Médicos têm um universo virtual à sua disposição, mas é

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Médicos têm um universo virtual à sua disposição, mas é
no4 | 2011
artigo
Caminhos do
tratamento
hormonal no
câncer de próstata
metastático
androgênio-dependente
atualização
Como funciona
e o que é
a auditoria
farmacêutica
Oncologiarede
na
Médicos têm um universo
virtual à sua disposição,
mas é preciso saber usar
A medicina foi uma das áreas que muito se beneficiaram com
as milhares de páginas da web, que vão desde os roteiros para
leigos, publicação de artigos de todo o mundo, transmissões de
congressos ou cirurgias em tempo real, à educação continuada não
presencial. É realmente um universo a favor dos profissionais da
saúde. O Dr. Renato Sabbatini é um dos médicos pioneiros na
exploração da Internet na medicina. Ele foi o fundador e diretor
por 20 anos do Núcleo de Informática Biomédica da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), em que criou
diversos projetos pioneiros, como o Hospital VirOncOlOgia
tual Brasileiro. Nesta edição, ele assina o artigo
Médicos têm um universo
virtual à sua disposição,
“Aplicações da Internet na Oncologia”, em que
mas é preciso saber usar
ensina caminhos seguros da navegação e dá
dicas de sites importantes para a especialidade.
A população masculina mundial enfrenta o câncer de próstata
como o segundo tumor de maior incidência e o sexto em mortalidade. Foram contabilizados cerca de 52.350 casos novos no
Brasil em 2010, tornando esse câncer o de maior incidência na
população masculina nacional (excetuando o câncer de pele não
melanoma). Os Drs. Ricardo Carvalho e Fernando C. Maluf
revisam o tratamento hormonal no câncer de próstata metastático androgênio-dependente.
A implantação da auditoria farmacêutica em hospitais ou em
outros serviços de saúde constitui uma importante ferramenta para
controle e avaliação dos recursos e procedimentos adotados nas instituições públicas e privadas, visando à melhoria na qualidade e resolubilidade. Conheça mais sobre o tema em “Atualização”.
O acompanhamento e a participação em pesquisas clínicas são fundamentais para os profissionais da saúde, pois oferecem uma base para a
avaliação crítica da prática em relação aos achados, e a promoção de mudanças pautadas nas evidências. Dr. Carlos Gil Ferreira, chefe do Serviço de Pesquisa Clínica do Instituto Nacional de Câncer (Inca), conta sua trajetória na “História
de Sucesso”. Não deixe também de conferir as notícias do “Espaço Sandoz”.
no4 | 2011
artigo
Caminhos do
tratamento
hormonal no
câncer de próstata
metastático
androgênio-dependente
atualização
Como funciona
e o que é
a auditoria
farmacêutica
Você já
parou para
pensar como seria o
mundo sem a Internet?
Parte dos leitores certamente
passou uma porção de suas
vidas sem saber o que a web
lhe reservaria, mas, uma vez
inserido nessa infinita rede
de informações, é muito
difícil, e arriscaria até dizer
impossível, sobreviver
sem ela.
na rede
Rua Anseriz, 27, Campo Belo
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Cód. da publicação: 12148.05.2011
O conteúdo desta obra é de inteira
responsabilidade de seu(s) autor(es).
Produzido por Segmento Farma Editores Ltda.,
sob encomenda de Sandoz, em abril de 2011.
Material de distribuição exclusiva à classe médica.
sumário
Boa leitura!
Os editores
4
11
15
16
20
atualidades
artigo de revisão
espaço sandoz
atualização
história de sucesso
Aplicações da Internet
a
i
g
o
l
o
c
na On
Renato M. E. Sabbatini
D
4
r. Renato M. E. Sabbatini é graduado e doutorado pela Faculdade de Medicina de Ribeirão
Preto da Universidade de São Paulo (USP), onde
também foi professor e pesquisador por 15 anos.
Foi fundador e diretor por 20 anos do Núcleo de Informática
Biomédica da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp),
onde criou diversos projetos pioneiros de uso da internet na saúde, tais, como o Hospital Virtual Brasileiro e várias revistas eletrônicas, projetos de telemedicina e de educação a distância na
área de saúde. Atualmente é presidente do Instituto Edumed
para Educação em Medicina e Saúde, uma instituição de pesquisa, ensino e desenvolvimento em tecnologias de informação e
comunicação (contatos: www.sabbatini.com/renato).
Pouca gente sabe, principalmente entre os mais jovens,
que a Web, o serviço mais importante da Internet, começou como uma forma de acesso on-line a textos simples,
principalmente artigos científicos, por volta de 1990. O
grande poder desses textos, no entanto, era a capacidade
de se interligarem uns aos outros por meio dos famosos
“links” ou apontadores. São aquelas palavras ou frases
grifadas que, quando clicadas com o mouse, remetem a
outro texto, localizado em qualquer ponto da rede, seja
no mesmo computador, seja em um computador do outro
lado do mundo, desde que esteja conectado à Internet.
Essa tecnologia imensamente poderosa é denominada de
hipertexto (o http:// que consta do endereço de páginas
na Web), mas quase imediatamente surgiu a hipermídia,
ou seja, a capacidade de interligar também outras formas
de informação, como imagens, animações gráficas, áudio
e vídeo digital etc., ampliando muito o alcance e a variedade de informações na Internet.
Desse modo, uma “teia” de informações (a “web”, em
inglês) superpôs-se a uma rede de interconexão física
entre computadores, e a consequência disso foi o crescimento exponencial e incontrolável das páginas de hipertexto e recursos de hipermídia, que hoje alcançam bilhões
e bilhões de unidades de informação. Quanto mais informação, mais útil será a Internet, tanto é que hoje ela
sobrepuja todas as outras formas de acesso à informação,
em qualquer área do saber.
Uma invenção mais poderosa ainda tomou a Internet
de assalto pouco tempo depois: a possibilidade de executar softwares aplicativos pela rede. Um exemplo simples:
um site que permite calcular o índice de massa corpórea
(IMC), a partir do peso e da estatura (veja: http://www.
nutriweb.org.br/n0101/imc.htm). A partir daí, a Web
deixou de ser uma teia de páginas para se transformar em
um gigantesco computador. “A rede é o computador”, diz
o ditado. Sua utilidade aumentou de forma espantosa, e
novas tecnologias são introduzidas a uma velocidade fantástica, que mal conseguimos acompanhar.
Neste artigo revisaremos algumas das aplicações mais
interessantes da Internet na área da saúde, principalmente para a oncologia.
Agulha no palheiro
Para usos profissionais em medicina e saúde, ferramentas
como PubMed, Google ou o Yahoo! (um dos pioneiros,
que era uma espécie de Páginas Amarelas da Internet) representam a forma mais completa, confiável e rápida de se
obterem informações sobre sites, páginas, bibliografias e
estatísticas na área. No entanto, para que você as use bem,
é necessário saber quais são os melhores e adicioná-los à
sua lista de favoritos em seu navegador. É preciso também dominar as técnicas de busca, para que os resultados
sejam obtidos de forma mais precisa, eficaz e rápida.
Onde estão os artigos?
A literatura de saúde tem crescido de forma exponencial,
tornando muito difícil para o médico e outros profissionais de saúde acompanhar o progresso do conhecimento,
até mesmo dentro da própria especialidade.
Tornaram-se imprescindíveis os recursos de indexação,
busca e localização rápida da informação publicada, a que
chamamos de pesquisa bibliográfica. Procurar artigos científicos de qualidade na Internet pode ser feito pelo Google, mas isso não é muito eficiente. O ideal é usar recursos
específicos e seletivos de pesquisa por palavras-chave. Na
área de saúde, o mais conhecido é o PubMed, mantido pela
National Library of Medicine dos Estados Unidos acessa uma base chamada Medline, com dezenas de milhões
de artigos de revistas publicadas desde o início dos anos
1960. No Brasil há várias outras bases de dados bibliográficos mantidas pela BIREME, agregadas sob o nome de
Biblioteca Virtual de Saúde (BVS). Muito útil também é o
Google Acadêmico, mais específico do que o Google geral,
embora não seja restrito apenas à área da saúde. Existem
outras ferramentas de busca para outras áreas da ciência,
como o Scopus, IngentaConnect, Scirus etc.
As bases de dados bibliográficos geralmente contêm
apenas os resumos dos artigos. Como localizar, então, as
fontes originais de informação? Felizmente, existe hoje
um grande número de revistas e livros on-line, uma con-
5
siderável parte deles gratuitos e que são apontados pelos
resultados da busca bibliográfica. Há também verdadeiras
bibliotecas eletrônicas, que hospedam centenas de revistas
científicas e médicas com os artigos acessíveis em texto
completo. Exemplos interessantes para a área da saúde são
a HighWire Press, a PubMed Central, a Public Library of
Science (PloS), e, no Brasil, a excelente SciELO (Scientific
Electronic Library), com revistas brasileiras e latino-americanas. Um bom índice de revistas eletrônicas gratuitas em
saúde na Web é o site FreeMedicalJournals.
Livros eletrônicos são também uma grande pedida para
acesso pela Internet. Hoje, até mesmo, você pode lê-los
confortavelmente usando um leitor eletrônico, como o
Kindle, o iPad, tablets similares e até smartphones. Existem
milhares de livros na área de saúde, tanto gratuitos quanto
pagos. Uma relação bem útil pode ser encontrada também
no site-irmão FreeBooks4Doctors ou ainda no enorme
Google Books, que realiza a pesquisa por palavras-chave.
Entrando pela porta
6
Com o crescimento exponencial no número de usuários,
principalmente entre os médicos e outros profissionais de
saúde, houve um interesse cada vez maior, que culminou a
partir de 1999 na criação e na manutenção de sites dedicados à informação profissional em medicina. Atualmente, este é um imenso setor, com dinâmica e modelos econômicos próprios, o qual foi denominado de e-Health, ou
seja, a medicina e saúde pela Internet. Os portais médicos estão entre eles.
E o que é um portal? Significa uma “porta de entrada”
para um conjunto de informações e serviços especializados, como acesso à informação científica, serviços de
conectividade (por exemplo, envio de faturas médicas
para convênios médicos usando a Internet) e comércio
eletrônico (compra e venda de bens e serviços pela Internet). Existem vários tipos de portais médicos atualmente, e a maioria deles sempre tem alguma coisa de útil
para oferecer para o médico que deseja se valer de algum desses serviços especializados. Os portais dedicados
a informações sobre medicamentos estão entre os mais
úteis e utilizados. Existem vários portais profissionais específicos para a área de oncologia, como a CancerNet, a
CancerWeb, a World Oncology Network, a Oncolink,
entre outros. As sociedades dedicadas à oncologia clínica
e cirúrgica também não deixam de ser portais especializados. São muitas, no Brasil e no exterior, que editam
também revistas eletrônicas.
Vendo e ouvindo on-line
Nos últimos anos, com a maior disseminação e o menor
custo dos acessos à banda larga, os áudios e vídeos on-line
tornaram-se extremamente populares, com sites como o
YouTube, Vimeo e similares gerando a maior parte do
tráfego atual da rede. Como não poderia deixar de ser, a
medicina, que é uma ciência em grande parte multimídia,
beneficiou-se profundamente com esses novos recursos, e
o número de imagens, áudios e vídeos agregados aos sites
especializados multiplicou-se enormemente. Atualmente,
é muito grande a variedade de informações que o usuário
interessado pode achar nesses formatos. Além dos sites
gerais citados, que podem ser pesquisados por palavras-chave, existem repositórios específicos de áudio e vídeo
em medicina. Podcast é uma transmissão on-line de áudio
(com aulas, entrevistas, informações sobre congressos, e
muito mais), que pode ser ouvida em seu computador ou
até mesmo em tocadores de MP3, como o iPod, telefones
celulares do tipo smartphone etc.
Aprendendo pela rede
O aperfeiçoamento contínuo do médico e de outros
profissionais de saúde envolve sua participação em várias atividades de aprendizado ao longo da vida, como
reciclagem, atualização, capacitação e treinamento
técnico e educação pós-graduada (cursos de extensão
universitária, especialização, pós-graduação lato sensu,
stricto sensu etc.). A Internet representa uma excelente
oportunidade de autoaprendizado por meio de nume-
Recursos de oncologia na Internet
Recursos gerais citados
Google: www.google.com.br
Google Acadêmico: www.scholar.google.com
Google Livros: www.books.google.com
PubMed: www.pubmed.gov
Biblioteca Virtual da Saúde: www.regional.bvsalud.org
Highwire Press: www.highwire.stanford.edu
PubMed Central: www.pubmedcentral.org
PloS: www.plos.org
SciELO: www.scielo.org
FreeMedicalJournals: www.freemedicaljournals.com
FreeBooks4Doctors: www.freebooks4doctors.com
YouTube: www.youtube.com
Vimeo: www.vimeo.com
EAD Instituto Edumed: www.ead.edumed.org.br
Sermo: www.sermo.com
Patients Like Me: www.patientslikeme.com
Instituições e associações (brasil)
(exterior)
Instituto Nacional do Câncer: www.inca.gov.br
Hospital do Câncer A.C. Camargo: www.hcancer.org.br
Fundação Oncocentro de São Paulo: www.fosp.saude.sp.gov.br
Instituto Ludwig de Pesquisa do Câncer: www.ludwig.org.br
Sociedade Brasileira de Cancerologia: www.sbcancer.org.br
Sociedade Brasileira de Oncologia Cínica: www.sboc.org.br
Associação Brasileira de Linfoma e Leucemia: www.abrale.org.br
Instituto Brasileiro de Controle de Câncer: www.ibcc.com.br
Centro Infantil Boldrini: www.boldrini.org.br
Sociedade Brasileira de Cancerologia: www.sbcancer.org.br
Sociedade Brasileira de Radioterapia: www.sbradioterapia.com.br
Colégio Brasileiro de Radiologia: www.cbr.org.br
Associação Brasileira de Registros de Câncer: www.abrc.org.br
Sociedade Brasileira de Oncologia Pediátrica: www.sobope.org.br
Instituto Nacional do Câncer dos EUA: www.cancer.gov
American Society of Clinical Oncology: www.asco.org
American Cancer Society: www.cancer.org
European Society for Medical Oncology: www.esmo.org
American Association for Cancer Research: www.aacr.org
American Society for Therapeutic Radioloy and Oncology:
www.astro.org
European Society for Therapeutic Radioloy and Oncology:
www.estro.be
Canadian Oncology Society: www.cos.ca
The National Comprehensive Cancer Network: www.nccn.org
sites (brasil)
(exterior)
Kit Câncer - Educação em Câncer: www.ecancer.org.br
Rede Brasileira de Combate ao Câncer: www.rbccancer.com.br
Aliança dos Médicos Contra o Câncer: www.amcc.com.br
Onco Guia: www.oncoguia.com.br
Oncopediatria.org: www.oncopediatria.org.br
Biblioteca Virtual de Oncologia: www.bvsoncologia.org.uy
World Oncology Network: www.worldoncology.net
Cancer Net: www.cancernet.co.uk
Cancer Web: cancerweb.ncl.ac.uk
OncoLink: www.oncolink.upenn.edu
About Cancer: http://cancer.about.com
Cancer Information Authority: www.thecancer.net
Oncology Tools: www.fda.gov/cder/cancer
Cancer Trial Help: www.cancertrialshelp.org
Oncology Clinical Trials:
www.centerwatch.com/patient/studies/area12.html
Clinical Trials: http://clinicaltrials.gov
eMedicine Oncology: www.emedicine.com/oncology
Medicine Net on Cancer: www.meds.com
revistas (brasil)
Revista das Sociedades Brasileiras de Câncer: www.rsbcancer.com.br
Revista Brasileira de Cancerologia: www.inca.gov.br/rbc
Acta Oncológica Brasileira: www.hcanc.org.br/acta
7
rosos sites que substituem, em grande parte, os meios
tradicionais usados para disponibilizar a educação continuada em saúde, como as bibliotecas e os programas
de autoestudo fornecidos por empresas e universidades, que usam materiais impressos, CD-ROMs e até
muitos tipos de cursos presenciais. Para isso existem
vários nomes e tecnologias, como educação a distância
(EAD), e-learning etc. Os cursos podem incluir áudios,
vídeos, videoconferência em tempo real (classe virtual)
e muitos outros recursos. Veja, para exemplificar, o site
de EAD do Instituto Edumed para Educação em Medicina e Saúde.
Outra forma bastante comum de atualização dos profissionais de saúde são os congressos. Pois bem, já existem
muitos congressos virtuais que são realizados inteiramente no ciberespaço ou que são disponibilização de congressos presenciais. Eles prometem revolucionar a disseminação do conhecimento nas ciências da saúde.
Socializando na rede
8
Não poderíamos deixar de mencionar uma das invenções
mais recentes da Internet, que tem sido chamada de Web
Social, ou Web 2.0. Ela se concretiza por intermédio de
sites denominados redes sociais, entre as quais as mais conhecidas são Orkut, MySpace, Facebook e Twitter. Hospitais, empresas, profissionais de saúde e muitos estudantes
usam intensamente essas redes para divulgar informações,
interagir com usuários, colegas e clientes, publicar informações textuais, visuais, auditivas e muito mais. Existem
também redes sociais especializadas para médicos, dentistas e outros profissionais da saúde, como a Sermo, nos Estados Unidos, e até redes sociais de pacientes interessados
em doenças específicas, como o PatientsLikeMe. Essas
redes, bem como a construção coletiva do conhecimento
(veja a MedPedia, por exemplo), blogs e microblogs, representam uma revolução dentro da revolução e alcançam
centenas de milhões de usuários ativos, que não somente
consomem, mas também geram informações.
Medicina feita de longe
A telessaúde (da qual a telemedicina é um subconjunto) é a aplicação da informática e das telecomunicações
para realizar diagnósticos, terapêuticas etc. a distância.
Existe uma infinidade de aplicações, como telecardiologia, telerradiologia, teledermatologia, teleoftalmologia,
telepsiquiatria e muitas outras. No Brasil, vários projetos foram iniciados em oncologia, como a rede OncologiaPediátrica.Org, e grandes sistemas como a RUTE
(Rede Universitária de Telemedicina) e a Telessaúde na
Atenção Primária estão em pleno funcionamento. Para
um país com dimensões continentais, como o Brasil, e
grande desigualdade de distribuição de recursos e pessoal médico, a telessaúde é absolutamente necessária e
precisa progredir muito mais.
Com a disseminação dos computadores portáteis e ultraportáteis (notebooks, netbooks, smartphones, tablets
etc.), a tendência é usá-los cada vez mais também, o que
vem sendo chamado de mHealth (saúde móvel).
Conclusões
Não há mais dúvida de que a Internet veio para ficar, é
cada vez mais influente e imprescindível na área da saúde, na medicina e na oncologia. É uma ferramenta hoje
tão importante como um estetoscópio ou um tomógrafo,
e está revolucionando profundamente a maneira como a
medicina é praticada, o relacionamento médico-paciente
e a operação das instituições de saúde. Para todos os profissionais de saúde, é importante cada vez mais dominar
essas ferramentas.
Referências
Sabbatini RME. e-Saude (e-Health). In: Knight PT, et al. (Editors):
e-Desenvolvimento. São Paulo: Yendis, 2007.
Sabbatini RME. Telemedicina e Informatização em Saúde (Telemedicine
and Informatization in Health). In: Siqueira E (org.) Technologies That
Change Our Lives. São Paulo: Saraiva, 2007.
Ricardo Carvalho
Membro integrante do Centro de
Oncologia do Hospital São José
CRM-SP 132.389
Fernando C. Maluf
Chefe da Oncologia Clínica do Centro
de Oncologia do Hospital São José
CRM-SP 81.930
Tratamento hormonal no
câncer de próstata
metastático androgênio-dependente
O
câncer de próstata representa o segundo tumor de maior
incidência e o sexto em mortalidade na população de sexo
masculino no mundo1. Nos Estados Unidos representa a segunda mais comum causa de óbito por câncer2. Em 2010, estimaram-se
no Brasil cerca de 52.350 casos novos, fazendo do câncer de próstata
o de maior incidência na população de sexo masculino (excetuando-se o câncer de pele não melanoma)3. Por meio da implantação de
programas de rastreamento utilizando o antígeno prostático específico
(PSA), tem-se alcançado um diagnóstico cada vez mais precoce, com
apenas 5% dos pacientes metastáticos ao diagnóstico. No entanto, uma
parte dos pacientes com doença localizada evoluirá com metástase em
algum momento de sua história clínica. Nesse momento, o foco do
tratamento passa a ser o controle da doença e a manutenção da qualidade de vida do paciente. Neste artigo, será abordado o tratamento
hormonal no câncer de próstata metastático androgênio-dependente.
A abordagem inicial se faz com a terapia de deprivação androgênica, por intermédio da castração cirúrgica (orquiectomia bilateral)
ou química com a utilização de análogos do hormônio de liberação
do hormônio luteinizante (LHRH), isolados ou em combinação com
antiandrogênios (AAs) periféricos4.
11
Os análogos do LHRH, como a
goserelina e a leuprorrelina, ao exercerem um contínuo estímulo à hipófise induzem uma transitória elevação
do hormônio luteinizante (LH), com
maior produção testicular de testosterona, o que pode resultar em elevação
inicial do PSA e aparente progressão
da doença (efeito flare). No entanto,
a persistência desse estímulo termina
por bloquear o eixo hipotálamo-hipófise, resultando em menor produção e liberação de testosterona, com
consequente inibição do crescimento
tumoral. A ausência da testosterona
circulante é a responsável direta pelo
desenvolvimento dos efeitos colaterais como fogachos, perda da libido,
impotência sexual, maior risco de
diabetes e doenças cardiovasculares,
além de perda óssea e muscular.
Os AAs são classificados em esteroidais (acetato de ciproterona) e
não esteroidais (bicalutamida, por
exemplo) e atuam inibindo a ligação
da di-hidrotestosterona aos receptores de androgênio. Pelo fato de interferir pouco no nível circulante da
testosterona, resultam em efeitos colaterais mais brandos que os observados com os análogos do LHRH.
Os diversos métodos de supressão
androgênica têm eficácia e perfil
de toxicidades semelhantes, sendo
observadas taxas de resposta (RR)
de até 80%. Em artigo recente, Seidenfeld et al. demonstraram uma
sobrevida global (SG) equivalente
entre os análogos de LHRH e a orquiectomia, com hazard ratio (HR)
de 1,12 (95% IC, 0,95-1,386)5. Na
tabela 1 podem-se observar diversos
estudos que analisaram a eficácia
dos AAs, sendo verificada menor
sobrevida naqueles pacientes que
utilizaram essa estratégia hormo-
nal androgênica quando comparada
à castração cirúrgica5-9. Apesar da
orquiectomia ser um procedimento
de baixo custo e de técnica simples,
ainda existe uma forte resistência, principalmente por parte dos
pacientes, em sua utilização como
estratégia inicial de bloqueio androgênico. Esse método é uma boa
opção para aqueles pacientes com
inadequada adesão ao tratamento
medicamentoso e naquelas situações em que se faz necessária uma
rápida queda dos níveis de testosterona, como é o caso dos pacientes com síndrome de compressão
medular, dor óssea severa e naqueles com sintomas de obstrução urinária. A Sociedade Americana de
Oncologia preconiza como estratégia inicial de escolha nos pacientes
com câncer de próstata metastático
androgênio-sensível a orquiectomia
Tabela 1. Terapia de supressão androgênica em câncer de próstata metastático: monoterapia
12
autor
pacientes
desenho
resultado
Kaisary et al.6
245
Bicalutamida versus orquiectomia
Sem diferença
Iversen et al. 7
376
Bicalutamida versus orquiectomia
Castração superior
Tyrell et al.8
1.453
Bicalutamida versus orquiectomia
Castração superior
Bales et al.9
> 1.000
Bicalutamida versus orquiectomia
ou análogo de LHRH
Castração superior
Seidenfeld et al.5
2.717
Metanálise
Castração superior
bilateral ou o uso de análogos do
LHRH, contraindicando o uso isolado dos AAs10.
O melhor momento para o início
da terapia de supressão androgênica
ainda é um tema controverso. Dados da literatura sugerem que o bloqueio androgênico precoce esteja
associado a uma maior sobrevida livre de progressão (p < 0,001) quando comparado ao bloqueio tardio
(iniciado somente na progressão/
piora dos sintomas), além de estar
associado a menos complicações
obstrutivas como a necessidade de
ressecção transureteral (p < 0,001)
e menos complicações ósseas (p <
0,001), com ganho discreto, mas estatisticamente significativo, em termos de SG em dez anos (p = 0,02).
Entretanto, esse benefício ocorre à
custa de maior toxicidade11-13. Por
outro lado, Studer et al., em um estudo randomizado com 197 pacientes demonstraram ganho em sobrevida câncer-específica favorável à
orquiectomia imediata (p = 0,09),
sem benefício em SG (p = 0,96)14.
O bloqueio androgênico completo
(BAC), isto é, a associação de orquiectomia ou análogos de LHRH
com os AAs não esteroidais, é uma
alternativa à supressão androgênica
em monoterapia. Essa estratégia parece estar relacionada a maior benefício, com ganho de até 13% em SG
em cinco anos quando se compara à
monoterapia, porém com maior toxicidade e possível impacto negativo
em qualidade de vida15,16. Resultados
semelhantes foram encontrados em
outra metanálise com mais de 6 mil
pacientes e 20 estudos16. Por sua vez,
Akaza et al., em estudo randomizado, duplo-cego, multicêntrico e de
fase 3, recentemente atualizado, com
205 pacientes com doença metastática, comparando o BAC (análogos
de LHRH + bicalutamida, 80 mg,
versus bicalutamida, 80 mg + placebo), demonstrou, após uma mediana
de seguimento de 5,2 anos, um ga-
nho significativo em SG a favor do
BAC (HR 0,78; 95% IC 0,60-0,99;
p = 0,049), com um ganho não significativo em sobrevida causa-específica e toxicidade semelhante entre os
grupos. Nesse estudo, mais pacientes
alcançaram um nadir do PSA ≤ 1
ng/mL com o BAC em comparação
ao grupo que recebeu os análogos
do LHRH em monoterapia (81,4%
versus 33,7%, p < 0,001)17,18. Um estudo italiano, com 259 pacientes e
follow-up de 54 meses, demonstrou
SG e sobrevida livre de progressão
semelhantes entre os grupos (bicalutamida isolada versus combinação
com goserelina e bicalutamida)19.
Dois estudos, um dinamarquês e
outro belga, comparando a eficácia
da orquiectomia bilateral versus a
combinação de goserelina com flutamida, apresentaram resultados
conflitantes20,21. Na tabela 2, pode-se
verificar a variabilidade de resultados
encontrados nos estudos que analisaram a eficácia do BAC.
Tabela 2. Terapia de supressão androgênica em câncer de próstata metastático: BAC
autor
pacientes
desenho
resultado
Akaza et al.17
205
BAC (com bicalutamida)
versus análogo de LHRH
A favor do BAC
Boccardo et al. 19
259
BAC (com bicalutamida)
versus bicalutamida
A favor da bicalutamida
Iversen et al. 20
264
BAC (com flutamida)
versus orquiectomia
Semelhante
Denis et al. 21
-
BAC (com flutamida)
versus orquiectomia
A favor do BAC
13
Em resumo, em pacientes com
câncer de próstata metastático hormônio-sensível, a orquiectomia bilateral ou o uso de análogos de LHRH
são as opções de escolha na terapia
inicial de supressão androgênica. O
BAC é associado a discreto ganho
na SG, porém à custa de maior toxicidade. Como estratégia alternativa
e reservada a casos selecionados nos
quais se opta por não se expor aos
efeitos colaterais da supressão de testosterona, a monoterapia com AAs
não esteroidais é uma opção, embora
com resultados inferiores à castração.
A escolha do tratamento deve sempre ser feita levando-se em consideração a preferência do paciente, suas
comorbidades, bem como os riscos e
benefícios de cada estratégia.
Referências
1. Jemal A, Bray F, Center MM, Ferlay J, Ward
E, Forman D. Global cancer statistics. CA
Cancer J Clin. 2011 Mar-Apr;61(2):69-90.
Epub 2011 Feb 4.
2. de Bono JS, Oudard S, Ozguroglu M, Hansen S, Machiels JP, Kocak I, et al. Prednisone plus cabazitaxel or mitoxantrone
for metastatic castration-resistant prostate cancer progressing after docetaxel
treatment: a randomised open-label trial.
Lancet. 2010 Oct 2;376(9747):1147-54..
3. Estimativa INCA 2010, Instituto Nacional
do Câncer, Ministério da Saúde, Brasil.
4. Damber JE, Aus G. Prostate cancer. Lancet. 2008 May 17;371(9625):1710-21.
14
5. Seidenfeld J, Samson DJ, Hasselblad V,
Aronson N, Albertsen PC, Bennett CL, Wilt
TJ. Single-therapy androgen suppression
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Sandoz entra no segmento
biofarmacêutico do Brasil
A Sandoz obteve a autorização de mercado de seu primeiro produto biológico: o Omnitrope (somatropina).
Com isso, a empresa é uma das primeiras a entrar no
segmento biofarmacêutico no Brasil.
O Omnitrope, cuja substância ativa é a somatropina,
é o biológico do hormônio do crescimento produzido
a partir da biotecnologia. Existem cerca de dez marcas
de medicamentos de referência com essa substância no
mundo, e algumas delas já são comercializadas no Brasil.
Biológicos ou biofármacos são medicamentos produzidos a partir de organismos vivos por meio de
técnicas de biotecnologia. Alguns biológicos são proteínas recombinantes e são produzidos utilizando-se
a tecnologia de DNA recombinante, um processo que
envolve a inserção de um gene específico em uma célula hospedeira para produzir uma proteína específica.
Essas moléculas representam uma classe diferenciada
de medicamentos comparados aos tradicionais medicamentos quimicamente sintetizados.
O Omnitrope é um produto injetável, registrado em
27 países. É produzido em instalações biofarmacêuticas
da Sandoz localizadas na Áustria (Kundl e Schaftenau).
Com a obtenção da autorização de mercado, a Sandoz
cumprirá as próximas etapas necessárias para iniciar a
comercialização do produto, o que deve acontecer até
De olho no futuro
o final do primeiro semestre deste ano.
toda a cadeia de valor.
Os medicamentos biológicos podem atender de uma
maneira mais eficaz às necessidades dos pacientes.
Estima-se que, até 2016, oito dos dez principais medicamentos do mundo serão biológicos.
Ao participar desse segmento biofarmacêutico,
a Sandoz reafirma sua visão de oferecer acesso a
medicamentos de alta qualidade.
Vanguarda
A Sandoz é líder mundial em desenvolvimento,
produção e comercialização de produtos biológicos. Tem marcado presença pioneira de produtos
biológicos em diversos países como Estados Unidos, Canadá, Japão, Austrália e também na região
da América Latina.
Essa posição de liderança traduz-se em três décadas de experiências biofarmacêuticas e mais de
uma década de experiência no desenvolvimento de
medicamentos biológicos. A Sandoz posicionou-se
dessa maneira dentro do grupo Novartis pela capacidade de integrar-se à biofarma e habilidade de
ampliar sinergias entre as divisões da empresa por
Para mais informações, acesse:
http://www.hexal.de.novartis.intra/files/flipbook/biosimilars_imagebroschuere_output/web/flipviewerxpress.html
15
auditoria
farmacêutica
A
16
trajetória da organização do sistema de saúde e do
mercado de planos privados de assistência à saúde
tem sido objeto de estudos de vários autores em todo
o País. A Constituição Federal de 1988 em seu Art. 196 estabeleceu as bases do Sistema Único de Saúde (SUS) que se consolidou na Lei nº 8.080, de 19/9/1990 e pretendia superar os
problemas do sistema de saúde brasileiro. Alguns estudos sobre
o SUS ainda revelam as dificuldades cotidianas de acesso aos
serviços de saúde, condições de atendimento nem sempre ideais e dificuldades para manter e contratar recursos humanos.
Nesse sentido, o mercado de saúde suplementar passou a ocupar um espaço cada vez maior no sistema de saúde brasileiro.
A industrialização crescente estimulou o credenciamento de
serviços e proporcionou a expansão desse mercado principalmente dando origem às empresas de medicina de grupo e co-
Márcia Manfredi
Mestre em Farmácia pela Universidade Federal de Santa
Catarina (UFSC), professora titular da disciplina Farmácia
Hospitalar na Universidade Regional de Blumenau (FURB),
coordenadora do MBA em Gestão Hospitalar no Sistema Unimed
CRF-SC 3.449
operativas. O mercado de saúde suplementar apresenta
especificidades que se estabelecem por meio das relações contratuais praticadas entre paciente, operadora e
provedor e obedece a resoluções que atualizam o rol de
procedimentos e eventos em saúde que constituem a
referência básica para cobertura assistencial nos planos
privados de assistência à saúde e fixam as diretrizes de
atenção à saúde.
Nos sistemas de saúde, considerando a relação que
se estabelece entre paciente, operadora e provedor, um
dos principais aspectos a considerar é o excesso de utilização de serviços, medicamentos e insumos, fato este
que pode estar relacionado com a presença de um terceiro pagador na relação paciente-provedor.
Tendo em vista que os medicamentos constituem
a intervenção terapêutica mais frequentemente utilizada, podendo ser também a mais econômica quando
corretamente empregada, e que compõem uma parcela expressiva do total médio dos gastos hospitalares,
recomendam-se estratégias custo-efetivas como único meio de superar situações críticas ocasionadas pela
adoção cada vez maior de novas práticas de medicina
e de dispendiosas novidades terapêuticas muitas vezes
sem comprovação de eficácia terapêutica.
As referências mundiais sobre o uso inapropriado
de medicamentos são numerosas e apontam causas múltiplas como a grande variedade de produtos
farmacêuticos disponíveis e a frequência de novas
As referências mundiais
sobre o uso inapropriado de
medicamentos são numerosas e
apontam causas múltiplas como
a grande variedade de produtos
farmacêuticos disponíveis e a
frequência de novas descobertas
na área que nem sempre agregam
valor terapêutico, mas aumentam
o custo dos tratamentos
descobertas na área que nem sempre agregam valor
terapêutico, mas aumentam o custo dos tratamentos.
O desenvolvimento da indústria farmacêutica, com o
aprimoramento das tecnologias de produção de medicamentos em larga escala e a descoberta de novos
agentes terapêuticos, levou à consolidação de um dos
mercados mais rentáveis e com maior crescimento nas
últimas décadas.
Nesse sentido, a implantação da auditoria farmacêutica constitui-se numa importante ferramenta para
controle e avaliação dos recursos e procedimentos adotados nas instituições públicas e privadas, visando à
17
A auditoria farmacêutica de contas médico-hospitalares consiste
no exame sistemático e independente dos fatos obtidos por meio
de observação, medição, ensaio ou outras técnicas apropriadas, de
uma atividade, elemento ou sistema, para verificar a adequação aos
requisitos preconizados pelas leis e normas vigentes
18
melhoria em qualidade e resolubilidade. Em publicações recentes na área hospitalar, os autores relatam que
muitos hospitais ainda desperdiçam recursos com erros corriqueiros relacionados aos medicamentos, como
aquisições desnecessárias e equivocadas e dispensações
exageradas, situações que podem ser evitadas por meio
da participação efetiva do profissional farmacêutico na
equipe de saúde como auditor.
A auditoria farmacêutica de contas médico-hospitalares consiste no exame sistemático e independente dos
fatos obtidos por meio de observação, medição, ensaio
ou outras técnicas apropriadas, de uma atividade, elemento ou sistema, para verificar a adequação aos requisitos preconizados pelas leis e normas vigentes. Na
função de auditor, o farmacêutico deve identificar-se
em todos seus atos, fazendo constar seu número de inscrição no CRF, e deve praticar atividades relacionadas
ao âmbito da profissão farmacêutica.
Há poucos anos, o Conselho Federal de Farmácia reconheceu a atividade do farmacêutico auditor por meio
da publicação da Resolução nº 508, de 29 de julho de
2009, estabelecendo que o farmacêutico auditor pode
desempenhar suas funções nos sistemas de avaliação
e controle efetuado pelo setor público (SUS), privado
(planos e seguros de saúde) e em auditorias para acreditação, premiações de qualidade e consultorias.
Compete ao farmacêutico, na função de auditor, as
seguintes atribuições:
a) Comprometer-se com o sigilo profissional, devendo registrar formalmente suas observações e conclusões, sendo vedada qualquer divulgação, exceto
em situação de dever legal.
b) Não autorizar, vetar ou modificar qualquer procedimento da organização auditada, limitando-se,
além de seu relatório, a propor sugestões.
c) Respeitar a liberdade e a independência dos outros profissionais, como integrante da equipe multiprofissional.
d) Ter visão holística, focada na qualidade de gestão,
qualidade de assistência e quanticoeconômico-financeira, visando ao bem-estar do ser humano.
e) Usar de clareza, lisura e sempre fundamentado nos
princípios constitucional, legal, técnico e ético.
A implementação das atividades do farmacêutico auditor pode ter início por meio do estudo das áreas de
atuação ou especialidades junto ao setor de estatística, com avaliação dos desempenhos individuais ou das
especialidades, segundo as necessidades apontadas nas
análises. Ações educativas com os farmacêuticos das
instituições prestadoras por meio de reuniões, discussões técnicas, correspondências, análises de protocolos
e incorporação de tecnologias e negociações são atividades fundamentais e devem fazer parte diariamente
das atividades da auditoria.
Outro aspecto importante a considerar é a elaboração
de indicadores de ações das atividades desenvolvidas, uma
vez que o registro, na forma de indicadores previamente
desenvolvidos, valida as ações do auditor e da auditoria
como grupo, dando-lhe transparência e credibilidade.
Considerando que a maioria dos atendimentos realizados em estabelecimentos assistenciais de saúde faz uso
de medicamentos, importantes ferramentas para o tratamento de diversas patologias podem ser considerados
como tecnologia altamente custo-efetiva e que podem
influenciar, de modo substantivo, as demais condutas
médicas, sua utilização de forma racional é imprescindível para que a qualidade da assistência prestada e ações
educativas voltadas a esse tema sejam asseguradas. Entretanto, a informação por si só não é suficiente para
modificar as práticas de prescrição. Atualmente, não
existe escassez de informações objetivas e atualizadas
sobre o uso apropriado de medicamentos, o que falta é
a distribuição e a aplicação das informações existentes.
O consumo de medicamentos em estabelecimentos
assistenciais de saúde deve ser monitorado por meio de
estudos de utilização de medicamentos que permitam
identificar práticas inadequadas de prescrição e utilização.
Os resultados poderão confirmar deficiências em vários
processos e darão respaldo à implantação da auditoria farmacêutica, que, por meio de estratégias específicas, pode
contribuir para o uso racional e consequentemente para a
redução dos gastos com medicamentos.
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Santa Catarina, Florianópolis.
19
Dr. Carlos Gil Ferreira
Soberania das
pesquisas clínicas
A
20
pesquisa clínica em oncologia é primordial,
pois é a partir dela que serão avaliados e
definidos os protocolos de tratamentos de
ponta. Além disso, sua realização está diretamente ligada à necessidade de inclusão de pacientes, o
que possibilita a muitos indivíduos o acesso a tratamentos inovadores, que dificilmente estariam disponíveis
pelo Sistema Único de Saúde (SUS) ou configurariam
na lista daqueles cobertos pelos convênios.
O Brasil é um país com grande potencial na pesquisa oncológica, pois dispõe de centros de estudo bem
estruturados, profissionais capacitados e o respaldo do
Instituto Nacional de Câncer (Inca).
Dr. Carlos Gil Ferreira é pesquisador sênior e chefe
do Serviço de Pesquisa Clínica do Inca, possui ampla
experiência na área de cancerologia e atua principalmente na pesquisa do câncer de pulmão, no desenvolvimento de novos fármacos, na biologia molecular, em
apoptose e no banco de tumores. Ele falou à Chymion
sobre a íntima relação entre a pesquisa e a prática clínica na oncologia e comentou sobre seu trabalho.
Chymion – O que diferencia o oncologista que participa
de pesquisas clínicas daquele que não o faz?
Dr. Carlos Gil Ferreira – A base de conhecimento é a
mesma. A diferença é que ser pesquisador clínico envolve um treinamento adicional. A pesquisa clínica dá ao
oncologista uma visão mais ampla do futuro do tratamento oncológico.
Chymion – Os médicos estão participando mais de protocolos e realizando bancos de registros?
Dr. Carlos Gil Ferreira – Sim, cada vez mais centros de
câncer participam de pesquisa clínica no Brasil, mas não
necessariamente gerando bancos de registro.
Chymion – O que o levou a atuar especificamente com a
pesquisa clínica?
Dr. Carlos Gil Ferreira – Desde a faculdade me interessei
por pesquisa. Minha escolha por oncologia foi baseada
nesse interesse de associar assistência e pesquisa. A pesquisa clínica é o campo ideal para esse casamento. Além
disso, o fato de eu possuir um Ph.D. em ciência básica
facilita a minha atuação como pesquisador clínico, já que
auxilia na compreensão de mecanismos de funcionamento celular e molecular das células malignas.
Chymion – Quais são suas principais áreas de interesse
e trabalho? O senhor também realiza pesquisa epidemiológica?
Dr. Carlos Gil Ferreira – Minhas áreas primárias de atua­
ção são o estudo do câncer de pulmão e o desenvolvimento de novos fármacos antineoplásicos. Participo de
estudos epidemiológicos que buscam caracterizar melhor
o perfil dos pacientes com câncer de pulmão no Brasil.
Chymion – Por que escolheu esses temas?
Dr. Carlos Gil Ferreira – Meu Ph.D. na Holanda teve
como tema a biologia celular e molecular do câncer de
pulmão e como a compreensão desses mecanismos pode
levar ao desenvolvimento de novas terapias. Essa formação influenciou a construção de minha carreira como oncologista e pesquisador.
Um dos objetivos desses estudos que realizamos é
compreender se as alterações moleculares que provocam
o câncer de pulmão no Brasil são as mesmas observadas
em outros países.
Chymion – Alguma de suas pesquisas já repercutiu na
prática, indicando novos caminhos terapêuticos?
Dr. Carlos Gil Ferreira – Alguns dados gerados pelo grupo
em que eu trabalhava na Holanda sobre uma classe de proteínas chamadas IAPs (inibidoras de apoptose) influenciaram o desenvolvimento de drogas que as tinham como alvo.
Da mesma forma, nosso grupo no Inca foi pioneiro
na proposição e utilização do modelo de câncer de colo
uterino como uma plataforma para o desenvolvimento
de drogas-alvo em oncologia, explorando as alterações
moleculares induzidas pelo vírus HPV (presente na
quase totalidade das pacientes com esse tipo de câncer).
Essa estratégia posicionou o Inca como um dos centros
de referência na área.
Chymion – O senhor acredita na individualização do
tratamento oncológico, com medicamentos cujo mecanismo de ação seja específico para cada paciente? Teremos essa realidade no Brasil?
Dr. Carlos Gil Ferreira – Esse é o único caminho viável
na oncologia: o droga ou a combinação de drogas certas
para os pacientes certos. Isso certamente é viável no Brasil.
Os estudos epidemiológicos moleculares que estamos coordenando no país, inicialmente em linfomas e câncer de
pulmão, têm o objetivo de caracterizar nossa população e,
dessa forma, servir como base conceitual para estratégias
ainda mais individualizadas no futuro.
Chymion – Qual é o cenário de pesquisas no Inca hoje?
Dr. Carlos Gil Ferreira – Os principais estudos clínicos
do Inca hoje se dividem nas seguintes linhas: estudos
epidemiológicos, moleculares para caracterizar as subpopulações com câncer de pulmão e linfomas; estudos
de desenvolvimento de fármacos em câncer de colo uterino; estudos de fase I em oncologia.
Chymion – O Inca deve lançar em 2011 a Rede Nacional
de Pesquisa Clínica em Câncer (RNPCC). O senhor
participa do projeto?
Dr. Carlos Gil Ferreira – Eu sou o coordenador da RNPCC.
Ela foi proposta como um braço da Rede Nacional de Pesquisa Clínica (RNPC) em função de suas peculiaridades que
marcam a pesquisa em oncologia. Ter pesquisadores com o
mesmo foco trabalhando juntos ajuda a criar sinergia. O
objetivo é realizar pesquisa clínica em oncologia ainda mais
alinhada com os interesses do SUS.
Chymion – Quais devem ser as principais estratégias
adotadas por médicos e pesquisadores brasileiros para
que protocolos seguros e eficazes sejam estabelecidos
com foco nas características da população nacional?
Dr. Carlos Gil Ferreira – Devemos cada vez mais caracterizar nossa população do ponto de vista epidemiológico
e molecular. A partir daí, é preciso focar na realização
de estudos que deem respaldo à incorporação de novas
tecnologias que sejam custo-efetivas.
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