Análise da Curva de Beveridge para a Cidade de Fortaleza

Transcrição

Análise da Curva de Beveridge para a Cidade de Fortaleza
Análise da Curva de Beveridge para a Cidade de
Fortaleza
Christiano Penna∗
Márcio Corrêa†
Setembro, 2008
∗
Doutorando em Economia do Centro de Pós-Graduação em Economia do Nordeste (CAEN),
Universidade Federal do Ceará. Email: [email protected].
†
Centro de Pós-Graduação em Economia do Nordeste (CAEN), Universidade Federal do Ceará.
Email: [email protected].
1
Resumo
Este trabalho se baseia na teoria da Curva de Beveridge e busca analisar o impacto das fricções
no mercado de trabalho, estudando o tema da eficiência no processo de formação de parcerias
produtivas para a cidade de Fortaleza. A Curva de Beveridge preconiza uma relação negativa
entre vagas ofertadas e desemprego. Para que haja um deslocamento dessa Curva é necessário
que a economia em análise passe por uma Curva de Atividade que não necessariamente mantém
tal relação. Através de uma análise empı́rica, com base num modelo recı́proco, buscamos estudar
como essa relação ocorre e de que forma os deslocamentos e movimentos ao longo de tais Curvas,
estimulados, podem vir a afetar o processo de job matching na cidade de Fortaleza.
Palavras-chave: Curva de Beveridge; Curva de Atividade; Job Matching
Abstract
This work is based on the Beveridge curve theory and seeks to analyze frictions and efficiency
in the job-matching process for the city of Fortaleza. The Beveridge curve advocates a negative
relationship between vacancies and unemployment. In order to have a shift in this curve is necessary
for the economy under consideration run through an activity curve, that not necessarily maintain
this relationship. Through an empirical analysis based on a reciprocal model, we examine how this
relationship occurs and how shifts and movements along the Beveridge curve are likely to affect the
job-matching process in Fortaleza.
JEL Classification: J64; J63; E32
Keywords: Beveridge Curve; Activity Curve; Job Matching
1
Introducão
O mercado de trabalho é caracterizado por imperfeições que decorrem, em sua grande
maioria, da heterogeneidade dos agentes e da dificuldade de obtenção de informações
acerca dos atributos dos trabalhadores e firmas, levando a coexistência sistemática
de postos de trabalho vagos e trabalhadores desempregados.1 Fundamentado nesta
caracterı́stica do mercado de trabalho, uma das abordagens mais utilizadas na literatura acadêmica consiste em estudar o comportamento da taxa de desemprego de
longo prazo, através da curva de Beveridge.2 Esta análise parte do pressuposto de
que existe uma relação negativa entre desemprego e postos de trabalho vagos ao
longo do tempo. Desta forma, é de se esperar que, ao longo de um determinado
ciclo econômico, as ofertas de emprego e a quantidade de desempregados apresentem
1
Tal problema leva a existência de desemprego friccional. Veja Pissarides (2000) para maiores
detalhes.
2
William Beveridge (1940) fez uma análise da influência dos ciclos econômicos no mercado de
trabalho britânico com dados de 1745 a 1849 e findou por constatar a existência de uma relação
negativa entre taxa de desemprego e postos vagos nos setores de têxtil e de construção.
2
taxas negativas de co-movimento, com altas ofertas de postos de trabalho e um baixo
nı́vel de desemprego sendo verificados em perı́odos de expansão econômica e, baixas
ofertas de trabalho e altos nı́veis de desemprego, sendo verificados em perı́odos de
contração econômica. Paralelamente, a Curva de Atividade pressupõe, no longo prazo,
a possibilidade de existência de uma relação positiva entre estas variáveis, refletindo
mudanças na velocidade e eficácia de formação de parcerias produtivas (job matching)
no mercado de trabalho.3
Nas últimas duas décadas uma vasta literatura, tanto teórica quanto empı́rica,
têm sido desenvolvida a partir do trabalho empı́rico pioneiro de Blanchard e Diamond
(1989) e da correspondência teórica proposta por Pissarides (2000). Contudo, persiste
a evidência de poucos estudos relacionados com dados do Brasil. Este fato decorre,
sobretudo, da ausência de dados consistentes sobre as ofertas de emprego durante um
longo perı́odo de tempo. Dentre os poucos trabalhos realizados para o Brasil podemos
citar Scandiuzzi e Gonzaga (2001), que buscam analisar os impactos dos choques de
demanda e de realocação no mercado de trabalho da cidade do Rio de Janeiro, e
Fraga e Dias (2007), que avaliam o papel do capital humano dos desempregados na
dinâmica do desemprego.
Desta forma, e buscando contribuir com a discussão e enriquecimento de exercı́cios
empı́ricos nesta área, este artigo utiliza o instrumental teórico proposto pela curva de
Beveridge de forma a examinar a dinâmica de formação de parcerias produtivas na
cidade de Fortaleza.4
Através da utilização do filtro de Hodrick-Prescott, torna-se possı́vel observar de
que modo a relação entre a taxa de desemprego e taxa de postos de trabalho vagos
da cidade de Fortaleza vem se comportando ao longo do tempo. Identificado tal
comportamento, realizou-se uma estimação conjunta das Curvas de Atividade e de
Beveridge e testou-se a possibilidade de um deslocamento desta segunda curva. As
evidências sugerem que houve um deslocamento ”para fora” da Curva de Beveridge,
sendo possı́vel inferir, com base na relação existente entre a Curva de Beveridge e a
Job Matching Function, que o mercado de trabalho de Fortaleza perdeu parte de sua
eficiência ao longo destes últimos 15 anos.
3
Note que as imperfeições no mercado de trabalho (ex. assimetria de informação, baixa mobilidade setorial e geográfica dos indivı́duos) podem tornar o processo de formação de parcerias lento
e, devido a isso, tanto o desemprego quanto o número de vagas ofertadas podem conviver em nı́veis
elevados, indicando a existência de recursos trabalhistas subutilizados.
4
Agradecemos ao SINE-IDT/Ce e ao SIGAE/MTE pela disponibilização dos dados.
3
O trabalho, após esta introdução, discorre sobre a Curva de Beveridge e a Curva de
Atividade, ferramentas teóricas que tratam dos custos de busca e eficiência no mercado
de trabalho. Em seguida, são apresentados os dados utilizados na pesquisa e propõese uma estratégia inédita, embora simples, com base no filtro de Hoddrick-Prescott
para identificação de um modelo econométrico a ser utilizado na análise empı́rica.
Após tal proposta, realiza-se uma estimação conjunta das Curvas de Atividade e de
Beveridge para a cidade de Fortaleza. Na seção final são apresentadas as principais
conclusões.
2
Curvas de Beveridge e de Atividade
A curva de Beveridge postula uma relação bivariada de equilı́brio entre a dinâmica
de criação de novos postos de trabalho e o fluxo de desemprego, pressupondo uma
relação negativa entre estas duas variáveis.5
Para ter uma idéia desta relação de equilı́brio, sejam U e V as respectivas quantidades de trabalhadores desempregados e de postos de trabalho vagos existentes
numa determinada economia. Considere N o nı́vel de emprego e L a força de trabalho
(L=N+U).6 Deste modo, ao impor retornos constantes de escala em m(U,V) e notando
que no estado estacionário o número de parcerias produtivas criadas deve igualar o
total de empregos destruı́dos, pode-se definir a Curva de Beveridge da seguinte forma:
λ = m(
u
, v).
1−u
(1)
Dois aspectos são relevantes na análise anterior, conforme podemos melhor visualizar na Figura 1: a distância da curva de Beveridge com respeito à origem e sua inclinação. Uma curva mais próxima da origem representa situações de maior eficiência
no processo de formação de parcerias produtivas, já que para um dado v, por exemplo, menor será o nı́vel de desemprego de equilı́brio. A inclinação da curva também
pode ser um indicador da capacidade de ajustamento do mercado de trabalho, pois
acusa em que medida o desaquecimento da economia se traduz em elevação na taxa
5
O número de parcerias produtivas formadas por perı́odo é dado por uma função (job matching function) não-negativa, côncava, homogênea de grau um e crescente em seus dois argumentos
M=m(U,V), onde U equivale ao número de trabalhadores desempregados à procura de emprego e V
a quantidade de postos de trabalho vagos. Veja Pissarides (2000) para detalhes.
6
Note que a taxa de desemprego pode ser definida como u=U/L e a taxa de postos de trabalho
vagos como v=V/L.
4
de desemprego. Note que quanto menor o impacto de uma desaceleração sobre a taxa
de desemprego (mais inclinada é a curva), maior será a capacidade de ajustamento
desse mercado.
Empiricamente, diversas possibilidades envolvendo a Curva de Beveridge podem
ser modeladas, buscando preservar sua relação negativa, sua convexidade e os retornos constantes de escala associados à job matching function.7 Contudo, as duas
abordagens empı́ricas mais difundidas na literatura são os modelos log-lineares do
tipo Cobb-Douglas e os modelos recı́procos.
Os deslocamentos da Curva de Beveridge são fatos comuns e vêm sendo constantemente identificados na literatura. Para que tal curva se desloque basta, por exemplo,
que a taxa de desemprego aumente sem que haja qualquer alteração nas taxas de
separação e de postos de trabalho vagos. Agora, como a Curva de Beveridge está
intimamente relacionada com a job matching function, tais deslocamentos sugerem
a exis- tência de outras variáveis capazes de contribuir para uma deterioração na
dinâmica de ocupação de postos de trabalho. Algumas das razões propostas pela literatura estão relacionadas, principalmente, com: i) o desemprego de longa duração,
que reduz a intensidade de busca dos desempregados e sua empregabilidade, através
da perda de competências8 ; ii) os benefı́cios concedidos pelo governo9 , como por exemplo os programas de transferência de renda; e iii) a dimensão do capital humano
disponı́vel na economia10 .
Assumindo que a relação entre a taxa de desemprego e a taxa de vagas é bem
comportada (i.e. assumindo que a relação entre tais variáveis é contı́nua ao longo
do tempo) e considerando o Teorema do Valor Intermediário, temos que seria pouco
provável a passagem de uma Curva de Beveridge para outra sem que se tenha uma
relação positiva entre taxa de desemprego e taxa de vagas (ver Figura 1 abaixo).
Ao definir a demanda por trabalho por LD = N +V , onde N e V são os respectivos
nı́veis de emprego e de postos de trabalho vagos, e a oferta de trabalho como LS =
7
Embora haja uma estreita relação entre a Curva de Beveridge e a job matching function, é
necessário ressaltar que esta primeira ferramenta é basicamente uma relação bivariada que associa
desemprego e postos de trabalho vagos, enquanto que a segunda engloba uma série de mecanismos
mais complexos também capazes de influenciar a dinâmica do desemprego.
8
Veja Budd et al. (1988) para detalhes.
9
Veja Jackman et al. (1989, 1990) para detalhes.
10
Veja Song e Webster (2003a, 2003b) para detalhes.
5
N +U, onde U representa o nı́vel de desemprego, podemos chegar a seguinte expressão:
V
LS
=
LD − LS
U
+ S.
S
L
L
(2)
Esta expressão anterior (Curva de Atividade) pode ser representada graficamente
como uma linha reta. Note que aumentos no processo de mismatching, originados, por
exemplo, pelo crescimento no desemprego de longa duração, a concessão de auxı́lios
financeiros por parte do governo e um desequilı́brio entre oferta e demanda de capital
humano poderiam deslocar a Curva de Beveridge. Contudo, este deslocamento deve
ocorrer sempre através da Curva de Atividade, conforme verifica-se na figura abaixo.
Figure 1: Curvas de Beveridge e de Atividade.
3
Análise Empı́rica
Na elaboração deste trabalho foram utilizadas duas séries disponibilizadas pelo Instituto de Desenvolvimento do Trabalho de Fortaleza (IDT - SINE / CE), são elas:
taxa de desemprego aberto e número de vagas captadas pela regional Fortaleza. Estas variáveis são mensais e abordam o perı́odo de janeiro de 1992 a julho de 2007.
6
A série da população economicamente ativa (PEA) da região metropolitana de Fortaleza disponibilizada pelo IBGE também foi utilizada como proxy para a força de
trabalho.11 Ao dividir a série disponibilizada pelo IDT, Vt , pela PEA de Fortaleza,
Lt , chega-se a variável taxa de postos vagos, vt . A variável desemprego aberto para
a região metropolitana de Fortaleza, ut , é a própria variável de interesse para análise
e não requer maiores comentários.12
Embora a relação conjunta entre tais variáveis seja extremamente irregular ao
longo do tempo, esta relação forma a base dos estudos empı́ricos que levam em consideração a Curva de Be- veridge e vem sendo empiricamente analisada desde o trabalho
precursor de Blanchard e Diamond (1989).13 Contudo, um fato levantado por Shimer
(2005) deve ser levado em consideração. É de se esperar que estas duas variáveis
tenham comportamentos cı́clicos distintos. A série de postos vagos deve acompanhar
o ciclo do produto, enquanto que a série de desemprego deve ter um comportamento
contrário. Desta forma, seria interessante a análise da dinâmica de longo prazo destas
variáveis, controlando para as flutuações tı́picas dos ciclos econômicos. O filtro de
Hodrick-Prescott, permite desagregar as duas séries em seus respectivos componentes
cı́clicos e de tendência. O comportamento temporal destas séries pode ser visto na
figura abaixo.
Ao se trabalhar com os componentes de tendência, ou seja, ao se descontar o
componente cı́clico das séries, a simples plotagem das séries originais dá lugar a um
gráfico de leitura mais regular e com maior conformidade com as condições de estado
estacionário, além de descrever o comportamento da relação entre desemprego e vagas
em Fortaleza ao longo do tempo, como se observa na figura 3.
Ao controlar para os efeitos cı́clicos, os possı́veis movimentos ao longo da curva
de Beveridge ficam evidentes. Pode-se notar que a partir de 1992 o número de vagas
ofertadas vai se ampliando enquanto que o desemprego vai se reduzindo. Tais fatos
provavelmente estão relacionados com a estabilidade econômica adquirida durante a
implantação do Plano Real.
Em janeiro de 1995 o desemprego atinge seu valor mı́nimo, retornando a crescer
até atingir seu máximo, em janeiro de 2004. Durante esse perı́odo, o nı́vel de vagas
11
Esta série é anual e foi extrapolada, ano a ano, para a obtenção dos respectivos valores mensais.
Por simplicidade, daqui por diante nos referiremos a estas duas variáveis como postos vagos e
desemprego.
13
Veja também Petrongolo e Pisarides (2001), Archambault e Fortin (2001), Wall e Zoega (2002),
dentre outros.
12
7
Figure 2: Desemprego e Vagas em Fortaleza
mantém-se dentro de um intervalo relativamente restrito.
Após 2004, Fortaleza volta a experimentar uma nova queda do desemprego e
um crescimento no número de postos de trabalho vagos. Como anteriormente mencionado, verifica-se um aumento na taxa de desemprego, sem uma alteração das taxas
de separação e de postos vagos, pode estar sugerindo um deslocamento da Curva
de Beveridge. Nestes termos, se forem encontradas evidências de que a Curva de
Berveridge vem se deslocando ”para fora”, teremos indı́cios de que o mercado de trabalho em Fortaleza estaria passando por um processo de perda de eficiência. Como os
possı́veis deslocamentos sempre se dão, através de uma Curva de Atividade, este fato
sugere que em algum ponto do tempo a relação negativa entre postos vagos e desemprego deve cessar, passando a se verificar uma relação positiva entre estas variáveis.
Posteriormente, somente após atingir a nova Curva de Beveridge, é que as variáveis
regresam ao seu estado inicial de correlação negativa.
No intuito de testar esta possı́vel mudança, formulou-se um modelo recı́proco com
a seguinte especificação:14
u t = β Xt + ε t ;
14
(3)
A especificação de um modelo log-linear requer ainda a imposição de retornos constantes de
escala de forma a eliminar a possibilidade de ocorrência de equilı́brios múltiplos. Entretanto, como
podemos verificar pelo gráfico 3, temos garantido a unicidade do equilı́brio. Desta forma, não existem
problemas em se trabalhar com o modelo do tipo recı́proco.
8
Figure 3: Desemprego versus Postos Vagos para a Série Original e Transformada
onde:
Xt = [1, D1t , D2t , ( v1t ), D1t ( v1t ), D2t ( v1t )]; Djt = 1, se t ≥ TjQ , e Djt = 0, caso
contrário;j = 1, 2. T1Q < T2Q são os perı́odos onde ocorrem as quebras estruturais,
ambos determinados endogenamente pelo modelo.15
Os parâmetros da equação anterior são estimados pela aplicação seqüencial de
mı́nimos quadrados condicionados a cada ponto do espaço de parâmetro Π.
Para cada TQ ∈ Π define-se o resı́duo εt = ut − β Xt . Se σ
2 (TQ ) é a variância
residual, a estimativa de MQO de TQ é o valor que minimiza a variância residual no
espaço Π.
Observa-se que esta modelagem sugere que quanto maior o número de vagas,
menor deve ser o desemprego em Fortaleza. As dummies endógenas captam qualquer
tipo de modificação no comportamento estrutural das variáveis, notando que no modelo proposto em (3) as quebras estruturais permitem identificar tanto mudanças no
intercepto, como na inclinação da curva de Beveridge.
O modelo sugere que podemos testar se houve um deslocamento da curva pois,
15
Embora as séries geradas pelo filtro HP sejam uma melhor aproximação para as condições de
estado estacionário da economia, os componentes de tendência gerados pelo filtro nos dão uma
excelente proxy para uma tendência de longo prazo das variáveis. Entretanto, ao suavizar as séries,
obter-se-á um componente de persistência nas mesmas. O resultado é que sempre teremos séries I(1)
e, neste caso, não poderemos trabalhar com a regressão anterior. Pode-se argumentar que o correto
seria trabalhar com vetores de cointegração, entretanto, não houveram muitos avanços na área de
VECM com mais de uma quebra estrutural desconhecida.
9
caso os coeficientes associados às dummies de inclinação não sejam estatisticamente
significantes, não terı́amos evidências de deslocamentos da curva de Beveridge. Em
outras palavras, durante todo o perı́odo em análise, a cidade de Fortaleza estaria
repousando sobre uma mesma curva. De outro modo, e o que parece ser mais plausı́vel
com base na análise da figura 3, pode-se esperar que os coeficientes das dummies
de inclinação sejam estatisticamente significantes e que tenham sinais alternados,
sugerindo a existência de três possı́veis Curvas - uma curva de Beveridge inicial, uma
Curva de Atividade e uma Curva de Beveridge final.
Desta forma, e dada a especificação do modelo, estimou-se a equação (3) utilizando as variáveis originais através de mı́nimos quadrados ordinários e erros padrão
consistentes com heterocedasticidade.16 Os resultados são os que se seguem:
Figure 4: Estimativas da Expressão 3
As dummies endógenas apontam para quebras estruturais em maio de 1998 e
março de 2001. Observa-se que o modelo está bem ajustado e que as dummies são
estatisticamente significantes (a não ser a segunda dummy de intercepto), sugerindo
a existência das três curvas.
As inclinações descritas a seguir são dadas por −βi ( 12 ), onde X representa o
X
número médio de vagas (0,001281). Na figura (5) apresentamos uma sı́ntese destas
três curvas.
As Curvas de Beveridge apresentam inclinação negativa, enquanto que a Curva
de Atividade relaciona desemprego e vagas de maneira positiva. Em posse das estimativas, podemos formular a variável desemprego estimado, u
t , e, ao plotarmos tal
16
Como de praxe, é necessário que ambas as séries sejam estacionárias. Aqui foi utilizado o teste
de raiz unitária proposto por Lanne et al. (2002). Para ambas as séries rejetita-se a hipótese nula de
raiz unitáira para um nı́vel de significância de 5 por cento. As quebras estruturais endógenas para
as séries de vagas e desemprego datam, respectivamente, em 1994 (mês 6) e 2003 (mês 9).
10
Figure 5: Coeficientes de Intercepto e de Inclinação
variável contra a variável postos vagos, chegamos às Curvas estimadas de Beveridge
e de Atividade para Fortaleza.
Figure 6: Curvas de Beveridge e de Atividade para Fortaleza
Como pode ser constatado pelas figuras (5) e (6), entre janeiro de 1992 a aproximadamente meados de 1998, a cidade de Fortaleza repousa sobre uma primeira curva
de Beveridge, B1, mais próxima da origem e mais horizontal, representando um maior
nı́vel de eficiência na formação de parcerias produtivas. Em um perı́odo posterior,
Fortaleza sai desta curva e entra numa Curva de Atividade, AC. Até abril de 2001
ocorre um aumento conjunto do desemprego e dos postos vagos. A partir deste ponto
(de maio de 2001 até julho de 2007) Fortaleza sai da Curva de Atividade e passa para
11
uma outra Curva de Beveridge, B2, mais vertical que a primeira. Isto sugere que o
mercado de trabalho da cidade parece perder tanto a sua capacidade de ajuste, em
comparação com o perı́odo de 92 a meados de 97, quanto seus nı́veis de eficiência, ja
que é necessário um maior número de vagas para redução nos nı́veis de desemprego.
4
Conclusão
A análise realizada foi baseada, única e exclusivamente, na Curva de Beveridge e, portanto, torna-se necessário um aprofundamento no referencial teórico da job matching
function para melhor subsidiar a análise da deterioração da taxa de formação de
parcerias produtivas. Entretanto, a literatura econômica sugere que os deslocamentos da Curva de Beveridge se dão, principalmente, devido ao mismatching gerado, por
exemplo, pelo crescimento do desemprego de longa duração, pelos auxı́lios concedidos
pelo governo e pela dimensão do capital humano disponı́vel na economia.
Song e Webster (2003) retratam evidências empı́ricas de que, ao se desagregar
a Curva de Beveridge da Austrália para trabalhadores mais e menos habilidosos, a
curva dos trabalhadores mais habilidosos é mais próxima da origem do que a dos
menos habilidosos. Isto é o que parece estar vindo a ocorrer na cidade de Fortaleza.
No perı́odo inicial os trabalhadores mais qualificados vinham se equiparando à dimensão do capital humano requerido pelas firmas, resultando em um maior nı́vel de
formação de parcerias. Com o passar do tempo, Fortaleza passa a crescer de maneira
elevada, e o crescimento do número de postos vagos é acompanhado pelo aumento do
desemprego. Surge então um hiato entre o capital humano disponibilizado pelos trabalhadores em busca de emprego e o requerido pelas firmas, agravando o mismatching
na cidade de Fortaleza. Posteriormente, a demanda por mão-de-obra passa a se ajustar à dimensão de capital humano levando a economia a retornar para uma relação
postos vagos/desemprego condizente com a Curva de Beveridge. Sob tal argumento,
seria necessário uma ampliação do capital humano dos traba- lhadores em busca de
emprego.
No tocante à participação do Governo, dois efeitos são relatados pela literatura:
um positivo e outro negativo. O primeiro revela que polı́ticas públicas voltadas para a
maior formação de parcerias produtivas são capazes de deslocar a Curva de Beveridge
para posições mais próximas da origem [Jackman et al. (1990)]. Desse modo, fica
claro que as esferas públicas no âmbito municipal, estadual e federal devem agir no
12
sentido de incentivar a formação de parcerias produtivas entre firmas e trabalhadores.
Isto pode ser feito através do fortalecimento de órgãos como o SINE/CE e de outras
instituições de intermediação laboral.
Contudo, vale a pensa ressaltar que algumas polı́ticas públicas podem gerar efeitos
perversos sobre a dinâmica do desemprego. Jackman et al. (1989) retratam ainda que
as transferências significativas por parte do governo podem estar elevando o salário
de reserva dos desempregados, diminuindo os incentivos para a saı́da da situação de
desemprego, levando a deslocamentos da Curva de Beveridge.
5
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