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Superior Tribunal de Justiça AgRg no RECURSO ESPECIAL Nº 762.440 - RS (2005/0104956-4) AGRAVANTE ADVOGADOS AGRAVADO INTERES. INTERES. INTERES. ADVOGADO : ASSOCIAÇÃO NACIONAL DAS EMPRESAS TRANSPORTADORAS DE VEÍCULOS - ANTV : DÉCIO FREIRE E OUTRO(S) JOSÉ ZATTI FACCIONI E OUTRO(S) : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL : GENERAL MOTORS DO BRASIL LTDA : SINDICATO NACIONAL DOS TRANSPORTES RODOVIÁRIOS DE VEÍCULOS E PEQUENAS E MICRO EMPRESAS DE TRANSPORTE RODOVIÁRIO DE VEÍCULOS : LUÍS MOAN YABIKU JÚNIOR : SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS RELATÓRIO O EXMO. SR. MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO (Relator): Em primeiro grau de jurisdição, o Ministério Público Federal promoveu ação civil pública, com pedido de tutela antecipada, contra a Associação Nacional das Empresas Transportadoras de Veículos - ANTV, ora agravante, o Sindicato Nacional dos Transportes Rodoviários de Veículos e Pequenas e Micro Empresas de Transporte Rodoviários de Veículos - SINDICAN e a General Motors do Brasil, objetivando a abertura do segmento de mercado para os "cegonheiros" autônomos na área de transporte para diversas localidades do país de veículos fabricados pela montadora General Motors do Brasil. A tutela antecipada foi concedida pelo Juízo monocrático, sob o entendimento de que o SINDICAM, a GMB e a ANTV teriam cartelizado o mercado de transporte de veículos, determinando que empresas e profissionais autônomos, desvinculados das empresas associadas da ANTV e não filiados ao SINDICAM realizassem, compulsoriamente, serviços de transporte de veículos à GMB. Contra essa decisão a ANTV interpôs agravo de instrumento, ante a suposta violação do princípio da livre iniciativa. O agravo restou desprovido pelo Tribunal Regional Federal da Quarta Região. Neste entretempo, o Ministério Público Federal emitiu recomendações Documento: 13208719 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 1 de 7 Superior Tribunal de Justiça (fls. 215/226) às empresas montadoras de automóveis (PEUGEOT e IVECO) para que promovessem medidas de abertura do sobredito mercado, com a contratação de novas transportadoras, não relacionadas à Associação Nacional das Transportadoras de Automóveis. Inconformada a ANTV requereu ao Juízo competente que tais recomendações fossem tornadas sem efeito, bem como que determinasse ao MPF que se abstivesse da emissão de novos atos. O pedido foi negado nos seguintes moldes: "Consoante o disposto no inciso XX da Lei Complementar nº 75/93, o Ministério Público Federal poderá expedir recomendações, visando a melhoria dos serviços publico e de relevância pública, bem como ao respeito, aos interesses, direitos e bens cuja defesa lhe cabe promover, fixando prazo razoável para a adoção das providências cabíveis. Ademais, o art. 129, III, da CF/88 estatui ser função institucional do Ministério Público "promover o inquérito civil e ação civil pública para a defesa do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos". (fls. 18) (...) Por conseguinte, a adoção de medidas atinentes à prevenção e repressão às infrações contra a ordem econômica do país, estão entre as atribuições do Ministério Público. Dessarte, durante o procedimento investigatório, destinado à coleta de elementos para eventual propositura de ação civil pública, como no caso, o Ministério Público Federal poderá expedir recomendações às pessoas (físicas ou Jurídicas) para que se abstenham de praticar atos que se abstenham de praticar atos que supostamente configurem infrações à ordem econômica." (fls. 20) O agravo de instrumento manejado contra essa decisão foi desprovido pelo Tribunal Regional Federal da Quarta Região em acórdão assim vazado: "PROCESSUAL. COMPETÊNCIA. MINISTÉRIO PÚBLICO. MERCADO DE TRANSPORTE DE VEÍCULOS. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. É de competência do Ministério Público da União expedir recomendações, ex vi do disposto no artigo 6º, XX, da Lei Complementar n. 75/93 (EMP), a circunstância de que tal recomendação decorreu da interposição de ação civil pública em Documento: 13208719 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 2 de 7 Superior Tribunal de Justiça trâmite perante a Seção Judiciária do Rio Grande do Sul, onde restou deferida a liminar para "abrir" o mercado de transporte autônomo de veículos por empresas não vinculadas à ANTV, bem como ao SINDICAM." (fls.244) Opostos embargos de declaração foram desacolhidos. (fls. 254) Inconformada, a Associação Nacional das Empresas Transportadoras de Veículos - ANTV interpôs o presente recurso especial alegando violação ao art. 535 do CPC e ao art. 6º da Lei Complementar nº 75/93. Sustentou a recorrente, em preliminar, que o acórdão recorrido não apreciou as seguintes questões: (a) a inexistência de poderes do Ministério Público para direcionar a atividade comercial; (b) a ausência de autorização, por parte da Lei 8.884/94, para emissão desses atos; (c) que as recomendações não se prestam para ameaçar os destinatários e tampouco constituí-los em mora e (d) que os atos representam violação ao princípio constitucional da livre concorrência e que somente poderiam ser emitidos pelo parquet após a decisão definitiva. No mérito, afirmou que "o poder de expedir recomendações, contido no art. 6º, inciso XX da Lei Complementar nº 75, de 1993, só pode ser entendido dentro das funções institucionais do Ministério Público, constantes do art. 129 da Constituição Federal. " (fls. 262) Nesse particular, salientou que as recomendações somente estariam autorizadas, no caso concreto, se as empresas citadas prestassem serviços de relevância pública, nos moldes do art. 6º, inciso XX da Lei Complementar nº 75, de 1993. (fls. 263/264) Aduziu, por fim, que "é certo que as acusações contidas na petição inicial da presente demanda ainda estão sob apuração não só por parte deste egrégio juízo como também pelas autoridades administrativas que fazem parte do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência ." (fls. 265) O recurso foi admitido na instância de origem (fls. 296) e, nesta Corte, foi Documento: 13208719 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 3 de 7 Superior Tribunal de Justiça inicialmente distribuído no âmbito da Primeira Seção que, em questão de ordem, declinou de sua competência. (fls. 313/314) O Ministério Público Federal opinou pelo não conhecimento do especial. (fls. 307/311) O recurso foi julgado em decisão monocrática, da lavra do Ministro Paulo Furtado, assim sintetizada: "DECIDO: Preliminarmente, quanto à alegada negativa de prestação jurisdicional, não se verifica, na espécie, omissão ou ausência de fundamentação na apreciação das questões suscitadas perante o Tribunal a quo. Como é sabido, não está o órgão julgador obrigado a se manifestar sobre todos os argumentos apontados pelas partes, a fim de expressar o seu convencimento. O pronunciamento sobre os fatos controvertidos, a que está o magistrado obrigado, encontra-se objetivamente fixado nas razões do acórdão vergastado. Efetivamente, como bem destacado no voto dos declaratórios, os embargos interpostos buscaram a reforma do julgado, porque não caracterizada qualquer das hipóteses do art. 535 do CPC. Em relação ao art. 6º, XX, da LC 75/93, a tese defendida pela recorrente demanda o revolvimento do contexto fático e probatório dos autos, desafiando a Súmula 7/STJ, com o seguinte teor: A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial. Ante o exposto, NEGO SEGUIMENTO AO RECURSO ESPECIAL , nos termos do art. 557 do CPC." (fls. 338) Sobrevindo, então, o presente agravo regimental, a Associação Nacional das Empresas Transportadoras de Veículos sustentou a clara violação ao art. 535 do CPC, bem como a inaplicabilidade da súmula 07/STJ ao caso. (fls. 344) É o relatório. Documento: 13208719 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 4 de 7 Superior Tribunal de Justiça AgRg no RECURSO ESPECIAL Nº 762.440 - RS (2005/0104956-4) VOTO O EXMO. SR. MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO (Relator): A irresignação não merece acolhida. De início, no que concerne à alegação de negativa de prestação jurisdicional, verifica-se que as questões submetidas ao Tribunal a quo foram suficiente e adequadamente apreciadas, com abordagem integral do tema e fundamentação compatível. Ademais, o magistrado não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos trazidos pela parte pois quando pronuncia-se de forma clara e suficiente sobre a questão posta nos autos, ainda que sucintamente, não se configura ofensa ao artigo 535 do CPC. De sua vez, a faculdade conferida ao Ministério Público de emitir recomendações decorre do cumprimento de sua missão institucional de zelar pela proteção aos serviços públicos, aos serviços de relevância pública, bem como aos direitos constitucionalmente assegurados cuja defesa lhe cabe, nos termos do art. 129, II, da Constituição Federal. Dessa forma, ao contrário do que afirmado pelo agravante, compete ao parquet a emissão de recomendações não só nos casos que evolvam serviços públicos ou de relevância pública, mas em todo e qualquer caso que diga respeito à sua atuação institucional. A propósito, confira-se, quanto ao particular, a previsão contida na LC nº 75/93: Art. 6º Compete ao Ministério Público da União: .... XX - expedir recomendações , visando à melhoria dos serviços públicos e de relevância pública, bem como ao respeito, aos interesses, direitos e bens cuja defesa lhe cabe promover , fixando prazo razoável para a adoção das providências cabíveis. (grifei) Documento: 13208719 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 5 de 7 Superior Tribunal de Justiça De outro lado, não impressionam os argumentos de que as recomendações não se prestam para ameaçar os destinatários e tampouco constituí-los em mora, ou de que somente poderiam ser emitidos após a decisão definitiva. Com efeito, "como o próprio termo indica, a recomendação não é uma ordem, uma requisição ou uma imposição de conduta. Tem a natureza jurídica de alerta, advertência, pedido de providência, indicação de um problema identificado (falhas nos serviços públicos ou desrespeito a direitos do cidadão, p. ex.), com sugestão dos meios para a respectiva correção. " (JOÃO BATISTA DE ALMEIDA. In Aspectos Controvertidos da Ação Civil Pública: Doutrina e jurisprudência - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2001). Não foi outra a tessitura que o Juízo monocrático conferiu ao instituto da recomendação, senão vejamos: "Impende destacar que o descumprimento da recomendação pelo(a) destinatário(a) não implicará qualquer condenação ou privação de bens ou liberdade, o que somente se dará por meio de ordem judicial. Nesses ternos, não há como proibir o Parquet de expedir recomendações, porquanto age no exercício de suas atribuições e nos limites legais." (fls. 20) Ainda nesse particular, convém lembrar que, conquanto a lide ainda não tenha sido definitivamente decidida, a tutela antecipada, deferida pelo Juízo monocrático, (determinando que empresas e profissionais autônomos, desvinculados das empresas associadas da ANTV e não filiados ao SINDICAM realizassem, compulsoriamente, serviços de transporte de veículos à GMB), foi mantida pelo Tribunal a quo no julgamento de agravo de instrumento, consoante a ementa abaixo transcrita: ORDEM ECONÔMICA.PROCEDIMENTOS LIMITADORES. ATIVIDADE ECONÔMICA. LIBERDADE. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. REQUISITOS. CONCESSÃO. Necessidade de prestigiar a liberdade de concorrência, a liberdade de fixação de preços em face dos custos que cada prestador Documento: 13208719 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 6 de 7 Superior Tribunal de Justiça de serviços de transporte efetivamente tem. A atividade econômica - fundada na valorização do trabalho humano e nas livres iniciativa e concorrência - deve ser pautada no sentido de assegurar a todos uma existência digna e justa, a teor da CF/88, art. 170. Fortes indícios de abuso de poder econômico por uso de práticas de fixação de preços e condições de venda de bens ou de prestação de serviços de transporte de veículos novos, saídos das montadoras ou originados de importação por montadoras. Identificadas limitações e empecilhos de acesso de novas empresas no mercado "cegonheiro". Inadmissível que o bem o e serviços ingressem no mercado de consumo de forma tabelada, com preços pré-fixados, sem liberdade de escolha de rota/trecho/trajeto de transporte. Presentes os requisitos necessários à concessão da antecipação de tutela. (notícia extraída do sítio do Tribunal de origem) Destarte, por tudo o que exposto anteriormente, a atuação do Ministério Público não representa violação ao princípio constitucional da livre concorrência, como alega o agravante, mas direciona-se à repressão ao abuso do poder econômico consistente, no caso, na formação ilegal de cartéis e na conduta comercial abusiva. Nessa perspectiva, exsurge clara a legitimação do Ministério Público para a tutela da ordem econômica, evitando infrações contra a economia popular e os interesses dos consumidores. Nesse sentido, observe-se a redação do diploma legal regente da matéria: Art. 1º Regem-se pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da ação popular, as ações de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados: ... V - por infração da ordem econômica e da economia popular. (Lei 7.347/85) Nesse contexto, cabe advertir acerca da eventual oposição de incidentes processuais infundados, capazes de ensejar da aplicação de multa por conduta indevida. Ante o exposto, nego provimento ao agravo regimental. É o voto. Documento: 13208719 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 7 de 7