Os Desafios das Organizações na Era do Conhecimento

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Os Desafios das Organizações na Era do Conhecimento
Os Desafios das Organizações na Era do Conhecimento
Autores:
Antonio Carlos de Azevedo Ritto
Doutor em Informática - PUC-Rio, Professor da Faculdade Carioca e da UERJ.
Rua Prudente de Morais, 237/301 – Ipanema Rio de Janeiro – RJ – CEP 22420-041
Fone 513-1038 - e-mail [email protected]
Luiz Sérgio Brasil d’Arinos Silva
Pós-graduado em Estudos Financeiros – FGV-RJ, Desenhista Industrial - ESDI-RJ.
Professor da Faculdade Carioca.
Av. Rainha Elizabeth, 676/701 – Ipanema – Rio de Janeiro – RJ – CEP 22081-030
Fone 267.8445 - e-mail [email protected]
Palavras chave - Organização, Gestão, Desenvolvimento Sustentado, Educação Continuada.
Resumo
Um novo, intrigante e desafiador ambiente envolve as organizações nas dimensões sócio-política, científica e
tecnológica e na revolução do conhecimento, determinando mudanças, tanto na ciência econômica, como na
ciência da administração. Desafios e tendências quanto ao trabalho, à sociedade, às organizações, ao mercado e
ao capital alimentam reflexões que cogitam modelagens plurais para inclusão de diferenças e de educação
continuada para a evolução no sentido do conhecimento.
1 Introdução
A proposta deste trabalho é convidar à reflexão sobre os caminhos da gestão, a partir do questionamento de
paradigmas vigentes que se mostram incapazes de prover soluções adequadas às organizações, em função das
mudanças verificadas no ambiente que envolve a todos.
2 O Conceito de Organização
Com o intuito de homogeneizar linguagens, cabe, primeiramente, contemplar o conceito de organização, tratado
em maior profundidade pela Ciência Econômica e pela Ciência da Administração. No caso da Ciência
Econômica, o conceito aparentemente mais próprio resume organização em estratégia e estrutura (CHANDLER,
1998), no sentido de que a estratégia a ser seguida define a estrutura organizacional desejada. Para Stonner e
Freemann (STONNER, 1995), na Ciência da Administração, "Organização é um conjunto de duas ou mais
pessoas trabalhando juntas e de modo estruturado para alcançar um objetivo específico ou um conjunto de
objetivos."
3 O Ambiente que envolve as Organizações
Há um mundo inteiramente novo envolvendo as organizações. Houve mais mudanças nos últimos cem anos, do
que nos mil anos anteriores. Lá, o planeta se apresentava como algo imprecisamente descrito a explorar e com
seus limites ainda por definir. Hoje, ele se apresenta como uma pequenina bola em constante encolhimento. Nos
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últimos 20 anos, tem-se a sensação de que a velocidade com que essa bola encolheu acelerou ainda mais: a
ciência e a tecnologia continuam vencendo barreiras físicas; redes informatizadas de comunicação conectam
pessoas instantaneamente, atravessando fronteiras e eliminando limites nacionais; em alguns momentos a política
cede lugar à economia; por todo o mundo vidas estão sendo transformadas pelo fenômeno denominado
"Globalização”.
3.1 O Ambiente Sócio-Político
Ao final da década de 70, o mundo estava congelado pela Guerra Fria que já durava 35 anos. Como um
prenúncio do que viria a ocorrer, os EUA conseguem a dramática e histórica vitória sobre a então URSS, na
decisiva partida de hóquei sobre o gelo nas Olimpíadas de Inverno de 1980 em Lake Placid. Lá, a histeria da
torcida encobria os desconfortos dos dois lados: os EUA, berço do capitalismo, sofriam com as altas do preço do
petróleo e com a recessão, enquanto o aparato soviético rateava sob o peso de seus orçamentos de defesa. Ao
sabor daquela vitória quase milagrosa, Carter declarava ser aquele um de seus momentos de maior orgulho: os
EUA haviam vencido. Ao time perdedor restava retornar à Pátria de cabeça baixa e aos postos de trabalho cujos
salários eram inferiores aos dos vencedores. Embora menores, os baixos salários eram compensados por uma
menor exigência de empenho: haveria sempre alguém a dizer o que deveria ser feito; fazer mais não significava
ganhar mais nem melhorar as condições básicas de vida presente e futura, asseguradas, mesmo que de maneira
precária para alguns, pelo planejamento centralizado. Era um torpor pouco exigente mas, de certa forma,
confortável.
Enquanto isso, nos EUA, os trabalhadores com melhores salários também se sentiam confortáveis: o "pacto
social" assegurava que, desde que não fossem cometidas impropriedades, o trabalho garantia os salários, que, por
sua vez, garantiam receitas de Governos sob a forma de tributos, que asseguravam a previdência dos
trabalhadores. Aos poucos, no entanto, sucessivas quebras de pactos passavam a ser determinadas pela própria
sociedade. Em 1978, os californianos começaram a questionar a carga tributária sucessivamente aumentada em
decorrência da inflação. Passado um tempo, é aprovado o Referendo Popular sobre a Resolução 13 que reduzia
em 2/3 os impostos sobre a propriedade imobiliária. Como decorrência, US$ 7 bilhões deixavam de ser
recolhidos aos cofres públicos e permaneciam com os contribuintes, que preferiam manter esses recursos em
suas mãos, para com eles decidir seu futuro, do que canalizá-los para o Governo. De reivindicação social, a
redução da interferência dos Estados na vida das pessoas tornava-se plataforma política, culminando como
proposta dos Conservadores na Inglaterra, numa manifestação clara de que a parcela da sociedade que, por
dispor de mais recursos não dependia do apoio dos Estados, não estava mais disposta a subsidiar as carências
desta mesma sociedade, representada pelos que se encontravam em dificuldade. Como demonstração inequívoca
dessa postura, Howard Jarvis, responsável pela campanha californiana, é recebido e publicamente citado como
exemplo por Margareth Tatcher em campanha, que diz: "quero deixar claro que é nosso Partido que reduz
impostos." Reagan, ao tomar posse em 1980, vai mais além e diz: "na crise atual, o Governo não é a solução para
nossos problemas. O Governo é o problema."
A partir daí, os Governos capitalistas ocidentais iniciam a grande mudança político-econômica deste final de
século, livrando-se de compromissos assumidos após a 2ª Grande Guerra, reduzindo sucessivamente os gastos
dos Estados, privatizando empresas estatais e transferindo cada vez mais para a sociedade a responsabilidade por
grande parte de sua própria sobrevivência. Essa nova ideologia atinge todos os cantos do mundo e até na China
passa-se a introduzir ganhos por produtividade nas fábricas, possibilitando aos novos globalizados o acesso às
maravilhas do materialismo ocidental, em uma sociedade que, aos poucos, é economicamente flexibilizada, ao
mesmo tempo que continua politicamente controlada. Enquanto isso, a economia planificada soviética
permanece engessada pelos gastos militares, não atendendo às reivindicações das sociedades que constituem suas
repúblicas e seus satélites, até que, sob o ícone da derrubada do Muro de Berlim, sua hegemonia sucumbe.
Diferente do que se verifica na China, no entanto, além da ideologia econômica, cai também a ideologia política.
Seguem-se turbulências de origens nacionalistas, anteriormente sufocadas pelas mãos de ferro do antigo regime
totalitário, ao mesmo tempo que, em um mundo que se apresenta a cada dia mais "multipolar e
multicivilizacional" (HUNTINGTON, 1996), consolida-se um novo paradigma de felicidade: o mercado. Neste
novo ambiente, as organizações começam a enfrentar novos desafios: Estados se percebem não detentores de
infra-estrutura institucional necessária para lidar com o novo paradigma; grupos sociais identificam suas
carências de conhecimentos, necessários a participar do novo jogo; empresas, agora inseridas na competitividade
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global, revelam-se despreparadas para enfrentar a concorrência: gigantes como a Kaiser Steel, por exemplo,
vêm-se obrigadas a fechar as portas. Em épocas passadas, essas empresas contavam com os Governos para
superar suas dificuldades. Agora, com os Estados reduzindo seus gastos, elas se encontram à deriva, sem
condições de resolvê-las, culminando, a partir de seus fracassos, por desmantelar de vez o antigo "pacto".
"Com a perda do significado da divisão do mundo entre economias capitalistas e comunistas e socialistas surge, a
partir daí, a divisão do mundo entre economias rápidas e lentas. Através da alta tecnologia, as economias rápidas
ganham admirável velocidade nos fluxos de informação e nas tomadas de decisão, aceleram a criação de novas
idéias, disseminam conhecimento pelo sistema econômico e outras riquezas - e poder - em menos tempo do que
as lentas" (TOFFLER, 1990). "Ocorre que esses fenômenos caminham na direção da chamada "aldeia global"
que, de um lado amplia as oportunidades, destrói barreiras, abre novos caminhos e maximiza as
interdependências; de outro, gera, através de acontecimentos significativos em algum ponto estratégico dessa
"aldeia global", efeitos múltiplos e imprevisíveis nas suas unidades componentes e particularmente nas mais
vulneráveis, como é o caso da América Latina, da África e suas organizações" (KLIKSBERG,1993). Neste
momento, muitos dos que clamaram pela redução de impostos começam a questionar se estavam certos, ao
perceberem que, de vitoriosos, passavam à condição de desfavorecidos, questionando se não deveria ter havido
um pouco mais de solidariedade nas decisões do passado.
3.2 O Ambiente Científico-Tecnológico
No campo científico-tecnológico, os antigos paradigmas são também questionados: da simplicidade racional e
linear para a complexidade; do risco para a incerteza, com a ênfase centrada agora nos conflitos oriundos das
dúvidas na formulação das próprias hipóteses. - "A negação ou ignorância da necessidade da modelagem mútua
(no sentido de seus múltiplos aspectos e pelos diversos atores envolvidos) da definição de um problema faz com
que os resultados das análises e estudos tornem-se irrelevantes ou até mesmo destrutivos no âmbito do processo
decisório"(ROSENTHAL,1992).
A natureza da transição é, portanto, multidimensional, não linear e praticamente imodelável devido às
interconexões nacionais e globais verificadas e à instabilidade no tempo da própria mudança verificada . Como
conseqüência, o que vemos emergir hoje são mudanças de valores e de comportamentos e um novo paradigma
que incorpora as novas realidades planetárias, cujo tratamento deve ser modelado a partir de uma "cosmovisão
científica pós-cartesiana" (HENDERSON, 1995), baseada nas ciências biológicas e na matemática da
complexidade - por serem essas as ferramentas que estudam os processos vitais em contínua mutação -,
contemplando, mas transcendendo os modelos de avaliação newtonianos-cartesianos clássicos. A lógica da nova
ciência pós-mecanicista, a bio-lógica, transcende a objetividade e o dualismo presentes no antigo paradigma.
Esta mesma corrente de pensamento pode também ser encontrada em Kelly (KELLY,1995) e em Capra
(CAPRA, 1982) que enfatizam a necessidade do tratamento dos problemas através da multidisciplinaridade da
abordagem, baseada na apreciação dos modelos vivos, face à quantidade de variáveis a considerar e à
complexidade do processo. Capra, particularmente, sintetiza a percepção de que o modelo cartesianonewtoniano-mecanicista-fragmentador, embora não desprezível, é insuficiente para lidar com as inter-relações e
complexidades presentes no processo que, em suma, espelha-se na noção do que seja a própria vida. Neste
contexto, paradigmas de análise e de observações de eventos nas partes e das partes que constituem todos são
restringidos pelas limitações da observação localizada que não contempla a visão do todo que as contém. Assim,
pelo olhar cartesiano, uma árvore é percebida por seus componentes: folhas, galhos, flores, frutos, tronco, raiz.
Pela atualidade científica, a árvore é percebida por suas conexões com o solo, o ar, a água, os animais, o vento,
outras árvores, que a interrelacionam com o holos pelas trocas complexas havidas entre esses elementos. A
mudança paradigmática da ciência, portanto, se dá na mudança de percepção do campo restrito para o campo
holístico, como forma de tratar sistemas complexos, caracterizados essencialmente pelos sistemas vivos.
3.3 O Ambiente do Conhecimento
A partir da explosão da tecnologia das comunicações, fluxos de informação globalizados permitem acesso ao
conhecimento de qualquer lugar do planeta; a informação se propaga independente de qualquer controle; todos
no mundo podem conhecer a situação de qualquer lugar, país, cultura, economia: "O custo para armazenar,
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processar e transmitir uma unidade de informação despencou à taxa de 20% ao ano, ao longo dos últimos 40
anos, enquanto o declínio do custo de energia, que serviu de combustível para a 1ª Revolução Industrial, foi de
apenas 50% em 30 anos ... hoje, o conhecimento dobra a cada 4 ou 5 anos, sendo que nos últimos 30 anos
produziu-se mais informação do que nos 5 mil anos anteriores" (LINOWES, 1992); "uma edição do Times de
domingo, hoje em dia, contém mais informação do que dispunha um homem do século XVII" (RAMONET,
1997); "Nos próximos 10 ou 15 anos a massa de conhecimento vai dobrar a cada 80 dias; o conhecimento
tecnológico de hoje representará apenas 1% do conhecimento que estará disponível em 2050" (VIANNA, 1996).
A revolução é no conhecimento; há necessidade de aprendizado continuado, permanente. As novas tecnologias
não estão tornando obsoletos os professores e as escolas, mas estão redefinindo os seus papéis. As mudanças na
maneira de aprender são cada vez mais orientadas pela economia e pela política. A revolução do aprendizado
está à caminho e tem demonstrado um grande poder de gerar uma economia de desenvolvimento rápido e
transformar organizações e sistemas educacionais mais antigos em instituições dinâmicas e produtivas. E todos
têm que estudar pois o ritmo das mudanças está transformando todos em aprendizes. Na era industrial, a ênfase
foi na separação e especialização dos trabalhadores, com os decorrentes problemas de coordenação lateral entre
as unidades. Na era da informação, as tecnologias interligadas e integradoras reúnem grupos que de outra forma
estariam separados, fazendo com que sua utilização, para obter vantagem competitiva, ocorra em uma escala
nunca antes tratada. A informação se propaga independente de qualquer controle; todos no mundo podem
conhecer a situação de qualquer lugar, cultura ou economia; as redes eletrônicas, na síntese dos recursos das
tecnologias da informação e da comunicação, transformam as instituições, possibilitando maneiras mais
flexíveis e ágeis na organização de pessoas e recursos: são as redes de conexões que, em última instância, unem,
no espaço imaterial, atores dispersos pelo globo, "possibilitando a virtualização de atividades como o trabalho
em casa, o ensino à distância, tele-operações, correios eletrônicos, reuniões e conversas remotas,
videoconferências, trabalho cooperativo, dentre outros" (RITTO, 1995), que, por sua vez, aceleram o surgimento
de novos conhecimentos, realimentando o processo de maneira cada vez mais rápida, a cada dia. "No PIB
japonês de 2005, 75% de sua formação terá como origem produtos e serviços não inventados até 1995"
(VIANNA, 1996).
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Mudanças observadas no contexto das organizações
4.1 Mudanças na Ciência Econômica
Na Ciência Econômica as mudanças vem sendo tratadas, principalmente, pelos economistas neoschumpeterianos, tais como Dosi (DOSI, 1992), Nelson (NELSON, 1996) e Freeman (FREEMAN, 1997), e
particularmente no que de refere ao desenvolvimento da tecnologia, pela consideração de que esta não é insumo
exclusivamente externo mas também e principalmente interno às organizações, - endogenia tecnológica - aí
incluído o conceito de destruição criativa decorrente da inserção tecnológica, assim como o crescimento das
organizações a partir das fronteiras de seus negócios. Essas mudanças, em essência, incorporam a noção de
sistemas vivos, na medida em que mudar, evoluir, configura-se na melhor das possibilidades de sobrevivência
para as organizações, no contexto atual.
4.2 Mudanças na Ciência da Administração
Na Ciência da Administração, os processos de gestão, vem apresentando sugestões, tais como Qualidade Total,
Reengenharia, "Downsizing", "Shrinking" , “Hipercompetitividade”, “Marketing de Guerrilha” e outras tantas
receitas infalíveis de sucesso que se mostram impotentes diante das mudanças observadas, embora sua aplicação,
em alguns casos, surta efeito - principalmente para patologias organizacionais curáveis por tratamentos de
choque. Em sua maioria, as organizações que adotam essas receitas são pacientes quase terminais, cujos
resultados econômico-financeiros estão à beira do colapso. Nem sempre, no entanto, essas prescrições salvam os
pacientes, por se constituírem soluções específicas para problemas específicos, no melhor estilo de tratamento
cartesiano-fragmentador, a saber: a qualidade, que trata bem processos existentes, é impotente para lidar com
mudanças que contemplam problemas situados para além deles; a reengenharia, por vezes, introduz
modificações organizacionais não palatáveis pela organização, até por que, para digeri-las, a organização precisa
de tempo para mudar sua cultura, o que implica forçosamente em aprendizado do novo, o que não se dá na
mesma velocidade da implantação das soluções propriamente ditas, principalmente quando estas são de ordem
tecnológica, de um modo geral prontas para o uso ao “clic” de um botão. Assim, fazer "downsizing" e
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"shrinking", que, por definição, buscam minimizar custos, é autofagia pois, além de cortar gorduras que não são
nítidas, acabam danificando músculos, ossos e sistemas nervosos, para manter a metáfora humana, danificando
irremediavelmente a capacidade de recomposição celular da organização no instante posterior. A maioria dos
procedimentos deste tipo mutilam a organização, por vezes de forma irremediável, exatamente no momento em
que o que ela mais precisa é de sangue novo, de células novas e de “próteses” adicionais para se manter viva "Você não pode continuar reduzindo custos e crescer ao mesmo tempo" (PETERS, 1997).
Simultâneas a essas propostas, contudo, surgem outras compatíveis com a atualidade científica. A partir de
Senge (SENGE, 1994) com as organizações que aprendem, de Hamel e Prahalad (PRAHALAD, 1995) com a
competição pelo futuro e finalmente de De Geuss (DE GEUSS, 1997) com a concepção de empresas vivas, o
estudo das organizações, apoiado principalmente em idéias anteriores de Maslow, Drucker e Argyris, converge
com o desenvolvimento observado na ciência, na tecnologia, no conhecimento e na própria economia neoschumpeteriana. Esses estudos organizacionais contemplam aspectos que focam, não exclusivamente a resultante
econômico-financeira, buscada pela grande maioria das organizações com fins lucrativos, mas também e
principalmente sua perpetuidade no tempo, como meta a ser perseguida pelas organizações, sejam elas de
quaisquer tipos, incluídas aí também as de fins lucrativos. Do estudo desses autores, depreende-se que os
paradigmas organizacionais que sinalizam na direção do sucesso assim o fazem entendendo-o, principalmente,
como a sobrevivência da organização - sua sustentabilidade - no ambiente mutante e incerto que lhes é
apresentado. Embora não possam garantir o sucesso em função das variáveis impostas pelos riscos que permeiam
a própria noção de sobrevivência, as bases conceituais destas propostas tratam, principalmente, o aprendizado
permanente, a constante busca pela inovação e o desenvolvimento nos limites de suas fronteiras, a partir da visão
de que o aprendizado, a inovação e a evolução são inerentes às comunidades constituídas por seres vivos - no
caso seres humanos - antes de se constituírem fábricas de resultados econômico-financeiros em constante
crescimento.
Intuitivamente, ou fruto da conscientização das diferenças também inerentes aos seres vivos, observa-se que o
processo de aquisição de conhecimento, antes restrito às instituições tradicionais de ensino - escolas e
universidades – migra para o interior das organizações, já que estas necessitam de uma aprendizagem particular e
sob medida que atenda suas demandas de conteúdos e de tempos de dedicação aos seus aprendizados. As
crescentes verbas atualmente destinadas à pesquisa e desenvolvimento endógenos são, talvez, a mais contundente
evidência disso. Já há tempos, manifestações em algumas empresas sinalizam para essas tendências. A Motorola,
a Microsoft, a Xerox com seu Centro de Pesquisas e a GM com o Projeto Saturn que, em 1992, promoveu um
esforço de treinamento que, no que diz respeito às horas de aprendizagem, correspondeu a 13 vezes o orçamento
da Universidade de Harvard, são exemplos do entendimento de que uma organização é, em primeiro lugar, um
conjunto de seres humanos com capacidade para aprender, inovar e agregar valor a toda a organização, em um
ambiente global aonde o capital, embora necessário, passa a ser cada dia mais superado pela aplicação da
inovação e pela criatividade oriundas das cabeças das pessoas - "na mudança e na disputa pelo futuro valem mais
o talento, a criatividade e a inovação, conhecimentos postos em produção, do que o capital"(PRAHALAD,
1995). Evidencia-se assim a crescente importância do capital intelectual, atributo, pelo menos por enquanto,
exclusivo da mente humana, em contraponto aos fatores de competitividade anteriormente representados por
território, "mão" de obra, matéria-prima e dinheiro.
Nesse contexto, as organizações são obrigadas a desaprender grande parte do seu passado para poder descobrir o
futuro. A competição pelo futuro é, primeiro, uma competição pela participação nas oportunidades e, depois,
pela participação no mercado. Para obter uma fatia desproporcional dos lucros futuros é necessário possuir uma
fatia desproporcional de competências necessárias. Essas competências representam o acúmulo paciente e
persistente de capital intelectual. É pouco provável que as oportunidades futuras se encaixem perfeitamente
dentro dos limites das atuais unidades estratégicas de negócios das diversas organizações que tem suas ações
centradas em seus sucessos passados e nos antigos fatores de competitividade. Como argumento inconteste, a
gênesis da microinformática no Vale do Silício demonstrou ao mundo que um grupo de "nerds" brincalhões,
cabeludos e mal vestidos de classe média era capaz de - no fundo de suas garagens, sem capital e contando
apenas com sua curiosidade por aprender e vontade de fazer coisas novas - criar algo que levou à loucura sisudos
homens de negócios, balançou organizações consideradas monstros sagrados e introduziu mudanças que
deslocaram o eixo do desenvolvimento da humanidade. Segundo Dosi e Teece (DOSI, 1993), "o
desenvolvimento observado nas atuais empresas multi-produto e multi-tecnologia está também fundamentado na
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capacidade de internalizar mudanças, certamente com grandes incrementos em seus departamentos de pesquisa e
desenvolvimento mas, geralmente, com um refinamento de estratégias específicas voltadas para a acumulação de
competências, antecipação e geração de mudanças."
Cabe salientar ainda que as características apresentadas acima exemplificam, pelo processo de crescimento
observado, as características biológicas desse aprendizado. Para usar Kelly (KELLY, 1995), o que se verificou
foi um processo de aprendizado em camadas sucessivas - "layers" - de aquisição de conhecimentos, que fazem
(até hoje) emergir, a cada instante, novos conhecimentos que se agregam aos anteriores ou os substituem dependendo do salto qualitativo observado - de forma coesa, aonde os participantes se comportam
simbioticamente em estado de co-evolução, caracterizando o aspecto vivo da experiência.
5 As Organizações e o Desenvolvimento Sustentado Global
Paralelo à noção de sustentabilidade organizacional já mencionada anteriormente, é cada vez mais presente o
conceito de Desenvolvimento Sustentado de economias, regiões e grupos sociais. Este conceito contrapõe a
noção de evolução ao paradigma vigente de crescimento - principalmente de expansão de ganhos de toda
natureza – percebido até agora como sinônimo de desenvolvimento, incompatível, no entanto, com a finitude de
recursos disponíveis no planeta. O crescimento, a supremacia de uns sobre os outros – observado no
comportamento dos predadores na natureza - como paradigma de desenvolvimento, implica obrigatoriamente na
percepção de que para alguns prosperarem é necessário que outros morram, devido à finitude mencionada. No
entanto, se este se torna um paradigma global a ser adotado, se todos buscarem crescer e ganhar mais o tempo
todo, além da insustentabilidade em termos de recursos, os choques entre interesses tornam-se inevitáveis,
transformando a proposta em um exercício de suicídio coletivo da espécie humana, aonde provavelmente os
sobreviventes serão os seres vivos que se adaptarem às conseqüências do holocausto. A mudança paradigmática
anunciada sugere a troca do paradigma de quantidade para a qualidade. Não se trata, no entanto de propostas de
qualidade como as propaladas pelas metodologias administrativas que buscam a eficiência de processos que, em
última análise, visam proporcionar maiores quantidades de lucros ou de dividendos para os acionistas das
empresas, mas sim de propostas que objetivam a melhoria da qualidade de vida das pessoas que constituem a
sociedade aonde as organizações estão inseridas. “A competição é saudável, talvez mesmo essencial, mas há que
haver algo na vida além de ganhar, ou seremos todos perdedores.” (HANDY, 1994)
Até agora, no entanto, o desenvolvimento sustentável não possui uma teoria central categoricamente colocada,
apresentando-se somente como um conceito, privado de colocações precisas, que caminha na direção de sua
configuração, na medida em que os estudos e debates se sucedem e que os pesquisadores têm condições de
aprofundar seus trabalhos. De qualquer maneira, é claro o sentimento, é evidente a intuição - que precedem o
processo da busca científica - de que algo não está "certo"; de que do jeito que as coisas vão, se nada for feito,
todos correm o risco de ver, mais uma vez - agora talvez de maneira entrópica - a natureza se manifestar para
impor uma nova ordem, utilizando os recursos de que dispuser, aí incluídos, é bom lembrar, os humanos. O
conceito de desenvolvimento sustentado, como sendo o desenvolvimento que contempla necessidades presentes
sem comprometer a capacidade das futuras gerações satisfazerem as suas, recebe contribuições e agrega
conceitos de estudos sobre ecologia, antropologia, sociologia, psicologia, design e informática. Este repertório é
reforçado ainda por outros trabalhos interdisciplinares, dos quais destacam-se a ciência dos sistemas, a dinâmica
não-linear e a teoria do caos. Os estudos sobre sustentabilidade questionam se o mundo como um todo, com uma
população eventualmente estabilizada em 15 bilhões de pessoas e avançando sempre seu progresso material,
poderá alcançar e manter o padrão americano de vida - american way of living - em um nível sustentável, a partir
do qual seriam almejados novos desenvolvimentos, havendo trabalhos que consideram impossível estender esse
padrão de vida a regiões menos favorecidas e que tais padrões seriam insustentáveis a longo prazo. Cabe ainda
ressaltar, mais uma vez, que desenvolvimento não significa necessariamente crescimento, como pretende fazer
crer o discurso neo-liberal mercadológico globalizador, que elege o mercado - demanda com poder de compra como o grande alvo a ser crescentemente atingido, esquecendo-se, na maioria das vezes, que as efetivas
oportunidades de desenvolvimento encontram-se em regiões e grupos sociais excluídos do processo, com
demandas não atendidas, estas sim, crescentes, e que, se atendidas, poderão um dia se configurar novos
mercados, a partir da inclusão de seus integrantes no conjunto de atores econômicos. A isto, Handy (HANDY,
1994) denomina o “Paradoxo do Mercado”. Embora o paradigma atual vincule quase sempre esses dois
conceitos, existem discussões sobre essa vinculação e a conceituação de sustentabilidade, sendo que esta aponta
mais para a direção da qualidade da vida, de um modo geral, enquanto que ao crescimento está implícita a noção
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de quantidade, o que, em essência, só se justificaria a partir do crescimento de demandas provenientes de
crescimento populacional, o que não se verifica nos países ricos, sustentáculos do modelo de mercado. Nesse
sentido, a mudança é, portanto, do paradigma de mais e maior (volume) para o suficiente e melhor (qualidade).
Exemplos de organizações que atuam nesse sentido já se manifestam, como, por exemplo é o caso da Body
Shop, empresa de cosméticos que advoga a tese do lucro com princípios e da Patagônia, empresa de vestuário da
Califórnia que, além de produzir roupas impermeáveis a partir de frascos plásticos descartados, estabelece para si
a noção de que seu desenvolvimento não está condicionado a um permanente crescimento no mercado - ela
decide por não ampliar volumes e número de pontos de vendas - mas sim à sua perpetuidade enquanto empresa,
adaptando-se, a cada momento, às variáveis ambientais enfrentadas, aí incluídas, não só a disponibilidade de
recursos, como também e principalmente as demandas observadas no mercado como balizador para seu
desenvolvimento. Em outras palavras, ela só admite crescer se houver pressão efetiva de demanda - solicitações
por parte do público para seus produtos -, desde que ela possa atendê-la de maneira solidária com o ambiente, aí
incluídas matérias-primas, energia e principalmente os recursos dos humanos - e não recursos humanos - com os
quais trabalha. Por ato de consciência ou por percepção de que sua sustentabilidade dependerá de mudanças em
sua própria postura, empresas de grande porte começam a cogitar parâmetros de desenvolvimento alternativos ao
atual, denominado TINA ( There Is No Alternative). A Shell, por exemplo, na constituição de seus cenários
globais para 2020 faz menção a um cenário TINA denominado “Just-Do-It”, em alusão à competição esportiva à
que se assemelha à atual guerra pelo mercado, mas contrapõe um outro, de cunho mais solidário, denominado
“DA-WO”, cujo nome é extraído de um antigo provérbio chinês que, em suma, significa a troca de um eu egoísta
e individualista por um grande eu coletivo.
6 Desafios
"Nós construímos em nossa civilização um mundo falso de flores de plástico e grama sintética, ar condicionado
e lâmpadas fluorescentes, janelas que não se abrem e música de fundo que nunca para, dias que não se sabe se
choveu, noites em que o céu nunca para de brilhar, "Walkman", "Watchman", casulos de entretenimento,
comida congelada para forno de micro-onda, corações sonolentos despertados de assalto por cafeína, álcool,
drogas e ilusões" - Al Gore (Citado em HANDY, 1994).
6.1 Tendências - O Olho do Furacão
Falar em desafios é tratar o futuro. Em qualquer momento, principalmente no atual aonde as velocidades se
aceleram, análises do passado e avaliações do presente não constituem bases sólidas para tratá-lo. Daqui a alguns
anos, talvez seja possível olhar para trás e fazer as avaliações corretas do que hoje sucede. Existem, no entanto,
tendências e sinalizações sobre as quais trabalhar, mesmo que esses sinais possam ser postos abaixo em um curto
espaço de tempo. De qualquer forma, é preciso ousar; propor, com consciência dos riscos envolvidos em fazê-lo.
Apesar das oportunidades que se colocam no horizonte a partir da perspectiva do alvorecer de uma sociedade
"neo-biológica" (KELLY, 1995), existem descompassos que constituem objeto de preocupação, contemplados
pela maioria dos autores citados, dentre os quais destacam-se: o trabalho, a sociedade, a ciência e a tecnologia,
as organizações o mercado e o capital.
6.2 Quanto ao Trabalho
Alto nível de desemprego estrutural; os contratos de trabalho terão sua natureza alterada e será facilitada a
realização de tarefas específicas em regime de tempo parcial, em oposição ao emprego assalariado; constantes
revisões da legislação/necessidade da readequação da legislação trabalhista: maior flexibilidade quanto à carga
horária; atualização para atender à realidade das condições de trabalho; desregulamentações; diminuição de leis,
decretos, normas, etc., aumentando a flexibilidade da interpretação de princípios (Constituição); trabalho em
casa; mobilidade no trabalho: a mudança de emprego, e não obrigatoriamente de atividade, aumentará. Será, em
breve, normal que as pessoas mudem de emprego de 4 a 5 vezes durante a sua vida; modificação no trabalho:
menos tempo, trabalho nos fins de semana, projetos, rotatividade de pessoas, com exclusão de pessoas do
processo produtivo; descapacitação contínua dos excluídos; concentração contínua da capacitação em poucos;
aumento do trabalho informal, sem garantias para os trabalhadores e com conseqüências na arrecadação de
tributos por parte dos Estados; com o aumento da expectativa de vida, a idade para aposentadoria subirá, criando
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conseqüências sobre os planos de seguridade social; a tecnologia, como elemento racionalizador de atividades,
continuará a exercer o seu papel de redutor líquido de postos de trabalho, contribuindo para o aumento do
desemprego; a tecnologia estabelece-se como paradigma de avaliação, premiando os que a incorporam,
marginalizando os que não o fazem, por que não o querem ou por que não o podem; quanto mais valor é
atribuído a um determinado tipo de trabalho, mais esse trabalho se torna alvo de substituição pela tecnologia;
quanto mais simples é o tipo de trabalho, mais facilmente ele é substituído pela tecnologia; "No início do Século
XXI, 50% da força de trabalho, nos países desenvolvidos não estará empregada" (OECD - Organization for
Economic Cooperation and Development) (Citado em HANDY, 1994). "Em sociedades em que o trabalho não
tem valor monetário, quase todos trabalham o tempo todo" (HANDY, 1994).
6.3 Quanto à Sociedade
Modelos sociais em transição; deficiências estruturais nos Estados recém-globalizados, comprometendo a
absorção do modelo de mercado; concentrações - de capital, de conhecimento, de qualidade de vida; países ricos
- mercados - com decréscimo populacional; países pobres - demanda - com acréscimo populacional (DRUCKER,
1997); aumento contínuo das riquezas individuais; redução contínua do número de pessoas em estado de riqueza;
aumento contínuo do estado de pobreza individual da maioria da população do mundo; aumento contínuo do
número de pessoas em estado de pobreza; aumento contínuo da demanda reprimida por bens e serviços básicos;
excludência dos menos favorecidos da economia formal; busca por "dinheiro" em atividades não inseridas na
"economia" formal: mercados paralelos, contrabando, comércio de drogas e de sexo, furtos, roubos e sequestros;
criminalidade, revoltas, convulsões sociais; salvações religiosas/religiosidade fanática; valores: destruição do
arcabouço moral - o instinto do "salve-se quem puder" (FRANK, 1995); aparência de que "tudo são flores",
sensação de que tudo está ótimo para os beneficiados; adoção de procedimentos para "minimização de
conseqüências": aumento dos custos de proteção social - assistencialismo e segurança. “A excludência dos
incluídos, a vida entre grades: o dono do castelo, excluído em seus domínios, com ares do Criador, prisioneiro
de luxo, imobilizado por sua própria criatura.”(BRASIL, 1996).
6.4 Quanto à ciência e à Tecnologia
Exerce o fascínio da novidade; reforça a componente lógico-racional, inibindo a manifestação de sensações, da
percepção, da intuição; reforça o materialismo, afastando a espiritualidade; desestimula a reflexão
(videotização); desfavorece a socialização (olho no olho); propicia a massificação de culturas e comportamentos,
soterrando individualidades e valores pessoais e grupais; oferece cada vez mais um número maior de
"supérfluos" tecnológicos enquanto não se mostra capaz de atender demandas básicas; exige velocidade de
acompanhamento, absorção e avaliação maior do que a capacidade humana de aprender, avaliar, escolher; exige
mudanças rápidas e sucessivas de comportamento, nem sempre compatíveis com o tempo necessário para o ser
humano se adaptar às mudanças. O limite da tecnologia está na capacidade do ser humano absorvê-la.
6.5 Quanto às Organizações
Inserção no modelo globalizado-mercadológico-competitivo; organizações - grupos de pessoas - transformadas
em fábricas de geração de recursos financeiros: o econômico e as pessoas, na melhor das hipóteses, em segundo
plano - não basta mais jogar, o importante agora é ganhar o jogo; desmembramentos, associações, incorporações
e fusões circunstanciadas e sem fundamentos de longo prazo; discursa-se pelo estratégico, pratica-se pelo tático;
redução de margens unitárias e globais em função da competitividade; necessidade de aumento constante das
escalas de produção para retornar a antigos patamares de lucratividade; necessidade de criar constantemente
novos produtos e serviços para garantir mercados; necessidade de fazer "re-design" constante de produtos e
serviços existentes, como arma de sedução; adoção de tecnologias de ponta em ambientes de gestão jurássicos;
camuflagem da mediocridade gerencial por trás da "máscara" tecnológica; organizações ricas em dados, mas
pobres em informação; adoção de "Marketing" tecnológico: tecnologias de ponta nas "áreas de contacto"
(clientes, fornecedores, etc.), mantendo processos arcaicos para dentro da organização; crença de que inovações
tecnológicas suprem deficiências organizacionais estruturais; organizações em atitude de passividade diante das
armadilhas contidas nas ofertas de pacotes tecnológicos, por incapacidade de avaliação da tecnologia ofertada;
"elefantes brancos" mal utilizados; organizações "perdidas" diante da multiplicidade de ofertas de tecnologia.
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"Os executivos dizem que seu maior ativo são as pessoas, mas poucos realmente se engajam nesse discurso e
nenhum coloca esses ativos em seus balanços" (HANDY, 1994)
6.6 Quanto ao Mercado
Paradigma: necessidade do mercado se expandir indefinidamente com aumentos contínuos de produção;
incompatibilidade entre o crescimento infinito e os recursos finitos do planeta (GEORGE, 1990). Países ricos
com redução populacional e concentração de renda nas mãos de poucos: mercados existentes em contração,
mercados existentes em saturação com pessoas que constituem o mercado com suas demandas por produtos
existentes já atendidas e com pouca capacidade de absorção de ofertas dos mesmos produtos; "invenção" de
novas demandas para o mesmo mercado – “the society of no needs” (MARZANO, 1998); aparência de
crescimento/existência do mercado pela absorção / criação /"garimpagem" de novos mercados territoriais e pela
criação de novos produtos; mercado: poucos com muita capacidade de compra. Países pobres com crescimento
populacional e aumento do número de pessoas com menor poder de compra: redução de volumes de venda
demanda: muitos com pouca ou nenhuma capacidade de compra. "A sociedade aonde um número cada vez
menor de pessoas competem por um número cada vez menor de oportunidades de valor cada vez maior"
(DRUCKER, 1997); a competição pelos novos mercados como fator de sobrevivência para quem ainda tem força
para continuar na "guerra" do mercado. "Soluções" verificadas: incremento contínuo da obsolescência planejada;
busca por novos mercados, na ilusão de que o modelo nunca se esgotará. Conseqüências das "soluções"
verificadas: mais produtos para o mesmo consumidor - fragilidade em função da concentração de vendas para os
mesmos consumidores; redução contínua de margens. Cada vez mais produtos. Cada vez mais, produtos
diferentes. Acirramento contínuo da competição pelo mercado - demanda com poder de compra. "O crescimento
econômico depende, em última instância, de mais e mais pessoas consumindo cada vez mais" (HANDY, 1994).
6.7 Quanto ao Capital
Tecnologia: produtos e serviços cada vez mais baratos de fazer e de comprar, menor necessidade de espaços e
territórios, menor necessidade de matérias primas; sobra de mão-de-obra, tecnologia cada vez mais barata. Desinvestimentos: "downsizing" e reengenharia. Sobras de capital no setor produtivo, carreados para o mercado
financeiro de capitais; perda de valor econômico do próprio capital, na medida em que o mesmo volume de
dinheiro tem maior poder de compra, em função dos barateamentos generalizados. Capitais gerando capitais a
partir de expectativas, sem representatividade de equivalências de valor. A cada dia que passa, o Capital parece
só ter valor para si mesmo. Assim mesmo, será que estamos condenados a ser prisioneiros de uma batalha sem
fim até o fim dos tempos? (HANDY, 1994).
7 Quem está sendo desafiado ?
Todos. Até porque, a partir da assimilação do conceito de organização a partir de grupos de pessoas, fica claro
que, sem que cada ser humano assuma a responsabilidade por seus atos, não haverá como constituir
organizações. Não existe a possibilidade de alguns delegarem a outros essa responsabilidade. Sim, somos todos
responsáveis e estamos todos diante de desafios.
8 Qual é o desafio?
O desafio colocado constitui-se em lidar, no curto, médio e longo prazo com a mudança e com seus impactos na
humanidade, tratando-a com base na sabedoria observada na natureza, viva, e com percepção clara de que dela a
humanidade é parte integrante e não algo externo a ela que pode usufruir, em benefício próprio e
indefinidamente, seus recursos, os únicos de que dispomos, aí incluídos todos os da espécie humana.
9 Propostas para Reflexão
Aceito o desafio, é preciso refletir sobre como enfrentá-lo. Não existem receitas prontas para o sucesso. Se
houvesse, todos e tudo estariam bem e não haveria desafio. Como isto não é verdade e o momento é de
mudanças, a hora é propícia para que seja iniciada, em todos os tipos de organização - social, empresarial,
governamental, pública, privada, etc. - e em todos os níveis, um exercício de endogenia, para usar o modelo
9
econômico mais recente referente à tecnologia, no sentido de que soluções sejam encontradas durante o processo
de sua busca. Diferente de épocas passadas em que propostas isoladas resolviam problemas de organizações
situadas distantes umas das outras, a busca agora é por soluções globais em seu sentido mais amplo, pela
percepção de que os fenômenos oriundos do processo de globalização e a própria mudança assim o impõe:
pensar globalmente e agir localmente, dentro dos limites de atuação e consideradas as peculiaridades de
indivíduos e coletividades parece ser a atitude a ser tomada. Quanto às áreas de atuação, duas se colocam
simultaneamente como prioritárias, não havendo distinção hierárquica ou de ordem entre elas, a saber:
modelagens plurais e educação.
9.1 Modelagens plurais
A ciência newtoniana-cartesiana apontava para a repetição de eventos e para mecanismos como forma de
explicação da natureza. Os pensamentos recentes, no entanto, identificam diferenças entre os organismos,
apontando para a repetição de alguns padrões - “patterns” - mas levando em consideração as diferenças
individuais de cada elemento que “adota” os mesmos padrões. As diferenças observadas a partir do conjunto
padrão-elemento caracterizariam, por assim dizer, a identidade de cada experiência. Levando-se em conta esses
aspectos, parece sensato considerar a noção de que, para se desenvolver, cada elemento, ao nível de indivíduo,
organismo ou organização deve considerar o padrão, atentando contudo para suas características individuais
próprias - sua identidade - modelando seu avanço a partir da conjugação dos fatores padrão-identidade. Ora, se o
modelo contém a variável identidade, claro está que cada modelo a adotar constituirá um modelo diferenciado,
não havendo, por conseqüência, dois modelos semelhantes nem a possibilidade de adoção de um mesmo modelo
por dois elementos. Este é o sentido da modelagem plural aqui mencionado. Ou seja, a adoção de modelos únicos
de desenvolvimento, sejam eles de qualquer natureza, traz implícita um conjunto de incompatibilidades com as
identidades individuais de cada um dos elementos aos quais se pretenda adotá-los, ocasionando, não raro,
rejeições ao padrão por incompatibilidade de identidades. A proposta para reflexão, nesse caso, é para que, antes
de mais nada, seja discutida e evidenciada a identidade do elemento - no caso a identidade da organização - a
partir da configuração de suas competências próprias consagradas (core competencies) , suas vocações naturais,
seus valores, anseios e visões de futuro e, principalmente, do estágio de desenvolvimento sustentável pretendido.
Aqui, o parâmetro para avaliação de sucesso deverá ser o maior número de elementos possível - pessoas - em
estado de satisfação, sendo esta proveniente de seus valores compartilhados. Caberá a cada cidadão, e em
especial aos que detém algum tipo de liderança ou poder, estimular o resgate desses valores, a identificação das
vocações particulares a cada grupo e de suas competências consagradas, no intuito de promover o
desenvolvimento sustentável de cada organização.
9.2 Educação
Acompanhar as mudanças, caminhando para a sustentabilidade sob modelagens plurais requer capacitação das
pessoas para enfrentar esses desafios, assumir postos de trabalho e desenvolver novas atividades. Esta
capacitação deverá se fundamentar principalmente no processo de educação em seu sentido amplo e não apenas
no treinamento para atividades específicas cujo conteúdo se apresenta inútil a cada mudança verificada, no
sentido de garantir a todos o exercício de sua cidadania. Trata-se portanto de um processo de educação
continuada, que busca ensinar às pessoas o processo de aprender a aprender, antes da preocupação em transferir
conteúdos de conhecimento, até porque, ao que tudo indica, estes estarão disponíveis a baixo custo a quem tiver
interesse em incorporá-los, não só por sua disponibilização nas redes como pela possibilidade de sua emergência
em decorrência da utilização desses recursos no compartilhamento de conhecimentos. É importante salientar que
quando é mencionada a capacitação, não está sendo referenciada exclusivamente a capacitação tecnológica de
ponta, mas também e principalmente o resgate de conhecimentos ancestrais, por vezes esquecidos sob o rolo
compressor da modernidade, que muitas das vezes contém soluções criativas não verificadas na cultura
globalizada. Além do esforço pela capacitação propriamente dita, haverá que ser feito ainda um esforço adicional
de conscientização, que possibilite às pessoas perceber que só o esforço próprio poderá, sem garantias prévias de
sucesso, possibilitar sua inserção no mercado de trabalho, seja ele globalizado ou não, inserido no modelo do
mercado ou particular a um determinado grupo social. A potencialidade para o trabalho em condições de
adversidade, esquecidas em momentos de paz ou de calmaria no ambiente, de um modo geral se revela frente a
adversidades - guerras e catástrofes naturais - manifestando aí de forma intensa toda sua potencialidade. Embora
"no ano 2.000, 70% dos trabalhos na Europa e 80% nos EUA irão requerer capacitação cerebral no lugar de
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capacitação física" (HANDY, 1994), muito ainda há a fazer com as próprias mãos para soerguer grupos
distanciados das maravilhas tecnológicas e mercadológicas do mundo desenvolvido.
Fruto do desenvolvimento dos conhecimentos e da ação do trabalho, é fundamental ser pensada a inclusão social
dos desfavorecidos, sob pena de, a par do lado humanitário preponderante, estar ameaçada a paz e a própria idéia
de mercado. Não haverá mercado se não houver poder de compra associado à sociedade. Imaginar que é possível
haver sempre um número menor de vencedores pretendendo usurpar mais valia de um grupo de perdedores é
uma ilusão de poucos aquinhoados que se esquecem o que aconteceu com o Império Romano, com a França de
1789 e com a Rússia do começo deste século, apenas para citar exemplos de maior significância. Mais uma vez,
não se trata de assistencialismo e sim de assumir a responsabilidade de prover cidadania, antes que seja tarde
demais.
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