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15 de junho de 2011
Nikos Kazantzákis Cinquenta anos de partida
ALEXEI BUENO
Palestra proferida em outubro de 2007
Há exatamente 50 anos, em 26 de outubro de 1957, às dez e vinte
da noite, num hospital de Friburgo, na Alemanha, morria Nikos Kazantzákis, não apenas um dos maiores escritores do século XX, mas
um dos maiores espíritos do seu tempo. Já na sua História da Literatura
Ocidental, cuja publicação se iniciou nessa mesma década, Otto Maria
Carpeaux utilizava essa exata expressão, “um dos maiores espíritos do
século XX”. Se, em tese, a grandeza espiritual poderia estar ausente em
grandes criadores de outras artes, nos grandes autores literários, pela
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própria natureza de seu instrumento condenados a tratar dos altos temas
humanos, isso parece mais difícil, mas a verdade é que, sob esse aspecto, a
posição do autor de Ascese se situa num píncaro dificilmente alcançável.
A morte de Kazantzákis, em boa parte, foi obra de uma das instituições que ele mais odiou em toda a sua vida: a burocracia. Cansado
com as festas e recepções em Cannes para o lançamento do filme de
Jules Dassin, Aquele que deve morrer, baseado no seu grande romance
O Cristo recrucificado, e dos trabalhos de lançamento de O pobre de
Assis, sua biografia romanceada de São Francisco, Kazantzákis decide
partir mais uma vez para o Extremo Oriente, que conhecera numa
prolífica viagem na década de 1930, Japão e China, especialmente esta
última, onde o viajante e o curioso infatigáveis ansiavam por conhecer
os resultados da revolução ocorrida oito anos antes. Kazantzákis parte, portanto, de Antibes, onde havia muito se estabelecera, com a sua
mulher Helena, em fim de maio daquele ano. Já havia algum tempo o
grande escritor convivia com uma leucemia que se mantinha sob controle. Após breves passagens por Berna, Praga e Moscou, o casal chega
a Pequim em 21 de junho. Depois da estada na China, e antes de partir
para o Japão, é ele obrigado a parar em Hong Kong, para aí se vacinar
contra a cólera e a varíola. Essas vacinas podem ter, no entanto, um
efeito mortal nos portadores de leucemia, o que não comoveu em nada
a burocracia daquele porto, que lhe afirmou ser impossível continuar a
viagem sem as próprias. Um médico de bom senso lhe prometeu então
aplicar-lhe apenas um simulacro das vacinas, o que Kazantzákis aceitou,
mas acabaram por lhe aplicar as vacinas verdadeiras. Oito dias depois,
em Tóquio, o escritor se encontrava sob grave ameaça de ter o braço
direito amputado. Era preciso voltar imediatamente para a Europa,
para a clínica onde se tratava regularmente, em Friburgo. Ao chegar
em Copenhague, em estado desesperador, é ele imediatamente hospitalizado, e um grande médico, prêmio Nobel de Medicina, afirma ser
imprescindível a amputação de seu braço. Inconformada, sua mulher
Helena consegue levá-lo até Friburgo, onde um tratamento de choque
salva-o da mutilação. Praticamente recuperado, Kazantzákis dita à sua
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esposa algumas passagens a acrescentar na sua belíssima autobiografia
Carta a el Greco, e recebe visitas diversas, como a do seu grande amigo
Albert Schweitzer. Fora de perigo, acontece então a fatalidade, o escritor contrai a Gripe Asiática, que corria a Europa e o mundo, e que
foi especialmente virulenta em sua passagem por Friburgo, enquanto
praticamente poupou outras cidades alemãs. Em apenas três dias, no
seu organismo combalido de convalescente, ela faz seu trabalho. Não
foram poucos os que falaram na perda precoce de Kazantzákis. Ora,
nenhuma morte aos 74 anos pode ser exatamente chamada de precoce,
mas a sua pujança intelectual e anímica estavam tão intactas, tanta coisa
ainda prometia o seu espírito, que muitos não puderam evitar a palavra.
Para Kazantzákis, na verdade, grande revoltado com a morte, caberia
o extraordinário verso de Jorge de Sena, originalmente uma frase por
ele colhida, em conversa informal, de José Blanc de Portugal, ainda que
por acaso vazada num alexandrino: “De morte natural nunca ninguém
morreu”. Creio que Kazantzákis gostaria de ter escrito esse verso, mas
agora que já falamos de sua morte, cuja efeméride do cinqüentenário
aqui nos reúne, falemos de sua admirável vida. Uma de suas sínteses,
pela obra titânica que produziu, talvez seja a terceira proposição dessa
sua epígrafe:
“Três espécies de almas, três orações:
1 – Sou um arco em tuas mãos, Senhor. Estende-me para que
não apodreça.
2 – Não me estendas demais, Senhor. Quebrarei.
3 – Estende-me, Senhor, e que importa se eu quebrar!”
Nikos Kazantzákis nasceu a 18 de fevereiro de 1883 em Candia,
cidade central da ilha de Creta, a atual Heráklion, filho de Mikalis e
Maria Kazantzákis. Seu pai seria o inspirador do personagem inesquecível que é o Capitão Mikalis, protagonista-título do seu maior roman-
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ce, geralmente conhecido no resto do mundo como A liberdade ou a
morte, divisa dos revolucionários cretenses contra a dominação turca.
Teve o escritor duas irmãs mais novas, Anastácia e Helena, e um irmão,
Jorge, morto ainda na infância. O que marcou toda a visão do mundo
do jovem grego, e marcou a fogo, foi a luta de Creta contra o Império
Otomano, com a sua infindável seqüência de rebeliões e de massacres.
“Massacre”, foi essa a palavra mais profundamente acolhida no coração
do jovem Nikos em todos os seus anos de formação, conforme ele mesmo
contaria posteriormente. Enquanto a Grécia continental se libertara
dos turcos desde 1829, Creta, esse navio entre o Ocidente e o Oriente,
como mais de uma vez a descreveu seu grande filho, permanecia sob a
opressão otomana, com o seu povo nulamente vocacionado a suportar
opressão alguma.
A esse arraigado sentimento da liberdade, essa qualidade negativa,
que só percebemos pela sua ausência, como a saúde, ou, como escreveu
Cecília Meireles:
Liberdade – essa palavra
que o sonho humano alimenta:
que não há ninguém que explique,
e ninguém que não entenda.
uniu Kazantzákis, muito jovem ainda, um senso agudo do que
podemos chamar de ancestralidade, uma anterioridade visceral que
sempre o levou a perceber-se como um elo efêmero no terrível fluxo
de matéria e espírito que é a espécie humana. É justamente durante a
sua juventude, na primeira década do século XX, que as escavações de
Arthur Evans arrancam do solo de Creta uma civilização desconhecida,
anterior à Guerra de Tróia, requintadíssima, dada às artes e à tauromaquia, civilização a que depois se passou a denominar minóica, e cuja
escrita — uma delas, a outra permanece misteriosa — o Linear B, ao
ser decifrada por Michael Ventris meio século depois, revelou não ser
outra coisa que uma forma arcaica do grego, língua que é, portanto,
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em seus muitos avatares, falada e escrita há mais de 3500 anos. “A raça
grega é imortal”, é uma frase recorrente na obra de Kazantzákis, dita
tanto por seus personagens como por ele próprio. A raça grega é aí,
evidentemente, metonímia da espécie humana, mas o autor de Alexis
Zorba não escondia o abissal orgulho que lhe dava pertencer a esse povo
sem paralelo para nós, ocidentais, e portanto para toda a humanidade.
Se a obsessão pela liberdade é obviamente oriunda da situação
de sua Creta natal, onde em 1866 mil homens, mulheres e crianças,
cercados pelos turcos no Mosteiro de Arkadi, fizeram-no saltar pelos
ares, preferindo o sacrifício a cair nas mãos do opressor, morrendo mas
levando juntos mil e quinhentos soldados turcos, um dos momentos
impressionantes da relação da criança que era então o escritor com
essa realidade é o dia em que seu pai, sob o plátano no qual, no centro
de Candia, três rebeldes gregos haviam sido enforcados pelos turcos,
ergueu o menino nos braços e o fez beijar os pés gelados dos três mártires
pela independência, conforme narrou Kazantzákis, décadas depois, na
Carta a el Greco. Outros dois instantes primordiais na gênese da sua
visão trágica, e do heroísmo trágico que dela adviria, foi a impressão de
perda da centralidade do homem ainda na infância, ao compreender,
com Copérnico e Darwin, a posição periférica da Terra entre os outros
astros, essa visão da noite estrelada que sempre o fascinou, e a baixa animalidade de onde viemos, idéia que depois será de grande importância
na criação de Ascese.
O episódio mais decisivo de todos, no entanto, e o mais antigo,
talvez seja o seu encontro com a morte. Passemos a palavra para Kazantzákis:
“Devo acrescentar um pormenor que influenciou profundamente
a minha vida: a primeira ferida que a minha alma recebeu. Atingi a
velhice, mas ela nunca se fechou.
Devia ter os meus seis anos e meu tio levou-me, pela mão, ao
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pequeno cemitério de São Mateus, na cidade, para ver, dizia ele, uma
vizinha.
Era primavera, o cemitério estava juncado de camomila; um roseiral, ao canto, estava coberto de pequenas rosas de abril. Devia ser
meio-dia, o sol aquecera a terra e sentia-se, por ali, o cheiro da erva. A
porta da igreja encontrava-se aberta, o padre pusera incenso no turíbulo
e colocara a estola; galgou o patamar e dirigiu-se para os túmulos.
— Por que é que ele faz aquilo? — perguntei ao meu tio, respirando profundamente o odor do incenso e da terra. Era um cheiro quente,
parecia-me um pouco obcecante, lembrava-me o cheiro do banho turco
onde minha mãe me tinha levado no sábado anterior.
— Por que é que ele faz aquilo? — perguntei novamente a meu
tio, que caminhava em silêncio por entre os túmulos.
— Cala-te, vem atrás de mim que já vês.
Passamos por trás da igreja e ouvimos pessoas a conversar; cinco ou
seis mulheres, vestidas de luto, estavam, de pé, em volta de uma campa;
dois homens levantavam a pedra tumular e um deles desceu para a cova
e começou a escavar. Aproximamo-nos e paramos à beira da campa
aberta. — Que fazem eles? Perguntei: — Desenterram ossos. — Quais
ossos? — Já vais ver.
O padre estava de pé, junto da cova, agitava o turíbulo de cima abaixo e murmurava orações. Debrucei-me sobre a terra cavada de fresco:
veio-me um cheiro a bafio, um cheiro a podridão e tapei o nariz; senti
náuseas, mas não me fui embora, esperei. — Os ossos? Que ossos? —
perguntava a mim próprio, e esperava.
De súbito, um homem que estava dobrado e escavava, soergueuse; apareceu metade do corpo por cima da cova; exibia um crânio nas
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suas mãos. Esvaziou-o da terra, mergulhou os dedos nas cavidades dos
olhos para tirar-lhes o barro; em seguida o depôs na borda da campa,
inclinou-se de novo e recomeçou a cavar.
— Que é isto? — perguntei, apavorado, a meu tio.
— Não vês, é uma cabeça de morto, um crânio.
— De quem?
—Não te lembras dela? Da nossa vizinha Anika.
—De Anika! As lágrimas jorraram, comecei a gritar. — De
Anika! De Anika! — gritava. Atirei-me para o chão, apanhei todas as
pedras que encontrei e pus-me a lançá-las ao coveiro. Lamentava-me,
gritava — como ela era bela, como cheirava bem! Costumava ir à nossa casa, punha-me sobre os seus joelhos, tirava o pente dos cabelos e
penteava-me: fazia-me cócegas debaixo dos braços e fazia-me rir; piava
como um passarinho...
Meu tio tomou-me nos braços e afastou-me dali; falava-me com
cólera: — Por que choras? Que esperavas? Ela morreu. Todos temos de
morrer.
Mas eu recordava-me dos seus cabelos louros, dos seus lábios vermelhos que me beijavam, dos seus grandes olhos, e agora...
— E os seus cabelos — gritava — os seus lábios, os seus olhos?...
— Acabou-se, acabou-se. A terra os comeu.
— Por quê? Por quê? Não quero!
Meu tio sacudiu os ombros:
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— Quando cresceres saberá por quê.
Nunca o soube. Cresci, envelheci e nunca o soube.”
Mas se a relação de inconformidade com a morte permaneceu
como um dos pilares desse espírito profundamente místico, a ânsia pela
independência da terra natal alcançou seu apaziguamento no dia 9 de
dezembro de 1898, apaziguamento que lhe permitiu mais livremente
ampliá-la para uma ânsia libertária de toda a humanidade. A descrição
da reação do seu pai ao dia secularmente aguardado é antológica, na seqüência da descrição do estado geral da ilha após o fim da grande espera
que não pode deixar de nos lembrar o nosso tão próximo Sebastianismo:
“Os dois maiores dias da minha vida foram estes: o dia em que o
príncipe Jorge desembarcou em Creta e, muitos anos depois, o dia em
que, em Moscou, a Revolução festejou os seus dez anos. Nesses dias
senti que as barreiras podem afundar-se — os corpos, os espíritos, as
almas — e que os homens podem regressar, após sangrentas e terríveis
atribulações, à unidade divina original. Já não há eu, tu, ele, tudo se
transforma numa unidade e essa unidade é uma profunda embriaguez
mística, a morte perde a sua foice, já não há morte, morremos um por
um, separadamente, mas todos juntos somos imortais, abrimos os braços e abraçamos, depois de tanta fome, tanta sede e tanta revolta, como
filhos pródigos, os nossos dois pais, o céu e a terra.
Os cretenses lançavam ao ar os seus lenços de cabeça, as lágrimas
corriam-lhes pela cara e molhavam as suas barbas brancas de capitães, as
mães erguiam os filhos nos braços, para que eles vissem o gigante louro,
o príncipe das lendas, que tinha ouvido a lamentação de Creta e partira,
há séculos, montado num cavalo branco, como São Jorge, para libertá-la.
Durante tantos séculos os olhos dos cretenses petrificaram-se de espera
à força de olhar o mar: vêem-no, não o vêem, em breve o veremos... Ou
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se tratava de uma nuvenzinha de primavera que os enganava, ou de uma
vela branca, ou, em plena noite, um sonho. Mas a nuvem, dissipava-se,
a vela desaparecia ao longe, o sonho se apagava e os cretenses voltavam
a fixar os olhos na direção do Norte, do grego, do moscovita, do Deus
impiedoso que andava tão lentamente.
E agora Creta fora abalada, os túmulos se abriram, um grito se elevara do cimo do Psiloriti: Ele está a chegar! Aí vem ele! Ei-lo! E os velhos
capitães tinham descido das montanhas com as suas feridas profundas e
as suas pistolas de prata, os jovens vieram com os seus punhais de cabo
preto e as suas violas sonoras, os sinos tocavam, a cidade estava toda
ornamentada com palmas e mirtos, o louro São Jorge encontrava-se de
pé sobre o molhe juncado de ramos de oliveira e o mar cretense brilhava
detrás dos seus ombros.
Os cretenses bebiam nas tabernas, cantavam, dançavam, tocavam
viola, mas não estavam aliviados. O seu corpo já não os continha,
erguiam os punhais, cortavam os braços e as coxas para que o sangue
corresse, para que ficassem aliviados. Na igreja, o velho metropolita levantou as mãos na direção da cúpula e olhou o Pantocrator; queria fazer
um discurso, mas a sua garganta estava apertada. — Cristo ressuscitou,
meus filhos! — Gritou, nada mais podendo articular. — Ressuscitou
verdadeiramente! — O grito brotou de todos os peitos como um trovão
e os lustres da igreja mexeram-se como se a terra tivesse tremido.
..........................................................................................................
......................................
Passou um gigante, carregando ramos de loureiro; viu meu pai e
parou, gritando: — Cristo ressuscitou, capitão Mikalis! — Creta ressuscitou — respondeu meu pai, colocando a mão sobre o coração.
Avançávamos; meu pai tinha pressa e eu corria atrás dele para o
acompanhar.
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— Aonde vamos, pai? — perguntei, quase sem poder respirar.
— Vamos ver o teu avô, anda!
Chegamos ao cemitério, meu pai abriu com um safanão a porta de
ferro; havia uma caveira desenhada na ombreira e embaixo dois ossos
cruzados, o símbolo de Cristo ressuscitado.
Viramos à direita, sob os ciprestes, galgamos as campas pobres,
com uma cruz partida, privada de lamparina. Meu pai deteve-se diante
de uma dessas campas pobres: um pequeno monte de terra, uma cruz
de madeira e, sobre esta, um nome, apagado pelo tempo. O pai tirou o
lenço da cabeça e prosternou-se, com a face contra a terra; escavou o solo
com as unhas, fez um pequeno buraco, como um funil, onde pousou a
boca e gritou três vezes:
— Pai! ele chegou! Pai! ele chegou! Pai! ele chegou!
A sua voz aumentava sempre, rugia. Tirou do bolso um frasco de
vinho, deitou-o gota a gota no buraco, esperando, de cada vez, que ele
descesse, que a terra o bebesse. Depois ergueu-se de um salto, benzeu-se
e olhou para mim. Os seus olhos cintilavam.
— Ouviste? — Perguntou-me, com a voz rouca de emoção —,
ouviste?
Eu não falava, nada tinha escutado.
— Não ouviste? — disse o pai enfurecido. — Os seus ossos rangeram.”
Bem antes disso, durante a insurreição cretense de 1889, toda a sua
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família se refugiara no Pireu, retornando seis meses depois. Na busca
de outro local não conflituoso o casal Kazantzákis e os filhos viveram,
entre 1897 e 1899, na ilha de Naxos, nas Cíclades, época que guardará
uma aura paradisíaca para o futuro escritor. Lá Kazantzákis estudou
na escola francesa da Sainte-Croix, onde aprendeu francês e italiano.
Entre as várias línguas que viria a dominar, o francês manteve um lugar
de destaque, tendo ele escrito diretamente nesse idioma seus romances
Toda-Raba e O jardim dos rochedos. A França seria, finalmente, o paradeiro final do viajante incansável que foi Kazantzákis, na sua casa de
Antibes, a mais grega das cidades francesas.
De volta à sua cidade natal, lá ele continuou seus estudos, de 1899
a 1902. Nesse ano transfere-se para Atenas, onde, em 1906, se forma na
faculdade de Direito da Universidade daquela capital, o mesmo ano em
que publica sua primeira novela, O lírio e a serpente. Em maio do ano
seguinte sua peça O dia nasce ganha um concurso dramático na mesma
Universidade. Em outubro, finalmente, chega a um momento decisivo
em sua biografia, partindo para Paris, para estudar filosofia. Na capital
francesa segue os célebres cursos de Henri Bergson em 1908 e 1909. Escreve um romance, Almas partidas, publicado na imprensa, e um ensaio
filosófico sobre o Pragmatismo. Em 1909 publica uma tese “Frederico
Nietzsche na filosofia do direito e da cidade”, assim como uma tragédia
em um ato intitulada Comédia, na revista Krétiké Stoa, com um assunto
praticamente idêntico ao de Huis-Clos que Sartre publicará décadas
depois. Ainda que possa parecer absurda uma possível influência, vale
lembrar que um dos maiores amigos de Kazantzákis, Albert Schweitzer,
era primo de Sartre. Em outra revista de Atenas publicou em seguida o
ensaio “A ciência está falida?”
Em 1910 outra tragédia sua, Sacrifício, foi premiada num concurso
teatral. A obra dramática de Kazantzákis, muito vasta e ainda apenas
parcialmente conhecida fora da Grécia, como a sua poesia, se estende,
de fato, do início do século até a sua morte, sendo o gênero a que mais
constantemente se dedicou. Algumas de suas tragédias, no entanto, alcançaram grande sucesso, especialmente as admiráveis Melissa e Teseu.
Em outubro de 1911 Kazantzákis se casa com Galatéia Alexiou,
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romancista cretense como ele, e se transfere para Atenas. Os quatro anos
seguintes serão para ele de grandes trabalhos de tradução, com títulos de
Darwin, A origem das espécies; Bergson, O riso; William James, Teoria
da emoção; Nietzsche, O nascimento da tragédia e Assim falou Zaratrusta; e Eckermann, com as célebres Conversações com Goethe. Em 1912
publica um longo ensaio sobre Bergson e se alista como voluntário nas
Guerras Balcânicas, mas não chega a participar do conflito. Em 1914,
ano em que estoura a guerra, conhece o poeta Angelos Sikelianos, com
o qual passa quarenta dias no Monte Athos, meditando sobre o destino. No ano seguinte os dois amigos viajarão exaustivamente através da
Grécia, período durante o qual Kazantzákis compõe as tragédias Ulisses
e Nicéforos Focas.
Esse é o momento em que Kazantzákis sofre uma espécie de crise tolstoiana, uma dúvida sobre ser ou não a arte a resposta para as
necessidades prementes da humanidade em crise, em vez de alguma
forma de uma nova religião, ou de uma nova mitologia. Oriundo de
um mundo arcaico, Kazantzákis nunca ocultou a angústia com que via
a civilização de massa e a industrialização explosiva condenarem ao
desaparecimento alguns valores insubstituíveis desse mesmo mundo
arcaico. Poucos intelectuais do século XX foram críticos como ele da
ideologia do progresso, antevendo em suas viagens contradições civilizatórias que só começaram a se tornar visíveis muito recentemente. Na
verdade, seu feroz amor pelo homem, o sopro profético do seu verbo, a
sua violência de vidente não são de maneira alguma “modernas”, assim
como a meta claramente soteriológica, salvífica, que domina toda a sua
obra, a mais distante de qualquer forma de diletantismo ou de arte pela
arte que se possa imaginar, antes uma pura, inesgotável e desesperada
busca de sentido para o absurdo. O grego Kazantzákis está mais perto
de seus ancestrais da Antigüidade do que normalmente se imagina.
O ano de 1917, ainda em plena Guerra, é um dos mais decisivos
de sua vida. Abandonando a literatura pela ação, em resposta à crise
por que passava — o que em pouco se revelará desastroso — resolve
explorar uma mina de linhita em Magna, na Moréia, para onde parte
acompanhado de certo Giórgis Zorba, um macedônio dotado de um
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vitalismo a toda prova e de uma espécie de sabedoria infusa que ele
transformará, um quarto de século depois, num dos grandes personagens romanescos do século XX, e sobre o qual voltaremos a falar. Em
outubro, após o fiasco completo de sua atividade mineradora, parte
para a Suíça, e em seguida em peregrinação pelos locais marcantes da
vida de Nietzsche, cuja descoberta lhe causara um impacto acima de
qualquer descrição. Para Kazantzákis Nietzsche se revelara o grande
mártir, o Dionisos crucificado, cujo destino fora expor cruamente aos
homens o abismo de desespero que se abre sob os seus pés, o abismo
antevisto por Buda, o criador do sistema mais terrivelmente pessimista na história da especulação humana, e trazido para o Ocidente por
Schopenhauer. Retornando da tentativa de ação para os braços da arte,
ele cumpria um caminho confessado em um parágrafo de seu texto “Em
que creio”: “Experimentei diversos caminhos para encontrar aquele da
minha libertação: o do amor, o da busca filosófica, o da curiosidade
científica, ainda o da regeneração social. Por fim me engajei naquele,
árduo e solitário, da poesia.”
Em 1919 Kazantzákis retorna à Grécia, e prossegue suas viagens
pelo país. Em maio é nomeado diretor-geral do Ministério de Assistência Social por Venizelos. Entre julho e agosto chefia uma missão
de repatriamento de gregos do Cáucaso, conseguindo salvar cento e
cinqüenta mil refugiados. Seu grande amigo Yannis Stavridakis morre
em Tiflis nesse momento. Em 21 de agosto Kazantzákis chega a Paris
para prestar contas a Venizelos. Em novembro de 1920, com a derrota
do Partido Liberal, deixa o Ministério e parte para Paris, Alemanha,
Áustria e Itália. O ano seguinte será de mais viagens pela Grécia, com
Sikelianos ou com o compositor Costas Sphakianakis. Em 1922 assina
um contrato, com uma editora de Atenas, para escrever livros didáticos
de História. Passa a morar em Viena, onde esboça a tragédia Buda. Nessa
época lhe acontece o estranho episódio de uma súbita e horrível deformação da face, no momento em que ia encontrar-se com uma mulher,
encontro que, a seu ver, daria início a um relacionamento desastroso.
Submete-se então a um tratamento psicanalítico com o Dr. Wilhelm
Steckel, discípulo de Freud, que considera o seu caso um exemplo típico
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de somatização histérica, conhecido como a rara “doença dos ascetas”.
Esse episódio reaparecerá em sua obra, tal qual, com o personagem
Manólios, de O Cristo recrucificado. Muda-se para Berlim em setembro,
numa Alemanha em plena crise, e no mesmo momento em que a Grécia
é fragorosamente derrotada pelos turcos na sua tentativa de recuperar
seus territórios da Ásia Menor.
Em 1923 termina Kazantzákis a composição de Ascese, ou Salvatores
Dei, os Salvadores de Deus. Essa obra, cuja melhor caracterização literária
seria a de poema em prosa filosófico, é ao mesmo tempo a síntese e a matriz geradora de toda a sua obra posterior, a sua coluna vertebral, mais ou
menos como o insuperável poema platonizante “Sôbolos rios que vão” o é
para a lírica de Camões. Escrito num tom doutrinário, imperativo, quase
catequista, Ascese permanece como um dos textos mais fascinantes produzidos pela riquíssima literatura do século XX. Seu final, que não pode,
no entanto, resumir a sua riqueza de conteúdo, espécie de profissão-de-fé
do heroísmo trágico, todo escrito em letras maiúsculas, diz:
“Creio num Deus guarda-fronteiras de duplo nascimento, militante
e sofredor, poderoso mas não onipotente, guerreiro dos mais recuados
confins, imperador de todas as forças da luz, visíveis e invisíveis.
Creio nas máscaras efêmeras e inumeráveis que Deus usou ao longo dos séculos e por trás de seu fluxo incessante distingo a indissolúvel
unidade.
Creio na sua luta tenaz e insone para domar a matéria e fazê-la
frutificar — fonte que dá vida às plantas, animais e homens.
Creio no coração do homem, eira terrena onde o guarda-fronteiras
combate contra a morte.
‘Socorro!’ gritas, ‘socorro!’, gritas, e eu te escuto, Senhor.
Dentro de mim, os antepassados, os descendentes, as raças todas,
a terra inteira ouvem o teu grito com terror e alegria.
Bem-aventurados os que ouvem e correm a libertar-te, Senhor,
dizendo: ‘Só eu e tu existimos’.
Bem-aventurados os que te libertam, unem-se a ti e dizem: ‘Eu e
tu somos um’.
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E três vezes bem-aventurados os que carregam nos ombros, sem
vergar ao seu peso, o grande, o extraordinário, o terrível segredo:
Sequer este um existe!”
Mas a verdade final de Kazantzákis, no fundo, não é a de Ascese. Acima dessa convicção racional, sobre a qual se construía a sua visão trágica,
havia a convicção não racional, ou mais que racional, do grande místico
que ele foi, o mesmo que afirmou um dia: “Sei, sem dúvida, que isso não
é verdadeiro, mas sei também que existe uma coisa mais verdadeira que a
verdade.” No verão desse mesmo ano ele visita a casa natal de Nietzsche.
Sua mulher se une a ele em Berlim, no fim do ano.
Em 1924 Kazantzákis visita Nápoles, Roma e Assis, terra do santo
que foi um dos seus heróis de sempre. Durante esse périplo pela Itália se
encontra com Marinetti. De volta à Grécia, e já em processo de divórcio
com Galatéia, conhece, em agosto, Helena Samios, sua futura mulher. No
fim do ano, à beira do mar, perto de Candia, inicia a redação da sua obra
máxima, que terá outros seis estados até a forma definitiva, Odisséia.
No ano de 1925, continuando a redação da epopéia, Kazantzákis
viaja longamente pela Grécia continental e insular. O momento central
do ano será, no entanto, a sua partida, a 13 de outubro, para Moscou,
como correspondente do jornal Eleutheros Logos. Sempre dominado
pela sua visão algo budista da eterna destruição e reconstrução de todas
as coisas que rege tanto o ritmo cósmico quanto o humano, a sua curiosidade pela inédita experiência da revolução soviética é imensa, assim
como a sua atração pela figura de Lênin como o mais radical condutor
de almas de sua época, fascinação que nunca abandonará. Sem nunca
ter sido comunista, fato aliás impossível, levando-se em conta a sua feroz
independência de caráter, Kazantzákis observa tudo com uma mistura de
simpatia, esperança e espanto, percebendo de forma quase clarividente
o caráter inequivocamente autocrático do partido, as perseguições e as
tragédias que daí adviriam, mas reconhecendo algo da necessidade de
tudo isso após o caldeirão de violências da guerra civil. Como sempre,
o que o fascinava não era essa ou aquela ideologia, mas o irrefreável esforço humano em direção a alguma coisa indefinida que ele descreverá
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como poucos em Ascese. De todos os horrores de que foi testemunha,
o que mais o impressionou foi a grande fome, época em que qualquer
um que caminhasse por ruas escuras se arriscava, ao passar pelo vão de
uma porta, a ser apanhado e literalmente devorado pelos famintos, ou
a assistir ao comércio tétrico de corpos de crianças mortas de inanição,
trocados entre uma família e outra para que cada qual não fosse obrigada
a comer os de seu próprio sangue. Há fotografias por ele tiradas nessa
época que ele mesmo considerava impublicáveis.
Sobre o sentido real dessa experiência escreverá ele mais tarde:
“Cada vez mais, percorrendo a URSS, eu sinto essa coisa inumana que já
me devorava na Grécia. O que me interessa não é o homem, nem a terra,
nem o céu, mas a chama que devora homem, terra e céu. A Rússia não
me interessa, mas a chama que devora a Rússia. Melhoria da sorte da
massa ou da elite, felicidade, justiça, virtude, engodos populares que
não me enganam. Uma só coisa me prende; eu a busco por toda parte
e meus olhos a seguem com espanto e alegria: a linha rubra que perfura e atravessa, como um rosário de crânios, os homens. Eu só amo
esta linha rubra, minha única alegria é senti-la perfurar e atravessar
meu crânio partindo-o, tudo mais me perece efêmero, beatamente
filantrópico e vegetariano, indigno de uma alma que se libertou de
toda a esperança.”
A aura de comunista, que sempre envolveu Kazantzákis, não resiste
a um exame mais atento de sua obra, talvez especialmente de seus livros
de viagens, subproduto biográfico desse viajante compulsivo, um dos
intelectuais de sua época mais próximos do lema terenciano do “Sou
humano, nada do que é humano me é estranho.” Em sua viagem ao
Japão, após andar de riquixá em Kioto — transporte que, segundo ele,
humilhava quem puxava e quem era puxado, e no qual sem dúvida só
embarcou para perceber isso — escreveu Kazantzákis:
“Qual o nosso dever?, perguntava-me eu sem tirar os olhos de suas
costas ensopadas de suor. Uma única coisa: contribuir para que uma
tarefa de coolie seja cumprida por aquele que não pode aspirar a nada
melhor. Estabelecer, mesmo momentaneamente, uma hierarquia exata
15 de junho de 2011
e justa e não a de hoje, injusta e inumana, onde aqueles que deviam ser
coolies circulam a cavalo e comandam.
A justiça não significa que todos sejam senhores ou escravos.
A justiça significa que o ser de natureza servil cumpra as funções de
servidor e o ser de natureza senhorial funções de senhor. Pois eu creio
firmemente na desigualdade dos seres. E se hoje, no mundo em que
vivemos, uma alma honesta execra naturalmente a organização social,
não é por existirem senhores e escravos, mas porque os senhores atuais
perderam as virtudes nobres dos senhores de outrora e se transformaram
em escravos de si próprios.”
Um texto como esse o aproximaria mais de uma idéia de república
aristocrática, como teorizava seu contemporâneo muitas vezes julgado
até fascista Fernando Pessoa, do que de qualquer forma de comunismo.
A verdade é que o próprio aristocratismo de um Fernando Pessoa só o
podia afastar do extremo plebeísmo boçal de todos os fascismos, assim
como o desespero de Kazantzákis, um desespero quase dostoievskiano,
com o sofrimento material da humanidade o afastaria naturalmente de
qualquer república aristocrática.
Mais estranho ainda a uma ideologia comunista é o seguinte parágrafo admirável, do mesmo livro de viagens:
“Bendita seja a prodigalidade, aquilo que nós chamamos luxo, supérfluo, extravagância. Ser civilizado significa considerar o luxo como
uma necessidade, ultrapassar o animal e não poder se contentar com
a comida, a bebida, o sono e o sexo. No instante em que o bípede sem
penas aspira ao supérfluo, ele começa a se transformar num ser humano.
Todo bem que este mundo possui, tudo que foi salvo dos formigueiros
humanos é um luxo: uma pintura, uma flor esculpida, um canto, uma
idéia que se eleva acima do espírito mediano. O luxo é a maior necessidade do homem superior. Aquilo que ultrapassa seu coração, isso é o
seu verdadeiro coração.”
A cada 15 - Alexei Bueno
Podemos imaginar como esses dois trechos repercutiriam em qualquer célula do partido comunista pelo mundo. No campo religioso, a
controvérsia é a mesma, entre um Kazantzákis ateu e o extremo oposto
disso. Tais são as contradições inerentes à riqueza de qualquer grande
espírito cioso de sua liberdade. Na verdade, como o maior dos seus
mestres, dos seus “condutores de almas”, a maior fixação de sua vida, ele
vinha não para trazer a paz, mas a espada, ou poderia como ele afirmar:
“Eu vim trazer o fogo à terra e que quero eu senão que ele se acenda?”
Não é à toa que a sua biografia escrita por sua viúva, e altamente calcada
em sua própria correspondência, foi por ela intitulada O dissidente.
No ano seguinte, 1926, Kazantzákis retorna a Atenas, onde se
instala com Helena, seu divórcio de Galatéia tendo sido publicado em
28 de abril. Viaja à Palestina com sua esposa e dois amigos. Em agosto
parte para a Espanha, onde entrevista Primo de Rivera. Em outubro,
agora outra vez na Itália, entrevista Mussolini. Conhece nessa época o
jovem escritor cretense Pandélis Prevelákis, que se tornará o seu maior
amigo e colaborador.
Em 1927 Kazantzákis parte para o Egito e o Monte Sinai, viagem
que lhe renderá um outro livro. A partir de maio se instala numa casinha em Egina, completamente isolado na criação de sua Odisséia,
cuja primeira versão ele ali consegue terminar. A 20 de outubro parte
novamente para Moscou, convidado para as festas de dez anos da Revolução. Conhece nessa ocasião Panait Strati, o escritor romeno, também
conhecido como o Gorki dos Bálcãs, hoje muito pouco lembrado, talvez
pelo fato de ter escrito toda a sua obra em língua francesa, sendo considerado um romeno na França e na Romênia um escritor francês. Após
uma longa viagem pelo Cáucaso e o Mar Negro, Kazantzákis e Stratis
chegam a Atenas no primeiro dia de 1928. Após tomarem parte num
comício no teatro Alhambra, os dois são processados, o que resulta para
ambos na proibição de qualquer atividade política. Em abril retornam
à Rússia, onde Kazantzákis se aproxima do cinema soviético em seu
apogeu — com os nomes, em plena atividade, de Eisenstein, Pudovkin,
Dovchenko ou Vertov — escrevendo mesmo um roteiro, O lenço verme-
15 de junho de 2011
lho, mas se dedicando, na mesma época, a retoques no texto de Ascese.
Os dois amigos se encontram com Gorki nesse ano. Até abril de 1929
viaja por todo o imenso território soviético, voltando finalmente para
Berlim. Vive durante onze meses na Tchecoslováquia com Helena, e
escreve, diretamente em francês, Toda-Raba, seu primeiro romance,
com uma forma muito próxima àquela do roteiro cinematográfico. A
base desse romance é exatamente a experiência das festas internacionais pelo primeiro decênio da revolução. Entre personagens de todas
as procedências, reais ou fictícios, Toda-Raba, um régulo africano, é
o mais culturalmente afastado daquela experiência sócio-econômica
extrema. O final do romance, dentro do mausoléu de Lênin, antecipa o
processo que Kazantzákis usará, anos depois, no impressionante final
de A última tentação.
O ano de 1930 o encontra a compor uma História da Literatura
Russa em dois volumes. Transfere-se novamente para Paris. Em 1932
morrem seu pai e sua mãe, a perda da última sendo-lhe especialmente
dolorosa. Nesse mesmo ano termina terceira versão da sua Odisséia, que
terá, como já dissemos, sete redações até o seu estado final, composta
de 33.333 versos de dezessete sílabas, muito próximos dos hexâmetros
homéricos, espalhados por um manuscrito de 1984 páginas. Trata-se
da maior epopéia do Ocidente, e do maior monumento da poesia grega
moderna. Nela Kazantzákis retoma as aventuras de Odisseu exatamente
onde Homero parara, e o acompanha até sua morte nos gelos do Pólo
Sul. É impossível resumir, no espaço desta curta homenagem, a riqueza
inesgotável dessa obra, síntese final do niilismo místico, do heroísmo
trágico de Kazantzákis, delineado primeiramente em Ascese, do seu
“olhar cretense” entre o Oriente e o Ocidente, entre o élan vital bergsoniano e o abismo de Nietzsche.
Dedica-se então a grandes trabalhos a quatro mãos com Prevelákis,
ao mesmo tempo em que traduz a Divina Comédia integralmente, com
métrica e rima, em quarenta e cinco dias. Em outubro retorna a Madrid,
onde se encontra com seu amigo Juan Ramón Jimenez, Benavente e ValleInclán. Nos dois anos seguintes, 1933 e 1934, entrega-se à composição
dos seus “Cantos” ou “Elegias” em terza rima, dedicados aos condutores
A cada 15 - Alexei Bueno
de almas que lhe serviram de exemplo, Gêngis Khan, Yannis Psycharis
— o grande líder na luta pela adoção do demótico como língua literária
da Grécia, a que Kazantzákis aderiu entusiasticamente —, Santa Teresa,
Lênin, Dom Quixote, Maomé, Nietzsche, Buda, Moisés.
1935 é o ano de sua grande viagem à China e ao Japão, que resultará
num livro de viagens com notáveis antevisões sobre o destino dos dois
países, e também com uma impressão penosa, especialmente no caso
chinês, daquele Extremo Oriente que parecia longe de despertar, e sobre
o qual escreveu: “Nesses países profundos onde os mortos dominam
os vivos, não há indivíduo, há apenas a massa, e sobretudo a massa
terrível, impenetrável, dos mortos. Cada minuto amarelo tem o peso
de séculos.” Se em 1936 Kazantzákis escreve O jardim dos rochedos,
espécie de adaptação romanesca, parcialmente em forma de diário,
do conteúdo de Ascese, reutilizando-o integralmente — tal como sete
anos antes escrevera Toda-Raba, esse romance que é parcialmente uma
reportagem em estilo cinematográfico — será a partir da década de 1940
que o gênero dominará a sua obra imensa, outorgando-lhe uma fama
internacional que a sua poesia, como sempre acontece, não lhe propiciara. Kazantzákis é, de fato, um romancista da completa maturidade,
quando não da velhice.
Entre 1941 e 1942 termina a tragédia Buda e inicia a redação de
Alexis Zorba. Invadida a Grécia pelo Eixo, Kazantzákis abandona Egina,
onde estava isolado, e segue para Atenas, pensando em partir para uma
ação direta na resistência grega. Hospeda-se com Pandílis Prevelákis,
e reencontra Angelos Sikelianos. Traduz nessa ocasião a Ilíada para o
grego moderno. Em 1943 termina a sua obra mais célebre, a Vida e obra
de Alexis Zorba, brilhante desde o título, geralmente traduzida como
Zorba, o grego, livro sem paralelo, o único romance picaresco-trágico
da literatura ocidental. Quase um livro de memórias, sob muitos aspectos, nele Kazantzákis buscou imortalizar a figura do Giórgis Zorba que
conhecera em 1917. Já outra guerra ensangüentava a Europa, quando
lhe chegou o telegrama comunicando a morte do personagem extraordinário, que depois correria o mundo no filme de Cacoyánnis. Assim
narra o autor aquele momento:
15 de junho de 2011
“Mas que fazer, pensei eu durante toda a noite, que fazer para
esconjurar a morte, a sua morte?
Abrira-se o alçapão sobre as profundezas do meu ser, e as
recordações saltavam para fora, empurrando-se umas às outras, e
rodeavam-me o coração, exasperadas. Mexiam os lábios e gritavam-me
para que reunisse Zorba, espalhado pela terra, pelo mar e pelo vento, e o
ressuscitasse. E não era esse o dever do coração? Não fora para isso que
Deus o criara, para ressuscitar os seres bem-amados? Portanto, deves
ressuscitá-lo.
Ainda que seja a morte, disse eu encorajado pelo sol alegre que incidia sobre o guerreiro e lhe concedia a vida, ainda que seja a morte, nós
iremos fazer com ela uma dança. Seremos nós, meu coração, a dar-lhe
o nosso sangue para que ele sobreviva; faremos tudo o que pudermos
para que viva um pouco mais esse maravilhoso glutão, beberrão, besta
de carga e mulherengo, esse vagabundo. O dançarino e o guerreiro. A
alma mais vasta, o corpo mais resistente, o grito mais livre que conheci
em toda a minha vida...”
Era o retorno da sensação que tivera na infância em relação ao seu
avô materno: “Este avô foi o primeiro a me fazer desejar não morrer,
para que meus mortos não morressem. Desde então muitos dos que amei
morreram, eles desceram não na terra, mas na minha memória, e eu
hoje sei que enquanto eu viver eles viverão também.” Do mesmo modo
que reconhecia perfeitamente as suas armas para essa missão: “Ah!...
As palavras! As palavras! Para mim, pobre de mim, não existe outra
salvação. Não tenho em meu poder mais do que vinte seis soldadinhos
de chumbo, as vinte e seis letras do alfabeto: eu decretarei a mobilização,
eu levantarei um exército, eu lutarei contra a morte.”
Em 1950 escreve O Cristo recrucificado, obra-prima indiscutível,
com personagens imortais como o Agá de Lyncovrissi, o grupo dos notáveis da cidade, o Pope intolerante, o místico Manólios, o padre Photis
ou o mascate Yannakos e seu mais do que amado burro Youssof. Tal
romance teve, sem dúvida, na nossa opinião, importância na gênese de
A cada 15 - Alexei Bueno
O pagador de promessas, de Dias Gomes, Yannakos sendo, claramente,
uma das matrizes para Zé do Burro, assim como o Pope de Lyncovrissi
o é para o pároco cruel da igreja de Santa Bárbara.
Da mesma época é a criação de A liberdade ou a morte, ou Capitão
Mikalis, no título original, o maior romance de Kazantzákis, dos maiores de todo o século XX, pela perfeição e complexidade estrutural, pela
impressionante grandeza épica, pela variedade de personagens como
poucos narradores já alcançaram. Misturando o épico, o amoroso e o
costumbrista de maneira genial, mais ou menos como Tasso, em sua
Jerusalém libertada, conseguiu tecer uma perfeita tapeçaria com o bélico, o amatório e o religioso, trata-se do seu grande romance cretense,
a epopéia das incessantes revoluções da ilha mítica contra o opressor.
Os personagens são criações inesquecíveis, desde a figura feroz do protagonista, inspirado no pai do autor e com o seu mesmo nome, até as de
Nuri Bey, de sua amante circassiana, do centenário pai de Mikalis, do
seu sobrinho Kosmas, do seu filho, obviamente um alter ego do pequeno Kazantzákis, de Ventusos, do Capitão Polyxinguis, de Bertoldo, do
alucinado místico muçulmano Effendine, cuja única alegria era, de seis
em seis meses, embebedar-se de vinho, comer porco e xingar Maomé
na casa do capitão, obrigando-o a ameaçá-lo de morte caso não fizesse
tudo isto, para assim diminuir a enormidade do seu pecado, o mesmo
personagem que só conseguia atravessar as ruas de Megalo Kastro —
por onde à noite São Minas, depois de descer do seu ícone, passeava a
cavalo — se alguém o carregasse, pois as via como terríveis rios de fogo.
De 1951 é a composição desse romance violentamente expressionista que é A última tentação. A descrição do esforço titânico do lado
humano do Messias para alcançar o seu lado divino foi espantosamente
mal compreendida, dando margem a toda sorte de ataques contra o autor, que acabara de produzir, no entanto, uma das mais impressionantes
demonstrações literárias de amor ao Cristo de que se tem notícia. O
final de A última tentação se resolve num crescendo de angústia quase
insuportável, sem dúvida um dos finais de narrativa mais poderosos de
nossa época. Talvez coubesse ao Cristo de Kazantzákis, o Cristo lutador que se eleva do carpinteiro fazedor de cruzes ao Deus crucificado,
15 de junho de 2011
repetir a si próprio a proposição central de Ascese: “Não é Deus que
nos salvará; somos nós que salvaremos Deus, combatendo, criando,
transformando a matéria em espírito.” Curiosamente, o livro que se
segue é O pobre de Assis, o mais lírico, o mais puro dos romances de
Kazantzákis, como o seu próprio protagonista o foi. É nesse ano que o
autor descobre a leucemia com que passará a conviver, ao lado dos velhos
problemas cutâneos, provavelmente de origem psicossomática, de que
recorrentemente sofreu, sem falar de alguns problemas oftalmológicos
mais ou menos sérios.
Em 1956 inicia a redação das suas memórias, a magistral Carta a
el Greco, na qual, como um soldado que entregasse o relatório de sua
missão a um superior, ao seu general, ele se confessa ao seu grande conterrâneo do século XVI, em sua Toledo adotiva. É a mesma época em que
Jules Dassin começa a rodar em Creta Aquele que deve morrer, versão
de O Cristo recrucificado, que será lançado no Festival de Cannes de
1957. Indicado ao prêmio Nobel por Thomas Mann e Albert Schweitzer,
Kazantzákis perde o prêmio, por um voto, para Albert Camus, de 44
anos de idade, trinta anos mais novo do que ele, após pesado lobby da
diplomacia grega contra a outorga do prêmio. O próprio Camus, que no
seu Le mythe de Sisyphe expôs algumas idéias próximas das de Kazantzákis, afirmaria mais tarde, em carta a Helena, ser Nikos, que faleceria
poucas semanas após a entrega do prêmio, cem vezes mais merecedor da
honraria do que ele. De fato, rótulos de herético ou de comunista acompanharam os últimos anos de suas relações com o país natal e a igreja
ortodoxa, sem esquecer da Católica, que o condenou veementemente.
Seu último romance, Os fratricidas, ou Os irmãos inimigos, publicado
postumamente, descreve de maneira terrível a guerra civil grega após
o fim da ocupação nazista, um conflito sangrento entre comunistas e
nacionalistas. Houve quem falasse de um último Kazantzákis desesperado, por causa do final desse grande romance, mas nada nele se afasta
da visão do mundo reconhecível nas obras anteriores do autor.
Retornando, finalmente, ao tema de abertura desta palestra, vale a
pena lembrar o que sobre a sua morte escreveu a sua sempre fiel Helena,
depoimento, aliás, dos mais comoventes:
A cada 15 - Alexei Bueno
“Nikos Kazantzákis pediu a Deus dez anos adicionais de vida, dez
anos a mais para completar sua obra — para dizer o que tinha de dizer
e ‘esvaziar-se’. Queria que, quando a morte viesse, encontrasse somente
um monte de ossos. Dez anos seriam suficientes, ou assim ele imaginava.
Mas Kazantzákis não era do tipo que podia ‘esvaziar-se’ assim facilmente. Longe de se sentir velho e cansado aos setenta e quatro anos,
considerava-se rejuvenescido mesmo após a sua última trágica aventura,
a da vacinação. Dois grandes especialistas de Friburgo, o hematólogo
Heilmeyer e o cirurgião Kraus endossavam essa opinião.
Durante todo seu último mês, o professor Heilmeyer gritava triunfante depois de cada consulta: — Estou lhe dizendo que este homem está
mais do que sadio. Seu sangue está tão puro quanto o meu.
— Por que você corre desse jeito, Nikos? — eu persistia em ralhar,
temendo que ele escorregasse e fraturasse algum osso.
— Não se preocupe, Lenotska, tenho asas — respondia. Sentiase a confiança que tinha no físico e na alma que se recusavam em se
transformar em pó.
Por vezes suspirava: —Ah, se eu conseguisse ditar para você? — E
segurando um lápis, tentava escrever com a mão esquerda.
— Qual é a pressa? Há alguém vindo atrás de você? O pior já passou.
Em alguns dias você vai poder escrever tudo que seu coração desejar.
Virava então a cabeça, me olhava, e suspirando, dizia: — Tenho tanta coisa para dizer. Estou sendo atormentado novamente por três temas,
três novos romances. Mas antes tenho de terminar a Carta a el Greco.
— Você o fará, não se preocupe.
15 de junho de 2011
— Quero fazer modificações no texto. Você pode me conseguir um
lápis e umas folhas de papel? Vamos ver se conseguimos fazê-las.
Mas nosso trabalho a quatro mãos terminava em poucos minutos.
— Não adianta. É impossível. Não sei ditar. Só sei pensar quando
o lápis está entre meus dedos.
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..........................................................................................................
.........................................
Não. Ele não conseguiu terminar a Carta a el Greco a tempo. E
foi incapaz de escrever um segundo esboço como era de seu costume.
Conseguiu, no entanto, reescrever todo o primeiro capítulo e uma das
partes finais: ‘Quando o germe da Odisséia frutificou em mim’, que enviou antes de sua morte para ser publicado no periódico Nea Estia. E
conseguiu reler seu manuscrito, fazendo correções ou acréscimos, aqui
e ali.
Na solidão, agora, revivo o entardecer outonal que descia, descia
suave, como uma criancinha, com o primeiro capítulo.
— Leia, Lenotska. Leia para que eu o ouça.
‘Guardo minhas ferramentas: visão, olfato, tato, paladar, audição, intelecto. A noite chegou, o trabalho do dia está feito. Como uma
toupeira retorno à casa, a terra. Não porque esteja cansado. Mas o sol se
pôs...’ Não pude prosseguir. Um nó se formou na minha garganta. Esta
fora a primeira vez em que Nikos havia falado da morte.
— Por que escreve como se estivesse pronto para a morte? —
gritei, em concreto desânimo. E a mim: por que hoje, logo hoje, aceitou
ele a morte?
A cada 15 - Alexei Bueno
— Não se alarme, mulher, não vou morrer, — respondeu sem a
menor hesitação. — Não dissemos que viveria outros dez anos? Preciso
de mais dez anos! — Sua voz baixara de tom agora. Estendendo a mão,
tocou no meu joelho. — Vamos, leia. Vamos ver o que escrevi.
A mim ele negou. Mas talvez soubesse. Porque nesta mesma noite
lacrou o capítulo num envelope junto com uma carta para o seu amigo
Pandélis Prevelákis: — Helena não o pôde ler. Começou a chorar. Mas
é bom para ela — e para mim também — que comece a se acostumar...
..........................................................................................................
......................................
— Não me julgue por maus atos, não me julgue pelo ponto de
vista humano, — um outro batalhador implorou-me certa vez. — Julgueme pelo de Deus, pelo objetivo secreto atrás de meus atos.
Assim é como deveríamos julgar Kazantzákis. Não pelo fez ou se o
que fez tinha ou não um valor sublime. Mas sim, pelo que queria fazer
e se o que quis fazer tinha este valor para ele e para nós também.
Eu, por mim, creio que sim. Durante meus trinta e três anos de
convivência ao seu lado, não posso me recordar de jamais ter-me envergonhado por uma única má ação de sua parte. Era honesto, sem malícia, inocente, infinitamente doce para com os outros, feroz só consigo
mesmo. Se se reatraía para a solidão, era somente porque sentia que os
trabalhos dele exigidos eram penosos e seu tempo, curto.
De olhos negros como breu, redondos na penumbra, as lágrimas
brotando, costumava me dizer: — tenho vontade de fazer o que diz
Bergson: ir até a esquina e, estendendo as mãos, começar a implorar
aos passantes: ‘Esmolas, irmãos! Quinze minutos de cada uma de suas
vidas. Oh, por pouco tempo, o bastante para terminar meu trabalho.
Depois, que venha Caronte.’
E Caronte veio — maldito seja! — ceifando Nikos na primeira flor
de sua juventude! Sim, caro leitor, não ria. Porque este era o instante
para que tudo florescesse e frutificasse. Tudo o que iniciou, este homem
que você tanto amou e que tanto o amou, seu Nikos Kazantzákis.”
15 de junho de 2011
O féretro de Kazantzákis chegou a Atenas, por via terrestre, no dia 3
de novembro. No dia seguinte, de avião, foi transportado a Heráklion, a
antiga Candia de sua infância e juventude, e exposto à veneração pública
na catedral da cidade. No dia 5, uma enorme multidão acompanhou
o corpo — a quem o patriarca ortodoxo teve a indignidade de negar
sepultura em terra consagrada, por causa das pretensas heresias do
escritor e do homem — ao Bastião Martinengo, nas grandes muralhas
venezianas que dominam a cidade, defronte do mar de Creta. Jovens
carregavam seus livros como se fossem ícones, e velhos capitães cretenses, com o lenço em torno da testa e o punhal na cintura — homens que
provavelmente nunca deviam ter lido seus livros dos quais pareciam ter
saído — carregaram seu caixão. Sobre seu túmulo se alça uma cruz de
madeira com a única inscrição “Nikos Kazantzákis, 1883-1957”, mas
em frente da cruz, numa pedra, pode-se ler seu epitáfio, tão parecido
com o lema de Isabel D’Este e síntese do seu heroísmo trágico, quase
um haicai, a forma japonesa que ele tanto amava:
Den elpizo tipota.
Den fovumai tipota.
Eimai eleftheros.
Não temo nada,
Não espero nada,
Sou livre!
Alexei Bueno
Outubro de 2007
A cada 15 - Alexei Bueno
Alexei Bueno nasceu no Rio de Janeiro, em 26 de abril de 1963. Publicou, entre outros livros, “As escadas da torre”, 1984 e “A juventude dos deuses,
1996. Como editor da Nova Aguilar organizou a Obra completa de Augusto
dos Anjos, 1994, a Obra completa de Mário de Sá-Carneiro, 1995, a atualização
da Obra completa de Cruz e Sousa, 1995, a Obra reunida de Olavo Bilac, 1996,
a Poesia completa, de Jorge de Lima, entre outros trabalhos. No ano de 2002
organizou, a convite da UNESCO, a “Anthologie de la poésie romantique brésilienne”, editada em Paris, e a “Correspondência de Alphonsus de Guimaraens”,
para a Academia Brasileira de Letras. Em 2004 organizou a antologia “Poesía
brasileira hoxe”, para a Editorial Danú, de Santiago de Compostela. Em 2006
organizou e publicou, junto com George Ermakoff, “Duelos no serpentário,
uma antologia da polêmica intelectual no Brasil”.

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