Cefaleia por Hipotensão do Líquor
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Cefaleia por Hipotensão do Líquor
Cefaleia por Hipotensão do LÍquor: uma clínica particular Pedro Bento Vilas (a) (b) 1. ; Catarina Félix ; Inês Menezes Cordeiro (a)(b) (a) (a) Centro Hospitalar do Algarve, Hospital de Faro – Serviço de Neurologia Autor para correspondência , email: [email protected] Introdução: A cefaleia é o sintoma neurológico mais frequente na população geral e na prática clinica, sendo responsável por 1,3 a 2% de todas as admissões no Serviço de urgência (1)(2). A cefaleia de hipotensão do líquor é um exemplo clássico da importância da história clínica no diagnóstico etiológico da cefaleia e na consequente orientação expedita do doente quando identificada Figura 1 TC crânio-encefálica à entrada apresentava hematomas subdurais fronto-parietotemporais bilaterais, sem densidades hemáticas no parênquima encefálico, nem desvios axiais 2. Apresentação do Caso Clínico: - Homem 48 anos, leucodérmico - Antecedentes pessoais: episódio de manipulação cervical há 5 meses em consulta de quiroprática. - Cefaleia frontoparietal bilateral tipo moinha e acufenos com 2 meses de evolução que agrava com ortostatismo e atividade física, e alivia com o decúbito , acompanhada de náusea e vómitos no dia de admissão - sem resposta a naproxeno, ibuprofeno e resposta ligeira a amitriptilina - Nega exacerbação com estímulo luminoso, auditivo ou alimentar. Nega febre, obstrução nasal, rinorreia, rinoráquia. - Exame objetivo no SU: Doente sonolento, ligeira lentificação das respostas e dor na percussão seios frontais. - MCDTs: Controlo analítico sem alterações no hemograma, ionograma e marcadores inflamatórios. TC-CE figura 1; RM-CE figura 2;. - repouso no leito em decúbito com abundante hidratação e consumo de cafeina. - Ao 9º dia há reversão da náusea e ligeira melhoria da cefaleia. - É identificada fístula raquidiana RM-Neuroeixo figura 3 optando-se pela correção por blood patch no 27ºdia internamento. - Às 24 horas após a técnica, tolera levante tendo alta às 48h para o domicílio - indicação para manter repouso e evicção de esforços nas duas semanas seguintes. - Tem consulta de Neurocirurgia para reavaliação 3. Discussão e Conclusão Figura 2 Derivação T2 RM crânioencefálica: espessamento e captação linear paquimeníngea/dural, de modo difuso. Relata-se herniação transtentorial descendente cerebral, apagamento espaço sub-aracnoideu ventrículos de dimensões reduzidas. Amígdalas cerebelosas em posição baixa com reduzidos espaços de líquor no buraco occipital, estruturas venosas intracranianas proeminentes, com permeabilidade arterial e venosa mantida. Figura 3 RM do eixo raquidiano com mielografia foram identificadas lâminas líquidas peri-vertebrais posteriores no nível C1-C2, dissecando planos musculares sub-occipitais. Estão relatados pequenos divertículos aracnoideus/aracnoidocelos a nível de C6/C7, D1/D2, D9/D10/D11. Este caso apresenta fatores de alerta que indicam a necessidade de estudo etiológico preciso: cefaleia de novo em individuo com mais de 40 anos; dor com agravamento progressivo; lentificação cognitiva. Tabela – Diagnostico Diferencial. Os exames de imagem confirmaram a impressão clinica de cefaleia de hipotensão/hipovolemia do líquor, cuja incidência estimada é de 5casos/100000 habitante/ano (6). Etiologicamente, com a diminuição do liquido cefalorraquidiano, o cérebro colapsa na cavidade intracraniana, causando tração nas estruturas de suporte originando dor(5). A cefaleia ortostática que resolve ou melhora quando deitado é o sintoma característico. Outros sintomas incluem diplopia, perda de audição, acufenos, vertigem e meningismo (1). Esta cefaleia pode ser secundária a punção lombar, injeção epidural ou uma manobra de Valsalva vigorosa (4). Fugas espontâneas de LCR estão associadas a doenças do tecido conjuntivo e/ou uma fraqueza subjacente da dura-máter (6). O diagnóstico deve ser considerado sempre que a história da cefaleia é típica, mesmo quando não há nenhum evento índice óbvio(4). No nosso paciente, não havia evidência de doença do tecido conjuntivo e consideramos que um evento traumático durante a sessão de quiropraxia terá estado na etiologia da fístula de LCR. A hipotensão líquor espontânea é geralmente descrita como benigna, contudo pode levar a complicações graves, como hematoma subdural, trombose venosa cerebral e a morte(7). O tratamento varia desde o repouso no leito até neurocirurgia e uma abordagem precoce permite reduzir a morbilidade e incapacidade funcional associada. Diagn Diferencial (3,4) A favor Contra Inicia com o ortostatismo, agravamento insidioso. Achados imagiológicos Critérios imagiológicos Sem febre, sem sinais meníngeos, Meningite sem alterações inflamatória Hematoma Sub-dural Cefaleia de progressão insidiosa, Sem história de TCE lentificação cognitiva Malformação Chiari Amígdalas cerebelosas em posição Sem sintomas de síndrome baixa com reduzidos espaços de siringomiélico tipo I líquor no buraco occipital Dor sobre seios frontais, cefaleia Sem rinorreia, febre, sem alterações Sinusite bilateral imagiológica Alivia com repouso no leito, piora Dor incaracterística, sem história Enxaqueca com exercício. prévia, sem resposta a terapêutica Hipotensão/ Hipovolémia Líquor Cefaleia de tensão Bilateral, sem outros sintomas acompanhantes Bibliografia Considerações Hematomas sub-durais secundários Requer punção lombar, a qual opta-se por não fazer devido a risco de herniação Requer pelo menos 5 preencham critérios crises que Requer pelo menos 10 episódios prévios para diagnóstico 1. Dermitzakis E V, Georgiadis G, Rudolf J, Nikiforidou D, Kyriakidis P, Gravas I, et al. Headache patients in the emergency department of a Greek tertiary care hospital. J Headache Pain. 2010;11(2):123–8. 2. Ang SH, Chan YC, Mahadevan M. Emergency department headache admissions in an acute care hospital:why do they occur and what can we do about it? Ann Acad Med Singapore. 2009;38(11):1007–10. 3. Torelli P, Jensen RH, Tavanaiepour D, Levy RM, Tan X, Dai Y, et al. The International Classification of Headache Disorders, 3rd edition (beta version). Cephalalgia [Internet]. 2013;53(6):137–46. Available from: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/18808500\nhttp://www.ncbi. nlm.nih.gov/pubmed/24409431\nhttp://www.ncbi.nlm.nih.gov/pub med/22325197\nhttp://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/16805756\ nhttp://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/24238370\nhttp://www.ncb i.nlm.nih.gov/pu 4. Kasper DL, Hauser SL, Jameson JL, Fauci AS, Longo DL, Loscalzo J, editors. Harrison’s Principles of Internal Medicine [Internet]. 19th ed. McGraw-Hill Education; 2015. Available from: http://www.mhprofessional.com/mediacenter/hpim19 5. Sun-Edelstein C, Lay CL. Headache attributed to spontaneous intracranial hypotension: Pathophysiology, clinical features, and diagnosis. UpToDate. 2015; 6. Schievink WI. Spontaneous Spinal Cerebrospinal Fluid Leaks and Intracranial Hypotension. JAMA [Internet]. 2006 May 17;295(19):2286. Available from: http://jama.jamanetwork.com/article.aspx?doi=10.1001/jama.295.1 9.2286 7. Idrissi AL, Lacour J-C, Klein O, Schmitt E, Ducrocq X, Richard S. Spontaneous Intracranial Hypotension: Characteristics of the Serious Form in a Series of 24 Patients. World Neurosurg [Internet]. Elsevier Ltd; 2015; Available from: http://linkinghub.elsevier.com/retrieve/pii/S1878875015008682