2012 nº 3 - Febrasgo

Transcrição

2012 nº 3 - Febrasgo
ISSN 0100-7203
2012
Revista Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia Março
Março 2012
volume 34
nº 3
volume 34
número 3 p. 99 - 142
Publicação mensal
ISSN 0100-7203
Órgão Oficial de Divulgação Científica da Federação Brasileira das
Associações de Ginecologia e Obstetrícia
Rev Bras Ginecol Obstet v. 34, n. 3, p. 99-142, mar. 2012
Publicação indexada na Base de
Dados Lilacs e SciELO. Disponível
eletronicamente no Scielo
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autores. É permitida a reprodução total ou parcial dos artigos, desde que mencionada a fonte.
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ISSN 0100-7203
Órgão Oficial de Divulgação Científica da Federação Brasileira das
Associações de Ginecologia e Obstetrícia
Rev Bras Ginecol Obstet v. 34, n. 3, p. 99-142, mar. 2012
Sumário
Editorial
99
Eduardo Leme Alves da Motta
Thaís Sanches Domingues
José Maria Soares Júnior
O uso de sensibilizadores de insulina no tratamento de infertilidade
em pacientes com síndrome dos ovários policísticos (SOP)
Use of insulin sensitizers in the treatment of infertility in patients with polycystic ovary syndrome (POS)
Artigos originais
102
Eliane Menezes Flores Santos
Lídia Pereira de Amorim
Olívia Lúcia Nunes Costa
Nelson Oliveira
Armênio Costa Guimarães
107
Roseli Mieko Yamamoto Nomura
Letícia Vieira Paiva
Verbênia Nunes Costa
Adolfo Wenjaw Liao
Marcelo Zugaib
113
Maria do Socorro Cavalcante
Everardo de Macêdo Guanabara
Camila Pinto de Nadai
118
Heleodoro Corrêa Pinto
Lutero Koch Jung
Eliana Wendland
Simone da Cunha Heineck
Perfil de risco gestacional e metabólico no serviço de pré-natal
de maternidade pública do Nordeste do Brasil
Profile of gestational and metabolic risk in the prenatal care service of a public maternity in the
Brazilian Northeast
Influência do estado nutricional materno, ganho de peso e
consumo energético sobre o crescimento fetal, em gestações
de alto risco
Influence of maternal nutritional status, weight gain and energy intake on fetal growth in high-risk
pregnancies
Complicações maternas associadas à via de parto em gestantes
cardiopatas em um hospital terciário de Fortaleza, CE
Maternal complications related to the mode of delivery in pregnant women with heart disease in a
specialist high risk delivery hospital in Fortaleza, CE
Colpotomia no tratamento da gestação ectópica
Treating ectopic pregnancy with colpotomy
122
João Rocha Vilela
Maria Teresinha de Oliveira Cardoso
José Gonçalves Franco Júnior
Anaglória Pontes
128
Ana Gabriela Pontes
Marta Francis Benevides Rehme
Maria Thereza Albuquerque Barbosa
Cabral Micussi
Técia Maria de Oliveira Maranhão
Walkyria de Paula Pimenta
Acurácia da histerossonografia versus ultrassonografia
transvaginal em mulheres inférteis candidatas às técnicas de
reprodução assistida
Sonohysterography accuracy versus transvaginal ultrasound in infertile women candidate to assisted
reproduction techniques.
A importância do teste de tolerância à glicose oral no
diagnóstico da intolerância à glicose e diabetes mellitus do tipo 2
em mulheres com síndrome dos ovários policísticos
The importance of oral glucose tolerance test in diagnosis of glucose intolerance and type 2 diabetes
mellitus in women with polycystic ovary syndrome
Lídia Raquel de Carvalho
Anaglória Pontes
Relato de Caso
133
Mariana de Almeida Pinto Borges
Maria Lucia Elias Pires
Denise Leite Maia Monteiro
Suely Rodrigues dos Santos
Forma atípica da síndrome de Mayer-Rokitansky-Kuster-Hauser
com malformação renal e displasia cervicotorácica (associação
de MURCS)
Atipical form of Mayer-Rokitansky-Kuster-Hauser syndrome with renal malformation and
skeletal abnormalities (MURCS association)
Agenda
139
Agenda
Instruções aos Autores
A Revista Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia (Rev Bras Gincecol
as respectivas publicações sobre o tema. Se houver interesse da revista,
será enviado convite para apresentação do texto definitivo. Todos
os autores devem ter publicações em periódicos regulares, indexados
sobre o tema da revisão. O número de autores é limitado a quatro,
dependendo do tipo de texto e da metodologia empregada. Devem ser
descritos os métodos e procedimentos adotados para a obtenção do
texto, que deve ter como base referências recentes, inclusive do ano em
curso. Tratando-se de tema ainda sujeito a controvérsias, a revisão deve
discutir as tendências e as linhas de investigação em curso. Apresentar,
além do texto da revisão, resumo, abstract e conclusões. Ver a seção
“Preparo do manuscrito” para informações quanto ao texto principal,
página de rosto, resumo e abstract;
Obstet., ISSN 0100 7203), publicação mensal de divulgação científica
da Federação das Sociedades de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo),
é dirigida a obstetras, ginecologistas e profissionais de áreas afins, com
o propósito de publicar contribuições originais sobre temas relevantes no
campo da Ginecologia, Obstetrícia e áreas correlatas. É aberta a contribuições nacionais e internacionais. A revista aceita e publica trabalhos em
português, inglês e espanhol.
O material enviado para análise não pode ter sido submetido simultaneamente à publicação em outras revistas nem publicado anteriormente.
Na seleção dos manuscritos para publicação, são avaliadas originalidade,
relevância do tema e qualidade da metodologia utilizada, além da adequação às normas editoriais adotadas pela revista. O material publicado
passa a ser propriedade da Revista Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia
e da Febrasgo, só podendo ser reproduzido, total ou parcialmente, com
a anuência dessas entidades.
5.
Comentários Editoriais, solicitados pelo editor;
6.
Resumos de Teses apresentadas e aprovadas nos últimos 12 meses,
contados da data de envio do resumo. Devem conter, aproximadamente, 300 palavras e, para serem aceitos, devem seguir as normas
da revista quanto à estruturação, à forma e ao conteúdo. Incluir título
em português e inglês e, no mínimo, três palavras ou expressõeschave. Não há revisão do texto dos Resumos de Teses. No arquivo
enviado, informar: nome completo do autor e do orientador; membros
da banca; data de apresentação e a identificação do serviço ou
departamento onde a tese foi desenvolvida e apresentada. Lembramos
que a publicação do resumo não impede a posterior publicação do
trabalho completo em qualquer periódico.
7.
Cartas dos Leitores para o Editor, versando sobre matéria editorial
ou não, mas com apresentação de informações relevantes ao leitor.
As cartas podem ser resumidas pela editoria, mas com manutenção
dos pontos principais. No caso de críticas a trabalhos publicados,
a carta é enviada aos autores para que sua resposta possa ser
publicada simultaneamente.
Os manuscritos submetidos à revista são analisados por pareceristas
e o sigilo sobre a autoria e a identidade dos revisores é garantido durante
todo o processo de edição. Os pareceres dos revisores e as instruções do
editor serão enviados para os autores para que eles tomem conhecimento
das alterações a serem introduzidas. Os autores devem reenviar o texto
com as modificações solicitadas assim que possível, devendo justificar, na
carta de encaminhamento, se for o caso, o motivo do não atendimento de
alguma sugestão para modificação. Não havendo retorno do trabalho
após três meses, presume-se que os autores não têm mais interesse na
publicação. Os autores podem solicitar em qualquer ponto do processo
de análise e edição do texto a sustação do processo e a retirada do
trabalho. Os conceitos e as declarações contidos nos artigos são de
responsabilidade dos autores.
A revista publica contribuições nas seguintes categorias:
1.
Artigos Originais, trabalhos completos prospectivos, experimentais ou
retrospectivos. Manuscritos contendo resultados de pesquisa clínica
ou experimental original têm prioridade para publicação.
2.
Relatos de Casos, de grande interesse e bem documentados, do
ponto de vista clínico e laboratorial. Os autores deverão indicar
na carta de encaminhamento os aspectos novos ou inesperados em
Informações gerais
1.
A revista não aceita material editorial com objetivos comerciais.
2.
Conflito de interesses: devem ser mencionadas as situações que podem
influenciar de forma inadequada o desenvolvimento ou as conclusões do
trabalho. Entre essas situações, menciona-se a participação societária
nas empresas produtoras das drogas ou dos equipamentos citados
ou utilizados no trabalho, assim como em concorrentes da mesma.
São também consideradas fontes de conflito os auxílios recebidos, as
relações de subordinação no trabalho, as consultorias etc.
3.
No texto, deve ser mencionada a submissão e a aprovação do estudo por um Comitê de Ética em Pesquisa reconhecido pelo Comitê
Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP).
4.
Artigo que trate de pesquisa clínica com seres humanos deve incluir
a declaração, na seção Métodos, de que os sujeitos do estudo
assinaram o termo de consentimento livre e informado. Os autores
relação aos casos já publicados. O texto das seções Introdução e
Discussão deve ser baseado em revisão bibliográfica atualizada. O
número de referências pode ser igual ao dos trabalhos completos.
3.
Técnicas e Equipamentos, para apresentação de inovações em diagnóstico, técnicas cirúrgicas e tratamentos, desde que não sejam, clara ou
veladamente, propaganda de drogas ou outros produtos. Valem para essa
categoria todas as normas aplicadas para trabalhos completos.
4.
Artigos de Revisão, incluindo avaliação crítica e sistematizada da literatura,
meta-análises ou revisões sistemáticas. A seleção dos temas e o convite
aos autores têm como base planejamento estabelecido pela editoria.
Contribuições espontâneas podem ser aceitas. Nesse caso, devem ser
enviados inicialmente um resumo ou roteiro do texto, a lista de autores e
v
devem informar, também, que a pesquisa foi conduzida de acordo
com a Declaração de Helsinque revisada em 2008.
5. No caso de trabalhos envolvendo experimentação animal, os
autores devem indicar na seção Métodos que foram seguidas as
normas contidas no CIOMS (Council for International Organization
of Medical Sciences) Ethical Code for Animal Experimentation (WHO
Chronicle 1985; 39(2):51-6) e os preceitos do Colégio Brasileiro
de Experimentação Animal - COBEA (www.cobea.org.br).
6. Todos os ensaios controlados aleatórios (randomized controlled
trials) e clínicos (clinical trials) submetidos à publicação devem ter
o registro em uma base de dados de ensaios clínicos. Essa é uma
orientação da Plataforma Internacional para Registros de Ensaios
Clínicos (ICTRP) da Organização Mundial da Saúde (OMS), e
do International Committee of Medical Journal Editors (ICMJE). As
instruções para o registro estão disponíveis no endereço eletrônico
do ICMJE (http://www.icmje.org/clin_trialup.htm) e o registro pode
ser feito na base de dados de ensaios clínicos da National Library
of Medicine, disponível em http://clinicaltrials.gov/ct/gui.
Preparo dos manuscritos
As normas que seguem foram baseadas no formato proposto pelo ICMJE
e publicado no artigo “Uniform Requirements for Manuscripts Submitted to
Biomedical Journals”, atualizado em Outubro de 2008 e disponível no
endereço eletrônico: http://www.icmje.org/.
Apresentação do texto
1.
Os trabalhos devem ser digitados em espaço 2 em todas as seções, da
página de rosto às referências bibliográficas, tabelas e legendas. Cada
página deve conter aproximadamente 25 linhas em uma coluna. Usar
preferencialmente o processador de texto Microsoft Word® e a fonte Times
New Roman 12. Não dar destaque a trechos do texto: não sublinhar ou
usar negrito. Numerar todas as páginas, iniciando pela de rosto.
Não usar maiúsculas nos nomes próprios (a não ser a primeira letra)
no texto ou nas referências bibliográficas. Não utilizar pontos nas
siglas (DPP em vez de D.P.P.). Quando usar siglas ou abreviaturas,
descrevê-las por extenso na primeira vez que mencionadas no texto.
Iniciar cada seção em uma nova página: página de rosto; resumo e
palavras ou expressões-chave; abstract e keywords; texto; agradecimentos; referências; tabelas individuais e legendas das figuras.
7.
O número de autores de trabalhos completos e relatos de casos é limitado a sete. Trabalhos de autoria coletiva (institucionais) devem ter os
responsáveis especificados. Trabalhos e estudos multicêntricos podem
ter número de autores compatível com o número de centros (cada situação será avaliada pela editoria e pelos revisores). Os investigadores
responsáveis pelos protocolos aplicados devem ser especificados. Todos
os autores devem ter conhecimento do texto enviado para a revista.
2.
8.
O conceito de coautoria é baseado na contribuição de cada um, para
a concepção e planejamento do trabalho, análise e interpretação
dos dados, para a redação ou revisão crítica do texto. A inclusão
de nomes cuja contribuição não se enquadre nos critérios citados ou
que tenham fornecido apenas suporte material não é justificável.
Página de rosto
9.
Os autores serão informados, por correspondência eletrônica, do
recebimento dos trabalhos. Os trabalhos que estiverem de acordo
com as Instruções aos Autores e se enquadram na política editorial
da revista serão enviados para análise por revisores indicados pelo
editor. Os originais em desacordo com os objetivos da revista ou
com essas instruções são devolvidos aos autores para as adaptações
necessárias antes da avaliação pelo Conselho Editorial ou recusados
sem análise por revisores.
10. Junto dos arquivos originais, deve ser enviada uma carta de encaminhamento, na qual deve ficar explícita a concordância com as
normas editoriais, com o processo de revisão e com a transferência
de copyright para a revista.
11. Para manuscritos originais, não ultrapassar 25 páginas de texto
digitado ou aproximadamente 30.000 caracteres. Limitar o número
de tabelas e figuras ao necessário para apresentação dos resultados
que são discutidos (como norma geral, limitar a cinco). Para manuscritos do tipo Relato de Caso, não ultrapassar 15 páginas de texto
ou 18.000 caracteres (ver “Preparo do manuscrito”, “Resultados”).
12. O trabalho deve ser enviado pelo sistema de submissão online no portal
SciELO. O endereço eletrônico de todos os autores deve ser fornecido.
Desta forma, os coautores receberão informação sobre a submissão do
vi
trabalho e, assim, não será necessária a assinatura de todos na carta
de encaminhamento. O endereço eletrônico para correspondência com
a revista é [email protected]. O arquivo correspondente ao trabalho
deve ser único e deve conter texto, referências, tabelas e figuras.
Apresentar o título do trabalho em português e em inglês; nomes
completos dos autores sem abreviaturas; endereços eletrônicos válidos de
todos os autores (opcional, em substituição à carta de encaminhamento);
nome da instituição onde o trabalho foi desenvolvido; afiliação institucional
dos autores; informações sobre auxílios recebidos sob forma de bolsas de
estudos, financiamento, fornecimento de drogas, reagentes ou equipamentos. Obrigatoriamente deve ser fornecido o endereço da instituição onde o
trabalho foi desenvolvido, o qual é publicado na página inicial do trabalho.
Devem ser indicados nome, endereço, telefone/fax e e-mail do autor para
o qual a correspondência deve ser enviada. Essas informações pessoais
são empregadas apenas para correspondência com a revista e somente
são publicadas se houver pedido do(s) autor(es).
Resumo
O resumo do trabalho deve aparecer na segunda página. Para trabalhos completos, redigir um resumo estruturado, que deve ser dividido em
seções identificadas: objetivo, métodos, resultados e conclusões. Deve ter
aproximadamente 300 palavras. O resumo deve conter as informações
relevantes, permitindo que o leitor tenha uma ideia geral do trabalho. Deve
incluir descrição resumida de todos os métodos empregados e da análise
estatística efetuada. Expor os resultados numéricos mais relevantes, e não
apenas indicação de significância estatística. As conclusões devem ser
baseadas nos resultados do trabalho e não da literatura. Evitar o uso de
abreviações e símbolos. Não citar referências bibliográficas no resumo.
Abaixo do texto do resumo indicar o número de registro e/ou identificação para os ensaios controlados aleatórios e ensaios clínicos (ver item
5 das “Informações Gerais”).
Na mesma página do resumo, citar pelo menos três palavras ou
expressões-chave que serão empregadas para compor o índice anual da
revista. Devem ser baseadas nos Descritores em Ciências da Saúde (DeCS)
publicado pela Bireme, que é uma tradução do Medical Subject Headings
(MeSH) da National Library of Medicine e está disponível no endereço
eletrônico: http://decs.bvs.br.
O abstract deve ser versão fiel do texto do resumo estruturado (purpose,
methods, results e conclusions). Deve ser também acompanhado da versão
para o inglês das palavras ou expressões-chave (keywords). O resumo e o
abstract dos Relatos de Casos e dos Artigos de Revisão e de Atualização
não devem ser estruturados e são limitados a 150 palavras.
Introdução
Repetir, na primeira página da introdução, o título completo em português
e inglês. Nessa seção, mostre a situação atual dos conhecimentos sobre o
tópico em estudo, divergências e lacunas que possam eventualmente justificar o desenvolvimento do trabalho, mas sem revisão extensa da literatura.
Para Relatos de Casos, apresentar um resumo dos casos já publicados,
epidemiologia da condição relatada e uma justificativa para a apresentação
como caso isolado. Expor claramente os objetivos do trabalho.
Métodos
Iniciar essa seção indicando o planejamento do trabalho: se prospectivo
ou retrospectivo; ensaio clínico ou experimental; se a distribuição dos casos
foi aleatória ou não etc. Descrever os critérios para seleção das pacientes
ou Grupo Experimental, inclusive dos Controles. Identificar os equipamentos
e reagentes empregados (fabricante, cidade e país). Se a metodologia
aplicada já tiver sido empregada, indicar as referências, além da descrição
resumida do método. Descrever também os métodos estatísticos empregados
e as comparações para as quais cada teste foi empregado.
Os trabalhos que apresentam como objetivo a avaliação da eficácia
ou a tolerabilidade de tratamentos ou drogas devem, necessariamente,
incluir Grupo Controle adequado. Para informações adicionais sobre o
desenho de trabalhos desse tipo, consultar ICH Harmonized Tripartite
Guideline - Choice of Control Group and Related Issues in Clinical Trials
(http://www.hc-sc.gc.ca/hpfb-dgpsa/tpd-dpt/e10_e.html). Ver também
itens 4 e 5 das “Informações Gerais”.
Resultados
Apresentar os resultados em sequência lógica, no texto, nas tabelas
e nas figuras. Expor os resultados relevantes para o objetivo do trabalho
e que são discutidos. Não repetir no texto dessa seção todos os dados
das tabelas e figuras, mas descrever e enfatizar os mais importantes, sem
interpretação dos mesmos (ver também “Tabelas”). Nos Relatos de Casos,
as seções “Métodos” e “Resultados” são substituídas pela “Descrição do
caso”, mantendo-se as demais.
Discussão
Devem ser realçadas as informações novas e originais obtidas na
investigação. Não repetir dados e informações já mencionados nas seções
“Introdução” e “Resultados”. Evitar citação de tabelas e figuras. Ressaltar
a adequação dos métodos empregados na investigação. Comparar e
relacionar suas observações com as de outros autores, comentando e explicando as diferenças. Explicar as implicações dos achados, suas limitações
e fazer as recomendações decorrentes. Para Relatos de Casos, basear a
discussão em ampla e atualizada revisão da literatura. As informações
sobre os casos já publicados podem ser tabuladas e exibidas nessa seção
para comparações.
Agradecimentos
Dirigidos a pessoas que tenham colaborado intelectualmente, mas
cuja contribuição não justifica coautoria, ou para aquelas que tenham
provido apoio material.
Referências
Todos os autores e trabalhos citados no texto devem constar dessa
seção e vice-versa. Numerar as referências bibliográficas por ordem de
entrada no trabalho e usar esses números para as citações no texto. Evitar
número excessivo de referências, selecionando as mais relevantes para
cada afirmação e dando preferência para os trabalhos mais recentes.
Não empregar citações de difícil acesso, como resumos de trabalhos
apresentados em congressos, teses ou publicações de circulação restrita
(não indexados). Não empregar referências do tipo “observações não
publicadas” e “comunicação pessoal”. Artigos aceitos para publicação
podem ser citados acompanhados da expressão: “aceito e aguardando
publicação” ou “in press”, indicando-se periódico, volume e ano. Trabalhos
aceitos por periódicos que estejam disponíveis online, mas sem indicação
de fascículos e páginas, devem ser citados como “ahead of print”.
Outras publicações dos autores (autocitação) devem ser empregadas
apenas se houver necessidade clara e forem relacionadas ao tema. Nesse
caso, incluir entre as referências bibliográficas apenas trabalhos originais
publicados em periódicos regulares (não citar capítulos ou revisões).
O número de referências bibliográficas deve ser aproximadamente
35. Os autores são responsáveis pela exatidão dos dados constantes das
referências bibliográficas.
Para todas as referências, citar os autores até o sexto. Se houver
mais de seis autores, citar os seis primeiros, seguidos da expressão et al.,
conforme os seguintes modelos:
Formato impresso
• Artigos em revistas
- Ceccarelli F, Barberi S, Pontesilli A, Zancla S, Ranieri E. Ovarian
carcinoma presenting with axillary lymph node metastasis: a case
report. Eur J Gynaecol Oncol. 2011;32(2):237-9.
- Jiang Y, Brassard P, Severini A, Goleski V, Santos M, Leamon A, et al.
Type-specific prevalence of Human Papillomavirus infection among
women in the Northwest Territories, Canada. J Infect Public Health.
2011;4(5-6):219-27.
• Artigos com título em inglês e texto em português ou outra língua
Utilizar o titulo em inglês, entre colchetes e no final da referência,
indicar a língua na qual o artigo foi publicado.
- Prado DS, Santos DL. [Contraception in users of the public and private
sectors of health]. Rev Bras Ginecol Obstet. 2011;33(7)143-9.
Portuguese.
- Taketani Y, Mizuno M. [Application of anti-progesterone agents for
contraception]. Rinsho Fujinka Sanka. 1988;42(11):997-1000.
Japanese.
• Livro
- Baggish MS, Karram MM. Atlas of pelvic anatomy and gynecologic
surgery. 2nd ed. Philadelphia: WB Saunders; 2006.
vii
• Capítulos de livro
- Picciano MF. Pregnancy and lactation. In: Ziegler EE, Filer LJ, editors.
Present knowledge in nutrition. Washington (DC): ILSI Press; 1996.
p. 384-95.
Formato eletrônico
Apenas para informações estatísticas oficiais e citação de referências de periódicos não impressos. Para estatísticas oficiais, indicar
a entidade responsável, o endereço eletrônico, o nome do arquivo
ou entrada. Incluir o número de tela, data e hora do acesso. Termos
como “serial”, “periódico”, “homepage” e “monography”, por
exemplo, não são mais utilizados. Todos os documentos devem ser
indicados apenas como [Internet]. Para documentos eletrônicos com o
identificador DOI (Digital Object Identifier), este deve ser mencionado
no final da referência, além das informações que seguem:
- Brasil. Ministério da Saúde. DATASUS [Internet]. Informações de
Saúde. Estatísticas vitais. Mortalidade e nascidos vivos: nascidos
vivos desde 1994. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2008. [citado
2007 Fev 7]. Disponível em: <http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/
deftohtm.exe?sinasc/cnv/nvuf.def >
Legendas
Digitar as legendas usando espaço duplo, acompanhando as respectivas figuras (gráficos, fotografias e ilustrações). Cada legenda deve ser
numerada em algarismos arábicos, correspondendo a cada figura, e na
ordem em que foram citadas no trabalho.
Abreviaturas e siglas
Devem ser precedidas do nome completo quando citadas pela primeira
vez no texto. Nas legendas das tabelas e figuras, devem ser acompanhadas
de seu nome por extenso. As abreviaturas e as siglas não devem ser usadas
no título dos artigos e nem no resumo.
Empregar o seguinte endereço para correspondências não previstas nas
instruções:
Jurandyr Moreira de Andrade
Editor
Revista Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia – Editoria – Avenida
Bandeirantes, 3.900, 8º andar – Campus Universitário – CEP 14049-900 –
Ribeirão Preto (SP) – Fone: (16) 3602-2803 – Fax: (16) 3633-0946 –
E-mail: [email protected].
• Monografia na Internet ou livro eletrônico
- Foley KM, Gelband H, editors. Improving palliative care for cancer [Internet]. Washington: National Academy Press; 2001 [cited 2002 Jul 9].
Available from: http://www.nap.edu/books/0309074029/html/.
Tabelas
Apresentar as tabelas em páginas separadas, com espaço duplo e
preferencialmente fonte Arial 8. A numeração deve ser sequencial, em
algarismos arábicos, na ordem em que foram citadas no texto. Todas as
tabelas devem ter título e todas as colunas da tabela devem ser identificadas
com um cabeçalho. A legenda deve conter informações que permitam ao
leitor entender o conteúdo das tabelas e figuras, mesmo sem a leitura do
texto do trabalho. As linhas horizontais devem ser simples e limitadas a
duas no topo e uma no final da tabela. Não empregar linhas verticais.
Não usar funções de criação de tabelas, comandos de justificação, tabulações decimais ou centralizadas. Utilizar comandos de tabulação (tab)
e não o espaçador para separar as colunas e, para nova linha, a tecla
enter. No rodapé da tabela, deve constar legenda para abreviaturas e
testes estatísticos utilizados.
Figuras (gráficos, fotografias e ilustrações)
As figuras devem ser apresentadas em páginas separadas e numeradas
sequencialmente, em algarismos arábicos, conforme a ordem de aparecimento
no texto. Todas as figuras devem ter qualidade gráfica adequada e apresentar
título e legenda. Para evitar problemas que comprometam o padrão da revista,
o processo de digitalização de imagens (scan) deve obedecer aos seguintes
parâmetros: para gráficos ou esquemas, usar 300 dpi/bitmap para traço;
para ilustrações e fotos (preto e branco), usar 300 dpi/RGB ou grayscale. Em
todos os casos, os arquivos devem ter extensão .tif e/ou .jpg. Também são
aceitos arquivos com extensão .xls (Excel), .eps, .psd para ilustrações em curva
(gráficos, desenhos e esquemas). São aceitas, no máximo, cinco figuras. Se as
figuras já tiverem sido publicadas, devem vir acompanhadas de autorização
por escrito do autor/editor e constando a fonte na legenda da ilustração.
viii
Itens para a conferência para a submissão do manuscrito
Antes de enviar o manuscrito, conferir se as Instruções aos Autores foram
seguidas e verificar o atendimento dos itens listados a seguir:
1.
carta de encaminhamento assinada por todos os autores (escaneada
e anexada como documento suplementar ou enviada pelo correio)
ou informação dos endereços eletrônicos válidos de todos os autores
na página de rosto;
2.
citação da aprovação do projeto do trabalho por Comissão de
Ética em Pesquisa, assinatura do termo de consentimento livre e
informado (na seção “Métodos”) e informação sobre o atendimento
das exigências para pesquisa em animais;
3.
número ou código do registro do estudo, se necessário, na página
de rosto (item 5 das “Informações Gerais”);
4.
conflito de interesses: informar se há ou não. Se houver, explicar sem
omissão de informações relevantes;
5.
página de rosto com todas as informações solicitadas;
6.
resumo e abstract estruturados e compatíveis com o texto do trabalho;
7.
três ou mais palavras-chave relacionadas ao texto e respectivas
keywords baseadas no Decs;
8.
verificar se todas as tabelas e figuras estão corretamente citadas no
texto e numeradas, e se as legendas permitem o entendimento das
mesmas;
9.
referências bibliográficas: numeradas na ordem de aparecimento e
corretamente digitadas. Verificar se todos os trabalhos citados estão
na lista de referências e se todos os listados estão citados no texto.
Eduardo Leme Alves da Motta1
Thaís Sanches Domingues2
José Maria Soares Júnior3
O uso de sensibilizadores de insulina no
tratamento de infertilidade em pacientes
com síndrome dos ovários policísticos (SOP)
Use of insulin sensitizers in the treatment of infertility in patients
with polycystic ovary syndrome (POS)
Editorial
Introdução
A síndrome dos ovários policísticos (SOP) é uma condição heterogênea, que apresenta
grande variedade de sintomas clínicos e alterações endócrinas e metabólicas. É a mais frequente
endocrinopatia da população feminina jovem. Afeta cerca de 5–10% das mulheres em idade
reprodutiva1, sendo a maior causa de infertilidade nas pacientes anovuladoras2. Seu tratamento
é baseado na sintomatologia preponderante, mas muitas controvérsias existem, principalmente
envolvendo a resistência periférica à insulina. Estima-se que essa condição esteja presente em
cerca de 50% das mulheres com SOP e, sobretudo, nas obesas, atingindo quase 70%3,4.
Nas últimas duas décadas, foi demonstrado o papel crucial da resistência periférica à
insulina, com consequente hiperinsulinemia compensatória, como importante fator fisiopatológico. A hiperinsulinemia contribui ao estimular diretamente as células da teca-ovariana,
ativando os receptores de IGF-15, corroborando assim para a maior secreção androgênica
e, ao mesmo tempo, suprimindo a produção da globulina carreadora de hormônios sexuais
(SHBG), levando a uma maior disponibilidade das frações livres dos androgênios6.
Desse modo, a indução ovariana na mulher infértil é muito variável e instável, com um
limiar muito tênue entre o hiperestímulo ovariano e a baixa resposta, pois é comum o excessivo
recrutamento folicular típico da SOP, mas a elevação androgênica também contribui para sua
precoce atresia. Logo, os agentes sensibilizadores de insulina vêm sendo avaliados desde meados
dos anos 1990, tendo a metformina (MTF) como o seu representante mais estudado, ao impedir
a excessiva ação insulínica nas células da teca, chegando, inclusive, a restabelecer os ciclos ovulatórios7. Assim, muitos pesquisadores se dispuseram a utilizar essa medicação como opção inicial
no tratamento da SOP8. Posteriormente, demonstrou-se que esses resultados eram contraditórios,
pois incorriam em diversos vícios metodológicos, sobretudo a falta de critérios para determinar a
resistência periférica à insulina, além do pequeno número de pacientes e a extrema heterogeneidade
dos grupos8,9. Dessa forma, para que os hipoglicemiantes orais tenham relevância no tratamento
da SOP, é fundamental a pesquisa da resistência insulínica e a determinação de quais mulheres
realmente irão se beneficiar de sua administração. É importante ainda salientar que sua eficácia
na melhoria dos sintomas geralmente ocorre somente após três a seis meses de uso7.
Correspondência
José Maria Soares Júnior
Rua Napoleão de Barros 715 – 7º andar
Vila Clementino
CEP: 04024-002
São Paulo (SP), Brasil
Recebido
23/11/2011
Aceito com modificações
04/01/2012
Disciplina de Ginecologia Endocrinológica do Departamento de Ginecologia da Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP –
São Paulo (SP), Brasil; Huntington Medicina Reprodutiva – São Paulo (SP), Brasil.
2
Programa de Pós-graduação (Doutorado) do Departamento de Ginecologia da Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP – São
Paulo (SP), Brasil; Huntington Medicina Reprodutiva – São Paulo (SP), Brasil.
3
Departamento de Ginecologia da Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP – São Paulo (SP), Brasil.
Conflito de interesses: não há.
1
Motta ELA, Domingues TS, Soares Júnior JM
Opções de tratamento na infertilidade
Além da investigação inicial do casal infértil, a perda de peso deve ser encorajada antes de se iniciar qualquer
tratamento, sobretudo nas mulheres obesas que desejam engravidar10,11, já que a indução da ovulação é menos efetiva
quando o índice de massa corpórea (IMC) é maior que 28–30 kg/m2 (Tang et al.)2. Ademais, a perda de peso de cerca de
5–10% da massa corpórea melhora a sensibilidade à insulina e, em grande parte, restaura a ovulação12. Assim, a principal
atitude inicial a ser tomada deve ser a mudança no estilo de vida, a prática de exercícios13 e a restrição dietética14. Além
dessas medidas, se comprovada laboratorialmente a resistência à insulina, é aconselhável o uso da MTF, pois poderá
contribuir com a melhor foliculogênese e até ao retorno aos ciclos ovulatórios, além da diminuição do IMC14,15.
Nas mulheres anovuladoras com SOP, o citrato de clomifeno (CC) ainda é a droga de escolha; entretanto, também
aumenta a chance de multiparidade em 10%15,16. Cerca de 80% irão responder ao estímulo ovariano com clomifeno,
mas apenas 50% irão engravidar em até seis meses de tratamento17. Aquelas consideradas resistentes ao clomifeno
(falta de ovulação após dois ciclos) ou com ausência de gestação após seis meses de CC, podem se beneficiar da associação com a MTF, sobretudo, as obesas e aquelas com comprovada hiperinsulinemia18,19. Nesses casos, se comprovada a
resistência à insulina, o uso da MTF, na dose de 1,5 g ao dia, por três meses, tende a melhorar o estímulo ovulatório.
Vale ressaltar que a MTF não deve ser utilizada como indutor isolado20.
Nos casos de insucesso, devemos utilizar as gonadotrofinas, de preferência o FSH recombinante, pela não atividade
junto às células da teca, associados não só a ciclos de coito programado, mas também de inseminação intrauterina. As
doses iniciais devem ser mínimas, com contínua monitorização ultrassonográfica e aumento gradual de doses, se comprovada a falta de crescimento folicular. Em geral, os resultados com a administração do FSH são superiores, não só pela
melhor atividade folicular, mas corrobora ainda pelo sincronismo endometrial, que o CC não apresenta. O uso da MTF
também é benéfico, se corretamente indicado em associação às gonadotrofinas, por aprimorar o desenvolvimento folicular, tornando-o mais fisiológico e, assim, melhorando as taxas de gestação, sem elevar o risco de multiparidade21.
Devemos considerar a fertilização in vitro (FIV), para aquelas pacientes sem sucesso com as táticas anteriormente
descritas. A atividade da MTF ainda é escassa e controversa quanto à gestação22, mas auxilia na prevenção da síndrome
de hiperestímulo ovariano23.
Em síntese, a resistência insulínica deve sempre ser avaliada nas mulheres com SOP, pois é reconhecida sua ação
deletéria junto às células da teca-granulosa, sobretudo nas obesas, quando é mais prevalente. Seu uso, quando apropriado,
por, pelo menos, três a seis meses, em doses de 1,5 g/dia, tende a restabelecer a ovulação24. Além disso, o aconselhamento pré-concepcional, com a modificação do estilo de vida e a redução de peso, por meio de atividade física e dieta,
é eficaz em reaver os ciclos ovulatórios.
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101
Eliane Menezes Flores Santos1
Lídia Pereira de Amorim1
Olívia Lúcia Nunes Costa2
Nelson Oliveira3
Armênio Costa Guimarães4
Perfil de risco gestacional e metabólico no
serviço de pré-natal de maternidade pública
do Nordeste do Brasil
Profile of gestational and metabolic risk in the prenatal care service
of a public maternity in the Brazilian Northeast
Artigo original
Resumo
Palavras-chave
OBJETIVO: Descrever a prevalência dos fatores de risco gestacionais e sua associação com desfechos materno-fetais
desfavoráveis. MÉTODOS: Estudo longitudinal, descritivo e analítico, levando em conta 204 gestantes atendidas no
ambulatório de pré-natal de maternidade pública entre maio de 2007 e dezembro de 2008. Os fatores de risco
incluíram aspectos sociodemográficos, antecedentes pessoais, obstétricos e familiares, índice de massa corpórea (IMC)
pré-gestacional elevado, excesso de ganho de peso gestacional e anemia. Desfechos adversos incluíram pré-eclâmpsia
(PE), diabetes mellitus gestacional (DMG), parto cesariano, prematuridade e recém-nascido (RN) com peso alterado.
RESULTADOS: A média de idade foi 26±6,4 anos, predominando as pardas (59,8%), com segundo grau completo
e superior incompleto de escolaridade (51,8%), união estável (67,2%) e ocupação remunerada (51,0%). A maioria
foi admitida no segundo trimestre (63,7%) e 16,7% no primeiro; 42,6% eram primíparas. Hipertensão arterial crônica
(2,9%), pré-eclâmpsia (9,8%), excessivo ganho de peso na gestação (15,2%) e diabetes mellitus gestacional (1,0%)
foram relatados em gestações anteriores. Na atual gestação foi encontrado IMC pré-gestacional elevado em 34,6%
e ganho excessivo de peso em 45,5%, bem como anemia em 25,3% e dislipidemia em 47,3%. O rastreamento
para diabetes mellitus gestacional indicado em 17,5% foi confirmado em 3,4% das mulheres. A proteína urinária
elevada em amostra única ocorreu em 16,4%. Resultados materno-fetais adversos incluíram PE (4,5%), DMG (3,4%),
prematuridade (4,4%) e partos cesarianos (40,1%). RNs grandes para a idade gestacional (GIG) somaram 9,8% e
pequenos para a idade gestacional (PIG), 13,8%. A análise de regressão de Poisson multivariada identificou IMC
pré-gestacional elevado (≥25 kg/m²) como preditor independente para PE (risco relativo (RR) de 17,2 e intervalo de
confiança (IC) 95% 2,1–137,5) e parto cesariano (RR=1,8; IC95% 1,1–2,8). A cesárea prévia mostrou-se preditora
para novo parto cirúrgico (RR=2,3; IC95% 1,3–3,9). Ganho de peso gestacional excessivo e anemia foram preditores
de risco para RN com peso aumentado (RR=4,7; IC95% 1,6–14,0 e RR=3,4; IC95% 1,4–8,1, respectivamente).
CONCLUSÃO: O sobrepeso e a obesidade pré-gestacionais, o ganho excessivo de peso na gestação e a anemia
foram fatores de risco para pré-eclâmpsia, parto cesariano e alteração de peso do RN.
Fatores de risco
Gravidez
Resultado da gravidez
Pré-eclâmpsia
Peso fetal
Sobrepeso
Keywords
Risk factors
Pregnancy outcome
Pre-eclampsia
Fetal weight
Overweight
Abstract
PURPOSE: To assess the prevalence of obstetric risk factors and their association with unfavorable outcomes for the
mother and fetus. METHODS: A longitudinal, descriptive and analytical study was conducted on 204 pregnant women
between May 2007 and December 2008. Clinical and laboratory assessments followed routine protocols. Risk factors
included socio-demographic aspects; family, personal and obstetric history; high pre-gestational body mass index
(BMI); excessive gestational weight gain and anemia. Adverse outcomes included pre-eclampsia (4.5%), gestational
diabetes mellitus (3.4%), premature birth (4.4%), caesarian birth (40.1%), high birth weight (9.8%) and low birth weight
(13.8%). RESULTS: The average age was 26±6.4 years; the mothers were predominantly non-white (84.8%), 51.8%
had incomplete or complete secondary level schooling, 67.2% were in a stable marital relationship and 51.0% had
a regular paid job; 63.7% were admitted to the prenatal clinic during the second trimester and 16.7% during the
first, with 42.6% being primiparous. A past history of chronic hypertension was reported by 2.9%, pre-eclampsia by
Correspondência
Eliane Menezes Flores Santos
Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública
Avenida D. João VI 275 – Brotas
CEP: 40290-000
Salvador (BA), Brasil
Recebido
26/09/2011
Aceito com modificações
11/01/2012
Programa de Pós-graduação (Mestrado) da Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública – Brotas (BA), Brasil.
Departamento de Ginecologia, Obstetrícia e Reprodução Humana da Faculdade de Medicina da Universidade Federal da Bahia –
UFBA – Salvador (BA), Brasil.
3
Departamento de Bioestatística da Universidade Estadual de Feira de Santana – UEFS – Feira de Santana (BA), Brasil.
4
Coordenadoria do Curso de Pós-Graduação da Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública – Brotas (BA), Brasil.
1
2
Perfil de risco gestacional e metabólico no serviço de pré-natal de maternidade pública do Nordeste do Brasil
9.8%, excessive gestational weight gain by 15.2% and former gestational diabetes mellitus by 1.0%. In the current pregnancy, elevated pre-gestational
BMI was found in 34.6%; 45.5% presented with excessive gestational weight gain, 25.3% with anemia and 47.3% with dyslipidemia. Of the 17.5% of
cases with altered blood glucose, gestational diabetes mellitus was confirmed in 3.4% and proteinuria occurred in 16.4% of all cases. Adverse maternal
fetal outcomes included pre-eclampsia (4.5%), gestational diabetes mellitus (3.4%), premature birth (4.4%), caesarean birth (40.1%) and high and low
birth weight (9.8% and 13.8%, respectively). Independent predictors of adverse maternal fetal outcomes were identified by Poisson multivariate regression
analysis: pre-gestational BMI≥25 kg/m² was a predictor for pre-eclampsia (RR=17.17; 95%CI 2.14–137.46) and caesarian operation (RR=1.79; 95%CI
1.13–2.85), previous caesarean was a predictor for present caesarean operation (RR=2.28; 95%CI 1.32–3.92) and anemia and high gestational
weight gain were predictors for high birth weight (RR=3.38; 95%CI 1.41–8.14 and RR=4.68; 95%CI 1.56–14.01, respectively). CONCLUSION: Pregestational overweight/obesity, previous caesarean, excessive weight gain and anemia were major risk factors for pre-eclampsia, caesarean operations
and high birth weight.
Introdução
Gravidez e parto são processos normais na vida feminina e geralmente culminam em desfechos bem sucedidos.
Apesar disso, fatores relativos à assistência inadequada, seja
no pré-natal ou na condução do parto, podem culminar em
óbito ou sequelas definitivas para a mãe e o concepto.
A obesidade, importante fator de risco para complicações
materno-fetais, hoje é considerada um problema de saúde
pública. Ocorrendo em mulheres em idade reprodutiva, pode
elevar o número de resultados obstétricos e neonatais desfavoráveis, gerando hipertensão, aumento dos partos cirúrgicos,
prematuridade e recém-nascidos com peso alterado1-7. É fato
que eclampsia e demais quadros hipertensivos na gestação
têm liderado as causas de mortalidade materna em nosso
meio8. Fatores familiares, sociodemográficos e econômicos
também podem contribuir para o aparecimento de doenças
relativas ao ciclo gravídico-puerperal9.
O presente estudo tem por objetivo descrever, além
das características dessa população, a incidência de desfechos materno-fetais adversos e a prevalência dos principais
fatores de risco a eles relacionados. As informações obtidas
por esses resultados podem trazer benefícios a um grande
número de mulheres que buscam assistência pré-natal na
rede pública.
Métodos
Trata-se de um estudo prospectivo, longitudinal, descritivo e analítico envolvendo 204 gestantes matriculadas
em ambulatório de pré-natal de baixo risco, em maternidade pública, atendidas entre maio de 2007 e maio de
2008. O critério de inclusão foi o encaminhamento delas
para atendimento pela autora do trabalho, até o número
indicado pela estimativa do cálculo amostral10. O critério
de exclusão foi a gestante ter definição de risco obstétrico.
Foram investigados antecedentes pessoais de diabetes
mellitus gestacional, hipertensão arterial, pré-eclâmpsia,
ganho de peso em gestação anterior e ocorrência de cesáreas
prévias. Na gravidez atual, obteve-se o Índice de massa
corpórea (IMC) pré-gestacional e, no ingresso no estudo,
por meioda fórmula de Quetelet (peso em quilogramas/
quadrado da altura em metro)3 e aferição da pressão
arterial, o que foi repetido a cada consulta subsequente até
o parto. Considerou-se sobrepeso pré-gestacional quando
o IMC inicial, e até 16 semanas de gestação, estava acima
de 25 kg/m². O cálculo do ganho de peso materno foi
obtido utilizando-se o IMC inicial, a partir do qual o
ganho permitido (total no primeiro trimestre e semanal
médio no segundo e terceiro trimestres) classificava o
estado nutricional da gestante em baixo peso, adequado,
sobrepeso ou obesidade11.
Foi considerada hipertensão arterial na gravidez
quando a pressão arterial sistólica (PAS) esteve maior
ou igual a 140 mmHg e/ou a pressão arterial diastólica
(PAD) maior ou igual a 90 mmHg em pelo menos duas
aferições, com intervalo superior a quatro horas e início
após 20 semanas de gestação, na ausência de proteinúria
anterior12; hipertensão crônica (HC), se a pressão arterial
estivesse acima de 140/90, de início anterior à gestação
ou antes da 20ª semana; pré-eclâmpsia leve se a elevação
tem início após 20 semanas, desaparecendo em até seis
semanas após o parto, podendo ou não ser acompanhada
de proteinúria13; pré-eclâmpsia grave se a pressão arterial
foi igual ou maior que 160/110, podendo ocorrer proteinúria e sintomas clínicos de iminência de convulsão.
A pré-eclâmpsia sobreposta à hipertensão crônica cursa
com piora ou aparecimento da proteinúria após 20 semanas
(acima de 300 mg/24 horas)14.
O critério diagnóstico para diabetes mellitus gestacional
(DMG) foi a glicemia de jejum maior ou igual a 110 mg/dL,
ou glicemia igual ou maior a 140 mg/dL após duas horas
do teste oral de tolerância à glicose (TOTG) com 75 g
de glicose anidra. O ponto de corte para o rastreamento
foi a glicemia de jejum maior ou igual a 85 mg/dL, após
a 20ª semana15,16.
O tabagismo foi considerado quando houve uso independente da quantidade17,18, e etilismo se o consumo
foi de pelo menos nove drinques por semana19. A proteinúria, considerada quando maior que 30 mg/dL, foi
avaliada em amostra única de urina matinal obtida na
primeira consulta, pelo método vermelho de pirogalol, na
ausência de sintomas de infecção do trato urinário (ITU)
ou atividade sexual recente.
Os exames laboratoriais realizados foram: hemograma,
colesterol total, HDL-c, LDL-c, triglicérides, glicemia,
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(3):102-6
103
Santos EMF, Amorim LP, Costa OLN, Oliveira N, Guimarães AC
teste oral de tolerância à glicose com 75 g, com ponto
de corte da glicemia de jejum em 85 mg/dL, após a 20ª
semana, além de testes sorológicos de rotina e proteína
urinária em amostra matinal isolada.
Como a maioria dos partos aconteceu em maternidades
variadas, os dados referentes aos desfechos materno-fetais
(tipo do parto, número de semanas em que ocorreu, peso
do recém-nascido e possíveis complicações) foram obtidos
por contato telefônico.
Para a análise estatística, utilizou-se o programa
SPSS versão 12, sendo descrita a frequência dos achados
sociodemográficos, a prevalência dos principais fatores
de risco e a incidência dos desfechos materno-fetais
desfavoráveis. A análise bivariada utilizou tabelas de
contingência entre preditores e respectivos desfechos,
enquanto a regressão multivariada de Poisson incluiu
variáveis com seis ou mais desfechos e valor p<0,1. O
nível de significância foi menor que 0,05 e o intervalo
de confiança 95%.
Esse projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética e
Pesquisa da Maternidade Climério de Oliveira e todas as
participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre
e Esclarecido (TCLE).
Resultados
Na população, a média de idade encontrada foi 26
anos, variando de 13 a 42. Houve predomínio da cor parda
(59,8%) e escolaridade com 2º grau completo (51,8%). Do
total, 51,0% exerciam atividade remunerada e a maioria
convivia em regime de união estável.
Dentre os antecedentes familiares, houve predomínio
de hipertensão (61,8%) sobre diabetes (41,2%) e, dentre
os pessoais, seis (2,9%) gestantes disseram ser portadoras
de hipertensão arterial crônica e uma (0,5%) de anemia
falciforme. Tabagismo anterior e atual foi referido por oito
(3,9%) delas e etilismo (uso de bebida alcoólica no mínimo
três vezes por semana) por 46 (22,1%) (Tabela 1).
IMC pré-gestacional elevado ocorreu em 70 gestantes
(34,6%) e o ganho de peso acima do esperado em 87 de
191 gestantes acompanhadas (45,5%) (Tabela 2).
Dentre os desfechos, a anemia foi encontrada em
47 (25,3%) de 186 pacientes que realizaram hematimetria e glicemia com indicação para rastreamento de
DMG, e em 32 (17,5%) das 183 que fizeram glicemia
de jejum, tendo seis delas (3,4%) confirmado o diagnóstico pelo teste oral de tolerância à glicose. Nove
de 201 gestantes (4,5%) tiveram pré-eclâmpsia, e de
182 gestantes, oito (4,4%) tiveram partos prematuros, 73 (40,1%) cesarianos, 20 (9,8%) recém-nascidos
com peso excessivo para a idade gestacional (acima do
percentil 90 ao nascer) e 27 (13,8%) com peso abaixo
do percentil 10 (Tabela 3).
104
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(3):102-6
Tabela 1.Características demográficas e clínicas de 204 gestantes obtidas na consulta
inicial de pré-natal em uma maternidade pública
Variáveis
Idade (média±dp)
26,5±6,4
n (%)
Cor
Parda
122 (59,8)
Escolaridade
Analfabeto/1º grau incompleto
29 (14,4)
1º grau completo/2º grau incompleto
60 (29,4)
2º grau completo/Superior incompleto
106 (51,8)
Superior completo
9 (4,4)
Ocupação
Remunerada
104 (51,0)
Não remunerada
100 (50,9)
Estado civil
União estável
147 (57,2)
Solteira
67 (32,8)
Antecedentes médicos
Hipertensão crônica
6 (2,9)
HG em gestação anterior
20 (9,8)
DMG em gestação anterior
2 (1,0)
Ganho de peso em gestações anteriores
65 (15,2)
Tabagismo
8 (3,9)
Etilismo
Dados físicos iniciais
45 (22,1)
(média±dp)
Circunferência obstétrica
92,3±10,0
Peso
65,7±12,5
Índice de massa corpórea
25,4±4,6
Pressão arterial sistólica
110,0±13,0
Pressão arterial diastólica
66,7±10,8
HG: hipertensão gestacional; DMG: diabetes mellitus gestacional; DP: desvio
padrão.
Tabela 2. Distribuição das informações clínicas e antecedentes em gestantes de pré-natal
de uma maternidade pública
Fatores de risco
Total
n
%
Índice de massa corpórea pré-gestacional elevado
204
70
34,6
Ganho de peso acima do esperado
191
87
45,5
Pré-eclâmpsia
201
9
4,5
Anemia
186
47
25,3
Cesáreas prévias
204
25
12,3
Tabela 3. Incidência de desfechos materno-fetais adversos ocorridos em gestantes de
pré-natal de uma maternidade pública
Desfechos materno-fetais
Total
n
%
Pré-eclâmpsia
201
9
4,5
Diabetes mellitus gestacional
183
6
3,4
Prematuridade
182
8
4,4
Cesáreas
182
73
40,1
Recém-nascido grande para a idade gestacional*
182
20
9,8
Recém-nascido pequeno para a idade gestacional**
182
27
13,8
*Peso ao nascer maior que o percentil 90 para a idade gestacional; **Peso ao
nascer menor que o percentil 10 para a idade gestacional.
Perfil de risco gestacional e metabólico no serviço de pré-natal de maternidade pública do Nordeste do Brasil
Tanto a análise bivariada quanto a regressão
multivariada de Poisson mostraram que o IMC prégestacional elevado associou-se significativamente com
pré-eclâmpsia (p<0,003, Risco Relativo (RR) de 17,7,
com Intervalo de Confiança (IC) de 95% 2,1–137,5) e
com parto cesariano (p<0,002, RR=1,7; IC95% 1,1–2,8).
A escolaridade de 2º grau completo com parto cesariano
pela análise bivariada (p<0,02), associação essa não confirmada pela regressão multivariada (p=0,69). A cesárea
prévia com novo parto cirúrgico (p<0,001, RR=2,3;
IC95% 1,3–3,4). O ganho de peso excessivo durante
a gestação mostrou associação com recém-nascido de
peso acima do percentil 90 (p<0,009, RR=4,7; IC95%
1,6–14,0). A anemia esteve associada tanto ao RN de
peso acima do esperado (p<0,049, RR=3,4; IC95%
1,4–8,1) quanto ao com peso menor que o percentil
10 (p<0,010), significância não confirmada quando
pela análise bivariada. Esses recém-nascidos de baixo
peso para a idade gestacional, no entanto, guardaram
associação com prematuridade (p<0,019, RR=2,8;
IC95% 0,8–9,5) (Tabela 4).
Discussão
A amostra do presente estudo obtida em uma maternidade pública de ensino universitário mostra que a
maioria das gestantes tinha 2º grau completo, superior à
escolaridade observada em unidades da mesma região20,21.
Apesar disso, a maior parte ingressou no pré-natal no
segundo trimestre de gestação, com perda do principal
período do acompanhamento, quando algumas medidas
preventivas necessárias poderiam ser mais eficazes, principalmente em relaçãoao peso e à anemia. Vale salientar que
42,6% eram primigestas, com média de idade de 23 anos.
O fator idade também justificaria o fato de que a maioria
com diagnóstico de hipertensão crônica tinha de 31 a 41
anos, predispondo à hipertensão não gestacional22.
O principal fator de risco encontrado para alterações
materno-fetais que resultaram em desfechos desfavoráveis
esteve relacionado com o peso aumentado da gestante.
Esse grupo contou com número significativo de mulheres que iniciaram a gestação com sobrepeso e ganharam
acima do preconizado ao longo do pré-natal, expondo-as
ao desenvolvimento de desfechos materno-fetais evitáveis
e concordante com a literatura como importante fator de
risco para complicações obstétricas e neonatais3,23-25, o que
também é corroborado pela literatura de outros países26.
É amplamente divulgado, portanto, que na gestação a
obesidade é vista como cofator para diversas outras patologias que afetarão diretamente os resultados20,25,27-30.
Na população geral, a obesidade pode justificar o fato de
que quase metade das gestantes avaliadas tinha parentes
próximos portadores de diabetes mellitus31.
Tabela 4. Associação entre desfechos materno-fetais desfavoráveis e fatores de risco por
meioda análise bivariada e da regressão multivariada de Poisson em gestantes do pré-natal
de uma maternidade pública
Fatores de risco
IMC pré-gestacional
Desfechos
Valor p
RR
(IC95%)
Pré-eclâmpsia
0,003
17,2
2,1–137,5
Cesárea
0,002
1,8
1,1–2,8
RN acima do peso
0,009
4,7
1,6–14,0
RN acima do peso
0,040
3,4
1,4–8,1
RN abaixo do peso
0,010
0,1
0,0–1,0
Prematuridade
RN abaixo do peso
0,010
2,8
0,8–9,5
Cesárea prévia
Nova cesárea
0,001
2,3
1,3–3,9
Ganho de peso
Anemia
Como o estudo foi realizado em região com predominante miscigenação racial, de maioria parda,
observou-se 61,8% de familiares do primeiro grau
portadores de hipertensão arterial, patologia prevalente
na raça negra22. Pelo mesmo motivo, o achado de 6,4%
de anemia falciforme entre os familiares das gestantes
se aproxima dos dados encontrados no estado da Bahia
por Naoum32. A incidência de 4,5% de pré-eclâmpsia
é concordante com trabalho de Buga et al.33, em que a
população guarda semelhança racial. A anemia ocorreu
em 25,3% do grupo, apontando benefício para o diagnóstico e correção precoces da patologia34,35.
Este trabalho tem como objetivo descrever as características da população de gestantes assistidas em
serviço público de pré-natal de maternidade universitária
e identificar os fatores de risco associados a desfechos
materno-fetais adversos.
Foram importantes os resultados, mostrando que
em gestantes com peso elevado ao ingressar no pré-natal
o risco de pré-eclâmpsia foi 17 vezes maior quando
comparado às gestantes de IMC normal, e que as com
ganho excessivo de peso ao longo da gravidez tiveram
cinco vezes mais chances de partos debebês com peso
acima do esperado. Por fim, há validade em priorizar
o parto natural, diante do aumento da necessidade de
repetição cirúrgica nas pré-cesariadas.
O estudo mostra a importância da identificação
precoce dos fatores de risco e sua correção, trazendo
benefícios para um dos setores da saúde pública mais
abordados no momento, por meio dos programas de
assistência materno-infantis. Modificar as condutas com
medidas preventivas e assistenciais, na maioria das vezes
com protocolos simples e pouca tecnologia, pode refletir
positivamente, logrando êxito ao objetivo de preservação
da saúde materno-infantil.
Agradecimentos
À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da
Bahia (FAPESB) pela concessão de bolsa de mestrado para
Eliane Menezes Flores Santos.
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(3):102-6
105
Santos EMF, Amorim LP, Costa OLN, Oliveira N, Guimarães AC
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Roseli Mieko Yamamoto Nomura1
Letícia Vieira Paiva2
Verbênia Nunes Costa3
Adolfo Wenjaw Liao1
Marcelo Zugaib4
Influência do estado nutricional materno,
ganho de peso e consumo energético sobre o
crescimento fetal, em gestações de alto risco
Influence of maternal nutritional status, weight gain and energy
intake on fetal growth in high-risk pregnancies
Artigo original
Resumo
Palavras-chave
Estado nutricional
Obesidade
Gravidez
Desenvolvimento fetal
Gravidez de alto risco
Keywords
Nutritional status
Obesity
Pregnancy
Fetal development
Pregnancy, high-risk
OBJETIVO: Analisar a influência do estado nutricional materno, ganho de peso e consumo energético sobre o crescimento
fetal em gestações de alto risco. MÉTODOS: Estudo prospectivo de agosto de 2009 a agosto de 2010, com os seguintes
critérios de inclusão: puérperas até o 5º dia; gestação de alto risco (caracterizada por complicações médicas ou obstétricas
durante a gravidez); feto único e vivo no início do trabalho de parto; parto na instituição; peso materno aferido no dia do
parto, e presença de intercorrência clínica e/ou obstétrica caracterizando a gravidez como de alto risco. O estado nutricional
foi avaliado pelo índice de massa corporal pré-gestacional e no final da gestação, sendo as pacientes classificadas em:
baixo peso, adequado, sobrepeso e obesidade. Para avaliação do consumo energético foi aplicado o Questionário de
Frequência de Consumo Alimentar. Foram investigados o ganho de peso materno, dados do parto e resultados perinatais,
investigando-se o crescimento fetal pela ocorrência de neonatos pequenos para a idade gestacional e grandes para a
idade gestacional. RESULTADOS: Foram incluídas 374 gestantes que constituíram 3 grupos de estudo, de acordo com
a adequação do peso do recém-nascido: idade gestacional adequada (270 casos, 72,2%), pequenos para a idade
gestacional (91 casos, 24,3%) e grandes para a idade gestacional (13 casos, 3,5%). Na análise univariada, as mulheres
com neonatos pequenos para a idade gestacional apresentaram média significativamente menor do índice de massa corporal
pré-gestacional (23,5 kg/m2, p<0,001), do índice no final da gestação (27,7 kg/m2, p<0,001) e maior proporção
de baixo peso materno pelo índice no final da gestação (25,3%, p<0,001). As mulheres com neonatos grandes para a
idade gestacional apresentaram média significativamente maior do índice de massa corporal pré-gestacional (29,1 kg/m2,
p<0,001), do índice no final da gestação (34,3 kg/m2, p<0,001) e maior proporção de sobrepeso (30,8%, p=0,02),
e obesidade (38,5%, p=0,02) pelo índice pré-gestacional, e obesidade pelo índice no final da gestação (53,8%,
p<0,001). Pela análise multivariada, foram identificados como fatores independentes para neonatos pequenos para
a idade gestacional o valor do índice de massa corporal no final da gestação (OR=0,9; IC95% 0,8–0,9, p<0,001) e a
presença de hipertensão arterial (OR=2,6; IC95% 1,5–4,5, p<0,001); e identificados como fatores independentes para
neonatos grandes para a idade gestacional o diagnóstico de diabetes mellitus (OR=20,2; IC95% 5,3–76,8, p<0,001) e
a obesidade pelo índice de massa corporal no final da gestação (OR=3,6; IC95% 1,1–11,7, p=0,04). CONCLUSÃO:
O estado nutricional materno no final da gravidez de alto risco está associado de forma independente ao crescimento
fetal, sendo o índice de massa corporal materno no final da gestação um fator protetor para o neonato pequeno para a
idade gestacional e a obesidade fator de risco para o neonato grande para a idade gestacional.
Abstract
PURPOSE: To analyze the influence of maternal nutritional status, weight gain and energy consumption on fetal growth
in high-risk pregnancies. METHODS: A prospective study from August 2009 to August 2010 with the following inclusion
criteria: puerperae up to the 5th postpartum day; high-risk singleton pregnancies (characterized by medical or obstetrical
complications during pregnancy); live fetus at labor onset; delivery at the institution; maternal weight measured on
Correspondência
Roseli Mieko Yamamoto Nomura
Departamento de Obstetrícia e
Ginecologia, Faculdade de Medicina
da Universidade de São Paulo
Avenida Doutor Enéas de Carvalho Aguiar 255 10º andar – sala
10037
CEP: 05403-000
São Paulo (SP), Brasil
Recebido
23/12/2011
Aceito com modificações
16/01/2012
Trabalho realizado na Disciplina de Obstetrícia do Departamento de Obstetrícia e Ginecologia da Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo – USP – São Paulo (SP), Brasil.
1
Disciplina de Obstetrícia do Departamento de Obstetrícia e Ginecologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo –
USP – São Paulo (SP), Brasil.
2
Programa de Pós-graduação (Mestrado) da Disciplina de Obstetrícia do Departamento de Obstetrícia e Ginecologia da da Faculdade
de Medicina da Universidade de São Paulo – USP – São Paulo (SP), Brasil.
3
Programa de Pós-graduação (Doutorado) da Disciplina de Obstetrícia do Departamento de Obstetrícia e Ginecologia da Faculdade
de Medicina da Universidade de São Paulo – USP – São Paulo (SP), Brasil.
4
Departamento de Obstetrícia e Ginecologia da da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo – USP – São Paulo (SP),
Brasil.
Conflito de interesses: não há.
Nomura RMY, Paiva LV, Costa VN, Liao AW, Zugaib M
the day of delivery, and presence of medical and/or obstetrical complications characterizing pregnancy as high-risk. Nutritional status was assessed by
pregestational body mass index and body mass index in late pregnancy, and the patients were classified as: underweight, adequate, overweight and
obese. A food frequency questionnaire was applied to evaluate energy consumption. We investigated maternal weight gain, delivery data and perinatal
outcomes, as well as fetal growth based on the occurrence of small for gestational age and large for gestational age neonates. RESULTS: We included
374 women who were divided into three study groups according to newborn birth weight: adequate for gestational age (270 cases, 72.2%), small for
gestational age (91 cases, 24.3%), and large for gestational age (13 cases, 3.5%). Univaried analysis showed that women with small for gestational
age neonates had a significantly lower mean pregestational body mass index (23.5 kg/m2, p<0.001), mean index during late pregnancy (27.7 kg/m2,
p<0.001), and a higher proportion of maternal underweight at the end of pregnancy (25.3%, p<0.001). Women with large for gestational age neonates
had a significantly higher mean pregestational body mass index (29.1 kg/m2, p<0.001), mean index during late pregnancy (34.3 kg/m2, p<0.001),
and a higher proportion of overweight (30.8%, p=0.02) and obesity (38.5%, p=0.02) according to pregestational body mass index, and obesity at
the end of pregnancy (53.8%, p<0.001). Multivariate analysis revealed the index value during late pregnancy (OR=0.9; CI95% 0.8–0.9, p<0.001)
and the presence of hypertension (OR=2.6; 95%CI 1.5–4.5, p<0.001) as independent factors for small for gestational age. Independent predictors of
large for gestational age infant were the presence of diabetes mellitus (OR=20.2; 95%CI 5.3–76.8, p<0.001) and obesity according to body mass
index during late pregnancy (OR=3.6; 95%CI 1.1–11.7, p=0.04). CONCLUSION: The maternal nutritional status at the end of pregnancy in high-risk
pregnancies is independently associated with fetal growth, the body mass index during late pregnancy is a protective factor against small for gestational
age neonates, and maternal obesity is a risk factor for large for gestational age neonates.
Introdução
O estado nutricional e o adequado ganho de peso
materno são fatores importantes para o bom resultado da
gravidez, bem como para a manutenção da saúde, a longo
prazo, da mãe e da criança. A obesidade materna e o ganho
de peso acima do recomendado aumentam os riscos para uma
série de resultados adversos, tais como: diabetes gestacional,
parto prolongado, pré-eclâmpsia, cesárea e depressão1-4.
Para o recém-nascido, verifica-se maior morbidade neonatal
e maior incidência de obesidade, sobrepeso e distúrbios
metabólicos na infância e adolescência5-7. O ganho de peso
materno abaixo das recomendações foi associado a maiores
taxas de baixo peso ao nascer (<2.500 g) e recém-nascidos
pequenos para a idade gestacional (PIG)8-10.
O crescimento fetal é influenciado positivamente
pelo estado nutricional materno. As anormalidades nos
padrões do crescimento fetal resultam em recém-nascidos
grandes para a idade gestacional (GIG) ou PIG. Ambos
apresentam maior risco de agravos na saúde, tais como:
baixos índices de Apgar, aspiração de mecônio, convulsões,
complicações respiratórias, hospitalização prolongada e
sequelas a longo prazo, incluindo a obesidade, hipertensão
arterial e síndrome metabólica11.
O estado nutricional é resultado do equilíbrio entre o
consumo de nutrientes e o gasto energético do organismo
para suprir as necessidades metabólicas. A obesidade materna associa-se a maior ganho de peso durante a gestação12.
Os parâmetros adotados para a vigilância nutricional em
gestantes são: índice de massa corporal (IMC) por semana
gestacional e ganho de peso gestacional. Pela avaliação
do IMC materno, é possível identificar gestantes em
risco nutricional, quando classificadas como baixo peso,
sobrepeso ou obesidade. Nessas condições, recomenda-se
realizar uma orientação nutricional13.
A alteração de peso materno na gravidez pode ser considerada como indicador do balanço de energia ingerida e
108
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(3):107-12
estado nutricional. Estudar a influência do ganho de peso e
das mudanças do estado nutricional materno nos resultados
da gravidez irá auxiliar na compreensão da relação estreita
entre o estado nutricional materno e o crescimento fetal. A
maioria dos estudos aborda análise de gestações de baixo
risco ou sem morbidades associadas. É de grande interesse
conhecer o papel do IMC materno em gestações de alto risco e
sua associação com resultados perinatais adversos. O objetivo
deste estudo foi analisar gestações de alto risco, buscando a
influência do estado nutricional e do ganho de peso materno
e do consumo energético no crescimento fetal.
Métodos
Este estudo prospectivo e transversal foi desenvolvido na
Disciplina de Obstetrícia do Departamento de Obstetrícia
e Ginecologia da Faculdade de Medicina da Universidade
de São Paulo – FM-USP, no período entre agosto de 2009
e agosto de 2010. O Protocolo de Pesquisa e o Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido foram aprovados pelo
Comitê de Ética em Pesquisa da instituição.
Foram convidadas a participar da pesquisa mulheres
que tiveram o parto realizado na Clínica Obstétrica do
Hospital das Clínicas da FM-USP, com os seguintes critérios de inclusão: puérperas até o 5º dia, cuja gestação foi
considerada de alto risco; idade materna maior ou igual a
18 anos; feto único e vivo no início do trabalho de parto;
parto na instituição; peso e altura maternos aferidos no
dia do parto. Foram caracterizadas como de alto risco as
que apresentaram alguma intercorrência clínica ou obstétrica, complicando a gravidez. Foram identificadas as
seguintes intercorrências: hipertensão arterial (34,8%);
diabetes mellitus (15,8%); cardiopatia materna (15,2%);
rotura prematura de membranas (11,0%), colagenoses
(6,2%) e outras complicações (17,1%).
Os dados foram coletados por meio de entrevista
aplicada pela pesquisadora executante, utilizando-se do
Influência do estado nutricional materno, ganho de peso e consumo energético sobre o crescimento fetal, em gestações de alto risco.
protocolo previamente elaborado, contendo: dados da
paciente, dados da internação, intercorrências obstétricas, diagnósticos clínicos, dados do parto e do recémnascido. Foram pesquisadas nos prontuários da paciente
as informações referentes às intercorrências clínicas e/ou
obstétricas; tipo de parto (vaginal ou cesárea) e dados de
idade gestacional no parto e peso do recém-nascido.
Para avaliação do consumo energético, foi aplicado
o modelo de Questionário de Frequência de Consumo
Alimentar (QFCA) validado por Ribeiro et al.14, desenvolvido para a população adulta. Por meio desse questionário,
foi possível avaliar o consumo dietético das gestantes, bem
como, analisar a ingestão calórica diária. Os dados sobre
alimentos consumidos (em gramas) foram analisados pela
sua composição nutricional, utilizando-se de tabelas de
composição química de alimentos, que formam o software
Nutwin (CIS EPM, versão 2.5 nº 2380).
O estado nutricional materno no final da gravidez
foi avaliado pelo IMC, tendo como base a altura e o peso
corporal da paciente, ambos aferidos na internação para o
parto. Quando a internação ocorreu em período anterior à
data do parto, foi utilizado o peso do dia do parto para o
cálculo do IMC final. Foram utilizados os valores limites
do IMC por semana gestacional da curva de Atalah Samur
et al.15 para a classificação do estado nutricional materno
final em: baixo peso, adequado, sobrepeso e obesidade.
Para o cálculo do IMC pré-gestacional foi considerado
o peso corporal da mulher antes da gravidez ou no seu
início, até a 13ª semana, autorreferido ou anotado no cartão
de pré-natal e classificado em baixo peso (IMC<18,5 kg/m2),
adequado (18,5–24,9 kg/m2), sobrepeso (25,0–29,9 kg/m2)
e obesidade (≥30 kg/m2), segundo a recomendação do
Institute of Medicine (IOM)16.
A idade gestacional foi calculada a partir da data da
última menstruação (DUM), quando era compatível com a
idade gestacional estimada pela ultrassonografia realizada, no
máximo, até a vigésima semana de gestação. Nos casos em
que não foi observada tal concordância, a idade gestacional
foi calculada pelos dados da primeira ultrassonografia. O
peso do recém-nascido, em gramas, aferido na sala de parto,
foi comparado à curva de normalidade de Alexander et al.17,
de forma que foram classificados como PIG os com o peso
inferior ao 10º percentil da faixa correspondente, adequados
para a idade gestacional (AIG) quando entre os percentis
10 e 90, e GIG quando acima do percentil 90.
Foram incluídas 374 gestantes, que constituíram 3
grupos de estudo, de acordo com a adequação do peso do
recém-nascido: AIG (270 casos, 72,2%), PIG (91 casos,
24,3%) e GIG (13 casos, 3,5%). As características da
população, nos grupos analisados, estão apresentadas na
Tabela 1. Não se constatou diferença significativa na média
da idade materna, na proporção de mulheres brancas, na
proporção de nulíparas ou quanto ao tabagismo.
Os resultados foram analisados com o programa
Medcalc, versão 11.5.1.0 (Medcalc Software, Bélgica). As
variáveis categóricas foram analisadas descritivamente,
calculando-se frequências absolutas e relativas. Para
análise das variáveis contínuas, os resultados foram expressos em médias e desvios-padrão. Para a comparação
entre proporções foi aplicado o teste de χ2, e, quando
pertinente, o teste exato de Fisher. Foi utilizado o teste
ANOVA para a comparação das médias entre os grupos,
nas variáveis com distribuição normal, e o teste de KruskalWallis para as variáveis de distribuição não normal. Foi
utilizado o modelo de regressão logística múltipla para
a identificação das variáveis independentes, associadas
aos desfechos: recém-nascido PIG e GIG. Foi adotado
como nível de significância o valor 0,05 (α=5%). Com
isso, níveis descritivos (p) inferiores a esse valor foram
considerados significantes (p<0,05).
Resultados
Entre as morbidades identificadas como complicações da gravidez, houve associação significativa entre o
diagnóstico de diabetes mellitus e o nascimento de GIG
(Tabela 1). A análise do estado nutricional materno prégestacional e no final da gravidez, e a associação aos desvios do crescimento fetal estão apresentadas na Tabela 2.
Verifica-se que ambos os parâmetros associam-se com a
ocorrência de recém-nascido PIG ou GIG. As mulheres
com neonatos PIG apresentaram média significativamente
menor do IMC pré-gestacional (23,5 kg/m2, p<0,001),
bem como do IMC no final da gestação (27,7 kg/m2,
p<0,001) e maior proporção de casos classificados como
de baixo peso materno pelo IMC no final da gestação
(25,3%, p<0,001). As mulheres com neonatos GIG
apresentaram média significativamente maior do IMC
pré-gestacional (29,1 kg/m2, p<0,001), do IMC no final
da gestação (34,3 kg/m2, p<0,001) e maior proporção de
sobrepeso (30,8%, p<0,02) e obesidade (38,5%, p=0,02)
pela classificação do IMC pré-gestacional, e obesidade
pelo IMC no final da gestação (53,8%, p<0,001). No
entanto, o ganho de peso materno e o consumo de calorias
na dieta materna não mostraram relação significativa com
anormalidades do crescimento fetal (Tabela 2).
As variáveis foram estudadas para a predição da ocorrência de recém-nascido PIG e GIG por meio do modelo
de regressão logística com seleção pelo procedimento
stepwise. As seguintes variáveis foram incluídas no modelo:
tabagismo, diagnóstico de hipertensão arterial, diabetes
mellitus, ganho de peso materno, IMC pré-gestacional, IMC
no final da gestação, classificação do estado nutricional
materno pelo IMC pré-gestacional e classificação pelo IMC
no final da gestação. Realizando-se a análise multivariada,
as variáveis independentes que restaram no modelo final
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Tabela 1. Características maternas, dados do parto e do recém-nascido nas gestações de alto risco, de acordo com a adequação do peso do recém-nascido
Características
AIG
(n=270)
PIG
(n=91)
GIG
(n=13)
Valor p
29,2±6,7
30,3±8,5
0,7
Idade, anos, (média±DP)
29,7±6,1
Cor branca, n (%)
137 (50,7)
43 (47,3)
5 (38,5)
0,5
Nulíparas, n (%)
91 (33,7)
40 (44,0)
4 (30,8)
0,4
Tabagismo, n (%)
33 (12,2)
20 (22,0)
1 (7,7)
0,06
Hipertensão arterial
86 (31,9)
38 (41,8)
6 (46,2)
0,1
Diabetes mellitus
42 (15,6)
7 (7,7)
10 (76,9)
<0,001
Cardiopatia materna
42 (15,6)
14 (15,4)
1 (7,7)
0,6
Rotura prematura de membranas
34 (12,6)
7 (7,7)
0 (0)
0,1
Colagenoses
15 (5,6)
7 (7,7)
1 (7,7)
0,7
Parto cesárea, n (%)
189 (70,0)
73 (80,2)
11 (84,6)
IG no nascimento, semanas, (média±DP)
37,7±2,6
Intercorrências clínicas e/ou obstétricas, n (%)
36,4±3,0
Apgar de 1º min <7, n (%)
30 (11,1)
12 (13,2)
Apgar de 5º min <7, n (%)
9 (3,3)
3 (3,3)
22 (8,2)
15 (16,5)
UTI neonatal, n (%)
Peso do RN, g, (média±DP)
3018±590
2095±573
38,4±1,0
0,1
<0,001
1 (7,7)
0,7
0 (0)
0,8
1 (7,7)
4166±21
0,07
<0,001
AIG: adequado para a idade gestacional; PIG: pequeno para a idade gestacional; GIG: grande para a idade gestacional; DP: desvio-padrão; IG: idade gestacional;
UTI: unidade de terapia intensiva; RN: recém-nascido.
Tabela 2. Estado nutricional, ganho de peso e consumo energético materno nas gestações de alto risco de acordo com a adequação do peso do recém-nascido
Características
AIG
(n=270)
PIG
(n=91)
GIG
(n=13)
Valor p
IMC pré-gestacional, (média±DP)
25,7±6,0
23,5±4,5
29,1±5,6
<0,001
Classificação pelo IMC pré-gestacional, n (%)
Baixo peso
16 (5,9)
5 (5,5)
Adequado
131 (48,5)
59 (64,8)
4 (30,8)
Sobrepeso
70 (25,9)
20 (22,0)
4 (30,8)
Obesidade
IMC no final da gestação, (média±DP)
53 (19,6)
30,6±6,1
7 (7,7)
27,7±4,5
0 (0)
0,02
5 (38,5)
34,3±5,9
<0,001
Classificação pelo IMC no final da gestação, n (%)
Baixo peso
31 (11,5)
23 (25,3)
Adequado
90 (33,3)
33 (36,3)
3 (23,1)
Sobrepeso
78 (28,9)
24 (26,4)
3 (23,1)
Obesidade
71 (26,3)
11 (12,1)
7 (53,8)
0 (0)
<0,001
Ganho de peso materno, kg, (média±DP)
12,3±7,1
10,6±7,0
13,7±7,8
0,1
Consumo energético, kcal/d, (média±DP)
2422±758
2342±720
2196±645
0,4
AIG: adequado para a idade gestacional; PIG: pequeno para a idade gestacional; GIG: grande para a idade gestacional, IMC: índice de massa corporal; DP: desvio-padrão.
para predição do recém-nascido PIG foram: diagnóstico de
hipertensão arterial (OR=2,6; IC95% 1,5–4,5, p<0,001)
e IMC no final da gravidez (OR=0,9; IC95% 0,8–0,9,
p<0,001). Com o presente modelo, constatou-se que
76,5% dos casos são corretamente classificados.
A análise multivariada para predição do recém-nascido
GIG foi realizada incluindo-se as seguintes variáveis:
tabagismo, diagnóstico de hipertensão arterial, diabetes
mellitus, ganho de peso materno, IMC pré-gestacional,
IMC no final da gestação, classificação do estado nutricional materno pelo IMC pré-gestacional e classificação
pelo IMC no final da gestação. Foram identificadas como
independentes as seguintes variáveis: diagnóstico de
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diabetes mellitus (OR=20,2; IC95% 5,3–76,8, p<0,001)
e obesidade na classificação pelo IMC no final da gravidez
(OR=3,6; IC95% 1,1–11,7, p=0,04), com o modelo
classificando corretamente 96,5% dos casos.
Discussão
Esta pesquisa constatou que existe associação entre o
estado nutricional materno e as anormalidades no crescimento fetal. Para a predição de neonato PIG, identificou-se
como fatores independentes: o diagnóstico de hipertensão
arterial e o valor do IMC no final da gravidez; enquanto,
para a predição do neonato GIG, foram identificados como
Influência do estado nutricional materno, ganho de peso e consumo energético sobre o crescimento fetal, em gestações de alto risco.
fatores independentes o diagnóstico de diabetes mellitus
complicando a gravidez e o diagnóstico de obesidade pelo
IMC no final da gestação.
Existem limitações que dificultam a avaliação do IMC
durante a gravidez pela influência de fatores como: retenção
de líquidos; o próprio crescimento uterino; formação de
tecidos fetais e da placenta, e o volume de líquido amniótico. No entanto, o IMC final parece ser fator comum que
influencia de forma independente no crescimento fetal.
A obesidade no final da gravidez é fator de risco para o
neonato GIG e o valor absoluto do IMC final exerce efeito
protetor para a ocorrência de neonato PIG.
O controle do ganho de peso corporal durante a
gestação é tão importante para a saúde materna quanto
para o resultado do parto. Mantakas e Farrell18, analisando o resultado da gestação de nulíparas, observam que o
maior IMC implica maior risco para cesarianas em obesas
(RR=1,6; IC95%=1,4–1,7), quando comparadas com as
de IMC normal. Esses autores também confirmam que o
aumento do IMC materno durante a gravidez contribui
de maneira negativa para os resultados perinatais, aumentando o risco de recém-nascido macrossômico (>4000 g),
distocia de ombros e de óbito fetal. No presente estudo,
não se constatou associação do tipo de parto à adequação do
peso do recém-nascido. Pelo fato de a população estudada
ser constituída apenas de gestantes de alto risco, é elevada
a taxa de cesáreas, dificultando verificar a associação do
crescimento fetal com o tipo de parto.
A classificação do IMC pelo peso pré-gestacional é
proposto pelo IOM16 para a determinação do estado nutricional materno e, a partir desse parâmetro, são estabelecidas as recomendações para o ganho de peso na gravidez.
Entretanto, sabe-se que as gestantes podem mudar de
classificação nutricional e, para melhor avaliação durante a
gestação, Atalah Samur et al.15 desenvolvem instrumento
baseado no IMC ajustado para a idade gestacional. Esse
método de avaliação antropométrica abrange aplicação
mais universal, podendo representar um método mais
satisfatório de estimativa, permitindo a identificação de
mudança de estado nutricional no decorrer da gravidez.
Pela curva de Atalah Samur et al.15, o peso da gestante
é acompanhado durante o seguimento pré-natal, e intervenções nutricionais podem ser propostas mediante
a verificação de tendências crescentes ou decrescentes da
curva da gestante.
O metabolismo basal aumenta de forma importante durante a gravidez, para que não ocorra competição
biológica entre a mãe e o feto, que poderia promover
comprometimento da saúde fetal. Dessa forma, se torna
necessário maior quantidade de energia e nutrientes. No
primeiro trimestre, não há necessidade de aumentar aporte
calórico, mas a alimentação deve ser equilibrada. Durante
o segundo trimestre, recomenda-se o aumento de consumo
dietético de energia em apenas 340 calorias por dia e, no
terceiro, de 450 calorias por dia19. De acordo com IOM16, a
ingestão recomendada de energia é de 2.403 calorias para o
primeiro trimestre, 2.743 calorias para o segundo, e 2.855
calorias para o terceiro trimestre. Desses valores, devem
ser subtraídas 7 calorias para cada ano de idade acima de
19 anos. No Brasil, estudo realizado em Porto Alegre com
gestantes, verificou média de consumo dietético de 2.776
calorias/dia20. No Rio de Janeiro com 407 gestantes, os
autores verificam média do consumo de 3.027 calorias21.
No presente estudo, constataram-se menores valores de
consumo energético, e esses parâmetros não mostraram
associação significativa com o crescimento fetal. Pelo fato
de esta casuística abordar especificamente gestantes de
alto risco, com diferentes patologias, acompanhadas no
contexto de suas intercorrências, é esperado que o perfil
de consumo dietético sofra influências, resultando em
valores relativamente inferiores aos apontados nos demais
artigos da literatura.
A longo prazo, recém-nascidos GIG de mães obesas
ou diabéticas tem predisposição para o desenvolvimento
de obesidade infantil e síndrome metabólica na vida
adulta22. Nos estudo de Bhattacharya et al.23 verifica-se
que mulheres com obesidade mórbida têm maior risco
de terem filhos com peso ao nascer >4000 g (OR=2,1;
IC95% 1,3–3,2). E a pesquisa HAPO24, estudo internacional, multicêntrico e epidemiológico realizado em 15
centros de 9 países, conclui que o IMC materno elevado,
independente da alteração glicêmica, está fortemente
associado a maior frequência de complicações relacionadas ao excessivo crescimento fetal e pré-eclâmpsia. Dessa
forma, quanto ao fator de classificação de recém-nascidos
GIG, no presente estudo, constatou-se maior associação
à obesidade e ao diagnóstico de diabetes, visto na análise
de regressão logística.
O presente estudo permitiu concluir que o estado
nutricional materno no final da gravidez de alto risco está
associado de forma independente ao crescimento fetal, sendo o IMC materno no final da gestação um fator protetor
para o neonato PIG e a classificação como obesidade um
fator de risco para o neonato GIG. A existência de determinadas patologias influenciam de forma independente
no crescimento fetal: a hipertensão arterial associa-se ao
neonato PIG e a diabetes mellitus ao GIG. Isso demonstra
a necessidade de acompanhamento mais eficiente de ganho de peso na gestação de alto risco, com o objetivo de
minimizar as anormalidades no crescimento fetal.
Agradecimentos
À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de
São Paulo – FAPESP pelo auxílio recebido (bolsa de
mestrado).
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Nomura RMY, Paiva LV, Costa VN, Liao AW, Zugaib M
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Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(3):107-12
Maria do Socorro Cavalcante1
Everardo de Macêdo Guanabara2
Camila Pinto de Nadai3
Complicações maternas associadas à via
de parto em gestantes cardiopatas em um
hospital terciário de Fortaleza, CE
Maternal complications related to the mode of delivery in
pregnant women with heart disease in a specialist high risk
delivery hospital in Fortaleza, CE
Artigo original
Resumo
Palavras-chave
OBJETIVO: Verificar a associação entre complicações maternas e tipo de parto em gestantes cardiopatas, assim
como identificar os possíveis fatores clínicos e obstétricos, implicados na determinação da via de parto. MÉTODOS:
Estudo retrospectivo e descritivo analisando prontuários médicos das gestantes cardiopatas internadas em Hospital
de Referência terciário no município de Fortaleza, Ceará, no período de 2006 a 2007. A população do estudo
incluiu todas as gestantes com diagnóstico anteparto de cardiopatias admitidas para realização do parto e excluiu
as gestantes que tiveram o diagnóstico de cardiopatia após o parto, independente da idade e semana gestacional.
Utilizou-se um questionário semiestruturado com variáveis demográficas, clínicas e obstétricas. Realizou-se, inicialmente,
uma análise descritiva por meio de frequências simples e proporções das variáveis sociodemográficas, clínicas e
obstétricas. Em seguida foram analisadas possíveis associações entre os aspectos clínicos, obstétricos e tipo de
parto, verificando associação entre complicações maternas e tipo de parto. Para isso, foi aplicado o teste Exato
de Fischer, considerando p<0,05 para o estabelecimento da significância estatística. Os dados coletados foram
processados e analisados utilizando o software Epi-Info™, versão 6.04, Atlanta, USA. RESULTADOS: Foram incluídas
73 gestantes cardiopatas. Dentre as congênitas, a comunicação interatrial foi a mais observada (11,0%) e entre
as adquiridas, a estone mitral a mais freqüente (24,6%). A proporção de partos cesáreos foi maior do que entre os
vaginais, exceto para mulheres com cardiopatia adquirida. Foi encontrada associação entre tipo de cardiopatia
e tipo de parto (p=0,01). Houve 13 complicações maternas (17,8%). Dentre as complicações, dez (76,9%)
ocorreram por parto cesáreo e três por via vaginal. Não foi encontrada associação entre complicações maternas
e tipo de parto em gestantes cardiopatas (p=0,74). CONCLUSÕES: Não houve associação entre a ocorrência de
complicações maternas e a via de parto em gestantes cardiopatas.
Cardiopatias
Gestantes
Complicações da gravidez
Parto
Mortalidade materna
Keywords
Heart disease
Pregnant women
Pregnancy, complications
Parturition
Maternal mortality
Abstract
PURPOSE: To determine the association between maternal complications and type of delivery in women with heart
disease and to identify the possible clinical and obstetrical factors implicated in the determination of the route of
delivery. METHODS: This was a retrospective and descriptive study of the medical records of pregnant women
with heart disease admitted to a tertiary reference hospital in the municipality of Fortaleza, Ceará, from 2006 to
2007. The study population included all pregnant women with an antepartum diagnosis of heart disease admitted
for delivery, while women who received a diagnosis of heart disease after delivery were excluded, regardless of
age and gestational week. A semi-structured questionnaire regarding sociodemographic, clinical and obstetrical
variables was used. A descriptive analysis was first performed based on simple frequencies and proportions of
the sociodemographic variables. Next, possible associations between clinical and obstetrical aspects and type of
delivery were analyzed, with the verification of association between maternal complications and type of delivery.
The Fisher exact test was applied for this analysis, with the level of significance set at p<0.05. The collected data
were processed and analyzed using the Epi-Info™ software version 6.04 (Atlanta, USA). RESULTS: Seventy-three
pregnant women with heart disease were included in the study. Interatrial communication was the condition most
frequently observed among congenital diseases (11.0%) and mitral calcification among the acquired ones (24.6%).
Correspondência
Maria do Socorro Cavalcante
Avenida Imperador 372 – Centro
CEP 60015-052
Fortaleza (CE), Brasil
Recebido
22/08/2011
Aceito com modificações
25/01/2012
Trabalho realizado no Serviço de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital Geral Dr. César Cals – HGCC – Fortaleza (CE), Brasil.
Núcleo Hospitalar de Epidemiologia do Hospital Geral Dr. César Cals – HGCC – Fortaleza (CE), Brasil.
2
Programa de Residência Médica em Tocoginecologia do Hospital Geral Dr. César Cals – HGCC – Fortaleza (CE), Brasil.
3
Internato de Tocoginecologia do Hospital Geral Dr. César Cals – HGCC – Fortaleza (CE), Brasil.
1
Cavalcante MS, Guanabara EM, Nadai CP
The proportion of cesarean deliveries was higher than the proportion of vaginal deliveries, except for women with acquired heart disease. An association
was detected between type of heart disease and type of delivery (p=0.01). There were 13 cases of maternal complications (17.8%). Among them,
ten (76.9%) occurred during cesarean section and three during vaginal delivery. No association mas detected between maternal complications and
type of delivery in pregnant women with heart disease (p=0.74). CONCLUSIONS: There was no association between the occurrence of maternal
complications and route of delivery among pregnant women with heart disease.
114
Introdução
Métodos
No Brasil, a incidência de cardiopatia na gravidez em
centros de referência é de até 4,2% e universalmente é considerada a maior causa de morte materna indireta no ciclo
gravídico-puerperal1. A gravidez representa um momento
de grandes modificações no organismo materno. O sistema
cardiovascular sofre alterações no débito cardíaco, frequência
cardíaca, resistência vascular periférica e volemia, todas estas
para possibilitar um fluxo útero-placentário satisfatório a
nutrir e oxigenar o feto em desenvolvimento2,3. Estas mudanças solicitam um esforço maior do coração que, quando
se apresenta com alguma disfunção, pode comprometer a
evolução da gravidez, o parto e o puerpério3.
A classificação funcional da New York Heart Association
(NYHA) é usada para avaliar o estado clínico de pacientes
com doença cardíaca e auxiliar no prognóstico materno
apontando as complicações maternas. A mortalidade
materna é diretamente proporcional à classe funcional
específica4,5. Pacientes cardiopatas com classes funcionais I e II costumam tolerar a gravidez, enquanto as que
possuem classes funcionais III e IV têm maiores riscos de
complicações cardiovasculares5.
Durante a gravidez de paciente cardiopata, a morbimortalidade materna e fetal aumenta, seja por complicações
próprias da doença de base, como edema agudo de pulmão,
fenômenos tromboembólicos, insuficiência cardíaca, seja
como por complicações fetais6.
O risco de complicações entre as gestantes cardiopatas aumenta muito, principalmente no período periparto
devido ao aumento da demanda cardíaca no parto e
pós-parto decorrente das contrações uterinas, ansiedade,
autotransfusão do útero e perdas sanguíneas2,5,7.
A determinação da via de parto, bem como do melhor
momento para a resolução da gravidez, são ainda objetos
de muitos questionamentos na gestação complicada pela
cardiopatia materna8. Na literatura referente ao tema cardiopatia e gravidez existem poucos trabalhos focalizando
complicações maternas e determinação da via de parto.
Alguns autores associam o parto cesáreo ao maior risco
de mortalidade e morbidade maternas8.
Diante do exposto, o objetivo deste estudo foi verificar
a associação entre complicações maternas e via de parto em
gestantes cardiopatas, assim como identificar os possíveis
fatores clínicos e obstétricos implicados na determinação
da via de parto em um Hospital de Referência para parto
de alto risco no Nordeste do Brasil.
Trata-se de um estudo transversal, descritivo e retrospectivo
realizado em um hospital público, nível terciário com unidade
de urgência e emergência em Ginecologia e Obstetrícia, referência para o atendimento à gestante de alto risco, no período
de 2006 a 2007, no município de Fortaleza, Ceará.
A população do estudo incluiu todas as gestantes
com diagnóstico anteparto de cardiopatias admitidas para
realização do parto e excluiu as gestantes que tiveram o
diagnóstico de cardiopatia após o parto, independente da
idade e período gestacional. A idade gestacional variou da
27ª a 42ª semanas, média de 37,3 (±3 semanas). Entre 2006
e 2007 no Hospital de Referência terciário no município
de Fortaleza, Ceará, foram admitidas para parto 15.098
gestantes e destas, 73 (0,5%) eram cardiopatas. A idade
variou de 14 a 46 anos, com média de idade de 26,4 anos
(±7 anos). A faixa etária mais frequente no estudo foi de
20 a 29 anos, correspondendo a 36 pacientes (49,3%).
Mais da metade (58,9%) eram residentes em Fortaleza e
possuíam entre 4 a 11 anos de estudo (76,7%); iniciaram
o pré-natal no 2º trimestre gestacional e apenas 37,0%
realizaram sete ou mais consultas de pré-natal. A cesárea foi
o tipo de parto mais frequente, com 69,9%, e três (4,1%)
foram a óbito (Tabela 1). Os dados foram coletados em
duas etapas: primeiramente foram identificadas todas as
gestantes cardiopatas internadas no hospital a partir dos
livros de registros existentes na sala de parto. Na segunda
etapa, após a identificação dos casos realizou-se a coleta das
informações nos prontuários de todas as gestantes cardiopatas arquivados na instituição. As informações referentes às
condições clínicas e obstétricas foram transcritas da evolução
médica e de exames de imagem contidos nos prontuários.
Utilizou-se um questionário semiestruturado com variáveis
categorizadas em aspectos demográficos (idade, escolaridade,
procedência), clínicos (tipos de cardiopatia, ocorrência de
comorbidades) e obstétricos (início do pré-natal, número
de consultas, presença de intercorrências, presença de complicações maternas, tipo de parto, óbito materno).
A variável complicação materna foi dividida em clínica
e obstétrica, e definida como qualquer paciente que apresentasse um dos seguintes sintomas: descompensação do quadro
clínico ou ocorrência de eventos cardiovasculares (disfunção
de prótese, choque cardiogênico, parada cardiorrespiratória);
anemia com necessidade de transfusão sanguínea; tromboembolismo pulmonar; edema agudo de pulmão; endocardite
infecciosa. Quanto ao quadro obstétrico foram consideradas
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(3):113-7
Complicações maternas associadas à via de parto em gestantes cardiopatas em um hospital terciário de Fortaleza, CE
complicações: sangramento aumentado no parto decorrente
de hipotonia uterina; traumatismo do canal de parto; presença
de hematomas intraperitoneais e em parede abdominal ou
ainda de vulva ou períneo; infecção puerperal.
Realizou-se, inicialmente, uma análise descritiva por
meio de frequências simples e proporções das variáveis
sociodemográficas, clínicas e obstétricas. Em seguida
foram analisadas possíveis associações entre os aspectos
clínicos, obstétricos e tipo de parto, verificando-se associação entre complicações maternas e tipo de parto. Para
isso foi aplicado o teste exato de Fischer, considerando
p<0,05 para o estabelecimento da significância estatística.
As informações obtidas foram processadas e analisadas no
software Epi-info™, versão 6.04, Atlanta, USA.
Este trabalho foi avaliado e aprovado em reunião do
Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) do Hospital Geral Dr.
César Cals, local do estudo, com parecer de nº 209/2008.
Tabela 1. Características sociodemográficas, pré-natal das gestantes cardiopatas
admitidas para parto
Variáveis
n
%
14–19
11
15,1
20–29
36
49,3
30–39
24
32,9
40–49
2
2,7
Faixa etária (anos)
Procedência
Fortaleza
43
58,9
Outros municípios
30
41,1
Escolaridade (em anos de estudo)
Analfabeta
3
4,2
1–3
7
9,6
4–7
20
27,4
8–11
36
49,3
12 e mais
5
6,8
Ignorado
2
2,7
Início pré-natal
1º trimestre
28
38,4
2º trimestre
32
43,8
3º trimestre
0
0,0
Ignorado
13
17,8
Nenhuma
1
1,4
1–3
8
11,0
4–6
37
50,7
7 ou mais
27
37,0
Nº consultas
Tipo de parto
Vaginal
22
30,1
Cesárea
51
69,9
Sim
3
4,1
Não
70
95,9
Óbito materno
Fonte: Dados da pesquisa/Serviço de Obstetrícia/Núcleo Hospitalar de
Epidemiologia do HGCC.
Resultados
A Tabela 2 mostra os aspectos clínicos e obstétricos
em relação ao tipo de parto. Observou-se que, para todos
os tipos de cardiopatia, a proporção de partos cesáreos foi
maior do que entre os vaginais, exceto na cardiopatia adquirida. Foi encontrada associação entre tipo de cardiopatia
e tipo de parto (p=0,01). Entre o grupo das comorbidades
clínicas, destaca-se a hipertensão arterial e anemia, tendo
a cesárea como via de parto mais frequente. Dentre as intercorrências obstétricas, não foram encontradas diferenças
nas proporções em relação ao tipo de parto.
Neste estudo foram encontradas 13 complicações
maternas (17,8%). Dentre as complicações, dez (76,9%)
ocorreram pós-parto cesáreo e três pós via vaginal. Não foi
encontrada associação entre tipo de parto e complicações
maternas em gestantes cardiopatas (p=0,7).
As complicações obstétricas observadas neste estudo
foram: hipotonia uterina com sangramento transvaginal
intenso com necessidade de transfusão sanguínea (dois
casos) e hematoma de parede abdominal (dois casos). As
complicações clínicas encontradas foram: infecção de sítios
Tabela 2. Aspectos clínicos e obstétricos entre gestantes cardiopatas e tipo de parto,
admitidas para parto
Tipo de parto
Dados clínicos
Vaginal (n=22)
Cesárea (n=51)
n
%
n
%
1
14,3
6
85,7
94,1
Tipo de cardiopatia
Arritmia
Valor p
0,01
Congênita
1
5,9
16
Adquirida
20
42,5
27
57,5
Outras
0
0,0
2
100,0
Hipertensão arterial
0
0,0
7
100,0
Diabetes
1
100,0
0
0,0
Anemia
3
27,3
8
72,7
Outras
2
20,0
8
80,0
Nenhuma
16
36,4
28
63,6
Amniorrexe prematura
4
44,4
5
55,6
DHEG
2
28,6
5
71,4
CIUR
2
33,3
4
66,7
Oligoâmnio
0
0,0
6
100,0
Óbito fetal
2
100,0
0
0,0
Diabetes gestacional
1
100,0
0
0,0
Nenhuma
11
26,2
31
73,8
Sim
3
23,1
10
76,9
Não
19
31,7
41
68,3
Comorbidades clínicas
0,1
Intercorrências obstétricas
0,3
Complicações maternas
0,7
Fonte: Dados da pesquisa/Serviço de Obstetrícia /Núcleo Hospitalar de
Epidemiologia do HGCC.
DHEG: Doença Hipertensiva Específica da Gravidez; CIUR: Crescimento IntraUterino Restrito.
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(3):113-7
115
Cavalcante MS, Guanabara EM, Nadai CP
extrauterinos (vias aéreas), edema agudo de pulmão, choque
cardiogênico, tromboembolismo pulmonar, endocardite
infecciosa, oclusão arterial aguda e morte materna em três
casos (dados não apresentados em tabela).
Discussão
Existem poucos trabalhos na literatura sobre o
tema discutido neste estudo, o qual apresenta algumas
limitações, dentre as quais se destaca a falta de registro
da classe funcional em alguns prontuários, que prediz o
prognóstico da gravidez em cardiopatas, o que impossibilitou a avaliação desta variável. Portanto, o fato de
este estudo ser retrospectivo e depender de informações
registradas em prontuários dificultou uma melhor análise
das complicações maternas.
As gestantes cardiopatas eram jovens, com baixo nível
de escolaridade e com dificuldade de acesso aos serviços
de atendimento pré-natal. Este estudo mostra que, de
acordo com o preconizado pelo Ministério da Saúde, pouco
mais de um terço das gestantes frequentaram o serviço de
pré-natal e tiveram o número de consultas consideradas
adequadas (seis consultas), e quase metade das gestantes
iniciaram o pré-natal no segundo trimestre. É importante
lembrar que a assistência pré-natal iniciada em fase precoce
da gestação desempenha um papel fundamental para o
sucesso da condução da gestante cardiopata. Portanto,
associando um número de consultas de pré-natal satisfatório com uma atenção de qualidade iniciada no momento
certo, pode-se reduzir consideravelmente os riscos de
complicações. Também foi observado que boa parte das
pacientes tinha apenas o ensino fundamental incompleto
(4 a 7 anos de estudo). A este respeito, o Ministério da
Saúde9 cita a baixa escolaridade como fator desfavorável
à gravidez, implicando na deficiência das gestantes ao
entendimento, aceitação e seguimento das orientações
prestadas pelos profissionais de saúde.
A incidência de cardiopatia no hospital no período
analisado foi de 0,5%, semelhante aos resultados apresentados por Avila et al.10. Diante do exposto, conclui-se
que o hospital de referência onde se deu a realização deste
estudo conseguiu captar parte das gestantes cardiopatas
do Estado. Para Reimold e Rutherford11, apesar de a
incidência de cardiopatia ser baixa na gravidez, a sua
presença aumenta o risco de resultados adversos maternos e perinatais.
Observou-se que o parto cesáreo foi empregado para
a maioria das pacientes e esteve relacionado à presença de
cesárea anterior, intercorrências obstétricas, apresentação
pélvica, diagnóstico de cardiopatia congênita e alguns
casos que não foram discriminados. O Brasil está entre os
países com mais alta taxa de cesárea (alcançando aproximadamente 40%), mas o recomendado pela Organização
116
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(3):113-7
Mundial da Saúde é de apenas 15%8. A taxa de cesárea
entre as mulheres portadoras de doença cardíaca tende a
ser mais elevada do que entre as mulheres saudáveis, seja
devido a questões clínicas, seja decorrente de repercussões
perinatais2. Comparando a taxa obtida com aquelas relatadas em outros estudos, verificou-se que a prevalência
de cesáreas nesta população foi alta, mas esteve dentro
da faixa esperada para gestantes cardiopatas atendidas
em hospital terciário.
Quanto à etiologia, os casos foram divididos em:
arritmias, cardiopatias adquiridas e congênitas. Dentre
as adquiridas, a doença cardíaca reumática foi a mais
prevalente, o que confirma os dados encontrados em outros estudos5,10. A cardiopatia reumática predomina nos
países em desenvolvimento, enquanto em países como
Canadá e Estados Unidos predominam as pacientes com
cardiopatia congênita10. O parto cesáreo predominou em
todos os tipos de cardiopatia.
Quanto à presença de comorbidades clínicas, a anemia foi a mais comumente observada, podendo, assim,
precipitar as complicações cardiovasculares. Mais uma
vez, ressalta-se aqui a importância de uma assistência
pré-natal eficaz para reduzir estes achados adversos.
Deve-se atentar, também, que o próprio trabalho de
parto induz a paciente grávida a um maior esforço com
demanda maior de oxigênio, e em situações de anemia,
pode gerar uma situação compensatória de alto débito,
mas que esbarraria em situações de débito cardíaco
fixo, como as valvopatias reumáticas estenóticas do
tipo mitral, com repercussões como edema agudo de
pulmão, aumentando o risco de complicações no parto
e puerpério.
Dentre as intercorrências obstétricas, a amniorrexe
prematura foi a mais prevalente. Foram também encontrados neste estudo casos de crescimento intrauterino restrito
(CIUR). Borges et al.12 relataram que as modificações hemodinâmicas e cardíacas que ocorrem durante a gestação
guardam íntima relação com o resultado perinatal.
A maioria dos partos não estavam associados às
comorbidades clínicas, intercorrências obstétricas e
complicações maternas. Foram observados três casos de
morte materna, um no intraparto e dois no puerpério
imediato, nas primeiras 72 horas. A mortalidade materna
neste estudo foi de 4,1%. De acordo com Viñas Oliva
et al.13, em estudo cubano abrangendo 233 gestantes
cardiopatas, a taxa de mortalidade materna foi de 1,2%.
A frequência de complicações maternas observadas neste
estudo não está muito acima dos números referidos na
literatura, apesar da alta prevalência de partos cesáreos
neste estudo. Os partos cesáreos devem ser realizados
com indicação obstétrica por estarem associados a maior
perda sanguínea, alto risco de tromboembolismo e risco
de infecções2.
Complicações maternas associadas à via de parto em gestantes cardiopatas em um hospital terciário de Fortaleza, CE
Concluiu-se, neste estudo, que o parto cesáreo foi
predominante entre as gestantes cardiopatas, apesar
de o parto vaginal com fórceps ser o recomendado.
Considerando que este tipo de parto expõe a mulher a maior risco de complicações e morte, torna-se
imprescindível melhorar a qualidade do pré-natal,
formar equipes multidisciplinares para prestar assistência pré-natal e parto, para acompanhar com maior
segurança a gravidez da gestante cardiopata e escolher
a melhor via de parto.
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Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(3):113-7
117
Heleodoro Corrêa Pinto¹
Lutero Koch Jung1
Eliana Wendland²
Simone da Cunha Heineck3
Colpotomia no tratamento da gestação
ectópica
Treating ectopic pregnancy with colpotomy
Artigo original
Resumo
Palavras-chave
Gravidez ectópica/terapia
Colpotomia/utilização
Vagina/cirurgia
Laparoscopia
Metrotexato/uso terapêutico
Keywords
Pregnancy, ectopic/therapy
Colpotomy/utilization
Vagina/surgery
Laparoscopy
Methotrexate/therapeutic use OBJETIVO: Relatar o uso da colpotomia para o tratamento de gestações ectópicas. MÉTODOS: Estudo transversal
retrospectivo. Foram incluídos todos os casos internados com suspeita clínico-laboratorial de gestação ectópica que
não preenchiam critérios para tratamento medicamentoso com Methotrexato no período de fevereiro de 2007 a agosto
de 2008. Foram analisadas variáveis demográficas, história ginecológica e características associadas ao tratamento
foram obtidas através de revisão de prontuário. RESULTADOS: Dezoito mulheres foram incluídas no estudo. A média
de idade foi de 27±5,2 anos. Todos os casos apresentavam gestação ectópica rota e todas as pacientes foram
submetidas à salpingectomia parcial. O tempo cirúrgico variou de 30 a 120 minutos (média de 64,5 minutos), sendo
contabilizado desde o momento de entrada da paciente na sala cirúrgica até o horário da saída. Nenhuma paciente
apresentou infecção pós-operatória. O tempo médio de internação foi de 40±14,3 horas. As medicações utilizadas
no período pós-operatório foram semelhantes em todos os casos, sendo baseadas em anti-inflamatório não esteroide,
dipirona, paracetamol e meperidina, conforme a necessidade. A dieta foi reintroduzida 8 horas após o término da
cirurgia. CONCLUSÕES: A utilização da colpotomia no tratamento da gestação ectópica apresentou bons resultados,
com ausência de complicações importantes e tempo de internação curto. O instrumental cirúrgico básico para a
realização desse procedimento é relativamente comum a todos os hospitais, e a técnica cirúrgica é reprodutível.
Abstract
PURPOSE: To report the use of colpotomy for the treatment of ectopic pregnancies. METHODS: This was a retrospective
cross-sectional study conducted on all women hospitalized with a clinical-laboratory suspicion of ectopic pregnancy
who did not fulfill the criteria for drug treatment with methothrexate, during the period from February 2007 to August 2008. Demographic variables, gynecologic history and characteristics associated with treatment were obtained by
reviewing the medical records. RESULTS: Eighteen women were included in the study. Mean age was 27±5.2 years.
All patients presented ruptured ectopic pregnancy and all were submitted to partial salpingectomy. Surgical time ranged
from 30 to 120 minutes (mean: 64.5 minutes) calculated from the moment when the patient entered the operating
room to the moment when she left it. No patient presented postoperative infection. Mean time of hospitalization was
40±14.3 hours. The medications used during the postoperative period were similar in all cases, being based on
nonsteroid anti-inflammatory drugs, dipyrone, paracetamol and meperidine, as needed. The diet was reintroduced
8 hours after the end of surgery. CONCLUSIONS: The use of colpotomy in the treatment of ectopic pregnancy showed
good results, with the absence of important complications and a short hospitalization time. The basic surgical instruments
needed for this procedure are relatively common to all hospitals, and the surgical technique is reproducible.
Correspondência
Heleodoro Corrêa Pinto
Hospital Fêmina
Rua Mostardeiro 17 – Bairro Moinhos de Vento
CEP 91430-001
Porto Alegre (RS), Brasil
Recebido
28/09/2011
Aceito com modificações
27/01/2012
Trabalho realizado no Hospital Fêmina – Grupo Hospitalar Conceição – GHC – Porto Alegre (RS), Brasil.
¹Grupo Hospitalar Conceição – GHC – Porto Alegre (RS), Brasil.
²Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre – UFCSPA – Porto Alegre (RS), Brasil.
3
Programa de Residência em Ginecologia/Obstetrícia do Hospital Fêmina – Grupo Hospitalar Conceição – GHC – Porto Alegre (RS), Brasil.
Colpotomia no Tratamento da Gestação Ectópica
Introdução
A gestação ectópica é definida como a gestação que
ocorre fora da cavidade uterina¹. Em 97% dos casos está
localizada na tuba uterina e, dessas, aproximadamente
55% ocorrem na região da ampola, 25% no istmo, 17%
na fímbria e 3% na cavidade abdominal, ovário e cérvice².
A incidência global da prenhez ectópica tem aumentado
ao longo do tempo, associado ao aumento da incidência de
doença inflamatória pélvica³. No Reino Unido, estima-se
uma incidência de 11,1 a cada 1000 gestações; nos Estados
Unidos são descritos cerca de 100.000 casos por ano4,5.
No Brasil, a mortalidade materna por gestação ectópica
insere-se entre as causas hemorrágicas e não há dados
sobre sua prevalência no país6. Em estudo realizado num
hospital público de São Paulo, a prevalência de gestações
ectópicas submetidas à laparotomia se manteve estável
durante os 6 anos levantados, respondendo por 11,2% do
total de laparotomias realizadas em mulheres no período
estudado6. É uma condição que, quando retardado seu
diagnóstico, apresenta grande morbidade e mortalidade
no primeiro trimestre da gestação7, evoluindo com sangramento, choque e morte.
Qualquer mulher em idade fértil pode desenvolver
uma gestação ectópica. Entretanto, considera-se como de
alto risco pacientes com gestação ectópica prévia, história
de cirurgia pélvica prévia incluindo ligadura tubária,
história de doença sexualmente transmissível, concepção
resultante de reprodução assistida, uso prolongado de
dispositivo intrauterino, tabagismo, múltiplos parceiros
sexuais e história de exposição ao dietilbestrol5,8.
Geralmente as pacientes apresentam-se com dor
abdominal, atraso menstrual e sangramento vaginal não
compatível com menstruação5. O uso de medidas seriadas de gonadotrofina coriônica humana (HCG), porção
beta e ultrassonografia facilitam o diagnóstico inicial5,8.
Um aumento irregular do β-HCG (≤66% em 48 h) e/ou
um β-HCG quantitativo maior que 1500 mIU/mL sem
imagem ecográfica intrauterina de gestação, mas com
uma imagem complexa em anexo, sugerem diagnóstico
de prenhez ectópica5.
A conduta expectante é uma das opções de tratamento,
com bons resultados em 47 a 82% dos casos, em pacientes
com níveis de β-HCG menores que 1000 mUI/mL e com
massa ectópica menor que 4 cm, sem batimentos cardíacos,
e que concordem com a forma expectante2.
Em pacientes hemodinamicamente estáveis, com
imagem menor que 4 cm e com quadro clínico compatível com gestação ectópica íntegra, β-HCG menor que
5000 mIU/mL e sem atividade cardíaca fetal, pode-se
optar por tratamento medicamentoso, e deve ser a primeira escolha para as pacientes desejosas de uma futura
gestação, uma vez que preserva a tuba uterina, mantendo
a capacidade reprodutiva9-11. O metotrexato é uma droga
antagonista do ácido fólico que compete com os receptores
dihidrofólico ácido redutase, que converte o dihidrofolato
em tetrahidrofolato. Na ausência do tetrahidofolato a
síntese de DNA é impossibilitada, impedindo a replicação celular2,12.
Em pacientes hemodinamicamente instáveis, a laparotomia é o tratamento indicado, sendo a salpingectomia
indicada nas pacientes com prole constituída, nos casos de
lesão tubárea irreparável, nas tentativas de salpingostomia
com sangramento persistente, quando ocorre recidiva de
gravidez ectópica na mesma tuba e quando os títulos de
β-HCG são muito elevados9. Diversos estudos compararam a eficácia da salpingectomia ou da salpingostomia em
relação ao futuro reprodutivo13,14, não existindo consenso
sobre qual seria o procedimento mais adequado15.
Quando a imagem ultrassonográfica da trompa é maior
do que 5 cm no diâmetro transverso ou quando existem
sinais clínicos compatíveis com gestação ectópica rota,
mas em presença de estabilidade hemodinâmica, indica-se
o tratamento cirúrgico laparoscópico9,16.
O tratamento da gestação ectópica por via vaginal
foi usado pela primeira vez em 1896 quando Huward
Kelly descreveu dez casos17. A colpotomia, assim como
a laparoscopia, é uma técnica menos invasiva do que a
laparotomia; ambas apresentam menor perda sanguínea,
menor dor no pós-operatório, menor tempo de internação
e retorno mais rápido às atividades rotineiras18,19.
O objetivo do presente estudo foi descrever uma
série de casos de gestação ectópica tratadas com a técnica
cirúrgica por via vaginal (colpotomia) em um hospital
público de Porto Alegre.
Métodos
Foram analisados, retrospectivamente, através de
revisão de prontuário, todos os procedimentos realizados
via colpotomia no período de fevereiro de 2007 a agosto
de 2008, no Hospital Fêmina de Porto Alegre, referência em atendimento de urgência ginecológica no estado
do Rio Grande do Sul. Foram incluídos todos os casos
internados por um dos autores (HCP), internados com
suspeita clínico-laboratorial de gestação ectópica, que não
preenchiam critérios para tratamento medicamentoso com
metotrexato A colpotomia foi a técnica escolhida tendo
em vista a experiência com cirurgia vaginal e por ser a
via cirúrgica de preferência dos membros da equipe. Os
prontuários foram revisados para a coleta de informações referentes à idade, paridade, raça, tempo cirúrgico,
complicações no pós-operatório e medicação analgésica
utilizada no pós-operatório.
As pacientes foram submetidas à colpotomia sob
anestesia condutiva, após jejum de 8 horas para sólidos
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(3):118-21
119
Pinto HC, Jung LK, Wendland E, Heineck SC
e 6 horas para líquidos, tendo sido desconsiderado nos
casos de urgência. O procedimento foi realizado com as
pacientes em posição ginecológica forçada, com coxas
flexionadas com aproximadamente 45° a 60° em relação
ao abdômen, para melhor exposição da pelve. Foi realizada
sondagem vesical de demora e utilizada a válvula de peso
longa, apoiando-a na parede vaginal posterior.
O afastamento da parede vesical anterior e a exposição do colo uterino foram feitos usando-se a válvula de
Breiski, sendo o lábio posterior do colo fixado e tracionado na sequência. A incisão foi realizada na transição
da mucosa vaginal posterior e colo uterino, utilizando-se
eletrocautério monopolar com 40 W de potência, com
posterior dissecção da parede vaginal.
Após a abertura do peritônio parietal a mesa cirúrgica
foi inclinada anteriormente para propiciar o escoamento
do sangue livre na cavidade. Algumas vezes, a trompa
afetada apresentou-se espontaneamente. Quando isso
não ocorreu, ela foi identificada usando-se gaze montada
e pinça de Babcock e a tuba foi clampeada com pinça de
Satinsky e realizada a salpingectomia parcial da extremidade proximal à massa. Sempre que possível, a tuba
foi mantida, utilizando-se a técnica de salpingostomia
conforme a técnica laparotômica, através da borda antimesentérica. Após lavagem da cavidade pélvica com soro
fisiológico a cavidade foi fechada com fio absorvível em
pontos separados e em uma única camada.
O projeto deste trabalho foi aprovado pelo Comitê
de ética em Pesquisa do Hospital Nossa Senhora da
Conceição – GHC (n° 081/08).
Resultados
No período analisado, foram submetidas ao procedimento vaginal 21 pacientes, das quais 18 foram incluídas
no trabalho. Dois prontuários não foram localizados. Uma
paciente operada não apresentava gestação ectópica, mas
sim cisto ovariano. Características demográficas e obstétricas podem ser observadas na Tabela 1.
Tabela 1. Características das 18 pacientes com gestação ectópica submetidas a colpotomia
(fevereiro de 2007 a agosto de 2008)
Característica
Média±DP
Idade
27±5,2
Tempo de internação (horas)
40±14,3
n (%)
Cor da pele
Branca
14 (77,8)
Preta
4 (22,2)
Paridade
Nulíparas
6 (33,3)
Multíparas
12 (66,7)
DP: desvio padrão.
120
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(3):118-21
Todos os casos apresentavam gestação ectópica tubária
rota e todas as pacientes foram submetidas à salpingectomia
parcial. Oito casos apresentaram gestação ectópica à direita
e dez casos à esquerda. O tempo cirúrgico variou de 30 a
120 minutos (média 64,5 minutos), sendo contabilizado
do momento de entrada da paciente na sala até o horário
da saída da sala cirúrgica. Nenhuma paciente apresentou
infecção pós-operatória. Dezessete pacientes receberam alta
em até 48 horas (94,4%) e uma paciente permaneceu 72
horas. A medicação utilizada no período pós-operatório foi
semelhante em todos os casos, sendo utilizados anti-inflamatórios não esteroides, dipirona, paracetamol e meperidina
conforme necessidade. A dieta foi reintroduzida 8 horas
após o término da cirurgia, conforme rotina do Hospital.
Após a alta hospitalar, a paciente retornou para consulta
médica em 30 dias para revisão cirúrgica e conhecimento
do resultado do exame anatomopatológico.
Discussão
A videolaparoscopia é o tratamento cirúrgico de escolha nos casos de gestação ectópica, sendo que, nos países
desenvolvidos, 80% dos casos são tratados por essa via9,11,20.
A laparoscopia permite o diagnóstico da patologia e o tratamento no mesmo tempo cirúrgico, proporcionando uma
redução significativa nos índices de complicações referentes
ao atraso no diagnóstico, somadas às vantagens de uma abordagem minimamente invasiva20,21. Além disso, a laparoscopia
é considerada a via preferencial por apresentar inúmeras
vantagens, como menor tempo de internação, retorno mais
rápido às atividades e custos mais baixos devido ao menor
tempo de hospitalização9,22. No entanto, a instalação do
instrumental laparoscópico tem um alto custo e requer treinamento especializado20,21. Em muitos hospitais brasileiros,
existe dificuldade para a realização da laparoscopia, seja por
limitação da equipe ou do instrumental endoscópico6.
O tratamento da gestação ectópica usando-se a abordagem vaginal pela colpotomia tem sido preterido como
segunda ou terceira opção cirúrgica, mesmo havendo relatos
de experiências que evidenciam ser um método seguro, rápido
e efetivo23. A via vaginal tem sido usada na abordagem de
diversas outras lesões pélvicas, como abscesso tubovariano e
ligadura tubária, e histerectomia. Os benefícios em relação à
abordagem laparoscópica e laparotômica já foram relatados
em recente revisão da Cochrane24. Vantagens significativas
foram comprovadas em relação à via abdominal, como retorno mais rápido às atividades, menor tempo de internação e
pós-operatório menos doloroso23,24. A via vaginal ainda evita
incisões abdominais, apresentando, portanto, melhor resultado cosmético para a paciente17. O instrumental cirúrgico
básico para a realização desse procedimento é encontrado
rotineiramente em todos os hospitais. Isso faz da abordagem
vaginal uma técnica facilmente reprodutível, ao contrário
Colpotomia no Tratamento da Gestação Ectópica
da laparoscopia, cujo instrumental não está disponível em
todos os hospitais brasileiros, além de requerer maior treinamento cirúrgico.
O presente estudo possui limitação por ser um relato
de um número relativamente pequeno de casos e por não
ter acompanhamento a longo prazo. Além disso, não houve
comparação desses casos com as demais pacientes tratadas
por outra via cirúrgica (laparotomia ou laparoscopia). No
entanto, os resultados observados em relação à cirurgia
vaginal foram muito bons, com tempo reduzido de internação e ausência de complicações importantes. Conforme
os prontuários analisados, nenhuma das 18 pacientes
necessitou de reinternação. O período máximo para alta
hospitalar próximo a 48 horas (94,4% das pacientes) é
semelhante à cirurgia laparoscópica. Pouca medicação no
período pós-operatório foi necessária, confirmando ser um
procedimento minimamente invasivo, de baixa lesão de
tecidos e com pequeno custo ao sistema de saúde.
O tratamento da gestação ectópica via colpotomia, já
instituído, mas talvez esquecido ao longo do tempo, pode
ser utilizado nessas situações, quando a videolaparoscopia
não está disponível, oferecendo uma melhor recuperação
às pacientes, quando comparado à laparotomia. Existe a
necessidade da realização de estudos prospectivos, para
comparar as diferentes técnicas cirúrgicas no tratamento
desta patologia, com tempo maior de seguimento23.
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Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(3):118-21
121
João Rocha Vilela1
Maria Teresinha de Oliveira Cardoso2
José Gonçalves Franco Júnior3
Anaglória Pontes4
Acurácia da histerossonografia versus
ultrassonografia transvaginal em mulheres
inférteis candidatas às técnicas de
reprodução assistida
Sonohysterography accuracy versus transvaginal ultrasound in infertile
women candidate to assisted reproduction techniques.
Artigo original
Resumo
Palavras-chave
Ultrassonografia/métodos
Histeroscopia/métodos
Endométrio/patologia
Pólipos
Infertilidade
Keywords
Ultrasonography/methods
Hysteroscopy/methods
Polyps
Endometrium/pathology
Infertility
OBJETIVO: Comparar a acurácia diagnóstica da histerossonografia (HSN) com a da ultrassonografia transvaginal
convencional (USG) na avaliação da cavidade uterina de mulheres inférteis candidatas às técnicas de reprodução
assistida (TRA). MÉTODOS: Realizou-se estudo transversal comparativo com 120 mulheres inférteis candidatas à
TRA, acompanhadas no Centro de Reprodução Assistida (CRA) do Hospital Regional da Asa Sul (HRAS), Brasília –
DF, no período compreendido entre agosto de 2009 e novembro de 2010. A HSN foi realizada com infusão de
soro fisiológico em sistema fechado. Comparou-se o achado da HSN com o resultado da USG prévia. A cavidade
uterina foi considerada anormal quando se visualizava: endométrio com espessura superior à esperada para a
fase do ciclo; pólipo endometrial; mioma submucoso e alteração do formato da cavidade do útero. A análise
estatística foi feita utilizando-se frequências absolutas, valores percentuais e o teste χ2 com nível de significância
de 5%. RESULTADOS: Observamos que 92 (76,7%) mulheres inférteis, candidatas à TRA, apresentavam cavidade
uterina normal pela HSN e em 28 (23,3%) foram detectadas as seguintes alterações: 15 pólipos (12,5%),
nove alterações no formato da cavidade uterina (7,5%), 6 miomas submucosos (5%), 4 espessura endometrial
anormal (3,3%) para a fase do ciclo menstrual e 2 septos uterinos (1,7%); 5 mulheres apresentavam mais de uma
alteração (4,2%). Enquanto a USG observou alterações da cavidade uterina apenas em 5 (4,2%) mulheres, a
HSN confirmou 4 das 5 alterações detectadas pela USG e detectou alterações na cavidade uterina em outras
24 mulheres que não tinham sido detectadas na USG, ou seja, a HSN foi capaz de detectar mais alterações
na cavidade uterina do que a USG, com diferença significativa (p=0,002). CONCLUSÃO: A HSN tem maior
acurácia que a USG na avaliação da cavidade uterina, neste grupo de mulheres inférteis candidatas às TRA.
A HSN poderá ser facilmente incorporada à propedêutica das candidatas às TRA e contribuir para reduzir as
falhas de implantação embrionária.
Abstract
PURPOSE: To compare the diagnostic accuracy of sonohysterography (HSN) and conventional transvaginal ultrasound
(USG) in assessing the uterine cavity of infertile women candidate to assisted reproduction techniques (ART). METHODS:
Comparative cross-sectional study with 120 infertile women candidate to ART, assisted at Centro de Reprodução
Assistida (CRA) of Hospital Regional da Asa Sul (HRAS), Brasília – DF, from August 2009 to November 2010.
Sonohysterography was performed with saline solution infusion in a close system. The sonohysterography finding was
compared to previous USG results. The uterine cavity was considered abnormal when the endometrium was found to be
thicker than expected during the menstrual cycle and when an endometrial polyp, a submucous myoma and an abnormal
shape of the uterine cavity were observed. The statistical analysis was done using absolute frequencies, percentage
values and the χ2, with the level of significance set at 5%. RESULTS: HSN revealed that 92 (76.7%) infertile women
candidate to ART had a normal uterine cavity, while 28 (23.3%) had the following abnormalities: 15 polyps (12.5%),
Correspondência
João Rocha Vilela
Serviço de Reprodução Humana – SRH, Hospital Regional da Asa
Sul – HRAS
Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal – SES/DF –
Brasília (DF), Brasil
Avenida L2 Sul SGAS Quadra 608 – Asa Sul
CEP 70203-900
Brasília (DF), Brasil
Recebido
28/07/2011
Aceito com modificações
24/01/2012
Trabalho realizado no Serviço de Reprodução Humana – SRH, Hospital Regional da Asa Sul – HRAS, Secretaria de Estado de Saúde
do Distrito Federal – SES/DF – Brasília (DF), Brasil.
1
Serviço de Reprodução Humana da Unidade de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital Regional da Asa Sul – HRAS, Secretaria de
Estado de Saúde do Distrito Federal – SES/DF – Brasília (DF), Brasil.
2
Curso de Medicina da Universidade Católica de Brasília – UCB – Brasília (DF), Brasil.
3
Programa de Pós-Graduação em Ginecologia, Obstetrícia e Mastologia da Faculdade de Medicina de Botucatu da Universidade
Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” – UNESP – Botucatu (SP), Brasil.
4
Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina de Botucatu da Universidade Estadual Paulista “Júlio de
Mesquita Filho” – UNESP – Botucatu (SP), Brasil.
Fonte de financiamento: Esta pesquisa foi desenvolvida com apoio financeiro da Fundação de Ensino e Pesquisa em Ciências da
Saúde mantidas pela FEPECS – Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal – SES/DF, processo nº 04/34 2009.
Acurácia da histerossonografia versus ultrassonografia transvaginal em mulheres inférteis candidatas às técnicas de reprodução assistida
9 cases of abnormal shape of the uterine cavity (7.5%), 6 submucous myomas (5%), 4 cases of inadequate endometrial thickness for the menstrual cycle
phase (3.3%), and 2 cases of uterine septum (1.7%); 5 women presented more than one abnormality (4.2%). While USG showed alteration in the cavity
only in 5 (4.2%) women, the sonohysterography confirmed 4 out of the 5 abnormalities shown by USG and detected an abnormal uterine cavity in 24
other women, who had not been detected by USG. This means that sonohysterography was able to detect more abnormalities in the uterine cavity than
USG, with a statistically significant difference (p=0.002). CONCLUSION: The sonohysterography was more accurate than USG in the assessment of the
uterine cavity of this cohort of infertile women candidate to ART. The sonohysterography can be easily incorporated into the investigation of these women
and contribute to reducing embryo implantation failures.
Introdução
A histerossonografia (HSN) é um procedimento
ambulatorial que teve sua acurácia testada por ensaios
clínicos1,2. Mostrou-se como método útil e confiável
para avaliação da cavidade uterina com elevadas taxas
de sensibilidade, especificidade e reprodutibilidade1-6. É
equivalente à histeroscopia na detecção de alterações ou
anormalidades da cavidade uterina1,7. É mais bem tolerada,
de baixo custo, rápida e causa desconforto mínimo2,5-10.
Está indicada como método de avaliação da cavidade uterina antes de indicar outro método mais invasivo como
a histeroscopia diagnóstica (HTDx)11.
Para não haver surpresas com alterações, a avaliação
prévia da cavidade uterina nos ciclos das técnicas de reprodução assistida (TRA) é muito importante. Tem como
objetivo diminuir cancelamentos de ciclos ou falha de
implantação embrionária, devido a pólipo endometrial
ou outra alteração da cavidade uterina, não detectada pela
ultrassonografia transvaginal convencional (USG), e com
isso, melhorar as taxas de sucesso do tratamento e evitar
prejuízo material e emocional a esse grupo de mulheres9,12.
Alterações endometriais e/ou da cavidade uterina, não
detectadas pela USG, estão presentes em uma parcela de
10 a 30% das mulheres inférteis e assintomáticas1,8,9,13.
A avaliação do útero com USG iniciou-se há mais de
quatro décadas e é utilizada rotineiramente como propedêutica
complementar em Ginecologia. Já nos primeiros estudos,
foi observada superioridade na qualidade de imagem obtida
pela HSN quando comparada àquelas da USG, proporcionando melhor localização, detalhamento da ecotextura e
dimensões das alterações da cavidade uterina2,5,9,14.
Segundo a Associação Americana de Ginecologia e
Obstetrícia (ACOG 2008)15, a HSN está indicada para
avaliação da cavidade uterina de mulheres com: sangramento uterino anormal pré e pós-menopausa; infertilidade
e abortamento habitual; suspeita de anormalidade na
cavidade uterina, mioma, pólipo e sinéquia; anormalidade detectada na USG, incluindo alteração endometrial
focal ou difusa; e imagem endometrial mal definida pela
USG. Alguns autores sugerem que a HSN seja usada
rotineiramente para a avaliação da cavidade uterina em
mulheres inférteis10. Outros a indicam em casos selecionados quando a USG é anormal16. Em relação às TRA, a
HSN é recomendada antes do tratamento de fertilização
in vitro (FIV)9,17, enquanto outros a utilizam como opção
em todas as mulheres com falha de implantação12,18.
Embora a HSN seja uma ferramenta útil na propedêutica de avaliação da cavidade uterina de mulheres
sintomáticas, com sangramento uterino anormal1,2,8,11,
ainda não estão bem estabelecidas as vantagens quando
se pretende avaliar a cavidade uterina de mulheres inférteis que serão submetidas a tratamento com TRA7,13,16-19.
Portanto, o objetivo do presente trabalho é comparar a
acurácia da HSN com a USG na avaliação da cavidade
uterina em mulheres inférteis candidatas às técnicas de
reprodução assistida.
Métodos
Estudo transversal comparativo entre USG e HSN em
mulheres inférteis candidatas à TRA. As pacientes foram
acompanhadas no Centro de Reprodução Assistida (CRA)
do Serviço de Reprodução Humana (SRH) da Unidade de
Ginecologia e Obstetrícia (UGO) do Hospital Regional
da Asa Sul (HRAS) da Secretaria de Estado de Saúde do
Distrito Federal (SES/DF), Brasília – DF, no período compreendido entre agosto de 2009 e novembro de 2010.
Este estudo foi submetido e aprovado pelo Comitê
de Ética em Pesquisa da Secretaria de Estado de Saúde
do Governo do Distrito Federal, processo nº 283/09. As
mulheres inférteis, inscritas e convocadas para tratamento
com TRA foram convidadas a participar do estudo e incluídas, após concordância e assinatura aposta em “Termo
de Consentimento Livre e Esclarecido”.
Foram selecionadas, por conveniência, 122 mulheres
entre os casais inférteis previamente inscritos e candidatos às
TRA, independente da causa da infertilidade. As mulheres
incluídas neste estudo não foram atendidas por queixas
de sangramento uterino anormal, não eram portadoras de
doença clínica ou psicológica que contraindicasse o tratamento e gravidez, nem tinham sinais clínicos de infecção
genital ou doença inflamatória pélvica aguda.
Todas as mulheres foram previamente submetidas à
USG entre o 3º e o 5º dia do ciclo menstrual para avaliação dos ovários, do útero e do endométrio, por diferentes
observadores e equipamentos.
Em outra oportunidade, foi realizada HSN como
propedêutica semiológica complementar, para avaliação da
cavidade uterina na primeira metade do ciclo menstrual,
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(3):122-7
123
Vilela JR, Cardoso MTO, Franco Júnior JG , Pontes A
entre o 5º e o 14º dia do ciclo menstrual espontâneo ou
após o sangramento de privação por interrupção do progestogênio ou anticoncepcional hormonal oral combinado.
O exame foi realizado por um único observador com
equipamento Aloka, modelo SSD500, com transdutor
transvaginal de 5 MHz.
Para a HSN, a mulher foi colocada em posição ginecológica para exposição do colo do útero, com espéculo
vaginal biválvula tipo Collin. Após a limpeza do colo
do útero com gaze e soro fisiológico a 0,9%, o cateter de
HSN previamente preenchido com soro fisiológico para
evitar a infusão de bolhas de ar na cavidade uterina foi
introduzido pelo orifício externo no canal cervical até
ultrapassar o orifício interno e atingir a cavidade uterina.
Após a retirada cuidadosa do espéculo vaginal, o transdutor
transvaginal revestido com preservativo, não lubrificado,
foi introduzido na vagina da mulher para, inicialmente,
realizar USG. Em seguida, realizava-se a HSN com a infusão
de soro fisiológico a 0,9%, através de sistema de infusão
fechado idealizado por nós. Neste sistema, o frasco com
100 ou 250 mL de soro fisiológico a 0,9% é conectado
com equipo de infusão diretamente ao cateter de HSN,
calibre 5, 6 ou 7 FR e 30 cm de comprimento.
Os critérios definidos como normalidade e anormalidade
da cavidade uterina pela HSN e USG foram: exame normal
quando o útero e a cavidade uterina foram normais e o endométrio com espessura compatível com a fase do ciclo. A
cavidade uterina foi considerada anormal quando se visualizava:
endométrio com espessura superior à esperada para a fase do
ciclo; pólipo endometrial; mioma submucoso e alteração do
formato da cavidade do útero. Mioma intramural e mioma
subseroso não são alterações da cavidade.
Para a análise estatística dos dados, foram realizados procedimentos estatísticos por meio dos programas
PASW® Statistics for Microsoft Windows® (SPSS) versão
18 e OpenEpi® versão 2. Devido à interdependência das
variáveis principais, a análise dos dados foi feita com cálculo
de frequências absolutas do tipo diferenças e percentuais
e o teste χ2, considerando-se nível de significância com
intervalo de confiança de 95%, p<0,05.
124
As causas de infertilidade observadas nos 120 casais
inférteis estão representadas na Tabela 1. Em setenta e
três (60,8%) a infertilidade tinha como etiologia o fator
feminino e desses, 54 (45,0%) tinham fator tubário,
dos quais 19 (15,8%) foram por laqueadura tubária; 62
(51,7%) apresentavam o fator masculino como causa da
infertilidade, dos quais 14 (11,7%) foram por vasectomia
e 15 (12,5%) casais tinham associação de fatores, a esterilização cirúrgica representa 27,5% das causas. O padrão
menstrual dessas 120 mulheres distribuía-se da seguinte
forma: 1 (0,8%) estava em amenorreia; 9 (7,5%) relataram fluxo menstrual escasso; 88 (73,3%), fluxo normal
e 22 (18,4%), fluxo excessivo. A duração média do fluxo
menstrual observada foi de 4,2 dias e intervalo médio
de 28,6 dias. Setenta e três (60,8%) eram nuligestas, ou
seja, tinham infertilidade primária; 18 (15,0%) eram
primíparas; 17 (14,2%) secundíparas; 9 (7,5%) tercíparas
e 3 (2,5%) quartíparas. Oito (6,6%) mulheres já tinham
tido de uma a três gestações ectópicas.
As alterações da cavidade uterina, observadas na USG
e na HSN, estão sumarizadas na Tabela 2. Na avaliação
prévia da USG, 115 (95,8%) mulheres não mostravam
alterações na cavidade uterina, e 5 (4,2%) apresentavam as
seguintes anormalidades: 4 (3,3%) miomas submucosos,
todos confirmados pela HSN e em 1 (0,8%) caso o pólipo
não foi visualizado pela HSN. Entretanto, a HSN observou
que 92 (76,7%) mulheres apresentavam cavidade uterina
sem alterações, e em 28 (23,3%) foram detectadas 36 alterações, 5 mulheres apresentavam mais de uma alteração
na cavidade uterina. As anormalidades visualizadas na
HSN foram: 15 (12,5%) pólipos, 9 (7,5%) alterações do
Tabela 1. Características clínicas dos casais candidatos às técnicas de reprodução
assistida
Características
n
Idade (anos) (média±DP)
Fator feminino
%
35,9±4,2
73
60,8
Tubária
54
45,0
Laqueadura*
19
15,8
Resultados
Ovulatório
17
14,2
Peritoneal
9
7,50
A HSN foi realizada em 120 mulheres, das 122
selecionadas para o estudo. Apesar da dificuldade para
introduzir o cateter em seis mulheres (4,9%), só em duas
(1,6%) não foi possível realizar o procedimento, sendo
então excluídas do estudo. As 120 mulheres apresentavam média de idade de 35,9±4,2 anos, variando de 25,8
a 46,8 anos, 82,5% tinham 40,0 anos ou menos. Durante
a realização da HSN não ocorreu nenhuma complicação
maior. Houve apenas um episódio de hipotensão postural
em uma mulher com histórico de síndrome do pânico.
Uterino
8
6,70
ISCA
3
2,50
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(3):122-7
Fator masculino
62
51,7
Vasectomia*
14
11,7
Fator feminino + masculino
15
12,5
Infertilidade primária
73
60,8
Infertilidade secundária
47
39,2
*A esterilização cirúrgica representa 27,5% das causas; ISCA: Infertilidade sem
causa aparente; DP: desvio padrão.
Acurácia da histerossonografia versus ultrassonografia transvaginal em mulheres inférteis candidatas às técnicas de reprodução assistida
Tabela 2. Comparação entre os resultados observados pela ultrassonografia transvaginal e
histerossonografia em mulheres inférteis candidatas às técnicas de reprodução assistida
Cavidade uterina
USG
HSN
n
%
n
%
115
95,8
92
76,7
Alterada*
5
4,2
28
23,3
Pólipo endometrial
1
0,8
15
12,5
Formato alterado da cavidade uterina
0
0,0
9
7,5
Mioma submucoso
4
3,3
6
5,0
Espessura endometrial anormal
para a fase do ciclo
1
0,8
4
3,3
Septo uterino
0
0,0
2
1,7
Normal
*Cinco mulheres apresentavam mais de uma alteração na cavidade uterina;
USG: Ultrassonografia transvaginal, HSN: Histerossonografia.
formato da cavidade uterina, 6 (5,0%) miomas submucosos,
4 (3,3%) espessamento endometrial anormal para a fase
do ciclo menstrual e 2 (1,7%) septos uterinos.
A HSN mostrou alterações na cavidade uterina de 24
mulheres inférteis candidatas à TRA, as quais não tinham
sido observadas previamente pela USG e confirmou os
4 casos de mioma submucoso visualizados pela USG,
o pólipo visto pela USG não foi observado pela HSN
(Tabela 2). Portanto, a HSN foi capaz de detectar mais
alterações na cavidade uterina do que a USG, diferença
significativa (p=0,002).
Discussão
A avaliação da cavidade uterina, para a detecção de
anormalidades que possam interferir na implantação embrionária ou na evolução da gravidez, é uma importante
etapa na preparação das mulheres que serão submetidas
a tratamento com as TRA, justificada pela incidência
relativamente alta dessas anormalidades.
Não há dúvida que a HSN é um procedimento que fornece melhor avaliação da cavidade uterina quando comparada
à ultrassonografia. Contribui com informações adicionais,
em mulheres inférteis, quanto à profundidade da alteração,
morfologia da cavidade uterina, do útero e dos ovários, o
que não é possível avaliar pela histeroscopia6,8,12,20.
Na análise das características clínicas dos casais estudados, candidatos às TRA, chama-nos a atenção o elevado
percentual da infertilidade decorrente de vasectomia (11,7%)
e laqueadura tubária (15,8%). Esse é um dado preocupante,
visto que 27,5% dos casais no presente estudo foram submetidos a tratamento de alta complexidade pós-esterilização
cirúrgica. E é um alerta para que a contracepção definitiva
seja muito bem avaliada antes da sua realização.
Os resultados do presente estudo demonstram que a
HSN é superior à USG para detectar alterações na cavidade
endometrial. O elevado percentual de alterações da cavidade
uterina detectadas pela HSN (23,3%) em relação à USG
(4,2%) mostra a importância e a necessidade de realizar a
HSN, rotineiramente, em todas as mulheres candidatas à
TRA, pois trata-se de procedimento de alta complexidade e
custo elevado. Apesar de nosso estudo apresentar limitações
que não podem deixar de ser levadas em consideração, visto
que a USG prévia foi realizada por diferentes observadores
e equipamentos, mostra, entretanto, que este resultado
traduz a realidade da nossa prática clínica diária; justifica
a diferença estatisticamente significante observada entre
a USG e HSN e reforça que HSN deve ser realizada antes
de um procedimento de alto custo como a TRA. Esses
nossos resultados estão de acordo com estudos prévios que
mostram que a HSN tem mais acurácia que a USG para
identificar alterações intracavitárias, como mioma e pólipo20,
e revela a alta precisão da HSN em detectar anormalidades
da cavidade uterina em mulheres inférteis8,19. Entretanto,
esses resultados diferem dos observados em outro estudo,
o qual conclui que a HSN não contribui com achados
adicionais quando a USG é normal, mas é benéfica se a
USG é anormal em mulheres inférteis16.
Dentre as alterações da cavidade uterina, observadas
pela HSN nas mulheres no nosso estudo, o pólipo endometrial foi o achado mais prevalente, com percentual
de 12,5%. Esse resultado é coerente com outros estudos
que mostram maior frequência de pólipo endometrial em
mulheres submetidas à TRA com falha de implantação
embrionária12,18. A realização da polipectomia antes da
TRA diminui o cancelamento da TRA9 e melhora a taxa
de gravidez quando comparada às que não realizaram esse
procedimento9,12.
As alterações da cavidade uterina são consideradas
causas tanto de falha de implantação quanto de perda
gestacional precoce e abortamento. A presença de pólipo endometrial tem sido relatada em mais de 10%
das mulheres assintomáticas no menacme e em até 32% das
mulheres inférteis que se submetem à FIV8. Apesar de
controverso e de não estar bem claro, o mecanismo pelo
qual o pólipo é responsável por parte do insucesso dos
procedimentos de TRA seria decorrente da diminuição
da área de implantação, alteração do volume da cavidade
uterina ou produção significativamente aumentada de
glicoproteínas e citocinas21. A alteração do formato da
cavidade uterina, visualizada nas mulheres do nosso estudo, é um resultado interessante que não tem sido descrito
em estudos anteriores, mas é possível que essa alteração
possa influenciar na implantação embrionária e justificar
a infertilidade desse grupo de mulheres inférteis.
No presente estudo, a HSN detectou 5% de miomas
submucosos, enquanto o USG, 3,3%. Esse dado é compatível com o trabalho de Grimbizis et al.20, que mostrou
que HSN tem mais valor que a USG no diagnóstico de
mioma e pólipo endometrial. Miomas são frequentemente
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(3):122-7
125
Vilela JR, Cardoso MTO, Franco Júnior JG , Pontes A
encontrados em mulheres em idade reprodutiva. Sua localização e o tamanho interferem diretamente nas taxas de
gravidez e podem acarretar um aumento de complicações
durante a gestação, como perda gestacional precoce e parto
prematuro22. A falha de implantação em mulher com mioma
deve-se à alteração da vascularização e à reação inflamatória
local devido à produção de substâncias vasoativas e à presença
excessiva de androgênios no endométrio23,24.
No nosso estudo, a presença de dois septos intrauterinos
não observados pela USG enfatiza a importância da HSN
em identificar anomalias uterinas como útero septado19.
As malformações mulerianas também comprometem a
implantação embrionária e são causa de perda gestacional, abortamento precoce, tardio e parto prematuro. A
maioria dessas malformações não é passível de correção ou
não há comprovação científica da eficácia dessa correção;
exceção para o septo uterino, que deve ser tratado antes
de qualquer tentativa de gravidez, assim como outras
malformações menos frequentes.
O diagnóstico do septo uterino, bem como o da
sinéquia, é difícil, e pouco provável que sejam feitos por
USG; porém, são facilmente detectados por HSN. O
procedimento indicou sensibilidade de 77,8 e 75% para
detecção destas malformações, contra 44,4 e 0% observados
pela HSG e a USG, respectivamente. No entanto, esse
estudo mostrou um elevado índice de falso-positivo25. A
taxa elevada de falso-positivo na HSN pode ser explicada
pela facilidade de as sinéquias mucosas serem desfeitas,
tanto pela ação mecânica direta da camisa da ótica, quanto
indireta pela maior distensão da cavidade (com gás ou
líquido) necessária para a HTDx.
A HSN é procedimento ambulatorial, “menos invasivo”, de melhor custo-benefício, com melhor acurácia e
especificidade na identificação de anomalias da cavidade
uterina, como útero septado e bicorno, quando comparada
à HSG ou HTDx em mulheres com história de perda
gestacional recorrente, infertilidade ou diagnóstico prévio
de anomalia uterina19.
Qualquer exame diagnóstico é passível de falha ou
impossibilidade de execução. A estenose cervical pode ser
causa impeditiva para a realização tanto da HSN quanto
da HTDx, pela impossibilidade de adentrar a cavidade
uterina. Portanto, a estenose cervical não é diagnóstico
da HSN e sim causa de impossibilidade de realização do
exame. Em nosso estudo, houve dificuldade para introduzir
o cateter em 4,9% das mulheres.
Quando comparada com a HTDx, considerada padrão
ouro para avaliação da cavidade uterina, a HSN é mais bem
tolerada, menos invasiva e menos onerosa5,10. É superior à
HSG para a detecção de anormalidades da cavidade uterina, além de não haver exposição à radiação e nem utilizar
contraste iodado, o que diminui os risco do exame25,26.
O baixo índice de complicações é uma de outras vantagens da HSN. Em uma revisão foram relatadas apenas 5
complicações em 2.278 procedimentos. É extremamente
difícil avaliar o valor da HSN em mulheres inférteis através das taxas de gravidez, devido às inúmeras variáveis
envolvidas na infertilidade como: causa de infertilidade,
idade da mulher e do casal, doenças concorrentes, qualidade embrionária, estrutura do laboratório e protocolos de
tratamento. E não se pode afirmar que todas as alterações
encontradas causariam prejuízo à receptividade endometrial
e à implantação embrionária se não fossem tratadas.
Os resultados do presente estudo confirmam dados
da literatura em que a HSN é mais efetiva que a USG na
detecção de alterações intracavitárias, em mulheres inférteis, e que este exame deveria ser realizado rotineiramente
antes das TRA. A HSN poderá ser facilmente incorporada
na propedêutica das candidatas às TRA e contribuir para
reduzir as falhas de implantação embrionária e, consequentemente, diminuir custos financeiros e emocionais
a casais que irão se submeter à TRA.
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Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(3):122-7
127
Ana Gabriela Pontes1
Marta Francis Benevides Rehme²
Maria Thereza Albuquerque Barbosa Cabral Micussi3
Técia Maria de Oliveira Maranhão4
Walkyria de Paula Pimenta5
Lídia Raquel de Carvalho6
Anaglória Pontes7
Artigo original
A importância do teste de tolerância à glicose
oral no diagnóstico da intolerância à glicose e
diabetes mellitus do tipo 2 em mulheres com
síndrome dos ovários policísticos
The importance of oral glucose tolerance test in diagnosis of glucose
intolerance and type 2 diabetes mellitus in women with polycystic
ovary syndrome
Resumo
Palavras-chave
Diabetes mellitus
Intolerância à glucose/diagnóstico
Obesidade
Síndrome do ovário policístico
Keywords
Diabetes mellitus
Glucose intolerance/diagnosis
Obesity
Polycystic ovary syndrome
OBJETIVO: Avaliar a importância do teste de tolerância à glicose oral (TTGO) no diagnóstico da intolerância à
glicose (IG) e diabetes mellitus do tipo 2 (DM-2) em mulheres com SOP. MÉTODOS: Estudo retrospectivo em que foram
incluídas 247 pacientes portadoras de SOP, selecionadas de forma aleatória. O diagnóstico de IG foi obtido por
meio do TTGO de duas horas com 75 gramas de glicose de acordo com os critérios do World Health Organization
(WHO) (IG: glicemia plasmática aos 120 minutos ≥140 mg/dL e <200 mg/dL); e o de DM-2 tanto pelo TTGO
(DM: glicemia plasmática aos 120 minutos ≥200 mg/dL) quanto pela glicemia de jejum segundo os critérios da
American Diabetes Association (glicemia de jejum alterada: glicemia plasmática ≥100 e <126 mg/dL; DM: glicemia
de jejum ≥126 mg/dL). Para comparar o TTGO com a glicemia de jejum foi aplicado o modelo de regressão logística
para medidas repetidas. Para a análise das características clínicas e bioquímicas das pacientes com e sem IG e/ou
DM-2 foi utilizada a ANOVA seguida do teste de Tukey. O valor p<0,05 foi considerado estatisticamente significante.
RESULTADOS: As pacientes com SOP apresentaram média etária de 24,8±6,3 e índice de massa corpórea (IMC)
entre 18,3 e 54,9 kg/m² (32,5±7,6). O percentual de pacientes obesas foi de 64%, de sobrepeso 18,6%, e peso
saudável 17,4%. O TTGO identificou 14 casos de DM-2 (5,7%), enquanto a glicemia de jejum detectou somente três
casos (1,2%), sendo que a frequência destes distúrbios foi maior com o aumento da idade e IMC. CONCLUSÕES: Os
resultados do presente estudo demonstram a superioridade do TTGO em relação à glicemia de jejum em diagnosticar
DM-2 em mulheres jovens com SOP e deve ser realizado neste grupo de pacientes.
Abstract
PURPOSE: To evaluate the importance of the oral glucose tolerance test for the diagnosis of glucose intolerance (GI) and
type 2 diabetes mellitus (DM-2) in women with PCOS. METHODS: A retrospective study was conducted on 247 patients
with PCOS selected at random. The diagnosis of GI was obtained from the two-hour oral glucose tolerance test with 75 g
of glucose according to the criteria of the World Health Organization (WHO) (GI: 120 minutes for plasma glucose ≥140
mg/dL and <200 mg/dL), and the diagnosis of DM-2 was obtained by both the oral glucose tolerance test (DM: 120
minutes for plasma glucose ≥200 mg/dL) and fasting glucose using the criteria of the American Diabetes Association
(impaired fasting glucose: fasting plasma glucose ≥100 and <126 mg/dL; DM: fasting glucose ≥126 mg/dL). A logistic
regression model for repeated measures was applied to compare the oral glucose tolerance test with fasting plasma
glucose. ANOVA followed by the Tukey test was used for the analysis of the clinical and biochemical characteristics of
patients with and without GI and/or DM-2. A p<0.05 was considered statistically significant. RESULTS: PCOS patients
had a mean age of 24.8±6.3, and body mass index (BMI) of 18.3 to 54.9 kg/m2 (32.5±7.6). The percentage of
obese patients was 64%, the percentage of overweight patients was 18.6% and 17.4% had healthy weight. The oral
glucose tolerance test identified 14 cases of DM-2 (5.7%), while fasting glucose detected only three cases (1.2%),
and the frequency of these disorders was higher with increasing age and BMI. CONCLUSIONS: The results of this
study demonstrate the superiority of the oral glucose tolerance test in relation to fasting glucose in diagnosing DM-2 in
young women with PCOS and should be performed in these patients.
Correspondência
Ana Gabriela Pontes Santos
Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da
Faculdade de Medicina de Botucatu
Distrito de Rubião Júnior s/n
CEP 18618-970
Botucatu (SP), Brasil
Recebido
24/10/2011
Aceito com modificações
20/01/2012
Trabalho realizado no Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina de Botucatu da Universidade Estadual
Paulista “Júlio de Mesquita Filho” – UNESP – Botucatu (SP), Brasil.
1
Programa de Pós-graduação em Ginecologia, Obstetrícia e Mastologia da Faculdade de Medicina de Botucatu da Universidade
Estadual Paulista “Julio de Mesquita Filho” – UNESP – Botucatu (SP), Brasil.
2
Departamento de Tocoginecologia da Universidade Federal do Paraná – UFPR – Curitiba (PR), Brasil.
3
Departamento de Fisioterapia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN – Natal (RN), Brasil.
4
Departamento de Tocoginecologia e Programa de Pós-graduação em Ciências da Saúde da Universidade Federal do Rio Grande do
Norte – UFRN – Natal (RN), Brasil.
5
Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina de Botucatu da Universidade Estadual Paulista “Julio de Mesquita Filho” –
UNESP – Botucatu (SP), Brasil.
6
Departamento de Bioestatística do Instituto de Biociências da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” – UNESP –
Botucatu (SP), Brasil.
7
Programa de Pós-graduação em Ginecologia, Obstetrícia e Mastologia do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade
de Medicina de Botucatu da Universidade Estadual Paulista “Julio de Mesquita Filho” – UNESP – Botucatu (SP), Brasil.
A importância do teste de tolerância à glicose oral no diagnóstico da intolerância à glicose e diabetes mellitus do tipo 2 em mulheres com síndrome dos ovários policísticos
Introdução
A síndrome dos ovários policísticos (SOP) é uma
endocrinopatia comum durante o menacme, caracterizada
pela anovulação crônica (oligomenorreia ou amenorreia),
hiperandrogenismo e morfologia ovariana policística1.
Mulheres com SOP apresentam risco elevado para intolerância à glicose (IG) e diabetes mellitus do tipo 2 (DM-2)2-4.
Por este motivo, o rastreamento para as alterações do metabolismo da glicose é recomendado para todas as pacientes com SOP5,6. O DM é um problema de saúde pública,
sendo que a SOP é considerada um fator predisponente
para o desenvolvimento do DM-27. A American Diabetes
Association (ADA)8 recomenda a glicemia de jejum para o
rastreamento do DM na população geral, embora este exame
não se aplique a mulheres com SOP, que subdiagnostica
os casos de DM-22,8.
O exame padrão utilizado para o rastreamento do
DM-2 na SOP é o teste de tolerância à glicose oral (TTGO)
de duas horas6. Controvérsias existem quanto à utilização
do TTGO no rastreamento do DM-2 na SOP, ou seja, se
este deve ser realizado em todas as pacientes5, somente nas
obesas9, ou na presença de fatores de risco como a idade
≥45 anos, obesidade, adiposidade abdominal, resistência
à insulina e história familiar de DM10.
Levando-se em consideração estes dados, o objetivo
do presente estudo foi avaliar a importância da utilização
do TTGO para o diagnóstico da IG e DM-2 em mulheres
com SOP.
Métodos
Foram analisadas, retrospectivamente, 247 mulheres
selecionadas de forma aleatória, portadoras de SOP, seguidas
no Ambulatório de Ginecologia Endócrina do Hospital
das Clínicas da Faculdade de Medicina de Botucatu, no
período de 1997 a 2007. O estudo foi aprovado pelo
Comitê de Ética e Pesquisa (CEP) do referido hospital
sob n° 639/2006.
Foram incluídas mulheres com idade compreendida
entre 12 e 40 anos, que apresentavam menarca há pelo
menos dois anos, e com o diagnóstico de SOP pelos
critérios estabelecidos pelo consenso de Rotterdam1,
que compreende a presença de pelo menos dois dos três
critérios seguintes: oligomenorreia e/ou amenorreia,
sinais clínicos (hirsutismo e/ou acne) e/ou bioquímicos
(elevação dos níveis séricos de testosterona); e morfologia
ovariana policística (presença de 12 ou mais folículos em
cada ovário medindo entre 2 e 9 mm de diâmetro e/ou
volume ovariano ≥10 mm3.
Foram excluídas pacientes que apresentassem outras doenças que cursavam com anovulação crônica e/ou
hiperandrogenismo (hiperprolactinemia, distúrbios da
tireoide, hiperplasia adrenal congênita de início tardio,
síndrome de Cushing e tumores produtores de androgênios de origem adrenal ou ovariana), e as que estivessem
em uso de qualquer medicação que interferisse no eixo
hipotálamo-hipófise-ovário há menos de 90 dias.
Em todas as pacientes foram avaliados: o padrão
menstrual (a amenorreia foi definida por ausência de
menstruação por no mínimo três meses e a oligomenorreia,
menstruações com intervalo menor que 35 dias e inferior
a 90 dias); o histórico familiar de diabetes; o índice de
Ferriman-Gallwey modificado11 (a paciente foi considerada hirsuta quando o somatório das áreas foi maior ou
igual a 8); a acantosis nigricans foi pesquisada em regiões
de dobras como a nuca, axila, região inframamária e raiz
de coxas12; na presença de acne, a paciente foi classificada
em três graus13. Para circunferência da cintura (CC), foi
considerada a medida da cintura na menor circunferência entre o rebordo costal e a crista ilíaca com limite de
corte de 80 cm14; o Índice de Massa Corpórea (IMC) foi
calculado por meio do índice de Quetelet15, cujo valor é
obtido pela razão peso/estatura2, considerando peso normal
nos valores entre 18,5 e 24,9, sobrepeso entre 25 e 29,9
e obesidade acima de 30 kg/m2.
A Testosterona total e a dehidroepiandrosterona
sulfato (DHEA-S) foram dosadas pelo método de quimioluminescência no equipamento Immulite 2000®
(Diagnostic Products Corporation – Los Angeles CA, EUA)
e com valor de normalidade de até 80 ng/dL e 600 µ/dL,
respectivamente, para testosterona total e DHEA-S.
O diagnóstico de IG e DM tipo 2 foi realizado pelo teste
de tolerância à glicose com 75 gramas de glicose anidra,
sem restrição calórica, por via oral, dissolvida em 300 mL
de água, entre 8 e 9 horas da manhã, após jejum noturno
de 12 horas. A solução foi ingerida em um tempo máximo
de cinco minutos. Amostras de sangue para dosagem de
glicemia foram obtidas imediatamente, antes e após 120
minutos da ingestão de glicose por via oral. A concentração
plasmática de glicose foi determinada pelo teste enzimático
calorimétrico da glicose – oxidase no equipamento Vitrus
modelo 950 (Johnson e Johnson®), e o resultado expresso
em mg/dL. Os distúrbios do metabolismo da glicose foram classificados de acordo com critérios do World Health
Organization (WHO)16 (IG: glicemia plasmática aos 120
minutos ≥140 e <200 mg/dL; DM: glicemia plasmática
aos 120 minutos ≥200 mg/dL) e de acordo com as recomendações da American Diabetes Association (ADA)8, que
utiliza a glicemia de jejum (glicemia de jejum alterada:
glicemia plasmática ≥100 e <126 mg/dL; DM: glicemia
plasmática de jejum ≥126 mg/dL).
Dentre as dosagens bioquímicas, foi investigado o colesterol total (CT), HDL-colesterol (HDL-C), LDL-colesterol
(LDL-C) e triglicerídeos (TG), realizados pelo método de
química seca, no Vitrus 950. Considerou-se como valores
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(3):128-32
129
Pontes AG, Rehme MFB, Micussi MTABC, Maranhão TMO, Pimenta WP, Carvalho LR, Pontes A
normais, CT igual ou abaixo a 200 mg/dL, HDL-C maior
ou igual a 50 mg/dL, LDL-C abaixo de 100 mg/dL e TG
abaixo de 150 mg/dL17.
As variáveis que apresentaram distribuição normal pelo
teste de Kolmogorov-Smirnov foram expressas em médias,
desvio-padrão (±), e em frequências (%), e o triglicerídeo
(TG) que não teve distribuição normal foi apresentado em
mediana e quartis. Para comparar o TTGO com a glicemia
de jejum foi aplicado o modelo de regressão logística para
medidas repetidas. Para análise das características clínicas
e bioquímicas das pacientes com e sem IG e/ou DM-2 foi
utilizada a análise de variância (ANOVA) seguida do teste
de Tukey para as variáveis normais, e para o TG foi ajustado
um modelo linear generalizado assumindo distribuição
gama e função de ligação logarítmica, seguido de teste
de comparações múltiplas (LSmeans test). O p<0,05 foi
considerado estatisticamente significante. Foi utilizado o
programa Statistical Analysis System (SAS), for Windows,
versão 9.2 (SAS, Inc.North-Caroline-Cary).
Resultados
Tabela 1. Características epidemiológicas, clínicas e bioquímicas em 247 mulheres com SOP
Parâmetro
Valores
n (%)
24,8±6,3
Amenorreia
189 (76,5)
Oligomenorreia
53 (21,5)
Hirsutismo
185 (75,0)
Acantosis nigricans
123 (49,6)
IMC
32,5±7,6
Circunferência da cintura (cm)
191 (77,3)
Obesidade
158 (64,0)
Sobrepeso
46 (16,6)
Peso saudável
43 (17,4)
História familiar de diabetes
141 (57,0)
Testosterona total (ng/dL)
162 (65,6)
DHEA-S (µg/dL)
192,4±99,0
IMC: índice de massa corporal; DHEA-S: dehidroepiandrosterona sulfato;
DP: desvio padrão
As pacientes apresentaram mais de um sinal e/ou sintoma.
Tabela 2. Frequência de glicemia de jejum alterada, intolerância à glicose e diabetes
mellitus tipo 2 em pacientes com SOP, de acordo com a glicemia de jejum e TTGO
Glicemia de Jejum
130
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(3):128-32
TTGO
n
%
n
%
Valor
p
Normal
221
89,5
208
84,2
0,002
Glicemia de jejum alterada
-
Categoria
As características clínicas e bioquímicas das pacientes com SOP estão apresentadas na Tabela 1. A média
de idade das 247 mulheres com SOP foi de 24,8±6,3
(12–40 anos) e do IMC de 32,5±7,6 kg/m2 (18,3–54,9).
Destas, 64% (158/247) eram obesas, 18,6% (46/247)
tinham sobrepeso e 17,4% (43/247) apresentavam peso
saudável. A história familiar de diabetes mellitus foi relatada
em 57% (141/247) dos casos, e este percentual foi maior
nas pacientes com IG (60,0%) e DM-2 (71,4%) do que
nas euglicêmicas (30,4%).
O TTGO mostrou significativamente maior frequência
de DM-2 (5,7%) do que a glicemia plasmática de jejum
(1,2%), e diagnosticou 10,1% de IG. A glicemia de jejum
detectou 89,5% (221/247) de mulheres euglicêmicas,
enquanto o TTGO diagnosticou 84,2% (208/247), ou
seja, maior número de alterações do metabolismo da
glicose nestas pacientes com SOP (Tabela 2). Entre as
pacientes obesas (158/247) observou-se 23 casos de IG e
13 de DM-2. Uma com sobrepeso (46/247) apresentou
IG, e outra, DM-2. Em uma paciente com peso saudável
(43/247) detectou-se IG.
As características clínicas e bioquímicas analisadas
em relação à ausência ou presença de anormalidades
do metabolismo da glicose, de acordo com o TTGO,
estão representadas na Tabela 3. As mulheres com IG e
DM-2 apresentaram maior idade, IMC e circunferência
da cintura e valores de triglicerídeos significativamente
maiores (p<0,0001) do que aquelas com tolerância normal à glicose. Não houve diferença significativa entre as
pacientes com ou sem IG e/ou DM-2 quanto aos valores
de testosterona total, CT e LDL-C.
média±DP
Idade
23
9,3
-
-
IG
-
-
25
10,1
-
DM-2
3
1,2
14
5,7
0,002
247
100
247
100
Total das pacientes avaliadas
IG: Intolerância à glicose; DM-2: diabetes mellitus tipo 2; Nota: *p significativo
<0,05 com aplicação do modelo de regressão logística para medidas repetidas.
(valores de referência: glicemia de jejum: glicemia de jejum alterada ≥100 e
<126 mg/dL e DM-2: ≥126 mg/d;TTGO: glicemia aos 120 minutos ≥140 e
<200 mg/dL; DM-2: glicemia aos 120 minutos ≥200 mg/dL).
Tabela 3. Características clínicas e bioquímicas das 247 pacientes com SOP com o diagnóstico
de tolerância normal à glicose, intolerância à glicose e diabetes mellitus tipo 2 de acordo
com o teste de tolerância à glicose oral
Parâmetro
Nº de pacientes
Tolerância à
glicose normal
Intolerância
à glicose
Diabetes
mellitus
Valor p
208
25
14
Idade (anos)
23,8±5,9b
29,4±6,6a
31,8±5,84a
IMC (kg/m2)
31,7±7,53b
36,3±6,3a
38,2±6,0a
0,0002
CC (cm)
92,6±15,9b
106,2±13,8a
107,4±12,4a
<0,0001
Testosterona total (ng/dL)
98,5±48,0a
125,1±111,2a
116,5±46,7a
0,06
Colesterol total (mg/dL)
180,6±34,9
191,8±52,7
203,6±37,0
0,06
HDL-C (mg/dL)
46,6±13,1b
38,1±11,2a
34,7±10,9a
0,0001
a
Triglicerídeos (mg/dL)*
108,0
(77,0;156,0)b
LDL-C (mg/dL)
111,3±30,0a
a
<0,0001
a
167,0
242,0
<0,0001
(108,0;279,0)a (172,0;361,0)a
116,5±49,5a
133,0±39,9a
0,09
*para o triglicerídeo foi ajustado um modelo linear generalizado assumindo distribuição
gama e função de ligação logarítmica seguido de teste de comparações múltiplas
(LSmeans test); a,bMédias com mesma letra não diferem estatisticamente.
IMC: índice de massa corporal; CC: circunferência cintura; HDL-C: High-densit
lipoprotein cholesterol; LDL-C: Low-density lipoprotein cholesterol; ISI: Índice de
sensibilidade à insulina. p<0,05 com aplicação de análise de variância (ANOVA)
seguida do teste de Tukey para variáveis com distribuição normal.
A importância do teste de tolerância à glicose oral no diagnóstico da intolerância à glicose e diabetes mellitus do tipo 2 em mulheres com síndrome dos ovários policísticos
Discussão
Os resultados do presente estudo demonstram a superioridade do TTGO em relação à glicemia de jejum em
detectar IG e DM-2 em mulheres jovens com SOP. Estes
dados são consistentes com estudos prévios que mostram
a necessidade de realização do TTGO em mulheres com
SOP2,5,18,19, e demonstram que a glicemia de jejum subdiagnóstica e é relativamente insensível na SOP, pois as
pacientes com SOP e IG podem apresentar glicemia de
jejum normal2,8.
Apesar de observarmos que as mulheres obesas com
SOP apresentaram maior frequência de IG 14,5% (23/158)
e DM-2 8,2% (13/158), não podemos deixar de levar em
consideração um caso de IG detectado em uma paciente
com peso saudável, e em outra, com sobrepeso, além de
um caso de DM-2 em uma mulher com sobrepeso. Estes
dados ressaltam a importância de se realizar o TTGO em
mulheres com SOP, uma vez que a IG é considerada um
importante preditor de DM-220.
As frequências de IG (10,1%) e DM-2 (5,7%)
utilizando-se o TTGO observada no presente estudo, são
superiores às encontradas para a população geral (2,7 e
3,0%) em mulheres brasileiras da mesma faixa etária21,22.
Porém, são inferiores à descrita em um grupo de pacientes
com SOP obesas que apresentaram 30,5% de IG e 13,3%
de DM-2 versus SOP não obesas (12,2x4,4%) de Ribeirão
Preto – (SP)23, mas comparáveis à frequência de DM-2
(4,8%) em mulheres com SOP na cidade de São Paulo18,
e também as verificadas em pacientes australianas com
SOP (15,6% IG e 4,0% de DM-2)3.
As alterações do metabolismo da glicose na SOP
variam de acordo com a população estudada e com o critério utilizado para realizar o diagnóstico de diabetes. É
conhecida a influência dos fatores genéticos, ambientais e
estilo de vida na frequência destes distúrbios 24,25. Nossos
resultados também mostram que a IG e DM-2 aumentam
com a idade e o IMC, conforme descritos anteriormente
em populações com SOP de origem americana, australiana,
brasileira, italiana e espanhola2,3,23,26,27. É conhecido que a
obesidade e o aumento da idade são fatores clássicos para
o desenvolvimento do DM-2, decorrente da exacerbação
da resistência à insulina que predispõe ao aparecimento
das anormalidades do metabolismo da glicose28. A história familiar de DM elevada neste grupo de mulheres
jovens com SOP demonstra a relevância deste fator no
desenvolvimento do DM.
O aumento do TG e a diminuição do HDL-C verificada neste estudo, associada ao aumento do IMC, são
consonantes com outros autores29,30. A obesidade e a resistência à insulina presente na maioria das portadoras de
SOP está associada à disfunção endotelial, que apresenta
como um dos mecanismos fisiopatogênicos, a elevação dos
ácidos graxos livres e dos triglicerídeos, predispondo estas
mulheres a um aumento de risco cardiovascular31.
É importante salientar que a maioria das pacientes
incluídas no presente estudo apresentaram a forma clássica
da SOP (oligoanovulação e hiperandrogenismo) e eram
obesas, e estas características podem ter influenciado
no aparecimento precoce da IG e DM-2 neste grupo de
pacientes com SOP.
Apesar das divergências sobre o TTGO ser realizado em
todas mulheres com SOP 9,10,19, o presente estudo demonstra
que o TTGO identifica maior número de anormalidades
do metabolismo da glicose do que a glicemia de jejum, e
deve ser realizado em pacientes com SOP. A oportunidade
de se diagnosticar IG e DM-2 em pacientes jovens com
SOP pode beneficiar estas mulheres com modificações do
estilo de vida e intervenções médicas e contribuir para a
prevenção do DM a longo prazo.
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Mariana de Almeida Pinto Borges1
Maria Lucia Elias Pires2
Denise Leite Maia Monteiro3
Suely Rodrigues dos Santos4
Forma atípica da síndrome de Mayer-RokitanskyKuster-Hauser com malformação renal e
displasia cervicotorácica (associação de MURCS)
Atipical form of Mayer-Rokitansky-Kuster-Hauser syndrome with
renal malformation and skeletal abnormalities (MURCS association)
Relato de caso
Resumo
Palavras-chave
Útero/anormalidades
Vagina/anormalidades
Rim/anormalidades
Aberrações cromossômicas
Anormalidades múltiplas/genética
Amenorréia
Ductos de Muller/anormalidades
Relatos de casos
Keywords
Uterus/abnormalities
Vagina/abnormalities
Kidney/abnormalities
Chromosome aberrations
Abnormalities, multiple/genetics
Amenorrhea Mullerian ducts/abnormalities
Case reports
Correspondência
Mariana de Almeida Pinto Borges
Rua Mariz e Barros 775 – Tijuca
CEP: 20270-004
Rio de Janeiro (RJ), Brasil
Recebido
19/10/2010
Aceito com modificações
12/12/2011
A forma atípica e mais severa da síndrome Mayer-Rokitansky-Kuster-Hauser (MRKH) ou MRKH tipo II é também
conhecida como associação de MURCS, cujo mnemônico significa aplasia/hipoplasia mülleriana (MU), malformação
renal (R) e displasia cervicotorácica (CS). Acomete pacientes do sexo feminino com cariótipo e função ovariana
normais, acarretando amenorreia primária. Apresenta incidência de 1:50.000, subestimada pelo diagnóstico tardio
e etiologia mal definida. Descrevemos um caso em criança e outro em adolescente, com o objetivo de predizer o
diagnóstico ainda na infância, antes da instalação do quadro de amenorreia; as pacientes apresentavam em comum
malformação renal, agenesia ou hipoplasia de derivados müllerianos e anomalias vertebrais, configurando o diagnóstico
de MURCS. A relevância do estudo é mostrar a necessidade de prosseguir a investigação na presença de algum
dos sinais da doença, pesquisando anormalidades correlatas, a fim de se estabelecer o diagnóstico precocemente
e, consequentemente, orientar pacientes e seus familiares quanto à melhor forma de condução do caso, incluindo
aconselhamento genético.
Abstract
The atypical and more severe form of Mayer-Rokitansky-Kuster-Hauser syndrome (MRKH) or MRKH type II is also known
as MURCS association, an acronym meaning aplasia/hypoplasia of Müllerian ducts (MU), congenital renal dysplasia
(R) and cervico-thoracic dysplasia (CS). It affects female patients with normal karyotype and ovarian function, evolving
to primary amenorrhea. It has an incidence of 1:50,000, but it is underestimated due to late diagnosis and undefined
etiology. We describe the cases of a child and an adolescent in order to predict the diagnosis even in childhood,
before the onset of amenorrhea. Patients had in common renal malformation, agenesis or hypoplasia of Müllerian
derivatives and vertebral anomalies, establishing the diagnosis of MURCS. The relevance of this paper is to show the
importance of further investigation when some of pathologic signs are present, researching correlated abnormalities in
order to establish an early diagnosis and consequently to provide guidance to the patients and their families about the
best way to conduct the case, including genetic counseling.
Trabalho realizado no Hospital Universitário Gaffrée e Guinle da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro – UNIRIO – Rio
de Janeiro (RJ), Brasil.
1
Programa de Pós-graduação do Serviço de Endocrinologia do Hospital Universitário Gaffrée e Guinle, Universidade Federal do
Estado do Rio de Janeiro – UNIRIO – Rio de Janeiro (RJ), Brasil.
2
Escola de Medicina e Cirurgia, Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro – UNIRIO – Rio de Janeiro (RJ), Brasil.
3
Centro Universitário Serra dos Órgãos – UNIFESO – Teresópolis (RJ), Brasil; Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual
do Rio de Janeiro – UERJ – Rio de Janeiro (RJ), Brasil.
4
Curso de Pós-graduação em Endocrinologia do Hospital Universitário Gaffrée e Guinle, Universidade Federal do Estado do Rio de
Janeiro – UNIRIO – Rio de Janeiro (RJ), Brasil; Ambulatório de Genética do Hospital Universitário Gaffrée e Guinle, Universidade
Federal do Estado do Rio de Janeiro – UNIRIO – Rio de Janeiro (RJ), Brasil.
Borges MAP, Pires MLE, Monteiro DLM, Santos SRD
Introdução
A síndrome Mayer-Rokitansky-Kuster-Hauser
(MRKH) é caracterizada por aplasia congênita do
útero e dois terços superiores da vagina em mulheres
com cariótipo e características sexuais secundárias
normais, apresentando incidência de 1:4.500 meninas1.
A MRKH pode ocorrer de forma isolada (tipo I) ou
associada à malformação renal, vertebral e, em alguns
casos, defeitos cardíacos ou auditivos2,3, configurando a MRKH tipo II ou associação de MURCS, com
incidência de 1:50.000 meninas4. A ausência de dois
terços proximais da vagina e ausência ou hipoplasia
uterina ocorre em 96% dos casos, agenesia unilateral
ou ectopia de um ou ambos os rins (88% dos casos);
hidronefrose e rim em ferradura também podem ser
encontrados. Já as anomalias de esqueleto, como defeito
vertebral, envolvendo segmento cervical e/ou torácico,
especialmente entre C5-T1, ocorrem em 80% dos casos,
assim como assimetria, fusão de vértebras ou vértebra
em cunha, escoliose e anomalia de Klippel-Feil (fusão
de vértebras cervicais). Há relato na literatura da malformação da junção occipito-atlanto-axial, causando
hiperostose anquilosante senil vertebral em adolescente
com MURCS, com início precoce de limitações na
mobilidade da cabeça associadas à rigidez significativa
ao longo da coluna vertebral5. Entre os defeitos menos
frequentes, estão os auditivos e as anomalias cardíacas,
cuja severidade é variável6.
A constituição cromossômica é 46,XX, embora tenham sido descritos casos de disgenesia gonadal XY ou
monossomia X com os defeitos congênitos anteriormente
descritos6.
A associação de MURCS/MRKH parece ocorrer de
forma esporádica, mas há relatos de casos familiais7, com
herança autossômica dominante, penetrância incompleta
e expressividade variável6,8. Apesar da etiologia ainda
ser mal definida, as malformações encontradas sugerem defeitos no campo de desenvolvimento, durante
a embriogênese dos órgãos afetados, a partir da quarta
semana de gestação9-11. A patogênese está intimamente
associada à regressão dos ductos de Müller (paramesonéfricos), não tendo sido encontradas mutações ou
polimorfismos no gene codificador do hormônio antimülleriano (HAM) e em seu receptor, como também
não foi demonstrado aumento na concentração sérica
e na expressão de HAM3,7.
O diagnóstico é tardio na maioria dos casos, sendo a
amenorreia primária o principal motivo pela procura do
atendimento, o que posterga a detecção da patologia para
a época em que, geralmente, ocorre a menarca ou mesmo
para a fase adulta. Apesar disso, existem casos descritos na
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literatura com diagnóstico intraútero, em recém-nascida
e aos 7 meses de vida2,12-14.
O objetivo do estudo foi relatar dois casos de
associação de MURCS, ressaltando a possibilidade de
se predizer o diagnóstico ainda na infância, antes da
instalação do quadro de amenorreia, principalmente
quando outras malformações estiverem associadas,
e chamar a atenção dos profissionais envolvidos no
atendimento a essas pacientes, que, diante da presença
de um dos sinais da doença, impõe-se a realização
de procedimentos que identifiquem anormalidades
correlatas, a fim de se estabelecer o diagnóstico precocemente, possibilitando traçar a melhor forma de
condução do caso.
Métodos
Foi realizada ampla revisão da literatura médica disponível por meio de pesquisa na mídia digital,
utilizando-se as bases de dados: MEDLINE (por meio
do PubMed), Google acadêmico, SciELO e LILACS. Para
identificação de publicações no MEDLINE, foi utilizada
a seguinte estratégia de busca: (murcs [All Fields] AND
(“association”[MeSH Terms] OR “association”[All Fields]))
AND (“humans”[MeSH Terms] AND (“women”[MeSH
Terms] OR “female”[MeSH Terms])), sendo encontrados
45 artigos. Para a busca em outras bases, foram utilizados
os termos “MURCS association” e “associação de MURCS”.
A busca resultou no total de 54 artigos, publicados entre
1979 e 2011, que foram avaliados por dois revisores,
sendo selecionados 17 artigos além de três livros-textos
para a confecção desse estudo, visando à discussão dos
casos relatados.
Todas as informações descritas no relato dos
casos foram obtidas após consentimento informado
e assinado pelas mães das pacientes, seguindo as
orientações do Código de Ética Médica do Conselho
Federal de Medicina do Brasil (2009) e observando
os princípios éticos para pesquisa médica envolvendo
seres humanos, compilados na Declaração de Helsinki
e corrigida pela 52ª Assembleia Geral da Associação
Médica Mundial em Edimburgo (2009).
Relato dos casos
Primeiro caso
Paciente é filha de pais saudáveis, jovens e não
consanguíneos, nascida de parto vaginal, a termo, com
peso e estatura compatíveis com a idade gestacional, foi
encaminhada ao nosso serviço aos 6 anos de idade, para
investigar anomalia de Klippel-Feil. Ultrassonografia
(USG) realizada com 22 semanas de gestação revelou
imagem cística anexial à esquerda, que, no curso da
Forma atípica da síndrome de Mayer-Rokitansky-Kuster-Hauser com malformação renal e displasia cervicotorácica (associação de MURCS)
investigação, aos 6 anos, demonstrou tratar-se de rim
único ectópico, localizado em fossa ilíaca esquerda, vincariante, mas com função normal e topografia comprovada
em USG posterior (Figura 1C). Os dois achados fundamentaram a solicitação da USG (Figura 1B) e tomografia
computadorizada (TC) pélvicas, que não evidenciaram
estruturas müllerianas (útero e trompas). Ao exame físico, apresentava desenvolvimento intelectual normal,
epicanto, telecanto, hipertelorismo ocular, nariz pequeno,
aletas hipoplásicas, palato alto e estreito, pescoço curto
e alado, gradil costal a esquerda saliente, tórax largo e
curto, polegares largos, unhas em vidro de relógio, clinodactilia no quartoquirodáctilo esquerdo e mancha “café
com leite” em região axilar posterior direita. Atualmente,
aos 11 anos, desenvolvimento puberal M3P2G2 pelos
critérios de Tanner15, estatura de 1,40 m (P25)16 e peso
de 40,8 kg (P50-75)16. Radiografia de coluna (Figura 1A)
revelou hemivértebras e blocos vertebrais com lordose e
escoliose lombar discreta de convexidade para a direita.
Ecocardiograma identificou prolapso de valva mitral
com fração de ejeção de 80% e insuficiência mitral leve.
Avaliação otorrinolaringológica foi normal. Exames
laboratoriais: FSH: 2,88 mUI/mL; LH: 1,84mUI/mL;
relação LH/FSH: 0,64; TSH: 2,1 µUI/mL; T4livre:
1,02 ng/dL; Estradiol(E2): 10pg/mL. Cariótipo em
banda G: 50 metáfases 46,XX.
Rim esquerdo
Bexiga
Segundo caso
Paciente filha de pais saudáveis, jovens e não consanguíneos iniciou investigação em nosso serviço aos 14 anos por
apresentar amenorreia primária. Nasceu de parto vaginal, a
termo, com parâmetros antropométricos compatíveis com a
idade gestacional. Rim policístico à esquerda, visualizado à
USG durante pré-natal, aos 7 meses de gestação, evoluindo
para nefrectomia aos 10 anos de idade. Ecocardiograma, aos
8 anos, revelou discreta persistência de canal arterial, valva
mitral rudimentar com prolapso do folheto anterior e tendão
justo-septal. Ausência de alterações auditivas. Radiografia de
coluna demonstrava fusão parcial de C2-C3, hemivértebra
em T2, escoliose torácica angular para direita, fusão de arco
posterior C6-C7, redução da altura das metades esquerdas entre
T1-T2 e T2-T3 (escoliose), ângulo de Cobb na 15a vértebra
torácica. Ao exame físico, apresentava dismorfias faciais discretas e pescoço curto, não caracterizando síndrome genética
conhecida. Aos 14 anos, desenvolvimento puberal M-5/G-5,
conforme os critérios de Tanner15, estatura de 1,54 m (P25)16
e peso de 58 kg (P80)16, ausência de hipertrofia de clitóris,
clinodactilia no quinto quirodáctilo de ambas as mãos. Nessa
época, constatou-se: testosterona: 351pg/mL; FSH: 4,9 mUI/
mL; LH: 5,0 mUI/mL; E2: 87 pg/mL; estrona (E1): 109 pg/
mL; prolactina: 24 ng/mL; TSH: 5,04 µUI/mL; T4 livre:
8,1 ng/dL; anti-TPO: 6,7 UI/mL. USG de pelve: revelou
útero rudimentar (2,0x1,5x0,5 cm) (Figura 2D), presença
dos ovários (Figura 2A), rim único à direita (Figura 2C); foi
complementada pela ressonância magnética (RM) de pelve
(Figura 2B), que revelou útero rudimentar. Posterior à uretra,
observa-se pequeno canal de 2,5 cm de comprimento (canal
vaginal rudimentar); endométrio não visualizado. TC de crânio
sem alterações. Cariótipo: 50 metáfases 46,XX.
OvE
A
B
OvD
A
B
Rim direito
C
C
Figura 1. (A) Radiografia de coluna cervical; (B) ultrassonografia pélvica
que não evidenciou estruturas müllerianas (útero e trompas); (C) ultrassonografia visualizando rim esquerdo em fossa ilíaca
Útero à USG US
D
USG: ultrassonografia.
Figura 2. (A) Visualização dos ovários à ultrassonografia pélvica; (B)
visualização do útero rudimentar à ressonância magnética pélvica (C)
evidenciado ausência do rim esquerdo e visualização do rim direito
à ultrassonografia abdominal; (D) visualização do útero rudimentar
(2,0x1,5x0,5 cm) pela ultrassonografia pélvica
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Borges MAP, Pires MLE, Monteiro DLM, Santos SRD
Discussão
É de suma importância que MURCS faça parte da
avaliação diagnóstica diferencial em pacientes do sexo
feminino com malformações renais, genitais e/ou de coluna, que apresentem amenorreia primária, tendo em vista
que quanto mais precoce o diagnóstico, mais adequada
será a conduta2,6,9.
No primeiro caso relatado, foi possível estabelecer
o diagnóstico precoce da associação de MURCS, pois a
paciente foi encaminhada ao ambulatório de genética aos
6 anos de idade, apresentando deformidades na coluna
cervical, tipo Klippel-Feil e história de malformação renal, sendo solicitada e realizada a USG pélvica, que não
evidenciou estruturas müllerianas (Figura 1B). A confirmação diagnóstica foi realizada pelo cariótipo normal e
pelo fato de também não terem sido encontradas outras
comorbidades associadas.
A paciente adolescente já poderia ter tido esse
diagnóstico confirmado anteriormente, pois apresentou
malformação renal, sendo submetida à nefrectomia aos
10 anos, mas a investigação não prosseguiu. Foi encaminhada à endocrinologia somente aos 14 anos, por apresentar amenorreia primária, apesar do desenvolvimento
normal dos caracteres sexuais secundários. Foi, então,
solicitada investigação do esqueleto, que mostrou fusão
de vértebras e RM pélvica (Figura 2B), que detectou
útero rudimentar com agenesia de vagina. O cariótipo
também foi normal.
Anomalias ocasionais incluem baixa estatura, defeitos
nas costelas, defeitos em membros superiores, assim como
anomalia escapular de Sprengel. Nossas pacientes, porém,
não apresentavam nenhum desses defeitos. Achados incomuns incluem surdez, cisto cerebelar, defeitos de ouvido
externo, assimetria facial, lábio leporino, fenda palatina,
micrognatia, defeito gastrintestinal e defeitos de lateralidade17. Ambas foram submetidas às avaliações auditivas
e ecocardiográficas e, apesar de não apresentarem déficit
auditivo, havia em comum prolapso de válvula mitral.
Não há relato na literatura sobre a frequência de determinados defeitos cardíacos mais comuns ou específicos à
associação de MURCS18.
Para o ginecologista e o endocrinologista, a amenorreia
primária será o aspecto preponderante, e a integridade
da genitália interna e externa deve fazer parte da investigação inicial. Confirmada a ausência ou hipoplasia de
útero e vagina, deve ser realizada a dosagem hormonal,
a fim de se estabelecer o diagnóstico diferencial de
MURCS2,6,9 com as disgenesias gonadais, cujos resultados
são anormais quando comparados àqueles encontrados
na portadora da associação de MURCS. Outro aspecto
a ser levado em conta é a história familiar, na qual a
presença de outros casos semelhantes9, e a existência
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Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(3):133-8
de malformações renais e de esqueleto em parentes de
primeiro e segundo graus deve ser investigada, para
confirmar ou excluir as formas herdadas8,19 e, com isso,
possibilitar a investigação molecular, a fim de estabelecer qual é a mutação gênica envolvida e propiciar o
aconselhamento genético quando pertinente.
A história gestacional também deve ser considerada,
pois há correlação entre MURCS e diabetes gestacional6,
assim como por uso de talidomida na gravidez6,9; ambos são
fatores de risco para várias outras doenças. Não foi evidenciada a associação desses fatores em nossas pacientes.
Uma vez identificada a hipoplasia ou agenesia de
estruturas müllerianas, a USG abdominal total deve ser
realizada a fim de identificar anomalias renais10,18. No
entanto, a detecção de estrutura quadrangular retrovesical pode, erroneamente, ser identificada como útero
hipoplásico ou juvenil, o que, na verdade, corresponde
a vestígio laminar, localizado embaixo do peritônio
e transversalmente ao lado posterior da bexiga, no
qual se fixam os ligamentos uterossacrais6. A USG
morfológica pode ser útil no diagnóstico pré-natal, se
deformidades esqueléticas, renais ou cardíacas forem
detectadas19. Nossas pacientes apresentaram alterações
renais à USG pré-natal, sem evidência de outras malformações. Na fase pós-natal, confirmou-se, por esse
exame, rim único e pélvico em uma paciente, e rim
cístico com refluxo urétero-renal, que culminou em
nefrectomia, na adolescente. A avaliação da morfologia
da genitália interna foi consequência da deformidade
de Klippel-Feil e da presença de rim único e ectópico
na criança, hoje ciente de não apresentar menarca; a
RM foi fundamental para definir o aspecto morfológico
interno da paciente adolescente6, o que não foi possível à USG, porém a RM, por ser exame não invasivo,
prepondera sobre a celioscopia, procedimento invasivo
e, por vezes, necessário, quando, por exemplo, houver
suspeita de disgenesia gonadal XY, na qual a retirada
das gônadas se impõe6.
O diagnóstico diferencial depende da idade e da
presença do achado clínico. Na infância, as síndromes
de Turner e Noonan devem ser descartadas, pois ambas
levam a alterações cardíacas, esqueléticas e renais, mas a
primeira condição apresenta cariótipo anormal, enquanto
o hipogonadismo é encontrado em ambas as patologias.
Na adolescência, o espectro de patologias é mais amplo e
requer exame físico cuidadoso e a constatação de amenorreia
primária, a fim de excluir disgenesias gonadais puras XX
ou XY, assim como insensibilidade a androgênios; nesses
dois últimos casos, o cariótipo estabelece o diagnóstico e
a conduta terapêutica é cirúrgica2,9.
Em geral, o tratamento depende da gravidade das
malformações8. Do ponto de vista ginecológico, o tratamento é conservador e adiado até que a paciente esteja
Forma atípica da síndrome de Mayer-Rokitansky-Kuster-Hauser com malformação renal e displasia cervicotorácica (associação de MURCS)
pronta para iniciar a atividade sexual. O método usado
deve ser avaliado individualmente, levando sempre em
consideração a escolha da paciente, podendo incluir intervenção cirúrgica ou não.
Quando a paciente descobre a presença de malformação
congênita envolvendo seus órgãos reprodutores, é comum
o desenvolvimento de ansiedade e angústia sobre sua feminilidade, aparência física6,9 e capacidade reprodutora,
sendo fundamental apoio psicoterápico para a paciente,
assim como para seus familiares.
A associação de MURCS pode ser atribuída a alterações
no blastema, que dão origem aos somitos cervicotorácicos
e o ducto paramesonéfrico, cujas relações espaciais já estão
determinadas na embriogênese até a quarta semana1. A
possibilidade de heterogeneidade genética na etiologia
da associação de MURCS levou os pesquisadores a buscarem o gene ou genes nela envolvidos, assim como a
região cromossômica onde estes se localizam. Alguns
estudos têm se mostrado promissores quanto a isso, por
exemplo, o gene WNT4, localizado no braço curto do
cromossomo 1, expresso precocemente no mesonéfron
em desenvolvimento, que está envolvido no desenvolvimento das trompas de Falópio, útero, ovários e glândulas
mamárias. Mutações do gene WNT4 têm sido associadas
à malformação dos ductos de Müller e virilização (hiperandrogenismo) em mulheres com cariótipo 46,XX20,
ao contrário de mutações localizadas no braço longo
do cromossomo 22, cujos resultados são controversos
quanto à sua associação com MURCS1,20. Apesar da
pesquisa molecular do gene ou genes envolvidos não
ter sido realizada no presente estudo, a documentação
e o relato de casos contribuem para o conhecimento de
sua frequência em nosso meio.
Portanto, quanto maior o número de casos descritos,
mais possibilidades de se identificar a etiologia da associação de MURCS, inclusive com melhor definição do papel
da mutação no desenvolvimento dos órgãos afetados e, a
partir daí, poderá ser possível estabelecer o risco de recorrência e, consequentemente, propiciar o aconselhamento
genético para as pacientes e suas famílias.
Concluímos que o diagnóstico precoce da associação
de MURCS é possível, desde que se investiguem outras
malformações na vigência de fusão de vértebras ou malformação renal, sabendo que a amenorreia primária pode
estar associada e, consequentemente, proporcionar apoio
e orientação para pacientes e seus familiares, além de
traçar a melhor forma de condução do caso e propiciar o
aconselhamento genético.
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