enfermagem em revista

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enfermagem em revista
ISSN 0872-8844
N.º115 . AGOSTO 2014
enfermagem em revista
ÉTICA
QUESTÕES ÉTICAS
INERENTES À
PASSAGEM DE
TURNO JUNTO DOS
DOENTES
O ESSENCIAL SOBRE
PASSAGEM DE
TURNO EM
ENFERMAGEM: UMA
REFLEXÃO
SUMÁRIO
SUMÁRIO
P04 EDITORIAL
P05 ÉTICA
QUESTÕES ÉTICAS INERENTES À PASSAGEM DE TURNO JUNTO DOS DOENTES
P13 O ESSENCIAL SOBRE
PASSAGEM DE TURNO EM ENFERMAGEM: UMA REFLEXÃO
P19 CIÊNCIA & TÉCNICA
A REDE SOCIAL DA REDE: CUIDADOS CONTINUADOS INTEGRADOS
P28 CIÊNCIA & TÉCNICA
OS ENFERMEIROS E A VACINAÇÃO DO HPV
P38 CIÊNCIA & TÉCNICA
ADESÃO À TERAPÊUTICA ANTI-RETROVIRAL. QUAIS AS INTERVENÇÕES DE ENFERMAGEM?
P47 CIÊNCIA & TÉCNICA
A IMPORTÂNCIA DA ENFERMAGEM FORENSE EM CONTEXTO DE INVESTIGAÇÃO CRIMINAL
P54 CIÊNCIA & TÉCNICA
QUANDO A FAMÍLIA DO DOENTE CRÍTICO ENTRA NO MUNDO DA EMERGÊNCIA: UM ESTUDO DE
REVISÃO
P66 CIÊNCIA & TÉCNICA
PRESENÇA DAS FAMÍLIAS NO SERVIÇO DE URGÊNCIA DURANTE A REANIMAÇÃO E OS PROCEDIMENTOS
INVASIVOS. QUAL O ESTADO DA ARTE?
P74 CIÊNCIA & TÉCNICA
TRAUMATISMO TORÁCICO. LESÕES NÃO ESPECÍFICAS
FICHA TÉCNICA
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EDITORIAL
EDITORIAL
ANTÓNIO FERNANDO S. AMARAL, Enfermeiro
[email protected]
A
AGOSTO 2014
questões de alocar aos enfermeiros mais atividades tem vindo a ser debatida nas
redes sociais de forma muito vigorosa. De um lado, alguns enfermeiros a defenderem
a possibilidade de se aumentarem as atividades e tarefas a desempenhar, pedidos de
radiografias e outros exames de diagnóstico, a prescrição de medicamentos, etc. Do outro, os
responsáveis da Ordem dos Médicos a esgrimirem argumentos no sentido de que não seja
permitida a delegação dessas atividades.
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Tenho para mim que esta discussão é mais séria do que uma mera discussão, mais ou
menos corporativa, feita no facebook ou noutra rede social. O atual governo, através do seu
ministro da saúde, tem desvalorizado significativamente a profissão de enfermagem e os seus
profissionais. Primeiro diminuído o valor/hora e depois diminuindo o número de enfermeiros
nos serviços a níveis próximos do dos anos 70, fazendo com que a maioria dos serviços
funcione no limiar dos padrões mínimos de segurança e, claro está, com claras repercussões
na qualidade dos cuidados que são necessários prestar e clara perda de eficiência para os
serviços. Claro que tudo isto, sendo prejudicial para os enfermeiros, porque lhes trás mais
cansaço e stress, é-o sobretudo para os utentes do SNS que vêem o seu acesso aos cuidados
prejudicado e serem inibidos do seu direito a que lhes sejam prestados cuidados em segurança.
Penso que este deveria ser o debate e a reivindicação dos enfermeiros. Voltar ao regime de 35
horas e a um aumento do número de enfermeiros nos serviços, de modo a garantir cuidados
de enfermagem às populações e não apenas alguns cuidados prestados por enfermeiros.
Claro que muitos dos nossos colegas embarcam na demagogia do governo para um
aumento da atividade, mas esquecem-se que com isso estão a privar os doentes de cuidados
de enfermagem para passarem a ter cuidados prestados por enfermeiros orientados por
protocolos na maioria deles elaborados por médicos. Onde fica a nossa autonomia se
realizarmos apenas tarefas delegadas à margem das que derivam de um processo de tomada
de decisão, baseado em conhecimento de enfermagem. De uma vez por todas, vamo-nos
centrar no essencial e só depois de estarem garantidos os cuidados que advêm da nossa
matriz é que devemos pensar em task shifting se isso melhorar o bem-estar e o acesso dos
doentes e a eficiência do sistema. Cumprir protocolos apenas, não.
ÉTICA
ENTRADA DO ARTIGO ABRIL 2013
Questões éticas inerentes
à passagem de turno
junto dos doentes
ANA TEIXEIRA
Enfermeira especialista em Enfermagem de Reabilitação.
ACES Tâmega III Vale do Sousa Norte - Centro de Saúde
Lousada
DANIELA DIAS
Enfermeira especialista em Enfermagem de Reabilitação.
Serviço de Urgência do Centro Hospitalar do Porto –
Unidade de Santo António
CHRISTINE MARTINS
Enfermeira especialista em Enfermagem de Reabilitação.
ACES Tâmega III Vale do Sousa Norte - Centro de Saúde
Lousada
LUÍS VIEIRA
Enfermeiro especialista em Enfermagem de Reabilitação.
Serviço de Urgência do Centro Hospitalar do Porto –
Unidade de Santo António
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RESUMO
A passagem de turno é por excelência um momento de troca de informação relevante de forma a assegurar a continuidade de cuidados. Quer
ela se realize na sala de trabalho, junto do doente
ou junto do doente e complementada na sala de
enfermagem, é imprescindível respeitar a confidencialidade das informações e o direito de privacidade que assiste o doente, levando a que os
enfermeiros sejam criteriosos quanto à informação a transmitir junto dos utentes.
ABSTRACT
The shift change is par excellence a moment of
exchange the important information to insure
the continuity of care. Whether it take place in
the room along with the patient or supplied in
the nursing retreat, who is essential to respect the
confidentiality of information and the right to privacy which assists the patient, so that nurses are
an important piece of knowledge to pass on their
users, passing the most insightful information and
relevant.
Palavras-Chave: Passagem de turno, enfermeiros,
sigilo profissional, confidencialidade, privacidade
Keywords: Shift change, nurses, professional secrecy, confidentiality, privacy
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ÉTICA
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INTRODUÇÃO
O doente, durante o internamento vê-se
confrontado com um lugar e com relações
diferentes das familiares e sociais às quais
está habituado, podendo sentir-se assustado, fragilizado, ansioso ou mesmo em situação de desequilibro físico, psíquico ou
emocional. Na perspetiva de Briga (2010, p.
5), “O hospital é um enredo de interacções,
um palco de cenários multifacetados, mas o
hospital é, acima de tudo, nomeadamente
pelas relações que aí se estabelecem, um lugar privilegiado de comunicação, onde nascem vínculos particulares e pessoais entre os
doentes que a ele recorrem por necessidade
e os profissionais que aí desempenham as
suas funções".
Temos como objetivo perceber como a
passagem de turno junto dos pacientes condiciona os seus direitos e os deveres dos profissionais e traçar algumas sugestões de alteração para um maior respeito pelo direito
à privacidade e confidencialidade na prática
dos cuidados de saúde em particular, promovendo uma reflexão critica sobre o tema que
permita melhorar a qualidade dos cuidados
de enfermagem tendo por base uma comunicação eficaz, porque comunicar é antes de
mais, uma arte, uma capacidade que nos é intrínseca. No entanto, parece-nos claramente
necessário prosseguir a reflexão acerca desta
questão bioética, que a todos toca, e em si
encontra inscrita a dignidade da pessoa humana como fundamento ético.
Em 2001, foi elaborado um parecer do
Conselho Jurisdicional da Ordem dos Enfermeiros que não responde de forma objectiva
a algumas particularidades suscitadas na prática, restituindo aos enfermeiros a responsabilidade individual e colectiva, de modo a não
colocar em causa os direitos dos utentes.
COMPETÊNCIAS NO CUIDAR EM
ENFERMAGEM
A Ordem dos Enfermeiros (2003) refere
que a competência do Enfermeiro implica
um nível de desempenho profissional demonstrador de uma aplicação efetiva do
conhecimento e das capacidades, incluindo
ajuizar. Assim, podemos dizer que um Enfermeiro é competente quando reúne e mobiliza o conjunto de saberes (saber, saber-fazer,
saber-ser e saber-estar), aplicando-os na
prestação de cuidados, atendendo à vertente científica, técnica e relacional (Conceição e
Ramos, 2004).
Na humanização dos cuidados de enfermagem jamais se pode dispensar a relação
de ajuda e o cuidar. “Cuidar, é AJUDAR A
VIVER (…)” (Collière, 1999, p.227), é (…) um
acto de reciprocidade que somos levados a
prestar a toda a pessoa que, temporária ou
definitivamente, tem necessidade de ajuda
para assumir as suas necessidades vitais (…)”
(Idem,p.235).
A relação de ajuda implica comunicação.
Comunicar é cuidar. Cuidar é humanizar. A
humanização permite a compreensão do
indivíduo no seu contexto físico, psíquico,
emocional, social e cultural. Para cuidareficazmente, o enfermeiro deve saber observar e avaliar corretamente e responder à sua
comunicação de forma adequada a cada situação. Isto requer conhecimentos técnicos,
compreensão e disponibilidade nas relações
humanas em situações deficitárias.
A comunicação é um processo de transmissão de mensagens no campo do relacionamento de pessoa para pessoa. Não há
interações passivas e é impossível não comunicar. Assim, estas duas premissas dizem-nos
que a comunicação é um processo complexo
que envolve trocas verbais e não verbais de
ÉTICA
informações, ideias, sentimentos e emoções.
Costa (s.d., p.70), salienta que comunicação
“É um acto de partilha que, se for eficaz, produzirá mudanças, actividade ou inactividade,
palavras ou silêncios, tudo possui um valor
de mensagem”. Cada pessoa reage a esta
mudança de acordo com as suas crenças, valores, história de vida e cultura.
Se por um lado, a comunicação verbal com
os doentes é, muitas vezes, dificultada pela
presença de diversas condicionantes, por outro lado, os enfermeiros esquecem frequentemente as potencialidades da comunicação
não verbal. A comunicação não verbal é uma
troca sem palavras, englobando um conjunto
de expressões corporais e de comportamentos que transcendem, acompanham e suportam as relações entre as pessoas dando-lhes
significado.
Através da comunicação não verbal, transmitimos as mensagens de forma inconsciente, por meio da expressão facial, da linguagem corporal, das características físicas, da
tacésica e da proxémica e na realidade o que
advém da comunicação não verbal é mais
facilmente retido relativamente às palavras.
Tal como refere Briga (2010) “é preciso não
esquecer que as mensagens silenciosas do
olhar, da expressão facial ou da postura são
em grande parte inconscientes e podem trair
a nossa vontade, os nossos verdadeiros sentimentos”. Mehrabian, citado por Briga (2010,
p.31) afirma que ”somente 7% das nossas
comunicações serão traduzidas em palavras,
38% sê-lo-ão pelas características da voz e
55% pelo resto do corpo”, sendo facilmente
compreendida a importância de estabelecer
uma relação harmoniosa entre estes dois tipos de expressão.
O DEVER DE SIGILO PROFISSIONAL:
PRIVACIDADE E CONFIDENCIALIDADE
DOS DADOS RELATIVOS AO DOENTE
O enfermeiro tem sobre a pessoa que cuida o dever de sigilo na medida em que o enfermeiro é obrigado a guardar segredo profissional sobre o que toma conhecimento no
exercício da sua profissão e assume o dever
de “considerar confidencial toda a informação acerca do destinatário de cuidados e da
família, qualquer que seja a fonte, partilhar a
informação pertinente só com aqueles que
estão implicados no plano terapêutico, usando como critérios orientadores o bem-estar,
a segurança física, emocional e social do indivíduo e família, assim como os seus direitos,
divulgar informação confidencial acerca do
indivíduo e família só nas situações previstas na lei, devendo, para tal efeito, recorrer a
aconselhamento deontológico e jurídico e a
manter o anonimato da pessoa sempre que
o seu caso for usado em situações de ensino,
investigação ou controlo da qualidade de cuidados. Cabe ao enfermeiro garantir cuidados
globalizantes e individualizados, tendo como
valor o respeito pela dignidade humana, de
forma a que a experiência de dor e sofrimento, por que passa o indivíduo, se dê num clima
e ambiente de segurança, protector da sua
dignidade e intimidade”.
Para Morais (2011, p.255) “a assistência à
saúde é sustentada pelo valor da confiança.”
Por este motivo, o carácter de confidência preserva o relacionamento entre o profissional e
o doente e, quando este segredo se quebra,
põe em causa toda a relação de confiança
que se criou entre os dois. A confidencialidade é um atributo que qualquer profissional de
saúde necessita de aprender a desenvolver, já
que dela depende a confiança que o utente
irá nele depositar. “O doente tem direito à pri-
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vacidade e o médico o dever de confidencialidade. A confiança no médico só é mantida
desde que este guarde sigilo absoluto dos
factos. A confidencialidade só pode ser quebrada quando o doente autoriza ou quando
lesa gravemente direitos de terceiros” (Serra,
citado por Morais, 2011, p. 87).
Francisconi e Goldim (1998, p. 271) defendem que “a preservação de segredos está
associada tanto à questão da privacidade
quanto da confidencialidade”.
Para Francisconi e Goldin(1998, p.271) “a
privacidade é a limitação do acesso às informações de uma dada pessoa, bem como do
acesso à própria pessoa e à sua intimidade. É
a preservação do anonimato e dos segredos.
É o respeito ao direito de o indivíduo manter-se afastado ou permanecer só. É o direito que o paciente tem de não ser observado
sem sua autorização”. Já Miguéns, citado por
Veríssimo (2009, p.21), analisa o conceito de
privacidade como sendo um “ambiente de
recato, sossego, intimidade, seio de família”, referindo também que a vida privada de
cada pessoa merece respeito e tem o direito
a não ser violada ou divulgada.
Confidencialidade tem origem na palavra
confiança, que é a base para uma boa relação terapêutica. O paciente acredita que o
profissional a quem confia certos assuntos
irá preservar tudo o que lhe for relatado, tanto que revela informações que muitas vezes,
outras pessoas com as quais convive, nem
sequer supõem existir. Assim, todas as informações relativas ao doente – situação clínica,
diagnóstico, prognóstico, tratamento e dados
pessoais – são confidenciais. No entanto, se
o doente der o consentimento e não houver
prejuízo para terceiros, ou se a Lei o determinar podem estas informações ser utilizadas, tendo como regra que o doente deve ser
alertado para a necessidade de não colocar
em risco a segurança ou a vida de outros.
Confidencialidade é a garantia do resguardo das informações dadas em confiança
e a protecção contra a sua revelação não autorizada (Francisconi e Goldim, 1998). Constitui uma atitude ou comportamento de respeito, de silêncio, de segredo, relativamente
a um facto, dado íntimo ou privado, da vida
de uma pessoa. “Em contrapartida, o direito à privacidade é violado quando se obtém,
por exemplo, a informação de um computador ou de um registo, ou seja, quando uma
pessoa sem autorização entra na sala de arquivos ou na base de dados do computador
de um hospital” (Silva, 2007, p.41).
Para Ourives (s.d., p. 255) “a confidencialidade é assumida como uma forma de
privacidade informacional que acontece no
âmbito de uma relação de cuidados, onde
a responsabilidade de cuidar do outro é um
acto de confiança que nos foi concedido e
não um direito que possuímos”. Dessa forma,
os profissionais somente deverão ter acesso
às informações que efetivamente contribuam ao atendimento do paciente.
A autorização ao acesso à informação é
uma dádiva do doente e implica uma necessidade terapêutica, não um direito ao seu
uso abusivo. Ainda segundo este autor, “a dimensão ética da confidencialidade impõe a
necessidade de discernir o valor terapêutico
da informação e avaliar aquilo que constitui
matéria do segredo partilhado em equipa e
aquilo que deve ser mantido em segredo”.
METODOLOGIA
A revisão da literatura decorreu entre Novembro de 2011 e Dezembro de 2012, tendo
sido operacionalizada através da pesquisa
ÉTICA
eletrónica de artigos em bases de dados:
SciELO, Google, Google Académico, PubMed,
Repositório Científico de Acesso Aberto de
Portugal, B-on, assim como referências de
livros e teses nos períodos de 1998 a 2011,
nas línguas inglesa e portuguesa.
Os descritores utilizados foram: passagem de turno, enfermeiros, sigilo profissional, confidencialidade, privacidade.
Como critérios de inclusão foram considerados as publicações em texto integral, com
limitação da pesquisa aos anos 1998 a 2011.
RESULTADOS
Após a revisão de literatura efectuada focamo-nos unicamente nos artigos/livros/dissertações que abordavam as questões éticas
inerentes à passagem de turno, bem como o
seu local. Através desta estratégia de pesquisa foram encontradas 5 publicações, 2 livros
e 5dissertações.
Passagem de Turno
Um dos momentos mais importantes e
privilegiados na formação dos profissionais
de enfermagem é a passagem de turno. Este
é um momento por excelência de troca de
informação relevante de forma a assegurar
a continuidade de cuidados (Pereira, 2001).
Segundo Ferreira (2010), a passagem de turno é um tempo significativo, que permite a
avaliação do trabalho realizado num turno,
a organização do turno seguinte e a discussão partilhada dos assuntos e dos problemas
surgidos na enfermaria. Assim, baseando-nos no Parecer do Conselho Jurisdicional da
Ordem dos Enfermeiros sobre a passagem
de turno, constatamos que é “um momento
de reunião da equipa de enfermeiros, tendo
como objectivo assegurar a continuidade de
cuidados, pela transmissão verbal de informação, e como finalidade promover a melhoria contínua da qualidade dos cuidados,
enquanto momento de análise das práticas
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e de formação em serviço/em situação” (Ordem dos Enfermeiros, 2001). Esta transmissão de informação é efectuada de forma
oral, complementando assim a informação
escrita nos registos de Enfermagem. Por
conseguinte, a passagem de turno não deverá ser encarada como uma simples transmissão de ideias e conceitos mas sim como
um dos pilares fundamentais do constante
aperfeiçoamento dos cuidados de enfermagem prestados (Carneiro citado por Ferreira
et al., 2010).
Neste seguimento de ideias, podemos
afirmar que a passagem de turno dos enfermeiros é um momento determinante no
seu quotidiano profissional, porque representa um momento de grande cumplicidade
na qual os profissionais de saúde refletem
sobre as suas práticas, gerando por vezes
mudanças de comportamentos e atitudes
que promovem o desenvolvimento pessoal
e profissional.
Os locais de Passagem de turno são geridos, em cada contexto de trabalho e atendendo às suas características, de forma considerada mais adequada para responder às
finalidades – e tanto podem ser utilizados
espaços de trabalho específicos ou exclusivos
dos enfermeiros como espaço da unidade de
cada utente, ou outros, não sendo estas opções mutuamente exclusivas (Ordem dos Enfermeiros, 2001).Deste parecer resultou que
o importante não será o local propriamente
dito, mas as informações transmitidas próximo de terceiros, sendo que se deve sempre
salvaguardar o direito dos utentes à privacidade e confidencialidade.
A passagem de turno dos enfermeiros,
junto ao doente, é uma prática internacional
e comum em muitos contextos hospitalares
do nosso país. O seu principal intuito é envol-
ver os utentes no seu processo de cuidados,
mas, devido sobretudo ao carácter delicado e
pessoal das informações transmitidas, muito
se tem discutido sobre as suas vantagens e
desvantagens. Nas situações de passagem de
turno junto do utente em espaço de enfermaria, terão de ser acautelados alguns aspectos,
já que os conteúdos da informação tenderão
a ser diferentes dos que poderão ser transmitidos posteriormente/anteriormente em gabinete/sala de enfermagem.
“O comprometimento da confidencialidade
é uma violação grave de um direito do doente
e em quase todas as passagens de turno ocorre um lapso, pois nem só o diagnóstico merece reserva. Por exemplo: a incontinência, a não
colaboração, a confusão, o risco de contaminação, a não adesão dos prestadores de cuidados ou a falta de apoio da família, a falta de
auto-controlo, a ansiedade, a agressividade, a
infecção, algumas dependências no auto-cuidado, o uso de álcool e drogas, etc, também
não são do foro da reserva da intimidade? E as
demais respostas às situações de doença, serão ou não? Todas as respostas são subjectivas,
pois convém não esquecer que o que é considerado confrangedor para uma pessoa pode
não o ser para outra. Consideremos, ainda a
interrogação de um dos participantes. Porque
todos os enfermeiros entram no quarto, quando só um me vai prestar cuidados? De facto,
uma transmissão triangulada, entre os enfermeiros (o que termina e o que inicia a o turno)
e o utente, seria muito mais adequada e vantajosa” (Ferreira, 2010, p.36).
A passagem de turno poderá ser realizada num ou em vários locais, de acordo com
as características de trabalho e a sua informação poderá ser fornecida junto do doente
em enfermaria e complementada em espaço
de trabalho, salvaguardando sempre os di-
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reitos dos utentes nomeadamente no que
concerne à privacidade e confidencialidade e
garantindo sempre a possibilidade de utilizar
o “Privilégio Terapêutico”.
Durante a passagem de turno devemos
ter em consideração o direito do doente à
confidencialidade e privacidade, proteção da
intimidade e à reserva da sua vida privada.
Assim, o respeito pelo direito à privacidade
implica o dever dos profissionais de saúde
em praticar os seus atos no respeito pela
intimidade da pessoa estando apenas presentes os elementos essenciais para a execução do mesmo. A partilha de informação
pertinente deve ser apenas e só com aqueles
que estão envolvidos no plano terapêutico,
considerando sempre o melhor interesse do
paciente, isto é, o seu bem estar, a segurança
física, emocional, social e os seus direitos.
O momento de passagem de turno tem
como objectivo centrar os cuidados nos
utentes, de forma personalizada, fornecendo-lhes mais informação, mas também
melhorar o desempenho global dos enfermeiros, interpelando-os relativamente aos
cuidados prestados durante o turno de trabalho cessante, procurando sempre manter
ao máximo a confidencialidade e privacidade dos utentes, levando a que os enfermeiros sejam criteriosos quanto à informação a
transmitir junto dos utentes.
CONCLUSÃO
A passagem de turno é também um momento de formação intra-equipa e de reflexão sobre a prática de cuidados de enfermagem prestados, tendo como objectivo
principal a continuidade de cuidados e a garantia do bem-estar do doente. Assim, a passagem de turno, junto dos doentes, acarreta
muitas vantagens ao processo de enfermagem, no entanto, deve existir um processo
de comunicação, de certa forma preconizado, no sentido de não transmitir informações
ao doente que possam prejudicar o seu estado de saúde, isto porque a saúde envolve
uma enorme componente emocional. Temos
que ter consciência que certa informação
não deve ser divulgada junto ao doente, pela
sua fragilidade tantas vezes presente. A linguagem utilizada pelos profissionais deve
impor também um certo cuidado uma vez
que, certos termos que nos poderão parecer
banais, revestem-se de enorme importância
para aquele que está numa situação de fragilidade psicológica, podendo potenciar um
aumento do medo, da preocupação, da tensão a que o doente está sujeito. Por outro
lado, o facto de a informação ser transmitida
nas enfermarias pode conduzir a um certo
desrespeito pelo direito de privacidade subjacente ao estado de doente, uma vez que os
pacientes que nada têm a ver com o processo clínico do outro, têm um acesso involuntário ao mesmo. Mais concluímos que, o facto
da informação ser transmitida de enfermeiro para enfermeiro leva a uma participação
passiva do doente no seu processo clínico,
e isto poderá ser contestável. A passagem
de turno, em enfermaria, permite a continuidade dos cuidados, o conhecimento mútuo
enfermeiro-utente e o cumprimento do seu
direito à informação. Contudo, também se
pode verificar o comprometimento da confidencialidade, a despersonalização, a pouca
interacção enfermeiro - utente e informação
que pode ser entendida pelo doente como
repetitiva, pouco interessante e com linguagem técnico-científica.
A passagem de turno nas enfermarias terá
pois que ser muito bem pensada antes de
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ÉTICA
AGOSTO 2014
ser aplicada nos serviços e deve ser realizada
com muita ponderação. A informação transmitida, deverá ser junto ao doente e complementada em local adequado, dependendo da realidade do serviço, como, a sala de
trabalho O doente deve ser envolvido como
gestor da sua própria saúde e doença sendo, portanto, o mais interessado por todo o
processo. As intercorrências devem sim ser
discutidas entre os profissionais para depois
comunicar ao paciente de uma maneira que
ele absorva melhor.
12
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Graduação para obtenção da licenciatura em Enfermagem apresentada à Universidade Fernando Pessoa,
Faculdade de Ciências da Saúde. [Em linha]. [Consult.
25 Nov. 2011]. Disponível em: http://bdigital.ufp.pt/
handle/10284/1381.
O ESSENCIAL SOBRE...
ENTRADA DO ARTIGO ABRIL 2013
PASSAGEM DE TURNO
EM ENFERMAGEM: uma reflexão
VERA SOFIA JOAQUIM CAVACO
Enfermeira no Hospital de Faro com Especialização
em Enfermagem Médico-Cirúrgica, Mestranda em
Enfermagem na Universidade Católica Portuguesa
PATRÍCIA CRUZ PONTÍFICE-SOUSA
Enfermeira com a Especialização em Enfermagem
Médico-Cirúrgica, Mestre em Comunicação em Saúde,
Professora na Universidade Católica Portuguesa.
13
RESUMO
A passagem de turno em enfermagem assegura a continuidade de cuidados, pela transmissão
verbal de informação, num momento de análise
das práticas e de formação em serviço. Assim é
necessário desafiar os enfermeiros a compreender a importância da informação a transmitir, do
tempo necessário e dos comportamentos a promover. Realça-se o carácter essencial da informação clara, sem ambiguidades e sistematizada,
de modo a evitar a banalização deste momento,
contribuindo para a continuidade e qualidade
dos cuidados e segurança da pessoa.
Palavras-Chave: Passagem de Turno, Continuidade dos Cuidados, Melhoria da Qualidade
ABSTRACT
The nursing shift report ensures continuity of care,
by verbal transmission of information, analysis of
practices and in-service training. For that is necessary to challenge nurses to understand the importance of the information provided, the required
time and the better behaviors. It is essential emphasize the clear, unambiguous and systematic
information, in order to avoid the trivialization of
this moment, contributing to the continuity and
quality of care and patient security.
Keywords: Shift Report, Continuity of Care, Quality
Improvement
AGOSTO 2014
O ESSENCIAL SOBRE...
14
NOTA INTRODUTÓRIA
A passagem de turno ou passagem de
ocorrências em enfermagem é um dos momentos privilegiados de partilha entre enfermeiros. Partilham-se informações para a
prestação de cuidados, mas também reflexões profissionais e vivências pessoais de
cada um. Muitos classificam este momento
como um reencontro diário entre profissionais com um objectivo comum, tal que
durante o horário de trabalho podem não
voltar a encontrar-se até à nova passagem
de turno. De facto, este momento é definido
por Nunes et al. (2005) como uma reunião
de enfermagem que permite a partilha de informação verbal, que garante a continuidade
dos cuidados, devendo ser encarada como
um momento de aprendizagem e formação
com a análise das práticas, que tende a promover a melhoria contínua da qualidade dos
cuidados. Os mesmos autores acrescentam
que a transmissão da informação é feita de
forma oral, podendo ser complementada
pela forma escrita. No mesmo sentido, Silva
e Campos (2007) acrescentam que a informação transmitida deve ser objectiva, clara
e concisa e deve ser relativa à prestação de
cuidados directos ou indirectos à pessoa,
podendo-se também transmitir outros assuntos institucionais de interesse.
Apesar deste conjunto de conceitos que
fazem imergir uma definição do tema, a
grande maioria dos enfermeiros de hoje
transmitem uma preconcepção que desvaloriza a sua importância. Raros são aqueles
que assumem a passagem de turno como
um momento excepcional de formação contínua, continuando a remete-la apenas para a
troca de informação. Por este motivo torna-se emergente compreender o que envolve
a passagem de turno. Guimarães (1999) de-
fende que a passagem de turno corresponde a um tempo de simbolismo significativo,
através da avaliação do trabalho realizado
num turno, organização do turno seguinte e
discussão de problemáticas decorrentes no
quotidiano dos cuidados prestados. Já Kerr
(2002) citado por Staggers e Jennings (2009)
considera este momento como um processo
complexo pelo conhecimento e experiência
intrínsecos ao seu conteúdo. Considerando
estes autores compreende-se que a passagem de turno envolve mais saber do que à
partida se pensava com a simples troca de
informação. De facto, a enfermagem é uma
disciplina que envolve uma complexidade
de saberes que se difunde em todas as actividades inerentes à profissão. Deste modo
surgem diversas questões “Estaremos nós a
eclipsar o verdadeiro sentido da passagem
de turno? Que significado atribuímos a este
momento da prestação de cuidados?”. É certo que em cada enfermeiro, cada contexto,
cada instituição haverão diferenças na concepção deste momento, que podem inclusive aproximar-se intimamente da verdadeira
noção de passagem de turno. Contudo, a
reflexão será sempre uma mais-valia para a
melhoria contínua da qualidade dos cuidados, conforme defendido pela nossa Ordem
Profissional.
O local da passagem de turno
Na literatura é comum encontrar-se a
discussão entre a dicotomia da passagem
de turno no quarto/unidade doa pessoa ou
numa sala à parte, ao qual a Ordem dos Enfermeiro (OE) já se pronunciou (Baker, 2010;
Ferreira et al., 2010; Nunes et al. 2005; Santos
e Ferreira, 2004; Staggers e Jennings, 2009).
Por questões relativas ao sigilo, Nunes et al.
(2005) descreve o parecer da OE, cujos as-
O ESSENCIAL SOBRE...
pectos conclusivos consideram que o espaço
onde se realiza a passagem de turno deverá ter em atenção as características de cada
contexto de trabalho, de modo a ir ao encontro dos objectivos da passagem de turno, anteriormente descritos. Como forma de
não extrapolar o Código Deontológico dos
Enfermeiros, é ainda feita referência à necessidade de salvaguardar o direito de privacidade e confidencialidade da pessoa e garantia da utilização do “privilégio terapêutico”.
O documento acrescenta ainda que não é o
local da passagem de turno que é colocado em causa, mas sim as informações nela
contidas, que possam ser involuntariamente
transmitidas a terceiros. Assim, a decisão do
local fica ao critério da própria equipa de enfermagem, que em conjunto, e sublinhando
o termo “equipa”, deverá tecer as melhores
considerações para o contexto onde exerce
funções.
Sistematizar a passagem de turno
Por ser central à manutenção da continuidade, qualidade e planeamento dos cuidados
prestados, Lamond (2002) procurou compreender o processo de decisão e julgamento do enfermeiro durante a sua passagem
de turno, tendo concluído que geralmente
a informação transmitida nesse momento
apresenta uma ordem específica, que confere uma estrutura ou esquema facilitador da
transmissão de informação. O autor concluiu
também que o enfermeiro tende a transmitir informação sumária acerca da condição
da pessoa, por pressupor que o enfermeiro
que recebe a informação fará uma associação cognitiva que permita concluir acerca
das necessidades específicas desse mesma
pessoa, e assim, se tende a reduzir-se o tempo dispensado na passagem de turno. No
mesmo sentido, ao comparar a informação
contida nos registos escritos e na passagem
de turno, o autor verificou que a primeira é
sempre mais completa e detalhada do que
a segunda, que justifica pelo facto dos registos escritos representarem um documento legalmente reconhecido. Curiosamente, o
mesmo estudo revela que os dados psicossociais da pessoa são mencionados mais frequentemente na passagem de turno, do que
nos registos escritos.
No que se refere à comunicação de um
profissional para o outro, a World Health Organization (2007) referencia que as lacunas
que ocorrem durante esse processo predispõem à existência de quebras na continuidade dos cuidados, tratamentos inadequados
e colocam em causa a segurança da pessoa.
Efectivamente, o trabalho de Hansten (2003)
citado por Dean (2009) enuncia que as diferenças verificadas na qualidade da informação transmitida na passagem de turno, podem favorecer a eficiência do turno seguinte
ou, por outro lado, podem atrasar os cuidados em cerca de 1 a 2 horas. É interessante
verificar o quão influente este momento é
para o sucesso das restante horas de prestação de cuidados, pelo que a World Health
Organization (2007) e Baker (2010) recomendam que a comunicação efectiva deverá ser
cara-a-cara, precisa e não ambígua, sugerindo alguns passos descritos no Quadro 1.
O que é que a passagem de turno despoleta nos enfermeiros?
Para além do já descrito, a comunicação inerente à passagem de turno pode
ser afectada por outras variáveis, que Roach (2002) citado por Dean (2009) referencia
nestas questões: “If a depressed person enters a room, what happens to others? What
15
O ESSENCIAL SOBRE...
bn– Exemplo de organização da informação da passagem de turno junto da pessoa,
adaptado de World Health Organization (2007) e Baker (2010).
Aplicar técnica SBAR
AGOSTO 2014
O uso de uma abordagem estandardizada minimiza a confusão entre os
profissionais
16
(S)Situation: o enfermeiro que termina o turno despede-se
da pessoa e o enfermeiro que entra cumprimenta a pessoa;
(B)Background: actualiza o colega acerca dos problemas actuais da pessoa, bem como do tratamento, medicação, exames complementares de diagnóstico e necessidades especiais
(ex. isolamento de contacto, risco elevado de queda…);
(A)Assessment: informa acerca dos acontecimentos durante
o seu turno;
(R)Recommendation: revê e certifica que tudo está operacional para o colega que entra (ex. permeabilidade de acessos
venosos, terapêutica em curso ou pendente, confirma pedido
de serviço social…);
Ao longo desta abordagem a pessoa é convidada a intervir
disponibilizando-se espaço para o esclarecimento de dúvidas e
facilitando a sua inclusão no planeamento dos cuidados.
Dispensar o tempo
necessário
Comunicar a informação importante dando a oportunidade
ao colega de colocar questões, respondendo adequadamente, sem outras interrupções irrelevantes.
Incluir informações
Status da pessoa, medicação, plano de tratamento ou outras
alterações significativas.
is the impact of the energy, motivation, and
commitment of a nurse who is leaving a
shift on those who take over?” (p.22). Efectivamente, estas questões nascem do facto
do autor concluir que pouco se tem escrito
sobre a problemática intra-profissional dos
enfermeiros durante a passagem de turno e
servem incondicionalmente de projecção à
reflexão. É sabido que comportamento gera
comportamento, pelo que um enfermeiro
desmotivado influencia invariavelmente a
energia dos restantes colegas e concomitantemente a disposição para a prestação de
cuidados inócua. Face à situação actual do
país e da profissão, não é tarefa fácil andar
de cara alegre em todos os momentos da
prestação de cuidados, mas assumindo a influencia que o nosso estado de espírito pode
ter para com o outro, poderemos assumir o
compromisso de deixarmos o nosso “fado”
de lado e de causarmos impacto positivo na-
queles que entram ou deixam o turno.
Silva e Campos (2007) referem que a
maioria das dinâmicas de passagem de turno são demoradas, desgastantes e tendem
à banalização e superficialidade, ao invés de
fomentarem a reflexão. Provavelmente, este
facto relaciona-se com a desorganização da
transmissão de informação/formação, mas
não só. Os mesmos autores enumeram alguns aspectos, relacionados com o comportamento da equipa, que interferem no sucesso da passagem de turno como: conversas
paralelas, telefonemas, campainhas, entrada
e saída de funcionários, solicitações médicas,
presença de familiares, brincadeiras dos profissionais, não pontualidade dos profissionais e saídas apressadas. Efectivamente, e de
modo empírico, todos os dias se assiste a um
ou mais destes exemplos, que inevitavelmente prejudicam a transmissão da informação/
formação. Quantos de nós não nos identifi-
O ESSENCIAL SOBRE...
camos com algum destes comportamentos?
De modo complementar, referencia-se ainda
o trabalho de Roach (1997) citado por Dean
(2009) que conclui que os enfermeiros na
passagem de turno despendem demasiada
energia a controlar os outros, ao invés de
desenvolver a capacidade honestidade, integridade ou compaixão pelo outro colega. De
facto somos demasiadamente críticos com os
colegas, em especial com o colega do turno
anterior, no que se refere às suas fraquezas,
que sistematicamente vamos identificando.
A tomada de consciência desta problemática
poderá ser uma mais valia para que, em conjunto, se possam arranjar estratégias dentro
da equipa que fomente um espírito crítico
construtivo, evidenciado de forma igualitária os pontos positivos e negativos, tal como
sugere Speas (2004) citado por Dean (2009).
A melhoria dos cuidados não está em apontarmos as fraquezas dos outros mas em encontramos as nossas próprias fragilidades
e desenharmos estratégias para as contornarmos. Integrando as concepções expostas
resumem-se as principais ideias no Esquema
1, que pretende ser um veículo catalisador
para a tomada de consciência daquilo que
fazemos e que poderemos melhorar.
Nota Final
Desde Nightingale que se assume a importância da comunicação oral como essencial à continuidade dos cuidados. A fim de
centrar os cuidados na pessoa torna-se fundamental encontrar formas de comunicação
e utilizar uma linguagem em que a pessoa
esteja presente, sob pena de se uniformizar
as situações que se pretendem descrever.
Assim, a passagem de turno em enfermagem assume um carácter primordial na partilha de experiências, convidando à reflexão
de cada profissional. A rotina pode transpor
este momento à banalização, pelo que se
preconiza a transmissão de informação clara,
Esquema 1 – Desafios para a passagem de turno no SUC.
Passagem de turno
Assegura a continuidade de cuidados, pela transmissão verbal de informação, num
momento de análise das práticas e de formação em serviço.
Informação a
transmitir:
Abordagem estandardizada,
Incluir informações pertinentes,
Excluir informações fúteis
Local – Unidade do doente
Intervenientes
Enfermeiro
emissor
Enfermeiro
Receptor
Tempo:
O necessário para comunicar as
informações e permitir espaço ao
esclarecimento de dúvidas
Doente
Comportamentos a
evitar:
conversas paralelas,
telefonemas,
campainhas,
entrada e saída de funcionários,
solicitações médicas,
presença de familiares,
brincadeiras dos profissionais,
não pontualidade dos
profissionais,
saídas apressadas.
Desafio: Que energia, motivação e empenho existe no enfermeiro que passa o turno e no
enfermeiro que o está a receber? O que podemos melhorar no nosso contexto de trabalho?
17
AGOSTO 2014
O ESSENCIAL SOBRE...
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sem ambiguidades e com uma ordem específica, de modo a evitar
confusões nos enfermeiros que
recebem essa mesma informação.
O tempo dispendido deverá ser o
suficiente para incluir o esclarecimento de dúvidas. O local deverá
ser o que se adeque às características do contexto de trabalho,
considerando a particularidade da
confidencialidade e privacidade
da pessoa. Mediante estas condições os enfermeiros deverão promover comportamentos que não
interfiram no sucesso da transmissão da informação, através do
controlo do ambiente circundante
ao local da passagem de turno.
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improves patient safety and nurse accountability. Journal of Emergency Nursing. ISBN 0099-1767. 36:4 (2010), 355-358.
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Begins with Shift-to-Shift Report. International Journal for Human Caring. ISBN
1091-5710. 13:2 (2009), 22-26.
FERREIRA, Ricardo; LUZIO, Fátima; SANTOS, Mayra
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(Visita de Enfermagem): opinião dos utentes. Revista
Referência. ISBN 0874-0283. 2ª Série:12 (2010), 29-37.
GUIMARÃES, Paula – Aprendizagens e quotidianos
profissionais. Estudo de caso de uma enfermaria. Braga: Instituto de Educação e Psicologia da Universidade
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LAMOND, Dawn – The information content of the nurse change of shift report: a comparative study. Journal
of Advanced Nursing. ISBN 0309-2402. 31:4 (2000),
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turno junto dos utentes: melhoria efectiva na prestação de cuidados? Revista Referência. ISBN 0874-0283.
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STAGGERS, Nancy; JENNINGS, Bonnie – The Content
and Context of Change of Shift Report on Medical and
Surgical Units. The Journal of Nursing Administration.
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WORLD HEALTH ORGANIZATION – Communication
during patient hand-overs: Patient safety solutions.
2007. [Em linha]. [Consult. 20 Dez. 2012] Disponível em
<http://www.ccforpatientsafety.org/common/pdfs/
fpdf/presskit/PS-Solution3.pdf >.
CIÊNCIA & TÉCNICA
ENTRADA DO ARTIGO MARÇO 2013
A REDE SOCIAL DA REDE:
CUIDADOS CONTINUADOS
INTEGRADOS
LÚCIA ALEXANDRA PINTO CARDOSO
Enfermeira no Serviço de Urgência do Centro Hospitalar
do Porto. Curso de Pós-Licenciatura em Enfermagem
Comunitária, Curso de Especialização em Saúde Publica
e Curso de Pós-Graduação em Enfermagem Avançada.
ANA FILOMENA SILVA DE FREITAS
Licenciada em Enfermagem. Mestranda em Enfermagem Comunitária, Curso de Pós Graduação em Enfermagem Avançada e Curso de Pós Graduação em Cuidados Continuados Integrados.
19
RESUMO
A importância da formação e ampliação de redes de solidariedade está na mobilização e distribuição de recursos, e na mudança do perfil
epidemiológico no processo saúde/doença. Esta
revisão bibliográfica objetiva determinar a importância da articulação e configuração das redes
sociais e de cuidados continuados integrados, na
satisfação das necessidades sociais e de saúde.
Os resultados corroboram que a configuração e
a articulação das redes sociais com o sistema de
saúde facilitam a gestão da rede e do seu alcance.
ABSTRACT
The importance of the formation and expansion
of networks of solidarity is the mobilization and
distribution of resources, and the changing epidemiological profile in the health / disease. This literature review aims to determine the importance of
coordination and configuration of social networks
and integrated continuous care in meeting social
needs and health. The results confirm that the configuration and coordination of social networking
with the health system to facilitate management
of the network and its reach.
Palavras-Chave: Rede social, Rede de Cuidados
Continuados Integrados, Enfermagem Comunitária
Keywords: Social Networking, Network Continuous Care, Community Nursing
AGOSTO 2014
CIÊNCIA & TÉCNICA
20
INTRODUÇÃO
Na atualidade, Portugal está numa fase
inicial da sociedade em rede. A governação
da saúde na sociedade em rede justifica a redefinição do equilíbrio entre os mecanismos
de influência (controlo social) em prol de redes de interação e cooperação (Sakellarides
et al., 2007-2013).
De acordo com o preâmbulo do Decreto-Lei nº 101/2006, de 6 de Junho, a constituição da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados (RNCCI), visa dar resposta
às carências de cuidados, resultantes do aumento da prevalência de doentes crónicos
com múltiplas cormorbilidades, do aumento
de idosos com dependência funcional, de
doentes incuráveis em estado avançado e
em fase final de vida. Neste domínio, a intervenção articulada entre a saúde e a segurança social assenta num modelo de natureza
preventiva, recuperadora e paliativa, num
nível intermédio entre os cuidados de base
comunitária e os de internamento hospitalar.
Por cuidados continuados integrados
define-se como o conjunto de intervenções
sequenciais de saúde e ou de apoio social,
resultante da avaliação conjunta focada na
recuperação global, compreendida como o
processo terapêutico e de apoio social, ativo e contínuo, que pretende promover o aumento da autonomia através da melhoria da
qualidade de vida (artigo 3º, do Decreto lei
nº101/2006).
A RNCCI, criada no âmbito dos Ministérios da Saúde e do Trabalho e da Solidariedade Social é constituída por unidades e
equipas de cuidados continuados de saúde,
e ou apoio social, e de cuidados e intervenções paliativas, provenientes dos serviços
comunitários de proximidade, envolvendo
os hospitais, os centros de saúde, os serviços
distritais e locais, a segurança social, a rede
solidária e as autarquias locais, e organiza-se
a nível local e regional (artigo 2º, nº1 e nº2
do Decreto lei nº101/2006).
Por rede social entende-se as relações e
vínculos sociais entre os indivíduos que podem promover o acesso ou a mobilização do
apoio social em virtude da saúde (Ordem dos
Enfermeiros, 2011). Degenne e Forsé (2004)
conceptualizam rede social como o conjunto
de atores sociais aliados entre si através de
relações interpessoais, que facilitam a transmissão de recursos que transpõem os limites
formais.
A aproximação entre a rede social e a rede
de saúde, consiste em fazer a junção da rede
social com a rede saúde e desta com redes
de indivíduos, pois são estes que permitem
funcionar as organizações (Gomide e Grossetti, 2009).
Neste sentido tendo por base alguns princípios da rede como: a continuidade dos cuidados entre os diferentes serviços, sectores
e níveis de diferenciação, mediante a articulação em rede; a proximidade da prestação
dos cuidados, através do desenvolvimento
do potencial dos serviços comunitários de
proximidade e na multidisciplinariedade,
interdisciplinaridade e intersetorialidade na
prestação dos cuidados; esta revisão bibliográfica tem como objetivo determinar a importância da articulação e configuração das
redes sociais e de cuidados continuados integrados, na satisfação das necessidades sociais e de saúde da comunidade, realçando
o contributo do enfermeiro especialista em
enfermagem comunitária e de saúde pública.
A relevância desta revisão bibliográfica,
parte do pressuposto que a saúde é produto
de diferentes áreas, interligadas e interdependentes, o que significa que o enfermeiro
CIÊNCIA & TÉCNICA
especialista em enfermagem comunitária e
de saúde pública pelas suas competências
específicas, estabelece, com base na metodologia do planeamento em saúde, a avaliação do estado de saúde de uma comunidade
e integra a coordenação dos Programas de
Saúde de âmbito comunitário e na consecução dos objetivos do Plano Nacional de
Saúde, sendo por isso, chamado a intervir
em estreita colaboração com outros profissionais e sectores da sociedade, na equidade
no acesso á saúde (Ordem dos Enfermeiros,
2010).
Para Laverack (2008), a saúde é o produto
de áreas diferentes, todavia estritamente relacionadas, designadamente a habitação, os
transportes, o emprego, os serviços de saúde comunitários e o acompanhamento social. Para o mesmo autor, os promotores de
saúde tem de laborar em cooperação com os
profissionais de muitos outros setores, para
desenvolver estratégias para combater a pobreza e as desigualdades sociais.
METODOLOGIA
No sentido de sistematizar o estado da
arte sobre a temática em estudo e partindo
dos pressupostos anteriormente mencionados, realizamos uma revisão bibliográfica da
literatura, no período entre Março a Maio
de 2012, tendo sido delineadas as seguintes
questões norteadoras da pesquisa:
Qual a importância da articulação e configuração das redes social e de cuidados
continuados integrados, na satisfação das
necessidades sociais e de saúde da comunidade?
Qual o contributo do enfermeiro especialista em enfermagem comunitária e de saúde
pública na articulação e desenvolvimento do
potencial das redes, através dos diferentes
recursos existentes na comunidade?
Para a identificação e seleção dos artigos
científicos a incluir nesta revisão, estabelecemos critérios de inclusão e exclusão e palavras-chave apropriadas, de acordo com as
questões objeto desta revisão bibliográfica.
Como Critérios de inclusão e de exclusão
estabelecemos:
1. Estudos primários centrados na temática em estudo;
2. Estudos com evidência científica,
quantitativos ou qualitativos;
3. Estudos com resultados acerca da análise da rede social no sistema de saúde;
4. Estudos em língua portuguesa e inglesa;
5. Estudos publicados a partir de 2002
até a data de pesquisa (30 de Abril de
2012, de acesso aberto e com texto
integral (Full Text), na base de dados
Scielo;
6. Estudos publicados a partir de 2007
até a data de pesquisa (30 de Abril de
2012, de acesso aberto e com texto
integral (Full Text), na base de dados
EBSCO Host.
A determinação das palavras – chave levou através da sua intersecção, à obtenção da expressão de pesquisa estabilizada:
((“Rede” OR “Network”) AND (“Saúde” OR
“Health”) AND (“Social”)). Esta expressão de
pesquisa estabilizada, como estratégia final
foi inserida na caixa de busca (search box)
existente nas bases de dados eletrónicas selecionadas, para a pesquisa bibliográfica.
As bases de dados electrónicas selecionadas foram: a MEDLINE, a Cochrane Database of Systematic Reviews, a CINAHL Plus,
Education Research Complete, Medic Latina
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AGOSTO 2014
CIÊNCIA & TÉCNICA
22
with Full Text e a Nursing Reference Center
através da EBSCO Host; Scielo; e o Repositório Cientifico de Acesso Aberto de Portugal.
Foram ainda consultadas as referências bibliográficas dos resultados de pesquisa obtidos, Google Books e o catálogo da Escola
Superior de Enfermagem do Porto.
Assim sendo, na totalidade foram filtrados 371 artigos, 99 obtidos em bases de dados a partir da EBSCOhost Web e 273 artigos na base de dados eletrónica Scielo, pelo
método integral de pesquisa em Portugal e
no Brasil. No que respeita à base de dados
Scielo, após leitura dos títulos, foram selecionados 15 artigos para leitura dos respetivos
resumos e destes foram selecionados cinco
artigos para leitura do texto na íntegra, tendo sido selecionados quatro artigos.
Dos artigos obtidos a partir da EBSCOhost
Web: 75 estavam indexados na CINAHL Plus
e 24 na Academic Search Complete. Após
leitura dos títulos foram selecionados 13 artigos para leitura dos respetivos resumos,
tendo sido selecionados cinco artigos para
leitura do texto na íntegra, e destes, selecionamos um artigo, de acordo com os critérios
de inclusão/exclusão.
Assim sendo, desta pesquisa resultaram
na totalidade cinco artigos.
ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS
RESULTADOS
Para avaliar a qualidade das evidências o
profissional de saúde deve compreender a
abordagem metodológica na qual a pesquisa esta inserida (Galvão et al., 2003).
Em argumento das questões norteadoras
e do objetivo desta pesquisa, bem como dos
referencias bibliográficas, na análise do rigor
metodológico dos estudos, seguidamente,
apresentamos um quadro (quadro 1) resumo
com as características dos estudos obtidos,
quanto: aos objetivos, aos métodos, aos participantes e aos resultados. No mesmo quadro, a numeração atribuída aos estudos diz
respeito a uma ordenação crescente da data
de publicação dos mesmos. Em complementaridade á análise do rigor metodológico dos
estudos, sucede-se a sua discussão. Este argumento desafiou á reflexão acerca do contributo do enfermeiro especialista em enfermagem comunitária e de saúde pública na
articulação e desenvolvimento do potencial
das redes, através dos diferentes recursos
existentes na comunidade.
O estudo 1 de Andrade e Vaitsman (2002),
tendo como referência os conceitos de rede
social, apoio social e empowerment, evidenciou que a ALpviver formada a partir da iniciativa de duas enfermeiras, através de ações
de apoio social possibilitou a formação e o
estreitamente de uma rede de solidariedade social. Essas ações constituíram mecanismos de aproximação dos pacientes em
direção a objetivos comuns, contribuindo
para o seu empowerment no sentido do desenvolvimento e descoberta de capacidades
individuais, do aumento da autoestima e de
um papel de sujeito ativo, num processo de
construção da saúde e na edificação de uma
sociedade mais participativa neste contexto, reconstituindo novas redes de relações
sociais. Os autores, salientam que a participação dos pacientes nos serviços de saúde
através de uma maior democratização da informação e reconhecimento dos usuários no
processo de cuidado com a saúde, contribuiu
para minimizar as condições sociais e de saúde adversas, perante um modelo assistencial
extremamente centralizado no médico (pa-
CIÊNCIA & TÉCNICA
QUADRO 1 – Resumo dos artigos filtrado
Estudo
1
2
3
Título
Apoio Social
e Redes conetando Solidariedade e
Saúde
Autores, Ano
e País
Andrade, G.;
Vaitsman, J.
2002, Brasil
Confiabilidade
Teste-reteste
de aspetos da Griep, R. et al,
Rede Social no 2003, Brasil
Estudo Pró-Saúde
Rede Social
no Sistema de
Saúde: um estudo das rela- Bittencourt,
ções interoga- O. ; Neto, F. ,
2009, Brasil
-nizacionais
em unidades
de serviços de
HIV/AIDS
Objetivo(s)
Participantes
Metodologia
Resultados
A ALpViver proporciona uma maior
integração entre os
pacientes, os proAnalisar o papel
fissionais de saúde,
Profissionais
da Associação
familiares e amigos,
de saúde hosLutando para
formam laços de
pitalares (N=5)
Viver (ALpViamizade e fortalece a
Estudo Qualie pacientes
ver), na visão
rede social dentro do
tativo Followde profissionais com maior
hospital. Em direção
-up: Janeiro
de saúde e pa- assiduidade
a objetivos comuns,
a Outubro de
cientes, a partir no quotidiano
contribuindo para o
2000
da ALpViver
dos conceitos
seu empowerment no
de rede social, (N=6)
desenvolvimento e
(N=11)
apoio social e
descoberta de capaciempowerment
dades individuais, do
aumento da autoestima e de um papel
mais ativo
Avaliar os
níveis de confiabilidade de
teste-reteste
de informações
relativas a rede
social no Estudo
Pró-Saúde
Demonstrar as
contribuições
da análise de
rede social para
os sistemas de
saúde, identificando padrões
e estruturas na
rede de serviços
dirigidos a portadores de HIV/
AIDS
Funcionários
técnico-administrativos de
uma universidade pública
do Rio de Janeiro
(N=192)
Responsáveis
técnicos de
unidades de
saúde especializadas em
HIV de Porto
Alegre
(N=11)
As informações fornecidas pelos participantes sobre a maioria das componentes
de rede social apreEstudo de
sentam altos níveis
Coorte
de confiabilidade e
Follow-up:
reforçam o uso das
Agosto a
perguntas utilizadas
Novembro de sobre a rede social
1999
em investigações de
diversos desfechos
relacionados com a
saúde
Há inúmeras características a serem
observadas nas transações interinstitucionais, como a governança, a estrutura e a
Estudo de
caso. Follow- dinâmica da rede. As
-up: Outubro unidades estudadas
2004 a Janei- funcionam como redes de serviços muito
ro de 2005
frágeis, sem evidentes
ações de parcerias e
sem marcantes ações
de governança
(Cont)
23
CIÊNCIA & TÉCNICA
AGOSTO 2014
4
24
5
Atenção Domiciliar como
Mudança do
Modelo tecno-assisten-cial
Rede e Apoio
Social Familiar
no seguimento
do Récem-Nascido Pré-Termo
e Baixo Peso ao
Nascer
Silva, K. et al,
2010, Brasil
Viera, C. et al,
2010, Brasil
Cinco instituições de saúde:
Analisar práticas
quatro serviços
de atenção domi- de atenção
ciliar de serviços
domiciliar e um
ambulatórios e
serviço de um
hospitalares e sua hospital filantróconstituição como pico, desenvolrede de substitui- vidos pela rede
ção dos cuidados de serviços de
de saúde
saúde no âmbito
do sistema único
de saúde (SUS)
Identificar a rede
social e apoio
social de famílias
com filhos pré-termo (PT) e baixo peso ao nascer
ao nascer (BPN)
com alta clínica
da unidade de
terapia intensiva
neonatal (UTIN)
radigma biomédico). Portugal (2005) reforça
que os indivíduos obtêm pelos laços sociais
aquilo que não conseguem pelo vínculo de
cidadania: serviços públicos eficientes e de
qualidade.
No estudo 2 de Griep et al.. (2003), os
autores concluíram que o processo de avaliação sobre a maioria dos componentes de
rede social, investigados através de um questionário, apresentaram altos níveis de confiabilidade, e por isso elevada estabilidade das
informações colhidas no Estudo Pró - Saúde.
Os resultados alcançados reforçam a importância de incluir questões sobre rede social
em investigações de diversos desfechos re-
Seis famílias de
crianças de PT
e BPN com alta
clínica do UTIN,
totalizando 22
participantes
entre famílias e
crianças
(N=22)
A atenção domiciliar
possui potencial para
constituir uma rede de
cuidados, com potencia
para contribuir para a
Estudo Qualita- continuidade e a intetivo com base gralidade da assistência
na metodolono domicilio, ao progia traçador.
duzir novos modos de
Realizado de
cuidar que atravessam
2005 a 2007
os projetos dos usuários, dos familiares, da
rede social e dos trabalhadores da atenção
domiciliar
Estudo Descritivo
As famílias estão
apoiadas pelos seus
familiares. No entanto
com as instituições
governamentais e com
os profissionais de
saúde apresentam um
vínculo frágil e superficial. A intersetorialidade
e a integração entre os
serviços são vulneráveis,
uma vez que não há
referenciação e contra
referenciação das famílias para os demais
setores da sociedade,
de forma a minimizar os
problemas que enfrentam no acompanhamento dos bebés
lacionados à saúde.
Os autores evocam para a carência de
informações sobre a confiabilidade dos instrumentos utilizados para avaliar os componentes de rede social, em investigações
epidemiológicas e para a necessidade de
análises posteriores sobre a validade do
questionário, de forma, a completar a sua
validação psicométrica, o que poderá contribuir para a decisão de utilizar um índice de
rede social. Neste domínio, dada a influência dos determinantes sociais na saúde das
comunidades, o enfermeiro especialista em
enfermagem comunitária e de saúde pública, estabelece com base na metodologia do
planeamento em saúde a avaliação do esta-
CIÊNCIA & TÉCNICA
do de saúde de uma comunidade e coopera
na vigilância epidemiológica de âmbito geo
- demográfico, desempenhando um papel
preponderante no desenvolvimento de estudos adicionais sobre a validade deste tipo de
questionários, que abrangem variáveis relacionadas não só à rede social como à RNCCI,
variáveis estas preditoras de desfechos de
saúde na comunidade.
Desde que se começou a questionar
importância relativa dos sistemas de prestação de cuidados de saúde, a tendência
tem sido a de desenvolver investigação
que mostre a importância dos diversos determinantes de saúde. (Sakellarides et al.,
2007-2013). A saúde não se reduz nas pessoas somente pelos serviços de saúde, mas
resulta das capacidades e iniciativas individuais em interação com a sua rede social
de apoio e o seu meio ambiente físico e
social (Observatório Português dos Sistemas de Saúde, 2003).
No estudo 3 de Bittencourt e Neto
(2009), para evidenciar as contribuições
da análise de rede social para o sistema
de saúde, os autores pesquisaram cinco tipos de relacionamentos que demonstram
a dinâmica e a estrutura de uma rede de
serviços: referência de transferência, referência de admissão, coordenação de caso,
programas conjuntos e consultorias. Os resultados indicaram uma fraca dinâmica na
rede, sobretudo nos relacionamentos que
não envolveram a permuta de pacientes,
alvitrando que se há instrumentos estabelecidos, como a marcação de consultas, há
uma maior dinâmica na rede; pelo contrário, apenas se observaram iniciativas locais
ou pessoais, que resultaram em pouca ou
nenhuma ação dos serviços. Os autores
concluíram que a integração e a coordenação entre unidades da rede de saúde são
altamente desejáveis.
Para Gomide e Grossetti (2010), a análise
de redes sociais é um instrumento adequado e estruturado, capaz de auxiliar as investidas avaliativas relacionadas aos serviços e
programas de saúde, realçando os diferentes resultados alcançados pelos mesmos. É
fundamental que o enfermeiro especialista
em enfermagem comunitária e saúde pública adeque o uso deste instrumento na sua
prática clínica, na medida em que uma das
suas competências consiste em integrar a
coordenação dos programas de saúde de
âmbito comunitário e consecução dos objetivos do Plano Nacional de Saúde (Ordem
do Enfermeiros, 2010).
Os autores Silva et al. (2010) (estudo 4)
afirmam que, a atenção domiciliar tem potencial para a transformação das práticas em
saúde. É possível criar um novo ambiente
de cuidado, fundado por valores e crenças
quotidianas no domicílio. O que configura
formas inovadoras de produção de projetos
terapêuticos entre usuários, familiares, rede
social e profissionais de saúde (médicos e
enfermeiros), que continuam a ser estratégicos e nucleares, pois são eles que prescrevem os cuidados a ser administrados na
complexidade do cuidar.
A transição para uma sociedade em rede,
é sustentada pela transformação das relações entre as hierarquias, as interfaces transacionais, os espaços concorrências dos mercados e as redes e dos diversos mecanismos
de cooperação nos sistemas de saúde, e no
modo como os intervenientes da saúde se
relacionam com estes mecanismos de influência (Sakellarides et al., 2007-2013).
25
AGOSTO 2014
CIÊNCIA & TÉCNICA
26
No Estudo 5, de Viera et al. (2010), os resultados indicam que a rede social das famílias em estudo se constituiu, sobretudo,
pelas instituições de saúde, da igreja, e de
algumas instituições para atividades de lazer,
sendo o serviço de saúde o mais distante da
maioria das famílias.
Quanto ao apoio social das famílias, realçaram os parceiros, os membros da família
extensa, os amigos, e outras pessoas com
as mesmas experiências. A família extensa representou para as famílias o seu mais
constante apoio, assim como o vínculo com
o profissional médico. A manutenção de vínculos com a equipa de enfermagem da UTIN
após alta hospitalar, também se constituiu
como uma importante fonte de apoio social, demonstrado pela confiança adquirida
durante o período de hospitalização. Neste
estudo, a família que se encontrava em situação de vulnerabilidade social, surgiu num
contexto de rede e apoio sociais fragilizados. Os profissionais de saúde, em especial
o enfermeiro, deve conhecer quem e o que
faz parte da rede de relações da família, no
contexto em que está inserida, de modo a
promover em parceria com a mesma, fontes
de apoio e rede sociais.
Para Vieira et al. (2009), a condição social,
económica, cultural, educacional, o apoio social e as características individuais e familiares atribuem diferentes formas de encarar e
responder perante o processo saúde/doença. Estes pressupostos vão de encontro às
competências do enfermeiro especialista em
enfermagem comunitária e de saúde pública, no que respeita à participação, em parcerias com outras instituições da comunidade e
com a rede social e de saúde, em projetos de
intervenção comunitária dirigidos a grupos
com maior vulnerabilidade.
CONCLUSÃO
Com argumento nos resultados obtidos
pelos vários autores, corroboramos a importância da configuração e da articulação das
redes sociais com o sistema de saúde na gestão das redes e do seu alcance, em benefício
da saúde das comunidades na singularidade
dos seus indivíduos. A rede social em saúde
tem potencial para contribuir para a continuidade e para a integralidade dos cuidados
de saúde, e para a satisfação das necessidades sociais e de saúde da comunidade, na
mitigação das desigualdades sociais.
O enfermeiro especialista em enfermagem
comunitária e de saúde pública pode contribuir na articulação e no desenvolvimento do
potencial da rede social para o sistema de
saúde, nomeadamente para a RNCCI, com
base nos recursos existentes na comunidade.
No entanto, as dimensões relacionadas à
rede social e aos cuidados de saúde viabilizadas através da operacionalização na RNCCI, ainda estão pouco explorados razão pela
qual é colocado como um desafio para futuras investigações.
As carências do sistema de saúde são
colmatadas pela articulação das redes e fundam-se nas responsabilidades individuais e
coletivas da sociedade e do Estado, que são
simultaneamente inclusivas e excludentes;
protetoras para quem faz parte, mas indiferentes para quem esta fora.
A configuração e articulação das redes
sociais com a RNCCI, impõem-se como um
dos principais motores e simultaneamente,
pilar de sustentação do sistema de saúde.
CIÊNCIA & TÉCNICA
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27
CIÊNCIA & TÉCNICA
ENTRADA DO ARTIGO MARÇO 2013
OS ENFERMEIROS E A
VACINAÇÃO DO HPV
AGOSTO 2014
PAULA SARREIRA DE OLIVEIRA
Enfermeira
28
RESUMO
Para o êxito dos programas de vacinação, de
nada adianta a segurança e eficácia das vacinas
se os profissionais de saúde não os utilizarem ou
a população não aderir. Nenhuma ação em saúde
é tão efetiva e eficiente quanto vacinar.
Uma serie de comportamentos de um indivíduo,
com caraterísticas semelhantes, denominamos
de atitudes desse indivíduo. Assim a atitude pretende ser, um mediador entre a forma de agir e a
forma de pensar dos indivíduos.
Este artigo pretende analisar o conhecimento,
atitudes e necessidades de informação dos enfermeiros relativamente à prevenção e vacinação
da Vírus do Papiloma Humano (HPV) em raparigas adolescentes nascidas em 1992, 1995 e 1996.
Optou-se pela pesquisa quantitativa, com carácter exploratório e descritivo procurando trabalhar
com o universo de conhecimentos e atitudes.
Através da realização da recolha de dados por
questionário auto preenchido, voluntário e anónimo com questões fechadas.
Os enfermeiros demonstraram conhecimentos
sobre a temática, destacando-se a necessidade
de desenvolverem processos educativos que favoreçam a participação da comunidade. As áreas
mais sensíveis de intervenção estão relacionadas
com a aquisição de conhecimentos e habilidades
para lidar com a problemática de saúde da população, com base no perfil epidemiológico.
Palavras-Chave: Vacinação, HPV, Enfermeiros, Atitudes; Valores.
ABSTRACT
For the success of vaccination programs is useless
safety and efficacy of vaccines if health professionals do not use them or the people don’t adhere to
the vaccination. No action on health is as effective and efficient as vaccinate to prevent major
diseases.
In the presence of a series of behaviours of an individual with similar characteristics, we call that individual attitude. Thus the attitude you want to be
a mediator between the way of acting and thinking of individual. Account the problem was defined
to analyse the knowledge, attitudes and information needs of nurses on prevention and vaccination
Papilloma Virus (HPV) in adolescent girls born in
1992, 1995 and 1996.
The study is based on an exploratory and descriptive, for quantitative research, seeking to work with
the universe of knowledge and attitudes. The technique chosen to perform the data collection was a
questionnaire filled out self, voluntary, and anonymous with closed questions.
Nurses demonstrated knowledge of the subject,
emphasizing also the need to develop educational
processes that foster community participation. The
most sensitive areas of intervention are relative
to the acquisition of knowledge and skills to deal
with the problem of population health, based on
the epidemiological profile.
Keywords: Vaccination; HPV; Nurses; Attitudes;
Values
CIÊNCIA & TÉCNICA
29
INTRODUÇÃO
A Epidemiologia tem demonstrado a vacinação como uma das medidas de maior
impacto na prevenção primária, sendo de
grande eficácia na prevenção e erradicação
de infeções. Além de ser um instrumento importante para a saúde na missão de proteger
a pessoa, o seu objetivo é o de conferir que a
imunidade seja conseguida numa maior percentagem possível de indivíduos, com o menor risco possível de efeitos adversos, e menor custo. Além disso, também para aqueles que não foram vacinados, quanto maior
o número de pessoas vacinadas, menor é a
possibilidade de contágio da doença. No entanto para que esse sucesso seja efetivo terá
que existir por parte dos profissionais quer
por parte da população uma forte adesão,
de modo a que os valores de imunidade re-
comendados sejam conseguidos. De modo
a atingir este sucesso, a literatura apresenta e discute estratégias para ampliação das
coberturas vacinais, incentivando o desenvolvimento das pesquisas sobre imunogenicidade, reatogenicidade e eficácia dos imunobiológicos.1
Com base na evidência proporcionada
pela investigação, procura-se que a enfermagem encontre caminhos nesta área, proporcionando contributos para uma melhoria
nas condições de prevenção, detecção, atendimento e encaminhamento das crianças
e jovens. Este estudo tem como objetivos
analisar os conhecimentos, as atitudes e as
necessidades de informação dos enfermeiros do ACES Arco Ribeirinho em matéria de
prevenção da HPV em raparigas nascidas em
1992, 1995 e 1996 e determinar os fatores
AGOSTO 2014
CIÊNCIA & TÉCNICA
30
associados à promoção da vacinação contra
infecções por HPV dos enfermeiros que vacinam do ACES Arco Ribeirinho.
permitindo-nos, em determinados momentos, tomar as nossas posições face às dos
outros2.
REFERENCIAL TEÓRICO
Com a finalidade de identificar as atitudes,
os conhecimentos e os valores dos enfermeiros que vacinam, optou-se por um referencial que facilitasse uma leitura do conceito
construído a partir daqueles que exercem o
seu trabalho nesta área do cuidar. Utilizou-se
a Teoria de Allport (1935) que refere as atitudes como bons predictores de comportamento. Este autor refere que as atitudes sociais desempenham funções específicas para
cada um de nós, são a base de uma série de
situações sociais importantes, tais como as
relações de amizade e de conflito. Referiu
também que, a atitude é um estado de preparação mental ou neural, organizado através da experiência e exercendo uma influência dinâmica sobre as respostas individuais
a todos os objetos ou situações que se relaciona, para este domínio do conhecimento,
a atitude pretende ser "um mediador entre a
forma de agir e a forma de pensar dos indivíduos"2 (p. 168). Assim, as atitudes têm uma
forte ligação com os comportamentos e são
inferidas, ou seja, são do campo da acção e
não são directamente observáveis.
Divergindo em muitos aspetos, as diferentes definições propostas para o conceito
de atitude têm, no entanto, alguns pontos
comuns. Primeiro as atitudes têm origem nas
experiências subjetivas, segunda as atitudes
são tomadas face a um objeto e por último
as atitudes incluem sempre uma dimensão
avaliativa2. Assim, as atitudes são fruto de
interações sociais, obtidas por processos de
comparação, identificação e diferenciação
TRAJETÓRIA METODOLOGICA
Na realização deste trabalho utilizamos
um tipo de estudo exploratório, descritivo,
de abordagem quantitativa, com amostragem não probabilística por conveniência.
Na pesquisa efetuada tivemos dificuldade
em encontrar um questionário adaptado para
a população do nosso estudo, confrontando-nos então com a necessidade de construir
um instrumento próprio. Antes da aplicação
do instrumento de colheita de dados, foi aplicado um pré-teste numa amostra aleatória.
Da sua aplicação não se verificou a necessidade de reformulação do questionário.
Assim, o questionário foi aplicado a uma
amostra (n=30) constituída por dois enfermeiros de cada Unidade de Saúde do ACES
Arco Ribeirinho que vacinavam, tendo em
conta que existe sempre um enfermeiro que
vacina e outro que o pode substituir.
Os dados foram recolhidos através de
questionário anónimo, com o tempo médio
de preenchimento de 15 a 20 minutos. Foram enviados via correio eletrónico para os
Enfermeiros Interlocutores de cada Unidade
de Saúde e preenchidos pelos enfermeiros
que vacinavam, nas suas Unidades de Saúde.
Para a análise e tratamento dos resultados
utilizou-se o programa SPSS (Statistical Package for Social Sciences), versão 16.
ANÁLISE E DISCUSSÃO
Como primeira análise dos dados deste
trabalho podemos referir que a maioria da
amostra era do sexo feminino. Os sujeitos
CIÊNCIA & TÉCNICA
estudados possuíam idades compreendidas
entre os 32 e os 50 anos, sendo que a média
de 38,93 anos com o desvio-padrão=9,845.
Quanto à distribuição dos elementos
por categoria profissional verifica-se que 20
(71,4%) são enfermeiros graduados.
Esta distribuição profissional da amostra
não traduz por si só significado. Pois, se por
um lado poderá significar o assegurar das necessidades básicas, como o desenvolvimento
afectivo, físico e intelectual, ao mesmo tempo
que, pode ser garantido o avanço na construção do conhecimento, ao ser mobilizado as
competências relativas a cada área.
A maior percentagem das enfermeiras da
nossa amostra 9 (32,1%) trabalha há mais
de 10 anos e 9 (32,1%) há mais de 5 anos
no Programa de Vacinação, o que pressupõe
maior experiência profissional. Associa-se a
isso a expressiva referência relativamente aos
conhecimentos sobre a vacina, ou seja 15
(53,6%) enfermeiros, consideraram os seus
conhecimentos como Muito suficientes. Relativamente á atitude de recomendação dos benefícios da vacinação contra o HPV verifica-se
que 22 (78,6%) das enfermeiras refere/ recomendar Sempre quais os benefícios da vacina.
Quanto à atitude de recomendação da vacinação do HPV, averigua-se que 25 (89,3%)
das enfermeiras recomenda Sempre a sua
inoculação.
Esta constatação6,7 sugere que o sucesso
deste programa de imunização vai depender
em grande parte, dos prestadores de cuidados de saúde, ao reconhecer a importância
da Imunização para os adolescentes e pré-adolescentes.
Aquando da administração da vacina os
enfermeiros esclarecem quanto à utilidade desta e qual o microrganismo causador
observando-se também que 18 (64,3%) da
amostra respondeu que falava Sempre, sobre a utilidade da vacina e qual o microrganismo causador.
Em relação à eficácia da vacina, apurou-se que 12 (42,9%) das enfermeiras falavam
Sempre sobre a mesma.
Na sensibilização para a importância do
cumprimento do esquema vacinal, observa-se que 26 (92,9%) dos enfermeiros referiu
alertar Sempre para o cumprimento do esquema vacinal, o que vai de encontro ao
recomendado pela Características do Medicamento8, que salienta a necessidade da
adolescente completar o ciclo vacinação de
três doses, caso contrário poderá não ficar
totalmente protegida.
Verificou-se que relativamente à questão
do HPV ser a infecção sexualmente transmissível mais comum, 12 (46,4%) dos elementos
da nossa amostra referiu Concordar Fortemente, ou seja a literatura refere que “ (…)
a infeção por HPV é a infecção sexualmente transmissível com maior prevalência no
mundo inteiro”9 (p.128).
Na questão referente á percentagem da
população infetada com HPV, verificou-se
que 11 (39,3%) das enfermeiras da nossa
amostra respondeu Concordar Fortemente
com a afirmação de que mais de 50% da população já foi infectada com o HPV. O que
vai de encontro10 ao (p. 128), “ (…) acredita-se
que 70-80% das mulheres sexualmente activas irão estabelecer contacto, nalgum momento, com o vírus e sabe-se hoje que 99,7%
dos Cancro do Colo do Útero estão associados à infecção por HPV”. As mulheres11 com
infeção recorrentes de HPV têm 300 vezes
mais probabilidade de ter Cancro do Colo do
Útero. Na questão referente ao teste de Papanicolau ter uma sensibilidade de deteção
do HPV superior a 50%, 14 (50%) enfermei-
31
AGOSTO 2014
CIÊNCIA & TÉCNICA
32
ros da amostra Concorda Fortemente. Como
se trata de uma doença silenciosa o rastreio
é fundamental uma vez que, quando detetada precocemente e numa fase inicial, o tratamento tem uma taxa de sucesso de 100%.
O rastreio12 sistemático através do exame Citológico reduz significativamente a incidência de Cancro do Colo do Útero, ou seja são
identificadas 30% das situações malignas.
Na questão referente ao conhecimento
sobre a possibilidade do Cancro do Colo do
Útero poder ser causado por genótipos do
HPV específicos, observou-se que 20 (71,4%)
da amostra refere ter este conhecimento.
Na afirmação referente á existência de certos genótipos específicos responsáveis pela
maioria das verrugas anogenitais, 19 (67,9%)
das enfermeiras respondeu Concordar Fortemente. Não existe uma caraterização epidemiológica dos tipos de HPV que ocorrem na
população feminina portuguesa, no entanto,
a DGS12 assume-se que os genótipos de HPV
em Portugal tenham de um modo geral, uma
distribuição semelhante à de outros países
da Europa comunitária. Assim, os genótipos
16 e 18 são os mais prevalentes e responsáveis por cerca de 70 a 75% dos casos do
Cancro do Colo do Útero”14.
Segundo a Sociedade Portuguesa de
Ginecologia15, os condilomas acuminados
anais nem sempre estão relacionados com o
coito anal, já que podem propagar-se através
das secreções vulvares. Sendo fundamental
a exploração sistemática para a sua deteção.
Relativamente aos conhecimentos sobre
a vacina do HPV, 15 (53,6%) das enfermeiras considerou os seus conhecimentos como
Muito suficientes. Os efeitos do desenvolvimento dos conhecimentos em enfermagem
são moldados pela orientação prática, o que
por sua vez, modela a perspetiva de enfer-
magem16. Essa perspetiva reflete o interesse
dos enfermeiros em, conceder à disciplina de
enfermagem os conhecimentos relacionados
com os cuidados e de acordo com os utentes.
Quanto à fonte de formação, 8 (28,6%)
das enfermeiras referiram as Orientações
Técnicas da Direcção Geral da Saúde como a
fonte por excelência da sua formação, o que
sugere a sua valorização e demonstra a sua
credibilidade de informação. Ressalta-se a
importância da educação contínua no local
de administração uma vez que novas vacinas
são adicionadas, novos conhecimentos adicionados, tornando imprescindível a capacitação na prática quotidiana das enfermeiras. A importância da educação continuada
deve-se ao facto de se privilegiar as oportunidades educativas surgidas no quotidiano dos trabalhadores de saúde. A partir da
análise do contexto podem ser estabelecidas
opções através das quais se indicariam alternativas para desenvolver o processo de capacitação, tais como o desenvolvimento de
conhecimentos e habilidades que17 poderão
adquirir-se gradual e progressivamente de
acordo com o problema e relacionando com
o objetivo educacional.
Os enfermeiros procuram o conhecimento dos seres humanos relativamente às
respostas para a saúde e doença de forma
a poder ajudar na vigilância e promoção da
saúde, para ajudar no seu cuidado, a fim de
contribuir para promover o auto-cuidado e
para ajudar na capacitação e desenvolvimento na utilização dos recursos 18.
A meta do desenvolvimento do conhecimento em enfermagem é a compreensão
das necessidades das pessoas de cuidados
de enfermagem, de forma a aprender a cuidar melhor. Portanto, as atividades do cuidar em que os enfermeiros estão envolvidos
CIÊNCIA & TÉCNICA
numa base diária pode ser o foco para o desenvolvimento do conhecimento e pode ser
congruente com actividades desenvolvidas
na estruturação do conhecimento, essencialmente porque o alvo dos cuidados é igual
em ambas as áreas, ou seja o ser humano.
A literatura refere dois tipos de metas
do desenvolvimento de conhecimento que
conduzem a atividades e progressos no conhecimento. Existe "o conhecimento em prol
do conhecimento" e o conhecimento para
fornecer melhores cuidados de enfermagem
através da resolução dos problemas centrais
de preocupação para a disciplina19,20.
A enfermagem como uma disciplina e os
enfermeiros como investigadores a sua missão é a de cuidar das pessoas e aumentar o
seu bem-estar, e não só participar no desenvolvimento de conhecimentos em prol do
desenvolvimento dos mesmos.
Nas formas de transmissão de formação,
15
“(…) as práticas são definidas por múltiplos fatores (conhecimento, valores, relações de poder, organização do trabalho etc.);
a aprendizagem dos adultos requer que se
trabalhe com elementos que “façam sentido”
para os sujeitos envolvidos (aprendizagem
significativa)” (p.25).
Os efeitos do desenvolvimento dos conhecimentos em enfermagem são influenciados
pela orientação prática, o que por sua vez,
modela a perspetiva de enfermagem15. Essa
perspetiva reflete o interesse dos enfermeiros
em, habilitar a disciplina de enfermagem com
conhecimentos relacionados com os utentes
com o objetivo de melhorar o seu bem-estar
e capacitá-los de acordo com as suas necessidades. Essa capacitação para o auto cuidado é
feita através da utilização de métodos de planeamento dos recursos disponíveis e criando novos recursos. Se estes são os principais
objetivos para o desenvolvimento de conhecimentos em enfermagem, então temos de
considerar a abordagens de desenvolvimento
de conhecimentos que tornam possíveis estes
fins. A saúde é também uma perspetiva que
define o que consideramos nas nossas avaliações, na aplicação do plano de cuidados, na
consideração das mudanças ocorridas depois
das nossas intervenções.20
Com o processo de enfermagem, as enfermeiras descobrem forças de saúde, mobilizam essas forças, e apoiam os recursos disponíveis para que os utentes possam tomar
decisões no seu processo de doença/saúde.
O sucesso21 da imunização deve ser garantido, pelo facto de que a saúde e os custos económicos das infeções provocadas pelos
microrganismos são substanciais. Continua referindo a importância do sucesso dos Programas de Imunização das Infecções Sexualmente
Transmissíveis (IST), sugerindo de que o sucesso na diminuição das infeções serão substanciais e de fácil comprovação relativamente ao
custo-benefício desse mesmo Programa.
No entanto, o sucesso22 destes programas
depende das taxas de aceitação entre a maioria das pessoas em risco. Estudos realizados
relativamente a outras vacinas como hepatite B, influenza e varicela demonstram que
a disponibilidade de vacinação não garante
uma adesão generalizada. Sugerem portanto
que, se deve progredir para a avaliação da
determinação dos potenciais de aceitação.
Quanto à administração da vacina, 28
(100%) das enfermeiras refere Concordar
Fortemente na administração da vacina a todas a raparigas antes de serem sexualmente activas e 16 (57,1%) das enfermeiras referem Concordar Fortemente quanto a esta
ser administrada a todos os rapazes antes
de serem sexualmente ativos. Estes resulta-
33
AGOSTO 2014
CIÊNCIA & TÉCNICA
34
dos vão de encontro ao referenciado pelo
Institute of Medicine dos Estados Unidos da
América no seu documento, “Vacinas para o
século 21”,23 onde é realçado que idealmente,
um programa de imunização eficaz para as
Infecções Sexual Transmissíveis deve incluir
jovens adolescentes, de preferência antes de
se tornarem sexualmente ativos.
As estratégias de imunização das IST´s
voltados para os pré-adolescentes e adolescentes vão colocar a maior parte da responsabilidade da decisão sobre os pais e os
prestadores de cuidados de saúde. Um estudo sobre a vacinação da hepatite B em adolescentes evidenciou que o melhor preditor
da aceitação parental foi a convicção com
que o enfermeiro conseguiu transmitir a importância que dava à vacinação.13
No entanto, os resultados indicaram que,
existia por parte dos profissionais o reconhecimento da importância da vacinação dos
rapazes como uma importante estratégia de
proteção das mulheres, visto serem os principais veículos de transmissão do vírus. No
caso do HPV a vacinação nos homens tem
uma eficácia quase de 100%. A OMS recomenda que se passe a vacinar os rapazes depois da cobertura completa das raparigas.
Fica claro que, para existir proteção geral da população, a imunização para as DST
deve ser efetuada aos adolescentes antes do
início da atividade sexual, de preferência, ou
o mais tardar entre 11 e os 12 anos de idade.
O sucesso dos programas de imunização6,7 vai depender em grande parte, dos
prestadores de cuidados de saúde, ao reconhecer a importância da Imunização para os
adolescentes e pré-adolescentes.
No entanto os mesmos autores mencionam que existe por parte dos profissionais
dos cuidados de saúde primários, resistência
em discutir com os adolescentes e com os
pais assuntos relacionado com a sexualidade.
Para as vacinas das DST25,22 encontraram
vários determinantes de aceitação. Nestes
estão incluídos determinantes como as crenças individuais e atitudes, acerca das caraterísticas da vacina. Foram 26,22encontrados determinantes de aceitação relacionados com a
saúde dos indivíduos. O facto de existe 27um
número crescente de enfermeiros envolvidos
nos Cuidados de Saúde Primários e consequentemente um aumento das intervenções
de enfermagem reflete-se 28 na melhoria das
taxas de vacinação.
Pesquisas anteriores29 sugerem que as
práticas dos prestadores de cuidados de saúde são influenciadas por normas sociais percebidas. Essa descoberta, segundo o mesmo
autor, indica que as normas sociais percebidas, como as recomendações feitas pelos
profissionais, organizações profissionais, influenciam significativamente a educação dos
adolescentes sobre as DST.
Na possibilidade da data do início do rastreio citológico ser protelado nas mulheres
imunizadas para o HPV, 25 (89,3%) das enfermeiras respondeu Não concordar. Quanto
à possibilidade de Reduzir o rastreio Citológico nas mulheres vacinadas, observou-se
que 25 (89,3%) das enfermeiras respondeu
que Não Concordava. Esta concordância vai
de encontro ao referido por Wright et al30 ao
afirmar que as mulheres com maior risco de
Cancro do Colo do Útero são aquelas com
idade igual ou superior a 40 anos, e que não
foram vacinadas na sua adolescência, ou seja
que não apresentam proteção nos próximos
anos/décadas. Outra razão é a não proteção,
ou proteção limitada, contra os tipos de HPV
de alto risco não incluídos na vacina. Além
disso, segundo o mesmo autor é provável
CIÊNCIA & TÉCNICA
que a proteção diminua com o tempo. No
entanto as infeções31,32,33 pelo HPV são muito comuns, estimando-se que cerca de 50 a
70% das pessoas com uma vida sexual ativa
possam contrair, pelo menos uma infeção
deste tipo.
Quanto à possibilidade da Reduzir o
número de intervenções no pós- rastreio,
verifica-se que 10 (35,7%) das enfermeiras
responderam Não Concordar com essa diminuição, já quanto à possibilidade da descontinuidade de rastreio citológicos, nas jovens
que foram vacinadas na sua adolescência, 23
(82,1%) das enfermeiras Não Concorda. Ou
seja, são34 as mulheres mais jovens as que
menos fazem citologias, ou seja 55,6% das
mulheres entre os 25-29 anos nunca fizeram
uma citologia, e as do grupo etário dos 45-49
anos, cerca de 46,5% as que mais cumprem
o intervalo de tempo recomendado. Segundo a Sociedade Portuguesa de Ginecologia14,
aconselha o início do rastreio 3 anos após a
primeira relação sexual.
Antes das vacinas serem administradas,
será importante assegurar que os profissionais tenham competências teóricas e instrumentais, para debater com os pais e jovens
adolescentes os benefícios da vacinação em
geral e das DST em particular.
Na questão colocada relativamente qual
a melhor idade para a introdução Universal
da Imunização para o HPV, a possibilidade
que reuniu maior consenso com 23 (82,1%)
Concorda Fortemente, foi a de ser administrada antes dos 14 anos. Na possibilidade do
esquema vacinal ser iniciado a partir dos 18
anos, observou-se que 12 (42,9%) das enfermeiras respondeu Não concordar. Embora a
idade35 recomendada para vacinação seja entre os 11e os 12 anos, pode ser no entanto administrada às raparigas desde os 9 até aos 26
anos de idade. Dados do Centro de Controlo
de Doenças e Prevenção dos Estados Unidos
da América38 sobre a Youth Risk Behavior Survey, revelaram que 34.4% dos alunos do 9º
Ano já iniciaram a sua atividade sexual. Ainda
para Vilelas36 no seu estudo 10,3% dos adolescentes do sexo masculino e 9,4% do sexo
feminino já tinham tido relações sexuais no 9º
ano de escolaridade. O início da primeira relação ocorre por volta dos 13 anos.
Além disso 37um estudo de prevalência de
clamídia entre adolescentes concluiu que os
alunos de 14 anos apresentaram uma prevalência de 27,5%.
Encontramos também que a idade do
adolescente influenciou a vontade para a recomendação da vacinação. Ou seja a vontade de recomendação da vacinação aumenta
com a idade do adolescente.
35
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir da análise, podemos concluir que
existem áreas mais sensíveis de intervenção relativas à aquisição de conhecimentos e habilidades para lidar com a problemática de saúde
da população, com base no perfil epidemiológico, ou seja, o reconhecimento e priorização
dos problemas, para orientar a intervenção.
Trata-se, portanto, de redireccionar o perfil dos enfermeiros para que atuem em conjunto com os outros parceiros de saúde, na
perspetiva de concretizar objetivos mais amplos. Destaca-se dois aspectos fundamentais na formação desse “novo profissional”.
Primeiro, para além de estar comprometido
com a competência técnica deverá também
estar envolvido com as éticas da responsabilidade e da solidariedade.
Outra área refere-se à especificidade da
intervenção da enfermagem, o que significa
AGOSTO 2014
CIÊNCIA & TÉCNICA
36
estar preparado para o “cuidar”, essência e
base histórica da enfermagem que, na saúde comunitária, pode ser interpretado como
conjunto de práticas e habilidades para o
acompanhamento, controle e resolução dos
problemas de saúde da população.
Destaca-se, também, a necessidade dos
profissionais de saúde desenvolverem processos educativos que favoreçam a participação da comunidade, estimulando-a a reconhecer os problemas e intervir sobre eles,
bem como a participar nas discussões e decisões que lhe digam respeito. Esses processos
são ações prioritárias do campo da promoção da saúde para lidar com as iniquidades,
por outro lado, mais do que reproduzir procedimentos ou desenvolver ações de caráter
fragmentado (pré-consulta, pós-consulta),
ligadas aos programas de saúde e voltadas
para a atuação de outros profissionais, cabe
à enfermagem aproveitar as oportunidades
de contato com a população para ampliar o
conhecimento sobre a mesma, com vistas a
uma assistência integral e participativa.
Em suma, verificasse que a especificidade
da prática de enfermagem não se deva restringir apenas à realização de procedimentos
técnicos, mas incorpore a dimensão da comunicação e perceção das necessidades do outro.
Este estudo tem diversas limitações, sugerindo que os resultados devem ser interpretados com alguma cautela.
Em primeiro lugar, a amostra de enfermeiros não é significativa. Existindo uma amostragem por conveniência, deste modo os
resultados não podem necessariamente ser
generalizados a todos os enfermeiros.
Este estudo incidiu sobre um conjunto de
fatores específicos, ou seja, vacina, profissional e adolescentes caraterísticos.
No futuro, será importante explorar outros fatores, tais como, as suas atitudes sobre
a sexualidade do adolescente e a sua capacidade de comunicar com os pais sobre temas
sensíveis. O profissional deve reconhecer a
importância que as crenças têm sobre a imunidade em geral.
Conhecer quais os fatores pessoais, discordantes de nosso sistema de valores, que
pode levar-nos a uma mudança de atitude de
sequência negativa, como o contrário, pode
também levar-nos a uma mudança de atitude,
porém neste caso, de sequência positiva.
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37
CIÊNCIA & TÉCNICA
ENTRADA DO ARTIGO MARÇO 2013
ADESÃO À TERAPÊUTICA
ANTI-RETROVIRAL.
QUAIS AS INTERVENÇÕES DE ENFERMAGEM?
NELSON MANUEL CARDOSO MENDÃO
AGOSTO 2014
Licenciatura em Enfermagem pela Escola Superior de Enfermagem de Angra do Heroísmo.
Enfermeiro na Equipa de Tratamento de Santarém do CRI Ribatejo.
Mestrando do 3º Curso de Mestrado em Enfermagem Comunitária da Escola Superior de Saúde de Santarém
38
RESUMO
A aceitação da doença VIH/SIDA, a cronicidade
do tratamento e os efeitos secundários da terapêutica anti-retroviral são alguns dos fatores que
condicionam a adesão ao regime terapêutico
anti-retroviral.
Pretende-se identificar as intervenções de enfermagem promotoras da adesão à terapêutica anti-retroviral na pessoa adulta com VIH/SIDA.
A partir da questão PI[C]O, foram definidos alguns conceitos e realizada uma pesquisa de artigos científicos em base de dados eletrónica (no
período entre 2007 a 2012), sendo selecionados 3
estudos, segundo critérios centralizados na problemática em estudo.
Emergem três intervenções de enfermagem promotoras da adesão à terapêutica: o envolvimento
da família nos processos de adesão, a entrevista
motivacional e a visita domiciliar de enfermagem.
Palavras-Chave: Intervenções de enfermagem,
adesão, terapêutica anti-retroviral, VIH
ABSTRACT
Acceptance of the disease HIV / AIDS, chronic treatment and the side effects of antiretroviral therapy are some of the factors that influence adherence to antiretroviral regimen.
It is intended to identify nursing interventions that
promote adherence to antiretroviral therapy in
adult with HIV / AIDS.
From the point PI [C] O, some concepts were defined and conducted a search of scientific articles
in an electronic database (for the period 2007 to
2012), three studies were selected according to criteria centered on the problem under study.
Rise to three nursing interventions that promote
adherence to therapy: family involvement in adhesion processes, motivational interviewing and
nursing home visits.
Keywords: Nurse interventions; adherence, antiretroviral, HIV
CIÊNCIA & TÉCNICA
INTRODUÇÃO
De acordo com a Organização Mundial de
Saúde as doenças crónicas constituem uma
área de grande preocupação no panorama
da saúde mundial, sendo responsáveis por
grande parte da mortalidade e morbilidade
observada nos países desenvolvidos e em
vias de desenvolvimento. Além disso, estas
serão a primordial causa de incapacidade no
mundo até 2020 e representarão a maior sobrecarga para os sistemas de saúde.
É neste contexto que a adesão ao regime
terapêutico, principalmente em situações de
doença crónica, assume uma grande importância para os profissionais de saúde, pois a
não adesão é responsável pelo aumento da
probabilidade de insucesso das terapêuticas,
por complicações evitáveis, por aumento dos
gastos com a saúde e aumento da morbilidade e mortalidade (Organização Mundial de
Saúde,2003).
O tratamento do VIH/SIDA tem progredido significativamente com o desenvolvimento da terapia anti-retroviral e estão definidos três pilares fundamentais para o seu
sucesso: a capacidade de entrada da pessoa
no sistema, a retenção/fidelização da pessoa
ao programa de assistência e a adesão à terapêutica (Programa Nacional para a infeção
VIH/SIDA, 2012).
A não adesão à terapêutica anti retroviral
pode ter grandes consequências para a saúde pública, uma vez que a resistência a esta
terapêutica (provocada por uma não adesão)
pode passar de pessoa para pessoa em situação de contágio (Organização Mundial de
Saúde, 2003).
O termo adesão ao regime terapêutico de
acordo com a CIPE/ICN Versão 2 (2011:38)
é definido como uma “ Ação auto-iniciada
para promoção de bem-estar, recuperação
e reabilitação, seguindo as orientações sem
desvios, empenhado num conjunto de ações
ou comportamentos. Cumpre o regime de tratamento, toma os medicamentos como prescrito, muda o comportamento para melhor,
sinais de cura, procura os medicamentos na
data indicada, interioriza o valor de um comportamento de saúde e obedece às instruções
relativas ao tratamento. (Frequentemente associado ao apoio da família e de pessoas que
são importantes para o cliente, conhecimento
sobre os medicamentos e processo de doença,
motivação do cliente, relação entre o profissional de saúde e o cliente).
De acordo com Michael (2011) a “Association of Nurses in AIDS Care” definiu competências específicas de enfermagem para os
cuidados, tratamento e prevenção do VIH/
SIDA onde o enfermeiro deve demonstrar
capacidade para promover a manutenção da
terapêutica anti-retroviral, através da utilização de estratégias/intervenções que promovam a sua adesão.
Nas orientações da Organização Mundial
de Saúde (2003) específicas para a adesão ao
regime terapêutico no VIH/SIDA (“Adherence
to long-term therapies evidence for action”)
são emanadas algumas intervenções que
promovem a adesão ao regime terapêutico anti-retroviral, nomeadamente: educar a
pessoa e explicar os objetivos da terapia e
a necessidade de adesão, recrutar a família
para apoiar o plano de tratamento, criar grupos de apoio à adesão, trabalhar em equipa
multidisciplinar (enfermeiros, farmacêuticos,
assistentes socias, voluntários, gestores de
caso e médicos), desenvolver relações com
organizações locais de base comunitária
para ajudar a explicar a necessidade de adesão e envolver ativamente a pessoa nas suas
decisões de cuidados próprios de saúde.
39
CIÊNCIA & TÉCNICA
AGOSTO 2014
A presente revisão sistemática da literatura, serve para refletir sobre os contributos
que estes profissionais podem proporcionar
nos processos de adesão à terapia anti-retroviral.
METODOLOGIA DE PESQUISA
O esquema de referência PICO (população, intervenção, comparação e “outcomes”/
resultados), elaborado por et all Sacket (1997)
é um método útil para elaborar questões de
investigação (Craig e Smyth, 2004).
Como ponto de partida para a revisão
sistemática da literatura foi formulada a pergunta de investigação: Quais as intervenções de enfermagem (I) que promovem a
adesão à terapêutica anti – retroviral (O)
na pessoa adulta com VIH/SIDA (P)?
Quadro n.º1 – Critérios para a formulação
da questão de investigação.
40
Conceitos
P a r t i c i - Quem foi
pantes
estudado?
Enfermeiros
Pessoa
adulta com
VIH/SIDA
Pessoa
VIH/SIDA
I
Inter ven- O que foi
ções
feito?
Intervenções
de Enfermagem
Intervenções
de Enfermagem
C
Podem
Comparaexistir ou
ções
não
O
Outcomes
Adesão à
terapeutica
anti-retroviral
Adesão à
terapêutica
anti-retroviral
P
Resultados/
Efeitos e
consequências
Palavras
Chave
« Nurs* »
« Adherence »
« HIV »
« Antiretroviral »
As palavras-chave foram validadas como
descritores na plataforma Medical Subject
Headings
(http://www.nlm.nih.gov/mesh/
MBrowser.html) e procedeu-se à pesquisa através da plataforma EBSCO (CINAHL Plus; Medline; Nursing & Allied Health
Collection; Medilactina) introduzindo as
palavras-chave na sequência apresentada
“nurs*”,”adherence”, “HIV”, “antiretroviral”
no modo “AB ABSTRAT” tendo sido utilizado
sempre o operador lógico “and”.
A pesquisa realizou-se no dia 15 de Novembro de 2012, estabeleceu-se como filtro
cronológico o período de Janeiro de 2007 a
Novembro de 2012.
Após a execução do protocolo de revisão
(Anexo I), aplicaram-se os critérios de inclusão e exclusão apresentados no Quadro nº2
Quadro nº2 - Critérios protocolados adotados
Critérios de
Inclusão
Critérios de
Exclusão
Estudos em Humanos
de ambos os sexos
Pessoa com VIH/SIDA
Estudos qualitativos e
quantitativos
Artigos
de
revisão
sistemática de literatura
Sujeitos Adultos (idade
superior ou igual a 19
anos e inferior a 64 anos)
Um dos autores é
enfermeiro
Artigos disponíveis em
PDF.
Estudos nas áreas de:
Saúde Infantil
Saúde Materna
Duplicação de artigos
Nenhum dos autores é
enfermeiro
Posteriormente à aplicação dos respetivos
critérios, surgiram 9 artigos. Após a leitura
integral do resumo, exclui-se: o artigo 2 e 8
uma vez que a análise dizia respeito as intervenções promotoras da adesão realizadas
por vários profissionais de saúde, o artigo 3
por nenhum dos autores ser enfermeiro, o
artigo 5 por se centrar na análise do tipo de
terapia anti-retroviral prescrita e o artigo 7
por dizer respeito à área da saúde materna.
Após esta fase, são apresentados 3 estudos que vão de encontro ao objetivo desta
revisão sistemática (identificar as intervenções de enfermagem que promovem a adesão à terapêutica anti-retroviral à pessoa
adulta com VIH/SIDA).
CIÊNCIA & TÉCNICA
Os artigos foram classificados segundo a
escala de 6 níveis de evidência (Guyatt G.&
e Rennie D. 2002) e foram elaboradas fichas
de leitura onde os estudos são apresentados
com base nos seguintes parâmetros: título,
autores, participantes, intervenções, resultados e tipo de estudo
RESULTADOS
ESTUDO 1 - A PRELIMINARY RANDOMIZED
CONTROLLED TRIAL OF A NURSE-DELIVERED
MEDICATION ADHERENCE INTERVENTION
AMONG HIV-POSITIVE OUTPATIENTS INITIATING ANTIRETROVIRAL THERAPY IN BEIJING,
CHINA
Autores: Jane M. Simoni , Wei-Ti Chen ,
David Huh • Karen I.Fredriksen-Goldsen,
Cynthia Pearson, Hongxin Zhao, Cheng-Shi
Shiu, Xin Wang, Fujie Zhang
Participantes: 70 pessoas que iniciaram
terapêutica anti-retroviral no Hospital de
Beijing’s Ditan.
Intervenções: Durante o período de
Dezembro de 2006 e Março de 2008 foram
criados dois grupos aleatoriamente, um
grupo de caso e um grupo de controlo. Ao
primeiro grupo de pessoas (n=26) (grupo de
controlo) quando era iniciada a terapêutica
anti-retroviral o enfermeiro explicava
em 30 minutos os planos de tratamento,
efeitos secundários da terapêutica antiretroviral, e a importância da adesão.
Posteriormente não havia mais qualquer tipo
de acompanhamento a não ser a entrega
da medicação. Esta intervenção breve foi
denominada por intervenção mínima.
Ao segundo grupo de pessoas (n=36) (grupo
de casos) quando era iniciada a terapia antiretroviral, o enfermeiro realizava 3 sessões,
de uma hora cada. As sessões decorriam
na primeira, quinta e nona semana após o
início da terapia anti-retroviral. As respetivas
sessões
envolviam
uma
abordagem
cognitiva-comportamental e a resolução de
problemas.
As sessões tinham como conteúdos, o
reforço para continuação do tratamento,
a aprendizagem da terapia anti-retroviral,
o regime prescrito, a comunicação com
os profissionais de saúde, a formulação
de um calendário de medicação diária ,
o armazenamento dos medicamentos,
estratégias de lembrança das tomas, os
efeitos secundários da terapia anti-retroviral
e a importância do apoio familiar e social,
Para além desta sessões neste grupo era
entregue a cada pessoa um dispositivo de
aviso eletrônico que relembrava a toma da
medicação anti-retroviral diariamente. Esta
intervenção foi denominada de intervenção
avançada. No grupo de controlo, havia a
hipótese da pessoa em estudo escolher um
familiar para ser envolvido no processo de
adesão. Dos 36 participantes 8 optaram por
escolher o conjugue, 1 escolheu o pai e 3
escolheram um parceiro do mesmo sexo.25
pessoas optaram por não envolver ninguém
no processo de adesão.
Resultados: A adesão era contabilizada
através da tecnologia EDM que consiste num
frasco de plástico e tampa que contém um
microprocessador capaz de gravar a dose,
data e hora precisa de cada abertura do
frasco. Para além desta tecnologia foi utilizada
simultaneamente o autorrelato em que a
pessoa respondia à questão “Quantas doses
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AGOSTO 2014
CIÊNCIA & TÉCNICA
42
de anti-retrovirais não tomou nos últimos
7 dias?”. Os autores também recorreram a
bio marcadores para contabilizar a adesão
nomeadamente a carga viral e a contagem
de células CD4.
Ao fim de 128 semanas, o grupo de caso
(intervenção mínima) apresentava 85,7%
de adesão através do autorrelato, 70,1%
de adesão através dos dados registados no
EDM relativo à dose administrada, 50,0%
de adesão relativo à hora exata da toma. A
carga viral média era de 1,9 log 10 copias/ml
e a contagem de células CD4 era em média
de 255.8 células/mm3.
O grupo de controlo (intervenção avançada)
no mesmo período de tempo apresentava
94,4% de adesão através do autorrelato,
71,8% de adesão através do dados registados
no EDM relativo à dose administrada, 56,7
% de adesão relativo à hora exata da toma.
A carga viral era em média de 2,0 log 10
cópias/ml e a contagem de células CD4 era
em média de 268.0 células/mm3.
Os autores consideram que apesar de não
haver relevância estatística em ambos os
grupos os grupo que sofreu uma intervenção
avançada no geral apresenta maiores níveis
de adesão.
Os autores concluem que a epidemia do
VIH na China continua a oferecer vários
desafios no que diz respeito aos processos
de adesão à terapêutica anti-retroviral e é
urgente estudar-se mais aprofundadamente
as intervenções promotoras da adesão à
terapeutia anti-retroviral.
É feita referência que os enfermeiros são
os profissionais mais aptos para intervirem
nos processos de adesão à terapêutica
anti-retroviral uma vez que estes têm um
conhecimento mais abrangente da pessoa
e por esse motivo devem ser aproveitados
como recurso nos processos de adesão.
Os autores fazem referência que incorporar
os membros da família que podem oferecer
apoio social, são medidas que devem ser
pensadas como estratégias promotoras da
adesão à terapêutica anti-retroviral.
Tipo de Estudo/Nivel de Evidencia: Quantitativo (“Randomized Controlled Trial”) /
Nivel II.
ESTUDO 2 - USING MOTIVATIONAL INTERVIEWING TO PROMOTE ADHERENCE TO
ANTIRETROVIRAL MEDICATIONS: A RANDOMIZED CONTROLLED STUDY
Autores: c. Diiorio, F. Mccarty, K. Resnicow,
M. Mcdonnell holstad, J. Soet,K. Yeager, S. M.
Sharma, D. E. Morisky e B. Lundberg
Participantes: 247 Pessoas que iniciaram
terapêutica anti-retroviral ou alteraram o esquema terapêutico anti-retroviral numa clínica de Atlanta, Georgia, nos Estados Unidos
da América.
Intervenções: Entre o período de Junho de
2001 e Novembro de 2003 procedeu-se à seleção dos participantes, em Janeiro de 2005
foi concluído o estudo.
Foram criados 2 grupos. O grupo de caso
(n=125),que individualmente recebia 5 sessões de aconselhamento motivacional para
adesão à terapia anti-retroviral. As sessões
decorriam durante um período de três meses. Em média as sessões duravam entre 20
e 90 minutos. Quando a pessoa não se podia
deslocar à clínica a sessão era realizada pelo
telefone.
As sessões eram realizadas por enfermeiros
CIÊNCIA & TÉCNICA
com competências específicas comunicacionais para este tipo de sessão. As sessões
tinham como objetivo ajudar as pessoas a
perceberem quais as ações necessárias para
manter com êxito um elevado nível de adesão
à terapia anti-retroviral através de uma técnica
comunicacional denominada entrevista motivacional. Nas respetivas sessões eram abordos temas como identificação de barreiras à
adesão, os benefícios da adesão ao regime terapêutico, as questões da ambivalência sobre
a toma dos medicamentos anti-retrovirais. Era
também, delineado com a pessoa um plano
de ação onde eram integradas estratégias
para melhorar a adesão à terapêutica.
O grupo de controlo (n= 122) não recebia
sessões de aconselhamento estruturadas
com base na entrevista motivacional. Utilizavam os métodos habituais em prática na
clínica em que cada enfermeiro decidia quais
os métodos de ensino mais adequado com
base no nível de educação e cultura. Era feita
uma pequena abordagem ao tipo de regime
terapêutico e horário.
A colheita de dados decorreu durante 12
meses. Aos participantes de ambos os grupos era fornecido um dispositivo denominado MEMS Caps. O respetivo dispositivo
tem um microprocessador onde fica registado a data e hora em que cada frasco que
contém terapêutica anti-retroviral é aberto.
Quando os participantes se deslocavam à
clínica os respetivo dispositivo era ligado a
um computador, onde ficavam registados
os dados de adesão. Em ambos os grupos
aos 6 meses através de análise laboratorial
era feita a contagem das células CD4 e avaliada a carga viral.
Resultados: O grupo de caso (grupo com
5 sessões de aconselhamento) ao fim de 12
meses apresentava 64% de adesão no que
diz respeito ao total da dose tomada, 41% de
adesão no que diz respeito a dose tomada
no horário prescrito. Aos 6 meses este grupo
apresentava 58% de adesão no que diz respeito à carga viral.
O grupo de controlo (grupo que não recebia
sessões de aconselhamento), ao fim de 12
meses apresentava 55% de adesão no que
diz respeito ao total da dose tomada, 24% de
adesão no que diz respeito à dose tomada
no horário prescrito. Aos 6 meses este grupo
apresentava 47% de adesão no que diz respeito à carga viral
Os autores fazem referência que este estudo
foi um dos primeiros a abordar os efeitos da
entrevista motivacional na adesão à terapêutica anti-retroviral e permitiu também treinar
os enfermeiros nesta técnica comunicacional. Os participantes do grupo de caso tiveram uma maior percentagem de adesão do
que os participantes do grupo de controlo.
A entrevista motivacional é usada principalmente por psicólogos nas suas práticas
clínicas. No entanto, no cenário da adesão
terapêutica na pessoa com VIH/SIDA, os enfermeiros são os profissionais mais indicados
para promover a adesão terapêutica a este
grupo de pessoas. A entrevista motivacional
pode ser utlizada como uma intervenção de
enfermagem que aumenta a motivação para
a mudança comportamental.
Apesar dos resultados obtidos, são necessários mais estudos para avaliar o efeito da entrevista motivacional nos processos de adesão terapêutica.
Tipo de Estudo/Nivel de Evidencia: Quantitativo ( “Randomized Controlled Trial”) /Nivel II.
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CIÊNCIA & TÉCNICA
ESTUDO 3 - EFFECTS OF NURSE-DELIVERED
HOME VISITS COMBINED WITH TELEPHONE
CALLS ON MEDICATION ADHERENCE AND
QUALITY OF LIFE IN HIV-INFECTED HEROIN
USERS IN HUNAN OF CHINA
AUTORES: HONGHONG WANG, JUN ZHOU,
LING HUANG, XIANHONG LI, KRISTOPHER P
FENNIE AND ANN B WILLIAMS
AGOSTO 2014
Participantes: Uma amostra de 116
participantes com terapeutica anti-retroviral
instituída e com consumos de heroína na
região de Hunan da China.
44
Intervenções: Durante o período entre Julho
de 2007 e Abril de 2008 foram criados dois
grupos, o grupo de controlo (n= 58) que recebeu apenas os cuidados de rotina.
O grupo de caso (n=58) recebeu visitas domiciliares combinadas com intervenção telefónica ao longo de oito meses.
As visitas domiciliares foram realizadas a
cada dois meses. As visitas domiciliares tinham os seguintes objetivos específicos:
fornecer informações básicas sobre o VIH
medicação e adesão; avaliar com os participantes e compreensão dos membros da
família e expectativa em relação à terapia
anti-retroviral; fornecer panfletos sobre o
tratamento anti-retroviral; educar os participantes e familiares sobre o esquema terapêutico anti-retroviral; informar sobre os
efeitos colaterais esperados; controlar os
efeitos colaterais dos medicamentos; avaliar
possíveis obstáculos para a adesão; informar sobre estratégias promotoras da adesão; identificar as situações e razões que expliquem a falta de tomas e as tomas fora do
horário prescrito; definir metas de adesão à
medicação; estabelecer e definir hora e local
para tomar a medicação; apoiar os membros
da família; avaliar a atitude dos membros
da família; fazer sugestões e criar estratégias para relembrar as tomas da medicação;
fornecer um dispositivo eletrônico com um
alarme para os participantes relembrarem a
toma da medicação; instruir os participantes a planear com antecedência mudanças
na rotina (férias, feriados); antecipar necessidade de medicação (medicação em stock);
sugerir soluções para eventos adversos; reforçar e fortalecer a capacidade de aderência; gerir o abuso de drogas; discutir com
os participantes e familiares o estigma e a
discriminação associados ao VIH/SIDA e uso
de drogas; avaliar o programa de manutenção com metadona nos participantes com
consumos de heroína ativos; instruir sobre
refeições saudáveis, higiene pessoal e saneamento do ambiente domiciliar, informar
sobre comportamentos de risco (relações
sexuais desprotegidas e partilha de material
cortante).
As chamadas telefónicas foram realizadas
a cada duas semanas pelos mesmos enfermeiros que realizaram as visitas domiciliares,
após cada visita domiciliar, para fazer valer o
efeito da visita domiciliar o tempo de cada
chamanda telefónica vairiou entre 10-20 minutos a uma hora
Resultados: Pretendia-se avaliar a adesão à
terapêutica anti-retroviral e a qualidade de
vida e depressão. Para tal como instrumento
de colheita de dados utilizaram o questionário “for Clinical Research on AIDS (CPCRA)
Antiretroviral Medication Self-Report” onde
os participantes devem responder se nos últimos 7 dias tomaram: toda a medicação, a
maioria, cerca de metadade ou muito pouca
medicação anti retroviral. Também foi questionado se tomaram a terapia anti retroviral
CIÊNCIA & TÉCNICA
no horário correto.
Para avaliar a qualidade de vida e depressão
utilizaram o questionário “Chinese versions
of World Health Organization Quality of Life
Instrument – Abbreviated version (WHOQOL-BREF)” e a escala “Self-rating Depression Scale”. Foi aplicado um pré-teste e um
pós-teste.
O tamanho da amostra deste estudo é pequeno o que limita a capacidade de generalizar as conclusões.
Ao fim de oito meses, os participantes do
grupo experimental apresentaram maiores
níveis de adesão à terapêutica anti retroviral e à toma da terapêutica no horário correto.
Na escala de qualidade de vida o grupo
caso demonstrou níveis mais significativos
nas dimensões física, psicológica, social
e ambiental do que o grupo de controlo.
Na escala da depressão o participantes do
grupo experimental apresentou níveis inferiores do que o grupo de controlo.
Os autores concluem que as visitas domiciliares e telefonemas são eficazes na promoção da adesão ao tratamento anti-retroviral
e melhoraram a qualidade de vida e sintomas depressivos em pessoas infetadas pelo
VIH/SIDA e com consumos de heroína.
No respetivo artigo surge como conclusão
que a família é um pilar fundamental para a
adesão ao regime terapêutico e o seu envolvimento no processo de cuidados faz com
que os participantes se sintam menos discriminados pelos membros da família e com
menores níveis de depressão
É importante que os enfermeiros reflitam sobre adesão à terapia anti-retroviral em consumidores de heroína.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
As evidências obtidas nesta revisão sistemática da literatura, destacam essencialmente três intervenções de enfermagem promotoras da adesão à terapêutica anti-retroviral
nomeadamente: o envolvimento da família
nos processos de adesão, a comunicação/
entrevista motivacional como instrumento
de capacitação e a visita domiciliar como recurso.
Estes resultados vão de encontro ao objetivo inicial deste trabalho, uma vez que foi possível identificar as intervenções de enfermagem que promovem a adesão à terapêutica
anti retroviral à pessoa adulta com VIH/SIDA.
A prática baseada na evidência é proporcional à qualidade dos cuidados em enfermagem, pois através desta surgem conhecimentos que orientam a prestação de
cuidados. O recurso a achados científicos
permitem ao enfermeiro, agir de forma fundamentada e competente
Toda a evidência analisada no presente
trabalho considera-se de nível II segundo
a classificação de Guyatt G.& e Rennie D.
(2002) o que sustenta a aplicabilidade prática destas intervenções de enfermagem no
quotidiano do enfermeiro.
Importa referir que para além a prescrição da terapia anti-retroviral há um grande
caminho a percorrer entre a pessoa a família
e o enfermeiro. É essencial que o enfermeiro
recorra à sua vertente educacional e estabeleça vínculos com a pessoa com VIH/SIDA
e os seus familiares, com vista a planear e
implementar intervenções favorecedoras da
adesão tornando a pessoa um agente ativo
no seu processo de cuidar.
45
CIÊNCIA & TÉCNICA
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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db=mnh&AN=20500277&lang=pt-br&site=ehost-live
CIÊNCIA & TÉCNICA
ENTRADA DO ARTIGO MARÇO 2013
A importância da Enfermagem
Forense em contexto de
investigação criminal
ANA FILIPA SANTOS DIAS
Enfermeira no Serviço de Urgência de Pediatria do Hospital de Santa Maria, Lisboa.
Pós-graduada em Enfermagem Forense pela Escola Superior de Enfermagem São Francisco das Misericórdias
RESUMO
O presente texto pretende enfatizar uma nova
vertente da Enfermagem, bastante desenvolvida nos Estados Unidos da América e, que em
Portugal começa a dar os primeiros passos. Esta
reflexão resulta de revisões bibliográficas sobre
a Enfermagem Forense, percorrendo o início da
Enfermagem como profissão e a sua essência,
aliada ao emergir crescente das ciências Forenses. Usufruí da minha experiência profissional,
decorrente das minhas práticas quotidianas e,
pretendi salientar a importância da existência de
Enfermeiros com conhecimentos na área Forense
de modo a auxiliar o sistema de Justiça.
Esta reflexão tem como objectivo, realçar a todos os profissionais de saúde, a importância dos
enfermeiros Forenses num processo de Investigação criminal, contribuindo para uma sociedade
mais justa e para o bem comum.
Palavras-Chave: Enfermagem Forense, Ciências
Forenses, Sistema de Justiça
ABSTRACT
This text intends to emphasize a new aspect of
nursing, fairly developed in the United States
of America and, that in Portugal it starts to
give the first steps. This reflection results from
bibliographical reviews about Forensic Nursing,
stepping through the beginning of Nursing as
a profession and its essence, together with the
growing often emerging forensic sciences. Take
advantage of my professional experience as a
result of my daily practices and, intended to point
out the importance of the Nurses with expertise in
forensic area of way to help the system of justice.
This reflection aims, enhance all healthcare
professionals, the importance of Forensic Nurses in
the criminal investigation process, contributing to
a fairer society and for the common good.
Keywords: Forensic Nursing, Forensic sciences, Justice Administration System
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AGOSTO 2014
CIÊNCIA & TÉCNICA
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INTRODUÇÃO
A profissão de Enfermagem é exigente
e requer conhecimento médico, habilidade
técnica e aptidões como a paciência, empatia
e compaixão. Tudo isto que define a profissão, aliado a uma precisão científica e à implementação de procedimentos adequados
de investigação, definem de uma forma sumária a Enfermagem Forense (Forensic Nursing: 2012)
Desenvolvi este tema, porque acredito que a Enfermagem Forense ocupa uma
elevada importância no processo de investigação criminal e consequentemente na sociedade, contribuindo para o bem comum,
competência imperatória do enfermeiro determinada no art. 80º do Código Deontológico do Enfermeiro.
Como tal, é primordial realizar uma breve
abordagem sobre a origem da Enfermagem,
enfatizando a sua génese e percurso histórico, e assim compreender a essência da profissão, aliada nos dias de hoje, às ciências forenses. Em seguida irei desenvolver sobre a
prática da Enfermagem Moderna e o emergir
crescente das ciências forenses. Vou ainda
abordar o emergir da Enfermagem Forense
e o seu percurso, enfatizando por fim a sua
importância baseada em referências bibliográficas e na minha subjectiva opinião, conjugada com a minha experiência profissional.
A HISTÓRIA DA ENFERMAGEM
Desde o emergir da vida, existe no Homem
a necessidade de cuidar, de "tomar conta" o
que permite à vida continuar, desenvolver-se
e, assim fazer recuar a morte. Este conceito
existe desde sempre e muito antes de os cuidados pertencerem a um ofício e/ou a uma
profissão (COLLIÈRE:1999).
A necessidade do cuidar correlaciona-se
com os primórdios da Enfermagem, inicialmente com as acções desenvolvidas pelas
mulheres, de modo a garantir a sobrevivência
das espécies. Posteriormente a prestação de
cuidados enraizou-se nas práticas sacerdotais baseadas no empirismo até ao período
hipocrático, onde foi gerada uma nova concepção de saúde dissociando assim, a arte de
cuidar a preceitos místicos e sacerdotais, baseando-se na utilização do método indutivo,
da inspecção e da observação. A prestação
de cuidados, ligada à prática da Enfermagem
foi desenvolvida no período medieval por religiosos, não tendo assim uma conotação de
prática profissional. Com a Revolução Industrial ressalta a Enfermagem como actividade
profissional institucionalizada até ao séc. XIX,
em que surge a Enfermagem Moderna muito
influenciada pelas correntes de pensamento
de Florence Nightingale (Conselho Regional
de Enfermagem do RJ)
A ENFERMAGEM MODERNA E AS
CIÊNCIAS FORENSES
Com Florence Nightingale emergiram as
bases da Enfermagem moderna. A criação
do modelo assistencial cujos alicerces são os
factos observáveis, iniciou uma nova abordagem de conhecimento através do método
científico. Implementou também, os registos
clínicos do doente, que hoje em dia ainda
são utilizados (Wikipédia: 2012).
Actualmente, podemos entender a Enfermagem como " A arte de cuidar e a ciência
cuja essência e especificidade é o cuidado ao
ser humano, individualmente, na família ou
em comunidade de modo integral e holístico, desenvolvendo de forma autónoma ou
em equipa actividades de promoção, protec-
CIÊNCIA & TÉCNICA
ção, prevenção, reabilitação e recuperação
da Saúde." (ROCHA, S; ALMEIDA, M.: 2000
pág.97).
Assim depreende-se que a Enfermagem actualmente, “abarca” um conceito
amplamente complexo que se centra na
prestação de cuidados ao indivíduo, não
meramente enfermo mas, tendo em conta
as várias vertentes do Ser Humano (físico,
espiritual, emocional, social e económico).
Tendo em conta esta perspectiva, podemos
salientar a necessidade dos diagnósticos e
intervenções de Enfermagem autónomas,
já estabelecidas por exemplo, pela NANDA e pela CIPE e ainda, desenvolvidas num
conceito de multidisciplinaridade implícito.
Este conceito vai revelar-se fundamental,
em termos de complementaridade com as
ciências forenses.
O termo forense advém do latim forensis que diz respeito ao tempo dos Romanos
em que os praticantes de delitos eram presentes no forum, onde existia um debate
público, para discutir vertentes de defesa e
acusação de modo a obter a Justiça social.
Assim se representa um processo forense
na nossa sociedade, nos dias de hoje (Lynch,
V.; Duval, J.: 2006).
Qualquer assunto em circunstâncias suspeitas requer de uma investigação para apuramento dos factos, podendo ser resolvido
em tribunal e por isso é considerado um
caso forense. Por este motivo, as ciências forenses referem-se à aplicação de várias disciplinas utilizadas para elucidar questões de
interesse para os tribunais em relação a um
crime ou a uma acção cível. Esta multiplicidade de disciplinas envolvidas em questões
forenses pretende de forma científica clarificar questões, que se encontram à margem
de livre apreciação do Juiz, de modo a dis-
sipar dúvidas e apurar a verdade atestando
a prova pericial, como está regulamentado
nos art.s 151º a 163º do Código de Processo
Penal (CPP).
As áreas científicas envolvidas em questões do meio forense são vastas, entre as
quais a área da saúde; especificamente os
médicos, na sua implicação nas perícias médico-legais.
A violência e os traumas associados, na
nossa sociedade actual estão amplamente
reconhecidos, como sendo um problema
de Saúde em todo o Mundo. Actualmente
a violência é encarada como uma responsabilidade mútua entre o sistema Legal e
de Saúde. A Medicina Legal é reconhecida como uma componente respectiva das
ciências forenses e consequentemente a
Enfermagem Forense também deve ser
encarada como tal, tendo em conta que
é uma ciência que aplica conhecimentos
científicos e habilidades para identificar,
promover a segurança, intervir e prevenir
em fenómenos de mortalidade e morbilidade (Lynch, V.; Duval, J.: 2006).
A ENFERMAGEM FORENSE
Com as transformações sociais existente na actualidade, aliadas à descrença
dos indivíduos pelos sistemas sociais, denotou-se consequentemente um aumento
da taxa de criminalidade. Segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE: 2010),
o número de crimes registados em 2009
aumentou 2,5% comparativamente a 2003.
Em relação a 2011, a taxa de criminalidade total situa-se nos 39,0 ‰, sendo que os
crimes contra a integridade física ocupam
5,7‰ dessa totalidade (INE: 2012). Posta esta realidade, facilmente conseguimos
49
AGOSTO 2014
CIÊNCIA & TÉCNICA
50
perceber a recorrência crescente aos sistemas de saúde e, da necessidade da existência de um “apoio” em contexto hospitalar para colmatar as lacunas, existente até
então, no que diz respeito à cadeia de custódia da prova, fundamental num Processo
de Investigação Criminal, para se concluir
a verdade dos factos. Assim, podemos falar em Enfermagem Forense que segundo a Internacional Association of Forensic
Nurses (IAFN: 2006) é definida como “ (…)
the practice of nursing globally when health
and legal systems intersect”. Os enfermeiros
são elementos privilegiados neste contexto
e, se se encontrarem despertos para estas
questões podem desenvolver um trabalho
complementar fundamental para combater
o crime e a violência.
Em termos evolutivos no que diz respeito
à Enfermagem Forense, documentos históricos revelam que antes da Revolução Francesa as parteiras testemunhavam a respeito
de abusos sexuais e gravidez. Em 1983, foi
publicado o primeiro artigo que englobava
a medicina nas ciências forenses, no Journal
of Forensic Science. No entanto, em 1986 foi
reconhecida cientificamente a Enfermagem
Forense pela American Academy of Forensinc Sciences. (Lynch, V.; Duval, J.: 2006).
Em 1992 numa reunião organizada pela
Sexual Assault Resource Service e a Universidade de Enfermagem do Minnesota, um
conjunto de Enfermeiros ligados a questões de abusos sexuais juntou-se e formou
a IAFN, organização internacional. Em 1995
esta associação foi reconhecida oficialmente como uma especialização pela American
Nurses Association (ANA). A missão do IAFN
está direccionada de forma a assegurar o
desenvolvimento, promoção e divulgação
de informações a nível internacional sobre
Enfermagem Forense, definindo metas e um
plano estratégico até 2014. Em 2002 a IAFN
iniciou o desenvolvimento de áreas particulares de especialização relativamente à Enfermagem Forense como o Sexual Assault
Nurse Examiner-Adult/Adolescent (SANE-A) e em 2006 o Sexual Assault Nurse Examiner Pediatric/Adolescent (SANE-P). Actualmente, a organização apresenta ainda
como prática da Enfermagem Forense áreas
particulares como a violência doméstica e
violência interpessoal, maus-tratos a idosos,
investigação de mortes e desastres em massa (IAFN: 2006).
Nos Estados Unidos da América, onde
a Enfermagem Forense já detém um papel
primordial no processo de investigação criminal, o enfermeiro Forense pode desempenhar funções em contexto hospitalar, em
situações de agressões de índole diversa. No
entanto o enfermeiro forense também poderá desempenhar um papel fulcral na comunidade, tendo em conta os vários níveis de
prevenção. Ao nível da prevenção primária
o enfermeiro poderá desenvolver junto da
comunidade acções de formação para a saúde, de combate à violência e criminalidade
(IAFN: 2006)
A IMPORTÂNCIA DA ENFERMAGEM
FORENSE
Mediante o que foi exposto anteriormente, salientando a essência da Enfermagem e o seu desenvolvimento, tendo
ciente o crescente emergir do conhecimento forense e assim, compreendendo a
intersecção entre as duas ciências, podemos definir a Enfermagem Forense de uma
forma mais complexa. Segundo (Lynch, V.;
Duval, J.: 2006: p. 5) “Forensic nursing scien-
CIÊNCIA & TÉCNICA
ce is defined as the application of the forensic aspects of healthcare combined with the
bio/psyco/social/spiritual education of the
registered nurse in the scientific investigation and treatment of the trauma or death
of victims and perpetrators of violence, criminal activity, and traumatic accidents”.
Já no desenvolvimento da prestação
de cuidados, no período hipocrático sobrepôs-se o método indutivo ao processo meramente empírico e aspectos como
a inspecção e observação foram valorizados em questões de saúde. Na Enfermagem Forense revelam-se essenciais tendo
em conta que a observação da vítima e ou
agressor bem como a inspecção aliada à
correcta recolha de vestígios são aspectos
fundamentais.
Ainda relativamente ao percurso histórico da Enfermagem, com Florence Nightingale e a sua influência na implementação
de registos clínicos, estes revelam-se aspecto fundamental da prática da Enfermagem Generalista. Em Enfermagem Forense
os registos manifestam-se de extremo interesse, tendo em conta que o enfermeiro
observa, avalia e regista informações que
podem ser imprescindíveis aquando de
um processo de investigação criminal e em
tribunal, de modo a apurar a verdade dos
factos ocorridos, podendo ainda ser solicitado para prestar prova testemunhal (art.s
128º a 139º do CPP), mediante aquilo que
observou e descreveu, uma vez que possui
os conhecimentos necessários, baseados
na cientificidade e na sua experiência, conferindo-lhe competências para que cumule
uma prova pericial.
No hospital o enfermeiro encontra uma
posição única tendo em conta que, muitas
vezes é o primeiro a estabelecer contac-
to com os utentes, ouvindo-o, avaliando as
suas lesões e estabelecendo prioridades. O
primeiro contacto, é um contacto privilegiado porque existe uma maior preservação dos
vestígios, mantendo a sua idoneidade e não
comprometendo as decisões a nível judicial
(Pereira, L.; Machado, L.: 2012).
Relativamente à minha experiência profissional, no Serviço de Urgência de Pediatria/ Unidade de Cuidados Intensivos Pediátricos, no decorrer da minha actividade
fui percepcionando a frequente ocorrência de situações de maus tratos, violações
e agressões a menores e, da minha sensação de impotência nestas situações, em
questões direccionadas face à minha implicação em todo o processo decorrente e
não somente na prestação de cuidados directos. Sendo uma área do meu interesse,
fui percebendo ao longo do tempo que a
minha actuação poderia ser mais útil de
modo a poder auxiliar no processo de investigação nestes casos. Fui, também tomando consciência que as acções desenvolvidas pelos enfermeiros, a maior parte das vezes ficavam aquém daquilo que
poderia ser realizado de modo a auxiliar
num processo de investigação criminal,
ao nível da preservação de vestígios, da
avaliação do utente e dos registos efectuados e, assim auxiliar o sistema judicial.
Talvez por esse motivo, não seja frequente
a solicitação dos enfermeiros para auxílio
num processo de investigação. Posto isto,
considerei a pertinência de ingressar na
pós-graduação de Enfermagem Forense,
para sedimentar e adquirir conhecimentos nesta área e, assim melhorar a minha
prática no âmbito dos cuidados de Enfermagem Gerais com a componente forense
associada.
51
AGOSTO 2014
CIÊNCIA & TÉCNICA
52
Assim, é preponderante a existência de
elementos nos serviços de saúde com conhecimentos nesta vertente, de modo a
implementar normas de actuação que se
coadunem com o processo de investigação
contribuindo assim para a resolução de
crimes e diminuição da violência na nossa
sociedade.
Percebemos que a Enfermagem Forense tem de ser encarada numa perspectiva
multidisciplinar em conjugação com as
vastas ciências, atestando a prova pericial
(CPP artº’s nº’s 151º ao 163º) de modo a
alcançar a verdade material e assim cumprir o dever legal e moral que está inerente
à responsabilidade de todos os indivíduos.
Esta colaboração, encontra-se também
prevista no art. 80º do CDE na alínea c),
que refere que o enfermeiro tem o dever
de “(…) Colaborar com outros profissionais
em programas que respondam às necessidades da comunidade.”
Só tendo um olhar numa perspectiva multidisciplinar, é que podemos acreditar na eficácia da resolução de crimes tendo em conta
o envolvimento de várias ciências, no qual se
enquadra a Enfermagem, que atestam a prova pericial e assim alcançam a verdade dos
factos ocorridos e, por sua vez a Justiça.
CONCLUSÃO
Cada vez mais, é considerada a pertinência da existência da Enfermagem na vertente forense, tendo em conta tudo o que
foi exposto ao longo do trabalho, salientado a posição privilegiada que o enfermeiro
ocupa no primeiro contacto com as vítimas
e ou agressores. Em Portugal, embora ainda haja alguma falta de informação sobre o
trabalho imprescindível que a Enfermagem
Forense pode oferecer, já começam a ser
dados os “primeiros passos” com a implementação de pós-graduações neste âmbito e por isso, torna-se imprescindível o
seu reconhecimento junta das autoridades
competentes.
Tendo em conta a minha prática profissional, existem com alguma frequência situações de violência, nomeadamente violações e agressões a menores, e por esse
motivo ao longo do tempo fui percebendo
a necessidade imperiosa da existência de
“elos” de ligação entre os sistemas de saúde e judicial. Cada vez mais, me consciencializo da importância de uma observação
“treinada”, da identificação de lesões, recolha de vestígios e de registos completos
para que se auxilie num processo de investigação criminal, de modo a combater a
criminalidade contribuindo assim para uma
sociedade mais justa e segura.
Há ainda um trabalho de relevo que
pode ser feito na comunidade, em termos de prevenção primária, na medida em
que o enfermeiro “oferece” educação para
a saúde à população, advertindo para os
malefícios de uma sociedade embutida na
violência, assim como está instituído no
art. 80º alínea b) do CDE “ O enfermeiro,
sendo responsável para com a comunidade na promoção da saúde e na resposta
adequada às necessidades em cuidados de
enfermagem, assume o dever de: (…) Participar na orientação da comunidade na busca de soluções para os problemas de saúde
detectados (…)”.
Em suma, podemos assim compreender a necessidade imperiosa da existência
de enfermeiros habilitados para participar
nestas questões de nível forense. É necessária a tomada de consciência social,
CIÊNCIA & TÉCNICA
nomeadamente das autoridades competentes e dos profissionais de enfermagem,
para o benefício de uma “parceria” entre
o sistema de saúde e o sistema judicial na
resolução de crimes.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Diagnóstico e Intervenções de Enfermagem: NANDA –
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BEnfermagem%252BForense-%252BLu%25C3%2583%
25C2%25ADsa%252BMachado%252Be%252BLiliana%
252BPereira.doc+Enfermagem+forense+preserva%C
3%A7ao+de+provas&hl=pt-PT&gl=pt&pid=bl&srcid
=ADGEESgFWqx6c0U68BiUSm2S0WUvDNp5_i1qX2lgfwdpokWoLty25dbDW01bi3x097teox6k4Le9vqS4oKLBS_nbzctZ7qDlI7dIb_HdMt0D3uQee85L7X-2MH
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Livros
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COLLIÈRE, Marie-Françoise – “ Promover a vida – Da
prática das mulheres de virtude aos cuidados de enfermagem” 5ª tiragem. Lisboa: Lidel – edições técnicas
Lda e Sindicato dos Enfermeiros Portugueses: 1999.
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Biblioteca Nacional de Portugal – Catalogação na Publicação PORTUGAL. Leis, decretos, etc. – “ Código de
Processo Penal”, 13ª ed. – (códigos de Bolso) ISBN 978972-40-4693-8
LYNCH, Virginia; DUVAL, Janet – “Forensic Nursing
Science” Second edition. St Louis Missouuri – Mosby
Inc., na affiliate of Elsevier Inc: 2006, págs. 1 a 8 e 10 a
18. ISBN 978-0-323-006637-2
53
CIÊNCIA & TÉCNICA
ENTRADA DO ARTIGO DEZEMBRO 2012
Quando a família do doente crítico
entra no mundo da emergência:
um estudo de revisão
ANDREIA JESUS PIRES ALVES
AGOSTO 2014
Licenciatura em Enfermagem
54
RESUMO
Avaliar e intervir no doente crítico cria desafios
complexos, devendo os cuidados a estes doentes
serem prestados mediante uma abordagem fundamentada e organizada. Face a uma situação de
emergência, o enfermeiro depara-se com o desafio de incluir a família no plano de cuidados, a fim
de garantir a qualidade e humanização dos cuidados prestados. Tal justifica a elaboração deste artigo de revisão bibliográfica, tendo como objetivo
identificar a evidência empírica produzida sobre a
influência da presença da família junto do doente
crítico, numa situação de emergência. A pesquisa foi realizada, entre os meses de maio e junho
de 2011, nas bases de dados eletrónicas: SciELO e,
através da B-ON, Academic Search Complete, Annual Reviews, Current Contents, Elsevier – Science Direct, PubMed, SpringerLink, Taylor&Francis,
Web of Science e Wiley Online Library, conduzindo
a uma amostra de 8 artigos primários. Os principais resultados apurados mostram que apesar de
cada família reagir de forma diferente numa situação de emergência, a sua presença pode melhorar a condição física e emocional do familiar crítico. Verificou-se também que a maior parte dos
profissionais de saúde não se sente à vontade ou
considera não estar habilitada para a prestação de
cuidados ao doente crítico com a família presente.
Palavras-Chave: Família, Enfermagem, Emergências, Cuidados Críticos
ABSTRACT
Assess and intervene in critically ill patients creates
complex challenges, and care for these patients are
provided through a reasoned and organized approach. Faced with an emergency situation, the
nurse is faced with the challenge of including the
family in the care plan, to ensure the quality and
humanization of care. This justifies the writing of
this literature review article, aiming to identify the
empirical evidence produced on the influence of
family presence from the critically ill patient in an
emergency situation. The survey was conducted
between the months of May and June 2011 in electronic databases SciELO, and through the B-ON,
Academic Search Complete, Annual Reviews, Current Contents, Elsevier - Science Direct, PubMed,
SpringerLink, Taylor & Francis, Web of Science and
Wiley Online Library, leading to a sample of 8 primary articles. The main results obtained show that
although each family react differently in an emergency situation, their presence may improve the
physical and emotional condition of the familiar
critical. It was also found that most health professionals do not feel comfortable or not considered
to have the skills to provide critical patient care
with family present.
Keywords: Family, Nursing, Emergencies, Critical
Care
CIÊNCIA & TÉCNICA
55
INTRODUÇÃO
De acordo com a Sociedade Portuguesa de
Cuidados Intensivos (2008), o doente crítico
é o indivíduo que, por disfunção ou falência
profunda de um ou mais órgãos ou sistemas,
encontra-se em risco de vida, estando a sua
sobrevivência dependente de meios avançados de monitorização e terapêutica.
Avaliar e intervir no doente crítico cria desafios complexos, devendo os cuidados a estes doentes serem prestados mediante uma
abordagem fundamentada e organizada
(Hall, 2009). Estes desafios incluem identificar patologias, interligar conhecimentos, ter
em consideração a vertente social e familiar.
Segundo a Classificação Internacional para
a Prática de Enfermagem, a família é conceptualizada como “unidade social ou todo
coletivo composto por pessoas ligadas através de consanguinidade, afinidade, relações
emocionais ou legais, sendo a unidade ou o
todo considerados um sistema que é maior
do que a soma das partes” (CIPE, 2011:115).
Definir família pode tornar-se uma tentativa
limitada, dada a dificuldade de contemplar
a sua unidade como um todo e de se tratar
de um conceito polissémico. No entanto, a
teoria sistémica procura dar um contributo
no sentido desta complexidade e defende a
família como “sistema de inter-relações no
AGOSTO 2014
CIÊNCIA & TÉCNICA
56
qual os laços (…) tornam a família um grupo
com identidade própria, reconhecida como
um sistema aberto no meio em que está integrada, da qual utiliza e para o qual fornece
recursos decisivos para a compreensão de
uma situação vivida numa das suas partes,
em situação de processo saúde-doença”
(Silva, Gonçalves e Costa, 2006:215).
Pelo supracitado e pensando que o bem-estar familiar é determinado pela saúde individual de cada membro, face a períodos
de instabilidade e mudança que podem levar a transformações na estrutura do sistema familiar, esta tem capacidade para manter a sua organização e desenvolver-se ao
longo do seu ciclo vital (Relvas, 1996).
A enfermagem de família surge alicerçada no pensamento sistémico, centrando-se
tanto no sistema familiar quanto nos sistemas individuais, dando ênfase à interação e
reciprocidade entre os membros da família
(Friedman, Bowden e Jones, 2003).
O conceito de enfermagem apresentado
no Regulamento para o Exercício Profissional de Enfermagem corrobora esta ideia,
uma vez que nos diz que se trata de uma
profissão com o objectivo de “prestar cuidados de enfermagem ao ser humano, são ou
doente, ao longo do ciclo vital, e aos grupos
sociais em que ele está integrado, de forma
que mantenham, melhorem e recuperem a
saúde, ajudando-os a atingir a sua máxima capacidade funcional tão rapidamente
quanto possível” (REPE, 2006:2959).
A abordagem dos cuidados continua
assim centrada no indivíduo, mas a família
deve constituir um parceiro nos cuidados de
enfermagem, até porque "as informações
fornecidas pelos familiares podem-nos ajudar a entender o paciente”. (Cintra, Nishide
e Nunes, 2000:9). No entanto, para que a fa-
mília cumpra o seu papel de “dar suporte à
situação vivenciada pelo paciente, ela também precisa de suporte nas suas necessidades físicas e emocionais” (Cintra, Nishide e
Nunes, 2000:9), porque tudo o que acontece a um dos seus membros, como o adoecer inesperado e grave, repercute-se na vida
dos restantes elementos, gerando instabilidade e sofrimento.
Uma situação de emergência pode ser
definida como uma alteração súbita do
estado de saúde ou agravamento de uma
situação de doença, que exige cuidados
médicos imediatos e cujo atraso na prestação dos mesmos se torna prejudicial para o
indivíduo. Situação na qual ocorrem experiências complexas e individualizadas, quer
para o doente, quer para a sua família (Mateus, 2007).
Para minimizar estas consequências, e
garantir a qualidade e humanização dos
cuidados prestados numa situação de
emergência, em que o limiar entre a vida e a
morte é ténue, o enfermeiro depara-se com
o desafio de incluir a família no plano de
cuidados do doente crítico. Neste âmbito,
foi criada recentemente em Portugal a Lei
n.º 33/2009, que garante ao doente o direito
a ser acompanhado no Serviço de Urgência,
reforçando a atualidade desta problemática.
Surge assim a necessidade de compreender
e refletir sobre a inclusão da família na prestação de cuidados ao doente crítico.
Tendo em conta o supracitado, torna-se
fundamental identificar a evidência empírica produzida sobre a influência da presença
da família junto do doente crítico numa situação de emergência, pelo que definimos
os seguintes objetivos específicos: refletir
sobre a influência da presença da família
na prestação de cuidados ao doente crí-
CIÊNCIA & TÉCNICA
tico; analisar de que forma a presença da
família influencia a evolução do estado de
saúde do doente crítico numa situação de
emergência e analisar o comportamento da
família do doente crítico, numa situação de
emergência.
De modo a atingir os objetivos acima mencionados, delineamos as questões
orientadoras que passamos a enunciar: De
que forma a presença da família influencia
a recuperação do doente crítico e o desempenho dos enfermeiros, numa situação de
emergência? De que forma é influenciado
o comportamento da família de um doente crítico, quando permitida a sua presença
junto do mesmo?
Formuladas as questões, partimos rumo
à descoberta do que sucede quando a família do doente crítico entra no mundo da
emergência.
METODOLOGIA
Realizamos um estudo de revisão bibliográfica que, segundo Fortin (2009), consiste
em fazer um inventário e o exame crítico de
um conjunto de publicações sobre um determinado tema de investigação. Neste tipo
de estudo, o investigador examina, em cada
um dos trabalhos escolhidos, os conceitos
que foram desenvolvidos, as relações com a
teoria, os métodos utilizados, os resultados
e conclusões obtidas.
A presente revisão da literatura foi realizada mediante análise de artigos que se reportam ao período temporal entre 2007 e 2011.
Quanto ao período de busca dos artigos compreendeu os meses de maio a junho de 2011.
A pesquisa baseou-se nos descritores:
Família (Family, Familia), Enfermagem (Nursing, Enfermería), Emergências (Emergen-
cies, Urgencias Médicas), Cuidados Críticos (Critical Care, Cuidados Criticos), tendo
como idiomas preferenciais português, inglês e espanhol.
Através da associação destes descritores,
nos três idiomas definidos, foi efetuada pesquisa nas bases de dados eletrónicas SciELO
e, através da B-ON, Academic Search Complete, Annual Reviews, Current Contents, Elsevier – Science Direct, PubMed, SpringerLink, Taylor&Francis, Web of Science e Wiley
Online Library.
Utilizando estas bases de dados, os descritores mencionados anteriormente e tendo em consideração o universo temporal já
descrito tivemos acesso a 2417 publicações,
das quais 52 foram excluídas por não serem
texto integral e 486 por se encontrarem repetidas nas diferentes bases de dados, restando 1879 publicações.
Dado o elevado número de publicações
encontradas, para restringir o número de
artigos, tornou-se necessário definir critérios de inclusão, para além de considerar
como participantes os artigos elaborados
entre 2007 e 2011. Estes foram:
- Intervenção: Influência da presença da
família na recuperação do doente crítico e
no desempenho dos enfermeiros e influência
sobre a família de um doente crítico, quando
permitida a sua presença junto do mesmo.
- Contexto do estudo: Estudos realizados
com doentes em situação de emergência.
- Desenho do estudo: Estudos primários
de abordagem qualitativa ou quantitativa.
Tendo em conta estes critérios, após analisar os 1879 artigos, rejeitamos 1712 pelo
título, 107 pela leitura do resumo, 2 pelo
desenho do estudo e 50 pela leitura integral. Através desta estratégia incluímos apenas 8 artigos para crítica.
57
CIÊNCIA & TÉCNICA
AGOSTO 2014
APRESENTAÇÃO / ANÁLISE CRÍTICA
DOS DADOS
Os 8 estudos primários que satisfizeram
os critérios de inclusão pré-definidos são
apresentados na tabela seguinte, constando
na mesma o objetivo geral, método, amostra
e principais conclusões de cada artigo.
58
Síntese das evidências encontradas
• AGARD, Anne Sophie; MAINDAL, Helle
Terkildsen - Interacting with relatives in
intensive care unit. Nurses’ perceptions
of a challenging task. Dinamarca. 2009.
Objetivo geral - Descrever como enfermeiros de cuidados intensivos usam conhecimentos pessoais, habilidades e expectativas para interagir com a família; Explorar
a relação entre habilidades e expectativas
e a atitude dos enfermeiros ao envolver a
família e permitir a sua presença durante
situações críticas.
Método - Estudo quantitativo, transversal,
exploratório. Questionário
Amostra - 68 enfermeiros de uma unidade
de cuidados intensivos de adultos.
Principais conclusões - A opinião dos enfermeiros em incluir a família nos cuidados não
é uniforme, nomeadamente em situações de
paragem cardíaca e entubação; normalmente os enfermeiros não suportam a presença
da família em situações críticas; os enfermeiros consideram que o seu conhecimento e
habilidades em interagir com a família são
bons e para além disso têm expectativas positivas sobre o resultado da sua interação.
•
GAMELL FULLÀ, A. [et al.] - ¿Están presentes los padres durante los procedimientos invasivos? Espanha. 2010.
Objetivo geral - Conhecer a situação atual
em relação à presença dos pais e/ou respon-
sáveis durante os procedimentos invasivos
em diferentes serviços de Urgências Pediátricas; conhecer os motivos pelos quais se restringe a presença dos pais e/ou responsáveis;
conhecer o grau de concordância dos profissionais de saúde quanto a esta presença.
Método - Estudo descritivo, segundo uma
abordagem quantitativa. Questionário.
Amostra - 32 responsáveis dos serviços de
Urgências Pediátricas, de diferentes hospitais
de Espanha, pertencentes à Sociedade Espanhola de Urgências Pediátricas.
Principais conclusões - A presença dos pais
e/ou responsáveis durante a realização de
procedimentos invasivos é escassa, especialmente nos mais invasivos; a ansiedade dos
pais e o pior rendimento dos profissionais
de saúde são os motivos argumentados para
restringir a presença dos pais e/ou responsáveis; os profissionais de saúde estão pouco
ou nada de acordo com a presença familiar,
especialmente durante as técnicas mais invasivas.
•
HUNG, Maria S.Y.; PANG, Samantha M.
C. - Family presence preference when
patients are receiving resuscitation in an
accident and emergency department.
China. 2010.
Objetivo geral - Analisar a experiência de familiares de pacientes que sobreviveram a ressuscitação pós acidente, num departamento
de emergência, e saber as suas preferências
relativamente a estarem ou não presentes.
Método - Estudo interpretativo, fenomenológico. Entrevista.
Amostra - 18 familiares adultos de pacientes
que sobreviveram a intervenções de manutenção de vida.
Principais conclusões - Nenhum dos familiares esteve presente na sala de emer-
CIÊNCIA & TÉCNICA
gência, mas a maioria refere que gostaria
de ter estado presente; os profissionais de
saúde deviam ser mais sensíveis e atentos
às necessidades individuais e preocupações
das famílias, tendo o cuidado de oferecer
a hipótese de estarem presentes; deveriam
existir guidelines para permitir atender às
necessidades individuais em situações de
risco de vida.
KÖBERICH, Stefan [et al.] - Family witnessed resuscitation – experience and attitudes of German intensive care nurses.
Alemanha. 2010.
Objetivo geral - Explorar experiências de
enfermeiros alemães de cuidados intensivos
e suas atitudes em relação à presença da família durante a ressuscitação.
Método - Estudo descritivo. Questionário e
uma Questão Aberta.
Amostra - 166 enfermeiros alemães de cuidados intensivos.
Principais conclusões - A presença de familiares durante a reanimação trouxe experiências negativas para os profissionais de
saúde; há profissionais de saúde que não
concordam que os familiares deveriam ter
a opção de presenciarem a reanimação; a
presença da família pode influenciar negativamente o desempenho dos profissionais
durante a reanimação; a presença da família poderia melhorar a compreensão entre
profissionais e familiares, abordando temas
como tomada de decisão, apoio às famílias,
ameaças de violência e envolvimento da família.
•
•
MITCHELL, Marion L.; CHABOYER, Wendy
- Family Centred Care – A way to connect
patients, families and nurses in critical
care. Austrália. 2010.
Objetivo geral - Descrever experiências das
famílias na prestação de cuidados individualizados ao seu ente querido em estado crítico, com o apoio da equipa de enfermagem.
Método - Estudo qualitativo. Entrevistas telefónicas.
Amostra -10 familiares que prestaram cuidados ao seu ente querido em estado crítico.
Principais conclusões - Os familiares dos
pacientes em estado crítico desfrutam da
prestação de cuidados ao seu ente querido; a
família sente-se útil; melhoria na comunicação
e maior proximidade física e emocional com o
paciente crítico; os enfermeiros de cuidados
críticos apoiam os familiares a individualizar
os cuidados; a inclusão da família promove o
sucesso dos cuidados prestados e a relação
entre família, paciente crítico e enfermeiros.
PASQUALE, Mae Ann. [et al.] - Family presence during trauma resuscitation:
Ready for primetime? Estados Unidos da
América. 2010.
Objetivo geral - Medir os efeitos da presença da família durante ressuscitação em trauma relativamente a ansiedade, satisfação e
bem-estar.
Método - Estudo quantitativo, prospetivo,
comparativo, multivariado. Questionário e
registos hospitalares dos doentes.
Amostra - 50 adultos membros de famílias,
dos quais vinte e cinco estiveram presentes
durante a ressuscitação de um familiar gravemente ferido e vinte e cinco não estiveram
presentes, num centro de trauma nível 1.
Principais conclusões - Familiares presentes durante a ressuscitação referiram que
beneficiaram o paciente e ganharam uma
melhor compreensão da situação; familiares
que não estiveram presentes durante a ressuscitação comentam que teriam preferido
•
59
AGOSTO 2014
CIÊNCIA & TÉCNICA
60
estar presentes; familiares presentes durante
ressuscitação em trauma não sofreram efeitos psicológicos negativos e tiveram os mesmos níveis de ansiedade, satisfação e bem-estar que os familiares que não estiveram
presentes; a qualidade dos cuidados durante
a ressuscitação foi mantida, mesmo quando presentes familiares; o facto de os familiares referirem que voltariam a passar pela
mesma experiência suporta a ideia de que
a presença de um familiar na ressuscitação
em trauma não é demasiado traumática; a
existência de um protocolo bem estruturado
relativamente à presença da família durante
ressuscitação em trauma permite que estes
estejam presentes sem correr riscos e sem
interferências para o paciente.
TOMLINSON, Karen R. [et al.] - Family presence during adult resuscitation:
a survey of emergency department registered nurses and staff attitudes. E.U.A.
2010.
Objetivo geral - Avaliar as atitudes dos enfermeiros e outros profissionais de saúde a
respeito da presença da família durante a
reanimação de adultos, num departamento
de emergência.
Método - Estudo quantitativo. Questionário
Amostra - 79 enfermeiros e outros profissionais de saúde que trabalham num departamento de emergência.
Principais conclusões - A presença da família é permitida perante atos menos agressivos como a punção venosa, mas não é comum em atos mais agressivos; a presença da
família pode facilitar a sua perceção sobre o
esforço da equipa em reanimar o seu familiar, sendo uma experiência facilitadora para
superar uma eventual morte do mesmo; a
presença da família pode interferir com o
•
processo de reanimação e aumentar o nível de stress da equipa; seriam importantes
orientações escritas sobre este tema.
VAVAROUTA, Antigone [et al.] - Family
presence during resuscitacion and invasive procedures: physicians’ and nurses’
attitudes working in pediatric departments in Greece. Grécia. 2011.
Objetivo geral - Determinar o conhecimento, experiências e opiniões dos médicos e
enfermeiros gregos, sobre a presença da família durante a reanimação e procedimentos invasivos; investigar a existência de políticas oficiais e práticas sobre a presença da
família; examinar possíveis correlações ou
fatores que promovem ou limitam a aplicação desta questão.
Método - Estudo descritivo, segundo uma
abordagem quantitativa. Questionário.
Amostra - 44 médicos e 77 enfermeiros que
trabalham num departamento de pediatria e
unidade de cuidados intensivos neonatais e
pediátricos.
Principais conclusões - A maioria dos
médicos e enfermeiros não estão familiarizados com a presença da família durante
a reanimação e procedimentos invasivos;
revelou-se ausência de políticas escritas
sobre a presença da família; os benefícios
da presença da família na ressuscitação ou
procedimentos invasivos superam possíveis
argumentos negativos, sendo benéfico para
a própria família.
•
Após esta síntese das evidências encontradas, verifica-se que a origem dos autores é muito variada: 2 artigos têm origem
nos E.U.A. e os restantes pertencem a países
como Espanha, Dinamarca, China, Alemanha,
Austrália e Grécia. Os artigos apurados fo-
CIÊNCIA & TÉCNICA
ram maioritariamente publicados em 2010 e
estão enquadrados no paradigma quantitativo, utilizando como instrumento de recolha
de dados o questionário. Tivemos oportunidade de perceber que as amostras estudadas reportaram-se a profissionais de saúde
do Serviço de Urgência ou de Unidades de
Cuidados Intensivos, de adultos e pediátricos, e a familiares do doente crítico. Os objetivos principais dos artigos selecionados
foram saber se os profissionais de saúde estão habilitados para lidar com a presença da
família em situações criticas e quais as suas
experiencias; avaliar as atitudes dos profissionais de saúde perante a presença da família durante a realização de procedimentos
ao doente crítico e conhecer as experiencias
dos familiares que assistiram à prestação de
cuidados ao familiar em estado crítico.
Para a análise das evidências contidas nos
artigos científicos encontrados, foi utilizada a
técnica de análise de conteúdo, proposta por
Bardin (2004). A análise de conteúdo pode
ser definida como um conjunto de técnicas
de análise de comunicação, visando obter,
por procedimentos sistemáticos e objetivos
de descrição do conteúdo das mensagens,
indicadores que permitam a inferência de
conhecimento.
Desta análise surgiram categorias que
vão de encontro aos nossos objetivos: influência da presença da família na prestação
de cuidados ao doente crítico; presença da
família influencia a evolução do estado de
saúde do doente crítico e comportamento da família do doente crítico. Emergiram
também alguns aspetos relacionados com a
temática em estudo que, apesar de darem
resposta aos objetivos, não se enquadram
nestas categorias, nomeadamente a opinião
dos profissionais de saúde face à presença
da família e a inexistência de protocolos
quanto a este aspeto.
Influência da presença da família na
prestação de cuidados ao doente crítico.
Da evidência produzida por alguns autores salienta-se um pior rendimento por parte
dos profissionais de saúde aquando da presença da família durante a prestação dos cuidados ao doente crítico pediátrico (Gamell
Fullà [et al.], 2010).
Alguns autores na comunicação de resultados fizeram referência à presença da
família durante o processo de reanimação.
Tomlinson [et al.] (2010) defendem que esta
pode interferir com a reanimação e aumentar o stress da equipa. O mesmo tema foi assunto de interesse de Köberich [et al.] (2010)
acrescentando as experiências negativas vivenciadas pelos profissionais de saúde face
à presença de familiares, nomeadamente a
dificuldade na prestação de cuidados a estes,
as ameaças físicas e situações de prolongamento do processo de ressuscitação.
Muito recentemente, o artigo de Mitchell e
Chaboyer (2010) refutou as ideias anteriores,
defendendo que a inclusão da família promove o sucesso dos cuidados prestados e o
relacionamento entre esta e os profissionais
de saúde. Também Tomlinson [et al.] (2010)
defenderam que a presença da família é uma
mais-valia durante a prestação de cuidados
ao doente crítico, na medida em que, o esforço da equipa em reanimar vai ser mais facilmente percecionado e valorizado pela família.
Sobressai, ainda, na evidência produzida a
compreensão entre profissionais e familiares
como aspeto positivo da presença da família
durante o processo de reanimação e facilitador da tomada de decisão (Köberich [et al.],
2010).
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Pelo supracitado, verifica-se que não há
unanimidade acerca da presença da família
trazer benefícios ou prejuízos à prestação de
cuidados ao doente crítico. Mesmo na realidade Portuguesa, não é de comum acordo
o procedimento a tomar face à família, pois
apesar de, com a criação da Lei n.º 33/2009,
“Todo o cidadão admitido num serviço de
urgência tem direito a ser acompanhado
(…)”, no Artigo 3.º são enunciadas limitações
ao direito de acompanhamento, justificadas
pela possibilidade de prejudicar a eficácia
dos exames e tratamentos a efetuar. Pasquale [et al.] (2010) defendem que a qualidade
dos cuidados prestados ao doente crítico é
mantida, estando a família presente ou não.
Na realidade nacional, tal pode ser conseguido através da mudança de mentalidades,
pois segundo a Lei anteriormente referida
“(…) compete ao profissional de saúde responsável pela execução do acto clínico em
questão (…)” a decisão de autorizar a presença da família ou não.
Caso esta autorização seja concedida,
importa conhecer a influência da família na
evolução do estado de saúde do seu familiar.
Presença da família influencia a evolução do estado de saúde do doente crítico.
Dos artigos analisados, apenas os autores
Mitchell e Chaboyer (2010) e Pasquale [et al.]
(2010) fizeram referência à influência da família no estado de saúde do doente crítico.
O artigo de Mitchell e Chaboyer (2010) considera que a presença da família melhora a
comunicação e permite uma maior proximidade física e emocional com o doente crítico,
contribuindo para um melhor relacionamento família - doente crítico. Por sua vez, Pasquale [et al.] (2010) concluíram que a presença da família traz benefícios para o doente,
referindo como exemplo que a família pode
providenciar informações valiosas sobre os
antecedentes clínicos do doente.
Estes achados vêm dar relevo à importância de constituir a família como parceiro
da prestação de cuidados, uma vez que podem ter informação que ajude na tomada de
decisão, tendo em conta que muitas vezes
o doente está inconsciente ou incapacitado
de comunicar. Assim, o papel de suporte da
família assume-se como relevante, devendo
os profissionais de saúde despender tempo
a escutá-los.
Salientamos que esta foi uma categoria
pouco desenvolvida nos estudos analisados, sendo que estes dão mais relevância ao
comportamento da família do doente crítico.
Comportamento da família do doente
crítico.
Sendo a família um grupo em que ocorrem interações entre os seus membros, e
sendo o bem-estar familiar determinado
pela saúde de cada um destes, importa saber
como age a família de um doente em estado
crítico e os sentimentos que manifesta.
Os sentimentos de ter sido útil, ter desfrutado da companhia do familiar e mostrar
carinho, foram referidos no estudo efetuado
por Mitchell e Chaboyer (2010) por familiares que tiveram oportunidade de prestar cuidados a um familiar em situação crítica. Os
autores foram mais longe ao referirem que
quando as famílias prestam cuidados físicos
estão a fazer muito mais, mostrando que se
envolvem com as pessoas que amam. Estes
mesmos autores referiram que a envolvência
dos familiares na prestação de cuidados melhora o relacionamento com os profissionais.
Por outro lado, Tomlinson [et al.] (2010)
consideraram que quando uma situação de
CIÊNCIA & TÉCNICA
emergência culmina com a morte do doente, a presença da família é facilitadora para
melhor ultrapassar o processo de luto. Isto
porque a família pode observar os esforços
efetuados para salvar a vida do seu ente querido, ganhando maior compreensão do empenho realizado com vista à recuperação do
seu familiar.
Com inquietações semelhantes surge o
estudo de Pasquale [et al.] (2010), em que
referiram que a maior necessidade dos familiares de doentes críticos é ter informação
sobre a evolução clínica do doente. No entanto, estes contrapõem algumas das ideias
anteriormente referidas, declarando que a
presença da família em procedimentos tão
invasivos como a ressuscitação pode gerar
danos psicológicos aos familiares.
Na mesma linha de pensamento, a reconhecer os resultados de Pasquale [et al.] (2010)
surgem as conclusões de Gamell Fullà [et al.]
(2010), que consideraram o comportamento
da família como inoportuno, reportando-se à
ansiedade como o motivo primordial para a
exclusão dos familiares de uma sala de urgência; surge também com algum peso o facto
de não considerarem os familiares preparados
para se comportarem perante uma situação
mais invasiva. De realçar que este é um estudo de âmbito pediátrico, em que a família dos
doentes foram só pais.
Pesando os prós e os contras, para as famílias de doentes em estado crítico, pode verificar-se que tudo vai depender da estrutura
e processos familiares em causa. Na pesquisa
efetuada, surgiram aspetos negativos para a
família apenas quando abordados doentes
pediátricos e doentes adultos sujeitos a procedimentos muito invasivos; por outro lado,
quando o doente crítico é adulto, os familiares
referiram que voltariam a passar pela mesma
experiência, tal como no estudo de Pasquale
[et al.] (2010), o que suporta a defesa da presença de familiares durante a ressuscitação.
Outros aspetos relacionados com a temática em estudo.
Prestar cuidados à família é, de acordo
com o Regulamento para o Exercício Profissional de Enfermagem (2006), uma incumbência dos enfermeiros, pelo que também o
seu sentir face à permissão da presença da
família, numa situação de emergência, deve
ser considerado.
Na opinião de Gamell Fullà [et al.] (2010) a
presença dos pais e/ou responsáveis durante a realização de procedimentos invasivos é
escassa, especialmente durante os mais invasivos, referindo-se à prestação de cuidados a
doentes críticos pediátricos. Ainda segundo
estes autores, uma razão para esta evidência
é o facto dos profissionais de saúde estarem
pouco ou nada de acordo com a presença
dos familiares, especialmente durante as técnicas mais invasivas.
O estudo conduzido por Agard e Maindal
(2009) revela que normalmente os enfermeiros não suportam a presença da família em
situações críticas. Esta presença pode gerar
ansiedade e stress nos profissionais de saúde; pode distraí-los do seu foco de atenção
(o doente), pois a família também necessita
de apoio (Tomlinson [et al.], 2010). Já na opinião de Vavarouta [et al.] (2011) não são apenas os enfermeiros, mas também os médicos
a não estarem familiarizados com a questão
da família testemunhar a reanimação e procedimentos invasivos.
Vários autores com as suas comunicações
identificaram a ausência de orientações escritas/protocolos sobre a presença da família
na prestação de cuidados ao doente crítico
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durante a ressuscitação, sem a família correr risco e sem interferências na reanimação
(Pasquale [et al.] (2010), Tomlinson [et al.]
(2010), Vavarouta [et al.] (2011)).
Refletindo sobre a análise efetuada, considera-se que as categorias descritas foram
de encontro aos objetivos desta revisão bibliográfica, respondendo assim às questões
orientadoras enumeradas previamente.
Quanto à questão orientadora: de que forma a presença da família influência a recuperação do doente crítico e o desempenho dos
enfermeiros, numa situação de emergência,
foi possível apurar que a presença da família no local da emergência, de alguma forma
melhora a condição física e emocional do familiar, uma vez que melhora a comunicação e
permite uma maior proximidade física e emocional com o doente crítico; e que a maioria
dos profissionais de saúde não se sente à
vontade ou considera que não possui habilidades para a prestação de cuidados ao doente crítico com a família do mesmo presente.
Verificou-se também que cada membro
da família de um doente crítico, seja adulto
ou pediátrico, lida de forma diferente com a
situação de emergência com que se depara,
havendo famílias que repetiriam a experiencia de assistir a uma reanimação bem sucedida, ou porque o seu relacionamento com os
profissionais melhorou ou porque obtiveram
mais informação. Contrariamente surgem familiares que preferem não o fazer por terem
medo de sofrerem danos psicológicos. Obtém-se assim resposta para a segunda questão orientadora: de que forma é influenciado
o comportamento da família de um doente
crítico, quando permitida a sua presença junto do mesmo.
CONCLUSÃO
A qualidade dos cuidados de saúde é
promovida através de uma abordagem centrada no doente e sua família, reconhecendo o papel integral da família e encorajando
a colaboração mutuamente benéfica entre
doente, sua família e profissionais de saúde. É reconhecido que a família do doente
crítico deve integrar a unidade de cuidados
numa situação de emergência, contudo surgem questões como: A presença da família
é benéfica para o doente? É confortável para
os profissionais de enfermagem? E a família, o
que sente e como reage? Foram estas questões que conduziram à necessidade de identificar a evidência empírica produzida sobre
a influência da presença da família junto do
doente crítico, numa situação de emergência.
Esta revisão de literatura é alvo de algumas limitações. Considera-se que a definição
de um horizonte temporal de 5 anos limitou
o número de artigos selecionados, no entanto este critério torna possível a obtenção
de conhecimento que traduz uma evidência
mais atual do tema em estudo. Também o
facto de realizarmos pesquisas em apenas 3
idiomas pode ter limitado o número de publicações. Outra limitação consiste no fato
de os objetivos dos estudos que incluímos
na amostra, serem sobretudo centrados nos
profissionais e não nas famílias.
Considera-se que o percurso para a concretização desta revisão de literatura despertou a consciencialização da necessidade dos
enfermeiros e as próprias instituições de saúde refletirem sobre a sua prática em situações
de emergência, no que diz respeito à presença da família do doente crítico, promovendo
a formação nesta área. Isto porque, emerge
da análise dos oito artigos analisados que
existem doentes críticos que retiram benefí-
CIÊNCIA & TÉCNICA
cios da presença dos seus familiares, daí que
fosse positivo as pessoas terem esta opção.
Seria gratificante constatar que os resultados da investigação constituíssem um pequeno passo em direção à mudança, pois
torna-se fundamental os profissionais desenvolverem habilidades práticas necessárias
à prestação de cuidados ao doente crítico
mesmo com a presença da sua família, e as
instituições de saúde elaborarem protocolos
que definam as situações em que a família
pode ou não estar presente, esclarecendo
como atuar para satisfazer as necessidades
dos familiares, para que esta não corra riscos
e a atuação dos profissionais não ponha em
risco o doente crítico.
Espera-se assim, com estas breves páginas, deixar aberta uma porta para que possam decorrer outras investigações neste sentido, dado que sem dúvida esta é uma temática a explorar.
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CIÊNCIA & TÉCNICA
ENTRADA DO ARTIGO JANEIRO 2013
Presença das famílias no serviço de
urgência durante a reanimação e os
procedimentos invasivos.
Qual o estado da arte?
P. COELHO
Mestre em Enfermagem Médico-Cirúrgica. Docente da
Universidade Católica Portuguesa
RESUMO
A enfermagem deve ter uma abordagem holística
nos cuidados e deve envolver o paciente e a família, fundamentalmente nos momentos de crise,
como é o caso da vivência de acompanhar um
familiar num serviço de urgência com todas as
particularidades que lhe estão associadas.
O objetivo deste trabalho é saber se a presença
da família durante as medidas de reanimação ou
procedimentos invasivos têm um impacto positivo ou negativo na família e nos profissionais de
enfermagem e quais as atitudes dos enfermeiros
nestas situações.
Os enfermeiros com formação mais elevada, assim
como com uma especialização específica na área
de emergência demonstram uma atitude de maior
aceitação à presença de família durante as medidas de reanimação e procedimentos invasivos.
Os aspetos positivos para a presença da família
são: compreender que as medidas e esforços de
reanimação foram as máximas e que tudo foi efetuado pelos profissionais, a oportunidade para a
família apoiar o seu ente querido e de se despedir em situações de fim de vida, a participação em
decisões de fim de vida, facilitando o processo
de luto, providenciar explicações e demonstrar á
família que a sua presença é um direito.
Como motivos para não haver a presença das famílias são apontados: o baixo nível de conhecimento dos familiares, as memórias traumáticas,
AGOSTO 2014
MANUELA CELESTE SOUSA FERREIRA
Enfermeira no Centro Hospitalar de S.João - Porto,
Serviço de Unidade de Cuidados Intensivos Polivalente
do Serviço de Urgência. Estudante do 5º Curso de PósLicenciatura em Enfermagem, na Universidade Católica
Portuguesa.
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CIÊNCIA & TÉCNICA
a interferência no trabalho dos profissionais, a
diminuta escassez de recursos humanos, o aumento do risco de infeção, o desconforto dos
profissionais em se sentirem observados na sua
atuação e o seu medo de falhar e o obstáculo à
comunicação na equipa.
Num estudo, efetuado no Hospital da Universidade do Colorado pelas autoras Kathleen S. Oman
em 2010, sugere-se a criação de protocolos que
permitam aos profissionais dar a opção às famílias de estarem presentes, avaliando os familiares
de acordo com as circunstâncias e as suas características para adequar o que será melhor para
Nurses with higher education, as well as with specific expertise in the area of emergency demonstrate an attitude of greater acceptance of family
presence during CPR and invasive procedures.
The positive aspects to the presence of the family
are: understand the measures and resuscitation efforts were the maximum and that everything was
done by professionals, the opportunity to support
your family and loved ones to say goodbye at the
end of life situations, participation in end of life
decisions, facilitating the grieving process, provide
explanations and demonstrate to the family that
their presence is a right.
o paciente. Este protocolo inclui o acolhimento
prévio à entrada dos familiares, com as devidas
explicações do que estes irão encontrar junto aos
pacientes, diminuindo a ansiedade destes e aumentando o nível de confiança nos profissionais.
Este trabalho caracterizou-se por uma revisão
da literatura tendo por base a pesquisa na ISI
of Knowndlege, com os descritores booleanos
urgência, enfermagem, família e cuidar, artigos
publicados no período de 2010 a 2012. Conclui-se que a pesquisa originou 25 artigos, dos quais
foram selecionados 6 após a leitura e dada a pertinência dos mesmos, tendo em conta a sua disponibilidade em texto integral e a sua relevância
para o tema em discussão.
As reasons for not having the presence of the families are identified: the low level of knowledge of
the family, traumatic memories, interference in
the work of professionals, the tiny human resource
shortages, increased risk of infection, the discomfort of professionals feel observed in his performance and his fear of failure and an obstacle to
communication in the team.
The study performed at the Hospital of the University of Colorado by the authors Kathleen S. Oman
in 2010, suggests the creation of protocols that
enable professionals to give families the option of
being present, assessing the family according to
the circumstances and characteristics to suit what
is best for the patient. This protocol includes the
reception prior to the entry of relatives, with appropriate explanations of what they will find with
patients, reducing anxiety and increasing this level
of confidence in the professionals.
This work was characterized by a literature review based on a search of the ISI Knowndlege, with
descriptors Boolean urgency, nursing and family
care, articles published in the period 2010 to 2012.
We conclude that the search yielded 25 articles,
of which six were selected after reading and given
the continued relevance, taking into account their
availability in full text and its relevance to the topic
under discussion.
Palavras-Chave: Emergência, Enfermagem, Família; Cuidar.
ABSTRACT
Nursing must take a holistic approach in the care
and should involve the patient and family, mainly
in times of crisis, such as the experience of accompanying a family member in the emergency
department with all the particularities associated
with him.
This paper is whether family presence during CPR
and invasive procedures has a positive or negative
impact on family and nursing professionals and
what the attitudes of nurses in these situations.
Keywords: Emergency, Nursing, Family; Caring.
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CIÊNCIA & TÉCNICA
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INTRODUÇÃO
As diretrizes da Organização Mundial
de Saúde (2010) descritas na declaração de
Munique de 2000 e da Ordem dos Enfermeiros expressas no Enquadramento Conceptual e Padrões de Qualidade dos Cuidados de Enfermagem (2001), enfatizam a
família como alvo dos cuidados numa crescente centralidade nos sistemas e cuidados
de saúde.
Torna-se um desafio à investigação em
enfermagem encontrar metodologias que
permitam aos profissionais nas diferentes
áreas de atuação adaptarem-se e consolidarem conhecimentos e estratégias que
lhes permitam providenciar cuidados de
excelência aos pacientes/famílias.
O serviço de urgência é um local privilegiado no contato com familiares que se
encontram fragilizados e ansiosos, tornando-se também um local onde os dilemas
dos profissionais perante a Família são uma
realidade. É essencial que os enfermeiros
procurem dar respostas aos problemas do
seu quotidiano e a consulta de bibliografia
atualizada permite conhecer o estado da
arte nesta temática e fornecer dados para
melhorar os cuidados.
O objetivo deste trabalho é saber se a
presença da família durante as medidas de
reanimação ou procedimentos invasivos
têm um impacto positivo ou negativo na
família e nos profissionais de enfermagem
e quais as atitudes dos enfermeiros nestas
situações.
METODOLOGIA
Foi utilizado o método exploratório descritivo com pesquisa avançada na base de
dados da ISI of Knowndlege, utilizando
como descritores booleanos “Emergency”,
and “Nursing”, and “Family”; and “Caring”.
Como critérios de inclusão foram selecionados artigos completos, publicados em inglês, português e espanhol com referências
disponíveis, com texto completo e datas de
publicação dos últimos 2 anos (2010-2012).
Foram encontrados 25 resultados, estes foram analisados, discutindo-se a sua relação
com o tema e o objetivo deste trabalho e
selecionados 6, tendo como critérios de exclusão serem artigos no âmbito da pediatria.
RESULTADOS
Foram encontrados 25 artigos e selecionados 6 que se relacionavam diretamente
com o tema enfocando a presença da família durante a reanimação e os procedimentos invasivos e as atitudes dos enfermeiros,
assim como os benefícios e as desvantagens enumeradas.
DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
Neste capítulo vou resumir os artigos
consultados nesta pesquisa e apontar os
aspetos mais relevantes que vão de encontro ao objetivo previamente delineado.
O artigo de Susan Ellison (2010), descreve um estudo efetuado a 208 enfermeiros
de um hospital de New Jersey aplicando o
questionário de suporte de presença à família, estudando as variáveis demográficas
(idade, sexo, etnia) e atitudes dos enfermeiros perante a família durante as medidas
de reanimação e procedimentos invasivos,
acrescentando a perceção e crenças pessoais acerca da presença da família para os
enfermeiros.
CIÊNCIA & TÉCNICA
Este estudo demonstra a relação significativa entre as atitudes perante a família e
as variáveis inerentes aos enfermeiros, tais
como a experiência profissional, a sua formação, o tipo de certificação académica e
a área de especialização. Segundo esta autora estes fatores são preditores para atitudes positivas perante a presença da família.
Como resultados deste estudo enumera-se que os enfermeiros com formação mais
elevada, assim como com uma especialização específica na área de emergência demonstram uma atitude de maior aceitação
à presença de família durante as medidas
de reanimação e procedimentos invasivos.
Este estudo também demonstra que a
presença das famílias interfere no desempenho dos enfermeiros devido às limitações estruturais das instituições, à escassez
de tempo e à falta de recursos humanos
que tenham disponibilidade para estarem
como o doente e com os seus familiares. A
falta de educação e de capacidade da família em compreender a situação e não transmitir ansiedade ao doente também dificulta
o trabalho destes profissionais.
Um dos aspetos positivos relatados neste estudo é a oportunidade de promover a
comunicação entre a família e os profissionais e providenciar apoio e suporte emocional. Deste modo a família compreende
que tudo foi efetuado, facilitando o processo de luto, a participação em decisões
de fim de vida, providenciar explicações e
demonstrar á família que a sua presença é
um direito e não uma opção dos profissionais. Aponta como motivos para não haver
a presença das famílias o baixo conhecimento dos familiares, as memórias traumáticas, a interferência no trabalho dos profissionais, a diminuta escassez de recursos
humanos, o aumento do risco de infeção,
o desconforto dos profissionais em se sentirem observados na sua atuação e o seu
medo de falhar.
O estudo apresentado por Lori M. Feagan e colegas (2011), realizado em Washington, pretende demonstrar o impacto
da educação dos profissionais na promoção
de atitudes perante a família durante a reanimação e outros procedimentos invasivos.
Neste estudo foram avaliadas as respostas
ao mesmo grupo de profissionais (médicos
e enfermeiros) em duas fases, antes e após
um programa de formação sobre a temática. Estes autores concluíram que a educação e a criação de protocolos com critérios
de inclusão e de exclusão para permitir a
presença das famílias antes, durante e após
os procedimentos demonstrou ser útil e ter
um impacto positivo nas atitudes perante
a família nos serviços de urgência e emergência.
Em 2010, num estudo efetuado no Hospital da Universidade do Colorado pelas
autoras Kathleen S. Oman, e colegas, referem que existe uma preocupação crescente
nos profissionais de saúde em saber o efeito da presença da família durante as manobras de reanimação e procedimentos invasivos nos familiares dos pacientes. Neste
estudo são apontadas vantagens que passo
a referir: família saber o estado do paciente, a oportunidade para a família apoiar o
seu ente querido e de se despedir em situações de fim de vida, a família perceber
que as medidas e esforços de reanimação
foram as máximas, assim como a perceção
da personalidade do paciente através do
que a família pode transmitir, permitindo
assim o cuidado holístico ao paciente e á
sua família.
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Como desvantagens neste estudo são
enumerados: o trauma para a família, o
medo da família e como podem transmiti-lo ao paciente, a ansiedade para os profissionais que se sentem observados, o obstáculo à comunicação na equipa. Todos estes
fatores contribuem para a contínua controvérsia existente sobre a presença da família
nos momentos de crise.
Neste estudo sugere-se a criação de protocolos que permitam aos profissionais dar
a opção às famílias de estarem presentes,
avaliando os familiares de acordo com as
circunstâncias e as suas características para
adequar o que será melhor para o paciente.
Este protocolo deverá incluir ainda que se
deverá perguntar ao paciente, no caso dos
procedimentos invasivos, se quer a família
presente e qual o membro e caso não possa
expressar a sua vontade assegurar que seja
respeitada a vontade da família.
A decisão da presença da família deverá
ser consensual na equipa e sempre que a
instabilidade do paciente justifique ou os
procedimentos sejam mais invasivos, ou a
família se torne emocionalmente perturbadora esta deva abandonar o local. É de realçar que estes protocolos de atuação estão
recomendados desde 2004, contudo ainda
poucos hospitais dispõem dos mesmos.
No artigo de Elinar Lowry, (2012) é relatado como num hospital de Chicago a
utilização de um protocolo desde 1992 é
considerada uma vantagem para os profissionais. Neste estudo é referido como 14
enfermeiras de urgência descrevem as suas
experiências perante a presença das famílias, através da análise de conteúdo das
entrevistas efetuadas. Este protocolo é útil
na medida em que define quando e como
a família deve estar presente, assim como
quando deverá sair com critérios adequadamente estabelecidos.
Neste estudo são enunciadas as vantagens e desvantagens da presença dos familiares junto aos pacientes em situações
de urgência, e acrescenta que estes profissionais deveriam ter um suporte emocional
adequado para lidar com estas famílias.
Este protocolo inclui o acolhimento prévio
à entrada dos familiares, com as devidas
explicações do que estes irão encontrar
junto aos pacientes, diminuindo a ansiedade estes e aumentando o nível de confiança
nos profissionais.
Num estudo publicado em 2011, realizado por Darcy Egging e colegas, é efetuada uma revisão sistemática da literatura
com os descritores “ presença da família”
e “emergência” e “procedimentos invasivos ou reanimação”, nas bases de dados
da Pubmed e Crochane publicados entre
2005 e 2009. Deste estudo emergem algumas recomendações de nível A e B e também o que não é recomendado. Existe uma
evidência fraca do ponto de vista dos pacientes dada a escassez de estudos nesta
temática. Os poucos estudos referem que
estes ficam contentes com a presença dos
familiares, embora também refiram que é
traumatizante para os seus familiares assistirem a procedimentos mais invasivos. Para
as famílias a evidência demostra que estes
se sentem mais satisfeitos em estarem presentes pois têm a perceção que tudo o que
era possível ser feito pelos seus familiares
foi efetuado.
Como conclusões deste estudo aponta-se como evidencia nível A que as famílias
desejam que lhes seja dada a opção de estarem presentes junto dos seus familiares. É
de evidência forte que os profissionais de-
CIÊNCIA & TÉCNICA
fendem que devem ser providenciadas explicações e suporte emocional aos familiares. Salienta-se a evidência de nível B dada
à necessidade de serem instituídas políticas
ou protocolos de atuação que providenciem estruturas e medidas de suporte emocional também garantido aos profissionais.
Alisha Gozdzialski e colegas, em 2012,
referem a partir de estudos realizados e
referidos no artigo das mesmas que a admissão a uma sala de emergência pode ser
considerado um evento repleto de stress
para o paciente e para a sua família. Uma
comunicação eficaz entre os profissionais e
os pacientes e/ou as suas famílias é muito importante e é um desafio para todos
os profissionais. Contribui para aumentar o
grau de satisfação dos familiares providenciar a informação adequada durante a permanência do paciente no serviço de urgência, dar tempo à família para colocar questões e dúvidas e adequar as informações às
circunstâncias singulares de cada família.
CONCLUSÕES
Os cuidados centrados no doente e na
sua família são um aspeto essencial na enfermagem e sem dúvida na enfermagem
de urgência. A enfermagem deve ter uma
abordagem holística nos cuidados e deve
envolver o paciente e a família, fundamentalmente nos momentos de crise, como é o
caso da vivência de acompanhar um familiar num serviço de urgência com todas as
particularidades que lhe estão associadas.
A revisão da bibliografia efetuada foi
pertinente e contribuiu para obter algumas
conclusões que são extremamente úteis
para a melhoria da qualidade dos cuidados
providenciados à nossa população e tam-
bém otimizar medidas de suporte emocional e institucional aos profissionais que
lidam de perto com estes dilemas nos seus
locais de trabalho.
O objetivo deste trabalho foi saber se
a presença da família durante as medidas
de reanimação ou procedimentos invasivos
têm um impacto positivo ou negativo na
família e nos profissionais de enfermagem
e quais as atitudes dos enfermeiros nestas
situações.
Após a leitura destes estudos conclui-se
que cada vez mais os profissionais de saúde
demonstram uma atitude de maior aceitação à presença de família durante as medidas de reanimação e procedimentos invasivos, isto porque cuidar alguém implica cuidar também a sua família e amigos e se os
profissionais de saúde conseguirem incutir
nas famílias o sentimento de confiança de
que todos os esforços foram empreendidos
quer no tratamento como nos cuidados de
reanimação, teremos certamente um processo de aceitação da doença ou luto facilitado aos familiares.
A decisão da presença da família deverá
ser consensual na equipa e sempre que a
instabilidade do paciente justifique ou os
procedimentos sejam mais invasivos, ou a
família se torne emocionalmente perturbadora esta deve abandonar o local. É de
realçar a sugestão de protocolos de atuação que segundo os estudos estão recomendados desde 2004, contudo ainda poucos hospitais dispõem dos mesmos. Estes
protocolos incluem o acolhimento prévio à
entrada dos familiares, com as devidas explicações do que estes irão encontrar junto
aos pacientes, diminuindo a ansiedade destes e aumentando o nível de confiança nos
profissionais.
71
AGOSTO 2014
CIÊNCIA & TÉCNICA
72
Contudo, para os profissionais existem
algumas barreiras perante a presença das
famílias, estes referem sentirem-se observados na sua atuação e têm medo de falhar,
assim como acrescentam que é um obstáculo à comunicação dentro da equipa. Os
protocolos de atuação neste âmbito devem comtemplar estruturas e medidas de
suporte emocional também garantido aos
profissionais.
A elaboração deste artigo surgiu com
o objetivo de permitir aos profissionais de
saúde a reflexão sobre uma temática muito
discutida na atualidade, contudo os estudos efetuados são na maioria a nível internacional e daí considerei pertinente promover a discussão à luz da nossa realidade.
Deste modo, vou expor como observador
participante o que de relevante me trouxe
a permanência num dos maiores serviços
de urgência de Portugal, durante o estágio
inserido na especialização em Enfermagem
médico-cirúrgica. Para isso, considerei que
a revisão integrativa é um dos métodos que
melhor se adequa a este trabalho, pois consiste num método de pesquisa que permite
a incorporação das evidencias na prática
clinica. Este método tem como finalidade
reunir e sintetizar resultados de pesquisas
sobre um determinado tema, contribuindo
para o aprofundamento do conhecimento
do tema investigado, conduzindo os enfermeiros à pratica baseada na evidencia, ampliando a qualidade dos cuidados de enfermagem.
Uma revisão integrativa é um método
de pesquisa que procura contribuir para a
melhoria do cuidado prestado ao paciente
e família, e facilita a incorporação de evidências, agilizando a transferência de conhecimento novo para a prática, conforme
nos diz Mendes et al (2008). Após a síntese dos resultados desta pesquisa, importa
incorpora-los na nossa prática diária, permitindo dessa forma assumirmos o compromisso da prática baseada na evidência,
transportando os conhecimentos obtidos
para a realidade.
Ao realizar o meu estágio num serviço
de urgência polivalente deparei-me com a
necessidade de efetuar esta pesquisa, dado
que me deparei com inúmeras situações
em que não foi possibilitado às famílias estar junto dos pacientes e noutros casos em
a família esteve presente, esse fato causar
algumas divergências entre os profissionais
ou entre outros pacientes ou familiares.
De acordo com a Lei nº 33/2009 da Assembleia da República de 14 de julho, o
serviço de urgência deve permitir a entrada de um acompanhante por utente, contudo no nosso país o cumprimento desta
lei nem sempre tem sido possível, dadas as
limitações de espaço das nossas urgências,
aliado ao crescente número de pessoas que
acorrem todos os dias a um serviço de urgência. Se ainda não reunimos condições
de aplicabilidade de uma lei que confere o
direito a alguém para estar acompanhado
num momento tão delicado, como poderemos evoluir para o debate que outros países impõem- a presença da família durante
as manobras de reanimação- sim ou não?
Penso que ao refletirmos sobre esta matéria haja a consciencialização da necessidade de mudar.
Não sendo possível obter dados concretos da nossa realidade, dadas as limitações
inerentes ao tempo disponível, importa referir algumas opiniões recolhidas junto dos
profissionais da urgência acerca das vantagens e desvantagens da presença dos fa-
CIÊNCIA & TÉCNICA
miliares durante a realização dos procedimentos invasivos ou mesmo nas manobras
de reanimação. É quase consensual que a
presença dos familiares diminui o número
de conflitos entre familiares e profissionais,
dado que estes estão a par de todos os procedimentos efetuados e as duvidas acerca
do estado clinico vão sendo dissipadas ao
longo da estadia na urgência, aumentando o nível de confiança nos cuidados e nos
profissionais. Contudo, apontam a falta de
recursos humanos e de estruturas físicas
para possibilitarem a permanência da família no serviço de urgência, tendo em conta
o respeito pela privacidade e dignidade da
Pessoa Humana.
Em relação à presença durante as manobras de reanimação, aqui a realidade que
vivenciei ainda se encontra longe do que
nos apontam os estudos efetuados. Para
estes profissionais a população portuguesa ainda não está preparada a nível cultural
e de conhecimentos para poder assistir à
reanimação do seu familiar, permitindo aos
profissionais o desempenho adequado das
suas funções, sem interferências. Em relação aos familiares pude constatar que cada
vez mais se integram nos cuidados, havendo uma maior aproximação entre familiares e profissionais, fato esse devido a uma
maior abertura das instituições às famílias
e ao espirito dos profissionais que cada
vez mais se disponibilizam a estar com as
famílias, perdendo o medo da exposição,
aumentando a sua autoconfiança, o que
de certa forma permitirá a valorização de
uma imagem de um profissional com sentido ético e humano ao mais alto nível, e é
sem duvida aqui que devemos estar nós…
os enfermeiros.
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73
CIÊNCIA & TÉCNICA
ENTRADA DO ARTIGO ABRIL 2013
TRAUMATISMO TORÁCICO.
Lesões não específicas
VANESSA ALEXANDRA G. DOMINGUES
Licenciada em Enfermagem
SARA CORREIA
Licenciada em Enfermagem
WILSON NOGUEIRA
Licenciado em Enfermagem
RESUMO
O presente artigo está direcionado para o Traumatismo Torácico, mais incisivamente para as lesões não específicas, nomeadamente as Lesões
Pulmonares, que se dividem em Lesão da Laringe,
Lesão da Traqueia, Lesão Brônquica, Pneumotórax (aberto e de tensão), Hemotórax, Contusão
Pulmonar, e Lesão do Diafragma; Lesões Cardíacas e dos grandes vasos que englobem as Contusões Cardíacas, Lesões Cardíacas Penetrantes,
Tamponamento Cardíaco, e Rotura da Aorta; e,
por último, as Lesões Esofágicas.
ABSTRACT
This article is directed towards Thoracic Trauma,
more incisively to unspecific lesions, namely Pulmonary Injuries which are divided in Laryngeal
Lesion, Traqueal Lesion, Bronchial Lesion, Pneumothorax (open and tension), Hemothorax, Pulmonary Contusion and
Lesion of the Diaphragm; Cardiac and Major Blood
Vessel Injuries which include Cardiac Contusions,
Penetrating Cardiac Injuries, Cardiac Tamponade
and Aortic Rupture; and finally, Esophageal Injuries.
Palavras-Chave: Traumatismo Torácico; Lesões
não específicas (Lesões Pulmonares, Lesões Cardíacas e dos grandes vasos; e Lesões esofágicas).
Keywords: Thoracic Trauma, Unspecific Lesions
(Pulmonary Injuries, Cardiac and Major Blood Vessel Injuries, Esophageal Injuries).
AGOSTO 2014
ANTÓNIO BRANCO
Licenciado em Enfermagem
74
CIÊNCIA & TÉCNICA
Uma vez que as Lesões não específicas
decorrentes de um Traumatismo Torácico
não são tão visadas pela comunidade científica, achámos pertinente o seu desenvolvimento e consequente aprofundamento.
Como objetivos delineámos:
• Compreender o conceito de trauma
e quais os mecanismos que lhe estão
associados;
• Obter conhecimentos teórico-práticos
acerca do Traumatismo Torácico, nomeadamente, as lesões não específicas;
• Adquirir competências para a prestação de cuidados de enfermagem ao
doente com Traumatismo Torácico.
O TRAUMA
Urden, Stacy e Lough (2008) entendem
por trauma como sendo uma doença ocasionada por um agente físico como a energia
de radiação, elétrica, química ou mecânica,
através do deslocamento de energia sobre
um corpo.
Segundo Castro e Aricó (2007), o trauma
é resultado da falta de cuidados, de perceção
ou distração de outrém, podendo ser intencional ou não intencional. Deste modo, esta
lesão é a principal causa de morte nos adultos jovens e é a terceira causa de morte em
todas as idades, mas nunca é demais referir
que é uma morte evitável. A prevenção do
trauma é de longe a mais barata e o modo
mais seguro para o gerir.
Os traumatismos dividem-se em não-penetrante/por impacto e em penetrante.
O primeiro é uma lesão em que a pele não
apresenta solução de descontinuidade nem
há contacto com o ambiente exterior. Apesar
da extensão destas lesões não ser tão visí-
vel, elas podem constituir um maior risco de
vida, uma vez que é difícil fazer um diagnóstico definitivo. A energia deste tipo de traumatismo transmite-se em todos os sentidos,
pelo que determinados órgãos ou tecidos
irrompem ou fazem rotura.
As forças não-penetrantes mais frequentes são os acidentes de viação, quedas, desportos de contacto e agressões.
Quanto ao segundo tipo de traumatismo,
o penetrante, Sheehy (2001) refere que este
tipo de lesões é “(…) provocada por penetração de objetos estranhos em movimento,
no corpo.” A energia obtida pelo objeto estranho dissipa-se para os tecidos ou zonas
circundantes. A mesma autora indica-nos
que a avaliação deste tipo de traumatismo
depende “(…) do agente responsável pelo ferimento, do modo como a energia se dissipa,
da distância entre a vítima e a arma e das
características dos tecidos atingidos.”
A gravidade das lesões depende da duração da exposição, sentido e magnitude da
energia aplicada, e da região corporal para a
qual a mesma energia é direcionada (Urden
et al., 2008: 990). Cerca de 70% das lesões
torácicas são causadas por este tipo de traumatismo.
Anatomia do tórax
O esqueleto da cavidade torácica é constituído pelo esterno, costelas, as cartilagens
costais e vértebras torácicas (figura 1) apresentando alguma mobilidade para facilitar os
movimentos respiratórios.
As costelas ligam-se às vértebras torácicas na parte posterior; já na parte anterior,
os sete primeiros pares ligam-se diretamente
ao esterno; da oitava à décima vértebra, estas
ligam-se ao mesmo mas pela fusão da cartilagem; os dois últimos pares – as flutuan-
75
CIÊNCIA & TÉCNICA
AGOSTO 2014
tes - não possuem ligação anterior (Seeley,
Stephens e Tate, 2011). O diafragma constitui o bordo inferior do tórax, sendo o bordo
superior contínuo às estruturas do pescoço
(Sheehy, 2001).
As estruturas internas da caixa torácica
são constituídas por órgãos e estruturas dos
sistemas respiratório, cardiovascular e gastrointestinal. As estruturas pulmonares estão
situadas no espaço pleural, enquanto que as
estruturas cardiovasculares e gastrointestinais situam-se no mediastino (cavidade que
se encontra entre os dois espaços pleurais).
76
Lesões não específicas
Decorrente do Traumatismo Torácico, podem surgir as seguintes lesões não específicas: Lesões Pulmonares; Lesões Cardíacas e
dos grandes vasos; e, as Lesões Esofágicas.
Resultante de Lesões Pulmonares, pode
surgir Lesão da Laringe. A fratura da laringe
não e um problema comum, mas colocam
em risco a vida do doente, Khsetry (1994),
Lewis (1986) e Pate (1989); cit. por Sheehy
(2001). Os mecanismos que originam esta
lesão, baseiam-se na aplicação de força na
face anterior do pescoço, como em casos de
embate contra volante, agressões nesta zona,
estrangulamento. A lesão não-penetrante
da laringe é sugerida pelo enquadramento
histórico do sucedido, no entanto, o doente
pode apresentar amolecimento ou crepitação localizados. Por vezes torna-se necessária a realização de exames complementares
de diagnóstico como a radiografia lateral
aos tecidos moles do pescoço ou mesmo Tomografia Axial Computadorizada (TAC). Em
doentes com dificuldade respiratória grave
ou obstrução, está indicada a entubação,
caso a mesma seja dificultada, pode realizar-se traqueotomia, de acordo com American
College of Surgeons (1993) e Wilson (1986);
cit. por Sheehy (2001), mas, “regra geral, na
Urgência realiza-se cricotirotomia, reservando-se a traqueotomia para tratamento cirúrgico” (Sheehy 2001:322).
Quanto ao tratamento, no caso de traumatismo penetrante, a intervenção cirúrgica
deve ser realizada de imediato. Este traumatismo pode vir acompanhado por lesão da
carótida ou da veia jugular. Nas lesões por
projétil, está associada destruição extensa do
pescoço e também deverá ser considerada
lesão cervical.
Na Lesão da Traqueia, os mecanismos de
lesão assemelham-se aos da laringe, referidos anteriormente, podendo ser um traumatismo penetrante ou não-penetrante. No
caso não-penetrante podem ser “subtis ou
agudas” (Sheehy 2001:323). O único sinal,
por vezes, de uma obstrução parcial é a respiração ruidosa, enquanto que a ausência
de respiração reflete uma obstrução total. O
diagnóstico torna-se ainda mais complicado
caso o doente apresente alterações de consciência. A avaliação é feita a partir de broncoscopia, TAC e laringoscopia. O tratamento
passa por entubação ou traqueotomia, em
casos mais graves recorre-se a tratamento
cirúrgico.
Na Lesão Brônquica, o traumatismo não-penetrante do tórax, segundo Sheehy
(2001), tem uma elevada mortalidade devido
ao diagnóstico tardio e por vezes inexistente. No traumatismo penetrante, em algumas
ocasiões, é apenas verificada durante a intervenção cirúrgica realizada por outras razões.
A hemoptose, enfisema subcutâneo, fervores ou crepitações mediastínicos (sinal de
Hamman), e pneumotórax de tensão com
deslocamento do mediastino, são sinais e
sintomas desta lesão. Na sequência do pneu-
CIÊNCIA & TÉCNICA
motórax de tensão o doente pode apresentar dispneia, taquicardia e poucos ou mesmo
nenhuns sons respiratórios, Sheehy (2001).
Baseado em Sheehy (2001), o tratamento
passa por suporte das vias aéreas ate à remissão da inflamação e do edema. Nos doentes
em que se verifique um rasgamento significativo é necessário o tratamento cirúrgico.
Relativamente ao Pneumotórax, esta lesão consiste na acumulação de ar no espaço pleural devido ao colapso parcial ou total
do pulmão com diminuição da pressão intrapleural. A lesão pode ter como etiologia,
também, o traumatismo penetrante e/ou
não-penetrante. A fratura de costelas com
laceração dos tecidos do pulmão – traumatismo não-penetrante –, é a causa mais comum desta lesão.
Como sinais, o doente refere dor no peito
e dispneia. A auscultação do pulmão revela poucos ou nenhuns sons respiratórios e
à precursão, verifica-se híper-ressonância. A
taquicardia e taquipneia podem estar presentes. Caso o ar se acumule no mediastino
podemos verificar o sinal de Hamman. Os
exames radiológicos são importantes para a
confirmação desta lesão.
O tratamento passa pela utilização de um
dreno torácico com um sistema subaquático
de drenagem uma vez que, assim, há uma
aspiração do ar e facilita-se a reexpansão do
pulmão. Depois de verificada a colocação
correta do dreno, o doente deve estar ereto
para diminuir a pressão dos órgãos abdominais sobre o diafragma, sendo também realizada hiperventilação com oxigénio.
De acordo com Sheehy (2001), o Pneumotórax pode-se dividir em Pneumotórax
Aberto e Pneumotórax de Tensão. No primeiro, verifica-se esta lesão quando existe
uma abertura no tórax de dimensão superior
a dois terços do diâmetro da traqueia. Assim o ar em vez de entrar pela traqueia, fá-lo pela parede torácica. Esta lesão resulta na
sua maioria por traumatismos penetrantes.
Quando o doente inspira o ar entra para o
tórax, devido à perda de pressão intratorácica, não sendo expelido, consequentemente
a pressão aumenta podendo formar-se um
pneumotórax de tensão. O doente apresenta dor no peito, dispneia, hipotensão, sons
respiratórios reduzidos ou ausentes, também
é frequente surgirem bolhas de ar em volta
da ferida. O tratamento imediato passa pela
utilização de um penso oclusivo fixado em
três pontos, permitindo que o ar saia e impedindo que este entre durante a inspiração.
O doente deve estar monitorizado para
despiste de sinais de pneumotórax de tensão,
caso se verifique, o penso deve ser retirado e
aplicado dreno. O tratamento definitivo é realizado através de um encerramento cirúrgico.
A mesma autora refere que, no segundo
– Pneumotórax de Tensão –, a acumulação
de ar num espaço pleural provoca deslocação das estruturas para o lado não afetado,
implicando risco de vida. O ar entra para a
cavidade pleural através da inspiração mas
o movimento inverso não se verifica com a
expiração. Consequentemente as estruturas
intratorácicas são comprimidas com a deslocação do mediastino. Na auscultação à redução ou mesmo ausência dos sons respiratórios, e caso o doente esteja vígil, poderá manifestar dor no peito, dispneia. A compressão do coração provoca disritmia, diminui o
enchimento diastólico e o débito cardíaco.
O ingurgitamento das veias do pescoço decorre do deficiente retorno venoso devido
à compressão do coração, mas no caso de
hipovolémia concomitante o ingurgitamento
não se verifica.
77
AGOSTO 2014
CIÊNCIA & TÉCNICA
78
No tratamento imediato deve ser feita a
descompressão do lado afetado utilizando-se um cateter de calibre catorze ou dezasseis. Introduz-se no segundo espaço intercostal, na linha média da clavícula, ou no 5º
espaço intercostal, na linha axilar anterior, no
lado afetado. A terapia definitiva consiste na
entubação torácica (Sheehy, 2001).
O Hemotórax consiste na acumulação de
sangue na cavidade pleural resultante de uma
hemorragia do parênquima pulmonar, lesão do coração, grandes vasos, e das artérias
mamárias internas, no entanto, a causa mais
frequente é a lesão das artérias intercostais.
Como sinais e sintomas o doente refere dor
torácica, apresenta alteração dos sons respiratórios, que podem estar diminuídos ou ausentes, e, no lado afetado, o doente apresenta
percussão dura do tórax. No tratamento deve
ser realizada hiperventilação com oxigénio,
por máscara de não reinspiração, ou em casos
graves entubação endotraqueal, linhas intravenosas de grande calibre para reposição de
fluídos. A drenagem torácica deve ser cuidadosamente observada, a fim de se avaliar a
necessidade de autotranfusão.
A Contusão Pulmonar verifica-se quando
o parênquima pulmonar subjacente é lesado
provocando edema e hemorragia. As forças
de concussão e de compressão são a causa
mais comum da contusão pulmonar. “A lesão do parênquima pulmonar provoca rotura
e hemorragia para o tecido pulmonar, para
os alvéolos e vias aéreas inferior” (Sheehy
2001:326). Esta situação provoca colapso
das vias aéreas e perda de ventilação, originando um shunting pulmonar seguido de
hipoxemia. A reação inflamatória resultante
dificulta a hematose pulmonar agravando o
quadro clínico. Nestas lesões podem estar
presentes sinais e sintomas como dispneia,
hemoptise, hipoxia e, por vezes, escoriação
ou equimoses da parede torácica. Durante a
auscultação o doente pode apresentar sons
normais, mas a gasimetria arterial pode revelar anomalias.
No tratamento, o doente deve ser posicionado em semifowler, de modo a facilitar
a reexpansão pulmonar, aspiração e fisioterapia torácica. Nas situações em que o doente estiver em hipoxia, a contusão pulmonar
pode afetar mais de 28% dos pulmões, segundo Shehhy (2001:326). Em casos de sinais
de choque, fratura de oito ou mais costelas,
idade avançada ou doença pulmonar subjacente, pode ser necessária a entubação e
ventilação mecânica. A administração de fluidos deve ser restrita, a não ser que haja presença de sinais de hipovolémia.
O traumatismo torácico pode provocar,
também, Lesões do Diafragma. O não-penetrante origina “grandes rasgamentos radiais,
acompanhados de herniação das estruturas
abdominais para o tórax” (Sheehy, 2001:326).
A maioria destas lesões ocorre do lado esquerdo, pois o oposto encontra-se protegido
pelo fígado. Sinais e sintomas como dispneia,
abdominalgias, epigastralgias, com irradiação
para o ombro esquerdo (sinal de Kehr), ruídos
hidroaéreos na extremidade inferior do tórax
e diminuição dos sons respiratórios no lado
afetado. A cirurgia de reparação constitui-se
como tratamento nestas situações.
As Lesões Cardíacas e dos Grandes Vasos englobam, de entre outros, as Contusões
Cardíacas. “A contusão cardíaca e a sufusão
do coração, geralmente resultante de traumatismo não-penetrante da face anterior do
tórax” (Sheehy, 2001:327). Assim, o miocárdio pode apresentar contusão que se assemelha ao enfarte do mesmo. Na avaliação
por ecocardiograma, em lesões moderadas,
CIÊNCIA & TÉCNICA
podem não ser reveladas alterações apesar
de estarem presentes disritmias. Em lesões
extensas, o mesmo exame poderá revelar
sinais de disfunção do miocárdio, (Daleiden,
1994; cit. por Sheehy, 2001).
Os sinais e sintomas de contusão não são
específicos, no entanto, podem estar presentes equimoses da face anterior do tórax, dor
no peito semelhante à da angina de peito,
mas a dor resultante da contusão não responde aos vasos dilatadores, ao contrário da
angina de peito.
Através da realização do Eletrocardiograma (ECG), na sua leitura é observável taquicardia sinusal, fibrilhação auricular, flutter auricular e contrações ventriculares prematuras.
Na observação dos ECGs verificam-se, também, alterações do segmento ST e da onda T,
prolongamento do intervalo QT, e bloqueio
do ramo fascicular direito. Este exame de
diagnóstico é importante pois possibilita a
distinção do tipo de patologias reforçando a
veracidade do diagnóstico clínico. Disritmias;
lesão valvular e rotura; tromboembolismo; e
insuficiência cardíaca congestiva, são consequências da contusão cardíaca. “O tratamento consiste em motorização do doente
durante vinte e quatro horas no mínimo”
(Sheehy, 2001:327). Os doentes com anomalias no ECG devem realizar ecocardiograma
e, se apresentarem alterações neste último,
devem realizar tratamento sintomático. Por
sua vez, aqueles que não apresentam quaisquer alterações no ECG ou que se mantenham assintomáticos durante vinte e quatro
horas, não requerem tratamento.
Nas Lesões Cardíacas Penetrantes, “A
maioria das vítimas com lesão cardíaca penetrante chega à Urgência em paragem cardíaca, hipotensão significativa na sequência
do tamponamento cardíaco ou hemorragia”
(Sheehy, 2001:327). Devido à posição anterior do ventrículo direito, este é o maioritariamente afetado. A taxa de sobrevivência,
segundo esta autora, depende muito do
diagnóstico precoce e do tratamento.
Nos doentes que apresentem paragem
cardíaca, está indicada a realização imediata
de toracotomia na Urgência. No ECG sem alterações não é necessária avaliação posterior,
mas nos casos com alteração, que indiquem
tamponamento, aludem para a necessidade
de fenestração subxifoideia. “Na exploração
subxifoideia positiva está indicada cirurgia cardíaca, para reparação da anomalia”
(Sheehy, 2001:327).
O Tamponamento Cardíaco ocorre com
o preenchimento rápido do pericárdio com
sangue, havendo, deste modo, uma redução
do “enchimento dos ventrículos” (Sheehy,
2001:328), aumentando a pressão exercida
no coração. Assim, verifica-se uma redução
da eficácia da contração do coração diminuindo, consequentemente, o débito cardíaco. Esta lesão possui um conjunto de sintomas clássicos – Tríade de Beck.
A hipotensão deriva da redução do débito
cardíaco; os sons cardíacos abafados derivam
da capacidade de isolamento do sangue; e o
ingurgitamento deve-se há deficiente capacidade do coração em dilatar-se, impedindo
o normal retorno venoso. A hipovolémia associada pode dificultar a manifestação destes sintomas. A principal etiologia desta lesão são os traumatismos penetrantes.
A pericardiocentese pode funcionar como
meio de diagnóstico mas, nesta situação,
existe o risco de lesões secundárias. Esta intervenção pode também ser um meio contemporizador, isto é, através dela melhora-se
a função cardíaca ate à realização da cirurgia.
Segundo Sheehy (2001) o ECG e a radiografia
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CIÊNCIA & TÉCNICA
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torácica não são meios de diagnósticos fiáveis devido às alterações contraditórias nos
parâmetros de avaliação. “Certos doentes
apresentam frequência anormal, conhecida
por alternância elétrica. A deteção precoce e
a intervenção rápida são cruciais para a sobrevivência do doente” (Sheehy, 2001:329).
Na Rotura da Aorta, segundo Sheehy
(2001:329), a maioria das vítimas morre no
local do acidente, sendo poucas as que sobrevivem no percurso até ao hospital. Assim,
o diagnóstico precoce e a intervenção cirúrgica rápida, são extremamente importantes
para a sobrevivência pois, segundo a autora,
mais de metade vítimas sem tratamento nas
primeiras quarenta e oito horas morrem.
O doente refere dor intensa e persistente no
peito ou nas omoplatas. Verifica-se dispneia e
hemoptise. “Se houver perda da integridade da
válvula aórtica, ouve-se um sopro sistólico alto,
precordial” (Sheehy, 2001:330). Outros sinais
são o choque hipovolémico; a diferença abrupta nos valores da tensão arterial dos membros
superiores; a síndroma de coartação aguda; e
nos membros inferiores a perfusão sanguínea
está diminuída ou mesmo ausente.
O exame de diagnóstico mais utilizado é
a radiografia torácica aórtica que demonstra
uma dilatação mediatínica. O meio mais fidedigno é o aortograma, mas este revela riscos
pois a administração de corante radiopaco
pode agravar a lesão, ou até mesmo provocar uma secção total da aorta.
O tratamento desta lesão consiste na reparação cirúrgica imediata. Na Urgência, o
tratamento passa pela cateterização de veias
com cateteres de grande calibre, de forma a
repor fluidos, e pela colheita de sangue para
triagem e compatibilidade.
Por último, a Lesão esofágica é rara, mas
geralmente é letal. Provoca mediastinite, de-
rivado à contaminação proveniente da saliva
e do conteúdo gástrico. “O doente poderá
sentir dor e/ou choque, desmesurados para
a lesão torácica visível” (Sheehy, 2001:330).
O diagnóstico é confirmado por exames de
contraste ou esofagoscopia. O tratamento
nestas situações é a reparação cirúrgica.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
As lesões não específicas, consequência
do Traumatismo Torácico, são inúmeras e
com grandes diferenças entre si. Estas podem constituir um risco de vida imediato
para a vítima, uma vez que são lesões que
acarretam complicações para os órgãos vitais
tendo em conta o seu mecanismo de lesão e,
nalguns casos, o seu difícil e tardio diagnóstico. Como tal, o enfermeiro deverá ter um
papel ativo na deteção dos sinais e sintomas
decorrentes de cada lesão de modo a poder
implementar um tratamento o mais precocemente possível.
Tendo em conta a escassez de informação sobre esta temática, com a leitura deste
artigo, é possível ampliar o leque de conhecimentos teórico-práticos, tal como fora delineado inicialmente nos objetivos.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Intervenção. (5ª edição). Loures: Lusodidacta.
Phipps, W. J., Marek, J. F., Sands, K. J. (2010).
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clínica. (7ª ed.). Vol.III. Loures: Lusociência.
Seeley, R.; Stephens, T.; Tate P. (2011). Anatomia &
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Sheehy, S. (2001). Enfermagem de Urgência: da teoria à
prática. (5ª edição). Loures: Lusociência.
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