A CULPABILIDADE vista por Serrano Neves

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A CULPABILIDADE vista por Serrano Neves
VISTA POR SERRANO NEVES
GOIÂNIA, SETEMBRO DE 2010
1
COLEÇÃO TÊMIS DESVENDADA
A Culpabilidade vista por
Serrano Neves
Da eficácia executória do dispositivo condenatório na sentença penal.
Serrano Neves
Procurador de Justiça Criminal
http://www.serrano.neves.nom.br
[email protected]
[email protected]
com contribuições de Humberto Rodrigues Moreira
REVISÃO 0.1 em 28/08/2010
EDITORA LIBER LIBER
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2
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3
Sumário
1 NOÇÃO DE CULPA E CULPABILIDADE.................................................................................9
1.1 O torcedor de futebol......................................................................................................................................................9
1.2 Quem comeu o meu biscoito........................................................................................................................................10
1.3 O alfaiate.......................................................................................................................................................................11
1.4 Culpabilidade NÃO PENAL........................................................................................................................................12
2 INTRODUÇÃO..................................................................................................................... 14
2.1 I. As várias acepções do termo culpabilidade no direito penal:....................................................................................14
2.2 II. Conceito de Culpabilidade como elemento/estrato do crime:..................................................................................15
2.3 III. Concepções dogmáticas da culpabilidade:.............................................................................................................16
2.4 IV. Elementos da culpabilidade normativa pura...........................................................................................................17
2.5 V. Esquema da Imputabilidade na Culpabilidade.........................................................................................................18
3 SENTENÇA DE EFICÁCIA RESTRINGIDA......................................................................20
4 DO FIM DA PERSEGUIÇÃO PUNITIVA...........................................................................39
5 A CULPABILIDADE............................................................................................................54
5.1 Consistente Legal..........................................................................................................................................................55
5.2 Exame da Hipótese.......................................................................................................................................................56
5.3 Orientação.....................................................................................................................................................................60
5.4 AS ELEMENTARES DA CULPABILIDADE.............................................................................................................68
5.5 Uma Visita à Imputabilidade........................................................................................................................................77
6 DA FIXAÇÃO DA PENA BASE........................................................................................101
6.1 A declaração................................................................................................................................................................104
6.2 Suficiência na declaração............................................................................................................................................104
7 DOS COMANDOS NORMATIVOS...................................................................................108
8 A MEDIDA DA CULPABILIDADE...................................................................................112
9 A NECESSIDADE DE ATRIBUIR UMA MEDIDA...........................................................116
10 A BUSCA DA EFICÁCIA.................................................................................................120
4
10.1 Do Interesse na Eficácia...........................................................................................................................................120
10.2 Discussão da ineficácia.............................................................................................................................................123
10.3 Da natureza declaratória...........................................................................................................................................127
10.4 Momentos da declaração..........................................................................................................................................131
10.5 Conclusão..................................................................................................................................................................141
11 DA DECLARAÇÃO..........................................................................................................143
11.1 Do conteúdo da declaração.......................................................................................................................................143
11.2 Do Dever de Fundamentar........................................................................................................................................144
11.3 Necessário e Suficiente.............................................................................................................................................149
11.4 A Natureza da Verdade..............................................................................................................................................151
12 EXPOSIÇÃO DO CASO...................................................................................................154
12.1 Breve Histórico dos Vícios.......................................................................................................................................158
12.2 Dispositivo arbitrário................................................................................................................................................162
12.3 Anulação arbitrária do dispositivo............................................................................................................................165
13 RECURSO EXCLUSIVO DA DEFESA...........................................................................169
13.1 Convalidação arbitrária do dispositivo.....................................................................................................................174
13.2 Do Interesse para Recorrer.......................................................................................................................................177
14 DOS PONTOS CONTROVERSOS..................................................................................181
15 DA NULIDADE ABSOLUTA...........................................................................................188
16 CASO E PROPOSIÇÃO...................................................................................................190
17 POSIÇÃO DO GABINETE...............................................................................................192
17.1 Da Ilegalidade e do Abuso de Poder.........................................................................................................................193
17.2 Da violação do texto constitucional..........................................................................................................................194
17.3 Do devido processo legal..........................................................................................................................................205
17.4 Da dignidade da pessoa humana...............................................................................................................................207
17.5 Da sociedade livre, justa e solidária..........................................................................................................................208
18 UMA METODOLOGIA PARA MEDIR A CULPABILIDADE........................................210
18.1 O que medir..............................................................................................................................................................214
19 RESUMO DOUTRINÁRIO..............................................................................................227
19.1 OBJETIVO...............................................................................................................................................................229
20 ANOTAÇÕES SOBRE O DIAGRAMA..........................................................................230
5
20.1 condição de punibilidade..........................................................................................................................................230
20.2 Equação do inteiramente incapaz.............................................................................................................................232
20.3 Equação do não inteiramente capaz..........................................................................................................................233
20.4 Do advérbio “inteiramente”......................................................................................................................................235
20.5 Entender inteiramente o caráter ilícito do fato..........................................................................................................235
20.6 Determinar-se de acordo com esse entendimento.....................................................................................................236
20.7 Condição de reprovabilidade....................................................................................................................................237
20.8 Demonstração...........................................................................................................................................................237
20.9 A culpabilidade como princípio (nulla poena sine culpa) (culpável)........................................................................238
20.10 A culpabilidade como elemento dogmático do delito (culpado).............................................................................239
20.11 A culpabilidade como legitimante da pena (culpabilizável)...................................................................................239
20.12 Caso concreto de ausência de culpabilidade...........................................................................................................241
20.13 Simulação de dispositivo........................................................................................................................................242
20.14 Dispositivo quase perfeito em caso concreto..........................................................................................................245
21 CAMINHO CRÍTICO DO EXAME DA CULPABILIDADE NOS TRÊS MOMENTOS 247
21.1 Momento I (fig. 13a).................................................................................................................................................247
21.2 Momento II (fig. 13b)...............................................................................................................................................250
21.3 Momento III – (fig. 13c)...........................................................................................................................................251
22 DA FUNDAMENTAÇÃO DA CULPABILIDADE..........................................................262
22.1 DA INDIVIDUALIZAÇÃO.....................................................................................................................................264
22.2 ANÁLISE DA CULPABILIDADE..........................................................................................................................266
22.3 DO CARÁTER DECISÓRIO DA FIXAÇÃO DA PENA.......................................................................................269
22.4 DO RECEBIMENTO (REJEIÇÃO) DA DENÚNCIA............................................................................................270
22.5 DA (IN)PROCEDÊNCIA DA DENÚNCIA.............................................................................................................271
22.6 MOTIVOS DE FATO E DE DIREITO.....................................................................................................................272
22.7 LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO.............................................................................................................275
22.8 DA EXTENSÃO DA MOTIVAÇÃO.......................................................................................................................283
22.9 FUNDAMENTAÇÃO DA SENTENÇA..................................................................................................................289
22.10 CONCLUSÃO........................................................................................................................................................292
23 EMBARGOS DE COERÊNCIA(*)...................................................................................294
23.1 FUNDAMENTAÇÃO DAS DECISÕES QUE RESTRINGEM A LIBERDADE.................................................294
23.2 DO EXAME DE CASOS CONCRETOS................................................................................................................294
23.3 JURISPRUDÊNCIA.................................................................................................................................................302
6
24 EPÍLOGO.......................................................................................................................... 310
24.1 Momento I da culpabilidade.....................................................................................................................................311
24.2 Momento II da culpabilidade....................................................................................................................................312
24.3 Momento III da culpabilidade...................................................................................................................................313
25 CALCULADORA DE PENA............................................................................................314
25.1 Tela Inicial - Calculadora em formulário - roda no BrOffice.Calc...........................................................................315
25.2 Instruções - Calculadora em formulário - roda no BrOffice.Calc...........................................................................316
25.3 Cálculo da Pena Base - Calculadora em formulário - roda no BrOffice.Calc..........................................................317
25.4 Ajuda do Cálculo da Pena Base - Calculadora em formulário - roda no BrOffice.Calc...........................................318
25.5 Ajuda do cálculo da Pena Base - Calculadora em formulário - roda no BrOffice.Calc...........................................319
25.6 Cálculo das Agrantes e Atenuantes - Calculadora em formulário - roda no BrOffice.Calc.....................................320
25.7 Cálculo dos Aumentos e Diminuições - Calculadora em formulário - roda no BrOffice.Calc...............................321
25.8 Ajuda do cálculo dos Aumentos e Diminuições - Calculadora - roda no BrOffice.Calc.........................................322
25.9 Tela Única (com ajudas) - Calculadora em planilha - roda no BrOffice.Calc..........................................................323
25.10 Tela Única (com ajudas) - Calculadora em planilha - roda em Excel (97/2003 e 2007/2010)...............................324
26 CONTEÚDO DO CD...............................................................................................325
7
1
NOÇÃO DE CULPA E CULPABILIDADE
CULPA E CULPABILIDADE SÃO NOÇÕES NATAS E LEIGAS.
A palavra culpa é usada para designar o vínculo entre uma pessoa e sua conduta
censurável.
1.1
O torcedor de futebol
O art. 654 do Código de Processo Penal expõe duas chaves mestras do instituto
do Habeas Corpus: “qualquer pessoa” (caput) e “conterá” (§1º).
“O técnico é culpado pela vitória do time” é uma afirmação no mínimo estranha
para os ouvidos leigos. Técnicos de futebol sempre são apontados como culpados pela
derrota do time.
Os torcedores de futebol sabem muito bem atribuir culpas. E mais, sabem
analisar a pessoa culpada diante das circunstâncias da conduta. E mais ainda, sabem
distribuir sanções proporcionais.
Sabem, aquele jogo perdido?
Pois é, o atacante goleador estava com o joelho doente, mas o técnico o escalou
assim mesmo, tem que, no mínimo, levar uma multa.
Ora! Diz outro torcedor: o cara é sério, e se escalou o jogador foi porque o
médico liberou, logo, tem que pagar multa também.
8
Deixa disso, sô ! O médico é meu vizinho de quintal, sujeito bom, se fez isso foi
porque levou uma cartolada, esse cartola tem que ser desmoralizado.
Qualé, mané! O cartola do time é meio enrolado, mas estou sabendo que o
patrocinador ameaçou romper o contrato se o atacante não fosse escalado, a assembleia
tem que demitir essa diretoria vendida.
Disse eu: quem de qualquer modo concorre para o “crime” incide nas penas a
este cominadas na medida da sua culpabilidade.
1.2
Quem comeu o meu biscoito
Archeobaldo chegava em casa mais cedo nas quintas-feiras e comia biscoitos de
queijo que sua dedicada esposa preparava.
Certa quinta-feira o Juninho comeu os biscoitos e quando a mãe viu já não dava
tempo de fazer outros.
Archeobaldo chegou, não encontrou os biscoitos e partiu furioso para cima da
esposa, mas esta – que não mentia – apontou Juninho como autor da façanha.
Archeobaldo pegou o chinelo para exemplar Juninho quando sua esposa o
interrompeu:
“Não faça isto ! Eu fiz os biscoitos como sempre, mas há hora do lanche do
Juninho eu estava fazendo as contas da casa para economizar seu suado dinheiro e
não dei atenção aos seus reclamos. Ele estava com fome e comeu os biscoitos.
Ora, Archeobaldo, o Juninho é uma criança, não podia entender essa sua mania de
comer biscoitos às quintas-feiras; estava com fome, eu não lhe dei atenção, ele
não achou outra coisa para comer. Então, não merece chineladas, mas deve ganhar
9
um sermão para não crescer achando que pode fazer tudo.”
E eu, refletindo: imputabilidade especial, potencial consciência do injusto,
exigibilidade de conduta diversa, analisadas de acordo com as circunstâncias do fato e o
domínio sobre elas.
1.3
O alfaiate
Comprei um terno no Magazine Machon. Ficou perfeito porque meu corpo tem
as medidas padrão do manequim 48.
O primeiro amigo que encontrei disse que eu não precisava usar terno de
indústria mesmo que servissem certinho no corpo, pois havia um monte de gente usando
os mesmos ternos, com pequenas variações de tecido e cor. Recomendou-me um
alfaiate, e lá fui.
Doutor, primeiro vamos tirar as medidas.
Tirou e concluiu que eram padrão do manequim 48.
O terno é para trabalho ou festa, doutor?
Para trabalho, respondi.
Então o doutor precisa de um tecido mais leve e um corte mais folgado para lhe
dar mais conforto.
Escolhido o tecido perguntou sobre a feijoada dos sábados e acresceu dois
centímetros na cintura, ao mesmo tempo em que sugeria algibeiras e bolsos traseiros
com alça para fechar no botão ao invés de casa.
Aceitei a sugestão da casa na lapela, quando ele disse que dava um toque de
elegância no doutor.
10
Provado estar ajustado e arrematado, estava usando o terno feito pelo alfaiate
quando reencontrei o mesmo amigo: “Caramba! Dá para ver que foi feito para você.”
E eu pensei com os botões do terno: resultado da individualização do pano, digo,
da pena.
1.4
Culpabilidade NÃO PENAL
Em destaque que vendedor do magazine me entregou um terno pronto que servia,
mas o alfaiate realizou uma operação de normatização individualizada, o mesmo tendo
sido realizado pelos torcedores e pela mãe do Juninho.
Apropriando-se de fatos e valores referidos às pessoas e suas circunstâncias
fizeram seus juízos e produziram resultados bem adequados aos casos.
Os casos dos torcedores de futebol e da criança que comeu os biscoitos estão
mostrando que pessoas leigas podem censurar condutas na conformidade da capacidade
do agente, sua potencial consciência do injusto e exigibilidade de conduta diversa.
A culpabilidade como censura à conduta do autor de uma ação, e mesmo a
graduação da culpabilidade, é aplicável, no cotidiano, a situações que passam ao largo
do direito penal.
Em todos os casos leigos incide censura leiga, independente de existir norma
escrita e sanção prevista.
No mundo leigo existe, sim, um alto grau de arbitrariedade dada a inexistência de
tipos e faixas de sanção, mas existe, em contrapartida, um esforço de razoabilidade na
análise e na imposição de sanção em razão da pessoa.
No caso dos biscoitos é válido fazer o exercício de ir aumentando a idade do
11
agente e reanalisando em função do aumento da capacidade para lidar com a conjuntura
biscoitos-fome, formar a consciência do injusto de comer os biscoitos e conduzir-se de
forma a não comê-los se existirem alternativas.
Este é o mundo leigo, mundo dos humanos julgando humanos.
O que ocorre no "mundo jurídico" como dessemelhança fundamental com o
mundo leigo é: a) existência de pessoa investida com o poder de analisar; b) existência
de tipos e sanções previstos na lei; c) existência de especial compreensão (doutrina
jurídica).
Decerto, no "mundo jurídico" humanos continuam analisando a conduta de
humanos, impostas as limitações da "nulla poena sine lege previa" e chamada à
presidência da concreticidade da sanção a razoabilidade ou proporcionalidade.
É possível – afirmo na falta de pesquisa científica – que os maus tratos à
culpabilidade no âmbito das sentenças penais condenatórias derivem da “tradicional”
especialização do discurso jurídico.
Everardo da Cunha Luna, in O Resultado no Direito Penal, comenta sobre a
criação de um “mundo jurídico” no qual as coisas devem acontecer independentemente
da realidade fática.
Tal mundo jurídico – comento eu – se vale de uma linguagem própria, rica em
expressões sinalagmáticas, rebuscamentos e hermetismo de linguagem, enfim, discursos
capazes de revelar que o autor sabe mais do que os comuns mortais que lhes submetem à
apreciação seus direitos e poderá um dia saber tanto quanto os que, eventualmente,
revisarão seus discursos, como querem demonstrar.
Bem, o sujeito dos direitos em apreciação que tenha um Advogado que também
12
habite tal mundo jurídico e que tenha habilidade e coragem para construir uma versão
inteligível para os comuns mortais.
Na área criminal é considerado que o cidadão só precisa saber a quantidade de
pena e o regime de cumprimento. Afinal, cometeu um crime.
Negar ao cidadão a fundamentação inteligível e individualizada sobre a relação
entre a sua culpabilidade e a quantidade de pena é ato de poder, simplesmente: se foi o
magistrado que disse então está certo.
Revelar ao cidadão a fundamentação inteligível e individualizada é um ato de
dever, ou como queira ato de poder-dever (ato de governo), ou melhor e atendendo a
embargos de declaração: ato do poder para cumprir o dever.
Doze laudas para dizer que o crime existe e doze linhas para tirar parte da
liberdade do cidadão fazem parecer que o bem jurídico protegido é a integridade do tipo
e que a liberdade é apenas um bem expropriável, e até pode ser assim esterilmente
tratada desde que antecedida de prévia e justa indenização, digo, fundamentação, como
garante a Constituição aos jurisdicionados.
2
INTRODUÇÃO
Por Humberto Moreira
2.1
I. As várias acepções do termo culpabilidade no direito penal:
1) Culpabilidade como antônimo de inocência. Nullum crimen sine culpa.
Nesse caso, a culpabilidade é um conceito amplo, que se refere ao fato de alguém ter
sido condenado definitivamente por um crime praticado. Quem está nesta situação, tem
13
seu nome lançado no “rol dos culpados”.
2) Culpabilidade como circunstância judicial a ser aferida na aplicação da
pena (art. 59 CP). A pena será maior ou menor conforme o grau de culpabilidade
verificado.
3) Culpabilidade como referencia à ideia de culpa lato sensu. Trata-se do
elemento subjetivo do crime (dolo ou culpa stricto sensu), localizado no tipo. Não há
responsabilidade penal objetiva.
4) Culpabilidade como elemento do conceito analítico / dogmático /
estratificado de crime. É o juízo de reprovabilidade ou censurabilidade da conduta típica
e antijurídica do autor.
2.2
II. Conceito de Culpabilidade como elemento/estrato do crime:
Conceito simplificado: REPROVABILIDADE PESSOAL DA CONDUTA
TÍPICA E ANTIJURÍDICA.
ZAFFARONI: “Já fornecemos o seu conceito geral: é a reprovabilidade do injusto ao
autor. O que lhe é reprovado? O injusto. Por que se lhe reprova? Porque não se
motivou na norma. Por que se lhe reprova não haver-se motivado na norma? Porque
lhe era exigível que se motivasse nela. Um injusto, isto é, uma conduta típica e
antijurídica, é culpável, quando é reprovável ao autor a realização desta conduta
porque não se motivou na norma, sendo-lhe exigível, nas circunstâncias em que agiu,
que nela se motivasse. Ao não se ter motivado na norma, quando podia e lhe era
exigível que o fizesse, o autor mostra uma disposição interna contrária ai direito”.
CIRINO: “O componente de culpabilidade do fato punível é um juízo de reprovação
sobre o sujeito que realiza um tipo de injusto, cujos fundamentos são a capacidade
14
geral de compreender e de querer as proibições ou mandados da norma jurídica
(capacidade de culpabilidade), o conhecimento real ou possível da proibição
concreta do tipo de injusto específico (consciência real ou potencial da
antijuridicidade) e a normalidade das circunstâncias do fato (exigibilidade de
comportamento diverso)”.
Injusto: tipicidade e antijuridicidade >>> Culpabilidade
Objeto da valoração >>> juízo de valoração
DAMÁSIO: “Para a existência do crime, segundo a lei penal brasileira, é suficiente
que o sujeito haja praticado um fato típico e antijurídico. Objetivamente, para a
existência do crime, é prescindível a culpabilidade”.
2.3
III. Concepções dogmáticas da culpabilidade:
Teoria psicológica - tem como ponto fundamental o modelo causal da ação. É a
relação subjetiva entre o fato e seu autor, isto é, o nexo psicológico que liga o agente ao
fato. (von Liszt) Manifesta-se através do dolo e da culpa. Por conter somente o dolo e a
culpa, é denominada “psicológica”.
ZAFFARONI: “A culpabilidade, entendida como relação psíquica, dá lugar à
chamada teoria psicológica da culpabilidade. Dentro deste conceito, a culpabilidade
não é mais do que uma descrição de algo, concretamente, de uma relação
psicológica, mas não contém qualquer elemento normativo, nada de valorativo, e sim
a pura descrição de uma relação”.
Teoria psicológica-normativa ou teoria complexa da culpabilidade - foi a primeira
15
teoria a reconhecer um elemento normativo (exigibilidade de conduta diversa) (Frank).
Porém, não retirou o elemento psicológico. A normatividade consiste na emissão de um
juízo de reprovabilidade sobre o fato praticado, consistente na aferição da exigibilidade
de comportamento diverso. São elementos da culpabilidade nessa teoria: 1)
imputabilidade; 2) elemento psicológico - dolo ou culpa; 3) elemento normativo exigibilidade de conduta diversa.
Teoria normativa pura – vincula-se à doutrina finalista da ação, de Welzel.
Segundo esta teoria, a culpabilidade contém apenas elementos normativos, destituídos
de elementos psicológicos. O dolo e a culpa migram para a tipicidade. Seus elementos
passam a ser: a) imputabilidade; b) potencial conhecimento do injusto; c) exigibilidade
de conduta diversa.
2.4
IV. Elementos da culpabilidade normativa pura
Imputabilidade ou capacidade de culpabilidade:
REGIS PRADO: “É a plena capacidade (estado ou condição) de culpabilidade,
entendida como capacidade de entender e de querer, e, por conseguinte, de
responsabilidade criminal (o imputável responde pelos seus atos). Costuma ser
definida como o ‘conjunto das condições de maturidade e sanidade mental que
permitem ao agente conhecer o caráter ilícito do seu ato e determinar-se de acordo
com esse entendimento’. Essa capacidade possui, logo, dois aspectos: cognoscitivo
ou intelectivo (capacidade de compreender a ilicitude do fato); e volitivo ou de
determinação da vontade (atuar conforme essa compreensão).”
16
2.5
V. Esquema da Imputabilidade na Culpabilidade
ZAFFARONI/SERRANO
Inimputabilidade por
• Incapacidade de compreensão da antijuridicidade ou injusto
• Incapacidade para determinar-se conforme a compreensão da
antijuridicidade
Efeitos:
• Elimina a culpabilidade, porque cancela a possibilidade exigível de
compreensão da antijuridicidade. Isenta de pena.
• Elimina a culpabilidade, porque estreita demasiado o âmbito de
autodeterminação do sujeito. Isenta de pena
Semi-imputabilidade por
• Redução capacidade de compreensão da antijuridicidade ou injusto
• Reduzida capacidade para determinar-se conforme a compreensão da
antijuridicidade
Efeitos:
• Reduz a culpabilidade porque cancela a possibilidade exigível de
compreensão da antijuridicidade. Reduz a pena.
• Elimina a culpabilidade, porque reduz consideravelmente o âmbito de
autodeterminação do sujeito. Reduz a pena a ser aplicada.
17
Potencial consciência da ilicitude: é a possibilidade de o agente ter o
conhecimento e entender o caráter injusto do fato, no momento da ação ou omissão. Não
é o conhecimento efetivo.
Exigibilidade de outra conduta: é a possibilidade de exigir-se do sujeito outra
conduta, diversa da praticada (criminosa).
CIRINO: “finalmente, o último estágio da pesquisa consiste no exame da
normalidade/anormalidade das circunstâncias de realização do injusto típico por um
autor capaz de culpabilidade, com conhecimento real ou possível da proibição
concreta: circunstâncias anormais podem constituir situações de exculpação que
excluem o juízo de exigibilidade de comportamento conforme ao direito: o autor
culpável ou reprovável pela realização não-justificada de um tipo de crime, com
conhecimento real ou possível da proibição concreta, é exculpado pela comunidade
jurídico-social, representada pelo Estado-juiz”.
Exemplos
• . revólver na cabeça de alguém para obrigá-lo a fazer algo – coação
psicológica
• . compreensão da agressão, no contexto sociocultural do autor, como
instrumento legítimo de realização da justiça.
Zaffaroni: “Essa concepção do direito penal (que sustenta ser a pena uma retribuição
pela reprovabilidade), é o chamado direito penal de culpabilidade." Para admitir a
possibilidade de censura a um sujeito, é necessário pressupor que o sujeito tem a
liberdade de escolher, isto é, de autodeterminar-se. Isso implica que esse direito penal
pressupõe ser o homem capaz de escolher entre o bem e o mal. Há, pois, uma opção
por uma determinada concepção do homem (concepção antropológica): a que o
18
concebe como um ser com autonomia ética (um ser com autonomia moral é uma
pessoa). Em síntese: o direito penal de culpabilidade é aquele que concebe o homem
como pessoa.
Por outro lado, quando se sustenta que o homem é um ser que somente se move por
causas, isto é, determinado, que não goza de possibilidade de escolha, que a escolha
é uma ilusão e que, na conduta se distinga dos outros fatos da natureza, nessa
concepção não haverá lugar para a culpabilidade. Dentro desse pensamento, a
culpabilidade será uma enteléquia, o reflexo de uma ilusão. Por conseguinte, em
nada servirá para a quantificação da pena. Somente será considerado o grau de
determinação que tenha o homem para o delito, ou seja, a periculosidade. Esse será,
assim, o direito penal de periculosidade, para o qual a pena terá como objeto (e
também como único limite) a periculosidade”.
Direito Penal de culpabilidade e de periculosidade
Zaffaroni“: Na culpabilidade de ato, entende-se que o que se reprova ao homem é a
sua ação, na medida da possibilidade de autodeterminação que teve no caso
concreto. Em síntese, a reprovabilidade de ato é a reprovabilidade do que o homem
fez. Na culpabilidade de autor, é reprovada ao homem a sua personalidade, não pelo
que fez e sim pelo que é.
3
SENTENÇA DE EFICÁCIA RESTRINGIDA
Em princípio, se verificado após o trânsito em julgado para a acusação que existe
obscuridade, ambiguidade, contradição ou omissão na sentença condenatória, poder-seia, sem demora, classificá-la como de eficácia comprometida.
Matéria de embargos de declaração não podem, nem mesmo em nome da ordem
19
pública, serem tratadas como erros materiais corrigíveis ao correr da pena, sem que
esteja sendo caracterizada uma hipertrofia de poder, consistente em um custo
extraordinário para a realização do direito penal.
Custo extraordinário sim, eis que o esclarecimento acontecerá num tribunal
superior, suprimindo não só a instância como o interesse e a iniciativa cabíveis ao órgão
acusador.
Acontece que, para não incorrer em hipertrofia de poder - falo dos recursos
julgados pelo Tribunal de Justiça de Goiás - a sentença "embargável" no interesse da
acusação, e para esta transitada em julgado, é justificada.
A justificação se dá - e isto é anotado nos meus pareceres - tendendo para o limite
do "se o juiz condenou e fixou pena é porque sabia o que estava fazendo".
Foi o bordejar desses limites pelo tribunal ao qual oficio que me conduziu a
estudar, no gênero, a espécie singular de sentença de eficácia restringida, que nada mais
é do que uma sentença que está abaixo no nível de satisfatória (Capítulo III).
Preferi, neste primeiro traçado, fazer uma abordagem nuclear, visto que a força
que imprime eficácia à sentença esta concentrada na fundamentação.
É a fundamentação ausente ou incompleta, insuficiente ou deficiente, portanto,
que esvazia as conclusões, transformando-as em juízo sem raciocínio, e a sentença, no
todo ou em parte, num ato arbitrário.
A preferência no exame da eficácia tem o propósito simples de fazer assegurar a
prática do regime democrático declarado na Constituição (art. 127), visto doze anos não
terem sido suficientes para a assimilação do devido processo legal nos seus aspectos
procedimental e substancial. Assim, não tratando a espécie como sentença arbitrária,
20
faço valer, à semelhança penal, que estou examinando a potencial consciência do regime
democrático, o que aloca o meu trabalho no quadro que vejo.
Ausência de fundamentação é uma hipótese radical que não gera problemas, mas
a insuficiência tende a receber um juízo suplementar à moda de um "deu para entender"
ou "esse cidadão precisa ficar (ou ir) para a cadeia".
Baixei o nível da linguagem propositadamente, pois neste particular passo
pretendo que os leigos me entendam, também, e necessariamente.
Meu ponto de vista será mais bem compreendido a partir da execução penal, mais
precisamente a partir da Guia de Recolhimento, suporte do título penal, da qual a
sentença condenatória é parte, e cuja execução passa pelas mesmas presidências do título
cível: certeza, liquidez e exigibilidade, e deve realizar-se, também como no cível, com a
menor gravosidade para o condenado (devedor).
Em ligeiras anotações, em sede de execução penal a menor gravosidade pode ser
tratada como a não imposição de gravame não previsto em lei, enquanto a certeza se
calça na existência de lei prévia, de processo e sentença; a liquidez se traduz na fixação
de tempos e verbas de condenação; e a exigibilidade se fulcra em a decisão não ter sido
atingida por causa extintiva da punibilidade.
Sentença atingida pela prescrição é inexigível.
Sentença que não fixa tempo ou verba de condenação é ilíquida.
Esses dois casos são de clara ineficácia restringida: não se executa.
De clara incerteza seria a Guia de Recolhimento que não estivesse acompanhada
da sentença, chegando mesmo, no meu modo de entender, a descaracterizar-se por falta
de elemento essencial, vez que a fé pública do escrivão na formação da guia não supre.
21
Também, se nas peças que compõe a guia não for possível determinar o juízo da
condenação, incerto fica ter existido processo.
Bem, o diretor do estabelecimento penal, diante dos casos já citados, poderia
escolher qual atitude tomar: não recebe o condenado, ou o recebe e pede
"esclarecimentos".
Imagino eu também que tais casos são raros, mas como dos quatro já enfrentei,
na prática, os três primeiros, são todos válidos e facilitam encaminhar o raciocínio.
Bem, não conheço caso em que o diretor do estabelecimento não tenha recebido o
condenado (?), mas as razões para tal não são jurídicas nem legais, estão no rol da via
das dúvidas, na mão de direção que prejudica o cidadão.
Justificável cautela?
Ficar preso uns dias não faz mal a ninguém !
O quê?
Inválido invocar a ordem pública como substitutivo do despreparo, da omissão e
da falta de iniciativa ou de recursos humanos ou materiais.
O último caso é mais sutil, e corresponde a uma Guia de Recolhimento
aparentemente perfeita, mas, na qual, a sentença contém vícios cuja apreciação já não
pode mais ser feita por vias ordinárias ou administrativas.
Tais vícios, que restringem a eficácia, nem sempre são evidentes, eis que as
conclusões da própria sentença os mascaram, como por exemplo a declaração de
procedência da denúncia ou de que o réu é culpado, ou a fixação de tempos e verbas de
condenação.
22
Comparando, os vícios que restringem a eficácia da sentença são comparáveis
aos erros no lançamento de parcelas numa operação de adição, ou seja, a soma estará
sempre correta, matematicamente falando, mas estará incorreta quando examinados os
fundamentos para o lançamento das parcelas.
As consequências de uma fundamentação obscura, ambígua, contraditória ou
omissa, pode ser de tal gravidade que sua eficácia passa a depender de outros atos
arbitrários para que a execução aconteça.
Seja, por exemplo, a culpabilidade no artigo 59 do Código Penal.
50. A diretrizes para fixação da pena estão relacionadas no art. 59, segundo o
critério da legislação em vigor, tecnicamente aprimorado e necessariamente
adaptado ao novo elenco de penas. Preferiu o Projeto a expressão "culpabilidade" em
lugar de "intensidade do dolo ou grau de culpa", visto que graduável é a censura,
cujo índice, maior ou menor, incide na quantidade da pena.
Exposição de Motivos da Nova Parte Geral
O grau de censura fixado pelo juiz sentenciante deve ser obtido, necessariamente,
através de um raciocínio. Esse raciocínio consiste em examinar as elementares da
culpabilidade e declarar uma medida.
A obrigatoriedade da declaração da medida aparece no artigo 29 do Código
Penal:
Art. 29 - Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este
cominadas, na medida de sua culpabilidade.
O artigo 29 é aplicável a todos os participantes, autores e partícipes. Como o
artigo 59 que arrola a culpabilidade é aplicável a cada um dos autores ou partícipes, não
23
é possível interpretar que a última parte só se aplica ao crime plurissubjetivo sem estar
interpretando que a individualização da pena deve ser feita de modo desigual para o
autor solitário.
Como a interpretação sugerida é proibida, resta, em síntese, que a culpabilidade
deve ser medida para todos, eis que a medida declarada terá repercussão para cada um,
conforme previsões:
Art. 44 - As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de
liberdade, quando:
III - a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do
condenado, bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição
seja suficiente.
Art. 71 - Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou
mais crimes da mesma espécie ...
Parágrafo único - Nos crimes dolosos, contra vítimas diferentes, cometidos com
violência ou grave ameaça à pessoa, poderá o juiz, considerando a culpabilidade, os
antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e
as circunstâncias, aumentar a pena ...
Art. 77 - A execução da pena privativa de liberdade, não superior a 2 (dois) anos,
poderá ser suspensa, por 2 (dois) a 4 (quatro) anos, desde que:
II - a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e personalidade do agente,
bem como os motivos e as circunstâncias autorizem a concessão do benefício;
Esses comandos se realizam no juízo sentenciante, mas, em existindo recurso
sobre algum deles exatamente porque não existe fixação da medida da culpabilidade, a
obscuridade, ambiguidade, contradição, deficiência, insuficiência ou omissão, exigiria
24
que o tribunal superior de "algum modo" encontrasse a medida que não está declarada, e
esse encontrar de algum modo é proibido, vez que a regra é de que a fundamentação
conduza, necessariamente, à conclusão.
Ora, invadir a instância inferior, ou aplicar um entendimento superior, para
encontrar a culpabilidade representaria uma arbitrariedade, qual seja o esforço de
declarar o que declarado não está para formar o antecedente necessário ao exame das
arguições Isto é perigoso, pois abre caminho para que as sentenças sejam "refeitas"
como preliminar para exame do recurso, criando a desordem pública.
Se a medida da culpabilidade determina a pena, sua substituição, aumento ou
suspensão, e essa medida não está declarada, a única solução do regime democrático e
do Estado Democrático de Direito para esse poder mal exercido, é conceder os
benefícios solicitados ou eliminar os prejuízos apontados.
Não passou desapercebido para o leitor que os antecedentes, a conduta social e a
personalidade são também contribuintes para a análise da substituição, aumento ou
suspensão.
Art. 59 - O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à
personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime,
bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e
suficiente para reprovação e prevenção do crime:
Todas as ditas circunstâncias judiciais do artigo 59 contribuem para a fixação da
pena.
A culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade atuam
especificamente na substituição, aumento ou suspensão, que são indicadores para a
25
execução da pena.
Os motivos, circunstâncias, consequências, e comportamento da vítima não
produzem flexões posteriores e, quando muito, na fase de execução da pena, podem ser
vistos como vetores criminológicos.
Algum excesso no exemplo está justificado porque as repercussões apontadas
foram extraídas da lei, mas existirão repercussões não autorizadas quando, diante da
obscuridade, ambiguidade, contradição, deficiência, insuficiência ou omissão de algum
comando legal, na fase da execução da pena tal tenha de ser recuperado. É que a
recuperação não ocorrerá por obra dos especialistas em proporcionar condições para a
harmônica integral social (segunda parte do artigo 1º da LEP), mas pelo esforço de
indivíduos mal preparados cuja experiência é de combate ao criminoso.
Dizem que na prática a teoria é outra, mas isso sempre me soou como uma
declaração de impotência intelectual ou instrumental.
Na realidade da prática, não existe boa aceitação em se gastar pólvora inglesa
com inhambu, ou seja, gastar a Constituição e suas garantias para colocar esses
criminosos vagabundos em pocilgas.
Então, ficam a Constituição e suas garantias reservadas para os jacus (aves nobres
de colarinho branco) que, por qualquer fumaça de pólvora piquete vão parar no STF.
A sociedade não aceita bem quando um colarinho branco é solto pelo STF porque
a decisão era de eficácia restringida, quando não radicalmente nula. Mas a sociedade não
se apavora, eis que o ladrão do dinheiro público não usa arma de fogo nem mata
ninguém com as próprias mãos. Mas se apavorará quando, por eficácia restringida o
latrocida é posto de volta na rua.
26
O comum em relação àquele que não recorrerá ao STJ ou STF tem sido a segunda
instância interpretar a obscuridade, ambiguidade, contradição, deficiência, insuficiência
ou omissão em favor da sociedade, ou seja, dando eficácia plena àquilo que tem eficácia
restringida visível nos próprios termos da declaração.
O direito não pode ser a ciência do vago nem da autoridade. Situado na área do
sensível, o direito se tornaria arbitrário se a sensibilidade pudesse ser dimensionada pela
política criminal, em outras palavras: a sensibilidade do judiciário aos clamores sociais,
em detrimento da sensibilidade ao justo formal e substancial, fá-lo decair da nobre
posição de serviço público para a de serviçal público.
No tocante à exigibilidade pouco existe para comentar, embora eu gostasse de
ver, logo adiante da sentença fadada a receber declaração da prescrição, o despacho de
retorno para o ato de ofício se transitada em julgado para a acusação sem recurso.
Sobra que a sentença esteja restringida no tocante à certeza e à liquidez.
Da liquidez enfrentam-se mais comumente casos em que o regime de
cumprimento da pena não foi fixado ou foi fixado a menor. Não estando o condenado
cumprindo por outra causa regime mais grave, a tendência é de manter o regime a menor
determinado na sentença transitada em julgado para a acusação, em homenagem ao
princípio da declaração. Essa orientação deveria ser seguida quando não fixado o regime
e não estando o condenado cumprindo por outra causa. Neste último caso, a existência
de obscuridade, ambiguidade, contradição, deficiência, insuficiência ou omissão,
determinaria que o regime fosse fixado simplesmente pela quantidade de pena.
Evidentemente, a eficácia da execução estaria restringida, vez que, embora o
"caso" comportasse cumprimento mais gravoso, não existem declarações na sentença
27
que conduzam ao regime legal mais grave. No entanto, já colecionei decisões superiores
que anotavam ser o cumprimento integralmente fechado previsto em lei especial
independente de declaração, de aplicação automática e derrogador de qualquer outro
regime diferente fixado. Nessas decisões, explícita ou implicitamente, era invocada a
ordem pública, conquanto sem deixar claro se a ordem pública invocada era aquela que a
polícia militar tem a atribuição de manter (§5° do art. 144 da CF) ou a decorrente do
regime e dos princípios adotados pela Constituição (arts. 1º, 2º, e §2º do art. 5º da CF).
Essa falta de clareza abre um espaço gigantesco de manobra entre a ordem
pública institucional e a ordem pública operacional, apontando que o tribunal superior,
ora pode descer ao local do fato e manter o criminoso na cadeia por conta de clamores
sociais presumidos, latentes ou concretos, em detrimento da ordem pública institucional;
ora pode alçar os píncaros e firmar que o devido processo legal existe e deve ser
efetivado.
Esse abaixa-sobe remove da cabeça do cidadão qualquer noção de garantia
processual, eis que pode esperar tudo o que está na doutrina, na lei e fora delas.
No tocante à certeza é preciso relembrar o caso clássico do negócio subjacente,
ou "causa debendi", que permite a execução de um título cível ou comercial.
Em paralelo a não ter força executiva uma nota promissória que não tenha um
negócio subjacente, o que é verificável como exceção porque não é essencial a
declaração da causa no documento, na sentença é exigida a declaração da "causa
debendi" e, transitada em julgado para a acusação sem a declaração, não é possível, nem
por exceção de ordem pública (?) verificar essa causa e fazer declaração posterior, ou
declarar "causa presumida".
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Não que o direito penal seja mais rigoroso que os outros direitos, conquanto o
seja, mas que a sentença penal tem natureza declaratória, ou seja, ela deve ser um todo
declaratório, e de tal sorte, a obscuridade, ambiguidade, contradição, deficiência,
insuficiência ou omissão, em qualquer um dos seus caracteres, vicia o todo.
Alguma coisa justifica que o juiz conduza o processo desde o recebimento da
denúncia, até mesmo uma escolha política, mas não existe argumento sobre a
improbabilidade de dar certo que um ou mais juizes sejam preparadores, praticando os
atos judiciais consistentes nos provimentos interlocutórios e os atos materiais
instrutórios e de documentação, e um faça o provimento final.
Na verdade, é até possível separar, na sentença, o que é simples documentação do
que deva ser raciocínio e juízo.
Art. 381 - A sentença conterá:
I - os nomes das partes ou, quando não possível, as indicações necessárias para
identificá-las;
II - a exposição sucinta da acusação e da defesa;
III - a indicação dos motivos de fato e de direito em que se fundar a decisão;
IV - a indicação dos artigos de lei aplicados;
Em reobservando o artigo 381, com o corte dos incisos V e VI, verifica-se
possível fazer uma simples exposição dos restantes, como uma espécie de relatório
enriquecido, para depois, e em separado, efetuar o raciocínio e o juízo. É que os
elementos de certeza objetiva devem ser comuns a todos os juizes.
A valoração desses elementos é que é singular de um.
Desse modo, poder-se-ia ter na sentença um juiz expositor e um juiz julgador.
29
Essa especulação pode não ter sentido prático, mas enfoca que os vícios de
declaração recaem sobre os elementos objetivos e sobre os elementos volitivos e, nessa
ordem, a ausência de declaração de um elemento objetivo esvazia o conteúdo volitivo do
raciocínio e do juízo que nele se apoiem
Em rigorosa demonstração:
Seja E o elemento objetivo, e será E sua declaração e E sua não
declaração.
Seja RE o raciocínio que contém E, e será RE sua declaração e RE sua
não declaração.
Seja JRE o juízo de RE, e será JRE sua declaração e JRE sua não
declaração.
Então, a declaração válida D será:
D=E.RE.JRE
O ponto ( . ) designa, na álgebra lógica, a função "and" ou conectivo "e".
As variáveis declaradas assumem o valor 1 (um) e as não declaradas assumem o
valor 0 (zero).
No caso a lógica deve ser positiva sendo 1 = + e 0 = Para D válido, D=1
30
D= 1.1.1
Pelo segundo postulado, 1.1 = 1 , logo:
D=1(1.1)= 1.1=1
Pelo segundo postulado 1.0 = 0 ou 0.1=0, e pelo terceiro 0.0=0, logo
D= 0.(1.1) = 0.1 = 0 ou
D= 1.(0.1) = 1.0 = 0 ou
D= 1.(1.0) = 1.0 = 0
Para qualquer variável que assuma o valor zero a declaração será inválida.
Em homenagem aos combatentes do rigor lógico volto ao patamar do sensível,
não do sensível que levou Cervantes a colocar a Misericórdia como companheira
constante da Justiça, não do sensível "penso assim" ou do sensível "algo me diz que ...",
mas do sensível que pode ser sentido sem a necessidade de instrumentos extensores para
enxergar o que não está escrito ou descobrir sujeitos ou predicados não declarados.
Seja uma hipótese comum, de um crime de estupro, analisada a circunstância
judicial "conduta da vítima".
a. a vitima estava com a maior parte do corpo coberta pelas vestes e
caminhava preocupada com o tráfego;
b. pelas circunstâncias nada fazia a vítima para atrair a atenção do agressor;
31
c. a conduta da vítima não influiu na agressão.
Observa-se que o elemento objetivo (a), o raciocínio (b) e o juízo (c) estão
harmônicos, ou seja, o elemento objetivo e o raciocínio conduzem à conclusão. Logo, a
conclusão é sensível, no sentido que estou dando ao termo.
É de permeável senso comum que 2,7 está mais próximo de 3 do que de 2, assim
como 2,4 está mais próximo de 2 do que de 3, e que 2,5 é equidistante de 2 e de 3.
Não comportando o rigor matemático senão para demonstrações, não se afasta,
por isto, que se deva ter um grau de tolerância na precisão das declarações. Esse grau de
tolerância pode ser definido como sendo a "proximidade" (em matemática o entorno) em
relação ao ponto objetado ou desejado.
O ponto em torno do qual será verificada a tolerância é sempre um elemento
objetivo primário (informação dos autos) ou elemento subjetivo secundário (argumento
do juízo) e constitui a fundamentação para a conclusão.
Seja como fundamentação por elemento objetivo dos autos a informação de que o
denunciado é voluntário em programas sociais e nada consta que o desabone
socialmente, então, a declaração na proximidade desta referência ser[á de conduta social
boa, ou relevante, ou meritória.
Seja como fundamentação por elemento subjetivo secundário a medida da
culpabilidade fixada como média para uma faixa de sanção de 1 a 5 anos, e a declaração
na proximidade dessa referência ( [1+5]/2=3 ) deverá ser maior que 2,5 e menor do que
3,5.
A sustentação doutrinária, que aloca a culpabilidade como pressuposto necessário
da pena, está dispensada para que seja enfrentada a questão de eficácia da sentença penal
32
condenatória transitada em julgado.
A Lei de Execução Penal fala claramente na jurisdição de execução, distinta da
jurisdição ordinária (art. 2º) e define a competência (art. 66). Fala também em processo
de execução (art. 2º) e em procedimento judicial (art. 195).
A ação de execução penal existe, a par da resistência doutrinária e, embora seja
promovida a mando do irrenunciável poder-dever estatal (ex-oficio). Dita ação
caracteriza-se por um ato que a instaura:
• - para as penas privativas de liberdade, a prisão e a expedição Guia de
Recolhimento, ou
• - para as penas restritivas de direitos um, "ato próprio", que materialize o
comando, ou
• - para a pena de multa, a execução em sentido estrito contra devedor
solvente na jurisdição da execução penal, ou
• - na suspensão condicional, a audiência admonitória.
A execução penal se subordina a antecedentes formais para que seja iniciada, e
estes incluem o exame da eficácia, ou força executiva do "título".
Com muita frequência a exigibilidade do "título" é examinada para extinguir ou
modificar a execução penal: causa extintiva, descriminalização, lei melhor, indulto etc. A
liquidez, mais raramente enfrentada, faltará se a quantidade da pena não tiver sido
fixada, admitida apenas na pena de multa a liquidação preparatória para corrigir
monetariamente (art. 49, § 2º do CP).
De algum modo, a certeza estará ausente no caso de faltar a declaração de causa
33
legal.
O enfrentamento é quanto à culpabilidade.
A primeira atividade do juiz, na decisão, é procurar a culpabilidade. Não a
encontrando, absolverá sem o exame das circunstâncias à frente dela no art. 59.
Encontrando-a, deverá declará-la como pressuposto necessário da pena.
O comando de fixação da pena base, "conforme seja necessário e suficiente para
a reprovação e prevenção do crime", indica existência da correspondência unívoca entre
o "juízo" e a "pena", comumente chamado de proporcionalidade. E esta
proporcionalidade é evidenciada quando o art. 29 dá o subcomando da "medida da
culpabilidade", para individualizar e distinguir a reprovação que recai sobre cada pessoa
em concurso no crime. Literalmente, pela Exposição de Motivos o comando seria lido
como "medida da intensidade do dolo ou grau de culpa". Medir é comparar a "grandeza"
com a unidade a ela referida em uma escala. Por exemplo: se quero medir a grandeza
"comprimento" de uma peça de tecido, devo escolher uma unidade de "comprimento"
(metro, polegada, etc.) e comparando a unidade com a grandeza dizer quanto a primeira
cabe na segunda.
Acontece que a medida da culpabilidade prevista no art. 29 é feita dentro do art.
59, não como privilégio do concurso, mas como garantia da necessidade e suficiência da
reprovação e prevenção individualizadas. Nessa ótica, a igualdade de tratamento
resultaria em medir a culpabilidade, existente ou não o concurso de pessoas. Por outro
lado, não podendo haver várias medidas para a culpabilidade, cada uma em um
momento diferente e para diferentes efeitos, a que resultar declarada no art. 59 é que
servirá para os exames dos arts. 53, 71 e 77, daí recomendar-se precisão na declaração.
34
Ora, se a culpabilidade é pressuposto necessário (nulla poena sine culpa), a sua
medida só terá sentido se operar como determinante da pena base e justificar a
correspondência unívoca. Assim, a quantidade de culpa encontrada determinará a
quantidade de pena base aplicada, vedada a operação reversa, pois a quantidade de pena
não é a medida da culpabilidade, é apenas o seu correspondente.
A precisão na declaração da medida da culpabilidade deve conduzir a que seja
reconhecida (ou identificada) na declaração da quantidade de pena base, resultando na
certeza de que o condenado está sendo punido pelo que fez, e não pelo que é. Portanto, o
grau de influência das circunstâncias que aparecem à frente da culpabilidade no art. 59
se reduz ao limite que não descaracterize a declaração dominante.
A precisão não é matemática, embora os termos a ela pertençam.
Recobremos no direito penal tais conceitos: limites são por exemplo, o mínimo e
o máximo de pena cominados em abstrato; intervalo é a distância entre o mínimo e o
máximo; entorno é a proximidade em relação a um ponto já escolhido, como por
exemplo, próximo do mínimo, mas não tão longe do mínimo que com ele não possa ser
confundido. Logo, declarada a medida da culpabilidade, (ponto já escolhido) a pena base
resultante do art. 59 deverá estar no "entorno". Em outras palavras: a determinante
culpabilidade (reprovação primária) não resultaria descaracterizado pelas outras
circunstâncias ( prevenção secundária).
A certeza da pena base resultaria de que:
• - a culpabilidade tenha sido declarada existente;
• - a medida da culpabilidade existente tenha sido declarada em unidades
reconhecíveis pelo conhecimento comum, sem necessidade de
35
interpretação;
• - a pena base tenha sido declarada.
Sejam casos de incerteza:
I - A culpabilidade e a medida não são declaradas:
... considerando o art. 59 fixo a pena base em ...
II - A culpabilidade não é declarada:
... considerando a culpabilidade em seu grau mínimo... fixo a pena base em ...
III - A medida não é declarada: ... considerando (análise das elementares da
culpabilidade) e... fixo a pena base em ...
IV - a pena está fora do "entorno": ... considerando a culpabilidade no grau
mínimo e mais... fixo a pena base no máximo...
A opinião comum com certeza (!) mandaria executar a pena, pois se houve
condenação "só pode ter sido" por ter existido o crime e a culpa. A opinião comum
padece de vício originário quando diz que a justiça é cega. Se fosse cega não precisaria
de venda nos olhos!
Nem mesmo o argumento da utilidade do direito penal, como limite para a defesa
social, resolveria a questão de se dar eficácia à incerteza. Esta posição derruiria o
principal pilar do Estado Democrático de Direito que é o exercício do poder via regime
democrático, e que se materializa na fundamentação dos atos do Poder. Ora, se no
Direito Administrativo o ato não fundamentado carece de eficácia, não poderia, no
direito penal, que é o mais exigente de todos, ganhar utilidade sem fundamentação.
Evidentemente, a execução de sentença penal condenatória incerta, ilíquida ou
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inexigível seria arbitrária.
A busca da verdade real é princípio reitor em matéria penal e possibilita a revisão
criminal a qualquer tempo. Verdade real o fato (mundo da realidade), não o
conhecimento que se tem o fato.
Apenas na política é que a interpretação supera o fato.
A culpabilidade é um fato pertencente à realidade. O juízo de culpabilidade é que
pertence ao mundo da cultura quando exigido pelo direito. Logo, o vício no juízo que
não permita reconhecer a verdade real na declaração (aspecto formal), ao enfrentar a
proibição de reforma para pior, deverá ter seus limites reduzidos aos verdadeiros que
possam ser constatados (critério da evidência) na declaração.
Nos julgamentos pelo Tribunal do Júri - exercício direto do poder, no termos da
Constituição – a questão se aguça. O júri condena ao afirmar a tese da acusação e negar
a da defesa. Se a defesa não formulou tese de exclusão da culpabilidade, esta virá
"embutida" pois o Presidente ao fixar a pena só tem disponível a sua medida, jamais
podendo absolver por ausências dela. A conclusão é pasmante: o mais soberano e
democrático julgador pode condenar sem declarar a culpa. A plena (pleno é tudo,
diferentemente do amplo que é o todo conhecido) defesa fica limitada se não puder
quesitar se o réu é culpável.
Acontece, com frequência maior do que a esperável, que as sentenças incertas por
não analisarem a culpabilidade nem fixarem o seu grau, ou são salvas da invalidade pelo
artificio do "deu para entender", ou são anuladas em recurso exclusivo da defesa com o
vago argumento do interesse da ordem pública.
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4
DO FIM DA PERSEGUIÇÃO PUNITIVA
"Ainda que o primeiro julgamento não tenha se completado, uma segunda persecução
pode ser enormemente injusta. Ela aumenta o ônus emocional e financeiro do
acusado, prolonga o período durante o qual ele permanece estigmatizado por uma
acusação não resolvida, e faz até mesmo crescer o risco de que um acusado inocente
venha a ser condenado. O perigo de tal injustiça contra o acusado existe sempre que
um julgamento é abortado antes da sua conclusão. Consequentemente, como regra
geral, o Promotor tem uma - e apenas uma - oportunidade de levar um acusado a
julgamento''
[U. S. Supreme Court, Arizona v. Washington, (1978).]
A regra é a de que pelo menos dois atores processuais tem interesse imediato em
que a sentença tenha eficácia executória plena: o órgão da acusação que da sentença
espera o atendimento dos interesses defendidos, e o juiz cujo dever é produzir uma
sentença de eficácia executória plena.
A necessária correlação entre o conteúdo processual e a sentença exige que a
acusação e a defesa procurem na sentença a declaração dos interesses que defendem e,
não os encontrando ou encontrando em parte, possam considerar a oportunidade de pedir
o complemento ou correção. A consideração a ser feita tem como regra geral a
sucumbência, que será avaliada do ponto de vista dos efeitos materiais ou da eficácia das
declarações. Evidentemente, a não impetração dos remédios legais significa aceitação da
sucumbência.
Em se tratando de comando sancionador, todo o conteúdo pode ser classificado
como um "mal" para o condenado, se trazido à conta a proibição da reforma para "pior".
Assim, enquanto não ocorre o trânsito em julgado para a acusação pode esta intentar
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tornar "pior" o "mal" já infingido. Porém, passadas as oportunidades legais, não pode
ocorrer a reforma para "pior".
A reforma para pior - insisto - não consiste apenas no agravamento da sanção
temporal ou pecuniária, mas - ou pelo menos num regime democrático - em tornar
possível a execução daquilo que, sem a reforma, não poderia ser executado. Em outras
palavras: a "reformatio in pejus" ocorre também quando é conferida força, eficácia,
legalidade ou legitimidade a uma sentença que de alguma, algumas ou todas careça.
O poder de coerção para efetivação dos deveres jurisdicionais cumpridos existe,
grosso modo, porque os condenados, se pudessem, escapariam da execução da pena.
Louvo os devotos que pensam em estender as mãos para as algemas ou entrar na cela em
passos rápidos e semblante contente, mas não arrisco dizer que eu mesmo faria isto.
Destarte, nenhum interesse tem o condenado em restaurar o que não tenha força,
eficácia, legalidade ou legitimidade, pois a restauração implica em execução. Nem
mesmo a defesa técnica tem interesse, visto lhe ser vedado pleitear a sucumbência.
Então, se falta força, eficácia, legalidade ou legitimidade a uma sentença, é a acusação
que sucumbe, e é seu dever procurar restaurar o que está perdido ou incompleto.
Ora, a sucumbência da acusação significa que o "mal" se tornou menor, e assim
menor será executado na proporção do tamanho, que pode até ser nenhum, se o
sucumbente não recorrer. Logo, não é preciso esforço para concluir que sendo a
ineficácia executória um "mal" menor, a restauração da eficácia, diante de recurso
exclusivo da defesa, é reforma para "pior".
Mesmo raciocínio pode ser feito trazendo o interesse processual e a inércia da
jurisdição para a discussão.
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A defesa não tem interesse processual em pleitear a eficácia executória do "mal",
e a jurisdição não pode se manifestar voluntariamente em favor da acusação.
Impossível imaginar que um Tribunal tenha o poder de correição funcional de
seus magistrados e dos órgãos da acusação através da correção da prestação
jurisdicional. Em palavras simples: quem quer que tenha cumprido mal o seu dever será
compelido a cumpri-lo novamente, ou o terá corrigido, se não atingiu a eficácia
necessária para que o poder de coerção efetivasse os comandos.
O que ocorre, segundo entendo, é que magistrados e membros do Ministério
Público, afeitos a séculos de obediência cega à legislação infraconstitucional, ainda não
se conscientizaram da existência de uma ordem jurídica, de um regime democrático, e
dos princípios adotados pela Constituição, preferindo permanecerem amarrados ao texto
dos Códigos e aos fins, como se estes justificassem os meios. Pior é que a afronta ao
Estado Democrático de Direito acontece com o nome de defesa da ordem pública, a
mesma ordem pública que garante aos cidadãos que a sua restauração deve obedecer
unicamente aos comandos dela mesma.
As pressões da defesa social afetam o executivo e o legislativo nas suas propostas
de mais Direito Penal, podem, o acréscimo está sendo feito sem a consciência de que
mais Direito Penal exige maiores e melhores estruturas judiciária e prisional para sua
operacionalização.
Deveras, qualquer administrador não ousaria aumentar sua oferta de serviços sem
antes estruturar-se para atender à demanda, a não ser que pretendesse enganar a clientela
adiando a entrega, ou fazendo o que o vulgo chama de "serviço porco".
A inconsciência do mal que está sendo causado é geral, e, embora a sociedade - e
40
alguns segmentos do Governo - esteja em crescente satisfação com o endurecimento do
Direito Penal, a inconsciência não permite avaliar que, na medida em que as garantias
constitucionais são afastadas em prol da punibilidade, é o próprio regime democrático
que é afetado.
Quando uma sentença condenatória sem eficácia executiva, já transitada em
julgado para a acusação, é anulada para que outra correta seja proferida, o Estadojurisdicional se posiciona como um fim em si mesmo, e para assim se posicionar, no
escopo deste trabalho, age de forma vil, aproveitando-se do recurso da defesa que leva a
matéria ao conhecimento - embora inexista pedido - para um provimento indireto em
matéria do interesse da acusação.
Existem regras para que o Estado-Jurisdicional atinja seus fins, e uma dessas
regras, claríssima no texto constitucional, é o respeito à coisa julgada.
Ora, a anulação da sentença transitada em julgado para a acusação se traduz no
esdrúxulo entendimento de que o respeito à coisa julgada só existe para a coisa "inteira",
ou seja, de modo simples: o trânsito em julgado para a acusação não precisa ser
respeitado quando a defesa recorre.
Então, vale examinar quantas oportunidades teve a acusação para aperfeiçoar seu
interesse na sentença condenatória.
A primeira já foi examinada e consiste nas alegações finais.
A segunda é quando da intimação da sentença, oportunidade para embargos de
declaração, e nesta não basta verificar se existiu condenação, é preciso verificar se as
declarações não estão viciadas pela obscuridade, omissão, ambiguidade, ou contradição.
A terceira se dá quando, não sanados os vícios ou sendo caso de insuficiência ou
41
ausência de fundamentação, a acusação deva recorrer para suprir.
Três oportunidades regulares, e a instância superior, não provocada, cria a quarta,
de ofício, quebrando o trânsito em julgado para a acusação.
A principal âncora da quebra do trânsito em julgado para a acusação, segundo o
Tribunal de Justiça de Goiás, é a "ordem pública", no entanto, não esclarece se a "ordem
pública" que invoca é outra em relação àquela que determina seja respeitada a coisa
julgada.
Ora, seja por suposição que, diante de uma sentença condenatória sem eficácia
executiva – por exemplo, sem nenhuma declaração sobre a culpabilidade - não seja
interposta apelação, ocorrendo o trânsito em julgado por "inteiro", a ser respeitado como
a coisa julgada a que se refere a constituição..
Seja que o condenado impetre Habeas Corpus pedindo o trancamento da
execução penal por constrangimento ilegal consistente em a sentença não ter obedecido
a Constituição no tocante à individualização da pena base.
Seja, de passagem, desfeita qualquer confusão que possa ser feita entre
individuação (entrega de alguma coisa a alguém) e individualização (entre a alguém de
alguma coisa feita para ele).
O exame é simples, consistindo apenas em verificar se existem ou não as
declarações sobre a culpabilidade.
Supondo verificado que a declaração não existe, o Tribunal não poderá proferi-la,
sobrando que, ou concede a ordem reconhecendo que a declaração não existe, ou denega
a ordem reconhecendo que a declaração não existe, e seria espantoso que duas decisões
contrárias pudessem ter a mesma causa: ora não se executa, ora se executa, diante da
42
inexistência de declarações sobre a culpabilidade.
O pedido no Habeas Corpus visa a liberdade, logo, é juridicamente impossível conquanto na prática eu conheça um caso - anular o processo de conhecimento que é
coisa julgada, para ensejar a remoção do vício que compromete fundamentalmente a
execução.
Alguns poderiam dizer que o Estado-Jurisdicional anula porque as regras não
foram cumpridas, mas não pode fazer essa alegação quem tem o dever inarredável de
cumprir as regras, e tem o poder de coação para fazer cumprir seus comandos.
A arbitrariedade - ou exercício não democrático do poder, como queiram consiste em que uma regra superior emanada do povo através de seus representantes
legítimos é afastada em um caso particular de mau cumprimento do dever pelo EstadoJurisdicional.
Mesmo a tirania costuma se armar com a legalidade para disfarçar a
arbitrariedade com a capa do Estado de Direito, mas, num Estado Democrático de
Direito, no qual, alem da declaração expressa (art. 127 da CF) da existência de uma
ordem jurídica e de um regime democrático, não existe erro quanto à palavra
Democrático anteceder a palavra Direito.
É de esperar que, no Estado Democrático de Direito, o Estado-jurisdicional não
assuma uma gestão de interesse social (punibilidade no caso concreto) ao largo do
regime democrático dentro do qual, no Estado hodierno, o bem estar e a pessoa humana
são o fim, e o Estado o meio.
Estou certo de que o Estado-administrador pode rever seus atos, seja para o bem,
seja para o mal, respeitados os limites constitucionais, mas o Estado-jurisdicional que se
43
afirma na garantia da coisa julgada, não pode quebrar essa garantia revendo de ofício a
coisa julgada, valendo-se da anulação de uma sentença penal condenatória que transitou
em julgado para a acusação, aos moldes do que esbocei folhas antes: meia coisa julgada
não é coisa julgada.
Examino, por respeito às hipóteses, que alguém argumente que a anulação da
sentença corresponda a "remoção" do constrangimento, no que eu concordaria se fora
uma declaração de nulidade. A partir da qual a sentença existente não pudesse ter seus
efeitos materializados.
Ora, a anulação deixa o processo sem sentença, e ele precisa terminar, mas a
causa da anulação sugere, em si mesma, que uma sentença eficaz seja proferida no lugar
da ineficaz., e isto constitui um novo constrangimento, pois caracteriza, como já
sustentei, a reforma para pior, a par de outras arbitrariedades anteriores.
Observe-se que o constrangimento da sentença ineficaz é puramente potencial,
vez que se não for executada não produz danos, mas essa solução não satisfaz do ponto
de vista de que a sentença não seria executada, para não causar danos, durante o curso da
prescrição. É que o Estado-Jurisdicional estaria substituindo a prescrição da pretensão
executória pela prescrição de seu erro não executório.
Digam-me que é legal declarar a nulidade da sentença condenatório ineficaz para
evitar uma execução sem causa legal, mas não me digam que é legal proferir outra
sentença, eficaz, fundamentada, para permitir a execução de comandos materiais que
antes não podiam ser executados legalmente por conta do trânsito em julgado para a
acusação.
A questão se encaminha para a vocação em relação ao nível que precisa ou se
44
quer ver reservado: a punibilidade no caso concreto ou a garantia constitucional que
protege explicitamente o condenado.
A punibilidade está situada no plano da imediatidade, do fim, da satisfação do
clamor social ou da opinião pública, e seus efeitos são extinguíveis, enquanto a garantia
da fundamentação das decisões está situada no plano mediato, dos meios, da satisfação
da segurança social e da ordem pública, e seus efeitos não são extinguíveis, pelo menos
enquanto durar o Estado Democrático de Direito.
Degradar a garantia da fundamentação para assegurar a punibilidade de um
cidadão subverte a ordem em que as coisas podem ser perdidas, e esse ânimo de
perdimento pode ter origem numa primária confusão entre ordenamento jurídico, que
são as diretrizes de concretização do Direito Positivo, e a ordem jurídica, que são os
princípios ou políticas que orientam a criação do Direito Positivo. A degradação das
garantias está fazendo parecer que, existindo uma Constituição, qualquer norma inferior,
pode ser concretizada sem o devido respeito ao plano superior.
No processo penal brasileiro os princípios da não culpabilidade, do contraditório
e da garantia da ampla defesa, e os efeitos deles decorrentes, são absolutos. São neles
que buscam, cada vez mais, um sentido democrático, conforme a previsão constitucional
dos artigos 5º, inciso LV, e 93, inciso IX. É imprescindível a permanência de tais
postulados, de forma vigorosa no procedimento, para a subsistência da lei penal
aplicada.
Por isso a Constituição da República normatizou como matéria processual e de
vigência imediata que todas as decisões judiciais deverão ser fundamentadas. Creio, até,
que a norma referenciada nada mais é que cansaço do legislador em não ver cumprido o
mesmo comando, já existente no Código de Processo Penal.
45
O vinculador do condenado à sanção penal é a culpabilidade - um dos elementos
da dosimetria deste - mas seu exame não se restringe à mais ou menos intensidade do
dolo ao nível de tipo de culpa.
Por questões metodológicas e analíticas, o crime é fato típico e ilícito. Todavia,
deve ser observado em sua totalidade. Assim é que à aplicação da sanção penal, o fato,
além de típico e ilícito, deve ser culpável. Portanto, para a imposição da pena, deve-se
analisar todas as suas elementares, o que equivale a dizer: a imputabilidade, a potencial
consciência de ilicitude e a exigibilidade de conduta diversa. A censura é graduável, e,
como tal, incide na pena a ser aplicada como reprovabilidade.
A devida fundamentação é imprescindível à obediência da garantia constitucional do
processo. Os sujeitos processuais têm o direito de tomarem conhecimento das razões
e dos motivos de quem os governa na relação processual. Principalmente quando o
ato de governo fere o ius libertatis do processado. Em respeito aos princípios
constitucionais da ampla defesa, da individualização da pena e motivação das
decisões.
Goiânia, 26 de Outubro de 1999
Byron Seabra Guimarães, relator
NOTA - "Face ao exposto, acolhendo a manifestação da douta Procuradoria de
Justiça, conheço do recurso, para anular a sentença para que outra seja proferida
ante os fundamentos constitucionais do processo."
O autor atualmente discorda desse último parágrafo do voto, conquanto nas
primeiras abordagens ao tema tenha apontado a anulação, evoluindo após reflexão.
É preciso avaliar que o Ministério Público atual está situado na posição de
garante de que o Direito Positivo a ser concretizado seja compatível com a ordem
46
jurídica e que a sua concretização aconteça segundo o regime democrático. Esta é sua
maior responsabilidade.
Art. 127 - O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função
jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime
democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.
A cabeça do artigo está no nível político, de princípios, enquanto o demais
aparece está no plano das diretrizes, da funcionalidade e operacionalidade. Seria
esdrúxula a interpretação de que as diretrizes depois de estabelecidas se tornam
independentes das políticas ou que a ordem jurídica devesse ser interpretada segundo a
legislação inferior. Pior ainda seria admitir que o Ministério Público se satisfaz apenas
com a concreticidade, na ponta inferior.
Assim, depois de três oportunidades para obter o provimento jurisdicional
satisfativo da pretensão persecutória segundo o devido processo legal, não pode o
Ministério Público aceitar ser diminuído por um ato de ofício que diz nas entrelinhas que
o órgão da acusação não leu a sentença da qual ficou ciente ou não agiu na
conformidade do seu dever de assegura a eficácia executória da sentença.
Não escapa da análise que o Estado-jurisdicional é, de modo simples, o dono da
sentença e que queira corrigir seus juízes para que produzam sentenças com eficácia
executória, mas, a posição do Ministério Público de função essencial à prestação
jurisdicional lhe cria o dever de também estar atento a essa correção, que seria feita
através de embargos ou apelação.
Dizer que a satisfação é questão pessoal não tem fundamento, pois alguém
poderia dar-se por satisfeito com o sentenciante declarando simplesmente que está
atendendo ao comando do artigo 59 do Código Penal;
47
É questão legal: ou as garantias da fundamentação e do devido processo legal
(procedimental e substancial) são atendidas em todas e segunda cada exigência da lei, ou
não satisfaz. Ademais, na dúvida sobre a decisão satisfazer ou não tem a acusação o
dever de pugnar para que se resolva no sentido de satisfazer. Contentar-se, por ação ou
omissão, com o vício é arbitrário, tanto quanto é arbitrário anular para que outra decisão
seja proferida, ou que uma sentença ilegal seja executada.
Assim, como contribuinte (função essencial à prestação jurisdicional) deve a
acusação sucumbir em relação à execução da sentença, quando, perdidas as
oportunidades regulares de aperfeiçoar a decisão, ocorra, para a acusação, o trânsito em
julgado.
O Estado-jurisdicional deve, por seu lado, assegurar a sucumbência da acusação
eis que o gerador do vício foi um juiz seu.
Ofende à ordem jurídica e ao regime democrático que, depois de o Estadojurisdicional e a função essencial à prestação jurisdicional terem falhado quanto aos seus
deveres, o mesmo Estado jurisdicional se valha apenas do poder, alheando-se ao poderdever de primeiro assegurar a ordem jurídica e o regime democrático para depois, se
couber, assegurar a eficácia executória.
Os recursos de ofício previsto para a absolvição sumária não foi recepcionado
pela Constituição, no que respeito a posição contrária, mas o considero incompatível
com o poder-dever agora subordinado à ordem jurídica e ao regime democrático
declarados na Carta. Antes, já o tinha como simplesmente um poder, vez que visava
revisar a sentença tendentemente contra o réu, agora o tenho como arbitrariedade ou
excesso de poder, frente a que o reconhecimento da exclusão da ilicitude é feito segundo
um "tipo de licitude" e, como a licitude é regra e sua exclusão a exceção, não é correto
48
admitir que os juízes sabem sobre a ilicitude mas não sabem "tanto assim" sobre a
licitude, eis que sua função é exatamente reconhecer a licitude, e cuidar da ilicitude
como exceção.
Ora, se os juízes não soubessem "tanto assim" sobre a licitude a ponto de suas
decisões em prol dela terem de ser revisadas por outros juízes que sabem mais do que
ele, seria necessário dizer que somente a experiência leva ao conhecimento da licitude assim negando que a norma possa ser entendida sem a concreticidade correspondente - e
que os juízes só poderiam afirmar conhecerem a licitude se tivessem oportunidade de
subirem para o segundo grau e julgarem um recurso de ofício.
Tal recurso de ofício desmerece o primeiro grau de jurisdição e desrespeita o
Ministério Público que com a decisão se conformou, a não ser que a continuidade da sua
prática esteja acontecendo por suspeita de "conluio absolutório" porque a acusação não
recorreu.
A anulação da sentença sem eficácia executória transitada em julgado para a
acusação, para que outra com eficácia seja proferida, na oportunidade do recurso
exclusivo da defesa, tem as mesmas características do recurso de ofício, mas não tem
nem previsão legal em torno da qual se estabeleça divergência. Tal anulação além de
constituir vedada reformatio in pejus, constitui um excesso de poder repudiado pela
Carta Maior.
Examine-se no Código Penal:
Art. 110 - A prescrição ...
§ 1º - A prescrição, depois da sentença condenatória com trânsito em julgado para a
acusação, ou depois de improvido seu recurso, regula-se pela pena aplicada.
49
Sem dúvida está sendo reconhecida a imutabilidade para a acusação, ou a "coisa
julgada" para a acusação, e sem dúvida também que a Constituição garante o respeito à
coisa julgada.
Caso a invocada ordem pública devesse sofrer alguma interpretação para ser
aplicada no caso da anulação da sentença sem eficácia executória, haveria de ser trazida
à conta que a "ordem pública" estabelece um parâmetro para a imutabilidade da decisão
condenatória, em favor da liberdade, que é exatamente o trânsito em julgado para a
acusação ou imutabilidade da decisão condenatória transitada em julgado para a
acusação.
É que, acima da segurança jurídica, pairam os princípios maiores da proteção da
liberdade, da justiça e da amplitude de defesa.
Como esclarece JOSÉ FREDERICO MARQUES (pág. 75, op. Cit.),
"Se a segurança jurídica e a Justiça estão conjugadas, como fundamento da
estabilidade que a res judicata imprime às sentenças, impossível será, no entanto, a
realização do justo objetivo com o sacrifício indevido do direito de liberdade. Se o
status libertatis é fundamental para a pessoa humana, constituiria um atentado, sem
justificativa, aos princípios que tutelam e garantem a dignidade e os direitos do
homem, colocar, em termos absolutos, a proeminência da segurança jurídica, na
realização da Justiça, a ponto de sacrificar-se um bem jurídico tão relevante como a
liberdade. Tal sacrifício, se alicerçado em sentença injusta, seria ilícito e
antijurídico; e é, por isso, que a imutabilidade das sentenças absolutórias é absoluta,
enquanto que a das condenações está sujeita a juízo rescisório da revisão criminal".
Sendo assim, a coisa julgada penal condenatória pode ser atacada, em nosso sistema
jurídico, pela via da revisão criminal (nos casos dos arts. 621 e 626 do Código de
50
Processo Penal), e pelo habeas corpus, nas hipóteses dos incs. VI e VII do art. 648 do
mesmo codex ( nulidade manifesta ou extinção da punibilidade ocorrida durante o
processo).
AUTORIDADE ABSOLUTA E AUTORIDADE RELATIVA DA COISA JULGADA –
CARLOS
FREDERICO COELHO NOGUEIRA
A ordem jurídica não comporta a interpretação de que no caso da prescrição
existe um direito do condenado estabelecido na lei porque, no caso da fundamentação
existe um direito do condenado estabelecido no plano superior constitucional:
Constituição da República
Art. 5º ...
§ 1º - As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação
imediata.
Interessante é que a prescrição penal só tem previsão na legislação
infraconstitucional como princípio:
Constituição da República
Art. 5º ...
§ 2º - Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros
decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados
internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.
O caso da imutabilidade da decisão condenatória normatizada para a prescrição é
caso de norma que segue um princípio não declarado, dai dever a interpretação conduzirse no sentido de que na existência de princípio declarado deva ele ser respeitado na
inexistência de norma que o excepcione.
51
A existência de norma que excepcione um princípio declarado não pode
acontecer em nível inferior, como mostra a Constituição ainda no artigo 5º, quando cuida
de um princípio que não declara – a prescrição:
XLII - a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à
pena de reclusão, nos termos da lei;
XLIV - constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis
ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático;
Então, existe uma declaração no nível Constitucional que adota o princípio da
prescrição, levando à conclusão de que tanto a Carta quanto o Código Penal adotam
princípio não declarado.
Como o princípio não declarado - prescrição - tem aplicação através do trânsito
em julgado para a acusação, que é a "meia" coisa julgada, existe então uma indicação de
que a "meia" coisa julgada exige respeito, enquadrando então que a "meia" coisa julgada
está contida na coisa julgada, que é um princípio adotado pela Constituição.
XXXVI - a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa
julgada;
Certamente não estão querendo dizer que a lei deve respeitar a coisa julgada, mas
a jurisdição penal não precisa respeitar.
Paulo Lúcio Nogueira explica melhor tal princípio afirmando que:
"a coisa julgada tem afinidade com a litispendência porque ambas se fundam no
princípio da duplicidade de processo sobre o mesmo fato criminoso ou no princípio
do non bis in idem (NOGUEIRA, 1995, p. 134).
O mesmo escritor diz que "o finamento da coisa julgada está na segurança e
52
estabilidade da ordem jurídica." correto o entendimento do nobre jurista porque se não
houvesse a coisa julgada, não veríamos jamais o fim de um litígio, visto que sempre
haveria uma revisão de julgamento por uma instância superior.
Conforme Romeu Pires de Campos Barros, existe para a coisa julgada o
fundamento político e o fundamento jurídico. "O fundamento político da res judicata,
provém da necessidade de incutir no ânimo dos cidadãos a confiança no juízo e na
justiça, dando a certeza do gozo e do bem da vida e garantido o resultado do processo."
(BARROS, 1969, p. 257)."O fundamento jurídico do instituto emana do princípio da
consumação da ação penal." (BARROS, 1969, p. 257). Baseado nesse pensamento,
concluímos que a coisa julgada é ato jurídico e, ao mesmo tempo, reflete-se em uma
decisão política, visto que incude seus efeitos no ânimo dos cidadãos.
"O fundamento da coisa julgada, portanto, não é a presunção ou a ficção do acerto
do juiz, mas uma razão de pura conveniência." (TORNAGHI, 1981, p. 182).
COISA JULGADA EM MATÉRIA PENAL - Dijosete Veríssimo da Costa Junior
5
A CULPABILIDADE
Podría haber escogido un tema menos ambicioso, pero he preferido referirme a la
culpabilidad porque considero que es el capítulo más delicado y significativo del
derecho penal, el más específicamente penal de toda la teoría del delito y el que, en
razón de eso, nos proporciona la clave de la crisis por la que atraviesa nuestro saber
desde hace algunos lustros y que parece acentuarse.
Discurso de Raúl Zaffaroni en la aceptación del Doctorado Honoris Causa otorgado por la
Universidad de Macerata (Italia), 2002. http://www.carlosparma.com.ar/zaffamacerata.htmhttp://www.carlosparma.com.ar/zaffama
53
cerata.htm
5.1
Consistente Legal
CF - Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade
do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos
seguintes:
LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo
legal;
XLVI - a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as
seguintes:
CF - Art. 93. Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá
sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios:
IX todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e
fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a
presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a
estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no
sigilo não prejudique o interesse público à informação; (Redação dada pela Emenda
Constitucional nº 45, de 2004)
CP - Art. 29 - Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a
este cominadas, na medida de sua culpabilidade. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de
11.7.1984)
CP - Art. 59 - O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social,
à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime,
54
bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e
suficiente para reprovação e prevenção do crime: (Redação dada pela Lei nº 7.209,
de 11.7.1984)
5.2
Exame da Hipótese
Seja examinada a hipótese: réu imputável, não incidência de causa extintiva e
sentença condenatória.
Na ordem em que a sentença é construída existe o momento no qual o
sentenciante declara procedente a denúncia ou, diretamente, declara o denunciado
culpado, no sentido de responsável por ter produzido o fato através de uma conduta
caracterizada pela conjugação ilícita do verbo núcleo do tipo.
Nesse momento o sentenciante declarou que o fato é crime (fato típico, ilícito,
culpável) e que o réu é o autor, autorizando, com tal declaração, o exame da
punibilidade, qual seja, se o réu receberá sanção [S], qual sanção e em que quantidade.
O exame da punibilidade será realizado com o manejo dos operadores do artigo
59 do Código Penal.
Dos operadores do art. 59 a culpabilidade é determinante da pena base [Pb].
Diz-se determinante porque só haverá pena base [Pb] se a culpabilidade puder ser
declarada como existente, e seja a culpabilidade existente expressa como C=1 e a
culpabilidade inexistente como C=0.
Anotado que está sendo usada a lógica digital (0,1) ou álgebra de Boole na qual 1
(um) é o verdadeiro ou existente, e o 0 (zero) é o falso ou não-existente
O caso geral, em forma de equação - lógica aritmética - é: C x S = Pb
55
(culpabilidade vezes sanção é igual a pena).
É certo que quando C=0 (sem pena) as demais circunstâncias [Dc] do art. 59 não
são examinadas. As demais circunstâncias não são examinadas mas existem, e existem
porque o fato existiu, logo, do ponto de vista do fato-real podem, todas elas serem
examinadas do ponto de vista do agente do fato (antecedentes, personalidade e conduta
social), do fato (motivos, circunstâncias e consequências) e do paciente (conduta), e isto
se aplica a qualquer fato real, seja crime (um homicídio) ou não (um casamento).
Se C=0 (sem pena) e como as demais circunstâncias tem existência autônoma no
fato-real existem, é necessário anulá-las para impedir seus efeitos, e isto pode ser feito
multiplicando por 0 (zero): 0 x Dc = 0 porque 0 x 1 = 0, podendo agora ser explicitada a
equação geral: C x C(Dc) = Pb
Para C=0 tem-se
Pb = C x C(Dc)  Pb = 0 x 0(1)  Pb = 0 x 0  Pb = 0
Para C=1 tem-se
Pb = C + C(Dc)  Pb = 1 x 1(1)  Pb = 1 x 1  Pb = 1
Demonstrado, então, que a culpabilidade é determinante da pena base e do exame
das demais circunstâncias.
A culpabilidade como determinante exige que seja examinada em separado das
demais circunstâncias, vez que estas só serão examinadas se C=1.
Em outras palavras pode ser dito que a culpabilidade existente (C=1) autoriza o
exame das demais circunstâncias (Dc), e a culpabilidade não-existente (C=0) não56
autoriza tal exame.
Tomando, do art. 29 do CP que quem concorre para o crime incide nas penas a
este cominadas na medida de sua culpabilidade - e isto é levado para o art. 59, impondo
mesmo tratamento (medida de sua culpabilidade) para o autor singular, a conclusão geral
é a de que a pena, seja para o autor singular ou autor em concurso, será sempre
proporcional à medida de sua culpabilidade, impondo que a pena base (Pb), primeira
fase na fixação, apareça na medida de sua culpabilidade.
Importante, então, que a culpabilidade receba a declaração de sua medida.
O "sua" do art. 29 é um possessivo, com o significado de "medida da
culpabilidade de quem concorreu para o crime", sem dúvida, uma pertinência ao agente,
uma individualização da culpabilidade.
Individualizar a culpabilidade para poder medi-la implica em reconhecer os
atributos do indivíduo para verificar, ou justificar, a sua maior ou menor capacidade para
lidar com a conjuntura fática, em especial a imputabilidade, a potencial consciência do
injusto e a exigibilidade de conduta diversa.
O art. 26 do CP anota: "...entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de
acordo com esse entendimento."
A expressão é de natureza jurídica, pertinente à responsabilidade.
O Direito Penal distingue perfeitamente o entender o caráter ilícito do fato (furto)
da potencial consciência do injusto (furto famélico) e o determinar-se de acordo com
esse entendimento (não furtar) da exigibilidade de conduta diversa (ficar com fome), e já
o fazia antes da entronização da culpabilidade no art. 59 valendo-se do estado de
necessidade.
57
Bem, o estado de necessidade introduz sérios complicadores no exame do caso
em que o agente furta um objeto, vende, e adquire comida para matar a fome. Tal agente,
sabedor do caráter ilícito do furto e de que deveria não furtar, crê justo que possa furtar
para matar a fome, em situação de fato que escapa do rigor do art. 24 do CP (estado de
necessidade), visto que a situação não era de perigo (morte por inanição) e até podia por
outro modo evitar (pedir esmola).
O que o Direito Penal não pode fazer é exigir que o faminto beire a morte por
inanição ou que não tenha vergonha de pedir esmola, logo, deverá o julgador coletar e
declarar elementos sobre a capacidade do indivíduo para lidar com a fome e com os
meios para provimento de comida.
O interessante, principalmente para espanto dos defensores da declaração sucinta,
é que o indivíduo-hipótese, absolvível pelo furto famélico, está perfeitamente
enquadrado na seguinte declaração:
" ... imputável, tinha ao tempo do fato, plena consciência da ilicitude de sua conduta
e condições de autodeterminar-se de acordo com esse entendimento, agindo com dolo
direto e intencional, de forma livre e consciente sabendo-se que cometia o delito
de ...".
A declaração acima é utilizada, em regra (com algumas variações de palavras),
para condenar.
A culpabilidade do indivíduo-hipótese só será determinada ao ser examinada a
imputabilidade especial (habilidades e oportunidades para provimento da própria
alimentação); potencial consciência do injusto (ter habilidades mas não ter oportunidade
de obter renda); e a exigibilidade de conduta diversa (pedir esmola, alimentar-se de
restos jogados no lixo, procurar parentes ou alma caridosa etc.)
58
5.3
Orientação
Podría haber escogido un tema menos ambicioso, pero he preferido referirme a la
culpabilidad porque considero que es el capítulo más delicado y significativo del
derecho penal, el más específicamente penal de toda la teoría del delito y el que, en
razón de eso, nos proporciona la clave de la crisis por la que atraviesa nuestro saber
desde hace algunos lustros y que parece acentuarse.
Discurso de Raúl Zaffaroni en la aceptación del Doctorado Honoris Causa otorgado por la
Universidad de Macerata (Italia), 2002.
-http://www.carlosparma.com.ar/zaffamacerata.htmhttp://www.carlosparma.com.ar/zaffamacerata.h
tm
Em sendo assim, sob a orientação do princípio da culpabilidade, mormente por
sua conseqüência material de que a responsabilidade penal dá-se pelo fato e não pelo
autor, NILO BATISTA arremata:
"Ai de vós, penalistas, que proclamais o direito penal do ato quando ensinais
culpabilidade e exerceis implacavelmente o direito penal de autor quando aplicais a
pena! Ai de vós que vos louvarem, porque assim procederam seus pais os falsos
profetas"137.
137 Salo de Carvalho, Aplicação da pena e garantismo, 2001, prefácio, p. Xii.
Reincidência: um instituto não recepcionado pela norma fundamental Elaborado em
09.2004. Atualizado em 01.2005.Leandro Recchiutti Gonsalves Pescuma
http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=6306&p=2 - qui ago-28-2008 09:05
59
5.3.1
Acepções da culpabilidade
El vocablo culpabilidad contiene,
al menos, tres significados:
EL CONCEPTO MATERIAL DE
CULPABILIDAD *PAZ MERCEDES
DE LA CUESTA AGUADO ** ESPAÑA
Cabe aclarar, a fin de una
correcta comprensión, que el
vocablo CULPABILIDAD contiene,
al menos, tres significados:
EVOLUCIÓN DEL CONCEPTO
JURÍDICO PENAL DE
CULPABILIDADEN ALEMANIA Y
AUSTRIA * Hans-Heinrich
Jescheck
1.- CULPABILIDAD como
fundamento del principio de
1.- “culpabilidad” como elemento
culpabilidad enunciado bajo el
dogmático del delito.
aforismo latino “nulla poena sine
culpa”.
(1) CULPABILIDAD como
fundamento del principio de
culpabilidad enunciado bajo el
aforismo latino “nulla poena
sine culpa”. (Relação entre o
mundo dos fatos e o mundo da
cultura.)
2.- “culpabilidad” como
fundamento del principio de
culpabilidad enunciado bajo el
aforismo latino “nulla poena sine
culpa”.
(2) CULPABILIDAD “ como
elemento dogmático del delito.
(Relação entre as normas e as
condutas)
2.- CULPABILIDAD “ como
elemento dogmático del delito.
(3) CULPABILIDAD como
3.- “culpabilidad” como elemento 3.- CULPABILIDAD como
elemento legitimador de la pena
legitimador de la pena y del ius
elemento legitimador de la pena y y del ius puniendi. (Relação
puniendi.
del ius puniendi.
entre os indivíduos e as
normas.)
http://derechogeneral.blogspot.c
om/2007/12/el-concepto-materialde-culpabilidad.html
http://criminet.ugr.es/recpc/recpc
0501.pdfhttp://criminet.ugr.es/recpc/
recpc05-01.pdf acessado as qui
ago-21-2008 17:50
60
Assinala-se que neste estudo a compreensão do termo culpabilidade é de
"elemento legitimador da pena e do direito de punir".
Apenas a acepção de número 3 (três) ajusta-se ao escopo da individualização da
pena com o manejo dos artigos 29 e 59 do Código Penal.
As acepções 1 e 2 da culpabilidade (vide início do texto) são inservíveis para a
determinação da pena base, à vista de que a acepção da culpabilidade como princípio,
nulla poena sine culpa, é negativa, isto é, servível para a não imposição de pena, e a
acepção da culpabilidade como elemento dogmático do crime assinala o elemento
subjetivo do crime.
Somente os imputáveis (entendimento da ilicitude e capacidade de determinação)
podem receber pena e dolo (culpa) é elemento subjetivo do crime.
A imputabilidade e o dolo desenham a relação (responsabilidade) objetiva
conduta-pena, que não é - nem pode ser - fundamento para a imposição da pena, sendo
necessário para a punibilidade clarear que o autor do fato podia compreender o injusto e
conduzir-se de outro modo (culpabilidade-pena), não sendo aceitável como
fundamentação da culpabilidade na individualização da pena a exigência genérica e
universal de conduta diversa ou conduta conforme a lei ou o direito.
Os casos de exclusão da culpabilidade demonstram, com clareza, que não se
exclui a conduta, ou seja, excluída a culpabilidade resta conduta(sim)-pena(não), com o
que é mantida a integridade da realidade fática da conduta, qual seja, a conduta não é
determinante da pena.
A pena, indicada como derivada do binômio culpabilidade(sim)-pena(sim),
assegura a integridade da relação jurídica da conduta pela negação de ambos os termos:
61
culpabilidade(não)-pena(não).
A fundamentação do termo culpabilidade(sim) na individualização da pena
(declarações atributivas de conteúdo individual) deve ser feita conforme a doutrina
indica seus componentes: imputabilidade, potencial consciência do injusto e
exigibilidade de conduta diversa e, por reforço, sendo individualização, as declarações
devem se referir ao indivíduo em julgamento no "seu" caso em julgamento, atendendo
assim à referência da medida da "sua" culpabilidade preceituada no art. 29 do Código
Penal, e isto feito de tal modo que possa ser reconhecido no dispositivo.
Qualquer declaração sobre a culpabilidade que não seja pertinente ao conteúdo de
um de seus componentes (imputabilidade, potencial consciência do injusto e
exigibilidade de conduta diversa) será, então, uma não-declaração da culpabilidade,
como se destaca no título 3.
A fundamentação é exigência constitucional cuja inobservância faz incidir a
nulidade sobre a decisão judicial.
É importante salientar, que ao longo do processo histórico de desenvolvimento do
Direito Penal a noção de dolo e culpa aparecem primeiramente no contexto da
culpabilidade, porque a idéia de culpabilidade era de que era culpa e dolo.
A culpabilidade foi definida primeiramente como um vínculo, uma ligação, uma
relação psicológica entre o agente e o fato que ele pratica e este vínculo psíquico, essa
relação psicológica encontrava-se no pensamento do "réu". Este vínculo psicológico se
expressava como dolo ou culpa e tinha como pressuposto a capacidade penal, a
imputabilidade. Só é capaz do dolo ou da culpa o imputável.
Entretanto, observou-se que a culpabilidade não pode ser vínculo psíquico,
62
porque serviria para o dolo e não para a culpa, pois percebeu-se que a culpabilidade não
estava no réu, mas que era um juízo sobre o réu. Pode-se dizer que a culpabilidade é a
possibilidade de censurar, é um juízo de censura e que emite a respeito de alguém, do
fato típico e ilícito que praticou.
Então ao julgar um indivíduo avaliasse se ele é digno de censura pelo ato
cometido através da previsibilidade do resultado. Esta questão da previsibilidade
subjetiva entra junto com a consciência da ilicitude, como segundo elemento da
culpabilidade.
Ilustração 1: Acepções da culpabilidade
O dolo compreende a consciência e a vontade do fato em si, se está diante de um
comportamento puramente psicológico. Esta noção vai ser alterada pela teoria atual, ou
seja, que a culpabilidade deve seu surgimento ao finalismo da Teoria Finalista da Ação,
63
que foi sistematizada por Welzel, que se baseou numa constatação de que o agir humano
é eminentemente finalista, porque o ser humano é o único ser vivo capaz de conduzir,
manipular os processos causais de acordo com seus propósitos, porque conhece esses
processos causais pela experiência, enquanto que a causalidade, em termos de natureza,
em termos até de um movimento corporal de um animal, é uma causalidade, que Welzel
denomina de "cega".
Há causalidade humana evidente, se, se sabe que uma arma de fogo é capaz de matar
e, se, conhece-se o processo que leva a morte através desta arma. Sabe-se como
funciona e porque mata, então se, se deseja matar alguém pode-se manipular esse
processo causal nessa direção, comprando uma arma e disparando-a contra a vítima,
porque previamente sabe-se que obterá o resultado desejado, logo, direciona-se a
conduta para o fim proposto.
Por sua vez, se o agente com um certo grau de instrução e de posição social furta um
anel em uma joalheria, sem que ninguém o obrigue a isso, ou o ameace, e sem estar
mentalmente enfermo, dizemos que esse sujeito podia motivar-se na norma que proíbe
furtar, e que lhe era exigível que nela se motivasse, porque nada o impedia. Por esta
razão lhe reprovamos o injusto, concluindo que sua conduta é culpável e reprovável.
[ ZAFFARONI, Eugenio Raúl e PIERANGELI, José Henrique. Manual de Direito Penal
Brasileiro Parte – Geral, 2ª.ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999.]
A culpabilidade, na visão de Roxin, pode ser fundamentada nos casos em que não
havendo a possibilidade de evitar o injusto, não faz sentido penalizá-lo. A partir disto, a
culpabilidade seria um critério político que derivaria da teoria do fim da pena: quando a
pena não cumprisse seu fim no caso concreto, já não teria sentido aplicá-la, e, portanto, a
culpabilidade estaria ausente.
64
A tipicidade penal, antes do advento da teoria da imputação objetiva
(1970,Roxin), possuía duas dimensões: objetiva (ou formal) e subjetiva.
A doutrina causalista clássica o fato típico requeria:
1. conduta voluntária (neutra: sem dolo ou culpa);
2. resultado naturalístico (nos crimes materiais);
3. nexo de causalidade (entre a conduta e o resultado);
4. relação de tipicidade (adequação do fato à letra da lei).
O tipo penal, como se vê, de acordo com a corrente causalista da ação, conta com
apenas uma dimensão: a objetiva (ou formal). Dolo ou culpa, a esse tempo, pertenciam à
culpabilidade (eram as formas da culpabilidade). Daí talvez se explique a confusão de
alguns sentenciantes entre os conceitos de culpabilidade e tipicidade, freqüentemente
expressos em suas sentenças.
A doutrina finalista de Welzel o fato típico requeria:
1. conduta dolosa ou culposa (dolo e culpa passam a fazer parte da
conduta);
2. resultado naturalístico (nos crimes materiais);
3. nexo de causalidade (entre a conduta e o resultado);
4. adequação do fato à letra da lei (relação de tipicidade).
O tipo penal, a partir do finalismo, passa a contar com duas dimensões: a objetiva
(ou formal) e a subjetiva (esta última integrada pelo dolo ou pela culpa).
Não há como sustentar a fundamentação da culpabilidade pela descrição do fato
criminal, assim como, não há como sustentar que o dispositivo da culpabilidade está
65
fundamentado pela repetição de fórmulas simples e vazias que referem às elementares
sem explicar-lhes o conteúdo.
Finalmente segundo o entendimento de Ferrajoli:
"... ningúm hecho o comportamiento humano es valorado como acción si no es fruto
de uma decisión; conseguientemente, no puede ser castigado, y ni siquiera prohibido,
si no es intencional, esto es, realizado com consciencia y voluntad por una persona
capaz de compreender de querer."
[ FERRAJOLI, Luigi. Derecho e Razón. Madrid : Editorial Trotta, 2000.]
A culpabilidade é o resultado de um juízo cujos argumentos são as suas
elementares, a expressão escrita desse juízo é a fundamentação exigida pela constituição,
que deve ser seguida por uma medida, segundo uma unidade e escala escolhidas pelo
sentenciante, para tornar-se inteligível. Desta sorte, a expressão escrita do juízo não
comporta adjetivos (patente, expressa, visualizada etc.) nem advérbios que não
pertençam à escala escolhida.
A culpabilidade adjetivada ou adverbiada sem referência a uma escala demonstra
apenas uma conclusão cuja subjetividade pode variar em cada leitor segundo seus
conceitos e preconceitos sobre, por exemplo, o que é "alta".
A fundamentação deve ser entendida por todas as partes formais e informais do
processo penal, segundo os ditames do regime democrático (art. 127 da Constituição), o
que exige clareza e precisão.
Os leitores em geral, independentemente do conhecimento especializado dos
juristas, têm o direito de entender as razões da condenação, vez que o processo é de
caráter público, e o condenado, mais do que isto, tem o direito de receber uma
66
condenação que lhe seja inteiramente inteligível, sob pena de estar sendo submetido ao
critério da autoridade.
Sem fundamentação da culpabilidade não é válida a sentença penal na parte
dispositiva, nem pode ser executada a pena.
Desta forma a pena imposta sem a análise das elementares e sem a medida da
culpabilidade não leva em conta a garantia da individualização, por lhe faltar o nexo
com o autor do crime. A ausência desta fundamentação específica gera a incerteza de
que a pena, por ato de juízo sobre a pessoa do condenado tenha sido a ele imposta, e isto
inviabiliza a execução.
5.4
AS ELEMENTARES DA CULPABILIDADE
As elementares da culpabilidade possuem uma interdependência que começa a
ser revelada pela ordem em que são arroladas na doutrina: a imputabilidade sustenta a
consciência e a conduta.
A imputabilidade, então, na fase de exame da culpabilidade, não pode mais ser a
geral, ou mínima, que antecedeu a declaração de culpável e que se conecta com a
consciência (entendimento e determinação) do ilícito correspondendo à qualidade de
"culpado", sendo necessário lidar com uma imputabilidade de quantificação ou punição,
sem a qual não é possível operar a individualização da pena (dever) remanescendo que a
pena maior ou menor corresponderia à individualização do julgador (poder).
Essa imputabilidade de quantificação é a culpabilidade individualizada que
influencia a formação da consciência do injusto e orienta a conduta, compondo um
injusto realizado individual que será avaliado à luz do injusto legal.
67
Essa imputabilidade representa a conjuntura individualizada que enfrentará as
circunstâncias do fato em que o agente está mergulhado, conduzindo a que a consciência
do injusto seja a do injusto individualizado no momento e nas circunstâncias do fato,
diante do que poderá ser verificado se daquele agente, naquele momento e naquelas
circunstâncias era possível exigir outra conduta.
Las facultades mentales e intelectuales sólo se desarrollan a cierta edad y
progresivamente. El hombre se encuentra en realidad sometido en su niñez al imperio
de la vida animal; su sentido moral está todavía embotado, y su razón es endeble e
incierta. Desconoce la naturaleza moral de las acciones humanas, o no hace más que
entreverla en confuso a través de una niebla; ni siquiera sabe discernir todas sus
consecuencias materiales”.
[ 2 - Reflexiones en torno a la cuestión etaria y la imputabilidad penal: consideraciones
para un debate político-criminal de orientación democrática y liberal. - Eduardo Gallardo
Frías Abogado - - http://publicaciones.derecho.org/doctrinal/
5.4.1
Da Imputabilidade como elemento da Culpabilidade
"El principio de culpabilidad debe asentarse sobre una concepción del hombre como
persona, o sea, como un sujeto que tiene capacidad para decidir la conducta a
seguir", afirma el maestro Zaffaroni.
[ 1 - Inadmisibilidad de las teorías que niegan el fundamento antropológico del principio de
culpabilidad. Por Alejandro Gustavo Defranco. - ASOCIACION DE ABOGADOS DE
BUENOS AIRES - Web: - Mail: ]
A imputabilidade individualizada é formada pela cultura, corpo de conhecimentos
e constante de deformação da percepção. Grosso modo, a cultura tem como elementos as
tradições e costumes do povo e do local; o corpo de conhecimentos tem como elementos
68
as experiências reais e as intelectuais; a constante de deformação da percepção tem
elementos psíquicos e intelectuais. Esse caldeirão representa a capacidade de expressão
(ação e reação) nas relações com outras pessoas. É a individualidade, ou coisa bem
próxima disso.
A sociedade cria regras de conduta dentro de um nebuloso campo de socialmente
aceitável, e o problema é que existem muitos socialmente aceitáveis conforme a
segmentação em classes. O socialmente aceitável de um grupo nem sempre coincide
com o socialmente aceitável do outro, bem como tais se distanciam na medida em que os
extremos sociais se afastam dentro da estrutura, fazendo nascer a terribilidade de o
extremo de cima ser operador do injusto legal que será aplicado nos segmentos abaixo
onde estão os operadores do injusto profano.
Destarte, nessa estrutura verticalizada de cima para baixo, a “defesa social” tende
a ser uma “defesa das classes superiores”, detentoras dos graus mais elevados do que
chamam de “civilização”.
Esta é uma segunda razão para a declaração de culpável (qualitativo) seja passada
no ponto em que todos são iguais perante a lei, e a culpabilização (quantitativo) seja
iniciada pelo exame da imputabilidade individualizada, que pode ser tomada como
sendo a capacidade de resposta do indivíduo quando recebe um "sinal" da realidade
fática, permitindo distinguir o operário do filósofo.
Se manifieste el rechazo a toda teoría que fundamente la punibilidad del sujeto que
cometiere una acción, típica y antijurídica en otro principio que no sea el de la
culpabilidad, entendido como reproche normativo a una persona responsable por su
decisión voluntaria libre, que reafirme el carácter de persona del ser humano.
[ 1 - Inadmisibilidad de las teorías que niegan el fundamento antropológico del principio de
69
culpabilidad. Por Alejandro Gustavo Defranco. - ASOCIACION DE ABOGADOS DE
BUENOS AIRES - Web: http://www.aaba.org.ar - Mail: [email protected] ]
A expressão - “o réu é imputável” - comumente usada no exame das elementares
não explicita os atributos que são próprios do agente em julgamento, fazendo necessário
que o julgador colecione, a partir do interrogatório e de testemunhas de referência, o
maior número de atributos que possa, com os quais formará o seu convencimento sobre
a imputabilidade individualizada. Não colecionando e afirmando simplesmente que o réu
é imputável, seu livre convencimento, por não motivado, torna-se arbitrário, e o exame
das elementares seguintes se contamina com a arbitrariedade, independente de estarem
motivadas ou não.
Muito tem sido escrito sobre a culpabilidade, mas pouco tem sido realizado na
prática das sentenças quanto à análise dos seus elementos e quanto à sua medida.
Costumo destacar um vício de origem na atividade judicante, que é o "critério da
autoridade", vulgarmente conhecido sob a forma do "manda quem pode e obedece quem
tem juízo".
A estas alturas pouco importa que antes de janeiro de 1985 a pena fosse
determinada pela intensidade do dolo e o réu respondesse por ter tido pouca, média ou
muita vontade de matar. Pouco me importa, também, que entre janeiro de 85 e outubro
de 88, uma parte significativa dos que se denominam operadores do direito entendesse
que pouca coisa havia mudado. É que, do que aconteceu entre março de 1964 e janeiro
de 85, ressalvados os bolsões intelectuais de resistência, fez a cabeça de muita gente
ruim e de muita gente que se acredita, até hoje, boa, salvou-se a reforma da Parte Geral
do Código Penal.
70
Os juristas, na maioria aferrados a conceitos construídos para justificar a
existência de um "mundo jurídico" não perceberam que a água havia se transmudado em
vinho e apenas substituíram o termo "dolo" por culpabilidade, possivelmente enganados
pela própria construção jurisprudencial que admitia, no concurso de pessoas, distinguir
um ou outro que tivesse tido "menor" vontade de cometer o fato-penal.
É que tal distinção jurisprudencial criou um sentido de poder, qual seja, o poder
de tirar da lei aquilo que ela não dizia.
Com a entrada da culpabilidade no cenário da pena, o comando para sua medida
(art. 29, CP) incorporou o poder na lei, e os aplicadores passaram de mandantes a
mandatários.
De fora, imagino o poder que existia com duas enormes faces: na cara a
satisfação de poder elaborar sem justificar, na coroa a satisfação de reservar o ditado
para a compreensão dos iluminados pelo saber. Assim, estava justificada a fixação da
pena base com um "raciocínio em bloco", que a experiência ensinava a fazer.
O critério da autoridade ditava que a prolatação condenatória era uma evidência:
bastava lê-la para "ver" que o prolator estava correto, ou seja, se foi um juiz que fixou a
pena base, então, tudo o que ele escreveu, se não estiver muito torto, está direito.
Não estou "malhando" os juízes. Na verdade, o que estou dizendo é que suas
sentenças transitam sob os olhos de Advogados e membros do Ministério Público,
incólumes, como se o termo culpabilidade nem estivesse escrito no artigo 59 do Código
Penal.
Até concordo que por alguma orientação político-criminal não se anulem
milhares de sentenças nem se concedam milhares de Habeas Corpus para bloquear a
71
execução de penas ilegais. Afinal, estamos no País em que a prisão definitiva vai ser
transformada em prisão incertamente transitória: o cidadão ficará preso até o dia em que
o Estado precisar da vaga dele para prender outro.
É preciso parar para pensar, e pensando reformular a prática, antes que se
descubra que a sociedade, na sua ânsia por resposta, está colocando o cabo do chicote
nas mãos dos atores do processo penal.
Considero o juízo de culpabilidade como uma capacidade nata.
Qualquer torcedor do Fluminense será capaz de apontar os culpados pelas
derrotas e qual e quanta culpa teve cada um.
E assim posso abrandar dizendo que o juízo de reprovação é uma capacidade
nata.
Tão nata que acontece de dois torcedores concordarem com a culpa mas
discordarem do grau e dos fundamentos, e estão, nessa discordância profana do "em
cada cabeça uma sentença", expressando o que os doutrinadores, em caudalosa doutrina,
ensinam: a culpabilidade está na cabeça do culpado, mas a reprovação está na cabeça do
julgador.
Os torcedores do Fluminense podem ter muitas discordâncias, vez que eles não
possuem códigos, doutrina e prisões para os orientarem.
Os julgadores não podem ter muitas discordâncias, vez que eles possuem
códigos, doutrina e prisões para os orientarem.
Julgadores devem ser profanos especializados, pois, afinal, somos todos
humanos, e eu um dos últimos torcedores do Fluminense.
Ora, os técnicos de futebol também podem ser classificados como inimputáveis,
72
semi-imputáveis e imputáveis, mas seja um técnico do Fluminense e lhes será possível
atribuir uma imputabilidade diferenciada que o distingue entre os técnicos de outras
agremiações.
E aí está a incógnita: será que a imputabilidade que autoriza submeter o cidadão a
uma ação penal é a mesma imputabilidade que autoriza a imposição da pena ?
Ora, Têmis ! tire a venda e veja o "pó de arroz" cobrindo a face do réu. Veja que
ele entrou no processo por ser um técnico de futebol, mas a pena deverá ser cumprida
por um técnico do Fluminense.
E não é a mesma coisa.
Deixo, neste passo, apenas um mote para a reflexão, vez que a culpabilidade,
determinante da individualização da pena, seria contraditória em si mesma se carregasse
um elemento de conteúdo universal.
Num segundo passo, a potencial consciência do injusto não pode ser nata, senão
teríamos os criminosos natos por inconsciência.
A consciência do injusto fica a depender do corpo de conhecimentos que o
técnico do Fluminense detém e de algumas especiais inclinações que se reúnem para
constituir uma "constante pessoal de deformação do conhecimento".
Ora, a formação do corpo de conhecimentos depende não só da existência de um
mecanismo eficaz de aquisição como da capacidade para adquirir (e como são
abundantes os doutores que não conseguiram aprender matemática).
Se colocada a imputabilidade geral em uma escala de 0 [zero] a X... [sem limite
superior], o intervalo de 0 [zero] a ? será o da inimputabilidade; o de ? a (1) o da semiimputabilidade. (1) é o marco da imputabilidade e o de (1) a (1+dX) [sem limite
73
superior] o da IMPUTABILIDADE ESPECIAL.
O marco legal da culpabilidade é condição de procedibilidade, ou seja, qualquer
indivíduo com mais de 18 anos de idade, em claras letras: tanto faz ter 18 anos e
algumas horas como ter 50 anos.
Considerando o marco legal da culpabilidade: 18 anos completados e capacidade
de entendimento do ilícito e determinação de acordo com o entendimento, e
considerando que acima desse marco legal é a realidade que distingue um imputável de
outro pela aquisição de conhecimentos e habilidades, existirá um intervalo mensurável
acima do marco legal determinante da capacidade de resposta individualizada diante das
circunstâncias do fato apontado como fato-penal.
A distinção entre as capacidades dos indivíduos de 18 anos e os de 50 anos (em
condições normais) é sensível inclusive aos leigos, que são capazes de emitir juízos
comparativos como:
- "Esse rapaz é muito ponderado, parece ter 50 anos vividos."
- "Esse velho (50 anos) está agindo como um rapazinho irresponsável."
Um dos atos mais profundamente humanos é o crime - assim determinado pelo
fato de os motivos do crime ainda serem claros para os estudiosos. Então, soa razoável
que o enfrentamento procure uma profundidade igual, fugindo da tendência objetiva de
igualdade dos resultados penalmente relevantes.
A justificativa para o perneta ter chegado em último lugar na corrida disputada
com os normais é que ele tem menor capacidade.
A justificativa para que o The Flash chegue ao final da corrida à frente de todos é
ser ele portador de uma habilidade especial.
74
Não é crível que magistrados pensem de modo diferente dos leigos.
Ilustração 2: Escala da imputabilidade
O marco legal da imputabilidade é, então, apenas o ponto de partida, a exigência
mínima, em comparação com a qual é certo que abaixo dessa exigência existem os
inimputáveis e os semi-imputáveis e acima dessa exigência existe a
IMPUTABILIDADE ESPECIAL, ou individualizada, a ser tomada como elemento da
culpabilidade.
75
5.5
Uma Visita à Imputabilidade
Diz o Código Penal:
Art. 26 - É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento
mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente
incapaz de entender o caráter criminoso do fato ou de determinar-se de acordo com
esse entendimento.
Parágrafo único - A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, em
virtude de perturbação da saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto
ou retardado não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de
determinar-se de acordo com esse entendimento.
A imputabilidade normativa é referente ao sujeito em si mesmo, considerando-o
incapaz ou com capacidade reduzida de entendimento e determinação acorde.
Conquanto se refira ao caráter criminoso ou caráter ilícito do fato, a relação do sujeito
com tal fato é apenas uma condição para a aferição da capacidade.
O aspecto temporal não deixa dúvida sobre a quantidade de capacidade ser um
pré-existente ao relação ao tempo da ação ou da omissão, ou seja, a capacidade do
sujeito é um estado que antecede a execução, qualquer que seja o intervalo medido antes
da execução. É possível imaginar que a capacidade se altere instantaneamente antes do
início da execução e ainda assim o disposto na lei será aplicável porque esse instante
pertence ao tempo da ação.
Para efeito de raciocínio será deixado de lado a hipótese do fato em execução
cujo caminho se agrava no curso dela por superveniência de alteração no estado de
capacidade.
76
O Direito Penal não pode desprezar a existência de um sujeito real, incapaz ou de
capacidade reduzida, nem que algum sujeito capaz sofra um acidente de capacidade ao
tempo do fato.
A doença ou pertubação mental e o desenvolvimento mental incompleto ou
retardado podem ter força "civil" incapacitante, plena ou não, de tal sorte que o sujeito
não consiga entender a própria vida e determinar-se de acordo com tal entendimento a
ponto de lhe ser nomeado um curador que irá suprir-lhe a capacidade. O estado de
capacidade do curatelado, ou interditado, pode ser tal que o reconhecimento de um
"potencial criminoso" conduza a adoção de cautelas que isto evitem, passando ele a vida
toda sem cometer crime.
A extensão do espectro do civilmente incapaz é, mesmo, alvo da referência leiga:
louco de pedra, sonso, tolo, lerdo, bobo etc, que estampam com razoável precisão que o
sujeito não possui habilidades mentais para lidar com as situações que lhe geram as
referências, ainda que tais restrições não exijam suprimento de capacidade, qual seja,
existe uma tolerância civil, uma razoabilidade na vida em sociedade, que respeita a
individualidade, e supre as incapacidades para a vida em sociedade, numa demonstração
clara de que a conduta desejável, ou esperada, só pode ser exigida daquele que possui
capacidade para conduzir-se, ou de quem se possa exigir que tal capacidade adquirisse.
As sociedades tendem a exigir padrões de conduta, seja num time de futebol de
várzea no qual o perna de pau, conquanto um bom sujeito, não joga porque coloca o
time em risco; seja num círculo científico composto por doutores e que os mestres são
impedidos de freqüentar. Assim, a normalidade da não-prática de atos ilícitos é uma
tendência, e o Direito Penal revela nos seus tipos, quais as não-práticas que lhe interessa
e tende a inibir a prática através do anúncio de sanções.
77
A tolerância do Direito Penal é revelada nos dispositivos que isentam ou
diminuem as sanções, e isto ocorre mesmo antes do Direito Penal da Culpabilidade,
apontando para o fato de que nas situações em exame não era possível exigir do sujeito
outra conduta (discriminantes putativas, erro penal, isenção de culpa, p.e.).
Por outro ângulo, é verificável que o Direito Penal, ao aplicar as sanções leva em
conta que o indivíduo possa entregar o exigido:
1. não se aplica a pena privativa de liberdade ao plenamente incapaz
porque ele não é livre, ou se a reduz se o sujeito não é inteiramente livre;
2. não se executa a pena pecuniária contra o financeiramente incapaz;
3. não se restringem direitos não possuídos;
4. não se põe a prestar serviços quem não tem habilidade para o serviço a
ser prestado.
Em resumo: o Direito Penal não tira de alguém aquilo que ele não tem; e isto é
uma regra geral, visível tanto no uso de talheres para peixe quanto na solução de
equações diferenciais, ou seja, o não-adquirido é uma constante na vida das pessoas e
lhes afeta a capacidade de responder a determinadas situações.
Trocando, no artigo 26 e seu parágrafo, os termos criminoso e ilícito por "social"
a provisão se ajusta igualmente, e até se aperfeiçoa se doença e desenvolvimento mental
forem entendidos como não-aquisição de habilidades para formação da capacidade de
resposta.
A evolução do Direito Penal se dá, nesse entendimento, no sentido de admitir
uma maior largura no calibre da razoabilidade sancionadora, criando a possibilidade de a
capacidade do indivíduo em manter-se no curso social balizado - desejado ou esperado 78
ser aferida diante das reais circunstâncias formadoras que trazem à conta as habilidades
adquiridas ou de aquisição possível.
Essas reais circunstâncias configuram-se a partir da predisposição genética e
acumulam-se de forma integrativa em toda a vida que antecede o tempo do fato ilícito.
Tal raciocínio conduz, com certeza, a que tudo seria justificável do ponto de vista
do sujeito, sobrando para o Direito Penal lidar com o quê escolha deva ser punido
justificadamente diante do interesse coletivo pela não-ocorrência.
Críticas virão apontando um "direito penal da maioria", uma forma de dominação
bem melhor do que o "direito penal do Estado", do ponto de vista de que a maioria é o
resultado da autocatálise da sociedade, sociedade que, como sistema, deve lidar com as
minorias como elementos não dispensáveis, e a execução penal atendeu a tal dispondo
sobre a harmônica integração social, qual seja, o restabelecimento da pertinência ao
sistema social.
Pela indicação da execução penal a função sancionadora seria uma das condições
para a harmônica integração social - repita-se: integração - e não função reeducadora ou
reintegrativa, vez que o sujeito que se desvia do caminho social desejado continua a
influir na sociedade mesmo durante um período de restrição de liberdade.
De tal sorte a pena deverá ser útil à sociedade que a integração do desviante deva
ser buscada tão eficazmente quanto a integração do paciente de algum mal de saúde, ou
seja, promover o estabelecimento da situação anterior.
Para o desviante da saúde estabelecem-se práticas de saneamento e vacinação
tendentes a evitar ou minimizar o desvio e, havendo desvio, o tratamento - de
ambulatorial a hospitalar - varia conforme a gravidade do mal e da capacidade de
79
resposta ao tratamento. E assim é procedido em relação ao conhecimento - da
alfabetização de adultos à abertura das faculdades - de forma a proceder uma
equalização (operação em que cada parte do sistema é levada ao ponto de melhor
desempenho para o todo) social, qual seja, em conclusão: dar ao sujeito aquilo que se
deseja ele entregue como resposta quando indagado.
A culpabilidade, que a lei recomenda seja medida - anote-se que o concurso de
pessoas não é um privilégio em relação à medida da culpabilidade, apenas especifica que
seja medida para cada um dos concorrentes - embora tenha os mesmos fundamentos da
imputabilidade tem outro espaço de operação, qual seja: o da capacidade não afetada
conforme o art. 26, dai ser um dos seus elementos a imputabilidade.
Ora, a imputabilidade é condição de procedibilidade ou condição taxada de
punibilidade, enquanto que a culpabilidade, por exclusão imposta pelo art. 26, não pode
ser uma ou outra coisa, logo, sobrante que o sujeito genericamente imputável, deva ter
aferida individualmente sua imputabilidade não-genérica.
Vale, na parábola do canoeiro que foi recriminado por estar perdendo parte da
vida por não saber Direito, a advertência que fez ao Advogado recriminante, no soçobrar
da canoa, que este, por seu lado, não sabia nadar. Ambos demonstraram a ausência de
capacidade para enfrentar determinada situação, conquanto não exigível do canoeiro
saber que havia um contrato de transporte, mas exigível do Advogado que se prevenisse
quanto ao evento previsível não desejado, aprendendo a nadar ou usando um salvavidas.
Como estamos lidando com o fato ilícito ou criminoso, temos um evento jurídico
único cuja diversidade fática na mesma espécie-tipo depende, quando visto do lado do
autor, de sua capacidade de resposta à situação, já que o dolo, definitivamente e para
80
sossego de todos, tomou habitação no tipo.
As soluções para as situações em que cada um se veja envolvido dependem não
só das habilidades para solucioná-las como da habilidade para encontrar alternativas de
solução quando as soluções pré-concebidas, por tal ou qual, não se revelem adequadas,
de tal sorte que o "determinar-se" de acordo com o entendimento pode ser evitar o
crescimento do risco da não-solução por adoção de alternativa que se revele eficaz ao
tempo do fato, e ai pode ser mostrado o que move o agente da defesa putativa: agir na
zona de menor risco.
Responsabilidade como resposta não soa estranho ao radical latino, validando
que o pensamento seja ajustado a que a imputabilidade seja vista como capacidade de
resposta, dado que o Direito Penal, quando atribui alguma coisa a um sujeito o faz com o
objetivo de que ele possa ser "expropriado" de algo que possui.
A rigor, a conduta do inimputável de matar alguém é tão dolosa quanto a do
imputável, a diferença está em que ele não estaria consciente do seu ato, mas sua mente
operou algum mecanismo que o levou a praticar os mesmos movimentos corporais de
matar que o plenamente imputável, e pode ser visto neste raciocínio aparentemente
contrário à doutrina que a pena só tem função se o a ela submetido tiver consciência da
conduta praticada e puder mudar tal consciência para não repetir a prática.
A idéia de "santificação" através de isolamento individual em celas onde a
penitência produz a reflexão e a revelação do que deve ser a vida correta, só mantém seu
espírito se vista pelo ângulo do tempo em que o verbo afligir é conjugado, ab-rogando a
idéia de que a pena deve causar aflição - o que antigamente motivava as penas corporais
- e instalando que o sujeito penitente conjugue, na forma prevista, o verbo na forma
reflexiva: afligir-se diante da situação de ter havido de entregar ao Direito Penal algo do
81
qual poderia estar usufruindo livremente.
Assim, a função da pena se realiza em tal medida individualizada que a
consciência de estar recebendo uma sanção em medida própria conduza o próprio sujeito
à conclusão de um justo possível.
Esse justo possível individualizado pode ser alcançado se, no processo, ocorrer o
conhecimento do sujeito no tocante à sua capacidade de resposta diante das
circunstâncias que revestem a sua relação com o fato em exame, traduzindo-se na busca
do seu "potencial" para alcançar a consciência do injusto (não do ilícito) e de conduzirse de outro modo satisfativo que não atraia o interesse penal.
Tanto a potencial consciência do injusto como a exigibilidade de conduta diversa
são influenciados pela capacidade de resposta ao fato (imputabilidade para o fato), de tal
sorte que chega a ser determinante, hipótese em que baseada apenas no profundo exame
da imputabilidade - e só dela - seria possível concluir que tal sujeito não pudesse
alcançar a consciência do injusto nem conduzir-se de outro modo.
A especificação da potencial consciência do injusto e da exigibilidade de conduta
diversa, como elementos a serem analisados, em seqüência, após a imputabilidade, pode
ser justificada pela indeterminação da largura temporal da expressão "ao tempo da ação"
- com o que se aproveita uma condição da lei - ao modo de um atleta que depois de
longo treinamento em academia, e com domínio completo da modalidade esportiva,
indicado para as olimpíadas, treme os joelhos e falha diante dos árbitros apenas por lhe
faltar a vivência - ou experiência.
Falharia o Direito Penal no tocante à culpabilidade se não deixasse margem para
a redução da imputabilidade - leia-se capacidade de resposta - ao tempo do fato
82
principal, em relação àquele que tudo teria recebido para poder entregar quando exigido,
e falharia por não contemplar que o ser humano seja apenas capaz de atingir um padrão
de conduta presumível e de falhar no "último instante". Observar que a falha possa
acontecer por uma razão humana do indivíduo é inerente à garantia da individualização
da pena.
Enquanto a imputabilidade genérica do art. 26 lida com a incapacidade (inteira ou
não) a culpabilidade lida com a capacidade (inteira ou não) mantendo a medida como
referência, no artigo 26 taxada e na culpabilidade fundamentada.
A imputabilidade do art. 26 aponta para os critérios de higidez bio-psíquica e vale
a partir da idade penal - 18 anos - a partir da qual se considera terem as estruturas biopsíquicas do sujeito adquirido o estado potencial mínimo para responder, e isto
independe das aquisições individuais, vez que não se poderia considerar penalmente
inimputável aquele que, por ausência de vida social não seja capaz de entender o caráter
ilícito - e determinar-se - do fato-penal-social por lhe faltar ter adquirido as habilidades,
sendo possível dizer que a imputabilidade do art. 26 é a aptidão presumida para o
entendimento e determinação em função da higidez bio-psíquica, chamado de
capacidade penal como condição de procedibilidade.
Ser mais capaz ou menos capaz é problema remetido para a culpabilidade, e o
processo penal só se livrará da formulação crime/culpa/pena quando o contraditório que é garantido para a premissa crime for garantido também para a premissa culpa. Tal
garantia, porém, refere-se apenas à efetividade, vez que a individualização (esta pena
para este indivíduo na medida da sua culpabilidade) já é garantia constitucional.
A dificuldade pode estar em entender o preceito constitucional que só admite a
culpa transitada em julgado com "princípio da inocência", o que, verdadeiramente não é,
83
pois não se processam inocentes para apuração da culpa.
Melhor denominado princípio da não-culpabilidade a referência constitucional
nada mais faz além de assegurar que a amplitude de defesa alcance, para além do
resultado e da autoria, a natureza do vínculo de autoria, qual seja, as justificativas
personalíssimas (pertencentes ao sujeito ativo) que autorizem a proporcionalidade e
razoabilidade da pena, levando o silogismo para crime/culpabilidade/pena, estrutura na
qual a falsidade da premissa crime impede o exame da culpabilidade e a falsidade
(ausência) da culpabilidade impede a aplicação de pena, num encadeamento de
determinantes.
A falha procedimental começa em que a denúncia nem mesmo pede que a pena
só seja fixada se a culpabilidade puder ser medida em grau que autorize a imposição de
pena, e isto pode ser chamado de denúncia com efeitos automáticos, e se evidencia no
interrogatório quando os comandos do art. 187 deixam de ser observado:
Art. 187. O interrogatório será constituído de duas partes: sobre a pessoa do acusado e
sobre os fatos. (Redação dada pela Lei nº 10.792, de 1º.12.2003)
§ 1o Na primeira parte o interrogando será perguntado sobre a residência,
meios de vida ou profissão, oportunidades sociais, lugar onde exerce a sua atividade,
vida pregressa, notadamente se foi preso ou processado alguma vez e, em caso
afirmativo, qual o juízo do processo, se houve suspensão condicional ou condenação,
qual a pena imposta, se a cumpriu e outros dados familiares e sociais. (Incluído pela
Lei nº 10.792, de 1º.12.2003)
§ 2o Na segunda parte será perguntado sobre: (Incluído pela Lei nº 10.792, de
1º.12.2003)
I - ser verdadeira a acusação que lhe é feita; (Incluído pela Lei nº 10.792, de
84
1º.12.2003)
II - não sendo verdadeira a acusação, se tem algum motivo particular a que
atribuí-la, se conhece a pessoa ou pessoas a quem deva ser imputada a prática do
crime, e quais sejam, e se com elas esteve antes da prática da infração ou depois
dela; (Incluído pela Lei nº 10.792, de 1º.12.2003)
III - onde estava ao tempo em que foi cometida a infração e se teve notícia
desta; (Incluído pela Lei nº 10.792, de 1º.12.2003)
IV - as provas já apuradas; (Incluído pela Lei nº 10.792, de 1º.12.2003)
V - se conhece as vítimas e testemunhas já inquiridas ou por inquirir, e desde
quando, e se tem o que alegar contra elas; (Incluído pela Lei nº 10.792, de
1º.12.2003)
VI - se conhece o instrumento com que foi praticada a infração, ou qualquer
objeto que com esta se relacione e tenha sido apreendido; (Incluído pela Lei nº
10.792, de 1º.12.2003)
VII - todos os demais fatos e pormenores que conduzam à elucidação dos
antecedentes e circunstâncias da infração; (Incluído pela Lei nº 10.792, de
1º.12.2003)
VIII - se tem algo mais a alegar em sua defesa. (Incluído pela Lei nº 10.792, de
1º.12.2003)
O cansaço da repetição constante dos interrogatórios pode ser a causa da sua
redução a um ramerrão burocrático-formal, e um indicador disto é que o "será
perguntado sobre" do §2º transformou-se num rol de perguntas que é lido pelo juiz
quando, na verdade, são referenciais para o conhecimento necessário e decisão, sendo
que o inciso VIII (se tem algo mais a alegar em sua defesa) é a abertura para a confissão,
85
vez que respostas a perguntas não podem ser confundidas com confissão, esta
espontânea aquelas provocadas.
Desta sorte, os vícios do Direito Penal da Autoridade foram transladados para o
Direito Penal da Culpabilidade e ensejam que o crime seja discutido à exaustão, como
era, e que a culpabilidade seja declarada como "evidência da autoridade" sem que
quanto a ela tenha sido exercido algum ato completo e satisfativo de conhecimento que
permita a fundamentação - e medida.
Introduzida quando já em andamento a abertura indiscriminada de faculdades e a
contratação mais indiscriminada ainda de professores formados ao tempo da intensidade
do dolo e dos juízos em bloco, a culpabilidade, hoje, 22 anos depois, ainda é justificada
pelo dolo ou tomada como sinônimo do dolo.
Possível, também, que a crescente demanda penal, inversa à dos julgadores,
influencie em não perder tempo com os criminosos, tantos que são e tantos crimes
violentos cometem, o que reforça o dito de que rico não vai para a cadeia ou não fica
preso, pois o acesso ao devido processo legal com substância de contraditório e
fundamentação correta de dispositivos tornou-se privilégio de quem pode pagar
Advogados caros que podem estudar e fazer valer o direito.
Por certo não se quer transformar o judiciário num consultório psico-sociológico,
mas requer-se, ainda que a título de tentativa idônea, que os julgadores dediquem um
pouco mais de atenção aos denunciados, declarando pelo menos tintas ou traços
indicadores do conhecimento que os permitiu fundamentar, pois a culpabilidade é Têmis
sem venda, qual seja, importa para ela quem está sob o olhar.
A declaração sobre a imputabilidade genérica, no dispositivo, é desnecessária
86
porque o dispositivo é formado a partir de uma declaração de culpa, declaração que não
pode ser passada ao inimputável e que deve ser taxada em relação ao semi-imputável, de
sorte que a declaração sobre a imputabilidade no momento do exame da culpabilidade já
não é mais sobre o potencial (higidez), devendo recair sobre o real, qual seja, o conteúdo
que a higidez permitiu acumular para além do mínimo exigido, ou quantidade (ou
potência) de capacidade de resposta.
Pecam igualmente os promotores que não sustentam a culpabilidade quando das
alegações finais ou quando recorrem pelo aumento da pena por conta da gravidade do
fato, e os Advogados que também não produzindo alegações sobre a culpabilidade
recorrem da pena por misericórdia, validando a continuidade do Direito Penal da
Autoridade cujo arbítrio em fixar uma pena é levado a autoridades superiores que por
outro arbítrio a manterão, aumentarão ou diminuirão.
Dar a cada um o que é seu, referência de Ulpiano à individualização da prestação
jurisdicional, pode ter evoluído dentro da complexidade social para que o "um" e o "seu"
sejam vistos como classes, justificando tanto a distribuição de cestas básicas de
alimentos para a classe dos famintos quanto a distribuição de cestas básicas de pena para
os criminosos, o que é uma solução de massa de eficácia duvidosa quando se fala em
direitos sociais e direitos individuais e coletivos sob o prisma da dignidade da pessoa
humana.
Entre os ideais penais de Jiménez de Asúa, humanista, e de Torquemada, o
inquisidor, a eficácia imediata parece estar a favor do segundo, vez que o "devido
processo legal da autoridade" se faz hoje pela mitigação das garantias constitucionais e
as execuções públicas foram substituídas pela execração na mídia.
A função excepcional do Direito Penal, que o chama ao cenário como última
87
razão de controle, coloca à margem que ele seja usado como suporte da validade dos
demais ramos do direito. Tal ideal é contrariado pela cultura legislativa da ameaça penal
em qualquer lei que se queira que "cole", o que cria a democracia constrangimental ou,
quem sabe, o estado democrático de direito constrangedor que nega ao cidadão a
verdadeira liberdade de cumprir uma lei livre de ameaça penal, pois diante de ameça não
poderá dizer que cumpriu espontaneamente.
É a excepcionalidade do Direito Penal, e unicamente ela, que justifica a
declaração fundamentada e medida da culpabilidade enquanto substância que referenda
a pena, vez que no âmbito da excepcionalidade pode - e deve - ser visto tudo aquilo que
dos outros direitos o sujeito não recebeu para compor a sua capacidade de resposta pois,
em caso contrário a pena individual conteria um quê de inadimplemento de obrigação de
fazer consistente em não ter adquirido aquilo que não lhe foi dado e nem ao menos
oferecido.
As implicações de não dar e nem ao menos oferecer qualidade para a capacidade
pode conduzir o analfabeto funcional formado pelo Governo a concluir - legitimamente que o que não é falta de decoro no Senado porque ocorreu uma "absolvição" também
não o é (a quebra de decoro é um ilícito) para o cidadão comum, e a legitimidade de tal
conclusão tem apoio na democracia, por incrível: se o maior pode o menor também
pode, pois existe apenas privilégio de foro, não de tipo em razão da pessoa. Ou pior, que
é a consagração do histórico "manda quem pode e obedece quem tem juízo".
Assim, sendo a conduta sob exame da culpabilidade um fruto da imputabilidade
para o fato-do-autor, a potencial consciência do injusto é aquele que ele poderia alcançar
e a exigibilidade de conduta diversa é aquela que ele poderia ter, descartados quaisquer
fatores que sejam próprios do sujeito conhecedor - o juiz - ou que sejam universais. O
88
natureza individualizadora da operação de fixação da pena deve conformar-se ao
raciocínio de que o Direito Penal é para todos, mas a pena é para cada um, na medida da
sua culpabilidade, fundamentadamente.
É esperado que esse raciocínio balize os caminhos para que o Direito Penal
assuma uma posição de co-autor da construção de uma sociedade livre, justa e solidária,
na qual a dignidade da pessoa humana seja um atributo dela e não uma deferência à sua
conduta na sociedade.
5.5.1
Potencial Consciência do Injusto
O "injusto individualizado no momento e nas circunstâncias do fato" é um injusto
profano, extremado do injusto legal predeterminado e pertencente à esfera do julgador.
Do agente é esperada uma espécie de discernimento entre o certo e o errado, entre
o bem e o mal, entre o justo e o injusto, extremos morais que o Direito contempla em
tipos de errado, mal e injusto como espécies legais.
As espécies legais, é bom repetir, estão ligadas à consciência do ilícito, ou do
injusto legal.
Considerando que a vida, no seu mais amplo sentido, que fornece para o Direito
os fatos e os valores para a formação da norma, e sendo a vida, no geral, profana, se as
relações fluíssem sempre pelo campo do certo, do bom e do justo, o Direito que cuida do
oposto permaneceria intocado.
Assim, ao julgador cumpre verificar se a superposição do círculo do injusto
profano no círculo do injusto legal ocorreu por livre ingresso, convite, convocação, ou se
o agente foi empurrado, ou seja, verificar se a conjuntura individualizada e as
circunstâncias do fato indicavam ou não para o indivíduo que o Direito devesse ser de
89
alguma forma sacrificado.
Na área penal os direitos do acusado devem ser entregues independente de
pedido, logo, cumprirá ao julgador demonstrar que o agente podia alcançar a consciência
do injusto se para isto tivesse se esforçado segundo sua capacidade.
A defesa fica excessivamente onerada quando o julgador usa a expressão "tinha a
consciência do injusto da conduta praticada", pois a defesa na espécie culpabilidade
acontece por exceção, ainda que, por prevenida, a defesa se antecipe ao julgador,
fornecendo elementos que a favoreçam.
Ora, todos, juristas e leigos, compreendem o caráter injusto de um fato, mesmo
um fato cível não típico (Art. 159 - Aquele que, por ação ou omissão voluntária,
negligência, ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a
reparar o dano.), embora somente os juridicamente afeiçoados sejam capazes de
compreender o caráter ilícito do fato.
A autonomia entre o ilícito e o injusto aparece nos casos de mercado, quando a
procura força para o alto o preço de um bem, privando algumas pessoas de adquiri-lo, o
que pode ser injusto, mas não é ilícito e nem é normativo.
Nada impede, porém, que o ilícito e o injusto coabitem no mesmo fato-penal: o
ilícito porque o fato-penal possui um verbo normativo que conjugado (ação censurada)
realiza o tipo; o injusto porque o autor do fato conjuga o verbo (ação censurável).
A potencial consciência da ilicitude pode não estar presente numa morte causada em
legítima defesa, caso em que é mais provável estar presente uma "potencial
consciência da licitude", do mesmo modo que o autor do fato lícito (ou terceiro) pode
entender que a prática é justa embora duvide da licitude, como pode entender que a
prática é injusta embora lícita.
90
DA POTENCIAL CONSCIÊNCIA: do injusto ou da ilicitude? - Serrano Neves http://www.serrano.neves.nom.br\cgd\036_xxx_cgd\058cgd.html
As sentenças condenatórias que chegam ao Gabinete desta Procuradoria
Criminal, com raras exceções, declaram que o condenado tinha a potencial consciência
da ilicitude da conduta ou ato.
Não está em discussão, neste passo, que a conclusão esteja ou não fundamentada,
está, sim, se é suficiente como exame de uma das elementares da culpabilidade.
O ilícito penal é sempre normativo, e o Código Penal assim aponta no artigo 26 e
seu parágrafo único como "o caráter ilícito do fato".
O tipo penal anuncia a ilicitude que se constitui quando da execução, e a idade
penal aponta para capacidade de entender o caráter (o espírito da coisa, a proibição)
ilícito do fato descrito e a nomina como imputabilidade. Imputabilidade é, então, um
atributo comum à categoria dos que tenham 18 ou mais anos de idade.
A consideração normativa de que os menores de 18 anos são inimputáveis cria
uma categoria de pessoas inteiramente incapazes dentro da qual a capacidade é exceção
não tratável pelo Direito Penal, que a dá como equivalente da isenção de pena.
A categoria dos imputáveis tem duas exceções.
Art. 26 - É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento
mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente
incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse
entendimento.
Na primeira o agente é tido por inteiramente incapaz.
Parágrafo único - A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, em
91
virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto
ou retardado não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de
determinar-se de acordo com esse entendimento
Na segunda o agente é tido por não inteiramente capaz.
Embora todos saibam que a imputabilidade penal é um critério bio-psíquico, é
válido compará-la com a "imputabilidade civil" que dá o menor de 16 anos como
inteiramente incapaz e desta idade até os 21 como relativamente capaz (ou não
inteiramente capaz) para perceber que o entendimento (e a determinação) em relação ao
ilícito do fato civil possui também uma faixa de relatividade, mas tem pontos de corte
diferentes.
É fácil perceber no cível que as pessoas inteiramente capazes perante a lei não
são inteiramente capazes para a realidade da vida. Umas são mais capazes e outras são
menos capazes de entender e de determinar-se de acordo com o entendimento.
Acontece que o continente (pessoa) do entendimento e da determinação é o
mesmo para o cível e para o penal, de modo que as faixas e os pontos de corte devem ser
entendidos como aquilo que satisfaz ao Direito Penal em relação às categorias que
estabelece, não podendo, no entanto, satisfazer em relação a cada um dos sujeitos que
compõe a categoria.
É que aos 18 anos de idade a capacidade de entendimento e determinação entre
um servente analfabeto pode estar muito distante da de um excepcional positivo que já
bacharelou em Direito, caso em que, para não ser exigida alguma coisa de quem não a
tem, o nivelamento deve ser por baixo, ou seja, para efeitos normativos os dois não se
distinguem enquanto categoria.
92
O tratamento dado pelo Código Penal às exceções extrai da categoria os sujeitos
(... o agente ...) não normais a ela, o que corresponde a uma proposição de
individualização normativa da imputabilidade.
A primeira proposição é afirmativa e a segunda é negativa, mas em termos
escalares elas são coerentes.
Se o extremo inferior é a inteira incapacidade, o superior deve ser,
necessariamente, a inteira capacidade, mas inteira capacidade que satisfaz ao Direito
Penal, não a inteira capacidade possível. Logo, existe para além da imputabilidade
normativa uma imputabilidade psíquica[1], ou seja, o Direito Penal, enquanto norma
geral, se satisfaz com uma capacidade, mas enquanto aplicação individual da norma
pode ir além desse mínimo satisfativo.
[1] psíquica, psicológica, subjetiva, interior, sempre no sentido de formação da
vontade.
A conclusão é a de que existem indivíduos que são mais capazes de entender o
caráter ilícito do fato e de determinar-se de acordo com esse entendimento, do que o
Código Penal exige, embora não sejam sobre-imputáveis; bem como o menos capazes é
também verdadeiro sem que os indivíduos se tornem sub-imputáveis. O sobre e o sub,
que estão fora da normatividade não podem afetar a norma (que é rígida), e isto
conduziria a uma perversa igualação diante de corpos de conhecimento e constantes de
deformação da percepção que conduzissem a que cada um (sobre e sub) concluísse por
um caráter diferente sobre a ilicitude do fato.
Para a imputabilidade normativa têm-se a culpabilidade normativa, ou seja, para a
ilicitude normativa (sempre normativa) existe a correspondente consciência também
93
normativa.
Erro sobre a ilicitude do fato
Art. 21 - O desconhecimento da lei é inescusável. O erro sobre a ilicitude do fato, se
inevitável, isenta de pena; se evitável, poderá diminuí-la de um sexto a um terço.
Parágrafo único - Considera-se evitável o erro se o agente atua ou se omite sem a
consciência da ilicitude do fato, quando lhe era possível, nas circunstâncias, ter ou
atingir essa consciência.
E mais uma vez a norma aponta para o seu lado de fora ao empregar o termo
"possível", ou seja, o indivíduo (... o agente ...) é extraído do conjunto como exceção.
Ora, já reconhecido o espaço externo à norma que é ocupado pela culpabilidade
psíquica[1], nada da ilicitude (que está "dentro" da norma) é servível.
De muitos ângulos a imputabilidade psíquica[1] poderia ser vista (antisociabilidade, imoralidade, lesão de interesse etc.), mas vou preferir um argumento de
contundência: se os crimes existentes forem descriminalizados os juristas dirão que
desapareceu o ilícito em relação a eles, mas os leigos, entendendo ou não o
desaparecimento do ilícito, entenderão que os fatos praticados conforme a redação dos
tipos extintos continuam injustos.
Continuam injustos no não-crime porque eram injustos no crime.
Ora, todos, juristas e leigos, compreendem o caráter injusto de um fato, mesmo
um fato cível não típico (Art. 159 - Aquele que, por ação ou omissão voluntária,
negligência, ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado
a reparar o dano), embora somente os juridicamente afeiçoados sejam capazes de
compreender o caráter ilícito do fato.
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A autonomia entre o ilícito e o injusto aparece nos casos de mercado, quando a
procura força para o alto o preço de um bem, privando algumas pessoas de adquiri-lo, o
que pode ser injusto, mas não é ilícito e nem é normativo.
Nada impede, porém, que o ilícito e o injusto coabitem no mesmo fato-penal: o
ilícito porque o fato-penal possui um verbo normativo que conjugado (ação censurada)
realiza o tipo; o injusto porque o autor do fato conjuga o verbo (ação censurável).
A potencial consciência da ilicitude pode não estar presente numa morte causada
em legítima defesa, caso em que é mais provável estar presente uma "potencial
consciência da licitude", do mesmo modo que o autor do fato lícito (ou terceiro) pode
entender que a prática é justa embora duvide da licitude, como pode entender que a
prática é injusta embora lícita.
Em qualquer direção que a massa seja espichada ela se mantém íntegra no tocante
a existirem concomitantemente o ilícito e o injusto, e poderem ser apreciados na ordem
natural: o injusto penal só poderá ser apreciado se o ilícito penal estiver determinado.
Assim, não está afastado do trato do artigo 59 do Código Penal, quando da
análise das elementares da culpabilidade, o que for pertinente à culpabilidade normativa
(dolo, culpa, potencial consciência da ilicitude), mas o exame só estará completo com o
concernente à culpabilidade psíquica[1] (potencial consciência do injusto), e o resultado
será a perfeita individualização.
O ponto era final, mas recebi uma mensagem do Mestre Sunda Hufufuur:
Serrano, sempre me atenho ao conceito de culpabilidade com sinônimo de
reprovabilidade. Assim sendo, culpabilidade, para mim, não é atendida, demonstrada
ou justificada, mas simplesmente analisada. Culpabilidade é o juízo emitido sobre a
95
conduta tomando como base a análise da imputabilidade, exigibilidade de outra
conduta, potencial consciência da ilicitude. Considero uma desgraça terminológica a
adoção do termo culpabilidade, pois incide sobre as noções de culpa. Da mesma
forma, culpabilidade normativa como sinônimo de valorativo também.
O Mestre Sunda cita, de sua consulta, a Enciclopédia Jurídica de Leib Soibelman,
em recente atualização:
"o juízo de reprovabilidade que incide sobre a conduta, e daí que é denominada de
teoria normativa, pois normativo significa valorativo, ou seja, a valoração, pelo
julgador, da conduta segundo a análise da imputabilidade, potencial consciência da
ilicitude e exigibilidade de outra conduta, do que resultará ser ela reprovável ou não.
É uma posição oriunda da teoria finalista, onde se argui que o dolo e a culpa são
uma direção natural dada para conduta, constituída, respectivamente, pelo querer o
resultado (dolo) ou pelo querer agir de maneira que é imprudente, negligente ou
imperita (culpa). Por esta teoria o dolo não é elemento da culpabilidade
(reprovabilidade), face ao fato de que existem condutas dolosas que não são
reprováveis, como o caso de legítima defesa real, por exemplo. A conduta culposa foi
a fonte de todas as críticas que recebeu esta teoria por parte dos juristas
(destacando-se entre os brasileiros Anibal Bruno), posto que é de difícil compreensão
que alguém aja com uma finalidade dirigida ao que não previu - culpa inconsciente ou não admitia em hipótese alguma que ocorreria - culpa consciente. Welzel, autor da
teoria, diferenciando objetivo de direção da conduta, citado por Damásio E. de Jesus,
in Direito Penal, I, Ed. Saraiva, 1994, pg. 405, responde que 'desde el punto de vista
jurídico relevante no es el objetivo, sino la dirección, porque esta no es procedente ni
cuidadosa', emitindo assim um noção que, máxima vênia, não satisfaz as indagações,
ficando o investigador a perquirir o espectral significado de 'direção'. "
96
Mestre Sunda Hufufuur é aliado no combate às culpabilidades esdrúxulas e
outras esdruxulizes do panorama político-jurídico atual.
5.5.2
Exigibilidade de Conduta Diversa
Grosso modo, pode ser afirmado que não existindo conflito de interesses o
Direito, se existir, não tem função. Também, conflitos são resolvidos com o bom senso
substitutivo do Direito, bem como conflitos são resolvidos apenas sob a luz do Direito.
Conflitos não resolvidos são levados para o campo do direito, e algumas espécies
são tratadas pelo direito penal. Assim, é verificável que o direito não preside o cotidiano
dos profanos.
Grosso modo, também, pode ser afirmado que a categoria dos “iniciados” tem
uma carga cotidiana de direito que pode alcançar facilmente metade do tempo
consciente. Destarte, o julgador e o julgado têm suas constantes de deformação da
percepção, em tese, situadas em polaridades opostas: o julgador iniciado vê que se deve
viver conforme o direito, enquanto o julgado profano vê simplesmente que se deve viver
e, enquanto vive, é o que é, se expressa conforme deseja e se expressa conforme as
circunstâncias o exigem.
O indivíduo pode ser um caipira nato e se apresentar na sociedade como um
príncipe, basta que o queira fazer ou as circunstâncias exijam que o faça.
Se o caipira se apresenta no palácio vestido como caipira as regras de conduta
social levam ao juízo de que ele deveria ter se conduzido de outra forma diante das
circunstâncias, mas o exame da conjuntura individual pode acabar por justificar que não
possuía roupas adequadas, não podia adquiri-las para a ocasião e que a razão da presença
era de relevância.
97
Assim, de modo mais simples, é possível introduzir no pensamento o que é a dita
exigibilidade de conduta diversa, mas é preciso afastar do espírito o preconceito de que
nada justifica o crime pois, injustificável, o Direito Penal teria uma configuração rígida:
crime-tipo = pena-tipo.
A previsão de faixas de sanção para cada crime, ao tempo em que podem revelar
o valor da ofensa, mais ainda constituem uma escala de justificabilidade que não afasta a
culpa, apenas gradua a culpabilidade.
O artigo 1º da LEP ilumina o artigo 59 do CP quando diz que a execução penal
deve promover condições para a harmônica integração social do condenado. A
interpretação é de que o infrator ou não estava integrado, ou se integrado não o estava de
forma harmônica.
A integração harmônica na sociedade deve ser aferida pelo acervo de
conhecimentos, pela constante de deformação da percepção, pela aptidão, pelo domínio
das habilidades e pela potência para o relacionamento individual e coletivo.
Se dado a cada um destes cinco elementos um peso variável entre 0 e 99 as
combinações que revelam as hipóteses de indivíduos únicos são da ordem de
10.000.000.000 (dez bilhões) ou seja, mais do que a população atual do Planeta.
A não integração ou a não harmonia aparecem naturalmente na visão das
diferenças sociais, fazendo surgir censuras das mais variadas e sanções igualmente
variadas, tanto quanto alguém sempre estará julgando um diferente dele mesmo, na
medida em que a graduação dos elementos de um diferem da graduação dos elementos
do outro, em princípio, por probabilidade.
O Direito Penal como censura mais rigorosa, tem uma sanção própria, mas, como
98
é o último a se fazer presente, deve contemplar que o indivíduo tenha se esforçado para
solucionar o conflito com os outros direitos, conforme sua conjuntura pessoal, e que as
circunstâncias não lhe tenham abatido o ânimo de se conduzir de outro modo, e assim os
tipos penais se apresentam como limites de convivência que foram ultrapassados,
identicamente a outros regramentos de condutas.
O Direito Penal, por ser última razão pode se apresentar com a máxima sanção,
mas não pode situar-se do outro lado do limite fixado tal como uma armadilha. Antes,
sua locação no mesmo campo aquém do limite é que garante, para a harmônica
integração social, que buscará o indivíduo do outro lado e o trará de volta para o
território original: a sociedade.
Não se pode exigir conduta conforme ao direito sem estabelecer a culpabilidade
presumida para todos os iniciados nas lides penais, ou para os que, sendo capazes para se
conduzirem de outro modo não tenham podido fazê-lo por força das circunstâncias.
Destarte, então, deve ser verificado se o indivíduo, que já tem a imputabilidade e
a consciência do injusto avaliadas, podia ou devia, frente às circunstâncias, se conduzir
de modo menos danoso ou perigoso.
Em todos os outros campos da vida a hipossuficiência é considerada para que
menos seja exigido daquele que menos tem, sendo promovidos os abrandamentos
estruturais que permitam ao menos conviver em igualdade próxima com o mais.
Existindo diferenças individuais que também permitem afirmar que uns são
menos em relação aos que são mais, não pode o Direito Penal, absurdamente tendente a
conectar o crime na hipossuficiência, abonar a coragem e o ímpeto dos mais e exigir dos
menos a covardia e a pusilanimidade.
99
Assim é que a cabeça do juiz, dentro da qual está sendo formado o juízo de
culpabilidade, não deve ser impermeável ao exame do esforço do acusado para,
podendo, se conduzir de modo menos danoso, e julgar pelo que o indivíduo praticou, e
não pelo que o juiz acha que ele é.
A defesa fica excessivamente onerada quando o julgador usa a expressão "era
exigida conduta conforme o direito", pois tal é servível para o discurso à beira da cova
daquele que por não alcançar a consciência do justo deixou-se matar quando podia atuar
em legítima defesa.
6 DA FIXAÇÃO DA PENA BASE
Art. 59 - O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à
personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime,
bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e
suficiente para reprovação e prevenção do crime:
Está consolidado pela doutrina e jurisprudência que cada uma das circunstâncias
judiciais deve ser fundamentada separadamente, traduzindo o quanto cada uma pesa de
modo favorável ou desfavorável na quantidade fixada.
Exigível o exame de todas elas separadamente, a fundamentação atenderá aos
requisitos de certeza e liquidez.
A certeza, neste particular, significa que foram declaradas razões capazes de
suportar a conclusão, e a liquidez se traduz por determinação de uma quantidade de pena
que guarde correspondência biunívoca com a conclusão.
Assim é que todas as circunstâncias judiciais passam por uma espécie de medida,
100
ou aferição de quantidade, o que pode ser notado quando no trato das circunstâncias que
estão adiante da culpabilidade os juízes adotam uma escala que vai do "inteiramente
favoráveis" ao "inteiramente desfavoráveis" passando pelo ponto central de "não
influenciarem"
A culpabilidade é a única circunstância que recebe o comando expresso de ser
medida (grifo nosso no texto do Código Penal.:
Art. 29 - Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este
cominadas, na medida de sua culpabilidade. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de
11.7.1984)
A novidade da reforma consagra a jurisprudência da pena proporcional à
participação, o que, no passado, se tornava aparente através da descrição da conduta, da
sua importância para o resultado e da pena proporcional.
A "importância" para o resultado nada mais era do que a medida, ou grau, de
participação, qual seja, a operação de medir antecede a reforma.
A nova redação remete para os parágrafos a distinção referente à participação, de
tal sorte que em não sendo de menor importância ou não querida em crime menos grave,
todos os concorrentes terão a pena cominada pela medida da culpabilidade, e estará
atendida a individualização da pena.
O crime é para todos, a sanção é para todos, mas a pena é fixada para cada um na
medida da sua culpabilidade através do artigo 59, mesmo artigo que é aplicado ao autor
singular, não existindo razão para que no caso de autor singular a culpabilidade não seja
igualmente medida.
Nenhum magistrado terá dúvida sobre ser a culpabilidade o determinante da pena
101
base pois verificará, a olho descalço, que a ausência de culpabilidade (o equipotente de
zero) desautoriza que as demais circunstâncias sejam examinadas e que, no caso de as
demais circunstâncias não pesarem contra nem a favor (equipotente de zero) a pena base
será ditada exclusivamente pela culpabilidade.
Seja: P a pena base, C a culpabilidade, S a sanção e Dc as demais circunstâncias
P=CxS+[(CxS)xD]
1.
Caso da culpabilidade equipotente a ZERO
C = 0 então C x S = 0 e P = 0 x S + [ 0 x D ] = 0 x 0 = 0
2.
Caso das demais circunstâncias equipotentes a ZERO
D = 0 para C x S > 0 será P = C x S + [ ( C x S ) x 0 ] = C x S + 0 = ( C x S )
3.
Onde (C x S) é a fixação da pena base proporcional à sanção do tipo.
(c.q.d.)
4.
Sobra discutir o que o legislador quis dizer com "conforme seja necessário
e suficiente
102
6.1
A declaração
6.1.1
Insuficiência na declaração
1) As elementares da culpabilidade não foram examinadas e fundamentadas com
suficiência, ficando sem causa a medida conseqüente.
2) Não foi declarada a medida da culpabilidade com clareza e precisão universais,
ficando a pena base fixada sem correspondência com o grau de censura.
3) A pena base não guarda com a determinante culpabilidade a relação de
proporção em que uma pode ser reconhecida na outra, seja porquê a medida da
culpabilidade não foi determinante da pena base, seja porque as demais circunstâncias
flexionaram a determinante culpabilidade com força excessiva.
4) As demais circunstâncias não foram examinadas e fundamentadas com
suficiência ficando sem causa a flexão imposta, independente da declaração da medida
estar correta.
6.2
Suficiência na declaração
1) Exame e fundamentação das elementares da culpabilidade com referência aos
aspectos individuais de cultura, corpo de conhecimentos, constante de deformação da
percepção, ou outros elementos que permitam determinar a conjuntura pessoal e dela
extrair uma graduação da capacidade de alcançar a consciência do injusto leigo e
conduzir-se de outra forma diante das circunstâncias do fato..
2) Demonstração de que o agente podia alcançar a consciência do injusto profano
e que não se esforçou para se conduzir de modo menos danoso frente às circunstâncias.
103
3) Declaração da escala adotada e a fixação de uma medida que decorra do
exame das elementares sem maior esforço mental e sem recorrência a outros pontos da
sentença e dos autos.
4) Fixação da pena base de modo que a medida da culpabilidade seja nela
reconhecida.
5) As demais circunstâncias estejam examinadas e fundamentadas e a flexão
imposta não descaracteriza a pena base fixada em relação à declaração de culpabilidade.
Insuficiente a declaração a conseqüência é a indefensabilidade:
MOTIVACIÓN NO EXAHUSTIVA: Es múltiple y reiterada la doctrina
Jurisprudencial que afirma que para que la omisión de adecuada motivación o en
general para que cualquier irregularidad procesal pueda determinar la nulidad de un
pronunciamiento judicial se requiere que el mismo origine a las partes efectiva
indefensión, impidiendo a las mismas el ejercicio del derecho de defensa STC 11
marzo 1996 con cita de las del mismo Tribunal 98/87; 145/90, 106/93; 367/93 y
15/95 y en análogos términos STC 18 diciembre 1995 que recuerda que se produce la
vulneración al derecho a la obtención de la tutela judicial efectiva si se comprueba la
imposibilidad de reparación del defecto en la vía jurisdiccional ordinaria con
existencia de indefensión material, resolución que recoge las STC 77/86; 116/86,
279/93 y 289/94.
Motivación de las resoluciones judiciales - POR MARTA CHUMILLAS MOYA – JUEZ http://www.uv.es/~ripj/10mot.htm sex jun-06-2008 10:35
A estrutura de uma decisão fundamentada pode ser reduzida à fórmula sucinta
"isto posto, concluo", que pode ser expressa em forma matemática (a + b + c = d)[1] em
em forma proposicional [(se a) e (se b) e (se c) então d] [2]
104
(a), (b) e (c) são atributos do sujeito em julgamento e definem a individualização
do conteúdo dos elementos da culpabilidade (continentes) (A = imputabilidade, B =
potencial consciência do injusto, C = exigibilidade de conduta diversa.
[1] (se A contém a) e (se B contém b) e (se C contém c) então (D contém d)
[2] (se quanto a está contido em A) e (se quanto b está contido em B) e (se quanto c
está contido em C) então (quanto d está contido em D)
O sucinto não pode ser confundido com o incompleto, que é o caso abundante de
os magistrados lançarem nos dispositivos condenatórios as formas [1], [2] ou [3],
quando o completo está expresso na conjunção de [3] com [4] (culpabilidade e medida
fundamentadas).
As declarações suficientes, conquanto sucintas, deverão ter o requisito da certeza:
“causa damnatoria”,
ou causa que implica em condenação, porque certa e
individualizada.
O lançamento de que a "culpabilidade é elevada", por exemplo, impede que o
recurso ataque os fundamentos, vez que as razões da elevação remanescem ocultas, e
assim pode ocorrer com todas as demais circunstâncias do art. 59 do CP.
A expressão "culpabilidade elevada" pode estar representando simplesmente a
"impressão" que a conduta causou, podendo estar lastreada em circunstâncias do fato
(p.e.: o destrinchamento do cadáver num homicídio) ou num tipo de autor (p.e.: morador
de favela dominada por traficantes) mas, nenhuma dessas "impressões" integra, por
presunção, os elementos da culpabilidade, podendo, no entanto, vir a integrar se
devidamente justificadas, seja para aumentar ou diminuir a medida da culpabilidade.
É evidente que diante da expressão "culpabilidade elevada" o recurso fica
105
limitado a contrapor que não é elevada e conduza que as razões sejam um reconhecimento (conhecer de novo) ou que o Tribunal re-faça o conhecimento.
Conquanto o recurso de apelação promova um devolução integral, e sendo
elementar que a segurança jurídica na primeira instância é bifronte porquanto dirigida ao
réu e à sociedade, é de ser considerado que, diante de argüida violação, deve a instância
superior verificar as duas frentes, em caminhos paralelos, trecho a trecho, congruentes,
verificando a ocorrência de erro: Erros facti - erro de fato; Error in judicando - erro ao
julgar; Error in objecto - erro quanto ao objeto; Error in persona - erro quanto à pessoa;
Error in procedendo - erro de procedimento; Error iuris - erro de direito, dentro do
último citado o erro de lógica.
As razões dos recursos, porém, só podem argumentar com o erro se o erro estiver
estampado e, em não estando, as razões serão tão vagas quanto o erro, qual seja, não
discutirão os fundamentos ou serão tão arbitrárias quanto o decidido, se não forem
simplesmente um clamor por misericórdia.
Destarte, não se pode privar a parte recorrente de argüir em compreensão e
extensão amplas, impondo o argumento de que a devolução integral do conhecimento
alcançará o propósito, resultando, então, que a indefensibilidade seja resolvida com uma
arbitrariedade.
Afirma la doctrina Constitucional en las Sentencias de 16 de diciembre y 17 de marzo
de 1997, que la motivación no consiste ni debe consistir en una mera declaración de
conocimiento y menos en una manifestación de voluntad que sería una apodíctica,
sino que ésta ha de ser la conclusión de una argumentación ajustada al tema o temas
en litigio, para el interesado, destinatario inmediato pero no único, y demás, los
órganos judiciales superiores y también los ciudadanos, puedan conocer el
106
fundamento, la ratío decidendi de las resoluciones. Se convierte así conforme
expresan las mentadas resoluciones en "una garantía esencial del justiciable
mediante la cual, sin perjuicio de la libertad del Juez en la interpretación de las
normas, se comprobar que la solución dada al caso es consecuencia de opa exégesis
racional del ordenamiento y no el fruto de la arbitrariedad".
Motivación de las resoluciones judiciales - POR MARTA CHUMILLAS MOYA – JUEZ
http://www.uv.es/~ripj/10mot.htm sex jun-06-2008 10:35
7
DOS COMANDOS NORMATIVOS
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988
Art. 5º Todos são iguais perante a lei,...
LVI - a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes:
A regulação prevista no inciso remete para o Código Penal:
Art. 29 - Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este
cominadas, na medida de sua culpabilidade. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de
11.7.1984)
O artigo 29, com o comando "na medida de sua culpabilidade", é uma regra de
individualização da pena que substituiu a jurisprudência anterior que já distinguia os
participantes pela conjugação dos verbos nucleares e verbos concorrentes.
A alteração, na prática, alterou o fundamento: antes o justo e agora o legal.
A individualização da medida da culpabilidade passou a ser um direito do
condenado, que é refletido em outras regras de individualização, também do Código
Penal:
107
Art. 44. As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de
liberdade, quando: (Redação dada pela Lei nº 9.714, de 1998)
III - a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do
condenado, bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição
seja suficiente. (Redação dada pela Lei nº 9.714, de 1998)
Art. 71 - Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, ...
Parágrafo único - Nos crimes dolosos, contra vítimas diferentes, cometidos com
violência ou grave ameaça à pessoa, poderá o juiz, considerando a culpabilidade, os
antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e
as circunstâncias, aumentar a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais
grave, se diversas, até o triplo, observadas as regras do parágrafo único do art. 70 e
do art. 75 deste Código.(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
Art. 77 - A execução da pena privativa de liberdade, não superior a 2 (dois) anos,
poderá ser suspensa, ...
II - a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e personalidade do agente,
bem como os motivos e as circunstâncias autorizem a concessão do benefício;
(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
Sem dúvida a regulação da individualização (art. 5º, LVI, CF) integra a cadeia
individualizadora composta pelos elementos legislativo, judicial e executório, para
atendimento do que dispõe a Lei de Execução Penal:
Art. 1º A execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de
sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica
integração social do condenado e do internado.
As disposições permitem concluir que a individualização da medida da
108
culpabilidade é indicação fundamental para que a execução penal conduza o direito
penal para sua hodierna finalidade.
Decerto a regulação restaria derruída se o artigo 29 do Código Penal fosse regra
reservada ao concurso de pessoas, vez que o crime de autoria singular é tão ou mais
abundante do que o de autoria plural, restando então entender que a expressão "na
medida de sua culpabilidade" entra no artigo 59 do Código Penal e atinge a circunstância
judicial culpabilidade, impondo que seja medida, conforme orienta a Exposição de
Motivos da Nova Parte Geral.
Art. 59 - O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à
personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime,
bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e
suficiente para reprovação e prevenção do crime: (Redação dada pela Lei nº 7.209,
de 11.7.1984)
18. O princípio da culpabilidade estende-se, assim, a todo o Projeto. ...
50. As diretrizes para fixação da pena estão relacionadas no art. 59, segundo o
critério da legislação em vigor, tecnicamente aprimorado e necessariamente
adaptado ao novo elenco de penas. Preferiu o Projeto a expressão “culpabilidade”
em lugar de “intensidade do dolo ou grau de culpa”, visto que graduável é a censura,
cujo índice, maior ou menor, incide na quantidade da pena. ...
A clareza de que a medida da culpabilidade, ou grau de censura, é determinante
da pena base resulta de que:
a - na ausência de culpabilidade as demais circunstâncias judiciais do art.
59 do Código Penal não são examinadas pelo sentenciante;
b - consideradas as demais circunstâncias do art. 59 do Código Penal como
109
"não-influentes" a pena base resulta determinada apenas pela medida da
culpabilidade.
Em conclusão é tido que as demais circunstâncias do art. 59 do Código Penal
podem influir na pena base como operadores de flexão não descaracterizante da medida
da culpabilidade, sob pena de, descaracterizando, ser destruída a correspondência
(proporcionalidade) entre culpabilidade e pena, correspondência que deve remanescer
inteligível por seus fundamentos.
Também, em não pode ser a medida da culpabilidade do agente uma escolha
arbitrária pois os comandos normativos disponíveis para o magistrado sentenciante
encontram sua expressão, ou conteúdo, no preenchimento dos continentes
imputabilidade, potencial consciência do injusto e exigibilidade de conduta diversa, com
elementos pertinentes ao indivíduo, sua conduta e seu fato-penal.
É de ser entendido, então, que o magistrado sentenciante deve formar sua vontade
na conformidade dos comandos normativos e da doutrina aceita, qual seja, o livre
convencimento motivado na análise dos elementos da culpabilidade e no
estabelecimento de uma medida devem ser expressos em tal redação que a
individualidade possa ser reconhecida, e também reconhecia a proporcionalidade entre a
medida da culpabilidade e a pena base flexionada pelas demais circunstâncias.
93. Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o
Estatuto
da
Magistratura,
observados
os
seguintes
princípios:
IX todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e
fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, ...
A declaração que contenha apenas a descrição dos comandos normativos, ou
apenas o resumo das orientações doutrinárias, ou termos genéricos, ou adjetivos
110
imprecisos (culpabilidade intensa, acentuada, demonstrada, patente, verificada etc) não
constitui fundamento de individualização da culpabilidade, no sentido de tornar
individual, especializar, particularizar.
As declarações estereotipadas vulneram os comandos normativos dos artigos 5º,
inciso XLVI, 93, inciso IX da Constituição Federal e a regulação da individualização da
pena, em especial o 59 do Código Penal, e as demais circunstâncias do art. 59 quando
isoladas da culpabilidade não podem ensejar a imposição da pena, configurando a
inexistência de causa legal para a pena e esvaziando a eficácia executória do dispositivo.
8
A MEDIDA DA CULPABILIDADE
Medir é encontrar a quantidade de uma grandeza.
As grandezas são conceituais, são entes convencionais que facilitam o estudo e a
descrição de um fenômeno susceptível de definição quantitativa.
Medir uma grandeza é compará-la com outra de mesma espécie.
A operação de medir grandezas chama-se medição, e o resultado da medição é a
medida
A ordenação das grandezas comparadas é feita através de uma escala.
A grandeza tomada para comparação tem o nome de unidade.
Uma grandeza fica definida por dois elementos: o número e a unidade, como por
exemplo: 36 (número) metros (unidade).
A dificuldade em aceitar que a culpabilidade possa ser medida em unidades e
escalas parece residir na atribuição de que é uma grandeza subjetiva, impalpável, ao que
111
se soma o costume de aceitar medidas objetivas ou palpáveis, como no caso dos 36
metros de tecido que podem ser apalpáveis, ou da temperatura do ar, que sentimos na
pele.
O subjetivo é tão grandeza e tão escalar que o medimos com escalas igualmente
subjetivas, como por exemplo o grau de atenção: nenhum, baixa, média, alta,
excepcional.
As medidas subjetivas estão sujeitas à imprecisão e à interpretação, o que é
amenizado com a declaração da escala, como citado no parágrafo anterior no qual a
escala tem quatro graus (0, 1, 2, 3)
Seja suposta uma outra escala subjetiva de graus de atenção: nenhuma, quase
nenhuma, muito baixa, quase média, média, quase alta, alta, excepcional (0, 1, 2, 3, 4, 5,
6, 7).
Tomando a nota mais alta para a atenção excepcional, os graus nas duas escalas,
para a mesma subjetividade, são 3 e 7, o que pode causar alguma perplexidade por se
referirem à máxima atenção, o que justifica que as escalas, quando transpostas de
subjetivas (termos vagos) para objetivas (termos precisos) devem ser declaradas para
conhecimento.
Qualquer escala subjetiva pode ser convertida em escala objetiva se o operador
souber e puder estabelecer pontos equidistantes que representem quantidades, e é isto
que os computadores podem fazer em favor dos cálculos das penas bases proporcionais
aos graus ou medidas da culpabilidade como declarados.
A culpabilidade, como "algo" que deve ser medido (art. 29 do CP) é uma
grandeza e, por pertinente a referir uma pena dentro da faixa prevista no tipo, tem seus
112
limites de medida nos mesmos limites da faixa de sanção, qual seja, variará entre o
mínimo e o máximo.
A variação da culpabilidade entre o mínimo e o máximo determinará a fixação da
pena base entre o mínimo e o máximo.
Notável é que uma escala de 1 a 10 (dez intervalos) ou de 1 a 100 (cem
intervalos) são de fácil utilização, qual seja, feito o juízo de culpabilidade e encontrado,
por exemplo, um grau 70 (escala de 1 a 100), fácil calcular a pena base:
Pena base = Pena máxima divida por 100 e multiplicada por 70.
Só é preciso saber fazer cálculos com anos, meses e dias, o que não é
complicado, mas o que uma calculadora especializada como a oferecida no CD anexo
não resolva de modo certeiro.
A culpabilidade é, então, a determinante da pena base, sendo intuitiva a relação
entre culpabilidade mínima e pena mínima e culpabilidade máxima e pena máxima,
ainda não consideradas, ainda, as demais circunstâncias que são simples flexionadoras,
como afirmado no título anterior.
Como todos os tipos se apresentam com um mínimo e um máximo de pena, o
intervalo pode ser, em todos eles, divido de modo igual, por exemplo, em 10 partes, de 1
(mínima) a 10 (máxima), e a unidade de medida da pena ficaria sendo 1/10 da sanção e a
escala (ou régua de medir) teria 10 partes ou divisões.
A operação feita no parágrafo anterior foi a mesma feita por Celsius para
construir seu termômetro centígrado, cuja unidade é 1/100 do intervalo entre o
congelamento e a ebulição da água, e a escala fundamental tem 100 divisões, de 0 a 100.
A fundamentação no exame das elementares é que orientará o julgador a
113
estabelecer um grau, ou medida, de censura, de modo que à censura mínima corresponda
a pena mínima e à censura máxima corresponda a pena máxima.
A escala de medir a culpabilidade guarda proporção direta com a escala de
sanção, podendo o julgador, uma vez encontrada a medida ou grau da culpabilidade,
facilmente encontrar a pena que levará à flexão.
Dificuldade só reside no cálculo de anos, meses e dias, mas nada que uma
planilha de cálculo, alguma habilidade, ou uma calculadora não resolva.
A declaração da medida da grandeza precisa estar referenciada ao elemento de
comparação, sem o qual estará em erro o orgulhoso pai cujo filho só tira nota 10, por
desconhecer que a escola adota a escala de 0 a 100.
Para a clareza e precisão desejáveis na declaração são inservíveis termos como
“baixa” que representa todo o intervalo entre a média e a mínima, ou “alta” que
representa todo o intervalo entre a máxima e a média, tudo por falta do elemento de
comparação. Muito pior para o termo “intensa” usado no sentido leigo de grande, pois
deriva de intensidade, e intensidade para a ciência é qualquer valor..
Insugerível a construção de um culpabilidômetro, de modo que o julgador pode
usar a própria escala do tipo em que o culpável incursionou, assim como um professor
pode dar uma prova com oito questões e depois fazer a correspondência com a escala da
escola sem prejuízo de que 8 é a nota máxima do professor e 10 a da escola.
Ora, se não existe nenhum demérito para um professor universitário atribuir ao
aluno uma nota entre 0 e 10 que é, por exemplo, a escala adotada pela escola e
conhecida por todos, não existirá nenhum demérito para um juiz declarar a escala que
adotou e a medida que efetuou segundo essa escala. Ao contrário, há mérito, pois o juiz
114
estaria "publicando" o que comumente fica na reserva mental.
O abuso de poder ocorre pela reserva mental e pelo uso de termos vagos ou
imprecisos, de modo que a defesa fica com o encargo de adivinhar o que o juiz quis
dizer e, não conseguindo - o que é normal - recorre “pro misericordia”.
9
A NECESSIDADE DE ATRIBUIR UMA MEDIDA
TÍTULO IV
DO CONCURSO DE PESSOAS
Regras comuns às penas privativas de liberdade
Art. 29 - Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este
cominadas, na medida de sua culpabilidade.
(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
O grifo (nosso) absorveu a jurisprudência anterior à reforma, que assentava a
graduação da pena conforme o grau de participação, qual seja, graduar a sanção por
comparação das condutas era prática corrente que e independia de comando legal.
O acréscimo da “medida da culpabilidade” não alterou que a sanção deva ser
graduada por comparação das condutas em concurso.
A novidade é a culpabilidade a ser medida.
Mesmo sendo regra do concurso de pessoas a aplicabilidade ao autor singular é
decorrência da uniformidade de tratamento, vez que cada participante no crime plural é
um participante singular, ou seja, conquanto as condutas sejam comparadas a medida da
culpabilidade é feita para cada um dos participantes separadamente.
115
Deveras, num crime em concurso de pessoas, sendo apuradas as condutas mas
certa a participação de apenas um, a medida da culpabilidade deste participante
identificado e processado poderia ser feita sem que lhe fosse imposto ônus maior do que
a medida da sua culpabilidade.
A ausência de condutas concorrentes para comparação não é obstáculo para que a
medida da culpabilidade deixe de ser aplicada ao autor singular, vez que tal autor estaria
sendo prejudicado pela não aplicação de parâmetro legal considerado justo.
O problema parece estar na identificação do que é a culpabilidade, e a dificuldade
se manifesta maior diante dos elementos que a compõe, elementos que são pertinentes
ao autor, vez que a imputabilidade é dele, é ele que poderá ou não alcançar a consciência
do injusto, e é ele que poderá ou não conduzir-se de forma diversa.
O momento do crime não acrescenta habilidades ao indivíduo, ou seja, ele parte
para o crime no estado em que está ou, mesmo, com suas habilidades diminuídas ou
inibidas.
Referida como podendo ser medida, têm-se que a culpabilidade é uma grandeza e
as grandezas possuem intensidade, e é essa intensidade que pode ser aferida.
A aferição da intensidade de uma grandeza é feita a partir de um padrão ou
referência, a partir do qual é estabelecida uma unidade e formada uma escala.
Tenha-se como exemplo a temperatura que lemos nos termômetros.
116
Ilustração 3: Escala como referência da medida
ESCALA
CONGELAMENTO
EBULIÇÃO
Centesimal
0
100
Reaumur
0
80
Farenheit
32
212
Kelvin
273
373
Rankine
491
671
117
Calor ou frio são apenas sensações, não são medidas, como será visto mais
adiante.
Por necessidade de medir temperaturas de alta intensidade (muito altas ou muito
baixas), foram adotadas outras divisões da mesma excursão, existindo as escalas:
Foi adotada a excursão entre o ponto de congelamento e o ponto de ebulição
(CNTP) como padrão para a intensidade da temperatura.A esse intervalo de excursão da
temperatura adotou-se dividir em 100 partes para estabelecer que cada uma seria 1 (um)
grau Centesimal (antigo Celsius), sendo o 0º (zero graus) o ponto de congelamento e
100º (cem graus) o ponto de ebulição.A idéia, ao apresentar as diversas escalas de
temperatura, é mostrar que a referência a um número não resolve o conhecimento, sendo
necessária a referência a uma escala e o conhecimento dessa escala.
Acostumados com a escala centesimal, quando sentimos calor a temperatura
estará superior a 25º Centesimais (medida da intensidade), e aos 10º Centesimais
(medida da intensidade) já estaremos morrendo de frio.
A menção a uma temperatura de 50º Farenheit (medida da intensidade) não nos
dá a referência mental (a questão é cultural) de estar fazendo calor ou frio até que ser
feita a conversão ou comparação com a escala Centesimal.
Um esquimó acostumado com 40 graus centesimais abaixo de zero (medida da
intensidade) estará num dia de temperatura alta se estiver fazendo zero grau centesimal
(medida da intensidade), e ele, com calor, tirará algumas roupas.
273 (medida da intensidade) é um número muito grande para que nossa mente
leiga aceite que tratar-se da temperatura do congelamento da água (0ºC) em graus
Kelvin.
118
Esta aparente confusão de números mostra que a referência a calor ou frio ou a
temperatura alta ou baixa, muita ou pouca intensidade, para ser inteligível, depende da
referência à uma escala e que tal escala seja conhecida.
10
A BUSCA DA EFICÁCIA
Se antes da vigência da Constituição Federal de 1988 o assunto merecia destaque,
em face da obrigatoriedade contida nos arts. 458 e 459 do Código de Processo Civil
e 381 do Código de Processo Penal da sentença ser motivada, muito mais se
acentuou essa importância com a entrada em vigor da nova Carta Magna, em face da
consagração constitucional de que todas as decisões dos órgãos do Poder Judiciário
devem ser fundamentadas, sob pena de nulidade (art. 93, IX e X, CF).
A SENTENÇA JUDICIAL E A CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 - JOSÉ
AUGUSTO DELGADO* - Juiz do TRF-5ª Região e Professor Universitário
10.1
Do Interesse na Eficácia
Sem gastar espaço discorrendo sobre as funções dos atores processuais porque
isto é bem feito na doutrina, é de ser destacado que a sociedade delegante do poderdever da perseguição punitiva espera não somente que o juiz diga o direito, espera
também que a satisfação do seu representante acusador seja a sua própria satisfação.
Acontece que a sociedade não pode pretender uma satisfação a qualquer custo,
vez que, como fonte do poder (art. 1º, parágrafo único, CF) o estabelece através de
representantes eleitos e se subordina ao processo legislativo. A lei, então, representa o
mais proximamente possível o sentimento dominante do povo em relação à culpa,
inocência, capacidade etc. E, assim, a construção das garantias processuais leva em
119
conta esse aspecto somatório quando tais garantias são dirigidas para o indivíduo.
Diferentemente, quando a sociedade reage a um perigo ou a um dano, pouco se
tem de somatório, isto é, a sociedade se apresenta como um corpo representado pelo que
é chamado de "opinião pública", e é a opinião pública - que não é opinião mas atitude que fica sujeita ao crivo das opiniões individuais.
A grande questão está em que a concretização penal se dá sobre um indivíduo
sobre o qual recai uma "opinião pública" que orienta atitudes individuais, e a dificuldade
operacional está em que a providência judicial satisfativa dos interesses individuais
homogêneos nem sempre satisfaz ao interesse coletivo da "opinião pública" nem às
atitudes individuais por esta orientadas.
Na prática, basta perguntar a alguém se um latrocida deve ser condenado à uma
pena muito severa, como 30 anos, perpétua, ou de morte, para em seguida perguntar se
deveria ser a mesma coisa se o latrocida fosse o pai ou o irmão do interlocutor. Com
certeza uma expressiva parte das respostas mostrará o homem-coletivo se distinguindo
do homem-indivíduo.
Ora, como no processo os interesses haverão de ser legais, além de legítimos, não
pode acontecer que a "legitimidade" ditada por uma conjuntura de crescimento da
criminalidade ou da violência invada o conteúdo das leis processuais que não foram
criadas para atender demandas sazonais.
Assim é que condenações proferidas com menor rigor processual refletem mais
uma tentativa de pacificação dos clamores sociais através da celeridade que o rigor
menor facilita, do que uma severa atuação da perseguição punitiva, menos lenta porém
efetivadora das garantias estabelecidas.
120
Bem, entre a sociedade delegante que ora se manifesta como somatório de
interesses individuais homogêneos, ora como um interesse coletivo, e a concretização do
poder-dever da perseguição punitiva, existe uma figura que deve garantir sociedade e o
indivíduo ao mesmo tempo: o Promotor de Justiça.
Como garante das relações decorrentes do poder-dever, o Promotor não pode
atender ao interesse coletivo penal.
A afirmação foi feita assim, secamente, em razão da afirmação anterior de que as
leis processuais não foram feitas para atender demandas sazonais, foram feitas para
serem aplicadas segundo existem mesmo que a demanda por sua aplicação seja maior
em determinada época.
Isto tem o nome de segurança.
Na medida em que as leis se aperfeiçoam em função de concepções advindas da
reflexão, mais e mais se exige do mandatário Promotor um esforço de gestão do
interesse que lhe é confiado, gestão esta que não comporta a perda da oportunidade sem
sanção. Não a sanção ao Promotor - que até pode existir mas não e objeto deste discurso
- mas a sanção que recai sobre o próprio interesse, na medida em que, mal gerido, o
resultado não corresponda ao resultado original previsto e desejado, logo, traduzindo-os
em resultado de eficácia restringida ou nula. Restringida por inexistência de previsão
que seja o comando seja válido quando obtido a qualquer custo ou com economia de
custos.
Destarte, a função acusadora, como gestão de um interesse, deve cessar a partir
do momento em que a ordem processual diga que está encerrada. Esse encerramento,
que carrega o nome de "trânsito em julgado para a acusação" assegura para o réu o
121
conteúdo declaratório da sentença também como eficácia da gestão do interesse da
perseguição punitiva, segurança da qual é garante o próprio titular da ação penal,
mandatário do interesse.
Então o trânsito em julgado para a acusação significa que o garante-titular está
satisfeito, e por decorrência satisfeita estão a sociedade e a ordem pública.
10.2
Discussão da ineficácia
Em discussão que o Estado tem o poder para poder cumprir o dever, e que o
regime democrático não comporta, quando o Estado cumpre mal o seu dever e com isto
se contenta, a correção por devolução do poder correspondente ao dever mal cumprido.
Ora, se transita em julgado uma sentença que não satisfaz ao conteúdo mínimo
satisfatório que lhe confere eficácia executiva, a sociedade deve suportar a não
execução, embora possa cobrar do garante-titular-mandatário o correspondente ao mau
exercício. O que não pode acontecer é a sociedade fraudar as regras que criou para
gestão do seu interesse com o argumento de que o interesse é superior às próprias regras.
O arbítrio nada mais é do que fazer prevalecer um interesse sobre as regras que
foram criadas para gestão desse interesse.
Então, o trânsito em julgado para o garante-titular-mandatário, referido na ação
penal como órgão da acusação, ou acusador, significa que o interesse deste está satisfeito
e que, posterior verificação de má gestão do interesse não autoriza a abertura de
oportunidade por quem quer que seja, e para o que quer que seja.
É, não autoriza a abertura de oportunidade por quem quer que seja, porque o
gestor do interesse público é o garante-titular-mandatário. A jurisdição é simplesmente
122
provocada para dar uma resposta multifronte.
Assim, embora acusador e julgador exerçam tutela sobre os interesses públicos, a
jurisdição deve respeitar que a eficácia de uma decisão penal é também um interesse
público, e é um interesse público cuja gestão não lhe é deferida sem provocação, e muito
menos uma sobre-gestão lhe seria deferida para comandar fazer o que o garante-titularmandatário não pediu que fosse feito na defesa da gestão do seu interesse.
O argumento de que a má gestão, por economia de custos, comprometeu a
eficácia executiva do resultado e que, portanto, a gestão do interesse pode ser renovada é
o argumento de que a qualquer custo a eficácia executiva deve ser alcançada, e isto
aparece não apenas nas anulações para que outras sentenças sejam proferidas, acontece
na manutenção do recurso de ofício das absolvições sumárias que transitam para
acusação e absolvido, mas não "transitam" para o juiz nem para os tribunais superiores.
Antes da Carta de 88 talvez se sustentasse uma sobre-gestão, sugerida pelo
regime de exceção ou pela ablação das alíneas do artigo da Constituição sobre o tribunal
do júri, mas dentro do Estado Democrático de Direito, com declaração expressa de
existência de uma ordem jurídica e de um regime democrático, é incomportável admitir
que exista quem tenha interesse maior na gestão do que o garante-titular-mandatário
previsto na lei.
Não seria justificativa suficiente para a sobre-gestão a inexistência de sanções ou
a não aplicações de sanções pessoais ou de carreira ao garante-titular-mandatário, vez
que o não existir ou o não aplicar não são da responsabilidade daquele que está sendo
processado criminalmente.
Assim é que o Promotor, deixando fluir o prazo recursal, sinaliza, com a não
123
interposição do recurso, que está satisfeito com a sentença, nada tendo a reparar,
inclusive em relação à eficácia executiva restringida.
Seja visto que, da nova oportunidade (proferimento de nova sentença com
conteúdo declaratório eficaz) não participa o gestor-garante-titular-mandatário, logo, a
decisão do tribunal superior que anule sentença transitada em julgado para a acusação
"corrige" não só o seu nativo juiz que deveria entregar a prestação por inteiro, como o
naturalizado promotor que se contenta com prestação menor do que a devida.
Não se pode dizer que é do interesse público, em matéria penal condenatória, que
o Estado faça de novo o que fez mal feito, principalmente, se para refazer viola o
trânsito em julgado para a acusação, ou seja, abrindo espaço para que o juiz satisfaça
plenamente o interesse da acusação que já se deu por satisfeita.
É de pouca segurança, senão demérito ou desvalia, que conformando-se o titular
da ação com a restrição executiva oriunda do erro da jurisdição, à jurisdição seja
deferido corrigir o erro em prol da eficácia plena.
Parece esquisito que, derivando a eficácia executiva de um ato de jurisdição,
alguém se contraponha a que a própria jurisdição corrija o erro. Não, não é esquisito, é
que tudo está se passando no patamar das garantias processuais, patamar no qual o
Promotor é garante e o Juiz efetivador, independente do crime e da pena.
Se o efetivador não efetiva e o garante não garante a efetivação, a sanção não
pode incidir senão sobre o interesse e se apresentar sobre a forma de restrição executiva
decorrente de a gestão não ter sido feita enquanto possível.
Por outro modo se estaria garantido que o órgão acusador possa errar deixando
que o juiz erre, pois seu erro será remediado independentemente de seu interesse, visto
124
que a hipótese só se apresenta em recurso exclusivo da defesa.
De um modo mais grosseiro pode ser dito que o réu apenas espera a decisão
condenatória pois, embora contribua para o contraditório, a maior parte dos processos
termina em condenação.
Também, não participa o réu da elaboração da sentença, e não lhe é reconhecido
interesse em recorrer para prejudicar-se.
O que tem o réu a ver se o juiz trabalhou mal e o promotor se contentou com tal ?
Nada, pois se lhe é reconhecido o direito de não se auto-acusar, reconhecido está
que não tem nenhum compromisso com a justiça penal no tocante aos erros que essa
cometer e que resultem, de algum modo, em benefício indevido para ele.
A titularidade para a ação penal pública, pertencente a uma instituição
permanente e essencial à função jurisdicional do Estado (art. 127 da CF), e o único caso
de substituição processual é a ação penal subsidiária, cujo "locus" de inserção (Art. 5º,
LIX da CF) e substituto privado demonstram que tal ação visa garantir a sociedade
delegante do poder-dever da perseguição punitiva, e não a jurisdição.
Seria simplista dizer que, se a vítima estivesse assistindo a acusação poderia
inconformar-se com a eficácia restringida, pois o instituto da assistência não foi criado
para vigiar a acusação, suprir-lhe as deficiências ou corrigir seus erros.
Entre o interesse da acusação e a ordem pública, inexistindo dolo, simulação ou
fraude, a não realização da ordem pública por má gestão do interesse e conformidade
com isto, significa o limite para o exercício do poder pelo Estado, não cabendo que o
Judiciário, que é poder de governo, agir em nome do Estado, outorgando a si próprio a
titularidade para a "exceção do dever mal cumprido" Assim como sustento que o juiz
125
que absolve sumariamente não tem interesse material nem processual na reforma da sua
decisão porque seu interesse não pode ultrapassar o devido processo legal, a acusação
conformada não tem interesse na reforma de uma sentença de eficácia restringida nem
tem substituto processual indicado na lei.
Conclusão: o trânsito em julgado para a acusação, salvo a ocorrência de dolo,
simulação ou fraude, constitui garantia para o condenado de que o conteúdo da sentença
se tornou imutável em relação ao interesse do titular da ação penal, seja em relação ao
conteúdo ou à eficácia.
10.3
Da natureza declaratória
A natureza declaratória da sentença penal quando analisada com a incidência do
comando constitucional de que todas as decisões judiciais serão fundamentadas torna
clara a exigência do Código de Processo Penal quanto ao conteúdo:
Art. 381. A sentença conterá:
I - os nomes das partes ou, quando não possível, as indicações necessárias para
identificá-las;
II - a exposição sucinta da acusação e da defesa;
III - a indicação dos motivos de fato e de direito em que se fundar a decisão;
IV - a indicação dos artigos de lei aplicados;
V - o dispositivo;
VI - a data e a assinatura do juiz.
Os incisos I a IV mostram que as informações constantes dos autos devem ser
transpostas para o corpo da sentença.(2)
126
(2) . Como ensina BETTIOL(3), a sentença é fruto e resultado de uma delicada
operação lógica que o juiz deve manifestar por escrito, a fim de que o raciocínio por
ele seguido possa ser controlado sob o aspecto de sua impecalibilidade. A jurisdição
é inteiramente ligada à motivação. A motivação, no que se refere ao fato, exige que o
juiz, se às provas recolhidas e valoradas, deva exprimir as razões pelas quais um
fato, nos seus elementos objetivos e subjetivos, essenciais ou acidentais, constitutivos
ou impeditivos deva ou não considerar-se presente. A motivação, quanto ao direito,
exige que o juiz deva exprimir o porquê de uma determinada escolha normativa e
interpretativa.
Conclui o mestre italiano: “Solo cosí l’imputato è posto in grado di conoscere e
giudicare l’attività mentale del magistrato nella scelta e nella valutazione di ogni
momento rilevante alla decisione; e solo cosí patranno essere individuati e indicati
gli errori logici nei quali è caduto il giudice. Anche questa possibilità eche oggi
l’ordinamento giuridico riconosce all’imputato è uma delle garanzie predisposte
dallo stato di diritto per la tutela della libertà individuali”.
A MOTIVAÇÃO DA SENTENÇA NA APLICAÇÃO DA PENA (*) - Heleno Cláudio
Fragoso - http://www.fragoso.com.br/cgi-http://www.fragoso.com.br/cgibin/heleno_artigos/arquivo46.ppdfbin/heleno_artigos/arquivo46.ppdfhttp://www.fragoso.c
om.br/cgi-bin/heleno_artigos/arquivo46.ppdf - 24/05/08 05:11:23
Parecendo desnecessário em razão de que uma sentença passada nos autos de um
processo pertence, por princípio, ao processo em que foi passada, o dispositivo sugere
que seus elaboradores já elegiam como imprescindível que as decisões judiciais penais
devessem ser fundamentadas, o que lhes conferia autonomia recorrente, qual seja, o
conhecimento do conteúdo da sentença remete ao conteúdo dos autos e da legislação
pertinente. (3)
127
Convém ressaltar que não há motivação sem referência aos elementos de prova
relativos aos pontos fundamentais da causa. É perfeita a observação de RICARDO C.
NÚÑEZ 8: “Em relación a las conclusiones de hecho de la sentencia, para llenar su
obligación de motivarlas (fundarlas), el juez debe comenzar por enunciar los
elementos probatórios que justifican cada una de esas conclusiones de hecho. No le
bastaria decir: está probado que Juan murió. Es preciso que sustente esa afirmación
em elementos probatórios. La motivación debe ser sobre todos y cada uno de los
presupuestos de la decisión; debe ser, em una palabra, completa”.
A MOTIVAÇÃO DA SENTENÇA NA APLICAÇÃO DA PENA (*) - Heleno Cláudio Fragoso http://www.fragoso.com.br/cgi-bin/heleno_artigos/arquivo46.ppdf - 24/05/08 05:11:23
Do I ao IV a sentença é uma suma da matéria de conhecimento e das leis que irão
suportar o dispositivo, ou conclusão.
A redação dos incisos I a IV, com a descrição do conteúdo, teria tido o propósito
de evitar as declarações simplesmente conclusivas que, se desejadas, teria orientado a
redação para um modelo semelhante ao abaixo:
I - a identificação;
II - a contraditório;
III - a motivação;
IV - a legislação;
V - o dispositivo;
Tal sequência de conclusões deixaria vago o conteúdo e isto poderia conduzir a
que seria correta a sentença “correta” passada, como descrito, em relação aos quatro
primeiro incisos:
128
Vistos etc.
O réu identificado em folhas e folhas destes autos, foi denunciado pelo conteúdo de
folhas 2 e seguintes, seguindo-se o contraditório pelo qual resulta condenado pelos
fatos descritos e razões de direito expostas, devendo ser aplicada a lei ....
Bastaria "ler os autos" para conhecer do conteúdo das conclusões, mas perdida
estaria a autonomia recorrente e afastados de apreciação o conteúdo no qual o
sentenciante se apoiou, ou seja, do conjunto de proposições dos autos certa seria apenas
a identificação das partes, restando incerto quais teriam embasado as conclusões,
exigindo que o leitor fizesse uma busca do caminho possível de trânsito até chegar à
mesma conclusão do sentenciante o que tornaria incerto e impreciso o conhecimento se
mais de um caminho existir, o que não é incomum no processo penal.
O código adjetivo obriga o juiz a declarar o óbvio, como por exemplo o nome do
réu.
Essa aparente peia ao raciocínio tem o sentido de garantir a correspondência
biunívoca entre a matéria dos autos e as conclusões do sentenciante, em resumo:
I - este processo pertence ao réu "A" e esta sentença declara "A" como
sujeito aos seus efeitos;
II - acusado pelo crime "B" defende-se em relação ao crime "B";
III - pelos fatos do crime "B" e pela conduta de "A" na execução de "B"
inexistente causa que o exima, então "A" é culpado pelo fato "B".
IV - por I, II e III, aplica-se a Lei Bcrim e Bpena.
Tal construção tornaria desnecessária a leitura dos autos, salvo se detectada
alguma contradição na seqüência do conteúdo.
129
O inciso V, no entanto, não veio pela descrição do seu conteúdo e nem poderia vir
com conteúdo descrito sem impor severa limitação ao juízo, mas na seqüência que
começa com a fundamentação do óbvio (nome do réu) não cabe interpretação de que o
conteúdo do inciso V possa ser simplesmente conclusivo. (4)
Qualquer que seja a situação a ser enfrentada, o Juiz tem a missão de fundamentar os
motivos que determinaram a conclusão apontada, por isso se constituir em direito e
prerrogativa dos jurisdicionados. Por essa razão CALMON DE PASSOS, in Da
Argüição de Relevância no Recurso Extraordinário, RF, 259:20, 1977, adverte que o
princípio da obrigatoriedade da motivação das decisões é de ser considerado, em
nosso sistema legal, regra genérica, sem comportar exceção, em feitos de qualquer
natureza, como corolário de princípio inerente à garantia constitucionalmente
assegurada, do devido processo legal.
A SENTENÇA JUDICIAL E A CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 - JOSÉ
AUGUSTO DELGADO* - Juiz do TRF-5ª Região e Professor Universitário
10.4
Momentos da declaração
O juízo, decisão, dispositivo ou conclusão, introduzida a culpabilidade no Direito
Penal, fazendo com que o dolo se deslocasse para o tipo - como proposto no próprio
Código Penal que classifica os crimes como dolosos e culposos - e vencidas as
preliminares das condições da ação e procedibilidade, surgem dois momentos de
declaração:
o momento em que, reconhecido o vínculo de autoria (produção do fato-crime), o
réu é declarado culpado (dolo ou culpa ínsitos ao tipo aceito);
o momento em que a culpabilidade do causador do fato é aferida para
130
determinação da quantidade de pena prevista no tipo aceito.
O primeiro momento não tem sofrido maus tratos por parte dos sentenciantes, vez
que "tradicional", mas o segundo momento vem sendo maltratado desde neonato, à vista
de que na sistemática extinta a maior ou menor vontade de matar (intensidade do dolo)
orientava a pena, e era isto que ditava pena maior ou menor para autores diferentes de
mesmo fato, p.e.: matar alguém com um tiro no meio da testa.
O autor era julgado pelo tamanho do seu "querer a ação" com se fora possível
absolver alguém por esse ter afirmado no processo que não queria matar, mas deu um
tiro na testa da vítima só para confirmar se ele era um cabeça dura ou não.
A culpabilidade veio para responder à indagação de "porque esse agente matou
alguém com um tiro na testa", qual seja, responder como a vontade do agente se formou
(imputabilidade especial e potencial consciência do injusto) e porque agiu segundo a
vontade formada (exigibilidade de conduta diversa).Não se pode exigir de alguém que
forme sua vontade segundo orientações ou parâmetros que não conhece.
Não se pode exigir de alguém que pratique uma conduta sem que seja portador
das habilidades em grau suficiente para a prática.
"O paraplégico poderia ter escapado do incêndio se tivesse saído correndo, o que
é a conduta esperada dos que ficam sujeitos a tal perigo."
A afirmação é disparatada, visto ser sabido que os paraplégicos não são
portadores da habilidade de correr, mas o disparate só pode ser aferido porque,
verificadas as habilidades do incendiado descobriu-se que era paraplégico. (5)
[5] Se a história confirma a estreita ligação entre argumentação e Direito, olhandose a questão sob a ótica do contemporâneo‚neo, podemos ver que h·, na verdade, uma
131
ligação essencial entre os dois. Em um pequeno mas muito ilustrativo livro, Anthony
Weston, pergunta: Para que serve argumentar?. E responde, a seguir: “(...)
argumentar quer dizer oferecer um conjunto de razões a favor de uma conclusão ou
oferecer dados favoráveis a uma conclusão. (...) Os argumentos são tentativas de
sustentar certos pontos de vista com razões. Neste sentido, os argumentos (...) são
essenciais”.
O Direito como Argumentação - Lino Geraldo Resende * - professor da disciplina
comunicação e Expressão na FAVI/FACES
[6] Dai que a afirmação simples de que do incendiado era exigível conduta diversa
não contempla a individualização da conduta.
[7] A culpabilidade - que deve ser medida por força do artigo 29 do Código Penal nada mais é do que o conjunto de habilidades bio-psíquicas e físicas para lidar com a
situação na qual o agente se vê envolvido.
[8] No caso do incendiado, mesmo o de pernas sãs poderia sucumbir se o pavor lhe
assumisse o lugar da razão, e o desconhecimento de tal circunstância poderia
conduzir à conclusão de que não escapou porque não quis.
Fundamental a apropriação das condições individuais, com as quais pode ser
produzida a conclusão individualizada:
"Do paraplégico, pela quebra da roda da cadeira e por ausência da habilidade
deambulatória, não é possível exigir que escapasse do incêndio."
"Por ter a razão apagada pelo pavor, o que lhe suspendeu a capacidade de formar
a vontade de correr, não é possível exigir que o cidadão, conquanto capaz em outras
situações não-apavorantes, escapasse do incêndio."
"Coitados", o aleijado e o apavorado recebem a justificativa porque deles temos
132
pena.
"Criminosos", porque não lhes conhecemos as condições individuais, não
recebem justificativa porque para eles temos pena.(6)
"O réu é imputável, tem potencial consciência do injusto e dele podia ser exigida
conduta diversa".
Tal conclusão, sem as premissas que a fundamentam, que são premissas
construídas com elementos da individualidade, não só parecem derivar da relação
objetiva crime-pena como aparecem assim derivadas quando alguns magistrados, à guisa
de fundamentação, descrevem o fato e a conduta.
c) Una tercera función que cumple la fundamentación de los fallos judiciales se
refiere a la legitimación del poder por el Estado sobre los ciudadanos. Una sentencia,
independientemente de si ésta es “racional” o no, implica ejercicio directo de las
potestades de imperio de la administración pública. Esta refleja de una forma –a
veces brutal como sucede en el Derecho penal– la ón Leviatán social sobre el
individuo concreto. Es probable que si el Estado no motivara sus decisiones (o al
menos no aparentara hacerlo) se enfrentaría, tarde o temprano, con el poder
despótico de las masas clamando por “Justicia”. ¿Qué significa fundamentar una sentencia? - O del arte de redactar fallos judiciales sin
engañarse sí mismo y a la comunidad jurídica - E. Salas - DE COSTA RICA
A resposta ao quesito do porque o culpado se conduziu "assim" diante do fato em
que se envolveu não é dada de forma que seja possível compreender que a quantidade de
pena está referida à capacidade individual de ação e reação. (7)
133
- Otra definición general del concepto la ofrece HABA: “Solicitar que las
afirmaciones tengan un fundamento vale decir que estén respaldadas en razones
(aceptables). Esto constituye la definición misma del pensamiento racional, e
inclusive del que simplemente pretende ser razonable. La cuestión del fundamento
surge por el hecho de pedir un por qué para aceptar cierto juicio.O del arte de redactar fallos judiciales sin engañarse a sí mismo y a la comunidad jurídica Minor E. Salas - UNIVERSIDAD DE COSTA RICA
134
Ilustração 4: Culpado e culpabilizado
135
Pode parecer esquecida - ou não lida - a Exposição de Motivos da Nova Parte
Geral do Código Penal:
49. Sob a mesma fundamentação doutrinária do Código vigente, o Projeto busca
assegurar a individualização da pena sob critérios mais abrangentes e precisos.
Transcende-se, assim, o sentido individualizador do Código vigente, restrito a fixação
da quantidade da pena, dentro de limites estabelecidos, para oferecer ao arbitrium
iudices variada gama de opções, que em determinadas circunstâncias pode envolver
o tipo da sanção a ser aplicada.
As causas de exclusão da imputabilidade são as seguintes:
• a) doença mental (26, caput);
• b) desenvolvimento mental incompleto (26, caput);
• c) desenvolvimento mental retardado (26, caput);
• d) embriaguez completa, proveniente de caso fortuito ou força maior (28, §
1º).
• As causas excludentes da culpabilidade são as seguintes:
• a) erro de proibição (21, caput);
• b) coação moral irresistível (22, 1ª parte);
• c) obediência hierárquica (22, 2ª parte);
• d) inimputabilidade por doença mental ou desenvolvimento mental
incompleto ou retardado (26, caput);
• e) inimputabilidade por menoridade penal (27);
136
• f) inimputabilidade por embriaguez completa, proveniente de caso fortuito
ou força maior.
Como extremo, a coação física determina uma autoria-instrumental.
As excludentes da imputabilidade correspondem a uma ausência de habilidades,
enquanto as excludentes da culpabilidade tratam da diminuição ou inibição das
habilidades.
A excursão que é feita no intervalo (imputável, semi-imputável, inimputável)
mostra que a graduação da ausência, diminuição, ou inibição das habilidades biopsíquicas e/ou físicas,é da essência da fixação da pena.
Sensível é que pessoas com mais habilidades possuem maior capacidade de
resposta do que as possuidoras de menos habilidades, e em boa parte das situações do
cotidiano as pessoas são escolhidas para serem autores de fatos segundo suas posses,
como ocorre nas contratações por empresas, notadamente, vez que buscada a capacidade
de resposta diante das situações que se lhes são apresentadas.
Em situação que conduz ao crime não poderia ser diferente, qual seja: menor
capacidade de resposta implica em menor domínio do fato, e o oposto também é
verificado.
Assim, sendo possível a existência de duas situações de fato que guardem
congruência de estrutura, cada uma enfrentada por indivíduos de mesma idade, o senso
comum distinguirá a capacidade de respostas, como posto:
"Em um estabelecimento de lazer A e B, ingerindo bebida alcoólica, jogavam
sinuca. Discutindo se a bola tacada tocou ou não na outra, A agride B com o taco,
causando-lhe lesões."
137
Seja que tal ocorreu em dois locais diferentes: num botequim de ponta de rua no
qual dois serventes de pedreiro semi-alfabetizados bebiam cachaça e jogavam
sinuquinha; no salão de um clube no qual dois profissionais liberais bebiam "12 anos" e
jogavam "snooker".
De quem, em tese, poderia ser exigido que se conduzisse de outro modo.
Do profissional liberal, seria a resposta. Mas, na concreticidade dos fatos,
somente a busca por outras circunstâncias da individualidade poderia explicar de forma
mais abrangente e precisa, vez que o profissional liberal poderia ser um "cavalo vestido
de gente" e o servente de pedreiro um "gentleman", visto isto se afastados os
preconceitos relativos à periculosidade presumida por estrato social ou econômico.
Então, haveria de ser verificada a diferença de imputabilidade entre um e outro na
comparação das suas posses de habilidades bio-psíquicas e físicas, e a repercussão no
potencial de alcançar a consciência do injusto e agir de forma diversa.
Apenas o preconceito forma a presunção de que o servente de pedreiro seja mais
perigoso e mais tendente a repetir a conduta, e que a conduta do profissional liberal seja
mais tolerável, mas a o acervo de habilidades, se verificado, poderá apontar o contrário.
No âmbito do Judiciário e do Ministério Público a aferição do merecimento é
tarefa de rotina que cada vez mais se quer aperfeiçoar através de critérios de posse de
habilidades, de forma a graduar o merecer através de abrangente e precisa
individualização. Mas tal não ocorre de forma tranquila pois, vez ou outra, por
coincidência, um candidato tido como de nítido maior merecimento mas mais afastado
da intimidade do colegiado é rejeitado ou, vice-versa, aprovado.
O aperfeiçoamento do processo de promoção por merecimento por mitigação das
138
subjetividades e majoração das objetividades, e abrangentes e precisas declarações não
só faz transparecer o justo como torna aferível e contestável a aplicação dos critérios de
individualização.
A redação de um dispositivo condenatório - que é nascido recorrível - deve
oferecer ao submetido a oportunidade de aferir e contestar. No entanto, se feita por
conclusões sem fundamentação, fica reduzido a um golpe de autoritarismo subjetivo,
dado que as razões que o sustentam remanescem "in pectore" do sentenciante e não são
aferíveis, fazendo com que o recurso seja uma rajada de metralhadora no escuro ou um
pleito de misericórdia.
O Direito Penal não é elaborado para os crimes e sim para as pessoas que os
cometem, e incide sobre um bem tão precioso - a liberdade - que as pessoas por ele
sacrificam a própria vida, seja o encarcerado que tenta saltar o muro sabendo que poderá
morrer eletrocutado ou baleado, seja um povo que pega em armas para se livrar de um
tirano.
Um Estado Democrático de Direito, com regime democrático declarado no bojo
constitucional, não pode criar o risco da tiranização da autoridade negando a um
condenado saber quais os fundamentos precisos da quantidade da privação da
liberdade. (8)
(8) mesmo sentido Antônio Scarance Fernandes ao expor a evolução de tal princípio:
Evoluiu a forma de se analisar a garantia da motivação das decisões. Antes,
entendia-se que se tratava de garantia técnica do processo, com objetivos
endoprocessuais: proporcionar às partes conhecimento da fundamentação para
poder impugnar a decisão; permitir que os órgãos judiciários de segundo grau
pudessem examinar a legalidade e a justiça da decisão. Agora, fala-se em garantia de
139
ordem política, em garantia da própria jurisdição. Os destinatários da motivação não
são mais somente as partes e os juízes de segundo grau, mas também a comunidade
que, com a motivação, tem condições de verificar se o juiz, e por conseqüência a
própria Justiça, decide com imparcialidade e com conhecimento de causa. É através
da motivação que se avalia o exercício da atividade jurisdicional. Ainda, às partes
interessa verificar na motivação se as suas razões foram objeto de exame pelo juiz. A
este também importa a motivação, pois, através dela, evidencia a sua atuação
imparcial e justa. A SENTENÇA JUDICIAL E A SUA FUNDAMENTAÇÃO - Ana Luiza Berg Barcellos* -
As excludentes da imputabilidade e da culpabilidade expressas na lei constituem
a precisa demonstração de que a pena não é consequência necessária da produção do
fato-penal, e quando necessária está sujeita a graduação segundo a capacidade de
resposta segundo a fundamentação que a lei oferece.
10.5
Conclusão
Não é possível encerrar sem antes enfrentar a questão da extensão do dispositivo
condenatório para verificação da validade do que vem sendo consagrado como
fundamentação sucinta.
Sucinto é o breve, ou descrito em poucas palavras, não passando que possa ser
incompleto, superficial ou insuficiente.
O sucinto em matéria de fundamentação não pode se afastar de que a conclusão
seja suportada por pelo menos uma razão (se A então B).
Art. 59 - O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à
personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime,
140
bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e
suficiente para reprovação e prevenção do crime:
A culpabilidade é a circunstância determinante da pena, vez que sem culpabilidade não há
pena e as demais circunstâncias nem são analisadas, e é isto que autoriza sustentar que o critério de
necessidade e suficiência assinalam a inevitabilidade da conclusão (culpabilidade = pena; nãoculpabilidade = não-pena).
A declaração de que a culpabilidade existe deve ser precedida das declarações de
que o conteúdo que compõe a culpabilidade existe.
Os elementos da culpabilidade são continentes específicos cujo conteúdo que os
preenche varia entre o sim e o não (vazio, com alguma quantidade, ou cheio).
Os elementos da culpabilidade se apresentam ao juiz como continentes
específicos a serem preenchidos, ou terem seus conteúdos atribuídos conforme
especificação e, desta sorte, a simples referência aos continentes (é imputável, tem
potencial consciência do injusto e lhe era exigível conduta diversa) não conclui a
verdade sobre o conteúdo.
A correspondência entre a especificidade do continente e a especificidade do
conteúdo ao continente revela apenas a adequação, vez que a fixação da pena é toda
presidida pela individualização, atraindo que a especificidade do conteúdo seja
pertinente ao indivíduo cuja conduta está sob juízo.
As declarações de conteúdo pertinente ao indivíduo sob juízo constituem a
fundamentação, ou razões para as conclusões sobre os elementos da culpabilidade.
A declaração de que era exigível uma conduta diversa, por exemplo, é tão vazia
de conteúdo individual que o próprio Código Penal arrola as condutas em relação às
quais é exigível conduta diversa, sob cominação de pena.
141
11 DA DECLARAÇÃO
También es nulo de nulidad absoluta el acto ilógicamente motivado, es decir cuando
se obtiene una conclusión que no tiene nada que ver con el argumento que se utiliza.
La omisión de la motivación da origen a la nulidad absoluta, ya que no sólo se trata
de un vicio de forma sino también de un vicio de arbitrariedad.
Derecho contencioso administrativo
http://www.monografias.com/trabajos6/deread/deread.shtml qui jun-19-2008 09:57
11.1
Do conteúdo da declaração
No Direito Penal da culpabilidade a declaração que fundamenta a exigência conduta
diversa deve estar calçado pelas declarações de que o indivíduo podia e as
circunstâncias permitiam que se conduzisse de forma diversa, ou seja, que era
portador das habilidades necessárias e tais não estavam diminuídas, inibidas ou
impedidas de exercício nas circunstâncias do fato em análise.
Analisar ser o agente portador das habilidades e não tê-las diminuídas, inibidas ou
impedidas de exercício vale para todos os elementos da culpabilidade.
Com maior rigor lógico é possível dizer que o dispositivo condenatório é um juízo
sintético – daí a idéia de sucinto ou seja, exprime um predicado não contraditório
com o sujeito, porém acidental à sua natureza.
Os termos empregados no juízo são complexos (sujeito e predicado) e singulares
(servem a um só indivíduo).
O raciocínio é o indutivo vez que a predicação do sujeito singular forma o conteúdo
do quesito geral (maior de 18 anos mais higidez mental igual a imputabilidade).
A proposição é modal contingente (enunciado de relações de fato não obrigatórias
142
porque poderiam ser de outra forma, mas que expressam como os fatos se passaram.
O aperfeiçoamento do juízo, consistente em ser uma decisão fundamentada, deve
obedecer ao princípio da razão suficiente: todas as coisas devem ter uma razão
suficiente pela qual são o que são e não são outra coisa.
É o princípio da razão suficiente o assinalador de que a individualização da pena
não poderia ser taxada na lei, sendo então remetido ao juiz - nesta ausência de
fundamentos expressos na lei – fazer a exposição das razões suficientes que garantam o
valor de atribuição modal contingente (mutável, recorrível) da proposição, cujo trânsito
em julgado a mudará para modal apodítica (irrecorrível ou imutável) e se aproxima de
uma definição genética, qual seja: relação das causas que produzem um efeito, clara e
precisa, sucinta e que convém somente ao sujeito condenado.
A lei penal e a caneta dos magistrados não pode cassar ao indivíduo o direito de
ser o que ele é, e como não pode ser julgado pelo que é (direito penal do autor) deve ser
julgado, fundamentadamente, pelo que faz, segundo sua capacidade de ação e reação no
fazer, e com atendimento do que preconiza a doutrina e orienta a sua sensibilidade.
A dedicação de garantias processuais-penais aos criminosos - em especial a
fundamentação do dispositivo condenatório -serve, em suma, para assegurar a eles que
seus acusadores e julgadores não só conhecem os fins do Direito Penal (promover a
harmônica integração social do condenado) como são trabalhadores na construção da
sociedade livre, justa e solidária.
11.2
Do Dever de Fundamentar
O dever de fundamentar a decisão, do ponto de vista do ato jurídico, deve gerar
um produto no qual a vontade e o conteúdo declaração correspondem aos fundamentos e
143
à conclusão, respectivamente.
También es nulo de nulidad absoluta el acto ilógicamente motivado, es decir cuando
se obtiene una conclusión que no tiene nada que ver con el argumento que se utiliza.
La omisión de la motivación da origen a la nulidad absoluta, ya que no sólo se trata
de un vicio de forma sino también de un vicio de arbitrariedad.
Derecho contencioso administrativo
http://www.monografias.com/trabajos6/deread/deread.shtml qui jun-19-2008 09:57
A sanção de nulidade para o descumprindo do dever de fundamentar esclarece a
implicação necessária entre a fundamentação e a decisão, de sorte que inexistente a
primeira a outra fica sem função e a declaração, esvaziada de conteúdo, perde a força
mandamental.
* (2) Esta obligación constituye, entonces, uno de los dogmas fundamentales de los
ordenamientos jurídicos contemporáneos. Este dogma se encuentra positivizado en
las constituciones y leyes de distintos países. Así, y para citar tan solo un par de
ejemplos, en la Constitución Española de 1978 se indica, en su artículo 120 inciso 3,
que “las sentencias serán siempre motivadas”. Por su parte, el Código Penal
Alemán, en su artículo 34, exige que el juez suministre las razones que respaldan sus
decisiones. Sin embargo, en pocas normas de la legislación internacional está
contemplado de una forma tan clara el deber de fundamentación como en el artículo
142 del Código Procesal Penal de Costa Rica, que indica literalmente: “Las
sentencias y los autos contendrán una fundamentación clara y precisa. En ella se
expresarán los razonamientos de hecho y de derecho en que se basan las decisiones,
así como la indicación del valor otorgado a los medios de prueba. La simple relación
de las pruebas o la mención de los requerimientos de las partes no reemplazará, en
ningún caso, la fundamentación. Será insuficiente cuando se utilicen formularios,
144
afirmaciones dogmáticas, frases rutinarias, la simple descripción de los hechos o la
sola mención de los elementos de prueba.” Adicionalmente agrega que: “Los autos y
sentencias sin fundamentación serán ineficaces”.
* ¿Qué significa fundamentar una sentencia? - * O del arte de redactar fallos
judiciales sin engañarse a si mismo y a la comunidad jurídica - * M i n o r E. S a l a s UNIVERSIDAD DE COSTA RICA - www.uv.es/CEFD/13/minor.pdf ter jun-10-2008
05:07
A vontade do juiz é presidida pelo livre convencimento motivado, caracterizando
assim que a formação da vontade não pode constituir uma reserva mental, impedindo
que o conteúdo da declaração seja formado por uma vontade não revelada.
O conteúdo da declaração, devendo atender aos requisitos legais de explicitação,
não pode, também, ser avaliado como tendo o pólo vontade na forma não explícita e,
como o pólo vontade é o próprio juízo em si, o dever acaba por consistir em fazer
coincidir expressamente a vontade de declarar com a declaração, formando um único
conteúdo no qual, a partir da leitura do primeiro elemento (vontade de declarar), o
segundo elemento é revelado ao espírito (inteligência) em coincidência com a leitura da
declaração.
As treze sínteses de julgados dos Tribunais acima citadas revelam o prestigio que a
jurisprudência empresta ao princípio da motivação lógica, clara e precisa da
sentença. Destaque-se, no particular, a preocupação em se exigir um nexo lógico
entre a fundamentação e a conclusão. Esse procedimento é considerado, no Direito
Processual Contemporâneo, um aspecto novo e de suma importância no campo da
garantia processual, conforme observação feita por PIETRO NUVOLONE in
Legalidade, Justiça e Defesa Social, in RBCDP, 8/9.
145
A SENTENÇA JUDICIAL E A CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 - JOSÉ
AUGUSTO DELGADO* Juiz do TRF-5ª Região e Professor Universitário
bdjur.stj.gov.br/dspace/bitstream/2011/9400/4/A_Sentença_Judicial_e_a_Constituição_Fed
eral.pdfseg jun-09-2008 06:36
Motiver un acte, motiver une décision, c'est justifier, expliquer..., pour inciter à agir.
Justifier. Définition traditionnelle de la motivation, le magistrat est tenu d'y procéder
dans chacune de ses décisions juridictionnelles. Alors, il décline trois fonctions de la
motivation : lutte contre l'arbitraire, contrôle par la Cour de Cassation et;
constitution d'une doctrine.
Expliquer. Là réside l'ultime fonction de la motivation : permettre la compréhension
de la décision par ses destinataires. Naturelle et basique, cette fonction en est
devenue insignifiante. Pourtant plusieurs
A SENTENÇA JUDICIAL E A CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 - JOSÉ
AUGUSTO DELGADO* Juiz do TRF-5ª Região e Professor Universitário
bdjur.stj.gov.br/dspace/bitstream/2011/9400/4/A_Sentença_Judicial_e_a_Constituição_Fed
eral.pdfseg jun-09-2008 06:36
* Hoy sabemos, y ciertamente desde los trabajos de MAX WEBER (1), que la
diferencia formal entre un sistema jurídico autoritario-represivo y un sistema basado
en la legalidad, reposa esencialmente, en la circunstancia de que en el primero se
recurre a expedientes autocráticos para legitimar los fallos judiciales: la voluntad del
rey, los intereses de la clase dominante, los caprichos del dictador, mientras que en el
segundo se acude a los medios técnicos que ofrece la burocracia judicial. Esta tesis
constituye el núcleo de la “racionalidad de los medios y los fines”(Zweck-MittelRationalität) y de la legitimidad del poder político. Con palabras aún más simples:la
aceptación social y ética (o como diría WEBER la “racionalidad formal”) y, por
146
ende, la legitimidad de una sentencia judicial dependen, en grandísima medida, de
cómo esta sentencia sea fundamentada.(2) De aluí que la posibilidad de motivación
sea un instrumento considerado esencial para la racionalidad de los fallos, pero
también un importante mecanismo para ejercer la crítica sobre la actividad de los
jueces.
*
* (2) Esta obligación constituye, entonces, uno de los dogmas fundamentales de los
ordenamientos jurídicos contemporáneos. Este dogma se encuentra positivizado en
las constituciones y leyes de distintos países. Así, y para citar tan solo un par de
ejemplos, en la Constitución Española de 1978 se indica, en su artículo 120 inciso 3,
que “las sentencias serán siempre motivadas”. Por su parte, el Código Penal
Alemán, en su artículo 34, exige que el juez suministre las razones que respaldan sus
decisiones. Sin embargo, en pocas normas de la legislación internacional está
contemplado de una forma tan clara el deber de fundamentación como en el artículo
142 del Código Procesal Penal de Costa Rica, que indica literalmente: “Las
sentencias y los autos contendrán una fundamentación clara y precisa. En ella se
expresarán los razonamientos de hecho y de derecho en que se basan las decisiones,
así como la indicación del valor otorgado a los medios de prueba. La simple relación
de las pruebas o la mención de los requerimientos de las partes no reemplazará, en
ningún caso, la fundamentación. Será insuficiente cuando se utilicen formularios,
afirmaciones dogmáticas, frases rutinarias, la simple descripción de los hechos o la
sola mención de los elementos de prueba.” Adicionalmente agrega que: “Los autos y
sentencias sin fundamentación serán ineficaces”.
¿Qué significa fundamentar una sentencia? - * O del arte de redactar fallos judiciales sin
engañarse a si mismo y a la comunidad jurídica - * M i n o r E. S a l a s UNIVERSIDAD DE COSTA RICA - www.uv.es/CEFD/13/minor.pdf ter jun-10-2008
147
05:07
11.3
Necessário e Suficiente
Freqüentemente, nas demonstrações das diversas ciências, encontramos dois termos
que estão intimamente associados a esta operação lógica: são eles os conceitos de
condição necessária e condição suficiente. Retraduzindo (1) em novos termos,
podíamos dizer que "Ser ouro é condição suficiente para brilhar" e "brilhar é
condição necessária para ser ouro". Ou seja, para ser ouro, um metal tem pelo menos
que brilhar: é uma condição necessária; por outro lado, basta (é suficiente),
sabermos que um metal é ouro para sabermos também que brilha. Sintetizando, em
termos mais técnicos, o antecedente é condição suficiente do conseqüente, e o
conseqüente é condição necessária do antecedente.
[ O cálculo proposicional: conectivas http://www.madeiraedu.pt/projectos/filosofia/filo.htm ]
Revista a hipótese de que ao declarado culpado não será aplicada pena se sua
medida da culpabilidade for equipotente a zero, seja examinado:
ANTECEDENTE OU CONDIÇÃO
SUFICIENTE
CONSEQUENTE OU CONDIÇÃO
NECESSÁRIA
CONCLUSÃO
Declaração de CULPADO
Aplicação de pena
FALSO
Declaração de CULPADO
Declaração de CULPABILIDADE
VERDADEIRO
Declaração de CULPABILIDADE
Aplicação de pena
VERDADEIRO
148
Demonstrado fica que entre a culpa e a pena está a declaração de culpabilidade,
como consequente da culpa (condição necessária) e antecedente da pena (condição
suficiente).
Tal raciocínio é válido para o dispositivo reformado que referia à intensidade do
dolo, vez que ausente o dolo (equipotente a zero) a pena resultaria nenhuma.
Necessário, no sentido do art. 59, se ajusta também ao conceito de implicação
necessária para reprovação (se A e B então C):
- existe culpa, existe culpabilidade, então pena;
Tomando que a culpabilidade deverá ser medida, o suficiente para a reprovação
se torna a própria medida da culpabilidade, ou função da culpabilidade, A = f(B):
- existe culpabilidade em tal medida, então pena na mesma medida.
Revista a hipótese de que quando as demais circunstâncias judiciais não são
influentes a pena será determinada exclusivamente pela culpabilidade, pode ser visto que
a culpabilidade é reprovação mesmo, como anunciado na doutrina.
A reprovação é feita pelo que o indivíduo pratica (censura da conduta) ficando
sem sentido que receba pena pela presunção (prevenção) de repetição.
Inalterada, esta parte (conforme seja necessário para a reprovação e prevenção)
nasceu no tempo em que a periculosidade era trazida à conta da pena e suportava a
presunção.
A reforma consagrou que a periculosidade, ainda que reconhecida como um
"estado da pessoa" está limitada pelo "princípio da inocência (não culpabilidade)", de
sorte que só se manifesta nos culpados e nem pode ser aferida nos não-culpados, e isto
afasta que a pena possa ter caráter inibidor de conduta futura apenas possível, mas não
149
provável.
Visto que a culpabilidade não se ajusta à prevenção, os conectivos "e" (necessário
e suficiente para reprovação e prevenção) exigem que a leitura do dispositivo seja feita
de modo a preservar a intenção original, o que não ocorreria se o primeiro par
(necessário e suficiente) fosse separado. Logo, a leitura acorde com a interpretação até
aqui dada seria:
(a) necessário e suficiente para reprovação;
(b) necessário e suficiente para prevenção.
Assentado que não cabe pena para a prevenção, a forma de manter a integridade
do texto é atribuir à prevenção um caráter flexionador da pena, mas como tal caráter não
pode ser aferido como culpabilidade - e nem a culpabilidade pode incorporar as demais
circunstâncias, sobra que a função flexionadora deve ser operada a partir das demais
circunstâncias.
11.4
A Natureza da Verdade
A eficácia formal e material do dispositivo condenatório exige que ele se
apresente como uma verdade que, vista por diferentes atores processuais, apresenta faces
diferentes.
Do ponto de vista processual apresenta a face da verdade lógico-formal, pois
deve obediência a enunciados pré-estabelecidos pela lei e pela doutrina quanto à forma e
conteúdo.
Do ponto de vista do juiz apresenta a face da verdade moral pois deve apresentar
correspondência entre a declaração e a vontade de declarar.
150
Do ponto de vista do condenado apresenta a face da verdade objetiva: o que está
escrito é suficientemente claro para revelar o conteúdo.
Ao proferir o dispositivo o sentenciante já deve ter vencido o estado de dúvida e
estar operando no campo da certeza objetiva consistente em lidar com dados que se
impõe à inteligência de todos porque existem nos autos.
Por se tratar de um processo de individualização, a evidência deve ser o critério
norteador de que os predicados convém ao sujeito condenado e que a conclusão é uma
necessidade lógica.
Ao condenado a verdade pode se revelar pelo sentido comum do justo e do
razoável, mas sua legitimidade deverá estar suportada por um amplo consenso das partes
de que no caso, no tempo e nas circunstâncias outra conduta não podia ser exigida, qual
seja, muitos poderão dizer que a declaração é, no mínimo, coerente com o estado das
coisas e do sujeito.
O caráter normativo do dispositivo condenatório impõe uma estrutura lógica cuja
validação será tão mais precisa quanto por mais lógicas puder ser aferida sem perder a
validade. Assim é que, se apresentando como lógica jurídica conclusiva, o
desenvolvimento poderá ser aferido pela redução da linguagem e submissão a outras
lógicas, e é isto que traça os contornos do discurso do magistrado: precisão na
informação e clareza na comunicação.
Toda a lógica do discurso jurídico é bem representada na decisão prudencial e
justificada do magistrado, um ato extremamente complexo que se interpõe entre a
ordem jurídica e a factualidade em julgamento. A decisão motivada do magistrado é
peça típica modelar de toda a lógica presente no discurso jurídico. Seu objeto são
atos humanos concretos e individualizados, culturalmente situados, determinados
151
historicamente no tempo e no espaço. A Lógica Jurídica é lógica do concreto.
Adquire o sentido existencial (espaço, tempo, valores axiológicos situados), próprio
de um julgamento que não acontece num universo abstrato de leis universais
necessárias, a serem aplicadas dedutivamente por rigorosas inferências formais. A
decisão do magistrado tem como palco o mundo real, onde se julgam condutas
humanas concretas e específicas.
Lógica Jurídica - A construção do discurso jurídico - Antonio Cappi e Carlo Cristiano
Baiocchi Cappi - Ed. UCG - 2004 - pg 441
Para atender ao sentido comum e ao consenso universal ao mesmo tempo será
preciso considerar que o processo penal tem como partes atores especializados diretos
(magistrados, promotores, Advogados), atores especializados indiretos (juristas e
doutrinadores), atores diretos não especializados (participantes do crime) e um público
(sociedade).
O consenso entre os atores especializados não basta como razão para convalidar o
dispositivo, é necessário que o dispositivo alcance mais, atingindo também o consenso
dos atores especializados indiretos, o consenso do sentido comum do condenado e o
consenso público, qual seja, quanto mais universalizado o consenso maior a validade da
declaração.
O sentido comum do condenado o orientará quanto ao justo, ao razoável e à
recorribilidade, tanto quanto isto se ajusta a ser o paciente da condenação. No entanto, o
sentido comum da sociedade se orienta, no geral, pela pouca ou nenhuma reflexão da
qual deriva a chamada "opinião pública", fruto das pressões próprias de um universo que
convive com os riscos e suporta os danos.
A tendência de dar algum tipo de satisfação à opinião pública tem se mostrado
152
através de interpretações judiciais cada vez mais alargadas para ferir o estado de
liberdade, como o entendimento de que o clamor público que não alcançou o nível de
perigo abstrato para a ordem pública ser razão para a decretação de prisões, expressão
típica da ausência de motivação válida, usado como supedâneo para a satisfação da
opinião pública e criando - é possível - para os tribunais superiores a exposição ao
conflito com a sociedade em busca de satisfação imediata quando corrigem o desvio.
12
EXPOSIÇÃO DO CASO
Dispositivo condenatório (art. 59, CP) no qual a análise dos elementos da
culpabilidade é vista como ausente ou insuficiente, com declaração do grau de censura
(medida da culpabilidade) que deixa sem razoável indicação que a conduta do
condenado seja merecedora da pena fixada, ou estabelece confusão sancionatória entre a
culpabilidade e as demais circunstâncias
Está sendo considerado que esta hipótese de dispositivo fragiliza a segurança
jurídica e afeta a extensão da recorribilidade.
La motivation est l'une des plus importantes obligations faites au juge pour démontrer
son impartialité. Elle l'oblige à donner la preuve, par la retranscription des
arguments échangés, qu'il a été à l'écoute des parties et qu'il n'a pas occulté une
partie du débat susceptible de déranger son a priori. La motivation contraint le juge à
se justifier, ce qui évite qu'il donne libre cours à ses préjugés. Elle oblige à
l'impartialité. Les parties au procès, mais aussi les tiers, peuvent s'assurer de la
pertinence de la décision au regard des arguments échangés. [Conférence de M. Jean
GERONIMI lors de la session de formation "la place de la justice dans les sociétés
démocratiques" ( 2 - 5 Novembre 1999 ) - Escola Nacional da Magistratura - França
153
- Intervention du 4 novembre 1999 à l'Ecole Nationale de la Magistrature
http://www.enm.justice.fr/centre_de_ressources/centre_de_ressources.
htmhttp://www.enm.justice.fr/centre_de_ressources/centre_de_ressources.htm]
A natureza declaratória da sentença penal não comporta conclusões cuja
fundamentação permaneça na mente do julgador e não chegue ao conhecimento do
condenando através de declaração fundamentada de forma clara, precisa e inteligível
para o condenado, conforme o dever estabelecido na Constituição.
Art. 93 - Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre
o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios:
IX - todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e
fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei, se o interesse
público o exigir, limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus
advogados, ou somente a estes;
A hipótese de fundamentação ausente ou insuficiente consagra que o
indissociável binômio poder-dever estaria sendo resolvido apenas no seu primeiro
termo: o poder, produzindo a fragilização do sentimento de segurança jurídica.
“Em uma sociedad moderna, la gente exige no solo decisiones dotadas de autoridad
sino que pide razones. Esto vale también para la administración de la justicia. La
responsabilidad del juez se há convertido cada vez más em la responsabilidad de
justificar sus decisiones. La base para el uso del poder por parte del juez reside em la
aceptibilidad de sus decisiones y no em la posición formal de poder que pueda tener.
Em esto sentido, la responsabilidad de oferecer justificación es, especificamente, uma
responsabilidad de maximizar el control público de la decisión. Por outra parte, es
especificamente a trabés de la justificación como el decisor crea la credibilidad em la
154
que descansa la confiança que los ciudadanos tienem em el (Aarnio, 1991, p. 29).
Citado em LÓGICA JURÍDICA – A construção do discurso jurídico – Antonio Cappi e
Carlo Crispim Baiocchi Cappi – Editora UCG, 2004 – p. 442
O dispositivo que apenas faz referência doutrinária à culpabilidade ou apenas faz
arrolamento dos elementos constitutivos valendo-se de expressões vagas, mesmo que
faça remissão a elementos constantes dos autos ou da própria sentença, exige do leitor
(público alvo) um processo de re-conhecimento e re-juízo, operações mentais que
comprovam ser a declaração insuficiente para revelar à inteligência os fundamentos da
conclusão através da simples leitura.
A insuficiência ou deficiência não pode ser tomada por declaração sucinta se falta
no redação o conteúdo individualizador e o grau de censura (medida da culpabilidade)
que assegurem ser a pena adequada ao condenado e seu fato julgado.
Esta obligación de motivación no puede considerarse cumplida con la mera emisión
de una declaración de voluntad de la autoridad, accediendo o no a lo pedido por el
gobernado en un proceso o procedimiento, o cuando tal declaración contiene
contradicciones internas o errores lógicos, sino que el deber de motivación que la
Constitución exige, impone la exteriorización lógica de los razonamientos que
cimienten la decisión de los funcionarios; exteriorización que debe ser congruente
con lo resuelto.
De lo expuesto puede concluirse, de un modo general, que existiría de parte de un
juzgador violación constitucional a la seguridad jurídica –por la falta de exposición
de las razones de una decisión–cuando ante una resolución jurisdiccional los
intervinientes en el proceso o procedimiento de que se trate no pueden conocer
razonablemente el por qué de las mismas y controlar la actividad de los funcionarios
155
a través de los medios impugnativos.
Sala de lo Constitucional de la Corte Suprema de Justicia: San Salvador, a las once horas y
dos minutos del día seis de octubre de dos mil cuatro.
http://www.jurisprudencia.gob.sv/exploiis/indice.asp?
nBD=1&nItem=32047&nModo=1http://www.jurisprudencia.gob.sv/exploiis/indice.asp?
nBD=1&nItem=32047&nModo=1 - seg jun-09-2008 06:20
Reinaldo Rodrigues de Oliveira Filho, anota que:
O dever constitucional de fundamentação das decisões judiciais, muito mais do que
simples garantia conferida às partes, representa efetivo pilar de sustentação do
Estado Democrático de Direito.
A súmula de efeito vinculante e sua inclusão no ordenamento jurídico. Revista Jurídica do
Ministério Público de Mato Grosso – Ano 2, N. 2 – 2007 – pág. 166
E cita:
O dever de fundamentar as decisões judiciais, ao mesmo tempo em que é um
consectário de um Estado Democrático de Direito, é também uma garantia. Quando
o jurisdicionado suspeitar que o magistrado decidiu contra a lei, desrespeitanto
direitos fundamentais ou extrapolando suas funções institucionais, deverá buscar na
fundamentação desta decisão subsídios para aferir a qualidade da atividade
jurisdicional prestada. E a inserção desta garantia no texto da Constituição é da
maior relevância (...). A garantia que tem o cidadão de conhecer as razões que
convenceram o magistrado a julgar desta ou daquela forma é tão absoluta que,
segundo entendemos, nem mesmo uma emenda, reforma ou revisão constitucional
pode retirá-la de nosso sistema. O dever de fundamentar as decisões judiciais, por
fazer parte integrante de um princípio estruturante da Constituição (do Estado
Democrático de Direito), não pode deste ser retirado, ou ter sua significação
156
restringida, sob pena de desvirtuamento da identidade e estrutura do próprio Estado.
Nojiri, Sérgio. O dever de fundamentar as decisões judiciais. São Paulo: RT 1998. p.69.
12.1
Breve Histórico dos Vícios
Exemplos de dispositivos submetidos à arguição de nulidade junto ao Tribunal de
Justiça de Goiás:
APELAÇÃO CRIMINAL 200801483462 “Vejo a culpabilidade de forma censurável,
isso em vista de ser o acusado imputável, sabedor do crime que estava cometendo,
tendo agido de forma premeditada, em conjunto com seu próprio irmão, agravado
pelo fato de o acusado estar à época dos fatos nomeado como agente de polícia,
devendo proteger toda a sociedade, mas de forma diversa aproveitou-se de sua
função para o cometimento de crimes, que deveria por obrigação de ofício evitar e
investigar tais ações criminosas. O mesmo poderia ter outro comportamento, haja
vista ser pessoa jovem que deveria continuar ganhando seu sustento na atividade
lícita que até então estava incumbido, mas diversamente adentrou no mundo do crime
para obter vantagens com a propriedade alheia.”
APELAÇÃO CRIMINAL 200800891443 - “Culpabilidade demonstrada. É
plenamente imputável, mentalmente são, contava com 23 anos de idade à época do
fato, conhecedor da ilicitude de sua conduta, sendo de conhecimento geral o dever de
respeito à propriedade alheia, sendo-lhe totalmente exigida conduta diversa. Ação
impregnada de vontade livre e consciente, evidente se apresenta o dolo na sua
conduta criminosa”.
APELAÇÃO CRIMINAL 200801989196 - “Culpabilidade: a culpabilidade está
evidenciada nos autos, tendo o acusado agido de forma livre e consciente. Tinha ele
plena consciência do caráter ilícito de seu comportamento. O acusado possui um
157
grau de escolaridade acima da média daqueles que normalmente delinqüem (segundo
grau completo, fl. 185), sendo-lhe exigível um distanciamento ainda maior do mundo
do crime. Destarte, merece sua conduta ser veementemente censurada”.
APELAÇÃO CRIMINAL 200801261710 - - “Considerando a culpabilidade do
agente, que merece intenso grau de reprovação, posto que é imputável, agiu com
vontade própria, tendo plena ciência da ilicitude de seu ato, sendo-lhe exigível
conduta totalmente diversa”.
APELAÇÃO CRIMINAL 200801257349 - “Considerando: sua culpabilidade
acentuada, pois sendo pessoa imputável tinha plena consciência da ilicitude do fato,
sendo que podia e devia agir de acordo com a norma, porém, optou por violá-la
desrespeitando o patrimônio alheio”.
APELAÇÃO CRIMINAL 200801340866 - “Alta é a culpabilidade, vez que praticou o
fato com a vontade livre e consciente, mesmo que, de princípio, não buscasse a morte
da vítima, buscou o roubo, correndo todos os riscos a ocorrência daquele resultado.
Dele esperar-se-ia conduta diversa, até porque sendo rapaz de pouca idade, com
apenas dezenove anos de idade, deveria obter bens materiais através do próprio
trabalho. Aumenta, ainda, a culpabilidade, o fato de ter sido a pessoa que desferiu
diretamente o disparo letal”.
Caracterização dos vícios:
1. descrição
doutrinária
das
elementares
da
culpabilidade
desacompanhadas das atribuições individualizadoras, o que corresponde
a simples descrição do conteúdo necessário do elemento continente;
v.g.: é imputável, tinha consciência do ilícito da conduta e lhe era
exigido conduta diversa;
158
2. descrição adjetivada ou adverbiada da culpabilidade, desacompanhada
das atribuições de conduta que justifiquem a atribuição; v.g.:
culpabilidade demonstrada; patente, acentuada, evidente etc.
3. ausência de medida inteligível (art. 25 do CP) da culpabilidade; v.g.:
culpabilidade alta, elevada, em alto grau etc.
4. descrição do fato-penal; v.g.: culpabilidade demonstrada pela
vontade de subtrair coisa alheia etc.
5. introdução do dolo como fundamento da culpabilidade; v.g.:
culpabilidade determinada pelo dolo;
6. exortações morais; v.g.: deveria obter bens materiais a partir do
próprio trabalho;
7. repetição (copy/paste) do dispositivo para vários crimes do mesmo réu
ou para vários réus na mesma ação penal;
8. estereotipação (carimbo) do dispositivo e uso em sentenças diversas
para casos diversos.
Não há intenção de impor um estilo de composição de texto ao dispositivo, mas
tão somente exigir harmonia, clareza e precisão, atributos que conferem inteligibilidade
ao teor do escrito, não exigindo operações mentais complementares.
As ocorrências comprometem a individualização da pena no sentido de não ser
possível verificar na fundamentação do dispositivo condenatório a existência dos
predicados do indivíduo ou de proporcionalidade entre o grau de censura (medida da
culpabilidade) e a pena base fixada.
A diversidade de dispositivos inibe sejam todos arrolados, mas é possível trazer
159
outros casos que comprometem a execução por fraudarem a individualização:
1. emprego de dispositivo estereotipado (carimbo) que é repetido a cada nova
sentença condenatória, indicando que a existência de um “juízo típico” de
culpabilidade;
2. repetição do estereótipo (carimbo) para vários autores em concurso no
mesmo crime, indicando o uso das funções copiar/colar (ou Ctrl + C / Ctrl
+ V) do computador;
3. repetição do estereótipo (carimbo) para crimes em concurso na mesma
sentença e mesmo autor, indicando o uso das funções copiar/colar (ou Ctrl
+ C / Ctrl + V) do computador;
4. disfarce do esterótipo (carimbo) com o uso de sinônimos (agiu < > atuou,
alta < > elevada).
Olsen A. Ghirardi anota, com propriedade:
“La prohibición de motivar las sentencias es, pues, una expresión típica de un
sistema autoritario.”
O caso limite de ausência de fundamentação, ou o caso mais abrangente, permite
inferir, validamente, que também abrange a hipótese: la aceitación de las sentencias sin
motivación es, pues, uma expressión típica de un sistema autoritário (redação nossa).
Al procederse al anatema de la fundamentación expresa, el juez sólo da a conocer la
parte decisoria y guarda in pectore la motivación. Las partes, por consiguiente, no
pueden conocer las razones que le han llevado a ella; se hace imposible descubrir los
eventuales errores; impide contrarrestar toda arbitrariedad y dificulta la labor de la
apelación. La prohibición de motivar las sentencias es, pues, una expresión típica de
160
un sistema autoritario.
Academia Nacional de Derecho y Ciencias Sociales de Córdoba (República Argentina)
1 - PATOLOGIAS LOGICO-FORMALES DE LA SENTENCIA (LA LOGICA Y LA
FUNDAMENTACION DE LAS SENTENCIAS JUDICIALES.) por Olsen A. Ghirardi
http://www.acaderc.org.ar/doctrina/articulos/aartpatologiaslogicoformales/?
searchterm=PATOLOGIAS%20LOGICOFORMALEShttp://www.acaderc.org.ar/doctrina/articulos/aartpatologiaslogicoformales/?
searchterm=PATOLOGIAS LOGICO-FORMALES
acessado 14/07/08 10:00:02
12.2
Dispositivo arbitrário
Está sendo considerado como arbitrário, por ausência de causa legal, o
dispositivo condenatório de cujos fundamentos não decorre a comunicação (transmissão
da informação) de que a culpabilidade existe e que sua medida ou grau justifica a pena
aplicada.
A par da nulidade como sanção das decisões judiciais não fundamentadas (art. 93,
IX, CF), a arbitrariedade advém de que o interesse da acusação em ver o réu condenado
só se materializa através da culpabilidade, qual seja: a declaração sobre a culpabilidade é
o fundamento determinante da pena.
Como defensor da ordem jurídica e do regime democrático (art. 127 da CF), o
órgão acusador é titular de interesses sucessivos caracterizados por fases do
procedimento, cuja realização - formal e substancial - tem o nome de DEVIDO
PROCESSO LEGAL.
O dispositivo da sentença (art. 59 do CPP) deve atender aos aspectos de
161
existência autônoma, dizendo todo o necessário sem que para entendimento deva haver
recorrência a outras partes da sentença ou dos autos. Assim, conquanto o dispositivo
possa ser justificado por leitura de partes da sentença ou dos autos, tal operação é um
novo juízo ou, no mínimo, um juízo de integração de elementos para compreensão,
mormente que a construção do dispositivo é uma operação de individualização a ser feita
neste único momento, independentemente de que os fatos individualizadores estejam
registrados em outras partes, visto que o condenado é intimado da sentença - e não do
conteúdo dos autos - devendo, pela fundamentação, como réu condenado, examinar a
recorribilidade com seus próprios recursos de inteligência.
Um dispositivo carente de fundamentação inteligível para o réu traz a
gravosidade excessiva de que sua opção recursal seja por misericórdia, ou que dependa
de o seu defensor operar como verdadeiro recompositor, tradutor ou intérprete da
decisão. Isto é um obstáculo à recorribilidade e, como tal, afeta a segurança jurídica.
2. Siempre relacionado con el derecho constitucional a la seguridad jurídica,
corresponde aclarar que dicha categoría jurídica impone a cualquier autoridad –
para el caso en estudio, al Tribunal Supremo Electoral– la obligación de motivar y
fundar sus resoluciones. Y es que, la obligación de motivación y fundamentación no
es un mero formalismo procesal o procedimental, sino que se apoya –como se señaló
en el Amparo 477-2001– en el principio de legalidad, y sobre todo, facilita a los
gobernados los datos, explicaciones y razonamientos necesarios para que éstos
puedan conocer el por qué de las mismas; posibilitando, en todo caso, una adecuada
defensa.
Precisamente, por el objeto que persigue la motivación y fundamentación, cual es la
explicación de las razones que mueven objetivamente a la autoridad a resolver en
determinado sentido, posibilitando el convencimiento de los gobernados de las
162
razones de las mismas, es que su observancia reviste especial importancia. En virtud
de ello, y como bien se dejó plasmado en el Amparo 765-2002, el incumplimiento de
la obligación de motivar adquiere connotación constitucional, por cuanto su
inobservancia incide negativamente en la seguridad jurídica en un proceso o
procedimiento, en el sentido que al no exponerse la argumentación que fundamente
los proveídos de la autoridad, no pueden los gobernados observar el sometimiento de
los funcionarios a la Constitución y a la ley, ni permite el ejercicio de los medios de
defensa.
Esta obligación de motivación no puede considerarse cumplida con la mera emisión
de una declaración de voluntad de la autoridad, accediendo o no a lo pedido por el
gobernado en un proceso o procedimiento, sino que el deber de motivación que la
Constitución exige, impone la exteriorización de los razonamientos que cimienten la
decisión de los funcionarios.
313-2004 - Sala de lo Constitucional de la Corte Suprema de Justicia: San Salvador, a las
diez horas y doce minutos del día diecisiete de diciembre de dos mil cuatro.http://www.jurisprudencia.gob.sv/exploiis/indice.asp?
nBD=1&nDoc=32047&nItem=35326&nModo=3&nBusquedaInd=25&nBusquedaTot=29
&strBusqueda=elemento%20preventivo%20de%20la
%20arbitrariedadhttp://www.jurisprudencia.gob.sv/exploiis/indice.asp?
nBD=1&nDoc=32047&nItem=35326&nModo=3&nBusquedaInd=25&nBusquedaTot=29
&strBusqueda=elemento preventivo de la arbitrariedad
Como pone de manifiesto la STC de 17 de marzo de 1976, “lo desarrolla en estos
términos: la motivación de las sentencias como exigencia constitucional (art. 120.3
de la Constitución Española) que se integra sin violencia conceptual alguna en el
derecho a una efectiva tutela judicial, ofrece una doble función. Por una parte, da a
conocer las reflexiones que conducen al fallo, como factor de racionalidad en el
163
ejercicio del poder y a la vez facilita su control mediante los recursos que proceden
(uno de ellos, éste de amparo). Actúa, en suma, para favorecer un más completo
derecho de la defensa en juicio y como un elemento preventivo de la arbitrariedad”.
Revista Internauta de Práctica Jurídica. Núm. 17 Enero-Junio 2006
LA MOTIVACIÓN DE LA SENTENCIA COMO MOTIVO D ERECURSO
EXTRAORDINARIO POR INFRACCIÓN PROCESAL1-Por Joaquín Ivars Ruiz.
Abogado.
http://www.jirabogados.com/art/art/recurso_extrordinario_rinfraccion_procesal1.ppdfhttp:/
/www.jirabogados.com/art/art/recurso_extrordinario_rinfraccion_procesal1.ppdf
12.3
Anulação arbitrária do dispositivo
Afastado que o dispositivo condenatório possa ser retificado ou completado na
Instância Superior por constituir isto flagrante usurpação de instância, sobra que, nos
casos examinados no Tribunal de Justiça de Goiás, tem ocorrido a declaração "ex
officio" da nulidade com devolução à instância originária para correção. Tal anulação é
uma violação do devido processo legal no tocante a criar um esdrúxulo privilégio de o
Estado-jurisdicional poder refazer o quê tinha o dever de ter feito corretamente, numa
espécie de sucumbência a si mesmo.
A anulação ex officio, que abre a sentença para correção, demonstra a existência
de um dispositivo sem eficácia executória, e ocorre em prestação jurisdicional
formalmente completa, diferentemente da devolução ex officio aplicável quando
elemento necessário da sentença nela não consta, e ocorre em prestação jurisdicional
formalmente incompleta.
Completar a prestação jurisdicional é ato de poder-dever.
164
Rescindir para consertar é ato arbitrário de simples poder.
São casos anotados de anulação arbitrária com devolução à instância originária:
1. Recurso exclusivo da defesa - que a defesa é carecedora de interesse em
firmar a eficácia da condenação sem causa legal, é comportável tão
somente a declaração de ineficácia e o trancamento da execução da pena,
não podendo o ministério público do segundo grau, como parte em
unidade, requerer para, por devolução, firmar a eficácia na instância
originária, sem que o ministério público do primeiro grau, como parte em
unidade, tenha embargado de declaração por omissão o dispositivo.
2. Recurso exclusivo da acusação - única interessada em firmar a eficácia da
condenação, a intimação da sentença é o momento para manifestação deste
interesse através de embargos de declaração, única hipótese que permite a
prorrogação do interesse de agir para a sede recursal, e legitima que o
ministério público do segundo grau, como parte em unidade, sustente
anulação e devolução.
A hipótese de declaração da nulidade do dispositivo e devolução à origem para
refazimento, sem pedido recursal expresso da acusação sucumbente em embargos de
declaração, configura abuso do poder jurisdicional, à vista de que é o próprio Estadojurisdicional que estabelece as normas procedimentais que abrigarão no conteúdo
material a sua eficácia, não lhe cabendo, portanto, descumpri-las com perda da
segurança judicial sem sanção de ineficácia, vedado que o procurador oficiante na
segunda instância, como parte em unidade, o requeira, dada a ocorrência da preclusão na
instância anterior, e vedado também que o requeira na qualidade de defensor da ordem
jurídica (fiscal da lei) dado que no exercício do poder o regime democrático prevalece
165
em face do devido processo legal negado por seus operadores, qual seja, rescindir ex
officio em causa própria para correção é ato arbitrário.
Daí por que acudir imediatamente as palavras com que MONTESQUIEU inaugurou
o Livro 29, de seu Espírito das Leis: "As formalidades da justiça são necessárias à
liberdade". Esse o real sentido e finalidade da forma, que não pode e não deve ser
deturpado, sob pena de erigirmos a forma como valor único em si mesmo. Por esse
motivo, o juiz de direito ao lidar com a matéria-prima no exercício de sua função, ou
seja, com conflitos de interesse gerais e universais, deve validar e aprofundar a sua
efetiva participação com o caso real posto ao seu desate, para que, uma vez abstraída
a legítima hierarquia de interesses tutelados pelos textos de um código de processo,
seja preservado o sentido fundamental e vital de todo o sistema que o anima. "Neste
sentido, tratando-se de um Código de Processo, o interesse público superior, que o
inspira e justifica, é que se preste ele a meio eficaz para definição e realização
concreta do direito material. Não há outro interesse público mais alto, para o
processo, de que o de cumprir sua destinação de veículo, de instrumento de
integração da ordem jurídica mediante a concretização imperativa do direito
material" (49).
A teoria das nulidades e o sobre direito processual - Danilo Alejandro Mognoni Costalunga
- especialista e mestrando em Direito Processual Civil, membro efetivo do Instituto
Brasileiro de Direito Processual
- http://www1.jjus.com.br/doutrina/lista.asp?assunto=264
A única hipótese, repita-se, de anulação do dispositivo condenatório e devolução
à origem para que outro seja passado na conformidade do devido processo legal ocorre
no recurso da acusação que interpondo embargos declaratórios por omissão no
dispositivo.
166
Como garante do devido processo legal na segunda instância, e preclusa a
arguição, não pode o procurador oficiante invocar sua qualidade de parte para arguir a
nulidade e requerer a devolução para que seja passado dispositivo conforme ao devido
processo legal, vez que a preclusão atinge a parte ministerial enquanto unidade,
restando, em nome do mesmo devido processo legal, atendendo aos fins da eficácia
material, ou substancial, argüir que o dispositivo condenatório carece de eficácia
executória por ausência de motivação, ou fundamentação, restando-lhe requerer, como
defensor da ordem jurídica e do regime democrático a declaração de ineficácia do
dispositivo, sugerindo Habeas Corpus ex officio em preliminar ou pleiteando o remédio
heróico em separado, para alcançar o trancamento da execução da pena..
É preciso trazer à conta a diferença fundamental entre dispositivo inexistente que
é aquele que não tem existência material ou cujo conteúdo é um completo abandono da
finalidade do processo, e dispositivo ineficaz que preenche a forma exigida mas cujo
conteúdo não tem força legal para produzir efeitos.
O dispositivo inexistente seria aquele não escrito ou cujo conteúdo passasse ao
largo do exame da culpabilidade e das demais circunstâncias.
O dispositivo ineficaz é o que contempla o exame da culpabilidade e das demais
circunstâncias sem oferecer razões de atribuição individualizadoras suficientes para
determinar a pena; o que apenas arrola o conteúdo especificado pelas propriedades do
continente; ou que se vale de expressões universais a qualquer condenado servíveis.
Qualquer que seja a situação a ser enfrentada, o Juiz tem a missão de
fundamentar os motivos que determinaram a conclusão apontada, por isso se constituir
em direito e prerrogativa dos jurisdicionados.
167
Por essa razão CALMON DE PASSOS, in Da Argüição de Relevância no Recurso
Extraordinário, RF, 259:20, 1977, adverte que o princípio da obrigatoriedade da
motivação das decisões é de ser considerado, em nosso sistema legal, regra genérica,
sem comportar exceção, em feitos de qualquer natureza, como corolário de princípio
inerente à garantia constitucionalmente assegurada, do devido processo legal.
A SENTENÇA JUDICIAL E A CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 - JOSÉ
AUGUSTO DELGADO* - Juiz do TRF-5ª Região e Professor Universitário
bdjur.stj.gov.br/dspace/handle/2011/9400 - ter jun-17-2008 16:21
NOTA IMPORTANTE: o autor, em suas manifestações processuais ao Tribunal de
Justiça de Goiás feitas até julho de 2008 pediu e aceitou o refazimento do
dispositivo condenatório por razões táticas. No entanto, a partir de agosto de 2008
o Gabinete da 23ª Procuradoria de Justiça de Goiás adotará posição fechada em
relação à nulidade absoluta e impetrará Habeas Corpus.
13
RECURSO EXCLUSIVO DA DEFESA
Impossibilidade de anulação ex officio, “in pejus”.
“O trânsito em julgado para a acusação revela conformidade com o teor da
decisão. O descuidado, a desatenção, a pressa ou o equívoco em relação ao devido
processo legal não podem ter força para quebrar o trânsito em julgado. Admiti-lo,
seria atribuir ao órgão ministerial não ter compromisso formal com o processo e
substancial com o direito, e estar a merecer, sempre que falhar quanto ao seu fim, a
oportunidade satisfazer-se às custas da defesa.”
É corrente nos tribunais superiores a anulação de ofício de sentença penal
condenatória cujo vício a torna imprestável para a execução.
168
Uma das hipóteses de anulação é a ausência ou a grave deficiência no exame das
elementares da culpabilidade e na declaração do grau ou medida que funcionará como
determinante da pena base.
Em outra sede a discussão sobre o exame das elementares e a declaração da
medida da culpabilidade, vez que não é estranho aos tribunais o reconhecimento da
nulidade e da consequente imprestabilidade executória da sentença.
O argumento central posto pelos sobre-juizes é o de que a nulidade representa
que o processo não alcançou o seu fim, porque o ato do juiz, em o terminando, não
encontra possibilidade legítima de recepção no ordenamento jurídico. Assim, em nome
da ordem pública, e de ofício, é declarada a nulidade da sentença para que outra seja
proferida na conformidade do devido processo legal.
Acontece que a declaração de nulidade é passada em recurso exclusivo da defesa,
reitere-se, ocorrido o trânsito em julgado para a acusação.
Não é reconhecido à defesa poder recorrer em prejuízo próprio, ainda que exerça
o direito amparada pelo mesmo descuidado, desatenção, pressa ou equívoco em relação
ao devido processo legal, que presidiu a inércia ou omissão da acusação.
Demasiado explicar que a vedação para a defesa decorre de sua falta de interesse,
dado que o sucumbente é a acusação, mas em dando atenção que este é o aspecto
imediato, evidente, que enseja o não conhecimento, não é difícil encontrar que o recurso
da defesa não lhe pode causar prejuízo, em qualquer hipótese.
Examine-se que não estando o objeto do recurso no continente da vedação que
lhe nega o conhecimento, e sendo tempestivo, o recurso será conhecido.
E, conhecido, se inclui um objeto estranho ao pedido.
169
O objeto estranho - a nulidade que torna a sentença imprestável para a execução pertence ao domínio da acusação, para a qual já ocorreu o trânsito em julgado. No
entanto, ao ser tal objeto incluído, o que se está é reconhecendo, em nome da ordem
pública, que o próprio tribunal dispõe de um recurso de ofício a ser exercitado
independente de provocação, ou seja, à simples vista da nulidade.
Demais que o tribunal disponha de tal recurso, e muito demais que tal poder
confira suspensividade ao trânsito em julgado para a acusação até que seja apreciado o
recurso da defesa.
Reconheço que é de ordem pública que o processo atinja seu fim mas,
considerando que nessa ordem pública estão incluídas as garantias constitucionais
processuais e substanciais que regem explicitamente o devido processo legal, dentre
elas, na espécie, a fundamentação das decisões, não há como entender que os gestores do
fim processual fraudem o seu dever de garantir fundamentando, e esses mesmos gestores
reconhecendo que não cumpriram com o dever pretendam um arrependimento eficaz às
custas, exatamente, do trânsito em julgado para a acusação que funciona como
impeditivo para a reforma em desfavor do condenado.
As decisões que coleciono contém um raciocínio enganoso: baixam os tribunais
que sentença nula é o equiparado da sentença inexistente.
Acontece que a sentença nula é tão existente que sobre ela recai a leitura para que
a nulidade seja conhecida.
A sentença nula tem existência formal, vez que o prolator lhe deu essa face ao
começar pelos vistos etc. e a concluir com um decido e pena.
A sentença nula tem existência material, vez que se assenta sobre um papel que
170
lhe confere documentabilidade.
A sentença inexistente no processo será, e somente será, aquela que não foi
prolatada, ou a peça que nem por arremedo possa receber tal denominação.
Assim, a sentença inexistente será tão inexistente no processo quanto um
automóvel ou navio, o que me autoriza a dizer que a sentença inexistente e equiparável a
um automóvel ou um navio inexistentes.
Qual seja, os tribunais vêm reiterando que a sentença nula é equiparada a
qualquer coisa que não existe, ou seja, não existe, mas não ficam carmim quando
declaram a nulidade do existente.
Razões devem ter os tribunais, mas deviam ter respeito por aqueles que sabem
que não existe a pretendida equiparação, o que existe é uma natural impotência: o que
não existe e o nulo não podem produzir resultados. Do lado do inexistente é óbvio, mas
do lado do nulo é a ordem jurídica que dita a improdutividade.
Simples dizer que a reforma para pior consiste apenas no aumento da pena ou na
agravação do regime, e que a prolação de outra sentença em lugar da que é nula, desde
que não agrave os pontos destacados não fere direito algum.
Creio não existir algo pior do que a execução de uma sentença condenatória cujos
comandos não atendem à exigibilidade.
Assim, será “in pejus” a reforma que, oportunizada pelo recurso da defesa, crie
situação de execução originalmente impossibilitada, e será violência judicial que a
situação seja criada com a quebra do trânsito em julgado para a acusação inerte ou
omissa.
Em nome da ordem pública, mas sem nunca delimitar o alcance, acaba sendo
171
promovida uma lavagem da sentença, de modo a tornar legal o ilegal.
Nos pareceres que remeto, desafio o tribunal local a anular de ofício na hipótese
inversa, qual seja a de a defesa por descuidado, desatenção, pressa ou equívoco em
relação ao devido processo legal, não ter recorrido sobre ponto em que evidentemente
sucumbiu, e o recurso, então estofado com o objeto estranho, seja provido, ex officio,
para que a defesa recorra sobre ponto que o próprio tribunal especificará ao declarar a
nulidade por ausência da ampla defesa.
Não me passa a dúvida de que o tratamento que vem sendo dispensado não é
igualitário, ou seja, o reconhecimento da inexistência de um mínimo aceitável enseja a
nulidade em prol da acusação, ao mesmo tempo em que a simples presença de Advogado
subscrevendo poucas e inúteis linhas é tomada como defesa suficiente.
Para a acusação tudo, para a defesa nada.
Para quem a lei ?
Que sentença inexistente é essa da qual o juiz manda publicar e intimar, e a
publicação e a intimação são feitas ?
Que sentença inexistente é essa da qual é recebido recurso da defesa e a acusação
contra-arrazoa ?
Que sentença inexistente é essa da qual o recurso da defesa é conhecido ?
Que interesse tem a defesa na declaração da nulidade ?
Já tentaram me dizer que a defesa tem compromisso com a justiça. Tem, mas daí
a ser admitido que recorra para que seja garantida a execução da pena, é de ser
recomendado, então, aos Advogados, que alertem os juízes sobre a proximidade do
termo da prescrição para que, julgando logo, seus clientes não fiquem impunes.
172
Não me refoge a doutrina para sustentar o discurso, mas esta peça tem um
propósito mais ambicioso do que implantar uma opinião. Tem o propósito de produzir
nos agentes que concretizam o direito penal uma reflexão sobre o devido processo legal
nos aspectos substancial e formal que garantem a sua pertinência a um Estado
Democrático de Direito, no qual o Ministério Público tem o mandato constitucional da
defesa da ordem jurídica e do regime democrático.
O que existe é sentença nula com trânsito em julgado para a acusação e cujo vício
de inexistência de causa para a pena torna ilegal que seja procedida a execução.
13.1
Convalidação arbitrária do dispositivo
Tem sido mais abundante nos últimos tempos a convalidação dos dispositivos
sem eficácia com o argumento de que são sucintos ou suficientes, tendo como exemplo:
“Culpabilidade: sendo o grau de reprovação da conduta, é desfavorável ao
condenado, posto que agiu com firme consciência da ilicitude, ou seja, com vontade
de produzir o resultado previsto no artigo 157, §2º, incisos I, do Código Penal, tendo
plena convicção e discernimento da ação típica e das resultantes conseqüências”.
Recurso: APELAÇÃO CRIMINAL 200802059877 - Parecer: 1/3038/2008 - N.º do
Tribunal: 33535-9/213 - Dispositivo de folhas 226:
Sucinto tem o significado corrente, breve, descrito em poucas palavras, mas com
conteúdo inteligível porque contém todos os elementos necessários para o entendimento
e não emprega meta-linguagem ou linguagem simbólica de difícil, senão impossível,
compreensão para parte mais importante do público a que é dirigida: o condenado.
A simples referência à Lei da Gravidade feita a físicos, ou a referência à "clausula
rebus sic stantibus" feita a juristas mais velhos, abre-lhes o universo do entendimento.
173
F = (m1.m2)/d2 (equação da atração universal) satisfaz aos físicos, e .a referência
à revisão dos contratos aclara a cláusula para os que a desconhecem.
"Matéria atrai matéria na razão direta das massas e na razão inversa do quadrado
da distância" é o enunciado da atração universal de melhor compreensão, assim como .a
dicção do artigo do Código Civil referente à cláusula traz o entendimento ao jurista mais
novo.
A lei da atração universal que mantém os planetas girando em torno do Sol é a
mesma que faz com que as pessoas que estão sobre o planeta Terra, possam pular e
voltar ao chão.
Os exemplos de formas sucintas foram vinculadas ao "público" para demonstrar
que o sucinto para um pode ser hermético ou ininteligível para outro.
A pretensão de eficácia do dispositivo condenatório alcança o estado de liberdade
do cidadão, a exigir que ele, como "público" e paciente da pena, tenha direito a tantas
palavras quanto bastem para entender as razões da quantidade de pena imposta.
A segurança jurídica é necessariamente bipolar e entre quem a oferece
(judiciário) e quem a recebe (condenado) existe a implicação necessária consistente em
que as declarações do juiz, que a materializam, produzam no jurisdicionalizado o
sentimento de segurança, isto é, o condenado pode até achar que a pena foi injusta, mas
não achará que lhe falta fundamento e, pelos fundamentos – e somente por estes - poderá
recorrer sem pedir misericórdia.
A doutrina ao redor do mundo se afasta tanto da fundamentação exaustiva quanto
da fundamentação expressa, considerando a primeira como não necessária e repudiando
a segunda por negar à parte o conhecimento das razões.
174
A referência doutrinária à culpabilidade, por arrolamento das elementares, mesmo
com remissão a elementos constantes dos autos ou da própria sentença, ou o
apontamento impreciso e/ou incompleto da censura, não constituem forma sucinta de
análise por faltar-lhe conteúdo individualizador e medida (ou grau de censura).
Sucinto é o breve, ou descrito em poucas palavras, não passando que possa ser
incompleto, superficial ou insuficiente.
O sucinto em matéria de fundamentação não pode se afastar de que a conclusão
seja suportada por pelo menos uma razão: se F (fundamento) então deve ser C
(conclusão).
A fundamentação sucinta deve ser uma declaração tão verdadeira quanto uma
fundamentação exaustiva, e ambas devem produzir no espírito a mesma revelação da
verdade.
A necessidade de integração de algum conteúdo ou de alguma operação mental
para apreensão mostra exatamente que a verdade não está revelada na declaração:
4 goiabas + 5 goiabas = 9 goiabas (verdade revelada)
X goiabas + 5 goiabas = 9 goiabas (fundamento oculto a exigir integração)
4 goiabas + 5 goiabas = X goiabas (ausência de conclusão a exigir operação mental)
Esta ataque às arbitrariedades, com o pedido de declaração da ineficácia
executória, tem um aspecto desastroso que é o de, a curto prazo, enquanto os
dispositivos são ajustados ao devido processo legal: não enviar para a prisão os que a
175
mereceram, o que pode ocorrer em grande número. Mas, por mais grave que tal cenário
se apresente, não pode ser vista como razoável a execução de uma pena sem causa legal,
e a solução parece estar encaminhada para ser aquela que, transitoriamente, menos ferir
a ordem jurídica e o regime democrático.
NOTA IMPORTANTE: o autor (Serrano Neves), em suas manifestações
processuais ao Tribunal de Justiça de Goiás feitas até julho de 2008 pediu e aceitou
o refazimento do dispositivo condenatório por razões táticas. No entanto, a partir
de 2009 o Gabinete da 23a Procuradoria de Justiça de Goiás adotará posição mais
rígida em relação à nulidade absoluta e impetrará Habeas Corpus.
A devolução pura e simples em face de trânsito em julgado para a acusação (ou
recurso da acusação sem prévia sucumbência em embargos declaratórios) tem ocorrido
sem oposição do Gabinete da 23ª Procuradoria de Justiça de Goiás por conveniência (ou
inconveniência) operacional, mas pode se apresentar-se como a melhor solução para
correção do desvio se o TJGO adotar posição, se não unânime, pelo menos majoritária.
Tal solução não alcançará eficácia sem que a magistratura e o ministério público
em primeira instância voltem sua atenção para a importância da correta fundamentação
da fixação da pena, abandonando a posição confortável de que o condenado mereceu a
pena e assumindo a posição de que a mereceu por correta declaração do mérito
individualizado.
13.2
Do Interesse para Recorrer
13.2.1
Do recurso da defesa
O condenado que recorre contra sentença nula que transitou em julgado para a
acusação, mesmo que usando as vendas de Têmis não tenha visto a nulidade, não tem
176
interesse numa reforma restauradora de eficácia. A hipótese de ausência de interesse é
solar, tanto porque o condenado não sucumbiu quanto à nulidade como porque a reforma
o prejudica.
Caso a sentença nula tenha transitado em julgado para a acusação, o condenado,
recorrendo por outro motivo, deverá ter seu recurso, se conhecido, não provido, e
receber a ordem liberatória da execução, salvo se a absolvição se impuser.
Só se pode dizer que a sentença nula equivale à sentença inexistente no tocante a
uma coisa: nenhuma das duas produz efeitos. Jamais poderia ser afirmado que a
sentença nula não existe e que, por isto, outra poderia ser proferida em seu lugar, mesmo
diante de recurso exclusivo da defesa. Caso fosse possível a última afirmação, estaria
sendo admitido que o juiz não encerrou a função jurisdicional e que a instância ainda
aberta impediria a espécie de recurso, abrindo a oportunidade para que o julgador
proferisse outra, de ofício. Ademais, repetindo, não soa lógico anular o inexistente, caso
em que, em se anulando se está reconhecendo que existe mas não produz efeitos, tanto
que se comanda substituir por outra que efeitos possa produzir. A sentença nula existe
enquanto juízo e ato formal de declaração e, uma vez transitada em julgado para quem
tenha interesse no saneamento do vício, não pode produzir efeitos.
Se o representante do poder judicante viola a ordem pública, derroga a
constituição e remove as garantias da individualização da pena, afrontando o princípio
"nula pena sine lege". A restauração que se possa fazer não é dar-lhe uma nova
oportunidade e sim impedir que a ilegalidade seja executada.
Se o titular da ação, mandatário constituído pela Carta Magna para fazer valer o
que nela está garantido, por isto ou aquilo, não vê ou aceita a ilegalidade e deixa
transitar em julgado, o que se possa fazer não é dar-lhe uma oportunidade de redimir-se
177
recorrendo de uma nova sentença e sim impedir que por via oblíqua exerça o “recurso da
desatenção”.
Se o juiz erra, promotor erra, Advogado não vê e o Tribunal anula de ofício em
recurso exclusivo da defesa, é melhor que se comece a tratar os réus pelos cognomes de
"cobaias", "sparrings", "bactérias" ou qualquer outro ente que os profissionais possam
usar nas suas experiências para desenvolver habilidades e conhecimentos, assegurando
que juiz e promotor possam refazer sempre que errarem, mercê de uma especial “ordem
pública” na qual o fim independeria dos meios.
A invocação da ordem pública, com o argumento de que com a sentença nula o
processo não atingiu seu fim, quando feita diante do trânsito em julgado para a acusação
é a semente do arbítrio, da qual podem brotar indesejáveis parasitas anulatórios capazes
de sugar a seiva vital do tronco do Estado Democrático de Direito, que precisa ser
desenvolvido e consolidado.
É do entendimento do Gabinete que é prejuízo para o recorrente, diante de
recurso exclusivo seu, não apenas o agravamento de pena ou regime, mas até mesmo a
correção de situação processual que de algum modo possa beneficiá-lo, como é o caso
das causas extintivas da perseguição ou punição que impedem a execução da pena,
sejam de fato (ex.: prescrição) ou de direito (ex.: perdão judicial).
A hipótese de anulação de ofício reduz a sentença a um mero ato administrativo,
ao qual se faculta ao administrador rever quando contém vício. Assim, tanto a
manutenção do dispositivo condenatório nulo e ineficaz, quanto a declaração de
nulidade por sobre preclusão ou trânsito em julgado para a acusação constitui violência
judicial e afeta a segurança advinda de que para a construção da sentença nula e ineficaz
o condenado em nada contribuiu.
178
Soluções inadequadas:
1. cassar o dispositivo, de ofício, mandando refazer;
2. prover recurso da acusação, com arguição da nulidade e pedido de
refazimento, se o recorrente deixou de interpor embargos declaratórios na
instância original.
São as soluções possíveis sempre resultantes em declarar a ineficácia do
dispositivo e suspender os efeitos executórios;
1. conhecer e prover arguição da defesa;
2. conhecer e prover arguição do promotor de justiça que interpôs embargos
declaratórios específicos;
3. conhecer e não prover a arguição de promotor que não tenha interposto
embargos de declaração na instância original. (*)
(*) A respeito da omissão, deve-se salientar que, não utilizados os embargos, para vêla sanada na decisão embargada, fica a instância superior impedida de supri-la, pois
uma decisão em tal sentido importaria a supressão de uma instância.
(ALMEIDA:1997,371).
Citados por Cristiano Carrilho S. de Medeiros
http://orbita.starmedia.com/jurifran/ajedec.html acessado em qua jun-04-2008 06:09
13.2.2
Do recurso da acusação que interpôs embargos declaratórios por omissão
Zelar pela eficácia executória da sentença penal é atribuição do Ministério
Público.
A omissão de fundamentação no dispositivo constitui infração ao dever de ofício
179
comandado na Constituição, vez que a sentença válida é composta por decisões
encadeadas, e o dispositivo condenatório uma decisão cujo conteúdo tem o
preenchimento determinado pelo art. 59 do Código Penal.
Destarte, a ausência, insuficiência ou deficiência na fundamentação constitui
omissão grave que não pode escapar do crivo daquele que é detentor de mandato
constitucional (art. 127 da CF) para defesa da ordem jurídica e do regime democrático.
Na lição de Moacir Amaral Santos:
"Dá-se omissão quando o julgado não se pronuncia sobre ponto, ou questão,
suscitado pelas partes, ou que o juiz ou juizes deveriam pronunciar-se de ofício.
Qualquer desses defeitos pode aparecer na fundamentação ou na parte dispositiva do
julgado, e até mesmo do confronto do acórdão com sua ementa"(SANTOS:1997,147).
Citados por Cristiano Carrilho S. de Medeiros
-http://orbita.starmedia.com/jurifran/ajedec.html acessado em jun-04-2008 06:09
A única hipótese de rescisão do dispositivo e refazimento na instância original é a
de ter o órgão acusador interposto embargos de declaração, específico por omissão na
fundamentação do dispositivo, o que não poderia ser admitido em relação à defesa.
14
DOS PONTOS CONTROVERSOS
São examinados os dispositivos condenatórios de primeiro grau, auguídos de
nulidade e as correspondentes decisões do Tribunal de Justiça de Goiás:
1) aceitando como sucinto o dispositivo que apenas gradua de forma genérica a
culpabilidade;
TJGO Segunda Câmara Criminal - FONTE: DJ n 13364 de 22/08/2000 p 4 - LIVRO:
180
250 - - EMENTA: “... PENA. FIXAÇÃO. 1- A não fundamentação das elementares da
culpabilidade caracteriza em tese a nulidade da sentença, não havendo todavia
plausibilidade na anulação da sentença condenatória quando esta apesar de não ter
explicitado todas as elementares da culpabilidade fixou a reprimenda bem próxima
ao mínimo legal, inobstante serem todas as circunstâncias judiciais desfavoráveis ao
réu. IMPROVIDO POR UNANIMIDADE". - - ACÓRDÃO: 08/08/2000 - RELATOR:
Dra Carmecy Rosa Maria Alves de Oliveira – DECISÃO: Conhecido e improvido, à
unanimidade.
1a) não aceitando como sucinto o dispositivo que apenas gradua de forma
genérica a culpabilidade;
TJGO Primeira Câmara Criminal._. FONTE: DJ n 11981 de 11/01/1995 p 7. _.
EMENTA: “Apelação entorpecente - Sentença condenatória - Culpabilidade:
Análise: Ausência – Nulidade. - Não é possível excluir-se a análise da culpabilidade
para aplicação da pena. Não basta dizer que esta foi "normal", "intensa". Para que
se formule o juízo de censura, num estado de direito que se presume ter um direito
penal democrático, a questão da culpabilidade assume relevância ímpar, visto que,
além do dolo, que é motivo de valoração dupla, uma relevando ao nivela do tipo-deilícito, outra, ao nivela do tipo-de-culpa - são analisadas a imputabilidade, a
consciência da ilicitude e a inexigibilidade de conduta diversa, com fatos concretos,
porque graduável é a censura, cujo índice, maior ou menor, incide na quantidade da
pena. - A ausência de fundamentação vulnera os comandos normativos dos artigos 5º,
inciso XLVI, 93, inciso IX da Constituição Federal, e 59 do Código Penal. - Apelação
conhecida e, de ofício, decretada a nulidade da sentença condenatória, para que
outra seja proferida.”. _. ACÓRDÃO: 27/12/1994. _. RELATOR: Des Byron Seabra
Guimarães ._. DECISÃO: Decretou a nulidade da sentença condenatória
181
1b) sobrepondo o interesse coletivo à segurança jurídica individual:
TJGO Segunda Câmara Criminal - FONTE: DJ n 13396 de 09/10/2000 p 7 - LIVRO:
255 - - EMENTA: "SENTENÇA. NULIDADE POR VIOLAÇÃO DA GARANTIA DO
DEVIDO PROCESSO LEGAL. PROCLAMAÇÃO QUANDO OCORRENTE NA
TUTELA DO INTERESSE PÚBLICO, AINDA QUE EM PREJUÍZO A DIREITO
SUBJETIVO DAS PARTES. PENA-BASE. VALORAÇÃO DO GRAU DE
CULPABILIDADE DO RÉU... Se violada na sentença a garantia do devido processo
legal, impõe-se seja proclamada a nulidade, com ensejo de renovação do provimento
nulo, ainda que decorrente prejuízo a direito subjetivo de qualquer das partes, porque
sobreleva a tutela do interesse público no correto exercício da função jurisdicional.
Não é nula a sentença quando, na valoração do grau de culpabilidade do réu para
fixação da pena base, motiva-se a desfavorabilidade em circunstância fática
reveladora de maior censurabilidade da conduta... Recurso provido para reformar
parcialmente a sentença". - - ACÓRDÃO: 26/09/2000 - RELATOR: Des João Canedo
Machado - DECISÃO: Sentença parcialmente reformada, à unanimidade.
2) admitindo que a inteligibilidade imediata do dispositivo não produz prejuízo
para o condenado
TJGO Segunda Câmara Criminal - FONTE: DJ n 13212 de 10/01/2000 p 17 LIVRO: 234 – A - individualização da pena pressupõe a análise dos critérios
subjetivos e objetivos elencados no artigo 59 do Código Penal. A análise da
culpabilidade, de forma confusa, por si só, se não evidenciado prejuízo ao réu, não
induz à nulidade da sentença. - Favoráveis ao acusado as circunstâncias judiciais,
adequa-se a pena a 'quantum' mais suportável, especialmente em face da política
criminal, de modo a torná-la mais condizente com a culpabilidade do agente.
Improvida a apelação do Ministério Público. - Provida a apelação do acusado com a
182
reforma parcial da sentença". - ACÓRDÃO: 21/12/1999 - RELATOR: Des João
Canedo Machado - DECISÃO: Conhecidos, improvido o 1º e provido o 2º, à
unanimidade.
3) permitindo o refazimento do dispositivo para conferir-lhe eficácia executória:
TJGO Segunda Câmara Criminal - FONTE: DJ n 13180 de 23/11/1999 p 6 - LIVRO:
231 - - EMENTA: “Apelação. Preliminar. Individualização da pena. Culpabilidade. A ausência da análise da culpabilidade (circunstância judicial prevista no art. 59 do
CP), exige a nulidade da sentença de mérito, posto que se trata de circunstância de
suma importância, fundamental para emissão do juízo de censura, ainda mais
quando a pena-base fora fixada acima do mínimo legal. Recurso prejudicado para
cassar de officio a sentença de primeiro grau". - - ACÓRDÃO: 11/11/1999 RELATOR: Des Roldão Oliveira de Carvalho - DECISÃO: Sentença cassada, à
unanimidade.
TJGO Primeira Câmara Criminal._. FONTE: DJ n 13659 de 12/11/2001 p 33._.
LIVRO: 315-B. _. EMENTA: "APELAÇÃO CRIMINAL. - SENTENÇA. - NULIDADE.
- Nulidade no tópico da individualização da pena conferida pela sentença, que está
totalmente carente de fundamentação. Inexistência de análise das elementares da
culpabilidade – imputabilidade, potencial consciência de ilicitude e exigibilidade de
conduta diversa. Nulidade insanável reconhecida de ofício, a fim de que outra
sentença seja proferida". ._. ACÓRDÃO: 25/10/2001._. RELATOR: Dr Alvarino
Egídio da Silva Primo._. DECISÃO: Sentença anulada, à unanimidade.
TJGO Segunda Câmara Criminal - FONTE: DJ n 11522 de 02/03/1993 p 6 - LIVRO:
76-C - EMENTA: “Recurso de Apelação. Nulidade da sentença. Falta de
fundamentação na aplicação da pena. Sem que se proceda ao exame das
circunstâncias judiciais, limitando-se o juiz a dizer do elevado grau de culpabilidade
183
do réu e afirmar ser elemento altamente perigoso, a pena, considerada elevada, não
pode ser definitivamente aplicada. Omissão de formalidade que constitui elemento
essencial do ato (art. 564, IV, combinado com o art. 387, II, do Código de Processo
Penal). Recurso provido”. - ACÓRDÃO: 09/02/1993 - RELATOR: Des Juarez Távora
de Azeredo Coutinho - DECISÃO: Conhecido e provido, à unanimidade.
TJGO Primeira Câmara Criminal._. FONTE: DJ n 13534 de 07/05/2001 p 15._.
LIVRO: 294._. EMENTA: "Apelação Criminal. Sentença. Ausência de
individualização da pena. Matéria de ordem pública. Nulidade decretada de ofício.
Na fixação da pena-base é indispensável a análise da culpabilidade do agente,
considerada a base fundamental para a individualização da sanção a ser aplicada ao
caso concreto. A ausência na aferição da culpabilidade afronta os princípios
constitucionais da ampla defesa, da individualização da pena e motivação das
decisões. Nulidade declarada de ofício". ._. ACÓRDÃO: 19/04/2001 ._. RELATOR:
Dr Alvarino Egídio da Silva Primo ._. DECISÃO: Sentença anulada, à unanimidade
TJGO Primeira Câmara Criminal._. FONTE: DJ n 13533 de 04/05/2001 p 8._.
LIVRO: 296._.EMENTA: “Apelação Criminal... Culpabilidade. Concurso de crimes.
Ausência de fundamentação. Nulidade da sentença condenatória... 2 - Mister seja
procedida análise acurada da culpabilidade em todas suas elementares, ou sejam,
imputabilidade, exigibilidade de conduta diversa e potencial consciência da ilicitude,
sob pena de violar o comando normativo dos artigos 93, inciso IX e 5º, inciso XLVI
da Constituição Federal. 3 - O juízo de censurabilidade em se cuidando de concurso
material deverá ser examinado para cada ilícito penal. Apelação criminal provida
para declarar a nulidade da sentença". ._. ACÓRDÃO: 19/04/2001._. RELATOR: Dr
Alvarino Egídio da Silva Primo ._. DECISÃO: Conhecido e provido, à unanimidade.
O Estado-jurisdicional, causador do dano processual através do poder-dever do
184
julgador, tendo seu agente promotor de justiça não atuado com embargos de declaração
por omissão, se aproveita do recurso para aplicação da nulidade (art. 93, IX da CF) e
salvação da pena privativa de liberdade, mandando que os arbitrários cumpram o poderdever na forma prevista, conduzindo para a conclusão de que o poder-dever estatal é
absoluto contra a própria Constituição, se não isto, pelo menos artificioso em resolver
com uma espécie de ordem pública que só ao Estado favorece.
Acontece que em matéria penal o ato-sentença taxado de julgado aparente ou de
sentença inexistente, transitado em julgado sem recurso, enseja a expedição da Guia de
Recolhimento e prisão do condenado, e os efeitos penais não são aparentes, são reais.
A posição do TJGO independente da origem do recurso, impondo a anulação e
refazimento - diante da arguição de nulidade feita pelo ministério público de segunda
instância - sem levar em conta que a defesa não arguiu por faltar-lhe o interesse em
firmar o efeito executório da pena, ou que o órgão acusador tenha sido vencido em sede
de embargos de declaração por omissão e possa recorrer nesse particular.
Apenas com o trânsito em julgado para a acusação é possível executar
provisoriamente ou liberar pela prescrição retroativa.
A posição do TJGO reconhece como de nenhum efeito o ato juridicamente
inexistente mas, ao invés de declarar, por consequência, que nenhum efeito produzirá
porque passadas as oportunidades de arguição e refazimento, sanciona a própria omissão
com uma arbitrária comissão de refazimento.
Desta sorte, em sede penal, a nulidade decorrente do abuso do poder-dever estatal
é insanável e a única declaração possível diante do perigo ou do dano à liberdade é a de
ineficácia executória e indica as seguintes soluções pelo TJGO:
185
1) concessão da ordem em Habeas Corpus impetrado para suspender a execução
se o dispositivo transita em julgado sem recurso;
2) concessão de ordem de Habeas Corpus, de ofício, em sede de recurso
exclusivo da defesa, independente de arguição;
3) concessão de ordem de Habeas Corpus, de ofício, em sede de recurso da
acusação - exclusivo ou não - se a matéria não foi vencida em sede de embargos de
declaração;
4) declaração de nulidade do dispositivo e comando do seu refazimento somente
na hipótese de a acusação ter sido vencida em sede de embargos de declaração;
A pedra cimeira tem como argamassa o argumento de que diante da nulidade
insanável a Segunda Instância não tem jurisdição rescisória “ex officio” e não existe
instrumento legal para rescindir em favor da sociedade.
"Para que uma sociedade subsista, é preciso que haja leis, como é preciso haver
regras para cada jogo”. (Voltaire)
A posição do Gabinete da 23ª Procuradoria de Justiça do Ministério Público de
Goiás é de que a violação da garantia constitucional do devido processo legal, por
ausência de causa para a pena, está sendo corrigida por outra violação
Absurdamente, as decisões anulatórias estão devolvendo ao juiz e ao promotor a
oportunidade de cumprirem suas atribuições de forma correta, a par de que estudaram
muitos anos, passaram em estreitos concursos, adquiriram experiência e ganham o
suficiente para que suas atribuições não atribulem suas vidas.
Para o condenado é a panca, cujo som no costado chega aos ouvidos da sociedade
186
para aplacar o clamor por punibilidade.
A sociedade perder o rumo pode acontecer.
O que não pode acontecer é a Constituição ser desprezada em nome da defesa
social.
5. Qualquer pessoa declarada culpada de crime terá o direito de fazer examinar por
uma jurisdição superior a declaração de culpabilidade e a sentença em conformidade
com a lei.
(Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos)
"Toda pessoa acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência, enquanto
não se prova sua culpabilidade, de acordo com a lei e em processo público no qual se
assegurem todas as garantias necessárias para sua defesa".
Declaração dos Direitos Humanos, da ONU, de 1948, que consagrou em seu art. 11:
Assim, em sede recursal ao invés de anular de ofício, deve o Tribunal conceder a
ordem de Habeas Corpus, reconhecendo a ineficácia executória do dispositivo,
trancando a execução da pena e expedindo a ordem liberatória.
15 DA NULIDADE ABSOLUTA
A pena cominada na Carta Maior ( ...fundamentadas todas as decisões, sob pena
de nulidade...), é aplicável a favor do interesse daquele a quem, não a tendo produzido
ou para ela contribuído, a nulidade aproveite, ou para o qual o interesse de agir seja
legítimo..
A ampla defesa esculpida como garantia processual individual não tem
187
contrapartida para a acusação que, estrita, tem como aliada o poder estatal, de modo que
em se falando de acusação se está falando do somatório da acusação estrita com o poder
estatal. Assim, as nulidades de ordem pública podem ser resolvidas em favor da defesa
que, não a tendo produzido, para ela contribuído, e para a qual o recurso não é possível.
Ao contrário, para a acusação que é garante da efetivação da ampla defesa, nada
aproveita mesmo em sede de recurso seu com arguição expressa de nulidade do
dispositivo condenatório no tocante à ausência ou deficiência de fundamentação
individualizada da culpabilidade no caso de falta de interesse implicitamente
manifestada pela conformação e não interposição de embargos, qual seja: não
reconhecimento da sucumbência diante da ineficácia.
A garantia da ordem pública num Estado Democrático de Direito, presidido pelo
regime democrático, consiste exatamente em garantir a parte submetida a proteção
suficiente em relação aos efeitos de atos viciados praticados pelo Estado-jurisdicional
titular de poder-dever, não existindo a hipótese de sacrifício de direito individual em
favor de direito coletivo porque, neste caso os direitos coletivos, ou direitos da
sociedade, estão garantidos pelas formalidades legais e delegações de poder-dever que
estabelecem a proteção suficiente através da face substancial do devido processo legal.
También es nulo de nulidad absoluta el acto ilógicamente motivado, es decir cuando
se obtiene una conclusión que no tiene nada que ver con el argumento que se utiliza.
La omisión de la motivación da origen a la nulidad absoluta, ya que no sólo se trata
de un vicio de forma sino también de un vicio de arbitrariedad.
Derecho contencioso administrativo
http://www.monografias.com/trabajos6/deread/deread.shtmlhttp://www.monografias.
com/trabajos6/deread/deread.shtml
188
Para que uma sentença seja inexistente, observa PONTES DE MIRANDA, "é preciso
que não seja sentença, nem tenha sido" (op. cit., p. 65). Sentença nula é aquela à qual
se pode opor o vício de invalidade como simples exceção sempre que a parte
vencedora pretender executá-la. Sentença rescindível é a que só se pode desfazer
mediante a ação especial chamada ação rescisória
A COISA JULGADA E A RESCINDIBILIDADE DA SENTENÇA - Humberto Theodoro
Júnior - http://www.webartigos.com/articles/6062/1/a-necessidade-de-relativizacao-dacoisa-julgada-inconstitucional/pagina1.hhtml
seg jun-09-2008 06:58
Assim, a nulidade é absoluta por imposição do texto constitucional, e é insanável,
para garantia da ordem pública.´
Uma sentença (imperfeita) contrária à lei (gesetzwidrig) ou mesmo contrária à
Constituição (verfassungswidrig) é uma sentença nula. Impõe-se a declaração da sua
nulidade. Coisa distinta é a pseudo-sentença, que não deve ser declarada nula, senão
inexistente (sem nenhuma eficácia jurídica).
Efeitos da preclusão pro judicato no Processo Penal - Autor: Luiz Flávio Gomes Publicado em: 9/9/2005 http://www.mundojuridico.adv.br/sis_artigos/artigos.asp?
codigo=394- sáb jun-07-2008 05:52
16 CASO E PROPOSIÇÃO
Sentença condenatória recorrida pelos fundamentos e com as razões constantes
de suas peças e que ao exame do Ministério Público do segundo grau revelou-se viciada
na fixação da pena base por insuficiência no exame das elementares da culpabilidade e
fixação da medida (ou grau de censura).
189
A proposição para discussão é estritamente de direito, e consiste em verificar se
as declarações referentes ao artigo 59 do Código Penal, na sentença em exame, atendem
ou não aos requisitos legais e, não atendendo, constitui nulidade absoluta, insanável, não
produzindo efeitos executórios por ausência de causa legal.
A distinção entre as nulidades absolutas e as relativas vem esteada, igualmente,
na natureza da norma infringida e nos fins tutelares da norma violada. Se a norma
transgredida tiver natureza cogente e tutelar interesse predominantemente público, a
nulidade poderá ser considerada absoluta. "Vício dessa ordem deve ser declarado de
ofício, e qualquer das partes pode invocar” (23).
O gênio de CARLOS ALBERTO ÁLVARO DE OLIVEIRA sustenta eruditamente que
"a forma investe-se da tarefa de indicar as fronteiras para o começo e o fim do
processo, circunscrever o material a ser formado, estabelecer dentro de quais limites
devem cooperar e agir as pessoas atuantes no processo para o seu desenvolvimento",
enfim, parafraseando RUDOLF VON JHERING, "a forma é a inimiga jurada do
arbítrio e irmã gêmea da liberdade” (46).
A teoria das nulidades e o sobre direito processual - Danilo Alejandro Mognoni
Costalunga -especialista e mestrando em Direito Processual Civil, membro efetivo do
Instituto Brasileiro de Direito Processual - http://www1.jjus.com.br/doutrina/lista.asp?
assunto=264
A proposição não contempla o exame dos autos, mas pode contemplar o exame
da sentença com o fim de verificar a existência de um fundamento válido que se
encontra em outras linhas às quais teria sido remetido, portanto, não implica em reexame
de fatos ou prova, e sim em exame da inteireza, coerência, clareza e precisão da
declaração como razões de direito para a eficácia, afastada, por impropriedade, a
190
hipótese de que o refazimento do dispositivo não causará prejuízo material ao réu, visto
que a conferência da pena passada implica, necessariamente, em re-exame do mérito da
individualização.
A proposição se atém, única e exclusivamente, ao exame do conteúdo da
declaração do dispositivo condenatório (vale o que está escrito), pertinente aos
comandos do artigo 59 do Código Penal.
Por se tratar de matéria que enfrenta a lógica jurídica (ou a falta dela), o tom da
proposição é o do Habeas Corpus, vez que tal sentença condenatória é um dano ao
direito de ir e vir dada a sua carga de ilegalidade e abuso de poder.
17
POSIÇÃO DO GABINETE
A pena imposta sem a análise das elementares e sem a medida da culpabilidade
não leva em conta a garantia da individualização, por lhe faltar a pertinência com o autor
do crime. A ausência desta fundamentação específica gera a incerteza de que a pena, por
ato de juízo sobre a pessoa do condenado tenha sido a ele imposta, ou que esteja na
medida certa, e isto inviabiliza a execução.
O interesse em uma pena que possa ser tomada como título executivo líquido,
certo e exigível, é do Ministério Público, órgão que movimenta a Justiça no sentido da
realização punitiva do Direito Penal. O Ministério Público é o sucumbente em relação ao
que inviabilize a formação do título executivo ou a execução da pena.
O condenado não tem interesse em recorrer para assegurar a execução de pena
incerta e nem deu causa à incerteza, e assim a anulação de ofício, em recurso da defesa, ou da acusação que não embargou para que uma pena fosse corretamente passada
191
equivale, no sentido material, a uma reforma para pior.
A pretensão punitiva do Direito Penal é um interesse pertinente à ordem pública e
se realiza através do Poder Judiciário mediante a persecução de que é o Ministério
Público o titular. O interesse do processado, também pertinente à ordem pública, é a
defesa, cujo exercício se contrapõe à acusação buscando elidir ou diminuir os efeitos que
o Direito Penal busca. A postura com que defesa deve operar, conquanto seja em favor
da Justiça, é em favor da Justiça defensiva, não podendo aliar-se ao propósito da
acusação, nem por sua conduta processual ceder espaço para que a acusação seja a força
dominante no processo ou que o processo seja resolvido com fundamento no critério da
prevalência do interesse da sociedade..
Assim, não tendo a defesa o encargo de promover o que não lhe aproveita, não
pode o recurso que interpôr ensejar a anulação da sentença condenatória para corrigir
defeitos que somente ao Estado-jurisdicional aproveitam, vez que, por conformação ou
omissão, a acusação não se valeu dos recursos disponíveis.
17.1
Da Ilegalidade e do Abuso de Poder
"Art. 5º ...
LXVIII- conceder-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar
ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por
ilegalidade ou abuso de poder;"
"O poder legal, diz Bobbio, é um poder democraticamente formulado no âmbito de
um ordenamento constitucional. A legalidade é por ele entendida como a qualidade
do exercício do poder, na perspectiva da tyrannia quo ad exercitam, enquanto a
legitimidade é definida como a qualidade do título, na perspectiva da tyrannia absque
192
titula²¹: para que um poder seja legítimo, é preciso que seus detentores tenham um
título que justifique sua dominação, enquanto a legalidade depende, justamente, do
exercício desse poder conforme as leis estabelecidas. Ora, como toda relação de
poder é, também, uma relação simultânea de coordenação e subordinação, temos
aqui duas perspectivas. Ex parte principis, isto é, do ponto de vista do governante, o
direito é um instrumento de poder: nesse sentido, a legitimidade expressa o
fundamento de seu direito de mando, enquanto a legalidade estabelece seu dever. Ex
parte populi, do ponto de vista dos cidadãos o direito é um instrumento de proteção:
nesse sentido, a legitimidade do poder é fundamento de seu dever de obediência,
enquanto a legalidade é a mais importante garantia de não serem oprimidos. Decorre
daí, pois, a conexão entre direito e política, entre lei e democracia. "O governo da lei
celebra o triunfo na democracia" - e esta, como vimos anteriormente, não é "senão
um conjunto de regras para as soluções dos conflitos sem o derramamento de
sangue". E no que consiste o bom governo democrático "senão, antes de tudo, no
respeito rigoroso destas regras?".
(José Eduardo Faria, Eficácia Jurídica e Violência Simbólica - O direito como instrumento
de transformação social, Série Pensamento Jurídico - Teses, EDUSP, São Paulo, 1988, p.10
17.2
Da violação do texto constitucional
A ausência de fundamentação afronta a Carta Maior:
Art. 93 - ...
IX - todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e
fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei, se o interesse
público o exigir, limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus
advogados, ou somente a estes;
193
A ausência de fundamentação, sem a mais mínima sombra de dúvida, constitui
supressão de garantia individual da Carta Maior.
Art. 5º - ...
XLVI - a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as
seguintes:
De tal sorte, a posição dos juristas sobre a nulidade é unânime.
A nulidade se estampa por ausência da análise das elementares e da medida da
culpabilidade, pois o caráter de garantia individual está a exigir um mínimo que possa
ser tomado por necessário (necessidade da pena) e suficiente (quantidade de pena
necessária). Tal mínimo só se apresentará no caso em que a fundamentação contenha
todos os elementos que tornem lógica a conclusão, ou seja, que tornem inteligível a
decisão, porque um terceiro, embora discordando dos argumentos não poderia discordar
da estrutura lógica.
O Gabinete está convencido de que o cidadão tem direito de entender uma
decisão condenatória por seus próprios meios, sem a necessidade de alguém para lhe
dizer o que significa, e é o caráter público (com o corolário da publicidade) que firma o
convencimento. A justiça não pode ser hermética a ponto de suas publicações só
poderem ser entendidas pelos iniciados, e aos profanos serem aplicados os efeitos, sob
ignorância.
Assim é que fundamentações sucintas habitam a área de risco de perda de clareza
ou de precisão, comuns à síntese como método e à concisão como estilo. O sucinto pode
ser claro e preciso para alguns especialistas, como é o caso dos presentes nos tribunais,
mas será assim para o réu?
194
Acontece que concisão é o dispêndio mínimo de esforço com o máximo do efeito
de expressão, segundo registra Albertina Fortuna Barros em Técnica de Estilo (Editora
Fundo de Cultura, 1968).
A sentença penal condenatória vem sofrendo um processo de desfundamentação
sob a ótica de que da sentença como um todo decorre a pena fixada. Essa ótica é um
paralogismo que contém o artifício de colocar a conclusão na primeira premissa do
silogismo, suprimindo o termo médio: Existe uma condenação; existe uma sentença;
logo a condenação decorre da sentença. O termo médio suprimido é exatamente a
fundamentação. Por fundamentação não se pode entender outra coisa senão a declaração
dos predicados atribuídos ao objeto. Se o julgador diz que a culpabilidade existe, ou que
está presente ou evidenciada, está declarando o objeto culpabilidade, apenas.
São os predicados do objeto culpabilidade que orientam a fixação da pena base:
as elementares (qualidade) e a medida (quantidade).
Torna-se, imperativo, imprescindível e inarredável que as sentenças sejam
completas, claras e precisas, existindo até os embargos de declaração para aperfeiçoálas. Logo, são nulas as incompletas, obscuras e imprecisas, carentes de alguma
integração extraordinária para que autorizem a conclusão que se lhes segue.
"Los principios de la política procesal de una nación no son otra cosa que segmentos
de su política estatal en general. Se puede decir que la estructura del processo penal
de una nación no es sino el termómetro de los elementos corporativos o autoritarios
de su Constituición."
(James Goldschmidt - PROBLEMAS JURÍDICOS Y POLÍTICOS DEL PROCESSO
PENAL - Bosch Casa Editorial - Barcelona, 1935).
195
A garantia constitucional da individualização da pena (Constituição Federal, (art.
5º, XLVI) restaria fraudada se não declarada a graduação correspondente à culpabilidade
na relação do acusado com o fato que praticou. Não fora o comando legal de graduação
(Código Penal, art. 59) a própria estrutura do discurso condenatório exigiria a declaração
do grau de intensidade do envolvimento do acusado com o fato praticado, por força de
uma escala de intensidade de sanção prevista no tipo, a exigir uma correspondência,
conforme é doutrina pacífica desde quando o dolo era medido. Assim, conclui-se que o
não reconhecimento dos dispositivos infra-constitucionais (procedural due process) é
também uma supressão de garantia expressa (due process of law) na Carta Maior:
"Art. 5º - ...
LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo
legal."
"Se, então, as Cortes observam a Constituição, e se a Constituição é superior a
qualquer norma legislativa ordinária, a Constituição, e não a lei ordinária, deve ser
aplicada. Aqueles que negam o princípio de que a Constituição deve ser
considerada pela Corte como um parâmetro, estão na verdade afirmando que os
tribunais devem fechar os olhos à Constituição, e ver apenas a lei."
(Caso Malbury vs. Madison - Justice Marshall, julgado em 1803 - Tradução de Ana Clara
Victor da Paixão, Advogada, Asssessora da 23ª Procuradoria de Justiça Criminal.)
"A cláusula due process of law não indica somente a tutela processual, como parece.
Ela tem um sentido genérico, caracterizado pelo trinômio vida, liberdade,
propriedade, ou seja, por ela tem-se o direito de tutela daqueles bens da vida, em seu
sentido mais amplo e genérico. Assim, tudo o que disser respeito à tutela da vida,
liberdade ou propriedade está sob a proteção da due process clause. Deste modo, há
196
uma caracterização bipartida, pois há o substantive due process e o procedural due
process, para indicar a incidência do princípio em seu aspecto substancial, vale dizer,
atuando no que respeita ao direito material, e, de outro lado, a tutela daqueles
direitos por meio do processo judicial ou administrativo.
(DEVIDO PROCESSO LEGAL: ASPECTOS PROCESSUAL E SUBSTANCIAL – Paulo
Roberto Dantas de Souza Leão - Promotor de Justiça e Professor da UFRN e UNIPEC Acervo do Virtual Office da 23ª Procuradoria de Justiça.)
Mais para além, não é o emprego da expressão "devido processo legal" no
sentido de "devido processo penal (procedural due process)" que esvazia a existência do
devido processo legal no sentido substantivo (substantive due process), vez que o
sentido primário, se não decorresse de constar o dispositivo das garantias individuais
cuja interpretação se estende para dar o máximo de proteção, decorre de que a ordem
jurídica nominada no art. 127 da Carta Magna é o próprio espírito do Estado
Democrático de Direito declarado no art. 1º da Carta Maior.
Decía Kant en el parágrafo 46 de su Teoría del Derecho: "El legislador sólo puede
corresponder a la voluntad convenida del pueblo...no debe poder cometer injusticia
alguna mediante su ley absolutamente con nadie". En esta frase se condensa el
objetivo de esta conferencia: por un lado, la reafirmación de la soberanía popular
como la base legitimadora de todo tipo de legislación; y, por otro, la constatación de
que no podemos hablar de derecho sin hacerlo de justicia. El hecho de que aquella
frase kantiana fuese dicha hace dos siglos no le quita nada de su radicalidad. Como
dijo Jean Genet, como respuesta a una pregunta acerca de la originalidad de sus
temas: no hay nada nuevo bajo el sol, todo está dicho, pero como muy pocos se
enteran, estamos obligados a repetirlo una y otra vez. El problema reside en que com
tanta repetición y tanto uso indiscriminado, los conceptos van perdiendo la fuerza
197
con la que nacieron. En nuestro presente histórico asistimos a la falta de un lenguaje
alternativo que oponer a los discursos dominantes. Padecemos un déficit de lenguaje,
y ello puede deberse a dos razones: -bien, porque no tenemos conceptos nuevos para
enfrentarnos a las nuevas realidades políticas y sociales: se habla de postmodernidad, de múltiples "neos", y lo que hacemos es estirar conceptos que tuvieron
su origen hace ya décadas; -bien, porque el poder administrativo se ha apoderado de
los conceptos antaños alternativos y los ha reconducido a su propio juego intelectual
de dominación. Parece reiterativo hablar de nuevo sobre la democracia, el Estado y
el derecho; pero estamos ante categorías que muestran la realidad em la que vivimos
y el proyecto según el cual queremos vivir. Y tanto como una realidad, o como un
proyecto, son hechos e ideas que necesitan de una constante y renovada reflexión.
(HACIA UN MARCO ALTERNATIVO DE ESTUDIOS JURIDICOS - Joaquín Herrera
Flores. Universidad de Sevilla - Acervo do Virtual Office da 23ª Procuradoria de Justiça.)
A insuficiência na declaração da culpabilidade transitada em julgado para a
acusação constitui violação no plano constitucional e no plano de leis federais penais
substantiva e processual.
A primeira violação consiste em ter o julgador faltado com o dever de
fundamentar, e constitui infração funcional na espécie abuso de poder:
Constituição da República
Art. 93 - Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre
o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios:
IX - todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e
fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei, se o interesse
público o exigir, limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus
198
advogados, ou somente a estes;
A segunda violação consiste em ter o julgador descumprido preceito garantidor
do devido processo legal infração jurisdicional na espécie abuso de poder:
Constituição da República
Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade
do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos
seguintes:
XLVI - a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as
seguintes:
Ambas as infrações ensejariam a impetração de mandado de segurança tendente a
suspender os efeitos da decisão cujo trânsito em julgado já estivesse consumado, face ao
direito líquido e certo ao devido processo legal.
A terceira violação é uma consequência da primeira, e consiste no esvaziamento
de preceito de lei federal:
Código Penal (DECRETO-LEI N.º 2.848, DE 7 DE DEZEMBRO DE 1940 e
modificações posteriores)
Art. 29 - Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este
cominadas, na medida de sua culpabilidade.
Art. 59 - O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à
personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime,
bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e
suficiente para reprovação e prevenção do crime:
199
A quarta violação, também consequência da primeira, consiste no esvaziamento
de preceito de lei federal:
Art. 381 - A sentença conterá:
III - a indicação dos motivos de fato e de direito em que se fundar a decisão;
A quinta violação ocorre por ter o titular da ação penal ter abandonado a
pretensão executória por omissão da perseguição da eficácia declaratória.
A sexta violação aparece quando o Tribunal da curso a uma ou mais violações
apontadas.
A não aplicação de preceitos categóricos constitui, independente da vontade do
julgador, ilegalidade e abuso de poder, figuras do núcleo da arbitrariedade.
Para entender que el una sentencia arbitraria es necesario saber que es la
"arbitrariedad". Según Legaz y Lacambra: "La arbitrariedad es la negación del
derecho como legalidad, em tanto que legalidad y cometida por el propio custodio de
la misma, es decir por el propio poder publico". Este autor entiende que se trata de
una conducta antijurídica de los órganos del Estado (Legaz y Lacambra, Luis.
Filosofia del Derecho, 5° edición, Barcelona, Editorial Bosch, 1979, pag. 630.)
Sentencias Arbitrarias por Incongruencia - Defecto en la consideración de extremos
conducentes. - Valeria Fernandez Pello - Seminario de Derecho Constitucional –
Universidad del Salvador - Año 1999
Ilegalidade ou abuso de poder são sanáveis por Habeas Corpus que elida os
efeitos.
"Por outro lado, seja de quem for o ato constritivo da liberdade de locomoção que
ostente ilegalidade ("desconformidade de atuação ou omissão, do agente do Poder
200
Público, com a lei, qualquer que esta, formalmente considerada, seja"), ou abuso de
poder ("praticado como se lei não houvesse, vale dizer, como se 'a autoridade
legislasse e criasse uma situação não prevista nem autorizada anteriormente', é
admissível o habeas corpus."
(Rogério Lauria Tucci, Direitos e garantias individuais no processo penal brasileiro, ed.
Saraiva, São Paulo, 1993, p. 444 e 445)
"O artigo 6º, § 3º do Decreto Lei nº 4.657, de 04.09.1942, Lei de Instrução do Código
Civil define: "Chama-se coisa julgada a decisão judicial de que já não caiba
recurso." Essa lei é tida como o "estatuto dos princípios gerais do direito", sendo
subsidiariamente aplicada em todos os ramos do Direito. Daí, conclui-se que tal
definição ou conceito é, portanto, aplicada na sua generalidade em todo o Direito. A
coisa julgada é a "imutabilidade da entrega da prestação jurisdicional e seus efeitos,
para que o imperativo jurídico, contido na sentença tenha força de lei entre as
partes."
(JOSÉ FREDERICO MARQUES, apud MIRABETE, 1996, p. 463)
"A sentença pode ser justa ou injusta. Desde, porém, que contra ela não caiba mais
recurso deve ser respeitada como depositária da verdade."
(MIRABETE, 1996, p. 463) (COISA JULGADA EM MATÉRIA PENAL - Dijosete
Veríssimo da Costa Junior - Acervo do Virtual Office da 23ª Procuradoria de Justiça.]
O Gabinete tem, sistematicamente, diante de dispositivo nulo e ineficaz,
sustentado a concessão de ordem de Habeas Corpus para impedir a execução da
sentença condenatória.
O Gabinete reconhece a equivalência entre o nulo e o inexistente no tocante a que
ambos não podem produzir efeitos, mas não reconhece a equipotência, vez que o nulo
201
possui conteúdo ineficaz e o inexistente não possui conteúdo nenhum.
O dispositivo nulo está expresso na sentença e a nulidade decorre do conteúdo
que, por ausência de causa legal, não tem potência ou eficácia executória.
Um dispositivo inexistente não consta da sentença e o único comando possível é
o de que tal dispositivo seja posto porque a prestação jurisdicional não se completou.
A ilegalidade e o abuso de poder são firmados com a inovação, a justificação ou a
validação de dispositivo nulo, ou com a rescisão sem pedido legítimo do órgão acusador
vencido nos embargos declaratórios.
"Ainda que o primeiro julgamento não tenha se completado, uma segunda persecução
pode ser enormemente injusta. Ela aumenta o ônus emocional e financeiro do
acusado, prolonga o período durante o qual ele permanece estigmatizado por uma
acusação não resolvida, e faz até mesmo crescer o risco de que um acusado inocente
venha a ser condenado. O perigo de tal injustiça contra o acusado existe sempre que
um julgamento é abortado antes da sua conclusão. Conseqüentemente, como regra
geral, o Promotor tem uma - e apenas uma - oportunidade de levar um acusado a
julgamento''
[U. S. Supreme Court, Arizona v. Washington, (1978).]
A devida fundamentação é imprescindível à obediência da garantia constitucional do
processo.
Os sujeitos processuais têm o direito de tomarem conhecimento das razões e dos
motivos de quem os governa na relação processual. Principalmente quando o ato de
governo fere o ius libertatis do processado. Em respeito aos princípios
constitucionais da ampla defesa, da individualização da pena e motivação das
decisões.
202
Byron Seabra Guimarães, como Relator
A segurança processual está ancorada pela natureza declaratória da sentença
condenatória, ou seja, a condenação deve ser uma conclusão fundada na relação fatodireito e não num ditado do julgador.
Embora seja possível realizar a "interpretação justificativa da pena", essa
operação confirma que o juízo (operação mental) não foi feito na origem e está sendo
feito posteriormente.
Dizer que o "juiz pensou mas não escreveu" corresponde a atribuir-lhe a
infalibilidade intelectual para justificar a falha de expressão.
A sentença, como ato motivado, não pode ser uma simples referência ao conteúdo
ou uma consequência natural da denúncia, daí que o legislador, para segurança dos
condenados, impôs que o prolator obedeça aos róis de exigência de conteúdo expresso e,
onde permitiu coisa diferente da precisão absoluta empregou o termo "sucinta". (CPP,
art. 381 - A sentença conterá: ... II - a exposição sucinta da acusação e da defesa;).
E então a sentença que não declara o conteúdo das elementares da culpabilidade
ou não declara o grau de censura, é nula.
E o nulo não se executa, porque, embora exista não pode produzir efeitos.
É necessária a mais especial atenção para a sutil figura da competênciajurisdicional "oportunista" que se vale de recurso da defesa para buscar efeitos em
prejuízo do réu.
Porque, então, os juizes tomam um compromisso de defender a Constituição? Este
compromisso certamente se aplica de maneira especial à sua conduta oficial. Como
seria imoral impor isto a eles, se se pretendesse usá-los como instrumentos - e
203
instrumentos conhecidos - para violar o que eles juraram defender! Por que um Juiz
juraria desempenhar os seus deveres de acordo com a Constituição (dos Estados
Unidos), se a Constituição não obrigasse o governo? Se este se fechasse para ela e
não pudesse ser fiscalizado por ela ? "
(Caso Malbury vs. Madison, Justice Marshall- julgado em 1803 - Tradução de Ana Clara
Victor da Paixão, Advogada, Assessora da 23ª Procuradoria de Justiça Criminal)
Em conclusão, a única solução dentro da ordem jurídica e do regime democrático
é a concessão da ordem de Habeas Corpus para suspender a execução da pena.
“Para que uma sociedade subsista, é preciso que haja leis, como é
preciso haver regras para cada jogo." - (Voltaire)
17.3
Do devido processo legal
Art. 5º...
LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo
legal;
"O princípio se caracteriza pela sua excessiva abrangência e quase que se confunde
com o Estado de Direito. A partir da instauração deste, todos passaram a se
beneficiar da proteção da lei contra o arbítrio do Estado. É por isto que hoje o
princípio se desdobra em uma série de outros direitos, protegidos de maneira
específica pela Constituição. Contudo, a sua enunciação no Texto Constitucional não
é inútil, pelo contrário, ela tem permitido o florescer de toda uma construção
doutrinária e jurisprudencial que tem procurado agasalhar o réu contra toda e
qualquer sorte de medida que o inferiorize ou impeça de fazer valer as suas
204
autênticas razões.”“.
(Celso Ribeiro Bastos e Ives Gandra Martins, Comentários à Constituição do Brasil, 2º
Vol., ed. Saraiva, São Paulo, 1988, p. 261 e 262).
"Já vimos, mais acima, a abrangência extremamente lata do princípio. As inferências
que dele podem se tirar são, no fundo, a nosso ver ilimitadas. Algumas delas a
própria Constituição vai fazê-lo anotando como direitos autônomos nos parágrafos
subseqüentes. Ainda assim, contudo o princípio do devido processo extravasa o
elenco constitucional. Para se constatar a variedade de direitos que podem ser
extraídos é interessante o confronto entre três autores que se propuseram a enunciar
catálogos destas garantias. Nelas por certo vamos encontrar muitas repetições, mas
ainda assim é forçoso reconhecer que todas apontam para direitos reconhecidos
pelos outros”.
(Celso Ribeiro Bastos e Ives Gandra Martins, Comentários à Constituição do Brasil, 2º
Vol., ed. Saraiva, São Paulo, 1988, p. 263).
"Trata-se, no dizer de PEDRO J. BERTOLIN, ao analisar assemelhadas
preceituações constitucionais do direito argentino, e especificando-as ao processo
penal, da "primeira e mais genérica manifestação técnico-jurídica" do due process of
law, correspondente ao estabelecimento da garantia constitucional em si mesma
considerada. E consubstancia-se, sobretudo, como igualmente assentado, numa
garantia conferida pela Magna Carta, objetivando a consecução dos direitos
denominados fundamentais, mediante a efetivação do direito ao processo,
materializado num procedimento regularmente desenvolvido, com a concretização de
todos os seus respectivos componentes e corolários, e num prazo razoável.”
(Rogério Lauria Tucci, Direitos e garantias individuais no processo penal brasileiro, ed.
Saraiva, São Paulo, 1993, p.64, 66 e 69).
205
"A Constituição Federal de 1988 consagra o princípio do devido processo legal, no
seu art. 5º, inciso LIV. Este princípio, originado da cláusula do due process of law do
Direito Anglo- Americano, deve ser associado aos princípios constitucionais do
controle judiciário - que não permite à lei excluir da apreciação do Poder Judiciário
lesão ou ameaça a direito - e das garantias do contraditório e da ampla defesa, com
os meios e recursos a ela inerentes, segundo o disposto nos incisos XXXV e LV do
mesmo artigo da Constituição. A garantia da prestação jurisdicional, com a devida
presteza e sem procrastinações, é corolário do devido processo legal. E quando a
expressão refere-se a processo e não a simples procedimento, alude sem dúvida ao
processo judicial pelo Estado, segundo os imperativos da ordem jurídica, e com as
garantias da isonomia processual, da bilateralidade dos atos procedimentais, do
contraditório e da ampla defesa. Penso ainda que a igualdade perante a lei e o
devido processo legal são princípios constitucionais complementares entre si, pois os
princípios da legalidade e da isonomia - essenciais ao Estado Democrático de Direito
- não fariam qualquer sentido sem um poder capaz de fazer cumprir e pôr em prática,
para todos, com a necessária presteza, a Constituição e as leis do país."
(Geraldo Brindeiro, Correio Brasiliense, DIREITO & JUSTIÇA, Brasília, 10/06/96, p. 3).
17.4
Da dignidade da pessoa humana
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos
Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de
direito e tem como fundamentos:
III - a dignidade da pessoa humana;
"A referência à dignidade da pessoa humana parece conglobar em si todos aqueles
direitos fundamentais, quer sejam os individuais clássicos, quer sejam os de fundo
206
econômico e social. Em última análise, a dignidade tem uma dimensão também
moral. São as próprias pessoas que conferem ou não dignidade às suas vidas. Não foi
este sentido, todavia, o encampado pelo constituinte. O que ele quis significar é que o
Estado se erige sob a noção da dignidade da pessoa humana. Portanto, o que ele está
a indicar é que é um dos fins do Estado propiciar as condições para que as pessoas
se tornem dignas. É lembrar-se, contudo, que a dignidade humana pode ser ofendida
de muitas maneiras. Tanto a qualidade de vida desumana quanto a prática de
medidas como a tortura, sob todas as suas modalidades, podem impedir que o ser
humano cumpra na terra a sua missão, conferindo-lhe um sentido. Esta é uma tarefa
eminentemente pessoal. O sentido da vida humana é algo forjado pelos homens. O
Estado só pode facilitar esta tarefa na medida em que amplie as possibilidades
existenciais do exercício da liberdade."
(Celso Ribeiro Bastos e Ives Gandra Martins, Comentários à Constituição do Brasil, 1º
Vol., ed. Saraiva, São Paulo, 1988, p. 425).
17.5
Da sociedade livre, justa e solidária
Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;
"A justiça é um dos valores fundamentais, transcendendo o próprio direito. Tem ela
na verdade razões ético-religiosas. O homem revolta-se contra a injustiça. O dar a
cada um o que lhe pertence parece constituir-se princípio mínimo para a convivência
humana. Nada obstante isto, a história demonstra que são muito poucas as
sociedades que se aproximaram, ainda que imperfeitamente, deste ideal. As
desigualdades humanas, a distinção entre governantes e governados, entre ricos e
pobres, entre poderosos e desvalidos, entre fortes e fracos têm sido uma constante.
207
Daí ter o Estado um papel importante na restauração destes desequilíbrios e destas
desigualdades. Mas o que o Texto Constitucional impõe não é aquela igualdade
acenada pelos países autoritários, mas sim a igualdade compatibilizada com a
liberdade. Isto significa dizer que um valor não pode ser obtido pelo esmagamento do
outro. É necessário que a liberdade seja utilizada com equilíbrio, moderação até
mesmo com limites. As próprias liberdades públicas só podem ser feitas valer na
forma da lei. A liberdade incondicionada leva à injustiça. É tarefa, pois, das mais
difíceis esta de conciliar a liberdade com a igualdade, mas é sem dúvida um objetivo
a que não escapa o Estado Moderno de Direito. No entanto, para que as injustiças
sociais sejam vencidas, é necessário que se supere uma concepção egoísta de vida.
Daí a Constituição agregar aos dois valores já referidos o da solidariedade. De fato,
são tão grandes as fraquezas humanas e tão árduas e penosas as dificuldades e
antagonismos que se lhes antepõem, que de pouco valerão a liberdade e a igualdade
jurídica, se elas não forem regadas por um espírito de solidariedade com o próximo.
Por seu turno, esta solidariedade não poderá limitar-se a um estado interior, a um
sentimento, ao amor dos nossos irmãos. Haverá de traduzir-se em formas efetivas de
aproximação, em que ao conflito se faça substituir a confraternização e a
colaboração."
(Celso Ribeiro Bastos e Ives Gandra Martins, Comentários à Constituição do Brasil, 2º
Vol., ed. Saraiva, São Paulo, 1988, p. 261E 262).
208
18
UMA METODOLOGIA PARA MEDIR A CULPABILIDADE
Ilustração 5: Imputabilidade Geral
209
IMPUTABILIDADE é a capacidade de resposta ao Direito Penal, presumida aos
18 anos de idade, podendo ser denominada por IMPUTABILIDADE GERAL para
efeito de estudo.O Código Penal assinala que a IMPUTABILIDADE GERAL pode ser
plena, reduzida, ou inexistente (IMPUTÁVEL, SEMI-IMPUTÁVEL e
INIMPUTÁVEL, distinguindo a incidência da pena.
A diminuição da capacidade de resposta conduz à semi-imputabilidade ou à
inimputabilidade.
É razoável afirmar que após os 18 anos o indivíduo pode aumentar ou diminuir a
capacidade de resposta em relação ao marco inicial.
É o aumento da capacidade de resposta que pode ser aferido em relação a dois
indivíduos de mesma idade mas portadores de acervos diferenciados de habilidades.
A este aumento está sendo dado o nome IMPUTABILIDADE ESPECIAL.
O aumento da capacidade de resposta, por aquisição de novas habilidades
psíquicas e conhecimentos, indica que pode existir, para dois indivíduos maiores de 18
anos e de mesma idade, aquisições diferentes que diferenciem a capacidade de resposta
acima do marco legal de 18 anos. A imputabilidade geral é condição de procedibilidade:
é bastante que tenha completado 18 anos.
A IMPUTABILIDADE ESPECIAL (parte verde escura externa à
imputabilidade geral) é um aumento não necessário da imputabilidade geral que, ao
diferenciar os indivíduos, produz uma espécie de individualização da imputabilidade
(capacidade de resposta individualizada) sinalizadora de que a conduta no momento do
fato-penal é dependente da IMPUTABILIDADE ESPECIAL na medida em que o
indivíduo porte habilidades maiores ou menores para agir na conjuntura do evento que
210
resultou em fato-penal.
A IMPUTABILIDADE ESPECIAL funcionará, então, como condicionante de
que o indivíduo possa compreender melhor que sua conduta é (ou não) injusta e possa
(ou não) adotar conduta diversa.
Enquanto a IMPUTABILIDADE GERAL é condição de procedibilidade a
IMPUTABILIDADE ESPECIAL é elemento da culpabilidade, orientadora da
potencial consciência do injusto e da exigibilidade de conduta diversa. Por “orientadora”
está sendo dito que a IMPUTABILIDADE ESPECIAL não determina os outros
elementos mas interage com as circunstâncias do fato da conduta, circunstâncias essas
que podem ser dominantes em relação às habilidades portadas.
Ilustração 6: Imputabilidade Especial
211
Ilustração 7: Caminho crítico da decisão
212
A IMPUTABILIDADE GERAL habilita a declaração de CULPADO, de
procedência da denúncia, ou de procedência da acusação, o que determina a incursão no
tipo e anuncia a faixa de sanção legal.
18.1
O que medir
MEDINDO O GRAU DE CULPABILIDADE II
Fig. 09
3
ABAIXO
DA
MÉDIA
4
5
ACIMA
DA
MÉDIA
ENTRE A
MÉDIA E A
MÁXIMA
ABAIXO
DA
MÁXIMA
M ÁXIM A
2
ENTRE A
MÍNIMA E A
MÉDIA
m é dia
m ínim a
1
ACIMA
DA
MÍNIMA
6
7
8
9
Ilustração 8: Medindo o grau de culpabilidade
CULPADO é uma palavra reservada para os autores de condutas censuráveis,
não sendo utilizada, por exemplo, para responsabilizar (relação autoria-fato) um técnico
pela vitória do time. No entanto, no caso do técnico, tornando-se ele merecedor de uma
recompensa, tal será estabelecida (medida) em função do emprego de suas habilidades
ou qualidades pessoais e não apenas por ser o técnico ou porque o time adversário fez
gol contra ou era de pernas de pau.
213
Os cálculos com tempos de calendário não são de fácil manejo com lápis e papel,
podendo ser automatizados em uma planilha de cálculo, e esta planilha pode também
não ser de fácil montagem, de sorte que é oferecida uma CALPEN no CD anexado ao
livro.
Para efeitos matemáticos a culpabilidade é uma grandeza (algo que pode ser
medido).
Para medir uma grandeza é necessário definir a escala e unidade.
Na medida de temperatura é adotada a escala centesimal definida como o
intervalo entre a temperatura de congelamento e a temperatura de ebulição da água, em
condições normais, e a unidade é o grau centesimal, ou centésima parte do intervalo, e
desse modo uma temperatura de 33ºC significa 33 graus acima da mínima.
A escala da culpabilidade está sendo definida como o intervalo entre a mínima e a
MÁXIMA dividido em 8 partes, e a unidade é o “grau de censura”.
Seja visualizado como funciona essa correspondência.
O importante neste passo é entender que a culpabilidade é uma grandeza e,
como visto na Ilustração 3. a quantidade de uma grandeza fica definida por uma
unidade e uma escala.
Na Ilustração 9 pode ser definido que a unidade é o grau e a escala é
mínimo/máximo, com o que é estabelecida a correspondência entre a culpabilidade e a
sanção pois a unidade da sanção é o tempo e a escala é a mínima/máxima.
Grandezas, escalas e unidades necessitam de publicidade para que todas as
pessoas possam lidar com elas, mas isto não representa dificuldade subjetiva, já que uma
declaração simples como “adotada a escala de 1 a 9 é atribuído o grau X à
214
culpabilidade”, como será visto mais adiante.
Ilustração 9: Medindo o grau de culpabilidade I
215
A idéia do grau de culpabilidade originada no art. 29 do CP é permitir que as
participações sejam distinguidas no ato de julgamento (antecedente) e não na declaração
da pena (consequente) garantindo a fundamentação.
Com uma escalade culpabilidade definida de 1 a 9 graus e exemplo de duas
faixas de sanção a correspondência é nítida.
Entre 1 e 9 pode ser atribuído qualquer grau, como por exemplo 2,7. Isto dificulta
a emissão de uma declaração subjetiva (ligeiramente abaixo do entre a média e a
mínima), mas pode ser facilmente contornado se a escala é declarada: na escala de 1 a 9
é atribuído 2,7 para a culpabilidade.
A crítica a essa metodologia é a de que o direito não é matemática, mas a fixação
de pena é tão matemática que são usadas quantidades referidas com números e frações
ordinárias para aumentar ou diminuir esses números.
Sabido que a pena base é formada também pelas demais circunstâncias do art. 59
do CP é necessário garantir que a pena base para um determinado grau de culpabilidade
seja uma declaração correspondente ao grau declarado e não seja confundida com graus
superiores ou inferiores.
216
Fig. 11
INTERVALO DE ENTORNO
Entorno do ponto
2
3
4
1
0,5
1
0,5
0,5
0,5
Ilustração 10: Intervalo de entorno
Seja o exemplo de 2 a 4:
2,01 < C1 < 2,50
2,51 < C2 < 3,49
3,51 < C3 < 4,00
Os pontos da escala da culpabilidade são equidistantes e, então, o intervalo de
entorno de um ponto deverá ser menor do que a metade da distância entre um ponto e
outro, ou seja: 0,49.Para que tal confusão não ocorra trabalha-se com o conceito de
217
intervalo de entorno, e tal será mostrado para pontos equidistantes como é o caso dos
graus da culpabilidade.
Deste modo é assegurado que a pena base estará sempre mais próxima, ou
sempre referida, ao grau de culpabilidade declarado.
Retomando a Ilustração 10 para a faixa de sanção de 2 a 8 anos, com um grau de
culpabilidade igual a 7, atribuindo uma pena base no entorno de 6,5 anos, as flexões
impostas pelas demais circunstâncias do art. 59 não poderão descaracterizar os 6,5 anos,
de tal modo que a pena base a ser declarada fica limitada entre 6,5–x e 6,5+x.
Continuando na Ilustração 10 e na faixa de sanção de 2 a 8 anos, sendo 9 os graus
de culpabilidade e 8 INTERVALOS (retorne à figura e conte os intervalos), a cada grau
corresponderá um acréscimo de (8-2)/8=0,75 anos
Os que se interessam pela matemática podem acompanhar o desenvolvimento da
fórmula que será utilizada na calculadora de penas:
m (pena mínima)
M (pena máxima)
f (intervalo de sanção)
g (graus da escala de culpabilidade)
A (acréscimo por grau de culpabilidade)
P (pena base não flexionada)
218
f=M–m
A = (M-m)/g = f/g
P = m + A(g-1)
Seja para a faixa de 2 a 8 anos com
grau de culpabilidade igual a 8:
f = M-m = 8 – 2 = 6
A = f/g = 6/8 = 0,75
P = m+A(g-1) = 2 + 0,75 x (8-1) =
7,25 [c.q.d. (conferir na tabela)]
GRAU MÍNIMO ACRÉSCIMO TOTAL
ZERO
1
2
3
4
5
6
7
8
9
ZERO
2,00
2,00
2,00
2,00
2,00
2,00
2,00
2,00
2,00
ZERO
0,00
0,75
1,50
2,25
3,00
3,75
4,50
5,25
6,00
ZERO
2,00
2,75
3,50
4,25
5,00
5,75
6,50
7,25
8,00
18.1.1
A função das demais circunstâncias do art. 59
Já ficou definido que a culpabilidade é determinante da pena, e por enquanto
basta entender que para uma culpabilidade de grau ZERO existirá ZERO pena.
Já ficou definido, também, que o intervalo de entorno é a metade do intervalo
entre os pontos, lembrando que a função do entorno é não deixar que a declaração inicial
do grau de culpabilidade resulte descaracterizado.
Seja retomada a Tabela ... e sejam vistos os graus 4, 5 e 6 aos quais correspondem
penas de 4,25 e 5,00 e 6,75 anos.
O intervalo entre 4,25 e 5,00 é 0,75 (observe que o intervalo entre dois pontos
sucessivos é igual ao acréscimo) e o entorno será 0,75/2=0,375.
Desta sorte, para uma declaração de culpabilidade grau 4 numa faixa de sanção
de 2 a 8 anos a pena base não flexionada poderá ficar entre 4,25-0,375=3,875 anos e
219
4,25+0,375=4,625
São 7 as circunstâncias que flexionam a pena base relativa ao grau declarado e é
preciso considerar que sendo todas desfavoráveis ou favoráveis a pena base deverá ficar
dentro do entorno.
Este método limitante evita que sejam atribuídas às circunstâncias flexionadoras
(prevenção individual) força reprovadora que indique grau de culpabilidade diferente do
declarado.
A calculadora fará todos os cálculos em anos, meses e dias, promovendo os
arredondamentos de fração de dia para mais ou para menos conforme a flexão se dê para
mais ou para menos, e de modo a que o mínimo de um intervalo não coincida com o
máximo de outro, valendo lembrar que o menor tempo de pena possível pelo Código
Penal é de 1 (um) dia, ou 1/365 do ano, que é igual a 0,0027.
Não se preocupe com a lógica dos cálculos, mas procure compreender que o
entorno de um grau declarado estará SEMPRE mais perto deste grau do que dos graus
anterior ou seguinte.
Retomando o cálculo anterior para o grau de culpabilidade 4 numa faixa de
sanção de 2 a 8 anos, com resultado não flexionado de 4,25 anos (4 anos e 3 meses),
pretende-se que a pena base declarada NÃO INVADA O ENTORNO do grau anterior ou
do seguinte.
220
Ilustração 11: Flexionando com as circunstâncias
A operação não é limitante do poder discricionário, ou seja, o magistrado pode
aplicar toda a força flexionadora a uma só circunstância mas a soma das forças
flexionadoras aplicadas a cada circunstância não ultrapassará o total previsto para
flexionar.
No caso calculado o máximo da força flexionadora é de 0,375 (+ ou – 0,0027) e o
magistrado poderá adotá-lo integralmente para uma única circunstância ou dividí-lo em
221
parcelas (iguais ou diferentes) para cada uma das 7 circunstâncias. A complexidade deste
cálculo é resolvida pela calculadora.
18.1.2
Análise das demais circunstâncias
O Direito Penal pretende reprovar o autor de crime pelo que ele fez (conduta
censurada) em comparação com o que ele poderia ter feito (conduta exigível), e neste
aspecto pouco importa se ele é um bom ou um mau sujeito.
Para lidar com os bons e os maus sujeitos o Direito Penal assinala que a pena
atenderá também à prevenção e, como a pena é individual a prevenção na pena
individual também o será, considerado que o indivíduo não pode ser reprovado pelo que
ele é, razão pela qual as demais circunstâncias foram tratadas, nos cálculos, como
flexionadoras da pena determinada pelo grau de reprovação.
Tal pensamento assegura que o indivíduo pode ser tão bom ou mau quanto for
que, em não cometendo crime, o Direito Penal não se interessa por ele. Mas, em
comentendo crime o Direito Penal o reconhecerá como pessoa humana tanto para a
reprovação quanto para a prevenção, e cuidará de que a segunda não se confunda com a
primeira e nem força igual a ela possa ter.
Antecedentes: não podem resultar em quantidade de pena significativa, sem que
esteja sendo imposta sanção sobre sanção já aplicada, ou antecipando sanção a ser
aplicada o que produz uma cascata pois a sentença futura poderá considerará a anterior
como antecedente.
Conduta Social: Considerando que exista uma conduta regular para a sociedade
em que o culpado vive (individualização) é sobre sua conduta nesta sociedade que
deverá incidir a análise e não sobre a conduta na sociedade cenário do crime, uma vez
222
que o crime sempre será um desvio da regularidade da sociedade onde ele acontece. Esta
circunstância, inevitavelmente, avalia a conduta de vida, atribuindo ao autor a
periculosidade social..
Exemplo desta possibilidade é fornecido por Zaffaroni:
"O sujeito de maus hábitos os terá adquirido por freqüentar tabernas e prostíbulos;
esta conduta é claramente atípica, mas quando a ele se reprova sua "condução de
vida", que desemboca num homicídio, estaremos reprovando sua conduta anterior de
freqüentar tabernas e prostíbulos, isto é, a reprovação da conduta de vida é a
reprovação de condutas anteriores atípicas, que o juiz considera contrárias à ética
(quando na realidade podem ser contrárias apenas a seus próprios valores
subjetivos). A culpabilidade pela conduta de vida é o mais claro expediente para
burlar a vigência absoluta do princípio da reserva e estender a culpabilidade em
função de uma "actio inmoral in causa", por meio da qual se pode chegar a reprovar
os atos mais íntimos do indivíduo"
(Manual de Direito Penal Brasileiro, pág. 612).
Citado em Teorias do dolo: uma simples referência histórica - Elaborado em
02.2000. - Carlos Otaviano Brenner de Moraes - procurador de Justiça no Rio
Grande do Sul, ex-corregedor-geral do Ministério Público, professor nas Escolas da
Ajuris, do MP/RS, do Centro de Estudos Jurídicos/RS e do Instituto de
Desenvolvimento Cultural, professor licenciado da Faculdade de Direito da PUC/RS
http://jus2.uuol.com.br/doutrina/texto.asp?id=957http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?
id=957
Personalidade: tal circunstância deveria ser retirada do rol, vez que sua análise
tem sido desvirtuada por profissionais do Direito que emitem opinião como Psiquiatra
223
ou Psicólogo, sem possuir a habilidade específica, decorrendo que a análise não pode ir
além da impressão havida durante o contato pessoal (interrogatório) do sentenciante com
o condenado. Esta circunstância tende para o direito penal do autor revivendo a
periculosidade.
Motivos do Crime: existindo motivos típicos apresentados nas qualificadoras,
causas e circunstâncias genéricas, é evidente que de qualquer motivo que não seja legal
não pode derivar reprovação. Os motivos do crime são um componente da propulsão
volitiva da conduta e essa circunstância tende a revalorizar motivações inerentes ao tipo,
tal como a libido exacerbada nos crimes sexuais, a cobiça no crime de furto, o desprezo
pela vida nos crimes de homicídio etc.
Circunstâncias do Crime: existindo circunstâncias apresentadas nas
qualificadoras, causas e circunstâncias genéricas, sobram as não tipificadas que – no
sentido claro de estarem ao redor – exerçam o que pode ser chamado de “pressão do
entorno”, como no caso de o agente ter sido agredido verbalmente na presença de
pessoas às quais imagina dever uma “atitude” ou, desfavoravelmente, valer-se de
situação em que não terá sua conduta “testemunhada”
Consequências do Crime: afastadas as consequências que são o próprio resultado
previsto no tipo (a morte no homicídio, a diminuição do patrimônio no furto etc.), é
evidente que de uma consequência que não seja legal não pode derivar sanção, assim
como não pode o agente ser punido por alguma coisa que não esteja no seu domínio
consciente, por exemplo, que a vítima do homicídio esteja desempregada e deixará viúva
e filhos sem pensão por morte.
Conduta da Vítima: as excludentes da ilicitude, algumas excludentes da
culpabilidade e algumas diminuidoras pelo valor da conduta, são operadas pelas
224
circunstâncias da conduta da vítima. Esta circunstância foi introduzida para privilegiar
autores de crimes que são “provocados” ou “facilitados” pelas vítimas (agressão sexual a
mulheres escassamente vestidas e provocantes, furto de coisa displicentemente deixada
ao alcance, destempero verbal etc.). Sua força diminuidora circunstancial não pode
concorrer com os motivos do crime nem com a culpabilidade.
Não é incomum, na prática, que entre a culpabilidade e as demais circunstâncias
exista uma certa “transferência” de conteúdo a firmar que todas sejam consideradas em
“bloco”, ou que a culpabilidade seja definida pelas circunstâncias judiciais à sua frente
no texto.
Interpreto que se assim devesse ser o legislador teria se valido de pontuação
dando sentido explicativo à culpabilidade (culpabilidade:), ou não teria redigido as
demais circunstâncias, deixando a critério da doutrina a determinação do conteúdo, ou
não teria empregado o termo culpabilidade.
A interpretação mais consistente é a de que as vírgulas entre as circunstâncias
funcionam como conectores “e”, conferindo autonomia a cada uma delas, o que é
confirmado pela jurisprudência que considera nulo o dispositivo que deixou de analisar
alguma ou algumas.
Em resumo: não pode existir reprovação incidente sobre o que o agente é, sobre
sua conduta de vida anterior ao crime, ou por algo que não esteja no seu domínio do
fato, ficando as demais circunstâncias judiciais dedicadas à prevenção, mas a uma
simples prevenção assinaladora, também necessária e suficiente.
[Culpabilidade + Circunstâncias] ⇒ [Pena Base]
[Pena Base] ⇒ [Culpabilidade + Circunstâncias]
225
[Culpabilidade + Circunstâncias] ⇔ [Pena Base]
A bicondicional ou equivalência, é, como o nome e o símbolo indicam, uma forma de
indicar abreviadamente a existência de uma implicação recíproca entre duas
proposições, ou seja, a composição de duas proposições que são simultaneamente
conseqüente e antecedente uma da outra, e, portanto, simultaneamente condição
necessária e suficiente uma da outra.
O cálculo proposicional: conectivas
http://www.esffranco.edu.pt/Fil/logica/logim032.hhtml 29/05/08 05:59:04
Estão expostas razões para a limitação da força flexionadora das demais
circunstâncias judiciais na fixação da pena base.
19
RESUMO DOUTRINÁRIO
O primeiro dos meus questionamentos sobre o Direito foi se seria assim algo tão
“humano” que, cada um tendo o seu próprio sentimento, não pudesse ser algo comum de
todos.
Após descobrir que o comum de todos podia ser uma necessidade de organização
- conquanto não deixasse de ser um sentimento coletivo - dediquei maior atenção na
procura do sentido do direito como uma espécie de organizador, buscando em primeiro
lugar se ele mesmo, o Direito, era organizado a ponto de, sendo compreendido, induzir
que todos se conduzissem conforme organizado.
Para validar o Direito como organizador das coisas foi necessário verificar se os
ideais e os fatos geradores da norma possuíam organização conhecida de modo que a
criação cultural fosse um reflexo da vida em todos os seus aspectos.
226
MIGUEL REALE foi minha orientação na compreensão da gênese normativa.
MAJADA PLANELLES foi quem me apresentou o resumo, ao dizer que “no és
posible olvidar que el derecho ha de seguir al hecho como la sombra al cuerpo, si no
se quiere crear um divorcio entre la ley y la vida”.
EVERARDO DA CUNHA LUNA ancorou meus pés no chão ao repudiar a
existência de um mundo jurídico no qual as coisas deveriam acontecer
independentemente das realidades.
Assim, adotei como método passar o Direito por tantas lógicas quanto possíveis
para verificar a consistência.
LOURIVAL VILANOVA foi o condutor dos primeiros passos com sua LÓGICA
JURÍDICA (LEJJBL, 1976):
“Então, falar de lógica jurídica seria dar acolhimento ao extra-lógico, à
concrescência ontológica do objeto jurídico. Importaria em ultrapassar aquele
núcleo minimo de objeto ((o objeto em geral, l'object quelconque), suporte do logos,
o mínimo semântico na linguagem moderna, ou o mínimo ontológico, na linguagem
clássica, e alcançar o fato específico do direito, na medida em que ele pode se
revestir de uma forma lógica.” (p. 80)
O emprego de demonstrações lógico-algébricas (expressões booleanas) pode ser
estranho para os profissionais do direito, mas tem justificativa doutrinária dentro do
próprio direito.
“De um modo geral, a Lógica Paracompleta pode ser concebida como a lógica
subjacente a teorias incompletas, como o Direito, haja vista a formulação de
linguagens paracompletas hierarquizadas, com extensões, complementações e
predicações (a partir de propriedades Booleanas) desenvolvidas e cabalmente
227
demonstradas.”
Alguns aspectos da lógica e da informática jurídicas - Maria Francisca Carneiro http://www.parana-online.com.br/canal/direito-e-justica/news/250998/ - acessado
08/06/09 13:11:30
19.1
OBJETIVO
Demonstrar que a culpabilidade é uma vinculação sucessiva entre a previsão legal
e a imposição de pena, devendo sua presença (contrário de ausência) ser verificada em
pelo menos três momentos (artigos citados do Código Penal):
1. no tipo (culpável)
Art. 18 - Diz-se o crime:
Parágrafo único - Salvo os casos expressos em lei, ninguém pode ser punido por fato
previsto como crime, senão quando o pratica dolosamente.
2. na condenação (culpado)
Art. 18 - Diz-se o crime:
I - doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo;
II - culposo, quando o agente deu causa ao resultado por imprudência,
negligência ou imperícia.
3. na fixação da pena (culpabilizado)
Art. 59 - O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à
personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime,
bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e
suficiente para reprovação e prevenção do crime:
228
Tormentoso lidar com algo que apresenta a cada momento uma nova face mas
não muda de nome. Sugestivo, então, que sejam atribuídos apelidos para cada face.
Em cada um dos momentos a culpabilidade aparece como pressuposto
(antecedente ou condição suficiente) legitimante de uma ocorrência (conseqüente ou
condição necessária).
Aparentemente o legislador, ao final do artigo 59, quis conferir maior precisão na
aplicação da pena explicitando os termos “necessário e suficiente”.
20
20.1
TERMO
CONDIÇÃO SUFICIENTE
(ANTECEDENTE)
CONDIÇÃO NECESSÁRIA
(CONSEQÜENTE)
CULPÁVEL
CULPA VERIFICÁVEL
RECEBIMENTO DA DENÚNCIA
CULPADO
CULPA VERIFICADA
PROCEDÊNCIA DA DENÚNCIA
CULPABILIZÁVEL
CULPA AFERIDA
REPROVAÇÃO
ANOTAÇÕES SOBRE O DIAGRAMA
condição de punibilidade
O ponto de corte do art. 27 do Código Penal (menores de dezoito anos) estabelece
a inimputabilidade e forma a presunção da imputabilidade (maior de 18 anos),
estabelecendo uma forma lógica digital ou de estados (NÃO/SIM):
(notação adotada “C” para ser lido como NÃO CÊ)
229
INIMPUTÁVEL → 0 (zero) → C = 0
IMPUTÁVEL → 1 (um) → C = 1 (notação adotada “C”)
A presunção de imputabilidade (C=1) é construída a partir de fatos conhecidos
(higidez biopsíquica) que têm como conseqüências a capacidade (C), admitida prova em
contrário (presunção relativa) (C=0; 0<C<1).
A prova em contrário é admitida no sentido de limitar (0<C<1) ou elidir (C=0) a
capacidade que é tida como existente (C=1).
De acordo com o art. 26 do Código Penal a condição de impunibilidade
(inimputabilidade) é o indivíduo ser “... inteiramente incapaz de entender o caráter
ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.”
INTEIRAMENTE INCAPAZ = ZERO  C=0
se
ENTENDIMENTO = ZERO  E=0
ou
DETERMINAÇÃO = ZERO  D=0
A inimputabilidade é estabelecida em função da incapacidade de resposta à
solicitação (sanção) do direito penal.
É esperado que a sanção surta efeito (promoção de harmônicas condições para a
230
integração social, conforme art. 1º da LEP), de tal sorte que a notação C=0 é uma
“entorno à direita de zero” dentro do qual não pode ser exigida resposta (parte preta da
faixa a seguir).
A redução de pena (semi-imputabilidade) opera no intervalo compreendido entre
o ponto à direita do entorno de zero e o ponto imediatamente à esquerda de um.
Apenas a imputabilidade como condição de punibilidade é absoluta C=1.
20.2
Equação do inteiramente incapaz
A proposição do art. 26 é de lógica negativa (incapaz):
(+ é notação booleana para a função “ou”, NÃO É ADIÇÃO)
C=E+DC=1+0=0C=0+1=0C=0+0=0
231
Ilustração 12: Escala da imputabilidade
20.3
Equação do não inteiramente capaz
A proposição do parágrafo único do art. 26 do Código Penal (redução de pena
ou semi-imputabilidade) é o indivíduo ser “... não era inteiramente capaz de entender o
caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.”
(notação adotada “<C”)
NÃO INTEIRAMENTE CAPAZ (< UM)  <C=<1
232
se
(ENTENDIMENTO < UM) E<1
ou
(DETERMINAÇÃO < UM)  D<1
para 0<C<1
<C = <E + <D = <1
<C = <1 + <1 = <1  <C = 1 + <1 = <1  <C = <1 + 1 = <1
É esta a proposição que permite deduzir a condição de IMPUTABILIDADE em
razão do conectivo “ou”.
Sendo a redução representada pelo operador “<” (menor que) a inversão seria
representada pelo operador “>” (maior que), no entanto, como a lógica da
imputabilidade como condição de punibilidade (*) é C/C (NÃO/SIM) e pode ser
representada por 0/1 (ZERO/UM), fica definido que:
para C = 0 (INIMPUTÁVEL) e C = 1 (IMPUTÁVEL)
C = 1 se e somente se C = 1 . 1 = 1
C = 1.0 = 0  C = 0.1 = 0
233
(o ponto “.” é a notação para o conectivo “e” que corresponde ao atendimento
simultâneo de duas condições)
(*) a hipótese “>1” (à direita de um) não pertence à imputabilidade como condição
de punibilidade, e será vista mais adiante como condição de reprovabilidade.
20.4
Do advérbio “inteiramente”
Diante do advérbio “inteiramente” é possível afirmar que a imputabilidade é uma
potência (capacidade aferida igual a um) mas não é possível afirmar que seja um
potencial (capacidade verificada mas não aferida) pois, para efeito de operar como
condição de punibilidade o valor da imputabilidade é sempre igual a 1 (um) qual seja,
não existe diferença individual entre indivíduos imputáveis para efeito de verificação da
condição de punibilidade.
20.5
Entender inteiramente o caráter ilícito do fato
Como primeiro termo da equação da imputabilidade o entendimento por inteiro
admite o entendimento de tratar-se de uma “potência” [capacidade verificada existente e
aferida], mas não admite seja tomado por “potencial” [capacidade verificada existente
mas não aferida] à vista de que a integridade da capacidade não pode ser imprecisa ao
ser tomada como condição de punibilidade e a dúvida solvida contra o réu.
A expressão “potencial consciência do ilícito” não guarda equivalência com
“entendimento do caráter ilícito do fato”, nem com “potencial consciência do injusto”.
“A autonomia entre o ilícito e o injusto aparece nos casos de mercado, quando a
procura força para o alto o preço de um bem, privando algumas pessoas de adquiri234
lo, o que pode ser injusto, mas não é ilícito e nem é normativo.
Nada impede, porém, que o ilícito e o injusto coabitem no mesmo fato-penal: o
ilícito porque o fato-penal possui um verbo normativo que conjugado (ação
censurada) realiza o tipo; o injusto porque o autor do fato conjuga o verbo (ação
censurável).”
DA POTENCIAL CONSCIÊNCIA DO INJUSTO OU DO ILÍCITO? - Serrano Neves
http://www.buscalegis.ufsc.br/revistas/index.php/buscalegis/article/view/17462/17026 - acessado
08/06/09 - 09:16:44
20.6
Determinar-se de acordo com esse entendimento
Se o indivíduo compreendeu o caráter ilícito do fato e determinou-se de acordo
com esse entendimento então ele não cometeu o ilícito, e esta afirmação é correta porque
a imputabilidade é uma condição universal, ou seja, todos os indivíduos maiores de
dezoito anos são imputáveis.
Culpáveis são apenas os indivíduos que cometem ilícitos porque eram capazes
para entender o caráter ilícito do fato mas não se determinaram de acordo com esse
entendimento embora capazes para tal.
Assim, o segundo termo da equação é o anúncio de conduta diversa esperada, tão
esperada que a maioria esmagadora dos indivíduos imputáveis não pratica ilícitos
penais, ou seja, a condição de punibilidade (imputabilidade) é um preceito de conduta
diversa ao ilícito e a imputação de ilícito penal a informação de que o agente não
observou o preceito, logo, sendo condição de punibilidade não pode ser levada à conta
da fixação da pena no tocante ao artigo 59 do Código Penal por não ser graduável,
observado que na semi-imputabilidade ocorre a redução de pena já fixada.
235
20.7
Condição de reprovabilidade
É visto no diagrama anexo que a condição de punibilidade acompanha o curso da
ação penal até o momento em que o denunciado é declarado culpado e seja possível
(ausência de causa de justificação ou isenção) verificar a condição de reprovabilidade.
20.8
Demonstração
A condição de reprovabilidade se apresenta no artigo 59 com o nome de
“culpabilidade” e deve ser expressa como um grau de censura, ou grau de reprovação, à
conduta do culpado.
Não sendo possível atribuir um grau de reprovação à conduta não haverá pena
mesmo que as demais circunstâncias do artigo 59 sejam desfavoráveis no mais alto grau
aferível, e é por isto que a culpabilidade é tratada como legitimante na fase de fixação da
pena.
Legitimante é a função de causa legal para a pena e traz em seu bojo a requisição
de proporcionalidade entre a reprovação e a pena (base), numa relação segundo a qual se
a pena (base) for expressa em graus da faixa de sanção esse grau deverá ser proporcional
ao grau de reprovação, relação que só se torna inteligível se o grau de reprovação for
declarado como legitimante, ex.: grau médio de culpabilidade correspondendo a um grau
médio de pena (base).
O reconhecimento da proporcionalidade faz da legitimante uma determinante,
como se demonstra:
x : C :: x : P  xC = xP  x/x = C/P  1 = 1
236
P~C (pena proporcional à culpabilidade) é tal que
C determina P e P é determinado por C
C
⇒
P;P⇐ C;C ⇔ P
tal que para C = 0 é P = 0
Como consequência de C = 0 nenhum valor pode ser determinado pelas demais
circunstâncias do artigo 59, dado que estas são simplesmente flexionadoras da
culpabilidade, vez que não possuem força sancionadora autônoma.
seja Pb a pena base
Pb = CP + CDc 
Pb=C(1+Dc)
para C=0  Pb=0(1+Dc)=0
ao contrário
para C>0  Pb>CP porque Pb = CP + CDc
20.9
A culpabilidade como princípio (nulla poena sine culpa) (culpável)
O fato natural produzido pelo agente ingressa no espaço para dar origem ao fato
penal através da verificação da adequação com o tipo.
237
A culpabilidade nesta acepção representa a “energia” na conjugação do verbo
nuclear, qual seja, na previsão do Código Penal:
Art. 18 - Diz-se o crime:
Parágrafo único - Salvo os casos expressos em lei, ninguém pode ser punido por fato
previsto como crime, senão quando o pratica dolosamente.
20.10
A culpabilidade como elemento dogmático do delito (culpado)
Art. 18 - Diz-se o crime:
I - doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo;
II - culposo, quando o agente deu causa ao resultado por imprudência,
negligência ou imperícia.
20.11
A culpabilidade como legitimante da pena (culpabilizável)
Art. 59 - O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à
personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime,
bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e
suficiente para reprovação e prevenção do crime:
Importante observar que no manejo do artigo 59 não podendo ser verificada a
culpabilidade (ausência de culpabilidade) as circunstâncias que lhe seguem adiante não
poderão ser verificadas para nenhum efeito.
Como conseqüência de C = 0 nenhum valor pode ser determinado pelas
demais circunstâncias do artigo 59.
Apesar do alinhamento das circunstâncias com o separador “vírgula” alguns
doutrinadores sugerem que a culpabilidade é formada pelo conjunto das circunstâncias
238
que se lhe seguem, o que é inconsistente pelas seguintes razões:
1. o uso das vírgulas torna irreconhecível que a primeira circunstância seja
continente e as demais sejam conteúdo;
2. reprovação por personalidade ou conduta social pertencem à
periculosidade já banida do Direito Penal por corresponder a sanção para o TIPO
DO AUTOR.
3. as circunstâncias à frente da culpabilidade podem assumir inconsistências
que conduzem para a indefinição:
a) se forem todas favoráveis o comportamento da vítima deverá ter
contribuído para o crime e a pena seria sugerida no limite mínimo;
b) se forem todas “neutras” o comportamento da vítima não deverá ter
contribuído para o crime e não haveria sugestão de pena, visto que estaria
sendo criada uma pena “normal” para um indivíduo “normal”.
b) se forem todas desfavoráveis o comportamento da vítima deverá ter sido
o de “resistir” ao crime, o que não é aplicável à maioria dos crimes, e a
pena seria sugerida no limite máximo;
4. a atribuição de pesos positivos ou negativos a cada uma das
circunstâncias implica na existência de um peso igual a zero (3.b) e na
probabilidade de soma zero (indefinição ou pena taxada).
A dificuldade dos doutrinadores e dos magistrados parece residir na análise dos
elementos que compõem a culpabilidade: imputabilidade especial, potencial consciência
do injusto e exigibilidade de conduta diversa, para esclarecimento do que vale o
arrolamento de casos concretos.
239
20.12
Caso concreto de ausência de culpabilidade
Arguida pelo autor e julgada pelo magistrado Geraldo Salvador de Moura no seu
tempo de juiz, o caso é o seguinte:
Fulano engraçou-se com beltrana e convidou-a para morar com ele, o que foi
aceito.
Fulano, empregado de nível e salário médio, podendo bancar sozinho as despesas
do casal, condicionou que beltrana deixasse o ofício de cabeleireira que lhe
proporcionavam renda para viver, o que foi aceito.
Fulano, zeloso por aspectos morais, condicionou que beltrana se afastasse das
amigas fofoqueiras, o que foi aceito.
Passado mais de ano fulano concluiu que beltrana não havia se adaptado à vida
em comum e propôs a beltrana o desfazimento da sociedade, o que foi aceito.
Beltrana, no entanto, argüiu que havia abandonando o trabalho e as amizades e
que precisava de tempo e meios para refazer sua vida, o que foi aceito por fulano.
Por uns três meses fulano bancou beltrana sem incidentes até que um dia ela o
procurou portando uma receita médica e pediu a verba para aquisição, no que foi
atendida.
Dez dias depois beltrana retornou, com a mesma receita, argumentando que
precisava repetir a medicação, o que foi aceito e bancado.
Mais dez dias e beltrana repetiu o pleito.
Fulano, desconfiado, deu o dinheiro mas seguiu beltrana para confirmar a ida até
a farmácia.
240
Descaminhada da ida à farmácia beltrana entrou em uma lanchonete, dirigiu-se a
uma mesa onde se encontrava sentado um rapaz com umas cervejas à frente, sentou-se,
abriu a bolsa e mostrou o dinheiro, ato em seguida ao qual ambos riram.
Fulano entrou na lanchonete, dirigiu-se ao casal, alertou o rapaz que não era nada
com ele e que ficasse quieto, tirou o cinto das calças e deu meia-dúzia de lambadas nas
costas da beltrana.
Como orgão da acusação no caso o autor sustentou que fulano havia estabelecido
um relacionamento adequado e razoável para sua condição social o qual não exibia
manchas de conduta; e que existia entre ele e beltrana um acordo firmado em confiança
que foi quebrado, sendo razoável para sua condição financeira e social sua discordância
com a conduta de beltrana não lhe podendo parecer injusto pretender uma reparação, o
que seria extremamente oneroso por outra via que não a iniciativa própria, sendo, por
conclusão diante de ter agido mais no sentido de uma injúria real (bater com cinto) do
que com o dolo da lesão corporal (lesões levíssimas embora visíveis porque
comprovadas imediatamente pela perícia) não podendo, portanto, ser exigida conduta
diversa.
Foi absolvido.
Salvou-o da condenação que o inquérito e a instrução judicial foram invasivos do
fato e da pessoa com profundidade capaz de revelar os detalhes que sustentaram a
argüição de ausência de culpabilidade.
20.13
Simulação de dispositivo
DISPOSITIVO SIMULADO PARA CASO CONCRETO – AUTOS EXAMINADOS
241
...
Ante o exposto, e sendo o denunciado imputável, julgo procedente a denúncia para
considerar Dispositivo Simulado como CULPADO pela incursão no tipo do artigo
155, §4º, incisos I e IV do Código Penal (destruição ou rompimento de obstáculo à
subtração da coisa e concurso de pessoas), prevista pena de reclusão de dois a oito
anos e multa.
Ausentes causas de exclusão passo à dosimetria da pena.
André Luiz dos Santos manteve silêncio perante a autoridade policial, anotado
apenas ter o curso primário incompleto, estar desempregado e viver em união estável
[fls. 15]. Em juízo [fls. 67] afirmou não ter profissão definida, ser pai de uma filha, já
ter sido condenado por crimes contra o patrimônio e estar cumprindo pena.
CULPABILIDADE: sem instrução que lhe permita maior discernimento, demonstrado
ter potencial consciência do injusto da conduta em razão da reiteração na espécie,
sendo exigível conduta diversa pelo simples fato de ter faltado ao seu recolhimento
noturno como condenado cumprindo pena em regime semi-aberto, sendo atribuída à
culpabilidade um grau de reprovação 4 na escala de 1 a 10, qual seja, pouco abaixo
da média,
ANTECEDENTES desfavoráveis em razão do conteúdo de fls. 117 a 120 com registro
de condenação e pena em execução.
CONDUTA SOCIAL sem informação e sem influência na flexão.
PERSONALIDADE sem referências de que a reiteração criminosa seja decorrente
dela, logo, sem influência na flexão.
MOTIVOS DO CRIME muito desfavoráveis por ter se valido de oportunidade e ter
fraudado sua obrigação penal.
242
CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME desfavoráveis em razão do envolvimento com menor
de idade.
CONSEQÜÊNCIAS DO CRIME estancadas nos limites do caput, irrelevante a
devolução dos bens subtraídos.
COMPORTAMENTO DA VÍTIMA não influente no crime.
Assim, do grau de reprovação flexionado pelas circunstâncias de prevenção, resulta a
pena base de 4 (quatro) anos, 5 (cinco) meses e 25 (vinte e cinco) dias, que aumento
de 6 (seis) meses em razão da reincidência (art. 61, I, do CP), tornando-a definitiva
em 4 (quatro) anos 11 (onze) meses e 25 (vinte e cinco) dias de reclusão a serem
cumprida em regime fechado em razão da reincidência.
Multa fixada em 10 (dez) dias multa à razão de 1/30 do salário mínimo vigente à
época do fato, atendendo à situação familiar e de desemprego.
Sem custas e despesas para o condenado.
Etc ...
Recurso: APELAÇÃO CRIMINAL 200900581977
Parecer: 1/1603/2009
Nº do Tribunal: 35583-0/213
Comarca: FAZENDA NOVA
Os cálculos dos tempos de privação de liberdade foram efetuados na CALCULADORA
DE PENA 3.0 desenvolvida pelo Procurador Serrano Neves.
A divergência em relação à pena fixada na sentença é atribuída à imposição da medida da
culpabilidade no grau 4 (escala de 1 a 10) conforme acima.
243
20.14
Dispositivo quase perfeito em caso concreto
Algumas partes foram suprimidas.
Recurso: APELAÇÃO CRIMINAL 200901597214
Parecer: 1/3228/2009
Nº do Tribunal: 36092-8/213
...
CULPABILIDADE - FUNDAMENTAÇÃO - Expressões determinantes da
inteligibilidade sobre a potencial consciência do injusto e exigibilidade de conduta
diversa. Fundamentação ancorada na realidade circunstancial do fato e seu autor.
...
Seja examinado o dispositivo de folhas 122/123:
“Considerando que sua culpabilidade foi intensa, pois cometeu o crime de atentado
violento ao pudor contra a vítima mesmo sabendo que esta tinha apenas 09 anos de
idade, pois conhecia a vítima desde que nasceu, tendo atraído a vítima para local
ermo sob a promessa de lhe dar dinheiro, agindo com dolo específico de praticar atos
libidinosos contra a vítima. Que o acusado é maior de 18 anos de idade e
perfeitamente capaz, sendo, portanto, imputável. Que ele tinha ou deveria ter plena
consciência de que sua conduta configurava crime, tanto que praticou o fato às
escondidas e ameaçando a vítima a não contar nada para ninguém, pois senão
ficaria pior para ela; e que naquelas circunstâncias era perfeitamente exigível dele
uma conduta diversa, pois na condição de amigo da família da vítima, deveria zelar
pela segurança e bem estar da vítima, de forma que sua conduta merece acentuado
grau de censurabilidade e reprovação”.
Deveras, um exemplo de que as coisas podem ser mais simples do que imaginado
244
pela maioria.
DA POTENCIAL CONSCIÊNCIA DO INJUSTO
"... Que ele tinha ou deveria ter plena consciência de que sua conduta configurava
crime, tanto que praticou o fato às escondidas e ameaçando a vítima a não contar
nada para ninguém, pois senão ficaria pior para ela; ..."
DA EXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA
" ... e que naquelas circunstâncias era perfeitamente exigível dele uma conduta
diversa, pois na condição de amigo da família da vítima, deveria zelar pela
segurança e bem estar da vítima, de forma que sua conduta merece acentuado grau
de censurabilidade e reprovação”.
Dois elementos analisados com argumentos pertencentes à realidade fática, com a
descrição de circunstâncias que estão adequadas ao conteúdo de preenchimento
requisitado como fundamentação da conclusão.
Em linguagem menor diria que o magistrado mostrou o que estaria "passando
pela cabeça" do recorrente no momento e cenário do fato, com duas declarações
fundamentadas de forma simples, capazes de, na mente do leitor, formar a idéia da
consciência do injusto [... tanto que praticou o fato às escondidas e ameaçando a vítima
a não contar nada para ninguém ...] e da exigibilidade de conduta diversa [... na
condição de amigo da família da vítima, deveria zelar pela segurança e bem estar da
vítima ...]
Conquanto ausentes declarações sobre a imputabilidade especial e sobre a medida
da reprovação, há de ser tomado que o dispositivo oferece bom grau de inteligibilidade,
à vista de que, pela fundamentação, o grau de reprovação pode ser dito realmente
"acentuado".
245
Adotando a razoabilidade de que o cacho de uvas no qual falta um bago não está
desfigurado, a clareza, precisão e concisão dos destaques atendem ao "rigor" das
exigências deste Gabinete quanto às declarações dispositivas sobre a culpabilidade
poderem ser entendidas por todos os leitores, principalmente o condenado.
21 CAMINHO CRÍTICO DO EXAME DA CULPABILIDADE NOS TRÊS
MOMENTOS
21.1
Momento I (fig. 13a)
O Momento 1 é caracterizado pelo exame da capacidade geral para a
culpabilidade, denominado imputabilidade.
Neste momento é examinada a imputabilidade geral, qual seja: o limite mínimo
da capacidade biopsíquica para responder à imputação.
O limite mínimo é verificado por presunção: 18 anos de idade completos:
idade > 18 = imputável e idade < 18 não-imputável
A definição da imputabilidade é feita por exceção pois o Código Penal, no art. 26
do Título III – DA IMPUTABILIDADE PENAL, cuida da inimputabilidade e da
imputabilidade reduzida, ou semi-imputabilidade, e disto resulta que a imputabilidade
plena do sujeito sob exame depende de que ele NÃO se enquadre em nenhuma das
hipóteses do código
A inimputabilidade, ou forma lógica não-imputabilidade, caracteriza, pode ser
246
dito, o sujeito = zero (inteiramente incapaz) para fins penais, com o que pode ser
estabelecido que o imputável é o sujeito = 1 (inteiramente capaz).
Observado que a imputabilidade reduzida é definida pela expressão "não era
inteiramente capaz" (forma lógica não-inteiramente) pode ser concluído que a
capacidade reduzida corresponde a:
0 < sujeito < 1
Quando da capacidade não plena a pena pode ser reduzida até o máximo de 2/3
(dois terços), induzindo que a menor capacidade reduzida não pode ser inferior a 1 – 2/3
= 1/3.
Direito não é matemática mas a matemática é um instrumento auxiliar para a
construção do justo, pois a não observação do limite igualaria todos os que estivessem
entre 0 (zero) e 1/3, negando-lhes a mesma proporcionalidade de redução conferida aos
outros:
(0)
(1/3)
SEM REDUÇÃO
(1)
COM REDUÇÃO
O intervalo sem redução corresponde a dar tratamento mais rigoroso àqueles que
são menos capazes, situação que contradiz o sentido da norma que é o de tratar de forma
menos rigorosa os menos capazes.
O impasse em relação ao justo-lógico só se resolve com a consideração de que
todo sujeito posicionado na faixa sem redução é sujeito = 0 (inteiramente incapaz).
247
A aplicação da proporcionalidade em todo o intervalo de 0 (zero) a 1 (um)
quando observado o limite legal de redução máxima de 2/3 não cria uma
inimputabilidade ficta, mas tão somente adequa a capacidade à "teoria dos mínimos
penais": toda capacidade abaixo de 1/3 é capacidade abaixo do mínimo, logo, sem relevo
penal, tratamento que já é corrente quando se aplica a insignificância (o insignificante é
uma realidade maior que zero e menor que o mínimo) e se tem que à lesão mínima ao
bem protegido corresponde a pena mínima (única razão plausível para a doutrina negar
a fixação da pena base abaixo da mínima cominada no tipo).
A regra é que a denúncia seja oferecida pela imputabilidade geral plena e
presumida, ficando a verificação da diminuição para a instrução.
Há de ser observado que a imputabilidade é atributo do estado da pessoa, o que
atrai as regras civis de verificação tendentes à estabelecer a capacidade mas que não
afetam a liberdade, indicando que as questões de estado da pessoa no tocante à privação
da liberdade devam ser tratadas com maior rigor na seara penal. Assim sendo justificado
que a redução da imputabilidade penal possa ser equiparada à redução da capacidade da
"imputabilidade civil" (capacidade para gerir sua pessoa e bens) com redução da
capacidade para gerir a "liberdade", o que corresponderá à imposição de pena de acordo
com a capacidade.
Tal configuração implica em ter o Estado-jurisdicional como tutor do estado da
pessoa, como assinalam os artigos 149 a 154 do Código de Processo Penal que alcançam
desde a fase investigatória até a execução da pena, permitindo concluir que a
imputabilidade é condição verificável a qualquer tempo.
Essa verificação a qualquer tempo permite que a denúncia seja recebida com a
presunção da imputabilidade plena mas, por se tratar de matéria de ordem pública não
248
inverte o ônus da prova, bastando que, diante da inércia jurisdicional ou ministérial a
defesa invoque a proteção, sendo então comum que o Momento I do exame da
culpabilidade seja ultrapassado com "celeridade" na ausência de insanidade
comprovada, conquanto a ação penal possa ser abortada por outras causas de exclusão
da culpabilidade – ou da ilicitude – comprovadas nos autos.
21.2
Momento II (fig. 13b)
O Momento II é caracterizado por findar com uma declaração de culpado, ou de
procedência da denúncia.
É mais comum que, com exceção das evidentes já no primeiro momento, as
causas de exclusão ou diminuição da culpabilidade sejam examinadas nesse segundo
momento, dado que existem casos (embriaguez fortuita completa, erros inevitáveis, erro
de proibição, obediência hierárquica, coação moral irresistível, coação física) que devem
ser definidos no contraditório, diante de uma instrução completada.
A declaração de culpado, com suas limitações declaradas, indica que é possível
verificar o quanto de reprovação deve ser feita à conduta do indivíduo.
Interessante refletir sobre o caráter geral das condições de procedibilidade desde
o primeiro momento até o fim deste segundo, sendo possível dizer que até findar este
segundo momento existe um sujeito processual submetido a regras gerais.
A declaração de culpado ou de procedência da denúncia estabelece a relação
entre o sujeito processual e seu fato processual, não mais do que isto, conquanto a
declaração positiva seja antecedente necessário do Momento III.
249
(NÃO CULPADO)
( ... D ... )
(CULPADO)
LIMITES DA EXTENSÃO DA DECLARAÇÃO 'D'
21.3
Momento III – (fig. 13c)
21.3.1
Do grau de censura
O Momento III é caracterizado por iniciar com a conversão do sujeito processual
para sujeito pessoa, ou indivíduo, como definido pelo verbo individualizar que é regente
da imposição da pena, e tem como fundamento, ou determinante, ou 'conditio sine que
non" que possa ser estabelecido um grau positivo de censura à conduta do indivíduo.
É o momento da culpabilidade para a pena.
Trazendo para cá a compreensão da matéria exposta nos capítulos anteriores, e
observando a teoria dos mínimos a situação de coerência é verificada quando duma lesão
mínima ao bem protegido indica uma pena mínima para imposição da qual deve ser
encontrado um grau minimo de censura:
Não encontrado o grau mínimo de censura o culpado resultará absolvido,
com o que fica demonstrado que a culpabilidade é DETERMINANTE na fixação
da pena (reprovação) e que as demais circunstâncias não tem força própria
apenante.
É fundamental distinguir o dolo da graduação da censura pois o dolo pertence ao
tipo e é invariável.
250
Dr. Milton Braz Paiva, que foi meu professor de Direito Penal lecionava é o dolo
era um pássaro: o Quero-quero. (1)
Quero-quero ou Téu-téu ( Vanellus Chilensis 1) "O quero-quero é sempre o
primeiro a dar o alarma quando algum intruso invade seus domínios. "
1 http://www.saudeanimal.com.br/quero-quero.htm acessado 02/09/10 05:14:24
QUERO a ação e QUERO o resultado.
Por crimes que exigem dano ao fato (crimes de resultado, ou materiais) ninguém
será condenado por querer (cogitatio) sendo imprescindível que o agente conjugue o
verbo nuclear do tipo (QUERO A AÇÃO), e essa conjugação conduz ao fim inerente ao
verbo (QUERO O RESULTADO).
É nítido que o agente FAZ algo e esse fazer tem o nome de CONDUTA, o que
não soa estranho para os que conhecem a expressão "iter criminis" ou caminho do crime.
O caminho do crime liga o "quero a ação" ao "quero o resultado"
Conduta é o percorrer o caminho do crime.
A conduta é variável, tão variável quanto percorrer um caminho usando bicicleta,
carro, moto etc. e em maior ou menor velocidade.
O dolo é invariável, repita-se, como sempre o foi, vez que não sendo possível
matar mais ou matar menos, ou morrer mais ou morrer menos, o resultado morte
independe de uma vontade maior ou menor, não podendo a vontade ser confundida com
o esforço físico ou intelectual para alcançar o resultado.
E é assim que, pelas figuras seguintes pode ser vista a variação da conduta (flexa
251
azul) em relação à invariabilidade do dolo (espaço entre as paralelas pontilhadas
vermelhas.
QUERO A
AÇÃO
QUERO A
AÇÃO
QUERO A
AÇÃO
... COGITAÇÃO ...
CONDUTA ABORTADA ...
QUERO O
RESULTADO
QUERO O
RESULTADO
QUERO O
RESULTADO
A flecha azul pode ser "medida" em largura, comprimento, cor, tonalidade etc.
enquanto o dolo permanece invariável delimitando o tipo, o que é válido para todos os
"dolos", desde o beijo na namorada até o assassinato do desafeto.
Lembrando que não existe aferição de "tamanho da vontade" e que o dolo,
252
pertencente ao tipo está figurado pelas paralelas pontilhadas vermelhas deve ser
lembrada também a expressão "incursão no tipo" (in + correr = correr dentro) para
entender os casos em que a flecha azul é mais larga que a largura das pararelas e o tipo
se desloca para mais grave como no caso das lesões corporais ou quando a flecha "sai"
do caminho e o resultado é diverso do pretendido.
A flecha azul é produto do indivíduo, é a externalização de sua conjuntura
(combinação ou concorrência de acontecimentos ou circunstâncias num dado
momento) individual.
Nos crimes que não exigem resultado naturalístico, ou crimes formais, ocorre
apenas o dano ao direito, como nos casos da ameça, abuso de autoridade, crimes de
responsabilidade, enfim, todos aqueles que possam caber na categoria de "atentado".
É absolutamente necessário não confundir atentado com tentativa nem com o 11
de setembro das torres gêmeas ou com homem-bomba.
Atentado é faltar com o dever de manter a integridade daquilo de que é guardião,
sendo possível dizer que atentado é a ameaça da autoridade, como nos casos de abuso de
autoridade ou de responsabilidade definidos nas constituições e aos quais se imputa,
erroneamente, no meu entender, não terem tipos definidos.
Para entender o esquema do dolo nos crimes formais basta analisar que o dano ao
direito vai desde um abalo psíquico (ameaça) até um desvio de finalidade prevista (o
prefeito constrói um hospital com a verba para a construção da escola), ou se constitui
num perigo de dano ao fato.
A figura do arqueiro é um exemplo razoável, visto que ele quer flechar e quer que
a flexa atinja o alvo, e possui os instrumentos.
253
O arqueiro cogita, pratica os atos preparatórios e atira a flecha.
Existe um momento interessante na ação de flechar: aquele em que o arqueiro
está com o arco distendido e a flecha apontada para o alvo.
Esta cena "congelada" permite verificar para onde o arqueiro está apontando, ou
seja, a probabilidade de acertar o alvo visado, este é o momento de perigo ao bem
jurídico, que poderá, ou não, ser seguido pelo dano ao bem material, ou gerar uma
consequência material (alteração na externalidade).
Não se perca de vista que os bens protegidos no Direito Penal são de natureza
jurídica (valor ideal) e podem ter natureza material (valor real) podendo ocorrer somente
dano ao ideal jurídico, dano ao jurídico e ao real, ou dano ao real nas hipóteses em que a
proteção jurídica é retirada, suspensa ou deslocada (excludentes da ilicitude).
A conduta do arqueiro mostra três fases reais: apontou para o alvo, disparou a
flecha, acertou o alvo, e a imputação pode ser mostrado num diagrama lógico, apenas
para reflexão sobre a conduta.
APONTOU A
FLECHA
SIM
NÃO
NÃO
DISPAROU A FLECHA
NÃO
SIM
SIM
ACERTOU O ALVO
254
Cada "não" implica numa solução diferente.
A doutrina assenta que o dolo pertence ao tipo, logo como o tipo contém dois
preceitos: descrição e sanção, é a faixa de sanção que revela existir uma igual faixa de
lesão ao bem protegido. P.e.: um soco no nariz com sangramento; mais um soco no olho
com congestionamento; mais um soco nos lábios com rompimento e assim
sucessivamente, indicando que a integridade física foi lesionada em sucessiva e
aumentada gravidade, dentro do mesmo tipo, pois a lei indica quando, por adução de
outras circunstâncias, quando a gravidade da lesão se desloca para outro tipo (grave,
gravíssima, seguida de morte).
Supondo uma lesão leve com o máximo de gravidade no tipo (art; 129, caput,
Cp), indicadora da sanção máxima, o salto à conclusão seria a indicação da
culpabilidade máxima, mas isto não é verdadeiro, visto que o esgotamento do tipo de
lesão é referente ao dolo (para todos) e não à pena (para o indivíduo).
Se, ao invés do salto é feita uma progressão no sentido da conclusão será visto
que embora culpado por tudo (dolo) tal não passa de um "apontador", sendo necessário
verificar, para não cair na armadilha da responsabilidade objetiva pelo dolo – o quanto é
possível censurar a conduta que esgotou a extensão da incursão no tipo, o que não é
estranho para os militantes penais quando examinam, por exemplo, o excesso exculpante
nas excludentes da ilicitude (culpado por tudo mas sem pena).
Pode ser dito que esse terceiro momento, embora seja o da fixação da pena pelo
grau de censura, é nitidamente exculpante, notação que também livra da armadilha da
responsabilidade objetiva, à observação de que a censura à conduta é toda baseada nas
negatividades sobre as quais o indivíduo não possuia domínio.
255
Senão vejamos:
1. Possuía o indivíduo capacidade aumentada para lidar com a
conjuntura da qual resultou o ilícito penal ?
2. A capacidade do indivíduo lhe permitia discernir entre o justo e o
injusto da conduta ?
3. Embora considerando justa a conduta lesiva as circunstâncias
permitiam conduta diversa ?
Conforme proposto três respostas não relativas aos objetos ideais referidos (ver
tabela adiante) trazem a culpabilidade qualitativa para o mínimo, sendo que a
culpabilidade quantitativa que se apresentará como um grau de censura individualizado
com fundamento nos objetos reais declarados (ver tabela adiante) poderá fletir para
maior que a mínima ou até excluir.Não existe nenhuma contradição com a teoria dos
mínimos pois esta se refere apenas ao ponto mínimo, não sendo capaz de excursionar
faixa acima, e é isto que também livra da armadilha da responsabilidade objetiva.
Respondendo as perguntas com um diagrama:
256
SIM
2
1
NÃO
SIM
3
NÃO
NÃO
QUANTITATIVO
SIM
QUALITATIVO ->
Seja visto na figura adiante como a culpabilidade excursiona na faixa de sanção
para o caso suposto
257
(NENHUMA)
(MÍNIMA)
LESÃO
(MÁXIMA)
LESÃO
SUGESTÃO
PENA
CULPABILIDADE
EXCURSÃO
QUANTITATIVA
HIPÓTESE DE
CULPABILIDADE ABAIXO
DA MÍNIMA
QUALITATIVO
REPRESENTADO POR
TRÊS RESPOSTAS NÃO
QUALITATIVO
REPRESENTADO POR
TRÊS RESPOSTAS SIM
Supondo definido o grau quali-quantitativo da culpabilidade as demais sete
circunstâncias operam uma flexão:
258
(NENHUMA)
(MÍNIMA)
(MÁXIMA)
LESÃO
PENA
CULPABILIDADE
QUALI-QUANTITATIVO
A tabela a seguir sugere as matérias pertinentes às elementares da culpabilidade
sob exame:
OBJETOS IDEAIS
CULPABILIDADE
REFERIDOS
OBJETOS REAIS
A SEREM DECLARADOS
IMPUTABILIDADE
ESPECIAL
Escolaridade, religiosidade, convívio familiar,
preferências pessoais, pontos de vista etc.
POTENCIAL
CONSCIÊNCIA DO
INJUSTO
Necessidade de confronto, incompreensão,
intolerância, inconformação, conflitos
pessoais ou sociais etc.
EXIGIBILIDADE DE
CONDUTA DIVERSA
Constrangimento, ausência de controle
emocional, impulso, condicionamento etc.
259
21.3.2
Da flexão do grau de censura
As demais circunstâncias do art. 59 do CP (antecedentes, conduta social etc.)
aparentemente se confundem com os objetos reais da culpabilidade, o que leva alguns
doutrinadores ao absurdo de afirmarem que a vírgula após a circunstância judicial
culpabilidade quer dizer dois pontos, ou seja, a culpabilidade é o conjunto das sete
circunstâncias seguintes.
O erro da formulação é patente: se a culpabilidade fosse o conjunto das sete
circunstâncias ou o dois pontos teria sido escrito pelo legislador ou a palavra
culpabilidade estaria figurando como desnecessária.
Visto que na ausência de uma culpabilidade mínima nenhuma outra circunstância
judicial será examinada, e que se tais demais circunstâncias forem "neutras" não terão
nenhuma influência na pena base, como já afirmado no correr do texto, invoca-se aqui, e
de novo, o princípio da proporcionalidade para evitar que aquele a quem as
circunstâncias judiciais "não fedem e nem cheiram" receba pena maior do que aquele
que as tem todas favoráveis, dado que seria o injusto dos injustos punir quem está em
situação de "regularidade".
Tenho que a posição jurisprudencial de atribuir pena base mínima apenas quando
todas as sete circunstâncias forem favoráveis é um artifício para justificar a já
estabelecida posição de não fixar pena base abaixo da mínima, posição que nada mais é
do que um "golpe de poder" declarado na ocasião em que, diante de uma pena base no
mínimo não se admite que circunstância atenuante genérica a descresça, ou seja: neste
caso onde está escrito SEMPRE leia-se NEM SEMPRE.
A incompreensão sobre a culpabilidade pode ter origem no vício histórico da
260
intensidade de dolo quando dez tiros matavam mais do que um tiro só. Porém, atribuir a
culpa ao legislador é a muleta com a qual o aleijado se desculpa por coxear.
É fácil ?
Não.
22 DA FUNDAMENTAÇÃO DA CULPABILIDADE
Art. 93. Lei complementar ...
IX todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e
fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade...
Constituição da República Federativa do Brasil
Art. 381. A sentença conterá:
I - os nomes das partes ou, quando não possível, as indicações necessárias para
identificá-las;
II - a exposição sucinta da acusação e da defesa;
III - a indicação dos motivos de fato e de direito em que se fundar a decisão;
IV - a indicação dos artigos de lei aplicados;
V - o dispositivo;
VI - a data e a assinatura do juiz.
Código de Processo Penal
Obter que as luzes de uma nova carta política iluminem a realidade social não é
uma tarefa fácil diante de um contexto histórico centralizador do poder e o recente
emergir de um estado autoritário que a Carta de 88 veio sepultar.
261
Vinte e um anos de Estado Democrático de Direito ainda não se revelaram
eficazes em apagar da memória os “facilitadores” do exercício do poder criados pelo
governo militar.
Assim, neste texto, é buscado afastar os restos do “negro véu” que ainda
impedem a plena incidência da luz constitucional no plano da atividade judicial.
Buscar a eficácia normativa constitucional da fundamentação das decisões
judiciais através do vigente Código de Processo Penal rumo a alcançar o dispositivo
condenatório das sentenças penais é o escopo.
A Constituição transforma-se em força ativa se essas tarefas forem efetivamente
realizadas, se existir a disposição de orientar a própria conduta segundo a ordem
nela estabelecida, e, a despeito de todos os questionamentos e reservas provenientes
dos juízos de conveniência, se puder identificar a vontade de concretizar essa ordem.
Concluindo, pode-se afirmar que a Constituição converter-se-á em força ativa se
fizerem-se presentes, na consciência geral – particularmente, na consciência dos
principais responsáveis pela ordem constitucional -, não só a vontade de poder (Wille
zur Macht), mas também a vontade da Constituição (Wille zur Verfassung).
DIE NORMATIVE KRAFT DER VERFASSUNG – Konrad Hesse, tradução de Gilmar
Ferreira Mendes, ED. SAFE, 1991, pag. 19
Cuida o artigo 59 do Código Penal da fixação da pena base e seu manejo está
regido pelo princípio da individualização, matéria sobre a qual não recai controvérsia.
A primeira circunstância do art. 59, a culpabilidade, é o foco da busca pela
fundamentação.
Vale ressaltar que são vedadas motivações implícitas. Os caminhos percorridos na
fundamentação constitucional são todos às claras. O provimento judicial deve ser
262
preciso sobre todas as questões vinculadas, dando-se as razões das premissas e das
conclusões para se impedir que eventuais intenções sub-reptícias possam provocar
desvios de finalidade na prestação jurisdicional.
VALORES E PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS, Alexandre Bizzotto, AB Ed, 2003, pág.
271
22.1 DA INDIVIDUALIZAÇÃO
Individualizar significa fazer (confeccionar, fabricar, modelar etc,) para o
indivíduo.
O mundo da realidade é a origem de todas as relações entre os sujeitos e objetos
que o compõem.
A atividade da inteligência perceptiva apreende essas relações e as transforma em
cultura.
A cultura se forma e mantém na medida em que são atribuídos valores aos
sujeitos, objetos, e relações.
A cultura é refinada transformando-se em conhecimento e o conhecimento é
codificado na forma de técnicas, tecnologias e ciência.
Os “mundos” coexistem em constante interação e integração, não parecendo que
um único mundo possa ser isolado para efeito de estudo sem perder sua referência com a
realidade.
De todos os “mundos” possíveis um pretende ser reitor dos demais e sua
pretensão tem como fundamento manter os demais em “estado de regularidade” com o
mínimo de oscilação: é o “mundo” jurídico.
263
De modo raso pode ser dito que estado de regularidade é o aceitável pela maioria
e mínimo de oscilação é o desvio aceitável da regularidade.
O “mundo” jurídico é, então, o mundo de todas as realidades, mesmo as
realidades que nele ainda não tiveram o ingresso carimbado (normatização).
Sempre que o mundo jurídico reage diante da desregularidade ou do desvio não
aceitável, ou incide para regular e evitar desvios, existem sujeitos implicados e
interessados, e desta sorte a reação afeta os sujeitos em maior ou menor grau, criando,
modificando ou extinguindo relações.
De todas as reações ou incidências uma é especialíssima, personalíssima, e
reservada para situações que por outra ordem não puderam ser resolvidas: o Direito
Penal.
Como sabido, o Direito Penal é um campo para o qual tudo converge em favor da
eficácia em relação a um sujeito que sofre a imputação de desregularidade e desvio,
A sanção é o instrumento através do qual o Direito Penal busca sua eficácia em
relação ao sujeito, como anunciado: reprovação e prevenção.
Três grandes comandos constitucionais balizam a pretensão de eficácia:
1. a proibição implícita de violação dos objetivos e fundamentos da
República e dos direitos e garantias individuais;
2. a proibição expressa de alguns tipos pena; contrários aos objetivos e
fundamentos da República;
3. a individualização da pena.
A Lei de Execução Penal fixa, em seu artigo primeiro, que o finalismo da
264
execução penal é a harmônica integração social do condenado com a promoção de
condições para tal e cumprimento dos dispositivos da sentença condenatória.
A hierarquia de prescrições deve ser obedecida pelos seus concretizadores com
idêntico finalismo (harmônica integração social do condenado): legislativo, judicial e
material.
O sujeito ativo é parte da realidade do crime, e parte reconhecida pelos elementos
biopsíquicos que a compõem como verificado na regência da imputabilidade,
circunstâncias, condições pessoais, causas de justificação etc.
22.2
ANÁLISE DA CULPABILIDADE
A culpabilidade, conquanto corretamente vista nos momentos em que se
apresenta como princípio e como elemento dogmático não pertencentes ao universo
biopsíquico do sujeito porque são apenas objetos jurídicos, não vem sendo considerada
corretamente no momento em que deve ser vista como atribuição personalíssima.
As considerações incorretas aparecem no dispositivo condenatório na forma de
fundamentação insuficiente para o reconhecimento de que a pena base aplicada é
referente, adequada e proporcional à capacidade para a conduta do sujeito condenado.
De todas as considerações possíveis para a fixação da pena a mais importante é
que cumpre o finalismo da execução.
Pretender a harmônica integração do condenado sem declarar a desarmonia e a
desintegração dele como sujeito e parte integrante do crime dificulta ou impede que o
próprio sujeito seja parte do processo de integração, negando-lhe acesso ao fundamento
da dignidade da pessoa humana de forma tão grave que a execução penal resulta
265
reduzida a um processo de “doma racional”, ou por vezes irracional.
As atribuições individuais devem ser tomadas em função do momento do crime,
qual seja, no cenário, espaço e tempo em que o sujeito está integrado ao crime, porque é
nesse momento em que estão em integração na conduta todas as influências objetivas e
subjetivas, ou externas e internas.
A circunstância judicial culpabilidade quer cuidar da imputabilidade, potencial
consciência do injusto e exigibilidade de conduta diversa no momento do crime, para o
fim de estabelecer um grau de censura.
A análise da culpabilidade deverá, então, responder que o indivíduo podia
conduzir-se de modo diverso porque capaz de avaliar o injusto da conduta vez que
portador de habilidades para tais, e mais que não existiam circunstâncias diminuidoras
dessa capacidade.
A análise recairá sobre intenções, motivos, percepção, móvel, objetivos, pressões
etc, ou seja, sobre tudo aquilo que conduziu o sujeito a produzir o resultado.
Intenção e motivo são noções conexas; o motivo é motivo de uma intenção (…). A
relação é tão estreita que, em certos contextos, motivos e intenções são indiscerníveis,
em particular quando a intenção é explícita. (…) A intenção responde à pergunta
“quê, que fazes?” Serve, pois, para identificar, para nomear, para denotar a acção (o
que se chama ordinariamente o seu objecto, o seu projecto); o motivo responde à
questão “porquê?” Tem, portanto, uma função de explicação; mas a explicação já
vimos, pelo menos nos contextos em que motivo significa razão, consiste em
esclarecer, em tornar inteligível, em fazer compreender. Portanto, é sob a condição
da redução do motivo a uma razão de… e da explicação a uma interpretação, que a
noção de motivo aparece separada da de causa por um “abismo lógico”: classificar
266
algo como motivo é excluir que o classifiquemos como razão de… (…).
A relação causal é uma relação contingente no sentido de que a causa e o efeito
podem identificar-se separadamente e que a causa pode compreender-se sem que se
mencione a sua capacidade de produzir tal ou tal efeito. Um motivo, pelo contrário, é
um motivo de: a íntima conexão constituída pela motivação é exclusiva da conexão e
contingente da causalidade.
Paul Ricoeur, O Discurso da Acção, Lisboa, Edições 70,1988, pp. 50-51
http://paginasdefilosofia.blogspot.com/2009/03/intencao-e-motivo-sao-nocoes-conexas-o.html - acessado
08:23:16 27/06/09
A análise da culpabilidade será, em suma, uma construção na qual o magistrado
declara os elementos constitutivos (conteúdo) da elementar (continente).
Tal construção é corrente e correta quando, em obediência ao comando legal de
construção da sentença o magistrado declara os motivos de fato (conteúdo) e de direito
(continente) em que se funda a decisão de procedência da denúncia (art. 381, III, CPP)
que corresponde à declaração de culpado.
O fundamento da declaração de culpado (decisão fundamentada) é a declaração
de que o continente (motivos de direito) está preenchido pelo conteúdo (motivos de fato)
adequado.
A declaração de culpado será, atendido o comando legal, o que a Constituição
anota como decisão fundamentada.
O inciso apontado, antes de ser um formulário a ser preenchido como aparenta, é
um rol de partes tão essenciais que mesmo o nome do indivíduo, sobejamente
identificado e conhecido deve constar para que a sentença tenha a natureza de peça
267
autônoma e constitua um título executivo.
É por esta ótica que apontamos o inciso III como regra geral para as decisões que
constarem do corpo da sentença e, dentre outras, o dispositivo condenatório fruto do art.
59 do CP é uma decisão da qual devem constar os motivos de fato e de direito.
Observado que na parte discursiva (dialética) o magistrado maneja a lei, a
doutrina, as ciências auxiliares pertinentes ao caso e a jurisprudência, têm-se como claro
que os elementos de fato e de direito estão constituídos por esse complexo, e mais claro
fica essa amplitude quando é visto que os motivos (artigos) da lei estão referidos no
inciso IV.
22.3
DO CARÁTER DECISÓRIO DA FIXAÇÃO DA PENA
A determinação constitucional sobre a fundamentação de que todas as decisões
judiciais não pode ser limitada pela taxionomia processual nem pelas limitações da
recorribilidade pois, em regra, todas as decisões judiciais são recorríveis se tomada a
recorribilidade como a possibilidade de que a decisão seja modificada, e assim podem
ser tomados também como recurso (ou meio) para modificar a decisão o Habeas Corpus
e a Revisão Criminal, com o efeito que têm de trancar a ação penal com denúncia
recebida ou modificar a sentença condenatória transitada em julgado, situações dadas
como “irrecorríveis”.
Sob a ótica do regime democrático (art. 127 da CF) o termo decisão, na vertente
da menor gravosidade para o cidadão e maior amplitude do preceito, decisão é escolha
na forma mais simples de responder sim ou não, como o é no júri.
Escolher entre sim e não é um processo de escolha que se enquadra como decisão
268
(eficácia protendida) e, portanto, deve ser fundamentada.
22.4
DO RECEBIMENTO (REJEIÇÃO) DA DENÚNCIA
É corrente, em nome de uma economia procedimental injustificada, o
recebimento da denúncia por lançamento de uma cota simples e pouco diferente de um
carimbo - recebo a denúncia – e tal simplificação não tem outra justificativa senão a das
estatísticas que podem validar ser a maioria esmagadora das denúncias uma espécie
“recebível”.
Dúvidas não existem de que são antecedentes informativos para o recebimento da
denúncia:
1. a existência de um fato;
2. a definição do fato como crime;
3. a presença dos requisitos e condições da ação e do processo.
Existe uma única hipótese que autoriza o recebimento da denúncia e está
caracterizada por três respostas SIM.
Uma única resposta NÃO implica em rejeição.
Ao exame de 1, 2 e 3 o magistrado decide por SIM ou por NÃO, e receber ou
rejeitar terá por fundamento, razão ou motivo, o conteúdo da matéria examinada.
Restando, portanto, cristalinamente demonstrado que a manifestação do magistrado
de recebimento da denúncia é um ato decisório, devido o gravame que decorre desta
prolação. Embasando este entendimento, também estão as legislações comparadas
que já regulam o recebimento da denúncia como uma decisão; bem como a tendência
atual reformadora do CPP em considerar nula a decisão de recebimento sem
269
fundamentação. Entendem também que se deve incluir esta como uma das hipóteses
de impetração do recurso em sentido estrito elencadas no art. 581 do CPP, além de
criar uma audiência preliminar(14) antes do recebimento da denuncia, como já
ocorre em alguns procedimentos especiais.
A natureza jurídica do recebimento da denúncia. Será uma discussão fradesca?
Elaborado em 10.2002. João Alves de Almeida Neto
http://jus2.uuol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3505 - acessado 040709 1115
Neste trilhar, Fernando Capez, em lúcida reflexão, professora que:
“Para nós o recebimento da denúncia ou queixa implica na escolha judicial entre a
aceitação e a recusa da acusação, tendo, por esta razão, conteúdo decisório, a
merecer adequada fundamentação.
Citado em: Recebimento da denúncia. Necessidade de fundamentação. Forma de controle
extraprocessual - Moacyr Corrêa Neto
http://www.clubjus.com.br/?artigos&ver=2.12253 - acessado 040709 1147
A automatização do recebimento da denúncia, porém, não afasta o caráter
decisório do ato.
O recebimento da denúncia determina a existência e curso da ação penal.
22.5 DA (IN)PROCEDÊNCIA DA DENÚNCIA
Costumeiramente os magistrados encerram o exercício dialético (exame do
contraditório, art. 381, II, III e IV) com a expressão “julgo procedente (ou parcialmente
procedente ou improcedente) a denúncia”.
Este ato é uma decisão, visto que há escolha, e é decisão fundamentada (a
270
sentença conterá) e os fundamentos os incisos citados no parágrafo anterior.
A procedência (ou procedência parcial ou improcedência) determina se o
magistrado poderá avançar para a fase da fixação da pena.
Ultrapassadas as hipóteses de não aplicação da pena o magistrado entra no
manejo das circunstâncias do artigo 59.
A primeira delas é a culpabilidade, que tem a função de determinante, qual seja,
verificada ausente as demais circunstâncias não serão examinadas e o culpado será
absolvido.
22.6
MOTIVOS DE FATO E DE DIREITO
Motivos de direito são comparáveis aos tipos: indicadores dos elementos que
devem estar presentes na declaração.
A declaração deve ser uma construção de adequação dos motivos de fato aos
motivos de direito e tem a figura de demonstração:
1. a ação de A (indivíduo criminalmente identificado) ...
2. ... eliminou (meios verificados)
3. ... a vida (verificação da morte, ou materialidade) ...
4. ... de B (vítima verificada)
5. B estava vivo antes da ação de A, então B era ALGUÉM.
6. Eliminar a vida é MATAR (verbo da ação de A)
7. MATAR ALGUÉM é crime: art. 121 do Código Penal.
Compreensível, corrente e usual que sem os motivos de fato não é possível
271
afirmar o motivo de direito, e sem a adequação (conteúdo requerido para preenchimento
do continente) entre eles a afirmação seria falsa.
motivo
Definition: razão pela qual justificamos nossa atitude. Opõe-se ao "móvel", que é
a causa real de nossa ação, o que a move efetivamente. — O motivo é a
razão consciente, a justificação social e freqüentemente retrospectiva do que fizemos;
enquanto que o móvel é um sentimento, um estado afetivo, que, aliás, pode
permanecer inconsciente. [Larousse]
Vocabulário da Filosofia
http://www.filoinfo.bem-vindo.net/filosofia/modules/lexico/entry.php?entryID=2292
acessado 08:30:05 27/06/09
fundamento
Definition: Usa-se este termo em vários sentidos. Por vezes equivale a princípio;
outras vezes a razão; outras ainda a origem. pode, por sua vez, empregar-se nos
diversos sentidos em que se emprega cada um destes vocábulos. Por exemplo:
“Deus é o fundamento do mundo”; “eis aqui os fundamentos da filosofia”; “conheço
o fundamento da minha crença”. Pode ver-se facilmente que, além de ser muito
variado o uso de tal termo, na maioria dos casos não é nada preciso.
Em geral pode estabelecer-se que são duas as principais acepções de fundamento:
1) o fundamento de qualquer coisa enquanto qualquer coisa real.
Esse fundamento - chamado por vezes fundamento real ou material - identifica-se às
vezes com a noção de causa, especialmente quando causa tem o sentido de a razão de
ser de qualquer coisa. Posto que a noção de causa pode por seu turno ser
272
compreendida em vários sentidos, o mesmo sucederá com a idéia de fundamento; é
muito comum, no entanto, identificar a noção de fundamento com a de causa formal.
2) o fundamento de qualquer coisa enquanto qualquer coisa real (de
um enunciado ou conjunto de enunciados).
Tal fundamento é então a razão de tal enunciado ou enunciados no sentido de ser
a explicação racional deles.
Tem-se
chamado
por
vezes
a
este fundamento, fundamento ideal.
Vocabulário da Filosofia
http://www.filoinfo.bem-vindo.net/filosofia/modules/lexico/entry.php?entryID=685
08:32:39 27/06/09
Intenção e motivo são noções conexas; o motivo é motivo de uma intenção (…). A
relação é tão estreita que, em certos contextos, motivos e intenções são indiscerníveis,
em particular quando a intenção é explícita. (…) A intenção responde à pergunta
“quê, que fazes?” Serve, pois, para identificar, para nomear, para denotar a acção (o
que se chama ordinariamente o seu objecto, o seu projecto); o motivo responde à
questão “porquê?” Tem, portanto, uma função de explicação; mas a explicação já
vimos, pelo menos nos contextos em que motivo significa razão, consiste em
esclarecer, em tornar inteligível, em fazer compreender. Portanto, é sob a condição
da redução do motivo a uma razão de… e da explicação a uma interpretação, que a
noção de motivo aparece separada da de causa por um “abismo lógico”: classificar
algo como motivo é excluir que o classifiquemos como razão de… (…).
A relação causal é uma relação contingente no sentido de que a causa e o efeito
podem identificar-se separadamente e que a causa pode compreender-se sem que se
mencione a sua capacidade de produzir tal ou tal efeito. Um motivo, pelo contrário, é
um motivo de: a íntima conexão constituída pela motivação é exclusiva da conexão e
273
contingente da causalidade.
Paul Ricoeur, O Discurso da Acção, Lisboa, Edições 70,1988, pp. 50-51
http://paginasdefilosofia.blogspot.com/2009/03/intencao-e-motivo-sao-nocoes-conexaso.html - acessado 08:23:16 27/06/09
O motivo legal para a culpabilidade é o artigo 59 do CP c/c art. 29 e referentes
adiante dele.
Os motivos de direito para a culpabilidade estão apontados pela doutrina com
sendo a imputabilidade (especial, no caso), a potencial consciência do injusto e a
exigibilidade de conduta diversa.
Quais seriam então os motivos de fato da culpabilidade, ?
22.7
LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO
Vige em nosso sistema jurídico o princípio do Livre Convencimento Motivado do Juiz,
segundo o qual o juiz tem liberdade para dar a determinado litígio a solução que lhe
pareça mais adequada, conforme seu convencimento, dentro dos limites impostos
pela lei e pela Constituição, e motivando sua decisão – fundamentação -. Cabe-lhe, à
luz das provas e argumentos colecionados pelas partes – Persuasão Racional –
decidir a lide.
A Emenda Constitucional nº 45/04, a súmula vinculante e o livre convencimento motivado
do magistrado. - Um breve ensaio sobre hipóteses de inaplicabilidade - Elaborado em
05.2005. - Luís Fernando Sgarbossa e Geziela Jensen
http://jus2.uuol.com.br/doutrina/texto.asp?id=6884 - acessado 040709 0808
Conquanto não se trate de uma lide no sentido estrito o princípio se aplica ao
processo penal na integralidade, como acima exposto.
274
A limitação imposta pela lei e pela Constituição só pode ser demonstrada e
obedecida se existirem declarações suficientes para conferência da motivação –
fundamentação – e a suficiência é verificada pela extensão da recorribilidade.
A extensão da recorribilidade deve alcançar os motivos de fato e de direito e tais,
então, precisam ser declarados de forma a premiar a inteligibilidade pois a decisão sobre
recorrer ou não é, de regra, é do domínio do sucumbente, no caso em estudo o
condenado, conquanto a deficiência de fundamentação prejudique também a acusação.
Quais seriam então os motivos de fato da culpabilidade?
A pergunta retorna para atender à necessidade de individualização da
culpabilidade que, na fixação da pena, é o parâmetro da proporcionalidade da pena em
relação à pessoa do condenado.
O art. 59 do Código Penal prescreve que a pena deve ser necessária e suficiente
para a reprovação e a prevenção e, simplesmente para fugir da responsabilização
objetiva deve ser entendido que a reprovação e a prevenção devem recair sobre o
indivíduo, e tanto assim é que o tipo oferece uma faixa de sanção para o mesmo crime.
Então, é no indivíduo e nas circunstâncias do cenário da conduta que serão
encontrados os motivos de fato a serem adequados aos motivos de direito.
Por circunstâncias do cenário da conduta devem ser considerados todos os fatores
que possam influir na tomada de decisão ou produzir determinada reação, em cotejo com
a capacidade do indivíduo para lidar com tais influências.
Desta sorte, os motivos de fato serão aqueles que constarem dos autos por
informação do denunciado, via interrogatório, ou por qualquer meio admitido em direito
como prova de ato ou fato.
275
Ao magistrado cumpre colher as informações de pessoa e cenário como motivos
de fato, e a insuficiência dessa coleta é tão grave que reflete diretamente na insuficiência
da fundamentação.
Apesar da objetividade informativa a conclusão sobre a culpabilidade é o
resultado de um juízo (livre convencimento motivado) a ser declarado com todos os
argumentos de fato e de direito.
O conteúdo da declaração do juízo da culpabilidade está detalhado em outros
textos aos quais se recomenda o acesso:
Caderno de Referência Doutrinária sobre a Culpabilidade
http://serrano.neves.nom.br/CRD4-CULPAB_1.0.pdf
A Culpabilidade vista por Serrano Neves
http://www.serrano.neves.nom.br/LIV_2-CULPABILIDADE.pdf
O estilo de composição do texto das declarações pode, sim, ser a concisão, desde
que a inteligibilidade não prejudique a recorribilidade (garantia da ampla defesa)
A concisão é apenas uma forma curta de composição na qual as idéias são
apresentadas e encadeadas na mínima inteligibilidade, dispensado o discurso
justificador.
Um exemplo de concisão é o silogismo da lógica formal na sua forma simples:
Todos os homens são mortais,
Sócrates é homem,
logo, Sócrates é mortal.
Esta forma simples é inteligível porque os termos são de conhecimento comum e
276
o homem-pessoa pode ser qualquer um. Porém, fossem os termos incomuns para a
pessoa a quem a comunicação é dirigida (condenado) e a forma requerida seria
aumentada, no mínimo, para o epiquirema, no qual os termos ou premissas são
demonstrados:
Todos os homens (designativo de todas as pessoas vivas) são mortais (por
constatação da inexistência de pelo menos um homem imortal),
Sócrates (nome de um homem, filósofo grego) é mortal (chegará o momento
em que morrerá),
Logo, Sócrates é mortal.
As demonstrações poderiam ser aumentadas até se transformarem em longo
discurso sem perda do raciocínio silogístico.
Não é requerido que a decisão fundamentada seja abundante, mas é requerido que
seja completa (premissas e conclusão), não sendo admitida a presunção de conhecimento
sobre algo que não foi declarado, ou a googlalização da decisão.
Google - Pesquisa avançada - Pesquisar: a web páginas em português páginas do Brasil
– Web
Resultados 1 - 50 de aproximadamente 41.200 para "Sócrates é mortal" (0,65 segundos)
A decisão judicial deve ser considerada pelo que nela está escrito, jamais pelo
que dela pode ser deduzido ou interpretado, vez que a necessidade de dedução ou
interpretação revela, exatamente, a deficiência de inteligibilidade, admitida a referência
à fonte dos autos (conforme folhas) ou a fonte externa (fonte bibliográfica) com a
precisão que não demande maior gravosidade para que as fontes sejam encontradas e
conferidas.
277
Matar a cobra e mostrar o pau é como os não-jurídicos exigem que algum
declarante a presente os fundamentos da declaração.
Qual o grau de inteligibilidade que deve ter uma declaração?
A resposta mais simples é que a declaração possa ser entendida pelo indivíduo a
quem é dirigida e estará sujeita aos efeitos dela.
Um exemplo na música encaminha o raciocínio:
C7 (notação cifrada do acorde de Dó maior com sétima)
C7 (C, E, G, B) são notas que compõem o acorde C7, dó, mi, sol, si.
C = 16,352 Hz, E = 20,602 Hz, G = 24,500 Hz, B -30,868 Hz, as
frequências (primeiras audíveis) das notas que formam o acorde.
Seja que as frequências podem ser produzidas por tubos de diâmetro D e
comprimento L, fechados em uma extremidade.(*)
(*) (fórmulas suprimidas, ver teoria em
http://www.feiradeciencias.com.br/sala10/10_15.asp )
Seja que com base nos tubos pode ser construída a flauta de Pan (um tubo para
cada nota) e alguém, soprando na flauta, ouça as notas.
Seja também que o acorde seja tocado num violão e o instrumentista diga para o
ouvinte: O que você ouviu é um C7.
O ideal seria o magistrado “tocar o acorde” na presença do ouvinte (condenado),
278
mas a processualística nem sempre permite isto. No entanto, por se tratar de um
“acorde” que privará o “ouvinte” da liberdade e de direitos, é de ser tido como
fundamental que, ao invés de escrever uma partitura jurídica que será executada pelo
defensor para que o ouvinte tome conhecimento, a DIGNIDADE DA PESSOA humana
seja contemplada com o mínimo direito de o condenado entender por olhos e ouvidos
próprios as razões da decisão.
Igual ferimento a um direito fundamental seria o magistrado prolatar uma
sentença na qual apenas escrevesse: Por incursão no tipo previsto na lei o réu é
culpado.
Folheando os autos um “mestre iniciado” nas artes jurídicas poderia concluir
que a decisão acima está correta.
Correta, mas totalmente carente de fundamentos de fato e de direito.
A finalidade da sentença é resumir os autos e a finalidade do dispositivo é
resumir a sentença, cada etapa, porém, com seus próprios motivos de fato e de
direito.
Desta sorte, a simples escrita dos motivos de direito (imputabilidade especial,
potencial consciência da ilicitude e exigibilidade de conduta diversa) assinala os
motivos de direito, mas não trazem como suporte os motivos de fato que seriam a
razão de decidir por maior ou menor grau de censura.
Na análise da culpabilidade a motivação de fato responde aos porquês:
1. porque é especialmente imputável;
2. porque podia alcançar a consciência do injusto;
3. porque poderia ser exigida conduta diversa.
279
A preocupação com a fundamentação das decisões antecede a Carta de 88:
A motivação, quanto ao direito, exige que o juiz deva exprimir o porquê de uma
determinada escolha normativa e interpretativa.
...
Convém ressaltar que não há motivação sem referência aos elementos de prova
relativos aos pontos fundamentais da causa. É perfeita a observação de RICARDO C.
NÚÑEZ: “Em relación a las conclusiones de hecho de la sentencia, para llenar su
obligación de motivarlas (fundarlas), el juez debe comenzar por enunciar los
elementos probatórios que justifican cada una de esas conclusiones de hecho. No le
bastaria decir: está probado que Juan murió. Es preciso que sustente esa afirmación
em elementos probatórios. La motivación debe ser sobre todos y cada uno de los
presupuestos de la decisión; debe ser, em una palabra, completa”.
A MOTIVAÇÃO DA SENTENÇA NA APLICAÇÃO DA PENA (*)
Heleno Cláudio Fragoso
Texto integral e original do artigo publicado na Revista de Direito do Ministério
Público da Guanabara, n.° 08, 1969.
A Carta de 88 ao estabelecer o Estado Democrático de Direito lançou luzes mais
fortes sobre a motivação das sentenças, justificando o alcance ampliado da função:
Eduardo Couture, quanto ao dever da fundamentação das decisões judiciais, diz que
se trata de "uma maneira de fiscalizar a atividade intelectual do Juiz frente ao caso, a
fim de poder-se comprovar que sua decisão é um ato refletido, emanado de um estudo
das circunstâncias particulares, e não um ato discricionário de sua vontade
arbitrária."
Neste mesmo sentido Antônio Scarance Fernandes ao expor a evolução de tal
280
princípio:
Evoluiu a forma de se analisar a garantia da motivação das decisões. Antes,
entendia-se que se tratava de garantia técnica do processo, com objetivos
endoprocessuais: proporcionar às partes conhecimento da fundamentação para
poder impugnar a decisão; permitir que os órgãos judiciários de segundo grau
pudessem examinar a legalidade e a justiça da decisão. Agora, fala-se em garantia de
ordem política, em garantia da própria jurisdição. Os destinatários da motivação não
são mais somente as partes e os juízes de segundo grau, mas também a comunidade
que, com a motivação, tem condições de verificar se o juiz, e por conseqüência a
própria Justiça, decide com imparcialidade e com conhecimento de causa. É através
da motivação que se avalia o exercício da atividade jurisdicional. Ainda, às partes
interessa verificar na motivação se as suas razões foram objeto de exame pelo juiz. A
este também importa a motivação, pois, através dela, evidencia a sua atuação
imparcial e justa.
A SENTENÇA JUDICIAL E A SUA FUNDAMENTAÇÃO - Ana Luiza Berg Barcellos –
29/05/2008*
http://www.mt.gov.br/wps/portal?cat=Direito,
+Justiça+e+Legislação&cat1=com.ibm.workplace.wcm.api.WCM_Category/Defesa+na+O
rdem+Jurídica/dc97b1481cba6a3&con=com.ibm.workplace.wcm.api.WCM_Content/A+S
ENTENÇA+JUDICIAL+
+E+A+SUA+FUNDAMENTAÇÃO/e54c9c0366c488a&showForm=no&siteArea=Início&
WCM_GLOBAL_CONTEXT=/wps/wcm/connect/eMatoGrosso/Estado/Informações/A+SENTENÇA+JUDICIAL+
+E+A+SUA+FUNDAMENTAÇÃO - acessado 08072009 0647
Do ponto de vista da ordem pública, ou função exoprocessual, sendo Portugal um
dos signatários da Convenção para a proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades
281
Fundamentais e possuindo uma constituição de mesmos princípios que a brasileira, vale
citar:
1 — Como justamente observa o juiz Franz Matscher na sua comunicação, a
necessidade de motivar a decisão é uma das exigências do processo equitativo, um
dos Direitos do Homem consagrado no artigo 6.º, § 1, da Convenção Europeia.
Mas logo acrescenta que a motivação não deve ter um extensão “épica” sem
embargo de dever permitir ao destinatário da decisão e ao público em geral
apreender o raciocínio que conduziu o juiz a proferir tal e tal sentença.
Corolariamente, só uma decisão revestida de motivação suficiente, permite de modo
eficaz o exercício do direito de recurso para um Tribunal Superior.
...
Uma fundamentação deficiente pode ser causa de nulidade, dado que a motivação
deve ser tal que, intraprocessualmente, permita aos sujeitos processuais e ao tribunal
superior o exame do processo lógico ao racional que lhe subjaz; e,
extraprocessualmente, a fundamentação deve assegurar, pelo seu conteúdo, um
respeito efectivo do princípio de legalidade na sentença.
A MOTIVAÇÃO DA SENTENÇA - MANUEL ANTÓNIO LOPES ROCHA - Juiz do
Supremo Tribunal de Justiça e do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem
www.gddc.pt/actividade-editorial/pdfs-publicacoes/7576-c.pdf - acessado 08072009 0706
22.8 DA EXTENSÃO DA MOTIVAÇÃO
Os magistrados costumam ser abundantes na declaração dos motivos de fato e de
direito quando formulam a existência do crime: transcrevem depoimentos, arrolam
doutrina e jurisprudência, e expõe raciocínios.
282
O propósito da abundância, do ponto de vista técnico, é assegurar que a precisão
e a coerência do ditado possam ser conferidas.
Conquanto aceitável que um motivo possa ser referido às folhas dos autos onde
pode ser encontrado – e o número da folha é sempre declarado – os magistrados, pela
próprio esforço de construção da sentença preferem transcrever, e as exceções correm
são a citação dos dispositivos legais apenas pelo número da lei e dos artigos, o que é
razoável por se tratar de universalidades.
Assim, é corrente e reconhecível à simples leitura, que os magistrados são
abundantes quanto aos motivos de fato do crime e econômicos, beirando a
metalinguagem, quanto aos motivos de direito.
Observado que a sentença é obra de perito, o encadeamento do discurso é tal que
os elementos do tipo são definidos sem que o verbo núcleo ou o nome dos elementos
sejam citados, na conformidade de garantir que a definição não contenha o termo
definido.
Igual esforço não é verificado na construção da pena através do manejo do art. 59
do CP, causando a impressão que a certeza da existência do crime prevalece sobre a
certeza da privação da liberdade.
A existência do crime resulta do critério da certeza objetiva, ou seja, o
pensamento e a declaração estão de acordo com os fatos expostos ao conhecimento.
No tocante à privação da liberdade não está sendo posto em dúvida que o juiz
tenha pensado e concluído corretamente, mas está sendo atacado que não declarou de
forma suficiente para que o leitor possa verificar a conformidade da declaração com os
fatos expostos ao conhecimento (motivos de fato) que se ajustam à conclusão
283
(adequação aos motivos de direito).
A validação da declaração insuficiente é feita com justificativa de que é sucinta.
O uso do sucinto é autorizado por lei (art. 381, III, CPP), não fora um estilo
válido de composição de texto, mas sucinto não é sinônimo de incompleto.
O sucinto – poucas palavras – deve conter os mesmos elementos essenciais que o
abundante e ser inteligível para quem a mensagem é dirigida.
A declaração no dispositivo condenatório enquanto função endoprocessual atende
aos aspectos formais do devido processo legal e satisfaz os atores peritos, mas o
cumprimento da função exoprocessual se dá no plano material dos efeitos quanto ao
sujeito condenado, sendo esperado que lhe seja inteligível por conhecimento próprio,
direito decorrente da dignidade da pessoa humana: conhecer dos motivos de fato e de
direito que lhe privam a liberdade sem necessidade de intérprete.
O poder que o magistrado tem apenas lhe dá a exclusividade de cumprir o dever
de fundamentar a decisão (discricionariedade da autoridade), não se transferindo para o
fundamento e, se transferido ganha o nome de abuso de poder ou arbitrariedade.
A decisão discricionária fundamentada revela a escolha dos argumentos e permite
que o recurso ataque os fundamentos ou a conclusão.
Por falta de fundamentação do dispositivo condenatório, em especial quanto à
culpabilidade, os recursos de “misericórdia” formam um volume expressivo a desafiar a
capacidade dos tribunais, e pior, com a consequência de banalizarem a decisão de
primeiro grau.
Al culpado que cayere debajo de tu juridición considerále hombre miserable, sujeto a
las condiciones de la depravada naturaleza nuestra, y en todo cuanto fore de tu parte,
284
sin hacer agravio a la contraria, muéstrate piadoso y clemente, porque aunque los
atributos de DIOS todos son iguales, más resplandece y campea a nuestro ver el de la
misericordia que el de la justicia".(CERVANTES)
A Misericórdia e a Justiça não são excludentes, como afirmou Cervantes, mas
mesmo a misericórdia, em decisão judicial, precisa ser fundamentada com motivos de
fato, embora não existam para ela os de direito.
Um dispositivo sucinto deve conter declarações suficientes para que os motivos
de fato e de direito confiram a máxima extensão da recorribilidade.
A máxima extensão da recorribilidade deve ser entendida como a exposição de
todos os motivos de fato e de direito que fundamentam o dispositivo,
independentemente da avaliação de que o condenado tenham ou não “merecido” a pena.
Da leitura de um dispositivo sucinto fundamentado deve resultar que, tanto para o
perito como para o não perito, pelos motivos de fato e de direito expostos a conclusão
não podia ser outra.
O dispositivo sucinto fundamentado evita que a acusação diante de um juiz de
caneta leve recorra na esperança de que um relator caneta pesada a reforme para mais
ou, ao contrário para a defesa, visto que uma e outra haverão de atacar os motivos
expostos e não apenas “clamar”.
Sucinto não é forma superior de linguagem, e a técnica de estilo o define:
CONCISÃO é o dispêndio minimo de esforço com o máximo efeito de expressão.
TÉCNICAS DO ESTILO – Albertina Fortuna Barros – EFC Brasil – 1968 – pág 21
O sucinto ou conciso pode ser definido pelo que não deve conter: palavras
285
supérfluas ou inúteis, circunlóquios, orações subordinadas desenvolvidas, redundâncias
etc.
Por conter os elementos essenciais à inteligibilidade o sucinto, ou conciso, é
estilo que agrada nas sentenças judiciais, ao contrário da prolixidade que desagrada.
O ideal como estilo de composição de sentença é a dissertação (intróito,
exposição, argumentos, provas, conclusão), estilo que é usado com mais frequência para
determinar a existência do crime.
A cultura judicial de que a fixação da pena é um “ato de poder” tem raízes
históricas fincadas no poder soberano do rei que nomeava seus magistrados: o soberano
não precisa justificar suas decisões e, por corolário, os prepostos do rei também não.
A evolução do pensamento judicial passou a exigir que o magistrado de carreira
(que não é preposto do rei) fundamente todas as decisões de forma completa e
inteligível, por todos os motivos de fato e de direito, ainda que sucinta ou concisa.
Num Estado Democrático de Direito não é admissível concluir que com ou sem
fundamentação a pena imposta seria a mesma e que, por isso, não ocorreria prejuízo para
o condenado.
O prejuízo que se examina sob a luz do regime democrático decorre, na espécie,
da inadimplência do estado-jurisdicional.
O devido processo legal, na sua reconhecida dupla acepção formal/substancial é
uma obrigação que o estado-jurisdicional garante que cumprirá por inteiro (ninguém ser
privado da liberdade sem o devido processo legal). Assim, iniciada a perseguição penal,
o estado-jurisdicional torna-se devedor e deve adimplir por inteiro.
Desta sorte, não existe prestação inútil, qual seja, o estado-jurisdicional prestará
286
ainda que o credor não queira a prestação, como é o caso daquele que se crê inocente, a
prova da inocência é clara, e por isto se recusa a nomear ou constituir defensor: terá
defensor para sua absolvição.
O que parece um absurdo (hipótese retro) nada mais é do que a efetivação da
força normativa da Constituição, ou de modo raso: é a auto defesa que o devido processo
legal faz da sua integridade.
A idéia da exigência de demonstração de prejuízo quando o devido processo legal
não é cumprido na integralidade é assustadora porque consagra que os meios não
importam se o fim é atingido.
O Estado Democrático de Direito é inteiramente balizado pela garantia dos meios
a serem utilizados para que os fins sejam atingidos.
A incidência da força normativa da Constituição sobre o devido processo legal
nela mesma garantido, no particular da fundamentação das decisões judiciais independe
– embora o tenha – de caminho aberto pela legislação inferior.
Aquela posição por mim designada vontade de Constituição (Wille zur Verfassung)
afigura-se decisiva para a práxis constitucional. Ela é fundamental, considerada
global ou singularmente. O observador crítico não poderá negar a impressão de que
nem sempre predomina, nos dias atuais, a tendência de sacrificar interesses
particulares com vistas à preservação de um postulado constitucional; a tendência
parece encaminhar-se para o malbaratamento no varejo do capital que existe no
fortalecimento do respeito a Constituição. Evidentemente, essa tendência afigura-se
tanto mais perigosa se se considera que a Lei Fundamental não está plenamente
consolidada na consciência geral, contando apenas com um apoio condicional.
DIE NORMATIVE KRAFT DER VERFASSUNG – Konrad Hesse, tradução de Gilmar
287
Ferreira Mendes, ED. SAFE, 1991, pag. 29
22.9
FUNDAMENTAÇÃO DA SENTENÇA
O mestre Miguel Reale, na sua teoria tridimensional do direito, diz que a norma é
a integração em fato e valor, estes em estado de bipolaridade e em implicação
necessária.
O Direito Penal apresenta os tipos punitivos com essa construção integrativa,
implicando necessariamente o fato (p.e.: matar alguém) a um valor (não matar alguém).
É relevante observar - a lição é de Manlio la Rocca - que para o Direito Penal
"fato é tudo aquilo que, mudando uma circunstância, muda o fato", o que é evidenciado
pelas qualificadoras, causas, condições e circunstâncias que determinam a construção da
sanção. A lição de Rocca se traduz também na "imutatio libeli".
Tal cenário é de garantia, garantia de que o fato do autor seja o fato por ele
produzido (o crime e todas as suas circunstâncias) submetido à adequação típica.
O homicídio - por ser definido por apenas duas palavras - mostra que, qualquer
que seja a configuração circunstancial de um homicídio simples - ainda que descrito em
muitas laudas, ocorre a redução ao "matar alguém" (raciocínio indutivo > do geral para o
particular).
A sanção prevista no tipo mostra que a aplicação da pena segue o inverso, qual
seja: a simples previsão do intervalo entre um mínimo e um máximo diz que para um
"matar alguém" podem existir muitas penas diferentes.
Para um leigo o autor de um crime "merece" pena, e o leigo "merece" significa
razão, justiça, conveniência, enfim: pelo que praticou o autor é merecedor de pena.
288
Um juiz, pensando leigamente, chega à mesma conclusão, mas não pode ditá-la
sem responder porque é razoável, justo ou conveniente, e é assim que diz a Constituição:
todas as decisões judiciais serão fundamentadas.
Para o leigo basta que o crime seja cometido, o autor julgado e a pena
estabelecida, porque assim o dizem a lei, os juízes e a "noção de castigo", mas o mesmo
universo de leigos que acaba encontrando razões para considerar que uma pena foi alta
ou baixa, em razão da pessoa, e em razão da pessoa o direito penal possui uma série de
figuras que aumentam, diminuem, isentam e imunizam conforme a pessoa.
Não é difícil automatizar a adequação típica para que o processo penal se
transforme em uma série de cliques na tela do computador, respondendo sim ou não a
proposições objetivas, como também não há dificuldade em construir calculadoras para
a dosimetria da pena nas quais a extensão do subjetivo é transformada em uma escala
objetiva.
Todo o processo de dosimetria da pena, assinalado pelos magistrados como
"subjetivo", culmina por uma clara objetividade: a espécie e quantidade de pena.
A culpabilidade entrou para o direito penal para liquidar com a subjetividade "não
jurídica" constituída por "acho" ou "a sociedade repudia", ou com o simples "merece".
A doutrina cuidou de assinalar as variáveis a serem aferidas (imputabilidade,
potencial consciência do injusto e exigibilidade de conduta diversa) pelo magistrado,
qual seja, a aferição, principalmente do ponto de vista da recorribilidade (ampla defesa)
consiste na declaração do conteúdo das variáveis, de tal sorte que a medida da
culpabilidade tenha fundamento e possa ser conferida pelo condenado.
Por óbvio, não seria possível conferir o resultado da equação a+b+c=7 dado que
289
as variáveis (a,b,c) podem assumir infinitos valores cuja soma seja 1 (um) mas é
perfeitamente claro que se a=1, b=2 e c=4 então o resultado é 7 (sete) o que permitirá ao
recorrente arguir sobre o valor de cada variável.
Em tese, um magistrado, conhecendo o tipo, e sabendo que a faixa de sanção é de
X a Y anos, poderá aplicar a pena mínima (X), a máxima (Y) ou a média (X/2+Y/2), ou
com habilidade qualquer pena no intervalo, sabedor apenas de que a faixa de sanção
guarda proporcionalidade com o fato e o valor envolvidos. Sua decisão, por falta de
valores numéricos, necessitará de fundamentação que justifique a dosimetria e será
inteligível para todos os sabedores da proporcionalidade retro referida.
Com a tese fica demonstrado que a fundamentação correta produz a abstração
numérica sem comprometer a inteligibilidade.
Na busca da inteligibilidade (e o corolário da recorribilidade) é que se tem
exigido dos magistrados, catilinariamente, que declarem o conteúdo individualizado das
variáveis (ou elementos da culpabilidade).
Expressões singelas como "culpabilidade acentuada", "imputável", "possuia
consciência do injusto", "era exigível conduta diversa", entre outras de igual construção,
são tão genéricas que podem ser aplicadas a qualquer condenado em qualquer processo.
Razoável exigir que os magistrados declarem o tamanho do acento da
culpabilidade, o grau de imputabilidade, o quanto de consciência do injusto tinha o autor
do fato e porque era exigível outra conduta, e isto só pode ser feito quando o magistrado
"conhece" do autor tanto quanto conhece de outras matérias dos autos.
"Conhecer" do autor exige mais do que a mecânica indagação prevista no código
de processo penal para o interrogatório, e isto se aplica a todo o artigo 59 do CP, e não
290
apenas à culpabilidade, exige que o magistrado compreenda que está julgando seres
humanos pela sua capacidade de "não cometer crimes", que é o "normal" desejado pela
sociedade.
Desta sorte, quanto mais capaz de "não cometer crime" maior o "desvio" da
normalidade quando o crime é cometido e maior a pena se, circunstancialmente, não
tinha o autor como evitar o "desvio".
Humanos não são "padrões jurídicos definidos", logo, não se resolve o que
pertence ao humano legalidade, mas com o ajuste do "conteúdo humano" aos parâmetros
que a lei assinala e a doutrina especifica, e isto pode ser feito em "cidadanês".
Enfim, para dar a cada um o que é seu é necessário saber quem é ele e qual a sua
capacidade de recepção.
22.10
CONCLUSÃO
A análise dos elementos que compõe a culpabilidade deve ser feita e demonstrada
através da declaração dos motivos de fato e de direito, não subsistindo nenhuma
justificativa de economia, obviedade, ou poder, capaz de afastar a força normativa da
Constituição e a força histórica da evolução do pensamento jurídico em favor de que os
magistrados devem aos jurisdicionados todas as explicações que estes necessitem para
compreensão formal e material da incidência das decisões.
A forma concisa ou sucinta do dispositivo condenatório deve conter todos os
motivos de fato e de direito em que a decisão pela graduação da censura se funda, e tais
motivos, por imposição também da Constituição devem revelar a individualização,
vedado, então, que a pena base seja construída através de declarações genéricas e
291
estereotipadas que a qualquer indivíduo servem.
A culpabilidade, como expressão da reprovação proporcional à conduta, é um
juízo de locação da reprovação dentro da faixa de sanção oferecida no tipo, deve, por
isto, ser expressa por um grau, índice ou medida (Art. 29, CP e Exposição de Motivos da
Nova Parte Geral, 50. ... visto que graduável é a censura, cujo índice, maior ou menor,
incide na quantidade da pena.) que permita, pela simples declaração, antever o ponto
central da locação.
As demais circunstâncias judiciais do art. 59 são comumente referidas em grau,
índice ou medida inteligível (escala de favorabilidade positiva ou negativa) não sendo
exigível coisa melhor, mas estão igualmente subordinadas à terem a referência suportada
por motivos de fato e de direito que possam ser aferidos e conferidos, como é o caso dos
antecedentes que se provam por anotações judiciárias, o mesmo não se podendo dizer
em relação às outras que se definem subjetivamente, como é o caso da “personalidade
voltada para o crime”.
Assim, este arrazoado deve ser estendido para todo o conteúdo da dosimetria da
pena para segurança de que a restrição da liberdade imposta pela sentença penal
condenatória mantenha a inviolabilidade do direito à liberdade (Art. 5º, CF).
292
23
EMBARGOS DE COERÊNCIA(*)
23.1 FUNDAMENTAÇÃO DAS DECISÕES QUE RESTRINGEM A
LIBERDADE.
(*) COERÊNCIA: qualidade de quem defende sempre os mesmos valores, as
mesmas soluções, para os mesmos problemas.
SUMA 101 - ART. 59 DO CP. CULPABILIDADE. NULIDADE. O juízo da
circunstância judicial da culpabilidade é a razão legal para a pena, logo, a ausência,
insuficiência ou deficiência da individualização fundamentada por motivos de fato
(elementos concretos) é ausência, insuficiência ou deficiência de razão legal,
implicando em liberar o condenado do constrangimento de pena sem causa legal pela
via do refazimento na instância original.
São examinadas as hipóteses de decisões que privam a liberdade, quer cautelares,
provisórias ou definitivas, independente da sede e da nomenclatura, arrolando-as dentro
do gênero RESTRIÇÃO DE LIBERDADE.
23.2
DO EXAME DE CASOS CONCRETOS
O site do TJGO apresenta pelo menos 84 decisões oriundas da busca "Todas as
palavras (E)" com a expressão "prisão elementos concretos", estas, refinadas com a
expressão "habeas corpus prisão elementos concretos conceder", resultaram em 28, e
com a expressão "habeas corpus prisão elementos concretos denegar" resultaram em 46.
A pesquisa por amostragem de leitura mostrou que:
1. conceder (conceder a ordem de habeas corpus) está ligado à inexistência
293
de elementos concretos declarados como fundamento das decisões;
2. denegar (denegar a ordem de habeas corpus) está ligado à existência de
elementos concretos declarados como fundamento da decisão
As decisões repudiam que a restrição cautelar da liberdade ocorra com a simples
referência aos motivos de direito (Art. 312 do CPP) ou com essa referência
acompanhada de motivos abstratos ou simples preocupações.
Com relação às decisões examinadas resulta certo que o TJGO é coerente no
tratamento dado às hipóteses de constrangimento ilegal como causa da restrição da
liberdade POR INEXISTÊNCIA DE ELEMENTOS CONCRETOS, casos em que
CONCEDE A ORDEM DE HABEAS CORPUS.
A posição inversa é verificada POR EXISTÊNCIA DE ELEMENTOS
CONCRETOS, casos em que DENEGA A ORDEM DE HABEAS CORPUS.
A prisão cautelar conquanto gênero de gravosidade "restrição de liberdade" é
espécie de grau menor do que a prisão definitiva pois pode cessar por inconsistente, por
excesso de prazo ou por desaparecimento dos motivos ensejadores, mediante provocação
ou de ofício.
A prisão definitiva por sentença condenatória é, de regra, não cessante pelos
mesmos motivos da cautelar, e só termina pelo curso do tempo, intercorrência de
inimputabilidade, ou desconstituição da condenação.
Na prisão cautelar o TJGO vem interpretando que o dispositivo de restrição
cautelar da liberdade deve expressar os motivos de direito (previsão legal das hipóteses)
e os motivos de fato, na forma de "elementos concretos" que permitam concluir que O
INDIVÍDUO é quem enseja a cautela, não se contentando com rumores, clamores,
294
opiniões ou preocupações que não tenham base de fato para incidência do conhecimento.
Na prisão definitiva, orientada pela dosimetria da pena, o TJGO vem admitindo
que a culpabilidade, como circunstância de fixação da pena, prevista no art. 59 do CP,
seja fundamentada apenas pelos motivos de direito (inimputabilidade especial, potencial
consciência do injusto e exigibilidade de conduta diversa) calçados em expressões
genéricas, ou universais, sem os "elementos concretos" (motivos de fato) que permitam
concluir que o INDIVÍDUO é quem enseja a censura, por sua conduta.
Dispositivo de decisão por prisão cautelar e dispositivo por sentença condenatória
são do mesmo gênero "restrição da liberdade" que devem seguir o mesmo balizamento
constitucional da fundamentação e da individualização.
Conhecendo de habeas corpus em caso de prisão cautelar o TJGO tem decidido
que a ausência dos elementos concretos (motivos de fato) constituem
CONSTRAGIMENTO ILEGAL.
Com fundamento em que todas as modalidades de prisão pertencem ao gênero
"restrição de liberdade" e estão regidas pelas mesmas normas superiores que, incidindo
no gênero não podem ser excluídas para nenhuma espécie ao gênero pertencente, e
considerando que em sede de habeas corpus o TJGO tem sido rigoroso na verificação
dos motivos de fato (elementos concretos) que devem acompanhar os motivos de direito
(hipóteses legais de prisão cautelar), está sendo requerido que todas as hipóteses de
decisão restritiva de liberdade sejam tratadas de igual modo: exigência de motivos de
fato (elementos concretos) que se adequem aos motivos de direito.
No tocante à culpabilidade do art. 59 do CP, os motivos de fato são os elementos
concretos da realidade do indivíduo: capacidade psíquica maior ou menor para
295
enfrentamento da situação; circunstâncias pessoais e de cenário capazes de influir na
decisão; e capacidade de domínio do fato e suas circunstâncias.
Conduzir-se de forma censurável (motivos de fato ou elementos concretos) no
pertinente a dar causa à restrição definitiva de liberdade é de mesma natureza que
conduzir-se de forma censurável (motivos de fato ou elementos concretos) no pertinente
a dar causa à restrição cautelar da liberdade.
É requerido o enfrentamento da incoerência, para que o TJGO adote uma de duas
posições possíveis, em exame de gênero:
1.enfrentando decisões restritivas de liberdade aceitar como
fundamentação apenas os motivos de direito, ou hipóteses legais, lançados em
razão de prevenção genérica e previsões ou expressões vagas não referentes à
realidade do indivíduo e sua conduta;
2.enfrentando decisões restritivas de liberdade aceitar como
fundamentação apenas os motivos de direito, ou hipóteses legais, que tenham
como suporte motivos de fato lançados em razão de elementos concretos
referentes à realidade do indivíduo e sua conduta.
As duas hipóteses conduzem à coerência, mas apenas a segunda atende ao que
pode ser tomado como vontade de cumprir a Constituição.
No caso do Habeas Corpus a concessão da ordem é apoiada no constrangimento
ilegal causado pela ausência, deficiência ou insuficiência de motivos de fato como
suporte dos motivos de direito, levando à conclusão:
A ausência, deficiência ou insuficiência de motivos de fato que deem suporte aos
motivos de direito na decisão que restringe a liberdade constitui constrangimento ilegal a
296
ser corrigido com a declaração de ineficácia executória, implicando em livrar o
indivíduo da restrição.
É de relevância examinar que a restrição provisória de liberdade ocorre em sede
de conhecimento da hipótese de restrição definitiva, diferindo, portanto, em relação ao
fim: a provisória visa alcançar a pena através do processo de conhecimento; a definitiva
visa alcançar a execução da pena.
Como espécies em comparação a restrição definitiva resulta de maior
gravosidade que a provisória. em função dos seus efeitos e limites temporais.
Deve ser cuidado, então, que sobre a espécie de maior gravosidade (restrição
definitiva) recaiam as mesmas exigências e garantias de fundamentação que na espécie
de menor gravosidade (restrição provisória).
É possível que existam atitudes psicológicas diferentes em relação a uma e outra
espécies em razão da hipótese de incidência da força maior (restrição definitiva) em
sequência à incidência de força menor (restrição provisória), o que leva à inclinação para
anular as decisões provisórias mas manter as definitivas em face de igualdade de
fundamentação.
A anulação de uma decisão de restrição definitiva, condenatória, enfrenta duas
questões delicadas: o desvalor do esforço de finalização e frustração da expectativa
social da punição.
A conciliação entre a garantia do devido processo legal, na espécie
consubstanciado como fundamentação suficiente, e a “sensação de impunidade” é
tormentosa mas precisa ser enfrentada.
De pouca compreensão na plataforma social que o criminoso confesso condenado
297
com base em provas “cabais” deva livrar-se da execução da pena porque o juiz não
escreveu o que estava obrigado a escrever, mas as funções jurisdicionais existem para
garantir que os juízes escrevam tudo a que estão obrigados.
Desta forma é pretendido que o indivíduo e a sociedade recebam o máximo de
proteção e efetivação de seus direitos e expectativas, considerando que o prejuízo para o
devido processo legal atinge igualmente o indivíduo e a sociedade, causando o pior dos
danos, que é a insegurança jurídica.
A rigor, a anulação por ausência, deficiência ou insuficiência de fundamentação
quanto aos motivos de fato ocorre por dois motivos:
1.os motivos de fato não existem ou são insuficientes, implicando que a decisão
não tem causa (aspecto material).
2.Os motivos de fato existem mas não foram declarados, implicando que a
decisão tem causa mas não tem declaração (aspecto formal).
O devido processo legal resulta adimplido por inteiro apenas quando as formas
prescritas abrigam os efeitos materiais.
Ao entrar no artigo 59 para dosar a pena base a sentença já resolveu as questões
gerais de não-pena, de tal sorte que neste passo a hipótese de não-pena é única: ausência
de culpabilidade.
De regra – pela abundância dos casos - a culpabilidade é positiva, ou ensejante de
pena, ou apresenta motivos de fato que preenchem os motivos de direito de forma a
fazer incidir censura sobre a conduta e graduar proporcionalmente a pena, a justificar,
então, que tais motivos de fato sejam buscados, encontrados e declarados.
É válido, num dispositivo não fundamentado, considerar “a priori” que a pena
298
base fixada está no padrão da razoabilidade com apoio na presunção de ter existido um
juízo que apenas não foi declarado, logo, não se parte do pressuposto de que a pena base
seja arbitrária, mas tão somente de que a ausência (deficiência ou insuficiência) de
fundamentação impede a conferência do juízo e afeta gravemente a extensão da
recorribilidade, resultando em que restaurar a conferência do juízo e a extensão da
recorribilidade corrige a decisão.
A solução estaria sendo encaminhada no sentido de completar a sentença
incompleta pois a incompletude fere o devido processo legal, enfim, solução
restauradora do devido processo legal cujo adimplemento, como obrigação que
transforma em dívida na ação penal, é cometido ao Estado-jurisdicional por imposição
constitucional, independente de requerimento de interessado.
Sentença penal condenatória incompleta é uma figura de eficácia restringida, e a
hipótese em estudo é a de incerteza executória por ausência de causa (ato jurídico
perfeito subjacente) para o título executivo, mesmo tido esse como líquido (quantidade
de pena e regime de cumprimento) e exigível (não atingido por causa extintiva da
punibilidade).
Na seara penal a restauração da eficácia executória do dispositivo condenatório
não fundamentado torna-se um dever do Estado-jurisdicional a ser cumprido antes da
ocorrência do trânsito em julgado para todas as partes.
O trânsito em julgado para acusação e defesa torna-se, pela linha de raciocínio, a
única hipótese de “trancamento” da execução, logo, enquanto não ocorrente tal trânsito
poderá o Estado-jurisdicional adimplir sua prestação faltante do devido processo legal,
vez que efetivador do mesmo. Desta sorte, sem refluir de sua posição em relação a que
em recurso exclusivo da defesa o trânsito em julgado para a acusação impediria a
299
correção do dispositivo, o autor apenas endossa a tese em favor da defesa para que esta a
argua.
Ao assegurar ao condenado em dispositivo não fundamentado a restauração em
favor da conferência do juízo e da extensão da recorribilidade é necessário garantir a
sociedade em relação à não impunidade mantendo indene as demais partes da sentença
não atacadas, ou seja, a restauração em exame se dará apenas no âmbito do artigo 59.
Agregue-se por imperativo que a restauração não pode resultar na “reformatio in
pejus” mas não impede a “reformatio in mellius” se os motivos de fato (elementos
concretos) encontrados a justificarem.
Restaurar o devido processo legal é um ato de garantia interna do Estadojurisdicional.
A prisão antes da sentença é de caráter processual e provisório e após a sentença
não transitada em julgado é de caráter condenatório e provisório, sendo a provisoriedade
o atributo que permite a devolução à origem para restauração do devido processo legal
vez que a causa legal da provisoriedade não desaparece.
Prejuízo para o condenado não haverá, visto que regimes e tempos impostos na
condenação podem ser executados provisoriamente.
O único complicador aparente é que a restauração não ocorra antes do término da
pena, o que configuraria a execução de pena sem causa legal, mas não se pode permitir
que para evitar tal ocorrência o Estado-jurisdicional consagre sua inadimplência do
devido processo legal.
Afasta-se a hipótese de o Tribunal proceder a restauração, em respeito à instância
primeira do juízo natural.
300
O trancamento da execução penal não é pedido neste passo à consideração de um
anômalo mas plausível "efeito devolutivo", mas terá seu cabimento examinado com o
trânsito em julgado do acórdão.
Este Gabinete requer a declaração da nulidade do dispositivo condenatório à vista
da ausência motivos de fato, ou elementos concretos, individualizados para a
determinante culpabilidade, e que sejam os autos remetidos à instância original como
providência de ofício, para que dispositivo seja completado e, restaurada a conferência e
extensão da recorribilidade, e intimadas as partes, subam para apreciação do recurso
renovado ou ratificado.
É o parecer.
23.3
23.3.1
JURISPRUDÊNCIA
DESAFORAMENTO CRIMINAL Nº 624-1/215 (200805073609)
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS
RELATOR DES. ALUÍZIO ATAÍDES DE SOUSA
EMENTA: DESAFORAMENTO. DÚVIDA SOBRE A IMPARCIALIDADE DO JÚRI.
INOCORRÊNCIA. Se do substrato fático em que assentada a pretensão de
desaforamento, não se tem como extrair elementos concretos que ponham em
dúvida a isenção dos jurados, é de rigor o indeferimento do pedido. PEDIDO
INDEFERIDO
DESAFORAMENTO CRIMINAL Nº 627-6/215 (200900474844)
Relator : Des. JAMIL PEREIRA DE MACEDO
301
EMENTA:
DESAFORAMENTO
CRIMINAL.
DÚVIDA
QUANTO
À
IMPARCIALIDADE DOS JURADOS. RISCO A SEGURANÇA PESSOAL DOS
ACUSADOS E DE SEUS ADVOGADOS. NÃO-DEMONSTRAÇÃO.
INDEFERIMENTO. O desaforamento, por ser medida excepcional, só pode ser
deferido se demonstrada por elementos concretos. Meras suposições abstratas e
infundadas de falta de segurança no local destinado a sessão de julgamento não são
insuficientes para modificar a competência do julgamento. E, o fato da família da
vítima ser conhecida na cidade, por si só, não respalda o pedido de desaforamento,
em especial quando não está instruído por qualquer documento hábil a comprovar as
alegações aventadas. PEDIDO INDEFERIDO.
23.3.2 HABEAS CORPUS nº. 34263-8/217 (200900542777)
Relator em substituição: Juiz CARLOS ALBERTO FRANÇA
EMENTA: Habeas Corpus. Prisão em flagrante. Liberdade provisória. Garantia da
ordem pública. Constitui constrangimento ilegal a manutenção da segregação
cautelar, cuja decisão, que indefere o pedido de liberdade provisória, se funda apenas
na necessidade da prisão em face da natureza do delito, para garantia da ordem
pública, sem indicação de elementos concretos a justificar a medida. Ordem
concedida.
23.3.3 HABEAS CORPUS Nº 34288-1/217(200900599973)
RELATOR DR. MÁRCIO DE CASTRO MOLINARI
EMENTA: HABEAS CORPUS. PRISÃO PREVENTIVA. AUSÊNCIA DE
FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA. ILEGALIDADE DO CONSTRANGIMENTO. A
manutenção da custódia cautelar do paciente mediante simples alusão a dispositivo
legal - artigo 312 do CPP, sem demonstração inequívoca de fatos concretos e
302
objetivos que a justifique, caracteriza constrangimento ilegal a ser reparado via do
writ. ORDEM CONCEDIDA.
23.3.4 HABEAS CORPUS Nº 34.746-2/217 (200901347560)
Relator : JAMIL PEREIRA DE MACEDO
EMENTA: HABEAS CORPUS. DECISÃO QUE INDEFERE PEDIDO DE
LIBERDADE PROVISÓRIA. USO DE EXPRESSÕES GENÉRICAS. DECISÃO NÃO
FUNDAMENTADA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL
CONFIGURADO. O despacho que indefere o pedido de liberdade provisória, tal
como o que decreta a prisão preventiva, deve ser adequadamente fundamentado, com
indicação objetiva de atos ou fatos concretos susceptíveis de causar prejuízo à
ordem pública, à instrução criminal ou à aplicação da lei penal. Indeferimento de
pedido de liberdade provisória arrimado nas circunstâncias tratadas no artigo 312,
do CPP exige fundamentação explícita, não suprida pelo manejo de expressões
genéricas. A Constituição Federal prescreve, nos termos do artigo 93, inciso IX, que
“todos os julgamentos dos órgãos do poder judiciário serão públicos, e
fundamentadas todas as .....
23.3.5 HABEAS CORPUS Nº 34866-0/217 (200901496477)
RELATORA Dra. CAMILA NINA ERBETTA NASCIMENTO E MOURA
EMENTA: HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO DUPLAMENTE QUALIFICADO.
PRISÃO PREVENTIVA. PEDIDO DE REVOGAÇÃO. INDEFERIMENTO.
FUNDAMENTAÇÃO NOS REQUISITOS DO ART. 312, DO CPP. FUGA APÓS O
FATO. RESIDÊNCIA FORA DO DISTRITO DA CULPA. ORDEM DENEGADA. A
custódia cautelar, por ser medida excepcional a restringir a liberdade individual,
exige fundamentação calcada em elementos concretos, que indiquem a necessidade
303
da cautela, conforme previstos no art. 312 do Código de Processo Penal. Não há
falar em arbitrariedade ou excesso na segregação, se mantida por se encontrar
presente o requisito da prisão preventiva, qual seja, assegurar a aplicação da lei
penal, sobretudo se demonstrado que o paciente possui residência fora do distrito da
culpa, e encontrava-se foragido há mais de quinze anos. ORDEM DENEGADA.
STJ - HABEAS CORPUS: HC 45175 DF 2005/0104201-3
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Relator(a): Ministra LAURITA VAZ
Julgamento: 05/12/2005
Órgão Julgador: T5 - QUINTA TURMA
Publicação: DJ 13.02.2006 p. 836
http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/56838/habeas-corpus-hc-45175-df-20050104201-3-stj
Ementa HABEAS CORPUS. ROUBOS CIRCUNSTANCIADOS TENTADOS E
CONSUMADOS EM CONTINUIDADE DELITIVA. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS.
CULPABILIDADE "EXTREMA". AUSÊNCIA DE MOTIVAÇÃO IDÔNEA. MAUS
ANTECEDENTES. PROCESSOS EM ANDAMENTO. IMPROPRIEDADE.
VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA NÃO-CULPABILIDADE. REGIME PRISIONAL
MAIS GRAVOSO. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO.
1. A culpabilidade foi considerada "extrema" sem a devida e necessária motivação
concreta, sendo certo que a inexistência de "motivo relevante à prática do crime"
não se presta a tanto. 2. Inquéritos ou ações penais em andamento não se prestam
para configurar maus antecedentes no momento da fixação da pena-base, bem como
para a fixação do regime prisional, em respeito ao princípio da não-culpabilidade.
Precedentes do STJ e do STF. 3. Ordem concedida para, corrigidas as
304
impropriedades, reformar a individualização da pena, nos termos do voto
Acordão Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Quinta
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráficas a seguir, por unanimidade, conceder a ordem, nos termos do voto da
Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Arnaldo Esteves Lima, Felix Fischer e
Gilson Dipp votaram com a Sra. Ministra Relatora.
23.3.6
STJ - HABEAS CORPUS: HC 44710 SP 2005/0094443-9
Relator(a): Ministro HÉLIO QUAGLIA BARBOSA
Julgamento: 14/12/2005
Órgão Julgador: T6 - SEXTA TURMA
Publicação: DJ 13.02.2006 p. 852
http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/56262/habeas-corpus-hc-44710-sp-20050094443-9-stj
Ementa HABEAS CORPUS. PROCESSO PENAL. TRÁFICO ILÍCITO DE
ENTORPECENTES. REVOGAÇÃO. PRISÃO PREVENTIVA. AUSÊNCIA DOS
REQUISITOS DO ART. 312 DO CPP. NECESSIDADE DA CUSTÓDIA NÃO
DEMONSTRADA. ORDEM CONCEDIDA. 1. A manutenção preventiva no cárcere,
por ser medida excepcional que restringe a liberdade individual, em face da
presunção de não-culpabilidade, exige a devida fundamentação calcada em
elementos concretos que indiquem a necessidade da custódia cautelar. 2. A fuga do
paciente não seria motivo para a prisão celular, se a verificação concreta de evasão
do acusado não constituiu motivação do decreto prisional no instante em que foi
exarado. 3. Ordem concedida para que o paciente seja colocado em liberdade, se por
outro motivo não estiver preso, ou salvo, nova imposição de medida restritiva
cautelar devidamente fundamentada.
305
Acordão Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima
indicadas, acordam os Ministros da SEXTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça,
na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade,
conceder a ordem de habeas corpus, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Votaram com o Relator os Srs. Ministros PAULO GALLOTTI e PAULO MEDINA.
Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro HAMILTON CARVALHIDO. Ausente,
ocasionalmente, o Sr. Ministro NILSON NAVES. Presidiu o julgamento o Sr. Ministro
PAULO GALLOTTI.
23.3.7
STJ - HABEAS CORPUS: HC 90008 MS 2007/0209500-5
Relator(a): Ministra LAURITA VAZ
Julgamento: 07/05/2008
Órgão Julgador: T5 - QUINTA TURMA
Publicação: DJ 02.06.2008 p. 1
http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/619156/habeas-corpus-hc-90008-ms-20070209500-5-stj
Ementa HABEAS CORPUS. PENAL. HOMICÍDIO CULPOSO. PENA-BASE
FIXADA ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. PRESENÇA DE CIRCUNSTÂNCIAS
JUDICIAIS DESFAVORÁVEIS. CONDUTA SOCIAL E CONSEQÜÊNCIAS DO
CRIME. POSSIBILIDADE. CULPABILIDADE DO AGENTE. SIMPLES MENÇÃO
AO GRAU ELEVADO DA CULPA. FUNDAMENTAÇÃO DEFICIENTE.
CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. 1. Muito embora o
descumprimento das condições do sursis processual não se refira exatamente à
personalidade do agente, encaixa-se no conceito de conduta social, ensejando, do
mesmo modo, a exasperação da pena, em igual patamar. 2. Mostra-se desarrazoada a
elevação da pena em razão da culpabilidade do agente, na medida em que não houve
306
indicação de razões válidas e suficientes para justificar a consideração da aludida
circunstância como desfavorável ao réu, limitando-se o julgador a afirmar que o
grau de culpa é alto, o que não se admite. 3. Conquanto a graduação do dolo ou
culpa constitua fator idôneo a ser sopesado no exame da culpabilidade do agente, o
juiz não se desimcumbe da tarefa de indicar elementos concretamente aferíveis a
dar suporte à essa consideração. 4. Ordem parcialmente concedida para, mantida a
condenação, anular a sentença condenatória, tão-somente, na parte relativa à
dosimetria da pena, a fim de que outra seja elaborada, em primeira instância, sem o
aumento relativo à culpabilidade do agente.
Acordão Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da QUINTA
TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráficas a seguir, por unanimidade, conceder parcialmente a ordem, nos termos
do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Arnaldo Esteves Lima, Napoleão
Nunes Maia Filho, Jorge Mussi e Felix Fischer votaram com a Sra. Ministra
Relatora.
23.3.8
STF - RECURSO EXTRAORDINÁRIO: RE 427339 GO
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
Parte: HENRIQUE BARBACENA NETO
Parte: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS
Relator(a): SEPÚLVEDA PERTENCE
Julgamento: 04/04/2005
Órgão Julgador: Primeira Turma
Publicação: DJ 27-05-2005 PP-00021 EMENT VOL-02193-03 PP-00578
http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/765433/recurso-extraordinario-re-427339-gostf
307
Ementa I. Contraditório e ampla defesa: art. 5º, LV, da Constituição: conteúdo
mínimo. A garantia constitucional da ampla defesa (CF, art. 5º, LV)tem, por força
direta da Constituição, um conteúdo mínimo essencial, que independe da
interpretação da lei ordinária que a discipline 255.397, 1ª T., Pertence, DJ
07.05.2004). II. Recurso extraordinário: improcedência das alegações de violação à
garantia da ampla defesa: desprovimento. 1. Alegação de que a defesa não teve
tempo hábil para estudar os autos corretamente afastada pelo acórdão, em face das
peculiaridades do caso. 2. Substituição de testemunhas da acusação: pedido
justificado: decisão recorrida suficientemente motivada: ausência de violação do art.
93, IX, da Constituição. 3. Júri: inquirição de testemunhas: não se computa como
testemunha a ser inquirida no plenário, a leitura de depoimento prestado
anteriormente. 4. Júri: falta de intimação de uma das testemunhas arroladas pela
defesa, residente fora da Comarca, para depor em Plenário: nulidade que, acaso
existente, para ela concorreu a defesa. III. Individualização da pena:
constrangimento ilegal: habeas corpus de ofício. 1. Ausência de constrangimento
ilegal na consideração do fato de o recorrente estar respondendo a outros processos,
o que, segundo a jurisprudência da Corte, configura maus antecedentes,
circunstância não considerada em nenhum outro momento da fixação da pena. 2.
Manifesto constrangimento, contudo, decorrente da ilegalidade da majoração
da pena-base pela culpabilidade considerada "incisiva", sob o fundamento de
que o recorrente era "plenamente imputável, cônscio da reprovabilidade de
sua conduta, sendo que outra lhe era exigida", pressupostos do elemento
subjetivo do crime. 3.Concessão de habeas corpus de ofício, para que o Tribunal a
quo proceda a nova fixação da pena, reduzindo-a, como entender de direito.
Decisão Por unanimidade de votos, a Turma negou provimento ao recurso
308
extraordinário. Concedeu, porém, de ofício, a ordem de habeas corpus, por maioria,
nos termos do voto do Relator; vencido, em parte, o Ministro Marco Aurélio, que a
concedia em maior extensão. 1a. Turma, 05.04.2005.
24
EPÍLOGO
O autor tem a vantagem de haver começado a estudar a culpabilidade ainda durante
a elaboração do anteprojeto da reforma e concluir seus estudos nas mesmas fontes
em que se louvou um dos anteprojetistas (Francisco de Assis Serrano Neves) falecido
antes da vigência da reforma.
A desvantagem foi o tempo de maturação, pois até atingir o ponto de certeza
passaram tantos anos quantos, na média, já tinham de estudos os anteprojetistas.
A inspiração para dedicar-se à culpabilidade vem tanto da homenagem ao tio
Advogado quanto da homenagem ao então Ministro Ibraim Abi-Ackel a quem se
atribui ter dito, em plena ditadura militar quando confrontado sobre o espírito da
reforma: "Antes de ser ministro sou Advogado".
Para aqueles que atribuem estar o autor fazendo um direito penal garantista,
protecionista, favorecedor, protetor dos criminosos etc, tenham a certeza de que é isso
mesmo.
309
24.1
Momento I da culpabilidade
Ilustração 13: Momento I da culpabilidade
310
24.2
Momento II da culpabilidade
Ilustração 14: Momento II da culpabilidade
311
24.3
Momento III da culpabilidade
Ilustração 15: Momento III da culpabilidade
312
25 CALCULADORA DE PENA
A calculadora (CALCPEN) é oferecida junto em este e-Liber-Liber e está
parametrizada conforme o entendimento corrente de não fixar pena base menor que a
mínima, conquanto o autor não concorde com essa posição.
A calculadora (CALCPEN) adota que a culpabilidade é determinante da pena e
que as demais circunstâncias do art. 59 do Código Penal apenas flexionam a pena de
censura para mais ou para menos mas não descaracterizam o grau de censura.
A calculadora (CALCPEN) limita a imposição das circunstâncias genéricas a 1/6
da pena base para que o aumento ou diminuição não adquira a mesma forma da menor
causa de aumento ou de diminuição que é também de 1/6.
313
25.1
Tela Inicial - Calculadora em formulário - roda no BrOffice.Calc
Ilustração 16: Tela Inicial - Calculadora em formulário - roda no BrOffice.Calc
314
25.2
Instruções - Calculadora em formulário - roda no BrOffice.Calc
Ilustração 17: Instruções - Calculadora em formulário - roda no BrOffice.Calc
315
25.3
Cálculo da Pena Base - Calculadora em formulário - roda no BrOffice.Calc
Ilustração 18: Cálculo da Pena Base - Calculadora em formulário - roda no
BrOffice.Calc
316
25.4 Ajuda do Cálculo da Pena Base - Calculadora em formulário - roda no
BrOffice.Calc
Ilustração 19: Ajuda do Cálculo da Pena Base - Calculadora em formulário - roda no
BrOffice.Calc
317
25.5 Ajuda do cálculo da Pena Base - Calculadora em formulário - roda no
BrOffice.Calc
Ilustração 20: Ajuda do cálculo da Pena Base - Calculadora em formulário - roda no
BrOffice.Calc
318
25.6 Cálculo das Agrantes e Atenuantes - Calculadora em formulário - roda no
BrOffice.Calc
Ilustração 21: Cálculo das Agrantes e Atenuantes - Calculadora em formulário - roda
no BrOffice.Calc
319
25.7 Cálculo dos Aumentos e Diminuições - Calculadora em formulário - roda
no BrOffice.Calc
Ilustração 22: Cálculo dos Aumentos e Diminuições - Calculadora em formulário roda no BrOffice.Calc
320
25.8 Ajuda do cálculo dos Aumentos e Diminuições - Calculadora - roda no
BrOffice.Calc
Ilustração 23: Ajuda do cálculo dos Aumentos e Diminuições - Calculadora em
formulário - roda no BrOffice.Calc
321
25.9
Tela Única (com ajudas) - Calculadora em planilha - roda no BrOffice.Calc
Ilustração 24: Tela Única (com ajudas) - Calculadora em planilha - roda no
BrOffice.Calc
322
25.10 Tela Única (com ajudas) - Calculadora em planilha - roda em Excel
(97/2003 e 2007/2010)
Ilustração 25: Tela Única (com ajudas) - Calculadora em planilha - roda em Excel
(97/2003 e 2007/2010)
323
26
CONTEÚDO DO CD
CONTEÚDO DO CD
E-book completo sobre a culpalidade
Calculadora de Pena Privativa de Liberdade para BrOffice
tipo formulário
Calculadora de Pena Privativa de Liberdade para BrOffice
Calculadora de Pena Privativa de Liberdade para Excel
97/2003 tipo planilha
Calculadora de Pena Privativa de Liberdade para Excel
2007/2010
Arquivos de AJUDA em
324
COPYLEFT SÃO LIVRES:
1) a reprodução exclusivamente para fins não comerciais, desde que o autor e a fonte sejam citados e seja incluída a nota COPYLEFT;
2) a modificação, acréscimo ou supressão desde que o
texto orignal sejam mantido como recefência.
COPYRIGHT O autor autorizará, na forma da lei, a reprodução comercial mas notifica os interessados
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325

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