PROMOÇÃO DE SAÚDE NUM SERVIÇO DE INTERNAMENTO DE

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PROMOÇÃO DE SAÚDE NUM SERVIÇO DE INTERNAMENTO DE
REVISTA DE FORMAÇÃO CONTÍNUA EM ENFERMAGEM
www.nursingportuguesa.com
Nº284/285 • outubro/novembro 2012 • Ano 24 • € 6,00
PROMOÇÃO
DE SAÚDE NUM
SERVIÇO DE
INTERNAMENTO
DE PEDIATRIA
HIPOTERMIA INDUZIDA
NO ADULTO NEUROCRÍTICO
QUEDAS EM GERIATRIA:
DOENÇA DE ALZHEIMER
SUPLEMENTO
Revista indexada
à base de dados
CANETAS DE INSULINA
– UMA ESCOLHA REFLETIDA
2
OUTUBRO/NOVEMBRO.12
I NORMAS DE PUBLICAÇÃO
REVISTA DE FORMAÇÃO CONTÍNUA EM ENFERMAGEM
INSTRUÇÕES AOS AUTORES
b) Ilustrações, abreviaturas, símbolos e notas de
deverão deixar claro a aprovação da Comissão de Ética
rodapé: as tabelas, quadros e figuras (fotografias, de-
bem como o processo de obtenção do Termo de Consen-
A Revista Nursing Portuguesa recebe submissões de
senhos, gráficos, etc) devem ser numeradas consecu-
timento Informado, dos participantes.
artigos, de acordo com as seguintes secções:
tivamente, com algarismos árabes, na ordem em que
e)Tipos de Artigos aceites pela Revista
- Investigação/Revisões Sistemáticas da Literatura
foram citadas no texto. Para ilustrações extraídas de
- Investigação/Revisões Sistemáticas da Literatura: tra-
- Revisão,
outros trabalhos, previamente publicados, os autores
balho de investigação, inédito, e que contribua para o de-
- Reflexão/ Relato de Experiência,
devem enviar a respectiva autorização. O título e resu-
senvolvimento da disciplina Enfermagem, com um limite
- Espaço do leitor.
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de 15 páginas. Este tipo de artigos deve conter, pelo me-
A Revista Nursing adopta as orientações das Normas de
tas de rodapé.
nos, Introdução; Objectivos; Revisão da Literatura; Méto-
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c) Citação de Referências Bibliográficas: As referências
do; Resultados; Discussão e Conclusões.
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- Artigo de Revisão: Revisão teórica de literatura
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a ordem em que forem mencionadas pela primeira vez no
actual e relevante para o conhecimento em Enferma-
com a seguinte formatação: todas as margens de 2 cm;
corpo de texto. Identificar as referências no texto por nú-
gem. Limite de 10 páginas.
fonte Arial ou Times, tamanho 11, com espaçamento en-
meros árabes, entre parêntesis e superiores à linha.
- Reflexão/Relato de experiência: aceitam-se estudos
trelinhas de 1,5 pt.
Quando se trate de citação sequencial os números devem
de caso e experiências de estratégias de cuidado inova-
a) Página Inicial: Deverá conter os seguintes dados e na
separar-se por traço (ex: 1-3) e quando intercalados, por
doras, ou eticamente dilemáticas, que possam conduzir
seguinte ordem: 1) título do artigo (conciso mas informa-
vírgula (ex: 1,3,9).
à reflexão sobre a profissão. Limite de 8 páginas.
tivo e em português e inglês); 2) nome do(s) autor(es), in-
• Exemplos de Listagem das Referências
- Espaço do leitor: este possibilita comentários de
dicando para cada um deles o(s) título(s) universitário(s),
Livros
leitores/recensão crítica, sucinta, sobre os artigos publica-
ou cargo(s) ocupado(s), nome do Departamento e Insti-
Martin R. La psicología de humor: un enfoque integrador.
dos na revista, bem como outro tipo de notas que o leitor
tuição aos quais o trabalho deve ser atribuído, Cidade, Dis-
Madrid: Orión Ediciones, S. L.; 2008.
deseje fazer chegar ao Editor ou Conselho Científico.
trito e endereço electrónico; 3) resumo, abstract (português
Capítulo de livro
f) Descrição dos procedimentos
e inglês); 4) descritores nestes dois idiomas.
Simons C, McCluskey-Fawcett K, Papini D. Theoretical and
Recebido o artigo este é analisado face ao cumpri-
Resumos e Descritores: o resumo terá que ter, no má-
functional perspectives on the development of humor du-
mento das normas estabelecidas nas Instruções aos
ximo, 120 palavras e quando de investigação deve con-
ring infancy childhood, and adolescence In: Mahemow K,
Autores, sendo liminarmente rejeitado se estas não
ter: objectivo da investigação, metodologia, procedimen-
McCluskey-Fawcett K, McGhee P. (Eds). Humor and aging.
forem cumpridas. Quando aceite, o artigo passa por
tos de selecção dos participantes do estudo, principais
Orlando: Academic Press; 1986. p. 53-80.
um processo de avaliação de dois revisores, que emi-
resultados e conclusões. Deverão ser destacados os
Artigos de periódicos
tem pareceres independentes. Quando existir dis-
novos e mais relevantes aspectos do estudo. Seguida-
Sudres J. La créativité des adolescents: de banalités en
cordância dos pareceres, um Membro do Conselho
mente ao resumo incluir 3 a 5 descritores. De acordo
aménagements. Neuropsychiatr Enfance Adolesc. 2003;
Científico, que não esteja envolvido em conflito de
com a Associação Portuguesa de Documentação e In-
51, 49–61.
interesses, emitirá o parecer definitivo. Se existirem
formação em Saúde os artigos publicados na área da
A exactidão das referências é de responsabilidade dos
alterações a efectuar, ao artigo, estas serão envia-
saúde, deverão adoptar como base de indexação, a lis-
autores.
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ta de Descritores em Ciências da Saúde - DeCS
Solicita-se que estes consultem as normas de Vancouver
co-autoria deve ser bem explícita a contribuição de
(http://decs.bvs.br), a qual corresponde à tradução bra-
para a correcta referenciação de todos os tipos de docu-
cada autor.
sileira do Medical Subject Headings (MeSH) disponí-
mentos utilizados. Sempre que possível e adequado, o au-
g) Agradecimentos – Podem surgir de acordo com
vel em http://www.nlm.nih.gov/mesh/MBrowser.html e
tor deve incluir duas ou mais referências, de publicações
o desejo dos autores e centram-se no agradecimento
elaborado pela NLM (National Library of Medicine). De-
da Nursing Portuguesa, no artigo.
a pessoas/entidades que contribuíram, efectivamente,
verão, no entanto, salvaguardar as diferenças de termi-
d) Aspectos Éticos
para o trabalho em causa, desde que estas tenham
nologia usada em Portugal e no Brasil.
Nas pesquisas que envolvem seres humanos os autores
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estão disponíveis.
3
ÍNDICE I
OUTUBRO .12
05
OUTUBRO/
NOVEMBRO 2012
17
EDIÇÃO Nº284/285
23
22 Agenda
10 Emergência
04 Editorial
Hipotermia induzida no adulto neurocrítico:
05 Tema de Capa
23 Suplemento
Onde estamos? Para onde vamos?
Promoção de Saúde num serviço
de internamento de Pediatria
Diabetes
17 Geriatria
Quedas em Geriatria: Doença de Alzheimer
REVISTA DE FORMAÇÃO CONTÍNUA EM ENFERMAGEM
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DIREÇÃO EDITORIAL
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Amélia Matos, Hospital de Santa Maria
Artur Batuca, INEM
Carlos Melo-Dias, Escola Superior de Enfermagem de Coimbra
Cristina Miguéns, Centro de Saúde da Figueira da Foz
Elaine Pina, Coordenadora da Comissão Nacional
de Controlo de Infeção
Emília Costa, Escola Superior de Saúde
da Universidade do Algarve
Filipa Veludo, ICS – Universidade Católica Portuguesa
Filomena Matos, Escola Superior de Saúde
da Universidade do Algarve
Helena Arco, Escola Superior de Saúde de Portalegre
Ilda Lourenço, CHCL – Hospital de São José
José Vilelas, Escola Superior de Saúde da Cruz
Vermelha Portuguesa
PARCERIAS
Luísa Brito, Escola Superior de Enfermagem de Coimbra
Manuela Néné, Escola Superior de Saúde
da Cruz Vermelha Portuguesa
Maria Adelaide Soares Paiva, Escola Superior
de Saúde da Universidade do Algarve
Maria da Conceição Silva Farinha, Escola Superior
de Saúde da Universidade do Algarve
Maria Filomena de Oliveira Martins, Escola Superior
de Saúde de Portalegre
Mário de Oliveira Martins,
Escola Superior de Saúde de Portalegre
Nuno Salgado, IPO de Coimbra
Paula Sapela, Escola Superior de Saúde Lopes Dias
Paulo Alves, UCP Porto
Pedro Lopes Ferreira, Faculdade de Economia
da Universidade de Coimbra
Pedro Parreira, Escola Superior de Enfermagem de Coimbra
Raul Cordeiro, Escola Superior de Saúde de Portalegre
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4
OUTUBRO/NOVEMBRO.12
I EDITORIAL
PROMOÇÃO DA SAÚDE… MUDANÇA DE PARADIGMA!
FRANCISCO VIDINHA
A Promoção da saúde tem sido uma das
antes como consequência de novas
de si e das suas experiências de saúde-
áreas de intervenção com maior evolução
necessidades sentidas pelos utentes dos
doença), para lembrar alguns dos muitos
e desenvolvimento nas últimas décadas.
serviços… necessidades essas, frequen-
pensadores que têm contribuído para
A sua filosofia, assente no Diagnóstico-
temente originadas, incentivadas, promo-
que a enfermagem de hoje seja o que é!
Intervenção-Avaliação, mais não faz do
vidas por todos aqueles que considera-
Nesta linha de pensamento, seja em ter-
que sistematizar em conhecimento cientí-
vam que as organizações de saúde não
mos da integração e interligação concei-
fico a prática milenar dos enfermeiros:
eram “fábricas”, nem os seus utentes
tual, seja a evolução dos métodos e téc-
observar o utente, executar os cuidados,
“peças” de uma qualquer engrenagem.
nicas de distribuição do trabalho em
avaliar os resultados.
A Enfermagem, os enfermeiros, ao longo
enfermagem que têm promovido, mais
Mesmo nos tempos idos, em que a meto-
dos tempos, pela sua capacidade de aná-
que a mudança, mas sim a evolução do
dologia de distribuição de trabalho
lise, perseverança em conseguir o
paradigma sociocultural, que me sinto
assentava na “tarefa”, muito por influên-
“melhor” para os seus doentes, mantive-
assolado por um sentimento angustiante
cia do paradigma industrial dominante,
ram uma mente aberta ao conhecimento
de assistir à partida de jovens enfermei-
os enfermeiros tinham sempre um
que se produzia, independentemente da
ros, com todo o seu potencial e idealiza-
momento para “escutar”, “perceber” o
área, e integravam-no nas suas práticas.
ção da profissão, motivados para contri-
sofrimento e as angústias dos doentes
Esta afirmação é corroborada pelo contri-
buir para a “energização” do sistema de
de forma a executar a tarefa centrando-a
buto de Nightingale (introdução de con-
prestação de cuidados… Acho que
na individualidade dos doentes.
ceitos de higiene, estatística, gestão),
NÓS, enfermeiros e utentes portugueses,
Penso ser óbvio que as mudanças de
Peplau (relações interpessoais), Neuman
não merecemos a entropia crescente do
paradigma não surgem por magia… mas
(teoria dos sistemas), Watson (perceção
sistema.
Errata — Na edição nº283 da revista NURSING (setembro 2012), na página 11, as imagens das figuras encontram-se trocadas.
Pedimos desculpa aos autores do artigo e aos leitores pelo lapso sucedido e publicamos nesta edição as imagens com as respetivas legendas de forma a reparar o erro sucedido.
Figura 6 – (Caso 3) RX Tórax, dia 19/01/2011
Figura 7 – (Caso 3) Rx Tórax dia 21/01/2011
às 19:24h. Após cinesiterapia respiratória
às 00:09h. Após cinesiterapia respiratória
OUTUBRO/NOVEMBRO.12
TEMA DE CAPA I
5
PROMOÇÃO DE SAÚDE NUM SERVIÇO
DE INTERNAMENTO DE PEDIATRIA
Health Promotion in Pediatric Internment Service
FERNANDA LOUREIRO
ANTÓNIA GUERREIRO
Licenciada em Enfermagem, Mestre em Ciências da Educação na especialidade
de Educação para a Saúde, Mestre em Enfermagem na Área de Especialidade
Licenciada em Enfermagem, Pós Licenciatura de Especialização em
Enfermagem de Saúde Infantil e Pediatria, Enfermeira no Serviço de Pediatria
de Saúde Infantil e Pediatria, Doutoranda em Enfermagem, Enfermeira no Serviço do Hospital de São Bernardo, Centro Hospitalar de Setúbal, E.P.E., Setúbal
de Urgência Pediátrica do Hospital de São Bernardo, Centro Hospitalar de Setúbal,
FILIPA ANDRADE
E.P.E. Setúbal
Curso de Enfermagem Geral, Curso de Especialização em Enfermagem de
Saúde Infantil e Pediátrica, Mestrado em Saúde Comunitária, Doutoranda em
Ciências de Enfermagem, Assistente do 2 Triénio no Instituto de Ciências da
Saúde, Universidade Católica Portuguesa, Lisboa
Recebido para publicação: julho de 2011
Aprovado para publicação: setembro de 2011
RESUMO
Referenciada pela Organização Mundial de Saúde e Ordem dos
Enfermeiros como área prioritária de investimento, a promoção de saúde
tem particular relevo na saúde infantil. Com o objetivo de identificar as
estratégias usadas pelos enfermeiros no âmbito da promoção de saúde da
criança/família num serviço de internamento de pediatria, efetuou-se estudo de tipo exploratório-descritivo com aplicação de questionário e tratamento estatístico descritivo. Dos resultados destaca-se a importância do tema,
o momento de intervenção e a pouca utilização de suporte informacional. A
implementação de estratégias face aos resultados centrou-se na melhoria
da qualidade dos cuidados. Como principal conclusão salientamos a
necessidade de investigações neste âmbito para aprofundar conhecimentos e conhecer o impacto do trabalho desenvolvido pelos enfermeiros.
Palavras-chave: Enfermagem pediátrica; Promoção da saúde.
ABSTRACT
Referenced by the World Health Organization and Ordem dos Enfermeiros
as a priority area for investment, health promotion as particularly importance in child` health. With the aim of identifying health promoting strategies
used by nurses to promote child/ family health promotion in a pediatric hospital unit, an exploratory-descriptive study was developed thru the application of questionnaires and descriptive statistical treatment. From the results
it stands out, the importance of this issue, the time for implementation and
the low use of informational support. The implementation of interventions
according to the results focused on improving the quality of care. We emphasize, as main conclusion, the need for further research in this area to get
a better understanding of the work done by nurses and consequent adaptation of practices.
Keywords: Pediatric nursing; Health promotion.
INTRODUÇÃO
A promoção de saúde adquiriu gradualmente relevância por parte dos
profissionais de saúde. Resulta da sua identificação enquanto foco de
atenção dos profissionais de saúde, destacada nas conferências internacionais de Otawa (1986), Adelaide (1988), Sunsdalle (1991), Bogotá
(1992) e Jacarta (1997) mas também, no plano nacional, enquanto área
prioritária de investimento(1).
Pretende-se a utilização de recursos e conhecimentos dos indivíduos
no sentido da adoção de estilos de vida saudáveis onde a vigilância de
saúde é um aspeto básico. No que concerne à enfermagem pediátrica,
assume particular importância pois trata-se de intervir de forma antecipatória no crescimento e desenvolvimento da criança e jovem conforme
preconizado no programa tipo de saúde infantil e juvenil(2). Por outro
lado, todas as oportunidades de contacto com a criança e família, onde
o espaço hospitalar se inclui, devem ser maximizadas com vista à promoção de saúde(3).
Os enfermeiros assumem, neste contexto, um papel essencial inerente ao
seu exercício profissional. A alínea b) do artigo 9 do Decreto-Lei n.
247/09 de 22 de Setembro(4) , refere que é função do enfermeiro realizar
intervenções de enfermagem requeridas pelo indivíduo, família e comunidade, no âmbito da promoção de saúde, da prevenção da doença, do tratamento, da reabilitação e da adaptação funcional. Em continuidade, a
Ordem dos Enfermeiros(5) enfatiza que os cuidados de enfermagem tomam
por foco de atenção a promoção dos projetos de saúde que cada pessoa
vive e persegue. Importa ainda integrar a evidência científica encontrada
nas ciências da educação e nas ciências da saúde para adotar as melhores estratégias promotoras de saúde. De facto, a promoção de saúde é
uma área que implica uma intervenção multidisciplinar com uma panóplia
de programas e iniciativas inerentes a cada área disciplinar. Contudo,
sabemos que os programas com maior probabilidade de sucesso são os
que se baseiam numa clara compreensão dos comportamentos de saúde
Revista Nursing; Edição outubro/novembro 2012; pág.5
6
I TEMA DE CAPA
OUTUBRO/NOVEMBRO.12
sideramos a educação para a saúde como um recurso à intervenção.
No âmbito da enfermagem, o Modelo de Promoção de Saúde proposto por
Nola Pender em 1982 define um modelo de atuação baseado em três componentes principais que se subdividem em variáveis passíveis de serem trabalhadas pelos enfermeiros com vista a uma prática fundamentada que
fomente a adoção de comportamentos promotores de saúde(14).
Foto: Beerkoff I Dreamstime
A primeira componente diz respeito às características e experiências individuais. Estas são únicas para cada pessoa e afetam de forma particular as
ações subsequentes(14).
A segunda componente do modelo é considerada a que apresenta maior
significância motivacional. Contempla seis variáveis (percebe benefícios
para a ação, percebe barreiras para a ação, percebe auto eficácia, senti-
A promoção de saúde adquiriu gradualmente relevância por parte dos profissionais
de saúde. Resulta da sua identificação enquanto foco de atenção dos profissionais
de saúde, destacada nas conferências internacionais de Otawa (1986), Adelaide
(1988), Sunsdalle (1991), Bogotá (1992) e Jacarta (1997) mas também, no plano
nacional, enquanto área prioritária de investimento.
alvo e contexto ambiental. Neste sentido, a teoria ajuda a compreender
a natureza dos comportamentos, explica a sua dinâmica, os procedimentos para modificar e efeitos das influências externas a que estão sujeitos(6).
Os profissionais de saúde no contexto hospitalar têm um papel importante, pois podem influenciar o comportamento de utentes e familiares que
respondem melhor às intervenções na área da saúde em situações de
doença aguda(7). No entanto, a caracterização das práticas de promoção
de saúde junto da equipa de enfermagem ao nível hospitalar, encontra-se
pouco estudada(8-11). A identificação objetiva do trabalho desenvolvido
neste âmbito permite um maior conhecimento da realidade e consequente
adequação das práticas.
QUADRO TEÓRICO
Definida de uma forma ampla como “process of enabling people to increase control over, and to improve their health”(12, p.1) a promoção de saúde é
muitas vezes associada a educação para a saúde. Esta, segundo Tones e
Tilford(13, p.11) trata-se de “toda a atividade intencional conducente a aprendizagens relacionadas com saúde e doença”. Queiroz e Barroso(3), referem
que a hospitalização de uma criança oferece oportunidade para desenvolver medidas de promoção da saúde, ação indispensável em todas as fases
de crescimento e desenvolvimento infantil. Neste sentido, o conceito de
promoção de saúde é mais amplo pelo que, no âmbito deste percurso, con-
Revista Nursing; Edição outubro/novembro 2012; pág.6
mentos em relação ao comportamento, influências interpessoais e sentimentos que influenciam) que constituem o “core” da intervenção dado
que são modificáveis através de intervenções de enfermagem(14-15).
Destacamos a variável “influências interpessoais” que se refere ao comportamento que pode ou não ser influenciado por outras pessoas, família,
cônjuge, profissionais de saúde, ou por normas e modelos sociais(16). As
fontes primárias de influências são as famílias, os pares e os prestadores
de cuidados de saúde sendo ainda reconhecida a importância da cultura
a este nível(14-15). O modelo de promoção da saúde propõe que as influências interpessoais afetam a adoção de comportamentos promotores de
saúde, de uma forma direta mas também indireta, pela pressão social e
do compromisso para um plano de ação(14).
A terceira componente compreende três variáveis: exigências imediatas
(que inclui forças impositivas e forças potencializadoras), comportamento
de promoção de saúde e compromisso com um plano de ação(15).
O modelo sumariamente apresentado serviu de referência ao trabalho
desenvolvido e norteou as opções tomadas com vista à promoção de
saúde da criança/família.
MATERIAL E MÉTODOS
O estudo realizado teve como pergunta de partida: Quais são as estratégias utilizadas pelos enfermeiros num serviço de internamento de pediatria
no âmbito da promoção de saúde da criança/família?
Estratégia define-se como uma combinação complexa para conseguir um fim(17).
Neste sentido, o estudo teve como finalidade identificar as combinações (por
exemplo métodos pedagógicos e recursos materiais) usadas pelos enfermeiros
para conseguir um fim (neste caso a promoção da saúde da criança/família).
Assim, definiu-se como objetivo: identificar as estratégias utilizadas pelos enfermeiros no âmbito da promoção de saúde da criança/família no serviço de internamento de pediatria. O nível de conhecimento determina a seleção do tipo de
investigação sendo que quando existem poucos conhecimentos acerca de uma
determinada temática o investigador deve orientar o seu estudo mais para a
descrição do que para a relação entre fatores(18). Neste sentido, o tipo de estudo que se apresenta é exploratório-descritivo pois pretende-se conhecer um
tema pouco encontrado na literatura(11,19). Enquanto instrumento de colheita de
dados foi utilizado o questionário que, segundo Fortin(18, p.249) é um “método
de colheita que necessita das repostas escritas por parte dos sujeitos”. A
mesma autora refere ainda que antes de iniciar a construção deste instrumento
se deve consultar na literatura a existência de questionários semelhantes. Neste
caso foram adaptadas questões de instrumentos já aplicados anteriormente e
com objetivos semelhantes devidamente autorizados pelos respetivos autores(11,19).
OUTUBRO/NOVEMBRO.12
TEMA DE CAPA I
7
A população é constituída pelos 17 elementos que integram a equipa de enfermagem do serviço de internamento de pediatria onde o estudo decorreu.
Inicialmente a amostra coincidia com a população (n = N) uma vez que todos
os enfermeiros tinham probabilidade de entrar no estudo. Contudo depois da
aplicação do questionário, durante o mês de Outubro de 2010, verificou-se que
houve retorno de um número menor de questionários. Assim, a amostra de tipo
probabilístico ficou com uma dimensão de 13 indivíduos (n=13 a que corresponde uma taxa de retorno de 76,5%). Os dados foram sujeitos a tratamento
estatístico descritivo com recurso ao programa Microsoft Office – Excel® e, na
questão aberta, a análise de conteúdo. Segundo Bardin(20, p.42) trata-se de “um
conjunto de técnicas de análise das comunicações”. O mesmo autor refere
ainda que ainda que a análise de conteúdo se processa em torno de três eta-
to de intervenções na área da promoção de saúde usando para tal os momentos chave da estadia de uma criança/jovem ao longo do internamento. Por fim,
é colocada uma questão de resposta dicotómica relativamente ao conhecimento de um modelo de enfermagem na área da promoção de saúde, uma vez
que, como já foi referido, a teoria suporta a prática.
pas: a pré-análise, a exploração do material e o tratamento dos resultados, a
inferência e a interpretação. Foi solicitada autorização à chefia do serviço para
aplicação dos questionários e foi garantida a confidencialidade dos dados obtidos clarificando o objetivo e enquadramento do estudo.
O questionário supramencionado foi composto por três grupos distintos. O primeiro grupo de questões reporta-se à caracterização sócio-demográfica e,
neste conjunto, consideraram-se dados de caracterização geral: idade, género, habilitações académicas e tempo de experiência profissional e especificamente na área de pediatria. O segundo grupo refere-se ao conceito de promoção de saúde pois este vai influenciar as práticas na área(19) pelo que se
considerou pertinente questionar os enfermeiros acerca da sua definição
numa questão aberta.
Por fim, o terceiro grupo refere-se às estratégias de promoção de saúde
onde se consideraram vários itens. O primeiro reporta-se à importância atribuída à promoção de saúde através de uma questão fechada dicotómica. Em relação a este item a pesquisa demonstra que apesar de os enfermeiros atribuírem muita importância a esta área, na prática quotidiana, a primeira prioridade
é sempre dada a atividades do foro curativo(19,21) só efetuando atividades de promoção de saúde “quando não há mais nada para fazer”(19). A questão seguinte
versa o fornecimento de suporte informacional que é referenciado na literatura
como importante e útil(22). Neste sentido questionou-se os enfermeiros, em pergunta semi-fechada de resposta dicotómica: “tem por hábito fornecer suporte
informacional (panfletos) às crianças e pais?” Sim (nestes casos solicita-se
que identifiquem quais os suportes)/ Não (questiona-se porquê?). A pergunta
seguinte refere-se ao método pedagógico empregue e utilizou-se a nomenclatura proposta por Ferrão e Rodrigues(23). Estes usam a seguinte classificação:
método expositivo (processo pedagógico não participativo utilizado na transmissão de informação de natureza teórica), método demonstrativo (privilegia a
aprendizagem prática e permite dotar rapidamente os formandos de um saber
– fazer com grande eficácia que se traduz numa automatização posterior de
procedimentos), método interrogativo (caracteriza-se por conduzir os formandos a descobrir progressivamente os diversos elementos de um assunto recorrendo a perguntas, o que implica a garantia prévia de que os formandos possuem algum conhecimento acerca do assunto a abordar) e método ativo (integra os três níveis do saber: saber-saber, saber-fazer e saber-ser/estar e compreende em si todos os métodos anteriores). Consideraram-se, ainda, os
temas abordados utilizando para tal o estudo de Coffman(24) sobre necessidades de formação dos pais que recorrem a serviços de emergências pediátricas numa questão de escolha múltipla. Apesar de ser num contexto diferente,
as temáticas são amplas e adaptadas ao local onde o instrumento foi aplicado.
Questionou-se ainda em relação ao momento mais propício de desenvolvimen-
que 93,2% (n=12) dos inquiridos tem licenciatura em enfermagem. Em relação
à experiência profissional verifica-se uma média de 10,5 anos com valor máximo
e mínimo de 20 e 1,4 anos, respetivamente. No que concerne à experiência profissional em pediatria pode-se verificar resultados semelhantes com média de
9,2 anos e valor máximo e mínimo de 20 anos e 4 meses, respetivamente.
No que se refere ao conceito de promoção de saúde verificou-se que a definição de promoção de saúde continha em si duas categorias distintas. Por um
lado, os enfermeiros referiram como se operacionaliza com 14 unidades de enumeração (U.E.) no total e, por outro lado, o objetivo da mesma com 15 U.E. conforme se pode verificar no quadro 1. (em baixo)
Denotámos que a subcategoria mais significativa com 5 U.E. é o “ensino”. Podese então referir que para o grupo de enfermeiros em análise, a promoção de
saúde pode ser operacionalizada pelo processo de desenvolvimento de competências e ensino atendendo ao potencial de saúde. Tendo por objetivo, uma trajetória de vida equilibrada e saudável com prevenção da doença e maximização
da saúde na ótica da melhoria da qualidade de cuidados com ganhos em saúde.
Os resultados obtidos no que se refere às intervenções de enfermagem encontram-se sumarizados no quadro 2. (na pag. seguinte)
Conforme se pode verificar no quadro 2, relativamente à importância atribuída
às intervenções no âmbito da promoção de saúde, os enfermeiros são unânimes em considerar estas como importantes (100%; n=13).
O suporte informacional (panfletos) não é fornecido pela maioria dos enfermeiros (54,5%; n=7). Estes apontam como causas a não existência de folhetos
RESULTADOS
No que diz respeito aos dados relativos à caracterização sócio-demográfica,
verificou-se uma média de idade de 34 anos com valor mínimo de 24 e máximo
de 45 anos com predomínio do género feminino. Dos 13 questionários verificouse que 15,4% são do género masculino (n=2) sendo os restantes do género
feminino (84,6%; n=11). No que diz respeito às habilitações literárias verifica-se
Revista Nursing; Edição outubro/novembro 2012; pág.7
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I TEMA DE CAPA
OUTUBRO/NOVEMBRO.12
os clientes a alcançarem o máximo potencial de saúde”. A mesma entidade
refere ainda que ao enfermeiro especialista em saúde da criança e do
jovem cabe, enquanto competência específica, assistir a criança/jovem
com a família na maximização da sua saúde(24). Para um desenvolvimento
pleno desta competência, todos os momentos de contacto com a
criança/jovem/família devem ser entendidos como oportunidades de intervenção. Conhecer os “moldes” em que estas intervenções ocorrem permite adequá-las aos contextos dando visibilidade aos cuidados de enfermagem(19). Neste sentido, cabe aos enfermeiros adotarem estratégias, em
todos os contextos, de forma alcançar a “excelência no exercício”.
Assim, atendendo aos resultados obtidos foi possível identificar estratégias
de otimização da promoção de saúde no serviço de pediatria.
disponíveis no serviço/quantidade insuficiente (23%; n=3), o esquecimento
(15,4%; n=2), não sentir a necessidade de usar (7,7%; n=1) e não se encontram acessíveis (7,7%; n=1).
Quando são utilizados suportes informacionais estes reportam-se aos temas: alimentação (23%; n=3), acolhimento ao serviço (23%; n=3), doenças (15,4%; n=2), segurança (15,4%; n=2), vigilância de saúde (7,7%; n=1) e doença crónica (7,7; n=1).
Em termos de método pedagógico foi referida com maior frequência o método
ativo (76,9%; n=10). Os métodos: expositivo (23%; n=1) e demonstrativo
(7,7%; n=1), foram também identificados.
Quanto aos temas abordados no ensino individual, todos os enfermeiros inquiridos identificaram as doenças e os tópicos gerais de saúde (por exemplo, alimentação) (100%; n=13). Foram ainda referidos a puericultura e a prevenção
de acidentes ambos com uma frequência de 10 (76,9%), os primeiros socorros
(15,4%; n=2), o desenvolvimento infantil (15,4%; n=2) e a reanimação (7,7%;
n=1). Um dos enfermeiros identificou ainda outro tema – a alta (7,7%), sem discriminar os conteúdos abordados.
No que concerne ao momento mais oportuno para a realização de atividades
nesta área foi identificado por todos os enfermeiros como “ao longo de todo o
internamento” (100%; n=13).
A maioria dos inquiridos não conhece nenhum modelo de enfermagem na área da
promoção de saúde (69,2%; n=9) e, entre os que referem conhecer 30,8% (n=4),
todos identificaram o Modelo de Promoção de Saúde de Nola Pender.
DISCUSSÃO
A Ordem dos Enfermeiros(5, p.11) reporta-se à promoção de saúde ao mencionar nos Padrões da Qualidade dos Cuidados de Enfermagem que “na procura permanente da excelência no exercício profissional, o enfermeiro ajuda
Revista Nursing; Edição outubro/novembro 2012; pág.8
Da análise dos questionários, e de uma forma geral, podemos perceber que o
conceito de promoção de saúde dos enfermeiros do serviço de pediatria é
atual. A referência a aspetos como “vida saudável”, “equilíbrio”, “maximização
da saúde”, “qualidade dos cuidados” aponta para um conceito aberto e multidimensional de saúde. Este aspeto é de certa forma concordante com a importância atribuída pelos enfermeiros às intervenções na área da promoção de
saúde: todos os inquiridos referem que estas são importantes. Em continuidade, verificámos que o suporte informativo é pouco utilizado, pelo facto dos panfletos e/ou brochuras estarem pouco acessíveis à sua posterior distribuição.
Neste sentido, foi elaborado um procedimento acerca do fornecimento de
suporte informacional que integra diversos panfletos. Atendendo a que se verifica que a faixa etária e situação clínica mais frequente no serviço são latentes
com patologias do foro respiratório, foram elaborados os seguintes suportes:
“Utilização e Manutenção da Câmara Expansora”, “Preparação de Biberões”,
“Extração e Conservação de leite materno”, “Prevenção de Sintomas
Respiratórios”. Outros panfletos (nomeadamente: “criança com vómitos”,
“criança com diarreia”, “criança com febre”) foram disponibilizados por outros
serviços da visada instituição, de entre os quais urgência pediátrica e unidade
de cuidados especiais neonatais, rentabilizando assim recursos existentes.
Como forma de dar resposta a outra das razões apontadas para a não utilização dos mesmos (o facto de não estarem acessíveis), foi solicitado às
educadoras do serviço a colaboração na construção de um suporte para
panfletos. Os folhetos foram colocados neste suporte e estão visíveis/acessíveis para utilização pela equipe. Por outro lado, esta é uma atividade que
por si só necessita de suporte e validação pois como referem Bowden e
Greenberg(26) o processo de ensino assemelha-se ao processo de enfermagem. Começa com a avaliação do problema segue-se a planificação, a
implementação e a avaliação da sua eficácia. Neste sentido foram ainda elaborados planos de sessão individual associados a cada um dos folhetos
elaborados. A título de exemplo, no que se refere à administração de terapêutica por câmara expansora o plano de sessão contempla as etapas do
fornecimento do suporte informativo e avaliação que consiste na observação do procedimento com recurso a grelha de observação.
O ensino individual e o suporte informacional são recursos importantes na assistência de enfermagem à criança/jovem/família(11,22) e influenciam o comportamento
de saúde. O modelo de Promoção de Saúde de Nola Pender refere, na variável
influências interpessoais (parte integrante do componente “comportamento especifico”) que os profissionais de saúde surgem como fontes primárias de influência
na adoção de comportamentos promotores de saúde(14). Os enfermeiros devem,
então, atuar junto da criança/família promovendo ensinos de forma que se traduza numa influência positiva na adesão de comportamentos saudáveis.
OUTUBRO/NOVEMBRO.12
CONCLUSÃO
Considerando o objetivo inicialmente estabelecido, verificamos que
o grupo de enfermeiros inquiridos usa como estratégias, desenvolvidas ao longo de todo o internamento da criança e família, a metodologia ativa versando temáticas relacionadas com o motivo de internamento e tópicos gerais de saúde. Estas estratégias são mediadas
por um conceito multidimensional de promoção de saúde e elevada
importância atribuída a esta área. Desconhecem, no entanto, um
modelo conceptual que suporte estas intervenções e verificou-se a
inexistência de suportes informativos identificados como úteis e
importantes no ensino ao utente pediátrico e família. No entanto, a
recetividade da equipe ao tema foi facilitadora da implementação de
intervenções.
Identificamos como limitações o tamanho da amostra assim como a
escassez de estudos similares no contexto nacional o que foi de certa
forma limitador da discussão de resultados. Podemos referir que o desenvolvimento de trabalhos, como o que se apresenta, deve ser incentivado
junto dos profissionais de saúde. Neste sentido, o estudo contribui para
o conhecimento nesta área pois oferece uma caracterização das práticas
assim como propostas de melhoria.
Destacamos ainda a necessidade de enquadramento numa moldura teórica que direcione as intervenções de enfermagem de forma fundamentada. No caso concreto, a integração do Modelo de Promoção de Saúde
de Nola Pender que identifica a influência dos profissionais de saúde na
aquisição de comportamentos promotores de saúde sustentou todo o
percurso. A construção de suportes formativos e planos de ensino individual assim como a divulgação do modelo referido foram estratégias
implementadas na sequência deste trabalho.
Deixamos como sugestão a realização de futuros trabalhos com amostras maiores e mais focadas em áreas específicas como por exemplo
intervenções direcionadas para a promoção de saúde na criança com
diabetes ou asma, que permitam encontrar novos caminhos e perspetivas diferentes neste campo. Sugerimos ainda a respetiva avaliação do
impacto destas intervenções traduzidas, por exemplo em indicadores
dos cuidados de enfermagem.
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I EMERGÊNCIA
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HIPOTERMIA INDUZIDA NO ADULTO NEUROCRÍTICO:
ONDE ESTAMOS? PARA ONDE VAMOS?
Induced hypothermia in neurocritical adult: where are we?
Where are we going?
JOSÉ FERNANDO DA SILVA MONTEIRO DE MAGALHÃES
Trabalho realizado no âmbito da Primeira Edição da Pós-graduação em Emergência e Trauma, sob orientação da Doutora Isabel Araújo – Escola Superior
de Saúde do Vale do Ave, CESPU.
Recebido para publicação: janeiro de 2011
Aprovado para publicação: janeiro de 2011
RESUMO
A Hipotermia Induzida consiste na descida da temperatura central do
Homem, apresentando efeitos neuroprotetores comprovados. Esta
influencia positivamente a taxa de prognóstico em determinados doentes neurocríticos, contudo a sua aplicação não é uma prática comum,
pelo que se sentiu a necessidade de realizar a presente revisão bibliográfica. O estudo tem como objetivo identificar o conhecimento empírico produzido sobre indução da hipotermia no doente neurocrítico.
Usaram-se os seguintes descritores internacionais: “Hipotermia induzida”, “Doente crítico”, “Proteção celular” e “Lesão cerebral traumática” e
obtiveram-se 42 artigos. Destes selecionaram-se 11, com base nos critérios: estudos em adultos; contexto de hipotermia induzida; publicação
entre 2005 e 2010; completos e de acesso livre; escritos em Português,
Inglês, Francês ou Espanhol; exclusão de artigos de opinião e de revisão
bibliográfica. Verifica-se que a Hipotermia Induzida é segura, estando
associada a um melhor prognóstico no doente neurocrítico e que a eficiência e a replicação da sua utilização aumentam com a existência de
protocolos. Este domínio do Saber enquadra-se no conhecimento científico a um nível observacional, tornando-se pertinente desenvolver
novos estudos no sentido de obter evidências que permitam melhorar a
prestação de cuidados de enfermagem ao doente neurocrítico, bem
como sensibilizar os enfermeiros para as certezas já existentes.
Palavras-chave: Hipotermia Induzida; Doente Crítico; Proteção celular;
Lesão cerebral traumática.
ABSTRACT
Induced hypothermia is a technique that involves the lowering of central
temperature of man, having proven neuroprotective effects. Although its
implementation positively influences the rate of neurocritical patients prognosis, is not a common practice. The purpose of this study was to identify
empirical knowledge produced on induction of hypothermia in neurocritical
patient. For this was made a review of scientific articles. Was used the des-
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criptors International Health Sciences: “induced hypothermia”, “critical ill”,
“protection cell” and “traumatic brain injury” and have obtained 42 articles.
From this was selected 11, being those studies in adults; in the context of
induced hypothermia; published between 2005 and 2009; full and free;
written in Portuguese, English, French or Spanish; excluding articles of opinion and literature reviews. It appears that Induced hypothermia is safe and
is associated to a better prognosis in neurocritical ill and the replication
and efficiency of their use increases with the existence of institutional protocols. This area of knowledge fits into the scientific knowledge to an
observational level, making it relevant to develop new studies to obtain evidence that will improve the delivery of nursing care to neurocritical ill and
draw the nurses attention to the certainties existing.
Keywords: Induced Hypothermia; Critical Patient; Cell protection;
Traumatic brain injury.
INTRODUÇÃO
A investigação é a base científica que orienta a prática e assegura a credibilidade da Ciência em Enfermagem. A enfermagem, como disciplina
em construção, necessita de produção e de renovação contínua do seu
próprio corpo de conhecimentos, sendo assim relevante desenvolver
estudos que facilitem a implementação de cuidados de enfermagem
gerais e especializados mais adequados, bem como a identificação das
necessidades da população. Tais estudos devem possibilitar a determinação de indicadores de resultados que permitam dar visibilidade do
contributo destes cuidados para alcançar o bem-estar do Homem
(Ordem dos Enfermeiros, 2006).
O Homem é um ser homeotérmico, pois possui meios para a regulação
da temperatura corporal no sentido de alcançar a normotermia (36,10 C
e 37,20 C). Os mecanismos de termorregulação atuam por feedback
negativo, controlados através do equilíbrio entre o calor produzido pelo
metabolismo e o calor ganho ou perdido para o ambiente externo. A
maior parte da produção de calor resulta das reações químicas que
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EMERGÊNCIA I
11
contacto físico direto com líquido, sólido ou gás. Já a convecção é a permuta de calor do ar ou líquidos orgânicos já aquecidos. Por último, a evaporação consiste na perda de calor que acompanha a vaporização de
líquido pela superfície da pele. O balanço entre os mecanismos de produção e perda de calor permite a estabilidade da temperatura corporal
(homeotermia), garantindo assim um fator fundamental na manutenção
do equilíbrio orgânico, designado por homeostasia (Seeley et al., 2007).
Da homeostasia depende a integridade funcional dos mecanismos bioquímicos e fisiológicos, como por exemplo o metabolismo celular e a frequência respiratória, tornando assim evidente a importância da regulação da temperatura corporal na manutenção da vida humana. O sistema
nervoso é o responsável por esta regulação e envolve os recetores térmicos, o centro de integração e processamento de informação e os sistemas eferentes. O sistema nervoso divide-se em sistema nervoso central (SNC) e sistema nervoso periférico (SNP). O SNC (cérebro e medula espinal) é o centro de integração e processamento da informação e
daqui saem as fibras que enervam as diversas estruturas do corpo, constituindo o SNP (Guyton et al., 2002).
Foto: Kingvald I Dreamstime
ocorrem em todas as células do organismo, tendo origem na decomposição das moléculas dos alimentos ingeridos. O conjunto destas reações constitui o metabolismo corporal, sendo a sua taxa diretamente
proporcional com a quantidade de calor produzido. Após a produção de
calor no organismo, o mesmo é transferido dos órgãos e células mais
profundos para a pele, onde é dissipado por fenómenos de radiação,
condução, convecção e evaporação. A radiação refere-se à emissão de
calor pela forma de ondas eletromagnéticas, que ocorre quando o organismo humano apresenta temperatura corporal superior à do meio
ambiente, havendo maior transferência de calor do corpo do que para o
corpo. A condução é uma forma de transferência de calor através do
A Hipotermia Induzida consiste na descida da temperatura central do Homem,
apresentando efeitos neuroprotetores comprovados. Esta influencia positivamente
a taxa de prognóstico em determinados doentes neurocríticos, contudo a sua
aplicação não é uma prática comum, pelo que se sentiu a necessidade de realizar a
presente revisão bibliográfica.
O balanço entre os mecanismos
de produção e perda de calor permite
a estabilidade da temperatura corporal
(homeotermia), garantindo assim um fator
fundamental na manutenção do equilíbrio
orgânico, designado por homeostasia
O SNP subdivide-se em divisão aferente ou sensorial, que transmite
sinais elétricos dos recetores sensoriais ao SNC, e divisão eferente ou
motora, responsável pela transmissão de sinais elétricos do SNC aos
órgãos efetores. A divisão eferente é composta pelo sistema somático
e sistema autónomo (vegetativo). O sistema somático é controlado
voluntariamente e orienta a condução de sinais elétricos aos músculos
esqueléticos, originando uma resposta comportamental através da contração dos mesmos. O sistema autónomo, de controlo subconsciente,
dirige a condução de sinais elétricos ao músculo liso, músculo cardíaco e glândulas, produzindo respostas involuntárias, como por exemplo
vasodilatação e vasoconstrição. Para o desencadear destes sistemas
de condução da informação é necessário haver estruturas que detetem
quando a temperatura está demasiado alta ou baixa. Essas estruturas
designam-se termorrecetores (McPhee et al., 2007).
Existem termorrecetores anatomicamente distintos para o frio e para o
calor. Ambos reagem com a maior intensidade às alterações da temperatura e podem-se encontrar em estruturas centrais, periféricas e nos
órgãos profundos. A nível central encontram-se núcleos sensíveis à
variação da temperatura na área pré-ótica e no hipotálamo anterior. A
nível periférico, estão presentes imediatamente abaixo da pele e distribuem-se em diferentes porções consoante a área do corpo. Aqui, também como adjuvante, existe ainda um terceiro tipo, os recetores da dor
e que são estimulados em variações de temperatura extrema (00 C a 150
C ou acima de 470 C). Nos órgãos profundos, nomeadamente medula
espinal, vísceras e à volta de grandes vasos toracoabdominais, encontramos também termorrecetores para frio e calor. Estes diferem dos
periféricos, porque apresentam uma sensibilidade mais acentuada para
diminuições da temperatura, explicada pela sua maior exposição à temperatura corporal central em detrimento da superficial. Interligando a
função dos recetores de calor e frio com a função do sistema aferente,
entende-se como a informação sensorial é conduzida até ao centro integrador (Guyton, et al., 2002).
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I EMERGÊNCIA
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O centro integrador, localizado no hipotálamo posterior, após a combinação das informações transmitidas pelas vias aferentes com o ponto
de regulação térmica (37 C) emite, através das vias eferentes, respostas no sentido de controlar as reações do corpo para o ganho ou perda
de calor. Estas respostas podem ser efetuadas através de três vias eferentes, sendo elas, a do sistema nervoso autónomo, a do sistema nervoso somático e através da hipófise. Na resposta autónoma a regulação
é efetuada através do controlo do tónus vascular (radiação); do controlo da sudorese e frequência respiratória (evaporação); do controlo do
metabolismo (termogénese química) e piloereção (inibição de condução e convecção). Por sua vez, a resposta somática traduz-se em tre-
estudo dos efeitos da hipotermia induzida (Miñambres et al., 2008).
A hipotermia induzida consiste na descida da temperatura central do
Homem abaixo dos 35 visando um propósito terapêutico. A hipotermia pode ser induzida através de mecanismos tópicos ou sistémicos e
é classificada por diferentes autores como hipotermia leve (340 C a
320 C), hipotermia moderada (320 C a 280 C) e hipotermia profunda
(<280 C) (Miñambres, 2008; Anjos, 2008; Polderman, 2008). No que
diz respeito aos métodos tópicos, estes são relativamente fáceis de
utilizar, no entanto o tempo necessário para atingir a temperatura alvo
é mais longo. Para a indução de hipotermia através destes meios podese recorrer a imersão em água fria, banhos de álcool, colocação de
mores e modificação comportamental. É ainda através da mediação da
produção de tiroxina que o hipotálamo possui outro mecanismo de termogénese química, na medida em que a variação da produção desta
hormona influi proporcionalmente na taxa de metabolismo celular. O
conhecimento destas respostas de produção e perda de calor são fundamentais na utilização da hipotermia induzida como um tratamento do
doente neurocrítico (Guyton et al., 2002).
O doente neurocrítico é aquele que apresenta lesões neurológicas que
ameaçam a vida. Estas podem incluir acidente vascular cerebral maci-
sacos de gelo ou pensos de hidrogel, aplicação de capacetes, mantas
ou colchões que permitam, no seu interior, a deslocação de ar ou água
fria. Os mecanismos tópicos por si só desencadeiam uma resposta do
organismo à descida da temperatura, o que resulta um aumento de tremores e consequentemente um aumento metabólico contraproducente
para o objetivo final. Desta forma é recomendado a associação de
mecanismos tópicos a intervenções invasivas ou sistémicas. Como
métodos sistémicos podem ser utilizadas as infusões endovenosas de
fluidos frios, a circulação extracorporal, o bypass cardiopulmonar, o
arrefecimento endovascular, lavagem peritonial, gástrica, retal e nasal
com fluidos frios. Existem ainda outras técnicas em estudo como a
hipotermia intraventricular cerebral, no entanto a sua aplicação no ser
humano é ainda uma incógnita. A infusão de fluidos endovenosos
(soro fisiológico e lactato de Ringer a 4 C) é a forma mais comum e
económica de induzir hipotermia, tendo ainda a vantagem de poder ser
utilizada como auxiliar de qualquer outro método. Por sua vez, a circulação extracorporal é muito dispendiosa, tem algumas limitações logísticas e acarreta algum grau de complicações para o doente, contudo
é a forma mais rápida de promover a hipotermia (Varon et al., 2008).
A hipotermia induzida é estudada desde 1949, tendo tido ao longo da
sua história um percurso controverso, verificando-se uma prática de
uso e desuso cíclico. Atualmente, longe de ser uma fonte de estudo
saturada, o conhecimento científico evidencia efeitos neuroprotetores
promissores em situações específicas no tratamento do doente neurocrítico que carecem de investigação (Anjos et al., 2008). O processo
de investigação em Enfermagem “(…) mesmo prosseguindo num caminho ainda insólito e incómodo, irá desenvolver-se e será apenas desejado se não negligenciar uma interrogação permanente e concomitante sobre o sentido e o porquê do que investiga” (Collière, 2003:404).
No sentido de contribuirmos para a evolução da prática baseada na
evidência e para a identificação de saberes específicos em
Enfermagem, que é o nosso domínio de interesse, iniciou-se o processo de resolução de um problema de investigação.
O problema teve como ponto de partida uma situação que causava
inquietude, com génese na prática clínica e que rapidamente se levantou sob a forma de uma questão. No decorrer de uma aula acerca do
tratamento do doente neurocrítico surge um conceito que despoleta a
atenção de todo o grupo: hipotermia induzida. A perceção inicial identifica-a como uma prática pouco dominada e explorada em Portugal e
com um potencial de estudo promissor no âmbito da Enfermagem
A hipotermia induzida consiste
na descida da temperatura central do Homem
abaixo dos 35º C visando um propósito
terapêutico. A hipotermia pode ser induzida
através de mecanismos tópicos ou sistémicos
e é classificada por diferentes autores como
hipotermia leve (34º C a 32º C), hipotermia
moderada (32º C a 28º C) e hipotermia
profunda (<28º C)
ço, hemorragias cerebrais (sub-aracnoidea, intracerebral, subdural e
intraventricular), tumores cerebrais, traumatismo craneoencefálico,
estados convulsivos graves, doenças neuromusculares (Guillain Barré
e miastenia gravis) e doenças da medula espinal (UC Neurocience
Institute, 2010). Nestes doentes é habitual a manifestação de febre,
podendo ser o resultado de infeções ou então de mecanismos centrais
relacionados com a presença de sangue ou mediadores inflamatórios
que estão em contacto com o cérebro. Está comprovado que nos doentes neurocríticos a febre é uma variável de mau prognóstico, independentemente da sua causa (Polderman, 2008; Badjatia, 2009). Sabe-se
que a redução da temperatura corporal em 1 C leva a uma diminuição
do metabolismo cerebral em cerca de 6 a 7%. O contrário promove a
libertação de radicais livres tóxicos que conduzem à morte celular. Por
este motivo é fundamental nestes doentes manter no mínimo a normotermia, uma vez que além dos benefícios comprovados, também mostra
o conhecimento científico que não tem efeitos prejudiciais (Audibert et
al., 2009). A relação da temperatura com o aumento da taxa de bom
prognóstico nos doentes neurocríticos despoletou interesse clínico no
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de Emergência e Trauma. Deste modo, e para reduzir este estado de
desconforto, o grupo decide iniciar o processo de investigação acerca
da hipotermia induzida no doente neurocrítico. A partir daqui, houve a
revisão de literatura inicial que permitiu delimitar o tema e formular a
seguinte questão de investigação: “Estarão os Enfermeiros sensibilizados para a importância da hipotermia induzida no adulto neurocrítico?”
Esta questão compreende as variáveis e a população a estudar, servindo
de orientação ao longo do trabalho, que tem como objetivo: identificar o
nível de conhecimento empírico produzido sobre indução da hipotermia
no doente neurocrítico.
METODOLOGIA
Polit e Hungler (1995:13) referem-se ao método científico como “um conjunto genérico de procedimentos ordenados, com o objetivo de adquirir
informações seguras e organizadas”. É então através da metodologia que
se estuda, descreve e explica os métodos que se utilizaram ao longo do trabalho para responder ao problema que despoletou a necessidade da realização do trabalho. Fazendo um percurso no paradigma qualitativo realizouse um estudo de revisão da literatura. Fortin refere que “a revisão da literatura é um inventário e um exame crítico do conjunto das publicações, tendo
relação com o tema do estudo” (2009: 87).
Nesta revisão, a pesquisa foi elaborada através da seleção de artigos
publicados e indexados às seguintes bases de dados: LILIACS, MEDLINE, SciELO, ADOLEC e IBECS. Como forma de pesquisa utilizaram-se
descritores internacionais em Ciências da Saúde, nomeadamente:
“Hipotermia induzida”, “Doente crítico”, “Protecção celular” e “Lesão
cerebral traumática”. Na pesquisa obtiveram-se 42 artigos.
A seleção dos artigos selecionados [1]fez[2]-se segundo os seguintes critérios: relatórios de investigação que retratassem estudos em adultos neurocríticos; inseridos na temática da hipotermia terapêutica/induzida; publicados entre 2005 e 2010; artigos associados a uma base de dados indexada; trabalhos completos e de acesso livre; escritos em Português, Inglês,
Francês ou Espanhol; e que se apresentassem sob forma de trabalho de
investigação, excluindo-se artigos de opinião e de revisão bibliográfica.
Na tabela seguinte descrevem-se os critérios de inclusão e exclusão dos artigos
encontrados, onde se verifica o motivo da eliminação de 31 trabalhos. (Tabela1)
EMERGÊNCIA I
13
Dos 42 artigos obtidos na pesquisa, selecionaram-se 11. Após a seleção,
foi efetuada uma análise crítica dos mesmos e sintetizadas algumas evidências enumeradas no quadro seguinte. (Quadro 1, Pag. seguinte)
DISCUSSÃO DE RESULTADOS
Os onze artigos associados à prática da hipotermia induzida como
uma medida de proteção neurocelular e analisados neste trabalho,
foram elaborados em oito países diferentes, não havendo mais de dois
artigos com origem no mesmo país, e nenhum com fonte Portuguesa.
Confirma-se assim a perceção inicial de que este é um domínio científico pouco explorado em Portugal. No que diz respeito à incidência de
estudo desta temática nos últimos cinco anos, observa-se uma ocorrência flutuante, havendo 3 artigos publicados em 2006, um em 2007,
cinco em 2008 e dois em 2009.
Relativamente ao tipo de estudo, todos os artigos enquadram-se
em trabalhos observacionais, não existindo manipulação de intervenções diretas sobre os indivíduos em estudo. Nos artigos analisados os autores limitam-se à observação da amostra e às suas
características. Quanto ao objetivo destes estudos observacionais, registam-se quatro artigos descritivos, cujos objetivos se
prendem com a descrição de variáveis. Nestes estudos, os objetivos de uma forma geral, tiveram o intuito de caracterizar o uso da
Hipotermia Induzida na prática clínica e verificar a existência ou
não de protocolos nos serviços que lidam diariamente com o
doente crítico. Os outros sete artigos são estudos analíticos ou
correlacionais, com a finalidade de estabelecer relações de causalidade entre as variáveis dependentes e independentes em
estudo. Nestes, testou-se a relação de causalidade entre a prática da Hipotermia Induzida com a proteção neurocelular, bem
como a relação do uso e eficiência da técnica com a existência de
um protocolo de atuação.
Para a recolha dos dados observados foram utilizados diferentes
instrumentos, sendo eles, o questionário, a entrevista e o registo
de observações. Através destes, em sete trabalhos foram usados
dados primários, tendo sido feita uma colheita de dados específica
para os mesmos. Nos outros quatro artigos, os autores, utilizaram
dados secundários, desenvolvendo instrumentos que permitiram a
triagem de informação previamente colhida com outros propósitos,
como por exemplo, bases de dados ou ficheiros clínicos. Os participantes dos estudos analisados eram maioritariamente (82%)
doentes pós-pcr, submetidos a Hipotermia Induzida com intenção
de proteção neurocelular e internados em Unidades de Cuidados
Intensivos.
No que diz respeito às principais conclusões dos trabalhos analisados, é
unânime o comprovado benefício da utilização da Hipotermia Induzida
como medida de proteção neurocelular. No entanto, esta área de intervenção apresenta algumas limitações, nomeadamente:
• O facto de ser um domínio científico que carece de maior aprofundamento no que respeita ao momento de aplicação da técnica no
doente neurocrítico, em que situações se deve aplicar e que métodos utilizar;
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I EMERGÊNCIA
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OUTUBRO/NOVEMBRO.12
OUTUBRO/NOVEMBRO.12
• Apesar de ser uma técnica recomendada em guidelines internacionais,
a sua aplicação não é comum, sendo apresentados como motivos principais a falta de protocolos nos serviços e a falta de recursos.
Concluiu-se ainda que a Hipotermia Induzida é um método seguro e a
sua utilização está associada a melhores prognósticos de saída em
doentes pós-pcr. Destaca-se o facto de, nos últimos cinco anos, não
existir nenhum estudo com critérios de inclusão neste trabalho que estabeleça qualquer relação da utilização da Hipotermia Induzida com o
prognóstico de doentes internados em Unidades de Cuidados
Intensivos Neurocríticos. Neste sentido, sugere-se a continuidade deste
trabalho de modo a aprofundar os potenciais benefícios desta técnica e
a aumentar o nível de conhecimento neste domínio. Apesar disto, é
importante evidenciar que para o desenvolvimento deste estudo houve
um acesso limitado ao conhecimento por questões financeiras.
A hipotermia induzida é estudada
desde 1949, tendo tido ao longo
da sua história um percurso controverso,
verificando-se uma prática de uso
e desuso cíclico
CONCLUSÕES
Na realização deste relatório de investigação verifica-se o cumprimento
do objetivo inicial, uma vez que na discussão de resultados é identificado o nível de conhecimento produzido na área da Hipotermia Induzida,
de acordo com os critérios de inclusão do estudo. A hipotermia induzida, como técnica auxiliar de proteção neurocelular, é um fenómeno inerente ao conhecimento científico através de diferentes estudos observacionais. Estes aferem importância à técnica e justificam o desenvolvimento deste Saber.
A elaboração deste relatório permitiu abrir uma nova janela na área dos cuidados de enfermagem ao doente neurocrítico. Importa no futuro avaliar e
experimentar em que condições esta técnica se verifica com traduções clínicas importantes no contributo para o aumento da qualidade de vida do
Homem. Fica ainda a sugestão para o desenvolvimento de mais estudos
nesta área, que permitam o estabelecimento de protocolos de atuação
adequados aos diferentes serviços hospitalares e extra-hospitalares.
Reconhece-se dificuldades inerentes a questões temporais, acrescidas
dos deveres profissionais dos quais não se pode desligar. Contudo, com
este espaço de reflexão espera-se encontrar algumas respostas às nossas dúvidas, assim como obter dados que permitam futuramente reformular conteúdos e metodologias, no sentido de melhorar a prestação de
cuidados de enfermagem.
Tal como em tempos os Portugueses rumaram em busca dos descobrimentos, resta agora navegar na direção do conhecimento.
EMERGÊNCIA I
15
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OUTUBRO/NOVEMBRO.12
GERIATRIA I
17
QUEDAS EM GERIATRIA: DOENÇA DE ALZHEIMER
FALLS IN GERIATRICS: ALZHEIMER’S DISEASE
MARÍLIA MARQUES
RITA MADUREIRA
Enfermeira
Enfermeira
MARTA FERREIRA
SARA CORREIA
Enfermeira no Lar Monte dos Burgos e Medicina Laboratorial Dr. Carlos da Silva Torres
Enfermeira no Serviço de Medicina Oncológica no Hospital de Barcelona, Espanha
SÓNIA SILVA
SÍLVIA PEREIRA
Enfermeira
Enfermeira no Serviço de Cirurgia das Especialidades no Centro Hospitalar
de Vila Nova de Gaia/Espinho, E.P.E
Recebido para publicação: março de 2011
Aprovado para publicação: abril de 2011
RESUMO
Ao longo dos últimos anos verifica-se um acréscimo no envelhecimento a nível
mundial e sendo os episódios de queda um acontecimento frequente nesta
faixa etária, com consequências devastadoras a vários níveis, torna-se pertinente a abordagem deste tema como forma de consciencializar os profissionais de
saúde e toda a população envolvida na prestação de cuidados aos mesmos.
O presente artigo tem como objetivo a revisão bibliográfica sobre a temática relacionada com risco de queda, em particular na população idosa portadora de demência.
Constatou-se que as quedas estão relacionadas com vários fatores, sendo
mais frequentes na população idosa, portadora de demência. Isto, porque,
além de todas as mudanças fisiológicas decorrentes do envelhecimento, os
idosos com demência apresentam alterações cognitivas relevantes que irão
influenciar a sua relação com o meio. A identificação de fatores de risco é
muito útil para um programa múltiplo de prevenção das quedas, sendo pertinente a uniformização de um parâmetro de avaliação do mesmo, em contexto de uma unidade de Psicogeriatria.
Palavras-chave: Queda; Demência; Doença de Alzheimer; Idosos;
Factores de risco; Escalas de avaliação de risco de queda.
ABSTRACT
Over the years we’ve seen an increase in the number of older people and
falls are the leading event that has a devastating meaning to their lives and
to those that are caregivers.
The present article was made with the goal of doing a bibliographical revision on the thematic about the risk of falls, mainly among the elderly people
with dementia. Therefore, the development of a work that would focus on
this theme became crucial to be a kind of alert to health professionals and
to those who live with someone in this situation. We concluded that falls
happened more often in the elderly people with dementia as a result of
many factors. Besides all the physiological changes of the aging, the elderly people with dementia have cognitive changes that will influence their relation with the environment. The identification of the risk factors is very useful
to an interdisciplinary program of falls prevention, being relevant the standardization of an evaluation parameter, in a geriatric psychiatry unit.
Keywords: Fall; Dementia; Alzheimer’s disease; Elderly people; Risk factors; Scales for assessing the risk of falling.
INTRODUÇÃO
“Pacientes com demência têm um risco aumentado de queda. Doentes com
demência têm maior dificuldade de decisão, menor perceção visual e menor
capacidade de se orientarem relativamente aos objetos que os rodeiam”.
(Greubel, D.; Stokesberry, C; Jelly, M., 2002, p. 84)
Atualmente, nos países desenvolvidos vive-se cada vez até mais tarde, contudo
os idosos nem sempre têm melhor qualidade de vida, pois cada vez mais são afetados pelo aparecimento de demências, nomeadamente a Doença de Alzheimer.
Com o aumento da idade e com a demência, os idosos tornam-se mais suscetíveis a sofrerem quedas que podem ter consequências graves para a sua saúde.
A abordagem deste tema tem como objetivos clarificar o conceito de quedas
e os fatores predisponentes, relacionando-os com as demências, mais especificamente com a Doença de Alzheimer. Assim, é feita a abordagem das consequências desse fenómeno e a planificação de intervenções preventivas de
quedas, apresentando no final uma parametrização do risco de queda, de
forma a objetivar a avaliação desse risco.
ENVELHECIMENTO
O envelhecimento é um processo fisiológico natural, que começa no momento da conceção e termina com a morte, no qual há alterações morfológicas,
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I GERIATRIA
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Qualquer pessoa, de qualquer faixa etária está sujeita a sofrer um episódio
de queda. No entanto, essa probabilidade é mais elevada nos indivíduos idosos, devido às alterações fisiológicas que sofrem associadas a vários fatores, daí este artigo se focar mais neste contexto.
QUEDA
Existem várias definições no que concerne ao conceito de queda o que, muitas vezes, torna difícil a generalização e a comparação de estudos efetuados
neste âmbito (Masud e Morris, 2001). Esta pode ser definida como “o deslocamento não intencional do corpo para um nível inferior à posição inicial com
incapacidade de correção em tempo hábil, determinado por circunstâncias
Foto: Yuri Arcurs I Dreamstime
multifatoriais, comprometendo a estabilidade” (Pereira cit por Ávila, 2007, p.3).
De entre todas as faixas etárias, os idosos são uma população bastante suscetível à ocorrência de episódios de queda. Tal acontecimento torna-se um
grande problema de saúde pública em termos de morbilidade, mortalidade e
de custos para os sistemas de saúde e sociais (Masud e Morris, 2001).
Segundo alguns estudos, a ocorrência de quedas é elevada na população
idosa: 32% (65-74anos), 35% (75-84 anos) e 51% (acima de 85anos)
(Pereira et. al, 2001).
As quedas estão relacionadas com vários fatores, sendo mais frequentes na
população idosa, portadora de demência. Isto, porque, além de todas as mudanças
fisiológicas decorrentes do envelhecimento, os idosos com demência apresentam
alterações cognitivas relevantes que irão influenciar a sua relação com o meio.
funcionais e bioquímicas, com redução na capacidade de adaptação
homeostática às situações de sobrecarga funcional, alterando progressivamente o organismo e tornando-o mais suscetível às agressões intrínsecas
e extrínsecas (GZ et al, 2007).
O aumento da população idosa é um fenómeno mundialmente observado,
nomeadamente nos países desenvolvidos, devido ao aumento da expectativa de vida, do melhor controlo de muitas doenças potencialmente fatais e da
diminuição das taxas de fecundidade e mortalidade (Carvalho, 2000).
A população idosa com perturbações mentais constitui um subgrupo significativo entre as pessoas da terceira idade. Os profissionais de saúde que prestam cuidados psiquiátricos a idosos devem ter competências específicas no
sentido de promoverem intervenções eficazes e adequadas a cada indivíduo.
Assim, devem ter conhecimento acerca do envelhecimento normal (alterações
biológicas, psicológicas e sociais), gestão dos problemas sociais e físicos da
terceira idade (luto, perda de papeis) e das patologias do foro mental mais
recorrentes (Doença de Alzheimer, depressão, entre outras).
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DEMÊNCIA
Segundo Carvalho (2000), demência caracteriza-se por pelo menos dois défices
cognitivos, a alteração da memória e uma das seguintes perturbações cognitivas:
afasia, apraxia, agnosia ou perturbação do funcionamento cognitivo. “A inclusão
obrigatória do défice de memória não é unânime entre os estudiosos do tema”
(Mattos, cit por Carvalho, 2000, p.6). Isto porque a memória para eventos mais
antigos está menos comprometida do que a memória para eventos recentes.
Contudo, o esquecimento pode ser o sintoma que tende a ocorrer mais precocemente, mas pode ser difícil de detectar nos estágios iniciais da doença.
Os indivíduos com demência podem desenvolver desorientação espacial, ter
dificuldade em realizar tarefas, apresentar défices de atenção e concentração,
apresentar delírios e alucinações e desenvolver perturbações motoras da marcha, levando a quedas (Carvalho, 2000). E podem, ainda “estar especialmente
vulneráveis a fatores de stress físicos e psicossociais, que podem intensificar
os seus défices” (APA, cit por Carvalho, 2000, p.7).
DOENÇA DE ALZHEIMER
A Doença de Alzheimer é a demência que atualmente apresenta maior incidência, constituindo cerca de metade de todas as demências; estima-se que esta
afeta 10% de todas as pessoas acima dos 65 anos de idade e quase metade
das que têm mais de 85 anos. Desta forma, “a Doença de Alzheimer é a principal causa de demência entre pessoas idosas, apresentando nos últimos
anos um crescimento rápido do número de acometidos devido ao aumento da
expectativa de vida” (Piermartini, 2008, p.1).
Para diagnosticar a doença no Diagnostic and Statistical Manual of Mental
Disorders (DSM-IV), é necessário que o indivíduo apresente quatro requisitos básicos: presença de demência, aparecimento gradual com declínio cognitivo contínuo, exclusão de todas as outras causas específicas de demência e não ocorrer
exclusivamente durante o curso de um delirium (APA, cit por Carvalho, 2000).
Segundo Carvalho (2000), a Doença de Alzheimer pode ser descrita em três
estágios. O primeiro, que pode durar de dois a três anos, é caracterizado
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GERIATRIA I
19
por sintomas vagos e difusos, com desenvolvimento insidioso, em que o distúrbio da memória é normalmente o primeiro sintoma a ser notado, além de alterações das funções visuais e espaciais, da linguagem, aprendizagem e concentração. Isto pode levar o indivíduo a ter dificuldades com situações complexas,
podendo ocorrer perplexidade, agitação e hiperatividade ou apatia e desinteresse. Já no segundo estágio, pode ocorrer deterioração acentuada da memória e
aparecimento de sintomas focais, que incluem afasia, apraxia, agnosia e alterações visuais e espaciais. Nesta fase, o funcionamento emocional, a personalidade e o comportamento social ainda podem estar relativamente preservados, mas
sintomas extra-piramidais podem ocorrer, com alteração da postura, aumento do
tónus muscular, desequilíbrio e comprometimento da marcha. Por fim, no tercei-
Os fatores extrínsecos estão amplamente relacionados com o ambiente,
salientando-se a fraca ou má iluminação da casa (especialmente no período
nocturno, entre o quarto e a casa de banho), superfícies irregulares ou escorregadias, tapetes soltos, escadas íngremes ou irregulares, objetos no caminho, vestuário e calçado inadequado, móveis inadequados, inexistência de
corrimão, entre outros. (Ávila, 2007).
Os utentes com demência e défices cognitivos apresentam uma maior frequência de queda, uma vez que há um comprometimento da atenção e da
memória, principalmente da memória recente e de aquisição, o que irá dificultar a adaptação a novos ambientes, a apraxia, a agnosia, a desorientação
espacial, a deterioração das funções executivas que influenciam as debilida-
ro estágio, todas as funções mentais estão gravemente afetadas, em que o indivíduo comunica através de sons incompreensíveis ou permanece calado, ficando por vezes na cama, com incontinência urinária e fecal. Podem aparecer sintomas e sinais neurológicos grosseiros, como hemiparésia espasticidade, rigidez,
tremor, reflexos primitivos e crises convulsivas. “Nesta fase, a deterioração corporal é surpreendentemente rápida, apesar do apetite preservado” (Bottino &
Almeida cit por Carvalho, 2000, p.9).
Segundo Piermartini (2008), num estudo efetuado com idosos portadores de
Doença de Alzheimer, num intervalo de 1,5 a 2 anos, 56,3% dos idosos tiveram pelo menos uma queda.
Num estudo com 404 pessoas com idade igual ou superior a 60 anos, comparou-se a ocorrência de quedas entre utentes com Doença de Alzheimer e sem
Doença de Alzheimer. Observou-se queda em 78% dos idosos com demência,
contra apenas 55% em utentes sem essa demência. Desta forma, idosos com
quadro demencial apresentam maior risco de caírem do que idosos sem
demência. Tal facto implica a necessidade de cuidados especiais com esses
indivíduos, visando minimizar o risco desses acidentes (Carvalho, 2002).
des motoras e sensoriais, a resposta protetora comprometida e o julgamento
empobrecido da gravidade do seu quadro clínico. Desta forma, o utente não
tem a perceção exata das suas capacidades nem das suas perdas, como o
declínio da marcha, o desequilíbrio e a instabilidade postural, o que faz com
que haja maior risco de queda nesses utentes. (Carvalho e Coutinho, 2002).
FATORES DE RISCO DE QUEDA
A estabilidade do corpo depende da receção adequada de informações de
componentes sensoriais, cognitivos (orientação temporo-espacial; memória;
capacidade de cálculo; capacidade de planeamento e decisão; linguagem expressão e compreensão), integrativos centrais e músculo-esqueléticos, de
forma altamente integrada. O efeito cumulativo de alterações relacionadas à
idade, doenças, e meio ambiente inadequado podem predispor à queda
(Pereira S.; Buksman S.; Perracini M.; Py L.; Barreto K.; Leite V., 2001).
Vários estudos identificaram mais de 400 fatores que potenciam a ocorrência de um episódio de queda, embora não exista nenhuma classificação
aceite universalmente (Masud e Morris, 2001).
De acordo com o Effective Health Care Bulletin, podemos agrupar esses
fatores em cinco grandes categorias: ambientais, quadro clínico da pessoa
associado à medicação, alterações decorrentes da idade, nutricionais e atividade física (Masud e Morris, 2001). Estas categorias podem ser dispostas
em aspetos relacionados diretamente com o indivíduo (fatores intrínsecos)
ou com o meio ambiente (fatores extrínsecos).
Entre os fatores intrínsecos estão incluídos: problemas ortopédicos dos membros inferiores, problemas de visão, problemas cardíacos, doenças associadas à labirintite, diminuição da força dos membros inferiores, problemas posturais, dificuldades de lateralidade, redução dos reflexos pela idade e dificuldades de coordenação motora, entre outros (Dieter, cit por Ávila, 2007).
FATORES DE RISCO PARA QUEDA EM IDOSOS DEMENCIADOS
Como referido anteriormente, existem algumas características das demências
que propiciam o risco de queda nos idosos. Assim, de forma sucinta apresentam-se os fatores de risco:
Défices cognitivos relativos à demência: comprometimento da atenção e da
memória recente ou de aquisição – dificultando a adaptação a novos ambientes.
Desorientação espacial: “Desde a simples mudança de um móvel, ou acréscimo de um degrau, até a mudança para outra casa, podem significar um
aumento no risco de quedas, devido à dificuldade de memorização de informações novas para esse grupo” (Carvalho, 2000, p. 62).
Deterioração das funções executivas: foi realizado um estudo que comprovou que a influência das debilidades motoras e sensoriais nas quedas são
moderadas, em parte, pelas funções executivas. “Isso deve-se ao facto de
utentes que apresentam deficiências nessas funções tenderem a agir de um
modo mais arriscado e inadequado, devido a julgamento errado da gravidade
das suas ações, podendo resultar numa queda” (Rapport cit por Carvalho,
2000, p. 62).
Comprometimento da marcha/desequilíbrio/instabilidade postural:
associado quer à demência e o desenvolvimento dessa doença, quer ao
processo de envelhecimento.
Índice de massa corporal: De acordo com um estudo realizado por Berlinger
& Potter (cit por Carvalho, 2000), idosos com demência, independente do tipo
ou severidade, possuem IMC aproximadamente 10% menor que aqueles cognitivamente intactos. Como o baixo IMC é apontado com um fator de risco
para as quedas, este também pode ser um aspeto que contribui para a maior
ocorrência de quedas entre os idosos com demência.
Sexo Feminino: estudos revelam que a absorção de cálcio é menor em
mulheres com demência (Carvalho, 2000), fator que também contribui para
a ocorrência de quedas.
Medicação: a medicação que estes utentes tomam, “especialmente os benzodiazepínicos, os fenotiazínicos e os antidepressivos têm sido relatados
como fatores de risco para quedas em utentes com demência. O uso dessas substâncias duplicam a probabilidade de quedas tanto em utentes com
défice cognitivo” (Ávila, 2007, p. 44).
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20
I GERIATRIA
ESPECIFICAMENTE NA DOENÇA DE ALZHEIMER
Horikawa et al (cit por Piermartiri, 2008, p. 2) demonstraram que a lesão na
substância branca identificada pela ressonância magnética causa distúrbios
na manutenção do equilíbrio e aumenta o risco de quedas na doença de
Alzheimer, sendo que o uso de drogas neurolépticas comummente utilizadas
no tratamento comportamental e de sintomas psiquiátricos, também estão relacionadas com o aumento de quedas, não afetando, no entanto, o equilíbrio.
CONSEQUÊNCIAS DAS QUEDAS
De acordo com a evidência científica, as quedas contribuem para o declínio
da capacidade funcional do idoso, aumentando a dificuldade e o grau de
dependência na realização das atividades de vida diárias (Fabrício e
Rodrigues, 2006).
As pessoas idosas que sofrem algum episódio de queda tornam-se mais
dependentes e inseguras devido às consequências que daí advêm (níveis
físico, psicológico e social): fraturas, hospitalização, isolamento e medo de
voltar a cair. (Fabrício e Rodrigues, 2006). Este último é definido como
“Síndrome Pós-Queda”, sendo que o medo de cair novamente pode ser a
complicação mais incapacitante de uma queda, conduzindo a uma diminuição da mobilidade e aumentando o desuso, desencadeando uma série de
complicações, com consequente perda da capacidade funcional, aumentando a suscetibilidade a um novo evento no futuro (Menezes; Bachion, 2007).
Também a ansiedade e a depressão são consequências de um episódio de
queda, diminuindo a qualidade de vida e de autonomia não só do idoso
como dos seus cuidadores, que se vêem na necessidade de readaptar
toda a sua rotina diária em função da recuperação ou adaptação do idoso
pós-queda (Carvalho e Coutinho, 2002).
INTERVENÇÃO DE ENFERMAGEM
Com a elaboração desta revisão compreende-se o relevo que um episódio de
queda pode ter na vida de um idoso e da importância de intervir eficazmente
no sentido da prevenção de tal fenómeno. Desta forma, o papel dos profissionais de enfermagem é vital na manutenção da autonomia e da independência das pessoas idosas.
A prevenção passa por uma eficiente avaliação do risco de queda de cada
idoso, existindo inúmeras escalas desenvolvidas para avaliar esse parâmetro.
Após a realização da avaliação de risco de queda o enfermeiro pode elaborar
um plano de intervenção que vise as necessidades específicas de cada indivíduo. É importante o conhecimento aprofundado sobre os fatores de risco no
sentido de ajudar os idosos a preveni-los como a diminuição ou cessação dos
fatores extrínsecos. Sendo que, segundo alguns estudos, a atividade física
constitui uma importante estratégia para minimizar défices de equilíbrio em idosos e consequentemente as possíveis quedas, revelando benefícios da intervenção motora nos sistemas cardiovascular, neuromuscular e sensorial, sendo
que outros comprovam, ainda, efeitos da atividade física sobre as funções
cognitivas (Christofoletti, 2006).
Para além das medidas já referidas, o profissional de enfermagem deve ter
especial atenção, para prevenir quedas no idoso: o ambiente em que este se
insere, evitando acrescentar objetos novos ao espaço pois o ambiente seguro para o idoso é aquele em que ele se sente seguro e que lhe é familiar; prestar especial atenção a alterações no estado de consciência do idoso uma vez
Revista Nursing; Edição outubro/novembro 2012; pág.20
OUTUBRO/NOVEMBRO.12
que uma diminuição desta pode aumentar o risco de queda; manter o espaço onde o idoso se movimenta iluminado; ter em atenção os idosos que
façam como medicação benzodiazepínicos, fenotiazínicos e antidepressivos
pois estes duplicam o risco de queda. No domicílio do idoso, o cuidador deve
ser instruído para retirar todos os objetos que aumentem o risco de queda,
como tapetes e fios e colocar os objetos de uso mais frequente pelo idoso
ao nível do olhar. Quanto a um idoso com Alzheimer em contexto hospitalar,
devem ser mantidas as grades da cama e colocada a cama no nível mais
baixo, para evitar a queda ou minimizar as consequências caso esta ocorra.
PARÂMETROS DE AVALIAÇÃO DE RISCO DE QUEDA
A Escala de Morse é um parâmetro que avalia vários parâmetros, desde
Antecedentes de Queda, Diagnóstico Secundário, Ajuda na Deambulação,
Medicação Endovenosa (EV), Marcha/Movimentação e Estado Mental (orientação) do indivíduo.
Esta escala deve ser aplicada na admissão do utente, diariamente e, se
necessário, em cada turno, quando a situação deste muda ou tenha havido
uma mudança na medicação que poderá colocar o utente em risco de queda,
quando um utente é transferido para outra unidade e após uma queda.
Antecedentes de queda – classificado com pontuação 25 se o utente
tiver caído durante o presente internamento ou se há uma história recente
de quedas fisiológicas, tais como ataques ou quedas devido a uma marcha
prejudicada. Se o utente não tiver caído, é classificado com pontuação 0.
Se um utente cai pela primeira vez, então a sua pontuação aumenta imediatamente para 25.
Diagnóstico secundário – classificado com pontuação 15, se o utente
tem mais de um diagnóstico médico (como por exemplo, uma demência),
caso contrário, pontuação 0.
Ajuda na Deambulação - classificado com pontuação 0 se o utente anda
de pé, sem ajuda (ainda que assistido por um enfermeiro), usa uma cadeira de rodas, ou está em repouso e não sair da cama (acamado). Se o utente
OUTUBRO/NOVEMBRO.12
usa muletas, uma bengala, ou um andarilho, a classificação passa para 15,
se o utente se apoia nos móveis/paredes a pontuação aumenta para 30.
Medicação EV - classificado com pontuação 20, se o utente tiver um aparelho ou uma solução salina intravenosa/heparina, caso contrário, pontuação 0. Em relação à solução EV, o perigo de queda estará associado com
todo o sistema que envolve esse processo e a dificuldade no seu transporte, aquando da deambulação; relativamente à heparina, quando usada de
forma prolongada poderá ter repercussões a nível osteoarticular, o que contribuirá para uma fragilidade motora e possível fator de risco de queda.
Vários autores referem a associação de demais medicação com o risco de
queda, entre essa medicação, as mais associadas são as benzodiazepinas,
os anti-convulsivantes, os anti-hipertensores e os anti-depressivos, que
desta forma poderão ser incluídos neste parâmetro, uma vez que todos eles
estão associados a efeitos adversos como tonturas, sonolência, confusão,
hipotensão ortostática, fatores que poderão levar a quedas.
Marcha/movimentação - Marcha normal, de pontuação 0, é caracterizada
pelo utente que anda com a cabeça levantada e os braços a balançar livremente ao lado. Marcha fraca, de pontuação 10, se o utente tem alguns défices na marcha, mas é capaz de levantar a cabeça enquanto está de pé, sem
perder o equilíbrio; se o apoio de móveis é necessário de forma muito leve
e se os passos são curtos. Marcha prejudicada, de pontuação 20, se o utente tem dificuldade em levantar-se da cadeira, empurrando sobre os braços
desta, ou seja, por meio de diversas tentativas de subida; porque o equilíbrio
do utente é pobre, este agarra os móveis firmemente, apoia-se em pessoas
e não consegue caminhar sem essa assistência; os passos são curtos.
Estado mental – neste parâmetro é avaliado o estado mental do utente,
verificando a auto-avaliação da pessoa sobre a própria capacidade de
deambulação. Questiona-se o utente e verifica-se o seu estado mental. Se
este for compatível com o normal e a resposta for coerente, terá uma pontuação de 0. Se a resposta do utente não é coerente com a pergunta ou se
a resposta não é realista, então o utente é considerado limitado quanto ao
seu estado mental, sendo classificado com pontuação 15.
É crucial a classificação e o registo diário do nível de risco de queda de
forma a classificar o utente segundo a escala em causa (Morse):
0 – 24: Baixo risco de queda
25 – 44: Médio risco de queda
3
45: Alto risco de queda
De acordo com o grau de risco em que o utente for classificado, deverão ser
tomadas atitudes preventivas de forma a garantir a prevenção das quedas.
CONCLUSÃO
A elaboração desta revisão bibliográfica permitiu concluir que existem fatores
de risco intrínsecos ou extrínsecos que podem fazer com que exista um maior
risco de queda. O risco de queda aumentado pode também ser consequência da utilização de alguns fármacos que pelas suas características podem
provocar fraqueza muscular, hipotensão postural, vertigens entre outros. A
Doença de Alzheimer pela sua própria evolução faz com que os utentes
GERIATRIA I
21
tenham um risco acrescido de queda, principalmente se conjuntamente com
a doença existir a toma dos fármacos referidos. Torna-se então importante
implementar instrumentos de avaliação do risco de queda nos idosos.
Após análise de várias escalas de avaliação de risco de queda, chegou-se
ao consenso que a escala que mais se adequa à população idosa, portadora de demência, é a Escala de Morse, uma vez que as restantes escalas são
mais específicas para certos parâmetros, como o equilíbrio e menos direcionadas para alterações cognitivas, não relacionando o risco de queda
com determinados fatores, como por exemplo, a medicação, os antecedentes de queda e o estado mental, abordados na escala eleita.
Bibliografia
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Long-Term Care. The Nurse Practitioner. 2002, 83-85
2. GZ, Mazo; DB, Liposcki; C, Ananda [et al] – Condições de saúde, incidência de quedas e nível de actividade física dos idosos. Revista Brasileira
de Fisioterapia. (Nov./Dez 2007). Vol. 11, n 6, p. 437-442
3. CARVALHO, Aline de Mesquita - Demência como factor de risco para
queda seguida de fractura grave em idosos. 2000, 1-191
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queda. 2007.
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fracturas graves em idosos. Revista da saúde Pública. Agosto, 2002
9. FABRÍCIO, Suzele; RODRIGUES, Rosalina – Percepção de Idosos sobre
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Revista de Enfermagem, 2006
10. MENEZES, R.; BACHION, M. - Estudo da presença de factores de riscos
intrínsecos para quedas em idosos institucionalizados. Ciência & Saúde
Colectiva. 2008. Vol.13, n 4, 1209-1218.
11. CHRISTOFOLETTI, G.; OLIANI, M.; GOBBI, L.: GOBBI, S.; STELLA, F. Risco de quedas em idosos com Doença de Parkinson e Demência de
Alzheimer: um estudo transversal. Revista Brasileira de Fisioterapia. 2006.
Vol. 10, n 4, 429-433.
1. COUTINHO, E.; SILVA, S.; - Uso de Medicamentos como factor de Risco
para Fractura Grave decorrente de queda em idosos. Cadernos de Saúde
Pública. Setembro, 2002.
Revista Nursing; Edição outubro/novembro 2012; pág.21
AGENDA
22
9 e 10 de novembro de 2012
Curso de Formação Avançada
1ºCongresso de Enfermagem em Urgência Pediátrica das Beiras
PREVENÇÃO E CONTROLO
DE INFEÇÃO
(UBI)
Local: Grande Auditório da Faculdade de Ciências da Universidade da Beira Interior
pelo Centro Hospitalar Cova da Beira e decorrerá na Covilhã, no Grande
Auditório da Faculdade de Ciências da Universidade da Beira Interior (UBI).
Para mais informações contactar o e-mail: [email protected]
I
06, 07, 10, 11 de dezembro de 2012
urso: 12
Curso de Prevenção e Controlo de Infeção
Local: Escola Superior de Saúde da Cruz
ZZZFU\VWDOJUDSKLFVFRP
A morte em pediatria, comportamentos desviantes, interrelações humanas em
urgência pediátrica são alguns dos temas centrais que serão abordados no
decorrer do 1º Congresso de Enfermagem em UrgênciaE Pediátrica das Beiras.
O evento, que se realizará nos dias 9 e 10 de Novembro de 2012, é promovido
Vermelha Portuguesa
A Escola Superior deFormadoras:
Saúde
Ana Parreira da Cruz Vermelha
Rita Marques
Portuguesa vai realizar o Curso de Prevenção e
Controlo de Infeção. A formação, que está agendada para os dias 6, 7, 10, 11 de Dezembro de 2012,
das 9h às 18h, com um total de 32 horas, destinase aos profissionais de Enfermagem.
Identificar os conceitos e princípios associados à
epidemiologia da infeção e cadeia epidemiológica,
Conhecer os Princípios de Prevenção e Controlo de
Infeção, Identificar as Precauções Básicas e Universais
do controlo da infeção e Identificar o papel das entidades e dos profissionais na prevenção e controlo de infeção são os principais objetivos. Para mais informações
contactar o E-mail: [email protected] ou o site:
http://www.esscvp.eu/secretaria/noticias/
11 de dezembro de 2012
I Jornadas de Enfermagem
Geriátrica e Gerontológica
Local: Universidade Fernando Pessoa
A Universidade Fernando Pessoa vai realizar, dia 11 de
dezembro, as I Jornadas de Enfermagem Geriátrica e
Gerontológica, que têm como temática principal
«Qualidade de Vida e Envelhecimento Ativo».
Envelhecimento e Memória, Competências dos
Enfermeiros no cuidado ao Idoso, Envelhecimento
Ativo e Qualidade de Vida, Qualidade de Vida são
alguns dos temas das sessões. Para mais informações
contactar o e-mail: [email protected]
17 e 18 de janeiro de 2013
XVI Reunião Anual de Cuidados Intensivos Pediátricos
Local: Porto
O Serviço de Medicina Intensiva Pediátrica do
Centro Hospitalar de São João realiza, nos dias 17 e
18 de janeiro de 2013, no Ipanema Park, Porto, a XVI
Reunião Anual de Cuidados Intensivos Pediátricos.
O encontro debruçar-se-á sobre variados temas na
área dos Cuidados Intensivos e na área da Pediatria
Geral. Para mais informações contactar o E-mail:
[email protected]
SUPLEMENTO
• Edição 284/285
outubro/novembro de 2012
CANETAS DE INSULINA – UMA ESCOLHA REFLETIDA .......................................................... pag. 02
EXAME DO PÉ NAS PESSOAS COM DIABETES .......................................................................... pag. 06
2
OUTUBRO/NOVEMBRO.12
I SUPLEMENTO
CANETAS DE INSULINA
– UMA ESCOLHA REFLECTIDA
ISABEL CORREIA
Enfermeira na APDP, Membro da Direção da Sociedade Portuguesa de Diabetologia
A descoberta da insulina data de 1922. No início da década de 70 surgem
• Caneta de insulina reutilizável – antes de se usar esta caneta ela tem que
as primeiras insulinas animais purificadas. A década de 80 trouxe as insulinas
humanas recombinantes. Nos anos 90 desenvolveram-se os primeiros análogos de acção rápida e já no seculo XXI surgem os análogos de acção longa.
Apesar do esforço de cientistas para desenvolver insulina que possa ser
administrada por via oral, ainda não foi possível desenvolver uma insulina com
a mesma eficácia no tratamento. Portanto, só é ainda possível administrar a
insulina por via parentérica, nomeadamente a via subcutânea, que é até agora
considerada a via mais segura e previsível do efeito terapêutico da insulina.
Os dispositivos para administrar a insulina por via subcutânea têm evoluído ao
longo dos tempos. Durante vários anos após a descoberta da insulina só era
possível proceder a esta administração usando seringas e frascos. Ainda existem hoje pessoas com diabetes que preferem este modo de administração.
As canetas de insulina foram desenvolvidas para facilitar este processo.
São usadas com agulhas próprias para canetas e que são vendidas em
separado. Cada tipo de insulina tem a sua caneta respectiva.
As canetas de insulina são fáceis de usar e são o dispositivo mais usado
pelas pessoas com diabetes na administração da sua insulina. Como podem
ser mantidas à temperatura ambiente o seu transporte encontrar-se facilitado.
Em Portugal existem três laboratórios que comercializam insulina, quer em
frascos, quer em canetas. As canetas de insulina dividem-se em dois grupos: canetas reutilizáveis e canetas descartáveis.
ser carregada com um cartucho de insulina (vendidos em caixas de cinco).
Cada cartucho contém 300 unidades de insulina, de acordo com a dose de
insulina da pessoa com diabetes dará para várias injecções. Quando termina a insulina desse cartucho, este será retirado da caneta (que possui um
compartimento próprio e adaptado ao cartucho) e ser colocado um novo.
Estas canetas se forem cuidadas poderão durar muitos anos. (Ver Tabela 1)
• Caneta de insulina descartável – estas canetas estão precheias de insulina e
quando termina a insulina da caneta esta é deitada fora. São comercializadas em
caixas de cinco e à semelhança dos cartuchos cada caneta também contem
300 unidades de insulina, o que significa que de acordo com a dose da pessoa
com diabetes também dará para varias administrações de insulina. (Ver Tabela 2)
As canetas das diferentes marcas e das diferentes insulinas possuem
características distintas. Quando a pessoa com diabetes vai iniciar
insulina a equipa tem que ter alguns factores em atenção:
• Qual a insulina adequada para aquela pessoa
• Qual a caneta disponível para aquela insulina
• Qual a dose máxima que se consegue injectar com aquela caneta
• Se são necessárias doses de meia unidade de insulina
• A forma como a caneta indica se tem insulina suficiente para a dose
necessária (quando está a terminar a insulina da caneta)
• O tamanho dos números do visor
• Se a caneta tem forma alternativa para marcar a dose necessária
(mais ou menos audível)
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OUTUBRO/NOVEMBRO.12
• A forma como se corrige na caneta um erro na marcação da dose
• A força necessária para injectar a dose marcada
• A dimensão da caneta
• Quais os sistemas de segurança da caneta
• O aspecto e material da caneta (plástico, metal)
• Quem é a pessoa que vai usar a caneta (idade, profissão, destreza
manual, problemas de visão, etc.)
• Preferência e gosto da pessoa com diabetes
SUPLEMENTO I
5
Entre as vantagens de administrar insulina com canetas podem-se referir:
— A simplicidade de funcionamento, de uma forma rápida e fácil marca-se
a dose necessária
— Possibilidade de marcar a dose de forma audível, muito útil para
quem tem baixa visão
— Mais precisão na marcação da dose, principalmente para quem tem
menos destreza manual ou problemas de visão
— Podem ser mantidas à temperatura ambiente, não necessitando de
refrigeração
As canetas de insulina descartáveis têm a vantagem de não terem que ser
desmontadas e novamente montadas quando termina a insulina, o que pode
— O aspecto das canetas, facilmente confundível com uma esferográfica
— As canetas de insulina são discretas e fáceis de utilizar
— A economia de tempo, já contém insulina não sendo necessário aspirar do frasco
facilitar a administração de insulina por algumas pessoas com diabetes.
É importante lembrar que a escolha da caneta certa para aquela pessoa com diabetes vai com toda a certeza contribuir para o sucesso da
insulinoterapia.
(Nota: artigo esctrito de acordo com a ortografia antiga da Lingua Portuguesa)
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OUTUBRO/NOVEMBRO.12
I SUPLEMENTO
EXAME DO PÉ NAS PESSOAS COM DIABETES
Foot examination in the people with diabetes
CLÁUDIA ARAÚJO
JOÃO AMADO
Licenciatura em Enfermagem
Mestrado em Saúde Pública
Pós-Graduação em Feridas e Viabilidade Tecidular
Professor Associado com Agregação
Instituto de Ciências da Saúde – Universidade Católica Portuguesa
Aluna do Mestrado em Feridas e Viabilidade Tecidular
Enfermeira na Unidade de Cuidados de Saúde Personalizados de Caminha,
Viana do Castelo
(Unidade Local Saúde Alto Minho, EPE)
Recebido para publicação: maio de 2012
Aprovado para publicação: setembro de 2012
RESUMO
A diabetes é considerada uma emergência à escala mundial, não apenas por
atingir milhões de pessoas, mas também porque as mais elevadas taxas de prevalência implicam, consequentemente, o aumento das suas complicações crónicas. Tais complicações refletem-se tanto em aumento dos gastos em saúde, em
sofrimento das próprias pessoas com diabetes, dos seus familiares e da comunidade em geral, como em desgaste psicológico dos enfermeiros seja pela preocupação, seja pelo interesse e dedicação na melhoria do controlo desta patologia. De entre as complicações que emergem da diabetes destaca-se o pé diabético. No contexto da prevenção das lesões no pé é imperiosa, nas consultas de
vigilância da saúde, a observação sistemática dos pés das pessoas com diabetes, pelos enfermeiros – profissionais de saúde que ocupam manifestamente a
primeira linha de cuidados de saúde. A partir de uma revisão sistemática da literatura apresentam-se os preceitos teórico-práticos a considerar aquando da realização do exame do pé nas pessoas com diabetes: a avaliação neurológica e
vascular, a inspeção das diferentes deformidades e a avaliação do calçado.
Palavras-chave: Pé diabético; Técnicas de diagnóstico neurológico;
Angiopatias diabéticas; Doenças do pé; Sapatos.
ABSTRACT
Diabetes is considered a global emergency, not only reach millions of people,
but also because the highest prevalence rates therefore require increased its
chronic complications. Such complications are reflected both in increased
spending on health care, in people’s own suffering with diabetes, their families
and the community in general, as in psychological burnout of nurses is the concern, whether the interest and dedication in improving the control of this pathology. Among the complications that arise from diabetes highlights the diabetic
foot. In the context of prevention of foot injuries is imperative, in consultations
on health monitoring, systematic observation of the feet of people with diabetes by nurses - health professionals who clearly occupy the first line of health
care. From a systematic literature review presents the theoretical and practical
principles to consider when performing the examination of the foot in people
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with diabetes: a vascular and neurological evaluation, inspection of the various
deformities and evaluation of the shoes.
Keywords: Diabetic foot; Neurological diagnostic techniques; Diabetic angiopathies; Foot diseases; Shoes.
INTRODUÇÃO
A diabetes é uma doença crónica que tem vindo, cada vez mais, a despertar o
interesse dos responsáveis pelos serviços de saúde e pela sociedade.(1) Para
além das mudanças substanciais e dos receios que a diabetes impõe à vida das
pessoas, dos seus familiares e dos prestadores de cuidados, os seus custos
económicos e sociais são importantes: gastos em cuidados de saúde, perda de
produtividade e rendimentos e perda de oportunidades associadas ao desenvolvimento económico.(1) A agravar este quadro ameaçador do bem-estar físico e
emocional das pessoas com diabetes e perturbador das famílias e comunidades
que se lhes associam, acresce o facto de a diabetes ser reconhecida como um
problema à escala mundial, atingindo milhões de pessoas, pelo que, inclusive, é
considerada uma epidemia global.(2) Com efeito, a diabetes é uma situação clínica que, embora heterogénea na sua etiopatologia e mesmo nas suas manifestações clínicas, tem vindo a aumentar de frequência em todo o mundo, sendo uma
doença em expansão epidémica.(2) Em Portugal, no ano de 2009, a diabetes
representou um custo de 1.500 milhões de euros (para todas as pessoas com
diabetes entre os 20 e os 79 anos), o que correspondeu a 0,9% do produto interno bruto e a 9% da despesa em saúde.(3)
A persistência de um nível elevado de glicose no sangue resulta em lesões
nos tecidos.(3) Embora a evidência dessas lesões possa encontrar-se em
diversos órgãos, é nos rins, olhos, nervos periféricos e sistema vascular, que
se manifestam as mais importantes, e frequentemente fatais, complicações
da diabetes.(3) Contudo, e apesar de não existir cura para a diabetes, considera-se que é possível um controlo eficaz desta patologia e, consequentemente, uma franca redução do risco de aparecimento das suas complicações, através da disponibilização efetiva de serviços de saúde, medicação
adequada e adoção de estilos de vida saudáveis.(1)
OUTUBRO/NOVEMBRO.12
Assim, uma das principais complicações da diabetes é o denominado pé diabético, cuja morbilidade é uma das principais preocupações nos cuidados de saúde
às pessoas com diabetes, tendo em conta os seus custos pessoais, sociais e económicos.(4) O pé diabético causa considerável sofrimento e importantes mudanças no estilo de vida das pessoas, impedindo o desenvolvimento normal das suas
funções, sobretudo as relativas aos membros inferiores e que, pela sua evolução,
pode conduzir à dramática necessidade de amputação.(5) As complicações no pé
são o principal motivo do tempo de ocupação prolongado de camas hospitalares
pelas pessoas com diabetes.(6) As úlceras de pé diabético são responsáveis por
40% a 60% de todas as amputações efetuadas por causas não-traumáticas.(6) O
número de pessoas com diabetes internadas por pé diabético manteve-se relativamente constante, em Portugal, entre 2005 e 2010.(3) Alguns estudos epidemiológicos evidenciam que a úlcera do pé precede em 85% das amputações nas
pessoas com diabetes.(2) O número de amputações major dos membros inferiores por motivo de diabetes tem registado uma ligeira trajetória de redução após o
ano de 2004 (valor máximo das amputações na última década).(3)
Ainda é, pois, evidente a necessidade de investimento neste grupo e indiscutível
a preocupação que deve persistir nos profissionais de saúde, nomeadamente da
enfermagem, no sentido de adiar o aparecimento das complicações desta patologia, que assombram as pessoas com diabetes.(5) E não foi por acaso que esta
condição patológica mereceu especial atenção por diversas entidades competentes.(2) Em 1980, na Conferência de Saint Vincent, que reuniu a World Health
Organization, a International Diabetes Federation, a European Diabetes
Association e outras associações de vários países, onde Portugal se fez representar pela Associação Protetora dos Diabéticos de Portugal, foi assumido o
compromisso de desencadear medidas de intervenção na patologia do pé diabético, de modo a reduzir em 50%, num prazo de cinco anos, as amputações
causadas pela diabetes.(7) Contudo, e conforme Pereira (2004), apesar de
alguns esforços desenvolvidos pontualmente em termos gerais, podemos considerar que Portugal, à semelhança de outros países, se encontra numa situação
de disparidade entre a teoria e a prática, entre a intenção e a ação.(7)
Assim, torna-se evidente a necessidade de reconhecimento de que a prevenção
das lesões através da observação periódica dos pés e o tratamento da patologia não-ulcerada por profissionais de saúde, nomeadamente por enfermeiros é,
em termos pessoais, económicos e socais, menos dispendiosa que o tratamento de lesões, que frequentemente se caracterizam pela cronicidade. Tal facto é
perfeitamente entendido quando verificamos que o tempo dispensado anualmente para a observação dos pés (mesmo quando considerada a necessidade de
uma observação mensal) é menor do que o tempo necessário para o tratamento de uma úlcera do pé durante quatro semanas (considerando dois tratamentos
semanais). Ao mesmo tempo, e sem atentar na prevenção de lesões, o tratamento de algumas patologias do pé é por si mesmo precursor de uma melhoria significativa do bem-estar das pessoas com diabetes. Deste modo, o tratamento de
determinadas alterações do pé por enfermeiros, a par do ensino e instrução das
pessoas, seus familiares e prestadores de cuidados na prevenção da maioria
das alterações do pé (como por exemplo as hiperqueratoses, fissuras cutâneas,
onicomicoses, onicogrifoses) e na escolha do calçado, são intervenções que se
traduzem rapidamente em conforto das pessoas com diabetes e em tranquilidade dos seus familiares e prestadores de cuidados.
Assim, será de reconhecer que a prevenção é a chave para a resolução do problema que constitui o pé diabético, calculando-se que seja possível com prevenção, reduzir de 50% a 75% a necessidade de amputação por causa não-traumá-
SUPLEMENTO I
7
tica que assombra as pessoas diabéticas.(5) A promoção de cuidados adequados com os pés pode garantir, em muitos casos, a prevenção de úlceras ou
aumentar o potencial de cicatrização, pelo que os enfermeiros devem reforçar a
importância de privilegiar e manter os cuidados dos pés.(8) Neste contexto, será
de reconhecer ainda que o exame dos pés e o encaminhamento atempado para
equipas especializadas são de particular importância.(8)
A eficácia das linhas orientadoras para a prevenção e o tratamento dos problemas do pé nas pessoas com diabetes implica uma parceria entre clientes e profissionais de saúde.(9) Neste contexto, será de salientar a importância dos enfermeiros, que ocupam um lugar de destaque entre os profissionais de saúde, pois
encontram-se na primeira linha de proximidade nos cuidados de saúde; e, pela
disponibilidade que lhes é intrínseca e pelas competências que assumem no
campo da prevenção da doença e promoção da saúde, apresentam-se como
um elemento chave na redução das amputações em pessoas com diabetes. O
primordial fator para o alcance deste objetivo é a observação sistemática dos
pés, nas consultas de vigilância de saúde das pessoas com diabetes.(10)
A preocupação com a diminuição da omissão do exame do pé tem sido grande em Inglaterra e nos Estados Unidos, onde estudos efetuados há mais de
duas décadas, em consultas de diabetologia, revelaram que em apenas 12%
a 19% das consultas de vigilância se solicitava às pessoas com diabetes que
descalçassem os sapatos e as meias.(10) Contudo, ainda persiste a necessidade de enfatizar que o ato de remoção do calçado e das meias é, em si mesmo,
a parte mais importante do exame do pé, já que a maioria dos problemas se
torna de imediato evidente.(10)
Nas pessoas com diabetes, o exame dos pés deve ser realizado, pelo menos, uma
vez por ano e, mais frequentemente, nas pessoas com diabetes que apresentam
um alto risco de ulceração do pé.(11) O exame do pé deve incluir a avaliação neurológica, a avaliação vascular, a inspeção de deformidades e a avaliação do calçado.(9)
Tendo em consideração este enquadramento, apresenta-se neste texto os aspetos que, na prática de enfermagem, se assumem como imprescindíveis na avaliação dirigida, simples e fundamental quer para a determinação do risco de ulceração no pé das pessoas com diabetes, quer para a implementação de medidas
preventivas específicas de redução do risco de ulceração.
Com o intuito de sistematizar o conhecimento existente sobre os testes e procedimentos a atender aquando da avaliação neurológica e vascular, bem como
os aspetos a considerar na avaliação do calçado e as alterações do pé, que
constituem em si fatores precipitantes de ulceração no pé e perante as quais
os enfermeiros devem estar particularmente atentos, partiu-se da consulta
documental em obras e instituições de referência na área da diabetes, que contemplasse tanto assuntos específicos (como por exemplo, pé diabético e prevenção de feridas crónicas), como orientações normativas (v.g., as aventadas
pela Direcção-Geral da Saúde, World Health Organization e associações de
diabetes, entre as quais se destaca o International Working Group on the
Diabetic Foot e a American Diabetes Association).
A par desta revisão de conteúdos científicos, e sobretudo para a identificação das
deformidades no pé mais prevalentes nas pessoas com diabetes, acresceu-se a
consulta de artigos publicados nas revistas científicas indexadas na
Medline/Pubmed – base de pesquisa bibliográfica de publicações médicas –
seguindo-se uma pesquisa com as palavras-chave (no título e no sumário): diabetic, foot, risk e factors, sem limites linguísticos e com data de publicação delimitada entre 1 de Janeiro de 2000 e 15 de Junho de 2011. Dos 307 artigos que resultaram da pesquisa foram selecionados, após leitura do sumário, os artigos cujo
Revista Nursing; Edição outubro/novembro 2012; pág.7
8
I SUPLEMENTO
OUTUBRO/NOVEMBRO.12
conteúdo se relacionava com os objetivos desta revisão da literatura, o que correspondeu ao apuramento da pertinência da leitura integral de 34 artigos científicos.
Assim, previamente à descrição das deformidades do pé mais frequentes nas pessoas com diabetes apresentam-se os aspetos teórico-práticos de maior importância aquando da avaliação neurológica e vascular do pé nas pessoas com diabetes. Posteriormente, apresentam-se as alterações no pé das pessoas com diabetes categorizadas em quatro grupos: deformidades ósseas, deformidades articulares, deformidades ungueais e deformidades tegumentares, expondo-se em
cada um deles as alterações mais frequentes e, também, sumárias considerações
sobre a sua influência no aumento do risco de ulceração no pé. Por fim, sendo
reconhecida a importância que o calçado apresenta no desenvolvimento de ulce-
and Complications Trial evidencia a importância do bom controlo metabólico na
prevenção da neuropatia e na redução da afetação neurológica.(2) A neuropatia
ração no pé das pessoas com diabetes, expõem-se de forma sistematizada os
aspetos que os enfermeiros devem considerar na sua avaliação, e por tal, se assumem como essenciais no aconselhamento de escolhas mais apropriadas.
Os enfermeiros representam um papel fundamental na gestão das doenças
crónicas, entre as quais se destaca a diabetes. Contudo, é indeclinável reconhecer que a responsabilização no autocuidado centra-se na pessoa com diabetes e na sua família.(12) Assim, os profissionais de saúde, em particular os
enfermeiros, são convocados a um papel ativo no desenvolvimento de ações
de educação e promoção da saúde, de forma a aumentar o nível de conhecimentos das pessoas com diabetes, promovendo a adesão ao regime terapêutico. Os enfermeiros devem investir, pois, no empoderamento da pessoa no
que respeita ao seu autocuidado, para que tome decisões adequadas a partir
da identificação das suas próprias necessidades, e que numa parceria consistente com o profissional de saúde delineie e implemente as melhores estratégias para a efetivação do controlo da diabetes.(12)
bilidade táctil, teste da sensibilidade térmica e avaliação da sudação no pé.(16)
Dada a variedade de exames para o diagnóstico da perda da sensibilidade protetora, constata-se que a opção por determinados testes difere de autor para
autor. Neste contexto, é importante referir que os testes quantitativos de avaliação da sensibilidade vibratória e da sensibilidade térmica são, normalmente, apenas realizados em centros especializados.(16)
Boulton et al. (2008) consideram que cinco exames simples, cada um com evidências conduzidas por estudos de coortes prospetivos, são considerados úteis
no diagnóstico da perda da sensibilidade protetora.(18) Assim, estes autores reconhecem que qualquer um dos seguintes testes – sensibilidade à pressão com
monofilamento de 10 gramas, sensibilidade vibratória com diapasão 128 hertz,
limiar da perceção vibratória com biotensiómetro, sensibilidade dolorosa com
picada ou reflexos aquilianos – possa ser utilizado na identificação da perda da
sensação protetora.(18) Idealmente, segundo estes autores, dois destes cinco testes devem ser, regularmente, realizados durante o rastreio do risco de lesão no
pé nas pessoas com diabetes.(18) Habitualmente, opta-se pelo exame da sensibilidade à pressão, com a aplicação do monofilamento de 10 gramas e por um
outro teste, sendo que, pelo menos, um dos testes com resultado anormal é indicativo de perda da sensação protetora.(18)
Segundo o International Working Group on the Diabetic Foot (2007), o diagnóstico de neuropatia assenta na avaliação da perceção da pressão, perceção da
vibração, discriminação (sensibilidade dolorosa), reflexos aquilianos e sensibilidade tátil.(19) Para Abbott, et al. (2002), os testes com pinos (sensibilidade dolorosa), cabo do diapasão (sensibilidade térmica ao frio), chumaço de algodão (sensibilidade tátil) e martelo de reflexos (reflexos aquilianos) não são recomendados
para o rastreio do risco de ulceração no pé nas pessoas com diabetes.(20)
Contudo, estes autores consideram que tais testes podem ser utilizados em sistemas de diagnóstico da neuropatia diabética.(20)
1.1. Perceção da pressão
O teste com a aplicação do monofilamento é um teste semi-quantitativo de avaliação da sensibilidade.(16) Pela aplicação do monofilamento de SemmesWeinstein avalia-se em simultâneo a sensibilidade táctil e a sensibilidade à pressão.(2) Pela aplicação do monofilamento mede-se a sensibilidade superficial.(21)
A sensação protetora pode ser avaliada pela resposta a estímulos de pressão
com monofilamentos de diversos calibres.(7) De forma a uniformizar, tanto quanto possível, os dados colhidos, fixou-se um calibre para o monofilamento de
5.07 (10 gramas).(7) O número 5,07 refere-se ao tamanho do monofilamento (o
diâmetro real é de 0,44) e 10 gramas relaciona-se com a força necessária para
o curvar, suavemente. A aplicação de mais do que 10 gramas de força não
aumenta, significativamente, a sensibilidade percebida pela pessoa. Os monofilamentos produzidos por Bailey e Owen Mumford são recomendados para
AVALIAÇÃO DO PÉ NA DIABETES
De acordo com o estudo desenvolvido por Oguejiofor, Oli e Odenigbo (2009)
verificou-se que em 96,4% dos participantes com neuropatia sintomática e 97,3%
dos participantes com neuropatia assintomática, os pés nunca tinham sido observados por profissionais de saúde.(13) De acordo com o mesmo estudo, constatouse que 31,3% dos participantes com neuropatia sintomática e 32,4% dos participantes com neuropatia assintomática nunca tinham sido informados acerca dos
cuidados com os pés.(13) A omissão da realização do exame do pé e da transmissão de informação sobre os cuidados com os pés foram verificadas no estudo de
De Berardis (2005): em mais de 50% dos participantes no estudo, os seus pés
nunca tinham sido observados por profissionais de saúde; e 28% dos participantes nunca tinham sido informados sobre os cuidados com os pés.(14)
A ulceração diabética decorre de alterações estruturais e funcionais do pé.(15) A
avaliação do pé nas pessoas com diabetes inclui o exame neurológico, exame
vascular, inspeção das deformidades do pé – ósseas, articulares, tegumentares
e ungueais – e avaliação do calçado. A avaliação do pé permite a determinação
do risco de ulceração do pé e, consequentemente, a averiguação da periodicidade da vigilância dos pés por profissionais de saúde.
AVALIAÇÃO NEUROLÓGICA DO PÉ NA DIABETES
Um fator importante no desenvolvimento de lesão no pé nas pessoas com diabetes é a neuropatia sensitiva, pois pode conduzir a traumatismo indolor e, consequente, ulceração.(5) A perda da sensibilidade é o principal fator preditivo do
desenvolvimento de lesão no pé.(16) O único tratamento disponível para a neuropatia diabética é o controlo metabólico rigoroso.(17) O estudo Diabetes Control
Revista Nursing; Edição outubro/novembro 2012; pág.8
periférica não pode ser diagnosticada apenas pela história clínica, pelo que é
obrigatório um exame cuidadoso do pé.(16) Porém, o exame clínico recomendado
é concebido para identificar a perda da sensação protetora ao invés de diagnosticar precocemente a neuropatia.(18) O exame clínico para avaliação da sensação
protetora é simples e não requer equipamentos dispendiosos.(18)
Na literatura são descritos vários testes para a avaliação neurológica do pé na
diabetes. De entre os testes mais citados apresenta-se o teste da sensibilidade
à pressão, teste da sensibilidade vibratória, teste do limiar de perceção vibratória, teste da sensibilidade dolorosa, teste dos reflexos aquilianos, teste da sensi-
OUTUBRO/NOVEMBRO.12
SUPLEMENTO I
utilização na prática clínica. Os monofilamentos North Coast Medical podem
ser utilizados mas a sua validade é alterada pelas condições ambientais, tais
como diferenças na humidade. Os monofilamentos Timesco e os Sensory
Testing Systems não foram considerados suficientemente precisos.(22)
O teste da perda de sensibilidade com o monofilamento 10 gramas está generalizado em todo o mundo.(18) Os monofilamentos de nylon são construídos de
forma a curvarem, quando uma força de 10 gramas é aplicada.(18) A perda da
capacidade de deteção da pressão, em um ou mais locais na superfície plantar,
tem sido associada a perda da função das grandes fibras nervosas.(18)
Muitos estudos prospetivos, incluindo o Seattle Diabetic Foot Study, têm confirmado que a perda da sensibilidade à pressão, diagnosticada pelo teste com o
monofilamento de 10 gramas, é altamente preditiva de ulceração.(18)
O monofilamento de Semmes-Weinstein apresenta vários problemas potenciais a considerar antes da sua utilização.(23) O teste com monofilamento é um
teste pouco objetivo, na medida em que a sua interpretação e validação
dependem da colaboração da pessoa, para além de poderem ser influenciadas pelo profissional examinador.(23)
O monofilamento deve ser adquirido num vendedor de instrumentos de calibração, pois existe uma considerável variação entre os diferentes tipos de monofilamentos disponíveis comercializados, sendo que alguns têm-se demonstrado
imprecisos.(22) Em acréscimo, será de considerar que as propriedades do material do monofilamento desgastam-se após testes repetidos. Yong et al. (2000)
descobriram que após 500 ciclos de testes havia uma redução média de 1,2 gramas na força de teste.(24) Booth e Young (2000) descobriram que alguns tipos
de monofilamento deformavam-se mais com uma força de 8 gramas do que 10
gramas para que eram concebidos.(22)
1
2
3
Figura 1 - Locais de teste com monofilamento. (16)
Figura 2 - Locais de teste com monofilamento. (7)
Figura 3 - Locais de teste com monofilamento. (18)
De acordo com o International Working Group on the Diabetic Foot (1999), não
há dados baseados em evidências descrevendo o número de aplicações e os
locais do pé onde o monofilamento deva ser aplicado.(16) Segundo o International
Working Group on the Diabetic Foot (1999) deve-se testar três locais na planta
do pé (figura 1).(16) De acordo com a mesma fonte, considera-se que a sensação
protetora está presente quando a pessoa responde corretamente a duas das
três aplicações: duas aplicações alternadas com, pelo menos, uma aplicação
simulada, na qual o monofilamento não é aplicado.(16)
De acordo com Pereira (2004), Sloan e Abel (1998) e Armstrong et al. (1998), o
teste da sensibilidade à pressão deve realizar-se em dez locais (figura 2) – nove
locais da planta do pé e um local no dorso do pé.(7; 25) Boulton et al. (2008) recomendam o teste de quatro locais – 1 , 3 e 5 cabeça metatarsiana e face plantar distal do hálux(18) (figura 3). Segundo estes autores, a incapacidade de sentir
o monofilamento de 10 gramas em pelo um dos quatro pontos testados é indicativa de neuropatia sensitiva.(18) O exame sensorial deve ser efetuado num
ambiente calmo e relaxado.(19)
9
Para a realização do teste de avaliação da perceção da pressão, a pessoa deve
estar em posição supina ou sentado(25) e não deve conseguir observar os pés.(19)
O monofilamento deve ser inicialmente aplicado na mão da pessoa, para que
conheça o tipo de estímulo a identificar.(16) Durante o teste não se deve perguntar à pessoa se sente ou não o estímulo, para não induzir a resposta.(17) Além
disso, deve-se variar o tempo entre as aplicações para que não se torne previsível o momento de identificação do estímulo.(25)
O tempo total de duração da aproximação, contacto com a pele e retirada do
monofilamento deve ser de, aproximadamente, dois segundos.(19) O monofilamento deve ser aplicado, suavemente, perpendicularmente à superfície da pele, e
pressionado contra a pele, de forma a fletir-se 60 graus(16) (figura 4).
A pessoa deve dizer quando sente a pressão e onde a sente (pé esquerdo/pé direito).(19) Se o monofilamento se mover durante o contacto com a pele, deve-se desconsiderar a resposta da pessoa ao estímulo e testar o mesmo local, novamente,
mais tarde.(17) No caso de existirem áreas ulceradas, necróticas, tecido cicatricial ou
hiperqueratose, deve-se testar o perímetro da anormalidade.(25) Após a realização
do teste, o monofilamento deve ser desinfetado com solução de hipoclorito de
sódio a 1:10 e conservado protegido, para que não se quebre.(17)
4
5
Figura 4 - Locais de teste com monofilamento. (15)
Figura 5 - Aplicação do diapasão. (16)
1.2. Perceção da vibração
Estudos prospetivos demonstraram que a diminuição na sensibilidade vibratória
é preditiva de ulceração.(16) Esses estudos utilizaram instrumentos eletrónicos portáteis para determinar de forma semi-quantitativa o limiar da perceção vibratória.
Infelizmente, estes instrumentos – biotensiómetro ou neurotensiómetro – são
muito dispendiosos.(16) O diapasão graduado de 128 Hertz pode ser utilizado,
como alternativa, para medir a sensibilidade vibratória de forma semi-quantitativa,
pela correlação que apresenta com o limiar da perceção vibratória.(16) O exame
com aplicação do diapasão mede a sensibilidade profunda.(21)
O exame sensorial deve ser realizado num ambiente calmo e relaxado.(19) A pessoa
não deve conseguir observar a aplicação do diapasão.(19) Previamente à realização
do exame do pé deve-se explicar à pessoa que se pretende identificar a vibração
(sensibilidade profunda) e não o toque (sensibilidade táctil) ou a temperatura (sensibilidade térmica), aquando da aplicação do diapasão.(16) O teste da sensibilidade vibratória deve ser ainda precedido pela aplicação do diapasão em vibração
no pulso da pessoa, para que reconheça o tipo de estímulo a identificar aquando
do exame ao pé.(16) O diapasão deve ser aplicado perpendicularmente à parte
óssea dorsal, na falange distal do hálux (figura 5) com uma pressão constante.(16)
De acordo com o International Working Group on the Diabetic Foot (1999), o diapasão deve ser aplicado duas vezes em vibração e uma vez parado, aleatoriamente.(16) A pessoa deve avisar quando o diapasão pára de vibrar.(26) Segundo o
International Working Group on the Diabetic Foot (1999), a pessoa diabética
demonstra sensibilidade vibratória quando responde corretamente a, pelo
menos, duas das três aplicações.(16)
De acordo com Boulton et al. (2008), uma resposta anormal no teste da sensibilidade vibratória pode ser considerada quando a pessoa diabética perde
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I SUPLEMENTO
a sensibilidade à vibração e o examinador ainda percebe a vibração.(18) Outra das formas de avaliação da sensibilidade vibratória, descrita na literatura, é a consideração
de que, na pessoa adulta normal, a vibração é percebida por 14 a 15 segundos, e de
que se perde em cerca de 1 segundo a cada década, após os 30 anos de idade.(26)
2. AVALIAÇÃO VASCULAR DO PÉ NA DIABETES
As alterações macrovasculares e microvasculares produzem isquemia dos tecidos e alterações na pele, que contribuem para o aparecimento de lesões.(5) A
doença arterial periférica é o fator causal, em cerca de um terço, das úlceras de
pé diabético e, muitas vezes, um fator de risco determinante na recorrência de
lesões.(18) As pessoas com diabetes devem ser avaliadas, quanto à presença de
doença vascular periférica, pelo menos uma vez por ano.(16) A avaliação deve
incluir a pesquisa de história de claudicação intermitente ou de dor isquémica
em repouso, bem como a pesquisa de outros sinais de isquemia crítica, e a palpação do pulso da artéria pediosa dorsal e da artéria tibial posterior.(16)
A isquemia crítica crónica é definida pela presença de um dos seguintes critérios: dor persistente, em repouso, requerendo analgesia regular por mais de
duas semanas, ou ulceração/gangrena dos dedos ou do pé, ambas associadas
a pressão sistólica no tornozelo inferior a 50 mmHg ou a pressão sistólica do
pododáctilo, geralmente do hálux, inferior a 30 mmHg.(16) Quando a isquemia progride, a dor ocorre em repouso, geralmente, no período noturno, relatada como
uma dor insuportável, que não cessa espontaneamente.(27) O alívio da dor pode
ser obtido pela manutenção dos membros inferiores em declive.(27) Os sintomas
de isquemia nos membros inferiores em pessoas com diabetes são, muitas
vezes, atípicos, dada a presença de neuropatia periférica.(28) Assim, em vez de
sentir dor típica na perna, a pessoa pode sentir as pernas cansadas ou apenas
incapacidade de caminhar a um ritmo normal.(28)
Na literatura são descritos vários testes para a avaliação vascular do pé na diabetes. De entre os exames mais citados destaca-se a palpação dos pulsos periféricos, o teste do tempo de preenchimento capilar e a determinação do índice
de pressão tornozelo/braço.
De acordo com Pereira (2004), o diagnóstico da doença vascular periférica
assenta na palpação do pulso pedioso dorsal, sendo o diagnóstico diferencial
realizado mediante o registo da onda de fluxo sanguíneo, com recurso a doppler,
e a determinação dos índices tensionais.(7)
Boulton et al. (2008) consideram que a doença arterial periférica pode ser diagnosticada pela ausência do pulso pedioso dorsal e do pulso tibial posterior, confirmando-se o diagnóstico pelo índice de pressão tornozelo-braço (IPTB) igual ou inferior
a 8.(18) O IPTB inferior a 0,5 ou uma pressão no tornozelo inferior a 50 mmHg é indicativo de alteração vascular grave.(25) O IPTB acima de 1,3 indica fraca compressão
das veias, resultante da rigidez da parede arterial, que nas pessoas com diabetes
se deve, normalmente, a arteriosclerose.(25) O exame vascular por ultra-sonografia
com doppler pode contribuir para a determinação do grau de isquemia.(25) A angiografia arterial apenas deve ser realizada quando se prevê a possibilidade de intervir
de forma invasiva no restabelecimento da circulação arterial.(28)
Serra et al. (2008) referem que o tempo de preenchimento capilar pode ser um
teste importante na confirmação da doença vascular periférica, quando os pulsos
não são palpáveis.(10) Se o pulso pedioso dorsal ou o pulso tibial posterior for palpável é, altamente, improvável a presença de isquemia significativa.(10) Contudo, a
American Diabetes Association recomenda a determinação do índice de pressão
tornozelo/braço nas pessoas com diabetes e idade superior a 50 anos.(29)
Outros testes, tais como a avaliação da pressão arterial sistólica digital ou a
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pressão de oxigénio transcutâneo podem ser utilizados no diagnóstico da doença arterial periférica.(19) Estes exames devem ser realizados, sobretudo, na presença de índice de pressão tornozelo/braço falsamente elevado (IPTB ≥ 1,3).(18
6
7
Figura 6 - Palpação pulso pedioso dorsal. (16)
Figura 7 - Palpação pulso tibial posterior. (16)
)
2.1. Palpação dos pulsos periféricos
O exame vascular deve incluir a palpação do pulso dorsal pedioso (figura 6)
e do pulso tibial posterior (figura 7) que devem ser caracterizados como presentes ou ausentes.(18)
Os pulsos devem ser palpados com muito cuidado, pois na presença de edema,
a palpação pode ser difícil. (10) Além disso, a palpação dos pulsos incorre numa
variação significativa inter-examinador.(10) Quando é duvidoso decidir se os pulsos
são ou não palpáveis, o teste do tempo de preenchimento capilar é considerado
um exame muito pertinente para o esclarecimento da condição vascular.(10)
2.2. Tempo de preenchimento capilar
O teste do tempo de preenchimento capilar efetua-se com a pessoa deitada,
elevando-se a perna entre 45 e 60 , até que o pé fique pálido,(10) durante
cerca de 20 segundos.(27) Posteriormente, solicita-se à pessoa que se sente
ou se levante, controlando-se o tempo que demora a ocorrer o preenchimento capilar (retorno à cor original).(10) Se o tempo de preenchimento capilar for
superior a 25 segundos, considera-se a presença de isquemia grave.(10) A
isquemia é confirmada pelo rubor de declive, que aparece de forma gradativa quando os capilares se tornam dilatados.(27) Quanto mais demorado for o
aparecimento do rubor, pior é o quadro isquémico.(27)
2.3. Índice de pressão tornozelo/braço
As pessoas diabéticas com manifestações clínicas de doença vascular ou ausência de pulsos periféricos devem ser submetidas à avaliação do índice de pressão tornozelo-braço.(26) O IPTB constitui um método fácil, objetivo e reprodutível
para o rastreio de doença arterial periférica,(26) que se realiza com um ecodoppler
manual e um transdutor de 8-10 mega-hertz (MHz)(28).
O IPTB é o resultado da divisão do valor da pressão arterial sistólica da perna
pelo valor da pressão arterial sistólica mais elevada dos braços.(28) Segundo as
recomendações do International Working Group on the Diabetic Foot e da
American Diabetes Association, o ponto de corte indicativo de isquemia é o
IPTB inferior a 9(26) (quadro 1).
Contudo, o IPTB pode ser enganoso, na pessoa diabética, pois a presença de
calcinose da média torna as artérias incompressíveis, o que se traduz em valores falsamente elevados ou em supra-pressões sistólicas no tornozelo.(18) O
IPTB entre 1,2 e 1,4 pode ser indicativo de falsa elevação por calcificação ou
shunts arteriovenosos.(26) O IPTB apresenta-se falsamente elevado pela calcificação das artérias, sendo que nessa situação a pessoa diabética deve ser encaminhada para um exame vascular mais detalhado.(25) Na presença de artérias incompressíveis da perna ou do tornozelo pode ser realizada a medição da pressão
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arterial sistólica digital (pressão do dedo do pé) ou pressão transcutânea de oxigénio.(18) Ainda neste contexto, será de considerar que um IPTB inferior a 0,5 ou
uma pressão no tornozelo inferior a 50 mmHg é indicador de circulação alterada, de forma grave, no pé.(28)
3. AVALIAÇÃO DAS DEFORMIDADES DO PÉ NA DIABETES
As deformidades estruturais e funcionais do pé alteram a biomecânica das extremidades inferiores e contribuem para o desenvolvimento de áreas de pressão
aumentada.(25) Deste modo, as deformidades do pé nas pessoas com diabetes
determinam um aumento do risco de ulceração.(25) Assim, no pé neuropático, o
stress repetido e moderado, entre 30 a 50 psi, pode causar lesão.(25)
3.1. Deformidades ósseas
A neuropatia – sensitiva e motora – contribui para o aparecimento de alterações nas estruturas ósseas, que conduzem ao desenvolvimento de deformidades nos pés.(7) Estas deformidades afetam a marcha e a distribuição
da pressão.(7) As deformações ósseas do pé, associadas à neuropatia diabética, mais frequentes, são os dedos em garra, dedos em martelo, dedos
sobrepostos, hálux valgo, pé cavo, pé plano, deformidades ósseas póscirúrgicas, deformidades ósseas do antepé e artropatia de Charcot.
3.2. Deformidades articulares
A hiperglicemia condiciona a glicação das proteínas nas articulações, tecidos
moles e pele.(32) As alterações de colagénio acometem precocemente os tendões, ligamentos e cartilagem do pé e tornozelo, induzindo a ocorrência de limitação da mobilidade.(32; 33) A limitação da mobilidade das articulações nas pessoas com diabetes aumenta a pressão na planta do pé, na medida em que o pé
não redistribui adequadamente a pressão, induzindo o aparecimento de úlceras
nas zonas de maior pressão, sobretudo na polpa dos dedos.(34; 25)
A amplitude de movimento da articulação tibiotársica, nas pessoas com diabetes,
apresenta-se diminuída, independentemente da presença ou ausência de neuropatia periférica.(33; 35) A rigidez da articulação metatarsofalângica é frequente nos
últimos quatro dedos do pé.(10) O hálux rígido é motivado pela rigidez da 1 articulação metatarsofalângica, com perda da dorsiflexão e ocorrência de uma maior
pressão na zona plantar do dedo e, consequentemente, com formação de calosidade. Ao mesmo tempo, a 1 cabeça metatarsiana torna-se proeminente, promovendo-se o atrito com o sapato.(7) A rigidez do hálux ocasiona, facilmente, úlcera
na face plantar da articulação interfalângica, junto do bordo medial do dedo.(10)
SUPLEMENTO I
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3.3. Deformidades tegumentares
A neuropatia – sensitiva e motora – apresenta-se, muitas vezes, associada a
danos das fibras do nervo autonómico.(36) No caso da extremidade inferior manifesta-se sob a forma de um transtorno sudoro-motor e/ou vaso-motor.(36) A desordem sudoro-motora ocasiona anidrose da pele, levando à formação de gretas e
fissuras e desordenamento neurovascular da perfusão microvascular. Estas alterações tornam-se fatores de risco para o desenvolvimento de úlceras no pé,
sobretudo aquando da ocorrência de traumatismo.(36)
Vários métodos para a identificação da perturbação da função autonómica no
membro inferior baseiam-se na medição da secreção de suor e no estudo da função microvascular periférica.(36) Com a pessoa deitada, observa-se o pé como
um todo e, sobretudo, a zona plantar e os espaços interdigitais.(10) Nas pessoas
com diabetes, as alterações da pele mais frequentes são as hiperqueratoses, fissuras cutâneas, formações bolhosas, micose interdigital e verrugas plantares,
bem como as úlceras e história de úlcera.
3.4. Deformidades ungueais e corte das unhas
As deformidades ungueais devem ser avaliadas, na medida em que se associam
a um aumento do risco ulcerativo e de infeção.(10) As alterações ungueais, mais
frequentes, no pé das pessoas com diabetes são o hematoma subungueal, onicólise traumática, onicomicose, onicogrifose, onicocriptose, paroníquia e o corte
inadequado das unhas. O corte das unhas é um aspeto de extrema importância
na prevenção de lesões no pé das pessoas com diabetes.(7)
As unhas devem ser limadas por segmentos, depois do banho ou após lavagem do
pé, e preferencialmente com lima de cartão.(7) O corte das unhas deve ser realizado
a direito e mantendo coberta a polpa dos dedos (figura 8). De forma a completar os
cuidados com as unhas, deve-se aplicar um verniz fortificante transparente.(7)
Figura 8 - Corte correcto/incorrecto das unhas. (16)
8
II. AVALIAÇÃO DO CALÇADO NA DIABETES
O calçado é a causa mais frequente da agressão nos pés em qualquer pessoa
e, nesse sentido, também é o principal fator causal de lesões no pé das pessoas
com diabetes, sobretudo, na zona mais frágil – o antepé (10) Deste modo, a avaliação do calçado é de extrema importância.(37)
O calçado adaptado às deformidades e alterações biomecânicas é essencial
para a prevenção de ulceração no pé.(16) As pessoas com diabetes sem perda da
sensibilidade podem escolher de entre os sapatos disponíveis no comércio.(16)
Um cuidado extra deve ser tomado pelas pessoas com diabetes com neuropatia e/ou vasculopatia, sobretudo quando apresentam deformidades do pé.(16) O
principal papel do calçado protetor é eliminar o calçado como fonte de patologia.(25) A combinação de um sapato de tamanho adequado e uma palmilha adaptada pode reduzir em 2% a pressão na planta e face lateral do pé.(25)
Um olhar crítico sobre o calçado foca diferentes zonas de risco conforme o tipo de
pé diabético: pé neuropático e pé isquémico.(10) A topografia das lesões no pé nas
pessoas diabéticas é diferente nos casos de neuropatia e de isquemia(10) (figura 9).
As úlceras neuropáticas ocorrem mais frequentemente na região plantar, em particular,
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Figura 9 - Tipologia das lesões no pé neuropático e no pé isquémico. (6)
nas zonas subjacentes a deformações ósseas.(19) As úlceras isquémicas e as neuroisquémicas são mais comuns nas extremidades dos dedos e na face lateral do pé.(19)
1. Dimensões do sapato
Um sapato cómodo deve respeitar a harmonia entre o comprimento e a largura
do pé ou, melhor, o perímetro do pé a diferentes níveis – tornozelo, região metatarsofalângica e dedos.(37) Um ponto importante comum ao pé neuropático e ao
pé neuroisquémico é o espaço para os dedos.(10) O extremo do sapato deve ter
1 cm mais que o dedo mais comprido e deve ser suficientemente alto e amplo
na ponta para impedir a lesão do dorso e da face lateral dos dedos, para além
de poder conter, eventualmente, uma palmilha de compensação às hiperpressões.(10) Por tal, na escolha dos sapatos é útil recortar a forma do pé numa folha,
que serve de molde na escolha dos sapatos(16) (figura 10). O calçado deve ser
experimentado com a pessoa em pé e, preferencialmente, no final do dia.(16)
2. Palmilhas
10
Figura 10 - Determinação das dimensões do calçado. (19)
O único objetivo das palmilhas é aumentar a superfície de contacto, de forma a
diminuir a agressão traumática gerada por uma hiperpressão plantar.(10) A inspeção
das marcas na palmilha velha ou no forro plantar do sapato antigo oferece informações importantes sobre as zonas de hiperpressão que importa compensar.(10)
3. Calcanhar, sola e tacão do sapato
O calcanhar do sapato deve ser firme para conter o pé sem deslizamentos laterais durante a marcha.(10) O sapato deve também ser flexível, e quando submetido a uma flexão antero-posterior deve dobrar-se transversalmente (não enrolar
ao nível das articulações metatarsofalângicas, para respeitar a elevação do pé,
durante a marcha)(37) Um contraforte resistente deve rodear a abertura do sapato para manter o calcanhar em posição fisiológica.(37) (figura 11).
A sua altura não deve ultrapassar a altura subtaliana.(37) O sapato deve apresentar estabilidade antero-posterior, pois um bom sapato deve estar montado
11
Figura 11 - Teste de retorcimento, teste de flexibilidade, avaliação
do equilibrio e estabilidade do calçado. (30)
sobre uma forma bem adaptada, que tenha em conta a relação entre a zona
média e a altura do tacão.(37) Neste caso, a superfície é máxima ao nível do calcanhar e da zona de apoio dos metatarsos.(37) Uma pressão de cima para baixo
na parte traseira de um sapato colocado sobre um plano duro não deve provocar a elevação da sola.(37) A sola deve ser resistente mas não demasiado rígida
para não se opor ao desenrolar do passo.(37) Segundo uma descrição da frente
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para trás, a sola deve ser composta, por uma ponta elevada, sobre um plano
duro; pelo enfuste sólido, ao nível da zona média, para evitar uma torção lateral
com o teste de retorcimento negativo (impossibilidade de torcer o sapato ao
nível da zona média); e por um tacão, que se for superior a 5 cm é antifisiológico.(37) Idealmente, a altura do tacão não deve ultrapassar 2 cm.(10)
4. Materiais na confeção do sapato
O material ideal para a composição do sapato é o couro, sobretudo para a primeira armação e para o cano, que requer um material que não apenas sustente, como
permita a flexão, além de favorecer a ventilação do sapato(37) (figura 12). As costuras ou juntas não devem coincidir com uma articulação ou uma proeminência
óssea.(37) O couro tem muitas qualidades mas é caro e desgasta-se rapidamente.(37) A sua utilização para o cano e a sola interior é, muitas vezes, suficiente.(37)
III. CONSIDERAÇÕES FINAIS
No contexto da prevenção das lesões do pé diabético, será de considerar que
as taxas de amputação podem ser francamente reduzidas através de estratégias
que incluam medidas de prevenção, tais como a educação da pessoa com diabetes, dos seus familiares e dos prestadores de cuidados, bem como a formação e mobilização dos profissionais de saúde. Assim, torna-se cada vez mais evidente que os enfermeiros por se assumirem como profissionais incondicionalmente e assumidamente disponíveis para a promoção efetiva da saúde, ocupam
um lugar de destaque e de responsabilidade na educação da pessoa com diabetes, privilegiando-se o seu empoderamento no autocuidado, bem como o da
sua família e do prestador de cuidados, e que a par da organização de cuidados
integrados e multidisciplinares, permitem reduzir o risco de desenvolvimento e a
progressão das lesões no pé. Deste modo, será de extrema importância reconhecer que a eficácia das linhas orientadoras para a prevenção e o tratamento dos
problemas do pé nas pessoas com diabetes depende inevitavelmente de uma
parceria efetiva entre clientes e profissionais de saúde.
Um importante aspeto na redução das amputações é, pois, a observação sistemática dos pés, nas consultas de vigilância de saúde das pessoas com diabetes.
O exame dos pés deve realizar-se, pelo menos, uma vez por ano e deve incluir o
exame neurológico (teste da sensibilidade à pressão e teste da sensibilidade, o
exame vascular (palpação dos pulsos pediosos e determinação do índice de pressão tornozelo/braço), a inspeção de deformidades (ósseas, articulares, ungueais
e tegumentares), fundamentada pela constatação de que a ulceração diabética
decorre de alterações estruturais e funcionais do pé e avaliação do calçado, que
ocupa um lugar de destaque entre os fatores precipitantes de lesão no pé. O
exame clínico desprovido de meios sofisticados de deteção da neuropatia e da
vasculopatia é considerado perfeitamente suficiente para a avaliação do risco de
lesão no pé.(10) Apesar do pé diabético se encontrar, diretamente, relacionado com
as lesões nervosas e alterações do aporte sanguíneo, muitos fatores externos
desencadeiam um conjunto de alterações que conduzem ao processo de ulceração nos membros inferiores.(38) Os fatores químicos que se encontram, mais frequentemente, na base do desenvolvimento de lesão no pé diabético, remetem
para a utilização de calicidas, pomadas e desinfetantes agressivos.(2) O traumatismo físico mais frequente é o causado pelo calor, em resultado de excessiva exposição solar, uso de botijas de água quente ou aproximação a lareiras e aquecedores.(2) A ausência de proteção contra o frio também constitui um fator precipitante
do desenvolvimento de lesão no pé diabético.(2) Os fatores mecânicos responsáveis pela ocorrência de lesão no pé diabético incluem as contusões e hiperpressões, que surgem em consequência da ausência de sensibilidade proprioceptiva,
OUTUBRO/NOVEMBRO.12
das deformações dos pés e do uso de calçado inadequado.(2)
Assim, é evidente a necessidade de reconhecimento de que a prevenção das
lesões através da observação periódica dos pés por enfermeiros e o tratamento
da patologia não ulcerada é menos dispendiosa que o tratamento de lesões que
frequentemente se caracterizam pela cronicidade. Por si só, o simples facto de
os profissionais de saúde se interessarem pelos pés das pessoas, responsabiliza-as, pois evidencia-se a necessidade de serem cuidados. Tal não acontece
com certeza de forma tão apelativa e efetiva se apenas referirmos que é importante observar os pés e atender aos cuidados de higiene e hidratação dos pés.
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