Cefaléias indometacino
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ARTIGO ORIGINAL Cefaléias indometacino-responsivas Indomethacin-responsive headaches Fabiano C. Tanuri,1 Mário F. P. Peres,1 Eliova Zukerman1 1 Médico neurologista Instituto de Ensino e Pesquisa do Hospital Israelita Albert Einstein RESUMO As cefaléias indometacino-responsivas são divididas em três grupos: Cefaléia Idiopática em Pontadas (“Jabs and Jolts Syndrome” ou “Idiopathic Sttabing Headache”); Cefaléias Trigêmino Autonômicas (Hemicrânia Contínua, Hemicrânia Paroxística Crônica e Episódica); Cefaléias Valsava-Induzida (Cefaléia benigna da tosse, Cefaléia benigna do esforço e Cefaléia benigna sexual). As cefaléias indometacino-responsivas podem ser primárias ou secundárias, necessitando algumas vezes de investigação apropriada. A melhora da dor com indometacina pode ocorrer com doses de 25 a 250 mg ao dia. Este trabalho revisa o histórico, nomenclatura, características clínicas, etiologia, mecanismos, epidemiologia, diagnóstico diferencial, prognóstico e tratamento das cefaléias indometacino-responsivas. KEY WORDS Hemicrania continua, chronical paroxysmal hemicrania, episodic paroxysmal hemicrania, indometacin, indomethacin-responsive headaches. PALAVRAS-CHAVE Hemicrânia contínua, hemicrânia paroxística crônica, hemicrânia paroxística episódica, indometacina, cefaléias indometacino-responsivas DADOS HISTÓRICOS E NOMENCLATURA ABSTRACT The indomethacin-responsive headaches can be divided into 3 groups: (1) idiopathic stabbing headache (“jabs and jolts syndrome”); (2) the trigemino-autonomic cephalgias (hemicrania continua chronic and episodic paroxysmal hemicrania); and (3) the valsalva-induced headaches (benign cough headache, benign exertional headache, and benign sexual headache). Indomethacinresponsive headaches can be primary or secondary. Appropriate investigation is necessary. We review the historical, nomenclature, clinical manifestation, etiology, epidemiology, differential diagnosis, prognosis and management of the indomethacin-responsive headaches. 48 INTRODUÇÃO As cefaléias indometacino-responsivas são aquelas melhoradas pela indometacina. Este tipo de cefaléia pode ser primária ou secundária, necessitando de investigação com exames complementares. Este estudo visa discutir os principais tipos de cefaléias indometacino-responsivas e o modo de ação da indometacina. A indometacina foi um medicamento introduzido em 1963. Trata-se de uma droga não esteroidal indoleacética, com propriedade antiinflamatória, antipirética e analgésica, sendo o único medicamento desta categoria com atividade antiinflamatória superior à aspirina. Tem sido utilizada em muitas patologias clínicas, como no ducto arterioso patente, artrite reumatóide, osteoartrite, espondilite anquilosante, gota, sendo também utilizada em oftalmologia nos casos de uveíte, inflamação no pós-operatório e em obstetrícia como tocolítico.1 A indometacina apresenta bons resultados em alguns tipos de cefaléias. As então chamadas cefaléias indometacino-responsivas são divididas em três grupos: 1) Cefaléia idiopática em pontadas (jabs and jolts syndrome ou idiopathic sttabing headache); Migrâneas cefaléias, v.7, n.2, p.48-54, abr./mai./jun. 2004 CEFALÉIAS INDOMETACINO-RESPONSIVAS 2) Cefaléias trigêmino autonômicas (hemicrânia contínua, hemicrânia paroxística crônica e episódica); 3) Cefaléias valsava-induzida, como a cefaléia benigna da tosse, cefaléia benigna do esforço e cefaléia benigna sexual. As cefaléias que respondem a indometacina também podem ocorrer em crianças.2 Moncada e Graff-Radford, em 1995, relataram oito pacientes que apresentavam dor facial e responderam a indometacina.3 Dodick et al, em 2000, estudaram pacientes com cefaléia hípnica com boa resposta ao uso de indometacina.4 Zukerman et al, em 2000, citam a resposta favorável em casos de hemicrânia paroxística crônica – tic, uma associação entre hemicrânia paroxística crônica e neuralgia do trigêmeo.5 Rozen, em 2000, relatou cefaléia crônica diária desde o início marcada por permanente alterações autonômicas associada a dor hemicrânia, com benefício após uso de indometacina.6 Alguns pacientes com cefaléia em salvas respondem à indometacina.7,8 Uma variante da cefaléia em salvas, a cefaléia em salvas valsalva-induzida, foi recentemente relatada, com resposta favorável à indometacina.9 Recentemente foram relatados três casos de pacientes com cefaléia tipo tensional crônica bilateral com resposta favorável à indometacina. A dose de 75mg de indometacina não trouxe benefícios em pacientes com enxaqueca.10,11 Sicuteri et al, em 1964, mostraram efeito favorável da indometacina com doses de 150 mg a 200 mg.12 QUADRO CLÍNICO As cefaléias trigêmino-autonômicas são caracterizadas por dor unilateral, associadas a alterações autonômicas. Todos os pacientes com dor estritamente unilateral deveriam ser submetidos a um teste com indometacina. Hemicrânia contínua A hemicrânia contínua é caracterizada por dor unilateral, contínua. A intensidade varia de moderada a forte, sem desaparecer completamente.13 As exacerbações da dor estão associadas a alterações autonômicas como, semiptose, miose, lacrimejamento e sudorese de face. Embora a dor não seja desencadeada por movimentos cervicais, é possível verificar pontos dolorosos no pescoço. Raramente associam-se sintomas como fotofobia, fonofobia e náuseas.14 Raramente a hemicrânia contínua tem uma história familiar de hemiplegia, sendo rara também a associação com aura.15,16 Alguns pacientes com hemicrânia contínua abusam do uso de medicação analgésica. Os pacientes com hemicrânia contínua respondem bem à ação terapêutica com indometacina, embora exista exceções. Alguns destes pacientes receberam somente a dose de 100 mg ao dia da droga, enquanto doses de até Migrâneas cefaléias, v.7, n.2, p.48-54, abr./mai./jun. 2004 250 mg ao dia devem ser utilizadas para excluir uma resposta à indometacina. A hemicrânia contínua predomina no sexo feminino (1,8:1 a 29:1). Existem três grupos: 1) Contínua desde o início; 2) Contínua transformada em episódica/remissiva; e 3) Episódica/remissiva. Este tipo de dor raramente tem uma causa definida, mas causas secundárias têm sido relatadas, como tumor mesenquimal, HIV e neoplasia de pulmão. Hemicrânias paroxísticas A hemicrânia paroxística crônica e a episódica são desordens caracterizadas por crises de dor forte, estritamente unilateral, que geralmente se localiza na região fronto-temporal, é de curta duração, 2 a 45 minutos. Pode ocorrer diversas vezes ao dia, de cinco a quarenta crises. Durante a dor aparecem alterações autonômicas, como hiperemia conjuntival, lacrimejamento, congestão nasal, rinorréia, ptose e edema palpebral, que são mais intensos do que na hemicrânia contínua.14 A hemicrânia paroxística crônica ocorre em mais de 70% dos casos, predomina no sexo feminino, na proporção de 7:3. As crises podem iniciar em qualquer idade, inclusive na infância, mas é mais freqüente seu início na terceira década. Aproximadamente 10% dos pacientes com hemicrânias paroxísticas relatam que o movimento do pescoço, particularmente a flexão, rotação ou ambos podem desencadear as crises. A hemicrânia paroxística episódica ocorre em surtos e intercalada de remissões. A hemicrânia paroxística crônica apresenta um período de crises diárias por mais de seis meses. Em 60% dos pacientes, a cefaléia é crônica desde o início. A forma episódica evolui para crônica em aproximadamente 20% dos casos. Durante a gestação as crises podem diminuir sua intensidade ou até desaparecer.17,18 Foram descritos alguns casos de hemicrânia paroxística crônica, secundários a lesão do seio cavernoso, adenomas pituitários e aneurismas. A hemicrânia paroxística crônica pode estar associada à cefaléia da tosse.19,20,21 Cefaléia valsava-induzida A cefaléia valsalva-induzida pode ser primária ou secundária. As formas primárias se dividem em cefaléia benigna da tosse, cefaléia benigna do esforço e cefaléia benigna sexual. Pascual et al, em 1996, estudaram 72 pacientes com cefaléias valsalva-induzida, e, destes, trinta (42%) apresentaram cefaléia induzida pela tosse, 28 (39%), por exercício físico, e 14 (19%), por atividade sexual. Dos casos estudados, 42% tinham uma patologia estrutural associada, como malformação de Arnold Chiari tipo I e hemorragia subaracnóide.22 A cefaléia da tosse pode ser primária ou secundária. Tem uma prevalência de 1% quando comparada com a 49 FABIANO C. TANURI E COLABORADORES população geral, é predominante no sexo masculino e tem início mais tardio que as outras cefaléias valsalva-induzidas. Atinge o pico de intensidade de dor rapidamente, em geral imediatamente e apresenta curta duração.14 Os casos de cefaléia da tosse secundários correspondem a lesões, muitas vezes na fossa posterior, sendo necessária a neuroimagem por ressonância magnética, como parte da avaliação para excluir estas lesões. Na forma primária da cefaléia por tosse, a resposta à indometacina pode ser dramática.23 A cefaléia benigna do esforço foi reconhecida primeiro por Hipócrates; muitas vezes é desencadeada por exercício físico intenso e prolongado, geralmente bilateral e pulsátil, podendo durar de cinco minutos a 24 horas. A indometacina é um tratamento efetivo e as doses variam de 25 mg a 150 mg. Recomenda-se tomar este medicamento previamente ao exercício. Outro tratamento útil é o tartarato de ergotamina ou a metisergida nas doses de 1mg a 2 mg tomado antes do exercício. A cefaléia benigna sexual afeta mais os homens que as mulheres e pode ocorrer em qualquer época da vida. A prevalência é de 1% quando comparada com a população geral. Os critérios diagnósticos, segundo a International Headache Society, classificam a cefaléia benigna sexual em três tipos: 1) Tipo peso; 2) Tipo explosiva; e 3) Tipo postural.14 A cefaléia do tipo peso localiza-se na cabeça e no pescoço, apresenta um aumento gradual da intensidade e está provavelmente relacionada com a contração excessiva da musculatura da cabeça e do pescoço. Pode ser prevenida ou aliviada pelo relaxamento destes grupos musculares. A cefaléia do tipo explosiva ocorre antes ou durante o orgasmo, sendo bilateral, de forte intensidade e muitas vezes pulsátil. A hemorragia subaracnóidea pode também ser provocada no ato sexual, devendo ser excluída por investigação apropriada. A cefaléia tipo postural do coito é decididamente incomum, assemelha-se à cefaléia pós-punção lombar, ocorre após o coito e pode desaparecer após diversas semanas. Este tipo de dor pode estar relacionado a uma fistula dural. A cefaléia idiopática em pontadas tem muitos outros nomes, como oftalmodínia periódica, jabs and jolts e cefaléia ice pick (do furador de gelo), entre outros.24,25,26 Este tipo de cefaléia é muito comum e apresenta uma prevalência de 30% quando comparada com a população geral.27 A dor na cefaléia idiopática em pontadas está geralmente localizada em áreas inervadas pelo primeiro ramo do nervo trigêmeo. A duração de cada episódio é extremamente curta, geralmente menos de dois segundos. A freqüência das crises é muito variável. Este tipo de dor, na maioria das vezes, é localizada na órbita, mas pode ser multifocal ou mudar de localização entre os episódios de dor.A cefaléia idiopática em pontadas é mais comum nas mulheres com proporção de 6,6:1 e, na maioria das vezes, inicia-se na meia idade ou mais tarde. 50 A cefaléia do tipo tensional, enxaqueca, cefaléia em salvas, hemicrânia paroxística crônica e arterite de células gigantes estão associadas à cefaléia em pontadas em 60% dos casos. Aproximadamente 15% dos pacientes apresentam uma forma crônica de cefaléia idiopática em pontadas, onde as crises ocorrem em mais de 80% dos dias. O exame físico geral, neurológico e oftalmológico, geralmente é normal.28 ETIOLOGIA Embora alguns casos de cefaléias indometacino-responsivas sejam secundárias, suas etiologias geralmente não são conhecidas. A etiologia da hemicrânia contínua é desconhecida. Têm sido relatados alguns casos secundários a tumor mesenquimal, HIV e neoplasia de pulmão. Pode também estar associada ao uso crônico de medicação analgésica, ou iniciar-se após um trauma de crânio.29 As lesões no seio cavernoso, ou próximas a ele, têm sido relatadas em casos de hemicrânia paroxística crônica secundária, sendo descrito recentemente um caso póstrauma.19,20,21,30 A etiologia das cefaléias valsalva-induzidas não é conhecida, especula-se que cefaléia da tosse possa ser conseqüência a uma dissociação da pressão liquórica cérebroespinhal.23 Esta hipótese tem sido feita devido a alguns casos de cefaléias por tosse serem secundárias a patologias na fossa posterior ou malformação de Arnold Chiari. A cefaléia por esforço físico ocorre provavelmente por distensão venosa aguda ou dilatação arterial, entretanto faltam evidências objetivas. A cefaléia benigna sexual apresenta diferentes mecanismos. A cefaléia do tipo peso está relacionada provavelmente a contração muscular excessiva. A de tipo explosiva pode estar relacionada com a liberação de óxido nítrico ou aumento na pressão arterial ou pressão intracraniana. A cefaléia tipo postural é rara e pode estar relacionada com fístula dural. MECANISMOS A indometacina é uma droga antiinflamatória não hormonal disponível desde 1963. Esta medicação inibe a ciclooxigenase, a prostaglandinase e a atividade de leucócitos. Possui propriedades antipirética, analgésica, antiinflamatória e diminui o fluxo sangüíneo cerebral, assim como a pressão do líquido céfalo-raquiano.1 A cefaléia é um efeito colateral bastante comum da indometacina, quando utilizada em pacientes não propensos a cefaléia. Dodick et al, em 1999, propuseram que esta droga possa ter um efeito na síntese do óxido nítrico e que a inibição do óxido nítrico possa ser efetivo nas síndromes Migrâneas cefaléias, v.7, n.2, p.48-54, abr./mai./jun. 2004 CEFALÉIAS INDOMETACINO-RESPONSIVAS cefaléias indometacino-responsiva.31 A indometacina também influencia na secreção de melatonina.32 Durante as crises de hemicrânia paroxística crônica, os níveis de VIP (vasoactive intestinal peptide) e CGRP (calcitonin gene-related peptíde) aumentam no sangue venoso jugular. O tratamento com indometacina faz estes níveis retornarem ao normal.33 O sumatriptano, apesar de inibir a secreção de neuropeptídeos inflamatórios, é geralmente ineficaz na hemicrânia paroxística crônica.34,35,36 O mecanismo exato de ação da indometacina no tratamento destas síndromes não é totalmente conhecido. A hemicrânia paroxística crônica, hemicrânia contínua, cefaléia da tosse e a cefaléia idiopática em pontadas, em geral, não são consideradas hereditárias, porém o aspecto genético não foi estudado sistematicamente nestas síndromes. Recentemente foi relatado o caso de um paciente que apresentava enxaqueca hemiplégica familial e hemicrânia contínua.15 Pouco se sabe sobre a interferência da gravidez nas cefaléias indometacino-responsivas. A hemicrânia paroxística crônica pode remitir durante a gravidez e somente retornar após o parto.37 EPIDEMIOLOGIA A hemicrânia paroxística crônica e a hemicrânia paroxística episódica são raras. Foram descritos aproximadamente 150 casos. A hemicrânia contínua é rara, o número de casos tem aumentado recentemente.38 Estudos epidemiológicos não referem a hemicrânia contínua na população em geral. Provavelmente muitos casos não são diagnosticados ou são diagnosticados erroneamente. A cefaléia por tosse, a cefaléia benigna por esforço físico, a cefaléia benigna sexual têm prevalência de 1% cada uma em relação à população geral.39 A cefaléia idiopática em pontadas tem prevalência de 2%, mas Sjaastad et al, em 1999, relataram a prevalência de 30% em relação a população geral e 60% dos pacientes apresentavam outros tipos de cefaléia associadas.39,27 DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL A hemicrânia contínua é uma das cefaléias crônicas diárias, podendo estar associada ao uso abusivo de medicação analgésica. Deve responder prontamente à indometacina, com doses variando de 25 mg a 250 mg por dia. As cefaléias rebote aos analgésicos provavelmente não respondem à indometacina, mas melhoram com a suspensão dos analgésicos de ação curta. Este tipo de cefaléia tipicamente revela uma história de crises intermitentes de enxaqueca, evoluindo para uma cefaléia diária, com o consumo progressivo de medicação analgésica. Todos os tipos de cefaléia crônica diária: enxaqueca transformada, cefaléia tipo tensional, a cefaléia nova e perMigrâneas cefaléias, v.7, n.2, p.48-54, abr./mai./jun. 2004 sistente e hemicrânia contínua podem ser estritamente unilaterais; entretanto, o único caminho para diferenciá-las é um estudo com indometacina. A hemicrânia contínua com aura visual foi recentemente relatada e a indometacina melhorou tanto a cefaléia como os sintomas visuais.40 A hemicrânia paroxística crônica apresenta similaridades com a cefaléia em salvas, ambas apresentam repetidas crises diárias de forte intensidade, unilaterais e acompanhadas de sintomas autonômicos. A cefaléia em salvas apresenta uma predominância para o sexo masculino e as crises duram de 15 a 180 minutos.14 A hemicrânia paroxística crônica ocorre 70% em mulheres. As crises duram de 2 a 45 minutos, são de curta duração, mas muito numerosas; a pronta resposta ao tratamento com indometacina é característica deste tipo de dor ao contrário, a indometacina é muito pouco efetiva na cefaléia em salvas. As lesões no seio cavernoso ou próximo, a ele podem determinar uma cefaléia de curta duração, assim na hemicrânia paroxística crônica deve ser realizada uma investigação rigorosa de uma causa secundária.28 O paciente que necessita de altas doses de indometacina para melhorar, acima de 150 mg por dia, também é suspeito de causas secundárias.21 A cefaléia em salvas e a hemicrânia paroxística crônica podem ocasionalmente co-existir com a neuralgia do trigêmeo (tic doloroso).5 A cefaléia da tosse pode ser iniciada também pela manobra de valsalva. Outros tipos de cefaléias, incluindo as enxaquecas, são transitoriamente pioradas pela manobra de valsalva. As lesões intracranianas, com efeito de massa e malformação de Arnold Chiari, podem ser responsáveis por cefaléia provocada por tosse. A cefaléia por exercício físico pode, às vezes, apresentar-se similar a hemorragia subaracnoídea; isto ocorre muitas vezes quando a cefaléia é relativamente forte e de início súbito (explosiva), como na cefaléia do ato sexual, próximo ao orgasmo. A cefaléia da hemorragia subaracnóidea tem duração maior, superior a uma hora e pode estar associada à rigidez de nuca e febre. É de forte intensidade e apresenta náuseas e vômitos por um período prolongado. A cefaléia idiopática em pontada pode ser confundida com uma outra neuralgia ou a uma cefaléia neuralgiforme de curta duração com hiperemia conjuntival e lacrimejamento (SUNCT). As dores neurálgicas e da cefaléia idiopática em pontadas têm duração similar, extremamente curta, geralmente menos de dois segundos. Entretanto, as neuralgias podem aparecer áreas de gatilho que provocam as crises, o que não ocorre na cefaléia idiopática em pontadas. As neuralgias respondem a carbamazepina, enquanto nas cefaléias idiopáticas em pontadas a resposta se dá à indometacina. 51 FABIANO C. TANURI E COLABORADORES SUNCT ocorre de uma a trezentas vezes ao dia, com crises durando de 15 a 120 segundos, mais longa que a cefaléia idiopática em pontadas, que sempre é menor que dez segundos e geralmente menor que dois segundos. A dor do SUNCT é de forte intensidade, geralmente frontotemporal e associada com alterações autonômicas, como semiptose, lacrimejamento ou rinorréia. Na cefaléia idiopática em pontadas não ocorrem estes sintomas. Ainda não existe tratamento efetivo conhecido para SUNCT.27,41 A literatura mostra que alguns pacientes com SUNCT responderam favoravelmente à gabapentina, lamotrigina e topiramato.42-51 DIAGNÓSTICO As cefaléias primárias são diagnosticadas pela história clínica. Algumas cefaléias indometacino-responsivas, como as hemicrânias paroxísticas e a hemicrânia contínua necessitam de um estudo com indometacina como um aspecto suplementar para o diagnóstico. Devido à raridade destas cefaléias e à possibilidade de serem secundárias, é apropriada a investigação com ressonância nuclear magnética de crânio com atenção ao seio cavernoso. Uma resposta imediata à indometacina na dose de 250 mg por dia ajuda a confirmar o diagnóstico. Delreux e cols, em 1989, relataram um caso de hemicrânia paroxística crônica associado a tumor de Pancoast, confirmada por Rx de tórax.52 A cefaléia por tosse, como algumas cefaléias, piora com a manobra de valsalva. Ocasionalmente é secundária a processos expansivos na fossa posterior, ou malformação crânio-cervical. A ressonância nuclear magnética, o exame de escolha. A cefaléia por esforço físico, quando o início é súbito e de forte intensidade, pode sugerir hemorragia meníngea, devido a aneurisma ou malformação arteriovenosa. A tomografia computadorizada do crânio (TC) pode detectar a hemorragia. O exame do líquor deve ser realizado nos casos em que há suspeita de hemorragia não revelada pela TC. A angiorressônancia magnética ou arteriografia digital é o próximo passo. A cefaléia idiopática em pontadas requer exames subsidiários, como VHS e biópsia da artéria temporal, quando se suspeita de arterite de células gigantes. PROGNÓSTICO E COMPLICAÇÕES Espada et al, em 1999, relataram oito pacientes com hemicrânia contínua, cinco homens e três mulheres com diagnóstico de hemicrânia contínua. Todos os pacientes estudados apresentaram melhora com indometacina. A medicação foi retirada com sucesso em três pacientes após três, sete e 15 meses respectivamente, permanecendo os mesmos sem cefaléia. 52 Três pacientes interromperam o tratamento devido a efeitos colaterais, com retorno da cefaléia. Destes, dois melhoraram parcialmente com aspirina.53 O prognóstico da hemicrânia paroxística crônica e da episódica é incerto. A episódica é caracterizada por remissão e recidiva, sendo mais rara que a crônica.54 A forma episódica pode evoluir para a forma crônica e ocasionalmente pode apresentar longos períodos de remissão.18 Em alguns casos a terapia com indometacina pode ser longa. A cefaléia benigna da tosse tem um prognóstico favorável, com aproximadamente 50% dos pacientes apresentando uma remissão espontânea em dois anos e mais de 80% ficam livres de cefaléia ou melhoram em até uma década.55,56 As cefaléias por tosse secundárias a uma causa estrutural, como malformação de Chiari, têm seu prognóstico dependente da causa secundária. O prognóstico da cefaléia idiopática em pontadas e da cefaléia benigna por esforço físico é altamente variável, mas os pacientes geralmente melhoram com medidas sintomáticas. As complicações são exclusivamente ou especialmente devido a efeitos colaterais da indometacina. Uma porcentagem significante de pacientes apresenta dificuldade de tolerar a droga, com efeitos colaterais, principalmente no trato gastrointestinal, como sangramento, perfuração, anorexia, náusea, vômito e diarréia. Pacientes em uso crônico de indometacina podem se beneficiar com o uso de medidas protetoras do trato gastrointestinal, como o uso de bloqueador –2 histamina e misoprostol. TRATAMENTO A hemicrânia contínua responde a doses de indometacina variando de 25 mg a 75 mg, três vezes ao dia; ocasionalmente foram usadas doses acima de 250 mg ao dia. Existem também relatos de pacientes que não responderam à indometacina.57 Outras drogas, além da indometacina, podem ser efetivas no tratamento da hemicrânia contínua, como o ibuprofeno e piroxicam beta-ciclodextrina. O rofecoxib, um inibidor da cox-2, foi relatado como efetivo na hemicrânia contínua.16 Recentemente, Rozen et al, em 2003, relataram que a melatonina, na dose de 6 mg a 12 mg ao dia, foi eficaz em cefaléias indometacino-responsivas em um paciente com diagnóstico de hemicrânia contínua e dois pacientes com cefaléia idiopática em pontadas.58 A melatonina apresenta uma estrutura molecular semelhante à indometacina, tende a ser mais tolerada e parece ser uma opção promissora.40 A hemicrânia paroxística crônica responde pronta e dramaticamente à indometacina nas doses de 25 mg a 50 mg, três vezes ao dia, geralmente em 48 horas. A ausência de uma resposta ou a necessidade de altas doses de indometacina, acima de 250mg ao dia, sugere causa secundária.21,57 Migrâneas cefaléias, v.7, n.2, p.48-54, abr./mai./jun. 2004 CEFALÉIAS INDOMETACINO-RESPONSIVAS Tabela 1 Cefaléias indometacino – responsivas 1. Insel P. Analgesics-antipyretics and antiinflammatory agents: drugs employed in the treatment of rheumatoid arthritis and gout. In: Gilman AG, Rall TW, Nies AS, Taylor P, editors. Goodman and Gilman’s the pharmacologic basis of therapeutics. New York: Pergamon Press, 1990, p.659-62. Cefaléias trigêmino-autonômicas • Hemicrânia contínua • Hemicrânia paroxística crônica • Hemicrânia paroxística episódica Cefaléia idiopática em pontadas • Jabs and Jolts Syndrome 2. Moorjani BI, Rothner AD. Indomethacin-responsive headaches in children and adolescents. Semin Pediatr Neurol 2001;8(1): 40-5. Cefaléias valsalva-induzida • Cefaléia benigna sexual • Cefaléia benigna do esforço • Cefaléia benigna da tosse 3. Moncada E, Graff-Radford SB. Benign indomethacin-responsive headaches presenting in the orofacial region: eight case reports. J Orofac Pain 1995;9(3):276-84. Tabela 2 Outras cefaléias com resposta moderada à indometacina • Cefaléia hípnica • Hemicrânia paroxística crônica –tic • Cefaléia em salvas crônica REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS • Dor facial • Hemicrânia associada com Sintomas autonômicos persistentes • Cefaléia tipo tensional Mathew, em 1981, descreveu o caso de um paciente com hemicrânia paroxística crônica que respondeu ao celecoxib, um inibidor da cox-2. O papel dos inibidores da cox-2 no tratamento das cefaléias indometacino-responsivas ainda é incerto.8 A cefaléia benigna da tosse geralmente responde a indometacina nas doses de 25 mg a 50 mg, três vezes ao dia.8 Terapias secundárias são consideradas, quando não existe resposta a indometacina, como naproxeno, metilergonovina, phenelzine ou diidroergotamina intravenosa.59,23 As crises de cefaléia idiopática em pontadas pouco freqüentes não exigem tratamento. Quando a dor é forte e freqüente, 65% dos pacientes apresentam melhora completa ou parcial com indometacina.57 A cefaléia benigna por esforço físico pode responder à suspensão do fator desencadeante, por exemplo, a interrupção da atividade sexual, caso uma crise esteja sendo iniciada. Este tipo de dor pode também diminuir conforme o indivíduo melhora o seu condicionamento físico. Indometacina na dose de 25 mg a 50 mg, ou tartarato de ergotamina na dose de 2 mg uma a duas horas antes do exercício físico ou sexo pode prevenir a crise. O propanolol, se tomado cronicamente, também pode prevenir a crise. Uma vez iniciado o ataque de dor e se houver fenômenos enxaquecosos associados, o sumatriptano 6 mg subcutâneo ou 20 mg nasal pode abortar a crise. Peres e Silberstein, em 2002, estudaram pacientes com diagnóstico de hemicrânia contínua que receberam rofecoxib ou celecoxib, e um terço destes pacientes apresentou melhora completa. Ainda não está claro se todas as cefaléias indometacino-responsivas podem responder a outros antiinflamatórios não esteróides, como os inibidores da ciclooxigenase-2.60 Migrâneas cefaléias, v.7, n.2, p.48-54, abr./mai./jun. 2004 4. Dodick DW, Jones JM, Capobianco DJ. Hypnic headache: another indomethacin-responsive headache syndrome? Headache 2000;40(10):830-5. 5. Zukerman E, Peres MF, Kaup AO, Monzillo PH, Costa AR. Chronic paroxysmal hemicrania-tic syndrome. Neurology 2000;54(7):1524-6. 6. Rozen TD. LASH: a syndrome of long-lasting autonomic symptoms with hemicrania (A new indomethacin- responsive headache). Headache 2000;40(6):483-6. 7. Geaney DP. Indomethacin-responsive episodic cluster headache. J Neurol Neurosurg Psychiatry 1983;46(9):860-1. 8. Mathew NT. Indomethacin responsive headache syndromes. Headache 1981;21:147-50. 9. Ko J, Rozen TD. Valsalva-induced cluster: a new subtype of cluster headache. Headache 2002 Apr;42(4):301-2. 10. Hannerz J. 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