LJlouo - Rede Paulista de Educação Patrimonial

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LJlouo - Rede Paulista de Educação Patrimonial
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SUMÁRIO
Editora C/ Arte (2007-2 a Reimpressão)
Editor: Fernando Pedro da Silva
Conselho Editorial: Antonio Eugênio de Salles Coelho
Eliana Regina de Freitas Outra
Lucia Gouvêa Pimentel
Marília Andrés Ribeiro
Marília Navais da Mata Machado
Otávio Soares Oulci
Regina Horta Ouarte
Revisao: Maria Lúcia Gonçalves Ribeiro
Ficha Catalográfica: Maria Holanda Vaz de Mello
Projeto Gráfico da Capa: Jorge Padilha
Ilustrações da Capa: "Tríptico" de Ana Amália, 19 97
INTRODUÇÃO
11
ARTE COMO CULTURA E EXPRESSÃO
13
1 - Cultura e ensino da arte
13
2 - A arte e a experiência segundo John Dewey
3 - Arte-educação pós-colonialista no Brasil: aprendizagem triangular
21
30
4 - Mário de Andrade e a arte-educação
(anexos: As escapatórias do amor e Pintura e assunto)
52
5 - Citação de imagens
65
6 - De Gauguin à América Latina
68
Projeto Gráfico do Miolo: Jefferson A. Vie ira
A ECOLOGIA DA DIVERSIDADE
Todos os direitos reservados. Proibida a reprodução, armazenamento
ou transmissão de partes deste livro, através de quaisquer meios, sem
prévia autorização por escrito.
Direiros exclusivos desta ediçã o:
Edit ora C/Arte
Av. Guarapari, 464
Cep 31560-300 - Belo Horizonte - MG
PABX: (31) 3491-2001
com. a [email protected]
B238t
Barbosa, Ana Mae, 1936Tópicos Utópicos/Ana Mae Barbosa.Belo Horizonte: C/Arte, 1998.
200p.: 33il. p&b - (Arte & Ensino)
ISBN: 978-85-87073-55-6
1. Arte - Estudo e ensino 2. Arte e educação.
COO: 707
CDU: 7.071.5
79
7 - A multiculturalidade de que se precisa no Terceiro Mundo
8 - A multiculturalidade e os Parâmetros Curriculares Nacionais de 97/98
9 - A multiculturalidade da arte e do museu
10 - Educação e meio ambiente
79
89
98
,
114
11 - Aprendendo a ver - Eileen Adams
126
O VISUAL E O VERBAL
137
12 - Leitura da imagem no vestibular
137
13 - A imagem verbalizada de Barbara Kruger
140
14 - A palavra imágica
143
15 - Além do visual-verbal. Oswald: um olhar multidisciplinar
147
ENTREVISTAS SOBRE MULHERES, ARTE E ENSINO
151
16 - Tuneu aprendendo com Tarsila
151
"-
17 - Yolanda Mohalyi
166
18 - Seonaid Robertson
169
UMA REFLEXÃO SOBRE A ARTE NA UNIVERSIDADE
19 5
Para Claudia Toni e Glaucia Amaral, pelos 15 anos de amizade sem pre fiel
e adequadamente resignificada, à med ida que se transformam nossas vidas.
To Mary! De ] ong and Pat 5tsbr who helped me to understand
thePosfeminis»: of the 90 s.
Para João Alexandre que se to rnou muito mais int eressante
e até mais feminista depois que se apose ntou .
Para minhas / me us amigas/ os que se to rna ram alunas / os de pós-graduação
e para @s alun@s que se to rna ram amig@s, em espe cial Lu cia Pimen te!
que me obrigou a publicar este livro.
APRESENTAÇÃO
o
segundo livro da Coleção ARTE & ENSINO - TÓPICOS UTÓ PICOS - traz o mais importante nome da arte-educação brasileira da arualidade. ANA MAE BARBOSA dispensa apresentação, pois, além da grande
produção de literatura na área, tem uma atu ação marcante junto aos órgãos
associativos nacionais e internacionais .
E ste volume é uma colet ânea de text os polêmicos publicados em várias épocas, principalmente quando Ana Mae esteve à frente da Direção do
Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo, e que despertam discu ssão e nova s buscas, como é do feitio da Coleção.
São textos esparsos no tempo de escrita, mas que se tornam presentes
no tempo deste livro. Algumas palavras tiveram que ser reco nduzidas ao
tempo passado. Outras já nasceram no presente. Mas todas estarão, certamente, no futuro das conversas entre o s arte -educadores e demais pessoa s
interessadas em percorrer os caminhos do conhecimento e da inovação fun damentada.
A va ried ad e dos temas e as linhas de abordagem v is a m se r
incentivadores e facilitadores de reflexões sobre teori a e prática do ensino de
arte. O agrupamento em blocos temáticos apenas formula um roteiro para
leitura, não representando uma seqüência obrigatória.
A Coleção ARTE & ENSINO contribui, com mais esta publicação,
para fom entar os diversos aspectos possíveis para discussão nessa área que,
por ser tão rica e diversificada, necessita conquistar seu espaço de maneira
contínua e cada vez mais competente.
i
Licia GOllvêa Pimentel
Coordenadora da Coleção
9
INTRODU ÇÃO
D ep ois da morte das uto pias esperanç o sas do mode rnismo, out ras
utopias, ago ra qua se em for ma de declaração de princíp ios, se impõem .
As utopias sem esperança de hoje, nesse fim de século, são uma trama
de ideologia e imaginação.
.
É destas utopias qu e tratam os tópicos desse livro.
O núcleo central é o respeito à diversidade: diver sidade dos código s
cultu rais; diversidad e biológica, gerando as exp ectativas de equilíbrio ecológico; diversidade de inter pretações e de leitur as da arte.
Este nucle amento na diversidade nutre-se do interesse pelas manifestações estéticas das mino rias e pela idé ia de arte como uma pr od ução qu e
deve ser estudada tendo- se em vista seu contexto cultura l.
Q uestiona-se o universalismo dos código s hegem ônicos que pr eside
os mu seus e elege- se a pluralidade como prin cípio articulador do conh ecime nto.
Respeitand o a pluralidade, experiências artísticas mu ltidisciplin ares são
analisadas e a liberd ade avaliativa na vida cultu ral é defendid a.
Relaçõe s entre o erudito e o popular; a teor ia e a prática; o verbal e o
visual; a e lite e as massas o rganizam o de sejo de mu da nça que transparece
nos textos.
O livro é uma homenagem aos colegas qu e trabalharam comigo no
fins dos anos 80 e inicio do s 90, e que comp artilh aram dos esforços em
direção à am pliação da capac idade de entendimento da arte por todas as
classes soc iais. Circunsc reve r a arte ao g ru po dos pouco s que pod em comprála é a atitude domin ant e e a morte do desejo na arte .
Na trilha das homen agen s, quase ao fim do livro, três entrevistas acerca de mulh eres artistas e/ou professora s comemoram: Tarsila, uma artis ta
que nunca ensinou mas que teve um aluno, um discípu lo direto qu e a enca ntou; Yolanda Mohaly, uma artista que explorou com seus alunos os mistério s
da abs tração e Seon aid Robertson, uma inglesa qu e, co nquistando, foi conquistad a por suas alunas brasileiras e pela " diferença".
11
Tópi cos Utó PICOS
Pretendemos que os diver sos textos, escrito s em diferentes tempos e
para diferentes lugares, se organizem de mod o a deixar transparente o desenho do fio que os une.
Agradeço a Luc ia Pimentel que co sturou comigo as relações entre os
textos, a Edwin Parra Rocco qu e pôs à minha disposiçã o Fábio Uliani para
ajudar, às tradutoras dos textos em inglês, a Jorge Padilh a e Sylmara Belotti, a
quem teria escolhido como filho s se m eu s filhos não os tivessem escolhido
para mim.
Finalmente meu muito o brigada a An a Amá lia, qu e tem toda minha
admiração por enfrentar corajosamente a di fícil pluralidade profissional de
artista e arte-educadora, e a Frederico, qu e interferiu na escolha do título
deste livro.
Ana Mae Barbosa
ARTE COMO CULTURA E EXPRESSÃO
Cultura e ensin o da arte *
E ducação para o de senvolvimento
de diferentes códigos culturais
A Educação poderia ser o ma is eficiente cam inh o para estimular a
con sciênc ia cultural do indivíduo, começando pelo reconhecimento e apreciação da cultura loc al. Co ntudo, a educação formal no Terceiro M undo ocidental foi completamente dominada p elos có digo s culturais euro p eus e, mais
recentemente, pelo código cultural norte-americano.
A cultura indí gena só é tolerada na escola sob a forma de folclo re, de
curiosidad e e de eso terismo ; sempre como um a cultur a de segu nda categoria. E m contrast e, foi a própria E ur opa que, na construç ão do ideal mo dernista das artes, chamou a atenção para o alto valor das o utras culturas do
lest e e do oe ste, através da apreciação das gravuras japonesas e das escu lturas
africanas. Desta forma, os art istas m odern os euro p eus fo ram os prim eiro s a
criar uma justificação a favo r do multicultur alism o, ap esar de analisar a cultura dos outro s sob seus próprios câno nes de valores. Somente no sécul o 20,
o s m ovimentos de descolonização e de liberação criaram a pos sibilidade política para que o s povos qu e tinham sido dominados recon hecessem sua própria cultur a e seus próprios valores.
Leitura cu ltural, identi dad e cultural,
ecologia cultural
A bu sca de identidade cultural passo u a ser um dos o bjetivo s do s
p aíses "recém-independentes", cu ja cultura tinh a sido , at é e n t ão,
institucionalmente definida pelos poderes centrais m etropolita nos e cuja his-
• Texto p roduzido por encomenda do Bureau Internacional de Edu cação da Un esco para emb asar a eis cussão do Congresso Internacional de Educa çã o, em Genebra, em 1992, qu e ab ord ou o tema Edu ca·
ção e Cultura.Tradu ção de Renata Santana.
12
13
Tópi cos Utópi cos
tó ria foi esc rita p elos coloni zad ores. Porém , a iden tidad e cultural não é um a
forma fixa ou con gelada, mas um p rocesso dinâmico, enri quecido através do
diálogo e tro cas com o utras cultu ras. N este sentido, a identidade c ultu ral
também é um p roblema para o mundo desenvolvido. Apesar disso, a preo cupação com o estímulo cultural através da educação tem sofrido um a di ferente abo rdagem nos mundos ind ustrializado s e em vias de de senvolvimen to,
revelan do diversos significados através de diferenças semân ticas. Enquan to
no Terceiro Mundo falamos sobre a necessidade de busca pela identidad e
cultural, os países industrializados falam sob re a leitura cultural e ecologia
cultural. Assim, no mundo industrializado, a qu estão cultural é centrada n o
fornecim ento d e informações glob ais e supe rficiais so bre diferentes campos
de co nheci mento (cultural literacy) e na ate nção equilibrada às diversas culturas de cada país (eco logia cultural). N o Terceiro Mundo, no entanto, a iden tidade cultural é o inte resse cen tral e significa necessi dade de ser cap az d e
reconh ecer a si próp rio, ou, finalm ent e, um a necessidad e básica de so b revivê ncia e de co nst rução d e sua própria realidade. Os três termos aos quais
no s referim os acima convergem em um ponto comum: a noç ão de diversidad e cultural. Sem a flexibilidade de enca rar a diversidad e cultural existente em
qualqu er país, não é possível tan to uma ide ntificação cultural como uma leitur a cultu ral global ou , ainda, um a cultu ra eco lógica.
Diversidade cultural: multiculturalismo,
pluriculturalidade e interculturalidade
Aqui, pa ra definir a diversidade cultural, nós temos que navegar novam ente através de u ma complexa red e d e te r mos. Alguns falam so b re
mu lticulturalisrno, outros sobre pluric ulturalidade, e temos ainda o termo
mais apropriado - inrerculruralidade. Enq uanto os termos "m ulticultu ral" e
" pluricultu ral" sign ificam a co existência e mútu o entendime nto de diferentes culturas na mesm a sociedade, e o termo "in rerculrural" significa a interação
ent re as diferentes culturas. Isto deveria ser o ob jetivo da educação int er essada no desenvolviment o cultural. Para alcança r tal objetivo, é n ecessário que a
educação fo rneça um conhecimento so bre a cultu ra loc al, a cultura de vá rios
grupos que caracterizam a nação e a cultur a d e ou tras naçõ es.
Arte corno cultura e ex pressão
baixas con tinuam a ser igno radas pelas instituições educacionais, mesmo pelos
qu e estão envo lvidos na educação destas classes. Nós ap rende mos co m Paulo Fr eire a rejeitar a seg regação cultural na educação. As décadas de luta para
salvar os opr imidos da igno rância so b re eles próp rios nos ensina ram qu e
um a educação libertária terá sucesso só quand o os pa rticipantes no pr ocesso
edu cacion al fo rem capazes de identificar seu ego cultu ral e se o rgulharem
dele . Isto não significa a defesa de gueto s cultur ais, nem de excluir a cultura
erudita das classes baixas. Todas as classes têm o direito de acess o aos códigos da cultura erudita por que esses são os códi gos do minantes - os códigos
do poder. É necessário con he cê-lo s, ser versad o neles, mas tais có digos continuarão a ser um co nheciment o exterior a não ser que o in divíduo tenha
dominad o as referências cultu rais da própria classe social, a po rta de entrada
p ara a assimilação do "outro". A mob ilidade social de pe nde da int er-relação
en tre os có digos culturais das diferente s classes sociais.
Intercult u ralid ad e: a cultu ra
do colon iz ad o r e do op rim id o
A diversidade cultural p resume o reco nh ecim ent o dos diferentes código s, classes, gru pos étnicos , crenças e sexos na nação, assim como o diálogo com o s diversos códigos culturais das várias naçõ es ou países , que incluem até me sm o a cultura dos primeiros colonizadores. Os movim entos nacionalistas radicai s, que pretenderam o fortalecimento da identidade cultural de
um país em isolamento, igno ram o fato de que o seu passado já havia sido
contaminado pelo contato com outras culturas e sua histór ia inte rpe ne trada
pela história dos coloni zadores. Por out ro lado, os colonizadores não podem
esq uecer que, histori cam ente, eles fo ram ob rigados a incorporar os co nceitos culturais que o oprimido prod uziu acerca daq ueles qu e os co loniza ram.
Interculturalid ade e cultura do "ou tro"
A demand a pa ra identifica ção - "isto é ser para um ou tro " - assegu ra
a represen tação do sujeito, di ferenciado do "outro" em "a lteridade" 1. "Identidade é ser para si mes mo e para o outro; conseqüentem ent e, a iden tidade é
encontrada entre no ssas diferenças." 2 A função das artes na formação da
Interculturalidade: alta e baixa cultura
1
N o que diz respeito à cultura local, pode-se co nstatar que apenas o
nível eru dito desta cultura é admitido na esco la. As culturas de classes sociais
14
HOMI, R. Bhabha. Remembering fanon: self, psycle and colonial condition. ln: KRUGER, Barbara e
MARIANI, Phil. (ed.) Remaking hislory. NewYork : Dia Foundation, 1989, p.139.
2 lbidem.
15
Tópicos UtÓPiCOS
Art e como cult ura e e.rp res s ôo
imagem da ide n tidade lhe co nfe re um papel característico dentre os co mplexos aspectos da cultura. Id entifi cação é semp re a produção de " uma imagem
de identi da de e tran sfo rm ação do sujeito ao assumir ou rejeitar aquela ima gem reconh ecida pelo outro" 3.
o papel da Arte no
desenvolvimento
cultural
Através das artes tem o s a representação simbólica do s traço s espirituais, materiais, intelectuais e emocionais qu e caracterizam a sociedade ou o
grupo social, seu mo do d e vida , seu siste ma de valores, suas tradiçõ es e cren ças. A ar te, co mo uma linguagem presentacional dos sentidos, tra nsmite signi ficad os que não pod em ser transmitidos através de nenhum outro tipo de
linguagem , tais co mo as linguagen s discur siva e científica.
N ão podemo s ente nder a cultura de um país sem co nhecer sua arte.
Sem conhece r as artes de uma socie dad e, só pode mo s ter conhecimento
par cial de sua cultura. Aq ueles qu e estão engajados na tarefa vital d e funda r a
iden tificação cultural não po dem alcançar um resultado significativo sem o
conhecimento das artes. Através da poesia, dos gestos, da imagem , as ar tes
falam aquilo que a história, a sociologia, a antropologia etc. não po dem dizer
porque elas usam outro s tip os de linguagem, a discursiva e a cien tífica, qu e
sozinhas não são capazes d e d ecodifi car nuances culturais. D en tre as artes, a
art e visual, tendo a imagem co mo matéria-prima, torna po ssível a visua lização
d e quem som os, onde estamos e como sentimo s. A art e na educação como
expressão pessoal e como cultura é um importante instrumento para a identificação cultural e o desenvolvim ent o. Através das art es é possível de senvolver a percepção e a imaginação, ap reender a realidade do meio ambiente,
de senvolver a capacidade crítica, pe rmitindo analisar a realidad e p erceb ida e
de senvolver a criatividade de maneira a mu dar a realidade que foi analisada.
"Relembrando Fan on " , eu diria que a arte cap acita um ho mem ou uma mulher a não ser um estranho em seu meio ambiente nem est rangeiro no seu
próprio país. Ela supera o estado de despersonalização, inserind o o indivíduo no lugar ao qual pert enc e.
3
Ibidem.
16
Arte-educação e a consci ên ci a
d e cidadania
Contudo, não é só incluindo arte no cur rículo que a mágica d e favorecer o crescime nto individual e o compor tamento de cidadão com o constr utor d e sua própria nação acontece. Além de rese r var um lugar para a arte no
currículo, o que está lon ge de ser realizado pelos E stados-m em bro s da Unesco,
é tam bém nec essário se preocupar como a arte é concebida e ensinada.
E m min ha expe riência, tenho visto as artes visuais sen do ensinadas
p rincipalmente co mo desenho geom étrico, ainda segu in do a tradição
positivista , ou a arte nas escolas sendo utilizada na comemoração de festas,
na produção de p resentes estere otipad os pa ra os dias das mães ou dos pais e,
na melhor da hipót eses, ape nas como livre expressão. A falta de p reparação
de pessoal para ensi nar artes é um problema crucial, levando -nos a confundi r im provisação com criativida de. A ane mia teórica domina a arte-educação,
que está fracassando na sua missão d e favorecer o con hecimento n as e sobre
artes visuais, organizado de forma a relacionar p rodução artística com ap reciação esté tica e in for ma ção his tóri ca. E sta in tegr ação co r resp o nde à
ep istemologia da arte . O conheciment o das ar tes tem lugar n a int erseção:
expe rime nta ção, d ecodificação e informação. N as artes visuais, estar apto a
prod uzir um a imagem e ser cap az de ler um a imagem são duas hab ilidades
int er-r elacion adas.
L eitura visual
Em no ssa vida diária, estam os ro deados po r imagen s impostas pela
m ídia, ven dendo produtos, idéias, co ncei tos, co mportamentos, slogans políticos etc. Co mo resultado de no ssa incap acidad e de ler essas imagens, nós
ap ren demos po r meio delas in con scientemen te. A edu cação dever ia p restar
atenção ao discurso visual. Ensinar a gram ática visual e sua sin taxe através da
arte e tornar as crianças conscientes da p rodução human a de alta qualid ad e é
um a forma de prepará-las para compreend er e avaliar todo o tipo de imagem, con scienti zando-as de que estão apre ndendo com estas imagens.
Um currículo que integre ativid ad es artís ticas, histórias das artes e
análise dos trabalhos artísticos levaria à satisfação das nece ssidades e interesses das crian ças, respeitando ao m esm o tempo os co nceitos da discip lina a
ser aprendida, seus valores, suas estrutu ras e sua específica contribuição à
cultura. D essa fo r ma , realizaríamos um equ ilíbrio entre as du as teor ias
17
T óp ícos UtÓp iCOS
curriculares dominan tes: aquela cen trada na criança e a centrada no conteúdo. E ste equilíb rio curricular começou a ser defendido no Reino Unido pel o
Basic Design Mooement dura nte os ano s 50, qu ando H arry Thubro n, V ictor
Pasmore, Rich ard H amilton, Richard Smith, Joe Tilson e E duardo Pao lozzi
d esenvolveram sua arte de ensin ar a arte . Eles associa ram atividades artísticas com o ensino dos princípios do desigll e informação científica sob re o ver,
tudo isso com ajuda da tecnologia. Seus alunos estudaram gramática visual ,
sua sintaxe e seu voca bulário, dominando elementos formais, tais co mo: ponto,
linh a, espaços positivo e negativo, divisão de áreas, cor, p ercep ção e ilusão,
sign os e sim ulação, tran sformação e p roj eção nas imagens produzidas pelos
arti stas e também pe los meios d e comunicação e publicidade. E les foram
acusa dos de racio nalismo, mas hoje, após qu ase 70 anos de arte-e ducação
exp ressio nista nas escolas do mundo ind ustrializado, chega mos à co nclusão
d e que a livre-exp ressão não é uma preparação suficie nte p ara o entendimento da arte.
Apreci ação d a Ar t e e des envolvimento
d a criatividade
Apreciar, edu car os sen tido s e avaliar a qu alidade das imagens produzidas p elos artistas é um a ampliação necessária à livre-expressão, de mane ira
a po ssib ilitar o de senvolvimento con tínuo daqu eles que, de p ois d e deixar a
escola, não se tornarão prod utores de ar te. Através d a apreciação e da
decodificação de trabalhos artísticos, des envolvemos fluência, flexibilidade,
elaboração e originalidade - os p rocesso s básicos da criatividad e. Além disso, a educação da ap reciação é fund ament al para o desenvolvim ento cultural
de um país. E ste desenvolvimento só acont ece quando uma p ro dução artística de alta qua lidade é associada a um alto grau de entendimento desta produ ção p elo público.
Ar te -educação preparan d o o público
p ara a Ar te
U ma das funções da arte-educação é fazer a me diação entre a arte e o
pú blico. Museus e centros cultur ais deveriam ser os líderes na pr eparação do
público para o entendim ento do trabalho artístico. E nt retanto, p ou co s museu s e centros culturais fazem esforço para facilitar a apreciação da arte . As
visitas guiadas são tão entendiantes, que a viagem de ida e volta aos museus é,
18
Art e co mo cultu ra e c xpre ss õo
d e lon ge, mais significativa para a crian ça. Mas é import ant e en fatiz ar que o s
museu s e centro s cultu rais são uma con tribuição insubstituível pa ra amenizar a idéia de inacessibilidade do trabalho artís tico e o sentime nto de ign orância do visitant e. Aqu eles qu e não têm educação escolar têm medo de entrar no museu. E les não se sent em suficientes conhecedor es para penetrar
nos " templo s da cultura" . É ho ra do s m us eus aba ndon arem seu comportam ento sacralizado e assumirem sua parceria com escolas, p orque soment e as
escolas podem dar aos alunos de classe pobre a ocasi~o e au to -segurança
para en trar em um museu. Os museus são lugares p ara a educação con creta
sobre a herança cultural que d everia p ertencer a to dos, não soment e a uma
classe econó mic a e social privilegiada. O s museus são luga res ideais para o
cont ato com padrões de avaliação da arte através da sua h istória, que prepara
um co nsumidor d e arte crítico não só para a arte de ontem e de ho je, mas
também p ara as manifestaçõ es artísti cas do futuro.
O conhe cime n to da relatividade dos padrões da avaliação dos tem p os
to rn a o in divíduo flexível p ara criar padrõ es apro priados p ara o julgam ento
daquilo que ele ainda não conhece. Tal educação, cap az de de senvolver a
auto -exp ressão, apreciação, de codificação e avaliação dos trabalhos p roduzidos por outros, assoc iados à contextualização históric a, é n ecessária não só
para o crescimento individu al e enriqueciment o da nação, mas tamb ém é um
instru mento p ara a profi ssionalização.
Ar te p ara o d ese nvolvim ento p rofiss ional
Um grande .número de trab alhos e pro fissões estão direta ou indire tament e relacionados à arte comercial e de propaganda , outdo ors, cinema, vídeo,
à publicação de livro s e revistas, à pro dução ele discos, fitas e CDs, a som e
cenários para a televisão, e todos os cam pos do desigl1 para a moda e indústria
têxtil, design grá fico, de co ração etc. Não posso conce ber um bom designer
gráfico que não possua algum as info rmações de história da art e, co m o, p or
exempl o, o conh ecime nto sob re a Bauh aus. N ão só designers gráfico s, mas
mu itos out ro s profiss io nais similares poderiam ser ma is eficient es se conh ecessem , fizessem art e e tivessem dese nvolvido sua capacidade analítica através da int erp retação dos trabalho s artísticos em seu contexto histó rico. To mei conhecimen to de uma p esquisa que co nstatou que os camera III e11 da televisão são mais eficient es qu and o têm algum contato sistemático com apreciação da arte. A interpr etação de ob ras de arte e a in for mação histórica são
inseparáveis; sendo uma a abordagem dia cr ónica h orizontal do objeto e a
19
TÓpicos Utópico s
Arte como cult uro e e xp rc ss õo
o ut ra sua projeção sincr óni ca ver tical. A interseção dessas d uas linhas de
investigação pr oduzirá um entendimento crítico de como os conceitos formais, visuais e so ciais aparecem na art e, como eles têm sido percebidos,
red efinidos, red esi gn ados, distorcid o s, descartado s, r eapropriados,
reformulados, justific ado s e criticados em seus processo s constr utivos. E ssa
abo rdag em de ens ino ilumina a pr ática da arte, me smo quando esta pr ática é
m eramente cat árti ca,
A arte e a experiência segun do Joh n D ew ey "
Arte pa ra o desenvol vim ento
emoci onal e afe tivo
Aqueles que defe ndem a arte na escola meramente para libertar a
emoçã o devem lembrar que podemos ap render muito pouco sob re no ssas
emo çõ es se não fo rm os cap aze s de refletir sob re elas. N a ed ucação , o subjetivo, a vida interior e a vida emocional devem progredir, m as não ao acaso. Se
a arte não é tratada como um conhecimento, mas somente co m o um "grito
da alma", não estam os oferecendo nem educação cognitiva, n em educação
emocio nal. Word sworth disse: "A art e tem que v er com emo ção, mas não tão
profundamente para nos reduzirmos a lágrimas."
o
conceito de experiência articula tod a a obra filosófic a de Dewey,
um conceito identificado com a existência individual e social.
É a qualidad e est ética qu e unific a a exp eriência enquanto reflexão . A
qu alidade estética de um a experiência de qu alquer natureza é a culminação
de um processo.
O pensamento de J ohn D ewey acerca das relações entre arte e experiên cia se manifesta ao lo ngo de sua obra, mas torna-se mais co nclusivo nos
escritos "Individualidad e e experiência de 1900" e "Pensamento e experiência" , em D emocracia e Educação, de 191 6, e .Art nature and exp eriente, de 1925.
Finalmente, a consumação de sua exp eriência reflexiva sob re o assunto eclode
no livro A'1 as experieuce, que se tornou , a partir de sua publicação, em 1933,
um desa fio para os arte -educador es.
Alguns teóri cos como Herbert Read e Benedetto Croce criticaram
est e livr o por excitar o pensamento sem apo ntar, entretanto, as soluções
m etodológicas para o ens ino da ar te. E sta, entretanto, é a funç ão que vem
sen do desempenhada por vário s intérpretes da ob ra de D ewey, através dos
mais de 60 anos que se passaram de sde sua publicação.
É. o conceito de exp eriência conjunta e intercornunicante como forma
de vida q ue define a democracia par a ele, assim como é conceito de experiência indi vidual qu e defin e a intenção consciente. E xp eriên cia, para D ewey, é a
int eração da criatura viva com as condi çõ es que a rodeiam. Aspectos e elem entos do eu e do mundo qualificam a expe riência com emoções e idéias.
Contudo, a exp eriênci a gráv ida de conhecim ento é exp eriên cia co mpleta.
Uma experiência incompleta nada sign ifica. As experiências incompletas alienam e confundem o univer so de sign ificados vitais do ser humano.
Nos anos 50, os trabalhos de E dwin Z iegfeld e de Belle Boas tentaram decodificar na pr ática os pressupo stos reflexivos de Art as experience. Na
• Art igo publicado no Anuário de Inovações em Comunicações e Artes, 1991 .
20
21
T ó pk o s UtÓpi COS
década de 60 foi a vez de ]une McFee, de K atherine D ewey e de Irving
K aufman escreverem sub stanciosos artigos int erpretando as idéias de D ewey,
o u estenderem suas idéias em direção à an tropologia. Os anos 70 for am mais
pródigos, e, dentre um a alen tada lista de intér pre tes de D ewey para a arteed ucação, tivemos Arthur Efland, E llio t E isner, G raeme Chalmers, L arry
Kanrner, Ralph Smith etc .
A déc ada de 80 foi buscar em Art as experience o pr incípio reformulador
do ensino da art e dit o pós-moderno, que confere à apreciação ênfase equilib rada com o fazer. Br oudy foi o artífice deste novo entendimento da o bra de
John D ewey, popularizad o e excessivamen te sistem atizado nos E stados Unidos p elo projeto da Getty Foundation.
Conhecer signific a ter um a experiência e não apenas ter exp eriência.
Uma experiência compl eta é tão íntegra que sua con clusão é uma consumação e não uma cessação. Consumação é a conclusão significativa impregnada
pela apreciação pe rvasiva que penetra o to do da experiência.
A experiência, seja qu al for o seu material (ciência, arte, filosofi a e
matemá tica), para ser uma exp eriência, pre cisa ter qualid ade estética. É a
quali dade estética que unifica a experi ência enquanto refle xão e emoção.
Qualidade estética resu lta da consu mação apreciada e difere da quali dade artística , que é específica, de mat eriais específicos, enquanto a qualidade
est ética é conatu ral a todos os materiais que cercam os ritm os constantes da
vida. Q ualidade estética não é ap enas o reconhecimento de scolo rido e frio
daquilo qu e foi feito, mas uma condição receptiva interna, que é a válvula
propulsora de futuras experiências. A qualidade estética de um a experiência
de qualquer natureza é a culminação de um processo.
A exp eriência pode ser da nosa para o mu ndo e sua culminância indesejável, mas pode possuir uma qualidade estética. Por exemplo, um médico
operando um paciente de um caso inédito e complicado, p ondo para funcionar todo o seu conhecimento acumulado, organizando-o em funç ão da situação nova, p ode che gar à conclusão de uma expericncia com qu alidade e st érica, embora o p aciente morra.
Arte como cultura e e xpre ss óo
será a experiência. Impregnada po r musgo, ba rro, outras pedras, capim e
flores do caminho, a culm inâ ncia e qualidade estética da experiência será a
integração do que ela trouxe consigo ao lo ngo do processo, co nstituindo-se
uma unidade enriquecida em relação à unidade que iniciou a descida.
Dewey lemb ra que "os inimigos do estético não são nem o pr ático
nem o intelectual, mas a lassidão dos fins indefinidos, a submis são à co nvenção no s p rocedim entos práticos e intelectuais".
Toda experiência é uma experiência estética se a experiência só cessa quando cada momento foi explorado. O encerramento do circuito de energia é o
oposto da suspensão, da stasis, é po rtanto a culmin ância da ação. E sta culminâ ncia, a sensação de completação, deflagra a energia apreciativa e a emoção.
A qualidade estética é p ervasiva, e, embor a atinja seu ponto máximo
no está gio da completação da exp eriência, ela permeia todo o pr oce sso contínuo de pro dução e percepção qu e regula a experiência . Co nh ecim ent o e
reconhecimento; con strução e reconstr ução ; produção e p ercepção da produ ção corporific am a experiência que tem a qualidade estética como elem ento unificador.
A qualidade estética é a ap reciação consum ató ria difusa que pe netra
toda a experiência, to rn ando-a significativa para () indivíduo. " O esté tico não
pode se r separado de mo do taxativo da experiência int elec tu al, já que esta
deverá ap resent ar cunho estético a fim de ser comp leta" (Dewey) e ser co mpleta para ser significativa.
O <'l ue difere a expe riência est ética da art e da experiência esté tica de
outra natu reza é o material. O ma terial das artes consiste em "q ualidades"; o
da expe riência intelectual não' possui qualidade própria int rínseca, mas são
signos e símbolos que subs tituem o utras coisas que podem em outra experiência ser exp erim entados qualitativamente.
Tod a ativid ade prática adquirirá qualidade estética sem pr e que seja
int eg rada e se mova por seus p róp rios ditames em direç ão à culmin ância.
1\ expe riência artística, o fazer artístico, o trabalho com materiais da
Art e, é fundamental, segundo D ewey, para desenvolver as capacidades de
pr odução - apreciação q ue constitui a experiência signific ativa em qu alque r
áre a. Segundo Dewey, " A arte une mais que expe riência s de outr a natureza.
As relações de fazer e padecer, e a energia de ida e vind a que faz com que
uma experiência seja uma experiênc ia".
D ewey usa em A rt as experieuce a idéia da experiência de uma pedra que
rola de cim a de um a montan ha. O objerivo da pedra é chegar embaixo. A
pedra teria uma experiência - resultado da cu lmin ância de um movimento
contínuo. Quanto mais a pedra revelar do seu cam inho , mais sign ificativa
A experiência ar tística é mais ins tan taneamente unificável do ponto
de vista intelectual em oci o nal e prático. Uma destas propriedades poderá vir
a ser mais dominante que a o utra de modo a caracteri zar a experiência como
um tod o, m as suas inter- re laçôes são facilmente verificáveis e apreciáveis.
22
23
T ópi cos Utópi cos
Na experiência do pensamento, só quando extr aímos um a solução é
que as premissas surgem. Portanto é a soluç ão que torna manife stas as premissas . A conclusão não é alvo separado e independente, mas a consumação
de um movimento tanto nas artes como no pensamento. Entretanto, dada
sua materialidade, o processo é mais facilmente verific ável nas artes.
Numa obra de arte', diferentes aros, episódi os, aco nte cimentos se m esclam materialmente e fundem-se numa unidade, em bor a as part es não desapareçam nem percam seu caráter próprio quando isto sucede. É no campo
das artes que o processo da experiência signific at iva se torna mais evident e
para o ser cognoscente. Nas artes, se revela pela obs ervação, pe rce pção e
verificação direta quando a experiência po ssui um a unid ade. A existência
desta un idade está constituída por um a qu alidade única (qualida de estéti ca)
que pene tra roda a experiência, ape sar da diferença de suas parte s con stitutivas.
O artista incorpora a si próprio a atitude daquilo que percebe enqu anto
trabalha. O fazer é artístico quando o resultado percebido é de tal natureza que
suas qualidades, enquanto percebidas , controlam a produção. O processo de
arte na produção está organicamente ligado com a estética da apreciação.
E sta o rganicidade é o ideal perseguid o nas outras áreas de conh ecimento e pen samento. A a rt e na educação é, portanto, essenci al p ar a
potenciali zar a operacionalida de da experiênci a significativa em outras áreas.
Por Outro lado, nas artes, o fazer chega ao fim qu and o o res ultad o é
co nsiderado bom e a este julgament o se ch ega não por juízo int electual.
E mb ora a percepção direta não seja preponderant e na exp eriência de p en samento, é-lhe con atural, porque a qualidade est ética de qu alqu er experiência
(in clusive a de p ensamento) de qualquer natureza depende mais da p ercepção direta que do juízo intelectual, uma vez que se revela por aquela sens ação
de completação de que se explorou ao máximo todas as possibilidades , como
no caso do m édico que fez uma belíssima operação embo ra o doente tenh a
morrido.
N o Brasil, as idéias de John Dewey sobre arte e exp eriênci a for am
pacientes de diferentes tratamentos epistemológicos.
A idéia de integração da experiência se inter-relacion ou com a idéia de
desenvolvimento da individualidade, através da inte gração orgânica com o
meio am biente , no caso da primeira tese defendida no Brasil sobre John
D ewey. Tr ata-se da tese de N ereo Sampaio (1929) 1.
Arte com o cultura e expressóo
N esta tese, o autor defend e as idéias de arte como pensamento visual
reflexivo, reveland o g rande influ ência do capítulo "Pensamento e experiência" do livro Educarão esociedade. (1898). Fundamentado em citações de Dewey,
Sampaio defende a idéia de ap reciação e gozo estético da natureza como
base para o desenvolvimento da capacidade de desenhar.
sobre a função
da arte na
educação
dada a
importância da
estética na
experiência
intelectual
Na realidade, D ewey pro p õe não só em Educação e sociedade, ma s tam bém em M eu credo pedagógico, a expe riência com o mundo fenomênico p ara
excitar a con sciência acerca da repr esent ação imagética. Chega mesmo a de screver uma aula e reproduzir desenh o s de crianças realizados pelo método
de obs ervação no livro EduCClrão e sociedade. É bem explicito, mo str and o desenh os considerado s espo ntâ neos de um a árvo re feitos por um a crian ça. Critica-os do ponto de vista da impropriedade da relação com o objeto e mo str a
desenhos da mesm a criança depois qu e foi levada a comparar seu desenho
espontâ neo com um a árvore no parque.
~ "'..:
'
Desenho considerado
pobre
Desenho da mesma crianç a
dep ois de obse rva r as
árv ores
, Anísio Teixeira defendeu tese sobre Dewey, mas não no Brasil, e sim no Teachers Colleg e, da Columbia
University (USA).
24
25
T60 1( OS Ut óp icos
A tese de N creo Sampaio dem o nstra uma pesquisa feita co m crianças
de 6 a 10 anos qu e, levadas a obs ervar o corpo humano, passando a m ão no
contorno da figura uns dos outro s, são capazes de artic ular melhor a represen tação da figura human a.
N ereo Samp aio se baseou em trabalhos de D ewey nos qu ais o co nceito de apreciação e de co n suma ção da experiência ainda não estava muito
bem exp licitado. O D ewey de Nereo Sampaio é aind a naturalista e ro m ân tico. D uas outrasexperiências, as da Es cola N ova - Refo rma Carn eiro Leão,
em Pernambuco, e a de Ar tus Perrelet, em Minas G erais - o pe racionalizavam
m ais dir etamente estes co nceitos de ap reciação e de consuma ção.'
A experiência de Pernambuco (feita por pro fesso res paulistas) int erpr etou o conceito de qualidade est ética e consum ação da experi ên cia através
da prática da Art e co m o expressão de aula. Nã o foi nada origina l esta
misinterpretation de John Dewey. As progressives scbools, nos E stad o s Unidos , já
haviam ado tado anos antes esta int erpretaçã o.
Co m o John D ewey fala da qualidade estética co m o consum ação da
exp eriência, os educadores interpretam literalmente o co nceito, exigindo qu e
cada aula terminasse com um desenho, ou dramatização, ou pin tu ra ou cerâm ica, etc. Co nsuma ção fo i entendida co mo rerrn inalidade.
H á um livr o, Escola N ova em Pernambuco (de J. Scaramelli), que traz um
verd adeiro relató rio das muitas aulas "Dewianas" nas quais se ensi na so bre a
vida dos peixes: se dissecam os peixes e por fim se desenham os p eixes. Ou,
ent ão, colhem-se folhas, aprend em-s e suas pa rt es e funçõ es e, p o r último,
desenham-se as folhas. É uma verdadeira int oxicação temá tica que se preten dia pro voc ar no aluno. Arte era ape nas o ponto final da intoxicação.
J á Ar tus Perrelet, em Minas Gerais, talvez tenha sido, das manifestações "dewianas" , no Brasil, a m ais fiel às idéias do mes tre. Pe rrel et veio ao
Brasil, em 1927, com o g rupo de europ eus qu e, a co nvite do gover no, pretendi a estab elecer a reforma educacional do Es tado de Minas Gerais. E sta
educado ra trabalh ava na época no In stituto Je an Ja cq ues Rou sseau, um a instituição de van gu arda educacio nal naque le tempo.
Colega dos m ais important es educado res, co mo Claparede, Piaget e
Bovet, Perr elet era, co m o todo O Instituto, co nsiderada discretam ente influenciada por Dewey, em artigo s de jornais e de revistas escritos so b re seu
2
Uma análise mais completa da influência de John Dewey no Brasil poderá ser encontrada no livro de
BARBOSA, Ana Mae. Recorte e colagem . São Paulo: Cortez, 1989.
26
Arte come cultura e ex pra ss õo
tra balho. Considero, contudo, que em bo ra citasse pouco J ohn Dewey, dele
assimilou muitos co nceito s, inclu sive o de qu alidade esté tica como apreciação da experiência que ser viu de base pa ra seu primei ro livro so bre o ensino
do desenho.
Nunca con segui localizar a primeira edição des te livro, embo ra tenha,
em 1975, pe squ isado nos arquivos do antigo Instituto Je an Ja cques Rousseau
e em sua bibli ot eca. Localizei familia res da au tora (em Gen eb ra e no Brasil),
m as nu nca m e foi possível determ inar a data da prim eira edi ção de seu livro.
A segu nda edição, de 1922, foi intensamente divulgada no s jornais euro peus.
V árias resenhas e artigos fo ram pro duzi dos sobre a autora e suas idéias .
Perrelet p retendia ensin ar arte através da ap reciação do m eio ambiente sem deixar de sistematizar o alfabe to da fo rm a, linha, cor, vo lum e, p erspectiva etc. Sua idéia cent ral era a apreciação da experiência. Co m o D ewey,
recome ndav a qu e a esco la não po deria pretend er estar segu ra de qu e a crian ça tivesse tido esta o u aquela expe riência. Para sistematizar o conhecim ento
era necessário, como num labo rató rio, provocar a exp eriência n a sala de aula,
explo rá-la e sistem atizá-la.
Para Per relet, o de senho era a gra fia do movi me nto - um a co ncep ção
ce rta m e nte assim ilad a d as van gu a rd as a rtís ticas d a ép oca, de sde o
Impre ssionismo até o Futurismo. E ntretanto, não poderia o professo r supo r
a exp eriência de movimento assimilada por seu aluno, teria (]ue p ro vocá-la.
Assim , pa ra ela, era muito imp o rtante aprender a grafar individualm ente o
m ovimento so m ent e depois de perceb ê-lo e ap reciá-lo, sendo o professor
test emunha des ta percepção e ap reciação. O livro de Perr elet é o prim eiro
livro d e ensino do de senho através da exp ressão co rp o ral de que se tem
notícia.
Perr elet p unha seus aluno s a ap reciarem m ovimentos p rovocados por
ela. Por exemplo, queria que os alunos ap rend essem a expressão da curva em
diverso s contextos: primeiro um jogo de se cu mp rim entare m un s aos o utro s, enquant o parte do g rupo ob ser vava qu e expressão tin ha o co rpo curvado no ato de cumprimentar. Um aluno aguava uma planta en quant o os outros observavam co mo seu corpo se curvava para atingir o ob jetivo e qual a
expressão e a qualidade da linha de seu corpo. Mandava o bse rvar os ninhos
dos pássaros, uma vas ilha redond a, os chorões, até retir ar dos alunos o conceito de curva co mo flexibilidade e co nt inent e que sup o rta um conteúdo.
Para isto fazia as crianças exp erim entarem beber águ a na s m ãos para observarem como as encurvamos em forma de co ncha para conter água.
27
T ópicos Utópicos
Só dep ois da apreciação do corpo em curvatu ra, dos objeto s que continham curvas, d e entender a ex p ressão da curva, é que passava ao desenho,
pe din do qu e d esenh assem algo q ue contivesse curva . O desenho qu e pedia
já não era ma is um de senho realista, ist o é, cópia da realida de, por ém algo
evo ca tivo do o bjeto, valo riza ndo m ais a expressão da forma traçad a do que
sua correspondên cia com a realida de.
Como Perrelet passou apenas dois anos no Brasil, deix and o seu livro
sendo traduzid o em Minas G erais' , o que ficou de seu método tão ligado à
ap reciação for am ap enas os de senho s q ue seus alunos ap rese ntavam como
resultad o de um longo trabalho ex plo ra tó rio. O trab alho expl o ratóri o foi
totalm ente esqueci do pel o s ed ucadores que a seguiram , os quais se p reo cuparam apenas em fazer seu s alunos desenharem sim plificada me nte. Com o
tempo isto ge ro u o terrível desenho pedagógico que nas décadas de 40 e 50
d ominou os cursos normais do país. Pior: er a a p ro fessora qu e fazia o desen ho sim pli ficado d e uma casa, de uma árvo re, e os alu no s tin ham que copiar
a sim plificação.
E n fim , operou -se a deturpa ção da sofisticação teórica de P err elet.
E nquanto os alunos de Perrelet p roduziam d esenhos simplificado s, mas com
exp ressão p esso al, as escolas brasileiras assassin aram seu m étod o, levando
os alunos a rep ro du zirem massific adas sim plificações form ais. O movim ento como faror de integração o rgânica da experiênci a em Dewey e em Perrelet
era a pe dra fundam ental, e a apreciação pervasiva co n tro lava a co nsu ma ção
d a experiência. M e» credo pedagógico também fo i credo para Perrelet ,
Hoj e, J ohn Dewey vem sendo constantemente revisitad o e revisado.
O capítulo H aving an e>.cperience de A rl as exp eriente tem sido o m ais citado nos
últimos livro s d e an e-ed uc ação escrito s por p ro fessores ingleses e norteam ericanos qu e d efendem o fazer artístico aliado à co m p reensão es té tica.
To d a uma nova pe dagogia da arte p rescr eve a aten ção para a arte na
escola em d ois sentido s: o sen tido cultural, isto é, arte como cultu ra, levando-se os alunos a apreciar, co n he cer e an alisar a herança ar tística que o s
pre ced e; e o sentido exp ressivo, isto é, arte como expressão realiza da no s
ateliês expl orando o fazer indi vidu al.
Esta nova pedagogia se reclama herdeira d e John D ewey e, entre as
muitas cit ações do autor que comprovam es ta descendência, as mais fre qüentes são ex traídas de H aving an experience. Por exem plo, Ralph Smith cit a
3
Há uma tradução, provavelmente não revisada pela autora, datada de 1930.
28
Arte (a mo culturo e erpre ssóo
em seu último livro sob re n B.A.E. (D isciplin e Based Art E d ucatio n) o segui nte texto de D ew ey:
"O arti sta seleciono u, simpli ficou, clarificou, abr eviou,
conde nso u seu desejo. O espectador tem de percorrer tais
operações de acordo com seu ponto de vista próprio e seu
pr óprio in teresse. Em ambos os casos tem lug ar um ato de
comp reensã o, de abstração, de cxtração do que é signific ativo.
Para pe rcebe r, o esp ectador pr ecisa criar sua própria exp eriência. Sem o ato de recriação um obj eto não será pe rcebido como
ob ra de arte."
N ovamente, D ewey está sendo tomado, em plen o século XX, muito
literalmente. Ralph Sm ith, com estas citaçõ es de D ew ey, pretende defender o
ensino da Arte atrav és da re+ leitu ra de ob ras d e A rte, esquecendo -se d e q ue
D ewey afirmou que o re + co nhecim ent o ap enas é c ómodo demais para u m a
co nsc iência v ívida.
Su a ob ra está aí para ser posta em prát ica pelo s arte-educadores de
u m a maneira integral e não ap enas pa ra ser re talh ada em pedaço s, e cada
p ed aço em cada m omento histórico justificar esta ou aquela metodologia do
ensino da arte.
N o Brasil, d ep oi s de haver influenciad o profunda me n te o Movim ento d a E scola N ova na década d e 30, D cwey caiu no os tracismo, ou pior,
p assou a ser cr iticado acerba damen te. O s po ucos au to res brasileiro s (uns 3
o u 4) que escreveram so b re ele nas d écadas de 80 e 90 foram até discr im inado s pelos grupo s hegemónicos encas telados na Fa culda de de Educação da
USP, da Unicam p e da PU C-Sr. Como dizia D ewey, o mundo qu e experim entam o s é real m as nem sem p re in telectualmente coere nte e seguro."
N o s Es tados U nid o s, o Centro de E stu do s D ew iano s n a Un iversid ad e de Southern Illinois em Carbondale continuou as pesquisas sobre sua
o b ra sem muita visibilidade durante os anos 80. A década de 90 ass iste a
revitalização da in fluê ncia de Jonh D ewey, qu e ve m sen do ap ontad o co m o
pion eiro da Ped agogia Cultural (jun to com Paulo Freire), da Ped ag ogia Crítica, d o C on strutiv ism o, d o Multicultural ism o . Sua o b ra ve m se n do
recontex tualizada por femi nistas, ed ucado res e po líticos , Entre 96 e 97 foram publicado s o ito livros sobre Jo hn Dewey nos E stados Unido s.
• Paráfrase de citação de Jonh Dewey em CAMPBEL. James. Und erstanding Dewey. Chicago: Open Court
Company, 1995, p.75.
29
Tóp ico s UtÓp ICOS
Arte -educação pós-colo nialista no Brasil:
aprendizagem triangular
A consc iência de ser colonizado dos brasileiros é titubeante, confusa e
mal-explicitada. Precisaríamos de um decodificador cultural como Frantz Fanon
para nos analisar, pois só alguém com o ele, psicananalista, ant ropólogo e
anticolonialista, daria conta de nossa contu rbada personalidade colonizada.
Diferentemente dos o utros países da América do Sul e da maioria do s
países colonizados do mund o, depois de três séculos de dom inação po rtuguesa, de repente no s vimos com o cap ital do Reino Po rtuguês.
O s anos an teriores de do minação tinham sido muito degradador es,
com o, em ge ral, o foi a coloni zação euro péia. P roibidos de termos imp rensa,
escol as sup erior es e mesmo um ensino prim ário e secundário o rganizados,
fomos domados pelos jesuítas e mes mo eles terminaram po r ser expulso s do
Brasil pelo poder centra l, con figurado pelo Marquês de Pomb al. A té aí a
história é a me sma de qualquer país descoberto pelos euro peus. E stávamos
condenados à igno rância e a receber com o habitan tes os prisio neiro s e os
indesej áveis do país que no s do minava . Entretant o, em 1808, com receio da
invasão por tropas de N apoleão Bonaparte, o Rei de Portugal transferiu o
governo, a Corte, para o Brasil. Um país qu e vivia à margem se torna centro,
o poder central e a colônia fundir am -se e con fundiram- se. As decisõe s passaram a ser geradas na colô nia que se mascarou de império, embora os int eresses a defender fo ssem ainda os dos colonizador es.
A cumplicidade entre co lonizados e colonizador es levou à independência do Brasil, doada por o rdem de Portugal, graças à insistência da Pr incesa Leopoldina, qu e qu eria garantir algum pod er para seus filhos ,
Para confirmar a cumplicidade coloni zador es-colonizados, lembro que
as revisões pós-coloni alistas têm sido mais rigoro samente condenatórias das
invasões culturais franc esa e inglesa, po uco se criticand o os portugueses e,
no caso do ensino da arte, ainda menos.
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Arte co mo cultura e exp re ssã o
o ensino da arte em Po rtugal era muito deficiente e o que o reinado
de D. João VI no Brasil proveu, muito mais avançado. Pelo meno s desde c!ue
o Brasil fora tom ado por Po rtugal, os pinto res e arquitetos portugu eses vinh am reclamand o do de scaso so frido pelas artes visuais em seu país. Por
exemplo, Francisco de H olanda, em seu livro Da Ciêllcia do Desenho, publicado em 1571, procurou dem onstrar a O. Jo ão III como as art es eram pouc o
p restigiadas em Portugal e tentou co nvencer o Rei de que o en tend ime nto da
pintura e do desenho eram essenciais para eficaz elabo ração de estra tégias de
guerr a. E muito s ou tros peroraram pela melho ria do ensino das artes em
Po rtugal nos séculos que se seguiram.
Qu and o D. João VI apa rtou no Brasil, para daí governar Po rtugal,
criou as primeiras esco las de educação sup erio r: Faculd ade de Medicina, para
pr eparar médico s para cuidar da saúd e da Corte; Faculdad es de Direito, para
pr eparar a elite política local; E scola Militar pa ra defe nder o país de invasor es
e um a Academia de Belas-Artes, Portant o, o ensino das H umanidades começou no Brasil pela arte.
Para criar a Academia Im perial de Belas-Artes, D. João VI, através do
Marquês de Marialva, que se achava na Eu ropa , e do naturalista Alexandre
vo n H umboldt, que estivera no Brasil, co ntratou artistas que ensinavam no
Instituto de França e eram a vanguarda da épo ca. O s artistas deste Ins tituto,
criado e desenvolvido por N apoleão Bo napar te, de po is de sua queda, passa ram a sofrer perseguições. Algun s deles, d entre vários co nvites recebido s
par a trabalhar cm país estrang eiro, inclusive de Catarina da Rússia, aceitaram
vir para o Brasil. O ex-dir etor da Seção el e Relas-Artes do Ministério do
Int erior de Na poleão, J oachim Leb reton, o rganizo u o grup o. E ram todos
neo clássic o s co nvictos e interferiram o stensivam ent e na m ud anç a d e
paradigma esté tico no Brasil. Quando chegaram , enco ntraram um bar roc o
flo rescen te. Impo rtado de Portugal, o barroco havia sido mod ificado pela
força criado ra do s artistas e artífices br asileiros, c pod em o s dizer que já existia um ba rroco br asileiro bem difer ent e do po rtu guês, do espanhol e do
italiano, mui to mais sensual, sedutor e até mais kitscb) se quiser mos usar um a
designação atu al,
Ao chega rem , o s artistas franc eses instituíram um a E sco la neoclássica
de linh as retas e puras, contrastando com a abundância de movim entos do
nosso barroc o: instalou-se um prec once ito de classe baseado na catego rização
estética. Barroco era coisa para o povo; as elites aliaram -se ao neoclássico,
que passou a ser símbo lo de distinção social. Esse pr econ ceito co nt ra o Barroco continua no Brasil como vimos através da recepção da crítica micliática
31
Arte como cultura e expre ss õo
T ópi cos UtÓpICOS
institu ída à exp osição organizada por E manuel Ar aújo no Ce ntro Cultural
Fiesp (São Paulo, jun ho-agosto, 98). Um crítico de g rande pr estígio, escre vendo acerca da exp osição, classificou o barroc o brasileiro de tosco e imitativo,
marcad o pela m ediocr idade e inabilidade do artesanato popular, uma esp écie
de esqu em a d e artesanato em gra nde escala da igreja católica. N ão li o artigo
porque est ava for a do Brasil, mas, qua ndo voltei, essas "verdades" atribuídas
ao crítico da Revista Bravo estavam sendo rep etidas pelos estudan tes de art e e
aplaudidas animad am ente p elos minimalistas.
Atitudes semelhant es no século passado impediram qu e, entre o barroco e o neoclássico no Brasil, hou vesse ricas negociações estilísticas, como
aconteceu, por exemplo, em Pr aga. Curiosam ent e, hoje, os reconstruc ioni stas,
estu dan do este episó dio, invest em co ntra a Fran ça como invasora cul tural e
n ão contra Po rtug al, que encomen dou a interv en ção em nossa cultur a. Este
é um dos inúmero s exemplos em nossa histó ria do ensino da arte qu e po demos chamar de perturb ação da consciênci a colonizad a, deri vada da confusão
de papéis: coloniza do versus colon izado r.
Nem m esmo o m od ernismo no Brasil ajudo u na deci fração do enig ma, por incl uir em sua configur ação a me sma problem ática e falsa identificação colonizado versus colon izador. Is so porque o pr ojeto do m odernism o
europeu foi inten sam ente b aseado nas culturas colonizadas ou pr imitivas.
Por sua vez, essas cultu ras, para se renovarem, socorreram-se do m od ernismo europeu, dos valores ren ovados das metrópoles que incluí am int erpretações feitas pelos colonizado res acerca dele s, os colonizados, o o utro da his tória. Na verdade, im po rta mos nossos próprios valores disto rcidos pel o colonizador. Entretant o, no Brasil, a voz precursora de O swald de Andrad e
conclamava pela atitude, defe nd ida dep ois pelos pós- coloni alistas como Albert
Memmi e Paulo Freire, de lutar po r um lugar na hist óri a, embora se tratasse
de um a históri a esc rita pela Eu rop a e de um lugar design ado, norninado pel o
pr óprio coloniza do r.
O cub ano Roberto Retam ar, na década de 70, atualizou o co nceito de
antropofagia de O swald de And rade, canibalizando-o, to rna ndo-o p ós-colonial na teo ria e co n tra discursivo na prática. Deglute, desconst rói e reo rganiza as influências da Europ a e dos Estados Unidos. Nem mais a dep endência
cultural, nem m ais a bu sca inalcançável da originalidade moderni sta, mas
adequação e elabor ação em diálogo crítico com os países centrais. O contra
ataque ao ne ocoloni alism o sug ere, no limiar do sécul o XXl , ope rações mais
complexas do que a sedu to ra idéia modernista do cani balism o / an tro po fagia.
32
Q uem de glu te quem?
Com o diz H om i Bhabha, nossa existênc ia hoje é m arc ada pela ten ebro sa sensação d e sobrevivênci a, vivendo um presente que não tem nome
próp rio, mas é de signado por um prefixo acrescent ado ao pa ssado. Trata-se
do prefixo "pós" do pós-modern ism o, do pó s-colo nialism o, do p ós-fem inism o etc. Q uerem os explicitamente ultrapassar o passado sem deixá-lo de
lado. A teo ria do reco nhecimento que susten ta as pe rsistentes pós-u to pias
pó s-colonialistas de no sso tem po se co n figu ram no Terceiro Espaço de H orn i
Bhabha, no co mbate à estereo tipia cultu ral de Edward Said, na alteridade
secun dária de Sanford B udick, na s políticas de reconhec imento das m in oria s
sugeridas po r Charles Taylo r e Susan \\'olf, na defesa do sincreti sm o visual
empreendida po r Mosh c Barasch, nas lib er tárias ab or dagen s da cultu ra co m o
um qllill b em desenhado de Luc y Lippard, e em muitas o ut ras elocubrações
de teó rico s da cultura engajados nos movimentos pós-colonialistas, principalme nte na Aust rália e na Ín dia .
C orreçõ es à Prop o s ta Triang ular
f oi no es forço dialogal entre o discurso pó s-moderno global e o processo consciente de diferenciação cultur al também pó s-m oderno que , no
ens ino da arte, surg iu a abordagem que ficou co nhecida no Brasil co m o
Merodologia T riangu lar, um a designação infe liz, mas um a ação reconstrutor a.
Sistem atizada no Mu seu d e Arte Co n temp orân ea da USP (87 / 93), a
Triangulação Pó s-Colo nialista do E nsino da Arte no Brasil foi ap elidada de
"meto do logia" pelos pro fesso res. Culpo -me por ter aceitado o apelido e usado a expressão Metodologia T riangular em m eu livro A ;lI/clgellJ no E nsino da
'l rle. Hoje , depois de anos de expe rime nt ação, esto u co nven cida de qu e
m eto dologia é co nstrução de cada p ro fessor em sua sala de aula e gostaria de
ver a expressão P ropos ta Triangular sub stitu ir a pre po te nte de signação
Metodologia Triangular. E m arte e em ed ucação, problemas semân ticos nunca
são ap enas semâ nticos, m as envolvem con ceirua ção.
A Pro posta Tr iangular deriva de uma d up la triangulação. A primeira é
de natureza epis tem ológica, ao de sign ar os co mponentes do en sino / aprendizagem po r três açõ es mentalmente e sen so rialment e bá sicas, quais sejam :
criação (fazer ar tístico) , leitura da obra de arte e co nt extualização. A segunda
triangulação está na gênese da própria sistematização, originada em um a tríplice
influênc ia, na deglutição de três outras abor dagens epistem ológicas: as Escudas
33
T ópico s Utó p ico s
aiA ire Libre mexicanas, o Critica]S/lIdies inglês e o Movimento de Ap reciação
E stética aliado ao D BAE (DisCipline BasedArt E dttcation) ame ricano.
N o início de uma pesquisa aind a não-concluída sobre a Históri a do
E nsino da Ar te em três países lat ino -am ericanos (Argentina, Urugu ai e Mé xico), m e entusiasmei com as E smelas ai A ire Libre do México, incentivada s
por José Vasconcelos e, principalmente, com a idéia de inter-relacionar arte
como exp ressão e como cultu ra na op eração en sino-aprendizagem , como o
fez Best Maugard, o autor do s livro s didáticos das E scnelas ai Aire Libre.
Surgidas depois da Revolução Mexicana de 1910, estas escol as se cons tituíram num fru tífero mo vimento educacion al, cuja idéia era a recuperação dos
padrõ es de arte e artesa nia mexicana, a con stitui ção de um a gra mática visual
mexicana, o ap rimor ame n to da pro dução artística do p aís, o estímulo à ap reciação da arte local e o incentivo à expressão indi vidual. I Pode-se me smo
dizer que as E scue/as ai A ire Libre foram a sem ente do mo vimento mu ralista
mexican o.
Na mesma épo ca em que des cob ri as E smelas ai A ire Libre, fui aluna,
no Rio de Jan eiro, de um cur so de Tom H udson, o inventivo professor do
País de G aies. To mei contato, en tão, com o utra linha de ensino integr ador a
da idéia de arte como expressão e como cultu ra, especialme nt e at ravés do
trabalho de Victor Pasmare e Richard H amilton na Universidade de Newcastle,
Posterio rment e, os texto s de D avid Thistlewo od e as con ver sas com ele sobre o moviment o d e Cntical Studies, na Ingla terra, muito ecoa ram na minha
opção epistemológica. Além disso, as leitur as sob re o movimento de ap reciação estét ica surgido no s E stados Unido s em meado s do s anos 60, sob a
in fluência de Manuel Bar kan e do qu al o Co ng resso da Penn Sta te, em 65,
tornou se algo semelhante a um manifesto, refo rçaram m uitos po ntoS teór icos. Posteriormente, o cantata com os construtores do Disciplined Based Art
E dtlcatiofl (O BAE) americano, co mo Elliot Ei sner, Ralph Smith e Brent Wilson, muito estimul aram me u posicion amento cultu ralista em relação às politicas artísticas.
Foi, entretant o, o movimento de crítica literária e ensino da literatura
ame ricana Reader Response qu e, em diálogo co m no ssa especificidade ter ceiromundista, inspi rou a design ação de " leitu ra de obra de Ar te" para um do s
comp onentes da triangulação ensino-aprendizagem.
, Acabo de termin ar uma pesquisa mais apro fundada sobre as Escuelas ai Aire Libre. O texto interpretativo
será publi cado em Revista da Universidade Fed eral do Rio Grand e do Sul.
34
Arre ( orno cultura e c xpre ss óo
o movimento Reader Response não de spreza os eleme n to s formais, ma s
não os pr ioriza como os estruturalistas o fizeram ; valo riza o objeto, mas não
o cultua, como os deconstrutivistas; exalta a cognição, ma s n a mesma medida considera a imp o rtância do emocion al na co mp reensão da ob ra de arte. O
leito r e o objeto constroe m a resposta à ob ra numa piagetiana int erp retação
do ato cognitivo e, mais aind a, vigo tscjuiana in terp ret ação de com p reensão
do mu ndo. Assimilação e acomod ação na relação leitor-objeto (reader - response)
são os processo s fund amentais que se im põem . A o pção p elo fundamental
se justifica, no caso de meu país, po is fun dam entais são no ssas necessidades
ed ucacionais. Tr ata-se de um país com alta percent agem de crianças fora da
escola, muitas das quais vivem na ru a, sendo de st ru ídas por aqueles qu e as
deviam proteger e de professores sem for mação específica porque a sociedade pouco valo riza a educ ação.
D aí a ênfase na leitura: leitura de palavras, ges tos, açõe s, imagens, necessid ad es, desejos, expectativas, en fim , leitura de nós me sm o s e do mundo
em que vivemos. N um país on d e os politico s ganham eleições através da
televisão, a alfab etização para a leitu ra é fundamental, e a leitu ra da imagem
artística, humanizadora. E m art e-educação, a Proposta T riangular, que até
pod e ser considerada elem entar se comparada com o s parâm etros edu cacionais e estéticos so fisticados das nações cent rais, tem correspondido à realidade do professor que tem o s e à necessidade de instrumentalizar o aluno
para o momento em que vivemos, respon dendo ao valo r fun damental a ser
buscado em no ssa educação: a leitur a, a alfabetização.
E ste princípio de leitura como interpretação cultur al, com muita influência de Paulo Fr eire, foi inicialmente experime nt ado na organ ização, cursos e o ficinas do Festival ele Invern o de Cam pos de Jordão em 1983, que
podemos considerar a primeira experiência pó s-m oderna de ensino da arte
no Brasil.
Contudo, a Proposta Triangul ar, como sistema epistemológico, só foi
sistematizada e amplament e testada ent re os anos de 1987 e 1993, no Museu
de Arte Con tempo rân ea da USP, tend o como meio a leitu ra d e ob ras o riginais. De 1989 a 1992 foi exp erimentada nas esco las da rede municipal de
ensino de São Paulo, tend o co mo meio reproduções de obras de arte e visitas
aos originais do museu. E ste projeto foi iniciad o no p eríodo em que Paulo
Freire foi Secretário de Educação do Municípi o de São Paulo e foi conduzido inicial~ente po r mim, depois por Regina Machado e por fim e por mai s
tempo por Chri stin a Rizzi . Sua avaliação positiva após qu atro anos foi extremam ente recompensadora.
35
Art e como cultu ro e expr e ssOo
Tópi co s U t6 p l(OS
Ainda em 1989, iniciou-se a experim en tação da Propo sta T riangular usa nd o-se o víd eo p ara a leit ur a da ob ra d e arte. A pesquisa financiada p ela Fundação IOC H PE, coo rdenada por A nalicc Pillar e D cn yse
Vieira, usando a P ro po sta Tr iangular e o víd eo para leitura da o b ra d e
arte, fo i feita co m quin tas sé ries das escolas particulares e p úb licas d o
mu nicípio de Porto Aleg re, co m classes-con tro le em ambo s o s sis temas,
p úb lico e privad o. N est as classes-contro le usam o s apenas o faze r ar tístico com boa ori entação m o dern ista e/ ou exp ressio nis ta, sem co nt ato co m
leitur as de o bras de arte e sem q ue ho uvesse qu alq uer con teúdo h is tó rico, enfi m , sem apreciação nem discu ssão so bre ob ras de art e. T ivem o s,
d uran te a pe sq uisa , ass ess o rias rápid as, m as m uito eficaz es, de Brc n t
\Vilson, E lliot Eis ne r, H elo ísa Fe rraz e Mariaz in ha F usari, e ouvimos
co m ent ário s d e Ralph Sm ith e E ilecn Adams. O resultad o foi q ue as
crianças que tiveram um ensino b asead o na P ropos ta T riangular (com
uso do vídeo), ao fim do semes t re, haviam se d esenvolvido ma is, tanto
na criação ar tística quanto na capacid ade de fala r sobre arte.
D epois veio a fase de produção de material escrito para orientar, sug erir ativid ades, info rmar historicamente e estim ular o s professores no uso de
cada vídeo da vide otcca de mais o u menos 250 exemplares, organizada pela
Fundação 10CHPE. Operando u ma matrize ira a laser que foi doada à Universidade Federal do Rio G rande do Sul, pre tendia-se for mar 25 outras
videotecas para distribuir o material pelo Brasil, a instituiç ões educaciona is
e/ou museus capazes de conservá -las. Estas deveriam manter serviço permanente de empr éstimo do s vídeos a professores e or ien tar cursos, preparando p ro fessores par a, através da Pro posta Triangular e do vídeo, explorar
as po tencialidacles do ver.
f oi prod uzido um vídeo com as impr essõ es das criança s sob re as experiências du rante a fase de pesq uisa. O que mais me imp ressiono u foi o
curto e incisivo depoiment o de uma criança de 12 anos; po bre, muito pob re,
pobreza detectável visualmente, não só através da roupa, mas do gesto e do
olhar, gue disse: " por gue nunca ninguém me falou sobre arte abstrata? G ostei muito de entender isso". So negação de informação das elites para as classes populares é uma constant e no Brasil, on de a maioria do s po dero sos, e até
alguns educadores, acham que esta histór ia d e criatividade é para crian ça rica.
Segundo eles, os pobres p recisam so men te ap render a ler, escrever e co nta r.
O que eles não dizem, mas nós sabemos, é que, assim, este s pob res serão
mais facilment e manip ulados.
A reação de grupos de arte-educado res d o Rio G rande do Sul foi
feroz contra as no vas abordagens culruralisras e/ou pós -modern as do ensino da art e, talvez po rque concent ravam -se naquele E stado o s modelos mais
pu ros e eficazes de ensino modern ista da art e.
Co mo não p odiam ir con tra a Fu ndação 10 CH P E po rque de p endiam de seus p at ro cín ios para o rganização de even to s e exp o siçõ es, inves tiram co n tra a Pr oposta T riangular, d isto rcendo -a m alicio sam ente,
calculand o err ada m ente que am eaçariam o pod er qu e sup un ha m q ue eu
tive sse na F undação. Fo i u m erro de cálculo, po is n unc a tive po de r cm
nen h um n ível d e dec isão d o P ro jeto A rt e na Es co la da F u nd ação
IOC HPE, nem na Rede Ar te na E sco la que pos terio rm ent e se co nstituiu. D ep ois de te r orga nizado teo ricament e o pro jeto, d e ter o rientado a
pri mei ra pes quisa co m muito entusiasm o e d e te r sugerido e facilitad o a
ida do s professo res estr ang eiro s co nvidados pa ra os p roj et e s d o MAC /
USP para pales tras c co nsulto rias em Porto Alegre, m inha atividad e se
lim ito u a co nsul tarias que semp re co nduzi com absoluta int eg ridad e.
Mesm o estas, a part ir de 95, se reduziram d rasticam ente.
Os de trarorcs da mudança provocada pela Propo sta T ria ngular,
em pr ime iro lug ar, afirma ram qu e se tratava de ada p tação ou có pi a d o
D BAE am erica no . O ra, como participante da socied ad e p ó s-m od ern a,
não so u contra a cópia, de sd e que ins crita no tem po e na locação ad equad os e fr ut o d e reconstr u ção . O mito da originalidad e é modernis ta, o
pó s-m o d ern ismo va loriza mais imensamente a elabo ração dentre o s processo s m ent ais envolv ido s na criatividade. Con tudo, d iria que a P roposta Triangular se op õe ao DB1\E porque este disci plinariza o s co mp onentes da aprendizagem da art e, se parando -os em fazer ar tístico, crí tica d e
arte, estét ica e his tória da arte, rev ela ndo inclu sive u m viés modernista
na de fesa implícita d e um currícu lo d esenh ado p or dis ciplinas. É a contradi ção in trínseca do DBAE, um siste ma pa ra o ensino da arre d e idéias
pó s-m o dern as, m as de co nstr ução m odern ista. Enq uant o isto, a Pr o po sta Triangu lar designa açõ es co mo componentes curriculares: o fazer,
a leitu ra e a co n textualização. N a época do M useu d e Arte Co ntem po rânea, est a co ntex tua lização era pr io ritariam ente histó rica, dad a a natureza
da ins tituição mus eu. Mas co m o pass ar do tempo no s torn am os mais
rad icais em rel ação à de sd iscip linarização e, em vez de design ar co mo
his tó ria da art e um do s co mpo nentes da ap rendizagem da art e, amplia mo s o espectro da ex periê ncia no meando -a contextualiz ação, a qual po de
ser histó rica , social, p sico lógica, ant ropo lóg ica, geog ráfica, ecológica, biológ ica et c., ass oc iand o- se o p ensam ento nã o ap en as a uma dis ciplin a,
o fazer, a leitura, a contextualização
36
37
Tóp IC OS Utó p IC OS
n rte como <ultura e e xore s soo
mas a um vasto conjunto de sa b er es disc iplinares o u não."
Contextualizar é estabelecer relaçõe s. N este sentido, a contextuali zação
no proc esso ensino-aprendizagem é a porta aberta pa ra a int erdisciplinarid ade .
A redução da contextualização à história é um viés modernista . É atr avés da
conte xtuali za çã o qu e se p o d e praticar um a educaç ão em dire ção à
multiculturalidade e à ecol ogia, valores curriculares qu e definem a p edagogia
p ós-m oderna ac ertadamente defen dido s pel os Parâm etros Cur riculare s N acion ais (PC N) .
Nos dois últimos anos, várias teses so b re arte-educação ap ontaram
par a a importância da contextualização do ensino , dos co nceitos, das im agens pa ra um a educação comprom etid a com o so cial. Quero destacar a de
M aria Luiza Sen e, intitulada A rteJ Vi.ruaiJ, M eio A mbiente e E ducare/o E scolar
(1998)3 que diz, na página 91:
(os, Combogós, LAtaJ e Sucatas e l.LIbirú;to da Moda. A escolha do co nt eúd o com
a qual tr abalh ar depende da ideologia do professor e do s códigos de valo r da
cultura do s aluno s. Respo nde, portanto, a o utra pergunt a: "o que en sinar?"
Q uan do se afirma que a Vide o rcca da Rede Ar te na E sco la é p rinci p alm ent e de vídeos de art e eru dita, eu conco rdo. N ão festejei so me nt e a
chegada ao acervo do vídeo da exposição que teve lugar no C ent ro Pompidou
em Paris, Os M ágicos da Terra, cur ada por Hubert M ar tin, que abriu os olh os e
as instituições europé ias pa ra a diversidade cultural sem ant epor barreiras de
raça, classe, gênero e naci onalidade. Além disso tam bém recomendei a co m p ra d o vídeo Vida de Santeiro, d e Ione Coel ho , b em como have r mai s
pluralidade cultural e depuração crítica nos vídeos existe ntes, alguns não m uito
bons. M as, como já disse, o papel do consultor é recomendar c não decidi r .
Q uem de cide é a direto ria .
"A transformação ambiental voltada à melhoria de qualidade de vida para todos os habitantes das cidades e dos países é uma das ações contextualizadoras das atividades ar tísticas a serem desenvolvidas na escola."
N a séria e mu ito boa diss ertação de mestrado de Ro seane Martins
Co elho, defendida na Universidade Federal de Santa Cata rina em 96", acerc a
da Difusão do ProietoA rte na E scola da Fundação IO CH PE na s esco las pú blicas
de Flo rianô po lis, outro s equívo cos so bre a Proposta T riangu lar entre o s professo res for am detecta dos. N este caso não se trata de má in tenção, mas de
int erpretação er rônea do s pr óprios p rofessores o u de qu em os preparou.
A contextu alização é em si m esm a forma de conhecimento relativizada .
Pesqui sas so bre a co gniç ão situada mostram que o conhecimento e o entendim en to são m ais facilm ente efeti vad os se emoldurado s pelo sujeito. É esta
m oldura que design am os contextu alização, a qu al pode ser sub jetivam ente
el ou social mente construída.
O utro equívoco mal-int enc ionado é dizer qu e a P roposta Triangular
se de stina ao trabalho com o códi go hegem ônico europeu e norte-am eric an o
erudito de art e. A Proposta Tri angul ar é siste m a cu ja proposição dep ende da
resposta qu e damos à pe rgunta: " co mo se dá o conhecim ent o em arte?"
Portant o, qu alquer conteúd o, d e qualquer natureza visual e esté tica,
p ode se r explo rado, interpretado e op erac ionalizad o atr avé s da Prop osta
Tri angular.
Muitas foram as exp eriências com Propo sta Tri angul ar em exp osiçõ es
de código p opular e de estétic a do cotidian o, co mo na exp osiç ão Carnauales-
2
Por favor, não confundam com a herói ca luta por um lugar para a arte como disciplina num currículo já
disciplinarizado, qu e só valoriza o conhecimento disciplinar. Esta luta é necessária no momento e con texto cultural em que vivemos, mas se o currículo abolir as discip linas ela cessará de ter sentido, assim
como já não tem sentid o rotular o conhecimento que se quer construir em arte s através das disciplina s
que compõem o sistema das artes.
3
Or ientad ora: Preta . Ora. Maria Filismina Fusari.
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O err o mais g rave é o de restringir o fazer art ístico, parte inte grante da
tri angulação, à releitura de o bras. O utro é pen sar qu e há um a hierar quia de
at ividades, isto é, p rimeiro a leitura da ob ra de art e, depois a contextualização
e finalm ent e o fazer, a cr iação. E sta não é urna in ter p retação co rreta.J á testemunh ei ou li relatos de trabalhos realizados nas mai s diferentes regiõe s d o
Brasil, como Ro ndo n ópolis, Vitó ria; Recife, Caruar u e Palm eira dos Índios,
q ue co m eçavam com o fazer e só en tão , a partir da seme lha nç a formal ou
o n teud ística com a o bra da criança , o professor esco lhia a obra do i da art ista a ser ana lisada ou apreciada , co mo dizem os Parâm etro s Curriculare s N acio nais (PC N). E m ou tros casos , como vi em Feira de Santana, Blu m ena u e
J acare í, os professores podem começa r analisando um context o social e his tó rico para depo is escolh er as o bras e objetos a serem dec odificad os a parti r
das pi stas dadas pel o contexto. E nem sempre, felizm ente, um professor
inventivo usa a mesma seqüência dos co m po nentes em diferentes aulas, co m
o me smo g rupo de alunos. Segundo Roseane Martins Coelho, com qu em
tive a op o rtunidade de co nversar demo rad amente depois de ler sua tese, os
, Orientadora: Preta. Ora. Mari a Luiza Belloni.
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Arce co rn o cul t uro e ex p re ss óo
TÕpl COS U t6pi ( OS
pro fesso res che gam a designar os co m po nent es da Proposta Tria ngular de
'fasei. N ão se tratam de fases da aprendizagem , mas de pr ocessos mentais
que se interligam pa ra operar a rede co gnitiva da aprendizage m.
Este err o é de somenos importância comparado com o engano de
restr ingir o faze r artístico à releitu ra. A releitu ra é um a atividade possível e
qu ant o m ais problematizadora mais criad o ra. A m elhor explicitacão sobre
releitura qu e co nh eço no Brasil é a d e A nalice Piliar, em um pequeno te xto
publicado no boletim e/ou ap res entado em reu nião da Red e Arte na E sco la.
Mas o perigo da reprodução improdutiva ro nda as releituras. Ando tão alarm ad a com a péssima qualidade de pe nsa me nto visua l resultant e de releituras,
que me peguei outro dia de sreco m endand o completam ente a releitu ra em
um a pa lestra. Um a releitura divergente elou subjetivada amplia o universo
da alte ridade visual e exercita o p ro cesso de ediç ão de ima gens com o qu al
no ssa cognição visu al naturalm en te trab alha. Mas releitu ra como procedime nto co nstante transforma o fazer art ístico em me ro exercício esco lar. Ar tistas se ut ilizam d e p ro ced ime ntos mui to variados em suas pe squisas visuais. A me sma d iversidade de estímulos se deve ex igir do pro fesso r de art e.
Para falar a verdade, a insis tência na releitura me provo ca o m ed o da cópia
pel a có pia.
Qu ase da mesma maneira, m e assusta a idéia do pr o fesso r que , a pretexto de trabalhar co m a leitura da o bra de arte e co m a co ntextualização, dê
lon gas p rele çôes discursivas, isto é, histo ricize acerca de um art ista ou leia
u m a ob ra para alunos red uzidos à p assividade. Aind a não vi isto aco nt ecer,
mas lemb ro -m e que, em um a reu nião da Rede Arte na Es co la da Fun dação
IOCHPE em Curitiba, ho rrorizei- m e com um a pro fesso ra de Sant a Catarina,
qu e justificou "trabalhar som ente o fazer artístico co m as crianças pe q uenas
p o rq ue elas não têm paciên cia de ficar sentad inhas ou vindo a p ro fess o ra
falar da vida do ar tista" . Tra balhar só o fazer artístico co m o alun o está b em,
é uma opção legítim a de um pro fessor modernista qu e pode ser muito comp eten te concentrando -se ap enas no desen volvim ento de um dos asp ec to s da
ap rendizagem da ar te. O que está terrivelm ent e equivocado são os conceitos
de leitur a da obra de arte e o de co nt extualização.
Leitu ra da obra de art e é questio nam ento, é busca , é descobe rta, é o
despertar da cap acid ade crítica , nun ca a redução do s alunos a receptáculos
das infor m ações do professor, por m ais in teligentes que elas se jam . A edu cação cultu ral que se pretende com a Proposta Triangular é um a ed ucação
crític a d o conhecimento construído p elo pr óprio aluno, co m a m ediação do
professor, ace rca do mundo visual e " ão uma " ed ucação banc ária" .
40
1\ Prop osta Trian gular é co n str u tivista, inrer acio nista, d ialogal,
rnulticulruralista e é pós-modern a por tudo isto e por articular ar te como
exp ressão e como cultura na sala de aula, sen do esta articulação o denominador comum de todas as propostas pós-modernas do ensino da art e qu e circulam internacionalme nt e na co nte mporaneida de .
O g rande gu arda-chu va dewiano, a articulação entre a ed ucação artística (criação) e a ed ucação estética (apr eciação), define o pós-modern ism o
em arte-educação, ou a co ntemporan eidade, se alguém , po r horror à palavr a
p ó s-m o dern ism o, preferir.
É preciso , en tretanto, ficar claro que educação estética não é ens inar
es tética no sent ido de for mu lação sistemática de cla ssificações e de teo rias
,]ue produzem definições de arte e análises acerca da beleza e da natureza.
Es te não é o pr incipal p ro pósito da educação est ética. O q ue chamam os de
ed ucação estética de crian ças, ad o lescent es e ad ulto s é principalmente a fo rmação do apr eciado r de art e usando a ter m inologia e o sentid o co ns um ató rio
q ue D ewey dava à experiência ap reciativa.
Com o professo res, tem os q ue p ro curar co nhece r estética para estarmo s pre parados para os questio nam entos estéticos que nec essariamente surgem no processo de no ssos alunos entenderem e co nhece rem ar te, qu er seja
fazendo arte o u interpretando o b ras de arte. N este senti do, a est ética tem um
eno r m e po tencial esclareced or e estim ulador do questio nam ento reflexivo,
ma tér ia-p rima da filos ofia da q ual a es té tica é lima subd ivisão ou filial.
Crawfo rd (1991) conside ra a estética uma disciplina de segunda orde m: seu
trab alho co meça quando as outra s d isciplinas comp letam sua tare fa. D iz ele:
"Não m ais limitada à tarefa de análise da beleza, no s temp o s co n temporâ n eo s, a E s té tic a am plia s eu ca mp o d e
questionamento acerca da naturez a do ob jeto da arte e do car áter de sua criação, apreciação, interpretação, avaliação, assim como
acerca das relaçõe s da arte co m a sociedade, tud o isto podendo
ser examinado em diferentes níveis de complexidade. "
E m educação, a tar efa da estética integrada na leitu ra da obra o u do
camp o de sen tido da arte é ajudar a clarificar p ro blem as, a entender no ssa
exp eriência da art e, a disc riminar entre opções, a tomar decisões, a em itir
juízos d e valor .
5
CRAWFORD. Donald."T he questions of aesthetics". ln: SMITH. Ralph and SIMPSON, Alan . Aesthetics
and arts education. Urbana ano Chicago: University of Illinois Press, 1991, p.15.
41
r óplcc s
U~ 6 p l ( 0 5
Tradicionalmente a qu estão mais importante a ser re sp ondida pel a
esté tica er a: o qu e é art e? H oje a qu est ão que pr evalece é aquela sublinhada
p or Marcel Duch amp e K ant: qu and o alg o, um o bjeto, uma id éia ou um a
atitu de é arte?
O de sloc amen to do foc o da qu estão so b re " o qu e é arte?" para a
qu estão "quando é arte)" foi ratificado pel as teo rias culruralistas, ou melho r,
mul ticulruralist as, d a art e. O co n tex to é co m po nente definidor da experiência artística e da exp eriência es té tica. Além disto, os problem as da perc epção
se am pliara m co ns ideravelmen te na er a 'p ós-Duchamp', te ndo em vista a
complexidad e d as realidades virtu ais. O seeing in e o seeing as d efini dos por
\X'o JJh eim 6 e \X'ittgen stein , re spe ctivam en te, se combi na m em múltiplo s
qu estionam ento s. E star visua lmente consciente das superfícies e disc ern ir o
qu e ne la se dest aca (seeing in) clam a na Arte Contem po rânea por seeing it as.
N ão se trata ape nas de uma percepção do que está lá nem tão pouco d e uma
ilusão, mas im aginação contextu alizada ou cognição nos m old es d o s sistem as saving as, desenhados p ara facilitar multiplicid ade nas m em órias d o s comp utado res .
A resp osta es tética, através de o perações sens or iais e físicas, é cognitiva.
T t ata-se de cognição qu e não se centra apenas em ar te fatos , mas in clui um a
rede de en ergia que liga o arti sta à audiência, e am bos, arti sta e audiência, ao
contexto e a toda a cul tu ra h erdada laten te o u ativa. Com o diz Peter Ab bs,
"A rte requer pa ra seu ent endimen to uma linguagem din âmic a de partículas e
ve rb os, n ão d e inertes su bs ta n tivos " ." Co mo no est ud o d as p artículas
s ubatô m icas, também no cam po d a arte no sso s termos deveriam ser aque les
ligado s a m ov imento, inrera ção, transformação. D a mesm a m aneira qu e a
natureza da m atéria nã o po de ser separada de sua ativida de, tam b ém a obra
d e arte não deveria ser co nceitua lm en te separada do complexo campo n o
qu al ela ope ra.
Faland o-se em arte n a educação, o utras variáve is se m obilizam tor nando-se a próp ria exp eriên cia estética do profes so r, elem ento definitivo da
exp eriên cia es té tica do alun o. A. exp osição do adolescente e da crian ça à arte
n a escola depende da escolha d o profe ssor. A exp eriência es tética pode se r
ma is ou m en o s significante e valiosa em fun ção de sta escolha. O p rofessor
d e arte precisa co n hecer esté tica para , pel o m en o s, sabe r o que escolh er.
6
WOLLHE IM, Richard . Painting as an ett. Prince ton. New Jersey: Princ eton University Pre ss, 1987, p.4 5.
7
ABBS, Peter. Delin ing the aesthetic field. ln: SMITH , Ralph and SIMP SON , Alan. Aestti etics and art
educalion. Urban a and Chicago: University 01Illinois Press, 1991, p. 248 .
42
Art e co rno cultu ra e e xpr e sv ôo
Uma das int erpretaçõ es p ráticas m ais ade quadas da Pro po sta T rian gu lar foi realizad a por Ant onio Bian cho Filh o, na co nstrução d e um aplicativo
m ultimídia pa ra o ens ino da g eo me tria através da arte". Aliás, esp ecialistas
têm me cham ado a aten ção para a adequação da Proposta Triangular às n ecessidad es de reinv en ção do siste m a de com unicaçõ es em relação ao m ecanism o da conscientização so cial. L eitura e contextualiza ção podem ser os
m eio s de trazer o d rama das ideologias para a logística9 da per cep ção da realidad e virtua l. "E nvelopadas nas exigências de p rodução e consum o imediat o,
as tecnologias se tornaram convin cen tes pri n cipa lm en te p o rq ue p ar ecem
funcio nar invisivelm en te.? "
A con textua lização pod e ser a mediação en tre per cep ção, histó ria,
política, identidade, experiên cia e tecnologia , que trans fo rmará a tecnologia
d e mero prin cípio o perativo em um m odo d e participa ção, tornand o visíveis
os mundo s p ar ticipatórios do consum o imediato.
A lém disto, é ó bvia a comp ro vação d e que a co n textualiza ção é
operacionalm ente co natu ral à lingu agem hiper tex tual.
Plurali dade de leituras
Sebastião Pedrosa, professo r da U niversidad e Federal d e Pernam b uco,
para sua tese d e d ou to rad o na Unioersiiy 0/ Cei/Irai E ngland, sobre a in fluência
br itânica n o ens ino d a arte no Brasil, entrev istou no iníc io dos anos 90 tr ês
ge raçõ es de arte-ed ucad or es e qu ase todo s, co m ap enas uma exc eção, nomearam a E CA e o M useu d e Arte Co ntem po rân ea (Ml\C) da Univer sid ad e d e
São Paulo com o as instituiçõ es mais influ entes na arr e-educação em nosso
país. Realm ente, de 1989 a 1993, o Ml\C foi um laboratório d e exp erim entação de en sin o- ap rendi zage m em art e com proj eta s educacionalmente ousad o s, algun s em par ceri a co m o utras instituições. M uitas idéias po stas em
p rática no lvIAC vinham se de senvolvendo na E scola de Com uni cações e
Artes (ECA) d esde os ano s 80, nos program as d e pós-graduação e especialização que aq uela escola m antém .
• Dissertaçã o de mest rado defendida no programa de Arte e Tecnologia da Imagem, linha de Pesquisa
Multi midia, Hiper texto e RealidadeVi rtual, do Instituto de Artes da Universidad e de Brasilia. Orientadora:
Suzete Venturelli.
9
Expressã o usada por Paul Virilio.
10
DRUCKRE Y. Timothy. Cu/ture on lhe brink: ideologies of tectmolcç y. Seattle: Bay Press, 1994, p.2.
43
Tóp .co s UtÓP f<OS
Arte cerne cult ura e ar p re vsóo
E ntretan to, a falta de um laborató rio de art e p ara cria nças, adolescen tes e adultos iniciantes nas artes retardou m uitas exp eriências acerca da comp reensão da obra de arte, feitas dep ois n o lVli\C, on d e contávam o s co m um
gr up o de 12 educad ores, alguns com D o uto rad o e Me strado, e a com p etente
coordenação d e Vera N ovis, que tão b em so ub e tran sferir seus sólido s co nh ecim ento s de teo ria literária p ara op erar co m a ob ra de arte visual. Aliás, a
crí tica d e art e n o s últ im o s anos vem se apropriando do s co nstr uto s teórico s
da literatura e tr aduz indo -o s pa ra as artes v isuais, sendo casos m ais re cent es
o da estética da recep ção, o da teoria ReaderResponse e o do desconstruci o nismo,
Vera N ovis, do m inando a an álise literária e v isual, e C hr istin a Rizzi p ela sua
exp e riê ncia anterior com a contextu alização de o b jeto s do co tidian o (no
M useu da Casa Brasileira) de ram sol.id ez à leitu ra da o b ra, co mpon ente central da Propos ta T rian gular de ensi no da arte, sis tem atizad a, testad a, rc tcstad a
e d ifu ndida pel o lVlt\C nos anos em qu e a ação daq uela instituição in flu en ciou a a rt e-educação n o Brasil. In flu ên cia est a cujo eco se fez sen tir ain d a em
94, p o r oc asião cio trab alho de arte-educação realiz ado no âmb ito da exp o sição A ,teM odema Brasileira- Uma 5 elt;ção da Coleção RobertoMnrinbo, ap resentada no (.,1ASP. Pro p o sta Tr ian gular é u m facilitad or ent re a obra e o p úb lico .
N es ta a borda ge m , a im agem é co n sid erad a campo de sen tido e o que co ns titui a ap rendizage m é a co n st ru ção de sign ificado s p elo observado r.
A ima ge m, quer seja ela figur ativa o u abstrata, é um âmbito de realidade , nã o ap en as um o b jeto. I m erso s num h umani sm o b asea do na do m inação
de o b jetos, tem sid o difícil p ara o s ed uca d ore s entende rem a im portância da
imagem , da reflexão sob re ela, da pe rce pção d e seu senti do, da sua pro dução
estética através da arte e d a sua sed ução atrav és cios me io s d e com un icação .
Refl exão so bre a im agem é algo que tem lug ar em mu ito pou cas es colas e
isso resulta cm co n seq üências nefastas n ão só para a co m p ree nsão da obra
d e art e, m as também p ara uma ap reciação crítica da televisão. A ~'lTV divulgo u um a pe sq uisa d em onstrand o que seu públ.ico não d iscrim ina o que v ê:
"Dos 36 '~'~ de paulistanos que vêem a MTV, q uando
p ergunramos acer ca de seu p rog ram a preferido na grade da
emisso ra, 14'i'o não 'so uberam precisar qual e 11 % resp onderam ge nericam ent e, clipe o u programas de clipe." !'
Inúmeras p esq uisas feitas no exterio r já d em o nstraram q ue o de senvolv im en to d a capacidade de anali sar e au feri r significados a imagens de obras
11
TV Folha, P.4. domingo, 5/2/1995.
44
d e a rte p rep ara para ver reflexivamente im agens de outra categoria, como as
ima gens d a T V.
O livro .Aprendeudo a t'O; pu blicad o p ela Co leção Ro bert o Marinho,
rela ta diver sas experiên cias com d iferentes leituras d as o b ras exp ostas n o
Museu de Arte de São Paulo (MA SP) em m arço e abril d e 94. Trata-se d e
lições qu e dem onstram a inventividadc das professo ras envolvidas no projeto e a flexibilida de da leitura d a obra de arre na Proposta Triangular. Algu mas, como Mariangela Ser ri Francoio, através d e jog os, buscaram d esenvolve r a percepção para a representação e a fle xibilidade para a criação de signi ficados. Outras, co m o EHy Fer rar i, levaram o s visitantes a investig arem as
d ife renças entre a representação visual da naturez a e a sua representação
o rgân ica. Temos ainda leitu ras es tru tu rais da co m p o sição da obra e leituras
o rientadas no sentido da reco ns tr ução da narrativa.
Essas arte-educadoras não es tavam apenas fazendo o s g rupo s de visi tan tes verem a Cole ção Ro b er to Marinho; elas estavam proporcionando uma
alfab etização visual básica, tr ansferível para a leitu ra d e outras imagens, não
só aplicável às imagens art ísticas. O que há em comum na s experiências que
desc revem é o fato de que , usando a P roposta Triangular, cada uma a seu
modo p otencializou a leitura v isual dos observadores, levando-o s a fazere m
suas próprias leituras, e nen huma caiu na tentação narcisista de explicar as
o b ras pa ra audiência s enfastiadas. Ai está a diferença entre um m ero professor e um educador: en c]uanto um seg ue modelos, o outro submete o m od elo
à sua linguag em pessoal.
Q ua ndo essas educadoras p ro curaram co ntextualizar historicam ente
Di Cavalcan ti, Pancetti e K.rajcberg, elas estavam alfabetizando cultu ralmente. O Brasil é um dos países da Am érica Latina m ais ign o ran te de sua p rópria
c ultu ra c os ed ucado res co meça m a se p reo cup ar co m isto. É um ab sur do
u m adolescente deixar a 8' série sem sab er so m ar fraçõ es, m as é tam b ém um
ab surdo não saber quc m fo i Porrinari e nu nca ter visto p elo menos re produçõ es d e o br as de T arsila do Am aral e de Anita Malfa tri.
Q ue utilidade tem isto ? Voc ês p od em p erguntar. Acesso ao có digo
er udito, q ue é o có dig o d o p od er, é essen cial p ara a ascen são d e classe. É tão
im p o rt ant e q uan to a valo rização da cultu ra da classe em (]ue se vive o é p ara
o reforço do ego . Po r outro lad o, a consciência de cidad ani a d ificilm ente se
aguç a se não co n h ecem o s a p rodução do p aís do qual so mos cid adã o s. 1\ 5
comunidades hu m anas são o rg an izadas com base em esp eci ficas info rmaçõ es co m p artil hadas p or todos.
45
Rrl e co mo cult uro e e.xpre ss õc
Tó picos Ut Óp i COS
E. D. Hirsch 12 define cuiturai literacy, isto é, alfabe tização cultural, co mo
" co nhe cim ento bás ico nec essário pa ra uma alfabe tização fun cional e uma
efetiva comunicação nac ional "!' , Ser culturalmente alfabetizado é " possuir
as infor mações básicas ne cessárias para pro sperar, florescer, ser bem-suc edido no mundo moderno" !" e vale para todas as classes so ciais, acrescen ta
H irsch.
N a definição d os co nteú dos da alfabe tizaç ão cultural do s am ericanos ,
Hirsch inclui ar te abs tra ta, exp re ssioni smo abs trato , Acro polis, \V'o o dy Allen ,
Paul Cé zanne) expressionismo, imp ressioni sm o, cub ism o, Leonardo da Vinci,
Michelangelo, Pablo Picasso, J ack son Po llo ck, pré-rafaelitas e mu itos outros
artistas, mo nu m ent o s e con ceito s ligado s às art es visuais. O erro de H irsch
foi pensar qu e um "dicionário de cultura" , o qual veio a produzir de pois de
sua pe squisa, iria resolver o probl ema da alfab etização cultural. P rovavelme n te nunca leu Paulo Freire, po is não sabe qu e a cult ur a de defini ções é
m era educação bancária, simples ar m azen am ento de informação passivo.
Cultu ra não se injeta, se pratica.
A Proposta Triangular foi solução segu ida em comu m p elas educadoras que orientaram a apreciação das ob ras na exposição da Coleção Ro berto
Ma rinho em São Paulo, mas cad a um a construiu seu mé todo, agiu e elaboro u
propos tas individuais centrad as em sua s pr eo cup ações teóri cas específicas e,
pr inc ipalmen te, levaram os visitante s a co mpre ender faz end o, co ns truindo
suas im agen s através do fazer artístico. Usaram cami nhos diferentes para
realizar o ide al de G eor ge E . H ein, de qu e to das as ativida des desenhadas
para a audiê n cia de mu seu s enga jem a mente e as mãos. E sta experiênc ia
co mprova primeiramente que leitura é interp retação, e dep o is qu e as interpr etaçõe s de um a o br a podem ser tão diferentes, tantos qua nto fo rem os
inte rp reta ntes.
Po r ou tro lad o, as interpret açõe s não estão sujeitas ao julgamento de
cert o e errado, mas podem ser julgadas p or ou tros critérios, como o s de
serem m ais ou m en o s con vin cent es, o u co ere n tes o u ra zoáv eis , ou
iluminadora s, ou abrangen tes, o u inclusivas etc. Interpretaçõ es são qualificáveis
e portanto algumas interpr etações pod em ser me lhores que outras. Interpretações implicam visão do mundo, lo go, p odem haver interp retaçõ es contraditórias e competitivas de um m esm o tr ab alho.
12
HIRSCH. E.D. Culturalliteracy. N.Y.: Vint age Books, 1988 p. XV.
13
Idem p.XI.
"Idem p. XIII.
46
interpretações são qualificáveis.
não certas ou erradas.
o obj ero da int erp retação é a o bra, não o artista, p o rranto um a int erpretação não pr ecisa incluir a int ençã o d o artista, mas não ne cessariam ente
se deve excluir dado s cap tados for a da o bra através da biog ra fia, da vida do
artista, o qu e era abominado pelos formalistas.
Mé todos de int erp retação não têm interesse em si m esm os, mas in teressam ape nas po rqu e reflete m teori as qu e buscam esclare cer co mo a interpretação é construída. Alguns m érod o s dão maior impo rt ân cia ao papel do
ob servado r, co ncebend o-o co m o criad o r de realidade s; o ut ros, co nsiderando a impos sibilidade do significado literal, orienta m em direção à análise das
relaçõ es de dep endência em função do co ntexto. E há ainda os qu e favo recem o resp eito à obje tivida de do obs ervável.
As teo rias da inte rpretação e seu s métodos os cilam en tr e maior ou
me no r responsabilid ade da em oç ão, ou da razão, e evidência na definição do
Lampo de sentido, e maior o u menor im portância d e uma das três pe rso nagen s prin cipais do ato interpretativo: int érprete, obra e contexto.
Se fizermo s um inv ent ário das diferentes questões ligada s à leitu ra da
ob ra de arte, verem os q ue as variáveis acim a nomeadas estão semp re presentes e lutand o p o r prep ond erância. São inúmeras as classificações das abordagens in te rp ret a tivas. Para o modern ism o, as mais impo rtantes fo ram o
form alismo e a iconografia. Am bas priorizavam a obra e não o leitor ou o
co n texto ma s divergiam quanto à prio rização da forma ou do co nteúdo na
leitur a da ob ra.
Para Ro ger Fr y, um dos p rim eiro s formalistas mod ern o s vin culado s
às art es visua is, a análise de uma o bra deve p rio rizar os elem ento s do desigll:
linha, for ma, co r, espaço, luz, bem co mo as categorias do desigl1: equilíbrio,
o rdem , ritm o, pad rão, co m posição. J á a iconografia de Panofsky co nsidera
cm prim eiro lugar o assun to, dep ois a co nvenção qu e pr ecede o tema, e por
último dad os culturais que defin em o tem a: o artista, o tempo.
T entando uma apro ximação m aio r ao co n texto cultural, tem os um a
varian te do formalism o, a teori a da G estalt de Arnheim que, estudando os
elem ento s do design, associa co nceito s de int erpr etação por aproximação co m
fo rm as e significados anterio r m ente co nh ecidos. O conhecimento ante rio r é
o con texto.
Também m ais co ntexrualizado ra é a iconologia, que inser e a ob ra em
um program a de co mp reensão mais amplo, mais intertextual qu e a ico nografia,
da ndo m ais relevância ao s dad os culturais (Gombrich) e à ideol ogia (Mit ch ell) ,
Con tu do, algu mas veze s na prática é difícil distinguir entre as du as, como no
47
TÓp l<OS Ut6 r.lIcos
caso da análi se feita pel a N a tional G allery d e Londres da s ob ras d o seu ace rvo di fundida p ela lingu agem midi ática,
A análise ep iste m o lógica pro cu ra conhecer pro cesso e co nteúdo in terrelacio nadam en te, e a an álise tele ológica busca res ponder questões acerca da
funç ão e p ro pó sito da arte . O citacism o na p ó s-m od ernidade ressuscitou a
abordagem arqueológica, levan do a inq uirir acerca das fontes o u origem d a
o bra ou d a im agem , se est á ins erida na tradição, se é resposta ind ivid ual o u da
so ciedade etc.
A s int erp retações p sico lóg icas e psicoan alíticas direc ionam as g uesrôes p ara as relações da obra co m a m ente (sent im ento s, ide ação , ob sess õ es,
rep ressõ es, eg o, id , estado s de consciênc ia etc.) e da rep resentação d a psi que
na ob ra etc . O s a sp e cto s m ais im p o r ta n te s de s tas qu es tõe s sã o o s
p reco nstr utivo s ou g ené tico s, qu e b uscam acla rar co m o a me nte do au to r
opera na criação e na fo rmalização d o tr ab alh o, Me no s interesse têm des pertad o o s aspectos afetivo s, mas há relevan tes int erpretaçõe s guc inves tigam
como a m en te do leito r o u ap reciado r respo nd e ao trabalho e co ntrib ui para
sua co mp letação.
U ma m udança m ais radical do fo co de atenção centrad o no p ro d utor
e no o b je to pa ra centrá -l o n o c o ns u m o fo i o p e r ad a p ela s te o r ias
feno m en o lógicas, cu jo eixo prepo nd erante d e análise é a na tureza d a ex periência estética do o bser vad or. Para Me rleau-Ponry, um fenomeno logista m eno s id ealis ta c m eta físico qu e seus m estres Husserl e Heidegger, interpretar é
percebe r. D an do pri mazia à exp eriênc ia p er ceptiva, co nsiderava a pe rcepção
co m o co nh ecim en to situad o, corporificado, reje itando o tratam en to do corpo co mo me ro m ecanism o de realização da m en te e a idéia d e re flexão co mo
superes tr u tura da con sciên cia. O pro cess o d e p ercepção foi co n sid erado um
fi m em si m esm o d o ponto de vista d a int erp retação .
J á a Penomenologia de G asron Bach elard , mais recepti va à im aginação, ab riu espaço para a reverb eração po ética. j\ Fenom enologia H erm en êutica
(G adam er e Rico eur), negando que a es trutura possa so zin ha ex plicar as
ino vações d a lingu ag em , explo ra os co nflitos de interp retações, po rqu e d iferenç a e op osição de entendim ento são conaru rais à nossa exp eriência como
seres interpretantes. O pap el dos costum es, das co n venções e das pressuposiçõ es no entendimen to da obra fo i especialmente destacado p o r G adam er e
pe los teóricos da recepção Gauss, Iser) .
Na T eoria da Recepção, um a in terp re tação centrada no produto r el
ou na obra p ouco revela acerca da estética comunicativ a. É a interp re tação da
48
Art0 co rno <ulturo e e xpre ss õo
relação dial ética entre prod ução e cons umo que ilum ina o entendimento do
pap el da ar te na sociedad e e relativiza o autoritarismo in terp retativo resultan te das teo rias qu e p ro clamam a autonom ia d a obra de arte. Filiad a à E st érica da Recep ção, a teoria Reader Respome se refere a uma leitura críti ca mais
in fluenciada pela su bjetividade do leito r, po rém co m atenção espe cial ao contex to. N em a au to nom ia da o b ra, nem a auto no mia do leito r. Am bos são
med iatizad os pelas cir cunstâncias do co nt ex to. O con texto co nt orna o pro cesso d e significação e deter m ina valor; po r isso não há significad o estável
nem valo r uni versal.
A s teorias da interp retação mais co ntemporâneas, co m o a sem io logia,
a sem ió tica ,0 d eco nstrucio nism o !" e o femin ism o, têm cm co m um a ên fase
no co n texto cultur al. AlhlUns a té as de sign am co mo ab o rdagens cu ltura listas
da leitura da o bra de arte e, espe cialm ente, o de co nstr uc io nism o e o fem inismo são id enti ficados co m o sistem as d e interpretação p ó s-m o de rn o s.
O sem iólog o N o r rn an Bryso n, em suas in terp retaçõ es, asso cia o car áler so cial da imag em à sua realidade como signo. E le ch am a a at enção para a
na tu reza d inâmica d a leitura da art e e d o s siste mas de sign o s gue orienta m a
circulação do vedo r e da cultu ra pela imagem . E ntretan to, a mai s conrundente abordagem contempo rânea à leitura da ob ra de art e é o c1econ strucio nismo.
Trata-se de ve r q ualqu er ob ra com o se se tratasse d e um d up lo statement: um
ex plícito e out ro esco ndido, q ue só poderá ser en tend ido no contexto da
dife rença, da oposiç ão e d o d esloc am ent o daquilo que é m anifestamen te
cent ral para as margens, para a p eriferia e vice-versa, Obviame nte, é de D errida ,
() for m ulad or do d eco ns truci o nism o, o m elh o r exemp lo de uma leitu ra
clcsco nstrucion ista da im agem, ao ana lisar Os Sapatos de Vincent van G ogh
(1886, M useu Van Gogh, Amsterdam). D errida põ e em o po sição a inrerpreraç ão d esse qua dro co m o au to biog rafia, feita por Me yer Schapiro e a d e
Mar tin H eidegger, q ue o interpreta co m o o statement ac erca do m u nd o de
uma m ulher camponesa.
D eco nstruindo a p rópria polaridade q ue o o rienta, D err id a pergun ta:
" co m o Heidegge r e Schapiro sabem qu e o s sapa to s fo rmam u m par? O ()ue
um par? O qu e é um par de sap ato s? D e luvas? De pés ?" etc. O que
Derrida qu estio na é a idéia de par co mo estru tura.
Esta sua leitura é uma m etá fo ra d e sua atirud e crítica caracterizada
pela d eco nstru ção das di ferenças e opo siçõ es en tre p ares d e signi ficad o s
é
" Há autores que preferem a grafia "desc onstrucionismo" . Como amba s são permitidas. fico com
"deconstrucionisrno", que é minha preferida,
49
r ópico s Utó p icos
consagrados pe lo pe nsamento ocidental. Sua abordagem analítica, bus cando
várias unidad es possíveis, se dá por m eio da foc alização em pontos nos qu ais
uma oposição bin ária tal co mo signi ficante-signi ficado, liter al-figural, pr esença-ausên cia, natureza-cultura, dentro-fora, o rde m- de so rde m , m asculinofem inino etc ., man ejad a cirurgicam ente e reco sturad a por uma linha de argum ent o, revela incongru ênci as no discurso e rompe a veladura colocada sobre
múltiplos sentidos.
Além da análise de Os Sapatos de Van G ogh ap resentada em T he T rutb
in Pail1til1g, livro publicado em franc ês em 1978 e em inglês em 1987, dois
o utro s estudo s de D errida ampliam as im plicaçõ es dec on strucionistas nas
artes esp aciais. Trata-se de um ensaio sobre os dese nhos de A nronin Ar taud,
produzidos qu ando int ern ado em asilo como louco e de um texto pa ra um
catálogo do Lo uvr e so bre ceguei ra e auto-retrato. Am bo s demonstr am o
deslo cam ent o do int eresse pelo có digo hegemóni co para a produ ção p eriférica das minorias."
Fin alm ente, tam bém a co laboração de D err ida co m Peter E isem ma nn
é exp licitadora da natureza do deconstrucioni sm o nas artes espaciais. Podemos dizer que Ei semmann , que provo ca a instabilid ade geom étrica na arquitetura, enco ntro u na atitu de filo sófic a de sequilibr ante de Derrida o seu du plo. T rata-se em am bos do m esm o mo vimento constante de b usca em dire ção a pontos d e reequilibração qu e p or sua vez dão origem a no vas
desequilibrações.
Arte co mo cultura e
e rore ssõ o
caso do quadro Portrait oj Mlle. Charlotte dll Vai d'Ognes (c1800). E ssa ob ra
estava no Metropolitan Museurn of Art de New York, co m o um tr ab alho de
jacques-Louis David e considerad a de extrao rdinári a q ualida de , um a da s mais
impo rt antes do famoso neoclássico fran cês. D esco briu-se , post erior m ente,
te r sido pintada p or Constance Marie Cha rpe n tier (1767-1849) . I m ediatam ente dep ois passou a ser des co n siderada p elos crític os, q ue viam nela atribu tos fem inin os semp re negativos. Chega ram a dizer: "é poesia, não artes
pl ásticas," " é literá ria em ve z de obra plástica", " tem um char me mui to evide n te" , " inteligent em ent e esconde sua fraqu eza" , "é uma mistu ra de atitudes
su tis qu e não co nvence, só serve para revelar o espírito feminino" ."
D eve-se a críticas e historiad oras como Abigail Solomon- G o deau, Mary
Ga rrard, Linda N ochlin, G iselda Po lloc k e Lucy Lippard, e a artistas como
[udy Chicago e Ana Mendieta, estudos e ob ras que ques tionaram o código
heg emó nico masculino.
E ste é um assunto ao q ual vo ltarei em m eu próxim o livro. Ago ra, ao
men cionar o feminismo, quis apenas abrir o lequ e int erpretativo para incluir,
en tre as mui tas abo rdagen s de leitura da obra de arte, um a que eleve ter esp ecial significação p ara a educação porqu e a educação é exercida principalm en te po r mulh eres que necessitam de instrumental teó rico qu e reforce seus
cgo s culturais, tão desq ualificados pela so cied ad e das arte s dominada pelo s
ho m ens.
O d eco ns truc ionismo não é um m étod o qu e se ap lica à dec odificação
de um texto o u imagem , é um a atitu de crític a não-hierarquiz ad a. D e um a
man eira geral, a pós-m od ernidad e lib ert o u os m étodos, transformando-o s
em atitudes, propostas elou abordage ns.
Po r último, quero me referir ao feminismo , que também é mu ito mais
uma atitude de p en sam ent o críti co, co ntex tualizado r e de smi stificad o r da
hegem onia e do pode r, do que me ra ferram enta de codific ad or a .
O femini sm o foi de início reinvindicat ório, denunciando a an ulação
da mulh er pe lo pod er dos homen s qu e faziam a his tória, como é o caso de
Gombrich , qu e não m en cion a nenhuma mulher em sua Story oj Art. Outras
denún cias escand alo sas con ven ceram acerca da característic a patri arcal do s
cânones do minant es na art e o cidental. Um dos exemplos mais gri tantes foi o
te Derrida tem outros estudos ace rca de artes plásticas, como os sobre Valeria Adam i e Gerard Tilu s-
Carmel e o sob re Marie-Françoise Plissart.
50
" Informações encontradas em ADAMS, Laurie Schneider. Ttie metnoaotoçieeotart. NewYork: Icon Editions,
1996.
51
lo orcos
U tÓpICO';
A ecologia do diver sidade
ficou claro qu e os problemas de multi culturalidade circun davam os estud os
de vários int electuais dos E stad os Unid os e Europa. Basta dizer qu e ent re
meus companh eiro s de residência, qu atro estavam escrev end o livro s so bre o
assunto. Entret ant o, o preconceito de classe não era assunto pertin ent e ao
conceito de mul ticulturalidade de nenhum deles. N ão podemos reclam ar po r
uma multiculturalidade da multicultu ralidade ou meta m ulticulturalidade.Isso
ainda não existe. Por isso tem os, no Terceiro Mundo, qu e produzir no ssas
próprias pesq uisas, nossas próp rias análises e no ssas p róprias açõ es para
supe rar os preconceitos de classe existentes em nossos países, a resp eito dos
có digos culturais co n figu ráveis.
Sab emo s que há no Br asil preco n ceito co ntra a p ró pria idéia de
multiculturalism o. Para uns é coisa de feminista hist érica ou de 'crioulo' como
tenho ouvido desrespeitosament e ser dito. Para Outros é invenção de am ericano que não tem nada que ver conosco porque, dizem, vivemos nu m a democrac ia racial e as m ulh eres aqui têm aces so ao poder e os negros não são
discriminados.
O crítico de cinem a n o rte- ame rican o Ro bert Starn, em entrevista
à Folha de S . Paulo (4/7/ 95), lem br a que o multi cultur alismo tem tu do a
ver com o Brasil. O modernismo de M ário de Andrad e, a antropo fagia
de Oswald d e Andrade e a tro pic ália de Caetano e G il são exemplo s d e
um conceit o de mu lt iculturalidade ma is amplo do que os que o s ameri canos es tão ma ne jan do.
A Multiculturalidade e os Parâmetros
Curriculares N acio nais de 97/98
Preanuncia-se a possibilidade de que os problemas de diversidade cultural comecem a ser tratados nas Esc olas do Brasil, pois, sob a design ação de
" plu ralidad e cultural" ) se tornaram tem as tra nsversais no s Parâm etro s
Curriculares N acionais (PCN) editados pelo MEC em 97/ 98.
E nt retanto, mais que mero tema de estudos de todas as disciplinas, as
q uest ões de multi cultur alidade só serão resolvidas pela flexibilização de ati-
tudes e valor es. Por outro lado, não se trata de problema transversal, mas
b ásico para um a edu cação que se con figure como democrática.
A parte geral dos PCN que trata dos temas trans versais, esp ecialmente aquela de dicada à pluralidade, é he rmé tica, com uma lingu agem baseada
cm terminologia pedagógica livresc a que será pouco op eracionalizável.
Aliás, não sei por qu e os PCN ado taram a exp ressão " pluralidad e" em
vez da de sign ação "multiculruralidade", pela qual o p ro blema da diversidade
é conhecido, debatido e avaliado, já há mu itos ano s, tanto pela edu cação
co mo pela arte. Talvez tenha sido m ais um a manifestação d o esp írito
colonialista de Cesar Coll, o espanhol qu e projetou os parâme tro s cur riculares
para todo o nosso pa ís. Talvez quisesse escamotear a origem de sua s idéias e
se mos trar original esco nd endo a sua fonte de inspiração no Cur rículo N acional Ingl ês, qu e ado ra os tem as tr an sversais, n om eand o u m d eles d e
"rn ulticulruralidade" .
Sabemos que a ordem de Cesar Coll aos brasileiros era para não citar
ninguém nos parâm etros, mas me par ece que ele foi mais am bicioso, chegando
até mes mo a tornar as idéias dos outros irreconh ecíveis para parecerem novas.
Co m isto desterrirorializou, desistoricizou e despolitizou os PCN. N o tase que as elaboradoras dos PCN de arte fizeram muita for ça para recup erar
algu ma histór ia sem infri ngir as regras estab elecidas por Cesar CoU. Mas sem
no m eação a história se transforma em mera moldura despolitizada.
88
89
TÓpicOS Ur óprcos
A ecolog ia da d rver s.c c d e
A p ermi ssividade citacista pós-mod erna não é escamoteador a em relação à origem das idéias ou imag ens apropriadas. Pelo contrário, insiste na
tran sparên cia das açõe s apropriativas. O desprezo pelas aspa s, que vêm sen do substituídas pela int erpretação dos tex tos e idéias dos qu e pen saram antes
de nó s, clam a por nomeação clara e au to ria ex plícita. Trata-se d e um
antiacademicismo resp eito so co m as idéias dos ou tros. A era do co m pu tado r
ins taurou até uma nova categoria de au tor : aquel e que estab elece ligaçõ es
entre textos e entre idéias, e já vemos registr ado, principalmente em estudos
qualit ativos, p or exemplo, que este ou aquele link foi antes estab elecido p or
fulan o ou cicrano na Internet ou em aulas.
A mo rte do autor é argumento ficcion al de Foucault ou fant asm a utópico. Ironicam ente, a morte da utop ia tam bém já foi anunciada. N o exce lente livro Ensaio sobre o textopoético em contexto digita~ Antonio Riserio diz:
" Con fesso qu e, observa ndo o mundo que m e é dado
obs erva r, socie dade s e culturas co n tem porâneas, não co nsigo
encontrar quaisquer indícios ob jetivos qu e apontem, com segu rança, para o desapare cimento da figur a do aut o r. Penso
mesmo que seria necessária uma gigantesca e p rofun da revolução cultural para ab olir o autor da humanidade. Ma s uma
revolução completam ent e diferente dessa que estamos vivendo agora. P ois, até o n d e p o sso ver, a cultura rnidi áticainformática não mos tra nenhuma inclinação espec ial pa ra ab rir
m ão da assinatura . E se não há p ressão n esse sentido , como
antecipar o u dar de barato o sumiço do auto r?" !
Quais as más intençõe s de Cesa r CoIl assassinando nossos auto res, os
autores de além-mar que já deglutimos e co m eles no ssa história?
N este livro que voc ê está lendo p rocuro um caminho p ara a minha
libertação acadê mica: evito notas de pé de página, cito autores no texto e não
cito O livro na bibliografia porque alguns textos são antigos e não os tenho
na ínte gra. Mas prefiro "errar" dizen do de quem são as idéias sem pr ecisar o
livro de onde vieram a me ap ropr iar das idéias dos outros sem info rma r ao
leitor que estou me apropriand o de alguém .
Por isso quero deixar claro q ue devo muitas das " minhas" idéias sob re
multi culturalidade a Graham Ch almers, a suas inúmeras publicaçõe s sobre o
, RISERI O, Antonio. Ensaio sobre o text o poético em contexto digital. Salvador: Fund ação Casa de Jorge
Amad o, 1998, p. 147.
90
.issunto, a suas palestras inspiradoras e, principalment e, quando trab alhamos
juntos na lnternationaiSoaety of Education tbroligh Art, à sua atitude em de fesa
de diversidade de normas politicas da instituição para atend er às difere nças
socioecon ômicas do Terc eiro Mu ndo. É bom lembrar qu e encont ram os nos
presidentes Marie Franç oise Chava nne e E Ilio t Eisner tod o apoio e empenho em prol do entendimento das diferent es condiçõe s e int eresses do mundo "s ubdesenvolvido" .
O idea l mesmo será com eçar indagando: por que o pr ofessor de arte
pre cisa trazer para sua sala de aula a pr eoc upação com as diferenç as culturais? A resposta, embora pareça óbvia, foi até agora pouco consid erada pe los
educado res: em uma sala de aula, espe cialme nt e na escola pública, se int errelacio nam ind ivíduos de dif erent es grupos culturais que terão sempre que
lidar com ou tros indivíduos tamb ém de diferen tes culturas e subculturas.
Os grupos culturais que se imbricam podem ser iden tificados pela
raça, gê nero, opção sexual, idade, loca ção geográfica, rend a, idade, classe social, ocupação, educação, religião etc.
As pr incipais que stões que norteiam a atitude mu lticultu ralista no ensino da arte são:
1. Como diferentes grupos culturais podem encontrar um lugar pa ra a
arte em suas vidas?
2. E ntender que grupos culturais diferentes têm tamb ém necessidade
el a arte, mas que o próprio con ceito de arte po de diferir de um grupo cultural
para o utro.
A co nsciência de que estas qu estões são básicas, em bo ra pa reçam simples, ajudar ia a:
1. Compreender que a arte pode conferir identidade às pessoas a rrn"és de sím bo los. Um exemplo: a Arte Haida, a Arte Cont emp orânea no C::1nadá e a Arte Marajoara no Brasil. Por qu e a Art e Ivlarajoara p erdeu sua fo r ça
para conferir identidade e a Ar te H aida, também indígena da mes ma América, to rn ou-se dignificadora pa ra os seus descendentes e resp eitada pe los indivíduos de outras culturas, in clusive domi nant es? Atitudes pós-co lon ialistas
podem ser alimentadas p ela atitude pluralista em relação à cultu ra.
Um a criança negra qu e visite um mu seu que exiba arte ou 'artefa to'
africano pod erá de lá sair com seu ego cultural refor çado pelo conh ecim ento, apr eciação e iden tificação com os valores vivenciais e estéticos da Arte
Africana, ou completamente despossuído culturalmente e desidenti ficado com
a gên ese de sua cultura, dep end endo da orientação que o p ro fissio nal do
91
Tóp ico s Ut ópicos
mu seu qu e o receb a der à sua visita. Já vi orientadores de mu seu, ao falarem
de Arte Africana, se referirem ap enas à escravidão e aos fazeres manu ais do s
escravos pa ra co ntex tualizar os objetos e, em nenhum momento, se referirem às suas qu alidades estéticas. E nt retanto, qu and o se con frontavam co m a
arte de có digo europeu e norte americano- branco, a co ntex tualização era
instituci onal e a apreciação tran scend ent al, apeland o para a sensibilida de estética, a valoração eco nó mica e a ide nti ficação com stattts social.
2. Sen sibilizar pa ra p roblem as de deficiên cia física e diferença de raças, nacion alidade, naturalidade, classe soc ial, religião.
3. Libertar-se de atitudes discrim inatóri as em relação a pessoas de o rigem étnica e/ou cultural diferen te.
4. Ser capaz de responder à diversidade racial, cultura l e de gênero de
maneir a positiva e socia lmente respon sável.
É através da co ntextualização de produ tos e valores es téticos qu e a
atitude multi culruralista é desenvolvida. D aí minha oposição à triangulação
explicitada pelos PCN , I' a 4' séries, qu al seja ação, apreciação e reflexão.
Considero que reflexão é ope ração envo lvida tan to na ação co mo na apre ciação. In sistir em destacá-la seria subs creve r a estética escolástica, qu e despr ezava a arte "i n teressada" no socia l e temi a o ape lo aos sentidos, isto é, à
sensorialidacle e à sensualidade co natural à arte, co mo Plat ão já antes o demonstrara. E xarcebava a int electu alização da arte co mo correção aos seus
aspectos sensoriais con side rado s enga nado res da mente.
A estética esco lástica não dá co n ta da arte co ntem porânea da qu al
devem os tam bém e principalmente tratar. Para um a triangulação cognoscen te,
que im pulsione a percepção da cultura do ou tro e relativize as normas e
valores da cultura de cada um , teríam os qu e con siderar o fazer (ação), a leitura das obras de arte (apreciação) e a co ntextualização, qu er seja histó rica,
cultural, socia l, eco lógica etc.
As elabo rado ras do s PCN preferiram design ar a deco dificação da obra
de arte como "a preciação". Costumo usar a exp ressão " leitu ra da obra de
arte " em lugar de "apreciação" por tem er que o termo ap reciação seja interpretado como um mero deslum br amen to que vai do arre pio ao sus piro romântico. A palavra "leitu ra" suge re um a int erpretação pa ra a qu al co laboram
um a gramá tica, um a sin taxe, um campo d e sen tido d ecodific ável e a poética
pessoal do decod ificador.
Continuo prefe rindo a substituição do termo ap reciação por ou tro
qualquer, mais próx imo ao esforço intel ectu al decodificador e menos sujeito
92
A e co lo q lo do
d l vtH S l d o (h~
a uma possível aproximação banal ou ep itelial com a obra. Um certo me do
da asso ciação do termo "leitu ra" com a decodi ficação semió tica parece ter
in fluenciado na sua rejeição.
mudança
N os PCN de Arte de 5' a 8' séries, elabo rados po ster iorme nte , as
elaborad oras o ptaram por um a ab ordagem mais co loquial e mais inquiridora. N eles fo i feita a substituição do termo "reflexão" pelo termo "co nt extualização" . É claro q ue trata-se de mud ança de conceito c não ap enas de te r
mo. 1\ ên fase na contextualização é essencial em todas as vertentes da ed ucação contemporân ea, que r seja ela baseada em Paulo Freire , Vygotski, App lc,
o u ge neri came nt e cons tr utivista, para parecer origi nal co mo (luis para 11( ') S
Ccsar Coll. Sem o exercício da contextualização co rrem o s o risco de qu e, do
po nto de vista da ar te, a pluralidade cultural se limite a uma abordagem meram ente aditiva.
A rnulticulruralidad c aditiva vem sendo veemente criticada por soció logos, ant ro pólogos, educadores e ar te-ed ucadores. Por abordagem aditiva
ent endemos a atitud e de apenas ad icionar à cultura do minante alguns tóp icos relativo s a ou tras cultu ras. 1Iulticulmr alidade não é apenas fazer cocar no
dia dos Índios, nem tão pouco fazer ovos de Páscoa ucranianos, ou do br ad uras •
japonesas, ou qualque r ou tra atividadc clic h é de outra cultura. O (jue precisamo s é manter um a atmos fera inve stigado ra, na sala de aula, ace rca das cultu- \
ras comp artilhadas pelo s alunos, ten do em vista que cada um de nós pa rrici {
pa no exercício da vida cotidiana de mais de um grupo cultural,
Por exem plo: eu me defino ao mesmo temp o como mulher do ponto
de vist a de gênero, no rdestina do po ntO de vista da locação cultu ral, arteeducadora do ponto de vista da ocupação, bran ca do ponto de vista da etnia,
heterossexual do pont o de vista da opção sexual, classe méd ia do pont o de
vista da renda. Po rtanto, p ert enço a alguns grupos de cu ltu ra dominant e,
mas tam bém pertenço a g rup os cultu rais discriminados, com o o de rnulhcrcs e de nord estino s em São Paulo. Além disso, como arte-educado ra, so u
discriminad a po r artistas, historiadores e críticos, os grupos dominant es na
área de arte.
D iria qu e para ter mo s uma ed ucação mulriculruralista crítica em arte é
necessário:
1. Promover o entendim ento de cruzamentos culturais, através da identificação de similaridades, pa rticularm ente nos papé is e funções da arte, dentro e en tre gr up os cultu rais.
2. Reco nhecer e celebrar diversidade racial e cultural em arte em no ssa
93
\
,
rÓ p lCO S Utópicos
soci edad e, enqua nto tamb ém se potenci aliza o o rgulho pela heranç a cultu ral
em cad a indivíduo.
3. Incluir em todos os aspe cto s do ensino da arte (produ ção, apreciação e co nt extualização) problem atizações acerca de etno centrism o, est ereótipos culturais, preconceitos, discriminação e racismo.
4. E n fatizar o estudo de g ru pos particulares e/ou minoritários do
ponto de vista do poder como mulheres, índios e negros.
5. Possibilitar a co n fro ntação d e problemas, tais como racism o, sexismo, excepc iona lidade física ou m ental, particip ação democrática, pa ridade
d e poder.
6. E xaminar a dinâmica de diferentes culturas.
7. Desenvolver a consciênci a acerca dos m ecanismos de manutenç ão
da cultura dentro de grupos so ciais.
8. Incluir o estud o acerc a da transmi ssão de valores.
9. Questionar a cultura dominante, laten te ou m anifesta, e todo tipo
de opressão.
10. Destacar a relevância da informação para a flexibilização do gosto
e do juízo acerca de outras culturas.
E mbo ra isto esteja com cara de 10 mandamentos da multiculturalidad e
em arte, arriscaria dizer que não são um regulam ento n em religião, m as lem bretes pós-cr íticos que , se postos em pr ática, de sm entiri am muitos do s preco nce itos culturais, como, por exem plo, a idéia de qu e a melhor arte é a
p rod uzid a p elos europ eus e a de que pintura a óleo e a escultura em m ármore são as m ais importantes formas de arte. Estas idéias só reforçam o có digo
hegem ônico. Outra idéia preconceituosa de qu e a m elhor arte tem sido produzid a por hom en s, também seria desmentida se a con textualizássemos em
relação ao papel secund ário que as so ciedad es têm determinado para as mu lheres. A diferença hierárquic a entre artesa na to e arte, que é tamb ém
pre conceituosa, seria contestada se analisássem os o valor dos sa be res dos
po br es e dos ricos auferido pe la cultura do minante.
Para chegarmos à desmistificação de muito s pr econceitos, é nec essário discutir:
1. a função da arte em diferentes culturas;
2. o papel do art ista em diferentes culturas;
3. o papel de quem decid e o que é art e e o qu e é arte de boa qu alidade
em diferentes culturas.
94
R ecologia do diver sidade
Estas discu ssõ es co nt ribu iriam para:
1. o respeito às diferenças;
2. o reconh ecimento d e m anifestações cultu rais qu e nã o se en caixam
no sistem a de valores qu e subscrevem os;
3. a relativização d e valor es em relação ao tempo.
Atividad es como ident ificar as formas de arte que importam em uma
variedade de culturas e subculturas seria uma estra tégia que p od eria levar a
um a atitud e multicultu ralista. Educação multiculturalista p erm ite ao aluno
lidar com a diferença d e m odo positivo na arte e n a vida .
N ão adian ta nada fugir do uso de p alavras co m o b ranco, n egro, raça
etc. A ch am ada lingu agem politicamente correta, como diz Gloria Steinern",
foi criad a pelas femini stas para ironizar o compo rtamento masculino, que
busc ava escam o tear a discriminação. O engr açado é que todos levaram a
sério. En tretanto a lu ta ant idiscrim ina tória consist e em falar a verda de abertam en te, dar o verdadeiro nome que design a o pr econceito, e não adap tar-se
aos novos temp os multi culturalistas atr avés de de sign ações científicas ou
sup ostam en te respeito sas como etnia em vez de raça, afro brasileiro em vez
de n eg ro.
Ao substituirmos raça por etnicidade, um princípio de or ganização
so cioecon ômico e de coesão, inadvertidamente negamos a história do racism o. I sto signi fica qu e a respon sabilidade dos brancos pe la explor ação e opressão dos negros e índios é suavizada pela de missão da história. Continuarem o s a mostrar a nosso s alunos o lH ollll/JIeJJt o às Bandeiras de Brech eret como
uma magnífica obra d e arte , sem analisar o fato de que ela com emora um
episó dio colonialist a de noss a história, no qual a m atança e a escravizaçã o
dos nativos, dos índi os, atingiram proporções dizimadoras.
O politicamente co rreto é um clichê. O que acontece, em geral, é que
mudou a linguagem m as o preconceito permanece, agora disfarçado. Militân cia
multi culturalista é compromisso com a de smontag em de preconc eitos e não
com lingua gem atenuante.
O que se está ob servando em todo o m undo é que a m od a globalizado ra
de estabelecer currículos n acionais ou outros eufemismos, como standards
nacionais e até parâmetros nacionais, resulta n o desenvolvimento do p oder
de controle do gov ern o sobre a educação, m as não numa melhoria de qualidade das escolas e do ensino.
, STEINEM , Gloria . A feminista tranqü ila. Entrevista ao Jornal do Brasil. Caderno Mulh er. p. 1,1 3/9/1997.
95
A e cologia da orver srcode
1,'lp I((, ·. llttl IJIlO '.
Na Inglaterra, h á qui nze anos , h avia maior atenção à educação multicu ltural d o que agora, depo is del a h aver se tornado o b rigató ria como tema
trans versal através do Cu rrículo N acional. Segund o os críticos de ed uca ção
ingle ses, a hipótese d e que a tra nsversalidade tem ática seja tão ameaçad ora
pa ta os p ro fessores qu anto o é a in ter disciplinaridade po de exp licar a ap atia
n o qu e se refere a temas cross cun iC1l//IIIJ na Inglater ra.
Se lá, ond e já h á uma tr ad ição d e luta p or in terd iscip lin a rid adc
(Sum merhill foi um exem p lo) es tá aco nt ecen d o isto, imagine no B rasil, o nd e
a d escon fiança int erd isciplinar e a falta d e d isp osição para navegar por ma is
d e um a dis cipl ina levo u a l\N PPAV - Asso cia ção Nacio nal d e Pesqu isa e
P ó s-gr ad uação em Artes Visuais (nã o é a ANPAP) a aprovar a exclusão da
arre-ed uca ção da área de artes do CNPq e d a CAPES. E ssa ass o ciação tem o
aval destas du as enti da d es que d everiam estar lutand o p ela mel horia d a ed ucação, pois são g overnam entais e g overn o tod o o dia en tra em no ssa casa
at ravés d e jo rn ais e televisões para afi rm ar a prio rida de d e su as açõ es em
relação à ed uca ção . E nq uanto isso, em um a reunião (9 de outu b ro d e 199 7)
de ap enas 12 pesso as', sem nenhu m ar te-edu cad or pr esente, a ANPPAV vo tou
a elimi na ção d a arte-educação p elo fato de ser difícil decidir q ua ndo um projeto apresentad o é de arte ou d e educação. Trata-se de mera int ole rância
interdisciplin ar e desrespei to pel a ep istem ologia d a arre.
°
N ão se sab e ainda a de cisão d a CAPES e d o CN Pq, p ois nun ca re sp o nde ram às cart as e ab aixo -assina dos d os art e-ed ucadores p ro testando contra a d iscriminação d a q ual fora m vít im as.
Coisas com o esta nos faze m tem e r p elo desenvolvimento das aventu ras co gnitivas q ue ultrap assem fr on teiras discipl inares e/ o u cu ltu rais.
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3
Os professores presentes nesta reunião e que aprovaram por unanimidade a exclusão de arte-e ducação da área de artes do CNPq e da CAPES eram no momento coo rdenadores dos programas de pós graduação em ar tes visuais de várias universidades brasileiras: Ora Glacy Antunes de Oliveira (UFG);
Dr. Heitor Capuz zo Filho( UFMG) ; Dr. João Evange lista Silvei ra (ECAlU SP); Ora Maria Amélia Bulh ões
(UFRGS) ; Ora Mar ia Ce leste de Almeida Wanner (UFBA.); Dra Piedade Carval ho (UFF); Dr Rogério
Medeiros (UFRJ) e os represen tante s das artes no CNPq . Ora. lcl éa Catani e CA PES, Ora. Sonia Go mes Pereira.
Sinto ter de dizer que estes professores nunca dera m atenção e muito men os resposta aos apelos
poste riores dos arte-educado res expressos em cartas e abaixo-assinados aprovados por assembléia no
Cong resso Nacional da Fede ração Nacional de Arte-Educadores do Brasil (Dez. 97, Macapá) e da Associaç ão de Arte-Educadores do Distrito Federal (Brasilia, Nov 97). Três out ros professo res que também
condenaram ii exclusão a area de a rte-educação naquele fatídi co ) Encontro da ANPPAV procurara m se
desculpar e acredito serão corajosos o suficien te para reverem suas posições no futuro . São eles: Dr.
.João Jurandir Spinelli (Unesp); Dr. Elyeser Sztrum (UNB); Dra.Helena Ja nk (Unica mp).
96
97
Tópicos
UtÓp ICOS
A e colc qro do drver s roc oc
Aprendendo a ver
Eilecn Adams
Minha primeira exp eriênci a co m meio ambiente foi como professor a
de arte na Púd ico School, d e 1974 a 1976, trabalhando no Front Door Projea
(projeto Porta da Frente) 1 e, d epois, como dire to ra do Pro jeto de Desenvolvim en to Curricular Ar! and lhe Buil! E nuironment (Arte e o Ambiente
Con struído)", Além disso, lecionei no cur so superior de en sino do design no
Rqyal CollegeasAr!, em Lond res, e em vá rios cursos na E scola Politécníca de
Birmingh arrr' . Passei a dedi car-me na pesquisa em tempo integral a p artir de
1985.
N este ensa io pretendo relacionar asp ect os da estética e do design com
a questão do m eio am biente . Que ro explic ar o rece nte de senvolvimento desse aspecto do ensino de ar te e do design, bem como considerar as p ossibilidades futuras. N o momento, essa é a minh a principal pre ocup ação. Atualm ente
trab alho como pesquisadora no pro jeto Aprendendo a Ver. O enfoqu e d a pes quisa é o trabalh o em escol as bas eado na experiência ambi ental e através dele
são desenvolvidos:
• o conhecim ento estético e de design;
• um a resposta sensível ao lugar;
• as habilidades críticas e discriminató rias (desenvolvimento da capacidade de julgamento);
• as habilidades de design (dar forma ao ambiente e lidar com mudanças).
1
2
Projet o Port a da Frente; Boletim de Educação Ambiental, n. 96, Abril de 1976.
Ver (1) ADAMS , E. & WARD, C. Arte e construção ambiental. Londres: Longm an (1982) ; (2) ADAMS , E. &
BAYNES, K. Arte e a construção ambi ental: atividade s de estudo. Londres: Longm an Resources Unit
(1982); (3) ADAMS , E. Arte e cons trução ambiental. Equip es de trabalho. Londr es: Longman Resour ces
Uni! (1982 ).
E sta área relacio na conc eitos artístico s, d e design e conceitos ambie ntais
e, como tal, nem semp re encont ra espaço específico no currículo escolar.
E nt retanto, no que diz respeito ao currículo oficial, pode ser incorporada
com o parte da disciplina de arte e design, design e tecnologia, além de educação
am bien tal. I sto diz respeito ao currículo "form al" - o qu e os p ro fesso res
pr eten dem ensinar. G ostaria de incluir tamb ém consideraçõ es sobre o currículo " in fo rmal" - o que os estud an tes aprendem ent re eles, e o currículo
" oculto" - o que eles ap ren dem pelo sim ples fato d e p articip ar em do am biente escolar.
A imp ortância dessa s áreas am pliou-se através do meu envolvim ento
com ou tro p rojeto de pesquisa, Aprendendo através de Paisagens, on de apro fundei
as oportunidades edu cacion ais para melho rar a qualidade ambienta l em área s
escolares.
D urant e os último s quin ze anos, meu trabalho es teve ligad o à filoso fia e prática de uma área do currículo de arte e design que se encontra no meio
ambiente e que procur a desenvolver diferentes m aneiras de ver - através dos
olhos do artista, do crítico e do designer, E sse trab alho começou como urn a
ren tativa d e explicar a aruaç ão do s professores d e arte e atravessou diversas
fases, atrav és d a experim ent ação, crítica e aper feiço amento, atingindo ago ra
o estágio adequ ado para inte grar o currículo esco lar.
N o início dos ano s 70, havia um interesse crescente nos assuntos
amb ienta is, particularmente o m eio am biente urbano , o qu e motivou algumas iniciativas o ficiais como o Relatório Skeffington, em 19694• N o enta nto,
o meio ambiente "natural" era mais enfatizado como fonte de estímulo s ou
referência p ara trabalhos de observação. N as esco las primárias eram emoldurados croquis que servi am como ilustr ação pa ra trabalhos de designo N as
esco las secundárias, cro quis e foto gra fias eram colocados em po rtifólios como
ma terial de referênc ia, destin ados ao trabalho em diferentes tipos de media. O
meio ambiente era usado como fonte de estímulos, com o modelo , como
"p ista" para idéias, tendo seu enfoque principal n a natureza. Os professores
de arte supun ham que o "e stud o ambient al" era responsabilid ad e da disciplin a de geog ra fia - e se fosse criado um espaço dirigido espe cificamente p ara
estudos am bientais, seria ocupado por um biólogo.
Durante a déc ada de 70, o estud o da arqu itetu ra foi ministrado em
poucas escolas, abordando princip alm ente história e o desenvolvimento de
, Escola Politécnica da Cidad e de Birmingham. Arte e construção ambiental. Artig o resultant e do trabalh o
de alunos do DPSE e PGCE (1983).
4
126
Relatóri o Skeffington, Pessoas e lugare s. Londr es: HMSO (1969).
127
A ec ologia do d iver sida de
TÓpicOS Utópicos
estilo s de arqui tetu ra. A his tó ria da art e parecia m ais r elacionad a com a história de pintura. Nem todos os professores de arte tinham conh ecimento de
que sua orientação se des tin ava ao ens ino da arte e da arquitetura. A crítica
como estud o ainda n ão é p opular hoje. O s p rofessores en car avam a críti ca
com sent ido ne gativo. Ficavam indeciso s so bre co mo lid ar co m estu dos d e
crítica em relação ao ambiente e achavam difícil relacio nar esse as p ecto com
seus conteúdos d e en sino. D a mesm a forma, o estudo do desigll era cada vez
mais v isto co m o território do p rofessor de artesan ato ou tecnol ogia, e o
estudo ambien tal de sempenhava ap enas um p eq uen o p apel em seu trab alh o,
embora o c ur rículo do curso de design incluísse um subs tancial componente
am bien tal.
DO
<;.E
Foi m uito difícil para os professo res ad o tarem a titud es di fer entes sem
estímulo ou a poio de fora d e sua classe. A fim de providenciar um ca talisado r
par a tal mudan ça, muitos arqui teto s e p ro jetistas am bientais foram encorajad o s a trab alh ar ao lad o de p ro fessores p ara d esenvolver asp ec tos críticos e de
ap ro fu n da me n to d o es tudo a m biental. Seu próprio trab alh o reivindica discriminação e julgamento em relação a ass un to s ambi entais e eles es tão in teressados em lidar com mudanças. O ap oio quanto à importância da arte e do
design em educação e para o envolvim ento de arquitetos e p roj etis tas foi dado
a partir d o relat óri o E mironmenta]educationin urban areas (Educação ambien tal
em áreas u rb an as)".
"A educação ambiental urban a deve ajudar as pessoas
~í,t.l )\
a se conscientizar, compreender, analisar e, final m c.ite, aper\ \\\\Vi.
feiçoar as edificações. Sua preocupação principal deve ser ajudar as pessoas a participar mais efetivament e na for mação de ~\j- , \
seu meio am biente local. Isto não é um problema único em
sua es sê nc ia, d eve nd o reportar- se também a as p ecto s
ambien tais de problemas tradicionais, variando desd e as ciências naturais, através da geografia c história da arte, arqui tctura
e planejamento. D evo incluir compone ntes visuais c de clesign
e deve envolver tanto a experiência direta com o o resultado
acadêmico." (Conclu são 2)
Tudo isso foi co nfir m ad o n as conclusões qu e fizeram p arte de um
relatório d e 1973 , en tirulado Design iII General E ducation (Design n a ed ucaç ão
geral)S, do Roya! College of A rf. O relatório revelou que o estud o de arte e
de sign nas escolas estava lim itado a pro jete s g ráficos e d e p ro duto s, com
ên fase n a criação d e o b jeto s. Havia p o uca evidência de estudos críticos e
nenhuma evidência de p rojetas ambientais.
O p ro jeto Front Door (porta da Frente) veio resp on der diretamente a essas conclusõ es. N aquela época, dois esp ecialistas em estudos de arte fo ram particula rm ente influentes para a promoção do trabalho am biental nas escolas: D an
- \~IlS Shanno n , o rientando assunt os de arqu itetura e planejamento; e R alp h Jeffrey,
um do s criadores do p ro jeto "A Arte e a Construção Ambiental para E sco las" .
D
an Shanno n promoveu o cantata entre professo res, arquitetos e projetistas;
NON
Ralph Jeffrey tinha um interesse particular na crític a como um estu do.
"l
, ':'1.:
c-l <'-C 1
'
. ""l
''As respostas estéticas for maram uma das áreas mais
impor tant es e mais negligenciadas. Nossa to tal falta de arcn
ção para a ed uca ção visual, para ensinar as pessoas a enxerga
rem, foi sempre reiterada pelos ent revistados; eles con sideraram este ponto um a das características mais p reocupantes ,k
nosso sistema educacional, o que acarre tou as co n seq üêr« 1.1' .
mais desastrosas. A preservação de um sentido de lugar c "
conhecimento de suas raízes foram aborda do s como aspc' I I J'
parti cularmente vitais, quando tant os tiveram experiêncr.i II,
segund a mão. Praz er, curiosidade e um sentiment o de elll . 11'
tamen to, quand o apropriados, devem ser ativamente cn r II .'
jados." (Conclusão 12)
Vário s docum entos curriculares e p ro g ra m as d e avali ação elaborados
apoiavam essa área de estudo, encoraj ando o pe n sam ento crítico e a ha bilidade de pl an ejamento, emb ora ainda ho uves se re sist ênc ia entre os p ro fessores
em lida r com uma áre a na qual eles sen tiam que h avia falta de co m p etê ncia
pe sso al e profissional. A ên fase do ensino de arte co n tinuava o rientada para
o trabalh o de expressão e o mod elo do artista co ntinuav a send o a grande
influência so b re o qu e foi e como foi en sin ado com relação ao tr abalho
am b ien tal. Par a muitos professores de arte, a experiência de seu próprio trei n amento - p ar a muito s d eles como pintores - teve um profundo efeito em
sua atuação como p rofessores e desafio s de am pliar sua aru a ção para um
território p o uco famili ar am eaçava a id entidade d e seu desempenho.
S
Colégio Real de Artes. Design na educação geral. Unidade Educacional de Projetos (1979).
128
I
Algum as entidad es tiv eram influência na cri aç ão do inte rc âu ii"
inr erprofissional na educação : E uropean Arcbitectural H eritage Year (A I1' I , I"
6
HALL , Peter. Educaçã o ambie ntal em áreas urbanas . Londres, DoE (1979).
I ' '' '
Tópico s Utópicos
A eco lo g ia do dive rsi(!çi l l"
outras referências variadas
Pat rim ónio Ar q uite t ônico E uropeu), o School Council (Co ns elho de E scolas),
e o Royal Institute of BritisbArchitects (Ins tituto Real Britânico de Ar quite tos) ,
e as associações regio nais de arte . Escritó rios de arquitetura e cen tros de
estudos ur ban os ajuda ram a facilitar essa ques tão .
H avia tamb ém o p erigo de que a cre scente p opul aridade do apren dizado, baseado em unida des, te nderia a enfatizar a realida de soc iopolitica , à
custa dos interesses estéticos e de design, e fosse negligenc iada a im portância
da percep ção ind ividual, a ética su bjetiva e sua respo sta corresp ondente:
"A cidade, como a conhecemos, a suave cidade da ilusão, mit o e pe sadelo é tão real, talvez mais real, do qu e a dura
cidade que po dem os localizar nos mapas, n as estatísticas, em
artigo s espe cializado s sobre sociologia e arquitetu ra urbana.':"
A ênfase d ada - an álise quantitativa - fez com que ficas se muito difícil
in tro du zir estu dos qualitativos, en fatizand o a avaliação e a fo rm ação de julgamento. E nq uanto a qualid ade ambienta l e o impacto am biental to rnaramse ago ra assun tos de natureza própr ia. O in teresse at ual nesses assun to s em
círc ulos nobres, na rn ídia, na sociedade, no governo e em filas de ô nibus,
tud o apo nta para o novo despertar de int eresse nessa área - o m eio ambiente
o nde vivemos, trabalhamos e nos divertimos, com o qu e ele se pa rece, co m o
ele é sen tido, com o somos por ele afera dos e co m nós o afetamos.
E sp ecialistas têm dito nos últimos anos:
...a essência da co ntribuição que a art e nos dá aqui se situ a no julgame nto e dec isão...
...a co nstituição e info rmação des ses julgamentos pela ex periência e
enr iquecimen to é a principa l finalidade da arte na escola...
...espe ra-s e que os alunos ten ham um co n hec ime nto crí tico de seu
me io ambiente, sua qualidad e e seu estilo (o u a falta deste) no proj eto de sua
casa, ves tim enta e ador no, e de como as co isas podem ser melho radas ...
...as principais habilidad es desenvo lvidas pela prática da arte são: a
habilidad e de comunicar-se visualme nt e e o poder de discriminação - o recon hec im ento de que, con for me o Relatóri o N ewsom, "os alun os são p essoas
que têm a capac ida de de for ma r um julgamen to correto"...
...tradição e antecedentes são menos úteis ago ra como guia s n um a
situa ção de muda nças aceleradas, e por isso há uma maior nec essid ad e de um
7
RABAN , Jonathan . Cidade suav e.
130
sen so de julgam ento co ns trutivo. T anto faz se responder m os, por exemp lo,
a novos produtos de co nsumo, a recentes manifestações artís ticas ou a alte rações do meio am biente com interesse , au to con fiança e bom julgame nto,
ou, ao co nt rário, co m uma vu lnerável falta de co n hec imento. Isto vai depender em parte da qualidade do processo educacional.i."
O p ropósito a long o prazo d o P r o jeto de Art e e C o n str uç ão
A m biental era de capacita r as pessoas a to mare m um a posição m ais criativa e participativa na form ação de se u meio am biente no futu ro . Is to
II'
re-em er giu agora co m o um a preo cupação em in iciativas, tais com o o
E stetas .Actions Programme (programa d e A tivida des Patrim oniais) e os pro - Ck.\ -\
gram as de cOJlllJJunity refurbisbment (recu p eração co m unitá ria), o nde os \J{\ I?\ I'
m o rad o re s são en corajados a assum ir um co ntrole m aio r na fo r m ação e
admi n is tração d e seus ar redores. I sto r e -em erg iu , n a co nsci ê nc ia
am b iental, co mo um a qu estão p ara a co n serv ação, re ab ilit açã o, re n ovação e heranç a. R e-emergiu em es fo rços re n ovados p o r pa rte d e in stitu içõ es e g rupos de p ressão para aumen tar os níveis d e inter esse, co m p reen são e preocupação ta n to d o p ú blico pro fissio nal co m o leigo. Re-cm crgiu n a retó rica go vern am en tal co m o a necessi d ade de m aio r r esp o n sa b ilid ad e pessoal pe lo meio am bie nte e engajamento de cidada nia . Re- crncrgiu co m o um co nce ito de m ídi a em inco ntáveis pro gramas d e televisão
sobre a r e cu p eraç ão d as cid ades, arqu itetu ra m o d er n a e projeto s
ambien tais. Aparece aind a em tantas o u tras co mpe tições e programas ele
prêm io s - a BBC tem It 's My Ciry (Es ta co n cIama p ara uma "I nghrcrra
m el h o r" ).
Sim, mas o que tem tud o isso a ver co m arte e desigll no co nt exto da
educação am biental? Tem tudo a ver, sobretu do se tivermos uma ampla vi
são de nossa tarefa e a relacio narmos com qu estões de educação em gn;\1.
Tem tu do a ver com o desenvolvime nto do co n heci m en to, da comprCl'lls:l()
e da p reocupação co m a qu alidade estética e do designo Se co mpararmos ( l
ressu rgim en to do int eresse o ficial e d o público em assun tos am bientais, co m
a atenção sem precedentes que arualme n te está send o dispensada à educação, aqu eles env olvidos com a educação de ar te e design precisam estar a par
da importância de seu cam po deatu ação em áreas que estão atu alm ente scn do examinadas bem mais detida me nte: estética, que envolve expe riênc ia scnso rial, considerações quanto à for ma e à aparência; crítica, qu e envolve a
, Departamento de Educa ção e Ciência : Papéis de comentários: Curriculo 5-16 .
131
A eco lo gi a da d lver s.dode
Tóp IC OS Utó p IC OS
formação de julga m en tos sobre qualid ade; e projetes, qu e envolve a forma ção e co ntrole do m eio am biente. Todas elas lida m co m os relacionamento s
entre pessoas e lugares, o que envo lve significado emocio na l, significa do sim b ólico e compreensão cultu ral. To das elas são b astant e ad equadas ao território do pro fess or de artes e design o u do profes sor de ensi n o funda m ental
preocupad o co m o ensino d e artes.
O trabalho nas esco las ab rang e um am plo raio d e in teresse. I sso in clui
tu do aq uilo que desenvolva um m aior g rau de conh ecimento am biental; aquilo
q ue cons trói u m vo cab ulário relacion ad o co m experiênc ia estética e d e desig11;
aquilo que encoraja um a resp o sta am p la para promover um se nti do de lugar.
A arte aqui é impo rtan te no de senvo lvim en to do sentido de p o sse e identidade em relação ao meio am bient e. E la é usada co m o um m eio de intensificar
exp eriências, in fluen ciar a p ercep ção, p er m itin do ao s estudan tes qu e refli tam sob re a exp eriên cia adq uirida e p o ssa rep ro cessá-Ia para que faça sen tido. E la tam b ém en co rajo u um a abo rdag em que enfatiza a c rítica, co m o um
es tu do atr avés do q ual o s estu da ntes têm sido ajudados a form ar julgamen tos d e ava liação sobre q ualid ade e a tentar explicá-los o u justificá-los. Este
tip o de trab alho envo lveu assim tan to o us o de uma linguagem visu al como
o uso d e palavras. El a m o stro u co m o em alguns casos isto condu z à atividade de desig11, o n de o s estudantes es tavam engajado s em co nc eitu alizar p ossib ilid ad es de mud an ça, utiliz ando im ag ina ção e fan tasia p ara criar uma n ova
realidade.
E s tas ár ea s de es tu d o en contraram eco em exem p los d e trab alho s
realiz ado s no exter io r, é sig nifica tivo q ue n o s caso s em que h o u ve um
co nraro d e trabalho com coleg as d e o u t ro s p aíses tan to as id éias p ara
.: . , estud o como o s m é to d o s de est u d o s de se n vol v id o s n esse país p u d eram
~O\fL se r tr ans fe rido s p ara o u tro s am b ien tes e d iver sas in stit uiçõ es c ult u rais.
l'A - E ntreta n t o, n u m e stud o q u e re alize i p a ra a U ne sco ,? em n o m e da So cied ad e Inte rn ac ional p ara E d u cação a t rav és d a A rte, e m 1983, fico u cl a ro
q u e co leg as no camp o do ensin o d a a r te em outro s países europe us de. ram u m a ên fase mui to maio r à id entidad e cu ltural do q u e n ó s d am o s em
• ~
I estud o s qu e lig am a arte ao m eio ambiente .
l~
O s mét o d o s d e estudo procu ra ram re sp o nde r a duas p ergun tas:
,co m o p o d emos ampliar a experiê n cia ambi ental d o s es tu d an t es? E co m o
po demo s apro fu n da r su a compreen são d o m eio am b ien t e? A a rte t em
U)I~ '
questões
.. ADAMS, E., BERG, E. & MASO N, R. (Mai o de 1984) Edu cação artística e educação ambíent aJ. (Revisa do. ADAMS , Out.l 1984, 1996). UNESCO - Sociedade Intern acional para Educação através da Art e.
132
sido u sad a como um m eio de intensificar ex p eriê ncias, concen t ra r a aten ção, como um meio de percepção, d e a nálise, de re flex ão sob re estas
experi ências, com o um meio d e reproce ssa r es ta experi ênci a a fim d e
en t en d ê-Ia. E la fo i u sad a não apenas p ar a re sp onder o que ali h avia, mas
p ara consid erar o qu e p oderia h aver, pa ra ex p lo rar o sign ificad o e va lor e
p ar a envo lv er os es tuda ntes na criação do sig n ificad o atrav és d a avaliação das a tiv id ad es. A escol a p ro p riamente di ta ag e como um p od ero so
ed uc ad or atrav és d a lin gu ag em vis ual, esp eci al e simbólica, que ela emprega e propo rcio na co m o u m a fonte sign ifica tiva para ed ucação arn bi e ntal, ar te s e desig11. Po deríamos p ergu nta r a t é que p onto o am b ie n teoutras
cs- tJJ W) \:
co lar, ta n to em ter mo s fí sicos como sociais, d est ró i as idéias, atitu dquestões
es c .
va lo res qu e pro curam o s p ro m over n a au la de a rtes ? Com o am p liare mos ~,~\ I
o in tere sse por val o res es té tico s e quali dad e de projeto introdu zin d o -o I\"'-' \\ ;~' \
n o n osso ambi ente d o di a-a -d ia e nas ati vidade s com ele r elac io n ad as) -::1\ 1\II I'
As idéias em sua ess ência são to das muito boas, m as é claro que ter ão
vida cur ta , a não ser q ue sejam fei tas tentati vas p ara ins titucio nali zá-las. Isto
está acon tecen do de diver sas man eiras: através do tr einam ento d e p ro fesso res, ta nto n o seu treinam ent o inicial qu anto p o sterio r; atr avé s de inici at ivas
d e dese n v o lv iment o de c u r rí c ul os , t ai s como equip e s de tr a b a lh o
int erp ro fissio nais; atr av és de programas de ava liação. E stes p ro g ram as pr ccisam de um reforço ad icional atrav és d e uma exp o sição mais ampla em apr e
. - e cori t:rere. n cias.
,
A'
sen taço- es, p u bli caço- es, co b ertu ra p or te Ievisao
cim a (I c 1.1Il I" ,
ele s precisa m se r explicitamente en quadrad o s no currículo ofic ial. E s rlldo s
. eIUIíd os em p e Io m en o s trc. s :'I IT :I S:
d e co n str ução am bilentaI po deri
enam se r m
não ap enas em ge ografia, ma s em ar te e design e design e tecn ologia. Pod('III" ~
de um a forma útil ado rar o con ceito do prati can te, on d e, a tra vés ele n:l'I" :;:1I1
so bre nossa atuação e da sua avaliação, p o ssamos revisar, definir c rl't1 l'!i lli I
n o sso tr abalho, dep ois inves tin do esta compreensão em futu ro s e01p n,(,ll' II
men tos . De fo rma igu almen te freqü ente, o de senvolvimento de currícu lo.
requer no vo s relacionamen to s de trab alho, p eríodo de exp eriências, assl1111i I
risco s, qu estionam ento e reavaliação, e implica estar preparando p:lr:1 I r. il ':1
lhar em favo r d e e aceita r um in evi tável g rau de mudan ça.
Na maioria das vezes, os relacio nam ent o s e p ráticas dentro d:l:: ( ',(
las tendem a enco rajar a co n solidação e tr abalh o na direção co n trá ria. Pr' ,
fessores criativo s sempre se envolvem em experiên cias e in o va ç ões. 1::111 V:II
p erman ecer em nível de aru açã o individual, a não se r qu e sua c xpc ric n ci.r ·;t j:1
tornad a acessível e di sse minada mais ampl amente. A questão ag or;) é 1(li 11:11
no sso trab alh o conhecido e no ssa voz o uvida.
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133
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r óp ico s
A eco loq io da diversida de
Ut Óp iCOS
Programa de cinco itens para arte e design
em relaç ão ao estudo ambiental
1. Atitude
Aqueles que estão envolvidos com ensino da arte e do design já viram que
não faz sentido ficar escondendo-se sob a falsa segurança do estúdio de arte e
deixar que qualquer um interfira na política escolar. As escolas são ago ra arenas
políticas, nas quais você, que qu er tomar uma posição positiva, briga por seu
espaço, justifica sua existência em condições que sejam aceitas e compreendidas
por outras pessoas a fim de desempenh ar seu papel profissional. É preciso que
os professores d e arte desenvolvam um autoconceito positivo. Professores envolvidos com esse ensino precisam reconhecer seu papel no contexto da educação em geral. Es pecialmente com relação ao currículo oficial, nós temos que
aceitar nossas respo nsabilidade relativamente a "todos" os aluno s e reco nhece r a
necessidade de cursos de artes e projetos que atenda m às necessidades de uma
diversidade de alunos. Os professores de arte e design precisam exemplificar o
modelo do bom aluno, ser curioso, querer aprender, saber com o aprender, valorizar novas experiê ncias e idéias, desenvolver conceitos, ser capaz de pensar e de
agir. Isto é particularmente imp ortante com relação ao meio ambiente, onde a
única certeza que temos é a de mud ança.
4. Treinamento de professores
Es tão ocorrendo mu itas mudanças nas condições de treinament o do
pr ofessor de arte e designoTorna-se ne cessário colo car as questões ambientais
de acordo com as várias exigências de professores e alunos. Torn a-se nec essário gerar e d esenvolver expe riências ade quadas , cursos e matérias que ajudem os professores a lida r co m esta complexa e desafiado ra área d e estudos
qu e inte r-relaciona qu estõ es d e arte, design e edu cação am biental.
5. Col abo ração interprofissional na educação
D evemos esta r preparados para pedir ajuda e apoio para enri quecer e
am pliar o que os professor es podem realmente proporc ion ar, pa ra utilizar os
recurs os que uma variedade de entidades da comunidade o fere ce. O utro s
profi ssionais e entidades que não pertencem a escolas estão em mu itos caso s
capaci tados e querend o dar assistê ncia, mas a iniciativa tem que pa rtir das
escolas, de form a que o trabal ho cooperativo seja dirigido para finalidades
educativas.
(Novembro de 1988)
2. Debate
Professor es de arte e design pr ecisam engajar-se no deba te sob re assuntos de estética, projeto e meio ambiente . Freqüentemente ou tras vozes
são ouvid as, e representa m difer entes co nju ntos de valo res qu e pode m
distorcer as men sagen s que as pessoas precisam ouvir. Falamo s levian a e
facilmente so b re exp ressão e comunicação. Pr ecisam os demon strar no ssa
proficiência nestes campos. Precisam os influ en ciar o pensam ento so bre o
currículo oficial. Pod em os fazê-lo co mo indivíduos, como m embro s de associações pro fissionais ou grupo s de int eresse especial.
3. Documentação e divulgação
Já é ba stante di fícil fazer o trabalho nas escolas sem ter ainda que
escrever so b re ele depois. Entretanto, se nós não documentarmo s no sso
trabalho de alguma forma e divulgarm o s os resultado s, ninguém ficará sabend o o que estamos fazendo. O ato de reportar ao nosso trabalh o, d e analisálo enc oraja um a tomada de posição crítica. Somo s capaz es de refletir so bre
nossa experiê ncia, de aprend er a partir dela e de co mpartilhá- la com ou tros,
d e forma qu e venham a apre nde r também .
134
135

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