25deMaio - DIA DA ÁFRICA, por Zulu Araújo

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25deMaio - DIA DA ÁFRICA, por Zulu Araújo
Fundação Pedro Calmon - Governo da Bahia -
#25deMaio - DIA DA ÁFRICA, por Zulu Araújo
Aviso de Pauta
Postado em: 24/05/2016 18:10
DIA DA ÁFRICA “Criar criar criar no espírito criar no músculo criar no nervo criar no homem criar na
massa criar criar amor com os olhos secos...” Agostinho Neto Celebrar o Dia da África (25 de maio)
continua a ser um grande desafio para os afrodescendentes brasileiros. Após quase 500 anos de
imigração forçada (escravização), temos que admitir que a maioria dos afro-brasileiros desconhece
quase que absolutamente o continente africano. Ainda resiste e persiste na cabeça de muitos uma
África mítica, idealizada e romantizada de acordo com suas necessidades espirituais ou
conveniências políticas. Evidente que parte dessa memória ancestral é uma prova inequívoca da
força originária da cultura africana. Mas, ainda assim, insuficiente, tanto para o conhecimento da
complexidade do continente africano no mundo atual, quanto para identificar formas e caminhos
para o exercício da solidariedade ao nosso continente mãe e suas demandas. As razões para esta
resiliência são múltiplas e diversas, e dentre elas se destaca a bem urdida e estruturada estratégia
de desafricanização promovida pelos colonizadores escravocratas, de ontem e de hoje, que fizeram
e fazem uso de mecanismos sofisticados para que estes laços mantenham-se interrompidos. Para
tanto, poderosas instituições concorreram eficazmente, dentre elas a Igreja Católica, que, ao longo
de séculos, não apenas nos retirou os nomes de origem, justificou moralmente a escravidão, como
demonizou todo nosso legado cultural, em particular o religioso. Tudo isto, claro, sob a égide da
mais cruel repressão. Neste sentido, importante lembrar que, ainda hoje, temos vivos e ativos os
recalcitrantes, a exemplo das igrejas neopentecostais, que insistem em perseguir, caluniar e
demonizar as religiões de matrizes africanas, quando não a própria origem africana, com o objetivo
de desqualificar e discriminar os seus descendentes. Lamentavelmente, têm contado para tal
intento, com o apoio e a conivência das estruturas e instituições dos poderes que compõe a nossa
República, ou seja, o Executivo, o Legislativo e o Judiciário. Apesar disso, passos importantes
estão sendo dados no caminho da superação destas ignomínias. Internamente, muitas conquistas
foram alcançadas, tais como: o reconhecimento das terras quilombolas, a implementação das
políticas de ações afirmativas, com destaque para as cotas no ensino superior e a inclusão da
História da África na grade curricular do ensino fundamental. Externamente, o Estado brasileiro, em
particular na gestão do presidente Lula, buscou requalificar e ampliar sua relação com o continente
africano, tanto no campo político/cultural, quanto no campo econômico. Embora tímidas e sob as
duras críticas dos setores conservadores da sociedade brasileira, estas iniciativas indicam avanços
importantes. No campo cultural, por exemplo, a criação da Universidade da Integração Internacional
da Lusofonia Afro-Brasileira – Unilab, tem possibilitado a disseminação do conhecimento e a troca
de experiências em ambiente de respeito à diversidade e ao pluriculturalismo, inerente à
Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), constituindo-se assim, como um novo
centro de referência e integração destes países por meio da ciência e da cultura. Ainda neste
campo, o trabalho desenvolvido pelo Ministério da Cultura, na gestão do ministro Gilberto Gil, por
meio da Fundação Palmares, realizou e participou de dezenas de eventos que muito contribuíram
para o intercâmbio cultural, a troca de experiências e o estreitamento dessas relações com o
continente africano. No campo econômico, a partir da criação do Fórum IBAS (Índia, Brasil e África
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do Sul) e dos mecanismos de aproximação dos BRICS, (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul)
as relações Brasil/África ganharam nova dimensão. E nesse contexto, o “novo” Brasil global acabou
coincidindo com a “nova” África que a União Africana, tanto tem almejado. Estas ações propiciaram
um aumento significativo não só do comércio entre o Brasil e a África (projetos de cooperação
técnica com 45 países africanos e expansão dos investimentos de empresas brasileiras na África de
$6,1 para $28,5 bilhões de dólares, nos últimos dez anos) como fez com que o Brasil participasse
mais ativamente na defesa e na solidariedade às demandas africanas no cenário internacional. Em
verdade, tem sido através da aproximação cultural e histórica com o continente, além da
afinidade de linguagem com os países lusófonos, que o Brasil tem tentado estabelecer sua
relação com a África nos últimos anos, agregando um aspecto que nem a China, nem a Índia têm
em comum com os países africanos – a cultura. Hoje, a situação é crítica e preocupante no Brasil,
se pensarmos em ampliação dessas ações, sendo grandes as possibilidades de retrocesso, visto
que, o Governo de Plantão demonstra ter muito pouca simpatia pelo aprofundamento destas
relações. A primeira manifestação pública do novo ministro das Relações Exteriores, José Serra, foi
o pedido de avaliação de gastos com as embaixadas do Brasil no continente africano, em número
de 37, com o objetivo claro de redução, e não apenas do número das referidas embaixadas, mas,
sobretudo da importância do continente nas relações externas brasileiras. Some-se a isto a
fragilidade que o movimento democrático vive no Brasil hoje, e dentro dele a fragilidade organizativa
e mobilizadora do movimento negro, e encontraremos um caldo de cultura propício para o
retrocesso nas relações entre o Brasil e a África, nos próximos anos. Se aliarmos a este quadro o
desconhecimento que grande parte das lideranças do movimento negro possui quanto à realidade
atual do continente africano, sem dúvida alguma, viveremos tempos difíceis. Neste sentido, a maior
contribuição que os afros brasileiros podem dar ao continente africano no momento é, de um lado,
buscar o fortalecimento do movimento negro, do lado de cá do Atlântico, com uma agenda política
clara e propositiva e que a um só tempo consolide as conquistas obtidas até agora e aponte novos
caminhos que nos levem a superação do racismo endêmico que persiste entre nós. De outro,
pressionar o Governo brasileiro a apoiar concretamente nos foros internacionais a pauta defendida
pela União Africana, ou seja, assegurar a unidade e solidariedade africanas, a eliminação definitiva
do colonialismo, a soberania dos Estados africanos e sua integração econômica, bem como a
cooperação política e cultural no continente. Além de manter e ampliar, tanto no campo diplomático
quanto no campo dos negócios, suas relações com o continente africano. No mais, viva a África e a
União africana! Toca a zabumba que a terra é nossa! Zulu Araújo - Diretor geral da Fundação Pedro
Calmon/Secretaria de Cultura
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