Salvador verá Matisyahu

Transcrição

Salvador verá Matisyahu
CS - 3
CMYK
CORREIO BRAZILIENSE
• Brasília, segunda-feira, 8 de janeiro de 2007 • 3
CADERNO C
DISCOS
EDVALDO SANTANA, QUE LANÇA O SEXTO ÁLBUM, É REVERENCIADO POR ARTISTAS COMO ARNALDO ANTUNES E LENINE E APONTADO COMO UM
DOS PAIS DA NOVA MPB. EMBORA ESTEJA NA ESTRADA DESDE OS ANOS 1970, SUA MÚSICA AINDA É POUCO CONHECIDA DO GRANDE PÚBLICO
PÉROLA OCULTA
GILBERTO NASCIMENTO
DA EQUIPE DO CORREIO
ão Paulo – Ele já foi chamado de Tom Waits da periferia e Louis Armstrong tupiniquim, por causa de sua
voz rouca inconfundível. É cultuado na cena underground paulistana e louvado por nomes como Arnaldo Antunes, Lenine e
Chico César. Transita com a mesma desenvoltura pelo blues, pelo
samba e pelo rap. Neste sexto disco, Reserva de alegria, gravou, entre outros, com os rappers Thaíde
e Rappin Hood.
Aos 51 anos, Edvaldo Santana
passou pelo Teatro de Arena nos
anos 1970, cantou no Fantástico
e mostrou sua voz até para o papa João Paulo II, no estádio do
Morumbi, em 1981. Fez sucesso
quando era do grupo Matéria
Prima, com uma música popularesca chamada Maria gasolina. Também é citado no livro
Blues – Da lama à fama, de Roberto Muggiati, que endeusa os
maiores blueseiros do mundo e,
por que não, do Brasil.
Edvaldo tem na sua lista de
parceiros, em gravações ou composições, outras figuras ilustres,
como Tom Zé, Itamar Assumpção, Bocato, Nuno Mindelis, Zélia
Duncan, Paulo Leminski e Haroldo de Campos. Há quem garanta
ser ele o pai da chamada nova
MPB brasileira. “O Zeca Baleiro é
um dos que sempre iam nos meus
shows e levavam letras”, lembra.
Inexplicavelmente, Edvaldo
ainda não é um nome conhecido
do grande público em todo o país.
Suas músicas têm ficado restritas
(por causa do famigerado jabá ou
por mero desconhecimento) a um
público seleto de rádios como a
USP, a Eldorado e a Cultura, de
São Paulo; Ipanema FM e Cultura,
de Porto Alegre; e a Inconfidência
de Belo Horizonte. Ou programas
de tevê como o Bem Brasil e Ensaio, ambos da TV Cultura.
Se é adorado nos meios mais
intelectuais, também tem uma
forte presença na periferia, principalmente em São Miguel Paulista, o bairro operário da zona
leste de São Paulo onde nasceu –
e que agrega mais nordestinos do
que várias capitais do Nordeste.
Lá, ele ajudou a fundar, no final
dos anos 70, o Movimento Popular de Arte, que levava música,
teatro e poesia para as praças e
ruas do bairro, atraindo gente como os atores Gianfrancesco Guarnieri e Celso Frateschi.
Edvaldo é um cronista do cotidiano dos subúrbios. Em seu tra-
S
balho anterior – Amor de periferia
– retratou, em Batê laje, os animados encontros de parentes e
amigos que se unem para erguer
a laje ou os puxadinhos típicos
das casas dos subúrbios, regados
sempre a garrafões de pinga e
churrasquinho de gato. É um pagode daqueles autênticos, acompanhado no disco pelo Quinteto
em Branco e Preto (criador do
projeto Samba da Vela). Poderia
ter feito grande sucesso na voz de
um Zeca Pagodinho, por exemplo, mas passou quase despercebido. A canção foi incluída, no
entanto, na trilha sonora do filme
Antônia, da cineasta Tata Amaral,
que também deu origem a um
seriado na Rede Globo.
É quase impossível classificar
o trabalho de Edvaldo. “Sou um
artista brasileiro urbano que recebe influências diversas e mantém isso vivo”, diz o cantor, que
ressalta a influência nordestina
em sua música – “principalmente da literatura de cordel, de
Luiz Gonzaga e Jackson do Pandeiro”. Elas vão também de Beatles a Carlos Santana e Bob Marley; de Jorge Benjor ao poeta
francês Baudelaire; e de Antônio
Marcos – ídolo dos tempos de
jovem guarda e seu conterrâneo
de São Miguel –, a Teixeirinha,
gaúcho que ficou famoso nos
anos 60 com o hit brega Coração
de luto, conhecido como Churrasquinho de mãe.
Edvaldo é um suburbano que
flerta ainda com a poesia concreta. O poeta Haroldo de Campos (morto em 2003) o definia
como um “um forroqueiro brutalista, com pedras cantantes na
garganta, capaz de rock e de rocha”. Para Arnaldo Antunes, ele
é um “herdeiro da malandragem que não vê obstáculo algum na senda que vai do rock ao
blues”. O ex-titã acredita que
Edvaldo seja merecedor de um
espaço muito maior na mídia.
“Esse trabalho tende a aparecer
cada vez mais. Vai se tornando
inevitável. Ele é um ótimo compositor, uma personalidade forte, bem singular, com timbre de
voz suja e rasgada, que faz ligação com diferentes áreas.”
CRÍTICA//
RESERVA DE
ALEGRIA
✰✰✰✰✰
Manoel Marques/Divulgação
Otimismo e
sensibilidade
A profusão de ritmos é
uma marca no trabalho
de Edvaldo Santana. No
CD Reserva de alegria,
tem a latinidade presente em um mambo recheado de sopros, com arranjo de Bocato (Quem é que
não quer ser feliz) e numa salsa-rock (Desemprego) que lembra Carlos Santana, um xará e
quase espelho para Edvaldo. Tem ainda samba-rap em dupla com
Rappin Hood (Pra viver é
sempre cedo), sambaenredo (Jorge Amado no
reino de Oxalá) e até um
xote (Luana de maio),
um hit dos tempos de Movimento Popular de Arte.
O disco, gravado com
patrocínio da Petrobras, é
otimista.Mas Edvaldo,como em trabalhos anteriores, volta a falar dos males
da periferia. Em Chacina,
com melodia sua e letra de
Arnaldo Antunes, é descrito o assassinato de jovens
pobres do subúrbio.A canção lamenta o pouco caso
com essa tragédia diária
nas grandes metrópoles.
“Não deu na TV/nem deu
no jornal/Não foi pra cadeia/nem pro hospital/Não teve caixão/não
teve funeral/E tem muita gente que acha normal”. É uma realidade
que, no meio musical,
poucos conhecem.
Nessa canção, Bocato
também toca trombone e
faz os arranjos de metais.
O arranjo de base é de Cid
Campos (filho do poeta
Augusto de Campos). O
rapper Thaíde ainda canta junto, além de assinar
o texto incidental.
Em Desemprego, Edvaldo lembra do cidadão
que “olha para a filha” e
sente “o desespero”, ciente
de que “a fome é um bicho
que mata primeiro”. Com
Chico Cesar, em Raios do
Oriente Médio,ele fala da
guerra e pergunta se “será
que é só com a dor/que a
gente é capaz de lembrar
da paz”.(GN)
RESERVA
DE ALEGRIA
Disco do músico Edvaldo
Santana. Gravação
independente, com
distribuição pela Tratore.
R$ 15. ✰✰✰✰✰
EDVALDO SANTANA FLERTA COM A POESIA CONCRETA E USA VÁRIOS RITMOS AO CONTAR AS HISTÓRIAS DOS SUBÚRBIOS
Leon Neal/Reuters - 25/6/06
FESTIVAL
Salvador verá Matisyahu
O ecletismo, decididamente,
é a marca registrada do Festival
de Verão de Salvador, que será
aberto no dia 24, no Parque de
Exposições da capital baiana. A
programação anunciada inicialmente, que conta com bandas pop e de axé music, o
rapper Marcelo D2 e o cantor e
guitarrista californiano Ben
Harper, ganha o reforço de outras atrações de segmentos diversos da música popular brasileira, além de mais uma estrela
internacional: o polêmico Matisyahu, judeu norte-americano
que acaba de ser indicado ao
Grammy 2007, na categoria melhor álbum de reggae.
Matisyahu, um astro ascendente, inicia pela capital baiana,
na abertura do Festival de Verão,
sua breve turnê pelo Brasil, onde
vem pela primeira vez. Depois
de Salvador, faz show no Rio de
Janeiro (dia 29) e em São Paulo
(dia 31). Nascido em West Ches-
ter, no estado da Pensilvânia, e
criado em White Plains (Nova
York), o garoto chamado Matthew Miller demorou um pouco
até descobrir sua identidade e
voz como Matisyahu – versão
hebraica do seu nome legítimo.
Em 2004, lançou Shake off the
dust… arise, seu primeiro disco,
e Live as stubb’s (registro de um
show), que resultou em sucesso
estrondoso no ano passado. Depois veio o CD Youth, com a trepidante faixa-título, que grita “a
juventude é o motor do mundo”.
Nesse álbum, Matisyahu expande seu universo musical: num
momento sua voz é doce, noutro
é inflamada e panfletária. “Não
me vejo como um homem tão
preparado, mas Deus jogou isso
tudo no meu colo. Não acho que
já tenha chegado lá, mas é meu
objetivo”, afirma. O regueiro dividirá o palco com Banda Eva,
Chiclete com Banana e Timbalada na noite do dia 24.
Convidados nacionais
Entre os novos convidados da
O JUDEU NORTE-AMERICANO MATISYAHU VEM PELA PRIMEIRA VEZ AO BRASIL: REGUEIRO POPULAR E POLÊMICO
organização do Festival de Verão
para o palco principal estão Alcione, que se apresentará no dia
25, antes de Jota Quest, Ivete
Sangalo e Asa de Águia; a banda
CMYK
DA EQUIPE DO CORREIO
gaúcha Papas na Língua, destaque do dia 26, juntamente com
Marcelo D2, Jammil e Uma Noites, O Rappa e Rapazolla. Para o
dia 27, no encerramento do
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IRLAM ROCHA LIMA
evento, está confirmado Carlinhos Brown, com o show Cancioneiro do Brasil, o mesmo que
foi apresentado na noite de réveillon em Roma, na Itália.
Além das canções de sua autoria, registradas em discos ao
longo da carreira, Brown vai
mostrar hits que compôs para
cantoras como Marisa Monte e
Daniela Mercury. E promete
uma prévia do novo álbum, que
será lançado simultaneamente
no Brasil, Estados Unidos e Europa, em março. “O público verá um Brown cancioneiro”, diz
o multimúsico.
Se no ano passado a pulseira
live strong foi o símbolo da ação
social do Festival de Verão, o
produto escolhido para a nona
edição é um broche no estilo
rastafari – símbolo do evento.
Confeccionada em material metálico, a peça está sendo comercializada por R$ 5, na loja oficial
do festival (primeiro piso do
Shopping Iguatemi), loja Axé
Mix (Aeroclube), Ticket Mix
(Shopping Barra e Aeroclube),
Central do Carnaval (Aeroclube,
Iguatemi, Pelourinho e Aeroporto). A renda será revertida
para 10 escolas públicas de Salvador. A ação social será direcionada para o segundo dos objetivos do milênio estabelecidos
pela ONU: educação básica de
qualidade para todos.