ed37_Boletim Jurisprudencia

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ed37_Boletim Jurisprudencia
Jurisprudência
Boletim
ANO II – Nº
12
Mercado de Capitais
As reorganizações societárias formuladas por companhias abertas têm levado a
diversas controvérsias sobre as situações em que deve ser aplicado o artigo 254-A da
Lei das S.A, que confere o direito conhecido como ‘tag along’. Nesta edição do boletim,
reunimos dois casos que envolvem a discussão sobre a incidência ou não desse
direito e as questões relacionadas à alienação ou aquisição de controle acionário.
Aquisição de controle da Arcelor
confere tag along aos minoritários
Em decisão conjunta da Superintendência de
Registro (SRE) e da Superintendência de Relações com
Empresas (SEP), foi determinada a necessidade de realização de oferta pública de aquisição de ações (OPA)
de emissão da Arcelor Brasil S.A. para cumprimento de
disposição prevista em estatuto social.
O caso começou quando a Mittal Steel Company N.V.
(Mittal) divulgou comunicado, em 27.01.06, informando a intenção de realizar uma oferta pública de aquisição de controle da
Arcelor S.A. (Arcelor Europa), controladora indireta de Arcelor
Brasil S.A. e Acesita S.A., que compreenderia também uma OPA
aos acionistas da Arcelor Brasil e Acesita S.A. Após duas ofertas
mal sucedidas, finalmente o conselho de administração da Arcelor Europa recomendou aos acionistas que aceitassem a oferta
revisada da Mittal de 25.06.06. Após a oferta revisada, a Mittal
adquiriu cerca de 92 % das ações da Arcelor Europa.
De acordo com as informações divulgadas pela Mittal
e pela Arcelor Europa, a operação societária compreende,
ainda, a posterior “fusão entre iguais” das duas empresas,
que consiste na incorporação da Mittal pela Arcelor Europa.
Estas companhias informaram ainda que, após a incorporação, nenhum acionista deterá mais de 50% do capital social
da sociedade Arcelor-Mittal.
Na data da oferta, foram divulgadas notícias pela
imprensa em que se afirmava que Arcelor Europa e Mittal
estudariam, em razão dos novos termos da oferta revisada,
a necessidade ou não de realização de OPA aos acionistas
da Arcelor Brasil. Em seguida, as companhias manifestaram
entendimento, através do fato relevante de 05.07.06, no sentido de que não havia necessidade de realização de OPA aos
acionistas minoritários da Arcelor Brasil e da Acesita.
Considerando que o estatuto da Arcelor Brasil estabelece que a “aquisição de ações que assegurem o controle
da controladora final da Arcelor Brasil determina a obrigação
de realizar OPA aos seus acionistas minoritários”, a área
técnica da CVM solicitou esclarecimentos sobre as razões
que levaram ao entendimento das companhias de que seria
desnecessária a realização da OPA.
Mittal e Arcelor Europa afirmaram que a OPA não
mais se aplicaria uma vez que, após realizada a “fusão entre
iguais”, nenhum acionista iria deter mais de 50% do capital
votante da companhia. Além disso, no caso em questão, não
seria aplicável o art. 254-A da Lei, pois não houve ‘alienação
do controle’, tendo em vista que a Arcelor Europa tinha o capital social extremamente diluído, sem controle definido, sendo
o controle adquirido pela Mittal mediante oferta pública.
No entendimento das áreas técnicas da CVM, o
estatuto da Arcelor Brasil foi além do que estabelece o art.
254-A da Lei das S.A. A redação do estatuto da Arcelor Brasil
estabelece que a “aquisição do controle” implica na necessidade de OPA aos acionistas minoritários, estendendo este
direito mesmo no caso da companhia não ter um controle
pré-definido que possa ser alienado. Por lei, a mesma OPA
somente seria obrigatória quando da realização de um negócio jurídico de alienação de controle pré-definido.
Assim, determinaram as áreas técnicas da CVM, por
meio do ofício 99/2006, a realização de OPA apenas aos acionistas minoritários da Arcelor Brasil S.A. Segundo o entendimento das superintendências, a Mittal adquiriu o controle
indireto da Arcelor Brasil e por isso tem o dever estatutário de
cumprir a obrigação de realização de OPA. Quanto à Acesita,
entendeu a área técnica que não há obrigação de ser realizada
a OPA, tendo em vista que não houve alienação de controle
(afastando-se a aplicação do artigo 254-A da Lei das S.A.) e
esta sociedade não possui dispositivo estatutário como o da
Arcelor Brasil. (Processo CVM nº RJ/2006/5105)
Acordos para transferência de direitos
políticos determinam realização de OPA
A OPA em caso de alienação de controle também
foi o centro de um recurso interposto pela Companhia
Brasileira de Distribuição (CBD), julgado em 11.04.06. A
Companhia questionava a decisão da área técnica da CVM
que determinou a realização de oferta pública de aquisição de ações decorrente de alienação de controle indireta
(art. 254-A da Lei das S.A), em virtude da implementação
de Joint Venture Agreement (Acordo de Associação) entre
Abílio Diniz e família, de um lado, e Cassino Guidchard
Perrachon S.A. do outro.
No início de 2005, a CBD era controlada pela holding Vieri Participações S.A., de propriedade de Abílio
Diniz, que detinha 61,19% das ações com direito a voto.
Nessa época, o Cassino, acionista da companhia desde
1999, e co-controlador em virtude de acordo de acionistas,
detinha 30,53% das ações com direito a voto.
O Acordo de Associação celebrado em 03.05.05 previu, em primeira etapa, a aquisição, pelo Cassino, de 50%
das ações ordinárias da Vieri Participações S.A., detidas
por Abílio Diniz. Em pagamento, o comprador entregaria,
R$1.000.000.000,00, US$200.000.000,00 e 12.500.000.000
ações preferenciais da CBD. Após a operação, Abílio e o
Cassino ficaram, cada um, com 50% das ações com direito
a voto da Vieri. Concluídas as operações, as relações entre
Abílio e o Cassino passaram a ser igualitárias, tendo Abílio
o poder de decidir quando houvesse impasses.
O acordo previu ainda a opção de compra para a
mudança de controle, através da aquisição, por parte do
Cassino, de uma ação ordinária da Vieri, de Abílio Diniz,
ficando assim, o Cassino com 51%. A implementação
das operações e a opção de compra de controle foram
vistas pela área técnica da CVM como geradoras de OPA,
prevista no art. 254-A. Argumentou a área técnica que o
direito de adquirir uma ação ao preço de apenas um real
e, conseqüentemente, adquirir o controle da companhia,
revelava que o prêmio atribuído às ações que conferiam
o controle já se encontrava inserido no valor pago pelos
50% das ações ordinárias que pertenciam a Abílio. Assim,
embora a opção de compra só se efetivasse dentro do
prazo de oito anos, o prêmio de controle estaria sendo
pago naquele momento e, por isso, ensejaria a OPA no
mesmo tempo.
O CBD recorreu argumentando que a opção só
poderá ser exercida em oito anos e que esse exercício
poderia nem mesmo acontecer. Afirmou também que o
art. 254-A não prevê a noção de potencial transferência
de controle e, portanto, não contemplaria a OPA naquela situação. Além disso, argumentou que o Cassino
não poderia ser considerado controlador desde então,
pois não tinha poderes para, isoladamente, exercer o
controle da CBD — o que descaracterizava, portanto,
a efetiva alienação de controle.
Segundo a CVM, exercício efetivo
do poder de controle não é necessário
para caracterizar a obrigatoriedade
da oferta pública
O Diretor Pedro Marcílio manifestou-se no sentido de que, no caso, não era necessário o exercício
efetivo do poder de controle, por parte do Cassino,
para caracterizar a necessidade de OPA. O que houve,
segundo ele, foi a transferência de controle em um
conjunto de operações. Afirmou também que a OPA
deveria ser realizada não só quando há a venda direta
das ações, como também, quando são firmados acordos
contratuais que impliquem na transferência dos direitos políticos que assegurem o controle. Considerou,
ainda, o fato do preço de controle estar sendo pago
desde aquele momento ao antigo controlador. Sendo
assim, o Colegiado, acompanhando o voto do relator,
determinou a realização de OPA aos acionistas minoritários da CBD. (Processo RJ/2005/4069. Reunião do
Colegiado de 11.04.06)
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