Uma Introdução para Compreender o Mercado Paralelo

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Uma Introdução para Compreender o Mercado Paralelo
Uma Introdução para Compreender
o Mercado Paralelo de Câmbio no Brasil
Hugo Cuevas-Mohr1
IMTC – Mohr Word Consulting
Introdução
Este breve artigo tem como objetivo explicar o uso, por Operadores do Mercado Paralelo (OMPs), de
transferências2 de dinheiro de brasileiros inocentes ou desavisados vivendo nos EUA, Europa e
outros lugares para abastecer um sistema no qual os Reais, normalmente em espécie e produtos de
atividades ilegais no Brasil, são depositados nas contas dos beneficiários da transferência no Brasil,
enquanto os Dólares ou Euros entregues aos remetentes no exterior são usados para saldar e
movimentar dinheiro como parte dessa “troca” de fundos.
O motivo pelo qual uso em este artigo as siglas GMRE (Gray Market Real Exchange3) é para
intencionalmente atrair a atenção para suas semelhanças com o BMPE (Black Market Peso
Exchange4), um termo cunhado na década de 90 para explicar como cartéis de drogas colombianos
lavam os lucros obtidos com as vendas de narcóticos nos EUA e na Europa. O objetivo de tal sistema
era facilitar as “trocas” dos Dólares obtidos pelos cartéis nos EUA por Pesos na Colômbia através da
venda de Dólares a comerciantes colombianos que desejavam comprar e pagar bens americanos (e,
posteriormente, chineses) para importação. O sistema explicava como os Dólares entravam no
sistema financeiro mundial por meio de corretores e assim eram lavados sem atrair atenção.
1
Hugo Cuevas-Mohr é o diretor da Mohr World Consulting (http://www.mohrworld.info), uma empresa de consultoria
com sede em Miami, na Flórida. Hugo trabalha na indústria de transferências de dinheiro há mais de 25 anos e também é
o diretor de conferências das IMTC (International Money Transfer Conferences, por suas iniciais em inglês), que incluem
a IMTC BRASIL 2012, que será realizada de 13 a 15 de fevereiro de 2012 em São Paulo (http://www.imtcbrasil.com ).
Hugo trabalhou na Colômbia e nos EUA na década de 90, quando a Colômbia enfrentou o desafio de formalizar seus
sistemas de pagamento por remessas e os controles e regulamentações contra lavagem de dinheiro foram estabelecidos.
2
Uso o termo “transferência” de dinheiro, em vez de “remessa”, porque a maioria dos bancos centrais e organizações
multilaterais usa o termo “remessas” apenas no sentido de “remessas de trabalhadores” (fundos enviados para auxiliar
as famílias em seus países de origem). Contudo, para o setor privado, “remessas” é um termo mais amplo, que inclui
quaisquer transferências internacionais de fundos realizadas por um indivíduo, qualquer que seja seu motivo: auxiliar a
família, repatriar fundos, depósitos (para economias, pagamento de contas, etc.), remessas por trabalhadores sazonais,
pagamento de empréstimos, fundos para comprar bens a ser vendidos, enviados, etc.
Essas transferências de fundos não costumam ser feitas por meio de transferências interbancárias. Alguns bancos agora
prestam ambos os serviços (remessas e transferências interbancárias), que são muito diferentes em termos de custo,
divulgação da taxa de câmbio, velocidade de pagamento, natureza do pagamento, etc.
3
Mercado Cinzento de Câmbio de Reais; no Brasil: Mercado Paralelo.
4
Consulte as publicações do FINCEN acerca do BMPE (Mercado Negro de Câmbio de Pesos):
http://www.fincen.gov/news_room/rp/advisory/pdf/advisu9.pdf , e uma publicação atualizada:
http://www.fincen.gov/news_room/rp/advisory/html/advis12.html
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A conexão entre o sistema BMPE e os cartéis de drogas atraía tanta atenção que foi resultado de
resposta, vigilância, regulamentação, investigação, acusação, entre outros, em nível global. O
Sistema do GMRE é semelhante ao sistema colombiano do BMPE, mas a conexão entre o sistema
brasileiro e atividades ilegais não é tão evidente e clara quanto no caso colombiano. O sistema
brasileiro parece mais conectado à lavagem de dinheiro comercial, evasão fiscal e corrupção do que
a outras atividades ilegais5.
O “Mercado Negro do Dólar” no Brasil evoluiu e os termos “doleiros” ou “operadores do mercado
negro” eram muito usados até recentemente.
“A expressão “mercado negro do dólar” praticamente desapareceu das páginas dos jornais. Por
um lado, a expressão ficou politicamente incorreta ao associar o negro a uma prática ilícita; por
outro, o chamado câmbio livre ou paralelo tornou-se uma atividade legal ou quase-legal.” 6
As autoridades brasileiras têm feito um trabalho em grande escala - realizado por órgãos
reguladores e agentes da lei - para combater os doleiros e o mercado negro, e abrir o mercado a
mais instituições, aumentando assim a concorrência e a capilaridade, além de facilitar as condições
para que mais instituições prestem serviços financeiros e de câmbio. É verdade que o “mercado
informal”7 mudou-se das ruas para os escritórios, do "negro" para o "cinzento" - um tom bem escuro
de cinza - e o termo atualmente utilizado é "mercado paralelo" ou "mercado B" 8 . Contudo, a
natureza dos crimes e a ilegalidade das operações não mudaram muito. As operações podem ter se
tornado mais sofisticadas, mas o sistema existe há décadas9 pelas mesmas razões: mover grandes
somas de dinheiro, sem que sejam detectadas, declaradas, ou sujeitas à supervisão ou controle pelo
governo.
5
O 2011 Cornerstone Report do HSI - Homeland Security Investigations (o braço investigativo da agência de imigração e
aduana dos EUA) explica o uso de lavagem de dinheiro baseada em comércio tendo os sistemas BMPE colombiano e
GMRE brasileiro como exemplos.
http://www.ice.gov/doclib/news/library/reports/cornerstone/cornerstone7-3.pdf
6
O mercado “negro” do dólar no Brasil, Economia e Energia - http://ecen.com/eee38/the_black.htm
7
Nem todas as atividades informais são necessariamente ilegais, como veremos posteriormente neste documento.
8
Consulte o site da NMTA para ver o documento de Paul S. Dwyer publicado em 2006, “U.S. Money Transmitters in the
Brazilian Doleiro Currency Market” (Agentes de transferência de dólares no mercado de câmbio paralelo do Brasil,
tradução livre): http://nmta.us/site/e107_docs/DoleiroPaper_FirstRelease.pdf
9
Para obter a descrição de um caso de 2004 envolvendo MSBs (empresas de serviços com dinheiro) brasileiras e o
mercado de doleiros, leia: “Bank Of America Settles Money Laundering Probe” (Bank of America faz acordo com
investigação de lavagem de dinheiro, tradução livre):
http://www.northcountrygazette.org/articles/092706MoneyLaundering.html . Confira também este artigo de 2001:
http://www.businessweek.com/2001/01_09/b3721167.htm . Um caso mais recente que envolveu 55 doleiros em 2009
está aqui: http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,55-doleiros-movimentaram-us-700-mi,696427,0.htm
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Assim, nós acabamos por chamá-lo GMRE, na sigla em inglês, o que os brasileiros conhecem como o
mercado paralelo.
“E sim, também há mercados negros do dólar no Brasil. No entanto, sua importância para os
turistas é zero. Você não encontrar pessoas na rua lhe oferecendo serviços de câmbio de dólares.
O mercado negro do dólar é usado por brasileiros ricos (principalmente) que desejam enviar
dólares para fora do país sem passar pelos controles do Banco Central - e para isso usam os
doleiros (operadores do mercado negro). A importância desse mercado negro costumava serem
tão grande que sua taxa de câmbio (conhecida como “dólar paralelo”) ainda é mostrada todos os
dias na imprensa junto à taxa do dólar comercial e do dólar turismo.” 10
Estimativa da dimensão do GMRE
Não acho que exista alguém no Brasil (ou em outro lugar do mundo) capaz de fornecer uma
estimativa definitiva do tamanho do GMRE e esse não é o propósito deste documento. No entanto,
realmente acho que o trabalho feito pelo ETCO11, o Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial e pela
Fundação Getulio Vargas12, um centro de ensino brasileiro muito respeitado, possa nos oferecer uma
perspectiva inicial.
“O custo dos bens e serviços produzidos pela economia subterrânea brasileira no último ano foi
equivalente a 27,1% do PIB do país, de acordo com um estudo publicado pela Fundação Getulio
Vargas, uma entidade privada.” 13
O estudo aqui citado é parte do trabalho contínuo do ETCO para estimar e chamar a atenção do país
para os problemas da informalidade, ilegalidade e evasão fiscal, que obstruem o crescimento da
economia brasileira. Através dos diversos métodos usados pelo ETCO para estimar a chamada
“economia subterrânea”, cada um deles demonstra que sua dimensão atualmente está em cerca de
18% do PIB (20,7% em 2003, 19,6% em 2006, e 17,2% em 2010). No entanto, é importante observar
que a porcentagem vem reduzindo devido ao crescimento da economia formal, e não exatamente à
redução da economia subterrânea. André Franco Montoro Filho, presidente-executivo do ETCO,
comparou o tamanho da economia subterrânea do Brasil ao PIB da Argentina.
10
Brazil Travel Blog, de Tony Gálvez - http://www.braziltravelblog.com
O ETCO - Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial (http://www.etco.org.br) - é uma Organização Não Governamental
(ONG) que congrega empresas e associações comerciais com o objetivo de promover a melhoria no ambiente de
negócios e estimular ações que evitem desequilíbrios comerciais causados por evasão fiscal, informalidade, falsificação e
outros desvios de conduta. Numa visão mais ampla, conscientizar a sociedade acerca dos malefícios sociais de práticas
não-éticas e seus reflexos negativos para o crescimento do país.
12
A Fundação Getulio Vargas (http://portal.fgv.br) é um centro de ensino de qualidade e excelência que dedica seus
esforços ao desenvolvimento intelectual do país. Sua política de promoção e incentivo à produção e ao aperfeiçoamento
de idéias, dados e informações faz da FGV uma das maiores instituições no cenário nacional e internacional, além de
possibilitar a formação de cidadãos éticos, cientes de suas responsabilidades como agentes transformadores da
sociedade.
13
Latin American Herald Tribune: http://www.laht.com/article.asp?CategoryId=14090&ArticleId=334886
11
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“A economia subterrânea brasileira esconde uma Argentina inteira. Segundo o estudo “Estimação
do Tamanho da Economia Subterrânea no Brasil”, produzido pelo Instituto Brasileiro de Economia
(IBRE) da Fundação Getulio Vargas para o ETCO, circularam na informalidade no ano passado 578,4
bilhões de reais, o equivalente ao PIB do país vizinho.” 14
Como descrito pelo ETCO, a economia subterrânea consiste de fraude (evasão fiscal), corrupção,
venda de bens roubados, contrabando e, em menor escala, prostituição, jogos ilegais, venda de
drogas, etc. Além disso, ela também inclui os setores informais, trabalho doméstico, vendedores de
rua, construção informal e outras atividades.
Há vários relatórios sobre a enorme economia informal brasileira. O Brasil ocupou a 105ª posição em um total de 151 países - em um documento de 2007 do Banco Mundial de acordo com o
tamanho de sua "economia subterrânea” 15.
A maioria das atividades da economia subterrânea que requerem a movimentação internacional de
fundos usa o GMRE. A porcentagem dessa enorme economia subterrânea que precisa da
movimentação de fundos para além das fronteiras brasileiras é um desafio que ainda requer
estimativa - desafio que deve ser enfrentado pelo ETCO e outros economistas brasileiros.
Transferências de Dinheiro e o GMRE
Especialistas concordam que o Brasil logo se tornará um dos maiores mercados de transferência de
dinheiro do mundo: em entrada, saída e nacionais. Atualmente, caso todas as transferências de
fundos que chegam ao Brasil fossem devidamente registradas, o país estaria entre os 15 maiores
mercados de remessa de fundos do mundo, junto a Egito, Indonésia e Vietnã, que recebem cada um,
mais de US$ 7 bilhões por ano. Atualmente, o valor total das transferências de fundos que entram
no Brasil relatadas pelo Banco Central do Brasil gira em torno de US$ 4,5 bilhões por ano, sendo
metade referente à “remessas de trabalhadores”.
As remessas enviadas ao Brasil são oriundas principalmente da América do Norte, Europa e Ásia.
Metade das remessas tem origem nos EUA, onde vivem quase 1,4 milhão de brasileiros16,
concentrados em Massachusetts (355 mil), Nova Iorque (300 mil), Flórida (300 mil) e Califórnia (100
mil). O órgão responsável pelo censo dos EUA informa que 340 mil brasileiros dos EUA nasceram
fora do país17. Cerca de 20% das remessas têm origem no Japão, onde estimativas dão conta de que
há 230 mil brasileiros residentes. O restante vem de Portugal, Espanha, Reino Unido e outros países
europeus, onde há 900 mil brasileiros residentes estimados.
14
Revista ETCO, Setembro 2010 Nº 16 - ANO 7: http://www.etco.org.br/user_file/revista/etco_16.pdf
“Shadow Economies All over the World” (Economias subterrâneas no mundo, tradução livre):
http://wwwwds.worldbank.org/servlet/WDSContentServer/WDSP/IB/2010/10/14/000158349_20101014160704/Rendered/PDF/WPS5356.pdf
16
Confira este documento do governo brasileiro: http://www.imtconferences.com/imtcweb/brasileiros/
17
A população nascida em outros países inclui qualquer pessoa que não era cidadã dos EUA no nascimento, incluindo aquelas
que se tornaram cidadãs americanas por meio da naturalização: http://www.census.gov/prod/2011pubs/acsbr10-15.pdf
15
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Manuel Orozco, da Interamerican Dialogue, uma especialista-líder em remessas, publicou um estudo
em 2008 intitulado “Brazilians in the United States: A Look at Migrants and Transnationalism”18 em
conjunto com Alvaro Lima e Eugenia Garcia-Zanello. Em tal estudo, eles estimaram que as
transferências de fundos dos EUA para o Brasil somaram cerca de US$ 3,5 bilhões em 2007.
“Nossos dados acerca dos brasileiros nos EUA mostram que cerca de 70% deles faz remessas,
enviando uma média de US$ 700 a cada vez, o que totaliza cerca de US$ 8.400 por ano. Usando
nossa estimativa de que havia cerca de 600 mil brasileiros nos EUA em 2007 e 65% deles enviavam
remessas de cerca de US$ 700 a cada mês; calculamos a soma total de remessas de dólares em
2007.” 19
Usando esses números de 2007, podemos criar uma estimativa geral de que 50% das remessas totais
enviadas ao Brasil têm origem nos EUA, enquanto o restante vem da Europa e do Japão. De acordo
com dados publicados pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), as remessas enviadas
ao Brasil foram de US$ 7,2 bilhões em 200820. No entanto, se você pesquisar os dados atuais do BID
descobrirá que o volume total relatado de remessas para o Brasil foi de US$ 4.746 bilhões para
2009.21
No site do BID é possível encontrar a seguinte declaração (quatro de março de 2010):
“O maior declínio ocorreu no Brasil - uma queda de 34% - prolongando uma tendência iniciada
bem antes da crise global. Migrantes brasileiros vêm apresentando a tendência de retornar ao seu
país, encorajados pelo crescente desempenho econômico do país e pelas perspectivas cada vez
piores nos países onde residem, como o Japão.” 22
É verdade que as remessas feitas ao Brasil têm diminuído à medida que a economia brasileira
melhora e a economia dos países de origem piora. Contudo, poucas pessoas da indústria de
transferências de fundos acredita que o volume enviado ao Brasil diminui nessa proporção. A
maioria das instituições financeiras e empresas de transferências internacionais de fundos que
operam por meio de canais registrados e licenciados no Brasil tem certeza de que mais da metade
do volume de transferências de fundos ao Brasil está nas mãos dos OMPs.
18
(Brasileiros nos EUA: um olhar sobre migrantes e transnacionalismo, tradução livre)
http://www.digaai.org/wp/pdfs/Lima.migrants&transn.7-23-09.pdf
20
http://idbdocs.iadb.org/wsdocs/getdocument.aspx?docnum=1910986
21
“Remittances to Latin America and the Caribbean in 2009 - The impact of the global financial crisis” (Remessas para a
América Latina e Caribe em 2009 - O impacto da crise financeira mundial, tradução livre).
http://idbdocs.iadb.org/wsdocs/getdocument.aspx?docnum=35101526 - O site da CEMLA possui dados referentes às
remessas brasileiras que dão conta de que o total de remessas do Banco do Brasil foi de US$ 2,192 bilhões em 2009, mas
faz a seguinte declaração (aqui traduzida): “Números publicados pelo Banco Central do Brasil. Os dados do MIF diferem
desse número, já que também consideram outros componentes da balança de pagamentos como parte das remessas. Os
dados do MIF para 2009 são de US$ 4,746 bilhões. Dados históricos do MIF disponíveis em: www.fomin.org” (tradução
livre): http://www.cemlaremesas.org/medicion/componentes.htm
22
Remittances to Latin America stabilizing after 15% drop last year” (Remessas para a América Latina se estabilizam após
a queda de 15% no ano passado, tradução livre) - http://www.iadb.org/en/news/newsreleases/2010-03-04/remittancesto-latin-america-stabilizing-after-15-drop-last-year-mif,6671.html
19
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Das maiores empresas globais de transferência de fundos, como Western Union, MoneyGram e RIA
Envia, às empresas americanas como Pontual Money Transfer, BB Money e Viamericas, o sentimento
é o mesmo: empresas de transferência de fundos operando com OMPs estão com uma parte bem
maior do mercado.
Em lugares como Boston e áreas vizinhas que abrigam brasileiros, em New Jersey - no lado oposto
do Rio Hudson em frente à Nova Iorque - e em Orlando, na Flórida, a porcentagem de transferências
de fundos enviadas com OMPs é ainda maior.
Agentes de MTCs (Money Transfer Companies; MTCs, por suas iniciais em inglês23) fazem
transferências para outros países por meio de uma MTC e transferências para o Brasil por meio de
outra MTC, que por sua vez trabalha com um OMP.
De acordo com uma empresa de pesquisas do Brasil, entre 45% e 62% das transferências de fundos
do corredor EUA-Brasil são processadas por empresas de serviços com dinheiro usando canais
irregulares no Brasil.
Rodney Alves24, um advogado americano-brasileiro que tem atuado como consultor para MTCs nos
EUA afirmou na recente conferência IMTC MIAMI 201125, realizada em Miami, durante uma
apresentação de nome "Migrando o Mercado de Remessas Brasileiro dos Canais Informais para os
Formais":
“Acredito, com base no volume de operações de alguns Operadores de Transferência de Fundos
dos EUA e da maioria das empresas de transferência de fundos da Europa, que o mercado paralelo
provavelmente cuida de 60% a 80% do volume total de remessas feitas de todo o mundo para o
Brasil. As remessas realizadas através do mercado paralelo no Brasil são o grande problema sobre
o qual ninguém quer falar. O mercado paralelo é tão complexo que mesmo com todos cientes de
sua existência, pouquíssimas pessoas realmente entendem como ele opera, e ainda menos estão
dispostas a fazer o necessário para eliminá-lo de uma vez por todas.” 26
23
Empresas de Transferências de Fundos
Almeida Advogados, Rodney Alves:
http://www.almeidaadvogados.com.br/almeidalaw/Ingles/detEquipe.php?codequipe=226&PHPSESSID=b285e77e94eedf
d851b010df74cedc2d
25
A conferência International Money Transfer Conference IMTC MIAMI 2011 http://www.imtconferences.com/imtcweb/en/conferences/imtc-miami/imtc-miami-2011.html
26
Anotações feitas durante a apresentação de Rodney Alves, confirmadas pelo próprio.
24
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Por que algumas MTCs usam OMPs para enviar as remessas de seus clientes?
A resposta é relativamente simples: a Taxa de Câmbio que a MTC pode oferecer a seus clientes. Os
OMPs são capazes de oferecer às MTCs mais Reais para cada Dólar ou enviado. A maioria das MTCs
que operam com OMPs não trabalha exclusivamente com eles, mas também com Prestadores de
Serviços de Remessas formais para evitar serem detectadas.
Vamos analisar em exemplo simples de um dia qualquer em 2011. Retirado dos Dados de Câmbio do
Banco do Brasil:
Média do Mercado para o dia:
Compra: 1,6979 Real por Dólar
Venda: 1,6986 Real por Dólar
Nesse dia, uma MTC oferecia ao público R$ 1,6816 para cada dólar. Uma MTC concorrente que
operava com um OMP (MTC-OMP) oferecia R$ 1,7300 para cada dólar. Em uma transação média de
US$ 500, o remetente de uma transferência poderia conseguir R$ 24 a mais - cerca de US$ 14 - para
o beneficiário se escolhesse trabalhar com a MTC-OMP.
Se colocarmos na ponta do lápis para entender melhor a operação, chegaremos à conclusão de que
o OMP que paga os fundos no Brasil está perdendo, somente nessa transação, mais de US$ 20. No
entanto, os Dólares americanos e Euros, já em uma Instituição Financeira fora do Brasil, valem
muito, e o OMP acaba compensando esse "prejuízo" na taxa de câmbio oferecida ao MTC ao vender
os fundos "limpos" por uma taxa de câmbio que proporcionará ao OMP um belo retorno.
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Explicando o uso das Remessas de Entrada realizadas por OMPs
Há vários modos de remessas usados por OMPs. Abaixo se encontra apenas uma dos esquemas.
Como pode ser visto, fundos de remessas são uma maneira fácil de lavar os lucros de atividades
ilegais no Brasil.
A – Uma remessa é enviada por um remetente nos EUA ou na Europa, para sua família no Brasil.
B - Os fundos do remetente são depositadas em uma Conta Bancária de propriedade da MTC e ela
os transfere para uma conta bancária de propriedade do OMP1 (no mesmo país, mas geralmente
em outro).
C - O OMP1 envia as instruções de pagamento ao OMP2 (que incluem uma lista de contas de
beneficiários, valores a depositar e dados de identificação).
D - Com os fundos do remetente em seu poder, o OMP1 distribui os fundos a diversos destinos.
E - O OMP2, tendo recebido as informações do remetente, instrui terceiros a fazer depósitos de
Reais na conta bancária dos beneficiários.
F - O dinheiro é depositado na conta bancária dos beneficiários; um recibo de depósito bancário é
recebido e enviado por fax / e-mail para os registros da MTC. Um auditor sem suspeitar do
esquema verá todos esses recibos de depósitos como evidência “legal” de que a remessa foi paga
em uma instituição financeira.
G - O beneficiário, também sem suspeitar de nada, confirma que os fundos do remetente estão em
sua conta bancária.
Com esse sistema, dinheiro de atividades ilegais no Brasil, quer sejam produzidos por atividades no
próprio país ou nas fronteiras com o Uruguai ou Paraguai, é depositado em milhares de contas
bancárias de beneficiários de remessas, enquanto os fundos do remetente são usados para
concluir as operações internacionais dos "proprietários" do dinheiro.
Vamos explorar os exemplos da “troca” que ocorre na outra extremidade da transação. Um
comerciante de recursos deseja evitar sonegar impostos no Brasil. Para tanto, ele se certifica de que
suas transações sejam feitas com dinheiro, assim evitando que esses fundos entrem no sistema
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financeiro brasileiro. Com esse dinheiro em mãos, ele procura um OMP2 e entrega seu dinheiro. O
OMP1 é instruído acerca de onde os fundos “de fora” precisam ser alocados, fechando o círculo da
“troca”.
Um político corrupto está pronto para receber um suborno. Ele sabe que é muito mais seguro
receber esse dinheiro em outro país. O comerciante que “compra” o auxílio do político entrega o
dinheiro ao OMP2, que instrui o OMP1 sobre onde os fundos devem ser alocados, fechando o círculo
de outra "troca".
Mas nem todos os casos envolvem dinheiro depositado na conta do beneficiário. Em algumas
transferências de fundos que fizemos em caráter de teste usando o canal MTC-OMPs, observei que,
na conta bancária do beneficiário, o depósito era feito diretamente por uma empresa (e não uma
instituição autorizada de transferência de fundos)27. Em alguns casos, observamos que os depósitos
foram feitos por empresas de factoring28.
É por isso que essas transferências de fundos jamais são informadas ao Banco Central do Brasil - elas
nunca são oficialmente registradas, já que os fundos não passam por Prestadores de Serviços de
Remessa autorizados antes de chegar diretamente ao beneficiário.
Um exemplo interessante me foi passado por um OMP que decidiu interromper suas práticas no
mercado paralelo, já que achava que as operações estavam ficando arriscadas demais para ele e
seus colegas. Os Reais usados pelos brasileiros para comprar produtos em países vizinhos são
vendidos a OMPs, que trazem o dinheiro clandestinamente de volta ao Brasil e fazem depósitos em
dinheiro para as contas bancárias de beneficiários de remessas. A “troca” ocorre quando os fundos
de transferências de dinheiro, nos EUA e na Europa, são usados para comprar bens ao redor do
mundo para fornecer tais produtos.
É importante observar que o OMP se certifica de que nenhum remetente / beneficiário fique
insatisfeito com o serviço, não recebendo nenhuma queixa de seus clientes. O que ocorreria,
imagino eu, se o remetente soubesse que os fundos depositados na conta bancária de seu parente
são os lucros decorrentes de evasão fiscal, corrupção ou contrabando?
O que é necessário para interromper o uso de remessas pelo GMRE?
Em primeiro lugar, é importante observar que vêm sendo realizadas ações para interromper o uso
de transferências de fundos por OMPs. Não apenas o Governo Brasileiro tomou diversas decisões
importantes para modernizar suas regulamentações de transferência de dinheiro, mas as indústrias
de serviços de câmbio e financeiros do Brasil também vêm realizando um trabalho de
27
Hawalas e outros Sistemas Informais de Transferência de Valores (Informal Value Transfer System or IVTS por suas
iniciais em inglês) funcionam de maneira semelhante: Hawalas: http://www.treasury.gov/resource-center/terrorist-illicitfinance/Documents/FinCEN-Hawala-rpt.pdf
IVTS: http://www.fincen.gov/statutes_regs/guidance/html/FIN-2010-A011.html
28
Consulte o Apêndice deste documento, “Factoring e o MCC no Brasil”.
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conscientização acerca de controles de lavagem de dinheiro e prevenção de crimes financeiros. A
ABM Transf (www.abmtransf.com.br) - Associação Brasileira das Empresas Prestadoras de Serviços
de Micro-Transferência de Dinheiro - trabalha sem parar na conscientização dos setores público e
privado. No entanto, à medida que se aumenta a conscientização acerca dessas atividades e medidas
de controle são estabelecidas, os OMPs também aprimoram seus métodos.
Nos EUA, a NMTA29 (www.nmta.us) também vem trabalhando na conscientização dentro da
Indústria de Transferência de Fundos, por meio da explicação do GMRE as Representantes de
Auditoria e Oficiais de Compliance de MTCs para que estejam mais preparadas para exigir
informações acerca da natureza e da legalidade do pagante final da transferência de fundos ao Brasil
enviada por sua instituição. Diversas MTCs cortaram todas as suas ligações com intermediários ou
corretores de transferências de fundos quando os mesmos não conseguem ou não estão dispostos a
fornecer as informações completas do pagante final. Eles o fizeram, mesmo com o custo de perder
agentes de transferências de fundos que os trocaram por empresas que continuam usando OMPs
(agentes usam essas empresas “para não perder clientes que buscam taxas de câmbio melhores").
Alguns “Banking Departments”30, como o da Califórnia, instruíram seus auditores a observar
cuidadosamente transferências de fundos ao Brasil de empresas licenciadas que operam no estado31
para se certificar de que tais fundos estejam sendo direcionados os Prestadores de Serviços de
Remessas no Brasil. No entanto, os esforços não acabam por aí. As autoridades dos EUA, com as
informações fornecidas pelos Bancos acerca de atividades suspeitas de MTCs, conseguiram congelar
as contas bancárias de empresas licenciadas de transferência / remessa de fundos que operam com
OMPs. Recentemente, houve confisco de fundos e revogação de licenças. Em um relatório publicado
há pouco tempo32, o FINCEN33 divulgou que o Brasil é o quinto, com 5%, do total de SARs34 enviados
pelas instituições que tem a obrigação legal de fazê-lo. Antes do Brasil, da primeira para a quarta,
encontramos a Venezuela (39%), Argentina, Uruguai e Emirados Árabes Unidos. Isso comprova que o
sistema bancário dos EUA e as MSBs35 suspeitam cada vez mais de transações relacionadas ao Brasil.
Mas isso não é o bastante. A cada etapa, os OMPs se tornam mais sofisticados e têm conseguido
evitar a abertura de ações judiciais contra eles. Esses corretores mudaram-se para outros locais,
como a Europa, onde estão confiantes de que podem evitar serem detectados.
29
Associação Nacional das Empresas de Transferência/Remessa de Dinheiro (tradução livre): National Money
Transmitters Association – NMTA - por suas iniciais em inglês.
30
Departamentos Estaduais de Supervisão de Atividades Bancárias
31
Ainda não há uma Licença Federal de Transferência de Fundos nos EUA. Cada estado regulamenta as MTCs e outras
MSBs de maneira independente, embora a MTRA (http://www.mtraweb.org) (Associação dos Reguladores de Empresas
de Transferência / Remessa de Fundos, tradução livre) tenha feito um bom trabalho para estabelecer alguns padrões
comuns e se reunir anualmente para análise dos problemas atuais.
32
http://www.fincen.gov/news_room/rp/files/sar_tti_20.pdf
33
Rede de Policiamento de Crimes Financeiros (tradução livre): Financial Crimes Enforcement Network – FINCEN - por
suas iniciais em inglês, uma unidade do Departamento do Tesouro dos EUA
34
Relatos de Atividades Suspeitas (tradução livre): Suspicious Activity Reports – SARs - por suas iniciais em inglês.
35
Empresas de Serviços Monetários (tradução livre): Money Service Business – MSBs - por suas iniciais em inglês.
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Uma questão que vem causando polêmica e sempre é levantada em encontros do setor são as
afirmações encontradas no excelente site "Remittance Prices Worldwide"36, do Grupo de
Desenvolvimento de Sistemas de Pagamentos do Banco Mundial. Esta diz respeito ao corredor EUABrasil:
“Observação: no Brasil, há diversas taxas de câmbio para USD / BRL: “comercial”, “paralelo” e
“turismo”. Para uma reflexão mais precisa do custo real arcado pelo remetente, a taxa do câmbio
paralelo foi usada como referência para o cálculo das margens de taxa de câmbio nesse corredor,
em vez da taxa de câmbio interbancária usada para os outros.” 37
Com relação ao corredor Reino Unido-Brasil, a afirmação é outra:
“Nesse corredor, a taxa de câmbio usada como referência para o cálculo das margens de taxa de
câmbio foi ajustada para uma reflexão mais precisa do custo real arcado pelo remetente. No Brasil,
há diversas taxas de câmbio para o USD: comercial, paralelo e turismo. A taxa de câmbio usada
como referência é igual à taxa de câmbio interbancária GPB / USD multiplicada pela taxa do
câmbio paralelo de USD / BRL.” 38
Essa afirmação é semelhante àquela feita sobre o corredor Itália-Brasil. O corredor Japão-Brasil39 não
possui qualquer afirmação desse tipo, fato que reflete a ausência de OMPs no mercado.
Essas afirmações são um sinal claro de que o GMRE é grande e bem-sucedido, já que suas taxas são,
de certo modo, “aceitas” e definitivamente influenciam os preços do mercado de remessas, que é o
que o site do Banco Mundial demonstra. A Indústria de Transferência de Fundos entende que essas
afirmações oferecem de modo implícito, legitimidade ao mercado paralelo e tem solicitado que o
Banco Mundial e os Agentes Reguladores Brasileiros discutam o problema e modifiquem a
afirmação, ou que retirem as informações da taxa do mercado paralelo. Estou de acordo que listar
ou usar a taxa do mercado paralelo em um site do Banco Mundial leva qualquer pessoa desavisada a
acreditar que se trata de um mercado “legítimo”.
Uma análise detalhada das empresas que oferecem as taxas do câmbio paralelo encontradas no site
do Banco Mundial também podem servir como sinal para agências reguladoras, autoridades,
auditores de conformidade e instituições financeiras acerca dos riscos enfrentados por essas
empresas ao operar com OMPs.
36
Preços Globais de Remessas, tradução livre.
http://remittanceprices.worldbank.org/Country-Corridors/United-States/Brazil/
38
http://remittanceprices.worldbank.org/Country-Corridors/United-Kingdom/Brazil/ (nov./2011)
39
http://remittanceprices.worldbank.org/Country-Corridors/Japan/Brazil/ (nov./2011)
37
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Vamos voltar à questão: o que é necessário para interromper o uso de transferência de fundos pelo
GMRE?
1- A primeira coisa para todos os envolvidos com transferências de fundos - indústria, reguladores
e autoridades competentes no Brasil, EUA e Europa, além de organizações multilaterais como o
BID, CEMLA40 e Banco Mundial - é aceitar o fato de que o sistema existe, de que transferências
de fundos para o Brasil estão sendo usadas como um meio fácil de integrar os fundos dos
remetentes ao Sistema do GMRE. Todos precisamos aceitar esse fato, mesmo que não
estejamos totalmente de acordo quanto ao tamanho do volume de transferências de fundos
que não são registradas adequadamente41 e assim evitam a detecção. Conscientização e
cooperação são os primeiros passos.
2- O Banco Central do Brasil precisa trabalhar para fornecer explicações e informações melhores a
autoridades dos EUA e Europa acerca de quais instituições estão legalmente autorizadas a fazer
pagamentos de transferências de fundos no Brasil e tornar seu site e documentos mais diretos
e fáceis de compreender42.
3- Não é frequente que a Indústria de Transferência de Fundos solicite que os reguladores
aumentem a prestação de contas ou a carga regulamentar com a qual lidam. No entanto,
associações comerciais de ambos os lados da equação vêm exigindo que seja necessário que as
MTCs dos EUA e da Europa divulguem, informem e sejam obrigadas a conhecer o pagante final
da transferência de fundos enviada ao Brasil. É óbvio que um recibo de depósito bancário não é
um sinal de que uma remessa foi processada por uma instituição autorizada no Brasil43. Sem
aplicar às MTCs regras e procedimentos claros, achamos que será impossível para os
Prestadores de Serviços de Remessas Brasileiras formalizados receber e pagar todas as
transferências de fundos que os migrantes brasileiros enviam ao seu país de origem.
Há vários casos de países que necessitam de cooperação internacional para o controle de fraudes,
evasão fiscal, corrupção e outras atividades ilegais.
Todos concordamos que precisamos de dados completos que sejam mensuráveis e confiáveis para
saber a quantidade de transferências de fundos recebidas pelo Brasil. Sem dados completos, o país
não será capaz de instituir as políticas que permitirão que as remessas sejam usadas para o
desenvolvimento de crédito, de programas para os que não têm acesso a bancos, educação
financeira, etc.
40
Centro de Estudos Monetários Latino-Americanos - http://cemla.org/
Independentemente de serem classificados como remessas, repatriação de capital, etc.
42
GENCE, a Gerência-Executiva de Normatização de Câmbio e Capitais Estrangeiros do Banco Central do Brasil, e seu
Diretor, o Sr. Geraldo Magela Siqueira, estão cientes da situação e se comprometeram a fornecer mais informações em
inglês e participar de encontros internacionais para o fornecimento de informações e assistência.
43
Políticas bancárias de alguns países proíbem o depósito de dinheiro em contas sem prova de que as mesmas
pertencem ao depositante
41
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Conclusão
O Brasil é o único país das Américas que ainda tem um grande desafio pela frente para direcionar o
fluxo de transferências de fundos dos canais informais para os formais44. Em algum momento, todos
os países do continente, entre os quais EUA, México e Colômbia, tiveram de enfrentar esse desafio e
obtiveram sucesso. Os desafios e sucessos da Indústria de Transferência de Fundos deste continente
serviram de exemplos para vários outros países na África, Oriente Médio e Ásia ao formalizar seus
próprios fluxos de remessas. Vários países também enfrentaram desafios enormes para impedir o
uso das remessas por operadores ilegais na lavagem de seus lucros derivados de atividades
criminosas. As autoridades internacionais certamente preferem operações em grande escala,
confiscando fundos e levando OMPs à cadeia; uma operação em escala global que envie uma
mensagem clara para assustar o restante dos OMPs e levá-los a encerrar suas atividades ilegais ou
migrar para outros métodos.
Há três anos, em 2009, um OMP decepcionado me abordou e contou que seus advogados haviam
lhe avisado que sua operação era legal e que ele seria capaz de provar tal afirmação. Eu ofereci a ele
a opção de convidar esses advogados para uma conferência na qual poderiam explicar a legalidade
de sua operação de transferência de fundos. Ele retornou com a alegação de que seus advogados lhe
disseram que isso revelaria os segredos de sua operação e as brechas legais descobertas por eles.
Vários brasileiros da indústria acreditam que há pessoas no governo que não querem o GMRE
exposto por se tratar de uma fonte importantíssima para a movimentação de fundos em atividades
relacionadas à corrupção. Embora a corrupção no governo seja um problema grave no Brasil, os
novos esforços realizados pela batalha anticorrupção da presidenta Dilma 45 são um sinal de que o
país está pronto para o desafio. Juntas, a Receita Federal do Brasil (RFB), a Polícia Federal e a
Procuradoria Geral da União vêm conduzindo uma guerra declarada contra a evasão fiscal e a
lavagem de dinheiro, algo que ficou claro com as notícias referentes à Operação Alquimia46 em
agosto de 2011, que teve como resultado o indiciamento de mais de 68 pessoas em 12 estados, a
confiscação de uma grande soma de bens e de um valor estimado de US$ 600 milhões em impostos
não recolhidos. A Operação Pomar47 revelou, em junho de 2011, o uso de empresas de papel para
cometer fraudes, contrabandear bens e lavar os lucros de atividades criminosas. Jose Casado, um
jornalista do O Globo, publicou um artigo no final de 2011 que dá boa conta da evolução recente da
batalha contra a lavagem de dinheiro no país48.
44
A Venezuela também enfrenta um grande desafio, já que as transferências de fundos recebidas também estão sendo
usadas para “trocas” devido aos existentes controles de câmbio nesse pais. Corretores trocam fundos, em dólares
americanos nos EUA - de remetentes de remessas - por bolívares no país, de venezuelanos que não podem ou não estão
dispostos a usar os canais formais para mandar o dinheiro para fora do país.
45
Brasil: Iniciativa anticorrupção da presidenta Dilma:
http://www.lab.org.uk/index.php?option=com_content&view=article&id=1078:brazil-president-dilmas-anticorruptiondrive&catid=65:news&Itemid=39
46
http://www.receita.fazenda.gov.br/principal/Ingles/Noticias/2011/17082011.htm
47
http://www.receita.fazenda.gov.br/automaticoSRFSinot/2011/06/28/2011_06_28_11_28_23_228562388.html
48
Brasil vira paraíso de lavagem de dinheiro http://www.imtconferences.com/docs/Brasil_vira_paraiso_de_lavagem_de_dinheiro.pdf
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Com base em registros de depósitos de transferências de fundos recebidas nas contas bancárias de
beneficiários de remessas, foi comprovado que empresas de factoring são usadas por OMPs para
efetuar pagamentos no Brasil como parte do GMRE49.
Quando ouço desencorajados Executivos de MTCs nos EUA e na Europa que nem mesmo querem
oferecer serviços de remessa para o Brasil por achar que concorrer com o mercado paralelo é uma
tarefa impossível, lembro-me do trajeto já percorrido pela indústria e penso que, mais cedo ou mais
tarde, trabalhando em conjunto com agências reguladoras e com as autoridades em ambos os lados
da equação, obteremos sucesso em separar as remessas do GMRE. Colocando em prática uma
iniciativa coletiva, não será algo difícil de atingir.
_________________________
Notas finais:
 Todos os sites aqui mencionados foram acessados entre setembro e novembro de 2011.
 Para comentários e contribuições, acesse o link contact em http://www.mohrworld.info.
 Quero agradecer a todas as pessoas e empresas que forneceram informações, orientação, consultoria, e
comentários utilizados para a publicação deste documento.
 Graças à Kathalin Carvalho e Rodney Alves pela revisão da versão em português deste documento.
 Este documento pode ser baixado aqui:
http://www.imtconferences.com/docs/Mercado_Paralelo_de_Câmbio_no_Brasil.pdf
 Versão em Inglês: http://www.imtconferences.com/docs/Understanding_the_Brazilian_Parallel_Market.pdf
49
Consulte o Apêndice, “Factoring e o MGCR no Brasil”.
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APÊNDICE I
Factoring e o GMRE no Brasil
“O Factoring se desenvolveu no Brasil devido às suas próprias características baseadas na economia e a na
realidade social do país, que são muito diferentes daquelas vistas no resto do mundo. Provavelmente, o número de
empresas de factoring em todo o mundo é menor do que a metade da quantidade de empresas de factoring no
Brasil - de acordo com uma pesquisa realizada pela Toth Management, uma empresa da qual eu participava até
50
recentemente, o número de empresas dessas empresas em todo o mundo é de cerca de 5.000”
O que é Factoring?
Factoring é uma forma de financiamento comercial de curto prazo no qual são comprados direitos creditórios
provenientes de bens e serviços realizados a prazo. O Factor (também chamado de “faturizador”) mantém o registro de
vendas e realiza outras tarefas administrativas relacionadas a funções de contas a receber, recolhe as contas a receber e
51
fornece proteção contra insolvência do devedor .
52
A Convenção Diplomática de Factoring Internacional (Ottawa, 1988) definiu um contrato de factoring como um
contrato entre duas partes: o Cliente (Fornecedor) e o Factor. De acordo com a Convenção, a empresa de factoring deve
realizar ao menos duas das seguintes funções: a) Financiamento para o fornecedor, incluindo empréstimos e
adiantamento de pagamentos; b) Manutenção do registro de vendas; c) Recolhimento de recebíveis; d) Proteção contra
não pagamento de devedores. O Factoring também é a prestação de consultoria de marketing e crédito, gerenciamento
de risco e crédito, monitoramento de contas a receber e outros serviços. O Brasil foi uma das 53 nações signatárias da
convenção de Ottawa.
A atividade foi introduzida pela primeira vez no Brasil pela promulgação legislativa de 20 de janeiro de 1995 (Lei nº 8.981
53
art. 28, § 1º, c-4 – seguida pelo art. 58 da Lei nº 9.430/96). O Factoring nasceu no Brasil com a criação da ANFAC
(Associação Nacional de Factoring). Rogério Alessandre de Oliveira Castro, em seu livro sobre a importância do Factoring,
descreve como a atividade foi criticada e contestada pelas instituições financeiras e como até mesmo o Banco Central do
Brasil (BACEN) tentou torná-la uma prática ilegal (Circular nº 703, de 16 de junho de 1982). Foi somente em 1988 que o
54
Banco Central aceitou a prática (Circular 1.359, de 3 de outubro de 1988) .
Ambas as associações de factoring, a ANFAC e a FEBRAFAC (Federação Brasileira de Factoring), fornecem aos seus
membros assistência legal e operacional, treinamento, serviços de contabilidade e fiscais, e cursos instrutivos contra
lavagem de dinheiro.
Há alguma ligação entre Lavagem de Dinheiro e Factoring no Brasil?
A última década abrigou inúmeros artigos e discussões no Brasil acerca da maneira de controlar a lavagem de dinheiro
(com base em comércio) por empresas de factoring no Brasil. Ambas as Associações Comerciais trabalham
continuamente no desenvolvimento de cursos sobre lavagem de dinheiro com o intuito de aumentar a conscientização
entre seus membros. Diversos especialistas de renome já publicaram livros sobre o assunto, como o Dr. Marco Antonio
de Barros (“Lavagem de Dinheiro e o Factoring”) e o Dr. Arnaldo Rizzardo ("Desvios na Utilização do Factoring").
55
O governo brasileiro vem debatendo a questão da regulamentação de empresas de factoring há cerca de 3 anos.
Devido a preocupações inquestionáveis existentes entre os setores público e privado com o uso do factoring para fins de
lavagem de dinheiro, o COAF (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) promulgou a "Resolução 13", que obriga
todas as empresas de factoring a prestar contas diretamente ao COAF. O COAF relatou 5.684 empresas de factoring
56
registradas em 2010 , com 29 delas tendo sido multadas desde 2006 devido a acusações relacionadas a lavagem de
50
Ernani Desbesel: http://www.portaldofomento.com.br/artigo.php?id=46
Uma boa definição para o factoring no Brasil pode ser encontrada aqui: http://www.grupomrg.com.br/rioclaro/duvidas.php
52
http://www.unidroit.org/english/conventions/1988factoring/main.htm
53
http://www.anfac.com.br
54
http://www.pa.sebrae.com.br/sessoes/pse/tdn/tdn_fac_oque.asp
55
http://coad.jusbrasil.com.br/noticias/2272656/plenario-aprova-regulamentacao-da-atividade-de-factoring
56
https://www.coaf.fazenda.gov.br/downloads/relatorios-coaf/RelatorioAtividades2010.pdf
51
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dinheiro. O número de relatórios recebidos pelo COAF de empresas de factoring em 2010 foi de 12.628. Os Relatórios de
57
Transações Suspeitas (RTS) somaram 5.212 em 2009 . O relatório do GAFI (Grupo de Ação Financeira) de 2010 resume
58
os requisitos de empresas de factoring perante o COAF .
59
A “Revista do Factoring”, um periódico de renome para o setor de factoring, publicou um volume especial em 2005
com foco na questão do Factoring e Lavagem de Dinheiro. Uma entrevista especial concedida pelo presidente do COAF,
o dr. Antonio Gustavo Rodrigues, foi o destaque da publicação, além de conter artigos do dr. Marco Antonio de Barros e
dr. Arnaldo Rizzardo, entre outros.
Factoring, Lavagem de Dinheiro e o Grupo de Ação Financeira (GAFI)
O Brasil faz parte do Grupo de Ação Financeira contra a Lavagem de Dinheiro e o Financiamento do Terrorismo (Financial
Action Task Force – FATF - por suas iniciais em inglês) e do Grupo de Ação Financeira da América do Sul (GAFISUD). Uma
avaliação conjunta de obra do FATF-GAFISUD foi realizada em outubro e novembro de 2009 e publicada em junho de
60
61
2010 em inglês e em português (Sumário Executivo) .
O relatório da avaliação descreve e analisa as medidas contra lavagem de dinheiro em vigor no país e faz recomendações
sobre como melhorar determinados aspectos do sistema. Além disso, ele também aborda os níveis de conformidade do
país, com base nas recomendações do Grupo de Ação Financeira (FATF).
Muitas recomendações para o controle, alteração dos requisitos de prestação de contas e necessidades de
regulamentações são direcionadas especificamente a empresas de factoring:
62
 Requisitos de identificação de proprietários e diretores
63
 Atenção a padrões e transações incomuns, além de requisitos de devida diligência de clientes
64
 Controles Internos
65
 Requisitos para licenciamento
66
 Falta de mão-de-obra do COAF para o controle de empresas de factoring
O governo brasileiro reagiu com rapidez às recomendações do GAFI e César Almeida, coordenador de supervisão do
COAF, comentou, em um artigo recente, que, em 2012, entrarão em vigor novas medidas que também se aplicarão a
67
empresas de factoring .
Factoring e o GRME:
Com base em registros de depósitos de transferências de fundos recebidas nas contas bancárias de beneficiários de
remessas, não há dúvida que empresas de factoring são usadas por OMPs para efetuar pagamentos no Brasil como parte
do GMRE. As dimensões do uso desse tipo de empresa para efetuar tais pagamentos será uma tarefa a ser analisada pelo
COAF e por Associações de Factoring. A análise das ramificações jurídicas e das contravenções da lavagem de dinheiro
realizada pelas empresas de factoring ao efetuar tais pagamentos, assim como das entidades internacionais que as usam
para canalizá-los, não faz parte do escopo deste apêndice.
57
http://www.fatf-gafi.org/dataoecd/13/50/45800700.pdf - Página 154 # 646 (tabela)
http://www.fatf-gafi.org/dataoecd/13/50/45800700.pdf - Página 142 # 591
59
http://www.editoraklarear.com.br/final/produtos.asp?produto=23
60
http://www.fatf-gafi.org/dataoecd/13/50/45800700.pdf
61
https://www.coaf.fazenda.gov.br/downloads/Sumario%20Executivo%20Brasil%202010.pdf
62
Página 117: 464 - Propriedade benéfica (COAF/FIs)
63
Página 101: 3.1 & Página 127: 520 - COAF/FIs - Risco de lavagem de dinheiro ou financiamento a terroristas
64
Página 263: 15 & Página 277: 3.8 - Controles Internos
65
Página 182: 789 -Empresas de factoring não estão sujeitas a quaisquer requisitos de licenciamento ou registro perante
o COAF
66
Página 189: 3.10.2 - Recomendações e comentários
67
http://www.anfac.com.br/v3/informativos-noticias.jsp?id=447
58
© 2012 – Hugo Cuevas-Mohr – Mohr World Consulting – v-1.2 - traduzido por Fernando Abreu - 16