cussy de almeida - ABCC - Associação Beneficente Criança Cidadã
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cussy de almeida - ABCC - Associação Beneficente Criança Cidadã
IMPRESSO ESPECIAL 9912248060/2010-DR/PE Associação Beneficente Criança Cidadã GASTRONOMIA É COM O OLIVIER ANQUIER. INVESTIMENTO É COM A CAIXA. LCI, CDB, Fundos e muito mais. Na CAIXA, você encontra diversas opções de investimentos e ainda conta com uma equipe sempre pronta para dar todas as orientações. Tudo com a solidez que só um banco com 150 anos pode oferecer. caixa.gov.br SAC CAIXA – 0800 726 0101 Informações, reclamações, sugestões e elogios 0800 726 2492 – Atendimento a deficientes auditivos 0800 725 7474 – Ouvidoria VEM INVESTIR NA CAIXA VOCÊ TAMBÉM, VEM. U M A P U B L I C A Ç Ã O D A A S S O C I A Ç Ã O B E N E F I C E N T E C R I A N Ç A C I D A D Ã A N O 1 N Ú M E R O 3 A G O . - O U T. 2 0 1 0 Fundos de Investimento não contam com garantia do administrador do fundo, do gestor da carteira, de qualquer mecanismo de seguro ou, ainda, do Fundo Garantidor de Créditos (FGC). A rentabilidade obtida no passado não representa garantia de rentabilidade futura. Ao investidor, é recomendada a leitura cuidadosa do prospecto e do regulamento do Fundo de Investimento ao aplicar seus recursos. . . . CORREIOS . . . E MAIS O concerto de 4 anos da Orquestra Criança Cidadã CUSSY DE ALMEIDA O SHOW CONTINUA A motivação dos Meninos do Coque permanece firme, honrando a história e o legado de um homem que viveu a música intensamente SUMÁRIO GAROTADA APOIA CAMPANHA CLAREAR 09 COLUNA: A PROPÓSITO DE INCLUSÃO SOCIAL 12 CAPA: MAESTRO CUSSY: O SHOW CONTINUA 14 QUATRO ANOS DE SONS E ESPERANÇA 26 DESAFIOS E PERSPECTIVAS DO ECA 30 ARTE NA CERTIDÃO DE NASCIMENTO 32 UM LAR PARA QUEM PRECISA 36 BREAKDANCE NAS RUAS DO RECIFE 39 SEGUNDOS PASSOS DE VITOR ARAÚJO 42 REVISTA CRIANÇ A C I D A D Ã | A G O / S E T / O U T. 2 0 1 0 EDITORIAL Nossa Associação Beneficente Criança Cidadã (ABCC) sofreu uma perda irreparável no dia 23 de julho. O falecimento do maestro Cussy de Almeida foi, de fato, um acontecimento doloroso para toda a sociedade pernambucana – principalmente, para os meninos e meninas do Coque, que tiveram o maestro como arauto da boa música, da educação e da solidariedade. Nesta edição, as páginas especiais vão para Cussy, como também a seção de textos das crianças da Orquestra, que vêm com testemunhos doces e fortes sobre seu mestre. O maior desejo de Cussy era que a Orquestra Criança Cidadã continuasse no caminho do sucesso independentemente das inevitáveis mudanças que atravessassem o percurso. Pois bem: o projeto segue em frente, e fortalecido pelos anos e pelo reconhecimento. O aniversário de quatro EXPEDIENTE REVISTA CRIANÇA CIDADÃ Rua General Estilac Leal, 439 Cabanga – Recife – PE Telefones: (81) 3224-0305 (81) 3428-7600 CONSELHO EDITORIAL (ASSOCIAÇÃO CRIANÇA CIDADÃ - ABCC) Des. Nildo Nery dos Santos Juiz João Targino Dra. Nair Andrade EDIÇÃO Mariane Menezes (ABCC) DRT/PE 4315 REDAÇÃO Equipe de Comunicação da ABCC: Carolina Barros, Daniel Leal, Milton Raulino e Sthephanie Melo. PROJETO GRÁFICO Aliança Comunicação DIAGRAMAÇÃO Milton Raulino (ABCC) anos dos Meninos do Coque lotou o Teatro Guararapes e justificou a TIRAGEM: 1.000 exemplares abrangência já internacional do grupo. O espetáculo será exibido pela IMPRESSÃO: Rede Globo Nordeste no próximo dia 13 de dezembro. Fiquemos atentos. Uma boa novidade que contribui para a expansão dos projetos da ABCC Esta publicação é um instrumento de comunicação da Associação Criança Cidadã / Orquestra Criança Cidadã. Comentários e sugestões devem ser enviados para o e-mail é o reforço da tradicional Campanha Clarear, firmada com a Celpe. A [email protected] ABCC vem apostando na solidariedade dos estudantes pernambucanos (www.associacaocriancacidada.org.br) informa sobre a possibilidade de CONTRIBUA Banco Real Ag. 1001, C/C 1027155-2 Deposite a quantia que desejar. ajudar crianças em situação de risco, objetivo maior da ABCC. Vale a PARCEIROS: para angariar mais colaboradores. Um banner no site da Associação pena conferir. E outras matérias discutem a problemática da infância em viés questionador – e por que não positivo? Trazemos, nesta edição, a questão dos nomes próprios, às vezes, elevados à esfera artística devido à criatividade de mães e pais. A reportagem da Criança Cidadã descobriu que muitos jovens e adultos convivem bem e até gostam de seus nomes diferentes. Outro texto exibe a realidade de crianças e adolescentes que usam talento na dança para sobreviver. É o caso do Breakdance, que pode ser observado nas ruas do Recife. Conheça, também, a ação da ABCC que ajuda moradores de rua, o “Aluguel Temporário”, e siga os passos do pianista Vitor Araújo, que já virou referência nacional. Vitor é a primeira personalidade jovem que abordamos na Revista Criança Cidadã. Nossa ideia é, a partir deste número, sair em busca desses talentos, inspiradores para quem deseja seguir carreira nas artes – ou sente que pulsa, escondida, aquela vontade perturbadora. Boa leitura. REVISTA CRIANÇA CI D A D Ã | A G O/ S E T / O U T. 2 0 1 0 REVISTA CRIANÇ A C I D A D Ã | A G O / S E T / O U T. 2 0 1 0 Talento jovem no Encontro de Música Antiga Os prodígios da Orquestra Criança Cidadã dos Meninos do Coque continuam se destacando por onde passam. Convidados para participarem do Oitavo Encontro de Música Antiga Recife e Olinda, que aconteceu dos dias 6 a 11 de agosto, no Mosteiro de São Francisco, em Olinda, alguns dos 13 alunos da Orquestra foram tão bem que acabaram sendo convidados pelos professores para uma apresentação no último dia dos trabalhos. O evento, Pernambucano organizado de Música, pelo Conservatório foi especialmente dedicado a composições do alemão Bach – um organista do período barroco. Para a professora e maestrina da Orquestra Criança Cidadã, Aline Ananias, os garotos souberam aproveitar, de forma sensacional, tudo o que o curso poderia oferecer. “Aproveitaram até mais do que eu esperava. Na verdade, cada aluno poderia fazer até dois cursos. clássica. Mostra agilidade. São poucos que a tocam”, disse Isaías. “Foi o nosso primeiro curso com certificado. E foi excelente porque aprendemos com ótimos professores, especialistas mesmo em música barroca”, falou o jovem de 18 anos. Doutor! Graças à Unimed Recife, meninos da Orquestra têm plano de saúde garantido Entre os benefícios estendidos aos 130 meninos e meninas da Orquestra Criança Cidadã, está o O professor de violino, o francês Xavier Julien- atendimento médico gratuito por meio da Unimed Laferrière, ficou impressionado com a capacidade dos Recife. Há quatro anos, quando a Orquestra estava garotos da Orquestra Criança Cidadã. “Fico feliz por nascendo e buscava apoios, deu-se o primeiro poder ajudá-los de alguma forma. Mas já vejo que passo para a concretização da parceria: um estão muito bem preparados. O grupo é realmente encontro entre o coordenador geral da Orquestra muito bom. Acredito que possam seguir uma carreira profissional sem problemas”, garantiu o professor. A professora paulista Raquel Aranha, que ensinou dança barroca, também gostou do desempenho dos meninos. “Os alunos são muito dedicados. Respeitam bastante o professor e são bem atentos a todos os detalhes que passamos. Você vê que eles têm gana em aprender. Isso é satisfatório para a gente”, concluiu Raquel, que dá aulas de Dança Barroca na Universidade Estadual de Campinas. No entanto, para a gente, foi aberta uma exceção, que foi muito bem aproveitada pelos meninos”, Criança Cidadã, juiz João Targino, e a presidente da Unimed Recife, Maria de Lourdes Araújo, na saída do Tribunal de Justiça de Pernambuco. A doutora Maria de Lourdes conta como, a partir daí, começou o relacionamento entre os parceiros. Maria de Lourdes e Nildo Nery com o spalla da Orquestra, João Pedro Lima, na sede do projeto O pedido de João Targino foi claro: que a Unimed Recife ajudasse os meninos do Coque, que os meninos. Principalmente porque esse é um tipo de precisavam de atendimento de saúde. colaboração que nós realmente vemos retorno. Nós sabemos no que estamos contribuindo, não é algo Maria de Lourdes, interessada no projeto, botou abstrato. Isso é muito importante para quem ajuda”, o pedido na pauta da reunião com o conselho diz Maria de Lourdes. da cooperativa. A aprovação foi imediata. “Todos garantiu. E eles foram além. Os alunos Isaías Tavares e Alexsandro Castro foram convidados para se adoraram a ideia de ajudar crianças em situação A médica comenta sobre o retorno que tem dos de risco”, conta. Um trabalho que é feito com familiares dos meninos e, ao mesmo tempo, muita dedicação e boa vontade. dos médicos que os atendem. “Muitas vezes, os profissionais terminam o atendimento de algumas apresentarem em uma noite onde somente os Com a contribuição da Unimed Recife, o fato é que das crianças da Orquestra e depois me ligam para todas as crianças vêm melhorando nos aspectos dizer como foi bom recebê-las no consultório”. de saúde, principalmente o odontológico. Desde Acompanhando os passos da Orquestra Criança Criança Cidadã, que compuseram uma orquestra o início, foram feitos 24 atendimentos por mês em Cidadã, Maria de Lourdes sempre visita o projeto de câmara (ou mini-orquestra).“Levamos cerca Odontologia e 18 atendimentos, também mensais, e não deixa de assistir às apresentações. “Observo em consultas variadas. “Todos os 1.816 médicos o aprimoramento de cada um. O sentimento de da cooperativa se sentem muito felizes em ajudar felicidade me invade todas as vezes.” professores estariam no palco. Ambos tocaram uma peça de Bach, “Branderburg n° 6”, ao lado de outros três companheiros também da Orquestra de dois meses para aprontar tudo. É uma peça em que a gente mostra a virtuosidade da música 6 Obrigado, O curso foi especialmente dedicado a composições do alemão Bach 7 Garotada Orquestra recebe prêmio apoia REVISTA CRIAN Ç A C I D A D Ã | A G O / S E T / O U T. 2 0 1 0 em Brasília O mais novo reconhecimento à Orquestra Criança Cidadã, a Medalha da Ordem do Mérito Judiciário do Trabalho, chegou às mãos dos Meninos do Coque no último dia 11 de agosto. O coordenador geral da Orquestra, juiz João Targino, recebeu a comenda do presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), ministro Milton de Moura França, em solenidade realizada na Corte Superior, em Brasília. Criado em 1970, o prêmio homenageia pessoas e instituições que se distinguem profissionalmente ou servem de exemplo para a sociedade. Trinta e nove homenageados receberam a comenda este ano. Muitas personalidades marcaram a entrega. “Tivemos destaque absoluto. A concessão desse prêmio significa mais um estímulo para continuarmos”, pontua João Targino. Além da Orquestra, outra instituição ganhou o prêmio: o instituto Ethos, cuja missão é mobilizar, sensibilizar e ajudar as empresas a gerir em seus negócios de forma socialmente responsável. REVISTA CRIANÇA CI D A D Ã | A G O / S E T / O U T. 2 0 1 0 Campanha Clarear Projeto de arrecadação de fundos através da conta da energia está em expansão Contribuir para o sucesso dos projetos de inclusão social da Associação Beneficente Criança Cidadã (ABCC) está cada vez mais fácil. A Campanha Clarear, que consiste na contribuição no valor de R$ 0,98 na conta de energia da Celpe, está sendo aderida pelas instituições de ensino do Recife. O lançamento aconteceu no Colégio Motivo, no dia 12 de o juiz joão targino e o ministro milton de moura frança, na entrega do prêmio, em brasília agosto. Durante a abertura do evento, crianças e E MAIS PRÊMIOS adolescentes lotaram a quadra de esportes do Motivo para viverem um momento atípico: ver Estudantes do Colégio de São José também entraram na Campanha Haja prêmios para a Orquestra Criança Cidadã. Os Meninos meninos da mesma idade – e vindos de uma do Coque estão na lista dos 13 cases vencedores da 9ª edição comunidade carente – tocar música clássica. da comenda Marketing Best Sustentabilidade. A premiação “Achei muito bonita a apresentação. É legal de sucesso: a credibilidade de quem está organizando, acontece desde 2002 e vem crescendo a cada ano, trazendo existir essa oportunidade para os jovens do o cuidado com a educação dos jovens e a oportunidade espaço para projetos sociais. A escolha dos vencedores Coque”, de uma carreira profissional”, comentou o empresário foi feita pela Associação Latino-Americana de Agências de Travassos sobre a Orquestra Criança Cidadã. Eduardo Belo. O lançamento contou com a demonstração O colégio entregará, aos estudantes, a circular de do vídeo institucional da Orquestra e com a adesão à campanha. O representante de cada sala ficará Do lado da Associação Beneficente Criança Cidadã (ABCC), presença do desembargador Nildo Nery e da responsável pelo recolhimento dos papéis. “Muita gente o presidente Nildo Nery expressou satisfação. “Essa é equipe da ABCC, além de representantes do deixa de ajudar projetos sociais porque não encontra disse o pré-vestibulando Pedro Publicidade, comandada pelo presidente Jomar Pereira da 8 Dia do Advogado - O dia 11 de agosto, que marca a entrega das comendas do Mérito Judiciário do Trabalho, não foi escolhido arbitrariamente pelo TST. Trata-se do Dia do Advogado, além de constituir data da Silva. mais uma grande conquista, que mostra a abrangência já Movimento Pró-Criança. “Há três pilares que uma forma. Desse jeito, ficou muito simples”, afirmou o fundação dos cursos jurídicos no país. internacional do nosso projeto”, comentou. fazem da Orquestra Criança Cidadã um projeto estudante do 3º ano do Ensino Médio Rodrigo França. 9 REVISTA CRIAN Ç A C I D A D Ã | A G O / S E T / O U T. 2 0 1 0 REVISTA CRIAN Ç A C I D A D Ã | A G O / S E T. 2 0 1 0 Outras instituições de ensino também estão abraçando a Campanha Clarear. O Colégio de São José recebeu a equipe da ABCC um dia depois. Voluntários da Associação apresentaram o documentário da Orquestra e falaram um pouco sobre como ser solidário cooperando com apenas R$ 0,98. “Nós somos um colégio católico. Está dentro da nossa proposta a formação humanitária do estudante. Com a Campanha, vamos por em prática o nosso trabalho, preparando o aluno para ser um cidadão consciente”, disse a coordenadora do São José, Suely Amorim. Após aprenderem um pouco sobre a realidade dos Meninos do Coque, os alunos do Colégio de São José estão mais engajados em ajudar os projetos sociais da ABCC, através da Campanha Clarear. “Fiquei muito emocionada vendo o documentário da Orquestra. Fiz música também e sei como é difícil. Tive que parar de tocar instrumentos por causa da minha coluna”, disse a aluna Diana Flávia de Paiva, que canta e já estudou violão, piano e violino. Saiba mais sobre o Clarear A Campanha Clarear é um projeto que visa à arrecadação de fundos para auxiliar na inclusão social de crianças e adolescentes em situação de risco. Ao todo, são cerca de 160 mil crianças beneficiadas através das ações de quatro Nildo Nery e Eduardo Belo, do Colégio Motivo, estão juntos na expansão do Clarear entidades: Associação Beneficente Criança Cidadã (ABCC), Movimento Pró-Criança, Pastoral da Criança e Organização do Auxílio Fraterno (OAF). Quem ajuda a ABCC contribui com os dois projetos principais da Associação: a Orquestra Criança Cidadã Meninos do Coque e o Espaço Criança Cidadã Dom Helder Camara, que fica no Parque do Caiara, no Cordeiro. Através da Campanha, é possível ajudar essas organizações, exercitando a cidadania e a solidariedade. A contribuição é feita através da conta de energia. Cadastrando-se, o usuário permite a subtração de R$0,98 pela Celpe, quantia que será revertida para o auxílio de crianças e jovens carentes. Como contribuir Para se cadastrar na Campanha Clarear, basta acessar o site da ABCC (www.associacaocriancacidada.org.br) e clicar no banner “Participe da Campanha Clarear”. Depois, é só digitar o nome do titular da conta de energia e o número do contrato, que também aparece Lançamento aconteceu na quadra do Colégio Motivo, com presença da Orquestra Criança Cidadã 10 na fatura. Um funcionário da ABCC se encarregará de ligar para o titular para confirmar o cadastro. 14 REVISTA CRIANÇ A C I D A D Ã | A G O / S E T / O U T. 2 0 1 0 REVISTA CRIANÇA CID A D Ã | A G O/ S E T / O U T. 2 0 1 0 A propósito de de Farias Reis e desembargadora Helena Caúla Reis) Dentre tantos, escolhemos a poesia de Fernando Limoeiro “O menino iluminado”, por ser a preferida “Ao olhar nos olhos de cada um desses jovens inclusão social do próprio Cussy de Almeida: músicos, enxergamos um brilho alegre de novas vidas surgindo.” (Desembargador Bartolomeu Bueno) Eu vi um anjo menino Tocando seu violino Sabendo que cada nota “Sabemos que, para ensinar música a cada Pode mudar seu destino uma dessas crianças, gasta-se a metade do valor Vi um maestro regendo para manter um presidiário atrás das grades.” A orquestra da esperança (Desembargador José Fernandes de Lemos) Refinando mão e almas E a vida dessas crianças especialmente, na proposta de oferecer oportunidade O desportista Hildo Nejar, comissário da FIFA, ao E vi como um deslumbrado visitar a Escola, disse: “Acho que o mundo todo tem Naquele momento exato de saber da existência desse projeto”. Que o Brasil tinha jeito: O aprendiz bem treinado para fazer florir trabalhadores e homens de bem, para colorir um mundo que, infelizmente, toca fora Registramos, nesta oportunidade, os comentários Não era mecânico ou pedreiro da harmonia e da paz.” (Nando Cordel) dos militares. Eles afirmaram: Na cena estava surgindo Um iluminado menino “...Esses meninos serão os músicos do futuro e “Observar esses meninos continua sendo estimulante vão renovar a estrutura orquestral brasileira...” para mim. Esse fenômeno merece ser estudado e (Dominguinhos) apoiado.” (General Santa Rosa) de Almeida dedicou os quatro últimos anos de “...Foi transformação “Que bom seria se existisse, em cada recanto deste sua vida aos Meninos do Coque, preparando-os acontecendo. A música é capaz disso...” (Yamandu Brasil, um projeto de similar magnitude.” (Coronel “Maestro, amigo, pai, que, para defender seus cuidadosamente para um futuro promissor. Adaptou Costa) Robson Roger) filhos, é capaz de brigar com tudo e com todos! O DES. NILDO NERY DOS SANTOS É PRESIDENTE DA ABCC E EX-PRESIDENTE DO TJPE. Acima de tudo, o trabalho de Cussy será sempre Mandado pelo Divino Pai Eterno, o maestro Cussy lembrado por seus alunos: emocionante ver a Com a gente, foi assim. Um excelente maestro, o método SuzukI de ensino instrumental para a nossa realidade, objetivando o desenvolvimento “Que sorte a desses garotos do Coque. Eles Na mesma linha, está o depoimento do chefe do 7° que nos ensinou a fazer uma boa música. Um rápido de educação artística das crianças carentes. encontraram, em seus caminhos, nada menos que DSUP, tenente-coronel Edvaldo Santos, que afirma: grande amigo, que, nas horas ruins, estava ali para Cussy trabalhava duas prioridades: o cidadão e o um dos mais competentes violinistas que o Brasil “O projeto irradia luz e esperança a uma camada levantar nossa cabeça e dizer: ‘não desista’. Um profissional. já produziu para abrir-lhes a passagem que leva ao da sociedade ávida por oportunidades. O talento paizão, que nos defendia com unhas e dentes e existe, não há dúvidas para quem ouve as crianças fazia de tudo para que ninguém nos magoasse. do Coque”. Cussy, se soubéssemos o quanto sua falta dói, mundo da música e do sonho.” (Elyanna Caldas) Graças ao rígido sistema de disciplina comportamental e de um acompanhamento psicológico e pedagógico teríamos aproveitado melhor cada minuto em Por sua vez, magistrados reconhecem: com especialistas nos ramos, os alunos do maestro viram rapidamente abrir-lhes o caminho do sucesso. “A Orquestra Criança Cidadã é um dos melhores projetos de responsabilidade social atualmente em É certo que todos que conhecem a Escola de Música trabalho maravilhoso tiveram um privilégio no momento, porém, o mais importante foi a conquista “... A beleza não está só nos acordes e arranjos, mas, que você estava presente. Para encerrar, eu digo: pronunciamentos da elite intelectual pernambucana Cussy não morreu. Ele se eternizou, como as sobre estrelas do infinito”. (Thamires Maria, 15 anos, a Orquestra Waldenio Porto, Criança Cidadã, presidente da como o Academia toca contrabaixo na Orquestra Criança Cidadã) Pernambucana de Letras e autor do romance “As crianças e adolescentes engajados nesse Os artistas afirmam: Neste breve espaço, seria impossível registrar os de execução no País.” (Juiz Élio Braz Mendes) não poupam aplausos ao vitorioso projeto. 12 O novo músico brasileiro! “Violinos do Coque”; Antônio Correia de Oliveira; O maestro deixou a Orquestra, consciente de que a Rostand Paraíso; Amaury Medeiros; Milton Lins; sua obra no Coque permanecerá como um projeto Reinaldo Oliveira; Josué Oliveira Lima; Clóvis Cabral; modelar de inclusão social. Alfredo Bertini; Geninha Rosa Borges; Aldo Paes de uma oportunidade para construírem um futuro, Barreto; e Sebastião Barreto Campello. 9 13 REVISTA CRIANÇ A C I D A D Ã | J U N / J U L . 2 0 1 0 Cussy de Almeida: ...E o show continua REVISTA CRIANÇA C I D A D Ã | A G O / S E T / O U T. 2 0 1 0 A estrela do homem que dedicou a vida à música e à solidariedade permanece brilhando O dia 24 de julho de 2010 amanheceu com um céu limpo e o sol radiante. No entanto, o tempo mudou bruscamente, e o resto do dia seguiu sob tempo nublado e chuvoso. De um susto, Pernambuco e a música clássica se deram conta da perda que sofreram – e prosseguiram, à tarde e à noite, em um ritmo triste e saudoso. No dia anterior, às 21h30, o maestro Cussy de Almeida, aos 74 anos, perdeu a luta contra a insuficiência pulmonar que o acometia nos últimos anos. O maestro, referência em todo o Brasil, já enfrentava problemas respiratórios há algum tempo e contava com a ajuda de um aparelho para respirar. Ele estava há 55 dias internado no Hospital Santa Joana, no Recife, onde Cussy teve a missão faleceu. de levar a música e O Corpo foi velado e cremado no cemitério a cidadania para crianças e adolescentes Morada da Paz, em Paulista. No velório do do Coque, dando-lhes um novo rumo a maestro, muita emoção entre os presentes. seguir. Com apenas 28% de sua capacidade Familiares, amigos e admiradores se juntaram respiratória, o maestro formou uma orquestra à missa, celebrada na capela central do com jovens que, até então, diferentemente cemitério às 15h, pelo amigo e pároco da dele, nunca haviam tido a oportunidade de Igreja de Casa Forte, Padre Edvaldo Gomes. experimentar a música. Hoje, a Orquestra Coroas de flores, vindas dos mais diversos Criança Cidadã é um grupo conceituado e lugares, adornavam o local e simbolizavam reconhecido nacionalmente. Ela se tornou as condolências de instituições amigas e um dos projetos sociais mais bem sucedidos conhecidos, que expressavam apreço e do Brasil. admiração por Cussy e sua trajetória de vida. Como um último gesto de gratidão e afeto, Cussy de Almeida sempre se dedicou à a Orquestra compareceu ao Morada da música inúmeros Paz para homenagear o homem que, para trabalhos realizados, no Brasil e no exterior, aqueles garotos, foi mais que um professor o mais recente foi a criação da Orquestra – foi alguém que lhes estendeu a mão. Um Criança Cidadã dos Meninos do Coque, que amoroso e rigoroso amigo. Os garotos se reuniram e, sob a regência da professora desde criança. Entre este ano completou quatro anos. Em 2006, 17 15 REVISTA CRIAN Ç A C I D A D Ã | A G O / S E T / O U T. 2 0 1 0 REVISTA CRIANÇA CID A D Ã | A G O / S E T / O U T. 2 0 1 0 E os sentimentos não paravam de transbordar. Após as canções, no fim da cerimônia, as pessoas exaltando a vida e a obra de Cussy. Entre elas, MENINOS DO COQUE SE EMOCIONAM AO SE DESPEDIREM DO MAESTRO CUSSY ocorreu a cerimônia de cremação, mais íntima e perto ao regente. Cussy de Almeida repousava limitada à família. A tarde, no entanto, já havia sido tranquilo. Na cabeça, levava a boina que tanto suficiente para se despedir. A saudade seria inevitável. gostava de usar. No peito, o broche do Clube Náutico Mas Cussy de Almeida ainda permanece entre os vivos: do maestro junto com sua família e a música. No rosto, um semblante calmo e sereno, como quem tem a consciência leve por ter cumprido com êxito a sua missão. Cada um que passava fazia uma Nathália Wicks Almeida e o juiz e amigo João Rio Grande do Norte, em 10 de março de 1936. Targino, coordenador geral da Orquestra. Até Seu pai, o compositor e pianista Waldemar de mesmo o próprio Dom Fernando se pronunciou, Almeida, transmitiu-lhe o gosto pela música enaltecendo o trabalho feito pelo maestro junto às clássica desde cedo. Começou com o violino, aos crianças do Coque. “De todas as obras realizadas seis anos. Aos 14, quando estudava com o maestro que está chegando a seus quatro anos, encerrou sua vida com chave de ouro. E ele não pode parar. Que Deus o abençoe cada vez mais”, disse o arcebispo. A cerimonialista Tatiana Marques, ao término de sua em cada trabalho que construiu e em cada pessoa que cativou. Os Meninos do Coque continuarão o seu “Em vez de fazermos um minuto de caminho. E um pouco de Cussy ainda viverá dentro silêncio, vamos fazer um minuto de de cada membro da Orquestra Cidadã. Porque ali ele aplausos e bravos para o maestro”. E sempre será lembrado. E a lembrança nunca morre. assim, durante um minuto, uma longa salva de palmas ecoou pela igreja, juntamente com inúmeros bravos. O SÉTIMO DIA A atriz Geninha da Rosa Borges Orquestra. Os garotos se aglomeraram em torno do amado mestre. Abraçados, lamentavam a dor Depois de uma semana, parentes e amigos de Cussy encerrou as homenagens, recitando de perder um grande amigo que lhes deu um novo de Almeida se reuniram para lembrá-lo mais uma vez. e interpretando o poema de sentido de vida. A igreja do Colégio Salesiano Sagrado Coração ficou Cecília Meireles “O último pequena para acolher os que vieram prestigiar Cussy. andar”. Um último acorde de violino soou pela capela. Pouco A noite foi repleta de homenagens comoventes. A missa de sétimo dia foi celebrada pelo arcebispo de Olinda e Recife, Dom Fernando Saburido, que deu início à missa com a leitura do evangelho de São Lucas, que narra a saga da morte e da ressurreição de Jesus Cristo. Entre os intervalos das leituras, a O ÚLTIMO ANDAR profissional ingressando na Orquestra No último andar é mais bonito: do último andar se vê o mar. É lá que eu quero morar. Sinfônica do Recife. Era o mais jovem O último andar é muito longe: custa-se muito a chegar. Mas é lá que eu quero morar. Todo o céu fica a noite inteira sobre o último andar. É lá que eu quero morar. Quando faz lua no terraço, fica todo o luar. É lá que eu quero morar. músico do grupo. Nela, se destacou como solista. Nessa época, o jovem Cussy conseguiu seu primeiro emprego. Aos 16 anos, também tocava em casas noturnas do Recife. Quando trabalhou na Rádio Jornal do Commercio, teve contato com grandes artistas e músicos populares dos anos 50. Confundia-se Os passarinhos lá se escondem para ninguém os maltratar: no último andar. diante de tantas atividades, mas, ao De lá se avista o mundo inteiro: tudo parece perto, no ar. É lá que eu quero morar: no último andar. formas, fascinava-o. Tinha vocação mesmo tempo, sabia o que queria: música. A música, em suas diversas para o violino, mas se interessava também por piano popular e pelo jazz norte-americano. Com as economias que juntou, se mudou para Paris em 1958, onde foi se especializar em violino no Conservatório Superior de Música. Orquestra Criança Cidadã, que não poderia deixar de O incentivo veio, nada mais, nada estar presente e prestigiar o maestro, fez performances menos, formidáveis, como “Czardas”, “Carinhoso”, “Cinema Paradiso” ORQUESTRA CRIANÇA CIDADÃ HOMENAGEIA O MAESTRO CUSSY DE ALMEIDA no VELÓRIO Vicente Fittipaldi, iniciou sua carreira (Cecília Meireles) a pouco, as pessoas foram saindo. No início da noite, e “Abôio”, sendo esta última uma do que do consagrado compositor Heitor Villa Lobos, com quem composição do próprio Cussy de Almeida. O auge da conviveu na Cidade emoção foi durante a execução de “My Way”. Lágrimas Luz e de quem obteve corriam silenciosas pelos rostos atentos à missa. Os grande aprendizado. músicos da orquestra e a maestrina, Aline Ananias, se comoveram bastante na hora da performance. 16 Cussy de Almeida Netto nasceu em Natal, no fala, fez uma proposta inusitada. prece; uns sorriam com ternura, davam um aceno; outros choravam – principalmente as crianças da encontravam-se seu irmão, Clóvis Almeida, a filha por Cussy de Almeida, este trabalho, formaram fila para dar um último adeus mais de Capibaribe, time que dividia espaço no coração VIDA E OBRA No final do evento, cinco pessoas fizeram discursos Aline Ananias, executaram três canções: “Carinhoso”, de Pixinguinha; “My Way”, de Paul Anka; e “Czardas”, de Vittorio Monti. Não poderia haver modo melhor de rememorar Cussy: a música foi uma grande paixão sua. Ali, à sua maneira, os Meninos do Coque fizeram o que aprenderam a fazer de melhor: expressar seus sentimentos através da música. A noite ainda reservou mais surpresas aos presentes. Thialyson Phillipe executando o solo de “my way” 17 REVISTA CRIANÇA C I D A D Ã | A G O / S E T / O U T. 2 0 1 0 REVISTA CRIAN Ç A C I D A D Ã | A G O / S E T / O U T. 2 0 1 0 “Cussy de Almeida será imortalizado como o melhor exemplo do maestro que, com sua batuta, ergueu sólidas pontes, regendo os melhores sentimentos do ser humano.” Aldo paes barreto (Jornalista) preciso ter disciplina, força de vontade e difícil, mas muito oportuno para investir humildade, humildade e humildade”. E no aprimoramento musical. Lá, atuou foi isso o que ele transmitiu àqueles que como solista na Orquestra Internacional viviam a sua volta. Cussy recebeu várias da Cidade Universitária e obteve uma condecorações. No exterior, recebeu os bolsa para um curso superior em prêmios Alberto Lulin e Virtuosidade, em Genebra, na Suíça. Em 1962, formou- Genebra. No Brasil, recebeu prêmios se; em seguida, passou à pós-graduação como a Medalha Pernambucana do na Classe de Virtuosidade, destinada Mérito, a Medalha do Mérito da Cidade apenas aos músicos mais talentosos. do Recife e o título de Cidadão de Atuou também na Orquestra de Jovens Pernambuco. O maestro atuou também Músicos da Suíça e na Orquestra de como compositor. Entre as muitas obras João Targino // Juiz de Direito e coordenador geral Câmara de Bienne. que compôs, destacam-se “Cipó branco da Orquestra Criança Cidadã de Macaparana”, “Kyrie”, Após retornar ao Brasil, no início dos “Cirandância”, “Cussy foi sucesso. Tenho muito orgulho dele como irmão, compositor... Que tudo o que ele fez se perpetue. Que essas crianças do Coque continuem juntamente com todas as obras que ele fez.” anos 60, Cussy de Almeida atuou como “Glória” e “Ave Maria”. clóvis almeida (irmão) “A orquestra tomou proporções e importância que vão além das pessoas. Ele queria continuidade. E É isso que faremos. Vamos realizar os planos do maestro Cussy, como forma de homenageá-lo.” João Targino (Juiz e Coordenador da Orquestra Criança Cidadã) Memorial ao maestro Cussy “Abôio”, “Nordestinados”, É muito difícil, quase impossível nesta hora de luto para a Orquestra Criança Cidadã dos Meninos do Coque, Oficial de Chancelaria no Itamaraty, sob traçar algumas considerações sobre o ilustre e quase indicação do presidente João Goulart, Por e foi professor da Universidade Federal Conservatório o insubstituível maestro Cussy de Almeida, conhecedor de profundo dos mestres clássicos. Nestes quatro anos do Rio Grande do Norte (UFRN). Nas Música – de 1967 a 1979 e de 1991 de ensinamentos quase ortodoxos, onde a disciplina décadas de 70 e 80, fundou orquestras a 1994, tendo fundado, nesta segunda e o aprendizado se confundiam, foi uma honra e um memoráveis, Orquestra vez, a Orquestra Suzuki do Alto do privilégio para estas crianças serem educadas pelo Armorial de Câmara de Pernambuco Céu. O projeto, que há muito tempo internacional maestro. Isso não tem preço. Como não (1970) e a Orquestra de Cordas era almejado pelo maestro, ousava tem preço uma sonata de Mozart, os quartetos de Dedilhadas (1982). E não parou por aí. no intuito do resgate da cidadania de Beethoven ou as grandes sinfonias de Brahms. Em 1974, foi o primeiro a adquirir um crianças e jovens carentes através violino Stradivarius no Brasil e solou em da música, demonstrando interesse Diante da figura imponente do grande mestre, diversas orquestras, sendo considerado pelo engajamento social. Em 1995, a exornado dos mais peregrinos dotes de capacidade o maior violinista brasileiro. Entre outras projeto foi encerrado, mas o sonho de musical, todos se curvavam. Era um líder nato. Para atividades, presidiu o Instituto Nacional Cussy não havia morrido. Dez anos ele, não havia obstáculos, muito menos empecilhos de Música da Funarte e a Fundação de depois, ao realizar um concerto com quando se tratava de elevar o nome da Orquestra e o Cultura da Cidade do Recife, além de a extinta Orquestra do Alto do Céu, o conhecimento musical dos alunos. Ele era o próprio haver fundado o museu Murilo Lagreca, maestro chamou a atenção do juiz João espetáculo. Intenso em todas as suas emoções. o Teatro Barreto e a Casa do Frevo. Targino, que, mais tarde, o convidou Da alegria estampada na face pela ida do spalla da para, juntos, delinearem o esboço do Orquestra para Varsóvia à tristeza porque outro não Cussy de Almeida é um exemplo de que hoje se chama Orquestra Criança conseguira o mesmo feito. Impunha castigos, ao determinação e dedicação. Pai de cinco Cidadã dos Meninos do Coque. Nos mesmo tempo em que demonstrava gestos de ternura. filhos, foi casado duas vezes. Ao mesmo últimos quatro anos de sua vida, tempo em que sabia ser paciente e Cussy a Era o contraditório maestro possuidor de raros dotes sensível, era rigoroso e exigente – esses meninos, deixando-lhes uma de combatividade. Essa sua personalidade marcante principalmente, no que diz respeito rica herança com lições de disciplina, fará com que sejamos fiéis à sua memória. Os seus à música. Segundo o próprio, “para cidadania, humildade e, claro, música. exemplos irão continuar a ser nossa bússola na como a chegar a qualquer lugar, com sucesso, é 18 Artigos O tempo que permaneceu na Europa foi duas se vezes, Cussy dirigiu Pernambucano dedicou inteiramente luta pelo bem-estar da Orquestra. Onde estiver, querido mestre, pode ter certeza que seremos seus continuadores da luta por esse ideal. O tempo, que tudo embota, não conseguirá apagar a saudade que habita no coração destas crianças e em todos nós. Continuaremos cultivando a música, o que de mais nobre existe no nosso espírito. *** O último tributo ao maestro Cussy De Almeida Graça Salsa // Advogada e voluntária da Orquestra Criança Cidadã Pelo lapso temporal de quatro anos da Orquestra Criança Cidadã, presenciei os mais emocionantes concertos regados a fortes emoções em teatros suntuosos, de palcos e cenários deslumbrantes. Mas nenhum foi tão comovente quanto o que testemunhei diante do corpo inerte do talentoso e glamoroso maestro Cussy de Almeida. Em volta do esquife, os meninos do Coque deram o melhor de si. Eles estavam muito mais preocupados com notas de afeto e acordes de gratidão, do que mesmo com as partituras. Sabiam que o mestre já não poderia corrigir nenhum deslize musical. Tinham sido preparados durante 4 anos por aquele que ali permanecia imóvel. Teriam que provar ao próprio mestre, nessa despedida, que a luta incansável não foi em vão. E aí, diante da adversidade dessa perda tão grande, para quem teve tão pouco da vida como eles, se superaram. Tocaram tão sublimemente que pareciam querubins enviados do céu. Talvez, enquanto seguravam os instrumentos musicais, perpassasse, por suas mentes, porque motivo mais um pai lhes era tirado, naquele momento em que ainda precisavam tanto de seus ensinamentos. Com certeza, em sua percepção, estão sem entender os desígnios de Deus. A face transtornada de cada um deles, as lágrimas sinceras que não estancavam de suas faces, comoveram não só a mim, mas a todos os presentes. Foi a cerimônia mais enternecedora que presenciei nos últimos tempos. Não pelo sepultamento 19 REVISTA CRIANÇA CI D A D Ã | A G O / S E T / O U T. 2 0 1 0 REVISTA CRIANÇ A C I D A D Ã | A G O / S E T / O U T. 2 0 1 0 em si, mas pela história de um ser humano que foi ouvida. Eu vi D. Fernando Saburido, arcebispo de declamando a poesia de Cecília Meirelles, “No de orfandade. De repente, após a chegada e fala enviado por Deus àquele projeto com a intenção de Olinda e Recife, oficiando a missa e distribuindo último andar”, em que se sentiu a presença dele do juiz João Targino, a Orquestra começa a tocar, que se construíssem sonhos. O maestro arrebatou centenas de hóstias consagradas aos fiéis amigos de em nuvem distante. estranhamente, sem ninguém na frente para regê- os Cussy. Eu vi choros contidos e liberados, carimbando Meninos do Coque a lugares inimagináveis. A história da Orquestra nunca mais será a mesma. o sentimento da perda irreparável. la. Todos sentem, então, a presença de Cussy de Foi uma noite linda, digna da memória de Cussy. Pode repousar em paz, maestro, que seus meninos Almeida, com seu boné imaculadamente branco, na cadeira de rodas, o cateter no nariz e o torpedo de ficarão entregues aos dois outros excelentes pais, Eu ouvi a Orquestra dos Meninos do Coque, que o desembargador Nildo Nery e o juiz João Targino. aprendeu as lições do mestre e maestro Cussy, com Deus, na sua infinita sabedoria, determinou três apenas uma facção dos que dispunham de energias pais para as crianças quase órfãs, sabendo que eles para tocar o repertório escolhido, sob a batuta da não poderiam perdê-los ao mesmo tempo ao longo maestrina Aline Ananias de Lima. Eu ouvi o início da da vida. Internacional maestro Cussy de Almeida, missa com a execução da música de Cussy “Cipó ficamos tristes e com saudades, mas tenha a certeza Branco de Macaparana”. Eu ouvi as “Czardas”, de Waldenio de que sua obra não se calará, e muitas vidas serão Monti, música preferida dele, num solo magistral que Pernambucana de Letras transformadas. eu vi de um violinista mirim, João Pedro. E me vi, ouvi e senti... chorando. oxigênio de lado, a batuta na mão, se emocionando e enternecendo a plateia inteira. *** Adianta-se Thialyson Phillipe e inicia o concerto O último concerto de Cussy com “My way” (Meu Caminho), uma das canções preferidas do maestro e que tem tudo a ver com Porto // Presidente da Academia o instante que presenciamos. As cordas do violino contam, naquele momento derradeiro, em harmonias saudosas, as lembranças de toda a vida de Cussy de Almeida. Depois do solo inicial, toda *** Eu vi, ouvi e senti Eu vi e ouvi o arranjo feito pelo Cussy de “Carinhoso”, Não havia velário. Cussy estava ali, imóvel, em a Orquestra entra de vez, e dá para se ver a mão de Pixinguinha e João de Barro, tocado pelo jovem campo aberto, como se descansando antes de levantada do regente dirigindo a partitura, como Júlio Carlos, egresso da Polônia, detentor de bolsa de começar a função. O velário era a tristeza expressa se acenando para os seus Meninos e Meninas do estudos, ora renovada, para aprimoramento técnico. em todos os semblantes. O tempo nublado Coque, num gesto final, se despedindo. A chuva atravessava os vidros das janelas e, quieto, vinha que cai lá fora então escorre pelas suas faces e marca o momento da separação. Reinaldo de Oliveira // Membro da Academia Pernambucana de Letras e dos Conselhos de Cultura O momento máximo artístico da solenidade foi a trazer a luz amortecida do pesar. Chovia lá fora. do Estado e do Município execução de “My Way”, em que a criança violinista E seu ruído nas janelas e no chão percutia em Thialyson Phillipe interpretou em solo ao longo do surdina, trazendo, para dentro da sala, a música O violino, que toca “My way”, relembra, também Eu vi, ouvi e senti a Missa de Sétimo dia de Cussy de corredor da Igreja, acompanhado, maravilhosamente, dolente do inverno que feria o silêncio consternado. para mim, uma manhã quando Cussy de Almeida Almeida. Foi na Igreja do Colégio Salesiano, repleta pela Orquestra, indiferente ao pranto de seus A chuva chegava também aos olhos rasos d’água me procurou na Academia Pernambucana de de amigos. Eu vi seus filhos da primeira mulher, componentes. e nublava a visão da cena. Uma quietação de Letras. Logo estava ensaiando ali os alunos de igreja se acamava na câmara ardente. Os círios sua Orquestra do Alto do Céu e, depois, o Grupo Nelly, Henrique, Isabela Corintha, Maria Gabriela e Waldemar, ainda descrentes da realidade maldita, Sentado, ao fundo do altar, D. Fernando parecia elevar se extinguiam e acompanhavam os minutos Orange. O violino de “My way” me recordou também com as faces úmidas. Eu vi Suzana, a esposa com as suas preces para cada músico, como a reforçar a finais daquela tarde esmorecida. Então, chegam o concerto no Santa Isabel e o lançamento de um quem foi feliz na última metade de seus anos, ideia inicial do desembargador Nildo Nery e do Juiz os Meninos do Coque com seus instrumentos. CD do Grupo Orange, no qual Cussy me faz uma abraçada a Nathália, a caçula. Eu vi o desembargador João Targino tornada realidade pela determinação e Esgueiram-se de uma porta lateral, portando dedicatória preciosa. Nildo Nery com os olhos turvos de lágrimas. Vi a irmã pelo ânimo de Cussy de Almeida. violinos, sustentando violoncelos e baixos, sem Ana Corintha, que veio dos Estados Unidos para O maestro compareceu à Camara Municipal do acreditar na tragédia. Vi a Orquestra Criança Cidadã Eu senti, no semblante das fisionomias, a dor de cada perturbarem o sossego ambiente. Faces sérias, Recife, com Orquestra, quando recebi o Título de dos Meninos do Coque, calada, muda, chorando. alma ali presente. Eu senti as palavras do juiz João vão se postando ao lado de Cussy e arrumam a Cidadão do Recife. São coisas para não serem Targino, emocionado. Eu senti o sofrimento de Clóvis Orquestra. Ficam quietos na ansiedade costumeira esquecidas. A feliz e rica oportunidade de conviver Eu vi as lágrimas de Waldenio Porto, presidente Almeida, irmão de Cussy, ao dar seu depoimento, de iniciarem a apresentação. Observam de pé os com Cussy, ao escrever “Violinos no Coque”, a da Academia Pernambucana de Letras, esquecido úmido, sobre o irmão. Senti as palavras doces de outros colegas que tomam assento no auditório. convite do desembargador Nildo Nery. Tudo isso daquele dia, que era de sua alegria íntima por Nathália, sua caçula, dominando a plateia que, Viro-me para trás e vejo a pequenina Stephany, que me lembrou o violino tocando “My way”, na tarde ser seu aniversário. Eu vi as lágrimas da jovem tantas vezes, o pai dominou. me encantou outro dia, e a chamei Flor de Lotus ensombrecida de sábado. violoncelista Bianca de Cássia correndo cordas abaixo, emprestando uma sonoridade úmida jamais 20 arrastá-los, no cuidado respeitoso para não no livro “Violinos no Coque”. Agora, lacrimosa, Eu vi, ouvi e senti Geninha da Rosa Borges junto de Daniel, experimenta o sentimento geral 21 REVISTA CRIAN Ç A C I D A D Ã | A G O / S E T / O U T. 2 0 1 0 Cantinho das Letras O dia 23 de julho foi de grandes emoções para a Orquestra Criança Cidadã. Com tristeza, todos se despediram do maestro Cussy de Almeida, em especial, as crianças e jovens do Coque que foram seus alunos. Como forma de agradecimento por tudo o que aprenderam na Orquestra Criança Cidadã, os alunos da Escola de Música Maestro Cussy de Almeida expressam algumas palavras de gratidão ao grande mestre: “O maestro Cussy foi muito importante para nós. Ele nos ajudou a tocar com amor e carinho. Nos ensinou a crescer.” (Estudante de violino Tamires Alves de Oliveira, 10 anos) “Vamos superar essa dor envolvidos pela saudade. Vamos continuar de cabeça erguida, como era o desejo do maestro Cussy, o meu melhor professor de música.” (Estudante de viola Anderson Rodrigues, 15 anos) “Maestro Cussy, um homem muito difícil de encontrar. Demonstrou força de vontade e perseverança. Ele mostrou, para todos, que pobreza não é doença nem sinônimo de ignorância. Ao contrário, ensinou que ‘o dom não escolhe cor nem classe social. Deus toca a cabeça de cada um’, com muito estudo, a pessoa pode vencer na vida.” (Estudante de violoncelo Vanessa Mouta, 15 anos) “Maestro Cussy de Almeida Netto: um pai e um amigo. Todo o seu jeito rígido era apenas um método para formar um cidadão do bem.” (Estudante de viola Rebeka Muniz, 14 anos) “O meu futuro foi mudado completamente por um anjo, que, por pura vontade de fazer crianças felizes, tornou possível uma utopia. Há quatro anos, eu nunca me imaginava tocando um instrumento clássico como 22 Meninos do Coque ganham reforço REVISTA CRIANÇA CI D A D Ã | A G O / S E T / O U T. 2 0 1 0 o violoncelo. Um anjo chamado Cussy de Almeida, com olhos azuis, sorriso incompreendido e o jeito rigoroso, mas, ao mesmo tempo, doce e singelo, me ensinou três regras, que, para sempre, vão complementar meu caráter: disciplina, aproveitamento e, o maior de todos: a humildade.” (Estudante de violoncelo Genilza Bezerra da Silva, 16 anos) “Desde quando entrei no projeto, percebi que o maestro Cussy era uma pessoa que só queria o bem dos outros. Ele foi uma pessoa muito especial para mim e sempre estará no meu coração.” (Estudante de viola Ivanise Silva, 14 anos) “O maestro nos ensinou a gostar de música. Sentiremos sua falta, Cussy.” (Estudante de violoncelo Nivaldo Raimundo da Silva, 13 anos) “Eu não queria que o maestro Cussy fosse embora. Gostaria que ele tivesse passado seu último dia comigo no projeto.” (Estudante de violino Wellington Ezequiel, 10 anos) “Maestro Cussy de Almeida, um grande homem, um idealizador. Seu sonho era formar músicos profissionais. Que Deus o tenha.” (Estudante de violino João Carlos Oliveira, 18 anos) “Cussy era forte e carismático. Com aquele enorme sorriso no rosto, dava a entender que o mundo era maravilhoso. Nós temos orgulho de dizer que ele foi nosso maestro e continuará sendo o nosso maestro, onde quer que ele esteja. Ele se foi, mas deixou coisas boas aqui na Terra que vão virar história. A maior forma de homenagearmos Cussy é continuando esse trabalho, que ele tanto amava. Ele não formou apenas musicistas, formou Crianças Cidadãs. Cussy, te amo eternamente.” (Estudante de violoncelo Bianca de Cássia, 14 anos) musical Maestro convidado e novo professor de violino chegam ao projeto Dois profissionais dão novos ares musicais à Orquestra Criança Cidadã neste segundo semestre: o maestro italiano Vittorio Ceccanti, já parceiro do grupo, e o professor de violino José Ademar Teixeira Rocha, especialista no método Suzuki. Enquanto Vittorio fica como regente convidado até dezembro, quando poderá renovar a parceria, Ademar tem contrato por tempo indeterminado. Depois de ministrar máster classes aos Meninos em abril deste ano e conduzir o grupo no quarto aniversário, em agosto, Vittorio agora assume a regência da Orquestra, auxiliado pela professora Aline Ananias. Ele já tem três visitas marcadas ao Recife até o final do ano. Os principais concertos serão acompanhados pelo italiano. Já Ademar Teixeira chega para reforçar o naipe de violinos, ele que foi o introdutor do método Suzuki no Conservatório Pernambucano de Música (CPM). Muitos daqueles que foram alunos de Ademar Rocha no Conservatório hoje ensinam na Orquestra. Ele conta que, por isso, já conhecia bem o projeto. “De certa forma, eu já sou parte desse grupo. É gratificante estar num trabalho maravilhoso como esse, que está dando certo”, orgulha-se o professor. As aulas de Ademar na Orquestra têm calendário definido: acontecem todas as quartas-feiras, durante o dia inteiro. O novo professor de violino da Orquestra Criança Cidadã Ademar Rocha começou a estudar violino aos 15 anos com o professor Albert Jaffé no Serviço Social da ADEMAR ROCHA VEM DAR SUPORTE AOS VIOLINISTAS DA ORQUESTRA Indústria (Sesi) de Fortaleza. Na Universidade Federal da Paraíba, tornou-se bacharel no instrumento. A pedido do professor e pianista Geraldo Parente, Ademar vem ao Recife em 1988, para participar de um curso sobre o Método Suzuki, que consiste em ensinar música às crianças de forma divertida e com amor. Assim, começa a nascer um vinculo forte entre o violinista e a capital pernambucana. Em 1989, o violinista teve a oportunidade de ir ao Japão assistir às aulas do próprio Shinichi Suzuki, idealizador do método homônimo, no Talent Education Institute / Suzuki Method Music School. “Foi uma grande experiência. Conheci professores de música de todo o Brasil e passei a fazer parte desse ciclo”, disse. Desde sempre, a correria é o ritmo de vida que o professor Ademar leva. No início da semana, ele se dedica ao CPM e, recentemente, à Orquestra dos Meninos do Coque. Durante a outra metade, volta para a família na Paraíba, onde dirige e ensina no Centro Musical Suzuki e é membro da Orquestra Sinfônica da cidade. 23 REVISTA CRIAN Ç A C I D A D Ã | A G O / S E T. 2 0 1 0 27 REVISTA CRIANÇ A C I D A D Ã | A G O / S E T. 2 0 1 0 28 Quatro anos de sons e REVISTA CRIAN Ç A C I D A D Ã | A G O / S E T / O U T. 2 0 1 0 esperança O silêncio que tomava conta do ambiente antes dos sons de violinos, cellos e zabumbas se unirem em uma só música parecia prenunciar uma noite inesquecível. Aos poucos, o público foi chegando, e a plateia, enchendo-se. Um a um, os convidados se acomodaram nas duas mil poltronas do Teatro Guararapes, no Centro de Convenções, em Olinda. Todos esperavam por uma apresentação memorável na noite do dia 5 de agosto. No palco, toda uma produção, literalmente, global. O clima estava perfeito. E quem compareceu certamente jamais se esquecerá de um dos momentos mais bonitos de uma história que ainda se equivale à de uma criança. No aniversário de quatro anos da Orquestra Criança Cidadã dos Meninos do Coque, todos que circundam o projeto de maior sucesso em Pernambuco ficaram encantados com o talento das crianças. Com menos 26 da metade de uma década de estudos musicais, o grupo é reconhecido pelo profissionalismo. Na noite preparada para brilhar, a Orquestra fez reviver a estrela do Rei do Baião, homenageado no “Concerto para Gonzaga”, em que 72 garotos do projeto estiveram no palco ao lado do cantor Alcymar Monteiro – intérprete das músicas do forrozeiro. Como convidado especial, o maestro italiano Vittorio Ceccanti, que já se apresentou em toda a Europa, além da Ásia, Estados Unidos e vários outros países da América do Sul - incluindo o Brasil -, foi o responsável por reger a Orquestra Criança Cidadã. Em uma apresentação de mais de duas horas, os meninos da Orquestra não puderam deixar de REVISTA CRIANÇA CID A D Ã | A G O / S E T / O U T. 2 0 1 0 homenagear o maestro Cussy de Almeida, falecido no último dia 23 de julho. Os alunos do mestre tocaram “Carinhoso”, de Pixinguinha – música preferida do maestro. Além disso, a diretoria da Orquestra também resolveu nomear a sua escola de música com o nome Escola de Música Maestro Cussy de Almeida, em mais uma homenagem póstuma a Cussy. Como atração da festa, o concerto ainda contou com a participação do coral dos garçons-cantores. Tudo foi devidamente registrado pela TV Globo, que ajudou a produzir o evento. A gravação será veiculada pela Rede Globo Nordeste para o Brasil e mais 160 países no dia 13 de dezembro – Dia Nacional do Forró e data em que Luiz Gonzaga completaria 98 anos de vida. PRESENÇAS ILUSTRES Além de toda a beleza de uma noite inspiradora, o evento que marcou o aniversário da Orquestra ainda contou com presenças bastante ilustres. A que chamou mais a atenção foi a do ator global Marcos Palmeira. E a presença do artista tinha um motivo especial. Ele está no Recife captando recursos a fim de filmar um documentário sobre a Orquestra, que será, provavelmente, veiculado no próximo Cine PE. Além do ator, destacou-se também a presença do apresentador do evento, o jornalista Francisco José. Na plateia, outras figuras ilustres como a primeira-dama de Pernambuco, Renata Campos; o desembargador Eduardo Sertório; o produtor de cinema Alfredo Bertini; o empresário Queiroz Galvão; e o comandante do Comando Militar do Nordeste (CMNE), o general Salvador. NADA COMO MERECIDOS ELOGIOS Durante a festa que marcou a comemoração dos quatro anos da Orquestra, o que não faltaram foram elogios ao trabalho realizado pelo coordenador geral do projeto, o juiz João Targino, e pelo presidente da entidade, o desembargador Nildo Nery dos Santos. Alcymar Monteiro, Francisco José, o maestro italiano Vittorio Ceccanti e o ator Marcos Palmeira não economizaram nas parabenizações à Orquestra. O primeiro foi o maestro. Convidado para reger os garotos e já íntimos deles – após uma passagem pela Orquestra em abril –, demonstrou grande carisma ao se esforçar para colocar em prática um recém-aprendido português. Sobre o palco, o italiano revelou uma enorme simpatia com o projeto pernambucano e garantiu: “Não há 27 REVISTA CRIAN Ç A C I D A D Ã | A G O / S E T / O U T. 2 0 1 0 REVISTA CRIANÇA CID A D Ã | A G O / S E T / O U T. 2 0 1 0 SONS DA ESPERANÇA um projeto igual a esse no mundo. O que acontece aqui é digno de muito orgulho. Essas crianças são maravilhosas e têm um talento incrível.” Francisco José, comandando a cerimônia, também não poupou elogios. Em um determinado momento, lembrou a história difícil dos jovens que moram em uma das comunidades mais violentas do Recife, o Coque. “São garotos que estão vencendo na vida e são exemplos para qualquer jovem no mundo”, afirmou. Ao subir ao palco, todo de branco, com uma estilosa roupa sertaneja, Alcymar Monteiro reverenciou a Orquestra com uma saudação com os braços. Ao fim, agradeceu a plateia e mandou um bonito recado a todos. “Fico feliz de ter participado desse momento. Queria que vocês nunca esquecessem essa Orquestra, que é um exemplo claro que o ser humano nasceu para o bem”, disse Alcymar. Por fim, o ator Marcos Palmeira teve o seu momento de astro ao ser convidado por Francisco José para subir ao palco. “É bonito ver essa perspectiva de cidadania através da música. Fiquei muito impressionado com a capacidade desses meninos e encantado com o talento de todos. É incrível poder ver de perto que é possível”, elogiou o ator. ALCYMAR MONTEIRO: PARCERIA MUSICAL EM SINTONIA COM A ORQUESTRA CRIANÇA CIDADÃ Todo bom filme parte de uma boa história. E toda boa história é potencialmente um prato cheio para um bom filme. Contando com essa recíproca lógica, já está confirmado: a história da Orquestra Criança Cidadã vai virar filme. O documentário longa-metragem em 35 mm será dirigido por Zelito Viana, o mesmo de Villa-Lobos: Uma Vida de Paixão. Zelito leva consigo o ator Marcos Palmeira para narrar Sons da Esperança, que mostrará o dia a dia das crianças através de entrevistas com alunos, dirigentes e funcionários, além de uma coleta de material audiovisual. GPCA inaugura nova sede e planeja expansão Sons da Esperança está na fase de captação de recursos. No entanto, já se sabe que será produzido por Alfredo Bertini, da Bertini Produções e Eventos. O plano é exibi-lo no próximo Cine-PE. “Está tudo muito no início. Mas a pretensão é começar assim que a gente conseguir patrocinadores. Na verdade, é só isso o que está faltando. Uma boa história já existe, com certeza”, afirmou Viana, em entrevista antes de assistir à apresentação da Orquestra no Teatro Guararapes. Zelito Viana também se prepara para gravar uma possível apresentação dos meninos no prêmio “Melhores Práticas de Inclusão Social do Mundo”, da Organização das Nações Unidas, que acontecerá no dia 3 de novembro em Dubai, Emirados Árabes. Tudo está, entretanto, no campo dos projetos. “A intenção é voltar no Cine PE 2011, apesar de sabermos que o tempo é curto. Vamos tentar contar essa história do modo como ela merece”, falou. O ator Marcos Palmeira, filho de Zelito, também conversou com a nossa reportagem e revelou a satisfação em fazer parte do documentário que mostrará a história da Orquestra. “Quero muito voltar aqui no ano que vem com esse filme pronto. Seria um grande orgulho para mim. Estamos no início da produção. Espero que dê tudo certo”, disse o artista, que se mostrou muito empolgado 1ª Circunscrição Judiciária, duas Varas de Crimes Contra a Criança e o Adolescente, a Comissão Estadual Judiciária de Adoção, dez Promotorias da Infância e a Unidade de Atendimento Inicial (Uniai) da Secretaria Estadual de Desenvolvimento Social e Direitos Humanos. Para Zanelli Gomes Alencar, as novas instalações refletem em melhor atendimento A Gerência de Polícia da Criança e do Adolescente está de cara nova. Além da inauguração de uma nova sede em Paulista, a GPCA localizada na Rua Fernandes Vieira, na Boa Vista, foi reformada. Prédios que compõem o Centro Integrado da Criança e do Adolescente (Cica), reunindo a GPCA, também foram aperfeiçoados e ampliados. Já visando uma maior expansão, é prevista a inauguração de uma nova instalação da GPCA em Prazeres. Além dos novos alojamentos da GPCA, no Cica já funcionam quatro Varas da Infância e da Juventude da Capital, uma Vara Regional da O gestor da GPCA, Zanelli Gomes Alencar, reforça a importância das modificações. Além das instalações adequadas, as reformas irão evitar problemas que envolvem a chuva. “O novo prédio na Fernandes Vieira está mais confortável. Garante mais espaço, o que reflete no bom desempenho para a realização do trabalho e no atendimento às pessoas”, disse. Além do quesito comodidade, as reformas também foram pensadas para aproximar a GPCA dos órgãos judiciais – o que acarreta em maior agilidade na resolução dos casos. A delegacia vai funcionar integrada às varas da Infância e da Juventude e à representação do Ministério Público presente no local. com o documentário. 28 29 REVISTA CRIAN Ç A C I D A D Ã | A G O / S E T / O U T. 2 0 1 0 REVISTA CRIANÇA C I D A D Ã | A G O / S E T / O U T. 2 0 1 0 O que diz o ECA Estatuto da Criança e do Adolescente 20 anos de desafios e conquistas Maior responsável por assegurar os direitos da infância e juventude no Brasil, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) completou 20 anos no último mês de julho. Nessas duas décadas de história, conquistas foram alcançadas e obstáculos foram vencidos. No entanto, o maior dos problemas permanece: a falta de conhecimento da população sobre o que diz, ao menos em linhas gerais, o ECA. A defensora pública Maria Luísa Mendonça alerta sobre a carência de discussão do tema nas instituições de ensino como um dos motivos para a dificuldade no cumprimento dos direitos e deveres das crianças e jovens. “São poucas as Universidades que têm disciplinas como o direito específico dessa faixa etária. Como é que você pode tornar conhecida uma lei que você não estuda e que carece de divulgação?”, questiona. Assim como a defensora pública, o juiz da Vara da infância e da juventude, Paulo Brandão, aponta o desconhecimento do público em geral como maior problema para o exercício do Estatuto. “A sociedade só discute sobre o ECA quando ocorre algum acontecimento, como um crime bárbaro. Nesse caso, se busca alguma informação, e, normalmente, ela vem deformada”, afirma. 30 Segundo o juiz, outro fator que precisa ser revertido é a persistência na implantação de medidas no combate à violência, como a redução da maioridade penal. Ele acredita que a construção da paz é o caminho mais eficaz para o bem-estar das crianças. “É preciso garantir, para as crianças, seus direitos desde o nascimento, dar um direcionamento a partir do qual elas tenham uma perspectiva real de vida. Que elas possam sonhar e ter dignidade. Partes dessas preocupações teriam que ser em realizar projetos sociais, de reintegração, apoio e acolhimento a esses jovens”, reitera. PARA PAULO BRANDÃO, O ESTATUTO AINDA TEM MUITO O QUE MELHORAR Lei número 8.069, de 13 de julho de 1990 Considerada uma das disposições mais importantes do documento, o quarto artigo do ECA discorre As conquistas também devem ser lembradas sobre os direitos da criança e do adolescente: “É na comemoração dos 20 anos do ECA. Houve dever da família, da comunidade, da sociedade em um grande avanço em relação ao abandono dos geral e do Poder Público assegurar, com absoluta menores. “Hoje, não se usa mais as instituições prioridade, a efetivação dos direitos referentes à como meio de criar crianças. O lugar delas é vida, saúde, alimentação, educação, ao esporte, com a família. O abrigo é uma etapa para que lazer, o menor e os pais sejam orientados. Logo se respeito, liberdade e à convivência familiar e procura a própria família para que a criança comunitária”. profissionalização, cultura, dignidade, tenha uma melhor condição de vida”, afirma a defensora pública Maria Luísa. Destacamos, também, os artigos terceiro e quinto: Além disso, é necessário reconhecer a “A criança e o adolescente gozam de todos os importância da existência do Estatuto direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, no Brasil. “Acredito que ainda seja sem prejuízo da proteção integral de que trata esta necessário fazer muitas observações Lei, assegurando-lhes, por lei ou por outros meios, para a melhoria dentro da estrutura todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes do ECA, mas é inegável a relevância facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, dele como documento garantidor espiritual e social, em condições de liberdade e de dos direitos da criança e do adolescente”, dignidade.” disse Brandão. “Nenhuma criança e adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, PARA MARIA LUÍSA, O ECA DEVE SER MAIS DISCUTIDO NAS ESCOLAS E UNIVERSIDADES violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais.” 31 REVISTA CRIAN Ç A C I D A D Ã | A G O / S E T / O U T. 2 0 1 0 REVISTA CRIANÇA CI D A D Ã | A G O / S E T / O U T. 2 0 1 0 Arte na certidão de nascimento A criatividade de alguns pais se eleva às alturas na hora de escolher o nome do filho. Para evitar as denominações muito inusitadas, existe uma Lei de Registro pouco conhecida Por Daniel Leal Imagine você, no auge dos seus 15 anos. Está pronto para ir àquela festa onde todos os seus amigos estão te esperando. E mais. Lá, vai estar aquela menina linda de uma série acima da sua no colégio. A garota não faz ideia de que você existe. No entanto, um detalhe, apenas um, te deixa com o pé atrás nessa situação: o seu nome. Se, quando o pronuncia, todos riem de você, o que fazer para evitar mais essa vergonha na sua vida? É justamente para evitar situações hipotéticas como a descrita acima que há uma lei federal, de pouco conhecimento da população. Essa Lei de Registros Públicos, existente desde 1973, prevê que o nome que possa expôr ao ridículo o seu portador será proibido de ser registrado até a autorização de um juiz. 32 Um escrevente de um grande cartório do Recife já passou por inúmeras situações inusitadas. Segundo o profissional, todos os dias chegam pais querendo registrar os filhos com nomes diferenciados. “Sempre nos deparamos com novidades por aqui. Estamos acostumados com a situação e explicamos todo o procedimento. Tem gente que entende; outras pessoas ficam zangadas. Mas veja se eu posso permitir que uma criança seja chamada de Antônio Querido Fracasso? Sem contar outros nomes que a gente já ouviu falar, como Janeiro Fevereiro de Março Abril. Os muitos nomes estranhos que aqui passaram, desde quando eu assumi o cartório, jamais foram aprovados por aqueles que tentaram ir ao juiz”, garantiu Fernando Salazar. O escrevente explicou detalhadamente o que diz a Lei. “Se o oficial verificar que tal nome pode levar a criança ao constrangimento ou ao ridículo no futuro, ou que elas venham a ser motivos de chacotas pelo nome, ele não deve registrá-la. Se o pai, mesmo com a recusa do oficial, insistir, aí a gente leva o caso ao juiz, que dará a palavra final”, minuciou Salazar, que já trabalha “com nomes” há mais de 15 anos. Um nome de muitos músicos Uma pessoa possuir o nome próprio composto por dez nomes já soa bastante estranho, não é verdade? Imagine, então, que esses dez nomes sejam de origem russa. A criança, nesse caso, no entanto, não é russa. É brasileira, nasceu no Recife. A primeira coisa que vem à mente? Provavelmente, algo como: “Quem teve uma ideia dessas?” ou “Deve ser complicado falar o nome desse garoto, não?” ou até “Essa pessoa existe? Mesmo?!” As respostas são todas positivas: a pessoa existe, o nome é difícil de falar, e a ideia tem um dono – é válido ressaltar, bem orgulhoso da autoria. Tchaikovsky Johansen Adler Pryce Jackman Faier Ludwin Zolman Hunter Lins, 19 anos, é estudante de administração. Segundo ele mesmo, jamais sofreu qualquer tipo de discriminação ou gozação pelo nome. Problemas, sim. Vários. Para tirar o CPF e o RG, foi aquela complicação. Matrícula na escola e na faculdade, mais dificuldades. “Tivemos que esperar três meses para autorizarem a abreviação do nome dele no CPF em Brasília, porque não cabia tudo, e abreviar no CPF é proibido”, lembrou a mãe do garoto, Jane Oliveira. A ideia de colocar tal nome em Tchaikovsky foi do pai. Ricardo Lins Lima, 43 anos, técnico em contabilidade, fala com orgulho que foi ele quem teve a ideia de registrar o garoto com um nome que chamasse atenção. “Quando namorávamos, eu e minha esposa já pensávamos em ter um filho e colocar um nome diferente nele. Eu queria algo que ficasse marcado mesmo. Fui destacando alguns nomes de músicos em uma revista e, com duas semanas, o nome do meu filho já estava pronto”, revelou. Na primeira tentativa de registrar o filho, no cartório João Romão, no bairro da Boa Vista, o dono da entidade se negou a permitir o registro. Na segunda tentativa, sucesso. “Eu lembro que o rapaz de lá adorou o nome. Disse que, se eu quisesse por mais nome ainda, poderia. Se eu soubesse que não seria tão difícil, eu teria posto 20 nomes, que é como eu queria mesmo. Ainda pensei em acrescentar na hora. Mas não lembrava os nomes que eu queria e desisti. Mas minha vontade mesmo, no começo, era uns 20 nomes”, recordou Ricardo. O que diz a Lei: Para mudança de nome: Para proteger as pessoas de qualquer constrangimento ou ridicularização, o artigo 55 da Lei de Registros Públicos (de 1973) prevê, em seu parágrafo único, que “os oficiais do registro civil não registrarão prenomes suscetíveis de expor ao ridículo os seus portadores. Quando os pais não se conformarem com a recusa do oficial, este submeterá por escrito o caso, independentemente da cobrança de quaisquer lucros, à decisão da Justiça especializada no assunto.” O artigo 56 da mesma Lei afirma que “o interessado, no primeiro ano após ter atingido a maioridade civil, poderá, pessoalmente ou por procurador bastante, alterar o nome, desde que não prejudique os apelidos de família, averbando-se a alteração que será publicada pela imprensa.” 33 REVISTA CRIANÇA C I D A D Ã | A G O / S E T / O U T. 2 0 1 0 REVISTA CRIANÇ A C I D A D Ã | A G O / S E T / O U T. 2 0 1 0 Antes de conhecer uma garota com esse nome, o Com a voz, Tchai Xérox que viria à sua mente? Possivelmente uma figura, Com um nome tão complexo de ser pronunciado, difícil seria não haver um apelido para Tchaikovsky. Uns chamam “Tchai”; outros, somente de “Kovsky”. O fato é que o estudante de administração garantiu no mínimo, tão diferente quanto é chamada, Se Autenticada e Fotocópia nem pensam em certo? Pois é. Mas o fato é que Autenticada dar seguimento na família com a leva de nomes só não pode ser tratada como absolutamente diferenciados, não se pode dizer o mesmo do comum porque está grávida de sete meses. músico Xérox Porfírio. Esse pernambucano parece que gostou mesmo do fato de inovar nos prenomes. jamais ter sofrido pelos nomes que tem. “Nunca sofri preconceito nem nada parecido pelo nome. O que sempre aconteceu foi a surpresa das pessoas pelo tamanho dele. Mas nunca me incomodei por isso”, pontuou o tranquilo menino. Muito tranquila, a cantora de música gospel Segundo ele, “o meu pai, na época, disse que havia Autenticada Porfírio, 33 anos, explicou que os muitas mortes por matar gente com nome igual por nomes foram ideia do pai dela, que gostaria de engano. E, por isso, ele disse que queria nome ter filhos como o nome diferente. “Ele sonhava diferente porque se a gente errasse, ia pagar”, em pôr nomes nos filhos que ninguém mais lembrou. tivesse. Eu nunca sofri, muito pelo contrário. piotr tchaikovsky Piotr Tchaikovsky é um músico contemporâneo de Johannsen, que é da Orquestra Sinfônica de Sincinato; Adler também era um grande pianista; Pryce e Jackmam também foram grandes músicos ; Faier foi da Orquestra do Teatro Bolshoi; Ludwin vem de Ludwig van Beethoven; já Zolman era um judeu; e Hunter era um americano. Todos músicos. ludwig van beethoven Jane de Oliveira, mãe: “Por mim, tudo bem. Eu apoiei a decisão do meu marido. Só vetei alguns nomes como Beethoven e Mozart. Porque o primeiro era o nome de um cachorro que eu tive, e o segundo, achei muito comum.” O meu nome sempre me abriu portas para eu E para manter a linha do seu pai, Xérox não poupou realizar algo porque sempre chamou muita, criatividade na hora de colocar o nome dos filhos. muita atenção”, afirmou Autenticada, que está Dentre alguns, estão Sherlaine, Shequira e, para lançando o cd “A Luz”. manter mesmo a tradição e o mesmo seguimento do pai, Carimbo. Haja criatividade para uma família. Segundo a cantora, o nome dela tem muito a ver com a sua personalidade: “Porque eu sou mesmo autêntica no que eu faço, no que eu falo. Eu gosto muito mesmo do meu nome”, garante Autenticada, que já chegou a sair no Fantástico e em outros diversos programas de televisão pelo seu nome. “Até hoje, recebo convite. O último foi o do Programa do Ratinho. Mas não fui porque hoje estou trabalhando muito no meu novo disco”, disse. UM FAMOSO TRIO DE IRMÃOS Quando se fala em nomes “diferentes” no Recife, logo surge, na conversa, a discussão sobre um famoso trio de irmãos. Xérox, Fotocópia e Autenticada são logo lembrados como exemplos de prenomes diferenciados. O que é questionado mesmo é se essas pessoas realmente existem. A reportagem da Revista Criança Cidadã foi atrás para descobrir até onde isso é mesmo verdade. E a resposta foi surpreendente. Os irmãos não só são reais, como também gostam dos seus nomes e jamais pensaram em trocá-los. Só tivemos acesso a conversar pessoalmente com Autenticada. 34 Ricardo Lins Lima, pai: “Hoje eu sei que não seria mais tão fácil colocar esse nome em um filho. Mas eu faria novamente. Como eu disse, a diferença, talvez, seria a quantidade de nome. Porque eu queria uns 20 em vez dos dez que eu pus.” Autenticada explica que o único dos três nomes que não há mesmo fundamento é o de Fotocópia. “O meu nome ainda não é comum, mas pode ficar. Vem da mesma linha de Socorro, Rosa, Graça, Glória. Só que esses já são comuns, vêm de longa data. No meu, eu serei apenas a primeira de várias que virão. Já Xérox, esse é o sobrenome de um inventor norte-americano. Então, é mesmo um nome. Só Fotocópia mesmo que não tem cabimento. Eu até aconselhei para ela trocar de nome, mas ela já está acostumada e vai deixar”, explicou Autenticada, que, com a beleza, já chegou a ser Miss Fernando de Noronha. A cantora gospel autenticada porfírio chama atenção pelo nome e pela beleza 35 REVISTA CRIA N Ç A C I D A D Ã | A G O / S E T / O U T. 2 0 1 0 Orquestra Um lar para quem precisa em Notas Por Stephanie Melo REVISTA CRIANÇA CI D A D Ã | A G O / S E T / O U T. 2 0 1 0 PARA CUSSY Não poderia ser diferente: a escola onde os Meninos do Coque se preparam diariamente se chamará, a partir de agora, Escola de Música Maestro Cussy de Almeida. A novidade foi anunciada no aniversário da Orquestra, no dia 5 de agosto. CONSULADO AMERICANO A Orquestra Criança Cidadã se apresentou na comemoração da Independência dos EUA, no dia 1° de julho, no Forte do Brum. Com muito talento e entusiasmo, os meninos e meninas do Coque chamaram a atenção de todos que estavam presentes, arrancando muitos aplausos. Sempre em busca do exercício da inclusão social, a Associação Beneficente Criança Cidadã (ABCC) e o Instituto de Assistência Social e Cidadania da Prefeitura do Recife (Iasc) são parceiros no programa “Aluguel Temporário”. O principal objetivo da ação é retirar adultos e crianças das ruas para reinseri-los na vida AGRADECIDO Feliz por ter recebido o DVD documentário da Orquestra Criança Cidadã, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva expressou sincero agradecimento pela gentileza ao desembargador Nildo Nery no dia 24 de julho. comunitária e, assim, reestruturar vínculos familiares. A cama é um banco ou uma calçada. O cobertor, um papelão. O frio é a realidade daqueles que não têm lar. Foi assim que o ex-morador de rua Agnaldo Nunes da Silva viveu durante um bom tempo, nas esquinas do Marco Zero. Hoje é diferente, graças ao “Aluguel Temporário”. Através do programa, a ABCC doa o valor de R$ 100,00 para o aluguel de um quarto. Nunes, agora, dorme sob um teto e numa cama simples, mas que, em comparação ao chão das ruas, é muito aconchegante. “Tenho tuberculose e passava a noite no frio. Aqui, estou me tratando, recebendo alimentação e ajuda com os medicamentos”, disse. De acordo com a gerente operacional do Iasc, Jaqueline Oliveira, para chamar os moradores de rua para o programa, equipes de áreas RPAs e educadores Agnaldo e Moisés não precisam mais dormir na rua Agnaldo Nunes e o colega Moisés Ferreira residem na pensão do programa, na Rua da Glória, há cinco meses, mas nem todos que participam do “Aluguel Temporário” passam tanto tempo como eles. “Muita gente abandona o espaço. Na verdade, se acostumam a viver na rua. Já teve morador que vendeu utensílio do quarto para conseguir dinheiro”, lamentou a assistente social do Iasc, Maria das Graças Marques. abordam-nos, geralmente famílias com crianças, sobre o aluguel e, posteriormente, solicitam a entrada. de saúde, registro de documentos e apoio psicológico Os benefícios do programa, no entanto, são publicamente reconhecidos. “O sonho dessa parceria é oferecer condições para que os moradores de rua, a princípio, tenham onde dormir e, futuramente, possam se sustentar por conta para os atendidos. própria”, finaliza Maria das Graças. Cerca de 20 famílias são atendidas mensalmente. Elas recebem o “kit reinserção”, utensílios básicos para se manterem. Além disso, o Iasc disponibiliza serviço 36 NAS LIVRARIAS A história da Orquestra Criança Cidadã pelas mãos do presidente da Academia Pernambucana de Letras (APL), Waldenio Porto, já está à venda na Livraria Saraiva. “Violinos no Coque” é a 10ª obra do escritor pernambucano. CONTAGIANTE Muito animada a apresentação da Orquestra no Encontro Internacional da Ordem do Carmo, no Convento do Carmo, Recife. O prior provincial, frei Francisco de Sales Alencar, era um dos mais entusiasmados. ALMOÇO DO BEM A Associação Beneficente Criança Cidadã (ABCC) foi uma das entidades sociais que marcou presença no Almoço do Bem, evento de divulgação da 314ª edição da Festa da Nossa Senhora do Carmo, padroeira do Recife. As festividades em celebração à Padroeira aconteceram do dia 6 a 16 de Julho e contaram com o apoio da Orquestra Criança Cidadã, numa apresentação no dia 14 de Julho. PARABÉNS A Associação Beneficente Criança Cidadã parabeniza dois importantes parceiros: a Organização do Auxílio Fraterno (OAF), pelos seus 50 anos, e o Imip, pela inauguração do Hospital Pedro II. UNIÃO SOLIDÁRIA Para celebrar o 18° aniversário do Quartel do 7º Depósito de Suprimentos, a Orquestra Criança Cidadã uniu-se à Banda Militar do Exército, resultando em uma noite de muita música no Teatro de Santa Isabel. A apresentação, realizada no dia 21 de julho, também simbolizou a parceria entre a Orquestra e o Exército Brasileiro, que disponibiliza o 7º Dsup como sede para o projeto. 37 REVISTA CRIAN Ç A C I D A D Ã | A G O / S E T / O U T. 2 0 1 0 REVISTA CRIANÇA CI D A D Ã | A G O / S E T / O U T. 2 0 1 0 FENEARTE A Orquestra Criança Cidadã se apresentou na noite de encerramento na Feira Nacional de Negócios do Artesanato, no dia 11 de Julho, com uma performance curta, mas muito bonita. O show atrasou e foi reduzido por causa das outras apresentações que ainda iam acontecer, devido à final da Copa do Mundo, mas isso não impediu que a Orquestra brilhasse, como sempre. SOLIDARIEDADE Movidos pelo espírito de solidariedade, os Meninos do Coque visitaram Barreiros, Mata Sul pernambucana, e doaram mantimentos para os desabrigados da enchente que devastou a região. Um galpão virou palco, e toda a atenção se virou para o talento dos sete instrumentistas, que levaram um pouco de emoção e magia para as vítimas. AMIGOS DO EXÉRCITO Outra comemoração simbolizou a união entre a Orquestra Criança Cidadã e o Exército Brasileiro. Dessa vez, a homenagem foi dedicada a integrantes do projeto: aos professores Fabiano Menezes, Aline Ananias e Nilzeth Galvão e ao gerente geral e executivo, Rosélio Pedroza. Eles receberam, na manhã do dia 26 de Julho, o diploma de Amigos do 7º Depósito de Suprimentos, na cerimônia do 18º Aniversário do Quartel, que aconteceu no Pátio de Formatura do local. Durante o evento, o comandante e coronel Edvaldo Marques prestou homenagem ao maestro Cussy de Almeida. PARCEIROS Um parceiro dos Meninos do Coque que marca constante presença é a Martur Viagens e Turismo, agência que há 20 anos operacionaliza serviços de receptivo em Recife, Porto de Galinhas, Natal e, mais recentemente, Fernando de Noronha. A Martur está sempre ajudando a Orquestra no deslocamento para as apresentações, inclusive, para outros estados. NOVO PRÊMIO A Orquestra Criança Cidadã está na lista dos treze cases vencedores da 9ª edição da comenda Marketing Best Sustentabilidade. A premiação acontece desde 2002 e vem crescendo a cada ano, trazendo espaço para projetos sociais. 38 JÚLIO CARLOS Um dos jovens talentos da Orquestra Criança Cidadã está de volta ao Recife depois de passar doze meses na Polônia num intercâmbio de estudos. Júlio usa a palavra “inexplicável” para designar a experiência. “Não consigo arrumar palavras para definir”, diz o violinista. Breakdance nas ruas do Recife Por Carolina Barros Tensão. Stress. Correria. Tumulto. Ruas barulhentas, quentes, e carros velozes. E lá estão eles: meninos e meninas se virando como podem nos sinais da cidade. De carro em carro, arrumam um trocado. É a busca pela sobrevivência. O dia a dia das metrópoles tem levado os jovens brasileiros ao trabalho infantil, de semáforos para subempregos. Quem anda pelas ruas de uma cidade como o Recife, assiste, diariamente, faça chuva ou faça sol, a crianças e adolescentes explorados, desamparados, com seu futuro comprometido. Normalmente, pedem para limpar os vidros dos carros, vendem chicletes ou chocolates. Há um novo grupo, no entanto, de veia mais artística: no intervalo do sinal vermelho para o verde, crianças e adolescentes fazem algum tipo de número performático, que abrange desde malabarismo com pauzinhos e fogo a uma inovadora prática de dança de rua. Caracterizados com roupas de artistas do hip hop, eles pulam, rodam, se jogam no chão, giram e se equilibram – um grande esforço, que se compensa com a crescente qualificação, dança após dança. Esse é o Breakdance. Que dança é essa? O Breakdance é um estilo de dança de rua que faz parte da cultura do hip hop. Surgiu em Porto Rico, na década de 70, em protesto aos aviões que caíam no período da Guerra do Vietnã. As pessoas começaram a girar de pontacabeça, como um moinho de vento, imitando helicópteros caindo. Logo, chegou aos Estados Unidos, servindo como alternativa para a diminuição da criminalidade entre as grandes gangues de rua que tomavam Nova York. Os grupos rivais continuaram competindo entre si, mas sem armas e brigas – apenas através da dança. 39 REVISTA CRIAN Ç A C I D A D Ã | A G O / S E T / O U T. 2 0 1 0 O Breakdance vai muito além de uma forma simples de dança. É, mesmo, mais do que um modo de vida para aqueles que amam o hip hop: é atitude, arte, paixão. O Break expandiu-se para o mundo em 1981, sendo que, no Brasil, ganhou novos elementos, novos passos característicos da cultura tupiniquim. REVISTA CRIANÇA CI D A D Ã | A G O / S E T / O U T. 2 0 1 0 ali. Depois de responder ao questionário da simpática moça, uma proposta: a participação em um comercial para uma faculdade do Ceará. que sua avó preparou e começa a ensaiar, ao som do hip hop, novos passos para serem feitos nas próximas apresentações. Thiago conta que resolveu ir aos sinais dançar quando fazia capoeira – através dela, passou a ter mais facilidade com o Breakdance. Há três anos, vem seguindo a mesma rotina, trabalhando de segunda a sábado e, caso necessário, aos domingos também. Lógico que Thiago aceitou. Ele ficou muito feliz com o convite, não só pelo dinheiro, faz questão de ressaltar, mas pela oportunidade de mostrar o talento na TV. “Isso caiu do céu pra mim. Estou muito empolgado. Vai ser muito bom, comemora o garoto, com um sorriso maior que o rosto. Enfim, a popularização Já não causa estranheza observar as crianças artistas nos sinais da cidade. Elas se juntam principalmente nos semáforos dos bairros da Torre, das Graças, de Boa Viagem e da Avenida Agamenon Magalhães. A performance começa com o cumprimento às pessoas que estão paradas em seus carros esperando o sinal abrir; depois, vem a dança. Os pequenos artistas realizam seus passos, agradecem, tiram o chapéu de pano e partem em direção aos carros. Com sorte, recebem algo em troca. Thiago Trajano, 17 anos, morador do Alto José Bonifácio, é uma das inúmeras crianças que passam o dia na rua, realizando pequenos bicos. Geralmente, ele fica nos sinais do bairro da Torre. Sua rotina é bastante puxada: acorda cedo e chega às ruas às 7h30. Pausa na hora do almoço e, quando tem sorte, consegue uma quentinha em algum barzinho por perto. Se não conseguir, tem que comprar alguma coisa, mas nem sempre tem dinheiro suficiente para comprar uma refeição. Se o bolso está vazio, fica sem comer e continua o trabalho. Thiago trabalha até as 20h, normalmente. Porém, se o lucro estiver bom, fica até mais tarde. Volta pra casa, toma banho, janta o 40 Mesmo tendo pai, mãe e irmãos, Thiago mora com a avó, Ivonete. Com os ganhos que obtém, ajuda na renda da casa – é ele que, basicamente, sustenta o lar. Thiago estudou até a quinta série do ensino fundamental. Sabe ler e escrever, mas, como muitas crianças, teve que largar os estudos para ajudar nas despesas. As crianças artistas não vivem isoladas. Muitas formam grupos para ensaiar. Existe, por exemplo, um que treina no Parque da Jaqueira. Thiago faz parte dele. Não há uma organização que ajuda ou orienta esses jovens. “É simplesmente algo que parte da gente. Somos amigos, mas o lucro é individual. A gente até curte o hip hop juntos, mas, na rua, é cada um por si”, conta. Entrar em contato com uma criança artista é uma experiência única. São pessoas que, em demonstração invejável de paciência, toleram cara feia, mau humor e desrespeito. São crianças e jovens que acham, nas ruas, uma oportunidade de desenvolver suas habilidades. São cheias de surpresas, brasileiros e brasileiras que lutam, todos os dias, por uma vida melhor. O que se pode fazer por elas? Muita coisa! O mínimo: dar um sorriso. O trabalho que Thiago tem feito é fruto de uma necessidade. Apesar disso, ele pratica o Breakdance por amor à arte. E, justamente por gostar muito, resolveu usá-la como meio de vida. “Eu danço e tal... trabalho porque eu amo o hip hop. Três anos não é brincadeira”, diz. Um dia, Thiago estava dançando em um sinal perto da lanchonete Bugaloo, nas Graças. De repente, um carro para, baixa o vidro, e uma mulher aparece. Ela perguntou o nome dele, quantos anos ele tinha, onde morava, se ficava sempre por 41 REVISTA CRIAN Ç A C I D A D Ã | A G O / S E T / O U T. 2 0 1 0 REVISTA CRIANÇA C I D A D Ã | A G O / S E T / O U T. 2 0 1 0 Segundos de ouvido por diversão. Daí, quando entrei no conservatório, escolhi o piano, até hoje não sei passos de por quê. Geralmente os jovens querem aprender violão, guitarra, bateria... Eu fui diferente”. Vitor Araújo E foi assim que a trajetória de Vitor Araújo começou. Como ele mesmo diz, “sem nada de especial”, além da vontade e da paixão que o movem. Ao longo dos últimos anos, fez apresentações pelo Recife e ganhou destaque. Antes mesmo de completar 19 anos, gravou seu primeiro trabalho, o CD/DVD TOC – Ao vivo no Teatro Santa Isabel, em 2008. Apesar da bagagem erudita do conservatório, a proposta de Vitor, aliando o moderno ao clássico, foi inovadora – e primordial para definir seu Por Milton Raulino estilo e conquistar seu espaço. “Tenho um olhar jazzista, faço rearranjos, improvisos. Também Com talento e ouvidos apurados, Vitor Araújo começou a carreira artística aos 17 anos, revelando-se um dos novos rostos da música clássica e popular contemporânea. Logo, o jovem tornou-se figura consagrada no cenário pernambucano e brasileiro. Hoje, aos 21 anos, ele lança seu segundo trabalho, “Paixão e Fúria”, apostando nas composições próprias e na maturidade musical. Com exclusividade, a Revista Criança Cidadã conversou com o pianista, que falou um pouco sobre o início da carreira, fama e música. O espetáculo começa. As luzes se apagam. Uma toco para um público que não é acostumado à música erudita, e isso chama mais atenção. É a inserção de um mundo em outro”, afirma. Vitor já participou de grandes eventos, como rádio antigo de pilha e um megafone. o Festival de Inverno de Garanhuns (2007), Além disso, um quinteto de cordas o Abril Pro Rock (2008) e a Virada Cultural de contribuiu para incrementar o espetáculo. São Paulo (2008). Entre tantas apresentações, pianista com a música – causando sua a angústia. música de fundo soa instigante, aguçando ainda 42 teatral com forte apelo sonoro, como um Vitor ressalta a participação no show de abertura Vitor, no auge dos seus 21 anos, já tem uma história do Carnaval do Recife de 2009. “Desde 2004, mais a espera do público. De repente, sob a O pianista, que engatou a carreira aos 17 anos, antiga com a música. Seus primeiros passos foram 2005, eu vou à abertura do carnaval. Sempre penumbra, Vitor Araújo entra em cena. O palco hoje é figura reconhecida nacionalmente pelo dados aos nove anos, quando começou a estudar sonhei em estar ali, tocando junto com todos se ilumina e uma enxurrada de aplausos invade seu estilo e personalidade ao tocar. Em seu no Conservatório Pernambucano de Música (CPM). aqueles batuqueiros. E pra mim foi uma honra ter o teatro. Como em um acesso de fúria, o jovem novo concerto, que já estreou em Goiás e em “No começo, a música era mais um hobby, uma tocado com um ídolo, que é o Naná Vasconcelos. pianista se debruça sobre a calda do piano e, de São Paulo, o rapaz trabalha obras eruditas e atividade fora da escola, mas eu acabei me Naquele mesmo dia, conheci o Caetano Veloso lá, retira papeis e partituras, atirando-os ao alto. composições concerto apaixonando, e ela se tornou minha profissão”. pessoalmente, e ele gostou muito de mim”, diz o Em seguida, com uma rapidez sutil, Vitor senta-se é diferente do primeiro. O primeiro tem onze Segundo ele, uma vez demonstrado o interesse, a pianista, conhecido por suas versões de “Samba calmamente ao piano e toca com ternura e amor músicas, mas só duas são minhas. Este novo tem família lhe deu suporte para começar. “Meus pais me e Amor”, de Chico Buarque, e de “Paranoid indescritíveis. Assim inicia o novo espetáculo oito músicas. São um pouco mais longas, têm incentivaram muito. Eu tive essa vontade, e eles me Android”, de Vitor Araújo, “1º Ato – Paixão e Fúria (ou A muito texto, muita coisa cênica. Cinco são minhas, deram apoio. Tanto que não tive influências. Não tenho angústia)”, que estreou no Teatro de Santa Isabel, e três são eruditas. Não entrou música popular”, músicos na família e, naquela época, não tinha amigos no último dia 28 de agosto. Trata-se da primeira explica Vitor. Os elementos cênicos fazem toda a músicos também. A vontade partiu de mim”, afirma. etapa de uma trilogia musical sobre a paixão. diferença durante o espetáculo. Entre as peças O instrumento escolhido, o piano, espelhou toda As influências e inspirações de Vitor Araújo vêm, No 1º ato, o tema é a relação entre paixão e apresentadas, Vitor mescla recitação de poemas. a carreira de Vitor. “Quando criança, eu tinha um especialmente, da música brasileira. Apesar do fúria, conectada com a relação do personagem- Outros elementos também compõem a cena teclado aqui em casa e eu costumava a tirar músicas gosto musical eclético, ele revela o que tem escutado próprias. “Esse novo da banda inglesa Radiohead. MÚSICA, CINEMA... E VITOR 43 REVISTA CRIAN Ç A C I D A D Ã | A G O / S E T / O U T. 2 0 1 0 REVISTA CRIANÇ A C I D A D Ã | A G O / S E T. 2 0 1 0 ultimamente. “Tenho ouvido música brasileira antiga, é só você se forçar a fazer algo que você não gosta, o cancioneiro popular desde a década de 1930 mas isso também é tornar concreto um objetivo. Eu até 1960, desde Pixinguinha e Noel, até a Era dos acho que eu poderia me aperfeiçoar mais”, declara. Festivais, passando por Caetano, Edu Lobo, Tom, Vinícius, Baden Powell, Lupicínio Rodrigues... É VIDA DE ARTISTA uma época que me encanta e me inspira muito. Dos eruditos, gosto muito de ouvir Villa-Lobos, Vitor Araújo, já consagrado em Pernambuco, parte Cláudio Santoro e Edino Krieger. Este último, eu tive para outros estados, buscando ampliar o seu público. a oportunidade de conhecer pessoalmente”, afirma. Atualmente morando em São Paulo, o rapaz, dono de um talento e um estilo cheios de atitude, se revela Outra vertente musical inspiradora para Vitor é o cada vez mais familiarizado com a vida de artista. jazz. O estilo afroamericano, que surgiu nos Estados Devido à experiência, Vitor Araújo se apresenta mais Unidos no início do século XX, é um dos elementos maduro musicalmente, passando a desfrutar de presentes na obra de Vitor, além de compositores uma fase muito positiva e estável em sua carreira. eruditos como Chopin, Beethoven e Bach. O jovem artista não esconde sua paixão pelo estilo. “O jazz me inspira muito artisticamente. Não consigo escutar um jazz e depois não ter vontade de tocar piano”, diz. Além das influências musicais, o teatro e o cinema também foram Contudo, “ Não sou exatamente criativo. Na verdade, eu tenho uma memória muito boa. ” importantes na formação artística o músico reconhece os obstáculos que enfrentou na fama, no início da carreira. “Não foi difícil nem ruim, mas foi muito estranho. Tive que envelhecer muito rápido; tive que adquirir uma maturidade que não tinha com 17, 18 anos”, diz. No entanto, Vitor não se arrepende do caminho que seguiu e reconhece de Vitor Araújo. Não é à toa que seu novo espetáculo as coisas boas que lhe chegaram desde então. “A traz muitos elementos cênicos e leitura de textos e primeira entrevista que eu dei foi no Jô Soares. Então poemas. “O cinema me inspira muito. Gosto, em foi uma responsabilidade grande. Tive que aprender especial, do cinema europeu. Admiro cineastas como a me portar nos lugares que ia, a conhecer os Chaplin, Kubrick, Lars Von Trier, Truffaut, Godard diversos públicos, porque a diferença de um estado e Fellini”. Em especial, o pianista ressalta a peça pra outro, no Brasil, é muito grande” afirma Vitor. “Mercadorias e Futuro”, um monólogo de José Paes de Lira, o “Lirinha”, do Cordel do Fogo Encantado. Apesar da fama, o rapaz não abandonou a “Assisti à peça e foi algo impressionante. Muito do meu simplicidade e a paz de uma pessoa comum. Como trabalho eu me inspirei nesse espetáculo”, afirma Vitor. qualquer bom anônimo, Vitor também se diverte e relaxa nas horas vagas, sem deixar de cumprir seus 44 E falando em se inspirar, segundo Vitor, essa é sua deveres como artista. “Eu estou sempre tocando ou grande qualidade. Com muita modéstia, o rapaz atribui estudando música. Quando não, estou vendo filme uma parcela de seu sucesso a seus ídolos. “Não ou lendo um livro. Fora o universo da arte, que ocupa sou exatamente criativo. Na verdade, eu tenho uma cerca de 90% do meu tempo, gosto de encontrar os memória muito boa. Meus ouvidos são muito abertos, amigos. E o assunto não é só música. Conversamos e tudo o que vejo e ouço eu sei que um dia eu vou usar muita besteira e jogamos videogame também”, em meus trabalhos”, diz. Por outro lado, Vitor Araújo diz. “Estava meio que de férias em julho, aí vim ao é crítico e também reconhece suas dificuldades. “Sou Recife pra assistir à Copa do Mundo. Mas aí o Brasil muito indisciplinado. As pessoas acham que disciplina acabou saindo”, lamenta o pianista, entre risos. 48