políticas de inventário de jardins históricos em portugal
Transcrição
políticas de inventário de jardins históricos em portugal
POLÍTICAS DE INVENTÁRIO DE JARDINS HISTÓRICOS EM PORTUGAL Luísa Estadão Direcção Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais [email protected] Os Jardins Históricos (JH) constituem parte inalienável do nosso Património Histórico-Cultural. Uma gestão correcta passa pela definição de uma Estratégia Nacional para a Salvaguarda, suporte de Políticas capazes de dotar este valioso legado arquitectónico e vegetal com uma perspectiva inovadora, portadora de futuro, que em definitivo lhe confira a categoria de Paisagem Património da Democracia. A Salvaguarda e o Restauro dos JH têm como principal instrumento o Inventário, e a valorização obtida através de acções de divulgação constitui prática fundamental para a sua permanência nas sociedades, enquanto bens culturais, tornando-se urgente a criação de um sentimento de ‘pertença’ por parte de quem tem a responsabilidade última de os defender – os portugueses. E isso faz-se, precisamente, através de uma correcta política de divulgação das suas principais características, informando e formando, contribuindo para um maior conhecimento e sensibilização da população face aos valores em causa, factor determinante da sua sustentabilidade. E porque só se pode gerir correctamente aquilo que se conhece, toda a intervenção num JH deve ser precedida de rigoroso levantamento e registo. O primeiro passo consiste em obter o máximo de informação, desde os limites da propriedade aos levantamentos topográficos, dos registos fotográficos à cartografia. Em síntese, a tudo o que informa o Inventário. A compreensão das tipologias características dos JH requer a definição de Normas de Inventário próprias. Para que o Inventário aconteça de forma sistemática, é necessário instituílo de acordo com legislação específica, sob compromisso do Estado e mediante eficiente articulação entre as instituições tutelares. Caminhar no sentido de conferir aos JH uma nova feição, de índole democrática, que assegure a qualidade e o carácter necessários a esta herança tão valiosa. Suportada por um Sistema de Inventário, Classificação e Salvaguarda consequente e eficaz, ‘ancorado’ numa Estratégia Nacional para a Salvaguarda. Uma Nova Visão. Palavras-Chave: Inventário; Jardim Histórico; Património; Salvaguarda 1 Introdução Em 1941, Francisco Caldeira Cabral recebeu um subsídio do Instituto para a Alta Cultura para o estudo dos Jardins Históricos, contando com o apoio dos seus alunos de Arquitectura Paisagista. Este foi sempre um tema ao qual deu a maior atenção ciente que o prejuízo é tanto mais para lamentar que não há praticamente nenhuns estudos feitos sobre jardins em Portugal (Caldeira-Cabral 1993), o que fez com que Caldeira Cabral entendesse ser necessário procurar pelo convívio e estudo das nossas boas quintas e jardins antigos, encontrar de novo o ambiente, as proporções, que nos são próprios (Caldeira-Cabral 1993). A paisagem criada intencionalmente pelo homem é a expressão mais completa e ao mesmo tempo a mais delicada do nosso património. Conservar os Jardins Históricos como património, obra de arte e documento, exige um trabalho complexo, desde o levantamento topográfico à representação cartográfica, ao registo e interpretação de todos os elementos, tendo em vista revelar a identidade arquitectónica e a informação que encerra. Do património dos Jardins Históricos portugueses, muito pouco está classificado, sob protecção legal ou divulgado, passando assim despercebido o seu valor cultural, adquirido e transmitido ao longo do tempo. Deste modo, é natural que a sensibilidade para este tipo de património e para a problemática que lhe está associada, se situe muito aquém do que deveria, sobretudo no que se refere ao património construído. O conhecimento de um jardim assegura a base de trabalho que constitui o apoio a qualquer acção ou projecto a desenvolver. A salvaguarda e o restauro têm como instrumento fundamental o inventário, e a valorização obtida por meio de acções de divulgação é essencial para a permanência destes jardins nas sociedades, enquanto bens culturais. É fundamental que se sensibilize para o valor documental e histórico do património construído, em particular dos Jardins, relativamente às suas qualidades artísticas e ambientais, às potencialidades culturais e didácticas e aos riscos da sua degradação e possível extinção, acentuando a necessidade de proteger e salvaguardar esta herança cultural. As características dos nossos jardins resultam de um amplo conjunto de circunstâncias: a organização social e a sua evolução; as “descobertas”, o contacto com novos povos, novos territórios e novas espécies; o nosso clima, verdadeiro mosaico de microclimas, conjugando influências mediterrânicas e atlânticas. Por tudo isto, os jardins portugueses constituem espaços alienados de uma riqueza incalculável, insubstituível, ecossistemas cujas estruturas e dinâmicas importa mantermos, verdadeiros “caldos” de cultura e saber, fiéis depositários da nossa Identidade. 2 Conceitos 2.1 JARDIM HISTÓRICO É a composição arquitectónica e vegetal que é de interesse público do ponto de vista artístico e histórico e como tal é considerado um monumento. artigo 1º da Carta de Florença, 1981i Podem-se considerar os jardins como criações espaciais, poéticas e pictóricas, obra das sociedades, construídas através de uma composição de elementos arquitectónicos e vegetais, dispostos segundo uma determinada forma. É a tentativa de modelação da Natureza pelo Homem, do estabelecimento, nesta, de uma ordem estética. Por serem referentes a um ou vários momentos da evolução de uma cultura, constituem um documento histórico de grande valor e interesse científico, testemunho cultural e contínuo do passar dos tempos, da vontade das sociedades e dos seus estados de alma. Surge assim como um artifício, pleno de simbolismos e de arte, com uma identidade própria, representando uma cultura, a aspiração do Homem, a tradição de uma sociedade, sendo através dos tempos, um dos indicadores das mudanças de atitude da Humanidade em relação com a Natureza e a Paisagem. 2.2 INVENTÁRIO DE JARDINS HISTÓRICOS Elemento fundamental, base de uma qualquer política de salvaguarda do património, e sobretudo, um instrumento de apoio à tomada de decisão para a sua tutela e recuperação. Não é fácil a catalogação de jardins históricos, pois trata-se, em larga medida, de património privado, fechado ao público, frequentemente em estado de abandono, destruído ou transformado. Os instrumentos cartográficos e bibliográficos que se utilizam no Inventário podem reduzir o problema técnico da sua individualização, mas só um reconhecimento integral, in situ, pode garantir uma maior certeza cognitiva. Uma vez que os inventários registam o valor dos Jardins históricos e a sua importância na paisagem, uma das principais vantagens da sua divulgação é a de conferir a este tipo de património um estatuto especial, que permita criar e desenvolver políticas para sua protecção, apoiadas em bases oficialmente reconhecidas. A Ficha compõe-se de uma parte escrita (informação e relatório propriamente dito) e de uma parte desenhada (planos, desenhos, fotografias e ilustrações), que contém a estrutura do jardim, a sua localização e a identificação de todos os seus componentes principais. São objectivos do Inventário de Jardins Históricos: • devolver à sociedade estas paisagens eruditas e vernaculares, de modo a que sirvam de base à compreensão de questões relacionadas com o património natural e cultural; • incentivar novas utilizações destas paisagens, valorizando-as, mantendo as estruturas e dinâmicas destes ecossistemas e dando especial destaque à arte, no estrito respeito pelo seu carácter histórico; • contribuir para uma maior divulgação e promover o interesse nos Jardins Históricos através de técnicas de interpretação inovadoras e eficazes. 3 Enquadramento internacional 3.1 Instituições - UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura): ICOMOS (Conselho Internacional de Monumentos e Sítios) e ICOMOS-IFLA (Comité Internacional dos Jardins Históricos). 3.2 Instrumentos e Medidas - Carta de Atenas, 1931 - Carta de Veneza, 1964 - Criação do Departamento de Jardins Históricos, IFLA, 1964 - Simpósio sobre Jardins Históricos Fontainebleau, 1971 - Carta de Florença, 1981 “a salvaguarda dos jardins históricos exige que eles sejam identificados e inventariados”ii 4 Exemplos de Aplicação de Políticas de Salvaguarda e Inventário Características comuns aos modelos analisados: 1. a importância dada por todos ao trabalho de campo, especialmente nos modelos Italiano e Inglês. A observação directa é, segundo Peter Goodchild, "o método mais simples e barato, mas obtêm-se os melhores resultados quando o observador é um expert"iii. O jardim enquanto “documento” único, limitado, irrepetível, com um processo próprio de desenvolvimento e uma biografia particular, necessita de uma observação detalhada do seu estado actual. A análise da vegetação e a comparação com planos e fotografias antigas comportam uma grande quantidade de informação que só pode ser obtida a partir do intenso trabalho de campo e arquivo; 2. a tendência para a sequenciação do trabalho, o estabelecimento de níveis de análise progressivos, muito acusado no modelo inglês, e as actividades de avaliação como passo intermédio, mas complementar, entre o nível mais baixo de informação (a identificação) e o mais alto (a catalogação). Através destas experiências comprova-se a importância da ficha enquanto ferramenta básica do Inventário, como instrumento global de conhecimento que necessita de ser completado para resultar eficaz. No conceito actual de inventário de bens culturais é dada menor importância aos dados históricos perante os componentes do objecto. O registo ocupa um lugar destacado, estruturado nas listas de elementos arquitectónicos, vegetais e ornamentais do jardim. Também contempla uma descrição de conjunto, que atende ao seu traçado e carácter ambiental, tanto interno como em relação com a envolvente. Os elementos vegetais são uma componente distintiva do jardim, relativamente aos outros bens imóveis: os campos que integram esta secção atendem às estruturas, às espécies e à manutenção do conjunto vegetal. A partir dos elementos obtidos inclui-se uma avaliação do objecto, em atenção a dois conceitos básicos: o estado de conservação das suas estruturas, construídas ou vegetais, e o valor patrimonial do conjunto (que pode ser entendido como a soma dos valores históricos, artísticos, botânicos e paisagísticos). Os dados de fontes de informação integram a documentação gráfica (levantamento de plano ou croquis de planta), a fotográfica e as fontes documentais. É referida toda a informação utilizada, independentemente da tipologia – bibliografia, fotografias, planos antigos, iconografia 5 Enquadramento Nacional Nos anos 60, o jardim começa a ser entendido como objecto de valoração estética e patrimonial, o que determinou uma abordagem mais rigorosa dos JH. Para isso contribuíram o texto de Caldeira Cabral, O Jardim Português, a obra de Ilídio de Araújo, A Arte Paisagista e dos Jardins em Portugal e um pré-inventário elaborado na DGPU e coordenado por António Viana Barreto. A esta nova atitude não terão sido alheias as intervenções de Ribeiro Telles na Quinta do Marquês de Pombal e de Caldeira Cabral na Quinta das Vidigueiras. Em 1985, Aurora Carapinha apresenta o documento Inventário da Arte Paisagista em Portugaliv. No final dos anos oitenta o interesse pelo JH estende-se aos órgãos de decisão (protocolo entre a APAP e o IPPAR, assinado em 1988, para acções de recuperação em JH). Nos anos 90 consolida-se o interesse pela temática do património; nas duas Escolas de Arquitectura Paisagista – Lisboa e Évora – assiste-se ao desenvolvimento de trabalhos e de assinaturas de protocolos visando a recuperação de JH. Este interesse é seguido por outras instituições. Para inventariação dos jardins estabeleceu-se um protocolo entre a DGEMN e a Universidade de Évora. As normas vigentes, IPA-Paisagem, foram realizadas por Aurora Carapinha. Tendo-se sentido necessidade de as aprofundar e adaptar, criaram-se entretanto duas subcategorias: Unidade de Paisagem e Jardins e Parques, estando em curso a aprovação das respectivas normas. Em 1990 foi editado o Tratado da Grandeza dos Jardins em Portugal, de Hélder Carita e António Homem Cardoso. Em 1992, Cristina Castel-Branco coordena a inventariação de 260 jardins e em 2002 publica Jardins com História, Poesia Atrás dos Muros. Destaque para o Encontro Internacional de Jardins Históricos, em Junho de 1995, onde foi definida a participação activa de Portugal no ICOMOS-IFLA; os encontros em Serralves, desde 2002; em Novembro de 2005, o Congresso Internacional Casa Nobre e o Ciclo Internacional de Conferências sobre Património; e em Maio de 2006, o Congresso O Jardim Medieval. Para além destes esforços de divulgação, da adesão a convenções internacionais e da subscrição da Carta de Florença, documento já com 25 anos, continua a não existir legislação específica para a salvaguarda dos JH. 5.1 • O Inventário em Portugal – Instituições: Não Estatais: Associação Portuguesa de Jardins e Sítios Históricos (APJSH) e Instituto Açoriano de Cultura (IAC) • Estatais: Direcção Geral de Edifícios e Monumentos Nacionais (DGEMN) e Instituto Português do Património Arquitectónico e Arqueológico (IPPAR) 6 Síntese das Políticas de Inventário dos Jardins Históricos em Portugal É urgente que o estudo dos nossos jardins se inicie, coordenando todos os elementos dispersos e coligindo o maior número possível de dados de todo o País (CaldeiraCabral 1993). É ponto de partida que se estabeleça o conceito de Jardim Histórico para definir os objectosv a incluir neste tipo de ficha de inventário. Estabelecer também que, sintetizando os critérios definidos ou adoptados em França, Espanha e Inglaterra, um jardim é passível de ser inventariado quando: - conserva traços representativos de um estilo; - é um jardin du plaisir cujo interesse deriva de uma intervenção estética; - constitui um elemento característico da paisagem; - preserva antigas e originais espécies de plantas; - foi obra de um projectista famoso; - está associado a pessoas ou acontecimentos dignos de registo. É portanto antiquada a ideia de que só se devem inventariar os jardins de renome e de grande monumentalidade. É fundamental descobrir-se a realidade do jardim português, o seu significado na construção da cidade, na cultura de cada região. O estabelecimento do grau permite incluir na mesma base de dados, o “registo” e o “inventário” de Inglaterra, o “inventário” e “catalogação” de Itália, ou o “identificar” e o “individualizar” de Espanha. Na DGEMN, o processo de listagem, designado por préinventário, é colocado em grau 9, estando incluído na base de dados como objecto existente. Quando este é estudado e criteriosamente inventariado, adquire nessa altura um grau (entre 0 e 5) atribuído por um revisor, passando a estar disponível ao público através da Internet, seguindo-se deste modo o modelo de ficha única. Da análise comparada dos inventários dos outros países surgem como essenciais, para um correcto levantamento e salvaguarda do Jardim Histórico, as seguintes abordagens: 1. hidráulica, 2. história de arte; 3. arquitectura; 4. botânica; 5. climatologia; 6. pedologia; 7. análise comparada com outros jardins da região; seguida de outros reconhecimentos, como sejam: 8. o contributo de proprietários ou outros interessados, 9. a colaboração de outras disciplinas com a arquitectura paisagista, como a geografia, a engenharia, ou a antropologia, quando se manifeste necessário. O resultado pretendido é um conhecimento sólido do jardim, que permita elaborar programas de acção específicos, melhor estruturados e mais consequentes. É, no entanto, importante optimizar a quantidade de informação com a rentabilidade e rapidez do desenvolvimento deste trabalho. É pedido um conhecimento aprofundado do jardim, mas ao mesmo tempo sintético e acessível ao público, contextualizado com o máximo de objectos (JH portugueses). Com a proposta de norma para ficha de inventário que adiante apresento, adaptando a da DGEMN (IPA – Inventário do Património Arquitectónico), pretende-se obter uma cobertura tão completa quanto possível das especificidades dos nossos JH. 7 Uma Nova Visão para o Inventário e Salvaguarda dos JH Portugueses O inventário constitui o primeiro passo no que se refere à identificação, quantificação e divulgação dos Jardins Históricos, à aferição da sua qualidade, do seu estado, da sua tutela, e à reunião de informações que se podem revelar preciosas e decisivas à prossecução de estudos de restauro e conservação. Este passo está a ser dado a nível estatal, sobretudo pelo trabalho levado a cabo pela DGEMN, que deve ser continuado, ampliado e apoiado. Conclui-se que: 1. É condição necessária que se institua, a nível nacional, uma norma única de inventário de Jardins, forçosamente articulada com o inventário dos outros tipos de património. A instituição que nesta matéria tem mais experiência, devendo por isso coordenar este serviço público é a DGEMN, o qual constitui a base das acções das outras instituições estatais. 2. À inventariação, pela DGEMN, deverá seguir-se a classificação, pelo IPPAR. A concretização deste propósito diminuirá o esforço financeiro, anulará a sobreposição de competências e inventários, além de optimizar este processo e acelerar o trabalho sistemático que visa a identificação de todos os Jardins Históricos, a nível nacional e dos portugueses além-fronteiras. 3. Para os Jardins, é imprescindível um inventário específico; a única forma de revelar a qualidade e o universo deste tipo de património e especificar as orientações necessárias à sua protecção, que conduzam a um compromisso de todas as entidades envolvidas no processo. Desenvolveu-se com este intuito uma proposta de norma de inventário, IPA-Jardins e Parques, apoiada na legislação, políticas e exemplos a nível internacional e em alguns países de referência, incluindo Portugal. A matriz utilizada é a da DGEMN, comum aos outros tipos de património contemplados pelo IPA (Monumento, Conjunto, Sítio e Unidade de Paisagem), e os campos de preenchimento das respectivas fichas foram reformulados e adaptados de acordo com as características específicas deste tipo de património. O resultado é uma norma que permite um inventário rigoroso de cada jardim, conseguindo caracterizá-lo desde a sua estrutura e características particulares (transmitindo o espírito de lugar), à sua história e dados técnicos, tanto de construção como a nível de elenco de vegetação, e do estado de conservação, partindo para propostas de intervenção e salvaguarda. Na norma de inventário é atribuído um grau indicativo do seu valor patrimonial, referenciado o estatuto de protecção jurídica existente, e feita uma análise comparativa a jardins com características tipológicas ou estilísticas equivalentes. Esta proposta foi testada através da criação de fichas que utilizaram como caso de estudo o levantamento de Jardins nos distritos de Viseu, Guarda, Lisboa, Portalegre, Évora, Beja e Faro (disponíveis no site da DGEMN - http://www.monumentos.pt). Um inventário comum às instituições estatais é um poderoso elemento de gestão, o instrumento primário de avaliação, gerador de dados para o estabelecimento de legislação específica para a salvaguarda dos Jardins Históricos. Permite também a racionalização das acções de tutela deste tipo de património, constituindo o melhor e mais moderno elemento de divulgação e promoção, por estar totalmente disponível ao público e em permanente actualização. Este instrumento está estreitamente relacionado com a existência de uma legislação específica e adequada aos JH, o que implica um processo de revisão da legislação já existente sobre Património, em particular sobre o Património Arquitectónico, e de produção das alterações que para o efeito se venham a revelar necessárias, incluindo a criação de um regime especial de incentivos fiscais e financeiros. É indispensável consciencializar a população portuguesa do valor excepcional do seu património, em matéria de jardins históricos e sensibilizá-la para a apreensão e apropriação adequada destes espaços, prevenindo a sua descaracterização. O Jardim Histórico é uma criação das sociedades, um sistema arquitectónico complexo e de composição conjunta: vegetal e inerte, que o torna um monumento vivo. Para além de tudo o que encerra este conceito, o JH é sobretudo um valioso testemunho da relação do Homem com a Natureza. O Jardim nunca se conclui, antes evolui e se adapta, assegurando poética, contemplação e romantismo. A salvaguarda deste património assenta necessariamente no seu reconhecimento enquanto parte integrante e fundamental do património cultural e deve expressar-se pela vontade comum em seguir princípios e recomendações de salvaguarda, estabelecidas internacionalmente, em atribuir competências e definir políticas e critérios de protecção e conservação, em identificar, divulgar, sensibilizar o público, em geral, do valor e significado dos Jardins Históricos. Os Jardins Históricos constituem parte inalienável do nosso Património Histórico-Cultural. Uma gestão correcta passa pela definição de uma Estratégia Nacional para a Salvaguarda, suporte de Políticas capazes de dotar este valioso legado arquitectónico e vegetal com uma perspectiva inovadora, portadora de futuro, que em definitivo lhe confira a categoria de Paisagem Património da Democracia. Proteger e valorizar o património cultural do povo português, defender a natureza, preservar os recursos naturais e assegurar um correcto ordenamento do território, é tarefa fundamental do Estado. alínea e) do artigo 9º da Constituição da República Portuguesa 8 Bibliografia Alçada, M., 2004. 75 Anos DGEMN: Conhecer, Inovar, Conservar, Informar. Lisboa: DGEMN. Añon, C., 1993. El Jardín Histórico: Notas para una Metodologia Previa al Proyeto de Recuperación. Jornal Scientifique – Jardins et Sites Historiques, Madrid: ICOMOSUNESCO, p.312-325. Belli, I., 1993. Per una carta del restauro dei giardini storici. In Jardins et sites historiques, Madrid: ICOMOS & Doce Calles, pp. 182-186. Birnbaum, C., guest editor, 1992. Preservation Forum. Focus on Landscape Preservation. Washington D.C.: National Trust for Historic Preservation, Volume 7, No. 3. Caldeira-Cabral, F., 1993. Fundamentos da Arquitectura Paisagista, Lisboa: ICN. Carapinha, A., 1985. Inventário da Arte Paisagista em Portugal, Provas de Aptidão Pedagógica e Capacidade Científica. Évora: Universidade de Évora. Castel-Branco, C., 2002. Jardins com História, Poesia Atrás dos Muros. Lisboa: Edições INAPA. Custódio, J., 1993. Salvaguarda do Património – Antecedentes Históricos. De Alexandre Herculano à Carta de Veneza (1837-1964). In Dar Futuro ao Passado. Lisboa: IPPAR, pp. 34-71. Goodchild, P., 2002. Paisagem e Património, Revista AP. Lisboa: APAP. Goodchild, P., 1990. Some Principles for the Conservation of Historic Gardens. Londres: ICOMOS. Goulty, S., 1993. Heritage Gardens. Care, Conservation, and Management. Londres. ICOMOS-IFLA, 1993. Compilation of papers on the subject. Jardins et Sites Historiques, Scientific Journal. Lambert, D., 1991. Researching a Garden's History from Documentary and Published Sources, Landscape Design Trust e The Centre for the Conservation of Historic Gardens. Matos, R., 1999. Recuperação de Jardins Hstóricos em Portugal, Algumas Reflexões, Tese de Mestrado. Évora: Universidade de Évora. i Carta de Florença, 1981. Comité Internacional de Jardins e Sítios Históricos. Artigo 9º da Carta de Florença iii Relatório do Encontro de Viena European Cultural Landscapes of Outstanding Universal Value. iv Provas de Aptidão Pedagógica e Capacidade Científica, Universidade de Évora, Departamento de Planeamento Biofísico e Paisagístico. v “para além da quinta-jardim, o conjunto avaliado (…), segue as definições internacionais que consideram como elementos de arte paisagística um recinto sagrado em redor de um templo, uma tapada ou parque de caça, uma cerca de convento, um eremitério ou uma envolvente de um castelo onde o caminho derronda que segue as muralhas foi traçado para que toda a paisagem se abrisse a perder de vista e a defesa do castelo ficasse garantida.” (Castel-Branco, C. 2002) ii