Da Palavra escrita à Palavra vivida

Transcrição

Da Palavra escrita à Palavra vivida
O viver as Palavra que gera Comunidade e Missão
Da Palavra escrita à Palavra vivida
Tu és a água viva...
1. Palavra (s) que iluminam
Jeremias contou a sua vocação missionária, quando o Senhor lhe disse: ‘Não
digas ‘sou um jovem’, pois irás onde Eu te enviar e dirás tudo o que Eu te
mandar. Não terás medo diante deles, pois Eu estou contigo para te livrar’ (Jer
1, 7-8).
Isaías apresenta a Missão do profeta: ‘O espírito do Senhor Deus está sobre
mim, porque o Senhor me ungiu: enviou-me para levar a boa nova aos que
sofrem, para curar os desesperados, para anunciar a libertação aos exilados e
a liberdade aos prisioneiros, para proclamar um ano da graça do Senhor’ (Is
61, 1-2). Cristo faz sua a Missão do profeta (Lc 4, 16-21).
Ezequiel apresenta Deus como libertador: ‘Eu vos reunirei de entre os povos e
vos reconduzirei de todos os países, para onde fostes dispersos, e vos darei a
terra de Israel (...) dar-lhes-ei um coração novo e infundirei no seu íntimo um
espírito novo. Arrancarei do seu corpo o coração de pedra e dar-lhes-ei um
coração de carne’ (Ez 11, 17-19).
S. Paulo pega em Is 52, 7 e faz o elogio do missionário: ‘Ora, como hão-de
invocar aquele em quem não acreditaram? E como hão-de acreditar naquele
de quem não ouviram falar? E como hão-de ouvir falar, sem alguém que o
anuncie? E como hão-de anunciar se não forem enviados? Por isso está
escrito: Quem bem vindos são os pés dos que anunciam as boas novas’ (Rom
10, 14-15).
2. O Sínodo sobre a Palavra de Deus
O Sínodo sobre a Palavra de Deus, realizado em 2008, apresenta a Palavra
em quatro perspectivas: a Voz (Revelação), o Rosto (Jesus Cristo), a Casa
(Igreja) e os Caminhos (Missão). A comunidade cristã constrói-se quando a
Palavra passa da Voz para os Caminhos, ou seja, da Revelação à Missão.
Sobre a Igreja, a Mensagem Final diz que ela é uma Casa sustentada por
quatro colunas: o ‘ensinamento dos Apóstolos’, a ‘fracção do pão’ (Eucaristia),
as ‘Orações’ e a ‘Comunhão Fraterna’.
Ao falar da Missão, o Sínodo recorda que a Bíblia nos apresenta o sopro de dor
que sai da terra ao encontro do grito dos oprimidos e do lamento dos infelizes.
E faz uma proposta aos cristãos: ‘Custodiai a Bíblia em vossas casas, lede-a,
aprofundai e compreendei plenamente as suas páginas, transformai-a em
oração e testemunho de vida, escutai-a com amor e fé na liturgia. Criai o
silêncio para escutar com eficácia a Palavra do Senhor e conservai o silêncio
depois da escuta, porque ela continuará habitando, vivendo e falando-vos.
Fazei que ela ressoe no começo do vosso dia, para que deus tenha sempre a
primeira palavra e deixai-a ressoar em vós á noite, para que a última palavra
seja de Deus’.
3. Comunidade e Missão segundo Bento XVI
D. José Policarpo, na saudação ao Papa, junto ao Tejo, disse: ‘ Os habitantes
de Lisboa habituaram-se a estar sempre dispostos a partir. E partiram á
procura de novos mundos, dinamizados pela urgência missionária do anúncio.
E ainda hoje continuam a partir, religiosos e religiosas, jovens e famílias
inteiras, a experimentar a aventura da Missão e a prender nela o verdadeiro
ritmo da sua Fé’.
Bento XVI também referiu este espaço, ‘donde partiram em grande número
gerações e gerações de cristãos’ que justificam um facto: ‘nas cinco partes do
mundo, há Igrejas locais que tiveram origem na missionação portuguesa’. Mas
não podemos dormir á sombra da história e da memória. A missão ‘na família,
na cultura, na economia, na política’ continua a constituir um desafio para a
Igreja.
O encontro com o mundo da cultura marcou o espírito de abertura desta visita.
A aventura dos descobrimentos e o entusiasmo missionário caracterizam a
cultura portuguesa. Há que respeitar outras ‘verdades’ e aprender com elas. A
missão prioritária da Igreja na cultura actual é ‘manter desperta a busca da
verdade, de Deus’. O papa terminou com um convite: ‘fazei coisas belas, mas
sobretudo tornai as vossas vidas lugares de beleza’.
Em Fátima, o Papa pediu que os católicos não tivessem medo de falar de Deus
e mostrar sinais da fé. Apelou à construção da civilização do Amor e da Paz,
ideia reforçada no encontro com agentes da Pastoral Social, onde apontou com
exemplo o estilo do ‘bom samaritano’ do Evangelho. Aos Bispos, Bento XVI
pediu um ‘novo vigor missionário dos cristãos’, a uma ‘viva dimensão profética
sem mordaças’ e mais comunhão entre a Igreja local e os Movimentos. Elogiou
o apoio dado às Igrejas Lusófonas.
Bento XVI foi dizer a uma enchente na Avenida dos Aliados que a Igreja é
Missão e que os cristãos nada impõem mas propõem o Evangelho de Cristo. E
foi ousado, ao afirmar: ‘temos de vencer a tentação de nos limitarmos aos que
ainda temos, ou julgamos ter de nosso e seguro: seria morrer a prazo,
enquanto presença de Igreja no mundo’. O Papa disse ‘não’ a uma Igreja de
manutenção, de cuidados paliativos e pediu que os católicos fossem
missionários e partissem ao encontro dos corações.
Afinal de contas, a Missão é uma paixão.
4. A construção da Comunidade pela Palavra – Carta Pastoral
dos Bispos
Os sinos já não marcam o ritmo da vida das pessoas. É urgente anunciar
o Evangelho. É fundamental a opção pelos mais pobres. Portugal é
espaço de Missão. A Igreja local é o sujeito primeiro da Missão. Há que
apostar mais na pastoral juvenil. Há que trabalhar á imagem do Bom
Pastoral. A igreja tem de se abrir mais ao Espírito Santo e partir ao
encontro dos corações.
Estas e outras ideias marcam a nova carta Pastoral que apela para um
novo rosto missionário de Portugal, que deve passar do ‘inverno’ à
‘primavera’ da Missão.
Os Bispos lembram que já não são os sinos das Igrejas quem marca o ritmo da
vida dos portugueses e que uma simples pastoral de manutenção não garante
futuro à Igreja. Dizem os bispos que a Missão parte do coração de cada um
para o coração de todos os outros. Dizem – como os Papas – que a Missão é a
primeira de todas as causas, o primeiro, o maior e o melhor serviço que a Igreja
presta à humanidade, ajudando a dar sentido à vida das pessoas. Os Bispos
recordam ainda que quem converte não são as estruturas mas o testemunho
de vida. Há ainda uma acentuação na opção e compromisso em favor dos mais
pobres. A Igreja local é o sujeito primeiro da missão, mantendo os Institutos
bem no centro, apostando na animação missionária como elemento fulcral na
pastoral das dioceses e paróquias.
Há ainda a salientar uma proposta concreta e inovadora: a criação de Centros
Missionários Diocesanos e Grupos Missionários Paroquiais. Os Centros devem
ser os principais propulsores da consciência e do empenho missionário da
Igreja Diocesana. Há ainda um incentivo grande dado à missão dos leigos,
sobretudo dos voluntários missionários. A aposta na pastoral juvenil é a última,
antes de surgir um apelo a seguir o fogo missionário de S. Paulo e da oração
conclusiva sobre a missão da Senhora da Anunciação.
O Bom Pastor, segundo Evangelho, é aquele que sabe guiar o rebanho a
‘pastagens verdejantes’, que conhece e ama cada uma das suas ovelhas,
quem é reconhecido e querido por elas, que vai à procura de todas as que se
perdem e que, em última análise, dá a vida por elas. Foi isto que Cristo fez, é
esta a missão de todos os cristãos hoje. O Bom Pastor propõe uma Igreja
atenta a todos, focada no essencial, longe da lógica das estatísticas, sensível
às periferias e às margens. Fiel à lógica da busca da ovelha perdida, a Igreja
terá a preocupação de partir em missão, indo de casa em casa, para anunciar
o Evangelho a todos. E são cada vez mais numerosos os que andam longe da
casa da Igreja.
Parece óbvio que ninguém ama o que não conhece nem anuncia aquilo que
não sabe ou em que não acredita. Os Bispos dizem que o ‘amor excessivo’ de
Deus por nós exige-nos uma dedicação radical ao seu anúncio. Nos tempos
que correm, não bastam discursos, não basta reformar estruturas. É preciso ir
mais longe e mais fundo e converter a nossa vida aos valores do Evangelho,
sabendo que tal exige remar contra a corrente. Também não é suficiente a
pastoral de manutenção do que já temos: é preciso partir em missão. Há aqui
um duplo apelo à espiritualidade (há que aprofundar pela oração as razões da
nossa fé) e à disponibilidade para partir onde o Espírito nos levar. O ideal era
atingir objectivo que aparece retratada na oração final sobre Maria: a Igreja
deve ser uma Casa grande, abertas e feliz, átrio de fraternidade’.
5. Ligação com Deus - Oração
Hoje há muitas formas de conectar com Deus, encontrar notícias da Missão e
propostas de orações ao ritmo da vida, de forma a melhor construir a
comunidade cristã. As redes sociais e a internet dão uma grande ajuda: a
‘Agência Ecclesia’ (www.ecclesia.pt), a ‘Zenit’(www.zenit.org), o ‘passo a
rezar’(http://passo-a-rezar.net),
o
‘Evangelho
quotidiano’
(http://
evangelhoquotidiano.org), ‘equipa ecuménica’ (www.ecumenismojovem.org)...
enfim, basta que queiras rezar que não faltam sugestões.
Hoje, proponho que rezemos com o Arcebispo do nordeste do Brasil D. Hélder
Câmara:
"Missão é partir, caminhar, deixar tudo, sair de si, quebrar a crosta do egoísmo
que nos fecha no nosso Eu.
É parar de dar volta ao redor de nós mesmos, como se fôssemos o centro do
mundo e da vida.
É não se deixar bloquear nos problemas do pequeno mundo a que
pertencemos: a humanidade é maior.
Missão é sempre partir, mas não devorar quilómetros.
É sobretudo abrir-se aos outros como irmãos, descobri-los e encontrá-los.
E, se para encontrá-los e amá-los é preciso atravessar os mares e voar lá nos
céus, então Missão é partir até os confins do mundo."
6. Compromisso(s) e Testemunho
A Missão tem um protagonista: o Espírito Santo. Nós somos actores
secundários neste filme da Evangelização, mas um bom filme depende
muito da qualidade de todos os actores. Ter um excelente protagonista dá
garantias de qualidade. Sermos óptimos actores assegura o sucesso da
obra. Temos, como escreveu D. Manuel Clemente, a responsabilidade de
acrescentar capítulos ao livro dos Actos dos Apóstolos.
A revolução silenciosa do Voluntariado Missionário
Foi em Agosto de 1988 (há 20 anos apenas!) que um grupo de Jovens Sem
Fronteiras partiu para Caió, no interior manjaco da Guiné-Bissau, para lançar os
alicerces da Escola Ciclo de Tubebe. Nesse mesmo ano, em Outubro, os Leigos
para o Desenvolvimento abriram a sua primeira comunidade em S. Tomé.
Assim começou, de forma organizada, esta onda de voluntariado missionário
em que os protagonistas são os leigos. Trata-se de uma lufada de ar fresco na
Igreja, de uma revolução silenciosa que nos tira a nós, membros de Institutos de
Vida Consagrada, o exclusivo do ‘partir’ em Missão.
O gosto pela missão e pela partida para países longínquos continua a estar no
horizonte de muitos dos jovens portugueses. Apesar das dificuldades em
arranjar financiamentos, existem no nosso país cerca de 40 entidades que
promovem este tipo de iniciativas, desde Dioceses a Paróquias, de
Congregações a IPSS ou ONGD que se dedicam exclusivamente à
dinamização de projectos no âmbito do voluntariado missionário e da ajuda ao
desenvolvimento.
A Igreja tem de tomar muito a sério esta nova ‘frente da Missão’ que envolve os
leigos, jovens e menos jovens, que partem e que, um dia, regressam ás suas
comunidades de origem marcados por uma experiência que lhes mudou as
vidas e a forma de viver e celebrar a sua fé.
Ponte 2008 em Angola
Taizé no Porto
A onda de paz de Taizé inundou o Porto em tempo de Carnaval 2010. Seis mil
pessoas participaram neste evento marcado pela oração, pelo encontro, pela
alegria, pela vontade de conhecer mais e melhor o que deve marcar um jovem
cristão hoje. Construir um mundo de justiça e paz é um objectivo que passa
pela opção de um estilo de vida mais simples.
Vindos de 25 países, os jovens encontraram no Porto o calor do acolhimento
das famílias, o silêncio para a oração, a partilha das experiências nos
workshops, a riqueza patrimonial e cultural da cidade, a reflexão e o encontro
fraterno nas paróquias e comunidades.
O epicentro do encontro era o Pavilhão Dragão-Caixa, no Porto onde todas as
noites havia o grande momento de Oração, presidida pelo Irmão Alois, prior de
Taizé. Na sua última intervenção, o Prior de Taizé pediu aos jovens que
aprofundassem a fé e fossem ‘missionários do Evangelho na vida quotidiana’.
Sugeriu que tomassem a sério o canto: ‘a alma que anda no amor nem cansa
nem se cansa’.
D. Manuel Clemente quis que os jovens e o ecumenismo tivessem lugar cativo
na agenda da Missão.
Ecumenismo Juvenil em Portugal
‘Reconciliai-vos!’ – foi o grito de S. Paulo que se tornou o lema do XI Fórum
Ecuménico Jovem, realizado no Centro Paroquial do Montijo, a 24 de Outubro
de 2009, com a presença de 150 jovens vindos de todo o país, pertencentes às
Igrejas Católica, Lusitana, Medotista e Presbiteriana.
Cinco workshops permitiram aos jovens reflectir sobre a reconciliação com
Deus, consigo mesmo, com os outros, entre as Igrejas e com a criação. Foi um
tempo forte de partilha, de diálogo, de aprofundar conhecimentos, que os
jovens apreciaram muito.
O ponto alto foi a Celebração Ecuménica de Envio, com a Cruz, a Bíblia e o
Arco-Íris como símbolos de uma reconciliação que é urgente continuar a
construir.
Duas novidades marcam a caminhada ecuménica jovem em Portugal: a
abertura do site www.ecumenismojovem.org e a gravação de um novo CD
ecuménico.
O XII FEJ realiza-se em Viseu a 6 de Novembro 2010.
Testemunho da Marta Vilas Boas
Põe-te a mexer...
Dinâmica: Muro da Missão
Há muros e muros. Uns separam: recordamo-nos do Muro de Berlim, da
Muralha da China e de tantos que dividem as propriedades por esse mundo
além. Há também o Muro das Lamentações onde colocamos as nossas
desgraças. Mas este Muro da Missão é um lugar onde nos expomos. Onde
anunciamos as nossas convicções de cristãos, catequistas e cidadãos do
mundo. Onde mostramos ao mundo caminhos de fé, reconciliação, justiça, paz
e partilha.
Assim, neste ‘muro’ (um grande papel de cenário colado à parede...) cada
um(a) escreva no Muro algo que traduza o seu compromisso missionário
enquanto cristão, catequista e cidadão. Vá lá, escreve o teu compromisso,
grava diante de todos o que aceitas fazer, como cristão e catequista.
Conclusão: Missão Hoje. Como (re)agir?
1. Num Mundo marcado pela violência e pela retaliação: optar pela Paz por
qualquer preço (contra todas as guerras e violações dos direitos humanos).
2. Num Mundo marcado pelo individualismo: optar pela vida de comunidade e
comunhão de bens. A partilha é uma palavra-chave.
3. Num Mundo marcado por algum racismo: optar pela vivência, desde a
formação, em comunidades internacionais.
4. Num Mundo marcado por alguma xenofobia: optar pela defesa e
compromisso em favor dos imigrantes, refugiados, deslocados, exilados.
5. Num Mundo marcado pelo lucro e pelo sucesso: optar pelos excluídos e
pobres.
6. Num Mundo marcado pela construção de trincheiras entre o norte e o sul:
optar por partir e/ou ajudar a partir rumo aos países mais desfavorecidos
(voluntariado missionário).
7. Num Mundo marcado pelo laicismo e secularismo: optar por colocar Deus
acima de tudo e testemunhar a Fé em Jesus Cristo.
8. Num Mundo marcado pela ganância do poder: optar por servir.
9. Num Mundo marcado por um norte rico que explora o sul pobre: optar por
apoiar o desenvolvimento, através de projectos.
10. Num Mundo marcado por gozar a vida: optar por dar a vida pelos outros.
Tony Neves
Braga, 11 Setembro 2010