Bicho-da-Seda (Biologia, Anatomia e Morfologia)

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Bicho-da-Seda (Biologia, Anatomia e Morfologia)
Notas de Aula de ENT 110 – Sericicultura
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BICHO-DA-SEDA
Existem oito espécies de bicho-da-seda criadas com a finalidade de
produzir fios de seda. Uma pertence à família Bombycidae, que é a Bombyx
mori Linnaeus 1758, e as outras, à família Saturniidae, que são Antheraea
pernyi Guerin (bicho-da-seda tasar chinês), Antheraea myllita Drury (bicho-daseda tasar), Antheraea yamamai Guerin (bicho-da-seda tasar japonês),
Antheraea assama Helfer (bicho-da-seda mouga), Atlacus ricini Boisduval
(bicho-da-seda eri), Philosamia ricini Drury (bicho-da-seda eri) e Eriogyma
pyretorum Wood (bicho-da-seda linha de pesca). A mais importante delas é B.
mori L., respondendo por mais de 95% da seda produzida no mundo.
4.1. CLASSIFICAÇÃO DA ESPÉCIE DE Bombyx mori
A. PELA ORIGEM
Japonesa: ovos de cor cinza-arroxeada; casulo branco, alongado e de
tamanho médio; ciclo uni e bivoltino, com quatro ecdises.
Chinesa: ovos esverdeados; lagartas jovens pouco resistentes ao calor, corpo
branco; casulo elíptico ou esférico, branco, amarelo-ouro, ou verde; fibra fina e
comprida; ciclo menor que a japonesa, uni, bi e polivoltino, com até três
ecdises.
Européia: ovos maiores que de outras origens da espécie; lagartas maiores
com manchas no corpo, pouca resistência ao calor; ciclo maior; mais
suscetíveis a doenças pebrina e poliedrose; casulo oval ou alongado, branco
ou rosado; ciclo monovoltino.
Indiana ou Equatorial: ovos brilhantes; lagartas menores, mais resistentes ao
calor, ciclo curto; casulo cônico, pequeno, branco ou esverdeado, pouco teor
de seda; fibra fina; ciclo polivoltino.
Coreana: ciclo da lagarta curto; casulo alongado, branco ou amarelo; univoltino
com três ecdises.
B. PELO VOLTINISMO
Monovoltino (um ciclo anual): ocorre nas regiões frias; ciclo larval mais longo,
maior crescimento do corpo; boa qualidade dos casulos; menor resistência a
doenças e altas temperaturas e umidade.
Bivoltino (dois ciclos anuais): ocorre nas regiões subtropicais; ciclo lagarta
menor; maior resistência ao calor; qualidade inferior dos casulos; mais
utilizada pelos sericicultores.
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Polivoltino (vários ciclos anuais): ocorre nas regiões tropicais; ciclo de lagarta
curto; maior resistência a doenças e calor; casulos pequenos; baixo teor de
seda.
C. PELO NÚMERO DE ECDISES OU DE MUDAS
Três ecdises: ciclo larval mais curto; resistente a doenças; lagartas e casulos
pequenos; fibra mais fina; espécie de origem coreana e chinesa.
Quatro ecdises: mais utilizada pelos criadores; lagartas e casulos médios.
Cinco ecdises: mutação da origem de quatro ecdises; lagarta de ciclo longo;
casulos maiores; fibra mais grossa.
A maioria dos sericicultores brasileiros utiliza híbridos das origens
chinesa e japonesa da espécie Bombyx mori L., de ciclo uni e bivoltino, com
quatro ecdises. Por ser uma espécie domesticada pelo homem há milhares de
anos, ela perdeu suas características selvagens. Seu poder de aderir é fraco,
e a escalada nos substratos fica difícil. Move-se por poucos centímetros,
mesmo que tenha fome, podendo até morrer se o alimento não estiver perto.
Alimenta-se somente de amoreira. A mariposa fêmea perdeu sua capacidade
de voar e o macho voa por poucos centímetros até aproximadamente 2 m, não
conseguindo acasalar se não for colocado junto com as fêmeas.
4.2. MORFOLOGIA E FISIOLOGIA DO BICHO-DA-SEDA
Ovo: O ovo fecundado tem cor amarelo-pálido, passando a amarelo-forte,
alaranjado e cinzento. Sua forma é oval e achatada, medindo
aproximadamente de 1 a 1,3 mm de comprimento; 0,9 a 1,2 mm de largura e
0,5 mm altura. A densidade é de 1,08, sendo mais pesado que a água,
enquanto o não fecundado é mais leve, o que facilita a separação. Cada
grama de ovo contém 1500 a 3300 ovos, dependendo da raça.
Lagarta: A lagarta recém-eclodida é chamada de “formiga”, é preta ou marrom
escura, coberta de pelos (cerdas), que caem em poucos dias. Depois torna-se
cinzenta ou azulada, ficando mais clara com o desenvolvimento, e aparecem
manchas pretas dispersas pelo corpo (Figura 11). Após a eclosão, a lagarta
pesa entre 0,5 a 0,6 mg e quatro semanas depois alcança seu máximo
desenvolvimento larval, pesando 5 a 6 g (10.000 vezes seu peso inicial),
estando pronta para tecer o casulo, transformar-se em pupa e em adulto.
Aparelho Digestivo: divide-se em intestino anterior ou estomodeu, médio
ou mesêntero e posterior ou proctodeu. Da alimentação até a eliminação
do bolo fecal levam de 1 a 1,5 horas nas lagartas jovens e 2 a 3 horas,
nas adultas. As fezes são expelidas em forma de uma estrutura
hexagonal. Apenas 10 a 20% da folha é ingerida por uma lagarta jovem
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e 60 a 70% por uma adulta; entretanto, 45% e 35% do alimento
consumido é aproveitado pelas lagartas jovens e adultas,
respectivamente. Durante o ciclo completo, uma lagarta consome 20 g
de folhas, das quais 85% são ingeridos no último estádio lagarta. Desse
total, 25% são convertidos em seda (Figura 12).
Órgãos de excreção: Os tubos de Malpighi são os principais órgãos de
excreção do bicho-da-seda. Origina-se no centro do intestino posterior,
ramificando-se em dois tubos, um em cada lado do intestino. Estes se
ramificam novamente em 3 tubos cada, que se inserem na parede do
intestino médio. A excreção constitui-se principalmente de ácido úrico,
além de outros elementos como o nitrogênio, fósforo, etc. (Figura 12).
Aparelho respiratório: O sistema de respiração é do tipo traqueal. As
traquéias são pequenos tubos que se ramificam pelo interior do corpo,
agindo na troca gasosa entre oxigênio e gás carbônico. As aberturas
das externas das traquéias são os espiráculos, que além de permitirem
a entrada de ar no corpo do inseto, facilitam a excreção de água durante
o encasulamento (Figura 12).
Aparelho circulatório: O sistema circulatório dos insetos, em geral, é do
tipo aberto, consistindo de um tubo que percorre todo o corpo, levando
alimento para todas as células. A hemolinfa penetra nas válvulas
torácicas situadas na região dorsal e é impulsionada para a região
cefálica, passando pela aorta (Figura 12).
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Figura 11. Morfologia externa do bicho-da-seda (Fonte: FAO, 1990).
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Figura 12. Morfologia interna do bicho-da-seda (Fonte: FAO, 1990).
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Glândulas Sericígenas: As glândulas de seda são labiais, de origem
ectodérmica, cilíndricas e tubulares, situadas do lado ventral do corpo
sobre o mesenterio. Os dois dutos são fechados na extremidade
posterior e se abrem nas fiandeiras, situadas na boca do inseto. Cada
glândula se divide em 3 partes: posterior, onde é secretada a fibroina; a
mediana, onde é secretada a sericina; e a anterior, onde ocorre a junção
da fibroina e sericina para formar o fio de seda, que sai pelas fieiras ou
fiandeiras. Como existem duas glândulas, o fio de seda é formado por
dois filamentos de fibroína, revestidos pela sericina. A seda começa a
a
a
ser secretada a partir da 3 idade; porém, na 5 , a glândula cresce
rapidamente, chegando a pesar 20 a 40% do peso da lagarta no final de
seu desenvolvimento (Figura 13).
Figura 13. Glândula sericígena do bicho-da-seda (Fonte: FAO, 1990).
Pupa ou Crisálida: A pupa ou crisálida do bicho-da-seda é obtécta ou
coberta. Inicialmente a pupa é amarela clara, tornando-se mais escura até o
amarelo forte. Sua forma é ovóide, com a cabeça pequena e os olhos grandes.
Nas pupas fêmeas existe uma fenda longitudinal dividindo o segmento da
extremidade ventral do abdome, enquanto nos machos há um ponto escuro
na margem posterior do mesmo segmento, que serve para diferenciar os
sexos e é importante, durante o acasalamento (Figura 14).
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Figura 14. Pupas do bicho-da-seda (Fonte: FAO, 1990).
Adulto: A emergência da mariposa inicia-se pela manhã com o auxílio de um
liquido alcalino, secretado no intestino, que umedece a casca do casulo,
amolecendo-a e facilitando o seu rompimento para a saída do adulto. A
cabeça da mariposa é pequena, com olhos compostos grandes e antenas
bipectinada. O aparelho bucal é atrofiado e as pernas são robustas; as asas
anteriores são maiores que as posteriores, porém as fêmeas não podem voar.
O abdome da fêmea é mais grosso que o do macho. O corpo e as asas são
cobertos por escama brancas. O acasalamento pode durar de algumas horas
até a um dia, porém bastam 30 minutos a uma hora para que ocorra a
fecundação de todos os ovos. A longevidade do adulto é de 14 a 15 dias para
as fêmeas e 7 a 8 para os machos (Figura 15).
Fêmea
Macho
Figura 15. Adultos do bicho-da-seda (Fonte: Corradello, 1987).
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4.3.
BIOLOGIA DO BICHO-DA-SEDA
Ciclo de vida: Os insetos, em geral, passam por quatro estágios de
desenvolvimento durante seu ciclo vital: ovo, larva, pupa e adulto. Para B.
mori, o ciclo de vida, que corresponde ao desenvolvimento do inseto da fase
de ovo a adulto, pode durar de seis a oito semanas, dependendo da origem e
das condições ambientais (Tabela 5).
Tabela 5. Duração (dias) das fases do bicho-da-seda de ciclo mono e bivoltino
e polivoltino.
Fases
Ovo
Lagarta
Pupa
Adulto
Total
Média
Mínima
9
20
10
3
42
Polivoltino
Máxima
12
24
12
6
54
48
Mono e Bivoltino
Mínima
Máxima
12
14
24
28
12
15
6
10
54
67
60
Em condições naturais, a espécie de ciclo monovoltino dá somente
a
uma geração por ano na primavera, e o ovo, que dará origem à 2 geração,
entra em diapausa, que dura até a primavera seguinte. Nas de ciclo bivoltino, o
a
ovo hibernante é aquele que dará origem à 3 geração. Os ovos polivotinos
praticamente não hibernam, produzindo seis a oito gerações por ano. A fase
de lagarta dura de 20 a 24 dias na espécie de ciclo polivoltino e de 24 a 28
dias, na de ciclo momo e bivoltino (Tabela 6), passando por 3, 4 ou 5 mudas.
No Brasil, as lagartas do bicho-da-seda passam por quatro mudas em 5
ínstares ou idades, sendo as 2 primeiras chamadas de fase jovem e as 3
últimas de fase adulta.
Tabela 6. Duração de cada idade das lagartas do bicho-da-seda.
Duração
(dias)
Alimentação
Muda
a
1
3
1
a
2
2a3
1
Idades
a
3
3
1
a
4
4a5
1
a
5
8 a 10
(pupa)
Total
20 a 24
4
A muda ou troca de tegumento da lagarta do bicho-da-seda ocorre
durante um período de repouso. Neste período a lagarta cessa sua
alimentação e fica imóvel, com a cabeça erguida. Ocorre a formação de uma
nova cutícula mole embaixo da velha, que fica rugosa e descorada, rompendose. A lagarta, então, expande o corpo e endurece a nova cutícula. Não se deve
perturbar as lagartas nesse período para não prejudicar a formação da nova
cutícula.
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9
a
Ao final da 5 idade, quando a lagarta atinge seu maior peso, ela cessa
a sua alimentação e está pronta para subir aos bosques para o
encasulamento. A glândula de seda está bem desenvolvida, ficando visível
através do corpo da lagarta, que se torna transluzente.
A lagarta fica inquieta à procura de um suporte para iniciar a
construção do casulo, que leva aproximadamente três dias para ficar pronto.
Após a construção do casulo, a lagarta inicia a transformação para pupa, que
dura de três a quatro dias (Figura 16).
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