Processos de tratamento e reuso de esgotos – parte 2
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Processos de tratamento e reuso de esgotos – parte 2
Problemas operacionais em lagoas de estabilização Os quadros a seguir mostram um resumo dos principais problemas operacionais que podem surgir em sistemas de lagoas de estabilização, bem como ações de prevenção e recuperação. Quadro 23. Problemas operacionais em lagoas anaeróbias. Odores desagradáveis Causas Prevenção/Recuperação Sobrecarga de esgotos. Se existir uma lagoa facultativa após a lagoa Presença nos anaeróbia recircular o líquido da LF para entrada esgotos. de substâncias tóxicas do esgoto na LA. Queda brusca da temperatura dos esgotos. Quimicamente, pela adição de nitrato de sódio em vários pontos da LA. Adição de cal para elevar o pH e assim cessar a fase de fermentação ácida responsável para produção de H2S. Proliferação de insetos Causas Causas Prevenção/Recuperação Material gradeado ou areia removida não Havendo grade ou caixa de areia junto à lagoa, o dispostos corretamente encaminhados a aterros (enterrados ou material deverá ser enterrado em valas previamente sanitários) ou abertas. mesmo deixados expostos em algum ponto da área externa da lagoa. Os vegetais deverão ser cortados tão logo ocorra Crescimento de vegetais no talude interno o seu aparecimento. Cuidado para que os vegetais da lagoa, na parte em que o nível de água não caiam na massa líquida. está em contato com o talude. A origem de grandes quantidades de Quando ocorrerem moscas junto às LA, é sempre moscas poderá também ser proveniente da conveniente revolver, com o auxílio de um rastelo película da escuma e óleo sempre presente ou jato d’água, a camada de material flutuante que nas cobre as lagoas anaeróbias. lagoas anaeróbias, bem como sua disposição inadequada, quando removida. Crescimento de vegetação Causas Prevenção/Recuperação Manutenção Inadequada. Vegetais aquáticos (crescem no talude interno) remoção total evitando a sua queda na lagoa. Vegetais terrestres (arbustos, ervas, capins etc.), que crescem no talude externo capinar o terreno; aplicar algum produto químico. Obs: outros problemas detectados em lagoas anaeróbias são relacionados ao entupimento das tubulações de entrada e aparecimento de uma camada espessa de escuma. Fonte: Jordão e Pessoa (2005). Guia do profissional em treinamento - ReCESA 1 Quadro 24. Problemas operacionais em lagoas facultativas. Presença de Escuma Causas Prevenção/Recuperação Superflorescimento de algas que chegam a O formar fotossíntese. uma nata esverdeada sobre a bloqueio da A passagem escuma da deverá luz ser prejudica removida a de superfície líquida. imediato pelo uso de um rastelo. Lançamento de material estranho na lagoa. A escuma de algas, se não for destruída ou removida, Placas de lodo desprendidas do fundo. certamente produzirá odores desagradáveis devido à Pouca circulação e atuação do vento. morte das mesmas. A escuma proveniente das placas de lodo que se desprendem do fundo deve ser removida de imediato. Odores desagradáveis Causas Sobrecarga Prevenção/Recuperação de esgotos que causa um Recomenda-se: abaixamento de pH, queda do nível de O2, 1. mudança na cor do efluente de verde para aquela que apresenta o problema deverá ser retirada de amarelado, aparecimento de zonas cinzentas operação até que se recupere, enquanto que se coloca junto à alimentação do afluente. em operação a segunda célula; 2. no caso de existirem duas células facultativas, no caso de existir apenas uma única célula recircular o efluente; 3. havendo aeradores superficiais flutuantes, estes poderiam ser instalados; 4. verificar a possibilidade de expandir o número de tubulações de distribuição do afluente de forma a evitar curtos-circuitos. Presença de substâncias tóxicas no esgoto. Recomenda-se: 1. tentar descobrir a origem do composto causador de toxicidade; 2. colocar uma segunda lagoa em operação paralela, se possível, isolando a primeira lagoa; 3. instalar aeradores superficiais na segunda lagoa que entrou em operação. Formação de caminhos preferenciais Recomenda-se: em caso de entradas múltiplas de afluente associados à má distribuição do afluente pela 1. forma geométrica da lagoa ou à presença de regularizar a sua distribuição uniforme; vegetação aquática no interior da lagoa. 2. em caso de entrada única de esgotos aumentar o número de entradas. Presença de massas flutuantes de algas na superfície líquida. Associadas às más condições atmosféricas. Instalar aeradores próximos à entrada da lagoa. Fonte: Jordão e Pessoa (2005). 2 Guia do profissional em treinamento - ReCESA Debate Você já operou alguma estação que possuía lagoa de estabilização? Caso já tenha, foi verificado algum problema operacional semelhante aos citados anteriormente? Quais foram as medidas tomadas para sanar o problema? Dentre as desvantagens citadas referentes ao uso de lagoas de estabilização para tratamento de esgotos, qual você acredita ser a de maior importância em sua cidade/localidade? Por quê? Compartilhe suas experiências com com os demais participantes da oficina e com o instrutor!!! Exercícios propostos 1. Explique a relação existente entre algas e bactérias para o perfeito funcionamento do sistema de lagoas de estabilização. 2. Liste as principais vantagens e desvantagens das lagoas de estabilização para o seu estado e Nordeste do Brasil. 3. Quais as principais diferenças existentes entre lagoa anaeróbia, facultativa e de maturação? 4. Liste os serviços mais importantes envolvidos na construção de lagoas de estabilização. 5. Descreva os principais problemas operacionais encontrados em lagoas de estabilização, e proponha as devidas soluções. Guia do profissional em treinamento - ReCESA 3 Noções de tratamento aeróbio de esgotos Autores: André Bezerra dos Santos, Sandra Tédde Santaella e Fernando José Araújo da Silva Introdução O tratamento aeróbio é uma etapa normalmente presente em estações de tratamento de esgotos por processos biológicos, já que o tratamento anaeróbio sozinho geralmente não possibilita o enquadramento dos contaminantes dentro dos padrões de descarte. Como o assunto é extremamente amplo, abordam-se no presente capítulo, informações fundamentais sobre as seguintes tecnologias: lagoas aeradas, lodos ativados, filtros biológicos percoladores, biofiltros aerados e wetlands. Dentre as tecnologias listadas, os biofiltros areados e as wetlands, detalhados no presente capítulo, assim como as lagoas de estabilização, detalhadas no capítulo anterior, são as que oferecem o maior potencial de aplicação no Nordeste do Brasil. Lagoas aeradas mecanicamente Em muitos projetos de lagoas de estabilização, a área requerida para implantação de um sistema convencional de lagoas é superior à disponível. Uma alternativa de solução do problema consiste em aumentar a eficiência do processo de estabilização da matéria orgânica, com a subseqüente redução da demanda de área, o que pode ser alcançado com o uso de lagoas com aeração artificial. As duas categorias de Fonte: http://www.saaegarca.com.br/Esgoto2.htm lagoas aeradas são: aerada facultativa e aerada com mistura completa. Figura 49. Vista aérea de uma lagoa de tratamento aerada artificialmente, a jusante de uma lagoa anaeróbia. 4 Guia do profissional em treinamento - ReCESA Lagoa Aerada Facultativa Nas lagoas facultativas aeradas (Figura 50), injeta-se artificialmente oxigênio no sistema pelo uso de aeradores de superfície ou ar comprimido, de tal maneira que haja a oxigenação de apenas uma parte da profundidade útil da lagoa. Nesta zona, a matéria orgânica será decomposta aerobiamente pelos microrganismos ali existentes. A parte da lagoa que não sofre influência da aeração serve para acumular o lodo formado que se sedimenta, sofrendo posterior processo de digestão anaeróbia. Em termos de operação e manutenção são mais complexas quando (2005) Figura 50. Esquema de ETE composta por lagoa aerada facultativa. Fonte: Adaptado de von Sperling comparadas às lagoas facultativas convencionais. Lagoas Aeradas de Mistura Completa Seguidas de Lagoas Lagoas de Decantação Diferente das lagoas aeradas facultativas, nas de mistura completa o grau de mistura e oxigenação, introduzidos no sistema é bem elevado e suficiente para alcançar toda a altura útil da lagoa, sem que haja uma zona de sedimentação. Há um intenso contato dos microrganismos com a massa líquida, colaborando para incremento da remoção de matéria orgânica. Como não há um dispositivo que faça uma separação sólido-líquido, normalmente projeta-se uma lagoa de decantação à jusante. Ela terá a função de separação de sólidos suspensos e sedimentáveis, permitindo a clarificação do efluente. Uma ilustração do sistema de tratamento composto de lagoa aerada de mistura completa seguida de lagoa de decantação é mostrada na Figura Figura 51. Esquema de ETE composta por lagoas aeradas de mistura completa. Guia do profissional em treinamento - ReCESA 5 (2005) Fonte: Adaptado de von Sperling 51. A lagoa de decantação é dimensionada para um tempo de detenção hidráulica (TDH) bem reduzido, em torno de 2 dias. Nela, os sólidos vão para o fundo, onde são armazenados por um período de alguns anos, após o qual são removidos. Há também as lagoas de decantação com remoção contínua do lodo de fundo (VON SPERLING, 2005). LembreLembre-se, sua importante. Caso participação você fazer tenha comentários a abordados, exponhaexponha-os sobre a é muito dúvidas dúvidas os ou assuntos todos os participantes!!! Filtros biológicos percoladores Filtros biológicos percoladores (FBP), também conhecidos como filtros biológicos aeróbios, são sistemas de tratamento de efluentes domésticos e industriais com grande potencial de aplicação, em razão da simplicidade e do baixo custo de operação. Ao contrário do que o nome suscita, estes sistemas não têm o objetivo de remover sólidos por filtração, uma vez que os espaços vazios existentes entre o material de enchimento são grandes para impedir que ocorra retenção de sólidos. O principal objetivo é que o material de enchimento sirva de meio para fixação de microrganismos que utilizarão a matéria orgânica presente no esgoto. Filtros biológicos são tanques preenchidos com material de alta permeabilidade, com área superficial grande e resistente à degradação química, física e biológica. O material que preenche o tanque é chamado de “meio suporte” e ao conjunto de meio suporte dentro do tanque é dado o nome de “leito”. Vários materiais podem ser empregados como meio suporte: pedra, brita, materiais poliméricos, materiais cerâmicos, escória de alto-forno, bambu, casca de coco, espuma de poliuretano, etc. (Figura 52). O esgoto é aplicado sobre o meio suporte e percola até o fundo do tanque de onde é drenado. Sobre o meio suporte é formada uma película, denominada de “biofilme”, composta por microrganismos e polissacarídeos extracelulares. Inicialmente, a matéria orgânica presente no esgoto é adsorvida ao biofilme e é consumida lentamente pelos microrganismos. Para que o metabolismo dos microrganismos seja eficiente, é necessário que haja, no esgoto, outras substâncias que sirvam como fonte de macro e micronutrientes. 6 Guia do profissional em treinamento - ReCESA Os microrganismos presentes nos filtros biológicos percoladores são, em geral, aeróbios e utilizam o oxigênio do ar que circula naturalmente entre o meio suporte. Microrganismos facultativos e anaeróbios também se encontram presentes, mas em (a) (b) com/1996foul.htm Fonte: http://www.jaeger. Fonte: http://www.multivis.nl/ ac.uk/Pages/default.aspx Fonte: http://www.napier. escala muito menor. (c) Figura 52. Material usado como meio suporte em filtros biológicos percoladores: brita (a); material polimérico estruturado (b) e material polimérico anelar (c). Com a aplicação contínua de esgoto no FBP, o biofilme formado (Figura 53) vai crescendo, dificultando a percolação, diminuindo os espaços vazios entre o meio suporte e a difusão de matéria orgânica, nutrientes e oxigênio para o interior do biofilme. Essa continua até um ponto em que há rompimento do biofilme, seja pelas forças de cisalhamento, seja pela morte e desprendimento dos microrganismos na camada mais interna do biofilme. Sendo assim, ocorre naturalmente o controle da massa microbiana dentro dos FBP. O biofilme que é desprendido sai com o esgoto e, nesse momento, a qualidade do esgoto tratado diminui e, por isso, o efluente dos FBP deve ser encaminhado para um decantador secundário como forma de diminuir a quantidade de sólidos at Boulder (2008). Fonte: University of Colorado presentes no efluente final do sistema de tratamento. Figura 53. Biofilme formado em um Filtro biológico percolador. Os FBPs (Figura 54) podem ser circulares ou retangulares, com vários metros de diâmetro ou comprimento, e o esgoto é disposto sobre a superfície através de distribuidores mecânicos móveis. Conforme o distribuidor avança, o esgoto é despejado, por gotejamento ou por jatos, sobre a superfície e percola rapidamente pelo leito do filtro, fazendo com que, imediatamente após a disposição, a área Guia do profissional em treinamento - ReCESA 7 molhada tenha contato com o ar novamente. Eles são classificados de acordo com as cargas orgânica ou hidráulica às quais são submetidos. Desta forma, são conhecidos como FBP de: baixa taxa (Figura 55A), taxa intermediária, alta taxa (Figura 55B), taxa super alta e FBP grosseiro. Os principais parâmetros de projeto de alguns FBP são mostrados na Tabela 1. A Fonte: http://industrial-landscape.com. com/ EducationTours.htm Fonte: http://www.greenwoodmetro. B Figura 54. Filtros biológicos percoladores: (a) acima da superfície, (b) enterrado. Tabela 1. Principais parâmetros de projeto de filtros biológicos percoladores. Taxa Alta taxa Condições operacionais Baixa taxa Meio suporte Pedra Pedra Pedra Taxa de aplicação superficial (m3/m2.dia) 1,0-4,0 3,5-10,0 10,0-40,0 Carga orgânica volumétrica (kgDBO/m3.dia) 0,1-0,4 0,2-0,5 0,5-1,0 Recirculação Mínima Eventual Sempre Moscas Muitas Variável Variável Arraste de biofilme Intermitente Variável Contínuo Profundidade (m) 1,8-2,5 1,8-2,5 0,9-3,0 Remoção de DBO (%) 80-85 50-70 65-80 Nitrificação Intensa Parcial Parcial intermediária Fonte: Adaptado de Chernicharo (2001). 8 Guia do profissional em treinamento - ReCESA Fonte: Chernicharo (2001). A Fonte: Chernicharo (2001). B Figura 55. Filtro biológico percolador de baixa (A) e alta (B) taxa. Lodos ativados Amplamente utilizado, em nível mundial, para o tratamento de águas residuárias domésticas e industriais, quando se deseja elevada qualidade do efluente e há problemas de disponibilidade de área, situação comum para grandes vazões e ETEs situadas próximas a aglomerados urbanos, ou ainda em países de clima temperado, onde outros processos biológicos como os de lagoas de estabilização ou tratamento anaeróbio não apresentam boas eficiências de remoção. O sistema de lodos ativados possui custos de implantação, operação e manutenção elevados, comparado a outros processos de tratamento, o que o inviabiliza como alternativa de tratamento, principalmente no Nordeste do Brasil. Ademais, são sistemas que produzem grande quantidade de lodo, o qual necessita de tratamento. Um sistema de lodos ativados pode ser classificado de diversas formas, conforme mostrado no Quadro 25. Os itens mostrados na Figura 56 são partes integrantes e a essência de qualquer sistema de lodos ativados de fluxo contínuo. Guia do profissional em treinamento - ReCESA 9 Quadro 25. Classificação dos sistemas de lodos ativados. Idade do lodo Fluxo Objetivos Objetivos do tratamento • Lodos ativados convencional • Contínuo • Remoção de carbono (DBO) • Aeração prolongada • Intermitente • Remoção (batelada) de carbono e nutrientes (N e/ou P) Fonte: Adaptado de von Sperling (2005) IDADE DO LODO A Idade do Lodo corresponde ao tempo médio que uma partícula de lodo permanece no sistema. O seu valor numérico pode ser estimado através do quociente entre o volume de lodo contido no tanque de aeração e a vazão de retirada de lodo em excesso do sistema. Tratamento preliminar Decantador primário (lodos ativados convencional) Tanque de oxidação ou reator aerado (todas as modalidades) Decantador secundário ou flotador ou membranas e recirculação de parte do lodo para o tanque de oxidação Função do espaço nas Retirada do efluente clarificado diversas unidades Retirada de lodo excedente Figura 56. Itens que compõem um sistema de lodos ativados de fluxo contínuo. Lodos ativados convencional (fluxo contínuo) Na modalidade convencional, depois do tratamento preliminar, onde se removem principalmente materiais grosseiros e areia, o esgoto segue para o decantador primário, que retira parte dos sólidos em suspensão presentes que possuam capacidade de sedimentação, formando assim um resíduo conhecido como lodo primário (JORDÃO e PESSÔA, 2005). O esgoto que sai do decantador primário segue para o reator biológico, conhecido também como tanque de aeração. Devido ao fornecimento de condições ambientais favoráveis às atividades metabólicas dos microrganismos, tais como suprimento de oxigênio, nutrientes, controle de pH, mistura, e elevadas concentrações de 10 Guia do profissional em treinamento - ReCESA microrganismos em suspensão, consegue-se elevadas taxas de remoção de matéria orgânica, e alguma remoção de nutrientes (principalmente por assimilação microbiana e volatilização) (METCALF e EDDY, 2003). Após o reator biológico, o esgoto misturado aos microrganismos presentes, se dirigem ao decantador secundário (ou a um flotador), para separação dos sólidos. Com isso, o efluente final sai com baixa concentração de sólidos, o qual é encaminhado para uma posterior desinfecção (normalmente cloração). Parte do lodo formado no decantador secundário é recirculado para o tanque de aeração, de forma a manter uma elevada concentração de biomassa no mesmo, sendo este fator o responsável pela elevada eficiência do sistema. O lodo que não retorna ao tanque de aeração (lodo excedente) é tratado juntamente com o lodo formado no decantador primário, usualmente compreendendo adensamento, digestão e desidratação. Na Figura 57, a parte de cima corresponde ao tratamento da fase líquida (esgoto), ao passo que a parte de baixo exemplifica as etapas envolvidas no tratamento da fase sólida (lodo). A idade do lodo é usualmente da ordem de 4 a 10 dias, a relação A/M (alimento/microrganismos) está na faixa de 0,25 a 0,50 kgDBO5/kgSSVTA.dia, e o TDH da ordem de 6 a 8 horas (VON SPERLING, 2005). Com esta idade do lodo, a biomassa retirada do sistema no lodo excedente não se encontra estabilizada, requerendo, portanto uma etapa de estabilização, que ocorre normalmente nos digestores (primário e secundário). De forma a reduzir o volume dos digestores, o lodo é previamente submetido a uma etapa de adensamento, operação que consiste Fonte: Adaptado de von Sperling (2005) na retirada de parte da umidade para diminuir o volume de lodo a ser tratado. Figura 57. Fluxograma de uma ETE de lodos ativados convencional. Guia do profissional em treinamento - ReCESA 11 Fonte: http://www.samaemogiguacu.com.br/ete.htm Figura 58. Processo de tratamento por lodos ativados, na modalidade convencional. Lodos ativados por Aeração prolongada (fluxo contínuo) Diferencia-se da modalidade convencional pelo maior tempo de aeração, com idades de lodo da ordem de 18 a 30 dias, mas recebendo a mesma carga de DBO do esgoto bruto (VON SPERLING, 2005). Tanto a quantidade de biomassa (kgSSVTA) quanto o volume do reator biológico são maiores, sendo o TDH na faixa de 16 a 24 horas. Devido à condição de carência de alimento imposta pelo sistema, ou seja, pela baixa relação A/M, as bactérias passam a utilizar o próprio carbono das suas células para a realização de seus processos metabólicos, conhecida como respiração endógena. Com isso, a biomassa é estabilizada aerobiamente no próprio tanque de aeração. Não são projetados decantadores primários em sistemas de aeração prolongada (Figura 59), no intuito de se evitar a geração de alguma outra forma de lodo, que venha a requerer posterior estabilização, já que o lodo do reator biológico já se encontra estabilizado. Além da eliminação dos decantadores primários, eliminam-se Fonte: Adaptado de von Sperling (2005) as unidades de digestão de lodo. Figura 59. Fluxograma de uma ETE de lodos ativados por aeração prolongada. 12 Guia do profissional em treinamento - ReCESA Lodos ativados de Fluxo intermitente intermitente (batelada) Esse sistema consiste na incorporação de todas as unidades, processos e operações, normalmente associados ao tratamento tradicional de lodos ativados: decantação primária, oxidação biológica e decantação secundária, em um único tanque, sendo função apenas de tempos operacionais pré-estabelecidos (Figura 60) (VON SPERLING, 2005). A duração usual de cada ciclo pode ser alterada em função das variações da carga afluente, dos objetivos operacionais do tratamento e das características do esgoto e da biomassa no sistema. Um fluxograma de uma ETE de lodos ativados em batelada é mostrada na Figura 61. Enchimento (entrada de esgoto bruto, decantado ou anaeróbio no reator) Reação (aeração e/ou mistura da massa líquida contida no reator) Sedimentação (sedimentação e separação dos sólidos em suspensão do esgoto tratado) Função do tempo para as Descarte do efluente tratado (retirada do esgoto tratado do diversas operações reator) Repouso (ajuste de ciclos e remoção do lodo excedente) Figura 60. Ciclos do processo de operação intermitente ou em batelada. O processo de lodos ativados em batelada pode ser projetado nas modalidades convencional e aeração prolongada, em função dos ajustes nos tempos de aeração, interferindo também na qualidade do lodo formado. As ETEs com esse tipo de tecnologia normalmente possuem vários reatores, cujos ciclos de operação são diferentes, ou seja, enquanto um reator está na fase de oxidação, o outro está enchendo, e assim, por diante. A Tabela 2 traz as principais características dos Fonte: Adaptado de von Sperling (2005) sistemas de lodos ativados usados no tratamento de esgotos sanitários. Figura 61. Fluxograma de uma ETE de lodos ativados em batelada. Guia do profissional em treinamento - ReCESA 13 Tabela 2. Principais características dos sistemas de lodos ativados usados no tratamento de esgotos sanitários. Item geral Item específico Idade do lodo Idade do lodo (dias) Modalidade Convencional 4-10 18-30 0,25-0,50 0,07-0,15 DBO (%) 85-95 93-98 DQO (%) 85-90 90-95 Sólidos em suspensão (%) 85-95 85-95 Relação Relação A/M A/M (kgDBO/kgSSVTA.dia) Eficiência de remoção Aer. prolongada Amônia (%) 85-95 90-95 Nitrogênio (%) 25-30 15-25 Fósforo (%) 25-30 10-20 Coliformes (%) 60-90 70-95 Área Requerida Área 0,2-0,3 0,25-0,35 Volume Total Volume (m3/hab) 0,10-0,15 0,10-0,15 Potência instalada (W/hab) 2,5-4,5 3,5-5,5 18-26 20-35 A ser tratado (L lodo/hab.dia) 3,5-8,0 3,5-5,5 A ser disposto (L lodo/hab.dia) 0,10-0,25 0,10-0,25 A ser tratado (g ST/hab.dia) 60-80 40-45 A ser disposto (g ST/hab.dia) 30-45 40-45 Energia (m2/hab) Consumo energético (kWh/hab.ano) Volume de lodo Massa de lodo Custos Implantação (R$/hab) 100-160 90-120 Operação (R$/hab.ano) 10-20 10-20 1 US$ = R$ 2,70 (2º semestre de 2004). Área total da ETE Fonte: von Sperling (2005). Banhados artificiais ou wetlands Banhados artificiais, alagados artificiais, terras úmidas construídas são denominações das constructed wetlands. Esta tecnologia faz parte dos sistemas naturais de tratamento de esgotos, com mimetização do ambiente dos alagados naturais, que envolve um rico complexo de plantas e microbiota. As espécies vegetais devem ser morfologicamente adaptadas para se desenvolverem em ambientes inundados, com volumes de espaços internos existentes nas folhas e capazes de transportar oxigênio para o sistema radicular (EPA, 2000; WEF, 2001). Parte do oxigênio pode sair também do sistema radicular para a área em torno da rizosfera da planta, criando condições de oxidação no sedimento, possibilitando a decomposição da matéria orgânica, bem como remoção de nutrientes (por oxidação biológica, assimilação e absorção). Anoxia e anaerobiose também estão presentes. A carga orgânica aplicada ao sistema e a profundidade do leito suporte determinarão uma maior ou menor ocorrência de destas condições. 14 Guia do profissional em treinamento - ReCESA Os banhados podem ser de fluxo hidráulico superficial (Figura 62) ou sub-superficial (Figura 63). Este último tem como vantagem a não proliferação de mosquitos, sendo, Fonte: Adaptado de EPA (2000) portanto, mas adequados ao Nordeste brasileiro. Fonte: Adaptado de EPA (2000) Figura 62. Banhado artificial com fluxo superficial. Figura 63. Banhado artificial com fluxo sub-superficial. Mecanismos de remoção de poluentes em banhados artificiais Em sistemas de banhados artificiais, os poluentes são removidos através de uma variedade complexa de processos físicos, químicos e biológicos. O Quadro 26 traz uma compilação dos principais mecanismos atuantes em terras úmidas para remoção de poluentes e contaminantes. Quadro 26. Mecanismos de remoção de poluentes em banhados artificiais. Mecanismo Contaminante Descrição P – Sólidos sedimentáveis Ação da gravidade Físico Sedimentação S – Colóides I – DBO, nitrogênio, fósforo, Guia do profissional em treinamento - ReCESA 15 metais pesados, orgânico material refratário e patogênicos Filtração Adsorção S – sólidos sedimentáveis e colóides S – colóides Ação do meio físico inerte Atração entre partículas (van der Waals) Químico Formação Precipitação P – fósforo, metais pesados Adsorção P – fósforo, metais pesados Decomposição P – material orgânico refratário de co-precipitação com compostos insolúveis Adsorção no substrato e superfícies de plantas Decomposição ou alteração de compostos menos estáveis por irradiação UV, oxidação e redução Biológico Remoção de sólidos coloidais e orgânicos solúveis Metabolismo microbiano P – matéria orgânica, nutrientes e patogênicos por bênticas bactérias e perifíticas. Nitrificação/desnitrificação Oxidação de metais suspensas, bacteriana. mediada por superior ou microrganismos. Metabolismo plantas a Decaimento natural de S – Orgânicos refratários e patogênicos Absorção biológica microbiana. Predação e/ou produção de compostos tóxicos aos patogênicos Decaimento natural ou organismos em P – patogênicos um meio desfavorável P: efeito primário; S: efeito secundário; I: efeito incidental (efeito ocorrendo incidentalmente pela remoção de outro componente). a Metabolismo inclui tanto reações de biossíntese como reações catabólicas. Fonte: Adaptado de Polprasert (1996), EPA (2000) e WEF (2001). Performance de banhados artificiais Os banhados artificiais são mais apropriados como pós-tratamento capaz de garantir nível secundário, porém, com remoção apenas razoável de nutrientes. É recomendável pelo menos a sedimentação do efluente bruto antes da construção do banhado (WEF, 2001). Há várias alternativas para tratamento primário de efluentes para compor uma configuração híbrida com banhados artificiais. Para as condições climáticas vigentes na maior parte do Brasil (temperatura média elevada e disponibilidade de luz solar), é mais apropriado o emprego de tecnologias de baixo custo que já foram demonstradas eficientes como os reatores anaeróbios. É possível dimensionar banhados artificiais para receberem esgoto bruto, porém com a exigência de uma área bem maior do que para uma unidade de póstratamento. A construção de unidades em série (tal como se faz com lagoas de estabilização) ou com fluxo empistonado, utilizando chicanas é uma alternativa, em princípio, mais eficiente. Tal configuração objetiva diminuir a dispersão hidráulica, 16 Guia do profissional em treinamento - ReCESA criando ecossistemas diferentes, elevando assim a capacidade do sistema na remoção de poluentes e contaminantes (EPA, 2000). A Tabela 3 apresenta a eficiência de banhados artificiais no tratamento de esgotos domésticos. Cabe destacar que banhados também possuem a capacidade de remoção de metais pesados, compostos orgânicos sintéticos (tóxicos e/ou recalcitrantes) e patogênicos específicos (enterovírus e protozoários) (EPA, 2000). Tabela 3. Eficiência média esperada com banhado artificial de fluxo sub-superficial. Eficiência de remoção (%) DBO 52 - 90 1 Sólidos Nitrogênio Fósforo Coliformes suspensos total total termotolerantes1 60 50 40 1-3 – unidades de Log. Fonte: http://www.uvm.edu/~cwrc/wetland%20overview.JPG Fonte: Compilado de EPA (2000); WEF (2001). Figura 64. Wetlands utilizados no tratamento de efluentes. Guia do profissional em treinamento - ReCESA 17 Dinâmica de grupo Divida a turma em 3 grupos: 1º grupo – Vocês são gestores de um hospital e sofrem com a impossibilidade de destinar seus efluentes na rede pública de esgotamento sanitário. Além de uma carga orgânica considerável, o efluente apresenta quantidade muito elevada de patógenos, necessitando, portanto, de uma unidade de desinfecção. Há uma pequena área disponível no terreno do hospital para execução de estação de tratamento de efluentes. Além disso, através de um levantamento com uma empresa de consultoria, verificou-se que o hospital pode bancar os recursos necessários a uma tecnologia mais avançada de tratamento. 2º grupo – Vocês são assessores técnicos do gestor de um município do interior do seu estado. O município já dispõe de rede de abastecimento de água, entretanto não apresenta rede coletora nem estação de tratamento de esgoto sanitário. Através de uma análise do Plano Diretor, verificou-se a existência de grandes áreas desocupadas nas regiões periféricas da cidade, onde ainda não há um uso específico previsto. Recentemente, o município teve acesso a recursos do PAC Saneamento e o prefeito decidiu implementar a rede e o tratamento de esgotos na cidade. Como o município é pobre, deve-se buscar uma solução que não demande muitos gastos com operação e manutenção. 3º grupo – Vocês são empregados da Empresa Estadual de Água e Esgoto e estão se deparando com alguns problemas referentes ao tratamento de esgotos dentro de condomínios localizados distantes da rede de esgotamento sanitário. As unidades de tratamento disponíveis nesses condomínios (tanques Imhoff) proporcionam uma redução de carga orgânica da ordem de 30%, descartando o efluente em seguida no corpo receptor. Estudos de autodepuração do corpo receptor demonstraram que, para garantia da sua qualidade, a eficiência mínima de remoção de DBO no tratamento deveria ser da ordem de 60%. Não há recursos disponíveis para instalação de uma estação de tratamento aerada mecanicamente e a área disponível é apenas o terreno onde já estão instalados os tanques Imhoff. 4º grupo – Vocês são gestores de um município que já dispõe de uma unidade de tratamento por digestores anaeróbios de fluxo ascendente seguidos de uma lagoa de estabilização facultativa. Foi verificado que a carga orgânica afluente à lagoa já superou a carga estipulada em projeto, o que vem provocando queda significativa da eficiência do tratamento. O município é bem estruturado em relação à mão-de-obra e disponibilidade de recursos; entretanto, verificou-se que não há mais áreas disponíveis para o projeto de outra lagoa. A baixa eficiência do sistema vem causando prejuízos na qualidade do corpo receptor, e necessita de uma solução rápida. 18 Guia do profissional em treinamento - ReCESA Baseados na sua própria experiência e nos processos e tecnologias de tratamento apresentados ao longo do curso, cada grupo deverá discutir entre seus membros e escolher a alternativa de tratamento de seus efluentes mais adequada à situação apresentada. Em seguida, cada grupo explicará o motivo de sua escolha, discutindo com o instrutor e com os outros grupos. Compartilhe suas experiências com os demais participantes da oficina e com o instrutor!!! Exercícios propostos 1. Liste os principais processos aeróbios de tratamento de esgotos. Quais os sistemas aeróbios mais empregados na sua cidade? 2. Quais as principais diferenças existentes entre os sistemas lagoa aerada facultativa e lagoa aerada de mistura completa seguida de lagoa de decantação? 3. O que consiste o processo aeróbio de lodos ativados e como o mesmo pode ser classificado? 4. Quais as partes componentes dos sistemas de lodos ativados convencional e por aeração prolongada? 5. Qual a finalidade do meio suporte utilizado nos filtros biológicos? 6. O que são banhados artificiais? Como se dá a remoção de poluentes nesses sistemas? Guia do profissional em treinamento - ReCESA 19 Manejo e reuso de águas servidas Autores: Suetônio Mota e André Bezerra dos Santos Introdução O aproveitamento de resíduos, sólidos ou líquidos, tem se constituído numa prática cada vez mais adotada, a qual deve ser incentivada e ampliada. Muito mais do que o lucro financeiro, devem ser considerados, com a prática de aproveitamento de resíduos, os benefícios ambientais proporcionados pela diminuição da utilização dos recursos naturais e a redução da poluição causada pela sua destinação, contribuindo, assim, para a conservação ambiental, observando os princípios do desenvolvimento sustentável (MOTA, 2006a). O aproveitamento de esgotos sanitários pode ser feito de diversas maneiras: reuso da água que se transformou em esgoto; utilização da urina; uso do biossólido (lodo de esgoto que foi submetido a algum tratamento). A Figura 65 indica as formas de aproveitamento do esgoto sanitário. Esgoto Sanitário Água Residuária Reúso da Água Urina Uso da Urina Lodo Uso do Biossólido Figura 65. Formas de aproveitamento de esgotos sanitários. As águas residuárias podem ser classificadas em: águas negras, compostas pelo líquido efluente das instalações sanitárias, incluindo as privadas; águas cinzas, provenientes de pias, lavanderias, ralos e chuveiros; águas amarelas, constituídas da urina humana. Há ainda a parcela composta pelo lodo do esgoto. Essas diversas formas de resíduos presentes nos esgotos sanitários podem ser aproveitadas de várias maneiras, como mostrado a seguir. 20 Guia do profissional em treinamento - ReCESA Reuso de águas As águas residuárias domésticas tratadas podem ser aproveitadas em diversos usos: irrigação de culturas, de áreas de parques e de campos esportivos; uso industrial; dessedentação de animais; uso recreacional; aqüicultura; usos domésticos (jardinagem, lavagem de veículos e de pisos, refrigeração, descarga de vasos sanitários); recarga de aqüíferos subterrâneos; manutenção de vazões mínimas em cursos d’água; usos urbanos (irrigação de áreas verdes, lavagem de ruas, combate a incêndios), dentre outros. O reuso de água pode ser feito de forma direta e indireta. Ele é considerado direto quando os efluentes, após devidamente tratados, são encaminhados diretamente de seu ponto de descarga até o local do reuso, que pode ser interno (reciclagem) ou externo ao local onde são produzidos (Figura 66). Irrigação Aqüicultura Esgotos Tratamento Usos Industriais Usos Urbanos Recarga de Aqüíferos Figura 66. Reuso direto de água. O reuso indireto pode ser feito de forma planejada ou não. Diz-se que o reuso indireto é planejado quando os efluentes, depois de convenientemente tratados, são descarregados de maneira planejada nos corpos d’água superficiais ou subterrâneos, para serem utilizados a jusante em sua forma diluída e de maneira controlada, em algum uso benéfico (Figura 67). O reuso indireto não planejado ocorre quando a água, já utilizada uma ou mais vezes em alguma atividade humana, é descarregada no meio ambiente e novamente utilizada, em sua forma diluída, de maneira não intencional e não controlada (BREGA FILHO e MANCUSO, 2003). Guia do profissional em treinamento - ReCESA 21 Esgotos Tratamento Recurso Hídrico Captação de Água Aproveitamentos: - Irrigação - Piscicultura - Usos industriais - Usos urbanos - Abastecimento animal - Outros usos Figura 67. Reuso indireto planejado de água. O uso de esgotos tratados é uma prática indicada para regiões áridas e semi-áridas, ou mesmo para locais onde há carência de água, apresentando as seguintes vantagens, vantagens segundo Mota (2006b): Aumento da oferta de água. Suprimento de água durante todo o ano, uma vez que constantemente são produzidos esgotos. Possibilidade de se utilizar a água disponível para fins onde há necessidade de melhor qualidade, como o abastecimento humano. Evita-se o lançamento de efluentes em cursos de água com vazões pequenas ou nulas, reduzindo-se os riscos de poluição. Aproveitamento dos nutrientes existentes no esgoto, diminuindo, ou mesmo eliminando, o uso de fertilizantes artificiais. Adição da matéria orgânica contida no esgoto, ao solo, contribuindo para a conservação do mesmo e a prevenção da erosão. 22 Contribuição para o aumento da produção de alimentos, quando usado em irrigação ou piscicultura, resultando em benefícios econômicos e sociais. Aumento das áreas verdes, de parques e de campos de esporte. Guia do profissional em treinamento - ReCESA Ainda de acordo com Mota (2006b), podem ser enumeradas como desvantagens do reuso de águas: A rejeição da população a essa prática, por desconhecimento de que é possível Riscos de contaminação ambiental. Riscos de transmissão de doenças aos trabalhadores e aos consumidores de utilizá-la com segurança ou devido a resistências de natureza cultural. produtos gerados a partir de águas de reuso. Possibilidade de alterações nas características do solo como conseqüência do reuso em irrigação, podendo-se citar como exemplo a salinização do solo. Possíveis danos às culturas, devido à presença de alguns compostos nas águas de reuso usadas em irrigação. As vantagens do aproveitamento de esgotos tratados justificam a sua utilização, contribuindo para minimizar o problema da escassez e má distribuição da água, como se verifica em regiões semi-áridas. Os esgotos tratados devem ser considerados como um recurso a ser aproveitado (e não um resíduo líquido), devendo a sua utilização integrar uma política de gestão dos recursos hídricos de uma bacia hidrográfica, constituindo, além de outros benefícios, uma alternativa para o aumento da disponibilidade de água e uma medida efetiva de controle de poluição. Entretanto, a utilização de esgotos tratados deve ser acompanhada de medidas visando evitar ou reduzir as suas conseqüências negativas, podendo-se citar, entre as mesmas: tratamento adequado do esgoto, em função da qualidade desejada para o efluente, a qual dependerá do tipo de uso; no caso de reuso em irrigação, escolha de método que provoque o menor risco de contaminação ambiental; proteção dos trabalhadores; conscientização da população sobre as vantagens do reuso e das medidas de controle a serem adotadas, etc. O Quadro 27 apresenta uma matriz para análise de projetos de utilização de esgotos, onde são considerados os aspectos técnicos, legais, políticos, sociais, econômicos e operacionais. Guia do profissional em treinamento - ReCESA 23 Quadro 27. Matriz para análise de projetos de utilização de esgotos Natureza do problema • Quais os volumes de esgotos produzidos e qual é a distribuição sazonal? • Onde os esgotos serão produzidos? • Quais são as características dos esgotos que serão produzidos? • Quais são as alternativas de disposição possíveis? Viabilidade legal • Que usos se pode fazer dos esgotos, de acordo com a legislação existente, se disponível? • Se não existem legislações estaduais ou federais, que usos se pode fazer dos esgotos dentro das diretrizes da Organização Mundial da Saúde (OMS) e da Organização para Alimentos e Agricultura (FAO)? • Quais são os direitos dos usuários dos recursos hídricos e como esses poderiam vir a ser afetados pelo reuso? Viabilidade Técnica • A qualidade dos esgotos tratados disponíveis é adequada para irrigação restrita ou irrestrita? • Quanto de terra está disponível ou é necessária para os projetos de irrigação? • Quais são as características do solo nesta terra? • Quais são as práticas de uso da terra? Elas podem ser modificadas? • Que tipos de culturas podem ser consideradas? • A demanda de água pelas culturas é compatível com a variação sazonal dos esgotos disponíveis? • Que técnicas de irrigação serão utilizadas? • Se a possibilidade de recarga de aqüíferos é uma das possibilidades para o uso dos esgotos, as características hidrogeológicas são adequadas? • Qual seria o impacto dessa recarga na qualidade das águas subterrâneas? • Existem problemas adicionais de saúde ou de meio ambiente, que necessitam ser considerados? Viabilidade política e social • Quais foram, no passado, as reações políticas a problemas de saúde e ambientais que, eventualmente tenham ocorrido em possível conexão com o uso de esgotos? • Qual é a percepção pública da prática do uso de esgotos? • Qual é a atitude de grupos de influência em áreas onde esgotos têm possibilidade de serem utilizados? • Quais são os benefícios potenciais do reuso para a comunidade? • Quais são os riscos potenciais? Viabilidade econômica • Quais são os custos de capital envolvidos? • Quais são os custos de operação e manutenção? • Qual é o valor da taxa de retorno? • Quais são os custos de implantação dos sistemas de agricultura irrigada com esgotos, isto é, custos de transporte de água para a área de plantio, instalação de equipamentos de rrigação, infraestrutura, etc? • Quais são os benefícios do sistema de irrigação com esgotos? • Qual é a relação custo/benefício do projeto de irrigação com esgotos? Viabilidade operacional • São os recursos humanos e a capacidade operacional locais adequados para as atividades de operação e manutenção dos sistemas de tratamento, irrigação, recarga de aqüíferos, operação agrícola e controle de aspectos de saúde e meio ambiente? • Caso contrário, quais são os programas de treinamento que devem ser implementados? Fonte: Biswas (1988) apud Hespanhol (2003). 24 Guia do profissional em treinamento - ReCESA Como exemplos de reuso planejado de água citam-se experiências da Sabesp – Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp, 2008). Várias prefeituras da Região Metropolitana de São Paulo (RMSP) – São Paulo, Barueri, São Caetano do Sul, Carapicuíba, Diadema e Santo André – utilizam esgoto tratado para fins não-potáveis, tais como limpeza pública e rega de jardins, entre outros serviços. Ao invés de utilizar água tratada para esses serviços de limpeza pública, caminhões, devidamente identificados e preparados (Figura 68), buscam água de reuso nas estações da Sabesp de Barueri, Parque Novo Mundo e São Miguel Paulista. Com isso, todos os meses, são aproveitados 34 milhões de litros de água nessas práticas, porém, com custos bastante reduzidos. Figura 68. Caminhão para distribuição de água de reuso. Sabesp, São Paulo. A Sabesp e as empresas do Pólo Petroquímico de Capuava assinaram termo de cooperação que vai impulsionar a criação do maior projeto de fornecimento de água de reuso do país. Denominado Aquapolo Ambiental, essa iniciativa prevê o fornecimento de água de reuso da Estação de Tratamento de Esgotos da Sabesp no ABC (ETE ABC) para as empresas do complexo, localizado entre os municípios de Santo André e Mauá. Por essa parceria, a água captada será transportada por meio de um duto de aço carbono e 16,5 km de extensão até o Pólo. Para isso, será construída uma estação elevatória na Estação de Tratamento de Esgotos ABC da Sabesp. Trata-se de um conjunto duplo de bombas, com capacidade total para 600 litros por segundo – podendo chegar a um potencial de até 1.000 litros por segundo, suprindo as necessidades atuais e de outras empresas interessadas. A água de reuso fornecida pela Sabesp, após tratamento complementar, será utilizada nos processos das plantas petroquímicas, como torres de resfriamento e sistemas de água de caldeiras. Uma prática de reuso bastante utilizada no mundo é a irrigação com esgoto tratado. No Brasil, isso tem sido feito, principalmente, de forma não planejada. No entanto, vários grupos de pesquisa vêm desenvolvendo trabalhos sobre reuso em irrigação, como parte do Prosab – Programa de Pesquisa em Saneamento Básico. Guia do profissional em treinamento - ReCESA 25 A Figura 69 mostra um plantio de feijão irrigado com esgoto doméstico tratado em área de pesquisa da Universidade Federal de Pernambuco, enquanto a Figura 70 apresenta o cultivo hidropônico de flores (Zínia) na Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Figura 69. Cultivo de feijão com esgoto tratado. UFPE / Prosab Figura 70. Cultivo hidropônico com esgoto tratado. UFRN / Prosab A utilização de esgotos sanitários constitui uma possibilidade de expansão das áreas irrigadas, de alívio sobre a demanda de água, de minimização de fontes de contaminação dos corpos receptores e de redução de custos de produção, haja vista o elevado conteúdo de nutrientes presentes nos esgotos (BASTOS et al., 2003a). Souza (2006), comparando o desenvolvimento de mamoneiras irrigadas com água e com esgoto, em quatro diferentes tipos de tratamento, encontrou os resultados constantes da Tabela 4. Na Figura 71 apresenta-se o cultivo de mamona irrigada com esgoto doméstico tratado. 26 Guia do profissional em treinamento - ReCESA Tabela 4. Valores médios das variáveis produção (PD), peso de 100 sementes (P100S) e números de frutos (NF) da mamoneira, para diferentes tratamentos. Aquiraz, CE. 2005.. Tratamento Médias PD P100S NF 1 955,05a 67,30a 250,50a 2 2073,87c 63,10a 604,50b 3 1224,20b 64,62a 349,75a 4 1220,17b 61,92a 344,75a Nas colunas, médias seguidas de mesma letra não diferem entre si ao nível de 5%, pelo teste de Tukey. Esgoto utilizado: efluente de estação de tratamento composta de quatro lagoas de estabilização em série. Tratamentos: T1 - água de poço mais adubação recomendada; T2 - efluente mais adubação recomendada; T3 – efluente; T4 - efluente mais a metade da adubação recomendada. Fonte: Souza (2006). Figura 71. Mamona irrigada com esgoto doméstico tratado. Aquiraz, Ceará. Os resultados mostram que os nutrientes presentes no esgoto tratado contribuíram para o desenvolvimento das culturas. Observa-se, para todas as variáveis analisadas, que os tratamentos com utilização de efluentes apresentaram os maiores rendimentos de produção da mamona, quando comparados com o controle irrigado com água de poço. O tratamento com efluente e adubação recomendada pela análise do solo, superou os demais tratamentos em todos os componentes de produção estudados. Como citado anteriormente, o esgoto também pode ser reutilizado no cultivo de peixes, em que o esgoto sanitário constitui fonte alternativa de produção de proteína a baixo custo, além de funcionar como uma forma de reciclagem de nutrientes (BASTOS et al., 2003b). Santos (2007) mostrou que é possível criar peixes em tanques com esgoto, obtendose uma produtividade do pescado (tilápia do Nilo) maior do que a obtida no viveiro abastecido com água de poço (controle). Além disso, os peixes mostraram-se possuir uma qualidade microbiológica satisfatória para o consumo tanto em termos Guia do profissional em treinamento - ReCESA 27 de patogênicos contidos nos músculos, pele e brânquias (Tabela 5), quanto em relação aos níveis de metais pesados acumulados. Tabela 5. Resultados das análises microbiológicas realizadas nas tilápia do Nilo cultivadas nos viveiros experimentais VE-1, VE-2 e VE-3. Microrganismo Microrganismo Pesquisado Estafilococus Coliformes Padrão Repetição Microbiológico Músculo VE-1 VE-2 VE-3 Termotolerantes coagulase Salmonella spp positive 45°C* (Ausência/25g) UFC/g) 2,0 x 10² Ausência <10 (10³ Condições Sanitárias Satisfatória Pele 1,1 x 10³ Ausência <10 Satisfatória Brânquias 2,0 x 10² Ausência <10 Satisfatória Músculo 17 x 10³ Ausência <10 Satisfatória Pele 1,4 x 10³ Ausência <10 Satisfatória Brânquias 2,2 x 10³ Ausência <10 Satisfatória Músculo 6,8 x 10² Ausência <10 Satisfatória Pele 1,1 x 10² Ausência <10 Satisfatória Brânquias 9,2 x 10² Ausência <10 Satisfatória * Não existe valor de referência na legislação vigente. Fonte: Santos (2007). Os esgotos provenientes de pias, lavanderias, ralos e chuveiros – denominados de “águas cinzas” -, após serem tratados, podem ser acumulados em um reservatório separado da edificação e destinar-se às descargas de aparelhos sanitários, irrigação de jardins, lavagem de pisos e outros usos. Com isso, podem ser economizados de 30 a 35% da água usada no prédio, deixando-se de utilizar para esse fim água potável, a qual é escassa e de custo elevado. De acordo com Hespanhol (2003), os custos elevados da água industrial, associados às demandas crescentes, têm levado as indústrias a avaliar as possibilidades internas de reuso e a considerar ofertas das companhias de saneamento para a compra de efluentes tratados, a preços inferiores aos da água potável dos sistemas públicos de abastecimento. A “água de utilidade” produzida em tratamentos de efluentes secundários e distribuída por adutoras que servem a um agrupamento significativo de indústrias, constitui-se, atualmente, em um grande atrativo para abastecimento industrial a custos razoáveis. Utilização de excretas A excreta humana (urina e fezes) contêm matéria orgânica, nutrientes, patogênicos, dentre outros elementos, sendo perfeitamente possível a sua reutilização na agricultura quando se garante a segurança sob o ponto de vista ambiental e de saúde pública. Um passo fundamental para essa prática é a separação das excretas na fonte (Figura 72), no tratamento e reuso, sendo esta a base do conceito do 28 Guia do profissional em treinamento - ReCESA Saneamento Sustentável ou Ecosan. Adicionalmente, prevê-se a separação e reuso das águas cinzas. (a) (b) (e) Fonte: EcoSanRes (2006). (d) Fonte: EcoSanRes (2006). (c) Figura 72. Componentes do sistema Ecosan, constando da separação das fezes e urina (a) e separação das águas cinzas (b), vaso de descarga com separação da urina (c), coleta da urina (d), vista de um banheiro ecológico e do tubo de ventilação (e). O balanço de nutrientes (N, P e K), assim como o teor de matéria orgânica (DQO), nos excretas é bem variado, conforme mostrado na Figura 73. Pode-se perceber que a urina contém a maioria do nitrogênio (87%) e boa quantidade de fósforo (40%) e potássio (10%), mas contribuindo muito pouco no balanço de DQO (12%). Em termos de nutrientes, as fezes contém uma boa quantidade de fósforo (40%), um pouco de N (10%) e K (12%), e representam cerca da metade da DQO do sistema (47%). As águas cinzas contém boa quantidade de K (34%), um pouco de P (10%) e N (3%) e são responsáveis por, aproximadamente, 41% da DQO. A Figura 74 fornece alguns números da carga anual de nutrientes e matéria orgânica devida à contribuição da urina, das fezes e águas cinzas. Guia do profissional em treinamento - ReCESA 29 Urina Fezes Águas cinzas 100% 80% Fonte: GTZ (2007). 60% 40% 20% 0% N P K DQO Parâmetro Figura 73. Características dos fluxos das águas residuárias domésticas sem a diluição de fezes e urina. 14,0 P 12,0 (kg DQO/hab.ano) (kg N,P,K /hab.ano) 5,0 K 4,0 3,0 N 2,0 1,0 Fonte: GTZ (2007). 16,0 6,0 10,0 8,0 6,0 4,0 2,0 0,0 0,0 Urina Fezes Águas cinzas Urina Fezes Águas cinzas Figura 74. Carga anual de nutrientes (à esquerda) e matéria orgânica (à direita) devida à contribuição da urina, fezes e águas cinzas. Urina Uma forma de aproveitamento de esgotos utilizada mais recentemente é o uso da urina humana como fertilizante natural agrícola. Esse tipo de esgoto tem sido denominado de “águas amarelas”. Estudos mostram que a urina é praticamente isenta de patógenos, sendo estes abundantemente presentes nas fezes. O armazenamento da urina por um período de um mês garantirá o uso seguro da mesma na agricultura (WINBLAD e SIMPSON-HÉBERT, 2004). Urina bruta (sem diluição) é um ambiente impróprio para os microrganismos sobreviverem, aumentando a taxa de decaimento dos patógenos, e prevenindo o aparecimento de mosquitos. Em uma residência onde as culturas são direcionadas para o consumo, a urina pode ser reutilizada diretamente. É recomendado, entretanto, que deve haver um mês entre a aplicação da urina e a colheita. Quando a urina é coletada de muitas residências urbanas e transportada para reuso em agricultura, o tempo de 30 Guia do profissional em treinamento - ReCESA armazenamento recomendado em temperaturas de 4-20º C varia de um a seis meses, dependendo do tipo de cultura a ser fertilizada. O reaproveitamento do esgoto doméstico gerado em áreas urbanas possibilita o reciclo de nutrientes em áreas agrícolas cultiváveis. Um adulto pode produzir cerca de 400 litros de urina por ano, que, por sua vez, contém 4kg de nitrogênio, 400g de fósforo e 900g de potássio. Estes macronutrientes se encontram na forma ideal para serem aproveitados pelas plantas: o nitrogênio na forma de uréia, o fósforo como ortofosfato e o potássio como íon livre. A proporção destes nutrientes na urina é mais apropriada se comparada com a quantidade e proporção dos nutrientes presentes nos fertilizantes industriais. E uma outra vantagem é que a urina apresenta concentrações muito baixas de metais pesados (ZANCHETA, et al., 2006). Segundo Winblad e Simpson-Hébert (2004), são várias as formas como a urina pode ser aplicada: Não diluída, antes ou durante a semeadura, ou em plantas no início de crescimento. Em uma dose grande ou em várias doses menores durante o período de produção. Misturada com água; urina diluída pode ser adicionada ao solo onde vegetais (e plantas como o milho) são cultivados – uma vez por semana ou, ainda, duas a três vezes por semana, molhando-se as plantas frequentemente com água outras vezes. Sobre o solo, de forma não diluída, antes do plantio. Bactérias do solo transformam a uréia em nitrato, o qual pode ser usado pelas plantas. Como um “ativador” de leiras de compostagem. O nitrogênio orgânico transformado estará disponível às plantas quando o composto for maturado. Urina fermentada concentrada pode ser aplicada ao húmus de folhas secas como um meio para o crescimento de vegetais e plantas ornamentais. A Figura 75 mostra um exemplo de separação e coleta da urina em nível domiciliar, podendo a aplicação ser feita em jardim ou no cultivo de algum vegetal, assim como a coleta de grandes quantidades de urina e aplicação em larga escala. Guia do profissional em treinamento - ReCESA 31 (b) (c) Fonte: EcoSanRes (2006). (a) Figura 75. Separação e coleta da urina em nível domiciliar (a), foto de um tanque de armazenamento de urina em residência multifamiliar (b) e aplicação da urina em larga escala (c). LembreLembre-se, sua participação importante. Caso você fazer tenha comentários a sobre abordados, exponha exponha-os a é muito dúvidas os ou assuntos todos os participantes!!! Fezes As principais preocupações sobre o uso seguro de excretas são relacionadas às fezes. Estima-se que 1g de fezes contém, aproximadamente, 106-107 vírus e bactérias, 103 cistos de protozoários e 100 ovos de helmintos (UNESCO, 2001). As mais importantes rotas de transmissão de doenças das fezes são as mãos, moscas, água, solo e comida que foi contaminada por qualquer dos quatro fatores anteriores, conforme mostrado na Figura 76. Os sistemas Ecosan são projetados para usar alguns fatores físico-químicos e biológicos para reduzir e/ou eliminar organismos patogênicos nas fezes. Esses ocorrem geralmente em duas etapas: o tratamento primário e o tratamento secundário. No tratamento primário visa-se reduzir o volume e o peso do material fecal para facilitar o armazenamento, o transporte, e adiantar o tratamento secundário. Tal tratamento requer câmaras embaixo do banheiro, nas quais se adiciona material para secagem das fezes, que lá são mantidas por certo período de tempo. Durante esse período, o número de patógenos será reduzido como resultado do tempo de armazenagem (6-12 meses), decomposição, desidratação (ventilação e adição de material seco) e aumento do pH (adição de cinza, uréia, cal), bem como pela presença de outros organismos e competição por nutrientes. 32 Guia do profissional em treinamento - ReCESA Fonte: Winbland e Simpson-Hébert (2004). Figura 76. Diagrama das principais rotas de transmissão de doenças pelas fezes. O objetivo do tratamento secundário é fazer o retorno seguro das fezes humanas para o solo. Tal processo pode ser realizado no próprio local de origem (como no jardim, por exemplo), ou fora da origem (estação de tratamento). Esse passo inclui tratamentos avançados como alta temperatura de compostagem, aumento do pH pela adição de uréia ou cal, bem como longo tempo de estocagem. Se um produto final totalmente esterilizado for requerido, o processo secundário poderia ser a carbonização ou incineração, o que tornaria inviável para o Nordeste do Brasil pelos seus elevados custos. Em lugares onde a temperatura ambiental alcance 20°C, um tempo total de estocagem de um ano e meio a dois anos eliminará a maioria das bactérias patogênicas e reduzirá substancialmente vírus, protozoários e parasitas. Para temperaturas ambientes de até 35°C, um ano de estocagem resultará no mesmo resultado, com patógenos morrendo mais rápido em temperaturas mais altas. O tratamento com materiais alcalinos também requer tempo para os patógenos morrerem num nível aceitável. Um pH acima de 9 unidades por cerca de 6 meses a 1 ano, é suficiente na maioria dos climas para matar a maioria dos organismos patogênicos. O Quadro 28 mostra algumas das formas de eliminar patogênicos em excretas. Quadro 28. Diferentes formas de eliminação de patogênicos contidos em excretas. Temperatura A maioria dos microrganismos sobrevive bem em baixas temperaturas (abaixo de 5º C) e morre rapidamente em altas temperaturas (acima de 40º C) na água, no solo, esgoto e em culturas. Em temperaturas de 55-65ºC, todos os tipos de patógenos (exceto esporos de bactérias) morrem em horas. pH Condições altamente alcalinas inativarão microrganismos. A Amônia Patógenos em excreta podem ser inativados pela adição de inativação é rápida em pH 12, mas leva mais tempo em pH 9. amônia. Guia do profissional em treinamento - ReCESA 33 Remoção de umidade Mistura de solo favorece a sobrevivência de microrganismos. Desidratação de fezes na câmara do sanitário ecológico diminuirá o número de patógenos. Radiação solar O tempo de sobrevivência de patógenos no solo e na superfície das culturas será reduzido pela radiação UV. Presença de outros O tempo de sobrevivência dos microrganismos pode ser organismos encurtado pela presença de outros organismos. Diferentes tipos de organismos afetam um ao outro pela predação, lançamento de substâncias antagônicas ou competição por nutrientes. Nutrientes Bactérias adaptadas em viver no trato intestinal não são sempre capazes de competir com outros organismos em determinados ambientes por nutrientes escassos. Isso deve limitar a habilidade da bactéria fecal em reproduzir e sobreviver no ambiente. Oxigênio A maioria das bactérias entéricas é anaeróbia e assim serão provavelmente vencidas por outros organismos em um meio ambiente aeróbio Fonte: Winbland e Simpson-Hébert (2004). Fezes humanas consistem principalmente de matéria orgânica não digerida, tais como fibras feitas de carbono. Embora as fezes contenham menos nutrientes do que a urina, o húmus produzido das fezes contém altas concentrações de fósforo e potássio. Após a destruição de patógenos através da desidratação e/ou decomposição, o material resultante pode ser aplicado ao solo para aumentar a quantidade de nutrientes, aumentar o teor de matéria orgânica e melhorar a capacidade de retenção de água. Uma forma simples de reciclagem é quando uma simples família pode utilizar o produto como fertilizante no seu próprio jardim ou plantação. Entretanto, em áreas urbanas isso pode não ser possível. Aproveitamento de lodo de esgoto O lodo de esgoto também não deve ser considerado como um simples resíduo. Suas características físico-químicas o tornam um excelente condicionador do solo, podendo auxiliar na melhoria das práticas agrícolas atualmente em uso em nosso país (MOTA, 2006a). A reciclagem agrícola é a alternativa mais adequada para a destinação do lodo de esgoto, desde que sejam tomados os devidos cuidados com relação aos riscos associados ao conteúdo de elementos traços e à sanidade. Os lodos são, em geral, ricos em matéria orgânica, nitrogênio, fósforo e micronutrientes, o que possibilita o seu uso na agricultura, como fertilizante, desde que devidamente avaliados e equacionados os riscos potenciais definidos pelos elementos traços, agentes 34 Guia do profissional em treinamento - ReCESA patológicos e pelo nível de odor e a conseqüente atração de vetores (ANDREOLI et al., 1997). Para ser utilizado, o lodo deve ser tratado, resultando no biossólido, o qual pode ser manuseado de forma segura na produção agrícola. Lodo é o termo utilizado para os sólidos gerados durante o processo de tratamento de esgotos antes do tratamento adequado para disposição final. Os biossólidos são os produtos orgânicos gerados nos processos de tratamento de esgoto primário e secundário que podem ser reutilizados de modo benéfico, após tratamento adequado (MIKI et al., 2001). A qualidade desejada para o biossólido e, conseqüentemente, o tratamento ao qual deve ser submetido o lodo de esgoto, dependem do uso ao qual o mesmo se destinará. O tratamento do lodo deve visar à estabilização, ao desaguamento e à higienização do lodo produzido, gerando, assim, um produto final que possa ter uso produtivo ou cuja destinação final (por exemplo, em aterro sanitário) possa ser feita sem problemas ambientais e com custo operacional baixo (VAN HAANDEL e ALEM SOBRINHO, 2006). A CETESB (1999) define duas classes para os biossólidos, conforme indicadas no Quadro 29. Quadro 29. Classes de biossólidos, de acordo com CETESB (1999). Classe Restrições / Exigências A • Não há restrição de uso, podendo ser comercializado ou distribuído gratuitamente. B • Evitar a aplicação manual e a realização de cultivo ou outro trabalho manual na área que recebeu o biossólido, por um período de 30 dias após a aplicação. Caso este tipo de operação não possa ser evitado, os trabalhadores deverão utilizar equipamentos de proteção adequados e ser devidamente orientados quanto aos procedimentos de higiene e segurança. • Não cultivar, por um período de 14 meses após a aplicação, alimentos cuja parte consumida toque o biossólido (melões, pepinos, hortaliças, etc.). • Não poderão ser cultivados na área alimentos cuja parte consumida fique abaixo da superfície do solo (batatas, cenouras, rabanetes, etc.): por um período de 38 meses após a aplicação, se o biossólido for incorporado durante os 4 meses seguintes ao seu espalhamento. por um período de 9 meses, se o biossólido não for incorporado antes de 4 meses após a aplicação. Fonte: CETESB (1999). Guia do profissional em treinamento - ReCESA 35 Em função da classificação do biossólido, são estabelecidos critérios em termos de microrganismos patogênicos, para a obtenção dos quais são indicados processos de redução de patógenos. O Quadro 30 apresenta os critérios de classificação e os processos de redução de patógenos para os biossólidos classes A e B. Quadro 30. Processos de redução de patógenos em função da classificação do biossólido. Tipo Tipo de Processo de Redução Biossólido Critério de Classificação de Patógenos Classe A Coliformes termotolerantes: densidade < • Compostagem 1.000 NMP/gST • Secagem térmica e • Tratamento térmico Salmonella sp: densidade < 3 NMP/4gST • Digestão anaeróbia termofílica • Pasteurização Classe B Coliformes termotolerantes: densidade < • Digestão aeróbia 2.000.000 NMP/gST em pelo menos uma • Secagem amostra • Digestão anaeróbia e • Compostagem Coliformes termotolerantes: média Fonte: Tsutiya (2001) • Irradiação • Estabilização com cal geométrica da densidade de 7 amostras < 2.000.000 NMP/gST ou 2.000.000 UFC/gST. NMP/gST – Número Mais Provável por grama de Sólidos Totais UFC/gST – Unidades Formadoras de Colônias por grama de Sólidos Totais. Fonte: Tsutiya (2001) Algumas pesquisas têm sido desenvolvidas, no Brasil, sobre o uso de biossólidos na agricultura. Poggiani et al. (2006) observaram que a aplicação de doses crescentes de lodo provocou incrementos diferenciados no volume de eucaliptos e que a dose mais adequada a ser aplicada estaria ao redor de 10 t ha-1. A aplicação de lodo refletiu-se de maneira positiva sobre a ciclagem de nutrientes, aumentando a produção de folhedo e, conseqüentemente, a transferência de nutrientes das copas dos eucaliptos para a serrapilheira e para o solo. Skorupa et al. (2006) avaliaram a viabilidade e o desenvolvimento de espécies florestais nativas, plantadas em solo degradado tratado com elevadas doses de lodo de esgoto, tendo como base o acompanhamento quadrimestral de parâmetros silviculturais básicos, como altura total, diâmetro do caule na base e área da copa. Os resultados obtidos após 16 meses de plantio indicaram que os tratamentos com lodo de esgoto apresentaram, ao longo do tempo, respostas superiores para todas as variáveis analisadas, quando comparadas ao tratamento com adubação mineral (NPK). Isso ocorreu para todas as espécies. Entre os tratamentos com lodo, o 36 Guia do profissional em treinamento - ReCESA tratamento 100 mg ha-1 foi o que apresentou os melhores resultados, embora, em alguns casos, já se equipare ao tratamento 200 mg ha-1. Considerações finais Como demonstrado, várias são as formas de aproveitamento dos diversos constituintes de esgotos sanitários, seja na sua forma líquida ou sólida, ou como lodo. O importante é garantir que os nutrientes presentes nas águas residuárias e no lodo voltem à natureza. Como bem destacado por Wimblad e Simpson-Hébert (2004), nas sociedades urbanas de hoje o fluxo de nutrientes das plantas é linear: os nutrientes são retirados do solo pelas culturas, transportados para o mercado consumidor, ingeridos, excretados e descarregados. Em uma sociedade sustentável, a produção de alimentos deve basear-se no retorno dos nutrientes das plantas ao solo. O uso de fertilizantes químicos não é sustentável, uma vez que sua produção baseia-se em recursos não renováveis. Você sabia... Segundo o Fundo das Nações Unidades para Agricultura, em 20 anos, 60% da população deverá enfrentar problemas de escassez de água? Exercícios propostos 1. Liste as principais formas de aproveitamento de esgotos tratados. 2. Liste as principais vantagens do reuso de águas e quais aspectos devem ser estudados primeiramente para a adoção dessa prática. 3. Liste os principais nutrientes contidos na urina e fezes humana, e como esses excretas podem ser reutilizados. 4. Descreva as principais formas de eliminação de patogênicos contidos em excretas. 5. Liste as possibilidades de reuso de lodo de esgoto, e quais requisitos deve possuir para ser reutilizado. 6. Pesquise se a prática do reuso de águas, excretas ou lodo é realizada no seu estado. Você acha que esta prática poderia ser ampliada? Justifique sua resposta. Guia do profissional em treinamento - ReCESA 37 Legislação aplicada ao descarte de esgotos em corpos d’água e reuso de esgotos em irrigação Autores: André Bezerra dos Santos e Suetônio Mota Aspectos gerais No Brasil, a legislação aplicada às questões ambientais e de saúde é bem ampla, sendo estabelecidas pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA), Ministério da Saúde (MS), Secretarias do Meio Ambiente dos Estados da Federação, dentre outros. Os principais padrões de interesse no presente capítulo são os relativos à qualidade da água em corpos d’água, lançamento de efluentes e ao reuso de efluentes tratados em irrigação. Padrões de qualidade do corpo receptor No Brasil, a Resolução CONAMA no 357/2005, a qual veio substituir a Resolução CONAMA no 20/86, dividiu as águas do território nacional em águas doces (salinidade < 0,05%), salobras (salinidade entre 0,05% e 3,0%) e salinas (salinidade > 3%). Em função dos usos previstos (Capítulo II), foram criadas 13 classes, as quais são apresentadas no Quadro 31 (BRASIL, 2005). Quadro 31. Usos preponderantes nas classes de água doce, salina e salobra, segundo a resolução CONAMA 357/2005. Uso Doces Esp. Abastecimento Salinas 1 2 3 4 Esp. Salobras 1 2 3 Esp. 1 2 3 doméstico Preservação equilíbrio das do natural comunidades aquáticas e ambientes aquáticos Proteção das de comunidades aquáticas Recreação contato primário Irrigação Aqüicultura Pesca 38 Guia do profissional em treinamento - ReCESA Recreação de contato secundário Dessedentação de animais Navegação Harmonia paisagística Fonte: Brasil (2007b). Os padrões de qualidade das águas determinados na Resolução CONAMA no 357/2005, no seu Capítulo III, estabelecem limites individuais para cada substância em cada classe (BRASIL, 2005), sendo os valores dos principais parâmetros de qualidade de água mostrados na Tabela 6. Guia do profissional em treinamento - ReCESA 39 Tabela 6. Alguns padrões de qualidade da água segundo a classe do corpo hídrico, presentes na Resolução CONAMA no 357/2005. Doces Parâmetro Materiais flutuantes Óleos e graxas Substâncias comuniquem que gosto Salinas Salobras Esp 1 2 3 4 Esp 1 2 3 Esp 1 2 3 - Aus. Aus. Aus. Aus. - VA VA VA - VA VA VA - Aus. Aus. Aus. Irides. - VA VA Irides. - VA VA Irides. - Aus. Aus. Aus. Não - VA VA VA - VA VA VA ou objet. odor Corantes provenientes de - Aus. Aus. Aus. - - VA VA VA - VA VA VA sólidos - Aus. Aus. Aus. - - VA VA VA - VA VA VA ou - 200 1000 1000a NE - 1000 2500 4000 - 1000 2500 4000 fontes antrópicas Resíduos objetáveis Escherichia coli coliformes 2500b termotolerantes 4000c (NMP/100mL) DBO5 (mgO2/L) - <3 <5 < 10 - - - - - - - - - COT (mg/L) - - - - - - <3 <5 < 10 - <3 <5 < 10 OD (mgO2/L) - >6 >5 >4 >2 - >6 >5 >4 - >5 >4 >3 Turbidez (UNT) - 40 100 100 - - - - - - - - - Cor verdadeira (mg Pt/L) - 75 75 - - - - - - - - - pH - 6-9 6-9 6-9 6-9 - 6,5-8,5 6,5-8,5 6,5-8,5 - 6,5-8,5 6,5-8,5 5,0- Clorofila a ( g/L) - 10 30 60 - - - - - - - - - 9,0 Aus. = ausentes Irides. = iridescências Não objet. = não objetáveis VA = virtualmente ausentes; a: dessedentação de animais; b: recreação de contato secundário; c: demais usos. Fonte: Brasil (2007b). 40 Guia do profissional em treinamento - ReCESA Padrão para lançamento de efluentes Segundo a Resolução CONAMA no 357/2005, no seu Capítulo IV, os efluentes de qualquer fonte poluidora somente poderão ser lançados, direta ou indiretamente, nos corpos de água, após o devido tratamento e desde que obedeçam às condições, padrões e exigências dispostos na supracitada Resolução e em outras normas aplicáveis. São condições obrigatórias para lançamento (BRASIL, 2005): Art. 33. Na zona de mistura de efluentes, o órgão ambiental competente poderá autorizar, levando em conta o tipo de substância, valores em desacordo com os estabelecidos para a respectiva classe de enquadramento, desde que não comprometam os usos previstos para o corpo de água. Art. 34. Os efluentes de qualquer fonte poluidora somente poderão ser lançados, direta ou indiretamente, nos corpos de água desde que obedeçam às condições e padrões previstos neste artigo, resguardadas outras exigências cabíveis: § 1o O efluente não deverá causar ou possuir potencial para causar efeitos tóxicos aos organismos aquáticos no corpo receptor, de acordo com os critérios de toxicidade estabelecidos pelo órgão ambiental competente. § 2o Os critérios de toxicidade previstos no § 1o devem se basear em resultados de ensaios ecotoxicológicos padronizados, utilizando organismos aquáticos, e realizados no efluente. § 3o Nos corpos de água em que as condições e padrões de qualidade previstos nesta Resolução não incluam restrições de toxicidade a organismos aquáticos, não se aplicam os parágrafos anteriores. § 4o Condições de lançamento de efluentes: I - pH entre 5 a 9; II - temperatura: inferior a 40ºC, sendo que a variação de temperatura do corpo receptor não deverá exceder a 3ºC na zona de mistura; III - materiais sedimentáveis: até 1 mL/L em teste de 1 hora em cone Imhoff. Para o lançamento em lagos e lagoas, cuja velocidade de circulação seja praticamente nula, os materiais sedimentáveis deverão estar virtualmente ausentes; IV - regime de lançamento com vazão máxima de até 1,5 vezes a vazão média do período de atividade diária do agente poluidor, exceto nos casos permitidos pela autoridade competente; V - óleos e graxas: 1 - óleos minerais: até 20mg/L; 2- óleos vegetais e gorduras animais: até 50mg/L; e VI - ausência de materiais flutuantes. Art. 35. Sem prejuízo do disposto no inciso I, do § 1o do art. 24, desta Resolução, o órgão ambiental competente poderá, quando a vazão do corpo de água estiver abaixo Guia do profissional em treinamento - ReCESA 41 da vazão de referência, estabelecer restrições e medidas adicionais, de caráter excepcional e temporário, aos lançamentos de efluentes que possam, dentre outras conseqüências: I - acarretar efeitos tóxicos agudos em organismos aquáticos; ou II inviabilizar o abastecimento das populações. Vazão de referência: vazão do corpo hídrico utilizada como base para o processo de gestão, tendo em vista o uso múltiplo das águas e a necessária articulação das instâncias do Sistema Nacional de Meio Ambiente (SISNAMA) e do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos (SINGRH). Art. 36. Além dos requisitos previstos nesta Resolução e em outras normas aplicáveis, os efluentes provenientes de serviços de saúde e estabelecimentos nos quais haja despejos infectados com microrganismos patogênicos, só poderão ser lançados após tratamento especial. Art. 37. Para o lançamento de efluentes tratados no leito seco de corpos de água intermitentes, o órgão ambiental competente definirá, ouvido o órgão gestor de recursos hídricos, condições especiais. Os valores máximos permissíveis de alguns compostos químicos segundo a Resolução CONAMA 357/05 são mostrados na Tabela 7. Tabela 7. Valor máximo permissível de alguns compostos químicos segundo a Resolução CONAMA no 357/05. Parâmetro Valor Máximo Parâmetro Valor Máximo Permissível CONAMA Permissível CONAMA no 357/2005 no 357/2005 Amônia total (mg/L) 20,0 Fluoreto total (mg/L) Arsênio total (mg/L) 0,5 Manganês (mg/L) 10,0 1,0 Bário (mg/L) 5,0 Mercúrio total (mg/L) 0,01 Boro (mg/L) 5,0 Níquel total (mg/L) 2,0 Cádmio total (mg/L) 0,2 Prata total (mg/L) 0,1 0,3 Chumbo total (mg/L) 0,5 Selênio total (mg/L) Cianeto total (mg/L) 0,2 Sulfato (mg/L) Cobre total (mg/L) 1,0 Sulfeto (mg/L) Clorofórmio (mg/L) 1,0 Tetracloreto 1,0 de 1,0 carbono (mg/L) Cromo total (mg/L) 0,5 Tricloroeteno (mg/L) 1,0 Dicloroeteno (mg/L) 1,0 Zinco total (mg/L) 5,0 Estanho total (mg/L) 4,0 Materiais 1 Sedimentáveis (mL/L) Ferro total (mg/L) 15,0 pH Fenóis (mg/L) 0,5 Temperatura ºC Regime 5-9 < 40 de qmax/qmin < 1,5 lançamento Fonte: Brasil (2007b). 42 Guia do profissional em treinamento - ReCESA Comentários gerais sobre os padrões de qualidade no corpo receptor e de lançamento de efluentes Conforme Von Sperling (2005), os padrões de qualidade no corpo receptor e de lançamento de efluentes estão de certa forma inter-relacionados. O real objetivo de ambos é a preservação na qualidade no corpo d’água. No entanto, os padrões de lançamento existem apenas por uma questão prática, já que é difícil se manter o controle efetivo das fontes poluidoras com base apenas na qualidade do corpo receptor. O inter-relacionamento entre os dois padrões se dá no sentido de que deverá ser verificado o atendimento aos padrões de lançamento e do corpo receptor. Devem ser avaliadas as seguintes situações hipotéticas: 1. Caso o efluente satisfaça os padrões de lançamento, mas não satisfaça os padrões do corpo receptor, as características de lançamento deverão ser tais que, necessariamente, atendam ao padrão do corpo receptor. Em outras palavras, nestas condições, o lançamento deverá ter características mais restritivas do que as expressas pelo padrão de lançamento usual. Esta situação pode ocorrer no caso de corpos receptores com baixa capacidade de assimilação e diluição. 2. Caso o efluente não satisfaça os padrões de lançamento, mas satisfaça os padrões do corpo receptor, o Órgão Ambiental poderá autorizar lançamentos com valores acima dos padrões de lançamento, desde que estudos ambientais demonstrem que as características do corpo receptor estarão dentro dos padrões para sua respectiva classe. Esta situação pode ocorrer no caso de corpos receptores com boa capacidade de assimilação e diluição. Padrões de balneabilidade A balneabilidade pode ser um importante uso das águas internas (ex.: lagos, represas) em comunidades organizadas. Os padrões microbiológicos para corpos d’água doce são funções do uso da água e da classe em que se acha enquadrado o corpo d’água, definidos na Resolução CONAMA no 357/2005 (BRASIL, 2005). Apesar de recente, a nova resolução manteve os limites definidos na Resolução CONAMA no 274/2000 (BRASIL, 2000), que prevê, além de limites para coliformes fecais (termotolerantes) e coliformes totais, limites para enterococos ou Escherichia coli. O Quadro 32 apresenta os padrões de balneabilidade fixados na supracitada resolução. Quadro 32. Padrões de balneabilidade definidos pela Resolução CONAMA no 274/2000. Balneabilidade / Padrões para o corpo de água categoria Própria Excelente Máximo de 250 CF/100 mL ou 200 E.coli/100mL Guia do profissional em treinamento - ReCESA ou 43 25 enterococos/100mL, em 80% ou mais das amostras das cinco semanas anteriores; Máximo Muito boa de 500 CF/100 mL ou 400 E.coli/100mL ou 50 enterococos/100mL, em 80% ou mais das amostras das cinco semanas anteriores; Máximo Satisfatória de 1.000 CF/100 mL ou 800 E.coli/100mL ou 100 enterococos/100mL, em 80% ou mais das amostras das cinco semanas anteriores. a) não atendimento aos critérios estabelecidos para as águas próprias; b) valor obtido na última amostragem for superior a 2.500 CF (termotolerantes) ou 2.000 E.coli ou 400 enterococos por 100 mL; c) incidência elevada ou anormal, na região, de enfermidades transmissíveis por via hídrica, indicada pelas autoridades sanitárias; d) presença de resíduos ou despejos, sólidos ou líquidos, inclusive Imprópria esgotos sanitários, óleos, graxas e outras substâncias, capazes de oferecer riscos à saúde ou tornar desagradável a recreação; e) pH < 6,0 ou pH > 9,0 (águas doces), à exceção das condições naturais; f) floração de algas ou outros organismos, até que se comprove que não oferecem riscos à saúde humana; g) outros fatores que contra-indiquem, temporária ou permanentemente, o exercício da recreação de contato primário. Fonte: Brasil (2007a). Padrões para uso agrícola A água para irrigação deve obedecer a determinados critérios que visam à preservação da qualidade das culturas, do solo agrícola, dos níveis de produção e à proteção da saúde do consumidor. A Organização Mundial da Saúde, em 1989, estabeleceu diretrizes para o uso de esgotos na agricultura, conforme indicado no Quadro 33 (WHO, 1989). Quadro 33. Diretrizes microbiológicas recomendadas pela WHO, em 1989, para uso de esgotos na agricultura. Sistema de tratamento Cat. Condições do reuso Grupos de risco Nematodos Nematodos Coliformes recomendado intestinais 1 fecais para atingir a (no ovos/litro)2 (Nº/100ml)3 qualidade microbiológica A 44 Irrigação de culturas Operários, a serem ingeridas consumidor estabilização cruas, es e público em campos ≤1 ≤ 1.000 Lagoas série esportivos, parques tratamento públicos4 equivalente de ou Guia do profissional em treinamento - ReCESA B Irrigação de cereais, Operários ≤1 culturas industriais, Não Retenção em aplicável lagoas de forragens, pastos e estabilização árvores5 por 8 a 10 dias ou remoção equivalente de helmintos e coliformes fecais C Irrigação localizada de culturas Nenhum da Não Não Pré-tratamento aplicável aplicável requerido pela categoria B, se não técnica ocorrer exposição irrigação de de trabalhadores e aplicada, do público não menos do mas que tratamento primário (1)- Ascaris, Trichuris, Necator americans e Ancilostomus duodenalis; (2)- Média aritmética durante o período de irrigação; (3)- Média geométrica durante o período de irrigação; (4)- Um valor diretriz mais restritivo (200 coliformes fecais por 100 ml) é apropriado para gramados públicos, tais como os de hotéis, com os quais o público tenha contato direto.; (5)- No caso de árvores frutíferas, a irrigação deve cessar duas semanas antes dos frutos serem colhidos, e frutos não devem ser colhidos do chão. Irrigação por sistemas de aspersores não deve ser utilizada. Fonte: WHO (2006). As diretrizes da Organização Mundial de Saúde foram revistas recentemente, resultando na publicação: Guidelines for the safe use of wastewater, excreta and greywater. Volume 2. Wastewater use in agriculture (WHO, 2006a), da qual foram extraídas as considerações seguintes. De acordo com a OMS, é necessário atualizar as diretrizes para levar em consideração evidências científicas sobre patógenos, produtos químicos e outros fatores, incluindo as mudanças nas características da população, as alterações nas práticas de saneamento, a existência de melhores métodos para avaliação de riscos, os problemas sociais e de equidade, além das práticas sócioculturais. A OMS, em suas últimas diretrizes, estabeleceu que a meta básica de saúde adotada corresponde a uma carga adicional de doenças de < 10-6 DALY por pessoa por ano. Este valor significa que cada pessoa perderá, por ano, o equivalente a 10-6 anos de vida, ou de boa qualidade de vida, causados por incapacidade. O DALY leva em conta a perda de anos, tanto por perda de qualidade de vida (incapacidade - perda parcial de anos), quanto por morte prematura (perda integral dos anos) causado pela doença. Para fins operacionais, é necessário também calcular o correspondente grau de redução de patógenos que alcança o nível de proteção da saúde e definir medidas de verificação apropriadas. A Tabela 8 traz as metas para alcançar o nível básico de saúde para a agricultura. As metas para o nível básico de saúde para rotavírus baseiam-se no QMRA (Quantitative Micobrial Risk Assessment - avaliação quantitativa de risco microbiológico), indicando Guia do profissional em treinamento - ReCESA 45 a redução de patógenos, em log10, requerida para alcançar 10-6 DALY, para diferentes formas de exposição. Os riscos para transmissão de rotavírus foram sempre estimados por serem superiores aos riscos associados com infecções por Campylobacter ou Cryptosporidium. Anos de vida ajustados por incapacitação (DALY) Vida com plena saúde Vida com menos saúde Surgimento de 80 60 40 uma doença Nível de saúde (%) 100 Período de recuperação 20 Morte prematura 0 0 20 40 DALYs Perdidos 60 80 Idade (anos) Figura 77. Ilustração do significado do DALY (ou AVAI). Tabela 8. Metas básicas de saúde para o uso de esgotos domésticos na agricultura. Cenário de exposição Meta para nível básico Redução (Log10) de Número de de patógenos ovos de saúde (DALYa por pessoa por ano) helmintos por litro Irrigação irrestrita ≤ 10-6 b Alface (folha) 6 ≤ 1c,d Cebola (raiz) 7 ≤ 1c,d 3 ≤ 1c,d 4 ≤ 1c,d 2 Sem Irrigação restrita ≤ 10-6 b Altamente mecanizada Atividade humana intensa Irrigação localizada ≤ 10-6 b (gotejamento) Culturas elevadas recomendação 4 ≤ 1e Culturas rentes ao solo a DALY – Desability adjusted life years (Anos de vida ajustados para a incapacidade). Tenta medir o tempo perdido por causa da incapacidade ou morte resultante de uma doença, comparado com uma longa vida livre de incapacidade na ausência de doença. b Redução de rotavírus. O nível de saúde básica pode ser alcançado, para a irrigação irrestrita e localizada, por uma redução de 6-7 unidades log de patógenos (obtida por uma combinação de tratamento do esgoto e outras medidas de proteção à saúde); para irrigação restrita, é alcançada por uma redução de 2-3 unidades 46 Guia do profissional em treinamento - ReCESA log de patógenos. Entende-se como 1 unidade logarítmica uma remoção de 90%, 2 unidades logarítmicas como uma remoção de 99%, e assim sucessivamente. c Quando crianças com menos de 15 anos são expostas, medidas adicionais de proteção à saúde devem ser adotadas (ex. tratamento para alcançar ≤ 0,1 ovo de helminto por litro no efluente, equipamentos de proteção como botas e luvas e tratamento com remédios). d Uma média aritmética deve ser determinada durante o período de irrigação. O valor de ≤ 1 ovo de helminto por litro deve ser obtido em pelo menos 90% das amostras, no sentido de permitir ocasionais amostras com valores altos (isto é, com > 10 ovos por litro). Para alguns processos de tratamento de esgotos sanitários (ex. lagoas de estabilização), o tempo de detenção hidráulica pode ser usado como um meio para assegurar conformidade com ≤ 1 ovo de helminto por litro. e Nenhuma cultura pode ser apanhada do solo Fonte: WHO (2006). Redução de Vírus, Bactérias e Protozoários Patogênicos Para alcançar a meta básica de saúde desejada, medidas de proteção à saúde devem ser efetuadas. Geralmente, o nível básico de saúde pode ser alcançado pela combinação de medidas de proteção a serem desenvolvidas em diferentes níveis do sistema. Uma redução de patógenos de 6-7 log pode ser alcançada pela aplicação de medidas de proteção à saúde, cada qual tendo sua unidade log de redução ou faixa de redução, como mostra o Quadro 34. Uma combinação dessas medidas é usada, de tal forma que para todas as combinações a soma das reduções individuais de unidades log de cada medida de proteção da saúde adotada é igual ao total requerido de redução de 6-7 unidades log. Quadro 34. Redução de patógenos alcançada por várias medidas de proteção sanitária. Redução Medidas de Controle Controle Patógenos de Observações (unidades log) Tratamento de esgotos sanitários 1-6 A redução de patógenos requerida a ser alcançada pelo tratamento do esgoto depende da combinação de medidas de proteção selecionada (como ilustrado na Figura 3.2) Irrigação localizada (gotejamento) 2 – culturas de baixo crescimento Culturas na forma de raízes e culturas tais como alface, que crescem acima do solo, mas em contato com o mesmo. Irrigação localizada (gotejamento) 4 – culturas de alto crescimento Culturas, tais como de tomate, cujos produtos colhidos não têm contato com o solo. Controle aerossóis da (na dispersão dos irrigação por 1 Uso de anemômetros aspersão) micro-aspersores, com aspersores de com controladores de direção automáticos, de aspersores direcionados para o centro. Barreira à dispersão dos aerossóis (na irrigação por aspersão) 1 Proteção dos residentes próximos de áreas de irrigação por aspersão. Uma Guia do profissional em treinamento - ReCESA 47 barreira de proteção deve existir com 50 a 100m. Decaimento de patógenos (“die- 0,5 – 2 por Morte na superfície das culturas que off”) dia ocorre entre a última irrigação e o consumo. A unidade log de redução alcançada depende do clima (temperatura, intensidade da insolação, umidade, tempo, tipo de cultura, etc.). Lavagem dos produtos com água 1 Lavagem de culturas usadas em saladas, Desinfecção dos produtos 2 Lavagem de culturas usadas em saladas, legumes e frutas com água limpa. legumes e frutas com uma solução desinfetante fraca, enxaguando-se com água limpa. Retirada da casca dos produtos 2 Frutas, culturas tipo raízes Cozimento dos produtos 6–7 Imersão em água fervente (ou próxima da fervura) até o alimento ficar cozido garante a destruição de patógenos. Fonte: WHO (2006). A Figura 78 ilustra diferentes combinações de medidas de proteção que podem ser usadas para alcançar a meta básica de saúde de 10-6 DALYs para as doenças relacionadas com excretas. Irrigação Restrita Restrita Irrigação Irrestrita 8 Manuseio humano 6 5 Altamente Mecanizada Fonte: Adaptado de WHO (2006). Redução de patógenos (log 10) 7 4 3 2 1 0 A B C D E Tratamento Tratamento Lavagem Irrigação gotejamento culturas rastejantes F G H Decaimento natural Irrigação gotejamento culturas altas Irrigação sub-superficial Figura 78. Exemplos de opções para redução de vírus, bactérias e protozoários patogênicos por diferentes combinações de medidas de proteção da saúde para alcançar o nível básico de saúde de ≤ 10-6 DALY por pessoa por ano. 48 Guia do profissional em treinamento - ReCESA Como exemplo de interpretação da Figura 78, observa-se que, em termos de irrigação irrestrita, para a Opção A, a requerida redução de patógenos é alcançada pela combinação de: (a) tratamento do esgoto, que proporcione uma redução de patógenos de 4 unidades log; (b) morte de patógenos entre a última irrigação e o consumo (2 unidades log de redução); (c) lavagem de produtos de saladas e legumes antes do consumo (redução de 1 unidade log). Esta opção, que garante uma redução de 7 unidades log de remoção de patógenos, é adequada quando culturas tipo raízes que podem ser ingeridas cruas são irrigadas com esgoto sanitário tratado. No caso da Opção C, é necessária uma combinação de um tratamento com baixo grau de eficiência na remoção de patógenos com a irrigação por gotejamento de culturas com elevado crescimento (tais como tomate), a qual alcança a requerida remanescente redução de 4 log de redução de patógenos. Considerando exclusivamente o tratamento do esgoto (Opção E), requer-se uma redução de 6-7 unidades log, para uso em irrigação irrestrita. Os elevados custos e a complexidade operacional dos processos de tratamento de esgoto requeridos nesta opção, geralmente impedem sua aplicação em muitos países. Mesmo em países onde esta opção é disponível, a mesma deve ser acompanhada de uma robusta análise custo-benefício. Em termos de irrigação restrita, as Opções F e G consideram, respectivamente, uma redução de 4 unidades log, no tratamento do esgoto visando ao uso em agricultura com alta participação humana, e de 3 log, quando for utilizada agricultura mecanizada. Para a Opção H é exigido um mínimo de redução de patógenos de 0,5 unidades log (tratamento em tanque séptico seguido por irrigação subsuperficial através da absorção do efluente no solo). Não há contato entre a cultura e os patógenos do efluente do tanque séptico; assim, a irrigação subsuperficial deve proporcionar a redução das remanescentes 6,5 unidades log requeridas para culturas tipo raízes. O monitoramento para verificar o desempenho de uma estação de tratamento cujo efluente será usado em irrigação é feito pela determinação do número de uma bactéria indicadora no efluente, tal como a E. coli. O Quadro 35 indica o número de E. coli por 100 mL para diferentes níveis de tratamento de esgotos sanitários, relacionando com as Opções A a G da Figura 78, a serem verificados no monitoramento. Quadro 35. Monitoramento do tratamento de esgotos sanitários (Número de E. coli por 100 mL de esgoto tratado), para os vários níveis de tratamento relacionados nas Opções A a G da Figura 78. Tipo de irrigação Opção Redução requerida de Monitoramento (Ver patógenos tratamento (unidades do número de E. coli por 100 mL Observações Figura) A 4 ≤ 103 Culturas tipo raízes pelo log) Irrestrita Guia do profissional em treinamento - ReCESA 49 B 3 ≤ 104 Folhagens C 2 ≤ 105 Irrigação por gotejamento D 4 ≤ 103 E 6 ou 7 ≤ 101 ou 100 de culturas elevadas Irrigação por gotejamento de culturas rentes ao solo Nível depende exigências da das agência locala. Restrita F 4 ≤ 104 Agricultura com uso humano intensivo (com proteção de adultos e crianças com menos de 15 G 3 ≤ 105 anos). H 0,5 ≤ 106 Agricultura mecanizada. Remoção de patógenos em fossas sépticas a Por exemplo, para tratamento secundário, filtração e desinfecção: Demanda Bioquímica de Oxigênio (5 dias) < 10 mg/L; Turbidez < 2 unidades NF; Cloro residual, 1 mg/L; pH, 6 a 9; e coliformes fecais não detectados em 100 mL. Fonte: WHO (2006a). Redução de helmintos O valor de ≤ 1 ovo de helmintos por litro de esgoto doméstico tratado é recomendado para a irrigação irrestrita. Estudos epidemiológicos, no entanto, indicam que alcançar ≤ 1 ovo de helmintos por litro pode não ser suficiente para proteção em situações onde as condições favorecem a sobrevivência dos ovos (ex. temperatura, condições de umidade do solo), permitindo a acumulação de ovos no solo e nas culturas, especialmente onde crianças com menos de 15 anos consomem alimentos não cozidos levados do campo pelos trabalhadores. Assim, quando crianças com menos de 15 anos de idade são expostas a consumo de legumes que tenham sido irrigados com esgoto contendo ≤ 1 ovo de helmintos por litro, devem ser adotadas medidas adicionais de proteção sanitária, que podem incluir: tratamento com anti-helmintos mediante campanhas massivas de uso de remédios ou campanhas de controle nas escolas; promoção da lavagem dos legumes com uma fraca solução detergente antes do uso. Alternativamente, os esgotos podem ser tratados até alcançar o nível de ≤ 0,1 ovo de helmintos por litro. Para a irrigação restrita, também é recomendado o nível de ≤ 1 ovo de helmintos por litro, com as mesmas observações feitas para irrigação irrestrita, para proteção de crianças com menos de 15 anos de idade. 50 Guia do profissional em treinamento - ReCESA As diretrizes adotadas adotadas pelo PROSAB O PROSAB – Programa de Pesquisas em Saneamento Básico elaborou diretrizes para o uso de esgotos sanitários na agricultura e na piscicultura (Dos SANTOS, 2006). O Quadro 36 contém algumas proposições para o uso agrícola de esgotos sanitários, constantes na bibliografia citada. Quadro 36. Diretrizes do PROSAB para uso agrícola de esgotos sanitários. Categoria CTer 100 mL-1 (3) Ovos helmintos Irrigação ≤ 1 x 103 ≤1 irrestrita(1) de Observações L-1 (4) ≤ 1 x 104 CTer 100 mL-1 no caso de irrigação por gotejamento de culturas que se desenvolvem distantes do nível do solo ou técnicas hidropônicas em que o contato com a parte comestível da planta seja minimizada. Irrigação ≤1x restrita(2) 104 ≤1 ≤ 1 x 105 CTer 100 mL-1 no caso da existência de barreiras adicionais de proteção do trabalhador(5). É facultado o uso de efluentes (primários e secundários) de técnicas de tratamento com reduzida capacidade de remoção de patógenos, desde que associado à irrigação subsuperficial (6). 1) Irrigação superficial ou por aspersão de qualquer cultura, inclusive culturas alimentícias consumidas cruas. Inclui também a hidroponia; 2) Irrigação superficial ou por aspersão de qualquer cultura não ingerida crua, inclui culturas alimentícias e não alimentícias, forrageiras, pastagens e árvores. Inclui também a hidroponia.; 3) Coliformes termotolerantes (CTer); média geométrica durante o período de irrigação, alternativa e preferencialmente pode-se determinar E. coli.; 4) Nematóides intestinais humanos; média aritmética durante o período de irrigação; 5) Barreiras adicionais de proteção encontradas em agricultura de elevado nível tecnológico, incluindo o emprego de irrigação localizada e equipamentos de proteção individual. Exclui-se dessa nota a irrigação de pastagens e forrageiras destinadas à alimentação animal; 6) Neste caso não se aplicam os limites estipulados de coliformes e ovos de helmintos, sendo a qualidade do efluente conseqüência das técnicas de tratamento empregadas. Fonte: dos Santos (2006). Guia do profissional em treinamento - ReCESA 51 Referências ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 13969: Tanques Sépticos: Unidades de Tratamento Complementar e Disposição Final de Efluentes Líquidos: Projeto, Construção e Operação. 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