Gastroenterologia, Hepatologia e Nutrição

Transcrição

Gastroenterologia, Hepatologia e Nutrição
Módulo V
Gastroenterologia,
Hepatologia e Nutrição
Diarreia Aguda na UTI
30
Lívia Gomes Pereira França
Graciana B. S. de Vasconcelos
Diarreia aguda (DA) é caracterizada pela ocorrência de fezes pastosas ou líquidas em quantidade superior a 200 g/dia com frequência superior a 3 vezes ao dia
associada ou não a sintomas de náuseas, vômitos, dor abdominal. A incidência
de diarreia aguda na população americana é de 0,44 episódios por ano, sendo
significantemente maior em paises em desenvolvimento. O agente etiológico
envolvido na patogênese da diarreia aguda varia a depender da região geográfica,
faixa etária, padrão sócio-econômico, uso prévio de antibióticos, sazonalidade, doenças concomitantes (SIDA) e inclui: vírus (Rotavírus); Escherichia coli
(principalmente cepa enterotoxígena), Salmonella, Shigella, protozoários (giárdia
e ameba), helimintos (estrongiloides, schistosoma), Yersinia, Campylobacter,
Vibrio, Yersinia e Aeromonas, doença inflamatória intestinal e colite isquêmica.
Diarreia do viajante é definida por dados epidemiológicos (viagem a locais
de poucos recursos sócio-econômicos) e é preponderantemente causada por
Escherichia coli enterotoxígena.
A DA é usualmente autolimitada, durando 5-7 dias, podendo, entretanto, se
associar a desidratação acentuada, sepse e disfunção orgânica, principalmente
renal.
A DA, por outro lado, que ocorre em pacientes hospitalizados, admitidos em
unidade de terapia intensiva (UTI) tem outro espectro etiológico. Tem incidência de 7,7 casos por 100 internações hospitalares e acomete cerca de 40% dos
pacientes internados em UTI. As principais causas de DA na UTI são: nutrição
enteral (uso de fórmulas hiperosmolares; rápida velocidade de infusão; dieta rica
em lipídeos); infecção (C. difficile, Salmonella, Cryptosporidium); hipoalbumi-
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nemia; medicações (antiácidos contendo magnésio, pró-cinéticos, antibióticos
e antagonistas dos receptores H2); jejum prolongado superior a 5 dias (atrofia
da mucosa intestinal). Cerca de 15%-35% dos pacientes críticos apresentam
diarreia relacionada à dieta enteral e/ou ao uso de antibióticos. A ocorrência de
diarreia pode acarretar grande prejuízo nutricional em decorrência do hábito
não-justificável de interrupções na infusão da dieta enteral.
A abordagem e o manejo dos episódios de DA que levam o paciente a UTI,
assim como também aqueles que ocorrem em ambiente de terapia intensiva
estão resumidos nos algoritmos abaixo.
Módulo V
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Capítulo 30
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Diarreia Aguda na UTI
Diarreia Aguda Comunitária
História
EF
Avaliar gravidade e duração
Dçs. concomitantes
Viagem recente
Uso prévio de antibióticos
Atividade profissional
Homossexualismo masculino
Presença de surto diarreico
na familia ou localidade
Características
• náuseas/
vomitos
• diarreia
• fezes
aquosas
• sangue
• muco
• febre
Considerar coleta: hemograma, sódio, potássio,
ureia, creatinina, glicemia, sumário de urina,
pesquisa de leucócitos fecais, rotavírus, pesquisa
direta de giardia, ameba e estrogiloides e
coprocultura (casos moderados/ graves)
Considerar pesquisa de toxina de C. difficile (se
história de internação e/ou uso de antibióticos)
Leucócitos fecais +
Disenteria
Febre
Diarreia do viajante
Sim
Internação
• desidratação importante
• disenteria
• comorbidade significativa
• idade > 70 anos
• dor abdominal moderada/
acentuada
• disfunção orgânica
• sepse/Sepse grave/Choque
séptico (admissão em UTI)
Cipro 500 mg 12/12 h de 3-5 dias ou
Norfloxacin 400 mg 12/12 h por 3-5 dias
Não
Não
Estado Geral
• hidratação
• nutrição
Resposta terapêutica
Tratamento de suporte
Tratamento específico SN conforme resultado de exames
Não
Resposta terapêutica
Tratamento empírico para parasitose [giardiase/estrongiloidíase] (Metronidazol 250
mg 8/8 h por 7 d ou Tinidazol 2 g / dose única + Albendazol 400 mg/d por 1-3 dias)
Investigar etiologia não infecciosa (retossigmoidoscopia / colonoscopia / endoscopia
digestiva alta com biópsias)
AIDS, HIV +,
Imunodepressão
Investigar diarreia no paciente
imunodeprimido
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Diarreia Aguda Nosocomial ou em UTI
Associada a Dieta Enteral
Associada ao Uso de Antibióticos
(vide algoritmo de infecção por C Difficile)
Avaliar o modo de administração da dieta
Risco maior de DA nas administrações gravitacionais e intermitentes
Avaliar a composição da dieta
- Risco maior de DA na presença de osmolaridade elevada, pobre conteúdo de fibras e
contaminação bacteriana
Correção ou ajuste do modo de administração e fórmula
Ausência de Melhora / Resolução
Considerar coleta: hemograma, sódio, potássio, ureia, creatinina, glicemia, sumário
de urina, pesquisa de leucócitos fecais, rotavírus, pesquisa direta de giardia, ameba e
estrogiloides e coprocultura (casos moderados/ graves)
Considerar pesquisa de toxina de C. difficile (se história de internação e/ou uso de
antibióticos)
Identificação e Correção dos Fatores Coadjuvantes
Ausência de Melhora / Resolução
Medidas Preventivas e Tratamento
Correção dos distúrbios hidro-eletrolíticos e ácido-básicos
Oferta de dieta enteral com baixa osmolaridade e rica em fibras solúveis, administrada
preferencialmente de modo contínuo
Uso de pró-bióticos e simbióticos
Uso de agentes anti-diarreicos (anticolinérgicos e opioides) na ausencia de causa
infecciosa
Módulo V
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Capítulo 30
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Diarreia Aguda na UTI
Diarreia Aguda
Shigelose/salmonelose
(febre, disenteria)
TMP/SMX 160/800 mg VO, 12/12h Ciprofloxacin 500 mg, VO, 12/12 3-5 dias
3-5 dias
Campylobacteriose
Eritromicina 250 mg, VO, 6/6h
5- 7 dias
E. colli enteropatogênica e
enterotoxigênica
Cipro 500 mg, 12/12h 3-5 dias
E. colli enteroinvasiva: (febre, disenteria)
TMP/SMX 160/800 mg VO, 12/12h Ciprofloxacin 500 mg, VO, 12/12 3-5 dias
3-5 dias
Diarreia por Aeromonas: Cipro 500 mg, VO, 12/12h 3-5 dias
Diarreia por vibrião: não colérico
Cipro , 500 mg, VO, 12/12h 3-5 dias
Diarreia por Yersinia: Cipro 500 mg, VO, 12/12h 3-5 dias
Ceftriaxone 2gr, EV, dia (casos graves) 5 dias
Giardíase:
Metronidazol 250 mg, VO, 8/8h Tinidazol 2 g, VO, dose única
7 dias ou
Amebíase: Metronidazol 750 mg, VO, 8/8h 7 dias
Diarreia por C. difficile:
Metronidazol 250 mg, VO, 6/6h Vancomicina 250 mg, VO, 6/6h 10 dias ou
5- 10 dias
Diarreia por V. cholerae:
Tetraciclina 500 mg, VO, 6/6H 3 dias
Diarreia por Cryptosporidium:Nenhum
Diarreia por Isospora: TMP/SMX 160/800 mg, VO, 12/12 h 7 dias
Diarreia por Cyclospora:
TMP/SMX 160/800 mg, VO, 12/12h Diarreia por E. coli
enterohemorrágica: Ampicilina 500 mg, VO, 6/6h 7 dias
5 dias
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Referências Bibliográficas
1. Bittencourt, PL, Vasconcelos GB.. Diarreia Aguda na UTI. In Caldeira Filho & Westphal.
Manual Prático de Medicina Intensiva. 6ª ed. São Paulo: Segmento Pharma Editores,
2008, p. 95.
2. Kelly CP, LaMojnt JT. Clostridium difficile-More difficult than ever. NEJM, 2008:359:193240
3. Thielman NM, Guerrant RL. Clinical practice. Acute infectious diarrhea. N Engl J Med.
2004
4. Wiesen P, Van Gossum A, Preiser JC. Diarrhea in critically ill. Curr Opin Crit Care
2006; 12: 149-54
Infecção pelo
Clostridium Difficile
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Graciana B. S. Vasconcelos
O C. difficile é o agente infeccioso mais frequentemente envolvido em DA em
paciente s hospitalizados. É uma bactéria anaeróbia, gram-positiva, produtora
de citotoxina, que tende a colonizar o intestino quando a flora entérica normal
é alterada, particularmente pelo uso de antimicrobianos. A colite causada pelo
C. difficile é uma doença mediada por toxina. A toxina A é capaz de ligar-se
diretamente ao epitélio, causando uma reação inflamatória grave, que produz um
exsudato rico em proteínas, neutrófilos, monócitos e enterócitos, que contribui
para o achado de colite pseudomembranosa ao exame de retossigmoidoscopia
ou colonoscopia. Os sintomas clássicos são de diarreia líquida associa ou não a
sangramento, cólicas e distensão abdominais que podem ocorrer de dias a até 6
semanas após a suspensão do tratamento antimicrobiano. O diagnóstico é feito
através da pesquisa das toxinas A e B. A cultura não é específica, pois a infecção
pelo C. difficile desenvolve em apenas metade dos pacientes hospitalizados que
são colonizados com C. difficile toxigênico, enquanto o restante são carreadores
assintomáticos. As toxinas A e B são os maiores determinantes da virulência do
C. difficile, cepas não produtoras de toxinas são não-patogências. Surtos graves
tem sido relatados com a cepa NAP-1/027, associada a aumento na produção das
toxinas A e B, resistência às quinolonas e produção da toxina binária. Doença
grave é definida com a presença de colite pseudomemebranosa à endoscopia,
admissão em UTI, ou presença de qualquer das duas variáveis abaixo: idade
superior a 60 anos; temperatura superior a 38,3°C; albumina inferior a 2,5 g/
dL e contagem de leucócitos superior a 15.000 cel/mm3.
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O objetivo inicial do tratamento é a suspensão de todos os antibióticos,
permitindo o restabelecimento da microflora normal intestinal, seguido se
necessário pelo uso de antibioticoterpaia com metronidazol ou vancomicina.
Recorrência após o tratamento com metronidazol e vancomicina ocorre em
18%-20% dos casos, tipicamente após 4 semanas da conclusão do tratamento.
O risco de infecção recorrente aumenta em pacientes que já tiveram episódios
prévios de infecção: 20% após o episódio inicial; 40% após a primeira recorrência
e 60% após 2 ou mais recorrências. Probióticos têm comprovada eficácia em
reduzir a incidência de diarreia associada a antibióticos, assim como eficácia
no tratamento da infecção pelo C. difficile.
Módulo V
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Capítulo 29
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Infecção pelo Clostridium Difficile
Infecção pelo Clostridium Difficile
INFECÇÃO PELO CLOSTRIDIUM DIFFICILE
[mais frequentemente com ampicilina, amoxicilina, cefalosporinas, clindamicina]
Diagnóstico da diarreia associada ao C. difficile (DACD)
pesquisa de toxina por cultura em tecido (padrão-ouro / alto custo)
ELISA para toxina A e B (sensibilidade/especificidade 60%-80%)
presença de colite pseudomembranosa ao exame endoscópico (baixa sensibilidade)
suspeita clínica com ou sem leucócitos fecais positivos
Sinais de Gravidade da DACD:
Presença de colite pseudomemebranosa à endoscopia,
Admissão em UTI
Associação de > 1 das variáveis:
• idade > 60 anos
• temperatura > 38,3°C
• albumina < 2,5 g/dL
• leucograma >15.000 cel./mm3
Esquemas de tratamento da infecção pelo Clostridium difficile:
Episódio inicial
Infecção leve a moderada
Metronidazol na dose de 500 mg via oral 3 x dia por 10 a 14 dias
Infecção grave ou insucesso ou intolerância ao metronidazol
Vancomicina na dose de 125 mg via oral 4 x dia por 10 a 14 dias
Primeira recorrência
Infecção leve a moderada
Metronidazol na dose de 500 mg via oral 3 x dia por 10 a 14 dias
Infecção grave ou insucesso ou intolerância ao metronidazol
Vancomicina na dose de 125 mg via oral 4 x dia por 10 a 14 dias
Segunda recorrência
Vancomicina
125 mg 4 x dia por 14 dias
125 mg 2 x dia por 07 dias
125 mg 1 x dia por 07 dias
125 mg 1 x em dias alternados por 08 dias ( 4 doses)
125 mg 1 x a cada 3 dias por 15 dias ( 5 doses)
Terceira recorrência
Vancomincina na dose de 125 mg via oral 4 x dia diariamente por 14 dias, seguido de
rifaximina 400 mg 2 x dia por 14 dias
Outras opções para infeccção recorrente
Imunoglobulina 400 mg/kg a cada 3 semanas - 2 a 3 doses
Terapias com outros microorganismos – cepas não toxigênicas de C. difficile,
“transplante fecal”
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Nycomed
Referências Bibliográficas
1. Bittencourt, PL, Vasconcelos GB.. Diarreia Aguda na UTI. In Caldeira Filho & Westphal.
Manual Prático de Medicina Intensiva. 6ª ed. São Paulo: Segmento Pharma Editores,
2008, p. 95.
2. Kelly CP, LaMojnt JT. Clostridium difficile-More difficult than ever. NEJM, 2008:359:193240
3. McFarland LV, Elmer GW, Suawicz CM. Breaking the cycle: treatment strategies for 163
cases of recurrent Clostridium difficile disease. Am J Gastroenterolol 2002;97:1769-75.
4. McFarland LV. Meta-analysis of probiotics for the prevention of antibiotic associated diarrhea
and the treatment of Clostridium difficile disease. Am J Gastroenterol 2006;101:812-22.
Zar FA, Bakkanagari SR, Moorthi KM, Davis MB. A comparison of vancomycin and
metronidazole for the treatment of Clostridium difficile-associated diarrhea, stratified
by disease severity. Clin Infect Dis 2007;45:302-7
Doença Inflamatória
Intestinal
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Maria Alice Pires Soares
As doenças inflamatórias intestinais (DII) genericamente englobam as DII
com etiologia bem definida, como as enterocolites infecciosas, parasitárias e
actínicas, dentre outras, e as DII com etiologia ainda não completamente definida. Neste último grupo, a retocolite ulcerativa idiopática (RCUI) e a doença
de Crohn (DC) representam 80%-90% dos casos, sendo o restante representado
principalmente pela colite microscópica (linfocítica e colagenosa), doença de
Behçet e a bolsite (“pouchitis”).
A RCUI e a DC se caracterizam por inflamação crônica da mucosa intestinal.
Seu diagnóstico e estadiamento de gravidade levam em conta parâmetros clínicos,
laboratoriais e endoscópicas (Tabelas 1 a 5). Tanto a RCUI quanto a DC são DII
de caráter recidivante, que podem se manifestar através de sintomas comuns,
Tabela 1: Frequência dos principais sinais e sintomas das DII
Diarreia
65,9%-96,4%
Sangramento
77,3%-96,0%
Dor abdominal
34,8%-81,3%
Emagrecimento
14,4%-43,0%
Febre
8,6%-20,5%
Tenesmo
8,6%-20,1%
Urgência fecal
1,6%-1,9%
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Tabela 2: Frequência das principais manifestações extra-intestinais
Articulares
(artrite ou artralgia periférica, espondilite anquilosante e sacroileíte)
26,9-64,6%
Mucocutâneas
(aftas, eritema nodoso, pioderma gangrenoso, vitiligo)
8,5-15,9%
Oftalmológicas
(uveíte, esclerite, episclerite, irite)
1,0-9,7%
Hepatobiliares
Colangite esclerosante primária (CEP), hepatite auto-imune (HAI) e
litíase biliar
5,9-16,8%
Tabela 3: Diagnóstico diferencial entre retocolite ulcerativa (RCUI) e
doença de Crohn (DC)
RCUI
DC
Doença perianal
Raro
Ocorre em 1/3 dos pacientes
Fístulas
Raro
Ocorre em até 40% dos pacientes
Abscessos
Raro
Ocorre em 20% dos pacientes
Estenoses
Raro
Comum
Achados Clínicos
Achados Colonoscópicos
Envolvimento retal
Sempre
Usualmente poupado
Padrão
Contínuo com extensão
proximal a partir do reto
Usualmente lesão salteadas
Achados Radiológicos
Envolvimento ileal
Raro, ileíte retrógrada
(“backwash ileitis”) não
específica
Presente em 75% dos casos
Achados Histológicos
Profundidade da
inflamação
Usualmente limitada à mucosa
ou submucosa, exceto nos
casos de fulminante
Tipicamente transmural
Granuloma
Apenas associado à criptite
nos casos de inflamação grave
Presente em 20% das biópsias
■
Módulo V
Capítulo 30
■
Doença Inflamatória Intestinal
Tabela 4: Classificação da RCUI quanto à gravidade do surto agudo
(Truelove & Witts)
Leve
Moderada
Grave
Pontuação
1
2
3
Nº de evacuações/dia
≤4
4-6
>6
Presença de sangue
vivo nas fezes
±
+
++
Temperatura
Normal
subfebril
Temp. noturna >37,5ºC ou >37,8ºC
em 2 dias num intervalo de 4 dias
Pulso
Normal
intermediário
>90 bpm
Hemoglobina (g/dL)
>10,5
intermediária
<10,5
VHS (mm/1ªhora)
<30
intermediária
>30 mm/1ªhora
6-8: atividade leve; 9-15: atividade moderada; >15; atividade grave
Tabela 5: Índice de Atividade (IA) Inflamatória na Doença de Crohn
(CDAI [Crohn’s disease Activity Index])
×*
Número de evacuações líquidas na última semana
2
Dor abdominal (ausente=0; leve = 1; moderada=2; grave=3)
Considerar a soma total dos dados individuais da última semana
5
Estado geral (ótimo=0; bom = 1; regular=2; mau=3; péssimo)
Considerar a soma total dos dados individuais da última semana
7
Nº de sintomas/sinais associados (alistar por categorias: a) Artralgia/artrite;
b) Irite/uveíte; c) eritema nodoso/pioderma gangrenoso/aftas orais; d) fissura
anal, fístula ou abscesso; e) outras fístulas; f) febre
20
(máx.
= 120)
Consumo de antidiarreico ( Não=0; Sim= 1)
30
Massa abdominal (ausente=0; duvidosa=2; bem definida=5)
10
“Déficit” de hematócrito; homens 47-Ht; mulheres: 42-Ht
(diminuir em vez de somar no caso do Ht do paciente ser > do que o padrão)
6
Peso†; porcentagem abaixo do esperado (diminuir em vez de somar se o peso
do paciente for maior que o esperado)
1
* Multiplicado por
†
Peso esperado ou ideal = A
ltura (m)2 x 25,5 = __ kg (homens)
Altura (m)2 x 22,5 = __ kg (mulheres)
Soma total (IA da doença de crohn) = < 150 = Remissão
150-250 = Leve
250-350 = Moderada
> 350 = Grave
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Nycomed
mas com características distintas quanto aos achados clínicos, radiológicos,
endoscópicos, histológicos e também no que concerne à evolução.
A DC pode comprometer qualquer segmento do trato gastrointestinal,
embora, mais frequentemente, acometa o íleo distal e o cólon. A RCUI, por
definição, compromete apenas o cólon. Ambos os sexos são afetados, com pico
de incidência em jovens nas 3ª e 4ª décadas de vida. O curso clínico é bastante
variável, podendo ser leve, com longos períodos de remissão, sem necessidade
de terapia de manutenção, ou mais grave, quando a remissão só é alcançada
com uso de imunossupressores ou terapia biológica, sendo necessário, por vezes, a intervenção cirúrgica. Nos últimos anos, grande progresso foi alcançado
na abordagem das doenças inflamatórias, principalmente no campo da terapia
biológica. O tratamento das DII precisa ser adequado aos diferentes graus de
atividade e extensão da doença, levando em conta ainda a presença de fístulas
ou estenoses, no caso da DC.
Doença Inflamatória Intestinal
Coleta: HMG, VHS, PCR, eletrólitos, albumina sérica, testes da função hepática e
renal, alfa 1 glicoproteína ácida, PPF com Baermann e sumário de urina, Rx de tórax e
abdome em duas incidências.
Avaliar diagnóstico, localização e extensão por colonoscopia, trânsito intestinal e/ou
tomografia computadorizada (Tabelas 1 e 3)
Avaliar presença de manifestações extra-intestinais (Tabela 2)
Avaliar gravidade pelos critérios de Truelove & Witts (RCUI) ou CDAI (DC) para definir
melhor terapêutica a ser empregada (Tabelas 4 e 5)
Retocolite Ulcerativa Inespecífica (RCUI)
Formas:
Distal (proctossigmoidite)
Colite esquerda
Pancolite
Doença de Crohn (DC)
Formas:
Inflamatória
Estenosante
Fistulizante
Ileal, colônica e perianal
Módulo V
■
Capítulo 30
■
Doença Inflamatória Intestinal
Retocolite Ulcerativa Inespecífica (Rcui)
Tratamento
Formas leves a moderadas
RCUI distal:
Iniciar com mesalazina tópica 0,8g-1g/dia (reservar corticoide tópico [hidrocortisona
100 mg/100 mL ou budesonida 2,3 mg/115 mL] como 2ª escolha) + mesalazina oral
3,2-4,8 g/dia
Na ausência de resposta em 7-14 dias: Prednisona 40-60 mg/dia
Colite esquerda ou pancolite:
Iniciar com mesalazina oral 3,2-4,8 g/dia *
Na presença de sintomas distais pode-se associar mesalazina ou corticoide tópico (vide
acima)
Na ausência de resposta em 7-14 dias: Prednisona 40 mg até 1mg/kg/dia com
desmame gradual em 8 semanas para evitar recidiva precoce.
ntroduzir azatioprina 2-2,5 mg/kg/dia ou mercaptopurina 0,75-1,5 mg/kg/dia em casos
refratários ou dependentes de corticoide.
Forma grave
Corticoides IV(hidrocortisona 300-400 mg/dia ou metilprednisolona 40-60 mg/dia)‫‏‬
Suspender anticolinégicos, antidiarreicos, AINEs e opioides
Considerar antibióticos: ciprofloxacino 400 mg IV de 12/12 e/ou metronidazol 500 mg
IV 6/6h
Suporte nutricional preferentemente enteral
Considerar infliximab ou ciclosporina IV na ausência de resposta em 5-7 dias
Considerar cirurgia na ausência de resposta em 5-7 dias de tratamento convencional
ou na falência do tratamento com infliximab ou ciclosporina IV ou na presença de
complicações: obstrução; perfuração ou hemorragia com necessidade de uso de > 6-8
UI de concentrados de hemácias/24-48h)
Iniciar mesalazina na possibilidade de ingestão por via oral.
Forma grave com megacólon tóxico
(Critérios radiológicos: dilatação do cólon transverso >5,5 cm e/ou do ceco > 9,0 cm)
Jejum; SNG aberta; Monitorização de FC e PA não-invasiva; PVC 6/6h
Coleta de hemocultura; urocultura e pesquisa de toxina C. difficile e Rx simples de
abdômen diário
Iniciar hidrocortisona 300-400 mg/dia ou metilprednisolona 40-60 mg/dia
Suspender anticolinégicos, antidiarreicos, AINEs e opioides
Iniciar antibióticos: ciprofloxacino 400 mg IV de 12/12 + metronidazol 500 mg IV 6/6h
Reavaliação clínico-cirúrgica diária
Considerar cirurgia na ausência de melhora em 24-72 horas ou na SD de perfuração
Tratamento de Manutenção
Mesalazina 1,2-4,8 g/dia *
Imunossupressores ou infliximab a depender do padrão de resposta ao tratamento inicial
* Alternativa: Sulfassalazina 2-4 g/dia
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Doença de Crohn (DC)
Tratamento
Formas inflamatórias e estenosantes
Leve a moderada:
DC ileo-colônica
• Iniciar com mesalazina 3,2-4,8 g/dia
• Na ausência de resposta à monoterapia associar prednisona 40-60 mg/dia até
1mg/kg/dia
Obs.: Budesonida 9mg/dia é apropriada nos casos de doença ileocecal isolada com
atividade moderada
Grave:
Hidrocortisona 300-400 mg/dia ou metilprednisolona 40-60 mg/dia
Considerar ciprofloxacino 400 mg IV de 12/12 horas e/ou metronidazol 500 mg IV
6/6h
Azatioprina 2,-2,5 mg/kg/dia ou mercaptopurina 0,75-1,5 mg/kg/dia ou terapia
biológica (cautela na presença de sintomas obstrutivos / contraindicado em infecção
ativa) em casos refratários ou dependentes de corticoide
Considerar cirurgia na ausência de resposta ao tratamento clínico, nos casos de
doença ileal ou ileocecal limitada. Nos casos de doença difusa do intestino delgado,
sem resposta ao tratamento clínico e com sintomas obstrutivos, estenoplastia e
ressecções conservadoras por cirurgiões experientes podem ter bons resultados
Forma fistulizante
Iniciar metronidazol 400 mg via oral 3x/dia e/ou ciprofloxacino 500 mg 2x/dia nas
fístulas perineais simples
Iniciar azatioprina 2 a 3 mg/kg/dia ou mercaptopurina 1 a 1,5 mg/kg/dia nas fístulas
perianais simples ou enterocutâneas excluída obstrução e abscesso
Considerar avaliação proctológica para drenagem de abscessos e colocação de
sedenhos
Considerar infliximabe IV (5 mg/kg/dia em 0, 2 e 6 semanas e manutenção de 5 mg/
kg de 8/8 semanas) ou adalimumabe SC (160 mg na semana 0; 80 mg na semana 2; e
manutenção de 40 mg de 2/2 semanas).
Terapia nutricional (enteral ou parenteral) na presença de desnutrição
Forma gastroduodenal
Inibidor de bomba protônica
Referências Bibliográficas
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therapy. World J Gastroenterol 2008; 14(3): 354-377
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Clin N Am 2007; 87: 697-725
3. Lichtensteian GR e cols. AGA institute medical position statement on corticosteroids,
immunomodulators and Infliximab in inflammatory bowel disease. Gastroenterology
2006; 130: 935-939
Hepatite Fulminante
33
Andréa Ribeiro Cavalcanti
Insuficiência hepática aguda (IHA) grave caracterizada pelo aparecimento de
encefalopatia hepática (EH) no intervalo deoito semanas do início de quadro
ictérico, na ausência de comprometimento prévio conhecido de função hepática.
Esta definição de Trey & Davidson é a atualmente empregada no Brasil para
definição de insuficiência hepática aguda grave e priorização de órgãos para
transplante de fígado de acordo com a portaria no 541 de 14 de março de 2002 do
Ministério da Saúde. Outros termos empregados para descrever diferentes tipos
de IHA grave estão resumidos na tabela 1. A mortalidade da hepatite fulminante
(decorrente principalmente de hipertensão intracraniana secundária à edema
cerebral) varia de 60% a 90% nos indivíduos com graus III e IV de EH, havendo
indicação nesses pacientes de transplante de fígado. As indicações para realização
de transplante no Brasil nos pacientes com IHA grave seguem os critérios adotados pelo grupo do King´s College e/ou do Hospital Beaujon (Tabela 2 e 3). A
abordagem do paciente com hepatite fulminante inclui: 1) Investigação da causa
e tratamento etiológico específico; 2) Análise do prognóstico para avaliação de
indicação do transplante de fígado e 3) Medidas de suporte.
176
Manual de Cuidados Intensivos em Gastroenterologia e Hepatologia
■
Nycomed
Tabela 1: Nomenclatura dos tipos de insuficiência hepática aguda grave
Insuficiência Hepática Fulminante (Trey and Davidson)
Insuficiência hepática aguda grave caracterizada pelo aparecimento de
encefalopatia hepática no intervalo de 8 semanas do início dos sintomas, na
ausência de comprometimento prévio conhecido de função hepática
Insuficiência Hepática Subaguda (Gimson)
Insuficiência hepática aguda caracterizada pelo aparecimento de encefalopatia
hepática no intervalo de 8 - 24 semanas do início dos sintomas, na ausência de
comprometimento prévio conhecido de função hepática
Insuficiência Hepática Hiperaguda (O’Grady)
Encefalopatia hepática no intervalo de 7 dias do início da icterícia
Insuficiência Hepática Aguda (O’Grady)
Encefalopatia hepática no intervalo de 8-28 dias do início da icterícia
Insuficiência Hepática Subaguda (O’Grady)
Encefalopatia hepática no intervalo de 4-12 semanas do início da icterícia
Insuficiência Hepática Aguda Grave (Benhamou)
Coagulopatia (Fator V < 50%)
Hepatite Fulminante (Benhamou)
Coagulopatia (Fator V < 50%) + encefalopatia hepática no intervalo de 2 semanas
do início da icterícia
Hepatite Subfulminante (Benhamou)
Coagulopatia (Fator V < 50%) + encefalopatia hepática no intervalo de 2-12
semanas do início da icterícia
Tabela 2: Critérios Prognósticos do King´s College Hospital (KCH)
Hepatite Fulminante Induzida por Acetaminofen
pH < 7.3 ou
INR > 6.5 e creatinina > 3.4 mg/dL
Hepatite Fulminante Induzida por Outras Causas
INR > 6.5 ou
≥ 3 parâmetros
Idade < 10 anos ou > 40 anos
Etiologia Adversa (Hepatite NANB, Hepatite por halotano ou por outras drogas)
INR > 3.5
BT > 17.6 mg/dL
Intervalo entre icterícia e encefalopatia > 7 dias
Tabela 3: Critérios Prognósticos do Hospital Beaujon (Clichy)
Encefalopatia Hepática associada a
Nível de Fator V < 20% (pacientes < 30 anos)
Nível de Fator V < 30% (pacientes > 30 anos)
Módulo V
■
Capítulo 31
■
Hepatite Fulminante
Hepatite Fulminante
Insuficiência hepática aguda grave
(hipoalbuminemia / ascite / TP < 50%, INR > 2)
Encefalopatia
Hepática (EH)
Considerar
Investigação de Causa e Tratamento
Etiológico Específico (Anexo 1)
Hepatite Fulminante
Transferência para centro com disponibilidade
de transplante de fígado (www.abto.com.br)
Monitorização do estado neurológico
EH grau II
Admissão em unidade de terapia intensiva
Avaliação de critérios de indicação de transplante de fígado (Tabela 2)
para priorização no sistema nacional de alocação e distribuição de órgãos
Considerar uso de N-Acetilcisteína IV independentemente da etiologia
EH grau
III / IV
Considerar intubação orotraqueal para proteção de via aérea
Considerar monitorização de pressão intracraniana (PIC) *
Medidas de Suporte
Prevenção e Manejo da Hipertensão Intracraniana
No uso de monitorização da PIC * empregar cateter subdural. Considerar
monitorização concomitante da saturação venosa de bulbo jugular (SjO2).
Manter a pressão de perfusão cerebral (PPC) [PPC=PAM-PIC] idealmente acima de 60
mmHg. Tratar elevação progressiva ( > 25 mmHg) ou sustentada (30-50 mmHg) da PIC
por mais de 5 minutos.
Uso de manitol 0,25-1 g/kg de acordo com PIC e PPC ou evidencias clínicas e
neurológicas de hipertensão intracraniana em pacientes sem monitorização de PIC.
Em casos refratários considerar coma barbitúrico, hipotermia moderada 32º a 33º e
salina hipertônica
Suporte hemodinâmico:
Monitorização hemodinâmica invasiva (PAM e PVC) em pacientes com EH grau III e IV
Uso de cateter de artéria pulmonar em pacientes com instabilidade hemodinâmica
e/ou disfunção orgânica. (Padrão de circulação hiperdinâmica com RVS baixa e IC
elevado)
Manter PAM > 65-70 mmHg ou em níveis superiores a depender da PPC
* uso controverso e sem comprovação de impacto na mortalidade
177
178
Manual de Cuidados Intensivos em Gastroenterologia e Hepatologia
■
Nycomed
Hepatite Fulminante
Medidas de Suporte
Prevenção e tratamento da insuficiência renal
Evitar agentes nefrotóxicos
Expansão volêmica
Na necessidade de terapia de reposição renal, usar preferencialmente hemofiltração /
hemodiafiltração
Manejo de infecções
Uso empírico de antibióticos de largo espectro (teicoplanina + cefalosporina 3ª
geração) em pacientes com suspeita de sepse ou instabilidade hemodinâmica
Uso empírico de antifúngicos (fluconazol) 5-6 dias após instituição de
antibioticoterapia de amplo espectro
Manejo da coagulopatia
Evitar uso de plasma fresco (PF) antes da indicação de transplante hepático pelo valor
prognóstico do INR
Na vigência de sangramento ou antes de procedimentos invasivos (PIC) empregar PF
e crioprecipitado caso INR > 1,5-2,0 e fibrinogênio < 100 mg/dL. Considerar uso de
fator VIIa recombinante (40 mcg/kg em bolus IV)
Uso de plaquetas se níveis inferiores a 20.000/mm3 ou 50.000/mm3 antes de
procedimentos invasivos
Monitorização rigorosa de eletrólitos e níveis glicêmicos
Uso de IBP IV para profilaxia de lesão aguda de mucosa gástrica
Suporte nutricional
Considerar uso de MARS (diálise extra-corpórea com albumina) na indisponibilidade
momentânea de órgãos para transplante hepático
Módulo V
■
Capítulo 31
■
Hepatite Fulminante
Anexo 1: Avaliação etiológica e tratamento específico da hepatite fulminante
Causa
Avaliação de Etiologia
Tratamento Específico
Viral
Hepatite A
IgM anti-VHA
Hepatite B
agHbs, IgM anti-Hbc
Hepatite delta (raro)
anti-VHD
Hepatite E (raro)
anti-VHE
Hepatite C (excepcional)
anti-VHC
Herpes simplex (raro)
IgM e IgG nti-HSV
Aciclovir IV
EBV (raro)
IgM e IgG anti-EBV
Aciclovir IV
CMV (raro)
IgM anti-CMV
Drogas
História Clínica Sugestiva
ou Compatível
Acetaminofen Uso
intencional (> 10 g) ou
inadvertido (> 4 g)
Níveis Séricos (200 mg/
dL 4 h ou 50 mg/dL 15 h
após uso)
N-acetilcisteína oral 140
mg/kg + 70 mg/kg 4/4 h
por 48-72 h
N-acetilcisteína IV 150 mg/
kg / 200 mL SG 5% em 15
min + 50 mg/kg 4/4 horas
até dose cumulativa total
de 300 mg/kg
Halotano, Isoniazida,
etc. Ervas e fitoterápicos
Cogumelos contendo
espécies de Amanita
Penicilina IV
Vascular
Quadro Clínico
Síndrome de Budd-Chiari
US doppler / arteriografia
Hepatite isquêmica
Congestão hepática (ICC)
US doppler
Esteatose aguda da gravidez
Quadro Clínico
Síndrome HELLP Eclâmpsia
Indução do parto
Hepatite Auto-imune
Auto-anticorpos AML,
AAN, AAMFR1
Doença de Wilson
Cobre, Ceruloplasmina
Pesquisa de Anel de
Kayser-Fleischer
Radiologia Intevencionista/
Trombólise
Indução do parto
Considerar
imunossupressão
(prednisona 20-30 mg/dia)
179
180
Manual de Cuidados Intensivos em Gastroenterologia e Hepatologia
■
Nycomed
Referências Bibliográficas
1. Bittencourt, PL; Santos DRD; Silva, LR. Insuficiência Hepática. Pronto Atendimento em
Pediatria. 2ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006, p. 648.
2. Bittencourt, P. L. ; Cavalcanti, A. . Hepatite Fulminante. Manual Prático de Medicina
Intensiva.. 3ª ed. São Paulo: Segmento Pharma Editores, 2009, p. 9-92.
3. Khan SA, Shah N, Williams R, Jalan R. Acute Liver Failure: a review. Clin Liver Dis
2006;10: 239–258
4. Larsen FS. Optimal management of patients with fulminant hepatic failure: Targeting
the brain. Hepatology 2004; 39: 299-301
5. Sass DA, Shakil AO. Fulminant hepatic failure. Gastroenterol Clin North America 2003;
32: 1195-1211
6. Santos DRD ; Bittencourt, P. L. ; Silva, L. R. . Insuficiência Hepática Aguda. In: Fabio
Ancona Lopez e Dioclécio Campos (Org). Tratado de Pediatria. 8 ed. São Paulo: Manole
Ltda, 2007, v. 27, p. 2121-2137.
Alterações de Enzimas
Hepáticas e Icterícia na UTI
34
Paulo Lisboa Bittencourt
Alterações de enzimas hepáticas hepatocelulares e/ou colestáticas, hepatite
aguda, colestase e icterícia ocorrem na maioria dos pacientes internados em
ambiente de terapia intensiva. Podem ocorrer à admissão hospitalar ou se
manifestarem durante o curso da internação na UTI. As principais causas de
“disfunção hepática” observadas à admissão hospitalar são as hepatites agudas
graves (vide algoritmo de hepatite fulminante), descompensação aguda de cirrose hepática (vide algoritmos do módulo de cirrose hepática) e colangite ou
colestase por ictérica obstrutiva (vide algoritmo de colangite) e abscesso hepático
(vide algoritmo). Por outro lado, as principais causas de elevações de enzimas
hepáticas e icterícia na UTI são: infecções; sepse; choque séptico; hipovolêmico
ou cardiogênico; trauma, cirurgia, hipoxemia, hepatite medicamentosa, hepatite isquêmica; congestão passiva crônica do fígado por insuficiência cardíaca;
hemólise e nutrição parenteral total (NPT), sendo o espectro de sepse, sepse
grave e choque séptico e a colestase induzida por NPT as causas mais frequentes
(Tabela 1). Colestase induzida por sepse geralmente ocorre nos primeiros 3-7
dias após o diagnóstico da infecção, enquanto que a colestase associada a NPT
usualmente surge após 2 semanas da introdução do suporte nutricional parenteral,
principalmente quando não são adotadas medidas preventivas (Tabela 2). Os
critérios para definição de hepatite medicamentosa de acordo com o padrão de
elevação de enzimas hepáticas e as principais drogas hepatotóxicas associadas
estão descritos, respectivamente, nas tabelas 3 e 4 e 5 e 6 e7.
182
Manual de Cuidados Intensivos em Gastroenterologia e Hepatologia
■
Nycomed
Tabela 1: Causas de alterações de enzimas hepáticas,
hiperbilirrubinemia e icterícia na UTI
Causas
Mecanismos
Infecção: pneumonia; infecção de trato urinário,
infecções ginecológicas
Hepatite trans-infecciosa
Sepse
Colestase intra-hepática
Obstrução biliar (algoritmo de colangite aguda)
Atentar para microlitíase, lama biliar)
Colestase Extra-Hepática
Abscesso Hepático (vide algoritmo)
Lesão intra-parenquimatosa
ocupando espaço
Hepatite aguda por drogas
Lesão hepatocelular usualmente
idiosincrásica
Hemólise: Infecção por Clostridium Perfringens,
Escherichia Coli; Drogas (penicilina, antimaláricos,
sulfonamidas, acetaminofen); anemia hemolítica,
deficiênica de glicose 6-fosfato desidrogenase;
transfusão maciça de concentrados de hemácias
Reabsorção de hematomas
Hemólise intravascular
Hiperbilirrubinemia não
conjugada
NPT
Colestase intra-hepática
Hepatite isquêmica
Hipoxia
Congestão passiva crônica do fígado
Necrose centrolobular
Trauma
Biloma
Multifatorial
Lesão biliar intra e/ou
extrahepática
Hepatite isquêmica
Hipoxia
Congestão passiva crônica do fígado
Necrose centrolobular
Ventilação Mecânica
PEEP elevado
Redução do fluxo sanguineo
portal e aumento da resistência
vascular intra-hepática
Cirurgia
Multifatorial
Módulo V
■
Capítulo 34
■
Alterações de Enzimas Hepáticas e Icterícia na UTI
Tabela 2: Medidas preventivas da colestase induzida por NPT
Investigar sinais de hepatopatia antes e durante o uso de NPT
Manter estímulo oral ou enteral para trofismo intestinal
Cuidados para prevenção de sepse associada a cateter
Minimizar agressões cirúrgicas e anestésicas
Manter aporte calórico por NPT inferior a 25 kcal/kg/dia
Usar emulsões lipídicas (30% do aporte calórico [< 1g/kg/dias]) mistas com TCM e TCL ou
com omega-9
Considerar esquema cíclico de NPT com interrupção por 5-8 horas
Administrar glicose com infusão inferior a 5 mg/kg/minuto
Administrar antioxidantes (vitamin E, selenium) e oligoelementos
Tabela 3: Critérios diagnósticos para estabelecimento de lesão hepática
aguda por drogas
Hepatocelular
Colestática
Pontos
Intervalo de tempo entre reação medicamentosa e tratamento
Incompatível
Antes da introdução ou > 15
dias da retirada *
Antes da introdução ou > 30
dias da retirada
Desconhecido
Documentação insuficiente
Documentação insuficiente
Sugestivo
5-90 dias após o início do 1
tratamento ou 1- 15 dias após
tratamentos subsequentes
5-90 dias após o início do 1o
tratamento ou 1-90 dias após
tratamentos subsequentes
(+2)
Compatível
< 5 ou > 90 dias ou > 15 dias
respectivamente, após o 1o
tratamento e os tratamentos
subsequentes
< 15 dias, após a interrupção
de quaisquer dos tratamentos
< 5 ou > 90 dias ou > 90 dias
respectivamente, após o 1o
tratamento e os tratamentos
subsequentes
< 30 dias, após a interrupção
de quaisquer dos tratamentos
(+1)
o
(critério de
exclusão)
(+1)
Evolução bioquímica da diferença entre o pico da atividade enzimática
da AST e o seu limite superior da normalidade, após interrupção do
medicamento
Redução ≥ 50%, em menos
de 8 dias
Redução ≥ a 50%, em
menos de 180 dias
( +3 ) *
Compatível
Redução ≥ 50%, em menos
de 30 dias
Redução for menor que 50%
em menos de 180 dias
(+2) **
Inconclusiva
Sem informação ou sem
interrupção da droga ou
redução > 50%, após 30 dias
Sem informação ou sem
interrupção da droga ou
estabilização ou elevação
enzimática
(0)
Contrária
Elevação ou redução < a 50%,
mesmo após 30 dias
Sugestiva
* (+2) e ** (+1) se lesão hepática aguda for do tipo colestático
(-2)
183
184
Manual de Cuidados Intensivos em Gastroenterologia e Hepatologia
■
Nycomed
Tabela 4: Critérios diagnósticos para estabelecimento de lesão hepática
aguda por drogas
Fatores de risco
Consumo de etanol: presente
ausente
(+1)
(0)
Idade:
≥ 55 anos (+1)
< 55 anos ( 0 )
(+1)
(0)
Obesidade: presente
ausente
(+1) *
(0) *
Associação concomitante com outras medicamentos
ausente ou presente com intervalo de tempo incompatível ou falta de
informação
(0)
presente com intervalo de tempo compatível ou sugestivo
(-1)
presente com intervalo de tempo compatível ou sugestivo e potencial
hepatotóxico comprovado
(-2)
presente com presente intervalo de tempo compatível ou sugestivo, potencial
hepatotóxico comprovado e mesma reação à reintrodução da medicação
(-3)
Presença de outras etiologias prováveis
Exclusão de todas as causas do grupo I e II
(+2)
Exclusão das seis causas do grupo I
(+1)
Exclusão de quatro ou cinco causas do grupo I
(0)
Exclusão de menos de quatro causas do grupo I
(-2)
Causa não medicamentosa comprovada
(-3)
Hepatotoxidade
Assinalada nas características da droga
(+2)
Reconhecida na literatura médica
(+1)
Desconhecida
(0)
Grupo I: confirmação de IgM anti-VHA, IGM anti-Hbc, anti-VHC, evidência radiológica de patologia
obstrutiva biliar , história de alcoolismo ou episódio de hipotensão aguda recente; Grupo II:
possibilidade de complicação hepática da doença tratada ou de doença associada ou de infecção por
citomegalovirus, virus Epstein Barr ou Herpes virus
Módulo V
■
Capítulo 34
■
Alterações de Enzimas Hepáticas e Icterícia na UTI
Tabela 5: Critérios diagnósticos para estabelecimento de lesão
hepática aguda por drogas de acordo com a reação à reintrodução do
medicamento
Hepatocelular
Colestática
Pontos
Positiva
duplicação de ALT com o
medicamento isolado
duplicação de FA ou BT com o
medicamento isolado
(+2)
Compatível
duplicação de ALT com os
medicamentos associados
inicialmente
duplicação de FA ou BT com
os medicamentos associados
inicialmente
(+1)
Negativa
ausência de aumento de
ausência de aumento de FA
ALT, com o mesmo esquema ou BT, com o mesmo esquema
terapêutico anterior
terapêutico anterior
(0)
Tabela 6: Principais drogas associadas a lesão aguda hepatocelular
Ácido nicotínico +
Dantrolene*+
Indometacina*
Perexilina*+++
Ácido paraaminosalicílico*
Dapsona
Iproniazida* ++
Pirazinamida*
Ácido tienílico*++
Di-hidralazina
Isoflurano
Pirimetamina/sulfadiazina
Ácido valproico**+
Diclofenac*+
Isoniazida**++
Piroxicam*
lparAlbendazol
Diidralazina+
Ketoconazol*+
Propiltiuracil*+
Alopurinol*
Disopiramida
Lovastatina
Quinidina+
Amiodarona*++
Disulfiram*
Maprotilina
Ranitidina
Ampicilina
Enalapril
Mercaptopurina
Sinvastatina
Aspirina*+
Enflurano*
Metildopa*+++
Sulfadiazina
Busulfan
Estreptoquinase
Metotrexate+++
Sulfasalasina
Cefalexina
Etretinato++
Metoxiflurano**
Tiratricol+
Ciclofenil
Fenilbutazona*+ Metronidazol
Verapamil
Ciclofosfamida*
Fenitoína*++
Minociclina
Zidovudina
Ciproheptadina
Fenobarbital*+
Naproxeno
Ciproterona
5-Fluorocitosina
Omeprazol
Cimetidina
Flutamida*
Oxacilina
Citarabina*
Glafenina*++
Oxifenilbutazona+
Clometacina*+++
Halotano***++
Oxifenisatina+++
Clomipramina
Hidralazina+
Papaverina+
Dactinomicina*+
Ibuprofeno
Paracetamol**+++
+ = Progressão para hepatite crônica ou cirrose hepática: + excepcional (menos de 5 referências na
literatura); ++ rara (entre 5-20); +++ frequente (mais de 20). * = Evolução fulminante: * rara (entre
5-20); ** frequente (mais de 20)
Adaptado de Biour M 3.
185
186
Manual de Cuidados Intensivos em Gastroenterologia e Hepatologia
■
Nycomed
Tabela 7: Principais drogas responsáveis por lesão aguda colestática
Amineptina
Etionamida
Sais de ouro
Amitriptilina**
Fluxoridina*
Sulindac
Amoxicilina-cido clavulânico*
Fluconazol
Tetraciclina
Anfotericina B
Imipramina*
Tiabendazol*
Ampicilina*
Indometacina
Tioridazina
Azatioprina
Interleucina-2
Ticlopidina
Carbamazepina*
Lovastatina
Tolbutamida**
Clorotiazida
Mercaptopurina
Clorpropamazina***
Metimazol
Clorpropamida
Metiltestosterona*
Ciclosporina
Mianserina
Contraceptivos orais
Naproxeno
Cotrimoxazol*
Nifedipina
Danazol
Nitrofurantoína
Dapsona
Noretandrolona*
Diazepan
Penicilamina
Diltiazen
Propafenona
Disopiramida
Quinidina
Enalapril
Ranitidina
Eritromicina*
Rifampicina
* = Progressão para colangite intrahepática crônica e ductopênia: * excepcional ( menos de 5
referências na literatura), ** rara ( entre 5 e 20), *** frequente ( mais de 20 ).
Adaptado de Biour M. 3.
Módulo V
■
Capítulo 34
■
Alterações de Enzimas Hepáticas e Icterícia na UTI
Alterações de Enzimas Hepáticas e Icterícia na UTI
Alterações de Enzimas Hepáticas em UTI
Avaliar e tratar etiologia: Investigar doença hepática prévia; uso de drogas
hepatotóxicas; investigar e tratar infecção; reavaliar suporte nutricional
(tabela 2)
Monitorizar enzimas hepáticas 1-3 vezes por semana
Monitorização de INR no caso de hepatite aguda (vide algoritmo de
hepatite fulminante)
Colestase e Icterícia na UTI
Avaliar e tratar etiologia (tabela 1)
Exclusão de obstrução de vias biliares ou abscesso hepático:
(ultrassonografia de abdomen superior)
Suporte hemodinâmico e tratamento da sepse/choque séptico
Reavaliar suoprte nutricioanl (tabela 2)
Monitorizar enzimas hepáticas e bilirrubinas
Colestase Associada
à Sepse
Antibioticoterapia
Drenagem do foco séptico SN
Suporte hemodinâmico
Reavaliação do modo ventilatório
(se possível redução do PEEP)
Expectativa de melhora em 1 semana
após controle da sepse
Colestase Associada
à Sepse
Modificar formula da dieta parenteral
(vide medidas preventivas na tabela 2)
Considerar metronidazol (250 mg 3x/dia)
Considerar ácido ursodeoxicólico (20–30
mg/kg/dia).
187
188
Manual de Cuidados Intensivos em Gastroenterologia e Hepatologia
■
Nycomed
Referências Bilbiográficas
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Carrilho FJ; Martins MA; Alves VAF (eds). Clínica Médica – HCFMUSP. Editora Manole,
São Paulo, 2007 (no prelo)
2. Bittencourt P.L; Farias AQ; Carrilho FJ. Fígado e Drogas. In: Federação Brasileira de
Gastroenterologia. (Org.). Condutas em Gastroenterologia. 1ª ed. São Paulp: Revinter,
2004, p. 475-482.
3. Bourjeily G. Obstetric disorders in the ICU. Clin Chest Med 2009; 30: 89-102.
4. Bansal V, Schuchert VD. Jaundice in the Intensive Care Unit. Surg Clin N Am 2006; 86:
1495–1502.
5. Fuchs M, Sanyal AJ. Sepsis and cholestasis. Clin Liver dis 2008; 12:151-172.
6. Guglielmi FW, Regano N, Mazzuoli S, Fregnan S, Leogrande G, Guglielmi A, Merli M,
Pironi, L, Penco JMM, Francavilla A. Cholestasis Induced by Total Parenteral Nutrition.
Clin Liver Dis 2008; 12: 97–110.
Colangite Aguda Grave
35
Simone Muniz C. F. Cunha
Colangite é uma inflamação das vias biliares secundária a infecção bacteriana,
geralmente associada à obstrução biliar por cálculos, tumores ou manipulação
endoscópica ou radiológica das vias biliares (Tabela 1). Os sintomas clássicos
de febre, dor em hipocôndrio direito e icterícia estão presentes em 15% a 70%
dos casos e na ausência de tratamento evoluem frequentemente para sepse e
choque séptico. Os principais agentes isolados são gram-negativos, devendo-se
atentar para enterococos e anaeróbios, particularmente em pacientes idosos com
infecções graves (Tabela 2). A abordagem da colangite deve incluir avaliação
diagnóstica da obstrução subjacente das vias biliares (Tabela 3), antibioticoterapia
com cobertura baseada na flora bacteriana mais provavelmente associada à infecção dentro do contexto clínico específico (Tabela 2) e tratamento endoscópico,
radiológico ou cirúrgico visando descompressão das vias biliares.
190
Manual de Cuidados Intensivos em Gastroenterologia e Hepatologia
■
Nycomed
Tabela 1: Causas de Colangite
Cálculos
Coledocolitíase
Litíase Intra-Hepática
Neoplasias
Tumores de Papila
Neoplasia de pancreas
Colangiocarcinoma
Compressão extrínseca por tumores no hilo hepático
Manipulação das vias biliares
Endoscópica (CPRE)
Percutânea
Cirúrgica
Estenoses biliares
Fibróticas / Associadas a Cálculos
Pós-Cirúrgicas
Pós-Trauma
Isquêmicas (pós-quimioembolização intra-arterial)
Pancreatite Crônica
Pancreatite Crônica
Colangite Esclerosante
Parasitária
Ascaris lumbricoides
Clonorchis sinensis
Opisthorchis felineus
Opisthorchis viverrini
Fasciola hepatica
Tabela 2: Principais Agentes Isolados de Pacientes com Colangite
Aguda
E. coli
Pseudomonas spp *
Klebsiella spp
Enterococcus
Enterobacter spp
Clostridium spp **
Proteus spp
Bacteroides spp **
* Em pacientes com colangite pós-CPRE e colangiografia transhepática percutâena; ** Em indivíduos
submetidos à derivação bilio-digestiva; idosos e em portadores de infecções graves
Módulo V
■
Capítulo 35
■
Colangite Aguda Grave
Tabela 3: Sensibilidade e especificidade dos métodos radiológicos para
diagnóstico de obstrução biliar por cálculos
US 1
TC2
CPRM3
US(endo) 4
CPRE5
Sensibilidade (%)
25–63
71–75
85
93–98
90–97
Especificidade (%)
95–100
97
93
97–100
95–100
Exame facilmente disponível, não invasivo, operador-dependente, com baixa sensibilidade
particularmente para lesões ou cálculos no terço distal do colédoco
1
Vantagem sobre o US na detecção de cálculos de 1/3 distal do colédoco e intra-hepáticos, além
de lesões no parênquima hepático e pancreático. Maior desvantagem possibilidade de alergia e
nefrotoxidade por contraste IV
2
Maior acurácia para avaliação de coledocolitíase em comparação com TC, com custo maior e menor
capacidade de discriminação em cálculos < 6 mm, cálculos impactados na ampola de Vater e em
cálculos associados à dilatação de colédoco > 10 mm.
3
Exame de maior acurácia para detecção de coledocolitíase, mas de alto custo, operador dependente
e com baixa sensibilidade para detecção de lesões/cálculos proximais ou intra-hepáticos
4
5
Exame invasivo de alta acurácia com potencial terapêutico
Adaptado de (1,2)
Tabela 4: Causas de colestase aguda intra-hepáticas
Intrahepática benigna Recorrente
Colestase da Gravidez
Medicamentosas
Hepatites Colestáticas
Colestases puras
Colangites
Induzidas por vírus ou álcool
Miscelânia: Congestão passiva crônica, Sepse, Pós-operatória, Sepse, NPT
191
192
Manual de Cuidados Intensivos em Gastroenterologia e Hepatologia
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Nycomed
Tabela 5: Principais drogas responsáveis por lesão aguda colestática
Amineptina
Diazepan
Naproxeno
Amitriptilina**
Diltiazen
Nifedipina
Amoxicilina-acido
clavulânico*
Disopiramida
Nitrofurantoína
Anfotericina B
Enalapril
Noretandrolona*
Ampicilina*
Eritromicina*
Penicilamina
Azatioprina
Etionamida
Propafenona
Carbamazepina*
Fluxoridina*
Quinidina
Clorotiazida
Fluconazol
Ranitidina
Clorpropamazina***
Imipramina*
Rifampicina
Clorpropamida
Indometacina
Sais de ouro
Ciclosporina
Interleucina-2
Sulindac
Contraceptivos orais
Lovastatina
Tetraciclina
Cotrimoxazol*
Mercaptopurina
Tiabendazol*
Danazol
Metimazol
Tioridazina
Dapsona
Metiltestosterona*
Ticlopidina
Mianserina
Tolbutamida**
Obs.: Associação sugestiva caso o evento (colestase/colangite) ocorra 5-90 dias após o início do 1o
tratamento ou 1-90 dias após tratamentos subsequentes e haja redução > a 50%, em menos de 180
dias após a suspensão do medicamento.
* = Progressão para colangite intrahepática crônica e ductopênia: * excepcional (menos de 5
referências na literatura), ** rara (entre 5 e 20), *** frequente (mais de 20).
Módulo V
■
Capítulo 35
■
Colangite Aguda Grave
COLANGITE AGUDA
Febre, Dor hipocôndrio direito, Icterícia, Alteração do Sensório +
Colestase e/ou Elevação de AST/ALT
Dieta zero
Expansão volêmica de acordo com variáveis de perfusão
Analgesia com Hioscína/Novalgina ou Tramadol
Fitomenadiona 10 mg IV se RNI alargado
Antibioticoterapia por 7-10 dias
Ampicilina / sulbactam 1.5-3 g IV de 6/6 h (infecção comunitária leve)
Cefepime 1 g 8-12/8-12 h (infecção comunitária grave ou hospitalar) + Metronidazol
500 mg IV de 6/6 h no paciente idoso com anastomose biliodigestiva ou com
infecções graves
Piperacilina/Tazobactan 4,5 g IV de 6/6 h em casos de colangite pós-manipulação
endoscópica, radiológica ou cirúrgica das bias biliares. Dar preferência a meropenem 1
g IV de 8/8 h na suspeita de cepa ESBL ou pseudomonas multiresistente
Ultrassonografia de abdomen superior
Coledocolitíase ou
Dilatação de colédoco
com suspeita de
coledocolitíase
(colelitíase)
CPRE em 72 horas
para terapêutica
CPRE urgente na
presença de piora
clínica ou instabilidade
hemodinâmica
(avaliar colocação
inicial de prótese ou
dreno nasobiliar em
pacientes com choque
séptico ou sepse grave)
Considerar
drenagem
percutânea ou
cirúrgica no caso
de insucesso
Ausência de dilatação
de vias biliares
Investigar possibilidade de:
Migração de cálculos
Outro diagnósticos (Tabela 4)
Colangite/hepatite
colestática medicamentosa
(Tabela 5)
Cirrose ou pós-operatório de
Transplante de fígado com
colangite sem dilatação de ´
Árvore biliar
Avaliar individualmente
Conduta expectante
/ CPRM ou Biópsia
Hepática
Tumor de pâncreas /papila
Estenose benigna ou
neoplásica em terço médio
ou distal do colédoco
Dilatação de Colédoco ou
Vias Biliares Intra-Hepáticas
TC na SD de TU de
pâncreas / papila
CPRM na SD de
estenose benigna
de vias biliares
CT e/ou CPRM na
SD de estenose
neoplásica de vias
biliares
Estenoses benignas ou
tumorais de hilo hepático
ou intra-hepáticas
Considerar drenagem
percutânea
Avaliar possibilidade de
drenagem endoscópcia
individualmente
193
194
Manual de Cuidados Intensivos em Gastroenterologia e Hepatologia
■
Nycomed
Referências bibliográficas
1. Biour M, Poupon R; Grangé JD; Chazouillères O, Levy VG, Bodin F et al. Hépatotoxicité
des médicaments. 12e mise à jour du fichier bibliografique des atteintes hépatiques et des
médicaments responsables. Gastroenterol Clin Biol 1999; 23: 1310-1352.
2. Bittencourt PL, Farias AQ, Carrilho FJ. Fígado e Drogas. In Cordeiro FTM, Mattos AA
(eds.). Condutas em Gastroenterologia. 1ª edição, Federação Brasileira de Gastroenterologia,
São Paulo: Revinter, 2004, p 475-48
3. Waqar A. Qureshi. Approach to the patient who has suspected acute bacterial cholangitis.
Gastroenterology Clinics of North America. 2006, 35: 409-23.
4. Ian F. Yusoff, Jeffrey S. Barkun, Alan N. Barkun. Diagnosis and management of cholecystitis
and cholangitis. Gastroenterology Clinics of North America. 2003, 32: 1145-68.
Terapia Nutricional ao
Paciente Crítico
36
Sylvania Campos Pinho
Durante a última década a tarefa aparentemente simples de alimentar os pacientes críticos tornou-se complexa e com muitas controvérsias. Os resultados
de numerosos estudos clínicos estabeleceram os seguintes princípios:
1. Se o intestino é funcional, utilize-o
2. O papel do suporte nutricional é limitar o gasto proteico e suprir nutrientes
essenciais e condicionalmente essenciais
3. A nutrição parenteral total deve ser limitada a pacientes que após 5 a 7 dias
de jejum são incapazes de tolerar dieta enteral mesmo que em pequenas
quantidades.
4. Hiperalimentação está associada a complicações significativas incluindo
hiperglicemia, esteatose hepática, ureia sérica elevada e produção excessiva
de CO2.
5. Nenhum dado sugere que a medida precisa dos gastos energéticos e dos
requerimentos nutricionais melhorem o prognóstico, porém tendências
nos levam a crer que quanto mais críticos menor a oferta de nutrientes
chegando a < 20 kcal/kg/dia.
6. A diarreia na vigência de nutrição enteral deve ser investigada de acordo
com check list: história clínica, exame físico, checagem de drogas associadas
incluindo antibioticoterapia, fecaloma, diarreia infecciosa com pesquisa de
leucócitos fecais, tipo de dieta e administração.
7. Pacientes em choque prolongado ou uso de noradrenalina e/ou adrenalina
com sinais de má perfusão, lactato elevado, acidose metabólica, não devem
196
Manual de Cuidados Intensivos em Gastroenterologia e Hepatologia
■
Nycomed
entrar em suporte nutricional parenteral ou se já estiverem em uso devem
ter o mesma suspenso.
8. Uso de dopamina menor que 10ug/kg/min e dobutamina não contra-indicará
o uso de NP se o lactato sérico estiver normal.
9. Em pacientes com NP, dieta enteral sempre que possível, deve ser mantida
em volume baixo 15 mL/h para manter trofismo, barreira integra e estimulo
tecido imunológico intestinal.
10. Pacientes nefropatas agudos e crônicos hipercatabolicos devem receber 1,5g
Ptn /kg/dia, devendo ser discutida com a equipe de nefrologia indicação
de diálise
11. Pacientes hepatopatas devem receber aporte calórico adequado com reposição
de vitaminas lipossolúveis e do complexo B em todas as formas de cirrose.
Em cirróticos descompensados sem encefalopatia usar dieta hiperproteica
até 1,5g/Ptn/kg/dia; com encefalopatia considerar causa de descompensação
porém não restringir proteína e considerar a suplementação de zinco 600
mg/dia; cirrose descompensada em estágio final não usar terapia nutricional.
Pacientes transplantados iniciar com terapia nutricional enteral precoce. No
etilista suplementar tiamina, folato e magnésio.
12. Na DPOC inicialmente optar por reduzir calorias (25–30Kcal/kg/dia). Na
retenção de CO2 a proporção de carboidratos será a menor possível para
diminuir o trabalho respiratório
13. No obeso hipercatabólico, a oferta proteica deverá ser preservada mesmo
trabalhando com relação nitrogênio:caloria próxima de 1:80 com objetivo
preservar massa magra.
14. Na pancreatite aguda grave, iniciar precocemente suporte nutriconal por
via enteral jejunal, dieta semi-elementar ou polimérica.
Módulo V
■
Capítulo 36
■
Terapia Nutricional ao Paciente Crítico
Pacientes com risco nutricional conforme avaliação ou desnutrido que não conseguem
ingerir por via oral uma quantidade adequada de alimentos ( avaliação ingestão oral )
Trato gastrointestinal funcionante /
hemodinamica estável
Não (obstrução intestinal/
fistulas de alto debito )
Nutrição parenteral
Sim (anorexia nervosa / doença
neurológicas / pré- e pos operatório
de queimaduras / politraumatismo
/ pancreatite doença /inflamatória
intestinal / fistulas altas)
Central via exclusiva ou
periférica se TNP < 5 dias
Suplementação via oral
Nutrição enteral (pacientes que não conseguem se
alimentar por via oral dentro 3 dias)
Risco de aspiração ( considerar uso e metaclopramida e eritromicina )
Não
Sim
Sonda nasogastrica ou gastrostomia
Posição jejunal ou jejunostomia
Dieta imunomuduladora: arginina
e/ou omega 3 em pacientes com
cirurgia gastrointestinal eletiva
Associar dieta enteral minima
sempre que possível
Dieta imunomoduladora: arginina e/
ou omega 3 no trauma / sepse com
Apache < 15 ou SDRA
Glutamina em queimados e trauma
Nutrição enteral precoce se possível
(estável )
Via enteral preferencial
Checar exames laboratoriais – incluir
eletrolitos e albumina serica
Calculo das necessidades: Inicialmente
20Kcal /kg/dia (fase catabólica)
evoluindo para 25Kcal/kg/dia na fase
anabólica .
Evitar hiperalimentar
Dieta polimérica hiperproteica 1,2 a
1,5g Ptn/kg/dia
197
198
Manual de Cuidados Intensivos em Gastroenterologia e Hepatologia
■
Nycomed
Referencias Bibliográficas
1. Heidegger CP, Darmon P, Pichard C. Enteral vs parenteral nutrition for the critically
ill patient: a combined support should be preferred. Current Opinion in Critical Care
2008, 14:408-414
2. Plautha M, Cabre E, Riggio O, Assis-Camilo M, Pirlich M. Kondrup J. ESPEN Guidelines
on Enteral Nutrition: Clinical Nutrition (2006) 25, 285–294
3. Heyland DK, MacDonald S, Keefe L., Drover JW. Total parenteral nutrition in the critically
ill patient: a meta- analysis. JAMA. 1998;280:2013-2019.
Hepatite Alcoólica
37
Liana Machado de Codes
É caracterizada por dano hepatocelular agudo induzido pelo álcool, ocorrendo
frequentemente em paciente com cirrose hepática de etiologia alcoólica. Maior
risco para doença alcoólica do fígado é observado em homens e mulheres com
ingestão etílica habitual, respectivamente, de 80 g/dia e 20 g/dia, sendo observada
hepatite alcoólica em 20% a 40 % dos casos. O quadro clínico é variável, podendo
o paciente estar assintomático e exibir apenas alterações laboratoriais (leucocitose,
elevação de aminotransferases < 300 UI/L com relação AST/ALT > 2, elevação
de GGT e de volume corpuscular médio transaminases < 400 UI) ou apresentar
manifestações graves de doença hepática: icterícia, ascite, encefalopatia, disfunção renal e coagulopatia. A mortalidade de pacientes hospitalizados é estimada
em torno de 50 à 75%. As principais causas de óbito são insuficiência hepática,
sepse, sangramento digestivo e síndrome hepatorrenal. O diagnóstico é dado
pela história de consumo de álcool e alterações clínico-laboratoriais, embora o
padrão-ouro para o diagnóstico da hepatite alcoólica (HA) seja a biópsia hepática que evidencia nesses pacientes necrose hepatocelular associada a infiltração
neutrofílica associada ou não à esteatose e presença de corpúsculos de Mallory.
Existem várias classificações prognósticas disponíveis: Função discriminante
(FD) de Maddrey, sistema MELD, classificação de Child Turcotte-Pugh, modelo
prognóstico de Lille e score de pontuação de Glasgow. O score prognóstico que
apresenta maior acurácia é o de Lille, mas o mais empregado para avaliação de
necesidade de tratamento é a FD de Maddrey. Um valor acima de 32 é associado a
alto risco de mortalidade a curto-prazo e determina a necessidade de tratamento
especifico com corticoides ou pentoxifilina. Medidas associadas a impacto na
sobrevida desses pacientes incluem abstinência alcoólica e suporte nutricional.
200
■
Manual de Cuidados Intensivos em Gastroenterologia e Hepatologia
Nycomed
Tabela 1: Função discriminante(FD) de Maddrey modificada:
FD= 4.6 (tempo de protrombina [segundos] – TP controle [segundos]) + bilirrubina total
(mg/dL).
Obs.: Um valor acima de 32 é associado a alto risco de mortalidade em curto prazo e determina a
necessidade de tratamento especifico.
Tabela 2: Model for End-stage Liver Disease (MELD):
3.8 x log BT (mg/dL) + 11.2 x log INR + 9.6 x log creatinina (mg/dL)
Obs.: MELD > 11 se associa significantemente a menor sobrevida em 30 dias (45% vs. 96%)
Tabela 3: Glasgow Alcoholic Hepatitis Score (GAHS)
Variáveis
1
2
3
Idade (anos)
< 50
≥ 50
–
Contagem de
leucócitos (109/L)
<15
≥ 15
–
Urea (mmol/L)
<5
≥5
–
INR
<1.5
1.5–2.0
>2.0
BT (mg/dL)
<7.4
7.4–14.8
>14.8
Obs.: GAHS > 9 se associa a pior prognóstico
Tabela 4: Modelo de Lille (http://www.lillemodel.com)
R = 3.19 - 0.101 x idade (anos) - 0.147 x (albumina no dia 0 em g/L) - 0.0165 x
(evolução da BT em mmol/L) - 0.206 x (insuficiência renal) - 0.0065 (BT no dia 0 em
mmol/L) – 0.0096 x (TP em segundos)
Insuficiência renal: 0 se ausente; 1 se presente (> 1,3 mg/mL)
Valor final de R entre 0-1
Valor de R < 0,45 se associa a maior mortalidade em 6 meses (25% vs. 85%, p < 0.000001) e
ausência de resposta aos corticosteroides
Tabela 5: Contra-Indicações ao Uso dos Corticoides na Hepatite
Alcoólica
Infecção em atividade
Ulcera péptica ativa ou sangramento digestivo recente ( < 15 dias)
Neoplasias
AgHBs+ ou Elisa HIV +
Módulo V
■
Capítulo 37
■
Hepatite Alcoólica
Hepatite Alcoólica
Sinais Clínicos e Laboratoriais
Antecedente de ingesta alcoólica compatível
Febre / Icterícia / Anorexia / Hepatomegalia / Encefalopatia
Coagulopatia / Leucocitose / AST e ALT < 300 UI / AST/ALT > 2 / Elevação de GGT e de
VCM
Diagnóstico presuntivo de HA na exclusão de outras causas de hepatopatia
(Avaliar biópsia hepática percutânea ou transjugular em casos duvidosos)
Medidas Gerais
Abstinência alcoólica definitiva
Reposição hidro-eletrolítica, de vitamina K 10 mg IV SN, tiamina 300 mg/dia , acido
fólico 5 mg/dia
Suporte nutricional precoce para 30-50 kcal/kg/dia e 1.0-1.5 g/kg de proteína/dia
Avaliação e rastreamento de complicaçoes (vide algoritmo de abordagem do paciente
com cirrose; ascite; hidrotórax, encefalopatia, insuficiência renal e infecções)
Avaliação prognóstica (vide tabelas 1-5)
Função discriminante ≥ 32
Prednisona 40 mg/dia por 28 dias sob
hospitalização com desmame gradual posterior
em 24 semanas na ausência de contra-indicações
aos corticoides (Tabela 5)
(Na incapacidade de ingesta oral:
Metilprednisolona 32 mg EV /dia)
Avaliação de resposta:
Se BT no D7 < BT em D0, prosseguir tratamento
até D28
Se ausência de queda ou elevação de BT noD7,
interromper tratamento
Pentoxifilina 400 mg VO, 3 vezes ao dia,
durante 28 dias na presença de contraindicações aos corticoides (Tabela 5)‫‏‬
Função discriminante < 32
Tratamento conservador
Suporte psicossocial
Encaminhamento a grupos
de suporte
(Alcoólicos Anônimos)
201
202
Manual de Cuidados Intensivos em Gastroenterologia e Hepatologia
■
Nycomed
Referências Bibliográficas
1. Sass & Shaikh. Alcoholic Hepatits. Clin Liver Dis 10 : 219-37, 2006
2. Louvet A. The Lille model: a new tool for therapeutic strategy in patients with severe
alcoholic hepatits treated with steroids. Hepatology,45(6): 1348-54, 2007.
3. Mathurin P et al. Early Change in Bilirubin Levels is an Important Prognostic Factor in
Severe Alcoholic Hepatits Treated with Prednisolone. Hepatology,38:1363-9, 2003.
4. Mathurin P. Corticosteroids for Alcoholic Hepatits_What’s next? J Hepatol, 43: 526-33,
2005.
Sepse Intra-abdominal
38
Matheus Tannus
Sepse intra-abdominal é uma manifestação sistêmica de peritonite grave.
Peritonite é definida como um processo inflamatório do peritônio causado por
agentes irritantes, tais como: bactérias, fungos, vírus, talco, drogas, granulomas
ou corpos estranhos. O espectro clínico das peritonites pode ser classificado de
acordo com sua patogênese em:
1. Peritonite primária: infecção do peritônio causada disseminação hematogênica por translocação bacteriana de microorganismo de flora entérica
que ocorre em pacientes imunodeprimidos, particularmente em cirróticos
com ascite (ver algoritmo de infecções no cirrótico) e síndrome nefrótica.
A flora é usualmente monomicrobiana: E. Coli , Proteus, Pseudomonas,
Klebsiella sp.
2. Peritonite secundária: infecção peritoneal que resulta de inflamação ou quebra
mecânica de integridade do trato intestinal ou urinário ou órgãos sólidos
(vide algoritmo de abdômen agudo). Pode ser classificada como peritonite
aguda por perfuração, pós-operatória ou pós-traumática. O quadro clínico
da peritonite inflamatória é de abdômen agudo com irritação peritoneal
(vide algoritmo de abdômen agudo). A peritonite pós-operatória ocorre em
1%-20% das laparotomias exploradoras e cirurgias eletivas, geralmente entre
o 5º e 10º dia de PO, podendo ser secundária a deiescência ou vazamento
de conteúdo intestinal pela anastomose; persistência de peritonite residual
por drenagem ineficaz do foco séptico e/ou incapacidade do peritoneo em
debelar a infecção. A flora é usualmente polimicrobiana: E. Coli; Proteus,
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Manual de Cuidados Intensivos em Gastroenterologia e Hepatologia
■
Nycomed
Pseudomonas, Streptococcus do grupo D, Klebsiella sp, Staphyilococcus sp, B.
fragilis, Clostridium
3. Peritonite terciária: definida como infecção intra-abdominal persistente ou
recorrente, após um tratamento aparentemente adequado de uma peritonite
primária ou secundária. Deve ser investigada em todo paciente que apresente
persistência ou recorrência de infecção/sepse e/ou progressão ou nova disfunção orgânica após 48 horas de antibioticoterapia e drenagem cirúrgica.
Não são observados na peritonite terciária coleções a ultrassonografia ou
tomografia computadorizada e exsudato purulento à laparotomia. Culturas
do líquido ascítico são frequentemente negativas, sendo recomendado
cultivo de fragmentos do peritoneo para melhor identificação de flora. A
flora é pode ser monomicrobiana ou polimicrobiana, incluindo os agentes
descritos para peritonite secundária, mais fungos e particularmente flora
gram-negativa produtora de ESBL e Pseudomonas com padrão de resistência
aos beta-lactâmicos.
As principais complicações da sepse intra-abdominal são: síndrome do compartimento abdominal (vide algoritmo); deiscência de suturas e fístulas (vide
algoritmo), infecção de ferida operatória e abscessos intra-abdominais.
Módulo V
■
Capítulo 38
■
Sepse Intra-abdominal
Tabela 1. Esquemas antibióticos empíricos utilizados no tratamento da
sepse intra-abdominal
Monoterapia
Terapia Combinada
Peritonite secundária
leve a moderada
comunitátia
Sulbactam/ampicilina
Ertapenem
Tigeciclina
Cefriaxone + Metronidazol
Cefepime + Metronidazol
Ciprofloxacino + Metronidazol
Peritonite secundária
grave comunitária
com possibilidade de
resistência bacteriana*
Imipenem
Meronem
Piperacilina/Tazobactam
(evitar se risco de flora ESBL)
Cefepime + Metronidazol
Peritonite secundária
hospitalar
Imipenem
Meronem
Piperacilina/Tazobactam
(evitar se risco de flora ESBL)
Imipenem /Meronem +
Vancomicina ou Linezolida
Imipenem /Meronem +
Fluconazol (peritonite fecal)
Piperacilina/Tazobactam
(evitar se risco de flora ESBL)+
Vancomicina ou Linezolida +
Fluconazol (peritonite fecal)
Peritonite terciária
(com possibilidade de
resistência bacteriana)
Imipenem /Meronem +
Vancomicina ou Linezolida
Imipenem /Meronem +
Fluconazol
* APACHE II > 15; Contato prévio com serviços de saúde; internação hospitalar
nos últimos 30 dias, idade igual ou superior a 65 anos, uso de corticoides ou
imunossupressores
205
206
Manual de Cuidados Intensivos em Gastroenterologia e Hepatologia
■
Nycomed
SEPSE INTRA-ABDOMINAL
Suspeita diagnóstica de sepse intra-abdominal
Ressuscitação inicial (sepse grave):
Imediata em pacientes com hipotensão ou lactato sérico elevado.
Metas: PVC : 8-12 mm Hg / PAM : ≥ 65 mmHg, diurese : ≥ 0,5 mL/kg/hora / Saturação
venosa central de oxigênio (SvcO2): ≥ 70%
Se SvcO2 < 70%, considerar transfusão de hemácias e/ou dobutamina (dose máxima 20
mcg/kg/min)
Diagnóstico
Colher duas ou mais hemoculturas antes de iniciar antibioticoterapia.
Colher amostra para culturas de líquido peritoneal ou de abscesso obtida por punção
percutânea ou laparotomia. Considerar coleta de fragmentos de peritônio na peritonite
terciária
Antibioticoterapia
Iniciar a antibioticoterapia até 1 hora do diagnóstico de sepse grave (vide tabela 1)
Reavaliar a antibioticoterapia 48-72h após o início do tratamento com o objetivo de
diminuir o espectro antibiótico.
Considerar associação de drogas em pacientes neutropênicos e com infecção por
Pseudomonas.
Controle do Foco Infeccioso
Detectar o provável foco infeccioso e se possível realizar drenagem de abscesso ou
desbridamento tecidual
Instituir as medidas para controle do foco infeccioso tão logo ele seja diagnosticado:
eliminação da fonte de infecção; lavagem exaustiva da cavidade com soro fisiológico
a 0,9% até retorno claro e drenagem da cavidade abdominal; prevenção de peritonite
secundária em pacientes de risco
Adequado controle da
fonte de infecção
Drenagem efetiva
Ausência de peritonite
fecal difusa, instabilidade
hemodinâmica,
hipertensão intraabdominal
Fechamento primário
Falência em obter adequado controle do foco
infeccioso
Drenagem pobre ou inadequada
Presença de peritonite fecal difusa, instabilidade
hemodinâmica, hipertensão intra-abdominal
Isquemia mesentérica
Infecção necrotizante de parede abdominal
Laparotomia tipo controle de dano no trauma
Considerar peritoniostomia com relaparotomia programadas
Módulo V
■
Capítulo 38
■
Sepse Intra-abdominal
Terapia com Volume
Usar cristaloides ou coloides
Administrar de 500 a 1000 mL de cristaloides ou 300 a 500 de coloides em 30
minutos em pacientes com perfusão tecidual inadequada. Repetir caso PAM e o débito
urinário não se elevem na ausência de sinais de sobrecarga de volume intravascular.
Atentar para o risco de síndrome de compartimento abdominal na reposição volêmica
agressiva
Mensurar pressão intra-abdominal em pacientes sob risco (algoritmo de síndrome de
compartimento abdominal)
Vasopressores
Iniciar os vasopressores por via central (dopamina/noradrenalina) caso a expansão com
cristaloides ou coloides não otimize a perfusão tecidual e os níveis pressóricos
Não empregar dose baixa de dopamina visando proteção renal
Instalar PAM invasiva em todo paciente usando vasopressores
Iniciar tatamento adjuvante com vasopressina caso o paciente permaneça com choque
refratário a despeito da restauração da volemia e altas doses de vasopressores
Terapia Inotrópica
Avaliar uso de dobutamina em pacientes com débito baixo apesar da ressuscitação
volêmica
Corticoterapia
Em pacientes que necessitem de vasopressor em dose alta, a despeito da reposição
volêmica adequada, deve-se iniciar hidrocortisona (200 a 300 mg/d).
Diminuir a dose de corticoide caso o choque séptico seja revertido.
Diminuir de forma escalonada a dose de corticoterapia no final da terapia.
Proteína C Ativada Recombinante Humana
Considerar em pacientes com disfunção orgânica induzida pela sepse associada a alto
risco de morte (APACHE II ≥ 25 ou mais de duas disfunções orgânicas).
Administração de Hemoderivados
Transfundir concentrado de hemácias após resolução de hipoperfusão tecidual quando
a hemoglobina estiver abaixo de 7 g/dL e tenha como alvo 7 a 9 g/dL na ausência de
doença arterial coronariana significativa ou sangramento
Não usar eritropoetina para anemia relacionada à sepse.
Não usar plasma fresco para corrigir distúrbio de coagulação a menos que exista
sangramento ou previsão procedimento invasivo.
Não usar terapia com anti-trombina
Transfundir plaquetas como profilaxia de sangramento quando o nível de plaquetas
estiver menor que 5.000/mm3.
Transfundir plaquetas quando o nível estiver entre 5.000 a 30.000 e exista risco de
sangramento. Caso seja necessária cirurgia ou procedimento invasivo, manter as
plaquetas acima de 50.000.
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Manual de Cuidados Intensivos em Gastroenterologia e Hepatologia
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Nycomed
Ventilação Mecânica em Pacientes com Lesão Pulmonar Aguda ou SARA induzida por
Sepse.
Evitar associação de volumes correntes altos com pressão de platô elevada. Ter como
objetivo reduzir o volume corrente até 6 mL/kg em 1 a 2 horas e manter a pressão de
platô menor que 30 cmH2O.
Se necessário estabelecer hipercapnia permissiva
Escolher um nível de PEEP que evite colapso pulmonar.
Escolher PEEP baseada na PaO2/FiO2 e guiada pela FiO2 necessária para manter
oxigenação adequada ou escalonar as PEEP de acordo.
Previnir pneumonia associada à ventilação mecânica mantendo a cabeceira elevada a
45 graus.
Usar protocolos de desmame e fazer teste de ventilação espontânea diariamente para
avaliar a retirada da ventilação mecânica.
As opções de teste para ventilação espontânea incluem baixo nível de pressão de
suporte com PEEP de 5 cmH2O ou tubo T.
Teste para ventilação espontanea quando o paciente estiver: colaborativo; com a
hemodinâmica estável, sem vasopressores; sem nenhum novo evento grave; com
parâmetros baixos de ventilação
Considerar extubação se o teste for bem sucedido.
Sedação, Analgesia e Bloqueio Neuromuscular em Sepse.
Usar protocolos de sedação para pacientes em ventilação mecânica.
Escala de sedação objetiva deve ser usada como guia para sedação com alvo de
sedação estabelecido
Usar infusão intermitente ou contínua com interrupção diária que permita o despertar.
Evitar bloqueadores neuromusculares se possível.
Uso de Bicarbonato
Em condições de hipoperfusão tecidual refletida por lactacidemia não está indicado o
uso de bicarbonato com intuito de melhora de hemodinâmica ou redução de
vasopressores, exceto em pacientes selecionados, com o pH menor que 7,15.
Profilaxia de Trombose Venosa Profunda (TVP)
Usar heparina de alto ou baixo peso molecular.
Usar meias de compressão ou método de compressão intermitente, quando heparina
for contra-indicada.
Em pacientes com alto risco de TVP utilizar a combinação de terapia com heparina e
métodos mecânicos
Profilaxia de Lesão aguda de mucosa gástrica:
Considerar IBP ou bloqueador de receptor H2
Suporte nutricional: (vide algoritmo)
Módulo V
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Capítulo 38
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Sepse Intra-abdominal
Reavaliação clínica em 48 horas após correção
cirúrgica ou percutânea de foco infeccioso
Infecção ou sepse persistente
Progressão ou nova disfunção orgânica
Dor abdominal persistente
Íleo prolongado
Distensão abdominal
Intolerância a nutrição enteral
Re-laparotomia de demanda
Referências Bibliográficas
1. Dellinger RP, Levy MM, Carlet JM, et al. Surviving Sepsis Campaign: international
guidelines for management of severe sepsis and septic shock: 2008. Crit Care Med
2008;36(1):296-327.
2. Ordoñez CA, Puyana JC. Management of Peritonitis in the Critically Ill Patient. Surg
Clin N Am 86 (2006) 1323-1349.
3. Rutherford E, Skeete D, Brasel K. Management of the Patient with an Open Abdomen:
Techniques in Temporary and Definitive Closure. Curr Probl Surg 2004;41:821-876.
4. Strauss E, Caly RW. Peritonite bacterian espontânea. Revista da Sociedade Brasileira de
Medicina Tropical 2003; 36:711-717.
209
Fístulas Digestivas
39
Cláudio Celestino Zollinger
Paulo Lisboa Bittencourt
É caracterizada pela formação de uma comunicação anormal entre duas
superfícies epitelizadas, sendo definida como fístula externa quando o trajeto
se dá entre uma víscera oca (esôfago, estõmago, duodeno, intestino delgado
proximal e distal e intestino grosso) e a pele e interna, quando ocorre entre duas
vísceras ocas. A maioria das fístulas são pós-operatórias e ocorrem com maior fre
quência em cirurgias de grande porte (com mais de uma anastomose digestiva);
cirurgias oncológicas, emergências cirúrgicas, trauma, anastomose precária e
sob tensão, desnutrição, presença de corpo estranho, irradiação prévia, uso de
corticoides e presença de doença de Crohn. Sua ocorrência se associa a alta morbimortalidade, longa permanência intra-hospitalar e altos custos relacionados
ao tempo de internação (4-6 semanas) frequentemente em unidade de terapia
intensiva e necessidade de reintervenções cirúrgicas. A mortalidade associada a
ocorrência de fístulas intestinais varia de 20%-40% e a causa principal de óbito
é sepse intra-abdominal. A maior probabilidade para aparecimento de fístula é
entre o 5º e 10º dia de pós-operatório.
As fístulas intestinais são classificadas como: de alto (≥ 500 mL/24 horas) e
baixo (< 500 mL/24 horas) débito; de trajeto simples ou complexo; de abertura
lateral ou terminal. Se associam a complicações sérias, tais como: distúrbios hidroeletrolíticos e ácido-básicos; desnutrição, lesões de pele e de ferida cirúrgica;
infecção de ferida cirúrgica, evisceração e sepse intra-abdominal. O tratamento
das fístulas intestinais se baseia em:
212
Manual de Cuidados Intensivos em Gastroenterologia e Hepatologia
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Nycomed
correção dos distúrbios hidro-eletrolíticos e ácido-básicos;
tratamento da sepse;
suporte nutricional;
proteção da pele nas fístulas externas;
controle do débito;
localização e definição do trajeto;
tratamento cirúrgico auxiliar (ostomias; drenagem de abscesso/ressecção);
tratamento cirúrgico definitivo.
Tratamento conservador Pode se associar a fechamento espontâneo de fistulas
em 30%-70% dos casos.
Tabela 1: Fatores que atuam favoravelmente e desfavoravelmente no
fechamento das fístulas intestinais
Favoráveis
Desfavoráveis
Anatômicos
Trajeto longo > 2cm
Trajeto único
Ausência de outras fístulas
Fístula lateral
Trajeto não epitelizado
Fístula com origem no jejuno,
cólon, coto duodenal ou
fístula pancreatobiliar
Ausência de abscesso
Trajeto curto < 2 cm
Trajetos múltiplos
Fístulas internas associadas
Fístula terminal
Trajeto epitelizado
Fístula com origem no
estômago, íleo e na porção
lateral no duodeno
Presença de abscesso
Estado do trato
digestivo
Sem doença intestinal
Dç de Crohn, enterite por
radiação, neoplasia residual
ou recorrente
Ausência de obstrução distal
Presença de obstrução distal
Defeito intestinal < 1 cm
Defeito intestinal > 1 cm
Intacta
Incisão aberta ou evisceração
Sem doença
Com infiltração maligna
Parede abdominal
Sem corpo estranho
Com corpo estranho (tela)
Nutrição
Bom estado nutricional
Desnutrido
Drenagem da fístula
Baixa
Alta
Módulo V
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Capítulo 39
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Fístulas Digestivas
Fistulas Digestivas
Abordagem inicial
Expansão volêmica de acordo com variáveis de perfusão
Correção dos distúrbios hidroeletrolíticos e ácido-básico
Investigar e tratar agressivamente sepse intra-abdominal
Antibioticoterapia inicial de largo espectro a depender do perfil mais provável de
microorganismos envolvidos (topografia da fístula/antibioticoterapia prévia/risco de infecção
por pseudomo as e cepas ESBL)
Drenagem de coleções e abscessos: inspeção de ferida cirúrgica e drenos, investigação de
coleções por US e/ou CT com punção percutânea ou drenagem cirúrgica
Localização da fístula: CT/ EREED / Enema opaco / Fistulografia
Esofágica / Ileo Distal / Cólon
Gástrica / Duodenal / Jejuno-Ileal
Avaliar Nutrição Enteral
Intolerância
Aumento do Débito da Fístula
Nutrição Parenteral Total
Alto débito
Avaliar uso de octreotide
Não
Melhora clínica
Redução do débito da fístula
Sim
Avaliar e corrigir causas de
refratariedade ao tratamento clínico
(Tabela 1)
Manter tratamento conservador
Expectar 4-6 semanas para observar
fechamento espontâneo da fístula
Ausência de melhora
Ausência de fechamento espontâneo
Risco cirúrgico baixo
Risco cirúrgico alto
Tratamento cirúrgico definitivo
Considerar manutenção de tratamento
de suporte
213
214
Manual de Cuidados Intensivos em Gastroenterologia e Hepatologia
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Nycomed
Referências Bibliográficas
1. Feldman M, Friedman, Sleisenger MH, eds. Sleisenger & Fordtran’s gastrointestinal and
liver disease. 7.ed. Philadelphia: WB Saunders; 2002: 2285-86.
2. Townsend CM, Beauchamp RD, Evers BM, Mattox KL, Sabiston Textbook of surgery.
17.ed. St. Louis: WB Saunders; 2003: 1497-1500.

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