I consenso Brasileiro de Transplante renal Módulo 5: Nefrectomia

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I consenso Brasileiro de Transplante renal Módulo 5: Nefrectomia
I consenso Brasileiro de Transplante renal
Módulo 5: Nefrectomia no doador vivo
Equipe:
Antônio Marmo Lucon
Jurandir Costa
Tibério Moreno de Siqueira Jr.
José Genilson Alves Ribeiro
Introdução
O transplante renal é a melhor alternativa para o paciente
portador de insuficiência renal crônica terminal.1 Transplante
renal intervivos apresenta melhor sobrevida do receptor e do
enxerto em 10 anos, quando comparado com o transplante
cadavérico.2
Escolha do rim a ser doado:
O melhor rim deve ser deixado com o doador.1,3(C-IV) No
caso de artérias múltiplas, o rim com menos artérias é a
melhor opção para doação.4(D-V) Por apresentar uma irrigação
terminal, deve-se dissecar cuidadosamente todas as artérias
acessórias e preservá-las. Os vasos do polo superior que
irrigam uma pequena área isolada do rim podem ser
seccionados sem dificuldades, colocando-se antes um pinça
hemostática sobre a artéria para determinar a área de tecido
renal que ficará infartada. Os segmentos renais inferiores a 2
cm de diâmetro não apresentam complicações quando se
infartam, todavia áreas de tamanho superior podem ser
perigosas porque é possível que provoque necrose extensa
que eventualmente conduza a uma fístula urinária calicial. Os
vasos acessórios da porção média do rim e do polo inferior
devem se respeitados porque podem irrigar a pelve renal e o
ureter.
Quando o doador apresentar veias renais múltiplas, as
veias renais secundárias de menor calibre podem ser ligadas
sem risco de hipertensão venosa no enxerto. Naqueles casos
em que as veias apresentam calibres iguais, conserva-se
uma delas, a que for melhor para anastomose.4(D-V)
Tradicionalmente, o rim esquerdo é o escolhido, pois possui
uma veia mais longa. No caso de doadoras em fase
reprodutiva, o rim direito deve ser o eleito para doação, pois
durante a gestação, a incidência de ureteroidronefrose direita
e pielonefrite é maior.5(D-V) Nos casos de nefrectomia
laparoscópica, o rim esquerdo deve ser o escolhido para
doação, pois além de possuir uma veia mais longa, há relato
de casos de trombose de veia renal direita e risco de
sangramento
por
desclampeamento
acidental
quando
utilizado o Satinski laparoscópico.6,7(C-IV)
Vias de acesso:
A via de acesso para a nefrectomia deve ser decidida
levando-se em conta vários fatores que são primordiais para
o sucesso do transplante. Em relação ao rim, deve-se
procurar o acesso que proporcione maior segurança à
cirurgia reduzindo ao máximo o tempo de isquemia quente.
Para o doador renal o procedimento cirúrgico deve ser o
menos traumático, causando o menor afastamento possível
do paciente de suas atividades habituais. A estética também
deve ser uma das preocupações na escolha da via de
acesso. Finalmente o cirurgião deve utilizar uma técnica por
ele dominada da qual se tenha todos os recursos técnicos e
tecnológicos para realizá-la com segurança.
A nefrectomia pode ser realizada por lombotomia, por via
anterior (intra ou extra-peritonial) ou por via laparoscópica
(com ou sem o auxilílio da mão) .
Lombotomia:
É a técnica mais difundida e tradicional para realização
de transplante intervivos. Geralmente a décima-primeira ou a
décima-segunda costela é ressecada.8 Menos comumente o
acesso pode ser realizado por via subcostal. Podem ser
utilizadas incisões menores do que as lombotomias clássicas
que resultam em menor morbidade e melhor estética.9(C-IV)
Via anterior:
A nefrectomia pode ser realizada pela via intra ou extraperitoneal a critério da equipe. Esta via tem como vantagens:
menor secção muscular, preservação dos nervos intercostais
e consequentemente menor flacidez da parede abdominal,
prevenção de pneumotórax e melhor estética.10(C-IV)
Nefrectomia laparoscópica:
A nefrectomia laparoscópica tem se mostrado muito
segura,
apresentando
resultados
comparáveis
com
a
nefrectomia aberta.11-14 Adicionalmente, a via laparoscópica
tem as vantagens de causar menos dor pós-operatória, alta
hospitalar
e
retorno
às
atividades
habituais
mais
precocemente e, melhor estética.15,16(B-III) O rim pode ser
retirado
por
uma
incisão
mediana
infraumbilical,
de
Pfannenstiel ou para-retal.17(C-IV) Pode-se optar pela técnica
assistida com a mão. A nefrectomia assistida com a mão, tem
mostrado resultados semelhantes à nefrectomia puramente
laparoscópica.18-20 A primeira é também utilizada com a
intenção de se diminuir as complicações relacionadas com a
curva de aprendizado. Esta opção permite ainda tempo de
isquemia quente menor.21(C-IV)
Comparação entre nefrectomia aberta e laparoscópica:
As técnicas laparoscópicas têm apresentado grande evolução
e resultados comparáveis à nefrectomia aberta na grande
maioria dos parâmetros. Vantagens e desvantagens se fazem
presentes em múltiplas variáveis a serem avaliadas:
Tempo cirúrgico: o tempo cirúrgico é ainda menor na
nefrectomia aberta. Mesmo a nefrectomia laparoscópia
assistida pela mão tende a apresentar um maior tempo
cirúrgico.22(C-IV)
Tempo de internação e retorno às atividades habituais: os
tempos
de
internação
e
de
convalescência
são
significativamente reduzidos nas cirurgias laparoscópicas,
assim como o uso de analgésicos.23,24(C-IV)
Custo: o gasto com material cirúrgico na nefrectomia
laparoscópica é maior.25(C-IV)
Isquemia quente: o tempo de isquemia quente tende a ser um
pouco maior na laparoscopia convencional e intermediário na
assistida com a mão, comparados com a nefrectomia
aberta.25(C-IV)
Função do rim transplantado: apesar do maior tempo de
isquemia quente apresentado pela nefrectomia laparoscópica,
a função do rim transplantado após 6 meses, não apresenta
diferença estatisticamente significativa quando comparado ao
rim retirado por nefrectomia aberta.26(A-II) A queda dos níveis
de creatinina
é mais lenta quando se usa a via
laparoscópica.
Estética: a cirurgia laparoscópica apresenta melhor resultado
estético. Este fator associado à menor dor pós-operatória é
responsável por um aumento do número de doadores vivos
em alguns centros de transplante renal.27-28
Recomendações
•
A lombotomia ainda é a técnica padrão-ouro para
nefrectomia do doador-vivo 9(C-IV);
•
Alternativamente, a nefrectomia pela via anterior ou a
laparoscópica pode ser empregada 10,11(C-IV);
•
A técnica laparoscópica já é uma opção aceita e pode
ser empregada quando a equipe cirúrgica tenha uma larga
experiência com cirurgia laparoscópica e haja material
adequado 14,15,16(B-III);
•
A nefrectomia assistida com a mão é uma variação da
técnica laparoscópica e que pode ser usada, de acordo com
a preferência da equipe cirúrgica26(A-II);
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