de revisão e educação - SBOT-RJ

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de revisão e educação - SBOT-RJ
AOT
Arquivos em Ortopedia e Traumatologia
Ano 1 – Fascículo 1 – Maio 2003
de revisão
e educação continuada
Programa
Criada na atual diretoria da Sociedade Brasileira de Ortopedia
e Traumatologia, regional Rio de Janeiro, a Comissão Estadual de
Educação Continuada ambiciona estimular ainda mais a difusão de
conhecimento ao ortopedista do nosso estado.
Arquivos em Ortopedia e Traumatologia (AOT) vem ocupar espaço
necessário, neste século de informação, para nossos associados.
Uma regional tão rica em eventos de educação continuada, ensino e
treinamento, realizadora de congressos, jornadas, simpósios, cursos
avançados, cursos de imersão e reuniões científicas de comitês
de especialidades, merece este periódico como registro de temas
importantes da especialidade. Serão publicados artigos de revisão
elaborados por membros da SBOT, comparando sua visão crítica e
experiência pessoal às apresentadas nas mais importantes publicações
Expediente
EXPEDIENTE
Editores científicos
Pedro Ivo de Carvalho
César Rubens Fontenelle
Diretoria da SBOT/RJ
Pedro Ivo de Carvalho
João Matheus Guimarães
César Rubens Fontenelle
Ney Pecegueiro do Amaral
Paulo Roberto Barbosa
Jorge Luiz Penedo
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Carlos Alfredo Jasmin
Manoel Ilídio Pinheiro
Vincenzo Giordano
Emílio Freitas
CEC/RJ
César Rubens Fontenelle
Vincenzo Giordano
Marcos Giordano
Marcos Britto
Carlos Alberto Araújo Neto
Marcos Musafir
Renato Graça
nacionais e internacionais sobre as patologias de maior prevalência
em nosso meio.
Esperamos que esta seja a pedra fundamental de uma grande obra
a ser lapidada por todos nós em prol dos ortopedistas de nosso país.
Pedro Ivo de Carvalho e César Fontenelle
Editores científicos
Sumário
Perspectivas na consolidação das fraturas
Vincenzo Giordano; Marcos Giordano; Irocy G. Knackfuss
Displasia do desenvolvimento do quadril:
tratamento até os 2 anos
6
9
Diagraphic Editora
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Osteossíntese intramedular: fundamentos e prática
Luiz Simbalista; Nelson Elias
13
de revisão
e educação continuada
e patrocinada por
Programa
Opiniões sobre os manuscritos publicados
na AOT deverão ser endereçados à SBOT/RJ
– Arquivos em Ortopedia e Traumatologia –Rua Teresa Guimarães, 92 – Botafogo­
–CEP 22280-050 – Rio de Janeiro-RJ.
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ão continuada
Perspectivas na consolidação das fraturas
Perspectives on fracture healing
Unitermos
Vincenzo Giordano ; Marcos Giordano ; Irocy
G. Knackfuss2
1
1
1. Membro titular da SBOT; mestre em Medicina, área de
Ortopedia e Traumatologia, pela Universidade Federal do
Rio de Janeiro (UFRJ)
2. Membro titular da SBOT; doutor em Medicina, área de
Ortopedia e Traumatologia, pela UFRJ
Consolidação de fratura;
fatores de crescimento
e diferenciação ósseos
Key words
Fracture healing;
bone growth and
differentiation factors
Abstract
Bone is a highly specialized tissue of the skeletal system. The metabolic bone response after a fracture constitutes an
ordered, well-differentiated sequence of events leading to the healing of the injured tissue in a manner very similar
to its prior architecture. Recent investigation has identified several bone growth and differentiation factors. Future
research using these proteins must establish their definitive role on osteogenesis. Bone carriers and recombinant
DNA therapy can be potentially used to enhance/stimulate bone formation in association to the bone growth and
differentiation factors.
Introdução
O osso é um órgão altamente especializado do sistema esquelético, formado por diferentes tecidos conjuntivos. Anatomicamente,
os ossos podem ser chatos e longos, formados, respectivamente, por
ossificação intramembranosa e endocondral(1). Este órgão desempenha importantes funções de ordem mecânica (suporte e locomoção),
metabólica (armazenamento de íons e manutenção da homeostase
sérica) e de proteção (órgãos vitais e medula óssea). Para atingir
tais objetivos é fundamental uma perfeita interação entre o osso
e seus tecidos moles adjacentes. Este contato se dá através das
superfícies externa (periósteo) e interna (endósteo), revestidas por
células osteogênicas organizadas em camadas. Observando-se o osso
em cortes transversais, diferenciam-se áreas densas sem cavidades
(osso compacto ou cortical) e áreas com numerosas cavidades que
se comunicam (osso trabecular ou esponjoso). Apesar de serem
formados pelas mesmas células e pelos mesmos elementos de
matriz, possuem diferenças estruturais e funcionais marcantes. Por
exemplo, no osso cortical, a porosidade é em geral inferior a 10%,
enquanto no osso esponjoso está entre 50% e 90%(1). Do ponto de
vista microscópico, o tecido ósseo é formado por diferentes grupos
celulares e matriz extracelular (Figura).
Os exatos mecanismos implicados in vivo na gênese do tecido
ósseo são controversos, envolvendo uma complexa interação de
fatores reguladores locais e sistêmicos(2, 3). A ação destes mediadores promove um equilíbrio contínuo entre formação (osteoblastos)
e reabsorção (osteoclastos) ósseas(4). A produção de uma fratura
representa uma quebra nesta relação, desencadeando uma série de
eventos intra e extracelulares que culminam com o reparo do tecido
lesado. A resposta do osso a um trauma consiste em uma seqüência
ordenada e bem diferenciada de eventos, que resulta na cicatrização
do tecido lesado de forma quase idêntica à sua estrutura inicial(5).
Keller et al.(6) demonstraram que, durante o processo de consolidação
da fratura, osteoclastos e osteoblastos estão intimamente relacionados. Estes autores sugeriram que a reabsorção das bordas da fratura
provavelmente estimula a diferenciação das células pluripotenciais,
assegurando rápida restauração da função do esqueleto.
O
reparo ósseo
Classicamente, o processo de consolidação das fraturas tem sido dividido em primário e secundário(2). A consolidação primária (ou consolidação cortical primária) envolve a tentativa direta da cortical óssea
de restabelecer sua integridade após uma fratura. Este processo parece ocorrer somente quando há contato absoluto entre os fragmentos
fraturados e estes encontram-se rigidamente fixados, assegurando
uma estabilidade capaz de reduzir substancialmente a deformação
relativa interfragmentar. Sob tais condições, há a formação de uma
discreta unidade de remodelação, o cone cortante, composto por
osteoclastos que abrem caminho para o neocrescimento vascular,
invasão de células primitivas e sua posterior diferenciação em osteoblastos. Ao contrário, a consolidação secundária envolve respostas do
periósteo e dos tecidos moles adjacentes, com subseqüente formação
do calo. Embora algumas fraturas possam consolidar primariamente, a
maioria delas consolida de forma secundária, através da combinação
de ossificação intramembranosa e endocondral. Assim, do ponto de
vista didático, pode-se dividir o processo de reparo ósseo em cinco
estágios. Estes estágios incluem uma fase inicial de formação do
Osteoindução
e origem dos osteoblastos
A diferenciação de um tecido sob a influência de outro é denominada indução. O termo osteoindução tem sido usado para descrever o
processo de diferenciação de células osteoprogenitoras em condroblastos
e osteoblastos, resultando na regeneração do tecido ósseo danificado(1).
O conceito de neoformação óssea promovida por substâncias osteoindutoras não é recente, no entanto somente no final da década
de 1970 Urist et al.(7) isolaram e descreveram o primeiro fator de
crescimento e diferenciação ósseo (FCDO). Estes autores observaram
que fragmentos de osso desmineralizado implantados em sítios
subcutâneo e intramuscular de cobaias induziram a formação de
tecido ósseo, atribuindo este achado a um fator osteoindutor ativo
presente na matriz óssea, ao qual chamaram de proteína morfogenética do osso (bone morphogenetic protein [BMP])(7). Posteriormente
novas proteínas foram demonstradas e caracterizadas(4, 8-10).
Estudos recentes têm sugerido que o reparo de uma fratura
é diretamente dependente da resposta celular local ao estímulo
gerado pelos FCDO(11). Células osteoprogenitoras estão presentes
no esqueleto e em órgãos não-esqueléticos(12). O contato destas
células com substâncias osteoindutoras promove sua proliferação e
diferenciação. Dependendo do local em que ocorre esta transformação, há a formação de tecido cartilaginoso e/ou ósseo. Quando este
processo se dá no esqueleto, é denominado ossificação ortotópica,
e quando ocorre fora do tecido ósseo, é chamado de ossificação
heterotópica (ectópica)(12). O potencial de indução destas células
levou Friedenstein(13) a dividi-las em osteoprogenitoras determinadas
(responsáveis pela ossificação ortotópica) e induzidas (ossificação
heterotópica).
Células osteoprogenitoras determinadas pertencem ao estroma
da medula óssea, que compreende o endósteo, os canais de Havers
e a camada de transição do periósteo(12-14). Histomorfologicamente,
este compartimento consiste em um emaranhado de células, tecido
gorduroso e vasos sinusóides. Estudos in vitro de culturas de medula
óssea humana identificaram estas células como sendo fibroblastos,
células epitelióides, adipócitos, células reticulares e macrófagos(15).
Esta população celular heterogênea varia enormemente em sua morfologia e expressão de atividade enzimática, fornecendo ao estroma
a capacidade de diferenciação em colônias de células fibroblásticas,
reticulares, osteogênicas e adiposas(12). Assim, apenas uma parte do
estroma da medula óssea é fenotipicamente formadora de osso(16).
A diferenciação de células osteoprogenitoras em osteoblastos é
apontada como o evento fundamental no processo de regeneração
óssea, no entanto a origem dos osteoblastos ainda não foi definitivamente estabelecida. Inúmeras teorias têm sido propostas ao longo
dos anos. Atualmente a teoria mais aceita é a de que os osteoblastos
originam-se de células primitivas mesenquimais indiferenciadas(1, 17,
18)
. Uma vez que o esqueleto é derivado do mesênquima, diversos
estudos têm correlacionado o processo de consolidação de fratura
à formação do esqueleto embrionário(19). Assim, acredita-se que o
processo de reparo de fratura recapitule, parcial ou completamente,
o processo de formação do osso fetal(19). De fato, a população celular
envolvida no reparo de uma fratura e aquela encontrada durante a
embriogênese esquelética são semelhantes histomorfologicamente(20). Além disto, foi demonstrado in vitro que células mesenquimais
do membro embrionário de aves e roedores dão origem a osteoblastos(21). Este conceito é reforçado pela presença dos FCDO tanto no
reparo ósseo quanto na esqueletogênese. Por exemplo, a ausência
de expressão de BMP-7 em camundongos resulta em anomalias
no crânio, nas costelas e nos membros traseiros(22); em humanos,
fibrodisplasia ossificante progressiva e dentinogênese imperfeita têm
sido associadas com alterações da expressão de BMP-2 e BMP-4 (23,
24)
. Finalmente, a extraordinária capacidade de regeneração do tecido
ósseo após uma fratura parece confirmar de vez esta teoria(25, 26). Ao
contrário dos tecidos moles lesados, que são reparados pela formação
de tecido cicatricial (cicatrização), o osso fraturado é substituído
por novo osso, com características fisiológicas e mecânicas iguais
às do tecido original (consolidação).
Fatores
de crescimento e diferenciação
ósseos
Fatores de crescimento e diferenciação ósseos são polipeptídeos de
baixo peso molecular produzidos fisiologicamente por osteoblastos em
pequenas concentrações e armazenados na matriz óssea em forma de
pró-peptídeos(4, 9). Correspondem a menos de 1% das proteínas nãocolágenas do osso, atuando basicamente como reguladores do volume
esquelético(8). A ocorrência de uma fratura provoca solubilização e
liberação destas proteínas. Uma vez ativadas, ligam-se a receptores
específicos da membrana celular de osteoblastos e outras células
envolvidas no reparo ósseo, estimulando a expressão de genes responsáveis pelo desencadeamento e perpetuação do processo de neoformação óssea. Em termos de interação célula/célula, manifestam
duas formas distintas de atuação. Estimulam localmente proliferação
e diferenciação celular e síntese de nova matriz protéica (efeito
parácrino); além disto, possuem um mecanismo de auto-regulação
sobre os osteoblastos, induzindo contínua expressão dos FCDO (efeito
autócrino)(2). Durante as fases do processo de consolidação de fratura,
apresentam variações espaciais e temporais em sua secreção e expressão, diretamente relacionadas com a população celular presente(27).
Formação óssea (osteoblastos, osteócitos)
Reabsorção óssea (osteoclastos)
Células
Pluripotenciais
Sistema fagocítico-mononuclear (macrófagos, monócitos)
Sistema retículo-endotelial (estroma da medula óssea)
Osso
Componentes orgânicos (35%)
Matriz
extracelular
Componentes inorgânicos (65%)
Figura
– Tecido
ósseo
Figure
– Bone
tissue
Proteínas colágenas (˜ 90%)
Proteínas não-colágenas (˜ 10%)
[principalmente cálcio e fosfato
em forma de hidroxiapatita]
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hematoma e desencadeamento do processo inflamatório, uma fase
subseqüente de angiogênese e formação de tecido cartilaginoso,
três fases sucessivas de calcificação da matriz condróide, apoptose
e remoção dos condrócitos e deposição de matriz osteóide. Após
a consolidação da fratura, inicia-se o estágio de remodelação,
restabelecendo as características mecânicas do osso(2).
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Estudos biomoleculares, incluindo os avanços tecnológicos alcançados pela engenharia genética, têm tornado possível a identificação
de diversos FCDO, como BMP, TGF-ß (transforming growth factor-ß),
PDGF (platelet derived growth factor), FGF (fibroblast growth factor),
IGF (insulin-like growth factor), entre outros(4, 7-10).
Perspectivas
Atualmente, tanto o uso de substitutos ósseos (matriz óssea desmineralizada, colágeno, hidroxiapatita) quanto a aplicação de princípios
de terapia genética (utilizando recombinação de DNA e vetores virais
[adenovírus e retrovírus]) vêm sendo propostos como meios de estimular
o processo de consolidação de fratura. A utilização de biomateriais
com propriedades osteocondutoras como veículo de administração dos
FCDO induz neoformação óssea. Desta forma, materiais que mimetizem
as características mecânicas e bioquímicas do osso parecem funcionar
melhor na função de carreadores dos FCDO. Cook et al.(28) criaram
um defeito segmentar nas ulnas de 16 cães com o objetivo de
estudar o efeito de implantes de colágeno embebidos em BMP-7.
Dividiram os animais aleatoriamente em três grupos: colágeno +
BMP-7, colágeno puro e nenhum implante. Avaliações radiográfica,
histológica e mecânica demonstraram tecido ósseo neoformado
no grupo colágeno + BMP-7 com características superiores às dos
outros grupos estudados (colágeno puro e nenhum implante).
Referências
bibliográficas
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fracture repair. Clin Orthop 355S: S73-S81, 1998.
Achados similares foram reportados recentemente por Welch et al.(29)
e Zellin et al.(30) usando BMP-2 + colágeno e TGF-ß + hidroxiapatita,
respectivamente.
Aplicação de terapia genética vem atualmente ganhando importância como forma de administração dos FCDO, uma vez que proporciona a
introdução destas proteínas em um sítio específico, com a possibilidade
de controle em sua expressão. A transferência de genes para determinada
região pode ser realizada de duas formas distintas: ex vivo ou in vivo(31).
Na transferência genética ex vivo, uma parte do DNA é transferida para
células em cultura e estas células modificadas são depois administradas
no paciente em um sítio predeterminado. Na transferência in vivo, o
gene é administrado diretamente dentro da população celular alvo numa
região específica. Para desencadear expressão genética, o DNA exógeno
deve penetrar na célula-alvo, evitar degradação lisossomal e penetrar
no núcleo. Assim, em ambas as técnicas preconiza-se a incorporação
destes genes por um vetor de administração, preferencialmente viral,
sendo mais empregados os retrovírus e os adenovírus. Em geral, retrovírus
têm sido mais usados na técnica ex vivo devido principalmente à sua
incapacidade de infectar as células quiescentes(31). No entanto Niyibizi
et al.(32) demonstraram que a ocorrência de infecção viral não é capaz de
interferir na habilidade destas células em responderem aos FCDO. Desta
forma, tanto retrovírus quanto adenovírus podem ser utilizados em qualquer uma das técnicas, facilitando a expressão dos genes necessários,
em alta concentração e por determinado período de tempo.
19. Ferguson C.M. et al.: Common molecular pathways in skeletal morphogenesis
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Endereço para correspondência
Vincenzo Giordano
Av. Érico Veríssimo 901/201 – Barra da Tijuca
CEP 22621-180 – Rio de Janeiro-RJ
Tel.: (21) 2495-8430 / Fax: (21) 2495-5294
e-mail: [email protected]
Developmental dysplasia of the hip: from
birth to two years old
Unitermos
Pedro Henrique Barros Mendes
Membro titular da SBOT; mestre em Medicina, área de
Ortopedia e Traumatologia, pela Universidade Federal do
Rio de Janeiro (UFRJ)
Displasia do desenvolvimento do quadril;
luxação congênita do quadril;
suspensório de Pavlik
Key words
Developmental dysplasia of the hip;
congenital dislocation of the hip;
Pavlik harness
Abstract
The term developmental dysplasia of the hip refers to a great amount of abnormalities of the growing hip which vary
from dysplasia to subluxation or dislocation of the hip joint. The early diagnosis of this disease is fundamental for
the results of the treatment, decreasing the complications and altering the natural history. The initial treatment with
the Pavlik harness is the mainstay in the newborn. Between six months and four years other options of treatment
can be used: traction, closed reduction, open reduction, femoral or acetabular osteotomies.
Introdução
A displasia do desenvolvimento do quadril (DDQ) refere-se a
um grupo de anormalidades do quadril em desenvolvimento, diferente das definições anteriores luxação ou displasia congênita do
quadril, que restringiam esta patologia a uma alteração congênita.
Esta denominação abrange alterações no crescimento e estabilidade
do quadril nos períodos intra-útero, peri e pós-natal que podem
levar a displasia, subluxação ou luxação. É essencial diferenciar dois
grupos distintos de DDQ: a que ocorre em crianças normais (típico)
e as chamadas teratológicas, que estão associadas a malformações
como mielomeningocele, artrogripose, entre outras(1).
Podemos dividir os tipos de quadris em função do posicionamento em relação à cavidade acetabular: luxado, quando a cabeça
femoral está fora da cavidade, podendo ser redutível ou irredutível;
luxável, quando a cabeça femoral está dentro da cavidade, porém
através de manobra suave pode ser completamente retirada do
acetábulo; e subluxável, quando o quadril está reduzido e pode
ser deslocado parcialmente da cavidade(1, 2).
A DDQ tem grande prevalência nos nativos das Américas e algumas regiões da Europa, sendo raramente observada em povos da
África. Acomete um em cada mil nascidos, e se forem considerados
os casos de subluxação e displasia, esta incidência aumenta 10%.
Regiões onde há o hábito de manter a criança com os quadris juntos
em extensão apresentam um maior número de casos (1-3).
O lado esquerdo é acometido em 60% dos casos, o direito em
20% e casos bilaterais em 20%. As meninas são mais acometidas,
assim como os nascidos através do parto pélvico. O primeiro filho
é acometido cerca de duas vezes mais. Oligodramnia e alterações
como torcicolo congênito, metatarso varo e pés calcâneos valgos
estão associadas à DDQ. A incidência está aumentada nos casos em
que a história familiar é positiva(1-3).
Anatomicamente, as alterações mais encontradas na DDQ são o
acetábulo raso e a persistência da anteversão femoral. Quanto maior
o período em que a cabeça permanece fora da cavidade acetabular,
maior a displasia acetabular. A subluxação persistente do quadril
leva à deformação progressiva do acetábulo e da cabeça femoral.
Estruturas como labrum, limbus, ligamento redondo, pulvinar, ligamento acetabular transverso, tendão do músculo iliopsoas e cápsula
articular sofrem alterações e passam a impedir a redução concêntrica
da articulação(1-3).
O labrum, estrutura fibrocartilaginosa localizada na borda acetabular, responsável por 20% a 50% do seu crescimento, pode estar
invertido e bloquear mecanicamente a redução do quadril. O limbus,
que é comumente confundido com o labrum, é uma resposta patológica do acetábulo às pressões sobre o quadril. A partir da eversão do
labrum decorrente da migração proximal da cabeça femoral ocorre a
interposição da cápsula articular entre este e a margem acetabular.
Com a estimulação mecânica, forma-se um tecido fibroso, o limbus,
que impede a redução concêntrica da cabeça femoral(2). O ligamento
redondo tende a aumentar seu comprimento e hipertrofiar-se em
decorrência do período em que a cabeça femoral permanece fora
da cavidade acetabular. O pulvinar, tecido fibrogorduroso que se
desenvolve e se hipertrofia no acetábulo, pode impedir a redução(1, 2).
Em crianças que permanecem com o quadril luxado por um período
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ão continuada
Displasia do desenvolvimento do
quadril: tratamento até os 2 anos
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ão continuada
maior, o ligamento acetabular transverso retrai e a cápsula articular
torna-se alongada e comprimida pelo tendão do músculo iliopsoas
contraturado, evitando a redução da articulação(1, 2).
Exame físico
Todo recém-nato deve ser examinado ao nascer. Uma história
detalhada deve ser colhida com o objetivo de identificar os fatores predisponentes (história familiar, apresentação, sexo, tipo de parto, etc.). A
criança deve estar calma e relaxada, em ambiente aquecido e confortável,
devendo-se começar com exame físico geral, na tentativa de identificar
qualquer alteração postural. As manobras de Ortolani e Barlow têm como
objetivo avaliar a estabilidade do quadril. A criança deve ser posicionada
em decúbito dorsal sobre superfície firme. Para realizar-se a manobra de
Ortolani no quadril esquerdo, o examinador segura com a mão direita a
coxa esquerda, mantendo o terceiro ou quarto dedo ao nível do trocanter
maior e o polegar ao nível do trocanter menor. A mão esquerda do
examinador é utilizada para estabilizar o quadril direito em abdução.
O exame começa com flexão do quadril a 900 e abdução da coxa
esquerda enquanto uma força anterior é exercida sobre o trocanter
maior. A sensação palpável de clunk é referida como a redução da
cabeça femoral luxada na cavidade acetabular (clunk de entrada). A
seguir aduzimos o quadril, e a cabeça femoral desliza para fora do
acetábulo (clunk de saída)(1, 2). A manobra de Barlow é executada no
mesmo decúbito, com as mãos do examinador na mesma posição. O
quadril a ser examinado é flexionado cerca de 450 e aduzido de 50 a
100. É realizada força caudal na coxa, na tentativa de retirar a cabeça
femoral do acetábulo, posterior e lateralmente, total (luxável) ou
parcialmente (subluxável)(1, 2). Ambas as manobras tendem a se tornar
negativas entre o segundo e terceiro meses de vida.
Deve ser avaliada a assimetria de pregas cutâneas, porém cerca
de 30% das crianças apresentam assimetria sem doença associada.
O sinal de Galeazzi avalia o encurtamento do membro acometido ao
compararmos a altura dos joelhos. Além disso, deve-se avaliar a abdução dos quadris, que estará diminuída no quadril afetado(1-3). Após o
início da marcha, nos casos unilaterais, a criança terá uma marcha
característica de encurtamento do membro, sinal de Trendelenburg
positivo e acentuação da lordose lombar.
Exames
complementares
Em um recém-nato com evidências clínicas de DDQ, as radiografias
simples devem ser realizadas, porém um exame normal não descarta a
doença. Achados anormais na radiografia podem sugerir ou confirmar
o diagnóstico, porém a radiografia normal não exclui a possibilidade
de instabilidade. Neste caso, o exame de escolha é a ultra-sonografia
do quadril.
O exame radiográfico apresenta diversas linhas e ângulos de
referência (Figura 1), mas é de difícil realização em virtude do
posicionamento da criança, não tendo lugar no diagnóstico precoce
da DDQ. A linha de Hilgenreiner é uma linha horizontal através da
cartilagem trirradiada dos quadris. A linha de Perkins é uma linha
perpendicular à linha de Hilgenreiner que tangencia a margem
acetabular lateral. Estas duas linhas dividem o quadril em quatro
quadrantes, devendo a cabeça femoral estar situada nos quadrantes
inferior e medial. A linha de Shenton passa pela borda medial da
diáfise e do colo femoral e pela borda superior do forame obturador.
O posicionamento incorreto da cabeça femoral leva à ruptura na linha
de Shenton. O índice acetabular é o ângulo calculado da interseção da
linha de Hilgenreiner com uma linha da margem lateral do acetábulo.
Um índice acima de 350 é sugestivo de displasia. Quando o centro
de ossificação da cabeça femoral está presente (entre quatro e seis
10
meses de idade), podemos calcular o ângulo CE de Wiberg, com uma
linha perpendicular à linha de Hilgenreiner cruzando o centro da
cabeça femoral e outra linha da margem lateral do acetábulo até o
centro da cabeça femoral. Um ângulo menor que 200 é considerado
anormal e pode estar associado a displasia e subluxação. O retardo no
aparecimento do núcleo de ossificação da cabeça femoral é esperado
nos casos de instabilidade ou luxação. A persistência da subluxação
ou da luxação levará ao alargamento do sinal da lágrima(1-3).
A ultra-sonografia do quadril é o exame de escolha para avaliarmos a DDQ antes do aparecimento do núcleo de ossificação da cabeça
femoral. É útil na confirmação da subluxação, avalia a displasia da
porção cartilaginosa do acetábulo e documenta a redutibilidade e a
estabilidade da redução no quadril em tratamento com o suspensório
de Pavlik(1-4). Descrito inicialmente por Graf(5), que enfatiza a morfologia do quadril a partir de mensurações estáticas, nesta técnica
uma linha de referência é traçada paralelamente à parede lateral do
ilíaco, uma segunda linha que vai do lugar onde a linha de referência
cruza o teto ósseo do acetábulo até a margem lateral do mesmo. O
ângulo formado é chamado de alfa (normal > 600), que representa a
porção óssea do teto acetabular e reflete sua profundidade; quanto
menor o ângulo maior a displasia acetabular. O ângulo beta é formado
por uma linha do labrum até a linha de referência, que representa
a porção cartilaginosa do teto acetabular e indiretamente reflete a
posição da cabeça femoral. O ângulo normal é < 700; valores acima
deste refletem subluxação do quadril e eversão do labrum. O método
dinâmico introduzido por Harcke(6) enfatiza a posição e a estabilidade
do quadril e a articulação é avaliada no plano transverso enquanto
variações das manobras de Barlow e Ortolani são realizadas. A estabilidade do quadril é avaliada em relação ao grau de deslocamento
entre a cabeça e o acetábulo(7).
A tomografia computadorizada tem seu papel na avaliação da
posição do quadril após realização de redução fechada ou aberta nos
pacientes imobilizados com aparelhos gessados, de difícil avaliação
através da radiografia simples.
A artrografia demonstra a porção cartilaginosa do acetábulo e
da cabeça femoral e testa dinamicamente a estabilidade e a qualidade pós-redução. Tem papel fundamental na decisão do tipo de
tratamento entre redução aberta ou fechada(8).
Tratamento
Grande parte dos quadris que se apresentam com subluxação ao
nascimento tende a corrigir-se espontaneamente em até três semanas
Figura 1 – Referências para avaliação da DDQ
Figure 1 – References for evaluation of DDH
Índice
acetabular
Linha de Perkins
Linha de
Hilgenreiner
Linha de
Shenton
Normal
Displásico
Suspensório de Pavlik
O suspensório de Pavlik é uma órtese dinâmica que permite a
criança mobilizar os membros inferiores, embora dentro de alguns
limites. A faixa anterior mantém os quadris fletidos, evitando a
extensão. A faixa posterior limita a adução. A indicação para o uso
do suspensório de Pavlik são quadris redutíveis em crianças de até
seis meses de idade (Figura 2). A família deve ser cooperativa e
comparecer a reavaliações para ajuste da órtese. Nos casos em que
o exame radiológico revela que o eixo do colo e a cabeça femoral
apontam para a cartilagem trirradiada, mas o quadril não está
totalmente reduzido, o suspensório pode ser usado, pois a posição
dos quadris em flexão limitando a adução permitirá o relaxamento
dos adutores, conduzindo a cabeça femoral gradualmente para sua
posição. Este grupo deve ser acompanhado semanalmente. Se após
duas semanas o quadril não estiver reduzido, outra modalidade de
tratamento deve ser instituída. A redução deve ser confirmada através da ultra-sonografia após duas semanas da utilização da órtese. A
regra para o tempo de utilização da órtese é que esta seja utilizada
por mais três meses após o quadril se tornar estável, durante 24
horas. Neste período a criança é avaliada a cada duas semanas.
Com a manutenção da estabilidade clínica iniciamos a retirada do
suspensório inicialmente quatro horas/dia nas duas primeiras semanas seguidas de oito horas/dia nas duas semanas seguintes e, por
fim, doze horas/dia por mais quatro semanas. Após este período é
realizado estudo radiológico e/ou ultra-sonográfico para avaliarmos
a presença de displasia acetabular. Se o exame for normal, o uso da
órtese é suspenso. Caso haja displasia residual, a utilização deve
ser mantida doze horas/dia até a resolução. Em crianças acima de
oito meses o suspensório torna-se ineficaz. Nestes casos utilizamos
órtese em dupla abdução até a regressão da displasia acetabular.
Entre os cuidados em relação aos ajustes da órtese, deve-se evitar
a abdução dos quadris, pois esta leva a um aumento na incidência
de necrose avascular da cabeça femoral, e a hiperflexão dos quadris,
que pode ocasionar neurapraxia femoral(1-3, 7).
Entre as causas de falha do tratamento, pode-se ressaltar a falta
de aderência pela família e o não-reconhecimento da falha do apaFigura 2 – Algoritmo para tratamento da DDQ
Figure 2 – Algorithm for DDH treatment
relho em conseguir redução concêntrica do quadril. Nos casos em que
o quadril é mantido em flexão e abdução com o uso do suspensório,
apesar de não estar reduzido, poderá ocorrer displasia acetabular
(particularmente da porção póstero-lateral), conhecida como doença
do suspensório de Pavlik(3,4).
Redução incruenta
Está indicada às crianças de seis a 24 meses ou nos casos em que
houve falha no tratamento com o suspensório de Pavlik. O uso de tração
cutânea ou esquelética pré-operatoriamente permanece controverso.
Seus defensores o justificam devido à diminuição dos índices de necrose
avascular da cabeça femoral. Não parece lógico que a utilização de tração
afete os obstáculos intra ou extra-articulares à redução do quadril.
A redução incruenta deve ser realizada sob anestesia geral, no
centro cirúrgico, com manobra de tração longitudinal, flexão e abdução
do quadril. Realiza-se a seguir artrografia dinâmica com intensificador de
imagens para avaliar a qualidade da redução, a extensão de cobertura da
cabeça femoral e a melhor posição de imobilização. Se a cabeça femoral
não estiver totalmente reduzida, a artrografia demonstrará uma coleção
medial no espaço entre a cabeça femoral e a borda medial do acetábulo.
Se este espaço for maior que 7mm, o que é indicativo de interposição
intra-articular, estará indicada a redução aberta(4, 7).
A zona de segurança é o espaço entre a abdução máxima e a
posição em que a cabeça femoral se torna instável. A tenotomia de
adutores diminui a contratura em adução, aumentando a abdução e
os limites da zona de segurança. Devem-se evitar posições em abdução forçada, pois estão associadas ao desenvolvimento de necrose
avascular. Após a redução é aplicado aparelho gessado em posição
humana em 1000 de flexão e abdução controlada. A redução do quadril
é confirmada através de tomografia computadorizada. O tempo de
imobilização varia de acordo com cada caso, no entanto, em geral,
são preconizados três meses, seguidos por mais dois meses com
órtese ou aparelho gessado em dupla abdução(2-4, 7, 8).
Redução cruenta
Embora indicada geralmente a crianças acima de 18 meses, pode
ser realizada em qualquer quadril em que o tratamento não-operatório
não obteve redução concêntrica e estável. Visa a remover obstáculos
que evitam a redução da cabeça femoral no acetábulo e a tornar a
articulação do quadril estável.
O acesso medial descrito por Ludloff, entre o pectíneo e os adutores
longo e curto, popularizado por Ferguson, e entre os adutores longo e
curto anteriormente e o adutor magno e o grácil posteriormente, tem
a vantagem de permitir a visualização direta das estruturas que impedem a redução da cabeça femoral, exceto do labrum, tendo como
grande desvantagem o aumento na incidência de necrose avascular(4,
9)
. Deve ser utilizado antes da fase de marcha, quando a retirada dos
obstáculos mediais à redução (contratura dos tendões adutores e
iliopsoas, porção inferior da cápsula e ligamento acetabular transverso) é suficiente para a obtenção de uma articulação concêntrica.
Ideal para luxações redutíveis, porém instáveis, e para aquelas em
que a cabeça femoral pode ser trazida ao nível do acetábulo, mas
não podem ser assentadas. Não está indicada a crianças acima dos
18 meses, pois a cabeça tende a migrar proximalmente e o labrum
torna-se obstáculo à redução, nem nos casos que necessitam concomitantemente de procedimento ósseo, como osteotomias femoral
e/ou acetabular.
O acesso ântero-lateral (Smith-Petersen), no intervalo entre o
sartório e o tensor da fáscia lata, realizado por uma incisão do tipo
biquíni, é o mais utilizado em qualquer idade. Apesar disto, sua
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sem tratamento. Quando a partir da terceira semana de exame clínico
o quadro persistir, está indicado o tratamento. Nos casos de luxação
ao nascimento, o tratamento é iniciado imediatamente.
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indicação de preferência ocorre em pacientes acima dos 18 meses
de vida, em qualquer situação em que a cabeça femoral não pode
ser reduzida no acetábulo. Permite ampla visualização da articulação
e acesso a todos os obstáculos à redução. Capsulorrafia pode ser
realizada, aumentando a estabilidade. Além disso, podem-se realizar
osteotomias pélvicas pelo mesmo acesso, quando indicadas(4, 10). A
incidência de necrose avascular da cabeça femoral é menor do que
pelo acesso medial.
Osteotomia femoral
O encurtamento femoral é efetivamente reconhecido por relaxar a
tensão das partes moles retraídas e contraturadas ao redor do quadril,
facilitando a redução e diminuindo o risco de necrose avascular da
cabeça femoral. É rotineiramente realizada em crianças acima dos dois
anos de idade. Pode ser utilizada em conjunto com redução cruenta do
quadril em qualquer idade, visando a diminuir a tensão sobre a articulação. É realizada por acesso lateral (separado do acesso para redução
cruenta) na região subtrocanteriana do fêmur e fixada internamente.
Quando há anteversão femoral acentuada, a osteotomia derrotatória
está indicada concomitantemente à redução aberta e ao encurtamento
femoral. A osteotomia (varizante, derrotatória) pode ser utilizada em
qualquer idade para corrigir subluxação residual do quadril, desde que
haja comprovação radiográfica ou artrográfica da redução em posição
de abdução e rotação medial do quadril.
Osteotomia pélvica
O desenvolvimento de uma articulação normal após redução
do quadril ou realização de uma osteotomia redirecional da região
proximal do fêmur leva em consideração a capacidade de remodelação do acetábulo. A correção acetabular é indireta, variando com
o tempo de crescimento restante. A remodelação acetabular é mais
acentuada nos primeiros seis a 12 meses após a redução do quadril.
É mais predizível até os quatro anos de idade, podendo ocorrer até
Referências
os oito anos e raramente após esta idade(11).
Em crianças de 18 meses a três anos não existe consenso se a
osteotomia pélvica deve ser realizada concomitante ou separadamente à
redução cruenta do quadril. Nesta faixa de idade, existe a preocupação
de aumento no risco de necrose avascular da cabeça femoral quando
ambos os procedimentos são realizados em conjunto. Em crianças
acima dos três anos, podem-se realizar simultaneamente redução
cruenta, encurtamento femoral e osteotomia de redirecionamento do
osso inominado. Os objetivos são conseguir a redução concêntrica da
articulação, evitar a osteonecrose e corrigir alterações secundárias do
acetábulo(11).
As osteotomias de redirecionamento do acetábulo podem ser divididas em fisiológicas (Salter, Pemberton e Steel) e não-fisiológicas
ou de salvamento (Chiari e Shelf). A mais utilizada é a osteotomia de
Salter(12), que redireciona o acetábulo ântero-lateralmente. É utilizada
em crianças com quadril luxado e displasia acetabular com o objetivo
de aumentar a estabilidade durante a realização da redução cruenta.
Está indicada isoladamente nos casos tratados com suspensório de
Pavlik ou com redução fechada, que apresentam displasia acetabular
em quadril reduzido de forma congruente.
Complicações
A necrose avascular da cabeça femoral é a mais grave, sempre
iatrogênica, observada em todas as formas de tratamento, inclusive no
suspensório de Pavlik. Acredita-se que seja ocasionada por interrupção
no suprimento sangüíneo, seja por compressão ou distração dos vasos
por abdução excessiva do quadril, lesão direta dos vasos que suprem a
cabeça ou excessiva pressão sobre a cabeça após a redução. Kalamchi
e MacEwen(13) classificam a necrose avascular da cabeça femoral em
quatro subtipos, relacionando o grau de acometimento e a deformidade residual.
bibliográficas
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Endereço para correspondência
Pedro Henrique B. Mendes
Av. Atlântica 778/402 – Leme
CEP 22010-010 – Rio de Janeiro-RJ
e-mail: [email protected]
12
Intramedullary nails: principles and practice
Luiz Simbalista1; Nelson Elias2
1. Membro titular da SBOT
2. Membro titular da SBOT; mestre em Medicina, área de
Ortopedia e Traumatologia, pela Universidade Federal do
Rio de Janeiro (UFRJ)
Unitermo
Hastes intramedulares
Key word
Intramedullary nails
Abstract
The management of diaphyseal fractures has evolved in the last years. Intramedullary nails are playing a major
role since new implants were developed and the healing process is being better understood. This procedure has
many mechanical and biological advantages over other fixation methods but is not free from risks. Knowledge of its
principles is necessary to achieve good results.
Introdução
Desde que foram introduzidas por Küntscher na década de
1940(1) até os dias de hoje, as hastes intramedulares (HI) evoluíram juntamente com os conhecimentos na área da metalurgia e do
processo de consolidação óssea. No Brasil, o emprego das HI tem
duas fases distintas. Inicialmente utilizavam-se apenas as hastes
do tipo Küntscher, não-bloqueadas, com técnica de introdução
através do foco(2). Suas propriedades mecânicas restringiam sua
utilização para fraturas localizadas no istmo do osso, com pequeno
grau de cominuição, o que limitava bastante sua aplicação. Com o
aparecimento de um sistema de HI desenvolvido na Faculdade de
Medicina de Ribeirão Preto por Paccola, houve grande popularização
do método no Brasil ao permitir a realização do procedimento de
estabilização intramedular bloqueada independentemente de mesa
ortopédica ou utilização de intensificador de imagens(3-5). Atualmente, com a maior disponibilização nos hospitais do intensificador
de imagens e com o aumento na oferta de diversos tipos de HI, o
método vem se tornando cada vez mais popular.
No tratamento das fraturas diafisárias, os objetivos são obter
a união dos fragmentos ósseos e recuperar a função do membro.
Para tanto, recomendam-se os seguintes princípios(6):
• Restauração do comprimento, eixo e rotação do membro;
• Estabilização da fratura dentro de suas necessidades;
• Técnica cirúrgica atraumática;
• Mobilização precoce.
As HI devem ser colocadas através de técnica cirúrgica atraumática, utilizando redução indireta e introdução sem violação do
foco fraturário, funcionando como tutor e procurando controlar os
fragmentos ósseos quanto ao comprimento, rotação e angulação.
Desta maneira, conferem estabilidade relativa no foco fraturário, permitindo mobilização precoce e promovendo uma consolidação óssea
secundária. Para se obter a consolidação óssea sem deformidades
angulares, rotacionais e de comprimento, é preciso identificar adequadamente a fratura e os fatores determinantes da estabilidade e de
seu comportamento biológico, para, assim, indicar a haste (quando
for o caso) mais adequada, planejar a técnica de colocação de acordo
com o tipo de mesa, o posicionamento do paciente na mesma, o
ponto de entrada e o sentido de introdução da HI, a fresagem ou
não do canal medular, a opção pelo bloqueio e, neste caso, o tipo
e a técnica a ser adotada, as técnicas de redução a serem utilizadas
além do protocolo pós-operatório.
É importante ressaltar que a estabilização de fraturas com HI é
mais uma técnica operatória dentro do arsenal do traumatologista,
e deve ser indicada naqueles casos em que for superior às demais,
não devendo o cirurgião tentar adaptar a ela um caso em que tal
técnica não esteja bem indicada, correndo o risco de obter resultados
insatisfatórios que não poderão ser creditados à técnica, e sim à
sua má utilização.
Tipos
de haste
Hastes flexíveis
Este grupo caracteriza-se pela colocação de várias hastes de
diâmetro reduzido e flexíveis, como as hastes de Ender, os pinos de
Rush e as hastes elásticas de titânio(7, 8). Apesar de simplificarem
o procedimento cirúrgico, por não necessitarem da fresagem ou
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Osteossíntese intramedular:
fundamentos e prática
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bloqueio, são, na maior parte das vezes, instáveis dos pontos de
vista rotacional e axial, limitando bastante sua aplicação ou necessitando de suplementação adicional de imobilização externa, o que
desrespeita o princípio da mobilização precoce.
Hastes não-bloqueadas
As hastes não-bloqueadas são classicamente representadas
pelas hastes de Küntscher(2). A estabilização das fraturas com estes
implantes está baseada no contato entre os segmentos ósseos e a
haste. Desta forma, limita sua indicação para fraturas localizadas
no istmo dos ossos longos. A fresagem é um recurso utilizado para
aumentar a área de contato entre o osso e a haste, conseqüentemente melhorando a estabilidade da fixação. Não possui estabilidade
longitudinal, devendo ser reservada às fraturas em que haja contato
entre os principais fragmentos ósseos. A introdução da haste através do foco de fratura leva à abertura do hematoma fraturário e à
agressão da circulação óssea, desrespeitando o princípio da técnica
cirúrgica atraumática.
Hastes bloqueadas com fresagem
A introdução do bloqueio aumentou as possibilidades de indicação das hastes para casos em que as fraturas se localizavam fora
do istmo ou possuíam graus de cominuição que impossibilitavam
estabilização adequada através das hastes não-bloqueadas(9, 10). A
fresagem, nestes casos, permite a colocação de hastes de maior
diâmetro, o que aumenta a estabilidade do sistema.
O processo de fresagem leva a algumas alterações locais, como
a lesão da circulação endosteal(11), que diminui o fluxo de sangue
para a região da fratura. Tal diminuição, associada ao espaço morto
dentro das fendas destas hastes, pode elevar o risco de infecção
pós-operatória, restringindo sua utilização em fraturas expostas(12,
13)
. O macerado ósseo, produto da fresagem, possui células viáveis, servindo como um enxerto ósseo e estimulando o processo
de consolidação. A fresagem leva a alterações sistêmicas, sendo
a principal delas o desprendimento de partículas de gordura na
circulação, podendo desencadear embolia gordurosa e síndrome da
angústia respiratória do adulto. Qualquer evento que aumente a
pressão dentro do canal medular pode levar à formação de êmbolos
gordurosos. Durante o processo de fresagem tal aumento ocorre
diversas vezes, comparado com um único aumento de pressão quando
da introdução de uma haste não-fresada. Tais êmbolos parecem
ter significado clínico, principalmente em pacientes com função
pulmonar alterada. Portanto, nestes casos e naqueles em que há
múltiplas fraturas de ossos longos, deve-se dar preferência à fixação
das fraturas com hastes não-fresadas(14). Apesar de a produção de
calor e de o aumento da pressão intramedular estarem associados à
fresagem, o uso de fresas adequadamente desenhadas, apontadas e
com aumento gradativo no seu diâmetro, bem como a utilização de
baixa rotação e pressão axial podem minimizar bastante tais efeitos.
Durante a fresagem nunca deve ser utilizado manguito pneumático,
correndo-se o risco de necrose tecidual pela ausência da refrigeração
proporcionada pela circulação(15-17).
Hastes bloqueadas sem fresagem
A presença de um espaço morto nas hastes fresadas e a lesão
da circulação endosteal causada pela fresagem elevam o risco de
desenvolvimento de infecção através deste método(12). As hastes
flexíveis utilizadas inicialmente(18, 19) para estes fins não estabilizavam
adequadamente fraturas complexas. Com o surgimento de hastes
sólidas e bloqueadas, aumentou-se a estabilidade do sistema de
fixação, ampliando o leque de indicações do método(20, 21).
14
A inserção destas hastes era consideravelmente mais difícil
por serem sólidas, com menor capacidade de acomodação dentro
do canal medular. Tal dificuldade foi resolvida com o uso de hastes
de menor diâmetro. As hastes têm seu menor diâmetro compensado pela utilização de materiais com maior resistência à fadiga e
menor rigidez (ligas de titânio), e por sua configuração e desenho
sólidos(14, 20, 21).
Outra vantagem observada foi a diminuição da formação de
trombos de gordura na circulação, permitindo sua utilização em
pacientes com a função pulmonar alterada ou com múltiplas fraturas
de ossos longos(20, 21).
Técnicas
de colocação das hastes
Para que se obtenha sucesso no tratamento com as hastes
intramedulares, é necessário que se planejem e executem alguns
passos-chave. Várias decisões serão tomadas baseadas na experiência
e na prática do cirurgião com determinada técnica. Em circunstâncias
especiais, pode ser necessária a adoção de outras táticas.
Tração esquelética pré-operatória
A tração esquelética pode ser utilizada no período pré-operatório nas fraturas do fêmur(3, 4, 10). Se o tratamento planejado é a
osteossíntese intramedular, a tração deve ser efetiva a ponto de
promover a restauração do comprimento ou ligeira distração entre
os fragmentos, do contrário paga-se o ônus de uma cirurgia mais
trabalhosa e traumática. Caso haja previsão de tratamento definitivo
para o período de sete a dez dias, a tração supracondiliana no fêmur é
mais efetiva. Caso contrário, há a possibilidade de infecção no ponto
de entrada dos pinos, colocando em risco o ato operatório. Nestes
casos, a tração através da tíbia é a mais recomendada.
Escolha do implante
Os critérios discutidos anteriormente deverão guiar o cirurgião
na definição do tipo de haste a ser utilizado. Adicionalmente, é
necessário que se definam comprimento e diâmetro. Como via de
regra, procura-se utilizar a haste de maior diâmetro por ser mais
resistente. O comprimento deve ser tal que permita o bloqueio distal
e proximal a cinco centímetros da linha de fratura, respeitando as
superfícies articulares e evitando a protrusão nos pontos de entrada.
A definição pré-operatória do tamanho da haste é mais crítica quando
da escolha dos modelos não-fresados, pois o tamanho inadequado
resultará na necessidade de troca da haste e perda da redução. A
determinação do diâmetro e comprimento das hastes pode ser realizada utilizando-se gabaritos, tendo como parâmetro as radiografias
simples do lado fraturado ou preferencialmente do contralateral. Nas
HI fresadas, o comprimento pode ser definido intra-operatoriamente
através da medida do fio-guia(14,20).
Mesa operatória
Na osteossíntese da tíbia e do úmero não se encontram maiores
dificuldades em se obter a redução da fratura e a realização do restante
do procedimento. Entretanto, no fêmur, pela grande massa muscular
presente na coxa, observa-se dificuldade muito maior tanto em obter
quanto em manter a redução da fratura. Para tanto, pode-se utilizar
mesa ortopédica ou radiotransparente, juntamente ao aparelho distrator. A utilização do distrator tem como vantagens a fácil mobilização
do membro durante o procedimento, permitindo melhor acesso ao
ponto de entrada, com menor via de acesso cutâneo, e a realização
de procedimentos em ambos os membros simultaneamente. A mesa
ortopédica tem como vantagem a manutenção do posicionamento
durante todo o ato operatório, mas, por outro lado, o processo de
Posicionamento do paciente
Na osteossíntese anterógrada do úmero, o paciente permanece
em decúbito dorsal ou em posição de cadeira de praia. Na inserção
retrógrada, a posição deve ser o decúbito ventral ou lateral para
facilitar o acesso posterior. No caso da tíbia, o decúbito dorsal com
o joelho flexionado é a posição de escolha, podendo-se usar algum
suporte ou coxim embaixo do joelho ou fletir a mesa operatória.
Para o fêmur, o decúbito dorsal facilita a identificação do ponto de
entrada com o intensificador de imagens, o controle rotacional do
fragmento distal e a abordagem de lesões em outras regiões. Além
disto, é mais seguro para pacientes com a função pulmonar comprometida. Como desvantagens destaca-se a necessidade de abordagens
cirúrgicas maiores e do desvio lateral do tórax para realização do
procedimento. Além disso, os instrumentos e implantes tendem a
desviar-se medialmente. Para inserção retrógrada, o decúbito dorsal
com o joelho fletido é a posição de escolha(20).
Via de acesso
Sem a utilização do intensificador de imagens, recomenda-se a
visualização direta do ponto de entrada da haste, devendo a via de
acesso se estender desde esta região até a projeção da haste na pele,
para evitar lesão de partes moles. Com a disponibilidade do intensificador de imagens pode-se fazer pequena incisão no ponto de projeção
da haste na pele, respeitando-se o comprimento do guia externo de
bloqueio(14, 20).
Ponto de introdução da haste
A determinação do ponto de introdução deve respeitar dois critérios: o desenho da haste e a anatomia de cada paciente. Como regra,
o ponto correto deve ser a projeção da haste nas incidências ânteroposterior e lateral na região de entrada. O não-cumprimento desta
regra pode dificultar o procedimento e levar a deformidades angulares
indesejáveis, principalmente quando o traço de fratura estiver próximo
ao ponto de entrada(14, 20).
Redução e passagem do fio-guia
Como já discutido anteriormente, as maiores dificuldades acontecem na osteossíntese do fêmur. As táticas adotadas neste osso podem
ser reproduzidas nos demais em caso de necessidade. A redução pode
ser realizada no pré-operatório através da mesa ortopédica ou no intraoperatório, com o aparelho distrator. Em fraturas recentes, operadas
em caráter de emergência, pode-se conseguir a redução através da
tração manual. Para alinhamento dos fragmentos na passagem do
fio-guia, podem-se manipular as extremidades ósseas utilizando-se
as mãos, alavancas radiotransparentes ou colocando-se pinos de
Schanz nos fragmentos. O fragmento proximal pode ser posicionado
através da introdução de uma haste curta e manipulação, até que as
extremidades se encontrem alinhadas. Para executar a passagem do
fio-guia, este deve ter sua extremidade ligeiramente angulada de modo
a fazer movimentos rotatórios, encontrando o fragmento distal com
mais facilidade. As hastes não-fresadas são introduzidas diretamente
no fragmento distal(14, 20).
mais de 30 segundos. O processo deve ser feito em estágios de meio
e nunca superiores a um milímetro. É importante que o sentido
de rotação das fresas seja sempre horário, podendo, do contrário,
causar danos(14, 16, 17).
Introdução da haste
Uma vez feita a fresagem, a haste de diâmetro adequado deverá
ser introduzida com facilidade no fragmento proximal. Caso haja
dificuldade, possivelmente o ponto de entrada não foi o adequado e a
haste está se chocando com o osso cortical. Tentativas de prosseguir
com a haste podem levar a fraturas iatrogênicas. No segmento distal,
principalmente em fraturas distais ao istmo, onde o canal é mais largo,
pode-se observar dificuldade em introduzir a haste no trajeto desejado,
levando a deformidades angulares indesejáveis. Nestas situações, a
colocação de parafusos perpendiculares e na direção em que a haste
tende a se posicionar (poller screws) pode ajudar a obter melhor
alinhamento(14, 20).
Bloqueio
A colocação de parafusos de bloqueio deve ser feita de acordo
com a necessidade imposta pela lesão. Como regra deve-se iniciar
pelo bloqueio distal. Esta tática permite correção de alterações no
comprimento e na rotação ao se manipular o guia proximal. Quando os
parâmetros necessários forem conseguidos, segue-se com o bloqueio
proximal. O bloqueio distal pode ser feito a mão livre, com auxílio
do intensificador de imagens ou com dispositivos que auxiliem na
orientação em direção aos orifícios da haste(14, 20). Alguns sistemas
já possuem um dispositivo que, ao anular o movimento no plano
sagital, permitem o bloqueio distal através de um guia externo sem
a necessidade de utilização de intensificador de imagens(23).
Em fraturas diafisárias do fêmur utiliza-se o bloqueio transverso
convencional. Para fraturas subtrocantéricas pode-se optar tanto pela
utilização de um bloqueio cefálico através de lâmina quanto pelo uso de
parafuso oblíquo anterógrado, caso o trocanter menor esteja intacto.
Em fraturas ipsilaterais da diáfise e do colo femorais, existe a opção
de fixação do colo através da haste. Quando as fraturas da diáfise
vêm associadas a fraturas da região intertrocanteriana, podem-se
utilizar as hastes do tipo gamma(14, 20, 21).
Sumário
Como via de regra, as hastes intramedulares são indicadas
para o tratamento de fraturas dos ossos longos, principalmente
aqueles submetidos à carga (fêmur e tíbia). A técnica fresada, por
permitir a colocação de implantes de maior diâmetro, aumenta a
estabilidade pós-operatória, devendo ser a escolhida para o manejo
de fraturas, pseudo-artroses e consolidações viciosas.
Em fraturas expostas, em pacientes com a função pulmonar
comprometida e naqueles com múltiplas fraturas de ossos longos,
as hastes não-fresadas passam a ser o implante de escolha, uma
vez que diminuem o lançamento de trombos na circulação e causam
menor desvascularização dos fragmentos fraturários.
O tipo de bloqueio deve obedecer às demandas mecânicas de
cada fratura.
Fresagem
A fresagem pode ocasionar lançamento de êmbolos na circulação e aumento da temperatura local. Quando indicada, deve ser
feita com ponteiras afiadas, sem exercer demasiada força axial nem
permanecer fresando o mesmo local sem que haja progressão por
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preparação é trabalhoso e seu uso está associado a lesões nervosas e
cutâneas(14, 20, 22).
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bibliográficas
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AO unreamed femoral nail (UFN) – Operative technique and early
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modular locking system. Early clinical experience. Unfallchirurg 97:
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22. Mc Ferran M.A., Johnson K.D.: Intramedullary nailing of acute femoral
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distractor. J Orthop Trauma 6: 271-278, 1992.
23. Krettek C.: “Intramedullary nailing” in AO principles of fracture management. Stuttgart-New York, Thieme, 195-218, 2000.
Endereço para correspondência
Luiz Simbalista
Hospital Barra D’Or, Serviço de Traumato-Ortopedia
Av. Ayrton Senna 2.541 – Barra da Tijuca
CEP 22793-000 – Rio de Janeiro-RJ
e-mail: [email protected]
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Questões
15. O uso de mesa ortopédica durante a colocação de uma haste intramedular bloqueada está associado a lesões nervosas e cutâneas.
1. O esqueleto humano é formado a partir de um modelo mesenquimal
através de ossificação intramembranosa e ossificação endocondral.
(
) Certo
(
) Errado
(
) Não sei
2. A população celular envolvida no reparo de fratura é histomorfologicamente semelhante à encontrada na embriogênese esquelética.
(
) Certo
(
) Errado
(
) Não sei
3. Macroscopicamente pode-se diferenciar o osso em esponjoso ou
imaturo e cortical ou maduro.
(
) Certo
(
) Errado
(
) Não sei
4. A matriz extracelular do tecido ósseo é formada principalmente por
componentes orgânicos, como o colágeno do tipo 1.
(
) Certo
(
) Errado
(
) Não sei
5. Os osteoclastos são células gigantes multinucleadas originadas do
sistema reticuloendotelial, fundamentais no processo de remodelação
óssea.
(
) Certo
(
) Errado
(
) Não sei
6. BMP, TGF-α, osteonectina e fosfatase alcalina são proteínas nãocolágenas do osso conhecidas como fatores de crescimento e diferenciação ósseos.
(
) Certo
(
) Errado
(
) Não sei
7. A consolidação das fraturas é um processo de cicatrização peculiar, onde
o osso fraturado é substituído por osso novo com características fisiológicas e mecânicas iguais às do tecido original.
(
) Certo
(
) Errado
(
) Não sei
(
) Certo
(
) Errado
(
) Não sei
16. Na fixação da fratura do fêmur com haste intramedular bloqueada,
o decúbito dorsal é contra-indicado a pacientes com função pulmonar
comprometida.
(
) Certo
(
) Errado
(
) Não sei
17. A falta de disponibilidade do intensificador de imagens inviabiliza a
realização de osteossíntese intramedular nas fraturas dos ossos longos.
(
) Certo
(
) Errado
(
) Não sei
18. A determinação do ponto de entrada da haste intramedular deve respeitar
o desenho do implante e a anatomia do paciente.
(
) Certo
(
) Errado
(
) Não sei
19. Na fresagem do canal medular, o sentido de rotação das fresas não é
importante.
(
) Certo
(
) Errado
(
) Não sei
20. O uso de parafusos fora da haste (poller screws) com o objetivo de
orientar adequadamente seu correto posicionamento é conduta importante nas fraturas do terço distal do fêmur.
(
) Certo
(
) Errado
(
) Não sei
21. Na displasia do desenvolvimento do quadril, o lado mais comumente
acometido é o direito em 60% dos casos.
(
) Certo
(
) Errado
(
) Não sei
22. A estrutura extra-articular que mais comumente impede a redução concêntrica da articulação do quadril é o tendão do iliopsoas.
(
) Certo
(
) Errado
(
) Não sei
8. O último estágio do processo de reparo ósseo é a remodelação.
23. As manobras de Ortolani e de Barlow tendem a ser negativas após o
terceiro mês de vida.
(
) Certo
(
) Errado
(
) Não sei
9. O enxerto ósseo autólogo tem capacidade osteoindutora e osteocondutora.
(
) Certo
(
) Errado
(
) Não sei
10. Terapia genética utilizando recombinação de DNA e vetores virais
constitui-se em nova perspectiva na melhora do processo de
consolidação de fraturas.
(
) Certo
(
) Errado
(
) Não sei
11. As hastes intramedulares desenvolvidas por Küntscher eram
indicadas para fraturas ocorridas no istmo dos ossos longos.
(
) Certo
(
) Errado
(
) Não sei
12. A lesão da circulação endosteal causada pela fresagem do canal
medular aumenta o aporte sangüíneo para o foco da fratura.
(
) Certo
(
) Errado
(
) Não sei
(
) Certo
(
) Errado
(
) Não sei
24. A assimetria de pregas cutâneas deve ser avaliada, porém cerca de
30% a 50% das crianças apresentam este achado sem doença associada
do quadril.
(
) Certo
(
) Errado
(
) Não sei
25. No quadril normal, o centro de ossificação da cabeça femoral deverá estar
no quadrante ínfero-medial de Ombredanne.
(
) Certo
(
) Errado
(
) Não sei
26. No exame de ultra-sonografia do quadril, o método descrito por Graf
enfatiza a morfologia do quadril a partir de mensurações dinâmicas.
(
) Certo
(
) Errado
(
) Não sei
27. A regra de tempo para a utilização do suspensório de Pavlik é que este
seja utilizado por mais de três meses após o quadril tornar-se estável.
(
) Certo
(
) Errado
(
) Não sei
28. Após a redução do quadril, é aplicado aparelho gessado com os membros
inferiores na posição humana de 100o de flexão e 70o de abdução.
13. A ocorrência de embolia gordurosa e de síndrome da angústia
respiratória do adulto está relacionada apenas à fresagem do canal
medular.
29. Na redução cruenta do quadril, o acesso medial descrito por Ludloff está
indicado a crianças acima de 18 meses de vida.
(
) Certo
(
) Errado
(
) Não sei
14. A distância entre os parafusos de bloqueio e o traço de fratura
não
deve ser menor do que 5cm.
(
) Certo
(
) Errado
(
) Não sei
(
(
) Certo
) Certo
(
(
) Errado
) Errado
(
(
) Não sei
) Não sei
30. No tratamento da displasia do desenvolvimento do quadril, a osteotomia
de Salter proporciona redirecionamento do acetábulo ântero-lateralmente.
Respostas na próxima edição
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