vidas secas - COC Educação

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Análise de obras literárias
vidas secas
Graciliano Ramos
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SumÁrio
1.Contexto social e HISTÓRICO..................................................... 7
2.Estilo literário da época............................................................ 9
3.O AUTOR.................................................................................................. 12
4.
A obra..................................................................................................... 14
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5.EXERCÍCIOS............................................................................................ 34
vidas secas
Graciliano Ramos
Vidas secas
1. Contexto social e HISTÓRICO
Na história do Brasil, o período compreendido entre os anos de 1894 e 1930,
aproximadamente, é chamado de República Velha, “a política do café com leite”,
porque ocupava a Presidência da República ora um governo mineiro, ora um paulista, o que revela a importância dada à lavoura cafeeira e à pecuária. A manutenção
desse regime dependia, sobretudo, do equilíbrio entre a produção e a exportação
de café. A elite agropecuária brasileira delegava ao Estado o papel de comprador
dos excedentes para garantir o preço em face às oscilações do mercado. Exemplo
típico dessa política foi o chamado Acordo de Taubaté, em 1906, segundo o qual
São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais se comprometiam a retirar do mercado
os excedentes da produção cafeeira para garantir o nível dos preços.
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A sociedade brasileira, no início do século XX, sofreu transformações graças ao processo de urbanização e à vinda dos imigrantes europeus para a região
Centro-Sul do país. Entretanto, ao mesmo tempo em que principiou o processo de
industrialização na região Sudeste, a mão de obra desqualificada dos ex-escravos
foi marginalizada, e esses se deslocaram para a periferia e para os morros; a cultura canavieira do Nordeste entrou em declínio, pois não tinha como competir
com o apoio dado pelo governo federal à “política do café com leite”.
No final do século XIX e início do século XX, duas realidades coexistiam
no Brasil: de um lado, a urbanização da região Centro-Sul, com sua consequente industrialização, e, de outro, o atraso das regiões Norte e Nordeste. E
um terceiro fator, ainda mais grave, somava-se a esse quadro: as oligarquias
rurais, com seus arranjos políticos, não representavam os novos estratos
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socioeconômicos. O resultado disso foi o surgimento de um quadro caótico,
que teve seu término com a chamada Revolução de 1930 e o Estado Novo de
Getúlio Vargas.
Na Bahia, ocorreu a chamada Guerra de Canudos; em Juazeiro, no Ceará,
o fenômeno do jagunço e a política do padre Cícero; os movimentos operários,
em São Paulo; a criação do Partido Comunista; o tenentismo, que teve seu ápice
na Coluna Prestes, combatida por Arthur Bernardes e Washington Luís. É claro
que esses conflitos ocorreram em tempos e locais diversos, entre 1894 e 1930,
parecendo exprimir, às vezes, problemas bem localizados. Entretanto, no conjunto, revelaram a realidade de um país que se desenvolvia à custa de graves
desequilíbrios. A queda da Bolsa de Nova York em 1929 e o movimento tenentista
colocaram fim à República Velha, com a vitória na chamada Revolução de 1930,
dando início ao chamado Estado Novo ou Era Vargas.
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2.Estilo literário da época
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Os intelectuais brasileiros da década de 1920 não ficaram alheios a todas
essas transformações sociais e históricas listadas anteriormente, até porque,
somados a elas, eventos importantes na esfera artística vinham acontecendo,
como a publicação de livros como Os sertões, de Euclides da Cunha, Triste fim
de Policarpo Quaresma, de Lima Barreto, e Canaã, de Graça Aranha, os quais
chamaram a atenção para aspectos da realidade do país até então não tematizados pela literatura brasileira, ao menos da forma como o fizeram seus autores nessas três publicações. Vivia-se também, na Europa, a ebulição artística
internacional provocada pelos movimentos vanguardistas, que consolidaram
em sua esteira as teorias futurista, surrealista, cubista e dadaísta. No âmbito
da língua portuguesa, surgia oficialmente o Modernismo português em 1915.
Dois anos depois, no Brasil, Anita Malfatti realizava sua famosa exposição de
telas inspiradas no Expressionismo alemão, o que provocou a irada reação de
Monteiro Lobato na forma de seu famoso artigo Paranoia ou mistificação?
A soma de todos esses fatos – sociais e históricos – acabou por gerar
determinadas reações e condições no seio da incipiente intelectualidade brasileira. A partir daí, foram necessários alguns passos para mudar os rumos
seguidos até então, tanto pelo pensamento sociológico nacional quanto pela
arte brasileira.
Essas reações aconteceram de tal forma que o Modernismo brasileiro,
independentemente do rótulo pelo qual viesse a ser nomeado, estava fadado
a ser aquilo em que se transformou naturalmente: maturidade e emancipação
da arte brasileira. Isso se deu principalmente por ter sido o Modernismo um
olhar novo e perscrutador sobre a realidade social do país, a qual começou a
ser artística e detidamente observada, seja com benevolência por alguns seja
com rigor crítico por outros. Essa realidade passou, então, a ser considerada
com a importância que de fato tem: essência do país.
Foi esse olhar, essa análise, que gerou a rebeldia contra os padrões da
arte europeia, a qual, em alta porcentagem, ainda tinha seus traços facilmente
identificáveis na arte brasileira. Esse olhar fez com que os modernistas da primeira hora tentassem identificar a verdadeira cultura nacional, para fazer dela
a autêntica matéria-prima da sociologia e arte nacionais, e, no passo seguinte,
propusessem e praticassem uma arte de ruptura com os modelos anteriores.
Foi esse novo olhar que nos apresentou o homem sertanejo da caatinga
e do norte de Minas com sua particular visão de mundo; o dos canaviais e dos
engenhos; o da briga pelo cacau; o caboclo dos cafezais e o das “rocinhas” do
interior paulista; o dos imigrantes italianos de São Paulo; o vivente dos pampas,
no seu trabalho de campeador ou às voltas com as lutas fronteiriças; o homem
da periferia das grandes cidades. Além disso, mostrou-nos, ainda que ficcional10
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mente, nossas lutas históricas regionais, o sentimento nacionalista e, sobretudo,
o jeito de ser brasileiro de cada um, na fala peculiar, nas tradições e nas práticas
quotidianas a que chamamos de regionalismo. E esse novo olhar nos revelou,
entranhados nas frinchas e nos poros desses temas, a nossa sensibilidade e os
nossos sentimentos, seja como indivíduos seja como coletividade.
É esse vastíssimo painel que resultou da renovação da arte brasileira, painel
que se constitui no grande legado modernista ao país, a ponto de esse movimento
ser considerado, legitimamente, como a independência da arte do Brasil.
2ª GERAÇÃO DO MODERNISMO (1930-1945)
Em literatura, o período entre 1930 e 1945 caracteriza-se pela tendência
do posicionamento ideológico, político e social dos intelectuais brasileiros. A
rebeldia estética da primeira fase modernista cedeu lugar à literatura socialmente
comprometida, sobretudo no que diz respeito à prosa de ficção. A revolução de
1930, o declínio e a dissolução das estruturas sociais e econômicas do Nordeste,
a imigração nas estradas do Sul apareciam nos novos estilos de ficção, caracterizados pela observação real e direta dos fatos. Euclides da Cunha e Lima Barreto,
do Pré-Modernismo, não eram mais exceções, mas sim os primeiros a abordar o
elemento regional/social e, como tal, ganharam sucessores. As elites urbanas e
seus intelectuais analisavam e procuravam compreender o país nos seus novos
aspectos. O campo de visão em que o artista atuaria se ampliava extremamente
e passava a lhe oferecer uma gama jamais vista quanto à variedade temática e à
atitude filosófica, política, formal e psicológica, sejam individuais ou coletivas,
resultando em ensaio, teatro, prosa e poesia em quantidade e variedade.
Diante de tal complexidade, a prosa passou a ser o gênero mais cultivado,
principalmente na vertente regionalista, com nas produções de Graciliano Ramos,
Érico Veríssimo, Jorge Amado, Raquel de Queirós, José Américo de Almeida e
José Lins do Rego.
Além do aspecto regional, usava-se o texto também para analisar ou denunciar injustiças sociais, como dificuldades com o trabalho, o meio, o abandono
do cidadão por parte do Estado, resumindo tudo na falta de perspectiva de uma
vida minimamente decente para o cidadão anônimo, modelo, aliás, ao qual se
enquadra a temática de Graciliano Ramos, autor de Vidas secas.
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A preocupação com essas realidades foi tão intensa nesses autores que a
linguagem literária evoluiu muito pouco, principalmente se considerarmos as
propostas inovadoras da geração modernista de 1922, isso porque preocupações
com a linguagem foram relegadas a segundo plano, haja vista que a essência do
projeto artístico desses autores centrava-se nos planos social e histórico.
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Graciliano Ramos
3.O AUTOR
Graciliano Ramos nasceu em Quebrângulo, interior de Alagoas, em 27 de
outubro de 1892. O mais velho dos 16 filhos de Sebastião Ramos e Maria Amélia
Ramos passou a infância nas cidades alagoanas de Buíque, Viçosa e Palmeira
dos Índios.
Assim como o poeta pernambucano João Cabral de Melo Neto (1920-1999),
Graciliano Ramos não possuía diploma universitário. Concluiu os seus estudos
secundários em Maceió, mudando-se, logo em seguida, para o Rio de Janeiro,
onde trabalhou em algumas redações de jornais, para depois voltar a Alagoas,
fixando residência em Palmeira dos Índios, onde trabalhou no comércio do pai.
Eleito prefeito da pequena cidade, cumpriu por dois anos o mandato, renunciando a ele por incompatibilidade política com o governo estadual.
Casou-se com Maria Augusta Ramos, com quem teve quatro filhos. Ao
enviuvar após sete anos de casamento, contraiu segundas núpcias com Heloísa
de Medeiros.
De volta a Maceió, foi perseguido, preso e levado para a Ilha Grande, no
Rio de Janeiro. Acusação: comunista. Nem ao menos filiado a algum partido de
esquerda ele era. Dentro do presídio, demonstrou toda a sua revolta contra a
ditadura do governo de Getúlio Vargas, escrevendo o romance autobiográfico
Memórias do cárcere, magnificamente interpretado no cinema pelo ator Carlos
Vereza. Libertado, filiou-se ao Partido Comunista Brasileiro.
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Em 1951, foi eleito presidente da Associação Brasileira de Escritores, sendo
reeleito no ano seguinte.
Interessante foi a sua inclusão na literatura: foi descoberto pelo poeta e
editor Augusto Frederico Schmidt (1906-1965), que lera os relatórios (nada convencionais) que Graciliano enviava ao governo de Alagoas quando prefeito de
Palmeira dos Índios e não teve dúvidas de que ali estaria escondido um grande
escritor. Indagado por Schmidt se não havia nada realmente literário engavetado,
Graciliano mostrou-lhe o romance Caetés, obra de nítida concepção introspectiva.
Surgia assim ao público um dos maiores prosadores da literatura brasileira.
Certa vez, seu amigo José Lins do Rego (1901-1957) escreveu sobre o
primeiro encontro deles: O tabelião de Mata Grande nos havia dito: os senhores vão
encontrar em Palmeira dos Índios o homem que sabe mais mitologia em todo o sertão.
O homem que sabia mitologia entendia também de Balzac, de Flaubert, de literatura,
como se vivesse disto, sabia francês, inglês, falava italiano. (O Estado de S. Paulo,
Dimensão de Graciliano, 24/4/05)
Apesar de viver em precárias condições financeiras (foi inspetor federal de
ensino), viajou pelo exterior, conhecendo os países comunistas, o que resultou
na obra Viagem.
Segundo Jorge Amado (1912-2001), ainda no artigo do Estadão, Graciliano
parecia seco e difícil (diziam-no pessimista); entretanto, era terno e solidário,
acreditava no homem e no futuro.
Fumante inveterado, morreu vitimado pelo câncer em 20 de março de 1953,
na cidade do Rio de Janeiro.
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Obras
1933 – Caetés (romance)
1934 – São Bernardo (romance)
1936 – Angústia (romance)
1938 – Vidas secas (novela)
1945 – Infância (memórias)
1944 – Dois dedos (literatura infantil)
1944 – Histórias incompletas (literatura infantil)
1947 – Insônia (contos)
1953 – Memórias do cárcere (memórias)
1954 – Viagem (relatos)
1962 – Alexandre e outros heróis (contos, contendo Histórias de Alexandre; A
terra dos meninos pelados e História da República)
1962 – Linhas tortas (crônicas)
1962 – Viventes das Alagoas (memórias)
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Graciliano Ramos
4.A obra
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Vidas secas
Vidas secas, uma novela desmontável?
Romance, novela ou uma coletânea de contos? O próprio Graciliano Ramos,
em Alguns tipos sem importância, uma das crônicas de seu livro Linhas tortas, depõe:
Em 1937 escrevi algumas linhas sobre a morte duma cachorra, um bicho que saiu
inteligente demais, creio eu, e por isso um pouco diferente dos meus bípedes. Dediquei em
seguida várias páginas aos donos do animal. Essas coisas foram vendidas, em retalho, a
jornais e revistas. E como José Olímpio (proprietário da Livraria José Olympio Editora) me pedisse um livro para o começo do ano passado, arranjei outras narrações, que
tanto podem ser contos como capítulos de romance. Assim nasceram Fabiano, a mulher,
os dois filhos e a cachorra Baleia, as últimas criaturas que pus em circulação.
Portanto, Vidas secas é uma junção de treze* contos formando uma novela
(ou romance, como disse o próprio autor), já que todos eles estão ligados entre
si, sendo o primeiro (agora capítulo) uma espécie de apresentação das personagens. Nos demais, há capítulos especialmente feitos para cada componente da
família (aí se inclui a cachorra Baleia), em que os outros viventes não passam de
coadjuvantes, dando à obra um caráter novelístico.
*Os capítulos (ou contos) de Vidas secas são:
Mudança; Fabiano; Cadeia; Sinha Vitória; O menino mais novo; O menino
mais velho; Inverno; Festa; Baleia; Contas; O soldado amarelo; O mundo coberto
de penas; Fuga.
Quanto às influências recebidas
Vidas secas se enquadra na linha regionalista, introduzida, na literatura brasileira, pelo romancista romântico Franklin Távora (1842-1888) ao publicar, em
1876, O cabeleira, obra cujo assunto gira em torno do banditismo no Nordeste. Mas
foi com romances regionalistas do Naturalismo que não só Vidas secas, mas vários
romances da geração de 1930 – como, por exemplo, A bagaceira (José Américo de
Almeida), O quinze (Raquel de Queirós), Pedra bonita (José Lins do Rego) e Seara
vermelha (Jorge Amado) – mais se identificaram. Estamos falando de Dona Guidinha
do Poço, de Manuel Oliveira Paiva (1861-1892) e, principalmente, de Luzia-homem, de
Domingos Olímpio (1850-1906), obra em que a seca1 se faz presente, como podemos
notar nesta passagem, cujo trecho se assemelha muito com Vidas secas:
O sol repontava no horizonte, como um rubro e enorme disco, surgindo de um lago
de oiro incandescente, quando o cortejo do êxodo se pôs em marcha, pela estrada da serra.
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Luzia percorreu, com enternecimento de saudade, os recantos da casa vazia, onde
ficavam o pilão, o jirau da latada, a trempe de pedra, os tições extintos, enterrados sob
1 Entretanto, não houve escritor mais preocupado com as grandes secas nordestinas que Rodolfo Teófilo, romancista,
pesquisador e cientista cearense, nascido na metade do século XIX, autor de História da seca do Ceará, Secas do Ceará, A seca
de 1915, A fome, Secas e tipos, dentre outras.
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Graciliano Ramos
tulhas mornas de cinza, tristes vestígios dos habitantes que a abandonavam. Contemplou
com lágrimas comovidas, o lar apagado, o terreiro, em torno, limpo, varrido, as árvores
mortas, os mandacarus carcomidos até ao alcance dos dentes dos animais vorazes, a paisagem triste, coisas mudas e mestas, que se lhe afiguravam companheiros de infortúnio, dos
quais se despedia para sempre. E partiu, conduzindo, à cabeça, uma pequena troixa.
Quanto à linguagem
Sobre seu ofício de escritor, Graciliano Ramos comentou: Deve-se escrever da
mesma maneira como as lavadeiras lá de Alagoas. Elas começam com uma primeira lavada,
molham a roupa suja na beira da lagoa ou do riacho, torcem o pano, molham-no novamente,
voltam a torcer... (O Estado de S. Paulo, Dimensão de Graciliano, 24/4/05).
Podemos perceber que Graciliano Ramos era um escritor obsessivamente
preocupado com a lapidação do texto. Não houve prosador da geração de 1930
mais direto, conciso e objetivo que Graciliano Ramos, mas nem por isso deixou de
trabalhar a linguagem com seus recursos estilísticos. Até mesmo em Vidas secas,
em que tudo é minguado – água, comida, dinheiro, diálogos, adjetivos –, podemos
encontrar algumas figuras que quebram a seca narrativa de personagens secos vivendo em terra seca: símiles e onomatopeias são as mais utilizadas, isso porque as
personagens são, a todo instante, comparadas a animais e, por vezes, à vegetação da
região, além de balbuciarem, grunhirem, rugirem imitando cabras, bois, ventos em
sons onomatopaicos. Abaixo selecionamos exemplos, aproveitando para também
mostrarmos o interessante processo que Graciliano Ramos realizou em sua obra,
animalizando as personagens humanas e humanizando a cachorra Baleia:
Sinha Vitória estirou o beiço indicando vagamente uma direção e afirmou com
alguns sons guturais que estavam perto.
Os calcanhares (de Fabiano), duros como cascos, gretavam-se e sangravam.
Ele, a mulher e os filhos tinham-se habituado à camarinha escura, pareciam ratos
– e a lembrança dos sofrimentos passados esmorecera.
Chape-chape. As alpercatas batiam no chão rachado. O corpo do vaqueiro derreava-se, as pernas faziam dois arcos, os braços moviam-se desengonçados. Parecia um
macaco.
Entregue aos arranjos da casa, regando os craveiros e as panelas de losna, descendo
ao bebedouro com o pote vazio e regressando com o pote cheio, deixava os filhos soltos no
barreiro, enlameados como porcos.
Estava escondido no mato como tatu. Duro, lerdo como tatu. Mas um dia sairia
da toca, andaria com a cabeça levantada, seria homem.
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Vidas secas
Pôs-se a berrar, imitando as cabras, chamando o irmão (mais velho) e a cachorra.
Debaixo dos couros, Fabiano andava banzeiro, pesado, direitinho um urubu.
Olhou com raiva o irmão e a cachorra. Deviam tê-lo prevenido. Não descobriu neles
nenhum sinal de solidariedade: o irmão ria como um doido, Baleia, séria, desaprovava
tudo aquilo.
Mas Graciliano Ramos encontrou espaço para criar imagens metafóricas e
paradoxais impressionantes, quebrando um pouco a frieza de sua linguagem:
O menino mais velho esfregou as pálpebras, afastando pedaços de sonho.
... temendo que a nuvem se tivesse desfeito, vencida pelo azul terrível, aquele azul
que deslumbrava e endoidecia a gente.
O casal agoniado sonhava desgraças.
Quanto ao foco narrativo
Como bem observou o crítico literário Álvaro Lins, no posfácio Valores e
misérias das vidas secas, presente na edição de Vidas secas, Graciliano Ramos, em
seus três romances anteriores, Caetés, São Bernardo e Angústia, adota narradores
em primeira pessoa: João Valério, Paulo Honório e Luís da Silva, respectivamente.
Dessa forma, o romancista parece que se excluiu da responsabilidade sobre eles,
largando-os à própria sorte, deixando-os com seus sofrimentos, suas angústias,
seus traumas, como se nada disso fosse com ele. Em Vidas secas, não. Ao adotar
um narrador em terceira pessoa, ainda mais onisciente, Graciliano deixa de lado
a impessoalidade, passando a sofrer com a família (incluindo aí Baleia), daí não
seria exagero dizermos que o narrador é o próprio Graciliano Ramos.
Como as personagens, principalmente Fabiano, são monossilábicas, pouco
se expressam pela fala, o autor lança mão do discurso indireto livre (em que
há uma mistura da fala do narrador com a fala da personagem), fazendo com
que a história deslanche (já que, de enredo mesmo, pouco há). Caso contrário,
seria impossível o seu desenrolar. A seguir, três fragmentos, exemplos de discurso indireto livre:
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Entristeceu. Considerar-se plantado em terra alheia! Engano. A sina dele era
correr mundo, andar para cima e para baixo, à toa, como judeu errante. Um vagabundo
empurrado pela seca. Achava-se ali de passagem, era hóspede. Sim senhor, hóspede que
demorava demais, tomava amizade à casa, ao curral, ao chiqueiro das cabras, ao juazeiro
que os tinha abrigado uma noite.
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Graciliano Ramos
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Estirou as pernas, encostou as carnes doídas ao muro. Se lhe tivessem dado tempo,
ele teria explicado tudo direitinho. Mas pegado de surpresa, embatucara. Quem não ficaria azuretado com semelhante despropósito? Não queria capacitar-se de que a malvadez
tivesse sido para ele. Havia engano, provavelmente o amarelo o confundira com outro.
Não era senão isso.
Então porque um sem-vergonha desordeiro se arrelia, bota-se um cabra na cadeia,
dá-se pancada nele? Sabia perfeitamente que era assim, acostumara-se a todas as violências, a todas as injustiças.
Quanto aos temas
Graciliano Ramos concebeu Vidas secas seguindo a linha proposta num
encontro de regionalistas promovido por Gilberto Freire, no Recife, em 1926, e
pelo romance A bagaceira (1928), de José Américo de Almeida. Nesse encontro,
foram discutidos a seca e os problemas dela decorrentes. Vidas secas superou tudo
o que já fora escrito sobre o tema. É interessante lermos a opinião do próprio
Graciliano Ramos sobre esse tema, presente no texto A propósito da seca (e da
retirada), incluído em sua obra Linhas tortas:
Certamente há demasiada miséria no sertão, como em toda parte, mas não é indispensável que a chuva falte para que o camponês pobre se desfaça dos filhos inúteis. Não
há dúvida de que a seca engrossou as correntes emigratórias que se dirigiram ao norte
e ao sul do país, mas a seca é apenas uma das causas da fome, e de qualquer forma os
nordestinos, em maior ou menor quantidade, teriam ido cortar seringa no Amazonas ou
apanhar café no Espírito Santo ou em São Paulo.
Que é que determina penúria tão grande no Nordeste? Por que a fuga da gente
de lá? A verdade é que essas coisas são evidentes em consequência do elevado número de
habitantes. Se excluíssemos a seca, ainda nos restaria bastante miséria, e ela avultaria
mais que em Mato Grosso, por exemplo, onde, sendo muito espalhada, pode não ser percebida. O êxodo dos flagelados é um modo de falar. Não há êxodo. Mas sai muita gente.
Sai gente de toda parte. Numa região, porém, onde se espremem quase dez milhões de
indivíduos mal acomodados, o total dos que emigram deve ser considerável. Do Pará e
de Goiás não poderiam sair muitos.
Podemos citar como outros temas, presentes em Vidas secas:
• a miséria (a penúria em que vive a família);
• a arbitrariedade (ou o abuso de autoridade na figura do soldado amarelo);
• a exploração no trabalho (a figura do fazendeiro explorador e do empregado explorado);
• a corrupção governamental (na figura do cobrador de impostos da prefeitura);
• a falta de perspectiva de vida (na figura do próprio narrador).
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Vidas secas
Regional x Universal
Vidas secas é uma obra regionalista na medida em que o seu autor se utiliza
de um espaço geograficamente delimitado: o sertão nordestino, com sua caatinga
rala (mandacarus espinhosos, juazeiros de galhos pelados), com os utensílios
típicos do sertanejo (cuia, aió, baú de folhas), com vestimenta característica da
vaquejada (perneiras, gibão, guarda-peito e chapéu de couro com barbicacho),
com as aves de arribação sobrevoando ao redor de bichos moribundos, com o
seu rio intermitente. Entretanto, tudo isso vai dando lugar (em interessantes monólogos interiores) a anseios, frustrações, esperanças, sonhos e fantasias de uma
família que se retira, fazendo com que a obra ganhe um caráter introspectivo e,
consequentemente, universal. É interessante ressaltarmos que o que caracteriza
cada membro da família é a solidão. Abaixo, dois trechos para exemplificar o regional e o universal. Note-se que o comportamento de Sinha Vitória, no segundo
trecho, não difere em nada do de mulheres de outros lugares e outras épocas:
Na planície avermelhada os juazeiros alargavam duas manchas verdes. Os infelizes
tinham caminhado o dia inteiro, estavam cansados e famintos. Ordinariamente andavam
pouco, mas como haviam repousado bastante na areia do rio seco, a viagem progredira
bem três léguas. Fazia horas que procuravam uma sombra. A folhagem dos juazeiros
apareceu longe, através dos galhos pelados da caatinga rala.
***
Agachou-se, atiçou o fogo, apanhou uma brasa com a colher, acendeu o cachimbo,
pôs-se a chupar o canudo de taquari cheio de sarro. Jogou longe uma cusparada, que
passou por cima da janela e foi cair no terreiro. Preparou-se para cuspir novamente. Por
uma associação, relacionou este ato com a lembrança da cama. Se o cuspo alcançasse o
terreiro, a cama seria comprada antes do fim do ano. Encheu a boca de saliva, inclinou-se – e não conseguiu o que esperava. Fez várias tentativas, inutilmente. O resultado foi
secar a garganta. Ergueu-se desapontada. Besteira, aquilo não valia.
RESUMO DA OBRA
Vidas secas é uma obra composta de treze capítulos, sendo que o primeiro
e o décimo terceiro se encontram, formando o que chamamos de obra cíclica.
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Mudança
A obra se inicia com uma pequena descrição (direta e objetiva) da caatinga
nordestina: seca, de vegetação rala, com seus juazeiros de galhos pelados. Sob o sol
escaldante, uma família de retirantes: Fabiano, Sinha Vitória, os seus dois filhos,
a cachorra Baleia e um papagaio. O cenário é desolador: urubus sobrevoam o céu
à espera da morte dos animais doentes. O menino mais velho, não aguentando
mais a caminhada, põe-se a chorar, interrompendo a viagem:
O pirralho não se mexeu, e Fabiano desejou matá-lo. Tinha o coração grosso, queria
responsabilizar alguém pela sua desgraça. A seca aparecia-lhe como um fato necessário
– e a obstinação da criança irritava-o. Certamente esse obstáculo miúdo não era culpado,
mas dificultava a marcha, e o vaqueiro precisava chegar, não sabia onde.
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Graciliano Ramos
Fabiano, arrependido do pensamento, carregou o menino no “cangote”; jamais deixaria o filho ali, desprotegido. A fome apertara a tal ponto que Sinha Vitória
não teve outra alternativa: matar o papagaio. E, para não ficar com a consciência
pesada, encontrou uma desculpa plausível: de que servia um papagaio que não
falava? Isso mostra o quanto a família não se comunica entre si. Não há conversas,
só balbucios, grunhidos, rangidos, olhares e gestos. Chegam, finalmente, a uma
fazenda abandonada e por ali se arrancham. A fome é disfarçada quando um preá
é caçado por Baleia, que, ciente de sua condição de animal, iria ficar apenas com
os ossos e, talvez, com o couro. Enquanto assam o preá, Fabiano sonha com o final
da seca, vivendo feliz com a sua família:
A fazenda renasceria – e ele, Fabiano, seria o vaqueiro, para bem dizer seria o dono
daquele mundo.
Os troços minguados ajuntavam-se no chão: a espingarda de perdeneira, o aió, a cuia
de água e o baú de folha pintada. A fogueira estalava. O preá chiava em cima das brasas.
Uma ressurreição. As cores da saúde voltariam à cara triste de Sinha Vitória. Os
meninos se espojariam na terra fofa do chiqueiro das cabras. Chocalhos tilintariam pelos
arredores. A caatinga ficaria verde.
Baleia agitava o rabo, olhando as brasas. E como não podia ocupar-se daquelas
coisas, esperava com paciência a hora de mastigar os ossos. Depois iria dormir.
Fabiano
Fabiano cura bicheira, fabrica as alpercatas dos filhos, afasta as veredas com as
mãos, assim como os seus antepassados. Lembra os sofrimentos passados antes de
se apossarem da casa, sente-se homem por um momento, para depois considerar-se um bicho. Mas também sente-se orgulhoso por isso, é forte, gordo, fuma o seu
cigarro de palha. Era vaqueiro e ninguém o tiraria dali. Mas cai em si e sabe que
nada daquilo lhe pertence. Era descomposto pelo fazendeiro, que pouco aparecia
e, quando aparecia, achava tudo ruim. Sabia que, a qualquer momento, podia ser
despedido. Arrepia-se só em pensar na volta da seca. Volta e meia recorda-se de
seu Tomás da bolandeira. Preocupa-se sempre com a educação dos meninos.
É importante observar, ainda, que, só neste capítulo, Fabiano e sua família
são comparados a cabra, rato, macaco, tatu e rês.
Um dia... Sim, quando as secas desaparecessem e tudo andasse direito... Seria que
as secas iriam desaparecer e tudo andar certo? Não sabia. Seu Tomás da bolandeira é que
devia ter lido isso. Livres daquele perigo, os meninos poderiam falar, perguntar, encher-se
de caprichos. Agora tinham a obrigação de comportar-se como gente da laia deles.
Alcançou o pátio, enxergou a casa baixa e escura, de telhas pretas, deixou atrás os
juazeiros, as pedras onde jogavam cobras mortas, o carro de bois. As alpercatas dos pequenos batiam no chão branco e liso. A cachorra Baleia trotava arquejando, a boca aberta.
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Vidas secas
Aquela hora Sinha Vitória devia estar na cozinha, acocorada junto à trempe, a
saia de ramagens entalada entre as coxas, preparando a janta. Fabiano sentiu vontade de comer. Depois da comida, falaria com Sinha Vitória a respeito da educação dos
meninos.
Cadeia
Fabiano vai à feira da cidade comprar mantimentos. Na bodega de seu
Inácio, não se conforma em beber cachaça “batizada” (misturada com água, assim como o querosene). O bodegueiro fingiu não ouvir o seu protesto. Na rua, é
convidado pelo soldado amarelo a jogar trinta-e-um. Não consegue dizer não e
titubeia em sua resposta, soltando palavras desconexas: Isto é. Vamos e não vamos.
Quer dizer. Enfim, contanto etc. É conforme.
Após perder dinheiro, sai sem se despedir. O soldado, tomando aquilo por
ofensa, vai ao seu encalço. Encontra-o debaixo de um jatobá, tentando encontrar
uma desculpa para explicar a Sinha Vitória a perda do dinheiro. Como não sabe
mentir, com certeza gaguejaria e Sinha Vitória o conhecia muito bem.
Após alguns empurrões do amarelo, Fabiano não se contém e xinga a sua
mãe. O soldado leva-o preso (por desacato à autoridade) e Fabiano é surrado na
cadeia. Sentindo-se humilhado e atormentado, sente ódio do soldado.
Preocupa-se com a família (o que Sinha Vitória poderia estar pensando?).
Fabiano passa a divagar (numa confusão de pensamentos) sobre si mesmo, sobre o governo personificado naquele soldado e na sua vingança (matando não
o soldado, mas os seus superiores).
Então porque um sem-vergonha desordeiro se arrelia, bota-se um cabra na cadeia,
dá-se pancada nele? Sabia perfeitamente que era assim, acostumara-se a todas as violências, a todas as injustiças. E o conhecidos que dormiam no tronco e aguentavam cipó de
boi oferecia consolações: – “Tenha paciência. Apanhar do governo não é desfeita”.
Mas agora rangia os dentes, soprava. Merecia castigo?
– An!
E, por mais que forcejasse, não se convencia de que o soldado amarelo fosse governo.
Governo, coisa distante e perfeita, não podia errar. O soldado amarelo estava ali perto,
além da grade, era fraco e ruim, jogava na esteira com os matutos e provocava-os depois.
O governo não devia consentir tão grande safadeza.
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Sinha Vitória
Como já citado, o maior desejo de Sinha Vitória é uma cama de lastro de
couro igual à de seu Tomás da bolandeira. Não suporta mais dormir na cama de
varas. É, entre todas as personagens da família, a menos animalizada, apesar de
sua linguagem gutural, soltando, de quando em quando, rugidos.
Tem respeito por Fabiano e é a única pessoa que o compreende. Sempre cachimbando junto à trempe de fogo, devaneia ora desejando a cama de couro, ora
21
Graciliano Ramos
lembrando o papagaio que matara para enganar a fome da família, ora na novilha
raposa que “roubara” a galinha.
Se vendesse as galinhas e a marrã? Infelizmente a excomungada raposa tinha comido a pedrês, a mais gorda. Precisava dar uma lição à raposa. Ia armar o mundéu junto
ao poleiro e quebrar o espinhaço daquela sem-vergonha.
Ergueu-se, foi à camarinha procurar qualquer coisa, voltou desanimada e esquecida.
Onde tinha a cabeça?
Sentou-se na janela baixa da cozinha, desgostosa. Venderia as galinhas e a marrã,
deixaria de comprar querosene. Inútil consultar Fabiano, que sempre se entusiasmava,
arrumava projetos. Esfriava logo – e ela franzia a testa, espantada, certa de que o marido
se satisfazia com a ideia de possuir uma cama, de couro e sucupira, igual à de seu Tomás
da bolandeira.
O menino mais novo
Sente orgulho do pai e quer ser um bravo vaqueiro como ele. O gibão, as
perneiras, o guarda-peito e o chapéu de couro faziam de seu pai um homem invencível; só os outros é que não percebiam isso. E, para provar que poderia vir a
ser como ele, monta num bode e cai estatelado no chão, provocando gargalhadas
no irmão e a reprovação de Baleia, quando, na verdade, queria era ganhar a admiração deles.
Retirou-se. A humilhação atenuou-se pouco a pouco e morreu. Precisava crescer,
ficar tão grande como Fabiano, matar cabras a mão de pilão, trazer uma faca de ponta
à cintura. Ia crescer, espichar-se numa cama de varas, fumar cigarros de palha, calçar
sapatos de couro cru.
Subiu a ladeira, chegou-se a casa devagar, entortando as pernas, banzeiro. Quando fosse homem, caminharia assim, pesado, cambaio, importante, as rosetas das esporas
tilintando. Saltaria no lombo de um cavalo brabo e voaria na catinga como pé-de-vento,
levantando poeira. Ao regressar, apear-se-ia num pulo e andaria no pátio assim torto, de
perneiras, gibão, guarda-peito e chapéu de couro com barbicacho. O menino mais velho
e Baleia ficariam admirados.
O menino mais velho
É curioso e, ao ouvir a palavra inferno, acha-a bonita, mas não sabe o que
significa. Por isso, pergunta para Sinha Vitória, que lhe fala de um lugar com
espetos quentes e fogueiras (não seria a própria região castigada pela seca?).
Não estando satisfeito, procura pelo pai, mas este não lhe dá confiança. Volta e
pergunta à mãe se ela já tinha ido lá. Recebe um cocorote como resposta. Revoltado, abraça de maneira apertada a cachorra (coisa de que Baleia não gostava,
mas não se desvencilha para não magoá-lo). Sente falta de uma amizade e Baleia
era o único vivente que lhe demonstrava simpatia.
22
Vidas secas
– Inferno, inferno.
Não acreditava que um nome tão bonito servisse para designar coisa ruim. E
resolvera discutir com Sinha Vitória. Se ela houvesse dito que tinha ido ao inferno, bem.
Sinha Vitória impunha-se, autoridade visível e poderosa. Se houvesse feito menção de
qualquer autoridade invisível e mais poderosa, muito bem. Mas tentara convencê-lo
dando-lhe um cocorote, e isto lhe parecia absurdo. Achava as pancadas naturais quando
as pessoas grandes se zangavam, pensava até que a zanga delas era a causa única dos
cascudos e puxavantes de orelha. Esta convicção tornava-o desconfiado, fazia-o observar
os pais antes de se dirigir a eles. Animara-se a interrogar Sinha Vitória porque ela estava
bem-disposta. Explicou isto à cachorrinha com abundância de gritos e gestos.
Inverno
Neste capítulo, toda a família está reunida diante do fogareiro, protegendo-se do frio. Lá fora, a chuva é torrencial. Fabiano tenta contar uma história, mas
tropeça nas palavras, atrapalhando-se. Definitivamente, não se dava com elas.
Mas ele está esperançoso, pois finalmente veria a caatiga verde com que tanto
sonhava. Sinha Vitória está assustada com o temporal e imagina que pode acontecer uma enchente e destruir tudo. Quando não é a seca que a apavora, é a água.
Mas o que mais impressiona é o sentido de família que Graciliano deu ao reunir
todos eles em torno do fogão de lenha.
Fabiano tornou a esfregar as mãos e iniciou uma história bastante confusa, mas
como só estavam iluminadas as alpercatas dele, o gesto passou despercebido. O menino
mais velho abriu os ouvidos, atento. Se pudesse ver o rosto do pai, compreenderia talvez
uma parte da narração, mas assim no escuro a dificuldade era grande. Levantou-se, foi
a um canto da cozinha, trouxe de lá uma braçada de lenha. Sinha Vitória aprovou este
ato com um rugido, mas Fabiano condenou a interrupção, achou que o procedimento do
filho revelava falta de respeito e estirou o braço para castigá-lo. O pequeno escapuliu-se,
foi enrolar-se na saia da mãe, que se pôs francamente do lado dele.
– Hum! hum! Que brabeza!
Aquele homem era assim mesmo, tinha o coração perto da goela.
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Festa
A família, desajeitada e sentindo-se ridícula em suas roupas (feitas por Sinha
Terta) e sapatos apertados, encaminha-se para a cidade, para a festa de Natal. Todos
se sentem inferiores às pessoas de lá. Fabiano tem verdadeiro pavor de multidão,
de lugares aglomerados (por isso não assiste à missa), tendo sempre a impressão de
que querem passá-lo para trás. Está preocupado em não perder de vista a mulher e
os filhos. Tem a intenção de jogar, mas é proibido por Sinha Vitória. Vai até a uma
tolda, bebe e, bêbado, revolta-se contra todos os que o exploram; sonha com soldados
amarelos ameaçando-o, enquanto Sinha Vitória enxergava, através das barracas, a cama
de seu Tomás da bolandeira, uma cama de verdade.
23
Graciliano Ramos
Convidou a mulher e os filhos para os cavalinhos, arrumou-os, distraiu-se um
pouco vendo-os rodar. Em seguida encaminhou-os às barracas de jogo. Coçou-se, puxou
o lenço, desatou-o, contou o dinheiro, com a tentação de arriscá-lo no bozó. Se fosse feliz,
poderia comprar a cama de couro cru, o sonho de Sinha Vitória. Foi beber cachaça numa
tolda, voltou, pôs-se a rondar indeciso, pedindo com os olhos a opinião da mulher. Sinha
Vitória fez um gesto de reprovação, e Fabiano retirou-se, lembrando-se do jogo que tivera
em casa de seu Inácio, com o soldado amarelo. Fora roubado, com certeza fora roubado.
Avizinhou-se da tolda e bebeu mais cachaça. Pouco a pouco ficou sem-vergonha.
– Festa é festa.
Baleia
Este capítulo, o primeiro escrito por Graciliano como conto, trata da morte
da cachorra. Fabiano, considerando-a doente (hidrófoba), é obrigado a sacrificá-la.
Justifica tal atitude, temendo pela vida dos meninos. Sinha Vitória impede que
os meninos presenciem a cena do sacrifício, porém luta para contê-los, principalmente o mais velho, que a tem como o seu melhor amigo. Sem atinar para o que
está acontecendo (não entende por que Fabiano aponta para ela a espingarda),
Baleia é ferida, não sente mais as pernas (e não as patas). Baleia tem vontade de
morder Fabiano, mas logo descarta essa ideia, pois nascera ao lado dele, passara
a vida ajudando-o na lida com o gado, sendo submissa a ele. Esse é o momento
da obra em que Baleia é mais humanizada. Pouco antes de morrer, ela delira:
Baleia queria dormir. Acordaria feliz, num mundo cheio de preás. E lamberia as
mãos de Fabiano, um Fabiano enorme. As crianças se espojariam com ela, rolariam com
ela num pátio enorme, num chiqueiro enorme. O mundo ficaria todo cheio de preás,
gordos, enormes.
Contas
Fabiano é explorado pelo fazendeiro. Recebe como pagamento pelo trabalho
de vaqueiro a quarta parte dos bezerros e a terça dos cabritos. Como Fabiano é um
“sem-terra”, como tantos que vivem por aí, não tem onde colocá-los, por isso é
obrigado a vendê-los ao próprio patrão: pouco a pouco o ferro do proprietário queimava
os bichos de Fabiano. E quando não tinha mais nada para vender, o sertanejo endividava-se.
Ao chegar a partilha, estava encalacrado, e na hora das contas davam-lhe uma ninharia.
Mesmo sendo alertado por Sinha Vitória, que “tinha miolo” e sabia fazer
contas, Fabiano não consegue se impor, aceitando a explicação do fazendeiro: a
diferença era por causa dos juros cobrados.
E em seu monólogo interior, revolta-se ainda mais ao recordar-se do cobrador de impostos da prefeitura, que lhe tirara dinheiro cobrando imposto sobre
a carne que pretendera vender na cidade. Tenciona beber cachaça na bodega de
seu Inácio, mas o incidente com o soldado amarelo vem à mente e, mais uma
vez resignado, volta para casa.
24
Vidas secas
Olhou as cédulas arrumadas na palma, os níqueis e as pratas, suspirou, mordeu
os beiços. Nem lhe restava o direito de protestar. Baixava a crista. Se não baixasse, desocuparia a terra, largar-se-ia com a mulher, os filhos pequenos e os cacarecos. Para onde?
Hem? Tinha para onde levar a mulher e os meninos? Tinha nada!
O soldado amarelo
Na caatinga, ao se deparar com o soldado amarelo que estava perdido, Fabiano tem a chance de vingar-se da surra que levara na cadeia: O rosto de Fabiano
contraía-se, medonho, mais feio que um focinho.
O soldado amarelo (amarelo agora de medo) é franzino e treme. Mas Fabiano decide não matá-lo, concluindo que não adiantaria nada. Por isso, ensina
ao soldado o caminho a ser seguido.
Devia sujeitar-se àquela tremura, àquela amarelidão? Era um bicho resistente,
calejado. Tinha nervo, queria brigar, metera-se em espalhafatos e saíra de crista levantada.
Recordou-se de lutas antigas, em danças com fêmeas e cachaça. Uma vez, de lambedeira
em punho, espalhara a negrada. Aí Sinha Vitória começara a gostar dele. Sempre fora
reimoso. Iria esfriando com a idade? Quantos anos teria? Ignorava, mas certamente
envelhecia e fraquejava. Se possuísse espelhos, veria rugas e cabelos brancos. Arruinado,
um caco. Não sentira a transformação, mas estava-se acabando.
O suor umedeceu-lhe as mãos duras. Então? Suando com medo de uma peste
que se escondia tremendo? Não era uma infelicidade grande, a maior das infelicidades?
Provavelmente não se esquentaria nunca mais, passaria o resto da vida assim mole e
ronceiro. Como a gente muda! Era. Estava mudado. Outro indivíduo, muito diferente do
Fabiano que levantava poeira nas salas de dança. Um Fabiano bom para aguentar facão
no lombo e dormir na cadeira.
O mundo coberto de penas
Curiosamente, este era o título que Graciliano Ramos deu à sua obra antes
de vir a lume.
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As aves de arribação prenunciam a proximidade da seca. Elas estão bebendo a água do gado, que logo morrerá. Fabiano, mais uma vez, admira a
esperteza da mulher, que o alertara de que as aves é que matavam o gado. Em
contrapartida, elas servem de alimento para a família, abatidas pela espingarda
certeira de Fabiano.
Esqueceu a infelicidade próxima, riu-se encantado com a esperteza de Sinha Vitória.
Uma pessoa como aquela valia ouro. Tinha ideias, sim senhor, tinha muita coisa no miolo.
Nas situações difíceis encontrava saída. Então! Descobrir que as arribações matavam o
gado! E matavam. Aquela hora o mulungu do bebedouro, sem folhas e sem flores, uma
garrancharia pelada, enfeitava-se de penas.
25
Graciliano Ramos
Fuga
Início da nova retirada. Se pudesse, Fabiano ficaria ali com a sua família,
mas é impossível: não há mais água, o gado está morrendo e, ainda por cima, está
devendo ao seu patrão. Por isso deixam a fazenda de madrugada, fugindo.
Fabiano está esperançoso. Chegando à cidade grande, tudo seria diferente:
os meninos estudando e Sinha Vitória, finalmente, dormindo em sua tão sonhada
cama de lastro de couro.
Mas o narrador não compartilha dessa esperança:
Eles dois velhinhos, acabando-se como uns cachorros, inúteis, acabando-se como
Baleia. Que iriam fazer? Retardaram-se, temerosos. Chegariam a uma terra desconhecida e civilizada, ficariam presos nela. E o sertão continuaria a mandar gente para lá. O
sertão mandaria para a cidade homens fortes, brutos, como Fabiano, Sinha Vitória e os
dois meninos.
personagens
No texto Alguns tipos sem importância, da obra Linhas tortas, Graciliano
Ramos concluiu sobre as suas personagens:
Todos os meus tipos foram constituídos por observações apanhadas aqui e ali, durante muitos anos. É o que penso, mas talvez me engane. É possível que eles não sejam
senão pedaços de mim mesmo e que o vagabundo, o coronel assassino, o funcionário
público e a cadela não existam.
A família protagoniza a obra (sendo Fabiano a personagem de maior destaque). Não devemos nos esquecer, é claro, da cachorra Baleia. Quanto ao antagonista
(aquele ou aquilo que faz mal ao protagonista), podemos considerar a seca como a
principal oponente da família e, como coadjuvantes dela, o fazendeiro, o soldado
amarelo, o cobrador de impostos da prefeitura, o bodegueiro etc. Portanto, nem
sempre o antagonista é um ser, mas um fator, assim como na obra O cortiço, de
Aluísio Azevedo (1857-1913), em que a miséria é a antagonista do cortiço (protagonista). A seguir, há caracterização de cada personagem de Vidas secas:
Fabiano
Chefe da família, Fabiano é um vaqueiro rude, de cara vermelha, olhos
azuis, cabelo e barba ruivos que nem ao menos sabe quantos anos tem. Dos membros da família, é o mais animalizado (como vimos, é como cabra, cavalo, tatu),
não consegue se expressar direito, por isso solta, a todo momento, grunhidos
e sons monossilábicos como, por exemplo, “Ecô!”; “Hum! hum!”; “Bem, bem”,
“An”. Não conseguindo se expressar de maneira coerente, tem receio de falar
com as pessoas, pois elas poderiam interpretá-lo mal, ofendendo-o. Não sabe
mentir e tem a imaginação fraca para inventar histórias. Assim, a única pessoa
que o compreende é Sinha Vitória, já habituada com os seus gestos.
26
Vidas secas
Fabiano, apesar de sua aridez, é preocupado com a educação de seus filhos
e com o bem-estar de Sinha Vitória e, por não conseguir dar condições dignas à
sua família, revolta-se contra todos e contra tudo.
Tem a nítida certeza de que é passado para trás por todos, mas resigna-se.
Não consegue se impor diante das pessoas: nem do bodegueiro seu Inácio, que
“batiza” a cachaça e o querosene; nem do fiscal da prefeitura que lhe cobrou
imposto sobre a carne que iria vender; nem do fazendeiro, que não é justo no
acerto de contas; muito menos diante do soldado amarelo, que, abusando de sua
autoridade, leva-o preso, ocasião em que é surrado injustamente.
A surra que Fabiano levou na cadeia não foi muito diferente da levada por
Graciliano Ramos quando menino, narrada por ele no capítulo Um cinturão, de
seu livro Infância. Eis um trecho:
As minhas primeiras relações com a justiça foram dolorosas e deixaram-me funda
impressão. Eu devia ter quatro ou cinco anos, por aí, e figurei na qualidade de réu.
(...)
Havia uma neblina, e não percebi direito os movimentos de meu pai. Não o vi
aproximar-se do torno e pegar o chicote. A mão cabeluda prendeu-me, arrastou-me para
o meio da sala, a folha de couro fustigou-me as costas. Uivos, alarido inútil, estertor. Já
então eu devia saber que rogos e adulações exasperavam o algoz. Nenhum socorro. José
Baía, meu amigo, era um pobre-diabo.
(...)
Junto de mim, um homem furioso, segurando-me um braço, açoitando-me. Talvez
as vergastadas não fossem muito fortes: comparadas ao que senti depois, quando me
ensinaram a carta de A B C, valiam pouco. Certamente o meu choro, os saltos, as tentativas para rodopiar na sala como carrapeta, eram menos um sinal de dor que a explosão
do medo reprimido. Estivera sem bulir, quase sem respirar. Agora esvaziava os pulmões,
movia-me, num desespero.
(...)
Foi esse o primeiro contacto que tive com a justiça.
Abaixo, a surra levada por Fabiano, no capítulo Cadeia, de Vidas secas. Notem
todo o seu inconformismo diante de tal brutalidade:
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Porque tinham feito aquilo? Era o que não podia saber. Pessoa de bons costumes,
sim senhor, nunca fora preso. De repente um fuzuê sem motivo. Achava-se tão perturbado
que nem acreditava naquela desgraça. Tinham-lhe caído todos em cima, de supetão, como
uns condenados. Assim um homem não podia resistir.
– Bem, bem.
Passou as mãos nas costas e no peito, sentiu-se moído, os olhos azulados brilharam
como olhos de gato. Tinham-no realmente surrado e prendido. Mas era um caso tão esquisito que instantes depois balançava a cabeça, duvidando, apesar das machucaduras.
27
Graciliano Ramos
Sinha Vitória
Mulher de Fabiano. O seu maior desejo é poder deitar-se numa cama de
lastro de couro, igual à de seu Tomás da bolandeira.
Segundo Fabiano, a mulher tinha “tutano” para as contas, alertando-o
sobre a exploração do patrão.
Sinha Vitória é a própria personificação do sertão nordestino: quando a
seca vai embora, ela fica taluda, os seios cheios, as nádegas volumosas, as pernas grossas e as bochechas vermelhas. Mas, quando a seca volta, Sinha Vitória
emagrece, enruga e os seus seios ficam bambos.
Se vendesse as galinhas e a marrã? Infelizmente a excomungada raposa tinha comido a pedrês, a mais gorda. Precisava dar uma lição à raposa. Ia armar o mundéu junto
do poleiro e quebrar o espinhaço daquela sem-vergonha.
Ergueu-se, foi à camarinha procurar qualquer coisa, voltou desanimada e esquecida.
Onde tinha a cabeça?
Sentou-se na janela baixa da cozinha, desgostosa. Venderia as galinhas e a marrã,
deixaria de comprar querosene. Inútil consultar Fabiano, que sempre se entusiasmava,
arrumava projetos. Esfriava logo – e ela franzia a testa, espantada, certa de que o marido
se satisfazia com a ideia de possuir uma cama. Sinha Vitória desejava uma cama real, de
couro e sucupira, igual à de seu Tomás da bolandeira.
Baleia
Quatro são os animais de maior destaque na literatura brasileira: o cachorro
Quincas Borba, do romance Quincas Borba, de Machado de Assis; a cadela Baleia,
de Vidas secas, e, em menor importância, a mula Camurça, do romance Chapadão
do bugre, de Mário Palmério, e o burro Nicolau, da peça teatral O pagador de promessas, de Dias Gomes. Antes de comentarmos sobre Baleia, leiamos um trecho
de Quincas Borba:
Se, apesar de tudo, Quincas Borba conseguia adormecer, acordava logo, porque Rubião
levantava-se e punha-se outra vez a descer e subir ladeiras. Soprava um triste vento, que
parecia faca, e dava arrepios aos dois vagabundos. Rubião andava devagar; o próprio cansaço
não lhe permitia as grandes pernadas do princípio, quando a chuva caía em bátegas. As
paradas eram agora mais frequentes. O cão, morto de fome e de fadiga, não entendia aquela
odisseia, ignorava o motivo, esquecera o lugar, não ouvia nada, senão as vozes surdas do
senhor. Não podia ver as estrelas, que já então rutilavam, livres de nuvens. Rubião descobriuas; chegara à porta da igreja, como quando entrou na cidade; acabava de sentar-se e deu
com elas. Estavam tão bonitas, reconheceu que eram os lustres do grande salão e ordenou
que os apagassem. Não pôde ver a execução da ordem; adormeceu ali mesmo, com o cão ao
pé de si. Quando acordaram de manhã, estavam tão juntinhos que pareciam pegados.
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Vidas secas
Baleia é ainda mais humanizada que o cachorro Quincas Borba. Segundo
Fabiano, ela era sabida como gente. Ciente de sua condição de animal, Baleia
se conforma com as sobras deixadas pela família. Vivia sonhando com ossos
que poderiam estar dentro da panela de Sinha Vitória. Quando é ferida por
Fabiano, tem vontade de mordê-lo, mas jamais faria isso, pois era submissa
a ele, nascera perto dele, ladrava como que tangendo o gado para ajudá-lo.
Momentos antes de morrer, teve uma alucinação: viu-se num mundo cheio de
preás, onde estava um Fabiano enorme, onde tudo era enorme e onde seria
feliz, espojando-se com os meninos.
1
A tremura subia, deixava a barriga e chegava ao peito de Baleia. Do peito para trás
era tudo insensibilidade e esquecimento. Mas o resto do corpo se arrepiava, espinhos de
mandacaru penetravam na carne meio comida pela doença.
Baleia encostava a cabecinha fatigada na pedra. A pedra estava fria, certamente
Sinha Vitória tinha deixado o fogo apagar-se muito cedo.
Baleia queria dormir. Acordaria feliz, num mundo cheio de preás. E lamberia as mãos de
Fabiano, um Fabiano enorme. As crianças se espojariam com ela, rolariam com ela num pátio
enorme, num chiqueiro enorme. O mundo ficaria todo cheio de preás, gordos, enormes.
O menino mais novo
Não sendo chamado pelo nome (nem seu irmão), sofre o processo de despersonalização, sendo só mais um naquele meio miserável e cruel.
Sente orgulho de ser filho do vaqueiro Fabiano e quer ser como o pai.
A roupa de vaqueiro de Fabiano é para ele como uma roupa de super-herói; sem
ela, Fabiano era mais um entre todos os mortais, mas, vestido e no lombo da égua
alazã, era terrível. E, para provar a si mesmo que poderia ser como o pai e ganhar
a admiração do irmão e de Baleia, monta num bode, mas cai estatelado no chão.
Sente-se humilhado, mas em pouco tempo se restabelece do acidente e:
... precisava crescer, ficar tão grande como Fabiano, matar cabras a mão de pilão,
trazer uma faca de ponta à cintura. Ia crescer, espichar-se numa cama de varas, fumar
cigarros de palha, calçar sapatos de couro cru.
AOL-11
Subiu a ladeira, chegou-se a casa devagar, entortando as pernas, banzeiro. Quando fosse homem, caminharia assim, pesado, cambaio, importante, as rosetas das esporas
tilintando. Saltaria no lombo de um cavalo brabo e voaria na catinga como pé-de-vento,
levantando poeira. Ao regressar, apear-se-iam num pulo e andaria no pátio assim torto,
de perneiras, gibão, guarda-peito e chapéu de couro com barbicacho. O menino mais velho
e Baleia ficariam admirados.
1 Há no nome Baleia um certo paradoxo, já que o animal vive numa terra castigada pela seca, que nada lembra a paisagem
litorânea. Mas parece ser comum, em Graciliano Ramos, dar nomes de animais marinhos aos seus cães, como o Tubarão,
cachorro de Paulo Honório, personagem de São Bernardo.
29
Graciliano Ramos
O menino mais velho
Solitário, sonhava com amigos, mas o único vivente que lhe dava atenção
era Baleia, por isso é o que mais se desespera quando Fabiano a sacrifica. Não
sabendo falar direito, balbuciava. Em sons onomatopaicos, imitava as cabras, o
vento, os galhos que rangiam na caatinga. Ao escutar de Sinhá Terta a palavra
inferno, achando-a diferente e bonita, decora-a para transmitir ao irmão e à Baleia,
para ganhar-lhes a admiração.
O menino tem imensa curiosidade em saber o significado da palavra inferno (parece ser o próprio Graciliano o menino curioso que aparece em um de
seus livros de memórias, Infância). Do capítulo O inferno, retiramos o seguinte
trecho:
Um dia, em maré de conversa, na prensa de farinha do copiar, minha mãe tentava compor
frases no vocabulário obscuro dos folhetos. Eu me deixava embalar pela música. E de quando
em quando aventurava perguntas que ficavam sem respostas e perturbavam a narradora.
Súbito ouvi uma palavra doméstica e veio-me a ideia de procurar a significação exata
dela. Tratava-se de inferno. Minha mãe estranhou a curiosidade: impossível um menino
de seis anos, em idade de entrar na escola, ignorar aquilo. Realmente eu possuía noções. O
inferno era um nome feio, que não devíamos pronunciar. Mas não era apenas isso. Exprimia
um lugar ruim, para onde as pessoas mal-educadas mandavam outras, em discussões. E
num lugar existem casas, árvores, açudes, igrejas, tanta coisa, tanta coisa que exigi uma
descrição. Minha mãe me condenou a exigência e quis permanecer nas generalidades.
Não me conformei. Pedi esclarecimentos, apelei para a ciência dela. Por que não contava
o negócio direitinho? Instada, condescendeu. Afirmou que aquela terra era diferente das
outras. Não havia lá plantas, nem currais, nem lojas, e os moradores, péssimos, torturados
por demônios de rabo e chifres, viviam depois de mortos em fogueiras maiores que as de
S. João e em tachas de breu derretido. Falou um pouco a respeito dessas criaturas.
Já o menino mais velho, em Vidas secas, não teve a mesma condescendência
da mãe, Sinha Vitória, tampouco de seu pai, Fabiano:
Deu-se aquilo porque Sinha Vitória não conversou um instante com o menino
mais velho. Ele nunca tinha ouvido falar em inferno. Estranhando a linguagem de Sinhá
Terta, pediu informações. Sinha Vitória, distraída, aludiu vagamente a certo lugar ruim
demais, e como o filho exigisse uma descrição, encolheu os ombros.
O menino foi à sala interrogar o pai, encontrou-o sentado no chão, com as pernas
abertas, desenrolando um meio de sola.
– Bota o pé aqui.
A ordem se cumpriu e Fabiano tomou medida da alpercata: deu um traço com a
ponta da faca atrás do calcanhar, outro adiante do dedo grande. Riscou em seguida a
forma do calçado e bateu palmas:
– Arreda.
30
Vidas secas
O pequeno afastou-se um pouco, mas ficou por ali rondando e timidamente arriscou
a pergunta. Não obteve resposta, voltou à cozinha, foi pendurar-se à saia da mãe:
– Como é?
Sinha Vitória falou em espetos quentes e fogueiras.
– A senhora viu?
Aí Sinha Vitória se zangou, achou-o insolente e aplicou-lhe um cocorote.
O menino saiu indignado com a injustiça, atravessou o terreiro, escondeu-se debaixo
das catingueiras murchas, à beira da lagoa vazia.
Seu Tomás da bolandeira
Sua função na obra é servir de referência, de modelo de gente instruída, culta
para Fabiano e Sinha Vitória. Ela é quem mais o admira e, por admirar uma pessoa
culta (inclusive votava) e educada como o seu Tomás (seu Tomás não mandava,
pedia), é menos animalizada que Fabiano, que, por sua vez, tem certas restrições:
apesar de toda sabedoria, homem de tanta leitura, também fugira da seca, deixando
para trás a sua bolandeira (máquina de descaroçar algodão). Note, no trecho abaixo,
que Fabiano se sente superior ao seu Tomás quando o assunto é a seca:
Ele, Fabiano, muitas vezes dissera: – “seu Tomás, vossemecê não regula. Para que
tanto papel? Quando a desgraça chegar, seu Tomás se estrepa, igualzinho aos outros”. Pois
viera a seca, e o pobre do velho, tão bom e tão lido, perdera tudo, andava por aí, mole. Talvez
já tivesse dado o couro às varas, que pessoa como ele não podia aguentar verão puxado.
O soldado amarelo
Representa para Fabiano o poder opressor, o abuso de autoridade, mas,
segundo ele, governo é governo.
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Quando Fabiano reencontra o soldado amarelo, agora em seu “hábitat natural”, isto é, a caatinga (e ninguém conhecia melhor aquele meio que o próprio
Fabiano), tem a chance de vingar-se da surra que levara na cadeia. Aí o amarelo
do soldado, que antes significava raiva, passa a significar medo (como é dito
popularmente, “amarelou” de medo). Fabiano se sobrepõe a uma personagem
que anteriormente lhe era superior. Mas desiste da vingança ao perceber que de
nada adiantaria matá-lo:
Aprumou-se, fixou os olhos nos olhos do polícia, que se desviaram. Um homem.
Besteira pensar que ia ficar murcho o resto da vida. Estava acabado? Não estava. Mas
para que suprimir aquele doente que bambeava e só queria ir para baixo? Inutilizar-se
por causa de uma fraqueza fardada que vadiava na feira e insultava os pobres! Não se
inutilizava, não valia a pena inutilizar-se. Guardava a sua força.
31
Graciliano Ramos
O fazendeiro
Simboliza a relação de exploração entre patrão e empregado. O fazendeiro
o enganava no acerto de contas (Sinha Vitória o alertava sempre), mas Fabiano,
com medo de perder o emprego, resignava-se. No capítulo Fuga, Fabiano, além
de não ter direito a receber nada, devia ao patrão.
Tudo seco em redor. E o patrão era seco também, arreliado, exigente e ladrão, espinhoso como um pé de mandacaru.
Fiscal da prefeitura
Símbolo da extorsão do governo, cobra de Fabiano um imposto sobre a carne
que este tentava vender na cidade. Dessa forma, o soldado amarelo, o fazendeiro e o
fiscal simbolizam para Fabiano poderes autoritários, exploradores e corruptores.
Supunha que o cevado era dele. Agora se a prefeitura tinha uma parte, estava
acabado. Pois ia voltar para casa e comer a carne. Podia comer a carne? Podia ou não
podia? O funcionário batera o pé agastado e Fabiano se desculpara, o chapéu de couro
na mão, o espinhaço curvo:
– Quem foi que disse que eu queria brigar? O melhor é a gente acabar com isso.
Despedira-se, metera a carne no saco e fora vendê-la noutra rua, escondido. Mas,
atracado pelo cobrador, gemera no imposto e na multa. Daquele dia em diante não criara
mais porcos. Era perigoso criá-los.
Sinhá Terta
Velha despachada, benzedeira e costureira, que, não chegando a ser como
seu Tomás da bolandeira, também causa admiração em Fabiano. Isso devido à
sua desenvoltura:
Sinhá Terta é que se explicava como gente da rua. Muito bom uma criatura ser
assim, ter recurso para se defender.
COMENTÁRIO CRÍTICO
No posfácio do livro Vidas secas, o crítico literário Álvaro Lins escreve um
interessante ensaio sobre a produção literária de Graciliano Ramos, Valores e misérias das vidas secas. Da parte em que dedica à obra Vidas secas, retiramos alguns
trechos em que o ensaísta evidencia acertos e defeitos presentes na obra:
Aliás, o mais brasileiro dos livros do sr. Graciliano Ramos é sem dúvida a novela
Vidas secas, publicada em 1938. Revelaram-se nesta obra algumas das melhores qualidades de seu autor, ausentes no que escrevera antes. Antes, em S. Bernardo e Angústia,
a sua atitude humana era quase simplesmente de sarcasmo e revolta egoísta. Em Vidas
secas, ele se mostra mais humano, sentimental e compreensivo, acompanhando o pobre
vaqueiro Fabiano e sua família com uma simpatia e uma compaixão indisfarçáveis.
32
Vidas secas
(...)
Contudo, tecnicamente, Vidas secas apresenta dois defeitos consideráveis. Um
deles é que a novela, tendo sido construída em quadros, os seus capítulos, assim independentes, não se articulam formalmente com bastante firmeza e segurança. Cada um deles
é uma peça autônoma, vivendo por si mesma, com um valor literário tão indiscutível,
aliás, que se poderia escolher qualquer um, conforme o gosto pessoal, para as antologias.
O outro defeito é o excesso de introspecção em personagens tão primários e rústicos,
estando constituída quase toda a novela em monólogos interiores.
(...)
Na substância, a novela apresenta uma perfeita unidade, uma completa harmonia
interior. O drama do primeiro capítulo repete-se no último; e tudo o mais que se encontra
entre eles constitui uma matéria de ligação entre os dois episódios semelhantes.
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Além de ser o mais humano e comovente dos livros de ficção do sr. Graciliano
Ramos, Vidas secas é o que contém maior sentimento da terra nordestina, daquela
parte que é áspera, dura e cruel, sem deixar de ser amada pelos que a ela estão ligados
teluricamente.
33
Graciliano Ramos
5.EXERCÍCIOS
Leia o texto a seguir para responder às questões 1 e 2.
Eram todos felizes. Sinha Vitória vestiria uma saia
larga de ramagens. A cara murcha de Sinha Vitória remoçaria, as nádegas bambas de Sinha Vitória engrossariam,
a roupa encarnada de Sinha Vitória provocaria a inveja
das outras caboclas.
A lua crescia, a sombra leitosa crescia, as estrelas foram esmaecendo naquela brancura que enchia a
noite. Uma, duas, três, agora havia poucas estrelas no
céu. Ali perto a nuvem escurecia o morro.
A fazenda renasceria – e ele, Fabiano, seria o vaqueiro, para bem dizer seria o dono
daquele mundo.
Os troços minguados ajuntavam-se no chão: a espingarda de pederneira, o aió, a cuia
de água e o baú de folha pintada. A fogueira estalava. O preá chiava em cima das brasas.
Uma ressurreição. As cores da saúde voltariam à cara triste de Sinha Vitória. Os
meninos se espojariam na terra fofa do chiqueiro das cabras. Chocalhos tilintariam pelos
arredores. A caatinga ficaria verde.
Baleia agitava o rabo, olhando as brasas. E como não podia ocupar-se daquelas
coisas, esperava com paciência a hora de mastigar os ossos. Depois iria dormir.
Graciliano Ramos
1. Ufla-MG
“Eram todos felizes”. Sobre essa frase, a afirmação falsa é:
a)Corresponde a um sonho de Fabiano.
b)É apenas um pensamento de Fabiano.
c) Foi dita por Fabiano a Sinha Vitória.
d)Equivale verdadeiramente a “Seriam todos felizes”.
e)Tem o verbo no passado designando vagamente um tempo imaginado.
2. Ufla-MG
I.O texto estrutura-se em dois planos: o do sonho e o da realidade.
II.No plano do sonho, há a predominância dos verbos no futuro do pretérito,
denotando hipótese.
III.No plano da realidade, predominam os verbos no imperfeito do indicativo,
denotando ação continuada.
Com relação às afirmações citadas, pode-se dizer que:
a) todas são falsas.
b) todas são verdadeiras.
c) somente a primeira é verdadeira.
d)somente a segunda é verdadeira.
e) somente a terceira é verdadeira.
34
Vidas secas
3. Fatec-SP
Fabiano ouviu o falatório desconexo do bêbado, caiu numa indecisão dolorosa.
Ele também dizia palavras sem sentido, conversava à toa. Mas irou-se com a comparação, deu murradas na parede. Era bruto, sim senhor, nunca havia aprendido, não
sabia explicar-se. Estava preso por isso? Então mete-se um homem na cadeia porque
ele não sabe falar direito?
Graciliano Ramos, Vidas secas
Neste trecho, a expressão “... não sabe falar direito?” reforça o ponto de vista
predominante do narrador, que define:
a) uma ambiguidade muito marcante no comportamento de Fabiano.
b) o conflito entre Fabiano e o poder representado pelo soldado amarelo.
c) o domínio da linguagem culta (padrão) como capacidade primeira que garante
ao homem a defesa do direito à liberdade.
d)a identificação de Fabiano com seu Tomás da bolandeira.
e) a “indecisão dolorosa” de Fabiano em situações que não exigiam o domínio
da palavra.
4. Fuvest-SP
Vidas secas, reconhecidamente, compõe-se de capítulos que se constituem em
quadros destacáveis, como se fossem narrativas autônomas.
a)O que confere unidade à obra?
b) Qual a relação existente entre o capítulo inicial, “Mudança”, e o final, “Fuga”?
5. Unicamp-SP
Uma personagem constantemente mencionada em Vidas secas, de Graciliano
Ramos, é seu Tomás da bolandeira. Homem letrado, é tido como um exemplo
de “sabedoria” por Fabiano, que muitas vezes o vê como um modelo.
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Em horas de maluqueira Fabiano desejava imitá-lo: dizia palavras difíceis, truncando tudo, e convencia-se de que melhorava. Tolice. Via-se perfeitamente que um sujeito
como ele não tinha nascido para falar certo.
Seu Tomás da bolandeira falava bem, estragava os olhos em cima de jornais e
livros, mas não sabia mandar: pedia. Esquisitice um homem remediado ser cortês. Até o
povo censurava aquelas maneiras. Mas todos obedeciam a ele. Ah! Quem disse que não
obedeciam?
a) Cite um episódio do romance em que fica evidente a dificuldade de expressão
de Fabiano na presença de pessoas que julga superiores.
b) Como o episódio escolhido por você exemplifica a relação, percebida por
Fabiano, entre um uso mais “difícil” da linguagem e o poder exercido por
determinadas pessoas?
35
Graciliano Ramos
6. Fuvest-SP
Em determinada época, o romance brasileiro “procurou (...) enraizar fortemente
as suas histórias e as suas personagens em espaços e tempos bem circunscritos,
extraindo de situações culturais típicas a sua visão do Brasil” (Alfredo Bosi).
Essa afirmação aplica-se a:
a) Vidas secas e Fogo morto.
b) Macunaíma e A hora da estrela.
c) A hora da estrela e Serafim Ponte Grande.
d)Fogo morto e Serafim Ponte Grande.
e) Vidas secas e Macunaíma.
7. ITA-SP
Assinale a melhor opção, considerando as seguintes asserções sobre Fabiano,
personagem de Vidas secas, de Graciliano Ramos.
I. Devido às dificuldades pelas quais passou no sertão, tornou-se um homem
rude, mandante da morte de vários inimigos seus.
II.Comparava-se, com orgulho, aos animais, pois era um homem errante que
vivia fugindo da seca.
III.Sentia-se fraco para exigir seus direitos diante de patrões e autoridades, por
isso não se considerava um homem, mas um bicho.
Está(ão) correta(s):
a) apenas a I.
b) apenas a III.
c)I e II.
d)I e III.
e)II e III.
Texto para as questões 8 e 9
Tudo seco em redor. E o patrão era seco também, arreliado, exigente e ladrão, espinhoso como um pé de mandacaru.
Indispensável os meninos entrarem no bom caminho, saberem cortar mandacaru
para o gado, consertar cercas, amansar brabos. Precisavam ser duros, virar tatus. Se não
calejassem, teriam o fim de seu Tomás da bolandeira. Coitado. Para que lhe servira tanto
livro, tanto jornal? Morrera por causa do estômago doente e das pernas fracas.
Graciliano Ramos, Vidas secas
36
Vidas secas
8. Centec-BA
O trecho apresenta como ideia central:
a) a valorização do trabalho intelectual para a existência humana.
b) o elogio da condição humana em tempo de seca.
c) as regras de sobrevivência humana em ambiente inóspito.
d)a preocupação metafísica do autor com relação ao homem.
e) a denúncia da fragilidade humana face à natureza.
9. Centec-BA
O trecho evidencia:
a) a crueldade das condições de vida e trabalho do homem.
b) a admiração do homem do povo pela classe dominante.
c) a inadequação do homem ao meio em que vive.
d)o compromisso do homem com o desenvolvimento regional.
e) o interesse pelo crescimento interior do indivíduo.
10. Vunesp
Leia o texto abaixo e responda à questão.
Mudança
Na planície avermelhada os juazeiros alargavam duas manchas verdes. Os infelizes
tinham caminhado o dia inteiro, estavam cansados e famintos. Ordinariamente andavam
pouco, mas como haviam repousado bastante na areia do rio seco, a viagem progredira
bem três léguas. Fazia horas que procuravam uma sombra. A folhagem dos juazeiros
apareceu longe, através dos galhos pelados da caatinga rala.
Arrastaram-se para lá, devagar, Sinha Vitória com o filho mais novo escanchado
no quarto e o baú de folha na cabeça, Fabiano sombrio, cambaio, o aió a tiracolo, a cuia
pendurada numa correia presa ao cinturão, a espingarda de pederneira no ombro. O
menino mais velho e a cachorra Baleia iam atrás.
Os juazeiros aproximaram-se, recuaram, sumiram-se. O menino mais velho pôs-se
a chorar, sentou-se no chão.
– Anda, condenado do diabo, gritou-lhe o pai.
Não obtendo resultado, fustigou-o com a bainha da faca de ponta. Mas o pequeno
esperneou acuado, depois sossegou, deitou-se, fechou os olhos. Fabiano ainda lhe deu
algumas pancadas e esperou que ele se levantasse. Como isto não acontecesse, espiou os
quatro cantos, zangado, praguejando baixo.
Ramos, Graciliano. Vidas secas. 64. ed. Rio de Janeiro: Editora Record, 1993, p. 9.
AOL-11
Explique, com base nos elementos do texto, por que Vidas secas é considerado
um romance regionalista.
37
Graciliano Ramos
GAbarito
1.C
2.B
3.C
4.
a)Os problemas (fome, miséria, necessidade
de fuga) enfrentados pela família. Em cada
capítulo, um membro da família é prioridade, mas já tinham sido apresentados em
conjunto no primeiro capítulo.
b)O primeiro capítulo mostra a família em
retirada; o mesmo acontece no último, formando uma obra cíclica.
5.
a) Há vários momentos a serem citados,
como, por exemplo: quando Fabiano
quer discutir com o vendeiro a respeito
da pinga “batizada”, mas este não lhe
dá ouvidos; quando o soldado amarelo
o convida para o jogo e ele não consegue
dizer não; quando Sinha Vitória contesta
o pagamento recebido pelo marido na
frente do patrão. Fabiano não consegue
se impor.
b)Uma pessoa, para ser respeitada e escutada
dentro da sociedade, tem de ter o mínimo
de domínio da linguagem.
6. A
7.E
8.C
9. A
10.A especificação do cenário (caatinga rala, juazeiros, galhos secos) e dos utensílios e hábitos
dos personagens (cuia, aió, baú de folha)
confere à obra um caráter regionalista.
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