excerto - Sinais Vitais

Transcrição

excerto - Sinais Vitais
ISSN 0872-8844
N.º104 . SETEMBRO 2012 . 6,5€
enfermagem em revista
A ENFERMAGEM QUE
FAZ A DIFERENÇA
CIÊNCIA E
TÉCNICA
CONDUTO
VASCULAR PARA
OBTENÇÃO DO
PERFECT MATCH
A PROPÓSITO DE UM
CASO CLÍNICO
CIÊNCIA E
TÉCNICA
DESOBSTRUÇÃO
DA VIA AÉREA
SUMÁRIO
PUB
SUMÁRIO
P04 EDITORIAL
P05 ACTUALIDADES
COMO PROVAR QUE A CAUSA DE CANCRO NOS HUMANOS PODE SER UM VÍRUS
P06 ACTUALIDADES
ENCONTRADO GENE QUE PODE SER A CHAVE PARA O DESENVOLVIMENTO CEREBRAL
P07 ACTUALIDADES
CÉLULAS COMUNS DO CORAÇÃO TORNAM-SE "MARCA-PASSOS BIOLÓGICOS" COM INJEÇÃO
DE UM ÚNICO GENE
P08 ACTUALIDADES
ALIMENTAR PACEMAKERS COM AS VIBRAÇÕES DO CORAÇÃO
P11 ÉTICA
QUALIDADE DOS CUIDADOS DE SAÚDE: REFLEXÕES ÉTICAS EM FIM DE VIDA
CUIDAMOS
DA SUA FORMAÇÃO
Mais informações em www.sinaisvitais.pt
P20 CIÊNCIA & TÉCNICA
TÉCNCA DE DESOBTRUÇÃO DA VIA AÉREA
P25 CIÊNCIA & TÉCNICA
TERAPIA POR VÁCUO NO TRATAMENTO DE FERIDAS
P29 CIÊNCIA & TÉCNICA
SAÚDE MENTAL: COMUNICAÇÃO EM ENFERMAGEM
P23 CIÊNCIA & TÉCNICA
PRESTADOR DE CUIDADOS INFORMAL OPERACIONALIDADE
P33 CIÊNCIA & TÉCNICA
ACOLHIMENTO DO DOENTE E FAMÍLIA NO SERVIÇO DE URGÊNCIA
P38 CIÊNCIA & TÉCNICA
CUIDAR DO DOENTE EM FASE TERMINAL DE VIDA E DA SUA FAMÍLIA
P47 CIÊNCIA & TÉCNICA
CONDUTO VASCULAR PARA OBTENÇÃO DO PERFECT MATCH
A PROPÓSITO DE UM CASO CLÍNICO
P53 FORMAÇÃO
A FORMAÇÃO E O DESENVOLVIMENTO ORGANIZACIONAL
PARQUE EMPRESARIAL DE EIRAS
LOTE 19, EIRAS
3020-265 COIMBRA
telefone 239 801 020
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FICHA TÉCNICA
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SOCIAL 21.947,90 € DIRECTOR António Fernando Amaral DIRECTORES-ADJUNTOS Carlos Alberto Margato / Fernando Dias Henriques EDITORES Arménio Guardado Cruz / João Petetim Ferreira /
José Carlos Santos / Paulo Pina Queirós / Rui Manuel Jarrô Margato CONSELHO CIENTÍFICO Ana Cristina Cardoso / Arlindo Reis Silva / Daniel Vicente Pico / Elsa Caravela Menoita / Fernando Alberto
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REGIÃO SUL Ana M. Loff Almeida / Maria José Almeida REGIÃO NORTE M. Céu Barbiéri Figueiredo MADEIRA Maria Mercês Gonçalves COLABORADORES PERMANENTES Maria Arminda Costa / Nélson
César Fernandes / M. Conceição Bento / Manuel José Lopes / Marta Lima Basto / António Carlos INTERNET www.sinaisvitais.pt E-MAIL [email protected] ASSINATURAS Mariana Cruz Gomes /
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REGISTO 118 368 DEPÓSITO LEGAL 88306/ 95 ISSN 0872-8844
3
EDITORIAL
ACTUALIDADES
EDITORIAL
SECÇÃO DA RESPONSABILIDADE DE ANTÓNIO FERNANDO AMARAL
COMO PROVAR QUE A CAUSA
DE CANCRO NOS HUMANOS
PODE SER UM VÍRUS
antónio fernando amaral, Enfermeiro
[email protected]
SETEMBRO 2012
Caros leitores, colegas.
4
A Revista Sinais Vitais é editada desde 1994
e, desde essa data, sempre manteve com os
seus assinantes um compromisso de qualidade que se manifestava, entre outros, na pontualidade com que chegava a vossas casas.
Infelizmente este último ano, nomeadamente nestes últimos 5 meses, isso não foi possível mercê de um conjunto de circunstâncias
a que a crise financeira que o país vive não
é alheia. De facto tem sido difícil produzir a
revista, porque tivemos que mudar as nossas
parcerias, indispensáveis para a produção, já
que por razões económicas não foi possível
continuar com as que tínhamos.
Estamos hoje em condições de poder continuar a produzir com a regularidade que queremos a nossa revista Sinais Vitais. No ano
que agora vai começar temos o projeto de a
editar numa plataforma online possibilitando aos nossos leitores uma maior proximida-
de e até uma maior interação com a direção
da revista e a com o seu corpo editorial. Pensamos que com esta alteração será possível
garantir uma maior qualidade e uma maior
regularidade na sua produção começando a
garantir um maior volume de artigos publicados e eventualmente, se esse for o desejo
dos nossos assinantes, uma maior periodicidade.
Aos atuais assinantes será prolongado e garantido o acesso online às edições também
da Revista Investigação em Enfermagem.
Mais tarde entraremos em contato convosco
para maiores esclarecimentos.
Nesta época do ano queria também deixar
aqui votos de que o natal vos seja muito feliz
e que o ano de 2013 seja cheio de venturas
tendo em conta os condicionalismos que o
orçamento de estado para o ano vai introduzir
Boas festas.
5
É evidente que os vírus estão envolvidos na origem de vários tipos de tumor humano. Em geral,
é muito difícil comprovar uma relação causal
entre vírus e determinado tipo de cancro. Se um
vírus for o único agente etiológico de um cancro
específico, a distribuição geográfica da infecção
viral deverá coincidir com a do tumor; a presença de marcadores virais deve ser maior nos casos
do que nos controles; e a infecção viral deve proceder ao desenvolvimento do tumor. Este critério
pode ser difícil de estabelecer se outros fatores
ambientais ou genéticos estiverem na origem do
mesmo tipo de cancro. Somente nos casos em
que a expressão contínua de uma função viral
for necessária à manutenção da transformação
é que os genes virais persistirão em todas as células tumorais. Se o vírus constituir uma etapa
inicial na carcinogénese em múltiplas etapas,
poderá haver a perda do genoma viral à medida que o tumor se desenvolve, mas pode repre-
sentar apenas um passageiro devido à sua afinidade pelo tipo celular. Em geral, vírus tumorais
não se replicam nas células transformadas, de
modo que é necessário utilizar métodos muito
sensíveis, como a pesquisa de ácidos nucléicos
ou proteínas virais, para detectar a presença do
vírus. A indução de tumores em animais de laboratório e a transformação de células humanas
em cultura constituem boas evidências circunstanciais de que um vírus é carcinogénico. Esses
sistemas podem fornecer modelos para análises moleculares do processo de transformação,
mas não constituem uma prova de que o vírus
provoca determinado cancro humano. A prova
mais definitiva de uma relação casual consiste
na redução da incidência do tumor mediante a
prevenção da infecção pelo vírus. Os métodos de
intervenção devem ser eficazes para reduzir a
ocorrência de cancro, mesmo se o vírus for apenas um dos diversos co-fatores.
ACTUALIDADES
ACTUALIDADES
ENCONTRADO GENE QUE
PODE SER A CHAVE PARA O
DESENVOLVIMENTO CEREBRAL
SETEMBRO 2012
Cerca de um em cada dez mil bebés nasce com uma cabeça anormalmente pequena.
A causa para esta doença - o que é conhecido como microcefalia - é um defeito no
desenvolvimento do cérebro embrionário. Crianças com microcefalia são severamente retardadas e a sua expectativa de vida é baixa. Certos casos de autismo e
esquizofrenia estão associadas com a desregulação do tamanho do cérebro.
6
As causas subjacentes ao défice de desenvolvimento cerebral pode ser o stress ambiental
(tais como o abuso de álcool ou radioterapia) ou
infeções virais (como a rubéola) durante a gravidez. Em muitos casos, no entanto, um gene
mutante pode estar na origem do problema.
David Keays, um líder do grupo no IMP, já encontrou um novo gene que é responsável por microcefalia. Junto com o seu estudante de Doutoramento Martin Breuss, foi capaz de identificar o
gene TUBB5 como culpado. O gene é responsável
por produzir tubulinas, os blocos de construção
da estrutura interna da célula. Sempre que uma
célula se move ou se divide, baseia-se nas orien-
tações do presente estrutura interna,
que age como se fosse um andaime.
Os pesquisadores, juntamente com
colaboradores da Universidade Monash (Victoria, Austrália), foram capazes de interferir com a função do
TUBB5 nos cérebros de ratos durante
o seu desenvolvimento. Isto conduziu
a perturbações maciças na população
de células estaminais e prejudicou a
migração das células nervosas. Quer
a produção de um grande número de
neurónios quer a sua posição correta
no córtex, são essenciais para o desenvolvimento do cérebro dos mamíferos.
Para determinar se os resultados são
também relevantes para os humanos,
David Keays colabora com os médicos
da Universidade de Paris-Sorbonne.
A equipe francesa liderada por Jamel Chelly, examinou 120 pacientes
com estruturas cerebrais patológicos
e incapacidades graves. Em três das
crianças foram encontrados pelo menos uma mutação do gene TUBB5.
Esta informação irá ser vital para os
médicos que tratam crianças com doenças do cérebro. Ela permitirá o desenvolvimento de novos
testes genéticos que formam a base do aconselhamento genético, ajudando os pais a construir
planos para o futuro. Ao entender como os genes diferentes causam transtornos cerebrais,
espera-se que um dia os cientistas sejam capazes
de criar novas drogas e terapias para tratá-los.
As novas descobertas destes pesquisadores estão
publicados na edição da revista Cell Reports. Para
David Keays, a compreensão da função de TUBB5
é a chave para a compreensão do desenvolvimento do cérebro.
CÉLULAS COMUNS DO CORAÇÃO
TORNAM-SE "MARCA-PASSOS
BIOLÓGICOS" COM INJEÇÃO DE
UM ÚNICO GENE
Pesquisadores do Cedars-Sinai Heart Institute têm reprogramado células
cardíacas comuns para se tornarem réplicas exatas de células marca-passo
altamente especializadas, injetando um único gene (Tbx18) - um grande passo em frente na busca de uma década para uma terapia biológica que permita corrigir alterações nos batimentos cardíacos.
Os resultados deste estudo serão publicados na
Revista Nature Biotechnology de Janeiro de 2013
e também estarão disponíveis no site da revista.
Embora já tenham sido criados marca-passos biológicos, este estudo é o primeiro a mostrar que um único
gene pode direcionar a conversão de células do músculo
cardíaco para células marca-passo genuínas. As novas
células geram impulsos elétricos de forma espontânea e
são indistinguíveis das células marca-passo nativas
As Células marca-passo geram atividade elétrica que
se transmite para outras células do coração num pa-
drão ordenado para criar contrações musculares
rítmicas. Se essas células não estão bem, o coração
bombeia de forma irregular. Quando o estado dos
doentes o permite é colocado um pace maker eletrónico como a única opção para a sobrevivência.
O batimento cardíaco origina-se no nódulo sino-auricular (SAN) da câmara direita do coração superior,
onde estão agrupados células marca-passo. Dos 10 bilhões de células do coração, menos de 10.000 são células marca-passo, muitas vezes referida como células
de SAN.
Uma vez reprogramadas pelo gene Tbx18, as células
marca-passo recém-criadas - "SAN" células induzidas
ou células isan - tinham todas as características essenciais das células marca-passo nativas e mantiveram
as suas características tipo SAN, mesmo depois de os
efeitos do gene Tbx18 ter desaparecido.
Mas os pesquisadores do Cedars-Sinai, empregando
um vírus projetado para realizar um único gene (Tbx18)
que desempenha um papel fundamental no desenvolvimento embrionário das células marca-passo, reprogramaram diretamente células do músculo do coração
(cardiomiócitos) em células marca-passo especializadas. As novas células assumiram as características e
função de células marca-passo nativas, tanto em células de laboratório como em estudos com cobaias.
Se as pesquisas subsequentes confirmarem e apoiarem
os resultados dos estudos com células marca-passo, os
pesquisadores disseram acreditar que a terapia pode
ser administrada por injeção de Tbx18 no coração de
um paciente ou pela criação de células marca-passo
no laboratório e transplantá-las para o coração. Mas
os estudos adicionais de segurança e eficácia devem
ser realizados antes dos ensaios clínicos em humanos
poderem começar.
7
ACTUALIDADES
ALIMENTAR PACEMAKERS
COM AS VIBRAÇÕES
DO CORAÇÃO
PUB
PUB
A ENFERMAGEM TEM UM ENDEREÇO
www.sinaisvitais.pt
SETEMBRO 2012
Ainda que os marca-passos exijam apenas pequenas quantidades de energia (cerca
de 1 milionésimo de watt), as baterias devem ser substituídas periodicamente, o
que significa várias cirurgias para os pacientes. Os pesquisadores têm procurado
maneiras de se prolongar a vida das baterias - tentando gerar energia para alimentar um marca-passo usando açúcar no sangue, ou o movimento das mãos e
das pernas - mas esses métodos ou interferem com o metabolismo ou exigem uma
cirurgia mais drástica, como passar um fio de membros para a região do peito.
8
Os engenheiros Aeroespaciais M. Amin Karami
e Daniel J. Inman, da Universidade de Michigan
em Ann Arbor, desenvolveram um protótipo que
poderia alimentar um marca-passo usando uma
fonte que é surpreendentemente próxima do coração: as vibrações na cavidade torácica que se
devem principalmente aos batimentos cardíacos.
Os autores descrevem a técnica e seu progresso de desenvolvimento num artigo publicado
recentemente numa revista de Física Aplicada.
No seu método, as vibrações na cavidade torácica deformam uma camada de material piezoeléctrico, que é capaz de converter a tensão mecânica em corrente elétrica. Testes indicam que
o dispositivo pode trabalhar a taxas cardíacas
de 7-700 batimentos por minuto (bem abaixo e
acima da gama normal), e que poderia produzir
oito vezes a energia necessária para um pacemaker. Além disso, segundo os autores, a quantidade de energia gerada é sempre maior do que
a quantidade necessária para fazer funcionar
um pacemaker, independente da taxa cardíaca.
Embora a equipe ainda precise de desenvolver
um protótipo que seja biocompatível, eles dizem
que o potencial para compactar este produtor
de energia com pacemakers lhe dá uma vantagem sobre os métodos concorrentes.
NOTÍCIAS √ FORMAÇÃO √ CIÊNCIA √ DISCUSSÃO
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ÉTICA
ÉTICA
ENTRADA DO ARTIGO NOVEMBRO 2009
QUALIDADE DOS CUIDADOS DE
SAÚDE: REFLEXÕES ÉTICAS EM FIM
DE VIDA
ANA MARIA MACHADO GONÇALVES REIS
SETEMBRO 2012
Enfermeira especialista, Mestre em Bioética, Doutorada em Ética e Profª. Coordenadora
convidada na Escola Superior de Saúde do Vale do Ave
10
RESUMO
Os direitos do doente em fim de vida são uma
realidade, por isso a obrigação de respeitar e
proteger os valores de um doente terminal é consequência da dignidade inviolável, inerente ao
ser humano, em todas as fases da sua vida. Sem
dúvida que este respeito e esta protecção se traduzem na criação de um ambiente que permita
ao ser humano morrer com dignidade. O binómio
enfermeiro-doente, quem cuida e quem é cuidado, situa-se entre seres humanos que do ponto de
vista ético têm dignidade. Ajudar uma pessoa a
morrer é apoiar o sentido de amor-próprio, a dignidade e escolha do mesmo no último momento
da sua vida. Para o conseguir devemos prestar
cuidados calmos, sensíveis e individualizados para
que a sua experiência humana final seja livre de
dor e se sinta reconfortada por ser vista como um
ser digno dos cuidados mais atentos.
Neste artigo, baseado em revisão bibliográfica, fazemos uma análise das responsabilidades
inerentes ao papel assumido pelos enfermeiros,
perante a sociedade, e o respeito pelos direitos
humanos no cuidar dos doentes, como princípios
orientadores da sua actividade profissional.
Palavras-chave: Cuidar, Doente terminal e Direitos.
ABSTRACT
The rights of the patient end of life are a reality, so the obligation to respect and protect the
values ​​of a terminally ill is a consequence of the
inviolable dignity inherent in human beings in
all stages of their life. No doubt this respect and
that protection is reflected in the creation of an
enabling environment for human beings to die
with dignity. The binomial nurse-patient and caregivers who care, is between human beings that
the ethical point of view have dignity. Helping a
person to die is to support the sense of self-esteem, dignity and choice in the very last moment
of his life. To achieve this we must calm caring,
sensitive and individualized so that your final human experience is pain-free and feel comforted
by being seen as worthy of a more attentive care.
In this article, based on a literature review, we
analyze the responsibilities of the role played by
nurses in society, and respect for human rights
in caring for the sick, as the guiding principles of
their profession
INTRODUÇÃO
Os problemas éticos envolvidos na prestação de
cuidados de saúde, particularmente suscitados
pelo cuidar do doente terminal, têm sido negligenciados com inevitáveis consequências nefastas para o cuidar do doente. Como consequência
do desenvolvimento dos novos conhecimentos, as
aplicações de áreas como a medicina e a biologia
podem pôr em causa o ser humano e a sua dignidade. De certa forma, esta imagem reflecte a inconsistência do ser humano que é manipulado pelas suas próprias obras e suas infinitas ambições.
O princípio ético em Enfermagem expõe, exactamente, o desígnio original da profissão do enfermeiro, que só por si, testemunha a sua fundamentação ética, porque enuncia exactamente
o propósito original da referida profissão, que
consta de: fazer tudo para o melhor bem-estar
do doente. Ainda se morre “mal nos séculos da
ciência”1. Esta realidade também é testemunhada quando observamos o abandono da pessoa à
solidão, numa sociedade onde não se sabe morrer.
Perante esta realidade, pretendemos, com esta
reflexão, propôr um caminho ético onde apresentamos as atitudes e práticas a adoptar, face a um
doente terminal, com o objectivo de garantir uma
morte digna. Esta reflexão pretende, ainda, ser uma
tentativa de ver, no cruzamento dos olhares, algo
que ajude a discernir a intuição e o caminho para a
humanização dos cuidados de enfermagem, particularmente no que respeita ao doente terminal.
Nesta análise, construímos um referencial teórico
com base na análise documental de textos e documentos sobre o doente terminal, de modo a permitir
um enquadramento da problemática em estudo.
OS DIREITOS DO DOENTE TERMINAL
A necessidade de acompanhar o ser humano no
fim de vida foi alertada pelas consciências, perante queixas e acusações de desumanização do processo que antecede a morte, pois “o cuidado não
pode e não deve cessar quando estamos diante de
um quadro de incurabilidade”2. Neste sentido, o
objectivo último da Medicina “é curar às vezes,
Keywords: Care, terminal Patient ,Rights.
1 QUEIRÓS, Júlio Dias «A Espiritualização do Morrer e do Luto». In:
Revista Discurso Filosófico nº 7460.011, Maio, 2003.
2 PESSINI, Leo - Distanásia. Até quando prolongar a vida ? São Paulo :
Edições Loyola, 2001, p. 335.
aliviar frequentemente, confortar sempre”3. Pôr
em prática esta visão vai garantir ao doente terminal viver com dignidade a própria morte.
Sabemos que os direitos do doente terminal têm
por base as necessidades do doente: desde as psicológicas, físicas até as religiosas/espirituais4. Daí
a análise conjunta dos direitos do doente terminal
apontar, nesta fase da vida, para o facto de estes
reflectirem as necessidades reais dos doentes e
para a obrigação dos profissionais de saúde atenderem a tais necessidades, como forma de acompanhamento do doente no processo de morte, garantindo uma qualidade dos cuidados prestados5.
Também, sabemos que o homem, ao longo da
vida, tem necessidade da presença dos outros (o
homem é um ser relacional), sendo imprescindível
na doença grave e, em especial, quando se aproxima da hora da morte. A tomada de consciência
destes novos desafios emergentes do cuidar permite-nos aprender a cuidar do doente terminal,
porque “como fomos ajudados a nascer, também
precisamos de ser ajudados a morrer”6.
É inquestionável que todo o ser humano, enquanto pessoa, em sentido ontológico, goza de uma
dignidade que lhe é intrínseca, sendo-lhe inato
todo um conjunto de direitos fundamentais, ocupando o primeiro plano o direito à vida, ou seja, é
“sujeito de direitos”. Reconhecer a dignidade do
homem exige o respeito e promoção dos direitos
humanos. A dignidade da vida humana da pessoa,
que está à nossa frente, deve ser preservada em
cada momento da existência. Podemos, transpor,
para os profissionais de saúde, o imperativo categórico da razão prática de Kant que diz: “Age
de tal maneira que uses a humanidade, tanto na
tua pessoa, como na pessoa de qualquer outro,
sempre e simultaneamente como fim e nunca
simplesmente como meio”7.
A pessoa humana sempre teve necessidade e direito a cuidados de saúde, Meneses, num estudo sobre a parábola do Bom Samaritano (Lc. 10,
3 Idem, p. 339.
4 Cf. SILVA, Paula Martinho – «Documentos Ético-jurídicos». In: M.
do Céu Patrão Neves (Coord). Comissões de Ética: das Bases Teóricas à
Actividade Quotidiano. Coimbra: Gráfica de Coimbra, 2002, pp. 582588.
5 Cf. PACHECO, Susana – Cuidar a Pessoa em Fase Terminal: Perspectiva
Ética. Loures: Lusociência, 2002, p. 91.
6 Idem, p. 339.
7 KANT, Immanuel – Fundamentação da Metafísica dos Costumes. Porto:
Porto Editora, 1995, p. 66.
11
SETEMBRO 2012
ÉTICA
12
25‑37), refere que este conto exemplar casuisticamente nos dias de hoje, poderá ser narrada da
seguinte forma: Um dia descobri (Samaritana)
uma mulher «meio consumida» pelas ratazanas
(desvalida no caminho) que agonizava, à chuva,
num esgoto, perante a indiferença dos transeuntes (sacerdotes, médicos, etc.) perto de um dos
hospitais de Calcutá. Levei-a aos ombros e fui ao
hospital para providenciar o seu internamento
(estalajadeiro). O pessoal do Campbell Hospital
recusou-a, considerando-a um caso sem esperança. A Madre Teresa (Samaritana) foi a mais dois
hospitais, mas com resultado negativo. Não pôde
ir a mais porque a «moribunda» expirou nos seus braços8. Como citado a atenção pelos doentes
no final da sua vida já era,
sem dúvida, uma forma
de solidariedade, e ao
mesmo tempo, uma
urgência inadiável.
De facto, se ao longo da vida qualquer
pessoa tem necessidade da presença
positiva dos outros,
esta torna-se mais
importante no caso
de doença grave, principalmente aquando da
proximidade da morte. Pacheco refere que os direitos do
doente terminal em “alguns aspectos não são devidamente tidos em linha
de conta, nomeadamente a importância de cuidar
quando já não é possível curar”9. Para esta autora, “morrer com dignidade é, sobretudo, morrer
no tempo certo – sem antecipação ou adiamento da morte – e da forma certa – sem dor, sem
sofrimento e acompanhado”10. Neste sentido, a
preparação para acompanhamento das pessoas
no final da vida deveria ter, inquestionavelmente,
em conta a dimensão da pessoa.
Também, o Conselho Nacional de Ética para as
8 Cf. MENESES, Ramiro Délio Borges – O Desvalido no Caminho (Lc 10,
25-37). Santa Maria da Freira: Edições Passsionistas, 2008, pp.214215.
9 PACHECO, Susana – «Os Direitos e Deveres da Pessoa Doente:
Perspectiva do Profissional da Saúde». In: Cadernos de Bioética, 29
(2002), p. 45.
10 Ib
ÉTICA
Ciência da vida (CNECV), no Parecer sobre Aspectos Éticos dos Cuidados de Saúde Relacionados com o
Final da Vida, afirma “de modo a que o processo
de morte decorra com respeito pela dignidade da
pessoa humana. […] é necessário que:
- O atendimento da pessoa em período final seja
personalizado e constante por parte da equipa de
saúde;
- Seja permitida a presença de familiares, durante 24 horas, bem como de outras pessoas que o
doente terminal deseje ver, incluindo ministros
religiosos;
- Seja facilitada a «alta», na fase final, se o doente
ou a família o desejar”11. Cumpridos estes
requisitos, “a morte em ambiente hospitalar (ou já fora dele)
pode ocorrer com respeito
pela dignidade humana e
as decisões médicas serão eticamente correctas e de boa prática
médica”12.
O CNECV refere ainda que é necessário
“o desenvolvimento,
na formação […], pré
e pós-graduada, de
um alto nível de preparação, para que os
profissionais de saúde saibam e possam assumir, conscientemente, as suas responsabilidades éticas face aos doentes
entregues aos seus cuidados, em especial
os que atingirem a fase terminal e devem morrer
com dignidade”13. É importante que o profissional
de saúde esteja consciente da realidade do doente terminal para que possa acompanhar o doente,
em fase terminal, não apenas de acordo com os
padrões de profissionalismo, mas também no espírito de solidariedade14. É necessário um trabalho
conjunto e articulado de toda a equipa de saúde
na promoção do máximo bem-estar do doente em
11 Citado em: CNECV – Documento de Trabalho, 11/CNECV/95,
Relatório – Parecer sobre Aspectos Éticos dos Cuidados de Saúde
Relacionados com o Final da Vida.
fase terminal, restringindo a expressão «advogado
do paciente», à tradução da grande proximidade,
que se vive entre o enfermeiro e o doente15. O cuidar em fim de vida revela assim a essência do próprio momento de cuidar, pelo que à pessoa em fim
de vida devem ser proporcionadas todas as condições que lhe permitam vivê-la em consciência,
como sendo o culminar da sua vida neste mundo.
Neste processo, os profissionais de saúde, nomeadamente os enfermeiros, empenham toda a sua
responsabilidade, elevando-se assim a qualidade
dos cuidados de saúde prestados.
A CARTA DOS DIREITOS DO DOENTE TERMINAL
A Carta dos Direitos do Doente Terminal, historicamente, reporta-nos para a Declaração Universal dos Direitos do Homem. Desde a aprovação
da Declaração Universal dos Direitos do Homem
(1948), Declaração dos Direitos do Doente (1973),
da Declaração Sobre os Direitos do Doente ou
Declaração de Lisboa em (1981), revista em 1995,
também a Carta Europeia dos Direitos do Doente
(1984) são documentos de onde emerge a ideia de
uma preocupação crescente sobre os direitos do
doente, em fase terminal, nomeadamente o direito de morrer em paz e com dignidade. No entanto, o documento que se reporta exclusivamente
aos direitos do doente em fase terminal é a Carta dos Direitos do Doente Terminal de 1975, que
surgiu de um seminário realizado em Lansing –
Michigan, em que o tema era: Paciente Terminal,
como Ajudá-lo16. Apesar do seminário e da carta
ser de 1975, estes direitos mantêm-se actuais e
reconhecidos ainda hoje como os mais importantes, para além de exprimirem as necessidades da
pessoa que se encontra na fase final da sua vida.
Pode ler-se nesta carta:
“Tenho direito a ser tratado como uma pessoa
humana até ao fim da minha vida;
Tenho o direito de manter um sentimento de
esperança, qualquer que seja a alteração que
me sobrevenha;
Tenho o direito de ser cuidado por pessoas capazes de manter esse sentimento de esperança
perante qualquer mudança que me aconteça;
Tenho o direito de expressar à minha maneira
os meus sentimentos e emoções perante a minha própria morte;
Tenho o direito de participar das decisões que
afectem os cuidados que me vão prestar;
Tenho o direito a receber a atenção da equipa
médica e de Enfermagem, mesmo que seja evidente que não me vou curar;
Tenho o direito de não morrer só;
Tenho o direito a não ter dor;
Tenho o direito a que respondam honestamente às minhas perguntas;
Tenho o direito de não ser enganado;
Tenho o direito a receber ajuda da minha família para aceitar a minha morte; […]
Tenho o direito a morrer em paz e com dignamente;
Tenho o direito de manter a minha individualidade e a não ser julgado pelo facto de que as
minhas decisões possam ser contrárias às dos
que me assistem;
Tenho o direito de discutir e partilhar as minhas vivências religiosas, mesmo que sejam
diferentes das dos outros;
Tenho o direito de esperar que se respeite a
dignidade do meu corpo humano depois da minha morte;
Tenho o direito a ser cuidado por pessoas
compassivas e sensíveis, competentes na sua
profissão, que se esforcem por compreender
as minhas necessidades e que encontrem satisfação pessoal ao prestar-me ajuda quando
for confrontado com a minha morte17.
A Carta dos Direitos do Doente Terminal, “de
certa forma, pode (e deve) servir de orientação
para os profissionais na sua conduta para com o
outro”18. Portanto deve ser o fio condutor dos cuidados de saúde. A Carta dos Direitos do Doente
Terminal não possui valor jurídico, mas enumera
intenções regulamentares que apresentam uma
síntese dos direitos do doente terminal. Também
“nunca será demais respeitar todos os direitos
da pessoa doente em fase terminal, para que ela
possa viver com dignidade o resto de tempo que
lhe falta e para que possa também morrer com
13Ib.
15 Cf. Id., p. 122.
17 ���������������������������������������������������������������
Esta carta encontra-se traduzida em: GAFO, Javier Fernández –
10 Palavras-Chave em Bioética. Trad. do Espanhol de Maria Amélia
Pedrosa. Coimbra: Gráfica de Coimbra, 1996, pp. 173-174.
14 Cf. PACHECO, Susana – Cuidar a Pessoa em Fase Terminal:
Perspectiva Ética, op. cit, pp. 126-129.
16 Cf.
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PACHECO, Susana - Cuidar a Pessoa em Fase Terminal, op. cit., p.
90.
18 ��������������������������������������������������
LANITA, Ana Maria – «Cuidar em Fim de Vida». In: Cadernos de
Bioética, 25 (2001), p. 91.
12 Ib.
13
ÉTICA
SETEMBRO 2012
ÉTICA
14
dignidade”19. Hennezel alerta, em A arte de Morrer20, que é necessário respeitar o doente terminal
e a qualidade do tempo que lhe resta, oferecendo-lhe cuidados e uma escuta, suficientemente
aberta e atenciosa para que ele “entre” vivo na
morte. Nesta perspectiva, o doente terminal carece, principalmente, da presença, disponibilidade
e respeito, tanto dos seus familiares, quanto dos
profissionais de saúde, de modo a possibilitar-lhe
seguir o percurso natural da sua doença, não se
sentindo só perante a última etapa da vida, permitindo-lhe uma morte digna e serena21.
Aspectos Éticos Emergentes do Código Deontológico do Enfermeiro
Como enfermeiros, será oportuno saber qual o
significado que queremos dar ao termo cuidar e
aqui, especificamente, em Enfermagem. Portanto, quando falamos de cuidar, em enfermagem, os
aspectos éticos que decorrem do nosso dever de
cuidar estão presentes não só no juramento dos
enfermeiros, como também nas regras e procedi19 PACHECO,
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Susana - Cuidar a Pessoa em Fase Terminal, op. cit., p. 91.
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HENNEZEL, M.; LELOUP, Jean-Yves – A Arte de Morrer. 2ª Ed. Trad.
do Francês de Gemeniano Cascais Franco. Lisboa: Editorial Noticias,
2000.
21 ���������������������������������������
Cf. HENNEZEL, M.; LELOUP, Jean-Yves, op. cit., pp. 81-97
mentos que supostamente devemos seguir.
Dos profissionais de saúde, destacamos os médicos e os enfermeiros como aqueles que vivem
mais de perto os problemas dos doentes terminais. O Código Deontológico dos Enfermeiros refere que “a acção dos enfermeiros é orientada por
uma preocupação efectiva em promover a qualidade de vida máxima no tempo de vida que resta,
em garantir cuidados de acompanhamento e de
suporte básicos e paliativos, com respeito pela
dignidade de cada pessoa e no cumprimento das
regras da ética e da deontologia profissional”22.
Ter este padrão de comportamento remete-nos
para as implicações do Código Deontológico dos
Enfermeiros referente seu artigo 76º alínea a)
“exercer a profissão com os adequados conhecimentos científicos e técnicos, com o respeito pela
vida, pela dignidade humana e pela saúde e bem-estar da população, adoptando todas as medidas
que visem melhorar a qualidade dos cuidados e
serviços de Enfermagem”23; ou ainda o artigo 78º,
no ponto 1 “As intervenções de Enfermagem são
realizadas com a preocupação da defesa […] e da
��Idem., p. 92.
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Consultado em: ESTATUTO DOS ENFERMEIROS – Deontologia
profissional – Decreto-Lei n.º 104/98, de 21 de Abril.
dignidade da pessoa humana […]”24. Também no
artigo 8 do capítulo IV do Regulamento do Exercício Profissional dos Enfermeiros (REPE) se refere
que “no exercício das suas funções, os enfermeiros deverão adoptar uma conduta responsável e
ética e actuar no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos” 25.
Cuidar de doentes terminais remete-nos para
uma área assustadora, onde os profissionais de
saúde estão, teoricamente, preparados para cuidar da vida, mas não estão formados e/ou capacitados para lidar com a morte; isso amedronta-os
e aterroriza-os. O Código Deontológico dos Enfermeiros dedica um artigo especificamente ao respeito pelo doente terminal (art. 87º): “o enfermeiro, ao acompanhar o doente nas diferentes etapas
da fase terminal, assume o dever de: a) defender e
promover o direito do doente à escolha do local e
das pessoas que deseja para o acompanhamento
na fase terminal da vida; b) respeitar e fazer respeitar as manifestações de perda expressas pelo
doente em fase terminal, pela família ou pessoas
que lhe sejam próximas; c) respeitar e fazer respeitar o corpo após a morte”26.
Os problemas de fim de vida dizem respeito ao
doente terminal, à morte e ao processo de morrer.
O cuidar deve ser orientado numa óptica de cuidados globais, activos e continuados, centrados
no doente e na família. João Paulo II lembrou aos
membros da Pontifícia Academia da Pro Vita, no
ano de 2001, “que a ética exige que os sistemas se
adaptem às exigências da Pessoa Humana e não
que esta seja sacrificada a qualquer sistema”27.
Como já descrito, os doentes terminais passam
por uma série de respostas emocionais únicas, ou
seja, “a pessoa que se aproxima do termo da sua
vida pode experimentar medos e angústias variados: medo do processo envolvente da morte, medo
da dor, do isolamento, da solidão, do desconhecido, a angústia pela perda do controlo da situação
e pelo futuro dos seus.”28. Daí, o profissional de
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Consultado em: Ibem
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Consultado em: GERMANO, Ana; et al., – Código Deontológico do
Enfermeiro: Anotações e Comentários. Lisboa: Edição Ordem dos
Enfermeiros, 2003, p. 168.
26 Citado em: Idem, p. 91.
27 Consultado em: INSTITUTO DE BIOÉTICA - Direitos do Homem
e Biomedicina. Lisboa: Universidade Católica Editora, 2003, p. 18.
28 ELIZARI, Francisco Javier – Questões de Bioética – Vida em Qualidade. Trad. do Espanhol de Bernardino Pacheco Henriques. Porto:
Editorial Perpétuo Socorro, 1996, p. 181.
saúde deve ter em atenção que a sua actuação
deve ser, sobretudo, cuidar do doente, através de
uma verdadeira relação de ajuda, baseada numa
verdadeira escuta, na empatia, na congruência
e no amor para com o outro. Meneses nos seus
estudos faz referência, que o processo «humanizador» está em estrita relação com a dimensão
agápica29. Deste modo será possível estabelecer
e manter uma comunicação terapêutica interpessoal, num clima de confiança que permita o apoio
e a ajuda ao doente, de modo a permitir-lhe viver
o mais serenamente possível até ao momento da
morte30. O grande desafio nos anos vindouros é
“de mostrar que se pode aliar a competência técnica à qualidade humana”31.
O documento Saúde um Compromisso – A Estratégia de Saúde para o Virar do Século (1998-2002),
emanado pelo Ministério da Saúde, relativamente
ao ponto 5 do capítulo 2 – Morrer – Direito à Dignidade, preconizava como objectivos gerais para
o ano 2002, “proporcionar, em cada Sistema Local
de Saúde, a oferta de serviços de saúde tecnicamente habilitados a prestar cuidados eficazes e
humanizados ao doente em fase terminal, com
impacto significativo no seu bem-estar e no da
sua família, propondo, ainda, que até ao ano 2007
exista pelo menos uma unidade de cuidados paliativos certificada em cada Sistema Local de Saúde”
32
. Entretanto, em 2003, foi aprovada a Rede de
Cuidados Continuados, constituída por “todas as
entidades públicas, sociais e privadas, habilitadas
à prestação de cuidados de saúde destinados a
promover, restaurar e manter a qualidade de vida,
o bem-estar e o conforto dos cidadãos necessitados em consequência de doença crónica ou degenerativa, ou por qualquer outra razão física ou
psicológica susceptível de causar a sua limitação
funcional ou dependência de outrem, incluindo
o recurso a todos os meios técnicos e humanos
adequados ao alívio da dor e do sofrimento, a minorar a angústia e a dignificar o período terminal
������������������������������������������������������������������
Cf. MENESES, Ramiro Adélio Borges- «Do Desvalido ao Samaritano:
Narrativa exemplar do Amor ao próximo pelo pai das Misericórdias
(LC. 10-35)». In: Estudios Franciscanos, V108, 442 (2007), Barcelona,
pp.146-143.
30 Cf. PACHECO, Susana - Cuidar a Pessoa em Fase Terminal, op. cit.,
pp. 129-135.
31 HENNEZEL, M.; LELOUP, Jean-Yves, op. cit., p. 46.
32 PORTUGAL. Ministério da Saúde – Saúde: um compromisso. A estratégia de saúde para o virar do século (1998-2002). Lisboa: Ministério da Saúde, 1999, p.38
15
SETEMBRO 2012
ÉTICA
16
da vida”33.
Nesta óptica, o CNECV afirma que “quando não
há esperança razoável de cura […], são as regras
da Medicina de acompanhamento que devem
prevalecer”34, e declara que “é eticamente inaceitável, […], que o doente terminal hospitalizado
seja isolado e abandonado até que ocorra a morte
na mais completa solidão”35. Esperar a morte no
corredor ou no corredor da morte.
Todos os doentes terminais passam por uma série de respostas emocionais únicas. “A pessoa que
se aproxima do termo da vida pode experimentar
medos e angústias variados: medo do processo
envolvente da morte, medo da dor, do isolamento, da solidão, do
desconhecido,
a angústia pela
perda do controlo da situação
e pelo futuro
dos seus. Nesses momentos,
quando
tantas
coisas
perdem
valor, as necessidades afectivas
assumem
um
relevo especial.
Sentir-se então
apreciado, respeitado, seguro, ter pessoas próximas em quem
confiar e a quem comunicar as emoções, temores
e desejos é extremamente importante”36. Então,
o profissional de saúde deve ter em conta que a
sua actuação deve ser, mais do que nunca, cuidar
do doente, através de uma verdadeira relação
de ajuda e esta deve basear-se não num simples
ouvir, não na simpatia, não na falta de autenticidade, mas numa verdadeira escuta, na empatia e
na congruência. Deste modo, será possível estabelecer e manter uma comunicação terapêutica
interpessoal, num clima de confiança que permita
o apoio e a ajuda ao paciente, de modo a permitir-lhe viver o mais serenamente possível até ao
ÉTICA
momento da sua morte.37 Daí a importância dos
cuidados paliativos. O grande desafio, nos anos
vindouros, é “de mostrar que se pode aliar a competência técnica à qualidade humana”38.
A partir de documentos e de cartas preconizamos
que os cuidados ao doente terminal devem ser
no seu lar, junto dos seus familiares, mas quando
tal não é possível então as Unidades de Cuidados
Continuados são essenciais. Todas estas unidades
estão implementadas? Ainda, temos um longo
caminho a percorrer. Mas, será que, na prática,
ajudamos a proporcionar cuidados humanizados?
Cuidar de doentes terminais, remete-nos para
uma área onde os profissionais de saúde, ainda
que,
teoricamente, preparados para cuidar
da vida não estão formados e/
ou capacitados
para lidar com
a morte. Isso
amedronta- os
e aterroriza-os.
Assistir o doente em fase terminal, com certeza, não é fácil,
mas é necessário. É uma tarefa árdua de 7 dias por semana e de 24 horas por
dia. Temos, por isso, que reflectir sobre a melhor
forma de ajudar a pessoa e a família a viver mais
esta etapa da vida terrena – a derradeira etapa.
Ninguém deve morrer sozinho!
Este processo de mudança exige não só que médicos, enfermeiros e outros profissionais de saúde,
como também os familiares, estejam mais informados sobre a diversidade das patologias terminais. São igualmente necessárias mudanças estruturais no nosso sistema de cuidados de saúde.
A qualidade de vida dos doentes terminais pode
melhorar com a atenção dada à dor e a outros sintomas físicos, bem como com o apoio psicológico,
social e espiritual quer do doente quer dos que
cuidam dele. Como enfermeiros consideramos
que se torna imperativo, perante o doente termi-
35 Ibem
37 Cf. PACHECO, Susana – Cuidar a Pessoa em Fase Terminal: Perspectiva Ética, op. cit., p. 129-135.
nal, aproximar, parar e ter tempo para escutar e
acompanhar quem sofre e quem, em última análise, apenas espera outra mão para segurar a sua.
Desta forma, porque nós e eles somos pessoas, a
nossa competência e qualidade dos cuidados que
prestamos são exigências éticas. Assim, devemos
reflectir com assiduidade no porquê do nosso
agir, tornando o nosso mundo naquilo a que Kant
chamava o “reino dos fins”, onde todos serão tratados como fim em si mesmos e não como meios,
atingindo o bem supremo, a nossa felicidade com
a dignidade que nos é conferida.
É importante fornecer aos profissionais de saúde
e à família uma formação humana, pois em certos meios hospitalares é cada vez mais necessário.
Temos de aprender a esquecer a relação com uma
doença e considerar a relação com a pessoa que
tem a doença. Devemos apenas respeitar uma tal
dimensão do ser humano39. Tal como Feytor Pinto defendemos que os problemas de Fim de Vida
são: o doente terminal, a morte e o processo de
morrer. Sendo o cuidar orientado numa óptica de
cuidados globais, activos e continuados, centrados no doente e na família. Convém, ainda, reflectir sobre como ajudar o doente na sua etapa
final, como satisfazer as suas necessidades e os
seus anseios. Os seus pedidos e suas decisões devem ser respeitados, pois a ajuda passa pelo conhecimento do seu mundo, da sua mentalidade,
dos seus valores e dos seus interesses. O seu grito de socorro, manifestado pela ansiedade e pela
depressão, deve ser prontamente atendido pela
transmissão de segurança e pela presença amiga.
O doente terminal necessita, essencialmente, de
um atendimento respeitoso humano e personalizado dos profissionais de saúde e dos familiares
ou das pessoas significativas, procurando uma
36 ELIZARI, Francisco Javier , op.cit, p. 181.
38 HENNEZEL, M.; LELOUP, Jean-Yves, op. cit., p. 46.
39 Cf. HENNEZEL, M.; LELOUP, Jean-Yves, op.cit, 2000, p. 37
33 PORTUGAL - Decreto-Lei n.º 281, de 8 de Novembro - Cria a Rede
de Cuidados Continuados, 2003.
34 CNECV, op. cit.
morte digna e serena40.
Assim, os cuidados a prestar ao doente terminal
baseiam-se, principalmente, no acompanhamento e conforto ao longo de todo o período de morte
eminente e têm como principal objectivo o alívio
da dor e do sofrimento, promovendo o máximo
bem-estar e qualidade de vida que lhe resta. Por
tudo isto, os profissionais de saúde devem ter
em conta que, no caso dos doentes terminais, os
cuidados de saúde a prestar têm como objectivo
uma companhia amiga, a ajuda e alívio do sofrimento. O cuidar em fim-de-vida “procura a qualidade de vida do utente e a sua dignidade enquanto pessoa”41.
As medidas de tratamento são paliativos, resolvem sintomas, aliviam o sofrimento e a dor. Nesta
fase final, pretende-se dar mais dias à vida, mais
qualidade aos dias, valorizar as suas alterações
psico-emocionais e envolver a família no acto
terapêutico. Como? Qual a nossa realidade hospitalar? Hoje-em-dia questiona-se o porquê dos
cuidados paliativos?
Morrer com dignidade é manter até ao fim a sua
identidade pessoal. Para melhor viver e para melhor morrer. O acompanhamento dos doentes no
fim de vida convida-nos a não separar o órgão
do corpo, o corpo do espírito e o espírito da vida.
Aprende-se a reavaliar holisticamente o doente,
o seu olhar, o seu silêncio, as suas queixas, a sua
agressividade, os seus medos expressos e os seus
desejos não satisfeitos. Faz-se um levantamento
das necessidades do doente em todos os planos
do somático ao psicológico.
O princípio ético assenta sobre a qualidade da relação e sobre a dimensão suprassensível de acompanhamento daquele que cuida. Acreditamos ser
importante reconhecer os direitos do doente terminal para que estes possam ser respeitados. Se
pretendêssemos resumir seis direitos, considerados por nós os mais importantes, optaríamos por
seleccionar os seguintes:
• Direito a ser tratado como pessoa;
• Direito a não morrer sozinho;
• Direito ao alívio da dor;
• Direito de participar nas decisões médicas;
• Direito à ajuda da família;
40 Cf. PINTO, Pe Victor Feytor – «O Direito de Morrer». In: Associação
dos Médicos Católicos Portugueses. - Da vida à morte. Coimbra:
Gráfica de Coimbra, 1988, p. 204.
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LANITA, Ana Maria, op. cit., p. 85.
17
ÉTICA
SETEMBRO 2012
• Direito a morrer em paz e com dignidade.
É no respeitar os direitos do próprio doente que o
profissional de saúde sente que a sua missão foi
cumprida, pois é na fase terminal que o tratamento deixa de ser curativo e passa a ser paliativo42.
O acompanhamento do doente terminal deve
fundamentar-se na companhia, na solidariedade
e no apoio, associado pela ajuda da Medicina, do
contacto social e familiar de forma a assegurar
o bem-estar do paciente, dentro ou fora do seu
lar. O modo como se cuidam os doentes terminais afecta, afinal de contas, cada um de nós, pois
aquele doente terminal, que está na minha frente,
será, amanhã, um de nós. É importante pensar (…)
Se temos todo o tempo do mundo para morrer,
então não temos todo o tempo do mundo para
humanizar a morte.
18
CONCLUSÃO
Actualmente, há uma preocupação por morrer
dignamente, o que representa uma conquista moral no prolongamento do interesse por uma vida
digna e humana.
Ficou patente que somos chamados a ser agentes de mudança, nesta sociedade, na medida em
que, ao estarmos comprometidos com o doente
terminal, podemos alargar o nosso horizonte e
contribuir para que todos os que connosco se cruzam, neste percurso da vida, experimentem uma
forma diferente de ser “rosto”, rosto que acolhe,
que afaga, que ama, que se solidariza. No entanto, cuidar dos doentes terminais requer uma filosofia de vida, para a qual reconhecemos que não
fomos preparados nem treinados, daí a importância de uma conduta ética em Enfermagem, visto
que o contacto quotidiano com situações físicas
e psicológicas de sofrimento e de crise, ou com
doentes em fase terminal, exige desenvolvimento
de competências.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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sobre Aspectos Éticos dos Cuidados de Saúde Relacionados com o Final da
Vida, 1995.
ELIZARI, Francisco Javier – Questões de Bioética – Vida em Qualidade.
Trad. do espanhol de Bernardino Pacheco Henriques. Porto: Editorial
Perpétuo Socorro, 1996.
42 Cf. PEREIRA, Maria da Graça – O Doente Oncológico e a sua Família. Lisboa: Climepsi Editores, 2002, p. 94.
CIÊNCIA & TÉCNICA
ESTATUTO DOS ENFERMEIROS – Deontologia profissional – Decreto-Lei n.º 104, de 21 de Abril, 1998.
GAFO, Javier Fernández – 10 Palavras-Chave em Bioética. Trad. do Espanhol de Maria Amélia Pedrosa. Coimbra: Gráfica de Coimbra, 1996.
GERMANO, Ana et al. – Código Deontológico do Enfermeiro: Anotações e
Comentários. Lisboa: Edição Ordem dos Enfermeiros, 2003.
HENNEZEL, M.; LELOUP, Jean-Yves – A Arte de Morrer. 2ª Ed. Trad.
do Francês de Gemeniano Cascais Franco. Lisboa: Editorial Noticias,
2000.
INSTITUTO DE BIOÉTICA - Direitos do Homem e Biomedicina. Lisboa:
Universidade Católica Editora, 2003
KANT, Immanuel – Fundamentação da Metafísica dos Costumes. Porto:
Porto Editora, 1995.
LANITA, Ana Maria – «Cuidar em Fim de Vida». In: Cadernos de Bioética, 25 (2001), p. 85-94.
MENESES, Ramiro Adélio Borges- «Do Desvalido ao Samaritano: Narrativa exemplar do Amor ao próximo pelo pai das Misericórdias (LC.
10-35)». In: Estudios Franciscanos, V108, 442 (2007), Barcelona, pp.146143.
MENESES, Ramiro Délio Borges – O Desvalido no Caminho (Lc 10, 2537). Santa Maria da Freira: Edições Passsionistas, 2008.
PACHECO, Susana – «Os Direitos e Deveres da Pessoa Doente: Perspectiva do Profissional da Saúde». In: Cadernos de Bioética, 29 (2002),
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PACHECO, Susana – Cuidar a Pessoa em Fase Terminal: Perspectiva Ética.
Loures: Lusociência, 2002.
PEREIRA, Maria da Graça – O Doente Oncológico e a sua Família. Lisboa:
Climepsi Editores, 2002.
PESSINI, Leo - Distanásia. Até quando prolongar a vida ? São Paulo: Edi����
ções Loyola, 2001
PINTO, Pe Victor Feytor – «O Direito de Morrer». In: Associação dos
Médicos Católicos Portugueses. - Da vida à morte. Coimbra: Gráfica
de Coimbra, 1988, pp. 203-218.
PORTUGAL - Decreto-Lei n.º 281, de 8 de Novembro - Cria a Rede de
Cuidados Continuados, 2003.
PORTUGAL. Ministério da Saúde – Saúde: um compromisso. A estratégia de saúde para o virar do século (1998-2002). Lisboa: Ministério da
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QUEIROZ, Júlio Dias «A Espiritualização do Morrer e do Luto». In: Revista Discurso Filosófico.nº 7460, 011 - Maio, 2003.
SILVA, Paula Martinho – «Documentos Ético-jurídicos». In: M. do Céu
Patrão Neves (Coord). Comissões de Ética: das Bases Teóricas à Actividade
Quotidiano. Coimbra: Gráfica de Coimbra, 2002, pp. 582-588.
ENTRADA DO ARTIGO SETEMBRO 2007
TÉCNICAS DE DESOBSTRUÇÃO
DA VIA AÉREA
MADALENA FERNANDA AZEVEDO RAMOS TORRES
Enfermeira no Serviço de Urgência do Hospital de São Marcos – Braga
RESUMO
A obstrução da via aérea é toda a situação que impeça parcial ou totalmente a ventilação pulmonar
normal. Como tal é uma emergência absoluta que
se não for reconhecida e resolvida rapidamente
leva à morte em minutos.
Uma das formas mais frequentes de obstrução
da via aérea é a resultante de uma causa “extrínseca” à via aérea – alimentos, sangue ou vómito.
Qualquer objecto sólido pode funcionar como
corpo estranho e causar obstrução da via aérea –
obstrução mecânica.
A avaliação e o controlo da via aérea efectuam-se
mediante condutas rápidas e simples, não exigindo inicialmente qualquer equipamento, bastando
a aplicação de técnicas manuais de controlo e desobstrução. As Pancadas Interescapulares, a Manobra de Heimlich e as Compressões Torácicas,
são técnicas realizadas manualmente e utilizadas
na desobstrução das vias aéreas por corpo estranho sólido.
ABSTRACT
The airway obstruction is any situation that
partially or completely prevent normal pulmonary ventilation. As such it is an absolute
emergency that if not recognized and resolved quickly leads to death within minutes.
One of the most frequent forms of airway obstruction is the result of a cause "extrinsic"
to the air - food, blood or vomit. Any solid object can function as a foreign body and cause
airway obstruction - mechanical obstruction.
The evaluation and control of air takes place
through conduits fast and simple, initially not
requiring any equipment, just the application of
manual techniques for control and clearance. The
Strokes Interescapulares, the Heimlich maneuver
and Chest Compressions are performed manually
and techniques used in clearing airway foreign
body solid.
Keywords Health Education; "Empowerment"
Community, Community Intervention Project
Palavras-Chave Obstrução da via aérea; Corpo
estranho sólido; Técnicas de desobstrução: Pancadas Interescapulares, Manobra de Heimlich e
Compressões Torácicas.
INTRODUÇÃO
A obstrução da via aérea pode ocorrer como resultado de muitas causas. Pode ser parcial (permitindo a passagem de algum fluxo de ar), ou
total (impedindo totalmente o fluxo de ar para os
pulmões). Funcionalmente as obstruções podem
ser divididas em três categorias: anatómicas (palato mole e epiglote), mecânicas (corpo estranho)
e patológicas (edema dos tecidos das vias aéreas).
Apesar de todos os tipos de obstrução poderem
apresentar os mesmos sintomas, o tratamento
de cada tipo é muito diferente; por esta razão
devemos estar preparados para identificar rapidamente a causa da obstrução e actuar apropriadamente.
Com este trabalho pretende contribuir para a
optimização da actuação perante uma vitima
com obstrução mecânica da via aérea.
As causas de obstrução da via aérea por corpo
estranho, bem como a classificação da obstrução, a sequência de actuação na obstrução mecânica e as situações de excepção á aplicação
das compressões abdominais, serão aspectos a
abordar ao longo deste documento.
CAUSAS
A obstrução da via aérea por corpo estranho
nos adultos, ocorre habitualmente durante as
refeições, com os alimentos (sendo a carne a
causa mais comum), e está frequentemente
associada à tentativa de engolir pedaços de
19
CIÊNCIA & TÉCNICA
CIÊNCIA & TÉCNICA
comida grandes e mal mastigados. Os doentes idosos com problemas de deglutição estão
também em risco de obstrução da via aérea por
corpo estranho e devem ser aconselhados a comer de forma cuidadosa. As próteses dentárias
deslocadas, os fragmentos dentários e chicletes, entre outros, constituem também causas
possíveis de obstrução da via aérea.
SEQUÊNCIA DE ACTUAÇÃO NA OBSTRUÇÃO
MECÂNICA:
Na obstrução mecânica da via aérea no adulto
consciente, existem várias manobras que podem ser efectuadas, com o objectivo de resolver
a obstrução e que, caso sejam bem sucedidas,
podem evitar a paragem respiratória.
Obstrução total
SETEMBRO 2012
Obstrução parcial com boas trocas gasosas:
CLASSIFICAÇÃO
O reconhecimento precoce da obstrução da via
aérea é indispensável para o sucesso no atendimento. É importante distinguir a obstrução
da via aérea por corpo estranho de outras situações dado que a abordagem é diferente (por
exemplo, quando a obstrução ocorre num local
publico, como um restaurante, é frequentemente confundida com um ataque cardíaco). Devemos assim, estar atentos aos sinais e sintomas
apresentados pela vítima e ter presente que a
obstrução mecânica pode ser classificada da seguinte forma:
OBSTRUÇÃO TOTAL
OBSTRUÇÃO PARCIAL
20
COM BOAS
TROCAS
GASOSAS
Figura 2 - Obstrução total (Torres, 2006)
• Se uma vítima consciente com obstrução da
via aérea se apresenta com tosse ineficaz, incapaz de falar ou de respirar proceder de imediato à aplicação de pancadas interescapulares (Fig. 3 e 4):
Figura 4 - Pancadas interescapularesl (Torres, 2006)
A vítima consegue tossir
vigorosamente com
respiração sibilante entre os
acessos de tosse.
• Se a obstrução não for resolvida com a aplicação das pancadas interescapulares passar à
aplicação de compressões abdominais – manobra de Heimlich (Fig. 5 e 6).
Figura 1 - Obstrução parcial (Torres, 2006)
COM MÁS
TROCAS
GASOSAS
EM VÍTIMA
CONSCIENTE
EM VÍTIMA
INCONSCIENTE
A tosse da vítima é fraca e
ineficaz;
A inspiração produz estridor;
Dificuldade respiratória
marcada e cianose;
Incapaz de falar, tossir ou
respirar;
Expressão de angústia bem
patente no rosto (olhos muito
abertos, boca aberta, querendo
desesperadamente falar, sem
conseguir emitir qualquer
som);
Frequentemente agarra o
pescoço com ambas as mãos,
parecendo querer “arrancar”
qualquer coisa;
Esforços ventilatórios
exagerados sem trocas gasosas;
Risco eminente de asfixia
e, como tal, de paragem
ventilatória.
Facilmente reconhecida pela
incapacidade de conseguir
ventilar a vítima.
mão na parte superior das costas, na linha
média entre as omoplatas, isto é na região
interescapular;
- Cada pancada deverá ser efectuada com
a força adequada tendo como objectivo
resolver a obstrução;
- Após cada pancada deve verificar-se se a
obstrução foi ou não resolvida, aplicando
até 5 pancadas no total.
 Enquanto a vítima respira e consegue tossir
de forma eficaz, não interferir com o esforço
da vítima em expelir o corpo estranho, mas
encorajá-la a tossir (a tosse é considerada
como um mecanismo de defesa natural, na
tentativa de desobstruir as vias aéreas).
 Se necessário pedir-lhe que se incline para
a frente e para baixo, pois esta posição ajuda o corpo estranho a sair para o exterior,
pela própria acção da gravidade.
 Vigiar se a obstrução é ou não resolvida e se
a tosse continua a ser eficaz.
 Estão contra-indicadas as pancadas interescapulares, sob o risco de maior interiorização do objecto e menor eficácia dos mecanismos de defesa implementados.
Obstrução parcial com más trocas gasosas:
 Actuar como se tratasse de obstrução total.
Figura 3 - Pancadas interescapularesl (Torres, 2006)
- Colocar-se ao lado e ligeiramente por detrás da vítima;
- Suportar o tórax da vítima com uma mão,
mantendo-a inclinada para a frente, numa
posição tal que se algum objecto for deslocado com as pancadas possa sair livremente pela boca;
- Aplicar pancadas com a base da outra
Figura 5 - Manobra de Heimlich (Torres, 2006)
21
CIÊNCIA & TÉCNICA
CIÊNCIA & TÉCNICA
do a saída do corpo estranho.
A ocorrência de complicações pode ser minimizada pela correcta execução da manobra, isto é,
nunca comprimir sobre o apêndice xifóide ou
na margem
inferior da grade costal. Mesmo com uma técnica totalmente correcta podem ocorrer complicações.
rão ser substituídas por compressões torácicas,
como manobra de desobstrução da via aérea.
O local de aplicação das compressões torácicas,
para desobstrução das vias aéreas, é o mesmo
que o utilizado durante as manobras de RCP –
zona média do esterno.
SETEMBRO 2012
2222
Figura 5 - Manobra de Heimlich (Torres, 2006)
• Colocar-se por trás da vítima e com os braços
envolver a sua cintura (a vitima deve ficar inclinada para a frente);
• Fechar uma das mãos em punho, e colocá-la
com o polegar para dentro contra o abdómen
da vítima, na linha média entre o apêndice xifóide e a cicatriz umbilical;
• Agarrar firmemente o punho fechado com a
outra mão, e puxar com um movimento rápido
e vigoroso, para dentro e para cima;
• As compressões devem ser pausadas, seguras e
secas, devendo cada uma ser um movimento claramente separado do anterior;
• Repetir as compressões abdominais até 5 vezes, vigiando sempre se ocorre ou não resolução da obstrução e o estado de consciência da
vitima.
SITUAÇÕES DE EXCEPÇÃO À APLICAÇÃO DAS
COMPRESSÕES ABDOMINAIS
A manobra de Heimlich só deve ser aplicada a
vítimas de obstrução da via aérea conscientes.
Esta manobra de desobstrução das vias aéreas
superiores, foi descrita pela primeira vez por
Henry Heimlich em 1974 e tem como finalidade
aumentar a pressão intra-abdominal e, de forma indirecta, a pressão intratorácica, simulando
assim o mecanismo de “tosse artificial”, forçan-
As compressões abdominais na manobra de Heimlich, não devem ser aplicadas em:
•- grávidas - Fig.7;
•- vítimas obesas (nas quais se tem dificuldade
em abranger o abdómen da vítima);
•- crianças com menos de 1 ano de idade
•- vítimas inconscientes
Nestes casos, as compressões abdominais deve-
BATUCA, Artur; COELHO, José; MOREIRA, Isabel – Técnicas de Urgência. Coimbra: FORMASAU, 1996. ISBN 972-96680-3-5. 120 p.
BATUCA, Artur A. - Reanimação Cardio-Respiratória: Suporte Básico
e suporte Avançado de vida. Amadora: Instituto de Formação em
Enfermagem, 2005. ISBN 972-99371-0-9. 106 p.
BITTENCOURT, Paulo F.; CAMARGOS, Paulo A. - Aspiração de corpos
estranhos. “Jornal de Pediatria”. Belo Horizonte: Sociedade Brasileira
de Pediatria. Vol. 78 N.º 1 (2002). URL: http://www.jped.com.br/conteudo/02-78-01-09/port.pdf (consultado em 30/06/2007).
•Se a técnica anterior não resolver a obstrução, alternar cinco pancadas interescapulares com cinco compressões abdominais, as
vezes que forem necessárias e de forma cíclica, até à desobstrução da via aérea, ou até à
vítima ficar inconsciente.
A manobra de Heimlich também pode ser executada pela própria vítima de obstrução da via aérea, no caso de se encontrar sozinha. Neste caso
dever-se-á empregar a técnica descrita como
auto-Hemlich, na qual o próprio coloca uma
mão em punho na linha média entre o apêndice xifóide e a cicatriz umbilical e com a outra
mão em cima da primeira comprime para cima e
para dentro com um movimento rápido.
Em alternativa, a técnica poderá ser executada comprimindo a porção superior do abdómen contra uma superfície rija, como por
exemplo as costas de uma cadeira ou um varão
de escadas.
Note-se que, perante uma vítima com obstrução
total da via aérea e em paragem cárdio-pulmonar, deve-se iniciar de imediato manobras de
RCP de acordo com o algoritmo do SBV.
BIBLIOGRAFIA
BROWNER, Bruce D.; CHAIRMAN, MD - Emergency: Care and transportation of the Sick and Injured. Orange: Seventh Edition, 1994.
ISBN 0-7637-0796-1. 960 p.
CBMMG - Prestando Socorros: Obstrução Respiratória (adultos).
Belo Horizonte: CBMMG. 2003. URL: http://www.bombeiros.mg.gov.
br/obstrucao_respiratoriaA.htm (consultado em 30/06/2007).
CPR - Principais alterações na reanimação pediátrica. Porto: UCI do
Hospital de Santo António, 2001. URL: http://www.cprportugal.net/
gca/index.php?id=214 (consultado em 30/06/2007).
CPR - Principais modificações no suporte avançado de vida. Porto:
UCI do Hospital de Santo António, 2001. URL: http://www.cprportugal.net/gca/index.php?id=213 (consultado em 30/06/2007).
Figura 7 - Compressões torácicas em vítima grávida
(CBMMG, 2003)
CPR - Principais modificações no suporte básico de vida para o adulto. Porto: UCI do Hospital de Santo António, 2001. URL: http://www.
cprportugal.net/gca/index.php?id=211 (consultado em 30/06/2007).
INEM – Manual V.M.E.R. Lisboa: Ministério da Saúde, 1999. 343 p.
As compressões torácicas, podem ser aplicadas
em vítimas conscientes ou inconscientes.
O número de compressões a aplicar à vítima, serão tantas quantas as necessárias para desobstruir as vias aéreas.
Cada compressão deverá ser aplicada de uma
forma pausada e segura.
CONCLUSÃO
Reconhecer uma obstrução da via aérea e iniciar
de imediato medidas adequadas, pode evitar a
PCR.
Dependendo do tipo do corpo estranho aspirado
e de sua localização nas vias aéreas, pode haver
obstrução parcial ou total à passagem do ar. Na
grande maioria dos casos, os métodos manuais
de desobstrução conseguem promover e manter
a permeabilidade das vias aéreas.
Este trabalho não se esgota aqui, espera no entanto que seja útil a todos os que o lerem.
INEM – Manual de Suporte Avançado de Vida. Lisboa: Ministério da
Saúde, 2006. 210 p.
MUNICÍPIO DE FELGUEIRAS – Asfixia e Obstrução das Vias Aéreas. Felgueiras: Município de Felgueiras, s/d. URL: http://www.cm-felgueiras.pt/VSD/Felgueiras/vPT/Publica/AccaoMunicipal /SegurancaProteccaoCivil/PrimeirosSocorros/asfixia.htm (consultado em
30/016/2007).
NAUI - Primeiros Socorros ASHI: Alteração de Protocolos de Primeiros Socorros. 2004. URL: http://www.naui.com.br/forms/ASHI_ALTERACOES_PROTOCOLO_2004.pdf (consultado em 30/016/2007).
SIATE/CBPR - Manual de Atendimento Pré-Hospitalar. Paraná: Polícia Militar do Paraná, s/d. 105-118. URL: http://www.pmpr.pr.gov.
br/arquivos/1gb/File/pdf/Cap-08_Vias_Aereas.pdf (consultado em
30/06/2007).
SILVEIRA, Elzio; MOULIN, Alexandre – Socorros em Actividades Físicas. 2006.
SZPILMAN, David - Manobra de Heimlich. URL: http://www.szpilman.com/biblioteca/medicina/ manobra_de_heimlich.htm (consultado em 30/06/2007).
TORRES, T. – Manobras de desobstrução das vias aéreas. Projecto
Saúde na Escola. Braga: Edição do autor. 2006. URL: http://tometorres.com.sapo.pt (consultado em 30/06/2007).
23
CIÊNCIA & TÉCNICA
CIÊNCIA & TÉCNICA
ENTRADA DO ARTIGO NOVEMBRO 2007
TERAPIA POR VÁCUO NO
TRATAMENTO DE FERIDAS
ALEXANDRA MARINELA TEIXEIRA PEREIRA
Enfermeira Graduada do Hospital do Barreiro
MAGDA AFONSO GUERRA
Enfermeira do Hospital de Santa Marta de Lisboa
ANA SOFIA GUALDINO
Enfermeira do Hospital de Santa Marta de Lisboa
VANESSA CORREIA
Enfermeira do Hospital de Santa Marta de Lisboa
SETEMBRO 2012
LILIANA FERREIRA MIRANDA
Enfermeira do Hospital de Santa Marta de Lisboa
INTRODUÇÃO
A utilização de sistemas de drenagem por vácuo
representa uma prática “antiga” e corrente em
Cirurgia. Permite a eliminação de sangue e outros fluídos das feridas no período pós-cirúrgico
favorecendo deste modo o processo de cicatrização e prevenindo as possíveis complicações. Em
1997, Argenta e Morykwas, nos Estados Unidos da
América, iniciaram uma abordagem inovadora no
tratamento de feridas de difícil cicatrização através do recurso da terapia por pressão negativa
localizada e controlada, utilizando um apósito de
poliuretano no leito da ferida com o objectivo de
estimular a granulação e a cicatrização. Segundo
estes autores (1997), este tipo de tratamento define-se como uma “Terapia baseada no uso de pressão
negativa gerando uma força mecânica não compressiva no tecido que permite a remoção de líquidos intersticiais da ferida, a redução do edema e a dilatação arterial. Este mecanismo permite o aumento da
proliferação celular e a síntese proteica favorecendo
a regeneração celular.”
24
RESUMO
A Terapia por vácuo representa um método inovador de elevada eficácia no tratamento de feridas. Caracteriza-se pela aplicação de uma pressão negativa controlada e localizada que permite
a remoção de fluidos intersticiais, a redução do
edema da ferida, o aumento da perfusão tecidular e consequentemente a regeneração celular.
O conhecimento correcto da sua aplicabilidade e
manuseamento permite uma mais valia na optimização do processo de cicatrização.
Palavras-Chave Terapia por vácuo; Ferida; Optimização; Cicatrização
ABSTRACT
The vacuum therapy represents a novel method
of high effectiveness in the treatment of wounds.
Characterized by applying a controlled and localized negative pressure which allows the removal
of interstitial fluid, reducing the swelling of the
wound, increasing tissue perfusion and thus cellular regeneration. The correct knowledge of
their applicability and handling allows a gain in
the optimization of the healing process.
Keywords Vacuum therapy, wound; Optimization;
healing
MECANISMO DE ACÇÃO
A pressão negativa quando utilizada de forma
controlada, favorece uma correcta evolução da
ferida nos diferentes estadios de cicatrização. O
seu mecanismo de acção assenta em:
- Estimular a proliferação de novos vasos (neoangiogénese) favorecendo a microcirculação na zona da lesão.
- Promover a vasodilatação arterial e consequentemente uma melhor oxigenação e
fornecimento de nutrientes aos tecidos lesados melhorando assim o processo de regeneração.
- Combinar o ambiente húmido e a pressão
negativa facilitando o desbridamento autolítico (através de enzimas proteolíticas
endógenas) e a eliminação do tecido desvitalizado. A remoção deste tecido é essencial
para prevenir a contaminação, reduzir a degradação tecidular e promover o desenvolvimento do tecido de granulação saudável.
- Permitir a eliminação do exsudado e a redução do edema da ferida, diminuindo deste
modo a pressão intersticial e a colonização
bacteriana, criando um ambiente húmido equilibrado e benéfico para a migração
epitelial e a cicatrização. Remove ainda as
metaloproteinas que comprometem a cicatrização e aumentam a colonização bacteriana.
- Provocar através da pressão negativa a aproximação dos bordos da ferida facilitando a
fase de contracção e epitelização. A pressão
negativa contínua ou intermitente estimula a diminuição da ferida dos bordos para o
centro, sendo o valor considerado terapêutico de 125 mmHg.
Apesar da sua vasta aplicabilidade, existem situações em que está contra-indicada a sua utilização
como: a ferida maligna, pelo risco de disseminação
e proliferação das células malignas; ferida com fístula (entérica e inexplorada); ferida com tecido
necrótico por constituir uma barreira mecânica
que impossibilita a acção do tratamento; ferida
com exposição de vasos sanguíneos e órgãos, e
por fim, doentes com Osteomielite que tenham
estruturas ósseas expostas à pressão negativa.
Em algumas aplicações são necessárias precauções especificas durante a utilização deste tipo
de terapia, como em doentes com feridas com:
hemorragias activas (risco de hemorragia); difícil
hemostase (Ex. hipocoagulação); proximidade de
vasos e órgãos; e exposição de estruturas ósseas (nestes casos poderão utilizarem-se compressas gordas para protecção das estruturas).
SISTEMA DE VÁCUO
O sistema de vácuo baseia-se num circuito fechado que permite exercer uma pressão negativa
controlada em zonas lesionadas, mediante a aplicação de:
 Máquina de vácuo (1);
 Esponja de poliuretano (hidrofóbico),
penso adesivo e dreno aspirativo para feridas cavitadas e exsudativas (2);
 Esponja de polyvinil (hidrofílica), penso
adesivo e dreno aspirativo – para feridas
25
CIÊNCIA & TÉCNICA
SETEMBRO 2012
superficiais e pouco exsudativas (3);
 Tubuladura com reservatório (4);
26
A sua utilização requer algumas precauções inerentes ao equipamento, deste modo:
• Nunca deixar a aspiração -OFF- mais de 2 h
em cada 24h;
• Mudar o penso de 48 a 72 horas;
• No caso de feridas infectadas, mudar o penso
entre 12 a 24 horas;
• A pressão negativa considerada ideal/terapêutica é de 125 mmHg, podendo ser ajustada entre 100 e 150 mmHg;
• Verificar o equipamento frequentemente (ex.
nível da pressão).
OPTIMIZAÇÃO DA TERAPIA POR VÁCUO
A optimização da terapia por vácuo depende de
um conjunto de acções que devem ser realizadas
em associação e complementaridade com o tratamento. Desta forma, os critérios, a periodicidade
da mudança do penso e a manipulação do equipamento devem respeitar as “Guidelines” dos fabricantes. Salienta-se que:
•Feridas infectadas, deverá usar-se um tratamento coadjuvante que elimine a infecção;
•Durante o tratamento, certificar que a esponja se encontra colapsada (manutenção do
vácuo);
•Doentes acamados, alternar decúbitos de forma a reduzir a pressão sobre o local da ferida;
• Ajustar um plano nutricional adequado ao
doente, prevenindo assim possíveis complicações (ex.: Anemia - que reduz a quantidade de
oxigénio fornecido aos fibroblastos e inibe a
CIÊNCIA & TÉCNICA
síntese de colagénio;
• Hipoalbuminémia/ Hipoproteinémia - que podem originar edema, o que reduz a elasticidade
cutânea, alterando a microcirculação local e um
consequente atraso na cicatrização da ferida).
PROGRESSOS DA CICATRIZAÇÃO DA FERIDA
COM TERAPIA POR VÁCUO
A avaliação do progresso da cicatrização de uma
ferida com terapia por vácuo assenta nos seguintes indicadores:
• Dimensões da ferida – a diminuição do seu tamanho e profundidade representam um indicador fiável de cicatrização. A monitorização
das dimensões da ferida deverá ser cuidadosamente documentada.
• Quantidade de fluidos – a quantidade de fluidos aspirados da ferida tende a decrescer com
a evolução da cicatrização.
• Edema local – a diminuição do edema representa a descompressão dos espaços intersticiais
durante o processo de evolução cicatricial.
• Cor da ferida – com a melhoria da vascularização local, o leito da ferida tende a apresentar-se com uma cor avermelhada.
• Cor do exsudado – como resultado da melhor
circulação sanguínea no local da ferida, o exsudado passa de seroso para serohemático
com o decorrer do tratamento.
• Regeneração tecidular – a formação de tecido
de granulação e posteriormente de epitelização durante a fase final de cicatrização.
Figura 1 – Evolução cicatricial de uma úlcera de pressão com
terapia de vácuo.
CUIDADOS NA REALIZAÇÃO DO PENSO
A realização do penso deve respeitar uma série de
critérios e normas de qualidade, de forma a favorecer a eficácia do tratamento instituído e proporcionar o máximo conforto ao doente durante
a sua execução.
O enfermeiro deve:
• Avaliar a dor do doente antes/durante/após a realização do penso utilizando uma escala de dor
(Escala Visual Analógica) e administrar analgesia prescrita se necessário. Com base nesta
avaliação planear estratégias para futuras mudanças do penso (ex. antecipar a terapêutica
analgésica 30 /60 minutos antes do penso).
• Em caso de aderência da esponja ao leito da
ferida, instilar Soro Fisiológico e deixar actuar
durante 10 a 15 minutos. Para minimizar a destruição do tecido de granulação.
• Observar as características da ferida, nomeadamente a cor (tecidos presentes), odor, exsudado e dimensões. Pode ainda fotografar a
ferida periodicamente para melhor monitorização da evolução cicatricial.
• Proceder à limpeza da ferida, usando o método de irrigação com Soro Fisiológico (S.F.) morno, para minimizar a destruição dos tecidos
jovens. O S.F. é o soluto fisiologicamente ideal
para a limpeza por ser isotónico e compatível
com os tecidos humanos.
• Secar a pele circundante, para evitar a sua maceração e aumentar a aderência da película
adesiva (o contacto prolongado com a humidade diminui a sua função de barreira, aumentando o risco de eczema exógeno e de dermite
de contacto).
• Cortar a esponja com o tamanho adequado às
dimensões da ferida e colocá-la com o dreno
aspirativo, sem forçar a sua entrada, de forma
a evitar lesar os tecidos recém formados.
• Aplicar um protector cutâneo não irritante na
pele em redor da ferida para reduzir o traumatismo das mudanças periódicas da película
adesiva e garantir a sua integridade.
• Colar a película adesiva sobre a esponja deixando uma margem mínima de 10 centímetros
para assegurar uma selagem eficaz da ferida
e reduzir o risco de fugas durante a aspiração.
• Conectar o dreno aspirativo à tubuladura
com reservatório e adaptá-lo à máquina de
vácuo. Posteriormente ligar a máquina e programar a pressão negativa desejada (pressão
recomendada de 125 mmHg). Esta deve ser
adequada à tolerância do doente, tipo de ferida e patologias associadas (pode oscilar entre
100 e 150 mmHg).
• Proceder aos registos de enfermagem de forma a garantir a continuidade de um plano de
cuidados individualizados e personalizados.
CONCLUSÃO
A terapia por vácuo representa um método inovador no tratamento de feridas estando demonstrado através de vários estudos a sua elevada eficácia no processo de cicatrização. Robert Feres
Júnior et al (2005), demonstraram no seu estudo
que o penso assistido por vácuo permite “…o tratamento de lesões complexas…”, “…minorar as graves
sequelas associadas a esse tipo de lesões…” e a “…redução do tempo de internamento.”
Este tipo de terapia veio alargar o horizonte das
opções disponíveis no tratamento de feridas. É da
responsabilidade da equipa de saúde escolher e planear o método/estratégia que mais se ajusta a cada
situação de forma a maximizar a sua eficácia.
A utilização deste tipo de terapia proporciona
processos de cicatrização mais rápidos, reduz o
período de internamento, os gastos associados,
as complicações e a mortalidade. Promove deste modo uma convalescença mais célere e consequentemente o aumento da qualidade de vida
dos doentes (recentemente, foi introduzido um
sistema portátil de vácuo que possibilita a continuação do tratamento instituído em regime de
ambulatório).
BIBLIOGRAFIA
AGREDA, J. Javier, et al; “Atención integral de las heridas crónicas”; SPA, 2004
BARANOSKI, Sharon, et al; “O essencial sobre o tratamento de feridas”; Lusodidacta;
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Internet
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http://www.gaif.net/artigos/DepoisdoTime%20Enf.Cristina.pdf
http://www.into.saude.gov.br/pi_ortoetrauma_v1nov2004_art3.php
http://www.kci1.com/
27
CIÊNCIA & TÉCNICA
CIÊNCIA & TÉCNICA
ENTRADA DO ARTIGO MARÇO 2008
SAÚDE MENTAL: COMUNICAÇÃO
EM ENFERMAGEM
SETEMBRO 2012
CARINA FREITAS
Centro Hospitalar Psiquiátrico de Coimbra Unidade Sobral Cid
28
RESUMO
Os processos de comunicação em saúde têm uma
importância central na relação entre profissionais, utente e família.
Em saúde mental, as intervenções técnicas são
restritas, o que faz da relação empática e terapêutica, consequentemente, do processo de comunicação como a intervenção de enfermagem
por excelência.
Palavras-Chave: Comunicação, Saúde Mental.
ABSTRACT
The processes of health communication are of
central importance in the relationship between
professionals, users and family. In mental health,
techniques intervention are restricted, which
makes the empathic relationship therapy, there-
fore, the communication process as a nursing intervention for excellence.
Keywords: Communication, Mental Health
INTRODUÇÃO
A área da saúde mental é talvez a mais complexa
e enigmática de todas as intervenções em saúde,
pois é a que mais evidencia as alterações na comunicação, entendida como um processo de receber e transmitir mensagens através de meios de
símbolos ou sinais. (SILVA, 1996).
Segundo Teixeira (1996), os processos de comunicação em saúde têm importância crítica e estratégica porque podem influenciar significativamente a avaliação que os utentes fazem da qualidade
dos cuidados de saúde, adaptação psicológica à
doença e os comportamentos de adesão à terapêutica e tratamentos.
Assim, a comunicação é um importante instrumento de intervenção na área da saúde mental.
Toda a tecnologia nesta área é construída através
de um processo de interacção, esperando que os
enfermeiros sejam capazes de estabelecer relações terapêuticas com os utentes.
A comunicação em saúde mental, deve ser clara,
compreensível e consciente, baseada na evidência
e personalizada. Esta personalização significa que
todos os profissionais de saúde devem adaptar e
moldar a informação, consoante as necessidades
do utente naquele instante tendo em atenção o
seu nível cultural e a sua capacidade cognitiva.
SAÚDE MENTAL EM PORTUGAL
A análise do sistema de saúde mental em Portugal
mostra alguns aspectos positivos na evolução das
últimas décadas. Foi um dos primeiros países europeus a adoptar uma lei nacional (1963) de acordo
com os princípios da sectorização, a qual permitiu
a criação de centros de saúde mental em todos os
distritos e o aparecimento de vários movimentos
importantes, tais como os da psiquiatria social e da
ligação aos cuidados de saúde primários.
Segundo o plano nacional de saúde mental, a criação de serviços descentralizados foi um desenvolvimento com um impacto muito positivo para a
melhoria da acessibilidade e qualidade dos cuidados, permitindo respostas mais próximas das
populações e uma articulação maior com centros
de saúde e agências da comunidade. A cobertura
do território nacional por estes serviços ainda é
muito incompleta, mas comparando a situação
actual com a situação há 30 anos, verifica-se que
se deram passos importantes.
Um outro aspecto positivo foi o desenvolvimento de programas e estruturas de reabilitação psicossocial, criados a partir do final dos anos 90, ao
abrigo do Programa Horizonte da Comissão Europeia, do Despacho 407/98e da legislação de apoio
ao emprego. Embora com um âmbito limitado,
estes programas representaram uma ruptura
significativa com a situação anterior, na qual estruturas como residências na comunidade e empresas sociais para doentes mentais graves eram
totalmente inexistentes em Portugal. Apesar destes aspectos inegavelmente positivos, a falta de
planeamento e de apoio consistente à melhoria
dos serviços de saúde mental levaram a que Por-
tugal se tenha atrasado significativamente neste
campo em relação a outros países europeus. Os
dados existentes e a análise dos resultados dos
estudos efectuados no âmbito deste relatório indiciam que os serviços de saúde mental sofrem de
insuficiências graves, a nível da acessibilidade, da
equidade e da qualidade de cuidados.
O acesso das pessoas com doenças mentais a respostas tradicionalmente dirigidas às pessoas com
deficiência deve ser efectivamente potenciado,
pois em certos domínios da reabilitação psicossocial os modelos que se aplicam podem ser idênticos. Importa aproveitar a revisão das políticas
de emprego activo em curso para desenvolver
mecanismos que permitam promover o emprego
apoiado de pessoas com doenças mentais, como
forma de as integrar no mercado de trabalho.
O apoio residencial em habitação independente
exige negociações com o Instituto de Habitação
e Reabilitação Urbana, com as autarquias e respectivos serviços de habitação, devendo ainda ser
conjugado com as unidades que prestam apoio
domiciliário na área da Saúde Mental.
A ENFERMAGEM NA EQUIPA DE SAÚDE MENTAL
A enfermagem psiquiátrica está fundamentada
no relacionamento interpessoal enfermeiro-utente, no qual se valorizam os aspectos biopsicossociais do ser humano.No aspecto biológico, a enfermagem observa efeitos colaterais da medicação
e acompanha a saúde geral do utente e da sua
família. No campo psicossocial, pode envolver-se
em diversas actividades, tais como a visita domiciliária, actividades ocupacionais e tentativas de
reinserção social.
É importante o enfermeiro, incentivar os utentes
a expressarem os seus sentimentos e ajudá-los a
identificarem os seus medos em determinadas situações. Os enfermeiros devem escutar sem fazerem juizos de valores e demonstrando interesse,
sendo assim possível criar uma relação terapêutica e empática com os utentes.
A arte da comunicação não envolve um simples
escutar, é fundamental, na área de saúde mental,
avaliar os movimentos corporais, o desconforto e
inquietude do utente perante certo assunto, o desinteresse por determinada situação, a sua orientação espaço-temporal. O enfermeiro necessita
de identificar os problemas do utente, de modo, a
equipa realizar uma abordagem terapêutica adequada à situação ou diagnóstico.
Assim, os cuidados de enfermagem consistem
29
PUB
CIÊNCIA & TÉCNICA
PUBLICAÇÕES SINAIS VITAIS.
SETEMBRO 2012
Dedicação à Enfermagem!
30
em acções que visam a melhoria da qualidade de
vida do utente e da sua família como um todo,
de acordo com as característica, com o objectivo
de colaborar na sua reintegração social, envolver
todos os intervenientes no tratamento do utente,
cooperando e colaborando com o ele.
Tal como em outra área, em saúde mental, é importante envolver a família no tratamento e do
possível internamento do utente.
A família é a mais antiga das instituições sociais
humanas. É nela que desenvolvemos e realizamos o
processo de socialização e onde interagimos. Não
há duas famílias iguais, cada família é única.
Esta como sistema aberto caracteriza-se pelo
equlíbrio dinâmico entre diálogo e evolução, quando existe uma mudança mais ampla, surge a crise.
A crise, segundo Minuchin (1983), é simultaneamente razão para evoluir e risco de disfuncionamento. Esta não deve ser entendida como algo
negativo, mas sim uma situação para novas estruturas ou reestruturação do sistema.
É de extrema importancia que toda a equipa multidisciplinar tenha conhecimento sobre a relação
da família com o utente, bem como os apoios sociais e psicológicos disponíveis, de modo a envol-
ver a todos nesta fase de mudança, que é a tao
estigmatizada, doença mental.
CONCLUSÃO
A qualidade da comunicação entre enfermeiros e
utentes está relacionada com a maior consciencialização dos riscos e motivação para mudança
de comportamentos, adaptação à doença, adesão à terapêutica e consequentemente uma
maior qualidade de vida.
A personalização da comunicação em saúde permite economizar tempo, aumentar a satisfação
dos utentes e família, e proporcionar a adopção
de comportamentos e hábitos de vida saudáveis.
BIBLIOGRAFIA
COSTA MENDES, M.A. et al – O idoso: problemas e realidades. Coimbra. 1º edição, 1999. ISBN: 972-8485-07-7.
MINISTÉRIO DA SAÚDE - Plano Nacional de Saúde Mental 2007 –
2016. Lisboa. 2008.
PHIPPS, W.J. – Enfermagem médico-cirurgica: conceitos e práticas
clinicas. Loures: 6º edição. 2003. ISBN: 972-8383-657.
SILVA, A.L. et al – Comunicação em Enfermagem em Saúde Mental.
2000
TEIXEIRA, J.A. – Comunicação em saude – Realação tecnicos de saude-utentes. Lisboa. 1996
/ EDIÇÕES
/ REVISTA SINAIS VITAIS
/ REVISTA DE INVESTIGAÇÃO
/ NEWSLETTER DIGITAL
CIÊNCIA & TÉCNICA
CIÊNCIA & TÉCNICA
ENTRADA DO ARTIGO MAIO 2008
ACOLHIMENTO DO DOENTE E
FAMÍLIA NO SERVIÇO DE URGÊNCIA
ANAÍSA REVELES
Licenciada em Enfermagem e Pós-Graduandas em Urgências/Emergências
LIONETA SILVA
Enfermeira Graduada no Hospital de Santo André, EPE – Leiria; Pós-Graduandas em
Urgências/Emergências
PAULA SILVA
REGINA MARTINS
Enfermeira Graduada no Hospital de Santo André, EPE – Leiria; Pós-Graduandas em
Urgências/Emergências
SÍLVIA DUARTE
Enfermeira Graduada no Hospital das Caldas da Rainha. Pós-Graduandas em
Urgências/Emergências
SETEMBRO 2012
Enfermeira Graduada no Hospital Distrital da Figueira da Foz, EPE; Pós-Graduandas
em Urgências/Emergências
32
RESUMO
Cuidar no Serviço de Urgência (SU) é muito mais
do que saber usar conhecimentos técnico-científicos é, acima de tudo, saber respeitar a individualidade do doente e acolhê-lo. Neste contexto,
passa por nós, enfermeiros, ter uma atitude de
mudança, que permita diminuir a distância existente entre enfermeiros e familiares, pois estes
contribuem para o bem-estar do doente. Numa
situação de doença e hospitalização, o doente
não deixa de ser parte integrante de uma família
e não deve ser visto isolado dela.
Palavras-Chave: Acolhimento; doente/família;
humanização
ABSTRACT
Care in the emergency department (ED) much
more than knowing how to use technical and scientific knowledge is, above all, must respect the
individuality of the patient and accept it. In this
context passes us by, nurses have an attitude of
change, to cut down the gap between nurses and
family members as they contribute to the welfare
of the patient. In case of illness and hospitalization, the patient ceases to be part of a family and
should not be seen isolated from it.
Keywords: Reception, patient / family; humanization
INTRODUÇÃO
Nem sempre o tratamento do doente é possível
no seu domicílio, tornando-se necessário recorrer
à hospitalização. Embora seja sempre angustiante a entrada num SU, esta pode ser atenuada, se
nas estruturas de acolhimento reinar o
bom senso e a competência do profissional qualificado, capaz de
serenar e acalmar os doentes
aí admitidos.
É imprescindível ter em
mente que o objecto de
cuidados é não só o indivíduo doente que foi
submetido a cuidados
de saúde mas também
da sua família ou pessoas significativas (Peneff,
2002).
Tal como refere Pinto in Marinheiro (2002, p.23) a “família
continua como ponto de referência
nas situações de crise, de doença, de sofrimento,
sendo reconhecida como fundamental no campo
da saúde por organismos internacionais como a
OMS, a UNESCO,…”
momento da admissão torna-se importante, na medida em que irá determinar a relação entre o utente,
família e os profissionais na unidade. A relação que
se estabelece nesse momento de admissão deve ser o
elemento básico de trabalho dos enfermeiros responsáveis pelo acolhimento.”
Na grande maioria das vezes, o doente é acompanhado ao SU por
um familiar ou por alguém
significativo. A família, é o
elo de ligação do doente à
comunidade e por vezes
com a própria equipa de
saúde, influenciando a
forma como o doente vai
responder à doença (Cardoso et al., 2002).
Apesar das mudanças
constantes na sociedade,
a família continua a ser responsável pelo apoio físico, emocional e social dos seus elementos.
Esta deve ser envolvida nos cuidados prestados
ao doente, para que desta forma possa contribuir
para a união familiar e diminuir sentimentos negativos (Cardoso et al., 2002).
ACOLHIMENTO DO DOENTE / FAMÍLIA NO SERVIÇO DE URGÊNCIA
A finalidade do acolhimento, é por um lado, ajudar o doente a ultrapassar sentimentos de ansiedade, de angústia e, por outro, ajudar a família
à qual estão também associados sentimentos de
medo e apreensão. O acolhimento implica observar o doente como uma pessoa que se compõe,
também, pela sua família. Com a situação de hospitalização os familiares sentem-se, muitas das
vezes, perdidos, desprotegidos e envolvidos num
ambiente desconhecido com inúmeras normas
(Ferreira et al., 2003).
Os enfermeiros têm de estar alerta e sensibilizados para incluir os familiares na prestação de
cuidados ao doente. Para muitos familiares sentirem-se incluídos aumenta o sentimento de utilidade, diminui a ansiedade e proporciona o direito
que a família tem de estar unida. O papel da equipa de saúde é determinante.
Para Gouveia in Ferreira et al. (2003, p. 10),
“A recepção e o acolhimento que se faz ao utente no
NOÇÃO E OBJECTIVOS DO ACOLHIMENTO
Definir acolhimento não é difícil pois qualquer
dicionário o define, mas torna-se mais complexo
quando o relacionamos com o ramo da saúde, no
meio hospitalar.
Carneiro in Cardoso (2002, p.12) refere que “O
acolhimento é uma atitude não de mera hospitalidade mas inserido num contexto de uma profunda relação humana (…), deverá ser cada vez mais
uma técnica da relação humana que procura receber bem.”
A humanização nos hospitais inicia-se com o
acolhimento dos doentes. A função de acolher,
é papel de todos os pertencentes à instituição
hospitalar mas, é fundamental que seja assumida
como um cuidado de Enfermagem porque somos
aqueles que mais tempo passa junto do mesmo. O
acolhimento deverá ser considerado um momento crucial e importante para todos os elementos
da equipa de Enfermagem, devendo também ter
em conta a triagem e o encaminhamento do doente no SU (Vieira, 2002).
33
SETEMBRO 2012
CIÊNCIA & TÉCNICA
34
No momento da admissão, a forma como é realizado o acolhimento é a mensagem com que o
doente e família ficam da instituição e de todos
aqueles que nela trabalham.
Acolher, é um acto de auxiliar o doente a familiarizar-se com o meio ambiente de modo a facilitar a
sua adaptação e esta implica a explicação dos actos de enfermagem e exames a realizar. Quando o
doente fica na Sala de Observações o enfermeiro
deve explicar as rotinas, horários das refeições e
apresentação do serviço, nomeadamente: localização da casa de banho e sala de enfermagem.
Deve, também, explicar as funções de todos os
profissionais que possam contactar com o doente
e como solicitá-los quando necessário (campainha junto da cama, de fácil acesso).
E porque acolher é ajudar, é importante saber
ouvir para minimizar todas as dúvidas e receios.
Segundo Ferreira et al. (2003, p. 11) “um bom acolhimento depende essencialmente da capacidade
da enfermeira colocar-se no lugar do doente e
questionar-se: como eu gostaria que fosse se estivesse no lugar do doente.”
De acordo com Ferreira et al., (2003) para que o
acolhimento seja bem sucedido há a considerar
alguns aspectos:
• ente como gostaria de ser chamado;
• ente deve ser familiarizado com o espaço físico, explicar-lhe os procedimentos que lhe
vão ser realizados, que equipamentos vão ser
utilizados, para que desta forma se sinta mais
tranquilo e possa também esclarecer dúvidas
e receios;
• olvimento directo e imediato à triagem;
• por si como pessoa e que é aceite como membro da equipa de saúde;
• nfermeiro prestar todos os esclarecimentos
necessários à tranquilidade e segurança do
doente;
• ente diminuir sentimentos de angústia, ansiedade e medos inerentes ao seu estado de
saúde. Deve ser sempre proporcionada a sua
privacidade;
• or aquilo que a outra pessoa tem para dizer;
• nente;
• ser um cuidado e responsabilidade do enfermeiro no momento da sua admissão.
CIÊNCIA & TÉCNICA
REACÇÕES COMUNS À ADMISSÃO DO DOENTE
NO SERVIÇO DE URGÊNCIA
Em relação às reacções mais comuns aquando
da admissão, Timby (2001) refere:
– Pode ser causada pela insegurança. Muitos
adultos não manifestam a sua ansiedade de
forma óbvia, apresentando nomeadamente
alterações do apetite, insónia, inquietação e
tristeza;
– Ocorre quando os doentes não conseguem interagir com os familiares e amigos. Para colmatar este problema os hospitais têm instituído
horários para visitas, o que no SU, dado à sua
especificidade, não sendo muito tempo, será
muito importante para o doente e sua família
este contacto, embora que breve;
– A privacidade é na maior parte das instituições
de saúde, um privilégio. Assim é muito importante que se demonstre respeito ao direito de
privacidade do doente. Na verdade, a maior
parte dos doentes possuem pouco mais do que
alguns centímetros em torno de si. O facto de
partilharem um espaço, com vários estranhos
e com a informação de que muitas pessoas
estão a movimentar-se pelo local em todos
os momentos do dia e da noite fica mais fácil
compreendermos o comprometimento da sua
privacidade;
– Tornar-se doente pode temporariamente privá-lo da sua identidade pessoal. Temos como
exemplo o facto de os doentes vestirem os pijamas/camisas hospitalares e todos eles poderem parecer iguais. Assim devem ser tratados
de uma forma pessoal, devemos saber e chamar o doente pelo seu nome. Em muitos SU os
doentes não podem ter consigo bens pessoais,
vestir a sua roupa, ter fotos de familiares, devido às características próprias deste serviço,
então temos que tentar minimizar o mais possível esta perda.
À medida que estas reacções se instalam levam a
que as suas convicções possam ser destruídas; podendo instalar-se sentimentos de revolta que se expressam frequentemente de uma forma agressiva.
HUMANIZAÇÃO DOS CUIDADOS DE ENFERMAGEM AO DOENTE E FAMILIA
Humanizar significa tornar humano, tornar mais
sociável; pressupõe que as pessoas, agentes de
humanização, devem humanizar-se a si mesmas,
fazendo nascer as virtudes pessoais e assimilando os valores humanos universais que tornam a
pessoa adulta disponível, acolhedora e conscientemente participativa (Neto et al., 2003).
Para Madeira et al. (2004, p.18) “o primeiro contacto com o hospital é pois determinante para o
desenrolar de toda a situação”. Roxo in Madeira et
al. (2004) acrescenta o facto de que as primeiras
impressões são as que perduram, desta forma é
no momento de admissão que o doente se sente inseguro, pelo que o enfermeiro deverá agir de
forma a exteriorizar interesse, simpatia e compreensão aquando da sua chegada ao SU.
É por isso importante que o enfermeiro crie um
ambiente de confiança e empatia procurando os
conhecimentos do doente e da sua família face à
sua situação clínica, aceitando e compreendendo
as diversas situações de stress e ansiedade, delineando desta forma objectivos realistas para ajudar a tranquilizar o doente e sua família.
A relação de empatia que o enfermeiro estabelece
com o utente, torna-se facilitadora e conduz assim a uma participação activa do doente em todo
o seu processo terapêutico.
Neto et al. (2003) salienta que esta relação desenvolve-se e fortalece-se ao longo de um processo
dinâmico que tem por objectivo ajudar o doente a
ser pró-activo na consecução do seu projecto de
saúde, sempre em parceria com a família. Acrescentam ainda que o SU, pelas suas características intrínsecas, a intensidade do trabalho
físico e mental, a confrontação contínua com a
morte e a ameaça constante de perda e fracasso,
é por si só indutor da desumanização dos cuidados de enfermagem prestados ao doente/família.
Para se poder cuidar no SU implica ser-se capaz
de escutar e compreender na altura em que o doente necessita de auxílio, mesmo quando o fluxo
de doentes é grande, nunca descorando o cuidar
o doente e sua família como nós gostaríamos de
ser cuidados, de acordo com os direitos e deveres
do doente.
Em situações de urgência, é sobejamente conhecido o desagrado dos familiares relativamente à
forma como são acolhidos. São muitas vezes menosprezados os dados sobre o seu doente sendo
estes uma mais valia em todo o processo. Por
outro lado, também não é tido em conta a necessidade de estar junto deste, quer por falta de
formação, de tempo ou de sensibilização do profissional. Quando acontece, é óbvio o desrespeito
pela confidencialidade a que tem direito, uma vez
que as informações lhe são transmitidas em locais inadequados.
Devemos também salientar a forma como as
mensagens são verbalizadas, frequentemente em
termos técnicos imperceptíveis à família. Sendo
os enfermeiros os profissionais que mais perto
estão do doente, é compreensível que seja a eles
que os familiares mais recorrem e, é de louvar
que mesmo estando muito ocupados se mostrem
disponíveis e com um sorriso sincero quando são
solicitados pelos familiares, induzindo nestes um
pouco de tranquilidade que tanto necessitam.
CONCLUSÃO
Terminamos sugerindo algumas medidas que
poderão ser elaboradas com o objectivo de um
melhor acolhimento do doente e seus familiares na urgência, tais como: a elaboração de um
manual de acolhimento e a sua divulgação pelos
doentes aquando da sua entrada na urgência; a
criação de incentivos e motivações para o pessoal de saúde, com o intuito de humanizar os
cuidados ao doente e sua família e a criação de
condições mínimas de trabalho, com a criação de
um gabinete do doente.
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VIEIRA, João Perestrelo - Triagem de Enfermagem na Urgência Geral de Adultos.
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CIÊNCIA & TÉCNICA
ENTRADA DO ARTIGO ABRIL 2008
NORMAS DE PUBLICAÇÃO
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Revista.
14. Os trabalhos devem ser enviados para [email protected]
CUIDAR DO DOENTE EM FASE
TERMINAL DE VIDA E DA SUA FAMÍLIA
Daniela Paiva
Enfermeira Licenciada, Serviço de Medicina, Hospital S. João
Juliana Carvalho
Enfermeira Licenciada, Serviço de Medicina, Hospital S. João
Susana Melo
Enfermeira Licenciada, Serviço de Medicina, Hospital S. João
37
RESUMO
Com os cuidados paliativos pretendemos assegurar a melhor qualidade de vida possível aos doentes e sua família.
Estes cuidados têm como principais componentes
o alívio dos sintomas; o apoio psicológico, espiritual e emocional; apoio á família; apoio durante
o luto.
Palavras-chave Doente terminal; cuidados paliativos; alívio de sintomas; morte; dificuldades de
acompanhamento.
ABSTRACT
In palliative care we aim to ensure the best possible quality of life for patients and their families.
These care have as main components the relief
of symptoms, the psychological, spiritual and
emotional, support to families; support during
bereavement.
Keywords : terminal patient, palliative care, symptom relief, death, difficult to monitor.
SETEMBRO 2012
CIÊNCIA & TÉCNICA
INTRODUÇÃO
Sabendo que a cultura dominante da sociedade
mundial, tem considerado a cura da doença como
principal objectivo dos serviços de saúde, a incurabilidade e a realidade inevitável da morte, são quase consideradas um fracasso da medicina.
Neste sentido, a abordagem da fase final da vida
tem sido encarada nos hospitais como uma prática
estranha e perturbadora , com a qual é difícil lidar.
Com este trabalho pretendemos alertar para o reconhecimento dos cuidados paliativos, como uma
prática essencial nos serviços de saúde, necessitando de apoio qualificado de modo a garantir o
bem estar do doente na fase terminal da sua vida.
De acordo com a OMS, cuidados paliativos são
“cuidados activos e totais, prestados a pacientes cuja
doença não responde a tratamento curativo. O controle da dor, dos sintomas e de problemas psicológicos, sociais e espirituais é da maior importância”
De uma forma geral, com este trabalho pretende-se ajudar os enfermeiros a cuidar melhor dos
doentes terminais e suas famílias, para que estes
possam viver, tão activamente quanto possível,
até á sua morte.
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CUIDADOS PALIATIVOS
O PAPEL DO ENFERMEIRO
A morte é um acontecimento com o qual os profissionais de saúde se confrontam no dia-a-dia.
Devido à natureza dos seus cuidados, o enfermeiro é um dos profissionais de saúde que vivencia
mais directa e imediatamente o processo de morte de alguém.
Cuidar do doente em fase terminal constitui um
verdadeiro desafio para os profissionais de enfermagem. O enfermeiro é o elemento da equipa de
saúde que mais próximo e mais tempo permanece
com o doente e família. Tem, deste modo, o privilégio de conhecer melhor a pessoa com doença,
no que respeita às suas necessidades, e de partilhar com ela os seus momentos mais íntimos. O
enfermeiro encontra-se numa posição privilegiada para ajudar a pessoa, o doente/família nesta
tão difícil etapa, que é o fim de uma vida.
O cuidar de uma pessoa em fase terminal passa,
por estar atento aos problemas físicos do doente,
como é o exemplo da dor fisica, mas também por
nunca esquecer a “dor psicológica”, que tantas
vezes dói mais que qualquer sintoma físico. Por
CIÊNCIA & TÉCNICA
isso, é fundamental que o doente seja visto como
um ser holístico, único e individualizado, e não
apenas como um conjunto de sintomas físicos a
serem tratados. Este facto leva-nos a constatar
que a nossa intervenção não passa apenas por
cuidados e técnicas sofisticadas, mas sim, muitas
vezes, pela nossa presença física e mental.
De uma maneira geral, o papel do enfermeiro
junto da pessoa em fase terminal passa por criar
um ambiente que conduza ao tipo de morte que
a pessoa deseja, ao mesmo tempo que a mantém
livre de dores, sofrimento e ansiedade.
Neste contexto, o papel do enfermeiro nos cuidados paliativos deve focar os seguintes aspectos: a
dor física; a “dor psicológica”; Cuidados á família;
a comunicação.
A DOR FISICA
Tratar a dor física será, talvez, a tarefa mais fácil
para o enfermeiro, numa situação terminal. “Dor
é aquilo que o doente diz que é”. Ocorre quando
ele diz que ocorre e magoa tanto, quanto ele diz
que magoa. A dor é sempre uma presença incómoda, indesejável, desnecessária e no entanto
convive connosco...
A pessoa que tem dor sofre em todo o seu ser. É
necessário ter uma visão holística da pessoa para
entender todo o seu sofrimento e diminuição.
Nós enfermeiros, que prestamos cuidados ao doente com dor, devemos apreciar o seu comportamento desde o biológico, à atitude, à manifestação psicológica, daí a dificuldade em definir a dor.
É uma sensação completamente subjectiva e uma
experiência holística.
Utilizar a escala analógica da dor, é dos recursos
mais usados pelos enfermeiros e dos mais eficazes. A dor deve ser avaliada com o doente e não
no doente.
Cabe ao enfermeiro a administração correcta dos
fármacos e a avaliação do seu efeito. Os enfermeiros estabelecem a ligação entre a manifestação
da dor, a prescrição médica, a administração e o
efeito dos farmacos.
Há várias terapêuticas que são do campo da enfermagem e sem pôr de parte a analgesia, podem
ser extraordinariamente importantes para o resultado único, que é o bem do doente.
Como técnicas não farmacológicas do alívio da
dor, podemos referir, por exemplo: aplicação de
calor/frio; massagem/relaxamento; acunpuntura,
aromaterapia, musicoterapia, reflexologia,etc.
A “DOR PSICOLÓGICA”
Tratar a “dor psicológica” do doente significa que
a actuação do enfermeiro deverá ser orientada no
sentido de promover a máxima qualidade de vida
no tempo que ainda lhe resta.
Podemos dizer que a dor é fisiológica, enquanto
o sofrimento é psicológico. O sofrimento é muito
mais vasto, mais global, isto é, existencial. Ele inclui as dimensões psíquicas, psicológicas, sociais
e espirituais. E é nestas dimensões que o enfermeiro terá que debruçar a sua atenção e dirigir a
sua acção.
Para se conseguir efectivamente tratar a “dor
psicológica” do doente, o enfermeiro deve relacionar-se com o doente, estabelecer uma relação
terapêutica e isto implica demonstar disponibilidade, estabelecer uma relação de ajuda baseada
na confiança.
A COMUNICAÇÃO
Os doentes moribundos têm necessidades de comunicação especiais. Dependendo da causa de
morte eminente e do estádio em que está, o doente pode estar amedrontado, com dores e incapaz de comunicar, ou pode estar completamente
calmo, orientado e capaz de participar. A situação
é que vai determinar a estratégia a usar, quer na
comunicação com o doente, quer na comunicação
com a família.
Em doentes em fase terminal, a comunicação doente/enfermeiro, vai muitas vezes mais além do
que as simples palavras. Engloba também a comunicação oral, escrita, não verbal, táctil, visual,
expressão mímica, corporal, gestual e outras....
mas não é só o quer se diz, mas também, as pausas, o ritmo, os silêncios...
• ATITUDES QUE INTENSIFICAM A COMUNICAÇÃO: interesse; aceitação; objectividade;
comprometimento.
• ATITUDES QUE INTERFEREM NA COMUNICAÇÃO: posição de superioridade; rigidez; Desatenção; esteriotipagem
• TÉCNICAS QUE FACILITAM A COMUNICAÇÃO: escuta activa; reflexão; perguntas abertas; esclarecimento; sumário; silêncio.
As más notícias são informações que alteram
drástica e desagradavelmete a opinião que o doente tem do seu futuro. Por ser quem, habitualmente, mais tempo passa com o doente, o enfermeiro, veste muitas vezes a pele do transmissor
das más notícias, quer para o doente, quer para
a família.
Aquando da transmissão de más noticias é necessário determinar primeiro, qual o grau actual de
informação que o paciente e sua família têm da
gravidade da sua doença. Como a compreendem,
para posteriormente proceder à transmissão de
informação o mais adequada possível. Toda a informação deve ser transmitida de uma forma honesta e simples.
OS CUIDADOS À FAMÍLIA
O doente terminal está a vivenciar uma fase da
vida muito particular. Fase esta, que pode ser
fonte de sofrimentos físicos e/ou psicológicos,
desesperos e medos. A família do doente, ou
pessoas significativas (amigos, vizinhos...) têm
um papel preponderante no apoio emocional ao
doente.
Pelo que é fundamental que os enfermeiros promovam a participação dos familiares/pessoas
significativas nos cuidados ao doente (por exemplo nos cuidados de higiene, na alimentaçao...)
Os profissionais “...nunca deverão substituir a família naquilo que ela pode fazer uma vez que conhece muito melhor o doente como pessoa bem
como as suas preferências, interesses, preocupações e hábitos” (Susana Pacheco, p.135. 2002)
Mas se toda a situação de doença e fase final de
vida, é um processo difícil para o doente, também
o é para a sua família. Assim, é função do enfermeiro ajudar a família a ultrapassar esta fase crítica e permitir que expressem os seus sentimentos e emoções. Os familiares são confrontados
com a realidade da doença grave e em último caso
com a realidade da morte.
Quando surge a possibilidade do doente terminal
ter alta, a família fica ainda mais perturbada e
confusa, pois depara-se com obstáculos sociais e
culturais diversos. Ana Sapeta (2000) descreve-os
como: “Dificuldades económicas, profissionais,
temporais; atitude-tendência em negar a morte;
falta de habilidade em lidar com o sofrimento e
a dor; fragilidade nos laços familiares e na soli-
39
SETEMBRO 2012
CIÊNCIA & TÉCNICA
40
dariedade entre gerações”. E conclui que “estes e
outros factores explicam a relutância em cuidar o
doente no domicílio”
De facto, no nosso país, é evidente a falta de
recursos económicos, estruturais e de apoio social, em particular para o auxílio aos doentes em
fase terminal de vida e suas famílias. Esta é talvez uma das razões mais fortes que dificultam a
permanência dos doentes terminais no seu ambiente familiar, o que implica o seu internamento e provavelmente , a sua morte em ambiente
hospitalar.
“Deste modo são necessárias condições para
que o doente possa permanecer no domicílio
tais como: o doente desejar ficar e casa, a família querer e poder cuidar do doente, a existência
de condições sócio-económicas adequadas e ainda uma equipe de cuidados domiciliários que dê
suporte ao doente e à família” (Susana Pacheco,
p.112, 2002)
Tendo subjacente esta realidade complexa com
que os familiares se deparam, é necessário intervir e efectuar mudanças prioritárias. Ana Sapeta
(2000) sugere:
• informação detalhada, numa linguagem adequada e intelígível sobre a situação clínica do
doente, ao próprio e sua família.
• permitir a presença de uma pessoa de família junto do doente terminal, garantindo assim a segurança afectiva do doente e alguma
assistência básica; o que permitirá à família
acompanhar o agravamento da situação, preparar-se para a separação, para o luto ou eventualmente para a alta. A alta destes doentes
deve ser planeada e preparada minuciosamente pelo médico, enfermeiro, assistente social,
sendo a família o educando.
• o doente deve conhecer o diagnóstico, o prognóstico de vida, para conscientemente participar nas decisões de tratamento futuras
• a transferência do doente do hospital para o
domicílio só é legítima se a família possuir recursos e conhecimentos suficientes para abraçar essa decisão.
Cada família deve então ser apoiada, quer a nível psicológico, emocional, quer a nível social e
económico, de acordo com as suas necessidades
específicas. O enfermeiro deve procurar conhecer
cada família em particular e conhecer as suas difi-
CIÊNCIA & TÉCNICA
culdades e desejos para poder planear e executar
intervenções de ajuda eficazes.
DIFICULDADES DO ACOMPANHAMENTO AO
DOENTE TERMINAL
Com os avanços técnicos adquiridos pela medicina até aos tempos de hoje, o Homem parece ter a
solução para toda e qualquer doença. Mas quando se esgotam as soluções curativas e a Medicina
nada pode fazer para travar o progresso galopante da doença, surge o desânimo, a derrota e a sensação de impotência. A morte é pois vista como
um fracasso humano e técnico.
Seguidamente, são apresentadas as várias dificuldades sentidas pelos enfermeiros na sua relação
com o doente terminal.
DIFICULDADES EM LIDAR COM O SOFRIMENTO
E A MORTE
Actualmente, estima-se que mais de 70% das
mortes, ocorram em ambiente hospitalar. A morte foi desenraizada do seu meio familiar e social,
tornando-se distante das pessoas em geral. Esta
sociedade do conhecimento e da técnica, não está
preparada para lidar com o fim da vida. A morte
incomoda, causa medo e angústia a quem a presencia e por isso é escondida e esquecida como
forma (ineficaz) de fuga a este sofrimento.
Os enfermeiros em particular ( e todos os profissionais de saúde em geral) sentem estas dificuldades, ao lidarem com o doente terminal. Confrontam-se com a sua própria finitude, com o medo
da morte sofrida e com a incerteza do que irão
encontrar depois da morte. Face à morte e ao sofrimento, o distanciamento e a fuga são mecanismos de defesa, frequentemente activados. Saber
que temos de cuidar de um doente moribundo
incomoda-nos, passamos o menos tempo possível
junto dele, evitamos olhá-lo, escondêmo-lo atrás
de biombos ou num quarto isolado.
“Cada vez mais o morrer se está a tornar mais solitário, muito mecânico e por vezes desumano” (
João, Apostolo)
DIFICULDADES EM LIDAR COM AS EMOÇÕES E
SENTIMENTOS
Ainda é escassa a formação em cuidados paliativos fornecida na formação base.
Esta falta de formação é referida pelos enfermeiros em inúmeros estudos de investigação sobre
esta temática.
Os enfermeiros sentem-se angustiados, tristes,
impotentes, sentem o fracasso de nada mais
poder fazer, o medo, a insegurança e a revolta.
(Abreu,Paula e Vieira, Nélia, 2004)
Lidar, diariamente, com a morte e o sofrimento
pode causar nos enfermeiros situações geradoras
de stress, de desmotivação e insatisfação profissional. Os profissionais de saúde sentem as dificuldades de lidar com esta complexa realidade, o
que pode conduzir ao seu desgaste físico, psicológico, à depressão e em última instância ao síndrome de burnout.
DIFICULDADES NA COMUNICAÇÃO
Toda a situação peculiar do doente terminal e sua
família, causa desconforto e sentimentos menos
positivos aos enfermeiros. Pelo que é natural que
seja penoso comunicar com estes doente e suas
famílias.
Os principais obstáculos à comunicação, sentidos
pelos enfermeiros são:
• défice de preparação para lidar com estas situações e em particular com a proximidade da
morte
• dificuldade em revelar a verdade aos doentes,
o que os leva a utilizarem comportamentos de
omissão e evitamento/fuga face às questões
dos doentes. (Saraiva, 2003)
Estas dificuldades em comunicar com o doente
terminal, facilmente, originam a conspiração do
silêncio. A própria família por achar que o doente
não está capaz de saber a verdade, frequentemente, pede aos profissionais esse silêncio. E o doente
terminal fica cada vez mais sozinho,e é impedido
de tomar decisões sobre o seu estado de saúde
porque desconhece a sua verdadeira situação. Os
enfermeiros geralmente, não sabem o que já foi
transmitido ao doente sobre a sua situação, e não
sabem o que dizer ao doente.
A MORTE EM AMBIENTE HOSPITALAR E O LUTO
Na actualidade, a morte foi desenraizada do seio
familiar e ostrarizada para o meio hospitalar. Deixou de ser vista, de ser sentida de perto, deixou de
ser pensada e refelctida. A morte tornou-se difícil
de suportar e de compreender, provocando o evitamento/ distanciamento em relação aos doentes
moribundos e, posteriormente, o prolongamento
do tempo de luto.
Quando a morte ocorria em ambiente familiar,
o moribundo era rodeado por toda a sua família,
incluindo crianças, que se despediam dele com
afectividade. Actualmente, morrer no hospital
implica grandes alterações ao cenátio anterior.
É frequente a pessoas morrer sozinha, longe da
sua família, do seu espaço e de tudo o que lhe
é querido. Pode ocorrer também a obstinação
terapêutica em doentes terminais, provocando
mais dor, sem com isso, obter melhorias significativas.
A falta de formação do pessoal técnico para
lidar com o moribundo a sua família e com a
morte, leva-o a comportamentos de piedade,
de fuga e de indiferença. A falta de pessoal e
a preocupação com a eficácia e rentabilidade
das instituiçoes de saúde, dominuem a capacidade dos profissionais, para cuidar de forma
humana, deste tipo de doentes. Outros factores
menos positivos, por veses, presentes nos hospitais, referidos també, por Marie de Hennezel
(2001) são: a tentação do anonimato (as pessoas
passam a ser o “cancro de fígado” ou um número), o silêncio (ninguém explica nada, porque os
profissionais têm medo de dizer a verdade) e a
falta de intimidade.
A experiência de morte é difícil de encarar tanto
para os enfermeiros como para os doentes e famílias. Os profissionais de saúde devem apostar na
formação para lhes permitir lidar com a morte de
uma forma natural.
Como lidam os doentes e os familiares com a morte? Marie de Hennezel considera que os maiores
medos dos doentes que se encontram a morrer
são o da dor física e o da solidão e do abandono.
Para além de outros tais como:
• “o medo de ficar separado dos que ama (e o
que lhes acontecerá?)
• o medo de assistir à própria degradação física
e talvez mental
• o medo de perder o controlo das coisas, de
ficar dependente, de perder a autonomia, de
estar à mercê dos outros (1999)”
• Para auxiliar o doente moribundo a enfrentar
a sua finitude, é imprescindível e prioritário o
alívio / controlo de sintomas tais como a dor,
41
CIÊNCIA & TÉCNICA
as naúseas e vómitos, a dificuldade respiratória...etc. e concomitantemente, a promoção da
sua qualidade de vida, de modo a:
• permitir a presença de familiares ou pessoas
significantes junto do doente e especialmente
nos últimos momentos de vida.
• oferecer a presença, respeito e atenção por
parte dos profissionais de saúde
• porpocionar à pessoa agonizante, momentos
de alívio através do toque, da massagem...
• fomentar um ambiente calmo e de paz interior (através da colocação no quarto do doente
uma vela, aromoterapia, incenso, música relaxante ou clássica...)
SETEMBRO 2012
(Adaptado de Marie Hennezel , 1999)
42
A família necessita igualmente de ser alvo dos
cuidados por parte dos enfermeiros. Não apenas
durante o tempo em que o doente está em fase
terminal mas também após a sua morte. O luto
afecta a pessoa na sua globalidade, nos seus aspectos físicos, emocionais, sociais e espirituais. É
uma crise, uma fase de transição que impulsiona
a pessoa a adaptar-se à sua nova realidade sem o
familiar falecido.
A aceitação da morte de um familiar ou ente querido é,certamente, mais fácil se essas pessoas
estiverem presentes nos seus últimos instantes
de vida. Acreditam que a pessoa morreu, porque
viram o corpo sem vida. E o seu processo de luto
inicia de forma menos perturbadora. A vivência
do luto, nunca é tarefa fácil. No entanto pode-se
tornar menos dolorosa e mais breve, se a família
sentir-se apoiada quer pelos seus amigos, quer
pelos profissionais de saúde. Este apoio é essencial para a progressiva aceitação da perda, e para
evitar a evolução para um luto disfuncional.
ESTRATÉGIAS PARA ULTRAPASSAR AS DIFICULDADES SENTIDAS PELOS ENFERMEIROS
Como referido anteriormente, lidar com a proximidade da morte, com o doente moribundo e com a
sua família, é custoso para os profissionais de saúde. Cabe aos enfermeiros desenvolverem comportamentos e estratégias capazes de permitirem uma
actuação mais próxima e equilibrada e que “ajudem
a preservar a sua saúde emocional e fisica, evitando
o esgotamento (burnout)” (Twycross – 2003).
CIÊNCIA & TÉCNICA
ACEITAR A MORTE E O SOFRIMENTO COMO
ALGO NATURAL E INEVITÁVEL
Se existe uma grande certeza nesta vida, é que
todos vamos morrer um dia. Estarmos conscientes de que somos mortais, e prepararmo-nos para
este facto, ajuda a aceitar a nossa futura morte e
a dos nossos entes queridos. “Se não formos capazes de enfrentar os nossos próprios medos perante
a morte, teremos muita dificuldade em ajudar os
outros” como refere Elizabeth Kubler-Ross (1975).
O enfermeiro deve então efectuar um trabalho
pessoal e interior por forma a ser capaz de lidar
com os seus medos, com a sua própria morte e com
a morte dos outros. Deverá “aprender a conhecer
os seus próprios sentimentos e emoções, nomeadamente os mais perturbadores”, para que evite o
uso de mecanismos de defesa que geralmente são
obstáculos à comunicação. (Sobreira et al, 2004)
É essencial mudarmos a nossa atitude perante a
morte e o sofrimento, aceitando-os como parte
integrante da vida.
IMPLEMENTAR REUNIÕES DE EQUIPA
Primeiramente, é importante uma reflexão pessoal sobre o que nos afecta/incomoda na relação
com o doente terminal. Após definir esses factores, a entre-ajuda entre os vários elementos da
equipa, facilita a superação dessas dificuldades.
Os momentos de diálogo e reflexão em equipa,
permitem a partilha de experiências e o desenvolvimento de soluções/estratégias para lidar com o
sofrimento e a morte.
A discussão dos casos clínicos em equipe, origina
outra grande vantagem: todos os elementos conhecem o doente, a sua situação clínica, o que lhe
foi dito e até que ponto ele quer conhecer a verdade do seu diagnóstico.
EFECTUAR AUTO-FORMAÇÃO NA ÁREA DOS
CUIDADOS PALIATIVOS
Para melhor cuidar destes doentes, é necessário estar preparado psicologicamente para lidar
com momentos dolorosos e emoções fortes. Cabe
a cada enfermeiro procurar formação sobre comunicação (ex: como dar más notícias), sobre a
relação de ajuda (ex: a importância do toque, da
presença humana) e sobre a área dos cuidados pa-
liativos em geral.
A formação, capacita o enfermeiro a cuidar, sem
medo das suas limitações pessoais e profissionais.
Capacita o enfermeiro a desenvolver-se pessoalmente e a ser mais flexível e maduro na tomada
de decisões. Capacita o enfermeiro a agir de forma mais equilibrada e humana.
PROMOVER A “HIGIENE” MENTAL E FÍSICA
Os enfermeiros devem adoptar diversas atitudes
e estratégias para não sucumbirem ao stress, à
angústia e a todas as emoções fortes sentidas durante o tempo de trabalho. Estas estratégias permitem o escape e a descompressão psicológica,
tão necessárias, para o equilibrio mental e físico
dos profissionais: diversão; actividades de lazer
gratificantes; exercício físico; dieta equilibrada;
meditação; relaxamento (massagens, termas...);
respeito pelos dias de folga e de férias, ajuda espiritual; musicoterapia. (adaptado de Ferreira, in SV
nº 58 jan 2005)
CONCLUSÃO
Morrer em ambiente hospitalar está longe de ser
um tempo tranquilo, familiar e pleno de afectividade. Muito existe ainda a fazer e a mudar, tanto
ao nível institucional, como ao nível dos profissionais de saúde e da sociedade.
É imperioso começar agora, a ver a morte como
um processo natural, a incluir a família nos cuidados ao seu doente e a cuidar de todas estas pessoas, com carinho e humanidade.
O caminho, apesar de longo, faz-se caminhando
e aos poucos e poucos, pretende-se alcançar um
ideal. Facilitar uma morte serena, digna, familiar
e indolor, é possível. Tal já ocorre nas várias instituições de cuidados paliativos existentes pelo
mundo inteiro. Instituições estas, ainda em reduzido número face ás necessidades existentes. Aos
poucos e poucos, e com o nosso empenho será
possível melhorar as condições existentes nos
hospitais.
Não podemos sempre nos desculpar com a falta
de tempo e de condições. Dar um carinho, uma
palavra amiga, estar presente junto do doente,
ainda que em silêncio, falar com o médico para
prescrever um analgésico ou deixar um familiar
acompanhar o doente, são gestos que não gastam
muito do nosso tempo e fazem toda a diferença
para a pessoa que está a morrer
Como refere, sabiamente, Madre Teresa de Calcutá: “Sei que o meu trabalho é uma gota no oceano,
mas sem ele, o oceano seria menor”
BIBLIOGRAFIA
ABRUNHOSA, Maria da Conceição Correia Guedes – Significação das experiências
subjectivas vivenciadas pelos familiares dos doentes oncológicos confrontados com a
morte: Uma análise fenomenológica.”Tese de mestrado em Ci~encias de Enfermagem, apresentada à Universidade Católica de Lisboa. Lisboa:[ s.l.], 1995.
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FERREIRA, Cátia; PEREIRA, Cristina. – Cuidados Paliativos uma experiência para
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FERREIRA, Isilda da Costa – Atitude do Enfermeiro perante a morte. “Revista Sinais
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HENNEZEL, Marie de. – Dialogo com a morte. 3ªed. Editorial notícias. Lisboa:
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HENNEZEL, Marie de. – Nós não nos despedimos: reflexão sobre o fim da vida. Editorial notícias. Lisboa:2001. ISBN: 972-46-1198-1.
HENRIQUES, Marília. – O enfermeiro e o morrer. “Revista Servir”. Nº 43. (1995),
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HENNEZEL, Marie; LELOUP. Jean-yves. – A arte de morrer. 2ªed. Editorial notícias. Lisboa: 2000.
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MAURICE, Abieen. – Para uma morte mais humana: expeirência de uma unidade
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PACHECO, Susana. – Cuidar a pessoa em fase terminal: prespectiva ética. Lusociência,2002. ISBN: 972-8383-30-4.
PESSINI, Leo; BERTACHINI, Luciana. – Humanização e cuidados paliativos. Edições
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TWYCROSS, Robert. – Cuidados Paliativos. 2ªed. Lisboa:2003. ISBN: 972-796-0936.
43
CIÊNCIA & TÉCNICA
ENTRADA DO ARTIGO ABRIL 2008
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A PROPÓSITO DE UM CASO CLÍNICO
HENRIQUE GUILHERME MARTINS AFONSO
Licenciado em Enfermagem pela Universidade Fernando Pessoa - Porto. Pós - Graduando
em Enfermagem de Cuidados Intensivos pela CESPU Formação
SÍLVIA DO ROSÁRIO PITEIRA NATÁRIO DE LOURENÇO
Licenciada em Enfermagem pela Escola Superior de Enfermagem São João de Deus,
Évora. Mestranda em Psicologia da Gravidez e da Parentalidade, pelo Instituto Superior
de Psicologia Aplicada.
45
RESUMO
A intervenção precoce da equipa de emergência
perante vítimas com traumatismo carotídeo é de
vital importância, uma vez que é esta quem tem
a primeira abordagem à vítima. O prognóstico da
situação depende de uma actuação rápida e eficaz. Neste sentido, faremos uma abordagem ao
traumatismo carotídeo, a forma como a equipa
de intervenção pré-hospitalar deve actuar e quais
os parâmetros padronizados que devem ser seguidos na intervenção da mesma, para aumentar as
probabilidades de sucesso nas intervenções.
Palavras chave: Traumatismo carotídeo; A. B. C.
D. E.; Pré-Hospitalar; C.H.A.M.U.
PARQUE EMPRESARIAL DE EIRAS, LOTE 19, EIRAS
3020-265 COIMBRA
telefone 239 801 020
fax 239 801 029
ABSTRACT
Early intervention of the emergency team on carotid trauma victims is vital, because they´ve the
first approach to the victim. The prognosis of the
situation depends on a quick and effective intervention. In this article, we make an approach to
the carotid trauma, the emergency team’s intervention and the standard parameters that should
be followed to increase the chances oh success in
this interventions.
Keywords: Carotid trauma; A. B. C. D. E.; Pre-Hospital; C.H.A.M.U
SETEMBRO 2012
CIÊNCIA & TÉCNICA
46
INTRODUÇÃO
Desde a descoberta da pólvora que a incidência
do traumatismo carotídeo tem vindo a aumentar.
Apesar de no passado este tipo de lesões só acontecer nas guerras, verifica-se actualmente uma
relação próxima entre o traumatismo carotídeo e
a maior facilidade de aquisição de armas de fogo
e armas brancas.
O traumatismo carotídeo remonta aos primórdios da humanidade pois verifica-se que já o homem das cavernas relatava traumatismo do pescoço através das pinturas rupestres. Mais ainda,
o primeiro relato escrito foi à aproximadamente
5000 anos nos papiros de Edwin Smith 1.
No que se refere à primeira intervenção relativa a
feridas penetrantes na região do pescoço, data de
1552 pelo francês Ambrosio Paré, que ligou a artéria carotídea à veia jugular de um soldado ferido
no campo de batalha 2.
Existem ainda registos de que, em 1803, um cirurgião britânico (Fleming) procedeu à correcção
cirúrgica com êxito da artéria carótida comum. Já
em 1811 Albernathy realiza novamente este procedimento, no entanto com pouco êxito, tendo
o paciente ficado hemiplegico e falecido poucos
dias após a cirurgia 3.
É importante salientar que nos últimos anos houve um grande avanço no que concerne ao corpo de
conhecimentos referente aos tratamentos e intervenções perante os pacientes traumatizados. Assim,
conhecimentos mais aprofundados sobre a fisiopatologia dos distúrbios hidroeletrolíticos, introdução de novas técnicas de diagnóstico e suporte ao
grande traumatizado, permitem reduzir progressivamente as taxas de mortalidade destes pacientes.
CASO CLÍNICO:
Homem, 34 anos encontrado pela esposa caído
na banheira, com hemorragia activa na região
cervical direita após tentativa de suicídio com
arma de fogo municiada com balas. À chegada
da equipa de emergência, a vítima encontrava-se inconsciente, com hemorragia activa. No
local foram efectuados os passos preconizados
pela escala de prioridades de advanced trauma
life support (ATLS). No momento da admissão
no Serviço de Urgência, a vítima encontrava-se
CIÊNCIA & TÉCNICA
hemodinamicamente instável, tendo recuperado após administração de medidas de suporte.
Ficando consciente, alerta e aparentemente
sem sinais neurológicos que sugerissem défi-
ces centrais para além disso apresentava penso compressivo na região cervical esquerda. A
equipa decidiu proceder à exploração cirúrgica
imediata. No momento da abordagem, observou-se um esfacelo grave com perda importante de substância na região cervical esquerda,
sem hemorragia activa. Procedeu-se então à
dissecação e referenciação da artéria carótida
comum, artéria carótida interna e externa. Era
evidente lesão punctiforme na artéria carótida
comum com fragilização da sua parede, poupando a bifurcação e artérias distais, que, tal
como a artéria carótida comum, eram pulsáteis.
Após a arteriotomia da artéria carótida comum
e confirmação das lesões endoteliais optou-se
pela recessão do segmento de artéria carótida
comum lesado. Seguidamente realizou-se um
enxerto de interposição com veia safena interna invertida. Ao fim de quinze dias a vítima
apresenta enxerto vascular permeável, confirmado por ecodoppler e angiografia, não apresentando défices neurológicos.
TRAUMATISMO CAROTIDEO:
O pescoço é a região do corpo que veicula a cabeça ao tronco, tendo a forma de cone invertido. Do
ponto de vista estritamente anatómico o pescoço
pode dividir-se em sector central ou região raquideana, sector posterior ou região da nuca e sector
anterolateral, este último é o sector mais importante, pois é nele que se localizam as estruturas
mais importante do pescoço 4.
O pescoço representa cerca de 1% da superfície
corporal, e pela sua disposição topografica encontra-se protegido pela coluna vertebral, maxilar inferior, externo e ombros que perante uma
ameaça o protegem, fletindo 5,6.
A artéria carotídea comum tem a sua origem na
artéria aorta à esquerda e no tronco braquiocefálico à direita dividindo-se posteriormente em
artéria carotídea externa e interna 7.
As lesões dos vasos do pescoço constituem 10%
do total das lesões vasculares, sendo que mais
de 95% destas são causadas por traumatismos
penetrantes. A artéria carótida comum é o segmento arterial lesado com mais frequência levando em cerca de 17% dos casos à morte.
A incidência de défice neurológico nestas vítimas
é de aproximadamente 40%, estas alterações fazem com que cada vez se preconize um melhor
atendimento das vítimas no meio pré-hospital 8.
As lesões da artéria carotídea podem ser classificadas como fechadas, penetrantes ou iatrogénicas. De seguida explicaremos sucintamente
cada um dos diferentes tipos de lesões carotídeo,
o traumatismo carotídeo fechado é provocado
por forças de aceleração / desaceleração, em
acidentes automobilísticos ou quedas em altura.
O traumatismo carotídeo penetrante verifica-se
quando objectos cortantes, punctiformes e perfurante ou projécteis de arma de fogo, cruzam o
esternocleidomastoideu 8. O traumatismo iatrogenico advém de procedimentos radiológicos endovasculares e de técnicas cirúrgicas complexas
na região cervical
As feridas penetrantes são as mais frequentes e
também as mais graves 5. Segundo Britt & Peyser,
as lesões provocadas por arma branca são menos
graves do que as provocadas por arma de fogo,
porque estas apresentam muitas vezes um trajecto imprevisível. Para além disso, a energia cinética
gerada e dispensada nos tecidos é um factor importante para determinar a morbilidade e a mortalidade da vítima. Neste sentido, a severidade
das lesões é determinada através de vários factores, tais como a velocidade do projéctil, o tipo de
arma e a distância entre esta e a vítima 9.
INTERVENÇÃO CLÍNICA DE ENFERMAGEM NO
CONTEXTO PRÉ-HOSPITALAR:
Segundo Sousa a intervenção clínica no contexto
pré-hospitalar tem por objectivo garantir, à população a prestação de cuidados de saúde em situações
de doença súbita e/ou acidente, assegurando por todos os meios disponíveis a mais correcta abordagem
e estabilização da vítima no local do acidente, o seu
acompanhamento e vigilância durante o transporte
até à recepção em unidade de saúde adequada. A
imprescindibilidade da intervenção dos enfermeiros
decorre deste compromisso.
Ainda de acordo com o autor supracitado, o enfermeiro possui formação humana, técnica e científica adequada para a prestação de cuidados em
qualquer situação, particularmente em contexto
47
SETEMBRO 2012
CIÊNCIA & TÉCNICA
48
de maior complexidade e constrangimento, sendo detentor de competências específicas que lhe
permitem actuar de forma autónoma e interdependente, integrado na equipa de intervenção de
emergência, em rigorosa articulação com os Centro de Orientação de Doentes Urgentes (CODU) e
no respeito pelas normas e orientações internacionalmente aceites.
Assim, a Ordem dos Enfermeiros emitiu as seguintes orientações para as intervenções do enfermeiro no pré-hospitalar:
1.Actuar sempre de acordo com o seu enquadramento legal, procurando assegurar, no exercício das suas competências, a estabilização do
indivíduo, vítima de acidente e/ou doença súbita, no local da ocorrência, garantindo a manutenção das funções vitais por todos os meios à
sua disposição;
2.Garantir o acompanhamento e a vigilância durante o transporte primário e/ou secundário
do indivíduo vítima de acidente e/ou doença
súbita, desde o local da ocorrência até à unidade hospitalar de referência, assegurando a
prestação de cuidados de enfermagem necessários à manutenção/recuperação das funções
vitais, durante o transporte;
3.Assegurar a continuidade dos cuidados de enfermagem e a transmissão da informação pertinente, sustentada em registos adequados, no
momento da recepção do indivíduo vítima de
acidente e/ou doença súbita, na unidade hospitalar de referência;
4.Garantir adequada informação e acompanhamento à família do indivíduo vítima de acidente e/ou doença súbita, de forma a minimizar o
seu sofrimento;
INTERVENÇÃO PRÉ-HOSPITALAR NA VITIMA
DE TRAUMATISMO CAROTIDEO:
O atendimento pré-hospitalar dos pacientes vítimas de traumatismo carotídeo deve ser considerado uma das partes mais importantes do tratamento, mas na literatura consultada e um dos
mais descorados 11.
Segundo Massada deve dar-se ênfase ao atendimento pré-hospitalar da vítima de traumatismo carotídeo. Aquando da chegada ao local da
CIÊNCIA & TÉCNICA
equipa de emergência o inicio da actuação deve
incidir na manutenção da segurança do paciente e da equipa. Assim, deve seguidamente preceder à interrupção do processo de lesão traumática, não retirando a agente causante caso
este ainda esteja cravado na vítima, ou efectuar
ao tamponamento.este procedimentos devem
ser orientados com base nos cinco passos de
ordem de prioridades (A.B.C.D.E.) envolvidos na
avaliação ou exame primário conforme preconiza o prehospital trauma life support (Phtls) e o
advanced trauma life support (ATLS) e por fim
deve efectuar-se o examesecundário, também
conhecido por (C.H.A.M.U.) 17.
Passamos seguida a descrever sumariamente os
cinco passos de ordem de prioridades que devem ser consideradas na abordagem a vítima.
A – Via aérea: Ao primeiro contacto com o paciente a sua via aérea deve ser avaliada e permeabilizada, juntamente com a estabilização da coluna
cervical. Sinais objectivos de complicações pulmonares, edema acentuado da face e orofaringe
indicam a necessidade de entubação orotraqueal
imediata ou utilização de outro dispositivo avançado para assegurar a permeabilização da via aérea e ventilação mecânica 13. Assegurada permeabilidade da via aérea, o paciente deve ser afastado
da fonte causadora do trauma, caso esta ainda o
ponha em risco.
B – Ventilação: Após assegurar a permeabilidade
da via aérea, o paciente deve ser avaliado quanto
à respiração. Caso esteja entubado a ventilação
mecânica é mandataria. O fornecimento de oxigénio suplementar deve ser sempre realizada,
seja por máscara de alto débito ou ventilação
mecânica.
C – Circulação: É fulcral a existência de acessos
venosos periféricos de grande calibre, devendo
ser colocados pelo menos dois cateteres intravenosos periféricos com o calibre mínimo 16G,
preferencialmente no antebraço. Caso não seja
possível, considerar flebotomia em safena, punção venosa central ou uma punção intra-óssea,
para que se possa iniciar reposição volémica.
Este tipo de pacientes necessitam de reposição
de grandes quantidades de líquidos em virtude
de o seu maior problema ser a hipovolémia, (tabela 1).
Tabela 1: Classificação do Choque Hipovolémico
segundo a American College of Surgeons
Classe I
Classe II
Classe III
Classe IV
Até 750
750-1500
1500-2000
Acima
2000
Até 15%
15 a 30%
30 a 40%
Acima 40%
Inferior a
100
Acima 100
Acima 120
Acima 140
Pressão de Pulso
(mmhg)
Normal ou
Aumentada
Diminuída
Diminuída
Diminuída
Frequência Respiratória
14-20
20-30
30-40
Acima 35
Perda
(ml)
Sanguínea
Perda
(%)
Sanguínea
Frequência
díaca
Car-
Diurese (ml/h)
Acima de
30
20 a 30
5 a 15
Desprezível
<l
Estado mental
Levemente
ansioso
Moderadamente
ansioso
Ansioso /
confuso
Confuso /
letárgico
Reposição
mica
Cristalóide
Cristalóide
Cristalóide
e sangue
Cristalóide
e sangue
volé-
É relevante salientar que o choque causado pelo
traumatismo carotídeo desenvolve-se instantaneamente 11. Deve dar-se primasia a soluções isotônicas para reposição líquida inicial. Neste sentido o
Lactato de Ringer deve ser a escolha inicial, sendo
a Solução Salina Fisiológica vulgo Soro Fisiológico, a segunda escolha (pois pode ser um causador
potencial de acidose hiperclorêmica em indivíduos com função renal comprometida).
O volume líquido inicial deve ser administrado tão
rápido quanto possível, um a dois litros no adulto
(ver tabela 2).
Tabela 2: Resposta à reposição volémica inicial
Resposta Rápida
R e s p o s t a
Sem Resposta
Transitória
Retorno ao
Normal
Melhora
transitória;
recidiva de
queda de TA
e FC
Continuam
anormais
Perda Sanguínea
Estimada
Mínima (10 a
20%)
Moderada a
persistente (20
a 40 %)
Grave (acima de
40%)
Necessidade de
mais Cristalóides
Baixa
Moderada a alta
Alta
Tipado e com
prova cruzada
Tipo específico
(AB0 e Rh)
Liberado em
carácter de
Emergência
Possível
Provável
Muito provável
Sim
Sim
Sim
Sinais Vitais
Sangue
Necessidade
Cirurgia
de
Presença precoce
do Cirurgião
Esquema 1: Algoritmo de intervenção do choque hipovolémico no paciente traumatizado
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CIÊNCIA & TÉCNICA
FORMAÇÃO
SETEMBRO 2012
ENTRADA DO ARTIGO NOVEMBRO 2009
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Após a estabilização da circulação da vítima deve-lhe ser colocado o colar cervical. 15.
D – Disfunção Neurológica: Procede-se ao exame neurológico do paciente avaliando o nível de
consciência, diâmetro, simetria e fotoreatividade
das pupilas, avaliação da vítima de acordo da Escala de Coma de Glasgow e possíveis défices motores e sensitivos.
E – Exposição e Controlo Térmico: Após a completa realização do “ABCD” o paciente deve ser totalmente exposto afim de se identificarem lesões
aparentes e, posteriormente, coberto com cobertor térmico para evitar a hipotermia. A analgesia
deve sempre ser iniciada no ambiente pré-hospitalar com a utilização de opiáceos intravenosos14,16.
E relevante salientar importância do tamponamento do local do sangramento afim de prevenir
a hipovolémia. A avaliação da área lesada e a administração vigorosa de fluidos são prioritárias
no atendimento inicial pré-hospitalar.
Durante este procedimento deve ter-se em conta
o algoritmo de intervenção do choque hipovolémico no paciente traumatizado (Ver Imagem 1)
Após a realização do exame primário deve-se
efectuado o C.H.A.M.U. ou exame secundário,
C – Circunstâncias que levaram à lesão – como
ocorreu, o que o proporcionou, agentes causantes;
H – História clínica – devem ser questionados todos
os antecedentes patológicos e cirúrgicos da vitíma;
A – Alergias medicamentosas – medicamentos a
que a vitima é alergia, que impeçam o seu uso durante a abordagem;
M – Medicação domiciliária – deve ser do conhecimento da equipe de saúde para possíveis despistes
de patologia associada bem como sobredosagem;
U – Última refeição – hora da ultima refeição em
virtude de haver alguns exames complementares de
diagnostico que devem ter algumas horas de jejum17.
Depois da realização de todas as manobras anteriormente relatadas e o paciente se encontrar
estabilizado, deve imobilizar-se a vítima através
da sua colocação em plano duro com os devidos
imobilizadores de cabeça e aranha, devendo ser
transportada o mais rapidamente possível para
um hospital diferenciado que possa dar resposta
ao seu actual estado 12.
REFLEXÃO FINAL:
O traumatismo carotídeo resulta frequentemente de lesão penetrante punctiforme que na maioria das vezes leva a uma grande morbilidade ou a
morte, o caso clínico relatado foi um dos casos de
sucesso que após tentativa de suicídio por arma
de fogo munida de cartucho o paciente conseguiu
sobrevier e sem sequelas de maior.
Apesar do traumatismo carotídeo representar
apenas 5% de todos os traumatismos vasculares
este é dos traumatismos que mais coloca em risco
a vida da vítima, neste tipo de lesões 70% de estas
lesões são provocadas por arma de fogo simples,
20% por arma branca, 5% por arma de fogo de
carga múltipla e 5% por traumatismo fechado18.
Assim pode concluir-se que este tipo de lesão necessita de uma intervenção rigorosa e adequada
no pré-hospitalar, caso contrario a probabilidade
das vítimas ficarem com lesões irreversíveis são
altas, para além de aumentar grandemente a s
taxas de mortalidade dos pacientes.
A FORMAÇÃO E O DESENVOLVIMENTO
ORGANIZACIONAL
ANDREA JOANA RESENDE DA SILVA
Enfermeira especialista em enfermagem médico-cirúrgica. Centro Hospitalar de Entre o
Douro e Vouga – Hospital S. Sebastião, UCIP.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS:
51
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RESUMO
Com o objectivo de alcançar um maior desenvolvimento, as organizações necessitam de recorrer
a diversas estratégias para enfrentar mudanças, a
formação é o meio ideal. É um processo que assenta num diagnóstico de necessidades de formação
e todo o processo deve conduzir efectivamente a
uma mudança de comportamentos e atitudes. Os
enfermeiros, fazendo parte de uma organização
cujo objectivo é prestar cuidados com qualidade,
devem realizar formação permanente. A formação do enfermeiro é contínua e deve ser planeada
e programada.
PALAVRAS-CHAVE Organização, formação, mudança, desenvolvimento.
ABSTRACT
In order to achieve further development, organizations need to use different strategies to cope
with changes, training is the ideal way. It is a process that is based on an assessment of training
needs and the whole process should lead to an
actual change in behavior and attitudes. Nurses,
as part of an organization whose aim is to provide quality care, should conduct ongoing training. Nursing education is ongoing and should be
planned and scheduled.
KEYWORDS Organization, training, change, development
SETEMBRO 2012
FORMAÇÃO
52
INTRODUÇÃO
O mundo de hoje caracteriza-se por um ambiente
em constante mudança. O ambiente que envolve as organizações é extremamente dinâmico,
exigindo delas uma elevada capacidade de adaptação como condição básica de sobrevivência. A
tendência natural de toda organização é crescer e
desenvolver-se. A eficiência da organização relaciona-se indirectamente com esta capacidade de
sobreviver, de se adaptar.
O desenvolvimento organizacional é uma resposta da organização às mudanças. É um esforço
educacional muito complexo, destinado a mudar
atitudes, valores, comportamentos e a estrutura
da organização, de tal maneira que esta se possa
adaptar melhor às novas conjunturas, mercados,
tecnologias, problemas e desafios que surgem.
Visa a clara percepção do que está a ocorrer nos
ambientes interno e externo da organização, a
análise e decisão do que precisa ser mudado e a
intervenção necessária para provocar a mudança, tornando a organização mais eficaz, perfeitamente adaptável às mudanças e conciliando as
necessidades humanas fundamentais com os objectivos e metas da organização.
Com o objectivo de alcançar um maior desenvolvimento, necessitam de recorrer a diversas estratégias para enfrentar essas mudanças, a formação
é o meio ideal para essa busca. O sucesso de uma
empresa face às sucessivas mudanças, cada vez
mais rápidas e em maior quantidade, depende da
preparação do seu pessoal. A formação, enquanto
veículo para a aquisição e actualização das competências, constitui uma alavanca fundamental
para o desenvolvimento das organizações e para
a qualidade do emprego.
A formação é um processo, formal ou informal,
de aquisição de conhecimentos, atitudes e comportamentos com relevância para a actividade
exercida e para o desenvolvimento pessoal e organizacional. Este processo engloba a reciclagem
ou actualização de conhecimentos anteriormente adquiridos, bem como o reforço de atitudes
e comportamentos desejáveis para o contexto
organizacional. Assim, encarando a formação
como um instrumento de gestão de recursos hu-
FORMAÇÃO
manos, ela deve estar enquadrada na estratégia
da organização e deve assentar num diagnóstico
de necessidades de formação e todo o processo
deve conduzir efectivamente a uma mudança de
comportamentos e atitudes – Mudança no desenvolvimento. Desta forma, pode dizer-se que
a formação tem como objectivos: melhorar o
desempenho de um indivíduo para uma função,
proporcionar desenvolvimento pessoal (como
preparar o individuo para outro cargo), ou seja, o
grande objectivo da formação é maximizar a eficácia e o desenvolvimento organizacional.
Segundo Câmara (2001) o processo de formação
passa por várias fases: diagnóstico de necessidades, concepção da formação, pré-avaliação,
follow-up e avaliação.
Diagnosticar necessidades de formação implica
conhecer os objectivos estratégicos da organização e pontos facilitadores e dificultadores da sua
execução, identificar lacunas existentes para que
a formação incida sobre esses aspectos, Não basta fazer formação por fazer, importa colmatar as
falhas.
O planeamento da formação deve partir da
análise das situações problema levantadas. A elaboração do plano deve definir claramente os objectivos da formação e priorizar as necessidades
para que a formação seja adaptada às verdadeiras
necessidades da organização.
Após a implementação da formação deve ser
efectuada uma pré-avaliação dos resultados da
formação. Verificar até que ponto os objectivos
previamente definidos foram alcançados e se
necessário realizar os ajustes considerados pertinentes, pelo responsável da formação, que deve
acompanhar todo o processo. Esta etapa é importante, na medida em que vai garantir a manutenção do grau de desenvolvimento alcançado com
a formação.
A avaliação tem o objectivo de verificar se realmente houve melhoria no desempenho, pois só
assim a formação poderá ser considerada um
investimento (individual e organizacional) e não
apenas um custo.
Uma unidade de saúde é um exemplo de organização e como tal deve ser gerida tendo em conta
esses pressupostos. Considera-se em alguns serviços, principalmente nos públicos, que a educação tende a elevar o nível do pessoal e, portanto,
o seu desempenho.
Os enfermeiros, fazendo parte de uma organização cujo objectivo é prestar cuidados com qualidade, devem realizar formação permanente. A
formação deve ser incentivada com ajuda de custos e facilitando a formação. A parte a ser custeada, a adequação de horários e outras facilidades e
incentivos dependem do interesse e da prioridade
que o projecto pessoal tiver para a organização,
mas deve fazer parte da política global da área de
recursos humanos. A formação do enfermeiro é
contínua e deve ser planeada e programada, com
mobilização dos meios adequados, de modo a incentivar o desenvolvimento do seu perfil profissional. (Lei n.º 9/95/M de 31 de Julho REGIME DA
CARREIRA DE ENFERMAGEM). À formação inicial
deve ser acrescentada um conjunto de acções
educativas, colectivas ou individuais, facilitadoras e aconselhadas aos trabalhadores no decurso
da sua carreira profissional, com o objectivo de
melhorar a sua competência profissional.
Desde a primeira decisão tomada a respeito dos
recursos humanos, como é o caso da necessidade
de formação, deve-se avaliar o que ocorre. A dificuldade começa ao definir o que será avaliado,
quem irá avaliar e como avaliar. Na minha opinião,
por um lado, os trabalhadores têm pouco interesse em comunicar mudanças nas suas vidas, por
outro, os superiores não se sentem confortáveis
ao avaliar os seus subordinados. A avaliação de
recursos humanos requer uma apreciação global.
O conteúdo técnico deverá estar sob a responsabilidade dos supervisores imediatos, supondo que
estes tenham conhecimento técnico suficiente
para fazê-lo e conhecimento das normas mais actualizadas e o trabalhador sempre que sentir a necessidade de mudar/adquirir novas competências
deve fazer-se ouvir para que estas sejam colmatadas. A avaliação de desempenho não deve ser feita por ser descrita como necessário em qualquer
manual de recursos humanos. Esta, justifica-se
caso haja o interesse em interferir na realidade
apontada por ela, de forma que no final haja uma
53
melhoria dos resultados.
Em 1988, os especialistas da OMS definiram vários princípios sobre a formação contínua, dos
quais se destacam:
• - Deve realizar-se sobretudo em serviço
• - É um instrumento de mudança
• - É da responsabilidade de todos, individual e
corporativamente, para dar a melhor resposta
possível às necessidades da população
• - Tem como elementos chave: a motivação e a
participação implicando: a multidisciplinaridade, trabalho em equipa e liderança.
• Ainda segundo a OMS, a formação contínua
deve desenvolver-se tendo em conta 4 elementos:
• - Os profissionais são mais do que técnicos
qualificados, têm de ser reflexivos, actuar
como investigadores, constituir experiências
PUB
FORMAÇÃO
e aprender com elas. Têm que, para além da
informação e conhecimentos metodológicos,
serem capazes de assumir a complexidade da
realidade em que os doentes são os protagonistas.
• - Aprender é mais que acumular informação, é
também desenvolver um processo criativo de
solução de problemas.
• - Aprender e mudar são duas faces da mesma
realidade
SETEMBRO 2012
• - A educação contínua está ligada à transformação das competências profissionais, tem de
haver colaboração activa do formando em todas as fases do processo formativo.
54
• Desta forma, a mudança deve ser efectivamente mensurável, através de uma avaliação
posterior, na melhoria de qualidade da prestação de serviços.
• O sistema formativo do Ministério da Saúde
salienta:
• - A necessidade de se alargar o campo das áreas de intervenção a novas temáticas, como
seja o da qualidade e da humanização da saúde;
• - A necessidade de consolidar a qualidade da
função de formação nomeadamente através
da valorização e desenvolvimento da formação de formadores, das respectivas competências pedagógicas e técnicas, dado o efeito
estruturante da intervenção de todos estes
agentes no processo formativo;
• - A necessidade de se diversificarem os destinatários da formação, reforçando, na própria
composição dos grupos, a multidisciplinaridade;
• - A necessidade de progressivamente se vir
a encarar a formação como um instrumento
para melhorar a gestão organizacional, contribuindo decisivamente para uma melhoria
da qualidade dos serviços onde se inserem os
formandos.
• Em suma, é evidente que o desenvolvimento
organizacional está directamente associado
ao desenvolvimento formativo, pois do primeiro depende a reunião de condições para o
avanço do segundo culminando num aumento
de qualidade da empresa.
Revendo todos estes conceitos de gestão organizativa dentro do universo da Enfermagem, no
qual me encontro, constata-se que nem sempre
estes modelos são postos em prática, Câmara
(2001) identificou de facto os passos ideais para
a optimização da formação mas gerir esses passos implica uma definição de prioridades que
inclua a formação como um factor essencial no
melhoramento de cuidados. Não raras vezes a
formação do enfermeiro fica ao cargo deste, não
existindo envolvimento do hospital na motivação, escolha ou organização dessa mesma formação. O diagnóstico de necessidades é efectuado numa fase inicial, em cada serviço, carecendo
de um desenvolvimento posterior, não se adaptando aos progressos científicos e tecnológicos.
Concepção de formação, pré avaliação e todos
os outros passos são inicialmente definidos mas
revistos muito tardiamente em todos os serviços. A formação é muitas vezes posta de lado
em prol da produção ou custos. Não sendo uma
regra, algo que aconteça em todos os serviços, é
no entanto algo que sucede mais do que o desejado. As normas e recomendações das várias organizações e vários “experts” em gestão organizacional definem formação como algo vital para
o desenvolvimento de uma empresa. No caso da
saúde considero algo vital para a humanidade,
logo não pode nunca ser ultrapassada ou ignorada em prol de algo como rendimentos a curto e
médio prazo pois o preço a pagar a longo prazo é
impossível de pagar.
Quero com esta reflexão final destacar a importância da gestão a todos os níveis numa empresa,
mas em Enfermagem a gestão formativa não é só
importante… é vital!
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CAMARA, P. [et al] – Humanator. Recursos humanos e sucesso empresarial, 2ª
ed, 1998.Lisboa: Publicações D. Quixote, 1997. ISBN 972-20-2020-4.
DECRETO-LEI nº 50/98. D.R.I SÉRIE. 59 (98-03-11) 44-950. LEI n.º 9/95/M. D.R.I
SÉRIE. 31 (95-07-95) 1019-1029.
PORTUGAL. Ministério da saúde. Departamento de recursos humanos da saúde
– Formação permanente.

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