Indonésia

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Indonésia
inDOnÉSiA
O processo de democratização da Indonésia, que se iniciou em 1998,
contribuiu de um modo determinante para a melhoria dos direitos
humanos no país. A maioria das comunidades religiosas locais é
reconhecida e opera livremente, isto apesar de algumas violações,
algumas das quais significativas, do princípio da liberdade de culto.
Líderes políticos e religiosos, bem como membros da sociedade civil,
referiram-se frequentemente à questão do lugar da religião na vida
política do país. A administração do presidente Susilo Bambang
Yudhoyono, o qual foi reeleito em 2009, deu passos importantes na
luta contra o terrorismo e a intolerância religiosa, especialmente nas
regiões mais sensíveis como Ambon e Sulawesi Central, promovendo
a paz na província de Aceh. Acima de tudo, esforçou-se por construir
um consenso abrangente para conduzir a Indonésia por um caminho democrático, ajudado em parte por um crescimento económico
numa altura de crise global.
Os grupos muçulmanos radicais e extremistas não têm ganho muito
apoio junto da população, como foi evidenciado pelas eleições parlamentares de Junho último que deram ao presidente cessante uma
vitória esmagadora. Pressões por parte de grupos marginais islâmicos
tiveram, no entanto, um impacto na agenda pública e nas políticas
do Governo, influenciando o comportamento e as actuações de juízes, magistrados do Ministério Público e políticos. Tal influência tem
sido exercida através de grupos de pressão privados, manifestações
de rua, ameaças e distúrbios populares que envolvem centenas, se
não mesmo milhares, de pessoas. Em 2008, isto produziu vários éditos ministeriais contra a comunidade Ahmadiyyah e a uma lei contra
a pornografia, lei essa inspirada na Sharia.
Grupos muçulmanos moderados, cristãos, hindus, budistas e outros
grupos religiosos e da sociedade civil tentaram opor-se à legislação
inspirada na Sharia, quer no Parlamento, quer nas ruas. Ao mesmo
tempo, o Governo nunca clarificou se planeia alterar as leis que interferem nos direitos dos denominados grupos heréticos ou rever regulamentos que de facto violam a liberdade religiosa.
Apesar dos melhores esforços por parte das autoridades, os ataques
e os actos de intimidação contra minorias religiosas, principalmente
por parte de movimentos e grupos muçulmanos radicais, continuaram a ocorrer. Na realidade, no país muçulmano mais populoso do
mundo, tanto os cristãos como alguns muçulmanos como, por exem-
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Muçulmanos79%
Cristãos11,8%
Animistas2,6%
Outros6,6%
Cristãos
29.085.930
Católicos
6.881.000
Circunscrições
eclesiásticas
38
SUPERFÍCIE
1.904.569km2
POPULAÇÃO
232.517.000
REFUGIADOS
798
DESALOJADOS
70.000-120.000
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Enquadramento político e institucional
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plo, os Ahmadiyyah, foram alvo de violência, os últimos porque são considerados heréticos
pelas principais correntes muçulmanas. Embora a Constituição reconheça a liberdade de
culto como um direito básico, algumas leis nacionais e das províncias, como a lei sobre a
blasfémia e as autorizações de construção que são requeridas para a edificação de igrejas,
foram usadas contra minorias.
Este clima de tensão foi confirmado num estudo elaborado pelo Instituto Setara para a
Democracia e a Paz, um grupo activista que conduziu a luta pela tolerância religiosa e pelos
direitos humanos. O P. Antonius Benny Susetyo, secretário executivo da Comissão Episcopal
para os Assuntos Inter-religiosos, é membro do Instituto. No ano passado, registaram-se mais
de 200 incidentes nos quais a liberdade religiosa foi violada. Agências estatais estiveram
envolvidas em 139 casos, sendo que em 101 destes os funcionários públicos tiveram um papel
‘activo’. Os outros trinta e oito foram casos de omissão. De igual modo, o Instituto encontrou
quarenta e oito casos de conspiração envolvendo a polícia. Outros casos envolveram o Ministério de Assuntos Religiosos (catorze casos), presidentes de câmara locais (oito casos), líderes
de Regência (distrito) (seis casos) e de tribunais (seis casos). Membros do Conselho dos Ulamas da Indonésia (MUI) estiveram envolvidos em vinte e nove casos nos quais a liberdade
religiosa foi violada; extremistas da Frente de Defensores Islâmicos (FPI) estiveram envolvidos em nove casos; e o Fórum da Comunidade Islâmica esteve envolvido em seis casos.
Com trinta e três ataques, os Ahmadiyyah voltaram a ser o grupo mais perseguido em 2009.
Os cristãos viram a sua liberdade religiosa ser violada em doze casos, seguidos de perto por
membros de uma seita, Satria Piningit Weteng Buwono, que foi alvo de dez ataques. Porém,
o número global de ataques decresceu em comparação a 2008, quando o Instituto Setara
registou 256 incidentes.
O Instituto Wahid, cujo nome vem de Abdurrahman Wahid, ex-presidente indonésio e antigo
dirigente do Nahdlatul Ulama (NU), uma organização islâmica com cerca de vinte milhões
de membros, também se concentrou no fundamentalismo existente no país. Para o NU, a
intolerância religiosa é, em grande medida, uma função de grupos muçulmanos extremistas
como o FPI e o MUI. Não obstante, a Indonésia conta com um número importante de crentes, intelectuais e líderes religiosos muçulmanos moderados, que consideram inaceitável o
crescimento do fanatismo religioso, o que se relaciona directamente com as campanhas de
islamização elaboradas por grupos extremistas.
Ataques anti-católicos
Nos primeiros seis meses de 2009, apesar da ausência de casos graves de perseguição contra
católicos indonésios, uma atmosfera de desconfiança continuou a envolver as organizações
e institutos católicos, tornando difícil levarem a cabo o seu trabalho em nome dos deficientes e dos marginalizados. No início de Julho, por exemplo, grupos muçulmanos impediram a
continuação da construção de uma casa para crianças deficientes em Java Oriental, ostensivamente por medo de que pudesse ser usada para proselitismo cristão. A construção decorria
em Junrejo, nos arredores de Batu (Malang, Java Oriental) e estava quase pronta a receber
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crianças com autismo, problemas mentais e outras inaptidões. O projecto fora ideia da Fundação Bakti Luthur (FBL), uma organização sem fins lucrativos gerida pelo Instituto Sekulir
Alma, uma instituição feminina laica. No dia 19 de Junho, o presidente da Câmara da cidade,
Eddy Rumpoko, revogou a sua licença de construção no seguimento de protestos por parte
de mais de 1000 muçulmanos locais. A Irmã Chatarina Sulasti, que é membro do Instituto,
rejeitou as alegações de proselitismo. Falando para a AsiaNews, ela afirmou que “ao tratar
dos nossos doentes, não mostramos nenhuma preferência, seja qual for a sua religião.” O P.
Heru Susanto, pároco em Batu, concordou com a religiosa. Segundo ele, o projecto era bom.
“Não há nenhum outro propósito”, insistiu, além do de proporcionar “cuidados carinhosos a
crianças com necessidades especiais.”
Apesar da oposição por parte de um grupo marginal da população muçulmana da Indonésia, a Igreja Católica lançou várias iniciativas a favor dos mais necessitados e nunca deixa de
ajudar em situações de emergência, como terramotos, que são uma ocorrência frequente no
arquipélago indonésio. Setembro foi um desses casos. Quando um terramoto de 7.3 atingiu
Tasikmalaya (província de Java Ocidental) em 1 Setembro, matando mais de setenta pessoas
e ferindo quase um milhar, os católicos agiram depressa, mostrando a sua solidariedade para
com as vítimas. Recolheram todos os tipos de bens básicos, tendas, artigos domésticos, e
enviaram-nos para o local, juntamente com o dinheiro que conseguiram angariar para ajudar
as vítimas. Além disso, essa acção foi impulsionada através de intensas trocas por e-mail e na
rede social Facebook. De igual modo, não só os crentes na diocese do Monsenhor Johannes
Pujasumarta, Bispo de Bandung, responderam “com entusiasmo” ao seu apelo, como inúmeros católicos fizeram o mesmo por toda a Indonésia. Em Jacarta e Lampung, todas as
paróquias recolheram dinheiro, roupas, produtos alimentares não perecíveis e ferramentas.
No dia 30 de Setembro, outro terramoto devastou Padang Pariam, uma região em Sumatra
Ocidental, semeando a morte e a destruição, provocando milhares de vítimas. Também aqui,
a Igreja pôs em movimento o seu próprio mecanismo de ajuda, alcançando aldeias nalgumas das zonas mais remotas do país para impedir surtos de doenças infecciosas. A Caritas
Indonésia providenciou apoio ao pessoal médico e coordenou as actividades de salvamento
e a distribuição de alimentos “sem distinções baseadas na afiliação étnica ou na convicção
religiosa.”
No dia 19 de Outubro, a AsiaNews informou que, em Purwakarta (província de Java Ocidental), a Igreja Católica de Santa Maria tornou-se o centro de uma controvérsia. As autoridades
locais revogaram a licença de construção que tinham concedido dois anos antes, o que constituiu um choque para os católicos locais que já tinham preenchido todos os documentos
necessários e obtido todas as autorizações exigidas. Os funcionários indicaram que havia
algumas “irregularidades” no processo de candidatura inicial quando a licença de construção
foi concedida. No entanto, para os cristãos locais, isto foi tudo um “pretexto” para parar o
projecto.
Construir uma igreja na Indonésia, quer católica quer protestante, é um processo longo e
complicado que pode levar cinco, ou até mesmo dez anos. Tudo começa com a concessão de
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licença de construção (um Izin Mendirikan Bangunan ou IMB em língua [Bahasa] indonésia)
por parte das autoridades locais. Porém, as coisas são mais complicadas quando se trata
de locais de culto cristãos. Além do IMB, os cristãos precisam do apoio de alguns residentes
locais na zona onde querem construir uma igreja, bem como do apoio do Fórum de Diálogo
Inter-religioso. Mesmo assim, os funcionários podem bloquear os planos, citando “outras”
razões inexplicadas. Normalmente, estas outras razões são pressões por parte de residentes
muçulmanos locais ou de grupos radicais muçulmanos que agem por fanatismo religioso.
A certa altura, o jornal diário indonésio Tempo informou que o chefe do Distrito de Purwakarta,
Dedi Mulyadi, revogara uma licença que tinha sido concedida a residentes cristãos na aldeia
de Cinangka, sub-distrito de Bungur Sari, porque a candidatura apenas conseguira angariar
o apoio de quarenta e cinco residentes muçulmanos, em vez dos sessenta que são requeridos
por lei para um local de culto cristão, tanto católico como protestante. Face a esta recusa,
o Bispo de Bandung, na província de Java Ocidental, Monsenhor Johannes Pujasumarta Pr,
pediu a ambas as partes que se envolvessem num “diálogo entre pessoas de boa vontade”, o
que deveria ser “o modo para lidar com todos os assuntos de carácter social” incluindo o caso
da Igreja Católica de Santa Maria. Ainda assim, o prelado insistiu que neste caso particular
“fossem respeitados todos os regulamentos”, e que ele usaria de “todos os meios legais” ao
seu alcance para proteger os direitos dos católicos.
Na Ilha de Sumatra, uma capela católica foi finalmente inaugurada apesar de protestos por
parte da comunidade muçulmana local. Uma petição contra a estrutura circulou, arrastando
o Fórum para o Diálogo Inter-religioso local para o seio da controvérsia, embora este seja
normalmente usado enquanto jurisdição para reduzir as tensões.
Neste caso particular, o chefe do distrito local ordenara mesmo que o edifício fosse removido.
No entanto, a tenacidade de milhares de católicos em Pangkalan Kerinci, distrito de Pelalawan, Sumatra, foi suficientemente forte para superar a oposição. Assim, a capela foi inaugurada sem incidentes no dia 18 de Outubro. O Monsenhor Martinus Situmorang, Bispo de
Padang, conduziu a cerimónia de abertura oficial da Sala de Oração da Paróquia do Sagrado
Coração, em Pangkalan. No seu discurso, incentivou os católicos a serem pacientes e a manterem a sua fé, acentuando o modo como “o trabalho misericordioso de Deus acaba sempre
por vencer”.
Quando as obras da capela se iniciaram em 2002, os muçulmanos não se mostraram preocupados com a sua construção. No entanto, alguns dias antes da inauguração, espalharam-se
rumores de que os cristãos estavam a planear construir uma igreja. Isto enfureceu os muçulmanos locais que lançaram uma petição e começaram a distribuir panfletos anti-cristãos
com um conteúdo provocatório. Apesar de pressões por parte das autoridades locais e ameaças de muçulmanos radicais, o bispo decidiu ainda assim inaugurar a capela. Agora os católicos possuem um local onde podem rezar.
No caso da Igreja Católica de Santa Maria, os crentes em Java Ocidental tiveram de recorrer
aos tribunais em busca de justiça. Liona M. Supriatna, a advogada que, no dia 13 de Novembro,
entregou o caso no tribunal administrativo local (PTUN) em nome da comunidade católica,
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afirmou que as acusações eram “totalmente infundadas”, reafirmando que a diocese tinha
satisfeito todas as exigências, preenchido toda a documentação necessária para a construção, e obtivera ainda o “apoio de residentes locais.”
À medida que se aproximava o Natal, a violência contra a minoria católica escalou. Na noite
de 18 de Dezembro, uma multidão enfurecida de cerca de 1000 muçulmanos, incluindo
mulheres e crianças, entrou de forma violenta na Igreja Católica de Santo Alberto, na Regência de Bekasi, cerca de 30 km a Leste da capital do país, Jacarta. “Um grupo de motoqueiros
invadiu a área onde a igreja fica situada”, afirmou uma testemunha ocular. Alguns transportavam bandeiras e latas de querosene. Uma mulher confirmou que se encontravam mulheres e crianças entre os atacantes.
O incidente ocorreu poucos dias antes do Natal, por coincidência, no primeiro dia do Ano
Novo islâmico que também é o primeiro dia do mês de Muharram, um dia tradicionalmente
marcado por corridas de motocicletas e de automóveis.
A Igreja Católica de Santo Alberto, uma capela que se encontra sob a jurisdição da Igreja
Católica de Santo Arnaldo, em Bekasi, estava quase terminada. Autorizadas por uma licença
de construção devidamente emitida, as obras no edifício tinham começado no dia 11 de Maio
de 2008 e estavam já completas a cerca de 80%. Os trabalhadores tinham terminado há
pouco as paredes e o telhado, e preparavam-se para colocar os ladrilhos no chão. Embora
incompleto, o edifício preparava-se para ser palco da Missa de Natal para a comunidade católica local.
Ainda assim, apesar de toda a perseguição e intolerância que tiveram de suportar, os católicos nunca deixaram de intervir em acções que beneficiam toda a população indonésia, quer
se trate de lidar com desastres naturais ou passos mais abrangentes empreendidos em favor
do desenvolvimento.
Em Novembro, depois de auxiliarem os habitantes deslocados pelo tremor de terra em
Padang (Sumatra Ocidental), os activistas cristãos do Grupo Humanitário e de Caridade
(KBKK) lançaram um plano para a reconstrução e desenvolvimento da área devastada pelo
tremor de terra de 30 de Setembro. Aberto ao clero e aos leigos, o grupo de 400 pessoas
tem estado activo na Indonésia durante os últimos dez anos em zonas onde a necessidade é
maior. A fundadora da associação, Irene Setiadi, explicou que o KBKK foi criado para reunir os
crentes que desejam “servir a Igreja colocando-se a si próprios, as suas capacidades, as suas
experiências profissionais e os seus fundos à disposição das pessoas em necessidade, independentemente da sua fé ou do seu credo religioso.”
Do mesmo modo, os católicos tentaram ajudar os agricultores e operários, que frequentemente se encontram nas margens da sociedade indonésia por causa da falta de “influência
política”. De facto, ao longo dos anos, os agricultores assistiram à redução contínua das terras cultiváveis devido à ampla industrialização e viram-se confrontados com o aumento dos
custos das matérias-primas. Num local, Salatiga, uma cidade na Java Central, uma associação, presidida pelo P. John Wartaya Winangun SJ, director da KPTT, juntou cerca de quarenta
e cinco agricultores e operários numa série de reuniões e debates. O clérigo afirmou que é
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importante, não só partilhar os problemas, mas também desenvolver soluções comuns para
“melhorar a qualidade de vida.” Uma transmissão de conhecimentos em rede em defesa dos
trabalhadores é uma parte essencial, porque permite aos membros da rede a “promoção dos
seus produtos” e a “troca de ideias e de opiniões”.
O Cardeal Jean-Louis Tauran, presidente do Conselho Pontifício para o Diálogo Inter-Religioso,
também deu ênfase à importância da cooperação bem como do diálogo inter-religioso entre
os Cristãos e os Muçulmanos durante uma visita à Indonésia no final de Novembro. De facto,
“construir pontes para o diálogo não é uma opção, mas sim uma necessidade”, afirmou,
depois de conhecer figuras políticas de proa, bem como os líderes muçulmanos e católicos.
Durante a visita, o prelado visitou a Mesquita de Istiqlal, em Jacarta, o maior local de culto
muçulmano no Sudeste da Ásia, que se situa em frente da catedral católica da cidade.
O trabalho realizado pelos católicos é muito apreciado e amplamente reconhecido. Por exemplo, no início de Dezembro, o P. Johannes Jonga Pr, um padre indonésio de 51 anos de idade,
ganhou o Prémio Yam Thiam Hien de 2009. Este prémio é atribuído ao indivíduo que mais
se distinguiu a nível nacional na promoção da paz e do respeito pelos direitos humanos e da
dignidade humana. Pároco desde 2001 em Wairs, uma pequena cidade no Distrito de Keerom,
na fronteira com a Papua-Nova Guiné, conseguiu lidar com as tensões geradas por rebeldes
separatistas que operam naquela área, ao mesmo tempo que ajudava os necessitados. Também apoiou as reivindicações da população local que têm sido vítimas de abusos por parte
dos militares e de grandes empresas multinacionais.
Os cristãos, uma minoria perseguida
A Indonésia assistiu a um incremento do fundamentalismo islâmico desde os primeiros
meses de 2009. Isto aconteceu sobre um pano de fundo de iniciativas fortes por parte do
Governo do presidente Yudhoyono, o qual destacou unidades do exército e esquadrões antiterrorismo especiais para capturar os criminosos mais perigosos. Na véspera das eleições
nacionais e regionais do dia 9 de Abril, a comunidade cristã expressou grande preocupação
sobre o apoio crescente aos partidos islamistas, como o Partai Bulan Bintang (PBB) e o Partai
Keadilan Sejahtera (PKS), sendo que ambos querem impor a Sharia (lei islâmica) no país.
“Os receios católicos são justificados”, afirmou J. Kristiadi, analista político católico no Centro
de Estudos Estratégicos e Internacionais (CSIS) de Jacarta, porque a discriminação e a violência anti-cristãs estão a aumentar. Para Kristiadi, os partidos islamistas estão a ganhar terreno
por causa do declínio relativo da Pancasila, a filosofia estatal baseada em cinco princípios
que inspiraram o nacionalismo laico da Indonésia e moldaram o processo de construção da
nação depois da independência. Na realidade, “uma pesquisa feita por alguns partidos nacionalistas pretendeu demonstrar que 80% dos estudantes universitários desejam ver a Sharia
substituir a Pancasila”, afirmou Kristiadi.
O aumento das tensões conduziu a actos de violência. No dia 27 de Abril, a polícia encontrou
duas pessoas assassinadas, mortas com uma catana; foram elas o Reverendo Frans Koagow,
clérigo protestante de 64 anos, e a sua esposa, Femy Kumendong, de 73 anos. O casal vivia
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em Manado, capital da província de Sulawesi do Norte, uma zona predominantemente cristã
protestante. Depois do crime, a polícia “procurou dois homens que tinham chegado à casa de
Reverendo Koagow numa motocicleta”, reportou o jornal do Vaticano L’Osservatore Romano.
Significativamente, “Nada foi roubado às duas vítimas de assassinato, pelo que o roubo ou
a extorsão podem ser afastados enquanto possíveis motivos”, reportou a AsiaNews, citando
fontes policiais. Aparentemente, o Reverendo Koagow jantara com os dois assassinos num
quiosque situado perto de sua casa. Mais tarde, eles acompanharam-no a casa onde o assassinaram juntamente com a sua esposa.
Na maioria dos casos, a liberdade religiosa é violada, forçando o encerramento de locais de
culto e conseguindo que as autoridades revoguem licenças de construção que já tinham sido
emitidas. As autoridades normalmente acabam por ceder por medo de represálias por parte
de muçulmanos radicais que não hesitam, frequentemente, em importunar e chantagear.
No dia 23 de Julho, uma comunidade protestante em Parung, Regência de Bogor (Província de
Java Ocidental), queixou-se de que uma igreja local foi destruída depois de os funcionários
locais terem dito que “faltava a necessária licença de construção.” Em sua defesa, os paroquianos locais fizeram notar que tinham obtido o acordo por parte de comunidades muçulmanas locais e tinham solicitado várias vezes a licença, mas não tinham recebido nenhuma
resposta. O edifício foi assim destruído no dia 21 de Julho porque não possuía a licença (IMB)
requerida em tais casos.
Em meados de Agosto, o Jacarta Post publicou algumas histórias relativas à discriminação
que a comunidade cristã em Banten tem de enfrentar “todos os domingos”. De acordo com
um líder cristão local, Bedali Hulu, os crentes tinham andado “cheios de medo” durante os
dois meses anteriores por causa de ataques constantes por parte de “dezenas de membros
de organizações muçulmanas” durante as missas de domingo. Cerca de quarenta membros
da Igreja Baptista Cristã de Jacarta (GKBJ) “viviam sob pressão constante” e sujeitos a ameaças intermináveis por parte de homens armados com paus. “Como podemos nós rezar correctamente se temos um grupo das pessoas a gritar palavras ameaçadoras contra nós à porta
da nossa igreja?” perguntou Bedali.
No final de Outubro, porém, foi a polícia que esteve por detrás de um ataque contra estudantes da Escola Evangélica de Teologia Arastamar (SETIA), que se encontrava temporariamente
instalada no antigo edifício da Câmara Municipal, na parte Ocidental de Jacarta. A escola
tinha estado a utilizar aquelas instalações depois de se ver forçada, em Julho de 2008, a
abandonar o seu próprio campus em Kampung Makassar, a Leste da capital. Também aqui foi
expulsa, mas desta vez pela polícia. Além de tudo o mais, três dias depois do raide do dia 26
de Outubro, vários estudantes e professores foram acusados de resistir a um agente policial.
Tudo começara no Verão de 2008, quando uma multidão muçulmana atacou o campus original da SETIA na zona Leste de Jacarta, incitados por falsas acusações de que um estudante
cristão roubara a motocicleta a um muçulmano e de que os cristãos tinham erigido edifícios
ilegais. Forçados a abandonar a sua escola original, os estudantes e professores da SETIA
estabeleceram-se no antigo edifício municipal de Jacarta Ocidental.
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Defendendo a sua instituição, o reitor da SETIA, Sukowaluyo Mintorahardjo, rejeitou as acusações em como a sua escola tinha falsificado documentos para poder construir determinadas instalações, como alegaram alguns líderes muçulmanos.
Imediatamente antes do Natal, os ataques contra os locais de culto cristãos aumentaram,
alguns deles com o objectivo claro de impedir as celebrações do Natal. O International Christian Concern (ICC) informou sobre um ataque levado a cabo no domingo, dia 6 de Dezembro,
em Temanggung, Java Central. Fontes contaram ao Kristiani Pos, um jornal local, que uma
multidão “destruiu azulejos, retirou as janelas e as portas e depois incendiou” a igreja, porque
os muçulmanos locais se opunham à existência de um local de culto cristão na sua zona.
Um outro incidente ocorreu no complexo habitacional de Harapah Indah, em Bekasi. O
Jacarta Post relatou no dia 18 de Dezembro que os residentes tinham atacado uma igreja
em construção. Ninguém ficou ferido durante o caos, mas os danos na igreja e nos edifícios
circundantes foram enormes. Cerca de 1000 pessoas lançaram pedras à estrutura; “alguns
invadiram violentamente o edifício, pegando-lhe fogo”, afirmou o director do comité de construção de igreja. Nem sequer a intervenção da polícia local acalmou a situação. Apenas a
chegada de 100 polícias de Bekasi convenceu os extremistas a parar o ataque. Um indivíduo
foi preso por roubar “artigos da igreja durante o ataque”.
No dia 24 de Dezembro, algumas horas antes do início das cerimónias de Natal, forças de
segurança indonésias incrementaram medidas de segurança por todo o país, estendendoas das províncias mais em risco, como Java central e Java Ocidental, até abrangerem o país
inteiro. Em Java Ocidental, as autoridades destacaram mais de 10.000 agentes policiais, além
das tropas regulares. “O destacamento massivo da polícia e exército” foi realizado para prevenir “potenciais ataques terroristas”, afirmou Timur Pradopo, chefe da polícia de Java Ocidental. Alex Bambang Riatmodjo, chefe de segurança em Java Central, tomou medidas semelhantes. Mais de 11.000 agentes foram destacados, apoiados pelo exército.
Ainda assim, tais medidas provaram ser inadequadas para impedir ataques em Java Ocidental, onde uma igreja protestante foi forçada a fechar. Em Bekasi, centenas de manifestantes
saíram à rua na Véspera de Natal para impedir a realização dos serviços religiosos na Igreja
Protestante Filadelfia Huria Kristen Batak (HBKP). Na ocasião, encontravam-se dentro do edifício 279 pessoas.
O Compass Direct News relatou que durante os dias que se seguiram, os protestos continuaram, forçando as autoridades a agir. No dia 31 de Dezembro, um funcionário do distrito emitiu
uma ordem de encerramento da igreja, impedindo quaisquer cerimónias religiosas e pondo
fim aos trabalhos de renovação.
Minorias religiosas, vítimas de violência
A maior parte da violência de carácter confessional na Indonésia acontece por instigação de
grupos extremistas como a Frente de Defensores Islâmicos (FPI), o Movimento Aliança AntiApostasia (AGAP) e o Conselho de Mujahedeen da Indonésia (MMI). Nem sequer os juízes e
os funcionários locais têm sido poupados à sua fúria.
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Atacaram e destruíram edifícios propriedade de minorias, entre os quais igrejas cristãs, templos hindus, bem como mesquitas xiitas e Ahmadiyyah. Ameaçaram os muçulmanos “moderados” e todos aqueles que, na sua perspectiva, expressam as denominadas opiniões anticonvencionais ou heréticas sobre a fé islâmica. Forçaram lojas e negócios a fechar durante
o Ramadão. Além disso, não são os únicos. A Entidade Coordenadora da Supervisão das Fés
Públicas (Bakor Pakem) e o Conselho dos Ulamas da Indonésia (MUI) também são grupos
extremistas muito activos. Na sua lista de prioridades tem estado a tentativa de banir as
actividades dos Ahmadiyyah, a restrição dos casamentos mistos, a limitação do pluralismo
religioso e da liberdade de culto, bem como o reforço da legislação relativa à blasfémia.
No seu Relatório sobre a Liberdade Religiosa Internacional de 2008, o Departamento de Estado
Norte-Americano considerou que, com início em 2008, trinta e cinco mesquitas de Ahmadiyyah foram vandalizadas e vinte e um outros centros ou locais de culto religiosos foram
forçados a encerrar.
No dia 2 de Junho de 2009, uma mesquita Ahmadiyyah no Sul de Jacarta foi incendiada por
indivíduos não identificados durante as orações matinais. Ninguém ficou ferido durante o
incidente, mas também não foi efectuada nenhuma apreensão. Em Agosto de 2009, membros do Fórum Comunitário Muçulmano de Ciputat (FMCC) vedaram o acesso a uma mesquita Ahmadiyyah na cidade de Tangerang do Sul, na Província de Banten, acusando os seus
membros de proselitismo. Também em Agosto de 2009, uma multidão enfurecida vandalizou uma mesquita Ahmadiyyah em Sukabumi e encerrou uma outra em Cianjur, Java Ocidental. Em Outubro de 2009, uma multidão destruiu a Mesquita de Mubarak, na aldeia de
Medan, província de Riau, depois da celebração do Eid al-Fitr.
A seita é discriminada porque é considerada herética pelos muçulmanos regulares uma vez
que não considera Maomé como sendo o último profeta. A situação incitou o Jacarta Post,
o jornal principal do país, a publicar uma série de artigos sobre o assunto. Num deles, intitulado “Nenhuma hajj para os seguidores Ahmadiyyah” que surgiu no dia 25 de Agosto de
2009, o jornal entrevistou seguidores Ahmadiyyah em Nusa Tenggara Ocidental que se queixaram de ser impedidos pelas autoridades locais de realizar a hajj a Meca.
No entanto, “O Gabinete de Assuntos Religiosos local negou a acusação”, disse um funcionário, Suhaimi Ismi, que explicou que “Não existe nenhuma lei que proíba os membros Ahmadiyyah de efectuar a hajj. Se o Governo da Arábia Saudita os tivesse proibido, isso seria um
outro problema”, mas “Nós certamente que não emitimos tal proibição”, insistiu.
O jornal também informou que, em Dezembro, a polícia deteve seis Ahmadiyyah no Sul de
Jacarta por causa de pressões por parte de grupos fundamentalistas, que tinham invadido
violentamente as suas casas e denunciado as suas práticas religiosas não ortodoxas. De
acordo com a polícia, membros da seita tinham organizado orações de sexta-feira numa residência privada e foram confrontados por um grupo de extremistas quando se preparavam
para partir.
A comunidade Ahmadiyyah da Indonésia tem cerca de 200.000 membros. Mesmo se a sua
existência não vai contra a lei, ela é vista como herética, uma situação que partilha com
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outros grupos muçulmanos. Um destes é o chamado Qiyadah al-Islamiyah, mas os líderes de
outros grupos pequenos foram também acusados de heresia.
Em Maio de 2009, Agus Imam Solhin, o líder de uma seita chamada Satria Piningit Weteng
Buwono, foi acusado por um tribunal no Sul de Jacarta, ao abrigo do Artigo 156º do Código
Penal indonésio de, entre outras coisas, reivindicar ser um profeta e receber orientação espiritual do primeiro presidente do país, Sukarno. Ele também foi acusado de conduzir orgias
rituais e de impedir os seus seguidores de cumprir o ritual das orações muçulmanas.
Alguns meses antes, em Fevereiro, o capítulo de Java Ocidental do Conselho dos Ulamas da
Indonésia (MUI) classificou de heréticos os ensinamentos de outro líder de uma seita, Noto
Ati, por alegadamente violar os ensinamentos do Alcorão e os hadith do Profeta Maomé.
Em ocasiões anteriores, as “sentenças” ditadas pelo MUI contra certos muçulmanos tinham
levado o Governo a prender, multar e deter esses mesmos muçulmanos.
Os refugiados birmaneses, os Rohingya, também não foram alvo de melhor tratamento na
Indonésia. Em final de Janeiro, a Indonésia recusou-se a conceder asilo político a 193 muçulmanos vindos de Mianmar, acusando-os se serem “migrantes por motivos económicos”. Os
refugiados eram de etnia Rohingya, uma minoria muçulmana birmanesa que tinha fugido
da sua pátria por causa da discriminação e da pobreza. Os refugiados que chegaram à costa
indonésia no dia 7 de Janeiro faziam parte de um grupo maior de 580 Rohingya que tinha
chegado à Tailândia primeiro, mas que tinha sido forçado a partir pelo exército tailandês e
a ir novamente para o mar sem alimentos nem água. Mesmo com a discriminação e violência que tinham de suportar em casa, os muçulmanos da Birmânia não obtiveram qualquer
ajuda por parte dos muçulmanos seus “irmãos” na Indonésia, quer cidadãos comuns, quer
funcionários do Governo.
Receios de “Islamização”; do terrorismo à Sharia
O Governo indonésio conduziu a luta contra os grupos que tentaram destabilizar o país e
arruinar a sua imagem internacional. O presidente Yudhoyono e a sua administração procuraram prender (ou eliminar) os terroristas internos, bem como aqueles que são afiliados de
grupos criminosos internacionais como a al-Qaeda.
Em 2009, a polícia levou a cabo várias operações que conduziram à captura ou morte de
fugitivos muito procurados. Porém, isto não foi o bastante para impedir os ataques, entre os
quais se conta um massacre sangrento em dois dos hotéis mais prestigiosos de Jacarta. No
dia 17 de Julho de 2009, bombistas suicidas fizeram-se explodir no Hotel Marriott e no Ritz
Carlton, matando nove e ferindo quase cinquenta pessoas. Nas horas que se seguiram ao
duplo ataque, o chefe da polícia da Indonésia, General Bambang Hendarso Danuri, confirmou
que matar o presidente Yudhoyono era um dos objectivos. A suspeita caiu imediatamente
sobre o Jemaah Islamiyah, um grupo afiliado da al-Qaeda, dirigido pelo terrorista nascido na
Malásia, Noordin Mohammed Top, que alguns dias mais tarde viria a reivindicar a responsabilidade pelo ataque.
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As forças de segurança indonésias acabariam por encontrar o esconderijo de Noordin, perto
de Mojosongo, um subúrbio de Surakarta, uma cidade na Java Central. A operação para o
capturar teve lugar no dia 17 de Setembro e foi conduzida pelo esquadrão anti-terrorismo de
elite do país, o Destacamento Especial 88. Terminou num tiroteio que durou dez horas e no
qual o líder do Jemaah Islamiyah e cinco outros terroristas foram mortos.
Algumas semanas mais tarde, os investigadores afirmaram que encontraram evidências de
que Noordin estava a criar uma célula da al-Qaeda na zona onde acabaria por ser morto, e
que estava a planear um ataque “ainda mais catastrófico que o ataque de 11 de Setembro”
em Nova Iorque. A informação estava contida em ficheiros encontrados no computador do
terrorista malaio, na sua casa em Solo (Java Central), que também revelaram que ele já tinha
recrutado várias pessoas entre os fundamentalistas locais e estava a tentar angariar fundos
para financiar a sua campanha de terror.
Nos dias que precederam a morte de Noordin, o Governo já tinha emitido advertências sobre
possíveis ataques por parte do terrorista malaio contra aviões civis, notando que ele poderia
contar com uma rede de bombistas suicidas dispostos a fazerem-se explodir.
Tentativas por parte de muçulmanos radicais, incluindo o infame Conselho dos Ulamas da
Indonésia (MUI), para forçar o Governo a adoptar leis mais duras sobre moralidade e comportamento conduziram a uma forte reacção por parte dos muçulmanos moderados.
Quando, depois de uma reunião em Padang Panjang, uma cidade na província de Sumatra
Ocidental, um grupo de 700 Ulamas emitiu uma fatwa contra o ioga, o vício de fumar e a
abstenção ao voto, afirmando que estas actividades eram “contrárias aos preceitos do Islão”,
um grupo de líderes religiosos muçulmanos moderados e representantes de grupos da sociedade civil reagiu negativamente. No dia 27 de Janeiro, dois dias depois de a fatwa ser emitida,
criticaram fortemente o MUI pelos seus éditos religiosos, apelidando-os de “inconstitucionais e desnecessários”.
De modo semelhante, a posição adoptada pelos Ulamas conduziu a uma onda de protestos
por topo o país. Para muitos indonésios, tal fatwa era equivalente a uma interferência em
actividades que deverão ser deixadas à esfera pessoal e à escolha individual, muito para além
do âmbito de aplicação dos éditos religiosos.
No final de Janeiro, esta hostilidade encontrou eco num grupo de imãs de Jacarta que expressaram oposição aos bombistas suicidas e à sua visão radical do Islão. Um estudo efectuado
pelo Centro para o Estudo da Religião e da Cultura (CSRC) da Universidade Estatal Islâmica
de Syarif Hidayatullah, conduzido entre Novembro de 2008 e Janeiro de 2009 e com a participação de 250 imãs, revelou que a maioria estava contra os ataques suicidas. Os resultados,
publicados no Jacarta Post, também indicaram que a maioria destes clérigos estava a favor
de uma unidade nacional e consideravam a democracia como a melhor forma de Governo.
E, no entanto, tais opiniões por parte de imãs estão longe de resolver as contradições do país.
No dia 3 de Fevereiro, a AsiaNews relatou que o Fórum dos Ulamas e dos Muçulmanos (FUUI)
quis banir os Clubes Lions e Rotary e acusou-os de “secretamente conceder fundos a Israel”,
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afirmando que estes clubes não “são organizações de carácter social mas fazem parte da
Maçonaria e dos movimentos Sionistas” e poderiam “pôr em perigo o Islão”.
De modo semelhante, no início de Março, alguns dias depois de assumir funções, o chefe
de polícia de Java Oriental ordenou que as suas funcionárias usassem o véu islâmico e que
todos os polícias deveriam orar cinco vezes por dia, como todo o bom muçulmano.
Também em Março, os serviços secretos da Indonésia fizeram soar o alarme após a publicação do livro intitulado Martyrs’ Trylogy (Triologia dos Mártires), contendo escritos e notas
autobiográficas de e sobre Amrozi, Ali Gufron e Imam Samudra. Todos os três foram condenados pelo seu papel nos bombardeamentos de Bali, em 2002, que mataram mais de 200
pessoas, e executados por um pelotão de fuzilamento no dia 9 de Novembro de 2008.
Em Maio, peritos jurídicos islâmicos insurgiram-se contra o Facebook, a popular rede social
que conta com milhões de membros em todo o mundo, afirmando que favorece “sonhos
ilegais” entre a juventude, e proporciona às pessoas do sexo oposto uma oportunidade
de namorar e de ter “relações proibidas” com pessoas casadas. Enquanto decisão, é muito
parecida com o édito emitido contra o vício de fumar, o ioga e a abstenção ao voto, e vem
no seguimento de uma proibição emitida na véspera do Ramadão contra dar esmolas aos
pobres e aos mendigos.
No dia 7 de Setembro, os Ulamas indonésios emitiram um édito contra os mendigos que são
particularmente numerosos em Jacarta durante o mês sagrado do jejum e da oração. Como
seria de esperar, a decisão do MUI provou ser muito controversa. Alguns grupos acharam boa
ideia; outros pensaram que, em termos morais, “impedir as pessoas de dar esmola durante o
mês santo do Ramadão não é boa ideia.”
Mas isto não foi o pior. O episódio que despoletou o debate mais amargo e mais duro que o
país alguma vez experimentou foi a decisão, por parte da legislatura de Aceh, de fazer com
que as mulheres adúlteras fossem apedrejadas até à morte. A nova lei provou ser tão controversa que, apesar de ser aprovada pela assembleia da província no dia 14 de Setembro, foi
suspensa pelo Governo da província alguns dias mais tarde porque “as entidades executivas
e legislativas” não conseguiam “resolver as suas diferenças na aplicação de [pena de morte
por] apedrejamento.” Como se isso não fosse o bastante, a legislação de anti-adultério de
Aceh deu origem a uma reacção por parte do Governo central que afirmou ter o direito para
suspender ou revogar o projecto de lei devido a “falhas jurídicas”.
Apesar da oposição, a legislatura da província de Aceh não ficou por aqui. Na realidade, adoptou uma série de regulamentos que impuseram “castigos corporais severos” a pessoas cujo
comportamento fosse julgado contrário à moralidade islâmica, como a homossexualidade, a
violência sexual, o jogo e o consumo de álcool.
No final de Outubro, outra lei proposta pelas autoridades de Aceh gerou repugnância e desprezo no resto do país, quando a província decidiu proibir as calças de ganga “justas” para
as mulheres e os calções para os homens. Ao abrigo da proposta, os indivíduos apanhados
em violação flagrante desde código de vestuário seriam forçados a usar artigos de vestuário
especiais fornecidos pelo Governo.
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Em Dezembro, o Gabinete dos Assuntos Religiosos local proibiu uma dança chinesa tradicional, o popular barongsai (ou dança do leão), durante as comemorações do quinto aniversário do tsunami, enfurecendo a comunidade chinesa local. As autoridades afirmaram que a
dança era estrangeira face à cultura local, enquanto os sino-indonésios apelidaram a decisão
de “ridícula”, considerando-a uma violação clara dos princípios da Pancasila.
Em Novembro, quando o filme de grande sucesso 2012, de ficção científica e do realizador
Roland Emmerich, chegou aos cinemas indonésios, o Conselho dos Ulamas da Indonésia apelidou-o de blasfemo, acusando-o de conter cenas contrárias aos princípios do Islão.
Amidhan, chefe nacional do Conselho dos Ulamas, criticou severamente a Comissão de
Censura da Indonésia (LSF) por não ter mostrado a “precaução necessária” e por aprovar
cenas sensíveis, inclusive imagens do “dia do juízo final” no qual uma mesquita é destruída, enquanto uma igreja cristã sobrevive intacta. “Todas as cenas que defendam a fé [cristã]
deveriam ter sido cortadas”, afirmou.
Em Outubro, depois do Parlamento da Indonésia adoptar um pacote de reformas do sistema
de saúde que acrescentou as razões válidas para o aborto, todas as religiões reconhecidas na
Indonésia, ou seja, os Muçulmanos, os Católicos, os Protestantes, os Budistas, os Hindus e os
Confucianos, bem como as mulheres activistas, uniram forças para se oporem à nova lei. Sem
excepção, todos os líderes religiosos se insurgiram em defesa da vida.
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