Revista CREMESC, edição 109, 2009
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Revista CREMESC, edição 109, 2009
Revista CREMESC, edição 109, 2009 Conselho Regional de Medicina do Estado de Santa Catarina Av. Rio Branco, 533 – Conj. 201/202 CEP 88015-201 Florianópolis – SC Tel. 48. 3952.5000 EDITORIAL A revista do CREMESC, a partir de 2009, passou por uma reestruturação editorial, adotando um perfil que deverá persistir em 2010. O espírito da revista é mesclar matérias sobre Ética Médica e Bioética, publicar pareceres e resoluções do CREMESC e CFM, registrar a história da Medicina em Santa Catarina e trazer também alguma informação sobre arte contemporânea catarinense, cinema e literatura. A questão do fim da vida vem sendo tema de várias discussões bioéticas. Trouxemos o assunto à tona na entrevista realizada com o Pe. Leo Pessini, no artigo do Cons. Élcio Bonamigo sobre testamento vital e agora Rodrigo Jorge da Luz Bertoncini com artigo sobre a sedação paliativa, que deve Presidente do CREMESC fazer parte de uma série a ser continuada, sobre os cuidados paliativos e a autonomia do paciente. A Bioética, ainda pouco lembrada pelo médico no seu cotidiano, deve assumir um papel central na tomada de decisões que envolvam dilemas éticos. O novo Código de Ética Médica, que entrará em vigor em abril de 2010, foi desenvolvido na sua maior parte com a base bioética. Questões que se apresentam como essencialmente práticas, como a transfusão de sangue em Testemunhas de Jeová, a indicação de qualquer procedimento diagnóstico ou terapêutico, a própria relação médico-paciente, tudo passa pela abordagem bioética. Os princípios da autonomia, beneficência e nãomaleficência devem ser considerados ao nos confrontarmos com cada paciente. Ao incorporar as dimensões social e multidisciplinar, a Bioética fornece a necessária postura crítica ao comportamento técnico e científico da Medicina. Agindo assim, dificilmente o médico terá problemas judiciais. O desenvolvimento ético profissional amplia os limites da legalidade, pois a visão ética vai muito além da visão legal. Não podemos nos esquecer de que o ato médico tem conseqüências técnicas, éticas, administrativas e legais. Considerando estes aspectos, esta edição traz o oportuno artigo sobre entrega de prontuário, apresentando também um panorama sobre este que é o mais importante documento médico. As requisições de prontuário por autoridade policial ou judicial tornam-se cada vez mais freqüentes e é necessário que o médico tenha consciência de como agir nestas situações, lembrando-se de sempre respeitar o sigilo do paciente. Ao final de um ano de trabalho, esperamos que esta publicação tenha atingido seus objetivos de orientar o médico na sua vida profissional e contribuir com o lazer de boa qualidade, abrindo novos caminhos de discussão construtiva. Uma revista não descartável, que possa ser conservada e utilizada como fonte duradoura de consulta para esclarecer dúvidas na ética profissional e na Bioética. 2 REVISTA CREMESC Diretoria Presidente: Rodrigo Jorge da Luz Bertoncini Vice-presidente: José Francisco Bernardes 1ª Secretária: Áurea Gomes Nogueira 2º Secretário: Ricardo Polli Tesoureiro: Tanaro Pereira Bez Corregedor: Vicente Pacheco Oliveira Corregedor Adjunto: Armando José d’Acampora Corpo de Conselheiros Alzira Ungaretti Haberbeck, Anastácio Kotzias Neto, Antônio Silveria Sbissa, Armando José d’Acampora, Áurea Gomes Nogueira, Diogo Nei Ribeiro, Dorival Antonio Vitorello, Élcio Luiz Bonamigo, Eliane Vieira de Araújo, Ernesto Reggio, Eulina T. Shinzato Rodrigues Cunha, Fábio Firmino Lopes, Itairan da Silva Terres, João Pedro Carreirão Neto, José Francisco Bernardes, José Eduardo Coutinho Góes, Juliano Pereima de Oliveira Pinto, Mário César Pereira da Silva, Marta Rinaldi Muller, Nelson Grisard, Newton José Martins Mota, Nivio Pascoal Teixeira, Odi José Oleiniscki, Osvaldo João Pereira Filho, Paulo César de Oliveira, Paulo Norberto Discher de Sá, Rachel Duarte Moritz, Ricardo Polli, Roberto Luiz d’Ávila, Romilton Crozetta da Cunha, Ronald Caputo Júnior, Rodrigo Jorge da Luz Bertoncini, Saint Clair Vieira de Oliveira, Sérgio Malburg Filho, Sheila Koettker Silveira, Simone de Oliveira Backes, Tanaro Pereira Bez, Tiago Antonio Brehm Padilha, Vicente Pacheco Oliveira, Wilmar de Athayde Gerent, Ylmar Corrêa Neto, Zulmar Vieira Coutinho Delegados Regionais Araranguá: Luis Taddeo Filho Blumenau: Jacy Bruns Canoinhas: Vagner Marcolin Trautwein Chapecó: Raja Elias Concórdia: Vera Lucia Telles Correa Criciúma: Rômulo Cezar Pizzolatti Curitibanos: Albari Goetten de Moraes Itajaí: Delmo Dumke Joaçaba: Athos Flavio Santiago Neves Joinville: Elisabeth Grubba Richter Lages: Heron C. Anderson de Souza Mafra: Jacy Gomes Porto União: Ayrton Rodrigues Martins Rio do Sul: Ademir Claudino dos Santos São Miguel do Oeste: Celina Augusta Zanin Poletto Tubarão: Flávio Geraldo Vieira Xanxerê: Cristiane Ortiz Gerente Geral Rosane Mara Laguna Revista CREMESC Médico Editor: Ylmar Correa Neto Projeto gráfico e Edição Dimensão Comunicação e Marketing Ltda Jornalista Responsável: Débora de Medeiros Linhares MTB SC – 0645-JP Editoração Eletrônica: André Fernando Dias Revisão: Andréia Scarpa Artigos assinados são de responsabilidade dos autores Capa Ondina, Atlas de Anatomia 90x48cm - 2007 Tiragem 12 mil exemplares Impressão Gráfica Agnus ENTREVISTA Dr. Roberto D’Ávila Roberto D’Ávila nasceu no Rio de Janeiro em 1952, formou-se em Medicina pela Universidade Federal do Rio de Janeiro em 1976, e lá se especializou em Cardiologia na Santa Casa de Misericórdia (6a. Enfermaria, Serviço do Prof. Nelson Botelho Reis). Em 1978 se fixou em Florianópolis, aprovado em concurso para professor auxiliar de ensino de anatomia da UFSC. De pais catarinenses havia aqui residido e estudado no Instituto Estadual de Educação entre 1963 e 1967. Com a dissertação “Comportamento Moral dos Médicos em Santa Catarina” completou mestrado na UFSC em 1998 e atualmente cursa o doutorado em bioética da Universidade do Porto, avaliando o desenvolvimento moral dos estudantes de medicina. Conselheiro do CREMESC desde 1983, foi seu presidente de 1994 a 1998. No Conselho Federal de Medicina, entre 1985 e 1989 foi suplente do Dr. Waldomiro Dantas, assumindo a titularidade da representação catarinense em 1999, em mandato por duas vezes renovado que prossegue pelo menos até 2014. Nesta REVISTA CREMESC - O que motivou seu interesse pela ética médica e como foi sua trajetória nos sistema de Conselhos de Medicina? ROBERTO D’ÁVILA - Entrei no Corpo de Conselheiros do CREMESC a convite do entrevista aos conselheiros Ylmar Corrêa Neto e Rodrigo Bertoncini, o novo Presidente do CFM fala do futuro da medicina brasileira. Presidente à época, Dr. Geraldo Nicodemos Vieira, como suplente, em 1983, passando a titular logo depois. Participei de algumas diretorias e cheguei a Presidente guiado pelo Prof. Nelson Grisard. Já são 26 anos de atividade ininterrupta como conselheiro e, diante dos inúmeros processos ético-profissionais, passei a me interessar pelo estudo da Ética Médica e desde 1995 pela Bioética. Tive sempre a honra de ser orientado pelosmaiores nomes da Ética Médica em Santa Catarina e no CFM fui Corregedor Geral de 1999 a 2007, Vice-Presidente de 2007 a 2009 e, 3 REVISTA CREMESC atualmente, Presidente. REVISTA CREMESC - O Presidente do CFM representa cerca de 400.000 médicos brasileiros perante a sociedade. Em sua opinião, quais os principais problemas destes médicos, quais as principais queixas da sociedade em relação à Medicina, e o que pode fazer o CFM para minorar estes problemas? D’ÁVILA - Entre os principais problemas dos médicos estão os baixos salários no SUS e baixa remuneração na saúde suplementar, condições indignas de trabalho, poucas vagas de Residência Médica em comparação ao número de egressos das escolas médicas e perda de prestígio profissional com a conseqüente baixa auto-estima. Entre os problemas da sociedade saliento a falta de acesso à serviços de saúde qualidade, poucos médicos atendendo nos ambulatórios e hospitais da rede pública com conseqüente insatisfação em relação ao Serviço Público e usurpação das funções dos médicos por outros profissionais de saúde. O CFM tem debatido estas questões diuturnamente com o Ministério da Saúde, parlamentares e com as Entidades Médicas e teremos em breve algumas soluções possíveis. REVISTA CREMESC - Quais são seus projetos prioritários na Presidência do CFM? D’ÁVILA - Aprovar a regulamentação da profissão médica, que já passou pelo Senado e Câmara, retornando ao Senado, mais uma vez, para nova aprovação e posterior sanção presidencial; criação de uma Carreira de Estado para os médicos do SUS, semelhante a do Poder Judiciário e Ministério Público; avaliação das escolas médicas com a não abertura de novas escolas e fechamento das ruins; certificação digital e assinatura eletrônica para todos os mé- 4 REVISTA CREMESC dicos, além de uma forte campanha publicitária para resgatar a imagem do médico brasileiro. REVISTA CREMESC - No campo da bioética o senhor é um defensor da autonomia do paciente. Qual seu modelo de autonomia para um país de origem latina onde a escolaridade é baixa e a pobreza freqüente. Há limites para a autonomia? D’ÁVILA - Nos países desenvolvidos do hemisfério norte, em especial os de origem anglo-saxônica, a autonomia é plena, onde até mesmo, em alguns, a eutanásia é aceita se for a vontade de uma pessoa com competência para decidir. A autonomia somente será plena se houver esclarecimento e liberdade para tomar decisões. Sei que, nos países de origem latina, com baixa escolaridade e onde muitos não têm a competência necessária para estas decisões torna-se difícil o exercício da autonomia. Portanto, no Brasil ainda estamos numa fase de discussão onde a autonomia ainda é limitada e onde, para os médicos, o perigo de morte é o limite ético e legal para a autonomia. REVISTA CREMESC - Também a formação moral dos médicos é uma das suas preocupações acadêmicas. Como vê a evolução moral dos estudantes de medicina e como o ensino da bioética pode colaborar para a melhoria da saúde da população? D’ÁVILA - Os estudiosos do desenvolvimento moral em crianças e adolescentes apresentam fases de desenvolvimento que começam com o medo da punição evoluindo para o discernimento do que é bom para si e a sociedade. O desenvolvimento da moral profissional, no caso dos estudantes de medicina, tem revelado, nos resultados iniciais da pesquisa que homens e mulheres desenvolvem-se diferentemente e pode haver regressão moral, involuindo do discernimento ético reflexivo para o medo da punição. Este é o tema de minha Tese de Doutorado, ainda em andamento. Se houver a comprovação científica haverá a necessidade da reformulação do ensino da Ética Médica nas escolas de Medicina e a Bioética, por ensinar o aluno a refletir sobre os dilemas éticos, do início ao fim da vida, poderá ser uma boa alternativa. REVISTA CREMESC - A formação técnica dos novos médicos é prejudicada por problemas nos cursos existentes, formação ineficiente no exterior (principalmente o caso Cuba) e abertura indiscriminada de novas escolas. Como podem o CFM e os Conselhos Regionais interferirem? D’ÁVILA - O Brasil tem hoje cerca de 179 escolas de Medicina para 190 milhões de habitantes. Em número só perdemos para a India com um pouco mais de 200 escolas (1.100.000.000 hab.) e para a China (1.300.000.000 hab.) com 150 escolas. Não precisamos de mais médicos e sim de uma boa distribuição dos mesmos pelo interior do País por meio de uma adequada política pública de interiorização da assistência à saúde, e de qualidade. Infelizmente não temos jurisdição sobre os estudantes de Medicina e a LDB (Lei das Diretrizes e Bases) da Educação concede autonomia às Universidades quanto à criação de novos cursos. Portanto só nos resta uma articulação com o Ministério da Educação no sentido de, em parceria, desenvolvermos um sistema de avaliação das escolas médicas, que permita o fechamento das escolas ruins. Além disso, estamos trabalhando junto ao Congresso Nacional, em contato direto e ENTREVISTA de Ética Médica, não só como coordenador nacional, mas como propositor inicial da idéia. Como analisa o processo ocorrido e o novo código? D’ÁVILA - O CFM criou uma Comissão Nacional e comissões regionais de Revisão do Código de Ética Médica, integradas por representantes do Ministério Público, Poder Judiciário, Sociedade Brasileira de Bioética (SBB), Federação Nacional dos Médicos (Fenam) e Associação Médica Brasileira (AMB). Os componentes das comissões exercitaram minuciosa avaliação das 2.575 sugestões de alteração encaminhadas por médicos e entidades organizadas da sociedade entre 2007 e 2009 em artigos que tratavam de temas como autonomia do paciente e do médico, conflito de interesses entre médicos e indústria (farmacêutica e de equipamentos) e direitos dos médicos. permanente com os parlamentares visando, através de projetos de lei, modificarmos o quadro atual. REVISTA CREMESC - Está na hora da instituição de uma prova obrigatória para inscrição nos Conselhos de Medicina como fazem os países desenvolvidos? E como seria o melhor modelo? D’ÁVILA - Sou absolutamente contra, porque entendemos que a escola médica deve também ser avaliada e não somente o formando ao final de 6 anos de graduação. Esta avaliação poderia ser até aceitável se realizada ao longo de todo o curso. Penso que estabelecer um eficiente modelo de Posse na Presidência do CFM REVISTA CREMESC - O senhor tem filhos médicos. Gostaria que um neto adotasse a profissão? Quais problemas antecipa para as novas gerações de médicos? avaliação do curso médico deva ser abraçada como tese. A dificuldade está em elegermos a metodologia adequada de avaliação. O que queremos avaliar? Conhecimentos, habildades, aptidões? O aparelho formador? Além disso, o que faremos com o resultados? As escolas mal avaliadas serão efetivamente fechadas. Penso que devemos iniciar a discussão. Avaliar o aparelho formador e o aluno ao longo de todo o curso, fechando as escolas ruins ou impedindo a abertura de vestibular até serem corrigidas as deficiências. D’ÁVILA - A última pesquisa realizada pelo próprio CFM mostra um descontentamento dos médicos e uma preocupação com o futuro da profissão médica no País. Os médicos andam mais estressados, com múltiplos empregos e baixa remuneração. Tais determinantes interferem piorando a qualidade de vida e a satisfação profissional. Tenho dois filhos médicos (uma cardiologista e um cirurgião plástico) e ficaria muito feliz se meus netos escolhessem a Medicina como profissão. Para mim, trata-se da mais bela profissão, mas também, a mais difícil e a mais incompreendida nos dias de hoje. REVISTA CREMESC - O senhor teve papel fundamental na recente revisão do Código 5 REVISTA CREMESC HOMENAGEM Dr. Elisiário Suas mãos ainda trazem à vida Dr. Elisiário em atividade no seu Consultório. Nascido em 29 de julho de 1931, em Blumenau, lá iniciou seus estudos e recebeu o Grau de Médico pela Universidade Federal do Paraná em 1957. Inscreveu-se no Conselho Regional de Medicina em 02/7/1960 sob o CRM 265 em Santa Catarina. Estudioso e disciplinado, distinguido aluno em Curitiba, recebeu dois dos 6 REVISTA CREMESC prêmios mais cobiçados por lá, traduzidos em medalhas de ouro: o Prêmio Dr. Nilo Cairo por alcançar o primeiro lugar nas disciplinas do primeiro até o sexto ano do Curso de Medicina e o Prêmio Prof. Garcez do Nascimento por ter sido o melhor aluno em todas as disciplinas até o quarto ano do mesmo Curso. Conseguiu distinção também no Hospital dos Servidores do Estado, no Rio de Janeiro, quando nos anos de 1958 e 1959 lá esteve, cursando a Residência Medica em Ginecologia e Obstetrícia. Naquele Hospital, que era a melhor escola médica da época, convivendo com as maiores expressões do país na especialidade. Nessa mesma época dividia o apartamento com seu grande amigo Ernesto Francisco Damerau. Foi discípulo do Dr. Paulo Barros, famoso na especialidade e também pela publicação do Atlas de Cirurgia Ginecológica que leva seu nome e até hoje é utilizado pelos residentes de Ginecologia, Cirurgia, e Cirurgiões Gerais, do qual Elisiário participou da elaboração. Amante e entendedor de música clássica, reconhece e diferencia os instrumentos utilizados, filarmônicas, maestros e arranjos os mais diversos. Atualmente vive em alto astral com o futebol, pois flamenguista doente, viu, recentemente, o Flamengo ser campeão brasileiro. De suas três filhas, é avô de quatro netos e uma das filhas, a mais velha, concluiu com seu mais efusivo estímulo, o Conservatório Musical, se especializando em Flauta Transversa. Chega a Blumenau em 1960 e ingressa no Hospital Santa Isabel como o primeiro Ginecologista e Obstetra da cidade, e, aonde trabalha até hoje com seus sobrinhos, Lucindo Pereira Filho, Mastologista e Juarez Pereira Zimermann, Ginecologista e Obstetra, com quem divide a atividade da cirurgia até hoje. Embora houvesse convite para permanecer no Rio de Janeiro junto ao seu Chefe, preferiu ser o primeiro Ginecologista de Blumenau, onde deve ter realizado mais de 20 mil partos. O parto era preferencialmente natural, pois iniciou numa época em que a anestesia ainda era incipiente, cesariana era conduta de exceção e o sexo das crianças era premeditado pelas avós, tias e vizinhas de acordo com as crendices populares: barriga pontuda era homem, barriga redonda era mulher. De acordo com a forma da barriga, é que o enxoval se tornava rosa ou azul. Nem se falava em ultra-sonografia. Mesmo com todas essas vicissitudes, Dr. Elisiário fez um belo trabalho em Blumenau, pois trabalhava com afinco e com as melhores condições que possuía: sua sensibilidade e o conhecimento. Não foi por acaso que, durante três mandatos consecutivos foi o Médico Chefe do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia do referido nosocômio, tal Dr. Elisiário Pereira Filho na formatura no Paraná em 1957. Dr. Elisiário com o fardão da Academia Catarinense de Medicina era o reconhecimento pela liderança medica e científica que possuía. Recentemente, ao conceder entrevista para um Jornal local, referiu que: “O futuro é imensurável, tudo o que for sonhado ou pensado poderá virar realidade. Com certeza encontrarão uma cura definitiva para a Aids, ninguém mais morrerá de epidemias passageiras como a gripe A e o câncer será como qualquer outra doença”. Essa é a visão atual de um homem que viveu para fazer os bebês nascerem com saúde, e deixar pais e mães felizes com seu rebento. Essa liderança científica desembocou na fundação do Centro de Estudos do Hospital Santa Isabel, onde também exerceu o cargo de Diretor Clínico. Exerceu a função de Delegado do Conselho Regional de Medicina em Blumenau. Atualmente, sua experiência é aproveitada como Membro do Conselho de Ética Médica do Hospital Santa Isabel e da UNIMED Blumenau e o foi até pouco tempo, no Conselho Deliberativo do Teatro Carlos Gomes. Também é, merecidamente, membro ativo da Academia Catarinense de Medicina. Armando José d’Acampora Anastácio Kotzias Neto Newton José Martins Mota 7 REVISTA CREMESC PARECERES Parecer Consulta CREMESC Nº 1746/09 Em ofício encaminhado ao Conselho Regional de Medicina de Santa Catarina, um Procurador da República, encaminha consulta com o seguinte teor: “há alguma norma que impeça um médico do SUS, não especialista em determinada área (clínico geral), prescrever medicamento para determinada especialidade médica, como por exemplo, tratamento de doença vascular e diabetes ?”. Resposta: O ato médico específico não exige que a exclusividade de determinados procedimentos seja desse ou daquele especialista. Não existe entre nós nenhum dispositivo ético ou legal que exija a qualificação médica para o exercício de uma determinada especialidade. A lei 3.268/1957, que regulamenta a profissão médica, deixa claro que o exercício da Medicina só é permitido a partir do registro do Diploma de Graduação Médica, reconhecido pela Lei Brasileira, no Ministério da Educação e Cultura, com sua posterior inscrição no Conselho Regional de Medicina da jurisdição competente. A partir deste registro, o médico pode exercer quaisquer atividades na área de diagnóstico e tratamento, independentemente de ter ou não um Título de Especialista. Assim, teoricamente, todo médico regularmente habilitado, em sua jurisdição, pode exercer a medicina no ramo que conscientemente se julgar capaz, limitado apenas pelo que diz seu entendimento e suas habilidades, respondendo, no entanto, ética e legalmente pelos resultados atípicos e inadequados do ato médico praticado. Conclui-se assim, que não é proibido a nenhum médico prescrever qualquer tipo de medicação. É o parecer, smj. Consº. Ronald Caputo Jr. Parecer Consulta CREMESC Nº 1787/09 O requerente solicita parecer quanto a conduta ética de médico que solicita exames para si próprio. Resposta: Deve-se levar em consideração que para a concretização do ato médico deve haver um médico que irá prestar um atendimento completo ao paciente. São indissociáveis, a anamnese, o exame físico, a solicitação de exames e a prescrição de medicamentos necessários. Uma pessoa não poderá ser, ao mesmo tempo, médico e paciente; prestar a si 8 REVISTA CREMESC mesmo um atendimento, com qualidade técnica e sem interferência emocional. Tendo em vista as observações apontadas concluise que, embora não seja expressamente proibido, não é recomendável que um médico solicite exames para si próprio. Esse é o parecer. Cons. Rachel Duarte Moritz ARTIGO Sedação Paliativa Cons. Rachel Duarte Moritz e Cons. Elcio Luiz Bonamigo A solução de conflitos morais está longe de obedecer à precisão dos cálculos matemáticos. Muitas vezes, quando possível, é necessário tentar fugir da forma dilemática em que há somente uma solução certa, excluindo a outra, tal como ocorre em uma equação matemática. A forma problemática, em que existem várias soluções possivelmente corretas, constitui um método que oferece alternativas aceitáveis à abordagem de conflitos morais quando a unanimidade é inalcançável. Neste aspecto, um assunto moral que parece estar convergindo para a unanimidade de pensamento nas sociedades médicas organizadas é a sedação final, termo atualmente substituído por sedação paliativa, que é caracterizada por uma sedação profunda e contínua, com o objetivo de reduzir o nível de consciência do paciente, e cuja intenção é a de aliviar os sintomas refratários em enfermos com doença avançada e terminal. Tal preocupação é considerável, pois um grande número das pessoas apresenta ou apresentará sofrimento intenso e insuportável imediatamente antes de morrer. A fase final da vida abrange o período de dias a semanas que antecedem a morte e no qual se desenvolve uma cadeia de eventos relacionados à doença terminal. Caracteriza-se pela mudança rápida no quadro clínico e na capacidade funcional do doente, com a presença de sintomas como a dor e a dispnéia. O paciente pode tornarse agitado, gemente e apresentar respiração estertorosa com perda progressiva da consciência. Nesse momento é necessário que haja uma atenção por parte do médico e de toda a equipe de saúde, visando o controle dos sintomas e a diminuição do sofrimento daquele que está morrendo e, conseqüentemente, de seus familiares. Os cuidados na fase final da vida devem ser abrangentes e realizados por equipe multiprofissional. A prevenção e o tratamento da dor devem ser incorporados como rotinas desses cuidados. O alivio da dor deve ser garantido mesmo nas situações de duplo efeito da medicação sedoanalgésica. As medidas no final da vida visam um ajuste terapêutico, em especial a priorização da suspensão de qualquer intervenção fútil e do controle dos sintomas próprios desta fase. A dor é citada como o principal sintoma a ser controlado. Entretanto, outros sinais e sintomas não podem ser menosprezados. Por exemplo, o desconforto da dispnéia ou de um ferimento com odor fétido pode ser extremamente angustiante para o paciente e seus familiares. O médico deve saber escutar as necessidades do doente. No final da vida o reconhecimento precoce e a avaliação sistemática dos sintomas são os “sinais vitais” do paciente terminal. Deve-se relembrar que a evolução da doença para a sua fase final gera novos problemas, como a dificuldade de deglutição do paciente que leva a não aceitação das medicações pela via oral. Neste momento, a via de eleição para a administração dos fármacos é a via subcutânea. A via endovenosa pode acarretar sofrimento adicional (acesso venoso doloroso, desconforto, flebite) enquanto a subcutânea pode trazer inúmeras vantagens (facilidade de administração, pouco desconforto, sem imobilização de membros). A sedação paliativa precisa ser fundamentada. A Bioética norte-americana possui quatro princípios fundamentais que até podem ser utilizados para justificar a sua utilização. No entanto, a justificativa dire- Cons. Rachel Duarte Moritz tamente relacionada à sedação paliativa encontra-se nos princípios morais acessórios, mais especificamente no princípio moral do duplo feito. Através deste principio, considera-se que uma determinada ação pode produzir dois ou mais efeitos simultaneamente, com conseqüências tanto positivas como negativas. Querendo-se o efeito bom, que deve ser honesto e proporcionado, tolera-se o efeito mau da ação. A separação de siameses, por exemplo, pode produzir um efeito bom, que é a salvação de um, justificando a boa ação. Ao mesmo tempo, produz um efeito mau pela possibilidade de morte do seu companheiro. Como outro exemplo, a retirada de útero com câncer de mulher grávida salva a mãe, como efeito benéfico, e mata o feto como um efeito indesejado. Da mesma forma, a sedação de paciente terminal possui duplo efeito: ao mesmo tempo em que se alivia a dor, diminui discretamente o tempo de vida do paciente. No entanto: a ação é boa e a intenção é correta, além de existir uma proporção de equilíbrio entre os dois efeitos, o bom e o 9 REVISTA CREMESC Cons. Elcio Luiz Bonamigo mau, favorecendo o bom. A reação contra a sedação paliativa, pelo que se percebe, é praticamente nula. O exemplo de aceitação partiu da Igreja Católica, através de documentos e testemunhos das autoridades. A Declaração sobre Eutanásia da Sagrada congregação para a Doutrina e Fé, de 1980, está de acordo com o uso dos medicamentos capazes de suavizar ou suprimir a dor, mesmo que surjam efeitos secundários como o torpor ou menor lucidez. Segundo a interpretação do Monsenhor Elio Sgreccia (1998, p. 617) a terapia da dor, no caso de sedação paliativa, não é considerada eutanásia indireta, mas uma ação lícita mesmo quando possa como conseqüência, abreviar a vida. A antecipação da morte resultante da administração de analgésicos somente é lícita quando se trata de um efeito não desejado, valorizando a intenção do ato, complementa a professora espanhola Gloria Maria Tomás Garrido (2006, p. 125). Do ponto de vista legal, pode-se afirmar que a medicina é uma atividade meio que visa o fim. Portanto, a responsabilidade médica é com a intenção e não com os resultados do tratamento. A sedação paliativa já está bastante 10 REVISTA CREMESC avançada em termos de aceitação mundial. No entanto, é necessário que sejam estabelecidos os critérios sobre as dosagens de medicamentos e os critérios da sua correta aplicação também em nosso país, da mesma forma como fez a Sociedade Espanhola de Cuidados Paliativos através do documento Aspectos Éticos de la Sedación en Cuidados Paliativos. Este consenso evitaria que o médico viesse a ser acusado de eutanásia injustamente. Assim sendo, salvo imprevistos, a sedação paliativa devidamente protocolizada, fundamentaria a conduta dos médicos para salvaguardar a dignidade humana de seu paciente no sentido de evitar um final de vida em meio a insuportáveis sofrimentos. É importante ressaltar que, mesmo sendo seguidos protocolos, cada paciente merece tratamento individualizado e embasado em sua necessidade especial. O controle da ansiedade com benzodiazepínicos de curta duração (midazolam), a administração de opióides para o controle da dor e para a redução da freqüência respiratória no doente dispnéico, a redução das secreções das vias respiratórias com o uso de anticolinérgicos e manutenção do estado de hipo-hidratação para evitar acúmulo de secreção podem ser importantes no arsenal terapêutico do paciente recebendo sedação paliativa. Na presença de soluço podem ser adicionados os antipsicóticos ou o midazolam em baixas doses. A sedação paliativa exige informação clara ao paciente e seus familiares. Devese esclarecer a intenção de sedar e suas conseqüências como a perda definitiva da capacidade de comunicação. Os pacientes devem ser mantidos sob vigilância contínua, no sentido de reavaliar suas necessidades. Coquetéis de sedativos usados sem critério e sem titulação de doses são condenáveis, do ponto de vista ético e técnico. BIBLIOGRAFIA Doyle D, Hanks G, Cherny N, Calman K, Eds. The Oxford Textbook of Palliative Medicine 3rd Edition, Oxford: Oxford University Press, 2004. Lynn J Study to understand prognosis and preferences for outcomes and risk of treatment (SUPPORT) Ann Intern Med. 126:97106, 1997. Lynn J, Adamson DM. Living well at the end of life: adapting health care to serious chronic illness in old age. RAND Corporation. Rand Health White Paper WP 137, 2003 http://www.medicaring.org/educate/download/wp137.pdf Nunes L. Ética em cuidados paliativos: limites ao investimento curativo. Rev Bioética, 2008; 16(1):41-50. Ribeiro DC. A eterna busca da imortalidade humana: a terminalidade da vida e a autonomia. Revista Bioética 2005; 13(2):112-119. Sagrada Congregação para Doutrina e Fé. Declaração sobre Eutanásia. Cidade do Vaticano, 1980. Sgreccia E. Manual de Bioética. I – Fundamentos da Ética Biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 2002. Sociedad Española de Cuidados paliativos. Aspectos Éticos de la Sedación en Cuidados Paliativos. Barcelona, 2002. Tomás Garrido GM. Cuestiones actuales de Bioética. Barcelona Espanha: EUNSA, 2006. 147p. Villas-Bôas ME. A Ortotanásia e o Direito Penal Brasileiro. Revista Bioética 2008; 16(1):61-83. ARTIGO Entrega de prontuários à autoridade judicial/policial A entrega, ato ou efeito de entregar, tem também o sentido de traição – a declaração de algo que se mantinha em segredo; uma revelação, a exposição de um segredo. O termo prontuário surge em 1676, significando “lugar onde são guardadas coisas de que se pode precisar a qualquer momento”. Atualmente, o mesmo termo é usado para dizer de “ficha que contém os dados pertinentes de uma pessoa” (Houaiss). Sinonímia Prontuário (no uso cotidiano e rotineiro); ficha clínica (nos consultórios médicos e emergências hospitalares); prontuário médico; prontuário médico-hospitalar; prontuário hospitalar; prontuário médico do paciente; “prontuário eletrônico” (apenas mais um meio físico) e prontuário do paciente . Adoto e aconselho o uso da expressão “prontuário do paciente”, pois ali não há somente dados médicos ou de caráter médico; há, também, anotações preciosas da enfermagem, nutricionistas, farmacêuticos etc., mas, com certeza, são todas informações do ou sobre o paciente que constituem a sua intimidade e, portanto, o seu sigilo. É fácil entender que o prontuário e o sigilo do paciente são corpo e alma, indissociáveis, devendo assim ser tratados. Conceito O prontuário do paciente é um conjunto de documentos padronizados e ordenados onde devem ser obrigatoriamente registrados todos os cuidados profissionais prestados aos pacientes e que atesta o atendimento a uma pessoa numa instituição de assistência médica ou num consultório médico, recebendo, neste último caso, a denominação “ficha clínica”. A Resolução CFM nº 1.638/02, de 10 de julho de 2002, em seu artigo primeiro, define prontuário médico “como o documento único constituído de um conjunto de informações, sinais e imagens registradas, geradas a partir de fatos, acontecimentos e situações sobre a saúde do paciente e a assistência a ele prestada, de caráter legal, sigiloso e científico, que possibilita a comunicação entre membros da equipe multiprofissional e a continuidade da assistência prestada ao indivíduo”. A mesma Resolução determina “que a responsabilidade pelo prontuário médico cabe: I - ao médico assistente e aos demais profissionais que compartilham do atendimento; II à hierarquia médica da instituição, nas suas respectivas áreas de atuação, que tem como dever zelar pela qualidade da prática médica ali desenvolvida e, III - à hierarquia médica constituída pelas chefias de equipe, chefias da Clínica, do setor até o diretor da Divisão Médica e/ou diretor técnico”. Embasamento filosófico, moral, ético e bioético. O prontuário é o repositório da intimidade do paciente, portanto, do seu sigilo. Por esta razão as informações ali contidas lhe pertencem, devendo o médico e a instituição agir per se como fiel depositário e guardador. A proteção ao prontuário não é somente material, mas de natureza moral: prontuário e sigilo andam juntos no sagrado exercício de assegurar o direito à privacidade e à confidencialidade dos pacientes. O preenchimento do prontuário do paciente, no que se refere às informações de interesse médico, é obrigação e responsabilidade intransferíveis do médico, sendo prática antiética e ilegal, portanto Cons. Nelson Grisard condenável, delegar seu preenchimento a outrem que não médico habilitado perante o Conselho de Medicina, fazendo-se exceção aos hospitais de ensino, onde alunos de medicina o fazem sob supervisão, correção e responsabilidade de médicos, sejam professores de medicina ou do staff do hospital de ensino. O prontuário do paciente corretamente preenchido é, e efetivamente tem sido, a principal peça de defesa do médico nos casos de denúncias por mau atendimento com indícios de imperícia, imprudência ou negligência, ou seja, na presunção da existência de erro médico, sendo, também, o documento médico mais adequado para a análise da qualidade e correção dos cuidados prestados aos doentes. É direito de todo paciente ou seu responsável legal, por si ou por advogado constituído, obter cópia integral de seu prontuário médico (hospitalar ou de consultório) a qual deve ser cedida incontinenti. Fala-se em cópia pela facilidade de serem obtidas e pela aceitação geral das mesmas, porém 11 REVISTA CREMESC há quem exija o original e neste caso a cópia ficará no arquivo médico do serviço ou da instituição. Esta entrega deve ser feita contra recibo a fim de salvaguardar o médico de denúncia de quebra de sigilo. “Cuidados especiais devem ser dispensados aos prontuários, aos arquivos médicos e aos boletins. O prontuário contendo dados e hipóteses sigilosas não pode ficar ao alcance de abelhudos alheios ao caso”, diz H. Alcântara. Afrânio Peixoto, citado por H. Alcântara, fundamenta o segredo médico em três elementos: o interesse do doente no sigilo quanto aos seus males; o interesse do médico em servir à própria causa, servindo ao doente e o interesse da sociedade em proteger esses interesses, de mútuo acordo, salvo quando interesses maiores, coletivos, estiverem em jogo e forem lesados pelo segredo profissional. A tradição, a ética e a lei consolidaram esses fundamentos como se verá mais adiante. Algumas citações a respeito: “Penetrando no interior das Famílias, meus olhos serão cegos e minha língua calará os segredos que me forem confiados” - Hipócrates, 460 a. C. “Primum nihil nocere e Bonnum faccere” (Em primeiro lugar não fazer mal e Fazer o bem) - Hipócrates, 460 a. C. “O que sei pela confissão sei menos do que se nunca o tivesse sabido” – S.T. de Aquino, século IV d.C. “Mais vale uma pálida tinta que uma boa memória” - Provérbio chinês antigo. “Eu não tenho visto insurretos nas minhas salas do hospital, eu não tenho visto mais que feridos”Dupuytren,1832, ( anatomista e cirurgião militar francês e um dos médicos de Napoleão, as voltas com a polícia e ao Comissário que no hospital lhe perguntava se havia insurretos da Revolução, respondeu com a esta célebre 12 REVISTA CREMESC frase ). “Não conheço nada de mais obrigatório” – João Vicente de Torres Homem, Barão de Torres Homem, médico, 1875. “Não maleficência e respeito à autonomia do paciente”- Princípios bioéticos, Beauchamp e Childress , 1979. “Não há possibilidade do exercício da medicina sem a existência e a estrita observância do sigilo médico. Ele é a segurança do paciente” - Grisard, 1995. À não maleficência, à beneficência e ao respeito à autonomia junta-se um dos maiores valores éticos da prática médica, se não o maior, que é o direito do paciente à confidencialidade, a intimidade confiada, que envolve a confiança na discrição de outrem. O dever de elaborar o prontuário do paciente É uma obrigação hipocrática e um dever profissional do médico, elaborar o prontuário do paciente. A Resolução CFM nº. 1.931/09, de 17.09.2009, que reformou o Código de Ética Médica - publicada no D.O.U. de 29.09.2009 com retificações publicadas em 13.10.09-, veda ao médico no seu artigo 87 “Deixar de elaborar prontuário legível para cada paciente” e no artigo 88 “Negar, ao paciente, acesso a seu prontuário, deixar de lhe fornecer cópia quando solicitada, bem como deixar de lhe dar explicações necessárias à sua compreensão, salvo quando ocasionarem riscos ao próprio paciente ou a terceiros”. O direito do paciente e o dever do médico quanto ao sigilo O sigilo é a intimidade do paciente só revelada por ele mesmo espontaneamente e a quem confie. Traduz a sua privacidade. O segredo é a informação de interesse particular compartilhada: é o sigilo revelado ao médico ou a outrem em confiança; ou a informação obtida pelo médico através da anamnese, do exame físico com o consentimento do paciente. Traduz a confidencialidade. A preservação do segredo sobre os dados de saúde/doença ou quaisquer fatos relacionados ao paciente, é um direito deste e um dever do médico, somente podendo ser revelado por autorização expressa escrita do titular da informação, justa causa ou dever legal. O atual Código de Ética Médica, de 1988 e em vigor até 13 de abril de 2010, afastouse da corrente absolutista – que impõe o sigilo incondicional em qualquer situação e da corrente abolicionista – que desaprova qualquer reserva de confidência, adotando a corrente relativista ou eclética da guarda do segredo, quando admite a revelação por “justa causa, dever legal ou por autorização expressa do paciente”. A justa causa exprime, em sentido amplo, toda a razão que possa ser utilizada como justificativa para a prática de um ato excepcional, fundamentado em razões legítimas e de interesse ou procedência coletiva. Assim, entende-se como uma razão superior que releva o que seria, em princípio, uma falta – a revelação do sigilo médico do paciente. O dever legal se configura por força de expressa disposição legal quando, compulsoriamente, o segredo médico tem de ser revelado. O atestado de óbito e a notificação obrigatória de doença são exemplos e nestas ocasiões, somente se revelará o diagnóstico e não se tecerão outros comentários. O revelar segredo médico sem justa causa, dever legal ou autorização expressa do paciente, causando-lhe dano, é crime! No entanto, vozes abalizadas da magistratura com assento no TJSC, pregam a análise criteriosa e o uso de estrito bom senso na aplicação dos dispositivos legais levando em conta, também, os aspectos humanos, éticos e morais envolvidos na decisão em favor da revelação de sigilo através da entrega do prontuário do paciente. Sobre ARTIGO isto, o “novo” Código de Ética Médica do CFM preceitua em seu artigo 89, quando veda ao médico “ Liberar cópias do prontuário sob sua guarda, salvo autorizado, por escrito, pelo paciente, para atender ordem judicial ou para a própria defesa”; o parágrafo 1º deste artigo esclarece: “Quando requisitado judicialmente o prontuário será disponibilizado ao perito médico nomeado pelo juiz” e o parágrafo 2º, complementa: “Quando o prontuário for apresentado em sua própria defesa, o médico deverá solicitar que seja observado o sigilo profissional”. A Justiça e a ética médica, ao serviço e proteção do ser humano, devem confluir ao recurso da pericia judicial medica para o desiderato, com o sentir de que o sigilo habita no prontuário do paciente! O relato de caso a seguir, resguardada a máxima discrição, é um mau exemplo prático: “Uma paciente procura médico especializado com registro de qualificação de especialista (RQE) no Conselho Regional de Medicina da jurisdição onde trabalha. O atendimento no consultório privado ocorre de forma técnica e ética adequadas e de cujo ato médico resultou um diagnóstico e um tratamento medicamentoso, sendo expedido, espontaneamente pelo médico o competente atestado de doença para fins de afastamento da paciente de suas atividades laborais como parte do tratamento. O atestado, licitamente fornecido, obedece à vedação contida no artigo 110 do Código de Ética Médica (Resol. CFM nº 1.248/88): “é vedado ao médico fornecer atestado sem praticar o ato profissional que o justifique, ou que não corresponda à verdade”. Embora os Tribunais reconheçam a competência legal do CFM e dos Conselhos Regionais para expedir resoluções a respeito da profissão médica, in casu, um juiz achou que o atestado era falso e determinou mandado de busca no consultório para entrega pelo médico do prontuário da paciente. O médico, atemorizado, o entre- ga ao oficial de justiça. Assim atendido o juiz não se satisfez! Desconfiou do teor e da licitude do documento apresentado (o prontuário da paciente) e determinou nova busca recebendo do médico a informação de que já o atendera. O magistrado, que já evocara o Código Penal em seu artigo 302 (falsidade de atestado médico) contra o médico, ameaça-o agora como incurso no artigo 330 (desobediência à ordem legal de funcionário público). Ato contínuo faz denúncia ao Conselho por infração ética e à Promotoria por infração legal. Assistia à autoridade judicial três possibilidades: solicitar à paciente que aportasse aos Autos o seu prontuário configurando sua autorização expressa se o fizesse; solicitar o concurso de perito judicial médico para a competente peritagem no consultório do médico com lavração de relatório atinente resguardando o sigilo e mandado judicial de busca e apreensão. Preferiu esta última e por duas vezes, com peritos diferentes causando transtornos ao trabalho do médico em consultório. Considerando-se ser ilegal a requisição de documentos médicos quando há outros meios legais de obtenção da informação e os constrangimentos ilegais que a desumana, imprudente, anti-ética e ilegal medida causou, andou mal o magistrado. Como conseqüências, o juiz foi admoestado, mas a paciente nunca mais procurou o médico que arcou sozinho com os prejuízos! O embasamento legal e normativo Constituição Federal do Brasil Art. 5º I - ninguém será obrigado a fazer ou a deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei; (...) X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação; (...) XXXIII - todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado. (...) Código Penal: “(...) Art. 154 - Revelar alguém, sem justa causa, segredo de que tenha ciência, em razão de função, ministério, ofício ou profissão, e cuja revelação possa produzir dano a outrem. Pena - detenção de três meses a um ano ou multa de 1 a 10 mil cruzeiros. Parágrafo único - Somente se procede mediante representação. (...) Art. 269 - Deixar o médico de denunciar à autoridade pública doença cuja notificação é compulsória. Pena - detenção de seis meses a dois anos, e multa, de quinhentos a três mil cruzeiros. (...)”. Código Civil: “(...) Art. 229. Ninguém pode ser obrigado a depor sobre fato: I - a cujo respeito, por estado ou profissão, deva guardar segredo; (...) “ Jurisprudência dos Tribunais – algumas citações: STF - RTJ 101/76 – É constrangimento ilegal exigir-se da clínica ou hospital a revelação de suas anotações sigilosas. STF - RTJ 39/50 – Recurso Extraordinário nº 60.176, Relator Min. Luis Gallotti – Ementa – Sigilo Médico. “No choque entre os dois interesses sociais, o que se liga ao resguardo do sigilo e o correspondente a repressão ao crime – a lei dá prevalência 13 REVISTA CREMESC ao primeiro. É certo que abre exceções, por exemplo, no caso de moléstia de notificação compulsória. Então há interesse social maior, que prepondera sobre o interesse atinente à manutenção do sigilo. Esses outros motivos previstos na lei são a justa causa, a que se refere o Código Penal, para permitir excepcionalmente a quebra do sigilo”. TJRJ - RDA 185/198, AC 3.059/91, relator Des. Carlos Alberto Direito (ex-Ministro do STF): “(...) assegura ao ser humano o direito de obstar intromissão na sua vida privada...A doença inclui-se entre esses interesses pessoais, que não pertencem a ninguém, que só integram a intimidade e a vida privada do paciente, que não pode ser exposta a público” (...) TJRS - AGR 598434587 – 6ª Câmara Cível, Relator Des. Décio Erpen: “Prontuário Médico – a privacidade foi instituída em prol do paciente ou usuário, não podendo o instituto se voltar contra o mesmo. Feito questionando conduta do hospital, onde se perquire o acerto ou não da atividade (...). O prontuário médico é do profissional, mas seu conteúdo é do paciente”. Código de Ética Médica – Resolução CFM nº 1.931/09: (...) Item XI dos Princípios Fundamentais: O médico guardará sigilo a respeito das informações de que detenha conhecimento no desempenho de suas funções, com exceção dos casos previstos em lei. (...) Art. 73 É vedado ao médico: revelar fato de que tenha conhecimento em virtude do exercício de sua profissão, salvo por motivo justo, dever legal ou consentimento, por escrito, do paciente. Resolução CFM Nº 1.605/00, de 15 de setembro de 2000, dispõe sobre o fornecimento das informações do prontuário à autoridade judiciária requisitante. 14 REVISTA CREMESC RESOLVE: Art. 1º - O médico não pode, sem o consentimento do paciente, revelar o conteúdo do prontuário ou ficha médica. Art. 2º - Nos casos do art. 269 do Código Penal, onde a comunicação de doença é compulsória, o dever do médico restringese exclusivamente a comunicar tal fato à autoridade competente, sendo proibida a remessa do prontuário médico do paciente. Art. 3º - Na investigação da hipótese de cometimento de crime o médico está impedido de revelar segredo que possa expor o paciente a processo criminal. Art. 4º - Se na instrução de processo criminal for requisitada, por autoridade judiciária competente, a apresentação do conteúdo do prontuário ou da ficha médica, o médico disponibilizará os documentos ao perito nomeado pelo juiz, para que neles seja realizada perícia restrita aos fatos em questionamento. Art. 5º - Se houver autorização expressa do paciente, tanto na solicitação como em documento diverso, o médico poderá encaminhar a ficha ou prontuário médico diretamente à autoridade requisitante. Art. 6º - O médico deverá fornecer cópia da ficha ou do prontuário médico desde que solicitado pelo paciente ou requisitado pelos Conselhos Federal ou Regional de Medicina. Art. 7º - Para sua defesa judicial, o médico poderá apresentar a ficha ou prontuário médico à autoridade competente, solicitando que a matéria seja mantida em segredo de justiça. Art. 8º - Nos casos não previstos nesta resolução e sempre que houver conflito no tocante à remessa ou não dos documentos à autoridade requisitante, o médico deverá consultar o Conselho de Medicina, onde mantém sua inscrição, quanto ao procedi- mento a ser adotado. Art. 9º - Ficam revogadas as disposições em contrário, em especial a Resolução CFM nº 999/80. A entrega de prontuário, quando não observados princípios éticos, morais e legais, causam prejuízos ante a possibilidade de revelação do sigilo dos pacientes nele contido. São necessários todos os cuidados e justificativas sólidas devem existir para a sua efetivação. BIBLIOGRAFIA Alcântara, HR de. Deontologia a Diceologia. Organização Andrey Editora, 1979; pág. 131-135. BRASIL. Decreto-Lei nº 2.848, Código Penal Brasileiro,1940. Conselho Regional de Medicina do Estado da Guanabara (RJ). Ética Médica;1974, pág. 317. Conselho Federal de Medicina. Resolução nº 1.246/88 (Código de Ética Médica). Resolução nº 1.605/00. Resolução nº 1.931/09 (Código de Ética Médica, reforma). BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil,1988. BRASIL. Lei nº 10.406, Código Civil Brasileiro, 2003. Grisard, N. Manual de Orientação Ética e Profissional. CREMESC, 4ª edição; 2006, pág. 79-88. Manual de Orientação Ética e Profissional. CREMESC, 4ª edição, 2006; pág. 90-94. Cunha, L e Patrício, ZM. Confidencialidade e privacidade em planos de saúde. Revista Bioética, 2008, 16:141-154. ARTIGO Declaração de Óbito A Declaração de Óbito (DO) é um documento de importância médica, legal, ética e social. É o documento básico para se registrar o óbito no Cartório e obter a Certidão de Óbito. Guardadas as devidas proporções, tem a mesma importância de uma Certidão de Nascimento. Com certa frequência se questiona de quem é a responsabilidade de preencher a Declaração de Óbito. Do ponto de vista prático e normativo, temos as seguintes considerações/orientações: 1- Nos casos de mortes por homicídio, suicídio e acidentes de qualquer natureza, ou suspeitos de uma destas situações, definidos como violentos ou suspeitos de terem sido violentos, compete ao médico legista do município ou região preencher a DO. Os óbitos súbitos de adultos jovens, em torno dos 18 aos 35 anos, até então sadios, em qualquer local, sem causa definida, devem ser considerados suspeitos. Óbitos de crianças e adolescentes com histórico e circunstâncias suspeitas da morte, narradas pelos pais e/ou responsáveis, seguem o mesmo raciocínio. Óbitos em penitenciárias, delegacias de polícia, instituições militares, instituições para menores infratores e na rua (moradores de rua), podem ser considerados como suspeitos. Na ausência de médico legista oficial, compete ao médico perito, nomeado pela autoridade policial ou judicial para realizar o exame cadavérico, preencher a DO. 2- Nos casos de óbitos naturais sem assistência médica, compete ao médico do Serviço de Verificações de Óbitos do município ou região preencher a DO. Na ausência de tal serviço, este preenchimento é atribuição do médico da Secretaria Municipal de Saúde. 3- Nos casos de óbitos naturais com assistência médica, em tratamento sob regime ambulatorial ou domiciliar, prestado por Programas de Saúde do Município, o preenchimento da DO compete ao médico assistente. Na ausência deste, outro médico do mesmo programa deve preencher o documento. Caso não se consiga definir a causa natural do óbito o preenchimento deve ser feito pelo Serviço de Verificação de Óbitos. 4- Nos casos de óbitos naturais de pacientes internados, com causas bem definidas, o preenchimento da DO compete ao médico assistente, ou na sua ausência, ao médico substituto (plantão ou sobreaviso) pertencente à mesma instituição. 5- Nos atendimentos de emergência em instituições hospitalares ou similares, nos casos de óbitos naturais de causa mal definida, após a assistência médica, compete ao médico do Serviço de Verificações de Óbitos do município ou região preencher a DO. Na ausência de tal serviço, compete ao médico da Secretaria Municipal de Saúde preencher a Declaração de Óbito. 6- Qualquer médico, assistente ou não, está autorizado, mas não é obrigado, a preencher a DO, a pedido da família, quando o óbito for natural, de causa bem definida. É necessário que constate pessoalmente o óbito e, através de informações dos familiares, receitas de medicamentos e/ou exames complementares do falecido, defina a causa do óbito natural. 7- Compete aos responsáveis pelo Instituto Médico Legal, Serviço de Verificação de Óbitos, Secretaria Municipal de Saúde e hospitais em geral, elaborar uma escala de plantão ou sobreaviso, para atendimentos de óbitos, principalmente para os períodos Cons. Zulmar Vieira Coutinho noturnos, finais de semanas e feriados. 8- Os médicos, quando encaminharem os corpos dos hospitais ou instituições similares para o Instituto Médico Legal ou Serviço de Verificação de Óbitos, devem enviar um relatório sucinto do caso. Do mesmo modo devem proceder ao encaminharem para o médico da Secretaria Municipal de Saúde. 9- O médico, se tem alguma dúvida sobre óbito violento ou suspeito de ter sido violento, ou natural, deve fazer contato telefônico, respectivamente, com o médico de plantão ou sobreaviso do Instituto Médico Legal e com o Serviço de Verificação de Óbitos ou da Secretaria Municipal de Saúde do seu município. O médico pode utilizar o formulário da instituição onde trabalha ou solicitar a DO à Secretaria Municipal de Saúde. Se o médico tem pacientes particulares, tem o direito de preencher a DO fornecida pelo município. 15 REVISTA CREMESC RESOLUÇÕES RESOLUÇÃO CFM Nº 1890/2009 (Publicada no D.O.U. de 19 jan 2009, Seção I, pg. 94-5) Define e normatiza a Telerradiologia O CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA, no uso das atribuições conferidas pela lei nº. 3. 268, de 30 de Setembro de 1957, regulamentada pelo Decreto nº. 44. 045, de 19 de Julho de 1958 e pela Lei nº. 11. 000, de 15 de Dezembro de 2004, e CONSIDERANDO que cabe ao Conselho Federal de Medicina disciplinar o exercício profissional médico e zelar pela boa prática médica no país; CONSIDERANDO o constante desenvolvimento de novas técnicas de informação e comunicação que facilitam o intercâmbio de informações entre médicos e entre estes e os pacientes; CONSIDERANDO que a despeito das conseqüências positivas da Telerradiologia existem muitos problemas éticos e legais decorrentes de sua utilização; CONSIDERANDO que as informações sobre o paciente identificado só podem ser transmitidas a outro profissional com prévia permissão do paciente, mediante seu consentimento livre e esclarecido e sob rígidas normas de segurança capazes de garantir a confidencialidade e integridade das informações; CONSIDERANDO que o médico que exerce a radiologia a distância, sem contato com o paciente, deve avaliar cuidadosamente a informação que recebe, só pode emitir o relatório radiológico ou tomar decisões médicas se a qualidade da informação for suficiente e adequada ao caso em questão; CONSIDERANDO o teor da “Declaração de Tel Aviv sobre responsabilidades e normas éticas na utilização da Telemedicina”, ado- 16 REVISTA CREMESC tada pela 51ª Assembléia Geral da Associação Médica Mundial, em Tel Aviv, Israel, em Outubro de 1999; co é a distância, utilizando a transmissão eletrônica de imagens radiológicas com o propósito de consulta ou relatório. CONSIDERANDO o disposto nas Resoluções CFM nº 1.638/2002 e nº 1.821/2007, principalmente no tocante às normas para transmissão de dados identificados; Art. 2º Os serviços prestados pela Telerradiologia deverão ter a infra-estrutura tecnológica apropriada e obedecer às normas técnicas e éticas do CFM pertinentes à guarda, manuseio, transmissão de dados, confidencialidade, privacidade e garantia do sigilo profissional. CONSIDERANDO o disposto na Resolução CFM nº 1.627/2001, que define e regulamenta o Ato Médico; CONSIDERANDO o disposto na Resolução CFM nº 1.643/2002, que define e regulamenta a Telemedicina; CONSIDERANDO o disposto nas Resoluções CFM nº 1.634/2002 e 1.785/2006, que reconhecem e regulamentam as especialidades médicas e áreas de atuação; CONSIDERANDO o decidido na sessão plenária de 18 de agosto de 2006, realizada em Brasília, com sucedâneo no Parecer CFM nº 36/2002; CONSIDERANDO o disposto na Portaria/MS/ SVS nº 453, de 01 de junho de 1998, que aprova o Regulamento Técnico que estabelece as diretrizes básicas de proteção radiológica em radiodiagnóstico médico e odontológico, dispõe sobre o uso dos raios-x diagnósticos em todo território nacional e dá outras providências ; CONSIDERANDO, finalmente, o decidido na sessão plenária do Conselho Federal de Medicina realizada em 15 de janeiro de 2009. Art. 3º A transmissão dos exames por telerradiologia deverá ser acompanhada dos dados clínicos necessários do paciente, colhidos pelo médico solicitante, para a elaboração do relatório. Parágrafo único. O paciente deverá autorizar a transmissão eletrônica das imagens e seus dados por meio de consentimento informado, livre e esclarecido. Art. 4º Para efeitos de transmissão de exames e relatório à distância, esta resolução reconhece como especialista os profissionais com registro específico no CRM, nas seguintes especialidades ou áreas de atuação: a) Especialidades: 1.Radiologia e Diagnóstico por Imagem 2.Diagnóstico por Imagem: Atuação Exclusiva Ultra-sonografia Geral 3.Diagnóstico por Imagem: Atuação Exclusiva Radiologia Intervencionista e Angiorradiologia 4.Medicina Nuclear RESOLVE: Art. 1º Definir a Telerradiologia como o exercício da Medicina, onde o fator críti- b) Áreas de Atuação: 1.Angiorradiologia e Cirurgia Endovascular 2. Densitometria Óssea 3. Ecografia Vascular com Doppler 4. Mamografia 5. Neurorradiologia 6. Radiologia Intervencionista e Angiorradiologia 7.Ultra-sonografia em Ginecologia e Obstetrícia Art. 5º Em caso de radiologia geral não contrastada, exceto mamografia, conforme o nível 1 do Anexo, e em caso de emergência, quando não existir médico especialista na cidade, o médico responsável pelo paciente poderá solicitar ao médico especialista o devido suporte diagnóstico a distância. Art. 6º Nos demais exames [conforme os níveis 2, 3 e 4 do Anexo], obrigatoriamente, deverá ter a presença do médico especialista no local da sua execução. Art. 7º A responsabilidade profissional do atendimento cabe ao médico especialista assistente do paciente, que realizou o exame. § 1º O médico especialista que emitiu o relatório a distância é solidário nesta responsabilidade. § 2º A apuração de eventual infração ética desses serviços será feita pelo Conselho Regional da jurisdição onde foi realizado o procedimento. Art. 8º Na emissão do relatório deverá constar o número do registro médico, nos respectivos Conselhos Regionais de Medicina, dos médicos envolvidos no atendimento. Art. 9º As pessoas jurídicas que prestarem serviços em Telerradiologia deverão inscrever-se no Cadastro de Pessoa Jurídica do Conselho Regional de Medicina do Estado onde estão situadas, com a respectiva responsabilidade técnica de um médico com título de especialista em radiologia e diagnóstico por imagem regularmente inscrito no Conselho Regional e a apresentação da relação dos demais médicos especialistas componentes do quadro funcional. § 1º Para atividades específicas e únicas em medicina nuclear, o responsável técnico deverá ser médico portador de título de especialista em medicina nuclear, devidamente registrado no Conselho Regional de Medicina e autorizado pela Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN). § 2º No caso do prestador ser pessoa física, este deverá ser médico portador de título de especialista ou certificado de área de atuação, conforme artigo 4º, devidamente registrado no Conselho Regional de Medicina da sua jurisdição. Art. 10. Revogam-se todas as disposições em contrário. Art. 11. Esta Resolução entra em vigor a partir da data de sua publicação. Brasília-DF, 15 de janeiro de 2009. ANEXO ÚNICO NORMAS OPERACIONAIS E REQUISITOS MÍNIMOS PARA A TRANSMISSÃO DOS EXAMES RADIOLÓGICOS REFERENTE AO ARTIGO 2º. Nível 1: Radiologia Geral não contrastada [por exemplo radiografias de tórax, extremidades, colunas, crânio, e outros], exceto mamografia. Os exames deverão ser transmitidos em formato JPEG com resolução mínima de 4 Megapixel ou DICOM 3. Nível 2: Radiologia Especializada ou Contrastada Os exames deverão ser transmitidos em formatos JPEG com resolução mínima de 4 Megapixel ou DICOM 3, sob responsabilidade de médico com registro no CRM de uma das especialidades ou área de atuação listadas no artigo 4º. Nível 3: Ultra-sonografia, Tomografia Computadorizada, Ressonância Magnética, Medicina Nuclear Os exames deverão ser transmitidos em formato DICOM 3, sob responsabilidade de médico com registro no CRM de uma das especialidades ou área de atuação listadas no artigo 4º. Nível 4: Mamografia Digital (CR ou DR) EDSON DE OLIVEIRA ANDRADE LIVIA BARROS GARÇÃO Presidente Secretária-Geral Os exames deverão ser transmitidos em formato DICOM 3, sob a responsabilidade de médico com registro no CRM de uma das especialidades ou área de atuação listadas no artigo 4º. A análise dos exames deverá ser feita em monitor específico. 17 REVISTA CREMESC RESENHAS Um homem bom Para Darwin Good, (ING/ALEM, 2008) Direção: Vicente Amorim, Elenco: Wigo Mortensen, Jason Isaacs, Jodie Whittaker, Steven Mackintosh, Gemma Jones 96 min. (Für Darwin, 1864), Fritz Müller, Tradução de Luiz Roberto Fontes e Stefano Hagen, Editora da UFSC: Florianópolis, 2009. Um pacato professor de literatura é chamado ao comando do III Reich, no início da escalada de Hitler, para dar explicações sobre um livro que escrevera alguns anos antes, abordando a eutanásia em pessoas seriamente doentes. Era uma obra ficcional, na qual o marido mata a esposa para que ela não sofra. Fica surpreso ao saber que a história agradara inclusive ao Führer, concordando em escrever um ensaio sobre o livro. Cuidador de sua mãe doente, com a esposa neurótica e com dois filhos, o professor divide-se entre as tarefas acadêmicas e domésticas. É também amigo e paciente de um psicanalista judeu. A ascensão do nazismo coincide com sua promoção a postos cada vez mais importantes na hierarquia universitária e do partido, ao qual adere sem questionar, alheio aos alertas do amigo. Como tantas outras pessoas, vai aos poucos se moldando ao regime, sem coragem para recusar cargos e temendo perder privilégios. Com produção inglesa, traz o trabalho do diretor Vicente Amorim, mais um brasileiro que se destaca no cenário internacional. A questão tratada no filme é essencialmente moral. Como um indivíduo sem maldade aliena-se e integra-se num sistema político e social sem questioná-lo em momento algum, mesmo observando a violência que gradualmente se instala. Se por um lado é penoso sobreviver naquele sistema, mais difícil ainda é não ser contaminado por ele e não se curvar à vaidade, proporcionada pelo aliciamento político. Manter-se íntegro, manter intactas suas convicções e ser capaz de sustentar uma postura crítica. Essa é uma questão que ainda hoje nos diz respeito. São cada vez maiores e mais freqüentes os dilemas morais que se nos apresentam. Apesar de vivermos hoje em um regime democrático, ainda assim não é fácil ter opinião própria e sermos capazes de resistir à atração de participar de ações institucionais que ferem ideais e normas éticas. Sempre existe o risco de, como no filme, criarmos uma ilusão protetora que pinta a realidade com outras cores e sons, com os excluídos pelo regime formando uma orquestra, tocando tranquilamente num momento de lazer. Rodrigo Bertoncini 18 REVISTA CREMESC A nova tradução de “Für Darwin”, de Fritz Müller (1821-1897), escrito quando morou na Ilha de Santa Catarina, é uma excelente introdução à obra e à vida do naturalista alemão/blumenauense. Elaborada por Luiz Roberto Fontes, médico do Instituto Médico Legal de São Paulo, e por Stefano Hagen, professor de veterinária da USP, a edição é acrescida da tradução de seis resenhas da época da publicação original, tanto relativas à edição alemã (Engelmann: Leipzig, 1864) quanto à inglesa (John Murray: Londres, 1869); e quatro longos necrológios do autor, incluindo o de Ernst Haeckel (1898) e o de Walter Blandford (1897), este publicado na Nature. Os textos complementares trazem informações interessantes sobre a vida de Fritz Müller, bem como o reconhecimento internacional daquele que Darwin denominou “príncipe dos observadores” e Haeckel “herói da ciência”. Particularmente interessantes são as descrições da saída da antiga Desterro em 1867, onde lecionava matemática no Liceu, por discordâncias com os jesuítas, e a demissão do cargo de naturalista viajante do Museu Nacional em 1890 pelos republicanos, dois exemplos locais da disputa entre religião, política e ciência. Este livro compõe com “O sábio e a floresta” de Moacir Werneck de Castro (Rocco: Rio de Janeiro, 1992), “Fritz Müller: a naturalist in Brazil” de David West (Pocahontas Press: Blacksburg, 2003), e as imprescindíveis publicações do neurocirurgião blumenauense Cezar Zillig “Dear Mr. Darwin” (Sky/Anima: São Paulo, 1997) e “Fritz Muller, meu irmão” (Cultura em Movimento: Blumenau, 2004) a bibliografia contemporânea básica sobre o “Brazil’s greatest naturalist”, segundo Ernst Mayr (1904-2005), Professor Emérito da Cátedra Alexander Agassiz de Zoologia da Universidade de Harvard. Ylmar Corrêa Neto ARTES Arte Catarinense Contemporânea IV Walmor Corrêa (Florianópolis, 1963) Walmor Corrêa, catarinense que vive em Porto Alegre, vem desenvolvendo desde o final da década de noventa uma obra conceitualmente única, mistura de imaginação e ciência. Utilizando a pintura, o desenho, esqueletos, galhos de árvore, taxidermia, vitrines e a palavra, modifica, mescla e nomeia espécimes, criando com ironia e humor uma fauna e flora particular, dissimulada. Suas obras, que à primeira vista parecem proceder de um sisudo Museu de História Natural, examinadas em detalhe revelam sutilezas como um coração de três câmaras em uma sereia, um esqueleto de pássaro com bico na forma de trompa, ou aves empalhadas com cabeça de rato, abordando preocupações bioéticas como morte, manipulação genética e xenotransplantes. Suas criações recebem denominações cientificamente pseudo-precisas como Wirbeltierspinne, uma aranha com cabeça de roedor, ou Pellagius sonhatorum chin, um peixe hermafrodita chinês viciado em drogas ilícitas. Tudo com muito apuro técnico. Reconhecido pela crítica especializada, tem sido convidado para as principais exibições nacionais, como a XXVI Bienal de São Paulo (2004), o Panorama da Arte Brasileira do Museu de Arte Moderna de São Paulo (2005) e a 7a. Bienal do MERCOSUL (Porto Alegre, 2009), além de coletivas na Espanha, Alemanha, Uruguai, Equador, Áustria, Chile, Argentina e Estados Unidos. Em 2008 foi artista convidado do atelier de gravura da Fundação Iberê Camargo (Porto Alegre). Entre suas exposições individuais salientamos aquelas na Assembléia Legislativa (Florianópolis, 1994), no Museu de Arte do Rio Grande do Sul (Porto Alegre, 2003), no Centro Universitário Mariantônia da USP (São Paulo, 2004), no Instituto Goethe (Porto Alegre, 2007), na Galeria Laura Marsiaj (Rio de Janeiro, 2008) e na Fundação BADESC (Florianópolis, 2009), bem como exibições na Espanha e Bélgica. Tadeu Chiarelli, crítico e professor de historia da arte da USP, escreve que “esses seres criados por Walmor B. Corrêa falam de um mundo fantástico, representam a taxidermia de uma fauna fantástica que perturba nossa percepção, sobretudo pelo fato de que, na atualidade, eles não se apresentarem mais como meras alucinações artísticas, mas como possibilidades científicas... Esse arquivo de animais metamorfoseados e representados nas pinturas de Walmor B. Corrêa desafia nossa crença na verdade da estética do natural, embora, como foi dito, sinalize para uma natureza transformada em puro artifício e arbitrariedade.” Ylmar Corrêa Neto GALHO - FERRO E TAXIDERMIA - 2009 CAIXA DE MÚSICA 19 REVISTA CREMESC Nesta edição Entrevista - Dr. Roberto D’Ávila Homenagem - DR. ELISIÁRIO Artigos - MORTE ENCEFÁLICA SEDAÇÃO PALIATIVA ENTREGA DE PRONTUÁRIOS À AUTORIDADE JUDICIAL/POLICIAL DECLARAÇÃO DE ÓBITO Resoluções: RESOLUÇÃO CFM Nº 1890/2009 Resenhas - PARA DARWIN (Für Darwin, 1864) UM HOMEM BOM - Good, (Ing/Alem, 2008) Arte Catarinense - Walmor Corrêa SEDE: AV. RIO BRANCO, 533 – 2º ANDAR - C.P. 1279 FONE: (48) 3952-5000 - FAX: (48)3225-5331 CEP 88015-201 – FLORIANÓPOLIS-SC SITE: www.cremesc.org.br E-MAIL: [email protected] DEL. ARARANGUÁ: (48) 3524-8075 DEL. BLUMENAU: (47) 3326-4554 DEL. CANOINHAS: (47) 3622-8263 DEL. CONCÓRDIA: (49) 3422-5114 DEL. CHAPECÓ: (49) 3323-0502 DEL. CRICIÚMA: (48) 3433-7223 DEL. CURITIBANOS: (49) 3241-6042 DEL. ITAJAÍ: (47) 3349-7724 DEL. JOAÇABA: (49) 3521-1611 DEL. JOINVILLE: (47) 3433-9452 DEL. LAGES: (49) 3222-8519 DEL. MAFRA (47) 3643-6140 DEL. PORTO UNIÃO: (42) 3522-0936 DEL. RIO DO SUL: (47) 3522-6399 DEL. S. M. O.: (49) 3621-3484 DEL. TUBARÃO: (48)3632-7876 DEL. XANXERÊ: (49) 3433-9883
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