Imprimir artigo - Bem Vindos a Faculdade de Direito de Alta Floresta

Transcrição

Imprimir artigo - Bem Vindos a Faculdade de Direito de Alta Floresta
CONCRETIZAÇÃO DO DIREITO FUNDAMENTAL À APOSENTADORIA
RURAL POR IDADE DO SEGURADO ESPECIAL
IMPLEMENTATIONOF THEFUNDAMENTAL RIGHTTO RURALRETIREMENT
BY AGEOFSPECIAL INSURED
Jéssica Liliane de Melo∗
Aline Fagundes dos Santos∗∗
Resumo: Pretende o presente artigo demonstrar a não concretização por completo do direito
aposentadoria rural por idade do segurado especial, embora se trate de direito fundamental,
constitucionalmente assegurado afeto à Previdência Social. Destaca que há infindáveis
indeferimentos dos pedidos postulados nos postos de atendimento do INSS e, consequentes
ingressos na justiça para o pleito do benefício. A análise será feita sobre alguns fragmentos
do conceito de seguro especial, conforme preleciona a Lei 8.213/1991, e também o exame
do
entendimento
do
Tribunal
Regional
Federal
da 4ª
Região,
em
situações
envolvendotrabalhadores rurais, bem como a aplicação da referida lei que dispõe sobre os
planos de benefícios da Previdência Social.
Palavras-chaves: Previdência. Concretização. Indeferimento. Segurado Especial.
Abstract:This articleaimstodemonstrate the non-implementation in fullof the fundamental
rightconstitutionallyguaranteed, by social security, with regard torural retirement by agefor
special insured.It must be observedthat there areunending rejections of requestedretirements
by
theoffices
of
theSocialSecurityandconsequentlyanincrease
in
requestsforjusticetograntthebenefit.The analysis will bemadeonsomefragmentsof the concept
ofspecialinsuranceasin the text ofLaw8.213/1991, and also examinetheunderstandingof the
Federal Courtof the 4th Region, in situationsinvolvingfarm workers, as well the
applicationof that lawwhich disposes aboutplansforSocialSecurity benefits.
Keywords: Social Security. Realization.Rejections.SpecialInsured.
∗
Acadêmica do 10. semestre da Faculdade de Direito de Alta Floresta (FADAF). E-mail:
<[email protected]>.
∗∗
Mestre em Direitos Fundamentais pela Universidade Luterana do Brasil (ULBRA - RS), Advogada atuante
em Direito Previdenciário, Professora Universitária e Coordenadora do Grupo de Iniciação Científica em
Direito Previdenciário da Faculdade de Direito de Alta Floresta (MT), membro do IBDP.
1INTRODUÇÃO
A aposentadoria por idade é um tema que nos leva a refletir, pois que é da natureza do
homem envelhecer e morrer com idade cada dia mais avançada. E para passar por esta fase
da vida, deseja-se possuir recursos financeiros o suficiente para viver com dignidade.
Uma velhice considerada tranquila, geralmente resulta da condição financeira do
idosode modo que, este nãopretende depender de familiares, quer ser independente, daí é
que se vê a importância dada ao benefício previdenciário da aposentadoria por idade, e neste
momento sob análise, o trabalhador rural, isto é, no direito garantido a ele de um benefício
previdenciário rural por idade.
Cabe aqui, mencionar as várias teses, as quais dizem respeito sobre a natureza do
benefício do homem do campo, quanto a se enquadrar como benefício previdenciário ou
assistencial, sendo que a conclusão a que se chega a partir daanálise da legislação é pela
segunda opção, entendendotodavia,que apenas não há a necessidade de contribuição por
parte do segurado especial.
O trabalhador rural, qualificado como segurado especial, contribui sim, mas não como
os demais segurados da Previdência Social. Ele contribui com anos de trabalho rural, o qual
leva alimento às mesas de inúmeras famílias brasileiras.
A relevância de se estudar o tema proposto, da concretização do direito à
aposentadoria rural por idade do segurado especial se deve a dificuldade, muitas vezes
encontrada, quando da postulação do benefício nos postos de atendimento do INSS. E a
partir disso, consequentemente, junto o Poder Judiciário que passa a fazer parte desta
relação, vez que, ao ter negado a concessão do benefício na esfera administrativa, cabe ao
segurado postular o direito à aposentadoria ao Estado-juiz.
Sendo assim, far-se-á uma breve análise do conceito de segurado especial e suas
particularidades, contidas na Lei n. 8.213/1991, e posteriormente, a apreciação de
jurisprudências do Tribunal Regional Federal da 4ª Região.
O homem do campo é um segurado que faz jus ao benefício previdenciário rural por
idade, tanto quanto qualquer outro segurado. E o que torna custoso a concessão do referido
benefício são as constantes negativas do Instituto Nacional de Seguro Social.
O método de abordagem a ser utilizado no presente trabalho acadêmico será o
indutivo. Caracteriza-se pelo processo mental realizado o qual parte do pressuposto de que
através de dados particulares, suficientemente constatados, deduz-se uma verdade geral ou
universal.
O método de procedimento utilizado será o histórico o qual consiste em investigar
acontecimentos, processos e instituições do passado para verificar a sua influência na
sociedade da hoje, pois as instituições alcançam a sua forma atual através de alterações de
suas partes componentes, ao longo do tempo, influenciados pelo contexto cultural particular
de cada época. Também se fará presente o método de procedimento monográfico. Este
baseia-se no estudo de determinados indivíduos, profissões, condições, instituições, grupos
ou comunidades, com a finalidade de obter generalizações.
2 ANÁLISE DO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DE APOSENTADORIA RURAL
POR IDADE SOB O PRISMA DA JURISPRUDÊNCIA DO TRIBUNAL
REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO
No desenrolar deste capítulo, uma breve panorâmica será realizada quanto à subsunção
da Lei n. 8.213/91 ao caso concreto, ou seja, como o Tribunal Regional Federal da 4ª Região
vem decidindo em questões previdenciárias quando há, na seara administrativa, negativa ao
requerimento da aposentadoria por idade rural por parte dos segurados especiais.
2.1 Aspectos legais e fáticos do segurado especial
Primeiramente, imprescindível mencionar o conceito de segurado especial trazido pela
própria lei dos Planos de Benefícios da Previdência Social caracterizando-se como a pessoa
física, residente no imóvel rural ou em aglomerado urbano ou rural próximo a ele que,
individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com auxílio eventual de
terceiros, trabalhe na terra e dela retire o próprio sustento e da família, como produtor,
pescador e seus respectivos cônjuges ou companheiros. Assim aduz o inciso VII, do artigo
11, da Lei n. 8.213/91:
Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas
físicas: (Redação dada pela Lei nº 8.647, de 1993)[...]
VII – como segurado especial: a pessoa física residente no imóvel rural ou em
aglomerado urbano ou rural próximo a ele que, individualmente ou em regime de
economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, na condição
de: (Redação dada pela Lei nº 11.718, de 2008)
a) produtor, seja proprietário, usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou
meeiro outorgados, comodatário ou arrendatário rurais, que explore
atividade: (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)
1. agropecuária em área de até 4 (quatro) módulos fiscais; (Incluído pela Lei nº
11.718, de 2008)
2. de seringueiro ou extrativista vegetal que exerça suas atividades nos termos do
inciso XII do caput do art. 2º da Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000, e faça dessas
atividades o principal meio de vida; (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)
b) pescador artesanal ou a este assemelhado que faça da pesca profissão habitual
ou principal meio de vida; e (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)
c) cônjuge ou companheiro, bem como filho maior de 16 (dezesseis) anos de idade
ou a este equiparado, do segurado de que tratam as alíneas a e b deste inciso, que,
comprovadamente, trabalhem com o grupo familiar respectivo. (Incluído pela Lei
nº 11.718, de 2008)
Ademais, é importante ressaltar a grande dificuldade dos trabalhadores rurais em
conseguir reunir todas as provas que o órgão administrativo responsável por conceder o
benefício previdenciário exige. Tanto é difícil reunir todas as provas demandadas para
comprovar os anos de trabalho campesino, que acaba por ocorrer o ingresso cada vez mais
corriqueiro ao Poder Judiciário, razão pela qual o INSS encontra-se como um dos maiores
réus da justiça brasileira.
Como preleciona Ibrahim (2011, p. 511), a Lei n. 11.718/08 traz em seu bojo as provas
documentais das quais o camponês necessita dispor,e de forma específicaapenas três, para
conseguir o pleito do benefício previdenciário na esfera administrativa:
A comprovação do efetivo exercício de atividade rural será feita em relação aos
meses imediatamente anteriores ao requerimento do benefício, mesmo que de
forma descontínua, durante período igual ao da carência exigida para a concessão
do benefício. Os documentos comprobatórios da atividade rural são aqueles
previstos pela Lei n. 11.718/08 em seu artigo 106, que são:
I – contrato individual de trabalho ou Carteira de Trabalho e Previdência Social;
II – contrato de arrendamento, parceria ou comodato rural;
III – declaração fundamentada de sindicato que represente o trabalhador rural ou,
quando for o caso, de sindicato ou colônia de pescadores, desde que homologada
pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS;
IV – comprovante de cadastro do Instituto Nacional de Colonização e Reforma
Agrária – INCRA, no caso de produtores em regime de economia familiar;
V – bloco de notas do produtor rural;
VI – notas fiscais de entrada de mercadorias, de que trata o § 7o do art. 30 da Lei
no 8.212, de 24 de julho de 1991, emitidas pela empresa adquirente da produção,
com indicação do nome do segurado como vendedor;
VII – documentos fiscais relativos a entrega de produção rural à cooperativa
agrícola, entreposto de pescado ou outros, com indicação do segurado como
vendedor ou consignante;
VIII – comprovantes de recolhimento de contribuição à Previdência Social
decorrentes da comercialização da produção;
IX – cópia da declaração de imposto de renda, com indicação de renda proveniente
da comercialização de produção rural; ou
X – licença de ocupação ou permissão outorgada pelo Incra. (NR)
Isto posto, é fato que a realidade da maioria dos trabalhadores que vivem nasáreas
rurais ainda é bastante simplificada, sendo que a atividade que exercem ocorre em um
pequeno ‘pedaço’ de terra para manter a família, ainda mais em locais longínquos, distantes
dos centros urbanos, isso leva a crer, facilmente, que são desprovidos de notas, cupons
fiscais, recibos, entre outros. Geralmente, os contratos são firmados ‘de boca’, pelo ‘fio do
bigode’, o arrendamento de determinada área de terra não é realizado formalmente, mediante
contrato escrito e registrado, mas sim acertado por intermédio da confiança.
Não há no pensamento da maioria da população residente no campo, a ideia de que
‘guardar papeis’ poderá lhe ser útil anos à frente. Falta esclarecimento, geralmente são
pessoas de baixa instrução e a interatividade que possuem fica restrita à comunidade
familiar. De maneira que, os quesitos exigidos pelo Instituto Nacional de Previdência Social,
dificilmente, poderão ser satisfeitos por completo.
Muitas das vezes, aquilo que é produzido por um pequeno produtor é vendido para o
vizinho, ou trocado por qualquer outra mercadoria, sem recibo, documento algum que
comprove a transação comercial e assim os anos passam e a vida segue neste ritmo pacato,
sem ambição e desprovido do mínimo conhecimento de que, lá na frente, quando não tiver
mais forças para o trabalho pesado, o trabalhador rural sequer conhece o seu direito de poder
se aposentar e muito menos possuirá as provas materiais de que necessitam para a
aposentação aos 60 (sessenta) anos e também sua esposa, aos 55 (cinquenta e cinco) anos de
idade.
Neste sentido, merece ser levantada a questão da falta de efetividade dos direitos
socais garantidos pela Carta Magna que abarca, dentre outras, as ações positivas a que o
Estado se dispôs a realizar para atender as necessidades do seu povo, conforme artigo
eletrônico de Elisa Maria Rudge Ramos, entitulado “Os direitos sociais: direitos humanos e
fundamentais”, disponível no site da LFG:
[...] conforme o artigo 5°, parágrafo 1° da Constituição da República, os direitos
fundamentais têm aplicabilidade imediata. Disto decorre que o Estado que se
omitir na implementação dos direitos sociais fundamentais poderá ser condenado à
obrigação de fazer, por meio do que se conhece como "judicialização das políticas
públicas”.
A proteção desses direitos não se materializa de forma plena. Ou seja, o Estado,
através do instrumento ‘Constituição’ reduziu a termo um conjunto de direitos e garantias
postulados pela massa e para efetivá-lo elabora dispositivos jurídicos com o fito de
regulamentar a concretização destes. Conforme preleciona a Autora e obra acima citadas:
A Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 e o Pacto Internacional
sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais de 1966 elevaram os Direitos
Sociais ao nível de Direitos Humanos, de vigência universal, independentemente
de reconhecidos pelas constituições, pois dizem respeito à dignidade da pessoa
humana.
Apesar de todo este aparato normativo, esbarra-se no que chamamos ‘esfera
administrativa’, mecanismo criado para colocar em prática o que o Poder Legislativo
instituiu. No caso em tela, clarividente é o acúmulo de requerimentos aos benefícios
previdenciários rurais por idade quando se chega ao INSS, o qual como já foi dito, é o maior
réu da justiça brasileira.
É neste momento que o Poder Judiciário faz às vezes do Poder Executivo. Aqui o
Estado-juiz determina ao Estado-administração o cumprimento daquilo que profetizou no
mais importante documento da nação. Sendo que, atualmente, os direitos tidos como mais
básicos, como saúde, educação, assistência, previdência social, muitas vezes precisam ser
postulados judicialmente para sua possível efetivação.
Frente a toda esta problemática do não imediatismo da concretização dos direitos
sociais por parte do Estado, o qual oferece a mesma resposta ‘clichê’, habitual, de que não
dispõe de verba orçamentária, como se não bastasse, vem acompanhada da normal negativa
dos requerimentos feitos aos postos de atendimento ao público pelo benefício
previdenciário, fazendo-se referência à aposentadoria rural por idade negada pelo INSS.
2.2 Análise de fragmentos do conceito de segurado especial sob o prisma
dajurisprudência do TRF
Após relatos preliminares a respeito de alguns aspectos jurídicos e fáticos do segurado
especial, cumpre agora adentrar à análise específica de excertos do conceito do referido
segurado insculpido na Lei 8.213/91 com base em decisões jurisprudenciais da Região Sul
do Brasil.
A escolha pelos julgados do Tribunal Regional Federal da 4ª Região se deve ao
pioneirismo em decidirem de maneira, a certo modo, avançada, as questões relativas aos
direitos previdenciários dos segurados especiais.
2.2.1 Análise do excerto ‘residente no imóvel rural ou em aglomerado urbano ou rural
próximo a ele’ sob o prisma da jurisprudência
Ao recorrer à instância superior, o juízo ad quem vem deferindo os recursos
interpostos tendo por base a interpretação literal da lei. O que o Instituto Nacional de Seguro
Social persiste em denegar, grande parte dos desembargadores do Tribunal Regional Federal
da 4ª Região decide, aplicando a lei ao caso concreto, ou seja, quanto ao fragmento do
conceito de segurado especial: “[...] residente no imóvel rural ou em aglomerado urbano ou
rural próximo a ele [...]”, assim foi o entendimento do Tribunalde Justiça do Paraná na
Apelação Cível abaixo colacionada:
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0021053-78.2011.404.9999/PR. D.E. Publicado em
26/03/2012.
Outrossim, o fato de o imóvel, hoje, se localizar em zona urbana ou de o
requerente residir em zona urbana, por si só, não descaracteriza a sua condição de
segurado especial. Nesse sentido, já se manifestou esta e. Corte, senão vejamos:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. INÍCIO DE
PROVA MATERIAL. DOCUMENTOS EM NOME DE TERCEIROS.
AGRICULTOR RESIDENTE NA ZONA URBANA. ADMISSIBILIDADE.
[...]4. O fato de a autora residir na cidade não descaracteriza a sua condição
desegurada especial, porquanto o que define essa condição é o exercício de
atividade rural independentemente do local onde o trabalhador possui
residência.(grifei)
(EIAC nº 16045/PR, TRF4, 3ª Seção, Rel. Juiz Ricardo Teixeira do Valle Pereira,
DJU de 11/02/2004, p.325)
Nota-se, pelo exposto da decisão, que a condição de segurado especial é definida pelo
exercício de atividade rural e sob nenhuma hipótese, leva-se em consideração o local onde
reside o trabalhador.
2.2.2 Análise dos excertos‘individualmente ou em regime de economia familiar’ e ‘auxílio
eventual de terceiros’ sob o prisma da jurisprudência
Outro problema suscitado em indeferimentos feitos pelo INSS está na interpretação
dos segmentos: “[...]individualmente ou em regime de economia familiar [...]” e “[...] auxílio
eventual de terceiros [...]”, os quais compõem o conceito de segurado especial. Isto posto, o
Egrégio Tribunal aduziu, conforme segue:
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0021053-78.2011.404.9999/PR. D.E. Publicado em
26/03/2012.
Por fim, ressalta-se que o fato de o cônjuge exercer atividade outra que não a rural
também não serve para descaracterizar automaticamente a condição de segurado
especial de quem postula o benefício, pois, ainda que considerado como
trabalhador rural individual, sua situação encontra guarida no art. 11, VII, da Lei
n° 8.213/91, sendo certo também que incumbia à Autarquia a prova de que a
subsistência da família era garantida pelo salário do cônjuge, e não pela atividade
rural desenvolvida pelo requerente.
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0021053-78.2011.404.9999/PR. D.E.Publicado em
26/03/2012.
Além disso, o auxílio de terceiros (vizinhos, bóias-frias) em determinados períodos
não elide o direito postulado, consoante o inciso VII do art. 11 da Lei n° 8.213/91,
visto que se trata de prática comum no meio rural.
Predomina o entendimento de que há a possibilidade de um dos membros da família
poder exercer atividade rural sem que disso resulte na extensão da qualidade de segurado
especial aos outros membros da família que, por exemplo, possuam emprego na área urbana.
Isto prova que, se o cônjuge exerce outra atividade laboral que não a rurícola, não haverá a
desconsideração da condição de segurado especial daquele que desempenhe suas atividades
trabalhistas no campo.
É certo também que, o auxílio eventual de vizinhos, bóias-frias e outros assemelhados
não destitui a qualidade de segurado especial, a menos que essa ajuda ultrapasse o período
de 120 (cento e vinte) dias no ano. Por sorte que, do mesmo modo que se é permitido
contratar pessoas para auxiliar no trato da terra, assim também o é quando da saída do
segurado ou de seu cônjuge, companheiro ou filho maior de 16 (dezesseis) anos de sua
‘propriedade’ para trabalhar em outras terras, para outras pessoas, principalmente no período
da entressafra, em que faz-se imprescindível a busca por outras fontes de renda.
2.3 Análise da extensão do benefício previdenciário de aposentadoria rural por idade à
esposa do segurado especial sob o enfoque da jurisprudência do TRF 4ª região
Muito comuns são os casos de negativa do benefício para as esposas ou companheiras
de trabalhadores rurais, pois estas não possuem terras, contratos ou notas em nome próprio,
sendo que todos estes documentos estão no nome do marido, companheiro ou convivente,
apesar de haverem trabalhado a vida toda no campo antes e depois de contrair matrimônio.
Ao se negar o pedido de aposentadoria rural por idade à esposa do segurado especial está
cometendo-se uma imensa injustiça, pois foram mulheres ativas e trabalharam tanto quanto
os homens na lida rural, e neste contexto é importante mencionar quedocumentos em nome
do marido ou do pai identificam-se como início de prova material do trabalho rural.
Isso é decorrente da definição do regime de economia familiar, em que os membros da
família colaboram no trabalho rurícola, numa relação de mútua dependência e colaboração.
Portanto, ao se verificar a qualidade de segurado especial do marido, por intermédio da
certidão de casamento, haverá a extensão desta característica à esposa, desde que associada à
robusta prova testemunhal.
Assim, foi o entendimento dos desembargadores do Tribunal Regional Federal da 4ª
Região, quanto à concessão do benefício previdenciário rural por idade às esposas dos
segurados especiais:
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0021053-78.2011.404.9999/PR. D.E.Publicado em
26/03/2012.
[...] é possível a consideração de documentos em nome dos demais membros da
família para à concessão do beneficio de aposentadoria por idade rural.
[...]Ademais, quando se trata de mulheres, a prova se torna ainda mais difícil, pois
se sabe que quando existiam documentos, estes eram lançados em nome do chefe
da família onde, há certo tempo, era o único membro familiar a possuir direito à
aposentadoria, de modo que deixar de atribuir-lhe a qualidade de trabalhadora
rural em face da inexistência de documento em nome próprio, qualificando-a como
tal, redunda em grande injustiça com as mulheres ativas neste tipo de trabalho
árduo em que trabalham tanto quanto ou muitas vezes ainda mais que os homens.
Os documentos apresentados em nome de terceiros, sobretudo quando dos pais ou
cônjuge, consubstanciam início de prova material do labor rural, de acordo com a
Súmula n° 73, desta Corte, haja vista que o trabalho com base em uma única
unidade produtiva tem como regra a documentação emitida em nome de uma única
pessoa.
[...]Tal orientação, agora sumulada, decorre da própria interpretação possibilitada
pelo art. 11 da Lei de Benefícios, que define o regime de economia familiar como
aquele em que os membros da família exercem "em condições de mútua
dependência e colaboração", sendo certo, repita-se, que os atos negociais da
entidade respectiva, via de regra, serão formalizados não de forma individual, mas
em nome do pater familiae, que é quem representa o grupo familiar perante
terceiros, função esta exercida, normalmente, pelo genitor ou cônjuge masculino
(STJ, Resp 506.959/RS, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 07-10-03; Resp 603.202, Rel.
Min. Jorge Scartezzini, j. 06-05-04 e Resp. 538.232/RS, Rel. Min. Laurita Vaz, j.
15-03-04).
[...]Oportuno, no presente caso, conferir-se decisão unânime proferida pela Sexta
Turma do Superior Tribunal de Justiça, em 26 de outubro de 1999, assim
ementada:
PREVIDENCIÁRIO. RURÍCOLA. PROVA TESTEMUNHAL. CERTIDÃO DE
CASAMENTO. MARIDO. LAVRADOR. EXTENSÃO PROVA MATERIAL.
1. Verificada a existência de certidão de casamento reconhecendo a atividade de
rurícola do marido, é de se estender à sua mulher esta condição, para fins de
obtenção de aposentadoria por idade ou por invalidez, desde que aliada à idônea
prova testemunhal [...] (REsp. nº 225.867, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, in
DJ de 29-05-2000).
2.4 Análise da prova testemunhal na concessão do benefício previdenciário rural por
idade sob o prisma da jurisprudência
Muito embora a prova testemunhal não seja, ao reportar-se ao processo civil, a melhor
das provas, até porque é chamada de ‘a prostituta das provas’, no âmbito previdenciário ela
ganha o seu devido valor, como lembra o entendimento do Egrégio Tribunal da 4ª Região:
REEXAME NECESSÁRIO CÍVEL Nº 0000095-37.2012.404.9999/RS
D.E. Publicado em 23/03/2012.
EMENTA:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. REGIME DE
ECONOMIA FAMILIAR. REQUISITOS LEGAIS. COMPROVAÇÃO. INÍCIO
DE
PROVA
MATERIAL,
COMPLEMENTADA
POR
PROVA
TESTEMUNHAL.
[...]No caso, os documentos juntados aos autos constituem início de prova
material. A prova testemunhal, por sua vez, é precisa e convincente do labor rural
da autora, em regime de economia familiar, no período de carência legalmente
exigido.
Fica claro que todos os requisitos exigidos pelo órgão administrativo, o INSS, para a
concessão do benefício, aportados ao artigo 106 da Lei n. 11.718/08 são provas cabais para a
comprovação da qualidade de trabalhador rural e a consequente qualidade de segurado
especial. Porém, ao se verificar o caso concreto, encontram-se situações em que a prova
testemunhal acaba se sobressaindo em relação às outras, pelo fato das outras provas não
possuírem a força necessária para o convencimento do julgador. É neste cenário que entra
em cena a prova testemunhal.
2.4.1 Análise da prova testemunhal na concessão do benefício previdenciário rural por
idade ao agregado sob o prisma da jurisprudência
No caso específico do agregado, cuja condição assemelha-se à de bóia-fria, essencial é
a prova testemunhal, pois é uma relação de trabalho regulada pela informalidade, visto que o
próprio INSS nega, metodicamente, o benefício a esse grupo de trabalhadores. Resulta daí a
desnecessidade de ingressar previamente na esfera administrativa para só após postular junto
ao Poder Judiciário.
Nesse diapasão, pela dificuldade de se comprovar documentalmente o exercício
laboral do bóia-fria é entendimento da sexta turma do Tribunal Regional Federal da 4ª
Região, pela mitigação da exigência de início de prova material sendo consentido a prova
exclusivamente testemunhal em alguns casos.
PREVIDENCIÁRIO.
APOSENTADORIA
RURAL
POR
IDADE.
TRABALHADOR RURAL. SEGURADO ESPECIAL. AGREGADO.
CONDIÇÃO SEMELHANTE À DE BÓIA-FRIA.
ACÓRDÃO
Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade,
negar provimento ao apelo do INSS e determinar o implantação do benefício [...]
[...] tendo em vista a ausência de requerimento administrativo, está-se diante de
benefício de aposentadoria requerido por trabalhador agregado, cujas relações de
trabalho são regidas pela informalidade, sem qualquer documento comprobatório
da atividade rural, não obtendo êxito na instrução dos seus requerimentos
administrativos.
[...]
4. Tratando-se de ação de cunho declaratório, pela sua própria natureza, dispensa o
prévio ingresso na via administrativa. Precedente do Superior Tribunal de Justiça.
5. omissis." (AG 1998.04.01.019144-9/PR, 6ª Turma, Rel. Des. Federal Nylson
Paim de Abreu, DJU 25-8-1998).
"AGRAVO DE INSTRUMENTO. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR
IDADE. TRABALHADOR RURAL. BÓIA FRIA. PRÉVIO REQUERIMENTO
ADMINISTRATIVO. DESNECESSIDADE.
Se a autarquia previdenciária sistematicamente nega o benefício aos chamados
trabalhadores rurais "bóias-frias", deles não se pode exigir prévio requerimento
administrativo." (AG 2003.04.01.009427-2/PR, 5ª Turma, Rel. Des. Federal
Antônio Albino Ramos de Oliveira, DJU 09-7-2003).
[...] a exibição de documentos e a produção de provas relativas aos longos anos
dedicados à terra olvidam a informalidade que é a tônica no campo. Por isso, caso
a parte-autora implemente a idade e o período de atividade rural equivalente
àcarência, é irrelevante que por ocasião do pedido administrativo ou em juízo
sobrevenha a perda da qualidade de segurado (artigo 102, §1º).
Quanto à demonstração da prática campesina, deduz-se do artigo 106 que os
elementos elencados nos seus incisos I e III, uma vez em nome do interessado e
alusivos ao período que se deseja comprovar, sempre lembrando que é admitida a
descontinuidade do labor, constituem prova plena do aludido trabalho. Ausentes
tais premissas, bem assim tendo sido juntados os demais documentos mencionados
naquele dispositivo, cujo rol não é taxativo, poderá configurar-se um início de
prova material, na medida em que se reportarem à parte do referido lapso
temporal, ainda que estejam em nome de terceiros, vinculados de alguma forma à
parte-autora, hipótese esta em que a ouvida de testemunhas será indispensável à
ampliação da eficácia probatória, em atenção à exegese que promana da Súmula
149 do STJ.
[...] Pelo relato uníssono das testemunhas [...] tem-se que, em verdade, a autora
trabalhava na condição de agregada, situação que em muito se assemelha à de
bóia-fria, em relação ao qual se defere tratamento diferenciado.
Considerando a informalidade com que é exercida a profissão no meio rural nessas
condições, que dificulta a comprovação documental da atividade, o entendimento
pacífico desta Corte é no sentido de que a exigência de início de prova material
deve ser abrandada, permitindo-se, em algumas situações extremas, até mesmo a
prova exclusivamente testemunhal.
[...]Nessas condições, na forma da fundamentação, voto no sentido de negar
provimento ao apelo do INSSedeterminar o implantação do benefício.
2.4.2 Análise da prova testemunhal na concessão do benefício previdenciário rural por
idade ao filho adotivo sob o prisma da jurisprudência
Outra situação, a qual remete à importância da prova testemunhal, aduz ao caso do
filho adotivo, como pode-se averiguar no julgado apresentado abaixo, em que pese tratar de
aposentadoria por tempo de serviço. O adotado, conforme a própria lei de benefícios, a
8.213/91, é equiparado ao filho do segurado especial que comprovadamente trabalhe com o
grupo familiar respectivo.
No caso concreto apresentado, o que confirma a veracidade de ser o requerente
adotado, é a prova testemunhal, pois não há documento por escrito do ato civil, conforme
informa a decisão. Ademais, a comprovação do período trabalhado por parte do filho
adotivo no campo com o respectivo pai também é corroborado por intermédio de
testemunhas.
Logo, reputa-se louvável a decisão do tribunal em indeferir a apelação do INSS
quando este sustenta a força que é dada às provas testemunhais a favor do postulante. Até
mesmo pela falta de formalidade do instituto da adoção apresentada ao referido caso, que ao
passar pelos desembargadores do TRF souberam julgar de maneira justa e em conformidade
ao caso concreto e não, simplesmente, engessados pela materialidade da letra da lei.
Assim, sinteticamente, resolveu a turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região:
APELAÇÃO CÍVEL Nº 2002.71.13.003259-2/RSD.E. Publicado em 12/05/2008
EMENTA:
PREVIDENCIÁRIO. LABOR RURAL. FILHO ADOTIVO. APOSENTADORIA
POR TEMPO DE SERVIÇO. RESTABELECIMENTO.
1. O tempo de serviço rural pode ser comprovado mediante a produção de prova
material suficiente, ainda que inicial, complementada por prova testemunhal
idônea.
2. Os documentos em nome de terceiros (pais/cônjuge) consubstanciam início de
prova material do trabalho rural desenvolvido em regime de economia familiar.
3. Não há óbice ao reconhecimento de tempo de atividade labutado em regime de
economia familiar, como enteado ou filho adotivo de casal de agricultores, a teor
do inciso VII do art. 11 da Lei n. 8.213/91.
4. Tendo sido comprovado o exercício de atividade rurícola pela parte autora, esta
faz jus ao restabelecimento da sua aposentadoria por tempo de serviço, a contar da
data do indevido cancelamento.
[...]Irresignado, o INSS interpôs recurso de apelação, sustentando, em síntese, a
ausência de início de prova material inequívoca complementada por prova
testemunhal idônea acerca das atividades agrícolas reconhecida pela decisão
monocrática.
[...]O tempo de serviço rural deve ser demonstrado mediante início de prova
material contemporâneo ao período a ser comprovado, complementado por prova
testemunhal idônea, não sendo esta admitida exclusivamente, em princípio, a teor
do art. 55, § 3º, da Lei n. 8.213/91, e Súmula 149 do STJ.
Cabe salientar que embora o art. 106 da Lei de Benefícios relacione os
documentos aptos à comprovação de atividade rural, o rol nele estabelecido não é
exaustivo. Desse modo, o que importa é a apresentação de documentos que se
prestem como indício do exercício de atividade rural (como notas fiscais,
talonários de produtor, comprovantes de pagamento do ITR, prova de titularidade
de imóvel rural, certidões de casamento, de nascimento, de óbito, certificado de
dispensa de serviço militar, cadastros em lojas, escolas, hospitais, etc.), os quais
podem se referir a terceiros, pois não há na lei exigência de apresentação de
documentos em nome próprio e, ademais, via de regra nas famílias dedicadas à
atividade rural os atos negociais são efetivados em nome do chefe do grupo,
geralmente o genitor (Nesse sentido: EDRESP 297.823/SP, STJ, 5ª T, Rel. Min.
Jorge Scartezzini, DJ 26/08/2002, p. 283; AMS 2001.72.06.001187-6/SC,
TRF4ªR, 5ªT, Rel. Des. Federal Paulo Afonso Brum, DJ 05/06/2002, p. 293).
Assim, os documentos apresentados em nome de terceiros, sobretudo quando
integrantes do mesmo núcleo familiar, consubstanciam início de prova material do
labor rural, consoante inclusive consagrado na Súmula 73 do Tribunal Regional
Federal da 4ª Região:
Súmula 73 - Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de
atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros,
membros do grupo parental"
[...]Registre-se, ainda, que o tempo de serviço rural sem o recolhimento das
contribuições, em se tratando de regime de economia familiar, aproveita tanto ao
arrimo de família como aos demais dependentes do grupo familiar que com ele
exerceram a atividade (STJ - RESP 506.959/RS, Rel. Min. Laurita Vaz, j. em
07/10/03 e RESP 603.202, Rel. Min. Jorge Scartezzini, decisão de 06/05/04).
[...]Ainda que os documentos não estejam em nome do demandante, tal situação,
por si só, não é impeditiva o reconhecimento da atividade rural, como já pacificou
o Tribunal Regional Federal da 4ª Região. É sabido de todos que a atividade
agrícola, exercida em regime de economia familiar, acontece exatamente como as
testemunhas narraram, ou seja, os filho ou a ele equiparados trabalham nas terras
dos pais desde a mais tenra idade, sem existir qualquer registro desta atividade.
[...]Por outro lado, a oitiva de testemunhas prestou-se a complementar a prova até
então produzida, e comprovou que efetivamente o autor exerceu atividade rural no
período postulado, em regime de economia familiar:
"... disse ser pai adotivo do autor. (...) Adotou o autor quando esse tinha 02 anos.
Não teve nenhum processo de adoção. O depoente tem propriedade e sempre
trabalhou na agricultura. Não tem empregados. O autor ajudou o depoente na
agricultura quando este tinha 10 anos de idade. O autor ajudou o depoente até
quando tinha 25 anos de idade. O autor ajudava a lavrar, plantar, colher, tratar os
bichos. Plantava milho, soja. Não tinha outra fonte de renda fora da agricultura. O
autor saiu a propriedade pois passou a trabalhar numa rede elétrica. (...) o autor era
tratado como filho." (fl. 204)
[...]As testemunhas foram unânimes, corroborando o aduzido na inicial de que o
demandante exerceu a agricultura em regime de economia familiar, com os pais
adotivos e os irmãos, sem empregados ou diaristas, até por volta dos vinte e cinco
(25) anos de idade, demonstrando a coesão e coerência da prova testemunhal
colhida, em acréscimo aos documentos juntados.
No que concerne à possibilidade de se considerar tempo de serviço laborado como
enteado ou como filho adotivo do casal de agricultores, em regime de economia
familiar, não vejo qualquer óbice, eis que a redação do VII do art. 11 da Lei n.
8.213/91, é clara ao dispor que:
"São segurados obrigatórios da Previdência as seguintes pessoas físicas:
[...]VII - como segurado especial: o produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário
rurais, o garimpeiro, o pescador artesanal e o assemelhado, que exerçam suas
atividades, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o
auxílio eventual de terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou
companheiros e filhos maiores de 14 (quatorze) anos ou a eles equiparados, desde
que trabalhem, comprovadamente com o grupo familiar respectivo. "
Desta forma, o enteado ou filho adotivo é também segurado especial da
Previdência Social, tendo direito ao cômputo do tempo laborado em atividade rural
em regime de economia familiar, para fins de aposentação.
Neste diapasão, a prova testemunhal se presta a, em conjunto com a prova
material, abalizar o reconhecimento do período postulado.
[...]Diante do exposto, voto no sentido de suprir omissão da sentença e negar
provimento à apelação do INSS e à remessa oficial, nos termos da fundamentação.
2.5 Análise da escassez documental na concessão do benefício previdenciário rural por
idade sob o prisma da jurisprudência
É de extrema valia mencionar a complexidade de situações que podem ocorrer no
campo e disso decorrer a ausência de documentação regular. A primeira delas e mais
provável, seria a condição climática da região. Muitas vezes precipitam mais chuvas do que
o devido, ou a seca castiga além do esperado e até mesmo a balança comercial pode inclinar
negativamente de modo a abarrotar os silos e levar para baixo os preços das commodities, o
que influenciam diretamente a produção campesina, conforme já entendeu inclusive o
Tribunal Regional Federal da 4ª Região, em decisão que segue abaixo:
EMBARGOS INFRINGENTES Nº 0012066-87.2010.404.9999/RS
D.E.Publicado em 10/04/2012
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS INFRINGENTES. APOSENTADORIA POR
IDADE RURAL. REQUISITOS. ATIVIDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA
MATERIAL. COMPROVAÇÃO. UTILIZAÇÃO DE MÃO DE OBRA DE
TERCEIROS EM CARÁTER EVENTUAL.
[...]Em se tratando de rurícola, cumpre ao julgador valorar os fatos e circunstâncias
evidenciados com ênfase no artigo 5º da Lei de Introdução ao Código Civil,
devendo-se levar em conta a realidade social em que inserido o trabalhador rural,
onde na demonstração dos fatos predomina a informalidade, não se mostrando
razoável exigir que os documentos carreados ao processo sigam sempre a forma
prescrita em lei, devendo ser considerados válidos quando de outra forma atingir a
finalidade precípua de comprovar o exercício da atividade rural, consoante
disposto no art. 244 do CPC.
[...]Realmente, cumpre salientar que, para caracterizar o início de prova material,
não é necessário que os documentos apresentados comprovem, ano a ano, o
exercício da atividade rural, seja porque se deve presumir a continuidade nos
períodos imediatamente próximos, seja porque é inerente à informalidade do
trabalho campesino a escassez documental.
Logo, como prelecionou o julgado dos embargosinfringentes acima citado, é de vital
importância que se leve em consideração a realidade social em que o produtor está inserido,
pois que a demonstração dos fatos, neste âmbito, perfaz pela falta de formalidade.
Sendo assim, cumpre ao juiz atender aos fins sociais a que a lei se dirige e às
exigências do bem comum, conforme aduz o artigo 5º da Lei de Introdução às Normas do
Direito Brasileiro, não havendo necessidade de exigir-se a apresentação de documentos para
comprovar ano a ano o exercício da atividade rural, de modo que, presume-se a privação dos
documentos exigidos.
3CONSIDERAÇÕES FINAIS
Cumpre demonstrar que a norma constitucional, a qual garante um direito
fundamental, quando se refere aos direitos sociais, em específico, previdência social, não é
totalmente eficaz, tendo em vista seu deficiente cumprimento na esfera administrativa.
Para melhor esmiuçar esta problemática houve necessidade de se trazer à tona o atual
entendimento, traduzido em jurisprudências, do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, no
tocante ao julgamento de casos concretos referentes à concessão do benefício previdenciário
rural por idade ao segurado especial.
Visto que o direito à previdência social está resguardado na Magna Carta brasileira,
em especial, acostado no capítulo II o qual abarca sobre os direitos sociais, e que inclusive é
abrangido pelo título II que dispõe a respeito dos direitos e garantias fundamentais, logo, faz
supor ser a previdência, uma garantia fundamental e por tal razão deve ter aplicabilidade
imediata como prevê o artigo 5º, § 1º da CF/88.
Ocorre que, no mundo dos fatos, a norma não subsume como deveria. Para o pleito do
benefício previdenciário rural por idade, sãonecessários inúmeros requerimentos a nível
administrativo, ao INSS e, na maioria das vezes, o pedido de benefício é negado por não
haver o cumprimento exatamente como preleciona o artigo 106 da Lei nº. 11.718/2008.
Esse dispositivo jurídico apresenta os documentos comprobatórios da atividade rural e
dentre os dez, o Instituto Nacional de Seguro Social exige a apresentação de três deles.
Porém, é sabido ser inerente à informalidade do trabalho rural a escassez documental, sem
falar ainda que referido dispositivo tem caráter apenas exemplificativo, conforme já
mencionado.
Logo, a concretização do direito à aposentadoria rural por idade é efetivada, após
postulação em juízo, e em decorrência da aplicabilidade imediata dos direitos fundamentais,
caso haja omissão por parte do Estado na implementação detais direitos, ele poderá ser
condenado à obrigação de fazer por intermédio da judicialização das políticas públicas. Em
suma, move-se toda a estrutura estatal para, ao final, haver uma ordem judicial determinando
ao INSS o pagamentodo benefício a quem tenhao direito.
Em síntese, normas garantidoras de direitos fundamentais são concretizadas, em sua
grande maioria, somente após o acionamento da máquina estatal. O que deveria ocorrer
exatamente de forma contrária, realizando o INSS sua respectiva função, ao resolver os
impasses na seara administrativa.
Importante mencionar a respeito do advento da Lei n. 11.718/2008 a qual trouxe
melhoras para a condição do segurado especial, porém esse fato não retirou o INSS do
primeiro lugar no ranking dos maiores réus da justiça brasileira.
Assim, no decorrer deste trabalho acadêmico baseado em pesquisa bibliográfica,
jurisprudencial, a compreensão que se faz é de que o aparato normativo não deixa a desejar,
embora o aparelho administrativo estatal precise ser renovado, estruturado quanto à análise
dos pedidos de aposentadoria rural por idade.
Conclui-se que o não preenchimento, de forma integral, dos 3 (três) requisitos exigidos
pelo INSS para que este conceda o benefício previdenciário rural por idade, apresenta-se
como um contra-ponto, pois ao se levar o caso aoPoder Judiciário, tem-se na maioria das
vezes, o deferimento do benefício, sendo que a exemplo do Tribunal Regional Federal da 4ª
Região, os desembargadores apenas interpretam a conceituação de segurado e também
levam em consideração o fim social a que a lei se dirige.
Por fim, o benefício previdenciário rural por idade quando concedido, acalenta, e ainda
estimula os trabalhadores rurais a continuarem no campo, produzindo, com satisfação,
econtribuindo para a economia da região onde vivem e impedindo o êxodo rural e,
consequentemente, o inchaço das grandes cidades.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil.9. ed. São Paulo: Saraiva,
2010.
BRASIL. Lei Ordinária: 8.213, de 24 de julho de 1991. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8213cons.htm>. Acesso em: 05 maio 2012.
BRASIL. Lei Ordinária:11.718, de 20 de junho de 2008. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2008/Lei/L11718.htm>. Acesso em:
05 maio 2012.
BRASIL. Tribunal Regional Federal (4. Região). Previdenciário. Processual civil.
Aposentadoria rural por idade. Requisitos preenchidos. Tutela específica. Apelação
cível nº. 0021053-78.2011.404.9999/PR. Apelante: Tereza de Jesus Duarte. Apelado:
Instituto Nacional Do Seguro Social - INSS. Relator: Des. Federal João Batista Pinto
Silveira. Julgamento em: Porto Alegre, 21 de março de 2012, publicado no D.E. em:
26/03/2012.Disponível em:
<http://jurisprudencia.trf4.jus.br/pesquisa/inteiro_teor.php?orgao=1&documento=4838177>.
Acesso em: 04 maio 2012.
BRASIL. Tribunal Regional Federal (4. Região).Previdenciário. Aposentadoria Rural
Por Idade. Regime De Economia Familiar. Requisitos Legais. Comprovação. Início De
Prova Material, Complementada Por Prova Testemunhal.Reexame Necessário Cível N.
0000095-37.2012.404.9999/RS. Parte autora: Ivete Machado De Moura. Parte ré: Instituto
Nacional Do Seguro Social - INSS. Relator: Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira.
Julgamento em: Porto Alegre, 13 de março de 2012, publicado no D.E. em: 23/03/2012.
Disponível em:
<http://jurisprudencia.trf4.jus.br/pesquisa/inteiro_teor.php?orgao=1&documento=4816875>.
Acesso em: 04 maio 2012.
BRASIL. Tribunal Regional Federal (4. Região).Previdenciário. Aposentadoria Rural
Por Idade. Trabalhador Rural. Segurado Especial. Agregado. Condição Semelhante à
de Bóia-Fria.Apelação Cível Nº 2008.70.99.000910-6/PR. Apelante: Instituto Nacional Do
Seguro Social - INSS. Apelada: Clarinda de AraujoBertoloto. Relator:Des. Federal Victor
Luiz dos Santos Laus. Julgamento em: Porto Alegre, 07 de maio de 2008, publicado no D.E.
em: 21/07/2008.Disponível em:
<http://jurisprudencia.trf4.jus.br/pesquisa/inteiro_teor.php?orgao=1&documento=2207350>.
Acesso em: 04 maio 2012.
BRASIL. Tribunal Regional Federal (4. Região).Previdenciário. Labor Rural. Filho
Adotivo. Aposentadoria Por Tempo De Serviço. Restabelecimento.Apelação Cível Nº
2002.71.13.003259-2/RS. Apelante: Instituto Nacional Do Seguro Social - INSS.
Apelado:AdemirFormento. Relator:Juiz Federal Eduardo Vandré Oliveira Lema Garcia.
Julgamento em: Porto Alegre, 30 de janeiro de 2008, publicado no D.E. em: 12/05/2008.
Disponível em:
<http://jurisprudencia.trf4.jus.br/pesquisa/inteiro_teor.php?orgao=1&documento=2041736>.
Acesso em: 04 maio 2012.
BRASIL. Tribunal Regional Federal (4. Região).Previdenciário. Embargos Infringentes.
Aposentadoria Por Idade Rural. Requisitos. Atividade Rural. Início De Prova
Material. Comprovação. Utilização De Mão De Obra De Terceiros Em Caráter
Eventual.Embargos Infringentes Nº 0012066-87.2010.404.9999/RS. Embargante: Marli
Teresinha Ransan. Embargado:Instituto Nacional Do Seguro Social - INSS. Relator:Des.
Federal Rogerio Favreto. Julgamento em: Porto Alegre, 29 de mar.de 2012, publicado no
D.E. em: 10/04/2012.
CÂMARA, Karine. A aposentadoria por idade rural e seu caráter assistencial. Revista
de Estudos Jurídicos, a. 15, n. 22, 2011. Disponível
em:<http://periodicos.franca.unesp.br/index.php/estudosjuridicosunesp/article/viewFile/398/
514>. Acesso em: 05 maio 2012.
COLONETTI, Fabio. INSS - o maior réu da justiça brasileira. Disponível
em:<http://www.fabiocolonetti.adv.br/mostranovidade.php?cod=168>. Acesso em: 15 abr.
2012.
IBRAHIM, Fábio Zambitte. Curso de direito previdenciário. 16. ed. Rio de Janeiro:
Impetus, 2011.
RAMOS, Elisa Maria Rudge. Os direitos sociais: direitos humanos e fundamentais.
Disponível em http:<//www.lfg.com.br>. Acesso em: 21 ago. 2011.
SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria geral dos
direitos fundamentais na perspectiva constitucional. 10. ed. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 2010.

Documentos relacionados