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Urologia
Terapia Focal – HIFU Sob
Medida – Para o Câncer da
Próstata: Recentes Avanços”
O
Hospital Nossa Senhora das Graças
(HNSG), em Curitiba, é o primeiro do
país a utilizar o ultrassom robótico HIFU,
técnica menos invasiva para tratar o câncer da
próstata (CP), com maior precisão.(1) O emprego
de HIFU no Brasil começou em janeiro de 2011
com o equipamento Sonablate® 500 (fig. 1). Mais
de 50 pacientes bem selecionados já foram
submetidos ao tratamento, em nosso centro,
com segurança.
O uso de terapias minimamente invasivas
para o CP localizado oferece o potencial intermediário entre seguimento ativo e tratamentos
radicais.(2-4) Na América Latina, além do Brasil,
HIFU está aprovado no México, Argentina e
Bolívia. Na Europa e Ásia, diversas agências
nacionais já o aprovaram (Inglaterra, Alemanha,
França, Espanha, Rússia, Japão, entre outros).
O Nossa Senhora das Graças (Curitiba) foi
o primeiro hospital do Brasil a usar a tecnologia
HIFU para o tratamento do câncer da próstata.
Também foi o pioneiro do emprego de HIFU em
geral, no Brasil.
Nas últimas décadas foi verificada uma
tendência para o diagnóstico precoce, em suas
fases iniciais (assintomático), do câncer da
próstata (CP).(5,6) Estima-se que este diagnóstico
anteceda de 3 a 12 anos a ocorrência de sintomas.(5) O efeito disso tem sido a identificação de
tumores menores, que ocupam apenas 5 a 10%
do volume da próstata, com maior incidência
de doença unifocal ou unilateral,(7) passíveis de
terapia focal (TF).
O CaPSURE (EUA) demonstrou que a
proporção de pacientes com câncer unilateral
de pequeno volume e baixo risco aumentou
de 29,8%, no período entre 1989-1992, para
45,3%, entre 1999-2001.(8)
Devido a este frequente diagnóstico precoce,
inúmeros pacientes portadores de CP localizados são submetidos a tratamentos radicais
[prostatectomia radical (PR), radioterapia externa
(RT), braquiterapia (BT) e crioterapia (CT)], independentemente da extensão e agressividade de
doença. Embora os índices de cura e de controle
de doença sejam satisfatórios, esses tratamentos causam transtornos urinários e sexuais
(inclusive disfunções orgásmicas) importantes.
Apenas a minoria dos pacientes não apresenta
consequências negativas destes tratamentos.
Dados científicos apontam, igualmente,
para um excesso de agressividade das terapias
convencionais para o CP localizado, sobretudo
para os de baixo e médio riscos. Exemplo disso
é o estudo de Abdollah e cols.(9) Eles avaliaram
a relação entre os tipos de tratamento (PR vs.
observação) e a taxa de mortalidade câncer
específica de 10 anos numa grande população
(44.694 homens). Nos casos de alto risco, eles
verificaram que a taxa foi de 5,2% para pacientes
operados (OP), contra 12,8% para aqueles apenas observados (OBS). Já para os pacientes com
Arq. Pessoal
Dr. Marcelo L. Bendhack*
* Membro Titular da Sociedade
Brasileira de Urologia. Mestre e
Doutor em Clínica Cirúrgica –
UFPR. Doutor em Uro-Oncologia
– Universidade de Düsseldorf,
Alemanha. Coordenador –
Programa de Pós-Graduação e
Residência Médica em Urologia
do Hospital Cruz Vermelha –
Universidade Positivo, Curitiba,
PR. Uro-Oncologia, Hospital
Nossa Sra. das Graças –
Curitiba. Membro do Conselho
da Federação Mundial de UroOncologia (WUOF). Presidente
da Associação Latino-Americana
de Uro-Oncologia (UROLA).
CRM-PR 13.525. CRM-SP
128.736.
Prática Hospitalar • Ano XV • Nº 89 • Set-Out/2013 43
Figura 1. Sonablate® 500 e o
transdutor posicionado durante
aplicação de HIFU.
riscos intermediário e baixo, as taxas foram
de 1,4 (OP) e 3,8% (OBS), respectivamente. Eles concluíram, ao identificar uma
pequena diferença neste último grupo, que
os pacientes que mais se beneficiaram da
PR foram os que apresentavam alto risco.
Menor benefício da cirurgia tiveram aqueles
com riscos médio e baixo.(9)
Assim, o acompanhamento vigiado e
a intervenção postergada, estabelecido
em protocolos conhecidos como “Active
Surveillance” (AS),(10) foram propostos com
o objetivo de minimizar (ou até mesmo
eliminar) efeitos colaterais dos tratamentos
clássicos para o CP. AS é criticada pela
seleção extrema de pacientes, pelo risco
de subestadiamento do CP(11) e de promover ansiedade aos pacientes
pelo “não tratamento do câncer
sabidamente presente”.
TFs têm sido também realizadas com outras tecnologias
além de HIFU: CT, terapia fotodinâmica, BT focal, TF com
laser (transperineal), terapia termal intersticial por micro-ondas,
ablação intersticial por radiofrequência, a eletroporação, a
termoterapia por nanopartículas, e outras
formas de RT, como prótons e “Cybernife”
(todas experimentais) (fig. 1).
A ultrassonografia de alta intensidade
focada (HIFU), principal forma de terapia
focal (TF), pode ser aplicada em toda a
glândula ou, de modo experimental, somente em parte(s) dela. HIFU é a única TF
efetivamente não invasiva (sem invasão
tecidual com p. ex. agulhas). Ela representa
a opção equilibrada, situada exatamente
entre AS e os tratamentos radicais (fig. 1).
Conceito de Terapia Focal (TF)
A TF é alternativa de tratamento emergente, com ótimas perspectivas de unir
Figura 2. Aspecto do transdutor
posicionado durante aplicação
de HIFU na região anterior da
próstata.
44 Prática Hospitalar • Ano XV • Nº 89 • Set-Out/2013
controle do câncer à redução da morbidade. A maioria dos procedimentos
empregados na TF são rápidos, com
curta internação, sessão única e requerem
mínima anestesia.
Num contexto mais amplo, o termo
HIFU, principal método de TF, pode ser
empregado de diversas maneiras:(3)
1.TF da próstata inteira com HIFU:
conceito clássico e amplamente
difundido. Técnica aplicada atualmente em 30 países, já utilizada
para mais de 10.000 pacientes.
2.TF da metade da próstata (hemi-HIFU) ou, ainda, em “L”. Neste
último cenário se trata uma metade
inteira e a porção posterior da outra.
3.TF “localizada”, isto é, especial
na área de positividade de uma
biópsia e/ou onde exames como a
Ressonância Magnética (RM) multiparamétrica (MP) apontem para
uma única área com doença. Este
conceito, bem como o anterior, são
objetos de estudo pelo grupo do
Prof. Emberton, de Londres, como
veremos mais adiante.(2,3,12)
O HIFU permite o tratamento do CP
através de lesão térmica por aquecimento
tecidual com dano direto (85 a 90 graus
Celsius), seguida por processo de cavitação. Após este processo, desenvolve-se
necrose de coagulação e substituição por
tecido inflamatório, e de granulação.(13,14)
Os transdutores da Sonablate®
possuem, simultaneamente,
ultrassonografia (US) Doppler
colorido, US preto e branco,
além do terapêutico. Pode-se
identificar a próstata em azul e
os pontos focais em amarelo
(fig. 2). A somatória de tratamento dos vários pontos focais,
nas regiões anterior, média e
posterior da próstata (nesta
ordem), permite determinar a
ablação completa da mesma.
Com isso, se permite acompanhamento em tempo real
Urologia
dos procedimentos, concomitantemente
à monitorização contínua do resfriamento
retal (ao redor de 15oC).
Além de apresentar alguns conceitos,
pretendemos apontar dados científicos
sobre a TF. Para fins de organização, vamos
dividir o assunto em 3 tópicos – 3 conceitos:
1. HIFU ou TF de glândula inteira
ou completa (TFC), para doença
primária;
2. HIFU ou TF parcial (TFP), para
doença primária;
3. HIFU ou TF de salvamento (TFS),
para doença recidivada.
“Os resultados de
acompanhamento de longo
prazo (12 anos de experiência)
de 753 pacientes indicam que
HIFU é tratamento eficiente
e seguro para pacientes com
CP localizado, especialmente
para os de riscos baixo e
intermediário”
1. HIFU ou TF de glândula inteira ou
completa (TFC) para doença primária
Em todos os tratamentos de glândula
total vigentes, os níveis pós terapêuticos
de PSA são fundamentais na determinação
dos critérios de cura (baseados no nadir
de PSA), bem como do diagnóstico da
recidiva bioquímica.
O HIFU pode ser utilizado como,
por ser menos agressivo e passível de
repetição ou associação com os tratamentos mais radicais, uma “primeira linha
de defesa interventiva”, pois não elimina
a possibilidade de, se não for eficiente,
utilizar os métodos clássicos como PR e
RT para curar a doença. Aliás, até mesmo
a reaplicação de HIFU pode ser indicada,
após um HIFU inicial.
Uchida e cols. (15) concluíram que os
resultados de acompanhamento de longo
prazo (12 anos de experiência) de 753
pacientes indicam que HIFU é tratamento
eficiente e seguro para pacientes com
CP localizado, especialmente para os de
riscos baixo e intermediário.
Inoue,(16) ao tratar 137 pacientes consecutivos com CP estádios T1 e T2, com
Sonablate® 500, concluiu que HIFU representa tratamento eficiente, minimamente
invasivo e que comporta repetições. Ele é
particularmente eficaz para pacientes com
riscos baixo e intermediário, e deveria ser
considerado como opção terapêutica para
o CP localizado.
Devido ao frequente quadro de obstrução urinária que o edema prostático
determina, após o tratamento, Sumimoto
e cols.(17) avaliaram resultados de 129 pacientes submetidos ao HIFU, 64 deles com
imediata ressecção transuretral da próstata
(RTU-P). Eles concluíram que esta medida
melhora a condição urina após o tratamento, sem causar morbidade adicional.
Shoji, (18) ao estudar 326 pacientes,
concluíram, acerca da qualidade de vida
(QV) após tratamentos para CP, que os
resultados funcionais e de QV após terapia
com HIFU para CP localizado são melhores que aqueles encontrados após outras
modalidades de tratamento.
Há outro estudo muito relevante sobre
a eficácia do tratamento HIFU, publicado
neste ano,(19) decorrente do tratamento de
1.002 pacientes, entre 1997 e 2007, o qual
trouxe a seguinte conclusão:
“HIFUca da próstata localizado,
com baixa taxa de mortalidade câncer
específica e um alto índice de sobrevida
livre de metástases aos 10 anos, bem
como com morbidade aceitável.”
O grupo de Emberton(20) demonstrou,
ao tratar 570 homens (entre 2004 e 2012)
com CP (23% com baixo, 34% com médio
e 43% com alto risco segundo D’Amico),
o seguinte:
a) TFC é uma opção terapêutica para
o CP, o qual é possível repetir e
com resultados “livre de doença”
favoráveis, a médio prazo;
b) HIFU pode ser usado como opção
de tratamento primário, minimamente invasivo (TFC).
Ainda como referências de apresentações científicas sobre o assunto, podemos
citar as seguintes apresentações de trabalhos, pelo nosso grupo, nos seguintes
eventos científicos:
1. Simpósios Internacionais de Uro-Oncologia da UROLA (Associação Latino-Americana de Uro-Oncologia), em Montevid – Uruguai
(2006), Curitiba – Brasil (2010) e em
Córdoba – Argentina (2012).
2. Congresso Paulista de Urologia –
São Paulo, 2012.
3. Encontro da Sociedade Paraguaia
de Urologia, 2012.
4. 39o Congresso Austríaco e da Sociedade Ba de Urologia, 6 a 8 de junho
de 2013, em Graz, na Áustria (fig. 3).
5. Evento de Uro-Oncologia da Sociedade Paranaense de Urologia, em
Londrina, agosto de 2013.
6. Evento anual de Uro-Oncologia das
Universidades USP-RP, UNICAMP e
UNESP, Ribeirão Preto, agosto de
2013 (mesa-redonda).
Figura 3. O serviço de Uro-Oncologia do HNS Graças apresentou seus resultados com HIFU
em vários eventos no Brasil, na América Latina e na Europa.
Prática Hospitalar • Ano XV • Nº 89 • Set-Out/2013 45
Tabela 1.Casuística de terapias focais
do serviço de Uro-Oncologia do
H. N. S. Graças - Curitiba
n = 50 + 4*
Incontinência urinária
Disfunção erétil
HIFU
Primária, glândula completa
Primária parcial
Salvamento, glândula completa
após RT
Salvamento, glândula completa
após BT
Salvamento após cirurgia
2.4 %
26.2 %
n
40
03
03
01
03
* 3 tratados no exterior + 1 tratado com RTU-P exclusiva (2004)
RT = radioterapia externa; BT = braquiterapia;
RTU-P = ressecção transuretral da próstata
Fonte: Bendhack M. et al. Em edição.
Com mais de 50 pacientes tratados em
nosso centro, o qual possui o mais longo
período de seguimento no cenário nacional, temos baixos índices de complicação
(tabela 1): 2,4% de incontinência (contra
4 a 20% da radioterapia e/ou cirurgia) e
26,2% de disfunção erétil (D.E.; contra 40
a 80% da cirurgia e radioterapia). Pacientes
com D.E. após HIFU respondem melhor ao
tratamento medicamentoso via oral que
outros, os quais receberam terapias radicais clássicas. Nenhum óbito pela doença
ocorreu em 33 meses de seguimento. Os
pacientes estão sob rigoroso acompanhamento clínico, uro-oncológico. Este se faz
com: exame físico, avaliaç com PSA, USG
(abdominal e/ou transretal), RM-MP e/ou
biópsia do leito prostático. Todas estas
formas de seguimento são utilizadas de
acordo com o caso. Em caso de recidiva,
os pacientes podem ser tratados com PR,
RT ou nova aplicação de TF.
2. HIFU ou TF parcial (TFP) para
doença primária
Ao se aplicar o princípio da TF em
que se trata apenas da lesão isolada, se
procura minimizar as complicações ao não
aplicar energia sobre tecidos prostáticos
normais. “Preservar tecido faz a diferença”,
segundo Mark Emberton (comunicado
pessoal). Após a TFP, deve-se monitorizar
ainda mais cuidadosamente o paciente e,
se necessário, oferecer resgates efetivos,
caso recidivem ou apresentem novos focos de doença. É imperioso que a TFP não
deva comprometer as taxas de cura e de
controles clínico e bioquímico, usualmente
obtidos com tratamentos clássicos.
A definição apresentada em consenso
sobre TF, em 2010, foi o seguinte: “TF é
um tipo de tratamento que visa erradicar
um câncer já identificado dentro da próstata e, ao mesmo tempo, preservar tecido
prostático não acometido com o objetivo
de preservar as funções geniturinárias”. (21)
Notem que neste conceito, TF já se
define como TFP. Daí as dificuldades de
interpretação e discussão acerca deste
assunto, sobretudo com os colegas não
acostumados à técnica. Em nosso departamento preferimos os conceitos de TFC
(C = completa) ou TFP (parcial). Mesmo
porque o termo “focal” pode ser relacionado à técnica (ultrassom focado de alta
intensidade) e não à área da próstata que
seja tratada.
Em 2011, o grupo de Londres, liderado
por Ahmed e Emberton, demonstrou resultados em 20 pacientes com idade média
de 60,4 anos e PSA médio de 7,3 ng/ml,
sendo 25% de baixo risco e 75% de risco
intermediário, submetidos à hemiablação
por HIFU. Todos foram submetidos à RM-MP e à biópsia transperineal mapeada
durante a seleção. Apenas 1 dos 19 pacientes submetidos à biópsia apresentou
neoplasia viável (um deles recusou a biópsia). Segundo os autores, após 3 meses
de tratamento, ocorreu queda do PSA em
80%. O índice de manutenção de potência sexual, de acordo com os critérios da
ASTRO, foi de 95% e apenas 5% usavam
forros para perdas urinárias. No curto seguimento de 12 meses, 89% dos pacientes
atingiram a “trifecta”: controle oncológico,
potência sexual e continência urinária.(22)
O grupo de Ahmed e Emberton publicou, em 2012, trabalho sobre TFP (HIFU). (23) A base do raciocínio deste estudo
foi verificar se a ablação focal seletiva
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(parcial) de lesões uni- ou multifocais pode, se comparada com terapia de toda a
próstata, reduzir os efeitos colaterais do
tratamento. Homens entre 25 a 80 anos
de idade, (PSA ≤ 15 ng/mL, Gleason score
≤ 4 + 3, estádio ≤ T2) foram incluídos. Eles
estavam virgens de tratamento hormonal
e puderam ser examinados com RM-MP
sob anestesia geral. Receberam TFP com
HIFU em todas as lesões conhecidas e
com aspecto de câncer, com margem de
tecido normal, identificadas na RM-MP,
nas biópsias mapeadoras com template, ou em ambas, com Sonablate® 500.
Os objetivos primários foram eventos
adversos, sintomas urinários e função
erétil, avaliados através de questionários.
Foram recrutados 42 homens durante 3
anos (fechamento em junho de 2010).
Um homem morreu 3 meses após a TFP
por pneumonia (causa não relacionada) e
foi excluído da análise. Após as TFPs, um
homem foi internado por retenção urinária
aguda e outro teve também internações
para tratamento de estenose uretral.
Nove homens (22%) tiveram disúria
leve a moderada, intermitente e autolimitada em cerca de 5 dias. Debris urinários
ocorreram em 14 homens com duração
média de 14,5 dias. Infecções urinárias
foram identificadas em 7. O índice de
função erétil foi similar no pré- assim como
12 meses após TF, bem como os índices
de satisfação no intercurso, desejo sexual
e satisfação global. Redução significativa
entre a linha de base e 12 meses após
foi identificada para a função erétil e
orgásmica (IIEF-15).(23) De 35 pacientes
com boa função pré-TFP com HIFU, 31
(89%) tiveram ereções suficientes para
penetração 12 meses após TF. Não houve
incontinência urinária 12 meses após TFP.
Os sintomas como LUTS melhoraram,
quando avaliados pelo IPSS, mas o IPSS
para QV não mostrou alteração.(2)
Houve melhora significativa na média
da próstata-FACT (avaliação funcional de
terapia do câncer) e nas médias dos escores da FACT geral. Nenhuma evidência
Urologia
histológica de câncer foi identificada em
30 dos 39 homens (77%), biopsiados seis
meses após TF; 36 estavam sem câncer
clinicamente significativo.
Após retratamento em 4 homens,
39 de 41 (95%) não tinham evidência de
doença na RNM-MP, aos 12 meses. A
interpretação da TFP com HIFU de lesões
tumorais individuais, se multi- ou unifocais,
determinou pequena taxa de efeitos colaterais geniturinários e taxa encorajadora
de ausência precoce de CP significante.
Conceito “lesão índice”
O grupo da Universidade de Stanford
instituiu o conceito de lesão índice ou
primária como a lesão clinicamente significante e que o volume (aproximadamente
0,5 ml) desta é indicativa de predição da
progressão.(23)
Uma das maiores limitações da TFP
é o risco do subestadiamento. Quando
submetidos à PR, 30 a 50% dos pacientes
apresentam neoplasias com maior grau de
Gleason e mais de 10% têm doença não
restrita ao órgão.(24)
A maioria dos CP são multifocais e não
homogêneos, podendo apresentar diferentes padrões de Gleason em distintas áreas,
o que teoricamente poderia desencorajar o
emprego de TFP. Entretanto, cerca de 20%
dos portadores de CP apresentam lesões
localizadas, sendo candidatos a algum tipo
de TF. A literatura tem demonstrado que a
associação de “templates” perineais (para
biópsias) com técnicas RNM-MP(25) podem
permitem maior acurácia diagnóstica.
A queda estimada do PSA após ablação da lesão principal permanece indefinida. Aqui também será fundamental o
conceito de seguimento sob medida.
Assim, a TF sob medida deve ser
adaptada a cada paciente, de acordo
com os achados de todos os exames, e
respeitados a idade e as comorbidades
dos mesmos. Nosso serviço, em respeito
aos vários estudos que apóiam a TFC,
habitualmente prefere HIFU para a glândula inteira, eventualmente subtotal. O
momento é de tentar selecionar quem tem
a melhor indicação para a TFP.
3. HIFU ou TF para doença recidivada
ou de salvamento (TFS)
Outra aplicação atrativa é o uso da TF
como resgate, após recorrências locais de
tratamentos prévios.(26)
As indicações de HIFU de resgate
incluem falhas após PR (desde que se
permita visualizar ou localizar área de recidiva), falhas após RT externa e/ou BT. Para
falhas nestes 2 últimos modos, a taxa livre
de recidiva bioquímica em 5 anos (após
HIFU de salvamento) foi de 52%.(27)
Ahmed et al. demonstraram, para
pacientes com recidiva após RT externa
tratados com TF, taxa de sobrevida livre de
recidiva (incluindo pacientes sem resposta
ao PSA) de 69% em 1 ano e 49% em 2
anos, de acordo com o critério Phoenix.(28)
Ao se excluir pacientes sem resposta ao
PSA, estas taxas foram de 74% e 58%,
respectivamente (mesmo critério). Os autores concluem que a TF de salvamento
é estratégia potencial para recidiva local
após RT e que pode reduzir os efeitos
colaterais que resultam das terapias clássicas de salvamento. HIFU de salvamento
pode ser considerada opção promissora
de tratamento.(29)
Apresentamos um exemplo tratado
em nosso serviço: paciente de 71 anos
com recidiva após BT, a qual havia sido
realizada 3 anos antes. A RM-MP demonstrou foco de atividade na zona periférica
esquerda (figs. 4 e 5). Aplicamos HIFU
em toda a próstata e o resultado do PSA
Figura 4.
Planejamento
de HIFU de
salvamento em
lesão recidivada
após braquiterapia
(há 3 anos), na
região pósterolateral esquerda
da próstata.
UROLA Meeting 2012. Bendhack M. et al.
Figura 5.
Planejamento
de HIFU de
salvamento
em lesão
recidivada após
braquiterapia
(há 3 anos), na
região pósterolateral esquerda
da próstata.
UROLA Meeting 2012. Bendhack M. et al.
Prática Hospitalar • Ano XV • Nº 89 • Set-Out/2013 47
Figura 6. PSA
total após HIFU de
salvamento para
paciente com recidiva
após braquiterapia.
Bendhack M. et al.
total declinou para 0,004 ng/ml (virgem
de hormonioterapia; fig. 6). Este resultado
permanece, agora já com 20 meses de
seguimento, comprovando a eficiência
do método. O fato relevante é que as
consequências negativas do HIFU como
salvamento foram muito menores do que
as habitualmente observadas com a PR
de salvamento.
Seguimento após TF
Para o diagnóstico de recidiva, na
atualidade, a biópsia é o método mais
confiável.(30) Após o diagnóstico de recidiva
pós TF, permanecem dúvidas sobre qual a
melhor abordagem de resgate: nova TF ou
tratamentos radicais (PR/RT), desde que
não tenham sido aplicados previamente.
Novamente teremos que desenvolver
terapias sob medida.
Terapia focal sob medida
No Hospital Nossa Senhora das Graças, em Curitiba, a terapia focal sob
medida se baseia nas tabelas de nomogramas, em especial o nomograma de
Sobreiro-Bendhack,(31) publicado como
tese de Doutorado do primeiro em 2002,
no Brasil. Naquele estudo foram incluídos
374 pacientes operados no nosso Departamento (HNS Graças, Curitiba) e 330 na
Clínica Urológica da Universidade de São
Paulo (USP). A intenção de fato, ao se
utilizar tal ferramenta, em conjunto com
a classificação de D’Amico para definir o
risco do CP, é indicar a TFC ou a TFP para
casos muito bem selecionados. Também a
forma como se aplica o tratamento HIFU,
quando TFP, pode ser mais ampla ou mais
restrita, personalizada a cada paciente.
Conclusões
A mate aqui apresentada sugere o
afastamento de ingenuidades decorrentes
do modo clássico de formar opinião, o
qual se baseia na linguagem figurativa dos
anos 90. O amplo e fácil acesso à literatura
permite hoje a atualização do médico, sem
interferência negativa de recomendações
pessoais infundadas.
A TF se apresenta como nova possibilidade terapêutica frente ao CP. Aqui nos
referimos em especial ao HIFU, devido à
segurança do método e sua boa exequibilidade, além de ser, de fato, não invasivo.
HIFU é tratamento potencialmente
efetivo para o câncer da próstata primário
e localizado, com baixa taxa de mortalidade câncer específica e um alto índice de
sobrevida livre de metástases aos 10 anos,
bem como com aceitável morbidade.
Tumores localmente recidivados após
RT, BT e/ou PR (neste último caso se
a recidiva pode ser visualizada) podem
também ser tratados com a TF. Esta indicação já encontra, inclusive, respaldo em
consensos urológicos nacionais.
48 Prática Hospitalar • Ano XV • Nº 89 • Set-Out/2013
Além dos estudos citados acima, concluindo pela eficácia e pela indicação do
tratamento, resta claro que o tratamento
HIFU completo ou TFC nãoexperimental
na medicina, mas rotineiro onde ela é mais
avançada.
Nosso centro está disponível para esclarecer os questionamentos de colegas
urologistas, oncologistas e radioterapeutas
que queiram aplicar, auxiliar ou apenas
acompanhar seus pacientes, durante ou
após o tratamento com HIFU.
Esperamos sobretudo por uma melhoria da capacidade de localizarmos
precisamente os focos tumorais e de
selecionarmos os pacientes com CP, candidatos à TF. De acordo com as condições
de risco da doença e das comorbidades,
bem como ao se respeitar as preferências
dos pacientes, poderão ser introduzidos
tratamentos focais, sob medida.(3) t
Referências
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Partin em pacientes brasileiros. 2004. 144 f. Tese
(Doutorado em Clínica Cirúrgica) - Universidade
Federal do Paraná, Paraná, 2004.
Endereço para correspondência:
Rua Mauá, 1.111 - CEP 80030-200
Curitiba - PR - www.hifubrasil.com.br
54o Curso de Atualização em Moléstias da Tireoide
09 e 10 de novembro de 2013
ICESP - Instituto do Cancêr do Estado de São Paulo
Para inscrições e mais informações acesse: www.perfectaeventos.com.br/tireoide
Coordenação
Prof. Lenine Garcia Brandão
Prof. Claudio R. Cernea
Prof. Marcos R. Tavares
Prof. Vergilius J. F. Araújo Filho
Dr. Erivelto Volpi
Temário
Convidado Estrangeiro
Dr. Keith Heller
New York University, USA
• Dicas práticas para reduzir a morbidade cirúrgica em tireoidectomias
Realização
Disciplina de Cirurgia
de Cabeça e Pescoço
HC - FMUSP
s
ga s
Va tada
i
Lim
• Conferência Anísio Costa Toledo
• Câncer bem diferenciado de Tireoide
• Discussão de Casos
• Carcinoma Medular de Tireoide
• Experiência de serviços
Apoio Institucional
Latin American
Thyroid Society
Inscrições
Sociedade Brasileira
de Cirurgia de
Cabeça e Pescoço
Agência de turismo
11 •3722
11 3721 49
5577
Prática Hospitalar
Ano 5850
XV • Nº 89 • Set-Out/2013

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