Charlie Salvador Gonçalves - GNMS
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Charlie Salvador Gonçalves - GNMS
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E DA TERRA DEPARTAMENTO DE FÍSICA TEÓRICA E EXPERIMENTAL PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM FÍSICA TESE DE DOUTORADO PROPRIEDADES FÍSICAS DO MONOCRISTAL Fe/MgO(100) E ESTUDO DA EXPANSÃO TÉRMICA DA SUPERFÍCIE DA Ag(100) por Charlie Salvador Gonçalves Natal RN, Brasil Fevereiro de 2010 UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E DA TERRA DEPARTAMENTO DE FÍSICA TEÓRICA E EXPERIMENTAL PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM FÍSICA PROPRIEDADES FÍSICAS DO MONOCRISTAL Fe/MgO(100) E ESTUDO DA EXPANSÃO TÉRMICA DA SUPERFÍCIE DA Ag(100) Charlie Salvador Gonçalves Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Fı́sica do Departamento de Fı́sica Teórica e Experimental da Universidade Federal do Rio Grande do Norte como parte dos pré-requisitos para obtenção do tı́tulo de Doutor em Ciências Orientador: Prof. Carlos Chesman de A. Feitosa Natal, RN Brasil 2010 Agradecimentos Aos meus pais Claudio Salvador Gonçalves e Maria Ferreira Gonçalves pelo esforço, segurança e apoio dado em todas as horas. Sem dúvida vocês me fortaleceram o suficiente e proporcionaram a realização deste trabalho. Ao Orientador, Professor e Amigo Carlos Chesman, pela confiança depositada. Em especial agradeço à minha esposa Ikaline e minha filha Celline, pela cooperação e paciência que tiveram nos momentos em que não tive. Ao Professor Antônio Azevedo do Departamento de Fı́sica da UFPE pelas medidas de FMR. Aos Professores do Laboratório de Fı́sica de Superfı́cies da UFMG: Edmar Soares, Vagner Eustáquio, Roberto Paniago, e da UFBA, Prof. Caio Castilho, pela paciência, pelo grande apoio, convı́vio e pelas horas de lazer. Aos amigos do Laboratório da UFMG: Diogo Reis, Fabio Negreiros, Wendel Simões, Guilherme, Gustavo e Thiago, pela ajuda na técnica LEED e pelas boas horas de conversa nos almoços do “bandejão”. Aos amigos e amigas da Moradia Ouro Preto I: Rosely, Mirlene, Juliana, Dudu e Jeffinho. À dona Mirian, Seu Cristovão e a Isabela Morgana pelo carinho, pela acolhida e pelas várias risadas que demos juntos. Aos meus grandes amigos do Laboratório: Neymar Pereira, Thatyara Freire, Sanzia Alves, Ubiratan Corrêa e Prof. José Américo, pelos momentos de alegria e ótimo convı́vio que tivemos no laboratório. Aos meus grandes amigos do SENAC: Carmem Gracielly, Josy Amorim, Edilayne Dias, Fabı́ola Pessoa, Myltson, Jair, Reginaldo, André, Daniel e Sandro, pelos felizes momenos que desfrutamos juntos nas aulas de inglês e momentos extraclasse. Aos Professores do departamento: Claudionor Gomes, Dori Hélio, Paulo Fulco, Eudenilson Lins, José Dias, Enivaldo Bonelli, Gilvan Borba, Rui Tetuliano e Renan. Pelas orientações, ensino, conselho e boas conversas pelos corredores do DFTE. À Celina e a Carlos dos Anjos, pela amizade e prontidão. Aos meus irmãos, Charlon e Charton, pelas muitas vezes que resolveram meus problemas pessoais. i Ao meu sogro, sogra e cunhada: Alı́pio, Rosa e Itaciara, grandes amigos que sempre me apoiaram, mesmo sem entender porque eu passava tantas horas no laboratório. Aos demais amigos da Rua Baraúnas, da Tv. Pitanga e do DFTE Finalizando, agradeço a FINEP, FAPERN, CAPES e especialmente ao CNPq pelo apoio financeiro. ii Resumo Neste trabalho foi desenvolvida a metodologia de deposição dos filmes monocristalinos de Fe/MgO (100) via magneto sputtering DC. Foi Investigado o crescimento de filmes na faixa de temperatura entre 100 o C e 300 o C. As propriedades estruturais e magnetocristalinas dos filmes foram estudadas por diferentes técnicas experimentais. A espessura e a rugosidade da superfı́cie foram investigadas por microscopia de força atômica (AFM). A técnica de espectroscopia de fotoelétrons excitados por raios-X (XPS) foi utilizada para determinar a pureza da composição dos filmes. E as propriedades magnéticas foram investigadas por ressonância ferromagnética (FMR) e Efeito Ker Magneto-óptico (MOKE). O resultados mostram que o aumento da temperatura de deposição gera um aumento da anisotropia magnetocristalina segundo um comportamento regido pela equação de Avrami. Como resultado principal, foi construida a estrutura base para a fabricação de dispositivos magnetoresistivos. E, como aplicação, são apresentadas as medidas do acoplamento entre uma tricamada de Fe/Cr/Fe/MgO. Em um segundo trabalho, foi investigado a dependência com a temperatura dos primeiros três espaçamentos entre camadas da Ag (100) via técnica de difração de elétrons. Utilizando um modelo de expansão linear da superfı́cie do cristal, foi determinada a temperatura de Debye, a variação percentual da distância interplanar e o coeficiente de expansão térmica da superfı́cie. A relaxação encontrada foi de 1% e os resultados são confrontados com as faces (110) e (111) da prata. iii Abstract In this work we have developed a way to grow Fe/MgO(100) monocrystals by magnetron sputtering DC. We investigated the growing in a temperature range among 100 o C and 300 o C. Structural and magneto-crystalline properties were studied by different experimental techniques. Thickness and surface roughness of the films were investigated by atomic force microscopy, while magneto-crystalline properties were investigated by magneto-optical Kerr effect and ferromagnetic resonance. Our results show that as we increase the deposition temperature, the magneto-crystalline anisotropy of the films also increases, following the equation of Avrami. The best temperature value to make a film is 300 o C. As the main result, we built a base of magnetoresistence devices and as an aplication, we present measurements of Fe/Cr/Fe trilayer coupling. In a second work we investigated the temperature dependence of the first three interlayer spacings of Ag(100) surface using low energy electron diffraction. A linear expansion model of crystal surface was used and the values of Debye temperatures of the first two layers and thermal expansion coefficient were determinated. A relaxation of 1% was found for Ag(100) surface and these results are matched with faces (110) and (111) of the silver. iv Lista de Abreviações MBE: Molecular Beam Epitaxy (Epitaxia por Feixe Molecular). AFM: Atomic Force Microscopy (Micorscopia de Força Atômica). LEED: Low Energy Electron Diffraction (Difração de Elétrons de Baixa Energia). XPS: X-ray Photoelectron Spectroscopy (Espectroscopia de Fotoelétrons por raios-X). MOKE: Magneto Optical Kerr Effect (Efeito Kerr Magneto Óptico). FMR: Ferromagnetic Ressonance ( Ressonância Ferromagnética). MFM: Magnetic Force Microscopy (Microscopia de Força Magnética). SATLEED: Simmetrized Tensor LEED. LASER: Light Amplification by Stimulated Emission of Radiation. VSM: Vibrating Sample Magnetometer (Magnetômetro de Amostra Vibrante). SMOKE: Surface Magneto Optical Kerr Effect. Fator R: Reability factor. IxV: Intensidade versus Energia em eV. RFA: Retarding Field Analizer (Analisador por Retardo de Campo). FCC: Face Centered Cubic (Cúbica de Face Centrada). MEIS: Medium Energy Ion Scattering (Espalhamento de Íons). DFT: Density Functional Theory (Teoria do Funcional da Densidade). MD: Molecular Dynamics (Dinâmica Molecular) v Sumário Lista de Figuras vii 1 Introdução 1 2 Energias Magnéticas 2.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . 2.2 O Processo de Magnetização . . . . . . 2.3 Energias Magnéticas . . . . . . . . . . 2.3.1 Energia Zeeman . . . . . . . . . 2.3.2 Anisotropia Magneto-Cristalina 2.3.3 A rede cristalina cúbica . . . . 2.3.4 Anisotropia de Forma . . . . . . 2.3.5 Anisotropia de Superfı́cie . . . . 2.3.6 Anisotropia Uniaxial . . . . . . 2.3.7 Acoplamento de troca Bilinear . 2.3.8 A Energia Magnética Total . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3 Técnicas Experimentais 3.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3.2 Descrição das Técnicas Experimentais . . . . . . . . . . . . . 3.2.1 O método de deposição por sputtering . . . . . . . . 3.2.2 Microscopia de Força Atômica . . . . . . . . . . . . . 3.2.3 Espectroscopia de fotoelétrons excitados por Raios-X 3.2.4 Magnetometria por Efeito Kerr Magneto-Óptico . . . 3.2.5 Ressonância Ferromagnética . . . . . . . . . . . . . . vi . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3 3 3 5 7 9 11 17 22 22 24 25 . . . . . . . 27 27 27 27 29 32 38 42 4 O Monocristal 4.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . 4.2 Detalhes experimentais . . . . . . . 4.2.1 O substrato MgO(100) . . . 4.2.2 O filme de Fe . . . . . . . . 4.2.3 Procedimento experimental 4.3 Resultados . . . . . . . . . . . . . . 4.3.1 XPS . . . . . . . . . . . . . 4.3.2 AFM . . . . . . . . . . . . . 4.3.3 MOKE . . . . . . . . . . . . 4.3.4 FMR . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5 LEED 5.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5.1.1 Breve histórico . . . . . . . . . . . 5.1.2 Teoria . . . . . . . . . . . . . . . . 5.1.3 Espalhamento atômico . . . . . . . 5.1.4 A simulação numérica - SATLEED 5.1.5 O Aparato experimental . . . . . . 6 Análise da prata 6.1 Introdução . . . . . . . . 6.2 O Modelo . . . . . . . . 6.3 Detalhes Experimentais . 6.4 Análise dos Resultados . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 48 48 49 49 51 52 54 54 56 57 61 . . . . . . . . . . . . 69 69 70 71 76 89 92 . . . . 102 . 102 . 103 . 104 . 106 . . . . . . . . . . 7 Conclusão e Perspectivas 121 7.1 Monocristal . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 121 7.2 Expansão da Ag(100) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 122 Referências 125 vii Lista de Figuras 2.1 2.2 2.3 2.4 2.5 2.6 2.7 2.8 2.9 2.10 2.11 2.12 2.13 2.14 Em (a) uma amostra magnética, na ausência de campo magnético, apresenta-se dividida em várias regiões com magnetizações orientadas aleatoriamente. A soma total das magnetizações é nula. Em (b) uma imagem das paredes de domı́nio de uma amostra comum de aço carbono, numa imagem feita pela técnica Microscopia de Força Magnética (MFM). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Movimento das paredes de domı́nio. . . . . . . . . . . . . . . . . . . Curva de histerese e seu pontos importantes. Ms é a magnetização de saturação, Mr a magnetização remanente e Hc o campo coercivo. ~ eM ~ na interação Zeeman. . . . . . . . Representação dos vetores H Representação dos cossenos diretores. . . . . . . . . . . . . . . . . . Representação dos cossenos diretores em termos de αi . . . . . . . . Plano de deposição [010]. O sistema de coordenadas utilizado é o mesmo. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Comportamento da função Energia para a simetria cúbica na direção [100]. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Plano de deposição [110]. O novo sistema de coordenadas é diferente do original. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Comportamento da função Energia para a simetria cúbica na direção [110]. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Plano de deposição [111]. O novo sistema de coordenadas está rotacionado em relação ao original. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Comportamento da função energia para a simetria cúbica na direção [111]. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Amostra inserida em um campo magnético. . . . . . . . . . . . . . Representação de uma amostra elipsoidal e seus eixos a,b e c. . . . . viii . . 4 5 . 5 . 8 . 10 . 10 . 13 . 14 . 15 . 16 . 17 . 18 . 19 . 19 2.15 Comportamento da função Energia para a simetria uniaxial . . . . . . 23 2.16 Ilustração de uma bicamada acoplada ferromagneticamente J > 0. . . 25 2.17 Ilustração de uma bicamada acoplada anti-ferromagneticamente J < 0. 25 3.1 3.2 3.3 3.4 3.5 3.6 3.7 3.8 3.9 3.10 3.11 3.12 3.13 3.14 3.15 Representação esquemática do sistema de sputtering. . . . . . . . . . Representação esquemática do conjunto haste - sonda de um Microscopia de Força Atômica. No detalhe, a sonda e suas dimensões nanométricas. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . O potencial de Lennard-Jones. Na área abaixo da linha de força nula, as forças são atrativas. Acima desta linha, as forças são repulsivas. . . Representação das duas regiões que determinam os modos de operação do AFM. Em (a) - Deflexão da mola operando em modo contato. Em (b) - modo não-contato. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Representação da topografia da amostra medida pela variação do posicionamento do feixe de LASER refletido pela haste . . . . . . . . . . Representação do processo de ejeção dos fotoelétrons. . . . . . . . . . Representação do livre caminho médio dos fotoelétrons ejetados em função de energia cinética para vários elementos [34]. As regiões delimitadas representam a respectiva sensibilidade de várias técnicas. . Aparato experimental da técnica XPS. . . . . . . . . . . . . . . . . . Espectro caracterı́stico do XPS de uma das amostras. . . . . . . . . . Representação do processo de emissão Auger. . . . . . . . . . . . . . As configurações de Efeito Kerr Magneto-Óptico. O quadrado amarelo representa a amostra ferromagnética. Em roxo, o substrato, a linha vermelha representa o percurso do LASER e finalmente em verde, a direção de aplicação do campo magnético externo. n̂ representa o versor normal a superfı́cie do plano de incidência. . . . . . . . . . . . O arranjo experimental para medidas de Efeito Kerr Magneto-Óptico. Modelo adotado quando a espessura do filme é menor que o comprimento de penetração da luz - SMOKE. . . . . . . . . . . . . . . . . . Torque gerado pelo campo magnético. . . . . . . . . . . . . . . . . . . Cone espiral de precessão amortecido pela perda de energia para a rede. ix 28 29 30 31 32 33 34 35 36 37 39 39 41 44 44 3.16 Equipamento de Ressonância Ferromagnética (FMR). Em verde, o eletroı́mã. Em amarelo o guia de ondas. E em vermelho, a cavidade ressonante. As setas pretas indicam o percurso da onda eletromagnética. E a seta verde a direção do campo magnético externo ~ z . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 46 H 3.17 Gráfico da derivada da absorção de micro-ondas na Ressonância Ferromagnética (FMR). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47 4.1 4.2 4.3 4.4 4.5 4.6 4.7 4.8 4.9 Célula unitária do MgO. Os átomos de Mg estão na cor verde. . . . Padrão LEED do cristal de MgO(100). A imagem foi realizada com incidência normal do feixe eletrônico no valor de energia = 64 eV. . Célula unitária do Fe. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Direção de crescimento do Fe. Considerando os cubos de baixo como a rede do MgO [100] e os de cima, a rede do Fe. O filme cresce na direção [110]. A face lateral de baixo representa o eixo fácil do filme, enquanto que a face lateral de baixo representa o eixo duro. . . . . Espectro de XPS mostrando a composição quı́mica do filme antes da limpeza. As intensidades dos picos de carbono (C) e de oxigênio (O)revelam camadas oxidadas na superfı́cie. A região maior delimi1 tada pela curva mostra a localização da “assinatura” do ferro F e−2p 2 3 1 e F e−2p 2 . A região menor delimitada representa os picos do F e−3p 2 3 e F e − 3p 2 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Espectro de XPS mostrando a composição quı́mica do filme após a limpeza. A redução do pico de C e a elevação dos picos do Fe 2p são notórias. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Espectro do XPS em torno das linhas do Fe 2p da amostra preparada à 250 o C após a limpeza. Evidência da pureza da composição quı́mica do filme no processo de deposição. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Imagem da impressão de tela do software do AFM mostrando a rugosidade da superfı́cie do filme crescido a 250 o C. O valor da rugosidade média (Ra) vale 0,25nm. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Magnetização normalizada em função do campo magnético externo. A medida foi efetuada no filme depositado na temperatura de 300 o C. A curva azul representa o eixo fácil e a vermelha o eixo duro, ao longo da direção [110]. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . x . 50 . 50 . 52 . 52 . 55 . 56 . 57 . 58 . 59 4.10 Magnetização normalizada em função do campo magnético externo medida ao longo da direção [110] das amostras crescidas a 100 o C, 150 o C 200 o C e 250 o C. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 4.11 Espectro de FMR para θH = 90o do filme crescido na temperatura de 250 o C. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 4.12 Campo de ressonância em função do ângulo planar de uma sequência de amostras crescidas à (a)100 o C, (b)150 o C, (c)=200 o C e (d)=250 o C. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 4.13 Em (a) - Hsat e HRes/2 em função da temperatura de deposição. A linha contı́nua representa o ajuste feito com a equação de Avrami. Em (b) - ∆Hsat em função da temperatura de deposição. A linha contı́nua representa o ajuste feito com a equação de Avrami. . . . . 4.14 Os resultados de Hsat e HRes/2 para FMR e MOKE, respectivamente, em função da temperatura de deposição. A linha contı́nua representa o ajuste feito com a equação de Avrami. O gráfico interno apresenta a anisotropia uniaxial determinada na simulação. Seu valor foi estimado em 10 Oe. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 4.15 Representação em duas dimensões do processo de formação de ilhas de Fe no substrato de MgO. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 4.16 Resultado da primeira tricamada Fe/Cr/Fe desenvolvida no departamento de Fı́sica Teórica e Experimental da UFRN. . . . . . . . . . 5.1 5.2 5.3 5.4 5.5 Na passagem entre 2 planos adjacentes a queda na intensidade do feixe de elétrons pode ser de até 10% enquanto que em R-X, na mesma configuração, a diminuição da intensidade e de apenas 10−8 . Assim enquanto os R-X revelam as caracterı́sticas do interior do cristal, LEED revela essencialmente caracterı́sticas da sua superfı́cie. . . . . . . . . Célula unitária de superfı́cie. Os vetores ~a e ~b tem módulo igual a metade da diagonal da face da correspondente célula de volume (representada pelas linhas tracejadas). . . . . . . . . . . . . . . . . Difração de Laue em um conjunto unidimensional de centros espalhadores. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Em a) a Esfera de Ewald em 3 dimensões. Em b) a vista superior da esfera e projeção dos pontos de difração. . . . . . . . . . . . . . . . Construção da Esfera de Ewald em duas dimensões. . . . . . . . . . xi . 60 . 61 . 62 . 64 . 65 . 67 . 68 . 72 . 74 . 74 . 76 . 77 5.6 Modelo de potencial muffin tin. A barreira de energia entre os potenciais esférico e constante do cristal aparece como um potencial degrau chamado Zero muffin tin. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5.7 Aparato experimental de LEED. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5.8 Esquema da óptica LEED. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5.9 Sequência de imagens com os padrões de difração para os seus respectivos valores de energias. Observe uma pequena janela quadrada delimitando um dos feixes. A sequência mostra o deslocamento do ponto de difração com o acréscimo de energia. . . . . . . . . . . . . 5.10 Imagem em três dimensões de um spot LEED. . . . . . . . . . . . . 5.11 Para os valores de energias da Figura 5.9 é mostrado o perfil correspondente de intensidade. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5.12 Curva IxV obtida pela sequência de janelas de intensidade. Os pontos marcados representam a intensidade da respectiva janela na Figura 5.11. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 6.1 6.2 6.3 6.4 6.5 6.6 . 79 . 93 . 97 . 99 . 100 . 100 . 101 Vista do empilhamento das faces (110) e (111). As respectivas faces estão voltadas para cima, em direção ao topo da página. . . . . . . . Em (a) - Variação percentual da relaxação da primeira camada da Ag(110) como função da temperatura do experimento [90]. Em (b) - Determinação experimental e simulação da relaxação da primeira camada para a Ag(111) [91].Medidas feitas por difração de elétrons (LEED) e espalhamento de ı́ons (MEIS) e simulações em dinâmica molecular (DM) e teoria do funcional densidade (DFT). Os dois gráficos a temperatura do experimento estão normalizados pela temperatura de fusão da prata. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Célula unitária e o empilhamento ABAB. . . . . . . . . . . . . . . . . Célula unitária de superfı́cie. Os vetores ~a e ~b tem módulo igual a metade da diagonal da face da correspondente célula de volume. . . . Indexação dos feixes difratados. Os pontos (0,1), (1,0), (-1,0) e (0,-1) são simétricos, assim nos dados experimentais consideramos um único feixe representado pela média entre as 4 curvas. . . . . . . . . . . . . Comportamento do fator-R em função da temperatura de Debye da primeira e segunda camada em 181K → Rp =0.18. . . . . . . . . . . xii 102 110 111 111 112 116 6.7 Comportamento do fator-R em função de ΘDebay1 (eixo x) e ΘDebay2 (eixo y). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 6.8 Procedimento para estimativa do erro na ΘDebye . Em (a), uma linha paralela ao eixo x, traçada no valor máximo do erro do Fator-R → 0.18 + 0.04 = 0, 22, intercepta- a em dois pontos da curva. A região delimitada no eixo x representa o intervalo do erro na temperatura. Veja que este intervalo é assimétrico. Este mesmo comportamento aparece para as outras temperaturas. . . . . . . . . . . . . . . . . . 6.9 Comportamento de ΘDebye das duas primeiras camadas atômicas em função das respectivas temperaturas do experimento. No detalhe, o comportamento de ΘDebye das três primeiras camadas atômicas em função das respectivas temperaturas do experimento, medidas para a face (111) da Ag. [91] . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 6.10 Comportamento da variação da distância entre as duas primeiras camadas atômicas em função das respectivas temperaturas do experimento. A curva verde representa o volume. . . . . . . . . . . . . . 6.11 Vista da distância entre planos das faces (111), (100) e (110). As respectivas faces estão voltadas para cima. . . . . . . . . . . . . . . 7.1 . 117 . 118 . 119 . 120 . 120 Resultado da medida de MOKE para uma tricamada Fe/Cr/Fe/MgO crescida com a metodologia de deposição investigada nesta tese. . . . 123 xiii Capı́tulo 1 Introdução Nas décadas de 80 e 90 surgiu a possibilidade de se utilizar uma técnica que é capaz de promover a formação natural de padrões periódicos de nanopartı́culas. É o chamado crescimento ou deposição auto-organizada [1, 2, 3, 4]. A obtenção de nanopartı́culas, espacialmente ordenadas ou monocristais mediante a auto-organização, abre um amplo leque de possibilidades para aplicações tecnológicas, como por exemplo, à área de catálise [5], à de sensores magneto-resistivos [6] e mı́dias de gravação magnética [7]. As técnicas são diversas, destacando-se entre elas a Epitaxia por Feixe Molecular (MBE) [8] e sputtering [9]. A primeira supera todas as demais no que diz respeito à precisão de deposição. Está no topo da tecnologia de fabricação e manipulação de filmes nanométricos. Contudo, devido ao seu alto custo financeiro, é impedida de ser utilizada em grande escala na fabricação de dispositivos semicondutores e de sensores magnéticos. Já a técnica de sputtering vem ganhando espaço e merecido reconhecimento como técnica de deposição de monocristais relativamente barata. A grande vantagem deste processo está relacionada ao menor custo dos equipamentos e à boa reprodutibilidade dos experimentos, o que possibilita a aplicação em larga escala de fabricação de dispositivos. Neste sentido, esta tese é composta de dois trabalhos experimentais, apresentados em 7 capı́tulos e que, apesar de tratarem de fenômenos diferentes, compreendem o tema da fı́sica de filmes finos e nanoestruturas. O primeiro trabalho trata do magnetismo aplicado a filmes de ferro nanoestruturados, crescidos pela técnica de sputtering. Neste, determinamos uma metodologia que torna possı́vel a fabricação de dispositivos magneto-resistivos. O objetivo proposto foi construir a base monocristalina para o desenvolvimento de tais dispositivos 1 e otimizar o processo de deposição. Esta primeira parte está dividida nos capı́tulos 2, 3 e 4 onde, primeiramente, é apresentada uma revisão teórica a respeito da energia magnética em filmes nanométricos. Em seguida, são apresentadas as técnicas, do ponto de vista teórico e experimental, que foram utilizadas para a caracterização das amostras. Finalizando, o quarto capı́tulo descreve o procedimento experimental e as discussões a respeito da metodologia de crescimento do monocristal de ferro no substrato de MgO. O segundo trabalho da tese trata da aplicação da técnica LEED para a investigação da superfı́cie do cristal de Ag na face (100). Investigamos o comportamento da expansão térmica do parâmetro de rede da superfı́cie deste cristal. O objetivo proposto foi o de determinar o coeficiente de expansão térmica da superfı́cie que, a princı́pio, deve ser diferente do valor de volume. O trabalho é apresentado nos capı́tulos 5 e 6. O quinto capı́tulo trata da teoria da difração de elétrons e os detalhes experimentais, finalizando com metodologia da aquisição e tratamento dos dados e da simulação numérica. O sexto capı́tulo é dedicado ao estudo do cristal de prata, e apresenta os resultados experimentais e a metodologia utilizada na determinação do coeficiente de expansão. O sétimo capı́tulo apresenta, separadamente, a conclusão e as perspectivas de cada trabalho, tanto na deposição de filmes monocristalinos, quanto à utilização da técnica LEED no apoio ao desenvolvimento de nanoestruturas e dispositivos no Departamento de Fı́sica Teórica e Experimental da UFRN. No apêndice, é apresentado o artigo publicado com os resultados da primeira parte da tese. 2 Capı́tulo 2 Energias Magnéticas 2.1 Introdução Existe uma classe de amostras que, quando são encontradas na natureza, sempre estão em um ordenamento natural, na qual sua magnetização é igual a zero. Este comportamento teve seu entendimento adiado por muito tempo, até o surgimento da teoria macroscópica conhecida como Campo Molecular, teoria escrita por Pierre Weiss [10]. Datada de 1907, ela afirma que os materiais magnéticos estão divididos em pequenas regiões chamadas de domı́nios, cuja magnetização permanece constante em magnitude e direção. Isto acontece de tal forma que as forças de interação são capazes de manter paralelos os momentos magnéticos vizinhos em um único domı́nio, enquanto que a grandes distâncias a orientação de um outro domı́nio pode ser totalmente diferente. Desta forma, a magnetização de uma amostra é a soma sobre todos os domı́nios magnéticos que a compõem. Porém, o entendimento microscópico só foi possı́vel após a teoria de Heisenberg, que mostra que este campo é o resultado da interação de troca entre dois spins vizinhos [11]. 2.2 O Processo de Magnetização A orientação dos domı́nios dentro de uma amostra possui uma configuração especial (ver Figura 2.1(a)), que estabelece uma magnetização nula do sistema, na ausência de um campo magnético externo, mantendo assim as linhas de campo magnético dentro da amostra [12]. 3 (a) (b) Figura 2.1: Em (a) uma amostra magnética, na ausência de campo magnético, apresenta-se dividida em várias regiões com magnetizações orientadas aleatoriamente. A soma total das magnetizações é nula. Em (b) uma imagem das paredes de domı́nio de uma amostra comum de aço carbono, numa imagem feita pela técnica Microscopia de Força Magnética (MFM). No entanto, feita a analise da interface de separação entre os domı́nios, não é encontrada uma transição abrupta de suas magnetizações, e sim uma transição suave onde os spins, responsáveis pela magnetização de cada domı́nio, giram sequencialmente da orientação do domı́nio inicial para a orientação do domı́nio final, ver Figura 2.2. Esta região é a chamada parede de domı́nio [13]. A rotação é a maneira mais eficiente de ocorrer a transição entre as orientações dos domı́nios magnéticos e possuem dimensões da ordem de dezenas de mı́crons. A Figura 2.1(b) mostra uma imagem de MFM das paredes de domı́nio de uma amostra comum de aço carbono. Aplicando-se um campo magnético externo, pode-se estudar o comportamento estático de uma determinada amostra pela sua resposta a este campo. Esta ”resposta do material” é a chamada curva de histerese magnética, mostrada na Figura 2.3. Este processo de magnetização pode ser dividido em quatro etapas: deslocamento reversı́vel das paredes de domı́nio (região A da Figura 2.3), deslocamento irreversı́vel das paredes de domı́nio (região B), rotação dos domı́nios magnéticos (região C) e, finalmente, a região D, na qual há o alinhamento dos momentos magnéticos restantes, desordenados devido aos efeitos térmicos. Os pontos Ms , Mr e Hc representam, respectivamente, a magnetização de saturação, magnetização remanente e campo coercivo. Todo este processo está ligado às várias modalidades de energia magnética associadas ao método de fabricação da amostra, à sua cristalinidade e às suas di- 4 Figura 2.2: Movimento das paredes de domı́nio. mensões. Desta forma, o estudo do comportamento da amostra, através da curva de histerese magnética dirá as caracterı́sticas do material e consequentemente sua aplicação tecnológica. Figura 2.3: Curva de histerese e seu pontos importantes. Ms é a magnetização de saturação, Mr a magnetização remanente e Hc o campo coercivo. 2.3 Energias Magnéticas Entender as formas anisotrópicas da magnetização é de extrema importância 5 para as possı́veis aplicações tecnológicas de um determinado material. Quando a estrutura é cristalina, a magnetização pode apresentar-se em direções preferenciais. Esta preferência pode ser decorrente tanto da própria estrutura atômica do filme, quanto da variação entre os parâmetros de rede do substrato e do filme ao longo do plano de crescimento. Tais anisotropias resultam de interações intrı́nsecas, que dependem de efeitos quânticos microscópicos e eletromagnéticos, ou extrı́nsecas, associadas à forma cristalina ou ao método de crescimento. Quando existe a anisotropia magnética, uma curva de histerese a revela a partir de medidas efetuadas em várias direções, apresentando valores de campo de saturação diferentes. Ao eixo que apresenta o valor mı́nimo do campo de saturação dá-se o nome de eixo-fácil da magnetização. Ao eixo que apresenta o valor máximo, dá-se o nome de eixo-duro da magnetização. Existem vários fatores que contribuem diferentemente para a energia magnética em amostras magnetizadas. A distribuição espacial dos átomos, as variações no parâmetro de rede ao longo do cristal, a distância entre as superfı́cies que delimitam as amostras ou ainda os acoplamentos entre duas ou mais camadas no regime nanométrico. Cada uma destas manifestações é determinada pelo comportamento das amostras quando expostas a um campo magnético externo. Este campo magnético é um dos parâmetros de controles do experimento, que deve possuir uma energia associada suficiente para vencer todos estes tipos caracterı́sticos de energia, conforme mencionado. A energia associada ao campo externo é a chamada energia Zeeman e será a primeira a ser abordada. A primeira pergunta a ser realizada quando investigamos uma amostra é com relação ao seu caráter cristalino. Tal cristalinidade pode ser determinada pela investigação das anisotropias cristalinas reveladas pela curva de histerese magnética da amostra. Aqui, a simetria da rede define com quais orientações a magnetização poderá se apresentar na sua configuração de mais baixa energia. Esta seção é dedicada ao detalhamento desta modalidade de energia, visto que, a partir da mesma, é que conseguimos extrair um dos importantes resultados da tese. A seguir serão apresentadas as anisotropias magnéticas de forma e de superfı́cie. Elas são as responsáveis pelo aprisionamento da magnetização no plano da superfı́cie do filme e, apesar de não entrarem explicitamente nos cálculos das simulações realizadas, elas são significativas, pois os filmes produzidos apresentam espessuras no regime nanométrico, tornando este efeito mais pronunciado. 6 Na sequência, são apresentadas a anisotropia induzida, chamada também de anisotropia uniaxial, e o acoplamento bilinear. A primeira forma aparece quando impomos direções preferenciais ao processo de deposição, como por exemplo, a aplicação de um campo magnético externo durante o processo, ou ainda pode surgir naturalmente pela superposição de diferentes materiais durante este mesmo processo. Já o acoplamento bilinear, se aplica quando há filmes finos acoplados e só pode ser explicada através da mecânica quântica [15]. Tais formas de energia merecem aqui serem apresentadas porque, nesta tese, foi desenvolvida a estrutura base para a construção de dispositivos compostos por multicamadas magnéticas acopladas [16], que funcionam através do acoplamento de troca. Finalizando o capı́tulo, será apresentado o modelo fenomenológico usado no processo de investigação e o ajuste do processo de crescimento dos filmes monocristalinos de ferro, onde energia magnética total é descrita do ponto de vista da magnitude ~ | e especialmente, do ponto de vista da direção de M ~ em do vetor magnetização |M termos dos cossenos diretores. 2.3.1 Energia Zeeman A Energia Zeeman existirá sempre que uma amostra magnetizada estiver submetida a um campo magnético. Ela é fruto do posicionamento do vetor magnetização da amostra em relação ao campo externo. Isto é, a grandeza escalar gerada pela projeção do vetor magnetização na direção do vetor campo magnético. A energia será máxima quando os dois vetores estiverem na configuração antiparalela, e será mı́nima quando estiverem em paralelo. Sua representação matemática é dada por: ~ ·H ~ EZeeman = −M (2.1) Quando é feita a análise de amostras compostas por vários filmes empilhados pode-se determinar a Energia Zeeman por unidade de área através de um somatório, no qual a energia de cada filme é proporcional à sua espessura d. Assim, tem-se: EZeeman = − X ~i ·H ~ di M (2.2) i Os vetores magnetização e campo magnético estão escritos em coordenadas esféricas na equações 2.3 e 2.4 de acordo com a Figura 2.4. 7 ~ eM ~ na interação Zeeman. Figura 2.4: Representação dos vetores H ~ = Ms (sin θ cos φebx + sin θ sin φeby + cos θebz ). M (2.3) ~ = H0 (sin θH cos φH ebx + sin θH sin φH eby + cos θH ebz ). H (2.4) Assim, a energia para um único filme será dada por: EZeeman = −dMs H0 sin θ sin θH cos(φ − φH ) − dMs H0 cos θ cos θH . (2.5) Sua unidade é o erg/cm2 no sistema CGS de unidades ou joule/m2 no Sistema Internacional (SI). O termo Ms corresponde ao estado em que todos os spins da amostra encontram-se alinhados com o campo magnético externo. Este termo é conhecido como magnetização de saturação. Considerando agora a situação em que o campo magnético aplicado seja paralelo ao plano do filme, isto é, perpendicular à direção de crescimento, podemos escolher o plano x-z, ou seja φ = φH , e assim tem-se: EZeeman = −Ms H0 cos(θ − θH )d. (2.6) ~ ao logo do campo H. ~ Logo, essa energia somente depende da componente de M 8 2.3.2 Anisotropia Magneto-Cristalina O mais importante tipo de anisotropia para o resultado desta tese é a anisotropia magneto-cristalina [17]. Ela é naturalmente menor que as demais formas de energia, no entanto, a direção da magnetização é unicamente determinada devido ao seu comportamento natural de alinhar os momentos magnéticos ao longo das direções cristalográficas. Quando uma amostra ferromagnética é investigada, diz-se que ela é monocristalina quando as curvas de histerese magnética mostram o comportamento preferencial por determinadas direções cristalográficas, repetindo seu comportamento para posições equivalentes. Este efeito é puramente estrutural e apresenta-se sob configurações especiais que minimizam a energia magnética associada. A energia magneto-cristalina é definida como o trabalho necessário para fazer a magnetização alinhar-se com determinada direção cristalográfica comparada com o eixo-fácil. Os eixos-fáceis representam as direções nas quais a magnetização naturalmente se alinha. No caso do ferro, como será visto a seguir, estas são as direções [001], [010] e [100]. A aplicação do campo magnético externo, na direção em que é mais difı́cil alinhar a magnetização, determina o eixo-duro da amostra que, novamente no caso do ferro, é a direção [111]. ~ |, com relação aos eixos cristalográficos, é dada em ~ /|M A direção de m ~ = M função dos cossenos dos ângulos entre m ~ e cada eixo. Estes são os chamados cossenos diretores. m ~ = (α1 , α2 , α3 ). (2.7) Sejam α1 , α2 e α3 os cossenos da direção da magnetização em relação aos eixos cristalográficos. De acordo com as Figuras 2.5 e 2.6 tem-se os seguintes cossenos diretores: α1 = cos β = sin θ cos φ; α2 = cos γ = sin θ sin φ; α3 = cos δ = cos θ; onde α1 2 + α2 2 + α3 2 = 1. (2.8) A energia magneto-cristalina, por volume, pode ser escrita como uma expansão em série de potências da magnetização em termos dos cossenos diretores: 9 Figura 2.5: Representação dos cossenos diretores. Figura 2.6: Representação dos cossenos diretores em termos de αi . Ecris = E0 + X bi α i + X i + X ijk bijk αi αj αk + X bij αi αj + ij bijkl αi αj αk αl + ijkl X ijklm 10 bijklm αi αj αk αl αm + + X bijklmn αi αj αk αl αm αm αn + O(α7 ). (2.9) ijklmn A expressão da energia magnética deve ser independente, por inversão, do sentido da magnetização, pois só depende de seu alinhamento com relação aos eixos cristalográficos. Assim, os termos de ordem ı́mpar são nulos. ~ ) = E(−M ~) E(M (2.10) E(αi ) = E(−αi ). (2.11) ou Logo, somente uma série de potências pares satisfaz a esta condição. A expressão reduz-se então a: Ecris = E0 + X bij αi αj + ij 2.3.3 X bijk αi αj αk αl + ijkl X bijklm αi αj αk αl αm . (2.12) ijklm A rede cristalina cúbica Para a rede cristalina de simetria cúbica, os termos cruzados αi αj da segunda parcela da equação 2.12 devem ser nulos, devido à exigência da equação 2.11. No entanto, a troca de dois eixos quaisquer também não deve alterar o resultado. Assim, os termos de ı́ndices iguais devem ser indistinguı́veis devido à simetria cúbica do sistema. Logo, as constantes multiplicativas devem ser as mesmas, isto é, b11 = b22 = b33 . Aplicando estas considerações aos termos de segunda ordemchega-se à: X bij αi αj = b11 (α12 + α22 + α32 ). (2.13) ij Aplicando estas considerações, agora nos termos de quarta ordem: X bijkl αi αj αk αl = b1111 (α1 4 + α2 4 + α3 4 ) + 6b1122 (α12 α22 + α1 2 α32 + α22 α32 ). (2.14) ijkl Finalmente, aplicando o mesmo procedimento para o termo de sexta ordem: X bijklmn αi αj αk αl = b111111 (α1 6 + α2 6 + α3 6 )+ ijklmn 11 +15b111122 (α12 α2 4 + α1 4 α2 2 + α1 2 α3 4 + α1 4 α3 2 + α2 2 α3 4 + α2 4 α3 2 + + 90b112233 α12 α22 α32 . (2.15) O arranjo dos termos, juntamente com a equação 2.8, e com as seguintes condições de normalização será: (α1 2 + α2 2 + α3 2 )2 = 1 (2.16) e (α1 2 + α2 2 + α3 2 )3 = 1, (2.17) que fornece a seguinte expressão para a densidade de energia: Ecris = E0 + b11 + b1111(α1 4 + α2 4 + α3 4 )+ +6b1122 (α1 2 α2 2 + α1 2 α2 2 + α2 2 α3 2 ) + 90b112233 (α1 2 α2 2 α3 2 )+ + 15b111122 (α1 2 α2 4 + α1 4 α2 2 + α1 2 α3 4 + α1 4 α3 2 + α2 2 α3 4 + α2 4 α3 2 . (2.18) Ecris = k0c (α12 + α22 + α32 ) + k1c (α12 α22 + α12 α32 + α22 α32 ) + k2c (α12 α22 α32 ) + ..., (2.19) Na equação anterior, k0c , k1c e k2c são funções dos coeficientes bijklmn , chamadas de constantes de anisotropia cúbica de zero, primeira e segunda ordem, respectivamente. Nesta expressão, o primeiro termo em parênteses pode ser desprezado por ser igual a 1, além disso, em geral k1c k2c k3c . Ecris = k1c (α12 α22 + α12 α32 + α22 α32 ). (2.20) As energias relacionadas à anisotropia magneto-cristalina para as direções [100], [110] e [111] podem ser obtidas em relação aos cossenos diretores da seguinte forma: • E100 → caracterizada por θ = 90o e φ = 0o . Logo α1 = 1, α2 = α3 = 0; • E110 → caracterizada por θ = 90o e φ = 45o . α1 = α2 = √1 2 • E111 → caracterizada por θ = 54, 7o e φ = 45o .α1 = α2 = 12 e α3 = 0; √1 2 e α3 = 0. Para um filme de ferro crescido na direção [100], [010] ou [001] (ver Figura 2.7), em uma das faces do cubo a magnetização é paralela a um dos eixos cristalinos. Escrevendo a equação 2.20 em coordenadas esféricas e arranjando os termos, temse: Figura 2.7: Plano de deposição [010]. O sistema de coordenadas utilizado é o mesmo. Ecris = k1c (sin4 θ cos2 φ sin2 φ + sin2 θ cos2 φ cos2 θ + sin2 θ cos2 θ sin2 φ) Ecris = k1c (sin4 θ sin2 2φ + sin2 2θ) (2.21) Existem outras anisotropias em filmes magnéticos que atuam no sentido de aprisionar a magnetização ao plano do filme, como será mostrado mais à frente. A magnetização está presa ao plano x-y do filme, assim, θ = π2 e a energia da anisotropia cúbica passa a ser escrita como: 1 Ecris = k1c sin2 2φ. (2.22) 4 Derivando 2 vezes com relação a φ encontra-se os pontos crı́ticos da função energia. Estes ângulos indicarão os eixos-fáceis e duros. Os pontos de inflexão da cris função energia cristalina dEdφ = 0, são portanto: φ = 0o , 45o , 90o , 135◦ , 180o , 225o , 270o , ou 315o . dEc2 1 c1 = k [2 cos(2φ) · cos(2φ) − 2 sin(2φ) · sin(2φ)] = k [2 cos2 (2φ) − 2 sin2 (2φ)]. c1 1 dφ2 4 4 (2.23) 13 2 ac = 2. Estes Para os ângulos φ = 0◦ , φ = 90◦ , φ = 180◦ e φ = 270◦ , temos dE dφ2 valores minimizam a energia e, por isso, são considerados os eixos-fáceis do filme de ferro. dE 2 = −2. Para os ângulos φ = 45◦ , φ = 135◦ , φ = 225◦ , φ = 315◦ , temos dφcris 2 Tais valores agora maximizam a energia e, por isso, são considerados os eixosduros do filme de ferro. Devido às quatro repetições do comportamento dentro de uma volta completa, esta simetria é também chamada de simetria tipo C4 [93]. Figura 2.8: Comportamento da função Energia para a simetria cúbica na direção [100]. Pode-se analisar o comportamento desta função energia para outros dois casos. Um, quando a direção do crescimento do filme é [110] e, outra quando é [111]. Suponha um filme no qual o plano de crescimento é [110], neste caso os novos cossenos diretores serão, de acordo com a Figura 2.9: 1 1 α10 = α3 , α20 = √ (α1 + α2 ); α30 = √ (α2 − α1 ); 2 2 14 Figura 2.9: Plano de deposição [110]. O novo sistema de coordenadas é diferente do original. assim, a energia devido a anisotropia cúbica em função dos novos (sistema de referência com linha, ver Figura 2.9) cossenos diretores pode ser escrita como: 1 1 1 Ecris = k1c [(α10 α20 )2 + (α10 α30 )2 − (α20 α30 )2 + (α20 )4 + (α30 )4 ] 2 4 4 (2.24) Já que a magnetização permanece no plano do filme, teremos φ0 = 0o , ou seja, α20 = 0. Agora, com os cossenos diretores em coordenadas esféricas, a expressão para a energia devido a anisotropia cúbica é: 1 Ecris = k1c [sin4 θ0 + sin2 2θ0 ] 4 (2.25) A Figura 2.10 mostra o comportamento angular desta anisotropia. Os eixosfáceis estão localizados nos valores θ0 = 90o e θ0 = 270o , enquanto que em θ0 = 0o e θ0 = 180o existe um mı́nimo local representando os eixos-duros. No entanto, para θ ∼ = 35o existe um máximo global que é chamado de eixo duro-duro. Devido à duplicação do mesmo padrão a cada volta completa, diz-se que a simetria é do tipo C2. Suponha agora, um filme no qual a direção de crescimento é ê00y = [111]( veja Figura 2.11). Para tanto, o eixo ê00z do novo sistema de coordenadas estará agora paralelo à direção [110] : Os cossenos diretores passam a ser dados, em função dos cossenos diretores não rotacionados, da seguinte forma: 2 1 α100 = √ (α1 + α2 ) + √ α3 ; 6 6 15 Figura 2.10: Comportamento da função Energia para a simetria cúbica na direção [110]. 1 α200 = √ (α1 + α2 + α3 ); 3 1 α300 = √ (α1 − α2 ). 2 Os cossenos diretores escritos em coordenadas esféricas serão: 1 ê00x = cosφ(êx + êy ) − sinφêz , 2 1 ê00y = √ (êx + êy + êz ) 3 e (2.26) (2.27) 1 ê00z = √ (êx − êy ). (2.28) 2 Neste novo sistema de coordenadas o ângulo φ é o ângulo entre o plano de crescimento (111) e a direção [110] e seu valor é 54, 74o . 16 Figura 2.11: Plano de deposição [111]. O novo sistema de coordenadas está rotacionado em relação ao original. A energia devido a anisotropia cúbica escrita em função dos cossenos diretores tem a seguinte forma: 1 1 1 1 Ecris = k1c [( α100 )4 + ( α200 )4 + ( α300 )4 + (α100 α300 )2 ] 4 3 4 2 √ √ 2 003 00 + k1c [ (α1 )(α2 ) − 2(α100 )(α200 )(α300 )] (2.29) 3 Lembrando que a magnetização está presa no plano, tem-se novamente θ00 = 0, isto é,α200 = 0. A energia devido a anisotropia cúbica em termos das coordenadas esféricas para um filme crescido na direção [111], é: 1 1 1 (2.30) Ecris = k1c (sin4 θ00 + cos4 θ00 + sin2 2θ00 ) = k1c , 4 2 4 onde o termo entre parênteses é igual a 1. Este resultado indica que a energia não tem relação com a direção da magnetização da amostra, devido à alta simetria do sistema crescido na direção [111], significando dizer que, somente com a curva de magnetização, não pode-se determinar o campo de saturação de uma amostra deste tipo. 2.3.4 Anisotropia de Forma Quando uma amostra ferromagnética é submetida a um campo magnético, como esquematicamente mostrado na Figura 2.13, formam-se dipolos magnéticos sequenciais ao logo da direção de aplicação deste campo. Porém, em sua fronteira, estes 17 Figura 2.12: Comportamento da função energia para a simetria cúbica na direção [111]. dipolos magnéticos não possuem próximos vizinhos. Diz-se então que são dipolos magnéticos não compensados e induzidos na superfı́cie do material. As linhas de campo geradas pelos dipolos se fecham na extremidade oposta, gerando um campo ~ 0 . Isto reduz sua intensidade no magnético em sentido contrário ao campo externo H interior da amostra e, por isto, este campo é chamado de campo desmagnetizante ~ d. H O campo desmagnetizante é dado por: fM ~ d = −D ~. H (2.31) f é uma grandeza tensorial chamada de fator de desmagnetização e No geral D depende da forma da amostra. Se a amostra não for esfericamente simétrica, um ou mais eixos poderão ser privilegiados, assim, existirá uma anisotropia associada a sua geometria. ~ d é definida A expressão para a energia associada ao campo desmagnetizante H 18 Figura 2.13: Amostra inserida em um campo magnético. ~ e a magnetização pela integral volumétrica do produto escalar entre este campo H ~: M 1Z ~ ·H ~ d dv, µ0 M (2.32) 2 vol No geral, este cálculo é complexo, mas muito útil quando se tem simetrias envolvidas. Para o elipsoide da Figura 2.14 o campo desmagnetizante é dado por: Ed = Figura 2.14: Representação de uma amostra elipsoidal e seus eixos a,b e c. Ed = 1Z fM ~ ·D ~ dv, µ0 M 2 1 fM ~D ~, Ed = V µ0 M 2 (2.33) (2.34) f é um tensor diagonal, com os semieixos a, b e onde V é o volume da amostra e D c do elipsóide representando os eixos do sistema de coordenadas. Assim, o traço do tensor será: f = 1. T rD 19 (2.35) No geral, o tensor escrito para uma direção arbitrária da magnetização em relação aos semieixos e em termos dos cossenos diretores α1 , α2 e α3 é dado por: Dα1 0 0 f D = 0 Dα2 0 , 0 0 Dα3 onde os ı́ndices 1, 2 e 3 representam respectivamente os eixos a, b e c. Escrevendo a energia por volume em termos dos cossenos diretores tem-se: 1 Ed = µ0 M 2 (Dα1 α12 ) + (Dα2 α22 ) + (Dα3 α3 2 ), 2 Para o caso de uma esfera tem-se: f D esf era = 1 3 0 (2.36) 0 0 1 0 , 3 1 0 0 3 onde a densidade de energia para esta configuração será: 1 1 Edesf era = µ0 M 2 (α12 + α22 + α3 2 ). 2 3 (2.37) Simplificando, teremos 1 (2.38) Edesf era = µ0 M 2 . 6 Isto significa dizer, que todas as direções de uma esfera são energeticamente equivalentes. Pode-se ainda escrever a densidade de energia em coordenadas esféricas: 1 Ed = µ0 M 2 (Dα2 1 θ cos2 φ + Dα2 2 1 θ2 φ + Dα3 cos2 θ). (2.39) 2 Para o caso de um esferóide com os semieixos menores exibindo o mesmo tamaf apresenta D = D e D = 1 − 2D . nho, a = b < c, a diagonal do tensor D α1 α2 α3 α1 A expressão para a densidade de energia para esta configuração é, em coordenadas esféricas, dada por: 1 Edesf eroide = µ0 M 2 (Dα2 1 θ cos2 φ + Dα2 1 θ2 φ + (1 − 2Dα1 ) cos2 θ) 2 1 = µ0 M 2 (Dα1 + (1 − 3Dα1 ) cos2 θ), 2 20 (2.40) dependendo somente do fator de forma. Para o caso de um cilindro infinitamente longo tem-se, a = b, e c = ∞. As extremidades do cilindro estão muito afastadas e não ”sentem” uma à outra. Desta f se apresenta como: forma, o tensor D f D cilindro = 1 2 0 0 0 1 . 0 2 0 0 0 A expressão para a densidade de energia para esta configuração é, em coordenadas esféricas: 1 Edcilindro = µ0 M 2 (Dα2 1 θ cos2 φ + Dα1 sin2 θ2 φ) 2 1 Edcilindro = µ0 M 2 θ2 . (2.41) 4 Finalmente, para um filme fino, crescido no plano x-z (direção eby ), e levando em conta que as distâncias entre as superfı́cies nas direções ebx e ebz são muito grandes quando comparadas a espessura do filme, isto é, α1 = α2 = ∞, a única componente significativa agora será Dα3 . Desta forma, pode-se escrever o tensor de forma como: f D f ilme 0 0 0 = 0 0 0 . 0 0 1 A energia é então expressa pela seguinte equação, 1 Edf ilme = µ0 M 2 cos θ2 , 2 (2.42) onde θ é o ângulo entre o vetor magnetização e o eixo eby de crescimento da amostra. Para minimizar esta energia é suficiente tomar o valor de θ = π2 ou 3π . A busca 2 natural pela minimização da energia mostra que, para um filme simples crescido na direção eby , o vetor magnetização será perpendicular a este. 1 ~ × ebz )2 . Edf ilme = µ0 (M (2.43) 2 Conclui-se assim que a anisotropia de forma atua no sentido de aprisionar a magnetização no plano do filme. 21 2.3.5 Anisotropia de Superfı́cie Resultados experimentais mostram que, em amostras magnéticas com ordem de grandeza em nanômetros para suas espessuras, possuem um tipo de interação que torna a magnetização de saturação de um filme fino, menor que o correspondente valor da de um filme espesso. Esta interação se torna cada vez mais pronunciada à medida que a espessura da amostra diminui. Fenomenologicamente, este comportamento é associado à presença de uma anisotropia de superfı́cie. Devido à quebra de simetria na interface, as energias devido a todas as anisotropias, para filmes, apresentam sua constante k anisotrópica descrita em termos de uma constante kef composta de 2 parcelas: 2ks , (2.44) d onde kv e ks representam as dependências da anisotropia cristalina devido ao volume e à superfı́cie, respectivamente. Nesta equação, d é a espessura do filme e a constante 2 representa o fato do filme possuir duas interfaces. Esta segunda parcela mostra a proporção inversa da magnitude desta anisotropia com a espessura d do filme. Por isso, ela somente aparece em filmes finos. Na prática, a anisotropia de superfı́cie possui a mesma formulação matemática da anisotropia de forma, por apresentar as mesmas caracterı́sticas comportamentais e ainda por contribuir com o aprisionamento da magnetização no plano do filme. A energia desta anisotropia é definida como: k ef = kv + Es = X i ks (Ms~· ebzi )2 , 2 ~ M (2.45) si onde θ é o ângulo entre a magnetização e o versor ebz corresponde à normal ao plano do filme. 2.3.6 Anisotropia Uniaxial A anisotropia uniaxial pode ser originada por vários fatores: pela tensão mecânica induzida no processo de crescimento do filme, devido à diferença entre os parâmetros de rede do substrato e do material do filme crescido, pela aplicação de um campo magnético durante a deposição, por uma deformidade da espessura ao longo do filme ou ainda pela superposição de camadas de material diferente. Logo, essa anisotropia 22 está intimamente relacionada com o que ocorre durante o processo de crescimento do filme. De uma maneira geral pode-se dizer que a anisotropia uniaxial tem sua origem devido a uma desordem na distribuição dos átomos em um substrato cristalino. Pode-se criar uma anisotropia uniaxial numa amostra aplicando-se um campo magnético externo para orientar a magnetização durante o processo de crescimento. Neste mesmo processo, pode-se ainda aquecer o substrato dando energia cinética e mobilidade aos átomos da rede (annealing), desde que não ultrapasse o valor da temperatura de Curie, neste caso a do Ferro. A anisotropia então aparece quando se faz um rápido esfriamento após um processo deposição, retendo a orientação da magnetização para cada átomo em cada sı́tio da nova rede cristalina construı́da. A expressão para a energia desta anisotropia é dada por: Euni = kuni cos2 θ. (2.46) Figura 2.15: Comportamento da função Energia para a simetria uniaxial Sendo Ku a constante de anisotropia uniaxial. De acordo com a Figura 2.15, o 23 eixo-fácil se apresenta para θ = π2 e θ = θ = π. 2.3.7 3π , 2 já os eixos-duros aparecem em θ = 0◦ e Acoplamento de troca Bilinear A interação de troca está relacionada ao alinhamento das magnetizações dos filmes que compõem a amostra e, ao contrário do que ocorre nas anisotropias magnéticas, o acoplamento não privilegia nenhum eixo cristalino. Quando se têm dois filmes finos magnéticos, separados por um espaçador condutor não magnético, ocorrem dois fenômenos interessantes. A magnetização do filme superior pode alinhar-se paralelamente, diz-se aqui, acoplamento ferromagnético, ou a magnetização pode se alinhar de forma antiparalela, agora chamada de acoplamento antiferromagnético. Estes dois efeitos são denominados de acoplamento de intercâmbio bilinear e somente através de mecânica quântica é possı́vel interpretá-los. Há ainda outras energias, como por exemplo, a relacionada ao acoplamento de intercâmbio biquadrático [16, 18], fenômeno no qual as magnetizações se alinham perpendicularmente, mas serão deixadas de lado neste momento. De acordo com o modelo de Heisenberg da Mecânica Quântica, a hamiltoniana do sistema de dois filmes finos pode ser escrita como: EBil = −J S~1 · S~2 , (2.47) onde J é o fator que mede esta interação e é chamado de integral de troca. S~1 e S~2 são os spins dos ı́ons vizinhos. Trocando-se os spins do modelo de Heisenberg pelas respectivas magnetizações dos filmes, chega-se a: ~1 · M ~2 M . (2.48) M1 M2 O denominador desta expressão foi acrescentado para que a equação se torne dimensionalmente correta e represente a densidade de energia em [erg/cm2 ]. Quando JBil > 0, ver Figura 2.16, a configuração que minimiza a energia é a paralela, isto é, a ferromagnética. Para JBil < 0, ver Figura 2.17 a minimização de energia é feita com o alinhamento antiparalelo, ou antiferromagnético. Parkin e colaboradores [19] descobriram que o sinal de J é influenciado pela espessura do espaçador. Logo, é possı́vel, gerar acoplamentos ferro e antiferromagnéticos somente variando a espessura deste espaçador. EBil = −JBil 24 Figura 2.16: Ilustração de uma bicamada acoplada ferromagneticamente J > 0. Figura 2.17: Ilustração de uma bicamada acoplada anti-ferromagneticamente J < 0. Em coordenadas esféricas, a energia do acoplamento bilinear, pode ser expressa por, EBil = −JBil [senθ1 senθ2 cos(φ1 − φ2 ) + cosθ1 cosθ2 ]. (2.49) 2.3.8 A Energia Magnética Total A energia magnética total que deve ser considerada para interpretar os resultados deste trabalho é composta pela soma de todas as contribuições energéticas mencionadas anteriormente. Desta forma, a expressão da energia total é, ET otal = EZeeman + EDesmag + ESup + EU ni + ECubica + EBil , (2.50) representando respectivamente: a energia Zeeman, energia de forma, energia devido à anisotropia de superfı́cie, energia devido à anisotropia uniaxial, energia devido à anisotropia cúbica e a energia devido ao acoplamento bilinear. De uma forma explı́cita, a energia total pode ser expressa por: ET otal = − 2 X ~ · eˆk )2 + di [Mi H0 cos(φH − φ) − 2π(M i=1 2 X ksup ~ (M · eˆk )] + [kcub1 (a21 a12 + a22 a23 + a23 a21 )] − JBil cos(φ1 − φ2 ), 2 M i=1 onde o termo di representa a espessura do i-ésimo filme. 25 (2.51) É comum ainda, expressar a energia total em termos dos campos efetivos. Esta é uma forma muito prática de se estudar as propriedades estáticas da magnetização de filmes. Isto facilita a comparação das intensidades relativas de cada energia. Os campos efetivos são definidos por: HSup = 2kU ni 2kSup , HU ni = , dMSat MSat HCub = 2kCub , MSat HBil = JBil dMSat (2.52) Ainda é válido escrever a equação da energia total em termos apenas das parcelas de energia que contribuem para a posição de equilı́brio da magnetização. A energia para dois filmes pode ser expressa então por: 2 X 1 1 Etotal =− H0 cos(φH − φ) + HU ni cos2 (θi − θu ) + Hcub sen2 2θi −HBil cos(θ1 −θ2 ) dMSat 2 8 i=1 (2.53) Tendo em vista todas as formas de energias passı́veis de existência, devido ao processo de crescimento empregado, e tendo descrito o modelo fenomenológico geral abordado, pode-se finalmente deixar de lado algumas destas energias que, apesar de estarem presentes, não entram nas simulações. As anisotropias de forma e de superfı́cie já fizeram seu papel aprisionando a magnetização no plano do filme. Como somente um único filme é considerado, não existe o termo de acoplamento bilinear. Desta forma, todo o estudo fica centralizado na análise do comportamento da seguinte expressão: 2 X Etotal 1 1 H0 cos(φH − φ) − HU ni cos2 (θi − θu ) − Hcub sen2 2θi =− dMSat 2 8 i=1 (2.54) Entender a teoria de como se processa a busca da posição de equilı́brio da magnetização e o comportamento das contribuições das várias modalidades de energia a serem vencidas, frente ao campo magnético externo, resume parte do trabalho executado nesta tese. Este capı́tulo foi inteiramente dedicado à esta explanação e seu conteúdo será abordado no quarto capı́tulo, nas análises feitas a partir das medidas de MOKE e FMR. 26 Capı́tulo 3 Técnicas Experimentais 3.1 Introdução Neste capı́tulo é feita a descrição das técnicas experimentais utilizadas na primeira parte da tese, referente à fabricação do monocristal de Fe/MgO. A técnica de Difração de Elétrons de Baixa Energia será descrita no capı́tulo 5, contemplando em mais detalhes, a sua teoria, o aparato experimental e a simulação numérica. As medidas foram efetuadas com a cooperação de vários laboratórios de diferentes partes do Brasil. Os resultados de magnetometria a Efeito Kerr Magneto-Óptico foram realizadas neste departamento, os de Ressonância Ferromagnética, feitas no Departamento de Fı́sica da UFPE. As medidas de Espectroscopia de Fotoelétrons Excitados por R-X foram no laboratório de Fı́sica de Superfı́cies da UFMG e as medidas de Microscopia de Força Atômica no laboratório de microscopia desta mesma universidade. 3.2 3.2.1 Descrição das Técnicas Experimentais O método de deposição por sputtering O método de pulverização catódica ou sputtering é bem conhecido no ramo de criação e investigação de superfı́cies, pelı́culas e filmes finos. É uma técnica versátil, que pode atuar como método de deposição ou mesmo de limpeza. Como o próprio nome sugere, o mecanismo fı́sico, no qual a técnica é baseada, é o bombardeamento de um alvo (cátodo) de grande pureza com ı́ons energéticos de Argônio ou Nitrogênio. 27 A colisão destes ı́ons favorece a ejeção de material do alvo, que é pulverizado em todas as direções e pode se depositar de maneira organizada em uma superfı́cie cristalina (substrato), colocada imediatamente oposta ao alvo, sob determinadas condições de temperatura e pressão. O aparato experimental é mostrado na Figura 3.1. Figura 3.1: Representação esquemática do sistema de sputtering. O procedimento envolvido é a criação de um plasma altamente energético através da descarga elétrica em um gás inerte, sustentada por uma fonte de corrente contı́nua, pulsada ou alternada. O plasma pode ainda ser aprisionado junto ao alvo através de campo magnético, ver detalhe do porta-alvo da Figura 3.1. Esta técnica, chamada magnetron sputtering, aumenta o rendimento do plasma devido ao aumento da taxa de colisão dos ı́ons com o alvo, sem um necessário aumento da pressão do gás de trabalho. Uma vez feita a calibração da taxa de deposição, a espessura de um filme é determinada somente pelo tempo de exposição do substrato ao plasma. Um obturador mecânico inserido entre o alvo e o substrato é usado para controlar o tempo de exposição do substrato ao processo de deposição. 28 3.2.2 Microscopia de Força Atômica Em 1986, Binnig, Quate e Gerber [20] desenvolveram um aparato experimental para medir forças em escala atômica. O princı́pio básico desta técnica consiste em medir a deflexão de uma haste (de 100 a 200 µm de comprimento) que possui uma extremidade onde está montada uma sonda. A sonda consiste de uma ponta de silı́cio [21], no formato de pirâmide invertida (ver detalhe na Figura 3.2), possuindo dimensões nanométricas. Ao passar a sonda por uma superfı́cie rugosa as forças de interação entre os átomos da superfı́cie da amostra e da ponta da sonda geram deflexões na haste. Estas oscilações podem então ser medidas e representarão a rugosidade da superfı́cie. A técnica é uma poderosa ferramenta topográfica gerando imagens em 3 dimensões de superfı́cies com resolução atômica [22, 23], por isso chamada de Microscopia de Força Atômica (AFM - Atomic Force Microscopy) ou nanoscopia. Figura 3.2: Representação esquemática do conjunto haste - sonda de um Microscopia de Força Atômica. No detalhe, a sonda e suas dimensões nanométricas. O AFM opera medindo as forças atuantes entre a sonda e a amostra. Estas forças dependem de fatores, tais como: materiais que compõem a amostra e a sonda; distância sonda/amostra; geometria da ponteira, entre outros. Quando a sonda se aproxima da amostra, ela é afetada por uma força de atração originada pela interação de Van der Waals. Esta atração aumenta até os átomos das duas superfı́cies começarem a repelir seus orbitais eletrônicos. A repulsão eletrostática enfraquece a força atrativa à medida que a distância diminui. A força anula-se quando a distância entre os átomos é da ordem de alguns ângstrons (distância caracterı́stica das ligações atômicas). Quando as forças se tornam positivas, podemos dizer que os átomos da sonda e da amostra estão em contato. Neste regime de interação as forças repulsivas 29 são dominantes. Para entender o funcionamento de um AFM deve-se ter o conhecimento das forças que agem entre os sistemas nanoscópicos a distâncias muito pequenas. Na Figura 3.3, estão representadas as forças que agem entre a sonda e a amostra em função da distância que as separa. Este tipo de força é proveniente do potencial de Lennard-Jones entre dois ou mais átomos, ou qualquer outro potencial de interação com uma dependência deste tipo na variável r. Figura 3.3: O potencial de Lennard-Jones. Na área abaixo da linha de força nula, as forças são atrativas. Acima desta linha, as forças são repulsivas. No microscópio de força atômica, a sonda é acoplada a uma haste flexı́vel tipo mola plana chamada de cantilever. Em resposta à força de interação entre as superfı́cies, a mola é defletida como na Figura 3.4. Os valores da constante de deformação da mola estão situados tipicamente na faixa de 0,001 - 100 N/m e os movimentos da ordem de 0,1 Å podem ser detectados [24]. O sinal de deflexão, é medido por um sensor de posicionamento de luz. Um feixe de LASER é direcionado à superfı́cie espelhada da haste e refletido por ela, atingindo o detector (ver Figura 3.5). Em uma posição de referência, o feixe atinge o ponto médio do sensor. Ao passar por uma elevação, a mola é inclinada para cima, variando a posição do feixe refletido no sensor, para um valor positivo. Ao passar por um vale, o feixe varia 30 sua posição para um valor negativo. As variações da posição do feixe do LASER no sensor são portanto, proporcionais à topografia da superfı́cie da amostra. Figura 3.4: Representação das duas regiões que determinam os modos de operação do AFM. Em (a) - Deflexão da mola operando em modo contato. Em (b) - modo não-contato. Existem diferentes técnicas de se obter imagens de superfı́cies usando AFM. Os modos de operação, também chamados modos de varredura, referem-se basicamente à distância mantida entre a sonda e a amostra, no momento da varredura, e às formas de movimentar a sonda sobre a superfı́cie da amostra. A técnica de AFM pode ser classificada em 2 modos de força distintos: Contato e não-contato [25]. Quando operado no modo de não-contato, a separação entre a ponta e superfı́cie da amostra é da ordem de 10-100 nm. As forças como Van der Waals, eletrostática, magnéticas, capilares e outras, podem ser medidas, fornecendo informações sobre a superfı́cie. Nesta região de operação, a haste do AFM se dobra na direção da amostra. Com separações da ordem de ângstrons, a ponta está em contato com a superfı́cie da amostra. Neste modo, a força de repulsão eletrônica faz a haste dobrar-se, afastando-se da amostra e permitindo que a topografia da superfı́cie seja mapeada com alta resolução. A Figura 3.4 mostra a deflexão da mola em ambos os modos. A varredura no plano x-y opera com base na aplicação de atuadores piezoelétricos. Cristais piezoelétricos quando submetidos à tensões mecânicas deformam sua estrutura atômica, produzindo uma diferença de potencial elétrico entre suas superfı́cies. A simetria deste efeito é verdadeira, e aplicando-se uma diferença de potencial a 31 um cristal piezoelétrico, podemos controlar a deformação de sua rede cristalina no regime nanométrico. O sistema haste-sonda acoplado a um dispositivo com esta caracterı́stica pode fornecer resolução de ângstrons nos eixos x, y e z do sistema cartesiano. Figura 3.5: Representação da topografia da amostra medida pela variação do posicionamento do feixe de LASER refletido pela haste . 3.2.3 Espectroscopia de fotoelétrons excitados por Raios-X Os primeiros experimentos acerca da Espectroscopia de Fotoelétrons (XPS- XRay Photoelectron Spectroscopy) nasceram do trabalho de Hertz [26] em 1887. Porém, a explicação para o processo de emissão eletrônica só veio após o trabalho de Einstein sobre o efeito foto-elétrico [27]. A consolidação da técnica como método de análise sofisticada da superfı́cie dos materiais apareceu muito tempo depois com o resultado de um trabalho meticuloso feito por Kai Seigbahn [28] em 1967, mas os primeiros trabalhos bem documentados a respeito dos espectros do XPS são devidos a Robinson [29, 30]. O desenvolvimento histórico do XPS desde Hertz, em 1887, até Seigbahn, descrevendo a emergência da técnica entre o perı́odo 1900 - 1960, é bem descrito em [31] e [32] por Jenkin et al . A técnica de Espectroscopia de Fotoelétrons (XPS) utiliza o Efeito fotoelétrico como princı́pio de funcionamento. Quando um feixe de radiação eletromagnética especı́fica incide sobre um material, a energia do fóton incidente é absorvida por um 32 elétron de uma camada interna do átomo. Este nı́vel de energia é excitado e, em um processo de perda de energia, emite um elétron de um determinado nı́vel eletrônico com energia cinética Ek . Considerando o processo como elástico, a energia cinética do elétron ejetado é: Ek = ν − Elig − φ, (3.1) onde, é a constante de Plank, ν é a frequência da radiação e φ é a função trabalho. Se a energia do fóton, for maior que a função trabalho do material esse elétron escapará do átomo, sendo emitido da superfı́cie do material. O elétron emitido com energia Ek , é chamado de fotoelétron. Uma representação do efeito é mostrada na Figura 3.6. Figura 3.6: Representação do processo de ejeção dos fotoelétrons. Os fótons usados para a excitação, nesta técnica, estão na faixa de raios-X e pelo fato de não possuı́rem carga elétrica, sua seção de choque é muito pequena, assim possuem um comprimento de penetração (λp ) [33] grande, penetrando profundamente no material. No entanto, os fotoelétrons ejetados possuem um livre caminho médio da ordem de ângstrons, devido à sua grande seção de choque (promovida pela carga eletrônica). Assim os únicos elétrons que podem escapar do material e serem coletados para análise são os ejetados pelas primeiras camadas atômicas da superfı́cie do material. A Figura 3.7 mostra o livre caminho médio do elétron em função de sua energia cinética. Na técnica de XPS a superfı́cie do material é bombardeada com raios-X e é feita a análise da dispersão de energia dos fotoelétrons emitidos. Como cada átomo da superfı́cie de um determinado elemento possui elétrons de uma camada mais interna com energia de ligação única, o resultado desta análise fornece a identificação e 33 a estequiometria da composição quı́mica da uma amostra, bem como, o estado eletrônico da superfı́cie deste material. Por isso, XPS é uma técnica de estudo de superfı́cie. Figura 3.7: Representação do livre caminho médio dos fotoelétrons ejetados em função de energia cinética para vários elementos [34]. As regiões delimitadas representam a respectiva sensibilidade de várias técnicas. Na fonte de raios-X, utiliza-se alvos de Mg e Al. As linhas mais intensas e frequentemente mais utilizadas são as linhas principais do M gKα =1253,6 eV e a do AlKα =1486,6 eV. Estes valores são suficientes para excitar pelo menos um fotoelétron do nı́vel mais interno de praticamente quase todos os elementos da tabela periódica [34]. Para que os fotoelétrons sejam coletados é imprescindı́vel que a região entre a amostra e o coletor não existam partı́culas. Isto acarretaria perda de energia cinética por colisão ou por recombinação. Desta forma, o sistema é mantido em ultra-alto vácuo, com pressões em torno de 10−10 mbar, isto conserva suas energias mantendo um livre caminho médio suficientemente longo para alcançar o detector. Uma pequena fração dos fotoelétrons que são ejetados da amostra é coletada, passam por um sistema de lentes eletrostáticas e seguem para os filtros de energia, aonde 34 posteriormente chegam ao detetor (channeltron). No detector os fotoelétrons são contados e identificados conforme a energia cinética que possuem. A contagem de fotoelétrons que incidem no detector em função da energia cinética, convertida em energia de ligação eV, gera o espectro caracterı́stico do XPS. As Figuras 3.8 e 3.9 mostram o aparato experimental e o seu espectro caracterı́stico, respectivamente. Figura 3.8: Aparato experimental da técnica XPS. Juntamente com o processo de emissão de fotoelétrons, ocorrem outros fenômenos devido à ionização do átomo. Quando o fotoelétron é emitido de um nı́vel interno 35 Figura 3.9: Espectro caracterı́stico do XPS de uma das amostras. do átomo deixando um estado eletrônico vazio, eventualmente, pode ocorrer o preenchimento deste buraco por um elétron de uma camada superior, emitindo um fóton. Este processo é conhecido como fluorescência de raios-X. Pode ainda, haver o preenchimento do buraco, juntamente com a emissão de um segundo elétron. Os elétrons emitidos através deste mecanismo são chamados de elétrons Auger [35]. Este fenômeno é representado na Figura 3.10. A energia do fotoelétron emitido de um estado de energia ligado, que deixou seu estado eletrônico sem alterar a configuração antes da fotoionização (Elig ), é dada por: Ek = ν − Elig . 36 (3.2) Figura 3.10: Representação do processo de emissão Auger. A expressão é conhecida como teorema de Koopman [36]. A função trabalho do elemento é compensada pelo espectrômetro, que adiciona pequenos valores ao valor da energia de ligação do elemento analisado. Outros mecanismos de emissão aparecem neste processo. Elétrons de valência ligados a um átomo que tiveram um de seus elétrons internos ejetados, sofrem uma perturbação levando a banda de valência a uma reorganização. Os demais elétrons ao se adaptarem à nova configuração podem promover a excitação de um elétron ou sua elevação a um nı́vel não preenchido de mais alta energia. A diferença na energia devido a esta configuração é representada por uma alteração de relaxação intra-atômica Ea , que é adicionando ao teorema de Koopman: Ek = ν − Elig + Ea . (3.3) Como resultado disto, um estado de energia abaixo do estado fundamental é gerado e um pico satélite aparece no espectro caracterı́stico. Este pico é chamado de shake-up e devido ao surgimento originado na camada de valência e não na camada principal do processo de fotoemissão, é considerado secundário. Sua intensidade é menor que a linha de emissão da energia de banda analisada. A linha de emissão é geralmente de poucos eV abaixo da linha de emissão principal. Um espectro XPS caracterı́stico, que varre desde a energia mı́nima até a energia máxima dos fotoelétrons, permite fazer uma análise quantitativa da composição atômica da superfı́cie da amostra. A identificação quı́mica da amostra é feita por comparação dos picos dos nı́veis de energia do espectro obtido com os espectros de referência catalogados, poe exemplo, no ”Handbook of X-ray Photoelectron Spectroscopy” [37]. 37 3.2.4 Magnetometria por Efeito Kerr Magneto-Óptico A técnica de investigar as propriedades magnéticas de filmes finos e ultrafinos mais utilizada atualmente é a magnetometria por efeito Kerr. Esta técnica pode apresentar uma sensibilidade duas ordens de grandeza maior, quando comparada a métodos indutivos como VSM, por exemplo. Pode ainda ser usada para mapear a magnetização em pequenas regiões, bastando para isso focalizar o feixe LASER na região desejada [38]. O grande interesse por este tipo de investigação deriva do recente crescimento e comercialização de dispositivos de armazenamento de informações de alta densidade, mais especificamente no sistema de leitura, no qual são usadas multicamadas magnéticas. Em 1876, o fı́sico Jonh Kerr [39, 40], descobriu que havia uma rotação do plano de polarização de um feixe de luz linearmente polarizado, quando este refletia numa amostra magnetizada. É o efeito semelhante ao Efeito Faraday [41] para a reflexão e foi denominado de Efeito Kerr Magneto-Óptico (MOKE- ”Magnet-Optical Kerr Effect”). Este efeito nasce da interação dos fótons com os elétrons das camadas do material que foram penetradas pela radiação. A magnetometria a efeito Kerr Magneto-Óptico baseia-se na rotação do plano de polarização da luz refletida por uma amostra, quando está inserida em campo magnético externo controlável. O resultado é uma curva de histerese magnética do filme medido, na qual o eixo x do gráfico representa o campo magnético externo e o eixo y representa a magnetização em unidades arbitrárias. Incidindo luz polarizada em um filme ferromagnético, pode-se observar três diferentes tipos de Efeito Kerr [42]. O Efeito Kerr longitudinal é sensı́vel à componente paralela da magnetização em relação à superfı́cie do filme e ao plano de incidência da luz. O efeito sensı́vel à componente paralela da magnetização em relação à superfı́cie do filme, mas ortogonal ao plano de incidência, chama-se efeito Kerr transversal. Já o efeito devido à componente ortogonal do vetor magnetização com relação ao plano da superfı́cie do filme chama-se feito Kerr polar. Uma representação gráfica destas configurações é apresentada na Figura 4.3.3. Uma configuração simples para o experimento de Efeito Kerr consiste em passar um feixe de LASER através de um polarizador, fazendo-o refletir na amostra imersa no campo magnético. A luz refletida atravessa um segundo polarizador (chamado de analisador) e é direcionada por espelhos a incidir num detector de luz. Uma representação é mostrada na Figura 3.12 38 Figura 3.11: As configurações de Efeito Kerr Magneto-Óptico. O quadrado amarelo representa a amostra ferromagnética. Em roxo, o substrato, a linha vermelha representa o percurso do LASER e finalmente em verde, a direção de aplicação do campo magnético externo. n̂ representa o versor normal a superfı́cie do plano de incidência. Figura 3.12: O arranjo experimental para medidas de Efeito Kerr Magneto-Óptico. Matematicamente, este feixe de luz incidente é representado por: ~ r, ~k, t) = E0 ei(~k·~r−ωt) . E(~ (3.4) Este feixe, ao passar pelo primeiro polarizador, fica com seu plano de oscilação ~ i determinado. (O ı́ndice i significa incidente). O polarizador do campo elétrico E está girado de um ângulo θ qualquer em relação à direção p̂. Desta forma, o campo elétrico incidente pode ser decomposto numa soma de dois campos elétricos oscilando 39 em fase nas direções p̂ e ŝ. ~ = E i ~s + E i p~ E s p (3.5) O feixe, após ser refletido pela superfı́cie do filme, perde intensidade devido à parcela de luz refratada internamente (aqui são levadas em consideração as condições de contorno [33] para os campos elétrico e magnético na superfı́cie do filme). As amplitudes dos feixes refletido e incidente nas polarizações p~ e ~s podem ser relacionadas através dos coeficientes de Fresnel [33]: Er Ei p = R p Esr Esi (3.6) onde rpp rps . R= rsp rss (3.7) Os elementos da matriz R são dados pela razão entre as amplitudes refletida e incidente em suas polarizações. Epr = i, Ep (3.8) rps = Epr , Esi (3.9) rsp = Esr Epi (3.10) rss = Esr . Esi (3.11) rpp e A onda refletida é então escrita na forma: ~ pr = (rpp Epi + rps Esi )~p + (rsp Epi + rss Esi )~s. E (3.12) Quando a espessura do filme é menor que o comprimento de penetração da luz [33], o efeito KERR é conhecido como SMOKE (”Surface Magneto-Optical Kerr Effect”) [43, 44, 45]. A técnica SMOKE começou a ser usada em 1985, num primeiro 40 experimento, investigando filmes de ferro crescidos epitaxialmente em substrato de ouro na direção [100] (detalhes na referência [44]). Para o entendimento do SMOKE é preciso considerar a Figura 3.13. Figura 3.13: Modelo adotado quando a espessura do filme é menor que o comprimento de penetração da luz - SMOKE. Neste regime de espessuras, existe uma reflexão interna devido à interface filme/substrato que contribui com uma parcela de efeito Faraday durante sua propagação através do filme e que deve ser levada em consideração. O cálculo dos coeficientes de Fresnel para este sistema consiste em aplicar as equações de Maxwell e satisfazer às condições de contorno nas interfaces ar/filme e filme/substrato, tantas vezes quanto o número de camadas da amostra no qual o feixe de luz penetra. Este problema foi resolvido por J. Zak et al considerando algumas aproximações [46], os coeficientes encontrados são: rps = − rpp = n3 cosθ1 − n1 cosθ2 , n3 cosθ1 + n1 cosθ2 (3.13) rss = n1 cosθ1 − n3 cosθ2 , n1 cosθ1 + n3 cosθ2 (3.14) 4π n1 dcosθ1 (cosθ2 n22 mz − n3 n1 senθ1 my )Q λ (n1 cosθ1 + n3 cosθ2)(n3 cosθ1 + n1 cosθ2) 41 (3.15) e rps = − 4π n1 dcosθ1 (cosθ2 n22 mz + n3 n1 senθ1 my )Q , λ (n1 cosθ1 + n3 cosθ2)(n3 cosθ1 + n1 cosθ2) (3.16) onde n representa o ı́ndice de refração, θ o ângulo entre o feixe e a normal, Q a constante magnetóptica e m a magnetização, para os seus respectivos ı́ndices. A informação magnética do filme é carregada pelos coeficientes rps e rsp , onde as componentes my e mz são as responsáveis pelos efeitos Kerr nas configurações longitudinal e polar. O efeito Kerr não depende dos coeficientes rpp e rss , pois estes coeficientes não carregam informação da magnetização. No entanto, neste trabalho não há interesse em quantificar os valores de magnetização e nem da constante magnetoóptica dos filmes crescidos. O interesse é obter as curvas de magnetização e, a partir delas, inferir a respeito da cristalinidade das amostras pela análise do seu comportamento. Para tanto, é suficiente a medida dos campos coercivos e de saturação, para as várias modificações de parâmetro no processo de deposição. 3.2.5 Ressonância Ferromagnética A magnetização, nesta seção, deixa de ser tratada como um vetor macroscópico e estático, passando a ser considerado um vetor capaz de acompanhar as oscilações rápidas de um campo eletromagnético. será discutida a interação dos meios magnéticos com uma onda eletromagnética, na qual as ondas de spin são consideradas o produto desta interação. O fenômeno de interesse e base da técnica experimental é a ressonância ferromagnética (FMR). Nesta técnica, uma onda eletromagnética na faixa de micro-ondas é aplicada a uma amostra magnética localizada em uma cavidade inserida entre polos de um eletroı́mã. Mede-se então a onda refletida, variando-se o campo magnético externo. Para um determinado valor de campo magnético, haverá uma absorção de energia e o sinal medido sofrerá uma queda na intensidade. Diz-se então que o sistema está em ressonância. Logo, a técnica de ressonância ferromagnética consiste em obter a resposta de uma amostra magnética, quando há a excitação em rádio-frequência. A descoberta do fenômeno deve-se a Arkad Yev [47, 48] que foi o primeiro a observar a absorção ressonante de micro-ondas em fios de Nı́quel e Ferro em 1912. Somente em 1923 Dorfman [49] explicou qualitativamente o fenômeno a partir de transições Zeeman. Em 1935 Landau e Lifshitz [50] explicaram o comportamento 42 de um ferromagneto na presença de micro-ondas. Em 1946 a absorção ressonante de micro-ondas foi observada mais claramente em ligas de Ni-Fe por Griffths [51] e simultaneamente por Zavoiskii [52]. Entre as décadas de 40 e 50, Kittel [53] e Van Vleck [54] generalizaram, em seus trabalhos, os cálculos de Landau e Lifshitz. Desde então muitos trabalhos experimentais surgiram evidenciando este experimento como um dos métodos mais eficientes no estudo da dinâmica da magnetização. ~z Na visão semiclássica, um spin eletrônico imerso em um campo magnético H possui uma posição de equilı́brio bem determinada (depois do perı́odo transiente). Esta direção será tomada como o eixo êz de um sistema de coordenadas cartesiano. ~ z e naturalmente esta configuração é O spin se orienta paralelamente ao campo H um mı́nimo de energia. ~ ·H ~ z. E = gµb S (3.17) Aqui, g é o fator de Landé e µb é o magneton de Bohr. Quando o spin é perturbado por um outro campo magnético h~0 repentino, no plano x-y, ele desvia-se de sua posição de equilı́brio e, sofrendo a ação de um torque gerado pelo campo externo, passa a precessionar em torno do vetor campo magnético ~ z , como mostrado na Figura 3.14. Este torque atua no plano perpendicular ao H ~ ×H ~ z sobre o momento magnético µ = gµb S ~ associado ao spin, e definido plano de S por: ~ ×H ~ z, ~τ = (h̄gµb )S (3.18) ~ d(h̄S) dJ~ = . dt dt (3.19) Pela segunda lei de Newton: ~τ = Desta forma, a equação de movimento de um spin é: ~ dS gµb ~ ~ =( )S × Hz . (3.20) dt h̄ O spin então perde energia para rede, voltando à sua posição de equilı́brio em um ~ z , de acordo com a Figura 3.15. O movimento é movimento de espiral em torno de H amortecido e uma parcela a mais deve ser adicionada à equação de movimento 3.20 representando o processo de perda de energia. No entanto, nosso interesse é estudar 43 Figura 3.14: Torque gerado pelo campo magnético. o comportamento no regime estacionário e, desta forma, o termo de amortecimento não será abordado. Figura 3.15: Cone espiral de precessão amortecido pela perda de energia para a rede. ~ tem-se: Passando este resultado para a grandeza macroscópica M ~ = M X 44 ~i gµb S V (3.21) ~ dM ~ ×H ~ ef . = γM (3.22) dt Esta é a equação de movimento de Landau-Lifshitz [50]. Hef é o campo magnético efetivo, ”sentido” pela magnetização e originado pelas contribuições dos termos de energia que a amostra possui. Na formulação da energia, a relação com este campo efetivo foi apresentada pela primeira vez por 1937 por Van Vleck [54]. γ = gµh̄ b é a razão giromagnética do elétron. A solução da equação de Landau-Lifshitz para uma amostra isotrópica é dada pela seguinte relação de dispersão: ω = γH0 , (3.23) onde ω é a frequência de ressonância e γ é a razão giromagnética (Para g =2,1, γ = 5,6π GHz/kOe). Isto sugere que para campos magnéticos da ordem de kOe (facilmente disponı́vel em laboratório) devemos usar frequências de oscilação da ordem de GHz (micro-ondas). A equação 3.23 representa um comportamento li~ z . No entanto, é tecnicamente near da frequência de ressonância com o Campo H inviável gerar micro-ondas em frequências variáveis. A geração deste tipo de onda eletromagnética está associada a parâmetros geométricos bem definidos (válvula Klystron). Por isso, é conveniente possuir uma frequência fixa em GHz, variar o ~ z e estudar o comportamento da absorção de micro-ondas pela amostra campo H para vários ângulos diferentes. Na técnica de FMR a amostra é colocada dentro de uma cavidade metálica especial que está presa a um goniômetro. Este sistema está inserido dentro de um ~ z esteja paralelo à superfı́cie da eletroı́mã, de maneira que o campo magnético H ~ z é estático e deve atingir valores da ordem de amostra, vconforme a Figura 3.16. H kOe. Haverá durante a varredura de campo magnético um valor no qual a absorção será máxima. Neste momento os spins, por estarem alinhados com o campo magnético externo, apresentarão um comportamento coletivo. Quando as micro-ondas cederem energia ao sistema, na mesna taxa de absorção, a frequência de ressonância terá sido atingida. Todos os spins possuirão a mesma frequência de precessão e o sinal medido sofre uma queda de intensidade, devido à absorção pela amostra. A precisão da medida do campo de ressonância melhora tomando a derivada da absorção. Desta 45 Figura 3.16: Equipamento de Ressonância Ferromagnética (FMR). Em verde, o eletroı́mã. Em amarelo o guia de ondas. E em vermelho, a cavidade ressonante. As setas pretas indicam o percurso ~z da onda eletromagnética. E a seta verde a direção do campo magnético externo H . forma, em medidas de FMR o gráfico obtido tem o comportamento da Figura 3.17. O campo de ressonância é o ponto onde a curva corta o eixo x na Figura 3.17. ~ z. A medida é feita para vários ângulos da amostra com relação ao campo H Se o sistema magnético não possui ordenamento e nenhuma direção preferencial quando foi fabricada (amostras policristalinas), a curva de FMR será praticamente igual para todas as direções. No entanto, para amostras monocristalinas, devido ao ordenamento da rede, as medidas de FMR apresentarão valores diferentes de campo de ressonância e repetitivos para determinados ângulos de acordo com as anisotropias que a amostra possui. 46 Figura 3.17: Gráfico da derivada da absorção de micro-ondas na Ressonância Ferromagnética (FMR). 47 Capı́tulo 4 O Monocristal 4.1 Introdução A deposição de materiais magnéticos em substratos cristalinos ganhou um profundo interesse na década de 80. Desde então, filmes finos magnéticos tem sido estruturas-base para dispositivos eletrônicos. O número de artigos cientı́ficos sobre o tema, desde então, cresceu consideravelmente, revelando muitas das propriedades inovadoras do ferromagnetismo aplicado a nanoestruturas [15]. Neste regime de espessura os efeitos quânticos são predominantes, gerando situações surpreendentes. O fenômeno explorado nos dispositivos baseados em válvulas de spin [55], juntamente com a descoberta da magnetorresistência gigante[56], a oscilação do acoplamento de troca [19, 57] e o acoplamento biquadrático[58], marcaram uma nova era no mundo da informação. A descoberta de tais fenômenos renderam o prêmio Nobel de Fı́sica a Albert Fert e Peter Grünberg em 2007. Para que estas propriedades apareçam, é preciso que as estruturas sejam compostas de poucas camadas atômicas. Neste regime de espessuras, a contribuição dos átomos da superfı́cie se torna muito significativa, gerando uma anisotropia energética fora do plano capaz de suprimir o efeito da magnetização normal à superfı́cie, aprisionando assim, a magnetização no plano do filme, como foi visto nas seções 2.3.4 e 2.3.5. Esta caracterı́stica é indispensável, hoje em dia, nos dispositivos de armazenamento, de gravação e de leituras de informações magnéticas. Tais observações e descobertas revolucionaram o mundo da informação. Graças a esses efeitos, a capacidade de armazenamento de informações gravadas magneticamente deu um salto 48 gigantesco. Desenvolver um dispositivo deste tipo exige que uma sequência de técnicas sejam dominadas. Dentre elas, a metodologia de deposição de monocristais ferromagnéticos em escala nanométrica é a fundamental. Existe assim um particular interesse na deposição de Fe/MgO [59, 61]. Estes materiais são relativamente baratos e o substrato possui algumas caracterı́sticas que favorecem seu uso como matriz de deposição, fornecendo resultados excelentes. O primeiro trabalho desta tese foi o desenvolvimento desse tipo de estrutura. As próximas seções descrevem o procedimento experimental e os resultados obtidos. 4.2 4.2.1 Detalhes experimentais O substrato MgO(100) O óxido de magnésio (MgO) é um dos mais importantes óxidos metálicos e possui uma ampla faixa de aplicações na ciência moderna e na tecnologia. Em sua aplicação mais nobre, os cristais de MgO são utilizados em grande escala como substrato para crescimento epitaxial nos mais diversos ramos da tecnologia. Isto se deve à grande estabilidade de sua superfı́cie, no que diz respeito à resistência à adsorção de impurezas, elevada dureza, baixa constante dielétrica e um comportamento linear de expansão em uma ampla faixa de temperatura [60]. Em especial, sua elevada relação custo/benefı́cio traduz sua aplicação em larga escala. O MgO é amplamente usado junto com outros óxidos na fabricação de dispositivos de modulação e chaveamento óptico, como agentes catalı́ticos ou compostos em isoladores elétricos para aplicação em supercondutores [61]. O cristal de MgO possui estrutura cúbica de face centrada (ver Figura 4.1) com parâmetro de rede medindo 4, 21Å, à temperatura ambiente e coeficiente de expansão térmica de (12, 8 × 10−6 )o C −1 . Esta configuração confere ao cristal uma grande aproximação com a estrutura dos mais importantes óxidos ferroelétricos e metais. Por isso, é um grande candidato à matriz no crescimento epitaxial. Ele é crescido pelo método de fusão à arco, denominado Arc-melting, em câmaras que atingem temperaturas da ordem de 3500o C. Nesta câmara, o pó de MgO de alta pureza é derretido e espontaneamente nucleado, gerando um cristal em um processo que dura em média 36h. [61]. É apresentado na Figura 4.2 o padrão de difração 49 de elétrons para o cristal de MgO (100) utilizado nas deposições deste trabalho. A imagem foi realizada com incidência normal do feixe eletrônico no valor de energia de 64 eV. Figura 4.1: Célula unitária do MgO. Os átomos de Mg estão na cor verde. Figura 4.2: Padrão LEED do cristal de MgO(100). A imagem foi realizada com incidência normal do feixe eletrônico no valor de energia = 64 eV. Os cristais de MgO utilizados foram adquiridos comercialmente (Ver referência [62]). Suas especificações são as seguintes: Face (100) com desvio de orientação de ±0, 2o e pureza de 99, 95%. Os 0, 05% restantes representam impurezas de Ca = 40ppm, Al = 15ppm e F e = 50ppm (as mais significativas). Os substratos possuem dimensões de 10 mm x 10 mm x 0,5 mm e apenas um dos lados polidos, 50 originalmente. Foram divididos em até 9 partes, onde cada uma foi destinada à deposição de um filme de ferro com variação de algum parâmetro, como temperatura de crescimento, parâmetros de controle do plasma ou espessura. Procedimento de limpeza A qualidade na deposição de um filme está intimamente associada à natureza de fabricação e à limpeza do substrato. Esta qualidade é medida pela aderência do filme ao substrato e, principalmente, medida pela rugosidade da superfı́cie do filme depositado (na fabricação de multicamadas, por exemplo, desejamos obter a superfı́cie mais homogênea e uniforme possı́vel). O método de limpeza varia com o grau de perfeição desejado. Nos filmes crescidos nesta tese, o procedimento não tem nenhum grau de sofisticação, porém, com uma metodologia simples e de fácil reprodução foi possı́vel desenvolver filmes de excelente qualidade morfológica, cristalina e magnética. O processo de limpeza consiste em 2 banhos de ultrassom imersos em acetona (C3 H6 O) e posteriormente em álcool metı́lico (CH3 OH), durante 10 minutos cada um. Os banhos são feitos com frequência de ultrassom de 40 kHz e à temperatura de 60 o C. Este procedimento retira qualquer tipo de contaminante solúvel por estes agentes, que porventura possam estar impregnados na superfı́cie do cristal. A secagem é realizada com jato de Nitrogênio (N2 ) pressurizado, evitando que eventuais partı́culas em suspensão nos lı́quidos fiquem prezas à superfı́cie [63]. 4.2.2 O filme de Fe O Fe possui estrutura cúbica de corpo centrado (ver Figura 4.3) com parâmetro de rede medindo 2, 86Å. Este valor é compatı́vel com o valor da diagonal da célula unitária do cristal de MgO na face (100). Assim, o substrato é adequado a servir como matriz de deposição para este elemento. A diagonal do MgO é praticamente duas vezes maior que o parâmetro de rede do ferro. A diferença é de somente 5%, no entanto, gera uma pequena contribuição para anisotropia magnética na forma uniaxial. Mas, frente ao valor da anisotropia cristalina, a parcela uniaxial não é significativa. Assim, tomando a direção [100] do MgO como eixo de referência, o Fe crescerá na direção [110], isto é, girado de 45o . No processo de medida usamos umas das 4 51 Figura 4.3: Célula unitária do Fe. faces laterais do substrato para determinar os eixos cristalográficos do filme de Fe. Enquanto a direção [110] (diagonal do MgO) representa o eixo fácil do filme. O eixo duro do Fe aparece na direção [100] do substrato. A Figura 4.4 mostra este fato. Figura 4.4: Direção de crescimento do Fe. Considerando os cubos de baixo como a rede do MgO [100] e os de cima, a rede do Fe. O filme cresce na direção [110]. A face lateral de baixo representa o eixo fácil do filme, enquanto que a face lateral de baixo representa o eixo duro. 4.2.3 Procedimento experimental No processo de deposição utilizamos um sistema de magnetron sputtering DC comercial da marca AJA, na qual sua câmara de deposição mede (30 × 30 × 30)cm3 com a distância entre o porta substrato e porta alvo medindo 90 mm. Este sistema é equipado com dispositivo de controle de aquecimento do substrato, podendo-se atingir a temperatura máxima de 800 o C. Um sistema de refrigeração força a circulação de água gelada pelo porta-alvo, porta-substrato e bomba turbo molecular. É equipado também com dois porta-alvos, tornando possı́vel a deposição de multicamadas com até dois elementos diferentes, sejam ferromagnéticos, não magnéticos ou semicondutores. Estão instaladas duas fontes de controle do plasma, uma em 52 corrente contı́nua com 100 watts de potência e outra em corrente alternada com 50 watts, podendo ser intercambiadas ou ainda ligadas simultaneamente. Após a inserção do substrato na câmara, inicia-se o processo de limpeza da atmosfera interior pelo acionamento do sistema de vácuo. Este sistema é composto por uma bomba mecânica que atinge 10−3 mbar em aproximadamente em 10 minutos e uma bomba turbo molecular com vazão de 210 litros por hora, destinada a obtenção de alto vácuo. Depois de acionada, a câmara atinge a pressão de base de 10−7 mbar em aproximadamente 20 horas. Depois de atingida essa pressão, é injetado o gás Ar com 99,999% de pureza, à pressão de 5, 5 × 10−3 mbar. Esta é nossa pressão de trabalho. Neste instante é realizada a limpeza do alvo com o mesmo processo de sputtering. A experiência mostra que em média, 5 minutos, são suficientes para que seja feita a retirada das camadas oxidadas do alvo. Durante este procedimento é feita a estabilização do plasma, mantendo a corrente de trabalho em 0,060 amperes e a diferença de potencial em torno de 380 volts. Nestas condições, a taxa de deposição do Fe permanece constante, com valor de 0, 75 Ås . O alvo de ferro utilizado foi adquirido comercialmente (ver referência [62]) com pureza de 99,999% Os filmes foram depositados com a espessura de 250Å e sem camada de proteção (cap layer ), variando-se a temperatura de deposição. Resultados experimentais para filmes nanométricos de Fe [57, 63] mostram que neste regime de espessura os filmes apresentam valores de campo se saturação equivalentes aos valores obtidos em amostras cristalinas e espessas de (bulk )de Fe. Este valor vale 550 Oe. Os valores de temperatura de 100 o C, 150 o C, 200 o C, 250 o C e 300 o C, foram baseados em medidas preliminares de MOKE. Os efeitos da temperatura de deposição na estrutura quı́mica e morfológica foram investigados pelas técnicas de XPS e AFM. MFoi medido os campos de saturação magnética para cada filme via magnetometria a Efeito Kerr Magneto-Óptico e seus graus de cristalinidade via Ressonância Ferromagnética (FMR). Assim, realizamos a busca dos parâmetros que maximizam o valor da anisotropia cristalina na deposição por sputtering DC . 53 4.3 4.3.1 Resultados XPS No procedimento de medida de XPS a pressão é mantida em 10−10 mbar. Devido à exposição da amostra à atmosfera, algumas camadas de contaminantes, que foram adsorvidas na superfı́cie, devem ser retiradas. Neste processo, a amostra é levada à uma outra câmara, onde é bombardeada por ı́ons de Ar. Algumas camadas atômicas são arrancadas da superfı́cie e, para restaurar a suavidade, fornecemos energia aos átomos, promovendo a difusão das partı́culas atravez do aumento da temperatura da amostra feita com bombardeamento de elétrons (e-Beam). Estes procedimentos são comuns a toda medida de XPS. Depois deste processo, a amostra é posicionada na câmara do XPS. Com o acionamento da fonte de raiosX, no analisador, é feita uma varredura de energia cinética dos fotoelétrons através de um filtro eletrostático. Um multiplicador de elétrons, acoplado a um sistema de aquisição, faz a contagem eletrônica para um dado valor de energia. Desta forma, o gráfico obtido é o número de elétrons versus a energia de ligação dos elementos (como visto na seção 3.8). O equipamento utilizado foi um VG-Escalab 220-iXL equipado com analisador de elétrons, fonte de raios-X de anodo duplo (Al/Mg) e facilidades de limpeza (sputtering com Ar+ ). As medidas XPS foram feitas com as linhas de emissão do Al Kα em 1253,6 eV. Para a condição de energia de passagem do analisador usamos 50 eV, para obter um amplo espectro (0-1100 eV), e de 20 eV para um espectro mais detalhado em torno das linhas de emissão do elemento. A Figura 4.5 mostra o espectro geral da amostra antes do procedimento de sputtering. A intensidade do pico do elemento carbono (C) foi usada como referência para estimar o tempo de sputtering da amostra. Estima-se que 1nm (≈ 4 camadas atômicas de Fe) foram retiradas do filme original, neste processo. A Figura 4.6 mostra a composição quı́mica do filme após a limpeza. Um espectro mais detalhado, em torno das linhas do Fe é apresentado na Figura 4.7. Os picos de intensidade nos valores de energia 706,8 eV e 719,9 eV remetem às 3 1 configurações do Fe-2p, respectivamente F e − 2p 2 e F e − 2p 2 , evidenciando uma composição quı́mica formada apenas por Fe metálico. Não foram encontradas linhas do F e2+ 2p ou F e3+ 2p, isto seria representado pela presença de picos satélites (shakeup) ao lado do pico principal (706,8 eV) nos valores de 708,2 eV e 710,4 eV. Isto 54 Figura 4.5: Espectro de XPS mostrando a composição quı́mica do filme antes da limpeza. As intensidades dos picos de carbono (C) e de oxigênio (O)revelam camadas oxidadas na superfı́cie. 1 A região maior delimitada pela curva mostra a localização da “assinatura” do ferro F e − 2p 2 e 3 1 3 F e − 2p 2 . A região menor delimitada representa os picos do F e − 3p 2 e F e − 3p 2 indica que, internamente, não houve oxidação parcial do filme inerente ao processo de crescimento. 55 Figura 4.6: Espectro de XPS mostrando a composição quı́mica do filme após a limpeza. A redução do pico de C e a elevação dos picos do Fe 2p são notórias. 4.3.2 AFM Utilizando a técnica de AFM foi investigada a morfologia da amostra, após sua saı́da do XPS. O equipamento usado foi o modelo IV MultiMode da Veeco Instruments Nanoscope. As medidas foram feitas no modo de contato, usando sonda de silı́cio. A Figura 4.8 mostra uma superfı́cie suave, sem apresentar a formação de ilhas de Fe quebrando a uniformidade da superfı́cie. A rugosidade média (Ra) encontrada vale 0, 253nm, enquanto que o valor RMS da rugosidade, Rq, vale 0, 349nm. As rugosidades Ra e Rq da imagem foram calculadas seguindo as seguintes equações dadas por 4.1 e 4.2: Ra = n 1X |zi |, n 1=1 56 (4.1) Figura 4.7: Espectro do XPS em torno das linhas do Fe 2p da amostra preparada à 250 o C após a limpeza. Evidência da pureza da composição quı́mica do filme no processo de deposição. Rq = v u n u1 X t |z 2 |, n 1=1 i (4.2) onde zi é a i-ézima altura medida e n o número de picos. Isto sugere um bom ajuste entre parâmetros de rede do filme e do substrato na interface ou ainda, que houve a difusão de átomos de Fe na rede do MgO [59]. No entanto, estudos micrográficos desta região não foram efetuados. No geral, filmes crescidos pelo método de sputtering apresentam uma superfı́cie delgada onde o efeito da difusão é muito pequeno [19, 57]. 4.3.3 MOKE A caracterização do perfil magnético das amostras foi efetuada por medidas de 57 Figura 4.8: Imagem da impressão de tela do software do AFM mostrando a rugosidade da superfı́cie do filme crescido a 250 o C. O valor da rugosidade média (Ra) vale 0,25nm. MOKE e FMR. As curvas de magnetização para os filmes forneceram os campos de saturação e os campos coercivos. A partir do comportamento destes campos em função de temperatura, pudemos pré-determinar a qualidade da cristalinidade na deposição do filme. O equipamento utilizado foi um magnetômetro tipo home made [42] equipado com um LASER de Helio-Neônio de 10,0 mW que emite comprimento de onda igual a 632,8 nm, e modulado por um obturador óptico operando em 500 Hz. Possui um par de bobinas que geram um campo máximo de 3500 Oe, polarizadores ópticos com 1 razão de extinção de 1000 e deteção do sinal via LOCK-IN. As medidas foram realizadas na configuração longitudinal (ver Figura 4.3.3) em todos os filmes da faixa de temperatura considerada. Para investigar o comportamento da anisotropia magnética no plano, as medidas foram feitas variando-se o ângulo entre uma das faces do substrato (tomado como referência) e a direção do campo magnético DC externo, considerando o eixo de giro sempre normal ao plano da superfı́cie do filme. As medidas para o filme crescido na temperatura de 300 o C são apresentadas na Figura 4.9. A presença clara de um eixo-fácil e um eixo-duro sugerem fortemente a 58 presença de anisotropia cristalina. A repetição do comportamento em ângulos relativos a rotações de 90o comprovam sua existência (simetria tipo C4). A magnetização de saturação apresenta valor em torno de 550 Oe (valor de bulk ). A coercividade apresenta valor de 20 Oe enquanto a magnetização remanente, um valor de 70% do valor da magnetização de saturação. Resultados similares são obtidos para filmes de Fe/MgO e Fe/GaAs em [63, 65, 67]. Nestes trabalhos os autores concluı́ram que filmes de Fe com campos de saturação próximos de 500 Oe e campos coercitivos próximo a 20 Oe, apresentam cristalinidade do Fe tipo ”bulk”. Figura 4.9: Magnetização normalizada em função do campo magnético externo. A medida foi efetuada no filme depositado na temperatura de 300 o C. A curva azul representa o eixo fácil e a vermelha o eixo duro, ao longo da direção [110]. A Figura 4.13(b) apresenta a influência da temperatura nas curvas de histerese medidas na direção [110]. Esta direção determina o eixo duro dos filmes e são suficientes para caracterizar a anisotropia cristalina em todas as amostras. Pode-se, portanto, afirmar que a anisotropia magnética cristalina aumenta com a temperatura de crescimento. Isto está de acordo com resultados obtidos na literatura 59 Figura 4.10: Magnetização normalizada em função do campo magnético externo medida ao longo da direção [110] das amostras crescidas a 100 o C, 150 o C 200 o C e 250 o C. em [65]. 60 4.3.4 FMR Foi utilizado um equipamento de FMR home made [66] equipado com cavidade ressonante retangular e operando com frequência de micro-ondas de 9,4GHz. Como nas medidas de MOKE, fizemos uma varredura da posição angular da amostra em relação ao campo externo, sempre a girando em um eixo normal ao plano do filme. O campo magnético foi modulado a 1 kHz com bobinas de Helmholtz para deteção via LOCK-IN. Todas as medidas foram efetuadas em temperatura ambiente. A Figura 4.11 mostra o comportamento ressonante da amostra crescida a 250 o C em 0, 9kOe. Figura 4.11: Espectro de FMR para θH = 90o do filme crescido na temperatura de 250 o C. Para cada valor de ângulo foi efetuada uma medida varrendo-se o campo magnético e encontrando os respectivos campos de ressonância. A Figura 4.12 apresenta o espectro de FMR em função do ângulo planar para as temperaturas de 100 o C, 150 o C, 200 o C e 250 o C. O comportamento do gráfico é simétrico. Por isso a variação angular apresentada está entre os valores 0 o e 180 o apenas. 61 Figura 4.12: Campo de ressonância em função do ângulo planar de uma sequência de amostras crescidas à (a)100 o C, (b)150 o C, (c)=200 o C e (d)=250 o C. É conhecido da literatura, que a variação do campo de ressonância entre os eixos fácil e duro, ∆HRes = HRes (θ = 0o ) − HRes (θ = 45o ), representa uma medida quantitativa da cristalinidade da amostra [68, 69]. A Figura 4.12 (a) mostra que a curva referente à temperatura de 100 o C possui um pequeno ∆HRes . Este valor aumenta à medida que a temperatura de deposição é elevada. De outro lado, analisando a simetria das curvas com relação ao ângulo da amostra, fica claro novamente, a existência da simetria tipo C4, originada pela anisotropia cúbica do Fe(100). Observa-se ainda a existência de uma pequena anisotropia uniaxial associada a uma possı́vel desigualdade nos parâmetros de rede do Fe e do MgO. Tal anisotropia pode ser determinada graficamente pela diferença entre os campos de ressonância para (θ = 45o ) − HRes (θ = 135o ). Esta diferença vale aproximadamente 20 Oe e não influencia de maneira significativa o comportamento magnético dos filmes [65]. Pode-se fazer um gráfico do comportamento de HRes , obtido das medidas de MOKE, e de ∆HRes , obtido do FMR, em função da temperatura de deposição. 62 Aqui é necessário um fator de correção de escala, dividindo ∆HRes por dois para colocar os parâmetros no mesmo referencial. As curvas obtidas, mostradas na Figura 4.14, apresentam um comportamento assintótico tendendo para o valor do campo de saturação do Fe bulk na temperatura de 300 o C. A Figura representa o campo efetivo da anisotropia magneto-cristalina em função da temperatura para um filme simples. 63 (a) (b) 64 Figura 4.13: Em (a) - Hsat e HRes/2 em função da temperatura de deposição. A linha contı́nua representa o ajuste feito com a equação de Avrami. Em (b) - ∆Hsat em função da temperatura de deposição. A linha contı́nua representa o ajuste feito com a equação de Avrami. Figura 4.14: Os resultados de Hsat e HRes/2 para FMR e MOKE, respectivamente, em função da temperatura de deposição. A linha contı́nua representa o ajuste feito com a equação de Avrami. O gráfico interno apresenta a anisotropia uniaxial determinada na simulação. Seu valor foi estimado em 10 Oe. . Os resultados da simulação numérica foram obtidos aplicando um algoritmo de busca do mı́nimo da energia magnética total, levando em conta as contribuições da energia Zeeman, da anisotropia uniaxial e da anisotropia cristalina. O modelo teórico da deposição está associado com a equação de Avrami [70]. Neste modelo, o processo de deposição passa por etapas contı́nuas de nucleação, aonde os átomos de Fe vão se aglomerando em ilhas que aumentam de tamanho antes de formar uma monocamada completa. A fração de transformação da fase ilha para a fase filme é dada como função do tempo pela equação 4.3: n F (T ) = 1 − eKT . (4.3) Originalmente, F(T) pode indicar um volume, uma superfı́cie ou uma linha, de acordo com sistema estudado. Neste caso, corresponde à cristalinidade do filme 65 medida em termos da criação de monocamadas estruturadas em função da temperatura de deposição. T é a temperatura de deposição, K a taxa de deposição e n é um número associado ao número de fases transcorridas, que neste caso vale 1. 66 A Figura 4.15 mostra uma representação em duas dimensões deste processo. Figura 4.15: Representação em duas dimensões do processo de formação de ilhas de Fe no substrato de MgO. Este comportamento está associado a uma busca por sı́tios de menor energia. Em baixas temperaturas, os átomos de ferro ao chegarem ao substrato não têm energia suficiente para, no processo de difusão, se estabelecerem nos sı́tios de mı́nima energia. Assim, se arranjam em uma configuração não favorável à formação de uma rede cristalina. No entanto, com o aumento da temperatura de deposição, cedemos a energia que faltava no processo de difusão. Os átomos se arranjam em uma estrutura que naturalmente otimiza sua cristalinidade. Um resultado experimental que comprova todas as caracterı́sticas apresentadas: espessura nanométrica, suavidade da superfı́cie, homogeneidade, pureza e alta cristalinidade, e que de uma vez por todas, define a técnica de sputtering DC como eficiente e confiável ao crescimento de monocristais de Fe é o acoplamento bilinear da tricamada Fe/Cr/Fe construı́da com este mesmo processo de deposição. A Figura 7.1 mostra este inusitado resultado experimental. 67 Figura 4.16: Resultado da primeira tricamada Fe/Cr/Fe desenvolvida no departamento de Fı́sica Teórica e Experimental da UFRN. 68 Capı́tulo 5 LEED 5.1 Introdução Neste capı́tulo é apresentada a segunda parte da tese, que contempla a investigação do comportamento do parâmetro de rede de superfı́cie do cristal de prata Ag na face (100) em função da variação da temperatura, usando a técnica de difração de elétrons de baixa energia. O termo superfı́cie significa fronteira de separação entre dois meios. No entanto, definir onde começa e onde termina a superfı́cie é um carácter relativo, pois dependendo da aplicação, o que se define como fronteira pode variar de alguns milı́metros a alguns ângstrons. Na indústria eletrônica de semicondutores, em especial no ramo da Fı́sica de Superfı́cies, esta fronteira é determinada pelas primeiras camadas atômicas. As propriedades estruturais e eletrônicas destas camadas em um cristal podem ser totalmente diferentes das propriedades do volume. Tratando da estrutura atômica, isto é devido à ausência dos próximos vizinhos para os átomos da camada adjacente superior. Em decorrência disso, as forças de interação entre os átomos da superfı́cie diferem do volume, muitas vezes gerando a reconstrução da superfı́cie, com a alteração do parâmetro de rede, acompanhada ou não, da rotação da célula unitária de superfı́cie apresentando uma subsequente variação na distância entre planos e/ou a exposição dos átomos das camadas subjacentes pela perda de uma linha inteira de átomos (efeito chamado missing row ). No entanto, para algumas orientações de clivagem, a superfı́cie permanece com os parâmetros estruturais de volume, comportamento denominado bulk terminated. 69 Em resumo, ao se quebrar a simetria de um cristal, os átomos da superfı́cie se arranjam em novas posições de mı́nimo de energia, estabelecendo propriedades, diferentes do seu volume, à superfı́cie do cristal. Determinar a configuração desta superfı́cie é crucial para a indústria de sensores e micro chips. A configuração do cristal, usado como estrutura base de um dispositivo eletrônico ou magnetoresistivo, deve ter suas caracterı́sticas como bandas de energia, coeficiente de dilatação, resistência elétrica entre outras, muito bem conhecidas para se determinar as faixas de operação de cada dispositivo. A técnica usada para o estudo de superfı́cie nesse regime de espessuras é a difração de elétrons de baixa energia. Denominada por LEED, do acrônimo em inglês Low Energy Electron Diffraction, essa técnica consiste em, utilizando o carácter ondulatório da matéria, bombardear a superfı́cie de um cristal com um feixe monoenergético de elétrons e, a partir do padrão de difração gerado, determinar a estrutura da superfı́cie. Nos parágrafos seguintes será descrita em mais detalhes esta técnica. 5.1.1 Breve histórico No final do século XIX os experimentos com descargas elétricas em tubos evacuados marcaram o nascimento da nova Fı́sica. Os experimentos de Sir Willian Crookes, a medida da razão carga/massa do elétron efetuada por J.J. Thomson [71], o experimento de Milikam, o de Frank-Hertz e o experimento de Davisson e Germer, estabeleceram os alicerces da Fı́sica Quântica. E, enquanto a nova teoria de um mundo com propriedades discretas acabava de ser concebida, a natureza ondulatória da matéria surgia como nova propriedade dos corpos. A dualidade onda-partı́cula foi proposta, pela primeira vez, por Einstein em 1908 quando tratou as ondas eletromagnéticas como partı́culas no fenômeno do efeito fotoelétrico [27]. Mas foi Louis De Broglie em 1924 [72] quem estendeu a coexistência de onda e partı́cula a todos os corpos em movimento. De Broglie postulou que o comprimento de onda de uma partı́cula com momento linear p~ é dada por p . Para elétrons, com energia cinética de 100 eV, o comprimento de onda equivalente é aproximadamente 1 Å, consequentemente, uma rede cristalina, com separação atômica da ordem do raio de Bohr 0,5 Å, seria uma boa grade de difração. A observação experimental da hipótese de De Broglie foi feita por Clinton Davisson e Lester Germer nos laboratórios da Bell em 1927. Na mesma época G. P. Thomson, filho de J.J. Thomson, observou a presença de anéis de difração quando 70 elétrons de alta energia atravessavam um filme metálico. Ele associou o diâmetro dos anéis com o comprimento de onda de de Broglie. Desta forma, enquanto seu pai descobriu o elétron como partı́cula, G. P. Thomson mostrou sua natureza ondulatória. Esses resultados foram publicados na Nature [73] e na Physical Review Letters [74], estabelecendo as bases experimentais da dualidade onda-partı́cula. Passados poucos anos da descoberta da difração de elétrons, Davisson e Germer confirmaram que o experimento não podia ser descrito pela mesma teoria de espalhamento usada na análise de raios-X, a teoria cinemática da difração. A primeira teoria de espalhamento dinâmico de LEED foi baseada na teoria de raios-X de Ewald [75]. Demorou décadas antes de uma estrutura ser determinada através da técnica. Ao contrário da difração de raios-X que foi sugerida por Max Von Laue em 1912 (Prêmio Nobel de Fı́sica em 1914) e teve seu primeiro resultado cristalográfico publicado por Bragg em 1913 (Prêmio Nobel de Fı́sica em 1915), a demora aconteceu devido à complexidade tecnológica do experimento, da dificuldade da coleta de dados e da falta de uma teoria adequada. Isto fez muitos cientistas a abandonarem. A partir de 1960 a técnica, no modo qualitativo, renasce com força. A tecnologia de vácuo disponı́vel na época podia fornecer uma pressão de 10 × 10−10 mbar e juntamente com os avanços experimentais e teóricos, obtido com os trabalhos de W. Ehremburg, H. E. Farneworth, McRae, Boudreaux, Heine, Marcus e Jepsen [77]permitiram que o padrão de difração fosse observado e mantido, mostrando que o espalhamento múltiplo era uma das bases da teoria LEED. Este, juntamente com os trabalhos Michael Van Hove e J. B. Pendry, [76, 77, 78], fortaleceram o alicerce teórico da técnica. Em 1975 o LEED é consolidado como técnica de determinação de estruturas atômicas de superfı́cie e, até hoje, é a técnica que levou à determinação do maior número de estruturas. 5.1.2 Teoria Diferentemente de raios-X, na teoria LEED não podemos simplesmente a partir do espaço recı́proco observado, determinar o espaço real do cristal usando o chamado Método Direto. A base deste método é a aplicação da teoria cinemática do espalhamento e da Transformada de Fourrier. O espalhamento de elétrons envolve uma teoria mais complexa, chamada de teoria de espalhamento dinâmico. Nesta, a onda eletrônica associada ao movimento do elétron sofre uma sequência de difrações e interferências, entre as poucas camadas atômicas penetradas, antes de sair 71 do cristal (veja na Figura 3.7 o comprimento de penetração dos elétrons). Figura 5.1: Na passagem entre 2 planos adjacentes a queda na intensidade do feixe de elétrons pode ser de até 10% enquanto que em R-X, na mesma configuração, a diminuição da intensidade e de apenas 10−8 . Assim enquanto os R-X revelam as caracterı́sticas do interior do cristal, LEED revela essencialmente caracterı́sticas da sua superfı́cie. Devido à grande seção de choque gerada pela carga eletrônica, ao adentrar no cristal, a onda associada perde até 10 % do valor de sua intensidade em cada camada penetrada. A Figura 5.1 compara o poder de penetração dos R-X com o dos elétrons. Os raios-X penetram profundamente na matéria sem significativa perda de intensidade. No caso de LEED, esta variação brusca de intensidade confere à técnica sua grande sensibilidade à estrutura da superfı́cie. A determinação estrutural em LEED é baseada em um método indireto no qual se faz a comparação entre as curvas experimentais de intensidade versus energia, com os resultados teóricos gerados a partir de estruturas modelo. A tarefa então, passa a ser a busca por uma estrutura que melhor se ajuste aos dados experimentais. O grau de concordância entre a teoria e experimento se dá através de um parâmetro denominado fator R. Difração da rede 2D Antes de saber como a variação de intensidade do padrão de difração contém as informações estruturais da superfı́cie do cristal, é preciso retomar alguns conceitos acerca do processo de difração e da cristalografia da superfı́cie. A difração resulta do espalhamento da onda eletrônica com os átomos do arranjo periódico do cristal. O espalhamento por um único centro é muito pequeno, no entanto, quando se considera uma rede composta de infinitos centros espalhadores periodicamente espaçados, o resultado final devido ao efeito de superposição das 72 ondas é bem significativo. Existem diferentes possı́veis condições para que ocorram interferências construtivas. Estas condições geram uma série de feixes difratados que contém as informações da estrutura da superfı́cie. No que se refere à periodicidade do cristal, a rede é definida em termos de um conjunto de pontos nos quais estão localizados os centros espalhadores. Não necessariamente correspondendo às posições atômicas, mas correspondendo sim, à posição das células unitárias. Este é o chamado espaço real. Se a rede for infinitamente periódica nas três dimensões, com a onda incidente possuindo um comprimento de onda bem definido e não havendo uma variação significativa de intensidade enquanto a onda penetra no cristal, o tratamento matemático se torna um processo relativamente simples. Este problema, em três dimensões, é o caso tratado com a teoria cinemática de raios-X. A periodicidade dos pontos de difração é definida em termos de uma rede de pontos imaginários arranjados espacialmente. Este é o chamado espaço recı́proco. Quando se trata da difração de elétrons, o cristal é aproximado por uma rede, em duas dimensões, infinitamente periódica na superfı́cie, mas com a terceira dimensão truncada. Como os elétrons possuem um comprimento de penetração da ordem de algumas monocamadas, a periodicidade nesta direção é medida a partir da última camada penetrada até o topo do cristal, onde é interrompida. Assim, a estrutura analisada em LEED é uma região periodicamente infinita em 2 dimensões, mas com um número limitado de camadas na terceira dimensão. O espaço real em duas dimensões é determinado por dois vetores ~a1 e ~a2 que são as bases de um paralelogramo delimitador da célula unitária de superfı́cie. Os módulos destes vetores são os parâmetros de rede de superfı́cie. Ver a Figura 5.2. Uma onda plana, ao interagir com esta estrutura, é espalhada em todas as direções. A superposição com as ondas espalhadas pelas células vizinhas, produz uma série de feixes de interferência construtiva nas regiões onde se encontram em fase. A condição de interferência construtiva acontece quando a diferença de fase entre as ondas for um múltiplo inteiro do comprimento de onda λ incidente. Como a onda incidente possui um comprimento da ordem do parâmetro de rede do cristal, a configuração dos feixes difratados representará seu respectivo espaço recı́proco. Para ilustrar este efeito, considerar a Figura 5.3, onde em uma rede unidimensional, vários centros espalhadores estão presentes. As condições de fase para a interferência no espalhamento da onda difratada são encontradas com a equação 5.1. 73 Figura 5.2: Célula unitária de superfı́cie. Os vetores ~a e ~b tem módulo igual a metade da diagonal da face da correspondente célula de volume (representada pelas linhas tracejadas). Figura 5.3: Difração de Laue em um conjunto unidimensional de centros espalhadores. ~ 0 e a onda difratada por Pode-se descrever a onda incidente pelo vetor unitário K ~ n0 , assim a condição de difração será escrita como: K a(senθn − senθ0 ) = nλ, (5.1) ~0 −K ~ 0 ) = nλ, ~a · (K n 0 (5.2) ou onde a é o parâmetro de rede e n um número inteiro. Ou, reescrevendo em termos ~ n0 ) = nλ: da diferença ~a · (δ K Estas equações são as chamadas condições de Laue. ~ h0 − K ~ 0 ) = hλ, a~1 · (K 74 (5.3) ~0 −K ~ 0 ) = kλ. a~2 · (K k (5.4) Os respectivos vetores no espaço recı́proco estão relacionados ao espaço real [93] por : a~2 × n̂ |a~1 × a~2 | (5.5) n̂ × a~1 , |a~1 × a~2 | (5.6) a~1 ∗ = 2π e a~2 ∗ = 2π onde a~1 · a~1 ∗ = a~2 · a~2 ∗ = 2π, (5.7) a~1 · a~2 ∗ = a~1 ∗ · a~2 = 0. (5.8) e A relação 5.7 mostra que os módulos dos vetores do espaço real e recı́proco são inversamente proporcionais. Desta forma, uma pequena distância no espaço real se torna grande no espaço recı́proco. Na direção perpendicular à superfı́cie, o aumento da distância de uma suposta camada imediatamente acima do topo para o infinito, faz a distância entre os pontos da rede recı́proca convergir para zero. Temos então uma densidade infinita de pontos na direção perpendicular à superfı́cie do cristal, gerando uma linha contı́nua (Ver Figura 5.4). Já a relação de ortogonalidade 5.8 mostra que dois pontos da rede recı́proca devem satisfazer a relação seguinte: ~ghk = ha~1 ∗ + k a~2 ∗ , (5.9) onde h e k são números inteiros. Considerando a conservação da componente paralela ~ 0 à superfı́cie do cristal, a condição de difração será satisfeita por qualquer vetor de K da rede recı́proca quando: ~ || = ha~1 ∗ + k a~2 ∗ , K (5.10) ~ = G. ~ ∆K (5.11) Uma construção muito útil para a visualização das condições de difração é a esfera de Ewald, vista na Figura 5.4. Nesta representação, considera-se um vetor de 75 ~ 0 apontando para a origem da rede recı́proca (em cima do cristal), onda incidente K ~ 0 | centrada na origem da rede representando desenha-se então uma esfera de raio |K a onda espalhada. A interseção da superfı́cie da esfera com as linhas do espaço recı́proco gera os vetores para os quais as condições de Laue são satisfeitas. Uma visualização do processo é mostrado em duas dimensões na Figura 5.5. Esta é apenas uma representação do fenômeno da difração com modificações para o caso em duas dimensões. A analogia com o experimneto é mostrada na Figura 5.4b, onde é mostrada a vista superior da esfera. A difração de elétrons, como dito antes, envolve uma teoria dinâmica diferente dos raios-X. Uma das razões é o aparecimento de alguns picos de interferência, no padrão de difração, em valores proibidos pelas condições de Laue. Isto gera uma total discordância entre as técnicas, caso se use a teoria de espalhamento cinemático em LEED. Figura 5.4: Em a) a Esfera de Ewald em 3 dimensões. Em b) a vista superior da esfera e projeção dos pontos de difração. 5.1.3 Espalhamento atômico Na teoria dinâmica o processo de espalhamento é visto como uma superposição de processos simultâneos. Considera-se que a onda eletrônica é espalhada por átomos individuais; que é espalhada entre os átomos de uma mesma camada e por átomos de camadas adjacentes. O processo consiste em resolver a equação de Schrödinger para a onda resultante espalhada nos diferentes processos. Dividindo o problema 76 Figura 5.5: Construção da Esfera de Ewald em duas dimensões. em três partes, a solução da primeira, consiste em determinar a amplitude da onda espalhada por átomos individuais. O hamiltoniano para um único átomo envolve um potencial V formado por várias parcelas. H = H0 + X Vi . (5.12) i Nesta primeira parte do cálculo, os centros espalhadores são tratados com o modelo de potencial muffin tin [77]. Nesta aproximação os elétrons oriundos do canhão interagem com esferas rı́gidas de raio rmuf f imersas em uma nuvem formada pelos elétrons fracamente ligados ao cristal. Considera-se que as esferas se tocam, mas nunca sobrepondo uma às outras. Dentro da esfera o potencial tem simetria esférica e na região intersticial o potencial é considerado constante. A Figura 5.6 mostra sua configuração. A parte do potencial que pertence à região interna às esferas muffin-tin deve conter as interações coulombianas e demais efeitos de troca e correlação. Este potencial 77 é calculado usando o método aproximativo de Hartree-Fock [78]. O potencial coulombiano de um átomo é calculado pela soma do potencial esférico do núcleo com o potencial da média eletrônica através da equação de Poisson: 52 U (~r) = −8πρ0 , (5.13) onde a densidade total média de carga atômica é calculada por: ρ0 = X |ψi2 |. (5.14) i O potencial do átomo devido à interação coulombiana é então: 2Z − U (~r). (5.15) ~r A contribuição para o potencial levando em conta todos os átomos do cristal é feita somando ao potencial de um átomo, o potencial de seu vizinho. Isto gera um potencial efetivo de simetria esférica onde consideramos que as contribuições não esféricas anulem uma às outras. Assim o potencial total dentro da esfera é escrito por: V (~r) = Vtotal (~r) = X 2Z − U (~r) + V0 (ai |~r), ~r i (5.16) onde VO (ai |~r) representa a contribuição esférica de um átomo vizinho localizado a uma distância ai . Uma vez determinado o potencial dentro das esferas, leva-se em conta a contribuição do potencial devido à região intersticial. Quando a onda eletrônica viaja em direção à amostra, ela passa pela interface vácuo/cristal. Nesta transição ela sofre o processo de reflexão e refração semelhante a uma onda luminosa atravessando dois meios de ı́ndice de refração diferentes. Este fenômeno é caracterizado por uma barreira de potencial tipo degrau. Esta barreira de energia é chamada de potencial óptico (VO ) e sua existência está relacionada a função trabalho do cristal. O VO é representado por uma grandeza complexa (ver equação 5.17), onde sua parte real (VOR ) representa os processos de refração e reflexão enquanto sua parte imaginária (VOi ) é responsável pela extinção da onda dentro do cristal. V0R contém todos os processos inelásticos embutidos. Vopt = V0re + iVOi . 78 (5.17) A simetria esférica do potencial atômico total nos permite usar harmônicos esféricos para as regiões dentro da esfera, no entanto, o modelo de potencial muffin tin tem uma peculiaridade na região de transição para o potencial constante. Os termos de expansão em harmônicos esféricos vindos das esferas vizinhas cancelam uns aos outros. A condição de contorno utilizada é uma interrupção abruta do potencial esférico pelo acréscimo de um pequeno degrau de energia. Neste procedimento criase um referencial de energia chamado zero muffin tin, para o cálculo do potencial constante. Isso foi proposto por Mattheiss em 1964 [79]. A Figura 5.6 mostra o procedimento. Figura 5.6: Modelo de potencial muffin tin. A barreira de energia entre os potenciais esférico e constante do cristal aparece como um potencial degrau chamado Zero muffin tin. A contribuição da região intersticial é tomada como uma média sobre o cristal. A ideia do processo é subtrair do volume do cristal, o volume dos centros espalhadores. Considerando que cada centro é uma esfera e possui o raio r0 (raio de Wigner-Seitz), o potencial médio da região intersticial do cristal é calculada pela soma dos potenciais Vtotal dentro da região limitada pela distância entre o raio da esfera muffin tin, Rmuf f e o raio r0 de um átomo livre do cristal. < V >= 3 Z ~r0 Rmuf f Vtotal (~r) 3 r0 − r3muf f 79 ! r2 dr, (5.18) Acrescenta-se ainda um termo de correção, sugerido por Slater [80], associado à antisimetria das funções de onda eletrônicas. Este termo é dado por: Vex (~r) = −3αex 3ρ(~r) 8π !1 3 . (5.19) Finalmente pode-se resolver a equação de Schrödinger incluindo os dois potenciais. Enquanto dentro das esferas usa-se o método de ondas parciais, na região intersticial, as soluções da equação são as funções de Hankel de primeiro e segundo tipos: 1 jl (kr) = [h1l (kr) + h2l (kr)], 2 (5.20) 1 onde l é o momento angular, jl é a função esférica de Bessel, k = [E + V0R ] 2 e VOR é a parte real do potencial óptico. Longe da fonte, as funções jl se comportam como a soma de duas ondas. Uma transmitida e outra refletida, possuindo a mesma magnitude, mas apresentando uma diferença de fase (phase shift). A onda refletida apresentará este deslocamento da fase devido ao espalhamento pelo potencial atômico. A onda espalhada é descrita em termos do deslocamento de fase por: i 1 h i2δl 1 e hl + h2l . (5.21) 2 O processo de espalhamento passa a ser calculado a partir do phase shift para cada valor de l através de uma matriz t. Cada elemento da matriz de espalhamento atômico é dado por: jl (kr) = −h̄2 1 senδl eil . (5.22) 2m 2ik As soluções da equação de Schrödinger dentro da esfera são as soluções radiais Rl (r) resolvidas pelo método numérico e fora são as funções de Hankel. Não é possı́vel, no entanto, igualar simultaneamente as amplitudes e derivadas das soluções dentro e fora da esfera no modelo muffin tin. Usa-se um artifı́cio matemático para contornar este problema, tomando-se a derivada logarı́tmica no ponto r = rmuf f . tl = 0 Ll (r) = 0 ei2δl h1l (krmuf f ) + h2l (krmuf f ) Rl0 (rmuf f ) = , Rl (rmuf f ) ei2δl (krm uf ) + h2l (krmuf f ) 80 (5.23) onde, do lado esquerdo da equação, estão as derivadas logarı́tmicas das soluções dentro da esfera e do lado direito as soluções na região intersticial. Desta forma o phase shift será escrito em termos da função Ll (r) e posteriormente inserido dentro da matriz de espalhamento. (2) e i2δl = (2)0 Ll hl − hl (1)0 Ll hl (2)0 − Ll hl . (5.24) Usamos todas estas suposições e artifı́cios matemáticos para determinar a amplitude da onda espalhada por um átomo estático, que não está vibrando devido a efeitos da temperatura. Um termo adicional de vibração (o fator de Debye-Waller) será inserido na equação multiplicando a amplitude. Este fator será discutido na próxima seção. Finalmente pode-se escrever a amplitude da onda através da equação 5.25 [78]. f (θ)e−M = −4π X (2l + 1)tl (T )Pl (cosθ). (5.25) i Nesta equação, θ representa o ângulo entre a direção da onda incidente e espalhada, tl são os elementos da matriz de espalhamento, que agora dependem da temperatura e Pl são os polinômios de Legendre. Os efeitos da Temperatura O efeito da temperatura é notável no experimento LEED. A redução do número de feixes difratados, bem como suas intensidades, são bem significativas. Quando a temperatura é elevada, a rede expande variando as posições atômicas e deslocando os picos de difração para valores mais baixos de energia. Ao mesmo tempo, a vibração da rede aumenta elevando o número de colisões inelásticas com fonons da rede. Consequentemente há uma queda no número de elétrons retroespalhados com mesma energia que o feixe incidente, gerando diminuição da intensidade. Da mesma forma, o aumento da amplitude de vibração contribui para o aumento da intensidade de fundo. Na teoria do espalhamento de elétrons devemos considerar as vibrações da rede devido à temperatura. Quando a superfı́cie é criada, as propriedades da região de interface são modificadas. Com relação aos parâmetros estruturais, é de se esperar que o parâmetro de rede da superfı́cie seja afetado de forma distinta do resto do cristal. Em especial, as 81 componentes perpendiculares devem expandir mais que as de volume. Considerando um comportamento linear, a(T ) = a(T0 )(1 + α∆(T )), (5.26) onde a(T0 ) e α são respectivamente, o parâmetro de rede e αé coeficiente de expansão térmica do volume medidos à temperatura ambiente. Podemos determinar um coeficiente de expansão para a superfı́cie, diferente do coeficiente volume. 1 ∆z , (5.27) z ∆T onde z e αs são respectivamente, a distância entre planos e o coeficiente de expansão térmica da superfı́cie. A observação experimental do deslocamento de energia ∆E dos picos de maior energia (chamados picos de Bragg) fornecem um coeficiente de expansão efetivo dado por: αs = αef = − ∆E . 2∆T (E − VOR ) (5.28) Nesta formulação, considerando que o comprimento de penetração do elétron aumenta com a energia, espera-se que para valores altos de energia, αef se aproxime do valor de volume enquanto para baixas energias este valor se aproxime de αs . Dobryzinski e Marududin [81] realizaram cálculos teóricos para o αF e e juntamente com trabalhos de Kenner e Allen [82], para outras superfı́cies, chegaram a seguinte expressão: 2 αs is 3 h∆r⊥ = , 2 αvol 4 h∆r⊥ ivol (5.29) onde ∆r⊥ significa a variação da distância entre camadas atômicas dos planos de superfı́cie (4 primeiros planos) e planos de volume. Para o limite de altas temperaturas, onde a temperatura do experimento é muito maior que a temperatura de Debye (T >> ΘDebye ), Wilson e Blastow [83] chegaram à uma expressão que relaciona os coeficientes de expansão com as respectivas temperaturas de Debye. 2 h∆r⊥ is Θ2Dvol αs = = . 2 αvol h∆r⊥ ivol Θ2Ds 82 (5.30) No Modelo de Debye a estrutura da rede atômica é vista como uma sequência de osciladores harmônicos, semelhante a uma série de molas ligadas entre si. A temperatura de Debye é uma medida que quantifica a rigidez desta rede. Quanto maior a temperatura de Debye, maior a rigidez da rede. 2 2 Na expressão anterior, h∆r⊥ ivol e h∆r⊥ is são as amplitudes quadráticas médias 2 2 de vibração e ΘDvol e ΘDs as respectivas temperaturas de Debye. Pode-se ainda, através do cálculo da amplitude de vibração, determinar uma forma de expressar a temperatura de Debye da superfı́cie em termos do valor de volume. Para tanto, considera-se que o cristal se comporta como osciladores harmônicos, resumindo o problema à determinação da constante de força: KT . (5.31) σ Supondo agora que os átomos da superfı́cie têm apenas metade dos vizinhos com relação aos átomos do volume σs ' 21 σvol . Assim: h∆r2 i = 1 2 2 h∆r⊥ is ' h∆r⊥ ivol . 2 (5.32) Substituindo na equação 5.30 chegamos a: 1 (5.33) ΘDs ' √ ΘDvol . 2 Esta é uma boa aproximação para determinar as temperaturas de Debye de um modelo. Este princı́pio foi usado para estimar ΘD da primeira e segunda camadas do modelo da Ag(100). Pode-se agora determinar o fator de Debye-Waller usado na equação 5.25 como fator de atenuação da amplitude de espalhamento. Supondo que a rede possui vibração isotrópica, o fator M será dado por: 1 ~ 1 ~ M = h∆K∆~ ri2 = |∆K|h∆~ ri2 , 2 6 (5.34) ~ é o momento transferido. onde ∆K Os elementos da matriz de espalhamento, em termos da dependência com a temperatura serão escritos como: tl (T ) = X exp[−2α(E + V0R )]jl0 [−2α(E + VOR )]tl00 l0 l00 83 1 4π(2l0 + 1)(2l00 + 1) 2 Z ×[ Yl00 0 (Ω)Yl0 0 (Ω)Yl0 (Ω)dΩ, (2l + 1) (5.35) onde α = h̄m2 h(∆~r)i2 , m é a massa atômica e as funções Y (Ω) são os harmônicos esféricos. A integral é realizada no ângulo sólido Ω. O phase shift pode agora ser escrito levando em conta a dependência com a temperatura. " # 4kim 1 tl (T ) . δl (T ) = ln 1 − 2i h̄2 (5.36) O espalhamento dentro de uma camada O espalhamento devido a um átomo foi descrito em termos de uma matriz de espalhamento, já levando em conta a contribuição da temperatura. Cada elemento desta matriz, era formado por termos de uma expansão em ondas esféricas do potencial total da superfı́cie. Para incluir o efeito de um subsequente espalhamento, devido a um outro átomo da mesma camada, é necessário expressar primeiramente, como a onda esférica, ~ = (lm) e centrada no primeiro átomo, se caracterizada pelo momento angular L propaga até o segundo. E depois, é preciso escrever a onda espalhada, centrada agora neste segundo átomo, carregando o efeito do primeiro espalhamento. A onda esférica espalhada pelo segundo átomo é caracterizada pelo momento ~ 0 = (l0 m0 ) e as posições do átomo 1 e 2 por ~r1 e ~r2 , respectivamente. angular L Devemos encontrar uma função que, assumindo um potencial constante entre os átomos, descreva esta transição. A função de troca é a função de Green. G21 LL0 2me X l10 = −4πi 2 K i h̄ Li Z YL∗ (Ω)YL∗0 (Ω)YL1 (Ω)dΩ (1) hl1 (k|~r2 − ~r1 |)YL1 (~r2 − ~r1 ). (5.37) Nesta equação, me é a massa do elétron e k é o módulo do vetor de onda. A soma em l se estende a |l − l0 | ≤ l1 ≤ l + l0 . O termo entre parêntesis é o coeficiente de Clebsh-Gordon [14]. Não há espalhamento nesta equação. A função de Henkel e os harmônicos esféricos descrevem apenas a propagação. Por isso a função de Green é chamada de operador propagação. 84 No entanto, quando a equação 5.37 é aplicada à matriz t de espalhamento, o resultado representa a amplitude de uma onda esférica espalhada pelo primeiro átomo que se propagou na direção do segundo, onde foi espalhada novamente. Assim, este é o segundo espalhamento. A onda pode ser espalhada diversas vezes entre esses dois átomos e o propagador pode ser aplicado n vezes para descrever uma sequência de espalhamentos. Considerando que t1 e t2 são as matrizes de onda espalhada pelos átomos 1 e 2 e que G12 e G21 são os propagadores entre estes átomos, o espalhamento devido à uma sequência de eventos pode ser escrito como: • Uma vez espalhada: átomo 1 −→ t1 • duas vezes espalhada: átomo 1 + átomo 2 −→ t2 G21 t1 • três vezes espalhada: átomo 1 + átomo 2 + átomo 1 −→ t1 G12 t2 G21 t1 O espalhamento total T 1 e T 2 de todos os caminhos que terminam nos átomos 1 e 2 é descrito por um conjunto de equações auto-consistentes [78]: T 1 = t1 + t1 G12 t2 , T 2 = t2 + t2 G21 t1 , (5.38) que podem ser estendidas a todo o plano de átomos, tomando estes dois a dois. Já que consideramos que os átomos são iguais, eles espalham a onda da mesma forma. A matriz de espalhamento entre um determinado átomo da rede estendida ao resto do plano atômico é: τ =t+t X Gin τ, (5.39) n onde i representa o átomo de referência e n um átomo qualquer da rede. Gin é o operador propagação entre os dois átomos. Estendendo agora este resultado a uma soma que leva em conta o espalhamento entre todos os átomos de um mesmo plano atômico, podemos definir um novo operador propagação dado por: τ = (1 + tG)−1 t. (5.40) A equação 5.40 é a solução para o espalhamento múltiplo em um mesmo plano atômico periódico. 85 O espalhamento entre camadas Para finalizar o espalhamento múltiplo, falta levar em consideração o espalhamento entre as camadas atômicas. Seguindo o mesmo raciocı́nio anterior, podemos tratar este problema como o espalhamento entre 2 átomos de camadas diferentes que possuem a mesma célula unitária. Cada plano atômico é caracterizado por sua matriz τ , determinada na equação 5.40. Assim como T 1 e T 2 representavam os espalhamentos múltiplos entre 2 átomos de um mesmo plano atômico, T 1 e T 2 representam agora, os espalhamentos múltiplos entre 2 átomos internos aos planos 1 e 2, respectivamente. T 1 corresponde ao conjunto de todos os caminhos possı́veis da onda espalhada em um átomo do plano 1, chegar no átomo i do plano 2, sempre voltando ao plano 1. Analogamente para T 2 . Assim T 1 deve ser escrita em termos de um propagador entre planos: T 1 = τ 1 + τ 1 Ḡ12(i) t2 , T 2 = τ 2 + τ 2 Ḡ21(i) t1 , (5.41) onde definimos: G12 = X Ḡ12(i) t1 , G21 = X Ḡ21(i) t1 , (5.42) (i) (i) Considera-se que a propagação entre planos atômicos é feita por meio de ondas planas. Desta forma, aproveitando a periodicidade da rede na direção perpendicular à superfı́cie, utiliza-se as ondas de Bloch. A nova função de Green que representa o operador propagação entre planos é: G21 LL0 2me X X l1 i = −4πi 2 K h̄ Li P ~ Z YL∗ (Ω)YL∗0 (Ω)YL1 (Ω)dΩ × Exp[−i~kin · (~rj − ~ri + P~ )]. (1) hl1 (k|~rj −~ri +P~ |)YL1 (~rj −~ri +P~ ) (5.43) Nesta equação ~ri e ~rj são as posições atômicas no plano i e plano j, respectivamente. Enquanto P~ se estende sobre todos os pontos em qualquer plano da rede, exceto no ponto ~rj − ~ri + P~ = 0. A equação 5.43 é a solução para o espalhamento múltiplo gerado por N planos de átomos. 86 A matriz de espalhamento A determinação de estruturas pela técnica LEED é fundamentada no estudo da variação de intensidade (I) dos feixes em função da energia (eV). As curvas IxV’s são formadas pelos feixes difratados no cristal e são mostrados em uma tela. Restanos agora, saber como a variação da intensidade dos pontos do padrão de difração carrega as informações a respeito da estrutura. A intensidade medida dos pontos de difração no experimento é proporcional ao quadrado da amplitude do espalhamento. No entanto, antes de calcular intensidade, é necessário descrever a relação entre matriz de difração e a matriz de espalhamento para as ondas incidentes e difratadas. A relação, considerando apenas um camada é a seguinte: Minc,dif = − 8π 2 i 2m X YL (~kdif )tLL0 YL∗0 (~kinc ), Akdif h̄2 LL0 (5.44) onde A é a área da célula unitária bidimensional. Os ı́ndices inc e dif representam as componentes da onda incidente e difratada. A partir da matriz de espalhamento a onda espalhada é escrita em função dos termos de coeficientes de reflexão e transmissão. [14] r+− = M +− r−+ = M −+ t++ = M ++ t−− = M −− , (5.45) onde os sinais + e - representam o sentido de propagação da onda. + = onda para frente, - = onda para trás. Os coeficientes são dados por: M~g±± 0~ g = − 16π 2 im X YL (~k~g0 )τLL0 YL∗0 + δ~g0~g δ±± , Ak~g+ h̄2 LL0 (5.46) onde a função delta de Kronecker foi adicionada para representar a onda transmitida sem mudança de direção. As matrizes que representam o processo de espalhamento múltiplo entre um par de camadas, incluindo o propagador, são dadas por [77]: 87 −+ − −+ + +− − −+ + −1 ++ R−+ = rA + t−− A P rB P (I − rA P rB P ) tA , (5.47) + +− − −+ + −1 ++ T ++ = t++ B P (I − rA P rB P ) tA , (5.48) +− + +− − −+ + +− − −1 −− R+− = rB + t++ B P rA P (I − rB P rA P ) tB (5.49) − −+ + +− − −1 −− T −− = t−− A P (I − rB P rA P ) tB , (5.50) e onde o propagador de onda plana entre as camadas é: ~± P~g± = e(±ik~g ·~rBA ) . (5.51) O processo é estendido para um número N de planos. Este número depende de condições impostas pelos planos da rede de Bravais próximos à superfı́cie, sendo basicamente determinado pelo livre caminho médio do elétron dentro do cristal, que obviamente, depende dos elementos que compõem o cristal. Esta é apenas uma das maneiras de tratar o espalhamento múltiplo. Existem outros métodos que são usados na simulação das intensidades dos feixes difratados como o Layer Doubling e o Reverse-Scattering Perturbation, que tratam a sequência de espalhamentos entre as camadas de formas diferentes. O fator R Como foi discutido antes, o experimento LEED impede que se tenha uma maneira direta de converter dados obtidos no espaço recı́proco do cristal em posições no espaço real. É necessário, portanto, utilizar uma maneira indireta para traduzir as informações coletadas. O que se faz é desenvolver um modelo do cristal, simular seu espalhamento de elétrons gerando curvas teóricas de intensidade x energia e, a partir destas informações, comparar com os dados experimentais. A teoria do espalhamento múltiplo é bem sofisticada, complexa e a simulação leva em conta um volume muito grande de informações. Existe uma série de parâmetros estruturais e não estruturais que devem ser modificados no intuito de fornecer o melhor ajuste entre teoria e experimento. É preciso, portanto, utilizar um parâmetro que quantifique a concordância entre dados coletados e os simulados, julgando a confiabilidade do modelo utilizado. Este fator de correlação é chamado de fator R (Reliability factor ). Existe uma série de fatores R que avaliam aspectos especı́ficos 88 das curvas IxV’s. Por exemplo, o fator Rx avalia a altura dos picos de intensidade do padrão LEED e confere um peso menor às posições destes picos. Isso garante uma sensibilidade aos parâmetros não estruturais como a Temperatura de Debye e estrutura de bandas. Porém, quando se deseja estudar os parâmetros estruturais como, amplitude de vibração, relaxação ou reconstrução da superfı́cie, utiliza-se o fator R de Pendry (RP ) [78, 77]. Na sua definição, RP confere o número 0 a duas curvas exatamente iguais e um número entre 0 e 1, em escala logarı́tmica. O processo de ajuste entre as curvas é baseado em algoritmos de busca de mı́nimo de funções. O método de busca envolve um algoritmo de minimização tipo gradiente ou mı́nimos quadrados em uma hiper-superfı́cie de parâmetros, sempre levando em conta o valor mı́nimo do fator RP . O volume de dados é tão grande, que somente com rotinas computacionais, é possı́vel realizar cálculos LEED. A estrutura do fator RP parte da hipótese que estas curvas são compostas por Lorentzianas do tipo: I(E) = N X j Aj , 2 (E − Ej )2 + VOi (5.52) onde N é o número de picos, Aj é a amplitude do pico centrado na energia Ej e VOi representa a parte imaginária do potencial óptico. Da maneira que foi criado, ele é sensı́vel à posição dos picos de intensidade nas curvas IxV’s. De acordo com [78], a variância do fator RP é dada por: ¯ = varR = ( 8V0i ) 12 , RR (5.53) Rmed ∆E onde Voi é a parte imaginária do potencial óptico e ∆E é a soma de todos os intervalos de energia dos feixes coletados em todo o experimento. Rmed é a média entre os fatores RP das várias curvas do experimento. O erro no fator RP será dado então por: ¯ ∆Rp = Rp × RR 5.1.4 (5.54) A simulação numérica - SATLEED A ideia básica do cálculo LEED, de uma forma sucinta, consiste em recriar computacionalmente o cristal do experimento, simular o processo de difração de 89 elétrons nesta estrutura, encontrar as respectivas curvas IxV’s teóricas e comparálas com as curvas reais, obtidas na coleta de dados, através do fator R visto na seção 5.1.3. O processo é uma busca do tipo tentativa e erro, que testa vários modelos de estruturas, com base em uma estrutura de referência. A construção virtual do cristal se dá através de informações acerca dos parâmetros estruturais e não estruturais do cristal real. Estes parâmetros são: os vetores de rede de superfı́cie e de volume, o posicionamento atômico, as coordenadas da célula unitária, a densidade eletrônica, o potencial óptico e a temperatura de Debye, as amplitudes de vibração paralela e perpendicular, etc. A determinação estrutural de superfı́cies envolve, portanto, o conhecimento prévio da cristalografia do sistema estudado, do ponto de vista, da estrutura do volume e do comportamento de seu padrão difração no processo da medida. De antemão, o pesquisador já conhece a estrutura do volume e, em um processo de tentativa e erro, procura determinar a estrutura da superfı́cie através de determinadas suposições no seu modelo, que melhor se adequam aos dados experimentais. Tendo em vista a complexidade da teoria do espalhamento múltiplo, a simulação do experimento LEED é composta de várias etapas. Cada etapa exige certa quantidade de parâmetros que devem entrar no cálculo de maneira sequencial. Na área de Fı́sica de Superfı́cies, existe um conjunto de programas especı́ficos, desenvolvidos pela comunidade, que são a base da simulação LEED. Estes programas são essencialmente compostos de uma série de rotinas escritas em FORTRAN, que exigem a manipulação dos arquivos de entrada e saı́da de diferentes formas. Os programas descritos aqui fazem parte do código SATLEED de M. Van Hove e A. Barbieri [84] e do código PHASESHIFT [85], dos mesmos autores. A seguir é descrito este processo, visando o entendimento do algoritmo do cálculo e a sequência lógica da criação da estrutura de referência. Para mais detalhes do procedimento de cálculo ver a referência [77] e [78]. O primeiro passo é calcular como a onda é espalhada pelo átomo, levando em conta todas as considerações descritas na seção 5.1.3, e descrever este espalhamento em termos da diferença de fase, phase shift. Esta é a aplicação do pacote PHASESHIFT, que é composto essencialmente em 4 rotinas de cálculo. Em cada rotina, os arquivos de saı́da gerados são processados pela rotina posterior, mas podem ser utilizados mais de uma vez dentro de uma mesma rotina, dependendo do modelo da estrutura do cristal. 90 Na primeira parte, é calculada a densidade eletrônica do átomo, o empilhamento atômico, o posicionamento da célula unitária de volume e de superfı́cie e ainda, quantas camadas do empilhamento serão consideradas como superfı́cie. Aqui é feita uma divisão do cristal em fatias (slabs). Cada fatia é composta por uma, duas ou três camadas atômicas que possuem as mesmas propriedades internamente. A segunda parte serve para determinar o nı́vel de referência de energia (zero muffin tin) no cálculo do potencial intersticial do cristal, ver a Figura 5.6, levando em consideração a barreira de potencial entre o vácuo e o cristal. O resultado deste cálculo carrega algumas descontinuidades nos valores de energia. Na terceira etapa então, é feita a remoção destes saltos de energia através de rotinas especı́ficas que consideram, ou não, efeitos relativı́sticos para cada slab do cristal. Finalmente, o quarto passo junta em um único arquivo, o phase shift calculado para cada slab e para cada valor de energia. O resultado final de todo este processo é um arquivo que contém o phase shift descrito na expansão em lmax termos de momento angular. O resultado obtido no cálculo do phase shift será usado como arquivo de entrada no código SATLEED. Do acrônimo em inglês para ”Simmetrized Automated Tensor LEED”, este conjunto é composto por dois códigos principais denominados TLEED1 e TLEED2. A ideia básica de sua utilização é, a partir de um conjunto de curvas IxV’s experimentais e de uma estrutura de referência, gerar curvas IxV’s teóricas, avaliando as mudanças de intensidade das curvas em função de pequenos deslocamentos das posições atômicas, confrontando os dados experimentais em um processo de maximização de concordância. O primeiro código necessita de 2 arquivos de entrada, nos quais estão todos os detalhes acerca da estrutura do cristal e do espalhamento. O processo do espalhamento é então simulado em termos de coeficientes de reflexão e transmissão, sendo calculados pela teoria de perturbação em conjunto com um método aproximativo denominado Tensor LEED [77]. Este método aumenta a dinâmica do cálculo, diminuindo o tempo de processamento. Essencialmente, esta rotina evita que o espalhamento seja recalculado para cada modelo. O segundo programa é alimentado pelo resultado do programa anterior. Sua função é gerar as curvas IxV´s das estruturas testadas e compará-las com os dados experimentais através do fator R. Utiliza para tanto, um método de otimização chamado de Algoritmo de Powell. Este algoritmo usa a estratégia de varrer a hipersuperfı́cie n-dimensional de parâmetros ao longo de um conjunto de direções inde- 91 pendentes. A busca pelo mı́nimo é feita em cada direção e, após sua localização, toma-se outra direção, ortogonal à anterior (e consequentemente ortogonal às demais direções) sem perder o seu resultado. Isto evita o retorno a caminhos já percorridos diminuindo o tempo computacional [87]. Como resultado, o arquivo gerado dá informação a respeito da estrutura, apresentando a variação das posições x, y e z dos átomos da superfı́cie, o valor V0R , o valor do fator R e as respectivas curvas IxV´s . Neste processo, o valor do potencial óptico é otimizado. Pode-se então determinar a relaxação da rede, a reconstrução da superfı́cie e as temperaturas de Debye para as primeiras camadas do cristal. 5.1.5 O Aparato experimental Um sistema LEED convencional é composto por: • Câmara de Ultra-alto vácuo • Manipulador de precisão para as amostras ; • Sistema de limpeza in situ, sputtering; • Sistema de aquecimento de amostras, annealing; • Sistema de monitoramento de limpeza da superfı́cie, espectroscopia Auger; • Canhão de elétrons com controle de energia do feixe eletrônico; • Filtros de energia de passagem composto por grades semi-esféricas; • Tela de fósforo para visualização do padrão de difração; • Sistema de vı́deo para aquisição de imagens; • Sistema de análise de imagens 92 Figura 5.7: Aparato experimental de LEED. A Câmara de vácuo O experimento LEED é sensı́vel às primeiras camadas atômicas de um cristal. Logo, é necessário que a superfı́cie esteja completamente livre de impurezas e permaneça assim durante todo o experimento. A tabela 5.1 mostra as taxas de formação de camadas de impurezas para as respectivas pressões de base. A unidade da taxa de formação de monocamadas é chamada de Langmuir e é definida como uma monocamada crescida por segundo na pressão de 10−6 torr. 1Langmuir = camada segundo (5.55) Para que os elétrons não recombinem ao encontrar moléculas à sua frente e, para garantir um longo tempo de duração do experimento, a técnica LEED deve utilizar uma câmara de ultra-alto vácuo, com pressões da ordem de 10 × 10−10 mbar. Isto garante um livre caminho médio para os elétrons da ordem de 500 km e que a amostra irá permanecer livre de impurezas por um tempo próximo a 104 segundos. O sistema de vácuo compreende um conjunto de bombas que permanecem em regime de trabalho constante e outras que fazem, somente, a manutenção do vácuo, sendo ativadas em determinados momentos. A primeira da série é a bomba mecânica. Responsável por iniciar a evacuação da câmara, esta atinge seu limite de pressão 93 Pressão de base (torr) 760 10 10−1 10−3 10−5 10−7 10−9 10−10 λ (m)) 6, 7 × 10−8 5, 0 × 10−6 5, 0 × 10−4 5, 0 × 10−3 5 500 5, 0 × 104 5, 0 × 105 n ( moleculas ) m3 2, 46 × 1025 3, 24 × 1023 3, 24 × 1021 3, 24 × 1019 3, 24 × 1017 3, 24 × 1015 3, 24 × 1013 3, 24 × 1012 segundos 1, 0 × 10−9 1, 0 × 10−8 1, 0 × 10−7 1, 0 × 10−5 1, 0 × 10−3 1, 0 × 101 1, 0 × 103 1, 0 × 104 Tabela 5.1: À pressão atmosférica, 760 torr, o tempo de formação de 1 camada de impureza adsorvida é da ordem de 1 ns, enquanto que na tabela, λ representa o livre caminho médio. em 10−3 mbar. Vale ressaltar que neste estágio já não existe mais um fluxo de partı́culas, o regime deixa de ser classificado como viscoso, onde o número de colisões molécula-molécula é milhões de vezes maior que o número de colisões moléculaparede, passando por um estado intermediário até chegar ao escoamento molecular. O estágio intermediário é atingido quando o livre caminho médio passa a ser da ordem de grandeza do recipiente. Já no estágio molecular o número de colisões intermoleculares e molécula/parede são da mesma ordem de grandeza [88]. Assim, o processo de extração de partı́culas se torna cada vez mais demorado. Em seguida, uma bomba turbo molecular é ativada diminuindo a pressão até 10−7 mbar, atingindo seu limite operacional. Neste regime de pressão, chamado de alto vácuo, a câmara principal pode ser isolada através de válvulas de gaveta e entram em operação as bombas iônicas. Até então, os componentes da seção de alto vácuo selavam a câmara com anéis de borracha, os o-rings, agora isto é feito com anéis metálicos de cobre especial. Temos então 3 seções distintas: a seção de vácuo, alto vácuo e ultra-alto vácuo (UHV). É aconselhável manter o bombeamento em cada seção ativo. Este procedimento assegura uma diferença de pressão entre cada seção em torno de 4 ordens de grandeza, evitando o gradiente brusco de forças de pressão nas paredes das válvulas. Para ajudar na manutenção do vácuo, uma bomba de sublimação de titânio pode ser acionada. Este tipo de bomba aproveita a propriedade reativa do elemento Ti, quando evaporado, para aprisionar as moléculas dispersas na parede da câmara. Esta bomba é ligada somente em momentos bem especı́ficos. 94 Um outro procedimento muito comum na obtenção do UHV é a operação denominada de baking. Neste procedimento é feito um aquecimento de todo o sistema a temperaturas em torno de 140 o C, sendo repetido toda vez que a câmara principal for exposta à atmosfera ambiente. Isto ajuda a retirada das moléculas de água adsorvidas nas paredes da câmara. O porta amostras O manipulador de amostras é de vital importância no experimento. Além de servir como suporte da amostra e do sistema de aquecimento, confere a imprescindı́vel liberdade de movimento dentro da câmara. No processo de limpeza por sputtering, a superfı́cie do cristal que foi bombardeada por ı́ons de Ar se encontra com a rugosidade acentuada. Este processo expõe a superfı́cie do cristal retirando algumas dezenas de camadas de impurezas adsorvidas e, consequentemente, acaba por destruir a periodicidade em duas dimensões da superfı́cie. Com o intuito de reestruturar esta periodicidade, o processo de aquecimento (annealing) aumenta a difusão dos átomos da rede cristalina. Isto acontece de tal forma que os átomos se rearranjam nos sı́tios de menor energia, restabelecendo assim a suavidade e a ordem da rede cristalina. No manipulador também é desejável que se tenha um criostato para medidas em baixa temperatura. O canhão de elétrons O responsável pelo bombardeamento da amostra por partı́culas com valores de energia ajustável é o canhão de elétrons. Este utiliza um filamento de tungstênio dopado com tório, como fonte de emissão termoiônica. Enquanto a corrente de filamento chega a 3 A, a corrente de emissão pode variar entre 10−8 e 10−4 A no estudo de cristais. O estudo de moléculas e sistemas orgânicos, que se dissociam facilmente, exige correntes menores, da ordem de 10−9 A. O canhão acelera os elétrons com energia até 1000 eV que depende somente da voltagem aplicada aos catodo e anodo no interior do canhão. Um conjunto de lentes eletrostáticas ajusta o foco e varia o diâmetro efetivo do feixe entre 1 a 2,5 mm com divergência angular em torno de 0, 5o . Com estes parâmetros, o comprimento de coerência fica em torno de 200 a 500 Å. Logo, a técnica se mostra eficiente somente para estruturas periódicas nestas dimensões. A qualidade do canhão está relacionada com a precisão e controle 95 da quantidade de elétrons que estão na faixa desejada de energia do feixe. Neste aspecto, a curva de emissão ideal é uma função δ centrada no valor de energia selecionada pelo operador, no entanto, o processo de emissão é governado por uma função gaussiana e, elétrons com energia superior e inferior ao valor desejado também são ejetados do filamento. O desvio na energia geralmente fica em torno de 0,5eV. O Analisador - Sistema de filtros O coração da técnica é o sistema de filtros de energia de passagem. Chamado de RFA pelo acrônimo da lı́ngua inglesa para Retarding Field Analizer ou Analisador por retardo de campo, é o sistema responsável por selecionar a energia dos elétrons espalhados pelo cristal. Desejamos estudar o cristal através dos elétrons espalhados com a mesma energia do feixe incidente. Para tanto, devemos eliminar os elétrons que sofreram colisões inelásticas com os fônons da rede ou que perderam energia por outros processos. Desta forma, sabendo a energia do feixe incidente, podemos garantir que o padrão de difração observado é composto apenas pelos elétrons retro espalhados com mesma energia. O sistema mais usado consiste de quadro grades metálicas em formato semiesférico, concêntricas e com a concavidade voltada para a amostra. Possuem um orifı́cio central por onde emerge o canhão de elétrons que as transpassa como mostrado na Figura 5.7. A primeira grade está conectada ao terra do sistema. Isto garante que o feixe eletrônico viajará em uma região livre de campo elétrico e não sofrerá aceleração no percurso de ida canhão-amostra ou na volta. Além disso, minimiza a deflexão eletrostática dos elétrons difratados no cristal. A segunda e terceira grades estão sob um potencial negativo variável. Estas duas grades são chamadas de supressoras e servem para conter os elétrons difratados que viajam com a energia menor que o feixe incidente. Este filtro permite que apenas elétrons retro espalhados com a mesma energia do feixe componham a imagem do padrão de difração na tela. Uma pequena porção de elétrons ejetados do canhão com energia maior que a desejada, devido ao comportamento gaussiano, difratam no cristal e não poderão ser detidos, contribuindo assim na imagem final como ruı́do de fundo. A quarta grade é aterrada ao sistema e serve para reduzir o campo eletrostático nas grades supressoras gerado pela alta voltagem da tela de fósforo. Uma quinta semiesfera feita de vidro ou alumı́nio e recoberta com fósforo (P) é colocada na sequência de grades. Esta tela está ligada a um potencial positivo variável de alguns quilovolts e serve para acelerar 96 Figura 5.8: Esquema da óptica LEED. 97 os elétrons que tiveram energia suficiente para chegar na quarta grade. Neste ponto, a energia final dos elétrons não é mais significativa, pois já foram selecionadas, e sua magnitude somente influenciará na intensidade do brilho do padrão. Na colisão dos elétrons com a tela, os elétrons das camadas mais internas do elemento P são excitados e saltam para um nı́vel de energia maior. Na volta ao estado fundamental um fóton com a diferença de energia é ejetado gerando luz. O intervalo de tempo no processo de desexcitação é chamado de persistência e define quanto tempo a imagem fica marcada na tela depois de desligada a fonte de excitação. Existem vários tipos do elemento fósforo com diferentes tipos de brilho e persistência para várias aplicações. No caso de LEED (modelos da VARIAN) o tipo utilizado é o P4 [89] com comprimento de onda emitido em 505nm (cor verde) e persistência de 1 − 10µs. Aquisição de dados A grande diferença de um sistema LEED qualitativo e LEED quantitativo é o processo de aquisição de imagens. Enquanto na primeira modalidade o padrão de difração é apenas observado, podendo ser fotografado ou gravado em vı́deo comum, na modalidade quantitativa o padrão de difração precisa ser gravado em vı́deo de uma forma especial. Nesta, cada frame ou conjunto de frames do vı́deo deve corresponder a um único valor de energia. Isto é feito com câmeras de alta resolução, capazes de resolver variações de intensidade luminosas imperceptı́veis ao olho humano. Programas computacionais controlam a energia do feixe de elétrons, o tempo de exposição, a abertura do obturador e a taxa de frames por segundo, tornando o processo totalmente automatizado. O experimento termina quando se obtém o vı́deo. Neste ponto começa a coleta dos dados experimentais que serão usados no processo de busca da estrutura da superfı́cie. Cada ponto do padrão LEED em cada frame é acompanhado traçandose a curva de sua intensidade luminosa versus a energia em unidades de eV. A Figura 5.9 mostra o processo para alguns valores de energia. A curva I x V experimental O processo de coleta consiste em localizar o ponto de interferência construtiva em cada foto e fazer a medida de sua intensidade luminosa para cada valor de energia. 98 (a) 60 eV (b) 120 eV (c) 180 eV (d) 240 eV (e) 300 eV (f) 360 eV Figura 5.9: Sequência de imagens com os padrões de difração para os seus respectivos valores de energias. Observe uma pequena janela quadrada delimitando um dos feixes. A sequência mostra o deslocamento do ponto de difração com o acréscimo de energia. Depois de localizado o ponto desejado, utiliza-se uma janela gráfica quadrada para se determinar a variação de intensidade de cor dentro desta região. Isso gera uma matriz bidimensional com N x N pixels que representa a tonalidade de cor da janela. Nos experimentos LEED, em geral, as imagens estão em tons de cinza para diminuir o volume de informação ocupado no disco rı́gido. Computacionalmente, as imagens monocromáticas são armazenadas utilizando-se um padrão de 8 bits por pixel. Isto permite uma combinação de 256 valores de intensidades, geralmente em uma escala não linear variando do preto ao branco nos fundos de escala. Ao branco é associado ao valor 256 significando intensidade máxima e ao preto o valor 0 representando intensidade mı́nima. Um mapeamento da janela é mostrado em um gráfico em três dimensões na Figura 5.10. Considerando a escala de intensidade, para cada janela é feito uma subtração da intensidade média das bordas do valor máximo do centro do quadrado. Então, para uma dada energia e para um dado ponto, temos seu respectivo valor de intensidade. A Figura 5.11 mostra o perfil de intensidade medido em cada janela da Figura 5.9. 99 Figura 5.10: Imagem em três dimensões de um spot LEED. O gráfico obtido pela intensidade de todas as janelas para cada ponto de difração nas respectivas energias fornece a curva IxV experimental. (a) 60 eV (b) 120 eV (c) 180 eV (d) 240 eV (e) 300 eV (f) 360 eV Figura 5.11: Para os valores de energias da Figura 5.9 é mostrado o perfil correspondente de intensidade. 100 Figura 5.12: Curva IxV obtida pela sequência de janelas de intensidade. Os pontos marcados representam a intensidade da respectiva janela na Figura 5.11. 101 Capı́tulo 6 Análise da prata 6.1 Introdução Os cristais clivados em baixos ı́ndices de Miller são alvo de estudo há muito tempo. As superfı́cies de metais, clivados nessas direções, possuem a importante caracterı́stica de apresentar pequenas reconstruções e relaxações próximas dos valores do respectivo volume. Isto se reflete em uma grande estabilidade da superfı́cie do cristal e, experimentalmente, se tornam bons candidatos, como substrato, para a criação de sensores. Muitos elementos possuem um comportamento médio de expansão perpendicular da superfı́cie, semelhante ao seu respectivo valor de volume. Enquanto a distância entre a primeira camada aumenta, a segunda pode sofrer contração, atenuando o efeito expansivo. Para estes materiais relaxações da ordem de 1% ou terminação tipo volume são esperadas. (a) Ag(110) (b) Ag(111) Figura 6.1: Vista do empilhamento das faces (110) e (111). As respectivas faces estão voltadas para cima, em direção ao topo da página. 102 As direções [110] e [111] dos cristais FCC apresentam empilhamento tipo ABA e ABC, respectivamente. A primeira apresenta uma superfı́cie aberta, expondo os átomos da segunda camada, como pode ser visto na Figuras 6.1-(a). Este arranjo proporciona à superfı́cie um coeficiente de expansão diferente do volume. A superfı́cie (110) foi bem explorada por várias técnicas e resultados de LEED [90] determinaram o coeficiente de expansão. Para o volume, o valor encontrado na literatura para o coeficiente vale 18, 9 × 10−6 K −1 , enquanto para a superfı́cie este valor sobe para (60 ± 20) × 10−6 K −1 , para uma faixa de temperaturas que varia de 10% a 60% da temperatura de fusão (1234 K). A Figura 6.2(a) mostra o comportamento das primeiras distâncias interplanares, medidas por LEED e MEIS, com a respectiva simulação por dinâmica molecular e DFT. Com relaçaõ à face (111), esta possui o maior grau de compactação devido à simetria hexagonal sendo a superfı́cie mais fechada desta famı́lia cristalográfica. Seu coeficiente de expansão foi determinado por LEED no trabalho de Soares et al [91] e vale (22, 0) × 10−6 K −1 . A Figura 6.2(b) mostra o comportamento das primeiras distâncias interplanares, medidas por LEED e MEIS. Neste trabalho foi investigado o comportamento da relaxação das 2 primeiras camadas atômicas da face (100) da Ag, bem como o comportamento de suas temperaturas de Debye, em uma faixa de temperaturas que varia entre 10% a 40% do respectivo ponto de fusão e determinamos o coeficiente de expansão térmica da superfı́cie. 6.2 O Modelo O modelo considerado do cristal de Ag (100) possui célula unitária cúbica de face centrada (fcc) com parâmetro de rede de volume medindo 4, 085Å, ver Figura 6.4, medido à temperatura ambiente (273K). O raio da esfera muffin tin mede 1,444Å no volume e na superfı́cie considera-se uma contração de 10% deste valor. A rede apresenta simetria p(1x1) com empilhamento tipo ABA, parâmetro de rede de superfı́cie medindo 2,888Å e espaçamento entre camadas igual a 2.043Å. Todos estes dados são correlacionados à temperatura ambiente e foram obtidos na referência [92]. Partiu-se do princı́pio de que a primeira e segunda camada possuem propriedades de superfı́cie, enquanto que da terceira camada em diante, as propriedades são consideradas de volume. A relaxação da superfı́cie é avaliada nas 3 primeiras camadas. 103 Estas possuem amplitudes de vibração perpendicular de 1.2Å para os átomos da superfı́cie e 1Å para os átomos de volume. Os deslocamentos paralelos à superfı́cie não são considerados devido à alta simetria deste tipo de rede. A temperatura de Debye do volume foi mantida constante com valor de 225K [93]. O modelo de expansão térmica da equação 6.1 é utilizado para fazer a correção dos parâmetros de rede nas temperaturas de 181K, 211K, 243K, 301K e 378K. a(T ) = a(T0 )(1 + α∆(T ) (6.1) onde a(T0 ) = 4, 0853Å e αAg é o coeficiente de expansão térmica do volume à temperatura ambiente. 6.3 Detalhes Experimentais O cristal de prata foi adquirido comercialmente da Empresa Monocristal Company, com 99, 995% de pureza, clivado na direção [100] e desvio de corte 0, 5o , originalmente. E o equipamento utilizado foi o sistema do grupo de Fı́sica de Superfı́cies da Universidade Federal de Minas Gerais. Dentro da câmara principal foi dado inı́cio à limpeza a nı́vel atômico utilizando o processo de sputtering com ı́ons de Ar. O processo foi feito em atmosfera estática de 5, 5 × 10−5 mbar com energia do feixe inicialmente em 500 eV e duração entre 30 min e 1 hora. Cada seção de sputtering foi seguida do annealing com temperatura máxima de 450 o C . A permanência nesta temperatura variou de alguns minutos a 12h com rampas de resfriamento suaves. A temperatura da amostra foi monitorada com um termopar Chromel-Alumel fixado no porta-amostra. A partir do décimo ciclo de limpeza um padrão LEED difuso, mas consistente com a cristalografia p(1x1) da Ag, já podia ser observado. Somente no décimo quinto ciclo, a amostra estava completamente preparada. Apresentando um padrão LEED bem definido com composição quı́mica da superfı́cie livre de impurezas, medida via espectroscopia Auger. O padrão LEED foi filmado usando o sistema de vı́deo da Omicron LEEDStar com o feixe de elétrons incidindo perpendicularmente na amostra. Usando a seguinte indexação para os feixes difratados, Figura 6.5, e considerando todo o conjunto de temperaturas, a coleta de dados totalizou 50 feixes. Após o processo de média, suavização e normalização restaram 16 feixes não equivalentes 104 distribuı́dos no conjunto de temperaturas. As curvas IxV´s obtidas estão representadas nas Figuras 6.6(a), 6.6(b), 6.6(c), 6.6(d) e 6.6(e). A parte imaginária do potencial óptico foi estimada pela largura dos picos de difração obtidos experimentalmente. A relação entre a largura e o valor de VOi é dada pela equação 6.2. ∆Epico ≈ 2|VOi |. (6.2) A parte imaginária do potencial óptico foi estimada em 6,5 eV pela média da largura dos picos à meia altura em cada curva IxV experimental. 105 6.4 Análise dos Resultados A busca do fator-R foi otimizada fazendo-se uma varredura em uma sequência de temperaturas de Deby iniciando em 100K e terminando em 350K em intervalos de 20K. Os gráficos apresentados na Figura ?? mostram o comportamento do fator-R em função da temperatura da primeira e segunda camada. ΘDebye do volume foi mantida constante em 225K. À baixa temperatura, 4 feixes não equivalentes são apresentados. As curva coletadas para 181K formam um conjunto que compreende uma energia total (∆Etotal ) de 928 eV. Para 211K e 243K, os conjuntos coletados possuem o mesmo ∆Etotal anterior. À medida que a temperatura sobe, a amplitude da vibração térmica aumenta gerando um espalhamento mais difuso e dificultando a coleta de outros pontos. Em 243K e em 301K, somente 3 feixes possuı́am ∆E de energia significativo, 948 eV e 723 eV, respectivamente. Em 378K, apenas 2 feixes foram coletados e compreende um ∆Etotal = 210 eV. A tabela 6.4 mostra a os valores encontrados para o s fatores-R em cada temperatura, bem como as temperaturas de Debye(ΘDebye ) das primeiras e segundas camadas. O erro na temperatura de Debye está relacionado com o erro no fator Rp , determinado pela equação 5.54. Uma maneira de estimar este erro pode ser feita utilizando o gráfico da função de mı́nimo do fator Rp para cada experimento. A Figura 6.4 mostra dois exemplos para a estimativa deste erro nas primeiras camadas: um para o experimento realizado em 211K e outro em 301K. Este mesmo procedimento foi usado para estimar erro das demais temperaturas. A tabela 6.4 resume os resultados de fator R, temperaturas de Debye, e valores da variação em ângstrons da expansão térmica da superfı́cie. Os valores para as partes reais do potencial óptico foram otimizados pelo programa. 106 T (K) T (%) Tm ΘDebye1 (K) ΘDebye2 (K) ∆E(eV ) Vo (eV ) F ator − RP 181 211 243 301 378 0, 147 0.171 0, 197 0, 244 0, 306 115 ± 40 (−30)140(+40) (−30)145(+40) (−30)140(+40) 120 165 180 185 180 175 928 928 948 723 210 3, 16 + i6, 5 2, 32 + i6, 5 3, 03 + i6, 5 4, 02 + i6, 5 3, 42 + i6, 5 0, 18 ± 0, 05 0, 16 ± 0, 04 0, 22 ± 0, 05 0, 18 ± 0.05 0, 17 ± 0, 08 Tabela 6.1: Valores das temperaturas de Debye e demais parâmetros não estruturais encontrados com a minimização do fator-RP . Os dados são apresentados em relação à respectiva temperatura do experimento normalizada pela temperatura de fusão da Ag (Tf usao = 1234K), com as respectivas precisões das medidas. Os valores entre parêntesis representam o intervalo assimétrico do erro. A Figura 6.9 apresenta o comportamento da temperatura de Debye das duas primeiras camadas atômicas em função das respectivas temperaturas do experimento, normalizada pela temperatura de fusão. A maneira usual de calcular a relaxação (∆ij ) entre duas camadas, i e j, é feita de acordo com a seguinte equação: (Dij − Dvolume ) , (6.3) Dvolume onde Dvolume é a distância entre planos do volume. A tabela 6.2 mostra a relaxação encontrada para as 3 primeiras camadas atômicas. E a variação da distância entre camadas é mostrada no gráfico da Figura 6.10. ∆ij = 100 × T (K) ΘDebye1 (K) ΘDebye1 (K) 181 211 243 301 378 115 140 145 140 120 165 180 185 180 175 ∆12 (%) ∆23 (%) ∆34 (%) -0,0687 0,3774 0.5976 1,0031 1,1413 0,3188 -0,1176 -0,6270 -0,6704 -0,3858 -0,7111 -0,4950 0,9944 0,6214 0,7280 Rp 0, 18 0, 16 0, 22 0, 18 0, 17 Tabela 6.2: Valores percentuais relativos a variação do espaçamento entre camadas. Os dados são apresentados em relação à respectiva temperatura do experimento normalizada pela temperatura de fusão da Ag (T mAg = 1234K). 107 A análise do gráfico da Figura 6.9 mostra que o comportamento da temperatura de Debye dos dois planos é semelhante aos encontrados para Ag(111). No detalhe da Figura 6.9, mostra a semelhança. A temperatura de Debye média para a primeira camada vale 132K, enquanto que para segunda, vale 177K. Levando em conta a equação 5.33, que estima as temperaturas de Debye da camada superior através do valor da temperatura do volume os valores esperados eram 112K para a primeira camada e 159K para a segunda. Isto está em pleno acordo, levando em conta a barra de erro do experimento. Logo: ΘDebye1 << ΘDebye2 << ΘDebyev olume , (6.4) 132K << 177K << 225K (6.5) Assim, O gráfico da variação percentual da expansão da superfı́cie mostra que a distância entre as duas primeiras camadas, aumenta de um valor próximo de 1% com relação ao respectivo valor do volume. Considerando que este comportamento é linear, como propusemos no modelo, isto corresponde a um valor de coeficiente de expansão superficial igual à 78 × 10−6 K −1 Estes resultados concordam com valores obtidos teórica e experimentalmente para a relaxação de outros metais clivados na mesma direção para a mesma faixa de temperaturas. Como por exemplo, o Pd apresenta 1, 2% [94], o Cu apresenta 1, 2% [95] e o Au, 1, 2% [96]. Da mesma forma, os resultados encontrados podem ser confrontados com os resultados para a Ag(110) e Ag(111), veja a Figuras 6.1 em (a) e (b). Colocando os coeficientes de expansão térmica em ordem crescente, podemos pensar que a relaxação da superfı́cie é função do grau de compactação de cada rede. A face mais compacta é a face (111). Ela possui o maior número de próximos vizinhos e a maior distância entre planos dentre as outras faces, veja Figura 6.11. No entanto, possui o menor coeficiente de expansão. Já a face (110) apresenta o menor fator de compactação na superfı́cie e a menor distância entre os planos. Seu coeficiente de expansão está no extremo oposto à face (111). Uma análise pré-liminar sugere que na face intermediária, face (100), terı́amos uma relaxação seguindo o mesmo comportamento, pelo menos nesta mesma faixa de temperaturas. Porém, a face (100) apresenta um valor superior aos demais. 108 22 × 10−6 K −1 << 60 × 10−6 K −1 << 78 × 10−6 K −1 . (6.6) αsup.Ag(111) << αsup.Ag(110) << αsup.Ag(100) . (6.7) Assim, A prata (110) apresenta outros valores para seu coeficiente de expansão. Cálculos de DFT, dinâmica molecular e medidas de espalhamento de ı́ons, diferem nos resultados de LEED [90]. Quando a temperatura é maior que 0.45 % de sua temperaturara de fusão, há uma transição de fases que leva o coeficiente de expansão para um valor muito superior, cerca de 21 vezes maior que o volume. Devido a este comportamento, a relação entre o fator de compactação da rede e sua respectiva relaxação não vale como regra, apesar de parecer válida. Assim, os resultados do estudo da expansão témica da superfı́cie da face (100) da prata revelam que os parâmentros de rede da superfı́cie não são alterados, permacescendo com os respectivos valores do volume. E que esta face apresenta expansão de 1% na distância entre as duas primeniras camadas. 109 (a) (b) Figura 6.2: Em (a) - Variação percentual da relaxação da primeira camada da Ag(110) como função da temperatura do experimento [90]. Em (b) - Determinação experimental e simulação da relaxação da primeira camada para a Ag(111) [91].Medidas feitas por difração de elétrons (LEED) e espalhamento de ı́ons (MEIS) e simulações em dinâmica molecular (DM) e teoria do funcional densidade (DFT). Os dois gráficos a temperatura do experimento estão normalizados pela temperatura de fusão da prata. 110 (a) (b) Figura 6.3: Célula unitária e o empilhamento ABAB. Figura 6.4: Célula unitária de superfı́cie. Os vetores ~a e ~b tem módulo igual a metade da diagonal da face da correspondente célula de volume. 111 112 (a) O fator-R de cada curva é mostrado abaixo respectivo feixe. O fator-R médio do experimento à 181K é Rp =0.18. 113 (b) O fator-R de cada curva é mostrado abaixo respectivo feixe. O fator-R médio do experimento à 211K é Rp =0.16. 114 (c) O fator-R de cada curva é mostrado abaixo respectivo feixe. O fator-R médio do experimento à 243K é Rp =0.22. (d) O fator-R de cada curva é mostrado abaixo respectivo feixe. O fator-R médio do experimento à 301K é Rp =0.18. 115 (e) 378K → Rp =0.17 Figura 6.6: Comportamento do fator-R em função da temperatura de Debye da primeira e segunda camada em 181K → Rp =0.18. 116 (a) 211K → Rp =0.16 (b) 243K → Rp =0.22 (c) 301K → Rp =0.18 (d) 378K → Rp =0.16 Figura 6.7: Comportamento do fator-R em função de ΘDebay1 (eixo x) e ΘDebay2 (eixo y). 117 (a) (b) 118 Figura 6.8: Procedimento para estimativa do erro na ΘDebye . Em (a), uma linha paralela ao eixo x, traçada no valor máximo do erro do Fator-R → 0.18 + 0.04 = 0, 22, intercepta- a em dois pontos da curva. A região delimitada no eixo x representa o intervalo do erro na temperatura. Veja que este intervalo é assimétrico. Este mesmo comportamento aparece para as outras temperaturas. Figura 6.9: Comportamento de ΘDebye das duas primeiras camadas atômicas em função das respectivas temperaturas do experimento. No detalhe, o comportamento de ΘDebye das três primeiras camadas atômicas em função das respectivas temperaturas do experimento, medidas para a face (111) da Ag. [91] 119 Figura 6.10: Comportamento da variação da distância entre as duas primeiras camadas atômicas em função das respectivas temperaturas do experimento. A curva verde representa o volume. (a) Ag(111) (b) Ag(100) (c) Ag(110) Figura 6.11: Vista da distância entre planos das faces (111), (100) e (110). As respectivas faces estão voltadas para cima. 120 Capı́tulo 7 Conclusão e Perspectivas 7.1 Monocristal Nesta tese foram crescidos filmes monocristalinos de Fe sobre MgO(100) preparados pelo método de deposição por magnetron sputtering DC adiferentes temperaturas. As propriedades quı́micas e a morfologia da superfı́cie foram estudadas pelas técnicas de XPS e AFM, respectivamente, enquanto as propriedades magnéticas por MOKE e FMR. Os resultados obtidos com a investigação do XPS, antes e depois da limpeza, mostram que a estrutura interna do filme não apresenta vestı́gios de oxidação. Internamente o filme se mantém homogêneo e composto somente por Fe metálico. Isto indica que a metodologia de limpeza e de deposição do filme são confiáveis. As medidas de AFM mostram que, na ausência de exposição à atmosfera o filme crescido à 250 o C possui rugosidade média RA= 0,25 nm, equivalente a uma camada atômica de Fe. Este valor indica que a suavidade e uniformidade da superfı́cie são comparáveis com padrões excelentes para a sobreposição de outros elementos. Considerando que a amostra permanece dentro da câmara, saindo à atmosfera somente após o término do processo, as caracterı́sticas medidas pelo XPS e AFM são válidas para todos os filmes. Com relação às medidas de MOKE e FMR, elas mostram que a melhor cristalinidade é alcançada quando a deposição é feita na temperatura de 300 o C. Este resultado mostra que a coercividade e a diferença entre os campos de ressonância no eixo fácil e eixo duro indicam a melhor cristalinidade para a amostra crescida 121 em 250o C. Além disso, a figura 4.14 mostra que a qualidade da cristalinidade do filme depende assintoticamente da temperatura sendo governado pela equação de Avrami. As técnicas experimentais indicam que os filmes depositados são nanométricos, compostos apenas de Fe metálico, são monocristalinos e possuem superfı́cies suaves. Os resultados indicam ainda, que existe uma forte dependência com a temperatura de deposição onde o melhor resultado é obtido para filmes crescidos à temperatura de 300 o C. Estes resultados foram apresentados em vários congressos nacionais e em um congresso internacional. O trabalho foi publicado em forma de artigo no periódico: JOURNAL OF PHYSICS D: APPLIED PHYSICS sob doi:10.1088/00223727/41/20/205005. Desejamos em um futuro próximo desenvolver estruturas magnéticas complexas, formadas por multicamadas nanométricas acopladas. Construir dispositivos com estas estruturas e elementos semicondutores, também está nos planos. A proposta de fabricar um monocristal de Fe sobre MgO foi somente o primeiro passo de uma série de obstáculos a vencer. Agora, com a metodologia de crescimento de monocristais dominada, já conseguimos uma nova conquista nessa corrida tecnológica. Desenvolvemos a primeira tricamada Fe/Cr/Fe/MgO (100) crescida pelo método de sputtering DC. O resultado de MOKE é visto na Figura 7.1, apresentando acoplamento bilinear e biquadrático. A qualidade das amostras crescidas se mostrou muito promissora apresentando resultados satisfatórios para o uso e consolidação da técnica de sputtering como método de deposição de monocristais. A próxima etapa é o estudo de tricamadas ferromagnéticas acopladas e crescidas em sequências quasi-periódicas. 7.2 Expansão da Ag(100) Nesta tese foi investigado o comportamento do parâmetro de rede da superfı́cie da prata (100) utilizando a técnica de Difração de Elétrons de Baixa Energia. O experimento foi realizado com incidência normal do feixe eletrônico para cinco valores de temperaturas: 181K, 211K, 243K, 301K e 378K. O padrão LEED foi filmado e as curvas IxV’s foram coletadas somando um total de 16 feixes independentes. No modelo proposto do cristal, consideramos na análise as 4 primeiras camadas atômicas e que as temperaturas de Debye da terceira camada em diante ti122 Figura 7.1: Resultado da medida de MOKE para uma tricamada Fe/Cr/Fe/MgO crescida com a metodologia de deposição investigada nesta tese. 123 nham o mesmo valor do volume (225K). Seguindo um modelo de expansão linear do parâmetro de rede, determinamos as temperaturas de Debye das duas primeiras distâncias entre planos. Os resultados mostram que a temperatura de Debye média para a primeira camada vale 132K, enquanto que para segunda, vale 177K. Os valores estimados, tomando por base o valor de volume foram 112K e 159K. Estes valores estão em pleno acordo, levando em conta que os valores conhecidos para o volume estão na faixa de 215K a 225K. Além disso, mostra que o comportamento da temperatura de Debye segue o mesmo comportamento da Ag nas faces (110) e (111). Quanto à variação percentual da expansão da superfı́cie, os resultados mostram que a distância entre as duas primeiras camadas, varia com um valor de 1% com relação ao respectivo valor do volume. E assumindo que tal comportamento é linear, isto corresponde a um valor de coeficiente de expansão superficial igual à 78 × 10−6 K −1 . Não encontramos nenhum efeito anarmônico nesta faixa de temperaturas. O resultado concorda com valores obtidos teóricos e experimentalmente para a relaxação de outros metais clivados na mesma direção para a mesma faixa de temperaturas. Como por exemplo, o Pd apresenta 1, 2% [94], o Cu apresenta 1, 2% [95] e o Au, 1, 2% [96]. Da mesma forma, os resultados encontrados podem ser confrontados com os resultados para a Ag(110) e Ag(111) e colocando os coeficientes de expansão térmica em ordem crescente teremos: 22 × 10−6 K −1 << 60 × 10−6 K −1 << 78 × 10−6 K −1 . (7.1) αsup.Ag(111) << αsup.Ag(110) << αsup.Ag(100) . (7.2) Assim, A tecnologia envolvida na área de nanoestruturas é bem sofisticada. O controle de parâmetros na escala atômica é crucial e a implementação de técnicas de visualização destas estruturas é de extrema importância. Neste contexto, a técnica de Difração de Elétrons de Baixa Energia será a próxima implementação. Os primeiros trabalhos nesta técnica, desenvolvidos pelo DFTE-UFRN em parceria com o grupo de Fı́sica de Superfı́cies da UFMG e UFBA, já rendem resultados e a futura implementação da técnica na região nordeste do Brasil se torna cada vez mais próxima. 124 Referências Bibliográficas [1] GAMBARDELLA, P., A. Dallmeyer, K. Maiti, M. C. Malagoli, W. Eberhardt, K. Kern, and C. Carbone. - Nature (London), v. 416, p. 301 (2002). [2] CHENG, R., K. Yu. Guslienko, F. Y. Fradin, J. E. Pearson, H. F. Ding, Dongqi Li, and S. D. Bader- Physical Review B, v. 77, (2008). [3] SPRIGHOLTZ G., Holy V, Princzolits M, Bauer G Science. v. 282, p. 734-737. (1998). [4] LENCHNER, R. T. and T. U. Schülli and V. Holy and J. Stangl and A. Raab and G. Springholz and G. Bauer. - Physica E, v. 21, p. 611 - 614. (2004). [5] VALDEN, M., X. Lai and W. Goodman. - Science, v. 281, p. 1647, (1998). [6] BARTHELÉMY, A.,Fert, A., J-P. Contour, M. Bowen, V. Cros, J. M. De Teresa, A. Hamzic, J. C. Faini, J. M. George, J. 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