O BULLYING NAS ESCOLAS PORTUGUESAS Susana Fonseca

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O BULLYING NAS ESCOLAS PORTUGUESAS Susana Fonseca
Seminário “Bullying, Violência e Agressividade em Contexto Escolar”
O BULLYING NAS ESCOLAS PORTUGUESAS
Susana Fonseca Carvalhosa
Universidade de Bergen, Noruega
Instituto Superior de Psicologia Aplicada, Portugal
[email protected]
BULLYING EM PORTUGAL: O QUE SE PASSA NAS ESCOLAS?
O bullying na escola define-se do seguinte modo: "um aluno está a ser
provocado/vitimado quando ele ou ela está exposto, repetidamente e ao longo do tempo, a
acções negativas da parte de uma ou mais pessoas" (Olweus, 1993) Considera-se uma acção
negativa quando alguém intencionalmente causa, ou tenta causar, danos ou mal-estar a outra
pessoa. Esse repetido importunar pode ser físico, verbal, psicológico e /ou sexual.
Devido às consequências e efeitos negativos destes comportamentos para o
desenvolvimento e para a saúde mental, é de extrema importância que as escolas não neguem
que o problema existe e que se dissipe a noção, de pais e educadores, de que este tipo de
comportamento é uma parte normal do crescimento. Isto também porque a liberdade do medo
do não é suficiente para assegurar uma aprendizagem com sucesso mas é uma condição
necessária para a aprendizagem eficaz.
Em Portugal, têm sido feitos vários estudos sobre a problemática do bullying. Estes
envolvem aspectos como a tradução da palavra “bullying” para português”, a observação dos
comportamentos de bullying nos recreios, a caracterização das vítimas, dos agressores e das
vítimas-agressoras e a prevalência deste tipo de comportamentos e a sua monitorização a nível
nacional.
Nas investigações com amostras nacionais representativas (Carvalhosa, Lima e Matos,
2001; Carvalhosa e Matos, 2004) verificou-se que, em 1998, 42.5% dos alunos entre os 11 e os
16 anos de idade relataram nunca se terem envolvido em comportamentos de bullying, 10.2%
afirmaram serem agressores (uma vez ou mais, no último período escolar), 21.4% referiram
serem vítimas (uma vez ou mais, no último período escolar) e 25.9% eram simultaneamente
vítimas e agressores. Já em 2004, verificou-se que 41.3% dos alunos nunca se envolveram em
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comportamentos de bullying, 9.4% são agressores, 22.1% são vítimas e 27.2% são tanto vítimas
como agressores. Pode-se assim concluir que em Portugal, existem taxas elevadas de
comportamentos de bullying, nas escolas.
Para a vitimação e para a provocação, os comportamentos mais referenciados são o
“gozar, chamar nomes, fazer troça”, “dizer mentiras, espalhar boatos”, “fazer comentários ou
gestos ordinários e/ou piadas sexuais” e “excluir, deixar de fora de actividades de propósito”
(Carvalhosa e Matos, 2005). Num estudo comparativo sobre a evolucão do fenómeno em
Portugal, verificou-se que a frequência dos comportamentos de vitimação e de provocação, uma
vez por semana ou mais, aumentaram nos últimos anos nas escolas Portuguesas (Carvalhosa e
Matos, 2004). Nas escolas estes fenómenos são muitas vezes despercebidos na sua verdadeira
extensão e expressão.
Ainda destacamos:
dos alunos portugueses entre os 10 e os 18 anos, 23.5% estão envolvidos em
comportamentos de bullying, 2 a 3 vezes por mês ou mais, ou seja, 1 em cada 4 alunos.
os rapazes envolvem-se mais em comportamentos de bullying na escola, quer como
agressores, quer como vítimas, quer com duplo envolvimento (simultaneamente agressores e
vítimas);
o envolvimento em comportamentos de bullying parece ter um pico aos 13 anos, embora
os mais novos (11 anos) se envolvam mais, enquanto vítimas;
nos últimos anos, verificou-se um aumento na frequência de bullying, uma vez por
semana ou mais, quer em relação a provocar os outros quer em relação a ser vítima.
SUPORTE SOCIAL
O suporte social é considerado um factor protector para o envolvimento em
comportamentos de bullying. Através de utilização de modelos de equações estruturais, uma
análise factorial confirmatória revelou que os modelos dos 2 factores correlacionados (Suporte
dos Amigos e da Família; Suporte dos Colegas e dos Professores) se ajustam aos dados (CFI de
0.95 e de 0.94) (Carvalhosa, Oddrun, Hetland, submetido a). Os resultados indicam que na
escola, as vitimas e as vítimas-agressoras recebem menos suporte dos colegas e os agressores
recebem menos suporte dos professores; fora da escola, as vitimas tem menos suporte dos
amigos. Podemos concluir que diferentes padrões de suporte social, dentro e fora da escola,
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foram encontrados para as vitimas, os agressores e as vítimas-agressoras. Estes resultados
podem guiar o desenvolvimento de intervenções para a prevenção do bullying.
COMPARAÇÃO INTERNACIONAL
O estudo Health Behaviour in School-aged Children (Currie, Hurrelmann, Settertobulte,
Smith, & Todd, 2000), envolvendo 35 países e regiões maioritariamente europeus, aponta que
cerca de 30 % dos jovens entre os 11 e os 15 anos reportam envolvimento em bullying, estando
os rapazes mais envolvidos do que as raparigas, em todas as idades e que as últimas optam mais
por formas de bullying indirecto como manipulação social e agressão verbal.
Como podemos ver pela observação do Gráfico, em Portugal são sempre os rapazes que
mais referem serem vítimas de bullying. Comparativamente com os outros países envolvidos no
estudo, os jovens Portugueses com 11 e 13 anos de idade colocam Portugal em 4º lugar no
ranking da vitimização na escola.
Em relação a agredir os outros, o Gráfico revela que são também os rapazes quem mais
provoca os outros nas escolas Portuguesas. Os dados dos jovens de 11 anos de Portugal quando
comparado com os outros 35 países em relação a provocar os outros, pelo menos 2 ou 3 vezes
por mês, nos últimos 2 meses, fazem com que ocupemos o 6º lugar no ranking do bullying na
escola.
A prevalência do bullying foi investigada em 29 países (ter sido vítima e ter provocado
outros), assim como as diferenças entre grupos etários e foi ainda explorada a relação entre o
bullying e o Produto Interno Bruto (PIB) (Carvalhosa, Oddrun, Hetland, submetido b). A análise
revelou que existe uma grande variação entre os países quando se comparou a frequência de
bullying comportamentos. A percentagem de vítimas variou entre 5,8% na Suécia e 40,1% na
Lituânia, bem como a percentagem de agressores variou de 3,4% em Inglaterra e 34,4% também
na Lituânia. A curva em U foi encontrada em todos os grupos etários, quando o PIB e o bullying
foram investigados. As novas estratégias de prevenção têm que se distinguir por um
compromisso de combater as desigualdades macro-determinantes através de políticas
informada por provas científicas. O envolvimento com macro-determinantes e com provas
científicas apresenta um grande desafio para a comunidade científica e política.
MODELO ECOLÓGICO
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De acordo com a teoria dos sistemas ecológicos (Bronfenbrenner, 1979), o
desenvolvimento humano ocorre num conjunto de sobreposições de sistemas ecológicos e foca
o relacionamento de um indivíduo dentro do seu contexto social. Todos estes sistemas
cooperam para influenciar o que uma pessoa se torna à medida que se desenvolve.
Bronfenbrenner (1979) sugere que um indivíduo se desenvolve dentro de um contexto ou
ecologia e este autor estrutura o ambiente em termos de uma série de círculos concêntricos
(ver Figura), em que o círculo no centro é a pessoa rodeada por microssistemas (e.g., pessoa família, pessoa - pares, pessoa - escolar e pessoa - comunidade). Nenhum sistema pode ser
considerado um microssistema se não está em contacto directo com a pessoa por um período
de tempo significativo. O próximo círculo é o mesossistema, que é um nível intermédio de
influência envolvendo ligações entre dois ou mais microssistemas (e.g., a relação entre a escola
e a família, a família e os vizinhos, o bairro e a escola). Em volta deste está o exossistema, que
inclui as definições sociais que só afecta a pessoa indirectamente (e.g., o trabalho dos pais, as
redes sociais da família). O círculo mais longe do centro é o macrossistema, que influencia a
pessoa através da cultura, de normas, de estilos de vida, sistemas de crença, recursos materiais
ou mudanças globais. O desenvolvimento de uma pessoa também será influenciada por
mudanças temporais - o cronossistems. Este sistema incorpora a dimensão de tempo (e.g.,
entrada na escola, puberdade, uma morte na família).
Alterações ou conflitos em qualquer sistema terá um efeito em todos os outros sistemas.
Baseado nesta teoria, o bullying é visto como um fenómeno que afecta o desenvolvimento
ecológico das crianças e dos jovens.
CONCLUSÃO
Apesar de a maioria dos comportamentos de bullying ocorrerem na escola, a sua
prevenção deverá centrar-se em toda a comunidade. Todas as pessoas têm um papel
importante a desempenhar:
Crianças e Jovens
Família
Escolas
Comunidade
Políticos / nível nacional
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REFERÊNCIAS
Bronfenbrenner, U. (1979). The ecology of human development. Cambridge: Harvard
University Press.
Carvalhosa, S., Lima, L. & Matos, M. (2001). Bullying - A provocação/vitimação entre pares
no contexto escolar português. Análise Psicológica, 4(XIX), 523-537.
Carvalhosa, S., & Matos, M. (2004). Bullying in schools: what's going on? Paper presented
at the 9th Biennial Conference of EARA, Porto.
Carvalhosa, S., & Matos, M. (2005) Provocação entre pares em idade escolar. In M. Matos
(ed.). Comunicação, gestão de conflitos e saúde na escola (3ª ed.). Cruz Quebrada: FMH Edições.
Carvalhosa, S., Oddrun, S., & Hetland, J. (submetido a). Relationship between bullying and
social support within and outside the school: Dimensional structure and variation across
countries. Child Development.
Carvalhosa, S., Oddrun, S., & Hetland, J. (submetido b). Relations between economic
development and bullying behaviour in young people: A cross-national analysis. Health
Promotion International.
Currie, C., Hurrelmann, K., Settertobulte, W., Smith, R. & Todd, J. (Eds.). (2000). Health and
health behaviour among young people. Copenhagen: World Health Organization.
Olweus, D. (1993). Bullying at school. Oxford: Blackwell.
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