Dermatite das fraldas
Transcrição
Dermatite das fraldas
NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2004, vol. XIII, n.º 3 Dermatite das fraldas Natividade Rocha1, Manuela Selores2 RESUMO A dermatite das fraldas deve ser interpretada não como uma entidade diagnóstica específica, mas sim, como um diagnóstico de localização, que engloba um amplo grupo de dermatoses de etiologia multifactorial. Neste trabalho, será abordada principalmente a dermatite da fralda irritativa primária ( para alguns autores sinónimo de dermatite da fralda), os seus principais diagnósticos diferenciais e tratamento. bolhoso, escabiose, sífilis congénita, VIH). Assim, a dermatite das fraldas deve ser interpretada não como uma entidade diagnóstica específica, mas sim, como um diagnóstico de localização, que engloba um amplo grupo de dermatoses de etiologia multifactorial. Neste trabalho, será abordada principalmente a dermatite da fralda irritativa primária e os seus principais diagnósticos diferenciais. Nascer e Crescer 2004; 13 (3): 206-214 INTRODUÇÃO Dermatite das fraldas, eritema da fralda, dermite da fralda são termos genéricos que abrangem um conjunto de dermatoses inflamatórias, que atingem a área do corpo coberta pela fralda. Não sendo portanto diagnósticos específicos, incluímos na dermatite das fraldas, principalmente com fins didácticos: as erupções causadas directamente pelo uso da fralda, dermatite da fralda irritativa primária ( para alguns autores esta seria sinónimo de dermatite da fralda (1) )e a dermatite de contacto alérgica às borrachas da fralda (muito rara), as dermatites exacerbadas pelo uso destas ( psoríase, eczema atópico, d.seborreica, miliária, dermatite Candidiásica, d. contacto alérgica), e aquelas que ocorrem nesta localização mas que não se relacionam com o seu uso ( acrodermatite enteropática, histiocitose de cél. Langerhans, granuloma glúteo infantil, dermatite estreptocócica perianal, impetigo 1 Interna Complementar de Dermatovenereologia Hospital Geral Santo António, SA - Porto 2 Directora e Chefe do Serviço de Dermatologia Hospital Geral Santo António, SA - Porto 206 artigos de revisão DERMATITE DA FRALDA IRRITATIVA PRIMÁRIA - dermatite em W (considerada por alguns autores sinónimo de dermatite das fraldas) A dermatite da fralda irritativa primária é a dermatite da área da fralda mais prevalente, sendo provavelmente a afecção cutânea mais frequente na 1ª infância nos países desenvolvidos, constituindo uma fonte significativa de desconforto para a criança. Dado tratar-se de uma dermatite frequentemente tratada de forma conservadora em casa, desconhece-se a sua prevalência exacta, contudo estima-se que atinja 25 a 65% das crianças (2,3). Embora possa ocorrer em qualquer idade, o período de utilização da fralda, é mais frequente entre os 6 e os 12 meses de idade (3,4). Não tem predilecção por sexo ou raça (1). O papel preciso das fraldas mantém-se desconhecido. No início do século XX, vários investigadores acreditavam que a amónia libertada na urina, fosse o principal factor envolvido na etiologia desta dermatite, também conhecida nessa altura por dermatite amoniacal (5). Em 1977, Leyden e colaboradores(6) demonstraram, através de testes epicutâneos, a inimputabilidade da amónia. Na década de 80, Berg(7) propôs um modelo para explicar a forma como vários factores relacionados com o uso da fralda, promovem o desenvolvimento e a progressão desta dermatite. Neste modelo, a dermatite da fralda irritativa primária é interpretada como o resultado final de uma cascata de eventos, desencadeada inicialmente por lesões a nível do estrato córneo, induzidas por exposição a múltiplos factores, tais como: hiperhidratação, fricção, temperatura, irritantes químicos, urina, e fezes. Após comprometimento da barreira cutânea, vários factores adicionais do mesmo tipo potenciam estas alterações originando um ciclo vicioso vulnerável às infecções por agentes microbianos oportunistas (ex: Candida albicans, etc.) (8,9,10). No desenvolvimento da dermatite da fralda irritativa primária têm de ser considerados vários factores: 1. Fraldas Apesar do termo “dermatite da fralda”, a fralda por si só, muito raramente ou nunca está implicada no desenvolvimento de dermatites de contacto irritativas ou alérgicas em crianças (11). Nos países desenvolvidos a diminuíção da frequência e severidade da dermatite das fraldas deve-se principalmente à melhoria na qualidade do material destas. A introdução no mercado de fraldas descartáveis, superabsorventes com capacidade de absorção de água 50 vezes superior, contribuiu significativamente para a melhoria dos cuidados de higiene. NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2004, vol. XIII, n.º 3 As fraldas descartáveis modernas possuem 3 camadas: uma interna que funciona como filtro, uma intermédia com capacidade de absorção de líquidos, e finalmente, uma externa à prova de água. Esta última camada previne a perspiração e dessa forma aumenta a temperatura e humidade local, tendo um papel fundamental na impermeabilidade da fralda. Por outro lado, as fraldas modernas são mais oclusivas, sendo responsáveis pelos casos raros de dermatite de contacto alérgica(12). A fralda ideal deveria ter uma boa capacidade de conter água, permitir um bom arejamento (menos oclusiva) e mudar de côr imediatamente após a criança urinar. Esta fralda ainda não existe. 2. Fezes / Urina Apesar da amónia (libertada na degradação bacteriana da ureia urinária) não constituir a causa primária da dermatite das fraldas pode actuar como um factor agravante numa pele previamente lesionada. É provável também que outros produtos resultantes da degradação da urina, ainda não identificados, desempenhem um papel importante no desencadeamento da dermatite. Estudos recentes sugerem que o aumento do pH local aumenta a actividade das proteases e lipases fecais, constituindo estas enzimas factores importantes na etiopatogenia da dermatite (10). Sabe-se ainda que a exposição prolongada da pele à urina aumenta a sua permeabilidade a substâncias irritantes. As fezes das crianças contêm quantidades importantes de enzimas digestivas proteolíticas e lipolíticas que, quando em contacto prolongado com a superficie cutânea coberta pela fralda, causam alterações importantes na barreira epidérmica. Uma das situações clínicas que evidenciam este facto é a diarreia, situação em que o contacto com as fezes é prolongado. Outros autores também sugerem um papel importante dos ácidos biliares na etiopatogenese da dermatite (13). 3. Fricção A fricção de pele-pele e de pelefralda durante os movimentos da criança, embora não seja um factor dominante é no mínimo um factor de predisposição. Este facto é apoiado pela predilecção desta dermatite pelas superfícies convexas (genitais, nádegas, parte inferior do abdómen e área proximal das coxas) e pelo não atingimento das pregas, conhecida também por dermatite em forma de “W” (14). 4. Hidratação O ambiente de hiperhidratação é causado não apenas pelas fraldas, mas também pela ureia urinária e por certas siuações clínicas como febre. Apesar das fraldas modernas conterem material absorvente que reduziu significativamente a humidade da área da fralda, o ambiente “tropical”, quente e húmido não foi ainda completamente eliminado. A hidratação excessiva é responsável por maceração cutânea que leva posteriormente a alterações da função barreira da epiderme, criando o ambiente ideal para a proliferação de microorganismos (9). 5. Temperatura A fralda dificulta a perspiração da pele subjacente, levando a um aumento da temperatura local. Este aumento leva a vasodilatação e consequentemente a inflamação. 6. Irritantes químicos Têm um efeito tóxico directo sobre a pele. Entre eles destacam-se alguns óleos, desodorizantes e conservantes. 7. Substâncias com capacidade sensibilizante A dermatite das fraldas é muitas vezes confundida com a dermatite de contacto alérgica às fraldas, contudo esta situação é excepcional nos primeiros anos de vida 15. 8. Microorganismos A Candida albicans contamina frequentemente crianças com dermatite das fraldas com mais de 3 dias de evo- lução, sendo muito raramente isolada na ausência de dermatite(16,17,18). Vários estudos sugerem uma forte associação entre a severidade da dermatite e o nº de colónias presente (2,19). A maioria dos autores acredita que a C. albicans invada apenas secundariamente a pele lesada(20,21,22), contudo outros autores defendem que esta possa desempenhar um papel primário. Apesar de inúmeras bactérias terem sido implicadas no desenvolvimento deste tipo de dermatite, as evidências mais recentes favorecem a infecção pela C.albicans. CLÍNICA Clinicamente caracteriza-se por um eritema brilhante, confluente com aspecto “envernizado”, que varia de intensidade ao longo do tempo. Por vezes apresentase na forma de pápulas eritematosas associadas a edema e ligeira descamação. Atinge tipicamente as áreas de maior contacto com a fralda “dermatite em W – fig.1”: superfícies convexas das nádegas, coxas, parte inferior do abdómen, pubis, grandes lábios e escroto. As pregas são poupadas. Quando o eritema começa a resolver, a pele torna-se enrugada com aspecto apergaminhado. Em crianças com menos de 4 meses de idade, a primeira manifestação pode ser um ligeiro eritema perianal. Existem dois subtipos morfológicos menos frequentes de dermatite da fralda irritativa primária. Um deles, também conhecido por “ dermatite das marés”, caracteriza-se por um eritema em banda, confinado apenas às margens da fralda na área do abdómen e das coxas. Este tipo de dermatite resulta da fricção constante que ocorre no bordo da fralda, agravada por ciclos consecutivos de humidade e secagem. O outro subtipo, mais severo, conhecido por “dermatite de SevestreJacquet”, manifesta-se por lesões papuloerosivas e úlceras. Atinge mais frequentemente crianças mais velhas. Nos rapazes, as úlceras podem envolver a glande e o meato urinário, causando desconforto e disúria. artigos de revisão 207 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2004, vol. XIII, n.º 3 Pode observar-se exsudação e crostas secundárias a infecção por Staphilococcus aureus. É frequente encontrar-se escoriações e liquenificação traduzindo prurido crónico. É importante salientar que os sinais indirectos de prurido, tais como escoriações, não se desenvolvem antes dos 2 anos de idade. Fig. 1 – Dermatite da fralda Irritativa primária ou Dermatite em “W” (pregas poupadas). Cortesia da Drª Ana Paula Vieira. DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL Os principais diagnósticos diferenciais estão representados nos Quadros I e II 1 - Dermatite de contacto alérgica A verdadeira alergia de contacto às fraldas pode complicar outro tipo de dermatose localizada à área da fralda ou surgir como uma dermatose isolada. É pouco comum em crianças com menos de 2 anos de idade. Deve-se suspeitar desta, quando não se verifica uma resposta após tratamento adequado. Embora seja pouco habitual, pode ocorrer após contacto da pele com determinados alergénios, tais como: parabenos, lanolina, compostos mercuriais e neomicina, ou ainda, certas substâncias presentes em fraldas descartáveis (ex: borrachas – fig.2), detergentes ou preparações de aplicação tópica. 2 - Dermatite por candida O ambiente húmido e quente produzido pela fralda favorece a proliferação da C.albicans. Esta pode penetrar o estrato córneo, activar a via alterna do complemento e induzir um processo inflamatório 23. (fig. 3) 208 artigos de revisão A diarreia crónica ou o uso de antibioterapia de largo espectro são duas situações que frequentemente favorecem a infecção por esta levedura. Quando a dermatite se torna crónica ou recorrente é importante pesquisar uma infecção candidiásica do aparelho digestivo (exame da cavidade oral), uma vaginite candidiásica ou uma mastite materna. 3 - Dermatite seborreica É uma doença inflamatória crónica que acomete frequentemente a área da fralda. Atinge preferencialmente as pregas, mas ao contrário da candidíase, não apresenta lesões satélites. (fig.4) Esta dermatite tem um bom prognóstico, resolvendo espontaneamente por volta dos 3 a 6 meses de idade. 4 - Dermatite atópica A dermatite atópica poupa geralmente a área da fralda, apesar dos atópicos serem mais susceptíveis a reacções irritantes. Quando atinge a área da fralda, manifesta-se de forma semelhante à dermatite irritante primária, contudo o eritema tende a ser crónico e refractário ao tratamento. 5 - Psoríase A psoríase é rara em crianças. Quando surge no 1ª ano de vida, geralmente inicia-se pela área da fralda. Este facto deve-se ao fenómeno de Koebner, secundário ao uso desta. (fig.5) 6 - Dermatite das fraldas mista Muitas vezes, vários destes tipos de dermatites ocorrem em simultâneo, tornando o diagnóstico bastante difícil. A dermatite irritativa primária é frequentemente complicada pela infecção por C.albicans, podendo alterar desta forma, o aspecto clínico do rash. Se o rash for severo e tiver mais de 3 dias de evolução é prudente associar corticóides de baixa potência com um antifúngico da classe dos imidazóis , para além de cremes barreira e do aumento do número de mudas de fraldas. Também é difícil despistar uma candidíase nos casos de intertrigo ou de dermatite seborreica com atingimento primário das pregas. Neste tipo de dermatites, principalmente na dermatite atópica, existe o risco de infecção bacteriana secundária. Assim, quando surgem bolhas ou crostas deverse-á considerar a possibilidade de uma infeccão por Staphilococcus aureus. A psoríase pode desenvolver-se ou ser precipitada por uma dermatite préexistente. Nestes casos, a apresentação clínica pode ser da dermatite subjacente. Dermatites menos frequentes: 7 - Histiocitose de células de Langerhans (doença de Letterer-Siwe) A histiocitose de células de Langerhans pode manifestar-se por atingimento da área da fralda. Embora seja uma NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2004, vol. XIII, n.º 3 Quadro I Principais diagnósticos diferenciais da dermatite das fraldas DERMATITE MORFOLOGIA LOCALIZAÇÃO HISTÓRIA IRRITATIVA PRIMÁRIA (DERMATITE em W) Eritema brilhante, confluente, c/ aspecto envernizado que evolui para pele enrugada c/ aspecto apergaminhado.Por vezes pápulas eritematosas associadas a edema e ligeira descamação. Superfícies convexas das nádegas, coxas, parte inf. abdómen, pubis, grandes lábios, escroto. Poupa as pregas CONTACTO ALÉRGICA Eritema, vesículas exsudativas que evoluem para descamação CANDIDIÁSICA É das dermatites mais características. Eritema vermelho-vivo com descamação periférica ou pústulas satélites. Quando envolve os genitais, existe um eritema confluente envolvendo todo o escroto ou grandes lábios. Muito raramente, presença de reacção psoriasiforme cutânea generalizada c/ pústulas satélites (patogénese desconhecida). Placas descamativas, bem delimitadas, tonalidade salmão. Presença de escamas gordas amareladas. Pode associar-se a fissuração, exsudação com formação de crosta. Sup. convexas (geralmente complica uma dermatose irritativa pré-existente) Pode haver envolvimento marcado das pregas ( principalmente se a sensibilização ocorrer a preparações tópicas). Pregas cutâneas Rash que evolui por surtos . Hx de diarreia recente. Uso de cuecas de plástico. Muda de fraldas pouco frequentes. Ausência de resposta clínica aos tratamentos clássicos SEBORREICA Pregas cutâneas c/ envolvimento posterior das sup. convexas, envolvimento do couro cabeludo, face, pregas retroauriculares, axilas, pescoço e umbigo. ATÓPICA Semelhante à dermatite irritativa primária. Pode associar-se a escoriações, liquenificação e crostas. Lesões de eczema atópico extra-área da fralda ( bochechas, prega antecubital e poplítea). PSORIÁTICA Placas eritematodescamativas (mais eritematosas do que descamativas), bem delimitadas, de diferentes dimensões. A descamação é menos frequente. Sup. convexas das nádegas e pregas inguinais. Quando há atingimento das pregas inguinais, é frequente o atingimento simultâneo das axilas e do pescoço. MILIÁRIA 1) miliária cristalina: vesículas pequenas superficiais sem associação a eritema. 2) Miliária rubra (pustulosa): aglomerados de micropápulas eritematosas e micropústulas não – foliculares. Toda a área da fralda TESTES DIAGNÓSTICOS Nenhum Testes epicutâneos Antibioterapia. Diarreia. Pesquisar atingimento concomitante da cavidade oral. Exame micológico c/ KHO, evidenciando pseudohifas ( colhido na periferia do rash ou em pápula ou pústula periférica ). Assintomáticas, raramente queixas de prurido Surge após o nascimento ( nos 1os 3 meses – média 3-6 semanas). Geralmente c/ boa resposta ao tratamento. Hx familiar de atopia.Dermatite crónica.Prurido intenso (sinal cardinal). Evolução crónica. Resistência aos tratamentos c/ corticóides de baixa potência. Hx familiar de psoríase ou placas c/ escama brancoprateada ou ponteado ungueal. Nenhum Lesões c/ características semelhantes na face, pescoço e axila. Hx de febre, temperatura ambiente elevada, uso de pomadas oclusivas ou calças plásticas. Pústulas estéreis. Coloração pelo Gram evidenciando a presença de PMNs, mas não de bactérias. Nenhum Nenhum artigos de revisão 209 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2004, vol. XIII, n.º 3 Quadro II Principais diagnósticos diferenciais da dermatite das fraldas DERMATITE MORFOLOGIA LOCALIZAÇÃO HISTÓRIA ESCABIOSE Pápulas, vesículas e pústulas pruriginosas, associadas a lesões de eczema, escoriações e crostas. As galerias (erosões lineares) são patognomónicas. Podem aparecer nódulos eritemato acastanhados, infiltrados, principalmente nas virilhas, nádegas e genitália. História familiar ou dos contactantes mais próximos, de prurido cutâneo intenso. IMPETIGO BOLHOSO Bolhas flácidas, grandes, que surgem em pele aparentemente normal. Após ruptura da bolha, surgem erosões vermelhas e húmidas c/ formação posterior de crostas melicéricas. Pode ocorrer disseminação rápida para outros locais do corpo. Eritema vivo, bem demarcado, perianal. Pode ocorrer fissuração peri-rectal. Área da fralda + espaços interdigitais, punhos, prega antecubital, axila, aréola, periumbilical, abdómen inferior, genitais e nádegas. Em crianças pode haver atingimento concomitante das palmas, plantas, cabeça, face e pescoço. Múltiplas lesões envolvendo as coxas, nádegas e abdómen inferior. ESTREPTOCÓCICA PERI-ANAL TESTES DIAGNÓSTICOS Exame microscópico directo das lesões suspeitas. Coloração pelo Gram e cultura. História de prurido e dor durante a defecação. História familiar de faringites streptocócicas de repetição. Cultura de zaragatoa peri-anal. GRANULOMA GLÚTEO INFANTIL Nódulos duros, indolores, eritematoa castanhadas a violáceos c/ cerca de 0.5-4 cm. O edema duro pode assemelhar-se a um linfoma ou sarcoma de kaposi Nádegas, face interna das coxas, parte inferior do abdómen. Também áreas extra-fralda: axilas e pescoço. Evolução de semanas a meses. Podem regredir espontaneamente, deixando cicatrizes atróficas. Biopsia cutânea HISTIOCITOSE DE CEL. DE LANGERHANS Pode iniciar-se por um rash inguinal, semelhante ao da D.seborreica. Evolui para formas mais erosivas. Pregas, espaços retroauriculares, couro cabeludo e tronco. Surge nos 1osanos de vida Resistência aos tratamentos clássicos. Lesões retroauriculares, nomeadamente pápulas infiltradas amareloavermelhadas e eritema descamativo do couro cabeludo e tronco. Petéquias e atrofia da epiderme. Nódulos purpúricos das palmas e plantas. Manifestações sistémicas: febre, anemia, diarreia, trombocitopenia, hepatoespleno megalia, linfadenopatia e tumores esqueléticos. Biopsia cutânea ACRODERMATITE ENTEROPÁTICA Erupção eczematosa vesicobolhosa ou placas descamativas, bem demarcadas: pregas da área da fralda, periocular, perinasal, perioral e extremidades distais. Se evolução crónica pode surgir liquenificação ou placas psoriasiformes. Periorificial e acral. História familiar AR. Nas formas adquiridas:prematuros c/ alimentação parentérico prolongado-Má-nutrição Fotofobia, diarreia, alopécia, distrofia ungueal, irritabilidade, apatia. Níveis plasmáticos de zinco baixos. Níveis de fosfatase alcalina baixos (metaloenzima dependente de zinco). SIFILIS CONGÉNITA Lesões elevadas, húmidas, semelhantes a verrugas (condiloma lata) associadas a erosões húmidas. Região anogenital Presente no nascimento ou nos 3 1osmeses de vida. Pode estar presente uma erupção eritematosa papuloes camosa semelhante à sífilis 2 ária. Serologia ( VDRL / TPHA ) + exame de microscopia de fundo escuro evidenciando espiroquetas. INFECÇÃO POR VIH Dermatite erosiva das fraldas associada a úlcera glútea profunda (pode constituír a 1ª manifestação da infecção) 210 artigos de revisão NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2004, vol. XIII, n.º 3 11 - Impetigo bolhoso O ambiente húmido e quente da área da fralda constitui um factor de predisposição para o desenvolvimento do impetigo bolhoso. Esta infecção é muito frequente em recém-nascidos em que o umbigo se encontra habitualmente colonizado por Staphilococcus aureus. É causada pelo Staphilococcus aureus tipo II que produz uma toxina epidermolítica responsável pela separação das camadas superiores da epiderme. Figura 2 - Dermatite de Contacto Alérgica à borracha do sistema anti-fuga da fralda. doença rara e fatal, deve ser considerada na presença de uma dermatite de aspecto inicial semelhante ao da dermatite seborreica de tratamento difícil. Surge geralmente nos primeiros anos de vida, mas também pode desenvolver-se em crianças com mais de 3 anos de idade. A biopsia cutânea é fundamental. 8 - Acrodermatite enteropática É uma doença rara suspeitada na presença de um rash da fralda atípico ou persistente. Existem 2 formas, uma de transmissão autossómica recessiva e outra adquirida e transitória. Na primeira, existe um defeito congénito na absorção gastrointestinal de zinco. As primeiras manifestações surgem quando termina o aleitamento materno, dado que este contém proteínas que transportam o zinco. A forma adquirida, resulta de uma deficiente ingestão de zinco. Esta situação pode ocorrer em crianças desnutridas, prematuros alimentados por via parentérica por períodos prolongados ou durante o aleitamento materno em mães com níveis de zinco baixos. A doença responde rapidamente aos suplementos de zinco, geralmente ao fim de 24 horas. Na presença de erupções periorificiais com características da A. enteropática, o diagnóstico diferencial deve incluir a deficiência de biotina e a fibrose cística. 9 - Doença estreptocócica perianal É uma doença frequentemente esquecida pelas suas manifestações clínicas muito subtis. É geralmente confundida com a dermatite irritativa primária, a candidíase peri-anal ou com a psoríase. Manifesta-se por uma infecção superficial, causada pelo Streptococcus beta-hemolítico do grupo A. 10 - Granuloma glúteo infantil É uma erupção nodular rara que pode ocorrer numa área pré-existente de dermatite irritativa primária. A etiologia é desconhecida, contudo por surgir frequentemente em área de dermatite da fralda, pensa-se que poderá representar uma resposta cutânea localizada, a um processo inflamatório prolongado. Não há evidências de relação entre a severidade da dermatite da fralda e a incidência desta erupção. O granuloma glúteo pode surgir mesmo após resolução da dermatite das fraldas. 12 - Miliária Atinge frequentemente a área da fralda devido ao seu ambiente tropical. Esta situação resulta do bloqueio na secreção das glândulas sudoríparas écrinas causado pelo calor e humidade. A miliária cristalina é mais frequente no recém-nascido e manifesta-se por pequenas vesículas superficiais não associadas a eritema. A miliária rubra ou pustulosa é mais frequente em crianças mais velhas e caracteriza-se por aglomerados de micropápulas eritematosas e micropústulas não-foliculares. Neste tipo de miliária é importante despistar uma pustulose estafilocócica. 13 - Escabiose O diagnóstico de escabiose deve ser considerado quando ocorrem pápulas, vesículas ou pústulas pruriginosas na área da fralda. Geralmente estas lesões surgem associadas a lesões de eczema, escoriações e crostas. 14 - Outras doenças vesicobolhosas Outras doenças sistémicas raras que podem manifestar-se por lesões vesiculares e bolhosas da área da fralda são a varicela, o herpes simplex, a doença mão-pé-boca, algumas dermatoses bolhosas crónicas da infância, a mastocitose bolhosa, a incontinência pigmentar e a epidermólise bolhosa. O diagnóstico é feito com base na morfologia e topografia das lesões. artigos de revisão 211 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2004, vol. XIII, n.º 3 15 - Sífilis congénita Dada a incidência crescente da sífilis, a sífilis congénita deve ser incluída nos diagnósticos diferenciais de uma dermatite da fralda. 16 - Vírus da imunodeficiência humana (VIH) Uma dermatite da fralda severa pode constituir a primeira manifestação de uma infecção pediátrica pelo VIH. Figura 3 - Dermatite por Cândida. Figura 4 - Dermatite seborreica da área da fralda. Figura 5 - Psoríase. 212 artigos de revisão PREVENÇÃO A prevenção e o tratamento da dermatite da fralda irritativa primária engloba um conjunto de medidas que têm como principais objectivos manter esta área seca, limitar a mistura e dispersão da urina e das fezes, reduzir o contacto com a pele, evitar irritação e maceração e manter, sempre que possível, um pH ácido. Por definição, não existe dermatite das fraldas em crianças que não usam fraldas, assim a remoção da oclusão, permanece a melhor e mais antiga medida na prevenção e tratamento desta situação. As medidas preventivas incluem a eliminação ou minimização de todos os factores implicados na etiopatogenia desta entidade. Assim existem 5 aspectos fundamentais na prevenção da dermatite das fraldas: Frequência da troca de fraldas. A fralda deve ser mudada, sempre que possível, após a criança defecar ou urinar. Em recém-nascidos a troca deve ser horária, enquanto nas restantes crianças com 3 a 4 horas de intervalo 1. Capacidade de absorção das fraldas. Hoje em dia, a maioria das fraldas comercializadas contêm um material acrílico em gel superabsorvente, eficaz em manter a área da fralda seca e em meio ácido. Contudo isto não deve constituir um estímulo para os pais manterem a mesma fralda por períodos mais longos. Controlo de infecções. A C.albicans contamina frequentemente a dermatite da fralda. A infecção por esta levedura deve ser considerada em der- NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2004, vol. XIII, n.º 3 matites com mais de 3 dias de evolução 24 . Fraldas descartáveis versus fraldas de pano. As fraldas descartáveis superabsorventes são as que possuem maior capacidade de manter a área da fralda seca 25. Em 3 estudos, em que foram comparadas fraldas descartáveis superabsorventes com fraldas de pano, foi demonstrado que as primeiras produzem um número significativamente menor de eritema 26,27,28. Não foram descritas ainda reacções alérgicas ao material absorvente contido nas fraldas descartáveis 25. Apesar disso vários autores dão preferência às fraldas de pano pela menor oclusão que estas provocam 29. Higiene diária. A higiene da área da fralda com água morna e algodão, sem recorrer a sabonetes, é suficiente na limpeza diária. Quando são utilizados sabões suaves, estes não deverão ser aplicados mais do que 2 vezes por dia 1. Apesar dos toalhetes de limpeza serem práticos e libertarem um cheiro agradável, não são recomendados pela maioria dos autores. Após cada muda de fralda, deverá ser aplicada uma pasta protectora ou um emoliente. As pastas são constituídas pela mistura de pós ( ex: óxido de zinco, amido, dióxido de titânio) com gorduras (ex: vaselina e parafina ). Aderem bem à pele, têm boa capacidade de absorção e reduzem a maceração. Desconhece-se se os aditivos presentes em alguns cremes barreira (ex: vitaminas) melhoram a sua qualidade, embora sejam conhecidas reações de sensibilização tanto irritativas como alérgicas. cremes barreira, poder-se-á adicionar um creme com acção anti-candida ( ex: nistatina ou imidazol). 2. Se o eritema persistir pode-se associar um corticóide de baixa potência (ex: hidrocortisona a 1%) no máximo 2 vezes por dia. Corticóides de potência, mais elevada estão contra-indicados pelo risco aumentado de atrofia e de estrias, além de que o efeito oclusivo da fralda aumenta a potência do corticóide aplicado. 3. Em dermatites severas e prolongadas, podem ser utilizados alcatrões em pomada. Em alguns países o seu uso está contra-indicado pelos riscos de carcinogénese. 4. Anti-fúngicos orais com acção anti-candida (fluconazol, ketoconazol) podem ser necessários em dermatites difíceis de controlar, tendo como objectivo principal tratar a colonização intestinal por candida. 5. Em situações de infecção bacteriana secundária, podem ser utilizados vários antibacterianos de acordo com a clínica da dermatite. DIAPER DERMATITIS Preparações a ser evitadas Preparações contendo ácido bórico e pó talco (pó de amido) devem ser evitados pelos riscos de toxicidade e de desenvolvimento de granulomas. BIBLIOGRAFIA TRATAMENTO O tratamento médico consiste em medidas simples, ajustadas de acordo com a severidade e o tipo de dermatite. 1. Se uma dermatite não melhora após higiene adequada e aplicação de ABSTRACT Diaper dermatitis is a topographic description of a wide range of inflammatory processes that occur in the area covered by a diaper. The authors describe mainly the primary irritant diaper dermatitis (also called diaper dermatitis) its differential diagnosis and treatment. Nascer e Crescer 2004; 13 (3): 206-214 1 - Wolf R, Wolf D, Tuzun B, Tuzun Y. Diaper dermatitis. Clinics in Dermatology 2000;18:657-660. 2 - Jordan WE, Lawson KD, Berg RW, et al. Diaper dermatitis: frequency and severety among a general infant population. Pediatr Dermatol 1986;3:198-207. 3 - Grant WW, Street L, Fearnow RG. Diaper rashes in infancy. Clin Pediatr 1973;12:714-716. 4 - Jordan WE, Blaney TL. Factors influencing infant diaper dermatitis; in Maibach HI, Boisits EK,eds: Neonatal skin: Structure and function. New York, Dekker, 1982,pt 205-222. 5 - Zahorsky J. The ammoniacal diaper in infants and young children. Am J Dis Child 1915;10:436-40. 6 - Leyden JL, Katz S, Stewart R et al. Urinary ammonia and ammonia-producing microorganism in infants with and without diaper dermatitis. Arch Dermatol 1977;113: 1678-80. 7 - Berg RW. Etiologic factors in diaper dermatitis: A model for development of improved diapers. Pediatrician 1986;14(suppl 1):27-33. 8 - Suskind RR. The effects of wetting on cutaneous vulnerability. Arch Environ Health 1965;11:529-537. 9 - Zimmerer R, Lawson KD, Calvert CJ. The effects of wearing diapers on skin. Pediatr Dermatol 1986;3:95-101. 10 - Berg RW, Buckingham KW, Stewart RL. Etiologic factors in diaper dermatitis: the role of urine. Pediatr Dermatol 1986;3:102-106. 11 - Orange AP, de Waard-Van der Spek FB. Comparison of cloth and superabsorvent paper diapers for preventing diaper dermatitis. Eur J Pediatr Dermatol 1991;1:225-32. 12 - Bonifazi E. Napkin dermatitis: causative factors. In: Harper J, Orange A, Prose N, ed. Textbook of Pediatric Dermatology. Oxford: Blackwell Sciences, 2000;140. 13 - Rodriquez JT, Abdo J, Flores N et al. The role of bile acids in the genesis of diaper rash. Pediatr Res 1976;10:359. 14 - Larrégue M, Gallet P, Rat JP et al. Wshaped napkin rash in infants. Dermatologica 1975;151:104-12. 15 - Noble WC. Microbiology of human skin. In: Rook A, ed. Major problems in dermatology, vol.2, 2nd ed. London: LloydLuke Medical Books, 1981:330-1. 16 - Leyden J, Kligman A. The role of microorganisms in diaper dermatitis. Arch Dermatol 1978;114:56-9. 17 - Gokalp A, Aldirmaz C, Oguz A, et al. Relation between the intestinal flora and diaper dermatitis in infancy. Trop Geogr Med 1990;42:238-40. artigos de revisão 213 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2004, vol. XIII, n.º 3 18 - Lopez Martinez R, Ruiz-Maldonado R. Candidiasis in children with diaper rash. Study of 140 cases. Med Cutan Ibero Lat Am 1982;10:225-30. 19 - Rebora A, Leyden J. Napkin dermatitis and gastrointestinal carriage of Candida albicans. Br J Dermatol 1981; 105:551-5. 20 - Casamitjana M, Lopez-Martinez R, Ruiz-Maldonado R et al. Bacteriological and mycological study of diaper dermatitis. Rev Latamer Microbiol 1982;24: 211-14. 21 - Dixon PN, Warin RP, English MP. Role of Candida albicans infection in napkin rashes. Br Med J 1969;5:23-7. 22 - Caputo RV. Fungal infections in children. Dermatol Clin 1986;4:137-49. 214 artigos de revisão 23 - Leyden JJ. Diaper dermatitis. Dermatol Clin 1986;4:29-8 24 - Weston W, Lane A, Weston J. Diaper dermatitis: current concepts. Pediatrics 1980;66:532-6. 25 - Orange AP. Management of napkin dermatitis. In: Harper J, Orange A, Prose N, ed. Textbook of Pediatric Dermatology. Oxford: Blackwell Sciences, 2000;153. 26 - Campbell RI, Seymour JL, Stone LC et al. Clinical studies with disposable diapers containing absorvent gelling materials: evaluation of effects on infant skin condition. J Am Acad Dermatol 1987;17:978-87. 27 - Seymour JL, Keswick BJ, Hanifin JM et al. Clinical effects of diaper types on the skin of normal infants and infants with atopic dermatitis. J Am Acad Dermatol 1987;17:988-97. 28 - Wilson PA, Dallas MJ. Diaper performance: maintenance of healthy skin. Pediatr Dermatol 1990;7:179-84. 29 - Wong DL, Brantly D, Clutter LB. Diapering choices: a critical review of the issues. Pediatr Nursing 1992;18:41-54. Correspondência: Natividade Rocha Hospital Geral de St. António Consulta externa de Dermatologia Rua D. Manuel II 4099-001 Porto Telef./Fax: 226097429 e-mail: [email protected]