Quem espera sempre cansa!

Transcrição

Quem espera sempre cansa!
Quem espera sempre cansa!
E S P E R A R. Até o som dessa palavra causa arrepios, incomoda,
é á s p er o! E s p er a r p or a lgu ém , p or a lgu m a cois a , d ever ia s er p r oib id o
por lei. Digo mais, devia ser tratado como crime inafiançável. Em minha
op in iã o é a a titu d e m a is d ifícil p a r a qu a lqu er s er h u m a n o qu e s e ja
minimamente h u m a n o. E s p er a r a lgu ém , p r in cip a lm en te, ger a u m a
a n s ied a d e qu e en ven en a o or ga n is m o. Nã o s ou m éd ico, m a s ten h o
cer teza d e qu e n ã o é s a u d á vel es p er a r . A d es ca r ga d e s u b s tâ n cia s (n ã o
s ei qu a n t a s n em qu a is ) qu e o n os s o cor p o s u p or ta d u r a n te a es p er a s ó
p od e s er a lta m en te p r eju d icia l a o s eu fu n cion a m en to. S ã o h or m ôn ios ,
fer om ôn ios , d em ôn ios , en fim , tod os os ônios qu e a ciên cia con h ece, e
provavelmente alguns que ela desconhece também!
Quem n ã o con cor d a comigo n u n ca es p er ou , apaixonado, p or
alguém. Digo a p a ixon a d o p or s a b er qu e es s e tip o d e es p er a é o m a is
leta l, o m a is d eva s ta d or . E n qu a n to es p er a m os p rovoca m os u m a r evolta
s ilen cios a (à s vezes n em ta n to) em m eia d ú zia d e á r ea s vita is . O
primeiro a sofrer é o estômago, que forma um buraco sem fundo bem no
m eio, p r ovoca n d o â n s ia d e vôm ito. A ca b eça gir a en lou qu ecid a com o
u m p iã o. O p eito a r qu eja , ofega n te, qu eren d o exp lod ir . As m ã os
u m ed ecem , tr em em , fa zem m ovim en tos d es con exos , s em s en tid o. O p é,
m a is d a s vezes , b a te n u m r itm o a lu cin a d o em qu a lqu er s u p er fície qu e
p os s a s er vir -lh e d e a p oio. A b oca fica s eca , os lá b ios s e con tr a em ,
fa zem os ca r r a n ca s in volu n ta r ia m en te. É u m ca os ! Com o qu a lqu er ca os ,
d eixa m a r ca s , d em or a p a r a s er a s s im ila d o. Com o is s o p od e s er b om?
Como não pensar em proibir tal desatino?
Ma s r etom em os a id éia in icia l. Pr oib ir a es p er a ter ia vá r ia s
va n ta gen s . Além d a evid en te econ om ia d e flu íd os e s en s a ções , o cor p o
s er ia p ou p a d o d e u m es for ço p a r a o qu a l n u n ca es tá p r ep a r a d o. E vit a r
o d es ga s te d a es p er a s er vir ia p a r a p r olon ga r a vid a ú til, d im in u ir a
exp ecta tiva qu e leva à a n s ied a d e qu e d es á gu a n es s e tor velin h o.
Qu a lqu er m éd ico é ca p a z d e r ecom en d a r u m p r oces s o d e r ela xa m en to
p a r a m elh or a r a s a ú d e, m a s é cu r ios o com o n in gu ém n u n ca p en s ou em
atacar uma das causas principais de estresse, a espera! Não acham que
os p olíticos , tã o cr ia tivos em ou tr a s qu es tões , já d ever ia m ter legis la d o
s ob r e o a s s u n to? Nã o tem ou tr o jeito, é p r ecis o a d ota r u m a a titu d e
r a d ica l p a r a en fr en ta r es s e tor m en to: é p r ecis o p roib ir a es p er a . A p en a
a s er a p lica d a p od er ia s er assim: qu em fiz e s s e es p era r a lgu é m d ev eria
ser con d en ad o a e s p erar o d ob ro d o te m p o! Na s m es m a s cir cu n s tâ n cia s ,
s em d ir eito a r egim e es p ecia l, vis ita , celu la r con tr a b a n d ea d o ou p en a
a lter n a tiva . Pr on to. Bem feito. Qu em m a n d ou n ã o s er p on tu a l? Acham
Injusto? E u n ã o a ch o, é o fa m os o “qu e a vid a te d ê em d ob r o tu d o qu e
m e d es eja s ” a p lica d o a o a to d e es p er a r . E u a ch o lógico, s im p les ,
justíssimo!
Ma s olh a , h a ja p a ciên cia , h a ja a u tocon tr ole! Às vezes a ch o qu e
es p er a r con s egu e m exer com tod os os n os s os m ú s cu los . O esperador,
espera a í? E S PE RADOR? Rep a r em n a com p os içã o d es ta p a la vr a : espera
a d or = esperador, em b lem á tico, n ã o é? O fa to é qu e qu em es p er a não
consegue evitar as carrancas, caras e bocas. A expressão mais comum é
o cen h o fr a n zid o que fa z com qu e o r os t o exib a u m s em b la n te d e p es a r ,
d e p r eocu p a çã o, d e s ofr im en to. Is s o é s ó a p on t a vis ível d o iceb er g, s ó
nós, esperadores con tu m a zes , s a b em os o qu e n os r ói p or d en tr o! Ma s a
qu es tã o é: o qu e fa zem os p a r a evita r , ou a m en iza r , es s es in ter m in á veis
m om en tos ? Fa zem os d e tu d o. S im , fa zem os qu a lqu er cois a , m a s é tudo
em vã o. Com eça m os a ler e p a r a m os . In icia m os u m texto, e n ã o o
ter m in a m os . Mu d a m os o CD n o a p a r elh o d e s om , m a s n ã o p r es ta m os
a ten çã o n em a té à s egu n d a fa ixa . Algu n s , m a is d es es p er a d os , a cen d em
u m ciga r r o com o ou tr o a in d a a ces o n a b oca ! Nã o d is s e qu e er a u m
caos? Nada parece capaz de dar alívio a uma espera!
Apesar de todo o furdúncio sempre é possível beneficiar-se de um,
digamos, efeito cola tera l! Qu a l a m elh or m a n eir a d e con h ecer em
detalhes uma tela de celular? Adivinharam, não é? É verdade, basta que
es teja m os à es p er a d e u m telefon em a . J á p er ceb er a m com o n ã o
con s egu im os tir a r os olh os d o a p a r elh o p or m a is d e d ois ou tr ês
s egu n d os ? Pega m os n o d ito cu jo a tod a a h or a , ver ifica m os o s in a l, a
carga da bateria, o modo de atendimento. Mais dois segundos e abrimos
e fech a m os o m a ld ito mudinho qu e n ã o s e m a n ifes ta ! Olh a m os tod os os
iten s n ova m en te e a in d a m a is u m a vez. Os m a is d eta lh is ta s ch ega m a
pegar o m a n u a l d e in s tr u ções p a r a ver s e h á a lgu m a fa lh a qu e p os s a
ser reparada ou um modo que faça o maldito induzir a ligação esperada.
É u m in fer n o! Dep ois d e h or a s olh a m os o r elógio p a r a con s ta ta r qu e
não se passaram mais que cinco minutos. Isso lá é vida gente?
E qu a n d o es p er a m os a lgu ém n u m loca l p ú b lico? Ah , m a s é u m
d r a m a ! An d a m os d e u m la d o p a r a ou tr o, olh a m os o r elógio n a ten ta tiva
d e a p r es s a r o p a s s o d os p on teir os , s im u la m os a ten d er o celu la r (p a r a
a ju d a r a m a ta r o tem p o qu e n ã o qu er em os ter ), con ta m os os
qu a d r a d in h os cer â m icos d a ca lça d a , u m a e ou tr a vez, e a in d a m a is
u m a p a r a con fer ir a s om a , p rova d os n ove e tu d o! Na d a . Nã o a d ia n t a . A
p es s oa n u n ca ch ega ! Olh a m os p ela cen tés im a vez o loca l p or on d e ela
dever ia ch ega r . Ten ta m os en xer ga r em qu em p a s sa p or p er to, tr a ços
qu e n os levem a identificar a p es s oa qu e es p er a m os . Tentamos
encontrar a lter n a tiva s d e ch ega d a , n ova s r ota s , ca m in h os qu e n ã o
conhecemos. Qu em s a b e ela vem p elo ou tr o la d o? Ta lvez já ten h a
chegado e está no toalete! É uma loucura, um desperdício de tempo que
nos come por dentro, como doença ruim.
Ma s o p ior é qu a n d o es p er a m os n os s a p a ixã o. Aí é o fim d o
m u n d o, é im p os s ível ter qu a lqu er con tr ole s ob r e n os s o cor p o. Pa r ece
que tudo entra em convulsão, em choque, em conflito! Mas sabe o que é
p ior ? É qu e fica m os in ven ta n d o d es cu lp a s p a r a o a tr a s o, tod a s ela s
p r on ta m en te r ecu s a d a s p ela n os s a a n s ied a d e. Ten ta m os en con tr a r
m otivos r a zoá veis , m a s tu d o qu e con s egu im os é n os d es es p er a r a in d a
mais.
Nu m d eter m in a d o m om en to, quase em p â n ico, r es olvem os u s a r o
qu e n os r es ta d e d ign id a d e e p en s a m os : “qu a n d o ela ch ega r , vou fica r
d e ca r a a m a r r a d a , qu em s a b e xin ga r e gr ita r tod a a m in h a r a iva . Desta
vez n ã o t em p er d ã o!”. Pela ú ltim a vez n a qu ele s egu n d o olh a m os o
r elógio e p er ceb em os qu e ela es tá m en os d e vin te m in u tos a tr a s a d a ,
m a s n ã o a d ia n ta , n os s o cor p o, p r os tr a d o, exa u s to, n ã o con s egu e m a is
disfarçar o sofrimento de horas de espera interminável.
De r ep en te, lá vem ela , ca m in h a n d o com p a s s os len tos (p elo
m en os é o qu e p a r ece). Com u m s or r is o a m a r elo es ta m p a d o n o r os to,
d iz a n tes d e qu a lqu er ou tr a cois a : “n ã o es tou m u ito a tra s a d a , n é?”.
“Cla ro qu e n ão, a m or”, r es p on d em os s em con s egu ir d is fa r ça r a a legr ia
d e vê-la p or p er to, “claro qu e n ão, a ca b e i d e ch egar, es ta v a a qu i
distraído, curtindo a paisagem”!
Defin itiva m en te, es p er a r a lgu ém d ever ia s er p r oib id o p or lei.
Con s id er a d o cr im e in a fia n çá vel, m a s fico p en s a n d o: e a qu eles qu e n ã o
têm n in gu ém p a r a es p er a r ? Nã o s er á ca s tigo m a ior ? Ha ver á cois a p ior
d o qu e es p er a r a qu ela qu e n ã o tem os ? S er á qu e is s o n ã o é qu a s e u m a
es p er a p or n ós m es m os ? E com o s en tir s a u d a d e d e qu em n ã o
con h ecem os ? E s ofr er d e a n s ied a d e p or a lgu ém qu e n em exis te?
Pen s a n d o m elh or , es p er a r a lgu ém , p r in cip a lm en te s e es s e a lgu ém
for a nossa paixão, não é tão ruim assim!
Mas qu e es p er a r fa z m a l a o s er h umano, lá is s o fa z! Devia s er
proibido por lei, como crime inafiançável.
This document was created with Win2PDF available at http://www.win2pdf.com.
The unregistered version of Win2PDF is for evaluation or non-commercial use only.
This page will not be added after purchasing Win2PDF.