4 Vol XVII 2008 - Revista Nascer e Crescer
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4 Vol XVII 2008 - Revista Nascer e Crescer
Vol. 17, nº 4, Dezembro 2008 17| 4 Revista do Hospital de Crianças Maria Pia Ano | 2008 Volume | XVII Número | 04 www.hmariapia.min-saude.pt Directora | Sílvia Álvares; Directora Adjunta | Inês Moreira; Presidente do CA do Centro Hospitalar do Porto, EPE | Fernando Sollari Allegro Corpo Redactorial | Amélia José; Ana Cristina Cunha; Artur Alegria; Carlos Enes; Carmen Carvalho; Conceição Mota; Esmeralda Martins; Inês Lopes; Laura Marques; Margarida Guedes; Maria do Carmo Santos; Miguel Coutinho Editores especializados | Artigo Recomendado – Maria do Carmo Santos; Tojal Monteiro. Perspectivas Actuais em Bioética – Natália Teles. Pediatria Baseada na Evidência – Luís Filipe Azevedo; Altamiro da Costa Pereira. Ciclo de Pediatria Inter-Hospitalar do Norte – Sofia Aroso; Rogério Mendes; Helena Jardim; Virgílio Senra; Fernanda Manuela Costa; Fátima Santos; Armando Pinto; Joaquim Cunha; Susana Tavares; Sónia Carvalho; Conceição Santos Silva. Caso Endoscópico – Fernando Pereira. 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Dunn (Bristol) Correspondentes - Almerinda Pereira (H.Braga) - António Lima (H.O.Azeméis); - Arelo Manso (C.H.Trás-os-Montes e Alto Douro); - Arlindo Oliveira (H.Ovar); - Braga da Cunha (C.H.Tâmega e Sousa); - Dílio Alves (H.P.Hispano); - Gama Brandão (Guimarães); - Gonçalves Oliveira (C.H.Médio Ave) - Gualdino Silva (H.Barcelos); - Guimarães Dinis (C.H.Médio Ave); - Henedina Antunes (H.Braga); - Joana Moura (H.Viana do Castelo); - Jorge Moreira (C.H.Póvoa Varzim / Vila do Conde); - José Amorim (C.H.Alto Minho); - José Carlos Sarmento (C.H.Tâmega e Sousa); - José Castanheira (H.Viseu); - José Matos (C.H.Trás-os-Montes e Alto Douro); - Lopes dos Santos (H.P.Hispano); - Manuel Reis (H.Amarante); - Óscar Vaz (C.H.Nordeste); - Pedro Freitas (H.Guimarães); - Reis Morais (H.Chaves) - Ricardo Costa (H.Covilhã); Rua da Boavista, 713 – 4050-110 PORTO Tel. 222 081 050 [email protected] NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia índice ano 2008, vol XVII, n.º 4 número4.vol.XVII 223 Editorial 224 Artigos Originais Sílvia Álvares Hábitos de Exposição ao Ecrã de uma População Pediátrica de uma Área Urbana Margarida Figueiredo, Catarina Sousa, Carla Teixeira, Fátima Pinto 228 Síndrome de Guillain-Barré: A Realidade de Um Centro Hospitalar Maria José Dinis, Marta Vila Real, Fátima Santos 233 Casos Clínicos Síndrome de Encefalopatia Posterior Reversível (PRES) Diana Gonzaga, Lúcia Gomes, Guilhermina Veloso, Tiago Correia, Sónia Alves, Cláudia Pereira, Paula Matos, Marta Pinho, Rui Almeida 237 Dermatite Estreptocócica Perianal Sónia Fernandes, Nelea Afanas, Luísa Tavares, José Castanheira 240 Artigos de Revisão Hemorragia Uterina Disfuncional na Adolescência Carla Laranjeira, Susana Soares, Elsa Pereira, Delfina Coelho, Cristina Ferreira, Susana Peres 245 Artigo Recomendado 247 249 Perspectivas Actuais em Bioética Tojal Monteiro Maria do Carmo Santos Comissões de Ética – o Desafio Metodológico Daniel Serrão 253 Pediatria Baseada na Evidência Avaliação Crítica e Implementação Prática de Revisões Sistemáticas e Estudos de Meta-Análise Luís Filipe Azevedo, Altamiro da Costa Pereira NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 262 Qual o seu Diagnóstico? Caso Endoscópico Fernando Pereira 264 Caso Estomatológico José M. S. Amorim 266 Imagens Filipe Macedo 268 Genes, Crianças e Pediatras Miguel Gonçalves Rocha, João Silva, Ana Maria Fortuna, Gabriela Soares 270 Pequenas Histórias Momentos Zen na Vida Quotidiana... Margarida Reis Lima 271 Índice de Autores 272 Índice de Assuntos 275 Agradecimentos NASCER E CRESCER summary revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 number4.vol.XVII 223 Editorial 224 Original Articles Sílvia Álvares Media Exposure of a Paediatric Population in an Urban Health Care Centre Margarida Figueiredo, Catarina Sousa, Carla Teixeira, Fátima Pinto 228 Guillain-Barré Syndrome: The reality of an Hospital Center Maria José Dinis, Marta Vila Real, Fátima Santos 233 Clinical Cases Posterior Reversible Encephalopathy Syndrome (PRES) Diana Gonzaga, Lúcia Gomes, Guilhermina Veloso, Tiago Correia, Sónia Alves, Cláudia Pereira, Paula Matos, Marta Pinho, Rui Almeida 237 Perianal Streptococcal Dermatitis Sónia Fernandes, Nelea Afanas, Luísa Tavares, José Castanheira 240 Review Articles Dysfunctional Uterine Bleeding in Adolescence Carla Laranjeira, Susana Soares, Elsa Pereira, Delfina Coelho, Cristina Ferreira, Susana Peres 245 Recommended Article 247 249 Current Perspectives in Bioethics Tojal Monteiro Maria do Carmo Santos Ethics Commissions – The Methodology Challenge Daniel Serrão 253 Evidence Based Paediatrics Critical Appraisal and Practical Implementation of Systematic Reviews and Meta-Analysis Luis Filipe Azevedo, Altamiro da Costa Pereira NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 262 What is your diagnosis? Endoscopic Case Fernando Pereira 264 Oral Pathology Case José M. S. Amorim 266 Images Filipe Macedo 268 Genes, Children and Paediatricians Miguel Gonçalves Rocha, João Silva, Ana Maria Fortuna, Gabriela Soares, 270 Short Stories Zen Moments in the Daily Life... Margarida Reis Lima 271 Author Index 272 Subject Index 275 Acknowledgements NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 editorial A “crise” anunciada chegou. Os media confrontam-nos diariamente com o aumento do desemprego, as falências, os pobres a ficarem mais pobres, os ricos menos ricos…O crescimento da pobreza é inevitável. A pobreza e a doença estão intimamente relacionadas: a doença é simultaneamente uma causa e um efeito da pobreza. Quer seja definida pelo rendimento, estado sócio-económico, condições de vida ou nível de educação, a pobreza constitui um determinante major da doença, estando associada a menor esperança de vida, maior mortalidade infantil, maior risco de doenças infecciosas (particularmente tuberculose e SIDA), maior tabagismo, abuso de álcool e drogas, maior prevalência de doenças, depressão, suicídio, comportamentos antisociais e violência e maior risco de exposição ambiental. Relativamente à criança em particular a pobreza afecta não só o estado de saúde mas também as suas capacidades cognitivas e de desenvolvimento: os indivíduos provenientes de classes economicamente mais desfavorecidas têm menos competências profissionais e sociais, o que diminui à partida a sua probabilidade de sucesso. Os objectivos da política comunitária em matéria de saúde e de pobreza são, entre outros, assegurar um acesso equitativo aos serviços de saúde e investir no desenvolvimento de determinados bens públicos mundiais, como a investigação e o desenvolvimento. A investigação clínica revela-se fundamental no esclarecimento de etiologia e epidemiologia dos novos padrões de doença e, consequentemente, na sua prevenção. Tomemos, como exemplo, a prevalência crescente da prematuridade, que se traduz num aumento da deficiência e de atraso do desenvolvimento da criança. Não conhecendo a causa, não podemos combate-la eficazmente. No entanto, quando falamos em investigação apercebemo-nos que a maioria dos projectos financiados estão associados à pesquisa laboratorial. Não há dúvida que a evolução da genética molecular e da ciência e tecnologia em geral têm trazido desenvolvimentos fundamentais para o diagnóstico e tratamento das doenças. Mas não parece justo que os projectos na área clínica sejam menosprezados relativamente a outras áreas do conhecimento. Bem sei que “é muito mais fácil experimentar com ratos”, mas “será que já não os tratamos o bastante”? Neste ano de 2009 que se avizinha difícil, esperamos que esta publicação possa contribuir para alertar para a defesa do direito à saúde da criança e adolescente (o acesso e a equidade aos cuidados de saúde, o atendimento em ambiente pediátrico e de acordo com o grupo etário, uma abordagem multidisciplinar envolvendo outros agentes da comunidade nomeadamente a reabilitação, a educação e os serviços sociais, o direito à escolha informada e a uma segunda opinião, o respeito pela criança e família) e, por outro lado, incentivar à investigação clínica na área da pediatria. Este é um apelo de colaboração a todos os profissionais e em particular das administrações hospitalares para uma tomada de consciência da importância desta matéria. A estas compete integrar, promover e desenvolver esta área na missão das instituições. Silvia Álvares A National Agenda for America’s Children and Adolescents in 2008: Recommendations from the 15th Annual Public Policy Plenary simposium, Annual Meeting of the Pediatric Academic Societies. Pediatrics, 122 (4):843 editorial 223 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 Hábitos de Exposição ao Ecrã de uma População Pediátrica de uma Área Urbana Margarida Figueiredo1, Catarina Sousa1, Carla Teixeira1, Fátima Pinto1 RESUMO Introdução: A televisão e outros meios audiovisuais podem ser benéficos mas o seu uso excessivo pode relacionar-se com alterações físicas e comportamentais. O tempo que crianças e adolescentes “perdem” em frente ao ecrã deveria preocupar pais e pediatras. Objectivos: Avaliação dos hábitos de exposição ao ecrã de uma população saudável de crianças e adolescentes. Material e métodos: Aplicação de questionário sobre hábitos de exposição ao ecrã, a pais de crianças e a adolescentes seguidos na consulta de Pediatria de um centro de saúde urbano. Resultados: Foram realizados 106 inquéritos. Aproximadamente 22% das crianças tinham mais de 2 anos quando começaram a ver televisão, cerca de 7% tinha uma televisão tendo as restantes duas ou mais, mais de metade tinha televisão no quarto, 64% tinha televisão no local onde eram feitas as refeições (88% tinham-na ligada enquanto comiam), 28% assistia menos de uma hora diária de televisão durante a semana (ao fimde-semana esta percentagem diminuía para 4,7%). O tempo total de exposição ao ecrã contabilizava 2 ou mais horas em 54%. O tipo de programas mais visto era desenhos animados e telenovelas. Aproximadamente 32% passava menos de uma hora diária em actividade desportiva e 50% despendia menos de uma hora diária a ler. Conclusões: Na população estudada, verificou-se excesso de tempo lúdico preenchido com meios audiovisuais em detrimento de outras actividades. O co__________ 1 Consulta de Pediatria, Centro de Saúde da Carvalhosa / Foz do Douro 224 artigos originais nhecimento dos hábitos de exposição ao ecrã permite um reajuste da informação a dar aos pais na consulta de vigilância infantil. Palavras-chave: ecrã, televisão, media, criança, adolescente Nascer e Crescer 2008; 17(4): 224-227 INTRODUÇÃO A televisão é o meio de comunicação mais difundido na sociedade moderna sendo também o de mais fácil acesso à criança e ao adolescente. Os benefícios da exposição aos media electrónicos (TV, Vídeo, DVD, computador) são alguns mas existem potenciais riscos que não podem ser ignorados(1-5). Estes entretêm, informam e acompanham mas podem ter consequências indesejáveis na saúde pública. O tempo passado em frente à televisão é subtraído a actividades importantes, tais como a leitura, os trabalhos escolares, os jogos, a interacção com a família, o desenvolvimento social e a criatividade(2-4). Segundo a bibliografia consultada, a maioria das crianças gasta cerca de 3 horas diárias (21 horas semanais) a ver televisão e 64% a 100% fazem-no antes dos dois anos de idade.(2-5) Este tempo, quando incluído ao despendido com DVD/vídeo, jogos de consola ou computador, aumenta para 5 horas diárias (35 horas semanais). Nesta actividade, os jovens assistem a 10.000 actos violentos por ano e a cerca de 15.000 actos com referências de carácter sexual dos quais apenas 15% alerta para o risco de Doenças Sexualmente Transmissíveis ou gravidez indesejada e somente 1% tem um objectivo preventivo.(6) Ainda que alguns dos programas televisivos possam ser do tipo educativo, estes são geralmente preteridos pelas crianças e adolescentes que preferem os de carácter apenas recreativo ou de audiências gerais que dispensam maior nível de concentração. (2-5) A exposição aos media aumenta ainda nas situações de depressão materna, nas famílias de baixa escolaridade e nas de menor investimento parental sendo as crianças entretidas nesta actividade passiva que ao funcionar como “babysitter” liberta os pais para funções não relacionais com prejuízo na construção das competências afectivas e pessoais.(2-5) Os hábitos precoces e/ou excessivos de consumo de televisão e/ou outros meio audiovisuais na infância e adolescência têm impacto negativo na saúde relacionando-se com mau aproveitamento escolar,(2-5,7) dificuldade de interacção com os pares, défice de atenção,(2-4,8) obesidade,(7,9) início precoce da actividade sexual,(8) alterações do padrão de sono, (8) comportamentos agressivos,(10) entre outros. O excesso de televisão durante essa etapa da vida pode ter consequências a longo prazo nomeadamente ausência de cumprimento de regras na realização dos trabalhos de casa, aborrecimento nas aulas, aversão escolar, dificuldade em terminar o ensino secundário e consequentemente em ingressar e concluir o universitário, resultando em baixo nível educacional e cultural depois dos 25 anos de idade(2-7,11-13). A exposição diária ao ecrã superior a 3 horas eleva significativamente o risco de perturbações de sono e a exposição precoce (antes dos dois anos e durante o desenvolvimento sináptico) aumenta o risco de problemas de atenção(10). A preferência deste entretenimento prejudica também o exercício NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 físico promovendo a obesidade sendo esta consequência reforçada pelo facto de que o padrão dietético das famílias em que as refeições são feitas com a televisão ligada, é aparentemente menos rico em frutas e vegetais e excessivo em “snacks”, pizas e bebidas gaseificadas(9). A relação entre o excesso de peso/obesidade infantil e o hábito de televisão aumenta ainda mais quando a televisão, o computador ou a consola estão também no quarto(7). O objectivo deste trabalho foi a avaliação dos hábitos de exposição ao ecrã de uma população saudável de crianças e adolescentes utentes num centro de saúde urbano. MATERIAL E MÉTODOS Aplicação de um questionário a pais de crianças e a adolescentes seguidos na consulta de Pediatria de um Centro de Saúde urbano de Outubro de 2006 a Abril de 2007. Os questionários foram aplicados relativamente a uma única criança do agregado familiar, a que vinha à consulta, e foram excluídas todas as crianças com patologia crónica e/ou incapacitante. Foram avaliados os seguintes parâmetros: sexo, grupo etário, idade com que começaram a ver televisão, número de televisões existentes em casa e os seus locais, existência de televisão na divisão onde habitualmente decorriam as refeições, horário, número de horas e tipo de programas que viam, existência de TV por cabo, computador e Internet, consolas e DVD, tempo utilizado na realização de trabalhos de casa, prática de desporto e leitura. Foi ainda avaliada a existência de regras de utilização destes meios audiovisuais e o exemplo dado pelos pais. RESULTADOS Foram realizados 106 inquéritos, sendo 51% (54) relativos a crianças/adolescentes do sexo masculino, com idade média de 8,11 anos (mínimo 5 anos e máximo 17) e desvio padrão 3,53 anos. Nesta população 13,2% tinham menos de 6 anos, 57,5% entre 6 e 10 anos, 21,7% entre 11 e 13 anos e 7,5% mais de 14 anos. Cerca de 7% tinha apenas uma televisão em casa e a grande maioria tinha três ou mais destes aparelhos (Quadro I). Mais de metade (57,5%) das crianças tinham-na no quarto e aproximadamente 64% no local das refeições (Quadro II), destas 88% mantinha-a ligada durante as mesmas. Para além de televisão, 91% tinha Leitor de DVD e 70% tinha TV por cabo, vídeo, computador e consolas e 51% tinha todos estes meios audiovisuais. Do total de crianças, 23% tinha começado a ver televisão depois dos dois anos de idade. Quando inquiridos sobre o número de horas passadas a ver televisão durante os dias de semana, 28% via menos de uma hora diária (79 via menos de duas horas, 21 entre duas e quatro horas e seis mais de quatro horas diárias). Quando a mesma questão era relativa apenas aos fins-desemana a percentagem que via menos de uma hora diária de televisão diminuiu para 4,7% (41 dos 106 assistia a menos de 2 horas, 33 entre duas e quatro horas e 31 mais de quatro horas diárias). O tipo de programa mais visto era o de desenhos animados (85) seguido de telenovelas (56), filmes e/ou séries (44) e telejornais ou programas culturais (15). O horário preferido era o que precedia o jantar (Quadro III). Contabilizado o total de tempo diário passado em frente ao ecrã (televisão, vídeo/DVD, consolas e computador), aproximadamente 46% contava menos de 2 horas e 54% duas ou mais horas (37% entre duas e quatro horas e 17% mais de quatro horas). Em relação ao tempo utilizado noutras actividades, 49% despendia menos de uma hora a fazer os trabalhos escolares, aproximadamente 32% passava menos de uma hora por dia em actividade desportiva (25% nunca a praticava) e 50% despendia menos de uma hora por dia a ler (34% afirmava não haver hábito de leitura). A televisão estava sempre ligada, como “barulho de fundo”, em 42% dos casos. Relativamente aos hábitos televisivos dos pais, 74% afirmava passar menos de duas horas por dia em frente à televisão, 18% entre duas e quatro horas e os restantes mais de quatro horas. Finalmente, 40% das famílias não tinha regras de utilização de televisão, consolas, computador, vídeo ou DVD. Quadro I – Relação entre o número de inquiridos e o número de televisões existente em casa Número de crianças/ adolescentes N=106 Número de Televisões 7 1 20 2 41 3 24 4 13 5 1 6 Quadro II – Localização das televisões nas casas das crianças/adolescentes Locais da casa com televisão Número de crianças/ adolescentes N=106 Quarto dos pais 85 (80%) Quarto da criança/ adolescente 61 (58%) Sala de jantar 64 (60%) Sala de estar 62 (58%) Cozinha 37 (35%) Outros 23 (22%) Quadro III – Horário de assistir televisão das crianças/adolescentes Horário de ver televisão Número de crianças/ adolescentes N=106 Manhã 41 (39%) Almoço 4 (4%) Tarde 31 (29%) Antes do jantar 53 (50%) Jantar 37 (35%) Das 21 às 22 h 45 (42%) Depois das 22 h 8 (8%) artigos originais 225 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 DISCUSSÃO E CONCLUSÕES Se usado de modo correcto a televisão pode ser benéfica. No entanto, demasiada televisão pode ser prejudicial e o seu uso excessivo limita tempo para brincar, ler e comunicar. A Associação Americana de Pediatria recomenda a não exposição ao ecrã (televisão, vídeo/ DVD, consolas e computador) antes dos dois anos de idade e a limitação, a partir dessa idade, a menos de 2 horas diárias usadas com programação adequada à faixa etária e supervisão dos pais(2-7,10-13). Este estudo revelou que mais de metade desta população pediátrica iniciou hábitos televisivos antes dos 2 anos de idade, via televisão ou permanecia em frente ao ecrã mais de 2 horas por dia, praticava menos de uma hora por dia de actividade física ou não tinha actividade física, usava menos de uma hora diária em actividades ligadas aos livros ou nem sequer lia, tinha televisão no quarto e fazia as refeições a ver televisão. Entre 40 a 50% despendia menos de uma hora na realização dos trabalhos escolares e negava regras familiares relativas à utilização destes meios de distracção. A exposição diária superior a quatro horas correspondeu a 17% e apenas 15% via programas educativos e adequados à idade. Alguns aspectos positivos prendem-se com o facto de mais de 50% ver menos de 2 horas diárias de televisão durante os dias úteis, embora as ultrapassassem aos fins-de-semana, e o horário preferido ser o do final da tarde, antes de jantar; contudo isso pode corresponder somente ao tempo que resta da actividade académica obrigatória. Há que salientar o facto de 80% preferir ver desenhos animados, mas este pode ser também um aspecto falsamente positivo dado actual predomínio em conteúdo desadequado e violento destes programas. Para além da qualidade dos programas a que assistem, a exposição, nos intervalos, a abundantes anúncios comerciais induz a hábitos de alimentação nada saudáveis e estimula o consumo(7-8,14). Relativamente à maior frequência de hábitos excessivos de ecrã nas famílias de menor investimento parental e baixos recursos culturais e económicos, esse aspecto passou desapercebido nes- 226 artigos originais te estudo onde as classes sociais eram semelhantes(2,3). A depressão materna não foi aqui questionada. O tempo que as crianças e adolescentes “perdem” com televisão, consolas, computadores ou DVD deveria ser alvo das preocupações de pais e pediatras. Na população estudada verificou-se excesso de tempo passado em frente ao ecrã em detrimento de outras actividades como brincadeira, leitura, desporto ou estudo. A prevenção desta situação passa também pela responsabilização dos pais para a saúde dos filhos na consulta de vigilância infantil alertando para os perigos do “consumo” de televisão e Internet. A leitura, o jogo e as actividades ao ar livre partilhadas em família ou com os pares, são alternativas promotoras do desenvolvimento psicomotor e mental capazes de aumentar competências que vão da locomoção e motricidade à linguagem, das competências pessoais e sociais às de realização e raciocínio prático(2-5). A existência de regras é essencial e estas passam por evitar o uso excessivo de media electrónica, evitar a exposição até aos 2 anos, limitar o tempo máximo às 2 horas por dia, seleccionar os programas preferindo os de conteúdo educativo, criar capacidade de escolha dos mesmos, co-visionar e discutir o tema assistido e dar o exemplo lembrando o conhecimento de que a criança imita os comportamentos, não colocar aparelhos de televisão nos quartos de dormir nem na divisão das refeições e proporcionar actividades lúdicas alternativas(2-6,13). O Pediatra e o Médico de Família devem obter formação acerca dos riscos de saúde pública decorrentes da exposição televisiva e partilhar essa informação com os pais, famílias e comunidade. A cooperação entre pediatras, professores, educadores e associações de pais pode ser preciosa nesse esforço. Devem também chamar a atenção para programas educacionais, incorporar questões acerca dos hábitos televisivos nas consultas de rotina, propor questionários que lhes permita focalizar-se em pontos de preocupação e aconselharem os pais, usarem a televisão ou vídeo nas salas de espe- ra apenas para programas educativos, incentivarem o estado a promover educação para este hábito, participarem na elaboração de mais estudos científicos acerca do impacto e dos perigos da televisão e da Internet na criança e adolescente. Em particular, seria útil uma maior pesquisa da influência dos ecrãs na área da perturbação de hiperactividade e défice de atenção, na descoberta da genitalidade/sexualidade, nos hábitos aditivos e finalmente na violência e delinquência juvenil(2-6). MEDIA EXPOSURE OF A PAEDIATRIC POPULATION IN AN URBAN HEALTH CARE CENTRE ABSTRACT Introduction: The television and the other audiovisual means may be useful but when in excess may be related to a wide range of alterations and/or behavioural problems. The time spent by children and adolescents in front of the TV should be a main concern of the parents as well as of the paediatrician. Objectives: To evaluate the television exposure habits of an healthy population of children and adolescents followed in an urban centre. Material and methodology: A questionary about the television exposure habits was applied to children’s parents and adolescents that were being followed through the paediatric consultation of the service of the Centro de Saúde da Carvalhosa. Results: 106 questionnaires were analyzed. Approximately 22% were more than 2 years old when they started watching TV, about 7% had one TV and the others had two or more, more than a half had a television in their bedrooms, 64% had the TV in the kitchen (88% said that during the meals the TV was on), 28% watched less than an hour a day during the week (during the weekend the percentage fell to 4.7%). The total time of exposure was equal or superior to two hours in 54%. The most popular programme was cartoons and soap operas. Approximately 32% spent less than one hour doing sports and 50% spent less than one hour per day reading. NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 Conclusion: We concluded that this population spends too much time with these audiovisual means putting aside other activities. The knowledge of these television exposure habits allows an adjustment of information and help counselling parents during the regular paediatric visits. Key-words: screen, television, media, child, adolescent Nascer e Crescer 2008; 17(4): 224-227 BIBLIOGRAFIA 1. Mendes P, Fernando A. A Criança e a Televisão. Acta Pediatr Port 2003; 34: 101-4 2. Zimmerman FJ, Christakis DA, meltzoff NA. Television and DVD/Vídeo Viewing in Children Younguer than 2 Years. Arch Pediatr Adoles Med 2007; 161: 473-479 3. Johnson JG, Cohen P, Kasen S, Brook JS. Extensive Television Viewing and the Development of Attention and Learning Difficulties During Adolescence. 2007; Arch Pediatr Adoles Med 2007; 161: 480-486 4. Mendelson AL, Berkule SB, Tomopoulos S, Le Monda CS. 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Pediatrics 2006; 118(5): e1303-10 CORRESPONDÊNCIA Margarida Figueiredo Hospital de Crianças Maria Pia Rua da Boavista, 827 4050-111 Porto margaridafi[email protected] artigos originais 227 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 Síndrome Guillain-Barré: A realidade de um Centro Hospitalar Maria José Dinis1, Marta Vila Real1, Fátima Santos1 RESUMO Introdução – O Síndrome Guillain-Barré (SGB) é uma polineuropatia desmielinizante aguda de natureza auto-imune. Objectivo – Caracterizar a população pediátrica de doentes internados no Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia com o diagnóstico de SGB, quanto à forma de apresentação, tratamento e evolução clínica. Doentes e Métodos – Foram analisados os processos clínicos dos doentes com idade inferior a 16 anos com o diagnóstico de SGB, entre 1 Janeiro de 2000 e 31 Dezembro de 2006. Aplicou-se na avaliação do estado funcional a Escala de Van Der Merché e Van Doorn. Resultados – Foram estudados sete casos, quatro do sexo masculino, com idades entre os 2 e 10 anos. Em 71% dos doentes a infecção respiratória ou gastrointestinal precedeu o quadro. Todos apresentaram alterações motoras, cinco alterações sensitivas e três envolvimento dos pares cranianos. Em três a forma de apresentação foi atípica. Cinco crianças tinham dissociação albumino-citológica (DAC) e encontraram-se sinais electromiográficos de polineuropatia desmielinizante aguda em 3. O agente mais frequentemente implicado foi o Campylobacter jejuni. Todas foram tratadas com imunoglobulina endovenosa (IgEV), com boa evolução clínica, recuperando sem sequelas. À altura da alta a maioria apresentava incapacidade funcional moderada. Discussão – A forma de apresentação nem sempre é a típica, podendo manifestar-se por dores musculares, simulando uma miosite, por forma “encefaliticas” ou __________ 1 Serviço Pediatria Centro Hospitalar Vila Nova de Gaia/Espinho E.P.E. 228 artigos originais por afecção dos pares cranianos. A punção lombar e a electromiografia (EMG) são bons exames auxiliares de diagnóstico. Contudo, quando a punção é realizada muito precocemente poderão não se encontrar as alterações esperadas; da mesma forma, a EMG deverá ser realizada depois das três semanas para ser informativa. Palavras Chave – Síndrome Guillain-Barré, dissociação albumino-citológica, electromiografia, Campylobacter jejuni, imunoglobulina endovenosa. Nascer e Crescer 2008; 17(4): 228-232 INTRODUÇÃO O Síndrome de Guillain-Barré (SGB) continua a ser uma entidade desafiante, apesar dos consideráveis avanços na sua compreensão e tratamento nos últimos anos(1). O SGB é uma polineuropatia aguda imunomediada, que depois do declínio da poliomielite se tornou a causa mais comum de paralisia aguda neuromuscular(2-8). A sua incidência nas crianças é de 0,4-0,6/ 100 000(9). Em 2/3 dos doentes os sintomas são precedidos, uma a três semanas, por quadros infecciosos(1,4,10,11). As infecções respiratórias são as mais comuns, em 40% dos casos, e cerca de 20% têm história de gastroenterite aguda(10,11). Os agentes mais frequentemente documentados são o Campylobacter jejuni, o CMV, o vírus de Epstein- Barr, os vírus herpes e o Mycoplasma pneumonia(1-4,10,11). Também estão descritos quadros pós-vacinais(3,4,11). A manifestação clínica mais frequente é a fraqueza muscular progres- siva, caracteristicamente ascendente e simétrica com arreflexia osteotendinosa. A hipótese de SGB deverá também ser considerada quando o quadro clínico se manifesta por atingimento dos pares cranianos com paralisia facial, dificuldade na deglutição e alterações da motilidade ocular . Oitenta por cento têm alterações sensitivas. A dor surge em 90% dos casos pediátricos sendo muitas vezes incapacitante. A disfunção autonómica (taquicardia, hipotensão postural, hipertensão, sinais vasomotores) ocorre em 2/3 dos casos(1,3,7,10,11). Os critérios de diagnóstico são baseados nas alterações clínicas e apoiados por alterações laboratoriais e electrofisiológicas(4,8,11) (tabela I). Apesar de existirem vários testes laboratoriais que possam corroborar o diagnóstico apenas a dissociação albumino-citológica (DAC) ao nível do líquido cefalo-raquidiano é considerado critério laboratorial(11). Os estudos de condução nervosa embora pouco sensíveis nos primeiros dias de doença são úteis quer na afirmação do diagnóstico, quer na avaliação do prognóstico, estando as formas axonais associadas a uma evolução menos favorável(3,10). O reconhecimento precoce de falência respiratória e a existência de uma boa unidade de cuidados intensivos continua a ser o ponto essencial no tratamento do SGB(1). Muitos estudos controlados demonstraram que a utilização da plasmaferese e da imunoglobulina intravenosa são igualmente eficazes e encurtam o tempo de recuperação da doença(1,3,7,10-12), optando-se actualmente quase sempre por IgEV por ter menos efeitos adversos. Oitenta e cinco por cento das crianças tem uma boa recuperação(3,13), sendo o prognóstico a longo prazo melhor que NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 nos adultos. A mortalidade é de aproximadamente 3 a 4% e geralmente secundária a falência respiratória ou complicações cardíacas(3,13). DOENTES E MÉTODOS Foi efectuada uma revisão retrospectiva dos processos clínicos dos doentes com idade inferior a 16 anos com o diagnóstico de SGB internadas no Serviço de Pediatria do Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia no período de 1 Janeiro 2000 a 31 Dezembro de 2006. Foram avaliados os seguintes parâmetros: idade, sexo, distribuição anual e sazonal, factores de risco associados, etiologia provável, forma de apresentação clínica, exames auxiliares de diagnóstico, tratamento e evolução. Aplicou-se na avaliação do estado funcional dos doentes a Escala funcional de Van Der Merché e Van Doorn. RESULTADOS Dos sete doentes internados, quatro eram do sexo masculino. A mediana de idade na altura do diagnóstico foi de 7 anos, com um mínimo de 2 e um máximo de 10 anos. Os doentes foram admitidos pelo Serviço de Urgência e não se encontrou qualquer relação entre o número de admissões e o mês do ano em que estas ocorreram. Todos os doentes eram previamente saudáveis, à excepção de uma criança com epilepsia de ausências. Cinco doentes apresentaram sintomas de processo infeccioso agudo prévio, nos 7 a 15 dias antes do inicio dos sintomas: 1 gastroenterite aguda, 3 infecções das vias aéreas, 1 com as duas situações simultaneamente e 1 com história de imunização para a hepatite B quatro meses antes. Todos apresentaram um quadro clínico de instalação aguda e todos em alguma fase da doença apresentaram alterações motoras com diminuição da força, dificuldade da marcha e diminuição ou abolição dos reflexos osteotendinosos (ROTs). Cinco crianças apresentaram dores musculares e parestesias. Houve envolvimento dos pares cranianos em três casos, em dois deles como primeira forma de manifestação de do- ença. Em dois verificou-se disfunção disautonómica, num caso com obstipação e retenção urinária e noutro com hipertensão arterial. Em três casos o diagnóstico foi feito sete dias depois do início da sintomatologia, em quatro, 15 dias depois. De referir que em duas crianças o diagnóstico só foi possível ao fim de 7 dias de internamento devido à sua forma atípica de apresentação. Um dos casos referia-se a uma criança do sexo feminino de 2 anos com um primeiro internamento por parésia do 6º par esquerdo e que após estudo analítico com punção lombar e estudo imagiológico cerebral normais, teve alta medicada com corticoide oral e orientada para a consulta de oftalmologia e neurologia. Ao 7º dia de evolução da doença foi reinternada por apresentar oftalmoplegia bilateral, sialorreia, alteração da deglutição, tetraparésia flácida, diminuição dos ROTs e parestesias, sendo nessa altura feito o diagnóstico de SGB - variante Miller-Fisher. O outro caso referia-se a uma criança do sexo masculino de 10 anos que recorreu ao Serviço de Urgência por paralisia facial direita, sendo constatado hipertensão arterial que motivou a realização de múltiplos exames incluindo um Tabela I – Critérios de diagnóstico do SGB Características requeridas para o diagnóstico Fraqueza muscular progressiva Arrefelexia Características que apoiam fortemente o diagnóstico Progressão dos sintomas durante dias Simetria reletiva dos sintomas Sintomas ou sinais sensitivos Envolvimento dos pares cranianos Recuperação 2 a 4 semanas depois da progressão cessar Disfunção autonómica Ausência de febre no início do quadro Proteinorraquia com < 10 células/mm3 Alterações electromiográficas típicas Tabela II – Dados demográficos e clínicos Doente Idade (anos) Sexo Manifestações clinicas 1 2 F D1 - Atingimento do oculomotor (VI par) D7 - Atingimento dos pares cranianos baixos (sialorreia, disfagia) com diminuição da força muscular, arreflexia, disfunção autonómica (Obstipação, retenção urinária) 2 6 M Diminuição da força muscular, arreflexia, dor, parestesias 3 10 F Diminuição da força muscular, arreflexia, dor, parestesias 4 10 M D1- mialgias D7-Paresia facial direita, HTA D12-Diminuição da força muscular, arreflexia 5 10 M Diminuição da força muscular, arreflexia 6 3 M Diminuição da força muscular, arreflexia, mialgias, parestesias 7 7 F D1- Paresia facial direita D5- Paresia facial esquerda D7- Diminuição da força, arreflexia, mialgias, parestesias Legenda: F- Feminino, M- Masculino, D…- dia de evolução da doença artigos originais 229 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 eco doppler renal que mostrou alteração dos fluxos das artérias renais e angiorressonância com hipoplasia dessas artérias pelo que iniciou anti-hipertensores. Ao 5º dia de internamento surgiu alteração da marcha por diminuição da força muscular com agravamento progressivo, pelo que realizou punção lombar que mostrou dissociação albumino-citológica. Fez tratamento com imunoglobulina e só nessa altura há melhoria dos valores tensionais. Manteve durante 2 anos o tratamento com anti-hipertensores e só passados 5 anos após vários eco-doppler’s com resultados contraditórios realizou arteriografia que excluiu patologia vascular renal. A hipertensão foi considerada uma das manifestações do SGB (Tabela II). Todos os doentes realizaram punção lombar, sendo que cinco mostraram dissociação albumino-citológica, com valores de proteínas que variaram entre os 54,9 e 182,9 mg/dl; em nenhum dos casos se verificou pleocitose. Nos dois casos em que o exame citoquimico de LCR foi normal, a punção lombar foi realizada, num caso sete dias após o início da sintomatologia e noutro foi efectuada duas vezes, uma no início da sintomatologia e outra sete dias após. Quatro doentes realizaram estudo electromiográfico, três dos quais apresentaram alterações compatíveis com polineuropatia desmielinizante, tendo o exame sido realizado três semanas depois do início da sintomatologia. Por impossibilidade técnica, no outro caso o estudo foi realizado dois meses após o diagnóstico, já não mostrando alterações. Cinco crianças realizaram estudo de imagem cranioencefálica: 1 tomografia axial computorizada (TAC), 1 Ressonância magnética (RM), 3 TAC e RM, sem registo de alterações. Três realizaram RM medular e num dos casos foi visível aumento da captação meníngea no cone medular e nas raízes da cauda, sinais compatíveis com SGB (Tabela III). Cinco das sete crianças apresentaram elevação dos níveis serológicos séricos para diversos agentes: Campylobacter jejuni (4 casos), Mycoplasma pneumoniae (1 caso), CMV (1 caso), Enterovirus (1 caso). Dois casos apresentavam IgG positivas para o Campylobacter jejuni no líquor (Tabela III). Todos fizeram tratamento com imunoglobulina endovenosa, cinco no esquema 1g/kg/dia durante dois dias e dois 400 mg/kg/dia durante cinco dias, sem qualquer reacção adversa. Nenhuma criança necessitou de ventilação invasiva ou de internamento numa unidade de cuidados intensivos. Cinco crianças iniciaram fisioterapia em regime de internamento. A média de dias de internamento foi de 10 com um mínimo de 4 dias e um máximo de 19 dias. À data da alta a maioria apresentava uma incapacidade funcional moderada, II-III/VI, na escala funcional de Van Der Merché e Van Doorn. Todos recuperaram sem sequelas. DISCUSSÃO Apesar da pequena dimensão da amostra os resultados são idênticos aos descritos na bibliografia sobre SGB. Constatou-se uma grande heterogeneidade na forma de apresentação, com 42% dos casos a ter como primeira manifestação o atingimento dos pares cranianos. Esta forma de apresentação atrasou o diagnóstico bem como as atitudes terapêuticas. O mecanismo preciso da fisiopatologia do SGB ainda é desconhecido mas admite-se que certos anticorpos dirigidos para epítopes específicos de bactérias ou vírus desencadeiem uma resposta imunológica cruzada contra antigénios presentes nos nervos periféricos causando lesão(2,3,5-7,9,11). Na nossa casuística, em 57% dos casos existiu uma situação infecciosa a preceder a sintomatologia: em Tabela III – Exames complementares realizados. Factores de risco. Doente LCR EMG Imagem 1 Sem DAB* Sem alterações TAC e RM c- sem alterações Campylobacter jejuni IVAs 2 Sem DAB** Polineuropatia desmielinizante RM c- sem alterações RM medular- captação aumentada Campylobacter jejuni CMV GEA+IVAs 3 DAB Polineuropatia desmielinizante TACc- sem alterações Campylobacter jejuni Vacina HBV 4 DAB Polineuropatia desmielinizante TACc e RMc- sem alterações Mycoplasma pneumoniae 5 DAB Não realizou Não realizou Campylobacter jejuni Enterovirus 6 DAB Não realizou RM medular- sem alterações IVAs 7 DAB Não realizou TACc, RMc, RM-medular-sem alterações IVAs Legenda: IVA- Infecção vias aéreas; GEA- Gastroenterite aguda; DAB- Dissociação albumino-citológica *- No inicio da sintomatologia e aos 7 dias de evolução da doença **- Aos 7 dias de evolução da doença 230 artigos originais Serologias Factores de risco GEA NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 42% infecção respiratória e em 28% infecção gastrointestinal, proporções muito idênticas às descritas na literatura(11). O Campylobacter jejuni foi o agente mais prevalente, mesmo naqueles sem história anterior de infecção gastrointestinal. Na variante Miller-Fisher está descrita uma associação com a infecção por Campylobacter, confirmada também no nosso caso. Alguns estudos têm mostrado uma associação entre o SGB e algumas vacinas incluindo a polio, influenza, rubéola/sarampo/parotidite e hepatite B, nas primeiras semanas depois da vacinação(1,3,4,7,11). Na nossa casuística existia um caso em que a criança tinha sido vacinada quatro meses antes para a hepatite B. Apesar de ter sido considerado factor de risco este espaçamento temporal mostra que provavelmente essa associação é pouco provável e de facto nessa criança foi identificado serologicamente um agente causal, o Campylobacter jejuni. Embora o diagnóstico seja fundamentalmente clínico, a punção lombar, a EMG e os estudos imagiológicos podem ser úteis na confirmação do diagnóstico(4), na avaliação do prognóstico e na exclusão de outras patologias. A maioria dos pacientes em algum momento da doença desenvolvem a típica dissociação albumino-citológica, mas a concentração de proteínas pode ser normal nos primeiros 5 a 10 dias de doença(11). No nosso estudo os achados citoquímicos do LCR mostraram dissociação albumino-citologica em 71% dos doentes. Destes apenas um tinha sete dias de evolução da doença; todos os outros tinham duas semanas de evolução. Nos casos em que não houve alterações a punção lombar foi realizada num caso no início da sintomatologia e repetida aos sete dias de evolução e noutro caso aos 7 dias de evolução da doença. Assim, quando a punção lombar é realizada ou numa fase precoce ou numa fase avançada da doença poderão não ser encontradas as alterações citoquímicas do líquor, o que está de acordo com o descrito na literatura. A EMG constitui o exame mais sensível e especifico para o diagnóstico do SGB(7), embora tipicamente as alterações surjam apenas 2 a 3 semanas depois do inicio da doença. No nosso estudo a EMG mostrou-se um exame importante quer na confirmação do diagnóstico quer no estabelecimento do prognóstico; todos os casos tinham sinais de desmielinização sem sinais de lesão axonal, sugerindo um prognóstico mais favorável. O único caso que não apresentou alterações realizou a EMG já em fase de resolução da doença. Os doentes com manifestações atípicas, nomeadamente com atingimento inicial dos pares cranianos, realizaram imagem cerebral. A RM pode ser útil no diagnóstico principalmente quando os estudos de condução são equívocos(11). É um teste sensível mas não específico(11). No nosso estudo revelou-se um exame importante fundamentalmente na exclusão de outros diagnósticos e mostrou-se importante também na afirmação do diagnóstico num caso em que revelou aumento da captação a nível das raízes medulares numa criança que não apresentava alterações no LCR. Todos os doentes responderam bem ao tratamento com IgEV independentemente do esquema terapêutico. O prognóstico depende de vários factores como a etiologia, as alterações clínicas, neurofisiológicas e bioquímicas(11). A infecção por Campylobacter e CMV é um dos factores de mau prognóstico, o que não foi verificado na nossa revisão, em que todos os doentes independentemente da etiologia ou das manifestações clínicas tiveram uma evolução clínica favorável. CONCLUSÃO O SGB envolve um grupo heterogéneo de entidades e formas diversas de apresentação para as quais o clínico necessita de estar alerta de forma a dar uma resposta precoce e atempada que impeça a progressão da doença para formas mais graves e irreversíveis. A maior parte das situações são precedidas por um quadro infeccioso prévio e o Campylobacter é o agente mais vezes implicado. O diagnóstico do SGB é fundamentalmente clínico, embora o estudo do LCR, a EMG e a RM do neuroeixo pos- sam ser úteis no diagnóstico, prognóstico e exclusão de outras patologias. O estudo citológico do LCR e a EMG demonstraram ser exames auxiliares de diagnóstico muito úteis. Contudo, quando a punção lombar é realizada muito precocemente poderão não se encontrar as alterações características. Também a EMG deverá ser realizada por volta da terceira semana para ser mais informativa. A imunoglobulina mostrou-se uma boa arma terapêutica. GUILLAIN-BARRÉ SYNDROME: THE REALITY OF AN HOSPITAL CENTER ABSTRACT Introduction - Guillain-Barré Syndrome (GBS) is an acute autoimmune demyelinating polyneuropatia. The aim of this work was to characterize the pediatric patients admitted to Centro Hospitalar Vila Nova de Gaia with GBS, analyzing the clinical presentation, treatment and the clinical evolution. Patients and Methods - Retrospective review of all children less than 16 years with GBS admitted in Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia between 1st January 2000 and 31st December 2006. The functional state was evaluated by the Van Der Merché and Van Doorn scale. Results - Seven cases were admitted during this period, 4 were males, aged 2 to 10 years. Respiratory and gastrointestinal prodromes were identified in 71% of the cases. All patients had motor disturbances, 5 sensory manifestations and 3 cranial nerves involvement. Five children had albuminocytological dissociation and electromyographic signs of acute demyelinating neuropathy was identified in 3. Campylobacter jejuni was the agent more commonly involved. All children were treated with intravenous imunoglobulins, with good evolution, recovering without sequels. On the time of discharge most of the children presented a moderate functional incapacity. Discussion - The clinical presentation in GBS can be variable: classic, miosites-like or encephalitis-like or with craneal nerve envolvent. Lumbar puncture (LP) and electromyogram are important artigos originais 231 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 to support the diagnosis. Nevertheless when LP is performed early in the course of the disease typical abnormalities may not be present. Also electrophysiological studies should be made after the third week of disease to be of greater diagnostic value. 4. 5. Key Words – Guillain-Barré syndrome, albuminocytological dissociation, electromyogram, Campylobacter jejuni, intravenous immunoglobulins. Nascer e Crescer 2008; 17(4): 228-232 6. BIBLIOGRAFIA 7. 1. Winer JB. Guillain Barré syndrome. Mol Pathol 2001;54:381-385 2. Kaldor J, Speed BR. Guillain-Barré Syndrome and Campylobacter jejuni: a serological study. Bristish Medical Journal 1984;288:1867-1870 3. Monteiro JP, Fonseca S, Proença J, Calhau P, Braga M, Fonseca MJ. Sín- 232 artigos originais 8. drome Guillain-Barré en edad pediátrica. Experiencia de la Unidade de Neuropediatría de un hospital portugués. Rev Neurol 2006;42(3):144-149 Dana L, Warren CR. Guillain-Barré Syndrome. 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Os achados típicos da ressonância magnética (RMN) contribuem para o diagnóstico. A sintomatologia e as alterações radiológicas são completamente reversíveis, quando corrigida atempadamente a causa subjacente. Os autores apresentam um caso clínico de uma criança, sexo masculino, com 8 anos e 9 meses de idade, transferida da Unidade de Cuidados Intensivos para o Serviço de Pediatria com traumatismo craneo-encefálico (TCE) grave. Durante o internamento verificaram-se valores tensionais persistentemente superiores ao P95 e ao 10º dia de internamento, na sequência de uma TAC cerebral de controle, observaram-se lesões de novo, hipodensidades parieto-occipitais bilaterais, sem restrição à difusão das moléculas de água na RMN, sugestivas de edema vasogénico - PRES. Após controlo da hipertensão arterial verificou-se regressão completa das lesões cerebrais. Os autores pretendem com este caso clínico alertar para esta entidade clinico-radiológica reversível, salientando a necessidade de diagnóstico atempado e tratamento precoce da causa subjacente para evitar danos neurológicos irreversíveis. __________ 1 2 3 4 Interno Complementar de Pediatria Assistente Hospitalar de Neuroradiologia Assistente Hospitalar Graduada de Pediatria Assistente Hospitalar de Pediatria Hospital Geral Santo António, EPE Palavras-chave: Síndrome de Encefalopatia Posterior Reversível, Hipertensão arterial, RMN cerebral com restrição às moléculas de água, Traumatismo craneo-encefálico. Nascer e Crescer 2008; 17(4): 233-236 INTRODUÇÃO A Encefalopatia posterior reversível (PRES) é uma síndrome clínico- radiológica, descrita pela primeira vez em 1996 por Hinchey(1) inicialmente em adultos e observada cada vez mais na população pediátrica(2). Caracteriza-se pelo início agudo ou subagudo de cefaleias, alterações do estado de consciência, alterações visuais, convulsões e sinais neurológicos focais(3). As causas mais frequentemente associadas com a PRES são: hipertensão arterial, eclâmpsia, fármacos (Imunossupressores: Tacrolimus, Ciclosporina A e agentes de quimioterapia: Ciplastina, Interferon α, Metotrexato), síndrome hemolítico- urémico e púrpura trombocitopénica trombótica(2). A tomografia axial computorizada (TAC) e, sobretudo, a ressonância magnética (RMN) contribuem para o diagnóstico, evidenciando edema bilateral envolvendo a substância branca, atingindo os territórios vasculares posteriores (lobos parietais e occipitais). Os achados imagiológicos podem gerar dificuldades no diagnóstico, hoje superadas pela RMN com a técnica de difusão das moléculas de água (DWI), que permite diferenciar o edema citotóxico (resultante de isquemia e enfarte) de edema vasogénico sugestivo de PRES(4). O prognóstico é geralmente bom, sendo as lesões completamente reversí- veis, quando corrigida atempadamente a causa subjacente. Caso contrário, podem instalar-se danos irreversíveis, como cegueira cortical e morte(2,5). CASO CLÍNICO Os autores apresentam o caso clínico de uma criança, do sexo masculino, raça caucasiana, com 8 anos e 9 meses de idade, com antecedentes pessoais e familiares irrelevantes, vítima de atropelamento por veículo de quatro rodas, que foi internada em Unidade de Cuidados Intensivos Pediátricos (UCIP), onde permaneceu por um período de 25 dias. À admissão na UCIP apresentava-se intubado e ventilado, com Score Glasgow 5 (O1M2V2), com politraumatismo com feridas corto-contusas na região frontal esquerda e couro cabeludo à direita. As TAC cervical, de tórax, abdominopélvica e a radiografia do esqueleto não revelaram quaisquer alterações. Realizou TAC cerebral que evidenciava múltiplas contusões hemorrágicas supratentoriais e discreto edema cerebral. Por aparecimento subsequente de hipertensão intracraniana refractária (PIC>40; PPC baixa) foi induzido coma barbitúrico com Tiopental que manteve durante 13 dias (padrão electroencefalográfico de “burst supression”). Manteve ventilação mecânica com parâmetros moderados (FiO2 0,3) até 20º dia de internamento, ficando posteriormente em ventilação espontânea. Evolução com instabilidade hemodinâmica, necessidade de suporte inotrópico com dopamina e noradrenalina até ao 19º dia, ficando posteriormente hemodinamicamente estável com valores tensionais no P50-90. Foi transferido ao 25º dia para o Serviço de Pediatria do Hospital Geral de Santo António, apresentando-se à admissão casos clínicos 233 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 Figura 1 – TAC cerebral em D1 de internamento no HGSA “Hematoma subdural crónico frontal direito… hipodensidade fronto--basal esquerda sugestiva de contusão… hipodensidades lentículo-capsulares direitas …” hemodinamicamente estável [TA: 117/60 mm Hg (TAS: P90/95; TAD: P50); FC 79 bpm; SpO2 99% (ar ambiente)], Score Glasgow de 7 (O4M2V1), pupilas isocóricas lentamente reactivas, com reacção à dor em extensão dos membros e tetraparésia espástica (espasticidade grau 3 a 5 na escala de Ashworth). Restante exame objectivo sem alterações. A TAC cerebral revelava hematoma subdural crónico frontal direito e múltiplas contusões hemorrágicas supratentoriais (Figura 1). No Serviço de Pediatria esteve clinicamente estável até ao 7º dia de internamento altura em que se verificam episódios de hipersudorese e períodos de agitação que aliviavam com analgesia com morfina, constatando-se nesta altura Figura 2 – TAC cerebral em D10 “ …Lesões de novo, hipodensidades cortico-subcorticais temporo-occipito-parietal direita e parieto-occipital esquerda…” valores tensionais persistentemente acima do P95. Efectuou ao 10º dia de internamento uma TAC cerebral de controle, que revelou lesões de novo, hipodensidades cortico-subcorticais temporo- parieto-occipitais bilaterais (Figura 2). Colocou-se como hipótese tratarem-se de lesões de enfarte agudo no território de ambas as artérias cerebrais posteriores e/ou fronteira e ramos perfurantes das artérias cerebrais médias ou, dado que as lesões não respeitavam nenhum território vascular bem definido, tratar-se de edema vasogénico. Foram colocadas como causas possíveis de enfarte: hipoperfusão cerebral, cardio – embolismo, dissecção das artérias vertebro-basilares ou carotídeas pós-traumatismo. Realizou uma Angioressonância das artérias carótidas e artérias vertebro-basilares que não revelou qualquer alteração. A RMN cerebral confirmou a presença de lesões occipito- parietais bilaterais ao nível da substância branca, envolvendo os territórios posteriores, desde o córtex até à região periventricular. Não se verificou restrição à difusão das moléculas de água (DWI), que pudesse traduzir isquemia recente e o ADC (Apparent Diffusion Coefficients) encontrava-se elevado, confirmando a ausência de edema citotóxico, ficando como hipótese mais provável edema vasogénico no contexto de PRES. (Figura 3) Figura 3 – A. RMN T2 FLAIR- plano axial, Fluid- Atennuated Inversion Recovery. Hiperintensidade de sinal ao nível da substância branca, envolvendo os territórios posteriores- lesões occipito- parietal direita e esquerda consistentes com edema vasogénico. B. Técnica de difusão das moléculas de àgua (DWI): Sem restrição à difusão das moléculas de àgua. C. Medição do ADC (Apparent Diffusion Coefficients) : aumento da difusão nas áreas de edema vasogénico (ADC elevado). 234 casos clínicos NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 A TA manteve valores persistentemente acima do P95, com valores máximos de 171/110 mmHg ao 14º dia. Foi instituído, tratamento com propranolol e nifedipina e ao 21º dia foi substituída a nifedipina pelo captopril. Para investigação etiológica da hipertensão arterial e suas repercussões efectuaram-se os seguintes exames complementares de diagnóstico: sedimento urinário, função renal, ionograma e perfil lipídico; ecografia renopélvica e eco doppler das artérias renais que foram normais; estudo imunológico: ANA negativos; anti-cardiolipina e anti-β2 glicoproteína negativos. C3 e C4 normais. Ig´s normais; ecocardiograma: normal; fundo ocular: OD: hemorragia peripapilar inferior, sem edema papilar. No 20º dia apresentou movimentos clónicos dos membros superiores. Foi efectuado EEG que revelou actividade de base lenta e períodos ocasionais de actividade paroxística predominantemente à direita, instituindo-se terapêutica com carbamazepina. Houve normalização dos valores da TA, com posterior suspensão da terapêutica anti-hipertensiva e melhoria dos episódios de agitação. A RMN cerebral efectuada 10 dias após o início do tratamento revelou regressão das lesões encontradas na RMN anterior, suportando o diagnóstico de PRES (Figura 4). Sem registo de novos episódios convulsivos, os EEG posteriores revelaram-se normais, suspendendo os antiepilépticos em D100. À data da alta (5 meses), a criança apresentava-se com valores tensionais normais sem qualquer tratamento antihipertensor. Mantinha estado neurológico sobreponível, com um Score Glasgow de 8 (O4M3V1), tetraparésia espástica sem controle cefálico, atrofia muscular generalizada e contracturas ligeiras a nível solear direito e anca direita. Do ponto de vista imagiológico, apresentava regressão completa das lesões parieto-occipitais bilateralmente, verificando-se uma redução acentuada do volume encefálico (Figura 5). Figura 4 – RMN T2 FLAIR em D23: lesão occipito-parietal direita apresenta dimensões mais reduzidas e a esquerda desaparece. Figura 5 – RMN T2 FLAIR em D116: resolução completa das lesões… Mantém-se colecção extra-axial na vertente fronto-parietal direita … redução do volume encefálico…” DISCUSSÃO A PRES é uma síndrome rara em crianças e o seu diagnóstico, se não houver índice de suspeição, é muitas vezes subestimado. A etiologia mais frequentemente descrita é a hipertensão arterial, sendo que nas crianças os valores de TA necessários para o desenvolvimento das lesões são geralmente inferiores aos dos adultos(2,6). O diagnóstico é clínico e imagiológico. A RMN é o melhor exame de diagnóstico evidenciando edema vasogénico bilateral envolvendo a substância branca, atingindo os territórios vasculares pos- teriores. A RMN com técnica de difusão das moléculas de água (DWI) é o exame gold-standard, permitindo diferenciar entre o edema vasogénico e o edema citotóxico, sendo que o ADC (Apparent Diffusion Coefficients) elevado confirma a ausência de edema citotóxico(4,7). O mecanismo fisiopatológico exacto nesta entidade ainda não é totalmente conhecido, estando provavelmente implicadas alterações da auto-regulação dos vasos cerebrais que, quer por aumento da pressão hidrostática, quer por aumento da permeabilidade vascular, permitem a passagem de líquido para o interstício e a formação de edema vasogénico(4,8). A predilecção pelos territórios posteriores deve-se provavelmente à menor inervação simpática, e uma vez que na PRES a resposta miogénica está comprometida, estas áreas tornam-se mais vulneráveis.7 A apresentação clínica é frequentemente inespecífica e pode ser facilmente confundida com outras entidades como o enfarte cerebral, encefalite, vasculite ou trombose do sinus sagital. O diagnóstico de PRES tem importantes implicações terapêuticas e prognósticas, pela potencial reversibilidade das lesões se o tratamento da causa subjacente for adequado e atempado. Por outro lado, se não tratada pode evoluir para edema citotóxico conduzindo a isquemia, enfarte e sequelas neurológicas permanentes(5). No presente caso a instalação deste quadro num doente com graves lesões neurológicas pós-traumáticas não permitiu detectar mais precocemente as manifestações clínicas. Foi difícil valorizar algumas manifestações como cefaleias ou convulsões (traduzidas por episódios de agitação e hipersudorese ou movimentos paroxísticos), que facilmente seriam atribuíveis ao seu quadro neurológico de base. A etiologia da hipertensão arterial, que foi transitória, não foi completamente esclarecida. Atendendo à normalidade da investigação efectuada, e dado tratar-se de um doente com um TCE grave, a desregulação autonómica central parece ser a causa mais provável. Para a evolução favorável deste quadro, com reversibilidade imagiológica casos clínicos 235 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 completa das lesões, contribuiu o rápido controle da hipertensão arterial. Em todos os doentes politraumatizados com alterações neurológicas o aparecimento de episódios convulsivos tardios, especialmente se associado a hipertensão ou outra causa predisponente devem alertar-nos para a possibilidade de PRES, cujo tratamento pode evitar que se somem novos deficits neurológicos. POSTERIOR REVERSIBLE ENCEPHALOPATHY SYNDROME ABSTRACT The Posterior Reversible Encephalopathy Syndrome (PRES) is a rare entity described initially in adults and observed more and more in children. Clinically, patients have headaches, alteration of the level of conscience and seizures. The typical findings in the magnetic resonance (MRI) contribute to the diagnosis. When promptly recognized and treated the underlying cause, the symptoms and radiologic abnormalities can be completely reversible. The authors present a clinical case of a child, male, with 8 years and 9 months of age, admitted in the Pediatric Department with a traumatic brain injury, 236 casos clínicos with serious neurological deficits. During hospitalization, tensional values became persistently > P95 and on a brain CT scan of control, new lesions were observed as bilateral hypodensities in parietal and occipital lobes, without restriction of the diffusion of the molecules of water on MRI, suggestive of vasogenic edema - PRES. Complete regression of the cerebral lesions were observed after control of the hypertension. With this clinical case the authors want to alert for this reversible clinic-radiologic entity, pointing out the need of an early diagnosis and treatment of the underlying cause to avoid irreversible neurological damages. 3. 4. 5. 6. Key- Words: Posterior Reversible Encephalopathy Syndrome, Hypertension, Diffusion-Weighted Magnetic Resonance imaging, Traumatic Brain Injury. 7. Nascer e Crescer 2008; 17(4): 233-236 BIBLIOGRAFIA 1. Hinchey J et al. A Reversible Posterior Leukoencephalopathy Syndrome. N Engl J Med 1996; 334:494-500 2. Arroyo HA, Ganez LA, Fejerman N. Encefalopatia posterior rever- 8. sible en la infancia. Neurol 2003; 37(6):506-510 Javed MA, Sial MSH e tal, Etiology of Posterior Reversible Encephalopathy Syndrome (PRES). Pak J Med Sci 2005, 21, 2:149-154 Covarrubias DJ, Luetmer PH et al. Posterior Reversible Encephalopathy Syndrome: prognostic utility of quantitative diffusio- weighted MR images. Am J Neurradiol 2002; 23: 1038-1048 Ishikura K et al. Posterior Reversible Encephalopathy Syndrome in Children: its high prevalence and more extensive imagin findings. Am J Kidney Dis 2006; 8:231-238 Singhi P, Subramanian C, Jain V e tal. 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Am J Neurradiol 2005; 26: 825-830 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 Dermatite Estreptocócica Perianal Sónia Fernandes1, Nelea Afanas1, Luísa Tavares2, José Castanheira3 RESUMO A Dermatite Estreptocócica Perianal causada pelo estreptococo β – hemolítico do grupo A (EβHA), é uma entidade bem definida, mas mal conhecida e sub diagnosticada, levando por isso a um tratamento tardio, expondo a criança ás complicações habituais como dor na defecação, obstipação, rectorragia com realização de exames invasivos que isso implica, podendo também haver a suspeita de abuso sexual com todas as suas consequências. Quando tratada precocemente apresenta-se com um quadro clínico leve e de fácil resolução. Os autores descrevem o caso clínico de um adolescente de 11 anos a quem foi feito o diagnóstico de Dermatite Estreptocócica Perianal e um breve resumo teórico. Palavras-chave: Dermatite Estreptocócica Perianal, Estreptococo β – hemolítico do grupo A Nascer e Crescer 2008; 17(4): 237-239 INTRODUÇÃO Amren e col. em 1966 descreveram pela primeira vez as erupções perianais causadas pelo Estreptocóco β-hemolítico do grupo A, designando--as por celulite perianal. Em 1985 Spear e col. descreveram 14 crianças com as mesmas lesões. Desde então, embora poucas, outras publicações têm vindo a referir a mesma __________ 1 2 3 Interno Complementar de Pediatria Assistente Graduada de Pediatria Director do Serviço de Pediatria Serviço de Pediatria – Hospital S. Teotónio Viseu doença. Recentemente, devido à constatação de um maior número de casos, vários autores, admitem não ser uma doença rara, mas sub diagnosticada. A Dermatite Estreptocócica Perianal é uma infecção cutânea – mucosa superficial, que tem como agente etiológico mais frequente o Estreptococo β – hemolítico do grupo A(1-4,8) e raramente o Estreptococo β-hemolítico do grupo G e o Staphylococcus aureus(2, 8). É uma doença frequente na idade pediátrica mas rara nos adultos. Atinge principalmente crianças entre 6 meses e os 11 anos de idade(1-3,6,8,9,11), e é mais frequente nos rapazes (70%)(1-3,5,7,8,). Tem uma incidência de 1/218 a 1/2000 visitas pediátricas no ambulatório(5,6), continuando a não ser reconhecida ou a sê-lo tardiamente, com a sintomatologia a persistir durante 3 semanas a 12 meses antes do diagnóstico correcto(1,6,8,11). Normalmente não ocorrem sinais e sintomas sistémicos, apresentando um estado geral conservado, sem febre ou outra sintomatologia sistémica(1,2,4,11). Pode existir uma história de faringite ou impétigo actual ou anterior associada. Numa fase inicial, manifesta-se habitualmente por um intenso eritema perianal, superficial, vermelho vivo, que irradia do ânus, com limites bem demarcados envolvendo a mucosa anal. Muitas vezes é doloroso ao toque. Raramente acompanhado de edema ou adenomegalias(7). Este eritema está associado a prurido em 78 - 80%(5,6) das situações e a exsudado superficial seroso ou sero - hemático(1, 5) Em associação com esta dermatite podese encontrar a descamação dos dedos semelhante a que ocorre na faringite estreptocócica e devido á libertação de exotoxinas pela bactéria(5). Aconselha-se que nas crianças sem causa aparente de descamação dos dedos deve-se fazer um exame da região peri-anal. Numa fase crónica a mucosa anal pode apresentar escoriações, fissuras e hiperpigmentação. O exsudado inicial passa a muco – purulento. Pode surgir dor e recusa à defecação (52%)(5 -7) levando a obstipação e fezes raiadas de sangue (35%)(5). Por último surgem as rectorragias na proctite e proctocolite(1,3,6). Por vezes a clínica é subtil com ligeira dor à defecação ou ao toque. Pode manifestar-se por uma erupção psoríasiforme vermelho – vivo, com extensão de vários cêntimetros da superfície anal e um exsudado superficial amarelado nos bordos(7). As manifestações mais raras são a celulite peri-anal, uma evolução crónica com recorrências e a infecção por S. Aureus com pústulas satélites(4). As complicações possíveis são a extensão para a região peri-anal e genital manifestando-se por vulvovaginite na rapariga e balanite no rapaz(1,2,4,5,7,8,). Dentro de outras complicações possíveis temos a blefaroconjunctivite, proctocolite, descamação dos dedos típica das infecções estreptocócicas(5,8), e as Amigdalites estreptocócicas de repetição na família. Por último, muito mais rara, a Nefrite aguda pós – estreptocócica. Por ser uma entidade pouco conhecida, sem uma clínica esteriotipada, o diagnóstico é tardio e evoca inicialmente outras entidades clínicas como a dermatite das fraldas, oxiuríase, dermatite seborreica, alergias, candidíase, fissura anal, psoríase do guttato, obstipação psicogénica, doença inflamatória intestinal e abuso sexual(1,3,4,6,11). Estes erros no diagnóstico conduzem a tratamentos errados e à cronicidade do quadro que pode arrastar-se por várias semanas a meses e á realização de exames invasivos. casos clínicos 237 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 O diagnóstico baseia-se principalmente numa forte suspeita clínica que pode ser confirmado pelo teste rápido do exsudado da lesão peri-anal com zaragatoa para pesquisa de antigénios do EβGA e/ou cultura em meio de agar com sangue de ovelha 5%(1,9,11). O teste directo de pesquisa de antigénios bacterianos é muito útil pela rapidez do resultado mas tem uma sensibilidade de 89%.(1). O diagnóstico definitivo é feito pela cultura. Apresenta-se em seguida um caso clínico para melhor ilustração da clínica e diagnóstico. CASO CLÍNICO Rapaz de 11 anos de idade, raça caucasiana, recorreu ao Serviço de Urgência de Pediatria do Hospital da área, referenciado pelo médico de família, por dor perianal agravada com a marcha e exantema perianal não pruriginoso com 5 dias de evolução. Negava dor a defecar, febre e alterações do trânsito intestinal. Tinha sido desparasitado há 3 meses com mebendazol. Negava qualquer medicação em curso. A mãe referia convívio com adolescentes que apresentavam comportamento sexual de risco. Ao exame clínico apresentava eritema perianal circunferencial 4-5cm de diâmetro com bordos bem definidos (Imagem nº 1), exsudado seroso superficial e sem lesões de grattage. Não apresentava fissuras na região perianal. Ao toque rectal o esfíncter anal apresentava bom tónus, ampola rectal com fezes e luva sem sangue. Antecedentes pessoais irrelevantes. Como antecedentes familiares a salientar irmã com 7 anos – Sdr. Munchausen por procuração. Perante o quadro clínico colocaramse como hipóteses de diagnóstico: deficit de higiene, dermatite estreptocócica perianal; parasitose; micose; eczema ou abuso sexual. No Serviço de Urgência fez-se um teste rápido, com zaragatoa, da lesão perianal, sem a sua introdução no orifício anal, para pesquisa do Estreptocóco β - hemolítico que foi positivo e pediu-se avaliação pela Assistente Social sendo posta de parte a hipótese de abuso sexual. 238 casos clínicos Fez-se assim o diagnóstico de Dermatite Estreptocócica Perianal iniciando tratamento oral com eritromicina 50mg/ kg/dia de 8/8 horas. Foi referenciado á Consulta Externa de Adolescentes onde pode constatar-se uma melhoria ao 10º dia de tratamento (Imagem nº 2) e a cura ao 15º dia de tratamento (Imagem nº 3). Teve alta da consulta, sem registo de recidiva da lesão. DISCUSSÃO O caso descrito confirma que a dermatite peri-anal é frequentemente diagnosticada tardiamente, o que pode ser explicado pelo não conhecimento desta entidade e pelo facto de se pensarem primeiro noutras entidades (como parasitoses e abuso sexual). Quando reconhecida precocemente e instituído o tratamento adequado, tem uma evolução benigna, evitando-se assim exames invasivos e tratamentos desnecessários. O Estreptococo β-hemolítico, em idades pediátricas, é um dos agentes bacterianos mais vezes responsável por amigdalofaringites, pneumonias, adenites, meningites, como também infecções cutâneas como a erisipela e o impétigo(1,9). O meio de contágio continua a ser um tema de discussão na comunidade científica. O Estreptococo β-hemolítico não é um gérmen saprófita da região perianal, possui estruturas filamentosas que lhe permitem uma aderência às células epiteliais e a invasão das mucosas. Qualquer traumatismo prévio vai facilitar a invasão da mucosa e posteriormente o aparecimento da doença(1,8,9). Certos autores defendem a sua potencial resistência aos sucos digestivos como meio para colonizar a região perianal(2,3,8,9). O meio de contágio mais frequente é a auto – inoculação pelos dedos a partir da orofaringe infectada ou infecções cutâneas como o impétigo(1-3,5,6). Outros meios de contágio também possíveis são a transmissão aérea e a intra-familiar a partir por exemplo da água do banho, ocorrendo vários casos na mesma família(1,3,5,6). A colonização perianal assintomática é frequente, verificando-se em cerca de 1% das crianças assintomáticas e 6% das crianças que têm faringite por Es- treptococo β-hemolítico do grupo A(1,3,4,6). Apesar desses meios de contágio, esta entidade clínica raramente é uma doença contagiosa(2). Existem vários factores que predispõem ao aparecimento desta dermatite. Entre eles temos a fragilização repetida da camada córnea(9); uso excessivo de detergentes; o traumatismo local; má higiene; a presença de Línquen Esclerosante Perianal; Psoríase Gutata e o Intertrigo(2,4,8). Muitos autores demonstraram que um focus estreptocócico perianal leva a exacerbações da Psoríse Gutata(3,4,5). Isto deve alertar para o exame da região perianal nas crianças com exacerbações agudas da Psoríase Gutata(3, 4). Num grande número de casos publicados o tratamento inicial foi a penicilina, quer sob a forma oral (penicilina), quer sob as várias formas de administração parentérica (Penicilina G benzatínica e / ou procaínica), com rápida resolução das queixas(1,2,3,5,6,9). Uma vez que em Portugal não temos disponível a penicilina oral, o tratamento poderá ser com amoxicilina, 50 mg/Kg/dia(1,2,5,6,11). Contudo são frequentes os insucessos terapêuticos, mesmo com tratamento durante 10 dias, sendo necessário a repetição do ciclo terapêutico e/ou administração de outros antibióticos(1). Especula-se que os germens locais, produtores de beta-lactamases, poderão inibir a acção da penicilina, protegendo o EβGA. A alternativa será a utilização de amoxicilina + ácido clavulânico, nas mesmas doses(1,11). Existem também autores que utilizam com sucesso a eritromicina oral (50 mg/kg/ dia) com rápido alívio sintomático e culturas de controle, no final do tratamento, negativas(1,2,3,5,6,9). No presente caso, um único curso de eritromicina resultou na rápida resolução das queixas, sem recidiva sintomática. O tratamento deve durar sempre no mínimo 10 dias(9), pois um tratamento mais curto predispõe a várias recorrências. Como as recorrências são muito frequentes, principalmente após o tratamento com amoxicilina (40-50%)(3), deve-se fazer um follow-up da criança e documentar bem a cura. Nas recorrências o tratamento é eficaz e nestas situações pode-se utilizar a eritromicina, que é um antibiótico com poucos efeitos NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 laterais e atinge bons níveis terapêuticos nos tecidos moles, sendo por isso uma boa opção terapêutica(3, 10). CONCLUSÃO Perante uma criança com eritema perianal associado ou não a dor com a defecação, exsudado ou prurido, devese pensar numa Dermatite Estreptocócica Perianal. O diagnóstico é baseado na suspeita clínica que deve ser confirmada com o teste rápido da lesão para pesquisa do estreptococo β-hemolítico. O início do tratamento adequado deve ser de imediato para evitar a cronicidade desta situação e resolução rápida das queixas. PERIANAL STREPTOCOCCAL DERMATITIS ABSTRACT Perianal Streptococcal Dermatitis caused by group A beta-hemolytic streptococcus, is a well defined identity but frequently not recognized; the delay in treatment exposes children to the usual complications such as painful defecation, constipation, rectal bleeding during invasives exams and suspicion of sexual abuse. When treated at an early stage it has a good and faster resolution. The autors describe a clinical report of an eleven years’ old boy with Perianal Streptococcal Dermatitis and with a short review of the subject. Keywords: Perianal Streptococcal Dermatitis, group A Beta-hemolytic streptococcus. Nascer e Crescer 2008; 17(4): 237-239 BIBLIOGRAFIA 1. Salgado M, Alegria A. Dermatite Estreptocócica Perianal. Saúde Infantil 1991; XIII: 135-137. 2. Souillet A L, Truchot F, Jullien D, Dumas V, Faure M, Floret D. Anité périanale streptococcique. Arch Pédiatr 2000; VII: 1194-6. 3. Krol L A. Perianal Streptococcal Dermatitis. 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É um diagnóstico de exclusão, devendo outras possíveis causas ser estudadas: discrasias sanguíneas, complicações de gravidez, endocrinopatias, patologia pélvica e medicamentos. Os autores fazem uma revisão da fisiopatologia, avaliação diagnóstica e tratamento, no sentido de uniformizar atitudes terapêuticas. Palavras-Chave: hemorragia uterina disfuncional, adolescência, diagnóstico, tratamento. Nascer e Crescer 2008; 17(4): 240-244 INTRODUÇÃO A Hemorragia Uterina Disfuncional (HUD) é uma patologia comum na adolescência. Cerca de 75% das adolescentes recorrem aos serviços de saúde por alterações menstruais pelo menos uma vez durante a adolescência(1) e são causa frequente de absentismo escolar(2). Em 90 a 95% das vezes, a HUD é a principal responsável. __________ 1 2 3 4 Interna Complementar de Pediatria Interna Complementar de Ginecologia e Obstetrícia Chefe de Serviço de Pediatria Assistente Hospitalar de Pediatria Centro Hospitalar do Alto Ave, EPE - Guimarães 240 artigos de revisão Por este motivo é importante conhecer os mecanismos fisiológicos do ciclo menstrual normal e as várias entidades clínicas a excluir. FISIOLOGIA DO CICLO MENSTRUAL O ciclo menstrual normal sugere que o eixo hipotálamo-hipófise-ovário (HHO) e o endométrio estão funcionantes. Este ciclo pode ser dividido em três fases: folicular, ovulatória e lútea. Durante a fase folicular existe uma produção cíclica e regular de estradiol, que é responsável pelo crescimento folicular e proliferação endometrial. Após a ovulação (fase lútea) ocorre a produção de progesterona cuja acção “anti-estrogénica” estabiliza o crescimento do endométrio. Embora a fase pós-ovulatória seja em média de 14 dias, a maior variabilidade da fase proliferativa faz com que o ciclo menstrual normal apresente um intervalo de 21 a 36 dias, com cataménio de 4 a 6 dias e um volume de sangue entre 30 a 80 mL(3). Nos ciclos anovulatórios, a ausência de progesterona origina um crescimento endometrial anormal, ocorrendo descamação irregular. O fluxo é prolongado e excessivo não apenas pela grande quantidade de tecido disponível para sangramento, mas também pela ruptura desordenada e abrupta do endométrio. Os ciclos menstruais são classificados de acordo com o intervalo, duração e quantidade de perda (4) (quadro I). A menarca ocorre entre os 11 e os 14,5 anos em cerca de 95% das raparigas(5) , determina o fim da puberdade e geralmente ocorre num estadio 4 de Tanner(6). A telarca geralmente ocorre 2 anos antes da menarca. Apenas 20% dos ciclos menstruais são ovulatórios durante o primeiro ano após a menarca(7) e 80% são ciclos irre- gulares, com duração de 21-45 dias e cataménios de 2-7 dias(8) . O padrão individual do ciclo menstrual estabiliza ao fim de 6 anos, sendo que nas raparigas com menarca precoce, ocorre mais rapidamente(9). Quando a menarca ocorre antes dos 12 anos, 50% dos ciclos são ovulatórios no primeiro ano, enquanto que nas adolescentes com menarca tardia, decorrem 8 a 12 anos até que todos os ciclos sejam ovulatórios(10). É importante informar a adolescente do seu padrão menstrual, baseado na idade de menarca, e sua evolução previsível. HEMORRAGIA UTERINA DISFUNCIONAL Aproximadamente 90% dos casos de hemorragia uterina anormal na adolescência devem-se a hemorragia disfuncional(11). Por definição, a HUD é uma hemorragia do endométrio, não dolorosa, excessiva e irregular, não atribuída a complicações da gravidez, alterações pélvicas estruturais ou doenças sistémicas(12). Na adolescência, esta entidade é consequência da presença de ciclos anovulatórios por imaturidade do eixo HHO. Mais raramente, ocorre ovulação mas é produzido um corpo lúteo anormal com secreção de níveis insuficientes de progesterona. DIAGNÓSTICO O diagnóstico de HUD só poderá ser estabelecido após exclusão de complicações de gravidez, causas iatrogénicas, doenças sistémicas ou patologia óbvia do aparelho genital (quadro II). O diagnóstico etiológico é portanto um desafio ao senso crítico do médico, à sua perspicácia na observação e interpretação dos sinais e sintomas, e à sua capacidade de saber utilizar os meios auxiliares de diag- NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 nóstico adequados para a comprovação ou exclusão das possíveis patologias (quadro III). A gravidez deverá ser excluída na adolescente com hemorragia uterina anormal. Causas possíveis de hemorragia relacionada com a gravidez incluem o abortamento, gravidez ectópica e menos frequentemente, placenta prévia, descolamento placentar e doença do trofoblasto. As causas iatrogénicas deverão ser consideradas. A hemorragia poderá ser induzida por fármacos, tais como anticoagulantes, anticoncepcionais com toma irregular, inibidores da recaptação da serotonina, anti-psicóticos, corticosteróides e tamoxifeno. Suplementos de ginseng ou soja podem provocar irregularidades menstruais por alteração dos níveis de estrogénios ou da cascata da coagulação. Após exclusão de gravidez e iatrogenia, é fundamental excluir doenças sistémicas, particularmente doença tiroideia, hematológica, hepática, suprarenal, hipofisária, hipotalâmica e ovárica, nomeadamente o síndrome de ovários poliquísticos. Infecções, dietas radicais, exercício intenso, traumatismo ou mais raramente neoplasias do aparelho genital podem ser responsáveis por hemorragia uterina anormal na adolescência. 1. História clínica Questionar detalhadamente a história ginecológica: idade da menarca, duração dos ciclos menstruais e dos cataménios, quantidade (frequência de troca de pensos absorventes e quantidade de fluxo em cada troca) e coloração do sangue perdido, presença de coágulos ou dor. A história detalhada deve ser obtida de preferência sem a presença dos pais para se pesquisar a vida sexual, muitas vezes mantida em segredo pela maioria das adolescentes, com vista a excluir doenças sexualmente transmissíveis e complicações associadas à gravidez. Quadro I – Classificação dos ciclos menstruais anormais de acordo com o intervalo, duração ou quantidade de perda sanguínea Termo Definição Oligomenorreia Hemorragia irregular que ocorre com intervalos >35 dias. Geralmente deve-se à presença de fases foliculares prolongadas. Polimenorreia Hemorragia regular que ocorre com intervalos <21 dias. Poderá ser causado por alterações da fase luteínica. Menorragia Hemorragia ocorre com intervalos normais (21 a 35 dias) mas com duração e fluxos excessivos (≥7 dias e ≥80 mL). Metrorragia Hemorragia irregular que ocorre entre os ciclos ovulatórios. Menometrorragia Hemorragia com intervalos irregulares, duração e fluxo excessivos (≥7 dias e ≥80 mL). Hipomenorreia Hemorragia que ocorre com regularidade e em quantidade diminuída Amenorreia Ausência de hemorragia durante um período ≥3 meses. Quadro II – Diagnóstico Diferencial de Hemorragia Uterina Anormal(4, 13, 14, 15) Gravidez e complicações associadas Doenças sistémicas Abortamento Hiperplasia da supra-renal, doença de Cushing Gravidez ectópica Discrasias sanguíneas (trombocitopenia, alterações da coagulação) Doença do trofoblasto Doença hepática Placenta prévia Supressão hipotalâmica Fármacos e causas iatrogénicas Adenoma pituitário ou hiperprolactinemia Contraceptivos orais Síndrome do ovário poliquístico Anticoagulantes Doença renal Corticosteróides Hiper- ou hipotiroidismo Antipsicóticos Lupus eritematoso sistémico Espironolactona Patologia do aparelho genital Dispositivo Intra-uterino Infecções (cervicite, endometrite, miometrite, salpingite) Suplementos (ginseng, soja) Neoplasias Tamoxifeno Traumatismo (corpo estranho, abuso sexual) Hemorragia Uterina Disfuncional (diagnóstico de exclusão) artigos de revisão 241 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 Quadro III – Avaliação da Hemorragia Uterina Anormal História Sinais, sintomas e avaliação diagnóstica Diagnósticos Dor pélvica Abortamento, gravidez ectópica, Doença Inflamatória Pélvica (DIP), traumatismo, abuso sexual Náuseas, aumento de peso e da frequência urinária, fadiga Gravidez Aumento de peso, intolerância ao frio, obstipação, fadiga Hipotiroidismo Perda de peso, hipersudorese, palpitações Hipertiroidismo Equimoses não traumáticas, hemorragia fácil Coagulopatia, leucemia Icterícia, história de hepatite Doença hepática Hirsutismo, acne, acantose nigricans, obesidade Síndrome do ovário poliquístico Hemorragia pós-coital Displasia cervical, pólipos endometriais Galactorreia, cefaleias, distúrbios visuais Adenoma da glândula pituitária Perda de peso, exercício excessivo, stress emocional Supressão hipotalâmica Bócio, aumento de peso, edema Hipotiroidismo Taquicardia, perda de peso Hipertiroidismo Icterícia, hepatomegalia Doença hepática Aumento do volume uterino Gravidez, leiomioma, carcinoma uterino Massa anexial Tumor ovárico, gravidez ectópica, quisto ovárico Palpação uterina dolorosa DIP, endometrite β-HCG Gravidez Hemograma com contagem de plaquetas e estudo da coagulação Coagulopatia Função hepática, tempo de protrombina Doença hepática Função tiroideia Hipotiroidismo, Hipertiroidismo Prolactina Adenoma pituitário Glicemia Diabetes mellitus DHEA-S, testesterona livre, 17-OHP Tumor ovárico ou supra-renal Citologia cervico-vaginal Displasia cervical Biópsia endometrial ou curetagem Hiperplasia, atipia ou adenocarcinoma Ecografia transvaginal Gravidez, tumor ovário ou uterino Histeroscopia Lesões intracavitárias, pólipos, fibromas submucosos Exame físico Avaliação laboratorial Imagiologia e histologia 242 artigos de revisão NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 Os hábitos de vida devem ser inquiridos, incluindo dietas de emagrecimento, prática de exercício físico, hábitos tabágicos, alcoólicos e drogas. Questionar alterações recentes da massa corporal, hábitos alimentares, factores de stress psicológico e consumo de fármacos. O uso de anticoagulantes, anticonvulsivantes, antidepressivos tricíclicos ou digitálicos podem induzir um aumento do fluxo. É importante conhecer a história ginecológica da mãe e irmãs, assim como a história familiar de endocrinopatias (doenças da tiroide, doença de ovário poliquístico) e hematológicas (doença de von Willebrand (DVW) ou defeito funcional plaquetário (PFD)). 2. Exame físico e ginecológico Avaliar o peso, altura, índice de massa corporal e estadio pubertário de Tanner. A determinação dos sinais vitais com medida da pressão arterial em decúbito dorsal e sentada são fundamentais na avaliação da estabilidade hemodinâmica da adolescente com hemorragia activa. O exame clínico pode revelar sinais de coagulopatia (petéquias, equimoses), hiperandrogenismo (acne, hirsutismo, clitoromegalia), diabetes mellitus (acantose nigricans) ou doença tiroideia (bócio). Na adolescente não-sexualmente activa deverá ser realizado um exame ginecológico digital para pesquisa de corpos estranhos intravaginais ou toque rectal para avaliação de massas pélvicas. Se a adolescente tiver iniciado a actividade sexual, procede-se à avaliação uterina e anexial por palpação bimanual(12). 3. Exames complementares Na avaliação inicial da adolescente com HUD é fundamental incluir o hemograma (com contagem de plaquetas), a fim de estabelecer a intensidade da anemia; e ecografia pélvica e/ou transvaginal para exclusão de patologia ovárica ou uterina estrutural ou gravidez. O doseamento de β-HCG, citologia cervico-vaginal e pesquisa de Neisseria Gonorrhoea e Chlamydia trachomatis devem ser incluídas nas adolescentes que iniciaram a actividade sexual. A solicitação de estudo da coagulação não deverá ser esquecida, principalmente quando a hemorragia uterina anormal surge na menarca. Alterações da coagulação estão presentes em cerca de 30% das adolescentes que necessitam de transfusão de glóbulos rubros (16). A menarca é, para muitas adolescentes, o primeiro “teste” dos mecanismos de coagulação, por isso, patologias como doença de Von Willebrand, deficiência de protrombina, púrpura trombocitopênica idiopática, ou distúrbios que levam a deficiência ou disfunção plaquetária, como leucemias e hiperesplenismo, só serão suspeitadas ou diagnosticadas neste período. A citologia cervico-vaginal deve ser realizada, especialmente nas pacientes com quadros crónicos e ausência de resposta ao tratamento, lembrando que neoplasias embora raras também podem ocorrer nesta faixa etária. Nas pacientes que apresentam hemorragia recidivante e achados sugestivos na história clínica e exame objectivo (quadro III), deverão ser pesquisadas endocrinopatias através de doseamentos hormonais (hormona foliculo-estimulante (FSH), hormona luteinizante (LH), prolactina (PRL), Estradiol, Progesterona, Testosterona livre, Testosterona total, Delta 4 Androstenediona, sulfato de diidroepiandrosterona (DHEA-S), Cortisol, 17 – hidroxiprogesterona (17-OHP), hormona tiroi- do-estimulante (TSH), tiroxina livre (T4L). Se PRL>100 ng/mL, é mandatório a realização de RMN cerebral(17). TRATAMENTO O tratamento visa controlar a hemorragia, restabelecer a volémia e prevenir a recorrência e as sequelas. Tratamento de urgência O internamento está recomendado se a doente apresenta hemorragia activa grave abundante e/ou repercussões hemodinâmicas, e/ou hemoglobina <7 g/ dL. Pode ser necessário transfusão de glóbulos rubros para correção da anemia em adolescentes com hemoglobina <7 g/dL. Nestes casos é necessária uma intervenção hormonal mais agressiva, tal como é esquematizado no quadro IV. O estrogénio conjugado endovenoso deve ser utilizado nas situações de hiperemese e apenas até controlar a hemorragia. Se a hemorragia não ceder em 48 horas, considerar o exame ginecológico sob anestesia e eventualmente histerospia. A dilatação e curetagem deve ser o último recurso. Doentes com DVW ou PFD podem responder à desmopressina intra-nasal. Tratamento de manutenção Na hemorragia grave (activa e abundante e/ou repercussões hemodi- Quadro IV – Terapêutica hormonal a instituir na HUD grave (17) Estrogénios (17 ß estradiol) 4 mg oral de 6-6 horas (no máximo 24 horas) (se não diminuir a hemorragia em 6-12 horas, iniciar estrogénio conjugado endovenoso – 25 mg, 6/6 horas, máximo 6 doses) + 2 mg oral de 6-6 horas (2 dias) + 2 mg oral de 8-8 horas (2 dias) + 2 mg oral de 12-12 horas (2 dias) + 2 mg oral/dia Progestativo (didrogesterona) 10 mg/dia oral - 10 dias artigos de revisão 243 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 nâmicas, e/ou hemoglobina <7 g/dL), o tratamento de manutenção consiste na suplementação de ferro e ácido fólico e na administração de: - 17 ß estradiol (2 mg/dia - 21 dias) e didrogesterona (10 mg/dia - nos últimos 10 dias) durante 3 meses, ou - 17 ß estradiol 2 mg durante 14 dias e 17 ß estradiol 2 mg + didrogestenona durante 14 dias (durante 3 meses), ou - contraceptivo oral (se e enquanto desejar contracepção)(17). O uso de antiinflamatórios nãoesteróides (AINE’s) como o ibuprofeno podem reduzir a perda hemática em 30 a 50%. Deverão ser administrados durante todo o cataménio. Tratam-se de fármacos úteis como tratamento co-adjuvante ao tratamento hormonal, especialmente em adolescentes com menorragia(18). Na hemorragia disfuncional moderada (hemoglobina 10 - 12g/dL) está indicada a suplementação de ferro oral e ácido fólico e administração de 17 ß estradiol em baixas doses (2 mg/dia – 21 dias) e didrogesterona (10 mg/dia – nos últimos 10 dias) ou contraceptivo oral (se e enquanto desejar contracepção)(17). A adolescente com hemorragia ligeira (hemoglobina >12g/dL) requer o mínimo de intervenção médica. Deverá ser elaborado um calendário menstrual e manter atitude expectante com reavaliação da situação. CONCLUSÃO A HUD é um problema comum na adolescente, principalmente nos dois primeiros anos após a menarca, pois os ciclos menstruais tendem a ser anovulatórios. O seu diagnóstico só é possível após exclusão de gravidez, causas iatrogénicas, doenças sistémicas e alterações anatómicas do aparelho genital. Trata-se portanto de um desafio diagnóstico frequentemente colocado ao Pediatra, que em colaboração com o Ginecologista programará a terapêutica. O prognóstico das adolescentes com ciclos anovulatórios por imaturidade do eixo HHO é excelente. 244 artigos de revisão DYSFUNCTIONAL UTERINE BLEEDING IN ADOLESCENCE SUMMARY The menstrual disorders constitute about 50% of gynaecological complaints in adolescence, and the dysfunctional uterine bleeding accounts for 90 to 95% of cases. This is a very common clinical entity in the first 2 years after menarche, because the menstrual cycles tend to be anovulatory. It is a diagnosis of exclusion, and other possible causes should be studied: coagulation disorders, complications of pregnancy, endocrinopathies, pelvic pathology and medications. The authors present a review of the pathophysiology, diagnostic evaluation and treatment in order to unify attitudes. Key-words: dysfunctional uterine bleeding, adolescence, diagnosis, treatment. Nascer e Crescer 2008; 17(4): 240-244 BIBLIOGRAFIA 1. Ziv A, Boulet JR, Slap GB. Utilization of physician offices by adolescents in the United States. Pediatrics. 1999 Jul;104(1 Pt 1):35-42. 2. Klein JR, Litt IF. Epidemiology of adolescent dysmenorrhea. Pediatrics. 1981 Nov;68(5):661-4. 3. Rehme M, Berezowski G, Cavalcante A. Hemorragia Uterina Disfuncional na Adolescência. Rev. Bras. Ginecol. Obstet. 2001 Jul;29(3):339-342. 4. Albers JR, Hull SK, Wesley RM. Abnormal uterine bleeding. Am Fam Physician. 2004 Apr 15;69(8):1915-26. 5. Tanner JM, Davies PS. Clinical longitudinal standards for height and height velocity for North American children. J Pediatr. 1985 Sep;107(3):317-29. 6. Root AW. Endocrinology of puberty. I. Normal sexual maturation. J Pediatr 1973;83:1–19. 7. Edmonds DK. 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ABSTRACT We examined the prevalence of vitamin D deficiency and insufficiency in children attending our tuberculosis (TB) clinic during a 2-year period. Sixty-four patients were included with active TB (n= 26) or latent TB infection (n= 38). Eighty-six percent (n=55) were vitamin COMENTÁRIOS Este estudo foi feito em Inglaterra. Os doentes tinham uma idade média de 8,4 anos (limites de 0,1 a 17 anos). A maioria pertencia a minorias étnicas, africanos e sul asiáticos. A deficiência/ insuficiência em vitamina D era maior nas crianças acima dos 10 anos e no Inverno. Os autores atribuem a falta de vitamina D, para além da menor radiação solar no Inverno, a outros factores com dietas vegetarianas, pele mais pigmentada e vestuário. A notificação de doentes com tuberculose pulmonar aumentou no verão, especulando os autores que esta sazonalidade se poderia relacionar com o longo período de maior carência em vitamina D, o que permitiria activação de formas latentes. Os autores referem não haver estudos publicados que suportem a hipótese da carência em vitamina D contribuir para a activação de formas latentes de tuberculose. No entanto, socorrem-se de trabalhos que apontam para um reforço imunitário na sua presença: nos neutrófilos aumenta a catelicidina, um péptido com funções antimicrobianas; a incubação de monócitos infectados com micobactérias com doses crescentes de vitamina D, restringe o crescimento bacteriano; uma única dose oral de vitamina D aumenta a imunidade para micobactérias, observada em modelos de infecção baseados em sangue total. Deduzem D deficient (serum 25-hydroxyvitamin D< 20 nmol/L) or insufficient (serum 25-hydroxyvitamin D< 75 nmol/L). Only one child with active T B was vitamin D replete. Keywords: tuberculosis, vitamin D, deficiency, insufficiency, children então que a luz solar e a suplementação oral sobem os níveis de vitamina D e esta aumenta a capacidade fagocitária de monócitos e macrófagos, leva à morte microbiana, especialmente de micobactérias. Teremos aqui uma boa perspectiva para explicação dos êxitos obtidos nos tempos passados, no Caramulo? Será a vitamina D um “tuberculicida”? Poder-seá especular que sim. Mas sobre vitamina D há outros dados e atributos não especulativos, tais como: Não é uma vitamina, mas uma próhormona. Que mais não fosse, pelo facto de que não preenche os requisitos para poder ser vitamina: um nutriente indispensável à vida, não sintetizado pelo organismo, portanto de fornecimento exógeno propriamente dito (alimentar) ou não (microbiota intestinal). A sua estrutura molecular é inclusivamente muito semelhante às hormonas esteróides: estradiol, cortisol e aldosterona (1,2). Classicamente, a acção da vitamina D relaciona-se com a saúde óssea, mas ultimamente tem-lhe vindo a ser imputadas outras acções biológicas. Têm sido encontrados receptores para a sua forma hormonal, a 1,25-dihidroxivitamina D, em múltiplas células para além das clássicas (enterócitos, células tubulares renais e osteoblastos), como é o caso de promielócitos, linfócitos T e D, queratinócitos, células beta-pancreáticas, da paratiróide, hipófise, cólon, ovário, mama, próstata, coração e pulmões. Admite-se que a falta da vitamina D possa relacionar-se com uma plêiade de doenças: esclerose múltipla, artrite reumatóide, doença inflamatória intestinal, psoríase, asma, diabetes tipo 1, hipertensão e doenças cardiovasculares, neoplasias do cólon, da próstata, do ovário e da mama, depressão e esquizofrenia (3-10). A suplementação com vitamina D poderá diminuir a mortalidade global (11,12). Embora algumas destas doenças sejam observadas no adulto, não podemos esquecer que a carência crónica na criança, ainda que assintomática, venha a ter reflexos décadas depois, devendo estar atentos a possíveis consequências com elevada morbilidade e mortalidade, resultantes de uma carência nutricional com prolongada latência. Quando a criança chegar a adulto, deve ser um adulto o mais saudável possível e não portador de algo de momento inaparente, vindo a ter expressão clínica anos depois. No capítulo da saúde óssea, o assunto parecia arrumado, mas não, pois o raquitismo está de volta13. A Academia Americana de Pediatria reviu, por isso, e recentemente, as suas orientações para prevenção do raquitismo e deficiência de vitamina D. Recomenda um suplemento diária de vitamina D de 400 UI para lactentes amamentados, desde os primeiros artigo recomendado 245 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 dias de vida, em vez das 200 UI a iniciar pelos 2 meses. Esta mesma dose deve ser administrada a crianças e adolescentes, se a nutrição e a exposição solar não assegurarem este aporte. Acrescenta que havendo forte evidência de que a carência em vitamina D durante a gestação venha a ter repercussões negativas na mulher e no desenvolvimento fetal, se deva ter em conta o estado em vitamina D na grávida, verificando-se os seus níveis, na forma de 25-OH-D, e que se não atingirem valores adequados,> 80 nmol/L, se suplemente com uma maior dose do que as tradicionais 400 UI existentes nos suplementos minero-vitamínicos, a qual influencia pouco os níveis maternos 14. Ultimamente, a literatura tem vindo a referir haver uma carência generalizada em vitamina D. Este facto deve-se particularmente à redução da exposição solar devida ao número de horas que crianças e adultos passam dentro de casa, ao uso de filtros solares aquando a exposição solar no verão, à poluição e às condições geográficas como latitude (> 37º a radiação solar é pobre em ultra-violetas) e altitude. O aporte alimentar tem ainda vindo a diminuir e há estados de mal-absorção intestinal não diagnosticados, como a doença celíaca. O estado em vitamina D tem vindo também a merecer atenção, considerando-se deficiência severa, deficiência, insuficiência, suficiência, excesso e intoxicação conforme níveis (nmol/L) respectivamente de <12.5, <37.5, 37.550, 50-250,> 250 e> 375 15. Portugal está numa zona de risco (acima de 37 º de latitude); a baixa altitude ajuda a reduzir ainda o teor destes raios e a população tem-se deslocado para o litoral; as condições alimentares não são as melhores e para além do primeiro ano de vida, não há hábito de recomendar suplemtação de vitamina D. sintetizar no seguinte: primeiro, há outros receptores celulares, para além dos clássicos; segundo, estes receptores precisam de níveis mais elevados para serem estimulados; terceiro, da falta desta estimulação poderá resultar morbilidade e mortalidade elevadas e passíveis de prevenção e, quarto, regista-se uma carência generalizada de vitamina D, devido a novos estilos de vida. Estamos assim perante um problema de saúde publica não reconhecido, de prevalência e gravidade elevadas, merecendo a atenção da comunidade médica e não só. Tojal Monteiro1 Nascer e Crescer 2008; 17(4): 245-246 BIBLIOGRAFIA 1. 2. 3. 4. 5. O artigo que escolhemos para comentar ilustra bem as novas opiniões da importância da vitamina D, à luz dos recentes conhecimentos acerca da sua fisiologia, conhecimentos que se podem __________ 1 Professor de Pediatria do ICBAS/HGSA 246 artigo recomendado De Luca H F. Overview of general physiologic features and functions of vitamin D. Am J Clin Nutr 2004; 80 (suppl): 1689S-1696S. Norman A W. From vitamin D to hormone D: fundamentals of vitamin D endocrine system essential for good health. Am J Clin Nutr 2008; 88 (suppl):491S-499S. Holick MF. High prevalence of vitamin D inadequacy and implications for health. Mayo Clin Proc 2006; 81 (3): 353-373. Camargo C A, Rifas-Shiman SL, Litonjua A A, Rich-Edwards J W, Weiss S T, Gold D R et al. Maternal intake of vitamin D during pregnancy and risk of recurrent wheeze in children at 3 y of age. Am J Clin Nutr 2007; 85:788795. Devereux G, Litonjua A A, Turner S W, Craig L C A, McNeill G, Martindale S, et al. 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NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 The Importance of Play in Promoting Healthy Child Development and Maintaining Strong Parent-Child Bonds Kenneth R. Ginsburg, MD, MSEd and the Committee on Communications and the Committee on Psychosocial Aspects of Child and Family Health Pediatrics 2007; 119:182-191 Play is essential to development because it contributes to the cognitive, physical, social, and emotional wellbeing of children and youth. Play also offers an ideal opportunity for parents to engage fully with their children. Despite the benefits derived from play for both children and parents, time for free play COMENTÁRIOS Um excelente texto de revisão sobre os benefícios do brincar no desenvolvimento infantil e os obstáculos que a vida actual coloca às famílias para a sua fruição pelas crianças. Fundamental para pediatras e profissionais que lidam com crianças, já que aborda um assunto de especial interesse, e que por vezes condiciona de forma marcante o quotidiano e a organização da vida familiar. O autor relembra as vantagens, comprovadas pela investigação, do brincar: estimula a linguagem, a motricidade, a cognição, a resolução de problemas; do ponto de vista relacional, promove o desenvolvimento do sentimento de partilha, de cooperação entre crianças e propicia experiências de prazer e liberdade na relação com adultos. É também um direito das crianças reconhecido pela Organização Mundial da Saúde. Entenda-se aqui o brincar centralizado pela criança, quando usa brinquedos que lhe exigem uma participação activa da imaginação, da fantasia e da criatividade (não estão aqui incluídos a televisão ou jogos de computador). Para crianças mais velhas e adolescentes tem o mesmo significado do dispor de algum tempo livre. has been markedly reduced for some children. This report addresses a variety of factors that have reduced play, including a hurried lifestyle, changes in family structure, and increased attention to academics and enrichment activities at the expense of recess or free childcentered play. This report offers guide- Sabe-se que o brincar deveria ser uma actividade diária e, particularmente nas crianças pré-escolares, algum desse tempo deveria consistir em brincadeiras com os pais. Um programa de treino parental denominado Incredible Years1, de larga utilização em outros países, agora também disponível no Departamento de Pedopsiquiatria do Hospital Maria Pia, estabelece como ponto fundamental do trabalho com os pais, o disponibilizar dez minutos diários a brincar com os filhos, pedindo-se que este tempo seja um tempo genuinamente dedicado a prestar atenção às iniciativas da criança, com um envolvimento que permita à criança liderar sob o interesse e a participação adequada dos pais. Mas muitos factores da vida moderna dificultam a existência de tempo livre para as crianças: o número importante de famílias monoparentais ou em que os dois progenitores trabalham e a necessidade de serem colocadas em instituições ou centros de actividades, o tempo dispendido nas viagens, a popularização de meios de entretenimento passivo (televisão e jogos de computador), a inexistência de espaços seguros e apropriados. A escolaridade e a pressão para uma preparação que viabilize a entrada no ensino superior (particular- lines on how pediatricians can advocate for children by helping families, school systems, and communities consider how best to ensure that play is protected as they seek the balance in children’s lives to create the optimal developmental milieu. mente para determinados cursos) são também potentes concorrentes. Alertase para a pressão dos meios de comunicação social e mercado que oferecem actividades e programas enriquecedores académicos e que pode fazer criar um estilo de vida apressado, do qual desaparece o tempo livre, sobrecarregando os pais e podendo também gerar ansiedade e stress. A pressão para uma educação académica de excelência, pode fazer dominar sentimentos de competitividade, de compulsão para o perfeccionismo e o “sucesso a todo o custo”. Por outro lado, a redução do tempo livre e do tempo de qualidade para as interacções familiares, são também afectados no seu papel de protecção contra o stress e ansiedade. Estes são factores que de algum modo estão presentes em muitos dos motivos de consultas em serviços de saúde mental. Diferente pode ser a situação de crianças de meios sociais desfavorecidos, em que pelo contrário, podem ser úteis as actividades estruturadas para reduzir o tempo sem supervisão de adultos. O pediatra torna-se, neste trabalho, um conselheiro capaz de discutir e orientar os pais nas suas opções, escolhas e decisões, acerca das actividades artigo recomendado 247 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 extra-curriculares ou programas de lazer para o tempo após as aulas. O artigo, embora não recusando a importância de outras actividades para o desenvolvimento e bem-estar das crianças, alerta para o risco do desaparecimento de tempo livre e a oportunidade do brincar não estruturado, advogando __________ 1 Pedopsiquiatra do Hospital Maria Pia/CHPorto 248 artigo recomendado que se encontre um ponto de equilíbrio na organização do quotidiano, de forma a promover-se um desenvolvimento equilibrado nos domínios académico, social e emocional. Maria do Carmo Santos1 Nascer e Crescer 2008; 17(4): 247-248 BIBLIOGRAFIA 1. www.incredibleyears.com NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 Comissões de Ética – o Desafio Metodológico Daniel Serrão1 RESUMO As Comissões de Ética para a Saúde, depois de um período em que foram bem aceites enfrentam, hoje, um problema de metodologia de trabalho e de critérios para a sua constituição e para a tomada de decisões. São apresentadas recentes propostas da UNESCO que não resolvem o problema de fundo e se limitam a regular aspectos formais da constituição e funcionamento destas Comissões. Propõe-se uma metodologia que dê ênfase ao aspecto da ética individual dos membros da Comissão e ao carácter descritivo e prescritivo dos pareceres produzidos. Sem a preocupação de consensos e valorizando a complementaridade. Palavras-chave – Comissões,ética, eticidade, consenso ético, complementaridade Nascer e Crescer 2008; 17(4): 249-252 INTRODUÇÃO Tive alguma responsabilidade na criação de Comissões de Ética na área da Saúde em Portugal. O artigo que publiquei na Revista “Gestão Hospitalar” aí por 1989, , foi o primeiro aviso de que era necessário que as Instituições prestadoras de Cuidados de saúde tivessem uma Comissão de Ética. Este aviso foi acolhido e tive a honra de constituir e coordenar a primeira Comissão de Ética hospitalar, independente dos órgãos de gestão, no Hospital de S. João. Foi em 1990. Só em 1995 (Decre- __________ 1 Professor no Instituto de Bioética da UCP to-Lei n.º 97/95) foi publicada a primeira lei que regulamenta as Comissões de Ética nos cuidados de saúde e apenas nos Hospitais, deixando de fora os Centros de Saúde Agora, quase vinte anos depois, quero reflectir convosco sobre como pode trabalhar uma Comissão de Ética. A questão que vou suscitar é, portanto, essencialmente de metodologia. Começarei pelo fundamento da questão. CONCEITOS Quando Potter lança o conceito de Bioética, define-a como uma nova disciplina científica. Como todas as outras disciplinas do conhecimento, tinha um objectivo e uma metodologia própria para atingir esse objectivo. O objectivo era o de conseguir que todas as decisões humanas procurassem ser um bem para a pessoa concreta e conseguissem melhorar a condição humana em geral. A metodologia para atingir este objectivo era a de cruzar, horizontalmente, todos os conhecimentos científicos sobre a natureza corporal dos seres humanos, com todos os conhecimentos científicos sobre a forma particular de ser e de estar dos homens no mundo. A esta forma peculiar do existir humano chamou Potter o ethos dos seres humanos e daqui criou a palavra Bioética para designar esta nova disciplina científica. Para Potter, o cruzamento dos saberes científicos, sendo uma relação de feedback com aportes múltiplos e nas duas direcções – o biologista molecular a forçar a reflexão do filósofo, e este a fazer pensar o outro – haveria de conduzir a uma nova sabedoria que seria o conteúdo da nova disciplina: a sabedoria de usar todos os saberes para o melhor bem de cada homem e para a melhoria universal da condição humana. Assim, a palavra ética, no novo vocábulo Bioética, é usada como um substantivo que descreve e caracteriza as propriedades dos seres humanos que estão para além da biologia corporal e são estudadas na história, na sociologia, na filosofia, na teologia. Por isso, a Bioética não tem como objectivo avaliar a qualidade das decisões de cada pessoa no seu viver diário profissional ou social em geral. A Bioética olha para as situações que ameaçam a sobrevivência dos humanos e suscita o estudo dessas situações, por cientistas da Biologia e por cultores das Ciências Humanas e Sociais, para que sejam propostas às organizações sociais, políticas e económicas, as grandes opções que podem garantir a nossa sobrevivência. Para Potter, a Bioética, como disciplina nova do pensamento humano, é, verdadeiramente, uma estratégia de sobrevivência. Mas esta Bioética, assim entendida como Bioética global, é um chapéu sob o qual se podem acolher análises sectoriais, que são como que partes constituintes desta Bioética Global. Quando, porém, estas análises sectoriais usam a palavra ética para se identificarem, por exemplo ética médica ou ética ambiental, estão a usá-la na forma adjectiva. Não como ética substantiva do agente, mas como eticidade dos actos e das decisões. Para a questão metodológica que pretendo tratar, é importante esta distinção que o idioma inglês faz, com rigor, utilizando Ethics com s, não como o plural de Ethic, mas como um adjectivo, para acolher a adjectivação dos actos e deci- perspectivas actuais em bioética 249 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 sões humanas, como, por exemplo, bons ou maus, úteis ou inúteis. Então, na língua portuguesa, a palavra ética, substantivo, refere-se a uma capacidade ou categoria da inteligência humana que lhe permite tomar decisões individuais ponderando valores pessoais. Usada no plural, as éticas, refere-se aos sistemas de avaliação externa, de base social, das decisões individuais e/ ou colectivas em relação aos valores de emergência social. O seu estudo pertence, essencialmente, à Sociologia. Usada no sentido adjectivo constitui um julgamento sobre a eticidade ou qualidade ética de um comportamento, acto ou decisão individual; julgamento que pode ser feito por outro indivíduo ou por estruturas sociais e se refere à adequação dos comportamentos, actos ou decisões individuais a valores individuais e a valores sociais. Face a esta sistematização dos entendimentos possíveis da palavra ética onde se situa uma Comissão de Ética? E que é que pode legitimamente esperarse de uma Comissão que se designa por Comissão de Ética?. Penso que são Comissões de Eticidade, ou seja, Comissões de Ética adjectiva. Vou argumentar em defesa desta convicção. COMISSÕES DE ÉTICA A UNESCO, pela sua Divisão de Ética das Ciências e das Tecnologias, publicou em 2005 e 2007 três pequenos livros ou guias, significativamente intitulados assim: • Guia n.º 1 – Como estabelecer Comités de Bioética. • Guia n.º 2 – Os Comités de Bioética em acção: processos e políticas. • Guia n.º 3 – Educando os Comités de Bioética A sua leitura ilustra bem a questão que nos ocupa. À pergunta “o que é um Comité de Bioética?”, os autores (não identificados) do Guia escrevem (e transcrevo apenas o essencial): “É o que trata, de modo sistemático e de forma contínua das dimensões éti- 250 cas a) das ciências da saúde; b) das ciências da vida e c) das políticas de saúde inovadoras”. “É um grupo que se reunirá para tratar de questões que não são simplesmente factuais mas são profundamente normativas… O objectivo do comité de bioética ultrapassa o nível factual dos dados empíricos; ele é estabelecido para responder não apenas à questão – Como devo eu decidir e agir? – mas também à questão mais ampla – Como devemos nós decidir e agir? – Assim passamos da ética – divisão tradicional da filosofia – para a política – Como deve o governo agir?” Tratando do caso específico das Comissões de Ética Hospitalares, o Guia menciona nada menos que 15 funções que elas devem desempenhar e exclui a análise e decisão sobre investigação clínica e ensaios de novos medicamentos que remete para uma Comissão de ética de investigação. Lendo o texto destas 15 funções que não posso reproduzir, claro está, tenho de concluir que uma Comissão de Ética Hospitalar deverá ocupar um lugar central em aspectos como o da educação em bioética, o estabelecimento de princípios directores e de política para o Estabelecimento e fazer a análise das políticas do Estabelecimento relativamente aos direitos e ao bem-estar dos doentes, e até intervir na resolução de diferendos dos profissionais entre si e com os doentes e a sua família, por exemplo, nas decisões de tratar ou não tratar. Estas funções e as restantes enunciadas no Guia levantam dois problemas de maior relevância: a escolha do Presidente e dos Membros e a metodologia da tomada de decisões. O texto é a um tempo prolixo e vago na forma como trata estas questões, tanto num como no outro Guia. E estas questões são fundamentais para o funcionamento correcto de uma Comissão de Ética Hospitalar. Nas entrelinhas percebe-se que primeiro é escolhido o Presidente e este influencia a escolha dos restantes membros. Mas quem escolhe o Presidente e com que critérios? perspectivas actuais em bioética Quando trata, em termos gerais, da escolha do Presidente de uma Comissão de Ética, o guia diz várias coisas importantes, mas apenas sobre os Comités Nacionais. No capítulo das Comissões de Ética Hospitalares, quando trata do recrutamento do Presidente e dos Membros, diz assim: “Uma vez escolhido e nomeado, o Presidente deve encorajar, pela via da conversação produtiva, a cooperação entre os membros da Comissão”. Mas nada diz sobre quem escolhe e quem nomeia. Esta ausência de tomada de posição reflecte, penso eu, a dificuldade de encontrar uma linha directiva face à prática seguida nos diversos países. Mas o processo de designação do Presidente e dos Membros da Comissão é crucial para assegurar a total independência do seu trabalho, a transparência do processo de decisão e o valor dos pareceres que emite. Quando fala dos membros, o Guia refere que a Comissão deve ter um especialista de Bioética, médicos, enfermeiros, um especialista de gestão de riscos, um especialista em Direito da Saúde, um trabalhador social (ou um especialista de ciências do comportamento ou um sociólogo), membros do clero (eventualmente o Capelão do Hospital, se existir) e representantes dos utentes escolhidos pela comunidade local. Esta enumeração deixa em aberto dois problemas – que médicos e que enfermeiros devem ser escolhidos, como e porquê? Vou admitir que estes difíceis obstáculos para a constituição de uma Comissão de Ética Hospitalar foram ultrapassados e que se constituiu uma Comissão de Ética Hospitalar presidida por uma personalidade, como diz o Guia “muito respeitada e bem informada” para exercer a função, e com membros devidamente qualificados para o exercício das suas funções; fica de pé o problema mais difícil: que metodologias vão usar para emitirem os seus pareceres, sejam eles consultivos, sejam eles deliberativos ou vinculativos, em relação à pessoa ou entidade que os solicitou. NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 A meu ver – e esta é uma opinião pessoal – uma Comissão de Ética Hospitalar não deve emitir nunca um parecer deliberativo e vinculativo. Considero, por isso, muito ajustado que os ensaios clínicos, nos quais o parecer da Comissão de Ética era deliberativo e vinculativo, tenham passado para uma Comissão de Ética Especializada de âmbito Nacional que sempre poderá solicitar opiniões – não vinculativas – de Comissões de Ética Hospitalares e de peritos médicos com especialização em éticas sectoriais, como é o caso da Pediatria, das perturbações mentais ou dos cuidados intensivos, por exemplo. METODOLOGIA Analisemos, então, a metodologia. Penso que o primeiro passo para a elaboração de um Parecer será o que designo de ética descritiva. Por ética descritiva entendo a caracterização minuciosa de todos os aspectos da questão que a Comissão tenha de analisar. A descrição exaustiva e minuciosa dos factos em apreço, constitui o primeiro passo e nele deverão participar todos os membros. A caracterização factual deverá ser aprovada por unanimidade, sem lugar para abstenções e reduzida a escrito. Se não há unanimidade, a discussão deve prosseguir até que não reste, em nenhum dos membros, qualquer dúvida sobre o que nos factos é fáctico. Seguidamente deve ser feita a análise da eticidade das decisões que sobre estes factos poderão ser tomadas pelos intervenientes responsáveis – médicos, enfermeiros, administrativos, outros técnicos de saúde. A avaliação da eticidade das possíveis decisões deverá ser feita com relação a valores expressamente citados e a princípios ou virtudes também expressamente referidos na proposta de parecer. Esta fase é a mais criativa do trabalho da Comissão de Ética e é a que obrigará os seus membros a um difícil exercício de ética pessoal. Cada um terá de interrogar-se não sobre os princípios abstractos e abstractamente aplicáveis, mas antes, sobre o porquê da decisão que vai propor ou apoiar. Afirmo, sem ambiguidade e depois de muitos anos de trabalho em Comissões de Ética, que os membros das comissões não são técnicos de ética que aplicam um código, eventualmente principialista ou consequencialista, mas são, sim, pessoas que encontrarão na sua autoconsciência, na intimidade do seu eu pessoal a resposta para si mais ajustada à boa decisão na questão em apreço. Embora íntima e pessoal, embora nascendo nos valores individuais que definem o carácter ou a virtude do membro da Comissão como agente ético, a proposta do membro terá de ser bem fundamentada e escrita. Numa decisão técnica, o agente, como pessoa, pode não figurar, pois são as regras científicas e técnicas que impõem a decisão. Numa decisão para avaliar a eticidade de uma decisão que se refere a pessoas, como pessoas e não apenas como corpos; como pessoas que têm uma natureza ética pessoal e que estão, necessariamente, inseridas num corpo social, ele também apoiado em valores sociais e comunitários que são o suporte da coesão familiar e social; numa decisão desta natureza e complexidade, direi que a pessoa do membro da Comissão assume uma relevância particular. O membro da Comissão vai situarse, ele próprio como pessoa, na situação sobre a qual se vai pronunciar. Esta postura empática deve introduzi-lo, profundamente, na questão em apreço e força-o a considerá-la em todas as suas facetas e a olhá-la sob diversos ângulos de visão. No meu trabalho em Comissões de Ética, como membro ou como Presidente, aprendi que há, claramente, uma visão masculina e uma visão feminina, por exemplo, em questões relacionadas com a procriação; que há uma visão diferenciada pela idade nas questões relacionadas com o fim da vida; que muitas das propostas individuais dos membros estão ligadas ao que tenha sido a sua experiência de vida pessoal. Etc,etc. Também, e de modo mais objectivo, à sua reflexão e ao conhecimento dos autores que escrevem sobre a eticidade em cuidados de saúde ou sobre as diversas antropologias, de base biológica, ou sociológica, ou teológica, ou economicista. Então, cada membro da Comissão de Ética terá, sobre a questão em apreço, uma postura pessoal, de génese muito complexa como procurei justificar. Pode a Comissão, às vezes por sugestão (ou imposição) do Presidente, amalgamar as diversas propostas num parecer dito, então, consensual? Digo, de novo sem ambiguidade, que não. Não há consenso ético. Pode haver, e há, muitas vezes, numa Comissão de Ética, opiniões iguais dos seus membros, referidas a um valor prima facie por todos reconhecido e aceite. Tive esta experiência gratificante quando presidi ao sub-comité do Conselho da Europa que aprovou a recomendação de que fosse proibida a clonagem humana reprodutiva. Considerada como gravemente ofensiva do valor prima facie que é a dignidade humana, todos se reconheceram nesta proibição embora os 9 membros de 9 países diferentes tivessem entendimentos diversos do valor “dignidade humana”. Mas a esta coincidência de opiniões não deve chamar-se consenso. Quando se busca um consenso, o que se pretende é que cada pessoa aceite uma proposta concordando apenas com partes dela e deixando cair a sua discordância face a outras partes. Em ética não devem procurar-se consensos, mas sim complementaridades entre as opiniões individuais. Cada opinião individual de um membro tem uma estrutura sólida: reconhece os valores prima facie em causa – por exemplo, liberdade, justiça, integridade – na descrição da natureza e características particulares da questão em apreço e reflecte sobre eles de forma discursiva e à luz dos seus valores individuais, dos valores do outro e dos valores sociais aplicáveis; e só depois prescreve uma decisão, que será a que, na sua leitura pessoal, acomoda da melhor forma, todos estes valores entre si. Este exercício de eticidade é individual e conduz a uma proposta pessoal de decisão. perspectivas actuais em bioética 251 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 O debate no interior da Comissão poderá permitir a emergência de novos factos ou de uma melhor e mais completa descrição da questão em apreço e permitir que um ou outro membro modifique a sua linha de reflexão ética. Mas isto não é procurar o consenso, mas sim permitir que cada membro possa fundamentar correctamente a sua reflexão e a sua conclusão. Dou um exemplo simples. Se um membro da Comissão de Ética tiver a firme convicção que uma pessoa doente apenas tem problemas corporais, físicos e biológicos orientará a sua reflexão para que o valor integridade corporal seja respeitado. Esta opinião está bem fundamentada e é correcta. Se um outro membro da Comissão de Ética tiver a firme convicção que uma pessoa doente, além de problemas corporais, físicos, tem ainda uma estrutura intelectual afectiva e espiritual que está também perturbada, orientará a sua reflexão para que os valores humanos e sociais sejam ponderados. E esta opinião estará bem fundamentada e é correcta. Ambas as opiniões deverão figurar no Parecer da Comissão porque ambas são legítimas e correctas; e porque partem de premissas racionais diferentes são opiniões complementares, sendo ambas verdadeiras. Este é o conceito de complementaridade que Niels Bohr, que o descreveu para a leitura das propriedades físicas do átomo aplicou, nos últimos anos da sua vida, à reflexão ética. É nesta linha que eu não sou favorável à busca de consensos, nem a opiniões maioritárias e minoritárias. E é igualmente nesta linha que eu não advogo que uma Comissão de Ética tenha o poder de dar deliberações, de praticar uma ética deliberativa. Nem pela sua natureza, nem pela sua composição, nem pela sua metodologia, pode uma Comissão de Ética construir uma deliberação. 252 Pode e deve prescrever uma ou mais linhas de reflexão ética, bem fundamentadas, que ajudem os decisores a tomar a melhor decisão. Mas o decisor vai ter de ponderar outros aspectos para além do contorno ético do problema em causa. CONCLUSÃO A ética não é um poder, é um serviço. As Comissões de Ética são espaços de reflexão individual e colectiva que devem iluminar as vertentes éticas das questões que lhes sejam postas ou dos problemas que lhes sejam submetidos. A pluralidade da sua composição assegura que a reflexão e o debate éticos não serão afunilados numa só direcção e que as opiniões que apresente serão racionalmente fundamentadas e sem contaminação emocional ou afectiva que perturbe a transparência da análise. Pela sua independência em relação a todos os poderes – o da gestão hospitalar, o poder dos profissionais, o poder político em geral e as influências sociais e religiosas – uma Comissão de Ética tem de ser uma estrutura exemplar. Os seus membros não recebem nenhuma iluminação transcendente para serem a consciência ética da instituição hospitalar. O exercício ético não é uma profissão, nem há eticistas encartados. Cada membro de uma Comissão de Ética, chamado a pronunciar-se sobre uma questão difícil – que um profissional ou a instituição não sabe resolver sozinha e por isso pede o conselho ético – terá de a estudar com rigor intelectual e com a maior humildade pessoal, procurando destrinçar os conflitos éticos das soluções possíveis e propor a que, na sua óptica pessoal, lhe pareça a melhor. Lévinas, o grande filósofo da ética, escreveu “L’éthique c’est une optique”. De facto, a ética é uma forma de ver os factos e as pessoas, em situação. As pessoas concretas que sofrem, que são cuidadas e que, um dia, morrem. perspectivas actuais em bioética Que a nossa ética, como Membros de uma Comissão de Ética, seja efectivamente uma Óptica. Límpida, translúcida e rigorosa. Este texto é uma síntese da comunicação apresentada no “II Encontro Nacional de Comissões de Ética para a Saúde”, no Hospital de S. João, em 28 de Novembro de 2008. ETHICS COMMISSIONS – THE METHODOLOGY CHALLENGE ABSTRACT Following a period in which they have been well accepted, ethical commissions in the Health Service confront today methodological and working criteria problems for both their constitution and decision making processes. UNESCO’s recent proposals are presented, but these do not resolve the fundamental problems, and only regulate formal aspects of constitution and function. A methodology is proposed that stresses the individual responsibilities of the members of the commissions and the prescribed and descriptive reports that they produce. This is advanced without concern for consensus while emphasising complementarity. Key-words: Ethical commissions, ethics, consensus, complementarity. Nascer e Crescer 2008; 17(4): 249-252 BIBLIOGRAFIA UNESCO, Establishing Bioethics Committees. Guide n.º 1, Paris, 2005 UNESCO, Committees at Work: Procedures and Policies. Guide n.º 2, Paris, 2006 UNESCO, Educating Bioethics Committees. Guide n.º 3, Paris, 2007 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 Avaliação Crítica e Implementação Prática de Revisões Sistemáticas e Estudos de Meta-Análise Luís Filipe Azevedo1, Altamiro da Costa Pereira1 RESUMO A Medicina Baseada na Evidência (MBE) é genericamente definida como a aplicação consciente, explícita e criteriosa da melhor evidência científica disponível na tomada de decisões sobre o cuidado individual dos doentes. Nesta rubrica de Pediatria Baseada na Evidência têm vindo a ser abordados os aspectos conceptuais, metodológicos e operacionais relativos à prática da MBE no âmbito específico da Pediatria. Neste artigo é apresentado um exemplo prático de aplicação dos conceitos, métodos e competências abordados nos artigos anteriores, debruçando-se especificamente sobre a avaliação crítica e aplicação prática de revisões sistemáticas e estudos de meta-análise. É apresentado um cenário clínico em que surge a necessidade de avaliar a evidência científica existente sobre a eficácia de intervenções terapêuticas para a erradicação da infecção pelo Helicobacter pylori em idades pediátricas, e é seguida uma metodologia prática e sistemática de avaliação crítica da evidência incluindo três questões essenciais: (1) Avaliação da validade ou qualidade metodológica da revisão sistemática; (2) Avaliação da importância científica e prática dos seus resultados; (3) Avaliação da aplicabilidade prática dos mesmos. Palavras-chave: Estudos de meta-análise, Helicobacter pylori, Medici__________ 1 Serviço de Bioestatística e Informática Médica da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto e Centro de Investigação em Tecnologias e Sistemas de Informação em Saúde – CINTESIS. na baseada na evidência, revisões sistemáticas, terapêutica de erradicação. junto de exemplos e cenários práticos nos quais se exemplifica a aplicação dos conceitos, métodos e competências anteriormente abordados. Nascer e Crescer 2008; 17(4): 253-261 INTRODUÇÃO A Pediatria Baseada na Evidência foi genericamente definida, no primeiro artigo desta série(1), como a aplicação consciente, explícita e criteriosa da melhor evidência científica disponível na tomada de decisões sobre o cuidado individual dos doentes pediátricos(2-4). Foi proposto um processo faseado que facilita a sua implementação prática e que é constituído por cinco fases(3): 1) Formulação de questões clinicamente relevantes; 2) Pesquisa da evidência científica de maior qualidade; 3) Análise crítica da evidência, relativamente à sua validade, impacto e aplicabilidade na prática clínica; 4) A integração da evidência científica no contexto específico em causa; 5) A avaliação e melhoria contínua deste processo. No segundo artigo desta série(5) foram desenvolvidos em maior detalhe os aspectos relacionados com a formulação de questões clínicas e a eficaz pesquisa da evidência científica. No terceiro artigo(6) foi apresentada uma abordagem prática com vista à avaliação da validade ou qualidade metodológica da evidência, da importância científica e prática dos resultados e da aplicabilidade prática dos mesmos. Neste quarto artigo da série, iniciar-se-á a apresentação de um con- CENÁRIO CLÍNICO Luís, de 7 anos de idade, recorre ao seu pediatra assistente apresentando queixas de náuseas e dor abdominal moderada, tipo ardência, na região epigástrica, aliviada pela ingestão de alimentos, mas reaparecendo cerca de 2 horas após as refeições, com cerca de 3 semanas de evolução. A mãe refere alguns episódios de dor durante a noite que levaram a criança a acordar. Negam quaisquer outros sintomas. A criança não tem antecedentes patológicos relevantes e não tem história de episódios semelhantes no passado. No exame físico o pediatra verifica a existência de dor ligeira à palpação na região epigástrica, sem sinais de irritação peritoneal e sem outras alterações relevantes. Perante este quadro o pediatra estabelece um plano de estudo, tendo solicitado um conjunto de exames complementares de diagnóstico não invasivos que se revelaram negativos. Num segundo momento, decide solicitar a realização de uma endoscopia digestiva alta com biopsia e pesquisa de infecção por Helicobacter pylori, com base na suspeita da existência de uma úlcera péptica, e tendo em conta as recomendações internacionais relativas à confirmação de infecção por H. pylori em crianças(7-10). A endoscopia revelou a existência de uma úlcera duodenal e a presença de infecção por H. pylori, estabelecendo a necessidade, segundo as recomendações internacionais(7-10), de instituir a terapêutica de erradicação da infecção por H. pylori. Na sequência pediatria baseada na evidência 253 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 destes resultados o pediatra sente a necessidade de rever a evidência científica relativa às melhores alternativas terapêuticas para a erradicação da infecção por H. pylori na criança. FORMULAÇÃO DA QUESTÃO Neste contexto, coloca-se ao pediatra uma questão relativa à eficácia das várias intervenções terapêuticas passíveis de serem utilizadas na erradicação da infecção pelo H. pylori. Assim, ao pensar na formulação de questão clínica, dever-se-ão ter em atenção os seus quatro elementos essenciais(5): 1) a população / problema são as crianças com infecção pelo H. pylori confirmada e com indicação para terapêutica de erradicação; 2) as intervenções a avaliar correspondem às intervenções terapêuticas em uso nesta indicação (incluindo, assim, as várias formas de terapêuticas simples, duplas, triplas ou quadruplas); 3) a intervenção alternativa será o tratamento placebo; 4) a variável de resultado clínico relevante, neste caso, será a proporção de sucesso na erradicação da infecção confirmada adequadamente, 4 ou mais semanas após início do tratamento. PESQUISA DA EVIDÊNCIA Tendo em conta que a questão clínica de interesse é a da eficácia de uma intervenção terapêutica, a procura de evidência científica deverá focar-se, essencialmente, em ensaios clínicos aleatorizados, pois estes são os estudos primários com maior nível de evidência científica neste tipo de questões. Apesar disto, cada um dos ensaios clínicos existentes na literatura dar-nos-á uma resposta independente à questão clínica de interesse, existindo muito frequentemente importante heterogeneidade entre os resultados dos vários ensaios disponíveis e na qualidade metodológica dos mesmos. Por este motivo, neste tipo de questões é frequente dirigir a pesquisa inicialmente para estudos de síntese de evidência, idealmente 254 pediatria baseada na evidência revisões sistemáticas e/ou estudos de meta-análise, garantindo assim uma visão mais abrangente da evidência científica disponível. Neste caso, o pediatra começou então por fazer uma pesquisa bibliográfica utilizando o serviço de acesso à base de dados Medline da PubMed(5), com o objectivo de encontrar revisões sistemáticas e/ou estudos de metaanálise que abordassem a eficácia dos vários tratamentos de erradicação do H pylori nas crianças. Para isto, começou por identificar os termos MeSH associados à expressão “Helicobacter pylori”, tendo verificado que a própria expressão correspondia a um termo MeSH(5). Em seguida, dirigiu-se à funcionalidade “Clinical Queries”, disponível na barra à esquerda na página inicial da PubMed, e utilizou o termo MeSH identificado na área de pesquisa de revisões sistemáticas (área central da página) e associou através de um operador booleano AND os seguintes termos (eradic* OR therap* OR treat*). Por último, o pediatra aplicou a funcionalidade “Limits” da Pubmed, utilizando o limite de categorias de idade (“Ages”), limitando para a categoria “All child: 0-18 years”. Este conjunto de passos corresponde à utilização da seguinte query de pesquisa final: (“Helicobacter pylori”(Mesh) AND (eradic* OR treat* OR therap*)) AND systematic(sb) AND (((infant(MeSH) OR child(MeSH) OR adolescent(MeSH))) ). Esta versão final da pesquisa permitiu que o pediatra identificasse 19 artigos, na sua maioria altamente relevantes, sendo o segundo artigo da lista um artigo de Khurana et al.(11), de Março de 2007, que é a revisão sistemática e estudo de meta-análise mais recentemente publicada no âmbito específico das alternativas terapêuticas para a erradicação da infecção por H pylori em idades pediátricas. Só existe uma revisão sistemática adicional especificamente sobre esta matéria que é mais antiga e que se encontra na posição 13 da lista(12). O passo seguinte será aceder à versão integral do artigo e iniciar a sua adequada e completa análise crítica. AVALIAÇÃO CRÍTICA DA EVIDÊNCIA – REVISÕES SISTEMÁTICAS E ESTUDOS DE META-ANÁLISE Genericamente, os estudos de síntese de evidência definem-se pela sua unidade de análise (trabalhos ou artigos de investigação primários) e pelos seus objectivos (análise e síntese da evidência)(13-15). Os estudos de revisão ou revisões bibliográficas na sua forma tradicional são narrativas, geralmente escritas por especialistas da área temática, e que pretendem constituir sumários qualitativos da evidência relacionada como uma questão científica ou área particular do conhecimento. Tipicamente, estes estudos envolvem a aplicação de métodos informais e subjectivos de recolha e interpretação dos estudos primários(13). As importantes limitações dos estudos de revisão tradicionais levaram à proposta de abordagens metodologicamente mais robustas e que minimizassem, dentro do possível, as fontes de possível enviesamento na pesquisa, selecção e avaliação dos estudos primários a incluir. Ao invés dos estudos de revisão tradicionais, as designadas revisões sistemáticas são estudos que incluem uma definição adequada e específica de uma questão de investigação; uma pesquisa de estudos primários completa, exaustiva e descrita de forma explícita e reprodutível; uma selecção dos estudos obedecendo a critérios de elegibilidade claros e reprodutíveis; uma avaliação da qualidade dos estudos primários sistemática e baseada em critérios de qualidade explícitos, consensuais e reprodutíveis; e, por último, uma metodologia de síntese da evidência segundo um protocolo e critérios predefinidos e explícitos (13-26). Os estudos de meta-análise constituem a aplicação de um conjunto de metodologias quantitativas estatísticas que permitem agregar ou sumariar os resultados provenientes de um conjunto de estudos primários, de forma a gerar uma medida de sumário ou agregação(20, 25, 26). Este tipo de estudos surge na sequência natural de uma revisão sistemática, sendo habitualmente a sua última fase. Revisões sistemáticas e estudos NASCER E CRESCER NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 de meta-análise não são sinónimos e, idealmente (mas não exclusivamente), todos os estudos de meta-análise deverão ser realizados como parte de uma revisão sistemática. Neste contexto, torna-se evidente que as revisões sistemáticas e os estudos de meta-análise, quando adequadamente executados, são uma fonte importantíssima de evidência sobre uma determinada questão científica. É, assim, facilmente compreensível que lhes seja atribuído o primeiro lugar nas hierarquias de evidência(2, 19, 27-31). Estes estudos são muito importantes do ponto de vista científico, pois ao colocarem como objectivos a síntese (qualitativa ou quantitativa) e a análise (por exemplo, através do estudo da heterogeneidade eventualmente presente e das variáveis que a justificam), de forma abrangente sistemática e explícita, da evidência relacionada com uma determinada questão, permitem uma análise e resposta à questão num nível superior e diferente daquele que pode ser obtido em cada um dos estudos primários incluídos. As revisões sistemáticas são ainda úteis na identificação de lacunas de conhecimento, na identificação de deficiências metodológicas nos estudos existentes e na formulação de recomendações para a investigação futura. Tendo encontrado a revisão sistemática que pretendia, o desafio seguinte que se coloca ao pediatra do Luís será, então, definir e aplicar um conjunto de critérios que lhe permitam avaliar este artigo relativamente a três aspectos fundamentais (Tabela 1): 1) validade ou qualidade metodológica; 2) importância dos resultados; 3) aplicabilidade prática dos resultados. (A) AVALIAÇÃO DA VALIDADE OU QUALIDADE METODOLÓGICA Definem-se habitualmente os seguintes critérios para avaliação da validade ou qualidade metodológica de revisões sistemáticas e estudos de meta-análise, em particular no âmbito de questões sobre a eficácia de intervenções terapêuticas ou preventivas(3,15,32): ano 2008, vol XVII, n.º 4 1) A revisão sistemática tem um objectivo e uma questão clínica claramente definidos? A adequada definição de uma questão clínica é fundamental neste tipo de estudos, sendo recomendado um processo de formalização das questões clínicas e objectivos da revisão sistemática, de forma a garantir a sua correcção metodológica, facilitar o processo de pesquisa da evidência e facilitar o processo de definição dos critérios de selecção dos estudos primários. No artigo de Khurana et al.(11) é possível verificar uma adequada definição da questão clínica e objectivos da revisão no último parágrafo da introdução. (A) Avaliação da validade ou qualidade metodológica: 1. A revisão sistemática tem um objectivo e uma questão clínica claramente definidos? 2. Os métodos e recursos de pesquisa da evidência utilizados são adequados e completos? 3. Os critérios de selecção dos estudos primários são adequados e explicitamente apresentados? 4. É feita uma adequada descrição do processo de selecção dos artigos e uma avaliação da reprodutibilidade deste processo? 5. Existe uma adequada descrição dos métodos de extracção de dados dos estudos primários? 6. É feita uma adequada descrição dos métodos de avaliação da qualidade/validade dos estudos primários? 7. É feita uma descrição dos métodos aplicados na síntese qualitativa e quantitativa dos resultados dos estudos primários? 8. É apresentado um sumário qualitativo das características (ex: participantes, intervenções e variáveis de resultado) dos estudos primários incluídos? 9. É apresentado um sumário qualitativo da avaliação da qualidade/validade dos estudos primários incluídos? 10. É feita uma análise adequada do fenómeno de heterogeneidade e uma análise das fontes ou factores associados à essa mesma heterogeneidade (análise de subgrupos, meta-regressão, etc.)? 11. É feita uma avaliação adequada dos potenciais viéses de publicação? 12. É feita uma apresentação e adequada discussão das conclusões que é possível retirar a partir dos resultados apresentados? (B) Avaliação da importância científica e prática dos resultados 13. Avaliação da magnitude e consequente importância científica, prática ou clínica dos resultados apresentados. 14. Avaliação da precisão das estimativas dos efeitos, medidas ou estatísticas apresentadas. (C) Avaliação da aplicabilidade prática dos resultados 15. Serão os resultados da revisão sistemática generalizáveis para a população à qual o meu doente pertence? 16. No contexto onde me insiro, estarão as intervenções terapêuticas avaliadas disponíveis e serão estas aplicáveis na prática clínica? 17. Quais são os potenciais benefícios e malefícios das intervenções terapêuticas no meu doente em particular? 18. Quais são as opiniões, valores e expectativas do meu doente relativamente aos resultados clínicos esperados e à intervenção terapêutica que é proposta? Tabela 1: Critérios de avaliação de revisões sistemáticas e/ou estudos de meta-análise relativamente a três aspectos fundamentais: (A) validade ou qualidade metodológica, (B) importância dos resultados e (C) aplicabilidade prática dos resultados. pediatria baseada na evidência 255 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, 2008, vol XVI, XVII,n.º n.º34 2) Os métodos e recursos de pesquisa da evidência utilizados são adequados e completos? Numa revisão sistemática o objectivo essencial será encontrar toda a evidência que responda à questão de investigação, tentando reduzir ao mínimo os chamados viéses de publicação, mas tentando simultaneamente minimizar a quantidade de artigos não relevantes. Deverão ser utilizados e descritos métodos de pesquisa de evidência que garantam, o melhor possível, terem sido encontrados todos os estudos primários relevantes e de forma a evitar os viéses de publicação. Idealmente deverão ser utilizadas várias estratégias complementares de pesquisa bibliográfica – pesquisa em várias bases de dados bibliográficas; pesquisa manual em revistas científicas seleccionadas, livros de resumos de congressos e encontros; pesquisa em listas de referências dos artigos encontrados; consulta de especialistas na matéria; etc. No artigo de Khurana et al.(11) é possível verificar, no primeiro parágrafo da secção de materiais e métodos, a descrição dos recursos de pesquisa de evidência que foram aplicados. Apesar de estes serem relativamente completos, seria desejável que tivessem sido utilizadas outras bases de dados bibliográficas além da Medline, uma vez que a utilização de uma única base de dados tem demonstrado ser insuficiente neste tipo de estudos(33). 3) Os critérios de selecção dos estudos primários são adequados e explicitamente apresentados? A selecção dos estudos primários que irão ser incluídos na revisão sistemática deverá obedecer a critérios claros, reprodutíveis e definidos de forma explícita. O objectivo será garantir a selecção de todos os estudos que respondem à questão de investigação e possuem qualidade metodológica aceitável, sendo esta selecção feita de forma não enviesada, isto é, não dependente de critérios subjectivos ou afectivos dos revisores, mas unicamente de critérios metodológicos e clínicos 256 pediatria baseada na evidência explícitos. A definição dos critérios de selecção deverá ter em conta critérios metodológicos que garantam a especificidade e a qualidade dos estudos a incluir (população alvo, intervenções em estudo, variáveis de resultado, tipo de estudos) e critérios clínicos específicos da questão em análise. A definição dos critérios de selecção deverá ser parcimoniosa, tentando prevenir o enviesamento na selecção, por exemplo viéses de publicação, e tentando não excluir evidência potencialmente relevante. A este respeito, destaca-se a necessidade de evitar, dentro do possível, a criação de critérios de exclusão relacionados com a língua de publicação dos artigos pois existe evidência que demonstra a possibilidade de este tipo de critérios introduzirem importante enviesamento(34-38). No artigo de Khurana et al.(11) é possível verificar, na secção materiais e métodos, uma detalhada descrição dos critérios de selecção que foram aplicados. De realçar o facto de os autores terem decidido incluir ensaios clínicos aleatorizados e não-aleatorizados e com e sem grupo de controlo (placebo). 4) É feita uma adequada descrição do processo de selecção dos artigos e uma avaliação da reprodutibilidade deste processo? O processo de selecção dos estudos a incluir na revisão contempla, pelo menos, duas fases. Na primeira fase, tendo à disposição a lista final de potenciais candidatos resultante da aplicação dos vários métodos de pesquisa, deverão ser avaliados os títulos e resumos de todos os artigos e aplicados os critérios de selecção (inclusão e exclusão) definidos. Após a primeira fase de rastreio e exclusão de artigos, deverão ser encontradas as versões integrais de todos os artigos ainda não excluídos. À medida que os artigos em formato integral vão sendo obtidos, deverá ser feita a sua leitura e aplicados estritamente todos os critérios de selecção, de forma a tomar uma decisão final sobre a exclusão ou inclusão do artigo. Tanto na primeira como na segunda fase, a selecção dos artigos deverá ser feita por pelo menos dois revisores de forma independente, devendo estes fazer um registo sistemático da sua decisão sobre a inclusão ou exclusão de cada artigo, assim como das razões pelas quais os artigos foram excluídos. No caso de não concordância entre os revisores deverão ser estabelecidos métodos de resolução de divergências. No artigo de Khurana et al.(11) é possível verificar, na secção materiais e métodos, uma descrição adequada dos métodos de selecção dos estudos primários que foram implementados. 5) Existe uma adequada descrição dos métodos de extracção de dados dos estudos primários? Depois da fase de selecção dos estudos, deverá fazer-se a análise cuidada dos artigos incluídos e a extracção de dados relevantes dos mesmos para posterior processamento e análise. Para a adequada concretização desta tarefa os revisores deverão previamente definir as variáveis relevantes a extrair dos estudos primários e construir um formulário ou aplicação padronizada de registo de extracção de dados. Esta tarefa deverá, também, ser realizada por pelo menos dois revisores, com um registo padronizado dos dados a extrair e usando métodos adequados de resolução de divergências (terceiro revisor ou consenso). 6) É feita uma adequada descrição dos métodos de avaliação da qualidade/validade dos estudos primários? Uma etapa fundamental de qualquer revisão sistemática é a criteriosa avaliação da qualidade dos estudos primários incluídos. Deverá ser usado um conjunto de critérios relevantes e consensuais em função do tipo de questão de investigação e do tipo de estudos incluídos. A tarefa de definição dos critérios de qualidade a aplicar é fundamental, sendo, por isto, recomendada a utilização de listas de critérios de avaliação de qualidade previamente criadas e avaliadas e de preferência NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 internacionalmente aceites. A avaliação da qualidade dos estudos primários constitui um importante guia para a interpretação e enquadramento dos resultados da revisão, para a verificação de lacunas na evidência existente e para a sugestão de recomendações sobre investigação futura. No artigo de Khurana et al.(11) é possível verificar, na secção materiais e métodos, uma descrição sumária dos critérios que foram aplicados para a avaliação da qualidade dos estudos primários incluídos e os procedimentos aplicados para a extracção de dados a partir dos estudos primários. Os critérios utilizados para a avaliação da qualidade dos estudos primários são, no entanto, muito limitados no seu âmbito e não são baseados em nenhum modelo internacionalmente aceite. 7) É feita uma descrição dos métodos aplicados na síntese qualitativa e quantitativa dos resultados dos estudos primários? A apresentação dos resultados numa revisão sistemática geralmente começa por uma síntese qualitativa das características gerais dos estudos incluídos, das suas características metodológicas, critérios de qualidade e dos seus resultados. Ainda que não seja apropriado dar continuidade à síntese quantitativa dos resultados dos estudos primários (pela grande heterogeneidade entre os estudos, pela existência de um número muito limitado de estudos, etc.), a síntese qualitativa da evidência tem por si só um valor inestimável para os clínicos e investigadores. Numa segunda fase serão feitas a análise e síntese quantitativas da evidência. Uma vez identificada a medida de efeito e extraídos os dados de cada estudo primário que permitem o seu cálculo, necessariamente associada a uma medida de precisão da estimativa (erro padrão ou intervalos de confiança), será possível representar globalmente os resultados quantitativos destes estudos. Posteriormente será possível calcular medidas de sumário ou agregação que são, antes de mais, resultado de um exercício de pondera- ção. As medidas de sumário vão resultar da agregação das medidas de efeito dos vários estudos primários, mas considerando ponderações específicas. As distintas ponderações devem-se ao facto das próprias medidas, provenientes de estudos diferentes, serem diferentes quanto à precisão que apresentam (têm amostras de tamanho diferente, têm variabilidade diferente, etc.). Naturalmente, será expectável que, se um estudo tem um maior número de indivíduos analisados, o seu resultado tenha maior “peso” na altura do cálculo da medida de sumário do que os resultados de outros estudos mais pequenos. Genericamente, pode dizer-se que a ponderação introduzida vai ser directamente proporcional ao inverso da variância das estimativas provenientes de cada estudo primário. A representação gráfica típica dos resultados dos estudos primários no contexto de uma revisão sistemática é feita através dos conhecidos “gráficos de floresta” (forest plots). Nestes gráficos são apresentadas, para cada estudo, as estimativas das medidas de efeito, representadas pelas caixas ou círculos de tamanhos variados (directamente proporcionais à precisão das estimativas de efeito dos estudos), juntamente com os respectivos intervalos de confiança (IC), representados pelas linhas horizontais em torno das caixas. Estes gráficos permitem ter uma noção global sobre os resultados de toda a evidência existente. Normalmente, mas não necessariamente, estes gráficos são acompanhados de uma medida de sumário ou agregação dos efeitos dos estudos primários, resultante da aplicação de metodologias de meta-análise (métodos de ponderação atrás referidos), e que é representada geralmente por um losango na parte inferior do gráfico. No caso do artigo em avaliação de Khurana et al. verifica-se que a descrição qualitativa dos estudos primários incluídos é feita ao longo do texto da secção de resultados. A descrição quantitativa dos resultados dos estudos primários e as medidas de sumário dos mesmos, quando apropriado tendo em conta a heterogeneidade presente, são apresentadas nas tabelas 1, 2 e 3 e nas figuras 2, 3 e 4. Deverá destacar-se que neste estudo são utilizadas como medidas de efeito as proporções de erradicação, assumindo-se desta forma que todos os grupos com tratamento activo são comparados com um grupo de controlo (placebo) que se assume ter uma proporção de erradicação de 0%. Esta metodologia e em particular a assumpção de que os grupos de controlo têm proporções de erradicação de 0%, não é a forma mais habitual de análise neste tipo de estudos, no entanto, os autores apresentam resultados empíricos que suportam e justificam esta assumpção no primeiro parágrafo da subsecção “Efficacy” da secção de resultados. De destacar, também, o facto de as figuras 2, 3 e 4 deste artigo serem forest plots com uma configuração que não é a mais habitual neste tipo de estudos, representando-se a magnitude das medidas de efeito no eixo vertical e as medidas de sumário como linhas horizontais e sem as respectivas medidas de precisão associadas. 8) É apresentado um sumário qualitativo das características (ex: participantes, intervenções e variáveis de resultado) dos estudos primários incluídos? A adequada descrição das características específicas metodológicas e clínicas de cada um dos estudos primários incluídos na revisão é um aspecto fundamental que permite ao leitor ter uma noção global da natureza da evidência científica que foi incluída na revisão. No caso do artigo em avaliação de Khurana et al. verifica-se que a descrição qualitativa dos estudos primários incluídos é feita ao longo do texto da secção de resultados. 9) É apresentado um sumário qualitativo da avaliação da qualidade/validade dos estudos primários incluídos? Tal como atrás foi referido é fundamental enquadrar o sumário da evidência científica apresentada em função da sua qualidade metodológi- pediatria baseada na evidência 257 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 ca. Neste sentido, uma adequada descrição dos resultados da aplicação dos critérios de qualidade previamente definidos torna-se um ponto fundamental da secção de resultados de qualquer revisão sistemática. No artigo de Khurana et al. os resultados da aplicação dos critérios de avaliação da qualidade dos estudos primários são muito sumariamente referidos ao longo do texto da secção de resultados. 10) É feita uma análise adequada do fenómeno de heterogeneidade e uma análise das fontes ou factores associados à essa mesma heterogeneidade (análise de subgrupos, meta-regressão, etc.)? O fenómeno da heterogeneidade refere-se à existência de grande variabilidade entre os resultados dos estudos primários, sendo esta superior àquela que seria esperada pelo simples efeito do acaso, isto é, dos erros aleatórios relacionados com a amostragem(39). O método mais comum no diagnóstico de heterogeneidade(40,41) passa pela aplicação de estatísticas apropriadas e testes estatísticos de hipóteses a elas associados. As mais frequentemente usadas para a avaliação da heterogeneidade(39-41) são a estatística Q de Cochran, a estatística I2 e a estatística H2. A presença da heterogeneidade levanta preocupações quanto à interpretação das medidas de sumário, sendo, por exemplo, necessário adequar os métodos de análise estatística aplicados (ex: utilização do chamado modelo de efeitos aleatórios em alternativa ao tradicional modelo de efeitos fixos). Será importante ter em atenção que a heterogeneidade poderá dever-se a características metodológicas e clínicas dos próprios estudos ou a reais diferenças entre as estimativas de efeito nos vários contextos. Os métodos mais comummente utilizados para explorar a heterogeneidade encontrada são(39,42,43): ♦ A procura de subgrupos em que exista homogeneidade dos efeitos – análise de subgrupos; 258 pediatria baseada na evidência ♦ A aplicação de métodos gráficos; ♦ A aplicação de métodos de metaregressão. No caso do artigo em avaliação de Khurana et al. foi feita uma análise bastante exaustiva do fenómeno de heterogeneidade para cada um dos tratamentos activos analisados (a análise de heterogeneidade foi limitada a tratamentos para os quais existiam dados provenientes de pelo menos 4 estudos diferentes). A verificação da existência de heterogeneidade foi associada a uma metodologia adequada de análise das fontes de heterogeneidade – a meta-regressão. Ao longo do texto da secção de resultados, nas tabelas 1, 2 e 3 e nas figuras 2, 3 e 4 é possível observar os resultados da análise de heterogeneidade e dos modelos de meta-regressão construídos para tentar explicar as causas da heterogeneidade quando esta era detectada. Esta metodologia de análise e avaliação das fontes de heterogeneidade é um ponto bastante forte deste estudo. 11) É feita uma avaliação adequada dos potenciais viéses de publicação? Um outro elemento crítico na execução de uma revisão sistemática é a avaliação dos chamados viéses de publicação. Os viéses de publicação são um tipo de erro sistemático particular que se enquadra num conjunto mais amplo de viéses relacionados com a divulgação dos trabalhos científicos. Este tipo de viéses tem origens diversas e ocorre quando estudos que apresentam resultados estatisticamente significativos (“positivos”) são: 1) com maior probabilidade submetidos para publicação pelos autores e/ou aceites para publicação pelas revistas científicas (viéses de publicação); 2) mais frequentemente publicados em inglês (viéses de língua); 3) publicados mais rapidamente (viéses relacionados com o desfasamento temporal); 4) citados com muita maior frequência (viéses de citação)(20,22). Deverá existir um especial cuidado com as metodologias de pesquisa de evidência e selecção dos estudos, de forma a salvaguardar, o melhor possível, o controlo deste tipo de viéses. Além disto, dever-se-ão aplicar métodos adequados de avaliação da presença de viéses de publicação. Para isto é frequente a aplicação de métodos gráficos, por exemplo, os gráficos de funil (funnel plots), ou testes estatísticos de hipóteses, por exemplo, o teste de Egger(20,22). A forma mais típica de análise de viéses de publicação, constitui a verificação de assimetrias nos funnel plots (gráficos que apresentam as medidas de efeito de cada estudo em função da precisão dessas mesmas estimativas). No artigo de Khurana et al. foi feita uma adequada avaliação dos potenciais viéses de publicação existentes, sendo apresentado na figura 1 do artigo um funnel plot representativo desta análise para um subgrupo específico de estudos. 12) É feita uma apresentação e adequada discussão das conclusões que é possível retirar a partir dos resultados apresentados? Após a concretização das fases de pesquisa, selecção, avaliação e análise da evidência disponível deverá ser feita uma adequada interpretação e discussão dos resultados encontrados e dever-se-á salientar a importância clínica e social dos achados. Deverá ainda ser feita a descrição e discussão das limitações dos estudos primários incluídos e as limitações do trabalho de revisão sistemática e meta-análise realizado. A discussão das limitações permitirá uma adequada avaliação da importância e significado das conclusões de uma revisão. No artigo de Khurana et al. é apresentada uma adequada discussão e enquadramento dos resultados encontrados e são discutidas, também, as limitações dos estudos primários e da própria revisão sistemática, dando especial ênfase ao problema dos factores mais importantes na explicação NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 da heterogeneidade encontrada nos resultados dos vários estudos primários (local geográfico onde o estudo foi realizado, duração do tratamento e o método de confirmação da erradicação da infecção). (B) AVALIAÇÃO DA IMPORTÂNCIA CIENTÍFICA E PRÁTICA DOS RESULTADOS A avaliação da importância dos resultados passa pela adequada interpretação e contextualização das medidas e estatísticas aplicadas na apresentação dos mesmos. Genericamente, a avaliação dos resultados deverá considerar sempre dois aspectos essenciais(3, 44): 13) Avaliação da magnitude e consequente importância científica, prática ou clínica dos resultados. Este ponto implica a avaliação da magnitude dos efeitos, medidas ou estatísticas apresentadas, para cada um dos estudos primários incluídos e medidas de sumário, a sua adequada interpretação e a sua devida contextualização clínica. 14) Avaliação da precisão das estimativas dos efeitos, medidas ou estatísticas apresentadas. Este ponto implica a verificação dos intervalos de confiança ou outras medidas de precisão das estimativas de efeito de cada um dos estudos primários incluídos e das medidas de sumário dos estudos primários. No caso do artigo em avaliação de Khurana et al. é possível observar as medidas de efeito e as medidas de sumário e respectivas medidas de precisão das estimativas (intervalos de confiança de 95% – IC 95%) para os vários tratamentos activos analisados ao longo da secção de resultados, nas tabelas 1,2 e 3 e nas figuras 2, 3 e 4. Os tratamentos activos que apresentam maiores proporções de erradicação da infecção pelo H. pylori são: a) tratamento duplo com amoxicilina e um nitroimidazol (ex: metronidazol), 2 a 6 semanas (proporção de erradicação de 83,6%, com IC 95% 79,8% – 86,7%); b) tratamento triplo com claritromicina, amoxicilina e um inibidor da bomba de protões, 1 a 2 semanas (80,2%, com IC 95% 76,4% – 84,0%); c) tratamento triplo com um macrólido, um nitroimidazol e um inibidor da bomba de protões, 2 semanas (89,0%, com IC 95% 80,3% – 97,5%); d) tratamento triplo com bismuto, amoxicilina e metronidazol, mais de 2 semanas (90,1%, com IC 95% 85,2% – 94,9%). (C) AVALIAÇÃO DA APLICABILIDADE PRÁTICA DA EVIDÊNCIA A última questão a ser abordada no processo de avaliação crítica da evidência será a questão da aplicabilidade prática da evidência científica encontrada. O objectivo do profissional de saúde será, na maior parte dos casos, a eventual aplicação da evidência científica aos seus problemas clínicos e aos seus doentes, logo, a avaliação da aplicabilidade prática é uma questão fundamental neste contexto(3,44,45). Os critérios fundamentais para avaliação da aplicabilidade de evidência científica, no âmbito de estudos de síntese que dão resposta a questões sobre eficácia de intervenções terapêuticas ou preventivas, são os seguintes: 15) Serão os resultados da revisão sistemática generalizáveis para a população à qual o meu doente pertence? 16) No contexto onde me insiro, estarão as intervenções terapêuticas avaliadas disponíveis e serão estas aplicáveis na prática clínica? 17) Quais são os potenciais benefícios e malefícios das intervenções terapêuticas no meu doente em particular? 18) Quais são as opiniões, valores e expectativas do meu doente relativamente aos resultados clínicos esperados e à intervenção terapêutica proposta? A avaliação da aplicabilidade da evidência científica deverá, idealmente, contemplar três aspectos essenciais – questões biológicas, questões socioeconómicas e questões epidemiológicas(45). O objectivo fundamental desta avaliação será o adequado enquadramento da evidência científica, dadas as características específicas do profissional de saúde, do contexto da sua prática clínica e dos seus doentes. No cenário clínico que tem vindo a ser desenvolvido e que tem por base a avaliação do artigo de Khurana et al. deverá destacar-se a importante discussão que é feita pelos autores relativamente a alguns aspectos que poderão ser relevantes no que toca à generalização dos resultados desta revisão sistemática, nomeadamente a heterogeneidade relacionada com o local geográfico de realização dos estudos, que os autores pensam estar relacionada com as diferenças entre as populações relativamente à frequência das resistências ao metronidazol. De especial relevo é também a discussão de factores determinantes para o sucesso da terapêutica, nomeadamente a duração adequada do tratamento e a frequência de reacções adversas medicamentosas com cada um dos tratamentos comparados. CONCLUSÃO As revisões sistemáticas e os estudos de meta-análise são considerados, habitualmente, o mais alto nível de evidência na resposta a qualquer questão de investigação. No entanto, como qualquer fonte primária de evidência, uma revisão sistemática e estudo de meta-análise só constitui o mais alto nível de evidência se for adequadamente concretizada, redigida, publicada e de preferência aplicada. Uma revisão sistemática deverá conter uma avaliação exaustiva e completa da literatura sobre uma determinada questão de investigação, através de um processo de pesquisa, selecção, análise e sín- pediatria baseada na evidência 259 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 tese da evidência científica seguindo uma metodologia sistemática, explícita e reprodutível. Além disto deverá conter uma adequada apresentação, interpretação e contextualização da evidência existente, com especial ênfase nas limitações, quer dos estudos primários quer do processo de revisão. Os clínicos e investigadores fazem um uso cada vez mais frequente deste tipo de estudos, quer por razões de ordem prática e aplicabilidade clínica, quer por razões científicas. Neste sentido, e porque muitos de nós seremos criadores ou utilizadores de revisões sistemáticas e estudos de meta-análise, é importante dominar os fundamentos conceptuais, metodológicos e operacionais deste tipo de estudos e sermos capazes de fazer a sua análise critica. O pediatra assistente do Luís acabou por recomendar a terapêutica de erradicação da infecção por H. pylori, tendo apoiado a sua decisão nos resultados do artigo de Khurana et al. A opção final será entre um tratamento duplo ou triplo (uma vez que, ao contrário do que acontece com os adultos, nas crianças a terapêutica dupla com amoxicilina e metronidazol parece ser tão eficaz quanto as terapêuticas triplas), equacionando a associação de um inibidor da bomba de protões, e com uma duração de tratamento entre 1 e 2 semanas (atendendo a que em muitos casos os regimes de 1 semana são suficientes). No próximo número desta série dedicada à pediatria baseada na evidência dar-se-á continuidade à apresentação de exemplos práticos de aplicação dos conceitos e métodos abordados nos artigos anteriores desta rubrica. CRITICAL APPRAISAL AND PRACTICAL IMPLEMENTATION OF SYSTEMATIC REVIEWS AND META-ANALYSIS ABSTRACT Evidence Based Medicine (EBM) is generally defined as the conscientious, explicit and judicious use of current best evidence in making decisions 260 pediatria baseada na evidência about the care of individual patients. In this section devoted to Evidence Based Paediatrics a thorough discussion on the conceptual, methodological and operational issues related to the practice of EBM in the field of Paediatrics has been presented. In the present article a practical example is developed allowing the application of concepts, methods and competencies covered in previous articles and specifically devoted to the critical appraisal and practical implementation of systematic reviews and meta-analysis. A clinical scenario is explored were the evidence about the efficacy of therapeutic interventions for eradication of Helicobacter pylori infection in children needs to be analysed and a systematic approach is used based on three main aspects: (1) assessment of validity and methodological quality of the systematic review; (2) assessment of scientific and practical impact of its results and (3) assessment of applicability of its results. Key-words: Evidence based medicine, eradication therapy, Helicobacter pylori, meta-analysis, systematic reviews. Nascer e Crescer 2008; 17(4): 253-261 BIBLIOGRAFIA 1. Azevedo LF, Costa Pereira A: Pediatria Baseada na Evidência. 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Jama 1998, 279:545-549. pediatria baseada na evidência 261 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 Caso Endoscópico Fernando Pereira1 Neste número vimos apresentar a situação clínica de uma criança de três anos e meio do sexo masculino, raça caucasiana, primeiro gémeo de gravidez gemelar de 34 semanas e que nasceu com diversas malformações. Onfalocelo e divertículo de Meckel que foram operados no primeiro dia de vida, criptorquidia, comunicação interventricular. O seu estudo genético revelou tratar-se de uma trissomia 8 em mosaico. Sem antecedentes familiares relevantes e sem consanguinidade dos pais. A criança teve um atraso do desenvolvimento psicomotor, com evolução ponderal abaixo do percentil 5. No dia do internamento teve vómito alimentar a que se seguiu episódio de hematemeses abundante recorrendo ao serviço de urgência. A sua observação mostrou criança com razoável estado geral, com acentuada palidez da pele e mucosas, com sinais vitais normais, auscultação pulmonar e cardíaca sem alterações aparentes e abdómen mole e depressivel, sem áreas dolorosas ou organomegalias. O aspirado gástrico continha sangue parcialmente digerido em pequena quantidade. Os exames analíticos realizados de urgência confirmaram a existência de anemia, (6,5gr/dl de Hemoglobina), hipocrómica e microcítica, com ferro e ferritina abaixo dos valores normais. Plaquetas, leucócitos e fórmula leucocitária e estudo da coagulação com valores normais. A Velocidade de sedimentação, a proteína C reactiva e LDH eram normais, bem como a função hepática e renal. __________ 1 Serviço de Gastroenterologia Hospital Maria Pia / CHPorto 262 qual o seu diagnóstico? Figura 1 O exame radiológico do tórax não mostrou qualquer alteração ao nível do parênquima pulmonar, árvore traqueo-brônquica ou da silhueta cardíaca. A radiografia simples do abdómen era normal. Efectuou transfusão de glóbulos rubros e perfusão com soro fisiológico após o que se procedeu à realização de endoscopia digestiva alta que permitiu observar a imagem que mostramos na figura 1. Tendo em conta a informação fornecida e o aspecto endoscópico qual lhe parece ser o diagnóstico? 1 – Variz gástrica sangrante 2 – Úlcera gigante do estômago 3 – Leiomioma Gástrico 4 – Pâncreas ectópico. NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 COMENTÁRIOS O exame endoscópico efectuado ao nosso doente, permitiu observar uma formação nodular polipoide, com cerca de 3cm de maior dimensão, localizada na parte alta da pequena curvatura na transição para a parede posterior, recoberta de mucosa gástrica de aspecto normal, base larga, dura ao toque e com umbilicação na extremidade distal, da qual se exteriorizava coágulo recente. O restante exame até DII era normal, havendo a assinalar pequena quantidade de líquido gástrico levemente hemático. O doente efectuou no dia seguinte tomografia abdominal que confirmou a presença da lesão, limitada à parede gástrica e ausência de outras alteração abdominais. Colocamos como hipótese mais provável o leimioma gástrico ou um tumor do estroma e uma vez que o doente ao segundo dia de internamento mantinha aspirado com sangue optamos pelo tratamento cirúrgico imediato. Foi efectuada gastrectomia parcial envolvendo a zona de inserção da lesão de fácil identificação. O pos-operatório decorreu sem incidentes e o doente ficou clinicamente bem. O exame histológico da peça operatória revelou tratar-se de lesão nodular submucosa de coloração acastanhada com 3cm de maior dimensão composta por estruturas acinares e ductais e ilhéus de langherans compatível com parênquima pancreático normal, como se mostra nas figuras 2 e 3. Havia focos de hemorragia na mucosa gástrica. O diagnóstico final foi então de Pâncreas ectópico que se apresentou por hemorragia digestiva. O tecido pancreático ectópico é frequentemente observado no exame endoscópico do tracto digestivo superior, com localização predominante no antro gástrico (85-95% dos casos) a uma distancia que pode ir até 6cm do canal pilórico, com dimensão em regra inferior a 3cm (80%) e geralmente umbilicado. São benignos e na maior parte dos casos não provocam sintomas. A sua localização justa pilórica pode criar quadros de obstrução pilórica e esporadicamente podem apresentar-se por hemorragia digestiva como o caso que apresentamos. A ecoendoscopia é útil no seu diagnóstico mas difícil de executar em doentes pediátricos como foi o nosso caso. Nascer e Crescer 2008; 17(4): 262-263 Figura 2 (cortesia da Dr.ª Fernanda Milanezi) BIBLIOGRAFIA 1 2 3 Matsushita M, Hajiro K, OkazaKi K, Takakuwa H. “Gastric aberrant Pâncreas: EUS analysis in compariosion with the histology.” Gastrointest. Endosc. 1999;49:493-497 Pouessel G, Michaud L, Pierre MH et al. “Endoscopic diagnosis of a gastric heterotopic pancreas and esophageal atrésia: an incidental association? Arch Pediatr. 2001; 8:181-185. Gottschalk U, Casper B, Boden G.” Ectopic pancreas presenting as a large gastric antral papilla”. Endoscopy2003; 35:547. Figura 3 (cortesia da Dr.ª Fernanda Milanezi) qual o seu diagnóstico? 263 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 Caso Estomatológico José M. S. Amorim1 Criança de 14 anos de idade que foi enviada à consulta de Estomatologia devido a tumefacções mandibulares, na região lingual, indolores e de crescimento lento. Ao exame objectivo a criança apresenta bom desenvolvimento estato-ponderal. A nível oral apresenta boa higiene oral, não sendo visíveis cáries dentárias. Apresenta muitas obturações dentárias efectuadas com amálgama, em bom estado. Constata-se ainda várias tumefacções de tamanho heterogéneo, por lingual da mandíbula, (Fig.1) revestidas por mucosa normal, indolores ao toque e de consistência dura. Antecedentes pessoais e familiares irrelevantes. Figura 1 __________ 1 Serviço de Estomatologia Hospital Maria Pia / CH Porto 264 qual o seu diagnóstico? Face ao descrito: Qual o seu diagnóstico? Qual a sua atitude? NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 No caso acima exposto o diagnóstico a colocar é o de Torus Mandibular. O Torus é uma protuberância nodular óssea que pode surgir na linha média do palato ou na região lingual da mandíbula. A sua incidência é mais frequente na região palatina da maxila do que na mandíbula. A etiologia destas lesões é desconhecida embora possam estar implicados factores genéticos no seu aparecimento. Geralmente surgem na segunda e na terceira décadas de vida. Habitualmente são assintomáticos, excepto quando a mucosa da superfície é traumatizada durante a mastigação. As úlceras traumáticas podem demorar semanas ou meses a cicatrizar, porque o osso subjacente é pouco vascularizado. Esta patologia não requer qualquer tratamento. Ocasionalmente é necessário proceder à sua remoção quando é preciso proceder a reabilitação dentária com prótese. Nascer e Crescer 2008; 17(4): 264-265 BIBLIOGRAFIA Regezi-Sciubba-Pogrel - Atlas of Oral and Maxillofacial Pathology, 1st edition, Saunders, 2000, Pag.126 qual o seu diagnóstico? 265 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 Imagens Filipe Macedo1 Criança do sexo feminino, com 6 meses de idade sem história de patologia prévia. Na sequência de infecção do tracto urinário, febril, é efectuada cistouretrografia miccional seriada (CUMS). Observa-se luxação da anca esquerda, previamente não diagnosticada. A CUMS é normal. Figura 1 - CUMS Figura 2 - CUMS __________ 1 Especialista em Radiodiagnóstico – SMIC - Porto 266 qual o seu diagnóstico? Qual é o seu diagnóstico? NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 DISCUSSÃO Este caso espelha um dos princípios gerais da radiologia – deve fazerse uma observação sistematizada das imagens obtidas, não se focando apenas nos órgãos e sistemas à partida em causa, mas avaliando também as outras estruturas abrangidas. No caso da CUMS, para além do aparelho urinário, deve fazer-se a observação atenta dos componentes osteoarticulares abrangidos nas imagens, nomeadamente para avaliar eventuais sinais de disrrafismo da coluna lombar. De assinalar a propósito, que na realização de CUMS se devem usar protocolos de baixa dose de radiação, o que pode reduzir a qualidade das imagens obtidas, embora sem prejuízo do seu valor diagnóstico. Nascer e Crescer 2008; 17(4): 266-267 BIBLIOGRAFIA ACR Practice Guideline for performance of voiding cystourethrography in children. American College of Radiology Practice Guidelines and Technical standards RES 9-2009, 521-524. qual o seu diagnóstico? 267 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 Genes, Crianças e Pediatras Miguel Gonçalves-Rocha1, João Silva1, Ana Maria Fortuna1, Gabriela Soares1 Criança do sexo feminino com 6 meses, enviada à consulta de Genética Médica por atraso de crescimento e assimetria corporal. Trata-se da primeira filha de um casal jovem, saudável e não consanguíneo. Sem antecedentes familiares de relevo. Gravidez vigiada e sem intercorrências. Parto por cesariana às 39 semanas de gestação. Antropometria ao nascer: peso 2130g (<P 5), comprimento 43 cm (<P 5) e perímetro cefálico 32.5 (P 5-10). Apgar 9/10. __________ 1 Unidade de Genética Médica - Centro de Genética Médica Doutor Jacinto Magalhães / INSA 268 qual o seu diagnóstico? Evolução estaturo-ponderal: peso e estatura P <5 e perímetro cefálico no P 5-10. Referidas dificuldades de alimentação com mau reflexo de sucção. No exame dismorfológico foi observado: micrognatia, lábios finos, cantos da boca descaídos, assimetria facial, clinodactilia do 5º dedo, assimetria corporal mais evidente nos membros inferiores. Sem atraso do desenvolvimento psico-motor. O cariótipo, estudo metabólico, e ecografia renal sem alterações. A eco- grafia transfontanelar revelou alterações da fossa posterior com cerebelo e 4º ventrículos algo elevados a ser complementado por TAC. Qual o seu diagnóstico? NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 O diagnóstico é Síndrome de Silver Russel (OMIM %180860). A sua incidência está avaliada em 1-30/100 000. Este síndrome é clinicamente heterogéneo caracterizando-se por atraso de crescimento intra-uterino e pós-natal com perímetro craniano normal, clinodactilia do 5º dedo e assimetria corporal. As características faciais típicas são: face triangular com fronte larga e proeminente, pavilhões auriculares de implantação baixa, cantos da boca descaídos e mento proeminente. Estes doentes podem também apresentar manchas café com leite, anomalias genitais, hipoglicemia, sudação excessiva, escleróticas azuladas, sindactilia nos dedos dos pés e dificuldades alimentares durante a infância. Pode haver atraso nas aquisições motoras e raramente compromisso cognitivo. O síndrome de Silver Russel deve ser equacionado perante um recem nascido pequeno para a idade gestacional e com 3 das 5 características: atraso crescimento pós-natal, macrocefalia relativa, assimetria corporal, fronte proeminente, dificuldades de alimentação ou índice de massa corporal <2DP. O diagnóstico diferencial faz-se com outras causas de atraso de crescimento intra-uterino, anomalias cromossómicas, progeria neonatal (Wiede- mann-Rautenstrauch), síndrome 3M e nanismo de Mulibrey. A maioria dos casos são esporádicos. A etiologia molecular subjacente é heterogénea estando descritos como mecanismos principais a dissomia uniparental materna do cromossoma 7 (mUPD7) em cerca de 5-10% dos casos e a perda de metilação do “imprinting center region 1” (ICR1) localizado em 11p15 em 3563% dos casos. Esta região do cromossoma 11 contem um agrupamento de genes que regula o crescimento fetal e placentar, estando também implicada no síndrome de Beckwith-Wiedemann (que se caracteriza por sobrecrescimento pré e pós-natal). Também estão descritos casos com anomalias cromossómicas e fenótipo Silver Russel relembrando a importância do cariótipo nestes doentes. A orientação para consulta de Genética é importante para diagnóstico diferencial e aconselhamento genético. O risco de recorrência é extremamente baixo nos casos de mUPD7 e perda de metilação do ICR1. O prognóstico é favorável sendo as principais preocupações as dificuldades alimentares e a baixa estatura. O tratamento é de suporte sendo que a terapêutica com hormona de crescimento aumenta a estatura final mas não para a estatura alvo. A implementação desta te- rapêutica deverá ser feita em consulta de Endocrinologia. Nascer e Crescer 2008; 17(4): 268-269 BIBLIOGRAFIA A Toutain. Le syndrome de Silver-Russell. Encyclopédie Orphanet. Juin 2003 (http://www.orpha.net/data/patho/FR/ fr-silver.pd) Christine Gicquel et al: Epimutation of the telomeric imprinting center region on chromosome 11p15 in Silver-Russell syndrome; Nature Genetics 2005, 37(9) 1003-1007. 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A essa história seguem-se outras e outras que os restantes ouvintes vão desenterrando dos recantos da memória, talvez porque a semelhança de pormenores os faça relembrar. Muitas vezes ficamos danados com a sensação de já ter vivido tantas dessas situações e já não nos lembrarmos delas para as contar aos amigos… Estamos sempre a dizer que temos que as escrever, mas acabamos por deixar “correr o marfim” e só algumas são retidas. Foi assim que em 2004, num desses momentos de reunião informal entre médicos da Consulta de Genética do extinto Instituto de Genética Médica Doutor Jacinto Magalhães do Porto, resolvemos entre nós iniciar um novo tipo de registo médico num caderno de capa amarela com uma bela flor roxa da Agatha Ruiz De La Prada, que baptizamos com o nome de “Pérolas e Momentos Zen da Vida Quotidiana da Consulta”. Tal título não podia ser aposto a um caderno que ficasse em branco, e logo foi emitida uma ordem oral de serviço da responsável para que se registassem todas as ocorrências dignas dessa honra antes que o esquecimento as apagasse. Aqui vos deixamos algumas dessas pérolas sob forma de pergunta e resposta… P – Quem é o médico que a segue habitualmente? R – Eu sou perseguida pelo Doutor X! P – Qual foi a causa do falecimento do seu bebé? R – Olhe Senhora Doutora, sem querer ofender, acho que se tratou de um caso de inteligência médica! P – Qual é o motivo para marcar o diagnóstico pré-natal? R – É porque tenho dois tios maternos com “homeopatia do cherne”! (Distrofia M. Duchenne) P – Então qual é o motivo que o traz cá? R – Venho cá para fazer um mapa cromossómico para demonstrar que sou feminino! P – Então, o menino tem passado bem? R – Ah! Senhora Doutora, este foi enxertado em cornadura de cabra velha, nada lhe pega! 270 pequenas histórias NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 Índice de Autores Abecassis F S162 Afanas N S196, S209, 238 Aguiar AL S198 Alegria A 121 Alexandrino AM S195 Almeida L S209 Almeida M S299 Almeida P S213 Almeida R S198, 234 Almeida S S212 Álvares S 7, 119, 223 Alves S 234 Amaral B S196, S197 Amorim J S196 Amorim JMS 43, 103, 150, 265 Andrade T 16, S204 Araújo A 75, S208 Araújo L S200, S212, S213 Araújo LN S207 Areias A 37, S195 Aroso S S198 Azevedo LF 30, 254 Azevedo MAS 25 Bachu H S202 Bandeira A 13, 133, S197, S200, S209 Barbot J 80, S199 Bilelo MJ S211 Belo F S206 Bini-Antunes M 80, S199 Bom Sucesso M S213 Borges T 13, S213, S214 Braga A S203, S204, S208 Braga-Tavares H S210 Brito MJ 65 Cálix MJ S199 Campos T S204 Cardoso C 133 Cardoso H 13, S213 Cardoso ML S209 Carinhas MJ S195 Carrilho I S166, S199 Carro E S210 Carvalho C 37, S209 Carvalho F 16, S210 Carvalho S 129, S195 Casanova C 16, S210 Castanheira J 238 Castanhinhal S S210 Castel-Branco MG S212 Castro A S198 Cerqueira A S206 Cidade Rodrigues J S201 Coelho D 241 Coelho S S211 Correia T S211, 234 Costa E S197 Costa M S198, S207 Costa S S204 Costa T 121, S201, S204 Cunha FI S211 Cunha J S207 Cunha JS 133, S196 Cunha O S198 Delgado L S212 Dinis MJ 80, 229 Duarte C S204 Duarte JV S203, S212 Faria MS S200, S201, S204 Fernandes AP 16 Fernandes B S211 Fernandes E S201 Fernandes M S202 Fernandes S 238 Ferreira C 241 Ferreira GC 65 Ferreira PL 63 Ferreira S S206 Figueiredo M S199, 225 Figueiroa S 129 Fonseca J S200, S212 Fonte M S204 Fortuna AM 269 Garrido C S211 Godinho C 49, S196 Gomes E S200, S212 Gomes L 234 Gomes T S210 Gonçalves C 80 Gonçalves M S204 Gonçalves-Rocha M 269 Gonzaga D S206, 234 Goudiaby J S203 Guedes A 37 Guedes M 51, 70 Grilo M S206 Horta A S195 Laranjeira C 241 Leitão AM 139 Leite D S202 Lima R S185, S196, S208 Lima S S198, S207 Lobo I 107 Lopes L 121 Loureiro M S158 Loureiro V 65 Macedo F 47,105, 152, 267 Machado R 65 Machado S 107 Maciel I 75 Maia C S211 Maia I 9, 75, S204, S208 Manuela F S209 Mansilha HF 87, 146, S196 Manso A 215 Marques L S197 Martinho I S208 Martins E 133, 154, S196, S197, S199, S200, S209 Martins S S208 Martins V S213 Matos IV S214 Matos P 234 Moço C S206 Monteiro T 21, 83, 109, 125, 142, 246 Morais L S197 Moreira A S212 Moreira D S201 Moreira E S196, S209 Mota C S200, S201, S204 Moura C 49 Moura R S204 Nápoles S S210 Nascimento P S200, S203, S204 Neves J S210 Novo A S214 Oliveira L S161 Oliveira M S204 Oliveira MJ S214 Oliveira T S201, S202 Ouzounov V S207 Palmares C S212 Peralta L S203, S212 Pereira A S195 Pereira AC 254 Pereira CA S211 Pereira C 129, 234 Pereira E 121, 241 Pereira F 41, 80, 101, 148, S177, S192, S208, 263 Pereira L S204 Peres S 241 Pinho M 234 Pinto D S214 índice de autores 271 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 Sampaio V 75 Santos F 229 Santos J S202 Santos MC 23, 85, 144, 248 Santos P S195, S198 Santos V S206 Sarmento A S200, S204 Sarmento P S202 Selores M 107 Senra V S197 Serrão D 250 Silva C S199, S213 Silva ES 90, S188, S203, S208 Silva G S204, S207 Silva J 49, 269 Silva SR S203, S211, S212 Soares G 49, 75, S209, 269 Soares S S201, 241 Soares T S173 Soares VS S201 Sotto-Maior T S198 Sousa C 139, 225 Sousa H 70 Sousa M S213 Sousa P 154 Pinto F 9, S204, 225 Pinto J S211 Pinto M S206 Pichel F S199 Portela A S195 Portugal V S195, S207, S210, S213 Proença E 133, S209 Queirós O S168 Quelhas I S207 Ramos A S196 Ramos S S207, S213 Reis A S203, S204, S212 Reis MG 70 Reis-Lima M 49, 75, 154, S209, 271 Ribeiro C S208 Rios J S129, S204 Rocha H S208 Rocha P S203, S212 Rodrigues LR S210, S213 Rodrigues N S195 Rosário C 80, S210 Sales Marques J S201 Salgado M S208 Sampaio B 37, S201 Sampaio M S198 Sousa S S201, S213 Sousa SG S210 Souto A S195 Tavares H S206 Tavares L 238 Tavares M S203 Tavares S S206 Taveira M S210 Teixeira AP S202 Teixeira C 225 Teixeira F 70 Teixeira M S202 Temudo T 129, S199, S214 Tomás E S211 Tomé S 13 Vale I S211 Vale MJ 80 Valente I S195 Valongo C S209 Vasconcelos O S195 Vaz I S201 Veloso G 234 Vila Real M 229 Vilarinho L S197 Vizcaino JR S208 Indice de Assuntos Vol. 17 Acidente Vascular Cerebral - Dissecção da artéria vertebral em adolescente: orientação diagnóstica e terapêutica. 129 - Da trombose do seio venoso ao enfarte cerebral infecção e status pró-trombótico. S206 Adenopatias - PFAPA, entidade rara ou pouco conhecida? Três casos clínicos. 70 Alergia a fármacos - Auto declaração de alergia a fármacos em idades pediátricas – análise multivariada de factores de risco. S200 Alimentação complementar - Artigo recomendado. 87 Alimentação no lactente - Alimentação no primeiro ano de vida o que fazem os pais. S208 - Artigo recomendado. 87 272 Alta estatura - Estudo retrospectivo de alta estatura sindrómica numa consulta de Genética/Metabolismo. S201 ALTE - ALTE – uma análise retrospectiva. S196 Alterações do estado de consciência - Alterações do estado de consciência em idade pediátrica. S166 Amelogénese - Caso estomatológico. 43 Anemia - Anemia ferropénica. Caracterização de uma população pediátrica. S199 Anomalia de Poland - Anomalia de Poland e … 75 Arritmias - Emergências cardiológicas neonatais. S158 índice de autores / índice de assuntos Asma - A asma, a obesidade e a hormona vitamina D. A hipótese do sol. 125 - Asma na criança: Provas de broncodilatação em primeira consulta de imunoalergologia. S212 Autismo - Artigo recomendado. 85 Baixa Estatura - Diagnóstico de baixa estatura: mais vale tarde que nunca? S213 Cardiopatias Congénitas - Emergências cardiológicas neonatais. S158 Células Tregs - A asma, a obesidade e a hormona vitamina D - A hipótese do sol. 125 Citopatia mitocondrial - Citopatia mitocondrial e rim. S200 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 Colestase neonatal - Colestase neonatal como abordar. S188 Conjuntivite neonatal - Conjuntivite neonatal. S207 Cuidados de saúde - O trilema da saúde: dificuldades e soluções. S90 Défice do transportador da creatina - Atraso mental ligado ao X – defeito do transportador da creatina. S209 Depressão pós parto - Artigo recomendado. 83 Dermatite perianal - Dermatite Estreptocócica perianal. A propósito de dois casos clínicos. 139 - Dermatite Estreptocócica perianal. 238 Diagnóstico pré natal - Duplicidade Renal, importância da suspeita pré-natal. S121 Dieta cetogénica - Dieta cetogénica experiência na pediatria. S199 Desenvolvimento infantil - Artigo Recomendado. 245 Desidratação hipernatrémica - Desidratação hipernatrémica no recém nascido. S196 Displasia da anca - Displasia do desenvolvimento da anca o papel dos factores de risco. S195 Disqueratose congénita - Disqueratose congénita uma doença enigmática. 80 Dissecção da artéria vertebral - Dissecção da artéria vertebral em adolescentes orientação diagnóstica e terapêutica. S129 Distrofia muscular Duchenne - Elevação das transaminases: causas não hepáticas. S206 Distrofia Ungueal - Disqueratose congénita uma doença enigmática. 80 Doença renal poliquística - Doença renal poliquística autossómica recessiva - Revisão casuística de 21 anos. S201 Doenças atópicas - A asma, a obesidade e a hormona vitamina D: A hipótese do sol. 125 - Artigo recomendado. 146 - Auto declaração de alergia a fármacos em idades pediátricas-análise multivariada de factores de risco. S200 Doenças auto-imunes - A asma, a obesidade e a hormona vitamina D: A hipótese do sol. 125 Doenças metabólicas - Rastrio neonatal nas doenças metabólicas hereditárias: follow-up 19 doentes. S197 - Citopatia mitocondrial e rim. S200 - Atraso mental ligado ao X – defeito do transportador da creatina. S209 Drogas de abuso - O que sabem os pediatras sobre abuso de drogas. S204 EBV - Hepatite colestática aguda: uma apresentação rara de uma infecção aguda. S203 Ectopia renal - Caso radiológico. 152 Edema Hemorrágico agudo - Edema Hemorrágico agudo da infância: Quando a raridade do diagnóstico e a apresentação atípica se conjugam. S211 Eficiência/ Eficácia - A reforma na saúde - ética, plural e multidisciplinar. 25 - O trilema da saúde: dificuldades e soluções. 90 Emergências cardiológicas - Emergências cardiológicas neonatais. S158 Epifisiólise - Imagens. S105 Endoscopia digestiva - Endoscopia digestiva em pediatria. S177 Ética - A reforma na saúde - ética, plural e multidisciplinar. 25 - Comissão de Ética - o desafio metodológico. 249 Estomatite aftosa - PFAPA , entidade rara ou pouco conhecida três casos clínicos. S70 Febre Períodica - PFAPA , entidade rara ou pouco conhecida? Três casos clínicos. S70 Fístula traqueo esofásica - Imagens. 47 Fractura Dentária - Caso estomatológico. 103 Galactosemia - Galactosemia clássica num prematuro: caso clínico. S209 Gastrostomia - Caso endoscópio. 101 Gestão de recursos em saúde - O trilema da saúde: dificuldades e soluções. 90 Giardiase - Giardiase numa instituição. S207 Ginecologia pediátrica - Consulta de ginecologia pediátrica da adolescência na Maternidade Júlio Dinis uma experiência multidisciplinar. S201 - Saúde sexual e reprodutiva: os comportamentos dos adolescentes. S202 - Hemorragia uterina disfuncional na adolescência. 241 Gripe - Infecções respiratórias por influenza: Reflexões para a ausência de um diagnóstico. 65 Hábitos de exposição ao ecrã - Hábitos de exposição ao ecrã de uma população pediátrica de uma área urbana. 225 Hemorragia digestiva alta - Caso endoscópio. 148 Hepatite - Hepatite colestática aguda: uma apresentação rara de uma infecção comum. S203 Hiperbilirrubinémia - Hiperbilirrubinémia não conjugada: experiência de um hospital distrital. S198 Hiperinsulinismo congénito - Hiperinsulinismo congénito revisão teórica e série de casos. S133 Hipertensão arterial - Caso endoscópio. 148 Hipoglicemia - Hiperinsulinismo congénito revisão teórica e série de casos. S133 Hipotiroidismo - Tiroidite Auto –imune, experiência de uma consulta. 13 HPV - Verrugas ano genitais na criança a importância da abordagem multidisciplinar. S210 Infecções respiratórias - Infecções respiratórias por influenza: reflexões para ausência de um diagnóstico. 65 Insuficiência cardíaca - Emergências cardiológicas neonatais. S158 índice de assuntos 273 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 Leucoplaquia - Disqueratose congénita, uma doença enigmática. 80 Pâncreas ectópico - Caso endoscópico. 262 LES - Lúpus eritematoso sistémico:a realidade de um serviço. S204 Luxação congénita da anca - Imagens qual o seu diagnóstico. 266 Mastoitite - Mastoidite Aguda. S173 Medicina baseada na evidência - Avaliação crítica e implementação prática da evidência. 30 - Avaliação crítica e implementação prática de revisões sistemáticas e estudos de meta-análise. 253 Miocardiopatias - Emergências cardiológicas neonatais. S158 Nefrouropatias congénitas - Duplicidade renal: importância da suspeita pré –natal. 121 - Nefrouropatias congénitas admitidas numa UCIN: casuística de 10 anos. S204 Neoplasia testicular - Tumefacção escrotal: necessidade de uma avaliação urgente. S213 Nutrição em Pediatria - Artigo recomendado: Comentários. 87 Obesidade - A asma, a obesidade e a hormona vitamina D: A hipótese do sol. 125 Obstipação - Obstipação na criança. Como lidar. S192 Odontoma - Caso estomatológico. 150 Osteoporose - Uso de Pamidronato na osteoperose de desuso. S210 Pediatria baseada na evidência - Avaliação Crítica e implementação Prática da evidência. 30 PFAPA - PFAPA , entidade rara ou pouco conhecida? Três casos clínicos. 70 274 índice de assuntos Pseudotumor cerebri - Pseudotumor cerebri e tratamento de acne com minociclina. A propósito de um caso clínico. 214 Púrpura Henoch Shönlein - Internamento por Púrpura Henoch Shönlein. A experiência do HPH. S198 PRES - caso clínico - Síndrome de encefalopatia posterior reversível. 233 Rastreio neonatal - Rastreio neonatal nas doenças metabólicas heriditárias: Follow-up 19 doentes. S197 Recém Nascido - Emergências cardiológicas neonatais. S158 - Urgências cirúrgicas neonatais. S161 Refluxo gastro-esofágico - Doença de refluxo gastro-esófagico: Métodos de diagnóstico e tratamento. S185 Torus Mandibular - Caso estomatológico. 264 Sexualidade - Saúde sexual e reprodutiva: os comportamentos dos adolescentes. S202 Síndrome Cri du Chat - Síndrome Cri du Chat: Caso Clínico. 37 Síndrome de Asperger - Artigo recomendado. 85 Sindrome de encefalopatia posterior reversível - Sindrome de encefalopatia posterior reversível. 233 Síndrome Guillain-Barré - Síndrome Guillain-Barré: A realidade de um centro hospitalar. 228 Síndrome de Junção - Sindrome de Junção Pielo Ureteral submetidos a cirurgia: casuística de 10 anos. S203 Síndrome de Noonan - Genes crianças e pediatras. 49 Síndrome de Silver Russel - Genes crianças e pediatras. 268 Síndrome de Sly - Genes , Crianças e Pediatrias. 154 Síndrome de Stevens-Johnson - Síndrome de Stevens-Johnson: Três casos Clínicos. S197 Síndrome de Usher - Surdez Neurosensorial Profunda e Renite Pigmentar: um caso familiar. S207 Sono - Hábitos de sono. 9 - Artigo recomendado. 23 Tosse - Artigo recomendado. 21 Transporte pediátrico - Transporte Neonatal e pediátrico: Organização e Perspectivas Actuais. S162 Trilema da saúde - O Trilema da Saúde Dificuldades e Soluções. 90 Trombose do seio venoso - Da Trombose do seio venoso ao enfarte cerebral: Infecção e Status Pró –trombótico. S206 Tuberculose - Artigo recomendado. 245 Ulcera do recto - Caso Endoscópio. 41 Ulerythema ophryogenes - Caso Dermatológico. 107 Urgências - Urgências Cirúrgicas Neonatais. 161 - Urgências Psiquiátricas na Adolescência. S168 - Triagem de Manchester na idade pediátrica – Estudo Inter-Hospitalar. 16 Varicela - Artigo recomendado. 142 Verrugas anogenitais - Verrugas anogenitais na criança: a importância da abordagem multidisciplinar. S210 VIH - Filhos de mãe VIH Positivo: Experiência de 8 anos na Maternidade Júlio Dinis. 195 Vitamina D - Artigo recomendado. 125 - Artigo recomendado. 245 Virus Influenza - Infecções Respiratórias por Influenza: Reflexões para a ausência de um diagnóstico. 65 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2008, vol XVII, n.º 4 AGRADECIMENTOS A Revista Nascer e Crescer agradece aos colaboradores, que fizeram a revisão dos manuscritos submetidos para publicação no ano de 2008. Esta intervenção é essencial para a qualidade científica dos artigos e representa horas de trabalho, experiência e esforço dedicados a esta actividade. Sentimo-nos honrados com a sua colaboração e disponibilidade. Alda Miro Coelho - Porto Amélia José Monteiro - Porto Ana Ramos - Porto Artur Alegria – Porto Calçada Bastos – Porto Carlos Correia - Porto Carmen Carvalho – Porto Conceição Mota – Porto Ermelinda Silva - Porto Eugénia Fernandes - Porto Esmeralda Martins – Porto Fernando Pereira – Porto Graça Fernandes – Porto Inês Carrilho - Porto Inês Lopes – Porto Laura Marques – Porto Manuela Santos - Porto Manuela Selores – Porto Manuel Correia – Porto Manuel Pinho – Porto Maria de Lurdes Morais - Porto Margarida Guedes – Porto Marcelo Fonseca - Porto Miguel Taveira – Porto Raquel Quelhas – Porto Rogério Mendes - Porto Rui Chorão – Porto Susana Figueiredo – Porto Susana Machado – Porto Teresa Oliveira – Porto Tojal Monteiro – Porto A Revista Nascer e Crescer agradece o apoio publicitário concedido ao longo do ano 2008, pelas instituições abaixo indicadas: Associação do Hospital de Crianças Maria Pia Dermoteca Merck Serono Glaxo Smithkline GSK Merck Sharp & Dhome agradecimentos 275 RESUMO DAS CARACTERÍSTICAS DO MEDICAMENTO. DENOMINAÇÃO DO MEDICAMENTO. SAIZEN 8 mg click.easy, pó e solvente para solução injectável. COMPOSIÇÃO QUALITATIVA E QUANTITATIVA. Cada frasco para injectáveis de SAIZEN 8 mg click.easy contém Somatropina* (hormona do crescimento humana recombinante). *produzida pela tecnologia do ADN recombinante em células de mamífero. A reconstituição com o solvente bacteriostático contido no cartucho apresenta uma concentração de 5,83 mg por ml. Excipientes, ver secção “Lista de Excipientes”. FORMA FARMACÊUTICA: Pó e solvente para solução injectável. Pó branco liofilizado e solvente límpido e incolor. INFORMAÇÕES CLÍNICAS: Indicações terapêuticas - SAIZEN está indicado no tratamento de: - atraso do crescimento em crianças causado por secreção insuficiente ou inexistente da hormona do crescimento endógena; - atraso do crescimento em raparigas com disgenésia gonadal (Síndroma de Turner) confirmada por análise do cariotipo; - atraso do crescimento em crianças pré-pubertárias devido a insuficiência renal crónica (IRC). - atraso do crescimento (estatura actual < -2,5 Desvio Padrão (DP) e estatura ajustada à dos progenitores < -1 DP) em crianças pequenas com baixa estatura para a idade gestacional (SGA “Small for Gestational Age”), com um peso e/ou comprimento à nascença inferior a –2 DP, que não conseguiram uma recuperação do crescimento (DP da velocidade de crescimento <0 durante o último ano) até aos 4 ou mais anos de idade. Terapêutica de substituição em adultos com deficiência pronunciada de hormona do crescimento, diagnosticada por um único teste dinâmico para deficiência de hormona do crescimento. Os doentes deverão também satisfazer os seguintes critérios: Início na infância: Os doentes com deficiência de hormona do crescimento diagnosticada na infância, deverão ser reavaliados, para confirmação da deficiência em hormona do crescimento, antes de iniciar o tratamento com SAIZEN. Início na idade adulta: A deficiência de hormona do crescimento no adulto deverá ser resultante de doença hipotalâmica ou hipofisária, e o doente deve apresentar pelo menos outra deficiência hormonal (excepto a prolactina), a qual deverá ser adequadamente tratada com terapêutica de substituição, antes do início do tratamento com hormona do crescimento. POSOLOGIA E MODO DE ADMINISTRAÇÃO: SAIZEN 8 mg click.easy destina-se a administração multidose. A posologia do SAIZEN deve ser individualizada para cada doente com base na superfície corporal ou no peso corporal. É recomendada a administração de SAIZEN ao deitar, nas doses seguintes: Atraso do crescimento devido a secreção insuficiente da hormona do crescimento endógena: 0,7-1,0 mg/m2 de superfície corporal, por dia, ou 0,025-0,035 mg/kg de peso corporal, por dia, por administração subcutânea. Atraso do crescimento em raparigas devido a disgenésia gonadal (Síndroma de Turner): 1,4 mg/m2 de superfície corporal ou 0,045 – 0,050 mg/kg de peso corporal, por dia, por administração subcutânea. A terapêutica concomitante com esteróides anabólicos não-androgénicos em doentes com Síndroma de Turner pode aumentar a resposta do crescimento. Atraso do crescimento em crianças pré-pubertárias devido a insuficiência renal crónica (IRC): 1,4 mg/m2 de superfície corporal, aproximadamente igual a 0,045-0,050 mg/kg de peso corporal, por dia, por administração subcutânea. Atraso do crescimento em crianças pequenas com SGA: A dose diária recomendada é 0,035 mg/kg de peso corporal por dia (ou 1 mg/m2/dia, igual a 0,1 UI/kg/dia ou 3 UI/m2/dia), por administração subcutânea. Duração do tratamento: O tratamento deve ser interrompido quando o doente tiver atingido uma estatura adulta satisfatória, ou quando as epífises estiverem fechadas. No atraso do crescimento em crianças pequenas com SGA, o tratamento é habitualmente recomendado até que se atinja a estatura final. O tratamento deve ser suspenso após o primeiro ano, se o desvio padrão da velocidade de crescimento for inferior a +1. O tratamento deve ser suspenso quando se atinge a estatura final (definida como velocidade do crescimento < 2 cm/ano) e, no caso de ser necessária a confirmação, a idade óssea seja >14 anos nas raparigas ou > 16 anos nos rapazes, o que corresponde ao encerramento epifisário. Deficiência de hormona do crescimento no adulto: No início do tratamento com somatropina, recomendam-se doses baixas, de 0,15 a 0,3 mg, administradas diariamente por injecção subcutânea. A dose deverá ser gradualmente aumentada, mediante controlo dos valores do Factor de Crescimento Insulin-like (IGF-1). A dose final recomendada de hormona do crescimento raramente excede 1,0 mg/dia. De modo geral deverá ser administrada a dose mínima eficaz. Nos doentes com mais idade ou com excesso de peso, poderão estar indicadas doses mais baixas. MODO DE ADMINISTRAÇÃO: Para a administração da solução reconstituída para injecção de SAIZEN 8 mg click.easy, consulte as instruções do folheto informativo e do manual de instruções fornecido com o auto-injector seleccionado: o auto-injector one.click, o auto-injector sem agulha cool.click ou o auto-injector easypod. Consulte também a secção “Instruções de utilização/ manuseamento”. CONTRA-INDICAÇÕES: SAIZEN não deve ser utilizado em crianças em que tenha ocorrido a fusão das epífises. SAIZEN está contra-indicado em doentes com hipersensibilidade à Somatropina ou a qualquer um dos excipientes do pó para solução injectável ou do solvente. SAIZEN está contra-indicado em doentes com neoplasia activa. A terapêutica anti-tumoral deverá estar terminada antes do início do tratamento com Somatropina. SAIZEN não deve ser utilizado em casos com evidência de qualquer progressão ou recorrência de uma lesão intracraniana subjacente. Doentes com patologia aguda crítica, apresentando complicações pós cirurgia de coração aberto, cirurgia abdominal, politraumatizados, insuficiência respiratória aguda ou situações similares não devem ser tratados com Somatropina. (Relativamente aos doentes, em tratamento com Somatropina, que desenvolvam uma situação clinicamente crítica, ver “Advertências e precauções especiais de utilização”.). ADVERTÊNCIAS E PRECAUÇÕES ESPECIAIS DE UTILIZAÇÃO: O tratamento deve ser efectuado sob a vigilância regular de um médico com experiência no diagnóstico e tratamento de doentes com deficiência de hormona do crescimento. Os doentes com neoplasia intra ou extracraniana em remissão, e em tratamento com hormona do crescimento, devem ser cuidadosamente observados pelo médico em intervalos regulares. Os doentes com deficiência de hormona do crescimento secundária a um tumor intracraniano, devem ser examinados frequentemente para avaliação da progressão ou recorrência da patologia subjacente. Foram registados alguns casos de leucemia em crianças com deficiência de hormona do crescimento, tratadas ou não com esta hormona, podendo eventualmente representar um ligeiro aumento da incidência desta patologia, quando comparado com crianças sem esta deficiência. Não se encontra estabelecida uma relação causal com o tratamento com hormona do crescimento. Após a administração de hormona do crescimento observa-se uma hipoglicémia transitória de aproximadamente 2 horas e, nas 2-4 horas seguintes verifica-se uma elevação dos níveis de glucose no sangue, apesar da existência de uma concentração elevada de insulina. A Somatropina pode induzir um estado de resistência à insulina, o qual pode resultar em hiperinsulinismo e, em alguns casos, hiperglicémia. Para detectar uma resistência à insulina, os doentes deverão ser monitorizados para evidência de intolerância à glucose. SAIZEN deve ser utilizado com precaução em doentes com diabetes mellitus ou com história familiar de diabetes mellitus. Os doentes com diabetes mellitus podem necessitar de um ajuste da sua terapêutica anti-diabética. Uma retinopatia estável não deve levar à suspensão da terapêutica de substituição com Somatropina. No caso de surgirem alterações pré-proliferativas e na presença de retinopatia proliferativa deve ser suspensa a terapêutica de substituição com Somatropina. Durante o tratamento com Somatropina, verificou-se um aumento da conversão de T4 para T3, o qual pode resultar a nível do soro numa redução das concentrações de T4 e num aumento das concentrações de T3. Em geral, os níveis periféricos da hormona tiroideia permaneceram dentro dos limites de referência para indivíduos saudáveis. O efeito da Somatropina nos níveis da hormona tiroideia pode ter relevância clínica em doentes com hipotiroidismo central subclínico, nos quais, em teoria, se pode desenvolver hipotiroidismo manifesto. Inversamente, em doentes a receber terapêutica de substituição com tiroxina, pode ocorrer hipertiroidismo ligeiro. Portanto, é aconselhável a avaliação da função tiroideia após o início do tratamento com Somatropina e sempre que se proceda a ajustes da dose. Pode verificar-se retenção de líquidos durante a terapêutica de substituição com hormona do crescimento no adulto. No caso de edema persistente ou parestesia grave, a dosagem deverá ser reduzida de modo a evitar o desenvolvimento da síndroma do canal cárpico. No caso de cefaleia grave ou recorrente, problemas visuais, náuseas e/ou vómitos, recomenda-se uma fundoscopia para verificar se existe papiloedema. Se se confirmar o papiloedema, deve considerar-se o diagnóstico de hipertensão intracraniana benigna (ou pseudotumor cerebral) e interromper o tratamento com SAIZEN. Actualmente, não existe evidência suficiente para levar a uma decisão clínica em doentes com hipertensão intracraniana resolvida. Se se reiniciar o tratamento com hormona do crescimento, é necessária uma monitorização cuidadosa para detecção de sintomas de hipertensão intracraniana e o tratamento deve ser suspenso se se verificar recorrência da hipertensão intracraniana. O deslizamento da epífise femural é frequentemente associado a perturbações endócrinas, tais como deficiência de hormona do crescimento e hipotiroidismo, e períodos de maior velocidade de crescimento. Em crianças tratadas com hormona do crescimento, o deslizamento da epífise femural pode ser devido quer a perturbações endócrinas subjacentes ou à maior velocidade do crescimento causada pelo tratamento. Os períodos de maior velocidade de crescimento podem aumentar o risco de alterações articulares, especialmente a articulação coxo-femural está sob particular pressão durante o surto de crescimento pré-pubertário. O médico e os pais devem estar alerta no caso de a criança tratada com SAIZEN apresentar claudicação ou queixas articulares localizadas à coxo-femural ou joelho. As crianças com atraso do crescimento devido a insuficiência renal crónica, devem ser examinadas periodicamente para evidência ou progressão de osteodistrofia renal. Em crianças com osteodistrofia renal avançada pode verificar-se episiolístese ou necrose avascular da cabeça do femural, sendo incerto se estes problemas são afectados pelo tratamento com hormona do crescimento. Antes de se iniciar o tratamento deverá ser efectuado um radiograma das articulações coxo-femurais. Nas crianças com insuficiência renal crónica, a função renal deve apresentar um decréscimo de 50% relativamente ao padrão normal, antes de se instituir o tratamento. O crescimento deve ser monitorizado durante um ano antes de se instituir a terapêutica, de modo a verificar alterações no crescimento. O tratamento convencional da insuficiência renal (o qual inclui o controlo da acidose, do hiperparatiroidismo e do estado nutricional durante o ano anterior ao tratamento) deve ter sido estabelecido e mantido durante o tratamento. O tratamento deve ser interrompido na altura do transplante renal. Antes de se iniciar o tratamento em crianças pequenas com SGA, devem ser excluídas outras razões clínicas ou tratamentos que possam explicar o atraso do crescimento. Em crianças pequenas com SGA, recomenda-se a determinação da insulina e da glicémia em jejum, antes do início do tratamento e anualmente. Em doentes com risco aumentado para diabetes mellitus (por exemplo, história familiar de diabetes, obesidade, índice aumentado de massa corporal, resistência grave à insulina, acanthosis nigricans) deve ser realizado o teste da tolerância à glucose oral. Em caso de diagnóstico de diabetes, não deve ser administrada hormona do crescimento. Em crianças pequenas com SGA, recomenda-se a determinação do nível de IGF-I antes do início do tratamento e depois, duas vezes por ano. Caso se detectem, em determinações sucessivas, níveis de IGF-1 que excedam +2 DP em relação à referência para a idade, a razão IGF-I/IGFBP-3 pode ser considerada para o ajuste da dose. Existe experiência limitada no início do tratamento em doentes com SGA e que estejam próximos do início da puberdade. Não se recomenda portanto o início do tratamento em doentes com idade próxima do início da puberdade. A experiência em doentes com SGA, com a síndroma de Silver-Russel é limitada. Em crianças com SGA, parte do ganho em estatura obtido com o tratamento com Somatropina pode perder-se, caso este seja suspenso antes de se atingir a estatura final. Deve mudar-se o local da injecção para evitar lipoatrofia. A deficiência em hormona do crescimento no adulto é uma situação vitalícia, pelo que deverá ser tratada adequadamente. No entanto, é limitada a experiência em doentes com mais de 60 anos ou em tratamentos prolongados. Em todos os doentes que apresentem uma patologia aguda crítica, o possível benefício do tratamento com Somatropina deverá ser avaliado relativamente ao potencial risco envolvido. Foram relatados casos de apneia do sono e morte súbita em doentes com Síndroma de Prader-Willi em tratamento com Somatropina. SAIZEN não está indicado no tratamento de doentes com Síndroma de Prader-Willi. INTERACÇÕES MEDICAMENTOSAS E OUTRAS FORMAS DE INTERACÇÃO: A terapêutica concomitante com corticosteróides pode inibir a resposta ao SAIZEN. Verificou-se que a Somatropina induz uma redução ligeira dos níveis de cortisol sérico em doentes com deficiência de hormona do crescimento recebendo terapêutica de substituição das suprarrenais. Consequentemente, nos doentes em terapêutica de substituição com corticosteróides, que iniciam terapêutica com Somatropina, recomenda-se a monitorização dos níveis de cortisol sérico e o eventual ajuste da dose dos corticosteróides. Dados in vitro publicados indicam que a hormona do crescimento pode ser um indutor do citocromo P450 3A4. Desconhece-se o significado clínico desta observação. No entanto, quando a Somatropina é administrada em combinação com medicamentos que se sabe serem metabolizados pelas enzimas hepáticas do CYP P450 3A4, é aconselhável monitorizar a efectividade clínica de tais medicamentos. GRAVIDEZ E ALEITAMENTO: Gravidez: No que respeita a SAIZEN, não existem dados clínicos sobre as gravidezes a ele expostas. Assim, desconhece-se o risco para o ser humano. Embora os estudos em animais não indiquem um risco potencial durante a gravidez, o tratamento com SAIZEN deve ser interrompido no caso de ocorrer uma gravidez. Aleitamento: Desconhece-se se as hormonas peptídicas exógenas são excretadas no leite, mas a absorção da proteína intacta pelo tracto gastrintestinal da criança é improvável. EFEITOS SOBRE A CAPACIDADE DE CONDUZIR E UTILIZAR MÁQUINAS: SAIZEN não interfere com a capacidade de conduzir ou operar com máquinas. EFEITOS INDESEJÁVEIS: Até 10% dos doentes podem apresentar vermelhidão e prurido no local da injecção, particularmente quando se utiliza a via de administração subcutânea. Espera-se que ocorra retenção de fluidos durante a terapêutica de substituição com hormona do crescimento no adulto. Edema, edema articular, artralgias, mialgias e parestesias podem ser manifestações clínicas desta retenção de fluidos. No entanto estes sintomas são geralmente transitórios e dependem da dose. Os adultos com deficiência de hormona do crescimento, em consequência do diagnóstico deste défice na infância, apresentam uma menor frequência de efeitos secundários do que os que iniciam a terapêutica na idade adulta. Podem formar-se anticorpos à somatropina em alguns doentes; desconhece-se o seu significado clínico, e até à data estes anticorpos têm apresentado baixa capacidade de ligação e não têm sido associados a atenuação do crescimento, excepto em doentes com deleções de genes. Em casos muito raros, em que a baixa estatura é devida à deleção do gene da hormona do crescimento, o tratamento com esta hormona pode induzir anticorpos atenuantes do crescimento. As reacções adversas reportadas a seguir encontram-se classificadas de acordo com a frequência de ocorrência, conforme se segue: Muito frequentes: ≥ 1/10; Frequentes: > 1/100 - < 1/10; Pouco frequentes: > 1.000 -< 1/100. Raros: > 1/10.000 - < 1/1.000; Muito raros: ≤ 1/ 10.000. Reacções no local de administração - Frequentes. Reacções no local da injecção: Lipoatrofia localizada, que pode ser evitada variando o local da injecção. Distúrbios do estado geral - Frequentes (no adulto) Pouco frequentes (na criança). Retenção de fluídos: edema periférico, entumescimento, artralgia, mialgia, parestesia - Pouco frequentes: Síndroma do canal cárpico. Sistema Nervoso Central. Pouco frequentes - Hipertensão intracraniana idiopática (hipertensão intracraniana benigna). Doenças endócrinas. Muito raros - Hipotiroidismo. Afecções musculosqueléticas. Muito raros - Deslizamento da epífise da cabeça femural (Epiphysiolysis capitis femoris), ou necrose avascular da cabeça femural. Doenças do metabolismo. A resistência à insulina pode resultar em hiperinsulinismo e, em casos raros, em hiperglicémia. SOBREDOSAGEM: Não foram relatados casos de sobredosagem aguda. Porém, exceder as doses recomendadas pode causar efeitos indesejáveis. Uma sobredosagem pode levar a hipoglicémia e, subsequentemente, a hiperglicémia. Além disso, uma sobredosagem com Somatropina pode causar manifestações de retenção de fluidos. PROPRIEDADES FARMACOLÓGICAS. Propriedades farmacodinâmicas: Grupo farmacoterapêutico: 8.1.1 Hormonas do lobo anterior da hipófise. Código ATC: HO1A. SAIZEN contém hormona do crescimento humana recombinante, produzida por células de mamífero geneticamente modificadas. É um péptido de 191 aminoácidos idêntico à hormona do crescimento humana hipofisária, no que respeita à sequência e composição de aminoácidos assim como ao mapa peptídico, ponto isoeléctrico, peso molecular, estrutura isomérica e bioactividade. A hormona do crescimento é sintetizada numa linha celular murina transformada, modificada através da adição do gene da hormona do crescimento hipofisária. SAIZEN é um agente anabólico e anticatabólico que produz efeito não só no crescimento, mas também na composição e metabolismo do organismo. Interactua com receptores específicos numa variedade de tipos de células incluindo miócitos, hepatócitos, adipócitos, linfócitos e células hematopoiéticas. Alguns, mas não todos os seus efeitos são mediados por uma outra classe de hormonas conhecidas por somatomedinas (IGF-1 e IGF-2). Dependendo da dose, a administração de SAIZEN produz um aumento na IGF-1, IGFBP-3, ácidos gordos nãoesterificados e glicerol, uma diminuição da ureia sanguínea, e diminuição nas excreções urinárias do azoto, do sódio e do potássio. A duração do aumento nos níveis de GH pode desempenhar um papel na determinação da magnitude dos efeitos. É provável uma saturação relativa dos efeitos do SAIZEN com doses altas. Não é este o caso da glicémia e excreção urinária do peptido-C, que só aumentam significativamente após doses elevadas (20 mg). Num ensaio clínico randomizado, crianças pré-pubertárias pequenas com SGA, foram tratadas durante três anos com uma dose de 0,067 mg/kg/dia, e verificou-se um ganho médio de +1,8 DP-estatura. Nas crianças que não receberam tratamento adicional para além dos três anos, perdeu-se parte do benefício, mas as crianças mantiveram um aumento significativo de +0,7 DP-estatura, na estatura final (p<0,01 comparado com o valor basal). Os doentes que receberam um segundo tratamento após um período variável de observação, apresentaram um aumento total de +1,3 DP-estatura (p=0,001 comparado com o valor basal), na estatura final. (A duração de tratamento cumulativa média no último grupo foi de 6,1 anos). O aumento na DP-estatura (+ 1,3 ± 1,1) na estatura final neste grupo foi significativamente (p<0,05) diferente do aumento em DP-estatura obtido no primeiro grupo (+0,7 ± 0,8), o qual recebeu apenas 3,0 anos de tratamento em média. Um segundo ensaio clínico, investigou dois regimes posológicos diferentes durante quatro anos. Um grupo foi tratado com 0,067 mg/kg/dia durante 2 anos e observado durante os 2 anos posteriores sem tratamento. O segundo grupo recebeu 0,067 mg/kg/dia no primeiro e terceiro anos e nenhum tratamento no segundo e quarto anos. Qualquer dos regimes de tratamento resultou numa dose administrada cumulativa de 0,033 mg/kg/dia durante o período de quatro anos do estudo. Ambos os grupos revelaram uma aceleração do crescimento comparável e uma melhoria significativa de +1,55 (p<0,0001) e +1,43 (p<0,0001) DP-estatura respectivamente no final do período de quatro anos do estudo. Os dados sobre a segurança a longo prazo continuam a ser limitados. Propriedades farmacocinéticas: A farmacocinética do SAIZEN é linear pelo menos com doses até 8 UI (2,67 mg). Com doses mais elevadas (60 UI/20 mg) não pode ser excluído um certo grau de não-linearidade, porém sem relevância clínica. Após administração IV a voluntários saudáveis, o volume de distribuição em estado estacionário é de cerca de 7 L, a “clearance” metabólica total é de cerca de 15 L/h, enquanto que a “clearance” renal é insignificante, e o fármaco exibe uma semi-vida de eliminação de 20 a 35 minutos. Após a administração de doses únicas de SAIZEN por via SC e IM, a semi-vida terminal aparente é muito mais prolongada, cerca de 2 a 4 horas. Isto é devido a uma taxa limitada do processo de absorção. As concentrações séricas máximas de hormona do crescimento (GH) são atingidas após aproximadamente 4 horas e os níveis séricos de GH voltam ao valor basal dentro de 24 horas, indicando que não ocorre acumulação de GH durante as administrações repetidas. A biodisponibilidade absoluta de ambas as vias é de 70-90%. INFORMAÇÕES FARMACÊUTICAS: Lista de excipientes: Pó para solução injectável. Sacarose, Ácido Fosfórico, Hidróxido de sódio. Solvente para utilização parentérica. Metacresol a 0,3% (p/v) em água para preparações injectáveis. Incompatibilidades: Não se conhecem presentemente incompatibilidades de SAIZEN com outras preparações farmacêuticas. Prazo de validade: 3 anos. Após reconstituição, o produto deve ser conservado durante um período máximo de 28 dias no frigorífico (2ºC – 8ºC). Os auto-injectores easypod e one.click, quando contendo o cartucho reconstituído de SAIZEN, têm de ser conservados no frigorífico (2ºC – 8ºC). Quando se utilizar o auto-injector sem agulha cool.click, unicamente o cartucho da solução reconstituída de SAIZEN, deverá ser conservado no frigorífico (2ºC-8ºC). Precauções especiais de conservação: Não conservar acima de 25ºC. Não congelar. Conservar na embalagem de origem. Para a conservação do produto reconstituído, ver secção “Prazo de Validade”. Natureza e conteúdo do recipiente. Os frascos para injectáveis DIN 2R de 3 ml contendo 8 mg de pó e os cartuchos de 3 ml contendo 1,37 ml de solvente são de vidro neutro (Tipo 1). Os frascos para injectáveis e os cartuchos são fechados com tampa de borracha. SAIZEN 8 mg click.easy está disponível em embalagens com: 1 frasco para injectáveis de SAIZEN 8 mg e 1 cartucho de solvente bacteriostático pré-incluídos num dispositivo de reconstituição (click.easy) composto pelo corpo do dispositivo com cânula de transferência estéril. Instruçôes de utilização / manuseamento: O cartucho contendo a solução reconstituída de SAIZEN 8 mg click.easy destina-se exclusivamente a ser utilizado com o auto-injector one.click, com o auto-injector sem agulha cool.click, ou com o auto-injector easypod. Para conservação dos auto-injectores contendo o cartucho, ver secção “Prazo de Validade”. Para a administração do SAIZEN 8 mg click.easy, consulte as instruções do folheto informativo e do manual de instruções fornecido com o auto-injector apropriado. Os utilizadores do easypod são principalmente crianças desde os 7 anos até à idade adulta. A utilização de dispositivos médicos por crianças, deverá ser sempre feita sob a supervisão de um adulto. O pó para a solução injectável tem de ser reconstituído com o solvente bacteriostático que o acompanha (metacresol a 0,3% (p/v) em água para preparações injectáveis) para administração parentérica, utilizando o dispositivo de reconstituição click.easy. A solução injectável reconstituída deve ser límpida, sem partículas. Se a solução contiver partículas, não deve ser injectada. Qualquer produto não utilizado ou o material usado deve ser deitado fora de acordo com as exigências locais. TITULAR DA AUTORIZAÇÃO DE INTRODUÇÃO NO MERCADO: Serono Portugal, Lda. R. Tierno Galvan, 16 – B, Amoreiras, Torre 3, 16 º, Esc. 1 - 1070-274 LISBOA. NÚMEROS DA AUTORIZAÇÃO DE INTRODUÇÃO NO MERCADO 3505484- Frasco para injectável – 1 unidade. DATA DA PRIMEIRA AUTORIZAÇÃO/RENOVAÇÃO DA AUTORIZAÇÃO DE INTRODUÇÃO NO MERCADO: Data da Primeira Autorização de Introdução no Mercado: 26/01/2001. Data da Renovação da Autorização de Introdução no Mercado: 03/04/2004. DATA DA REVISÃO (PARCIAL) DO TEXTO: 23 de Fevereiro de 2007. Medicamento sujeito a receita médica. Fornecimento exclusivo hospitalar (CompartIcipado 100% nos estabelecimentos saúde especiais).
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