VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento VIII

Transcrição

VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento VIII
Anais
VIII Congresso Brasileiro
de Psicologia do Desenvolvimento
Universidade de Brasília
Organizadores:
Maria Cláudia S. L. de Oliveira
Diva Maria Albuquerque Maciel
Jane Farias Chagas
Maristela Rossato
Mônica Neves Pereira
Patricia Maria Campos Ramos
Sylvia Regina Magalhães Senna
De 12 a 15
de Novembro
de 2011
C749
Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
(8. : 2011 : Brasília).
Anais do VIIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento / Maria Cláudia Santos Lopes de Oliveira ...
[et al.], organizadores. – Brasília : Associação Brasileira de Psicologia do Desenvolvimento, 2011.
1352 p. ; 21 cm.
ISSN 2177-1413
1. Psicologia do desenvolvimento – Congressos. I. Oliveira,
Maria Cláudia Santos Lopes de (org.).
CDU 159.922
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
Sumário
Apresentação .....................................................................................
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Comissões...........................................................................................
7
Estrutura do evento............................................................................
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Programação Científica.......................................................................
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Sábado, 12/11 ....................................................................................
9
Domingo, 13/11..................................................................................
9
Segunda-feira, 14/11 .......................................................................... 473
Terça-feira, 15/11 ............................................................................... 985
Índice por atividades .......................................................................... 1329
Índice Remissivo ................................................................................. 1333
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
APRESENTAÇÃO
Prezados Participantes do
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento,
É com grande prazer que apresentamos os Anais do VIII CBPD, um evento da
Associação Brasileira de Psicologia do Desenvolvimento que neste ano tem por tema
A Psicologia do Desenvolvimento para a Transformação da América Latina.
O VIII CBPD traz à capital federal cerca de 600 participantes, entre pesquisadores, profissionais, estudantes de graduação e pós-graduação de Psicologia e áreas afins, oriundos de quase todos os estados brasileiros e de países das Américas e
Europa. Este número constitui um recorde e dá testemunho da importância deste
evento, que se consolida no calendário científico da Psicologia brasileira.
São apresentados aqui aproximadamente 500 trabalhos, entre mesas redondas, simpósios, comunicações orais e pôsteres, relacionados a sete áreas temáticas.
Constituem eles relatos de pesquisas e abrangem uma pluralidade de contextos,
objetos e metodologias, em torno dos quais se tem construído a Psicologia do Desenvolvimento. Mas, encontramos também relatos de experiência profissional, trabalhos que enfocam o estado da arte da pesquisa da área e ensaios críticos, os quais
expressam a diversidade de leituras do fenômeno do desenvolvimento humano na
linha do tempo, uma pluralidade de perspectivas que temos buscado preservar neste
Congresso!
Este ano, o CBPD apresenta outras novidades. Abraçamos a vocação de promover e qualificar a interlocução e as redes de colaboração acadêmica com nossos
colegas pesquisadores e profissionais de outros países da América Latina. Contamos
com a presença de congressistas e renomados conferencistas de diferentes países do
continente americano, com destaque para Colombia, Peru, Argentina, Cuba, Estados
Unidos, além da Alemanha. Deste modo, visamos contribuir para dar expressão à
riqueza do pensamento psicológico que se produz nos diferentes países desse continente, além de debater questões comuns a nossas realidades socioculturais de países
constituídos a partir de relações coloniais.
Desta forma, adotamos intencionalmente uma posição distinta da que marcou
a construção histórico-social da nação brasileira que, ao longo dos cinco séculos de
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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
história manteve o olhar direcionado para a Europa e a América do Norte, e as costas
para o continente latinoamericano. Que essa realidade, que já vem se alterando, seja
positivamente afetada pelos debates ocorridos neste Congresso!
Aproveitamos a oportunidade para expressar nosso agradecimento à CAPES,
CNPq, Universidade de Brasília e a todos aqueles participantes, membros das Comissões, avaliadores ad hoc, parceiros e patrocinadores, sem os quais não teríamos
chegado até aqui.
Brasília, 15 de novembro de 2011.
Maria Cláudia S. L. de Oliveira
Presidente da ABPD
Comissão Organizadora do VIII CBPD
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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
COMISSÕES
Diretoria da ABPD
Maria Cláudia Santos Lopes de Oliveira
Adeiaide Alves Dias
Ana Paula Soares da Silva
Miriã Alves de Alcântara
Zena Winona Eisenberg
Comissão Científica
Vera Maria Ramos de Vasconcellos
(Coordenadora)
Avaliadores Ad Hoc
Adelaide Alves Dias
Alba Cristiane Santanna
Alessandra Oliveira Machado Vieira
Alexsandra Zanetti
Ana Cecília de Souza Bastos
Ana Paula Soares da Silva
Anamelia Lins e Silva Franco
Angela Donato Oliva
Angela Maria Uchoa de Abreu Branco
Bernadete de L. Alexandre Mourão
Carolina Lampreia
Cecília Guarnieri Batista
Cláudia Broetto Rossetti
Débora de Hollanda Souza
Diva Maria Albuquerque Maciel
Elaine Pedereira Rabinovich
Eliane Maria Fleury Seidl
Elton Hiroshi Matsushima
Gabriela Souza de Melo Mieto
Ivalina Porto
Jane Correa
Jane Farias Chagas Ferreira
Julio Rique Neto
Leila Regina de O. d’ Paula Nunes
Leila Sanches de Almeida
Lucia Helena Cavasin Zabotto Pulino
Lucia Vaz de Campos Moreira
Maria Cláudia S. Lopes de Oliveira
Maria Helena Fávero
Maria Helena Vilares Cordeiro
Maria Regina Maciel
Mário Sergio Vasconcellos
Maristela Rossato
Miriã Alves de Alcântara
Mônica Neves-Pereira
Olga Maria Piazentin Rolim Rodrigues
Patricia Alvarenga
Rosalia Duarte
Rosangela Francischini
Ruben de Oliveira Nascimento
Sávio Silveira de Queiroz
Silviane Bonaccorsi Barbato
Tania Mara Sperb
Vera Maria Ramos de Vasconcellos
Zena Winona Eisemberg
Comissão Organizadora Local
Diva Maria Albuquerque Maciel
Jane Farias Chagas Ferreira
Maristela Rossato
Mônica Neves-Pereira
Sandra Ferraz Castilho Freire
Gabriela Souza de Melo Mieto
Sylvia Magalhães Senna
Comissão Executiva
Ana Carolina Villares Barral Villas Boas
Ana Paula Carlucci
André de Carvalho Barreto
Francisco Rengifo Herrera
Julia Escalda Mendonça
Julio Cesar dos Santos
Manuela Smith
Marina Kohlsdorf
Mônica Rocancio Moreno
Patricia Cristina Campos Ramos
Polllianna Galvão Soares
Rute Morais Nogueira Bicalho
Sueli de Souza Dias
Tatiana Yokoy de Souza
Secretaria Executiva
Cláudia da C. Freire
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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
ESTRUTURA DO EVENTO
Dia 12/11 - sábado
Dia 14/11 - segunda-feira
17h-17h30 – Mesa de abertura
8h30-10h – Programação Científica
17h30-18h30 – Conferência de
abertura
10h-10h30 – Coffee Break
18h30-19h30 – Apresentação
musical
19h30 – Coquetel
10h30-12h30 – Programação
Científica
12h30-14h – ALMOÇO
14-15h30 – Programação Científica
15h30-16h – Coffee Break
Dia 13/11 - domingo
16h-18h – Programação Científica
18h-20h – Programação Científica
8h30-10h – Programação Científica
19h30 – Lançamento de Livros
10h-10h30 – Coffee Break
10h30-12h30 – Programação
Científica
Dia 15/11 - terça-feira
12h30-14h – ALMOÇO
8h30-10h – Programação Científica
14-15h30 – Programação Científica
10h-10h30 – Coffee Break
15h30-16h – Coffee Break
16h-18h – Programação Científica
10h30-12h – Programação
Científica
18h-20h – Programação Científica
12h-14h - Programação Científica
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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
DIA 12/11 - Sábado
CONFERÊNCIA
“La Psicología del desarrollo en la actualidad. Una mira desde lo histórico cultural“,
proferida pelo prof. Dr. Guillermo Arias Beaton, da Universidad de La Habana, Cuba.
DIA 13/11 - Domingo
8h30-10h
CONFERÊNCIA
“Bullying: Prevenção da Violência e Promoção da Cultura da Paz nas Escolas
Angela Uchoa Branco – UnB
Diversos estudos voltados para a investigação de crenças e valores entre crianças,
adolescentes e professores têm demonstrado que, na maioria dos contextos escolares, os professores orientam seus alunos
a competirem entre si ou a serem individualistas (e.g. Branco, 2003; Kohn, 1992; Palmieri, 2003). Essa orientação é geralmente implícita nas variadas formas de manifestação do “currículo oculto” associado
à comunicação e à metacomunicação. O
currículo oculto se expressa pela canalização, geralmente sutil, das crenças, valores e ações dos alunos em certa direção,
e pode ocorrer, por exemplo, por meio da
valorização da competição, e até mesmo
da agressão física e verbal como estratégia
de resolução de conflitos, minimizando-se
o sofrimento emocional do aluno humilhado e discriminado pelos colegas. No
contexto escolar, a mídia noticia com freqüência situações de bullying, onde crianças e adolescentes vivenciam incontáveis
constrangimentos como apelidos relacionados à sua aparência e agressões por
parte dos colegas. Observa-se que nesses
contextos de violência gratuita e repetitiva muitas vezes a escola e os professores não encontram alternativas para lidar
com a situação, uma vez que o bullying é
um fenômeno complexo, sintoma de uma
sociedade onde valores sociais positivos
e a ética são colocados em segundo plano. Dessa forma, é necessário destacar a
importância de se discutir sobre as emoções, as raízes afetivas e motivacionais do
fenômeno bullying, e promoção da ética
e cooperação entre os alunos, articulando
o tema com a realidade da escola, com as
características e conteúdos das próprias
disciplinas e atividades pedagógicas e com
as interações sociais que se dão no âmbito
educacional. Nesta palestra, irei analisar
e discutir estas questões, trazendo dados empíricos obtidos em pesquisa por
mim coordenada sobre o tema, onde entrevistas e observações foram feitas com
professores e crianças do quinto ano de
escolas públicas e particulares. Tendo em
vista a relevância da escola nos processos
de socialização e desenvolvimento moral
de crianças e adolescentes, e necessário
a co-construção de uma Cultura de Paz.
A Paz, porém, não é sinônimo de um estado estático de harmonia, caracterizado
pela ausência de conflitos, mas sim deve
ser entendida como um permanente processo (Jares, 2007) co-construtivo motiva9
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
do por valores de justiça, solidariedade e
negociação de conflitos, onde sentimentos de empatia e compreensão mútua
permeiem os processos de comunicação
e as estratégias de ensino adotadas pelos professores. Para a paz ser promovida
na escola, é necessário a re-significação
subjetiva da violência e da competição
por parte da cultura escolar como um
todo, no sentido de se promover, diante
de conflitos, a negociação cooperativa e
inteligente. Nosso trabalho em relação à
questão do bullying tem se inspirado particularmente na perspectiva sociocultural
construtivista (e.g. Branco, 2006; Madureira & Branco, 2005; Valsiner, 2007). Esta
abordagem teórica se apresenta bastante
produtiva em abranger a complexidade
do fenômeno bullying, e promover ações
efetivas em prol de uma cultura de paz
na escola. Internalizar desde a infância o
princípio de que o “outro merece ser tratado como eu gostaria de sê-lo”, preveniria situações de violência e bullying na
escola e, possivelmente, contribuiria para
a construção da paz em contextos sociais
mais amplos, como a família, o ambiente de trabalho e outros. Entretanto, para
a construção do respeito mútuo e de um
ambiente de paz na escola, é essencial
que haja o empenho político e local para
a formação dos professores, no sentido
de prepará-los para prevenir o bullying e
saber atuar caso este ocorra no ambiente escolar, de forma cooperativa e com o
trabalho conjunto de todos os participantes da comunidade escolar. Não é mais
possível desconsiderar a importância da
promoção das interações sociais positivas
para o desenvolvimento global da criança
e do adolescente no âmbito das instituições educativas. Estas podem e devem
atuar no campo da promoção concreta de
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interações humanas saudáveis, éticas e
respeitosas, promovendo valores relativos
à justiça, dignidade humana e responsabilidade social. Quanto mais cedo isto for
feito, mais os alunos serão beneficiados
em seu desenvolvimento. Daí a necessidade de prevenção da violência na escola,
especialmente a prevenção do bullying,
por meio da promoção da educação para
a paz como eixo transversal presente em
todas as atividades exercidas no contexto
escolar, das matérias estudadas às aulas
de educação física, sempre passando pela
qualidade atenciosa, respeitosa porém firme dos educadores. Afinal, os alunos precisam conhecer e compreender o significado da convivência pacífica, da mediação
construtiva de conflitos e da construção
permanente de um contexto democrático baseado na ética. O certo é que todos,
professores e alunos, são sujeitos ativos
na transformação de sua própria realidade, e somente a partir de suas convicções
e motivações algo poderá ser transformado. A programação e implementação de
atividades cooperativas entre os profissionais que atuam na instituição educativa e
nas salas de aula, bem como atividades
cooperativas incluindo as famílias, todas
são relevantes para o sucesso de projetos
integrados de prevenção do bullying e de
promoção de uma Cultura de Paz. Somente com base em um trabalho conjunto de
todos os profissionais envolvidos no contexto da escola, um trabalho de equipe no
qual todos—inclusive funcionários como
porteiros, merendeiras etc—participem
ativamente, é que poderão ser gerados
processos de transformação da cultura
escolar no sentido da inclusão de todos,
e do trabalho efetivo em relação a promoção da paz e da prevenção do bullying nas
escolas.
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
CO 01-LT01
Emoção/Afetividade
LT01-951 - REVISÃO BIBLIOGRÁFICA:
A EMOÇÃO NO DESENVOLVIMENTO DO
BEBÊ NO PRIMEIRO ANO VIDA
Ludmilla Dell’Isola Pelegrini de Melo Ferreira
- USP/RP
[email protected]
Kátia de Souza Amorim - USP/RP
katiamorim@ffclrp.usp.br
Financiamento: FAPESP, CNPq
A emoção é tema presente em diversas
áreas do conhecimento, dentre eles, a
psicologia do desenvolvimento. Henri
Wallon se destaca pelos seus estudos sobre a emoção, tornando-se um referencial
para a investigação deste tema. Em sua
teoria, a emoção é elemento central nos
primeiros meses de vida, a qual propiciaria a constituição do vínculo entre bebê e
ambiente social; representando, assim, o
primeiro plano de sociabilidade que contribuiria para promover a solidariedade
de comportamento e de atitudes entre
o bebê e as pessoas no entorno. A partir da leitura deste autor e de alguns de
seus estudiosos, no entanto, percebeu-se
a exploração da emoção mais restrita ao
plano teórico e aos primeiros meses de
vida. Buscando aprofundamento dessa
questão, traçou-se o objetivo de desenvolver um estudo empírico para investigar
a emoção ao longo do primeiro ano de
vida, investigando suas manifestações em
processo de transformação ao longo deste
período. Para a realização deste trabalho,
um dos percursos foi verificar o que tem
sido produzido na literatura, em termos
de estudos empíricos, acerca da emoção
relacionada ao desenvolvimento de todo
o primeiro ano de vida. É essa revisão
que será aqui apresentada. Para o levantamento bibliográfico, realizou-se revisão
nacional e internacional sobre a temática
seguindo as etapas: 1ª) escolha das bases
de dados para pesquisa: uma base de dados nacional (BVS-Psi) e uma internacional
(PsycINFO); 2ª) traçou-se critérios de inclusão (artigos, teses e dissertações; sem
restrição de data na base nacional e restrição dos últimos cinco anos na internacional; idiomas inglês, português, espanhol e
francês; trabalhos com disponibilidade de
resumos) e exclusão (livros, capítulos de
livro e resenhas; revistas exclusivamente
da área médica); 3ª) pesquisa e definição
das terminologias indexadas (emoções,
desenvolvimento emocional, desenvolvimento infantil (BVS-Psi e PsycINFO), estados emocionais e bebês (BVS-Psi), e early
childhood development (PsycINFO); e 4ª)
busca pelas palavras-chave (bebê, infant
e emoção), e os cruzamentos entre elas e
os descritores. Algumas palavras buscadas
- como emoções/emotions, bebê/infant,
desenvolvimento infantil/infant development - resultaram em expressivos números de artigos; por outro lado, a partir dos
cruzamentos, houve queda considerável
deste número. Considerando que o objetivo desta revisão foi analisar o que tem
sido produzido sobre emoção especificamente no desenvolvimento de bebês no
primeiro ano de vida, a partir dos resumos e dos critérios de inclusão/exclusão,
optou-se por afunilar as buscas aos cruzamentos, chegando-se a 249 trabalhos, 247
artigos e 2 teses. Ao analisar estes trabalhos, percebe-se a diversidade de estudos
e, ao mesmo tempo, a escassez dos mesmos relacionados à emoção no desenvolvimento de bebês, pois a maior parte dos
11
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
trabalhos é realizada somente com o pai
ou com a mãe dos bebês, analisando os
aspectos emocionais dos pais no processo da maternidade e paternidade. Ainda,
encontram-se relatos clínicos enfocando
alguma dificuldade ou patologia materna,
ou até mesmo a relação mãe-bebê de forma teórica ou clínica, predominantemente
a partir da psicanálise. No entanto, foram
encontrados trabalhos sobre o desenvolvimento de bebês considerando a emoção
como um dos processos deste desenvolvimento. Estes estudos podem ser divididos
entre teórico, revisão de literatura e empíricos. Os primeiros apontam para a importância e necessidade de novos estudos
na área, principalmente longitudinais e da
abordagem sociocultural e evolucionista.
Os segundos são estudos realizados com
bebês entre 0 e 2 anos, principalmente
em laboratório, transversais, com vídeogravação ou observação e focando a díade
mãe-bebê. Estes trabalhos têm analisado
e discutido as expressões faciais, vocalizações, resposta ao meio e construção
do repertório emocional, propondo, de
uma forma geral, que as expressões faciais dos bebês estão intimamente e relacionalmente conectadas ao contexto e
aos estímulos que lhes são apresentados,
mostrando sintonia e reciprocidade com o
ambiente e também a variabilidade individual das respostas emocionais. Compreende-se que estes trabalhos colaboram
para a visualização dos aspectos emocionais e expressivos dos bebês ao longo do
primeiro ano de vida, e contemplam o caráter biológico e social da emoção. Por outro lado, a análise mostra algumas lacunas
entre esses estudos, como a ausência de
investigações longitudinais, realizadas no
ambiente do bebê, que não seja em laboratórios, e que acompanhem o processo
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de/em transformação da emoção no desenvolvimento do bebê. Sendo assim, os
estudos encontrados na literatura oferecem material empírico para a discussão
da temática, e também apontam direções
para estudos prospectivos.
Palavras-chave: Emoção, bebê,
desenvolvimento, revisão bibliográfica.
Contato: Ludmilla Dell’Isola Pelegrini de Melo
Ferreira - [email protected]
LT01-1305 - RECONHECENDO EMOÇÕES:
UM OLHAR DESENVOLVIMENTAL SOBRE
O PAPEL DA MÚSICA NA ONTOGÊNESE
HUMANA
Nara Côrtes Andrade - UFBA,
[email protected]
A emoção é intrínseca à experiência que
temos com a música, sendo que diferentes
afetos podem ser expressos através dela, a
exemplo de serenidade, tristeza, angústia,
medo, entre outros. Apesar das reflexões
sobre as relações entre música e emoção
remontarem a pensadores como Platão,
pesquisas científicas são recentes e vêm
apontando que “as respostas emocionais
para a música dentro de uma cultura aparentam ser altamente consistentes dentro
da mesma e entre ouvintes, acurada, razoavelmente imediata e precisa” (Viellard
et al, 2008, p. 721). As emoções são fenômenos complexos e multidimensionais
que compreendem desde fenômenos biológicos a fenômenos subjetivos e sociais,
sendo, muitas vezes, acompanhada de
uma intensa reação fisiológica e psicológica. Defende-se que as emoções possuem
três funções principais: 1) Social - comunicar informações sobre estado de ânimo,
além de prováveis comportamentos e in-
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
tenções; 2) Adaptativa - preparar fisiologicamente o indivíduo para a ação, aumentando suas chances de sobrevivência; Motivacional – facilitar os comportamentos
motivados (Fernandez-Abascal et al, 2010;
Freitas-Magalhães e Castro, 2009). Segundo Reeze (2006, p. 191), “as emoções são
fenômenos expressivos e propositivos de
curta duração, que envolvem estados de
sentimento e ativação, e que nos auxiliam
na adaptação às oportunidades e aos desafios que enfrentamos durante eventos
importantes da vida”. Pesquisas sobre
emoções básicas expressas por músicas
vêm apontando que as respostas emocionais podem ser bastante consistentes
e coincidentes entre as diferentes idades
(Peretz, 2009). Muitos autores defendem
que emoções como alegria, medo e tristeza podem ser induzidas através da música,
sendo que estas estão presentes em diversos espaços do nosso cotidiano, como, por
exemplo, em trilhas sonoras de filmes, especialmente aqueles dirigidos às crianças.
Em termos ontogenéticos, as emoções
dependem do amadurecimento de estruturas neurais que dêem sustentação a
seu funcionamento. Segundo Férnandez-Abascal e cols. (2010), as emoções primárias, a exemplo da alegria, da surpresa, da
repugnância (nojo), da tristeza e do medo,
se desenvolvem no início da vida, enquanto as emoções secundárias ou sociais, tais
como ciúme, culpa, vergonha, precisam
tanto do desenvolvimento de estruturas neurais quanto aspectos referentes a
aprendizagem e socialização, tais como internalização de algumas normas sociais ou
desenvolvimento de identidade pessoal.
Do ponto de vista adaptativo, é essencial
que o bebê compartilhe seus estados internos com seus parceiros sociais (Bergamasco, 1997) e seja capaz de processar in-
formações relativas ao estado afetivo dos
mesmos. A criança começa a desenvolver
a capacidade de percepção relativa às expressões vocais e faciais no seu primeiro
ano de vida (Flom et al, 2008), sendo que
aos 4 meses de idade, os bebês podem
discriminar expressões bimodais (facial e
vocal) de felicidade, tristeza e irritação e
aos cinco meses diferenciam expressões
unimodais vocais de raiva, felicidade e
tristeza. As crianças prestam atenção preferencialmente a estímulos auditivos que
expressem emoções. No caso da fala, por
exemplo, as crianças atentam mais a falas
emotivas do que a falas neutras (Kitamura & Burnham, 1998; Singh, Morgan &
Best, 2002). Em pesquisa realizada como
bebês de seis meses de idade, encontrou-se que as crianças apresentavam maior
atenção sustentada a episódios de canto
materno do que a episódios de fala materna (Nakata & Trehub, 2004). Estes autores salientam que a fala é um importante
meio de transmitir emoções, entretanto,
possivelmente a música é uma maneira
mais eficaz de fazê-lo, especialmente entre crianças em estágio pré-linguístico, as
quais podem as mensagens verbais em
sua forma, mas não em seu conteúdo.
Segundo Peretz e Sloboda (2005), estes
achados sugerem que, possivelmente, a
música pode ser considerada como mais
poderosa que a fala no que diz respeito à
expressão de emoções. Flom et al (2008),
em pesquisa realizada com crianças saudáveis nascidas a termo e sem complicações neonatais, observaram que crianças
entre 5 e 7 meses foram capazes de discriminar trechos felizes e tristes quando
habituados a trechos tristes e não quando
habituados a trechos alegres. Com 9 meses, entretanto, as crianças discriminaram
todos os trechos musicais avaliados como
13
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
afetivamente diferentes. Kastern e Crowder (1990), em estudos realizado com
crianças entre 3 e 12 anos, apontam que,
mesmo as crianças mais jovens, de 3 anos
de idade, mostram reconhecer a valência
afetiva da música de sua própria cultura negativa, positiva - associando-a aos modos em que estas são compostas, modo
menor e maior, respectivamente. Segundo Cunningham & Sterling (1988), aos 4
anos as crianças já são capazes de reconhecer explicitamente emoção de alegria
expressa pela música. Entretanto, o estudo realizado por Dalla Bela e cols. (2001)
encontrou que crianças de 3 e 4 anos não
apresentam ainda habilidade no reconhecimento de emoções alegres e tristes.
Estes autores destacam que questões metodológicas, tais como a tarefa apresentada de apontar para faces esquemáticas
representando as reações emocionais, podem haver interferido no resultado, já que
esta pode requerer habilidades ainda pouco desenvolvidas nesta faixa etária. Sendo
que aos 5 anos as crianças são capazes de
reconhecer músicas alegres e tristes (Dalla
Bella & cols., 2001) e aos medo e ameaça
(Dolgin & Adelson, 1990; Terwogt & Van
Grinsven, citado por Vielard e cols., 2008).
É importante salientar que estas pesquisas se referem a uma melhor acurácia no
reconhecimento de emoções alegres e
tristes, enquanto as emoções de medo e
raiva são muitas vezes confundidas entre
si. A música, historicamente, tem sido um
elemento recorrente em todas as culturas
conhecidas (Schellenberg & cols., 2008)
com a qual a criança convive, a exemplo
das canções de ninar, brincadeiras cantadas, etc. A mesma a dimensão emocional
intrínseca à sua experiência é de imenso
valor ao desenvolvimento, a exemplo da
regulação emocional que exerce em crian14
ças muito pequenas, caracterizadas pelas
canções de ninar; socialização e interação
entre pares, a exemplo das brincadeiras
cantadas (Pinto & Lopes, 2009); entre outras dimensões. Entretanto, como ressalta
Baruch (2010), as pesquisas em psicologia
da música com crianças são relativamente recentes, sendo ainda mais escassas
no Brasil. As diversas pesquisas que têm
sido realizadas acerca da à discriminação
e ao reconhecimento de emoções em música com diferentes faixas etárias apontam
para uma compreensão de como este
fenômeno ocorre durante o desenvolvimento infantil. Entretanto, como podemos notar acima, é importante salientar
que estas são, em sua maioria, recentes e
pouco consensuais, sendo ainda escassas
e apontando um campo de estudos em
expansão.
Palavras-chave: música, emoções,
desenvolvimento humano.
LT01-1307 - O TESTE DO DESENHO DA
FAMÍLIA COMO UMA REPRESENTAÇÃO
DOS MODELOS INTERNOS DE
FUNCIONAMENTO
Débora Matos - UFPE
[email protected]
Antônio Roazzi - UFPE
[email protected]
Financiamento: CNPq
John Bowlby postulou que o comportamento de apego no ser humano, assim
como em várias outras espécies é de ordem primária e instintiva, cuja função
adaptativa seria a preservação da vida,
tendo em vista que o filhote sozinho
não tem a mínima chance de sobreviver.
Assim, a criança tem uma tendência na-
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
tural para buscar o contato e a proteção
de um adulto, seja ele a mãe ou a figura
de um outro cuidador. O tipo de cuidado oferecido pela mãe ou cuidador, ou
seja a figura de apego primária, oferece
um protótipo de relacionamento sobre o
qual a criança é capaz de construir suas
expectativas diante de relacionamentos outros que surgem ao longo da vida.
Ainsworth (1978), em seu experimento
“Situação Estranha” observou três estilos
de apego, que se desenvolviam na criança conforme os critérios de sensibilidade
desta figura primária para responder aos
sinais do bebê e a quantidade e a natureza da interação entre os mesmos. Assim,
crianças com estilo de apego seguro (B)
apresentam um bom equilíbrio entre autonomia e proximidade, sendo capazes de
utilizar a figura de referência como base
segura. A qual é percebida pela criança
como positiva, sensível e sempre disponível às suas requisições de ajuda. Nas
crianças com apego evitante (A) há uma
ênfase na autonomia e independência,
mostram-se indiferentes à figura de apego, a qual é percebida como impaciente,
negativa e rígida. As crianças com apego
ambivalente (C), por sua vez, apresentam
excessiva ativação do sistema de apego,
buscando uma contínua confirmação da
presença e proteção da figura de apego.
É interessada, mas não consegue estabelecer rotinas sincronizadas, apresentando
incoerências. Está convencida de não ser
amável, enquanto que o outro é percebido como confiável e positivo. Os estilos de
apego discriminados por Ainsworth (op.
Cit.) sofreram uma evolução no sentido
de não serem mais vistos como formas estanques de relacionamento. Os modelos
Internos de funcionamento (MIF), como
agora são denominados, podem sofrer
mudanças durante a vida, de acordo com
outras experiências vividas pelo indivíduo.
O desenho tem sido usado há muito tempo pela psicologia como forma de acessar
as representações do indivíduo acerca de
si mesmo e do mundo que o cerca. Partindo do mesmo pressuposto o desenho
da família foi estudado por diversos autores de forma a classificar características
no mesmo que tivessem correlação com
os estilos de apego (Kaplan, May, 1986;
Fury, Carlson, Sroufe, 1997; Attili, Ruby,
2000; Maddigan, Ladd, Golberg, 2003).
Mais recentemente Roazzi, & cols., (2011)
também verificaram a possibilidade de
acessar as representações acerca das relações afetivas por meio do desenho da
família em crianças de educação infantil e
ensino fundamental. Tal pesquisa, já realizada na Itália, está sendo trazida para o
Brasil por meio deste trabalho, tendo em
vista a necessidade de pesquisas com o
tema, contextualizadas nesta realidade
específica. Analisar a correlação entre as
características do desenho da família e os
Modelos Internos de Funcionamento, tomando como base os estudos anteroires.
Prover uma base para futura validação
do desenho como uma representação
do apego por meio do uso de um instrumento já conhecido. Avaliação de uma
amostra composta por 25 alunos do 1º
ano do Ensino Fundamental de uma escola pública do Recife com relação aos
estilos de apego por meio de uma versão
modificada (Attili, 2001) do Separation Anxiety Test, de Klagsbrun e Bowlby (1979).
Aplicação individual do teste do desenho
da família validado para classificação dos
estilos de apego por Fury e colaboradores
(1997). A versão italiana do presente estudo demonstrou que o desenho da família
pode ser considerado um método válido
15
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
para assessar os estados atuais de apego
em crianças. Por meio de testes estatísticos tradicionais, utilizando o SSA (Smallest
Space Analysis - Bloombaum, 1970; Guttman, 1965; Shye, 1985; or Similarity Structure Analysis - Borg & Lingoes, 1987), muitas características do desenho mostraram
relação com as tipologias de apego. Dados
obtidos por meio de simultâneas inercorrelações lançaram luz sobre as complexas
estruturas representacionais da criança
acerca de seus laços familiares. As seguintes variáveis dimensionais mostraram-se
relevantes: Crianças coma pego ambivalente demonstraram maior probabilidade
de situar seu próprio desenho mais próximo do desenho da mãe que os seguramente apegados (os quais se desenhavam
a uma distância equilibrada da mesma:
C < B, A; ʤ2 (2)= .28 p<0.05), além disso
localizavam o desenho da família a uma
distância maior da borda inferior da folha
que as crianças seguras (C > B; ʤ2 (2)= 5.4
p<0,001), seus desenhos cobriam uma
pequena área da folha em comparação
comos desenhos das crianças com apego
seguro (C < B; ʤ2 (2)=2.81 p<0.05).As crianças seguras se desenharam mais ao centro
da folha que as crianças de apego evitante
(B<A; ʤ2 (2)=3.8 p<0.01). Variáveis categoriais relevantes: Houve uma tendência por
parte das crianças inseguras , em comparação às seguras, de desenharem figuras
incompletas (B < A, C; ʤ2 (2)=3.41 p<0.05).
No desenho de crianças ambivalentes havia ausência de chão em maior proporção
que no desenho das demais (C < A, B; ʤ2
(2)= 10.9 p<0.05) e frequentemente suas
figuras estavam flutuando (C > B, A; ʤ2
(2)= 13.3 p<0.001). Crianças seguramente apegadas mostraram maior probabilidade, embora não significativamente, de
desenhar figuras com braços abertos (B >
16
A, C; ʤ2 (2)= 2.78 n.s.). Também desenharam mães com expressões faciais positivas
(B>A, C; ʤ2 (2)= 8.2 p<0.05). Crianças evitantes desenharam com maior probabilidade barreiras entre os representantes da
família (A > B, C; ʤ2 (2)= 8.7 p<0.05). Assim,
temos fortes evidências que nos embasam
no sentido de que os resultados do presente estudo têm contribuições similares,
porém respaldadas pela singularidade da
cultura brasileira. De forma que se apresente como uma contribuição relevantes
no aprofundamento da temática da Teoria
do Apego no país.
Palavras-chave: desenho da família;
representação interna; teoria do apego.
LT01-1329 - WALLON E BOWLBY:
AFETIVIDADE EM DISCUSSÃO
Fabíola Lira Gonçalves - UFPE
[email protected]
Débora Matos - UFPE
[email protected]
Financiamento: CNPq
O ponto de partida deste ensaio deu-se
pela articulação entre teorias psicológicas
do desenvolvimento humano que tratam
da afetividade. Neste sentido, propõe-se
um diálogo entre as abordagens teóricas,
a saber: a teoria psicogénetica de Wallon
e a teoria do apego de Bowlby, já que estes autores defendem uma concepção integrada do ser humano em seus aspectos
cognitivos e afetivos. Historicamente, as
teorias psicológicas têm gerado uma visão
dicotômica entre cognição e afetividade.
A teoria psicogenética de Piaget (2007)
ressalta o aspecto cognitivo no desenvolvimento do indivíduo. Por outro lado, se
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
contempla na psicanálise a ênfase na singularidade do sujeito, tendo a afetividade
um papel central na constituição deste.
Na teoria walloniana as emoções e o afeto, tem papel fundamental na constituição
da pessoa. A emoção teria primeiramente
a função biológica calcada na concepção
evolutiva de Darwin, tendo em vista que a
espécie humana, em geral, tem um único
filho por gestação, e um longo período de
dependência deste em relação aos cuidados do adulto para o seu desenvolvimento
pleno. A primeira manifestação de emotividade na vida humana, conforme esta
abordagem é o choro, que é concebido
como a garantia de que as necessidades
do bebê serão prontamente atendidas
pela mãe. Daí tem-se uma emoção, carregada de sua característica contagiosa
e epidêmica, sendo à base da relação
eu-outro. Esta manifestação emotiva se
constitui na relação entre os aspectos
biológico e social, pois o choro também
é considerado por Wallon como uma expressão de linguagem, uma vez que a mãe
ouve o choro do bebê, é contagiada por
sua reação emocional de desconforto e
reage atendendo às suas solicitações. Para
Dantas (1992), na teoria walloniana, cuja
orientação filosófica é o materialismo dialético, a emoção é simultaneamente biológica e social, circunscrita em um tempo
historicamente situado, a premissa básica
é da unicidade do sujeito nas dimensões
que o integram. Desse modo, a emoção
humana, se constitui por meio das manifestações de linguagem verbais e não verbais que só acontecem em função da mediação cultural e social entre sujeitos. As
etapas do desenvolvimento humano em
Wallon não são estanques. O sujeito não
perde, ou substitui totalmente as emoções primárias, elas coexistirão com as no-
vas emoções que surgirão durante toda a
existência. Por essa via explicativa, o pressuposto integrador entre os aspectos biológicos, cognitivos e afetivos funcionam de
modo sincrético, portanto indissociáveis.
Wallon ressalta dois mecanismos reguladores do desenvolvimento psicogenético,
a saber: alternância e preponderância,
estes se articulam num jogo interacional
intenso entre os componentes biológicos
e sociais do psiquismo humano. À medida
que as interações entre os indivíduos vão
ocorrendo, vão surgindo novas formas de
afetividade, por exemplo: o sentimento e
a paixão que podem se manifestar tanto
de modo verbal, pois há palavras que a
expressam, bem como gestos e atitudes
motoras que podem expressá-las do mesmo modo, sem que haja uma hierarquia
na forma escolhida pelo sujeito para expressar a afetividade. O que demarca a
escolha da expressão afetiva é o contexto
interacional instaurado entre os sujeitos
envolvidos no ato comunicacional. Para
Bowlby, o vínculo da criança à sua mãe é,
também, um comportamento inicialmente de ordem primária e instintiva, cuja
função adaptativa seria a preservação da
vida. Assim a criança tem uma tendência
natural para buscar o contato e a proteção
de um adulto, seja ele, a mãe ou a figura
de outro cuidador. Essa busca de contato,
manifestada primeiramente pelo choro,
provoca determinado tipo de reação na
mãe, que a partir de então, se configura
como cuidadora. Constitui-se, assim, um
estilo de relacionamento primário entre
mãe e filho, ou cuidador e criança. O tipo
de cuidado concedido por este, oferece
um protótipo de relacionamento sobre o
qual a criança é capaz de construir, por
meio de generalização, suas expectativas
diante de relacionamentos que surgem ao
17
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
longo de sua vida. Há, assim, duas condições que contribuem na formação ou não
do apego a uma figura primária, ou ainda
ao estilo de apego proveniente desta relação: a) a sensibilidade desta figura para
responder aos sinais do bebê; b) a quantidade e a natureza da interação entre os
componentes do par. Conforme estas variáveis, três padrões básicos de apego podem se desenvolver (Ainsworth, 1978): a)
Crianças com estilo de apego seguro apresentam um bom equilíbrio entre autonomia e proximidade, sendo capazes de utilizar a figura de referência como base segura, a qual é percebida pela criança como
positiva, sensível e sempre disponível às
suas requisições de ajuda; b) Nas crianças com apego evitante há uma ênfase na
autonomia e independência, mostram-se indiferentes à figura de apego, a qual
é percebida como impaciente, negativa e
rígida; e c) As crianças com apego ambivalente, por sua vez, apresentam excessiva
ativação do sistema de apego, buscando
uma contínua confirmação da presença e
proteção da figura de apego. É interessada, mas não consegue estabelecer rotinas
sincronizadas, apresentando incoerências. Está convencida de não ser amável,
enquanto que o outro é percebido como
confiável e positivo. Estes estilos de apego
tornam-se relativamente estáveis entre o
primeiro e o segundo ano de vida e se manifestam como uma “tendência geral” que
influencia as relações do sujeito consigo,
com o outro e com o meio. Estes estilos,
porém, podem ser alterados a partir de
outras experiências significativas ao longo da vida. Autonomia, autoconfiança,
confiança para explorar e conhecer, são
características intimamente relacionadas
a um apego seguro. Percebe-se uma relação entre afetividade e cognição, de forma
18
indissociável, afetando todas as esferas da
vida do indivíduo. Assim as duas teorias
integram a base orgânica e contato com o
outro, com o social, os quais impulsionam
o afeto e a cognição. Este homem completo e total tem todos estes componentes
constantemente interagindo entre si. Ele
está, ao mesmo tempo, se adaptando ao
meio, aprendendo o mundo ao seu redor,
significando o mesmo e se relacionando
com o outro a partir de suas experiências.
Todas estas atividades coexistem e se nutrem mutuamente.
Palavras-chave: Afetividade, Psicogênese da
Pessoa Completa, Teoria do Apego.
LT01-1373 - O DESENVOLVIMENTO DO
OLHAR NO BEBÊ E SUA RELAÇÃO COM
O DESENVOLVIMENTO POSTURAL:
REFLEXÕES SOBRE RELAÇÃO, CULTURA E
COMPLEMENTARIDADE
Natália Meireles Santos - FFCLRP/USP
nmeireles@aluno.ffclrp.usp.br
Kátia de Souza Amorim - FFCLRP/USP
katiamorim@ffclrp.usp.br
O primeiro ano de vida é uma etapa de
grandes transformações no desenvolvimento humano, em que inúmeras habilidades são adquiridas (Pio, 2007). Estudar
o bebê é uma forma de aprender sobre
quem somos e como somos constituídos
(Bussab, Carvalho & Pedrosa, 2007). O
bebê apresenta formas particularizadas de
interação, reveladas por episódios “mais
fugazes, desordenados, pouco estruturados e pouco intencionais” (Anjos, Amorim,
Rossetti-Ferreira & Vasconcelos, 2004).
Apesar disso, o bebê apresenta formas de
expressão significativa, (gestos, expressões faciais, vocalizações, postura corpo-
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
ral) com indícios importantes de intenção,
desejos, incômodos, capazes de suscitar
reações no outro, quer seja um adulto ou
outra criança. No processo, o bebê mostra-se ativo dentro de um sistema cultural
ao utilizar-se de capacidades interativas
empregadas a partir de meios convencionais de comunicação direcionados ao outro, como o sorriso e o olhar (Anjos et al.,
2004). O olhar destaca-se como recurso
comunicativo, indo além da visão, atingindo a esfera relacional e propiciando comunicação (Belini & Fernandes, 2008). Nesse
sentido, Elmôr (2009) aponta o olhar como
uma ferramenta importante para estabelecer comunicação entre seres humanos.
Fogel e cols. (1999) acrescentam a postura como aspecto influente no desenvolvimento do olhar no bebê, destacando que,
nos primeiros meses de vida, o posicionamento corporal do bebê ainda está muito
subjugado ao manejo adulto. Os autores
ressaltam a importância de investigar o papel de fatores motores e sociais envolvidos
nessa associação da postura e do olhar.
Amorim (2008) aponta como a mudança
postural proporciona uma modificação
significativa na percepção e participação
no ambiente por parte do bebê. Bebês
que antes demonstravam certo isolamento em relação às coisas ao redor passam a
ter maior atenção ao ambiente e a buscar
ativamente a proximidade com outros. Os
processos envolvidos na co-construção do
engatinhar estariam ligados à emergência
de maior intencionalidade e autonomia no
bebê. Mas, há a necessidade de estudos
mais sistemáticos a essa questão. Traçou-se assim, o objetivo do estudo. O objetivo
tem sido investigar como se dá o processo
de transformação do olhar como recurso
expressivo no bebê; e como se dá a relação
daquele com diferentes momentos de seu
desenvolvimento postural, em dois bebês
analisados em situação de interação em
dois contextos (ambiente domiciliar e creche). Para a condução do projeto, o mesmo foi submetido à avaliação do Comitê
de Ética em Pesquisa (CEP), da Faculdade
de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão
Preto (FFCLRP/USP), sendo aprovado, em
concordância com a Resolução n° 196/96.
A coleta e análise de dados estão sendo
conduzidas fundamentalmente através da
perspectiva da Rede de Significações (Rossetti-Ferreira, Amorim, Silva & Carvalho,
2004). Estão sendo realizados dois estudos
de caso (Yin, 2005), com acompanhamento longitudinal. Entende-se que o estudo
de caso propicia a observação em ambiente natural, de forma a apreender a complexidade em que os processos estão imersos;
e, de maneira a preservar as características
significativas dos acontecimentos, dentro
de seus contextos e relações (Freitas & Pozzebon, 1998). Criança em domicílio: Os
sujeitos são um bebê (Marina), sua mãe
(Júlia) / o pai (Pedro) e a avó (Mirian). O
material empírico é do Banco de imagens
do projeto Processos de (Trans)formação
da Comunicação e Linguagem, ao Longo
do Primeiro Ano de Vida: Um Estudo de
Caso (Rodrigues, 2008). Esse estudo acompanhou o bebê, semanalmente, desde seu
nascimento, ao longo de todo seu primeiro ano de vida, investigando o desenvolvimento da comunicação e da linguagem
durante esse período. Serão utilizadas cenas da criança a partir do quarto mês de
vida. Criança em creche: O sujeito pivô é
Nisete, 5m e 6d ao ingresso na creche. Seu
estudo se fará a partir do banco de Imagens do Projeto Integrado Processos de
Adaptação de Bebês à Creche (Rossetti-Ferreira, 1994). Este projeto acompanhou
os processos de ingresso e frequência de
19
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
21 bebês, em uma creche universitária.
Acredita-se que esses contextos permitam
evidenciar processos de desenvolvimento
significados de diferentes maneiras, pelas
particularidades de organização dos espaços, bem como pelas práticas discursivas
do contexto e das pessoas no entorno e
em interação. As gravações dos bebês estão sendo vistas e algumas cenas, transcritas. Nessas são buscadas particularidades
nos processos de olhar e da postura corporal. As cenas são analisadas microgeneticamente (Goes, 2000), de modo a apreender
mudanças ao longo do tempo, através de
recortes de episódios de diferentes momentos do desenvolvimento postural e do
olhar no bebê. A partir do mapeamento
realizado, foi recortado um episódio interativo no ambiente domiciliar: Júlia leva
Marina (quatro meses) para o quarto para
dar-lhe banho. Deita-a virada para cima
na cama. Marina começa a choramingar.
Júlia senta Marina na cama, segurando-a
de modo que ambas ficam frente a frente (Júlia abaixa-se ao lado). Marina olha e
passa a mexer nos pés. Começa um movimento em que Júlia insistentemente tenta
chamar a atenção de Marina, utilizando-se
de vários recursos auditivos e táteis. Nem
sempre Marina retribui com o olhar, mas
quando o faz ambas sorriem. Júlia levanta-se então e pega Marina no colo, e leva-a
para frente de um espelho, com ambas
voltadas para o mesmo. Enquanto isso, a
pesquisadora passa por detrás com a câmera, chegando a aparecer no espelho. O
olhar de Marina volta-se para a imagem
da pesquisadora. Marina movimenta-se e
esforça-se para virar-se para trás. Quando
a mãe o percebe, vira seu próprio corpo,
tornando possível que Marina olhe diretamente para a pesquisadora. No episódio,
fica evidente a insistente e custosa ne20
gociação do olhar por parte da mãe que
suscita reflexões sobre a inserção desse
recurso em nossa cultura e como o bebê
se apropria deste na interação, inclusive
quando não há pontos de encontro; nem
sempre Marina retribui o olhar à mãe, mas
antes se volta para seu próprio corpo. Chama ainda a atenção o contato e manejo
corporal do bebê realizado pela mãe em
uma relação também negociada. Marina
não é simplesmente subjugada às ações da
mãe , mas esta também reage à comunicação do bebê (choro, movimento corporal,
olhar), numa relação de complementaridade (Seidl de Moura & Ribas, 1999).
Palavras-chave: olhar, comunicação,
desenvolvimento postural
LT01-1435 - A COMPREENSÃO
INTERDISCIPLINAR DA RELAÇÃO
MÃO-BEBÊ: UMA APROXIMAÇÃO DE
WINNICOTT À NEUROCONCIÊNCIA DO
DESENVOLVIMENTO
Célia Regina de Souza Cauduro - USP/SP
[email protected]
Vera Silvia Raad Bussab - USP/SP
[email protected]
Na teoria psicanalítica de Donald W. Winnicott ((1983; 1988 a, b, c, d; 1990; 1994;
1997; 1999 a, b, c, d, e) sobre a constituição do sujeito e nos trabalhos da Neurociência do Desenvolvimento, existem afirmações sobre a importância da qualidade
da experiência vincular nas primeiras etapas da vida pós-natal. A correspondência
entre estas duas teorias se organiza por
meio do conceito winnicottiano de experiência intersubjetiva: “o bebê no colo da
mãe, que precisa crescer, isto é, constituir uma base para continuar existindo e
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
integrar-se numa unidade” (Loparic, 2008,
p.145). Segundo Loparic (2008), “Winnicott introduziu um novo modelo ontológico do objeto de estudo da psicanálise,
centrado no conceito de tendência para
a integração, para o relacionamento com
pessoas e coisas e para a parceria psicossomática“ (p.145). Esta afirmação de Loparic (2008) é apoiada pelas pesquisas
neurocientíficas sobre o desenvolvimento
humano que afirmam que o corpo materno é a principal fonte de provisão das
informações ambientais, e funciona como
um regulador externo que organiza os
sistemas neurológico, perceptual, emocional e relacional pela sua presença física e pelo seu comportamento interativo
(Feldman, 1996; 1999; 2003; 2006; 2007).
A Neurociência do Desenvolvimento - As
conclusões dos estudos da neurociência
do desenvolvimento descrevem como as
experiências vividas na interação entre a
criança e o cuidador primário no período
neonatal, podem alterar o processo de
desenvolvimento do sistema nervoso. Os
bebês, ao nascerem, apresentam considerável individualidade, são sensíveis aos
estados afetivos do outro e mobilizam respostas em seu meio ambiente. Tal capacidade requer um grau significativo de inter
coordenação pré-funcional entre o cérebro e o corpo. Atualmente, existe grande
evidência que a organização do cérebro
do neonato é altamente dependente da
estimulação dos cuidadores, e que estas
interações quando validadas por experiências adequadas, constituem um regulador da epigênese social da mente infantil,
isto é, promovem as condições necessária
para a autoregulação emocional. Estas experiências adequadas são proporcionadas
por um cuidador primário (mãe) sensível
capaz de decodificar ou entender as pis-
tas não verbais dos comportamentos do
bebê, crucial para o estabelecimento de
um vínculo seguro (Schachner, Shaver, &
Mikulincer, 2005). A autoregulação emocional é a habilidade para controlar estados internos ou respostas relacionadas
aos pensamentos, emoções, atenção e
desempenho. Os mecanismos neurais que
sustentam os processos regulatórios podem ser os mesmos que fundamentam os
processos cognitivos superiores. Existem
processos complexos pelos quais a emoção relaciona-se à cognição e ao comportamento, que, conseqüentemente, interferem no processo de desenvolvimento
(Bell & Wolfe, 2004; Bell & Kirby, 2007).
A autoregulação emocional desempenha
um papel central na socialização e no desenvolvimento do comportamento moral,
depende do desenvolvimento do córtex
pré-frontal; está associada ao desenvolvimento de diferentes estratégias de adaptação durante as etapas subseqüentes do
ciclo vital (Levesque, A., 2004; Lewis &
Stieben, 2004). As situações de negligência e maus tratos, eventos traumáticos
que quando duradouros, representam
risco ao desenvolvimento psiconeurobiológico infantil; estas situações podem estabelecer uma vulnerabilidade ao estresse
pós-traumático (PTSD), e uma predisposição à violência na idade adulta. Situações
de privação ou trauma que promovem
interrupções no processo de formação do
vínculo, causadas por fatores maternos
(ex. depressão pós-parto) e/ou relacionadas ao bebê (doenças hereditárias, congênitas ou adquiridas), podem desorganizar
a regulação psicobiológica e neuroquímica
no desenvolvimento cerebral, conduzindo
à neurogênese, sinaptogênese e diferenciação neuroquímica anormais.Os dados
da pesquisa de Chelini et al., (2010) inclu21
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
ída no Projeto Ipê -Temático FAPESP no.
06/59192-2, que estuda possíveis efeitos
da Depressão Pós-Parto (DPP) no desenvolvimento numa população atendida
pelo sistema público de saúde apontam
que “ a resposta do cortisol a um estressor leve foi maior em filhos de mães deprimidas (análise de medidas repetidas;
t = 2,44, 94df, p = 0,0166). Este resultado
indica que aos quatro meses após o parto
o eixo HPA pode ter sido afetado pela DPP
materna, já que filhos de mães deprimidas
não mostraram a esperada supressão da
resposta do cortisol comumente observada em torno de três meses”. Em concordância com Ovstscharoff e Braun (2001),
a interação diádica entre o recém-nascido
e a mãe funciona como um regulador do
desenvolvimento da homeostase interna infantil. Interferem no funcionamento
normal do eixo HPA (Hipotálamo-Pituitária-Adrenal) resultando na alteração do
ritmo circadiano, elevando os níveis basais e reduzindo o volume cerebral. Os
efeitos podem ser de longo prazo, conduzindo a uma intensa resposta do eixo
HPA a qualquer situação desafiadora,
atrofia hipocampal e prejuízos no desempenho cognitivo na vida adulta. Winnicott
e a Neurociência do Desenvolvimento: a
construção de uma hipótese interdisciplinar - A hipótese formulada a partir desta
aproximação é que a relação de mutualidade entre o biológico, o emocional e o
social (e não o emocional enquanto uma
conseqüência linear da condição biológica, ou o biológico como condição direta
do emocional) apontada pela neurociência, no processo de desenvolvimento humano, é estabelecida por meio de uma
relação intersubjetiva fundada em uma
maternagem que Winnicott (1988) chamou de “mãe suficientemente boa”.Estas
22
sutis interações emocionais alteram os níveis da atividade cerebral e exercem um
papel importante no estabelecimento e
manutenção dos circuitos do sistema límbico (Ziabreva, I., Poeggel, P., Reinhild, S.,
Braun, K., 2003; Wilkinson,2004; Cirulli,
Berry, Alleva, 2003; Bradshaw, Schore,
Brown, Poole, & Moss, 2005; Fonagy &
Target, 2005; Ovstscharoff e Braun, 2001;
Balbernie, R.(2001); Graham, et al.,1999;
Schore, 2005). “A “mãe suficientemente
boa” tambem não existe sem os outros.
Ela não existe sem um campo sociocultural, que lhe dê possibilidades de exercer suas funções” (Safra, 2002).Coerente
com afirmação de Fonseca, V.R.J.R.M. et
al. (2010) - Projeto Ipê -Temático FAPESP
no. 06/59192-2, “A sensibilidade materna
é influenciada por fatores sócio-cognitivos
e afetivos”. As conclusões da pesquisa de
Defelipe, (2009) - Projeto Ipê -Temático
FAPESP no. 06/59192-2: “A DPP1 parece
capaz de perturbar os arranjos interativos
tornando-os menos consistentes. Porém,
apesar desta possível limitação, por vezes,
mães com DPP podem interagir adequadamente com seus bebês. Por fim, a DPP
por não se tratar de um fenômeno capaz
de incidir linearmente sobre a interação
mãe-bebê, e sobre o desenvolvimento
posterior, deve ser investigada em associação com outros fatores psicossociais
de risco.” Confirmam a compreensao de
Aitken & Trevarthen (2001) que consideram o vínculo como resultado de um conjunto complexo de fatores individuais e
ambientais que interagem de uma forma
não linear.
Palavras-chave: Psicanálise, Neurogênese,
Vínculo
1
DepressãoPós-Parto.
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
CO 10 - LT01
Depressão Pós-parto
LT01-901- DEPRESSÃO PÓS-PARTO:
O IMPACTO SOBRE A RESPOSTA AO
ESTRESSE DO BEBÊ É MODULADO PELO
COMPORTAMENTO MATERNO
Marie-Odile Monier Chelini - IPUSP
[email protected]
Vera Regina J. R. M. Fonseca - IPUSP
[email protected]
Vinicius Frayze David - IPUSP
[email protected]
Emma Otta - IPUSP
[email protected]
Financiamento: FAPESP
A depressão pós-parto (DPP) afeta, mundialmente, uma entre cada cinco parturientes (Miller, 2002; Nemeroff, 2008),
comprometendo o desenvolvimento e
comportamento dos seus filhos (Essex
et al., 2002; Herrera et al., 2004; Pearlstein et al., 2009). Particularmente, uma
relação significante entre depressão maternal após o parto e disfunções do eixo
hipotálamo-hipófise-adrenal (HPA) de
seus filhos foi evidenciada, com níveis de
cortisol aumentados em bebês, crianças e
adolescentes (Brennan et al., 2008; Kaplan
et al., 2008). Em geral, os sintomas da DPP
ficam evidentes algumas semanas após o
parto (Robertson et al., 2004). Entretanto,
uma detecção antecipada dos seus efeitos sobre o bebê permitiria implantar-se
cuidados preventivos para limitar sua severidade. Uma reatividade psicológica e
adrenal aumentada ao estresse psicossocial durante a gestação foi associada a um
risco maior de DPP (Nierop et al., 2006),
sugerindo que efeitos da DPP sobre a
criança podem antecipar seu diagnóstico.
O presente estudo teve por objetivo investigar se os efeitos da DPP sobre a função
adrenal da criança podem ser detectados
no recém-nascido. Também foi avaliada a
relação entre a interação mãe/bebê e os
níveis de cortisol. Hipotetizamos que: 1)
recém-nascidos cujas mães desenvolverão
DPP apresentam concentrações de cortisol salivar mais altas do que aqueles cujas
mães não apresentarão DPP, 2) filhos de
mães com DPP apresentam aos 4 meses
de idade concentrações basais de cortisol
mais altas do que filhos de mães sem DPP,
3) filhos de mães deprimidas apresentam
aos 4 meses reação endócrina ao estresse
mais acentuada do que filhos de mulheres
sem DPP, e 4) há correlação negativa entre
concentrações de cortisol dos recém-nascidos e intensidade da interação positiva
mãe/bebê. Metodologia: A amostra continha 74 mães e filhos, participantes de um
estudo longitudinal sobre DPP. O cortisol
dos bebês foi mensurado em amostras de
saliva coletadas dois dias após o nascimento (alta) e 4 meses depois do parto, antes
e depois de um exame clínico. As mães foram classificadas quanto à DPP três meses
após o parto, através da escala de depressão pós natal de Edimburgo (EPDS) (Cox
et al., 1987), validada no Brasil (Santos et
al, 1999). Foram consideradas deprimidas
mães que receberam escores superiores
a 11. Interação mãe/bebê: Foram analisados os 3 primeiros minutos da filmagem do primeiro encontro da mãe com o
bebê. Baseado na escala de Biringen, et al.
(2000), foi criada uma escala de 4 pontos
(0 ausência e 3 máximo) para seis categorias de comportamento materno (vivacidade, falar espontâneo com o bebê e sobre
o bebê, sorrir, tocar o bebê e olhar para o
bebê) e quatro do bebê (vivacidade, exci23
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
tação, olhar e ser acalmado pelo contato
com a mãe). Dados dos recém-nascidos
foram obtidos dos prontuários. Análise estatística: Utilizamos testes t e chi quadrado entre os grupos com e sem DPP para
identificar possíveis variáveis de confusão.
Depois, foi formulado e ajustado um modelo linear misto (LMM), descrevendo a
concentração do cortisol dos bebês como
função da condição da mãe (DPP) e do
tempo (Demidenko, 2004). Foram então
testados efeitos possíveis de variáveis do
recém-nascido e dos escores de relação
mãe/bebê sobre cada medida de cortisol.
O nível de significância adotado foi < 0,05.
Resultados: Foram consideradas deprimidas 16 mulheres (23,8%). Não houve diferenças da interação avaliada para mães e
bebês entre grupos, nem para nenhuma
variável de confusão. O LMM mostrou efeito do tempo no cortisol (F2/71 = 25.52, p <
0.0001). Nos dois grupos, a concentração
de cortisol era maior na alta que na linha de
base aos 4 meses e aumentou após o exame clínico. Não houve efeito da DPP nem
da interação DPP e tempo sobre os níveis
de cortisol. Verificou-se, contudo, um coeficiente de variação (CV) maior na resposta
endócrina de filhos de mães deprimidas
em resposta ao estressor (CV = 124.54) do
que no outro grupo (CV = 75.47). O modelo
mostrou interação no tempo entre escore
de interesse materno e DPP apenas entre
filhos de mães deprimidas (F1/51 = 4.18, p =
0.046). Especialmente, foi evidenciada correlação negativa entre escore do interesse
materno e variação do cortisol do bebê
após o evento estressor apenas no grupo
com DPP (Pearson r = -0.904, p = 0.005).
Com o modelo, foi possível controlar as
concentrações de cortisol pelo interesse
materno, que então se mostraram maiores em filhos de mães deprimidas na alta
24
(19.9 ± 3.3 nmol/L vs 9.3 ± 1.8 nmol/L), aos
4 meses antes (8.2 ± 2.3 nmol/L vs 2.7 ±
0.5 nmol/L) e depois do evento estressor
(11.1 ± 2.3 nmol/L vs 4.0 ± 0.6 nmol/L).
Discussão: O nível de cortisol dos bebês
aos 4 meses é semelhante entre os grupos,
contradizendo alguns resultados (Brennan
et al., 2008) mas consistente com Azar et
al. (2007). Diferentemente de Azar, não
foram encontradas diferenças na variação
do cortisol frente ao estresse, entretanto,
observou-se maior variação interindividual
no grupo filhos de deprimidas, sugerindo
reação mais heterogênea ao estresse. A
análise mostrou uma explicação possível,
evidenciando correlação entre maior resposta endócrina ao estresse e menores escores de interesse materno apenas no grupo com DPP. A análise inferencial mostrou
também diferença entre os grupos nas
concentrações basais de cortisol. Os níveis
de cortisol estimados depois do controle
para efeito do interesse materno sugerem
que a qualidade da interação materna depois do parto pode tamponar o efeito da
depressão no eixo HPA dos bebês, mesmo
apenas 2 dias após o nascimento, quando
a DPP ainda não é detectável. Efeitos similares foram reportados (Gunnar, 1998;
Kaplan et al., 2008). Nossos resultados sugerem que intervenções visando melhorar
a qualidade dos cuidados maternos, sugeridas em estudos prévios (Gunnar & Donzella, 2002; Wachs et al., 2009) podem ser
implantadas desde os primeiros momentos de vida do bebê.
Palavras-chave: Depressão pós-parto; cortisol;
interação mãe-bebê.
Contato: Departamento de Psicologia
Experimental, Instituto de Psicologia,
Universidade de São Paulo, São Paulo
[email protected]
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
LT01-937 - RELAÇÃO ENTRE
DEPRESSÃO PÓS-PARTO MATERNA E
DESENVOLVIMENTO DA COOPERAÇÃO
EM CRIANÇAS
Laura Cristina Stobäus - IP/USP
[email protected], Capes
Maria Lucia Seidl de Moura - UERJ
[email protected]
Vera Silvia Raad Bussab - IP/USP
[email protected]
Financiamento: Capes, CNPq, FAPERJ e FAPESP
Estudos em diferentes ambientes socioculturais têm mostrado uma incidência de
depressão pós-parto (DPP) em 10 a 20%
das mulheres. Dentre as decorrências relevantes do quadro, tem havido um interesse especial nos potenciais comprometimentos da interação mãe–bebê (Field,
2010), no desenvolvimento cognitivo e
emocional da criança (Murray e Cooper,
1997) que repercute, entre outras dimensões, no desenvolvimento do comportamento cooperativo da criança. Este trabalho é parte do Projeto longitudinal “Depressão Pós-Parto como um fator de risco
para o desenvolvimento do bebê: estudo
interdisciplinar dos fatores envolvidos na
gênese do quadro e em suas consequências” (temático Fapesp nº 06/59192). Díades mãe-bebê, usuárias do sistema público de saúde, têm sido acompanhadas desde a gestação até o terceiro ano da criança, de modo a investigar fatores ligados à
DPP e seus possíveis efeitos no desenvolvimento infantil. A ontogênese da cooperação envolve uma representação interna
das próprias intenções e objetivos, base
para a inferência de que o outro também
possui desejos e intenções semelhantes,
isto é uma “Teoria da Mente” (Tomasello,
2009). Com um ano, a criança consegue
distinguir e preferir um agente cooperativo a um não cooperativo (Hamlim, Wynn,
Bloom, 2007), o que é, em si mesmo, indicativo da importância deste desenvolvimento precoce. A cooperação entre pares
parece emergir ao final do segundo ano,
através de jogos imitativos. No terceiro
ano as crianças se tornam mais compreensivas quanto às ações e desejos dos
outros, podendo entender quando estes
não foram alcançados (Brownell, Ramani, Zerwas, 2006), condição básica para a
potencial oferta de ajuda. As descobertas
que as crianças fazem a respeito das emoções e de estados mentais dos outros são
centrais para o desenvolvimento de suas
relações sociais e vão se aprimorando
através da experiência comunicativa nas
relações familiares (Dunn e Brophy, 2005).
Em pesquisas anteriores do presente projeto, microanálises mostraram diferenças nesta experiência comunicativa: por
exemplo, arranjos interacionais mãe-bebê
(4 meses) apresentaram-se menos estruturados na presença de DPP (De Felipe,
2009), bem como nos padrões gerais destas crianças que com 1 ano brincaram menos e ficaram mais ansiosas em situações
de separar-se da mãe (Vicente, 2009). O
desenvolvimento da capacidade de “teoria da mente” na criança está diretamente
relacionado a aspectos essenciais desta
experiência interacional, como o da atenção compartilhada e da linguagem. Ambas
passam por etapas de aquisição e aprimoramento (Baron-Cohen e Swettenham,
1997; Carpenter, Nagel e Tomasello, 1998)
e propiciam à criança compartilhamento
e troca de experiências com as pessoas
significativas da sua convivência, em especial a mãe (Peterson, 2000). Dentre as
inúmeras influências maternas, ligadas
ao desenvolvimento do apego e da regu25
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
lação emocional, pode-se destacar a que
se inicia no “mamanhês”: as referências
maternas ao classificar objetos presentes
no foco de atenção da criança favorecem
a aquisição da linguagem e o entendimento social (Ensor e Hughes, 2008). Evidentemente, importa o contexto significativo
da composição familiar: embora a mãe
em geral ocupe posição central, também
podem estar presentes outros adultos e
outras crianças (Dunn e Brophy, 2005). O
objetivo do presente estudo foi avaliar,
através de tarefas de cooperação infantil,
se a DPP afeta o desenvolvimento do comportamento de cooperação de crianças,
uma vez que esta condição pode afetar
as experiências interacionais e afetivas
da díade. MÉTODO. Participantes: Foram
estudadas 50 crianças de três anos (16
meninos, 36 meninas), distribuídas igualmente quanto a indicadores de depressão
pós-parto de suas mães (DPP) aos 4 meses
pós parto (Escala de Depressão Pós-Parto
de Edimburgo). Procedimento: Foi filmado o desempenho da criança em tarefas
de cooperação: 1) ajudar a mãe, pessoa
familiar, a guardar brinquedos, depois de
uma sessão de brincadeira e 2) ajudar experimentador, desconhecido, a pegar objeto que ele deixa cair ao solo (adaptadas
de Warneken et col. 2007). Resultados:
Foram encontradas diferenças significativas (qui-quadrado) na ajuda ao experimentador na situação geral, agrupando
ausência de ajuda no conjunto com a não
ajuda na tarefa específica: crianças do grupo DPP, cooperaram menos que as demais
(x²=6,52,p=0,02; 72%x36%). Embora não
tenha havido diferença significativa entre
os sexos nesta categoria, meninas tenderam a cooperar mais (x²=4,17, p=0,67; 56%
x 26%). Na categoria específica de ajuda
ao experimentador, meninas cooperaram
26
significativamente mais do que os meninos (x²=6,04, p=0,02, 71% x 30%). Não
houve diferença na ajuda à mãe: a grande
maioria das crianças ajudou, independentemente da DPP (80% das com DPP e 88%
sem DPP), e do sexo (83% dos meninos e
86% das meninas). Discussão: Concluímos
que a DPP materna influenciou algumas
das respostas cooperativas das crianças,
especificamente quanto à pessoa desconhecida. Evidentemente, a mãe, além de
conhecida, ocupa lugar central na constelação afetiva da criança e isto deve ser
levado em conta na discussão. Ainda assim a familiaridade parece relevante neste
contraste de efeitos da DPP: a menor colaboração com a pessoa estranha pode representar dificuldade de estabelecimento
inicial de relações no caso das crianças de
mães com DPP. Também merece destaque
a interação com o sexo da criança: como
as meninas apresentaram mais propensão à ajuda do desconhecido do que os
meninos, precisa-se avaliar, cercando-se
de novos dados, se os meninos são mais
afetados neste aspecto pela DPP materna.
Os resultados são compatíveis com a suposição de que a condição de DPP afeta
de modo complexo os processos subjacentes à interação social com pessoas não
conhecidas e com a mãe. Conjugados com
resultados anteriores que mostravam alterações interacionais das díades com DPP
(em DeFelipe, 2009 e Vicente, 2009, acima
apresentados), compõem um quadro de
efeitos destas peculiaridades das experiências comunicativas no desenvolvimento
subsequente. Não indicam um prejuízo
generalizado na capacidade de assumir a
perspectiva mental do outro, uma vez que
a ajuda à mãe se processa da mesma maneira nos dois grupos. Mas mostram uma
resistência à ajuda ao desconhecido, na
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
condição DPP, especialmente no caso dos
meninos. De um modo geral, a constatação deste tipo de efeito da DPP no desenvolvimento da criança contribui para uma
compreensão mais ampla do processo.
Além disso, a constatação destes efeitos
ligados à inserção social da criança confere importância adicional à prevenção e à
intervenção.
Palavras-chave: depressão pós-parto,
cooperação infantil, interação mãe-bebê.
Contato: Laura Cristina Stobäus
e-mail: [email protected]
LT01-957 - CORRELAÇÃO ENTRE
SINTOMAS DEPRESSIVOS MATERNOS
E PROBLEMAS DE COMPORTAMENTOS
EM CRIANÇAS COM DESENVOLVIMENTO
TÍPICO
Ana Ribeiro Santana - UFRB/CCS
[email protected]
Gustavo Marcelino Siquara - UFRB/CCS
[email protected]
Thiago da Silva Gusmão Cardoso - UFRB/CCS
[email protected]
Mariângela Santos de Jesus - UFRB/CCS
[email protected]
Patrícia Martins de Freitas - UFRB/CCS
[email protected]
Financiamento: FAPESB e CNPq
A família é uma instituição primária, na
qual, o indivíduo tem contato com as primeiras interações sociais. Esse sistema
pode ser compreendido como grupo de
pessoas que interagem a partir de vínculos afetivos, consanguíneos, políticos
e que estabelecem uma rede infinita de
comunicação e de mútua influência. A família consolida-se como um importante
nicho para o desenvolvimento global do
indivíduo, devido às influências que pode
exercer em seu comportamento. Os pais
são considerados como a fonte primária
que o ser humano possui de contato com
o mundo, e desempenham um papel importante no comportamento e desenvolvimento da criança e adolescente, como
mediadores entre eles e a sociedade. Diversos estudos ressaltam que a convivência das crianças com mães que apresentam transtornos psiquiátricos, incluindo a
depressão, configura-se como um fator de
risco para o desenvolvimento dos filhos.
Nesse sentido, este estudo busca correlacionar sintomas depressivos de mães com
problemas de comportamentos internalizantes e externalizantes de seus filhos. Os
participantes do estudo foram 21 sujeitos,
sendo 42% do sexo feminino e 58% do
sexo masculino, com idade média de 8,90
anos (dp=0,91) entre 7 e 11 anos, que frequentam uma escola pública da cidade de
Santo Antônio de Jesus-BA. Os instrumentos utilizados foram a Escala de Depressão
Beck e a Lista de Verificação Comportamental (Child Behavior Checklist – CBCL),
versão para pais. O Inventário de Depressão de Beck (IDB) é um instrumento de autorrelato constituído por 21 grupos de afirmações de múltipla escolha em que a pessoa deve responder qual a opção que esta
de acordo com o seu estado na naquela
determinada situação. Os itens estão relacionados aos sintomas depressivos como
desesperança, irritabilidade, culpa além
de sintomas físicos como fadiga, perda de
peso e diminuição da libido. Já o CBCL é
um questionário que avalia a competência
social e problemas de comportamento em
crianças e adolescentes em duas versões
uma de 1 ano e 6 meses até 5 anos e outra de 6 a 18 anos, a partir de informações
fornecidas pelos pais. As escalas do CBCL
27
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
identificam problemas de comportamento
frequentemente encontrados na infância
e na adolescência. As subescalas são classificadas como: Ansiedade/Depressão, Retraimento, Queixas Somáticas, Problemas
socialização, Problemas Pensamento, Problemas Atenção, Comportamento Quebra-Regra, Comportamento Agressivo. Os
pais foram convidados para uma reunião
na qual foi apresentado o projeto. Após
esclarecimentos os pais assinavam o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
(TCLE) e responderam o CBCL e o BDI. Para
análise de dados foi utilizado o programa
estatístico SPSS 18.0. Os dados foram analisados através da correlação de Pearson.
As correlações foram às seguintes entre o:
BDI e Problemas de socialização (r= 0,507
e p=0,04*); Problemas de Pensamento (r=
0,509 e p=0,04*); comportamento de quebra de regra ( r=0,483 e p=0,03*); comportamento agressivo ( r=0,50 e p> 0,05); ansiedade e depressão ( r=0,477 e p=0,053);
retraimento (r=0,343 e p=0,177); queixa
somática (r=0,232 e p=0,370); problemas
de atenção (r=0,370 e p=0,144). Pode-se
verificar nos resultados que houve uma
correlação moderada positiva entre o BDI,
respondido pela mãe e as subescalas sobre os problemas de comportamentos do
filho indicado pelo CBCL nos seguintes critérios: Problemas de socialização (r= 0,507
e p=0,04*); Problemas de Pensamento
(r= 0,509 e p=0,04*); comportamento
de quebra de regra (r=0,483 e p=0,03*);
e comportamento agressivo ( r=0,50 e
p> 0,05). A proporção de significância foi
igual tanto para comportamentos internalizantes e externalizantes. Os resultados
nos permitem confirmar a pressuposição
de que há correlação entre sinais de depressão materna e problemas de comportamento, tanto para o perfil internalizante
28
quanto externalizante. Diante desse resultado, juntamente com a literatura atual,
podemos concluir que os problemas de
comportamentos representam déficits ou
excedentes comportamentais que prejudicam o desenvolvimento cognitivo, físico e
psicossocial. Esses comportamentos atribui nas crianças um sentimento de empobrecimento na capacidade pessoal, e incute o sentimento de incompetência pessoal, que podem se apresentar na forma de
sentimentos de vergonha, dúvidas sobre
si mesmas, baixa estima e distanciamento
das demandas da aprendizagem. Assim,
faz-se necessário que o processo desenvolvimental seja bem sucedido para que
as crianças tornem-se adultos saudáveis
e competentes para responder de modo
satisfatório às demandas de seu ambiente
emocional, social, familiar e profissional.
Palavras-chave: depressão; comportamento;
desenvolvimento.
Contato: Ana Ribeiro Santana, Graduanda em
Psicologia - [email protected].
LT01-965 - O SUPORTE SOCIAL COMO
FATOR DE PREVENÇÃO DA DEPRESSÃO
EM MÃES DE BEBÊS INTERNADOS EM
UMA UTIN
Claudia Moura de Sant'Anna C. Oliveira - UVV
[email protected]
Izabel Lima de Vasconcellos - UVV
[email protected]
Luciana Bicalho Reis - UVV
[email protected]
Marlucia de Souza Thompson - UVV
[email protected]
A internação de um filho, em geral, constitui-se numa situação geradora de estresse, acompanhada de alterações emocio-
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
nais e psicológicas para as mães, sendo
que nem sempre esses sujeitos recebem
o apoio social adequado para lidar com tamanha adversidade. A presença de mães
que se encontram em um quadro depressivo se revela comum em Unidades de
Tratamento Intensivo Neonatais (UTIN),
principalmente aquelas que não recebem suporte social adequado (Baptista,
Batista & Torres, 2006). Mães com bebês
internados em UTIN podem apresentar
quadros de depressão e outros transtornos, sendo a internação, possivelmente,
um dos fatores que contribuem para tal
episódio. Como nos mostram Linhares et
al (2006), a prematuridade e a hospitalização do bebê podem ocasionar às mães
sentimentos conflitantes em relação ao
bebê real e o imaginado, além de culpa,
ansiedade, instabilidade emocional, baixo
senso de competência e dificuldade de
contato físico com o bebê, angústia ao ir
à UTIN, medo de apegar-se ao bebê tendo que encarar a perda devido ao possível óbito, luto antecipatório entre outros.
Ainda segundo as mesmas autoras, todos
esses sentimentos podem ser indicativos
de estado de depressão. Sarason, Levine,
Bashan e Sarason (1983, citados por Ribeiro, 1999) definem Suporte Social como
apoio ou auxílio que uma pessoa recebe
de outra em quem possa confiar, que a
valorize e que demonstre que gosta dela.
No entanto, é necessário que o sujeito favorecido esteja disposto a ser ajudado e
que perceba o suporte como disponível.
Existem diversos tipos de suporte social,
dentre eles, o familiar, grupo de amigos,
o psicológico e o institucional. Coutinho et
al. (2000, citado por Baptista et al., 2006)
apontam que um apropriado suporte social propicia ajuda em diversas ocasiões,
maior domínio do ambiente e autonomia
no transcorrer da vida do indivíduo. Neste
sentido, Kessler, Price e Wortman (1985,
citados por Ribeiro, 1999), afirmam que
o suporte social pode resguardar os indivíduos em risco de possíveis inquietações
mentais. Segundo Dessen & Braz, (2000,
citado por Baptista et al., 2006) o amparo
familiar é o mais importante tipo de suporte social para a manutenção da saúde
mental e o enfrentamento de situações
estressantes, além de favorecer a adequação de comportamentos maternos em
relação aos filhos. Neste sentido, na situação de internação de um filho, o suporte
social pode mostrar-se como fator de prevenção e proteção da depressão materna.
Assim, a presente pesquisa propôs verificar a relação entre depressão e ausência de suporte social em mães de bebês
internados em uma UTIN de um hospital
infantil na região de Vila Velha-ES. OBJETIVOS: Delinear o perfil socioeconômico e
familiar de mães que participam do Grupo
Psicoterapêutico de mães da UTIN; Analisar a percepção que os sujeitos têm acerca do suporte social que recebem (tanto
informal quanto formal) durante o período de internação dos seus filhos; Verificar
se a participação das mães no Grupo Psicoterapêutico constitui-se para os sujeitos
uma fonte de suporte social; Verificar qual
tipo de suporte social é o considerado
mais importante para as mães no momento da hospitalização de seu filho e correlacionar se os sujeitos que têm melhor percepção do suporte social recebido são os
que apresentam menos sentimentos negativos indicativos de depressão durante o
período de internação do bebê. MÉTODO.
Trata-se de uma pesquisa de caráter qualitativo e descritivo, realizada em uma UTIN
de um Hospital Infantil no município de
Vila Velha-ES. Integram a pesquisa mães
29
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
de bebês internados há pelo menos 15
dias e que participam do Grupo Psicoterapêutico de mães da UTIN. Na ocasião de
ingresso na pesquisa, as mães assinarão o
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e responderão a uma Entrevista Individual Semiestruturada, gravada em áudio
e posteriormente transcrita para análise.
Os relatos obtidos no grupo também integrarão os dados. Será utilizada ainda a
Escala de Edimburgo – EPDS que é utilizada para identificar sintomas de depressão
que se manifestam após o parto (Santos,
1995, citado por Ruschi et al 2007). Outro
instrumento a ser utilizado será a Escala
de Satisfação com o Suporte Social – ESSS
(Ribeiro, 1999), que será adaptada ao contexto hospitalar. Esta Escala é constituída
por 15 itens que se distribuem por quatro
dimensões, satisfação com amigos (SA),
intimidade (IN), satisfação com a família
(SF) e atividades sociais (AS). Os sujeitos
terão assegurados sua identidade e sigilo das informações fornecidas, que serão
utilizadas somente para fins de produção
científica e receberão apoio psicológico da
equipe de pesquisadores. RESULTADOS
PARCIAIS. A coleta de dados foi iniciada
como projeto piloto e espera-se verificar
o quanto o suporte social contribui para
a prevenção da depressão. Nos dados
coletados de forma preliminar, já se percebe que as mães entrevistadas relatam
receber pouco suporte social (da família
e grupos sociais aos quais pertencem), e
apresentam sinais indicativos de depressão. Espera-se como benefício da pesquisa uma melhor compreensão das relações
entre a vivência da maternidade na UTIN,
a prevalência de sintomas depressivos
nestes sujeitos e a relação disso com uma
melhor ou pior rede de apoio social. Para
os sujeitos, espera-se que a participação
30
nos Grupo Psicoterapêutico de mães da
UTIN permita a construção de estratégias
de enfrentamento da situação de adoecimento e internação do filho.
Palavras-chave: maternidade, depressão,
suporte social.
LT01-974 - TECENDO FIOS: A VIVÊNCIA
MATERNA E O VÍNCULO ENTRE MÃE E
BÊBE INTERNADO EM UMA UNIDADE DE
TRATAMENTO INTENSIVO
Claudia Moura de Sant'Anna C. Oliveira - UVV
[email protected]
Izabel Lima de Vasconcellos - UVV [email protected]
Luciana Bicalho Reis - UVV [email protected]
Marlucia de Souza Thompson - UVV
[email protected]
Paula Maria Tonon - UVV
[email protected]
A maternidade é um acontecimento de
muita importância para a mulher. Desde
cedo, ainda menina, nas brincadeiras e na
relação com as mães, a maioria delas começa a “brincar” de ser mãe. Ninam suas
bonecas, cuidam de sua alimentação, trocam sua fralda, a fim de se preparar para
ter o próprio filho. Durante a vivência da
maternidade a mulher começa a idealizar
um filho conforme a sua própria imagem
e semelhança, esperando o momento de
apresentá-lo à sociedade. Desta forma,
a emergência do parto prematuro não
está relacionada somente a antecipação
do nascimento do bebê, mas também de
sua mãe, que despreparada para esse momento, torna-se “prematuramente mãe”,
necessitando reajustar-se a essa dura realidade. Aquilo que muitas vezes foi temido
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
durante a gravidez torna-se real e ambos
estão agora vulneráveis, inseridos em um
ambiente desconhecido que irá separá-los ainda muito cedo. O recém-nascido de
risco, também chamado de prematuro ou
bebê pré termo, é aquele que nasce com
uma idade gestacional menor que 37 semanas e em casos extremos os que nascem com menos de 28 semanas de gestação. Alguns bebês prematuros podem
nascer com complicações ou alterações
orgânicas, além do baixo peso e respiração
deficitária, necessitando assim de aparelhos especializados para a sobrevivência.
Pesquisas revelam que atualmente no
mundo 20 milhões de bebês nascem prematuramente, sendo que desses, um terço morre antes de completar um ano de
idade (Romanoli & Moreira, 2008). A prematuridade traz em seu bojo significativas
consequências emocionais que são marcadas pela perda desse bebê imaginado durante a gestação. A perda do bebê idealizado, o berço que estará vazio, as roupas que
a princípio não serão usadas, a cobrança
da família e do meio social, podem colocar
em risco uma relação (mãe-bebê) que ainda se constrói. A internação de um bebê
em uma Unidade de Tratamento Intensivo
Neonatal (UTIN) contribui para o afastamento entre a mãe e o bebê, interferindo
significativamente na relação de vínculo e
apego. A separação, que não poderia ser
de outra forma, traz consigo sentimentos
de culpa, incompetência e luto pelo bebê
idealizado, o que dificulta ainda mais o
estreitamento dos laços parentais (Raad,
Cruz & Nascimento, 2006). Assim, pode
ocorrer uma ruptura no processo de vinculação já que muitas mães sentem-se receosas de tocar ou conversar com seu filho,
o que pode gerar stress psicológico para
ambos (Schumacher, 2002). A UTIN será
por um bom tempo o lugar onde mãe e filho irão conviver no limiar entre a vida e a
morte. A partir de agora, terão que “tecer
fios”, criar laços, construir vínculos que poderão estar fortemente abalados a partir
daquele momento. Neste sentido, a presente pesquisa tem por objetivo analisar
como se dá a qualidade da relação e vínculo entre mães e seus bebês pré-termos
que estão internados em uma Unidade de
Terapia Intensiva Neonatal (UTIN), ou seja,
conhecer e analisar como a prematuridade
e o ambiente artificial de cuidados iniciais
ao recém-nascido podem trazer dificuldades ao estabelecimento deste vínculo inicial da mãe com o bebê e que recursos e
estratégias são criados por estas mulheres
para enfrentar tais adversidades. OBJETIVOS: (1) Identificar e analisar os sentimentos vivenciados pelas mães em relação
ao nascimento prematuro e à internação
de seus bebês na UTI neonatal; (2) Identificar as estratégias de enfrentamento adotadas pelas mães em relação à situação de
hospitalização do bebê e na busca de criação de vinculo afetivo com o filho; (3) Verificar que tipo de conhecimentos as mães
têm em relação à importância de se manter um vínculo afetivo com o bebê, mesmo
que internado na UTI neonatal. MÉTODO:
Trata-se de uma pesquisa qualitativa e
descritiva, realizada através de entrevistas
individuais, com roteiro semiestruturado
em uma Unidade de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN) do Hospital Dr. Alzir Bernadino Alves (HIMABA) no município Vila Velha-ES. Fazem parte da pesquisa 10 mães
de bebês prematuros e de baixo peso internados na UTIN desde o nascimento e
que participam do Grupo Psicoterapêutico
de mães da UTIN. Após aceite do convite,
as mães serão esclarecidas quanto à sua
participação na pesquisa e assinarão o Ter31
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
mo de Consentimento Livre e Esclarecido
atendendo-se às exigências do Conselho
Nacional de Saúde. Em seguida, será realizada a Entrevista Individual, seguindo-se ao roteiro pré-estabelecido. Também
serão colhidas as informações oriundas
dos atendimentos psicológicos individuais, bem como dos encontros do Grupo
Psicoterapêutico das mães da UTIN. Tanto
as entrevistas individuais, quanto reuniões
em grupo serão gravadas em áudio e seu
registro transcrito para posterior análise. Os prontuários dos bebês cujas mães
integram a pesquisa servirão para complementar as informações fornecidas pelas mães relativas aos dados de saúde do
bebê, tais como idade gestacional e peso
ao nascimento, complicações/alterações
presentes na ocasião do nascimento. RESULTADOS PARCIAIS. A coleta de dados já
foi iniciada por meio de estudo piloto que
pretende verificar a adequação do roteiro
de entrevista. Pelas entrevistas realizadas
até o momento, observou-se que as mães
passaram o período da gravidez idealizando um bebê perfeito, sem problemas ou
qualquer alteração de saúde. Porém, o
nascimento prematuro e a internação na
UTIN, constituem-se experiências emocionalmente difíceis. Quanto ao vínculo mãe-bebê, observa-se que não houve entre
as mães já entrevistadas dificuldades em
constituí-lo e mantê-lo, porém o ambiente
hospitalar e as práticas de assistência ao
recém-nascido foram citados pelas mães
como um dos principais fatores dificultadores na interação com seus bebês.
Palavras-chave: Maternidade-prematuridadeUnidade de Terapia Intensiva Neonatal
Contato: Claudia Moura de Sant’Anna Carvalho
de Oliveira - Centro Universitário Vila Velha [email protected]
32
LT01-1336 - ANÁLISE DE INDÍCIOS DE
DEPRESSÃO PÓS-PARTO NAS MÃES
QUE FREQUENTAM UM CENTRO DE
EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA PARA
ATENDIMENTO PUERPERAL EM
ENFERMAGEM
Vanessa Cavalcanti de Torres - AEB
[email protected].
Aliny Valéria Bezerra Cavalcante - FAEB
[email protected]
Grasiela Nascimento da Conceição - FAEB
[email protected]
A depressão pós-parto (DPP) constitui fator agravante para dificuldade no período
pós-parto, tendo sinais característicos tais
como: humor deprimido, falta de interesse pelas atividades diárias, desinteresse
pelos cuidados maternos para com seu filho, medo de não ser uma boa mãe, choro
fácil, entre outros, que podem ser identificados para possível diagnóstico, através de uma consulta de qualidade onde
o profissional deve estar atento a esses
sinais para que seja realizado tratamento adequado, ou até mesmo a prevenção
da instalação desta patologia. Durante o
puerpério várias alterações ocorrem tanto
na mulher como no recém-nascido, pois
é um período que permite a troca de carinho, de segurança para o bebê durante
os cuidados prestados pela mãe (Guedes-Silva et. al., 2003). O puerpério deve ser
assim, um período prazeroso para a mulher, pois só dessa maneira ela conseguirá
transmitir afeto para o seu filho, contribuindo para desenvolvimento saudável
do seu bebê (Mattar et. al., 2007). Se a
mesma não apresenta condições emocionais para cuidar da criança, isto o afetará
diretamente, facilitando o desenvolvimento de patologias (Schwengber & Piccinini, 2003). Sendo assim, este estudo teve
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
como objetivo, identificar possíveis indícios de depressão pós-parto nas mães que
freqüentam o CEPAC (Centro de Pesquisa
e Atenção à Criança), no laboratório da
FAEB (Faculdade de Enfermagem do Belo
Jardim) em Belo Jardim-PE. A atenção à
mulher no puerpério fica facilitada durante a consulta quando do encaminhamento de seus filhos para o CEPAC que é um
Centro de Pesquisa e Atenção à Criança,
pois no período em que essas mães levam
seus filhos é o de maior incidência da DPP,
facilitando assim, o diagnóstico inicial dessa doença. Portanto, mostra-se a importância da atenção não só à criança, mas,
também à mãe que, muitas vezes, deixam
de atentar para a sua saúde, porém seu
estado físico e mental influenciará na saúde e bem estar de seu filho. Entendemos
que o estado emocional da mãe alterado,
incidirá sobre a qualidade de vida de seu
filho e como conseqüência, uma dificuldade em estabelecer laços afetivos ao longo
da vida entre ambos. Nesse estudo foram
utilizados um questionário para os dados
pessoais e a Escala de depressão pós-parto de (EPDS). A EPDS é composta por 10
itens e tem sido amplamente utilizado em
todo o mundo, demonstrando ser um instrumento útil para detectar mulheres sob
risco de apresentar depressão pós-parto.
Idealizada por Cox Holder et al. em 1987,
essa escala é de fácil aplicação e pode ser
utilizada por profissionais de saúde de
diversas áreas. Quanto à população desse estudo foi composta por 38 puérperas
quando as mesmas levaram seus filhos
para consulta de puericultura no CEPAC.
A análise utilizou um método estatístico
para o tratamento dos dados, de acordo
com os critérios definidos pelo próprio instrumento empregado para avaliação das
participantes, tendo como base o teste de
t de student que apontou um intervalo de
95% de confiança a média da amostra é
de 0,8; erro padrão de 0,07; mediana igual
a 1; desvio padrão igual a 0,4 e variância
igual a 0,2. Os resultados apontaram que
(a) 32% da amostra apresentou indícios de
depressão pós-parto suficientes para que
fosse classificada no grupo de risco, (b) o
número de mulheres que apresentou resultado indicativo foi maior nas de dezenove anos, tendo estas como estado civil
respectivamente união estável que representou 32% da amostra, (c) quanto ao grau
de escolaridade 18% tinha apenas ensino
fundamental incompleto, observando-se
desta forma que o número de mulheres
que possuem pouca escolaridade é significativo, estando inclusas neste percentual a maioria das mulheres com indícios
de DPP. Diante desses dados, percebe-se
que o profissional de saúde deve estar
habilitado para detectar precocemente
os indícios de depressão pós-parto, tendo
sensibilidade para entender as mulheres
que apresentem os sinais preditivos nesta fase, podendo intervir no tratamento
e encaminhamento para atendimento especializado. As consequencias da DPP não
são apenas para a mulher, mais também
para a criança, podendo afetar, inclusive, a
relação conjugal, pois o comprometimento do binômio mãe-filho, pode ser ocasionado por mães menos afetuosas e mais
ausentes nas respostas às necessidades
de seus filhos, prejudicando, dessa forma,
o cuidado com o mesmo.
Palavras-chave: Depressão pós-parto; mãefilho; Puerpério.
33
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
LT05-801 - RELACIONAMENTO
CONJUGAL, CLIMA AFETIVO DA FAMÍLIA
E DEPRESSÃO PÓS PARTO
Júlia Scarano de Mendonça - IPUSP
[email protected]
Vera Sílvia Raad Bussab - IPUSP
[email protected]
José de Oliveira Siqueira - IPUSP
[email protected]
Financiamento: FAPESP
Essa pesquisa está inserida no Projeto Temático FAPESP Depressão pós-parto (DPP)
como um fator de risco para o desenvolvimento do bebê: estudo interdisciplinar
dos fatores envolvidos na gênese do quadro e em suas conseqüências (Processo
06/59192-2). A DPP tem sido apontada
como um distúrbio emocional com potenciais implicações para a mãe e o bebê.
Chama a atenção a predominância dos
estudos com foco exclusivo na mãe e na
criança, sendo o pai e outros membros da
família menos estudados. Recentemente,
estudos têm mostrado associações entre
DPP e inadequações no funcionamento
familiar (Burke, 2003; Johnson & Jacob,
1997). Cummings e Davies (1994) sugerem
que além da DPP, o “distúrbio psicossocial
na família” associado à depressão deva
ser considerado como fator de risco para
o desenvolvimento da criança. A associação entre DPP e problemas na relação
conjugal também tem sido apontada na
literatura da área (Burke, 2003; Cummings & Davies, 1994; Silva & Piccinini, 2009)
bem como em análises prévias feitas no
presente projeto temático (Silva, 2008).
O conflito conjugal tem sido identificado
como relevante para a qualidade da vida
familiar, para a compreensão das origens
da DPP e para prognósticos mais precisos
sobre a influência do contexto familiar
34
no desenvolvimento da criança. O objetivo da presente pesquisa foi aprofundar
o entendimento das relações entre DPP,
avaliada aos 4 e 8 meses da criança, e conflito conjugal e familiar. Como associações
significativas entre a ocorrência de DPP e
a de Depressão Anterior independente da
gestação (DA) foram constatadas previamente (Silva, 2008), as relações entre DPP
e conflito serão também analisadas à luz
da presença ou não de DA. Método. Cento e treze famílias da classe média baixa,
atendidas pelo Hospital Universitário da
USP e pelo SUS. Três entrevistas: na gestação, aos 4 e aos 8 meses da criança foram
realizadas para coletar informações sobre
a família e a criança. Foram analisadas
questões sobre a relação conjugal, o clima
familiar, a ocorrência de DA e a de DPP (Escala de Depressão Pós-natal de Edinburgh
- EDPE), de Cox, Holden e Sagovsky (1987),
aplicada aos 4 meses da criança. O teste
exato qui-quadrado de Pearson mostrou
associações significativas entre conflito
conjugal e DPP aos 4 (X²=23.108; p=0,000)
e aos 8 meses (X²=16.848; p=0,000), com
percepção materna de baixo nível de conflito associada à ausência de DPP, e de
alto nível de conflito associada à DPP. O
tamanho estimado do efeito obtido por
meio do V de Cramer foi de .474 e .413,
respectivamente. Resultados análogos
foram obtidos para o conflito familiar, indicando a percepção de baixo conflito na
ausência de DPP e o aumento da percepção do conflito na presença de DPP, aos 4
(X²= 10.389; p=0,006 e V de Cramer=.303)
e aos 8 meses ( X²=20.008; p=0,000 e V de
Cramer =.423). Verificou-se associação significativa entre conflito conjugal e familiar,
independentemente da DPP, aos 4 (X²=
28.687, p=0,000) e aos 8 meses da criança (X²= 76.689; p=0,000), com magnitudes
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
de efeito da ordem de .373 e .622, respectivamente. Com o objetivo de discriminar
o efeito da DPP de possíveis efeitos de DA,
os dados foram analisados separando-se
os casos de DPP associados ou não à DA.
Esta análise fortaleceu a idéia do efeito específico da DPP, pois, na ausência de DA,
houve associação significativa com conflito
conjugal aos 4 (X²=12.213, p=0.007 e V de
Cramer=.440) e aos 8 meses (X²=12.095,
p=0.011 e V de Cramer=.438); e com
conflito familiar aos 8 meses (X²=12.813,
p=0.009 e V de Cramer=.451), no mesmo
sentido dos resultados gerais. Na presença de depressão anterior, não houve associações significativas em nenhum dos
momentos. As associações entre DPP e
conflito corroboram a idéia da importância do contexto conjugal e familiar para
a compreensão do quadro. Os valores da
magnitude do efeito relativamente baixos, como frequentemente acontece nos
dados da literatura, são compatíveis com
a interpretação de um fenômeno multideterminado: ao que tudo indica, um conjunto de variáveis associa-se à DPP, sendo
uma parcela destas representada pelo
conflito conjugal e familiar. Considerada
a multideterminação, esta magnitude de
efeito passa a representar participação relevante destes conflitos no quadro da DPP.
A associação entre os conflitos conjugal e
familiar sugere dependência entre essas
variáveis, conforme previsto. O maior valor do quiquadrado aos 8 meses sugere
aumento da associação com o passar do
tempo. De forma similar, aos 4 meses, os
valores mais altos do qui-quadrado para a
associação entre a DPP e o conflito conjugal do que para o conflito familiar sugerem que nos primeiros meses após o parto
(coincidentemente com o pico da DPP aos
3 meses após o parto) o conflito conjugal
tenha um impacto maior. Importa salientar que os conflitos familiares e conjugais
mostraram-se significativamente associados à DPP, independentemente da DA,
o que apóia a compreensão de relações
peculiares da DPP com o conflito. Contudo, pelo fato de as associações verificadas
acima serem encontradas somente na ausência de DA, é possível que esta atue de
forma diferente na constituição da DPP,
com outras associações entre as variáveis.
Há outra interação complexa entre apoio
social (afetado por conflitos) e a DPP a ser
considerada: as ligações entre baixo apoio
e DPP sugerem causalidade, mas, ao mesmo tempo, a própria DPP poderia evocar
apoio social no cuidado com a criança.
Evidentemente, deve-se considerar ainda
uma possível bidirecionalidade de efeitos
entre conflitos conjugais e familiares com
a DPP, pois os conflitos podem propiciar o
desenvolvimento da DPP, e esta, por sua
vez, intensificar os conflitos. As relações
entre DPP e aspectos gerais de harmonia
e apoio social têm se revelado importantes para a compreensão da origem e das
conseqüências da DPP e tem merecido
atenção especial no presente projeto,
tanto pelo interesse teórico quanto pelo
interesse em termos de prevenção e de
políticas públicas.
Palavras-chave: depressão pós-parto, relação
conjugal, família
Contato: [email protected]
35
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
LT05-925 - ESTILO DE APEGO E DEPRESSÃO PÓS-PARTO
Carla Cristine Vicente - UFRRJ
[email protected]
Vera Silvia Raad Bussab - USP
[email protected]
Financiamento: FAPESP
O estilo de apego que a criança constrói, a
partir das diferentes interações das quais
participa, se refere a estratégias ontogenéticas de desenvolvimento social. O apego
se relaciona ao sentimento de segurança
e proximidade do bebê em relação a suas
figuras significativas, o que integrará o seu
desenvolvimento global e construirá um
modelo de funcionamento interno para
seus relacionamentos futuros (Bolwby,
1990). A Depressão Pós-Parto (DPP) é um
distúrbio com sérias implicações potenciais
para a mãe, por propiciar a emergência de
sintomas como humor deprimido, labilidade emocional, sentimentos de incompetência para lidar com a criança, distúrbio do
sono, perda de prazer e ideação suicida, o
que, por sua vez, pode acarretar prejuízos
para o bebê, associados a atrasos no desenvolvimento físico e cognitivo (Patel, Souza
& Rodrigues, 2003). Este estudo objetivou
avaliar estilos de apego em bebês de mães
com e sem indicativos de DPP, a fim de avaliar se a construção do vínculo de apego era
influenciada pela depressão materna, de
modo a aprofundar a compreensão sobre
o desenvolvimento afetivo e da sua importância no desenvolvimento geral da criança.
Este estudo esteve associado ao projeto
temático “Depressão pós-parto como fator
de risco no desenvolvimento: estudo interdisciplinar dos fatores envolvidos na gênese
do quadro e em suas conseqüências”, no
qual mães e bebês atendidos pelo sistema
público de saúde foram acompanhados lon36
gitudinalmente, desde a gestação até o 3º
ano da criança. O estilo de apego da criança
foi avaliado através dos procedimentos da
“Situação Estranha”, segundo protocolo desenvolvido por Ainsworth, Blehar, Waters e
Wall (1978) e Main e Solomon (1990). Uma
equipe de 04 pessoas treinadas participou
das filmagens, feitas quando os bebês foram completando 12 meses. Todas as díades foram recebidas pela pesquisadora e
instruídas para participar dos oito episódios, (duração de 21 minutos), nos quais
ocorria uma seqüência de interações entre
o bebê, a mãe e uma pessoa desconhecida
do bebê, envolvendo separações e reuniões
mãe-bebê. Foram analisadas 85 díades, divididas em dois grupos: experimental (com
indicativos de DPP) e controle (sem DPP)
(“Escala de Depressão Pós-Parto de Edimburgh - EDPE” (Cox, Holden, & Sagovsky,
1987). A classificação do padrão de apego
(seguro; inseguro – evitante, ambivalente
ou desorganizado) foi feita conforme o protocolo de Ainsworth e cols. (1978), que considera quatro dimensões: Procura de proximidade; Manutenção de contato; Evitação
de proximidade, e Resistência ao contato e
conforto, avaliadas via atribuição de valores
de 1 a 7 pontos, detalhadamente definidos.
A classificação foi realizada às cegas, separadamente, por duas observadoras para o
índice de DPP da mãe. A confiabilidade das
observações medida pelo índice Kappa de
Cohen apontou concordância de 0,833, valor confiável para avaliações. Dadas as reconhecidas ligações entre os estilos de apego
e a regulação da segurança afetiva com
autonomia, exploração e brincadeira, foi
desenvolvido um protocolo adicional de observação, para avaliar padrões de exploração do ambiente, de brincadeira e sinais de
ansiedade, como movimentos repetitivos,
desconcerto emocional e cessação de ativi-
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
dade e de interação com a pessoa estranha,
nas episódios de separação e retorno da
mãe. Segundo os critérios do instrumento
da Situação Estranha, predominou a classificação de apego seguro (82%), para o grupo
como um todo (inseguros evitantes 11% e
resistentes 7%). O mesmo perfil de distribuição de estilos foi verificado no subgrupo
com DPP, com predominância de apego seguro em 87% dos casos. Dos bebês (27) de
mães que tinham indicativos de DPP, apenas 4 foram classificados como inseguros,
contrariando as expectativas. Apesar de não
se refletirem na classificação final do estilo
de apego, verificaram-se relações entre DPP
e dimensões do protocolo da Situação Estranha, por análise de regressão múltipla
(método stepwise), que indicou duas dimensões como preditivas da DPP materna:
mais comportamentos resistentes (B=1,76;
t=2,66; sig= 0,01); menos busca de contato (B= -3,40; 7= 2,61; sig= 0,01). As análises
do protocolo adicional mostraram peculiaridades significativas nas crianças do grupo
DPP: menos deslocamento exploratório
(x2(1)= 4,307 p=0,038), menos manipulação
de brinquedo (x2(1)= 5,434 p= 0,02), menos
iniciativa na manipulação de brinquedos (X2
(2)= 5,939, p=0,005), mais comportamentos ansiosos nos dois episódios de separação (X2 (1)= 4,400, p= 0,036; e x2(1)= 3,398
p= 0,028), e menos retomada de exploração
nos retornos da mãe (x2(1)= 3,896 p= 0,040;
e x2(1)= 3,922 p= 0,038). Não houve predominância de estilos de apego inseguros no
grupo com DPP, conforme esperada pelos
indicadores da literatura sobre o desenvolvimento de vinculação afetiva. Entretanto,
foram constatadas ligações significativas
da DPP com as dimensões de comportamento resistente e de busca de contato,
compatíveis com aspectos de insegurança neste grupo. Padrões de exploração do
ambiente, de brincadeira e ansiedade nas
crianças também apareceram prejudicados
no grupo DPP. Nos episódios de separação
da mãe, as crianças do grupo controle agiram com mais segurança, como se esperassem pelo retorno breve de suas mães. Na
comparação com os dados observacionais,
a classificação de segurança dos bebês esteve diretamente associada à desenvoltura,
iniciativa, manutenção e retornos à exploração ambiental e dos brinquedos, quanto
às oportunidades de interação com a figura
materna. De acordo com a ênfase atual nos
comportamentos dos bebês no retorno da
mãe (Waters e cols., 1995), como base para
a compreensão da natureza do vínculo, o
presente estudo indicou efeitos relevantes: bebês do grupo controle, mesmo após
a angústia pela separação, demonstraram
apoiar-se mais na mãe como base segura para a exploração ambiental. Como os
bebês de mães com indicativo de DPP, de
modo geral, não retomaram as atividades
após a separação da mãe, podemos presumir uma angústia maior ou falta de habilidade da mãe para restabelecer a confiança
de seus bebês, o que é compreensível na
situação em que se encontram. O conjunto de resultados aponta a importância de
questões metodológicas, ligadas a um cenário de complexidade de determinações,
bem como à necessidade de consideração
de ajustamento dos instrumentos de avaliação do apego. Reitera, também, efeitos da
DPP no desenvolvimento dos padrões ligados à vinculação afetiva e a relevância de
estudos de acompanhamento para a compreensão do quadro e para a promoção de
programas de intervenção.
Palavras-chave: classificação de apego, depressão pós-parto, desenvolvimento social
Contato: [email protected]
37
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
CO 07 - LT01
Envelhecimento
LT01-905 - DETERMINANTES DO RISCO DE
DEPRESSÃO EM IDOSOS EM UMA EQUIPE
DA ESTRATÉGIA DE SAÚDE DA FAMÍLIA
Cristiane Alves da Fonseca do Espírito Santo SMS/Goiânia
[email protected]
Cristina Ferreira Lemos de Castro Carneiro S.M.S/Goiânia
[email protected]
Helizett Santos de Lima - UNB
[email protected]
Lorena Baía de Oliveira Alencar - SMS/Goiânia
[email protected]
Olívia Cândida Pequeno - SMS/Goiânia
[email protected]
Sandro Rogério Rodrigues Batista - UFG
[email protected]
Os transtornos do humor são uma das
desordens psiquiátricas mais comuns em
idosos, sendo responsáveis pela perda de
autonomia e pelo agravamento de quadros patológicos preexistentes. Dentre
eles, a depressão é a mais frequente e
está associada ao maior risco de morbidade e de mortalidade, ao aumento na utilização dos serviços de saúde, à negligência
no autocuidado, à adesão reduzida aos
regimes terapêuticos e maior risco de suicídio. A presença de comorbidades e o uso
de múltiplos medicamentos são habituais
na população idosa, fazendo com que,
tanto o diagnóstico quanto o tratamento
dos transtornos do humor se tornem mais
complexos. Diante da importância desses
transtornos e da dificuldade diagnóstica,
a avaliação sistemática dos indivíduos idosos com queixas de tristeza e/ou anedonia
38
pode contribuir para melhorar a detecção
dessas patologias. Diversos estudos mostraram que a Escala de Depressão Geriátrica (EDG) oferece medidas válidas e confiáveis para diagnosticar a depressão em
idosos, sendo um dos instrumentos mais
frequentemente utilizados. Os fatores ligados à depressão precisam ser observados de forma cuidadosa e criteriosa pelos
profissionais da saúde, para que se possa
realizar a prevenção e o tratamento, a fim
de evitar sofrimento ao idoso e dificuldades para seus familiares ou cuidadores,
além de consequências negativas para a
sua qualidade de vida. O presente estudo teve como objetivos estimar o risco de
depressão em idosos na equipe 1 da Unidade de Atenção Básica de Saúde da Família (UABSF) Leste Universitário e avaliar
os determinantes do risco de depressão
em idosos. A pesquisa foi desenvolvida no
município de Goiânia, Distrito Sanitário
Campinas-Centro, UABSF Leste Universitário. Foi realizado um estudo quantitativo, transversal, com 92 idosos (com idade
igual ou superior a 60 anos) de ambos
os sexos, no período de maio a junho de
2010, que responderam a um questionário sobre variáveis demográficas, socioeconômicas, comportamentais e de estado
de saúde, além da Escala de Depressão
Geriátrica (EDG-15). A análise dos dados
utilizou o programa Excel® (Microsoft),
bem como para a elaboração de gráficos e
tabelas. Com relação à análise estatística
foram adotados o teste exato de Fisher e
o teste estatístico de hipóteses Qui Quadrado. Segundo os resultados obtidos com
a pontuação na Escala de Depressão Geriátrica, observou-se que 68,5% (n=63) dos
idosos apresentaram risco de depressão,
pois alcançaram mais de 5 pontos no escore utilizado. Verificou-se também que
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
na amostra de 92 idosos, houve predominância do sexo feminino, com 75 mulheres
(81,5%). Quanto à idade, a maior frequência dos idosos estava na faixa etária entre
60 e 79 anos (n=78) e que não houve diferenças significativas quanto à presença
de depressão entre as faixas etárias estudadas. Para o estado civil, a frequência de
sintomatologia depressiva foi maior entre
os idosos casados (83%). Em relação à escolaridade, a maioria dos idosos não tinha
escolaridade (n=36) sendo que 83% destes
apresentaram frequência maior para risco
de depressão. E ainda, que os idosos com
curso superior apresentaram sintomatologia depressiva, demonstrando que o fato
de ter cursado nível superior, demonstrou
não ser fator de proteção para sintomatologia depressiva. Em relação à renda familiar mensal, o risco para depressão foi
maior entre os idosos com renda familiar
de até um salário mínimo (84,6%) e idosos
que não possuíam aposentadoria (66,6%).
Em relação à internação, dentre os idosos
que estiveram internados (n=17), houve
risco de depressão alto (83,3%). Para análise estatística da variável relacionamento
familiar, as respostas foram dicotomizadas
nas categorias ótimo/bom (91,3%) e regular/ruim (8,7%). E finalmente pode-se
afirmar que dentre os participantes que
consideraram seu relacionamento familiar como ruim, a frequência do risco de
depressão foi de 87,5%. Há que se considerar que o aumento da população idosa
vem sendo observado em todo o mundo,
mas o reconhecimento e o tratamento de
transtornos depressivos na população idosa, ainda permanecem como um desafio.
Por isso, a identificação dos fatores de risco para depressão em idosos, associados
com sua incidência pode ajudar os profissionais que atuam na Estratégia de Saúde
da Família (ESF), a diagnosticar e propor
intervenções mais precoces e adequadas.
É fundamental, portanto, que os profissionais de saúde tenham familiaridade com
as características desse agravo e estejam
capacitados, preparados para investigar a
presença de sintomas depressivos e seus
determinantes de risco. Nesse sentido, a
articulação da saúde mental com a atenção básica, principalmente através da ESF,
é essencial para diagnosticar e propor intervenções mais precoces e adequadas,
valorizando a inserção familiar e social
deste indivíduo, através do trabalho multiprofissional, baseado na integralidade
das ações, colaborando para a melhora da
qualidade de vida do idoso.
Palavras-chave: Saúde Mental, depressão,
população idosa.
Contato: Helizett Santos de Lima, Secretaria
Municipal de Saúde de Goiânia e Universidade
de Brasília, [email protected]
LT01-1206 - CORPO E ENVELHECIMENTO
EM DEBATE NA UNIVERSIDADE ABERTA
À TERCEIRA IDADE
Vilma Valeria Dias Couto - UFTM
[email protected]
Deise Coelho de Souza - UFTM
[email protected]
Cecília Fernandes Carmona - UFTM
[email protected]
Ana Alice da Silva Pereira - UFTM
[email protected]
A iniciativa de trazer os idosos para as universidades começou no Brasil em meados
da década de 70 e desde então vem sendo
implantada progressivamente em muitas
universidades (Cachioni & Neri, 2004). Na
Universidade Federal do Triângulo Minei39
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
ro, a Universidade Aberta à Terceira Idade
(UATI) é um programa de extensão universitária, interdisciplinar, que tem o objetivo
de possibilitar aos idosos acesso a universidade numa perspectiva de educação
continuada e visa o resgate da cidadania,
a promoção da saúde e desenvolvimento
do idoso. O objetivo da psicologia é promover debates sobre o envelhecimento,
considerando os aspectos subjetivos deste processo e suas implicações no desenvolvimento do idoso. Na UATI, elegemos
o corpo como um dos eixos de reflexão
do envelhecimento. O corpo passa por
significativas transformações ao longo da
vida e na velhice as perdas que atingem
seu funcionamento, anunciam a chegada
desta etapa da vida. Para muitos idosos, o
corpo é fonte de angústia e preocupação,
seja porque é foco de adoecimento ou devido ao significado que assume na nossa
cultura que valoriza a imagem do corpo
jovem. Sobre o corpo humano, o saber
da biologia, ao compreendê-lo como uma
somatória de órgãos e funções, acaba confrontando a pessoa com uma ideia de um
corpo interior feito de pedaços sobre o
qual ele nada sabe, pois sobre ele quem
sabe é a medicina. A questão do corpo na
psicanálise é abordada num outro registro, trata-se de um corpo que é mediador
que organiza a relação entre a psique e o
mundo externo e através do qual o sujeito
é reconhecido e com o qual se identifica.
Na UATI a proposta é ampliar a ideia do
idoso sobre seu próprio corpo para além
um corpo físico, falamos de um corpo sobre o qual os afetos, os prazeres e sofrimentos vão deixando marcas, construindo
história, criando uma imagem corporal
que permite reconhecimento, apesar das
mudanças que o tempo ou as circunstâncias impõem (Goldfarb, 1998). O nosso
40
objetivo neste trabalho é compreender os
significados atribuídos ao corpo na velhice, considerando as transformações que
acontecem no envelhecimento. Metodologia: O projeto contou com a participação de 15 idosas. Foram feitos quatro encontros com duração de duas horas cada.
As atividades foram realizadas por meio
de oficinas e dinâmicas de grupo cujo propósito era refletir sobre o envelhecimento
pela via do corpo. A metodologia envolve
a participação ativa dos idosos na discussão, buscando incentivar a expressão de
ideias e experiências de cada um. Para a
apresentação da proposta, foi elaborado
um vídeo contendo diferentes imagens de
corpos que favoreciam o reconhecimento
de transformações corporais que advém
com a idade e a influência cultural na valorização do corpo jovem. Após exposição
do vídeo, os idosos eram solicitados a falar
das imagens. Nos encontros posteriores,
trabalhamos com oficinas que abrangiam
momentos de realização de tarefas seguidos de discussões. Na oficina “Espelho,
espelho meu” todos eram convidamos
a se mirarem no espelho. Buscamos trabalhar a imagem do corpo e o estranhamento que experimentamos diante da
imagem do corpo refletida no espelho,
especialmente diante da imagem que traz
as marcas e sinais da idade. Nesta oficina,
discutimos ainda o conceito de imagem
corporal como a representação mental do
nosso corpo. Na oficina “os sentidos do
corpo”, trabalhamos os sentidos básicos
do corpo humano por meio de atividades práticas envolvendo a visão e audição
que confirmaram as restrições advindas
com os anos de vida, e também permitiu
discutir outras possibilidades de potencializar os sentidos, incluindo o resgate
de lembranças relacionadas às sensações
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
já experimentadas em outros momentos
de vida. Para atingir o propósito deste
trabalho de compreender os significados
do corpo atribuídos pelos idosos da UATI,
consideramos como material de análise as
falas que foram registradas durante a realização das oficinas. Trabalhamos com recortes de falas e as possibilidades de sentidos que podem advir. Resultados: Com
base nas falas das idosas, percebemos que
o corpo possibilita diferentes formas de
olhar o processo do envelhecimento. Para
algumas idosas, este processo é um evento natural, decorrente do desenvolvimento humano e as transformações do corpo
é um evento inevitável, como assinalam
as falas a seguir: “eu avalio as mudanças
como consequências da vida, é natural,
como a morte é natural”; “envelhecemos
desde o dia que nascemos, todos vamos
envelhecer e morrer.” Outras relacionam
as mudanças do corpo na velhice como
aspecto facilitador ao aparecimento de
problemas da ordem física, tais como
exemplificam as seguintes falas “quando fica mais velha engorda mais fácil”;
“o peso também pode prejudicar a saúde, podemos dar colesterol, pressão alta,
prejudica tudo isso”; “a gordura deforma
a gente”. Algumas falas apontaram para
uma imagem do corpo positiva diante dos
sinais de envelhecimento do corpo: “cada
ruguinha é uma experiência que a gente
tem”. Outra fala mostra a satisfação com
o corpo atual quando comparado com o
corpo de sua juventude, aspecto que favorece a autoimagem: “quando olho no
espelho vejo uma pessoa que já foi muito gorda, hoje é magra, sarada, gostosa.
Hoje mudei muito, sei lidar com minhas
dificuldades, depois dos 50 melhorou muito.” Entretanto, outras falas mostram que
as mudanças do corpo ainda que inevi-
táveis não são desejáveis:“claro que não
estou melhor agora, as rugas começam a
aparecer, esquece as coisas;é normal, mas
não ficamos como antes.”; “muda tudo, a
pele é a matéria que vai envelhecendo”;
“nada me agrada”. Destacamos também
algumas falas que marcaram a relevância
dos cuidados dispensados ao corpo na
velhice que são importantes tanto para
garantir saúde como também para favorecer uma melhor imagem de si na velhice:
“é importante cuidar do corpo para ter
saúde”; “meu cabelo me agrada, quando corto arrumo, fico bem”; “nada como
uma tinta para os branquinhos”; “todo dia
acordo e passo batom.” Por fim, uma fala
em especial aponta a estreita relação de
cuidado entre o corpo e espírito: “...à medida que você cuida do corpo físico você
está cuidando do corpo espiritual. temos
que cuidar do corpo para que o espírito
esteja bem e temos que cuidar do espírito
para que o corpo esteja bem.” Considerações Finais: Compreendemos que o corpo
é alvo de interesse e investimento não só
pelo valor estético que assume na nossa
cultura, mas como importante via de saúde e envelhecimento saudável. Verificamos que é recorrente o discurso em torno
da responsabilidade do idoso no cuidado
ao corpo físico, especialmente para prevenir ou retardar a ocorrência de adoecimentos que podem advir com a idade.
Quanto à forma como o idoso vê e pensa
seu corpo, a experiência possibilitou reconhecer que as transformações do corpo
interferem negativamente na imagem que
têm de si mesmo. Contudo, existem, igualmente, aspectos positivos nessas transformações que podem favorecer a imagem
de si, especialmente quando significados
como sinal de experiência e maturidade.
Este trabalho possibilitou compreender
41
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
que o corpo ainda que marcado pelos sinais de envelhecimento e limitações pode
continuar sendo alvo de investimentos suficientemente significativos que possibilitam realizações e reconhecimento.
Palavras-chave: Envelhecimento. Corpo. UATI
Contato: Vilma Valéria Dias Couto Universidade Federal do Triângulo Mineiro
Departamento de Psicologia Clínica e
Sociedade
[email protected]
LT01-1343 - INFLUÊNCIA DA
AUTOEFICÁCIA GERAL E DA MEMÓRIA
EM IDOSOS QUE BUSCAM CURSOS DE
INFORMÁTICA
Laina Jacinto Couto - UNITAU
[email protected]
Fernanda Rabelo Prazeres
[email protected]
Marluce Auxiliadora Borges Glaus Leão - UNITAU
[email protected]
As possibilidades de um processo de envelhecimento ativo e de uma vivência de
velhice com autonomia, independência
e qualidade de vida tem conduzido idosos a se ajustarem às demandas da vida
cotidiana, principalmente aquelas relacionadas ao progresso tecnológico atual,
como o domínio sobre conhecimentos de
informática. O enfrentamento de situações novas como essa exige um equacionamento entre seus potenciais e limites
biológicos, psicológicos e sociais, mobilizando o senso de autoeficácia do idoso,
ou seja, a crença que tem em relação às
suas capacidades para produzir resultados. Este estudo teve como objetivo investigar a influência da autoeficácia geral
e da autoeficácia de memória em idosos
42
que ingressam em cursos de informática.
Foi feita uma pesquisa quantitativa do tipo
correlacional, junto a 23 idosos que se
matricularam em cursos de informática,
utilizando-se uma escala de autoeficácia
geral e outra de autoeficácia de memória.
Os resultados indicam elevado escore de
autoeficácia geral e um baixo escore da
autoeficácia de memória. Permitem supor que a baixa crença desses idosos em
relação ao próprio potencial cognitivo de
memória deve estar associada a estereótipos negativos sobre a velhice, todavia, os
resultados da autoeficácia geral são indicativos de condições favoráveis ao ajustamento desse público às novas condições
pessoais e contextuais. Com o aumento
da expectativa de vida populacional ampliam-se as possibilidades de um processo
de envelhecimento ativo e de uma vivência da velhice como uma fase da vida de
autonomia, independência e qualidade de
vida (Neri, 1995). Frente ao atual progresso tecnológico, adultos maduros e idosos
buscam se ajustar às demandas da vida
cotidiana por meio da educação continuada. A procura por cursos de informática,
para além de uma estratégia educativa de
inclusão social do idoso, exige um equacionamento entre seus potenciais e limites biológicos e psicológicos, que por sua
vez, pode gerar desequilíbrios em relação
às capacidades do indivíduo para produzir
resultados. Fazer esse curso envolve uma
avaliação das habilidades sociais necessárias para o alcance dos resultados. O constructo psicológico da autoeficácia tem sua
origem na Teoria Social Cognitiva, a partir
de uma visão do homem constituído pelos
sistemas sociais, e que por meio das trocas
vão ocorrendo adaptações e mudanças no
comportamento, sendo essa relação de
indivíduo com o meio, denominada reci-
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
procidade triádica (Bandura, 2008; Azzi
e Polydoro, 2006). Pajares e Olaz (2008)
argumentam que a autoeficácia é considerada uma percepção que o indivíduo
tem sobre suas capacidades, operando
como um dos determinantes que regulam
a motivação, o afeto e a ação humana, sofrendo mudanças de acordo com a dinâmica de interações desse indivíduo com o
ambiente. As crenças de autoeficácia são
formadas a partir de quatro fontes: experiência de domínio, experiência vicária,
persuasões sociais e estados somáticos,
determinando quanto de esforço a pessoa
dedicará em uma atividade e quanto perseverará quando confrontada com obstáculos, ou seja, coloca em evidência seu
potencial de resiliência frente a situações
adversas. Para Neri (2006) o senso de autoeficácia da pessoa idosa pode ser afetado pelas perdas biológicas das quais está
sujeita, influenciando seu autoconceito,
suas emoções e metas pessoais. A crença
na plasticidade da memória determina a
escolha de tarefas e desafios em idosos,
evidenciando uma relação recíproca entre o senso de autoeficácia em memória
e em sua plasticidade. Considerando esses pressupostos, entende-se que a busca
do idoso por cursos de informática pode
gerar múltiplos benefícios, como a experiência de ampliação do contato social e da
estimulação cognitiva, favorecendo o controle pessoal sobre os domínios que estão
preservados, bem como ajudar nas habilidades cujo domínio esteja limitado. Investigar a influência da autoeficácia geral
e da autoeficácia de memória em idosos
que ingressam em cursos de informática.
Trata-se de uma pesquisa quantitativa,
do tipo correlacional, abordando sujeitos
com 60 ou mais anos, que se matricularam em 2011 nos cursos de informática
de um projeto socioeducativo destinado a
esta população, em uma cidade do interior do Vale do Paraíba Paulista. Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética da
Universidade de Taubaté, sob o nº 497/10.
Do total de 48 matriculados, participaram
23. A coleta dos dados ocorreu nos dias
e horários dos cursos, utilizando-se um
questionário de características sociodemográficas, uma Escala de Autoeficácia
Geral (Ribeiro, 1995) e uma Escala de Autoeficácia de Memória - MAC-Q (Croock
et al, 1992, Mattos et al., 2001), respondidos por eles mesmos, com supervisão da
pesquisadora. Os resultados estão sendo
submetidos a provas estatísticas por meio
da ferramenta computacional SPSS. Os resultados demonstram que nessa amostra
73,91% são mulheres e 26,8% homens;
40,5% apresentam experiência anterior
com computador; sendo os principais indicadores de escolaridade – 21,7% Ensino
Superior Completo, 47,8% Médio Completo. Os motivos para busca desses cursos
foram: acompanhar o desenvolvimento
tecnológico, estimular a mente, manter
contato social e aumentar a disposição ou
ânimo de viver. Constatou-se nas escalas
um índice elevado de autoeficácia geral e
um baixo escore da autoeficácia de memória, permitindo confirmar os achados
de Neri (2006) de que a presença de uma
crença negativa desses idosos em relação
ao próprio potencial cognitivo de memória, pode estar baseada em estereótipos
que associam velhice com incapacidade,
falta de domínio sobre o ambiente e prejuízos de naturezas diversas. Todavia, ao
buscarem esses cursos indicam um comportamento resiliente, uma estratégia de
enfrentamento dos obstáculos, corroborado pelos motivos que alegam. Serão ainda
aplicadas provas estatísticas de correlação
43
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
entre os resultados dessas escalas, e delas
com a variável gênero, escolaridade e experiência anterior com computador. Estes
resultados preliminares permitem pensar
que a baixa crença de autoeficácia de memória desses idosos não está associada a
perdas cognitivas advindas do envelhecimento biológico, visto apresentarem uma
alta crença de autoeficácia geral, portanto, indicativos de potencial para modificar
o modo como manejam suas vidas e essas
crenças, facilitando assim o ajustamento
deles às novas condições pessoais e contextuais.
Palavras-chave: Idosos; Autoeficácia;
Memória.
LT01-1471 - ENVELHECIMENTO,
DESENVOLVIMENTO E
INSTITUCIONALIZAÇÃO: A EXPERIÊNCIA
DE ESTÁGIO BÁSICO EM PSICOLOGIA
Deyse Salatiel de Moura - UVV
[email protected]
Pâmella Vitória Moreno dos Santos Rigoni - UVV
[email protected]
Tainá Barreto Silveira - UVV
[email protected]
Sabrine Mantuan dos Santos Coutinho - UVV
[email protected]
O envelhecimento consiste em um processo dinâmico e progressivo, no qual se
processam transformações diversas (morfológicas, fisiológicas, bioquímicas e psicológicas) que produzem a perda gradual
da capacidade de adaptação do indivíduo
ao meio ambiente, ocasionando maior
vulnerabilidade e maior incidência de processos patológicos (Papaléo Netto, 1997)
Diante do quadro de comprometimento
físico e cognitivo decorrente em geral, do
44
surgimento de algumas doenças, muitas
famílias optam pelo asilamento/institucionalização de seus idosos, visando, normalmente, garantir uma melhor assistência e
qualidade de vida aos mesmos. Doenças
típicas da idade porém, não exclusivas da
mesma, como o Alzheimer, trazem muito
sofrimento para os familiares por não saberem lidar com a patologia que o idoso
possui. Além disso, os casos de comprometimento cognitivo não são tão facilmente
identificados, deixando as pessoas no entorno do idoso confusas acerca de sua real
condição. Engelhardt, Laks, Rozenthal e
Marinho (1997) destacam que os quadros
leves de comprometimento cognitivo são
freqüentes, passando muitas vezes despercebidos, e há uma necessidade de distinguir (o que muitas vezes é difícil) entre
manifestações iniciais de doença e modificações associadas com o processo normal
de envelhecimento. As casas de repouso /
asilos para idosos acabam sendo entendidos como boa ou única alternativa, já que,
geralmente, acolhem e cuidam de idosos
debilitados fisicamente e/ou psicologicamente. Por outro lado, a internação de
idosos em asilos ainda é vista com preconceito, sendo considerada prejudicial ao seu
desenvolvimento, sobretudo por levar ao
isolamento, abandono e exclusão social.
De fato, alguns autores apontam que o
processo de institucionalização é permeado por dificuldades relacionadas à adaptação ao novo modelo, à perda de identidade e autonomia, o que pode acarretar problemas físicos e emocionais, acelerando
e/ou acentuando a velocidade das perdas
funcionais dos idosos. Este trabalho consiste em relato da experiência de Estágio
Básico em Psicologia vivenciada por alunos
do curso de Psicologia do Centro Universitário Vila Velha em uma Casa de Repouso
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
para idosos situada em Vitória/ES. Trata-se
de instituição privada, que se dedica ao
atendimento ao idoso, oferecendo serviços especializados, e para tanto conta com
uma equipe composta por enfermeiras
gerontólogas, técnicos de enfermagem,
geriatra (acompanhamento mensal) e fisioterapeuta (acompanhamento semanal).
O estágio, desenvolvido numa perspectiva
psicossocial, teve início em Julho de 2010,
e contava com uma carga horária prática
semanal de 04 horas, cumpridas na casa
de repouso por um grupo de três estagiárias do quarto período do curso de Psicologia. Nessa época a instituição estava
atendendo, em média, 35 idosos, de idades variadas. Num primeiro momento, foi
realizado estudo bibliográfico referente ao
tema, e após esse período inicial, foi realizada a entrada no campo, que, inicialmente, consistiu em observação participante,
visando conhecer a dinâmica institucional, levantar as demandas da instituição,
os temas de trabalho a serem explorados
e o estabelecimento de vínculo com os
idosos e funcionários. Posteriormente foram organizadas atividades que visavam
potencializar a interação social do grupo
de idosos que tinham condições físicas e
cognitivas de participar, bem como o estreitamento de vínculo – ressaltando que
a necessidade de maior interação entre os
idosos foi a principal demanda identificada. Moura, Passos e Camargo (2005) ressaltam que a comunicação é essencial para
a sobrevivência do homem, em especial
para o idoso, garantindo a manutenção de
suas relações sociais e evitando a carência
afetiva e emocional. Também foram desenvolvidas atividades grupais que tiveram como objetivo a reabilitação cognitiva
(exercícios para a memória, por exemplo),
já que muitos dos idosos residentes na ins-
tituição sofrem de Alzheimer, doença que
traz muitos prejuízos à memória. Entre as
várias atividades desenvolvidas ao longo
do estágio, pode-se citar: exibição de figuras/imagens que trouxessem aos idosos lembranças de momentos variados de
suas vidas para compartilharem com o grupo; audição de músicas antigas, da época
da juventude e fase adulta dos participantes, com a descrição do que lhes vinha à
memória; leitura de contos e sua repetição
pelo idoso para exercitar a memória; execução de dinâmicas de grupo que oportunizassem conhecer um pouco mais da vida
de cada idoso e favorecer a interação entre
o grupo; realização de entrevistas semiestruturadas sobre temas relacionados à
história de vida dos idosos; realização de
trabalhos manuais, como a confecção/
ornamentação de um diário pessoal para
cada idoso, buscando o desenvolvimento
da criatividade e a possibilidade de expressarem suas emoções e sentimentos
diários. Houve situações em que algumas
atividades programadas acabaram não
sendo desenvolvidas em virtude do pouco
interesse ou indisposição dos idosos. Na
instituição, os idosos eram divididos pela
enfermeira responsável para participar das
atividades grupais, geralmente, de acordo
com o nível de comprometimento físico e
cognitivo. Nem todos os idosos participavam sempre de todas as atividades, o que
variava de acordo com o estado de saúde
do idoso naquele dia e de sua disposição
para participar. Além de promover a interação social entre os idosos, o estágio também trouxe a possibilidade de criação de
um espaço para acolhimento das questões
individuais que não emergiam nas atividades grupais, assim como de um espaço
permanente de contato com a equipe e
com os familiares (realização de encontros
45
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
periódicos com a equipe e de reuniões
com os familiares). Mesmo reconhecendo
todas as dificuldades relacionadas ao processo de institucionalização, inclusive as
mencionadas pelos próprios idosos (ficar
longe da própria casa e da família e amigos; seguir uma rotina determinada por
outros; conviver com pessoas desconhecidas, entre outras) crê-se que a mesma
pode ser vivida de uma forma menos dolorosa ao se buscar a criação de um contexto
que favoreça as potencialidades do idoso e
seu desenvolvimento. É nesse sentido que
o trabalho realizado buscou trazer suas
contribuições, mostrando que a Psicologia
tem muito a colaborar na intervenção com
idosos institucionalizados. Como destacam
Neri, Yassuda e Cachioni (2005), a Psicologia conta com “um conjunto de técnicas
de diagnóstico, avaliação e intervenção
voltadas ao tratamento dos problemas
comportamentais e psicológicos que afetam o funcionamento e o bem-estar subjetivo dos idosos” (p. 19), podendo, assim,
oferecer importantes contribuições para a
qualidade de vida de idosos, sobretudo os
funcionalmente debilitados.
Palavras-chave: institucionalização, idoso,
desenvolvimento, Psicologia
LT02-950 - A RELAÇÃO ENTRE ESTILOS
REFLEXIVOS E NARRATIVA EM IDOSAS
Petra Paim Ehrenbrink - UFES
[email protected]
M. Lima de Souza - UFES
[email protected]
Laís Almeida Ambrósio - UFES
[email protected]
A queda da taxa de mortalidade e natalidade colabora para o envelhecimento da
46
população principalmente em países desenvolvidos. Estima-se que o Brasil, em
2025, terá a sétima maior população de
idosos no mundo com cerca de 32 milhões
de pessoas com 60 anos ou mais. O avanço
da idade faz com que surjam doenças típicas da população idosa como a depressão,
que, apesar de não ser uma doença exclusiva dessa faixa etária, tem sido apontada como um problema de saúde pública
e afeta pelo menos um em cada seis pacientes idosos que recebem tratamento
na atenção básica de saúde, nos pacientes depressivos há piora da saúde global,
aumento de custos com a saúde, aumento
de transtornos cognitivos, e mortalidade
relacionada ao suicídio e a doença física.
Por outro lado, estudos sobre os estilos
de o processo reflexivo da consciência
têm sugerido que determinados estilos de
pensamento parecem estar associados a
um funcionamento psicológico mais negativo, colaborando principalmente para o
surgimento da depressão e de outras psicopatologias. Estudos constataram que internações psiquiátricas estão entre os dez
principais motivos de internação em idosos. A ruminação é caracterizada por um
tipo de pensamento repetitivo de caráter
negativo que tende a exacerbar sintomas
depressivos e ansiogênicos. A reflexão é
um tipo de pensamento mais bem adaptado à resolução de problemas e pode amenizar o impacto negativo da ruminação.
Acredita-se que pessoas do estilo reflexivo compreendem suas vidas de maneira
positiva e sentem-se mais felizes. Neste
sentido, investigar os estilos reflexivos da
população idosa pode colaborar para um
melhor entendimento dos processos psicopatológicos que acometem os indivíduos dessa faixa etária. Identificar os estilos
reflexivos dos idosos e comparar com a
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
estrutura (forma e conteúdo) das narrativas sobre suas próprias vidas. Estudo qualitativo e exploratório com uma etapa de
coleta de dados quantitativa. Participaram
do estudo onze idosas com idades entre
sessenta e dois e oitenta e três anos, que
apresentaram condições de se expressar
verbalmente através da escrita. Para a obtenção dos dados utilizamos o Questionário de Ruminação e Reflexão (QRR) e um
protocolo de redação com o tema “Conte
sua história”. A aplicação do instrumento
foi realizadas individualmente na casa da
participante. Inicialmente os dados foram
tratados estatisticamente (média e desvio
padrão). A partir dos escores fornecidos
pelo QRR foram definidos os pontos de
corte: Reflexivo alto= 42; Reflexivo médio= 39; Reflexivo baixo= 36; Ruminativo
alto= 43; Ruminativo médio= 36 Ruminativo baixo= 29. Os idosos apresentaram
cinco estilos de reflexividade: 1. Ruminativo baixo+Reflexivo médio (duas participantes) ; 2. Ruminativo médio+Reflexivo
baixo (duas participantes); 3. Ruminativo
médio+Reflexivo alto (três participantes); 4.Ruminativo médio+Reflexivo médio (três participantes); 5. Ruminativo
alto+Reflexivo alto (uma participante).
As narrativas apresentaram os estilos de
gênero gramatical descritivo (predominância de substantivos e adjetivos na narrativa – ocorrência em cinco narrativas)
quanto dinâmico (predominância de verbos e advérbios – cinco narrativas). Uma
narrativa não teve predominância de nenhum dos dois estilos de gênero gramatical. Os temas abordados nas narrativas
foram “breve relato sobre a história de
vida”, “características pessoais”, “família”,
“preocupação com os outros”, “religião”
e a “importância em manter-se ativa”. Na
categoria “breve relato sobre história de
vida”. Participantes com altos escores no
estilo ruminativo produziram narrativas
que focalizavam características pessoais negativas como, por exemplo: “... Sou
uma pessoa muito insegura... A ansiedade, muitas vezes me impede de viver feliz
e fazer a felicidade dos outros.” Enquanto
participantes com altos escores no estilo
reflexivo produziram narrativas com características pessoais positivas como, por
exemplo,” Gosto de ser quem eu sou por
ter realizado minhas aspirações...” Esses
dados confirmam nossas hipóteses de que
pessoas com o estilo reflexivo compreendem sua vida de maneira mais positiva relatando sentirem-se mais felizes. Enquanto as de estilo ruminativo interpretam os
acontecimentos de forma mais negativa.
Sete participantes apresentaram o estilo
reflexivo ruminativo médio ou alto. O estilo ruminativo por ter como característica
um tipo de pensamento mais repetitivo,
faz com que a pessoa rememore, e pense
mais freqüentemente em acontecimentos
do passado. Isto pode estar relacionado
com o fato de cognitivamente idosos terem uma diminuição na capacidade de
armazenamento de informações e memórias recentes, aumentando, assim, o uso
da memória de longo prazo é a mais utilizada. Assim, acredita-se que os escores
do estilo ruminativo na população idosa
tenha sido mais alto. A terceira idade, é
por muitas vezes, associada socioculturalmente como um período de sabedoria,
formada por uma vida de experiências,
esses indivíduos são vistos como pessoas
sábias pela sua capacidade de lembrar de
fatos, fazerem análises éticas e morais, e
oferecerem soluções e alternativas para
problemas cotidianos. Atividades estas,
que exigem muita reflexão, análise e ruminação de algumas idéias, colaborando
47
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
também para um possível desenvolvimento do estilo ruminativo de reflexividade.
Palavras-chave: Idosas; estilos reflexivos;
narrativas.
Contato: Petra Paim Ehrenbrink, UFES,
[email protected]
CO 16 - LT02
Novas tecnologias
LT02-693 - GRUPOS FOCAIS ONLINE
SÍNCRONOS EM PESQUISA QUALITATIVA:
ASPECTOS COMUNICACIONAIS
Gabriela Sagebin Bordini - UFRGS
[email protected]
Tania Mara Sperb - UFRGS
[email protected]
Financiamento: CNPq
O grupo focal é uma técnica de coleta de
dados que vem sendo largamente utilizada em pesquisa desde os anos 80, sobretudo como técnica de investigação
qualitativa (Schneider, Kerwin, Frechtling
& Vivari, 2002). Comumente, essa técnica
é usada em seu formato tradicional, isto
é, presencialmente. Sua utilização é usual principalmente entre os pesquisadores
que têm interesse pela coleta de dados
por meio da interação grupal (De Antoni
et al., 2001). Este era o caso da pesquisa
aqui relatada, cujo objetivo era conhecer
as concepções de adolescentes sobre o
que é ser homem e o que é ser mulher na
atualidade. Tinha-se como base, o pressuposto de que os significados atribuídos ao
masculino e ao feminino são culturalmente construídos e transmitidos socialmente
através da interação (Diamond, 2002; Lou48
ro, 2004). Optou-se, então, por trabalhar
com as narrativas produzidas por adolescentes em interação, mediante a realização de grupos focais em formato virtual,
já que a internet vem sendo um dos contextos de interação privilegiados pelos
adolescentes (Subrahmanyam, Greenfield, Kraut & Gross, 2001). Os chamados
grupos focais online síncronos são grupos
em que os participantes interagem via internet em tempo real (Walston & Lissitz,
2000). Esbarrou-se, contudo, na ausência
de trabalhos científicos nesses moldes, na
área da psicologia. Diante disso, foi necessário basear-se em alguns procedimentos utilizados por outras áreas da ciência,
selecionando aquilo que se aplicaria aos
objetivos da pesquisa em questão. Em relação às entrevistas virtuais, por exemplo,
Nicolaci-da-Costa, Romão-Dias e Di Luccio
(2009) sublinham que, comumente, as
conversas online apresentam rupturas.
Isso pode decorrer do intervalo que existe
entre o envio de uma mensagem – que é
realizado somente quando o participante
terminou de redigi-la e optou por postá-la – e o recebimento da resposta relativa
à mensagem enviada. Dado que, também
nos grupos focais online síncronos, as participações de cada um dos membros iriam
aparecer na tela de acordo com a ordem
em que tivessem sido enviadas, e não seria possível interromper a escrita de cada
um, esperava-se que a comunicação nesses grupos ficasse fragmentada. Provavelmente as discussões seriam descontínuas,
intercaladas com outras discussões ou
com outros assuntos. Por outro lado, Schneider et al. (2002) explicam que a alta velocidade em que se dá a postagem dos comentários escritos na comunicação virtual
permite que a discussão não pare apenas
porque um dos participantes está escre-
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
vendo sua mensagem. Por isso, os componentes de grupos focais online síncronos,
em comparação com aqueles dos grupos
presenciais, fariam comentários mais curtos, emitindo pequenas frases simplesmente para expressar concordância com
opiniões já apresentadas, propiciando
uma discussão menos elaborada. Diante
disso, esperavam-se dificuldades quanto
à profundidade das discussões nos grupos
focais online síncronos e em relação à obtenção de narrativas longas e individuais.
O presente trabalho visa colaborar com o
avanço da pesquisa qualitativa em psicologia no Brasil, por meio do relato e da discussão das especificidades comunicacionais encontradas nos grupos focais online
síncronos realizados.Participaram 41 adolescentes com idades entre os 14 e os 15
anos, estudantes de uma escola estadual
e de uma escola particular de Porto Alegre
(RS), selecionados por conveniência. Com
os adolescentes devidamente autorizados
pelos responsáveis, foram realizados 6
grupos focais online síncronos, através do
programa de bate-papo MSN, que possibilita conferências online. Todos os grupos
tiveram 7 participantes, exceto um que
contou com 6. Dois grupos foram compostos por adolescentes do sexo masculino,
2 por adolescentes do sexo feminino, e 2
eram mistos. Os grupos tiveram lugar na
sala de informática das escolas em que os
participantes estudavam e foram moderados pela pesquisadora. Esta e todos os
adolescentes tinham um computador à
sua disposição, conectado ao MSN. A discussão era realizada por escrito e iniciava
com a questão de abertura, proposta pela
moderadora: “Contem histórias que vocês
acham que mostram bem o que é ser homem ou o que é ser mulher hoje.”. Os comentários e a identificação do participan-
te que os fizera apareciam na tela de cada
membro, de acordo com a ordem em que
tinham sido postados. As interações nos
grupos focais online síncronos foram discutidas com base na literatura já existente
sobre o tema. A realização online dos grupos focais pareceu ter influenciado a produção dos componentes. Confirmando os
apontamentos de Schneider et al. (2002),
em geral, as participações foram curtas
e os comentários, não muito elaborados
e emitidos rapidamente. A comunicação
entre o grupo mostrou depender da velocidade na qual cada componente era capaz de escrever suas mensagens e acompanhar as dos outros. Isso tornou difícil a
manutenção de uma sequência de interações por parte do grupo, pois a comunicação não ocorria de maneira linear. Assim,
também se confirmou a hipótese baseada
em Nicolaci-da-Costa et al. (2009). A independência entre as participações dos
componentes dos grupos realizados não
foi vantajosa à elaboração de narrativas
longas ou detalhadas. Ocorreu com frequência que, enquanto um participante
escrevia uma mensagem mais longa ou
em resposta a alguma mensagem postada
anteriormente, outros já escreviam mensagens relacionadas a outros assuntos. As
narrativas produzidas ao longo das discussões foram, na sua maioria, fragmentadas
e entrecortadas por assuntos diversos do
tópico proposto. Portanto, a utilização
de grupos focais online síncronos não seria aconselhável quando o pesquisador
pretende obter as tradicionais narrativas
longas e sequenciadas. Este método seria
mais adequado às investigações que têm
como foco a interação entre os participantes. A pesquisa realizada mostrou que grupo focal online síncrono não é uma mera
transposição do grupo focal presencial
49
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
para o ambiente virtual. Chamaram atenção as especificidades marcantes relativas
à comunicação encontradas nessa técnica.
Mais pesquisas são necessárias para que
se conheçam essas particularidades e para
que se possa esclarecer em que situações
os grupos focais online síncronos são mais
ou menos vantajosos, ou mesmo complementares aos grupos focais tradicionais.
Palavras-chave: Grupos Focais Online;
Pesquisa Qualitativa; Internet.
Contato: Gabriela Sagebin Bordini (UFRGS)
[email protected]
LT02-958 - EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA
ONLINE E DESENVOLVIMENTO HUMANO:
INTERFACES E PERSPECTIVAS
Jane Farias Chagas - FTBB/UnB
[email protected]
Um dos desafios inerentes a crescente demanda por cursos a distância na modalidade online consiste em garantir a qualidade
de ensino por meio da incorporação de
tecnologias de informação e comunicação,
de novos processos espaço-temporais de
interações que efetivamente sejam sustentados por teorias de aprendizagem e
de desenvolvimento humano (Carvalho,
Nevado & Menezes, 2005; Chagas, 2010).
Nessa direção, Moraes (2002) chama a
atenção quanto à necessidade de que os
desenhos educacionais e as novas práticas
pedagógicas reconheçam a natureza viva
e transdisciplinar do processo de construção de conhecimento, a interatividade dos
processos cognitivos e sejam capazes de
recuperar a inteireza humana, os valores
multiculturais e o respeito às diferentes
maneiras de pensar. Ainda segundo Moraes (2002), a organização e planejamento
50
educacional e as relações estabelecidas
entre os diversos componentes dos fluxos
nutridores dos processos de aprendizagem e as trocas materiais e informacionais
provocam mudanças estruturais de caráter postural, atitudinal e valorativo. Estas
relações precisam ser mais congruentes
com os princípios organizadores da vida,
com a natureza dinâmica da matéria e da
construção de conhecimento. Nesse sentido, o objetivo deste trabalho é descrever
arquitetura de curso online com base no
Modelo Bioecológico de Bronfenbrenner,
considerando os componentes: pessoa,
processo, contexto e tempo (Bronfenbrenner, 2005). A adoção desses pressupostos
traz implicações para o planejamento de
pesquisa, para o desenvolvimento de desenhos de cursos a distancia ou modelos
educacionais. Do ponto de vista da pesquisa, ressignifica a relação entre pesquisador
e pesquisado, requer análise do espaço
de vida em termos de atividades, papéis
e padrões de interação e a ampliação e
triangulação de estratégias para sondar o
conteúdo do campo psicológico. No âmbito educacional, os conhecimentos produzidos pela psicologia do desenvolvimento,
especialmente os vinculados às teorias
sistêmicas, têm contribuído para uma
ampla discussão dos sistemas de ensino,
os métodos e teorias de aprendizagem e
promovido uma compreensão das particularidades dos processos educativos em interseção com o desenvolvimento humano
e com a aprendizagem (Polônia & Senna,
2005). Desta forma, assumir uma postura
ecossistêmica solicita repensar a relação
professor-aluno, aluno-aluno, aluno-processo, entre outras, a partir da: (a) análise
mais detalhada das atividades, papeis e
relações em que esses atores se envolvem
nos diversos ambientes ecológicos, (b) for-
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
mulação ou reformulação do planejamento educacional a partir do mapeamento de
características individuais e ambientais. É
importante ressaltar que as mudanças produzidas nas concepções e/ou atividades da
pessoa transferem-se para outros ambientes e outros momentos de vida. Ou seja,
sugere considerar as triangulações interpessoais, a transição e validade ecológicas
e as acomodações progressivas e mútuas
entre um ser humano ativo, criativo, dinâmico e em desenvolvimento e as propriedades mutantes dos ambientes imediatos
e distais (Chagas, 2008). Advém ainda, do
emprego desses princípios, a necessidade de utilizar diferentes instrumentos e
abordagem multimetodológica, currículos
estruturados de acordo com as transições
de desenvolvimento do indivíduo, o entendimento das mudanças no papel do aluno
e do professor ao longo do curso de vida,
os avanços tecnológicos e a práxis pedagógica (Polônia & Senna, 2005). Para Stokols
(1999) diferentes contextos afetam de
forma variada os processos de desenvolvimento, o que leva também a resultados
divergentes. Isto significa que as condições
ambientais encontram-se mediadas por
atributos pessoais, pelas disposições circunstanciais e pelo estágio de curso de vida
dos indivíduos envolvidos em processos de
qualquer natureza, inclusive os educacionais. Esses resultados podem ser temporários, de curto ou longo prazo e exercem influência direta ou indireta sobre os processos de desenvolvimento, mesmo quando
as condições ambientais transcendem o
espaço geográfico. Sendo assim, a educação a distância na modalidade online exige tanto uma influência mútua ativa com
os recursos tecnológicos e informacionais
como também com eventos, informações
e pessoas. Dinâmica que requer novos pa-
drões de interação entre as pessoas e que
fomenta uma gama variada de atividades
desenvolvidas em mais de um ambiente
ao mesmo tempo. Essa simultaneidade
pode gerar tanto efeitos positivos quanto
negativos. Entre os efeitos positivos cita-se o aumento da capacidade humana em
lidar com um volume crescente de dados
e como efeito negativo destaca-se o aceleramento e sobrecarga de informações.
Essa estrutura e funcionalidade alteram
as características dos processos distais e
proximais que afetam o desenvolvimento.
Várias tensões interpessoais e psicológicas podem surgir a partir das interações
promovidas em um ambiente online que
podem ser semelhantes ou não aquelas já
conhecidas no mundo não-virtual. Contudo, torna-se relevante apontar que mesmo
nos espaços de interação virtual, os participantes constroem um senso simbólico
de espaço e lugar. Este cenário desafia as
formas de organização educacional e os
sistemas de crenças e valores dominantes
(Stokols, 2005). Por outro lado, o envolvimento ativo em atividade molar constitui
indicador do grau e da natureza do desenvolvimento. Nesse sentido, a atividade
molar pressupõe comportamento continuado que possui um momento (quantidade
de movimento, impulso) próprio e perceptível como portador de significado e intenção pelos participantes do ambiente. Isto
posto, as interações em um ambiente de
aprendizagem online, devem ser planejados de forma a permitir o engajamento
em atividades significativas, intencionalmente elaboradas visando a construção de
conhecimentos e o compartilhamento de
experiências que promovam o desenvolvimento tanto intelectual, como afetivo e social. Ancorados nesta perspectiva, a aprendizagem e o desenvolvimento constituem
51
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
processos mediados pela participação
da pessoa em padrões progressivamente
mais complexos de atividades recíprocas,
permeada por sentimentos positivos de
mutualidade. Com isso, as propriedades
da pessoa e do ambiente, as estruturas e
funcionalidades dos cenários ambientais e
dos processos que ocorrem dentro e entre
os sistemas devem ser considerados como
forma interdependente e analisados em
rede. Os conteúdos das atividades molares
possuem um alcance ampliado dependendo da quantidade de interações entre as
pessoas, símbolos e objetos presentes em
cada ambiente. A variedade, a qualidade
e a quantidade de interações influenciam
na durabilidade dos efeitos das aprendizagens ao longo do curso de vida.
Palavras-chave: Educação a distância;
Desenvolvimento Humano; Modelo
Bioecológico; Arquitetura Educacional.
Contato: Jane Farias Chagas, FTBB/UnB,
[email protected]
LT02-1208 - ANÁLISE DA RELAÇÃO
ENTRE LINGUAGEM, COGNIÇÃO E
INTERSUBJETIVIDADE NO CONTEXTO DA
CIBERCULTURA COM BASE NA TEORIA
DE VIGOTSKI
Ruben de Oliveira Nascimento - UFU
[email protected]
Nesse trabalho discutiremos, com base em
literatura especializada, a noção de que a
interação social na Cibercultura traz consigo uma carga psicológica importante em
nível de intersubjetividade, examinada a
partir de contribuições da psicologia histórico-cultural de Vygotsky. Também analisa
esse tema a partir da relação entre linguagem e processos cognitivos, como fatores
52
interligados favorecidos pela tecnologia.
A relação entre sociedade e tecnologia
sempre existiu de diferentes maneiras na
história da humanidade, causando impactos no desenvolvimento humano. De uma
perspectiva sociocultural, as novas tecnologias da informação e da comunicação
são realizações atuais, exemplos contemporâneos do processo de humanização
que sempre se apoiou, em cada época, em
aparatos físicos (ferramentas) e culturais
(símbolos, linguagem) para sua realização (Wertsch, 1995; Briggs & Burke, 2004;
Cook, 2005; Vigotski, 2007). Nos dias de
hoje, a Cibercultura é um exemplo do que
acima apontamos. Pretto, Riccio e Pereira (2009) comentam que a Cibercultura é
uma categoria do momento histórico atual, “que possibilita a associação do universo da cultura com o da comunicação e das
tecnologias, especialmente as digitais” (p.
85-86). Para esses autores, “a marca principal é a liberação do pólo de emissão na
comunicação, através da implantação das
redes tecnológicas que potencializam a
autoria e colaboração em rede” (Pretto,
Riccio & Pereira, 2009, p. 85-86). Para esses autores, a interatividade que as novas
tecnologias abarcam, dinamiza a difusão
de mensagens, diminui fronteiras e auxilia na colaboração e atuação conjunta dos
indivíduos, abrindo novas possibilidades
de comunicação, interação, aprendizagem
e práticas sociais. A Cibercultura trata de
processamento de informação, o que implica em processos cognitivos. Segundo
Fonseca (2007), cognição é um “sistema
representacional com capacidade de sentir, integrar, pensar, comunicar e agir a
partir de capacidades de processamento
de informação” (Fonseca, 2007, p. 30-31).
Mas, Fischer (2009) assinala que “a língua
dá voz à ação humana, de maneiras com-
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
plexas e sutis” (p. 219); e como cognição
implica num sistema representacional,
a linguagem acaba assumindo um papel
importante, se observamos o conteúdo representacional, simbólico, de uma
produção cultural digital (Costa, 2008).
Fonseca (2007) explica que o desenvolvimento cognitivo não se dá somente pela
autoregulação da estrutura, mas também
pelo envolvimento do indivíduo em “sistemas de mediatização interindividual
que se co-constroem em contextos sócio-históricos” (p. 36). A Cibercultura abarca
essa noção e implica situações de intersubjetividade. A intersubjetividade tem
importante papel nas relações sociais face
a face (Berger & Luckmann, 2004). Mas,
como acima mostrado, na Cibercultura ela
possui a mesma importância psicológica,
dado o caráter transcendente da linguagem (que independe de tempo e de espaço), e suas relações cognitivas. No uso de
computadores, por exemplo, as interfaces
permitem a mediatização tecnológica nas
interações, e ainda afetam nossas formas
de criar e comunicar. Segundo Johnson
(2001), “os seres humanos pensam através de palavras, conceitos, imagens, sons,
associações” (p. 17). O computador lida
com representações e sinais, permitindo
formas de interação à distância (Johnson,
2001). Nas redes sociais, as interações
também assumem um caráter intersubjetivo muito importante na medida em
que os indivíduos podem organizar suas
ações em rede, em espaços mais informais (Marteleto, 2001). A psicologia histórico-cultural de Vygotsky traz importantes
contribuições para essas discussões; entre
elas a importância da mediação simbólica.
Segundo Vygotsky, a mediação simbólica tem origem social e assume destaque
na formação psicológica e na relação/
interação com pessoas, objetos, eventos,
valores, crenças e atitudes culturalmente
desenvolvidas e historicamente constituídas (Vigotski, 2001, 2007; Vigotski & Luria,
2007). Para Vygotsky (2007) era importante “entender o papel comportamental
do signo em tudo aquilo que ele tem de
característico” (p. 53). Vigotski (1991) afirma que o signo tem um papel importante
nos processos coletivos, interpsicológicos,
sendo meios de comunicação e de influência. Para Vygotsky (1991), “todo signo,
si tomamos su origen real, es un medio
de comunicación e podríamos decirlo más
ampliamente, un medio de conexión de
ciertas funciones psíquicas de carácter
social.” (p. 78). De acordo com Vygotsky
(1991a), a função de comunicação do
signo endossa processos interpsicológicos, direciona a atenção, define papéis na
comunicação e contribui para a internalização do que foi socialmente significado.
A intersubjetividade, na perspectiva vigotskiana, está imbricada nesses fatores.
Wertsch (1995) comenta que a intersubjetividade é um processo de comunicação
humana que transcende o mundo privado
dos participantes por meio da conduta
comunicativa (situações de fala). Wertsch
(1995) coloca que, na teoria vigotskiana,
esse é essencialmente um processo semiótico numa dada situação. Entendemos
que em interações sociais produzidas em
ambientes virtuais, tais premissas são
válidas, mas, queremos enfatizar suas
possibilidades dialéticas. Nesse sentido,
mencionamos Molón (2010) quando expõem a perspectiva de Smolka e colaboradores sobre intersubjetividade na teoria de Vygotsky, ao colocarem ênfase na
relação dialética das dimensões intra e
interpsicológica. Smolka e colaboradores
comentam que “sendo a palavra e o sig53
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
no polissêmicos, a natureza e a gênese do
processo de constituição do sujeito implicam, necessariamente, o diferente e o
semelhante” (Molón, 2010, p. 58). Assim,
entendemos que intersubjetividade numa
perspectiva vigotskiana, envolve uma
concepção interativa e semiótica de sujeito, constituída pelo outro via linguagem,
como processos dialógicos, dialéticos e de
significação, que não dicotomizam sujeito
e social. Nesse sentido, a intersubjetividade ajudaria a constituir socialmente sujeitos e saberes, em atividades simbólica e
cognitivamente formuladas. Segundo Fonseca (2007), a cognição “transformada na
sua representação pela linguagem, dotou
o ser humano da capacidade de raciocínio e de resolução de problemas” (p. 34).
A Cibercultura é um ambiente onde essa
premissa ocorre, utilizando-se as ferramentas que ela contém. Concluímos que a
intersubjetividade no contexto virtual, na
Cibercultura, pode diferir em alguns índices ou esquemas comunicacionais daqueles praticados face a face, porém mantém
efeitos psicológicos semelhantes, porque
se vale do caráter transcendente da linguagem e de processos cognitivos em comum, conseguindo realizar a passagem do
privado para o coletivo, que é um aspecto marcante da intersubjetividade. Essas
questões têm influência nos processos de
desenvolvimento psicológico e social dos
sujeitos no contexto tecnológico atual. O
importante é examinar criticamente como
as pessoas estão interagindo no ciberespaço, que construção social/interpessoal
vem se formando e como têm sido objetivadas as percepções sociais dos sujeitos
nesse contexto.
Palavras-chave: Cibercultura;
Intersubjetividade; Vygotsky.
54
LT02-1408 - AS RELAÇÕES ENTRE
PROFESSOR-ALUNO NA EAD A PARTIR
DA CONSTRUÇÃO DE CONHECIMENTO
E DESENVOLVIMENTO DAS FUNÇÕES
PSICOLÓGICAS
Angélica de Fátima Piovesan - UNIT
[email protected]
Fabricia Borges - UNIT
[email protected]
Salete Peixoto - UNIT
[email protected]
Neste trabalho iremos discutir as relações
de interação entre professor-aluno na Educação a Distância. Para isso, utilizaremos a
Psicologia Histórico-Cultural através de Vigotski. Também, usaremos o conceito de
“Inteligência Coletiva” desenvolvido por
Pierre Levy, filósofo da informação que estuda as interações entre internet e sociedade. Sabemos que a construção destes
conceitos e seus significados são distintos,
construídos e estudados em épocas e contextos diferentes, no entanto, acreditamos
que podemos relacioná-los para entender
a construção de conhecimento e o desenvolvimento das funções mentais superiores através do uso das tecnologias. Vigotski desenvolveu sua teoria descrevendo como o indivíduo se constrói como ser
humano a partir das relações sociais, entre o Eu-Outro e essas relações permitem
que haja uma reconstrução interna (intrapessoal) de uma operação externa (interpessoal). Esse processo de internalização
das formas culturais de comportamento
se aplica à atenção voluntária, à memória
lógica e formação de conceitos com base
nas operações com os signos. No entanto,
podemos dizer que as funções psicológicas superiores se originam das relações
sociais e que as atividades cognitivas não
se limitam ao uso de signos e instrumen-
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
tos. Os signos são representados pela linguagem oral e gestual, pela escrita, pelos
números, não modificando o objeto das
operações psicológicas, mas dirigindo-se
para o controle do próprio individuo. Já os
instrumentos sofrem mudanças humanas
sobre o objeto e são orientados externamente. As relações dialéticas entre as funções psicológicas percepção, atenção e as
operações sensório-motoras são afetadas
pelo uso de instrumentos quando relacionados à fala, auxiliando no desenvolvimento das funções psicológicas. A partir
do entendimento do desenvolvimento
das funções psicológicas, vamos tratar do
uso das tecnologias no desenvolvimento
psicológico. Lévy (2007) criou o termo “Inteligência coletiva”, onde as inteligências
individuais são somadas e compartilhadas
por toda a sociedade a partir do surgimento das novas tecnologias possibilitando
trocas de conhecimento e aprendizagens
coletivas. "Ela possibilita a partilha da memória, da percepção, da imaginação. Isso
resulta na aprendizagem coletiva, troca de
conhecimentos". Só existe “Inteligência
Coletiva” se houver cooperação competitiva (relacionada às relações sociais) ou
competição cooperativa (relacionada à
liberdade). Fazendo uma relação entre os
conceitos de Vigotski e de Levy utilizados
neste trabalho, podemos dizer o seguinte:
o desenvolvimento das funções psicológicas superiores pode ocorrer a partir da
internalização de aprendizagens, da mediação semiótica nas interações professor-aluno e o uso de tecnologias interfere no
processo de desenvolvimento da Zona de
Desenvolvimento proximal (ZDP) mediado
pelo professor quando abordamos a EAD.
O professor propicia a aquisição de novos
conhecimentos ao aluno através de atividades desenvolvidas nos ambientes virtu-
ais de aprendizagens (AVA). Consideramos
que o uso de tecnologias possibilita o desenvolvimento das funções psicológicas
como também contribui para a formação
da “Inteligência Coletiva”. Nosso objetivo
foi identificar e descrever os significados
construídos nas narrativas de dois professores da Educação a Distância em relação
às interações professor-aluno mediadas
pelo uso de tecnologias na EAD. Esse trabalho é um recorte de uma pesquisa realizada com professores de EAD de uma
universidade privada de Aracaju, SE. As
entrevistas narrativas e de histórias de
vida foram gravadas, transcritas e realizadas na própria instituição de ensino. Após
as transcrições construímos o mapa de
significados para cada professor por meio
do qual identificamos e descrevemos os
significados construídos a partir das entrevistas sobre as interações entre Professor-aluno na Educação a Distância. Nas
entrevistas os professores nos contaram
sobre as novas experiências obtidas nas
relações professor-aluno mediadas pelo
uso de tecnologias. Para um deles não há
como falar da Educação a distância sem
comparar com o ensino presencial por
causa do contato físico, visual existente
no presencial. Uma forma de esse contato
ocorrer na EAD é a partir da maior dedicação do professor ao aluno, dando mais
atenção para que ele aprenda, identificando e re-significando formas de ser e agir
no processo dialógico com o aluno. Também foi narrado sobre o desenvolvimento de relações de afetividades a partir do
uso de emails, chats e fóruns, como nos
contou um dos professores que recebeu
emails de agradecimentos pelo aprendizado. Para ele, é um reconhecimento que
muitas vezes não acontece no ensino presencial. Outro ponto refere-se a melhora
55
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
do desempenho profissional na educação
presencial. Isso ocorre devido a maior
dedicação prestada ao aluno e a necessidade de melhor planejamento das aulas
na EAD. A consideração do Ambiente Virtual como um “ambiente frio” também é
central nas narrativas, por isso enfatizam
maior dedicação ao aluno. Esses discursos
permeiam o imaginário dos professores
possibilitando transformação no modo de
dedicar-se ao aluno como também, propiciam maior interação e afetividade, que é
tema central abordado pelos professores
na melhoria da relação professor-aluno.
Diante destas narrativas percebemos
que a interação professor-aluno na EAD é
marcada pelo desenvolvimento de novas
formas de relacionamentos tanto para o
professor como para o aluno.
Palavras-chave: Interação Professor-aluno,
Inteligência Coletiva, Educação a Distância.
Contato: Angelica de Fatima Piovesan,
Universidade Tiradentes, UNIT, Mestranda
em Educação, bolsista PROSUP CAPES.
Integrante do Grupo de Estudos GPECS.
[email protected]
LT01-859 - INTER-RELAÇÕES ENTRE
DESENVOLVIMENTO HUMANO
E EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA NA
PERSPECTIVA DA APRENDIZAGEM
Ruben de Oliveira Nascimento - UFU
[email protected]
A Educação a Distância (EAD) é uma modalidade educacional recente no Brasil,
que vem crescendo bastante nos últimos
anos. Esse crescimento deve vir acompanhado de muita pesquisa e discussão sobre seu processo ensino-aprendizagem.
56
A EAD é realizada por meio de tecnologia
da informação e da comunicação; com
os sujeitos separados temporal, espacial
e fisicamente; com destaque em processamento de informação, interatividade/
interação e produção escrita, entre outros (Moore e Kearsley, 2008; Dias e Leite,
2010; Menezes, 2010). Como qualquer
processo educacional a EAD tem relação
com fatores de desenvolvimento cognitivo, afetivo e social de seus sujeitos. Por
isso, nosso objetivo com este estudo é
apontar teoricamente que a Psicologia
pode contribuir com a EAD também investigando variáveis de desenvolvimento humano dos sujeitos que ela atende, em seu
contexto educacional. Um caminho para
isso é analisar o perfil do estudante de
EAD. De acordo com o Censo EAD 2009,
a idade dos alunos na EAD, “concentra-se
na faixa etária de 25 a 39 anos, a maioria dos estudantes possui renda média de
1 a 10 salários, sendo que o grupo mais
representativo (29%) recebe de 1 a 3 salários mínimos mensais” (p. 23). Além disso, o Censo EAD 2009 aponta que “apesar
de um perfil diversificado, os estudantes
de EAD não são constituídos por uma
maioria de jovens recém-saídos do ensino médio” (p. 23). Ferreira e Mendonça
(2007) mostram que a maioria dos alunos
de EAD é de profissionais em atividade
produtiva, casados, e que buscam a EAD
para aumentarem seus conhecimentos.
Nesse sentido, “os cursos a distância são
uma maneira que as pessoas encontram
de ficarem informadas e ainda assim dispor de tempo para a família, visto que podem acessar os cursos até mesmo de suas
residências” (Ferreira e Mendonça, 2007,
p. 7). O aluno de EAD também precisa “se
empenhar em definir horários fixos de
estudo em casa e/ou no trabalho para se
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
dedicar ao curso e ter disciplina para tal”
(Behar, 2009, p. 26). Pela faixa etária dos
alunos, podemos situá-los na fase inicial
da vida adulta (Papalia e Olds, 2000). A
definição de adulto somente pelo fator
idade é uma questão complexa, porque o
desenvolvimento depende de diversos fatores físicos e psicológicos que variam de
indivíduo para indivíduo, e entre contextos socioculturais (Rogoff, 2005; Feldman,
Papalia e Olds, 2009). Mas, o fator idade
ajuda a situar estatisticamente os alunos
de EAD num determinado momento do
desenvolvimento, cujas características
gerais permitiriam pensar sobre as outras variáveis do perfil. Assim, uma inter-relação entre EAD, desenvolvimento humano e aprendizagem, pode ser notada,
especialmente se tratarmos a EAD como
meio para formação continuada ou atualização profissional. Abordando formação continuada com alunos adultos, Alvarado Prada (1997) assinala que “o que
caracteriza as pessoas adultas são suas
experiências, sua história de vida, seus
saberes” (p. 76). Papalia e Olds (2000)
comentam que o aluno adulto costuma
empregar mais a experiência de vida, enriquecendo com isso sua aprendizagem.
Para o aluno adulto no contexto social
atual, a aprendizagem formal continuada
“é uma maneira importante de desenvolvimento de seu potencial, bem como de
acompanhar as mudanças no mundo do
trabalho” (Papalia e Olds, 2000, p. 453).
Assim, o aluno de EAD, adulto, trabalhador, casado, tem prerrogativas pessoais e
sociais que podem representar boa parte
de sua motivação para os estudos e o que
espera deles. Segundo Tapia e Garcia-Celay (1996), a motivação na aprendizagem envolve “que tipo de metas os alunos
perseguem, de que modo influem em seu
comportamento e que variáveis contextuais influenciam para que se perceba,
em um dado momento, a consecução de
algumas como sendo mais viáveis do que
outras” (p. 162). Motivação é um componente pedagógico fundamental na EAD.
Paralelo a isso, a Andragogia (ensino de
adultos) considera que os alunos adultos
apreciam ter certo controle e responsabilidade pessoal sobre o que está acontecendo; preferem definir o que é relevante
para suas necessidades; preferem tomar
decisões sozinhas ou pelo menos serem
consultados; têm muita vivencia e gostam
de utilizá-la no aprendizado; preferem
adquirir informações ou conhecimento relevantes para resolver problemas
no presente; geralmente tem motivação
intrínseca para aprender (Moore e Kearsley, 2008, p. 173-174). Essas características podem ter impacto no processo
de aprendizagem na EAD, que valoriza
muito a autonomia do estudante frente
ao seu programa de formação. Segundo Moore e Kearsley (2008) autonomia
do aluno de EAD significa que o mesmo
deve tomar decisões a respeito de seu
aprendizado, organizando os recursos disponibilizados. Contudo, toda autonomia
é relativa. Assim o sistema também tem
responsabilidades com essa autonomia,
e compreender aspectos relacionados ao
desenvolvimento humano e à aprendizagem, contribui nesse sentido. Em termos
de psicologia da aprendizagem, Bransford, Brown e Cocking (2007) mostram
que conhecimentos, habilidades, crenças
e conceitos prévios influenciam o modo
como se percebe um ambiente educacional e a organização do conhecimento.
Essas questões afetam as “capacidades de
recordação, raciocínio, solução de problemas e aquisição de novo conhecimento”
57
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
(Bransford, Brown e Cocking, 2007, p. 27),
de modo que aprender é mudar. Carvalho
(1996) também mostra que desenvolver é
mudar. O adulto continua seu processo de
desenvolvimento, aprendendo, vivendo
mudanças e estabelecendo metas e possibilidades. A EAD deve assimilar essas discussões ao seu contexto educacional, mas
não para simplesmente adequar o aluno
ao seu processo pedagógico. Segundo
Vigotski (2003) a educação não deve somente comunicar hábitos e conhecimentos, mas promover a “formação de vários
vínculos novos dentro de um sistema de
comportamento previamente formado” (Vigotski, 2003, p. 82). Para Vigotski
(2003), “deve-se considerar como característica da educação o momento de não-consolidação, de fluidez do crescimento
e de mudanças originais no indivíduo”
(p. 82). Assim, defendemos que na EAD
deve-se promover uma “aprendizagem
que passa à frente do desenvolvimento
e o conduz” (Vigotski, 2001, p. 332). Essa
perspectiva pode ajudar na discussão
dos modelos de formação em EAD. Neste
trabalho consideramos alguns aspectos
gerais da vida adulta que não esgotam a
discussão colocada, porém, indicam que
o processo de aprendizagem na EAD tem,
em especial, uma inter-relação com fatores do desenvolvimento humano a ser
considerada pedagogicamente em seu
contexto educacional.
Palavras-chave: Aprendizagem,
Desenvolvimento, Educação a Distância.
58
CO 31 - LT4
Cognição e Aprendizagem
LT04-723 - INVESTIGANDO O
DESENVOLVIMENTO SOCIOCOGNITIVO
INFANTIL
Jaqueline Pereira Dias - USP
[email protected]
Edna Maria Marturano - USP
[email protected]
Financiamento: CAPES
O desenvolvimento sociocognitivo compreende o conhecimento sobre o mundo
social; o pensar sobre as pessoas, o que
elas fazem ou deveriam fazer e como elas
se sentem. (Rodrigues & Tavares, 2009) De
acordo com Bee (2003) tais conhecimentos envolvem processos e mecanismos da
cognição social. A referida autora ressalta
que a compreensão da criança em relação
a ela mesma, as pessoas e os seus relacionamentos sociais reflete ou baseia-se
em seu desenvolvimento cognitivo geral.
Para tanto, aponta que a criança mais jovem direciona-se sua atenção a características externas das situações, enquanto
as crianças com mais idade buscam as
causas (princípios internos); as crianças
pequenas tiram conclusões por meio de
suas observações, enquanto as crianças
mais velhas já são capazes de realizar
inferências. Tais dimensões de mudança
caracterizam, também, um desenvolvimento natural da cognição social (Bee,
2003). Segundo Fenning, Bake e Juvonen
(2011) para se investigar a cognição social
teóricos da área recorrem ao modelo do
processamento da informação social, que
esclarece como as informações são processadas e organizadas em uma situação
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
social. O modelo que tem evidenciado
mais resultados empíricos é o de Dodge
e Crick (1994); por meio do modelo em
questão é possível compreender como a
informação social se processa.
Teglasi e Rothman (2001) aplicaram o
modelo à exploração do conteúdo de histórias infantis, com base em seis passos
mentais que se expressam nas seguintes
questões: - o que está acontecendo? - o
que os personagens estão pensando e
sentindo? - quais são as intenções e metas dos personagens? - o que os personagens alcançam com suas ações? - como os
personagens executam e monitoram seus
comportamentos? - quais as lições aprendidas? No presente estudo, os seis passos
do processamento da informação social
propostos por esses autores são empregados para avaliar o desenvolvimento
sociocognitivo de crianças. Seu objetivo
é verificar se há diferenças desenvolvimentais na qualidade das respostas de
crianças pré-escolares e escolares, ao serem questionadas, com as seis perguntas
exploratórias, sobre uma história infantil
rica em pistas sociais. Método – Sujeitos
- Participaram do estudo 49 crianças, 19
crianças de 5-6 anos, pertencentes a uma
escola de educação infantil e 30 crianças
de 8-9 anos, pertencentes a uma escola
de ensino fundamental. Ambas as escolas são de rede pública e situam-se em
uma cidade do interior de Minas Gerais.
Materiais e procedimentos - Para a investigação sociocognitiva selecionou-se um
livro de história infantil, rico em pistas
sociais, pertencente à pesquisa de Rodrigues e cols. (2007). A fim de sistematizar
a investigação foi elaborado um roteiro de
aplicação, estruturado em 80 perguntas,
que visa explorar e discutir o conteúdo
da história. Para a seleção das perguntas
mais pertinentes a investigação realizou-se uma análise textual e das ilustrações
do livro selecionado para o levantamento
dos indicadores verbais e visuais de pistas
sociais, internas e externas, em cada página. Com base nessa análise, as perguntas para a sondagem sociocognitiva foram
organizadas em categorias de acordo com
os seis componentes propostos por Teglasi e Rothman (2001). Sendo assim, tem-se
23 itens investigando o que está acontecendo; 24 itens investigando o que os personagens estão pensando e sentindo 12
itens investigando as metas e intenções
dos personagens; 6 itens para o que os
personagens alcançam com suas ações;
12 itens para como os personagens executam e monitoram seus comportamentos; e 3 itens para as lições aprendidas.
Para a investigação propriamente dita,
cada criança era retirada, individualmente, da sala de aula e participava da leitura-dialogada da história com base no roteiro de perguntas. A avaliação, com duração média de 20 minutos, era gravada e
posteriormente transcrita para a análise
de dados. Após todas as avaliações transcritas, realizou-se uma junção de todas as
respostas a cada item, tanto para crianças
de 5-6 anos quanto para crianças de 8-9
anos. As respostas foram organizadas em
níveis de reflexão sócio-cognitiva estabelecidos por três juízes mediante consenso. Resultados - Para o componente o que
está acontecendo? Em que a investigação
direciona-se para a codificação e interpretação das pistas sociais, nota-se que as
crianças de 8-9 anos captam mais pistas
se comparadas às crianças de 5-6 anos.
Estas últimas também são capazes de decodificar pistas e algumas delas apresentam respostas ricas em detalhes, no en59
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
tanto as crianças de 8-9 anos destacam-se na qualidade da respostas. A referida
observação vai ao encontro das informações apontadas por Bee (2003) em que o
pensar na infância altera-se com o desenvolvimento. Em relação ao componente
o que os personagens estão pensando e
sentindo? Nota-se que as crianças pequenas apresentam um vocabulário restrito
de nomeação de sentimentos. Além disso,
em algumas situações tais crianças fazem
referência a uma situação e não a um sentimento; já as crianças mais velhas, de um
modo geral, são capazes de nomear sentimentos e discriminá-los coerentemente a
historia. Ao investigar metas e intenções,
terceiro componente, observa-se que as
crianças mais velhas apresentam respostas mais completas, no entanto as crianças pequenas são capazes de identificar
corretamente a meta/intenção presente
na cena. Ao se explorar a elaboração de
alternativas de resolução de problemas
para o personagem, as crianças mais velhas apresentam soluções mais consequenciadas. Para a investigação de resultados alcançados, quarto componente, e
monitoramento e execução de comportamentos, quinto componente, muitas
das crianças, incluindo ambas as idades,
compreendiam o que estava sendo questionado, porém as crianças mais velhas
apresentaram respostas mais detalhadas, apontando maior compreensão. Em
relação ao último componente, quais as
lições aprendidas, observa-se que a maioria das crianças mais velhas foi capaz de
compreender a história como um todo,
extraindo lições pertinentes do livro. Já as
crianças mais novas, geralmente, ficaram
presas aos acontecimentos da história,
não sendo capazes de extrair as lições e
transpô-las para a vida cotidiana. Tal fato
60
corrobora a afirmação de Bee (2003) de
que crianças pequenas se prendem a observações e crianças mais velhas já estão
aptas a realizarem inferências.
O roteiro de investigação se mostrou sensível para a avaliação sociocognitiva. As
crianças mostraram-se interessadas pela
história e os resultados encontrados são
corroborados pela literatura do desenvolvimento infantil.
Palavras-chave: desenvolvimento
sociocognitivo; infância, história infantis.
LT04-970 - GRUPOS DE CONVIVÊNCIA:
RELAÇÃO ENTRE CONCEITOS
COTIDIANOS E CIENTÍFICOS
Camila Lima Nascimento - UNICAMP
[email protected]
Cecília Guarnieri Batista - UNICAMP
[email protected]
O processo de desenvolvimento infantil,
mais especificamente, referente a crianças com queixas de alterações no desenvolvimento e/ou dificuldades escolares,
pode sofrer influências negativas, advindas dos efeitos das repetidas histórias de
fracasso nas tarefas educacionais. Uma
das possibilidades de redução desses
problemas é a participação da criança
em projetos de educação não formal, em
grupos de convivência. Essa participação
pode favorecer interações em que predominem momentos de aquisição e troca
de experiências entre os participantes,
permitindo a exploração de capacidades
e o desenvolvimento de competências
com diferentes propostas, como projetos
voltados para a formação de conceitos.
Cavalcanti (2005) destaca a formação de
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
conceitos como sendo um processo criativo, que se orienta para a solução de problemas e que depende, fundamentalmente, da experiência, na qual a apropriação
de significados depende do contexto, da
atividade e da participação do indivíduo.
Oliveira, Chaves e Alves (2006) afirmam
que a formação de conceitos depende de
um movimento coletivo, trazendo a importância do contexto grupal, com flexibilidade nas atividades propostas, baseada
na percepção dos comportamentos e conhecimentos trazidos pelos participantes.
Vygotsky diferencia os conceitos aprendidos nas interações cotidianas (cotidianos)
daqueles adquiridos no contexto escolar
(científicos) e os relaciona, afirmando que
os cotidianos conferem sentido aos científicos, por terem significados emocionais e
pessoais (Van der Veer & Valsiner, 2001).
Dessa forma, fundamenta as afirmações
segundo as quais a formação de conceitos pode ser facilitada por um contexto de
grupo em que adultos encorajem o estabelecimento de relações entre vivências
do cotidiano e conhecimentos formais.
Gerhardt (2010) destaca dois aspectos
relacionados ao processo de formação de
conceitos: o descolamento da realidade
imediata e a articulação entre conceitos.
Para a autora, o aprendizado consiste na
formação de um espaço emergente, resultante do encontro dos processos individuais e ambientais em um momento
único. O processo de aprendizado deve
ser apresentado como uma realidade
a ser construída (envolvendo conceitos
científicos), baseada nas realidades já
conhecidas (conceito cotidianos), permitindo que ambas as realidades sejam percebidas e conceptualizadas pelo sujeito
em desenvolvimento. O objetivo do presente trabalho é apresentar um estudo
sobre formação de conceitos, realizado
com crianças que apresentam dificuldades escolares em grupos de educação
não formal, buscando identificar exemplos de apropriação de conceitos científicos, com base na análise da dinâmica das
interações entre adultos e crianças. Os
dados apresentados foram selecionados
do conjunto de filmagens das atividades
desenvolvidas em grupos de convivência,
constituídos por crianças com queixas de
dificuldades escolares e, a maioria, com
diagnósticos de alterações orgânicas no
desenvolvimento. Os encontros eram semanais, realizados em um serviço de saúde de uma universidade pública, com duração de 60 minutos, sendo coordenados
por uma equipe envolvendo docentes e
estudantes de pós-graduação. A atividade
dos grupos era fundamentada em proposta de educação não-formal, envolvendo o
desenvolvimento de projetos temáticos
(Batista & Laplane, 2007). Participaram do
estudo quatro crianças com faixa etária
entre doze e catorze anos, matriculadas
em escolas regulares. O projeto foi aprovado por Comitê de Ética, e os pais assinaram um Termo de Consentimento Livre
e Esclarecido. A coleta de dados consistiu
na transcrição das sessões do estudo dos
Solos, que foi parte do projeto temático
“Geografia do Brasil”, das quais foram recortados episódios significativos (Pedrosa
& Carvalho, 2005). As sessões envolveram
demonstrações práticas, aula teórica com
especialistas, estudo de campo, jogos de
tabuleiro com tarefas relacionadas aos
conteúdos apresentados, atividades de
leitura e escrita permeadas por diálogos,
incentivando os relatos das crianças participantes, cujos nomes apresentados são
fictícios. A análise consistiu no levantamento dos conhecimentos que as crian61
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
ças já tinham previamente e dos indicadores de apropriação de conhecimentos
pelas crianças, buscando problematizar a
identificação de articulação de conceitos
e descolamento da realidade imediata,
na construção de conceitos cotidianos e
científicos. Como parte dos resultados,
um dos episódios do estudo é apresentado para exemplificar a análise realizada, o
Episódio 3-3, em que o adulto apresenta
questões relacionadas a noções já apresentadas.
Cecília (ad): O que estraga o solo?
Evandro: Produtos químicos, matadores
de insetos artificiais.
Camila explica o perigo dos pesticidas e
agrotóxicos e continua as perguntas.
Camila (ad): Por exemplo, quando chove
muito e não tem planta em cima? O que
acontece com o solo?
Tamara: Entra dentro. (referindo-se ao
deslocamento do solo)
Camila (ad): A professora mostrou uma
foto, vocês lembram? O que aconteceu
com a estrada que estava em cima do
solo?
Tamara: Rachou.
Celso: Rachou.
Nesse episódio, o adulto retoma uma pergunta apresentada duas aulas antes (1).
Evandro responde com elementos não
apresentados em aula (2). O adulto expande a resposta e detalha mais a pergunta inicial (3). Tamara inicia a resposta (4)
e o adulto concorda e completa, fazendo
referência à aula expositiva (5). Então, Tamara (6) e Celso (7) respondem, apropriadamente. Considera-se que, no episódio,
as crianças participaram de forma a con62
tribuir para a articulação entre diferentes
eventos, todos relacionados aos “danos
ao solo”, tendo o adulto atuado de forma
a propiciar essa busca de articulação. Os
episódios analisados permitiram identificar exemplos de apropriação de conceitos
científicos pelas crianças, muitas vezes,
enunciados de forma não canônica e relacionados a conceitos cotidianos. A partir
dos estudos apresentados foram permitidas reflexões acerca das competências
e capacidades das crianças participantes. Observou-se que a apropriação dos
conceitos nem sempre é completa, mas,
foram evidenciadas construções e apropriações por parte das crianças, sendo
que cada criança apresentou sua própria
maneira de demonstrar a apropriação de
um conceito. A participação dos adultos
mostrou-se importante, uma vez que as
crianças apoiaram-se, constantemente,
nas relações por eles apresentadas entre
as experiências cotidianas e os conceitos
apresentados, durante o processo de elaboração de conceitos. Desta forma, os dados indicaram capacidades e competências nas crianças participantes, cada uma
a seu modo. Foi possível, assim, evitar a
cristalização de incapacidades e queixas,
possibilitando mudanças significativas
nas formas de lidar com o aprendizado da
criança e contribuindo para o seu desenvolvimento.
Palavras-chave: desenvolvimento humano,
necessidades especiais, grupos de
convivência
Contato: Cecília Guarnieri Batista, UNICAMP,
[email protected]
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
LT04-1319 - INFLUÊNCIAS DO AMBIENTE
NA PERCEPÇÃO DE APRENDIZAGEM
NUMA SALA DE AULA DE IDIOMAS:
BREVES CONSIDERAÇÕES A PARTIR DE
UMA INVESTIGAÇÃO EM PSICOLOGIA
AMBIENTAL
Rodolfo Luís Leite Batista - UFSJ
[email protected]
Aliene Cássia Carvalho Gonçalves - UFSJ
[email protected]
Tatiane Rose Oliveira de Mendonça - UFSJ
[email protected]
Larissa Marinho Medeiros dos Santos DPSIC/UFSJ
[email protected]
É apresentado o estudo de caso acerca da
influência causada pelo ambiente na percepção de aprendizagem de uma língua
estrangeira – LE – entre os alunos de um
projeto de extensão do Departamento de
Letras, Artes e Cultura da Universidade Federal de São João del-Rei (DELAC/UFSJ). Os
trabalhos foram conduzidos pelos autores
durante o primeiro semestre de 2011 e
apontam novas possibilidades de compreensão acerca de uma sala de ensino de LE
a partir dos conhecimentos provenientes
da Psicologia Ambiental. Tal estudo objetivou investigar a influência do ambiente em
uma sala de ensino de idiomas mediante
a realização de modificações acarretadas
pelo uso de multimídias e modificações na
disposição física da sala, principalmente, o
posicionamento do professor e a disposição das cadeiras. Assim, buscou-se identificar a importância de diferentes meios
didáticos para aprendizagem de uma língua estrangeira na percepção dos próprios
alunos. Foi realizada breve revisão de literatura que pudesse amparar as modificações realizadas e subsidiar teoricamente o
trabalho desenvolvido. Sendo a Psicologia
Ambiental o campo da ciência psicológica
cujo foco de estudo é a influência do ambiente na subjetividade e comportamento
humanos (Moser, 1998; Sager, Sperb, Roazzi & Martins; 2003), compreende-se que
ela surge enquanto possibilidade de compreensão da realidade de ensino-aprendizagem nas salas de aula de LE. Compreendendo que cada ambiente pode oferecer
variados aspectos de influências ao comportamento humano (iluminação, temperatura, ruídos, sensação de aglomeração e
apinhamento, por exemplo), optou-se por
investigar a percepção dos alunos sobre a
influência do ambiente em sua aprendizagem de uma língua estrangeira. Segundo
Tuan (1980), o estudo da percepção permite compreender a ambiência, uma vez
que elas envolvem características individuais – que variam conforme a idade, sexo,
gênero e história de vida – e relacionadas
à situação investigada. O processo de coleta de dados foi dividido em três grandes
etapas: assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, uma série de
observações e aplicação de um questionário semiestruturado. As aulas observadas
classificadas da seguinte maneira: a) aulas
expositivas e com carteiras dispostas em
fila (consideradas como de situação natural e utilizadas como base para comparações); b) aula com atividades realizadas
em duplas; c) aula com utilização de mídia
auditiva na língua estrangeira; d) aula com
audição de música; e) aula com atividade
realizada em círculo sem uso de multimídia; f) aula em semicírculo, e g) aula com
uso de vídeos. As observações foram realizadas com foco na participação dos alunos,
sendo contabilizadas as interações entre
aluno-aluno, aluno-professor e professor-aluno com utilização da LE. Cada sessão
durou noventa minutos, período de dura63
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
ção da aula. A aplicação do questionário
se fez após a realização da série de oito
observações, sendo ele construído tendo em vista que o ambiente é vivenciado
como campo unitário que se dá abaixo do
nível de consciência, isto é, nem sempre é
experienciado de modo que o percebamos.
O questionário foi composto de doze itens,
aos quais os voluntários deveriam pontuar
em uma escala crescente de um a doze, indicando as alterações que mais afetaram
seu processo de ensino-aprendizagem.
Ao serem retomadas as discussões acerca
do processo de ensino-aprendizagem de
LE, deve ser ressaltado que tal processo
se constitui como uma relação dinâmica
e dialógica, ou seja, um acontecimento
inédito a cada instante, que se modifica
constantemente e é marcado pela interação de duas vias. Professores e alunos entram em contato ao abordarem o conhecimento. Enquanto relação, o processo de
ensino-aprendizagem se revela como um
processo de natureza complexa, marcado
pela afetividade e pela motivação, que
precisa ser compreendido uma vez que
repercute no desenvolvimento dos indivíduos (Miccoli, 2010). Já quanto ao uso de
multimídias nas salas de idiomas, Tondelli,
Francisco, Reis e Sousa (2005) afirmam
que seu uso é recente. Desta forma, gradativamente, a utilização de recursos didáticos que não a tríade lousa-livro-giz vem
sendo substituída: os exercícios orais de
repetição foram abandonados em função
de uma abordagem comunicativa, pautada
pelo ensino de quatro habilidades – escuta, fala, leitura e escrita – e com foco na
interação entre professor e alunos na sala
de aula através de trabalhos em duplas ou
em grupos e situações simuladas com uso
da LE. Esse avanço culminou com o uso do
computador e da internet como recursos
64
tecnológicos na sala de idiomas, criando
a possibilidade da interação em situação
real de comunicação (Tondelli et al., 2005).
Portanto, hoje o ensino-aprendizagem não
é um evento que dá primazia à figura do
professor ou dos livros do mestre (Miccoli,
2010). No entanto, o uso de multimídias
ou modificações no ambiente da sala de
aula não pode ser utilizado de modo arbitrário. Desta forma, Miccoli (2010) afirma
que para que o professor atue como facilitador no processo de aprendizagem é necessário que ele conheça seus alunos e os
diferentes métodos para definir o melhor
caminho a ser trilhado. O domínio da língua estrangeira se fará de modo gradual,
passando por um processo de refinamento
até a obtenção da fluência ambicionada.
Ao final do trabalho empreendido, aponta-se que, de maneira geral, os alunos consideraram a audição de mídias na língua estrangeira e conversação como os aspectos
mais influentes na aprendizagem; aspectos
referentes ao ambiente físico não foram
mencionados como influências importantes na sala de aula; mudanças na ocupação
do espaço físico da sala não influenciaram
na interação nas categorias consideradas.
Considera-se que a fim de otimizar o processo, cabe ao professor oferecer diferentes oportunidades de aprendizagem aos
seus alunos. Portanto, é importante que
haja uma integração dos meios disponíveis, com atividades que sejam do interesse dos alunos e que se aliem às técnicas
pedagógicas, para a obtenção de um ambiente propício ao ensino-aprendizagem.
Palavras-chave: Psicologia Ambiental, Ensino
de Língua Estrangeira, Sala de aula.
Contato: Rodolfo Luís Leite Batista,
Universidade Federal de São João Del Rei,
[email protected]
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
CO 35 - LT05
Relações Familiares 1
LT05-762 - CONJUGALIDADE E OS
DESAFIOS DA CONTEMPORANEIDADE
Camila Ferrari - UCSAL
[email protected]
Cristiane Cavalcanti - UCSAL
[email protected]
Juliana Orrico - UCSAL
[email protected]
Encontrar alguém para compartilhar a
vida e ter filhos parece ser uma busca incessante, já que esta passagem configura-se como um rito significativo em muitas
sociedades. Tal união é bastante cultivada
em nossa cultura, seja pela profundidade
e intimidade proporcionadas, seja pela
companhia e autoafirmação advinda da
relação estabelecida com o parceiro. O casamento é considerado o mais forte prognóstico de felicidade e bem-estar pessoal.
Por outro lado, o casal contemporâneo é
confrontado por duas forças paradoxais a individualidade e a conjugalidade - que
se tencionam constantemente. Encontrar
o equilíbrio entre essas energias tem sido
um grande desafio dos cônjuges na atualidade. A relevância em estudar conjugalidade envolve o fato de que, em algum
momento da vida, as pessoas irão experimentar a convivência com o outro, apresentando-se sob as mais variadas formas
possíveis de organização. Muitos estudos
sobre amor, casamento, família e divórcio, assinalam que a concepção do amor
romântico ainda ocupa o papel central no
imaginário amoroso das relações conjugais na cultura ocidental. O levantamento
bibliográfico do tema da conjugalidade
aponta para um crescente interesse nesta linha de pesquisa, estando a maioria
dos trabalhos concentrados nos últimos
cinco anos. Tópicos como adoecimento,
infidelidade, parentalidade, migração, gênero, violência e relações de trabalho são
os mais diretamente relacionados com
o grande tema. Neste trabalho, visou-se
analisar as relações conjugais, levando em
consideração domínios como satisfação,
investimento do casal na relação e processos adaptativos. Trata-se de um estudo de
natureza exploratória e multicêntrica, de
caráter qualitativo e quantitativo. Utilizou-se um roteiro de pesquisa com itens acerca do casamento e do significado de família, no qual incluiu duas questões abertas
(“o que é família pra você” e “quem faz
parte da sua família”). Foi realizada em
Salvador-BA com uma população de 102
participantes. A população foi composta
basicamente pelo sexo feminino em 78%,
casada pela primeira vez (63,7%), com idade entre 30-35 anos (36,3%), funcionárias
do setor privado (60%), com dois filhos
(33,4%) e oriundas da classe média-alta.
O conceito de família recebeu conotações
positivas, associadas à base da pessoa
(12%). Chama atenção a não valorização
da relação entre família e sustento (0,7%),
mas sim ao suporte incondicional (6,7%) e
cuidado ʤ proteção (4%). A família extensa
foi considerada pela maioria dos participantes como fazendo parte do seu sistema
(41%), embora os agrupamentos monoparentais e reconstituídos já aparecerem
com relativa frequência na pesquisa. Em
relação à conjugalidade, a amostra acredita ser importante a estabilidade conjugal
(93%), a gratificação pessoal dos cônjuges
na relação (90%) e a geração e educação
dos filhos (86,9%), na medida em que se
mostraram satisfeitos com suas relações
65
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
(89,4%). Ser casado legalmente foi valorizado por 49,5%. A conjugalidade, na
maioria da população entrevistada, possui
características contemporâneas, ou seja,
homens e mulheres estão envolvidos com
o desenvolvimento profissional, a satisfação afetiva na relação com o outro e, no
geral, compartilham a preocupação com a
o bem-estar do mútuo. O espaço familiar
é, por conta disso, propiciador de crescimento para todos os envolvidos. Nessa
pesquisa, observou-se que existe uma
preocupação com a satisfação do parceiro
e uma tentativa de conciliar individualidade com conjugalidade, apesar de ser uma
tarefa difícil nos dias atuais. O panorama
social contemporâneo apresenta múltiplas
formas de conjugalidade e um crescente
aumento de dissoluções conjugais, sucedidas ou não de recasamentos, tornando-se cada vez mais importante o desenvolvimento de pesquisas que aprofundem a
compreensão sobre as questões relacionadas ao laço conjugal, pois atualmente o
casamento, não necessariamente envolve
um projeto de filiação e descendência.
Podem-se observar, da mesma forma,
múltiplas facetas do desejo de procriação,
representadas seja pela busca de um filho
quando não existem possibilidades biológicas de concepção, seja por seu inverso, a
escolha voluntária por não ter filhos. Esse
cenário de dissociação, aliado aos avanços
da medicina, permitiu, além de uma sexualidade sem procriação, seu reverso. Isso
ocorre graças à outra característica da conjugalidade contemporânea, que diz respeito à busca de satisfação dentro da relação
e a garantia do espaço para a individualidade, marcando bem a igualdade dos gêneros, e não mais o casamento como uma
condição natural. Pode-se observar, como
efeito, uma explicitação da homossexuali66
dade, um aumento no número dos divórcios e de recasamentos, bem como o surgimento da não obrigatoriedade da coabitação como regra conjugal. Para estudos
prospectivos, pode-se pensar em analisar
os resultados do questionário utilizado sob
égide do gênero, pois é fato que teríamos
definições e percepções diferentes da família e casamento.
Palavras-chave: conjugalidade, família, laços
conjugais
Contato: Cristiane Cavalcanti, UCSal/FTC,
[email protected]
LT05-811 - GÊNERO E GERAÇÃO:
DESCONTINUIDADES NAS INFÂNCIAS
EM FAMÍLIAS DE UMA COMUNIDADE
LITORÂNEA
Angelina Nunes de Vasconcelos - UFPE
[email protected]
Heliane de Almeida Lins Leitão - UFAL
[email protected]
Gabriel Fortes Cavalcanti de Macêdo - UFAL
[email protected]
Financiamento: CNPq, FAPEAL
A família se apresenta como cenário privilegiado para a investigação dos processos
de constituição da subjetividade em sua
indissociabilidade do contexto relacional
e sociocultural. O estudo de questões de
gênero no contexto familiar é de grande
importância, pois é na família que ocorrem as primeiras experiências de relações
de gênero e da transmissão intergeracional de atribuições e papéis de gênero
na cultura. Além disto, é na família que
se estabelecem as relações afetivas primárias, a partir das quais se constroem
importantes processos de identificação
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
que formam o núcleo da identidade de
gênero. As transformações observadas na
família contemporânea têm levado a uma
crescente necessidade de pesquisa acerca das relações familiares na atualidade,
considerando-se particularmente as mudanças no comportamento feminino e o
enfraquecimento dos valores tradicionais
e suas repercussões nos papéis e relações
de gênero. Entretanto, as mudanças observadas na família não afetam todos os
grupos sociais da mesma maneira, sendo
necessário investigar os diferentes contextos comunitários em que ocorrem. A
organização familiar nas camadas populares apresenta especificidades, tornando-se necessário compreender questões de
gênero neste contexto. Com freqüência
prevalece um modelo tradicional de família com uma rígida divisão de papéis entre
homens e mulheres. O homem é considerado o detentor da autoridade, estando
este poder sustentado principalmente no
seu papel de principal provedor da família,
o que lhe garante, ainda, uma privilegiada
relação com o mundo social e do trabalho.
O presente trabalho apresenta uma discussão dos resultados obtidos numa pesquisa sobre gênero com famílias nucleares
de uma comunidade litorânea do Nordeste. A comunidade estudada caracteriza-se
como sendo de baixa renda, localizada
numa área litorânea de forte potencial turístico, sendo sua história recente marcada
por grandes transformações ambientais e
culturais decorrentes da chegada do turismo de massa. O estudo buscou conhecer
a infância nestas famílias, focalizando os
indicadores de transmissão intergeracional de gênero. Os participantes do estudo
foram seis famílias de uma comunidade litorânea, constituídas por pai, mãe e, pelo
menos, duas crianças com idades entre 06
e 11 anos. As famílias apresentaram nível
sócio-econômico baixo e, em sua maioria,
eram nativas da comunidade. Os instrumentos utilizados foram: entrevistas semiestruturadas; histórias semiprojetivas;
produção de “Retratos de família” através
da realização de fotografias e desenhos;
e estudo observacional nas casas de duas
das famílias participantes e no espaço comunitário. Foram observadas importantes
descontinuidades intergeracionais entre a
infância vivida pelas crianças desta comunidade e aquela vivida por seus pais. As diversas influências e informações apreendidas pelas crianças na rua, na escola e através da mídia, geram descontinuidades de
gênero entre as gerações, principalmente
por produzir novas expectativas de futuro. A centralidade da escolaridade na vida
destas crianças marca a principal diferença
intergeracional na família e na comunidade. Em relação à nova geração, a oportunidade da escolarização formal equipara
as experiências de gênero, na medida em
que são oferecidas igualmente a meninos
e meninas. Em relação aos meninos, a
escolarização aponta para a aquisição de
conhecimentos não acessíveis aos pais,
o abandono de profissões tradicionais e
novas possibilidades de inserção no mercado de trabalho. No caso das meninas, a
escolaridade cria a expectativa de preparação para o mercado de trabalho, priorizando o desenvolvimento profissional e a
autonomia financeira, em detrimento do
casamento e da maternidade precoce vivenciadas por suas mães. Além disto, com
a proibição do trabalho infantil, as crianças
já não acompanham seus pais na rotina do
trabalho adulto, enfraquecendo-se expectativas de transmissão de saberes e habilidades relacionadas a ocupações tradicionais, tais como a pesca para os homens e o
67
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
artesanato para as mulheres. Estas experiências promovem profundas modificações
na vida familiar, causando estranhamento
nos adultos. As mães relatam que acompanhavam suas mães nas atividades domésticas, assumindo-as como suas principais
responsabilidades. Constatam, entretanto,
que as meninas de hoje vivenciam rotinas diferentes daquelas vividas por elas,
priorizando a experiência na escola e as
decorrentes expectativas com relação ao
futuro. As falas das meninas corroboram
esta realidade, revelando que a escola se
constitui em importante ambiente de referência e pertencimento no seu cotidiano.
Por outro lado, numa clara reprodução dos
estereótipos de gênero, observou-se que
os meninos são mais “livres”, gozando de
maior permissão para explorar o espaço
da rua, enquanto as meninas sofrem restrições, devendo permanecer no espaço
da casa, geralmente cuidando das tarefas
domésticas. Verifica-se aí a manutenção
da tradição e das desigualdades que caracterizam os espaços aos quais se vinculam
homens e mulheres adultos. Entretanto,
contrariando a expectativa de que mais
liberdade geraria maior autonomia dos
meninos, sugere-se sua maior dependência emocional. Os homens, em suas respostas às histórias semiprojetivas retratam
os filhos como menos autônomos do que
as filhas, recorrendo muito mais aos pais,
principalmente à mãe, para a solução dos
problemas emocionais apresentados. Esta
diferença se confirma nas respostas dos
próprios meninos às histórias em comparação com as das meninas. Uma possibilidade de compreensão dessa diferença
estaria baseada numa concepção estereotipada destes pais de que sentimentos
de tristeza, medo, fracasso e culpa sejam
mais aceitáveis e “apropriados” à expe68
riência feminina, sendo esperado que as
meninas estejam mais familiarizadas com
estas situações e apresentem um repertório mais amplo de estratégias de soluções
aos dilemas fictícios apresentados. Expectativas diferenciadas de quais emoções
são apropriadas para cada gênero podem,
de fato, produzir diferentes níveis de aceitação, enfrentamento e integração de determinadas experiências emocionais. Observamos que nestas famílias predominam
papéis, funções e atitudes ligadas a um
modelo tradicional de organização familiar, os quais são transmitidos através das
conversas, das práticas disciplinares e da
organização do ambiente doméstico e comunitário. Como resultado, as crianças exibem comportamentos consistentes com
os estereótipos de gênero. Por outro lado,
constata-se a valorização da escolarização
das crianças que, gerando rupturas com a
tradição, tende a igualar as experiências de
meninos e meninas quanto ao acesso a novos conhecimentos, experiências sociais e
expectativas para o futuro.
Palavras-chave: família, gênero,
intergeracionalidade
Contato: Angelina Nunes de Vasconcelos,
UFPE, [email protected]
LT05-820 - TEMPO DA CRIANÇA
NO LITÍGIO PARENTAL NA JUSTIÇA:
REFLEXÕES SISTÊMICAS
Marcia Regina Ribeiro dos Santos - TJDFT
[email protected]
Liana Fortunato Costa - UnB
[email protected]
Trata-se do recorte de uma pesquisa qualitativa realizada em mestrado acadêmico
cujos dados foram coletados em um Tribu-
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
nal de Justiça. O estudo versou sobre as
significações do tempo entre as decisões
em ações que envolvem litígio em Varas
de Família, na perspectiva dos vários participantes envolvidos durante a execução
do processo judicial: família, advogado,
juiz de direito, promotor público e psicólogo – profissional do setor psicossocial da
Justiça. Tendo como objetivo discutir o significado do tempo dado pela criança, foi
selecionada uma dada família cujo processo retornou para estudo psicossocial pela
segunda vez. O primeiro havia sido realizado há um ano. O processo era referente
à disputa de guarda da filha em comum,
em que a mãe era a requerente e o pai, o
requerido. Para a realização da pesquisa,
obteve-se aprovação do Conselho de Ética
e todos os participantes tiveram acesso ao
Termo de Compromisso Livre e Esclarecido-TCLE. Para identificar o significado do
tempo para cada participante das decisões
ao longo da tramitação processual, foram
realizadas entrevistas semiestruturadas
direcionadas a cada um dos membros participantes da família envolvida. Além desses, realizou-se entrevista com o juiz que
encaminhou os autos para o setor psicossocial, com o promotor que se manifestou
no decorrer do processo, com os advogados da requerente e do requerido e com o
psicólogo que efetuou o estudo no referido setor. Apesar de a criança participante
(sexo feminino, nove anos de idade) estar
incluída durante a realização da entrevista
com os componentes da família presentes
– pai, mãe, avó materna e companheira
do pai – não foi elaborada entrevista exclusiva para ela. A criança tinha estabelecido vínculo de confiança com a psicóloga
e com a pesquisadora, demonstrando estar à vontade no ambiente oferecido para
a realização da pesquisa. Ela teve espaço
lúdico junto aos seus familiares durante o
período da entrevista. O espaço utilizado
foi uma das salas do setor psicossocial que
estava equipada com os seguintes recursos: brinquedos, papéis, lápis coloridos,
mesinha e cadeirinhas, dentre outros.
Depois que todos os componentes da família responderam às indagações formuladas, a pesquisadora se dirigiu à criança
e lhe fez perguntas que são apresentadas
nos resultados. A primeira pergunta feita
a criança foi se ela se lembrava a idade
que tinha quando o processo teve início.
Ela respondeu que tinha seis ou sete anos.
Foi perguntado como ela esperava que o
processo terminasse e ela disse que não
sabia. E, tal como seus familiares, aguardava a decisão judicial. A exemplo de sua
família materna, ela se queixou do tempo
que passava com a mãe – fins de semana quinzenais e quartas-feiras com pernoite – considerando-o pouco. Por fim,
verbalizou o desejo de ficar mais tempo
com a mãe. Ela não fez referência ao pai
nem aos familiares desse senhor durante
a realização da pesquisa. A despeito disso,
observou-se boa interação entre ela e o
núcleo familiar do pai. A análise e a discussão tiveram como base as expressões
da criança e o padrão interacional familiar
observado. Depreendeu-se que os pais e
os outros membros da família percebiam
o sofrimento da filha. Eles, no entanto,
não conseguiam evitar que a criança participasse dos desentendimentos existentes
e, para amenizar as tensões, delegavam
a ela o papel decisório. O litígio parental
envolveu delegacia de polícia e documentos que buscavam comprovar a incompetência de um e de outro no exercício dos
papéis materno e paterno. Lembranças
oriundas do convívio interrompido geravam desconfianças e também contribuíam
69
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
para dificultar a livre prática das funções
parentais. A partir das intervenções realizadas pela psicóloga do setor psicossocial
que acompanhou o estudo, a família passou a aguardar a decisão do juiz, evitando
sobrecarregar emocionalmente a criança.
Do ponto de vista sistêmico, depreendeu-se que os conflitos que permeavam as
relações afetavam a todos, em especial a
criança, por ainda depender emocional e
financeiramente de adultos responsáveis.
Os resultados mostraram que o tempo de
tramitação processual, três anos, era o
tempo que a criança lembrava, ao se referir à idade que tinha quando este teve
início. Observou-se que, do mesmo modo
que faziam seus familiares, ela passou
a transferir para o juiz a decisão de sua
residência principal. A criança, ao fazer
referência ao juiz como participante importante naquele momento de sua vida,
evidenciou que tinha noção de sociedade
e que dela fazia parte. Ademais, por ser
leal ao afeto materno, a criança verbalizou o desejo de residir com ela. Parece
que no entendimento da criança, o sofrimento da mãe e da avó diminuiria a partir
dessa nova organização familiar. A criança
demonstrou ter noção de tempo ao fazer
menção de sua idade quando do início do
processo judicial e de medida temporal ao
dizer que era pouco o tempo que passava
com a mãe. Ela demonstrou também noção de espaço, ao indicar o local em que
gostaria de permanecer por mais tempo.
A expressão da criança foi fundamental
para subsidiar o relatório da psicóloga que
realizou o estudo. A profissional concluiu
pela sugestão da casa materna como residência principal, modificando a sugestão
fornecida no primeiro estudo psicossocial
realizado, que era a casa paterna. Depreendeu-se que as expressões da criança e
70
as relações existentes foram fundamentais para a sugestão da psicóloga do setor
psicossocial para subsidiar o processo decisório do julgador. Entendeu-se que para
a criança, o tempo mensurável, isto é, a
quantidade de tempo que lhe era disponibilizada a passar com a mãe era considerada reduzida, preferindo aumentá-la.
O desejo da mãe e da avó em acolhê-la
por mais tempo no ambiente doméstico,
poderia ser traduzido pela criança como
espaço de segurança, proteção e afeto.
A noção de sociedade, evidenciada pela
criança, foi representada em sua fala
quando mencionou que o juiz decidiria
sobre sua guarda.
Palavras-chave: tempo, criança, Justiça
Contato: Marcia Regina Ribeiro dos Santos,
TJDFT, [email protected]
LT05-945 - O CRACK E A FAMÍLIA: UM
ESTUDO SOBRE A DINÂMICA FAMILIAR
DO USUÁRIO VICIADO
Heron Flores Nogueira - UCB
[email protected]
Maria Alexina Ribeiro - UCB
[email protected]
A droga sempre existiu e é normatizada de
acordo com compreensão legal de cada
país, tornando a lícita e/ou ilícita. Pesquisando a temática droga verifica-se que ela
e o seu consumo são assuntos historicamente antigos na discussão política, social
e cultural, além disso, sabe-se que a motivação para o uso de drogas sofreu modificações no decorrer do tempo, pois antigamente, as drogas eram utilizadas em situações e ocasiões específicas e com grupos
determinados. Autores como Ribeiro e
Laranjeira (2010) dizem que a característi-
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
ca comum das drogas com potencial para
induzir adicção é o fato de terem a capacidade de alterar o comportamento ao aliviarem sintomas desagradáveis como dor,
ansiedade, ou estresse ou, no pólo oposto, ao promoverem sensações de extremo
prazer e bem-estar. Com relação a estudos
envolvendo o crack no Brasil não há dados
precisos sobre quando e como essa droga
chegou ao país e tomando os dados epidemiológicos feitos com a população em
situação de rua, eles demonstram não
são apontados uso do crack até o ano de
1989. O primeiro estudo sobre o consumo
de crack no Brasil aconteceu em São Paulo com um grupo de 25 usuários. O perfil
descrito pelos autores sobre esse grupo
estudado: homens desempregados, com
menos de 30 anos de idade, baixa escolaridade e poder aquisitivo, provenientes
de famílias conflituosas. Os primeiros estudos mostram que, de um grupo de 131
pacientes internados como dependentes
de crack, 18% morreram nos cinco anos
que sucederam a alta, sendo homicídio a
causa mais frequente. Tanto em São Paulo
quanto em Belo Horizonte, onde foram feitas pesquisas, o resultado apontou a mesma relação intrínseca entre homicídios e
crack, correlacionado ao tráfico de drogas.
De acordo com Penso et. al. (2004) nos últimos anos foram realizados estudos que
objetivavam compreender como as famílias de dependentes químicos se estruturam e como as relações se constituem. Estas autoras ressaltam que a compreensão
era focada na tríade família - pai, mãe e o
filho dependente de droga. O pai foi a figura vista como desatento e distante e a mãe
como super protetora e envolvida com a
vida do filho. No entanto, recentemente,
estudiosos como Penso, Costa e Sudbrack
(2008), Trindade e Bucher (2008) e Fer-
reira (2004), se propuseram a ampliar o
olhar para a problemática das drogas no
ambiente familiar buscando uma compreensão transgeracional dessa temática e
automaticamente retirando o foco da relação linear descrita acima da tríade. Nesse sentido, objetivou-se com esta pesquisa compreender numa perspectiva transgeracional a dinâmica familiar de usuários
de crack. Os objetivos específicos deste
estudo foram: investigar como ocorriam
as relações intrafamiliares entre membros
nos diferentes subsistemas; identificar
possíveis padrões de heranças transgeracionais; descrever os principais aspectos
da dinâmica e estrutura familiar como papéis, fronteiras, limites, autoridade, afetividade; investigar o significado atribuído
pela família à droga; descrever a expectativa dos membros sobre o futuro da vida
familiar. Participaram desta pesquisa três
famílias, todas com um membro usuário
de crack com pelo menos dois anos de uso
da droga e em tratamento de internação
numa clínica de reabilitação psicossocial
no Distrito Federal. Esta foi uma pesquisa
qualitativa na modalidade de Estudo de
Caso e foi adotada como aporte teórico
a Teoria Sistêmica. Para coleta dos dados
foram utilizados três instrumentos considerados por autores sistêmicos como
fundamentais para a compreensão da dinâmica familiar: entrevista semiestruturada do ciclo de vida familiar, construção
do Genograma e colagem em família. O
contato inicial com os participantes se deu
por meio de um convite verbal e pessoal
para a participação na pesquisa, obedecendo aos critérios de disponibilidade de
toda a família nuclear em participar da
pesquisa nas duas etapas. O contato inicial possibilitou o agendamento dos dois
encontros que ocorreram separadamen71
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
te e tiveram uma duração média de uma
hora e meia cada. No primeiro encontro
os participantes responderam ao questionário semiestruturado e construíram o
Genograma familiar. No segundo encontro foi realizada uma colagem familiar. Os
dados foram coletados no próprio local
de internação, sendo cada encontro gravado em áudio e seu conteúdo transcrito
na íntegra. Para compreensão das respostas adotamos o enfoque da Epistemologia
Qualitativa, numa postura de produção de
conhecimento construtivo-interpretativo.
Foram construídas Zonas de Sentido que
são categorias representadas aqui por metáforas relacionadas ao conteúdo obtido
durante a coleta das informações. Como
principais resultados apresentamos aqui
algumas categorizações: “O uso do crack:
uma herança familiar”. Onde é discutida
a transmissão geracional do uso do crack,
existente no sistema familiar como uma
possibilidade de herdar os “valores” familiares; “Relações violentas: o carinho da
família é a chibata”, apontada pelos participantes a violência aparece como uma
das maneiras dos subsistemas se relacionar, é também interpretada como uma
forma de comunicação e de transmissão
de “afetos”; “O filho-pai”, os filhos usuários acabam assumindo o papel de pai
da própria família, invertendo papéis, ao
mesmo tempo, sendo “esposo” da própria
mãe, onde há ausência do genitor e super
proteção da genitora. Essa dinâmica dificulta o processo de desenvolvimento do
sistema familiar; “Crack: uma maldição ou
uma salvação?”, uma visão contraditória é
encontrada quando as famílias atribuem
um significado para a droga. Para uns ela é
vista como uma maldição que acaba com
a harmonia e com a saúde, para outros ela
é considerada uma salvação para ameni72
zar os sentimentos gerados pelos conflitos
familiares; “Uma vida sem drogas”, apesar de diversos estudos apresentarem a
devastação que o crack representa para a
saúde do usuário e as dificuldades apresentadas pelo adicto de manter-se abstinente, as famílias preservam otimismo
quando o assunto é o futuro, acreditam
que a droga deixará de fazer parte de sua
realidade ao mesmo tempo em que delegam essa responsabilidade apenas para o
usuário.
Palavras-chave: crack, família, dinâmica
familiar
Contato: Heron Flores Nogueira, UCB,
[email protected]
LT05-1030 - MEU TEMPO, SEU TEMPO:
REFLEXÕES SOBRE O RELACIONAMENTO
ENTRE AVÓS E NETOS A PARTIR DO
DESENVOLVIMENTO DE UM PROGRAMA
INTERGERACIONAL NO CONTEXTO
ESCOLAR
Jacqueline F. C. Marangoni - GDF
[email protected]
Maria Cláudia Santos Lopes de Oliveira - UnB
[email protected]
A importância da família no desenvolvimento humano é inegável. Esta consiste
no primeiro espaço de convivência e construção de significados do ser humano,
promovendo a transmissão de valores e
práticas socioculturais por meio dos relacionamentos entre as gerações. Ao longo
da história as famílias mudaram e na contemporaneidade, não se pode falar em um
modelo familiar único, devido à flagrante
heterogeneidade das configurações familiares encontradas no cenário social.
Novos modelos familiares se apresentam,
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
motivados pelas transformações intensas
que perpassam as relações de gênero, as
atitudes e valores humanos. A crescente
inserção da mulher no mercado de trabalho, a intensa circulação de informações
e inovações tecnológicas e o aumento da
expectativa de vida, as separações e novos casamentos modificam a organização
afetiva e social dos contextos familiares
(Barros, 2006; Biasoli-Alves, 1997, 2000;
Dessen & Braz, 2005; Rocha-Coutinho,
2006). Temos assim na experiência de
diferentes famílias as expressões das mudanças históricas e culturais que podem
ou não gerar conflitos, mas demandam
constantes negociações entre as gerações
jovens e as mais velhas, que tendem a
conviver por um período maior de tempo
(Oliveira, 2007; Rocha-Coutinho, 2006).
Tataravós, bisavós, avós, netos e filhos
interagem em diferentes espaços sociais,
marcados por dimensões socioculturais
e históricas próprias. As relações que se
estabelecem entre eles são atravessadas
por um conjunto de significados e sentidos importantes para a contextualização e
entendimento da família transgeracional
ou multigeracional. Um aspecto relevante é o processo de trocas intergeracionais
no contexto familiar, em decorrência das
dificuldades socioeconômicas de nosso
país. Os idosos, ainda considerados em
muitos discursos sociais como dependentes, começam a configurar-se como uma
geração que oferece suporte afetivo e financeiro para as gerações mais jovens. Os
avós emergem nesse cenário como personagens centrais na vida de suas famílias,
participando ativamente da educação dos
netos e proporcionando apoio afetivo-financeiro aos filhos (Dias, 2004; Dias &
Silva, 1999, 2001; Oliveira, 2007). Essa realidade complexa demanda estudos que
busquem compreender as transferências
intergeracionais e as possibilidades de
interações entre avós e netos nos diferentes contextos familiares. Como espaço
encarregado da promoção de desenvolvimento, a escola, nesse contexto, assume
o compromisso de formar cidadãos, pessoas comprometidas com a compreensão,
a crítica e a transformação da realidade
sociocultural, na direção de trocas sociais
mais justas e equânimes (Milani, 2003).
Entre as possíveis ações com as quais a
escola deve estar comprometida, destacamos a construção de programas que
favoreçam a interação entre gerações. O
presente estudo parte de uma intervenção realizada em uma escola pública do
Distrito Federal (DF). Seu objetivo é identificar e analisar os sentidos construídos
por avós e netos em encontros intergeracionais delineados pela técnica do grupo focal. A metodologia está baseada na
epistemologia qualitativa e desenvolvida
como um processo construtivo-interpretativo. Participaram do estudo, oito avós,
com idades que variaram de 50 a 69 anos.
Entre os netos adolescentes, foram nove
participantes, com idades que variaram de
13 a 18 anos. Dois moravam com os seus
avós e eram criados por estes; os outros
relataram já terem vivido a experiência de
coabitar com os avós, em algum momento
da infância. A análise dos dados foi realizada por meio da Epistemologia Qualitativa
proposta por González-Rey (1997). Para o
autor, pesquisador e pesquisados estabelecem uma relação dialógica e dinâmica
em que as informações são coconstruídas.
A análise das informações permitiu identificar quatro “zonas de sentido”: 1) avós
como cuidadores principais ou corresponsáveis na educação dos netos - As narrativas ofertadas pelos participantes permiti73
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
ram reconhecer os avós como pessoas ativas no processo de desenvolvimento dos
netos e esteio emocional e financeiro da
família; 2) conflitos intergeracionais - Foi
possível perceber que o relacionamento
entre avós e netos se dá em um movimento dinâmico, marcado por atritos, confrontos e conflitos que tendem, em alguns
momentos, a distanciá-los. Os netos apontaram as lacunas históricas que estabelecem diferenças de gerações (“meu tempo,
seu tempo”) e a insistência dos avós em
tratar de questões atuais a partir de valores coerentes com a lógica sociomoral de
sua época como fatores que dificultam a
relação com os avós; 3) realidade sociocultural contemporânea marcada pelo medo
- O sentimento de medo foi sustentado
discursivamente por avós e também por
netos. O temor e a sensação de insegurança atravessaram as narrativas coerentemente com a cultura do medo que marca
a atualidade, de modo a alterar a vida dos
participantes, restringindo a convivência
nos espaços sociais e tornando-se alvo
recorrente das preocupações dos avós na
educação de seus netos; 4) realidade sociofamiliar dos avós marcada por dificuldades - A experiência em grupo suscitou
uma série de recordações por parte dos
avós que remeteram às suas relações com
os seus próprios avós, na infância, assim
como trouxeram a experiência do começo
de suas vidas conjugais e do nascimento
de seus filhos e de seus netos. As narrativas dos avós contextualizaram situações
e condições sociais, econômicas, históricas e culturais marcadas por dificuldades
e sofrimento que influenciam a relação
que estabelecem com seus netos. A análise das narrativas de avós e netos permite
pensar que os valores da sociedade atual
se mostram, intimamente, relacionados
74
às representações que uma geração atribui à outra, assim como influenciam os relacionamentos entre elas. Ficou evidente
também que para entender as relações
intergeracionais é preciso atentar-se para
temas como a violência no contexto urbano, a relação de codependência afetiva e
financeira entre as gerações de no contexto familiar, as dificuldades socioeconômicas e educativas na relação avós-netos,
a negociação entre valores tradicionais e
modernos, as representações sobre velhice e adolescência na perspectiva dos
envolvidos e aquelas presentes no imaginário social mais amplo. Por fim, o estudo
indica a necessidade de pesquisas sobre
os relacionamentos intergeracionais, em
especial, a relação avós-netos, no mundo
contemporâneo e reitera a importância da
escola como contexto para a realização de
programas de integração entre gerações.
Palavras-chave: relação avós-netos,
programas intergeracionais, escola
Contato: Jacqueline Ferraz da Costa
Marangoni, GDF, [email protected]
CO 41 - LT07
Violência/Gênero
LT07-895 - VIOLÊNCIA E GÊNERO: O
PODER DAS MULHERES NA REDE DO
TRÁFICO DE DROGAS
Dayane Martins José dos Santos - UFF
[email protected]
Financiamento: FAPERJ
O presente trabalho tem por objetivo discutir as relações de poder estabelecidas
pelas internas em um presídio feminino.
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
A pesquisa é realizada com mulheres que
cumprem penas por envolvimento com o
tráfico de drogas em um presídio na região norte fluminense, no Rio de Janeiro.
Na pesquisa, a literatura foucaultiana é tomada a fim de conceituar o poder nos dias
atuais e diferenciá-lo da concepção de poder tanto do Estado absolutista quanto da
teoria marxista. Foucault (1979) vai dizer
que o poder é disperso e é encontrado em
todas as relações e campos sociais. Tais relações de poder assumem formas distintas
nos contextos intra e extramuros em um
presídio. No encarceramento, por exemplo, o poder pode ser refletido no comportamento de algumas mulheres que se
“transformam” em homens e assumem o
papel tradicional masculino numa relação
homossexual. O poder é visto aqui como
atrelado ao gênero. Fora do encarceramento, a menção ao poder é recorrente
quando analisamos as motivações expressas por essas mulheres para o ingresso no
tráfico de drogas. Tais mulheres almejam
a obtenção de dinheiro a fim de satisfazer
seus desejos de consumo de bens materiais, fomentados pela mídia e pela própria
sociedade, além de almejarem o poder de
ser bandida, que é um poder reconhecido socialmente como um poder masculino. Nosso objetivo no presente trabalho
é discutir as relações de poder estabelecidas pelas internas em contextos intra e
extramuros de um presídio. Em um primeiro momento, abordaremos o contexto
extramuros prisional, analisando como as
relações de poder influenciam na inserção
dessas mulheres no tráfico de drogas. Posteriormente, iremos problematizar a mesma questão em contexto prisional. O trabalho de campo está sendo conduzido no
Presídio Feminino Carlos Tinoco da Fonseca, na região norte fluminense do estado
do Rio de Janeiro. Essa instituição abrange
a maioria maciça de mulheres sentenciadas pelo envolvimento com a atividade do
tráfico de drogas. Outros dados analisados
na pesquisa foram coletados no Presídio
Nelson Hungria, localizado no município
do Rio de Janeiro. Esses dados fazem parte do grupo de pesquisa “Violência e Gênero”, que iniciou suas atividades no ano
de 2007. Os dados a serem analisados são
as entrevistas abertas em profundidade
realizadas com as internas do presídio citado acima. Todas as mulheres entrevistadas foram condenadas por tráfico de drogas. A metodologia utilizada para analisar
os dados é a Análise do Discurso Crítica
(FAIRCLOUGH, 1992), que prima pela centralidade das relações do poder evidenciadas pelos relatos das participantes. A análise do discurso possibilita analisar as falas
que atravessam a constituição subjetiva
de tais mulheres, emergindo assim sua
contradição, submissão e os discursos que
são produzidos pela própria instituição.
De início, podemos desmistificar a ideia
de que tais mulheres se inserem nas atividades do tráfico exclusivamente como um
meio de sustentabilidade. A atualidade se
caracteriza pela produção de necessidades que não se referem à sobrevivência
biológica do corpo, mas, principalmente,
à sobrevivência num contexto social em
que o consumo é altamente valorizado
e possibilita a inserção em espaços mais
privilegiados. A ditadura de mercado é incentivada cotidianamente, seja pelo meio
midiático, seja pela própria sociedade,
modificando e produzindo necessidades
pessoais. Os dados coletados nos mostraram que a maioria das mulheres entrevistadas inicia as atividades ilícitas com o
propósito de obter dinheiro para gastar
com roupas, acessórios, carros, etc. Tendo
75
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
esses objetos de consumo, elas acabam
por ganhar uma maior visibilidade e status perante à sociedade. Num segundo
momento, ao analisarmos as relações de
poder intramuros prisionais, notamos que
há uma continuidade desse status conquistado fora da prisão. As mulheres que
chegaram a ocupar cargos importantes
na hierarquia do tráfico, ao serem presas,
continuam a exercer e ocupar um certo
lugar de destaque na prisão, devido à sua
trajetória de vida alcançada nas atividades
de drogas. Outra forma de poder notada nas entrevistas é atrelada ao gênero.
Destacamos aqui a relação homossexual
presente nas instituições, que é bastante
comum devido à dificuldade que se tem
para conseguir autorização para a visita íntima e ao abandono afetivo e sexual
experimentado pela maior parte das mulheres no encarceramento. Porém, o que
nos instigou e gerou questionamentos é
que, em algumas dessas relações, havia
uma “transformação” de uma das parceiras em “homem”. Essas mulheres travestidas se caracterizavam como homens,
assumiam comportamento, vestimentas e
codinomes masculinos. Para elas, o “virar
homem” dentro da prisão possibilita uma
maior visibilidade dentro da instituição e
também um maior respeito das demais internas. Por fim, os resultados obtidos na
atual pesquisa nos possibilitaram refletir e
questionar sobre as relações de poder que
perpassam a vida dos indivíduos, principalmente em um contexto prisional.
Palavras-chave: gênero, poder, criminalidade,
tráfico de drogas
Contato: Dayane Martins José dos Santos,
UFF, [email protected]
76
LT05-1032 - O PAPEL DAS RELAÇÕES
AFETIVAS NA CONSTITUIÇÃO
DA IDENTIDADE DE MULHERES
ENCARCERADAS
Carolina Ferreira Barbosa - UFF/PURO
[email protected]ff.br
O presente trabalho visa apresentar o
papel das relações afetivas no processo
constitutivo da identidade de mulheres
encarceradas. Diversos autores, em consonância com os estudos em Criminologia,
atentam para o fato de que a criminalidade feminina é, em geral, desprezada ou
explicada em virtude dos relacionamentos
amorosos com parceiros envolvidos em
atividades criminosas (Barcinski, 2009a;
Barcinski 2009b; Guedes, 2006; Souza,
2009; Zaluar, 1993). Uma atividade criminosa de extrema violência e constante
risco de morte para aquele que exerce tal
atividade é, em geral, relacionada aos homens. Eles são os “chefes” do negócio, os
que são munidos de armas de fogo e que,
fortes e destemidos, assumem a frente
de combate (Zaluar, 1993). Por demandar uma série de características físicas e
psicológicas particulares, podemos dizer
que o mundo do crime faz parte do domínio masculino e, desse modo, a inserção
masculina em atividades transgressoras é
mais facilmente esperada. As mulheres,
portanto, têm assumido um papel secundário no cenário do crime, vinculando-se em atividades menos violentas como
roubo a lojas e supermercados ou, no
caso específico do tráfico de drogas, por
amor a um bandido ou pelo vício (Zaluar,
1993). Assim, como a inserção feminina
em atividades criminosas é menos evidente e como a figura feminina desperta
menos desconfiança neste meio, as mulheres são tidas, tradicionalmente, como
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
coadjuvantes neste cenário e os homens,
como protagonistas. Para entendermos o
papel dos homens/parceiros na iniciação
criminosa de mulheres, podemos pensar
que as relações afetivas estão no centro
da constituição da identidade feminina,
tal como afirma Miller (1987). Assim, o
envolvimento das mulheres em atividades
criminosas estaria intimamente relacionado à figura do homem como bandido e à
proteção, por parte das mulheres, da relação estabelecida com seus parceiros criminosos e à proteção/criação dos filhos. A
partir da ênfase no papel preponderante
do afeto na constituição da subjetividade
feminina, podemos entender que as relações afetivas estabelecidas no contexto
prisional feminino evidenciam sua importância enquanto estratégia de sobrevivência emocional neste espaço e, consequentemente, contribuem para a constituição
da identidade destas mulheres. Assim, as
vinculações amistosas e amorosas entre
as mulheres encarceradas, o “casamento”
que reproduz papéis hegemônicos de marido e mulher no cárcere, a homossexualidade e o fenômeno do “travestismo”, por
exemplo, contribuem para o enfrentamento do sofrimento advindo do abandono
familiar na condição de encarceramento.
Não excluindo o protagonismo e a iniciativa pessoal das mulheres como motivadores para um percurso criminoso feminino
(Barcinski, 2009a), o objetivo deste trabalho é investigar o lugar das relações afetivas e as peculiaridades desse processo
num contexto intra e extra muros prisional, bem como sua influência no percurso
de construção da identidade de mulheres
encarceradas. Em outras palavras, o foco
está na análise do papel dessas relações
afetivas para a constituição da identidade nesses dois contextos: a inserção e
permanência das mulheres no tráfico de
drogas e o período de encarceramento. O
estudo se baseia em reflexões realizadas
a partir de entrevistas qualitativas, em
profundidade, com cinco mulheres encarceradas com histórico de envolvimento
no tráfico de drogas no Rio de Janeiro. A
partir da análise crítica de discurso (Fairclough, 2008), a análise versa sobre as
tensões entre os discursos hegemônicos
e os discursos de resistência constitutivos
da identidade das participantes. Portanto,
importa para a compreensão deste processo a fluidez dos significados produzidos
pelo discurso no contexto sócio-histórico
e cultural no qual as participantes estão
inseridas e o modo como deles se apropriam. As entrevistas evidenciam o papel
preponderante que as relações afetivas
têm na constituição da identidade das
mulheres, tanto no contexto intra muros,
como no extra muros. Os dados demonstram que a vinculação amorosa dessas
mulheres com traficantes contribui para a
inserção delas no tráfico de drogas, e esta
participação, em relação à inserção masculina em tal atividade, acontece de modo
muito particular. Após o encarceramento,
estereótipos afetivos passam a ser supervalorizados, como a idealização da figura
materna e da maternidade em si. As relações amorosas entre as mulheres, que
se estabelecem na prisão, são marcadas
pelos referenciais heterossexuais tradicionalmente conhecidos, ou seja, há entre
elas a exigência de uma figura masculina
de atividade e uma feminina de passividade. No caso das “sapatões” (mulheres que
se travestem de homens e adotam nomes
masculinos), embora haja uma recusa ao
relacionamento afetivo com homens, essas mulheres acabam por se aproximar
deles no modo como se comportam e
77
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
exercem um poder diferenciado sobre
as outras mulheres, poder este que está
atrelado à figura masculina. Diante do exposto, percebemos que a inserção de mulheres em atividades criminosas evidencia
uma ruptura com os discursos hegemônicos sobre o tipo de comportamento próprio do feminino, em especial no que se
refere à capacidade de cometer crimes tidos como de dominância masculina, como
a inserção no tráfico de drogas e o protagonismo dessas mulheres diante de seus
atos – apesar de haver uma negociação
deste lugar com o da vitimização. Sendo
a prisão e a favela espaços marcados pela
violência, as mulheres encontram meios
para existir e até mesmo sobreviver nesses contextos, na tentativa de conciliar
as marcas constitutivas que determinada
cultura convenciona como ser mulher e o
envolvimento em atividades criminosas tipicamente masculinas.
Palavras-chave: gênero, discurso,
criminalidade, relações afetivas, identidade
Contato: Carolina Ferreira Barbosa,
[email protected]ff.br / [email protected]
LT07-1231 - CRIMINALIDADES E
MULHERES: OS DESAFIOS DO EXISTIR NA
CONTEMPORANEIDADE
Carolina Ferreira Barbosa - UFF/PURO
[email protected]ff.br
Milena Rezende de Moraes - UFF/PURO
[email protected]
A atualidade possui configurações sociais
dos tempos anteriores, o que possibilita
dizer que hoje há fusão de valores modernos e contemporâneos convivendo na
sociedade. A Modernidade se caracterizou pela criação de dispositivos que cap78
turavam as potencialidades políticas dos
corpos, a fim de explorá-los como riqueza
econômica. Os saberes se articularam ao
Estado, produzindo modos de conceber a
realidade, revestidos de veracidade. Essa
articulação produziu efeitos significativos
no modo de compreender os sujeitos,
inserindo-os numa norma considerada
ideal para experimentar a vida (Foucault,
2009). O exercício da disciplina apropriava das forças sociais suas habilidades. O
objetivo principal era docilizar os corpos
aos dispositivos. O poder sobre a vida,
através dos saberes, tinha como alvo criar
mecanismos reguladores que afetassem
a população e os indivíduos, de maneira
que se autorregulassem (Foucault, 2009).
As instituições, como família e prisão, assumiram funções pedagógicas. Na primeira, cabia ao homem disciplinar sua casa e,
na segunda, cabia ao Estado assumir esta
função, já que a família não conseguia
exercer com êxito seu processo de constituir-se como nuclear. Isso porque nem
todas as famílias conseguiram se organizar segundo os padrões de heterossexualidade e papéis bem delimitados dos seus
membros. As determinações de gênero
são produções de verdades construídas
historicamente para a regulação dos corpos. Sobre isso Saffioti (2010) diz que “o
Estado tem ratificado um ordenamento
social de gênero através de um conjunto
de leis que se pretendem objetivas e neutras, porque parte da errônea premissa de
que a desigualdade de fato entre homens
e mulheres não existe na sociedade” (p.
445). Narvaz e Nardi (2007), a partir de
Foucault, dizem que não cabe “libertar”
o indivíduo do Estado, mas dos indivíduos
estarem liberados quanto às práticas individualizantes que as instituições estatais
promovem. Em seus estudos, Foucault
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
não atribuiu devida importância às lutas
das mulheres contra aos valores androcêntricos que historicamente pautavam
as relações humanas. Acreditamos que é
estratégia estatal a segregação dos grupos sociais, para despolitizá-los. Um olhar
atencioso para as questões de gênero se
faz urgente para intervir nas práticas e
discursos que colocam as mulheres como
“minorias sociais” ou minorias políticas.
Em relação à prisão, o que se tem visto é a
reclusão de certos grupos sociais desprovidos de riqueza econômica e que se percebem com pouca visibilidade e poder social (Ciarallo, 2009). O lugar ocupado pela
mulher criminosa é traçado nesse contexto de estigmas socialmente construídos,
associados à classe e, principalmente, ao
gênero. As representações sociais acerca
do feminino constituem certos modos de
se envolver afetivamente com o outro e
com o trabalho. Essas representações são
fortemente impulsionadas pelas práticas prisionais, que acabam constituindo
formas de se existir pautadas no que se
espera de uma mulher na sociedade em
geral. Este trabalho objetiva conhecer
os lugares ocupados pelo feminino na
prisão e fora da prisão no que se refere
aos contextos de trabalho e família, diante da fusão de valores que caracterizam
a contemporaneidade. Entendemos que
as relações nesses contextos são permeadas por relações de poder e de tensão. A
busca das mulheres por visibilidade e poder é constante, sendo o protagonismo, a
intencionalidade das ações das mulheres
e a centralidade de gênero, norteadores
de suas relações sociais (Barcinski, 2009).
No presente estudo foram entrevistadas cinco mulheres encarceradas em um
presídio do Rio de Janeiro. As entrevistas
foram qualitativas, em que as mulheres
foram convidadas a contar suas histórias
de vida. O interesse maior foi em relação
às formas pelas quais elas (re) criavam
suas histórias, considerando os lugares
que ocupavam nos seus grupos sociais
(intramuros e extramuros) e o lugar que
esse grupo ocupava na sociedade global.
As participantes foram avisadas do caráter voluntário de sua participação e puderam interromper a gravação ou mesmo a
entrevista em qualquer momento. Os dados foram analisados a partir da Análise
Institucional do Discurso (Guirado, 2010).
Considerando as participantes como “sujeitos institucionais” (Galvão e Serrano,
2007), buscamos compreender os lugares
que as mulheres ocupavam a partir de
regras socialmente construídas e o papel
que as práticas institucionais possuíam na
construção da subjetividade. O sujeito é
objetivado por práticas institucionais, pois
é regulado e normatizado a partir dos modos de funcionamento das instituições. O
processo de subjetivação se refere à forma pela qual o sujeito apropria tais experiências (Foucault, 2009). As entrevistas
mostram que os lugares ocupados pelas
mulheres criminosas são construídos a
partir do conflito de conciliar os relacionamentos amorosos, familiares e o trabalho. Fora dos muros prisionais, os lugares
ocupados não se restringem ao espaço
privado do lar, mas são lugares marcados
por estigmas sociais de gênero. Na prisão,
elas ocupam o lugar máximo de privação,
abandono, exclusão e humilhação social.
Sobre as perspectivas para a vida pós-encarceramento, algumas mulheres não
vêem possibilidade de construir seu lugar no mundo fora da ilegalidade. Outras
cogitam a possibilidade de “sair da vida
do crime”, mesmo que isto signifique o
exercício de menos poder social. Dentro
79
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
da prisão, alguns fenômenos conferem
mais poder como a homossexualidade, o
trabalho devido ao bom comportamento
e o tipo de crime cometido. Fora da prisão, “ser mulher de traficante”, estar envolvida no tráfico de drogas e exercer a
maternidade são posições de prestígio no
grupo social das encarceradas. O papel da
instituição prisional é de promover atividades em que a mulher esteja adequada
aos papéis domésticos. Dentre as atividades e medidas tomadas, encontramos
atividades de artesanato, dinâmicas feitas
por religiosos que incentivam a afetividade e impedimentos para visitas íntimas
com os parceiros, por exemplo. Por fim,
as mulheres entrevistadas, marginalizadas economicamente, constroem seus lugares ora se colocando como vítimas, ora
como protagonistas das relações sociais,
buscando sempre maior exercício do poder. Esse poder pode ser exercido de forma explícita, pela violência ou de maneira
implícita, camuflada, constrangida.
Palavras-chave: criminalidade, mulheres,
lugares sociais
Contato: Carolina Ferreira Barbosa, UFF,
[email protected]ff.br / [email protected]
LT07-1414 - VIOLÊNCIA E
DESENVOLVIMENTO SUBJETIVO EM
RELAÇÃO HOMOAFETIVA FEMININA
Carlos Felipe de Freitas Rossi - UNICESP
O conceito de família tem sido utilizado
para dar referência à unidade de reprodução biológica e social, criada por laços
consangüíneos ou de aliança, instituído
pelo casamento e/ou pelas uniões consensuais, por vínculo de descendência
entre pais e filhos – biológicos ou não, in80
cluindo, os adotivos – e por laços de consangüinidade entre irmãos. (DURHAM,
1983; LÉVI-STRAUSS, 1986 apud ROMANELLI, 2003, p. 249). Nos dias atuais, é
inegável que as constituições familiares
estão em crise. Um desequilíbrio que não
pode ser considerado patológico, mas sim
um rearranjo frente às novas proposições
e atuais condições históricas e sócio-econômicas (ROMANELLI, 2000). A conhecida
família nuclear, composta por pai, mãe e
filhos, deixa de ser o modelo comum e vigente no arcabouço social para dar lugar
a instituições familiares de diversas constituições e dinâmicas de funcionamento
(NEVES, 2006), como famílias constituídas
por marido, esposa e filhos; aquelas constituídas por uniões estáveis, onde o enlace
matrimonial jurídico não existe; famílias
matrifocais chefiadas por mulheres, compostas por mães e filhos; famílias ampliadas agregando parentes do lado materno
e/ou paterno; famílias recompostas, as
quais um parceiro ou ambos já possui ou
possuem filhos de união anterior e também famílias compostas por casais homoafetivas. No âmbito das relações homoafetivas, de acordo com o senso comum, os
casais formados por homens possuiriam
um grande número de parceiros e seriam
infiéis ou inconstantes, não raro com histórico de violência entre os parceiros. Já
nos casais do sexo feminino, por vários
fatores, entre eles os fisiológicos, as mulheres supostamente baseariam suas relações no afeto, respeito, cumplicidade
e instinto materno, sendo isentadas da
violência relacional. Entretanto, em qualquer relacionamento, hetero ou homoafetivo, masculino ou feminino, existem casos de violência real, física e/ou simbólica
que constituem fatores que determinam
o curso do desenvolvimento da subjetivi-
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
dade destes atores (ARIÉS, 1981). O objeto deste trabalho é apresentar um estudo
de caso sobre violência entre um casal
homoafetivo do sexo feminino. O fato das
uniões estáveis entre pessoas do mesmo
sexo ainda não serem plenamente reconhecidas, ainda que já legalizadas, pode
fazer com que casais vivam à margem
da sociedade e com que o preconceito e
a falta de informações de parcela da sociedade incitem estes membros a permanecerem escondidos como casais, muitas
vezes, obturando violências. O caso em
foco é o de Vitória (V), residente de uma
capital brasileira, sexo feminino, 38 anos
de idade, divorciada, desempregada, sem
filhos. Caçula de três irmãs, aos 18 anos
perdeu o pai e até seus 23 anos não pode
casar-se, pois cuidava da mãe. Seis meses
depois do falecimento da genitora, após
7 anos de namoro, casou-se com José (J),
negro, 5 anos mais velho que ela, com
quem viveu junto por 9 anos. Segundo
seu relato, nunca precisou (não lhe foi
permitido) trabalhar, pois J era muito ciumento e não me deixava sair de casa para
trabalhar ou estudar (sic). Ainda casada,
conheceu Maria (M), 63 anos, funcionária
pública aposentada, de alto poder aquisitivo, integrante de um círculo de amigas
homossexuais, todas com elevado poder
sócio-econômico. M incitou V a separar-se de J e, apesar da diferença de idade,
mantiveram um relacionamento estável
durante 6 anos, morando na casa de M.
V relatou que, durante o relacionamento, M a tratava com desdém, utilizado
expressões ofensivas e menosprezando
todo esforço de desenvolvimento pessoal e/ou profissional: você é um resto de
preto, não sabe fazer nada direito (sic).
À semelhança de J, M afirmava que V
não precisava trabalhar ou estudar, pois
caberia àquela sustentá-la na união. Era
tratada como inferior e incapaz de prover
suas próprias necessidades. Você é burra,
pobre, incompetente e incapaz de aprender qualquer coisa [...] ela tem 3 carros,
eu tinha que andar de ônibus porque ela
não me deixava pegar nenhum. Era eu
que dirigia sempre, mas só podia dirigir se
fosse pra sair com ela do lado (sic). A despeito do cenário de violência, V não tentou estudar ou trabalhar por acreditar-se
incapaz para qualquer atividade exceto as
obrigações de casa. Os atos de violência a
que era exposta apareceram como inibidores da construção de seu autoconceito
e tornar-se sujeito em desenvolvimento
constituía um desafio quase impossível
e desnecessário, desvelando o quanto
M subtraia qualidades e capacidades de
V, mantendo uma relação de dominação, de provedora e detentora da razão.
O relacionamento ruiu. Com o término
da relação, V procurou ajuda psicológica.
Encontrava-se em estado de sofrimento
profundo, queixando-se de depressão,
falta de vontade de viver e sensação de
culpa, além da preocupação do que os outros vão pensar de mim por ter terminado
com ela (sic). Por ser constituída através
das relações sociais, a subjetividade é entendida como uma realidade do ser humano; como um sistema de significações
e sentidos constituídos nas relações que
o indivíduo estabelece em seus mais variados estágios de desenvolvimento (REY,
1999). Qualquer forma de violência pode
modificar, interferir, inibir, prejudicar ou
até evitar o processo de desenvolvimento da subjetividade, que está inserida
em um contexto histórico sócio-cultural
único; o sujeito se torna um ente datado,
histórico. V busca a psicoterapia e inicia a
ressignificação de ser e estar no mundo.
81
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
No processo, começa a compreender que
a construção subjetiva é um dado social
e que cada parceiro tem seu objetivo na
trama relacional. A descoberta de seu
valor e papel social tem possibilitado o
enfrentamento da posição autocrática e
final do outro. Paulatinamente, vem superando dificuldades, estigmas e infantilização a ela imputados. V terminou seu
curso técnico, planeja cursar um curso superior e aguarda ser contratada por uma
empresa onde já estagia. A violência pode
engendrar formas limitadoras do desenvolvimento subjetivo e da constituição do
sujeito como pessoa. Quando velada, não
deixa marcas visíveis no corpo da vítima,
mas apresenta severas seqüelas no aparelho psíquico, podendo agravar-se, descambar-se para somatização de sintomas
ou para o processo de violência física com
efeito em cascata. Por estarem “fora dos
padrões sociais”, muitos casos de violência em casais homoafetivos não são notificados, pela dificuldade de apresentar
provas da violência simbólica. Nas agressões físicas, a vítima passa pelo constrangimento exigido pela burocracia legal de
abertura de inquérito e buscas de provas
para as investigações. Mais um golpe de
violência é desferido contra a vítima, que
poderá sentir-se envergonhada, exposta,
humilhada, quando almejava proteger-se
através dos métodos legais. Submeter-se,
paradoxalmente, configura ato de proteção. Este estudo mostra que a violência e
a opressão, embora sirvam de elemento
limitador do desenvolvimento, dialeticamente podem forjar sua superação e
engendrar papel catalizador no desenvolvimento, como no caso de V., realçando
capacidades e potencialidades.
82
LT01-853 - A CRIMINALIDADE
COMO RECURSO PARA A SAÍDA DA
INVISIBILIDADE FEMININA
Mariana Barcinski - PUC/RS
[email protected]
O ingresso de jovens de camadas mais
pobres brasileiras na rede do tráfico de
drogas como estratégia de fuga da invisibilidade social e da falta do sentimento de
pertença que marcam suas vidas tem sido
discutido na literatura (Cruz Neto, Moreira,
& Sucena, 2001; Pereira, 2009). Excluídos
de um sistema social que não reconhece
sua existência no cotidiano ou em suas
necessidades básicas de proteção, educação e trabalho, esses jovens optariam por
atividades criminosas para se tornarem
visíveis. Causar medo nas pessoas, através
da associação com facções criminosas e da
ostentação de armas ou tornar-se parte
das estatísticas acerca da violência urbana
são formas de adquirir visibilidade, mesmo
que carregada de conotações e sentimentos negativos que, em última instância,
servem para aprofundar a realidade de
exclusão social experimentada por esses
jovens. Quando tratamos da participação
feminina no tráfico de drogas, a questão
da invisibilidade como motivadora de comportamentos criminosos ganha contornos
peculiares. Como o tráfico é, indiscutivelmente, reconhecido como uma atividade
masculina, participar dele dá às mulheres
traficantes a possibilidade de se distinguir
de outras mulheres. Elas se tornam visíveis
(diferentes de outras) ao desempenharem
tarefas reconhecidas como masculinas. A
saída da invisibilidade, no caso das mulheres envolvidas no tráfico, portanto, se dá
primordialmente pela diferenciação, pela
afirmação de um poder antes exclusivo
dos homens e pelo reconhecimento exter-
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
no deste poder. O objetivo deste trabalho,
portanto, é compreender como mulheres
traficantes definem a sua participação na
rede do tráfico de drogas e de que forma
a descrição desta participação – desde a
motivação para a entrada até os papéis desempenhados na atividade – está permeada pela tentativa de saída da invisibilidade
que marca determinado grupo socialmente marginalizado, especialmente as mulheres que o compõem. O engajamento
de mulheres em atividades criminosas,
notadamente no tráfico de drogas, é descrito de maneira geral na literatura como
subordinado à participação dos homens
nessas mesmas atividades. Sem ignorar o
fato de que parecem, de fato, ser os homens os maiores motivadores para a entrada das mulheres na rede do tráfico de
drogas (Zaluar, 1993), a ênfase quase que
exclusiva na criminalidade feminina como
decorrente de suas relações afetivas retira
o protagonismo e reforça a invisibilidade
feminina na prática de crimes violentos e
atividades ilícitas. Ao ignorar as especificidades dos crimes cometidos por mulheres,
a própria literatura atesta ou reforça a invisibilidade feminina no que se refere aos
fenômenos sociais da violência e da transgressão. A partir de uma perspectiva de
gênero podemos compreender que, para
além da reduzida relevância social atribuída à criminalidade feminina, a ausência
de estudos sobre mulheres envolvidas em
atividades criminosas se deve também ao
fato de a violência, da agressividade e da
transgressão não estarem previstas nos
discursos acerca do feminino. As explicações tradicionais para a diferença entre
as taxas de criminalidade feminina e masculina baseiam-se na imagem da mulher
como naturalmente dócil, passiva e menos
suscetível à prática de comportamentos
violentos (Walker, 2003). Sob esta mesma
perspectiva, Goetting (1988) sugere que a
falta de atenção em relação aos crimes femininos se deve, em grande parte, ao fato
de as expectativas sociais sobre os papéis
desempenhados pelas mulheres legitimarem a posição das mesmas como vítimas,
mas nunca como perpetradoras de violência. Além das características associadas
ao feminino servirem teoricamente como
elementos protetivos à prática criminosa,
a socialização feminina, com sua ênfase no
espaço privado como domínio privilegiado
de atuação das mulheres, seria a origem
da participação subalterna das mulheres
em atividades ilícitas e da característica
não violenta dos crimes femininos. A invisibilidade das mulheres nas teorias acerca
da criminalidade seria, então, justificada
pelo caráter atípico dos crimes por elas
cometidos. Através da análise discursiva
sistêmica (Falmagne, 2004) de entrevistas
com duas mulheres com uma história passada de envolvimento no tráfico de drogas,
o presente trabalho discute a forma como
o envolvimento das participantes na atividade representou uma estratégia de saída
da invisibilidade que marca a existência
de mulheres nas favelas. Através do desempenho de tarefas reconhecidamente
masculinas, como carregar armas, entrar
em confrontos armados com a polícia e
com facções criminosas rivais e gerenciar
pontos de venda de drogas em suas comunidades, tais mulheres marcaram uma
distância significativa em relação a outras
mulheres ao seu redor. Tal diferenciação,
e especialmente o reconhecimento social
do caráter atípico de suas atividades como
traficantes, representou na história de vida
dessas duas mulheres a saída (mesmo que
temporária) da invisibilidade feminina na
favela. Os dados analisados no presente
83
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
trabalho refletirão as especificidades da
participação feminina no tráfico de drogas
e a forma como as mulheres traficantes
constroem esta participação primordialmente em oposição a outras mulheres
ao seu redor. As referências ao poder e
ao status adquiridos como traficantes ganham significado especial quando tratadas
sob uma perspectiva de gênero, se entendermos a violência e a transgressão como
prerrogativas masculinas. O discurso das
participantes, portanto, reflete o investimento das mesmas em constituírem as
suas identidades através da marcação de
elementos que distinguem as suas trajetórias (e o reconhecimento externo desta
distinção) da história de outras mulheres,
em geral.
Palavras-chave: gênero, criminalidade,
invisibilidade social.
LT01-980 – RELAÇÕES DE PODER E
GÊNERO NO MUNDO DO TRABALHO:
APORTES TEÓRICO-CONCEITUAIS2
Vânia Maria Lopes Venâncio - UnB
[email protected]
Maria Helena Fávero - UnB
[email protected]
O filme O Diabo veste Prada (2006), da
obra de Lauren Weisberger (2003), explora o mundo do trabalho de uma revista de
moda liderado por uma mulher autoritária, ambiciosa e de uma ética singular no
trato das pessoas e dos negócios. Quais
aspectos deste filme podem contribuir
2
Este estudo foi desenvolvido no âmbito da disciplina Psicologia do Desenvolvimento Adulto, do Programa de Pós-Graduação em Processo de Desenvolvimento Humano
e Saúde, da Universidade de Brasília, sob a docência da
Profa. Dra. Maria Helena Fávero.
84
para a análise dos estudos sobre trabalho,
poder e gênero, sob a ótica da psicologia
do desenvolvimento? Primeiro ele revela
e desvela as especificidades da atividade
laboral e seus aspectos psicossociais: grupos, organizações e comunidades em situações do dia-a-dia, sem separar indivíduo
e coletividade, afeto e razão, processos
inconscientes e processos sociais. O seu
enredo explicita duas questões centrais
para este trabalho: o tácito e o explícito
nas relações de poder dentro de uma organização, que Fávero (2010) discute como
políticas organizacionais e que dizem respeito ao processo cotidiano por meio do
qual as abstrações sobre poder e organização são vividas e ainda os processos mascarados destas políticas, nas quais estão
implicadas os processos gendrados e são
intimamente relacionadas à masculinidade competitiva que age nos meios de trabalho. Tais questões inspiraram o presente
trabalho que analisa artigos publicados em
periódicos nacionais sobre as relações de
poder e gênero no mundo do trabalho.
Consultamos as bases de dados do Scientific Electronic Library Online (Scielo) e do
Periódicos Eletrônicos em Psicologia (PePsic). Elegemos os seguintes critérios: (a) a
articulação entre os descritores trabalho,
poder e gênero em todos os índices e em
pares; b) sem demarcação de período e de
tempo e (c) autoria de pesquisador brasileiro. Encontramos 39 artigos, publicados
em 24 revistas, de 1998 a 2010, sendo 31
do Scielo e 8 do Pepsic. A pesquisa compreendeu três démarches: identificação
pela internet, leitura e análise dos artigos.
Nesta última sistematizamos a análise em
tabelas, como proposto por Fávero e Souza
(2001), nas quais a primeira coluna fornece um contador relativo às referências; a
segunda apresenta a referência completa
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
do estudo; a terceira, o país de origem do
estudo; a quarta identifica o referencial
teórico; a quinta identifica os objetivos
do estudo; a sexta, o método e a sétima,
os principais resultados. Identificamos diferentes abordagens em diferentes áreas
do conhecimento: da Psicologia, da Sociologia, da Educação, da Administração e da
Saúde. Entendemos que tal fato ressalta a
necessidade de uma visão multidisciplinar
na análise da complexa teia de significados
que a articulação dos temas trabalho, poder e gênero suscita, assim como revela a
necessidade de se intensificar a produção
científica sobre esta articulação, ampliando o escopo de grupos sociais, incluindo
diferentes categorias profissionais, considerando a Psicologia do Desenvolvimento do Adulto, que, como ressalta Fávero
(2007), “permaneceu muito tempo como
um espaço vazio entre o desenvolvimento
do adolescente e o do idoso” (p.194). Nossa análise bibliográfica evidenciou que:
a produção científica nacional apresenta
publicações a partir de 1998 e se intensifica a partir de 2007; em sua maioria, os
artigos discutem a tríade trabalho-poder-gênero, articulando os três descritores,
mas prevalecendo a relevância em um dos
temas, com o predomínio do tema trabalho, seguido de gênero e em menor monta
a questão do poder; a complexidade do
mundo do trabalho se revela e se desvela
em relações de poder gendradas que contribuem para condições desiguais entre
trabalhadores e trabalhadoras, como nos
revela a análise de Anzorena (2008); trabalho, poder e gênero também estão configurados de acordo com algumas abordagens
de referência; nas abordagens que tratam
da liderança e gestão, em sentido lato, as
condições materiais da produção aparecem como justificadoras da discriminação
e desigualdade entre mulheres e homens,
agravados quando entram os fatores de
classe social, etnia e raça; a práxis nas organizações e nas relações privadas e públicas apresentam aspectos que corroboram
a tese da situação desigual da mulher nas
esferas sociais, econômicas, políticas e filosóficas; algumas categorias profissionais
foram ressaltadas com base nessa questão, como os profissionais da área de enfermagem; grupos sociais informais foram
sujeitos de vários estudos de casos como
mulheres indígenas, mulheres em situação
prisional e travestis. Temas particulares
também foram evidenciados: as políticas
públicas aparecem no questionamento do
Programa Bolsa Escola, no aparato legal à
questão da violência doméstica, na revisão
dos programas de saúde coletiva e na adequação da legislação trabalhista. Em suma,
os resultados dessa pesquisa bibliográfica
apresentam importantes questões para
reflexão: 1. A necessidade de incremento
teórico-metodológico que fundamente os
estudos para que se considerem efetivamente os temas trabalho, gênero e poder,
tomados articuladamente; 2. Tal incremento deve considerar o aporte da psicologia do desenvolvimento e em particular
da psicologia da vida adulta, considerando
os temas em questão do ponto de vista do
ciclo de vida; 3. Que se assuma o desafio
da Psicologia crítica e reflexiva na consideração do referido aporte, isto é, se considere os chamados vieses culturais e políticos não como um problema metodológico,
mas sim, por meio dos quais se considere
as dinâmicas do gênero (Jill Morawiski,
1997, 2005). Esta é a nossa pretensão em
futuros estudos.
Palavras-chave: trabalho; poder; relações de
gênero.
85
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
LT01-1190 - "OS MENINOS ESTÃO
PRONTOS PARA A MATEMÁTICA";
"OS MENINOS SÃO INTELIGENTES POR
CAUSA DA GENÉTICA? O EMBATE ENTRE
AS ADOLESCENTES, OS ADOLESCENTES E
OS PROFESSORES DE MATEMÁTICA.”
Francisca Zuita Alves Paiva - FAJESU/DF
[email protected]
Maria Helena Fávero - UnB
[email protected].
Embora tenha havido nas últimas décadas
um aumento significativa no número de
mulheres na Educação Básica e no Ensino
Superior, as pesquisa apontam que as mulheres superaram os homens em escolaridade, estão em maior número nas áreas
de humanas e biológicas e os homens estão em maior número nas áreas de exatas. Evidencia-se ainda que esta tendência
se mantém nos cursos de pós-graduação
(Godinho, 2005; Ristoff, 2006; Chamom,
2005). Por isto mesmo, Fávero (2010 a)
enfatiza uma das linhas de pesquisa sobre
a relação entre gênero e socialização, focando a diferença que persiste nos dados
dos estudos nacionais e internacionais
sobre a entrada de mulheres na área de
ciências e de tecnologias em comparação
à entrada e permanência dos homens. Um
dos aspectos ressaltados por esta autora
diz respeito ao ensino de matemática e
a natureza da mediação do conhecimento na instituição escolar. Fávero (2010 b)
defende a tese segundo a qual, a instituição educacional mantém a ideologia do
patriarcado na sua forma contemporânea,
por meio da mediação significados sobre papéis de gênero em articulação aos
significados sobre as diferentes áreas do
conhecimento. Assim, Fávero & Salgado
(2006; 2007) evidenciaram tal articulação tanto nas concepções de estudantes
86
universitários, como nas concepções de
professores e pais de alunos. Os dados
destes estudos foram confirmados em outro estudo desenvolvido em duas fases: 1/
entrevista com professores de matemática que atuam do 6º ao 9º ano do Ensino
Fundamental, todos de uma mesma escola da Rede Particular de Ensino de uma
cidade satélite do DF. As entrevistas foram
semiestruturadas em 4 eixos – o desempenho de alunas e alunos em matemática;
as possíveis explicações para as possíveis
diferenças de desempenho; gênero e área
do conhecimento. 2/ participaram 8 alunos do sexo masculino, entre 14 e 15 anos
de idade, do 9º ano do Ensino Fundamental, todos de uma mesma escola da Rede
Particular de Ensino de uma cidade satélite do DF, a quem propusemos a discussão:
“na opinião de vocês quem se sai melhor
em matemática, os meninos ou as meninas?” A análise da discussão evidenciou
dados contraditórios com os das professoras e professores. Segundo os estudantes:
as meninas são mais inteligentes na matemática; elas são mais maduras; elas estudam mais; aprendem com mais facilidade;
a maioria dos meninos só quer “vadiar”;
os meninos têm ter alguém “empurrando”, senão “a gente não aprende não”.
Para comprovar sua posição o grupo forneceu dados: na sua classe de 35 alunos,
15 do sexo feminino e 20 do sexo masculino, 8 alunas se destacam em matemática
contra 2 alunos. O estudo apontou indícios
sobre o chamado “currículo oculto das escolas”, em referência aos valores sociais
gendrados que permeiam as informações,
os procedimentos e as próprias atividades
escolares e que se constituem em peças
fundamentais da socialização. Ficou evidenciado que os professores e professoras
têm expectativas diferentes para meninos
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
e meninas e isso ainda permanece como
um dado particularmente presente no
caso do ensino da matemática (Paiva e Fávero, 2010). E as meninas o que será que
pensam sobre estas expectativas? Para
responder a esta questão desenvolvemos
o presente estudo, que se focou nesta
questão por meio da discussão entre adolescentes do sexo feminino. Constituímos
quatro grupos focais: dois de seis alunas
de sexto ano cada (um de uma escola da
Rede de Ensino Público do DF e outro de
uma escola da Rede Particular de Ensino
do DF); e dois grupos de seis alunas do 3º
ano do ensino médio cada (um de uma
escola da Rede de Ensino Público do DF e
outro de uma escola da Rede Particular de
Ensino do DF). A todos os grupos foi proposto para discussão duas frases obtidas
de estudo anterior prescrito acima. A primeira foi obtida junto a professores e professoras de matemática da Rede Particular de Ensino do DF: “As meninas vão bem
em matemática porque se esforçam; os
meninos estão prontos para o raciocínio
matemático”. A segunda foi obtida junto
a estudantes do sexo feminino do 9º ano
do Ensino Fundamental de uma escola da
Rede Particular de Ensino do DF: “As meninas são mais inteligentes em matemática; elas são mais maduras; elas estudam
mais; os meninos só querem vadiar”. Cada
frase foi apresentada separadamente, seguida do convite a sua discussão. Após o
término da discussão da primeira frase foi
apresentado a segunda e feito um novo
convite a discussão. Ao término da discussão foi proposto as alunas que relatassem
suas escolhas profissionais. As discussões
nos grupos foram registradas em vídeo e
os atos da fala foram tomados como unidades de análise. Quanto a primeira discussão, os resultados evidenciaram que:
as alunas discordaram dos professores;
acordaram que os alunos do sexo masculino não são melhores em matemática; argumentaram que a sociedade é machista e
desqualificam a inteligência feminina. Ex:
“então eles querem dizer que os meninos
são inteligentes por causa da genética? A
inteligência dos meninos está no DNA?”.
Os resultados da segunda discussão evidenciaram que: as alunas acordaram que
os alunos não são bons em matemática
porque eles só pensam em “curtir a vida
e deixam os estudos para depois; os meninos só pensam em som”; alegaram que
apesar disto, os homens ocupam melhores posições no mercado de trabalho com
melhores salários: “às vezes as mulheres
fazem o mesmo trabalho do homem, mas
recebem um salário menor”. Quanto as
suas escolhas profissionais evidenciou-se
a opção prioritária por áreas de humanas
tais como: Nutrição, Educação, Medicina,
Biologia, Arquitetura e outras. Podemos
dizer que nossos dados apresentam uma
questão particular que necessita de novos
estudos: apesar de partilharem a concepção de que os alunos do sexo masculino
não são melhores em matemática, as adolescentes declaram opções profissionais
por áreas tidas como próprias aos papéis
femininos. Assim concluímos sobre a necessidade, como outras autoras já salientaram (Abramo, 2004; Anzorena, 2008;
Arnot, 2006; Fávero, 2010 a; 2010 b). de
se desenvolver pesquisas que fundamentem ações para promover a mudança nas
concepções sobre a relação entre gênero
e capacidade intelectual e a relação entre
gênero e escolha profissional.
Palavras-chave: gênero, ciência e matemática;
concepções sobre a matemática; escolarização
e socialização gendradas.
87
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
DIA 13/11 - Domingo
10h30-12h
MR LT06 - Mesa Redonda
Convidada
MR LT06-973 - DESCRIÇÃO E AVALIAÇÃO
DE UMA CAPACITAÇÃO PARA
PROFISSIONAIS DA REDE DE PROTEÇÃO
À INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA NO
INTERIOR DO RS
Normanda Araujo de Morais - UFRGS
[email protected]
O objetivo desta Mesa Redonda é descrever e avaliar o processo de implantação
de uma tecnologia social, proposta pelo
Programa de Apoio a Núcleos de Excelência – PRONEX, realizado em um município
do noroeste do RS. Trata-se de um projeto de pesquisa multicêntrica, realizada
com a parceria de 10 Universidades, que
tem como objetivo implementar e avaliar
uma proposta de capacitação de profissionais das áreas da saúde, da educação
e da rede de proteção de crianças e adolescentes nas seguintes temáticas: direitos humanos, violência e mediação de
conflitos. O processo de capacitação teve
a duração de 30 horas e trabalhou os seguintes temas: direitos das crianças e de
adolescentes, mulheres e minorias étnicas e sociais; maus-tratos contra crianças;
consequências psicológicas da violência;
fatores de risco e de proteção; resiliência;
comportamento infrator; uso de drogas
na adolescência e mediação de conflitos.
Além disso, ao final, os participantes mon88
taram um projeto de intervenção a ser
implantado nos seus locais de atuação, a
partir das demandas percebidas no seu
cotidiano. A capacitação foi realizada com
base em aulas expositivas dialogadas, trabalhos em grupos e discussão de filmes.
Além disso, contou com a realização de
um pré-teste, avaliação de cada módulo
(Direitos Humanos, Violência e Mediação
de Conflitos) e um pós-teste, ao final dos
três módulos da capacitação. Os trabalhos
que serão apresentados dizem respeito
aos dados quantitativos do pré-teste e aos
dados qualitativos obtidos nos diários de
campo da equipe que participou da primeira edição do Pronex. A mesa será composta de três trabalhos. O primeiro deles
buscará descrever a capacitação que foi
realizada (organização dos temas, cronograma, caracterização dos participantes),
assim como apresentar os primeiros dados qualitativos que resultaram da mesma (impressões da equipe sobre o envolvimento dos participantes, temas centrais,
fragilidades identificadas na rede, etc). O
segundo trabalho buscará descrever os
índices de esgotamento profissional e de
bem-estar no trabalho, apontados pelos
participantes no momento do pré-teste.
Por fim, o terceiro trabalho buscará apresentar, também com base em dados quantitativos do pré-teste, os principais valores
que têm embasado a prática desses profissionais, bem como a sua percepção sobre como se sentem desde que começaram a trabalhar com essa população. Os
dados aqui avaliados dizem respeito aos
30 participantes que responderam ao pré-teste, sendo a maioria do sexo feminino
(n=28; 93,3%) e com média de idade de 38
anos (DP=10,93). A apresentação do conjunto de trabalhos permite estabelecer os
pontos centrais dessa primeira edição do
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
PRONEX, quais sejam: a relevância de propostas de capacitações como essa, especialmente, para trabalhadores do interior
do estado, para quem o acesso a cursos e
capacitações é mais limitado; a relevância
das estratégias de avaliação do impacto
e do processo da tecnologia proposta; e,
por fim, o importante papel multiplicador
que estratégias desse tipo podem ter, ao
criarem um espaço nos quais os profissionais da rede local podem se encontrar,
discutir temas relevantes ao seu cotidiano
e identificar estratégias que venham a fortalecer a rede.
DESCREVENDO A CAPACITAÇÃO PARA
PROFISSIONAIS DA REDE DE PROTEÇÃO
À INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA NO
INTERIOR DO RS
Jeane Lessinger Borges - SETREM
[email protected]
Normanda Araujo de Morais - UFRGS
[email protected]
Trata-se de um recorte de um projeto de
pesquisa multicêntrica, sobre a efetividade
de uma tecnologia social junto a 1.200 profissionais da rede de proteção no estado
do Rio Grande do Sul (RS), realizado através do Programa de Apoio a Núcleos de Excelência (PRONEX). O objetivo da pesquisa
mais ampla é o de capacitar profissionais
das áreas da saúde, da educação e da rede
de proteção de crianças e adolescentes
para a identificação de indicadores de violência, futuros encaminhamentos e acesso
à rede de atendimento, bem como avaliar
o impacto e o processo da capacitação.
Visa-se que, ao final da intervenção, os
participantes possam instrumentalizar-se
e serem multiplicadores dos conhecimentos adquiridos e da vivência desenvolvida
ao longo dos módulos de trabalho. Este
trabalho busca descrever dados iniciais,
referentes a uma proposta de intervenção
junto a uma amostra de 30 profissionais da
rede de proteção às crianças e adolescentes vítimas de violência da Região Noroeste do RS. Especificamente, busca-se com
esse trabalho: descrever a capacitação
realizada nessa primeira etapa do PRONEX
e apresentar dados qualitativos acerca do
processo de avaliação da mesma. A intervenção foi planejada a partir de três módulos, os quais contemplam os temas dos
direitos de crianças e adolescentes, mulheres e minorias étnicas e sociais (6 horas);
maus-tratos contra crianças, consequências da violência, fatores de risco e de proteção, resiliência, comportamento infrator
e uso de drogas na adolescência (16 horas); bem como mediação de conflitos (4
horas). Além disso, um turno de trabalho
(4 horas) foi dedicado à montagem de um
projeto de intervenção pelos participantes, a partir das demandas percebidas no
seu cotidiano. A intervenção totalizou 30
horas, e buscou-se avaliar a efetividade
desta através de um levantamento pré e
pós-teste. Além disso, foram adotados diários de campo para o registro de dados
qualitativos, os quais foram elaborados
pela equipe de psicólogas palestrantes e
bolsistas de iniciação científica. Os participantes são, predominantemente, do sexo
feminino (93,3%), sendo que 40% têm ensino superior completo e 46,7% têm pós-graduação. A idade média da amostra era
de 38 anos (DP=10,93). Os participantes
desta amostra incluem profissionais da
Psicologia (30%), do Serviço Social (23,3%),
da Enfermagem (26,7%) e da Educação
(15,3%), representantes de cinco municípios da referida região. A renda mensal
variava de R$ 600,00 a 5.000,00 (M = R$
89
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
2.004,90 reais). O principal vínculo de trabalho foi celetista e concursado (ambos
com 26,7%; n = 8), seguido de estatutário
(13,3%; n = 7). O tempo médio de trabalho
na ocupação atual variava entre 1 mês e 30
anos (M = 7,3 anos) e o tempo médio de
atuação profissional com o fenômeno da
violência contra criança era de 4 anos (DP=
4,0). Em relação aos dados qualitativos, os
resultados preliminares desta intervenção
apontam: (a) a satisfação dos participantes com os temas abordados, sobretudo,
com temáticas como resiliência e Psicologia Positiva, vistos pela primeira vez pela
maioria deles; (b) a grande participação e
motivação dos presentes no processo de
capacitação; (c) a oportunidade criada na
capacitação da rede local de proteção ser
avaliada e discutida, inclusive, apontando
suas fragilidades. Dessa forma, ficou visível
a falta de uma rede de proteção articulada,
ou seja, observou-se a existência de vários
serviços da rede de proteção na cidade,
porém, com atuações individualizadas;
(d) predomínio de encaminhamentos da
rede para os serviços de assistência social especializados (por exemplo, CREASs),
como sendo o serviço de referência para
as situações de violência contra a criança;
(e) a alta rotatividade dos profissionais nos
serviços da rede, sendo que os participantes demonstraram perceber a perda do
vínculo do usuário com a equipe e com o
profissional como sendo uma dificuldade
no trabalho cotidiano em seus serviços de
origem; e (f) a necessidade de formação
permanente para os profissionais que atuam na rede de proteção. Os dados apontaram, ainda, que a capacitação possibilitou
um momento para a elaboração de projetos de intervenção sobre diferentes temas,
envolvendo infância e adolescência em
situação de vulnerabilidade psicossocial
90
e o fortalecimento do trabalho em rede.
Verificou-se que tais projetos abordaram
tanto intervenções primárias quanto terciárias junto às crianças e suas famílias, a
partir de um viés interdisciplinar. Nesse
sentido, de um modo geral, os resultados
encontrados nesta etapa inicial do PRONEX contemplam os objetivos da proposta
mais ampla desta pesquisa. O recorte proposto neste trabalho problematiza o trabalho que vem sendo desenvolvido na rede
de proteção à criança vítima de violência,
apontando suas lacunas e possibilidades,
num grupo de profissionais do interior do
RS. Os resultados encontrados podem oferecer subsídios para políticas públicas no
atendimento a crianças e suas famílias expostas a situações de violência. Além disso, aponta-se a necessidade de uma maior
articulação entre os serviços da rede de
proteção, em prol de uma maior integralidade das ações e de um atendimento mais
humanizado.
Palavras-chave: rede de proteção, criança e
adolescente, capacitação.
NÍVEIS DE BEM-ESTAR E SÍNDROME
DE BURNOUT EM PROFISSIONAIS
DA REDE DE PROTEÇÃO A CRIANÇA E
ADOLESCENTE DO INTERIOR DO RIO
GRANDE DO SUL
Juliana das Neves Nóbrega - UFRGS
[email protected]
Clarissa Pinto Pizarro de Freitas - UFRGS
[email protected]
Normanda Araujo de Morais - UFRGS
[email protected]
Bruno Figueiredo Damásio - UFRGS
[email protected]
Silvia Helena Koller - UFRGS
[email protected]
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
Este trabalho é um recorte do projeto
“Avaliação de uma tecnologia social aplicada para a capacitação de profissionais
da área da educação, saúde e da rede de
proteção a crianças e adolescentes sobre
direitos humanos, violência e mediação de
conflitos”, o qual foi direcionado aos profissionais da rede de proteção à criança e
ao adolescente, do estado do Rio Grande
do Sul. Discutir-se-ão dados referentes à
primeira etapa da capacitação, com profissionais de cinco municípios da região noroeste do Rio Grande do Sul. A satisfação
que as pessoas têm com o seu trabalho
pode ser explicada, em parte, pelos seus
níveis de bem-estar no trabalho, sendo
tal indicador uma importante ferramenta
para avaliar o desempenho ocupacional
e o comprometimento organizacional. O
bem-estar é um construto amplo, o qual
tem sido associado à felicidade, satisfação,
afetos positivos e avaliação subjetiva de
qualidade de vida. Quando vinculado ao
trabalho, o bem-estar torna-se útil à medida que expõe a não equivalência entre
a satisfação e insatisfação, demonstrando
que uma não está diretamente vinculada à
outra. Associado à insatisfação no ambiente ocupacional, identifica-se o burnout, ou
síndrome do esgotamento profissional.
Essa se caracteriza, entre outras coisas,
pela predominância de sintomas emocionais disfóricos; de sintomas psicológicos e
comportamentais, em detrimento de sintomas físicos; e diminuição gradativa no
rendimento ocupacional. Apesar de não
haver consenso na definição de burnout,
existe uma significativa concordância em
relação às dimensões que a constituem.
São elas: exaustão emocional, despersonalização e baixa realização pessoal no
trabalho. Considerando o exposto, o objetivo desse estudo foi analisar o nível de
bem-estar e síndrome de burnout em profissionais da rede de proteção à criança e
ao adolescente, de cinco municípios do
interior do Rio Grande do Sul. Participaram
30 profissionais, dos quais 28 mulheres e
dois homens. A média de idade foi de 38
anos (DP= 10,9). A maioria era de religião
católica (n=24; 80%), possuía nível superior
(n=14; 46,7%) ou algum tipo de pós-graduação (n=12; 40%). A área predominante de
formação foi a Psicologia (n=9; 30%), seguida pelo Serviço Social (n=8; 26,7%) e pela
Enfermagem (n=5; 16,7%), e a renda mensal variou de R$ 600,00 a 5.000,00 (M = R$
2.004,90 reais). Quanto ao vínculo de trabalho, os principais foram celetistas e concursados (ambos os grupos com 26,7%; n =
8), seguido de estatutários (13,3%; n = 7).
O tempo médio de trabalho na ocupação
atual variou de 1 mês a 30 anos (M = 7,3
anos). Os instrumentos utilizados foram a
Escala de Bem-estar Afetivo no Trabalho
e Maslach Burnout Inventory (MBI). A primeira avalia os níveis de bem-estar no trabalho, por meio da subescala de afetos positivos e da subescala de afetos negativos; o
MBI investiga os níveis de burnout através
das três escalas: exaustão emocional, despersonalização e realização profissional.
Os dados foram analisados por meio de estatísticas descritivas e da correlação de Pearson. Os valores do alpha de cronbach (α)
da Escala de Bem-estar Afetivo no Trabalho
na subescala de afetos positivos foi α=0.86
e na subescala de afetos negativos foi α =
0.86. Os valores do α do MBI para o fator
exaustão emocional foi α = 0.79, para o fator despersonalização α = 0,25 e para baixa
realização pessoal no trabalho α = 0,72 indicando, em geral, uma consistência interna significativa. Os resultados encontrados
na Escala de Bem-estar Afetivo no Trabalho
indicaram que os profissionais apresentam
91
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
uma relação positiva com o trabalho. Isso
pode ser notado na média ponderada da
subescala de afetos positivos M = 4,43 (DP
= 0,41); complementando essa percepção,
a média ponderada da subescala de afetos
negativos foi de 2,50 (DP = 0,88). No MBI,
a média ponderada para o nível de exaustão emocional foi de 2,08 (DP = 0,48), para
despersonalização foi de 1,53 (DP = 0,43)
e de baixa realização profissional foi de
1,79 (DP = 0,41). Os achados indicam que
os profissionais apresentam baixos níveis
de burnout. As análises de correlação de
Pearson indicaram que as dimensões afeto negativo da Escala de Bem-estar Afetivo
no Trabalho está positivamente relacionada às dimensões de exaustão emocional
(r=0,71; p=0,001) e baixa realização no
trabalho (r=0,54; p=0,002) do MBI. Com
relação ao afeto positivo da Escala de
Bem-estar Afetivo no Trabalho, observou-se que o mesmo está negativamente relacionado às dimensões de exaustão emocional (r=-0,53; p=0,003) e baixa realização
(r=-0,59; p=0,001) no trabalho do MBI. No
que se refere à dimensão de despersonalização do MBI, essa não está significativamente relacionada com a Escala de Bem-estar Afetivo no Trabalho. As correlações
demonstraram que os dois instrumentos
foram adequados para acessar os aspectos
constituintes da relação dos profissionais
com o próprio trabalho. Neste sentido,
pode-se inferir que os profissionais que se
disponibilizaram a participar da primeira
etapa da capacitação apresentavam relações positivas com o trabalho por eles
desenvolvido, aspecto corroborado pelos
índices da Escala de Bem-estar Afetivo no
Trabalho e pelo MBI.
Palavras-chave: burnout, bem-estar, rede
proteção
92
PERCEPÇÃO SOBRE VALORES
QUE INFLUENCIAM A PRÁTICA DE
PROFISSIONAIS DA REDE DE PROTEÇÃO
A CRIANÇAS E ADOLESCENTES DO
INTERIOR DO RS
Normanda Araujo de Morais - UFRGS
[email protected]
Juliana das Neves Nóbrega - UFRGS
[email protected]
Clarissa Pinto Pizarro de Freitas - UFRGS
[email protected]
Bruno Figueiredo Damásio - UFRGS
[email protected]
Silvia Helena Koller - UFRGS
[email protected]
Este trabalho tem como objetivo avaliar os
principais valores que embasam a prática
de profissionais da rede de atendimento a
crianças e adolescentes do interior do Rio
Grande do Sul, assim como as percepções
destes profissionais, sobre como têm se
sentido desde que começaram a trabalhar
com essa população. Esses profissionais
(n=30) participaram da Capacitação promovida pelas Universidades Federal do
Rio Grande do Sul (UFRGS) e pela Faculdade Três de Maio (SETREM) acerca das
temáticas de direitos humanos, violência
e mediação de conflitos, com duração de
30 horas. No início das atividades, os profissionais responderam a um questionário
de pré-teste, no qual constavam questões
de caracterização sociodemográfica, além
de escalas específicas, sobre esgotamento
profissional, bem-estar no trabalho, valores que fomentam suas práticas e percepções de como se sentem desde que começaram a trabalhar com crianças e adolescentes. Os resultados destas duas últimas
escalas foram analisados para o presente
trabalho. Na escala de valores (seis itens;
alpha = 0,70), o participante deveria apon-
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
tar um valor entre 1 a 5 para avaliar a frequência (nunca a sempre) com que valores familiares, religiosos, institucionais,
do Estatuto da Criança e do Adolescente
(ECA), formação técnica e experiência profissional influenciam a sua prática. Na escala de percepção sobre como se sentem
desde que começaram a trabalhar com
crianças e adolescentes (13 itens; alpha
= 0,89), o participante deveria destacar
numa escala de 1 a 5 (discordo totalmente
a concordo totalmente) o quanto se sente
mais otimista, cansado, feliz, preparado,
pessimista e outros, desde que vem trabalhando nessa área. A amostra foi predominantemente do sexo feminino (n=28;
93,3%) e tinha, em média, 38 anos de idade (DP = 10,93). A maioria declarou-se católica (n=24; 80%) e possuía nível superior
(n=14; 46,7%) ou algum tipo de pós-graduação (n=12; 40%). A área predominante de formação foi Psicologia (n=9; 30%),
seguida por Serviço Social (n=8; 26,7%) e
Enfermagem (n=5; 16,7%) e a renda mensal variou de R$ 600,00 a 5.000,00 (M =
R$ 2.004,90 reais). O principal vínculo de
trabalho foi celetista e concursado (ambos
com 26,7%; n = 8), seguido de estatutário
(13,3%; n = 7). O tempo médio de trabalho
na ocupação atual variou entre 1 mês e
30 anos (M = 7,3 anos). Já o tempo médio
do trabalho com direitos da criança e do
adolescente foi inferior (M = 4 anos; variando de 1 mês a 21 anos). Entre os participantes, a experiência profissional (M =
4,66; DP = 0,55) foi apontada como o item
que mais influencia a prática, seguida pelos demais valores: formação técnica (M =
4,50; DP = 0,78), valores institucionais (M
= 4,17; DP = 0,87), valores familiares (M
= 4,00; DP = 1,2) e valores religiosos (M =
2,87; DP = 1,33). Análises de correlação
envolvendo esses valores e características
sociodemográficas (idade, escolaridade,
tempo médio de trabalho na ocupação
atual, tempo de trabalho com direitos da
criança e renda mensal) mostraram as
seguintes correlações: valores familiares
e idade (r = 0,39; p < 0,05); valores familiares e tempo de trabalho (r = 0,45; p <
0,05); valores religiosos e idade (r = 0,36;
p < 0,05); valores religiosos e tempo de
trabalho (r = 0,46; p < 0,05); valores religiosos e tempo de trabalho com direitos
da criança e do adolescente (r = 0,51; p <
0,01); influência da legislação do ECA com
escolaridade (r = 0,43; p < 0,05) e da legislação do ECA com a renda mensal (r =
0,37; p < 0,05). Ou seja, os valores familiares e religiosos tenderam a ser apontados por profissionais mais velhos e com
mais tempo de trabalho; os valores religiosos também foram mais mencionados
pelo grupo de profissionais que trabalha
há mais tempo com direitos da criança;
e, por fim, os valores do ECA foram mais
mencionados pelo grupo de profissionais
com maior escolaridade e renda. Quando
convidados a avaliarem como se sentiam
desde que começaram a trabalhar com
crianças e adolescentes, os participantes
ressaltaram que: (a) começaram a buscar
conhecimentos que julgavam necessários
(M = 4,52; DP = 0,50); (b) estavam certos
que queriam continuar trabalhando na
área (M = 4,45; DP = 0,63); (c) sentiram
que agregaram conhecimentos que julgavam necessários à atuação (M = 4,38;
DP = 0,56); (d) desenvolveram uma visão
menos preconceituosa da população (M =
4,21; DP = 0,92); e (e) uma visão menos
idealizada desta (M = 4,14; DP = 0,59). Os
itens que obtiveram as menores médias
foram aqueles que expressavam uma visão negativa, dentre eles: sentir-se mais
pessimista (M = 2,10; DP = 0,90), sentir-se
93
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
mais cansado (M = 2,21; DP = 0,98) e sentir-se mais frustrado (M = 2,28; DP = 1,03).
Análises de correlação dos itens dessa
escala com variáveis sociodemográficas
mostraram apenas uma correlação positiva, a saber: o tempo de trabalho com
direitos da criança esteve correlacionado
com o item “sentir-se mais otimista quanto ao sucesso do trabalho” (r = 0,48; p <
0,05). Em síntese, os resultados sugerem
a importância da experiência profissional
na prática cotidiana dos participantes.
Inclusive, eles ressaltam a busca pelo conhecimento na área como um passo que
deram desde que começaram a trabalhar
com a temática de direitos da criança e do
adolescente. Há, ainda, por parte dos participantes, uma visão positiva da sua prática, a qual é relacionada a sentimentos de
felicidade e realização. Ambos os aspectos
(busca de conhecimento técnico, sentimento de felicidade e realização) ficaram
visíveis nos depoimentos e na forma como
se mostraram engajados na capacitação.
Palavras-chave: profissionais, rede de
proteção, infância e adolescência
Contato: Normanda Araujo de Morais, UFRGS,
[email protected]
MR LT02 - Mesa Redonda
Convidada
MR LT02-1503 - VIGOTSKI NA
ATUALIDADE, UMA DISCUSSÃO
TEÓRICO-METODOLÓGICA
A mesa redonda tem por objetivo reunir
especialistas em Vygotsky que trazem uma
perspectiva atual na leitura dos textos e
na prática de pesquisa. A mesa é compos94
ta por Ana Luiza Bustamante Smolka, uma
das pesquisadoras vygotskianas do Brasil
de maior proeminência, com destaque
nos cenários nacional e internacional; pelo
professor Bernd Fichtner, da Universidade
de Siegen na Alemanha, que repensa a
teoria de Vygotsky no contexto da produção das ciências humanas; pela professora
Marta Sforni, pesquisadora ativa na área,
com enfoque na Teoria da Atividade; e,
por fim, Zoia Prestes, tradutora das obras
de Vygotsky que levanta questionamentos
atuais acerca da interpretação da teoria
vygotskiana no Brasil.
VYGOTSKY NA CONTEMPORANEIDADE:
CONTRIBUIÇÕES, INSPIRAÇÕES E
PROVOCAÇÕES
Ana Luiza Bustamante Smolka - UNICAMP
L. S. Vygotsky nos deixou uma obra extensa, densa e inacabada, repleta de intuições fecundas. Ao mesmo tempo em
que nos inspira e nos fornece as bases
de uma consistente sustentação teórico-metodológica, a obra se abre a múltiplas
interpretações. Vygotsky privilegiou em
seus estudos o desenvolvimento cultural
da criança, chamando a atenção para a
história do desenvolvimento cultural do
ser humano. Apontando insistentemente
para a importância de se considerar a história – das funções mentais superiores, da
atividade humana, do desenvolvimento
do gesto de apontar, dos signos, da linguagem, da consciência -, ele argumentava
sobre a constituição social da personalidade individual forjada numa história de relações sociais. Vygotsky dizia que a história do desenvolvimento cultural nos leva,
de cheio, aos problemas da educação.
Suas preocupações se orientavam, assim,
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
para os modos de ensinar, para os modos
de estudar as relações de ensino, e para
os resultados ou efeitos dessas relações.
Em sua perspectiva do desenvolvimento
humano, a educação e o ensino, como o
trabalho do homem sobre o homem, adquiriam fundamental relevância. Buscando compreender como a criança se apropria da cultura, ou como o coletivo cria as
funções mentais superiores na criança, ele
defendia a tese da participação do outro
e dos instrumentos técnicos e semióticos
como constitutivos da emergência de novas formas de atividade humana no curso
da história. Perseguindo essas questões
no campo da Psicologia e da Educação,
Vygotsky não se cansou de levantar e discutir a questão do método. Interessado na
emergência e no engendramento de novas formas de atividade, ele desenvolveu o
que chamou de método instrumental, histórico genético, ou de dupla estimulação,
no estudo das relações desenvolvimento/
aprendizagem/ pensamento/linguagem /
experiência/consciência. Nos últimos anos
de sua vida, chegou a afirmar que “a análise semiótica é o único método adequado para estudar a estrutura do sistema
e o conteúdo da consciência” (Vygotsky,
1996:188). Sua obra plural e “em aberto”
repercute e se desdobra hoje em uma diversidade de tendências. São muitos os
aspectos que demandam aprofundamento. Participando das atuais discussões e
visando a incitar o debate, trago para essa
apresentação fragmentos do material empírico referente a um projeto de pesquisa
em andamento que assume o referencial
em questão e que tem como objetivo a
melhoria do ensino público. A intenção
aqui é problematizar e explorar o potencial teórico, conceitual e analítico de alguns pressupostos e construtos atribuídos
a Vygotsky, em interlocução com outros
autores contemporâneos. Tomando como
foco e lugar de análise as enunciações
dos professores em reuniões de estudo, a
proposta é refletir sobre as possibilidades
de (investigação do) desenvolvimento dos
sujeitos e de desenvolvimento da própria
da atividade de ensinar, considerando as
con(tra)dições da contemporaneidade.
A ABORDAGEM DE VYGOTSKY COMO
PROVOCAÇÃO PARA AS CIÊNCIAS
HUMANAS
Bernd Fichtner - Universidade de Siegen/
Alemanha
Nos últimos vinte anos vivenciamos o colapso e a dissolução de três fronteiras importantes: 1. a fronteira entre o homem e
o animal foi definitivamente desconstruída pelos resultados da pesquisa sobre os
primatas; 2. a fronteira entre organismo e
maquina foi aniquilada pelas pesquisas da
neuro-informática e nanotecnologia; 3. a
fronteira entre o físico e o não físico desapareceu. Com o desaparecimento destas
fronteiras todos os velhos dualismos, com
os quais estávamos compreendendo a realidade, perderam a sua credibilidade, especialmente aqueles fundamentos das
distinções dicotômicas: matéria/espírito,
corpo/mente, indivíduo/sociedade. Neste
contexto, a abordagem histórico-cultural
de Vygotsky é uma provocação irritante
formulando perguntas inúmeras. Quando
nós hoje estamos examinando e analisando as obras de Vygotsky podemos dizer
que ele também nos examina de perto.
Nós mesmos somos o objeto de pesquisa
quando queremos compreender um autor
do passado. Nessas tentativas de compreender o pensamento de Vygotsky constru95
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
ímos sempre conhecimento novo sobre o
nosso presente quer dizer a nossa compreensão da psicologia de desenvolvimento torna-se quase mais transparente nas
suas estruturas, seus contornos, suas
fronteiras e, sobretudo nos seus aspectos
problemáticos. As ciências humanas se esforçam – com maior ou menor êxito – para
conseguir aproximações cada vez mais
precisas à realidade pesquisada. Com essa
lógica as ciências humanas acreditam que
essa realidade na sua essência já é entendida e compreendida. Assim a psicologia
de desenvolvimento pode-se afirmar o
que é desenvolvimento psíquico. A psicologia de desenvolvimento define também
o que é uma criança ou o que é um adolescente. As crianças são pesquisadas há
mais de cem anos. Encontramos uma acumulação impressionante de conhecimento cientifico. Nessa lógica com certeza sabemos hoje mais sobre crianças do que se
sabia na época de Vygotsky. Porém, encontramos aspectos sobre este tema que
ainda não são plenamente compreendidos. Como exemplo podemos questionar
o pouco que realmente se sabe sobre os
adolescentes e suas ligações com as novas
tecnologias de informação e comunicação, a mudança atual de valores morais e
éticos destes adolescentes, etc. Na perspectiva linear da lógica da pesquisa cientifica como aproximação cada vez mais precisa à realidade todos os problemas aparecem resolvíveis. Uma conseqüência disso: a importância dos métodos e da metodologia (metodologia: a avaliação e a
análise do sistema dos métodos a respeito
da sua “objetividade”, de sua “reliabilidade” e sua “validade”). Wanderley Geraldi
(2005) critica esta direção e orientação,
mais ou menos técnica, para os métodos e
para a metodologia com estas palavras:
96
”Nenhum vôo é permitido, exceto aquele
que obedece às regras do que é requerido
para a construção de novos enunciados”.
Uma polícia discursiva (ou, uma polícia
das ciências disciplinares) está pronta
para voltar ao já firmado, ao já previsto,
ao já estatuído, ainda que estivesse lá por
ser dito. E há que fazer isso com rigor.” Sabemos realmente o que é o desenvolvimento de uma criança, de um adolescente
– ou mais geral o que é uma criança, o que
é um adolescente? Nas Arte e Filosofia encontramos que o conhecimento não tem
nem uma acumulação linear nem uma
hierarquização desse conhecimento. Aleijadinho não é mais avançado do que Velásquez e Cézanne não é mais avançado
do que Aleijadinho. Espinosa não é mais
avançado do que Descartes. Nem Hegel
que Descartes. A filosofia e a arte estão
indicando que esta ideia de uma “aproximação a realidade” é uma ilusão. Mas, o
que arte e filosofia realmente têm em comum? Na lógica de uma obra de arte ou
de um conceito fundamental de filosofia
se encontra “a Perspectiva do Novo/o
Ponto de Vista do Novo”. Isso significa ver
e olhar um fenômeno, uma realidade
como se os olhássemos pela primeira vez.
No olhar da filosofia e no olhar da arte, a
realidade nunca é já totalmente compreendida. Ao contrário, ela é indeterminada,
aberta. Nesse sentido uma obra de arte e
um conceito fundamental de filosofia são
sempre pressupostos e tematizam uma
relação formal com a realidade. A relação
com essa realidade ou com esse fenômeno é precisamente e absolutamente determinada pela forma enquanto, que a
realidade, o fenômeno fica aberto e indeterminado. O formal, a representação
possibilita aqui a escolha de uma perspectiva: conceitos teóricos e obras de arte
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
como modelos de um diálogo com a realidade mediando uma relação. “A Perspectiva do Novo/o Ponto de Vista do Novo”
exige aceitar o metafórico no processo de
olhar e de ver, o que significa ver algo
como algo (isso é isto). A metáfora não reflete semelhanças; não apresenta algo
que seja comum entre objetos, como fenômenos e processos; algo que está já
pronto, disponível e preestabelecido. A
metáfora cria e constrói fundamentalmente relações. Metáforas são como crianças:
impressionam o seu ambiente de uma
maneira específica. Elas portam o novo, o
não previsto. Representam enfoques de
relevâncias junto com uma orientação
para o futuro. Como uma criança é uma
promessa de vida, vida que não é preestabelecida em seus passos. Metáforas não
têm só uma função constitutiva na formação cítrica de nossa experiência, mas também para as mudanças, transformações e
reestruturações delas. As fronteiras e limites de uma área preestabelecida de experiências podem ser destruídos, quebrados
e alargados. Uma relação estandardizada
e automatizada pode ser assim rompida.
Muitas obras de Vygotsky se caracterizam
pela confrontação e ruptura com o estabelecido, com o sistema estereotipado,
fechado e fixado. O seu trânsito por e o
interesse pela Arte e Filosofia lhe proporcionaram condições de ter uma visão mais
ampla das questões psicológicas, incorporando contribuições dessas outras áreas
de conhecimento. Encontra-se na abordagem de Vygotsky uma enorme riqueza e
diversidade de temas, passando pela neuropsicologia, pela linguagem, pela educação, nomeadamente quando enfrenta
problemas de deficiências, pelas questões
semióticas do cinema, aliando questões
teóricas e metodológicas, de modo que
acaba por introduzir e apontar caminhos
para todas as ciências humanas. Gostaria
de mostrar como nas obras de Vygotsky a
lógica geral de arte e de filosofia atua concretamente nas disciplinas humanas, sobretudo na psicologia do desenvolvimento. No centro da metodologia vigotskiana
encontra-se o “Método Histórico” ou também o assim chamado “Método Genético” ou “Método Histórico” pelo qual
Vygotsky tematiza o seu pressuposto fundamental: entender cada fenômeno vivo
exige entendê-lo no seu início e também
no processo do seu desenvolvimento. A
este método está incorporado o famoso
lema de Hegel: "O inteiro é sempre o resultado compreendido junto com o processo
de seu desenvolvimento". Este lema foi assumido por Vygotsky como um principio
universal metodológico. Este problema
principal do desenvolvimento foi analisado e pesquisado através de três perspectivas metodológicas: (1) A abordagem de
Vygotsky apresenta uma perspectiva monística, quer dizer, toda separação entre
indivíduo e sociedade, corpo e mente, entre cognição e emoção, entre físico e espírito, entre ações exteriores e ações interiores foram rigorosamente negadas. (2) A
abordagem de Vygotsky apresenta uma
perspectiva holística, que se opõe a qualquer reducionismo, ou seja, processos
complexos não se podem reduzir a processos elementares. Por exemplo, um processo psíquico não se pode explicar reduzindo-o a processos físicos ou químicos.
Segundo Vygotsky se deve encontrar ou
construir unidades de análise que permitam considerar os processos complexos.
(3) A abordagem histórico-cultural apresenta uma perspectiva interdisciplinar ou
multidisciplinar. A base desta perspectiva
são sempre problemas sociais ou proble97
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
mas práticos. Um problema social sempre
tem aspectos diferentes: individuais, psíquicos, culturais materiais etc. Os próprios
especialistas em interdisciplinaridade não
se encontram nos estudiosos ou nos pesquisadores, mas nos práticos, que devem
resolver problemas práticos sempre multidimensionais. Na palestra vou tentar de
concretizar esses aspectos ao respeito da
conceitualização de “desenvolvimento”
na abordagem de Vygotsky.
PESQUISA SOBRE ENSINO,
APRENDIZAGEM E DESENVOLVIMENTO:
CONTRIBUIÇÕES DA TEORIA DA
ATIVIDADE
Marta Sueli de Faria Sforni - UFSC
As discussões acerca do papel da escolarização sobre o desenvolvimento psíquico desencadeadas pela abordagem
Vigotskiana ressaltaram o valor da educação escolar na constituição dos sujeitos. Porém, quando Vygotsky fala de
ensino, não se refere a qualquer ensino,
mas àquele que se “adianta ao desenvolvimento”, ao “bom ensino”, a uma “correta organização da aprendizagem” ou,
ainda, ao “aprendizado adequadamente
organizado” (VYGOTSKY, 2001). Ou seja,
não basta ao indivíduo freqüentar escolas, não lhe basta ter acesso a conceitos
científicos para que seus processos internos de desenvolvimento sejam acionados.
Tal fato suscita dois possíveis problemas
de investigação: O que qualifica um bom
ensino ou uma correta organização da
aprendizagem? Em que sentido a organização do ensino pode influenciar qualitativamente o processo de desenvolvimento?
Davidov (1992) considera que o ensino
que impulsiona o desenvolvimento está li98
gado à fundamentação lógico-psicológica
da estruturação das disciplinas escolares.
Isto é, o conteúdo e os meios didáticos
por meio dos quais o conteúdo é ensinado determinam o tipo de consciência e de
pensamento que se formam nos estudantes. Assim, a organização do ensino não é
um assunto exclusivamente didático, mas
está relacionado também ao potencial de
desenvolvimento psíquico dos estudantes. Nesse sentido, as respostas aos dois
questionamentos, expostos acima, podem
oferecer conhecimentos importantes para
a Didática e para a Psicologia. Mas para se
chegar a tais respostas é necessário encontrar procedimentos de pesquisa que
permitam identificar se uma forma de
organização do ensino tem o potencial de
promover o desenvolvimento dos estudantes. A necessidade de analisar como
têm sido ensinados conceitos científicos
na escola, bem como de identificar condições teórico-metodológicas para a organização do ensino em que a aprendizagem
conceitual contribua para a promoção do
desenvolvimento psíquico (Sforni, 2004),
tem nos acompanhado desde a pesquisa
de doutorado. Atualmente, as pesquisas
que temos realizado conjuntamente com
os membros do Grupo de Pesquisa Ensino,
Aprendizagem e Conteúdo Escolar - UEM,
e com os membros do GEPAPe-USP – Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Atividade
Pedagógica, têm como objetivo “Investigar princípios teórico-metodológicos da
atividade pedagógica, tendo como fundamento a Teoria Histórico-Cultural”. Além
dos estudos de Vygotsky, contamos também com os subsídios da Teoria da Atividade de Leontiev (1983, 2004). Como procedimento metodológico para coleta de
dados, temos organizado “experimentos
didáticos” ou “experimentos formativos”
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
que permitem acompanhar o processo
de aprendizagem dos sujeitos, quando
inseridos em uma situação de ensino organizada de acordo com alguns princípios
teórico-metodológicos que consideramos
favoráveis ao desenvolvimento dos estudantes, sendo que, esses modos de organização do ensino também são objetos de
investigação. Alguns conceitos desenvolvidos por Leontiev (2004) são orientadores
de nossas ações, dentre eles os conceitos
de objetivação e apropriação do conhecimento. Na compreensão dos conhecimentos científicos como instrumentos psicológicos, nos quais estão objetivados processos mentais já alcançados pelo gênero
humano, encontramos valiosos indícios
que podem orientar a tomada de decisões
na organização do ensino. Apropriar-se de
um conceito, nessa perspectiva, significa
tomar posse desses processos mentais, o
que implica colocar em movimento esses
processos à medida que interagimos com
o conhecimento. Daí a relação entre ensino, aprendizagem e desenvolvimento,
destacada por Vygotsky. Nesse sentido, é
preciso que os conceitos – objetos de ensino – estejam inseridos em uma atividade na qual sua função como instrumento
seja explícita. Pensar a aprendizagem de
conceitos nessa perspectiva implica reconhecer que a sua apropriação não se resume à definição e memorização, como
normalmente ocorre no contexto escolar.
Também os conceitos de ação e operação,
apresentados por Leontiev (2004), têm
nos permitido algumas inferências significativas. Esse autor explica que a assimilação do conhecimento implica a formação
de ações mentais. Ao afirmar que no processo de aprendizagem motora ou intelectual, o sujeito passa da ação à operação
com o objeto do conhecimento, sendo
que a operação se constitui na ação automatizada, Leontiev oferece pistas para se
pensar uma orientação metodológica para
o ensino de conceitos. Mesmo que muitos conhecimentos sejam já operacionais
ou automatizados na cultura, para que
eles sejam desenvolvidos no sujeito como
operações conscientes é preciso que elas
se formem primeiramente como ações
(Leontiev, 2004). É preciso que um dado
conteúdo seja objeto direto da atenção,
da percepção, do raciocínio do sujeito
para que passe a compor o conteúdo e o
modo de ele operar com os fenômenos da
realidade, ou seja, para que, de fato, seja
apropriado como instrumento simbólico
pelo sujeito. Por quais meios investigar o
impacto do ensino sobre aprendizagem
e desenvolvimento dos sujeitos, já que
esses são processos tão subjetivos? Se
aprender é mais do que recitar definições,
implica “fazer uso” dos conceitos na realização de ações e operações mentais, é
preciso buscar elementos externos que
explicitem os processos psicológicos envolvidos em determinadas atividades do
sujeito, já que essas atividades podem
revelar a forma pela qual o sujeito opera
com os conceitos. Assim, em nossas pesquisas temos tomado como objeto de
análise a própria atividade do sujeito com
objetos e fenômenos. Observamos se ele
realiza a atividade por meio de um pensamento categorial, em nível teórico, ou
se depende de representações sensoriais,
limitando-se ao pensamento empírico, o
que significa diferentes níveis de desenvolvimento. Considerar a atividade como
objeto de análise “significa a possibilidade
de se analisar um elemento observável e,
por meio dele, desvelar a forma e o conteúdo da subjetividade” (Sforni & Galuch,
2009, p. 127). Partindo do princípio de que
99
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
há unidade entre linguagem, pensamento
e ação, tomamos como fontes de análise a
linguagem e a ação, como meios que nos
permitem inferir, mesmo que parcialmente, o pensamento conceitual promovido
pelo ensino. Cabe destacar que tais procedimentos investigativos constituem-se em
um caminho em construção, marcado por
dúvidas e algumas limitações, mas que
tem apresentado resultados promissores,
o que nos estimula a continuar caminhando, apesar das incertezas.
L. S. VYGOTSKY: A FORÇA E A
ATUALIDADE DE SUA OBRA
Zoia Prestes - UniCEUB
Lev Semionovitch Vygotsky foi um pensador soviético e seu nome é bem conhecido hoje no Brasil, principalmente entre os
que se dedicam aos estudos nas áreas da
pedagogia e psicologia. A trajetória acadêmica no Brasil das obras de Vygotsky, seus
colaboradores e alunos teve início no fim
dos anos 70. Seus estudos estão presentes
no mundo inteiro, editados e publicados
nas mais diferentes línguas, tais como inglês, francês, italiano, espanhol, alemão,
japonês, português, húngaro e dinamarquês. Se fizermos hoje uma rápida busca
nas publicações das obras de Vygotsky
na Rússia, por exemplo, veremos que, na
última década, seus três principais livros
foram relançados por diferentes editoras, assim como foram reeditados artigos
publicados apenas nos anos 30, antes de
serem proibidos, em coletâneas que estão
surgindo novamente nas prateleiras das
livrarias da Rússia. Quando se analisa a
extensa produção escrita de Lev Semionovitch Vygotsky, nota-se que foram poucos
os livros que escreveu: Psirrologuia iskuss100
tva (Psicologia da Arte), escrito em 1925 e
publicado somente em 1965; Pedagoguitcheskaia psirrologuia (Psicologia Pedagógica) de 1926, e Michlenie e retch (traduzido no Brasil como Pensamento e linguagem ou Construção do pensamento e da
linguagem), de 1934; e uma série de livros
didáticos para o ensino à distância (por
correspondência), tais como Pedologia da
idade escolar (Pedologuia chkolnogo vozrasta), de 1928, Pedologia da juventude
(Pedologuia iunochevskogo vozrasta), de
1929, e Pedologia do adolescente (Pedologuia podrostka), escrito entre 1930 e
1931. Alguns capítulos deste último livro
didático foram republicados no volume 4
de Obras reunidas (Sobranie sotchineni).
Os livros publicados, principalmente após
a morte de Vigotski, reúnem artigos, textos e estenografias de aulas proferidas ou
discursos em eventos científicos. O levantamento mais completo e sistematizado
até o momento está apresentado em anexo à biografia escrita por Guita Vigodskaia,
filha de Vygotsky, e Tamara Lifanova
(1996) que relaciona 274 títulos. Embora
Daniil Borissovitch Elkonin, contemporâneo, aluno e colaborador de Vygotsky,
relacione cerca de 180 trabalhos (Elkonin,
1984). Essa divergência nas informações a
respeito de sua produção teórica mostra
não apenas o interesse que ainda desperta sua obra em seu país, mas também é
uma divergência que está prestes a ser
reduzida a zero com a publicação da obra
completa. Um dos motivos da divergência é que na lista de Guita estão indicados até mesmo artigos e textos que ainda
permanecem na forma de manuscritos e
estão guardados nos arquivos da família
que, atualmente, prepara o lançamento
de dois volumes das obras completas que
deverão conter 16 volumes, cada um com
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
uma média de 400 páginas. Além de proibidas na URSS por quase 20 anos, as obras
de L.S. Vygotsky nem sempre tiveram um
destino digno. Ao analisarmos detalhadamente o percurso de algumas de suas
publicações, pode-se afirmar, sem medo,
que foram muitas as adulterações, os cortes, as censuras que sofreram ao longo da
história, tanto em sua pátria como fora
dela. Desde a publicação de seus primeiros livros nos Estados Unidos e de traduções para o português a partir das versões
norte-americanas, já se passaram mais de
30 anos. Sem dúvida, essas primeiras iniciativas de trazer para o Brasil os estudos
de um dos mais importantes pensadores
soviéticos do século XX merecem reconhecimento. No entanto, atualmente, a
própria Rússia reconhece que muitos textos do autor, para que fossem publicados
ainda no fim dos anos 50, foram cortados
e alterados pelos editores (Zaverchneva,
2009, 2010). É desconcertante descobrir,
por exemplo, que o livro Michlenie i retch
(traduzido como Pensamento e linguagem) teve alguns parágrafos cortados e
que, somente em 1996 (González, 2007,
p. CXXXIV), foi publicada a primeira edição
do texto original que se encontra microfilmado na biblioteca da Universidade Estatal de Moscou. Mais perturbador ainda é
o fato de que, no Brasil, uma mesma editora publica duas versões (Vygotsky, 1987
e 2001) dessa obra de Vygotsky como se
fossem livros diferentes. Na verdade, até
são, já que uma delas, a edição resumida,
não pertence de fato à pena do pensador,
mas sim aos seus editores que a adulteraram, atribuindo a autoria a Vygotsky. Essa
edição apareceu em 1987 pela editora
Martins Fontes traduzida do inglês por Jefferson Luiz Camargo, a partir da edição do
Instituto Tecnológico de Massachusetts.
Mais recentemente, em 2001, no Brasil,
foi publicada pela mesma Martins Fontes
a versão completa de Michlenie e retch,
sob o título A construção do pensamento
e da linguagem, traduzida diretamente do
russo por Paulo Bezerra. Na ficha técnica
do livro não está indicada a edição russa
da qual foi traduzida para o português,
mas, ao comparar com a edição russa integral de 2001, pode-se afirmar que é o
texto completo, pois contém todos os trechos suprimidos na edição soviética retalhada de 1956 (González, 2007, p. CXXXI).
Mas parece que não foi somente a obra
de Vygotsky que sofreu adulteração. Sua
vida também é cercada de mistérios e fatos pouco esclarecidos. As divergências
entre as interpretações de fatos importantes de sua vida permanecem ainda como
um campo bastante nebuloso na história
da psicologia soviética. Se forem feitas
comparações entre textos biográficos publicados na União Soviética (por exemplo,
Levitin, 1990), na Argentina (por exemplo,
Blanck, 1984) e nos Estados Unidos (por
exemplo, Kozulin, 1990) é possível detectar discrepâncias acerca de fatos importantes da vida e obra do autor. Assim, o
estudioso de Vygotsky vê-se diante de informações, por vezes, até contraditórias e
a melhor alternativa na busca de um quadro mais coerente da vida e obra do autor
é a realização de exames comparativos
das diferentes biografias disponíveis. Atualmente, além das biografias citadas, há a
escrita por sua filha, em colaboração com
T. M. Lifanova e encontra-se publicada em
russo e em inglês (1996, 1999 a, b, c), esta
última não totalmente na íntegra (faltam
fotos e fac-símiles de alguns documentos).
A outra biografia é de autoria de Iarochevski (2007) e foi publicada somente em
russo. Além disso, em 2011, foi publicada
101
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
na Rússia mais uma biografia do pensador Misl i sudba psirrologa Vigotskigo (O
pensamento e o destino do psicólogo Vigotski), de autoria de Igor Reif. Diante desse quadro, não resta dúvida de que há em
todo o mundo um grande interesse pelas
ideias e pela vida de Vygotsky.
MR LT01 - Mesa Redonda
Convidada
MR LT01-1508 - O ENVELHECIMENTO
BEM SUCEDIDO E A APOSENTADORIA:
A PRÁTICAS DE HOMENS IDOSOS
E DIFERENTES PROGRAMAS DE
PREPARARO PARA A APOSENTADORIA
Samia Abreu - UnB
[email protected]
Lilian Maria Borges Gonzalez - UCB
[email protected]
Cristineide Leandro França - UnB
[email protected]
Sheila Giardini Murta - UnB
[email protected]
Eliane Seidl - UnB
[email protected]
Isolda Gunther - UnB
[email protected]
Juliana Seidl - UnB
[email protected]
Ana Carolina da Conceição
[email protected]
Marina Pedralho - UnB
[email protected]
Nadielle Lira - UnB
[email protected]
Rochely Karen Moreira Carvalhedo - UCB
[email protected]
Andressa Gonzáles Azevedo Pinheiro Soares
Macedo - UnB
102
[email protected]
Juliane Rosa - UnB
[email protected]
João Luís X. M. de Negreiros - UnB
[email protected]
Brisa Oliveira - UnB
[email protected]
De acordo com a perspectiva do life-span,
o envelhecimento humano é um processo
multidimensional e multidirecional que
engloba um delicado equilíbrio entre limitações (perdas) e vantagens (ganhos). Consonante com essa visão, o envelhecimento
e a velhice constituem experiências heterogêneas e, como tal, devem ser abordados em sua complexidade e diversidade. A
passagem para aposentadoria, é uma fase
difícil e nem sempre enfrentada de forma
positiva por alguns trabalhadores. Os Programas de Preparação para Aposentadoria
surgem como medida preventiva para melhorar a qualidade de vida das pessoas que
se encontram nessa fase e necessitam de
ajuda para atravessá-la de forma saudável.
O envelhecimento bem sucedido e a aposentadoria serão apresentados em suas
manifestações frente a um estudo sobre
a concepção e práticas de homens idosos
(estudo 1), a implantação de um programa
de preparação para aposentadoria (estudo
2) e avaliação de um intervenção preventiva breve no planejamento da aposentadoria (estudo 3). O presente estudo buscou
investigar as percepções de treze homens
com idades entre 62 e 78 anos, todos casados, aposentados e portadores de diferentes doenças crônicas, recrutados em
um centro de convivência para idosos, os
quais foram entrevistados individualmente
acerca de suas concepções de envelhecimento bem sucedido e das práticas adotadas na busca de uma velhice saudável. As
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
respostas obtidas foram submetidas à análise de conteúdo de Bardin. Os relatos dos
participantes foram agrupados em fatores
físicos e psicossociais. Dentre os fatores físicos mencionados, foi possível identificar
duas subcategorias, que apresentavam em
comum o fato de enfatizarem as necessidades ou limitações orgânicas da pessoa
idosa, a saber: busca de serviços médicos e
uso da medicação e reconhecimento e respeito às limitações físicas. Os fatores psicossociais, por sua vez, foram organizados
em oito subcategorias: manutenção de
hábitos saudáveis; ausência de hábitos nocivos à saúde; manutenção de atividades
de trabalho ou recreativas; esquiva ou manejo de situações estressantes; satisfação
em viver; manutenção de bom relacionamento familiar; prática de ações solidárias
e controle das finanças. Os participantes
relataram manter em seus cotidianos práticas preventivas e promotoras da saúde,
as quais foram organizadas tomando por
parâmetro três eixos temáticos: busca e
utilização dos serviços de saúde, hábitos
saudáveis e vida ativa. A promoção do envelhecimento saudável e a prevenção de
incapacidades devem assumir um papel
central nas pesquisas e cuidados no campo da saúde dos idosos, considerando que
podem assegurar um uso mais eficiente
dos serviços de saúde e melhorar a qualidade de vida destas pessoas, ajudando-as
a permanecerem independentes e produtivas. O objetivo do estudo é descrever as
etapas de implantação do Programa de
Preparação para Aposentadoria adotado
pela Universidade de Brasília, chamado
Viva Mais!. O modelo seguiu as seguintes
etapas: Avaliação de necessidades - Inclui
a revisão da literatura, elaboração do roteiro de entrevistas individuais e dos grupos focais com trabalhadores aposentados
da Instituição. Criação de identidade visual
e cartilha para os participantes - Consistiu
na elaboração de todo o material gráfico,
design da cartilha, convites e cartazes de
divulgação. Sensibilização e Divulgação Foram realizadas visitas aos sindicatos e à
diretoria de saúde da universidade. Informações sobre o programa foram disponibilizadas no site da UnB e convites entregues
individualmente. Formação dos grupos e
conteúdo da intervenção - Foram formados dois grupos, 13 servidores concluíram
a intervenção. O programa contou com
intervenções estruturadas em 8 módulos
informativos e módulos vivenciais em um
formato psicoeducativo, com duração de
três horas semanais, totalizando 24 horas
de programa. A partir da análise dos dados, foram encontradas seis dimensões de
maior investimento pelos participantes,
a saber: Aposentadoria, Finanças, Laços
Afetivos e Sociais, Ocupação, Autoconhecimento e Saúde. Os temas citados pelos
participantes, relacionados à categoria
Aposentadoria, foram: a tomada de consciência em relação à aposentadoria e o
planejamento de questões legais relativas
à mesma. Na categoria Finanças, os participantes indicaram a realização de atividades com fins lucrativos e o cuidado com as
finanças, como a quitação de dívidas bancárias. Quanto à categoria Laços Afetivos e
Sociais, foi mencionado o cultivo de amizades, laços familiares e da relação com o
parceiro. Além disso, investimento na atividade profissional, cumprimento de obrigações, lazer e responsabilidades com bens
materiais foram temas que apareceram na
categoria Ocupação. Por fim, na categoria
Autoconhecimento, foram apontados os
seguintes temas: lidar com mudanças e reflexão sobre seus comportamentos. Pode-se observar que os objetivos do programa
103
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
vêm sendo alcançados o que justifica a sua
continuidade e propõe uma agenda de
pesquisa para adaptação de procedimentos, novas formas de avaliação e aprimoramento desse modelo preventivo. Esse estudo teve como objetivo testar e aprimorar
os procedimentos e estratégias de uma intervenção breve no planejamento da aposentadoria. Utilizou-se para esse fim uma
oficina breve com técnicas psicoeducativas
pré-estabelecidas. Participaram da pesquisa 09 trabalhadores, com a idade entre 22
e 63 anos, sendo 03 homens e 06 mulheres. Para coleta dos dados foram utilizados
os seguintes instrumentos: Questionário
Sociodemográfico para trabalhadores em
situação de pré-aposentadoria e a Escala
de Estágio de Mudança em Comportamento de Saúde. A intervenção ocorreu em
sessão única, em grupo, com aproximadamente 180 minutos de duração. Consistiu
na utilização de estratégias psicoeducativas e teve como base o modelo “FRAMES” (Feedback, Responsability, Advice,
Menu de Option, Empathy, Self-eficacy).
Para tratamento dos dados, utilizou-se a
técnica de análise conteúdo de Bardin. O
tratamento dos dados permitiu identificar
que os preditores de uma aposentadoria promissora envolvem sentimentos de
persistência, iniciativa, suporte familiar,
busca de uma nova carreira e continuar os
estudos. Como fatores de risco destacam-se as doenças, solidão, diminuição nas
relações sociais, pouco dinheiro, condições de trabalho inapropriadas, ausência
de políticas públicas para esse segmento
populacional e falta de apoio da família e
amigos. A segunda categoria investiga o
que a intervenção breve possibilitou aos
participantes descobrir, pensar e sentir
sobre a transição para a aposentadoria.
A terceira categoria abrange a descrição
104
dos recursos significativos para enfrentar
as vulnerabilidades originadas nessa fase
de transição. Sugere-se que esse modelo
breve de intervenção seja investigado em
um número maior de sujeitos e em outros
ambientes organizacionais.
Palavras-chave: envelhecimento bem
sucedido, programa de preparação para
aposentadoria, intervenção preventiva breve.
MR LT01 - Mesa Redonda
Convidada
MR LT01-717 - “AS MELHORES COISAS
DO MUNDO” COMO ESTÍMULO
EVOCATIVO AOS DESAFIOS DA
JUVENTUDE NA UNIVERSIDADE
Francisco Silva Cavalcante Junior - UFC
[email protected]
Utilizando-nos do filme “As melhores coisas do mundo” (BODANSKY, 2010) como
estímulo evocativo, os trabalhos propostos por esta Mesa Redonda apresenta um
conjunto de autores que se debruçam sobre suas experiências docentes em cursos
de graduação para refletir sobre os desafios da juventude com a qual convivem em
suas aulas. Uma análise das condições de
valia introjetadas por jovens universitários
que os impedem de seguirem um caminho de desenvolvimento autônomo de
suas trajetórias de vida é o primeiro tema
abordado. Inovações metodológicas aplicadas na disciplina de Psicologia da adolescência, vida adulta e velhice permitem
que professora e estudantes estudem, de
forma autobiográfica, as condições valorativas que os impedem de navegarem em
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
fluxo vital pleno pelos estágios da vida. Na
sequência, o professor visa compreender
fenômenos das expressões e linguagens
adolescentes que são expressas no ciberespaço, a partir da exibição do filme “As
melhores coisas do mundo”, em sala de
aula, abordando o crescente uso dos serviços das novas tecnologias por jovens
universitários, assim como os variados
“novos” fenômenos que se desdobram
a partir desse espaço virtual que passa a
ser amplamente utilizado e propagado.
Narrativas adolescentes em redes sociais
são registradas e analisadas neste estudo.
Por fim, o desafio da tríade da neurose
coletiva que se apresenta na juventude
atual, ao matar, se matar ou se drogar,
é ampliado, quando a morte passa a ser
apresentada por adultos jovens na universidade como a única liberdade encontrada, tema também evocado e densamente
trabalhado no filme “As melhores coisas
do mundo”. Orientados por uma perspectiva da Abordagem Centrada na Pessoa
cuja aprendizagem significativa emerge da
experiência, os professores universitários
aqui reunidos compartilham transformações que se constroem em suas práticas
docentes, de forma espontânea, com uma
capacidade transformadora de mobilização de todos os envolvidos no processo de
ensino e aprendizagem do adulto jovem
no contexto da universidade brasileira.
PEDALANDO NAS TRILHAS DA VIDA
Terezinha Teixeira Joca - UNIFOR
[email protected]
Desde a concepção, o bebê carrega uma
bagagem impregnada de expectativas de
seus pais. Dessa forma, a família e o meio
exercem forte influência na constituição
do sujeito como pessoa. E, desde muito
pequenina, a criança percebe que esperam algo dela. Ao mesmo tempo em que
começa a sentir a necessidade de consideração positiva de seus pais e de outras
pessoas significativas. Passa a perceber o
comportamento de aprovação ou reprovação daqueles que aprecia e a necessidade de aceitação é tão importante que
passa a guiar seu comportamento a partir
dessas experiências. Isso sugere que a experiência poderá não mais estar seguindo
um fluxo natural de aperfeiçoamento de
nosso organismo, mas caminhando em
direção ao valimento do amor de nossos
pais e aceitação da sociedade. Essas expectativas, essas condições para ser aceito
e amado é o que chamamos de condições
de valia. É uma valoração do amor a ser
recebido. E todos nós trazemos condições
de valia assinaladas em nossas vidas, que
foram passadas por pais, professores, instituições, sociedade e por tudo que impõe
algo a partir de um apreço condicional,
que leva a pessoa mudar o curso de nossas escolhas para podermos ser aceitos ou
amados e que frustra a nossa força motivadora em direção ao crescimento. Denominei essas condições de rodinhas da bicicleta emocional. Neste momento, pretendo lançar mão dessa metáfora que venho
desenvolvendo a partir de uma pesquisa
realizada com uma jovem em final de adolescência, que buscava irromper com as
condições de valia impostas pelo meio e
que disparava uma luta pelo seu próprio
crescimento, tomando como abordagem,
para o estudo, a etnográfica centrada
na pessoa, proposta por Harry Wolcott
(1999). Ampliei esse estudo através de minhas observações e das impressões apresentadas pelas pessoas ao lerem o texto,
utilizado em sala de aula para jovens uni105
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
versitários, que imprimem suas reações,
seus sentidos dados após o contato com
essas rodinhas, que os remetem à infância e à adolescência. Aprofundado minha
percepção sobre as condições de valia,
percebi que, durante o percurso de vida, o
sujeito não se torna isento das condições
impostas pelo meio, pois poderá sobreviver uma ou outra que tropeçará no desejo
de ser amado e aceito. Essa situação de
condicionalidade poderá levar a pessoa à
incongruência e, consequentemente, ao
desenvolvimento de patologias. Dilatando
o olhar, quando é conseguido retirar as
rodinhas da bicicleta emocional segue-se
adiante e passa a fazer uso de algo mais
sofisticado, as marchas da bike. Esse novo
recurso representa as formas que se possui para reagir aos problemas, modo como
se percebe que não pode direcionar todas
as culpas dos problemas ao meio e aos
outros, passa-se a tomar consciência das
próprias incapacidades e competências.
Descobre-se e reconhece o seu valor interno. Lembrando que a adolescência não
é só balada, diversão, papos livres e aventura e que os problemas surgem como terrenos diversos, enlameados, pedregosos,
asfaltados, arenosos, que só se consegue
sair se souber fazer uso da marcha adequada. Lembro, também, que as rodinhas
da bicicleta emocional não estão presentes apenas na infância. Andar com rodinhas pode representar o sentir-se amado,
amada. Um amor atarraxado à sua condição de crescimento, um amor atrelado ao
pequeno espaço seguro, que não consegue vislumbrar novos caminhos a serem
conquistados. Com a minha chegada à
disciplina Psicologia da adolescência, vida
adulta e velhice, apresentei o texto “Das
Rodinhas da bicicleta as marchas de minha bike” logo após a exibição do filme “As
106
melhores coisas do mundo” (Bodanzky,
2010) e encantei-me com as reações emocionadas e as experiências trazidas pelos
estudantes da evocação que essas duas
obras geraram. Assim como os estudantes, passei a visitar as fases de desenvolvimento e, como propõe Amstrong (2011),
fizemos uma navegação pelos estágios da
vida, enveredamos pela “Odisseia do desenvolvimento humano” e resolvi desbravar esses novos caminhos, pedalando nas
trilhas da Vida, cujas descobertas serão
compartilhadas nesta comunicação.
Palavras-chave: condições de valia,
desenvolvimento humano, fluxo vital.
LINGUAGENS ADOLESCENTES NO
CIBERESPAÇO: VIDAS PÚBLICAS E
PRIVADAS
Márcio Silva Gondim - FANOR
[email protected]
Este estudo visa compreender fenômenos
das expressões e linguagens adolescentes que são expressas no ciberespaço, a
partir da exibição do filme “As melhores
coisas do mundo” (Bodansky, 2010), em
sala de aula do Ensino Superior. Trata-se
de um tema relevante e atual, tendo em
vista o crescente uso dos serviços das novas tecnologias, assim como os variados
“novos” fenômenos que se desdobram a
partir desse espaço virtual que passa a ser
amplamente utilizado e propagado. Além
disso, enfatiza-se que as narrativas adolescentes precisam ser registradas (Oliveira,
2006). Optou-se pela delimitação na adolescência, por ser o público representado
no filme e pela possibilidade de debater
temas atuais relacionados à juventude
brasileira. O filme foi exibido em três sa-
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
las de aulas, cada uma com uma média de
quarenta estudantes, que foram convidados a escreverem as reações ao filme por
meio de textos-sentidos (Cavalcante Jr,
2001). O filme citado apresenta cenas que
demonstram situações específicas dos
usos do ciberespaço: um blog em que um
jovem registra escritos acerca de si e uma
jovem que sofre agressividades e preconceitos por ter imagens íntimas expostas
na Internet. “As melhores coisas do mundo” foi apresentado a estudantes do Ensino Superior da cidade de Fortaleza (CE).
Destacaram-se, como pontos de reflexão,
neste estudo: 1) Manifestação da escrita
de si – pensamentos e emoções; 2) Manifestações da linguagem do preconceito,
intolerância e agressividade. Em ambas as
manifestações, com características e reflexões peculiares, observam-se em comum
a exposição da vida privada por meio das
novas tecnologias (especificamente blogs). Tendo em vista que os serviços tecnológicos são utilizados de modo crescente,
nota-se também que a interioridade e as
vidas íntimas ganham espaço e repercutem entre os adolescentes, de modo veloz
e ágil, propagando informações privadas
de modo amplo: tanto reflexões diárias
acerca da vida e morte, como informações
da vida íntima e sexual que ganham notoriedade pública na comunidade escolar.
A possibilidade de uma hipervisibilidade
(intencional ou não) parece haver em ambos os casos. Também é pertinente pensar
acerca das motivações acerca das histórias
dos outros (a espetacularização da vida
pública, assim como um modo de anunciar publicamente uma importante decisão pessoal). No primeiro ponto discutido,
“1) Manifestação da escrita de si – pensamentos e emoções”, percebeu-se que as
experiências de escrita do jovem persona-
gem do filme remeteu os estudantes (em
sala de aula) a lembranças, pensamentos
e sentimentos (Cavalcante Jr, 2001) acerca
da escrita de si. Pode-se, então, considerar que as histórias de vidas são carregadas de particularidades e modos singulares de perceber a existência. Sendo assim,
podemos verificar momentos em que as
histórias de vidas permitem às pessoas
fazerem um processo retrospectivo: olhar
a um caminho percorrido, para acontecimentos, situações, atividades, pessoas
significativas que encontraram, destacando que tudo o que é dito é importante,
no sentido de descobrir a riqueza interior
da experiência. Entende-se, assim, que se
deve somar novas ferramentas estético-crítico-culturais no exercício pessoal e
engajado de tornamo-nos sujeitos empoderados (Olinda, 2010). Recordações
evocadas pelas pessoas mostram-se como
ricos materiais para que os sujeitos entendam o que são (presente), porque são o
que são (passado) e para onde querem
direcionar as vidas (futuro). Dessa forma,
os estudantes envolveram-se em uma
atitude de reflexividade crítica acerca do
mundo que nos rodeia, também escrevendo sobre si (Brandao, 2008). Ocorreu uma
interação propiciada por um grupo reflexivo em sala de aula, no qual se contou, ouviu-se e representou-se imageticamente,
conduzindo a aprendizagens biográficas.
Desse modo, verificou-se a relevância de
compartilhar experiências autobiográficas, proporcionando reflexões e relações
em que as pessoas descobrirão nelas a capacidade de utilizarem essas relações para
crescerem e se transformarem. Conforme
Delory-Momberger (2006), a história de
vida é a ficção verdadeira do sujeito: é a
história que o narrador tem como verdadeira, e ele se constrói como sujeito no
107
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
ato de sua enunciação. O sujeito é objeto
incessante de sua própria construção. Verifica-se que o ato de registrar por escrito
as experiências e percepções, inscreve-se
na dinâmica do projeto de si e concretiza
uma forma particular dele, compreendendo a vida contada como uma construção
de si, sempre aberta e sempre a refazer.
Nessa primeira discussão, percebeu-se a
publicação de si como algo transformador
e útil aos sujeitos. No segundo ponto trabalhado, “2) Manifestações da linguagem
do preconceito, intolerância e agressividade”, verificou-se a relevância de sensibilizar criativamente os estudantes em
relação às questões psíquicas relacionadas ao bullying, fenômeno conhecido vulgarmente como assédio moral e físico em
ambientes escolares, que vem crescendo
em vários ambientes; desde o doméstico,
empresas , escolas, universidades , penitenciárias, forças armadas e mais recentemente nos meios virtuais (ciberespaço),
onde a intolerância, discriminação e as
minorias são alvos de ataque a indivíduos
reconhecidos como mais frágeis. O filme
retrata exatamente o “cyber bullying”,
quando uma jovem é submetida a vários
constrangimentos públicos. O bullying
é um problema social que deixa fissuras, muitas vezes, irreversíveis no sujeito
(Antunes, 2008; Bandeira, 2010; Zaine,
2010). Tratando-se de uma pesquisa-ação
qualitativa, convidaram-se os estudantes
do Ensino Superior pro que expressarem
reações ao filme (Cavalcante Jr, 2001),
emergindo as seguintes discussões: a)
pensar sobre o assunto, não refletido anteriormente; b) atenção para a gravidade
do problema social; c) mobilizar-se com as
situações vividas pela jovem personagem.
Considerou-se, no filme, que o (cyber)
bullying sofrido pela adolescente carac108
teriza-se como uma violência psíquica na
qual se destacam atitudes intimidadoras
conscientes com caráter de ridicularizar.
Nesse caso, discutiu-se o quanto pode ser
extremamente negativo a publicação de
si no ciberespaço. Neste estudo, percebemos um movimento que Josso (2004,
p. 171) denomina de uma “estranheza do
outro” e “estranheza de si”, ou seja, diante
de relatos de experiências de vida, somos
levados a reflexões acerca de nós mesmos.
A partir das descrições das cenas do “As
melhores coisas do mundo”, compreende-se outras situações semelhantes que
ocorrem na vida cotidiana, possibilitando
assim uma significativa reflexão acerca
desse tema. Espera-se, assim, promover
reflexões nas quais o saber psicológico
possa contribuir ao entendimento desses
fenômenos.
Palavras-chave: sala de aula, psicoeducação,
filme brasileiro.
QUANDO A MORTE É A ÚNICA
LIBERDADE NA JUVENTUDE: “NINGUÉM
ESCUTA A MINHA DOR”
Francisco Silva Cavalcante Junior - UFC
[email protected]
André Feitosa de Sousa - FANOR
[email protected]
A tríade da neurose coletiva que se agrava
nos dias atuais é um problema que ocupa
os estudos da Psicologia Humanista há
longo tempo. Em uma trilogia de ações
que findam a vida ou subtraem os anos
de existência, o ser humano mata, se
mata ou se droga (Frankl, 2010). De todos
os tipos de morte, o suicídio é analisado
como o problema mais alarmante da vida
(Hillman, 2009). Entretanto, em nenhuma
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
população do mundo, a aceitação da
morte é recebida de forma natural quando
acontece na juventude (Armstrong,
2011). No caso do suicídio, torna-se ainda
mais desafiadora a sua compreensão.
Abordando as várias facetas da juventude
no Brasil, a temática do suicídio também
está presente no filme “As melhores
coisas do mundo” (Bodansky, 2010). Nele,
acompanhamos o sofrimento do jovem
Pedro (interpretado por Fiuk) para quem o
blog é o principal veículo de expressão de
suas emoções: “Ninguém escuta a minha
dor... Podem te arrancar os braços, as
pernas... mas sem a alma, você é apenas
uma caixa de ovos boiando por aí... O meu
desejo comanda o meu destino e a morte
é a única liberdade”. O presente trabalho
objetiva promover uma reflexão, no
âmbito da Psicologia do Desenvolvimento,
sobre a morte como a única liberdade
encontrada na juventude e será ilustrado
com um estudo de caso de uma jovem
universitária, acompanhada em uma de
nossas disciplinas na Universidade, cuja
vida foi colocada em risco em tentativas
recorrentes de consumar a sua morte.
Utilizando-se de e-mail escreveu-nos:
“professor me ajuda a morrer”. Em uma
de suas contas em redes sociais, postou
durante dias seguidos narrativas de
seu sofrimento, o que gerou uma onde
de sucessivos e-mails que nos foram
enviados por seus colegas de turma com
compartilhamento de preocupações
e pedido de ajuda: “Eu estou muito
preocupada, tenho medo que ela consiga
enfim o que quer. Por favor, professor,
tenta fazer alguma coisa.” Um outro dizia:
“Estou a lhe enviar este e-mail pelo motivo
do sr. ser da área e sabe como lhe dar
com pessoas como ela. Recentemente ela
tem colocado... mensagens depressivas,
dizendo ter desistido da vida, que não
aguentava mais...”. Analisamos, portanto,
o papel do professor de Psicologia do
Desenvolvimento no contexto de uma
juventude que sofre e pede ajuda ao
professor “da área”, muitas vezes o
único profissional psicólogo no âmbito
dos cursos de licenciatura para os quais
esta disciplina é obrigatória. Por outro
lado, desenvolvemos a proposta de
que a abordagem da morte e do morrer
em cursos de graduação torne-se uma
temática transversal que não fique
restrito à disciplina de Psicologia. O
conhecimento de teorias sobre a morte e
o morrer, em suas orientações teóricas e
suas variações culturais, pode representar
um conhecimento importante para ser
desenvolvido por profissionais com
diferentes formações. No caso em estudo,
precedido por um episódio de suicídio
consumado de uma outra estudante na
mesma instituição, a preparação de texto
informativo sobre a morte e o morrer
permitiu aos professores de diferentes
disciplinas, a abordagem do tema em
suas salas de aula, com foco na vida como
dádiva da morte; a compreensão do fato
de que refletir sobre a morte pode ser um
importante estímulo para a descoberta do
significado de viver de forma consciente
(Armstrong, 2011) dos adolescentes e
adultos jovens que estão na universidade.
Os episódios inesperados narrados nesta
comunicação tiveram o potencial de
promover importantes aprendizagens e
mudanças no corpo docente e discente:
o interesse pelo estudo dos temas
integrantes do ensino da Psicologia
do Desenvolvimento foi despertado;
docentes e discentes passaram a escutar
mais atentamente as dores de seus alunos
e colegas, e um programa de tutoria para
109
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
os estudantes de graduação foi priorizado.
Por fim, renovamos o potencial de uma
aprendizagem que emerge da experiência,
conforme difundiu amplamente Carl
Rogers (1983: 22) na Abordagem Centrada
na Pessoa: “Aprender, e especialmente
aprender com a experiência, tem sido um
elemento fundamental que faz com que a
vida valha a pena”.
Palavras-chave: juventude, ciclos de vida,
suicídio.
MR LT01 - Mesa Redonda
Convidada
MR LT01-1304 - A ÉTICA DO CUIDADO
NO PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO
HUMANO: COMPREENDENDO AS
RELAÇÕES FAMILIARES
Maria Regina Basílio Teodoro Dos Santos UNIUBE
Vilma Valeria Dias Couto
Conceição Aparecida Serralha
O conjunto de trabalhos apresentados
nesta mesa redonda propõe discutir o desenvolvimento humano como corolário do
cuidado propiciado pelo ambiente familiar, bem como pelos espaços educacionais
que complementam este cuidado. Discute
a importância dos papéis parentais e as relações que se estabelecem dentro da família, independentemente da configuração
que esta apresenta. Atenta para a questão
ética do cuidado, que deve estar presente
não só em um contexto natural de cuidado, mas também em toda e qualquer intervenção político-social, educacional e
profissional de apoio à família. A proposta
110
abrange o debate teórico e possibilidades
de intervenção partindo das contribuições
de duas importantes abordagens, a Psicanálise e a Centrada na Pessoa. Abrangem
também atividades de extensão universitária realizadas, que enfocaram, no caso
dos trabalhos de base psicanalítica, sobretudo as situações advindas de relações
familiares disfuncionais que favorecem o
recrudescimento da agressividade e a manifestação da violência, e que culminam
em problemáticas no campo da saúde e
da escola, dificultando o desenvolvimento
saudável da criança, do adolescente e do
adulto. Os diferentes enfoques trazem em
comum a importância da clínica, que não
se coloca à parte das questões sociais que
envolvem o desenvolvimento humano,
mas permite direcionamentos que visem
ao cuidado às famílias, à subjetividade de
seus membros e às relações interpessoais
que ocorrem em seu seio. Assim, esses
direcionamentos não se orientam por atitudes de avaliação, julgamento e medidas
de correção, mas sustentam modos de
cuidar que garantem a autonomia e a independência das famílias.
A ÉTICA DO CUIDADO: PLATAFORMA
E VIA DE POSSIBILIDADE DO
DESENVOLVIMENTO HUMANO3
Conceição Aparecida Serralha – UFTM
[email protected]
MEC/SESu/DIFES – PROEXT 2010
Em se tratando de bebês e crianças pequenas, uma rede de cuidados, que se
3
Agradeço à FAPEMIG o apoio para a apresentação deste
trabalho no VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do
Desenvolvimento
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
caracteriza por articulações que diversificam, integram e ampliam os cuidados
oferecidos, tem se expandido abarcando
a mãe e a relação mãe-bebê, bem como a
relação educador-criança. Contudo, essa
rede ordinariamente tão necessária, merece cuidados ela própria, pois, em alguns
casos pode alterar-se rapidamente, assemelhando-se mais a outro tipo de rede
(de pesca) com uma característica aprisionadora, imobilizadora e sufocante, do
que a um apoio efetivo que leve em conta
as reais necessidades dos envolvidos. A
ideia de que se pode ter um método, uma
técnica, ou um saber mais certo e perfeito
que outros tende a se implantar com incrível facilidade. Isso nos faz pensar sobre a
questão ética envolvida nos cuidados que
são oferecidos, pois chama a nossa atenção sobre os equívocos gerados a partir
de determinados saberes. A psicanálise,
em suas várias escolas ou abordagens,
discute a questão ética relacionada à naturalização das necessidades humanas e
a proposição de cuidados universalizada e
utópica, que retira a dimensão subjetiva
daqueles que recebem e fornecem cuidados. De acordo com Motta (2011), “a ética do cuidado,” [pensada pela psicanálise,
...] é a do cuidado enquanto experiência
essencialmente humana, se tiver por direção a localização subjetiva”, “não se refere a nenhum código [...] se refere ao sujeito, enquanto sujeito do desejo inconsciente (p. 149)”. Winnicott (1989/1994),
entretanto, considerou-se “a figura de
proa do movimento no sentido de um
reconhecimento da satisfação da necessidade como mais inicial e fundamental
que a realização de desejos” (p. 357), sem
deixar de considerar o bebê necessitado
como uma pessoa. É essa satisfação que
irá possibilitar ao ser humano chegar à
condição de poder desejar, e é a essa satisfação que podemos relacionar uma ética, uma vez que a dependência do ser humano de outro ser humano para a satisfação de suas necessidades é um fato. Isso
implica uma responsabilidade de atender
ao que o bebê necessita de uma maneira
que favoreça o desenvolvimento de suas
tendências herdadas, que lhe possibilite a
sua pessoalidade. Este estudo pretende,
portanto, discutir a natureza e a qualidade do cuidado ao indivíduo, as características do ambiente cuidador, a relação
deste com a cultura em que se insere e
da qual sofre influências, que são importantes para o desenvolvimento de suas
tendências herdadas ou geneticamente determinadas. Tem por base a teoria
do amadurecimento de D. W. Winnicott,
bem como experiências em atividades de
extensão realizadas com profissionais da
educação infantil e familiares de crianças na primeira e segunda infância, que
apresentavam alto grau de agressividade.
Para tanto, foram realizadas leituras de
textos winnicottianos e outros autores,
bem como observações dos ambientes
da criança, encontros com educadores e
cuidadores, que possibilitaram diálogos
importantes para a troca de conhecimentos, dúvidas e angústias próprias ao educar/cuidar. Sem um reconhecimento das
questões inconscientes envolvidas no cuidado, uma ênfase em instruções técnicas
para este é cada vez mais realizada, objetivando o atendimento às necessidades
da criança para um desenvolvimento integral saudável. As atividades de extensão
realizadas permitiram ver que, se por um
lado, a partir do momento que essa noção de cuidado é difundida, mais e mais
pessoas reconhecem o seu valor e se empenham em oferecer cuidados adequa111
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
dos aos bebês e crianças pequenas, como
também apoio às mães e às famílias; por
outro lado, vê-se crescer a construção de
projetos de “escolas de pais”, “educação
em saúde”, “orientações aos pais”, que
passam a exigir condutas adequadas por
parte das mães e dos pais, sem considerar
seus contextos de vida e seus padrões de
defesas individuais. Além disso, a “mãe
suficientemente boa”, pensada por Winnicott (1988/1990), perde sua condição
de adequação às necessidades de seu
próprio bebê e se torna uma mãe padronizada, repleta de instruções a serem
seguidas, ignorando individualidades e
subjetividades. Esse tipo de vivência, em
graus variados, pode ser frequentemente encontrada. Crianças rotineiramente
estimuladas e obrigadas a dar conta do
que não conseguem entender ou que não
conseguem dar um único sentido sequer,
fomentando a criação de novos diagnósticos psiquiátricos, que abarquem sua
desorganização. Os pais e os educadores, enquanto crianças que, muitas vezes,
cresceram sob esse tipo pressão, se vêm
agora pressionados a cuidar/educar, sem
uma base da qual possam se sentir seguramente apoiados. As reações de negatividade não são incomuns, e os cuidados
que poderiam ser naturalmente intuídos
a partir de uma sustentação emocional
adequada, não são realizados por recusa,
negligência ou indiferença. E então, os
profissionais responsáveis pela “educação
em saúde”, ou “pela educação continuada”, não entendem, e se perguntam por
que os pais e os educadores não realizam
as orientações dadas e aprendidas. Por
mais que tenhamos consciência da importância de ambientes suficientemente
bons para o amadurecimento emocional
de nossas crianças, sabemos que nem
112
sempre esses ambientes serão possíveis.
Correlatamente, podemos entender a importância de várias políticas públicas, que,
apesar de não serem ideais, podem atender minimamente às necessidades das
crianças e de suas famílias, o que é essencial, mas o que não quer dizer conseguir
que elas alcancem um amadurecimento
psicossomático. Para esse alcance, é necessária a presença de alguém que esteja
física e emocionalmente bem, “vivo”, capaz de ver e ouvir este bebê, ou criança,
como uma pessoa que tem necessidades
próprias e preferências, podendo atendê-las; e não é raro o fato de que esse alguém não seja a própria mãe, até porque
a esta pode estar faltando o apoio e a
sustentação emocional necessários a um
cuidador. O cuidado essencial não pode
ser automático ou mecânico e, como bem
disse Winnicott (1988/1990), desde que
seja um cuidado propiciado por um ambiente humanamente envolvido, pode até
ter falhas. O ambiente pré-escolar especialmente pode complementar bem esse
papel. Contudo, compreender as questões das relações primárias da criança,
que afetam o seu desenvolvimento e desempenho escolar, não retira a importância de se pensar sobre as multideterminações dos problemas encontrados tanto no
cotidiano familiar quanto escolar, ou seja,
sobre as características macrossociais e
culturais também na constituição desses
problemas, para que mudanças sejam
promovidas.
Palavras-chave: ética do cuidado;
agressividade; ambiente.
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
A IMPORTÂNCIA DAS
RELAÇÕES FAMILIARES PARA O
DESENVOLVIMENTO
Maria Regina Basílio Teodoro dos Santos –
UNIUBE
[email protected]
A concepção e existência do outro origina-se numa díade e conclui-se numa tríade ou grupo maior. A organização dessa
vivência e de sua dinâmica, observados os
papéis de cada membro, indubitavelmente, favorece a manutenção da homeostase familiar.
Em se tratando de abordagem, a Centrada na Pessoa prima pelas relações interpessoais. A mesma parte do pressuposto de que em todo indivíduo existe uma
disposição à atualização, uma tendência
inerente ao organismo para o crescimento, desenvolvimento e atualização de suas
potencialidades numa direção positiva e
construtiva. Esta tendência promovida
em uma relação interpessoal é cercada
por atitudes de empatia, consideração
positiva incondicional e congruência. Por
empatia entende-se que é a atitude de
tentar se colocar no lugar da outra pessoa
e tentar "ver com os olhos dela". É compreender a pessoa a partir de seu quadro
de referência; neste sentido, na situação
familiar, consideram-se todos os aspectos que constituem a pessoa como idade,
estrutura em todos os sentidos, personalidade e outros. Para isto, é preciso deixar de lado nossas próprias perspectivas
e valores para poder penetrar no mundo
do outro sem julgamentos. Por consideração positiva incondicional, entende-se
que é a atitude de aceitar cada aspecto
da experiência da uma pessoa e não colocar condições para a aceitação ou para
a apreciação desta. A consideração positiva incondicional sugere um cuidado não-possessivo, como forma de apreciação
do outro como uma pessoa individualizada, a quem é permitido ter os seus próprios sentimentos e experiências. Congruência, por sua vez, pode ser entendida
como atitude de integrar-se, vivenciando
plenamente os sentimentos que fluem na
pessoa no momento. A pessoa está congruente quando está livre e é profundamente ela mesma. Por isso, ser congruente significa ser real e genuíno. São estas
atitudes que permitem o crescimento e a
atualização das potencialidades criativas e
positivas dos indivíduos em qualquer forma de relação interpessoal. Isto nos ajuda
a compreender a amplitude do campo de
aplicação da Psicologia através da referida
abordagem, incluindo as áreas da psicoterapia, educação, resolução de conflitos,
relações familiares, grupos de encontro,
grupos de crescimento e grandes grupos
de comunidade. Segundo Rogers (2009),
como conseqüência de uma psicoterapia
centrada no cliente, os clientes modificam sua vida familiar, da seguinte maneira: expressam melhor seus sentimentos
– retiram a máscara que usavam; as relações podem ser vividas numa base real –
o cliente descobre que pode-se viver uma
relação com base nos sentimentos reais,
podendo exprimir sentimentos de vergonha, de angústia e de aborrecimento
e que a relação sobrevive a isso, em vez
de fundar numa aparência defensiva; melhora a comunicação nos dois sentidos:
compreendem a fundo as idéias e os sentimentos de outra pessoa e é compreendido por ela, isso é uma das experiências
mais humana, rara e compensadora; e,
finalmente, desejar que o outro seja independente – os clientes tendem a permitir
113
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
que cada membro da família tenha seus
próprios sentimentos e seja uma pessoa
independente. Em se tratando, especificamente das relações familiares, podemos dizer que a família é um contexto
único e dinâmico para o desenvolvimento
do ser humano. Portanto, para se falar em
desenvolvimento é necessário compreender o indivíduo nesse contexto. A família
é algo singular e complexo, especialmente se for considerado a forma como as
relações acontecem nesse conjunto. Poderíamos dizer: famílias – meio ambiente/cultura - problemas/conflitos - possibilidades de soluções. A condição familiar,
por mais complexa que seja, nos remete
ao sentimento de pertencer a um grupo,
nos tirando da solidão, que, segundo Camon (1993), “na maioria das vezes, é diretamente associada com desespero, sofrimento e com o suicídio.” Segundo este
autor, é como se, suportar a questão de
ser só, fosse dicifil ou desesperador para a
maioria das pessoas. Camon, ainda completa que a solidão distancia quando se
mantem um relacionamento estreito ou
íntimo com uma pessoa que se ama, com
a qual se tem proximiadade e afinidade.
E a conclusão inevitável a que se chega
é “cada um é um”, porém, como parte
de um grupo ou de uma família (Camon,
1993). De acordo com Rogers (2009), verifica-se que um indivíduo pode encontrar
satisfação em exprimir atitudes emocionais fortes no contexto em que surge, no
caso, no contexto familiar. Dessa forma,
para este autor, a pessoa descobre que
é melhor viver em condição mais real do
que numa relação dissimulada, exprimindo mais livremente, renunciando atitudes
defensivas e ouvindo o outro. Compreendem, assim, o que a outra pessoa sente e
porque é que sente. Salienta, ainda que,
114
“à medida que eu aceito melhor ser eu
mesmo, descubro que me encontro mais
preparado para permitir ao outro ser ele
próprio, com tudo o que isso implica. Isso
significa que o círculo familiar tende a
encaminhar-se no sentido de se tornar
um complexo de pessoas independentes
e únicas, com valores e objetivos individualizados, mas unidas por verdadeiros
sentimentos – positivos e negativos – que
existem entre elas, e pela satisfação do
laço da compreensão recíproca de, pelo
menos, uma parte do mundo particular
de cada um dos outros. É desse modo
que as pessoas descobrem maior satisfação nas relações familiares, o que facilita,
em cada membro da família, o processo
de descobrir-se e de vir a ser ele mesmo.”
(Rogers, 2009). No que se refere às relações familiares é fundamental discutir sobre contexto histórico, social e econômico
em que as pessoas estão inseridas, enfim,
analisar a diversidade cultural existente.
Pois as alianças e os conflitos existentes
nas relações familiares, influenciam, significativamente, no comportamento e
desenvolvimento das pessoas, especialmente, crianças e adolescentes. Assim,
pode-se dizer que a família, enquanto um
espaço em que se pode desenvolver uma
comunicação aberta entre os membros e
eles podem expressar seus desejos e preocupações, favorece sobremaneira a coesão do próprio grupo familiar.
Palavras-chave: Família. Conflito.
Compreensão.
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
A RESPONSABILIDADE DOS PAIS NA
PROBLEMÁTICA DA AGRESSIVIDADE DOS
ADOLESCENTES
Vilma Valeria Dias Couto - UFTM
[email protected] br
MEC/SESu/DIFES – PROEXT 2010
Na atualidade uma das problemáticas que
perpassa a adolescência diz respeito à recorrência das manifestações de agressividade e violência. As estatísticas revelam o
impacto da violência na população adolescente. Estudos mostram que a violência é
um dos fatores determinantes nos índices
de mortalidade na adolescência e apontam os jovens como os seus autores (Minayo, 1990; Adorno, Lima & Bordini, 1999;
Waiselfisz, 1998). Essa situação exige dos
profissionais diferentes possibilidades de
compreensão e enfrentamento que os levam a propor intervenções nos contextos
clínico, social, educacional e familiar. Com
base num projeto de extensão universitária que sustenta intervenções junto a adolescentes de uma instituição socioeducacional, propomos discutir a influência dos
pais na agressividade dos adolescentes.
Uma das etapas do projeto propõe o debate de temáticas ligadas à agressividade
na adolescência. De um modo geral, verificamos que o entendimento da agressividade e violência do jovem é associado a
problemas familiares, especialmente dos
pais. Essa constatação justifica a discussão
da implicação dos pais na problemática da
agressividade do adolescente. Ainda que
as intervenções sejam realizadas diretamente com os adolescentes, reconhecemos que este trabalho deve visar também
os pais na medida em que eles, de alguma forma, estão implicados nos conflitos
que favorecem a agressividade. Neste
trabalho, apresentamos algumas vias de
compreensão da influência dos pais na
questão emocional próprias à adolescência. Consideramos também a influencia da
dimensão da cultura nas características da
família contemporânea que dificulta a superação da experiência da adolescência e
contribui para o aumento da agressividade e violência dos adolescentes. Em torno
da família de um adolescente dito agressivo normalmente circulam discursos que
culpabilizam os pais pelas dificuldades dos
filhos. É freqüente ouvirmos falas que remetem para uma lógica de compreensão
das perturbações dos adolescentes como
decorrente de famílias desestruturadas,
pais ausentes, negligentes ou permissivos
demais. Somando a este entendimento
generalizante e culpabilizante, encontramos estudos (Rutter, 1961, citado por
Marcelli & Branconnier, 2007) que associam as dificuldades dos adolescentes aos
indicadores de patologia familiar de divórcio, separação dos pais, doença mental e
alcoolismo parental.
Buscando avançar na discussão, recorremos a Marcelli (2007) que distingue três
perspectivas de análise da influência da
família nos conflitos da adolescência. A
primeira compreende os conflitos entre
pais e adolescentes como conseqüência do processo de adolescência e desse
modo é o adolescente que entra num embate com os pais, se opondo a eles para
marcar sua autonomia. Nesta perspectiva, a revolta e hostilidade do adolescente dirigida aos pais é um mecanismo de
encontrar-se a si mesmo e constitui uma
pressão necessária para superar os laços
de dependência com os pais. Ainda que
o adolescente deprecie seus pais, ele não
deseja destruí-los como modelos para sua
vida adulta. Por outro lado, numa segunda perspectiva, alguns autores julgam que
115
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
as condutas problemas dos adolescentes
resultam em grande parte de atitudes
patológicas dos pais que se vêem ameaçados pelas tentativas de independência
do filho adolescente. Trata-se de pais frágeis que não suportam os esforços de separação do adolescente. Por último, uma
terceira perspectiva, agrega autores que
consideram que os conflitos entre os adolescentes e seus pais testemunham tanto
dificuldade do adolescente de assumir
seu crescimento e sua autonomia como
dificuldade dos pais de superarem o que
é chamado de crise parental. Nesta perspectiva, os conflitos do adolescente não
são vistos simplesmente como resultado
da adolescência, mas testemunham tanto as dificuldades dos adolescentes como
dos pais. Apesar destes três pontos de vistas não serem excludentes, acreditamos
que é possível reconhecer um entre eles
que parece mais pertinente a cada adolescente e sua família. Compreendemos
que os adolescentes precisam desafiar os
pais, hostilizar sua autoridade já que este
desafio é fundamental para o desenvolvimento de sua autonomia. Os pais devem
suportar as provocações e os desafios de
uma forma ativa, por meio de uma postura coerente e firme. Mas como os pais de
hoje acompanham o adolescente em sua
crise? Será que eles estão sendo capazes
de reconhecer as reivindicações dos seus
filhos adolescentes? Em acréscimo à discussão da agressividade dos adolescentes, consideramos que o funcionamento
da família também é influenciado pelo
contexto social. Estudos mostram que as
características da família contemporânea
dificultam a superação do processo da
adolescência. Vários autores (Roudinesco,
2003; Figueira, 1987), analisando a transformações socioculturais que influencia116
ram o arranjo da família contemporânea,
sustentam o enfraquecimento das figuras
parentais. Mayer (1997, citado por Savietto, 2006), por exemplo, vai apontar a ambigüidade do lugar ocupado por homens
e mulheres como pais na atualidade. Ele
considera que a família atual está em crise, e remete essa situação à falta de estabilidade e à incerteza que estão em jogo
no desempenho dos papéis dos membros
da família. Para Levisky (2001), a confusão
de papéis na família atual é fruto da ausência de hierarquia dos seus membros,
que gera uma indiferenciação entre pais e
filhos. Para ele, a falta de clareza dos papéis promove uma desorganização interna
e externa que é capaz de gerar um sentimento de insegurança no adolescente que
neste momento, precisa ter ao seu lado
um adulto para confrontá-lo em suas reinvidicações e ajudá-lo a pensar e a se desenvolver. Este breve exame da influencia
dos pais na problemática da agressividade
dos adolescentes mostra que na clínica,
não só o adolescente deve ser olhado e
escutado, mas também a própria família.
Hoje a avaliação do ambiente familiar de
um adolescente em dificuldade deve fazer
parte da abordagem dos profissionais. Entretanto, não se trata de tomar os pais em
consideração para culpabilizá-los, mas de
reconhecer a responsabilidade dos mesmos no processo de subjetivação do adolescente. Nesta perspectiva, destacamos
a proposta de intervenção clínica que envolve um trabalho de apoio narcísico parental (Marty, 2006). Trata-se de uma proposta de tratamento da agressividade que
passa pela tomada de consciência, por
parte dos pais, do papel que devem exercer na constituição do self, em particular
no momento da adolescência. Os resultados do projeto de extensão apontam que
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
apesar das resistências é possível maior
implicação dos pais na problemática dos
filhos adolescentes desde que se sintam
apoiados e não culpados pela instituição
e profissionais.
Palavras-chave: Adolescência. Agressividade.
Família.
MR LT01 - Mesa Redonda
Convidada
MR LT01-785 - A CONSTRUÇÃO
DA ESCOLHA PROFISSIONAL NO
CURSO DA VIDA: UM LOCUS DE
INTERLOCUÇÃO ENTRE A PSICOLOGIA
DO DESENVOLVIMENTO E A PSICOLOGIA
DO GÊNERO.
Maria Helena Fávero - UnB
[email protected]
Financiamento: CNPq
Nossas pesquisas têm focado o desenvolvimento psicológico e a Psicologia
do Conhecimento e elas nos ensinaram
que as áreas de conhecimento mantêm
representações sociais próprias e particulares e que essas se articulam com os
significados dos papéis de gênero. Há
duas décadas nossos dados já evidenciavam que em uma situação de resolução
de problemas o desempenho dos alunos
e das alunas variava se as informações
para a realização da atividade eram dadas por um homem ou por uma mulher.
Temos desenvolvido uma linha de pesquisa para nos dedicarmos ao estudo
da Psicologia do Gênero tendo em vista
uma maior compreensão dos processos
psicológicos desenvolvimentais. Temos
insistido, então, em expor a ideologia do
patriarcado contemporâneo - que fundamenta, por meio da tese da naturalização, as ideologias da masculinidade e da
feminilidade - para sustentar a necessidade de reflexão sobre as práticas sociais
e institucionais vigentes e sobre nossas
próprias práticas profissionais e pessoais
em relação ao gênero, que sustentam em
última análise, um processo gendrado
de socialização que mantém a ideia das
chamadas escolhas profissionais adequadas segundo o gênero. Temos insistido
também que este processo gendrado de
socialização mantém padrões gendrados
de emoção que mediam as aquisições
individuais. Assim, as crenças gendradas
sobre a emoção podem atuar na interpretação dos indivíduos sobre suas próprias
experiências emocionais vividas em determinadas circunstâncias. Considerando
o exposto, esta mesa redonda discutirá,
através de relatos de pesquisas as seguintes questões particulares: (a) o acesso às
diferentes áreas do conhecimento segundo o gênero e suas implicações na escolha
profissional; (b) a desigualdade da participação de homens e mulheres nas áreas
de ciências e tecnologia; (c) o ensino e a
aprendizagem da matemática como um
filtro crítico na manutenção desta desigualdade; (d) o acesso ao conhecimento
sobre o gênero e a tomada de consciência da sua relação com a própria subjetividade; (e) a implicação da consideração
do gênero na pesquisa desenvolvimental.
Em suma, por meio do aporte e da articulação entre a Psicologia do Desenvolvimento, a Psicologia do Conhecimento e a
Psicologia do Gênero esta mesa redonda
abordará ambos: as interações particulares de gênero na construção e na mediação do conhecimento científico e que tais
117
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
interações particulares dizem respeito à
igualdade de gênero, educação e cidadania democrática inclusiva.
Palavras-chave: Socialização de papéis de
gênero; Escolha profissional, Cidadania.
ESCOLHA PROFISSIONAL E GÊNERO:
UMA RELAÇÀO QUE DEMANDA UMA
PSICOLOGIA REFLEXIVA E CRÍTICA.
Maria Helena Fávero - UnB
[email protected]
Financiamento: CNPq
O consenso nas publicações sobre epistemologia, filosofia e história da psicologia
critica a ideia de se considerar os chamados
vieses culturais e políticos como um problema metodológico e defende o interesse
nos vieses sociais e históricos do conhecimento científico (Janice Haaken, 1988;
Ronald Mather, 2000; Jill Morawiski, 2005;
Jan Smedslund 2009; Kenneth J. Gergen,
2010). Neste consenso, a perspectiva feminista tem insistido na constituição de uma
psicologia reflexiva e crítica que considere
as dinâmicas do gênero (Jill Morawiski,
1997; 2005). Assumindo esta perspectiva
temos defendido a tese da interação dialética entre o ser humano e a sociocultura
para evidenciar a importância do gênero
nessa interação, tanto nas construções
pessoais como nas socioculturais (Fávero,
2010 a; 2010 b). Assim, temos procurado
fundamentar a articulação entre desenvolvimento, conhecimento e gênero, defendendo que o plano do funcionamento interno não é dado: ele é construído (Fávero,
2007 a). É nessa perspectiva que entendemos a socialização: uma construção gendrada cujo ponto central reside no modo
como entendemos a emoção e como a
118
filiamos aos significados do feminino e do
masculino (Fávero, 2010a). Temos assumido dois desafios. O mais óbvio é evidenciar
a manutenção da ideia de que homens e
mulheres constituem duas categorias diferentes de indivíduos; o mais sutil diz respeito às noções de objetivo e de subjetivo,
culturalmente e historicamente associados a essas duas categorias: a objetividade, associada à razão, à masculinidade e ao
mundo público; a subjetividade, associada
à afetividade, à feminilidade e ao mundo
privado. Por exemplo, em um estudo sobre as representações de gênero com estudantes universitários, professores e pais
de alunos obtivemos, frente à questão “Na
sua vida escolar, entre professores e professoras, qual ou quais lhe marcaram mais,
eles ou elas? Por quê?” duas proposições-chave: as professoras são mais afetivas;
os professores são mais competentes. No
geral, as professoras foram relacionadas às
áreas sociais e humanas e os professores
às áreas exatas (Fávero & Salgado, 2006).
Em outro estudo, a análise dos atos da
fala produzidas em grupos focais (Fávero,
2007 b) de professores indicaram 5 temas
predominantes: 1º – gênero e exercício do
magistério nas séries iniciais – evidenciando duas proposições: a sociedade espera
que a mulher alfabetize; a instituição escolar concorda; 2º – a competência masculina no magistério – foco na racionalidade,
autoridade e controle, segundo a premissa
de que a figura masculina impõe respeito;
3º – magistério e maternagem – sensibilidade, natureza e cuidado fundamentaram
a premissa de que a relação entre magistério, mulher e maternagem é natural; 4º
– habilidades femininas – separação entre
áreas de conhecimento e gênero: a mulher
apresenta, naturalmente, mais habilidades
linguísticas, artísticas e manuais; 5º – o
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
homem como chefe de família e provedor
–os sujeitos defendem melhores salários,
não pelo magistério em si, mas por serem
homens e provedores (Fávero & Salgado,
2007). Estes dados confirmam a análise
de Abramo (2004) e Anzorena (2008). Ou
seja, um sistema de diferenças como o gênero, torna-se um princípio organizador
das relações sociais: como os homens e
mulheres mantêm intensa interação, seja
no contexto privado, como nos contextos
públicos, o gênero difere de outras formas
de desigualdade; esta interação constrói
experiências que confirmam, ou potencialmente determinam as crenças sobre
as diferenças e desigualdades de gênero
(Ridgeway e Smith-Lovin, 1999; Ridgeway
e Correl, 2004). Portanto, defendemos que
a escolha profissional é uma construção
vinculada a uma socialização gendrada.
Estas questões nos permitem focar duas
questões particulares: 1. A desigualdade
da participação de homens e mulheres nas
áreas de ciências e tecnologia; 2. O ensino e a aprendizagem da matemática como
um filtro crítico na manutenção desta desigualdade, já que está no centro das crenças parentais sobre as escolhas ocupacionais tidas como “apropriadas” aos papéis
de gênero (Watt e Eccles, 2008). Igualmente, os professores e professoras têm expectativas diferentes para alunos e alunas
particularmente no caso da matemática e
isto se inicia muito cedo na escolarização
(Mosconi, 2001). Comprovamos isto em
um estudo sobre as concepções de professores e professoras de matemática: para as
professoras, as alunas têm bom desempenho em matemática porque se esforçam;
os alunos estão prontos para o raciocínio
matemático; para os professores, as alunas tendem naturalmente para as áreas
humanas e os alunos para as exatas; as alu-
nas se esforçam para aprender, mas “não
têm o raciocínio matemático desenvolvido”. Levando tais premissas para a discussão com alunos da 9ª série, entre 14 e 15
anos, obtivemos concepções distintas: “as
meninas são mais inteligentes na matemática”; “elas são mais maduras”; “elas
estudam mais”; “aprendem com mais facilidade”; “a maioria dos meninos só quer
‘vadiar’” (Alves & Fávero, 2010). Por outro
lado, nossas pesquisas de intervenção com
estudantes com dificuldade em matemática (Fávero, 2007 c) apontam como Dweck
(2007) que, ver a competência em matemática como um dom fixo e “natural”, leva
os estudantes a questionarem sua própria
capacidade e perderem a motivação quando encontram dificuldades; ver a competência como um processo de desenvolvimento leva-os, diante de dificuldades, a
procurar procedimentos ativos e efetivos.
Nossos estudos têm nos permitido ampliar
esta discussão para a questão mais ampla
da relação entre conhecimento e cidadania e de trazer à pauta de discussão, “no
contexto das diferentes áreas do conhecimento científico, a relação entre ensino, filosofia e cidadania, com o intuito de tornar
explícita a possibilidade efetiva de considerar a responsabilidade humana e cidadã e
pleitear que a instituição escolar assuma,
por princípio, educar o cidadão e prover
educação para a cidadania” (Fávero, 2009,
p.16). Por isto mesmo concluímos, partilhando os aspectos consensuais dos estudos da linha de pesquisa que focamos
aqui: 1. Pleitear uma educação que fundamente, por meio de sua prática, uma relação entre igualdade de gênero, pedagogia
e cidadania (Arnot, 2006; Enslin e Tjiattas,
2006); 2. Conquistar justiça social, tanto no
nível doméstico como no nível global (Howell, 2007); 3. Sustentar a tese segundo
119
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
a qual a afirmação dos direitos humanos
universais caminha junto com a decisão de
desafiar a distinção entre público e privado
(Kaplan, 2001).
Palavras-chave: psicologia critica; socialização
gendrada e escolha profissional; cidadania.
LA RESOLUCIÓN DE PROBLEMAS:
INDICIOS ACERCA DE EL PROCESO DE
CONSTRUCCIÓN DE LA ESCOGENCIA DE
UNA PROFESIÓN
Yilton Riascos Forero - UNICAUCA/COLÔMBIA
[email protected]
Maria Helena Fávero - UnB/DF
fá[email protected].
La literatura nacional e internacional enfatiza la importancia de la relación entre
género, ciencia y matemática y la relación
entre desarrollo psicológico, conocimiento
y género (Fávero, 2010 a). Se trata de una
cuestión de punta que compara la igualdad en el acceso al conocimiento entre los
géneros; sobre todo las áreas de ciencia
y tecnología y su relación con las creencias culturales sobre género. Defendemos
como Fávero (2010 b) que las instituciones
educativas, lugar donde tales creencias
están en juego, deben ser consideradas a
través de la articulación entre a psicología
del desarrollo, la psicología del género y la
psicología del conocimiento. La resolución
de problemas se presta para esto porque
evidencia las interacciones entre regulaciones cognitivas y regulaciones sociales y
expone el papel de la mediación semiótica
en el desarrollo psicológico (Riascos & Fávero, 2010). En particular, la resolución de
problemas estadísticos evalúa la lectura,
análisis e inferencia sobre la distribución
de los datos y los conceptos estadísticos,
120
ofreciendo así, subsidios para la Psicología
cognitiva y educativa (ver Watson & Morritz, 2001). Presentamos los resultados de
estudios en lo que hemos propuesto tareas sobre el contenido de dos conjuntos de
cajas de fósforo de diferente marca (X e
Y), que involucra en su solución la media
aritmética, la mediana y la moda, a estudiantes de ambos sexo, de quinta y octava
serie de enseñanza fundamental, de una
escuela de Brasilia, DF (150 estudiantes) y
de dos escuelas de Popayán, Colombia (85
estudiantes). En cada una de las 3 tareas
se buscaba que los estudiantes determinaran la marca de fósforos que, segundo
los datos presentados tendrían más contenido en sus cajas: “Las empresas X e Y,
fabrican fósforos que venden en cajitas.
Todas las cajas presentan una etiqueta que
indica 40 fósforos de contenido. Se sabe,
por observación y conteo que algunas cajas no siempre tienen el mismo número
de fósforos. Algunas veces ellas presentan
más o menos cantidad de fósforos; otras
veces, presentan efectivamente la cantidad indicada (40)”.Se evidenció diversos
comportamientos en el desarrollo de estrategia para la resolución, encontrando
que las estrategias de mayor complejidad
las desarrollaron los estudiantes brasileros. De las estrategias identificadas, se encontró con más frecuencia la de sumar los
valores; pocos estudiantes utilizan división y tablas de frecuencias.Se identificó un
comportamiento diferente entre las alumnas de 5ª serie y las de 8ª serie, contrario
al de los estudiantes hombres respecto al
número de tareas no resueltas. En el caso
de los alumnos brasileiros, todos los de
sexo femenino de la 5ª serie procuraron
desarrollar una estrategia para resolver
el problema, mientras que el 18,42% de
los de sexo masculino no lo hicieron; este
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
dato se invierte en la 8ª serie: 27,91% de
los de sexo femenino no desarrollan una
estrategia de resolución, para 10% de los
de sexo masculino que no lo hicieron. Este
dato no fue observado en los estudiantes
colombianos, sin embargo se observó el
uso de estrategias más simples por los alumnos de sexo femenino. Las conclusiones
corroboran las evidencias de otros estudios (Berger, 2004; Fávero e Soares, 2002;
Gonzalez-Pienda & Coll., 2006; Fernandes
& Healy, 2007; Fávero, 2009; Fávero & Pina
Neves, 2009; Muniz, 2009) y apuntan a las
dificultades de los alumnos brasileiros y
colombianos en la utilización de instrumentos matemáticos en la solución de los
problemas propuestos; la interacción particular del medio escolar con la lógica del
sistema numérico decimal y su notación y
una práctica de enseñanza que se viabiliza
a través de reglas no efectivas en la mediación de este sistema lógico y su utilización
como instrumento para la construcción
de nuevos instrumentos de pensamiento, como analizado por Fávero & Soares
(2002); la importancia de la enseñanza de
la estadística en currículo de matemática
de enseñanza fundamental; la importancia de considerar la articulación entre el
género y la enseñanza y el aprendizaje de
las diferentes áreas del conocimiento de
modo que se pueda asegurar la paridad
entre los géneros en lo que respecta a las
profesiones relacionadas con la ciencia,
la tecnología, las ingenierías, como propuesto por Fávero, 2010 a ; el papel de la
psicología en esta cuestión, que se refiere
a la escogencia de una carrera profesional
y, en última instancia, respecto a la construcción de la ciudadanía.
Palabras-clave: resolución de problemas,
desarrollo cognitivo, género.
O GÊNERO DA MATEMÁTICA NA
FORMAÇÃO PSICOPEDAGÓGICA: O
DESAFIO DA PESQUISA NA DOCÊNCIA
Regina da Silva Pina Neves - SBEM
[email protected]
Maria Helena Fávero - UnB
[email protected]
Da última década do século passado para
cá, houve uma ampliação significativa do
número de mulheres na Educação Básica
e no Ensino Superior (Godinho, 2005; Ristoff, 2006): as mulheres superaram os homens em escolaridade; estão em maior
número nas áreas de humanas e biológicas; os homens estão em maior número
nas áreas de exatas e, isto permanece nos
cursos de pós-graduação (Chamom, 2005;
INEP, 2011). Fávero (2010) discute essas
diferenças argumentando que é necessário compreender a natureza das relações
que crianças, adolescentes, jovens e adultos têm construído com as diferentes áreas de conhecimento e como tais relações
têm influenciado a escolha profissional.
Assim, Fávero (2010) defende uma linha
de pesquisa particular, focada na investigação da escolha “profissional de postos
relacionados à ciência, matemática e tecnologia; sobre a permanência da mulher
nas carreiras tecnológicas e sua relação
com os fatores emocionais; a relação entre gênero e tempo dedicado ao trabalho
(p.188).” Dentro dessa linha de pesquisa,
temos desenvolvido estudos focados particularmente na formação de pedagogas e
psicólogas, estudantes de pós-graduação
em psicopedagogia de uma universidade
pública. Temos perseguido o duplo desafio de, primeiro, definir um procedimento
didático para abordar o estudo do desenvolvimento de competências conceituais
em matemática como uma disciplina do
121
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
curso em questão, considerando-se que
ele deve responder à necessidade de discutir as questões pertinentes à Educação
Matemática e, ao mesmo, mediar o conhecimento matemático. Segundo, tal situação didática deve se constituir em um
lócus de pesquisa. Assim, num primeiro
estudo, apresentamos a 26 pedagogas
e 6 psicólogas, estudantes do já referido
curso, duas tarefas: a resolução de uma
situação-problema e a análise dos registros de sete alunos produzidos na resolução de três situações-problema. Os resultados evidenciaram que, no geral, as participantes descreviam o erro sem levantar
hipóteses, atribuindo-o ao aluno e apresentavam um discurso construtivista, incompatível com suas respostas e dúvidas
conceituais (Fávero & Pina Neves, 2009).
No segundo estudo colocamos em experimentação um procedimento didático
focado na relação entre resolução de problemas, didática e história da matemática, visando capacitá-los a intervir como
psicopedagogos na mediação do conhecimento matemático na prática clínica e
institucional. Evidenciou-se que a maioria associava a matemática ao medo, ao
fracasso e à dificuldade. O procedimento
didático que desenvolvemos desarticulou
tal associação e desenvolveu: a competência para analisar a notação de alunos e
colegas segundo o campo conceitual nos
quais as resoluções se inseriam; a compreensão da mediação e da notação na
conceituação matemática; a tomada de
consciência sobre a importância do currículo de matemática e das práticas de avaliação; a prática da pesquisa na formação
inicial e continuada de professores. Nossos dados corroboraram os estudos que
têm investigado a relação entre gênero e
aprendizagem de matemática por meio
122
de uma abordagem qualitativa segundo
os quais existe um viés cultural relacionado com gênero no desenvolvimento dos
currículos de matemática (isto é, exemplos mais relacionados com o universo
simbólico de meninos, a partir sexto ano,
por exemplo) e com a própria prática didática, como diferentes tipos de perguntas e incentivos para meninos e meninas (Walden e Walkerdine, 1985; Freire,
2002; Andrade et al, 2003; Souza, 2008).
Insistindo na perspectiva de que a docência universitária pode e deve ser um lócus
de pesquisa, recentemente desenvolvemos um terceiro estudo junto aos atuais
estudantes do curso já mencionado, com
o intuito de refinar nosso procedimento
didático com os seguintes objetivos: 1/
compreender como avaliam a relação
que estabeleceram com a matemática,
seu ensino e aprendizagem ao longo da
sua escolarização; 2/ analisar o seu desempenho sobre a conceituação matemática relacionada a tópicos curriculares
presente na Educação Básica, 3/ compreender como a crença sobre sua própria
competência impacta sua futura prática
profissional de psicopedagogo. Participaram 23 mulheres, entre 23 e 48 anos, provenientes dos cursos de fonoaudiologia,
psicologia e pedagogia. Tendo em vista os
objetivos anunciados, lhes propusemos
uma atividade em quatro etapas: 1ª / responderam perguntas que identificavam
idade, formação, local de trabalho, atividade desenvolvida, atuação profissional;
2ª / completaram as duas frases: “Na minha vida escolar a matemática...”; “ Os
professores de matemática na minha vida
escolar...”, 3ª / resolveram uma situação-problema sobre conceitos algébricos e
geométricos, extraída do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA) e,
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
4ª / descreveram seus sentimentos durante a 3ª etapa. Os dados foram analisados considerando-se a filiação entre competências e dificuldades Fávero (2001,
2005b), e a natureza da tarefa proposta.
Os dados da 1ª etapa evidenciaram atuações, como psicóloga, docente dos anos
iniciais, orientadora educacional e coordenadora educacional, todas envolvendo
trabalho com crianças e adolescentes em
situação de risco, necessidades especiais
e situação de dificuldade de aprendizagem, na maioria relacionada à matemática. Os dados da 2ª etapa evidenciaram:
a consideração da matemática como importante área de conhecimento para a
inserção dos sujeitos na sociedade atual;
relatos de experiências escolares positivas com a matemática nos anos iniciais
do Ensino Fundamental; relatos de que
tais experiências mudam de natureza e
passam a ser negativas na medida em
que avançam na escolaridade, atingindo níveis de desinteresse, dificuldade e
aversão no ensino médio; relatos sobre a
diferença na mediação do conhecimento
matemático por parte de seus professores e professoras a depender do nível de
ensino, sendo mais acolhedores nos anos
iniciais, menos acolhedores nos anos finais do ensino fundamental e no ensino
médio, assumindo métodos mais investigativos, nos anos iniciais e mais formais
nos demais níveis, influindo seus próprios
modos de ver e aprender matemática. Os
dados da 3ª etapa – resolução de problema – evidenciaram dificuldades na análise de padrões geométricos, na interpretação algébrica e na resolver da equação,
evidenciando a não compreensão de fórmulas matemática e o significado de seus
termos. Os dados da 4ª etapa evidenciam relatos associados a sentimento de
medo, angustia e dúvidas sobre a própria
competência diante da tarefa. Por fim,
assumem a importância de desenvolver
competências sobre o conhecimento matemático para a sua futura prática profissional em psicopedagogia. Tais resultados
reforçam a necessidade de procedimento
didático que articule resolução de problemas, didática e história da matemática
para o desenvolvimento de competências
matemáticas fundamentais para a prática
profissional em psicopedagogia.
Palavras-chave: conhecimento matemático,
gênero, pesquisa didática.
MR LT04 - Mesa Redonda
Convidada
MR LT04-1232 - CONTRIBUIÇÕES DA
PSICOLOGIA ESCOLAR À PROMOÇÃO DO
DESENVOLVIMENTO HUMANO ADULTO
Cynthia Bisinoto - UnB
[email protected]
Baseando-se em uma perspectiva crítica,
positiva e progressista da Educação, as
práticas profissionais, de pesquisa e de
produção de conhecimento em Psicologia
Escolar vêm se disseminando para diversos espaços educativos nos quais a atuação e mediação da área se comprometem
com os processos de aprendizagem e de
desenvolvimento (Araujo, 2003; Guzzo,
1996, 2001; Martínez, 2003). Se, historicamente, o trabalho da Psicologia Escolar
se consolidou no contexto da escola da
educação básica, outros espaços de desenvolvimento humano, também responsáveis por promover processos educacio123
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
nais de diferentes naturezas, vêm sendo
reconhecidos como campos legítimos de
inserção do psicólogo escolar (Marinho-Araujo, 2009; Oliveira & Marinho-Araujo,
2009; Soares & Marinho-Araujo, 2010).
Alguns destes contextos são as creches,
orfanatos, abrigos, asilos, organizações
não governamentais, cursinhos pré-vestibular, Instituições de Educação Superior,
entre outros. Nesses diferentes espaços
tem sido recorrente a preocupação e
compromisso, sobretudo dos psicólogos
escolares, com as múltiplas possibilidades
de mediação em prol do desenvolvimento
humano, particularmente o desenvolvimento humano adulto, o qual é um tema
lacunar na Psicologia de forma geral (Fávero & Machado, 2003; Marinho-Araujo,
2009). Por conseguinte, têm crescido as
discussões em torno das competências
dos profissionais que atuam na educação, cujo trabalho deve comprometer-se
com o desenvolvimento e aprendizagem
(Marinho-Araujo & Almeida, 2005; Soares & Marinho-Araujo, 2010). Com base
em ações contextualizadas e ampliadas a
outros atores e instâncias institucionais,
a Psicologia Escolar tem investido no desenvolvimento humano adulto por meio
de ações que visem à formação de competências profissionais dos agentes da
educação, sejam os próprios psicólogos
escolares ou outros atores (coordenadores, professores, pais e alunos) envolvidos
no processo educativo. Como campo de
reflexão teórica, os pressupostos conceituais e metodológicos que orientam a
prática dos psicólogos escolares têm se
alicerçado, especialmente, nas proposições da abordagem histórico-cultural do
desenvolvimento humano. Essa abordagem, que tem em Vygotsky (s.d./1999,
s.d./2003, s.d./2009), Luria (s.d./2008) e
124
Leontiev (s.d./2004) seus maiores expoentes, concebe o homem como um ser
ativo, social e histórico, e assume que
ele se constitui a partir das interações
sociais que são mediadoras da construção de suas características, sentimentos,
pensamentos, crenças, conhecimentos e
concepções, enfim, da sua subjetividade.
Essa perspectiva incita-nos a pensar sobre
os espaços contemporâneos do trabalho
educativo como lócus para a elaboração
de processos formativos e de mediação
de competências que busquem favorecer
o desenvolvimento, tanto individual quanto coletivo, sob uma perspectiva sistêmica, dinâmica e relacional (Araujo, 2003;
Marinho-Araujo & Almeida, 2005). Nessa
perspectiva, a mesa redonda aqui proposta apresenta relatos e pesquisas que discutem contribuições da Psicologia Escolar
ao desenvolvimento humano adulto em
diferentes espaços educativos e almeja
suscitar reflexões sobre os desdobramentos das ações interventivas do psicólogo
escolar junto aos profissionais desses contextos. Assim, o primeiro trabalho apresenta e discute uma proposta de atuação
para os Serviços de Psicologia Escolar na
Educação Superior. O segundo, apresenta
experiências de intervenção do psicólogo
escolar em espaços de trabalho cotidiano
e de formação continuada. Na sequência,
serão abordadas possibilidades de mediação da Psicologia Escolar junto a educadores sociais em organização não governamental, visando o desenvolvimento de
competências profissionais.
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
PROPOSTA DE ATUAÇÃO PARA A
PSICOLOGIA ESCOLAR NA EDUCAÇÃO
SUPERIOR
Cynthia Bisinoto - UnB
[email protected]
Um dos contextos emergentes de atuação
e pesquisa em Psicologia Escolar é a Educação Superior, a qual tem como finalidade
formar sujeitos para a vida em sociedade.
Para além do foco na competência profissional, que é uma das dimensões do desenvolvimento dos sujeitos, a formação em
nível superior deve incidir na preparação
de pessoas capazes de enfrentar de forma
ética e socialmente comprometida os desafios extremamente contraditórios, ambíguos e complexos que são característicos
da sociedade contemporânea. Mais do que
habilitar sujeitos a exercerem com competência e sucesso sua atividade profissional,
a Educação Superior tem como finalidade
formar cidadãos conscientes do seu poder
transformador no combate à exclusão, injustiças, desigualdade, enfim, questões relevantes na área social, econômica, política
e cultural de uma nação (Dias Sobrinho,
2004, 2005; Goergen, 2008; Marinho-Araujo, 2009; Morosini, 2005, 2006; Ristoff,
1999, 2008; Severino, 2000, 2002; Sguissardi, 2006, 2008). Nesse sentido, a Educação
Superior é um dos espaços sociais privilegiados e fecundos à promoção do processo de desenvolvimento humano adulto
justamente pelo fato de que as diferentes
aprendizagens ali propiciadas são propulsoras do desenvolvimento. Por meio da relação com os vários objetos de conhecimento
científico, a crítica, a reflexão e o exercício
político da participação social, além das
relações interpessoais que se constrói entre os sujeitos adultos e jovens adultos, a
natureza da mediação que ocorre na Edu-
cação Superior é qualitativamente distinta
daquela que transcorre em outros contextos. O conhecimento científico, artístico
e cultural intencionalmente contemplado
nos planejamentos de ensino, as informações divididas, os saberes apropriados, as
posturas éticas e ideológicas partilhadas,
bem como as vivências pessoais e as relações intersubjetivas que se fomentam no
contexto educativo são mediadoras do processo de aprendizagem e, por conseguinte,
do desenvolvimento humano que tem nela
sua base (Oliveira, 2011). Por essa razão, a
Educação Superior como contexto no qual
transcorrem múltiplos e complexos processos de aprendizagem tem papel primordial
na mediação das funções psicológicas superiores dos sujeitos adultos que frequentam esse espaço, seja como estudantes ou
como profissionais (Marinho-Araujo, 2009;
Oliveira & Marinho-Araujo, no prelo). Entretanto, em virtude das inúmeras e complexas transformações características da
sociedade contemporânea, as Instituições
de Educação Superior (IES) têm se confrontado com desafios e dilemas relacionados
ao seu papel frente às demandas do mercado; à expansão quantitativa das instituições
e dos cursos; à efetividade dos programas
de apoio ao acesso e permanência; à adequação dos objetivos pedagógicos e institucionais à realidade dos estudantes; à qualificação do corpo docente; à necessidade
de inovações curriculares e pedagógicas;
entre outros. Para enfrentar de forma mais
eficiente estes desafios, as IES têm desenvolvido algumas estratégias como a criação
de Serviços de Psicologia voltados ao apoio
ao estudante, ao sucesso acadêmico, à inserção profissional, entre outros objetivos.
Se, por um lado, nos países europeus e
norte-americanos estes serviços estão em
funcionamento há muitos anos, por outro,
125
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
no Brasil, a produção científica relativa à
atuação da Psicologia Escolar no Sistema
de Educação Superior e a presença dos psicólogos escolares nas IES são consideradas
restritas e recentes (Bariani, Buin, Barros
& Escher, 2004; Oliveira, Cantalice, Joly &
Santos, 2006; Serpa & Santos, 2001). Dessa
maneira, a Psicologia Escolar tem um grande desafio que é o de ampliar suas perspectivas de atuação por meio de práticas
diferenciadas em um contexto ainda pouco explorado pela área. Com o intuito de
conhecer o trabalho realizado nestes Serviços, desenvolveu-se um estudo com objetivo de investigar a atuação da Psicologia
Escolar em IES do Brasil e, em especial, do
Distrito Federal. Nesta apresentação, pretende-se, portanto, discutir alguns dos resultados relativos à atuação dos psicólogos
escolares na Educação Superior brasileira
e, na sequência, apresentar uma proposta
de criação e estruturação para os Serviços
de Psicologia na Educação Superior. No que
tange aos resultados da pesquisa, nota-se
que os Serviços de Psicologia distribuídos
nas IES brasileiras não são privilégio de um
tipo de instituição; ao contrário, eles se fazem presentes tanto nas universidades com
perfil acadêmico quanto nas faculdades
com perfil mais profissionalizante; em relação à natureza administrativa das IES com
serviços, são as instituições privadas as que
mais os têm. O foco principal da ação dos
psicólogos nestes serviços são os estudantes, fundamentalmente os de graduação,
todavia, apesar do objetivo principal estar
centrado neste segmento da comunidade
acadêmica, alguns Serviços já estendem
suas ações para outros públicos da instituição, ampliando seu foco de intervenção.
Considerando que são muitos e diversificados os espaços de aprendizagem, bem
como são múltiplos os caminhos que levam
126
a um desenvolvimento saudável e pleno
em suas potencialidades, é extremamente
pertinente haver uma variedade de atividades que tenham como meta a promoção
desses processos. Relativamente à proposta de criação e estruturação dos Serviços de
Psicologia, ela se ancora na perspectiva histórico-cultural do desenvolvimento psicológico humano (Leontiev, s.d./2004; Luria,
s.d./2008; Vygotsky, s.d./1999, s.d./2003,
s.d./2009) e na abordagem preventiva e
institucional de atuação em Psicologia Escolar (Araujo, 2003; Marinho-Araujo & Almeida, 2005). Se, por um lado, pretende-se, com este modelo de atuação, propor
algumas linhas de intervenção para os psicólogos que trabalham nestas instituições,
por outro, aspira-se que ele venha figurar
como detonador de um movimento de reflexão, estudo, investigação e problematização acerca das possibilidades de atuação
da Psicologia Escolar na Educação Superior.
A proposta de atuação se organiza em seis
eixos: (a) a fundamentação teórica que a
sustenta, baseada na abordagem histórico-cultural do desenvolvimento humano; (b)
os objetivos que se entende pertinentes
aos serviços desse tipo; (c) o público alvo
para o qual podem ser dirigidas as intervenções; (d) a descrição dos recursos humanos
que podem compor os serviços, destacando as características do perfil dos psicólogos escolares, o número de profissionais e
o vínculo de trabalho com a IES; (e) alguns
elementos importantes sobre o funcionamento e organização do serviço; e, por
fim, (f) possíveis atividades que podem ser
desenvolvidas pelos profissionais, as quais
estão organizadas em três dimensões interdependentes.
Palavras-chave: Psicologia Escolar, Educação
Superior, Serviços de Psicologia.
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
PSICOLOGIA ESCOLAR:
RESSIGNIFICANDO METODOLOGIAS
PARA ATENDER ÀS NOVAS DEMANDAS
DA ATUAÇÃO
Rejane Barbosa - SEEDF/FA,
[email protected]
O estudo acerca do desenvolvimento
adulto vem se configurando como um
importante e necessário campo de pesquisa, haja vista os avanços tecnológicos
e a atual configuração sociocultural, que
demandam o exercício de novas capacidades intelectuais, sociais e afetivas. Em
uma perspectiva histórico-cultural, pode-se dizer que o ser humano desenvolve-se
ao longo de todo seu curso de vida, uma
vez que é capaz de manter e aperfeiçoar
as interações com seus pares, com instrumentos e com o ambiente por meio das
mais diferentes linguagens e signos culturais presentes no seu cotidiano (Vygostky,
s.d./2007). Neste contexto, a Psicologia
Escolar constitui-se como área de conhecimento que contribui fundamentalmente para que a escola possa atingir seus
objetivos enquanto espaço de promoção
das diversas aprendizagens, do desenvolvimento humano e da cidadania. Não somente para os estudantes, mas principalmente para os profissionais que ali atuam.
Dessa, forma torna-se relevante pesquisar
e apresentar possibilidades de formação
continuada que favoreçam o desenvolvimento de habilidades e recursos pessoais,
interpessoais, profissionais, cognitivos, éticos, entre outros que corroborem à formação de competências do psicólogo e dos
demais atores da escola (Barbosa, 2008).
Com base na abordagem histórico-cultural (Leontiev, s.d./2001; Luria, s.d./1990;
Vygotsky, s.d./ 2000, s.d./2007) e na abordagem por competências (Kuenzer, 2002;
Le Boterf, 2003; Wittorski, 1998; Zarifian,
1993), esta apresentação tem, dentre seus
objetivos, compartilhar experiências de
trabalho cotidiano e de formação continuada para profissionais da educação, mais
especificamente voltada para professores
e psicólogos que atuam no contexto da
escola. O psicólogo escolar é um dos profissionais que deve contribuir com a ressignificação e oxigenação dos espaços subjetivos presentes no contexto educacional.
Pode atuar por meio da promoção de espaços coletivos e individuais de reflexão,
no qual compareçam assuntos relacionados à prática profissional, reconhecimento
dos desafios e avanços presentes no contexto escolar, das potencialidades do grupo, discussão das concepções de desenvolvimento e aprendizagem presentes no
grupo escolar, entre outros. O contexto de
ensino atual solicita um profissional que,
mediante o desenvolvimento de novas
habilidades de compreensão da escola em
sua conjuntura social, cultural, política e
econômica, seja capaz de planejar estratégias de favorecimento ao desenvolvimento
dos profissionais que ali atuam (Almeida,
2001, 2002; Araujo, 2003; Barbosa & Marinho-Araujo, 2010; Campos & Jucá, 2003;
Campos, Lopes, Onofre, Alexandre & Silva,
2005; Cruces, 2003; Guzzo, 2001, 2005;
Guzzo & Weschsler, 1993; Marinho-Araujo
& Almeida, 2003, 2005; Neves, 2007; Souza, 2004, 2007; Vectore & Maimoni, 2007).
A título de ilustração, serão apresentadas
três experiências intervenção do psicólogo
escolar em espaços de trabalho cotidiano
e de formação continuada desenvolvidas
entre os anos de 2009 e 2010. O primeiro
focaliza o trabalho desenvolvido no âmbito da Secretaria de Estado de Educação
do Distrito Federal (SEEDF) com o grupo
de psicólogos escolares, o qual se refere a
127
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
reelaboração do documento norteador da
atuação em Psicologia Escolar no DF, denominado Orientação Pedagógica do Serviço
Especializado de Apoio à Aprendizagem
(OP/SEAA). O modelo inovador do trabalho realizado proporcionou a todos os participantes a discussão acerca das concepções institucionais que balizam a atuação
e a construção coletiva das ações que hoje
estão presentes no cotidiano de muitos
psicólogos escolares do Distrito Federal
(Marinho-Araujo, Neves, Pena-Moreira &
Barbosa, no prelo). O segundo apresenta a
dinâmica de atuação do psicólogo escolar
que compõe as equipes multidisciplinares
de apoio à aprendizagem da SEDF, implementada em uma cidade do Distrito Federal proposta a partir da pesquisa desenvolvida por Barbosa (2008). O modelo de
trabalho foi organizado em três dimensões
denominadas: (a) intraequipe; (b). interequipes e (c) extraequipe, cujo objetivo geral foi viabilizar para os próprios psicólogos
e para os demais membros da comunidade
escolar – pedagogos, gestores, professores, alunos, pais, entre outros – o desenvolvimento de habilidades e recursos que
subsidiem ações competentes e promotoras do sucesso escolar. O terceiro e último
exemplo refere-se à atuação do psicólogo
escolar no programa de acompanhamento
ao aluno com altas habilidades, também
da SEDF, que pautada pelas mesmas bases
epistemológicas e teóricas vem ratificando este tipo de intervenção relacional e
institucional já utilizada nas experiências
anteriores como uma possibilidade de ampliação e ressignificação do trabalho do
psicólogo escolar com vistas à promoção
do desenvolvimento humano adulto no
contexto escolar. Portanto, a apresentação do tema aqui exposto contribui com
estratégias para a promoção do desenvol128
vimento adulto, as quais vêm sendo utilizadas, nos últimos cinco anos de trabalho
em Psicologia Escolar, na esfera da SEEDF,
de modo a cooperar com a ressignificação
da atuação psicológica no contexto escolar, numa perspectiva preventiva, para
além da remediação/tratamento das dificuldades de aprendizagem apresentadas
pelos estudantes. Igualmente, abre novas
possibilidades de compreensão das queixas escolares em um contexto muito mais
complexo e permeado por possibilidades
de desenvolvimento subjetivo de todos e
por oportunidades de promoção do sucesso escolar e social.
Palavras-chave: desenvolvimento humano
adulto, atuação institucional, desenvolvimento
de competências.
ATUAÇÃO DA PSICOLOGIA ESCOLAR
EM ONG: CONTRIBUIÇÕES PARA O
DESENVOLVIMENTO DE COMPETÊNCIAS
DE EDUCADORES SOCIAIS
Pollianna Soares - UnB
[email protected]
Nas últimas décadas, a Psicologia Escolar
tem revisto seus fundamentos epistemológicos para o estabelecimento de novas diretrizes de atuação profissional e produção
de conhecimento nos contextos de educação formal e não formal (Campos & Jucá,
2003; Cruces, 2003, 2005; Marinho-Araujo, 2007, 2009; Marinho-Araujo & Almeida, 2005; Oliveira & Marinho-Araujo, 2009;
Soares & Marinho-Araujo, 2010; Souza,
2006, 2010). O redirecionamento de sua
práxis, que amplia seu escopo de atuação
para distintos contextos educacionais, tem
ocorrido em meio a diversas mudanças no
campo político da educação no Brasil, ins-
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
tigando a Psicologia Escolar a comparecer
com um posicionamento crítico e levantando novas questões sobre a realidade
educacional do país. Nesse cenário, as
organizações não governamentais (ONGs)
de natureza educacional vêm ganhando
atenção da Psicologia Escolar por promoverem atividades educativas não formais,
visando o desenvolvimento humano (Soares, 2008; Soares & Marinho-Araujo, 2010;
Souza, 2009). As ONGs educativas surgem
no cenário brasileiro, especialmente entre
as décadas de 70 e 80, vinculadas a movimentos sociais que visam ao incentivo de
ações direcionadas à garantia dos direitos
civis relacionados à educação básica pública. A inauguração desses espaços tem demandado profissionais da educação com
um perfil específico à natureza e filosofia
institucionais, vinculado fortemente ao
compromisso com a transformação social
(Gohn, 2009, 2010). A esses profissionais,
Romans, Petrus e Trilla (2003) têm denominado de educadores sociais, os quais
proveem mediação pedagógica distinta
dos contextos formais de educação. Surgido em meio às emergências da sociedade
civil, o educador social ainda se encontra
com um perfil profissional pouco definido,
principalmente em virtude da falta de formação adequada, tanto inicial como continuada, para o exercício competente de sua
atuação. Conforme Caro e Guzzo (2004),
“muitas vezes, observam-se inadequações
de educadores sociais bem intencionados,
pela falta de formação, de apoio e até de
uma orientação por parte de profissionais
das diversas áreas de desenvolvimento”
(p. 16). Diante desse desafio, entende-se que a área da Psicologia Escolar pode
trazer contribuições às ONGs educativas
e, entre as suas possibilidades de atuação,
destaca-se urgência de ações que auxiliem
no desenvolvimento e consolidação da
identidade profissional do educador social.
Tradicionalmente, se reconhece a Psicologia Escolar como uma das áreas científicas
que contribuem para a discussão da formação do professor da educação formal
(Facci, 2009). Nesse novo panorama social,
há de se pensar sobre as possibilidades de
mediação dos psicólogos escolares junto
ao educador social nos contextos de educação não formal, que visem à transformação da realidade social. Dessa forma,
considera-se que a Psicologia Escolar deve
estar voltada para a mediação do desenvolvimento humano adulto, por meio da
promoção de intervenção e mediação psicológica que objetive contribuir para a formação das competências necessárias ao
exercício pedagógico crítico e politicamente comprometido com a transformação
social (Barbosa, 2008; Guzzo, 2003, 2005).
Para isso, é importante compreender o perfil necessário do educador social no recente cenário educativo brasileiro (Caro & Guzzo, 2003; Gohn, 2009). Entendendo que a
constituição das competências do trabalho
esteja ligada diretamente à subjetividade
humana e ao desenvolvimento psicológico
dos sujeitos (Araujo, 2003), considera-se o
trabalhador como um sistema complexo e
em contínua evolução nas esferas sociais,
cujo processo de formação profissional
está relacionado à constituição histórica
do seu processo de subjetivação. Assim,
ao se considerar o desafio da construção
do perfil profissional do educador social,
percebe-se a relevância em compreender
o caráter político, social, econômico e cultural intrínseco aos problemas sociais que
emergem na sociedade e que se presentificam na constituição da subjetividade desse sujeito trabalhador em especial. Nessa
direção, defende-se que a perspectiva his129
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
tórico-cultural do desenvolvimento (Leontiev, s.d./2001; Luria, s.d./1990; Vygotsky,
s.d./2000, s.d./2007), em articulação à
abordagem por competências (Le Boterf,
2003; Wittorski, 1998; Zarifian, 1993), são
aportes teórico-metodológicos relevantes
à formulação de estratégias de desenvolvimento adulto. Em virtude do campo de
atuação do educador social estar relacionado a compromisso e militância em favor
dos setores sociais mais desfavorecidos,
sua postura deve estar para além do caráter pedagógico, assumindo, também, posições de cunho político e ideológico (Romans, Petrus & Trilla, 2003). O comprometimento dos profissionais envolvidos nesse setor reflete uma atuação em prol da
transformação social, o que se torna fator
imprescindível para a conscientização de
sua responsabilidade como agente do desenvolvimento e emancipação social dos
sujeitos (Caro & Guzzo, 2004). É com essa
conscientização que o Psicólogo Escolar
deve estar comprometido quando sua intervenção direciona-se ao desenvolvimento adulto. Assim, a atuação em Psicologia
Escolar nesse contexto deverá vincular-se
ao desenvolvimento de competências de
educadores sociais, considerando a constituição histórica e social das ONGs que
requerem, em suas atividades institucionais, a expressão de recursos subjetivos e
objetivos de seus profissionais, manifestos
por meio de habilidades, conhecimentos,
saberes e capacidades que compõe o perfil
pessoal e profissional do ser educador. A
trajetória de vida pessoal e profissional do
educador e a própria história social dos espaços educacionais configuram a subjetividade social que constituem a identidade
dessa categoria (Araujo, 2003; Marinho-Araujo & Almeida, 2005). Defende-se,
nessa apresentação, que a atuação do
130
psicólogo escolar deve privilegiar o acompanhamento das práticas pedagógicas no
próprio contexto educativo, lócus privilegiado para o desenvolvimento de processos de formação contínua dos educadores
sociais. A formação continuada em serviço
se constitui como estratégia bastante útil
para o desenvolvimento de competências
que promovam reflexões e processos de
conscientização contínuos na práxis profissional (Guzzo, 2005; Marinho-Araujo &
Almeida, 2005). Tal conscientização, mediada pelo psicólogo escolar, poderá evidenciar, criticar e denunciar concepções
deterministas de desenvolvimento humano; práticas domesticadoras e autoritárias
de ensino e de aprendizagem; processos
de exclusão, marginalização e discriminação camuflados em processos avaliativos
ou em procedimentos pedagógicos pouco
críticos e autônomos em sua intencionalidade (Guzzo, 2003, 2005; Marinho-Araujo
& Almeida, 2005).
Palavras-chave: psicologia escolar, desenvolvimento de competências, educador social.
MR LT04 - Mesa Redonda
Convidada
MR LT04-1399 - ESCOLA INCLUSIVA,
ESTRATÉGIAS PEDAGÓGICAS E
FOSSILIZAÇÃO DE APRENDIZAGEM
Tânia Maria de Freitas Rossi - UNICESP
[email protected]
Financiamento: FAP-DF
Esta mesa redonda discute a escola inclusiva, focalizando quatro temas interrelacionados: O primeiro, Sobre o conceito
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
de fossilização analisa o uso do termo
fossilização na Psicologia e na Linguística,
um conceito não monolítico dada a falta
de uniformidade entre objetos de estudo.
O uso abarca (1) construtos complexos
vinculados falhas, desvios e estabilização
de funcionamento cognitivo resistente
à alterações; (2) causas individuais, não
generalizáveis, subjetivas, com conotação histórica e cultural e, (3) efeitos da
aprendizagem hebbiana nas construções
lingüísticas em um nível não-ótimo de
proficiência em relação à língua materna, de caráter dinâmico. Na Psicologia, a
fossilização é estudada como sucessão de
estágios necessários ao desenvolvimento
e formação de hábitos histórico-culturais,
urgindo se retomem a abordagem genética do fenômeno, transcendam sua identificação e focalizem a dinâmica de seu
desenvolvimento. Sugere a investigação
dos processos de mediação semiótica e de
internalização do conhecimento, ou seja,
do ensinar e do aprender, base da fossilização. O segundo, Estratégias pedagógicas
para o ensino-aprendizagem de conceitos
científicos em uma escola inclusiva investiga estratégias pedagógicas de quatro
professoras na construção de conceitos
científicos em quatro turmas de crianças
com desenvolvimento típico e deficiência
intelectual. Analisou-se atividades realizadas na introdução de um novo conceito e
sua apropriação pelas crianças, baseado
nos pressupostos vygotskianos. Foram realizadas entrevistas semiestruturadas com
as professoras e filmadas interações entre
estas e as crianças, especialmente aquelas
com desenvolvimento atípico, retratando
três momentos: apresentação, desenvolvimento e conclusão na constituição de
um conceito novo. Os resultados indicam
que as estratégias e recursos utilizados
pelas professoras contribuem para o desenvolvimento dos conceitos nos dois grupos, mas suscitam melhor compreensão
da (1) internalização dos conceitos pelas
crianças, a ponto de tornar-se automatizados, (fossilizados); (2) dos processos
que asseguram a continuidade do desenvolvimento. O terceiro tema, O processo
de inclusão em salas regulares: pontos
críticos, possibilidades pedagógicas e desafios na formação de professores, discute
o modelo educativo tendo como referência a concepção de inclusão nas escolas,
se valorizam e atendem à diversidade humana/cultural. Sustenta que, atualmente,
há reconhecimento das diferenças, não
como incapacidades, e que o objetivo é
ensinar a todos dado que aprender é condição inerente aos seres humanos. Compreende a realidade educacional como
multifacetada e as propostas pedagógicas
devem refletir a ação educativa, embasada na autonomia, na construção coletiva
do conhecimento e nas potencialidades
a serem estimuladas no processo de ensino e de aprendizagem. O quarto tema,
Atendimento especializado aos alunos
inclusos em salas regulares, mostra que o
atendimento educacional especializado às
pessoas com deficiência deve realizar-se,
preferencialmente, na rede regular de ensino, com estabelecimentos profissionais
especializados próprios ao atendimento
do aluno e professores capacitados à real
integração, nas classes comuns. Entretanto, o quadro atual afigura-se outro: faltam material específico para atender aos
alunos e profissionais especializados para
atender à criança especial. Lembra que o
papel a ser assumido pelos profissionais
educacionais especializados seria o de catalisar demandadas e coordenar atividades coletivas que fomentem os processos
131
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
de discussão, reflexão e resolução coletiva
e colaborativa dos problemas educativos.
SOBRE O CONCEITO DE FOSSILIZAÇÃO
Tânia Maria de Freitas Rossi - UNICESP
[email protected]
Vigotski (1997), ao estudar o desenvolvimento das funções psicológicas, deparou-se com processos que, ao longo do tempo, tornaram-se rígidos/mecanizados,
sem que sua aparência externa sofresse
modificação, enquanto que sua aparência
interna era modificada e esmaecida. Em
analogia à paleontologia, os denominou
“processos fossilizados”. A fossilização refere-se ao automatismo e à mecanização
de comportamentos e é o final de uma linha que une o presente ao passado, os estágios superiores do desenvolvimento aos
estágios primários (Vigotski, 2003). O termo fossilização, de uso freqüente na Linguística, possui definições e entendimentos distintos, apresentação de argumentos
teóricos e dados empíricos para descrição
e explicação do fenômeno e conceituação
que seguem a mesma diversidade. Assim,
o objetivo deste estudo é analisar alguns
desses usos correntes. A Linguística congrega grande parte das investigações e
focaliza processos de automatização de
comportamentos e seu uso não deliberado em situações de aprendizagem de uma
segunda língua, com uso contínuo de formas desviadas da forma correta da língua
em estudo. Todavia, há mais tentativas de
descrição que de explicação do fenômeno.
A noção de fossilização inicia-se em 1953,
quando Weinreich (1953) demonstrou
a existência da transferência gramatical
permanente nas formas da língua nativa
de um aprendiz de uma língua não-nativa
132
que foram erroneamente identificadas
com formas equivalentes dessa segunda
língua, para elas transferidas, tornando-se
fossilizadas. Em 1961, Nemser (citado por
Percegona, 2005) sustentou que, na aquisição de língua não-nativa, o sujeito cria
um sistema intermediário (interlíngua) no
qual a língua em estudo não é exatamente
como a língua “oficial” e tampouco como
a nativa. A fossilização compreenderia todos os estágios de competência lingüística
não nativa, considerados permanentemente adquiridos. Selinker (1972; 1993),
descreveu o fenômeno afirmando que são
itens, regras e subsistemas lingüísticos
que os falantes de uma língua nativa particular tendem a manter em sua interlíngua
em relação a uma outra língua em estudo,
não importando a idade do aprendiz, ou
a quantidade de explicações que recebeu
sobre esta. Nakuma (1998) examinou os
pressupostos implícitos na definição de
fossilização e concluiu que algum conhecimento desviado foi instaurado como padrão cognitivo e, nesse caso, estaria relacionado ao sucesso ou fracasso do sujeito
ao adquirir certas regras de uma segunda
língua. As formas fossilizadas seriam o resultado da esquiva, do desejo intencional
de não adquirir uma dada forma porque
acredita que ela já esteja disponível em
sua bagagem cognitiva. Crer que a fossilização manifesta-se apenas através de
formas desviadas fornece uma conotação
pejorativa, como se formas não desviadas
não fossem fossilizáveis. A fossilização surge da percepção individual do aprendiz da
segunda língua a respeito das equivalências entre esta e a língua materna, cujo
resultado pode ser positivo ou negativo.
Selinker e Lakshmanan (1993) demonstram, posteriormente, que a estagnação
na fossilização deve ser considerado ape-
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
nas a estabilização do processo de aprendizagem em um patamar, focalizando
algumas áreas localizadas. O estudante
apresenta um desenvolvimento contínuo
em algumas áreas da segunda língua e, ao
mesmo tempo, uma relativa estabilização
de erros em outras (Percegona, 2005). A
falta de uniformidade quanto ao processo
de fossilização na Linguística mostra que
não se está diante de um conceito monolítico. Há construtos complexos vinculados
a manifestações de falhas, desvios e a
estabilização de um funcionamento cognitivo resistente às alterações. Há o delineamento de possíveis causas individuais,
não generalizáveis, nas quais cada sujeito
percebe a realidade de forma idiossincrática, o que institui uma conotação histórica, cultural e, ainda, subjetiva. Há a
concepção da fossilização não como estabilização permanente da interlíngua, mas
como efeitos da aprendizagem hebbiana
nas construções lingüísticas em um nível
não-ótimo de proficiência e complexidade
em relação à língua materna, o que lhe assegura caráter dinâmico e não estável. De
fato, interessantes contribuições da neurociência e de simulações computacionais têm sido desenvolvidas sobre como
se realiza a aprendizagem na micro e na
macroestrutura cerebral e faz lembrar da
hipótese de uma estrutura latente de linguagem, de caráter biológico de Weinsreich (1967). Bliss e Lomo (citados por Lent,
2001) realizaram uma estimulação elétrica
repetitiva nas fibras colaterais de Schaffer,
situadas no hipocampo e registraram a
atividade resultante nas células piramidais
da região responsável pela consolidação
da memória (Cornos de Amon – regiões
CA). Eles constataram significativo aumento no potencial pós-sináptico excitatório
na célula piramidal após a estimulação de
potenciação de longo prazo (PLP), resultando na descoberta de um caso típico de
plasticidade sináptica entre um neurônio
pré e um neurônio pós-sináptico, tal como
proposto por Hebb. (Lent, 2001). Se a PLP
for adequada e possuir significado para o
sujeito, ocorrerão a aquisição e a manutenção das habilidades cognitivas desejáveis. Se a ativação for inapropriada, o
ajuste sináptico hebbiano tenderá a fortalecer as tendências existentes, impedindo
o progresso na aquisição do efeito desejado. No caso da aprendizagem de uma segunda língua, se o sujeito não perceber as
diferenças entre as formas da língua materna e da nova língua a ser aprendida, os
padrões do sistema da sua língua materna
continuarão sendo fortalecidos indevidamente, ou seja, haverá uma fossilização
de determinadas formas da interlíngua.
Na Psicologia, dentre os raros autores que
se debruçam sobre o fenômeno e adotam
a acepção vigotskiana, estão Gallimore e
Tharp (2002) que afirmam ser a fossilização o conhecimento interiorizado, no
qual o sujeito passa a resolver situações-problema sem precisar de ajuda assistida.
Eles definiram quatro estágios genéticos
situando-os na zona de desenvolvimento
proximal (ZDP). O sujeito gradualmente
necessita de menos assistência para executar uma atividade, aumentando sua
capacidade de autoregulação e o comportamento assistido torna-se não assistido
e autorregulado. O estágio I refere-se às
atividades que o sujeito pode operar com
auxilio de pessoas mais capacitadas para
que, mais tarde, ele aja com independência. No estágio II, ele realiza tarefas sem
assistência externa e ainda que sob influência do modo de funcionamento de outra
pessoa e sem autodireção. No próximo estágio, a assistência e a autoassistência não
133
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
são necessárias, pois há interiorização e
automatização do conhecimento, ou seja,
fossilização. No último estágio há a desautomatização do funcionamento anterior
(desfossilização), com a retomada de uma
nova ZDP. No limite, as contribuições de
Gallimore e Tharp (2001) são aproximações que descrevem o comportamento
fossilizado por meio da sucessão de estágios necessários ao desenvolvimento, com
formação de hábitos histórico-culturais.
Carece sobremaneira, retomar a abordagem genética do fenômeno, transcender
sua identificação e buscar a dinâmica de
seu desenvolvimento. O conceito de fossilização é ainda uma grande lacuna e na
psicologia reclama que se focalize e investigue os processos envolvidos com a
mediação semiótica e a internalização de
um dado conteúdo, em outros termos, do
ensinar e do aprender.
Palavras-chave: fossilização, aprendizagem.
ESTRATÉGIAS PEDAGÓGICAS PARA O
ENSINO-APRENDIZAGEM DE CONCEITOS
CIENTÍFICOS EM UMA ESCOLA
INCLUSIVA
Divaneide Lira Lima Paixão - UCB
[email protected]
As atividades humanas são construídas,
segundo Vygotsky (1984), ao longo da vida
e são resultado de aprendizagens mediadas na e pela cultura, o que imprime às
relações sociais e à atividade psicológica traços comuns que transcendem suas
qualidades particulares. No seio dessa
discussão, o processo de escolarização
surge como uma significativa experiência
que abre possibilidade de aprendizagem e,
consequentemente, de desenvolvimento.
134
Analisar a dinâmica do processo de ensino e aprendizagem que ocorre nas escolas
torna-se, pois, fundamental, uma vez que
é nesse espaço que o desenvolvimento
psicológico da criança pode alcançar níveis
de aprimoramento de determinadas funções e estabelecer mudanças dos vínculos
e das relações interfuncionais tal como indicadas por Luria e Yudovich (1985). O desenvolvimento de cada função psicológica
particular, por sua vez, depende dessa mudança, como no caso do desenvolvimento de conceitos. Na aprendizagem de um
conceito, as funções psicológicas superiores que pressupõem o uso das ferramentas
intelectuais, são ativadas pela interação
social, especialmente, sob a orientação ou
a supervisão de pessoas mais experientes.
Por isso, no tocante ao desenvolvimento
de conceitos, as propostas pedagógicas
devem levar em conta a adequação do material ao nível real e potencial dos sujeitos
aprendizes, considerando a diversidade
da aprendizagem e os ritmos diferenciados de cada um. Nesse sentido, o estudo
ora apresentado buscou analisar as estratégias pedagógicas adotadas por quatro
professoras, para o ensino-aprendizagem
de conceitos científicos em quatro turmas
formadas com crianças que apresentam
desenvolvimento típico e crianças com deficiência intelectual (DI). Foram realizadas
filmagens das professoras e seus alunos,
buscando identificar e analisar as atividades realizadas com vistas à introdução de
um novo conceito e sua apropriação pelas
crianças, tendo como base os conceitos
propostos por Vygotsky (1984), no que diz
respeito à Zona de Desenvolvimento Proximal. Nas filmagens em vídeo foram privilegiadas as interações entre as professoras
e as crianças, especialmente aquelas com
DI, retratando três momentos distintos da
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
constituição do conceito científico: apresentação, desenvolvimento e conclusão.
Foi realizada, também, com cada professora uma entrevista semiestruturada para
investigar aspectos da ação pedagógica
no decurso da apresentação de um conteúdo novo. Os dados apontam que entre
as estratégias utilizadas pelas professoras
para introduzir um novo conceito científico estão: contextualização do conteúdo e
vivências por meio de dinâmicas variadas;
o processo de aplicar, avaliar, fortalecer e
reavaliar os conteúdos programados; o uso
da leitura pausada do material selecionado. Quanto aos recursos acionados, são
identificados: material concreto, música,
figura/imagem, poemas, material do tipo
impresso e cartazes. As professoras elaboram materiais diversificados para permitir
e imprimir diferentes modos de abordar
o assunto, evidenciando considerar o processo como diferenciado para cada um de
seus estudantes, o que possibilita a todas
as crianças com ou sem DI a construção
de conhecimentos e de modos de funcionamento para lidar com o desenvolvimento dos conceitos. Alternam momentos
de atendimento individual ao aluno com
aprendizagem colaborativa, buscam empregar atividades lúdicas e de fixação de
conteúdos, de forma a motivar os estudantes e levá-los a perceber a vinculação
entre certos elementos estruturantes do
conceito. São promovidas condições para
o desenvolvimento de competências e internalização dos conceitos científicos, por
intermédio de jogos, reálias, que, para elas
contribuem para promover as funções psicológicas superiores como memória técnica, criatividade, raciocínio, comparação,
discriminação e generalização de idéias,
além do pensamento abstrato. Ao discutir o processo de construção do conheci-
mento de crianças com DI, Vygotsky (2002)
analisa que elas apresentam certa dificuldade em constituir o pensamento abstrato, e que se o conteúdo e as situações de
aprendizagem não forem mediadas, isso
fica mais difícil. Nesta direção é que a escola e professores devem assumir a iniciativa
e a intervenção no processo de aprendizado de forma competente e consciente, na
medida em que os esforços devem se focar
para estágios de desenvolvimentos ainda
não alcançados. O trabalho educativo deve
fomentar novos conhecimentos, habilidades e competências, reconhecendo o nível
real de desenvolvimento do aluno. Os procedimentos utilizados pelas professoras e
o modo como elas os justificam corroboram a perspectiva teórica histórico-cultural
ao passo que elas buscam introduzir um
conceito paulatinamente, ressaltando sua
construção social. Das quatro professoras,
três salientaram empregar estratégias diversificadas para atender especificamente
as crianças com DI. Ao serem planejadas
estas atividades levam em consideração
a necessidade e o direito de adaptação
curricular e isso pressupõe o emprego de
situações de aprendizagem em pequenos
grupos ou duplas, considerando os níveis
de aprendizagem e as dificuldades apresentadas, frente a um dado conteúdo. As
professoras relatam fragilidades variadas
no decorrer do processo, especialmente
com relação à aprendizagem das crianças
com DI, como manter a concentração, trabalhar a memória e otimizar o tempo de
a realização das atividades; a não fixação
dos conceitos e informações; a não compreensão e acompanhamento das atividades, como acontece com o restante da
turma. Tal posição corrobora os achados
de Bogoyavlensky e Menchisnskaya (1991)
que sustentam não existir uma relação
135
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
direta entre a construção de noções e desenvolvimento cognitivo e, portanto, nem
toda aprendizagem escolar possibilita ao
aluno o desenvolvimento das funções
mentais superiores. De fato e também
para Vygotsky (1995), as pessoas com
DI apresentam um desenvolvimento das
funções psíquicas superiores com ritmo
diferenciado, em relação às crianças com
desenvolvimento típico, e um dos maiores
entraves no desenvolvimento de conceitos
para aquele grupo está justamente no processo de generalização e abstração, que
não depende somente do caráter da gravidade da deficiência, mas também da realidade social na qual ele se desenvolve e dos
recursos mediacionais que lhe são apresentados. As análises até aqui engendradas apontam que as estratégias e recursos
utilizados pelas professoras participantes
deste estudo contribuem para o desenvolvimento dos conceitos científicos nos dois
grupos de crianças e suscitam uma melhor
compreensão acerca da (1) internalização
dos conceitos pelas crianças, a ponto de
tornar-se automatizado, isto é, fossilizado;
(2) do processo que assegura a continuidade do desenvolvimento.
Palavras-chave: deficiência intelectual,
aprendizagem de conceitos científicos,
estratégias pedagógicas.
O PROCESSO DE INCLUSÃO EM SALAS
REGULARES: PONTOS CRÍTICOS,
POSSIBILIDADES PEDAGÓGICAS
E DESAFIOS NA FORMAÇÃO DE
PROFESSORES
Ana da Costa Polonia - SEEDF/UnB
O processo de inclusão, não se restringe a
oportunidade de matricular a criança com
136
uma necessidade educativa especial e,
possibilitar o seu acompanhamento educacional, em uma sala regular, com colegas que tenham desenvolvimento típico.
Ele projeta também, os anseios da sociedade em constatar que todas as pessoas
são capazes de aprender, independente
de suas dificuldades e limitações. Estas
condições ressaltam o potencial do ser
humano, superando as deficiências físicas, intelectuais, emocionais, comportamentais, sendo reconhecidamente implementado, por um processo pedagógico de
qualidade. Este solidamente construído,
sobre bases teóricas e metodológicas e,
intrinsecamente, vinculado às ações, às
estratégias, aos materiais e aos espaços
pedagógicos promotores do desenvolvimento e aprendizagem. Schwartzman
(1997 apud Siqueira, 2008) ressalta que a
legislação brasileira assegura a inclusão e,
sobretudo, demanda que o sistema educacional, aceite a pessoa com necessidades educacionais especiais, em classes regulares ou comuns. Paradoxalmente, ele
reflete que, se as escolas regularmente,
não têm conseguido, com sucesso, promover os alunos denominados ‘normais’,
como estender então este atendimento
educacional aos que apresentam necessidades educativas especiais? Enfatiza a
responsabilidade do sistema educacional,
na medida em que, este não prepara os
professores do ensino regular para atender e trabalhar pedagogicamente com
alunos identificados com necessidades
educativas especiais. Sem este preparo
acadêmico, didático e metodológico fica
precário, mesmo com a experiência e boa
vontade do professor, adotar a premissa
da inclusão. Sem dúvida, a formação inicial, experiência profissional, o domínio
da estratégias de ensino e das proposta
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
didáticas, aliadas à formação profissional
se em constituem pilares para estabelecer uma aprendizagem de qualidade que
se estende a todos os alunos, sobretudo,
aos que demandam constantemente um
atendimento diferenciado. Como sublinhado por Vygotsky (1984), o bom ensino
é aquele que se adianta ao desenvolvimento, isso implica que, o professor deve
estar ciente e adote abordagens pedagógicas diferenciadas que possam incidir sobre a zona de desenvolvimento potencial
do aluno, fazendo que, posteriormente,
ele adquira a autonomia ao empregar
aquele conhecimento. No entanto, condições como o número de alunos por turma
e o apoio das equipes multidisciplinares
e psicopedagógicas, são aspectos que
devem ser avaliados, quando se discute
o ensino de qualidade e a inclusão escolar. Considerando as condições educacionais brasileiras, Mazotta (2005) indica
que são poucos os municípios, cidades e
estados que contam com um sistema de
ensino estruturado, nos aspectos físicos,
materiais, humanos e políticos, de forma
a responder as demandas e a contemplar
as condições peculiares do aluno com necessidades educativas especiais. Sublinha
que a educação de qualidade perpassa
pelo equacionamento das políticas educacionais, voltadas ao atendimento destes recursos e à formação dos profissionais da escola, não se restringindo à ação
pedagógica do professor. Consonante à
proposição de uma abordagem educacional diferenciada, se enfatiza a necessidade de cursos de formação continuada, especificamente, aqueles que enfoquem estratégias pedagógicas e práticas, métodos
e didáticas que atendam as necessidades
dos alunos inclusos. E que substancialmente, possam apoiar os professores, em
sua atuação em sala de aula, refletindo
mudanças no planejamento, na avaliação
e na reelaboração das atividades. Fávero, Pantoja e Mantoan (2004) reforçam
que para ensinar a turma toda, é preciso
programar atividades abertas e diversificadas, porque estas englobam distintos
níveis de compreensão, conhecimento e
até mesmo de desenvolvimento dos alunos, sem privilegiar ou persistir na noção,
de que alguns sabem mais e outros menos. Subjacente a esta formação, está a
condição de oferta contínua, diversificada
e democrática de cursos ou capacitações
para atingir o quantitativo de profissionais
da educação, não apenas os professores,
que atuam em escolas regulares. Deve-se
ainda, associar, o espaço de apoio e supervisão psicopedagógica que existe nas
escolas, resgatando o compartilhamento,
a discussão e a reflexão, por meio de leituras e estudos de temas ligados ao processo ensino-aprendizagem, estimulando
a elaboração de materiais pedagógicos
e uma adequação curricular que atenda as condições peculiares dos alunos e
que permita a superação progressiva de
suas dificuldades. É consenso entre os
pesquisadores que, a formação docente
é um dos alicerces do sistema educacional, enfatizado o investimento constante,
na formação continuada, considerando
seus reflexos, na melhoria do ensino e as
repercussões em sala de aula. Enfocando temas ou conteúdos que emergem
das necessidades e das situações provenientes do contexto escolar, resgatando
a vivência pedagógica como condição imprescindível à construção de conhecimento e às transformações geradas nas práticas educativas. Complementando esta
discussão, Garcia e Yáñez (1997, apud
Oliveira, 2009) resgatam que os profes137
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
sores são profissionais imersos em uma
organização e, por esta condição, devem
ser assegurados espaços direcionados ao
desenvolvimento de seus próprios processos de aprendizagem, que de sobremaneira, interferem em seu planejamento e na dinâmica de suas aulas. Enfim, o
modelo educativo tendo como referencia
à concepção de inclusão, está sedimentado nos estabelecimentos de ensino que,
prioritariamente, valorizam as diferenças
e se preocupam em trabalhar a diversidade humana e cultural. Reconhecendo as
diferenças, não como incapacidades ou
limitações, e objetivam ensinar todos os
alunos porque o aprender é condição inerente dos seres humanos. Em geral, rompem as barreiras entre as disciplinas curriculares, constroem uma rede de conhecimentos, evitando a concepção de currículo, sob ótica conteudista, valorizando a
integração entre os saberes, tendo como
referência a transversalidade (Gallo, 1999
apud Montoan, 2006). Nesta perspectiva, a realidade educacional é compreendida como múltipla e multifacetada e as
propostas pedagógicas, refletem a ação
educativa, embasada na autonomia, na
construção coletiva do conhecimento e
nas potencialidades que são constantemente estimuladas pelo processo ensino-aprendizagem. Estas diretrizes edificam
ambientes polissêmicos, estimulando temas que partam da realidade do aluno,
considerando sua identidade sociocultural, estabelecendo espaços criativos e diferenciados para aprender.
Palavras-chave: formação de professores;
inclusão; processos pedagógicos.
138
ATENDIMENTO ESPECIALIZADO
AOS ALUNOS INCLUSOS EM SALAS
REGULARES
Teresa Cristina Siqueira Cerqueira - UnB
A Constituição da República Federativa
do Brasil de 1988 assegura, em seu Artigo
208, “o atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente, na rede regular de ensino”
(Oliveira, 2009). Indicando que os sistemas
de ensino devem ter em seus estabelecimentos profissionais especializados para
o atendimento do aluno com necessidades educativas especiais, e ainda, professores capacitados para assegurar a real
integração, nas classes comuns. Ele deve
ser disponibilizado em todos os níveis de
ensino, notadamente, pelas características
presentes na escola regular, na medida
em que se constitui em ambiente propício para garantir e estimular a convivência entre os alunos, independente, de sua
condição, especialmente, quando se pretende romper com rótulos e preconceitos.
Sabe-se que o processo de interação social
é um fator que atua positivamente no desenvolvimento global dos sujeitos com ou
sem deficiências (Montoan, 2006). Uma
preocupação emerge em relação aos recursos humanos e psicopedagógicos, eles
devem estar intimamente, associados às
estratégias e aos materiais didáticos, estando disponíveis no contexto escolar, de
forma a atender as demandas dos atores:
professores, familiares, alunos e outros
profissionais da educação. Principalmente,
quando se vislumbra e se assegura o processo de inclusão, o considerando como
fonte permanente de desenvolvimento e
aprendizagem humana, tendo como eixo a
diversidade cultural. Retomando a função
e o atendimento especializado nos espa-
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
ços escolares, Alves et al (2006) destaca
que as salas de recursos multifuncionais
são espaços na escola, centrados no atendimento educacional especializado, objetivando atender os alunos com necessidades educativas especiais, com o emprego
de estratégias diferenciadas de ensino, de
forma potencializar a aprendizagem e o
fazer pedagógico. Visa então, favorecer e
desenvolver a construção de conhecimentos e, concomitantemente, propiciar que
todos os estudantes possam ativamente
participar do currículo da escola, e desenvolver habilidades e competências imprescindíveis à qualidade do ensino. Nele se
encontram materiais didáticos, pedagógicos, equipamentos e recursos outros, além
dos profissionais com formação e qualificação para o atendimento às pessoas com
necessidades educacionais especiais, estendendo, quando necessário, orientações
aos professores da sala de aula. A perspectiva assegurada neste ambiente, é que o
professor responsável considere as diferentes áreas do conhecimento, os estágio
de desenvolvimento cognitivo dos alunos,
seu nível de escolaridade, potenciais e dificuldades, aliados aos recursos específicos
para sua aprendizagem, de maneira a possibilitar atividades de complementação e
suplementação curricular. Assim, os alunos
podem ser atendidos individualmente ou
em pequenos grupos, conforme necessidade e programação especial, em horários
diferenciados e opostos, de suas aulas, em
sala regular. Configura-se como um espaço para atender, com qualidade, os alunos
com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e aqueles identificados com
altas habilidades que fazem parte das turmas de ensino regular De 2005 a 2009, foram disponibilizadas 15.551 salas de recursos multifuncionais para todos os estado,
incluindo o Distrito Federal, englobando
4.564 municípios brasileiros - 82% do total.4 Outro profissional presente na escola
e que pode integrar esta rede de apoio psicopedagógico é o orientador educacional.
Atualizando as suas funções, Placco (1994,
apud Oliveira, 2009) enfatiza que o papel
deste profissional sofreu transformações,
não sendo mais a porta de ‘entrada de alunos problemas’. Sobretudo, emerge como
um dos educadores da escola, envolvidos
em uma ação escolar coletiva, estabelecendo processos voltados ao desenvolvimento de uma atividade pedagógica de
qualidade, significativa e inserida no projeto político pedagógico da escola. Assim,
ele pode atender o grupo de professores
e as demandas particulares de cada um,
ainda promover discussões e grupos de
estudo, além de buscar outros profissionais que possam dar apoio profissional, de
acordo com as necessidades do grupo de
professores. Quanto aos profissionais que
compõe o quadro de especialistas, focados
no apoio educacional, se pode identificar, o
supervisor escolar, o orientador educacional e o coordenador pedagógico, Oliveira
(2009) retoma que na atualidade a função
deste grupo converge para a qualidade da
ação pedagógica: oferecer assessoramento ao docente, adotando uma perspectiva
colaborativa de trabalho, fortalecendo as
bases de uma atividade educacional de
cunho coletivo, voltadas ao fazer pedagógico crítico e reflexivo, aliando a competência à experiência, como fundamentos
do processo ensino-aprendizagem. Esta articulação possibilita trocas de experiência,
4
Implantação de salas de recursos multifuncionais, disponível em http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_
content&view=article&id=12295&Itemid=595, acessado
em 21/11/2011, às 1:15.
139
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
conhecimentos e rede de apoio entre os
profissionais da escola. Sobre a constituição da equipe psicopedagógica e seu papel no espaço escolar, Muller et al (2010)
aponta entre os seus objetivos: promoção
da melhoria da qualidade do processo
de ensino e de aprendizagem, adotando
uma perspectiva institucional, centrada na
abordagem preventiva e interventiva, com
vistas ao aprimoramento e contextualização das atividades profissionais, dos distintos atores que fazem parte das instituições
educacionais. Visa então, fomentar e incrementar a qualidade educacional, retratada no desenvolvimento e aprendizagem
efetiva dos alunos, fundamentada na cultura de sucesso escolar. Ela é atualmente,
composta por um profissional formado em
pedagogia e outro em psicologia, sendo
rebatizada, como Equipes Especializadas
de Apoio à Aprendizagem. Apesar do reconhecimento e da legislação que assegura
este apoio educacional especializado, em
grande parte das escolas, falta material
específico para atender os alunos, profissionais especializados, como intérpretes de Libras para atender a criança com
necessidade educativa especial, Ainda, o
coordenador pedagógico e o orientador
educacional, e entre outros profissionais
especializados que estariam catalisando as
demandadas e coordenando atividades coletivas, que fomentassem os processos de
discussão, reflexão e proposição, visando à
resolução coletiva e colaborativa dos problemas educativos. Mazotta (2005) ressalta que este atendimento é restrito e, não
atingem uma boa parte dos municípios, cidades e estados. E a precariedade engloba
desde o espaço físico destinado a sala de
recurso ou destinada ao atendimento por
parte das equipes atuarem. Além disso, os
materiais didáticos, os recursos humanos e
140
o número reduzido de profissionais, retratam as dificuldades de sua implantação. Inclusive as políticas educacionais, por vezes,
negligenciam o investimento nas equipes
de atendimento especializado, sobrecarregando o professor, o deixando isolado e se
sentindo responsável pelo processo pedagógico de inclusão.
Palavras-chave: equipes de apoio à
aprendizagem, educando com necessidades
educativas especiais, sala de aula, sala de
recurso, equipes multiprofissionais.
SP LT03 - Simpósio
SP LT03-1244 - AÇÕES EDUCATIVAS
E O DESENVOLVIMENTO MORAL DA
SOCIEDADE
Vannuzia Leal Andrade Peres - PUC-Goiás/
UnB
[email protected]
Rafael de Almeida Mota - PUC-Goiás
[email protected]
Cândido Martins do Santos Neto - PUC-Goiás
[email protected]
Luciane Aparecida Muniz Mols - PUC-Goiás
[email protected]
Roberta Alves Dionisio - PUC-Goiás
[email protected]
Marina Magalhães David - PUC-Goiás
[email protected]
Com base nos resultados de pesquisa
qualitativa sobre a “Expressão Moral do
Goianiense”, realizada em quatro semestres consecutivos por alunos do Curso de
Psicologia da Pontifícia Universidade Católica de Goiás, foram desenvolvidas ações
educativas com adolescentes, adultos e
idosos na perspectiva da psicologia histó-
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
rico-cultural da subjetividade de González Rey. Com o objetivo de criar espaços
sociais de desenvolvimento moral, essas
ações consistiram na construção de diálogos e reflexões sobre a invisibilidade do
outro, a despersonalização do sujeito e a
produção da violência nas relações, dentre outras categorias construídas no processo da pesquisa. Para isso foram utilizados cartazes, panfletos, vídeos e jogos de
ação envolvendo todos os participantes
que foram escolhidos aleatoriamente e
deram seu consentimento livre e esclarecido ao serem convidados nos diferentes
espaços da cidade, dentre eles um clube
de futebol e duas escolas, uma de ensino
fundamental e outra de ensino médio. O
envolvimento ativo dos participantes no
diálogo e reflexão sobre as categorias e
sobre os temas delas decorrentes, possibilitaram a construção do indicador de
sentido de que é premente a realização de
ações educativas que desafiem e comprometam os sujeitos com práticas sociais,
atividades e relações que privilegiem o
desenvolvimento moral da sociedade.
A MORAL NO ESTÁDIO DE FUTEBOL – A
ESSENCIA DO FUTEBOL NAS TORCIDAS
ORGANIZADAS
A partir de um estudo realizado por quatro
semestres na matéria “Psicologia do Desenvolvimento III”, que visava compreender a expressão moral do Goianiense em
vários espaços sociais, sendo um deles o
estádio de futebol, teve-se direcionamento à segunda parte deste projeto, que ansiava práticas de modelos educativos para
possibilitar a reflexão, consciência e envolvimento cognitivo-emocional das pessoas
vinculadas aos times, no caso, participan-
tes de torcidas organizadas, para que elas
pudessem através de si mesmas, de sua
subjetividade e de sua capacidade de análise compreender quais atitudes necessitavam ser metamorfoseadas para que a relação homem – sociedade estivesse pautada
na Moral, abortando assim atitudes que
são contrárias ao viver social harmônico,
como a violência exacerbada, que se vê tão
vinculada a estes meios que supostamente
deveriam propiciar formas de lazer límpido, mas que na realidade só reafirmam a
posição de Sujeitado de seus participantes.
Foi realizada uma ação educativa, de caráter qualitativo (González Rey, 2005) em
um clube de time local, quando teve-se a
priori uma perspectiva de construção de
conhecimento, com integrantes da torcida
e estudantes de psicologia refletindo sobre
este “indivíduo torcedor” e como o grupo
o posiciona frente à agressividade, rivalidade, revanchismo e incapacidade de discernimento que o precipita à uma agressão
cega em decorrência de desdobramentos
futebolísticos. Mostrou-se visível como em
organizações populares, grupos de massa,
no caso, as torcidas organizadas, o processo de morte do Sujeito. Ele se torna exaurido de sua própria voz, sua capacidade de
decisão não está mais pautada em si, mas
no grupo, abdicando-se deste modo da
sua subjetividade e agindo de acordo com
a direção acenada pelo grupo, o que torna
visível a compreensão do por que da violência estar tão latente nestes meios, tendo em vista que as amarras impossibilitam
a autonomia e tornando-os sujeitados,
fazendo com o que seu corpo grite a todo
instante para ser retomada a posse de ser
Sujeito de si mesmo.
Palavras-chave: subjetividade, sujeito, torcidas
organizadas
141
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
EDUCAÇÃO MORAL DE JOVENS
NA ESCOLA – SERIA A ESCOLA UM
DELIMITADOR CRIATIVO E SOCIAL?
Tal trabalho surgiu da necessidade de se
compreender como o sujeito moral, isto
é, aquele que se orienta a partir da moral
constitutiva de sua personalidade (González Rey, 1989) emerge de relações de
extrema complexidade, muitas vezes ríspidas e que camuflam com discursos doces o marasmo, a estagnação e práticas
deletérias que muitas vezes dão formas
as silhuetas das Escolas. Como podemos
discorrer sobre sujeitados sociais e sobre
a incapacidade reflexiva de um grande
número de pessoas, se em nosso modelo
de educação vigente, as escolas, um dos
primeiros passos das crianças à um meio
social além de sua família, só impõem ainda mais o desligamento do homem de si
mesmo, de suas sensações, sentimentos,
manifestações, destituindo-o daquilo que
o torna único, a sua subjetividade? A proposta de nosso trabalho de ação educativa
era desafiar pais e professores a levarem
em conta a necessidade de expressão da
criança, de tornar-se sujeito e se envolver
de forma ativa com o mundo que a circunda, para romper com uma relação de
obrigatoriedade, automatizada e, assim,
abandonar o patamar de sujeitada e tornar-se sujeito de seu próprio aprendizado.
Tendo como direção teórica a perspectiva
histórico-cultural da subjetividade de Fernando Gonzalez Rey, tivemos a oportunidade de construir junto aos pais e profissionais da educação a representação de
uma escola onde o sujeito não fosse negado a todo instante, mas sim enxergado
e valorizado. O abordar dessa escola tão
pouco humanizada exigiu a reflexão sobre
este fatídico da educação que se mostra
142
presente em todas as ramificações sociais
dos meios de ensino, possibilitando assim
a mudança nesta concepção de como se
dá o ensino, o aprendizado e as relações
dentro do ambiente escolar, para formar
sujeitos morais.
Palavras-chave: escola, educação moral,
subjetividade
ESCOLA E EDUCAÇÃO MORAL:
MUDANÇA OU MANUTENÇÃO DO
STATUS QUO?
Com base na psicologia histórico-cultural
da subjetividade de González Rey foi realizada ação educativa em uma escola, com o
objetivo de criar um espaço de expressão
autentica dos alunos, no tocante as suas
relações cotidianas com os professores.
Participaram da ação educativa, alunos
do sexto ano do ensino fundamental de
uma escola estadual. Motivados por cartazes ilustrativos de situações de opressão
e violência, os alunos foram desafiados a
expressarem suas idéias e emoções produzidas no espaço da sala de aula, com
relação à escola e aos professores. Nesta
atividade lúdica os alunos expressaram,
por meio da arte, emoções produzidas nas
práticas delimitadoras de suas relações no
âmbito escolar, tais como: insatisfação,
raiva, desmotivação, desconsideração.
Deste modo, pôde-se perceber sua necessidade de participar ativamente da vida
da escola, necessidade esta que se mostra
escassa numa realidade escolar que busca
a homogeneização. Se para Edgar Morin
(2003), a moral é “a constituição do outro em mim”, como podemos pensar em
Moral em um espaço onde a figura de autoridade desconsidera os anseios dos alunos? Portanto, existe constituição deste
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
outro moral em mim? Ele é simplesmente ignorado? O profissional da educação,
ao tornar-se o detentor da verdade, não
dificultaria o desenvolvimento do aluno
enquanto sujeito? Na perspectiva de González Rey (2006) o desenvolvimento do
sujeito somente é possível pela aprendizagem, o que implica em envolvimento do
aluno no processo de educação e, portanto, na mudança deste status quo.
Palavras-chave: escola, moral,
desenvolvimento
A MORAL DO GOIANIENSE NA FAIXA DE
PEDESTRES
A partir de pesquisa sobre a expressão moral do goianiense, na disciplina de Psicologia do Desenvolvimento do curso de Psicologia da Pontifícia Universidade Católica de
Goiás, foi realizada uma ação educativa no
trânsito, na perspectiva da teoria histórico-cultural da subjetividade, com o intuito de
mobilizar as pessoas para refletirem e produzirem uma subjetividade sobre a importância de respeitarem a faixa de pedestres.
Para isso foram utilizados panfletos, a partir dos quais as pessoas eram abordadas
e convidadas a participarem da ação. Observou-se que a grande maioria dos participantes mostrou interesse e motivação
para a discussão sobre o tema, bem como
preocupação com a educação de motoristas e pedestres para se respeitarem mutuamente. Sobre a questão, ainda há muito
que fazer, as pessoas precisam se conscientizar que respeitar a faixa de pedestres
é um problema do âmbito da moral. Essa
noção de respeito precisa ser desenvolvida
por cada pessoa, fazer parte de sua orientação moral (González Rey, 1989) e não
apenas ser uma obrigação. Impor leis e punições para pessoas que não respeitam a
faixa pode ser uma medida imediata, mas
não a solução quando para o desenvolvimento humano, o que significa não apenas
obedecer às fiscalizações, mas respeitar os
direitos do outro.
Palavras-chave: desenvolvimento moral,
subjetividade, faixa de pedestres.
A MORAL DO GOIANIENSE NAS
AGÊNCIAS BANCÁRIAS
No primeiro semestre de 2011, na Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC-Goiás), com base no conceito de González Rey de que a moral é um elemento
da personalidade que orienta o sujeito
nas suas relações e práticas sociais, foi
realizada uma ação educativa visando
o desenvolvimento moral de usuários e
funcionários de duas agências bancárias
da cidade de Goiânia, uma de um bairro
periférico e outra de um bairro nobre. É
importante enfatizar que as gerências
de ambas as agências foram devidamente esclarecidas sobre o intuito da ação e
permitiram que fosse realizada desde que
a identidade da instituição fosse preservada. A ação consistiu na distribuição de
panfleto contendo, como disparador para
reflexão e discussão, a seguinte pergunta:
“Como está sua moral dentro da agência
bancária? As reflexões e discussões sobre
a moral, tanto com os usuários quanto
com os funcionários de ambas as agências, trouxeram aos estudantes a oportunidade de entrarem em contato com uma
realidade complexa, em que cada pessoa
pensa e age diferentemente da outra, ou
seja, existe aquela que está indiferente,
143
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
aquela que ironiza sobre a problemática
da moral e aquela que está atenta à ela, se
interage com os estudantes e se mobiliza
para ajudar a mudar a realidade. Entretanto, o fato de pessoas terem dado atenção
à ação é um importante indicador de que
o tema pode e precisa ser retomado em
outras oportunidades. Uma vez registrado em vídeo, com a permissão dos participantes, o processo da ação educativa
permitiu aos estudantes produzirem um
pequeno documentário que deverá, então, servir a outras ações educativas que
serão realizadas por outros estudantes em
futuro próximo.
Palavras-chave: agências bancárias,
desenvolvimento e moral.
CO 24 - LT4
Literatura e Brincar
LT04-722 - LIVROS DE HISTÓRIAS: UM
RECURSO PROMOTOR DE SAÚDE NA
EDUCAÇÃO INFANTIL
Jaqueline Pereira Dias - USP
[email protected]
Edna Maria Marturano - USP
[email protected]
Financiamento: CAPES
A permanência na educação infantil acontece em uma fase crucial para o desenvolvimento social, escolar e emocional da
criança. O Referencial Curricular Nacional
para a Educação Infantil (1998) ressalta
que é função social da escola capacitar a
criança para sua inserção na sociedade;
para isso a formação pessoal e social e a
aquisição do conhecimento de mundo
144
inserem-se como experiências de aprendizagem (Gonçalves & cols. 2008; Rodrigues
& Oliveira, 2009). Neste contexto, as estratégias preventivas e promotoras de saúde
vêm ganhando cada vez mais destaque
(Borges & Marturano, 2009; Rodrigues,
Dias & Freitas, 2010). Matinez (1996) assegura que a escola é um espaço potencial para se prevenir problemas e promover saúde. Um recurso promotor de saúde
são as histórias infantis (Borges & Marturano, 2009; Kalyva & Agaliotis, 2009; Rodrigues, 2009; Teglasi e Rothman, 2001).
Rodrigues e Oliveira (2009) salientam que
o relato e a leitura de histórias favorecem
a ampliação da realidade da criança, a
escuta e observação dos outros em uma
perspectiva de aprendizagem e conscientização de que as outras pessoas também
possuem sentimentos, pensamentos, motivos e desejos e que cada ação tem uma
consequência nos diversos contextos que
vivenciam. Teglasi e Rothman (2001), utilizando a literatura infantil, elaboraram
um programa para promover o desenvolvimento sociocognitivo de crianças agressivas, com base nos seis componentes do
modelo de processamento da informação
social proposto por Dodge e Crick (1994).
Como resultados obtiveram redução de
comportamentos externalizantes em alunos de 4º e 5º ano. Tendo como apoio
teórico o mesmo modelo, o presente estudo teve por objetivo promover habilidades sociocognitivas, por meio da leitura
de livros de histórias infantis, em alunos
da educação infantil. Esperava-se que,
com o desenvolvimento do pensar sociocognitivo propiciado pela intervenção, as
crianças melhorassem suas habilidades
sociais e seu comportamento nas relações
com os companheiros. Método – Sujeitos
- Participaram do estudo até o momento
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
25 crianças de 5-6 anos, matriculadas no
Pré III de uma escola de educação infantil
filantrópica, no interior de São Paulo. Materiais e procedimentos - Para implementar a intervenção, foram selecionados 25
livros ilustrados de histórias infantis, ricos
em pistas sociais, com base na pesquisa
de Rodrigues e cols. (2007). A intervenção
foi conduzida durante três meses, em 25
sessões, com cerca de 50 minutos cada,
em grupos com até 9 crianças. Em cada
sessão, a interventora lia um livro de história interativamente, visando explorar e
discutir o seu conteúdo com as crianças,
de acordo com o modelo de seis componentes do processamento da informação
social. Na exploração do primeiro componente - o que está acontecendo? - as crianças observam e interpretam as pistas sociais. No segundo - o que os personagens
estão pensando e sentindo? - as crianças
são incentivadas a observar o “mundo
interno” dos personagens por meio das
ilustrações e leitura. No terceiro componente - quais são as intenções e metas
dos personagens? - relacionam-se os sentimentos e pensamentos, já identificados,
com os objetivos e as metas. No quarto
- o que os personagens alcançam com
suas ações? - Discute-se com as crianças
a relação entre os objetivos e metas dos
personagens e os resultados alcançados.
No quinto - como os personagens executam e monitoram seus comportamentos?
- as ações dos personagens são avaliadas
levando em consideração as consequências do comportamento. O sexto e último
componente - quais as lições aprendidas?
- abre para a criança a oportunidade de
estabelecer relações entre as experiências
vivenciadas pelos personagens da história
e aquelas vividas por ela própria em seu
dia a dia. Dois instrumentos foram aplica-
dos junto aos professores, antes e depois
da intervenção, de modo a aferir os seus
efeitos. Para avaliar as habilidades sociais
das crianças, foi utilizado o Questionário
de Respostas Socialmente Habilidosas QRSH-RP (Bolsoni-Silva, Marturano & Loureiro, 2009), composto por 24 itens agrupados em três fatores - Sociabilidade e
Expressividade Emocional, Iniciativa Social
e Busca de Suporte. Para avaliar problemas de comportamento, empregou-se o
Questionário de Capacidades e Dificuldades – SDQ (Fleitlich, Cortázar & Goodman,
2000), composto por 25 itens em cinco
escalas: sintomas emocionais, problemas
de conduta, hiperatividade, problemas
de relacionamento e comportamentos
pró-sociais. Um procedimento de avaliação sócio-cognitiva também foi utilizado,
porém seus resultados ainda não estão
disponíveis. Os resultados das avaliações
pré- e pós-intervenção foram comparados
por meio do teste de Wilcoxon. Resultados e discussão - Os resultados apontaram
incrementos significativos (p < 0,05) da
pré para a pós-avaliação nos escores totais de dois fatores do QRSH-PR. No fator
sociabilidade e expressividade emocional,
com 14 itens, aumentaram os escores nos
itens comunica-se positivamente, cumprimenta, expressa carinhos, expressa desejos, expressa frustração e desagrado de
forma adequada, faz elogios e tem relações positivas. No fator iniciativa social (6
itens), houve incremento nos itens toma
a palavra, participa de temas de discussão, negocia. Os itens usualmente está de
bom humor e toma iniciativas mostraram
tendência a aumento (p < 0,10). No SDQ,
houve melhora da pré para a pós-avaliação nas escalas relativas a problemas de
relacionamento e comportamentos pró-sociais. Os resultados demonstraram
145
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
uma redução de problemas de relacionamento e aumento nas taxas de comportamentos pró-sociais. Não tendo havido
mudança nos indicadores de busca de
suporte (QRSH-PR), sintomas emocionais,
hiperatividade e problemas de conduta
(SDQ), pode-se supor que os resultados
refletem a especificidade do programa
para promover comportamentos socialmente habilidosos e reduzir problemas de
relacionamento. A evolução encontrada
nos referidos resultados denota que com
o programa de leitura de histórias infantis
as crianças se tornam mais colaboradoras,
empáticas, atenciosas e, provavelmente,
mais capazes de analisar as consequências de cada comportamento (Rodrigues,
2009; Rodrigues & Oliveira, 2009), o que
pode contribuir para a melhora da convivência na escola (Borges & Marturano,
2009). Conclusão - Programas promotores
de habilidades infantis são de grande valia para favorecer o relacionamento interpessoal; a literatura infantil vem se mostrando benéfica dentro desta proposta.
Por meio dos livros de história as crianças
esclarecem de modo interativo, contextualizado e reflexivo o processamento da
informação social tornando-se cada vez
mais ajustadas ao meio social.
Palavras-chave: desenvolvimento
sociocognitivo, livros de histórias infantis,
educação infantil
LT04-744 - A MUSICALIZAÇÃO NO
CONTEXTO DOS PROJETOS SOCIAIS DO
VALE DO PARANHANA/RS
Alexandre Herzog - FACCAT
[email protected]
Patrícia Fernanda Carmem Kebach - FACCAT
[email protected]
146
Os projetos sociais são hoje uma realidade muito comum à sociedade brasileira.
São iniciativas individuais ou coletivas
que visam a proporcionar a melhoria da
qualidade de vida de pessoas e comunidades. A sociedade se mobiliza, por meio
de contribuições voluntárias, organizando
e desenvolvendo projetos e ações sociais
para transformar determinada realidade
para o bem comum. A arte e a música,
mais especificamente, representam a manifestação cultural de um povo e contribuem para qualificar a vida das pessoas,
na medida em que, através da arte, o ser
humano manifesta sua cultura e, correlativamente, suas emoções, ou seja, aquilo
que compartilha socialmente e seu mundo subjetivo. Sendo assim, elas se tornam
uma importante ferramenta para que os
projetos sociais atinjam seus objetivos.
Os resultados de pesquisas anteriores
(Kebach, 2003; 2008) evidenciam que a
educação musical nos espaços informais
demonstra ser algo bastante produtivo
em termos de musicalização e de trocas
sociais, o que motivou a realização da
pesquisa atual. Diante disso, o objetivo
desta pesquisa é investigar no âmbito de
projetos sociais no Vale do Paranhana/RS,
como ocorrem as práticas musicais para
compreender de que modo estes espaços
podem contribuir para a construção musical, para a inclusão e resgate da cultura
local dos sujeitos envolvidos neste processo. Através da pesquisa, poder-se-á mapear a Educação Musical informal na região
de estudo e sua repercussão na sociedade
local, legitimando-se este espaço. Pretende-se também contribuir para que os
atuantes nos projetos sociais aprimorem
seu trabalho e pensar na implantação da
educação musical, obrigatória nas escolas
a partir de 2011, em função da lei 11.769
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
publicada no Diário Oficial da União em
agosto de 2008, de modo mais qualificado e significativo. A metodologia utilizada
visa compreender o fenômeno em suas
dimensões individual e social. Os sujeitos
investigados serão os professores (ou outros proponentes) e participantes do processo de musicalização no contexto dos
projetos sociais. Utilizar-se-á a técnica de
observação coletiva e entrevistas individuais. Essas entrevistas serão realizadas com
base na técnica de aplicação do Método
Clínico Piagetiano (Delval, 2002), a fim de
compreender, através da livre conversação com os agentes do processo, de que
modo ocorrem a produção musical e as
interações sociais nos espaços investigados. O método clínico se traduz pelo procedimento de coleta de dados através da
observação das ações e livre conversação
sobre determinada temática, para seguir
o pensamento da pessoa entrevistada. No
caso desta pesquisa, os dados referentes
às ações musicais dos sujeitos serão registrados através de filmagens e as entrevistas gravadas e transcritas, para posterior
análise. A eleição da observação das ações
musicais e dos sujeitos entrevistados será
feita através de entrevista com um proponente de atividade musical e um participante destas atividades de cada uma das
seis cidades do Vale do Paranhana: Taquara, Parobé, Três Coroas, Riozinho, Igrejinha e Rolante. Serão mapeados espaços
diversificados de projetos sociais, o que
se caracteriza como pré-requisito para a
eleição de determinados projetos, ou seja,
em cada cidade, será eleito um espaço diferente para ser mapeado. Até o presente
momento, a pesquisa permitiu verificar a
existência de 25 projetos sociais ocorrendo nas cidades do Vale do Paranhana. A
educação musical tem sido trabalhada
nesses projetos através do ensino de instrumentos musicais e por meio da realização de corais, que permitem a construção
do cantar dos participantes e a sensibilização musical. Nos projetos mapeados
até o presente momento, de modo geral,
objetiva-se trabalhar com a prevenção
antidrogas, a promoção de saúde, melhorar a qualidade de vida dos participantes,
promover a socialização de crianças e sua
permanência na escola, profissionalizar o
jovem e mantê-lo longe do trabalho sem
condições, além de reunir a comunidade
e fomentar o gosto pela espiritualidade e
cultura local. Caracterizam-se como iniciativas movidas por diversos tipos de proponentes, desde igrejas, moradores dos
municípios, secretarias de educação e de
assistência social até escolas e programas
federais. Esta pesquisa está em fase de coleta de dados e poderá contribuir para a
construção de conhecimento acerca dos
projetos sociais e as práticas de educação
musical desenvolvidas na região do vale
do Paranhana. Os projetos já mapeados
revelam a relação entre a música e a qualidade de vida e, também, a intenção de
promover uma educação musical qualificada. Na etapa em que os pesquisadores
analisarão com mais profundidade os projetos eleitos em cada cidade do Vale do
Paranhana, ter-se-á como objetivos os seguintes: analisar como as pessoas que trabalham com musicalização nestes espaços
compreendem seu papel e o dos educandos para compreender a fundo os processos de ensino e aprendizagem musical;
verificar as relações interpessoais estabelecidas nos projetos para compreender o
que une as pessoas em torno das ações de
educação musical; investigar a função, natureza e impacto que a Educação Musical
causa nas localidades dos projetos sociais
147
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
onde é desenvolvida para compreender
como os grupos em situação de vulnerabilidade e risco social podem vislumbrar
novas perspectivas de estruturação social,
a partir da interação nos cenários de musicalização nestes projetos.
Palavras-chave: educação informal, projetos
sociais, musicalização
LT04-810 - JOGOS COOPERATIVOS E
A PROMOÇÃO DA COOPERAÇÃO NA
EDUCAÇÃO INFANTIL
Marilícia Witzler Antunes Palmieri - UEL
[email protected]
Valéria Queiroz Furtado - UEL
[email protected]
Em muitas das práticas educativas no âmbito da educação infantil, desvelam-se
diferentes procedimentos contemplando
alternativas educativas e pedagógicas diversificadas. Estas permitem o trânsito de
uma ampla gama de valores, conceitos,
regras, orientações, idéias e concepções,
configurando relações motivacionais altamente complexas e que implicam no desenvolvimento de diferentes padrões de
interação social. O eixo central do estudo
recai sobre a necessária superação de valores atrelados as práticas sócio-culturais
competitivas e individualistas das relações
humanas que se estabeleceu em nossa
sociedade, as quais têm sido enfatizadas
no exercício do cotidiano escolar (Branco,
2003, 2006; Crockenberg & Bryant, 1979;
Johnson & Johnson, 1989; Palmieri, 2003;
Salomão, 2001). Isto porque, dependendo das ações pedagógicas do professor,
é ele quem define as normas e as regras,
como também lidera e domina de forma
quase absoluta o espaço comunicativo das
atividades a serem desenvolvidas pelas
148
crianças. A idéia de educação infantil – entendida como aquela que se orienta para
o desenvolvimento de crianças de zero a
seis anos de idade (Brasil, 1998) – está associada, culturalmente, às dimensões do
“cuidar” e do “educar”, visando garantir
a não-fragmentação das experiências de
ensino-aprendizagem à criança pequena
(Angotti, 2000; Machado, 2000; Oliveira,
1999). Porém, muitas vezes, tais contextos
se encontram à mercê de concepções teóricas e práticas não adequadas para expressar, em sua plenitude, o caráter educativo, pedagógico e formativo, implicado
nas diversas experiências vivenciadas pela
criança (Machado, 2000). Dentre as diretrizes apontadas pelo Referencial Curricular
Nacional para a Educação Infantil (Brasil,
1998) para o desenvolvimento do trabalho
com crianças de quatro a seis anos está à
promoção de interações que favoreçam a
troca de idéias, oportunidade de expressão, de contato com outras vivências e a
construção conjunta de conhecimentos e
habilidades sociais, sublinhando a cooperação como o principal tipo de interação a
ser estimulado e promovido. Nessa perspectiva a proposta pedagógica dos jogos
cooperativos (Correia, 2006, 2007; Brotto,
2000; Salvador e Trotte, 2000; Soler, 2003)
apresenta-se como um recurso educativo
promissor para a modificação de práticas,
conceitos e valores competitivos e individualistas comumente encontrados na
escola, a qual enaltece o resultado e não
o processo, ao valorizar a vitória como
prêmio do sucesso individual (Correia,
2006; Salvador & Trotte, 2001). Chama-se de “cooperativos” jogos que alteram
a estrutura dos jogos tradicionais de suas
características de exclusão, agressividade,
seletividade e exacerbação presentes em
jogos competitivos, para uma estrutura de
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
jogos que sejam basicamente pautados na
cooperação, no envolvimento e na diversão (Brotto, 2002). São jogos que aceitam
as diversidades e as limitações dos participantes promovem o exercício da confiança pessoal e interpessoal, cumplicidade,
solidariedade, respeito mútuo (Correia,
2006), uma vez que ganhar e perder são
apenas referências para um contínuo
aperfeiçoamento de todos, vislumbrando
um verdadeiro exercício educativo para a
paz (Brotto, 2002). Neste sentido, o melhor momento para introduzir os jogos cooperativos para o exercício da cultura da
cooperação é a educação infantil, considerando que a criança ainda foi pouco exposta a experiências de competição (Soler,
2003). Acreditamos que as possibilidades
e os limites dessa proposta no contexto da
educação infantil contribuirão à análise do
complexo processo construtivo de socialização entre professores e alunos inseridos
em espaços educacionais que tem por
base um contexto heterogêneo e dinâmico, ancorado em diferentes aspectos relativos à interdependência humana, aí convivendo, em princípio, orientações múltiplas e diversificadas. O presente trabalho
é fruto de estudo anterior sobre o tema ludicidade e formação de educadores infantis realizado em um Centro de Educação
Infantil do município de Londrina-PR. Uma
oficina de Jogos Cooperativos foi promovida a quinze educadoras, as quais reconheceram a necessária promoção de atividades verdadeiramente cooperativas na
educação infantil, e, ao mesmo tempo, revelaram desconhecer como este tipo de vivência pode ser promovido nas atividades
lúdicas que desenvolvem com as crianças
no dia-a-dia da instituição. Dentro deste
contexto se insere o presente estudo (em
fase inicial), desenvolvido na mesma insti-
tuição, visando analisar, em nível microgenético, como três educadoras promovem
ou inibem a cooperação entre seus alunos
(4 a 6 anos), utilizando como recurso pedagógico os jogos cooperativos. O estudo
inclui: 1) Registro das atividades diárias realizadas com as crianças (protocolo específico); 2) Entrevistas (inicial e final) com as
educadoras (roteiro semiestruturado); 3)
Planejamento dos jogos para orientar as
professoras a reconstruírem e adaptarem
jogos a uma concepção não competitiva
ou cooperativa (categorização de Orlik,
1989, apud Correia, 2007); 4) Registro em
vídeo de atividades de jogos cooperativos
estruturados pelas educadoras. Como resultado parcial, os registros das atividades
diárias têm revelado um grande volume
de “atividades livres” sendo promovidas
às crianças fora da sala de aula, onde predomina as instruções das educadoras sem,
contudo, considerarem o interesse das
crianças pelas brincadeiras. Quando se
trata de atividades sendo estruturadas no
contexto da sala de aula, as educadoras se
orientam pelo objetivo de obter a atenção
das crianças na realização de tarefas individuais ou em grupo, com a atenção orientada para a professora, desestimulando-as a
interagirem entre si. Tais atividades, geralmente, se reduzem às educadoras contando uma estória para as crianças, repetidas
vezes por um período determinado e, na
seqüência, as instruem para a produção
individual de trabalhinhos (pintura, desenho, recorte, colagem). Neste caso, não se
observa preocupação das professoras com
atividades estruturadas para as crianças
interagirem cooperativamente que façam
com que aprendam novos conceitos e
experimentem algo novo no contexto da
sala de aula. Questiona-se o pouco espaço
para a criação de um ambiente propício a
149
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
negociações professoras-crianças, o que
levaria a um posicionamento mais democrático na sala de aula. Problematiza-se o
caráter educativo das atividades propostas
e o tipo de interação estimulado e promovido no âmbito da instituição. Acreditamos que a prática dos Jogos Cooperativos
nesse contexto educacional propiciará às
crianças a participação em atividades lúdicas que incentivam a cooperação, visando
o alcance de objetivos comuns, adquirindo também progressiva autonomia e independência para coordenar suas ações
com a de outros. As educadoras poderão
explorar as configurações motivacionais
facilitadoras de modalidades construtivas de interdependência social, o que nos
propiciará analisar os diferentes tipos de
inter-relações que ocorrem no conjunto
dos fatores que se apresentam típicos desse contexto.
Palavras-chave: Jogos Cooperativos;
Cooperação; Educação Infantil.
LT04-1412 - A LITERATURA INFANTIL NO
DESENVOLVIMENTO DA IMAGINAÇÃO
E CRIATIVIDADE DE ALUNOS DE 2 A 5
ANOS DE IDADE
Priscila Martins do Nascimento da Silva - UnB
Norma Lucia Neris de Queiroz - UnB
[email protected]
O presente trabalho caracteriza-se com um
estudo de pesquisa, cujo título é A literatura infantil no desenvolvimento da imaginação e criatividade de alunos de 2 a 5 anos
de idade. Foi estabelecido como objetivo
geral, analisar a prática pedagógica de um
grupo de professoras da educação infantil
de uma escola particular do Distrito Federal em relação à literatura infantil, especial150
mente, o desenvolvimento da imaginação
e da criatividade de seus alunos. Definimos
os seguintes objetivos específicos: identificar concepções de leitura, literatura infantil, imaginário e criatividade presentes no
ideário das professoras participantes deste
estudo; analisar estratégias pedagógicas
utilizadas pelas professoras para realizar
uma leitura prazerosa; descrever os projetos de literatura infantil desenvolvidos na
escola, destacando o desenvolvimento da
imaginação e criatividade de seus alunos;
identificar os programas da escola para
capacitação de professores no que diz respeito ao trabalho com projetos literários;
identificar as possibilidades de aplicação
das estratégias pedagógicas desenvolvidas
no campo da literatura nessa escola, em
instituições da rede pública do DF. Para que
tais objetivos fossem alcançados, organizamos o referencial teórico que fundamenta
todo o estudo com os trabalhos de Alencar
(2003); Coelho (2000); Garcez (2008); Machado (2002); Martinez (1997); Vygotsky
(2009); Zilbermam (2005). A metodologia
escolhida para o desenvolvimento da pesquisa foi a de cunho qualitativo, utilizando
instrumentos de coleta de dados como a
observação participante em três turmas da
educação infantil e a entrevista semiestruturada com as respectivas professoras. Os
resultados deste estudo revelam que a prática da literatura realizada pelas professoras da escola investigada, mesmo que em
alguns momentos precise de maior embasamento teórico e capacitação profissional
no que diz respeito a intenções pedagógicas pautadas numa prática mais rica em
possibilidades de criação e imaginação, faz
com que a literatura chegue a seus alunos
de maneira que favorece e possibilita a
vivência de sua verdadeira essência, sem
cobranças, ou seja, viver a literatura pela
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
própria literatura. Refletindo sobre os resultados, é possível dizer que para realizar
uma prática pedagógica pautada na literatura, mais especificamente na literatura
infantil, é preciso ir além dos fantoches e
dramatizações e sim viver a leitura da palavra com encantamento e prazer.
Palavras-chave: Literatura infantil; Educação
infantil; Criatividade; Imaginação.
LT04-1422 - O CIRCO: UMA PROPOSTA
DE AÇÃO INCLUSIVA EM EDUCAÇÃO
FÍSICA PARA A EDUCAÇÃO BÁSICA.
Vivianne Flávia Cardoso - UnB/UAB
[email protected]
Juliana Eugênia Caixeta - UnB
[email protected]
Nesse trabalho, discutimos a inclusão de
alunos deficientes nas aulas de educação
física, entendendo que a escola deixa de
ser uma instituição social com forte apelo
seletivo e passa a ser o lugar em que as
potencialidades devem ser vistas, as dificuldades superadas e os resultados aproveitados em prol de uma sociedade melhor. O processo de aprendizagem aciona
vários processos de desenvolvimento
que sem este estímulo poderiam não vir
a acontecer (Vygotsky, 1994). Quando falamos de inclusão de pessoas deficientes,
o que temos que fazer é descobrir como
promover zonas de desenvolvimento
proximal que estimulem estas crianças
a adquirir e formar o pensamento abstrato. Sabemos que a mediação do mais
experiente impulsiona o desenvolvimento
do menos experiente. “No processo de
construção do conhecimento, as crianças
se utilizam das mais diferentes linguagens
e exercem a capacidade que possuem
de terem idéias e hipóteses originais sobre aquilo que buscam desvendar” (Rcnei,1998, p.21) Compreender, conhecer e
reconhecer a forma particular das crianças serem e estarem no mundo é um dos
grandes desafios da educação infantil. A
escola é uma instituição social privilegiada
e responsável por promover este encontro com as mais diversas áreas do conhecimento, dentre elas, a da cultura corporal
de movimento pela qual a Educação Física
é diretamente responsável. Cultura corporal são todas as manifestações corporais
humanas que são geradas na dinâmica
cultural, são conhecimentos historicamente acumulados e socialmente transmitidos
(PCN EF, 1992, 1998). Segundo o PCN EF
(1992, p. 27) “É preciso que o aluno entenda que o homem não nasceu pulando,
saltando, arremessando, balançando, jogando etc. Todas essas atividades corporais foram construídas em determinadas
épocas históricas, como respostas a determinados estímulos, desafios ou necessidades humanas”. Assim, o aluno deficiente
deve ser atendido em suas necessidades e
desafiado em suas potencialidades como
todas as outras crianças, pois o objetivo
das aulas de educação física é a inclusão
do aluno na cultura corporal de movimento por meio da participação e reflexão, de
um conjunto de vivencias que contribuam
para seu desenvolvimento global. Descrever e analisar o processo de inclusão de
alunos deficientes nas aulas de Educação
Física na educação infantil que foram realizadas em uma escola pública de Vitória
durante os meses agosto a novembro de
2010. Nesse trabalho, realizamos a união
da abordagem qualitativa de pesquisa
com a pesquisa-ação em um estudo de
caso. Participaram do estudo 25 crianças
na faixa etária de 4 anos, incluindo uma
151
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
criança com Síndrome de Down, uma estagiária, a professora de Educação Física,
a professora regente da turma 4A e a pesquisadora, que também atuou como mediadora das atividades. Como técnicas e
materiais para coleta de dados foram utilizados observações e composição de diário
de campo, filmagens, fotografias. Como
procedimento foi adotado a implantação
do planejamento da proposta pedagógica
Circo em que cada dia havia uma atividade
diferente. Na medida em que as atividades
eram avaliadas, o planejamento inicial sofria ajustes. O tema circo foi escolhido por
apresentar um universo lúdico muito rico
para a criança, porque permite o trabalho
com músicas, com personagens, como: o
palhaço e o mágico e com diferentes expressões corporais, como: malabarismo,
acrobacias (como cambalhotas), equilibrismo, trapézio, corda bamba, dentre outros. A intervenção foi planejada visando
vivenciar com as crianças práticas corporais atreladas à temática do circo de forma
lúdica e prazerosa. Durante a intervenção
foi possível observar que todas as crianças
participaram ativamente, inclusive João,
portador da síndrome da Down. Todos os
alunos demonstraram parceria e cooperação. O processo de mediação professor/
aluno foi muito importante para promover um ambiente inclusivo, pois à medida
que pensávamos um processo de aprendizagem que incluísse todas as crianças buscamos também uma prática voltada para
competências dos sujeitos e que contribuísse para superar as limitações impostas pela deficiência. Quanto à mediação
aluno/aluno: das relações espontâneas,
citamos a cooperação, esta acontecia toda
vez que um colega ajudava o outro a realizar determinada atividade, como: virar
cambalhota, alcançar o trapézio, subir e
152
se balançar no balanço de pneu. Quanto
a relações mediadas, trabalhamos, além
da cooperação, soluções de problemas e
a tomada de decisões, pois assim nossos
alunos poderiam acessar seu repertório
motor, além de ressignificar movimentos
culturalmente construídos e historicamente acumulados. De acordo com Melo
(2010, p. 29), “na perspectiva em que o
contexto da ação assume papel central
no processo de desenvolvimento motor, o
sujeito é considerado ator do seu próprio
desenvolvimento”. Dentro da temática do
Circo, realizamos intervenções variadas na
turma, de forma que João tivesse oportunidade de ser atendido em suas necessidades individuais, vindas principalmente
da hipotonia, uma das características da
Síndrome de Down. Esta experiência mostrou que a Educação Física contribui para
a construção de uma escola inclusiva à
medida que integra saberes e fazeres diferentes dentro de um mesmo contexto,
quando tece reflexões sobre os significados e sentidos que as ações corporais têm
dentro da escola e na vida dos indivíduos
envolvidos. Acreditamos que intervenções
como as apresentadas nesse estudo evidenciam o papel da educação física como
promotora do desenvolvimento integral
das crianças, integrando o desenvolvimento cognitivo, afetivo e motor. Percebemos
que a intervenção na educação física pode
ir além dos “muros” da quadra e integrar
ações da escola como um todo. Adultos e
crianças, crianças e crianças vivenciaram
e evidenciaram, neste estudo, as possibilidades que se abrem no trabalho coletivo,
contextualizado à cultura infantil e, também, à cultura corporal de movimento.
Palavras-chave: Inclusão Escolar, Educação
Física, Cultura Corporal.
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
LT04-1423 - A CONSTRUÇÃO DO
SI MESMO E DO OUTRO NAS
BRINCADEIRAS DE FAZ-DE-CONTA
Sônia Regina dos Santos Teixeira - UFPA
[email protected]
Os princípios teóricos e metodológicos
adotados neste estudo tiveram como
pressupostos o referencial da psicologia
histórico cultural e foram utilizados para
compreender como determinadas experiências inquietantes vivenciadas por crianças ribeirinhas, durante brincadeiras de
faz-de-conta contribuíram para o processo
de constituição cultural das mesmas. Para
Vygotsky (1984), o indivíduo, ao nascer,
ainda não é verdadeiramente humano.
Somente passa a sê-lo quando, a partir
da interação com outros sujeitos, internaliza os significados compartilhados no
seu contexto sociocultural. Para o autor,
em cada fase do processo de constituição
cultural do sujeito há uma atividade que
contribui de forma fundamental para a
construção do psiquismo humano. Na fase
por ele denominada pré-escolar, de três a
seis anos, a brincadeira de faz-de-conta é
a principal atividade a contribuir para esse
processo. Assim, investigar como as crianças brincam, como interagem e os significados construídos durante as brincadeiras, pode ajudar na compreensão do processo de constituição cultural dos sujeitos.
Considerando que, atualmente, muitas
crianças nessa faixa etária participam de
programas de educação infantil, as turmas
de educação infantil constituem-se lócus
importantes para a investigação dessa atividade e, consequentemente, do processo
de constituição cultural das crianças, que
delas participam. Valsiner (1997) afirma
que o indivíduo, exerce um papel dialético no seu processo de constituição cul-
tural. É construído porque os significados
compartilhados nas interações tornam-se
constitutivos do sujeito e é construtor,
porque os significados compartilhados
são resignificados, recriados pelo sujeito.
Na brincadeira de faz-de-conta é possível
perceber essa co-construção. A criança é
construída pelos significados partilhados
no seu grupo cultural, uma vez que a matéria da situação imaginária origina-se das
experiências diretamente vividas ou presenciadas pela criança. Ao mesmo tempo,
é construtora, na medida em que recombina os significados e cria situações ficcionais que são virtuais, não correspondendo
a cópias literais dos significados partilhados. Para Simão (2004), o ser humano
constrói o si mesmo e a cultura, por intermédio do constante diálogo entre o “mim
mesmo” e o “outro”, principalmente, a
partir de vivências que ferem as expectativas do “mim mesmo” e o instigam cognitivo e afetivamente – as “experiências
inquietantes”. A autora questiona a relevância de estudos que buscam o acúmulo exaustivo e seletivo dos dados visando
descrever a ‘interação em si’, ‘o mais objetivamente possível’. Para ela, ao examinar
as falas das interações, o pesquisador, ao
invés de procurar os diálogos marcados
pelos consensos entre os sujeitos, deve
tomar como objeto de suas análises as falas que expressem ‘momentos de tensão’,
investigando para onde elas orientam os
interlocutores, na negociação para a distensão e reconstrução do conhecimento
sobre o conteúdo da conversa, mas, sobretudo, na reconstrução concomitante e
interdependente do conhecimento sobre
relações eu-eu e eu-outro. Nesse sentido,
foi realizado o presente estudo para verificar as experiências inquietantes vivenciadas pelas crianças, durante as brinca153
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
deiras de faz-de-conta e como as mesmas
contribuem para o processo de constituição cultural das crianças que participavam
das interações. O estudo faz parte de uma
pesquisa maior realizada durante o ano de
2005 e teve como participantes dez meninos e seis meninas, com idade entre quatro e cinco anos e a professora da classe
de uma escola localizada na Ilha do Combu, no município de Belém, Pará. O procedimento de coleta constou de gravações
em vídeo das brincadeiras que ocorreram
no cotidiano da classe. As informações foram coletadas quinzenalmente, perfazendo um total de 16 registros. Os episódios
de faz-de-conta foram transcritos e examinados do ponto de vista microgenético, de
acordo com a forma concebida pela psicologia histórico cultural. A análise centrou-se na dinâmica do processo de construção de significados pelas crianças. Ficou
evidente na análise dos episódios que as
experiências inquietantes vividas pelas
crianças, durante as brincadeiras, contribuíam para a tomada de consciência da
diferenciação entre o si mesmo e o outro.
Isso pode ser observado pelo uso frequente dos pronomes pessoais e possessivos e
pela diversidade de formas de ocupação
do lugar do outro da cultura, durante a
representação de diversos papeis sociais.
Tais achados confirmam a proposição de
Góes (2000), de que a brincadeira de faz-de-conta é um excelente campo para
investigar os indícios da construção do si
mesmo e do outro, pelo fato, da criança,
nessa atividade, manejar, constantemente, imagens de si e dos outros da cultura.
A análise mostrou também como as crianças estavam constantemente significando
e ressignificando a sua relação com os parceiros, figuras cognitivo-afetivas a quem
alimentavam expectativas diversas a todo
154
instante (Simão, 2002, 2004). O estudo revelou momentos de tensão presentes nos
diálogos entre as crianças, que as exigiam
reconstruções afetivas e cognitivas constantes. É evidente na análise, que embora tenha sobressaído o investimento das
crianças na negociação de conflitos para
garantir o processo interativo do brincar,
longe de ser um ambiente harmônico,
este era um espaço marcado por tensões,
desencontros e disputas. Verificou-se ressignificações de princípios de classificação
dos sujeitos, presentes no contexto sociocultural das crianças, tais como: mais ou
menos competente; mais velho e mais
novo; adulto e criança; homem e mulher
e feio e bonito. Tais ressignificações estavam na origem de diversas experiências
inquietantes. Na análise ficou evidente
que o processo de constituição cultural
ocorre da diferenciação de elementos inicialmente indiferenciados. Tal diferenciação só é possível, por intermédio do distanciamento psicológico crescente, possibilidade que as crianças encontram no
faz-de-conta, que as exige uma maior descentralização do si mesmo e uma menor
contextualização. No faz-de-conta, na medida em que a criança discorda da outra,
ela instaura um distanciamento entre o si
mesmo e o outro. Isto a possibilita tomar
consciência cada vez mais abrangente de
seus contextos, de si mesma, dos outros
e de suas relações com eles e a participar,
de formas cada vez mais diferenciadas do
processo de construção da sua subjetividade e da sua cultura.
Palavras-chave: Brincadeira de Faz-de-Conta;
Educação Infantil; Crianças Ribeirinhas.
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
CO 27 - LT4
Inclusão 2
LT04-798 - INCLUSÃO ESCOLAR DE
ALUNOS AUTISTAS: CONCEPÇÕES DE
PROFESSORES DE ESCOLAS PÚBLICAS DO
DISTRITO FEDERAL
Mara Rubia Rodrigues Martins - SEEDF
[email protected]
Sandra Francesca Conte de Almeida - UCB
[email protected]
As indagações acerca da possibilidade de
inclusão escolar de pessoas com autismo
habitam o imaginário dos envolvidos no
processo educativo e lançam um debate
sobre as condições que vão além da garantia dada por lei (acessibilidade) à escolaridade em salas comuns. Assim, é necessário que a escola e os professores se preparem para incluí-las. O presente trabalho
investigou as concepções de 23 professores regentes de escolas públicas acerca
da inclusão escolar de alunos autistas no
ensino regular. A fundamentação teórica
que embasou o estudo é a psicanalítica,
enfatizando a compreensão do autismo,
na perspectiva freudo-lacaniana, o conceito de educação terapêutica e as relações
entre psicanálise e educação. A grande
descoberta da psicanálise, a constituição
do sujeito no campo do Outro, ensina que
a pessoa se torna sujeito pelo desejo e
que o sujeito só pode se constituir como
sujeito desejante se o Outro o desejou,
antes. Para que o sujeito se constitua não
basta apenas que seja cuidado, é preciso
também que seja desejado e que o Outro
responda à sua demanda. Cabe ao professor, na função de suplência do outro, mas
de um outro barrado, sobretudo em se
tratando de crianças autistas, apresentar
das mais diversas formas e de diferentes
maneiras os objetos da cultura ao aluno,
para que este encontre um lugar no mundo ou que nele possa advir como sujeito.
A educação terapêutica (Kupfer, 2001) é
um conjunto de práticas interdisciplinares
que visa à retomada do desenvolvimento global do sujeito ou a reestruturação
psíquica interrompida pelo surgimento
do autismo. Na pesquisa, foi utilizada a
abordagem qualitativa de tipo etnográfico, adotando-se como instrumento de
coleta e construção de dados a entrevista
semiestruturada. Os resultados indicaram
congruência e semelhança de concepções
e práticas pedagógicas entre os professores entrevistados. Observou-se que a
maioria dos sujeitos entrevistados, vinte
e um, era favorável à inclusão escolar de
alunos com autismo, embora tivessem relatado o mal- estar que sentiam frente ao
aluno autista, cuja “diferença” os remetia
ao exercício constante da impotência, da
incapacidade, da angústia, marcas significantes da castração. Apesar da formação
acadêmica de nível superior, esta não os
autorizava, de “per si”, a implicar-se subjetivamente no trabalho realizado com esses alunos. Cabe ressaltar que as concepções dos professores sobre o processo de
inclusão escolar, bem como sua compreensão acerca do autismo, permitiam que
se perpetuasse a ideia de que os autistas
vivem em um mundo à parte, isolados da
realidade e que, por tais motivos, as práticas inclusivas se restringiam a ações educativas de pouco impacto na subjetividade
e no comportamento desses sujeitos. Os
dados relativos aos fatores que facilitavam
ou dificultavam a inclusão de autistas no
ensino regular se expressaram sob a forma de uma aparente contradição. Foram
155
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
apontados como fatores facilitadores: a
informação/conhecimento, a formação
específica, a presença de um professor
auxiliar, em sala de aula, e o envolvimento
da família; como fatores que dificultavam
a inclusão, apareceram esses mesmos aspectos, mas em situação de falta, de carência ou de ausência. Quanto às práticas
pedagógicas diárias, foi possível observar
que a grande maioria, dezenove dos vinte e três professores, realizava algum tipo
de adaptação curricular, quer seja nas
atividades propostas, no atendimento ou
nas avaliações dos alunos autistas, o que
nos permitiu inferir que os professores
se preocupavam em oferecer atividades
pedagógicas que levavam em consideração as peculiaridades e limitações de seus
alunos autistas e as suas próprias. O papel
do educador, nas vicissitudes da constituição do sujeito, é o de fornecer aos alunos
autistas inscrições primordiais, conteúdos
ideativos, objetos da cultura, a partir de
diversas linguagens, instituindo o simbólico em torno do real, diferenciando-se da
educação formal, ocupando o lugar de Outro barrado, transmitindo, além de conhecimentos, valores, ideais e um saber existencial. A educação terapêutica, prática
interdisciplinar que visa à reestruturação
psíquica da criança com transtorno global
do desenvolvimento, foi sugerida como
proposta de atendimento educacional aos
alunos autistas inclusos no ensino regular,
assim como a criação de um espaço de
interlocução e de escuta dos professores,
de modo que estes pudessem ressignificar
suas angústias e rever suas certezas, desconstruir saberes e aprender a conviver
com a impossibilidade de uma educação
ideal, apostando no saber e no desejo de
que, pelo ato educativo, um aluno-sujeito
possa advir. A escuta dos educadores en156
volvidos no processo de inclusão escolar
é de fundamental importância, pois dar
voz a esses que são os protagonistas da
educação inclusiva, juntamente com os
alunos, significa apostar no professor e
criar condições para que a educação terapêutica aconteça. Os resultados deste
estudo confirmaram, ainda, a complexidade do processo de inclusão de autistas no
ensino regular e apontaram para a necessidade de se dar continuidade a outros estudos e pesquisas que levem em consideração essa temática, sobretudo a função
da escola e do professor no processo de
reestruturação psíquica de crianças com
graves problemas de desenvolvimento.
Palavras-chave: Inclusão escolar; autismo;
psicanálise.
LT04-933 - O BRINCAR EM CRIANÇAS
COM DEFICIÊNCIA VISUAL
Letícia Coelho Ruiz - UNICAMP
[email protected]
Cecília Guarnieri Batista - UNICAMP
[email protected]
Muitos trabalhos discutem questões sobre o desenvolvimento de crianças com
deficiência visual, por meio de comparações com aspectos do desenvolvimento
de crianças videntes. Nesses estudos, as
dificuldades e os déficits são salientados,
por tomarem por base a relação normal/
deficiente. Warren (1994) sugeriu uma
“abordagem diferencial”, que se caracteriza por buscar compreender as variações
no desenvolvimento entre indivíduos com
deficiência visual, considerando importantes os casos de indivíduos que se destacam
pelo desenvolvimento de habilidades diferenciadas. A detecção de uma habilidade,
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
mesmo que em um único participante, já
é indicação de que a deficiência não impede a sua aquisição. Sugere, portanto, que
a pesquisa seja voltada para perguntas sobre os fatores que levaram essas pessoas
a adquirir tais habilidades. Um contexto
em que podem ser observados aspectos
do desenvolvimento infantil é durante
o brincar. Vygotsky (1988) discute sobre
a relação entre o brincar e as funções
mentais superiores, afirmando que, ao
partir do brinquedo, com destaque para
o brincar de faz de conta, a criança torna-se capaz de compreender o real e atuar
de maneiras distintas e mais elaboradas,
em relação às que costuma apresentar em
seu convívio social. A atividade lúdica confere liberdade à criança, por meio destas
ações simbólicas, e lhe permite ultrapassar os limites determinados por seu nível
atual de desenvolvimento. Hueara, Souza,
Batista, Melgaço e Tavares (2006) evidenciaram as competências apresentadas por
crianças cegas e com baixa visão, durante
atividades relativamente livres de exploração de brinquedos. A brincadeira relativamente livre, encorajada, mas não dirigida
por adultos, levou à constituição de um
ambiente muito propício ao desenvolvimento do faz-de-conta. Na conclusão do
estudo, destacaram-se diversos exemplos
de capacidades apresentadas por estas
crianças, na criação de cenas, representação de papéis, estabelecimento de regras, que nem sempre eram evidentes em
outros contextos, especialmente, os de
avaliação formal. Na mesma direção, foi
proposto um estudo envolvendo crianças
com deficiência visual e/ou alterações visuais, a maioria com outras alterações no
desenvolvimento. Procurou-se identificar
habilidades e competências das crianças,
a partir da análise de transcrições de vide-
ogravações e análise qualitativa e microgenética de episódios, segundo Carvalho
e Pedrosa (2005) e Góes (2000). O estudo
abrangeu sete crianças de 4 a 8 anos, organizadas em dois grupos: (a) no Grupo 1
participaram três crianças, duas com baixa
visão e uma cega; (b) no Grupo 2 participaram duas crianças com baixa visão e duas
com alterações visuais e dificuldades escolares. As filmagens foram feitas de abril
a junho de 2010. Foram videogravadas 8
sessões, com cada um dos grupos. As observações foram realizadas em situações
que propiciaram contatos com brinquedos
em momentos de interação. Foram preparados conjuntos de brinquedos variados,
com atenção às necessidades referentes
à deficiência visual (brinquedos coloridos,
sonoros, etc). O pesquisador era o coordenador das sessões. Foram analisados
episódios relevantes de faz de conta, em
relação aos seguintes aspectos: modos de
brincar entre as crianças, modos de manuseio de objetos e formas de atuação do
adulto, de acordo com as categorias criadas para a análise. Os pais das crianças estudadas foram entrevistados no que se refere às formas de brincar dessas crianças.
Foi elaborado um sistema de categorias,
abrangendo os seguintes aspectos: Formas de Interação (adulto- criança e criança-criança) e Uso de Objetos. Foi, também,
focada a questão das dificuldades específicas de crianças com problemas visuais durante a brincadeira. Dois exemplos de análise são apresentados. Na sessão “O lobo e
o porquinho” (Grupo 1), no que se refere
à Interação criança- criança, observou-se
que o grupo manteve na maior parte do
tempo, Ação conjunta. Quanto ao Uso de
Objetos, as crianças elaboraram uma Cena
de faz de conta análoga à história dos três
porquinhos, com alguns elementos novos,
157
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
como a aparição de um policial, a prisão,
o lobo chegando de carro. Na Interação
adulto-criança, observou-se que o adulto
apresentou Sugestão para integração das
atividades e, depois que foi observada na
Atividade conjunta das crianças, passou
a apresentar Comentários e Avaliações
Positivas. Na sessão “Mãe, pai e filho”
(Grupo 2), quanto à Interação criança-criança,observou-se predomínio de Ação
conjunta. No que se refere ao Uso de objetos, as crianças criaram uma Cena de faz
de conta entre quatro crianças, de “fazer
comidinhas”, com papéis de pai, mãe e
filhos, cada um assumindo um papel combinado entre eles. E quanto à Interação
adulto-criança, a atuação foi semelhante
à da sessão já descrita. No final da sessão
surgiu a necessidade, explicitada pelas
crianças, de registro escrito da brincadeira
para poderem dar continuidade à mesma
na sessão seguinte. Também foi observado que, nessa sessão, uma das crianças
pegou algumas caixas de alimento e leu
os registros das caixas. É interessante
destacar esses aspectos, pois, indicaram
a compreensão da função da escrita, sendo que a maior queixa de aprendizagem
desses alunos estava relacionada à leitura
e escrita. A análise das sessões permitiu
identificar estratégias das crianças para a
exploração dos objetos e elaboração de
faz de conta. Foi possível identificar alguns
obstáculos na interação com a criança
cega e alguns exemplos em que a intervenção do adulto pôde promover melhor
interação entre as crianças. No grupo com
a criança cega, o adulto descreveu a localização dos brinquedos, aproximou objetos
e deu pistas verbais de direcionamento
para que a criança realizasse deslocamentos. O adulto também orientou as outras
crianças para que facilitassem a participa158
ção da criança cega (ex: permitir o contato
com os brinquedos utilizados pelos outros). Quanto às crianças com baixa visão,
o adulto orientou à exploração de objetos
(ex: pistas para aproximação, exploração
tátil e comparação entre objetos). Os resultados trazem subsídios para a intervenção educacional, com um modelo voltado
para a facilitação das aquisições das crianças; apontam, também, para aspectos específicos, relativos a possíveis obstáculos
para participação na brincadeira de faz de
conta por parte de crianças cegas e com
baixa visão mais severa; descrevem, ainda, soluções propostas pelo pesquisador,
de forma a propiciar brincadeiras em níveis crescentes de elaboração e de superação dos obstáculos identificados.
Palavras-chave: brincar, deficiência visual,
Educação Especial
Contato: Letícia Coelho Ruiz, CEPRE/FCMUNICAMP, [email protected]
LT04-986 - A CONDIÇÃO
UNDERACHIEVEMENT NO FENÔMENO
ALTAS HABILIDADE/SUPERDOTAÇÃO:
DESDOBRAMENTOS EMPÍRICOS
Fernanda do Carmo Gonçalves - UnB
[email protected]
Vanessa Terezinha Alves Tentes - SEDF
[email protected]
Denise de Souza Fleith - UnB
[email protected]
Conceber o indivíduo superdotado, enxergar o seu potencial e ao mesmo tempo
reconhecer suas limitações é um exercício
desafiador, presente nos estudos sobre
a condição de baixa performance acadêmica ou underachievement (McCoach &
Siegle, 2003; Montgomery, 2009; Neihart,
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
2002; Ourofino, 2005, 2007; Ourofino &
Fleith, 2005; Reis & McCoach, 2002). A
baixa performance acadêmica em indivíduos superdotados refere-se, portanto, a
uma condição concomitante a de superdotação, que interfere no desenvolvimento do indivíduo, em consequência da discrepância entre o potencial previamente
revelado e a performance atual exibida.
A condição antagônica vivenciada pelo
superdotado o coloca em situação de risco, de vulnerabilidade social e emocional,
acentuando ainda mais suas necessidades educacionais especiais. As Diretrizes
Nacionais para a Educação Especial na
Educação Básica reconhece o aluno superdotado, como aquele que apresenta
“grande facilidade de aprendizagem que
o leve a dominar rapidamente conceitos,
procedimentos e atitudes” (Ministério da
Educação, 2001, Art. 5°, III). A Política Nacional da Educação Especial, no que tange
às altas habilidades/superdotação, define
o superdotado como aquele que demonstra “potencial elevado em qualquer uma
das seguintes áreas, isoladas ou combinadas: intelectual, acadêmica, liderança,
psicomotricidade e artes, além de apresentar grande criatividade, envolvimento
na aprendizagem e a realização de tarefas
em áreas de seu interesse” (Ministério
da Educação, 2008, p.15). Superdotação
e insucesso escolar não se complementam mutuamente, pois se encontram em
extremos opostos no espectro do ensino.
No entanto, apesar da dissonância cognitiva que essa condição suscita, a realidade
mostra que muitos superdotados exibem
baixo rendimento escolar. Ao longo dos
últimos trinta anos a preocupação com
superdotados underachievers tem ganhado força e espaço de investigação. Para
Heacox (1991), nos Estados Unidos exis-
tem cerca de dois milhões de estudantes
superdotados e a prevalência de underachievers pode chegar a 50% dos alunos
identificados no contexto educacional.
Mais recentemente, o Davidson Institute
for Talent Development (2009) divulgou
que a população de superdotados abrange 2.392.300 indivíduos, ou seja, 5% dos
estudantes norte-americanos. Desse total,
mais da metade é considerada underachiever. Esses dados reforçam a preocupação
dos estudiosos da área de superdotação e
confirmam a prevalência de underachievers em vários países, conforme verificado
em estudos conduzidos na Espanha por
Olivarez (2004), na Áustria por Schober
(2004), na Alemanha por Sparfeldt (2006)
e mais recentemente por Doeschot-Bults
e Hoogeveen (2010), na Turquia por Baslanti e McCoach (2006), em Hong Kong
por Phillipson (2007), na República Tcheca por Dvorakova (2008) e Holesovska
(2010), na França por Villatte e Leonardis
(2010) e na Inglaterra por Montgomery
(2009), além da extensa produção verificada nos Estados Unidos da América e no
Canadá. No Brasil, os estudos sobre desempenho escolar abarcam os alunos de
modo geral (Pinheiro-Cavalcanti, 2009; Libório, 2009). No que tange especificamente à performance acadêmica de indivíduos
superdotados, não foram encontrados estudos brasileiros que investigassem esse
fenômeno. No entanto, chamam atenção
os dados oficiais apresentados no Censo
Escolar 2010 demonstrando que no país
existem 53.791.142 estudantes matriculados na Educação Básica, sendo que deste total, 398.155 são alunos da educação
especial, 5.186 alunos são considerados
superdotados e, entre estes, apenas 465
estão matriculados no Distrito Federal
(Ministério da Educação, 2010). Diante
159
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
deste quadro, se fortalece a concepção
de que muitos alunos superdotados são
invisíveis ao sistema e certamente dentre
estes estão muitos underachievers. Ainda
mais complexa é a situação daqueles que
mesmo identificados como superdotados
apresentam uma produtividade aquém de
seu potencial, revelando uma desconexão
entre capacidade, habilidade e o desempenho acadêmico real e, por esse motivo,
acabam, de alguma forma, excluídos do
processo educacional e os dados oficiais
sequer os mencionam. (Ourofino & Fleith,
2005). O objetivo deste estudo foi identificar a prevalência de superdotados underachievers entre superdotados de um
atendimento educacional, descrever as
habilidades, as preferências, os interesses,
os aspectos motivacionais, as características pessoais, as relações interpessoais e
acadêmicas e os estilos de aprendizagem
de alunos superdotados e superdotados
underachievers. Investigar ainda possíveis
diferenças entre os alunos desses grupos,
dos gêneros masculino e feminino, em
relação à inteligência, criatividade, motivação para aprender, autoconceito, desempenho escolar e atitudes parentais.
Participaram do estudo 96 alunos, sendo
53 superdotados e 43 superdotados underachievers. Utilizou-se um delineamento
descritivo-comparativo e uma combinação de instrumentos para acessar as variáveis investigadas. Foram empregados testes psicométricos de inteligência não verbal, de pensamento criativo verbal e figurativo e de desempenho acadêmico, bem
como aplicadas escalas de características
pessoais, acadêmicas e motivacionais,
estilos de aprendizagem, autoconceito e
atitudes parentais. A análise baseou-se
também nos dados colimados no Protocolo de Investigação da Performance Aca160
dêmica de Alunos Superdotados, análise
documental e questionário demográfico.
Para o estudo comparativo foi realizada a
análise de variância multivariada (MANOVA). Os resultados indicaram prevalência
de alunos superdotados underachievers
entre superdotados na razão de 2:1. As
variáveis descritivas que mais se destacaram na autopercepção desse grupo foram,
em sua maioria, coincidentes. Os alunos
superdotados em comparação aos underachievers obtiveram desempenho significativamente superior nas medidas de inteligência, criatividade total e criatividade
verbal, autoconceito (na dimensão conduta comportamental e autoestima global),
desempenho escolar total e na dimensão
escrita. Por outro lado, os underachievers
se destacaram nas medidas de motivação
extrínseca, quando comparados aos superdotados. Com relação ao gênero, os resultados sinalizaram diferenças significativas a favor do gênero masculino quanto à
inteligência. Da mesma forma, as alunas
obtiveram resultados superiores, quando
comparadas aos alunos, nas medidas de
criatividade verbal, motivação intrínseca
para aprender, autoconceito na dimensão
autoestima global e desempenho escolar
na dimensão escrita. Interações significativas entre grupo e gênero foram observadas em relação à inteligência e autoconceito nas dimensões competência escolar,
aceitação social e autoestima global. As
alunas superdotadas underachievers obtiveram resultados inferiores em todas as
medidas quando verificados os efeitos da
interação grupo e gênero. Quanto às variáveis relacionadas à família, não existem
diferenças significativas no que tange às
atitudes parentais adotadas na educação
de superdotados e superdotados underachievers. Alunos underachievers são invi-
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
síveis ao sistema de ensino e estão de, algum modo, excluídos dos processos educacionais. É imperativo que a sociedade se
mobilize para criar alternativas alinhadas
com o movimento de educação inclusiva,
a fim de reverter essa realidade paradoxal.
Palavras-chave: Educação, Superdotação,
Underachievement
Contato: Fernanda do Carmo Gonçalves, UnB,
[email protected]
LT04-1036 - INCLUSÃO DE CRIANÇAS
AUTISTAS: UM ESTUDO SOBRE
CONCEPÇÕES E INTERAÇÕES NO
CONTEXTO ESCOLAR
Emellyne Lima de Medeiros Dias Lemos UFPB
[email protected]
Nádia Maria Ribeiro Salomão - UFPB
[email protected]
Financiamento: CNPq
A interação social é de grande relevância
no processo de desenvolvimento infantil
entendendo que o sujeito, inserido em
um contexto histórico-social, é um ser
ativo em suas interações desde a mais
tenra idade. Nesse processo destaca-se
a importância do ambiente interpessoal
para a aquisição de habilidades comunicativas ressaltando a convivência com
outras crianças, assim como o suporte do
adulto, uma vez que, sensível às necessidades conversacionais da criança é capaz
de adequar seu comportamento comunicativo às capacidades desta última. O
presente estudo adota uma perspectiva
desenvolvimentista que concebe o desenvolvimento típico a partir da articulação
entre capacidades biológicas iniciais para
o engajamento social e as interações so-
ciais posteriores. Nessa perspectiva, o
autismo é caracterizado por prejuízos biológicos primários acarretando déficits nas
interações sociais. Esta pesquisa aborda o
transtorno autista que abrange um espectro heterogêneo de quadros comportamentais envolvendo desvios no desenvolvimento desde os primeiros anos de vida
nas áreas de interação social, comunicação e imaginação. Inúmeras pesquisas são
realizadas e muitos aspectos permanecem
inconcludentes, sobretudo em relação à
etiologia, as possibilidades terapêuticas e
inserção em escolas regulares. A inclusão
escolar dessas crianças é questionada por
alguns educadores devido aos prejuízos
inerentes às características da síndrome,
mas este trabalho se apóia em estudos
que admitem que embora seja uma prática difícil, é também realizável e possível,
considerando os benefícios das vivências
escolares tanto em termos de interações
sociais quanto do desenvolvimento de
habilidades cognitivas nas crianças do
espectro. A falta de clareza quando aos
benefícios da inclusão escolar dessas
crianças traz implicações às concepções
sobre os indivíduos autistas. Nesse sentido, destaca-se a importância de conhecer
as concepções de pais e educadores visto
que tais idéias apresentam implicações
nas práticas e nas interações estabelecidas com a criança. Dada à importância da
interação social e a influência dos contextos situacionais e interacionais o presente
estudo tem como objetivos principais analisar as interações sociais entre as crianças
com espectro autista e as demais crianças
nos contextos de escolas regulares considerando a mediação das professoras,
assim como, analisar as concepções dos
pais e professores acerca da criança e do
processo de inclusão escolar com ela rea161
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
lizado. Participaram deste estudo crianças
e professoras de duas escolas regulares
particulares da cidade de João Pessoa PB; sendo analisadas duas turmas de uma
escola e três de outra, totalizando cinco
professoras, como também cinco crianças
com diagnóstico do espectro autista, com
idades variando entre 3 e 5 anos, de classe
sócio-econômica média e seus respectivos
pais. Para a coleta dos dados, foram utilizadas entrevistas semiestruturadas com
os pais e professoras registradas através
de um mini-gravador, como também, foram realizadas duas filmagens em cada
turma contemplando 20 minutos em cada
uma das situações de pátio e sala de aula,
dos quais foram transcritos e analisados
10 minutos. Com o objetivo de caracterizar as crianças deste estudo também
foi utilizada a escala de avaliação CARS
(Childhood Autism Rating Scale). Quanto
à análise dos dados, as entrevistas foram
transcritas e analisadas a partir da técnica
de análise de conteúdo, as filmagens foram transcritas e foram analisadas através
de categorias pós-formuladas tendo em
vista a bidirecionalidade nas interações
estabelecidas nos contextos escolares de
pátio e sala de aula, assim como, a participação dos membros em termos de frequência e duração do comportamento. Os
resultados apresentados neste trabalho
contemplam parte dos resultados da pesquisa de dissertação de mestrado. Em relação à análise das verbalizações dos pais
das crianças com espectro autista, embora considerando apenas 5 participantes
alguns aspectos foram encontrados, quais
sejam: percepção dos filhos como crianças
carinhosas e afetuosas, atribuindo a dificuldade em comunicar-se como sendo a
principal característica de criança autista;
relatos de dificuldades em definir autis162
mo, alguns abordando que as dificuldades
na interação social diferiam de preferência ao isolamento; satisfação com o processo de inclusão escolar realizado com
seus filhos e reconhecimento da importância do papel da família nesse processo.
Outro aspecto foi que embora atribuíssem
expectativas mais voltadas à socialização,
a maioria enfatizou as diferentes habilidades adquiridas pelos seus filhos após a
entrada na escola. Quanto às professoras
a maioria demonstrou estar reformulando
suas concepções a partir das experiências estabelecidas com estas crianças no
cotidiano escolar, adotando concepções
que embora abordem as dificuldades das
crianças, partem de aspectos positivos
que envolvem as possibilidades e os resultados dos esforços dispensados com o
trabalho de inclusão. No que diz respeito
às interações estabelecidas no contexto
escolar foram observadas categorias de
comportamentos verbais e não verbais
em três áreas: comportamentos da criança com espectro autista, comportamentos
da professora e comportamentos das demais crianças. Na primeira área emergiram as seguintes categorias e subcategorias: Olhar, sendo este dirigido a pessoas,
ações ou objetos; Iniciativa, sendo esta
dirigida a pessoas, ações ou a objetos;
Resposta adequada; Interação passiva;
Imitação; Demonstração de afeto; Sorriso;
Esquiva e Isolamento. Já na segunda área
foram observadas as categorias: Mostrar;
Gesticular; Apoio físico; Modelo; Demonstração de afeto; Diretivos, sendo estes de
atenção, de instrução e de controle de
comportamento; Informação e Feedback.
Por último, sobre os comportamentos das
demais crianças emergiram as categorias:
Olhar; Iniciativa; Esquiva e Demonstração
de afeto. Nos contextos de pátio foram
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
enfatizadas as brincadeiras sendo elas em
conjunto ou isoladas. Resultados parciais
indicam a importância da mediação das
professoras, uma vez que as crianças autistas do presente estudo demonstraram
se comportar, nos diferentes contextos,
mais frequentemente em resposta a professora ou a situação do que por imitação.
Pretende-se com este estudo subsidiar
orientações a pais e profissionais principalmente no que se refere à inclusão escolar de crianças autistas, tendo em vista
que as concepções podem influenciar os
comportamentos dos adultos, como também, os comportamentos dessas crianças
podem ser influenciados considerando os
contextos interativos, a mediação do adulto e, sobretudo, as particularidades de
cada criança.
Palavras-chave: Espectro autista, Concepções,
Inclusão
Contato: Emellyne Lima de Medeiros Dias
Lemos, UFPB, [email protected]
LT04-1197 - A EDUCAÇÃO INCLUSIVA
E O TRABALHO DAS ASSESSORIAS
ESPECIALIZADAS
Simone Cassiani - PM-Amparo
[email protected]
Alessandra Rodrigues de Almeida - PM-Amparo
Marisol Regina Pavani de Oliveira - PM-Amparo
A Rede Municipal de Ensino de Amparo
vem desenvolvendo um trabalho em prol
de uma educação inclusiva e de qualidade visando beneficiar a TODOS. Reconhecendo que a Constituição Federal de 1988
garante a todos o direito à educação e o
acesso à escola (Art. 1º; 3º; 205; 206 e
208) e atendendo a esses princípios constitucionais, a Secretaria Municipal de Amparo, elaborou um documento intitulado,
“A lógica da inclusão na rede municipal de
ensino de amparo – estratégias de apoio
para a construção da educação inclusiva”. O objetivo é contribuir com a prática
e a compreensão de algumas das razões
pelas quais é tão difícil saber como lidar
e o que fazer quando temos alunos cujas
características nos evidenciam a necessidade de trabalhar com as diferenças nos
mais variados contextos do cotidiano de
uma educação que se propõe a ser inclusiva. O Programa de Educação Inclusiva,
intitulado “A educação tem muitas faces educando e aprendendo na diversidade”,
tem como proposta o apoio aos professores, no qual consiste no levantamento
de informações sobre o atendimento de
diferentes casos nas escolas, buscando
categorizar e caracterizá-los para o conhecimento da realidade e encaminhamentos
pedagógicos e clínicos, encontros com
profissionais da educação e saúde para
discussão de dificuldades e indicações das
intervenções realizadas, levantamento de
propostas, orientações, encaminhamentos e registros. Segundo Sassaki (1998),
na escola inclusiva há colaboração e apoio
mútuo entre professores, terapeutas e
consultores para se oferecer orientação
na própria sala de aula em vez de retirar
alunos do horário de aula para desenvolver terapias no ambiente escolar, o que
seria muito inadequado, uma vez que a
escola não se confunde com a clínica, e o
papel de cada profissional deve ser respeitado. O trabalho clínico deve ser realizado
fora do espaço escolar, com profissionais
da saúde. Atualmente a Secretaria vem
crescentemente investindo em formas de
instrumentalizar os profissionais que atuam nas unidades escolares na perspectiva
de qualificar o atendimento educacional e
desenvolver uma prática de Educação In163
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
clusiva voltada a participação democrática
de todos. Além de todo trabalho desenvolvido pela SME, composto no documento do Programa, vimos nesse texto enfatizar uma ação que tem sido de grande
valia ao desenvolvimento dos alunos e à
prática pedagógica dos professores, que é
o trabalho realizado pelas assessorias contratadas pela SME para garantir o apoio e
as orientações às unidades escolares e
diretamente aos professores que atendem alunos com as diversas deficiências.
A fim de desenvolver o reconhecimento
e a valorização das diferenças humanas
em todas as instâncias, minimizando os
preconceitos e buscando garantir a implementação de práticas inclusivas mais adequadas, a qualificação e aprimoramento
do atendimento educacional a todos os
alunos, considerando suas diferenças, capacidades e ou limitações, e a competência de todos os profissionais das escolas,
a Secretaria Municipal de Educação, dando continuidade as ações do Programa “A
Educação tem muitas faces – Educando
e aprendendo na diversidade”, vem investindo desde 2006, na contratação de
assessorias especializadas e consultorias
para o desenvolvimento desse trabalho:
Assessoria em Gestão Inclusiva, LIBRAS e
Comunicação Suplementar e Alternativa
(CSA); Assessoria em Fisioterapia, Psicologia e Terapia Ocupacional, desempenhando atuação com todos os alunos matriculados nas salas regulares e na orientação
do trabalho do Atendimento Educacional
Especializado da rede municipal de ensino. Foram observados resultados que
beneficiaram: a) os professores, que se
sentem mais seguros, esclarecidos, informados e valorizados, em sua prática e
qualificado para atuar com todos os alunos com condições de trabalho, pensan164
do no processo de ensino e aprendizagem de seus alunos de maneira integral
e inclusiva; b) os alunos são assistidos em
suas necessidades, tendo a possibilidade
e oportunidade de desenvolver todas as
suas habilidades, de participar de todo
processo educativo da escola, sendo visto
como seres com potencial para aprender;
c) os pais estão mais conscientes e informados sobre as ações da rede e se sentindo participantes do processo escolar, valorizados e comprometidos com seu filho
e com todos da escola; d) a equipe escolar
que está mais informada e comprometida
com todos da escola, não somente com
os alunos com necessidades educacionais especiais. Enfim, TODOS aprendem a
conviver e a serem pessoas melhores com
nossas diferenças. Em síntese, a inclusão
escolar e em todos os âmbitos só ocorrerá
se TODOS alinharmos nosso leme em direção ao acolhimento, compromisso com o
próximo, acreditando em sua capacidade,
competência e possibilidades, adotando
posturas e atitudes que não dê brechas
para o surgimento de barreiras, conservadorismo, resistências e ou ações preconceituosas e ou excludentes que levam
ao impedimento da Inclusão. Precisamos
rever nossos papéis como cidadãos e assumir nossa identidade em benefício do
que acreditamos, numa sociedade mais
justa e Inclusiva para TODOS. A Secretaria Municipal de Educação está investindo
em ações que beneficiam não somente as
pessoas do âmbito escolar, mas realizando ações interdisciplinares que envolvem
e sensibilizam toda a comunidade escolar
e a sociedade, ou seja, TODOS nós, sem
exceção.
Palavras-chave: educação inclusiva,
assessorias, saúde.
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
LT04-1352 - CONTRIBUIÇÕES DA PRÁTICA
DOCENTE PARA A INCLUSÃO DO ALUNO
COM NECESSIDADE EDUCACIONAL
ESPECIAL EM TURMA REGULAR
Noélia Martins dos Anjos - Unb
[email protected]
O trabalho pedagógico concretizado por
uma de suas vertentes, o trabalho docente, apresenta natureza dinâmica que deve
reunir teoria e prática como ferramenta
a ser utilizada, dentre outras coisas, no
desenvolvimento de habilidades sociais.
Nesse sentido, e tendo o professor no espaço escolar posição de sujeito mais experiente e, portanto, mediador de novos
conhecimentos, o trabalho docente pode
vir a ser uma das formas mais eficazes de
inclusão de alunos com deficiência no ensino regular. Ao desenvolver meu trabalho
como Pedagoga no Serviço Especializado
de Apoio à Aprendizagem - SEAA em uma
escola pública do Distrito Federal, observo
que os professores regentes que atuam no
ensino regular e que têm em suas classes
alunos com necessidades educacionais especiais – ANEEs, diagnosticadas como deficiência apresentam dificuldade em compreender a inclusão deste aluno no ensino
regular por meio do trabalho docente. A
partir dessa observação e para melhor
compreensão dessa realidade, busquei
resposta à seguinte problemática: como as
concepções de ensino e aprendizagem que
nutrem os educadores, bem como as práticas docentes aplicadas em sala de aula
contribuem, ou não, com a inclusão dos
alunos com necessidades educacionais especiais no ensino regular? Por isso, como
objetivo geral de pesquisa, pretendi entender de que forma o trabalho pedagógico docente pode tornar efetiva a inclusão
de ANEEs no ensino regular, considerando
se o professor na condição de sujeito mais
experimentado e no exercício de um papel historicamente comprometido com
mudanças sociais, tem sustentado em sua
prática ações que consolidam os pressupostos da educação inclusiva, indo além
de garantias como a socialização e interação, promovendo antes, a aprendizagem
escolar. Ao passo que a pesquisa se lançou
pela elucidação dessa primeira proposta,
moveram também essa investigação os seguintes objetivos específicos: conhecer as
concepções de ensino e de aprendizagem
que norteiam as práticas educacionais
dos professores participantes; quais medidas são tomadas pelo docente no que
se refere à continuidade de sua formação
inicial; quais relações estabelecidas entre discurso e prática e finalmente como
são compreendidas pelos professores as
contribuições de seu trabalho no que se
refere ao desenvolvimento da aprendizagem escolar. Como pressupostos teóricos,
a pesquisa pautou-se nos trabalhos de:
Resende (2006), Pimenta (2006) e Dessen
e Polônia (2007) para abordagens acerca
do trabalho pedagógico e saberes da docência. Sobre as concepções de ensino e
aprendizagem compreenderão os estudos
de Freire (1997), Tunes, Tacca e Mitjáns
Martinez (2006), Kassar (2006) e Vygotsky
(2003). Por fim, as considerações referentes ao trabalho docente e educação inclusiva apresentam embasamento nas avaliações de Mantoan (2007), como também
na legislação brasileira referente ao tema.
A metodologia de pesquisa baseou-se nos
pressupostos da abordagem qualitativa,
cuja coleta de dados foi realizada por meio
dos instrumentos de observação, questionário e entrevista semiestruturada aplicados junto aos professores de uma escola
pública dos anos iniciais do Ensino Funda165
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
mental do Distrito Federal. O tratamento
dos dados se deu de acordo os procedimentos próprios do método qualitativo,
utilizando de análise interpretativa dos
resultados com vistas à produção de reflexão e contribuições para a prática docente
no lócus pesquisado. Dentre os resultados
obtidos pela pesquisa a partir dos objetivos elencados, foi possível perceber que a
passagem do ANEE pela escola e o trabalho dos profissionais envolvidos, colaboraram para que, de alguma forma, esse aluno experimentasse crescimento em algum
aspecto de seu desenvolvimento: tanto
na socialização, na convivência com seus
pares ou até mesmo vencendo expectativas negativas que são feitas a seu respeito. Entretanto, verificou-se que dentre as
concepções de ensino e de aprendizagem
que embasam o trabalho docente, ainda
permanecem arraigadas na prática dos
professores pesquisados os pressupostos
de uma educação voltada para os resultados obtidos a partir da aprendizagem de
conteúdos escolares sem fins específicos,
não sendo abertamente defendidas medidas de promoção de aprendizagem escolar que resultem na inclusão do ANEE no
universo dos saberes formais. Outro tópico proposto pela pesquisa foi a condução
do processo de formação continuada e se
esta contemplaria os pressupostos necessários ao trabalho com o ANEE. Observou-se insuficiência na formação ao longo da
carreira e na condição profissional que
vincula as professoras ao exercício do seu
trabalho, tendo em vista dificuldades impostas pelo sistema de ensino na seleção
dos profissionais para oferta de formação
continuada e no processo de escolha de
turmas com ANEE que não tem sido conduzido de forma criteriosa. Também, foi
possível observar imprecisões e divergên166
cias no processo de oferta e procura do
atendimento especializado, visto que a
própria rotina escolar e as incumbências
profissionais de cada função envolvida
podem ter tido influência significativa no
afastamento observado entre as professoras regentes e àquelas encarregadas
pelo apoio a ser oferecido. Finalmente, a
última proposição a que se lançou esse
trabalho foi a apuração de contribuições
do trabalho docente para a aprendizagem
escolar. Conforme já sinalizado pela análise da principal assertiva levantada pela
pesquisa, não se pode deixar de observar
diversos aportes ao processo de desenvolvimento do ANEE, efetuados por meio do
trabalho docente. Porém, muito ainda há
que ser feito para que essas contribuições
contemplem de forma integral a aprendizagem escolar que ainda encontra-se em
situação de desvantagem quando comparadas a outras contribuições, que nem
sempre perpassam o fazer tipicamente
docente e sua função precípua de promoção dos aspectos que favoreçam a relação
de ensino e de aprendizagem. Dessa forma, o que se pode arrematar de todo esse
trabalho é a expectativa de que o investimento na formação inicial e contínua do
professor será o diferencial para que este
pense e repense sua ação, não se conformando com um saber, que ainda válido
ao seu tempo, encontra-se ultrapassado
e insuficiente para as demandas da educação atual. Considera-se ainda que, para
muitos, a aprendizagem escolar pode não
ser o principal objetivo de quem enfrenta
tantas adversidades provindas da condição imposta pela deficiência, entretanto,
é esse o trabalho que deve ser desenvolvido por professores e professoras, até para
que não se sustente mais uma forma de
perpetuação da exclusão.
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
Palavras-chave: trabalho pedagógico,
aprendizagem escolar, inclusão
Contato: Noélia Martins dos Anjos,
Universidade de Brasília,
[email protected]
CO 38 - LT06
Vulnerabilidades/risco
LT06-866 - PROCURANDO A MORTE: O
ZULLIGER NA AVALIAÇÃO DE PACIENTES
COM TENTATIVAS DE SUICÍDIO
Silvana Alba Scortegagna - UPF/RS
[email protected]
Luana Gasparetto Fontanella - FHST, Erechim/RS
[email protected]
O suicídio está entre as 10 principais causas de morte, no mundo, e entre as três
primeiras quando se considera a faixa
etária entre 15 e 35 anos. No Brasil, a
incidência tem aumentado, especialmente, entre adolescentes e adultos jovens.
O Estado do Rio Grande do Sul registra
o maior coeficiente de suicídio no país
- 9,88 casos/100.000 habitantes - com
maiores coeficientes de mortalidade entre a população idosa (com mais de 70
anos de idade); porém, nos últimos anos,
há elevação nas faixas mais jovens, entre 20 e 59 anos. A tentativa de suicídio
pode ser considerada como uma reação
frente à ação do traumático que, pela
força do irrepresentável, leva o indivíduo
ao ato de tentar dar fim à própria vida.
Algumas dessas situações são resultantes de contextos nos quais o sujeito se vê
acometido por um excesso, mostrando-se incapaz de processar e metabolizar a
tensão (trauma/excesso) psiquicamente.
O ato de matar-se expressa, então, além
da impossibilidade de contenção do traumático via representação simbólica, a
única via de descarga possível para uma
demanda de trabalho para o qual o indivíduo não encontra recursos de mediação. Assim sendo, muitos desses atos se
apoiam na insuficiência de recursos mentais, na incapacidade de dar figurabilidade à dor psíquica. Com isso, deflagram-se
os fatores de risco psicossociais, de desenvolvimento, e os quadros psicopatológicos relacionados. Entre os primeiros
destacam-se: nível socioeconômico e de
escolaridade baixos; dinâmica familiar
disfuncional, traumas e perdas pessoais;
baixa autoestima, falta de controle da
impulsividade e da agressividade, humor
lábil, precários recursos para o enfrentamento de problemas, tentativas prévias
e antecedentes na história familiar. Entre
as perturbações mentais mais evidentes
estão os transtornos borderline, a esquizofrenia, a dependência química e os
quadros depressivos. Essas organizações
permitem perceber que os atos suicidas
podem ter motivações totalmente diversas, e que têm relação com rupturas em
diferentes períodos do desenvolvimento afetivo-emocional. Considerando ser
esse um problema de saúde pública e a
escassez de estudos com esses pacientes que, frequentemente, encontram-se
nas emergências dos hospitais e, em sua
maioria, sobrevivem às tentativas de seus
atos lesivos, há necessidade de se verificar a validade de instrumentos eficientes
e rápidos de avaliação psicológica, para
que possam auxiliar na compreensão
da estrutura e da dinâmica psíquica dos
mesmos. Com esse propósito, o presente
estudo buscou investigar as características de personalidade de pacientes com
167
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
várias tentativas de suicídio, os fatores de
risco relacionados e a validade do Zulliger
nesse contexto. Foram participantes duas
mulheres, de 41 e 47 anos de idade, divorciadas, uma auxiliar de serviços gerais
e outra de indústria, com ensino fundamental e médio, respectivamente. Utilizaram-se como critérios de inclusão: (a)
tentativas de suicídio anteriores; (b) hospitalização em decorrência da tentativa
de suicídio, por um período de no mínimo
três dias; (c) não fazer uso de medicações
que pudessem interferir na fidedignidade
dos achados. Como instrumentos utilizaram-se a entrevista clínica semiestrutura
e o teste Zulliger no Sistema Compreensivo ZSC. Os dados foram analisados quanti
e qualitativamente, trazendo elementos
sobre a leitura da realidade, defesas psicológicas, autopercepção, percepção interpessoal e história de vida. A entrevista
semiestruturada revelou que o Caso “A”,
de 41 anos, é divorciada, mas vive, atualmente, com um companheiro; é mãe de
um menino de 15 anos e de uma menina
de 25 anos. A baixa hospitalar deu-se pela
intoxicação por ingestão de 20 comprimidos de carbamazepina e de amitriptilina,
sendo sua terceira tentativa de suicídio
por consumo de medicamentos. As duas
tentativas anteriores foram: uma aos 20
anos de idade, por ingerir veneno, ocasião em que começou a sentir vontade de
se matar e, a outra, quando tentou cortar
os pulsos por sua perícia ter sido negada.
O início desses episódios foi relacionado
com a morte de seus dois irmãos, que foram assassinados com tiro na cabeça. O
Caso “A” pensa em se matar porque acredita que irá para um lugar melhor, mas,
ao mesmo tempo em que quer morrer,
quer melhorar para cuidar de seu neto.
O Caso “B”, de 47 anos, é divorciada e
168
tem três filhos: duas meninas, uma de 14
e outra de 27 anos de idade e um menino, de 18 anos. A baixa hospitalar deu-se
pelo consumo de 18 comprimidos de diazepam, sua quarta tentativa de suicídio,
sendo uma anterior ao tentar atirar-se
do quarto andar de um prédio. O início
desses episódios foi relacionado com o
excesso de trabalho, quando também começou a apresentar sintomas psicóticos.
Dados da família de origem revelaram a
presença de irmãos usuários de drogas,
sendo um deles morto por overdose, e
de morte por suicídio nos dois avôs, tanto
por parte de pai quanto de mãe. O Caso
“B” pensa em se matar porque não tem
outra opção; além de querer morrer quer
matar seus filhos. A análise comparativa
dos protocolos de entrevista permitiu verificar que ambas as pacientes apresentaram cinco tentativas de suicídio cada
uma, sobretudo pela ingestão de medicamentos; possuíam, em seu desenvolvimento, histórico familiar disfuncional
e de perdas traumáticas; foram diagnosticadas com transtorno de personalidade borderline e participam de grupos de
atendimento psicoterápico individual em
ambulatório de saúde mental. A interpretação dos protocolos do ZSC, por sua
vez, possibilitou confirmar a história do
desenvolvimento pessoal por meio dos
dados de personalidade e a identificar
prejuízos na apreensão da realidade, de si
mesmo, do outro e nas interações sociais,
por meio de atribuições de aspectos subjetivos, distorcidos e falhos. Os dois casos
apresentaram dificuldades de controle
emocional, impulsividade, instabilidade
nos relacionamentos e isolamento. Esses
resultados podem ser úteis para ampliar
a compreensão de pacientes com tentativas de suicídio, para predizer as possi-
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
bilidades de novas ocorrências e, ainda,
para direcionar programas de tratamentos mais eficientes e adequados. Além
disso, conclui-se que o ZSC pode ser útil
em contextos de avaliação clinica e hospitalar, respeitando-se as limitações de seu
emprego.
Palavras-chave: teste Zulliger, tentativa de
suicídio, fatores de risco
Contato: Silvana Alba Scortegagna, UPF/RS,
[email protected]
LT06-873 - ADOLESCÊNCIA,
VULNERABILIDADE E RESILIÊNCIA:
AVALIAÇÃO DE FATORES DE PROTEÇÃO
EM UMA AMOSTRA DE ADOLESCENTES
NO INTERIOR DO RIO GRANDE DO SUL
Jeane Lessinger Borges - SETREM
www.setrem.com.br ou
[email protected]
Sara Eduarda Pires - SETREM
www.setrem.com.br ou
[email protected]
Este trabalho apresenta os resultados de
uma pesquisa sobre a presença de fatores
de proteção, associados a variáveis individuais e do contexto familiar e escolar, em
uma amostra de adolescentes em situação de vulnerabilidade psicossocial. Este
estudo foi realizado ao longo do primeiro
semestre de 2011, durante a etapa inicial
da prática de estágio curricular da segunda autora, sob orientação da primeira autora, junto a adolescentes que frequentavam uma escola pública de tempo
integral, localizada num município da Região Noroeste, no interior do Rio Grande
do Sul. Os aspectos teóricos norteadores
deste estudo são a Teoria Bioecológica
do Desenvolvimento Humano (Bronfen-
brenner, 1996), a Psicologia Positiva e o
conceito de Resiliência (Paludo & Koller,
2006, 2007; Yunes, 2006). Nesse sentido, os pressupostos teóricos subjacentes
possibilitam uma melhor compreensão
do desenvolvimento humano, sobretudo,
no que se refere a crianças e adolescentes expostos a situações de vulnerabilidade psicossocial, uma vez que possibilitam
investigar os efeitos dos fatores de risco e
de proteção no desenvolvimento infanto-juvenil. A Teoria Bioecológica do Desenvolvimento Humano enfatiza a necessidade de uma melhor compreensão das
características do contexto, da pessoa,
dos processos envolvidos e do tempo no
desenvolvimento humano. A Psicologia
Positiva é uma nova sub-área, dentro da
Psicologia, que busca investigar os aspectos positivos do desenvolvimento do ser
humano, fortalecendo as potencialidades
e a saúde do sujeito em desenvolvimento (Assis, Pesce, & Avanci, 2006; Yunes,
2006). Um constructo teórico importante
da Psicologia Positiva se refere ao de resiliência, que pode ser compreendido como
a capacidade do indivíduo de superar as
situações de adversidades. Atualmente¸
a resiliência vem sendo considerada não
como um evento isolado e de caráter individualizado, mas, sim, como um processo
dinâmico e abrangente incluindo, além da
pessoa, o contexto familiar (Yunes, 2003).
Nesse sentido, uma maior compreensão
da presença de fatores de proteção no
contexto familiar e escolar, bem como de
características individuais - por exemplo,
autoestima e satisfação de vida - na mediação do impacto dos fatores de risco
presentes no desenvolvimento de adolescentes, se tornou o foco de atenção desta
pesquisa. A interação entre risco e proteção necessita ser melhor investigada, a
169
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
fim de se compreender como estes interferem na resiliência de adolescentes. Para
tanto, foram entrevistados 40 adolescentes (52,5% meninos e 47,5% meninas),
com idades entre 11 a 17 anos (M=12,97;
DP=1,10), residentes na área urbana e
periférica de um município gaúcho caracterizado, eminentemente, pela agricultura familiar. Os adolescentes foram
convidados a participarem da pesquisa,
tendo sido autorizados por seus pais, que
assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Foi aplicado um Questionário com 16 questões estruturadas,
sobre variáveis individuais e do contexto
familiar e escolar, que pudessem estar
associadas à resiliência. Este questionário
foi elaborado a partir dos dados de Assis
et al. (2006) e aplicado de forma coletiva.
Os dados foram tabulados e analisados no
programa SPSS versão 13.0. Foram realizadas análises estatísticas descritivas e de
frequência simples, bem como cálculo de
correlação de Spearman. Os resultados
apontaram que a trajetória de vida destes adolescentes foi caracterizada pela
exposição a eventos estressores (56,1%),
incluindo separação dos pais, morte de
um ente querido, uso de drogas por um
familiar e violência doméstica. Os participantes relataram vivenciar algum sofrimento psíquico frente a estas diferentes
situações adversas (41,5%). No entanto,
estes adolescentes se percebiam como
tendo uma autoestima alta (58,5%) e uma
elevada satisfação de vida (82,9%), além
de terem planos para o futuro (82,9%).
Foi encontrada uma correlação positiva
entre alta autoestima e monitoramento
parental (r=.50; p<0,01), bem como entre
satisfação de vida e relacionamento com
os pais (r=.64; p<0,01). A família destes
adolescentes caracterizava-se, em sua
170
maioria, pelo modelo nuclear (65%), embora 17,5% vivessem numa família monoparental, chefiada pela figura da mãe. O
relacionamento com os pais foi avaliado
de forma positiva (70,7%), sendo que monitoramento (63,4%), afeto (56,1%) e estabelecimento de regras (61%) foram avaliados pelos adolescentes como aspectos
importantes na relação pais-filhos. Os
relacionamentos com amigos e professores também foi avaliado de forma positiva (78,0% e 56,1%, respectivamente). Em
relação às estratégias de enfrentamento
utilizadas pelos adolescentes frente às
situações adversas, os itens “continuar
tentando resolver o problema” (75,6%),
“acreditar em si mesmo frente às dificuldades que a vida lhe apresenta” (48,8%)
e “pedir ajuda a alguém” (46,3%) foram
os mais citados pelos adolescentes entrevistados. Nesse sentido, os resultados
apontam que, apesar da presença de fatores de risco ao desenvolvimento destes
adolescentes, sobretudo pela exposição
a eventos estressores, os participantes
apresentaram boa autoestima e elevada
satisfação de vida. Observou-se, ainda,
um predomínio de estratégias de enfrentamento adaptativas por parte dos adolescentes frente a situações adversas. A
presença de fatores de proteção na família e no contexto comunitário (grupo de
pares e escola) pode ser considerada uma
variável importante para o processo de
resiliência. Conclui-se que uma maior investigação da interação de características
individuais e do contexto de desenvolvimento do adolescente podem dar subsídios para os estudos sobre resiliência em
jovens, na tentativa de potencializar os
aspectos saudáveis destes indivíduos e de
sua capacidade de superação das dificuldades e adversidades da vida.
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
Palavras-chave: infância, vulnerabilidade,
resiliência
Contato: Jeane Lessinger Borges, Faculdade
Três de Maio/SETREM,
[email protected]
LT06-898 - REDE DE APOIO, EVENTOS
ESTRESSORES E AJUSTAMENTO NA
VIDA DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES
EM SITUAÇÃO DE VULNERABILIDADE
SOCIAL
Normanda Araujo de Morais - UFRGS
[email protected]
Marcela Raffaelli - UIUC
mraff[email protected]
Silvia Helena Koller - UFRGS
[email protected]
Este trabalho tem como objetivo: (a)
descrever e comparar dois grupos de
adolescentes em situação de vulnerabilidade social - um grupo em situação de
rua e um grupo que vive com sua família
- quanto ao número e impacto dos eventos estressores, à sua rede de apoio social
e afetiva, e ao indicador geral de ajustamento; e (b) verificar se as características
da rede de apoio (tamanho e qualidade)
moderaram o efeito do número e impacto dos eventos estressores sobre o índice geral de ajustamento. Trata-se de um
estudo transversal, que foi realizado com
98 crianças/adolescentes, em dois grupos: aqueles que vivem em situação de
rua (n=32; 32,7%) e os que moram com
suas famílias e frequentam uma instituição para jovens em situação de vulnerabilidade social (n=66; 67,3%). No grupo
de base-rua (G1), a maioria (n=27; 84,4%)
era do sexo masculino, com idade média
de 14,69 anos (SD = 1,85). Já no grupo
com base-familiar (G2), 38 (57,6%) eram
do sexo feminino e tinham, em média,
15,53 anos (SD = 1,12). Foram utilizados
os seguintes instrumentos: (a) Inventário de Eventos Estressores (para avaliar
os fatores de risco), (b) Mapa dos Cinco
Campos (para avaliar a rede de apoio –
número de contatos e fator de proximidade) e (c) um bloco de instrumentos que
compôs o Índice Geral de Ajustamento
(Checklist de Sintomas Físicos, Escala sobre o Uso de Drogas, Escore de Risco para
Comportamento Suicida, Índice Geral de
Comportamento Sexual de Risco e a Escala de Afeto Positivo e Negativo). Houve
diferença estatisticamente significativa
entre os grupos, sendo que o de base-rua
(G1) apresentou maior média de eventos
estressores e valores de impacto e pior indicador geral de mau ajustamento, comparado ao grupo de base-familiar (G2). A
comparação das médias entre os grupos
também mostrou diferença estatisticamente significativa na variável “rede de
apoio”. G1 apresentou maior número de
contatos no campo “instituição”; maior
fator de proximidade total e no campo
“amigos/vizinhos e parentes”, quando
comparado a G2. Uma ANOVA fatorial do
tipo 2 (alto vs. baixo nível de proximidade familiar) x 2 (alto vs. baixo número de
eventos estressores), em que o nível de
ajustamento representou a variável dependente, revelou efeitos principais significativos tanto para a proximidade familiar quanto para os eventos estressores.
Foi encontrado um efeito de interação
significativo entre estas duas variáveis.
A descrição gráfica dessa interação mostrou que houve moderação da proximidade familiar, no nível de ajustamento de
indivíduos que vivenciavam alto nível de
eventos estressores. Ou seja, na presença
de um alto nível de proximidade familiar,
171
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
o impacto de eventos estressores sobre o
ajustamento foi menor do que quando o
nível de proximidade familiar era baixo.
Os resultados do presente estudo corroboram, empiricamente, a importância da
“proximidade” familiar como um fator de
proteção na vida de adolescentes que vivem em situação de vulnerabilidade social. Mais especificamente, sobre a vida
daqueles/as que estão submetidos a um
maior número de eventos estressores.
Nenhum estudo que testava a associação
entre rede de apoio e ajustamento, a partir do Mapa dos Cinco Campos, foi identificado até então. Quase sempre, as pesquisas que utilizam esse instrumento o
fazem para descrever as características da
rede de apoio dos participantes. A utilização deste instrumento com adolescentes
em situação de vulnerabilidade social (na
rua ou na família) mostrou-se apropriado, pela riqueza de dados produzidos e
pelo aspecto lúdico e terapêutico que sua
aplicação possibilita. Durante a aplicação
do Mapa, foi frequente a expressão de
sentimentos e relatos de vida que, talvez,
demorassem mais tempo para serem expressos, caso apenas a entrevista tivesse
sido utilizada. À luz desses resultados,
confirma-se a necessidade de programas e políticas sociais que tenham a família como foco de atenção e interesse.
A retomada da família como referência
das políticas públicas é justificada como
a estratégia mais adequada (ao lado das
intervenções sociais tradicionais – saúde,
educação, habitação, renda, etc.) para o
desenvolvimento de programas sociais
efetivos de enfrentamento das diversas
situações que implicam em vulnerabilidade social (tais como, pobreza, violência,
situação de rua etc.). Além disso, o foco
na família está relacionado com a visão
172
de que programas e políticas públicas
com foco no indivíduo tendem ao fracasso, assim como intervenções pontuais,
compensatórias e assistencialistas. Tão
importante quanto o suprimento de condições materiais e econômicas às famílias
é a existência de programas sociais que
visem um acompanhamento mais sistemático destas. Embora a miserabilidade
econômica seja considerada um dos fatores que mais contribuem para a fragilidade dos vínculos familiares, isso não significa dizer que o problema será resolvido,
quando as famílias receberem apenas o
apoio financeiro necessário. Ao contrário,
as propostas assistencialistas vigentes,
até então, apenas reforçam a percepção
dessas famílias como incapazes e desqualificadas para o cuidado de seus filhos.
Urge uma nova concepção de família, a
qual esteja baseada não apenas nas suas
vulnerabilidades e fragilidades, mas, que
as reconheça, também, em suas próprias
potencialidades e recursos, e que atue
fortalecendo-as.
Palavras-chave: rede de apoio, família,
vulnerabilidade social
Contato: Normanda Araujo de Morais, UFRGS,
[email protected]
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
LT06-1015 - DESENVOLVIMENTO EM
RISCO: RELATO DE INTERVENÇÃO
PSICOLÓGICA JUNTO A CRANÇAS E
ADOLESCENTES EM SITUAÇÃO DE
RISCO. UMA EXPERIÊNCIA DE EXTENSÃO
UNIVERSITÁRIA
Emily Souza Gaião - UEPB
[email protected]
Luciano Edgley dos Santos - UEPB
[email protected]
Lívia Sales Cirilo - UEPB
[email protected]
Ana Karine Gonçalves dos Santos - UEPB
[email protected]
Aline Ribeiro - UEPB
[email protected]
Ana Karoliny da Silva Carolino - UEPB
[email protected]
Clarissa Loureiro das Chagas Campêlo - UEPB
[email protected]
Gabriella Cézar dos Santos - UEPB
[email protected]
Johanna Sales Pereira - UEPB
[email protected]
No Brasil, assim como em outros países,
a pobreza ainda é um traço marcante na
sociedade, como resultado da má distribuição de renda. As dificuldades advindas
desse fato podem comprometer o desenvolvimento de crianças e jovens brasileiros menos favorecidos economicamente,
por dificultar o acesso a diversos tipos de
informações levando-os, em muitos casos,
a começar a trabalhar precocemente, reduzindo suas potencialidades e os expondo a situações delicadas de violência física e psicológica, desestruturação familiar,
uso de drogas (lícitas ou ilícitas), abuso e
exploração sexual, comportamento sexual promíscuo, relações sexuais desprotegidas, ausência de referência apropriada,
entre outros. Cada vez mais, as políticas
de atenção à criança e ao adolescente
em situação de risco se deparam com
mais desafios na busca de melhorar as
precárias condições de vida em que estas
se encontram vivendo, muitas vezes, em
um cotidiano de situações extremas de
exclusão social, no qual os direitos assegurados no Estatuto da Criança e do Adolescente não são respeitados (ECA, 1990).
São consideradas em situação de risco as
crianças e adolescentes que apresentam
um atraso no desenvolvimento esperado
para a sua faixa etária, de acordo com a
cultura em que se encontram (Bandeira et
al., 1996). Hutz e Koller (1996) classificam
tais situações em três categorias: risco
físico (doenças genéticas ou adquiridas,
prematuridade, problemas de nutrição,
entre outros); risco social (exposição a
ambiente violento, a drogas) ou risco psicológico (efeitos de abuso, negligência ou
exploração), podendo, ainda, terem como
causa fatores externos (relacionados com
condições ambientais adversas) ou internos (relacionados a comportamentos que
acentuem a possibilidade de conseqüências adversas para o desenvolvimento do
indivíduo). Esta situação de risco acaba se
traduzindo por dificuldades na freqüência
e no aproveitamento escolar; nas condições de saúde, de forma geral; e nas
relações afetivas, consigo mesmo, com
sua família e com o mundo, tendo como
conseqüências a exposição a um circuito
de sociabilidade marcado pela violência,
pelo uso de drogas e pelos conflitos com
a lei. Muitas vezes, estas experiências de
vida facilitam dinâmicas expulsivas da família nuclear e da casa, e o ingresso no
circuito da rua e das instituições de abrigamento. Nos casos em que as situações
de risco são detectadas por órgãos públicos como a Vara da Infância e Juventude
173
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
ou Conselho Tutelar, geralmente, as crianças são transferidas para abrigos; em outros casos, faz-se um acordo com a família
para que a criança possa estar assegurada. Um dos aspectos mais observados em
crianças que adentram nos abrigos é a situação de abandono que, algumas vezes,
são encontradas em situação desumana.
Entretanto, de acordo com Hutz e Koller
(1996), os estudos relacionados ao desenvolvimento de crianças e jovens tendem
a focar no desenvolvimento de crianças
brancas da classe média de nossa sociedade, fato que se torna mais grave devido
ao fato de que, apesar do grande número
de problemas sociais que o país enfrenta,
os estudos em Psicologia sobre indivíduos
expostos aos riscos provocados por estes
problemas têm merecido pouca atenção
(Hutz & Koller, 1996). O déficit de estudos nessa temática deixa à deriva essa
população, tão necessitada de atenção
e de cuidados. Uma das ferramentas que
as universidades possuem para intervir
sobre os problemas sociais é a extensão
universitária, que visa contribuir para a
viabilização e fortalecimento da relação
universidade-sociedade. Objetivando auxiliar na redução das conseqüências das
situações de risco ao desenvolvimento
de crianças e adolescentes usuários da
Organização Não Governamental (ONG)
“Menina Feliz”, residentes em bairros de
periferia da cidade de Campina Grande-Paraíba, foram realizadas oficinas temáticas e terapêuticas por graduandos do curso de Psicologia, como atividade do componente curricular “Extensão II”, presente
na grade curricular do curso de Psicologia
da Universidade Estadual da Paraíba. O
público atendido por essa atividade era
de meninas com idades entre 6 e 16 anos,
de duas unidades da ONG “Menina Feliz”.
174
Os encontros foram realizados quinzenalmente, durante o período de um ano. De
modo intercalado às intervenções, os encontros com as meninas eram avaliados e
os resultados eram discutidos pelo grupo
de extensão, possibilitando a elaboração
de novas atividades para o encontro seguinte. Nas oficinas foram trabalhadas
temáticas como sexualidade, violência na
sociedade, relações familiares, violência
doméstica e outros, em dinâmicas de grupo, rodas de conversa, grupos de escuta,
a partir das sugestões advindas das participantes. Os relatos que refletiam uma dinâmica familiar conturbada, ausência de
orientação, atos de violência e comportamento sexual não adequado estiveram
presentes durante as atividades realizadas. Os encontros se mostraram importantes para o desenvolvimento das meninas, primeiramente, por terem propiciado
momentos de convívio de maior proximidade entre elas, uma vez que a convivência com pessoas da mesma idade, principalmente, quando em relação de amizade, oferece grandes experiências e contribuições para o desenvolvimento. Moreno
(2004) assinala estas contribuições como
claramente distintas das proporcionadas
pelas relações de parentesco. Ainda de
acordo com o autor, o contato com iguais
permite ao indivíduo situações de aprendizagem ao refletir sobre si mesmo, tecer
considerações do eu a partir da perspectiva do outro, compartilhar experiências
e desenvolver suas competências sociais.
Apesar da resistência em falar sobre os
temas propostos, algumas participantes abordaram as situações de violência
vividas, demonstraram curiosidade em
questões de ordem sexual, enfatizando a
necessidade de realização constante de
oficinas de expressão e grupos de escuta,
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
para que tivessem um espaço para elaborar seus sentimentos diante das situações
vivenciadas. Faz-se necessário que essas
crianças em situação de risco continuem
sendo acompanhadas através de outros
projetos de extensão; que as políticas governamentais se tornem mais eficazes em
relação às possibilidades de acompanhamento, através dos órgãos competentes
e que os profissionais possuam um olhar
mais atento, com o objetivo de minimizar
as conseqüências que podem ser geradas
pelas situações difíceis, enfrentadas por
essas crianças.
Palavras-chave: desenvolvimento, situação de
risco, extensão universitária
Contato: Emily Souza Gaião, UEPB,
[email protected]
LT06-1018 - DESENVOLVIMENTO
HUMANO E COMUNITÁRIO MEDIADO
PELO SERVIÇO DE PROTEÇÃO SOCIAL
BÁSICA: REFLEXÕES TEÓRICAS
SOBRE PERSPECTIVAS E ATUAÇÃO DA
PSICOLOGIA.
Alexsandra Maria Sousa Silva - UFC
[email protected]
Nara Maria Forte Diogo Rocha - UFC
[email protected]
A presente pesquisa nasce da interface da
Psicologia do Desenvolvimento e da Psicologia Comunitária. Pergunta-se sobre o
lugar da Psicologia no serviço de Proteção
Social Básica, examinando teoricamente
e analisando a noção de desenvolvimento humano e comunitário, propostas pela
Política Nacional da Assistência Social, à
luz da Teoria Sócio-histórica e da Psicologia Comunitária. Experiências de extensão
e estágio em Psicologia instigam a pro-
blematização sobre as possibilidades da
práxis “psi” no serviço de proteção social
básica, lócus imprescindível para a promoção do desenvolvimento humano e
comunitário. A noção de desenvolvimento
humano e comunitário, dentro da política
de Assistência Social, nos parece um problema que exige atenção e requer aprofundamento teórico, tanto na perspectiva
das leis que regem a política de assistência
social, quanto na perspectiva das possibilidades de atuação da Psicologia que se faz
no cotidiano em movimento. Diante disso
buscamos sistematizar, neste documento,
os conceitos de desenvolvimento humano
e comunitário; problematizar esses conceitos, dentro da política pública de assistência social; e refletir acerca de sua compreensão e importância na práxis do psicólogo
no contexto social e político atual. Como
referência teórica, partimos de Vygostky,
entendendo que estudar o desenvolvimento é estudar o movimento - por isso
a perspectiva histórica – e estudar as relações – por isso a perspectiva social, enxergando o sujeito como interativo, por conta de uma aprendizagem que se dá pelas
suas relações intra e interpessoais de troca
com o meio social. Para Leontiev (1978), a
consciência humana diferencia a realidade
de seu reflexo, o que permite diferenciar
o mundo das impressões, possibilitando o
desenvolvimento da capacidade de auto-observação. Afirmamos, com isto, que ter
consciência de alguma coisa é distinguir
o reflexo entre esta coisa e como este reflexo se dá em meio à realidade, atentando para como se dá o desenvolvimento
humano, a partir dessa (auto)percepção.
Por desenvolvimento comunitário consideramos que, hoje, se fale nessa compreensão atrelada à formação de lideranças
locais e à participação comunitária onde,
175
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
através de vínculos afetivos, cooperação e
solidariedade, os moradores-sujeitos tornam-se responsáveis pela construção de
sua história coletiva. A isso se relaciona o
conceito de sujeito da comunidade (Góis,
2008), como sendo aquele que, saindo do
véu da submissão e implicado com a realidade que lhe afeta, compreende melhor
o modo de vida de sua comunidade e de
si mesmo, enxergando seu valor e poder,
para descobrir-se e desenvolver-se. É válido, ainda, esclarecer a diferença entre
desenvolvimento comunitário e desenvolvimento da comunidade, uma vez que
este último refere-se a ações mais intensas
de agentes externos e não propriamente
ações nascidas do potencial comunitário,
de comum acordo com o agente externo.
E perpassando uma dimensão histórica de
como a Psicologia foi adentrando o campo
da assistência, afirma-se que o trabalho do
psicólogo é priorizar as potencialidades e,
assim, é percebida a sua importância para
a superação do viés assistencialista, bem
como para re-inventar uma práxis capaz
de promover o protagonismo e a autonomia, tanto individual quanto coletiva,
da família e da comunidade. O CREPOP
(2007) compreende que “a capacidade
de enfrentamento das situações da vida é
afetada pelas experiências, condições de
vida e significados construídos ao longo
do processo de desenvolvimento” (p. 17).
Esta percepção é consoante com o ideal do
psicólogo, de ser um dos responsáveis pela
facilitação do processo de transformação
social. Dessa forma, se pode enxergar a
importância a ser dada a compreensão
que esses profissionais têm, diante de sua
atuação, sobre o que é desenvolvimento
humano e comunitário. Utilizamo-nos da
pesquisa qualitativa e, como guia, da pesquisa bibliográfica. Na Política Nacional de
176
Assistência Social, a Proteção Social Básica se assume com o objetivo de atuar no
sentido de “prevenir situações de risco por
meio do desenvolvimento de potencialidades e aquisições, e o fortalecimento de
vínculos familiares e comunitários” (PNAS,
p. 27). Dando-se conta de que a Política de
Assistência Social, em nível de Proteção
Social Básica, se constrói no sentido da
prevenção, pode-se perceber que o exercício da atividade comunitária tende a levar
o sujeito a um caminho para além, que é
o da promoção do desenvolvimento e da
autonomia e, portanto, a cidadania. Sendo
assim, a concepção de desenvolvimento
humano e comunitário, dentro da PNAS,
busca afastar-se da concepção assistencialista através da promoção da autonomia,
definindo-se como o desenvolvimento de
potencialidades e fortalecimento dos vínculos familiares, e compreendendo o sujeito numa dimensão histórico-cultural, considerando a participação social, a cidadania
e o desenvolvimento que se dá ao longo de
toda a vida. Além do que, compreender o
ser humano fundando, epistemológica e
metodologicamente, no materialismo histórico e dialético, como concebe a teoria
sócio-histórica, dá possibilidades ao psicólogo de apreender os fenômenos humanos
e sociais na sua mais concreta forma de
existir e se manifestar, favorecendo uma
compreensão contextualizada com a realidade que nos encharca, transitando entre
as dimensões que são pessoais, familiares,
comunitárias (e, portanto, sociais). Assim,
a práxis do Psicólogo perpassa a facilitação humana e comunitária, que pode se
dar pela compreensão de ir aonde o povo
está, nas ruas e nas comunidades. Além
disso, atentamos para a atuação conjunta
das tantas políticas públicas. Concluímos
com o compromisso da Psicologia de de-
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
nunciar e anunciar novas possibilidades de
se sentir, perceber e transformar a realidade, pela via do desenvolvimento humano
e comunitário.
Palavras-chave: desenvolvimento humano,
desenvolvimento comunitário, proteção social
básica
Contato: Alexsandra Maria Sousa Silva,
Universidade Federal do Ceará/campus Sobral,
[email protected]
LT06-1248 - TENTATIVA DE SUICÍDIO E AS
CARACTERÍSTICAS DE PERSONALIDADE
POR MEIO DO HTP
Luana Gasparetto Fontanella - FHST,
Erechim/RS
[email protected]
Silvana Alba Scortegagna - UPF/RS
[email protected]
O suicídio está entre as 10 principais causas
de morte no mundo. No Brasil, a incidência
tem aumentado e o Estado do Rio Grande
do Sul registra o maior coeficiente de morte por suicídio do país. Entre os principais
fatores de risco relacionados destacam-se:
os níveis socioeconômicos e de educação
baixos; os problemas com o funcionamento da família (dinâmica familiar conturbada); as relações sociais e os sistemas de
apoio precários; as perdas traumáticas; as
perturbações mentais como depressão,
perturbações da personalidade, esquizofrenia e abuso de álcool e outras substâncias; a baixa autoestima; a falta de controle da impulsividade e os comportamentos
autodestrutivos; a labilidade do humor; e
a inabilidade para gerenciar e enfrentar
os problemas. Outros fatores associados
ao suicídio dizem respeito às tentativas
prévias, à doença afetiva, ao isolamento
social, à história familiar e à declaração de
intenções. Com o objetivo de investigar características de personalidade de pacientes que cometeram tentativa de suicídio,
foram avaliadas 4 mulheres, com idades
entre 29 e 47 anos, usuárias do SUS, que
se encontravam internadas em um hospital geral por tentativas de suicídio. As participantes – denominadas, simbolicamente, de Rosa, Orquídea, Bromélia e Hortência - eram casadas, tinham filhos, possuíam diferentes níveis de escolaridade, não
exerciam atividades profissionais, estavam
sob auxílio doença e tinham histórico de
transtorno mental na família. Como critérios de inclusão, consideraram-se: (a)
tentativas de suicídio anteriores; (b) hospitalização em decorrência da tentativa de
suicídio, em um período de no mínimo 3
dias, para haver estabilização do quadro
clínico; (c) não fazer uso de medicações
que pudessem interferir na fidedignidade
dos relatos da entrevista e do teste psicológico. Como instrumentos, foram utilizados a entrevista clínica semiestrutura com
as pacientes e os familiares, e o teste HTP.
Os resultados da entrevista revelaram que
Rosa teve baixa hospitalar devido à tentativa de enforcamento (amarrou uma corda
no suporte da televisão e uma na maçaneta da porta, subiu num banquinho e se
atirou); fez uso de drogas e medicamentos
(clorpromazina, tegretol e haldol) antes da
tentativa; após ser atendida no hospital, a
mesma quis ir embora e seu marido assinou o termo de responsabilidade. O marido fotografou o episódio, após terem-na
encontrado, para que ela pudesse ver e,
quem sabe, se sensibilizar e mudar. Já teve
internação em clínicas para dependentes
químicos, onde, também, teve tentativa
de suicídio devido à abstinência. As demais tentativas foram devido a não aguen177
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
tar mais viver e a querer terminar com o
sofrimento de sua família. É usuária de
cocaína injetável e de medicações anestésicas injetáveis (morfina e dolantina). Encontra-se em tratamento no CAPS AD e já
apresenta sintomas psicóticos (paranóia,
alucinações). Orquídea foi hospitalizada
em decorrência da ingestão de 18 comprimidos de diazepan e para ser encaminhada para uma clínica psiquiátrica, pois,
tem diagnóstico de transtorno borderline.
Encontra-se em tratamento psiquiátrico
e psicológico há, aproximadamente, dois
anos. Relata que segue o tratamento correto até certo ponto: “é que nem criança
quando ganha chocolate e dizem pra ela
comer um pedacinho por dia e ela segue
isso, mas, de repente, come tudo de uma
vez só... eu faço a mesma coisa, eu tomo
certinho um comprimido por dia, mas tem
dias que dá vontade e eu tomo um monte pra testar até aonde eu aguento”. Frequentemente, faz ameaças, dizendo que
vai matar seus filhos. Bromélia foi internada devido à intoxicação de medicamentos
(20 comprimidos de carbamazapina e de
amitriptilina); é sua terceira tentativa de
suicídio utilizando medicamentos, sendo
que teve outra tentativa, quando estava
com 20 anos, ingerindo veneno. Bromélia relata que desde essa idade pensa em
se matar, acreditando que “lá em outro
lugar vai ser melhor”. Nessa época esse
sentimento foi agravado com a morte de
um de seus irmãos, assassinado com um
tiro na cabeça e, há mais ou menos 8 anos,
outro irmão foi assassinado da mesma forma. Hortência teve baixa hospitalar porque queria tentar se matar de qualquer
jeito; tentou enforcar-se, atirar-se da janela e cortar-se com facas. A família não
sabe dizer quantas tentativas Hortência
já teve, sua filha diz que ela esta sempre
178
tentando, sendo que começou há mais ou
menos 6 anos, quando ela se mudou para
o interior onde não há vizinhos e ela fica
sozinha o dia todo. Hortência relata que
fizeram “mal feito” na casa onde ela mora,
pra separar ela e seu marido, porque ela
diz que fica “possuída” e faz essas coisas.
Seu marido trabalha de motorista; já moraram em várias cidades, porque ele troca
de emprego seguidas vezes. O resultado
do teste HTP apresentou características
comuns, considerando-se a localização
dos desenhos (esquerda), a linha de solo,
os detalhes na casa como na porta (aberta). Na figura da pessoa, detalhes como a
presença de dedos indicaram atuação e
detalhes no pescoço, impulsividade. Essas
características são consonantes com aspectos relacionados às características de
personalidade de indivíduos que cometem
tentativas de suicídio, especialmente, no
que diz respeito à incapacidade de tolerar
frustrações, impulsividade, intolerância e
atuação. Na realização do HTP, as narrativas das participantes sobre os desenhos
revelaram idéias de morte, sentimentos
de frustração, carência afetiva e evidenciaram a utilização de mecanismos de defesa
como identificação projetiva, o que é, comumente, empregado por pacientes com
Transtorno Borderline. Apesar da amostra
reduzida do estudo, esses resultados auxiliam na melhor compreensão das características de personalidade de indivíduos
que apresentam risco de suicídio e na capacitação de profissionais que atuam nesse contexto.
Palavras-chave: tentativa de suicídio, teste
HTP, características de personalidade
Contato: Luana Gasparetto Fontanella,
Fundação Hospitalar Santa Terezinha,
Erechim/RS, [email protected]
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
LT01-976 – TRABALHO INFANTIL:
CAUSAS E CONSEQUÊNCIAS PARA O
DESENVOLVIMENTO IDENTIFICADAS
NAS PRODUÇÕES EM PERIÓDICOS DE
PSICOLOGIA.
Antonielli Jatobá Bezerra Tinoco - UFRN
[email protected]
Mariana Pinheiro Cabral - UFRN
[email protected]
Rosângela Francischini - UFRN
[email protected]
A inserção de crianças em atividades laborativas é registrada, na história do Brasil,
desde o período colonial. À época, crianças escravas trabalhavam para prover a
própria subsistência, situação corroborada
tanto pela diferença de classes, como pelo
status secundário que a infância tinha na
sociedade de então. Essa concepção sobre
a infância só veio a ser modificada, não de
forma abrupta e generalizada, a partir do
século XVIII, período esse em que a criança passou a ser vista como sinônimo de
fragilidade e inocência. Embora seja um
fenômeno presente ao longo da história,
o trabalho infantil foi sendo caracterizado de formas diferenciadas. Assim, temos
uma diversidade de conceitos cujos critérios são igualmente diferenciados. Os critérios mais recorrentes são: faixa etária,
remuneração, regularidade, frequência,
tipo e local da atividade. Considerando a
idade mínima recomendada para o trabalho, a Convenção 138, da Organização
Internacional do Trabalho (OIT, 1973) fixa
em 16 anos. Por outro lado, para atividades que coloquem em risco a saúde,
a segurança e a moralidade do sujeito,
essa idade passa para 18 anos. Ainda em
relação a esse critério, a Constituição de
1988 mantém a recomendação da OIT. A
promulgação do Estatuto da Criança e do
Adolescente (ECA. Brasil, 1990) consolida
essa idade mínima proibindo qualquer
trabalho a pessoas menores de 16 anos,
salvo na condição de aprendiz, a partir dos
14 anos. Outro critério relevante na conceitualização do trabalho infantil é a frequência e regularidade dessas atividades.
Muitas vezes, as crianças são impedidas
de exercitarem outros direitos: frequência
à escola, convivência familiar e comunitária, prática do lazer e do esporte, cultura.
No que se refere ao local e ao tipo de atividade, a Convenção 182 e a Recomendação
190 da OIT preconiza que as “piores formas” de trabalho infantil são aquelas que
resultam em prejuízo à saúde, à segurança
e à moral da criança. Diante das questões
apontadas acima, estabelecemos, como
objetivo deste trabalho, identificar, nas
produções em Psicologia, enquanto eixos
temáticos: 1.) os conceitos de trabalho
infantil e suas causas; b) as consequências para o sujeito. Foi realizada, então,
uma revisão bibliográfica na Base de Dados Scielo, no período de janeiro de 1991
a dezembro de 2010. Acrescentamos a
essa fonte, a leitura dos principais livros/
documentários impressos recorrentemente presentes na bibliografia da área. Na
pesquisa eletrônica, foram empregadas as
seguintes Palavras-chave: crianças de rua,
crianças e adolescentes em situação de
rua, crianças em situação de rua, crianças
em situação de trabalho nas ruas, trabalho de menores, trabalho infantil, trabalho
infantil agrícola, trabalho infantil de rua,
trabalho infantil produtivo, trabalho infanto-juvenil, trabalho precoce. Procedeu-se
à leitura dos resumos e foram excluídos
os artigos que não atendessem aos objetivos deste trabalho. Desse processo, resultaram 44 artigos. Procedeu-se, então,
à leitura desses artigos, observando os
179
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
eixos temáticos aqui definidos. A leitura
de livros/documentários centrou-se nas
produções da OIT e foram fundamentais
para a compreensão dos conceitos de trabalho infantil adotados pelos autores dos
artigos. A partir da leitura e identificação
dos eixos propostos, com apoio na Análise de Conteúdo Temática, sistematizamos
os elementos e compomos um quadro,
caracterizado a seguir: 1.) Tipos de atividades desenvolvidas e faixa etária considerada. Iniciando por essa última unidade
de sentido, a faixa etária citada e/ou considerada pelos autores é aquela proposta
pela legislação, principalmente o ECA e as
Resoluções da OIT. O Estatuto, em conformidade com as propostas internacionais,
e com atenção às especificidades locais,
estabelece, em 1990, a proibição do trabalho infantil para menores de 14 anos,
sendo essa condição sido alterada, pela
Emenda Constitucional de número 20, Artigo 7º, inciso XXXIII (Brasil, 1998), fixando
a proibição do trabalho a menores de 16
anos de idade, ressalvando a condição de
aprendiz, a partir dos 14 anos. No que diz
respeito aos tipos de atividades desenvolvidas, comparecem as mais diversas, incluindo aquelas consideradas “piores formas de trabalho infantil”. Em relação aos
fatores explicativos para inserção de crianças na condição de trabalhadores - foram
identificados dois grandes grupos, denominados fatores macroestruturais e fatores microestruturais. Acrescente-se, no
entanto, fatores considerados de ordem
cultural, como a importância atribuída ao
trabalho, pelas famílias, a consideração
do trabalho como alternativa única para
impedir a inserção da criança no mundo
das ruas, das drogas, da vagabundagem.
Acrescente-se, ainda, a ineficiência de políticas públicas voltadas para a população
180
de baixa renda. (Campos e Francischini,
2003). A pobreza é o principal fator apontado pelos autores. Com a insuficiência de
ganhos, as famílias obrigadas a inserirem
seus filhos no mercado de trabalho, ampliando, assim, o orçamento doméstico.
Dentre os fatores microestruturais, destacam-se as relações entre os membros
das famílias e sua dinâmica interna, muitas vezes, permeada por outras formas de
violência. Em relação às consequências do
trabalho para o desenvolvimento da criança, destacamos, as consequências para a
escolarização (dificuldades para ingresso
no sistema educacional, altos índices de
evasão e de repetência, baixo desempenho escolar). Impossibilidades de vivência
da cultura lúdica, fator importante para o
exercício do Ser Criança, também são indicadas pelos autores. Do ponto de vista da
saúde, muitas consequências são apontadas: cansaço físico e mental, dores no corpo e na cabeça, doenças infecto-contagiosas causadas por acidentes com materiais
cortantes e perfurantes contaminados,
contaminação por agrotóxicos ou outros
produtos químicos, traumatismos decorrentes de acidentes de trânsito, dores na
coluna e dores musculares, sintomas devidos a exposição às alterações climáticas
e à poeira sem as devidas proteções, DSTs,
gravidez precoce e indesejada, intoxicação decorrente da exposição à nicotina.
Considerando a ampla variedade de consequências do exercício de atividades de
trabalho pelas crianças, resta-nos questionar: porque, então, o trabalho infantil persiste e sua erradicação não se torna uma
realidade? Estarão, as produções acadêmicas contribuindo para o entendimento
dessas questões? Em artigo denominado
Trabalho Infantil e Produção Acadêmica
nos anos 90: tópicos para reflexão, Ferrei-
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
ra (2001), indica a necessidade de pesquisas interdisciplinares que possam tornar
visíveis os determinantes e impactos do
trabalho precoce. As instituições de ensino superior têm responsabilidade ímpar
nessa tarefa. Os artigos aqui apontados
sinalizam para algumas respostas e fazem
emergir a urgência e seriedade necessárias no tratamento dessa questão.
Palavras-chave: Trabalho Infantil, Crianças,
Trabalho Infanto-juvenil.
LT03-906 - PROJETO CONSULTÓRIO
DE RUA DO MUNICÍPIO DE GOIÂNIA:
CONQUISTANDO A CIDADANIA
Elaine da Cunha Fernandes Mesquita - SMSG
[email protected]
Helizett Santos de Lima - SMSG/UnB
[email protected]
Marcelo Santos Ribeiro - SMSG
[email protected]
Rôzi-Mayry Oliveira Soares Duarte - SMSG
[email protected]
Sheila Alves da Cunha - SMSG
[email protected]
Roberto Vaz de Abreu - SMSG
[email protected]
O uso de substâncias psicoativas por pessoas em contexto de vulnerabilidade social, em situação de rua, tem preocupado
a sociedade brasileira. No município de
Goiânia esta realidade não é diferente
e percebe-se a necessidade de ofertar o
acesso aos serviços de saúde existentes
para essa parcela da população que se encontra excluída da sociedade e em condições precárias de sobrevivência. O Plano
Emergencial de Ampliação do Acesso ao
Tratamento e Prevenção em Álcool e outras Drogas (PEAD 2009-2010), do Sistema
Único de Saúde (SUS), tem como objetivo
a expansão de estratégias de prevenção e
tratamento relacionadas ao consumo de
álcool e outras drogas, mediante ações
intersetoriais, ou seja, ações integradas
de setores como saúde, justiça, assistência social, educação, cultura, esporte e lazer, tanto na esfera governamental como
não-governamental, com prioridade para
os cem maiores municípios brasileiros,
abrangendo todas as capitais. Visa a ampliação do acesso, qualificação dos profissionais, prevenção, promoção da saúde e
redução de danos relacionados ao consumo de substâncias psicoativas e, ainda, o
resgate dos direitos humanos e de cidadania da população usuária. Os dispositivos consultórios de rua no SUS tem como
princípios a garantia dos direitos humanos, combate ao preconceito e estigma,
inclusão e reinserção social, baseadas em
ações de redução de danos e integradas
a outras políticas públicas de saúde no
campo da saúde mental. É composto de
equipe volante multiprofissional, com
técnicos da saúde mental, atenção básica,
educadores sociais, oficineiros e redutores de danos que desenvolvem trabalho
extramuros nos locais onde se encontram
as pessoas que vivem em situação de rua
e fazem uso de substâncias psicoativas,
prioritariamente a população jovem. Esses dispositivos devem integrar a rede de
saúde mental local, trabalhar com ações
voltadas para a intra e intersetorialidade,
para possibilitar aos usuários o acesso aos
diversos serviços de saúde disponíveis e,
ainda, outros serviços como da assistência
social de acordo com as demandas específicas apontadas pela clientela atendida.
Entre os projetos da rede especializada
em saúde mental de Goiânia, que foram
aprovados recentemente pelo Ministério
181
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
da Saúde e estão em fase de implantação e
execução, destaca-se o Consultório de Rua
1, projeto de intervenção, que tem equipe
multiprofissional composta de dezesseis
técnicos, sendo três educadores de rua/
redutores de danos, três psicólogos, uma
enfermeira, uma assistente social, um clínico geral com formação em saúde mental, um oficineiro, um profissional de educação física e cinco alunos de graduação
estagiários do PET Saúde Mental. A equipe
atua na região Campinas-Centro, próximo
ao Terminal Rodoviário de Goiânia, onde
se encontra parcela considerável de pessoas vivendo em situação de rua do município. A população atendida é qualquer
pessoa em situação de alta vulnerabilidade social, com uso abusivo de substâncias
psicoativas, principalmente o crack, que
vive em condições precárias no espaço da rua, com prioridade para crianças,
adolescentes e jovens. É relevante apresentar esse novo dispositivo de atenção
e suas contribuições para o atendimento
dessa clientela, pois o mesmo traz inúmeros desafios, como: mudança no modelo
de atendimento, busca do contato com o
usuário pelo atendimento in loco (na rua),
identificação das necessidades/demandas
da clientela a partir da escuta da mesma,
bem como a efetivação das parcerias intra e intersetoriais e o atendimento em
rede. Ademais, essa modalidade de atenção pode favorecer o resgate de direitos
humanos e de cidadania da clientela-alvo,
com enfoque em experiências anteriores
e nas políticas públicas voltadas para esta
área.
Palavras-chave: redução de danos, uso de
drogas, jovens em situação de rua
Contato: Helizett Santos de Lima, SMSG/UNB,
[email protected]
182
CO 03 - LT01
Transtornos de Desenvolvimento
LT01-770 - AUTISMO E AMIZADE
NO CONTEXTO ESCOLAR: ESTUDO A
PARTIR DO MODELO PIAGETIANO DE
INTERAÇÃO SOCIAL.
Claudia Broetto Rossetti - UFES
[email protected]
Lorena Santos Ricardo - UFES
[email protected]
Financiamento: CNPq
Jean Piaget afirma que os aspectos sociais
e individuais constituem polos indissociáveis de uma única realidade no processo
de desenvolvimento humano. O referido
autor argumenta ainda que as pessoas
são a fonte de toda classe de cognições e
de sentimentos e que, se a criança sente
necessidade de socializar seu pensamento, esta necessidade pode satisfazer-se
quando esta tem amigos, com os quais
brinca sem constrangimentos. Assim,
para além dos aspectos científicos, a importância social das amizades também
deve ser considerada. Com o advento da
inclusão de pessoas com deficiência em
escolas regulares, as crianças passaram
a ter contato com uma realidade diferenciada na sala de aula. No caso específico
dos transtornos do espectro autista, a
manifestação dos comportamentos estereotipados, típicos do quadro, pode acabar afastando as demais crianças, ou, ao
contrário, dependendo de como é feita a
inclusão, esse contato pode resultar em
novas experiências e aprendizados sobre
o respeito às diferenças e sobre o convívio
social. Dessa maneira, a presente pesquisa objetivou investigar se há diferença no
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
conceito de amizade, no respeito às diferenças e na formação de relacionamentos
de amizade no contexto escolar entre 17
crianças que estudam com um autista em
classe inclusiva (CI) e 17 crianças que estudam em classe não inclusiva (CNI). Assim, participaram 35 crianças, com idades
variando entre 7-8 anos, estudantes do
2º ano do ensino fundamental de duas
escolas da rede pública de um município
do interior do Espírito Santo. Para a coleta de dados foram criados 14 cartões com
desenhos de crianças em diversas situações, sendo seis específicos para meninas
(1- duas meninas brincando; 2- duas meninas brigando; 3- uma menina mais velha e uma menina mais nova; 4- um grupo
de meninas conversando e uma menina
isolada, num canto; 5- uma menina cega,
com óculos escuros e bengala, e uma menina que não é cega; 6- uma menina na
cadeira de rodas e outra menina em pé,
ao lado), seis cartões específicos para meninos (as mesmas situações dos cartões
detalhados anteriormente, mas com desenhos de meninos) e dois cartões para
ambos (1- um menino e uma menina; 2um grupo de crianças, sendo um menino
negro, uma menina asiática, uma menina
loira, um menino gordo e ruivo). Além
disso, utilizou-se um roteiro de entrevista baseado no método clínico Piagetiano.
O encontro com cada criança ocorreu individualmente, na própria escola, após a
aprovação pelo Comitê de Ética e a assinatura dos Termos de Consentimento Livres
e Esclarecidos pela diretora e pelos responsáveis. Primeiramente os cartões foram apresentados a cada participante. Em
seguida, era solicitado que a criança descrevesse o que via, dissesse se as crianças
do desenho poderiam ou não ser amigas e
justificasse sua resposta. Logo depois era
realizada a entrevista cujo roteiro continha 14 questões divididas em três grupos
temáticos: o primeiro visava investigar a
concepção de amizade dos participantes;
o segundo, compreender a relação entre
a percepção de diferenças (e respeito
a elas) e a possibilidade de um relacionamento de amizade com aqueles que
são vistos como diferentes; e, o terceiro,
analisar a formação dos relacionamentos
de amizades na escola, nos contextos de
classe inclusiva e não inclusiva. Todas as
etapas da coleta de dados foram gravadas
em áudio. Os cartões foram descritos de
forma bem semelhante pela maioria dos
participantes. De maneira geral, ambas
as classes apontaram para a possibilidade
de amizade entre as crianças dos cartões,
embora na CI tal possibilidade apareça
em 75% das respostas dadas aos cartões
enquanto na CNI esse número se reduz
(66%). Em relação ao primeiro grupo temático da entrevista, tanto a CI (40%)
como a CNI (50%) entendem amizade
como brincar/se divertir e o “brincar” é
apontado como principal facilitador para
se ter amigos. Sobre o que atrapalha a ter
amigos, “fazer mal” é apontado como o
principal fator. Quanto ao segundo grupo temático investigado, na CI a maioria
dos participantes (60%) acha possível ter
um amigo que é diferente, enquanto que
na CNI apenas 40% considera essa possibilidade. Quando questionados sobre o
que consideravam “diferente”, a maioria
das respostas da CI (30%) apontou para
diferenças no comportamento. No caso
da CNI o “diferente” foi mais associado a
características físicas (55%). Além disso,
enquanto mais participantes da CNI afirmaram haver alguém diferente na sala na
qual estudam, mais participantes da CI se
consideram amigo das crianças apontadas
183
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
como diferentes. Por fim, no terceiro grupo temático investigado todos os participantes afirmaram ter amigos na escola.
Quando perguntados sobre quem na sala
tem mais amigos, houve maior coesão entre as respostas dos participantes da CI,
ou seja, poucas crianças foram citadas. Na
CNI foram muitas crianças. O motivo mais
apontado pela CI (59%) e pela CNI (79%)
para determinada criança ter muitos amigos foi a boa comunicação/interação dela
com os demais colegas. Sobre “ficar mais
sozinho”, a maioria dos participantes afirma que existe alguém assim na sala e tanto a CI (33%) como a CNI (46%) apontam
como motivo o fato de ninguém gostar da
referida criança. Todos os participantes da
CNI e 94% dos da CI afirmam que é bom
ter amigos na escola. Entre os motivos,
a maioria dos participantes assinalou a
possibilidade de brincar com os amigos
no contexto escolar. A maioria dos participantes de ambas as classe afirmou que
ter amigos na sala é benéfico, pois pode
ajudar a aprender os conteúdos das matérias, uma vez que um amigo pode ajudar o outro quando houver dificuldades.
De forma geral, os participantes de ambas
as classes conseguem definir bem o termo “amizade” e percebem o diferente de
forma semelhante, embora os alunos a
CI pareçam se dispor a respeitar e se relacionar mais com aqueles que são vistos
como diferentes do que os alunos da CNI.
Dessa maneira, espera-se que os resultados da presente pesquisa venham a contribuir para uma compreensão maior da
temática abordada, que possam auxiliar
na elaboração de novas estratégias para
que o processo de inclusão se torne cada
vez mais viável no contexto escolar, em
especial para os portadores de transtornos do espectro autista.
184
Palavras-chave: Teoria de Piaget,
Desenvolvimento Atípico, Inclusão
Contato: Claudia Broetto Rossetti.
Universidade Federal do Espírito Santo
[email protected]
LT01-774 - TRANSTORNO DE DÉFICIT DE
ATENÇÃO E HIPERATIVIDADE (TDAH):
PENSANDO O DESENVOLVIMENTO
ATÍPICO A PARTIR DA TEORIA
PIAGETIANA
Camila Tarif Ferreira Folquitto - USP
[email protected]
Maria Thereza Costa Coelho de Souza - USP
[email protected]
Financiamento: FAPESP
O Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) é uma das principais
causas de procura nos ambulatórios de
saúde mental infantil no Brasil. Embora
não haja consenso a respeito de algumas
características do TDAH, acredita-se que
se trata de um fenômeno biopsicossocial.
Assim como ocorre em outros transtornos, os sintomas de TDAH são aspectos
que, em certo grau, estão presentes em
crianças de diferentes idades e contextos.
Portanto, o que diferencia crianças com
um desenvolvimento considerado dentro
do esperado, de crianças com este transtorno é que, nestas, tais aspectos manifestam-se com uma frequência e intensidade consideradas sintomáticas, comprometendo a adaptação, socialização e desenvolvimento. O termo “desenvolvimento atípico” é utilizado para descrever trajetórias de desenvolvimento de crianças
nas quais há uma ausência de atributos,
características ou construções essenciais
para o desenvolvimento, ou quando estas
são conquistadas de maneira mais lenta,
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
muitas vezes necessitando de mais trocas
e experiências com o meio. No caso do
TDAH, a literatura demonstra que crianças com tal diagnóstico apresentam um
desempenho em baterias neuropsicológicas comparável aos resultados de crianças mais novas não diagnosticadas. Outra
importante característica é a dificuldade
em “pensar antes de agir”, entendida no
campo da Neuropsicologia como uma
dificuldade em inibir pensamentos ou
atitudes impulsivas, justamente por uma
dificuldade em antever suas consequências. Portanto, acreditamos que o próprio
campo de pesquisas sobre o TDAH aponta
a necessidade de uma investigação mais
detalhada a respeito do desenvolvimento das crianças diagnosticadas com este
transtorno. A partir da teoria de Jean
Piaget, temos um referencial teórico que
permite realizar pesquisas sobre o TDAH
à luz da Psicologia do Desenvolvimento.
A teoria piagetiana procura responder a
questão de como é possível a construção
de conhecimento. Por meio de um processo dialético de interação e adaptação
ao mundo, os indivíduos desenvolvem-se progressivamente, em seus aspectos
cognitivos, afetivos e morais. Embora Piaget não tenha estudado especificamente
crianças diagnosticadas com algum tipo
de transtorno, suas contribuições podem
ser aplicáveis a este campo de pesquisa,
já que, na teoria piagetiana temos como
foco o sujeito epistêmico e suas ações
no mundo. Assim, as particularidades e o
contexto social não são descartados, mas
procura-se entender as regularidades e
semelhanças dos processos de desenvolvimento em diferentes contextos. Com
base na teoria piagetiana, temos como
objetivo realizar reflexões que contribuam para uma maior compreensão sobre
o TDAH, a partir de dois eixos principais:
1) o estudo do desenvolvimento de crianças com este transtorno, com ênfase na
construção de noções operatórias, em
especial na noção de tempo; 2) a diferenciação entre aspectos estruturais e procedimentais das ações, suas interrelações e
funções no desenvolvimento das noções
operatórias. Em relação ao desenvolvimento das referidas noções, pesquisas
demonstram que, em provas operatórias,
crianças hiperativas apresentam uma tendência em emitir julgamentos e respostas
típicos do período pré-operatório de desenvolvimento, no qual ainda não estão
construídos aspectos importantes para o
desenvolvimento da inteligência operatória, como a conservação, interiorização
da ação em pensamento, flexibilidade
mental e reversibilidade. Os sintomas de
impulsividade podem ser compreendidos
de forma mais detalhada diante desses
indícios de defasagens no desenvolvimento. Para que a criança consiga “pensar antes de agir”, é necessário que ela
consiga coordenar os eventos passados,
à luz dos acontecimentos presentes, para
tomar uma decisão acertada, prevendo
as consequências futuras. Para Piaget, a
construção da noção de tempo é o aspecto necessário para a coordenação desses
eventos, e, em consequência, para a possibilidade do estabelecimento das relações causais. Portanto, o tempo, para este
autor, é compreendido como uma noção
cognitiva, estruturante do real e organizadora das experiências do indivíduo. O
tempo pode ser apreendido de maneira
objetiva ou subjetiva, e, a respeito dessa
questão, Piaget distingue o tempo físico,
que se refere à duração métrica do tempo, e o tempo vivido, que seria a duração
psicológica do tempo, ou seja, a sensa185
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
ção dos sujeitos em relação à passagem
do tempo. Serão apresentados dados de
pesquisa realizada com 62 crianças, que
investigou as noções temporais em crianças com TDAH, e os possíveis efeitos das
medicações psicoestimulantes utilizadas
para o tratamento do transtorno no desenvolvimento das noções operatórias.
Crianças com TDAH tenderam a apresentar dificuldades em mensurar intervalos
de tempo, e demonstraram, em suas respostas às perguntas feitas na aplicação
das provas piagetianas, uma noção temporal não dissociada da noção de espaço.
Em relação ao uso do metilfenidato na
amostra clínica, não foi observada diferença entre o desempenho de crianças
com TDAH medicadas e não medicadas.
Portanto, por meio destas pesquisas podemos pensar que crianças com TDAH
possuem sintomas que as impedem de
focar a atenção em estímulos importantes; em decorrência disso, as trocas com
o meio, que possibilitam construções cognitivas essenciais, ficariam prejudicadas,
acarretando um atraso no desenvolvimento, na apreensão de noções abstraídas das relações dos objetos do mundo
físico. A partir desses resultados, realizaremos uma discussão teórica a respeito
da interação entre os procedimentos,
isto é, as ações pontuais que os sujeitos
realizam para atingir determinado fim, e
as estruturas, que dizem respeito ao conjunto das implicações necessárias para a
realização das ações, que são atemporais
e interiorizadas. Refletir sobre as relações
entre o par procedimentos/estruturas
nos permite pensar a respeito da qualidade das ações e procedimentos de crianças
com TDAH, sobre o que “sabem fazer” e
o quanto elas “compreendem as razões”
destes procedimentos. Exemplificaremos
186
esta construção teórica com dados de
pesquisa em andamento, que busca realizar intervenções em crianças com TDAH
a partir de jogos e situações problema.
Assim, esperamos que tais pesquisas e
apontamentos teóricos possam contribuir
para um melhor entendimento de crianças TDAH, e contribuir para a elaboração
de estratégias de intervenção no campo
da Psicologia e da Educação.
Palavras-chave: desenvolvimento atípico;
TDAH; teoria piagetiana.
Contato: Camila Tarif Ferreira Folquitto.
Instituto de Psicologia da Universidade de São
Paulo
E-mail: [email protected]
LT01-969 – A MEDIAÇÃO AFETIVA NO
PROCESSO DE INCLUSÃO ESCOLAR DO
ALUNO COM TRANSTORNO GLOBAL DO
DESENVOLVIMENTO - TGD – UM ESTUDO
DE CASO.
Érika Goulart Araújo - UAB/UnB
[email protected]
Geane de Jesus Silva - UAB/UnB
[email protected]
O estudo levanta uma inquietação científico-pedagógica e constitui-se num estudo de caso evidenciado no contexto de
uma escola pública do Distrito Federal na
perspectiva de uma criança do sexo feminino diagnosticada com Transtorno Global do Desenvolvimento – TGD portadora de Autismo atípico, matriculada no 2°
Ano do Ensino Fundamental. A pesquisa
teve como principal problemática: entender até que ponto a mediação afetiva no
contexto escolar pode contribuir com o
processo de inclusão educacional de um
aluno com TGD. Para isso, como objetivo
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
geral visou compreender como a mediação afetiva pode contribuir para o processo de inclusão educacional de um aluno
com TGD. Como metas específicas, foi
necessário identificar a contribuição da
mediação afetiva entre professor e aluno,
observar a interação entre o aluno e seus
pares, verificar as limitações específicas
da aluna e sua relação com as trocas afetivas e a identificação da mediação pedagógica que o professor lança mão para a
interação com o aluno com TGD. O trabalho de pesquisa embasou-se em teóricos
como: Piaget, Vygotsky, Wallon, Sassaky e
Documentos e legislação específica sobre
Educação Inclusiva. Com intuito de estabelecer relação entre afetividade e interação social, buscou-se refletir sobre a mediação no contexto escolar considerando
as teorias construtivistas e sociogenéticas
que evidenciam os aspectos individuais,
sociais e culturais do desenvolvimento. A
discussão foi direcionada para educação
inclusiva, especificamente a inclusão do
aluno com TGD, dimensionando o papel
da mediação afetiva e do outro no processo de inclusão educacional. Desta forma,
este aluno foi caracterizado e focado em
suas especificidades, apresentados frente à mediação do outro e de suas interações com o ambiente. Empregou-se na
metodologia a abordagem qualitativa de
pesquisa, pois seu caráter dialógico possibilita a obtenção de dados descritivos mediante contato direto e interativo do pesquisador com o objeto de estudo no intuito de entender os fenômenos segundo a
perspectiva dos participantes da situação
estudada. E, nesse caso, como a realidade a ser pesquisada refere-se ao contexto
escolar de um aluno TGD, optou-se pelo
estudo de caso, pois tal método atende
ao propósito da pesquisa em questão.
Participaram da investigação o Professor
Regente, a Supervisora Pedagógica e a
Professora do Atendimento Especializado
– Sala de Recursos, a Orientadora Educacional e a aluna. Os instrumentos empregados na estruturação do levantamento
das informações foram os seguintes: a
observação, diário de campo, entrevista
semiestruturada e análise documental
sendo discutidos à luz do caráter interpretativo-construtivo. Sendo assim, foram construídas as seguintes categorias
de análise com base nos objetivos específicos desse trabalho: Mediação afetiva;
Interação social do TGD; Limitações específicas e a Participação do outro no processo de inclusão. Tais eixos nortearam a
organização dos dados obtidos por meio
de cada um dos instrumentos utilizados
e também a apresentação dos resultados
alcançados. Nesse sentido, os principais
resultados obtidos revelaram que com
base na ideia de mediação sendo a intermediação, de algo interposto entre uma
coisa e outra tendo como base a afetividade, podemos evidenciar que a mediação afetiva proporcionou à aluna um ambiente de permanente desenvolvimento.
Sobre a interação da aluna, suas limitações não implicam em seu isolamento,
pois há interação, uma vez que respeitada
seu ritmo e sua individualidade. Em relação à possibilidade real de desenvolver e
romper com as limitações específicas da
aluna a partir da intervenção do outro
como mediador proporcionou identificar
o inexorável papel da medição afetiva
que revelou ser de extrema importância
dentro do processo de inclusão educacional de um aluno TGD. No que concerne
à participação do outro no processo de
inclusão, os dados sugerem ainda o fortalecimento do outro no ambiente escolar
187
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
o qual é espaço privilegiado de interação
social, pois possibilita a apropriação da
diversidade cultural e aprendizagem de
conteúdos, base para a constituição da
pessoa em si e também do outro. Portanto, o papel do outro na superação das dificuldades de aprendizagem e no caso, de
inclusão educacional, tem relevância significativa e status de mediador propulsor
das potencialidades do indivíduo sendo o
outro sujeito ativo, concreto que atua em
sistemas históricos complexos da atividade interativa. Tendo em vista tais resultados, chega-se a seguinte resposta para a
pergunta inicial: a mediação afetiva contribui significativamente com o processo
de inclusão educacional de alunos com
TGD, pois o que se caracteriza como obstáculo dentro de um quadro de espectro
autista, ou seja, a dificuldade nas relações
e trocas afetivas, é o que substancialmente justifica ações interativas que possibilitem seu desenvolvimento. Com este estudo pôde-se apreender que o processo de
inclusão da aluna torna-se efetivo a partir
das trocas afetivas e da participação do
outro, o qual compõe o cenário da aluna
de maneira bem particular, pois é a partir
dele que ela se mostra e se constitui. A
contribuição dessas reflexões possibilita reelaborar questões sobre o papel do
outro no processo de inclusão escolar a
partir da mediação afetiva, indicando sua
eficácia quando resguardada a individualidade do aluno com necessidades educacionais especiais.
Palavras-chave: Educação Inclusiva,
Mediação Afetiva, transtorno global do
desenvolvimento.
Contato – Érika Goulart Araújo – UAB-UnB –
[email protected]
188
LT01-1046 – AUTISMO: CONCEPÇÕES DE
PROFISSIONAIS DAS ÁREAS DA SAÚDE E
EDUCAÇÃO
Cibele Shírley Agripino Ramos - UFPB
Nádia Maria Ribeiro Salomão - UFPB
Financiamento: CAPES
O autismo é um dos transtornos do desenvolvimento mais estudados atualmente, cuja compreensão representa um
fator relevante para a formação de diversos profissionais. Embora seja um tema
bastante investigado, ainda não existe
um consenso a respeito da sua etiologia, visto que as explicações variam dependendo do enfoque teórico adotado,
o que dificulta a elaboração do próprio
conceito de autismo. Apesar das divergências teóricas envolvendo a sua etiologia e das mudanças de enfoque ocorridas
ao longo dos anos, pode-se dizer que há
um consenso a respeito da existência de
um comprometimento em três importantes áreas para o desenvolvimento infantil
nesse transtorno: interação social, comunicação/linguagem e comportamento,
sendo esta tríade de prejuízos utilizada
como critério diagnóstico de autismo. O
diagnóstico de autismo deve ser realizado até os três anos de idade, entretanto,
muitas vezes, ele só é feito mais tardiamente, por volta dos quatro ou cinco anos
de vida da criança. Tem sido ressaltada,
nos últimos anos, a importância de uma
identificação precoce do autismo, já que
por meio dela é possível antecipar a intervenção. A identificação e a intervenção precoce são de extrema importância
para que sejam amenizados os prejuízos
decorrentes do autismo, o que justifica a
necessidade de os profissionais se informarem a respeito dos avanços relacionados a essa área, principalmente aqueles
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
referentes ao diagnóstico do transtorno.
Vários profissionais estão envolvidos tanto no diagnóstico quanto na intervenção
do autismo. No entanto, poucos estudos
têm sido realizados a fim de investigar as
concepções ou crenças de profissionais
de diversas especialidades acerca deste transtorno. Nesse sentido, o presente
estudo teve como objetivo investigar as
concepções que profissionais de diversas
áreas, que comumente lidam com o grupo
autista, possuem a respeito de tal transtorno. Considera-se que a forma como
eles concebem o autismo influencia na
maneira como será feito o diagnóstico e a
intervenção, e, consequentemente, trará
reflexos importantes para o desenvolvimento da criança com autismo. Participaram deste estudo 29 profissionais, sendo
sete psicólogos, sete fonoaudiólogos, seis
pedagogos, três psiquiatras, três neurologistas e três pediatras. Estes profissionais
foram procurados em instituições públicas e privadas que recebem indivíduos
com necessidades educativas especiais,
bem como em consultórios particulares,
todos localizadas na cidade de João Pessoa - PB. Os instrumentos utilizados neste
foram um questionário de identificação
aplicado ao profissional e uma entrevista
estruturada, com perguntas referentes às
concepções dos participantes quanto às
causas, indicadores, prognóstico e intervenção no autismo, bem como ao papel
que a família desempenha no desenvolvimento das crianças que possuem esse
transtorno. A análise das respostas foi
realizada buscando-se as convergências e
divergências entre as concepções dos profissionais das diferentes áreas do saber.
Verificou-se que a maioria dos profissionais acredita em uma causa orgânica para
o autismo, embora, dentre estes, alguns
considerem que fatores ambientais possam desencadeá-lo. Um número menor
de profissionais caracterizou o autismo
como sendo de origem multifatorial, isto
é, que envolve uma associação de fatores orgânicos, psicológicos e ambientais.
Houve ainda profissionais que não se
posicionaram a respeito. No que se refere à identificação do autismo, os profissionais, em geral, acreditam ser possível
identificá-lo antes dos três anos de idade.
Entretanto, nem todos acreditam na possibilidade de o fechamento do diagnóstico
ser realizado antes dessa idade. Dentre os
aspectos que possibilitam a realização da
identificação precoce, foi destacada a importância do olhar diferenciado do pediatra, cujo acompanhamento contribui para
que as características do autismo possam
ser percebidas mais facilmente. As características relatadas com maior frequência pelos participantes quanto aos sinais
precoces de autismo foram a ausência do
contato visual, isolamento, movimentos e
atividades repetitivas e chorar demais. A
confusão com outras condições, como déficit auditivo, por exemplo, foi mencionada como um dos problemas que interferem na identificação precoce, tendo sido
ressaltada, assim, a importância do diagnóstico diferencial. No que diz respeito ao
prognóstico do autismo, a grande maioria
dos profissionais acredita que é possível
haver uma evolução positiva nesse transtorno, mas que esta depende de alguns
fatores, como o grau de autismo que a
criança apresenta e se a intervenção é
iniciada precocemente. Destacaram-se
ainda como importantes para um bom
prognóstico a necessidade de a criança
ser acompanhada por uma equipe multidisciplinar e de haver a participação da família no tratamento. Quanto às propostas
189
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
de intervenção mais eficazes para o autismo, os profissionais, em geral, acreditam
que é preciso atentar para as necessidades de cada criança em particular, bem
como para o seu contexto familiar. Além
da importância de uma equipe multidisciplinar no tratamento, destacou-se também como importante a integração entre
pais, profissionais e escola. Dentre os profissionais que citaram métodos específicos para o tratamento, os mais mencionados foram o TEACCH, o ABA, o PECS e o
Son-Rise. A maior parte dos profissionais
considera válidas estratégias alternativas,
como a musicoterapia, a arteterapia e a
equoterapia. Contudo, nem todos acreditam que estas estratégias devam ser utilizadas isoladamente, mas como um complemento a outras formas de intervenção.
Quanto ao papel da família no auxílio ao
desenvolvimento das crianças com autismo, os aspectos mencionados com maior
frequência foram a necessidade de haver
estimulação por parte dela e a aceitação.
Por fim, considera-se que alguns profissionais não conseguem definir claramente o que causaria o autismo, o que talvez
tenha feito com que eles não se posicionassem a respeito. Acredita-se que a falta
de um consenso na literatura acerca das
causas do autismo, bem como a diversidade de quadros clínicos encontrados, possam ter contribuído não apenas para que
alguns profissionais não se posicionassem
a respeito da etiologia, como também
para a diversidade de explicações sobre as
causas do autismo apresentada por eles.
Enfatiza-se a necessidade de outros estudos sobre as concepções dos profissionais
acerca do autismo que envolvam uma
quantidade maior de profissionais, especialmente os da área médica, que foram
minoria na presente investigação.
190
Palavras-chave: autismo; concepções;
profissionais.
Contato: Cibele Shírley Agripino Ramos
- Estudante de Pós-Graduação (mestrado) Universidade Federal da Paraíba
[email protected]
LT01-1052 - A CRIANÇA COM SÍNDROME
DE DOWN E SUA FAMÍLIA: UM
ESTUDO SOBRE A DINÂMICA FAMILIAR
DE ACORDO COM A PERSPECTIVA
SISTÊMICA
Luciene Pires de Araújo Lins - UCB
Maria Alexina Ribeiro – UCB
[email protected]
A Síndrome de Down caracteriza-se pela
existência de um cromossomo extra, ou
seja, em cada célula há 47 cromossomos,
quando o esperado são 46 cromossomos.
As crianças com Síndrome de Down possuem características físicas específicas,
que podem ser observadas pelo médico
ao fazer o diagnóstico clínico. O diagnóstico da Síndrome de Down, atualmente,
pode ser obtido antes mesmo do nascimento do bebê durante o acompanhamento pré-natal. Se o acúmulo de fluído
na nuca fetal, conhecido como translucência nucal (TN), for excessivo, no período de 11 a 136/7 semanas, há um risco
aumentado para a ocorrência de anomalias cromossômicas, malformações fetais
e síndromes genéticas. A revisão da literatura mostrou que há uma escassez de
estudos que envolvem todos os membros
da família e seu funcionamento, necessitando, portanto, de mais investigações na
área, principalmente no tocante especificamente ao papel do pai nesse contexto,
onde foram encontrados poucos estudos.
Em geral, há certa predominância de tra-
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
balhos que priorizam, especificamente, a
relação da mãe com a criança que possui
Síndrome de Down, bem como os aspectos sócio-educativos, na maioria das vezes com o enfoque particular em um ou
mais membros da família. Dificilmente
esses estudos têm enfatizado a família
e sua dinâmica como um todo. Estudos
apontam para a importância da família
no desenvolvimento da criança com Síndrome de Down, pois mesmo com toda
a dificuldade que a família tem que lidar
nas várias situações difíceis, é ela que vai
fazer de tudo para que o filho possua um
atendimento especial e de qualidade. Assim, uma vez que a família é o primeiro
universo de socialização da criança e é a
mediadora das relações desta com seus
diversos ambientes, é fundamental que
pesquisadores e profissionais foquem sua
atenção para a compreensão da dinâmica
de funcionamento de famílias de crianças
com Síndrome de Down. Este trabalho
apresenta um estudo sobre a dinâmica
familiar e os padrões de relacionamento
de uma família com um filho com Síndrome de Down. Trata-se de uma dissertação
de mestrado da primeira autora orientada pela segunda. O objetivo do estudo
foi conhecer a dinâmica de uma família
com um filho diagnosticado pela Síndrome de Down, enfocando alguns aspectos
dessa dinâmica, visando contribuir com
o conhecimento sobre o tema e possibilitar uma melhor assistência às famílias.
Privilegiou-se o referencial da pesquisa
qualitativa de González Rey com utilização do estudo de caso. A pesquisa teve
como participante uma família constituída por pai, 39 anos, militar, mãe, 42, uma
filha, 16, e um filho de 18 anos que possui
Síndrome de Down. A família é natural do
nordeste brasileiro e reside em Brasília/
DF há seis anos. A família foi convidada a
participar da pesquisa por meio da pesquisadora e, após ser informado sobre os
procedimentos do estudo, assinou o Termo de consentimento Livre e Esclarecido.
O projeto foi submetido e aprovado pelo
Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Católica de Brasília - UCB. Para o
levantamento dos dados foram realizados
três encontros com a família com o objetivo de conhecer a história familiar, com
base em um roteiro, elaborar o genograma, o ecomapa e a confecção da colagem
com a participação de todos os membros
da família que teve como tema “Nossa
família”. A análise dos dados foi feita de
acordo com a abordagem construtivo-interpretativa de González Rey a partir de
três Zonas de Sentido: 1) História familiar
e fases do ciclo de vida; 2) Subsistemas,
fronteiras e hierarquia e 3) “Em Brasília é
difícil fazer amizades”: relações da família
com outros sistemas sociais. Os resultados apontam para a falta de preparo dos
profissionais ao atender uma criança com
deficiência, sem acolhimento e sensibilidade ao lidar com família; a dificuldade,
por parte da família, em aceitar a deficiência do filho, tendo que elaborar o luto
pelo filho ideal perdido; o medo dos pais
de terem outros filhos com deficiência; o
relacionamento entre irmãos permeado
de cooperação e apoio mútuo, embora
haja sentimentos de ciúmes; reestruturação familiar durante as várias etapas
do ciclo de vida, possibilitando aos membros exercerem outros papéis e funções
familiares; pouca permeabilidade das
fronteiras com os outros sistemas sociais,
ou seja, a família possui poucos relacionamentos sociais. A escolha do método e
a abordagem sistêmica foram essenciais
para o alcance dos objetivos de pesquisa
191
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
e proporcionaram um melhor entendimento sobre a dinâmica de uma família
que possui um membro com Síndrome
de Down. Como sugestões para pesquisas
futuras, consideram-se importantes estudos que abordassem a questão religiosa
como enfrentamento para aceitar o filho
com deficiência. Também seria muito interessante a realização de um estudo que
focalizasse somente o pai, uma vez que
a revisão bibliográfica nos trouxe poucos
dados a respeito da relação do pai com o
filho com Síndrome de Down.
Palavras-chave: Síndrome de Down, dinâmica
familiar e abordagem sistêmica.
Contato: Luciene Pires de Araújo Lins Universidade Católica de Brasília – UCB
[email protected]
PO-LT04-A
LT04-702 - A EDUCAÇÃO INCLUSIVA NA
PERSPECTIVA DOS PROFESSORES
Lanusa Menezes da Silveira - UCB
A inclusão de alunos com necessidades
educacionais especiais (ANEEs) no ensino
regular tem encontrado inúmeras barreiras, e tem sido motivo de muitas discussões e estudo. O presente trabalho tem
como objetivo contribuir para o estudo
do processo da Educação Inclusiva na
perspectiva dos professores de uma escola da rede pública da cidade do Gama-DF.
Deste modo, este estudo buscou analisar: “A Educação Inclusiva na perspectiva
dos professores”, com intuito de promover reflexões sobre as possíveis soluções
diante das dificuldades encontradas na
192
educação inclusiva. Participaram do estudo quatro professores do Ensino Médio
que atendem alunos com necessidades
educacionais especiais em uma escola
da rede pública de ensino. Os procedimentos e instrumentos utilizados para a
investigação do objeto de estudo foram
concretizados através de uma entrevista
semiestruturada que continha doze perguntas, que investigavam a educação inclusiva na perspectiva do professor, para
conhecer as impressões que os docentes
têm a respeito dos seus alunos com necessidades educacionais especiais, buscando um maior conhecimento quanto
aos seus sentimentos, dificuldades, angústias e representações que possam facilitar ou dificultar seu desempenho profissional diante da proposta inclusiva. Assim
sendo, esta pesquisa se caracteriza por
ser qualitativa pautada por teóricos representativos. A discussão dos resultados
deu-se mediante a análise do conteúdo.
A análise dos resultados obtidos, indicou
a carência de recursos pedagógicos para
trabalhar com alunos com necessidades
educacionais especiais, a falta de capacitação profissional, a necessidade de
um ambiente adequado aos alunos com
necessidades educacionais especiais e a
falta de contato com a família. Esses desafios estão aliados a uma má formação
dos profissionais da Educação em relação
à educação inclusiva.
Palavras-chave: Educação inclusiva; Alunos
com Necessidades Educacionais Especiais
(ANEEs); Capacitação; Professor.
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
LT04-705 - CONCEPÇÕES DE
PROFESSORES/AS DA REDE PÚBLICA
DE EDUCAÇÃO DO DISTRITO FEDERAL
SOBRE INCLUSÃO ESCOLAR
Vanuza Sales - UNB
[email protected]
Carla Francini H. Terci - UNB
[email protected]
A Educação como possibilidade de desenvolvimento humano sempre foi uma maneira que encontramos para nos referir a
capacidade cognitiva do outro.Entretanto,
na perspectiva da educação inclusiva é
preciso, vislumbrarmos um novo contexto
escolar, onde outras questões e olhares
possam ser delineados no relacionar-se
com o diferente, principalmente na experiência da escola. A educação inclusiva
pressupõe essas novas interações, principalmente no ambiente pedagógico, onde
deveriam ser vivenciadas relações que
denominamos de educativas, ou ‘pedagógicas’. E através dessas, percebemos a
necessidade de usá-la, como recurso, no
processo educativo. A inclusão escolar é
entendida como um processo complexo
de profundas transformações: na estrutura dos sistemas educacionais e das escolas
e nas práticas educacionais. Para Maciel e
Barbato (2010) é um recente fenômeno
sociocultural que, entre outras características, se configura complexo por evidenciar a separação conflituosa que é habitualmente feita entre o individual e o social.
As concepções de desenvolvimento e de
aprendizagem também já se constituíram
em objeto de estudo feito por Vygotski
(1977), quando propõe uma análise das
teorias que enfocam as relações entre essas concepções, investigando quais são as
implicações educativas de determinados
princípios teórico-práticos que dão sus-
tentação a essas teorias. Vigotski (1991),
presume do entendimento de que o ser
humano se constitui como tal mediante as
relações social, histórica e cultural, e esse
estabelece a aprendizagem como o eixo
dessas relações, admitindo ser esta que
promove o desenvolvimento. Segundo
Fonte (2005), é na sala de aula que ocorre
o momento crucial da educação escolar, e
encontro de duas vidas, ambas buscando
crescer e alcançar plenitude comunhão
aluno professor. [...] O relacionamento
entre estes dois elementos constitui a
chave do processo ensino aprendizagem.
[...] (p. 04). Dos professores espera-se
que conduza o seu grupo de estudantes,
buscando compreender e negociar os diferentes processos de significação que
envolvam situações de aprendizagem que
planejou. (Tunes, Tacca & Bartholo, 2005,
p. 01). Analisar as concepções de professores da rede pública do Distrito Federal
- SEE/DF, ensino básico - sobre a Inclusão
Escolar na escolarização formal. Examinar
que concepções teóricas sobre inclusão
escolar que norteiam a prática pedagógica dos professores. Identificar na relação professor x estudante que elementos foram favorecedores no processo de
inclusão escolar. Participantes: três (03)
professoras de três escolas de ensino fundamental séries iniciais, sendo uma, (01),
de cada uma, das escolas acompanhadas
pelo profissional psicólogo escolar. Os
respectivos profissionais professores são
todos pertencentes a escolas públicas do
DF. Elaborou-se um roteiro de entrevista
narrativa para os professores. Os professores foram investigados a partir de suas
práticas, para chegar a concepções, o que
implica, conseqüentemente perceberem
que concepções construíram no percurso
de suas práticas de ensino e aprendiza193
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
gem, e, possibilitando ressignificar essas
na perspectiva da educação inclusiva. Foi
realizada uma análise qualitativa dos dados, por aproximação de sentido dos conteúdos levantados entre as participantes
entrevistadas. As falas foram organizadas
e agrupadas em categorias a partir dos
temas cujos sentidos eram semelhantes,
sendo essas denominadas por uma expressão que melhor as representasse pela
força dos temas recorrentes. Os professores embora sejam os principais agentes
dessa ação, não percebem ainda, nem
consideram como elemento principal do
processo pedagógico a relação professor
e estudante, portanto, reestruturar a escola deve compreender repensar as práticas, as ações e acima de tudo considerar
as possibilidades relacionais como espaço
do processo de ensino e aprendizagem,
como recurso educativo. A pesquisa por
meio da análise dos dados nos permite concluir que com a fragmentação do
conhecimento pedagógico influenciado
pelo ecletismo do senso comum, a falta
de diálogo com o conhecimento teórico
influencia nas concepções dos professores sobre inclusão escolar. Percebe-se nas
percepções das profissionais entrevistadas, uma lógica particular que sustenta
a importância crescente da necessidade da mudança da prática pedagógica a
partir da relação professor e estudante.
Verificou-se que o trabalho dos profissionais professores não é fundamentado em
uma única concepção de inclusão, o que
pôde ser demonstrado pela coexistência
de várias percepções e práticas indistintas. Constatou-se que as abordagens dos
profissionais da escola são permeadas
pela prática intuitiva, discutindo-se, a partir da perspectiva sócio interacionista, as
diversas possibilidades relacionais como
194
espaço de aprendizagem para os atores
da escola numa cultura colaborativa de
desenvolvimento e inclusão escolar.
Palavras-chave: Inclusão escolar, concepções,
prática, pedagógica, vínculo professorestudante.
LT04-738 - O ALUNO QUE NÃO
APRENDE: DIFICULDADE OU
TRANSTORNO DE APRENDIZAGEM?
Aline Pacheco de Medeiros Ferro - UPM
[email protected]
Giuliano Michel Mussi - UPM
[email protected]
Lígia Canellas - UPM
[email protected]
Nathália Zoli Sant`Ana – UPM
[email protected]
Paulo Roberto Pereira de Souza - UPM
[email protected]
Sérgio Martins Lopes - UPM
[email protected]
José Salomão Schwartzman - UPM
[email protected]).
No Brasil, a evasão escolar ainda é um
grande desafio para as escolas, para os
pais e para o sistema educacional. Segundo dados do INEP (Instituto Nacional
de Estudos e Pesquisas Anísio Teixeira),
de 100 alunos que ingressam na escola
na 1ª série, apenas 5 concluem o ensino
fundamental, ou seja, poucos terminam
a 8ª série. Estudos mostram que em torno de 15% a 20% das crianças no início
da escolarização apresentam dificuldade
em aprender e, logo, mau desempenho
escolar. Essas estimativas podem chegar a
30%-50% se forem analisados os primeiros seis anos de escolaridade. O mau desempenho escolar (MDE) nestes estudos,
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
é definido como um rendimento escolar
abaixo do esperado para determinada
idade. O diagnóstico precoce do MDE é
um ponto fundamental para a superação das dificuldades escolares, pois além
de orientar os educadores e pais sobre
a melhor forma de lidar com a criança,
direciona a elaboração de programas de
reforço escolar e a adoção de estratégias
clínicas e/ou educacionais que auxiliam a
criança no desenvolvimento escolar. Objetivos: Levantar as principais causas do
MDE; Identificar os fatores intrínsecos e
extrínsecos envolvidos no MDE; Diferenciar os conceitos dificuldade e transtorno
de aprendizagem; Descrever quais são os
transtornos de aprendizagem segundo o
DSM-IV(Manual diagnóstico e estatístico
de transtornos mentais); Descrever outros
transtornos envolvidos no MDE: Transtorno de déficit de atenção/hiperatividade
e Transtorno de desenvolvimento de coordenação. O presente estudo trata-se
de uma pesquisa descritiva, com levantamento bibliográfico em bases de dados
científicos: SCIELO, LILACS, DEDALUS. Utilizamos como descritores: mau desempenho escolar; transtorno de aprendizagem;
transtorno de déficit de atenção/hiperatividade; dificuldade de aprendizagem O
MDE depende de diferentes fatores: os fatores extrínsecos (ambientais), como: características da escola (físicas, pedagógicas, qualificação do professor), da família
(nível de escolaridade dos pais, presença
dos pais e interação dos pais com escola
e deveres); e, os fatores intrínsecos, ou
seja, o próprio indivíduo. Os termos dificuldades e transtorno de aprendizagem
têm gerado muitas controvérsias entre os
profissionais, tanto da área da educação
quanto da saúde. Isto porque, há uma
sintomatologia muito ampla, com diver-
sidade de fatores etiológicos, quando se
considera o aprendizado da leitura, escrita e matemática. Entretanto, é necessária
uma adequação nestas terminologias a
fim de possibilitar uma homogeneização
quando estes casos são discutidos pelos
profissionais das áreas afins. O DSM-IV
classifica o transtorno de aprendizagem
(TA) e o define como a situação na qual
os “resultados do indivíduo em testes padronizados e individualmente administrados de leitura, matemática ou expressão
escrita estão substancialmente abaixo do
esperado para sua idade, escolarização
e nível de inteligência. Os problemas de
aprendizagem interferem significativamente no rendimento escolar e nas atividades de vida diária que exigem habilidades de leitura, matemática ou escrita.” O
mesmo manual de diagnóstico divide os
transtornos de aprendizagem em: Transtorno da Leitura (dislexia); Transtorno
da Matemática (discalculia); Transtorno da Expressão Escrita; Transtorno da
Aprendizagem Sem Outra Especificação.
A dislexia é um distúrbio de linguagem,
de origem constitucional, caracterizado
pela dificuldade em decodificar palavras
simples. Mostra uma insuficiência no processo fonológico, sendo que essas dificuldades em decodificar palavras simples
não são esperadas para a idade. Apesar
da instrução convencional, adequada inteligência, oportunidade sociocultural e
ausência de distúrbios cognitivos e sensoriais fundamentais, a criança falha no
processo de aquisição da linguagem com
frequência, apresentando problemas na
leitura, na aquisição de novas palavras e
na capacidade de soletrar. No transtorno
da matemática (ou discalculia), a capacidade matemática, individualmente testada, encontra-se abaixo do esperado para
195
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
idade cronológica. Corresponde a 6% dos
Tas e ocorre igualmente em ambos os
gêneros. Algumas situações específicas
podem associar-se a ela como: epilepsia,
Síndrome de Turner, TDA/H, síndrome alcoólica fetal, fenilcetonúria tratada, entre
outros. No transtorno da expressão escrita, a disgrafia e disortografia, individualmente testadas, apresentam-se acentuadamente abaixo do esperado para idade
cronológica. Corresponde a 8% a 15% dos
TAs e compromete todas as áreas acadêmicas. Pode ser resultado de alterações
motoras, de percepção espacial, de linguagem, além de memória e atenção. Já,
o transtorno da Aprendizagem Sem Outra
Especificação envolve, de acordo com
o DSM-IV, os transtornos da aprendizagem que não satisfazem os critérios para
qualquer Transtorno da Aprendizagem
específico, podendo incluir problemas em
todas as três áreas (leitura, matemática,
expressão escrita) que, juntos, interferem
significativamente no rendimento escolar.
Para o diagnóstico do Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH)
é necessário que o profissional tenha
experiência clínica significativa, conhecimento teórico e, muita reflexão. As escolas, a cada dia que passa se envolvem em
uma tendência de explicar o MDE de seus
alunos pela presença do TDAH e muitas
vezes este diagnóstico realizado na escola
pode estar equivocado. O Transtorno do
Desenvolvimento da Coordenação (TDC)
que ocorre quando há atraso no desenvolvimento de habilidades motoras ou
dificuldades para coordenar os movimentos sem causas neurológicas ou sensoriais
identificadas, também causam prejuízos,
contribuindo para o MDE. Infelizmente,
no decorrer do processo ensino-aprendizagem, esbarramos com alguns proble196
mas que podem atrasar ou comprometer
todo um trabalho educacional, uma vez
que a educação não tem apenas histórico de sucessos e aprovações. Muitas vezes, a criança em idade escolar, por estar
apresentando um MDE é discriminada e
até emocionalmente agredida por professores, pais e pelos próprios colegas da
escola. Porém, o MDE pode estar completamente ligado ao ambiente em que
ela está inserida, sendo assim uma dificuldade de aprendizagem ao invés de um
transtorno. Cabem a nós, pais, professores, orientadores e educadores em geral,
termos a sensibilidade de enxergar em
nossos alunos quando algo não vai bem
e encaminhá-los a uma equipe multidisciplinar para que este seja acompanhado
de perto e diagnosticado de maneira correta, a fim de obter um bom rendimento.
É de fundamental importância analisar a
qualidade das mediações estabelecidas
em diferentes contextos sociais (como a
família e a escola), considerando que o
esfacelamento das relações entre os indivíduos se tornou uma característica da
pós-modernidade, na qual se verifica o
surgimento de verdadeiras epidemias de
desordens de aprendizagem.
Palavras-chave: mau desempenho escolar;
transtorno de aprendizagem; transtorno
de Déficit de Atenção e Hiperatividade;
dificuldade de aprendizagem.
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
LT04-751 - O BRINCAR FAVORECENDO O
DESENVOLVIMENTO E O APRENDIZADO
DA CRIANÇA PEQUENA NA ESCOLA
Tuana Porto Lima Cordeiro - UFPB
Andréia Dutra Escarião - UFPB
[email protected]
Financiamento: PROLICEN
Introdução: Este projeto surge da necessidade em avançar os estudos na área da
educação infantil, pensando a formação
do professor numa perspectiva que atenda a necessidade da criança pequena na
escola. Não há como pensar numa escola que favoreça o desenvolvimento e o
aprendizado da criança, sem relacionar
esses aspectos à brincadeira, a uma prática pedagógica que objetive o aprender
brincando. A questão da formação docente para a educação infantil está longe de
constituir-se em uma questão resolvida no
cenário educacional brasileiro. É preciso
destacar que historicamente temos avanços e recuos, tanto no plano teórico, quanto no plano da prática, a questão envolve
debates, por perpassar distintas concepções da prática educativa e por constituir-se numa atividade que envolve um alto
grau de complexidade para a sua realização. Ainda se constitui um grande desafio para a educação infantil consolidar-se
enquanto etapa de fundamental importância na educação básica. Infelizmente é
comum, educadores demonstrarem falta
de conhecimento acerca dos fundamentos da educação infantil e das técnicas que
podem ser utilizadas como meio de favorecer o desenvolvimento integral da criança, sendo a brincadeira uma delas. Ligadas
a esta problemática, emergem algumas
questões cujas respostas seriam indicadoras da possibilidade da formação incidir
positivamente na melhoria da prática pe-
dagógica na escola e capaz de repercutir
na qualidade da educação infantil: como
os estudantes da UFPB, vêem a importância da brincadeira como meio de favorecer o desenvolvimento e a aprendizagem
da criança pequena? Quais os limites e as
contribuições da formação acadêmica na
ressignificação da identidade dos docentes da educação infantil? Quais as dificuldades encontradas pelos professores em
compreender de fato o objetivo pedagógico das brincadeiras utilizadas na escola
infantil? Estas se constituem nas principais
questões de estudo, cujo aprofundamento a ser realizado, em fase subseqüente,
permitirá perceber a existência ou não de
mecanismos articuladores da prática na
formação no cotidiano das práticas pedagógicas dos professores, com vistas à melhoria da Educação infantil. Sabemos que
a criança traz consigo um conjunto de características que se expressam, sobremaneira, no campo educacional, ou seja, traz
para escola aspectos emocionais próprios,
apresentam comportamentos, valores,
interesses e dificuldades, aprendizados e
cultura decorrentes de sua vivência social
e familiar. A partir desta realidade, faz-se
necessário embasar teoricamente os estudos sobre a criança da educação infantil. Evidentemente, esta pesquisa deverá
analisar o seu objeto tendo como marco
referencial o contexto que essas crianças
estão inseridas, e as políticas voltadas
para educação infantil. Analisar como a
brincadeira pode favorecer os processos
de desenvolvimento e de aprendizagem
da criança pequena na escola; Identificar
as concepções teóricas sobre a criança pequena e a educação infantil; Identificar as
contribuições da brincadeira como ação
pedagógica lúdica no desenvolvimento integral da criança pequena; Verificar se os
197
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
professores da educação infantil fazem a
relação entre a brincadeira e o desenvolvimento e o aprendizado da criança pequena na escola; Desenvolver atividades lúdicas que favoreçam o desenvolvimento integral da criança pequena em articulação
com os professores. Nossa pesquisa é de
natureza etnográfica em razão desta abordagem metodológica permitir aos pesquisadores uma vivência direta na realidade
onde se insere a pesquisa. A pesquisa
abrangerá o docente que se encontra em
pleno exercício de suas atividades docentes na etapa da educação infantil na Escola
de Educação Básica do Centro de Educação da Universidade Federal da Paraíba. A
esse estudo, caracterizado com pesquisa
e intervenção, interessa observar como
a brincadeira vem sendo trabalhada na
etapa de educação infantil, assim como
pretende contribuir com a elaboração de
propostas de atividades lúdicas que possam ser inseridas no processo de planejamento dos professores que trabalham
com crianças pequenas na escola nas suas
práticas docentes. O projeto atende direta
e indiretamente os professores que trabalham com a Educação Infantil e às crianças
pequenas matriculadas na escola, lócus
da pesquisa. A metodologia prioriza a parceria, o trabalho coletivo facilitado pelo
exercício do diálogo e da avaliação permanente para retroalimentar o projeto, corrigido o que for necessário em busca da
consecução dos seus objetivos. O trabalho
de pesquisa está sendo realizado coletivamente por meio de reuniões de estudo,
seminários, debates, produção de textos e
atividades junto às crianças contando com
a participação dos professores da escola.
A pesquisa encontra-se em andamento.
Espera-se que esse estudo favoreça uma
ampla reflexão da produção de práticas
198
educativas em prol da melhoria da educação infantil, tanto no plano da formação
dos sujeitos envolvidos, quanto no plano
das escolas do sistema público de ensino.
Portanto, argumentamos a necessidade
da sua viabilidade em razão da relevância do estudo, ressaltando a importância
de refletir criticamente sobre o brincar na
educação infantil como forma de favorecer o desenvolvimento e o aprendizado da
criança pequena na escola, assim como, a
possibilidade de revisão das práticas pedagógicas dos professores da educação
infantil como forma de garantir uma melhoria na qualidade da educação atendendo às reais necessidades e expectativas da
criança pequena na escola.
Palavras–chave: Educação Infantil. Prática
Pedagógica. Brincadeira.
LT04-884 - A EDUCAÇÃO DE ESCOLARES
COM BAIXA VISÃO: PERCEPÇÕES DOS
PRÓPRIOS SUJEITOS.
Marília Costa Câmara Ferroni - UNICAMP
[email protected]
Maria Elisabete Rodrigues Freire Gasparetto
- UNICAMP
[email protected]
Nos dias atuais, a inclusão é uma questão
central em todos os ambientes em que
vivemos: famílias, escolas, mercado de
trabalho, espaços de lazer e todas as situações da vida do ser humano (Amiralian,
2009). Educar os escolares com baixa visão é favorecer-lhes condições para que
desenvolvam suas possibilidades naturais
e possam contribuir com seu trabalho
para uma comunidade à qual tenham o
sentimento de pertença (Masini, 2007).
Considera-se baixa visão quando o valor
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
da acuidade visual corrigida no melhor
olho é menor que 20/60 e igual ou maior
que 20/400, ou o campo de visão seja menor que 20 graus com a melhor correção
óptica. A baixa visão subdivide-se em três
categorias: perda visual moderada, em
que o indivíduo apresenta acuidade visual < 20/60 e ≥ 20/200; perda visual grave
< 20/200 e ≥ 20/400; e cegueira Legal <
20/400 e ≥ 20/1200 (OMS, 2003). Para
melhorar o desempenho visual de escolares com baixa visão, é recomendada a utilização dos recursos de Tecnologia Assistiva, uma área do conhecimento de característica interdisciplinar que engloba produtos, recursos, metodologias, estratégias,
práticas e serviços que objetivam maior
funcionalidade, autonomia, independência, qualidade de vida e inclusão social da
pessoa com deficiência (Gasparetto et al.,
2009). Qualquer recurso que potencialize
o funcionamento visual do indivíduo com
baixa visão, em suas atividades diárias, é
caracterizado como recurso de Tecnologia
Assistiva e pode ser classificado em recursos óptico, não óptico, eletrônico e de
informática. Em pesquisa sobre a percepção de diretores do sistema público sobre
a inclusão educacional, verificou-se que
faltavam recursos de tecnologia assistiva
e materiais pedagógicos destinados ao
uso do escolar com deficiência visual (Janial & Manzini, 1999). Quando se trata da
educação de escolares com necessidades
especiais, questões relacionadas à interação social se tornam ainda mais importantes, por possuírem algumas limitações
quanto às possibilidades de locomoção e
exploração de objetos. Freqüentemente,
são considerados incapazes de executar
certas atividades, participar, decidir por
si mesmos, contribuir nas atividades em
grupo e em brincadeiras livres, havendo
subestimação de suas potencialidades e
capacidades (Bezerra & Pagliuca, 2007).
Esses escolares são, muitas vezes, isolados do contato com parceiros e têm interações restritas à relação com o adulto
limitando, assim, suas experiências fora
da família. Esse isolamento pode ocorrer
nas relações parentais, com a vizinhança, escolares e em caráter terapêutico,
embora a interação constitua importante
elemento da vida social do escolar, pois,
promove um contexto propício ao desenvolvimento de suas competências sociais.
A relação com os pares também é um elemento importante a ser considerado no
processo de construção, desenvolvimento
e transformação do indivíduo, da cultura
e da sociedade (Souza & Batista, 2008).
As necessidades visuais de cada pessoa
variam de acordo com cada fase e momentos de sua vida, em atividades escolares, de lazer, de vida diária, do trabalho
ou na vida adulta e, para o bom desempenho dessas pessoas, se faz necessária
a parceria entre a área da saúde, escola,
família e ensino especializado (Carvalho
et al., 2005). Os profissionais que atuam
na educação, habilitação e reabilitação de
escolares com baixa visão necessitam conhecer esta população, para uma melhor
elaboração de programas de habilitação
e/ou reabilitação visual, que propiciem
desenvolvimento, transmissão de conhecimentos de acordo com as necessidades
de cada um, transformação em novos saberes, aprendizagem e preparo para a inclusão social. A presente pesquisa tem por
objetivos: conhecer a percepção de escolares com baixa visão em relação às suas
dificuldades visuais; investigar suas opiniões sobre a comunidade escolar; verificar
o uso de recursos de tecnologia assistiva
nas atividades cotidianas. Realizou-se um
199
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
levantamento descritivo, tipo transversal.
A coleta de dados foi realizada no período
de janeiro a agosto de 2010, com aplicação de um questionário semiestruturado
a escolares com baixa visão, observações
e leitura de prontuários. Para elaborar o
instrumento e adequá-lo à realidade estudada, realizou-se um estudo exploratório, com a finalidade de descobrir novos
enfoques, conhecimentos, vocabulários
e percepções dos escolares com baixa
visão em relação ao tema estudado. A
população foi composta por 19 escolares
na faixa etária entre 12 e 17 anos, com
baixa visão congênita (94,7%) ou adquirida (5,3%), regularmente matriculados no
Ensino Fundamental II (63,2%) ou no Ensino Médio (36,8%) e que freqüentavam
os serviços de Habilitação e ou Reabilitação Visual nos municípios de Campinas
ou em Ribeirão Preto. Destes, 52,6% eram
do sexo feminino e 47,4% do sexo masculino; verificou-se que os dados do Censo
Demográfico de 2000 apresentaram maior
prevalência de pessoas com deficiência
visual do sexo feminino. De acordo com
a classificação de baixa visão, 79,0% dos
escolares entrevistados apresentam baixa
visão moderada; 15,7%, cegueira Legal e
5,3%, grave. Verificou-se que 94,7% declararam ter dificuldades visuais na escola, destacando-se as dificuldades para
enxergar a lousa (33,3%), ler dicionário
(22,2%) e realizar leitura de livros (16,7%).
Em relação à autopercepção das dificuldades visuais, verificaram-se: dificuldades
acadêmicas, pegar ônibus, andar a noite e
assistir televisão. Enfatizando as relações
com a comunidade escolar, a maioria dos
alunos possui bom relacionamento com
professores (79,0%) e 68,4% indicaram
possuir boa relação colaborativa com os
colegas de classe, pois, os mesmos ditam
200
a matéria. Embora a maioria dos entrevistados (52,4%) tenha relatado não possuir
relacionamento com a direção, coordenação e outros funcionários da escola, esses
profissionais fazem parte da comunidade
escolar e deveriam ajudar os escolares
em relação à orientação, estimulação e
integração, já que são responsáveis pela
inclusão educacional, de modo a favorecer a aprendizagem, a independência e a
autonomia dos escolares com baixa visão
(Bezerra & Pagliuca, 2007). Sobre o uso
de recursos de Tecnologia Assistiva, prevaleceram os recursos de informática, no
qual 76,7% dos respondentes declararam
fazer uso de recurso específico para baixa visão. É imperativo que uma atenção
maior seja dada à educação de escolares
com baixa visão, pois, as maiores dificuldades enfrentadas são do âmbito acadêmico. Acredita-se que uma das formas de
minimizar ou sanar as dificuldades é com
o preparo da comunidade escolar, por
meio de palestras, reuniões com profissionais especializados, leituras de textos
informáticos, exibição de vídeos e estudos
nos HTPC (hora de trabalho pedagógico
coletivo). Outra ferramenta importante é
a utilização de Recurso de Tecnologia Assistiva, destacando o uso da informática,
um recurso importantíssimo a ser explorado pelos alunos com deficiência visual,
pois, pode auxiliar no desenvolvimento da
programação e conteúdo escolar, proporcionando melhor desempenho visual na
leitura de livros e dicionários disponíveis
na internet.
Palavras-chave: educação, inclusão,
deficiência visual
Contato: Marília Costa Câmara Ferroni,
CEPRE- FCM- UNICAMP, marilia_ferroni@
hotmail.com
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
LT04-995 - APRENDIZAGEM EM
CRIANÇAS AUTISTAS: DUAS VISÕES
Ana Karina C. R. de-Farias
[email protected]
Ângela Suzana Rodrigues Guimarães - UniCEUB
[email protected]
Alyne Farias Moreira - UniCEUB
[email protected]
Isabele Raiana de Mendonça Rangel - UniCEUB
[email protected]
Thaís Polônio Ribeirinho - UniCEUB
[email protected]
O autismo é classificado como um dos
Transtornos Globais do Desenvolvimento, segundo o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, o DSM-IV-TR (Associação Americana de Psicologia,
APA, 2002). Dentre os critérios diagnósticos, estão falta de reciprocidade nas interações sociais, comportamentos estereotipados, limitação nas atividades e interesses, assim como falhas na aquisição e/
ou na emissão de algum comportamento
verbo-gestual ou vocal (Martins, 2010).
Para o sucesso na aprendizagem de autistas, é importante que o professor acredite na capacidade de aprender desses
alunos. Essa interpretação da realidade
determinará as práticas e comportamentos do professor e o investimento por ele
creditado aos alunos (Abric, 1998). Dessa
forma, esse estudo se propôs a investigar
as crenças e práticas de duas professoras
que lidam com crianças autistas por meio
de dois estudos de caso, sendo que uma
delas trabalha com ensino especial e a
outra com ensino inclusivo. O instrumento escolhido para a coleta de dados foi
uma entrevista semiestruturada, dentro
de uma perspectiva qualitativa de produção de conhecimento, com itens como,
por exemplo: “Como você definiria o au-
tismo?”, “Qual é o papel de um professor
que trabalha com autistas?” e “Quais são
as dificuldades de aprendizagem de um
aluno autista?”. Notou-se que a professora do ensino especial ocupa esse cargo
por vontade própria, por causa de eventos da sua vida pessoal; apresenta uma
visão interacionista da aprendizagem,
apropriando-se do papel de mediadora;
recusa o papel de cuidadora; e assume
a responsabilidade pelas dificuldades de
aprendizagem em sala de aula. Já a professora do ensino inclusivo acredita que
o professor tem a função de transmitir o
conhecimento; reconhece a necessidade
de assumir o papel de cuidadora; enfatiza
as dificuldades de aprendizagem próprias
de alunos autistas; e busca a aprendizagem formal. Ambas acreditam na importância da escola para a melhora do
espectro autista. Sabe-se que visões interacionistas da aprendizagem consideram
o desenvolvimento como advindo das relações entre o indivíduo e seu meio. Dessa forma, essa interação seria uma base
propícia a mudanças (Baum, 1994/2006;
Vigotsky, 1998). Portanto, compartilhando de uma visão interacionista da aprendizagem, a professora do ensino especial
parece propensa a acreditar na possibilidade de desenvolvimento das crianças
autistas. Também, por seu maior interesse na execução de sua função e por
ter investido mais em sua formação, a
professora do ensino especial mostra-se,
atualmente, melhor preparada para lidar
com alunos autistas.
Palavras-chave: Autismo infantil, Ensino
especial, Ensino inclusivo
Contato: Thais Polonio Ribeirinho, UniCEUB,
[email protected]
201
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
LT04-1039 - ESTRATÉGIAS DE ENSINO
APRENDIZAGEM PARA O DEFICIENTE
INTELECTUAL
Cristiane Alves Cardoso - UAB/UnB
[email protected]
Patrícia Cristina Campos Ramos - UnB
[email protected]
Andrea Moreira Couto Fournier - UAB/UnB
[email protected]
Financiamento: CNPq
É na escola que os direitos dos Alunos
com Necessidades Educacionais Especiais
(ANEEs) são garantidos. Por esse motivo,
a instituição escolar desempenha papel
importantíssimo no processo inclusivo
do aluno, já que é através dela que este
poderá obter novos conhecimentos e consolidar aqueles adquiridos em outros contextos de seu convívio social. Influenciada
por diretrizes internacionais, a educação
inclusiva brasileira está ampliando seus
horizontes, e vem conquistando espaço
na legislação do país, que tem demonstrado crescente preocupação em integrar ao
meio os grupos historicamente excluídos
em função de classe, etnia, idade, gênero,
deficiência entre outros. Garantir a qualidade de ensino educacional a cada um de
seus alunos, reconhecendo e respeitando
sua diversidade, é uma das características
do sucesso de uma escola inclusiva. Atualmente, existem avanços significativos
ao que se refere à educação especial e,
mais propriamente para o nosso foco de
interesse, a Deficiência Intelectual (D.I.).
A D.I. afeta uma parcela significativa das
pessoas na população em geral e, também, das crianças em idade escolar. Essa
deficiência ainda não é suficientemente
compreendida e, por isso, constitui objeto de investigação de inúmeras áreas de
202
conhecimentos. A DI se caracteriza por
registrar um funcionamento intelectual considerado por alguns autores como
significativamente inferior à média, impossibilitando o indivíduo de responder,
conforme se espera, às demandas da sociedade. Tendo em vista as questões destacadas até aqui, o objetivo geral desta
pesquisa foi o de buscar compreender o
processo de ensino-aprendizagem de uma
criança diagnosticada com D.I.; e como
objetivos específicos: conhecer as causas
e conseqüências da D.I e verificar o desenvolvimento da criança com D.I em relação
ao processo de ensino-aprendizagem durante o 2º semestre de 2010. A metodologia empregada buscou alcançar resultados
qualitativos, através do acompanhamento
da vida acadêmica e sócio-cultural de um
aluno com deficiência intelectual, matriculado no 4º ano do Ensino Fundamental
em turma regular de uma escola pública do DF, em que a pesquisadora atuava
como professora regente. A instituição de
ensino fundamental escolhida como fonte de pesquisa para este estudo possuía
44 turmas em 2010, ano em que foi desenvolvido o estudo. Além do aluno com
diagnóstico de D.I, participaram do estudo
a mãe do aluno e a professora da sala de
recursos. Para a construção das informações junto aos participantes foram utilizados alguns materiais, como livros, artigos, roteiro de entrevistas, câmera digital,
computador. Para iniciar a construção de
informações, foi pedida autorização para
a instituição escolar e, após consentimento, deu-se início ao processo de esclarecimentos relevantes ao trabalho. As
informações necessárias foram obtidas na
própria instituição escolar, pela pesquisadora. Os envolvidos no processo da construção destas informações preencheram
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
e assinaram o Termo de Consentimento
Livre Esclarecido para início das atividades
de pesquisa. O familiar responsável pelo
aluno também autorizou a participação
da criança na pesquisa, após conversa em
reunião com a professora pesquisadora,
que lhes garantiu o sigilo das informações
e seu uso apenas para fins de pesquisa. Ao
serem informados sobre o processo, tanto
o responsável quanto o aluno demonstraram satisfação em serem escolhidos para
tal, e seus nomes não foram divulgados,
sendo ambos referenciados apenas por
nomes fictícios. Para descrever o aluno e
o seu processo de aprendizagem foram
utilizadas todas as informações a que tivemos acesso na instituição escolar, como:
relatórios de apoio ao docente, relatórios
psicopedagógicos, relatório médico e relatório de desempenho escolar. Foram retiradas, desses documentos, informações
consideradas relevantes para a construção
desta pesquisa. Os resultados alcançados
demonstraram que o acompanhamento
diferenciado e adequado às especificidades e necessidades do aluno contribuiu,
significativa e positivamente, para o processo de ensino-aprendizagem. Analisando o histórico da vida escolar do aluno nas
escolas pelas quais passou, percebemos
que na primeira escola o aluno não teve
muito progresso e a mãe esteve ausente.
Na segunda escola, com a troca de professor, o aluno apresentou melhorias significativas em seu rendimento escolar. Segundo relatório, naquele período, o aluno
aprendeu a ler, embora tenha continuado
com dificuldades na resolução de operações matemáticas; a ausência da mãe foi
um ponto mencionado mais uma vez pela
equipe escolar. Na terceira escola a mãe
também se mostrou ausente e as atividades desenvolvidas com o aluno tinham
por objetivo buscar sua autonomia na realização das atividades. Contraditoriamente, analisando a entrevista com a mãe,
observou-se, por parte dela, uma grande
preocupação de que seu filho aprendesse os conteúdos curriculares; além disto,
que se sentia incomodada pelo fato de o
filho brincar com crianças de idade inferior à dele, além de acreditar que a escola
já atendia suas necessidades. O diário de
campo e o portfólio, confeccionados com
o objetivo de verificar o desenvolvimento cognitivo do aluno, traziam atividades
realizadas com o intuito de atingir os objetivos da adequação curricular. Nele, o
aluno apresentou avanço significativo na
realização de suas produções; organizou
as ideias e conseguiu transmitir seus pensamentos. O conhecimento adquirido foi
expresso através de ilustrações. A percepção do aluno sobre os conteúdos ministrados, no entanto, foram representados da
forma com que ele conseguia interpretar
os fatos, sendo que, na maioria das atividades, foi necessária a intervenção da
professora. Conclui-se, então, que o aluno
participante desta pesquisa, diagnosticado com deficiência intelectual, conseguiu
manter um bom desenvolvimento educacional, provavelmente, porque a prática
educativa esteve direcionada às suas particularidades, já que sabemos que cada
indivíduo tem o seu tempo para aquisição de novos conhecimentos e aprimoramento dos antigos. O direcionamento
das atividades facilitou o aprendizado do
aluno e, através dos resultados obtidos,
foi possível notar que o atendimento individualizado, a adequação das atividades e
a participação dos colegas como monitores contribuíram para que o aluno se desenvolvesse e se sentisse incluído naquela
instituição. A conclusão que chegamos,
203
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
inspirados em Vigotski, é que o olhar do
educador deve estar sempre voltado para
as potencialidades do educando e nunca,
como corriqueiramente ocorre, para as
suas deficiências e limitações.
Palavras-chave: Deficiência intelectual,
Ensino-aprendizagem, Inclusão Escolar
Contato: Cristiane Alves Cardoso, UAB/UnB,
[email protected]
LT04-1043 - CONTRIBUIÇÕES DA
PSICOLOGIA PARA A EDUCAÇÃO EM
SAÚDE DE ADOLESCENTES EM UM
SERVIÇO DE SAÚDE
Etiene Oliveira Silva Macedo - UnB
[email protected]
Maria Inês Gandolfo Conceição - UnB
[email protected]
Financiamento: CNPq
O presente trabalho visa apresentar as
contribuições da inserção da Psicologia
nas atividades voltadas à educação para a
promoção da saúde de adolescentes atendidos no serviço público de saúde. Trata-se dos resultados parciais de pesquisa desenvolvida pela 1ª autora, sob orientação
da 2ª, para obtenção do título de mestre,
cuja dissertação se encontra em andamento. Tomou-se como referência a realização
de grupos temáticos, desenvolvidos dentro de um Programa de Atenção Integral
à Saúde do Adolescente. Essas atividades
tiveram duração de 3 meses, organizadas
em 12 sessões estruturadas a partir do
referencial metodológico do sociodrama
(Nery, Costa & Conceição, 2006) e tiveram
como objetivo, propiciar aos participantes
da pesquisa, por meio de jogos e dramatizações, a vivência sócio-afetiva sobre
seu momento no processo de desenvol204
vimento humano, enquanto sujeitos em
transformação, inseridos num contexto
de relações e condições historicamente
constituídas. Participou dessa pesquisa
um total de 26 adolescentes, organizados
em dois grupos, com 14 e 12 participantes, respectivamente, organizados por faixa etária (10 a 14 anos e 15 a 19 anos).
Selecionaram-se os temas desenvolvidos
durante as vivências nos grupos, a partir
das diretrizes nacionais para a atenção integral à saúde de adolescentes e jovens,
na promoção, proteção e recuperação
da saúde, do Ministério da Saúde (Brasil,
2010), os quais incluíram: direitos sexuais
e direitos reprodutivos, projeto de vida e
cultura de paz. Além disso, também foram
abordados temas considerados importantes pelos participantes, diretamente relacionados aos anteriores, como processos
identitários e relações familiares. A relevância desse trabalho está na contribuição teórico-metodológica que a Psicologia
pode oferecer a partir da inserção nos
espaços públicos que atendem essa população. Desde a década de 1970, os psicólogos têm participado do Sistema Único
de Saúde, sobretudo na atenção terciária,
a partir da Psicologia Hospitalar. Relatos e
pesquisas sobre a inserção do psicólogo
na atenção primária estão ainda em construção, devido ao pouco tempo de inserção do profissional nesse espaço (Boing,
Crepaldi & Moré, 2010). Especificamente
em relação à promoção da saúde integral
de adolescentes, observa-se que esses
relatos são escassos. Dentre as contribuições alcançadas por esse estudo, pode-se
destacar o fortalecimento da atuação da
psicologia em contextos não-clínicos, mas,
essencialmente, terapêuticos. Nessa perspectiva, tem-se a expansão da concepção
de fato clínico: fatos sociais e psicológicos
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
se complementam ou se suplementam
em torno do objeto estudado, o que exige
intervenções terapêuticas cada vez mais
criativas (Nery & Costa, 2008). Outra contribuição é a aproximação da Psicologia
com a Saúde, o que requer um posicionamento ético-político junto ao seu objeto
de estudo. Para se compreender o sujeito
em sua integralidade é preciso reconhecer
sua inserção num espaço histórico e cultural. No presente estudo, a adolescência
é concebida como um momento no processo de desenvolvimento humano, cuja
transição é multifacetada, mediada por relações que se dão num contexto sociohistoricamente constituído. De acordo com
Vygotsky (1996), o adolescente só pode
ser compreendido a partir de relações que
são objetivadas na cultura: adolescentes
de contextos diferentes vão se desenvolver também com especificidades diferenciadas. Logo, essa transição não pode ser
tomada como um “a priori”. Do contrário,
corre-se o risco dessa transitoriedade legitimar o caráter de invisibilidade desses
sujeitos, como o vir a ser, o inacabado que
almeja a vida adulta. Em relação à promoção da saúde, buscou-se o entendimento
da saúde em sua concepção mais ampliada, com dimensões e causalidades múltiplas (Brasil, 2010). Além de contribuir
para o desenvolvimento psicossocial dos
adolescentes participantes, essa pesquisa
discute também a prática da Psicologia no
Sistema Único de Saúde, pois comparece
como um fazer transversal, inseparável
dos princípios norteadores dessa política, na busca de uma saúde possível aos
participantes, neste caso, os adolescentes
atendidos, considerando seus múltiplos
contextos de inserção (Santos, Quintanilha & Dalbello-Araújo, 2010). Discutem-se
também como as ações e práticas podem
convergir para possibilitar aos participantes a realização de escolhas possíveis em
prol da saúde; ações que busquem a autonomia e a saída coletiva para problemas
que também são vividos na coletividade.
Palavras-chave: Adolescência, Psicologia,
Sistema Único de Saúde
Contato: Etiene Oliveira Silva de Macedo, UnB,
[email protected]
LT04-1048 - VALIDADE DO ZULLIGER
NA AVALIAÇÃO DA COMPETÊNCIA
INTERPESSOAL
Jucelaine Bier Di Domenico Grazziotin
[email protected]
Silvana Alba Scortegagna - UPF/RS
[email protected]
A avaliação psicológica é uma prática frequente no contexto organizacional, pois
possibilita melhor compreensão das habilidades do indivíduo, do seu funcionamento psicológico e, ainda, dos aspectos
preditivos do desenvolvimento de seu
comportamento. Atualmente, as habilidades de competência interpessoal nesse âmbito, passaram a ser um requisito
imprescindível em todos os níveis ocupacionais, desde aquele que atende à comunidade externa à empresa como aos
clientes e ao público em geral, até aqueles
que convivem diariamente com o público
interno, no mesmo setor e intersetores.
Assim, a competência interpessoal é a
habilidade de lidar eficazmente com as relações interpessoais, de lidar com outras
pessoas de forma adequada às necessidades de cada uma e às exigências da situação. Perceber de forma acurada uma
situação e suas variáveis permite que o
sujeito desempenhe melhor o seu traba205
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
lho, tanto na dimensão técnica requerida
pela natureza dessa atividade quanto na
de ser capaz de se posicionar de forma habilidosa na rede de relações interpessoais,
interna e externa, no local de trabalho. A
competência interpessoal é revelada nas
relações estabelecidas entre indivíduo-indivíduo e indivíduo-grupo, englobando assim atitudes individuais e coletivas, sendo
estas jamais indissociáveis. Desse modo,
para avaliar o desenvolvimento e a aquisição da competência interpessoal é necessário a utilização de instrumentos válidos,
que reúnam um conjunto de evidências
que assegurem a sua relevância, a sua
utilidade nos usos propostos e nas interpretações geradas. É nesse contexto, que
o teste Zulliger no Sistema Compreensivo
ZSC se insere, especialmente por integrar
diversos aspectos da personalidade, com
base tanto nos preceitos da psicometria,
como nos da projeção e por possibilitar
uma investigação mais completa do universo psíquico do examinando, tão solicitada no campo empresarial. Assim sendo,
o objetivo deste estudo foi verificar as evidências de validade do Zulliger no Sistema
Compreensivo ZSC, focalizando a variável
relacionamento, a saber: SumT (sombreado textura); Fd (comida ou ação de
comer); H (humano inteiro), Hd (detalhe
humano),(H) (para-humano inteiro), (Hd)
(detalhe para-humano); GHR (boa representação humana) e PHR (representação
humana pobre); a (movimento ativo) e p
(movimento passivo); (isolamento); PER
(resposta personalizada); AG (movimento
agressivo); COP (movimento cooperativo) que, por hipótese, estariam correlacionadas com os fatores de Habilidade
IHS: F1) autoafirmação e enfrentamento
com risco; F2) autoafirmação na expressão de afeto positivo; F3) conversação e
206
desenvoltura social; F4) autoexposição a
desconhecidos e situações novas; F5) autocontrole da agressividade em situações
aversivas. Participaram dezenove sujeitos,
entre 18 e 43 anos de idade, média 27,5
anos (DP=8,83), dez (53%) do gênero feminino e nove (47%) do gênero masculino, quinze (78,94%) com ensino médio
completo e quatro (21,05%) ensino médio incompleto. Todos exerciam atividades de atendimento direto ao cliente em
uma loja de uma rede de supermercados.
Destes, sete (36,84%) na função de operadores e frente de caixa; sete (36,84%)
como atendentes de perecíveis e cinco
(26,31%) no cargo de atendentes de loja.
Os participantes responderam ao ZSC seguido pelo IHS, de forma individual em
uma única sessão. Nos resultados, em relação ao ZSC, apenas as variáveis SumT e
Isolamento oscilaram entre os parâmetros
normativos. Também os fatores do IHS,
mantiveram-se nos índices normativos.
Os resultados, além disso, demonstraram
que os indicadores GHR, GPHR, pure H,
Sum H, que informam sobre o bom relacionamento e percepção interpessoal
adequada, correlacionaram-se positiva e
significativamente com fatores GIHS, F3 e
F1 do IHS. A variável COP, apesar de não
ter apresentado índices significativos de
correlação com o IHS, apontou aspectos
positivos qualitativamente, manteve-se
na média normativa e em comparação à
AG, mostrou-se superior. As variáveis AG,
PHR, SumT, que podem informar sobre o
relacionamento e a percepção interpessoal prejudicados, correlacionaram-se negativa e significativamente com os fatores
GIHS e F5 do IHS. Portanto, sendo a idéia
principal desse estudo, verificar as evidências de validade do ZSC em correlação com
os fatores do IHS, que teoricamente ava-
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
liam construtos similares, relacionamento
e habilidade social, a correspondência dos
resultados obtidos entre os instrumentos,
forneceu uma importante contribuição
para a sua legitimidade. Por fim, mesmo
sendo um estudo de caráter preliminar, os
resultados contribuíram para afirmar a validade do Zulliger na avaliação psicológica
da competência interpessoal no contexto
organizacional.
Palavras-chave: competência interpessoal,
Zulliger no Sistema Compreensivo, evidência
de validade.
LT04-1193 - A INCLUSÃO NO PROGRAMA
DE EDUCAÇÃO PRECOCE NO DISTRITO
FEDERAL: DIFERENTES MOMENTOS
Andrea Moreira Couto Fournier - UnB
[email protected]
Patrícia Cristina Campos Ramos - UnB
[email protected]
Cristiane Alves Cardoso - UnB
[email protected]
O desenvolvimento da criança tem sido
estudado, ao longo do tempo, sob diferentes enfoques. Para a teoria da maturação biológica, por exemplo, o desenvolvimento ocorre de forma natural e tem
uma raiz endógena; a teoria ambientalista, por sua vez, preconiza que o conhecimento vem da experiência do indivíduo;
já de acordo com a abordagem construtivista, a aprendizagem ocorre com a
interação sujeito-ambiente, enquanto
teóricos da abordagem histórico-cultural
apontam o papel da cultura, da sociedade e da história como essenciais para o
desenvolvimento individual. Assim, cada
criança é singular no modo de aprender e
desenvolver-se, e podemos compreender
o desenvolvimento como decorrente do
fluxo de interações entre características
estruturais da pessoa e diferentes contextos dos quais ela participa. Entre estes
contextos, a escola é uma instituição social que faz parte do processo de desenvolvimento do indivíduo, com a função
de ampliar as capacidades interpessoais/
intrapessoais, de pensar, planejar, memorizar, o que não se diferencia no âmbito
da inclusão de crianças com necessidades educacionais especiais. Portanto, o
objetivo geral desta pesquisa foi traçar
um paralelo entre o funcionamento do
Programa de Educação Precoce no DF, em
dois diferentes momentos e contextos: o
atendimento no Centro de Ensino Especial e o atendimento em uma escola de
ensino regular de educação infantil. Os
objetivos específicos deste estudo foram:
observar as diferenças e semelhanças
entre estas duas realidades e identificar,
com base nos depoimentos e opinião
dos participantes, os fatores que atuam
como facilitadores ou dificultadores no
processo de inclusão da criança. Trata-se de uma pesquisa qualitativa, da qual
participaram professores, coordenador e
pais integrantes do Programa de Educação Precoce em realidades distintas, que
tratam do funcionamento do Programa
de Educação Precoce em Centros de Ensino Especial e em Centros de Educação
Infantil. Os participantes deste estudo foram: uma professora educadora física, a
coordenadora do Programa (ambas já trabalharam nas duas realidades citadas), a
gestora da escola de educação infantil e o
pai de uma criança que também frequentou o Programa em ambos os contextos.
A referida criança atualmente integra o 2º
período da Educação Infantil, na mesma
unidade de ensino em que já participou
207
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
do Programa de Educação Precoce, também tendo participado do mesmo Programa em Centro de Ensino Especial. A
condição definida para esta participação
foi que todos estivessem envolvidos com
o programa, direta ou indiretamente. As
entrevistas foram realizadas por meio de
procedimentos similares e pautadas por
referenciais teóricos e pressupostos metodológicos comuns. Os três instrumentos foram idealizados para entrevistas
semiestruturadas, sendo que o primeiro
era destinado ao gestor da instituição que
já atuava na escola antes do Programa de
Educação Precoce se iniciar lá. O segundo
instrumento era aplicado em professores
e coordenador do Programa. O terceiro,
destinado à entrevista com a família da
criança. Buscamos, com isto, valorizar o
ambiente natural, bem como o significado que as pessoas participantes deram
e dão à inclusão e à educação. O estudo
foi realizado em uma escola de Educação
Infantil localizada em uma Região Administrativa de Brasília, no Distrito Federal.
As entrevistas foram transcritas em sua
integridade e foram considerados temas
recorrentes para a definição das categorias utilizadas para análise. Os entrevistados trouxeram, em suas verbalizações, a
importância do processo de inclusão e aspectos que favorecem o desenvolvimento
infantil dentro da escola comum, além disto, salientaram a importância da presença
de outras crianças no processo de desenvolvimento das crianças em situação de
necessidade especial, como referências
uma para as outras. Segundo eles, esse
processo é uma via de mão dupla, pois as
crianças (com ou sem necessidades especiais) aprendem com as diferenças. Ainda
para os participantes, é importante que
este processo ocorra o mais cedo possí208
vel, por que o preconceito ainda não está
cristalizado, e as crianças que convivem
com a diferença na escola tendem a ser
mais compreensivas com a diversidade. A
criança em situação de necessidade especial, inserida na escola desde cedo e que
faz parte do alunado, aos poucos vai conquistando seu espaço, interagindo com
funcionários e outras crianças, com os
próprios colegas em sala de aula e participando das atividades coletivas da escola.
Outro aspecto trazido nas entrevistas foi
o impacto na percepção dos pais ao levarem seus filhos para serem atendidos no
Programa de Educação Precoce e se depararem com crianças, jovens e adultos nos
Centros de Ensino Especial que apresentam um desenvolvimento muito aquém
do esperado, podendo comprometer a
frequência da criança no Programa devido ao preconceito, o que pode levar a
própria criança a não se desenvolver de
forma adequada. Outro aspecto trazido
nas entrevistas foi relativo à dificuldade
no processo de inclusão como as barreiras arquitetônicas, falta de monitor, respeito à estratégia de matrícula, a qualificação profissional, a resistência e a aceitação do profissional com a criança com
necessidades especiais. Apesar de tudo,
foi relatado que com o Programa em funcionamento na escola comum os professores estão mais sensíveis ao processo de
inclusão. Também é reconhecida, pelos
participantes deste estudo, a importância do Programa para o desenvolvimento
das crianças com necessidades especiais
e sua futura inclusão na rede pública de
ensino regular. Os trabalhos desenvolvidos nos Programas de Educação Precoce,
tanto nos Centros quanto em escolas regulares, objetivam a inclusão. No entanto,
através dos relatos, foi possível concluir
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
que, além do Programa ser particularmente benéfico para o desenvolvimento
infantil, o funcionamento do mesmo em
escolas regulares é mais favorável para o
processo de inclusão. É consenso entre os
participantes a importância do Programa
de Educação Precoce inserido em escola
regular, devido a vários processos positivos inerentes a este modo de inclusão.
No futuro, políticas institucionais podem
ser implementadas, de forma a contribuir
ainda mais para o processo de inclusão,
já que esta população de 0 a 3 anos não
é amplamente atendida, ainda, no Brasil.
Palavras-chave: Centro de Educação Infantil,
Centro de Ensino Especial, Educação Precoce.
Contato: Andréa Moreira Couto Fournier,
UnB, [email protected].
LT04-1253 - FORMAÇÃO CONTINUADA:
UM ESPAÇO PARA REFLEXÃO EM
EDUCAÇÃO INFANTIL
Caroline Andrea Pöttker - UEM
[email protected]
Este artigo se originou do relatório de estágio na área de Psicologia Escolar, que
ocorreu durante um ano, foi realizado
num Centro de Educação Infantil, localizado em um município de Santa Catarina. Para se referir ao local de estágio
será usado o nome fantasia, C.E.I. Algodão Doce. A educação infantil sempre
mostrou-se necessária, mesmo que suas
finalidades e objetivos mudassem com
o tempo para atender as solicitações de
uma sociedade em transformação. Ela
exige um ambiente que encoraje e apóie
as expressões de sentimentos, interesses
e valores pelas crianças e isso só será possível se o professor assegura-se de que
as experiências de aprendizagem sejam
apresentadas às crianças de uma forma
adequada a seu nível de pensamento. É
imprescindível que o professor da educação infantil tenha uma formação específica para trabalhar com seus alunos. O
objetivo dessas formações continuadas
é auxiliar as professoras a problematizarem as atividades realizadas por elas na
escola, para que possam refletir, ter consciência do fim a atingir e assumir o papel
de mediadoras entre os alunos e as atividades desenvolvidas na escola e na sociedade. Para tanto, a formação continuada
deve ser concebida como um trabalho de
reflexibilidade crítica sobre as práticas e
de construção permanente de uma identidade pessoal e profissional em interação
mútua. Com essa premissa, esse trabalho
teve como objetivo propiciar um espaço de reflexão e conscientização sobre a
prática pedagógica de cada professora e
transmitir conhecimentos gerais da Educação Infantil, para as Agentes de Educação Infantil, visando um melhor desenvolvimento das suas atividades pedagógicas.
Participaram do estudo 10 agentes de
educação infantil e 6 professoras. Para
isso utilizou-se de encontros quinzenais
com o grupo das Agentes, e encontros
grupais, mensalmente, e individuais, semanalmente, com as professoras. Com as
agentes de educação infantil foram realizados 4 encontros, onde priorizou-se os
seguintes temas: abordagens em aprendizagem (Tradicional e Integradora), as
funções de uma Instituição de Educação
Infantil: cuidar e educar, desenvolvimento
infantil e o brincar. Desse modo, na realização do primeiro encontro com as agentes de educação infantil foram abordadas
as diferenças entre duas abordagens da
Aprendizagem: a Tradicional e a Integra209
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
dora. Viu-se como essencial proporcionar
às agentes um momento de reflexão e
conhecimento sobre as diferenças entre
a Tradicional e a Integradora, bem como,
a relevância de se ter clareza dos conceitos de cada abordagem e seguir conscientemente uma teoria escolhida. Pois,
segundo Almeida (2002), ao oportunizar-se uma formação de qualidade aos profissionais de Educação Infantil, estaremos
subsidiando-lhes na construção de suas
práticas, proporcionando-lhes consciência das opções teórico-práticas que fazem
e, assim, podendo oportunizar que se libertem das amarras impostas pelas inseguranças originárias do desconhecimento
de seu objeto de trabalho – a infância.
No segundo encontro foram trabalhados os objetivos da Educação Infantil: o
cuidar e educar. O cuidado e a educação
são indissociáveis, pois a instituição deve
promover práticas de educação e cuidados, que possibilitem a integração entre
os aspectos físicos, emocionais, afetivos,
cognitivos/lingüísticos e sociais da criança, entendendo que ela é um ser completo e indivisível. Já no terceiro encontro o tema proposto para discussão foi o
desenvolvimento infantil. Darezzo (2004)
afirma que algumas informações sobre o
desenvolvimento infantil, as fases que caracterizam seu desenvolvimento em termos de habilidades, limites e descobertas, ajudam muito o adulto nas decisões
frente a problemas que surgem no dia a
dia. Portanto, pode-se dizer que o conhecimento sobre o desenvolvimento infantil
permite realizar aconselhamento de pais
e formação de programas educacionais
mais eficazes. Por último, no quarto encontro, foram levados para o debate três
conceitos da educação infantil: o brincar,
a brincadeira e o brinquedo. Sylva e Lunt
210
(1994) postulam que a brincadeira parece
ser importante para diversos aspectos do
desenvolvimento, e essas vivências lúdicas são necessárias para que a criança se
desenvolva normalmente. Como as agentes estão constantemente em contato
com as crianças, principalmente nos momentos das brincadeiras, é imprescindível
que elas compreendam a importância do
momento lúdico para o desenvolvimento da criança e, com isso, possam proporcionar-lhes um ambiente agradável e
criativo. Na atividade com as professoras
foram realizados encontros grupais e individuais. O encontro grupal foi realizado
mensalmente no turno vespertino, com
grupo fixo, na sala dos professores. Para
a realização do primeiro encontro foi
abordado as diferenças entre duas abordagens em Aprendizagem: a Tradicional e
a Integradora. Já para os demais encontros os temas foram definidos tendo-se
como base os encontros individuais com
as professoras. Os encontros individuais
foram realizados semanalmente, tanto no
período da manhã como no da tarde, com
duração de aproximadamente uma hora,
sendo que os horários dos encontros foram combinados com as próprias professoras. Tanto com os encontros individuais
e grupais pode-se perceber a abertura
das professoras para novos conhecimentos e discussão das dificuldades enfrentadas em sala de aula, foi discutido sobre
a construção de propostas pedagógicas
e curriculares, que espelhe as conquistas
e saberes já existentes nestas práticas, e
também sejam capaz de vislumbrar encaminhamentos futuros. O trabalho do
professor de educação infantil exige a
mobilização de muitos conhecimentos
para cuidar e educar as crianças, interagir
com as famílias e lidar com as exigências
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
institucionais. Diante disso, Nóvoa (1995)
aponta que um modelo construtivo de
formação continuada para professores
parte da reflexão interativa e contextualizada, articulando teoria e prática. E neste
processo formativo, centrado na profissão
e na vida da escola, que se entende, deva
residir o foco de origem e de retorno da
formação continuada fundamentada nos
princípios da reflexão crítica compartilhada. Formação esta que, longe de constituir uma formulação acabada, se apresenta como uma categoria da formação
docente. Após a realização das atividades
percebeu-se que as professoras e agentes
refletiram sobre suas práticas profissionais e, com isso, modificaram algumas de
suas formas de atuações. Como no caso,
as funcionárias relatam terem dificuldades na disponibilidade (falta) de tempo
para a realização das atividades programadas para o dia, após a intervenção passaram a se reorganizarem e desenvolver
as atividades.
Palavras-chave: Educação Infantil, Formação
Continuada, Professores
LT04-1269 - A PERCEPÇÃO DE
AUTOEFICÁCIA EM ALUNOS COM
DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM
Fernanda Elis Matte - FACCAT
Paula Grazziotin Silveira Rava - FACCAT
[email protected]
A percepção que o indivíduo tem sobre
a sua capacidade para desempenhar determinada tarefa é conceituada como
autoeficácia. Estas percepções acompanham o sujeito, podendo ter influências
positivas ou negativas sobre o seu desempenho real. Pode-se afirmar que a
autoeficácia compreende um julgamento
pessoal de capacidade relativa a um domínio específico e não necessariamente
representando a real capacidade de um
indivíduo, mas o que o mesmo acredita
ser capaz de realizar, em uma variedade
de circunstâncias (Souza; Brito, 2008).
A autoeficácia é conceituada entre dois
componentes: a expectativa de eficácia e
a expectativa de resultado. A expectativa
de eficácia corresponde, então, à crença
individual de capacidade ou a falta dela
para a realização de uma tarefa específica. Já a expectativa de resultado é a crença de que determinado comportamento
leva a um resultado (Hall; Lindzey; Campbell, 2000). Alguns fatores exercem um
papel na origem e no desenvolvimento
destas crenças: experiências, realizações
e desempenhos anteriores, experiência
vicariante, persuasão social e estados fisiológicos e afetivos (Souza; Brito, 2008).
As crenças de autoeficácia podem influenciar como as pessoas sentem, pensam, se motivam e se comportam. Tais
consequências são provocadas através
de quatro processos principais: processos
cognitivos, relacionados à antecipação do
resultado dos próprios comportamentos,
processos motivacionais, afetando variáveis como esforço e tempo que uma
pessoa emprega em uma determinada
atividade, processos afetivos, relacionados às reações emocionais dos indivíduos, quando experimentam atividades que
julgam difíceis e os processos de seleção,
já que as pessoas escolhem realizar as atividades que pensam ter um desempenho
eficiente (Souza; Brito, 2008). As dificuldades de aprendizagem correspondem a
uma falta de habilidade específica, como
na leitura, na escrita ou na matemática,
em crianças que apresentam um rendi211
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
mento bem abaixo do esperado para seu
nível de desenvolvimento, escolaridade e
capacidade intelectual. O transtorno de
aprendizagem pode ser suspeitado em
um aluno que apresente uma inteligência
normal, habilidades motoras e sensoriais
de acordo com o esperado, bom ajuste
emocional e um nível socioeconômico e
cultural mínimo (Rotta; Ohweiler; Riesgo,
2006). As dificuldades de aprendizagem
são de difícil solução já que são de causa multifatorial. Dell’Agli, Caetano e Castanho (2009) sugerem que a chave para
estudarmos uma solução estaria em unir
os aspectos cognitivos aos afetivos, pois,
segundo elas, não podem ser avaliados
separadamente. A afetividade pode acelerar ou retardar a aprendizagem, pois é
considerada o combustível, a motivação
para aprender, sendo a inteligência, a
estrutura, a organização. Portanto, para
aprender o sujeito necessita de uma estrutura de inteligência, mas ainda de
um motor que a impulsione, sendo esta
a afetividade (Dell’agli; Caetano; Castanho, 2009). Outros estudos também têm
apontado a relação entre afetividade e
inteligência. Alunos que apresentam um
alto senso de autoeficácia são capazes de
realizar atividades utilizando mais estratégias cognitivas e metacognitivas, persistindo por mais tempo do que os alunos
com baixa percepção de autoeficácia
(Medeiros et al. 2003). Já os alunos que
apresentam um rendimento escolar fraco
e atribuem isso à incompetência pessoal
distanciam-se das atividades intelectuais,
demonstrando problemas emocionais e
comportamentos internalizados (Roeser;
Eccles, 2000 apud stevanato et al. 2003).
Quando os estudantes pensam serem
capazes de realizar a tarefa, vivenciam o
momento como prazeroso e interessante,
212
ao passo que, em situações aversivas, em
que consideram não ter capacidade para
desenvolver as atividades, não apresentam gosto, nem real interesse, apenas realizam-nas, pois lhe é solicitado (Dell’agli;
Caetano; Castanho, 2009). Quando um
estudante experimenta situações de dificuldades de aprendizagem, o sentimento
é de fracasso, pois, por não obter êxito
nas atividades escolares, sente-se incapaz, gerando sentimentos de frustração
e comportamentos disfuncionais, entre
outros (Carneiro; Martinelli; Sisto, 2003).
A criança que apresenta dificuldades de
aprendizagem, então, encontra-se diante
de um problema de circularidade causal,
quando sua baixa crença de autoeficácia
a deixa menos motivada e atenta às atividades acadêmicas, gerando de fato um
mau desempenho e, assim, confirmando
sua ideia de que não é capaz. Há uma forte relação entre o desenvolvimento intelectual e as crenças autorreferenciadas.
Apenas ter habilidades cognitivas, portanto não explica um sucesso ou fracasso
escolar. Assim, profissionais da educação
precisam buscar desenvolver, além dos
conteúdos de cada disciplina, autopercepções de capacidade positivas (Souza;
Brito, 2008). Este estudo buscou avaliar a
percepção de autoeficácia de alunos com
dificuldades de aprendizagem e de alunos
sem dificuldades de aprendizagem. Para
tanto, utilizou-se o Roteiro para a avaliação da autoeficácia (Medeiros; Loureiro,1999 apud Medeiros et al., 2000) em
38 alunos, sendo 19 alunos com dificuldades de aprendizagem e 19 alunos sem dificuldades de aprendizagem. Objetivou-se
investigar se há relação entre a percepção
de autoeficácia e dificuldades de aprendizagem, através da comparação entre
os dois grupos de alunos. Encontrou-se
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
diferença significativa entre os dois grupos, sendo que os alunos com dificuldades de aprendizagem apresentaram uma
percepção de autoeficácia mais baixa que
os alunos sem dificuldades de aprendizagem. Diante dos resultados apresentados,
percebe-se que, alunos que experimentam situações de dificuldades de aprendizagem, sentem-se muitas vezes fracassados. Carneiro, Martinelli e Sisto (2003)
afirmam que, por não obterem êxito nas
atividades escolares, alunos com dificuldades de aprendizagem sentem-se incapazes, gerando sentimentos de frustração
e comportamentos disfuncionais, entre
outros. Portanto, como sugerem as mesmas autoras, estes alunos apresentam
um problema de circularidade causal, em
que a baixa percepção de autoeficácia os
deixa menos motivados, gerando um real
mau desempenho e, então, confirmando
sua ideia de incapacidade no âmbito escolar. Dentre a amostra analisada, o teste
de Mann Whitney apontou não existir diferença significativa entre a variável sexo
e a percepção de autoeficácia (P=0,928),
refutando a hipótese de que os alunos do
sexo masculino apresentam uma percepção de autoeficácia mais baixa. Entretanto, o grupo de alunos com dificuldades
de aprendizagem foi constituído, em sua
maioria, pelo sexo masculino (79%), demonstrando que a maioria dos estudantes, com dificuldades de aprendizagem,
nesta escola e nos anos pesquisados, é do
sexo masculino.
Palavras-chave: autoeficácia, dificuldades de
aprendizagem, crianças.
Contato: Paula Rava, FACCAT,
[email protected]
LT04-1280 - A INFÂNCIA
CONTEMPORÂNEA NA PERSPECTIVA
DOS PROFESSORES
Dayane Aparecida do Nascimento - UFMT
[email protected]
Raquel Gonçalves Salgado - UFMT
[email protected]
Financiamento: FAPEMAT e CNPq
As discussões sobre a temática da infância constituem um campo inesgotável de
informações e descobertas. Por isso, ao
nos depararmos com cenas em que as
crianças aparecem como protagonistas de
experiências que atestam saberes e competências nas suas relações íntimas com
as tecnologias e a cultura do mundo contemporâneo, é inevitável que se produza
um estado de perplexidade e dúvida com
relação aos nossos saberes sobre a infância. Diante desse fato, surge a necessidade
de considerar o tema da infância contemporânea como um campo para a configuração de outros mapeamentos e imagens,
dada a diversidade de experiências, valores e conhecimentos que as crianças têm
construído. Por outro lado, há de se considerar os adultos, principalmente aqueles que assumem a tarefa de educar, na
alteridade que seus saberes, experiências,
valores e concepções revelam ao se depararem e se relacionarem com a infância
vivida pelas crianças hoje. Diante dessa
dupla tarefa, a pesquisa em questão busca compreender a infância contemporânea no diálogo entre gerações. No sentido
de problematizar a idéia da criança como
ser inacabado, em estado transitório para
a vida adulta, situamos o escopo teórico
desta pesquisa no campo da Sociologia da
Infância, que se propõe a interrogar a sociedade a partir de uma perspectiva que
213
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
considera as crianças como eixo da investigação sociológica, com vistas não apenas à produção de conhecimento sobre a
infância, mas sobretudo à compreensão
da sociedade em seu conjunto (Sarmento, 2005). Nesta pesquisa, constituem-se como parâmetros de análise tanto os
discursos dos adultos (professores) sobre
a infância vivida pelas crianças hoje (seus
alunos) quanto os discursos das próprias
crianças sobre as experiências que revelam e assumem como legítimas de suas infâncias. Trata-se, portanto, de analisar as
tensões entre os modos como os adultos
atribuem sentidos à infância vivida pelas
crianças nos dias atuais e os modos como
elas próprias definem as experiências que
marcam seu tempo de vida. Nesse diálogo
de temporalidades e valores, destacam-se
os discursos que historicamente atravessam o conceito de infância e se materializam em valores para os adultos e aqueles que se apresentam como referências
simbólicas às crianças para a constituição
de experiências próprias de seu tempo de
vida. Este estudo, em particular, como um
dos subprojetos da pesquisa abordada,
enfatiza as experiências da infância contemporânea sob a ótica dos professores.
Seus objetivos consistem em analisar os
sentidos que os professores atribuem às
suas experiências de infância e àquelas
vividas pelas crianças hoje e compreender, nas interlocuções entre professores e
crianças, os contrapontos em relação aos
sentidos que atribuem à infância. Além
disso, busca-se delimitar como eixo teórico-metodológico a alteridade presente
nessa produção discursiva, uma vez que a
criança se apresenta como o outro situado no passado do adulto (Bakhtin, 1992).
Trata-se de uma pesquisa-intervenção, em
que as relações estabelecidas entre os su214
jeitos que dela participam e o pesquisador
se definem ao mesmo tempo como objeto de investigação, à medida que se tem
como foco a produção discursiva que se
processa nesse contexto, e como postura metodológica, haja vista a intervenção
que se efetiva na deflagração dessa produção discursiva. Nessa dupla dimensão da
pesquisa, os sujeitos que dela participam
não são apenas informantes de dados a
serem traduzidos pelo texto analítico do
pesquisador, posto que constroem conhecimentos e refletem sobre suas próprias
concepções, valores e práticas. Para que
as relações entre as crianças e os professores não sejam capturadas pelas amarras
institucionais da escola, o locus da pesquisa é o Laboratório Especial de Ludicidade
(Brinquedoteca) do Campus de Rondonópolis da Universidade Federal de Mato
Grosso. Trata-se de um Laboratório que
funciona, desde 2008, como um programa
de extensão e tem oferecido atendimento
a instituições de Educação Infantil da rede
pública municipal de Rondonópolis, situadas nas imediações do Campus. Como
as turmas de crianças que frequentam a
Brinquedoteca estão sempre acompanhadas por seus professores, é válido afirmar
que esse espaço oferece condições favoráveis para que ambos os sujeitos possam
compartilhar suas experiências, tendo
como mediação o brincar. Atualmente,
a Brinquedoteca tem atendido três instituições com o perfil acima descrito. Os
sujeitos participantes desta pesquisa são:
as crianças, de 5 a 6 anos, de três turmas
do 2º agrupamento da Educação Infantil,
sendo duas de uma escola e uma de outra;
e os professores responsáveis por essas
turmas. Como estratégia metodológica,
temos a realização de grupos de discussão com as crianças e os professores, or-
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
ganizados sob a forma de oficinas, como
forma de suscitar debates sobre questões
relacionadas à infância contemporânea.
Entendemos que, desse modo, seja possível que todos, à sua maneira, inclusive
o pesquisador, participem do processo
de construção de sentidos (Castro, 2008).
Outro importante recurso metodológico
é a realização de entrevistas semiestruturadas com as professoras sobre as suas
experiências de infância e os modos como
significam as experiências de infância vividas pelas crianças com quem atuam.
Salientamos, nessas entrevistas, o entrecruzamento dos valores relativos à infância, constituídos a partir das experiências
que marcaram a infância das professoras,
com os sentidos que estas atribuem à infância vivida pelas crianças hoje – como se
apresentam, seus saberes, suas práticas e
suas relações com os adultos. Nesse diálogo de temporalidades e gerações, temos
observado, nos discursos das professoras,
um estado de perplexidade, com tom saudosista, diante da quebra de uma imagem
tradicional da infância – subordinada ao
adulto e inocente – devido à constatação
de experiências e saberes manifestos pelas crianças hoje muito mais avançadas e
complexas do que os de outras gerações
e, por isso, considerados como fora de seu
tempo.
Palavras-chave: infância contemporânea,
relações intergeracionais, professores.
Contato: Dayane Aparecida do Nascimento,
UFMT/Rondonópolis, [email protected]
LT04-1340 - O QUE PENSAM OS AGENTE
AUXILIAR SOBRE SUAS CRECHES
Ana Carolina Monnerat Fioravanti - PUC/Rio
[email protected]
Amanda Cristina de Freitas Souza - NEIPE/
UERJ
[email protected]
Daniele Vieira de Azevedo - NEIPE/UERJ
[email protected]
Vera Maria Ramos de Vasconcellos - PROPED
- NEIPE/UERJ
[email protected]
Este trabalho apresenta alguns dados referentes aos questionários de “Avaliação das
Creches” preenchidos pelos Agente Auxiliar, que atuam em cinco creches municipais do Rio de Janeiro e que fazem parte da
pesquisa Agente Auxiliar de Creche: Educadores da Infância Carioca. Em 2007 houve um concurso público para esta função
(Edital nº1 de 04/08/2007), que desconsiderou as premissas da LDB 9394/96 e não
exigiu nem mesmo o ensino médio na modalidade normal para trabalhar na educação infantil. Apesar de protestos contra a
efetivação do mesmo, a partir de junho de
2008, foram oferecidas 1.519 vagas regulares, e 81 para pessoas com deficiência e, a
partir de então, o quadro de pessoal das
creches públicas passou a contar com novos profissionais, marcando uma nova trajetória na história dessas instituições.
Frente à nova realidade, sentimos necessidade de investigar quem eram estes profissionais e o que intencionavam ao fazer um
concurso público. Assim surgiu através do
Núcleo de Estudos da Infância: Pesquisa &
Extensão (NEI:P&E) e na Linha de Pesquisa
Infância, Juventude e Educação do Programa de Pós-Graduação em Educação, da
Universidade do Estado do Rio de Janeiro
(ProPEd/UERJ) a pesquisa que tem por ob215
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
jetivo acompanhar e analisar, junto com os
educadores a trajetória de formação em
serviço dos mesmos e suas concepções sobre criança, infância, educação e creche.
Realizamos a partir de 2009, um trabalho
conjunto com os educadores das cinco creches e a Universidade. Dentre outras ações
propostas, desenvolvemos encontros coletivos de formação continuada para os novos profissionais em setembro, outubro,
novembro de 2009 e outubro 2010. Neste
trabalho apresentaremos parte dos resultados desses encontros e de práticas reflexivas realizadas em cada creche. O objetivo
desta apresentação é aumentar o foco, via
um olhar mais sistemático às respostas das
práticas das educadores das 5 creche situadas na 1ª e na 3ª CRE do Rio de Janeiro. A
observação do dia-a-dia e as respostas das
crianças no cotidiano da instituição são
trazidas pelas co-pesquisadoras para o lócus universitário, através de sessões reflexivas que acontecem de 15 em 15 dias no
(NEI:P&E – UERJ). O outro olhar foi a resposta que os demais educadores deram
através do questionário, após dois anos da
pesquisa (2009 – 2010), que incluiu os
Centros de Estudos Coletivos, realizados
na UERJ. Foram 74 (setenta e quatro) educadores em 123 que devolveram o questionário respondido. São eles agentes auxiliares de creche, recreadoras e professoras
articuladoras, divididas em 22 (vinte e
duas) na primeira creche; 12 (doze) na segunda, 24 (vinte e quatro) na terceira, 12
(doze) na quarta e na quinta creche 9
(nove) educadores (dos 34 atuantes). O
questionário foi composto com perguntas
abertas e objetivas, para avaliar tanto
questões da prática como questões relacionadas a estrutura básica de funcionamento das unidades. São sete eixos principais: Planejamento institucional (regimen216
to interno, projeto político pedagógico e
centros de Estudos), divisão multiplicidade
de experiências e linguagens (desenvolvimento infantil, respeito a valores familiares, etc), dimensão e interações, saúde e
prevenção de agravos, materiais e mobiliários, formação e condições de trabalho e
cooperação e troca com as famílias. Uma
ANOVA nas questões objetivas em relação
ao escore total do questionário demonstrou que houve diferença significativa entre as cinco creches F( 72 ) = 11,224; p <
0,004. Tal diferença foi marcada principalmente pelas creches 3 e 4 por apresentarem menor média na avaliação total do inventário. Esse padrão de comportamento
se repetiu em muitas outras dimensões
avaliadas dentro do próprio questionário.
Dentro do eixo Planejamento Institucional,
foram analisadas as diferenças entre as
creches em 4 subescores. Através da ANOVA no subescore Regimento Interno (RI)-4
itens, encontramos diferença entre as creches F(72,1)= 8,414477; p<001 atribuída
as médias muito baixas das creches 1 e 2.
No subescore Proposta Pedagógica Consolidada (PP)- 21 itens, não foi encontrada
diferença significativa entre as creches
F(72)= 2,579672; p= 0,044939. No subescore Planejamento, Acompanhamento e
Avaliação (PAA)- 4 itens, encontramos diferença entre as medias F(72)=10,03138; p<
0,001, devido as baixas médias das creches
4 e 5 e no subescore Registro da Pratica
Educativa (RP)- 3 itens encontramos diferenças entre as medias F(72)= 35,69113,
p<0,001, devido a creche 1. Dentro do eixo
- Dimensão Multiplicidade de Experiências
e Linguagem foram analisadas diferenças
entre 3 subescores. No subescore Crianças
construindo sua autonomia e tendo experiências saudáveis com o próprio corpo
(AE)- 3 itens a ANOVA demonstrou diferen-
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
ça significativa F(72)= 11,61414; p<0,001
atribuída as baixas médias das creches 3 e
4, do mesmo modo, no subescore Crianças
relacionando-se com ambiente natural e
social (ANS)- 5 itens encontramos diferença significativa F (72)=8,833919; p<0,001,
também em função das creches 3 e 4. Já
no subescore Crianças expressando-se por
meio de diferentes linguagens plásticas,
simbólicas, musicais, teatrais, e corporais e
tendo experiências agradáveis variadas e
estimulantes com a linguagem oral e escrita (LOE)- 5 itens não foram apresentadas
diferenças entre as 5 creches analisadas
F(72)= 1,449122; p= 0,227418. Dentro do
eixo - Dimensão Interações, foram analisadas diferenças entre 2 subescores: Respeito a dignidade, às diferenças, das crianças
e estímulo a cooperação mútua (RD)- 3
itens onde a ANOVA encontrou diferença
entre as medias das creches F(72)=
3,283955; p<0,05 em função da media
muito baixa da creche 3 e Respeito a idéias
conquistas e produções das crianças (RCP)2 itens onde em função das baixas medias
das creches 3 e 4, também foi encontrada
diferença entre as médias F(72)=3,283955;
p<0,05. Dentro do eixo - Dimensão Promoção de saúde e prevenção de agravos, o
subescore Constituição de hábitos alimentares (HA)- 3 itens a ANOVA apresentou
diferença entre as médias das creches
F(72)=5,471698; p<0,005 em função de
baixas médias das creches 3 e 4 ao passo
que o subescore Avaliação de riscos, segurança e medidas de prevenção de acidentes (RSP) - 6 itens, não apresentou diferença entre as 5 creches estudadas F(72)=
2,09616 ; P=0,090814. Dentro do eixo - Dimensão Espaços materiais e mobiliários a
ANOVA demonstrou diferença significativa
no subescore Espaços, mobiliários e materiais que favorecem as experiências das
crianças (EM)- 3 itens F(72) = 9,36783;
P<0,005 em função das baixas médias dos
itens 3 e 5 e no subescore Espaços, mobiliários e materiais para responder aos interesses dos adultos (EMA) - 4 itens F(72) =
7,831102; P<0,005, em função das baixas
médias dos itens 2, 3 e 5. Dentro do eixo Dimensão formação e condições de trabalho das professoras, professores e demais
profissionais a ANOVA não demonstrou
diferença significativa no subescore Formação inicial (FIP) – 3 itens, F(72) =
2,091485, p= 0,09143, mas por outro lado,
em função da baixa média da creche 4,
houve uma diferença significativa entre as
creches no subescore Formação continuada e condições de trabalho adequada (FC)
– 4 itens, F(72)=9,492752; P<0,005. Dentro
do eixo Escore na Dimensão cooperação e
troca com as famílias e participação na
rede de proteção social, a ANOVA demonstrou diferença entre os grupos em função
das menores medias das creches 3 e 4 no
subescore Respeito e Acolhimento (RA) – 4
itens F(72)=7,760763; P<0,005. Assim
como também foi encontrada diferença no
subescore Garantia do direito das famílias
de acompanhar as vivencias e as questões
ligadas as crianças (DF) – 5 itens F(72) =
4,479957, p<0,005 atribuído a maior média da creche 1. No subescore Participação
da instituição na rede de proteção aos direitos da criança (DC) – 10 itens a diferença
entre os grupos foi atribuída as menores
medias das creches 4 e 5, F(72) = 7,092314;
p<0,005. Uma ANOVA nas Diferenças entre
os escores totais do questionário em relação as funções (Recreador e Auxiliar) não
demonstrou diferença significativa F(70) =
1,865164 p = 0,176465 Estes dois olhares
(respostas das co-pesquisadoras e avaliação quantitativa do questionário) nos demonstraram que houve uma dualidade de
217
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
respostas, entre as observações das co-pequisadoras, que levantam a questão da
discrepância entre a proposta da formação
continuada e o que acontece no dia-a-dia
das creches e as respostas dadas aos questionários pelas educadoras. Apesar das
respostas dos questionários e as observações das co-pesquisadoras não corresponderem, compreendemos que quando elas
nos informam questões distintas das que
ocorrem no cotidiano, estão demonstrando conhecimento de como deveria ocorrer. Externando pelo menos a intenção de
realizar melhor no futuro.
Palavras-chave: avaliação, creche, educadores
e formação continuada.
LT04-1348 - A INFÂNCIA NA PERSPECTIVA
DAS CRIANÇAS
Rayssa Karla Dourado Porto - UFMT
[email protected]
Rayany Mayara Dal Prá - UFMT
[email protected]
Raquel Gonçalves Salgado - UFMT
[email protected]
Financiamento: FAPEMAT
As experiências, os saberes e as competências que as crianças hoje revelam em
suas interações cotidianas com os meios
de comunicação, cada vez mais integrados
às novas tecnologias, têm feito com que os
nossos saberes sobre a infância, na maioria das vezes assentados como “verdades”,
sejam postos em xeque. Este trabalho consiste em um subprojeto de uma pesquisa
que busca compreender a infância contemporânea a partir do diálogo entre os
sentidos que crianças e adultos produzem
sobre esse fenômeno, ou seja, como esses
sujeitos, nas suas singularidades e situados
218
em tempos distintos, definem e significam
o que caracteriza a infância nos dias de
hoje. Ao recusar-se a conceber a infância
como tempo de vida em transição para a
vida adulta, esta pesquisa tem como fundamentação teórica os estudos realizados
no campo da Sociologia da Infância, que
busca compreender os fenômenos sociais
e culturais a partir da infância, admitindo
que a criança não apenas se apropria de
uma cultura que já encontra constituída,
mas nesta também opera transformações
ao interpretá-la e a partir dela produzir
práticas sociais (Sarmento, 2008). Nessa
perspectiva teórica, dois enfoques assumem relevância: por um lado, as crianças
são vistas como atores sociais em seus
mundos de vida e, por outro, a infância
se define como uma categoria geracional
socialmente constituída. Regida por esses
vieses teóricos, esta pesquisa busca compreender a infância na contemporaneidade numa perspectiva intergeracional, entendendo que os adultos em questão são
os professores, sujeitos que assumem a tarefa de educar as crianças, também participantes da pesquisa. Este subprojeto, em
particular, tem como foco as experiências
que as crianças constroem a partir dos diversos aparatos culturais que circulam na
cultura contemporânea, bem como os sentidos e os valores que atribuem a essas experiências. Busca-se, portanto, compreender como as crianças definem e significam
o que, para elas, é próprio da infância tal
como se apresenta hoje. Este estudo pretende problematizar as verdades e as autoimagens, como destaca Arroyo (2008),
do pensamento pedagógico ao se deparar
com as experiências concretas da infância,
marcadas pela época e pela cultura em
que são produzidas. Tem se tornado cada
vez mais insustentável a manutenção de
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
imagens e discursos sobre a infância, sobretudo aqueles que, produzidos no campo da psicologia do desenvolvimento, vão
ganhar corpo no pensamento e na prática
pedagógica, sem a confrontação com os
modos como as crianças concretas vivem
e significam suas próprias experiências. A
pesquisa, em sua abordagem metodológica, define-se como uma pesquisa-intervenção, na qual as relações estabelecidas
com as crianças são, ao mesmo tempo,
foco de análise e uma postura diante da
realidade investigada, posto que são instauradas situações desencadeadoras dos
discursos em torno do objeto em questão
– a infância. Desse modo, as crianças não
são apenas informantes de dados, mas se
apresentam como sujeitos que constroem
conhecimentos e refletem sobre suas próprias concepções, valores e experiências
no processo de pesquisa. O locus da pesquisa é o Laboratório Especial de Ludicidade (Brinquedoteca) do Campus de Rondonópolis da Universidade Federal de Mato
Grosso, que tem oferecido, desde 2008, na
condição de programa de extensão, atendimento a instituições de Educação Infantil
da rede pública municipal de Rondonópolis, Mato Grosso, situadas nas imediações
do Campus. Atualmente, participam da
Brinquedoteca três escolas municipais de
Educação Infantil, que atendem crianças
na faixa etária de 4 a 6 anos. Entretanto,
da pesquisa participam apenas três turmas
de 2º agrupamento, com crianças de 5 a
6 anos, sendo duas de uma escola e uma
de outra. Consistem em estratégias metodológicas a observação participante das
brincadeiras e das interações das crianças
no contexto da Brinquedoteca e a realização de oficinas, como espaços de discussão sobre questões como: o que significa
ser criança; o que é ou não próprio da
infância; o que uma criança pode ou não
saber/fazer. Busca-se, com esta pesquisa,
desconstruir, tanto teoricamente quanto
metodologicamente, a idéia de uma infância apartada da vida, das experiências e
das culturas produzidas pelas crianças, no
sentido de redimensioná-la como um tempo da vida humana cujo valor e significado
não se efetivam prospectivamente, mas se
configuram no próprio exercício de vivê-lo.
Assim, objetiva-se identificar nos discursos das crianças as experiências que elas
próprias assumem como legítimas de seu
tempo de vida. Nas oficinas desenvolvidas,
até então, observou-se que as crianças,
diante de figuras de objetos e imagens,
que, em grande parte, poderiam ser consideradas como próprias do universo adulto,
as definem, na maioria das vezes, como
pertencentes tanto à infância quanto à
vida adulta, quando instigadas a situá-las
como “coisas” de crianças, de adultos ou
dos dois. Estamos diante de um estreitamento das fronteiras entre esses mundos.
Cada vez mais, torna-se evidente a participação das crianças em situações sociais
antes não acessíveis a elas, construindo
experiências e conhecimentos não previsíveis em décadas passadas. Diante disto,
perguntamo-nos: que implicações éticas
e educativas esse novo mapeamento da
infância em sua relação com a vida adulta
nos traz? Como estabelecer, no campo da
educação, um diálogo entre as gerações
marcado pelo reconhecimento do outro,
ao mesmo tempo, como singular e legítimo? Estas são questões que mobilizam a
pesquisa que aqui se apresenta.
Palavras-chave: infância, contemporaneidade,
relações intergeracionais
Contato: Rayssa Karla Dourado Porto, UFMT/
Rondonópolis, [email protected]
219
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
LT04-1445 - CONCEPÇÕES DE
PROFESSORES SOBRE EDUCAÇÃO
INCLUSIVA: UM EXERCÍCIO DE
INVESTIGAÇÃO
Pedro Mar Rebello - UnB
Luísa Pereira Nishioka - UnB
Carolina Braga Cunha - UnB
Bruna Pedrosa Mundim - UnB
Lúcia Helena Cavasin Zabotto Pulino - UnB
[email protected]
O que é uma criança? O que é uma criança
com problema de desenvolvimento? Em
que aspectos estas crianças se diferem?
Será que deve haver um tratamento diferencial para crianças portadoras de necessidades especiais? Tais questionamentos
foram motivadores para este exercício de
investigação, que tem como objetivo conhecer a concepção dos professores sobre
as escolas inclusivas, e é de extrema importância para isso o pensar sobre o conceito
de crianças com problemas de desenvolvimento, já que é a partir desta concepção
que os professores vão trabalhar com tais
crianças. Para que os professores das escolas inclusivas possam trabalhar de forma
igualitária com os alunos, é preciso que
eles conheçam o processo de desenvolvimento de uma criança. Segundo Vygostsky
(1984), o desenvolvimento deve ser pensado em dois níveis: o nível de desenvolvimento real e o nível de desenvolvimento
potencial. No real, considera-se o que uma
pessoa já tenha alcançado e no potencial,
aquilo que se espera que ela alcance. A
zona de desenvolvimento proximal neste
contexto, sustenta o teórico, “é a distância
entre o nível de desenvolvimento real, que
se costuma determinar através da solução
independente de problemas, e o nível de
desenvolvimento potencial, determinado através da solução de problemas sob
220
orientação de um adulto ou em colaboração com companheiros mais capazes”. De
acordo com esse conceito, o autor defende
que o processo de ensino-aprendizagem
na escola deve ser construído na zona de
desenvolvimento proximal, tomando como
ponto de partida o nível de desenvolvimento real da criança - num dado momento e
com relação a um determinado conteúdo
a ser desenvolvido - e como ponto de chegada o nível de desenvolvimento potencial,
que são os objetivos estabelecidos pela
escola, supostamente adequados à faixa
etária e ao nível de conhecimentos e habilidades de cada grupo de crianças. Desta forma, uma criança com problemas de
desenvolvimento é vista como uma criança
cujo processo de desenvolvimento pode
ser marcado por uma especificidade, o que
não impede os processos mediacionais
que promovem a sua educação, da mesma
forma como ocorre com todas as outras
crianças. Vygotsky (1993) enfatiza que uma
condição de deficiência não impossibilita o
desenvolvimento da criança, e que a noção
de que um portador de deficiência se torna um cidadão incapaz é uma construção
social e que a própria criança pode se apropriar dessa ideia. Esta pesquisa foi realizada
como trabalho final da disciplina Psicologia
da Infância, ministrada para alunos do segundo semestre do curso de psicologia na
Universidade de Brasília. Utilizou-se metodologia qualitativa. Participaram deste
estudo duas professoras de diferentes escolas inclusivas, sendo que a entrevistada
1 lecionava em uma escola associativa de
educação infantil localizada em um bairro
nobre de Brasília (DF) e a entrevistada 2 lecionava em uma escola pública de ensino
fundamental localizada no município de
Duque de Caxias (RJ). As professoras foram
escolhidas por terem dado aula para crian-
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
ças com problemas de desenvolvimento
em contextos diferentes. Na entrevista, foi
utilizado um roteiro de questões orientadas para uma entrevista semiestruturada
contendo oito perguntas que focalizavam
as seguintes dimensões: concepção do que
é ser professor, ser criança, ser uma criança com problema de desenvolvimento, ser
professor de uma criança com problemas
de desenvolvimento e concepção sobre
escolas inclusivas. Por meio das entrevistas pode-se constatar que as professoras
partilhavam concepções semelhantes.
Ambas apresentaram a visão de criança
como um novo ser que chega ao mundo já
construído, como indivíduos que possuem
sua singularidade, individualidade e especificidades, de forma que as crianças com
problemas de desenvolvimento devem ser
consideradas crianças como outras quaisquer. Elas ressaltaram que o desenvolvimento não é linear e que cada criança tem
seu ritmo e seu caminho, de forma que
o professor possui a função de trabalhar
cada uma em sua individualidade. Segundo elas, o professor tem uma função mais
ampla do que a de passar conhecimentos;
enfatizam a importância de se ter uma relação de afetividade com os alunos e de
respeitar as diferenças que se apresentam.
Elas concordam também na importância
da integração de todos na sociedade e no
papel fundamental que escolas inclusivas
desempenham nesse âmbito, mas que, em
sua maioria, as escolas não são inclusivas,
pois não possuem condições para lidar
com a diversidade. As entrevistadas tiveram visões diferentes no que diz respeito à
necessidade de um preparo especializado
para professores que lidam com crianças
portadoras de necessidades especiais: a
professora 1 acredita que o preparo deve
vir naturalmente da convivência com as di-
ferenças e demonstrou preocupação com a
possibilidade de um preparo formal limitar
a visão dos profissionais às teorias aprendidas, cegando-os para as crianças reais com
quem estariam trabalhando, enquanto a
professora 2 afirmou que um preparo formal é essencial para um trabalho adequado com tais crianças. Além disso, a primeira
entrevistada enfatiza que as diferenças de
cada criança devem ser trabalhadas em
toda a turma de forma a evitar qualquer
segregação. A segunda entrevistada acrescenta que todos possuem problemas de
desenvolvimento, na medida em que todos
possuem desenvolvimentos distintos em
diferentes áreas e que ninguém nunca fica
pronto, acrescentando também que a relação dos alunos com os professores é dialética e que os professores estão constantemente aprendendo com seus alunos justificando uma relação menos hierarquizada
nas salas de aula. Conclui-se que a questão
da inclusão é mais complexa do que meramente o cumprimento de uma lei; é uma
questão de transformação do pensamento
das pessoas, pois inclusão não é apenas a
inserção da criança nas escolas regulares,
mas proporcionar a sua inclusão dentro do
contexto escolar. É necessário que o professor perceba a singularidade de cada criança a fim de adaptar as atividades escolares
para que esta possa participar juntamente
com as outras crianças. Dessa forma, ela
poderá desenvolver suas habilidades de
acordo com o seu ritmo de desenvolvimento, além de poder estabelecer contato com
um novo ambiente, diferente do que ela
está acostumada.
Palavras-chave: educação inclusiva; professor;
desenvolvimento
Contato: Pedro Mar Rebello, UnB, pedrom.
[email protected]
221
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
LT04-1469 - TDAH: UMA ANÁLISE
DA ESPECIFICIDADE DO TRABALHO
PEDAGÓGICO
Evanilda da Silva Correia - FACITEC
[email protected]
Helen Tatiana dos Santos Lima - FACITEC/SEEDF
[email protected]
Sabe-se que o Transtorno de Déficit de
Atenção e Hiperatividade (TDAH) interfere
diretamente na vida social e no desempenho acadêmico dos sujeitos nesta condição. Atualmente, a Associação Brasileira
de Déficit de Atenção (ABDA), chegou a
conclusão que o quadro é um transtorno
neurobiológico cerebral, que acompanha
vários indivíduos desde a infância até a
idade adulta, e que cerca de 3 a 5 % das
crianças em idade escolar sofrem desse
mal (Silva, 2003). Os sintomas do quadro podem variar a depender do tipo de
transtorno apresentado pelo sujeito que,
conforme o DSM IV (Silva, 2003), pode ser
predominante desatento, predominante
hiperativo ou combinado. Em ambos os
casos, tais sintomas podem comprometer
a vida social e escolar do sujeito. Assim, o
TDAH predominante desatento, de acordo
com Silva (2003), é aquele que apresenta
falta de atenção; está passivo de erros por
pequenos descuidos, tanto nas tarefas escolares como em outras; tem dificuldade
para concluir tarefas; evita atividades que
exigem esforços mentais e frequentemente
perde objetos pessoais. Rotta et al. (2006)
acredita que os alunos desatentos são os
mais prejudicados com relação ao aprendizado, uma vez que esse transtorno é o
que mais influi negativamente na dimensão cognitiva. O TDAH do tipo hiperativo,
segundo Silva (2003), é aquele que, com
frequência, mexe ou sacode pés e mãos, se
remexe nos acentos, se levanta da carteira,
222
é facilmente distraído por estímulos externos, tem dificuldades de esperar sua vez
em brincadeiras ou em situações de grupos, dispara respostas para perguntas que
ainda não foram completadas, tem dificuldades em seguir instruções e ordens e tem
dificuldades em manter a atenção em tarefas ou mesmo atividades lúdicas. Frequentemente, muda de uma atividade inacabada para outra, não conseguindo brincar em
silêncio ou tranquilamente e; na maioria
das vezes, fala em excesso. Já o TDAH do
tipo combinado, ainda conforme a autora,
é aquele que reúne, no mínimo, seis ou
mais sintomas de desatenção associados
a outros seis de hiperatividade e impulsividade. Silva (2003) afirma que a maioria
das crianças ou adolescentes que possuem
o transtorno, se enquadra nessa última categoria. Cabe ressaltar que a criança com
o transtorno, independente do tipo, pode
desenvolver normalmente sua capacidade
cognitiva. No entanto, Bee (2003) enfoca
que estas crianças podem ter uma baixa
autoestima caso não seja acompanhada
de forma diferenciada pelo professor no
que tange ao desempenho escolar. A autora defende que esta criança necessita de
uma interação sadia entre família, escola e
o meio onde vivem, para que o transtorno
não afete sua estrutura cognitiva, social e
cultural no futuro. Para tanto, Silva (2003)
alega que o trabalho pedagógico necessita
ser reorganizado para atender a especificidade dessa criança. Dorneles (2000) corrobora afirmando que estudantes com TDAH
necessitam de intervenções para que suas
dificuldades comportamentais e acadêmicas sejam amenizadas. Para isso, segundo o
autor, os professores precisam perceber as
áreas a serem trabalhadas com seus alunos
e, com a ajuda de psicólogos e psicopedagogos, descobrir as dificuldades e facilida-
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
des vividas pelos mesmos, afim de elaborar
um planejamento e um programa de intervenção acertada. O docente deve, também,
saber utilizar a comunicação assertiva; dar
ordens de modo cortês, mas com firmeza e
sempre olhar para a criança antes de emitir
uma frase ou advertência. Além disso, ele
deve ser democrático, compreensivo, amigo e empático. É importante, portanto, que
o professor desenvolva recursos de ensino
para descobrir o estilo de aprendizagem de
cada sujeito, de modo que possa favorecer
um desempenho escolar mais satisfatório. Sabendo disso, este estudo se propôs
a identificar a forma pela qual o professor
trabalha com os alunos que tenham esse
transtorno. Para isso, foi realizada uma
pesquisa qualitativa, por meio de entrevistas com 3 professoras dos anos iniciais do
Ensino Fundamental de uma escola da rede
pública de ensino do DF. Os resultados da
pesquisa evidenciaram que as professoras
identificam a necessidade do desenvolvimento de estratégias pedagógicas específicas para com o aluno com TDAH para que
haja uma aprendizagem favorecida. Pode-se pensar que, na dinâmica pedagógica,
tais concepções são colocadas em prática,
pois elas relatam que sua ação é norteada
pelo trabalho diversificado, em que usam
recursos diferentes para promover a aprendizagem deste aluno, imagens, movimentos, histórias, brinquedos lúdicos, músicas
e jogos. Entretanto, elas denunciam as dificuldades encontradas para trabalhar com
esse aluno, dentre as quais citam a falta de
apoio da instituição escolar, o pouco recurso didático disponível e o grande número
de alunos em sala. Assim, pode-se concluir
que ensinar a criança com esse transtorno
pode ser uma tarefa difícil se as posturas
e medidas necessárias não forem tomadas.
Entretanto, entende-se que estas medidas
não envolvem apenas o professor, mas, a
família, a criança e toda a comunidade escolar. Por isso, a interação entre essas partes é de extrema importância, uma vez que
ela reflete diretamente no fracasso ou sucesso escolar do educando.
Palavras-chave: Transtorno de Déficit de
Atenção e Hiperatividade; Professor; Trabalho
Pedagógico.
Contato: Helen Tatiana dos Santos-Lima;
FACITEC/ SEEDF; [email protected]
LT04-1480 - FOTOGRAFIA E FAZ DE CONTA
Aline do Carmo Oliveira - IESB
[email protected]
Emanuelle Mendes das Chagas - IESB
[email protected]
Alice Araujo Costa - IESB
[email protected]
Rafael dos Reis Braga - IESB
[email protected]
Anaí Haeser Peña - IESB/UnB
[email protected]
Muitas vezes conhecida como uma das
formas mais comuns do comportamento
humano, especialmente durante a infância,
a brincadeira marca a vida de muitas crianças em diferentes sociedades, constituindo
uma prática cultural típica dessas crianças.
Criatividade e espontaneidade casam-se
na brincadeira, ao mesmo tempo em que
regras sociais e morais são exercitadas e
testadas e aprendizagens são construídas.
Segundo Siaulys (2005), a brincadeira permite à criança vivenciar o lúdico e descobrir a si própria, pois nessa atividade ela
apreende a realidade ao mesmo tempo em
que se desenvolve. Dito de outra maneira,
através do brincar a criança se humaniza,
no sentido de constituir uma forma de
223
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
participação cultural, de permitir o contato e o exercício com atividades e forma de
funcionamento da comunidade na qual a
criança está inserida. Vygotsky (1998) afirmou que o sujeito se constitui nas relações
com os outros, por meio de atividades caracteristicamente humanas, mediadas por
ferramentas técnicas e semióticas. A brincadeira infantil, nesta perspectiva, assume
uma posição privilegiada para a análise do
processo de constituição do sujeito, pois
constitui uma atividade em que, tanto os
significados social e historicamente produzidos são construídos, quanto novos
podem ali emergir. A brincadeira e o jogo
de faz-de-conta seriam considerados como
espaços de construção de conhecimentos
pelas crianças, na medida em que os significados que ali transitam são apropriados
por elas de forma específica. Paralelamente, os objetos com os quais a criança se relaciona são significados em sua cultura e a
relação estabelecida com eles se modifica
à medida em que a ela se desenvolve. Dessa maneira, num primeiro momento essa
relação é marcada pela predominância de
sentidos convencionais, característicos da
cultura em que está inserida, de tal forma
que o objeto diz para a criança, de certa
forma, como deve agir. Com o passar do
tempo, de modo gradativo, a relação entre
objeto significado e ação se altera, tendo
a brincadeira um lugar de destaque nessa
mudança. Na situação da brincadeira há
mudança na relação da criança com os objetos, pois estes perdem sua força determinadora. Dessa maneira, ao brincar a criança pode dar outros sentidos aos objetos e
jogos, partindo de sua própria ação, de sua
imaginação, da trama de relações que estabelece com os amigos com os quais produz
novos sentidos e os compartilha (Cerisara,
2002). “A criança vê um objeto, mas age
224
de maneira diferente em relação ao que
vê. Assim, é alcançada uma condição que
começa a agir independentemente daquilo
que vê.” (Vygotsky, 1998, p. 127). A partir
do exposto, verifica-se a fundamental importância da brincadeira para o desenvolvimento infantil ao permitir a transformação
e produção de novos significados. Vygotsky
(1998) defende que a criação de situações
imaginárias na brincadeira surge a partir da
tensão entre o indivíduo e a sociedade. A
brincadeira libera a criança das amarras da
realidade imediata e oferece a oportunidade de controlar uma situação existente (Cerisara, 2002). A fotografia, por seu turno,
pode ser definida como um verdadeiro ato
icônico (Dubois, 1993), um encontro entre
o ato de fotografar um objeto ou cena em
circunstâncias específicas, com o ato de sua
percepção e contemplação. O fotografar
permite a recriação da realidade, pois apresentam um recorte da realidade realizado a
partir de uma intenção específica daquele
que fotografa.
O presente trabalho apresenta análises
preliminares de um estudo que tem como
objetivo identificar o papel da fotografia
como instrumento em brincadeiras de faz
de conta, em duas situações diferentes:
uma na qual as crianças são ao mesmo
tempo os fotógrafos e os fotografados, e
outra em que são fotografadas em situação
de brincadeira de faz de conta com a participação de um adulto. As duas situações
são apresentadas para as crianças como
brincadeiras. Na primeira situação as crianças são incentivadas a brincar de fazer caras
expressando sentimentos ou a fazer caretas em frente a uma webcam e aprendem
a tirar fotos de si mesmas fazendo essas caras ou caretas. Depois de um momento de
aprendizagem e ambientação das crianças
são deixadas a vontade e sem a presença
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
do adulto para brincar e tirar fotografias
utilizando a webcam. A situação de brincadeira de faz de conta com a participação
de adulto consistiu na escolha livre, pelas
crianças, de situações para brincarem e representarem. As crianças escolheram brincar que eram, por exemplo, o Zeca Urubu
e o Pica-pau em uma situação em que um
engana o outro, em outro momento brincaram de Chapeuzinho Vermelho e Lobo
Mau, e em outro de super-heróis. As cenas eram fotografadas tanto pelas crianças
quanto pelo adulto presente. Em ambos os
casos as fotografias são apresentadas às
crianças, que as vezes as identificam como
produto ou continuidade da brincadeira.
Palavras-chave: faz de conta, brincadeira,
fotografia, desenvolvimento
Contato: Aline Do Carmo Oliveira, IESB,
[email protected]
LT04-1513 - PERCEPÇÃO DAS MÃES
ACERCA DO CONSUMO INFANTIL
Eugênia Lúcia Paiva de Oliveira - UFPB
[email protected]
Patrícia Nunes da Fonsêca - UFPB
[email protected]
Walkyria dos Santos Farias Machado - UFPB
[email protected]
Vivian Kelle Lau Alves - UFPB
[email protected]
Nájila Bianca Campos Freitas - UFPB
[email protected]
Nas últimas décadas, percebe-se um aumento significativo do consumo em todo
o mundo, motivado principalmente pela
sociedade capitalista. As empresas investem muito em produção de bens e anúncios publicitários para atrair cada vez mais
o consumidor. O consumidor consciente
sabe da importância de comprar as mercadorias que necessitam, ao contrário do
consumista, que compra constantemente produtos supérfluos, seja pelo simples
prazer de comprar ou para mostrar o seu
poder financeiro frente ao seu grupo social. Os consumidores adultos têm uma
grande responsabilidade não apenas com
a sustentabilidade do planeta, mas, sobretudo, com os modelos de comportamentos transmitidos as crianças. Os pais
ou responsáveis devem ter a consciência
de que a família é o primeiro contexto de
socialização da criança e, portanto, ela vai
adquirir valores e crenças acerca da vida
e do mundo a partir de suas primeiras relações. Deste modo, é fundamental que
os pais demonstrem aos filhos comportamentos de consumo condizentes com suas
condições sociais e necessidades. Estudos
mostram que pais que consumem em excesso, sejam roupas, alimentos, utensílios
para casa e carro influenciam negativamente no comportamento dos filhos que,
provavelmente, vai se tornar uma criança
consumista. A literatura também aponta
que pais consumistas geralmente negligenciam os filhos e tornam-se permissivos
do consumo infantil. Na atualidade, há um
crescimento considerável no consumo por
parte de crianças, isto tem preocupado
profissionais de diversas áreas, tais como:
psicólogos, educadores, psicopedagogos,
sociólogos, nutricionistas e médicos. Tem-se constatado que o consumo em excesso
tem provocado uma série de problemas à
vida das crianças, especialmente, de natureza física, emocional e social. As crianças
estão mais propensas a se alimentarem
inadequadamente, frente à infinidade de
opções de comidas, muitas delas gordurosas sem nutrientes necessários e importantes para a saúde infantil. A isto, tem sur225
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
gido um aumento no número de crianças
obesas e com doenças adquiridas a partir
da má alimentação, levando-as a aumentar as fileiras dos grupos de risco. O consumo também prejudica a vida emocional da
criança uma vez que o brinquedo ou o jogo
nada mais é do que um substituto da atenção e amor dos pais. Na atual realidade
social, a criança não é mais um sujeito que
depende exclusivamente das escolhas do
adulto na hora de comprar, mas um cliente
decidido, que opina e consome. As crianças
tem se tornado um público exigente quanto ao consumo, pois muitas delas querem
adquirir objetos de marca consolidada
no mercado. Para assegurar ainda mais o
comportamento consumista da criança, as
empresas estão investindo em diversidade
de produtos e publicidade voltada para o
mundo infantil, especialmente no que se
referem a brinquedos, alimentos, roupas,
objetos de uso pessoal, etc. Há uma variedade de produtos que encantam os olhos e
o paladar da criança. Frente ao crescimento do consumo infantil, o Instituto Alana,
tem desenvolvido ações relacionadas ao
fomento de uma consciência crítica na sociedade a respeito do consumo de produtos e serviços por crianças e adolescentes
e, principalmente, atividades que buscam
debater e apontar meios de minimizar os
impactos negativos do consumismo na infância. O presente trabalho teve por objetivo verificar o comportamento consumista das crianças da segunda infância, especialmente no que se referem a brinquedos,
alimentos, filmes e passeios. Participaram
20 mães com idades entre 25 a 45 anos.
Moravam no interior do estado da Paraíba, onze eram profissionais autônomas,
sete eram donas de casa, uma assistente
administrativa e uma técnica enfermagem.
Todas tinham filhos com idade entre 3 e 5
anos. Elas responderam um questionário
226
contendo quatro questões relacionadas
ao consumo infantil, especificamente, em
relação à alimentação, aos brinquedos, a
filmes e ao lazer. Na oportunidade foi comunicado que o estudo era voluntário e
que o nome dos participantes seria mantido em sigilo. Foi feito uma análise quantitativa das respostas maternas. Os resultados mostraram que, segundo as mães, as
crianças consomem na alimentação mais
chocolate (20,8%), refrigerante (16,6%)
e bombons (16,6%); nas compras, consomem mais brinquedos (28%) e bonecas e
bonecos (25%); no lazer, pedem para sair
para parques (28,5%) e pizzaria (17,3%).
Na aquisição de filmes infantis, as meninas pedem para comprar mais da Barbie
(17,8%) e os meninos do BEM 10 (17,8%).
Conclui-se que o consume das crianças
tem sido um comportamento cada vez
mais comum na nossa sociedade, mesmo
em idades tão precoces as crianças decidem e ordenam que os pais correspondam
as suas exigências. Pode-se constatar que,
na alimentação, as crianças demonstram
consumir alimentos sem nutrientes necessários ao perfeito funcionamento do organismo, ao mesmo tempo em que mostra a
passividade das mães em corroborar com
o filho e não impor as regras de uma boa
alimentação. No quesito compras, percebe-se que os brinquedos e as bonecas/
bonecos foram os que se sobressaíram,
isto pode indicar que apesar do consumo,
as crianças da faixa etária do estudo preferem este tipo de brinquedo até porque estão na época propícia ao desenvolvimento
das representações simbólicas. No que se
refere às compras de objetos, constata-se
a escolha pela marca consolidada da mercadoria, o que revela ser um consumidor
bastante exigente e até disposto a pagar
mais caro pelo produto. Então, observa-se
a necessidade de uma discussão sobre o
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
tema, seja através de campanhas na mídia
ou nas escolas, a fim de promover uma
reflexão da sociedade, especialmente, de
pais e professores sobre a importância de
se ter um consumo consciente e o reflexo
do consumismo no desenvolvimento da
formação da personalidade, dos hábitos e
dos comportamentos sociais.
Palavras-chave: Consumo, crianças, educação
infantil.
Contato: Patrícia Nunes da Fonseca, UFPB,
[email protected]
LT04-1516 - ESCOLA COMO
COMUNIDADE: COMPARAÇÃO
SOCIODEMOGRÁFICA
Jaciara de Lira Almeida Dantas - UFPB,
[email protected]
Patrícia Nunes da Fonsêca - UFPB
[email protected]
José Farias de Souza Filho - UFPB
[email protected]
Nájila Bianca Campos Freitas - UFPB
[email protected]
Samara Pereira Cabral - UFPB
[email protected]
Em todas as culturas há sistemas organizados, de maior ou menor complexidade,
que preparam os jovens para sua incorporação à sociedade. Entretanto, na sociedade brasileira, por exemplo, as escolas são,
por excelência, a instituição encarregada
de transmitir conhecimentos, normas e
valores da cultura, fontes basilares para o
desenvolvimento adequado do jovem e de
sua inserção à sociedade. A escola constitui-se um contexto de socialização, que é
presumivelmente, distinto do contexto familiar. A diferença baseia-se em padrões de
comportamentos, regras de interação, métodos de comunicação e procedimentos de
transmissão da informação. Alguns autores
mostram que as escolas que adotaram a
perspectiva de escola como uma comunidade possibilitaram um desenvolvimento
interpessoal e intrapessoal aos alunos. Com
isso, os alunos reduziram os conflitos interpessoais e tiveram maior interesse pelos
outros, demonstrando aceitação e confiança nos valores democráticos. Evidenciou-se ainda o envolvimento dos alunos em
atividades de grupo e um elevado desempenho acadêmico. Como se pode perceber, o senso de comunidade é um fator de
integração na medida em que promove o
envolvimento entre estudantes na sala de
aula e na escola como um todo, a ponto
destes adotarem as normas e os valores
da escola como uma ação comum. O senso de comunidade na sala de aula envolve
dois elementos principais: (a) a percepção
de ajuda e trabalho coletivo em prol de um
objetivo comum, e (b) a percepção de que
cada aluno deve contribuir significativamente para o crescimento da classe como
um todo. A percepção e avaliação que os
jovens formavam acerca da escola, das atividades nela desenvolvidas e do seu papel
na sua vida, verificaram que as percepções
positivas destes jovens estavam diretamente correlacionadas com a participação em
atividades extra-curriculares, com o ato de
pegar livros emprestados na biblioteca e de
estudar com outros colegas da escola. Em
contrapartida, identificaram uma correlação inversa com gazear aulas e desrespeito
aos professores. Assim, buscando-se compreender melhor a realidade brasileira, especificamente de João Pessoa/PB, decidiu-se realizar um estudo com o objetivo de
verificar se há diferenças na percepção dos
jovens acerca da escola como comunidade,
considerando o sexo, a faixa etária e o tipo
de escola (particular vs. pública). Participaram deste estudo 242 jovens matricula227
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
dos regularmente no ensino fundamental
(23,1% e 38,4% cursavam a 6ª e 8ª séries,
respectivamente) e médio (38,5% estavam
cursando o 2º ano). A maioria foi do sexo feminino (57,7%) e de escola privada (53,7%)
de João Pessoa, PB. Os participantes tinham idades entre 11 e 20 anos (m = 14,3;
dp = 1,88). Esta foi uma amostra de conveniência, não probabilística, tendo participado os jovens que, presentes nas salas de
aula visitadas e tendo sido requeridos a colaborar, decidiram formar parte do estudo.
Os participantes responderam a Escala de
Percepção da Escola como Comunidade. Os
dados foram analisados no O Statistical Package for the Social Sciences (SPSS). Foi realizada uma MANOVA para medidas repetidas, observando-se diferenças entre suas
pontuações [Lambda de Wilks = 0,73, F (2,
240) = 43,70, p < 0,001]. O teste post hoc de
Bonferroni relevou que as pontuações dos
participantes diferiram entre os três fatores
(p < 0,001), na ordem apresentada: colaboração, ajuda e proximidade (m = 3,1, dp =
0,80), relações interpessoais positivas (m
= 2,7, dp = 0,77) e influência do estudante
(m = 2,5, dp = 0,77). Um passo seguinte foi
conhecer a influência de três variáveis demográficas em relação às pontuações dos
participantes, a saber: tipo de escola (pública versus privada), série (6ª e 8ª séries
do ensino fundamental e 2º ano do ensino
médio) e sexo. Neste sentido, realizou-se
uma MANOVA considerando como variáveis critérios os três fatores de percepção
da escola como comunidade, e as variáveis
demográficas como antecedentes. Duas
destas variáveis apresentaram efeitos principais: série [Lambda de Wilks = 0,94, F (3,
454) = 2,38, p = 0,03] e sexo [Lambda de
Wilks = 0,96, F (3, 227) = 2,74, p = 0,04]. Os
testes univariados indicaram a influência
da série em relação ao fator colaboração [F
(2, 229) = 3,78, p = 0,003], com o teste post
228
hoc de Bonferroni revelando que os jovens
de 6ª série do ensino fundamental obtiveram maior média neste fator (m = 3,36) do
que aqueles do 2º ano do ensino médio (m
= 2,89). Por outro lado, o sexo teve efeito
principal em relação ao fator influência [F
(1, 229) = 2,59, p = 0,04], em que os rapazes
obtiveram pontuação maior (m = 2,68) do
que as moças (m = 2,46). Nenhum efeito de
interação foi observado entre as três variáveis consideradas. Os estudantes de séries
mais elementares tendem a apresentar
melhor percepção da escola como comunidade do que os de séries mais avançadas.
Isso foi exatamente o que se observou no
presente estudo, em que os estudantes de
6ª série apresentaram médias maiores do
que aqueles da 8ª série (ensino fundamental) e do 2º ano do ensino médio. Contudo,
o fizeram unicamente no fator colaboração,
ajuda e proximidade. É provável que os alunos das séries iniciais mostrem um envolvimento maior com a escola, tendo melhor
relação com seus colegas e administradores da instituição, além de apresentarem
um bom rendimento acadêmico. Isto posto, demonstram ser mais responsáveis e
ajustados ao contexto escolar, ou ao menos
mais obedientes, cumpridores de normas
sociais convencionais. Por outro lado, os
alunos de séries mais avançadas podem estar começando a se interessar por atividades extraescolares (por exemplo, shoppings, namoro, campeonatos), o que diminui a
probabilidade de apresentarem um padrão
consistente de percepção da escola como
comunidade, haja vista que esta pode ser
menos influente nas suas vidas do que outros grupos ou instituições de referência.
Palavras-chave: Escola; Percepção;
Comunidade.
Contato: Jaciara de Lira Almeida Dantas, UFPB,
[email protected]
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
DIA 13/11 - Domingo
14h-15h30
CONFERÊNCIA
“ONDE FICAM OS BEBÊS NOS DIREITOS
DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES?”
Fúlvia Rosemberg - FCC
SP LT04 - Simpósio
SP LT04-845 - A TEORIA HISTÓRICOCULTURAL DA SUBJETIVIDADE: DESAFIOS
PARA A EDUCAÇÃO E A PSICOLOGIA DO
DESENVOLVIMENTO HUMANO
Maria Eleusa Montenegro - UNICEUB
[email protected]
Vannuzia Leal Andrade Peres - PUC-Go/UnB
[email protected]
Ana Maria Orofino Teles - FE/UnB
[email protected]
Geisa Nunes de Souza Mozzer - UFG
[email protected]
Reflexões e pesquisas na perspectiva da
teoria histórico-cultural da subjetividade
de Fernando González Rey têm sido realizadas em diferentes instituições de ensino
superior, por diferentes professores. Neste
momento, em que a necessidade é analisar os avanços concretos desta proposta e
os desafios que ela coloca para as áreas da
educação e do desenvolvimento humano,
as autoras vêm expor suas produções com
o objetivo de ampliar o debate sobre um
pensamento que é plenamente aberto à
novidade. Inicialmente faz-se uma reflexão
sobre os possíveis avanços da teoria da
subjetividade com relação à psicologia soviética e, a seguir, sobre as relações entre a
aprendizagem e o desenvolvimento humano nessa perspectiva, quando comparecem os principais conceitos desenvolvidos
por González Rey nessa direção. Por último
são apresentadas duas pesquisas na perspectiva histórico-cultural da subjetividade:
uma sobre a violência nas escolas e outra
sobre a criatividade infantil, pesquisas essas que se articulam e se desdobram na
tensão dos questionamentos e problematizações gerados na construção interpretativa das produções subjetivas dos sujeitos,
acessadas e expressas no decorrer do momento empírico e que tem se constituído
em um grande desafio para a educação e a
psicologia do desenvolvimento.
A TEORIA DA SUBJETIVIDADE NA
PERSPECTIVA HISTÓRICO-CULTURAL DE
FERNANDO GONZÁLEZ REY: UM AVANÇO
À PSICOLOGIA SOVIÉTICA
Maria Eleusa Montenegro - UNICEUB
[email protected]
Atualmente, a educação, carente de qualidade e de valorização, busca em diferentes teorias educacionais e psicológicas
elementos que possam contribuir para o
processo de ensino-aprendizagem. Em
vista disso é que se pretende, com este
trabalho, propiciar aos profissionais da
educação a teoria da subjetividade, na
perspectiva Histórico-Dialética do autor
cubano contemporâneo Fernando González Rey (2000; 2004; 2005); como uma alternativa de continuidade, avanço e aprofundamento dos teóricos clássicos soviéticos, sobretudo de L. S. Vygotsky (1984;
229
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
1987; 1988). Inicialmente houve a preocupação em conceituar o Materialismo
Histórico-Dialético de Marx, filosofia de
base da Psicologia Histórico-Cultural, e de
apresentar os conceitos desta Psicologia
e da Educação na perspectiva Histórico-Dialética. Como aspectos básicos do trabalho foram discutidas as categorias de
sentido, de significado, de subjetividade,
do papel do outro e da emocionalidade
para os autores L. S. Vygotsky e Fernando
González Rey. Percebeu-se em González
Rey, por meio da teoria da subjetividade,
uma visão mais aprofundada do homem
também como sujeito da própria história.
O papel das emoções e do outro é visto,
para este autor, de uma forma mais subjetiva. O outro não é percebido com um
papel de caráter instrumental, mas como
ser de relações, detentor de expressões
diferentes que dependem da qualidade do próprio curso no contexto social e
cultural. Para González Rey a educação
é um “processo vivo que não aceita ‘receitas’ pré-fabricadas e cujo curso define-se nos sentidos e nos significados que as
atividades e formas de comunicação implicadas nesse processo vão produzindo
por meio dos sujeitos que o configuram”.
A cultura das relações e da comunicação
passa a ter um lugar central para a teoria
da educação. Acredita-se, também, que
maior aprofundamento da teoria da subjetividade de González Rey somente tem
a contribuir com o conhecimento do indivíduo, da educação, do desenvolvimento
e do processo ensino-aprendizagem, propiciando subsídios para a superação dos
problemas educacionais.
Palavras-chave: Teoria da Subjetividade.
Histórico-Cultural. Psicologia Soviética.
230
A APRENDIZAGEM E O
DESENVOLVIMENTO HUMANO
SOB A PERSPECTIVA DA TEORIA DA
SUBJETIVIDADE
Ana Maria Orofino Teles - UnB
[email protected]
O modelo ou enfoque científico de caráter
empírico e analítico prestigia o controle
das variáveis, a objetivação do fenômeno
estudado e o isolamento do mesmo de
seu contexto, o que parece ser impossível nas investigações que estudam o humano, principalmente em seu atributo de
"ser social". Nesse sentido, as abordagens
de ordem hermenêutica e fenomenológica contribuem para ampliar o sentido do
fazer ciência e da construção do conhecimento. O saber deve ser contextualizado
e o mundo como coisa em si cede espaço
ao mundo como representação e construção de um observador que compartilha
certos consensos sociais. Na esteira desse processo de rupturas paradigmáticas
encontramos em González Rey o pensador capaz de apresentar uma teoria para
a integração das diversas partes isoladas
em que se desenvolveu a psicologia como
ciência. Talvez seja até possível falar em
psicologias, ao invés de uma só psicologia,
pela diversidade de teorias que co-habitam esse campo de conhecimento resultante desse modelo de compartimentalização do saber. A aprendizagem, por sua
vez, ficou restrita ao campo do comportamento observável, ou então ao campo
dos processos cognitivos e, na maioria
das vezes, entendida como algo mecânico que se dá através de um processo de
interiorização linear de algo que vem de
fora. A teoria da subjetividade de González Rey (2002, 2004, 2005a, 2005b, 2008)
vem para apresentar um pensamento que
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
responda a uma psicologia geral, uma ciência de amplitude e reunião dos conhecimentos fragmentados. Uma teoria que
conjuga a epistemologia e a metodologia
necessárias à integração lógica do fazer
ciência em psicologia. Com González Rey
temos uma maneira interessante de entender a aprendizagem, e também o desenvolvimento, pois ambos passam a ser
concebidos como processos subjetivos.
Não exclusivamente cognitivo, não uma
simples interiorização, mas de produção
de sentidos subjetivos que reconfiguram a
subjetividade da pessoa. Ou seja, o aprendiz irá aprender na medida em que produzir novos sentidos, que são unidades
subjetivas formadas pela total integração
entre o simbólico e o emocional. A personalidade, entendida como uma configuração de configurações subjetivas, se
transforma no processo de aprendizagem
e, com isso, aquele que entrou na sala
de aula será diferente daquele que sair.
Esse entendimento do humano e de seu
desenvolvimento explica a aprendizagem
como um processo complexo que implica
a subjetividade individual da pessoa, seja
criança ou adulto; a sua subjetividade social, pois essa pessoa está subjetivamente
imersa no tempo e no espaço e seu contexto histórico e social são relevantes;
implica também a tensão entre sua emocionalidade e sua racionalidade, onde a
aprendizagem se dá nas contradições e
não só nas linearidades e nas transmissões diretas de informação; e também na
produção do sujeito, pois, para González
Rey esse processo acarreta a produção de
sentidos subjetivos e as reconfigurações
subjetivas e não exclusivamente a interiorização de algo externo e alheio. Para
a teoria da subjetividade não existe desenvolvimento e aprendizagem sem uma
participação ativa de um sujeito concreto
que produz. Nessa perspectiva de subjetividade cultural-histórica a motivação
não vai estar na atividade, nem na tarefa
proposta, muito menos no professor e na
sua simpatia. A motivação está no sujeito
que aprende e a aprendizagem acontece
quando o conteúdo passa a fazer sentido
para o sujeito, implicando nisso também a
sua emocionalidade. Para a teoria da subjetividade existe uma integração complexa
entre o sentir, o pensar e o agir; e existe o
sujeito. Os atos mecânicos de memorização não significam aprendizagem, ou seja,
aprender é um processo subjetivo complexo que passa por um sujeito concreto e
todo e qualquer processo de massificação
do ensino anularia esse sujeito e sua capacidade singular de aprender. O próprio
conceito de desenvolvimento ganha outro caráter ao conjugar não só o "andar
para frente" na aprendizagem e também
o "adquirir conhecimentos", mas também
as contradições, os processos cíclicos e as
ambiguidades inerentes ao complexo sentido da subjetividade humana.
Palavras-chave: subjetividade,
desenvolvimento, aprendizagem, sujeito.
A PRODUÇÃO SUBJETIVA DA VIOLENCIA
NAS ESCOLAS
Vannuzia Leal Andrade Peres - PUC/Goiás
[email protected]
Já não é mais novidade que a violência
nas escolas é um fenômeno mundial. Para
isso é só observar as notícias veiculadas
nos meios de comunicação de massa,
especialmente a televisão. O problema
é que pouco se sabe, de fato, como essa
violência tem sido constituída na com231
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
plexidade do real social das diferentes
escolas e como diferentes crianças e adolescentes poderiam estar subjetivamente
com ela envolvidos em seus processos
de aprendizagem e desenvolvimento. Na
abordagem complexa e subjetiva do psiquismo humano, proposta por González
Rey (2011), o primeiro passo para a explicação dessa constituição é uma análise
de como o sistema econômico, o sistema
político-social e as ideologias vigentes
estão sendo mediados por professores e
alunos no cotidiano da escola. Este autor
compreende que os fatos sociais, econômicos e culturais que constituem a realidade social perpassam pela constituição
dos processos psicológicos dos sujeitos,
não de forma imediata, mas por meio de
sua mediação subjetiva que inclui suas
produções cognitivo-emocionais geradas
e expressas no espaço escolar. Pergunta-se, então, como o processo ensino/
aprendizagem tem envolvido os professores e seus alunos na produção subjetiva
do espaço social da escola, que ao mesmo
tempo é seu espaço social de constituição
psicológica? Para González Rey (1999) a
subjetividade integra dialeticamente o individual e o social, implicando, para isso,
o sujeito com sua história e seu espaço
social que o constitui e é por ele constituído em um processo recursivo. Entre o
sujeito e seu espaço social, no qual ele
atua, há um processo dialético que lhe
possibilita constituir sua psique que é gerativa, não reprodutiva. Buscamos, assim,
refletir sobre a qualidade do diálogo e da
dialética daqueles que atuam nas escolas, especialmente professores e alunos,
e como esse processo poderia estar complexa e subjetivamente envolvido com a
constituição e a expressão da violência
entre eles. Ao articular emoções, pro232
cessos simbólicos e significados, para a
compreensão da organização psicológica
subjetiva do sujeito, González Rey (1999,
2003, 2011) desenvolve um outro conceito, o de “sentido subjetivo” que nos
permite ir mais além e fazermos, finalmente, a seguinte pergunta: que registros
complexos das experiências de relação
na escola, poderiam estar envolvidos na
constituição psicológica do sujeito e na
sua produção subjetiva da violência? Para
González Rey (2011), entretanto, a ênfase, ainda hoje, é nas funções cognitivas
mediadas pelos signos, supostamente
internalizados, deixando-se de lado a expressão simbólico-emocional do sujeito,
fruto de sua imaginação, sua fantasia e
emoção, o que confere à psique um caráter gerativo. Essa ênfase no cognitivo,
mediado por aspectos da vida objetiva,
de forma direta e imediata, viria dificultar
o desenvolvimento de um modelo teórico que explicasse como as emoções, os
processos simbólicos e os significados são
articulados na organização psicológica do
sujeito e na sua produção subjetiva de
seus cenários sociais. Em síntese, a falta
desse modelo viria dificultar a explicação
de como o cenário social escolar, no qual
o foco deveria ser a aprendizagem e o desenvolvimento do sujeito, é, ao contrário,
palco de produção subjetiva da violência,
em níveis cada vez maiores. A partir da
implantação da disciplina "Estágio Básico em Psicologia Escolar" na PUC-Goiás,
em 2009, desenvolvemos uma pesquisa
sobre o tema nas escolas estaduais. As
informações foram construídas pelos alunos por meio de observações interativas,
redações, desenhos, discussão de temas,
complementação de frases e entrevistas. Além disso, realizaram ações interativas com professores e alunos nas salas
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
de aula. Pode-se dizer que, com base na
Psicologia Histórico-Cultural da subjetividade de González Rey buscaram fazer
uma leitura das realidades das escolas
e desenvolver ações compatíveis com a
proposta de uma psicologia escolar/educacional que visa à aprendizagem e ao
desenvolvimento humano, considerando
a diversidade desses processos em cada
sujeito concreto. A realização das ações
interativas os ajudaram a compreender:
1) que a diversidade não é um empecilho
para o desenvolvimento do cenário da
sala de aula, mas a sua riqueza; 2) que o
diálogo deve ser uma prática cotidiana da
sala de aula para que alunos e professores desenvolvam uma reflexão sobre suas
histórias e necessidades; 3) que as práticas pedagógicas devem atender à diversidade do processo de aprendizagem e à
necessidade de desenvolvimento da imaginação criativa e da inventividade, ora
relegadas a segundo plano na maioria das
escolas, o que torna invisíveis as crianças
e os adolescentes concretos; 4) que a produção subjetiva, possibilitada pelo exercício da imaginação criativa, ajuda a superar as barreiras das condições objetivas
das relações entre professores e alunos,
tais como o mau humor, a impaciência,
a falta de atenção e a indiferença. Compreenderam, ainda, a necessidade que há
das crianças e adolescentes poderem expressar a realidade social das escolas, nas
suas relações com a realidade social mais
ampla, mediadas por suas emoções muitas vezes contraditórias. Afinal, pudemos,
todos nós, vivenciar o desafio da psicologia histórico-cultural da subjetividade,
isto é, de buscar ultrapassar o pensamento da causalidade clássica e considerar
a subjetividade de alunos e professores,
tanto na realização de práticas pedagógi-
cas que atendam à diversidade da sala de
aula quanto na educação para uma convivência pacífica e respeitosa entre eles.
Palavras-chave: subjetividade, escola,
violência
A CRIATIVIDADE INFANTIL NA
PERSPECTIVA HISTÓRICO-CULTURAL DA
SUBJETIVIDADE
Geisa Nunes de Souza Mozzer - PUC/Goiás
[email protected]
Esta pesquisa teve como objetivo central
buscar compreender como se expressa a
criatividade nas crianças na Educação Infantil, privilegiando a atividade de ouvir
e contar histórias, entre crianças de 3 a 6
anos de idade. Para tanto, é apresentado
um breve levantamento bibliográfico sobre
o conceito de criatividade e criatividade infantil abordando como esses temas estão
sendo discutidos na literatura especializada. Durante a comunicação da pesquisa,
buscou-se responder as seguintes questões: Por que estudar criatividade? Como
ela se expressa? Como a criatividade é
concebida à luz da teoria Histórico-Cultural
da Subjetividade? Com quais recursos subjetivos/personológicos a criatividade das
crianças está relacionada? Quais as maiores barreiras para o seu desenvolvimento?
Como a criatividade se relaciona com a
Literatura Infantil nesta fase inicial da vida
da criança? Buscou-se também analisar os
elementos contextuais que podem interferir na expressão da criatividade das crianças na Educação Infantil, sempre privilegiando a atividade de conto, reconto, criação e interpretação de histórias, a partir
da Teoria Histórico-Cultural da Psicologia,
inaugurada por Lev Vigotski (1896-1937), e
233
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
da Teoria Histórico-Cultural da Subjetividade desenvolvida pelo pesquisador cubano
Fernando González Rey (1999, 2007). À luz
desta última, propomos discutir o conceito
de subjetividade, personalidade, sujeito,
sentido subjetivo, unidades subjetivas do
desenvolvimento e subjetividade social.
Segundo Vigotski (1930-1990), a criança
tem a criatividade menos desenvolvida
que o adulto, pois este último estaria mais
capacitado à produção criativa. Para o autor, o processo de imaginação e de criação
não é espontâneo e o mundo cultural é,
em grande parte, produto da imaginação, fantasia, memória e imitação. Sendo
assim, a imaginação e a criatividade, juntamente com outras funções psicológicas
superiores, são o que distingue o mundo
cultural do mundo natural. Essas funções
se desenvolvem no contexto histórico-cultural. O domínio histórico-cultural, para
Vigotski, não representa o histórico social
do indivíduo nem seu contexto cultural
presente, mas refere-se à natureza do desenvolvimento dos processos psicológicos
humanos (Neves-Pereira, 2007). A concepção de criatividade como processo da subjetividade, foi analisada à luz dos estudos
desenvolvidos por Mitjáns Martínez (1997,
2002, 2006, 2007). Esta autora apresenta a criatividade como uma expressão da
personalidade que se manifesta de forma
diferente em cada um dos sujeitos, estando relacionada com a sua constituição
subjetiva. Ou seja, fazendo um contraponto com a ideia de que a criatividade é um
traço isolado da personalidade, esta abordagem teórica entende que a criatividade
se expressa e está relacionada com a capacidade cognitiva, com a forma pela qual
o indivíduo interage dialeticamente com o
contexto social, bem como com a subjetividade social constituída nos espaços sociais
234
nos quais as crianças atuam. Diferentes
técnicas qualitativas foram utilizadas à luz
da concepção epistemológica qualitativa,
proposta por González Rey (2002, 2005). A
pesquisa empírica se dividiu em duas fases:
a primeira com um grupo de 20 crianças de
5 anos de idade, quando foram realizadas
sessões de conto e reconto de histórias de
personagens infantis escolhidos pelas próprias crianças. Nestas sessões foram exploradas questões cognitivas, como escrever
o nome dos personagens da história, descobrir as cores das roupas dos personagens, formar palavras a partir do nome dos
personagens, dentre outros. Depois desta
etapa foi solicitada a algumas crianças que
vestissem a fantasia dos personagens das
histórias. Elas ficaram fantasiadas durante
o período de um dia, ou seja, todo o período de permanência no CMEI (Centro Municipal de Educação Infantil), quando foram
feitas as observações. As análises ainda
estão sendo realizadas, mas os primeiros
resultados demonstram que a criatividade,
nesta fase da vida criança, manifesta-se de
forma diferente em cada um dos sujeitos,
mas sempre mediada, principalmente,
pela memória, cognição, percepção, atenção, imitação, afetividade, ou seja, mediada e relacionada com as configurações
subjetivas de cada uma, bem como com
a subjetividade social constituída nos espaços sociais nos quais as crianças atuam.
Assim, nessas pesquisas temos observado
crianças pré-escolares em diferentes interpretações de histórias através das quais a
criatividade tem se manifestado de forma
bastante relacionada com a personalidade
e subjetividade de cada um dos sujeitos
observados. As crianças, ao interpretar os
personagens das histórias, demonstram
características dos mesmos que se misturam à sua própria constituição subjetiva.
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
Percebemos ainda que o contexto social,
por exemplo, a relação estabelecida com
a professora e com as outras crianças do
grupo, também interferem na expressão e
manifestação da criatividade das crianças.
Desta forma, buscamos discutir também
a relação da criatividade com a Literatura
Infantil. Ou seja, como a criatividade pode
ser melhor desenvolvida nas Escolas de
Educação Infantil através da atividade de
contar, recontar, interpretar e criar histórias. Assim, buscamos observar quais
características gerais dos contextos que
podem provocar, assim como preconiza
Mitjáns Martínez (1997), circuitos negativos e positivos para o desenvolvimento,
manifestação e expressão da criatividade,
dentre outros aspectos.
Palavras-chave: subjetividade, criatividade,
educação infantil
SP LT04 - Simpósio
SP LT04-930 - INCLUSÃO ESCOLAR:
AÇÕES E REFLEXÕES NAS ESCOLAS DA
SECRETARIA DE ESTADO DE EDUCAÇÃO
DO DISTRITO FEDERAL
Mírian Barbosa Tavares Raposo - UnB
[email protected]
Albenira Alves Rodrigues Soeira - SEE/DF
[email protected]
Ana Ester Soares Oliveira - SE/DF
[email protected]
Claudia Maiana Silva - SEE/DF
[email protected]
Esse simpósio representa o fruto de um
trabalho desenvolvido no Curso de Especialização em Desenvolvimento Humano,
Educação e Inclusão Escolar, oferecido
pela Universidade de Brasília, em parceria com a Universidade Aberta do Brasil.
O curso, de 420 horas, foi oferecido na
modalidade a distância e ocorreu durante os anos de 2010 e 2011, atendendo a
quase 500 alunos advindos de diferentes
localidades no Brasil. A proposta do curso
buscou dar respostas à demanda de educadores que solicitam um curso de qualidade para sua formação continuada, representando uma iniciativa conjunta para
atender à demanda de escolas, hospitais
e do contingente de profissionais que
trabalham em diversas associações, que
procuram instâncias formadoras e especializadas para promover sustentabilidade
ao processo inclusivo. Seu objetivo era o
de qualificar profissionais que lidam com
a questão do desenvolvimento humano e
com o campo da educação, para atuar na
promoção e sustentabilidade da inclusão
escolar de alunos com necessidades especiais. Entre as atividades de formação
oferecidas pelo curso, incluía-se a construção de uma pesquisa monográfica orientada, que ocorreu nos últimos seis meses
de funcionamento do curso. Tal pesquisa
abrangeu todos os diversos componentes
do currículo do curso, como ação integradora que visava assegurar a indissolubilidade teoria e prática. Os trabalhos apresentados representam uma síntese de três
monografias construídas ao longo do curso, todas produzidas nas escolas da rede
pública de ensino do Distrito Federal. As
principais pesquisadoras dos três estudos
são professoras dessa rede, em formação
continuada, e cada uma delas, a partir de
suas especificidades, visou refletir a respeito do processo inclusivo na escola, buscando construir recursos teórico-metodológicos que pudessem orientar e facilitar a
235
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
ação dos diversos participantes desse processo. Consideramos que seus resultados
representaram uma importante contribuição para a organização do trabalho pedagógico da escola e da sala de aula, uma vez
que possibilitaram um exercício reflexivo
sobre a prática educacional inclusiva, tanto para os pesquisadores em formação
como para os contextos educacionais nos
quais as pesquisas foram desenvolvidas.
A INCLUSÃO ESCOLAR DOS ALUNOS
COM NECESSIDADES EDUCACIONAIS
ESPECIAIS NA EDUCAÇÃO INFANTIL E
SUAS FAMÍLIAS
Albenira Alves Rodrigues Soeira - SEE/DF
[email protected]
Mírian Barbosa Tavares Raposo - UnB
[email protected]
O contexto atual em que vivemos, na
sociedade, incentiva o movimento de inclusão. Esse movimento parte da idéia de
que gozamos dos mesmos direitos e que
todos os cidadãos têm garantias e direitos
primordiais para a sua vida, como: saúde,
educação, segurança, trabalho, previdência social e lazer (Brasil, 1988). A inclusão
deve partir da inserção do indivíduo na
sociedade e da garantia de seus direitos.
De acordo com Madeira Coelho (apud Kelman, 2010), a inclusão é um termo interessante, e serve de bandeira globalizada
para os grupos ditos minoritários e marginalizados da sociedade. No tocante a educação, o dever do Estado de proporcionar
o direito à educação encontra-se em seu
artigo 205: "Educação direito de todos e
dever do Estado" (Brasil, 1988). Bronfenbrenner (1996 apud Kelman, 2010) afirma
que a família e a instituição escolar são
ambientes que promovem o desenvolvi236
mento humano. De acordo com Moreira
(apud Dessen & Weber, 2009), tanto a
família como a escola podem trazer situações que incentivem o crescimento da
criança, como também podem contribuir
para o desencadeamento de situações
adversas que podem prejudicar a criança no seu desempenho educacional. Esse
trabalho pretendeu, portanto, compreender atitudes positivas para a inclusão
nos dois sentidos, ou seja, da família e da
escola. Na visão de Bronfenbrenner, família e escola são microssistemas, entendidos como contextos de maior influência
para o desenvolvimento de uma criança
(apud Dessen & Silva, 2004). A família é
o primeiro local de convivência de uma
criança e deveria ser o maior incentivador
de quebra de preconceitos, em se tratando da criança com necessidades educacionais especiais. Já o papel da escola
é o de incluir e criar estratégias para o
crescimento dessa criança. Aranha (apud
Barbosa, Rosini & Pereira, 2007) ressalta
que a educação inclusiva é um projeto a
ser construído por todos os envolvidos na
comunidade escolar, e que só terá êxito
quando as atitudes em relação à inclusão
escolar forem positivas. Ao se falar de família, escola e pessoa com necessidades
especiais ou com deficiência, tem-se em
mente as palavras diversidade, respeito
e igualdade de oportunidades. De acordo com Glat e Duque (2003), o papel dos
profissionais é fundamental para minimizar os sentimentos de superproteção
ou segregação e promover orientações
e esclarecimentos sobre as capacidades
do filho com necessidades especiais, bem
como provocar um olhar dos pais sobre si
mesmos. Ainda com Glat (2004) uma vez
orientados e sensibilizados para a nova
situação, os pais podem influenciar, posi-
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
tivamente, na autoconfiança do filho para
o desenvolvimento de suas capacidades.
Este trabalho teve por objetivo compreender a relação família-escola no processo de inclusão dos alunos com necessidades educacionais especiais na Educação
Infantil do Ensino Regular. Quanto à abordagem, a mais indicada foi a pesquisa
qualitativa. De acordo com Maciel e Raposo (2010), tal pesquisa representa um
processo permanente de construção do
conhecimento pela interação do pesquisador, do pesquisado e da pesquisa, em
si. A escola contexto da pesquisa selecionada para o estudo é uma escola da rede
pública, inaugurada em 11 de outubro de
1978; está localizada na zona urbana de
uma das regiões administrativas do DF,
atendendo crianças da própria comunidade e de regiões próximas. Participaram
desta pesquisa uma mãe de aluno NEE inserido numa turma de educação infantil e
a regente da turma desse mesmo aluno.
O instrumento mais adequado para as situações propostas foi a entrevista semiestruturada. O roteiro para a efetivação da
entrevista foi organizado em três blocos
de questões sobre os entrevistados: (a)
apresentação; (b) seus conhecimentos teóricos sobre o assunto proposto; e (c) sua
prática vivenciada. A entrevista foi realizada com o auxílio de um gravador. Para
analisar as informações construídas por
meio das entrevistas, portanto, optamos
pela construção de categorias teóricas de
análise. As categorias elencadas são frutos da análise de informações construídas
por meio das entrevistas. Os títulos das
categorias foram formulados a partir de
temas que envolviam tanto a sociedade
quanto a comunidade escolar, e as categorias são: conhecimento e vivência compartilhada. O segundo tema mais explo-
rado pelas entrevistadas foi a preparação
prévia da sociedade, família e escola para
a inclusão de alunos com necessidades
educacionais especiais, tanto no meio social como educacional. Outro tema foi: A
inclusão - bem comum, já que a inclusão
foi muito citada pelas duas participantes
da pesquisa como o envolvimento de todos da sociedade nesta luta; elas citaram
a inclusão como uma causa não abraçada por todos da sociedade, a começar
pelas autoridades que fazem as leis e as
colocam em prática. O terceiro tema mais
explorado foi denominado: A qualidade no cotidiano educacional e inclusivo,
pela busca na qualidade no atendimento
no ambiente escolar, já que o ambiente
pode ser educacional, mas, não necessariamente, inclusivo; reconhecer e conhecer quais são as atitudes da sociedade,
família e escola nessa etapa de vida do
ANEE é essencial para assegurar sucesso.
O último tema levantado foi denominado: Os frutos da inclusão nos parâmetros
de igualdade para todos, tendo recebido
este título por incluir os resultados de
uma boa inclusão e da convivência entre
sociedade, família e escola. As percepções
e traduções feitas ao longo desse período
– de pesquisa, entrevistas e análises - são
que alguns assuntos ou temas são antigos, mas, com soluções e atitudes ainda
tímidas e pequenas para o que a realidade pede. A intenção, com este trabalho,
não é apontar erros e falhas da família ou
da escola, mas, a de buscarmos, juntos,
a resolução dos problemas encontrados
ao longo do percurso. Se a maior tarefa é
da escola, inclusive, ao dar subsídios para
a família, no entanto, precisamos rever
nossos conceitos e atitudes. Precisamos
entender que não adianta estarmos num
local onde a inclusão deve acontecer, se
237
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
não tivermos mente aberta para aceitar e
incentivar não somente o aluno NEE, mas
todo o excluído.
Palavras-chave: inclusão, necessidades
educacionais especiais, relação família-escola
PROGRAMA DE ATENDIMENTO
EDUCACIONAL ESPECIALIZADO
COMPLEMENTAR
Ana Ester Soares Oliveira - SEE/DF
[email protected]
Mírian Barbosa Tavares Raposo - UnB
[email protected]
Atualmente, o grande desafio da educação
tem sido o de promover o desenvolvimento da aprendizagem, onde a diversidade
constitui um traço marcante no contexto
escolar. Diante desta realidade, diversas
ações são sugeridas, a fim de contemplar
as peculiaridades do processo de aprendizagem dos alunos com necessidades educativas especiais. A Secretaria de Estado
de Educação do Distrito Federal, a partir
das Diretrizes Pedagógicas, disponibiliza
atendimentos educacionais especializados
complementares, aos alunos inclusos em
escolas regulares, a fim de complementar
o processo de desenvolvimento da aprendizagem. Hoje, atendimentos como: Educação Física adaptada, Artes, Informática
adaptada, Jardinagem e Argila são realizados pela SEE-DF, em centros de ensino
especial, com caráter complementar, no
horário contrário ao de aula. O Programa
de Atendimento Educacional Especializado
Complementar visa contemplar as particularidades e necessidades dos alunos e auxiliar no processo inclusivo. A diversidade
de conhecimentos é elemento propulsor
do desenvolvimento humano e da apren238
dizagem; sendo a escola um ambiente
que reúne diversidade de conhecimentos, atividades, regras e valores, permeados por conflitos, problemas e diferenças
(Mahoney apud Dessen & Polonia, 2007),
ela se transforma em espaço privilegiado
de desenvolvimento. Ressaltando a importância da educação na diversidade,
cabe à escola criar meios que superem
as dificuldades, assegurem o desenvolvimento e promovam ações que conduzam
a atividades que transcendam a educação
informativa. O estímulo a atividades desportivas, recreativas e culturais aproxima
os diferentes, rompendo com as barreiras
do monoculturalismo (Kelman, 2009). A
Secretaria de Educação Especial, por meio
dos seus programas e ações, apresenta
possibilidades para viabilizar o processo
inclusivo e apoiar os sistemas de ensino
com programas de formação continuada
de professores na educação especial, programa de implantação de salas de recursos
multifuncionais e demais programas que
buscam implementar a educação inclusiva
e o direito à diversidade. Segundo o Decreto nº 6571/2008, entende-se por atendimento educacional especializado todo
o conjunto de recursos de acessibilidade
e pedagógicos organizados institucionalmente, ofertados de forma complementar
ou suplementar à formação dos alunos no
ensino regular. Este documento enfatiza,
ainda, a importância da transversalidade
das ações do ensino especial no ensino regular, no intuito de viabilizar e consolidar
o processo inclusivo. Diante destas concepções, as diretrizes pedagógicas do DF
contemplam o processo inclusivo, ao apresentarem orientações para a realização do
atendimento educacional especializado na
perspectiva inclusiva. Dentre os programas
apresentados, o Programa de Atendimen-
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
to Educacional Especializado Complementar tem o intuito de oferecer atendimentos
que não são ofertados no ensino regular.
Esta é mais uma ação que sugere o fortalecimento do processo inclusivo, a partir
da reelaboração dos ambientes educacionais, com o intuito de efetivar o processo
de inclusão escolar e embasar a construção da sociedade inclusiva. Neste estudo,
buscamos compreender a importância dos
atendimentos educacionais especializados
complementares, na implantação e manutenção do processo de inclusão, bem como
a relevância destes no processo de desenvolvimento humano e educacional dos
alunos com necessidades educativas especiais. O contexto da pesquisa foi um centro
de ensino especial, que disponibiliza vários
ambientes para a realização dos atendimentos complementares. Para este estudo foram selecionados dois professores,
sendo um do atendimento complementar
e um do ensino regular; a mãe de um aluno matriculado no atendimento complementar, também foi convidada a participar
desta pesquisa. A entrevista semiestruturada foi o instrumento de construção de
informações, por preservar a naturalidade
e possibilitar que as informações construídas refiram-se aos mais diferentes ambientes sociais (Gil, 1989). O procedimento de análise foi a categorização de dados,
elaborada com base nas transcrições das
entrevistas aqui mencionadas. Através da
elaboração de um quadro, focalizamos, nas
falas dos participantes, aspectos essenciais
do desenvolvimento do aluno. Como parte
dos resultados, a partir da categorização
das informações, foram levantadas três
categorias: Diagnóstico: compreensão da
realidade - os participantes expuseram as
dificuldades na precisão de um resultado
diagnóstico de uma criança com TGD e a
importância da família como promotora de
possibilidades para favorecer o desenvolvimento humano. Segundo Carvalho (2010),
apesar dos avanços, o diagnóstico é dificultado pela significativa heterogeneidade de
comportamento e atitudes, pois, as manifestações autísticas variam de pessoa para
pessoa. Dessen e Polonia (2007) enfatizam
que os laços afetivos, principalmente entre
pais e filhos, podem ser aspectos positivos
para desencadear um desenvolvimento
saudável, possibilitando o ajustamento do
indivíduo em diversos ambientes. Processo de Adaptação da escola à necessidade
do aluno: Inclusão - nesta categoria, percebemos que as ações educacionais aplicadas favoreceram o processo educacional
de um aluno participante do Programa
Educacional Especializado Complementar.
Em dois espaços diferentes, os professores transformaram suas práticas, a fim
de proporcionar o desenvolvimento da
aprendizagem do aluno. Segundo Carvalho (2010), os aspectos educacionais considerados evidenciam a importância da
mediação educacional, favorecendo maior
aproveitamento dos espaços escolares,
bem como ações efetivas de aprendizagem, promovendo o desenvolvimento do
aluno. Rede de apoio à inclusão: Programa
de Atendimento Educacional Especializado
Complementar - os participantes definiram
os atendimentos especializados complementares como atividades essenciais no
auxílio e apoio ao processo educacional regular; ainda, ressaltaram a importância de
profissionais capacitados no atendimento
a alunos com necessidades especiais. Professor e aluno, por estarem "mergulhados
em diferentes possibilidades interativas",
constroem um espaço versátil e enriquecedor para o processo de ensino/aprendizagem. Em outra vertente, a ação do pro239
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
fessor também é pautada pela definição
da função da educação, que não seria só
a de prover oportunidades para o crescimento e expressão, mas, essencialmente,
de nutrir possibilidades relacionais (Bartholo, Taca & Tunes, 2007). A partir das informações aqui apresentadas, verificamos
a importância dos atendimentos especializados complementares, no apoio e fortalecimento do processo inclusivo. As estratégias de divulgação devem ser fortalecidas,
a fim de alcançarem maior quantitativo de
alunos inclusos. Outro aspecto que reforçamos é a utilização de todos os espaços
educacionais, de modo a se constituírem
ambientes inclusivos. E, finalmente, reiteramos a importância da elaboração de
uma política inclusiva, onde todos os segmentos educacionais possam participar da
construção de ações como o Programa de
Atendimento Educacional Especializado.
Palavras-chave: inclusão escolar, atendimento
educacional especializado complementar,
desenvolvimento humano e da aprendizagem
A REALIDADE EDUCACIONAL E A
INCLUSÃO ESCOLAR
Claudia Maiana Silva - SEE/DF
[email protected]
Mírian Barbosa Tavares Raposo - UnB
[email protected]
Atualmente, as diversas demandas educacionais exigem que as escolas regulares
estejam preparadas para receber alunos
com necessidades educacionais especiais, proporcionando-lhes uma educação
de qualidade com condições igualitárias,
onde as diferenças sejam respeitadas no
processo de ensino e aprendizagem. Na
antiguidade, pessoas com deficiências
240
eram intituladas anormais e possuidoras
de forças malignas muito ligadas a crenças
sobrenaturais; elas eram consideradas um
mal para a sociedade (Boaventura, 2008).
A Declaração de Salamanca de 1994 marca
a luta contra o preconceito; a partir dela,
se iniciaram discussões voltadas à inclusão e de atendimento em todo o mundo,
inclusive, no Brasil (Moraes, 2009). Bueno
(2001) refere-se ao movimento brasileiro
de integração escolar que, desde a década
de 1970, privilegia a detecção de características individuais que possam prejudicar
a escolarização dos alunos e que, diante
deste diagnóstico, incorpora cada aluno
à educação regular ou especial. No Brasil,
historicamente, o sistema segregado de
ensino, somado à educação bancaria (Freire, 1987), torna ainda maior o desafio de
mudanças. Bueno (2001) destaca que, ao
lado dessas práticas de reprovação, está o
ensino seriado ou a ausência de qualquer
seriação na educação especial. Segundo
a Orientação Pedagógica da Educação Especial do Distrito Federal (2010), a rede
publica de ensino, visando tornar sua estrutura organizacional pedagógica mais
inclusiva e, para efetivar esse processo,
define que ele deverá acontecer de maneira paulatina, tendo em vista a acessibilidade curricular e o aprimoramento das
perspectivas organizativas, de maneira
coerente e responsável, respeitando a flexibilização da dimensão da temporalidade
e de outros aspectos, para que o sistema
de ensino se torne cada vez mais inclusivo. Quanto à qualificação profissional do
professor, Leão (2004) entende que essa
qualificação seja essencial para a inclusão
e deva ser continuada. Ferreira (2005), a
esse respeito, afirma que o processo de
inclusão pressupõe uma escola que possui uma política participativa com cultura
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
inclusiva, de maneira que os membros da
comunidade escolar sejam colaboradores
entre si, apóiem-se mutuamente e aprendam uns com os outros. Esta pesquisa
teve por objetivo analisar como gestores
e professores de uma escola regular na
cidade de Ceilândia viabilizam o processo
de inclusão. Foi nossa intenção específica
compreender que aspectos da organização do trabalho pedagógico da escola e
da sala de aula poderiam ser consideradas
fundamentais para o desenvolvimento e a
aprendizagem do aluno com necessidades
educacionais especiais. Como parte da
metodologia, entendemos que a pesquisa qualitativa responde a questões muito
particulares; ela se preocupa, nas ciências
sociais, com um nível de realidade que
não pode ser quantificado. Para a realização desse trabalho participaram o diretor
da instituição de ensino e uma professora
que atua com alunos especiais (NEEs) na
área da surdez. As estratégias empregadas
para a construção dessa pesquisa foram a
pesquisa documental e as entrevistas. Foi
elaborado um roteiro com 46 perguntas,
que foram distribuídas em cinco categorias, para a realização da entrevista.
Após ouvirmos atentamente as entrevistas, procuramos transcrevê-las fielmente,
não omitindo nem acrescentando nada
além daquilo que foi dito. Dentre os resultados, de acordo com o PPP da escola
pesquisada, o processo de avaliação não
se refere, apenas, a uma verificação do
rendimento escolar do aluno, mas, sim, a
todo um processo de adaptação e crescimento que consciente de que seu papel
apresente domínio sistêmico, evidenciado
nas demonstrações e articulações práticas
com a vida. As entrevistas demonstram a
concepção do diretor e da professora em
relação às práticas da inclusão. A partir da
analise desses instrumentos chegamos a
três categorias: (a) a formação dos professores: por meio dessa categoria foi possível observar que a formação do professor
deve acontecer durante todo o processo,
ou seja, deve ser inicial e continuada, partindo da realidade do professor, da escola
e dos alunos envolvidos no processo; (b)
a família como parceira: percebeu-se a
profunda necessidade da participação da
família, numa perspectiva bidirecional, de
maneira que um possa alimentar o outro
de informações fundamentais que contribuam para o desenvolvimento do aluno
NEE; (c) o currículo e suas adequações:
sugere-se, a partir dessa categoria, que os
alunos possam vivenciar, no processo educacional, um currículo contextualizado,
interdisciplinar e que sofra adequações
compatíveis com as necessidades específicas de cada um dos alunos em formação;
e (d) avaliar no dia a dia: a avaliação, a
partir dos resultados do estudo, deve ser
processual, contextualizada, formativa e
servir como ponto de referência para reorganização das atividades escolares. Concluímos que ainda não seja possível realizar a inclusão que desejamos, mas, entendemos que a experiência relatada seja
relevante, no que diz respeito ao processo
evolutivo da escola como espaço inclusivo. O professor pode utilizar as estratégias
apresentadas para enriquecer o seu trabalho e para refletir sobre suas estratégias
e instrumentos utilizados no processo de
ensino aprendizagem, a fim de alcançar os
objetivos desejados. A inclusão de qualidade é possível, apostando numa postura de respeito dos professores frente aos
seus alunos com dificuldades de aprendizagens, sendo eles NEEs ou não. Como
formaremos cidadãos que promoverão
as mudanças necessárias no meio em
241
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
que vivemos construindo uma sociedade
melhor? Ansiamos por educadores que
sejam capazes de desencadear ações que
tornem os seres humanos melhores, que
pensem no outro e no futuro do planeta, e
que utilizem, para isso, criatividade, disposição e, como falou o diretor, sentimento.
Acredita-se que este estudo possa oferecer importantes contribuições quanto à
inclusão escolar de qualidade e proporcionar, aos professores, oportunidade de
reflexão quanto a sua prática pedagógica,
com um novo olhar e uma nova postura,
em relação à educação inclusiva.
Palavras-chave: inclusão/avaliação/
adequações curriculares, relação famíliaescola, formação de professores
Contato: Mirian Barbosa Tavares Raposo, UnB,
[email protected]
SP LT04 - Simpósio
SP LT04 1293 PSICOLOGIA DO
DESENVOLVIMENTO E POLÍTICAS
PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO INFANTIL NO
MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO
Vera Maria Ramos de Vasconcellos - ProPEd/
UERJ
[email protected]
Fátima Veról Rocha - SME/RJ
[email protected]
Maciel Cristiano da Silva - ProPEd/UERJ e
SEMED/NI
[email protected]
Flávia Maria Cabral de Almeida - ProPEd/
UERJ
[email protected]
Marcia Gil - ProPEd e SME/RJ
[email protected]
242
A proposta apresentada é parte das discussões e reflexões realizadas no Núcleo
de Estudos da Infância: Pesquisa & Extensão (NEI:P&E) e na Linha de Pesquisa Infância, Juventude e Educação do Programa de Pós-Graduação em Educação, da
Universidade do Estado do Rio de Janeiro (ProPEd/UERJ). Com foco nas Políticas
Públicas busca estabelecer um trabalho
profícuo de parceria com a Secretaria Municipal de Educação da Cidade do Rio de
Janeiro (SME/RJ), onde a pesquisa Agente
Auxiliar de Creche: Educadores da Infância
Carioca é desenvolvida. Visa, entre outros
objetivos, apoiar a implementação das
políticas públicas do governo municipal
na formação em serviço dos agentes auxiliares de creche, aprovados no concurso
público realizado em 2007 (Edital nº1 de
04/08/2007) e dos Professores de Educação Infantil (Edital nº 91, de 25 de outubro de 2010). A pesquisa está situada nas
áreas de Educação Infantil e Desenvolvimento Humano e visa influenciar na produção de discussões sobre as questões de
desenvolvimento e formação de subjetividade de crianças (0 a 42 meses) e adultos
(educadores da infância e familiares), num
ambiente educacional específico (creche).
Articula temas de pesquisa, valorizando a produção nacional da Psicologia do
Desenvolvimento em interlocução com a
Educação da Infância. Este Simpósio apresentará quatro pesquisas interrelacionadas, são elas: (i) Formação de Educadores
de Creche: Compartilhando Experiências;
(ii) Infância & Inclusão: Olhares sobre as
Práticas Pedagógicas e o Desenvolvimento
Humano; (iii) Diálogo entre Família e Educadores de Creche; e (iv) De um Concurso
a Outro: a trajetória de um município na
Construção de Identidade do Educador
Infantil.
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
FORMAÇÃO DE EDUCADORES
DE CRECHE: COMPARTILHANDO
EXPERIÊNCIAS
Fátima Veról Rocha - PROPED/UERJ e SME/RJ
[email protected]
Ana Lúcia Ferreira - FE/NEIPE/UERJ
[email protected]
As mudanças no cenário nacional após a
promulgação da CF/88, no âmbito educacional, referente à educação das crianças
de zero a seis5 anos, vincula o atendimento
em creches e pré-escolas à área de Educação. Tal fato representou o primeiro
passo rumo à superação do caráter assistencialista que, até então, predominava
nos programas de atendimento à infância
e seu texto deixa claro que as propostas
educacionais devam basear-se em princípios de respeito aos direitos das crianças.
Posteriormente, o Estatuto da Criança e
do Adolescente (1990) e a LDBEN6 9394
(1996) surgem com o objetivo de concretizar e regulamentar seus dispositivos nas
diferentes esferas da sociedade. Neste cenário, os profissionais que desenvolvem o
trabalho com as crianças, também passam
a ter importância reconhecida legalmente
e os debates acadêmicos sobre a qualidade
dos serviços oferecidos aos pequenos têm
enfatizado também, a questão da formação de profissionais que atuam neste nível
da ensino. De acordo com a LDBEN/96, art.
62 “a formação mínima para o exercício do
magistério na educação infantil [...] é o nível médio, na modalidade normal”. (BRA5
O que já foi alterado pela Emenda Constitucional nº 53,
de 19 de dezembro de 2006 que estabelece: IV - educação
infantil, em creche e pré-escola, às crianças até 5 (cinco)
anos de idade.
6
Lei que disciplina a educação escolar, que se desenvolve,
predominantemente, por meio do ensino, em instituições
próprias. (Art.1º, § 1º).
SIL, 1996). No município do Rio de Janeiro,
por força da legislação, as creches públicas
passaram a integrar a SME/RJ. Desde então, mudanças estruturais aconteceram
em decorrência do processo transitório.
A principal mudança na estrutura de funcionamento das instituições ocorreu após
o concurso público (Edital - SME/SMA
nº8, de 24/07/2007 ). Em junho de 2008,
o quadro de pessoal das creches públicas
do município do Rio de Janeiro passou a
contar com os novos profissionais egressos
do concurso. Este estudo apresenta parte
dos resultados da pesquisa “Creche Odetinha: um estudo de caso”, desenvolvida no
mestrado em Educação do PROPED/UERJ
(2008 - 2010). A pesquisa teve por objetivo
descrever e analisar o processo de formação de um grupo de 34 educadores7 (AAC),
recém concursados e atuantes numa creche municipal, localizada na zona norte do
Rio de Janeiro. Os instrumentos utilizados
na pesquisa foram questionários, sessões
reflexivas (em pequenos/grandes grupos),
além de análise dos relatórios de avaliação
e registros produzidos pelos educadores.
Nesta apresentação será destacado o perfil
dos educadores, com o objetivo de refletir
sobre a formação em serviço necessária
para atender às especificidades de trabalho com criança de zero a três anos. Para
produzir esses dados, utilizamos um questionário que continha itens relativos a: i)
dados pessoais; ii) aos aspectos formativos
(trajetória escolar e nível de escolaridade); iii) profissionais (vínculo empregatício, carga horária de trabalho, experiência
anterior e atividade laboral exercida antes
de trabalhar na creche) e iv) sobre as atri7
Agente Auxiliar de Creche: educadores das creches
públicas do município do Rio de Janeiro que integram o
quadro de pessoal de apoio à educação, desde 2008.
243
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
buições profissionais (atividades desenvolvidas com as crianças e expectativas
em relação ao cargo e a creche). A análise
permitiu conhecer alguns traços da história
de profissionalização dos educadores nesta
creche. Quanto ao gênero, 3 são do sexo
masculino e 31 são educadoras (91%). Nível de escolaridade, dos 34 educadores: 1
tem pós- graduação lato sensu em educação e 16 possuem 3º grau completo. Deste total, apenas 9 possuem formação em
pedagogia. O restante compreende outras
formações como: psicologia, administração de empresas, direito, engenharia civil,
fisioterapia, marketing e licenciatura em
educação física. Ainda em nível superior,
10 possuem 3º grau incompleto: 4 estão
cursando a formação superior em pedagogia e 6 educadores em outras áreas: farmácia, licenciatura em história (2), matemática, geografia e educação física. Encontramos ainda, 10 funcionários com ensino
médio completo e, deste total, somente 6
concursados possuem formação em curso
Normal8 , os outros 4 educadores têm ensino médio regular9. Analisando o grau de
escolaridade, constatamos que apesar do
edital do concurso para o cargo de Agente
Auxiliar de Creche contrariar a disposição
da LDBEN/96 de que “a formação mínima
para o exercício do magistério na educação
infantil [...] [é] a oferecida em nível médio,
na modalidade Normal” (BRASIL, 1996, art.
62.), nenhum educador concursado, atuante nesta instituição, possui formação mínima. Na realidade, nesta creche, 79% do
grupo de educadores têm ou estão cursando o 3º grau (formação superior). Os dados encontrados nos mostram que, apesar
8
Atualmente, três cursando nível superior (licenciaturas em
áreas diversas)
9
Deste total, três estão cursando o PROINFANTIL.
244
dessa formação superar o nível fundamental exigido no edital, 50% dos funcionários
concursados, não possui formação específica para o exercício do magistério. Este
quantitativo soma 17 funcionários leigos,
sendo que do total, 59% (10 educadores)
atualmente estão cursando o PROINFANTIL10. Em relação à experiência profissional
anterior ao concurso: 44% dos educadores nunca tinham trabalhado com criança,
30% já haviam desenvolvido algum tipo de
atividade com a faixa etária acima de quatro anos e, somente, 26% já possuía experiência anterior em creche. A não exigência
de formação específica em educação como
pré requisito para o cargo trouxe, para as
creches, educadores leigos, com nível de
escolaridade elevado, entretanto, muitas
vezes, sem experiência anterior de trabalho na Educação Infantil. Dados que denotam uma mudança significativa do que
havia sido apresentado como a realidade
do cenário nacional, apontado em estudos
anteriores: leigos, com baixa escolaridade,
providos dos saberes da experiência profissional. (Oliveira et al., 2006; Cerisara, 2002;
Kishimoto, 1999). Dos 4 educadores que
já atuavam na área de ensino, sem experiência em creche, encontramos professor
nível fundamental, de pré-escola, de educação de jovens e adultos e de curso preparatório, todos oriundos da rede privada.
Dos 9 educadores que tinham experiência
em creche, 7 já trabalhavam nesta creche,
antes do concurso. Durante a pesquisa,
as propostas de intervenção não fugiram daquilo que era proposto pela SME/
10
Trata-se de um curso semipresencial de formação para o
magistério, em nível médio, na modalidade Normal, oferecido para professores em exercício na educação infantil,
que atuam em creches e pré-escolas da rede pública e da
rede privada que não possuem a formação exigida pela
legislação vigente.
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
RJ como espaço de formação: os Centros
de Estudos. Tivemos por objetivo, ao longo de 2009, avaliar o que ia mudando na
concepção destes profissionais em relação
ao conceito de “creche” e do trabalho por
eles realizado que integrasse “educação e
cuidado”. Esperamos que as considerações
ora apontadas, possam contribuir e embasar as discussões sobre políticas públicas
e sociais voltadas para a infância, assim
como na estruturação de diretrizes para a
formação das profissionais que lidam com
crianças tão pequenas.
Palavras-chave: Educação Infantil, Creche,
Formação de Professores.
INFÂNCIA & INCLUSÃO: OLHARES
SOBRE AS PRÁTICAS PEDAGÓGICAS E O
DESENVOLVIMENTO HUMANO
Maciel Cristiano da Silva - ProPEd/UERJ e
SEMED/NI
[email protected]
Fabíola Lira Gonçalves - FE/NEIPE/UERJ
[email protected]
O presente trabalho enfoca as primeiras
articulações desenvolvidas na pesquisa
de mestrado “Inclusão de Crianças Focais
na Educação Infantil”. A pesquisa analisa
dados de um follow-up com crianças participantes de duas investigações anteriores.
A primeira “Infância, Educação e Inclusão:
um estudo de caso”11 e a segunda “Crianças Focais: uma triangulação educação-família-saúde na creche”12. Apresenta a
11
SILVA, Maciel Cristiano da. Infância, Educação e Inclusão:
um estudo de caso. 2009. Monografia (Graduação de Pedagogia) UERJ. Rio de Janeiro.
12
OLIVEIRA, Miriam P. R. de. Crianças Focais: a triangulação educação-família-saúde na creche. 2009. Dissertação
(Mestrado em Educação) UERJ. Rio de Janeiro.
discussões referentes ao Estudo de Caso
da primeira pesquisa mencionada que teve
como foco uma criança com múltiplas deficiências. Inicialmente o diagnóstico era
de surdez, porém na instituição os educadores perceberam outras dificuldades, que
prejudicavam a participação da criança nas
atividades por eles propostas. Para mergulhar, no cotidiano, das práticas pedagógicas de Educação Infantil fez-se necessário
uma proposta metodológica de imersão
do pesquisador na instituição para compreender a dinâmica da mesma. Por ser
uma única criança observada (e seu entorno), optou-se pelo estudo de caso. Para
Yin (2001) esta proposta metodológica é
utilizada para compreender processos na
complexidade social nas quais eles se manifestam: seja em situações problema, em
análise de obstáculos, seja em situações
bem-sucedidas, para avaliação de modelos exemplares. Esta proposta possibilita
compreender um caso particular em sua
complexidade. Exige do pesquisador investigar a realidade articulada a determinado
contexto e definir recursos metodológicos
capazes de aprofundar e construir explicações que permitam captar o real. Para tanto, há que se consideram as dimensões e
os movimentos da criança e de seus outros
sociais (educadores e outras crianças). No
primeiro momento da pesquisa decidimos
relativizar o Caso estudado, dialogando
com as práticas pedagógicas de Jean Itard,
tendo por base seus relatórios de 1801 e
1806 (In: Banks-Leite & Galvão, 2001) e no
filme O Menino Selvagem de François de
Truffaut (1970). Para tal usamos como referencial teórico a perspectiva sócio-histórica
de Lev Vygotsky (1998 e 2007), focando os
processos de desenvolvimento e sociabilidade presentes no material empírico de
Jean Itard. Para o levantamento de dados
245
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
adotamos como procedimentos metodológicos: observações com registro e entrevistas semiestruturadas, com a mãe adotiva13
do menino e cinco educadores. As entrevistas aconteceram no decorrer das atividades de acompanhamento e observação da
criança na creche. Nas análises dos escritos
de Itard, percebemos que o médico tinha
por propósito desenvolver os sentidos de
seu jovem pupilo, dando grande importância aos aspectos sensoriais. A prática desse
médico era baseadas na concepção filosófica empirista de Condillac (1715-1780), na
qual o sujeito era entendido como desprovido de experiência. Dr. Itard intencionava
moldar e controlar o comportamento de
seu aprendiz a partir de estímulos sensoriais e uso de recompensas e punições. No
que tange ao desenvolvimento de Victor,
deve-se considerar que enquanto vivera
isolado nas Florestas de Avyeron, não precisara de nenhum recurso de comunicação
humana para satisfazer suas necessidades
fisiológicas, dependia tão somente de sua
astúcia física na superação dos obstáculos
da natureza. Em sua nova fase de vida, Victor necessitava de da mediação de sujeitos
sociais para o mundo que lhe era apresentado. Somente imerso num contexto humano, poderia atribuir sentido e sentir necessidade do uso da fala oral. Vale destacar
que mesmo com um universo interpessoal
restrito e pela necessidade de comunicação com os outros sujeitos, Victor desenvolve o que é chamado de “linguagem da
ação”, constituída de gestos e mímicas
(Banks-Leite & Souza, 2001). Tais recursos
de comunicação que foram apropriados
pelo menino eram ignorados por seu tutor
que só objetivava o desenvolvimento da
fala. Para o médico, as linguagens corpo13
A biológica faleceu durante o parto.
246
rais e gestuais não eram consideradas forma de linguagem valida para que houvesse
processo comunicativo. O Dr Itard compreendia tais manifestações como primitivas
e, portanto, um obstáculo ao aprendizado
da verdadeira linguagem: a fala. Sobre essa
relação Banks-Leite & Souza(2001) esclarecem que o fato do jovem Victor usar a
linguagem da ação e através dela ser entendido, evidencia que o convívio social
não lhe era estranho. Como bem é destacado pelas autoras o gesto de apontar só
é entendido como tal, como efeito de um
ato de interpretação por outrem. Passando agora à descrição das observações das
cenas cotidianas do menino na creche (Estudo de Caso), destacamos a presença de
alguns indícios de interação social que para
seus educadores, de forma similar ao médico-educador Itard, não eram valorizadas.
O menino observado mantinha-se, muitas
vezes, próximo de outras crianças e adultos, independente de estar numa atividade
de relacionamento com elas. Nos relatos
dos educadores é enfatizado um peculiar
interesse da criança por água, assim como
os relatados pelo médico-educador, sobre
o menino de Avyeron. No trabalho com
os educadores buscamos valorizar o que a
criança conseguia apresentar. Por exemplo,
constatamos que seu relacionamento com
outros sujeitos ocorria em forma de gestos,
ou seja, a partir do que os outros conseguiam perceber na ação dele. Tal fato era
muitas vezes interpretada como agressão.
Verificamos também que a participação do
menino nas atividades da creche era reduzida propositalmente pelos educadores,
pois solicitavam que o menino chegasse
um pouco mais tarde e saísse sempre antes
das demais crianças. Esta decisão prejudicava a participação da criança em foco nas
atividades pedagógicas orientadas, ou seja,
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
deixava-se de oportunizar momentos de
interação mediada pelos educadores. Conforme os relatos e observações partilhadas, passamos (pesquisador e educadores)
a perceber que a criança compreendia e
interpretava fatos e ações que ocorreriam
ao seu redor. Do mesmo modo, apresentava um potencial comunicativo facilmente
compreendida pelos sujeitos ao seu redor,
mesmo sendo elas denominadas pelos
educadores de agressivas; na verdade isto
pode ser alguma possível forma de comunicação com os demais sujeitos. Em suma,
esta fase da pesquisa possibilitou articular
uma reflexão dos fazeres cotidianos dos recém chegados agente auxiliares de creche,
com crianças que demandavam outros
fazeres pedagógicos, como, por exemplo,
o menino em estudo. Forneceu suporte à
formação continuada dos educadores, (re)
significando algumas práticas de cuidar-educar. As discussões permitiram aos
educadores e ao pesquisador momentos
de reflexão sobre o tema, além de prestar
apoio técnico-pedagógico à equipe de coordenação da creche.
Palavras-chave: Infância, Inclusão, Práticas
Pedagógicas.
DIÁLOGO ENTRE FAMÍLIA E
EDUCADORES DE CRECHE
Flávia Maria Cabral de Almeida - ProPEd/UERJ
[email protected]
Amanda Cristina de Freitas Souza - FE/NEIPE/UERJ
[email protected]
Em nossa sociedade, é crescente o número
de famílias que decide colocar suas crianças pequenas na creche. Esta procura deve
entrar na pauta das políticas públicas para
a ampliação de vagas e a garantia da quali-
dade do serviço oferecido para essas crianças (BRASIL, 2006). Quando se trata de
oferta e qualidade das creches, devemos
levar em consideração as necessidades das
famílias, especialmente das mães trabalhadoras (Aquino & Vasconcellos, 2005; Mizrahi, 2004) e das famílias que necessitam
de uma rede social de apoio (Piccinini et
al., 2007). Embora legítimas as necessidades dos adultos, a criança deve ser o alvo
principal, sendo reconhecida como sujeito
de direito a ser educado em um ambiente
complementar à família (Brasil, 1996). O
objetivo deste trabalho é apresentar parte
da tese que vem sendo construída sobre a
relação creche-família, apresentando resultados obtidos nas análises preliminares. A tese tem como finalidade analisar o
processo de construção da relação família-educadores ao longo de três anos em uma
creche pública municipal do Rio de Janeiro.
Estudos sobre o desenvolvimento humano
afirmam que a família é a primeira mediadora entre o homem e a cultura, garantindo uma unidade dentro das relações afetivas, sociais e cognitivas presentes no grupo
(Dessen & Polônia, 2007). Essa instituição
depara-se com desafios vindos do mundo
do trabalho, das questões de gênero, do
advento de novas tecnologias. A maneira
como se organizam frente a esses desafios
é relevante para verificar a necessidade de
compartilhar o cuidado com os filhos e/ou
contar com o suporte das redes de apoio
social. A formação dessas redes deve ser
estimulada, levando-se em conta que as
famílias também estão constantemente
lidando com fatores de estresse próprias
da dinâmica do relacionamento entre seus
membros (idem). A creche constitui um
dos braços dessa rede de apoio e compartilha com as famílias a educação de suas
crianças, representando mais um espaço
247
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
para o desenvolvimento. A interação família e creche tem sido considerada um palco
de negociações de valores e crenças, mas
também de conflitos entre os saberes de
um e de outro. Alguns desses conflitos se
traduzem na falta de confiança, na disputa
(real ou imaginária) pelo amor da criança
(Maranhão & Sarti, 2008). Investigações
nesse campo têm demonstrado que, em
geral, os momentos de encontro são breves (na entrada e/ou despedida) e baseadas na solução de problemas imediatos,
porque as professoras se dividem entre
as crianças e os familiares, que geralmente estão apressados. Tanto as professoras
quanto as famílias almejam um contato
mútuo, embora o que geralmente motiva o
diálogo sejam as insatisfações de ambas as
partes (Bahia, Magalhães & Pontes, 2009;
Sarkis & Bhering, 2009). Mesmo quando a
creche planeja e incentiva a comunicação
pode haver constrangimentos entre famílias e professores (Bhering & Sarkis, 2007).
Em geral, famílias e professores concordam
sobre os ganhos sociais que as crianças adquirem quando frequentam a instituição
de educação infantil, mas de diferentes
pontos de vista: os pais não enfatizam os
aspectos pedagógicos; as professoras, por
sua vez, valorizavam a preparação das atividades pedagógicas e não mencionam
a relação com pais para a ampliação das
possibilidades educativas (Bhering, 2009).
A creche, por ser uma instituição onde as
crianças passam uma grande parte do seu
tempo, convivendo com outros colegas e
adultos, lidando com as normas coletivas,
é um novo contexto de desenvolvimento.
Isto traz implicações para os estudos sobre o desenvolvimento humano, já que é
diferente dos contextos que as teorias do
desenvolvimento até então analisavam. As
questões que antes eram restritas aos am248
bientes familiares, agora são compartilhadas com os educadores da creche (Bhering
& Sarkis, 2007). Os sujeitos da pesquisa
são educadores e famílias de 42 crianças que frequentam a creche desde 2009
(quando tinham entre quatro e doze meses) até o ano de 2011. Adotamos a perspectiva do estudo de caso longitudinal, optando por fontes de dados diversificadas,
que permitem uma visão mais abrangente
do objeto (Alves & Azevedo, 2010). Utilizamos questionários, entrevistas, diário
de bordo e observações. Para este trabalho, apresentaremos os resultados obtidos
através de 3 questionários: ficha de acompanhamento e observação do período de
inserção e avaliação do trabalho da creche
(2009 e 2010). Os questionários foram
submetidos a exame quanti e qualitativo. Os resultados preliminares do primeiro questionário indicam que os aspectos
importantes observados na inserção de
crianças são semelhantes para educadores
e famílias, o que diferencia é a ordem de
importância. As famílias ficam atentas aos
fatores comumente relacionados ao “cuidado” (alimentação, sono), deixando em
último lugar o que é típico de um ambiente coletivo: a relação com outras crianças
e adultos. A idade das crianças em 2009
também deve ter contribuído para que os
aspectos ligados ao “cuidado” apresentassem maior destaque. Os educadores, por
sua vez, estão mais atentos aos aspectos
ligados ao trabalho desenvolvido na creche, como a brincadeira e a interação. O
choro para ambos constitui um forte indicador para saber se a criança está bem ou
não durante a inserção. Nos outros dois
questionários, verificamos que a busca
pela creche se devia ao fato de a mãe trabalhar fora. As famílias respondentes estavam satisfeitas com o trabalho promovido
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
pela instituição, e mais da metade afirmou
que colocaria o filho na creche, mesmo se
não trabalhasse. Todos os pais disseram
participar das reuniões, sendo presentes
no cotidiano da instituição e estabelecendo diálogo constante com os educadores
e a direção. A presença na creche contribuiu para que conhecessem o trabalho da
instituição, reconhecendo que a atividade
da creche era educar e cuidar, e complementar à família. A independência e interação foram os aspectos mais destacados
no desenvolvimento do filho, sendo também destacadas quando mencionavam as
vantagens da creche. No questionário de
2010, a mudança significativa foi a comunicação e socialização como aspectos que
foram desenvolvidos com a frequência da
criança à creche. Através da análise desse
material e dos demais utilizados na investigação, esperamos ampliar o conhecimento
sobre o tema em estudo. Acreditamos que
a creche pode contribuir no desenvolvimento da criança, mas também na própria
relação desta com sua família.
Palavras-chave: Creche; Família; Infância.
DE UM CONCURSO A OUTRO A
TRAJETÓRIA DE UM MUNICÍPIO NA
CONSTRUÇÃO DE IDENTIDADE DO
EDUCADOR INFANTIL
Márcia de Oliveira Gomes Gil - PROPED/UERJ
[email protected]
Daniele Vieira de Azevedo - FE/NEIPE/UERJ
[email protected]
RESUMO
O presente artigo apresenta um breve histórico da trajetória de organização do corpo docente e de apoio que atuam junto à
Educação Infantil no município do Rio de
Janeiro. É intenção olhar especificamente
a partir do ano de 2005, com a criação da
categoria funcional de Agente Auxiliar de
Creche14, que passou a integrar o Quadro
de Pessoal de Apoio à Educação, através
da Lei 3985 de 08 de abril, até criação do
cargo de Professor de Educação Infantil
em 201015. Este percurso é analisado a
partir de concursos públicos realizados
nos últimos 3 anos, voltados para o profissional que atua com funções pedagógicas junto às crianças pequenas. Em 2007,
foi realizado o primeiro concurso público
para agente auxiliar de creche, através de
provas e títulos, ocorrendo a seleção de
forma regionalizada, isto é, por CRE16, com
exigência de formação mínima em nível
fundamental17 e carga horária de 40 horas
semanais. Esta pesquisa analisa as mudanças nas políticas educacionais públicas
da cidade do Rio de Janeiro, desde o edital
conjunto SME/SMA nº8, de 24 de julho de
2007 (com oferta de 1.519 vagas regulares
e 81 para pessoas com deficiência), para
Agentes Auxiliares de Creche, até o edital nº 91, de 25 de outubro de 2010 (com
14
No ano de 2005, o poder executivo do município do Rio de
Janeiro, através da Lei 3985 de 08 de abril, criou a categoria funcional de “Agente Auxiliar de Creche”, que passou
a integrar o Quadro de Pessoal de Apoio à Educação. O
ingresso ao cargo, deu-se através de concurso público realizado em 2007, constituído de provas e provas de títulos,
sendo exigido a formação mínima em nível fundamental
e carga horária de 40 horas semanais. A seleção ocorreu
regionalmente, isto é, pelas Coordenadorias Regionais de
Educação (CRE).
15
Projeto de de lei nº 701/2010, cria no quadro permanente
do poder executivo do Município do Rio de Janeiro a categoria funcional de professor de Educação Infantil.
16
Coordenadoria Regional de Educação – a cidade do Rio de
Janeiro está divididas em 10 Coordenadorias
17
Em desacordo com a LDBEN 9394/96, que no seu artigo 62
define “a formação mínima para o exercício do magistério
na educação infantil [...] é o nível médio, na modalidade
normal”.
249
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
oferta de 1424 vagas regulares e 76 para
pessoas com deficiências). A chegada dos
agentes auxiliares de creche às instituições
buscava substituir o recreador - profissional contratado junto às Organizações da
Sociedade Civil (OSC)18. Também trouxe alguns questionamentos pertinentes à nossa discussão. Para começar, as funções dos
agentes auxiliares de creche são descritas
no edital do concurso e envolvem ações
pedagógicas19, tais como: disponibilizar e
preparar os materiais pedagógicos a serem utilizados nas atividades; auxiliar nas
atividades de recuperação da autoestima,
dos valores e da afetividade; observar as
alterações físicas e de comportamento, desestimulando a agressividade; estimular a
independência, educar e reeducar quanto
aos hábitos alimentares, bem como controlar a ingestão de líquidos e alimentos
variados. Ainda de acordo com o edital e
pela própria nomeclatura do cargo, estava
descrito com função esse profissional atuar em apoio pedagógico a um professor.
Participar da execução das rotinas diárias,
de acordo com a orientação técnica do
educador; Colaborar e assistir permanentemente o educador no processo de desenvolvimento das atividades técnico-pedagógicas; Receber e acatar criteriosamente
a orientação e as recomendações do educador no trato e atendimento à clientela.
Na realidade, não havia um educador para
cada grupamento. Um olhar mais atento ao documento20 que ainda norteava o
funcionamento dessas instituições, aponta
que a estrutura técnico-administrativa da
creche conta com: um diretor, professor ou
especialista de educação da rede de ensi18
Resolução SME nº 816/2004
19
Edital conjunto SME/SMA nº8 de 24 de julho de 2007
20
Resolução SME nº 816/2004
250
no; um professor regente articulador, também professor da rede; cozinheiro ou merendeira; lactaristas, para as creches com
berçário; auxiliar de serviços gerais e recreadores. Estes últimos, mesmo depois de
2008, com a chegada dos agentes auxiliares de creche dependendo da localização
da unidade, permaneceram nas creches
até junho de 2011. A Professor(a) Regente
Articulador(a) tem a responsabilidade de
coordenar o trabalho pedagógico de toda
a creche.. Assim, os fazeres cotidianos junto às crianças ficam centrados no recreador/agente auxiliar de creche ou seja, em
profissional sem formação específica para
tal função. Enfatizamos a importância de
uma formação anterior àqueles que se
dedicam ao trabalho educativo, sem desconsiderar a formação que ocorre no cotidiano das ações. Segundo Vasconcellos
(2001) a formação de professores e outros
profissionais para o trabalho nas instituições de educação infantil só são possíveis
pela construção coletiva e reconstrução
pessoal de sentidos, significados e valores
referentes a uma filosofia de educação infantil para todas as crianças, independente
de raça, religião ou etnia.(p.?) As questões
apontadas acima contrariam diretamente
a legislação, e parecem demonstrar um
caráter de precariedade no atendimento
oferecido às crianças. Com a posse de uma
nova gestão na Cidade, algumas mudanças
tiveram curso, e estão sendo analisadas
nesta pesquisa. Dentre elas está a criação
do cargo de Professor de Educação Infantil, com realização de concurso público em
2010. Desta vez, o edital exigiu a formação
mínima Normal Médio (na modalidade
normal), Normal Superior ou Pedagogia
(com Licenciatura Plena, com habilitação
para docência na Educação Infantil e anos
iniciais do Ensino Fundamental ou especí-
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
fica para Educação Infantil). A carga horária
é de 22 horas e trinta minutos semanais.
O cargo tem como descrição sumária:
Planejar, executar e avaliar, junto com os
demais profissionais docentes e equipe de
direção, as atividades da unidade de Educação Infantil e propiciar condições para
o oferecimento de espaço físico e de convivência adequados à segurança, ao desenvolvimento, ao bem-estar social, físico
e emocional das crianças. Com a chegada
dos novos profissionais (Professor de Educação Infantil) às creches um novo dilema
se instala, isto é: profissionais com funções
próximas, carga horária e salários distintos.
Esta pesquisa pretende realizar um estudo
que acompanhe a constituição/produção
da identidade do educador da infância
carioca. São questões de estudo: Como
será a convivência dos Agentes Auxiliares
de Creche e os Professores de educação
Infantil? Como se dará a partilha das tarefas diárias? Qual o impacto da entrada
dos professores no desenvolvimento e na
educação da infância carioca? Observar as
duas políticas e buscar entender os significados lá expressos e os sentidos reconstruídos por cada profissional é fundamental
para constituir um olhar sobre as políticas
de Educação Infantil que se concretizam
nesta cidade. Uma nova identidade do
Educador da Infância Carioca parece estar
se constituindo. O olhar pedagógico vem
ganhando força com novas políticas que
assentam o professor nesta etapa de ensino, e desta forma, atendem à necessidade
urgente de oferecer atendimento de qualidade às crianças, na forma de seu direito
assegurado em lei.
Palavras-chave: Agente Auxiliar de Creche,
Concurso Público, Professor de Educação
Infantil, Identidade do Educador da Infância.
SP LT06 - Simpósio
SP LT06-1404 - AVALIAÇÃO E INTERVENÇÃO
EM PSICOLOGIA PEDIÁTRICA: PROPOSTAS
PARA MINIMIZAR RISCOS AO
DESENVOLVIMENTO
Kelly Ambrósio Silveira - UFES
[email protected]
O campo da Psicologia Pediátrica tem sido
definido como um domínio interdisciplinar
e de interface da Psicologia do Desenvolvimento e da Psicologia Clínica. Este campo
se ocupa do funcionamento e do desenvolvimento físico, cognitivo, social e emocional, além do seu relacionamento com
a saúde de crianças, adolescentes e suas
famílias. No cenário brasileiro, a Psicologia
Pediátrica vem se consolidando como um
campo de saber científico, em que existe
uma preocupação bastante clara em enfatizar uma visão global e psicossocial do
desenvolvimento humano, sobretudo, nos
contextos da saúde e da educação. Nesse
sentido, estudos nessa área têm enfocado
a eficácia de propostas metodológicas de
avaliação e intervenção, em uma perspectiva desenvolvimentista, e que sejam aplicadas a populações em situação de vulnerabilidade, ou seja, com risco de problemas
e atraso no desenvolvimento. No presente
simpósio, pretende-se apresentar e discutir pesquisas realizadas em nível de pósgraduação, em Psicologia Pediátrica, com
enfoque na avaliação e intervenção, com
diferentes tipos de população em condição
de vulnerabilidade biopsicossocial: (a) crianças inseridas no contexto hospitalar
por problemas diversos, como bebês prematuros e com baixo peso internados em
UTIN e enfermaria pediátrica, e (b) crianças
251
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
entre 6-11 anos de idade hospitalizadas, e
bebês prematuros e com baixo peso, com
idade entre 18 e 36 meses, freqüentando
Ambulatório de Neurologia, em hospitais públicos. O Estudo 1 deste simpósio
abordará as estratégias de enfrentamento
(coping) de crianças entre 6 e 11 anos que
se encontram hospitalizadas e de seus cuidadores, utilizando dois instrumentos de
avaliação de coping: Instrumento de Avaliação do Enfrentamento da Hospitalização
(AEH) e Escala Modos de Enfrentamento
(EMEP), também analisando os problemas
de comportamento entre as crianças estudadas por meio do Child Behavior Checklist (CBCL/6-18 anos). Esta escala também
foi utilizada no Estudo 2 deste Simpósio,
que aborda as percepções maternas sobre
cuidados e problemas comportamentais
de filhos prematuros e com baixo peso,
com idade entre 18 e 36 meses. Com essa
mesma população, o Estudo 3 analisará
uma proposta de intervenção com mães
de bebês prematuros e com baixo peso,
internados em UTIN, integrando dados de
pesquisas realizadas em hospitais públicos
de Vitória, ES e do Rio de Janeiro, RJ, em
parceria entre universidades (UFES, UFRJ,
UVV e Faculdade Salesiana de Vitória).
Enfocando mais diretamente o cuidador
- geralmente a mãe -, pessoa central no
processo de desenvolvimento infantil, os
dados dessas pesquisas podem contribuir
ou contêm propostas de intervenção que
conduzem à melhoria nas estratégias de
enfrentamento dos problemas apresentados pelos filhos, adquirindo, assim, um
caráter protetor de seu desenvolvimento.
Pretende-se discutir como essas propostas
podem contribuir para consolidar a área
da Psicologia Pediátrica como campo de
estudo, pesquisa e intervenção no cenário
acadêmico-científico no Brasil.
252
Palavras-chave: Psicologia Pediátrica,
riscos ao desenvolvimento, estratégias de
enfrentamento
HOSPITALIZAÇÃO INFANTIL:
ESTRATÉGIAS DE ENFRENTAMENTO DE
CRIANÇAS E CUIDADORES
Camila Ramos Medalane Cravinho - UVV
[email protected]
Claudia Pedroza Canal - UVV/
[email protected]
Alessandra Brunoro Motta Loss - UFES
[email protected]
Financiamento: FUNADESP/UVV/CNPq
A implantação do modelo de assistência
psicológica e de humanização, em serviços de saúde pediátrica, tem contribuído
para que aspectos do desenvolvimento
físico, cognitivo e emocional da criança
sejam minimamente afetados pela doença. De outro lado, os vários tipos de tratamento provocam mudanças na rotina
da criança, exigindo freqüentes idas ao
hospital, internações, afastamento escolar e familiar, exposição a procedimentos
médicos invasivos, entre outras alterações do cotidiano, que provocam reações
de stress e sofrimento (McCaffrey, 2006).
No caso da hospitalização, estudos mostram que um período de internação superior a cinco dias é fator de risco para
o desenvolvimento de transtornos comportamentais (Dias, Baptista & Baptista,
2003). Deve ser levado em consideração,
ainda, que a hospitalização tem impacto
não somente sobre a criança em desenvolvimento, mas, também, sobre sua
família. O cuidado diário da criança no
hospital implica no abandono temporário das atividades cotidianas e dos outros
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
membros da família, bem como a responsabilidade de gerenciar os cuidados com
a criança doente em um ambiente hostil,
no qual a tomada de decisão sobre esses
cuidados está centrada em pessoas até
então desconhecidas (Weisz, McCabe
& Dennig, 1994). Assim, uma vez que o
comportamento da criança pode afetar
o modo como ela lida com a hospitalização, interferindo no curso da recuperação, e que o contexto adverso associado
à hospitalização é suficiente para gerar
reações de stress e sofrimento, exigindo a
necessidade de enfrentamento da situação para a eliminação ou minimização do
estressor; este estudo buscou investigar
as estratégias de enfrentamento de crianças hospitalizadas e de seus cuidadores,
bem como verificar a presença de problemas de comportamento entre as crianças
estudadas. Para tanto, realizou-se um
estudo descritivo, de corte transversal,
com 15 crianças: 7 meninos e 8 meninas, com idades entre 6 anos e 3 meses
a 12 anos e 11 meses (média de 9 anos
e 5 meses), internadas em hospital público de Vila Velha/ES, que responderam
ao Instrumento de Avaliação do Enfrentamento da Hospitalização (AEH) (Motta
& Enumo, 2004, 2010), que fornece informações sobre os comportamentos durante a hospitalização e permite verificar as
estratégias de enfrentamento da hospitalização, a partir do relato das crianças;
e ao Child Behavior Checklist (CBCL/6-18
anos) (Achenbach & Rescorla, 2004), que
avalia a competência social e problemas
de comportamento anteriores à hospitalização. Para a análise do enfrentamento
dos familiares, 15 cuidadores - sendo a
maioria mães - responderam à Escala Modos de Enfrentamento (EMEP) (Faria &
Seidl, 2006; Seidl, Rossi, Viana, Meneses
& Meireles, 2005). As informações coletadas na avaliação foram analisadas quantitativa e qualitativamente, de acordo com
as normas dos instrumentos. Em relação
aos comportamentos apresentados pelas
crianças durante a hospitalização, obtidos
a partir do AEH, verificou-se o predomínio de comportamentos facilitadores (M
= 1,93) sobre os comportamentos não-facilitadores (M = 0,77). A análise por
tipo de comportamento destaca a média
maior dos comportamentos: assistir TV e
tomar remédio. Os comportamentos que
apresentaram menor média foram buscar
informações e cantar. Entre os comportamentos não-facilitadores, verificou-se
uma pontuação média maior na prancha
pensar em milagre e desanimar. Esconder não foi referido por nenhuma criança como um comportamento emitido no
hospital. A pontuação média superior no
comportamento de assistir TV pode ser
justificada pelo fato de ser o único recurso de distração disponível para a criança
durante a internação, mostrando a relevância de ações institucionais que promovam o brincar nesse contexto. Quando
se analisam as justificativas das crianças
para suas respostas, a fim de obter a estratégia de enfrentamento que está sendo relatada, foi verificada uma proporção
maior da estratégia de distração (40,5%),
seguida da estratégia de ruminação
(31,1%), busca por suporte (25,7%) e solução do problema (20,3%). A estratégia
que apresentou menor proporção foi regulação da emoção (1,3%). A estratégia
de distração tem sido predominante em
outros estudos com crianças hospitalizadas por doenças crônicas, como o câncer,
mas a freqüência da estratégia de ruminação é um indicador da necessidade da
inclusão do psicólogo na equipe de saúde,
253
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
avaliando e desenvolvendo propostas de
intervenção que favoreçam o processo
adaptativo da criança. Na análise de competência (CBCL), as crianças foram referidas, na maioria, como não-clínica (Social
= 87,5%; Escolar = 81,2%). Com relação
ao envolvimento da criança em atividades esportivas e de lazer, a maioria foi
referida como clínica, indicando o baixo
envolvimento em atividades recreativas.
Já a análise de problemas de comportamento (CBCL) mostrou que a maioria das
crianças foi referida como clínica. A análise por tipo de comportamento permitiu
verificar que a indicação de problemas é
do tipo internalizante, caracterizado por
um padrão de depressão, retraimento
e desânimo. Esses achados ressaltam a
importância da inserção do psicólogo na
Pediatria, uma vez que um padrão de desânimo e depressão anterior à hospitalização pode repercutir na variabilidade
de estratégias da criança para lidar com
a hospitalização. Com relação à avaliação
das estratégias de enfrentamento dos cuidadores, verificou-se que dos quatro fatores da EMEP, o Fator 3 (Busca de prática
religiosa/pensamento fantástico) apresentou média de pontuação superior (M=
2,95 e DP= 1,77), seguido do Fator 4: Busca de suporte social (M= 2,83 e DP= 1,82)
e do Fator 1: Enfrentamento focalizado no
problema (M= 2,81 e DP= 1,73). O fator
que apresentou menor média foi o Fator
2: Enfrentamento focalizado na emoção
(M= 1,75 e DP=1,21). A análise por itens
destaca médias superiores nos itens 44
– “Eu me apego à minha fé para superar
esta situação” (M = 3,65) e 6 – “Espero
que um milagre” aconteça (M = 3,55), ambas as estratégias do Fator 3. A freqüência
maior de estratégias do Fator 3 mostrou-se coerente com estudos que indicam a
254
busca da religiosidade no enfrentamento
de problemas, especialmente, em situações de pouco controle, como é o caso
da hospitalização. Além disso, considera-se a cultura religiosa como variável que
interfere na resposta de enfrentamento.
Espera-se que a presente avaliação possa
contribuir para o subsídio de intervenções
com crianças hospitalizadas, bem como
com seus cuidadores, prevenindo danos
emocionais gerados pela hospitalização.
Palavras-chave: estratégias de
enfrentamento, hospitalização infantil,
cuidadores.
Contato: Camila Ramos Medalane Cravinho,
Centro Universitário Vila Velha/UVV,
[email protected]
PERCEPÇÕES MATERNAS SOBRE
CUIDADOS E PROBLEMAS
COMPORTAMENTAIS DE FILHOS
PREMATUROS E COM BAIXO PESO
Kelly Ambrósio Silveira - UFES/IESFAVI
[email protected]
Schwanny Roberta Costa Rambalducci
Mofati Vicente - UFES
[email protected]
Sônia Regina Fiorim Enumo - UFES
[email protected]
Financiamento: CNPq
A literatura tem apontado a prematuridade e o baixo peso como fatores que
podem conferir maior vulnerabilidade
ao desenvolvimento infantil. Seus efeitos
podem ser observados durante a primeira infância e, até mesmo, na fase escolar
(Linhares, Bordin & Carvalho, 2004; Magalhães, Catarina, Barbosa, Mancini &
Paixão, 2003). Diversos estudos mostram
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
que crianças em condições de nascimento prematuro e com baixo peso (PT-BP),
quando comparadas a crianças com peso
≥2.500g e >37 semanas de gestação, são
mais propensas a apresentar comprometimentos no desenvolvimento cognitivo e
comportamental (Espírito Santo, Portuguez & Nunes, 2009; Linhares, Chimello,
Bordin, Carvalho & Martinez, 2005). Ao
mesmo tempo, a Psicopatologia do Desenvolvimento tem indicado a ação de fatores biopsicossociais que tendem a produzir efeitos diferenciados ao longo da trajetória de desenvolvimento infantil (Laucht,
Schmidt & Esser, 2004). Nesse contexto, a
interação de criança e seus familiares parece ser crucial para o desenvolvimento
de variadas habilidades (Linhares, Martins & Klein, 2004). Ressalta-se, também,
que as condições neurológicas e familiares da criança atuam de modo significativo a suavizar ou agravar tais comprometimentos. Estudos têm apontado que
mães com filhos PT-BP mostram-se mais
atentas nos cuidados com os filhos, assim
como mais sensíveis em relação aos sinais
emitidos por eles (Feldman, 2007). Esses
comportamentos maternos podem constituir-se em uma forma de compensação
perante os riscos aos quais os bebês estão
expostos. Por outro lado, as mães podem
apresentar comportamentos menos assertivos ao lidar com o filho, em decorrência da fragilidade do recém-nascido e
sentimentos de culpa vivenciados (Feldman, 2007; Morsh & Abreu, 2008). Diante
disso, esta pesquisa investigou queixas
comportamentais relacionadas aos filhos,
além de formas de cuidado e interação
entre crianças PT-BP com idade entre 18
e 36 meses e suas mães, inscritos em Programa de Follow up de um Ambulatório
de Neurologia de um hospital público da
Grande Vitória, ES. Participaram da coleta
30 mães de crianças PT-BP, divididas em
três grupos: mães de crianças de 18 a 24
meses (G1= 10), 24 a 30 meses (G2= 10) e
30 a 36 meses (G3= 10). Foram aplicados:
um questionário sobre dados familiares
e de nascimento e uma entrevista semiestruturada contemplando percepções
sobre formas de cuidado com os filhos,
métodos de estimulação que as mães utilizavam e expectativas sobre o desenvolvimento do filho. Também foi aplicado o
Child Behavior CheckList – CBCL (1½ a 5
anos) (Achenbach & Rescorla, 2004), que
avalia problemas comportamentais do
tipo internalizante e externalizante, além
de conter escalas orientadas pelo DSM-IV
que, no caso do presente estudo, apontaram predominância de problemas externalizantes, com 30% da amostra apresentando perfil Clínico para esse problema
comportamental. Os problemas mais frequentes foram de ordem atencional (50%
da amostra). A maioria das crianças (20)
apresentou perfil clínico para pelo menos
um tipo de problema comportamental,
com maior proporção no G1 (7). Considerando as médias obtidas pelos T scores, os
problemas atencionais e a agressividade
tiveram as maiores pontuações, sobretudo, em G1 (60,5 e 61,3) e G2 (65,0 e 62,2),
respectivamente. Considerando as escalas orientadas pelo DSM-IV, foi observada
maior frequência em G1 e G2 de Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade
(5 crianças cada) e Transtorno Desafiador
e Opositor (2 e 3 crianças, respectivamente). A partir da entrevista, foi possível
identificar que 80% das mães acreditavam que o fato do filho ter nascido PT-BP
não influenciava seu desenvolvimento e
que a assistência que a criança iria receber seria primordial. As mães relataram
255
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
que levavam sempre a criança para consultas com médico, fisioterapeuta e outras especialidades que fossem necessárias. Costumavam, também, estar muito
presentes na vida dessas crianças, dando
carinho e apoio, fatores que elas acreditavam ser fundamentais para o desenvolvimento de seus filhos. Uma pequena parte
das mães (20%) acreditava que a PT-BP
influenciava o desenvolvimento de seus
filhos, mas, todas concordavam que a estimulação era essencial. Todas as mães
falaram sobre a importância de sua ajuda no desenvolvimento da criança; essa
ajuda foi traduzida, em 72,5% das mães,
em cuidados com a saúde, como acompanhamento com profissionais de saúde,
boa alimentação, uso de remédios e vitaminas; dar atenção, carinho e cuidar foi
relatado por 62,5% das mães; e realização de atividades lúdicas, por 37,5% das
mães. Foram relatadas outras atividades
com baixos índices, tais como levar para
escola e creche, com 15%, e também praticar natação, com 7,5%. Com relação às
atividades que realizavam juntos, as mais
citadas foram: passeio no parque ou pracinha, visita aos parentes e atividades
realizadas em casa, tais como brincar. Verificou-se que, enquanto a frequência de
menção às visitas a parentes diminuiu de
G1 a G3, a menção de atividades lúdicas
e de lazer aumentou. De acordo com as
mães, os pais tiveram um papel secundário no cuidado dos filhos, desenvolvendo
atividades voltadas à vigilância e às atividades lúdicas. Na perspectiva das mães,
os familiares costumavam lidar com as
dificuldades externalizantes, demonstrando os seguintes comportamentos, em
ordem decrescente de frequência: tentar
distrair a criança (11), ajudar a criança
por achá-la frágil (9), mesmo irritado, não
256
interferir (7), bater (3) e não dar atenção
(2). Observou-se que em G1 houve maior
frequência de comportamentos pouco
assertivos, ligados, sobretudo, a ajudar a
criança por achá-la frágil (5), tentar distrair a criança (4) e não interferir, mesmo
nervoso (3). Diante dos resultados obtidos, é possível concluir que as mães de
crianças PT e BP acreditam que esses fatores podem não afetar o desenvolvimento
da criança, a partir do momento em que
elas se disponibilizam ao cuidado. Sugere-se que o sentimento de culpa frente ao
nascimento de risco, porventura, experimentado pelas mães e demais familiares, pode contribuir para a manutenção
de repertório comportamental que contemple a superproteção, como forma de
compensar a vulnerabilidade apresentada pelos filhos e o desconforto frente aos
problemas apresentados. G1 apresentou
discurso relacionado à superproteção e
ao cuidado não assertivo, e teve maior
frequência de crianças com problemas
comportamentais externalizantes. Os
dados presentes confirmam a literatura
quanto à vulnerabilidade de crianças nascidas PT-BP para a manifestação de problemas comportamentais, sobretudo, os
de padrão externalizante, e a presença de
cuidados familiares pouco assertivos, indicando a necessidade de apoio aos pais,
com treinamento de habilidades ligadas à
estimulação dos filhos.
Palavras-chave: risco ao desenvolvimento,
prematuridade, avaliação do
desenvolvimento
Contato: Schwanny Roberta Costa
Rambalducci Mofati Vicente, Universidade
Federal do Espírito Santo,
[email protected]
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
ANÁLISE DE UMA PROPOSTA DE
INTERVENÇÃO COM MÃES DE BEBÊS
PREMATUROS E COM BAIXO PESO
INTERNADOS EM UTIN
Ana Cristina B. Cunha - UFRJ
[email protected]
Luciana F. Monteiro - UFRJ
[email protected]
Cristiane T. Rocha - UFRJ
[email protected]
Ana Paula A.S. Medeiros - UFRJ
[email protected]
Anderson M. Rodrigues - UFRJ
[email protected]
Camila S. Pereira - UFRJl
[email protected]
Fabiana Pinheiro Ramos - UFES
[email protected]
Schwanny Roberta Costa Rambalducci Mofati
Vicente - UFES
[email protected]
Maria Luiza Guidoni Macedo - UFES
[email protected]
Kely Maria Pereira de Paula - UFES
[email protected]
Sônia Regina Fiorim Enumo - UFES
[email protected]
Financiamento: CNPq/MCT/CAPES/MEC/
FAPERJ/CNRMS/MEC
Situações de risco podem acarretar maior
vulnerabilidade para atrasos de desenvolvimento, sobretudo, quando no nascimento de um bebê estiverem presentes
condições de risco, como a prematuridade
e o baixo peso (PT-BP). Tais condições podem, freqüentemente, ser causa de internação dos bebês em Unidades de Terapia
Intensiva Neonatal (UTIN) e provocar alterações nas expectativas maternas acerca
do seu desenvolvimento, modificando, assim, as possibilidades de interação da día-
de mãe-bebê (Carvalho, Linhares, Machado & Martinez, 2004). A UTIN, dispositivo
que oferece o máximo de suporte para o
desenvolvimento do recém-nascido, também se constitui em potencial fator de
risco, devido às privações de estímulos
sensoriais ou excesso de estimulação decorrente da atividade humana e tecnológica presentes nesse ambiente (Raeside,
1997). As complicações neonatais podem
constituir indicadores para ocorrência de
efeitos negativos no desenvolvimento,
tais como: deficiências motoras, visuais
e auditivas; retardo mental; distúrbios de
atenção; dificuldades de aprendizagem
em idade escolar e pior desempenho em
testes de capacidades cognitivas e lingüísticas, se comparados aos de crianças
nascidas a termo e com peso adequado
(Espírito Santo, Portuguez & Nunes, 2009;
Linhares, Bordin & Carvalho, 2004). Isso
tudo pode ser agravado quando a percepção materna da condição da criança
resulta em maiores níveis de estresse,
ansiedade e depressão, que podem perdurar mesmo após a alta, indicando a
necessidade de intervenção psicológica
(Feldman, 2007). Nesse contexto, a realização de intervenção durante o período
em que a mãe fica internada com o bebê
pode minimizar os impactos da hospitalização infantil no bem-estar emocional
materno, com possíveis reflexos na interação mãe-criança e no desenvolvimento
infantil (Gasparetto & Bussab, 1994; Melnyk, Feinstein & Fairbanks, 2006; Melnyk
et al., 2006). O objetivo deste estudo foi
analisar uma proposta de intervenção em
Psicologia Pediátrica (Barros, 2003), conduzida em duas maternidades públicas
de referência para assistência pré-natal e
perinatal de alto risco - na Região Metropolitana da Grande Vitória, ES (n=18) e na
257
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
Maternidade-Escola da Universidade Federal do Rio de Janeiro (n=14). Seguindo
as normas éticas, as mães foram abordadas pessoalmente e convidadas a participar do grupo de intervenção, que ocorreu
em duas sessões consecutivas. O critério
de inclusão na amostra era o bebê ser PT-BP e estar internado na UTIN. Na sessão
1 do grupo de intervenção foram explicitados às mães os objetivos e as etapas da
pesquisa. Após a concordância assinada,
as mães responderam, individualmente,
um protocolo de registro de dados sobre
seu perfil psicossocial, sendo entregue um
material de apoio com informações sobre
desenvolvimento infantil, prematuridade,
baixo peso e a internação na UTIN, conteúdos transmitidos às mães nos dois dias
do grupo, sob a forma de palestra informativa seguida de discussão, com apoio
de material audiovisual. Na sessão 2, as
mães responderam um inventário de satisfação do usuário e um questionário de
avaliação da intervenção psicológica implementada, para verificar se a participação no grupo as ajudou a enfrentar melhor a situação de internação do bebê. As
categorias analisadas foram: (a) se o grupo
ajudou a mãe no enfrentamento da situação do bebê; (b) o que a mãe achou mais
interessante ou importante (ou não interessante/importante) no grupo; (c) como
a mãe se sentiu após as sessões: “muito
melhor”; “melhor”; “igual”; “pior” ou
“muito pior”; (d) o que a mãe aprendeu
sobre o bebê internado em UTIN: “nada”;
“muito pouco”; “alguma coisa”; “várias
coisas” ou “muitas coisas”; (e) o que a
mãe aprendeu sobre como lidar com o
bebê internado: “nada”; “muito pouco”;
“alguma coisa”; “várias coisas’ ou “muitas
coisas”; (f) estado emocional da mãe após
o grupo para cuidar do bebê internado:
258
“nada confiante”; “um pouco confiante”;
“o mesmo que antes”; “mais confiante’ ou
“muito mais confiante”; (g) percepção materna do quanto o grupo ajudou a enfrentar a internação do bebê: “não ajudou”;
“ajudou pouco”; “nem ajudou, nem atrapalhou”; “ajudou um pouco” ou “ajudou
muito”; (h) sentimentos maternos sobre
participar do grupo: “detestou muito”;
“detestou um pouco”; “sente-se neutra”;
“gostou um pouco” ou “gostou muito”. Os
resultados mostraram que todas as mães
avaliaram que o grupo ajudou no enfrentamento da situação de internação do seu
bebê, quer seja porque elas adquiriram
conhecimento (n=12), quer seja porque
puderam contar com suporte psicossocial
(n=14) ou ambas as coisas (n=5). Todas as
mães consideraram interessante e importante o conteúdo transmitido ao grupo,
sendo que a maioria (n=20) avaliou como
interessante e importante o conhecimento adquirido (características do bebê
PT-BP, como cuidar do bebê, marcos do
desenvolvimento infantil, por exemplo),
além da troca de experiência que o grupo
promoveu (n=7), entre outros aspectos.
Sobre como as mães se sentiram após as
sessões, 8 relataram que se sentiram “um
pouco melhor do que antes”, enquanto 24
mães declararam se sentir “muito melhor
do que antes”. Quando questionadas sobre o que aprenderam sobre o bebê internado em UTIN, a maioria (n=20) disse ter
aprendido “muitas coisas” sobre o bebê
internado e “muitas coisas” sobre como
lidar com o bebê na UTIN (n= 21). Após
participar do grupo, apenas uma mãe
declarou se sentir da mesma forma que
antes em relação a estar confiante para
cuidar do bebê, enquanto que a maioria
se declarou “mais confiante” (n= 13) ou
“muito mais confiante” (n=18); além dis-
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
so, a maioria afirmou ter “gostado muito
do grupo” (n= 31) e 27 mães também consideraram que o grupo “ajudou muito” a
enfrentar a internação do bebê na UTIN.
Os sentimentos e percepções maternas
acerca da participação no grupo indicam
uma avaliação positiva da proposta de intervenção psicológica adotada, capaz de
promover estratégias mais adequadas de
enfrentamento da hospitalização do bebê,
a partir do conhecimento adquirido, bem
como do suporte psicossocial e da troca
de experiências que o grupo proporcionou
às mães.
Palavras-chave: grupo de mães, estratégias de
enfrentamento, prematuridade e baixo peso
Contato: Cristiane Tonnensen Rocha,
Universidade Federal do Rio de Janeiro,
[email protected]
CO 17 - LT02
Surdez
LT02-1382 - COGNIÇÃO E LINGUAGEM
DOS SURDOS: UM ESTUDO
EXPLORATÓRIO COM BASE NO TESTE
WISC-III
Tharso Meyer - UCPel-RS
[email protected]
Vera Figueiredo - UCPel-RS
[email protected]
Considerando o número cada vez maior
de surdos inseridos na comunidade acadêmica/escolar, surge uma demanda de
profissionais especializados, metodologias e instrumentos adequados para atender às necessidades dessa população com
características tão específicas. A avaliação
da inteligência dos surdos é uma atividade muitas vezes relevante para decidir
quanto ao encaminhamento e/ou planos
de intervenção para a efetividade dos
processos inclusivos. As escalas Wechsler
de inteligência, em suas diversas edições,
são amplamente utilizadas na avaliação
de crianças e adolescentes, estimando a
capacidade intelectual geral em função
dos domínios das habilidades verbais e
não-verbais. Encontram-se vários estudos
que utilizam estas escalas também com
surdos, administrando, principalmente,
o conjunto de subtestes não-verbais, os
quais não exigem respostas que envolvam
a linguagem oral do examinando. Devido
ao atraso no desenvolvimento da
linguagem, os surdos, geralmente, têm
desvantagens nos subtestes verbais. As
aplicações costumam ser administradas
de maneira informal (gestualização), oral
(leitura labial) e mesmo, no caso de utilizar a Língua de Sinais, não há referências
de estudos de adaptação. Os resultados
apontam para escores médios na escala
não-verbal e médios inferiores a limítrofes
na escala verbal. Além de problemas relacionados à falta de adaptação do instrumento, outros fatores podem justificar o
baixo desempenho dos surdos nos subtestes verbais das escalas Wechsler. Segundo
a literatura, as oportunidades limitadas de
ouvir informações e a falta do reforço auditivo prejudicam a aquisição e o aumento
do vocabulário dos surdos. A limitação em
compreender conceitos científicos pode
estar associada à ausência de algumas
aprendizagens do cotidiano, previamente
adquiridas. A dificuldade ao acesso a uma
língua que seja oferecida de forma natural
pode levar a criança surda a um tipo de
pensamento mais concreto. Os pais de 90
a 95% dos surdos são ouvintes, a maioria
259
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
demonstrando resistência no aprendizado
e na utilização da Libras. Consequentemente, o filho surdo chega à escola sem
dominar nenhuma língua, encarregando
a instituição de criar condições para esta
aquisição. A língua brasileira de sinais – Libras foi reconhecida no país em abril de
2002 e é considerada a língua materna
dos surdos. Por ser uma língua recente
e em construção, há uma limitação de
expressões, não havendo, ainda, sinais
formais para alguns vocábulos do português. O sinal utilizado para determinado
conceito em Libras, pode abranger outros
significados que representam, no português, palavras diferentes. Assim, a dificuldade dos surdos pode estar associada à
privação de ferramentas da competência
gramatical. Apresentar alguns resultados
sobre a capacidade cognitiva e o desenvolvimento da linguagem dos surdos,
segundo seu desempenho nas provas do
teste de inteligência WISC-III. Com intuito
de verificar a adequação do instrumento
para a comunidade surda, o WISC-III, na
sua forma original, adaptado ao contexto
brasileiro, foi apresentado a um grupo de
especialistas para analisar a adequação
dos itens ao contexto dos surdos. Logo,
foram feitas algumas modificações pertinentes e, após, os itens e as instruções do
instrumento foram traduzidas para Libras.
O teste WISC-III traduzido foi filmado e
gravado em DVD para treinamento e padronização das aplicações. O instrumento
foi aplicado em uma amostra-piloto constituída de 14 escolares surdos de ambos
os sexos, usuários da Libras, matriculados
de quatro escolas públicas, inclusivas e
exclusivas, duas cidades da região sul do
país. Apesar de o teste ser padronizado
para a faixa de 6 a 16 anos, foi aplicado
em participantes com idades entre 7 a 21
260
anos, considerando-se o critério mais relevante, a escolaridade dos adolescentes,
uma vez que, normalmente, há um atraso
na escolarização dos surdos. O teste foi
aplicado nas próprias instituições escolares por duplas de pesquisadores com domínio da Libras; um sinalizava os itens e
outro registrava as respostas. Em relação
aos subtestes não-verbais, foram testadas
as instruções e os itens iniciais de cada
subteste. Os participantes não tiveram
dificuldades de compreender e executar
as tarefas, demonstrando terem potencial para o raciocínio prático-concreto e
facilidade para percepção e organização
de estímulos visuais, confirmando dados
da literatura. No subteste Informação, os
dados mostraram que os alunos surdos
parecem ter dificuldade de memorizar
e assimilar conteúdos dos itens relacionados com a vivência pessoal e o currículo escolar. Em Semelhanças, o tipo de
estímulo utilizado é breve, já que inclui
perguntas simples e repetitivas, exigindo
que o indivíduo identifique a similaridade
entre os dois conceitos ou objetos apresentados. As respostas referiram-se, geralmente, às diferenças entre os objetos,
sendo associadas às situações concretas,
demonstrando dificuldade no raciocínio
abstrato. No subteste Vocabulário, dos 30
itens que compõe o subteste, 14 palavras
não foram encontradas no dicionário de
Libras, indicando pobreza lexical da língua.
A tarefa no subteste exige que o examinando identifique o significado da palavra
dando sinônimos. Observou-se repertório
limitado de vocabulário, uma vez que, um
único sinal em Libras, pode ter vários sinônimos e significados diferentes. No subteste Compreensão, que envolve conhecimento de situações sociais do cotidiano,
os participantes não conseguiram dar
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
dois argumentos diferentes nos itens que
exigem duas respostas, sugerindo pensamento mais concreto e dificuldade para
expressar as ideias. No subteste Dígitos,
o examinando deve repetir uma série de
números, sinalizados pelo examinador.
Identificou-se dificuldade sequencial visual e limitações na memória imediata.
No subteste Aritmética que exige cálculos
a partir da sinalização do examinador de
problemas matemáticos, os participantes evidenciaram dificuldade de executar
cálculo mental, e déficit de atenção. O desempenho nos subtestes verbais, que envolve domínio e aprendizagem da língua e
raciocínio teórico-reflexivo, demonstrou
pouca qualidade na elaboração das respostas. Pode-se concluir que, apesar das
limitações em algumas habilidades cognitivas dos surdos e restrições na comunicação familiar, a falta de recursos léxicos
da própria Língua de Sinais e a estrutura
inapropriada dos subtestes verbais dificultam o processo de avaliação deste grupo
clínico, por meio do teste WISC-III sem um
processo de adaptação.
LT02-1448 - OS EFEITOS DO
NASCIMENTO DE UMA CRIANÇA
SURDA EM UMA FAMÍLIA OUVINTE –
CONSIDERAÇÕES DESDE A PSICANÁLISE
Letícia Silveira Vasconcelos - UFBA
www.ufba.br
Sônia Maria Rocha Sampaio - UFBA
www.ufba.br
Duas correntes principais e opostas sobre
a surdez são encontradas na psicologia e
nas demais áreas que se ocupam do tema.
A mais antiga, vinculada a um modelo médico, denominada modelo clínico-terapêutico, se alinha a uma concepção da surdez
como uma deficiência que deve ser reparada. Esta perspectiva está referida a um
conceito fixo de normalidade. É uma tendência, neste modelo, atribuir-se ao surdo desvantagens maturativas, sejam elas
de origem neurológica ou psicológica. Na
psicologia, a concepção clínico-terapêutica foi dominante especialmente entre os
anos 50 e 60, dando origem à Psicologia da
Surdez, que atribuía ao surdo dificuldades
de ordens motora, intelectual e comportamental. (Bisol, Simioni & Sperb, 2008;
Solé, 2005). Em oposição a esta corrente,
surge o modelo socioantropológico, que
se desenvolve em interface com os Estudos Culturais, as antropologias de grupos
minoritários, políticas de educação, políticas identitárias, entre outros. Este conjunto de estudos é denominado Estudos
Surdos. Ele parte de uma compreensão da
surdez como diferença, cultural e lingüística, e propõe a construção de saberes e
práticas que considerem as particularidades da aquisição da linguagem e construção do conhecimento pelos surdos como
qualitativamente diferentes dos ouvintes.
(Skliar, 2010; Bisol et al, 2008; Solé, 2005).
Um terceiro grupo de trabalhos sobre a
surdez pode ser identificado, ainda que
não se constitua como um modelo. São
os trabalhos que se constroem a partir da
teoria psicanalítica. Segundo Solé (2005),
só recentemente este tema tem sido estudado por psicanalistas e ainda há um
número pequeno de artigos publicados.
Esses estudos devem ser considerados
como um grupo a parte, não se alinhando
com nenhuma das correntes citadas anteriormente. Em um artigo no qual analisam
a produção da psicologia brasileira sobre
a surdez, Bisol et al (2008) também situam os estudos de concepção psicanalítica
como um terceiro grupo. Dos 34 artigos
261
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
encontrados, seis foram identificados pelas autoras como pertencentes ao modelo
clínico-terapêutico, 24 ao socioantropológico e quatro à concepção psicanalítica.
Desde a psicanálise, a surdez vai ser tomada a partir da forma como se inscreve na
história do sujeito e daqueles com quem
vai estabelecer seus primeiros laços. Desse modo, como afirma Solé (2005, p.35),
a psicanálise “não se atém à normalização
e não busca a cura”, mas vai se perguntar
sobre as especificidades da estruturação
subjetiva de cada sujeito marcada pela
surdez. Este trabalho parte da idéia de que
a surdez se apresenta para a teoria psicanalítica, de cara, como um desafio, uma
vez que vai demandar um repensar sobre
algumas questões centrais à psicanálise,
em especial àqueles que trabalham com
a psicanálise e o desenvolvimento infantil. Porém, justamente por isso, que é na
própria psicanálise que se poderá produzir
contribuições importantes sobre o tema.
Entre estes pontos destaca-se a centralidade incontestável da linguagem para esta
teoria e sua conseqüente importância para
a estruturação subjetiva; a importância
atribuída pela psicanálise, desde Freud,
às primeiras experiências da criança com
a linguagem, mediada pelo Outro Primordial; e o papel fundamental da voz materna, e do manhês, para o enlaçamento do
bebê à linguagem. Neste trabalho, buscamos artigos empíricos de outras áreas de
pesquisa para verificar essas idéias. Entre
outros, Beauchemin, González-Frankenberger, Trembla et al., (2010) ressaltam
a importância da voz, em detrimento de
outros estímulos sonoros, para o córtex
auditivo, em especial de vozes familiares.
Este estudo demonstrou que bebês não
só reagem à voz materna de forma mais
ativa, como reagem de forma diferente,
262
ativando áreas corticais relevantes para a
linguagem. Também Kuhl (2007) mostra
que o uso do manhês por adultos encoraja
a reciprocidade nas crianças e demonstra
que mesmo recém-nascidos preferem as
falas dirigidas aos bebês, ainda que não
sejam produzidas por suas próprias mães
e mesmo que não sejam ditas em sua língua materna. Os estudos sobre a aquisição
da linguagem ressaltam a importância de
que a criança seja, desde seu nascimento,
inserida em um ambiente lingüístico natural, em que a língua lhe seja apresentada
cotidianamente. Esta compreensão se sustenta no entendimento de que a língua e a
linguagem são adquiridas em relação com
o outro e com o meio. De modo geral, os
trabalhos sobre a surdez definem a língua
de sinais como língua natural, ou língua
materna, dos surdos, justamente por ser
essa uma língua que o surdo pode apreender naturalmente. No entanto, entre
90 e 95% das crianças surdas nascem em
famílias ouvintes, que não dominam a língua de sinais. Algum tempo se passa até
que a família possa se adaptar às necessidades lingüísticas deste novo membro e
que possa escolher que caminho vai tomar
no que diz respeito à inserção de seu filho
na língua. Diante do exposto perguntamos
o que pode nos dizer a psicanálise sobre
os efeitos do nascimento de uma criança
surda em uma família de ouvintes. Três
grupos de efeitos são analisados: os efeitos na entrada do bebê na linguagem, os
efeitos na alienação e separação entre os
corpos da mãe e do bebê e os efeitos na
apresentação do mundo ao bebê. Entendemos que, embora apresentados de forma separada, estes são eventos essenciais
ao processo de estruturação subjetiva. A
análise destes três eixos, a partir de artigos teóricos, relatos de casos e experiência
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
profissional com crianças surdas e suas famílias, demonstrou que a surdez, enquanto ausência de percepção do estímulo
auditivo, não impede o processo de estruturação subjetiva. No entanto, ela coloca
algumas barreiras, especialmente por conta da diferença lingüística entre o bebê e
sua família. Não é a lesão real, mas a lesão
fantasmática (Bergès, 1988b) que pode
trazer efeitos mais nocivos e permanentes
para o sujeito surdo. Sob todos os aspectos, ficou bastante clara a necessidade de
um diagnóstico o mais precoce possível da
surdez. Do lado estrutural, o saber sobre a
surdez e o poder elaborar o luto pelo filho
idealizado é que vão dar início à construção de um novo lugar para o bebê. Do lado
instrumental, um acompanhamento interdisciplinar poderá ajudar a família a lançar
mão de diferentes possibilidades lingüísticas, ainda nos primeiros momentos de sua
entrada na linguagem.
Palavras-chave: surdez, psicanálise,
estruturação subjetiva
Contato: Letícia Silveira Vasconcelos – UFBA –
[email protected]
LT03-1004 - PROJETOS DE VIDA DE
UNIVERSITÁRIOS SURDOS EM UMA
PERSPECTIVA ÉTICA
Alline Nunes Andrade - UFES
[email protected]
Heloisa Moulin de Alencar - UFES
[email protected]
Financiamento: FAPES
A moral passa por desenvolvimento (Piaget, 1932/1994; Kohlberg, 1992) e se origina da indeterminação, que “obriga o ser
humano a construir o modo como quer
ser e o modo como se quer viver” (Puig,
1998, p. 26). La Taille (2006) diferencia
moral de ética, sendo moral referente
aos deveres e ética relacionada às reflexões acerca da felicidade. Nesse contexto, é possível emergirem perguntas como
“quem eu quero ser?” (La Taille, 2006, p.
46) e “que vida eu quero viver?” (p. 36),
instigando a investigação sobre projetos
de vida. Para Damon (2009), o projeto de
vida, em uma perspectiva ética, é “uma
intenção estável e generalizada de alcançar algo que é ao mesmo tempo significativo para o eu e gera consequências
no mundo além do eu” (p. 53). Pesquisas
sobre projetos de vida em tal perspectiva destacam a escassez de projetos de
vida em que o outro comparece de forma
central (D'Áurea-Tardeli, 2005; La Taille
& Madeira, 2004; Miranda, 2007). Para
investigar a relação entre moralidade e
legitimação de atos violentos, La Taille e
Madeira (2004) analisaram projetos de
vida de adolescentes e observaram que,
em linhas gerais, o uso da violência não
foi condenado moralmente pelos participantes. Os autores ressaltam que "grande
parte dos adolescentes justificam hipoteticamente a violência [...] e, no plano ético, não inclui outrem como parceiro nos
seus projetos de vida." (p. 30). Em sua
pesquisa, D'Áurea-Tardeli (2005) verificou
que somente 29,55% dos participantes
apresentaram aspirações solidárias em
seus projetos de vida. Por sua vez, Miranda (2007) também considerou as justificativas dos projetos de vida de adolescentes
em conectados, nos quais outras pessoas
eram incluídas como protagonistas e participantes, ou desconectados, quando
outras pessoas eram consideradas, mas
de modo instrumentalizador. As principais justificativas (66,7%) caracterizaram
263
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
os projetos de vida como desconectados
(Miranda, 2007). Com base nesses dados,
pretendemos investigar o grau de consideração do outro em projetos de vida
estabelecidos por universitários surdos,
usuários da língua de sinais. Os surdos
fazem parte de uma comunidade minoritária que, de acordo com Gesueli (2006),
é usualmente discriminada, comumente
pela adoção de uma perspectiva médica
da surdez ou modelo clínico da surdez.
Porém, Skliar, Massone e Veinberg (1995)
alegam ser possível assumirmos a perspectiva socioantropológica, que considera
o surdo como parte de uma comunidade
para a qual a língua de sinais exerce um
papel fundamental. Nebel (2006) observa
que por ter sido comum o modelo clínico
da surdez na área educacional, “a escola
não tinha compromisso com o desenvolvimento cognitivo do aluno” (p.12). Histórias de fracasso escolar e proibição do
uso de Libras nos espaços escolares foram
relatadas por pessoas surdas em estudos
sobre humilhação (Andrade, 2006; Andrade & Alencar, 2008, 2010). Pretendemos,
assim, investigar a existência de projetos
de vida em uma perspectiva ética, com a
participação de 16 universitários surdos,
da região da Grande Vitória-ES, usando
o método clínico piagetiano, por meio
de uma entrevista semiestruturada em
língua de sinais e filmada na íntegra. Perguntamos aos participantes ‘Quem é você
no futuro do jeito que você gostaria que
fosse?’. Em resposta, foram citados 102
projetos de vida. Os principais projetos de
vida são de ‘atividade profissional’ (n=29),
‘formação acadêmica’ (n=27), ‘relacionamento afetivo’ (n=20) e ‘bens materiais’
(n=11). Em ‘atividade profissional’ (n=29)
identificamos como principal intenção
o desejo de tornarem-se professores de
264
surdos e de Libras. Os projetos de ‘formação acadêmica’ (n=27) destacam cursar
uma pósgraduação lato ou strictu sensu e
concluir a graduação atual ou cursar uma
nova graduação. Esse dado vai de encontro aos resultados apresentados por Miranda (2007), em cujo estudo os projetos
de formação acadêmica foram pouco
considerados. Os projetos de ‘relacionamento afetivo’ (n=20) abrangem tanto o propósito de casar e constituir uma
família, como apenas ter filhos, adotar
crianças surdas, investir na formação dos
filhos e cuidar dos próprios pais. Os ‘bens
materiais’ (n=11) foram considerados em
menor quantidade e dizem respeito à
aquisição de casa e carro, além de ter melhores condições financeiras. Em relação
às justificativas, propomos o Grau de Consideração de Si e do Outro (GCSO), pois a
maneira como o outro e/ou si próprio foram considerados nas justificativas caracterizou a conexão ou desconexão dos projetos. Nessa análise, os projetos citados
pelos participantes podem ser do tipo: 1)
‘autocentrado’ (n=158), com referência
às próprias características, necessidades,
habilidades, possibilidades de satisfação
pessoal ou benefício pessoal, em que o
outro pode aparecer, mas figurativamente; 2) ‘conectado com a comunidade surda’ (n=63), com referência aos integrantes da comunidade surda como protagonistas; 3) ‘conectado com a sociedade’
(n=32), com preocupação em promover a
inclusão, considerando o próprio relacionamento com os ouvintes como pessoas
capazes de conhecer, interagir, respeitar e/ou reconhecer o valor positivo dos
surdos; 4) ‘conectado com pessoas próximas’ (n=24), em que o outro é alguém
ou mais pessoas com relação de proximidade com o participante ocupando um
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
papel de protagonismo em seu projeto;
5) ‘desconectado de pessoas próximas’
(n=9), em que o outro é alguém ou mais
pessoas com relação de proximidade com
o participante, porém considerado como
meio para realizar um projeto. Os dados
apresentados indicam o quão é urgente,
para esses participantes, o investimento em si próprio, haja vista a quantidade
de argumentos categorizados como auto
centrados, ressaltando a importância do
sentimento de expansão de si próprio (La
Taille, 2006) como crucial para a experiência do sentido da vida. Em contrapartida,
as justificativas que apontam para a conexão com o outro, em níveis diferentes de
relação, totalizam um número considerável (n=119). Em tais argumentos identificamos que o participante se beneficia
com o beneficio conquistado ao outro por
meio de seus projetos de vida, especialmente projetos de atividade profissional
e de formação acadêmica. Lembramos
que projetos de vida que incluíam o outro
de forma solidária foram pouco encontrados nos estudos mencionados (La Taille
& Madeira, 2004; D’Áurea-Tardeli, 2005;
Miranda, 2007). Pretendemos contribuir
para a ampliação das pesquisas em Psicologia da Moralidade, no que tange aos estudos sobre projeto de vida em uma perspectiva ética, tendo pessoas surdas como
público-alvo, a respeito de quem existem
poucas pesquisas realizadas.
Palavras-chave: moralidade, projetos de vida,
surdos
Contato: Alline Nunes Andrade, UFES,
[email protected]
LT03-1007 - EXPECTATIVAS E
ESTRATÉGIAS DE UNIVERSITÁRIOS
SURDOS SOBRE SEUS PROJETOS DE VIDA
Alline Nunes Andrade - UFES
[email protected]
Heloisa Moulin de Alencar - UFES
[email protected]
Financiamento: FAPES
O mal-estar moral vivido pela sociedade
contemporânea tem sido alvo de reflexões (La Taille & Menin, 2009), instigando
a realização de pesquisas sobre projetos
de vida. Projeto vital é "uma intenção estável e generalizada de alcançar algo que
é ao mesmo tempo significativo para o eu
e gera consequências no mundo além do
eu" (Damon, 2009, p. 53). Pesquisas recentes destacam a escassez de projetos
de vida em que o outro comparece de
forma central (D'Áurea-Tardeli, 2005; La
Taille & Madeira, 2004; Miranda, 2007).
Em sua pesquisa, D'Áurea-Tardeli (2005)
verificou que somente 29,55% dos participantes apresentaram aspirações solidárias em seus projetos de vida. Miranda
(2007) também classificou as justificativas dos projetos de vida de adolescentes
como conectados, nos quais outrem era
incluído como protagonista, ou como desconectados, quando outras pessoas eram
consideradas, mas de modo instrumentalizador. As principais justificativas (66,7%)
caracterizaram os projetos de vida como
desconectados (Miranda, 2007). Expectativas positivas em relação ao futuro são
verificadas em estudos sobre projetos
de vida de adolescentes (Sarriera, Silva,
Kabbas, Lópes, 2001; Miranda, 2007; Oliveira & Saldanha, 2010) e de estudantes
universitários (Callegaro & Zimmerman,
2007). Por outro lado, autores identificam
a indefinição do perfil profissional exigido
265
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
pelo mercado como fator de influência
negativa das expectativas de estudantes
universitários (Gondim, 2002; Bardagi,
Lassance, Paradiso, Menezes, 2006). Autores como Matheus (2003), Furlani &
Bonfim, (2010) consideram que determinadas condições sociais vivenciadas por
jovens podem resultar em restrição de
expectativas a metas mais palpáveis. Furlani e Bonfim (2010) observam ainda que
seus participantes “expressavam a falta
de criatividade e motivação para projetar
planos objetivos e metas diversificadas
para suas vidas” (p. 57), o que pode estar
relacionado à condição econômica desfavorável. Com base nesses dados, pretendemos investigar os projetos de vidas, as
expectativas e as estratégias de realização
por parte de universitários surdos. Estudos apontam para a existência de humilhação nas histórias de vida de surdos
(Andrade, 2006; Nebel, 2006; Gesueli,
2006; Andrade & Alencar, 2008, 2010)
marcadas pela exclusão e pela impossibilidade de comunicação devido à adoção
de uma perspectiva médica da surdez.
Para Skliar, Massone & Veinberg (1995), a
perspectiva médica impõe uma visão patológica, resultando em estratégias e recursos de ‘normalização’ do sujeito surdo;
em contrapartida, a perspectiva socioantropológica considera o surdo como parte
de uma comunidade para a qual a língua
de sinais é central. Considerando esse
histórico de restrições às pessoas surdas,
entrevistamos 16 universitários surdos da
Grande Vitória-ES, utilizando o método
clínico piagetiano (Piaget, 1932/1994) em
língua de sinais, com filmagem integral.
Perguntamos aos participantes ‘Quem
é você no futuro do jeito que você gostaria que fosse?’. Como resposta, foram
citados 102 projetos de vida: ‘atividade
266
profissional’, ‘formação acadêmica’, ‘relacionamento afetivo’ e ‘bens materiais’
. Posteriormente, realizamos as seguintes perguntas e respectivas justificativas,
para cada projeto mencionado: 1) ‘Você
acredita que você realizará esse projeto?’
e 2) ‘De que maneira você pretende realizar esse projeto?’. Sobre as expectativas
de realização dos projetos, obtivemos
como principais respostas: ‘sim’ (n=65)
e ‘depende’ (n=26). As justificativas das
expectativas são do tipo ‘autocentrado’
(n=71), ‘conectado’ (n=39) e ‘desconectado’ (n=28). Em geral, argumentos autocentrados explicam as expectativas
positivas de realização dos projetos, pois
os participantes se baseiam em suas próprias habilidades, desejos e condições.
Também nota-se que a conexão com pessoas próximas, com a comunidade surda
e com a sociedade, presente nas justificativas do tipo ‘conectado’, motivam os
participantes a crerem na concretização
de seus projetos. Porém, respostas categorizadas em ‘depende’ revelaram argumentos desconectados, especialmente
aqueles em que o participante está desconectado de si e centrado no outro. Assim, embora desejáveis, alguns projetos
estão dependentes de outras pessoas
para que sejam realizados, gerando instabilidade na projeção de si no futuro.
Sobre como os participantes pretendem
realizar os projetos, as principais estratégias foram ‘acadêmicas’ (n=63), ‘profissionais’ (n=44) e de ‘cuidado com o outro’
(n=20). Para esses participantes, a realização dos seus projetos depende principalmente de estudar, concluir a graduação e
conhecer novas tecnologias. Em seguida,
obter um trabalho futuro, avaliar alternativas de trabalho e participar de concursos configuram estratégias ‘profissionais’.
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
O ‘cuidado com o outro’ foi mencionado
apenas pelas mulheres, principalmente
em relação ao cuidado e à educação dos
filhos já existentes. As justificativas das
estratégias foram categorizadas em ‘autocentrado’ (n=103), ‘conectado’ (n=79)
e ‘desconectado’ (n=45). As referências
às próprias habilidades, necessidades e
características foram novamente consideradas pelos participantes, à frente dos
argumentos que remetem à conexão com
a comunidade surda, com pessoas próximas e com a sociedade. Argumentos
desconectados foram mencionados pelos
participantes, em especial a desconexão
de pessoas próximas e a sociedade desconectada dos surdos. Logo, se parte das
estratégias eram conectadas devido ao
desejo de criar oportunidades de desenvolvimento aos surdos, de proporcionar
o desenvolvimento intelectual e moral
dos filhos e de favorecer a inclusão propiciando o relacionamento entre ouvintes
e surdos, as estratégias desconectadas
sugerem o uso de pessoas próximas –
nesse caso, intérpretes e filhos -, como
meio para a realização dos seus projetos.
Outro tipo de desconexão aparece em argumentos nos quais a sociedade está desconectada dos surdos. Logo, o fato de as
políticas de inclusão educacional serem
criadas sem considerar a opinião dos surdos, o mercado de trabalho local não propiciar a inclusão de trabalhadores surdos
e os participantes não saberem como será
seu futuro profissional após a formatura
exemplificam essa desconexão. Lembramos que a indefinição do perfil profissional foi apontada por alguns autores (Gondim, 2002; Bardagi, Lassance, Paradiso,
Menezes, 2006) como aspecto negativo
da expectativa futura. Constatamos que
as expectativas e as estratégias para reali-
zação dos projetos de vida apresentavam
justificativas do tipo autocentrado, seguido por argumentos conectados. Esse
dado parece indicar a valorização que os
participantes atribuem a si próprios, mas
que também assinalam o lugar do outro
em suas aspirações, de forma conectada;
sendo que esta última forma foi pouco encontrada noutros estudos (La Taille & Madeira, 2004; D’Áurea-Tardeli, 2005; Miranda, 2007). Pretendemos contribuir para a
ampliação das pesquisas sobre projeto de
vida em Psicologia da Moralidade, tendo
pessoas surdas como público-alvo, a respeito de quem existem poucas pesquisas
realizadas.
Palavras-chave: surdos; expectativas;
estratégias
Contato: Alline Nunes Andrade, UFES,
[email protected]
LT07-1429 - SURDEZ E
HOMOSSEXUALIDADE: ASPECTOS DA
FORMAÇÃO IDENTITÁRIA DE SUJEITOS
SURDOS NO ENFRENTAMENTO DO
DUPLO PRECONCEITO
Fabrício Santos Dias de Abreu - FE/UnB
[email protected]
Daniele Nunes Henrique Silva - UnB
[email protected]
Aqueles considerados deficientes fogem
aos padrões normatizados de desenvolvimento e são concebidos culturalmente
como sujeitos incapazes de viverem amplamente em sociedade. No que tange às
limitações sociais impostas a essas pessoas, a expressão da sexualidade é uma
temática não problematizada; um lugar
de negação da dimensão erótica. Em geral, prevalece a ideia de que as pessoas
267
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
deficientes são assexuadas, consideradas
infantis e inocentes (incompletas pelo
defeito). O pensamento mais tradicional
dirige-se para o argumento de que a sexualidade do sujeito com peculiaridades
no desenvolvimento inexiste, apesar da
bibliografia científica recente apontar no
sentido de contestar a relação entre deficiência e assexualidade (ou de problemática sexual) como sinônimos (Beche,
2005; Bisol, 2008 Maia, 2006 e Moukarzel, 2003). Apesar desses apontamentos,
o que prevalece nos discursos cotidianos
a respeito da sexualidade de pessoas com
deficiência é que ela se manifesta de forma atípica e infeliz (Maia, 2006). Quando
se fala em homossexualidade relacionado às deficiências, o assunto é envolto
em uma penumbra, com raros estudos
investigativos. O que se percebe são indícios de discussões teóricas ainda incipientes (Maia e Ribeiro, 2010). A escassez
dos trabalhos acadêmicos parece refletir
a dificuldade de abordagem do assunto.
Assim, não se imagina uma pessoa com
deficiência gay ou lésbica. Essa cartografia subjetiva (forma(to)s de identidades
sexuais) apresenta, no seu fundo de análise, o problema do duplo-preconceito;
ser deficiente e ser homossexual. O que
prevalece no discurso hegemônico é a noção de que a sexualidade ora inexiste, ora
é deformada, assim como a pessoa que a
expressa. È, portanto, uma dimensão que
se manifesta de forma atípica (quase patológica) e infeliz. Segundo Ferrari e Marques (2010), existem estratégias de desqualificação a todos aqueles considerados desviantes dos padrões estabelecidos
pela sociedade hegemônica. Muitos indivíduos, em função disso, se posicionam
a partir do lugar de subalternidade. De
acordo com Foucault (1999), existem des268
qualificações que se constituem de maneira dupla; síntese da junção de vários
fatores de desqualificação em um mesmo
individuo como: ser surdo (“deficiente”) e
ser homossexual. Nos estudos de Beche
(2005), em que se discute a relação entre
deficiência e sexualidade, a autora aponta
a percepção dos surdos sobre a homossexualidade, evidenciando que o tema
ainda causa dúvida e incompreensão,
pois há pouca informação disponível (na
família, na escola e outras instituições de
apoio) sobre a temática. Além disso, são
escassos os espaços inclusivos (com uso
da libras) para sanar dúvidas acerca da sexualidade e suas diversas manifestações.
Segundo Anderson e Kitchen (2000), a
maior dificuldade encontrada na vida de
uma pessoa com deficiência, no que tange as questões da sexualidade, é causada
pelo fracasso informacional dos recursos
educacionais (e de outros serviços) em
proporcioná-los esclarecimentos sobre
o tema. Nessa linha, Bisol (2008) afirma
que o surdo não encontra na família espaço proveitoso para dirimir suas duvidas
sobre sexualidade, pois, na maioria dos
casos, a comunicação é precária devido a
não fluência em Libras. Dessa forma, é na
escola e no convívio com surdos adultos
que pode acontecer o tratamento da temática. O presente trabalho aborda conceitualmente essas temáticas interdisciplinares, tentando preencher, pontualmente, a lacuna e a carência de pesquisas
nesse campo. A partir de relatos de dois
homens surdos, que assumem uma identidade bilíngue homossexual como fator
constitutivo de suas vivências, buscou-se
problematizar: a) aspectos gerais da condição social do surdo; b) experiências e
vivências homossexuais; e c) (duplo)preconceito. Por meio de entrevistas semies-
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
truturadas, contando com a participação
de uma interprete fluente em Libras (já
conhecida e aprovada pelos sujeitos entrevistados), os dados, ainda em fase preliminar de análise, demonstram que, para
esses sujeitos, existe um marco (ponto de
transição) definidor do reconhecimento
da sua condição homossexual: a primeira
relação sexual ocorrida na infância tardia.
Nesses termos, a condição homossexual
se refere ao ato sexual propriamente vivido, restrita a genitalidade e ao sexo. Os
surdos entrevistados parecem identificar
a sexualidade como algo relacionado à
ação, não necessariamente vinculado à
dimensão do afeto, da comunicação, da
gratificação libidinosa ou de construção
de vínculos. Além disso, observa-se que
os sujeitos ouvidos estabelecem estratégias de ocultamento da homossexualidade como forma de não sofrerem um
duplo preconceito. As estratégias mais
relevantes apontadas dizem respeito ao
controle do corpo, no que tange aos trejeitos estabelecidos socialmente como
femininos, e ao silenciamento em relação
à opção sexual nos diversos ambientes
em que os sujeitos transitam. Os dados
encontrados revelam que a condição homossexual ainda é pouco compreendida
pelos surdos, pois há dúvidas, preconceitos e mitos acerca da experiência sexual.
Desse modo, torna-se relevante ampliar
os estudos nessa área e sua interface com
as políticas públicas de assistência e formação das pessoas surdas.
Palavras-chave: surdez, homossexualidade,
identidade
Contato: Fabrício Santos Dias de Abreu, UnB,
[email protected]
CO 32 - LT4
Violência
LT04-812 - CONSELHO TUTELAR
E ESCOLA: REPERCUSSÕES DE
PRÁTICAS SOCIAIS COM CRIANÇAS E
ADOLESCENTES
Maria das Graças Vasconcelos Paiva - UERJ
O objetivo deste trabalho é investigar o
impacto produzido pela ação do Conselho
Tutelar em escolas do subúrbio, periferia
e zona norte da Cidade do Rio de Janeiro.
Foram realizadas entrevistas com professores das respectivas escolas para verificar
suas opiniões sobre o Conselho Tutelar. A
escolha deste órgão foi determinada pela
sua estreita ligação com a comunidade,
inovando a forma de interação entre Poder Público e a sociedade. Age vinculado
administrativamente ao Poder Executivo
Municipal. Recebeu a função de garantir
que os preceitos do Estatuto da Criança
e do Adolescente (ECA) fossem exercidos
pela família e pela sociedade e pelas entidades de atendimento. Por outro lado,
a Psicologia social comunitária, em seus
vários enfoques, mostra seu compromisso com qualidade de vida da população e
com os direitos humanos. Seu campo de
pesquisa em práticas sociais é bastante
amplo, pois, considera prática social toda
prática de interação entre sujeitos sociais.
Neste trabalho, serão enfocadas aquelas
praticadas sobre as crianças e adolescentes nas escolas que deveriam dizer respeito aos seus direitos e deveres infantis e
juvenis. As práticas educativas constituem
um tipo de prática social na infância. Denunciar, observar maus tratos e faltas excessivas são práticas sociais, pois, exigem
269
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
a ação do sujeito em favor de outro. Seu
sentido se fundamenta em fazer surgir
efeito em outros, planejada, consciente ou
inconscientemente. O Conselho Tutelar é
uma instituição mediadora entre as vidas
da criança e do adolescente e a vida coletiva, institui, portanto, uma nova prática entre outras que podem ser consideradas no
tratamento das questões da infância. Cabe
a seguinte pergunta: Em que medida a escola receberá a intervenção desta nova
prática? Este trabalho tem como hipótese:
a cultura solidificada das instituições escolares torna-se um empecilho para o pleno
desenvolvimento das práticas sociais tutelares. Professores que lecionam em escolas da rede pública estadual e municipal de
ensino fundamental e médio da zona norte, subúrbio e periferia da cidade do Rio
de Janeiro Dez participantes são do sexo
masculino, idade: 28 e 52 anos e 48, do
sexo feminino, idade 23 e 60 anos. Média
de idade, 40 anos (DP=10,16). Exercem o
magistério em média a 15 anos (DP=9,43)
e residem no subúrbio e da zona norte desta cidade. A escolaridade varia do segundo
grau à pós-graduação: 4 professores possuem apenas segundo grau, 41, superior
completo e 13, pós-graduação. O nível
socioeconômico a partir do grau de escolaridade, embora não homogêneo, pode
ser avaliado variando entre o nível médio baixo, médio e médio alto. Entrevista
visando atender os objetivos subjacentes
considerados pertinentes aos temas centrais do estudo. O instrumento foi desenvolvido no sentido de obter informações
dos professores sobre o conceito de conselho tutelar (CT); a relação, dificuldades e
barreiras encontradas no relacionamento
entre escola e o CT; os encaminhamentos,
suas principais causas; credibilidade na
atuação do CT; as atitudes, crenças com
270
relação ao CT. Composta de nove perguntas transcritas em folha de papel. Os cinco
temas mencionados anteriormente foram
abordados em questões abertas e os outros quatro em questões fechadas. Os
contatos nas escolas foram feitos através
dos diretores ou coordenadores pedagógicos. As entrevistas foram respondidas
por escrito por grupos de professores. O
propósito inicial era realizar entrevistas individuais. Contudo, a rotina escolar a que
estão submetidos os professores impediu
por falta de tempo de responder individualmente às entrevistas. Como alternativa
metodológica, as perguntas foram oferecidas transcritas e o registro dos dados foi
feito em uma folha de papel onde se encontravam registradas as nove perguntas.
No primeiro contato com os professores,
pedia-se a colaboração voluntária e informava aos participantes sobre o objetivo e
o tema da pesquisa. Pedia-se também que
assinassem um termo de consentimento
informado. O anonimato e a confidencialidade dos dados obtidos eram assegurados
a todos. Em cada escola visitada, entregava-se a grupos de professores a entrevista
que respondiam na presença do psicólogo,
por escrito, e devolviam a seguir. Conhecimento do que é Conselho Tutelar- 62%
conhecem; 38% desconhecem o conceito
de Conselho Celular. Causas de encaminhamentos ao CT- Para 31% da amostra,
o CT é uma alternativa para solucionar
problemas de mau comportamento escolar, esgotadas todas as possibilidades de a
escola resolver com a família. Para 29%,
a causa é o comportamento inadequado
na escola provocado por transtornos familiares Relação Conselho Tutelar versus
Escola - Para 28%, o relacionamento com
o CT é ineficiente, os conselheiros despreparados, omissos e desinteressados e
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
desconhecem a realidade escolar. Os professores não têm informação de como o
CT funciona, onde situam e afirmam desconhecer as atribuições dos conselheiros
(24%). Para 21%, a relação foi considerada
apenas insatisfatória, sem parceria entre
Conselho Tutelar e a escola. Para 17%,
a relação é unilateral, da escola para o
CT e de um cunho disciplinar e punitivo.
Apenas uma minoria (10%) considera a
relação positiva e que ainda poderia ser
melhor se o CT fosse menos burocrático
e contasse com mais recursos. As atitudes
pessoais com relação ao Conselho Tutelar
- Os participantes variam desde aqueles
que são radicalmente contra, alegando
que o órgão é ineficaz, inútil, burocrático
e não devia existir; os de centro, argumentando “que pode melhor”; “que em algumas escolas funcionam em parceria”. E
professores que são totalmente a favor e
defendem como necessário para a defesa
dos direitos das crianças e apoio à escola.
Credibilidade na intervenção do Conselho
Tutelar - Os participantes agrupam-se em
três grupos gerais: a maioria (55%) não
acredita na ação do CT na escola porque
sua intervenção seria “paliativa” e/ou burocrática, e os “episódios” continuam se
repetindo mesmo com sua intervenção.
25% alegam que não possui conhecimento
para avaliar a pergunta. Para 21%, a relação foi considerada apenas insatisfatória,
sem parceria entre Conselho Tutelar e a
escola. A minoria (20%) acredita que a escola precisa de ajuda para casos complexos junto às famílias. Com base nos dados
da pesquisa, conclui-se que o impacto sobre as práticas sociais educacionais não é
relevante.
Palavras-chave: Conselho Tutelar; Infância e
Juventude; Práticas sociais educacionais
LT04-904 - O BULLYING NA PERSPECTIVA
SOCIOCULTURAL CONSTRUTIVISTA
Raquel Gomes Pinto - UnB
[email protected]
Angela Branco - UnB
[email protected]
No contexto sociocultural do século XXI,
alcançar o sucesso e a felicidade parece
significar, para a maioria das pessoas, adquirir bens de consumo e realizar projetos individualistas considerando-se, cada
vez menos, as necessidades e a dignidade do outro, bem como as condições do
meio ambiente no qual vivemos. Desde
muito cedo, crianças e adolescentes são
expostos, de forma explícita ou implícita,
a situações onde o competir é considerado a melhor forma do sujeito se constituir como pessoa e atingir seus objetivos.
Crenças e valores orientados para a acirrada competição e o individualismo têm
sido promovidos de forma recorrente,
em diversos contextos sociais. Situações
onde competição e individualismo são
valorizados promovem a progressiva desvalorização da ética e a emergência de
agressões e violência. A incidência crescente do bullying nas escolas retrata a
necessidade de mudar o paradigma educacional. Segundo a psicologia científica,
não existem fórmulas mágicas e o fenômeno precisa ser analisado considerando
o papel da cultura, do sujeito construtivo, e da causalidade múltipla. Prevenir
o bullying implica que a escola assuma,
intencionalmente, o trabalho dos valores
sociais positivos com alunos e professores, de forma a incluir a paz como eixo
transversal no currículo escolar. Com
o objetivo de investigar como a escola
pretende promover ações preventivas
e de resolução de situações de bullying,
271
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
analisamos um projeto de prevenção do
bullying, desde sua implantação, ainda
em 2011. A pesquisa inclui análise de
documentos, observação das atividades
previstas no projeto e entrevistas com
a coordenadora, com seis professores e
com seis crianças do quinto ano de uma
escola pública da cidade de Brasília – DF.
Os eixos norteadores da pesquisa foram:
como o projeto define e compreende o
fenômeno bullying, quais os seus objetivos e quais as atividades desenvolvidas
para o alcance destes objetivos. O projeto é, assim, analisado e discutido a partir
das falas dos entrevistados e das observações realizadas, buscando-se identificar coerência, bem como convergências
e divergências no discurso de educadores e alunos. Consideramos que as instituições educativas podem e devem atuar
no campo da promoção concreta da paz,
de interações humanas saudáveis, éticas
e respeitosas, promovendo valores como
justiça, dignidade e responsabilidade social. Consideramos que o presente estudo contribuiu para a análise de iniciativas
da própria escola sob a orientação e supervisão da coordenadora, e os resultados obtidos deverão gerar subsídios para
a elaboração e a avaliação de projetos
desta natureza, auxiliando na prevenção
da violência na escola e promovendo
ações concretas em prol da paz.
Palavras-chave: bullying, sociocultural,
violência
Contato: Raquel Gomes Pinto, UnB, raquel.
[email protected]
272
LT04-1311 - CULTURA DE PAZ,
PREVENÇÃO DA VIOLÊNCIA E
SOCIALIZAÇÃO NA PERSPECTIVA DE
POLICIAIS MILITARES
Letícia de Sousa Moreira - PMTO
[email protected]
Angela Uchoa Branco - UnB
[email protected].
A sociedade pós-moderna apresenta uma
configuração social bastante diversificada, onde crenças e valores são diretamente influenciados pelo contexto sócio-histórico-cultural em que a pessoa está inserida. As transformações e construções
humanas decorrem tanto de um processo
interno quanto externo, permeados pelos
diversos agentes que compõem a sociedade. O desenvolvimento humano, portanto, é fruto da interação de uma série
de fatores e, sobretudo, das relações aí
estabelecidas. A partir dessa idéia, surgiu
o interesse na seguinte questão: como o
ser humano desenvolve suas ações vislumbrando a paz ou a violência? Entende-se que os conflitos violentos têm sido
protagonistas de grandes tragédias ao
longo do tempo em todo o mundo. Isso
ocorre porque a sociedade persiste promovendo práticas culturais onde competição, agressão e violência são toleradas
ou mesmo incentivadas, e assim a grande maioria das pessoas não internalizam
o valor, o sentimento e a vivência da paz
em suas vidas. A Cultura de Paz está intrinsecamente relacionada à cooperação
e à resolução não-violenta dos conflitos.
É uma cultura concebida como processo
orientado para a tolerância, solidariedade e compartilhamento em base cotidiana, uma cultura que respeita os direitos
individuais, o princípio do pluralismo,
que assegura a liberdade e divergência
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
de opinião. Ela se empenha em prevenir conflitos violentos resolvendo-os em
suas fontes ou origens. Na perspectiva
sociocultural construtivista aqui adotada,
a Paz é concebida como um conceito caracterizado pela convivência cooperativa
entre seres humanos em geral, ou seja,
como um conceito positivo e não como
a simples ausência de conflitos ou enfrentamentos. Considerando o processo
de desenvolvimento humano como dinâmico e contínuo, torna-se possível a (re)
construção de valores, crenças, emoções
e expectativas para serem desenvolvidos
na família, escola e sociedade objetivando a construção de uma Cultura de Paz.
Fazendo um recorte para um contexto específico, foi escolhida a Polícia Militar do
Estado do Tocantins como campo de pesquisa, por suas peculiaridades de atuação
social, sendo por vezes preventiva e por
vezes coerciva, e por ser o campo de trabalho da pesquisadora. Assim sendo, este
estudo buscou investigar e compreender
como o sistema de crenças e valores pessoais, permeado pela instituição militar,
influencia as convicções e ações de policiais militares para a construção de uma
Cultura de Paz neste contexto específico.
Nesse sentido, tornou-se necessário compreender quais as práticas e concepções
estão presentes na vida dos policiais militares para pensar em sua atuação, visando a construção de uma Cultura de Paz.
O desenvolvimento dessa visão de vida
e de trabalho, vinculada à noção da paz,
busca promover um aprimoramento concreto na prestação de serviços da instituição, sempre de forma articulada com os
demais setores da sociedade. A realidade
atual da Polícia Militar no Brasil tem por
objetivo aperfeiçoar a qualidade das relações entre o policial e a sociedade, de for-
ma que este seja um mediador de conflitos, utilizando o poder de polícia somente
em casos extremamente necessários.
O ideal da Polícia Comunitária, Jornada
Formativa de Direitos Humanos e Proerd
(programas desenvolvidos pela Secretaria
Nacional de Segurança Pública), propõem
que os policiais estejam preparados para
lidar com os problemas cotidianos dos
cidadãos comuns, de forma preventiva
e não somente coerciva, como há anos
se postulava. A metodologia utilizada foi
baseada na pesquisa qualitativa, a partir
de entrevistas semiestruturadas, onde
os indicadores empíricos foram construídos ao longo do processo de interação
pesquisador-pesquisado. Foram selecionadas seis entrevistas, de um estudo mais
amplo, com quatro homens e duas mulheres e o critério de seleção foi a diversidade de posicionamentos apresentados
pelos policiais entrevistados. Todos os
participantes ingressaram na instituição
há pelo menos cinco anos, um tempo razoável para que haja maior familiarização
com a cultura institucional militar. Todos
os participantes selecionados têm filhos,
pois também buscou-se avaliar possíveis
preocupações dos participantes com o futuro deles na sociedade de forma geral. O
procedimento de análise seguiu o modelo construtivo-interpretativo, que busca
transformar as informações dos participantes em algo que tenha sentido para
eles e para a pesquisa. A partir do discurso dos participantes, observou-se que os
policiais militares têm dificuldades com o
tema da Cultura de Paz, em conceituar e
admitir a existência de conflitos positivos.
Os indicadores obtidos com as entrevistas
revelam crenças permeadas pela cultura
institucional, na qual a paz é vista como
algo subjetivo, ligado muito mais à noção
273
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
de harmonia interior e espiritualidade do
que à paz social. A visão de paz no sentido mais preventivo, permeado por ações
concretas, é algo distante do pensamento dos participantes. Ficou evidenciado
que os participantes da pesquisa não se
reconhecem nesse papel de agentes multiplicadores da paz e transformadores da
sociedade, modelo de atuação social e
presença forte do estado nas ruas. Eles
não conseguem visualizar a ressonância
e abrangência de suas ações enquanto
portadores de uma identidade profissional que, além de tudo, é uma autoridade
constituída e deve ser usada em favor
da comunidade. No entanto, forneceram
muitas sugestões para a construção de
uma Cultura de Paz na instituição e todos
se colocaram como voluntários para participar, mesmo sem definir exatamente
como poderiam colaborar. Nesse sentido,
acredita-se que uma mudança de cultura institucional pode favorecer a integração entre os membros da instituição,
tão requisitada pelos participantes deste
estudo, e também deve contribuir para
promover diálogos cooperativos, campo
fértil para o cultivo e amadurecimento de
idéias e sugestões. Dessa forma, a realização deste trabalho visou construir subsídios para desenvolver valores e competências que levem os policiais militares a
serem promotores da Cultura de Paz no
exercício das diversas funções que desempenham, dentro e fora da instituição,
melhorando a qualidade de vida dos envolvidos nesse processo de construção.
Palavras-chave: Cultura de Paz,
Construtivismo Sociocultural, Polícia Militar.
Contato: Letícia de Sousa Moreira, Polícia
Militar do Tocantins, [email protected]
274
LT04-1349 - PALAVRAS E AÇÕES QUE
MACHUCAM
Claudilene Pereira - Me Ninar Creche Escola
[email protected]
Amanda Nogueira Cordeiro - UMINHO
amandanc_uff@hotmail.com
Atualmente, questões relacionadas à
agressão verbal, física, coação e constrangimento entre crianças nas escolas são
muito comentadas. Tais atitudes (isoladas
ou em conjunto), quando praticadas entre
pares, numa relação desequilibrada de
poderes, de forma regular e intencional
caracterizam o bullying, podendo causar
transtornos físicos, cognitivos e psicológicos em suas vítimas. Este tema começou
a ser estudado na Noruega, nos anos 70.
Uma pesquisa realizada no Rio de Janeiro
pela extinta ABRAPIA, em 2002, com mais
de 5000 crianças, revelou que 40,5% dos
alunos já tinham participado em casos
de bullying, sendo 16,9% alunos vítimas,
12,7% alunos agressores e 10,9% vítimas/
agressor. Mas que providências são concretamente tomadas? Que trabalho desenvolver com as crianças? Que caminho
seguir? Segundo Barros, Carvalho e Pereira (2009): “num primeiro momento há
de reconhecer que a violência é um problema social e que a escola tem um papel
fundamental na sua redução por meio de
ações e programas preventivos buscando
parcerias com as famílias dos alunos envolvendo-os com o problema.” Por isso,
apontamos que um programa de prevenção primária pode ser o primeiro passo no
intuito de que as crianças e a comunidade
educativa, incluindo pais e professores,
percebam que o tema deve ser tratados
por todos. Casas (1998) aponta que a prevenção relaciona-se com realidades conhecidas, onde são conhecidos os efeitos
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
negativos que podem ter. Segundo Caplan
(apud Casas 1998), a prevenção primária
caracteriza-se por ter um enfoque comunitário, por ser interdisciplinar e proativa,
interconectar os diferentes aspectos da
vida (orientação bio-psicossocial), utilizando técnicas educativas e sociais orientadas para dotar os indivíduos de recursos
ambientais e pessoais, e assim enfrentarem seus problemas e promoverem contextos sociais justos. A prevenção primária
dirige-se a grupos que não manifestam sinais evidentes de enfermidade ou problema social, onde só existe a consideração
que alguns membros possam estar em
risco. Partindo da teoria de Brofenbrenner, detentora de uma visão bioecológica
do desenvolvimento humano, adotamos
uma visão sistêmica onde o desenvolvimento se dá através de forças emanadas
por múltiplos ambientes e das relações
entre eles, através da interação sinérgica de quatro núcleos inter-relacionados:
Processo, Pessoa, Contexto e Tempo (Narraz & Koller). Naquele o destaque é dado
para o conceito de processos proximais,
que são formas particulares de interação
entre organismo e ambiente que operam
ao longo do tempo. Em relação a Pessoa,
parte-se do princípio que suas características são tanto produtoras, quanto produtos do desenvolvimento. O conceito de
Contexto refere-se à interação recíproca
de quatro níveis ambientais interdependentes estruturados de forma concêntrica: microssistema, mesossistema, exossistema e macrossistema. O Tempo também
influencia o desenvolvimento humano
através de mudanças e continuidades. Notamos uma crescente desvalorização de
atitudes gentis e cordiais entre as crianças. A busca pela perfeição, competitividade, intolerância com as diferenças e
brincadeiras ofensivas e demasiadas têm
sido protagonistas nas interações escolares e relações em geral. Diante disto, em
2010, foi iniciado o projeto “Palavras e
ações que machucam”, surgido da vontade da Equipe Pedagógica e professores da
Me Ninar Creche Escola (escola particular
situada em Niterói-RJ) de trabalhar com
as crianças (dos 6 aos 10 anos) questões
relacionadas aos valores éticos culturais e
de convivência entre as pessoas. Para tomar uma ação preventiva junto às crianças sobre o tema bullying, escolhemos potencializar as interações dentro da escola,
desta com a família e da criança com a
comunidade, considerando os diferentes
níveis ambientais de interação. Neste caso
consideramos a escola como microssistema para as crianças e, a relação entre
a escola e a família como mesossistema,
contudo não desconsideramos a influência do mesossistema e do macrossistema
no seu desenvolvimento. Os principal
objetivo deste projeto foi diminuir episódios comportamentais nas crianças que
possam interferir de forma negativa o desenvolvimento e as interações entre pares
na escola. Para isto foi preciso repensar
(equipe e crianças) atitudes e palavras ditas no dia-a-dia, para atingir uma melhor
convivência, trabalhando valores como
respeito, cooperação, entendimento,
compreensão, tolerância e fraternidade.
A idéia foi promover junto à comunidade
acadêmica um entendimento de questões
sócio-culturais pertinentes à atualidade,
para que percebam que idosos, portadores de necessidades especiais, diferentes
etnias, classes sociais, culturais e credos
devem ser respeitados e compreendidos
em suas particularidades,e assim aumentar o respeito mútuo no ambiente escolar. A primeira ação foi a apresentação do
275
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
vídeo “Palavras que machucam” (sessão
coletiva), em sequência, conversas com
professores e Equipe Pedagógica e ações
pontuais com as crianças (encontro quinzenal com a psicóloga da escola denominado “grupo de reflexão) e atividades em
parceria com professores regentes. Outras
estratégias utilizadas foram: Leitura dos
livros “A ovelha rosa da Dona Rosa” e “O
colecionador de segredos”, e desenvolvimento de atividades a estes relacionados.
-Dinâmicas de grupos voltadas para o
respeito aos pares e aos demais; Elaboração de “combinados” (regras particulares
para cada turma) referentes aos comportamentos; Autoavaliação individual das
crianças; Reunião de pais promovendo
parceria no processo de conscientização
das crianças; Reunião junto à Equipe Pedagógica para discussão de textos sobre
bulliyng e valores éticos e sociais; Visitas
a espaços promotores de auxílio a idosos
e portadores de necessidades especiais.
É importante ressaltar que este projeto é
uma ação preventiva que não se caracteriza por ter uma temporalidade determinada, por isso buscamos atingir seus objetivos constantemente na dinâmica cotidiana da escola. Entretanto, no seu período
de maior intensidade de ações, pudemos
notar alguns resultados concretos: Identificação das atitudes e comportamentos
a serem repensados pelas crianças; Conscientização da equipe de professores acerca dos resultados de suas falas e atitudes
frente às crianças; Exposição de trabalhos
realizados pelas crianças sobre a temática
na mostra de Arte e Expressão da escola;
Aumento da parceria entre as famílias e
a equipe pedagógica; Sucesso da visita a
Casa de Repouso Lar Esperança, onde as
crianças propuseram atividades de leitura
e ofereceram lanche. A compreensão de
276
pais e crianças sobre a importância da visita foi surpreendente, ficando evidenciada no cuidado que tiveram ao oferecerem
alimentos que condiziam com as limitações biofísicas dos idosos. Publicação de
textos coletivos no Informativo Interno da
escola. Por fim, acreditamos que houve
o despertar de um julgamento moral das
atitudes e responsabilização em relação
ao respeito ao próximo, às diferenças e
aos seus iguais.
Palavras-chave: prevenção primária, valores
sócio-culturais, bullying
Contato: Claudilene Francisco Pereira, Creche
Escola Me Ninar, [email protected]
LT04-1507 - VALORES HUMANOS E
ATITUDES FRENTE À ESCOLA: UM
ESTUDO CORRELACIONAL
Patrícia Nunes da Fonsêca - UFPB
[email protected]
Rildésia Silva Veloso Gouveia - UNIPÊ
[email protected]
Deliane Macedo Farias de Sousa - UFPB
[email protected]
Kátia Correa Vione - UFPB
[email protected]
Larisse Helena Gomes Macedo Barbosa UFPB
[email protected]
Eugênia Lúcia Paiva de Oliveira - UFPB
[email protected]
As pesquisas sobre as atitudes no contexto escolar têm sido bastante diversificadas e demonstram um novo foco de
interesse na área escolar ou da educação.
Por mais de vinte anos estas estiveram
voltadas, predominantemente, a abordar o desempenho acadêmico dos estudantes de uma forma mais objetiva (isto
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
é, notas nos exames escolares), o que
atendia ao interesse imediato de pensar e
modificar as políticas públicas de educação. Entretanto, embora este tema ainda
ocupe espaço importante na agenda daqueles que fazem a educação, aspectos
mais subjetivos dos estudantes têm recebido cada vez mais destaque, a exemplo
da satisfação do estudante com a escola,
das experiências vivenciadas e das atitudes apresentadas frente ao contexto escolar (Daly & Defty, 2001). Coerente com
esta linha de interesse, Willms (2003)
constatou, em pesquisa realizada pelo
Programa Internacional de Assistência ao
Estudante, que os jovens que participavam mais das atividades oferecidas pela
escola parecem ter melhor relação com
seus colegas e administradores da escola,
além de apresentar um bom desempenho
acadêmico. Por outro lado, aqueles que
apresentam atitudes negativas, de desafeto com as pessoas inseridas na escola
podem, gradualmente, vir a demonstrar
comportamentos desajustados. Reforçando este aspecto, Duarte (2004) indica
que a falta de envolvimento, interesse e
vontade por parte dos jovens refletem
seu descompromisso total frente às atividades da escola, atuando como fator de
risco. Por outro lado, algumas pesquisas
têm mostrado que as atitudes positivas
dos estudantes em relação à escola compreendem um fator de proteção quanto
à delinqüência e ao uso de substâncias
proibidas (Cheng & Chan, 2003). Deste
modo, cogita-se que as atitudes apresentadas pelos jovens frente à escola podem
influenciar em seu engajamento na escola, bem como o seu desempenho acadêmico. Mas a que fatores estariam associadas essas atitudes? Um desses fatores, de
acordo com Fonsêca (2008), poderiam ser
os valores humanos, uma vez que estes
são entendidos como um construto que
influencia as atitudes e as ações humanas
e servem como padrões avaliativos do
comportamento (Gouveia, 2003). No presente estudo, parte-se do modelo acerca
dos valores proposto por Gouveia (1998,
2003; Gouveia & cols., 2008) que define
os valores como critérios de orientação
que guiam as ações do homem e expressam as suas necessidades básicas. Ainda
de acordo com este autor seria possível
observar seis subfunções valorativas, a
saber: interativa, normativa, suprapessoal, existência, experimentação e realização. Deste modo, objetivou-se conhecer
se e em que medida os valores humanos
e as atitudes frente à escola estão relacionados.Para lograr tal objetivo, contou-se
com uma amostra de conveniência (não
probabilística) composta de 291 estudantes do ensino fundamental, sendo a maioria do sexo masculino (53%), de escolas
públicas (53,5%) e com idades variando
entre 10 e 18 anos (m = 13,2; dp = 1,76).
Estes responderam a um livreto composto pelos seguintes instrumentos: Questionário de Valores Básicos (QVB – Gouveia,
1998; 2003), Escala de Atitudes Frente
à Escola (Cheng & Chan, 2003; Fonseca,
2008), e por fim, questões demográficas
(sexo, idade, tipo de escola). Inicialmente,
entrou-se em contato com as escolas, procurando obter a autorização para coletar
os dados. Em seguida, enviou-se o Termo
de Consentimento Livre e Esclarecido para
os pais ou responsáveis assinarem, permitindo a participação dos estudantes. Após
essa etapa, os participantes responderam
ao instrumento individualmente, porém
em ambiente coletivo de sala de aula, e
em média, 30 minutos foram suficientes
para concluírem o preenchimento do
277
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
questionário. Para a análise de dados foi
utilizado o Pacote Estatístico para Ciências Sociais (PASW), versão 19. Foi realizada uma análise de correlação de Pearson
entre as seis subfunções valorativas e as
atitudes frente a escola a fim de verificar
se existe relação entre tais variáveis. Os
resultados indicaram que, com exceção
da subfunção experimentação (r = -0,00,
p < 0,987), as demais apresentaram correlação direta e significativa com as atitudes frente à escola, a saber: normativa (r
= 0,37, p < 0,001), suprapessoal (r = 0,37,
p < 0,001), interativa (r = 0,32, p < 0,001),
existência (r = 0,31, p < 0,001) e realização
(r = 0,17, p < 0,001). Diversos estudos têm
corroborado a adequação psicométrica
do modelo proposto por Gouveia (1998;
2003) para o entendimento dos valores
humanos, destacando-se sua capacidade
para explicar diversos comportamentos
e atitudes sociais (Chaves, 2006; Pimentel, 2004; Santos, 2008). Como é possível
observar nos achados deste estudo, os
valores normativos estão relacionados às
atitudes frente à escola, pois estes refletem, de algum modo, o quanto os jovens
aderem ou não às normas existentes na
escola, como se integrar, ajustar e engajar
ao contexto escolar (Fonsêca, 2008). No
que diz respeito à relação entre a subfunção suprapessoal e as atitudes em questão, justifica-se uma vez que os tais valores refletem a busca pelo conhecimento,
por aprender coisas novas e interessantes
(Gouveia, Fischer & cols., 2008). Além
destas relações, observou-se ainda que
a subfunção interativa também apresentou uma correlação com as atitudes frente à escola, o que faz todo sentido, uma
vez que a escola é um ambiente onde a
interação é de fundamental importância
(Gouveia, 2009). Ademais a relação en278
tre os valores de existência e as atitudes
frente à escola pode ser compreendida já
que as pessoas que adotam tais valores
são pessoas preocupadas em assegurar
sua sobrevivência, planejando o futuro
em busca de estabilidade e a escola é tida
como um ambiente onde se adquirem
ferramentas (sociais e acadêmicas) para
assegurar o futuro estável. Por fim, observou-se a relação entre as atitudes frente
à escola e os valores de realização ocorre
em razão das pessoas que adotam tais valores serem orientadas ao êxito, enfatizarem a busca pela eficiência sendo capaz
de alcançar metas, terem um ideal de realização e orientarem suas vidas nesta direção. Tais valores estão em consonância
a um dos principais objetivo da educação
que é o bom desempenho, a aquisição
de conhecimentos e habilidades pessoais e sociais, aspectos necessários para
progressão satisfatória na vida acadêmica, social e profissional no futuro. Deste
modo, considera-se de suma importância
ampliar os conhecimentos acerca das diferentes formas de influências sofridas
pelos jovens acerca dos valores humanos,
e como estes podem vir a interferir nas
atitudes frente à escola para que a lacuna
encontrada no âmbito escolar seja preenchida. Uma vez que, diversos estudos têm
demonstrado que altos níveis de engajamento escolar e atitudes positivas frente
à escola estão associados à um melhor
desempenho acadêmico e a uma redução
na probabilidade de abandono escolar
(Finn & Rock, 1997; Fredricks, Blumenfeld
& Paris, 2004).
Palavras-chave: Engajamento Escolar; Valores
Humanos; Atitudes.
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
LT03-803 - CULTURA DA PAZ E
PREVENÇÃO DA VIOLÊNCIA NA ESCOLA
SEGUNDO PROFESSORES DE ESCOLA
PÚBLICA DE BRASÍLIA
Bruno Campos - UnB
Lorena Leite - UnB
Alia Barrios - UnB
Angela Branco - UnB
Crenças e valores são frequentemente citados pelos educadores como importantes
objetivos da educação formal. Entretanto,
a dimensão motivacional, constituída por
valores e crenças, não têm sido discutida
no processo de construção dos currículos
escolares e das metodologias pedagógicas. Valores ligados a competição e ao individualismo estão presentes nas salas de
aula das escolas brasileiras e estas têm
enfrentado sérias dificuldades em relação
às interações agressivas que cada vez mais
se observa no cotidiano escolar. Esses valores competitivos e individualistas, de forma oculta ou explícita, se fazem presentes
especialmente nas práticas pedagógicas e
nas interações sociais que se estabelecem
nas salas de aula. Nos projetos para a educação básica no Brasil existe como objetivo
o desenvolvimento da independência e da
autonomia dos alunos, mas não se explicita
a necessidade de que esta autonomia seja
associada à responsabilidade e a moralidade. Este tipo de socialização, segundo Rogoff (2005), tende a influenciar o individuo
para uma atuação individualista, orientada
quase que exclusivamente por interesses
pessoais em detrimento dos interesses coletivos. E é assim que a competição e o individualismo têm sido cada vez mais observados em várias pesquisas e, segundo autores como Staub (2002) e Branco (2003),
práticas e valores desta natureza estão significativamente relacionados a motivações
anti-sociais. A Cultura da Paz é um contexto
importante para a internalização e prática dos direitos humanos. A promoção da
Cultura da Paz em nível mundial tem sido
bastante mencionada pela Organização
das Nações Unidas, tanto é que a revisão
feita em 1989 da Declaração Universal dos
Direitos da Criança de 1959 foi bastante
influenciada pelo tratado que estabelece
a necessidade da Cultura da Paz. Portanto,
emerge no âmbito das ciências psicológicas
a necessidade de se compreender os processos de internalização de valores como
pré-requisito para a co-construção da paz,
uma vez que “co-construir a paz significa
analisar e favorecer as configurações do sistema motivacional que sejam compatíveis
com as crenças e valores que caracterizam
o que denominamos paz” (Branco, 2009).
Nesse sentido, o presente trabalho teve
como objetivo a construção de dados que
permitissem analisar e refletir criticamente
sobre a questão da ontogênese dos valores
humanos, e a possibilidade de contribuir
concretamente para a promoção de valores humanistas, de orientação cooperativa
e solidária, no contexto escolar, de acordo
com a Cultura de Paz. Para tanto, foram entrevistados doze professores de quarto ano
de escolas públicas do Distrito Federal acerca de sua opinião sobre a socialização de
seus alunos, os valores humanos, o papel
da educação, o papel do conflito, o desenvolvimento da criança, e sobre estratégias
para a construção da Cultura da Paz, assim
como dificuldades e empecilhos para esta
construção. A realização de projetos para
a construção de Cultura de Paz na escola
foi considerada importante ou necessária
pelos entrevistados, sendo que a maioria
deles afirmou ter disposição para participar como voluntário de projetos deste tipo.
Diversos fatores foram apontados como
279
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
empecilhos para a Construção da Cultura de Paz, sendo que a grande dificuldade
de comunicação entre a escola e a família
foi considerada central. Houve menção às
divergências entre família e escola quanto
aos papeis e objetivos específicos de cada
contexto, e foram discutidos fatores como
desigualdade social, violência urbana e influência negativa da mídia sobre as crianças. Os professores apresentaram vários
tipos de definição de Paz, mas quase todas
eram definições ingênuas e individualistas.
Entre elas encontramos definições como
a “ Paz é a ausência de conflito” ;“é uma
característica interna”; “é tranqüilidade”
interna ou externa, “é ligada ao convívio
harmonioso” e assim por diante. Para a
grande maioria dos professores não existem conflitos desejáveis, os conflitos são
sempre negativos; entretanto alguns, especialmente quando solicitados a se posicionar se “existem conflitos desejáveis?”,
diziam que sim e que estes poderiam gerar
crescimento pessoal. Como sugestões e
passos concretos para a construção da Cultura da Paz, os entrevistados citaram a promoção de palestras (tanto para pais quanto
professores), dramatizações, aulas voltadas
para o tema e discussão de filmes. Foram
relatadas e analisadas histórias envolvendo
“alunos problema”, casos de professores
agredidos por alunos, brigas entre alunos e
bullying. Verificando o grau de desconhecimento dos professores quanto a questões
de socialização e internalização de valores,
o estudo discute a grande necessidade de
orientar os educadores para que possam
bem conceituar, compreender e saber
posicionar-se na prática de forma a atuar
como promotores de uma Cultura de Paz.
Palavras-chave: cultura da paz; violência;
escola pública
280
LT03-816 - VIOLÊNCIA NA ESCOLA E
CULTURA DA PAZ: COM A PALAVRA AS
CRIANÇAS
Bruno Campos - UnB
Lorena Leite - UnB
Alia Barrios - UnB
Angela Branco - UnB
Considerando que todo cientista tem
o compromisso de favorecer a saúde e
bem-estar dos indivíduos e da sociedade,
o objetivo do presente trabalho consistiu
em construir dados que permitam analisar e refletir criticamente a questão da
violência nas escolas na percepção e avaliação de crianças do quinto ano do ensino fundamental, bem como analisar suas
sugestões acerca do que pode ser feito
para se promover uma cultura de paz
no ambiente escola. Nosso objetivo foi
construir subsídios para contribuir com o
desenvolvimento de valores humanistas,
de orientação cooperativa e solidária, no
contexto escolar. Para o cumprimento de
tal objetivo e como guia teórico-metodológico para a realização do trabalho, partimos de uma perspectiva sociocultural de
caráter construtivista cujo foco se dá na
qualidade semiótica do desenvolvimento humano, com ênfase na linguagem e
na comunicação não verbal das pessoas.
Ainda são poucos os estudos encontrados
na literatura que produzem dados na direção da reflexão acerca da origem e do
desenvolvimento dos valores humanos,
e em como estes são culturalmente disseminados. Segundo Juberg (2000), as
pessoas são agrupadas de acordo com
características que, conforme a ideologia
dominante, são julgadas como boas ou
ruins, positivas ou negativas. Tais julgamentos constituem a base de preconceitos geradores de violência, pois, segundo
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
a autora, esses estimulam a discriminação social, legitimando a agressividade e
atitudes segregacionistas. Seguindo essa
lógica, os indivíduos passam a serem
percebidos e tratados em função de estereótipos e preconceitos associados ao
grupo a que pertencem. Essa tendência,
cada vez mais freqüente nos contextos
educacionais atuais, origina o fenômeno do bullying, definido pela execução
de um mal não percebido, causado por
ações pequenas, mas que são repetidas
frequentemente (Staub, 2003). As ações
violentas são causadas, na maior parte
das vezes, psicologicamente produzidas
por frustrações e aprendizagem de formas agressivas de resolução de conflito, e
múltiplas são as motivações para comportamentos pró-sociais como o bullying. A
metodologia utilizada para a investigação
das percepções e avaliações das crianças
quanto ao bullying e a cultura da paz qualitativa, uma vez que nosso objetivo foi
identificar e analisar os processos de significação no contexto da diversidade dos
participantes da pesquisa, que gerou uma
riqueza de informações ao longo do processo de construção interativa dos dados.
Nesta pesquisa realizaram-se dois grupos
focais em duas escolas públicas do Distrito Federal (A e B) com crianças de 5º ano,
com idade entre 10 e 11 anos de idade,
o grupo A com a participação de quinze
alunos (nove meninos e seis meninas),
e o grupo B com a participação de onze
(sete meninas e quatro meninos). Eles
aconteceram de acordo com um roteiro
semiestruturado, contendo perguntas
que abordavam a reflexão conjunta sobre
as experiências e avaliação das dificuldades de interação e relacionamento entre
as crianças, com os professores e entre as
pessoas em geral no contexto de sala de
aula; a questão do bullying nas interações
em sala de aula e fora dela; E a criação
de atividades e práticas específicas de natureza cooperativa e sugestões diversas
para a construção da paz e prevenção do
bullying no contexto escolar. Realizados
os grupos, observou-se resultados muito
interessantes. Na escola A, as crianças
revelaram que, para elas, as características que definiriam uma vítima de um
agressor seriam diversos atributos físicos,
inclusive antagônicos (como ser baixo ou
alto, gordo ou magro), dado esse que confirma a esterotipia criada com padrões
culturais de beleza idealizados no grupo a
que se pertence. Na escola B isso se confirmou, pois um dos sujeitos participantes do grupo, que era negro, disse que os
outros gostavam de chamá-lo de ‘lacraia’,
e que ele não gostava disso. Ninguém explicou o porquê desse apelido, mas uma
suposição que podemos fazer é que este
menino tem uma aparência não muito
compatível com os padrões de beleza vigentes em nossa sociedade. Nessa escola
evidenciou-se, também, a presença generalizada do bullying, pois a discussão do
tema surgiu antes mesmo do pesquisador
lançar a pergunta sobre bullying para ser
discutida entre as crianças após a exibição do vídeo de um menino que contava
a sua história de vítima de bullying. Além
dos resultados encontrados que corroboram as questões levantadas e discutidas
na literatura, foi possível verificar a ampla diversidade de motivações e contextos geradores de bullying, que precisam
ser melhores investigados. Tudo indica
que um aspecto importante seja a dinâmica das interações e relações que ocorrem em contextos competitivos, como a
escola. A internalização de valores e padrões de agressão e violência como forma
281
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
de obter sucesso e popularidade entre
os colegas, o que eleva a autoestima do
“ganhador”, acaba gerando situações de
grande sofrimento para todos, pois nem
sempre existe apenas uma vítima envolvida na situação: como observamos no grupo B, quase todos desqualificam-se uns
aos outros. Aprender a resolver conflitos
de forma pacífica, por exemplo, não faz
parte do cotidiano dessas crianças. Isto
tudo confirma a necessidade crescente
de se realizar ações preventivas tanto no
contexto educacional, como em outros
setores da sociedade. Afinal, a capacidade de resolver conflitos de forma pacífica
e a tolerância exige o desenvolvimento
de estratégias específicas para a promoção de práticas, crenças e valores para a
construção da paz articulando crianças e
adultos, família, escola e comunidade.
Palavras-chave: cultura da paz, violência na
escola, escola pública
CO 48 - LT03
Abrigamento e Adoção
LT03-764 - SITUAÇÃO DE ABRIGAMENTO
PARA CRIANÇAS, POLÍTICAS PÚBLICAS E
SOFRIMENTO PSÍQUICO
Ana Maria Monte Coelho Frota - UFC
[email protected]
Ângela de Alencar Araripe Pinheiro - UFC
[email protected]
No Brasil, a política de atendimento à
infância e à juventude, em situação de
abandono, vem sofrendo transformações
profundas: do gerenciamento da Igreja,
282
passando por profissionais liberais até
o domínio do Estado, presente na contemporaneidade. A histórica da infância
no Brasil (Pinheiro, 2006) é marcada por
abandono, crueldade, violência. Na Colônia, já existia o abandono de crianças
índias, brancas e negras (Leite, 1997).
Priore (1996 e 2000) e Marcilio (1997)
explicitam práticas de abandono e violências físicas, morais e sexuais no Brasil,
por longo período. No século XIX, emergiram tentativas filantrópicas de cuidados
à infância abandonada e, no século XX,
surgiram instituições para crianças dentro das exigências produzidas no período
(Rizzinni e RizzinniI, 1990): compuseram
um sistema de proteção, solidificado na
era Vargas, presente até os anos 60; os
anos 70 configuraram práticas compensatórias de educar crianças asiladas (Nunes,
2009). Pela falência do sistema de acolhimento das crianças abandonadas, o Estado passou a ser cobrado de prover-lhes
assistência (Rizzinni e RizzinniI, 2004). O
Serviço de Atenção ao Menor, criado durante o Estado Novo, faliu quase de imediato, surgindo a Fundação Nacional do
Bem Estar do Menor, prometendo uma
prática de atenção social a menores em
vias de marginalização ou marginalizados. A partir dos anos 70, com denúncias
regulares na imprensa, principalmente
após o golpe militar e o fracasso do milagre econômico, voltou a se pensar esta
problemática (Passetti, 1996). O Ano Internacional da Criança, marca o início do
enfrentamento da crueldade com o atendimento à criança abandonada e o abrigamento é situação extraordinária, provisória e excepcional. O Plano Nacional de
Promoção, Proteção e Defesa do Direito
de Crianças e Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária –PNPPDDCA-
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
CFC- (2006) explicita a provisoriedade do
abrigamento, e a necessária convivência
da criança com a família e comunidade.
Contudo, abrigos continuam crescendo em número e quantidade de abrigados. Segundo Arpini (2003), Siqueira,
Dell’aglio (2006), Yunes, Miranda, Cuello
(2004), os abrigos somente conseguem
atender necessidades de sobrevivência
física, deixando brechas para sofrimentos
psíquicos, aproximando-se da conceituação de instituição total (Goffman, 1996).
Políticas Públicas são abordagem recente (anos 1990) entre psicólogos, e mais
ainda sua execução e formulação, como
campo de atuação (Bock, 2003; Contini, 2002; Gonçalves, 2003; Yamamoto,
2003). A inclusão das políticas públicas
no fazer psicológico vincula-se ao reconhecimento do ser humano como constituidor e constituído pelo contexto; aos
anseios inolvidáveis da população, destituída de bens e serviços fundamentais,
com implicações em sua subjetivação.
Campo tenso e contraditório, as políticas
públicas no País são ainda reconhecidas
mais como benemerências do que como
instrumentos de universalização de direitos humanos. Focalizando práticas de
abrigamento, vale refletir: com prevalência no campo da caridade, têm sido executadas prioritariamente por instituições
religiosas/humanitárias. Concepções discriminatórias para crianças tidas fora do
casamento contribuíram para manter a
prevalência de práticas assistencialistas,
repercutindo no processo de subjetivação (Pinheiro, 2006); CF e ECA trazem
inovações que se contrapõem às práticas
referidas, requerendo reordenamentos
institucionais. Lembremos princípios legais que colocam o abrigamento como
direito: CF, Art. 208 – O dever do Estado
com a Educação será efetivado mediante
a garantia de... IV: atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero a seis
anos. Art. 227, Parágrafo 6º. – Os filhos,
havidos ou não da relação do casamento,
ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer
designações discriminatórias relativas à
filiação. A Doutrina da Proteção Ingeral e
o PNPPDDCACFC igualmente contribuem
para colocar o abrigamento no campo da
cidadania, fortalecendo a concepção de
abrigamento como direito e situação. As
reflexões levam-nos a um questionamento: como garantir o usufruto do direito à
convivência familiar e comunitária para
crianças que vivem mais permanência no
abrigo do que provisoriedade? Parece-nos quase impossível pensar nesta garantia. Anunciamos como possibilidade
que os abrigos sejam construídos como
instituições de pequeno porte, que possam construir laços afetivos e de confiança, e vínculos assemelhados aos dos diferentes agrupamentos familiares. Necessário atentar para a inserção da criança
abrigada nos diferentes espaços sociais
da comunidade. Utópico? Certamente, e
norte para a transformação da sociedade
e do atendimento de direitos da criança.
Palavras-chave: Infância, Abrigamento,
Políticas Públicas
283
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
LT03-960 - VERIFICAÇÃO DE UM
MODELO MEDIACIONAL ENTRE A
EMPATIA E O PERDÃO INTERPESSOAL EM
RELAÇÃO A UM OFENSOR.
Júlio Rique Neto - UFPB
[email protected]
Nilton Formiga - UFPB
[email protected]
Felipe Fernandes de Medeiros - UFPB
[email protected]
Financiamento: CNPq
Este trabalho verificou um modelo de
mediação entre a Consideração Empática (CE) e a Tomada de Perspectiva (TP)
para o perdão interpessoal. Buscou-se
saber se a CE e a TP influencia na redução da mágoa em relação a um ofensor
facilitando o perdão. O tema do perdão
é presente na ciência, senso comum e
conhecimento religioso. Na psicologia,
autores têm se interessado em verificar
as variáveis preditoras do perdão visando uma melhor qualidade nas relações
humanas. De acordo com Enright, Freedman e Rique (1998) o perdão interpessoal é uma atitude moral na qual uma
pessoa considera abdicar do direito ao
ressentimento, julgamentos negativos, e
comportamentos negativos para com outra pessoa que a ofendeu injustamente.
Bem como, o perdão tem a função de fomentar na pessoa a compaixão para com
a pessoa que ofendeu. Para o perdão,
faz-se necessário um re-enquadramento
cognitivo (ou reframing) da situação, ou
seja, a vítima reelabora o evento sob uma
nova perspectiva. Neste processo, é esperado que a vítima desenvolva a CE e TP
do ofensor como variáveis facilitadoras
do perdão (Enright & Fitzgibbons, 2000).
Davis (1983) definiu a CE como a capa284
cidade do observador simpatizar com o
outro e se inclinar a ajudá-lo e TP como a
habilidade cognitiva de tomar a perspectiva do outro e entende-lo(a) a partir do
contexto no qual ele(a) está inserido(a).
Rique e cols. (2010) testaram um modelo
no qual a CE é associada ao grau da mágoa e a TP é associada ao grau do perdão,
porém, tal modelo não permitiu avaliar a
existência de uma mediação entre essas
variáveis e o perdão interpessoal explicando o grau da mágoa em relação a um
ofensor. Este trabalho propõe verificar
esta mediação. Participaram deste estudo, 201 jovens do sexo masculino e do
sexo feminino, estudantes secundaristas e universitários com media de idade
de 19 anos (DP = 2,06) do município de
João Pessoa – PB. Os sujeitos responderam as seguintes escalas: a escala do
perdão – EFI (Enright Forgiveness Inventory, Enright & Rique, 2000), uma escala
objetiva composta inicialmente por uma
Folha de Rosto que coleta informações
sobre a mágoa e uma breve descrição da
ofensa, depois um Inventário de 60 itens
divididos em três subescalas de 20 itens
cada (10 positivos e 10 negativos) sobre
afetos, comportamentos e julgamentos,
é respondido em uma escala de concordância com seis pontos (1 = discordo e
6 = concordo) e, finalmente, o Item do
Perdão, que corresponde a uma questão
objetiva: "Por favor, indique o quanto que
você perdoou a pessoa que você avaliou
na Escala EFI". Essa questão é respondida
em uma escala de cinco pontos (1 = não
perdoei e 5 = perdoei completamente).
Administrou-se também uma adaptação
das escalas de CE e TP da EMRI (Davis,
1983, adaptada por Ribeiro, Koller & Camino, 2001). Foram feitas adaptações
semânticas nos itens destas escalas para
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
que os participantes respondessem pensando no ofensor que foi avaliado na escala EFI. Após as modificações, os itens
adaptados foram aleatoriamente distribuídos e medidos em uma única escala
objetiva de cinco pontos (1 = baixo e 5 =
alto) com 14 itens no total. Por último, foi
utilizada uma escala sócio demográfica
para informações sobre idade, sexo etc.
A ordem das escalas foi a seguinte: primeiramente a escala sócio demográfica,
em seguida a EFI com o item do perdão e,
por último, a escala de CE e TP. O estudo
atendeu as recomendações éticas da resolução 196/96 do CONEP. Os estudantes
foram convidados verbalmente a participarem do estudo e a administração dos
questionários ocorreu em sala de aula,
com cada participante respondendo individualmente todas as medidas. Para testar o efeito de mediação da variável independente - VI (CE e TP) na variável mediadora -VMe (o perdão) sobre a variável
dependente – VD (a mágoa), efetuou-se
o teste de Sobel. Este teste tem como
função avaliar a VMe como preditora
da VD e como a VI deve ser preditora da
VMe. Assim, na presença de ambas – VI
e VMe – uma relação significativa prévia
entre a VI e a VD decresce em magnitude, demonstrando o efeito da mediação
(Baron & Kenny, 1986; MacKinnon, Warsi
& ,1995; Sobel, 1982). Este cálculo é caracterizado por uma relação que altera
para mais ou para menos a influência da
VI sobre a VD. Sendo assim, modelo proposto foi considerar a CE e a TP como VIs
influenciando o perdão. O perdão passou
então a ser uma variável de mediação da
VD (intensidade da mágoa). Para verificar
o modelo proposto, inicialmente buscou-se avaliar a validade da escala de CE e
TP em relação ao ofensor. Os resultados
mostraram indicadores de ajuste que garantiram a adequabilidade de sua estrutura (c2/gl = 1,12; RMR = 0,05; GFI = 0,96;
AGFI = 0,93; CFI = 1,00; TLI = 0,99; RMSEA
= 0,02, CAIC = 365,92 e ECVI = 0,80) observando uma associação positiva entre a
TP e CE (l = 0,77). A EFI também mostrou
índice de confiabilidade interna Alfa satisfatório de 0,97 na amostra do presente
estudo. Em seguida, dois modelos foram
testados separadamente. No primeiro
modelo, os resultados mostraram que a
CE apresentou um escore preditivo positivo com a mágoa, porém, não significativo. Por outro lado, a CE influenciou
positivamente o Perdão que, como predito, influenciou negativamente, a Mágoa
(z = 12,47; p < 0,001) explicando 33%
da amostra na relação entre essas variáveis. No segundo modelo, verificou-se
que a TP influenciou significativamente
de forma negativa a Mágoa e positivamente o Perdão, que por sua vez explicou negativamente, a mágoa (z = 12,47;
p < 0,001) 32% da amostra no modelo.
Nesse sentido, encontrou-se tanto uma
relação direta da CE e TP sobre a mágoa
como uma relação mediada pela variável
do perdão, influenciando negativamente
a mágoa. Considerando esses resultados,
confirmou-se o modelo de mediação do
perdão sobre a mágoa. Uma vez encontradas maiores magnitudes da CE e TP no
perdão e na mágoa, exponencialmente
maior será o impacto do grau de perdão
sobre a intensidade da mágoa.
Palavras-chave: perdão interpessoal,
consideração empática, tomada de
perspectiva, mágoa
Contato: Júlio Rique Neto, UFPB,
[email protected]
285
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
LT03-1024 - CASAS DE ACOLHIMENTO E
AS RELAÇÕES DE RESPEITO EXISTENTES
EM SUA ROTINA
Carla Andressa Placido Ribeiro - UNESP
[email protected]
Adrián Oscar Dongo Montoya - UNESP
Patrícia Unger Raphael Bataglia - UNESP
Financiamento: FAPESP
Na Lei nº 8.069, de julho de 1990 no
Estatuto da Criança e do Adolescente a
criança é vista como pessoa em desenvolvimento e goza de todos os direitos
fundamentais intrínsecos ao ser humano assegurando-lhe o desenvolvimento
físico, mental, moral, espiritual e social.
No caso das crianças e adolescentes institucionalizadas por razão de maus tratos,
abandono ou por serem órfãs, seus direitos são preservados pelo Estado sendo
garantido um abrigo, seja em famílias
substitutas ou em casas de acolhimento
(abrigos provisórios). Com o objetivo de
entender como as relações estabelecidas nas rotinas dessas casas contribuem
para o desenvolvimento moral de seus
acolhidos, pesquisamos uma casa de
acolhimento na cidade de Marília-SP, e
observamos qual o tipo de relação (respeito unilateral ou respeito mútuo) que
predomina em sua rotina e consequentemente qual o tipo de educação moral estabelecida, pois, segundo Piaget (1994),
a pressão exercida pelo adulto à alma da
criança acarretará resultados diferentes
do que a livre cooperação entre crianças
e, dependendo de como ocorre a educação moral moldará as consciências e
determinará comportamentos de modos
diferentes, ou seja, a relação educativa
de caráter unilateral (coação adulta) resulta na heteronomia, contrariamente as
286
relações de respeito mútuo (cooperação)
promove a autonomia. Para as realidades
morais se constituírem é relevante que
os indivíduos estabeleçam relações sociais, pois, é nessas relações entre os indivíduos que se estabelecem as normas.
Não há, portanto, moral sem educação
moral. "[...] não há uma única moral e
nem haverá tantos tipos de reações morais quanto as formas de relações sociais
ou interindividuais que ocorrem entre a
criança e seu meio ambiente" (PIAGET,
1930/1996, p. 3). Na casa de acolhimento pesquisada, apesar dos acolhidos serem assistidos em suas necessidades básicas, as ações educativas junto às crianças e adolescentes se fundam, sobretudo, em relações de respeito unilateral à
autoridade e às regras estabelecidas, as
quais não promovem a responsabilidade
interior e a vida cidadã. O cumprimento
das regras nem sempre solicita, por parte
as crianças e adolescentes, a necessária
tomada de consciência das suas ações.
E sabemos que a participação na elaboração e exercício consciente das regras
é absolutamente necessária para o seu
cumprimento responsável. “As crianças
são heterônomas quando fazem um uso
imitativo das regras e quando as consideram sagradas, pois vindas da tradição e
imutáveis... As crianças são autônomas
quando fazem um uso racional e social
das regras, e quando as consideram produtos do e para o grupo” (MENIN, 1996,
p.46). Observamos que o processo de
tomada de consciência na construção
de regras também não é uma prática
junto aos funcionários da instituição. As
crianças pesquisadas não têm um espaço
social e coletivo onde possam agir e experienciar valores de respeito mútuo. Assim, as relações entre crianças, via de re-
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
gra, não se pautam pelo respeito mútuo
e pelos laços de solidariedade, pelo contrário, são relações de competição que se
sobrepõem a essas relações. Suas noções
de justiça se fundamentam no respeito à
autoridade adulta e não em laços de cooperação entre iguais, de solidariedade
e respeito mútuo. Esses dados mostram
que as relações que ocorrem no interior
da instituição (entre adultos e acolhidos
e entre os próprios acolhidos) não estariam promovendo a autonomia moral e/
ou não estariam conseguindo alterar os
efeitos das práticas educativas vivenciadas com suas famílias e noutros centros
educativos. Se para Piaget (1994) o desenvolvimento da noção de justiça de um
indivíduo se estabelece, principalmente,
em função das relações estabelecidas em
seu meio social, podemos afirmar que é
fundamental o papel da educação moral
motivada na autonomia e na reciprocidade. “O alcance educativo do respeito mútuo e dos métodos baseados na organização social espontânea das crianças entre
si é precisamente o de possibilitar-lhes
que elaborem uma disciplina, cuja necessidade é descoberta na própria ação, ao
invés de ser recebida inteiramente pronta antes que possa ser compreendida”
(PIAGET, 1973, p.77). Com isso, propomos à instituição uma pesquisa de intervenção com o objetivo de constituir junto
aos funcionários da casa e acolhidos um
ambiente favorável ao desenvolvimento
moral das crianças e adolescentes, estabelecendo em suas relações rotineiras o
respeito mútuo. Assim, podemos refletir se um ambiente favorável à tomada
de consciência das regras, baseado no
princípio do respeito mútuo e na relação
de cooperação entre todos os membros
dessa instituição adultos, possa promo-
ver o desenvolvimento moral dos acolhidos. A proposta foi aceita pela instituição
e encontra-se em sua etapa final no que
diz ao trabalho de intervenção junto aos
funcionários (reuniões que promova a reflexão crítica das condutas entre adultos
e para com os acolhidos) e em andamento no trabalho de intervenção junto aos
acolhidos. Podemos assim, expor os resultados preliminares divididos em dois
grupos: junto aos funcionários, e, junto
aos acolhidos. No primeiro grupo alguns
funcionários já fazem reflexões críticas
a respeito de suas práticas colocando-se no processo de educação moral das
crianças e adolescentes e nos problemas
da instituição. Também apresentam interesse em adquirirem novas posturas que
auxiliem no bom desempenho de seu
trabalho enquanto educador, no entanto
ainda há os que não se enxergam como
tal e apresentam resistência em se colocar nos problemas da instituição. Muito
ainda devemos percorrer para a constituição de um ambiente favorável ao desenvolvimento moral, mas julgamos que
o principal que é a visão da necessidade
desse ambiente já tem alcançado grande
parte dos funcionários e o interesse de
alguns em se orientarem para estabelecerem com as crianças e adolescentes
uma relação de respeito mútuo. No segundo grupo o trabalho tem sido bem
minucioso com o propósito dos acolhidos
perceberem qual o caráter que a regra
apresenta em sua convivência na instituição (preservar os princípios de respeito,
justiça, igualdade... e de sua reciprocidade) e de perceberem que a regra em si
não é imutável, mas seguindo um princípio moral válido, ela pode ser modificada
e constituída pelo grupo. Para isso, trabalhamos com brincadeiras, contos e con287
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
fecções de materiais promovendo identificação com o grupo e a necessidade de
respeito mútuo e de cooperação para se
estabelecer um bom convívio, dentro e
fora da instituição.
Palavras-chave: casa de acolhimento;
educação moral; relações de respeito
Contato: Carla Andressa Placido Ribeiro,
UNESP, [email protected]
LT04-1437 - PROPORCIONANDO
RELAÇÕES QUE FAVORECEM A
CONSTRUÇÃO DA AUTONOMIA
DE CRIANÇAS EM SITUAÇÃO DE
ABRIGAMENTO
Arytanna Zuitá Barbosa Ferreira - UnB
[email protected]
Lorena de Abreu Menezes Araujo - UnB
[email protected]
Regina Lúcia Sucupira Pedroza - UnB
[email protected]
A realidade das relações interpessoais no
contexto de abrigamento, no Brasil, tem
sido evidenciada por certo fatalismo da
impossibilidade de crescimento de recursos de personalidade que permitam
a construção da autonomia. Defendemos
que, apesar desse contexto deparar-se
com regras rígidas, por exemplo, com os
horários predeterminados e fixos para
todas as atividades do dia a dia e pouco
espaço para a criança exercer sua individualidade, é possível criar condições favoráveis ao desenvolvimento da pessoa
como sujeito ativo e de direitos, deveres
e desejos. Entretanto, ainda prevalece
a idéia de que a criança só pode se desenvolver por completo no seio de uma
família, de forma que a adoção aparece como única possibilidade para essas
288
crianças, ao invés de se proporcionar
uma reestruturação da família de origem
para que ela exerça seu direito de viver
com seus filhos. Sendo assim, refletimos
sobre a importância de um trabalho cujo
foco inclua o desenvolvimento da autonomia desses sujeitos. Baseando-se na
experiência de trabalho no projeto de extensão “Os afetos em cena: a brincadeira
nas relações em um abrigo para crianças
e adolescentes”, desenvolvido por alunos
de Psicologia da Universidade de Brasília,
vimos pensando e buscando desenvolver
essa questão. Ao tratar da autonomia, é
importante ser colocado que acreditamos nesse processo como uma construção, como algo que se constitui a partir
das relações interpessoais desenvolvidas
em parceria. Acreditamos, também, que
para que se comece a pensar na construção de tais relações é preciso adotar um
olhar diferenciado sobre a criança, um
olhar que em si mesmo traga a ideia de
que é possível que esse sujeito seja autônomo. Um exemplo disso está no questionamento de Rogers que, ao pensar
em sua relação com o outro, questiona
“como posso proporcionar uma relação
que essa pessoa possa utilizar para seu
próprio crescimento pessoal?” (Rogers,
2001, p.36). Diferentemente disso, o que
encontramos nos abrigos é, muitas vezes, um olhar assistencialista sobre o outro, que, ao se questionar, por exemplo,
como seria possível mudar ou transformar aquela pessoa, carrega uma percepção que retira a possibilidade de movimento e protagonismo do sujeito. Segundo Foucault, conquista-se a autonomia a
partir de uma libertação que ocorre pelo
exercício individual e conjunto de práticas de liberdade. No entanto, deve-se entender a construção de autonomia como
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
mais que um processo de libertação, ou
um sinônimo de independência. Dentro
dessa questão, podemos pensar, então,
em qual é a medida da liberdade dentro
desse processo. De fato, a autonomia
está estreitamente ligada ao conceito de
liberdade; no entanto, tal liberdade não
significa retirada de limites, pelo contrário, como traz Paulo Freire: “a liberdade
não se autentica sem o limite da autoridade, mas o limite que a autoridade se
deve propor a si mesma, para propor ao
jovem a liberdade, é um limite que necessariamente não se explicita através de
castigos” (Freire, 2001, p. 250). Partimos
do pressuposto que esse limite é constituidor do sujeito e, portanto, necessário
para a diferenciação do eu psíquico. O autor propõe, ainda, que seja alcançado um
equilíbrio entre autoridade e liberdade,
já que, quando esse equilíbrio se desfaz
em favor da autoridade, nos deparamos
com uma realidade de autoritarismo; por
outro lado, quando se desfaz em favor
da liberdade, tem- se um clima licencioso, e, assim, a liberdade não é liberdade,
e a autoridade se esvazia como tal. No
trabalho desenvolvido pelo projeto de
extensão citado anteriormente, busca-se
manter esse equilíbrio e se acredita que,
dessa forma, seja possível estabelecer as
relações interpessoais favorecedoras à
construção do processo de autonomia.
Referindo-se ainda a esse projeto, ao trabalhar com a questão da autonomia, o
instrumento que se utiliza para construir
não só tais relações interpessoais, como
também o espaço favorável para seu desenvolvimento, é a brincadeira. Busca-se
proporcionar um espaço do brincar seguro, em que a criança pode ser ela mesma, pode ser diferente, ou simplesmente
pode ser. É um espaço em que é dada
a oportunidade para a criança escolher,
experimentar, tentar, sonhar, ser plenamente, mesmo em aspectos que normalmente seriam reprimidos, como experimentar sentimentos de raiva, tristeza,
angústia e até agressividade – sempre
de forma mediada e responsável e dentro dos limites humanos éticos. Por meio
do brincar abre- se um espaço em que é
possível à criança exercer sua individualidade, sendo respeitada e escutada,
sem censura, pois acreditamos que seu
desenvolvimento, como um todo, deve
respeitar sua unicidade e individualidade
como ser humano. As relações com esses
sujeitos são construídas buscando-se não
carregar olhares e atitudes comumente
pré-concebidas e determinantes, como
estereótipos de crianças em situação de
abrigamento como sendo agressivas ou
possuidoras de desenvolvimento cognitivo e motor inferiores; além disso, não
há espaço para um olhar penoso, que
pensamos ser extremamente nocivo para
a constituição de qualquer indivíduo.
Assumindo as ideias expostas, e tendo
como norteador de atuação profissional
o respeito e a honestidade para o desenvolvimento de qualquer relação interpessoal saudável, o objetivo deste trabalho
é refletir sobre as possibilidades de se
construir relações interpessoais diferenciadas que favoreçam o desenvolvimento
da autonomia de crianças em situação de
abrigamento.
Palavras-chave: Abrigamento;
Desenvolvimento Infantil; Autonomia.
289
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
LT07-1234 - PINTANDO E BORDANDO:
UMA REFLEXÃO ACERCA DA INFÂNCIA E
DA SITUAÇÃO DE ABRIGAMENTO
Alyne Farias Moreira - CEUB
[email protected]
Bianca de Moraes Ávila - UnB
[email protected]
Camila Moura Fé Maia - UnB
[email protected]
Lídia Furtado Oliveira - UnB
[email protected]
Regina Lúcia Sucupira Pedroza - UnB
[email protected]
Thaís Polônio Ribeirinho - CEUB
[email protected]
Um levantamento bibliográfico realizado
por Ayres, Coutinho, Sá & Albernaz (2010),
a respeito de crianças que se encontram
em situação de abrigamento, aponta para
uma delicada situação: a construção de
uma identidade institucional, a “criança
de abrigo”. Há uma lógica determinista
que atribui características psicológicas às
crianças em decorrência dessa situação.
Afirma-se a vitimização da criança por estar vivendo longe de sua família, demarcando um lugar específico de segregação
em relação àquelas não abrigadas. Neste
estudo, buscamos fazer uma reflexão crítica sobre a identidade institucional que
despersonaliza e dificulta a visão da criança como sujeito ativo e em constante mudança com possibilidades de se desenvolver em contextos adversos. Já em 1958,
Anna Freud e Burlingham, em estudo sobre crianças em situação de abrigamento,
notaram um atraso de seis meses na linguagem dessas crianças e atribuíram-no à
falta de contato com a mãe. Além disso,
apontaram que as crianças parecem mais
agressivas do que outras que vivem com
a família. Do ponto de vista cognitivo, as
290
autoras citaram estudos que comprovavam que crianças em instituições apresentaram atraso no desenvolvimento, exteriorizado pelo atraso na linguagem, pela
dificuldade de memorização e pelo não
reconhecimento de pessoas do convívio.
Estudos atuais continuam atribuindo essa
identidade deficitária particular às crianças de abrigo. Dell’Aglio e Hutz (2004), em
pesquisa sobre depressão e desempenho
escolar em crianças institucionalizadas,
colocam que tais crianças possuem médias mais baixas relativas ao seu desempenho escolar e maior depressão quando
comparadas com as que vivem com suas
famílias. Percebe-se, portanto, que pesquisas relacionadas a crianças em situação de abrigamento, muitas vezes, se limitam a descrever as diferenças do contexto
que teriam como conseqüência déficits
de desenvolvimento cognitivo, afetivo e
social. Esses estudos classificam tais crianças em uma identidade estática e focada
nesses déficits (Ayres et al., 2010). As representações sobre a criança no abrigo
possuem profunda relação com o processo histórico-cultural de políticas assistenciais à infância. Historicamente, os abrigos
surgiram como instituições que acolhiam
tanto adolescentes em conflito com a lei,
como aqueles que foram separados de
suas famílias por negligência, abandono
ou maus tratos. Além disso, as características negativas endossadas por concepções psicológicas estigmatizantes se baseiam em comparações entre percepções
sobre as crianças que estão em abrigos e
as crianças que estão com suas famílias
(biológicas e nucleares). Ou seja, há uma
concepção de que o único espaço de desenvolvimento saudável possível é o seio
familiar. Deve-se lembrar, entretanto, que
a família nuclear é uma construção sócio-
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
-histórica, como bem aponta Ariès (1978),
e não contém, per se, todas as condições
que viriam a caracterizar um ambiente
saudável. As crianças quando retiradas
do seu seio familiar, ao serem abrigadas,
entram em contato com uma nova organização de espaço e tempo e passam a
conviver com novas pessoas, normas e
hábitos. Essas mudanças súbitas podem
causar estranhamentos devido às origens,
histórias, angústias e dificuldades tão diversas de cada um. Sendo assim, reações
vistas como de agressividade, de depressão e déficits podem aparecer em situações de abrigamento. No entanto, não
são características inerentes das crianças,
e sim expressões dos conflitos vividos.
Apontamos, portanto, que a visão estática desse processo apenas estigmatiza as
crianças, impossibilitando o acolhimento
e a ressignificação desses fenômenos. O
presente trabalho não se propõe a qualificar qual o melhor ambiente de desenvolvimento, mas sim de propor uma reflexão
crítica dos conceitos de instituição familiar
e de abrigamento. Nesse sentido, visamos
não só descrever a situação da criança em
abrigo, mas, a partir da construção de diferentes tipos de relações, oferecer possibilidades de produzir novos sentidos para
seu desenvolvimento. Assim, o trabalho
volta-se para a criança como sujeito de
direitos que se desenvolve imersa em relações interpessoais. Estamos resgatando,
portanto, uma visão de criança enquanto
sujeito ativo, que é construtor e construído em um meio único e próprio. Sendo
assim, a infância é algo indeterminado,
relativo e imprevisível (Larrosa, 2004) que
transforma seu meio em um constante vir
a ser. As considerações aqui resumidas a
partir das reflexões dialógicas entre a teoria e a prática são provenientes de um
trabalho de extensão realizado em uma
instituição de abrigamento no entorno do
Distrito Federal. Esse trabalho é um projeto de extensão do Instituto de Psicologia
da Universidade de Brasília, denominado
Pintando e Bordando: desenvolvimento de
crianças e adolescentes em abrigos. Tem
por objetivo a criação de um espaço diferenciado de relações interpessoais, lazer
e comunicação. Utiliza-se a brincadeira
como instrumento que favorece essas
relações, possibilitando o desenvolvimento de recursos de personalidade como a
criatividade e a autonomia. Por meio do
brincar, as extensionistas criam um meio
ativo de desenvolvimento afetivo e cognitivo, em que transforma a criança e é
por ela transformado. Isso só é possível
a partir da disposição das extensionistas
em se colocarem como psicólogas em
constante atenção à escuta das demandas
das crianças. Dessa forma, a brincadeira
permite uma aproximação entre adultos
e crianças e entre elas mesmas. Nesse espaço, a criança pode tomar a iniciativa e
propor novas brincadeiras onde lhe é assegurado que possa colocar seus desejos,
sendo acolhida nos limites constituintes. A
partir das atividades de brincadeira, construímos com as crianças uma forma de se
relacionar pautada no respeito, promovendo o desenvolvimento de recursos de
personalidade que os tornem mais capazes de fazer suas próprias escolhas, lidar
com contradições do cotidiano, perceber
que existem diferentes tipos de relações
pessoais, elaborar a questão da separação e do abandono entre outros. Reafirmamos, portanto, a imprevisibilidade do
sujeito que se constitui nas relações de
abrigamento, sendo impossível determinar a forma como irá ocorrer o desenvolvimento de cada criança. Sendo assim, nos291
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
so trabalho visa proporcionar um espaço
de brincadeira que permita a criança lidar
com situações adversas do abrigamento
no seu processo de desenvolvimento. Isso
só pode ser feito se a criança é vista como
sujeito único, acolhida e respeitada em
seus desejos e suas histórias.
Palavras-chave: abrigo, infância, identidade
Contato: Camila Moura Fé Maia, UnB, mila.
[email protected]
DIA 13/11 - Domingo
16h-18h
Mesa Redonda Convidada
A JUVENTUDE NA AMERICA LATINA:
VALORES E DESENVOLVIMENTO
HUMANO
Júlia Sursis Nobre Ferro Bucher-Maluschke - UCB
Silvia Helena Koller - UFRGS
Fernando González Rey - CEUB/UnB
Normanda Araujo de Morais - UNIFOR
Esta mesa redonda se propõe a apresentar
e discutir resultados de pesquisas realizadas no Brasil e em países da América Latina que enfocam o desenvolvimento dos
jovens e sua relação com a formação de
valores. Partindo do conceito de virtude
desenvolvido pelos gregos na antiguidade
como “um traço de caráter merecedor de
admiração, tornando seu portador melhor,
quer seja do ponto de vista moral ou intelectual, quer na conduta de matérias es292
pecíficas” abordaremos a noção de valor
que definido por Gerard Legrand traduz
a “passagem do desejo para o conjunto
doutrinário e prático que constitui uma
moral fundada (explicitamente ou não)
em um conjunto de valores que são também abstrações representando o que se
tem por desejável”. Nesta perspectiva inúmeras são as questões que se colocam na
contemporaneidade sobre a construção e
vivência de valores para os jovens. O Prof.
Fernando Rey a partir de suas pesquisas
realizadas em Cuba, na Guatemala e no
Brasil, abordará o tema dos desafios dos
valores dos jovens em diferentes realidades da América Latina, discutirá alguns dos
processos macro e micro sociais que hoje
vivem esses três países da América Latina
e os desdobramentos desses processos
nos problemas específicos do desenvolvimento de valores dos jovens. Serão analisados os processos de configuração subjetiva dos valores morais, aspecto central
no processo de desenvolvimento da juventude. A Profª.Sílvia Koller apresentará os
resultados da pesquisa desenvolvida com
Prof.Carlos Nieto sobre o desenvolvimento
de valores em adolescentes e jovens em
situação de rua no Brasil e na Colômbia.
Serão discutidos aspectos relacionados
às questões biosociodemográficas desta
população, os fatores que os levam à situação de extrema vulnerabilidade e alguns
aspectos protectivos, incluindo valores sociais e pessoais, que os auxiliam na sobrevivência e na superação. O Prof. Benedito
dos Santos apresentará os resultados de
sua pesquisa sobre (In)justiça emocional:
o sentido de justiça de crianças e adolescentes que fogem de casa. Será abordada
a formação do senso de justiça entre crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade e violência intrafamiliar para ar-
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
gumentar que o sentido de injustiça emocional é um componente importante no
entendimento dos atos de fugir de casa. A
Profª. Normanda Araújo apresentará reflexões acerca dos valores atribuídos por jovens em situação de vulnerabilidade social
acerca de suas famílias a partir da pesquisa
realizada com dois grupos de jovens. Um
grupo que ainda mora com suas famílias e
que frequenta o Trabalho educativo e outro grupo que vive em situação de rua. Semelhanças e especificidades dos contextos
familiares para os dois grupos são discutidas. A Profª. Júlia Bucher-Maluschke apresentará a partir da pesquisa de histórias de
vida de jovens, filhos de pais “fora da lei”,
como construíram e vivenciam seus valores pessoais num contexto intrafamiliar e
social contraditório. Esperamos suscitar
com esta mesa-redonda novos encaminhamentos para a investigação nesta área
do desenvolvimento humano.
MR LT04 - Mesa Redonda
Convidada
MR LT04-979 - REFLEXÕES TEÓRICOMETODOLÓGICAS EM PESQUISAS COM
CRIANÇAS
Rosângela Francischini - UFRN
[email protected]
Angela Coutinho - UFSC
[email protected]
Sônia M. Gomes Sousa - PUC/Goiás
[email protected]
O objetivo principal desta Mesa é apresentar trabalhos que se propõem a refletir
sobre questões teórico-metodológicas que
perpassam a atividade de pesquisa com
crianças. Assim, serão abordadas questões
específicas, relacionadas ao trabalho de investigação com crianças pequenas - bebês
-, considerando-as, a partir do referencial
da Sociologia da Infância, sujeitos sociais,
portanto, que estabelecem relações com o
outro, grupo geracional ou não e, nessas
relações, tem um papel ativo na composição dos contextos em que estão inseridas.
O contexto eleito para o trabalho empírico
foi uma creche em Braga/Portugal e os resultados apontaram para a importância das
ações das crianças/ bebês na condução da
ação do(s) outro(s) e nas transformações
de suas próprias ações. Aliando a perspectiva teórico-metodológica da Psicologia
Sócio-Histórica às reflexões sobre as condições de exclusão/inclusão dos sujeitos
sociais crianças, considerando, inclusive,
aquelas que vivem em contextos onde a
violação de seus direitos se faz presente,
a segunda exposição aborda a condição da
criança - e a persistente desconsideração
por essa condição - enquanto sujeito que
produz sentidos e significados aos acontecimentos de seu cotidiano, considerando
os contextos instituicionais e seus atores.
Assim, afirma a autora: “O reconhecimento da criança como sujeito concreto,
inserido num contexto que ajuda a produzir e que o produz, leva a compreender a
posição desse sujeito no contexto social,
a situá-lo numa realidade mais ampla e a
tentar apreender o processo pelo qual ele
(sujeito) se forma. Sem esse enfoque, tem-se uma análise parcial do problema, uma
espécie de ‘psicologismo’, uma abordagem
insuficiente, incapaz de dar conta do processo de exclusão–inclusão social a que
estão submetidos milhares de seres humanos. Portanto, é necessário compreender
a realidade social como uma construção
humana, e não simplesmente como um
293
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
dado natural, pois é no processo de produção de sua realidade social que o homem
produz-se a si mesmo como ser histórico
e cultural.” A terceira exposição tem por
objetivo estabelecer um diálogo entre a
Psicologia Sócio-Histórica e a Sociologia da
Infância. A partir da constatação de que na
bibliografia especializada em Sociologia da
Infância comparecem críticas recorrentes
à Psicologia do Desenvolvimento, principalmente, de vertente piagetiana, a autora
se propõe a sinalizar as possibilidades de
aproximação entre essas duas áreas do
conhecimento, considerando, no entanto,
a Psicologia Sócio-Histórica representada
por Vygotsky, cujo desafio é pensar o desenvolvimento do sujeito a partir do materialismo dialético, das interinfluências
e das transformações recíprocas sujeito-ambiente. Por seu lado, da Sociologia da
Infância é chamada à cena a tese da “reprodução interpretativa”, elaborada por
Corsaro, que assume a capacidade e o poder que as crianças têm de transformarem
os elementos de seu contexto, através das
interpretações que fazem desses elementos, sinalizando para a importância das relações intrageracionais.
DESAFIOS METODOLÓGICOS PARA O
ESTUDO DAS RELAÇÕES SOCIAIS DOS
BEBÊS
Angela Coutinho - UFSC
[email protected]
Financiamento: Alβan – Programa de bolsas
de alto nível da União Europeia para América
Latina
Esta comunicação tem por objetivo apresentar algumas reflexões sobre os desafios
metodológicos na pesquisa com bebês,
294
bem como as possibilidades de diálogo entre diferentes áreas do conhecimento no
estudo de problemáticas interdisciplinares, como são as relacionadas às crianças
e às suas infâncias. Para tanto, toma como
referência uma pesquisa de doutorado desenvolvida no âmbito de um programa de
doutorado em Estudos da Criança. Trata-se de um estudo com orientação etnográfica, que foi desenvolvido em um contexto
de educação infantil do tipo creche, em
Portugal, tendo como objetivo conhecer a
ação social dos bebês no contexto da creche e, especificamente, identificar a recorrência e o modo como ocorrem tais ações
sociais. As perguntas que orientaram o
estudo são: Como ocorre a ação social entre os bebês, nas relações cotidianas no
contexto da creche? Quais elementos são
constituidores de tal ação? As relações e
as ações sociais são ideias e práticas similares? O que caracteriza a ação de bebês
na estruturação das suas experiências, no
contexto da creche? Há uma ordem social diferenciada para adultos e crianças,
no interior das instituições? Como elas
são estruturadas? Quais indicativos para
a formação das professoras de educação
infantil emergem do conhecimento da
ação social dos bebês na creche? A base
teórico-metodológica selecionada encontra-se na interface das Ciências Humanas
com as Ciências Sociais, nomeadamente
a Sociologia da Infância, numa perspectiva que situa a criança como ator social
e a infância como construção histórica e
cultural (Ariès, 1981; James & Prout, 1990;
Pinto & Sarmento, 1997). Dentre os pressupostos a serem abordados está a ideia
de que a infância deve ser estudada a
partir de si própria, considerando que as
crianças são as melhores informantes sobre as questões que lhe dizem respeito.
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
Tratando-se de bebês, há questões importantes a serem debatidas em torno da escolha de instrumentos de coleta de dados
e o trato dispensado aos dados coletados.
Isso porque, ao buscar superar a ideia de
negatividade ou falta atribuída à infância,
desde a etimologia da palavras infans que é aquele que não fala - a legitimidade
da competência social dos bebês passa
pela descortinamento de seus modos de
ser e estar no mundo, não pela ausência
da fala, mas, pela presença de múltiplas
outras formas de comunicação. A capturação das vozes dos bebês ocorreu, neste
estudo, por meio da utilização de instrumentos como o diário de campo e o vídeo,
sendo o último um instrumento valioso,
sobretudo, porque essas vozes manifestam-se pelo gesto, pelo corpo, pelo silêncio, pelo olhar, enfim, por múltiplas
formas de comunicação. Ainda na esteira
da abordagem em torno da recolha de dados junto às crianças bem pequenas, nos
deparamos com questões éticas que se
referem não só à utilização de termos de
consentimento informado dos familiares/
responsáveis ou devolutiva dos resultados
às partes interessadas - aspectos fundamentais a qualquer processo de pesquisa
-, mas, algumas questões bastante sutis,
contudo, fundamentais quando partimos
de perpectivas de pesquisa que tomam as
crianças como atores sociais, pois, como
respeitar o direito dos bebês de escolherem ou não participar de uma pesquisa?
Ou, ainda, de participar da pesquisa apenas em determinados momentos? Como
“ler” a sua opinião, que nem sempre é direta, sobre a presença de um outro adulto
em seus espaços de vida, para satisfazer
uma necessidade que lhe é alheia? Devemos considerar, ainda, que a partir dos
childhood studies temos acompanhado,
sobretudo, nas últimas duas décadas, um
crescente número de estudos que revelam a competência social das crianças (James, 1998; Hutchby & Moran-Ellis, 1998),
no entanto, as crianças envolvidas em tais
estudos, quase sempre, encontram-se em
uma faixa etária em que as formas de comunicação aproximam-se das utilizadas
correntemente pelos investigadores-adultos. Esse dado nos provoca a pensar que,
mesmo que tais estudos avancem no sentido de considerar a opinião das crianças
como legítima e relevante, eles ainda não
conseguem superar a marginalização das
crianças bem pequenas, algo posto como
desafio para as diferentes áreas. Mesmo
aqueles que têm se proposto a ouvir as
vozes das crianças bem pequenas: em que
medida as crianças são atores e não meros
objetos de estudo? O que diferencia esses
papéis? As questões apresentadas constituem o eixo orientador da proposta de comunicação ora proposta que, como anunciamos inicialmente, toma como base um
estudo de doutorado, que por preocupar-se com tais questões e tomá-las como
fundamentais ao processo de pesquisa,
permitiu compreender que os processos
constitutivos das ações sociais dos bebês
relacionam-se a diferentes categorias sendo que, neste grupo, em específico, nossa
interpretação permitiu relacioná-los com
a elaboração cultural e, de modo bastante
recorrente, às situações de brincadeira; ao
corpo, à sua dimensão social e enquanto
expressividade; as relações entre os pares,
com ênfase para as relações de gênero e
a problematização das relações a partir
da classe social. A idéia da competência
dos bebês, no que tange à estruturação
de ações que são sociais, porque são
mobilizadas pela ação de outro, se revelou de modo complexo e nas minúcias de
295
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
sua expressividade, seja nas situações de
brincadeira, no revelar das preferências
por determinados pares, assim como da
sua condição social enquanto menina ou
menino pertencente a uma determinada
classe e estatuto social. Os bebês agem
socialmente, determinando a ação de outros, modificando a sua própria ação, assim como atuando sobre a estrutura, que
embora tenha um poder interferente, não
conforma as suas ações, dada a sua capacidade enquanto agente.
Palavras-chave: pesquisa com bebês,
metodologias de pesquisa, estudos sociais da
infância
O ESTUDO DA INFÂNCIA COMO
REVELADOR E DESVELADOR DA
DIALÉTICA EXCLUSÃO–INCLUSÃO
SOCIAL
Sônia M. Gomes Sousa - PUC/Goiás,
[email protected]
A psicologia sócio-histórica, que tem como
sujeito principal de investigação a criança
ou o adolescente, têm produzido pesquisas que privilegiam aspectos ausentes
das investigações em outros momentos
históricos. Desse modo, ao voltar-se para
temas como a violência contra crianças, o
abandono, a exploração sexual, o trabalho
infantil etc, essas pesquisas contribuem
para a construção de um campo investigativo que alcança e focaliza a dimensão da
exclusão–inclusão (Sawaia, 1995 e 1998)
na vivência infantil. Investigar os sentidos
e significados que as crianças atribuem a
diversos fenômenos da sua vivência cotidiana na contemporaneidade – família,
convivência com os pares, escola, traba296
lho, lazer, violência física, sexual e/ou psicológica – é uma tentativa de romper com
a concepção dominante, que vê a criança
como o infante, ou seja, ‘aquele que não
tem fala’, para colocá-la num lugar de
protagonista, em defesa de seu status de
sujeito de direitos. O estudo da infância e
da criança objetiva, assim, desvelar o real,
subvertendo a aparente ordem natural das
coisas, pois, compreende que a criança fala
não apenas de seu mundo e de sua ótica
infantil, mas, também, do mundo adulto
e da sociedade contemporânea (Kramer,
1996). E, nessa perspectiva, pretende também colaborar na elaboração de políticas
públicas não excludentes e que vejam a
infância não como risco, mas, fundamentalmente, como oportunidade (Rizzini et
alii, 2000). A opção por estudar/pesquisar
a infância parte do pressuposto de que a
criança, na vida que vive e nas diversas
formas de subjetivação que produz, revela e desvela o mundo e expressa a história
dos homens. Assim, estuda-se a infância,
buscando captar a criticidade da criança
sobre o mundo e a do pesquisador sobre
a relação criança–mundo. Contudo, essa
perspectiva teórico-metodológica não é
ainda usual, pois, estudar a criança quase
sempre parece ao adulto interessar-se por
um ‘objeto’ menor. Uma prova disso é que,
quase sempre, as teorias sobre a infância
estão profundamente marcadas pela ótica do ajustamento da criança à sociedade
dos adultos, não apenas esquecendo a sua
forma específica de ver e viver o mundo,
mas, tentando transformá-la em adulto
idealizado. Geralmente, não se leva em
consideração que tal ajustamento deve
ser o resultado de um processo histórico
e cultural e que a transmissão/assimilação
cultural não se dá de uma forma completa, nem tampouco passiva e pacífica. Da
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
visão fragmentária da infância, que não
permite a compreensão plena da criança
em sua singularidade, resultaram teorias
nas quais se perdeu a dimensão dos conflitos, das crises e das tensões vividas por
ela, em seu processo de desenvolvimento.
O reconhecimento da criança como sujeito
concreto, inserido num contexto que ajuda
a produzir e que o produz, leva a compreender a posição desse sujeito no contexto
social, a situá-lo numa realidade mais ampla e a tentar apreender o processo pelo
qual ele (sujeito) se forma. Sem esse enfoque, tem-se uma análise parcial do problema, uma espécie de ‘psicologismo’, uma
abordagem insuficiente, incapaz de dar
conta do processo de exclusão–inclusão
social a que estão submetidos milhares
de seres humanos. Portanto, é necessário compreender a realidade social como
uma construção humana e não, simplesmente, como um dado natural, pois, é no
processo de produção de sua realidade social que o homem produz-se a si mesmo
como ser histórico e cultural. Embora Ariès
(1986) tenha, na década de 1960, defendido teses como a de que o sentimento
de infância não estava presente no mundo medieval e a de que a infância é uma
construção social, não raro, encontramos,
na sociedade atual e no mundo acadêmico, questionamentos sobre a importância
de seu estudo. Os questionamentos comparecem travestidos pelo discurso do rigor
científico – a criança é um sujeito confiável?, como acessar o seu discurso?, o que
ela “fala” tem importância? Na realidade,
tais questionamentos expressam a condição social subalterna (Charlot, 1986) a que
a infância tem sido submetida. E, mesmo
na aparência da sociedade capitalista contemporânea, em que a infância parece
posta em destaque – em função do estí-
mulo exagerado ao consumo, da exposição
à mídia etc. –, a criança continua, cotidianamente, não confirmada como sujeito
do seu tempo e da sua história. Refletir
sobre o sofrimento ético-político em situação de exclusão–inclusão social “é uma
oportunidade de refletir sobre subjetividade enquanto fator histórico e confronto
político e participar do debate transdisciplinar capaz de romper a cisão clássica
entre homem/sociedade e subjetividade/
objetividade”, na compreensão de Sawaia
(1998, p. 6). Há um aspecto que não deve
nem pode ser esquecido, especialmente,
quando se trata da realização de pesquisas
com crianças: o pesquisador é portador
de um poder expresso por sua condição
social, por sua formação, pela hierarquia
de idade. E é óbvio que essas condições,
presentes nas relações sociais, marcam
sua relação com os sujeitos pesquisados.
Por isso, é sempre importante ele se perguntar e se avaliar – assim como também
ser avaliado pelos seus pares – a respeito
de como utiliza esse poder nas suas relações com os seus pesquisados, mais ainda,
quando estes são crianças. É indispensável
ao pesquisador que investiga a temática da
infância, a formação adequada. Ele tem de
extrapolar a sua área específica, entender
as implicações e os procedimentos jurídicos, científicos e técnicos atinentes a essa
área. Sobretudo, deve ter sempre presente que “a pesquisa não pode representar
apenas um momento de coleta de dados,
que beneficie somente o pesquisador e a
comunidade científica. Este processo deve
representar um fator de proteção para a
criança que será ouvida, protegida e ajudada” (Lisboa & Koller, s.d., p. 20). É fato que
a sociedade reconhece a infância como o
momento da vida em que o indivíduo deve
ser cuidado, no sentido biopsicossocial.
297
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
Todavia, é notório que essa compreensão
não encontra suporte na realidade nem
alcança o universo das crianças brasileiras.
O reconhecimento dessa fase da vida, em
sua plenitude, exige a garantia – a todas
as crianças – da possibilidade concreta de
ser criança e do direito à infância, resguardado pela sociedade e pelos adultos que
a compõem.
Palavras-chave: Psicologia sociohistórica,
infância, dialética exclusão/inclusão social
A INFÂNCIA EM QUESTÃO: DIÁLOGOS
ENTRE A PSICOLOGIA SÓCIO-HISTÓRICA E
A SOCIOLOGIA DA INFÂNCIA
Rosângela Francischini - UFRN,
[email protected]
O objetivo deste trabalho é estabelecer um diálogo entre a Psicologia Sócio-Histórica, representada por Vygotsky, e
a Sociologia da Infância. Sua emergência
deve-se às opções teórico-metodológicas
que orientam nossas atividades de ensino, pesquisa e extensão e às inquietações
decorrentes de leituras da produção acadêmica em Sociologia da Infância. Nesse
contexto, chamou-nos atenção as observações das críticas recorrentes à Psicologia
do Desenvolvimento, que comparecem
na bibliografia em Sociologia da Infância.
Os temas privilegiados nas/das investigações são: desenvolvimento cognitivo e
desenvolvimento social do sujeito, embora não sejam os únicos. Assim, as principais teorias do desenvolvimento, que têm
em Piaget o teórico de maior destaque,
centram-se nesses domínios. A partir das
traduções de parte da obra de Vygotsky,
observou-se a emergência e acentuação
de grupos de pesquisas, na Psicologia e
298
na Educação, principalmente, com produções acadêmicas que sinalizam a filiação
teórico-metodológica à abordagem sócio-histórica. Interacionismo, construtivismo,
aprendizagem e desenvolvimento passam
a ser focos privilegiados de discussão acadêmica. Neste trabalho, retomamos alguns
pressupostos da Psicologia Sócio-Histórica
cujo diálogo com os pressupostos básicos
da Sociologia da Infância nos seja possível.
Em nosso caso, estaremos considerando
o sujeito-criança. Com esse propósito, iniciamos com uma abordagem das críticas à
Psicologia do Desenvolvimento que comparecem nas principais obras em Sociologia da Infância. Observamos, inicialmente, que as críticas à Psicologia, presentes
nas obras de referência em Sociologia da
Infância, centram-se, principalmente, na
Psicologia do Desenvolvimento piagetiana.
Essa opção deve-se ao fato de que a Epistemologia Genética teve grande influência,
no século XX, principalmente na Psicologia
e, também, na Educação, área em que se
concentram as pesquisas em Sociologia da
Infância. Segundo James e James (2008), a
Psicologia do Desenvolvimento concebe o
sujeito a partir de estágios de desenvolvimento e das estruturas cognitivas que os
caracterizam, enquanto processo linear e
diretamente relacionado à idade cronológica. Acrescente-se, ainda, a concepção de
desenvolvimento como um processo caracterizado por aquisições progressivas de
determinadas competências, que têm no
universo adulto o modelo/ perspectiva a
ser alcançado. Essa atribuição de uma condição de transitoriedade à criança, acrescida de sua condição de dependência em
relação ao adulto, é criticada por Sarmento (2006), que afirma: “Neste domínio, a
psicologia do desenvolvimento tem sido
a mais consistente promotora de uma re-
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
presentação social da infância sustentada
na incompletude, na incompetência e na
imperfeição das formas de pensamento,
que, por isso mesmo, necessita de acompanhamento e promoção nas sucessivas
‘etapas de desenvolvimento’ legitimando
não apenas o controlo adulto, mas a assimetria radical de poderes intergeracionais
na condução da vida das crianças” (Sarmento, 2006, p. 52). Ainda, o mesmo autor
afirma que coube à Sociologia da Infância
resgatar a infância das “perspectivas biologistas (...) e psicologizantes, que tendem
a interpretar as crianças como indivíduos
que se desenvolvem independentemente
da construção social das suas condições de
existência e das representações e imagens
historicamente construídas sobre e para
elas” (Sarmento, 2006, p. 43). Ressalva,
no entanto, é feita pelo autor à Vygotsky,
cuja abordagem atenta para os contextos
sociais de desenvolvimento e para o papel das crianças nesse processo. Assim, a
Sociologia da Infância reivindica a “construção social da infância” nos estudos
sobre a criança e seu desenvolvimento,
reivindicação esta presente no clássico de
Ariès (1981), História Social da Criança e
da Família. Considerando os apontamentos iniciais deste trabalho afirmamos que,
em Vygotsky, comparece, igualmente, uma
reflexão sobre o desenvolvimento infantil
tendo como norteadores os estágios de
desenvolvimento; no entanto, esses estágios não são concebidos como agregados
de traços psicológicos separados, mas,
antes, por estruturas cujo caráter integrativo de seus componentes compõe as tendências do desenvolvimento nas diversas
faixas etárias, ao longo de seu percurso.
Considere-se, no entanto, a fluidez entre
as fronteiras das idades e o caráter qualitativo das diferenças que os conformam (Bo-
zhovich, 2009). Dessa forma, os estágios
de desenvolvimento são pensados a partir
da composição de diferentes processos e
funções mentais, e das distintas possibilidades de combinação entre esses processos e funções. Ainda, como indicadores de
diferentes domínios e predominâncias de
formas de interação com os contextos. As
alterações qualitativas que são observadas nas interações da criança representam
momentos de transição e de desenvolvimento de novas funções mentais que, por
sua vez, resultam em novas organizações
da consciência como um todo. Consequentemente, de novas possibilidades de ação
e de transformação tanto de si, quanto do
contexto. À ciência Psicológica, portanto,
e mais especificamente à Psicologia do
Desenvolvimento, é colocado o desafio
de pensar o desenvolvimento do sujeito
a partir do materialismo dialético, das interinfluências e das transformações recíprocas sujeito-ambiente. Por seu lado, a
Sociologia da Infância, aproximando-se do
exposto acima, ao tecer uma revisão crítica
sobre os processos de socialização, se opõe
a determinadas vertentes da Sociologia
em que as crianças são “tematizadas como
objecto de um processo de inculcação de
valores, normas de comportamento, e de
saberes úteis para o exercício futuro de
práticas sociais pertinentes” (Sarmento,
2006, p. 54). As crianças são consideradas atores sociais, grupo geracional com
características próprias, com capacidade
de ação e de criação da cultura. Portanto,
longe de serem reprodutores passivos nos
processos de socialização, Corsaro (1997)
propõe a tese da “reprodução interpretativa”, que assume a capacidade e o poder
que as crianças têm de transformarem os
elementos de seu contexto, através das interpretações que fazem desses elementos.
299
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
Nesse contexto de discussão, a interação
social assume papel de relevância. Uma
aproximação com o conceito de Zona de
Desenvolvimento Proximal de Vygotsky é
sinalizada, considerando, no entanto, que
a Sociologia da Infância, diferentemente,
sinaliza para a importância das relações
intrageracionais. Concluímos com a observação de que outros pontos de diálogo são
sinalizados, observando, com James e James (2008), que: “precisamente por causa
de sua complexidade, um entendimento
compreensivo da infância não pode ser
realizado/alcançado através de uma perspectiva epistemológica e disciplinar única:
um fenômeno complexo requer estudo interdisciplinar, assim, o estudo da infância
tem que ser compreendido como uma atividade multi e interdisciplinar” (p. 26).
Palavras-chave: infância, Psicologia Sócio-Histórica, Sociologia da Infância
MR LT01 - Mesa Redonda
Convidada
MR LT01-939 – TRANSTORNOS ALIMENTARES E OBESIDADE NO CICLO DE VIDA
FAMILIAR: O PAPEL DA FAMÍLIA
Maria Alexina Ribeiro - UCB
[email protected]
O objetivo da mesa redonda é apresentar
dados importantes de pesquisas e intervenções realizadas na Universidade Católica de Brasília – UCB, bem como discutir
questões relacionadas ao tratamento que
é oferecido no DF para crianças e adolescentes com transtornos alimentares
– anorexia nervosa e bulimia nervosa – e
300
obesidade. Esses transtornos e a obesidade são reconhecidos como graves problemas de saúde, atingindo um número grande de pessoas, o que tem preocupado as
autoridades de saúde do nosso país. Participarão dessa mesa redonda pesquisadoras participantes do projeto de pesquisa
“Construção de metodologia de atendimento psicossocial a crianças e adolescentes com transtornos alimentares e suas
famílias”, em andamento na Universidade
Católica de Brasília – UCB e coordenado
pela proponente dessa mesa redonda. A
equipe responsável pelo projeto é formada por seis professoras doutoras da UCB e
UnB, uma médica da Secretaria de Saúde
do DF, quatro alunos de mestrado em psicologia da UCB e oito alunos de iniciação
científica cursando graduação em psicologia na UCB. A primeira participante da
mesa é a Dra. Denise Leite Ocampos, médica, atualmente respondendo como chefe do Núcleo de Saúde do Adolescente da
Secretaria de Estado de Saúde do Distrito
Federal, que vai apresentar dados sobre o
atendimento aos adolescentes no Distrito
Federal, contextualizando a questão dos
transtornos alimentares e obesidade. Em
seguida, teremos a participação da psicóloga é Aldenira Barbosa, Cavalcante, Mestre em Psicologia pela UCB, apresentando
sua pesquisa de mestrado sobre anorexia
nervosa na adolescência, orientada pela
proponente dessa mesa, que também
participará como co-autora do trabalho. A
última participante da mesa é Ana Flávia
Nascimento Otto, nutricionista e Mestre
em Psicologia pela UCB, apresentando sua
pesquisa de mestrado sobre obesidade
grave e TCAP em adultos, orientada pela
proponente dessa mesa, que participará
como co-autora do trabalho.
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
ATENÇÃO INTEGRAL À SAÚDE DE ADOLESCENTES NO DISTRITO FEDERAL: A
QUESTÃO DOS TRANSTORNOS ALIMENTARES E OBESIDADE
Denise Leite Ocampos - SES/DF
[email protected]
A adolescência é marcada pela experimentação de valores, de papéis sociais
e de identidades e pela ambiguidade entre ser criança e ser adulto. No entanto, a
adolescência não deve ser vista somente
como fase, etapa, período provisório ou
de transição. Esse momento é marcado
por aprendizados, descobertas e desafios biopsicossociais. Tendo em vista esse
momento especial de intenso aprendizado na vida do ser humano, a Organização
Mundial de Saúde e Ministério da Saúde
do Brasil instituíram o Programa de Saúde de Adolescentes em 1989 e o Distrito
Federal oficializou o Programa em 1991.
Atualmente as ações de Atenção Integral
a Saúde de Adolescentes no DF são administradas pelo Núcleo de Atenção Integral
à Saúde do Adolescente da Secretaria de
Estado da Saúde. Essas ações encontram-se implantadas nas 15 Regionais de Saúde
e têm, como prioridade, três eixos de ação:
crescimento e desenvolvimento saudáveis,
promoção da saúde sexual e reprodutiva
e redução da morbi-mortalidade por acidentes e violências. A população na faixa
etária da adolescência, de 10 a 19 anos, no
DF, corresponde a 20,1%, cerca de 469.000
adolescentes. O total de atendimentos
aos adolescentes chega a 35%, o que é
considerado ideal em relação ao total de
atendimentos da população em geral. Há
uma ligeira predominância de pacientes
na faixa etária de 10-14 anos (36,4%) em
relação aos da faixa de 15-19 anos (53,7%)
e de pacientes do sexo masculino (56,3%)
em relação ao feminino (43,7%). Dentre
os principais diagnósticos realizados nos
atendimentos de janeiro de 2009 a junho
de 2010, os diagnósticos mais frequentes
foram: 23 diagnósticos de saúde mental:
TDAH, Dificuldade com Autoridade, Distúrbio de conduta, Ansiedade, Deficiência
Mental, Superproteção Parental, Depressão, Dificuldade Escolar, Timidez, Alcoolismo Parental, Violência Familiar, Obesidade
ou Sobrepeso, Opressão Familiar, Drogas,
Luto, Fobias, Adoção, Depressão Materna,
Conflitos Familiares, TEPT, TPM e/ou cólicas, Conflitos com a Sexualidade, Rebeldia.
Destes, 10 dizem respeito a diagnósticos
psiquiátricos propriamente ditos, sejam
do adolescente ou de seus pais: TDAH, Distúrbio de conduta, Ansiedade, Deficiência
Mental, Depressão, Alcoolismo Parental,
Drogas, Fobias, Depressão Materna, TEPT.
Em termos de frequência, a importância da
prevalência de problemas mentais entre
os/as adolescentes fica também evidente:
70% são de saúde mental e, desses, 37,6%
são de quadros psiquiátricos. Entre os diagnósticos biomédicos, predominaram Rinite
Alérgica, Acne, Cefaléia, Deficiência Auditiva ou Visual, Epilepsia, Gastrite e Hipercolesterolemia. Os transtornos alimentares e
a obesidade, embora não constem entre
os mais frequentes, têm aparecido como
queixa frequente nas consultas dos adolescentes que procuram o Núcleo. Este tem se
preocupado com os referidos diagnósticos,
o que motivou a busca de parceria com a
Universidade Católica de Brasília – UCB, visando proporcionar aos técnicos da Secretaria de Saúde que atendem aos adolescentes um melhor embasamento teórico
e instrumental para um atendimento mais
eficaz dos casos. A partir desse cenário, e
apoiados pelos indicadores, reconhecendo
a complexidade desses fenômenos, que
301
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
escapam do domínio do indivíduo e alcançam a família e a sociedade, e adotando a
lógica da vigilância à saúde, são oferecidos
serviços de promoção à saúde e prevenção
dos agravos aos adolescentes na atenção
básica: acolhimento, acompanhamento
Biopsicossocial, grupo de adolescentes,
grupo interventivo para pais, acompanhamento de pré-natal, planejamento reprodutivo, acompanhamento nutricional, oficinas temáticas, imunização e articulação
interinstitucional. As equipes são multidisciplinares e são compostas por: médico(a)
s, enfermeiro(a)s, técnico(a)s de enfermagem, assistentes sociais e psicólogo(a)
s, sendo que a composição da equipe varia de serviço para serviço. As principais
atividades realizadas são: acolhimento,
atendimento individual, grupo de instrumentalização de pais, grupo para pais de
adolescentes em situação especial de uso
de drogas, grupo de adolescentes, grupo
de adolescentes gestantes, grupo de planejamento sexual e reprodutivo, além de
oficinas e ações nas escolas, por meio do
Programa Saúde na Escola – PSE. Compreendemos que, embora a média de atendimentos alcançou o objetivo quantitativo
em relação ao ideal estabelecido, é preciso
que haja um grande empenho na melhoria
qualitativa dos atendimentos, com investimentos variados na qualificação profissional e na organização da rede para o acolhimento desta população, considerando
as várias especificidades que apresenta.
Ao mesmo tempo, é necessário investir na
busca ativa e na atenção integral, já que
a demanda espontânea é principalmente
motivada por acidentes, doenças agudas e
à gravidez na adolescência.
Palavras-chave: adolescência, transtornos
alimentares, obesidade.
302
ANOREXIA NERVOSA NA ADOLESCÊNCIA:
O PAPEL DA FAMÍLIA NO SURGIMENTO E
MANUTENÇÃO DO TRANSTORNO
Aldenira Barbosa Cavalcante - UCB
[email protected]
Maria Alexina Ribeiro - UCB
O aumento significativo do número de pacientes com Anorexia Nervosa nas ultimas
décadas, leva a pensar numa verdadeira
“epidemia” do transtorno. O desequilíbrio da relação do individuo com a sua
forma de se alimentar, tem preocupado
os especialistas em saúde mental. A Anorexia Nervosa caracteriza-se por uma perda de peso acentuada, resultante de uma
restrição calórica voluntária do paciente
devido a um temor exacerbado de engordar e a uma busca implacável da magreza. Estudos apontam a incidência de
pessoas cada vez mais jovens, e a média
de idade das meninas com anorexia caiu
de 12-14 anos para 7-8 anos. Esta dissertação de Mestrado objetivou compreender a dinâmica de famílias que possuem
um membro adolescente portador de
Anorexia Nervosa, identificando aspectos
do relacionamento intrafamiliar específicos de famílias com esta problemática. A
adolescência é considerada uma etapa do
desenvolvimento humano que pressupõe
a passagem de uma situação de dependência infantil para a inserção social e a
formação de um sistema de valores que
definem a idade adulta, segundo estudiosos. Encarada como uma fase do ciclo de
vida familiar, a adolescência apresenta tarefas particulares, que envolvem todos os
membros da família. Pode-se dizer, então,
que este período se constitui como uma
fase de transição do indivíduo, da infância para a idade adulta, evoluindo de um
estado de intensa dependência para uma
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
condição de autonomia pessoal. Adotamos uma metodologia baseada na proposta da pesquisa qualitativa, pesquisa-ação e uma adaptação da metodologia
de Grupo Multifamiliar, o qual se fundamenta nos pressupostos: a) da Terapia Familiar, tendo a visão de família enquanto
sistema, sendo a relação o ponto focal do
trabalho, priorizando o interpsíquico mais
que o intrapsíquico, e utilizando os recursos sistêmicos como a circularização e a
provocação; b) da Psicologia Comunitária,
visando ao trabalho em equipe com diferentes saberes, científicos e populares ; c)
do Sociodrama em que o grupo é o protagonista e as famílias possuem objetivos
comuns, além de se identificarem mutuamente; d) e da Teoria das Redes Sociais,
que enfoca a interação humana com a
troca de experiência, desenvolvendo a
capacidade autorreflexiva e autocrítica.
Os participantes foram três famílias com
adolescentes do sexo feminino diagnosticadas com Anorexia Nervosa, em atendimento em uma instituição pública de saúde da SES/DF, em Brasília. Os instrumentos utilizados foram: roteiro de entrevista
semiestruturada, genograma, colagem,
construção do ciclo de vida familiar e gravação em áudio - MP3. Os dados foram
submetidos à análise de conteúdo e interpretados de acordo com a abordagem sistêmica da família. A análise demonstrou
dificuldades múltiplas no sistema familiar,
tais como: padrão de comunicação pouco
claro; presença de conflito conjugal com
a adolescente anoréxica se posicionando
triangulada com os pais; negligência dos
pais da adolescente; depressão das mães;
mães dependentes afetivamente das filhas, fronteiras internas difusas e evitação de conflitos. Alguns aspectos foram
sinalizados pelas famílias ao final dos gru-
pos multifamiliares: 1) de que não existe
uma única forma correta de lidar com as
dificuldades decorrentes da doença; 2) a
conclusão de que precisam observar melhor as mudanças de comportamento dos
filhos; 3) a percepção de que o momento
do diagnóstico causa sofrimento a todos;
4) o grau de importância de buscar informações sobre os sintomas da filha; 5) o
entendimento de que o tratamento familiar é eficaz para a união da família; 6)
o sentimento de que dividir as angústias
em relação à AN, com as demais famílias
é importante; 7) o entendimento que a
adesão ao tratamento exige mudanças no
ambiente familiar; 8) e por fim, relataram
o fortalecimento dos vínculos familiares
após compartilhar seus sofrimentos com
outras famílias. Nessa perspectiva, este
estudo mostrou que as interações que
se estabelecem entre pais, mães, filhos e
filhas permeadas por sofrimentos, conflitos, valores e crenças interagem com as
questões biológicas, nutricionais e psicossociais que envolvem a dinâmica familiar
dos sujeitos pesquisados. Esses dados
mostram a complexidade da doença, cujo
conhecimento exige uma leitura que inclua várias dimensões do contexto onde
está inserida e reforçam a importância da
terapia familiar no tratamento dos transtornos alimentares.
Palavras-chave: anorexia nervosa, família,
adolescência.
303
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
OBESIDADE E TRANSTORNO DA COMPULSÃO ALIMENTAR (TCAP) NA IDADE
ADULTA: CONHECENDO A FAMÍLIA DO
PACIENTE E SUA DINÂMICA
Ana Flávia Nascimento Otto - UCB
[email protected]
Maria Alexina Ribeiro - UCB
Entre as pessoas com obesidade grave
existe uma sub-população com características semelhantes, que não respondem
ao tratamento comportamental para perda de peso. Este grupo apresenta um tipo
de transtorno alimentar conhecido como
Transtorno da Compulsão Alimentar Periódica (TCAP). Essa patologia é uma nova categoria diagnóstica proposta pelo Manual
Diagnóstico e Estatístico de Transtornos
Mentais, 4ª edição - DSM-IV, para possível
inclusão nos transtornos alimentares, sendo que até o momento, está inserida nos
transtornos alimentares sem outra especificação. É caracterizada pela presença periódica de compulsão alimentar com subsequente angústia, devido à ausência de
comportamentos regulares voltados para
eliminação do excesso alimentar Apesar de
diversos estudos investigarem o ambiente
familiar de pessoas com transtornos alimentares, existe uma escassez de estudos
que aliem funcionamento familiar, obesidade e TCAP. Por isso, o objetivo deste trabalho foi investigar a dinâmica familiar de
um adulto com obesidade grave e TCAP, a
partir do arcabouço teórico da Abordagem
Sistêmica da Família. A pesquisa foi delineada na forma de um estudo de caso realizado a partir dos dados levantados em
duas visitas domiciliares para construção
do genograma familiar, ecomapa, colagem
da família e realização de duas tarefas:
tarefa nº 2 de Féres-Carneiro e tarefa nº
4 de Watzlawick. O estudo demonstra a
304
ligação entre o papel da alimentação no
desenvolvimento infantil, pertencimento
familiar e a eclosão da compulsão alimentar na fase adulta A literatura aponta que
a interação da mãe com o bebê, via aleitamento, e, posteriormente, a interação
da família com a alimentação da criança,
constitui fator fundamental no surgimento de alguns casos de obesidade. Muitas
mães e famílias têm uma excessiva preocupação com a alimentação da criança e
a alimentam de forma exagerada, criando
um hábito alimentar que pode se manter.
Essa relação alimento-afetividade foi intensificada na vida de Eva, pela ênfase que
a mãe dava em alimentá-la, parecendo ser
essa a única forma de carinho que a mãe
lhe dedicava. A expressão de afeto através
do alimento iniciada na amamentação e
perpetuada com o uso de outros alimentos, pode ter influenciado ou predisposto
ao surgimento da compulsão alimentar e
da obesidade. As perdas são outro aspecto
que chamou a atenção na história da família de Eva. Elas permeiam o ciclo de vida
familiar desde a sua família de origem: o
pai de Eva abandonou a família assim que
ela nasceu. As perdas sempre provocam
uma desestabilização do sistema familiar,
e a experiência de superá-la fortalece a
capacidade resiliente da família para enfrentamento de adversidades futuras.
Entretanto, quando este ajuste ocorre em
apenas parte do sistema familiar, cria-se
um desequilíbrio entre os membros, onde
uns tornam-se mais resilientes que outros
e estas diferenças podem afastá-los, justamente nos momentos de reorganização de
papéis e de vínculos na família. A vivência
desta crise pode paralisar a família no seu
processo natural de desenvolvimento e
favorecer o surgimento de sintomas. No
caso da Família Dias, a saída do pai de Eva
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
foi a primeira crise enfrentada por ela. A
família, na tentativa de adaptar-se a essa
nova realidade, promoveu Eva à condição
de filha parental. Ela, além de cuidar da
mãe alcoolista, também cuidava dos seus
irmãos, apesar de ser a filha mais nova.
Essa troca de papéis quando temporária
constitui a base de identificação da criança com os pais e esse arranjo natural não
acarreta, necessariamente, prejuízos para
o funcionamento familiar. Mas se a parentalização tornar-se um modo habitual e
prevalente de relação, como no caso de
Eva, o filho parental é excluído do subsistema fraterno e inserido no subsistema
parental, assumindo prematuramente
uma considerável responsabilidade emocional, que o obriga a desenvolver um
falso-self de autonomia, independência e
autossuficiência. Esse filho fica triangulado e fusionado com figuras parentais indiferenciadas, transformando esse papel
num aspecto de sua própria identidade.
Provavelmente, a parentalização de Eva
tenha dificultado o seu relacionamento
com seus irmãos, referidos por ela como
“inimigos”, visto que sua permanência no
papel parental a impediu de desenvolver
uma relação de igualdade no subsistema
fraterno. Já na fase adulta, quando Eva já
era casada e suas filhas eram pequenas,
morre seu irmão mais próximo e em seguida sua mãe adoece gravemente. Nesse
momento de luto e de dificuldades financeiras, Eva começa a desenvolver os sintomas de compulsão alimentar. Nos seus relatos refere não ter tido apoio dos irmãos
para cuidar da mãe, o que demonstra o
ambiente desligado de sua família de origem. O desenvolvimento do TCAP parece
estar intimamente ligado a um sistema
familiar desligado. De fato, um baixo nível
de coesão familiar enfraquece a resiliência
familiar, entendida aqui, como a capacidade do grupo familiar de suportar crises
e adversidades acionando o potencial de
reparação e superação. Dessa forma, a
estrutura familiar desligada pode ter dificultado o manejo da crise iniciada com a
morte do irmão e agravada pela doença
materna, e gerado uma sobrecarga na família nuclear, culminando no surgimento
de um novo sintoma, o TCAP. Outras características identificadas similares quanto
ao funcionamento de sistemas com obesidade descritos na literatura foram: fronteiras internas difusas e externas rígidas;
ênfase à lealdade familiar; forte ligação
entre alimentação, afetividade e pertencimento e comunicação marcada por pouca
expressão de sentimentos. Sobre o funcionamento familiar de pessoas com TCAP,
também foi observado características relatadas na literatura, como vulnerabilidade
à obesidade e baixa coesão na família de
origem. Por outro lado, a pesquisa identificou aspectos da dinâmica que não foram
encontrados nos estudos revisados e que
podem estar relacionados com o desenvolvimento de obesidade e TCAP: a parentalização do paciente com o sintoma e
uma comunicação familiar paradoxal. Com
base nesses resultados salientamos que a
obesidade não se limita ao indivíduo, ela
está intimamente ligada ao sistema familiar e, portanto, precisa ser tratada de
forma sistêmica. Se conseguirmos mudar
o nosso olhar, do indivíduo para o contexto, e incluir a família no tratamento da
obesidade e do TCAP, não como fonte de
suporte, mas como agente primordial de
mudança, possivelmente teremos melhores resultados ao longo prazo.
Palavras-chave: obesidade/TCAP; família,
dinâmica familiar.
305
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
MR LT01 - Mesa Redonda
Convidada
MR LT01-1013 – IMPLICAÇÕES DO ENVELHECIMENTO PARA A PERCEPÇÃO VISUAL E AUDITIVA
Luciana Carelli Henriques de Andrade - InPA
[email protected]
Maria Ângela Guimarães Feitosa - UnB
[email protected]
Roberta Ladislau - UnB
[email protected]
O aumento da expectativa de vida da
população tem despertado crescente interesse de pesquisadores em diferentes
áreas para estudar o envelhecimento,
pelos seus aspectos econômicos, sociais,
biológicos e psicológicos. Na presente
mesa redonda dá-se atenção aos aspectos biológicos caracterizados por um processo degenerativo progressivo, marcado
por alterações estruturais e funcionais e
aos aspectos psicológicos relacionados a
decréscimo no funcionamento sensorial,
perceptual e cognitivo. São apresentadas
e problematizadas alterações na percepção que acompanham o processo de envelhecimento, abordando tanto alterações
usuais não necessariamente vinculadas a
doenças, como as alterações na percepção de fala e no processamento temporal
auditivo, quanto às alterações associadas
a doenças crônico-degenerativas, como
as alterações na percepção da emoção
em idosos com doença de Alzheimer. São
examinadas as implicações destas alterações para outros aspectos da percepção
e para a vida social do idoso, as relações
dessas alterações de percepção com as
dimensões biológica e cognitiva do fun306
cionamento da pessoa, e as implicações
do conhecimento já disponível para ações
voltadas para a atenção ao idoso, proporcionando-lhes mais qualidade de vida.
O ENVELHECIMENTO DO SISTEMA
AUDITIVO E A PERCEPÇÃO AUDITIVA EM
IDOSOS: A COMPREENSÃO DA FALA EM
DESTAQUE
Luciana Carelli Henriques de Andrade - InPA
[email protected]
O envelhecimento constitui processo
degenerativo progressivo, marcado por
alterações estruturais e fisiológicas nos
sistemas cardiovascular, respiratório,
músculo-esquelético, nervoso e sensorial os quais desencadeiam complicações
importantes para os processos sensoriais
e cognitivos (Feitosa, 2001). A perda da
audição começa em torno dos 20 anos
de idade, entretanto, nesta fase, esta perda não é notada e nem facilmente mensurável. Ela começa a ser percebida em
torno dos 50 anos. Em geral, os homens
apresentam uma perda auditiva notável
mais cedo que as mulheres (Yost, 2007).
Homens a partir dos 69 anos têm limiares auditivos mais altos do que mulheres
na faixa de 4000Hz. Observa-se a partir
dos 50 anos o aumento progressivo nos
limiares auditivos detectados por meio
da audiometria tonal (Syka, 2002). Segundo Baraldi, Almeida e Borges (2007) é na
faixa etária de 80 anos que a dificuldade
para ouvir sons em alta frequência está
mais acentuada, e depois dos 90 o nível
de perda se estabiliza. A perda auditiva bilateral e simétrica que ocorre progressivamente em função do avançar da idade é
chamada de presbiacusia. A presbiacusia
gera dificuldade de localização espacial,
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
processamento de informações sobre frequência, tempo, intensidade dos sons e
compreensão da fala. As diversas mudanças anatômicas que ocorrem no sistema
auditivo do idoso, tanto na parte periférica quanto central interferem na eficácia
do processamento da compreensão da
fala. A presbiacusia é percebida como o
principal fator explicativo para a dificuldade de compreensão da fala desta população (Humes, Watson, Christensen, Cokely,
Halling & Lee, 1994). A presbiacusia atinge cerca de 60% dos idosos acima de 65
anos e inclui mudança gradual na sensibilidade auditiva para todas as frequências,
sendo as perdas para as altas freqüências
as de maior magnitude (Bess, Hedley-Williams & Lichtenstein, 2001). A perda
da sensibilidade para altas frequências
ocorre porque as estereocílias das células ciliares da base da cóclea, responsável
pela transdução do som, são estimuladas
diante de todas as frequências sonoras,
assim seu desgaste é maior e ocorre primeiro, se comparado com as estereocílias
das células do ápice, que demoram um
pouco mais para ficarem flácidas e processam apenas frequências baixas. Como
as células da base da cóclea são especialistas em processar sons de alta frequência, o prejuízo na compreensão dos sons
agudos ocorre primeiro (Syka, 2002; Yost,
2007). O envelhecimento do sistema auditivo (SA) está correlacionado com várias
alterações, as quais podem ser resumidas
em mudanças cognitivas, morfológicas e
fisiológicas. Como mudanças morfológicas constata-se, segundo Syka (2002): a) a
desestruturação das células ciliadas internas e externas e b) as perdas das células
ganglionares espiraladas que formam as
fibras do nervo auditivo. Nas mudanças
fisiológicas identifica-se: a) a diminuição
na amplitude dos reflexos acústicos, b) a
diminuição dos potenciais de tronco encefálico, c) a diminuição da inibição do
sistema nervoso auditivo central (SNAC)
e d) o prolongamento das latências das
respostas do tronco encefálico. Encontram-se, também, evidências sobre irregularidades no processamento da informação no que tange a: a) alterações no
processamento e na resolução temporal,
b) alterações no processamento espacial
(i.e. localização de sons), c) diminuição
progressiva e acentuada da sensibilidade
para frequências altas, d) declínio na resolução de frequências, e) o aumento do
limiar de audibilidade para tons puros e
f) lentificação na velocidade de processamento. Como a intenção das autoras
relaciona-se aos processos de percepção
da fala, serão argumentados de forma
seletiva os aspectos relacionados a esta
temática. Parte da diminuição progressiva
na compreensão de fala associada à idade
avançada é devido a um declínio na capacidade do processamento funcional, a deterioração da memória episódica secundária e a diminuição na velocidade dos
processos mentais (Gordon-Salant, 2005;
Marshall, 1981). Em resumo, observa-se que a ocorrência da presbiacusia em
idosos compromete várias habilidades relacionadas com a audição. Compreender
e discutir sobre o processo de envelhecimento sensorial e os seus efeitos é uma
tarefa importante para os profissionais
de saúde que lidam com idosos, pois isto
possibilita a busca de meios mais eficazes
e positivos para a comunicação e relacionamento com os idosos.
Palavras-chave: Envelhecimento, Envelhecimento do sistema auditivo, Percepção de fala.
307
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
ENVELHECIMENTO E PROCESSAMENTO
TEMPORAL AUDITIVO
Maria Ângela Guimarães Feitosa - UnB
[email protected]
É de longa data conhecido que com o processo de envelhecimento, as pessoas vão
gradualmente perdendo a sensibilidade
auditiva, com prejuízo em maior grau para
homens do que mulheres, e para sons de
frequência alta do que frequências baixas.
Acompanha este processo uma dificuldade crescente de comunicação oral, com
eventual prejuízo para a própria autonomia pessoal, e estes dois tipos de prejuízo
são componentes centrais da presbiacusia . Uma série de estudos tem analisado
aspectos específicos do processamento
do som que também acompanham o envelhecimento e há documentação importante de prejuízo crescente em processamento temporal, em discriminação de frequência e de intensidade, e em uma série
de tarefas em que o ambiente acústico
inclui ruído ou distorções, especialmente
se estas tarefas são de reconhecimento
de fala. Revisões abrangentes deste cenário podem ser encontradas em Fozard
& Gordon-Salant (2001) e Fitzgibbons
& Gordon-Salant (2010). Muitas vezes,
um aspecto importante da informação
auditiva é a sua organização no tempo,
demandando que o ouvinte realize um
processamento temporal do som. Nesta
apresentação damos atenção diferenciada ao envelhecimento do processamento temporal, uma habilidade considerada importante para a percepção de sons
complexos e com características acústicas
altamente dinâmicas ao longo de intervalos de tempo razoavelmente curtos, como
as envolvidas no reconhecimento da fala e
na percepção auditiva do espaço, incluin308
do a localização de fontes e a percepção
de movimento. O processamento temporal vem sendo estudado em dois aspectos
centrais e com metodologias comportamentais psicofísicas próprias. De um lado
aquelas situações em que é necessária a
integração de informação ao longo de um
período relativamente longo, como na
detecção de sinais fracos; de outro lado
aquelas situações em que é necessário
um processamento rápido para evitar o
efeito mascarador de outros sons antecedentes ou subsequentes, ou seja uma boa
acuidade ou resolução temporal (Eddins
& Green, 1995; Helfer & Freyman, 2008).
Mais recentemente o aspecto temporal
da informação tem sido ampliado para o
estudo da percepção de fluxos, objetos e
cenas auditivas (por exemplo, Sakai, Chimoto, Qin & Sato, 2009). Dentro da temática de processamento temporal, e mais
especificamente no estudo da resolução
temporal, encontramos vários estudos
utilizando procedimentos em que a tarefa do participante é identificar a presença de falhas, interrupções, em um sinal
contínuo e mostramos a partir de estudos realizados por diferentes grupos de
pesquisadores que a resolução temporal
diminui com a idade (por exemplo, Snell,
1997; Neves, 2005; Ross, Schneider, Snyder & Alain, 2010). Procuramos argumentar que a diminuição da competência do
processamento temporal não se relaciona
com a diminuição na sensibilidade a tons
puros, mas se relaciona a outras competências de importante valor adaptativo,
como a percepção da fala, do espaço, e de
aspectos mais subjetivos como a análise
de cenas. Por fim, comentamos sobre a
dificuldade em dissociar os componentes
sensoriais e cognitivos do processamento
auditivo.
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
Palavras-chave: Processamento temporal,
Envelhecimento auditivo, Desenvolvimento
sensorial.
PERCEPÇÃO EMOCIONAL NO ENVELHECIMENTO
Roberta Ladislau - UnB
[email protected]
O aumento da expectativa de vida da população despertou o interesse de muitos
profissionais para estudar o envelhecimento. Falcão e Dias (2006) advertem
que em 2025, o Brasil será o sexto país
com maior população de idosos no mundo. Esse processo de envelhecimento
tem trazido diversas consequências. Uma
delas é o aumento de doenças crônico-degenerativas, como as demências, que
vêm se tornando muito comuns na população mundial, chegando a duplicar a
cada cinco anos, após os 60 anos (Caramelli & Barbosa, 2002). O DSM-IV considera demência toda síndrome que apresenta declínio da memória, de alguma
outra função superior (e.g. linguagem,
gnosias, praxias ou funções executivas)
e que interfira nas atividades de vida diária. Caramelli e Barbosa (2002) e Farah e
Feinberg (2005) afirmam que a Doença de
Alzheimer (DA) é a causa mais comum de
demência, atingindo 50% dos idosos acima de 65 anos. A DA evolui, inicialmente,
com o prejuízo na orientação temporo-espacial e nas memórias de curto-prazo
e episódica. A seguir, ocorrem déficits na
linguagem, nos distúrbios de planejamento, nas habilidades visuoespaciais e no
processamento emocional. Nos pacientes
mais idosos, é comum a ocorrência de
sintomas psicóticos (Caramelli & Barbosa,
2002). É comum observar, nesses idosos,
alterações emocionais também. No envelhecimento normal, o idoso passa por
uma série de transformações emocionais
e psicológicas. Sua autoestima e a sua
aceitação de si mesmo podem ficar mais
vulneráveis à medida que sofre alterações
em sua autonomia, em sua liberdade, no
seu convívio social e nos vínculos afetivos
no grupo. (Gáspari & Schwartz, 2005).
Como consequência, pode-se ter um isolamento social e um cenário facilitador de
depressões. Porto, Bertolucci, Ribeiro e
Bueno (2008) explicam que os idosos possuem uma maior habilidade na regulação
das suas emoções do que os jovens. Conforme os autores, os idosos focariam em
uma resposta antes de gerar a emoção.
Eles utilizam a teoria da seletividade socioemocional, segundo a qual, os idosos
valorizariam mais objetivos com significado emocional, investindo mais cognitiva e
comportamentalmente nessas situações.
Assim, a emoção direcionaria processos
cognitivos, e, ao direcioná-los, a memória formada poderia sofrer influência em
seu conteúdo. No caso da DA, Abrisqueta,
Ueta, Oliveira, Bertolucci & Bueno (1998)
afirmam que essa população apresentam
capacidade de atribuir conteúdo afetivo aos estímulos. Contudo, a associação
entre a emoção e a memória nesses pacientes não é consistente, pois a emoção
não promove uma melhora na evocação
de informações. Para os autores, é possível que o conteúdo emocional seja retido pelos idosos. Contudo, essa retenção
não deve ser suficiente para a evocação
do conteúdo cognitivo dos estímulos. Os
autores sugerem ainda que é possível que
os pacientes com DA percam, em estágios
iniciais, a capacidade de evocar o conteúdo emocional dos estímulos, provavelmente devido ao comprometimento da
309
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
amígdala. Devido a essa dificuldade no
processamento das emoções, o presente trabalho buscou estudar o reconhecimento de expressões emocionais da
face em idosos com DA por considerar a
importância desse reconhecimento para
a regulação do comportamento e para a
interação social do idoso. Como resultados, observou-se que os idosos com DA
em estágio moderado obtiveram índice
de reconhecimento próximo de 80% para
a face de alegria; de 36% para a de tristeza e as restantes ficaram abaixo de 20%
de reconhecimento. Esses dados sugerem
que o reconhecimento da face de alegria
é a única que está preservada nesse grupo. Como sugerido no estudo de Luzzi,
Piccirilli e Provinciali (2007), o déficit no
reconhecimento de expressões faciais
emocionais em idosos com DA está relacionado ao hemisfério direito. Mais especificamente, o hemisfério direito está voltado para o processamento de emoções
negativas (Perry et al., 2001). A preservação do reconhecimento da face de alegria
sugere que ainda há uma memória residual voltada para essa expressão emocional facial. Considerando que a emoção é
eliciada por representação mental e memória (Scherer & Ekman, 1984), parece
que os déficits encontrados na percepção
de faces emocionais estão mais relacionados à progressão da DA, que afeta tanto
as habilidades visuoespaciais quanto o
processamento da emoção. O aspecto
emocional, portanto, deve ser bem estudado a fim de favorecer os programas
de estimulação para os idosos, proporcionando-lhes mais qualidade de vida. Nesse trabalho, entede-se qualidade de vida
como envelhecer de forma satisfatória e
isso “depende do delicado equilíbrio entre as limitações e as potencialidades do
310
indivíduo, o qual lhe possibilitará lidar, em
diferentes graus de eficácia, com as perdas inevitáveis do envelhecimento” (Néri,
2000, p. 12-13).
Palavras-chave: Envelhecimento visual, Reconhecimento de expressões faciais, Doença de
Alzheimer.
Contato: Maria Ângela Guimarães Feitosa,
UnB, [email protected]
MR LT04 - Mesa Redonda
Convidada
MR LT04-1235 - TECENDO INFÂNCIAS:
CONTRIBUIÇÕES DA PSICOLOGIA E DA
EDUCAÇÃO PARA A FORMAÇÃO DE
PROFESSORES
Paula Cristina Medeiros Rezende - UFU,
[email protected]
Paula Amaral Faria - ESEBA/UFU,
[email protected]
Pâmela Faria Oliveira - ESEBA/UFU,
[email protected]
Denise Bortoletto - ITV
[email protected]
Esta mesa pretende contribuir com o debate sobre a constituição e formação de
professores, a partir do encontro entre a
Pedagogia e a Psicologia, abordando questões atuais relativas à Educação Infantil.
Atualmente, a infância tem-se apresentado como tema central na constituição de
um novo paradigma que convida a compreender a natureza histórica-cultural da
criança, tentando romper com a ideia de
infância enquanto in-fans, ou seja, criança sem fala, sem voz. Concomitante a este
movimento de legitimação de uma infân-
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
cia “rica” e ativa, constatamos que o educador infantil, diretamente responsável
por este universo, se encontra sem espaço
para uma interlocução teórica-prática sistematizada que o ajude a ampliar suas possibilidades de intervenção neste contexto.
Deste modo, a formação em serviço dos
professores da educação infantil coloca-se
em pauta na ordem da urgência, intimando os profissionais que atuam na área da
educação a problematizarem e compartilharem suas práticas e fundamentações
teóricas. Assim, pretendemos articular
esta temática possibilitando legitimar as
diferentes vozes que compõem o cenário
escolar, a saber: professores da educação
infantil, pedagogo e psicólogo escolar. A
primeira fala abordará a formação em
serviço do educador infantil, destacando
a relevância da arte como ferramenta útil
no processo de ampliação dos sentidos
sobre a atuação deste profissional no cotidiano da educação infantil. Por meio da
metáfora do Parangolé, proposto pelo artista Hélio Oiticica, pretende-se articular
os recursos e as potências que o educador da infância pode desenvolver em sua
prática diária. A segunda apresentação,
proposta por uma professora da educação
infantil de uma Escola de Educação Básica,
versará sobre as perspectivas teóricas do
campo da Educação e da Psicologia que
sustentam as práticas educativas, dando
destaque às especificidades deste profissional; a formação inicial e em serviço e
as possibilidades de diálogos com a proposta educativa de Reggio Emilia. Em seguida, por meio das experiências de uma
educadora infantil, também de uma Escola de Educação Básica, pretende-se abordar a importância do desenvolvimento de
habilidades e competências necessárias
para instrumentalizar o profissional da
educação, culminando em uma atuação
coerente com a perspectiva que compreende a criança como produtora de cultura.
A quarta fala será desenvolvida por uma
pedagoga que compõe uma equipe de
apoio pedagógico da Educação Infantil de
uma instituição privada, onde refletirá e
explicitará as intervenções possíveis neste
campo, delineando uma formação de professores que esteja voltada e comprometida com os processos de desenvolvimento
e aprendizagem das crianças.
Palavras-chave: formação de professor,
educação infantil, infância.
PARANGOLÉS: Formação em Serviço de
Professores da Educação Infantil.
Paula Cristina Medeiros Rezende, UFU,
[email protected]
O presente trabalho, desenvolvido a partir
da experiência de uma psicóloga escolar
com um grupo de formação de educadores da educação infantil, inspira-se nos Parangolés do artista plástico Hélio Oiticica
quando convida o espectador a assumir
um posicionamento ativo na constituição
da atividade criadora, abandonando o lugar de mero espectador. Parangolés são
capas, estandartes, bandeiras para serem
vestidas ou carregadas pelo participante
de um happening. As capas são constituídas de tecidos coloridos estampados com
palavras e imagens que aparecem com o
movimento da pessoa que o carrega. Ao
vestir o parangolé o participante se constitui obra de arte e supera a ideia de suporte para a capa. De acordo com Oiticica há
uma “incorporação do corpo na obra e da
obra no corpo”. De acordo com Salomão
(2003) a “relação artista-propositor com o
participante que veste o parangolé não é
a relação frontal do espectador e do espe311
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
táculo, mas como que uma cumplicidade,
uma relação oblíqua e clandestina, de peixes do mesmo cardume”. A intenção do artista é provocar o público, convidando-o a
abandonar o lugar de espectador em atitude meramente contemplativa e a ocupar o
lugar de participante ativo na constituição
da atividade criadora, experimentado também uma inundação sensorial vibrante no
corpo inteiro pela cor, tato e movimento
rápido e improvisado. Assim, o conceito de
exposição de obra de arte para ser apreciada pelo público passa a ser problematizada,
inserindo na questão a idéia de invenção
criativa do espectador, agora participante.
O objetivo da participação é oferecer ao
homem a possibilidade de experimentar,
de se descobrir na criação. A obra, como
objeto de arte em si, não diz nada. Fica à
espera do seu interlocutor para comungar
no movimento a experiência artista. De
acordo com Favaretto (1992) o interesse
de Oiticica, ao criar o Parangolé, não foi
outro senão o de levar o indivíduo ao dilatamento de suas capacidades artísticas,
para a descoberta de seu centro interior
criativo, de sua espontaneidade expressiva
adormecida, condicionada ao cotidiano.
A transposição das intenções de Oiticica
para a arena da Educação Infantil nos permite refletir sobre como os educadores da
infância tem se posicionado em relação a
práticas educativas que legitimem os direitos fundamentais das crianças e colaborem na construção de uma sociedade mais
democrática. Quais os espaços que este
educador tem para dar continuidade ao
seu processo de formação que possibilite
exercer com autoria uma prática marcada
por experiências criativas, com sentidos
voltados para a formação da criança autônoma, também autora de suas experiências? A visão de infância que temos como
312
fio condutor neste trabalho está de acordo com a perspectiva sócio-histórica, que
considera o homem como um ser ativo,
social e histórico; e a sociedade, como produção histórica dos homens (Bock; Gonçalvez, Furtado, 2009). Assim, esse sujeito
se constitui e constrói o mundo dialética
e dialogicamente, não podendo ser compreendido independentemente de suas
relações e vínculos. Deste modo, adulto
e criança se constituem mutuamente durante a história e dentro de um contexto
sócio-cultural. Juntos constroem sentidos
e significados do mundo infantil e adulto,
se opondo, contrapondo e complementando; demarcando um campo de tensão
e confronto presente no cotidiano desses
sujeitos (Prado, 2005). A criança se constitui e se constrói em relação com adultos,
jovens, idosos, não estando para vir a ser
um adulto. É um autor e ator social, um interlocutor que se relaciona com o mundo
conversando, brincando, questionando e,
na medida em que realiza esse intercâmbio, possibilita a construção de diferentes
versões de sentido. Para Corsaro (1997),
citado por Müller (2006), as crianças são
responsáveis pelas suas infâncias, uma vez
que contribuem ativamente para a mudança social e para a construção da cultura a partir da interação com seus pares
e com os adultos. Elas são agentes ativos
que constroem suas culturas e colaboram
para a produção do mundo adulto, afetam
e são afetadas pela sociedade. Dahlberg,
Moss e Pence (2003) aproximam-se desse
pensamento à medida que apontam para
o reconhecimento de algumas características deste novo paradigma da infância, as
quais são de suma importância para este
estudo, tais como: a infância como uma
construção social e sempre contextualizada; as crianças enquanto atores sociais que
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
exercem atividade e função; o direito de
terem seus relacionamentos sociais e cultura estudados, e de contribuírem para os
recursos e produções sociais; a legitimação
de que as crianças têm uma voz própria e
devem ser ouvidas de modo a serem consideradas com seriedade; a necessidade de
se atentar para a maneira como o poder
do adulto é mantido e usado, assim como
a elasticidade e a resistência das crianças a
esse poder. Desta forma, os Parangolés de
Hélio Oiticica, nos convidam a trabalhar no
sentido da construção de uma educação
composta por sujeitos criativos, ativos, co-responsáveis de práticas educacionais voltadas para a democracia. A formação em
serviço de Educadores da Infância sustentada pela teoria sócio-histórica e tramada
nas interações cotidianas entre educadores e crianças, pode anunciar-se como uma
forma alternativa para alcançarmos uma
educação infantil de qualidade.
FORMAÇÃO DO PROFESSOR PARA
EDUCAÇÃO INFANTIL: DIÁLOGOS
TEÓRICOS
Paula Amaral Faria - UFU,
[email protected]
O trabalho tem como intenção articular as
principais perspectivas teóricas disponíveis socialmente no campo da Educação e
da Psicologia, com o processo de constituição e formação de uma educadora infantil
de uma escola de Educação Básica da Universidade Federal de Uberlândia. Esta instituição, por ser uma escola de aplicação,
constitui-se também em um espaço que
recebe estagiários do curso de pedagogia
e psicologia para desenvolverem projetos
de pesquisa juntamente com a comunidade, o que possibilita ampliar a discussão
para a formação inicial de professores. Em
torno da formação em serviço dos professores que atuam na primeira infância
alguns tópicos merecem ser destacados
como fundamentais para sustentar uma
prática diferenciada: as especificidades do
professor de educação infantil; formação
inicial e em serviço; desafios atuais diante
da formação desse setor e possibilidades
de diálogos com a proposta educativa de
Reggio Emilia. Primeiramente acredita-se
importante situar o momento atual em
que o segmento da Educação Infantil tem
atravessado no cenário da Educação brasileira, dado esse relacionado com a formação dos nossos educadores. Tomam-se
como base as discussões travadas no XV
ENDIPE (2010). Neste foi discutido que o
setor da educação infantil está vivendo
um intenso processo de revisão de concepções sobre a educação de crianças em
espaços coletivos, e de seleção e fortalecimento de práticas pedagógicas mediadoras de aprendizagem e do desenvolvimento das crianças. Discutiu-se também sobre
a não antecipação de processos para o
Ensino Fundamental. Embora o momento
atual apresente um quadro de maior regulamentação, as análises realizadas indicam permanências, redefinições e tensões
que ainda demandam mobilizações dos
diferentes setores envolvidos, e das políticas públicas voltadas para as questões da
infância. Um dessas tensões apresentadas
durante o referido evento, especificamente por Cruz (2010) refere-se à formação de
professores da Educação Infantil. Um dado
discutido diz respeito à necessidade do
professor da primeira infância constituir
uma profissionalidade específica relativa
a aspectos diferenciadores do papel de
professor de crianças pequenas, de zero a
cinco anos. A formação do professor de313
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
veria contribuir para uma ação docente
que inclua, dentre outros aspectos: avaliar
cuidado e educação; planejar experiências
diversificadas, que atendam aos vários aspectos do desenvolvimento infantil; estabelecer e manter uma relação cooperativa
e amistosa com as famílias; aprender a
ser parceiro do desenvolvimento infantil,
estimulando-o, mas não o apressando;
abordar as diferentes áreas de conhecimento de maneira integrada; vincular a
aquisição de novos conhecimentos e habilidades pelas crianças aos seus reais desejos e necessidades, promovendo uma
verdadeira aprendizagem significativa; dar
atenção privilegiada aos aspectos emocionais, especialmente durante o período
de inserção a criança a creche ou a pré-escola; dar oportunidade e estímulo para
a criança expressar os seus sentimentos,
desenvolver a sua autonomia, ajudando-a a desenvolver a sua identidade cultural, racial e religiosa. Ao que se refere à
formação inicial do educador, de crianças
pequenas, a autora defende que os cursos que cuidam dessa etapa da formação
deveriam repensar, sistematizar e enriquecer dois conjuntos de informações,
intimamente relacionados: as referentes
ao desenvolvimento e a aprendizagem
infantil, focalizando a criança concreta,
localizada histórica e socioculturalmente.
Aspectos fundamentais para que o professor possa desenvolver com qualidade seu
trabalho, contextualizá-lo e posicionar-se
diante dos problemas que a área enfrenta, dentre eles: a constituição histórica da
infância; as políticas públicas da Educação
Infantil; a identidade profissional docente.
Sobre a formação em serviço do professor
as leituras indicam que a formação precisa ter como referência o saber docente,
o reconhecimento e valorização do que o
314
professor acumulou na sua vivência pessoal e profissional – o que é importante
para que ele também reconheça e valorize
o conhecimento da criança. Para desempenhar bem seu trabalho cotidiano, esse
profissional precisa aprender a refletir
sobre a sua prática, construindo um projeto educativo que leve em consideração
a utilização de recursos que possam os
auxiliar na construção de uma educação
para a infância de maior qualidade como:
a documentação, a avaliação, a pesquisa e
a observação, desde que não seja suprimida a importância de sensibilizar, de brincar, de ler, dialogar e escutar a infância.
Identifica-se em Dahlberg, Moss e Pence
(2003) que os desafios atuais diante da
formação do educador para a primeira infância referem-se em aceitar as limitações
temporais e espaciais, de que não há concertos rápidos e nem projetos universais.
Mas há possibilidades de conhecimento
e ações locais: o indivíduo interessado
pode ler e refletir sobre temáticas relativas a sua formação e sobre a infância, bem
como outras que por ventura surgirem
necessidades; o grupo, a equipe de uma
instituição, podem discutir e explorar diferentes recursos e possibilidades para o
aperfeiçoamento da sua formação, como
exemplo, a documentação pedagógica.
Podendo assim aprofundar o seu entendimento do trabalho pedagógico e levando
a refletir sobre as concepções que construímos sobre a criança e a infância, e nesta discussões podemos buscar inspirações
em trabalhos como o de Reggio Emilia, e
assim fortalecer uma formação docente
de qualidade. Edwards, Gandini e Forman
(1999), a partir de suas experiências nas
escolas de Reggio, recomendam que os
professores devem ter o hábito de questionar suas certezas, devem possuir uma
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
sensibilidade imensa, devem ser conscientes e estar disponíveis, devem assumir um
estilo crítico em relação às pesquisas e
conhecimento continuamente atualizado sobre as crianças, devem manter uma
avaliação enriquecida do papel dos pais, e
devem possuir habilidades para falar, ouvir e aprender com. Contudo é fato que a
educação para a primeira infância é um direito da criança. A criança não tem direito
apenas ao acesso a creche e/ou a pré-escola, mas a uma experiência educativa de
qualidade, que realmente seja prazerosa
e eficaz na promoção das suas múltiplas
aprendizagens e desenvolvimento. Como
o professor é a figura mais importante
para a qualidade dessa experiência, é imprescindível que a sua formação inicial e
em serviço seja foco de atenção por parte
das políticas públicas e dos cursos de formação desses profissionais.
DIÁLOGOS SOBRE A INFÂNCIA:
EXPERIÊNCIAS DE UMA EDUCADORA
INFANTIL
Pâmela Faria Oliveira - UFU,
[email protected]
Ao longo da história da infância percebemos uma história da marginalização que
abrange os mais diversos âmbitos, seja
social, cultural ou econômico. As crianças
precisavam viver sempre em um mundo
que não era o seu, que não estava feito a
sua medida, sendo vista como um adulto
em miniatura. Contudo, atualmente, percebemos uma ampliação no modo como
temos visto e interagido com a infância.
Inicia-se uma configuração de um mapa
de direitos da infância cada vez mais preciso e comprometido com as novas teorias
e políticas educacionais, reafirmando o
compromisso que a sociedade deve assumir em relação à infância. Diante desde
quadro devemos encontrar novas formas
de se trabalhar com crianças, incluindo
entre estas a valorização das múltiplas
linguagens infantis buscando o desenvolvimento integral das mesmas. Também
exige um bom entendimento por parte
do professor sobre este desenvolvimento
e aprendizagem das crianças, pois oferecer uma educação de qualidade demanda
conhecimentos profissionais, estratégias
e cuidado únicos apropriados a infância.
E para isso exige-se também uma boa formação do professor que atua na educação
infantil, pois a qualidade do trabalho com
a criança é intrinsecamente vinculada à
formação e qualificação do profissional da
área. Pensando em dialogar sobre estas
questões pretendo, a partir da minha experiência como educadora infantil da Escola de Educação Básica da Universidade
Federal de Uberlândia, contribuir com a
reflexão sobre a formação do professor da
educação infantil, destacando a importância do desenvolvimento de habilidades e
competências necessárias para instrumentalizar este profissional da educação para
um trabalho mais rico, prazeroso e efetivo.
A partir do diálogo rico entre a pedagogia e
a psicologia, temos refletido e estruturado
novas formas de compreender a infância
e, por conseguinte, temos buscado experimentar em nosso cotidiano escolar uma
atuação coerente com esta perspectiva
que se apresenta. Dahlberg, Moss e Pence
(2003) nos colocam que há muitas crianças
e muitas infâncias, a primeira infância é a
base do progresso bem sucedido na vida
posterior. É o início de uma jornada de realização da incompletude da infância para
a condição humana plena da idade adulta.
A infância deve ser entendida como uma
315
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
construção social, elaborada para e pelas
crianças, em um conjunto de relações sociais, e a principal fase onde se constrói a
identidade infantil, portanto merece atenção especial por parte dos educadores
que trabalham com a educação infantil.
Faria e Mello (2005) nos mostra que hoje
temos um acervo bem denso de pesquisas revelando infâncias diferenciadas,
crianças curiosas e inventivas, capazes de
estabelecer múltiplas relações e levantar
hipóteses de várias naturezas, derrubando por terra, portanto as concepções da
criança incompleta, incapaz, egoísta por
natureza, assim desafiando o adulto profissional da educação a trabalhar de acordo com as múltiplas linguagens infantis.
Teóricos como Vygotsky, Piaget e Wallon
também contribuem para os nossos estudos, trazendo uma melhor compreensão
do processo de constituição dos sujeitos,
de seu desenvolvimento e de sua construção de conhecimento. O estudo destes
autores tem dado sustentação teórica ao
trabalho do educador infantil e auxiliado
na compreensão do desenvolvimento infantil. As contribuições destes teóricos nos
fazem compreender que a aquisição de
conhecimento é um processo construído
pelo indivíduo durante sua vida. Assim nós
educadores devemos desenvolver práticas
pedagógicas alinhavadas aos saberes infantis, pois isto leva a situações privilegiadas de aprendizagem infantil onde o desenvolvimento pode alcançar níveis mais
complexos, exatamente pela possibilidade
de interação entre os pares em uma situação imaginária e pela negociação de regras
de convivência e de conteúdos temáticos.
Uma criança nunca pode perder a curiosidade a respeito do mundo que a envolve,
e esse certamente há de ser um grande
objetivo da Educação Infantil. Um exemplo
316
prático que nos mostra que a possibilidade
de realizar um desenvolvimento e aprendizagem significativos, valorizando uma
prática pedagógica em sua dimensão libertadora, criativa, participativa, inclusiva
e democrática, por um processo de interação com o outro, mediado pela cultura,
uma prática pedagógica que contemple o
lúdico, a cultura, a formação humana e a
construção de conhecimentos pela criança, são as escolas de Educação Infantil de
Reggio Emillia. Edwards, Gandini e Forman
(1999) referem que o respeito a cooperação, a solidariedade, a autonomia, a inclusão, o direito de brincar a manifestação e
valorização da pluralidade cultural, social e
ética, ou seja a interação da criança com o
seu meio promove o desenvolvimento integral da criança. Nas escolas de Reggio as
crianças são encorajadas a tomarem suas
próprias decisões e a fazerem suas próprias escolhas. Os educadores exploram
as múltiplas linguagens da infância, incentivam os relacionamentos e entendem as
crianças como promotoras do seu próprio
desenvolvimento, abrindo as portas para
as cem linguagens infantis. Charlot (2005)
coloca que há uma grande diferença entre
ensinar e formar, a idéia de ensino implica um saber a transmitir, e a idéia de formação implica em dotar o indivíduo de
competência. Assim formar o professor é
dotá-lo de competência que lhes permitirão gerir tensões e construir mediações
entre a teoria e a prática. Assim o autor
defende uma formação de professores,
onde é necessário trabalhar saberes e práticas em diversos níveis, e articular estas
com as lógicas de desenvolvimento da
criança na educação infantil. O professor
deve formar uma identidade profissional
estruturada na sua relação com o mundo
e com teorias. Edwards, Gandini e Forman
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
(1999) nos mostram que o sucesso da escola está intimamente relacionado com
a boa formação de seus professores. De
acordo com o autor os professores de Reggio realizam sua formação em serviço e
desenvolve seus conhecimentos enquanto
trabalham com as crianças. Estes fazem
questionamentos constantes sobre o seu
ensino, e trabalham em conjunto com
toda a comunidade escolar, deixando de
lado o modo isolado e silencioso de se trabalhar. Mostrando-nos a importância do
professor reflexivo.
NOVOS OLHARES SOBRE A EDUCAÇÃO
INFANTIL: A FORMAÇÃO EM SERVIÇO DE
PROFESSORES COMO POSSIBILIDADES DE
DIÁLOGOS SOBRE A INFÂNCIA
Denise Bortoletto - ITV
[email protected]
O presente trabalho tem como objetivo
apresentar o relato de experiência da autora, junto à equipe de apoio pedagógico da
Educação Infantil de uma instituição privada de ensino de Uberlândia-MG. A literatura esclarece que o trabalho do Pedagogo
nas equipes de apoio pedagógico precisa
estar relacionado ao desenvolvimento de
projetos e de práticas educacionais que
intentem criar condições favoráveis à autonomia das crianças e dos educadores, de
modo a desenvolver suas competências e
habilidades, que só serão efetivadas por
meio de condições de aprendizagem facilitadoras (Porto, 2009; Bassedas, 1996). A
aprendizagem é entendida aqui como decorrente de uma construção, de um processo permeado por questionamentos,
hipóteses e reformulações, enfim, uma
dinâmica ação pedagógica que envolva
o construir e o reconstruir saberes histo-
ricamente acumulados e culturalmente
comunicados. Nesta instituição, as ações
da autora são realizadas com as crianças
e suas famílias e com os educadores. Estes
últimos constituem foco principal desta
apresentação. O cotidiano escolar revela
uma multiplicidade de saberes e práticas,
muitas vezes não vivenciados pelos professores em seu processo de formação inicial.
Por isso, acreditamos ser necessário investir esforços de modo a viabilizar intervenções que valorizem a formação dos professores em serviço, na tentativa de possibilitar a eles novos olhares sobre a infância
e sobre as crianças e, ainda, sobre as suas
relações estabelecidas com elas. Além disso, reflexões sobre as suas salas de aulas,
as suas práticas didático-metodológicas
e sobre a nova realidade escolar tornam-se indispensáveis. Conforme esclarece a
literatura educacional, investir em situações que sejam favorecedoras da aprendizagem significativa, valorizar o conhecimento prévio dos alunos, relacionar os
conhecimentos escolares com a realidade
atual, constituem alguns dos desafios do
educador frente ao novo contexto econômico e cultural. As investigações atuais referentes à formação de professores revelam a necessidade de se instrumentalizar
os futuros professores ou os professores
em serviço para pensarem ativamente na
realidade escolar, bem como em sua própria inserção nela. Como pode ser observado nos estudos de Facci (2009), Sawaya
(2002) e Souza (2002) é na formação em
serviço do professor que se encontra uma
possibilidade de que suas práticas pedagógicas sejam refletidas, repensadas e até
mesmo reestruturadas. Estamos de acordo com o pensamento de Sawaya (2002)
ao sugerir que uma das contribuições fundamentais da psicologia ao campo educa317
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
cional está relacionada à formação de professores. Todavia, a autora alerta que este
processo deve estar sustentado em ações
que levem o professor a rever criticamente as relações que constituem o seu fazer
educacional, e ao mesmo tempo, que ele
possa refletir sobre suas concepções, seus
modos de atuação e sua relação interpessoal na instituição escolar. Como pode ser
visto em Machado (2002), se na escola
não existirem estratégias coletivas para
pensar os acontecimentos do cotidiano,
se faltarem recursos para atender aos interesses diversificados das crianças, se não
se realizam discussões que auxiliem o processo ensino-aprendizagem, as dificuldades tornam-se fatalidades. Assim, torna-se
urgente repensar junto aos professores as
suas concepções de infância, criança e de
Educação Infantil e, é no espaço de formação em serviço, que esses saberes poderão ser construídos e reelaborados. Para
isso, busca-se um novo significado ideológico e social da infância a partir das ideias
de Piaget e Vygotsky. Tomando por base
esses referenciais teóricos, a criança passa a ser vista como agente construtor do
conhecimento e sujeito ativo no processo educacional. Por conseguinte, as contribuições desses autores sinalizam uma
nova etapa na história da educação das
crianças. Frente ao até aqui exposto pode-se considerar que a formação em serviço
de professores precisa estar pautada em
processos e estratégias que permitam tratar a criança em sua individualidade, para
assim buscar melhorias para os processos
de desenvolvimento e aprendizagem das
crianças, especialmente àquelas inseridas
na Educação Infantil.
Contato: Paula Cristina Medeiros Rezende,
UFU, [email protected]
318
MR LT04 - Mesa Redonda
Convidada
MR LT04-1337 - PRÁTICAS SOCIAIS E
DESENVOLVIMENTO HUMANO EM
CONTEXTOS EDUCACIONAIS
Luciano Santana Lopes - FAPRO,
[email protected]
Alice Farias de Araújo Marques - SEE/EMB
[email protected]
Denise de Oliveira Alves - Anhanguera
[email protected]
Luciana Câmara Fernandes Bareicha Anhanguera
[email protected]
As temáticas ora desenvolvidas giram em
torno de práticas sociais inseridas nos diferentes contextos cotidianos, sobretudo
nos ambientes educacional e esportivo.
São ressaltados os princípios e intenções
grupais que encorpam as práticas sociais, em especial as pedagógicas, bem
como suas interações que favorecem o
desenvolvimento humano. Os trabalhos
apresentam proposições conceituais relevantes para a compreensão do desenvolvimento humano em uma dimensão
sócio-histórica, atribuindo centralidade
aos “processos” e às características da
pessoa. O primeiro aborda a inclusão
educacional de pessoas com deficiência no ensino superior, tomando como
eixo estruturante o acolhimento e a valorização das diferenças e da diversidade humana, questões socioculturais nas
quais se apóiam ou deveriam se apoiar
as práticas sociais. O segundo trabalho
relaciona a construção da subjetividade
ligada às representações sociais, comprometimentos de grupos e valores sociais
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
estimulados e valorizados nas práticas
educacionais. O terceiro discute as práticas esportivas associadas à formação
motora e psicossocial de crianças e adolescentes no âmbito do esporte de alto
rendimento. O último trabalho apresentado discute a conjunção subjetividade e
práticas sociais, especificamente as educativas escolares, como uma necessidade de reflexão nos setores da psicologia
social e educação. O objetivo da mesa é
discutir os aspectos relacionais sob distintas perspectivas teóricas, promovendo
um debate que perpasse vários espaços
de práticas sociais. Os autores também
apresentam posicionamentos epistemológicos, os quais dão visibilidade aos
aspectos psicológicos da trama social na
qual se detém. Os trabalhos apresentam
proposições conceituais relevantes para
a compreensão do desenvolvimento humano em uma dimensão sócio-histórica
atribuindo centralidade aos “processos”
e às características da pessoa em desenvolvimento. Algumas considerações finais
são apresentadas: 1) As ações educacionais para a inclusão refletindo o avanço
no desenvolvimento dos direitos humanos devem envolver um rigoroso processo de planejamento e organização de
recursos de acessibilidade, rompendo,
assim, com as barreiras que obstaculizam
a plena participação e aprendizagem de
estudantes com deficiência no ensino
superior. 2) Conhecer como a criança é
representada internamente pelos estudantes de pedagogia nos revela a forma
como essa fase do desenvolvimento humano é retratada pelos formandos da
educação. Pode-se considerar que existe
uma construção subjetiva vinculada às
representações sociais na relação criança
e adulto que interfere significativamente
na aceitação ou não da criança em compreender o mundo em que ela vive. 3) A
teoria psicológica que discute os aspectos
do desenvolvimento infantil e adolescente nem sempre pauta a práticas cotidianas dos profissionais que trabalham com
iniciação esportiva. Daí a importância de
articular suas práticas pedagógicas com
o estágio de desenvolvimento no qual o
atleta se encontra, considerando os aspectos cognitivo, afetivo, físico e social. 4)
É importante considerarmos que durante
o processo educacional a subjetividade
perpassa a inserção do professor na relação com os seus pares, de maneira a responsabilizá-lo pela intencionalidade de
seus atos pedagógicos. Ressaltamos que
a subjetividade com características intencional e subjetiva, atravessa as interações
sociais também no contexto educacional
influenciando na construção de valores
humanos e, portanto sendo necessária
a atenção devida a essas práticas sociais
contemporâneas.
ACESSABILIDADE DE ESTUDANTES COM
DEFICIÊNCIA AO ENSINO SUPERIOR
Denise de Oliveira Alves - Anhanguera,
[email protected]
A inclusão social e educacional de pessoas com deficiência constitui, hoje, processo mundial que eclodiu no Brasil a
partir da década de noventa e tem como
filosofia estruturante o acolhimento e a
valorização das diferenças e da diversidade humana. Sua proposição conceitual
toma como referência alguns documentos internacionais que passam a nortear
a formulação de políticas públicas. Entre
eles destacam-se: a Declaração Mundial
Sobre Educação para Todos (Tailândia,
319
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
2009); a Declaração de Salamanca (Espanha, 1994); a Convenção Interamericana
para Eliminação de Todas as Formas de
Discriminação contra as Pessoas Portadoras de Deficiência (Guatemala, 1999); a
Convenção sobre os Direitos das Pessoas
com Deficiência, (Estados Unidos, 2006).
O conteúdo expresso nestes textos constitui um marco histórico em defesa da inclusão de grupos sociais em situação de
vulnerabilidade e tem importante repercussão na educação, exigindo uma reinterpretação da educação especial, que
passa a ser compreendida no contexto
da diferenciação adotada para promover
a eliminação das barreiras que dificultam
ou impedem o acesso à escolarização por
parte das pessoas com deficiência. Vários
autores, ao tratarem da educação inclusiva, traduzem a dimensão de um “projeto revolucionário”. Eizirick (2005) utiliza
a guerra como metáfora para defender
a idéia de ser a inclusão um processo
complexo, difícil e doloroso e demandar
a “gestação de uma mentalidade inclusiva”; em Mantoan (2006) encontramos
“andar no fio da navalha” para expressar
o embate, a resistência, a ruptura epistemológica, inerente à proposição de uma
escola aberta para todos; ainda, Forest e
Lusthaus (1987), pesquisadores canadenses, utilizam o caleidoscópio como metáfora para a inclusão. Caleidoscópio é um
aparelho formado por um pequeno tubo
de metal, com pequenos fragmentos de
vidro colorido, que, por meio do reflexo
da luz exterior em pequenos espelhos inclinados, apresenta, a cada movimento,
combinações variadas e agradáveis efeitos visuais. Quem já teve oportunidade
de conhecer o brinquedo impressionou-se com a infinidade de desenhos que os
pedaços de vidro podem produzir. O mais
320
importante, para a reflexão que pretendemos trazer aqui, é que se retirarmos
qualquer pedaço ele perde parte de sua
beleza. Especificamente relacionado ao
âmbito educacional o conceito toma a
dimensão de um redirecionamento das
práticas educacionais e dos sentidos subjacentes às mesmas. Trata-se de uma postura ativa de identificação de barreiras
que alguns grupos encontram no acesso a
educação e também na busca de recursos
necessários para ultrapassá-las. Tal concepção difere substancialmente de outras
formas de inserção escolar de pessoas
com deficiência, requerendo uma visão
ampliada de educação, dos recursos, da
estrutura, do currículo e uma mudança
estrutural do sistema educacional. Com
relação à inclusão de estudantes com
deficiência no ensino superior, apesar de
um crescente ingresso deste alunado, o
que confronta as práticas discriminatórias e a cultura seletiva da universidade,
dados do Censo escolar/2009 revelam
que, em um universo de 5.954.021 estudantes com matrícula, apenas 20.019
apresentam algum tipo de deficiência, o
que equivale a um percentual de 0,34%.
Este contingente mínimo que consegue
acessar ao ensino superior encontra uma
instituição despreparada, em suas bases
política, organizacional e, principalmente, na dimensão epistemológica, ou seja,
na concepção que está subjacente a ação
docente dos professores universitários.
Para uma melhor contextualização desta
realidade precisamos não perder de vista uma perspectiva mais ampla que é a
análise das condições nas quais se deu
o nascimento da universidade no Brasil.
Sabemos que sua criação não se concretizou alicerçada às especificidades da nossa realidade educacional, nem tampouco
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
se pautou em políticas governamentais
construídas a partir da preocupação de
que a universidade viesse a assumir o
papel social de democratizar o direito à
educação. Mesmo com a concretização,
em 1931, do Estatuto das Universidades
Brasileiras, considerado como um dos
grandes marcos estruturais da universidade em nosso país, pouco se alterou
do caráter excludente e seletivo que vinha caracterizando o ensino superior. Ao
contrário, de acordo com Garcia (2000),
o estatuto corrobora para consolidar a
“(...) hegemonia dos que se pretendiam
proprietários do saber, que eram também
os proprietários das terras e de todas as
riquezas produzidas, e que se utilizavam
do saber para justificar seu poder” (p.
68-69). Isto demonstra que o Documento revelou-se insuficiente para diminuir
o quadro de exclusão social na educação
brasileira. Em 1994 podemos localizar a
primeira iniciativa por parte do Ministério da Educação com relação ao acesso
de estudantes com deficiência no ensino
superior.Trata-se da Portaria nº 179/1994
que recomenda a inclusão da disciplina
“Aspectos
Ético-Político-Educacionais
da Normalização e Integração da Pessoa
Portadora de Necessidades Especiais”.
A recomendação era, prioritariamente,
para os cursos de Pedagogia, Psicologia
e demais licenciaturas, e a inclusão de
conteúdos relativos a essa disciplina em
cursos da saúde, serviço social e demais
cursos superiores, de acordo com as suas
especificidades. Em 2007 é lançado o
Plano de Desenvolvimento da Educação:
razões, princípios e programas – PDE,
reafirmado pela Agenda Social, tendo
como um de seus eixos o acesso e a permanência das pessoas com deficiência no
ensino superior. O Documento focaliza a
qualidade da educação e apresenta instrumentos de aferição do nível de eficácia
do ensino ministrado nas escolas brasileiras. Recentemente, em 2008, é publicada
a Política Nacional de Educação Especial
na Perspectiva da Educação Inclusiva. Em
seu texto o Documento traz a prerrogativa de que, na educação superior, a educação especial se efetive por meio de ações
que promovam o acesso, a permanência
e a participação dos estudantes com deficiência. Estas ações envolvem o planejamento e a organização dos recursos e
serviços para a promoção de acessibilidade arquitetônica, nas comunicações, nos
sistemas de informação, nos materiais
didáticos e pedagógicos, que devem ser
disponibilizados nos processos seletivos e
no desenvolvimento de todas as atividades que envolvam o ensino, a pesquisa e
a extensão. Essas proposições conceituais
têm desencadeado um conjunto de ações
e políticas que dão conseqüência aos
princípios filosóficos da inclusão. A inclusão de estudantes com deficiência no
ensino superior é, portanto, uma proposição visionária, que considera a evolução
dos direitos humanos e nos convida a refletir sobre a essencialidade epistemológica e o caráter emancipatório desta nova
perspectiva.
Palavras-chave: Inclusão, docentes
universitários, estudantes com deficiência,
acessibilidade.
Contato: Denise de Oliveira Alves,
Faculdade Anhanguera de Brasília,
[email protected]
321
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DO
“SER CRIANÇA”: A INFÂNCIA NA
SUBJETIVIDADE DOS ESTUDANTES DA
PEDAGOGIA
Luciana Câmara Fernandes Bareicha Anhanguera,
[email protected]
No Brasil, durante o século XVI, como
nos lembra Del Priore (1992), vislumbramos o momento áureo da ocupação
jesuítica. Nesse período, nossas crianças
eram retratadas como anjos gordinhos e
bochechudos que brincavam em jardins.
Pareciam simbolizar, por um lado, aspectos místicos da infância e, por outro, os
mártires dos ensinamentos dos professores jesuítas. O que mais chama atenção
nas produções artísticas e literárias dessa
época é a elaboração de um modelo de
criança que resultou em dois aspectos.
O primeiro revela uma visão de criança
como detentora de poderes místicos, que
a levava a suportar provações físicas em
“nome da sua fé”, valorizando qualidades
intrínsecas ao indivíduo. O segundo revela
uma criança que incorpora as características do Menino Jesus que, através de uma
imagem divinizada e associada à inocência que transmitia, era usada para interceder junto aos fiéis da Igreja Católica e para
converter os infiéis. A infância era vista
como um momento propício para o que
se chamava catequese, sendo a criança,
sobretudo a indígena, passível de aceitação dos conteúdos doutrinários. A criança
indígena era tratada como depósito de informações, sem se levar em consideração
suas características físicas, psicológicas e
de interação social. Usadas como símbolo para a propagação de informações de
caráter religioso, as crianças eram subme-
322
tidas ao rigor de treinamentos e penitências durante a época colonial. Na expectativa de conquistar novos adeptos ao pensamento católico, elas foram as primeiras
a serem catequizadas, recorrendo-se a artifícios punitivos quando necessários (Del
Priore, 1999). Com o passar do tempo, as
crianças indígenas do Brasil tornaram-se
adolescentes ou, como disse Pe. Manoel
da Nóbrega, chegaram aos anos da puberdade que eram caracterizados pela
autonomia, iniciando questionamentos
quanto à necessidade de abandonar seus
costumes (Del Priore, 1992). Esse ponto
de vista aponta uma diferença entre a infância e a adolescência, sendo a infância
suscetível à aceitação direta de informações, diferentemente do adolescente que
levanta dúvidas a respeito dos temas ensinados através de avaliações críticas dos
conteúdos assimilados. Nesse período,
como observa Chambouleyron (19

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