Plano de Ordenamento e Gestão da Paisagem Protegida de Corno

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Plano de Ordenamento e Gestão da Paisagem Protegida de Corno
Plano de Ordenamento e Gestão da
Paisagem Protegida de Corno do Bico
1ª Fase - CARACTERIZAÇÃO
Parte 2: Estudos de Base - Valoração
Novembro de 2008
Equipa Técnica
Coordenação
•
Pedro Beja
Colaboradores
•
Susana Rosa
•
Sofia Lourenço
•
João Honrado
•
Joana Marques
•
Luís Reino
•
Joana Santana
•
Luís Gordinho
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ÍNDICE
1. INTRODUÇÃO ............................................................................................... 4
2. VALORES NATURAIS ................................................................................... 7
2.1. Valores físicos ......................................................................................... 7
2.2. Valores biológicos .................................................................................... 7
2.2.1. Valoração da flora e vegetação......................................................... 7
2.2.2. Valoração da fauna terrestre ........................................................... 16
2.3. Síntese dos valores naturais.................................................................. 31
3. VALORES PAISAGÍSTICOS ........................................................................ 33
4. VALORES CULTURAIS ............................................................................... 35
5. VALORES SOCIOECONÓMICOS ............................................................... 36
5.1. Sector primário ...................................................................................... 36
5.2. Sector secundário .................................................................................. 37
5.3. Sector terciário ....................................................................................... 37
5.4. Benefícios indirectos .............................................................................. 38
6. VALORES INTRÍNSECOS DO SÍTIO .......................................................... 40
7. BIBLIOGRAFIA ............................................................................................ 43
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ANEXOS
Anexo I – Valoração das formações vegetais da Paisagem Protegida de Corno do
Bico
Anexo II – Valoração de espécies da Flora da Paisagem Protegida de Corno do Bico
Anexo III – Valoração de espécies de vertebrados terrestres e dulciaquícolas da
Paisagem Protegida de Corno do Bico
Anexo IV – Listagem de espécies de vertebrados terrestres e dulciaquícolas de
conservação prioritária na Paisagem Protegida de Corno do Bico
Anexo V – Valoração das Unidades Paisagísticas identificadas na Paisagem
Protegida de Corno do Bico
CARTOGRAFIA
[23] – Carta de valores geológicos (1:25.000)
[24] – Carta de valores hidrológicos (1:25.000)
[25] – Carta de valoração da vegetação (1:25.000) √
[26] – Carta de áreas de especial interesse para espécies prioritárias da flora
(1:25.000) √
[27] – Carta de valores florísticos e de vegetação (1:25.000) √
[28] – Carta de valoração dos biótopos para a fauna (1:25.000) √
[29] – Carta de locais de especial interesse para espécies prioritárias de fauna
(1:25.000) √
[30] – Carta de valores faunísticos (1:25.000) √
[31] – Carta síntese de valores naturais (1:25.000) √
[32] – Carta de valores paisagísticos (1:25.000) √
[33] – Carta de aptidão turística (1:25.000) √
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1. INTRODUÇÃO
O presente relatório consiste no trabalho de avaliação e quantificação de valores
naturais, desenvolvido no âmbito do Contrato de Prestação de Serviços entre o
Instituto da Conservação da Natureza e Biodiversidade e a ERENA – Ordenamento e
Gestão de Recursos Naturais, Lda, no âmbito da elaboração do Plano de
Ordenamento e respectivo Regulamento da Paisagem Protegida de Corno do Bico.
Este trabalho corresponde à segunda etapa da fase de caracterização da área da
Paisagem protegida, tendo como objectivos centrais a identificação dos valores
presentes no território, nas componentes biofísicas, paisagísticas, patrimoniais,
culturais e sócio-económicas, e a classificação de cada valor de acordo com uma
escala de valoração pré-definida.
A componente de valoração foi realizada tendo como base a abordagem descrita
detalhadamente no Caderno de Encargos, que segue em termos conceptuais o
procedimento proposto pela primeira vez em Portugal por Palmeirim et al. (1994).
Globalmente, a metodologia baseia-se num sistema de pontuações, utilizando um
conjunto de critérios de ponderação que traduzem a vulnerabilidade de cada espécie e
a sua relevância na Paisagem Protegida de Corno do Bico. Assim, é atribuído em cada
caso um Valor Ecológico Específico (VEE), que é utilizado subsequentemente na
valoração diferencial das classes de espaço em que a área de estudo é dividida
(biótopos faunísticos, unidades de vegetação, etc.).
O estabelecimento de prioridades de conservação com base na metodologia proposta
levanta problemas de ordem conceptual e prática, que se tentou resolver ou minorar
através de algumas adaptações. Um dos principais problemas, já patente no trabalho
de Palmeirim et al. (1994), relacionava-se com os pesos relativos que são atribuídos
aos critérios que traduzem o grau de ameaça intrínseco de uma dada espécie e a sua
relevância a nível local. Isto é, um valor muito elevado de VEE pode ser atribuído a
espécies muito ameaçadas ou intrinsecamente vulneráveis, mas que ocorrem
localmente de forma rara ou mesmo acidental. Independentemente do seu interesse
de conservação global, não se deve dar em princípio grande prioridade a espécies
deste tipo, uma vez que o planeamento e gestão locais são, em grande medida,
irrelevantes para a sua conservação. Pelo contrário, poderá haver espécies
relativamente menos vulneráveis, cuja população numa dada Área Protegida seja
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muito relevante no contexto nacional ou global, devendo por isso ser consideradas
como prioritárias. O balanço entre ameaça e relevância é difícil de estabelecer em
qualquer sistema de valoração, mas constitui uma componente crítica para o seu
sucesso. A experiência prévia de aplicações anteriores desta metodologia comprova
que
um
correcto
estabelecimento
da
fenologia
das
espécies,
ponderando
cuidadosamente a classificação de espécies de ocorrência acidental e uma correcta
valoração regional são a melhor abordagem para minorar este problema.
Entre as tentativas de resolver estas limitações têm sido ensaiados sistemas
alternativos de estabelecimento de prioridades de conservação, incluindo, por
exemplo, o sistema de SPEC (Species of Conservation Concern) e os critérios de
identificação de IBA (Important Bird Areas) desenvolvidos pelo Birdlife (e.g. Costa et
al. 2003). Este sistema não se baseia em pontuações, permitindo, contudo, de forma
razoavelmente satisfatória, definir graus de importância para espécies ameaçadas,
identificar áreas críticas para assegurar a conservação destas espécies (IBA), e
identificar as espécies mais relevantes em cada área. O desenvolvimento de um
sistema deste género transcende largamente os objectivos do presente trabalho,
tendo-se optado, por isso, pela aplicação da metodologia proposta. Esta aplicação foi
contudo acompanhada por uma análise crítica dos resultados obtidos com base em
dados biológicos e ecológicos externos ao sistema de pontuação. Desta forma,
procurou-se obter uma identificação mais satisfatória das espécies de conservação
prioritária na área da Paisagem Protegida de Corno do Bico, dando especial atenção à
sua relevância para a conservação de cada espécie.
Outro problema na aplicação do sistema de valoração decorreu das insuficiências de
dados quantitativos sobre as espécies existentes na área da Paisagem Protegida. De
facto, a informação existente sobre a generalidade dos vertebrados é bastante
escassa, desconhecendo-se por exemplo os biótopos de ocorrência para a maioria
das espécies que já foram inventariadas, bem como dados acerca da sua distribuição
geral e abundância. Estas insuficiências de informação tornam impossível a aplicação
do sistema tal como é apresentado no Caderno de Encargos, pelo que foram
propostas algumas alterações que permitem colmatar estas insuficiências. As
alterações metodológicas são apresentadas e discutidas detalhadamente ao longo do
texto.
Em função das limitações apresentadas, as ordenações de espécies produzidas pelo
sistema de valoração devem ser encaradas com as devidas cautelas, uma vez que
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podem traduzir de forma pouco satisfatória a importância relativa de cada espécie no
contexto da área actual da Paisagem Protegida de Corno do Bico. Apesar de se ter
tentado resolver este problema através da análise crítica dos resultados, a
identificação das espécies de conservação prioritária ainda deverá ser alvo de
discussão alargada, de forma a encontrar um conjunto consensual de espécies que
possam servir como focos prioritários de conservação (sensu Lambeck 1997).
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2. VALORES NATURAIS
2.1. Valores físicos
Valores Hidrológicos e Hidrogeológicos
A valoração das estruturas hidrológicas teve em atenção o seu papel no
funcionamento dos ecossistemas dulciaquícolas na área da Paisagem Protegida,
tendo em conta que albergam espécies de grande interesse de conservação, e a sua
importância em termos de exploração de recursos hídricos para consumo humano e
usos agrícolas. Assim, o rio dos Cavaleiros e o rio Coura foram classificados com o
nível Alto. Não existe informação detalhada acerca da distribuição de furos e
captações, pelo que não foi possível valorar os elementos hidrológicos mais relevantes
do ponto de vista destas captações e elaborar a carta de valores hidrológicos (Carta
[24]).
Em termos hidrogeológicos toda a zona corresponde ao Maciço Antigo, não havendo
nenhuma área particularmente importante em termos de sensibilidade e produtividade,
pelo que a carta [23] não foi elaborada.
As áreas artificializadas (habitações, caminhos, etc.) não foram classificadas, devido
ao papel geralmente negativo no funcionamento dos sistemas hidrológicos.
2.2. Valores biológicos
2.2.1. Valoração da flora e vegetação
Flora
A valoração da flora (e também da vegetação) é constituída por duas etapas, na
primeira é calculado o Valor Ecológico Específico (VEE) de cada taxon através de uma
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soma de parâmetros, na segunda este valor é espacializado pela sua correspondência
com a carta de vegetação. Seguidamente explicam-se todos os passos em detalhe.
Metodologia
Determinação do Valor Ecológico Específico (VEE)
A determinação do VEE seguiu de perto a metodologia explicitada no Caderno de
Encargos, resultando da soma dos seguintes parâmetros, que variam todos de 0 a 10:
Estatuto de conservação – Directiva Habitats
A inclusão da espécie nos anexos da Directiva Habitats foi pontuada segundo a
correspondência:
10 Taxon incluído no Anexo II como prioritário
9
Taxon incluído no Anexo II como não prioritário
7
Taxon incluído no Anexo IV
5
Taxon incluído no Anexo V
0
Taxon não listado na Directiva Habitats
Estatuto de conservação – Livro Vermelho da Flora*
No Caderno de Encargos a pontuação neste parâmetro é feita de acordo com o
estatuto de conservação segundo os critérios para as categorias de ameaça definidos
pela UICN. No entanto, dado que o Livro Vermelho da Flora ainda não está publicado,
foram seleccionadas as espécies endémicas ou que, na sequência de estudos
anteriores realizados na região, se revelaram como raras ou ameaçadas.
Estatuto de conservação – Grau de ameaça local
Este parâmetro mede o grau da ameaça da espécie no contexto da área de Paisagem
Protegida do Corno do Bico, tomando o valor máximo – 10 – quando o grau de
ameaça é máximo, ou seja, quando a espécie corre o risco de desaparecer na área.
Este valor apresenta alguma subjectividade pois depende de vários factores como a
intensidade da colheita, a destruição do habitat, a vulnerabilidade da população, etc.,
factores dificilmente quantificáveis na ausência de estudos de base.
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Estatuto biogeográfico – Grau de endemismo
A pontuação atribuída a cada espécie para este parâmetro está de acordo com o
proposto no Caderno de Encargos:
10
Endemismo português ou quase português (se apenas uma
parte mínima da população se encontra em Espanha)
8
Endemismo ibérico
5
Endemismo da Península Ibérica e Sul de França
5
Endemismo de Portugal e da Macaronésia
5
Endemismo de Portugal e Norte de África
3
Endemismo da Península Ibérica e Macaronésia
3
Endemismo da Península Ibérica e Norte de África
2
Endemismo de Portugal, Norte de África e Macaronésia
1
1
0
Endemismo da Península Ibérica, Norte de África e Sul de
França
Endemismo da Península Ibérica, Norte de África e
Macaronésia
Endemismo europeu ou mais vasto
Estatuto biogeográfico – Isolamento
Este parâmetro mede o isolamento da população presente na Paisagem Protegida do
Corno do Bico, pontuado pelo seguinte critério:
10
5
0
A população está isolada da principal área de
distribuição
A população está no limite da sua área de
distribuição
A população está dentro da sua área de
distribuição principal
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Estatuto biogeográfico – Raridade
Os critérios apresentados no Caderno de Encargos para a quantificação da raridade
baseiam-se na distribuição geográfica, no tamanho da população local e na
especificidade de habitat dos taxa para calcular um índice de raridade de acordo com
o proposto por Rabinowitz et al (1996).
Cartografia do Valor Florístico (VF)
O Valor Florístico, expresso em classes de relevância, representa o valor que cada
unidade de vegetação tem, tendo em conta as espécies que nela ocorrem, ou podem
ocorrer. É portanto o resultado da junção dos valores reais e potenciais em cada
unidade. Esta operação pressupôs dois tipos de cartografia, para cada taxon:
•
Cartografia real da ocorrência do taxon: para os casos em que a localização do
taxon é conhecida, não estando associado claramente a um habitat ou, caso
esteja, ocorrendo esporadicamente apenas, levando a que a ocorrência do
habitat não seja sinónimo da ocorrência do taxon. Neste caso, foram
desenhados polígonos especificamente para o taxon.
•
Cartografia potencial: para os casos em que o taxon está claramente associado
a um habitat, sendo expectável que ocorra, em maior ou menor abundância,
sempre que o habitat ocorre. Neste caso, a ocorrência do taxon foi associada
ao polígono de vegetação existente.
Para cada taxon foi avaliado o melhor método de cartografia que, nalguns casos,
correspondeu às duas abordagens (por exemplo, quando reconhecidamente a
prospecção foi insuficiente em face da abundância do taxon).
Resultados
Valor Ecológico Específico (VEE)
A seriação dos taxa pelo seu VEE apresentada no Anexo II mostra que existe um
grupo de 5 taxa que sobressai nitidamente dos restantes pelo seu valor elevado.
Como seria de esperar, Bruchia vogesiana encabeça a lista, o que advém da
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população dentro da Paisagem Protegida ser uma das escassas populações
portuguesas conhecidas, e devido à extrema dependência de um habitat de ocorrência
única na área (turfeira de Lameiro das Cebolas). Nenhum outro taxon é dotado de
raridade semelhante, mas por outras razões, Bryoerythrophyllum campylocarpum,
Veronica micrantha, Narcissus cyclamineus e Festuca summilusitana apresentam
também um valor elevado. Factores como a presença no Anexo II da Directiva
Habitats, a raridade (relacionada com a especialização da planta e/ou dimensão das
populações) e o grau de endemismo em conjunto justificam estes valores.
Embora apresente uma distribuição geográfica alargada, a região da bacia do rio
Coura apresenta uma das poucas populações portuguesas de Bryoerythrophyllum
campylocarpum, sendo também uma das mais importantes populações registadas
para a Europa ocidental. Veronica micrantha é uma espécie endémica do noroeste da
Península Ibérica que, à semelhança do que ocorre em toda a região, apresenta na
Paisagem Protegida do Corno do Bico um baixo número de efectivos, tendo sido
observada apenas na aldeia de Gaviães. A ocorrência de Narcissus cyclamineus,
outro endemismo do noroeste da Península Ibérica, está restrita (na Paisagem
Protegida) às proximidades da aldeia de Soutelo, nas margens do rio Coura. Festuca
summilusitana é uma espécie endémica da Península Ibérica listada no Anexo II da
Directiva Habitats, relativamente frequente nas montanhas do norte e centro de
Portugal e globalmente pouco ameaçada, mas bastante rara em toda a área da
Paisagem Protegida do Corno do Bico, tendo sido observada apenas nas fendas dos
afloramentos graníticos da zona de Outeirais.
Valoradas com relevância Média, surgem diversas espécies que pela sua raridade ou
grau de ameaça local justificam a inclusão no estudo, designadamente Menyanthes
trifoliata, Arnica atlantica, Narcissus triandrus e Narcissus bulbocodium.
As populações portuguesas de Menyanthes trifoliata e Arnica montana subsp. atlantica
são bastante fragmentárias e ameaçadas pela destruição dos habitats turfosos. O
principal factor de ameaça das espécies de Narcissus (N. triandrus e N. bulbocodium)
é, à semelhança do que acontece com Ruscus aculeatus, a colheita excessiva, razão
pela qual foram considerados para efeitos de valoração florística da área.
Vegetação
A metodologia de valoração da vegetação seguiu a proposta no Caderno de Encargos.
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A unidade de valoração foi a comunidade, que corresponde aos polígonos
cartografados. Não foi considerada uma subdivisão da comunidade em habitats para a
sua valoração porque o nível de informação existente não era suficiente para
completar todos os parâmetros de valoração; no entanto, a presença de habitats da
Directiva em cada comunidade foi quantificada e valorada, como adiante explicado, e
usada como um dos parâmetros. Seguidamente resume-se a metodologia de
valoração efectuada.
Metodologia
Valoração das unidades de vegetação (VCC)
O valor de conservação das comunidades (VCC) foi calculado pela soma de cinco
parâmetros (Presença do habitat na Directiva Habitats, Grau de raridade, Grau de
naturalidade, Grau de ameaça e ocorrência de Singularidades), e hierarquizado em
quatro classes de relevância (Baixa, Média, Alta e Excepcional), de acordo com o
referido no Caderno de Encargos:
Directiva Habitats
A presença de um ou mais habitats inscritos na Directiva Habitats foi pontuada de 0 a
10 de acordo com metodologia proposta no Caderno de Encargos
10
Habitat incluído no Anexo I como prioritário
8
Habitat incluído no Anexo I como não prioritário
0
Não incluído
Dado que as comunidades integram vários habitats, e se considera que os habitats
estão mais ou menos sobrepostos, foi atribuído à comunidade o valor de conservação
do habitat (VChabitat) mais elevado, entre aqueles que a constituem.
Grau de raridade
O grau de raridade de uma comunidade foi pontuado na escala de 0 a 10 seguindo a
linha de raciocínio que subjaz à seguinte escala:
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10 Habitat é representante único no país
8
Habitat tem grande interesse, dada a sua raridade a nível nacional
Apesar de não ser muito raro ao longo do país, apresenta algumas
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singularidades devido a factores locais, que podem ter uma expressão
única a nível nacional
4
0
Habitat relativamente comum ao longo do país, mas regionalmente pouco
frequente
Habitat comum a nível nacional e regional
Embora toda a valoração das comunidades se sustente no modo como estas foram
definidas que, como já foi observado, não está tão exaustivo como desejável, o
parâmetro grau de raridade é o que mais sofre com as lacunas àquele nível, bem
como com a subjectividade que está normalmente aliada à definição das
comunidades.
Grau de ameaça local
Este parâmetro mede o grau de ameaça da comunidade no contexto da Paisagem
Protegida do Corno do Bico, tomando o valor máximo – 10 – nos casos em que a
comunidade está em riscos de desaparecer na área. A ameaça é avaliada com um
pouco de especulação sobre o futuro de cada comunidade, tendo em conta as
actividades humanas em curso na área, as suas tendências futuras e a fragilidade da
comunidade face a essas actividades.
Singularidade
A Singularidade, que mede o interesse que a comunidade desperta na comunidade
científica, é também um parâmetro algo subjectivo e potencialmente redundante com o
grau de raridade e com a valoração da flora.
Aplicação do valor florístico às unidades de Vegetação
Após a atribuição de classes de relevância para cada espécie a partir do seu valor
ecológico específico (VEE) foi determinado o valor florístico (VF) de cada unidade de
uma forma eficaz, embora simples, de acordo com os seguintes critérios:
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•
Excepcional: unidades com pelo menos uma espécie de relevância
Excepcional, ou pelo menos duas de relevância Alta;
•
Alta: unidades com pelo menos uma espécie de relevância Alta, ou pelo menos
três de relevância média;
•
Média: unidades com pelo menos uma espécie de relevância Média.
À semelhança do que é sugerido no Caderno de Encargos, não se atribui a classe
“valor baixo”, dado que as espécies consideradas para efeito de definição de áreas de
interesse florístico apresentam sempre alguma relevância florística (média a elevada).
Valor Florístico e de Vegetação das Comunidades
O valor final atribuído às unidades de vegetação resulta do cruzamento dos valores
florísticos (VF) das comunidades com os respectivos valores de vegetação (classes de
relevância associadas aos VCC), tendo sido seleccionado o maior valor entre eles.
Resultados
Valor de Conservação das Comunidades (VCC)
A valoração das comunidades, apresentada no Anexo I, evidencia que as turfeiras
colinas, os mosaicos agro-florestais e os bosques de carvalho são as comunidades
mais importantes na área, sendo que as turfeiras apresentam uma fraca
representatividade com apenas um local, em Lameiro das Cebolas. O valor desta
comunidade resulta da sua raridade, quer a nível local, quer global, e pela ocorrência
de singularidades florísticas já mencionadas. No caso dos bosques de carvalho, o
valor desta comunidade deriva da correspondência perfeita com os habitats 9230pt1 e
8220pt3 da Directiva Habitats. Os carvalhais representam uma grande extensão da
Paisagem Protegida do Corno do Bico, no entanto, são bastante jovens e grande parte
tem origem antrópica, razão pela qual apresentam um grau de naturalidade
relativamente baixo. A maior intensidade luminosa relativamente a bosques mais bem
conservados causa alterações ao nível da estrutura e composição da vegetação,
estando ausentes muitas das espécies nemorais características de carvalhais mais
maduros e presentes numerosas espécies heliófilas.
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Paralelamente, os mosaicos agro-florestais apresentam também um valor muito
elevado devido à singular combinação entre vegetação florestal e pratense.
Outras unidades que assumem alguma importância são os rios colinos e os mosaicos
colinos de granito, por serem habitats naturais relativamente sujeitos a perturbação
antrópica e apresentarem algumas particularidades florísticas.
As restantes comunidades apresentam valores comparativamente mais baixos e
correspondem a etapas subseriais dos carvalhais, dominadas por tojais e urzais-tojais
galaico-portugueses, cuja diversidade à escala mundial é máxima na Península Ibérica
e se encontram muito bem representados na área da Paisagem Protegida do Corno do
Bico.
Valor Florístico e de Vegetação das Comunidades
A análise da carta 27, que sintetiza os valores relativos à flora com os relativos à
vegetação, discrimina de uma forma eficaz os locais mais importantes para a
conservação da componente botânica.
Os Rios Colinos, classificados como excepcionais, são zonas com habitats muito
importantes do ponto de vista da conservação, alguns deles prioritários, com destaque
para os amiais ripícolas (91E0pt1), aos quais se acrescenta a ocorrência de diversas
espécies raras ou ameaçadas como Narcissus triandus, N. cyclamineus, Lysimachia
nemorum e Scrophularia herminii. Outra unidade com valor Excepcional é a que inclui
as turfeiras atlânticas (7140pt2) e substratos turfosos associados, que devem o seu
valor à ocorrência de Bruchia vogesiana e à já referida ameaça de destruição.
As comunidades com relevância Alta correspondem de uma forma geral a todos os
carvalhais e respectivos mosaicos sobre granitos, com giestais e vegetação pratense.
Também classificados como altamente relevantes, as comunidades de afloramentos
de granito devem a sua importância à ocorrência de tomilhais galaico-portugueses
(8230pt1) e de Festuca summilusitana, espécie do Anexo II da Directiva Habitats,
bastante rara em toda a área da Paisagem Protegida do Corno do Bico.
As comunidades com relevância Média incluem a generalidade dos matos colinos
(sobre xisto e granito), cuja flora e vegetação é, do ponto de vista da conservação,
menos ameaçada.
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2.2.2. Valoração da fauna terrestre
Valoração das espécies
A valoração da fauna terrestre, e também aquática, foi direccionada apenas para as
classes de vertebrados, uma vez que os dados relativos às comunidades de
invertebrados são praticamente inexistentes (só existe alguma informação para a
Ordem dos Lepidópteros, da Classe dos Insectos), não apenas a nível do elenco
específico, mas também a nível das suas características ecológicas que contribuem
para o processo da valoração. Em consequência, optou-se também por não valorar
biótopos com base em espécies de invertebrados; biótopos onde ocorressem espécies
relevantes deste grupo apareceriam inevitavelmente pouco valorizados se fosse
utilizada a metodologia de valoração dos vertebrados, já que não possuem estatutos
de
conservação
comparáveis,
entre
outros
motivos
acima
descritos.
Essa
comparabilidade também não seria possível se fosse utilizada uma metodologia de
valoração (forçosamente) muito distinta para o grupo dos invertebrados. Dadas estas
limitações, optou-se por valorizar apenas espécies de vertebrados e biótopos com
base também apenas neste grupo.
A valoração dos vertebrados terrestres (Mamíferos, Aves, Répteis, Anfíbios e Peixes
Dulciaquícolas e Migradores), foi então efectuada de acordo com as especificações do
Caderno de Encargos, sendo necessárias, no entanto, algumas adaptações
metodológicas. Estas modificações decorreram das limitações de informação para
muitas das espécies faunísticas, que obrigaram a que fosse efectuada a valoração
global para a área da Paisagem de Corno do Bico e não para cada um dos seus
biótopos individuais. Apesar de na maior parte dos casos ser possível atribuir as várias
espécies pelos biótopos, em função das suas preferências ecológicas, mesmo com
poucos dados objectivos de distribuição real, são muito escassos ou inexistentes os
dados que possibilitem a estimativa por biótopo da maioria dos parâmetros utilizados
na valoração das espécies. Acresce ainda que a relativamente pequena dimensão da
área de estudo faz com que em muitos casos exista dependência funcional entre os
vários biótopos, forçando a que a sua valorização tenha em atenção esta
complementaridade. As alterações metodológicas necessárias para proceder à
valorização faunística dos biótopos são indicadas na secção correspondente.
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Excluindo os aspectos referidos anteriormente, a valoração da fauna seguiu a
metodologia proposta, baseando-se num sistema de pontuações, em que o Valor
Ecológico Específico (VEE) é atribuído em função de critérios que ponderam o:
•
Estatuto de Conservação (EC), obtido pela soma dos estatutos de acordo com o
Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal (atribuindo pesos de 0 a 10, em 5
níveis, aos estatutos de ameaça, por ordem crescente) e da UICN (classificados da
mesma forma), Directiva Habitats (atribuindo pesos de 0 a 10, em 4 níveis) ou
Aves (atribuindo peso de 10 a espécies prioritárias incluídas no Anexo I e de 8 às
restantes espécies do Anexo I) e com a situação perante a Convenção de Berna
(atribuindo peso 5 às espécies do Anexo II e 2 às do Anexo III);
•
Estatuto Biogeográfico (EBg), obtido pela soma dos pesos atribuídos às
distribuições global e nacional da espécie (classificadas de 0 a 10, da mais
alargada para a mais restrita) com o peso atribuído à respectiva tendência
(classificada de 0 a 10, da expansão para a regressão e dando mais peso quando
esta é em Portugal e na Europa, do que quando só em Portugal e, menos ainda,
quando só na Europa); a informação utilizada para estimar os diversos parâmetros
variou em detalhe e actualidade, em função dos dados disponíveis (e.g., anfíbios e
répteis - Godinho et al. 1999);
•
Estatuto Biológico (EB), obtido pela soma dos pesos atribuídos à tendência do
efectivo populacional da espécie (classificada de 0 a 10, do aumento para o
declínio generalizado em Portugal e a nível global), à concentração das suas
populações na área de estudo (classificada em 3 níveis, de 0 a 10, consoante se
concentra ou não na área e se concentra num maior ou menor número de outros
sítios), ao facto de se reproduzir ou não na área de estudo (classificado em 4
níveis, de 0 a 10, consoante a probabilidade), ao facto de ser ou não migradora (5
ou 0, respectivamente), ao seu nível de especialização alimentar (classificado de 0
a 5, em três níveis, de generalista a especialista) e ao seu nível de especialização
em termos de habitat (classificado da mesma forma que a dieta);
•
Estatuto Regional (ER), atribuído directamente em função de a espécie em causa
ser ou não característica da região, rara na Paisagem Protegida de Corno do Bico,
localmente ameaçada, etc. (três níveis, de 0 a 10, consoante o interesse regional).
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Estes quatro critérios foram depois combinados para calcular o VEE para cada
espécie, com base na sequinte expressão:
VEE = k1 × EC + k 2 × EBg + k 3 × EB + k 4 × ER ,
em que ki são factores de ponderação atribuídos a cada um dos critérios. As
constantes utilizadas foram: K1 = 1,25; k2 = 1,25; k3 = 0,38 e k4 = 2,50. No caso da
herpetofauna utilizaram-se as seguintes constantes: k1 = 1,21; k2 = 1,20; k3 = 0,39 e
k4 = 2,50.
As únicas alterações efectuadas a este sistema de ponderações relacionaram-se com
os Livros Vermelhos, uma vez que foi publicada em 2005 a actualização dos estatutos
de conservação dos vertebrados terrestres em Portugal (Cabral et al. 2005),
relativamente aos estatutos publicados na década de 1990 (SNPRCN 1990, 1991).
Existe pelo menos um problema com esta opção, que é o facto das novas categorias
da IUCN (2001) diferirem um pouco das anteriores (IUCN 1990), pelo que o peso a
atribuir a determinados estatutos não se encontra definido no Caderno de Encargos e
teve que ser redefinido. Apesar disso, a utilização dos novos estatutos deverá
constituir uma mais-valia para o trabalho, permitindo contrariar a tendência para o
Plano de Ordenamento ficar desactualizado logo após a sua execução. Assim, foram
utilizados os estatutos do novo Livro Vermelho, atribuindo as seguintes ponderações:
10 – Criticamente ameaçada e em perigo; 8 – Vulnerável; 6 – Quase ameaçada; 3 –
Informação Insuficiente; 0 – Não ameaçada.
Para cada espécie, os dados para a estimativa de cada um dos parâmetros de
valoração foram obtidos a partir de informação bibliográfica, usando um grande
número de fontes publicadas e não publicadas. Com esta opção, pretendeu-se tornar
o trabalho mais expedito e, ao mesmo tempo, garantir uma certa uniformidade de
critérios entre diferentes POs, em consonância com a utilização de uma metodologia
quantitativa e objectiva. No entanto, fez-se uma revisão substancial da informação,
quer para actualizar os parâmetros em função de nova informação disponível, quer
para adaptar os valores à situação específica da Paisagem Protegida de Corno do
Bico.
Os resultados da análise de valoração são apresentados no Anexo III, sendo descritos
nas próximas secções os resultados mais relevantes para cada grupo taxonómico.
Plano de Ordenamento e Gestão da Paisagem Protegida de Corno do Bico
18
Peixes dulciaquícolas e migradores
De acordo com o ICNB (dados não publicados), na Paisagem Protegida ocorrem sete
espécies de peixes dulciaquícolas, incluindo a enguia Anguilla anguilla, migrador
catádromo. Em geral, estas espécies obtiveram valores elevados de VEE, derivados
em grande medida dos seus estatutos de conservação desfavoráveis, distribuição
geográfica global e, em alguns casos, distribuição geográfica localizada em Portugal.
Destaca-se em particular a panjorca Chondrostoma arcasii, que obteve o segundo
VEE mais elevado. Trata-se de um endemismo ibérico, com o estatuto “Em Perigo”
(Cabral et al. 2005). Ainda incluídas nas 50 espécies com VEE mais elevado podemse encontrar o ruivaco Chondrostoma oligolepis (22ª posição), a boga-comum
Chondrostoma duriense (23ª posição), o escalo do Norte Squalius carolitertii (43ª
posição) e o barbo-comum Barbus bocagei (50ª posição).
Anfíbios
No caso da herpetofauna, o processo de valoração foi efectuado com os dados
disponíveis que se resumiram aos fornecidos pelo ICNB (dados não publicados),
Espaço-Terra 2004, Almeida et al. (2001) e Honrado (2007b).
Dado existirem algumas limitações quanto a dados provenientes de inventariações
dirigidas, o VEE atribuído a cada espécie deriva essencialmente de questões globais,
como o estatuto de conservação e a área de distribuição.
Os anfíbios revelaram-se um grupo bastante relevante do ponto de vista da
conservação na Área de Paisagem Protegida de Corno do Bico. Quatro espécies
estão incluídas no grupo com os 25 VEEs mais elevados (de um total de 13 espécies
atribuídas para a PP); mais três estão contidas no grupo com os 50 VEEs mais
elevados, o que representa mais de metade do total da riqueza específica deste grupo.
Esta relevância deve-se essencialmente a dois aspectos: ao facto da área possuir
características climáticas ecológicas bastante específicas no contexto nacional, e
portanto exibir uma fauna de anfíbios bastante particular, nomeadamente de espécies
que têm áreas de distribuição muito restritas; e dos estatutos de conservação
desfavoráveis a nível nacional e/ou internacional atribuídos a algumas destas
espécies.
Plano de Ordenamento e Gestão da Paisagem Protegida de Corno do Bico
19
Das espécies com maior valor ecológico específico destaca-se a salamandralusitânica Chioglossa lusitanica, à qual foi atribuído o 5º valor mais elevado de todas
as espécies de vertebrados. Trata-se de um endemismo ibérico com elevados
requisitos ecológicos (Almeida et al. 2001) e que apresenta um estatuto de
conservação desfavorável tanto a nível nacional como internacional (Cabral et al.
2005, IUCN 2006). A rã-de-focinho pontiagudo Discoglossus galganoi, o tritãopalmado Triturus helveticus e a rã-ibérica Rana iberica apresentam, respectivamente,
os 9º, 11º e 16º VEEs mais elevados.
Répteis
As fontes de informação utilizadas no processo de valoração das espécies de répteis
foram as mesmas dos anfíbios, possuindo portanto o mesmo tipo de limitações.
Cinco espécies de répteis estão incluídas no grupo de vertebrados com os 25 VEEs
mais elevados, de uma forma geral devido a motivos semelhantes aos descritos para
as espécies de anfíbios. Estas são, por ordem decrescente, a víbora de Seoane
Vipera seoanei, a cobra-lisa-europeia Coronella austriaca, o lagarto-de-água Lacerta
schreiberi, a víbora-cornuda Vipera latastei e a cobra-de-pernas-pentadáctila ou furapastos-ibérico Chalcides bedriagai. Mais uma espécie está incluída no grupo dos 50
VEEs mais elevados: a lagartixa de Bocage Podarcis bocagei.
Destas espécies, aquela com mais destaque é a víbora de Seoane, que tem uma área
de distribuição em Portugal muito limitadaa, tratando-se de um endemismo do
Noroeste da Península Ibérica, restrita a menos de 1,3% do território nacional
(Godinho et al. 1999, Almeida et al. 2001). Juntamente com a víbora-cornuda, e com
maior destaque para esta última, foram alvo de estudos específicos que permitiram um
maior conhecimento acerca da sua ecologia e ameaças em termos de conservação
(Brito 2003, Brito & Álvares 2004). Trata-se de uma excepção relevante face às
restantes espécies da herpetofauna para as quais os dados existentes são bastante
mais limitados.
Aves
Das 104 espécies de aves cuja ocorrência foi atribuída para a Paisagem Protegida de
Corno do Bico, cinco estão incluídas no grupo de 25 vertebrados com os VEEs mais
Plano de Ordenamento e Gestão da Paisagem Protegida de Corno do Bico
20
elevados. Este número de espécies é relativamente reduzido tendo em conta a maior
riqueza específica da Classe das Aves face aos restantes vertebrados, ou a situação
noutras Áreas Protegidas.
De realçar a escassez de informação existente, que contrasta também com a situação
noutras PPs, pois frequentemente as aves são o grupo que apresenta maior
informação disponível. Estes resultados podem portanto não ser alheios a esse facto,
sobretudo quando comparados com outras áreas geográficas.
Os dados relativos à fenologia das espécies de aves são também eles bastante
limitados; em todo o caso foram identificadas as espécies que com maior
probabilidade serão ocasionais na área, de forma a excluí-las do processo de
valoração. É possível, contudo, que com a realização de estudos direccionados se
identifiquem ou confirmem mais espécies não-acidentais na área, o que poderá
provocar alterações em futuros processos de valoração de espécies.
À semelhança dos restantes grupos de vertebrados já abordados, os dados utilizados
no processo de valoração das espécies de aves foram provenientes de dois tipos de
fontes: inventariações e bibliografia, incluindo dados não publicados do Novo Atlas das
Aves Nidificantes em Portugal, cedidos pelo ICNB, bem como outros relatórios
(Honrado 2007b) e atlas de distribuição (Rufino 1989). A informação acerca da
distribuição e abundância destas espécies especificamente para a área de Paisagem
Protegida é bastante limitada.
Assim, e um pouco à semelhança dos outros grupos de vertebrados, os valores
ecológicos específicos mais elevados apresentados pelas espécies de aves deveramse principalmente a dois motivos: a apresentarem distribuições restritas em Portugal
ou estatutos de conservação desfavoráveis. De facto, parte das espécies que revelou
VEEs elevados exibe áreas de nidificação reduzidas, concentradas no Norte do país
ou corresponde a aves de rapina, grupo em que muitas espécies apresentam
estatutos de ameaça desfavoráveis.
O picanço-de-dorso-ruivo Lanius collurio é a ave que apresenta o VEE mais elevado
(surge na 7ª posição). Esta espécie apresenta em Portugal uma área de nidificação
muito restrita, limitada às áreas montanhosas do extremo Norte e também a alguns
vales dos rios Minho, Coura, Lima e Cávado (Reino 2004). As serranias minhotas,
pertencentes aos concelhos de Paredes de Coura, Arcos de Valdevez, Ponte de Lima,
onde se insere a Área de Paisagem Protegida, consistem na área de distribuição de
um dos quatro núcleos principais desta espécie em Portugal (Reino 2004). O Livro
Plano de Ordenamento e Gestão da Paisagem Protegida de Corno do Bico
21
Vermelho
dos
Vertebrados
de
Portugal
considera-a
“Quase
Ameaçada”,
essencialmente por apresentar uma população reduzida (Cabral et al. 2005). Parece
haver, contudo, evidências de que terá sofrido declínios consideráveis em algumas
áreas, por exemplo no concelho de Ponte de Lima (Reino 2004). Estes declínios
poderão muito provavelmente ser atribuídos a alterações no uso do solo ou, mais
concretamente, nas práticas agrícolas, que terão tido como consequência uma
diminuição na diversidade florística e na entomofauna (Reino 2004).
Ocorrem mais quatro espécies de aves nos 25 VEEs mais elevados: o noitibó-cinzento
C. europaeus, o cruza-bico Loxia curvirostra, o falcão-abelheiro Pernis apivorus e o
tartaranhão-caçador Circus pygargus; estas surgem, respectivamente, nas 13ª, 14ª,
15ª e 24ª posições.
Estima-se que as populações de noitibó-cinzento se encontrem em declínio, bem
como o seu habitat, o que lhe justificou a atribuição do estatuto “Vulnerável” (Cabral et
al. 2005). É um possível nidificante na Área de Paisagem Protegida, que inclui alguns
dos seus habitats preferenciais.
O cruza-bico Loxia curvirostra é uma espécie que apresenta uma área de nidificação
em Portugal muito reduzida, cujo efectivo reprodutor se estima inferior a 250
indivíduos maduros (Cabral et al. 2005). Embora a população nidificante pareça
estável (Cabral et al. 2005), é uma espécie cuja nidificação é frequentemente irregular,
padrão que se verifica ao longo de toda a sua área de distribuição (Rufino 1989).
Sendo Portugal o limite sul de distribuição da espécie (Cabral et al. 2005), a sua
presença na Paisagem Protegida reveste-se de particular interesse.
O falcão-abelheiro é uma espécie com população reduzida em Portugal (Cabral et al.
2005); dado a PP apresentar habitat bastante propício à sua ocorrência e nidificação,
esta última foi considerada possível na área de Paisagem Protegida. A sua escassez
populacional levou a que lhe fosse atribuído o estatuto “Vulnerável” em Portugal
(Cabral et al. 2005).
O tartaranhão-caçador é um nidificante escasso em Portugal, embora se distribua, em
geral, pela maior parte do território nacional (Onofre & Rufino 1995). Nidifica na
Paisagem Protegida de Corno do Bico, onde encontra habitat propício, que no Norte
do país consiste sobretudo em matos de urze, tojo ou giesta ou searas de centeio
(Onofre & Rufino 1995). Tem o estatuto “Vulnerável”, segundo o Livro Vermelho dos
Vertebrados de Portugal (Cabral et al. 2005).
Plano de Ordenamento e Gestão da Paisagem Protegida de Corno do Bico
22
Mamíferos
Tal como para os grupos anteriores, a informação disponível relativa aos mamíferos
da Paisagem Protegida de Corno do Bico é bastante limitada. As principais fontes de
informação utilizadas foram provenientes de inventariações dirigidas (Espaço Terra
2004 e Honrado 2007b, fazendo este último uma compilação dos dados disponíveis),
atlas de distribuição (Mathias 1999) e consulta de especialistas (H. Rebelo,
com.pess.).
Entre as 25 espécies que apresentam os VEEs mais elevados encontram-se oito
espécies de mamíferos, que incluem a espécie de maior valor ecológico específico,
calculado entre todos os vertebrados da PP: a toupeira-d’água Galemys pyrenaicus. A
toupeira-d’água ocorre no Norte e Centro de Portugal, Norte de Espanha e Pirenéus
franceses (Mathias 1999). É muito especializada em termos de selecção de habitat,
distribuindo-se pelos cursos de água da zona salmonícola e da transição salmonícolaciprinícola (Cabral et al. 2005), nomeadamente os da Área da Paisagem Protegida de
Corno do Bico. Apresenta estatutos de ameaça desfavoráveis tanto a nível nacional
como internacional.
O lobo Canis lupus apresenta o 4º VEE mais elevado das espécies de vertebrados.
Embora não seja uma espécie especialista em termos de habitat, o seu estatuto de
ameaça em Portugal - “Em Perigo” (Cabral et al. 2005) - e a perseguição de que é
alvo, tornam-no uma espécie prioritária em termos de conservação. A alteração e
fragmentação dos seus habitats consistem também em ameaças bastante relevantes
(ICNB dados não publicados). A população que ocorre na Paisagem Protegida de
Corno do Bico faz parte do núcleo de Arga/Paredes de Coura, destacando-se neste
núcleo a importância da sua conectividade com o núcleo do Parque Nacional da
Peneda-Gerês (Álvares 1998, Álvares et al. 2000).
O morcego-negro Barbastella barbastellus ocorre na 8ª posição da lista de valoração.
É uma espécie à qual foi atribuído o estatuto “Informação Insuficiente” pelo Livro
Vermelho dos Vertebrados de Portugal (Cabral et al. 2005), pois é grande o
desconhecimento acerca da sua distribuição, ecologia e tendência populacional.
Recentemente tem sido alvo de estudos dirigidos que permitiram aumentar de forma
significativa o volume de conhecimento acerca da espécie em Portugal. É uma espécie
Plano de Ordenamento e Gestão da Paisagem Protegida de Corno do Bico
23
florestal associada a florestas de folhosas bem desenvolvidas (Cabral et al. 2005),
nomeadamente carvalhais. Trabalhos recentes de inventariação revelaram que ocorre
numa área muito próxima da Paisagem Protegida, no rio Cabrão (H. Rebelo, com.
pess.). A Paisagem Protegida de Corno do Bico possui igualmente boas condições de
habitat para a ocorrência da espécie. Está em declínio pela sua área de distribuição
global, tendo-lhe sido atribuído o estatuto “Vulnerável” pela IUCN (IUCN 2007).
O morcego-de-ferradura-pequeno Rhinolophus hipposideros aparece na 17ª posição,
sendo uma espécie que se pensa ter uma população reduzida e que se admite ter
vindo a sofrer um declínio continuado, estando por isso classificada como “Vulnerável”
pelo Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal (Cabral et al. 2005). Considerou-se
que tinha uma ocorrência provável numa área muito próxima da Área Protegida, no rio
Cabrão, com base numa inventariação efectuada com gravações com detector de
ultra-sons (H. Rebelo com. pess.).
O morcego-lanudo Myotis emarginatus ocorre na posição seguinte, 18ª, e à
semelhança do morcego-negro é uma espécie acerca da qual existe um grande
desconhecimento acerca da sua distribuição e ecologia. Apresenta assim o estatuto
“Informação Insuficiente” segundo o Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal
(Cabral et al. 2005). Pensa-se que em Portugal terá uma população reduzida, bem
como um número muito reduzido de colónias (Cabral et al. 2005). Devido à área de
Paisagem Protegida apresentar um habitat propício para a espécie, considerou-se que
a sua reprodução aqui é possível. A nível global o morcego-lanudo está em declínio e
é considerado “Vulnerável” (IUCN 2007).
Ainda incluídos na lista das 25 espécies mais valoradas encontram-se o gato-bravo
Felis silvestris, o morcego-rato-grande Myotis myotis e o morcego-de-ferradura-grande
Rhinolophus ferrumequinum, respectivamente nas 20ª, 21ª e 25ª posições. O gatobravo é considerado “Vulnerável” segundo o Livro Vermelho dos Vertebrados de
Portugal, visto ter sofrido um decréscimo de cerca de 30% nos últimos 24 anos (Cabral
et al. 2005). A Paisagem Protegida de Corno do Bico apresenta condições de habitat
bastante propícias para esta espécie, visto que surge associada a bosques de
caducifólias (Cabral et al. 2005). O morcego-rato-grande está também classificado
como Vulnerável segundo o Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal, devido a
apresentar uma área de ocupação reduzida e se admitir um declínio continuado ao
longo dos últimos anos (Cabral et al. 2005). Não se conhecem colónias de reprodução
desta espécie na Paisagem Protegida, mas poderá utilizá-la como área de
Plano de Ordenamento e Gestão da Paisagem Protegida de Corno do Bico
24
alimentação. Por fim, o morcego-de-ferradura-grande, à semelhança da espécie
anterior, está classificado como Vulnerável segundo o Livro Vermelho dos Vertebrados
de Portugal, devido a apresentar uma população pequena e se admitir um declínio
continuado dos seus efectivos e da qualidade do habitat ao longo dos últimos anos
(Cabral et al. 2005).
Síntese dos resultados de valoração faunística
Ordenando as 183 espécies de vertebrados terrestres não-acidentais em função dos
VEE calculados anteriormente, verifica-se que 32% das 25 primeiras espécies da lista
são mamíferos, 20% são aves, também 20% são répteis, 16% são anfíbios e 12% são
peixes. Como foi já referido, a percentagem de aves nas posições cimeiras é
relativamente reduzida face à situação de outras Áreas Protegidas, o que estará
indubitavelmente associado, entre outros motivos, com a disponibilidade de habitats
específica.
A representação, relativamente homogénea, de todos os grupos de vertebrados,
sobretudo terrestres - entre os 20 VEEs mais elevados, sugere que o algoritmo e os
coeficientes de ponderação utilizados não estão a enviesar os resultados, favorecendo
uns grupos em detrimento de outros.
Curiosamente, numa Área Protegida cujos habitats dominantes e mais característicos
não são zonas húmidas, 9 das 25 espécies com maior VEE estão, em maior ou menor
grau, associadas ao meio aquático. Isto sugere uma grande importância destes
habitats no contexto global da Paisagem Protegida de Corno do Bico.
As maiores fraquezas desta ordenação foram sendo referidas no texto respeitante a
cada grupo taxonómico. Não se considerou adequado, por exemplo, considerar-se
como espécies altamente prioritárias na área de estudo aquelas que revelaram uma
ocorrência ocasional.
No entanto, por uma questão de precaução, aquelas que apresentam uma ocorrência
(ou nidificação) possíveis na área de Paisagem Protegida, sobretudo com base nas
suas preferências de habitat e distribuição geral, têm que ser consideradas nos
processos de valoração, sob pena de se ignorarem espécies potencialmente
importantes do ponto de vista de conservação. Em todo o caso, é possível que mesmo
que não ocorram ou não se reproduzam na área no presente, ou que o façam
Plano de Ordenamento e Gestão da Paisagem Protegida de Corno do Bico
25
esporadicamente, o venham a fazer no futuro, caso as condições ecológicas
melhorem, o que deverá e poderá ser impulsionado pelo presente Plano de
Ordenamento.
Devido a estes problemas, os VEE obtidos com a metodologia aplicada foram
considerados apenas uma primeira aproximação na definição do valor de conservação
da fauna da área de estudo, sendo os resultados da análise conjugados com
informação biológica e ecológica complementar. Em particular, considerou-se a
relevância da Paisagem Protegida de Corno do Bico na conservação das espécies,
eliminando espécies que apenas estão presentes durante curtos períodos durante as
migrações ou que ocorrem de forma marginal ou acidental.
Com base na conjugação dos VEE com a avaliação qualitativa, identificaram-se 25
espécies de conservação prioritária na Paisagem Protegida de Corno do Bico (Anexo
IV). Estas espécies incluem 3 peixes, 4 anfíbios, 5 répteis, 5 aves e 8 mamíferos.
Valor Faunístico dos Biótopos (VFB)
A valoração de biótopos foi efectuada com base numa adaptação da metodologia
proposta no Caderno de Encargos, de forma a ultrapassar as limitações de informação
existentes. De facto, para a maioria das espécies, é desconhecido o seu grau de
dependência dos diferentes biótopos, pelo que seria impossível a sua utilização. Em
consequência, as análises foram baseadas essencialmente nas 25 espécies
consideradas de conservação prioritária (Anexo IV). Foram excluídas espécies
acidentais e espécies para as quais a gestão do biótopo seja pouco importante para a
sua conservação. A fórmula utilizada para o cálculo dos VFB foi portanto:
VFB = ∑ VEE ,
em que VEE são os Valores Ecológicos para cada uma das espécies utilizadas na
valoração dos biótopos. Optou-se por não utilizar o número de espécies como factor
de ponderação adicional, uma vez que não existem dados objectivos que permitam
estimar a riqueza específica de cada biótopo. Uma vez calculados os VFB, procedeuse à hierarquização dos biótopos em termos da sua importância para a conservação
da fauna, considerando quatro níveis de classificação: Excepcional, Alta, Média e
Baixa.
Plano de Ordenamento e Gestão da Paisagem Protegida de Corno do Bico
26
Os resultados deste processo de valoração de biótopos são indicados na Carta [28].
Como biótopos de interesse Excepcional surgem os bosques de caducifólias. Esta
valoração resulta sobretudo da sua grande importância para um elevado número de
espécies (17 das 25 espécies prioritárias), das diversas classes de vertebrados.
As zonas agrícolas e pastagens, os matos e os bosques ripícolas são classificados
com relevância Alta. Também nestes biótopos ocorre um grande número de espécies,
de todas as classes de vertebrados terrestres. Não albergam, contudo, espécies tão
ameaçadas ou neles ocorre um número inferior destas espécies, em comparação com
os biótopos excepcionais.
Com um valor Médio foram classificados os rios colinos e os pinhais. Os rios colinos
são biótopos vitais para algumas das espécies mais valoradas da Paisagem Protegida
(nomeadamente para aquelas que ocorrem na 1ª e 2ª posições, a toupeira-de-água e
a panjorca), que deles têm uma dependência estrita. De facto, e ao contrário da
maioria das espécies incluídas na lista dos 25 VEEs mais elevados, estas ocorrem
apenas neste biótopo. A sua classificação com importância média deriva assim,
apenas, de albergar um menor número de espécies que os restantes, mas há que
realçar o facto das espécies que lá ocorrem serem de grande prioridade de
conservação. Os pinhais são importantes para algumas espécies, que em geral
ocorrem também noutros biótopos, à excepção do cruza-bico, uma espécie muito
associada a estes povoamentos florestais. O valor Baixo foi atribuído a biótopos mais
humanizados, os eucaliptais e as zonas urbanas. Ainda assim ocorrem aqui espécies
de conservação prioritária, embora muito poucas, que estão associadas a
povoamentos florestais, incluindo-se nestes os de eucalipto, ou então que utilizam
zonas urbanas para se alimentarem (caso do noitibó-cinzento).
Áreas de especial interesse para espécies prioritárias da fauna
Conforme requerido no Caderno de Encargos, a distribuição na Paisagem Protegida
de certas espécies de fauna foi alvo de representação individual numa “Carta de locais
de especial interesse para espécies prioritárias da fauna” (Carta [29]). Essas espécies
foram seleccionadas de acordo com os critérios indicados no Caderno de Encargos:
•
Espécies prioritárias no âmbito do Dec.-Lei nº 140/99, de 24 de Abril. No elenco
faunístico da Paisagem Protegida existe apenas uma espécie de mamífero abrangida
Plano de Ordenamento e Gestão da Paisagem Protegida de Corno do Bico
27
por este critério: o lobo. Esta espécie é bastante bem conhecida em termos de áreas
de ocorrência, e sabe-se que existe um núcleo que utiliza a área de Paisagem
Protegida, embora de forma marginal (ICNB dados não publicados). No entanto, visto
que é bastante generalista no que diz respeito à selecção de habitat, não se
considerou ser muito adequada para a definição de áreas de especial interesse, que
são à partida mais vocacionadas para identificar zonas pontuais de importância muito
elevada.
•
Espécies que se destacaram pelos respectivos Valores Ecológicos Específicos
estimados. Este critério levou-nos a definir locais de especial interesse para espécies
como a toupeira-de-água, a salamandra-lusitânica, o lagarto-de-água e o tartaranhãocaçador. O bufo-real Bubo bubo, embora não esteja incluído nas 25 espécies mais
valorizadas, foi também alvo de delimitação de locais de especial interesse, dado que
tem uma ocorrência relativamente localizada na Paisagem Protegida e ocupa ainda
assim a 35ª posição na lista dos VEEs. É uma espécie com estatuto “Quase
Ameaçada” segundo o Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal (Cabral et al.
2005) e pertencente ao anexo I da Directiva Aves, pelo que se considerou justificável a
delimitação de áreas prioritárias para a sua conservação.
Outras espécies apresentam valores de VEE que justificariam a delimitação de áreas
prioritárias para a conservação; no entanto, o reduzido conhecimento acerca das suas
áreas de distribuição, por um lado, ou a sua associação a biótopos específicos, por
outro, não permitiram, ou não se adequaram, respectivamente, à sua delimitação. No
último caso os biótopos relevantes encontram-se suficientemente valorizados, e dada
a sua forte associação aos biótopos em causa, considerou-se não se justificar a
delimitação de áreas prioritárias específicas.
•
Singularidades (sensu Palmeirim et al. 1994). Este critério, individualmente, não
nos levou a considerar nenhuma espécie para efeitos da carta de locais de especial
interesse para espécies prioritárias de fauna, apesar de eventualmente algumas das
espécies seleccionadas pelos dois critérios anteriores, tal como outras pertencentes
ao elenco faunístico da área em questão, possuírem provavelmente algumas
características particulares. No entanto, o reduzido conhecimento acerca da ecologia e
biologia das espécies faunísticas do Corno do Bico resulta na quase inexistência de
informações acerca de singularidades que estejam eventualmente presentes.
Plano de Ordenamento e Gestão da Paisagem Protegida de Corno do Bico
28
Pode-se ainda assim realçar uma característica biogeográfica da área que se pode
considerar uma singularidade: consiste no limite de distribuição sudoeste do picançode-dorso-ruivo, uma espécie de distribuição euro-siberiana. É possível que constitua
também o limite biogeográfico de outras espécies com o mesmo tipo de limite de
distribuição, contudo a escassez de dados não permite apontar outros exemplos.
Existe também uma singularidade taxonómica que é de destacar, nomeadamente a
ocorrência de uma espécie de peixe dulciaquícola. A boga-comum, anteriormente
designada por Chondrostoma polylepis, foi recentemente subdividida em três espécies
distintas (segundo informação do Plano Sectorial Rede Natura 2000), sendo que a que
ocorre na área de Paisagem Protegida é Chondrostoma duriense. Trata-se de um
endemismo ibérico que em Portugal se distribui apenas nas bacias do Douro e da
Galiza (Doadrio 2001).
•
Espécies de invertebrados. Tal como foi já referido, não é de todo possível
aplicar os critérios de valoração utilizados para os vertebrados às espécies de
invertebrados, por motivos descritos no início da secção 2.2.2 Valoração da fauna
terrestre. Este facto tem como consequência a impossibilidade da valorar os biótopos
com base nestas espécies. O desconhecimento das áreas de ocorrência específicas
das espécies de invertebrados para as quais existem dados de localização não
permitiu igualmente a delimitação de áreas prioritárias para a fauna para espécies de
invertebrados com importância para a conservação.
A delimitação dos locais de especial interesse para espécies prioritárias de fauna
seguiu as distribuições apresentadas por Honrado (2007a, 2007b), bem como dados
do ICNB (não publicados) e cartografia associada, onde são descritas as metodologias
detalhadas aplicadas. Seguidamente, apresenta-se para cada espécie uma descrição
breve do procedimento adoptado no mapeamento da respectiva distribuição local para
a elaboração da carta de locais de especial interesse para espécies prioritárias de
fauna.
Toupeira-de-água (Galemys pyrenaicus)
A toupeira-de-água é muito especializada em termos de selecção de habitat. Tem uma
distribuição restrita tanto a nível global como no território continental. Ocorre apenas
em algumas das linhas de água da Paisagem Protegida (ICNB dados não publicados),
tendo estas sido definidas como áreas prioritárias para a fauna.
Plano de Ordenamento e Gestão da Paisagem Protegida de Corno do Bico
29
Salamandra-lusitânica (Chioglossa lusitanica)
A salamandra-lusitânica é um endemismo ibérico que apresenta elevados requisitos
ecológicos e encontra-se muito dependente de ambientes saturados em humidade
(Almeida et al. 2001). Ocorre na área de Paisagem Protegida associada a riachos,
pequenos canais ou junto a nascentes de água (Espaço Terra 2004). Os dados de
distribuição disponíveis apontam para a sua ocorrência em duas linhas de água que
foram delimitadas como áreas prioritárias (Honrado, 2007a, 2007b).
Lagarto-d’água (Lacerta schreiberi)
O lagarto-d’água é um endemismo ibérico que ocupa essencialmente zonas húmidas,
embora em regiões de elevada pluviosidade, como a PP, possa afastar-se das
margens das linhas de água (Espaço Terra 2004). Foi identificada uma linha de água
como importante para esta espécie, comum a uma área de ocorrência da salamandralusitânica, que foi definida como local de especial interesse para a fauna.
Tartaranhão-caçador (Circus pygargus) e Bufo-real (Bubo bubo)
O tartaranhão-caçador é uma espécie nidificante relativamente rara na Paisagem
Protegida de Corno do Bico, distribuindo-se essencialmente pelo seu extremo
noroeste (Honrado, 2007a, 2007b). O bufo-real, possível nidificante, apresenta o
mesmo tipo de padrão de distribuição, ocorrendo nalgumas zonas comuns, noutras
adjacentes (Honrado, 2007a, 2007b). Ambas as espécies possuem elevados estatutos
de ameaça a nível nacional e por conseguinte justifica-se plenamente a definição de
locais de especial importância a elas dirigidas na PP.
Carta de valores faunísticos
A carta de valoração faunística dos biótopos (Carta 28), foi cruzada com a carta de
locais de especial interesse para espécies prioritárias (Carta 29), por forma a produzir
a carta final de valores faunísticos (Carta [30]). Para esta combinação, considerou-se a
categoria adicional correspondente ao “Valor Crítico”, englobando os biótopos
faunísticos de valor Alto ou Excepcional coincidentes com locais de especial interesse
para espécies prioritárias. Nesta carta final, os ambientes artificializados não foram
valorizados, devido ao seu reduzido interesse para conservação (Carta [30]).
Plano de Ordenamento e Gestão da Paisagem Protegida de Corno do Bico
30
Esta Carta identifica claramente como as áreas mais importantes para a fauna uma
área no extremo noroeste da PP, ocupada por carvalhais e mosaico agro-florestal,
bem como duas linhas de água que albergam espécies definidas como prioritárias do
ponto de vista de conservação.
As restantes áreas não apresentam valorações significativamente diferentes em
relação às cartas de valor faunístico dos biótopos (Carta [28]).
2.3. Síntese dos valores naturais
A carta síntese dos valores naturais (Carta [31]) foi elaborada através da combinação
da carta de valores florísticos e de vegetação (Carta [27]) e da carta de valores
faunísticos (Carta [30]). Optou-se por não incluir nesta síntese os valores físicos,
devido à dificuldade de os combinar objectivamente com os valores biológicos. Para
além disso, os valores físicos foram definidos com base em grandes manchas
homogéneas, tendendo portanto a fazer os valores biológicos perder discriminação
espacial.
Para proceder à combinação das cartas, começou-se por atribuir pontos aos valores
de relevância identificados em cada uma das cartas individuais: 0 – áreas
artificializadas; 1 – Valor Baixo; 2 – Valor Médio; 3 – Valor Alto; 4 – Valor Excepcional;
5 – Valor Crítico. As pontuações dadas às cartas da flora e da fauna foram então
somadas, obtendo-se uma pontuação que pretende traduzir o valor natural global de
cada polígono. Optou-se por não categorizar de novo estes valores, por forma a obter
maior discriminação entre áreas com valores próximos.
Esta carta deve ser interpretada com cautela, uma vez que perde parte da informação
presente nas cartas originais. Por exemplo, é impossível saber se um dado valor
médio é obtido devido à flora e à fauna também apresentarem valores médios, ou
devido a uma delas apresentar um valor elevado e a outra apresentar um valor
reduzido. Para resolver este problema, poderia ter-se optado por atribuir a cada
polígono o valor máximo encontrado para a fauna e a flora. Este procedimento iria,
contudo, diminuir a capacidade de discriminação entre áreas, uma vez que
frequentemente as áreas de maior valor florístico e faunístico não são coincidentes.
A carta síntese mostra como valores naturais mais relevantes algumas linhas de água,
algumas áreas agrícolas e bosques de folhosas. As zonas menos valorizadas são as
Plano de Ordenamento e Gestão da Paisagem Protegida de Corno do Bico
31
áreas mais artificializadas e suas envolventes. Numa posição intermédia estão outras
áreas agrícolas, os restantes bosques de folhosas e os matos.
Plano de Ordenamento e Gestão da Paisagem Protegida de Corno do Bico
32
3. VALORES PAISAGÍSTICOS
A estimativa e cartografia dos valores paisagísticos (Carta [32]) foram efectuadas de
acordo com a metodologia proposta no Caderno de Encargos, através de um sistema
de pontuações atribuídas a cada Unidade de Paisagem, em função de três parâmetros
complementares:
•
Diversidade (Nenhuma – 0; Pouca – 1; Razoável – 2; Muita – 3) – parâmetro
que traduz principalmente o valor biológico e ecológico da paisagem, sendo
atribuídas pontuações em função dos níveis de diversidade e raridade
associados às comunidades vegetais, à fauna e aos habitats mais relevantes, e
à presença de endemismos;
•
Harmonia (Nenhuma – 0; Pouca – 1; Razoável – 2; Muita – 3) – parâmetro que
traduz o valor estético da paisagem em função de critérios algo subjectivos,
como sejam, a Ordem (estabilidade da utilização do território e o equilíbrio das
condições ecológicas) e a Grandeza (bacias visuais e valor dos cenários);
•
Identidade (Nenhuma – 0; Pouca – 1; Razoável – 2; Muita – 3) – parâmetro que
traduz o carácter único da paisagem em função das suas características
naturais e da presença de símbolos de valor histórico-cultural.
Segundo o caderno de encargos, é proposta a atribuição dos níveis “Excepcional” e
“Relevante” às unidades com maior valor paisagístico, não sendo as restantes
classificadas. No presente trabalho, contudo, considerou-se que esta divisão era
demasiado redutora, uma vez que nas unidades não classificadas existiam valores
claramente diferentes em termos paisagísticos. Em particular, existiam unidades que
não tendo um valor extraordinário a nível nacional, assumiam bastante importância na
contextualização da Paisagem Protegida de Corno do Bico a nível regional. Para estas
unidades criou-se assim o nível “Agradável”, que corresponde a um nível
imediatamente inferior ao “Relevante” definido no Caderno de Encargos. Para as
restantes unidades manteve-se a opção de não as classificar, conforme proposto no
Caderno de Encargos.
A valoração das Unidades de Paisagem, identificadas no Relatório de Caracterização,
é apresentada no Anexo VI. Esta análise valorizou principalmente as Unidades de
Plano de Ordenamento e Gestão da Paisagem Protegida de Corno do Bico
33
maior relevo, que proporcionam grandeza assinalável de cenários, ou paisagens
menos fragmentadas com valores de diversidade apreciáveis. Assim, consideraram-se
de Valor Relevante a Mata de Corno do Bico, os Campos de Parada e as Encostas de
Vilares.
Com uma relevância regional, e portanto classificados com o nível Agradável, foram
identificados os Campos de Sobreiras, as Encostas de Travanca e a Mata do Cristelo.
Estas Unidades estão associadas essencialmente a valores intermédios de harmonia
e identidade. Apresentam uma humanização, em geral, média; o relevo varia de
ondulado a muito ondulado.
Relativamente às restantes Unidades de Paisagem, foram dadas pontuações mais
baixas; esta opção não resulta em todos os casos de valores paisagísticos
intrinsecamente baixos, mas da necessidade de adoptar escalas comparativas, em
que os valores máximos foram atribuídos a unidades de carácter excepcional. De
qualquer forma estas unidades apresentam de uma forma geral uma paisagem
degradada, ou cujo carácter não exibe nenhuma particularidade estreitamente
associada com a área em questão.
Plano de Ordenamento e Gestão da Paisagem Protegida de Corno do Bico
34
4. VALORES CULTURAIS
A Paisagem Protegida de Corno do Bico apresenta um património cultural assinalável.
Os valores culturais mais relevantes serão provavelmente de dois tipos: a actividade
agrícola e pastoril que moldou a paisagem, proporcionando marcas únicas com valor
do ponto de vista de conservação como sejam os lameiros; e vestígios arqueológicos
do período do Neo-Calcolítico, as mamoas, uma marca muito característica da região
pela sua abundância.
Em termos arquitectónicos os elementos mais importantes serão alguns exemplos de
arquitectura religiosa, no entanto os mais relevantes do concelho situam-se fora da
área da Paisagem Protegida.
As manifestações etnográficas mais relevantes são as relacionadas com as
actividades agrícola e pecuária, que produziram marcas muito características na
paisagem, como os “canastros” ou espigueiros para armazenamento e secagem de
cereais (www.cm-paredes-coura.pt). O cultivo do milho é também uma marca muito
relevante da região, patente na gastronomia e também num conjunto de edifícios de
armazenamento e transformação (www.cm-paredes-coura.pt). Paredes de Coura
conta com mais de centena e meia de moinhos e um incontável número de
espigueiros em madeira, pedra e tijolo (www.cm-paredes-coura.pt). Associado ao
abandono da agricultura, verifica-se o abandono progressivo deste património,
estando em curso alguns projectos de recuperação de alguns núcleos mais
significativos (www.cm-paredes-coura.pt).
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35
5. VALORES SOCIOECONÓMICOS
5.1. Sector primário
As actividades económicas do sector primário da zona de Paisagem Protegida de
Corno do Bico consistem na agricultura, pecuária e exploração florestal (ICNB dados
não publicados). A região é caracterizada pela sua ruralidade; de acordo com o INE
(1991) o sector primário ocupa cerca de 47% da população activa.
O valor sócio-económico associado a cada uma destas actividades é desconhecido,
uma vez que não existem dados actualizados que permitam caracterizar estas
actividades de forma adequada.
Pode-se considerar que a actividade sócio-económica de maior destaque é a
agricultura, por consistir ainda no maior sector empregador (ICNB dados não
publicados).
Na Paisagem Protegida a caça é praticada em dois tipos de regime cinegético: o
Regime Cinegético “Terreno Livre” e o Regime Cinegético Especial, do qual faz parte a
Zona de Caça Associativa de Travanca (Processo n.º 2306 da Direcção Geral das
Florestas) que é gerida pela Associação de Caçadores do Alto Minho. O coelho bravo
é a espécie cinegética mais relevante (Soares, 2001).
A pesca é também praticada na área, sendo encontrando-se concessionado para
pesca desportiva o troço da confluência do rio dos Cavaleiros com a ribeira de Reiriz,
sob gestão da Câmara Municipal de Paredes de Coura, estando sujeitos a exploração
cerca de 1000 lotes. As espécies exploradas são a Boga, a Truta, o Escalo e a Enguia,
esta última desaparecida após a construção da barragem do rio Coura (Pedro
Rodrigues, com. pes.).
Não é possível contudo estabelecer neste momento a valorização relativa destas
actividades, dada a inexistência de dados quantitativos adequados.
Plano de Ordenamento e Gestão da Paisagem Protegida de Corno do Bico
36
5.2. Sector secundário
Nas freguesias que integram a Paisagem Protegida de Corno do Bico a construção
civil é a única actividade do sector secundário desenvolvida a destacar (ICNB dados
não
publicados).
O
valor
sócio-económico
associado
a
esta
actividade
é
desconhecido.
5.3. Sector terciário
O pequeno comércio e a actividade turística são as actividades do sector terciário que
se desenvolvem na área de Paisagem Protegida (ICNB dados não publicados). À
semelhança dos restantes sectores, o valor sócio-económico associado a estas
actividades é desconhecido (ICNB dados não publicados).
Dadas as suas características paisagísticas a Paisagem Protegida possui um potencial
considerável para o desenvolvimento do Turismo em Espaço Rural e para o Turismo
de Natureza, vertentes turísticas que nos últimos anos têm conhecido algum
incremento (ICNB dados não publicados). No perímetro da Paisagem Protegida de
Corno do Bico existem dois alojamentos de turismo rural. O desenvolvimento do
produto Turismo de Natureza, associado à criação da PPCB, fez aumentar o número
de turistas na área (ICNB dados não publicados).
Na área da Paisagem Protegida de Corno do Bico, de acordo com os presentes usos e
com os imperativos de conservação da natureza, poderão definir-se as seguintes
categorias turísticas (por ordem alfabética):
•
Acessos principais - correspondem aos caminhos utilizados pelos visitantes
para acesso aos percursos e às principais áreas edificadas;
•
Áreas de fruição das paisagens naturais - correspondem sobretudo às áreas de
maior atractivo paisagístico, geralmente de maior altitude. Devido à
sensibilidade de alguns dos ecossistemas, a actividade turística deverá ser
limitada nalguns locais. Apesar disso, esta área poderá ser utilizada para
Plano de Ordenamento e Gestão da Paisagem Protegida de Corno do Bico
37
algumas actividades tais como percursos de interpretação dos espaços
naturais;
•
Áreas degradadas - correspondem a espaços degradados pelas actividades
humanas, que frequentemente representam factores negativos para a
apreciação da paisagem. Desta forma, são áreas que se considera essencial
recuperar de forma a valorizar a aptidão turística da Paisagem Protegida;
•
Áreas de recreio peri-urbanas - correspondem às áreas florestais e agrícolas,
envolventes aos principais aglomerados populacionais da Paisagem Protegida;
•
Observação da vida selvagem - corresponde às áreas favoráveis para a
observação da vida selvagem. Estes locais têm elevada sensibilidade à
perturbação humana, pelo que a sua utilização deverá ser baseada em postos
de observação que se venham a revelar adequados;
•
Percursos na natureza - correspondem à rede de caminhos secundários e
percursos da Paisagem Protegida, que constituem ou poderão constituir os
principais eixos de acesso para visitantes integrados em percursos de
interpretação dos espaços naturais, passeios pedestres, etc.;
•
Turismo no espaço rural - corresponde às áreas agrícolas da Paisagem
Protegida. A área poderá ter alguma aptidão para o turismo no espaço rural,
com base nalguma capacidade de acomodação que possa ser proporcionada
através da conservação e recuperação do património construído. O
aproveitamento das referências arquitectónicas deve recuperar, integrar,
respeitar e enaltecer a arquitectura tradicional como um elemento fundamental
da paisagem. Poderão ser proporcionadas ao visitante actividades de
interpretação do espaço rural. A capacidade de carga desta secção deverá ser
estudada em função dos constrangimentos ambientais.
5.4. Benefícios indirectos
Os principais benefícios indirectos resultantes dos serviços prestados pelos
ecossistemas da Paisagem Protegida relacionam-se principalmente com a produção
directa e indirecta das florestas de folhosas (madeira, lenha, pastorícia, produção de
cogumelos, produção de plantas aromáticas, agricultura, apicultura e exploração
Plano de Ordenamento e Gestão da Paisagem Protegida de Corno do Bico
38
cinegética). Para além disso, as características paisagísticas da Paisagem Protegida
tornam esta área particularmente atractiva para o Turismo de Natureza e de Ar Livre,
actividade que se tem iniciado em anos recentes.
Plano de Ordenamento e Gestão da Paisagem Protegida de Corno do Bico
39
6. VALORES INTRÍNSECOS DO SÍTIO
Globalmente, os valores da Paisagem Protegida de Corno do Bico relacionam-se
principalmente com a presença de bosques de folhosas bem preservados, aos quais
estão associados habitats e espécies de conservação prioritária, bem como os rios
colinos e a alguns matos.
Para alguns destes habitats e espécies associadas a Paisagem Protegida constitui
uma área relevante para a sua conservação a nível nacional e internacional (Cabral et
al. 2005, Honrado 2007a, b). Para além disso, estes ambientes constituem unidades
interessantes para o desenvolvimento de estudos científicos e de gestão aplicada,
direccionados às formações vegetais mais relevantes. Estes estudos seriam de toda a
relevância, tanto mais que existem grandes lacunas de conhecimento que interessaria
colmatar a fim de esclarecer de forma mais sustentada o real valor da Paisagem
Protegida para as áreas em causa. Outras actividades como o turismo de natureza
deverão também ser consideradas como mais-valias no planeamento e gestão da
Paisagem Protegida.
Em termos naturais, e em termos de comunidades vegetais, que nestes casos
específicos se sobrepõem com os biótopos e usos do solo, os bosques de folhosas
são indubitavelmente um dos valores mais importantes da Paisagem Protegida,
contribuindo simultaneamente para a conservação de habitats e espécies faunísticas
ameaçadas e para a valorização sócio-económica associada à sua produção. Alguns
matos de maior valor de conservação, constituem igualmente valores de grande
relevância, bem como algumas linhas de água, devido aos valores florísticos e
faunísticos que apresentam, bem como à sua mais-valia no que diz respeito à
disponibilização de recursos hídricos. De destacar ainda a presença de uma turfeira,
habitat muito raro a nível nacional que alberga algumas espécies florísticas muito
ameaçadas.
As zonas de agricultura e produção florestal mais intensiva, nomeadamente resinosas,
e as zonas mais humanizadas são os habitats menos interessantes da Paisagem
Protegida. Apesar disso, podem ocorrer pontualmente nessas áreas algumas espécies
com valor de conservação e regionalmente relevantes (caso do noitibó-cinzento).
Plano de Ordenamento e Gestão da Paisagem Protegida de Corno do Bico
40
Floristicamente, entre as espécies presentes na área de estudo, pode-se destacar
Bruchia vogesiaca como a mais relevante, já que foi detectada apenas num habitat de
ocorrência única na área, a turfeira de Lameiro das Cebolas, sendo esta uma das
escassas populações portuguesas conhecidas. Bryoerythrophyllum campylocarpum,
Veronica micrantha, Narcissus cyclamineus e Festuca summilusitana também devem
ser destacadas, já que todas pertencem ao Anexo II da Directiva Habitats, apresentam
um grau de raridade de assinalar e possuem algum grau de endemismo. B.
campylocarpum, apesar de ter uma distribuição geográfica global alargada, apresenta
na PP uma das populações mais importantes da Europa ocidental, sendo igualmente
uma das escassas populações portuguesas. V. micrantha N. cyclamineus são
endémicas do noroeste da Península Ibérica e são raras na PP, à semelhança da sua
restante área de distribuição. F. summilusitana é também endémica da Península
Ibérica e, embora seja relativamente frequente no norte e centro de Portugal, é
bastante rara na PP.
De menor importância que as plantas anteriores, é ainda de referir a presença de
Menyanthes trifoliata, Arnica atlantica, Narcissus triandrus e Narcissus bulbocodium.
As primeiras duas possuem populações bastante fragmentadas e estão ameaçadas
pela destruição dos habitats turfosos, enquanto as restantes estão ameaçadas pela
colheita excessiva.
Em termos de comunidades vegetais, as turfeiras colinas, os rios colinos, os mosaicos
agro-florestais, os mosaicos colinos e os bosques de carvalho são as comunidades
mais importantes na área, sendo que as turfeiras apresentam uma fraca
representatividade com apenas um local, em Lameiro das Cebolas. O valor da turfeira
resulta também da ocorrência de várias singularidades florísticas. Os rios colinos
correspondem também a habitats da Directiva e neles ocorrem diversas espécies
raras ou ameaçadas. A importância dos bosques de carvalho deriva da sua
correspondência perfeita com os habitats 9230pt1 e 8220pt3 da Directiva Habitats.
Em termos faunísticos, a principal importância da Paisagem Protegida está
relacionada com espécies de distribuição bastante restrita em Portugal, algumas muito
associadas biogeograficamente ao clima atlântico. Entre as espécies com maior valor
de conservação, destacam-se a toupeira-de-água (Galemys pyrenaicus), a víbora de
Seoane (Vipera seoanei), a panjorca (Chondrostoma arcasii), o lobo (Canis lupus), a
salamandra-lusitânica (Chioglossa lusitanica), o tartaranhão-azulado (Circus cyaneus),
a cobra-lisa-europeia (Coronella austriaca), o picanço-de-dorso-ruivo (Lanius collurio)
Plano de Ordenamento e Gestão da Paisagem Protegida de Corno do Bico
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e o morcego-negro (Barbastella barbastellus), devido ao seu estatuto de ameaça e à
presença de núcleos reprodutores ou invernantes (ICNB dados não publicados,
Honrado 2007a, b, Almeida et al. 2001, Rainho et al. 1998, H. Rebelo com. pess.). Em
todo o caso, seria de toda a conveniência obter dados adicionais sobre a importância
relativa destas e doutras populações de espécies com interesse de conservação, visto
a informação existente ser bastante escassa. A informação para os invertebrados é
ainda mais escassa, existindo alguns registos de ocorrência de espécies raras e
ameaçadas, mas desconhecendo-se quase em absoluto o seu estatuto na Paisagem
Protegida.
As actividades sócio-económicas na Paisagem Protegida têm uma importância
considerável, no sentido em que mantêm determinados habitats que são relevantes
para algumas populações de fauna e flora, nomeadamente algumas práticas agrícolas
e pecuária extensiva. A silvicultura de espécies folhosas autóctones é também
bastante importante. A Paisagem Protegida tem ainda aptidão para o desenvolvimento
do turismo rural e de natureza, nomeadamente para actividades relacionadas com a
interpretação dos espaços naturais e agro-florestais, a realização de passeios a pé, de
bicicleta e a cavalo, a realização de campos de trabalho associados à gestão da
Paisagem Protegida e ao desenvolvimento de trabalhos científicos, etc..
Em resumo, os valores da Paisagem Protegida centram-se nas espécies e habitats
associados aos bosques de folhosas, turfeiras, alguns matos e linhas de água, os
quais têm elevada importância aos níveis regional e, nalguns casos, nacional. Em
termos sócio-económicos, a agricultura desenvolvida na Paisagem Protegida
apresenta um valor regional, promovendo a manutenção de alguns habitats. A
valorização desta componente deverá ser reforçada através de actividades
relacionadas com o eco-turismo. A compatibilização da conservação dos valores
naturais com a gestão agrícola, nomeadamente tendo em conta a tendência de
abandono desta actividade, constitui um dos principais desafios de planeamento e
gestão da Paisagem Protegida.
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