Edição nº 97 - Escola FORTEC-Ed. infantil, fundamental, médio
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Edição nº 97 - Escola FORTEC-Ed. infantil, fundamental, médio
Caro leitor, EDITORIAL ISSN 1982-2898 Diretores Sônia Inakake Almir C. Almeida EDITORA Luiza Oliva COLUNISTAS Cassiano Zeferino de Carvalho Neto Claudio Castro Sanches Emilia Cipriano Maria Irene de Matos Maluf Nílson José Machado COLABORARAM NESTA EDIÇÃO Adalberto Amaral Elaine Kamke Elisandra Cecília Schwanka Gustavo Teixeira Heloísa Lück Heloísa Monte Serrat Barbosa Iracy Maria de Oliveira Boamorte Ivete de Lima Laura Monte Serrat Barbosa Margareth Mariano da Silva Maria Helena Negreiros Nurit Bensusan Regilene Paulina da Cunha Renato Casagrande Sandra Regina do Amaral Sirlândia Reis de Oliveira Teixeira Teuler Reis Direção de Arte Jonas Coronado ASSISTENTE DE ARTE Cristiane Lima Sergio Willian Atendimento ao leitor e circulação Catia Gomes Jornalista Responsável Luiza Oliva MTB 16.935 [email protected] Impressão Prol gráfica Filiada à Apoio O Grupo Direcional apóia: A visita do professor norte-americano Salman Khan ao Brasil, no início do ano, reacendeu as discussões sobre a tecnologia como parceira da aprendizagem. O professor é reconhecido por suas videoaulas de ciências, como matemática, física, química e biologia, além de tópicos de humanidades, como história e história da arte, ciências da computação e economia, disponíveis no canal do You Tube, a Khan Academy, com mais de seis milhões de acessos mensais pela internet. Alguns dos vídeos também estão disponíveis no Portal do Professor do Ministério da Educação. Em encontro com Salman Khan, a presidenta da República, Dilma Rousseff, convidou o professor para desenvolver pesquisas educacionais e materiais pedagógicos específicos para serem usados no processo do Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa. É certo que a tecnologia é ferramenta indispensável na busca pela qualidade de ensino. Mas ela não elimina outros fatores indiscutíveis, como a valorização do professor e de todos os profissionais envolvidos na educação. Um deles, o coordenador pedagógico, é o tema da entrevista desta edição, com a professora Laurinda Ramalho de Almeida, autora de livros da área e especialista no assunto. Os jogos e brincadeiras, estimuladores da aprendizagem, também são abordados nesta edição. É o que mostra o artigo sobre Educação ambiental, De Vladivostok ao Cerrado: jogar para se divertir... e aprender..., assinado por Nurit Bensusan. Como constata a autora, “criar jogos físicos, de papel, de cartas, em tempos de computadores, tabletes e outros equipamentos eletrônicos, é um desafio, mas uma roda de jogo ainda exerce sobre as crianças um fascínio, assim como a natureza. Juntar esses dois elementos pode ajudar na preservação do interesse dessas pessoas por temas ambientais no futuro”. A série Manual de Jogos, Brinquedos e Brincadeiras, de Sirlândia Reis de Oliveira Teixeira continua trazendo ideias para os professores aplicarem com suas crianças. Este mês, começamos a publicar o curso Educar a infância, desafios constantes, preparado por Laura Monte Serrat Barbosa e Heloísa Monte Serrat Barbosa. Mãe e filha, as educadoras abordarão, em oito módulos, aspectos essenciais para a formação de nossos educadores da infância. Nossos assinantes ativos poderão responder a avaliação do curso e, conforme o aproveitamento, receberão certificados de participação, assinados pela Síntese Centro de Estudos da Aprendizagem. A todos, desejamos um excelente início de ano letivo! Ótima leitura! Revista Um abraço, Siga-nos no twitter Luiza Oliva Editora Direcional Educador @DirEducador http://twitter.com/DirEducador erramos Na edição 96, de janeiro/2012, no artigo Documentação Pedagógica, houve uma falha de revisão à página 12. O correto é: “Há muito tenho observado nos Centros de Educação Infantil que a fotografia é usada apenas para mostras culturais e reunião de pais. Além disso, aleatoriamente as fotos são escolhidas somente pela beleza estética, sendo as outras descartadas automaticamente sem um olhar mais aprofundado.” Nos desculpamos pela falha. Direcional Educador é uma publicação mensal do Grupo Direcional, com circulação nacional. Dirigida a diretores, educadores, coordenadores e todos os profissionais que atuam na área da educação. Não é permitida a reprodução total ou parcial das matérias, sujeitando os infratores às penalidades legais. As matérias assinadas são de inteira responsabilidade de seus autores e não expressam, necessariamente, a opinião da revista Direcional Educador. Rua Vergueiro, 2.556 - 7ª andar cj. 73 CEP 04102-000 - São Paulo-SP Tel.: (11) 5573-8110 - Fax: (11) 5084-3807 [email protected] www.direcionaleducador.com.br Para publicar seus artigos na revista Direcional Educador, basta enviá-los para: [email protected]. aos cuidados do diretor. Os artigos serão analisados e, caso aprovados, serão publicados oportunamente, conforme a programação das edições. Envie também no e-mail: • Seu mini-currículo para ser publicado junto ao artigo. • Sua foto em tamanho 600x600 pixels ou maior (opcional). • Seu endereço, para que possamos lhe enviar exemplares da revista. • Declaração de que o artigo é inédito e que não foi enviado para nenhuma outra revista da área de educação, autorizando sua publicação na revista Direcional Educador, tanto na versão impressa quanto na versão digital (internet e CD) Se você organiza algum evento na área da Educação (curso, palestra, seminário, congresso), envie material de divulgação para o e-mail faleconosco@grupodirecional. com.br. O material poderá ser divulgado na seção Agenda, conforme a disponibilidade de espaço e a programação das edições. Direcional Educador, Fevereiro 13 SEJA COLABORADOR DA DIRECIONAL EDUCADOR 3 SUMÁRIO SUMÁRIO Fevereiro 13 ENTREVISTA Laurinda Ramalho de Almeida Por Luiza Oliva 11 TETRAEDRO O Currículo Por Nílson José Machado 08 CAPA Bullying: sintoma da sociedade moderna Por Teuler Reis 12 NOSSOS ALUNOS E AS DROGAS Drogas e os transtornos escolares Por Gustavo Teixeira 14 GESTÃO DA APRENDIZAGEM NA SALA DE AULA A Gestão e Liderança do Professor na sala de aula como promotores da concentração do aluno na aprendizagem (4) Por Heloísa Lück 18 17 EDUCAÇÃO PARA A INFÂNCIA Replanejar é rever a carta de intenções construída no tempo de planejamento Por Emilia Cipriano e Claudio Castro Sanches 29 ARTE Arte na Educação: uma iniciativa para entender e trabalhar arte 3. Cor, Linha e produção artística de Picasso Por Adalberto Amaral, Elaine Kamke, Iracy Maria de Oliveira Boamorte, Margareth Mariano da Silva e Sandra Regina do Amaral 34 FORMAÇÃO DE PROFESSORES Chega de homenagens ao professor Por Renato Casagrande 40 ENSINO FUNDAMENTAL E MÉDIO Como aproximar, no ensino de Língua Portuguesa, a cultura patrimonial da escola (culturas valorizadas) das culturas da juventude? Por Regilene Paulina da Cunha 21 EDUCAÇÃO AMBIENTAL De Vladivostok ao Cerrado: jogar para se divertir... e aprender... Por Nurit Bensusan PÁGINA DO PSICOPEDAGOGO Eu começo, nós recomeçamos: a volta às aulas! Por Maria Irene Maluf 46 E AGORA, PROFESSOR? Educação Digital – Parte VII Por Cassiano Zeferino de Carvalho Neto 22 Direcional Educador, Fevereiro 13 EDUCAÇÃO INFANTIL Pequenos artistas Por Ivete de Lima 4 32 EDUCAÇÃO INTEGRAL Desafios e Perspectivas da Educação Integral: o Currículo integrado Por Maria Helena Negreiros 36 GEOGRAFIA O resgate de valores em um contexto sócioambiental com proposta de inserção do indivíduo no espaço onde vive Por Elisandra Cecília Schwanka 43 ATIVIDADES PRÁTICAS Manual de Jogos, Brinquedos e Brincadeiras - 6 Por Sirlândia Reis de Oliveira Teixeira 48 LIVROS 25 CURSO Educar a Infância – Desafios constantes Módulo I – Introdução: sobre a Infância hoje Por Laura Monte Serrat Barbosa e Heloísa Monte Serrat Barbosa 50 AGENDA Direcional Educador, Fevereiro 13 06 5 ENTREVISTA LAURINDA RAMALHO DE ALMEIDA Por Luiza Oliva Direcional Educador, Fevereiro 13 A educadora analisa a importância da formação continuada para os coordenadores pedagógicos e as principais funções desse profissional na escola. 6 L aurinda Ramalho de Almeida é professora e pesquisadora na área de Educação e formação de professores há mais de 40 anos. Cursou Pedagogia na USP e mestrado e doutorado em Psicologia da Educação na PUC-SP. É docente no Programa de Estudos Pós-graduados em Educação: Psicologia da Educação da PUCSP. Sempre envolvida com a Orientação Educacional e a Coordenação Pedagógica, tanto nas universidades quanto na prática das escolas, em 1998 começou a publicar a série de livros O Coordenador Pedagógico, publicada pela Loyola. “Tínhamos clareza de dois pontos: a necessidade de um bom trabalho de coordenação pedagógica nas escolas e uma lacuna na literatura sobre essa área. Alguns alunos do Programa de Pós-Graduação de Psicologia da Educação da PUC-SP, principalmente Eliane Bruno e Luiza Christov, que agora estão efetivadas na UNESP-Capital, insistiram que deveríamos pensar numa literatura sobre coordenação, partindo de nossas experiências e a Loyola encampou a ideia”, relata. Com a receptivi- dade do primeiro livro, Laurinda, Eliane e Luiza organizaram O coordenador pedagógico e a formação docente. “A partir do terceiro, O coordenador pedagógico e o espaço da mudança, editado em 2001, e até hoje, a organização ficou a cargo de Vera Placco e eu. Já estamos elaborando o nono livro, que deverá sair este ano”, conta. “Penso que a receptividade que temos recebido dos coordenadores das redes públicas e particular de ensino, bem como de professores do Ensino Superior, tanto Graduação como Pós-Graduação, se deve ao fato de nós, autores, falarmos a linguagem dos coordenadores – nós falamos com eles, e não sobre eles”, complementa. A seguir, algumas ideias da educadora a respeito da coordenação pedagógica. DIRECIONAL EDUCADOR - Gostaria que relatasse sua experiência pessoal como Coordenadora Pedagógica. A senhora atuou 31 anos na rede estadual de ensino em São Paulo, sempre como coordenadora pedagógica? LAURINDA RAMALHO DE ALMEIDA Trabalhei 31 anos na rede estadual de ensino de São Paulo em vários cargos e funções, em escolas e órgãos centrais da Secretaria. Em 1969 aconteceu o primeiro concurso de Orientação Educacional promovido pela Secretaria Estadual de Educação, para suprir cargos de orientação educacional. Eu havia cursado Orientação Educacional como pós-graduação na USP; prestei o concurso e assumi o cargo em 1970. Comecei a trabalhar em uma Escola Técnica. Nas reuniões que nós, orientadores, fazíamos, surgiu com força a discussão sobre a necessidade da coordenação pedagógica nas escolas. Entendíamos que era importante a orientação educacional, mas igualmente importante a coordenação pedagógica e acabamos assumindo um duplo papel nas unidades escolares. Assumimos a necessidade de trabalhar orientação educacional via currículo, atuando numa linha preventiva, junto aos professores. Interessante que hoje temos uma situação semelhante, embora invertida: o coordenador pedagógico que está na rede oficial (professor coordenador na estadual e coordenador pedagógico na municipal, em São Paulo) acaba fazendo também funções que eram do orientador educacional, anteriormente. Qual a maior lacuna existente na formação dos coordenadores pedagógicos? Assim como os professores, o coordenador deve ter uma formação continuada? Sim, a formação continuada é uma necessidade para os coordenadores pedagógicos. A sociedade está em constante mudança, e a escola precisa ser ressignificada em função das mudanças. O coordenador, que tem como principal atribuição a formação de professores, não pode descuidar de sua própria formação. Há outro fator a considerar: via de regra a formação inicial não tem dado a atenção merecida ao coordenador pedagógico. Fala-se muito da relação professor-aluno e menos das relações professoresprofessores e coordenador pedagógicoprofessores na escola. Em seu artigo A coordenação pedagógica no estado de São Paulo nas memórias dos que participaram de sua história, a senhora cita “a importância dos saberes das relações interpessoais para a formação dos coordenadores pedagógicos”. Como deve se dar a formação dos coordenadores quanto ao enfrentamento de conflitos inerentes às relações interpessoais? O ensino é uma profissão relacional por excelência. Daí falar-se bastante das relações professores-alunos. Mas o coordenador trabalha com professores, e coordenador e professor são pessoas, antes de serem profissionais. Relações entre pessoas significam embates de subjetividade, fruto de trajetórias pessoais, de contatos com outros significativos, nas instituições e fora delas. Conflitos são inerentes às relações. A formação do coordenador deveria prever um espaço para o desenvolvimento de habilidades de relacionamento interpessoal, como tenho afirmado, para que tenha um olhar atento, um ouvir ativo, um falar autêntico, um prezar constante. Como fazê-lo? Como formador – sendo modelo para um relacionamento promotor de desenvolvimento; apresentando textos de autores que têm focalizado a questão, para reflexão teórica; trazendo práticas do cotidiano das escolas, por exemplo, na forma de incidentes críticos, que são casos típicos da situação escolar, e que possibilitam reflexão teórico-prática. E muitas outras modalidades que o formador traz de sua trajetória acadêmica e profissional. Relações de amizade na escola, entre coordenador e os professores, são compatíveis com o dia a dia profissional? Relações de amizade fortalecem o relacionamento. Mas com o cuidado de respeitar os limites do que é privativo (da amizade) e o público (do profissional). Qual a relação entre o coordenador e o projeto político-pedagógico da escola? Uma relação muito íntima. O coordenador pedagógico, em suas funções articuladora, formadora e transformadora é elemento chave para articular os professores na elaboração do projeto político pedagógico, fazendo que aconteça, de verdade, uma proposta coletiva; e elaborada esta, uma prática em função dos objetivos propostos no projeto pedagógico. E quanto à função do coordenador no relacionamento com os pais, deve ser o de mediador entre direção e/ou os professores? Um bom relacionamento com os pais é atribuição da direção, da coordenação e dos professores. Há casos específicos que devem ser atendidos pela direção, outros mais adequadamente pelo próprio professor. Evidentemente o coordenador pode atuar como mediador dessas relações, mas sem esquecer que sua atribuição principal é a pedagógica. Como evitar que o coordenador se transforme no faz-tudo da escola, atrelado mais a funções burocráticas do que pedagógicas? Tendo clareza de seu papel, que é pedagógico e não burocrático, e trabalhando para que os demais profissionais da escola reconheçam isso. O orientador educacional e o coordenador devem trabalhar em parceria? O orientador é figura em extinção dentro das escolas? Sem dúvida. Nas escolas que contam com orientador educacional e coordenador pedagógico, esses dois profissionais podem ter uma parceria muito profícua. Trabalhei numa escola que tinha esse modelo, e nós duas, coordenadora pedagógica e orientadora educacional, planejávamos juntas as pautas das reuniões pedagógicas, das reuniões com pais, discutíamos em conjunto casos de alunos e professores, elaborávamos propostas de formação. Agora – de novo – têm que existir relações interpessoais saudáveis e respeitosas (o que não impede que haja conflitos de opiniões) e um objetivo comum a alcançar, que é a qualidade do processo ensino-aprendizagem: um professor que ensina e um aluno que aprende. Orientador educacional não é figura em extinção, não. Muitos orientadores atuam fazendo parte de equipes multiprofissionais, principalmente em escolas particulares (e em escolas oficiais, em alguns estados). Contatos com Laurinda Ramalho de Almeida: [email protected] Direcional Educador, Fevereiro 13 Foto: Juliana Ramalho ENTREVISTA 7 CAPA CAPA sintoma da sociedade moderna Direcional Educador, Fevereiro 13 Por Teuler Reis 8 ntes de falar em bullying, penso ser necessário revisar nossa trajetória educacional. Caminhos tortuosos, desacreditados por uma sociedade que se sustenta na aparência, movendo-se por uma economia capaz de ofuscar a luz do bom senso e da sensatez. Não estou imune aos ditames da ferocidade dessa configuração. Vivo nela, respiro o desrespeito dos representantes da sociedade, ainda que a contragosto. Em todos os setores impera a desconfiança, o mau exemplo se espalha por todo lado, o individualismo avassalador, a corrupção, descaso generalizado, vergonha desavergonhada. Nesse cenário, os processos educacionais parecem fantasmas, e nem mesmo assombram. Estamos carentes de pessoas ocupadas com a arte de educar, falo da educação que é capaz de romper com a manipulação desenfreada, fazendo abandonar a ignorância vil que cega o indivíduo. Permanecemos desprovidos de mudanças significativas e necessárias, somos reféns de professores desacreditados na mudança, de projetos ineficazes, de falsas preocupações que sobrevoam o grande problema da sociedade, mas não provocam as mudanças desejadas. Não sou propenso a queixas e re- clamações, mas, se o tom das minhas palavras iniciais é desabafo trata-se de uma verdade. Nossa sociedade está doente e continuamos a buscar diagnósticos por todos os lados. Encontrase abandonada ao descaso das autoridades, de pais pouco preocupados com a formação de valores, que dão péssimos exemplos aos seus filhos, de sistemas educacionais que fazem do lucro seu objetivo maior. Enfim, não adianta mascarar a realidade, pois ela sofre, está doente. Há pessoas bem intencionadas? Sim. Como também existem escolas que já encontraram o caminho para as mudanças, mas a grande maioria passa longe desse encontro. A palavra capacitação virou uma espécie de mantra dentro do sistema educacional, porém acredito ser nosso problema bem mais simples de resolver. Nossa sociedade abrandou as regras de convivência, deixou de lado a preocupação com a formação humana, banalizou valores e, nessa triste realidade, o ter passou a ser mais importante do que o ser. Vivemos num estado hipnótico no que diz respeito a valores e virtudes. A ética, enquanto uma tentativa de regulamentar a maneira como conduzimos nossas vidas, pouco efeito surte nas pessoas. Cada um se sente dono cidadãos quando proporcionamos ao sujeito o conhecimento necessário para conviver em sociedade. A escola precisa abrir os olhos, e não só ela, toda a sociedade. Não podemos prescindir de requisitos tais como a formação de valores, das virtudes, das leis, se a proposta é educar para cidadania. O humano precisa transcender, já que vive em busca de significados, de um sentido para a própria existência. Nessa busca, a liberdade se torna quase uma obsessão, isto é, ir além de si mesmo é quase uma ordem. A questão se complica quando a busca dessa liberdade rompe com certos acordos, pactos, estabelecidos por alguns, para o bem-estar de todos. Se abster de restrições internas e externas pode até trazer uma sensação de autodomínio, de autocontrole e liberdade, no entanto coloca em risco a harmonia da sociedade. A crise de valores, o excesso de drogas, o bullying não deixam de ser formas ambíguas de buscar uma “certa liberdade”. É, de certa maneira, um não ao pacto. Sempre me lembro de John Dewey ao dizer que nossas falhas morais têm origem em alguma fraqueza de disposição, em alguma ausência de humanidade, em alguma inclinação unilateral que nos faz chegar ao juízo ou à decisão quanto ao fato concreto de modo negligente ou malevolente. Vejo o bullying como uma fraqueza de disposição, ausência de bons exemplos, reflexo de uma educação deficiente, tanto em casa como na escola. O termo pode até mesmo ser novo, mas o fato em si é tão antigo quanto a humanidade. Sempre existiram pessoas ruins, pessoas negligentes, que não tiveram a chance de aprender o que é respeito, justiça, amor ao próximo e outros sentimentos nobres da alma humana. Bullying é uma postura descuidada com o outro, um relaxamento da boa conduta. Costumo dizer que vivemos a Bullying é uma postura descuidada com o outro, um relaxamento da boa conduta. Direcional Educador, Fevereiro 13 Bullying: de sua própria verdade, como se fosse possível viver sozinho. Já faz um bom tempo que insisto numa educação para cidadania. Embora as pessoas acreditem estar a escola formando cidadãos, eu penso o contrário. Ela faz pouco, muito pouco. Nossa constituição, nossas leis de diretrizes e bases da educação, os Parâmetros Curriculares Nacionais, todos os documentos que regem a educação no Brasil dizem ser tarefa da escola formar cidadãos. Como diria meu saudoso amigo Bartolomeu Campos Queirós “o papel aceita tudo”. Na prática essa realidade não se confirma. Em meio à crise moral em que vivemos, deixamos, ou melhor, abrimos mão do grande trunfo para mudança: a escola. Embora os PCN’s digam que as disciplinas devem funcionar como ferramentas para se atingir a cidadania, isso está longe de acontecer, pois depende de um entendimento novo sobre a sala de aula, um olhar novo para a função da escola. Ser cidadão é conviver numa sociedade regida por regras, deveres, direitos. Esse pacto social está elencado na nossa constituição. Ser cidadão é ter conhecimento das regras do jogo social. Já estive em auditórios com 900 professores que ao perguntar quem já havia lido a constituição, ou trechos dela, apenas 12 pessoas levantaram a mão. Ser cidadão é saber que no artigo 5º inciso V da Constituição Federal está escrito que é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem, ou ainda que no mesmo artigo inciso X diz ser invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação. Quando escrevi Bullying: Tô fora coloquei partes da Constituição e da Declaração dos Direitos Humanos. Assim fiz, porque entendo que só formamos 9 10 TETRAEDRO síndrome da desobediência, basta dizer “faça isso” e as pessoas fazem o contrário. Se a placa diz para não usar telefone celular, há sempre alguém que faz vista grossa; burlar as regras virou algo corriqueiro. Não sou moralista e nem acho que o caminho para uma vida em sociedade passe por um moralismo desenfreado, mas se queremos viver juntos, compartilhar os mesmos espaços, ter uma vida saudável, é preciso afinar nossas condutas de maneira tal que todos saiam ganhando. E já temos documentos para orientar nossas ações, mas são desconhecidos pela grande maioria dos brasileiros. Lembro-me bem de quando aceitei o convite de uma escola para trabalhar formação humana com alunos do Ensino Médio. Apresentei minha proposta que trazia, dentre os conteúdos, os Códigos de Defesa do Consumidor, o Estatuto do Idoso, trechos da Constituição e outros. Alguns professores acharam aquilo um disparate, para minha surpresa, alguns deles não conseguem ver a escola como formadora de cidadãos, ainda que o façam apenas no discurso, na prática é diferente. O resultado foi ótimo, os alunos se dividiram em grupos e cada um ficou responsável por passar para toda a escola. Penso no bullying como um sintoma da nossa sociedade. Por trás de uma história de bullying tem sempre um sujeito vitimado, às vezes, nem teve na vida alguém que lhe barrasse, que lhe “emprestasse o ouvido”, lhe apontasse o caminho correto para viver bem com o outro. É fácil acusar, apontar o dedo, mas a questão é reconhecer as histórias por trás desses episódios de bullying. A verdade é que adolescentes e crianças apenas repetem o que veem. Atitudes de bullying são de certa forma uma extensão da sociedade, humilhações, intimidações, agressões são atitudes presentes no cenário nacional. A todo momento essa triste realidade se manifesta. Banalizamos a violência, o descaso com o idoso, a miséria, e assim ficamos reféns do nosso próprio desleixo. Sempre penso nas virtudes como a grande saída para essa crise de valores em que vivemos. A palavra virtude vem de virtus e significa excelência; se queremos a excelência, o caminho passa por ela. E vale dizer que não nascemos com nenhuma virtude; aprende-se. Pais e educadores devem se incumbir dessa transmissão à família, e a escola precisa colocar a formação das virtudes como sua prioridade. Aquele que faz bullying está carente e, quem tem tolerância, prudência, respeito, não comete bullying. Podemos e devemos acreditar numa mudança capaz de trazer de volta a paz entre os homens. O bullying que assombra nossas escolas precisa ser encarado de frente. No entanto, é preciso deixar a hipocrisia de lado e reconhecer que essa mudança deve começar dentro de cada um de nós. Não vamos avançar nesse processo se exemplos continuarem carregados de falta de ética, se valores continuarem deturpados, se não nos conscientizarmos de que viver em sociedade é comungar da sabedoria que reconhece o outro em sua dignidade. É preciso trocar o eu pelo nós. Uma renúncia necessária para fazer imperar a paz entre os homens. Teuler Reis é autor de Bullying… Tô fora e Educação e Cidadania: A Batalha de uma Educação Comprometida, ambos publicados pela Editora WAK. www.teulerreis.com.br O CURRÍCULO Por Nílson José Machado 1 – Currículos, mapas O conhecimento não é imediatamente acessível a quem nele se inicia. Para trazê-lo para a escola é preciso organizá-lo, disciplinálo, traduzi-lo em disciplinas. Os currículos escolares são como mapas a recobrir o território do conhecimento. São instrumentos para orientar as ações, instigar viagens e viabilizar percursos conscientes. As disciplinas são como os estados: repartem o território das significações, mas devem colaborar continuamente na busca do interesse primordial da escola a construção e a partilha de significados. As fronteiras disciplinares não devem servir de óbices para uma interação fecunda: é preciso fomentar a livre circulação interdisciplinar. Os interesses dos alunos situam-se muito além dos programas disciplinares. Nas últimas décadas, os currículos têm apresentado uma fragmentação disciplinar excessiva. Parecem menos um mapa e mais uma prateleira de supermercado. Oferecem cacos, ou retalhos de conhecimento, eventualmente sedutores, mas certamente desorientadores. 2 – Mapas, planejamento Todo planejamento refere-se imediatamente ao projeto do qual é tributário. Planejar é organizar as ações a serem realizadas, tendo em vista os objetivos que se buscam. O mapeamento do que é fundamental é o primeiro passo a ser dado. Descartar irrelevâncias, decompor, hierarquizar e articular as metas são ingredientes necessários ao planejamento. Os temas envolvidos encontram-se multiplamente relacionados, mas nem tudo é igualmente relevante: ponderar as relações constituintes é preciso. Um elemento decisivo no ato de planejar é o tempo de que se dispõe. A decisão sobre o que é fundamental ou relevante depende inteiramente de tal fator. É impossível definir percursos ou destacar prioridades sem a referência a balizas temporais. Os planejamentos não têm a natureza e a rigidez das leis. Não podem ser fotografias, ou representações estáticas. São como mapas em permanente estado de atualização, ou cinemapas, na feliz expressão de Pierre Lévy. Planejar é como construir o roteiro de um filme. 3 - Planejamento e avaliação No planejamento das atividades escolares, as aulas ocupam um lugar de destaque, mas as atividades extraclasse, como as resultantes da convivência com os professores, ou do contato direto com a realidade exterior à escola, também constituem espaços vitais, em que as competências pessoais se desenvol- vem. É fundamental que tais espaços sejam inseridos organicamente no planejamento escolar. Em sintonia, a avaliação do rendimento dos alunos deve relacionar-se diretamente com tal planejamento, envolvendo o conjunto das atividades realizadas. A formação pessoal do aluno requer o desenvolvimento de um espectro de competências (capacidades de expressão de si e de compreensão do outro, de argumentação e de decisão, de contextuação dos conteúdos aprendidos e do recurso a eles para a extrapolação dos contextos). O crescimento pessoal do aluno exige, pois, que se recorra a um espectro de instrumentos de avaliação: isoladamente, nenhum instrumento é suficiente para o reconhecimento das competências. 4 – Avaliações, currículos Nas avaliações educacionais, os currículos desempenham importante papel como instrumentos de organização das ações. Não são apenas elencos de disciplinas, com seus conteúdos programáticos. Devem incluir espaços e atividades que articulem dimensões cognitivas, pedagógicas e políticas do ato educativo. Não podem desdenhar dos conteúdos, em nome do discurso político, nem submeter-se acriticamente a tecnicidades pedagógicas que atropelem ou minimizem a importância de tarefas básicas, como a construção da cidadania e a vivência de princípios éticos. Na estrutura curricular, é preciso construir e alimentar espaços de igualdade e diferença, articular e mediar a convergência de interesses pessoais e coletivos. Na construção do par cidadania/ pessoalidade, o diálogo e a confiança no fazer com a palavra são elementos imprescindíveis. O elogio do diálogo, no entanto, não pode elidir a assimetria nos papéis e nas responsabilidades de professores e alunos nas atividades de planejamento e avaliação. Nílson José Machado é professor titular da Faculdade de Educação da USP, onde também coordena dois grupos de estudo de frequência livre: os Seminários de Estudo em Epistemologia e Didática - SEED, e os Seminários de Ensino de Matemática – SEMA. É autor de diversos livros, entre eles Educação – Microensaios em mil toques (volumes I, II e lll, pela Editora Escrituras). www.nilsonjosemachado.net Direcional Educador, Fevereiro 13 Direcional Educador, Fevereiro 13 CAPA 11 Nossos alunos e as drogas Nossos alunos e as drogas DROGAS E OS TRANSTORNOS ESCOLARES 12 iversos estudos internacionais referem a associação de transtornos comportamentais na infância ao desencadeamento do uso e abuso de drogas na adolescência. Aproximadamente 89% dos jovens usuários de drogas apresentam outro diagnóstico comportamental associado, tais como: transtorno desafiador opositivo, transtorno de conduta, transtorno de déficit de atenção/hiperatividade (TDAH) e depressão. Os transtornos disruptivos do comportamento, representados pelo transtorno desafiador opositivo e o transtorno de conduta, aumentam muito o risco para o uso de drogas, sendo que adolescentes que fazem esse uso problemático de substâncias preenchem critérios para o transtorno de conduta em até 80% dos casos. O transtorno desafiador opositivo pode ser definido como um padrão persistente de comportamentos negativistas, hostis, desafiadores e desobedientes observados nas interações sociais da criança com adultos e figuras de autoridade de uma forma geral, como pais, tios, avós e professores. As principais características do transtorno desafiador opositivo são: perda frequente da paciência, discussões com adultos, desafio, recusa a obedecer solicitações ou regras, perturbação e implicância com as pessoas, podendo responsabilizálas por seus erros ou mau comportamento. Essa criança se aborrece com facilidade e comumente se apresenta enraivecida, irritada, ressentida, mostrando-se rancorosa e com ideias de vingança. No transtorno de conduta há um comportamento ainda mais agressivo, desafiador, onde os direitos básicos alheios, regras e normas sociais são violados. Trata-se de uma condição mais grave quando comparada ao transtorno desafiador opositivo, sendo responsável por frequente encaminhamento aos serviços de saúde mental da infância e adolescência. Jovens com transtorno de conduta apresentam comportamento antissocial com agressão física e comportamento cruel com outras pessoas e animais, sendo muitas vezes autores de bullying dentro do ambiente escolar. Não demonstram sentimento de culpa ou remorso pelos seus atos, são negativistas, desafiadores, hostis e podem realizar atos de vandalismo, furtos e destruição de patrimônio alheio. Roubos frequentes de brinquedos em lojas de departamento ou de objetos pessoais de colegas em sala de aula, além de violência e intimidações contra outros estudantes podem ser observados em quadros iniciais do transtorno de conduta. Com frequência apresentam dificuldades em interações sociais, possuem poucos prejuízos no desempenho acadêmico e social, pois têm dificuldade em se organizar, em manter atenção em sala de aula e em realizar deveres escolares ou permanecer sentados ou quietos. Adolescentes com o diagnóstico de TDAH experimentam drogas mais precocemente, usam-nas em maior quantidade, tornam-se mais dependentes e demoram mais tempo a buscar tratamento. Esses fatos estariam relacionados a uma tendência maior de automedicação realizada na busca por alívio dos sintomas de inquietação motora, hiperatividade e agitação que o TDAH promove. Há também uma menor percepção do abuso, maior dificuldade de cessação do uso e menor senso crítico na escolha do grupo por esses jovens. Crianças e adolescentes com depressão apresentam-se frequentemente com tristeza, falta de motivação, solidão e humor deprimido, contudo é comumente observado um humor irritável ou instável. Esses jovens podem apresentar mudanças súbitas de comportamento com explosões descontroladas de raiva, mostrando-se irritados e podem envolver-se em brigas corporais no ambiente escolar ou durante a prática desportiva. A criança pode apresentar dificuldade em divertir-se, queixando-se de estar entediada ou “sem nada para fazer” e pode rejeitar o envolvimento com outras crianças, dando preferência por atividades solitárias. Dentro da sala de aula ou no recreio escolar, a mudança comportamental de uma criança anteriormente bem socializada e entrosada com o grupo e que passa a isolar-se pode ser sinal de alerta a professores. A queda do desempenho acadêmico quase sempre acompanha o transtorno, porque crianças e adolescentes com depressão não conse- guem concentrar-se em sala de aula, há perda do interesse pelas atividades, falta de motivação e pensamento lentificado, e o resultado disso tudo é observado no boletim escolar. Queixas físicas como cansaço, falta de energia, dores de cabeça ou dores de barriga são comuns. Insônia, preocupações, sentimentos de culpa, baixa autoestima, choro excessivo, hipoatividade, fala em ritmo lento e de forma monótona e monossilábica também ocorre em grande número de casos. Pensamentos recorrentes de morte, ideias e planejamento de suicídio podem estar presentes em todas as idades e os atos suicidas tendem a ocorrer com maior frequência entre estes adolescentes. Comportamentos de risco durante a adolescência são comuns, entretanto estes podem se acentuar durante episódios depressivos, como a prática sexual promíscua sem proteção e o abuso de álcool e outras drogas. Portanto, a identificação precoce dessas condições comportamentais e o tratamento correto pode ser uma ferramenta essencial nesse primeiro passo para a prevenção do envolvimento dos nossos queridos estudantes com as drogas. Gustavo Teixeira é Médico Psiquiatra Infantil, Professor Visitante do Department of Special Education - Bridgewater State University e Mestre em Educação - Framingham State University Contato: www.comportamentoinfantil.com Direcional Educador, Fevereiro 13 Direcional Educador, Fevereiro 13 Por Gustavo Teixeira amigos e os sintomas de baixa autoestima, baixa tolerância à frustração, irritabilidade e explosões de raiva normalmente estão presentes. Todos esses fatores culminam em comportamentos delinquenciais, provocações de brigas corporais em ambiente escolar ou na rua, inclusive com a utilização de armas como faca, bastão ou arma de fogo. Abandono e reprovação escolar, fugas de casa, mentiras, consumo de álcool e outras drogas, comportamento sexual de risco e ausência de arrependimento por seus atos também são comuns. Vários estudos referem à associação do TDAH ao uso de drogas na adolescência. Para termos uma ideia, entre 20 e 50% dos adultos dependentes químicos de álcool apresentam história de TDAH na infância. Entre abusadores de cocaína e opióides a prevalência dessa associação pode chegar a até 45% dos casos. Comportamentos característicos de crianças e adolescentes com transtorno de déficit de atenção/hiperatividade incluem dificuldade em focar a atenção em um único objeto, são facilmente distraídos, parecendo não escutar quando alguém lhe dirigem a palavra, agem como se estivessem no “mundo da lua”. Podem não terminar seus deveres de casa, apresentando grande dificuldade em se organizar e frequentemente perdem seus materiais escolares, chaves, dinheiro ou brinquedos. A criança pode se apresentar inquieta, não conseguindo permanecer sentada, abandonando sua cadeira em sala de aula ou durante o almoço de família. Está sempre a mil por hora ou como se estivesse “ligada em uma tomada de 220 v”, fala em demasia e dificilmente brinca silenciosamente, estando sempre gritando. Os pacientes com este diagnóstico apresentam 13 A GESTÃO E LIDERANÇA DO PROFESSOR NA SALA DE AULA COMO PROMOTORES DA CONCENTRAÇÃO DO ALUNO NA APRENDIZAGEM Direcional Educador, Fevereiro 13 Por Heloísa Lück 14 ons professores são aqueles que assumem o seu trabalho docente orientados por uma perspectiva proativa em relação a seu papel e à possibilidade de orientar os alunos, assumindo o compromisso de mobilizar a energia e a atenção dos alunos no processo de aprendizagem e construção do conhecimento, ativando os seus processos mentais para a observação, a análise, a comparação de fatos, fenômenos e circunstâncias e a inferência de interpretações, dentre outros aspectos. Segundo essa perspectiva o aluno é percebido pelo professor como um ser humano com experiências de vida peculiares e dotado de potencial para o desenvolvimento, que alcança, na medida em que é ativamente envolvido no processo ensino-aprendizagem. Desse modo, o professor se vê como um agente responsável por desbloquear possíveis empecilhos e entraves a esse desenvolvimento pela aprendizagem e participação e envolvimento do aluno em suas atividades. Vale dizer, o professor considera o espaço de sala de aula como um ambiente de interação em que entram em jogo, como elemento mobilizador ou desmobilizador, medos, ansiedades, percepções, tendências de alunos e de pro- fessores em interação. Estar consciente desses aspectos e das suas influências no comportamento dos alunos é uma condição importante para a promoção de um ambiente de aprendizagem positivo na sala de aula e faz parte da ação docente nesse contexto. Portanto, conforme identificado em pesquisas sobre a efetividade de escolas em âmbito mundial e de contextos os mais diversificados, bons professores se percebem como importantes agentes do desenvolvimento e aprendizagem dos alunos, comprometem-se com esses resultados e atuam com dedicação e de forma criativa, na obtenção desses resultados. Dificuldades são consideradas como parte do processo ensino-aprendizagem e também como estímulo para o trabalho pedagógico, que se torna um extraordinário campo de desenvolvimento de competências docentes pelo professor (ICSEI, 2013). Sabe-se que esse trabalho é desafiante, uma vez que um aluno é diferente do outro, que cada aluno aprende em seu ritmo próprio e muitas vezes, a partir de estilos próprios. Por outro lado, tendo em vista inadequados hábitos adquiridos no próprio contexto escolar, em decorrência da 4 falta de habilidades de seus professores, os alunos apresentam um conjunto de comportamentos e atitudes que interferem negativamente em sua aprendizagem e na de sua turma. Compreender essas diferenças e atuar de maneira a redirecionar a sua energia para a promoção da aprendizagem dos alunos faz parte do desafio docente e se constitui no cardápio de sua atuação. Levar em consideração boas práticas nesse sentido é, pois, uma importante estratégia para superar dificuldades e desenvolver competências docentes. O Congresso Internacional sobre a Efetividade e Melhoria das Escolas (ICSEI 2013) corroborou, nas pesquisas apresentadas, algumas competências importantes e necessárias para que os professores possam construir em sua sala de aula ambiente favorável à concentração do aluno nas atividades de aprendizagem, e que evitam a agitação, a dispersão e a comunicação entre colegas sobre assuntos diferentes dos referentes ao foco da aprendizagem pretendida. No artigo desta autora, publicado no exemplar anterior de Direcional Educador (edição 96, de janeiro de 2013), foram apontadas três condições que se coadunam com os resultados de investigações realizadas sobre a efetividade das escolas: i) na prática do professor estão as bases da mudança que pretendem alcançar; ii) alunos respeitam professores seguros, confiantes e competentes em seu trabalho; iii) não se controla os alunos, e sim a situação em que eles estão envolvidos. Neste artigo são apontados mais dois pressupostos relacionados ao interesse dos professores na construção de disciplina como elemento do processo educacional, que têm sido utilizados pelos professores e contribuem para a melhor qualidade do trabalho educacional, e melhores resultados de aprendizagem: i) disciplina se constitui em uma condição processual contínua e dinâmica ativa focalizada na aprendizagem, em vez de episódio ou evento, e ii) disciplina é resultado de relação interpessoal na sala de aula. Disciplina não se constitui em um episódio ou evento e sim em um processo e uma dinâmica Uma das circunstâncias mais comuns na dificuldade dos professores de realizarem experiências de aprendizagem de forma organizada com a atenção dos alunos focada nesse processo e seu objeto é considerarem situações consideradas como “indisciplina” como um episódio pelo qual os alunos diretamente envolvidos são responsáveis. Como consequência dessa percepção limitada e até mesmo reativa, professores concentram sua atenção em reprimir comportamentos que consideram como indisciplina, corrigir os alunos e gastar tempo em lições de moral para esses alunos, desviando a atenção própria e dos alunos do foco da aprendizagem e deixando de construir um ambiente dedicado à formação e à aprendizagem do comportamento humano como processual, circunstancial e evolutivo, marcado por altos e baixos, por tensões e distensões, por compreensões e incompreensões, por contradições a serem compreendidas e solucionadas, como parte de um movimento formativo. A disciplina escolar não deve ser uma condição almejada pelo professor como resultado de características individuais dos alunos, mas uma condição construída em processo de natureza social, que apresenta vários desdobramentos e situações diversas nem sempre favoráveis e “satisfatórias”, mas que fazem parte do processo socioeducacional. A perspectiva processual aponta para a necessidade do professor adotar alguns cuidados, como por exemplo: evitar a rotulação de comportamento e de alunos; contextualizar os comportamentos dos alunos identificando as condições e situações que os favoreceram e condicionam, inclusive e sobretudo a metodologia de ensino adotada e a relação professor-aluno; analisar as atitudes pessoais e a relação entre as mesmas e o comportamento dos alunos; identificar comportamentos e desempenhos limitados e inefetivos, e condições que possam favorecer a aprendizagem a partir dos mesmos e a sua superação para a formação em estágios mais efetivos; prestar atenção à dinâmica de relacionamento entre os alunos e sua evolução. Nesse conjunto de atenções e cuidados é importante que o professor tenha em mente que o comportamento é circunstancial e eventual, em vista do que, deixar que se repitam sem a reorientação das circunstâncias que os facilitam, permite que eles progridam, proliferem e sejam reforçados, em cujo caso, as vítimas da omissão docente passam a ser culpados das “falhas” de seu desempenho. Disciplina é resultado de relação interpessoal que ocorre na sala de aula Uma professora participante de uma oficina sobre disciplina na sala de aula afirmou: “disciplina em sala de aula seria algo mais fácil e natural, na medida em que reconhecessemos o aluno como uma pessoa dotada de sentimentos e, portanto, com o direito de ser respeitado e ouvido. A disciplina não acontece por imposição de autoridade, mas por cumplicidade de ser humano com o outro. A percepção dos limites viria da percepção do outro. A questão é: Como se desenvolve ou se resgata no aluno essa dimensão da relação EU TU? Como se exercita o respeito, o olhar, a sensibilidade, o cuidado com o outro?” Esse questionamento da professora surgiu a partir do entendimento de que a característica mais importante do processo ensino aprendizagem, liderado e orientado pelo professor, é a relação interpessoal entre professor e alunos pela qual se transmite valores, expectativas e se constrói o entendimento de quem somos como pessoas, quais os nossos compromissos e qual o nosso verdadeiro exercício em relação aos mesmos. Conforme Carl Rogers afirmou, educação é processo de relacionamento interpessoal e, portanto, condição fundamental para o desenvolvimento de seres humanos. Sem esse entendimento, não se pode ter educação e sim apenas instrução e treinamento, condição em que os computadores e a educação a distância podem ser mais efetivos. É importante reconhecer que a dimensão do relacionamento interpessoal torna o professor não apenas insubstituível, mas imprescindível, assim como expressa a medida em que a educação é um processo humano. É na medida em que se desconsidere ou abdique dos cuidados necessários para a construção de relacionamentos humanos – que devem ser autênticos -, que se pode considerar ser o professor melhor substituído por meios da tecnologia. Estes, então, ganham uma dimensão de importância diferente, deixando de ser o que deveriam ser: ferramentas de apoio nas mãos de bons professores, e transformando-se, inadequadamente em centro do processo de ensino. A sala de aula é um ambiente de relacionamento entre professor e alunos e de alunos entre si, de cuja qualidade depende a motivação do aluno para a Direcional Educador, Fevereiro 13 GESTÃO DA APRENDIZAGEM NA SALA DE AULA GESTÃO DA APRENDIZAGEM NA SALA DE AULA 15 EDUCAÇÃO PARA A INFÂNCIA 16 aprendizagem, a constituição de ambiente propício para tal fim, assim como o atendimento de algumas de suas necessidades básicas, como, por exemplo, a de pertencer, de ser aceito, estimado e valorizado como pessoa, dentre outras necessidades relacionadas à natureza humana como ser social, que se realiza em interação com seus semelhantes (Lück, 2013). O atendimento a essas necessidades é realizado pelo professor com um conjunto de cuidados simples, mas importantes, como por exemplo: dirigirse ao aluno pelo nome, o que o leva a conhecer todos os alunos por nome; criar oportunidades para que todos os alunos se expressem, façam perguntas, apresentem sua perspectiva e suas dúvidas sobre o que se está tratando; criar condições para a interação entre os alunos, de forma organizada; observar o desempenho dos alunos, cuidando para integrar em atividades coletivas os alunos que muitas vezes ficam isolados; olhar os alunos nos olhos; conhecer os interesses dos alunos. É importante que o professor realize experiências nesse sentido e construa uma lista própria de cuidados que podem contribuir para o desenvolvimento de uma cultura de participação e trabalho coletivo marcado por interações interpessoais positivas na sala de aula. É importante ter em mente que o respeito entre professor e alunos e dos alunos entre si corresponde a uma circunstância que demanda reciprocidade, cujo exemplo, orientação e liderança, porém, cabem ao professor a quem compete a formação dos alunos que ensaiam comportamentos para experimentar seus limites, testar os professores e também para ventilar suas frustrações. As aulas como processo de aprendizagem significativa correspondem a circunstâncias socioeducacionais em que os alunos devem ter a oportunidade de interagir de forma dinâmica e contínua, a fim de que desenvolvam competências sociais importantes tanto na criação de condições básicas da cultura de apren- dizagem, como para o desenvolvimento de competências que os alunos necessitam para a vida, como por exemplo, a canalização de energia pessoal em atividades, a capacidade de ajustar-se a uma dinâmica comum de atividades coletivas, dentre outros aspectos. Motivação e disciplina Sabe-se que a disciplina é conseguida na medida em que o aluno esteja envolvido e motivado nas experiências de aprendizagem. Porém, é importante entender que a motivação, embora seja um elemento interior em relação ao aluno, é uma condição estimulada e orientação externamente exercida pelo professor, sendo totalmente inadequado esperar que o aluno apresente espontaneamente essa motivação. É fundamental entender que a motivação precisa ser estimulada, instigada, orientada e continuamente ativada, pois ela não se mantém constante e de uma vez por todas. A disciplina está diretamente vinculada às condições motivadoras que o professor providencia o tempo todo em cada aula e que dependem de habilidades docentes diversas promotoras da ativação mental dos alunos, como por exemplo: as que se referem a organizar o contexto da aprendizagem; a estabelecer conexão entre o seu objeto e a vivência dos alunos; a ilustrar com exemplos os conceitos aprendidos; a suscitar a exemplificação pelos alunos; a fazer perguntas reflexivas e problematizadoras; a suscitar perguntas pelos alunos; a variar as estimulações de aprendizagem com dinâmicas de interação, trabalho de grupo, trabalhos individuais e ensino expositivo-dialogado; a estabelecer a organização lógica do conteúdo de aprendizagem, em acordo com o nível de desenvolvimento dos alunos; a monitorar a compreensão pelos alunos sobre o objeto das aulas, dentre outros aspectos. Conforme depoimento de uma professora: “Quando nós [professores] demonstramos aos alunos que gostamos do que fazemos, nos esforçamos para tornar nossas aulas interessantes, prestamos atenção a todos os alunos e nos empenhamos por mantê-los atentos e dinamicamente envolvidos nas aulas, então temos aulas interessantes e alunos interessados. E se há interesse, há motivação e há disciplina.” Nessas circunstâncias, pode-se dizer que há um processo educacional voltado para a realização de aprendizagens significativas. Deixar que nossos alunos participem mais, ser o mediador e que nosso aluno seja o descobridor. Dessa maneira, tendo alunos mais participativos, teremos menos indisciplina e mais participação, pois os alunos estarão canalizando positivamente suas energias. Referências bibliográficas ICSEI 2013. Educational systems for school effectiveness and improvement: exploring the alternatives. Santiago do Chile: Fundação Chile/ICSEI, janeiro, 2013. LÜCK, Heloísa. Diagnóstico do atendimento a necessidades educacionais dos alunos. Belo Horizonte: Projecta Educacional Ltda. Série Programa de Gestão Educacional. 2013. Heloísa Lück é doutora em Educação pela Columbia University, em Nova York, com pós-doutorado em Pesquisa e Ensino Superior pela George Washington University, em Washington D.C. É Diretora Educacional do CEDHAP – Centro de Desenvolvimento Humano Aplicado, conferencista e docente em cursos de capacitação de profissionais da educação. E-mail: [email protected] REPLANEJAR É REVER A CARTA DE INTENÇÕES CONSTRUÍDA NO TEMPO DE PLANEJAMENTO Por Emilia Cipriano e Claudio Castro Sanches tempo de replanejar o planejado. Quando falamos em planejamento de início de ano, no sentido maior, estamos falando em replanejamento. Se assim não for, estaremos esquecendo o processo de continuidade das ações planejadas para longo prazo nos inícios dos cursos, ou seja, de Educação Infantil, de Ensino Fundamental, de Ensino Médio. Todo replanejamento deve estar pautado nas avaliações realizadas ao longo do ano e na avaliação final, onde devem ser considerados alguns pontos de reflexão para a reorganização do trabalho pedagógico, dos conteúdos, das posturas e da formação dos profissionais. Estas questões, entre outras, a serem levantadas pela equipe da escola, devem ser consideradas imprescindíveis para replanejar e contemplar as ações que foram desenvolvidas, de acordo com a proposta elaborada para cada curso no início do ano, que serão balizadoras para pensar e repensar a continuidade do planejamento do ano anterior. Para esse momento propomos pensar sobre: O planejado se realizou plenamente? Durante o ano, no desencadear das ações, quais foram os pontos fortes e quais os pontos frágeis das propostas? O planejado e o vivido corresponderam às necessidades das crianças? Os espaços físicos e os materiais de apoio necessitam ser repensados para garantir o desenvolvimento da proposta de trabalho? O calendário atendeu às necessidades do tempo planejado? As atividades extracurriculares estavam articuladas com o planejamento e com as ações desenvolvidas nos momentos dessas atividades? Em relação ao ensino aprendizagem, durante o percurso foram realizadas re- flexões questionando o planejamento das ações, metodologia, didática e avaliação? Quanto ao conteúdo, qual o significado em relação à aprendizagem, desenvolvimento e transformação, nas posturas das crianças? Os saberes construídos responderam aos problemas concretos referentes às necessidades dos aprendizes e construíram novos olhares? As relações criança - criança, adulto criança, família - escola, foram permeadas pela práxis dialógica, envolvendo respeito, solidariedade, valores, compreensão, contribuindo para o bem estar da criança na escola? Quais foram as aprendizagens significativas dos aprendizes e educadores? O processo de capacitação dos profissionais refletiu na qualidade de ensino? Outra questão séria a ser pensada para a continuidade do planejamento é a formação das equipes de trabalho e devem ser pautadas nas reflexões: o que sabiam e faziam antes; o que sabem e fazem hoje e o que devem saber para fazer melhor o seu trabalho de educador. A preparação de uma equipe de trabalho deve ser realizada por profissionais que tenham fundamentação e conheçam os fazeres dos cursos para dar qualidade à formação continuada dos professores envolvidos. Uma equipe deve ter sempre a preocupação com pesquisas, inovações e formação para a ação, objetivando fazer a diferença qualitativa no desenvolvimento dos aprendizes. A formação deve ser planejada a partir dos contextos das instituições e do conhecimento dos profissionais a serem envolvidos no processo de formação. Tem como objetivo reconstruir caminhos, saberes e fazeres, em movimentos de ação-reflexãoação, para o fortalecimento do educador e consequentemente do ensino, assim como da aprendizagem, visto que não há ensino sem aprendizagem. Em uma proposta de formação para alcançar resultados de qualidade, o professor precisa sentir desejos de mudança e se mobilizar para quebrar paradigmas, rever as resistências, constituir-se como aprendiz, acreditar nas possibilidades de ultrapassar os limites já conquistados e não se colocar como alguém que tudo já aprendeu. Como educadores acreditamos que as mudanças só ocorrem se a pessoa, alvo da formação, desejar mudar, o que não muda não permanece igual, cristaliza-se e fica pertencente há um tempo que já passou e sem sentido para os novos tempos. O início de ano é sempre tempo de repensar, de reaprender, de reconstruir-se para ser e Aprender a Ser. Desejamos que nos olhares de 2013 estejam presentes metas de superação dos desafios que a escola de hoje tanto necessita para MUDAR. Emilia Cipriano é Doutora em Educação, Mestre em Psicologia da Educação e Pesquisadora da Infância. Claudio Castro Sanches é Mestre em Educação, Especialista em Gestão Educacional e Pesquisador da Infância. www.aprenderaser.com.br Direcional Educador, Fevereiro 13 Direcional Educador, Fevereiro 13 GESTÃO DA APRENDIZAGEM NA SALA DE AULA 17 NossosEDUCAÇÃO alunos e as AMBIENTAL drogas Nossos EDUCAÇÃO alunos AMBIENTAL e as drogas De Vladivostok ao Cerrado: jogar para se divertir... e aprender... 18 ocê sabe onde fica Vladivostok? E Omsk? Dudinka? Vancouver? Se você respondeu afirmativamente a essas perguntas, há uma boa chance que você tenha jogado War quando era criança. Claro que nenhum de nós jogou War com a intenção de aprender geografia, mas eis que, de fato, aprendemos. Inúmeros estudos mostram que a grande maioria de nós aprende com mais facilidade com o que fazemos por nós mesmos do que com o que lemos, escutamos ou até mesmo vemos. No caso do War e de muitos outros jogos, a experiência real é substituída pelo jogo, criando um simulacro de vivência e alavancando a aprendizagem, mesmo que não haja uma intenção explícita. No caso da preocupação com a natureza, muitas vezes é possível dar às crianças oportunidades de experiências reais, mas dificilmente tais experiências abarcam o todo. Ou seja, mostrar e experimentar alguns dos processos biológicos deve ser parte integrante do aprendizado, mas não oferece à criança a dimensão da questão ambiental. Em geral, as crianças possuem uma empatia em relação à natureza que os adultos perderam ao longo da vida. Ao serem confrontadas com uma informação sobre uma espécie ameaçada, por exemplo, as crianças reagem penalizadas querendo saber mais e querendo descobrir se não há como salvar aquela espécie. Os adultos, por sua vez, em geral têm uma visão mais utilitarista e querem saber que diferença fará em sua vida cotidiana o desaparecimento daquela espécie. Conseguir preservar essa empatia, pelo menos em parte, é, ao meu ver, um dos segredos da formação de adultos mais preocupados e responsáveis com o meio ambiente. As atividades e produtos de popularização da ciência podem ajudar nisso: desde fomentar a curiosidade e o conhecimento sobre outras espécies e sobre os processos biológicos presentes no planeta até oferecer uma visão mais completa de consequências das ações humanas sobre o meio ambiente. Livros de popularização da ciência têm seu papel, principalmente auxiliando os leitores a refletir e a fazer conexões entre as questões apresentadas e seu dia-a-dia. Os jogos, por sua vez, apresentam uma dimensão a mais: eles agregam a experiência, a vivência, dando intensidade para o processo de aprendizagem. A experiência com os jogos desenvolvidos pela Biolúdica, nossa oficina de criação de jogos com temas biológicos, mostra que o aprendizado pode se dar de forma intensa, rápida e divertida, corroborando com a ideia de que os jogos podem funcionar como simulacros das experiências em termos de eficiência de aprendizagem. Por exemplo, um dos jogos da Biolúdica é o “Bioquê?”, um jogo de desafios biológicos (veja quadro 1, na página 20). O objetivo do jogo é encontrar o mais rápido possível a carta ilustrada que corresponde àquele desafio e colocála no centro da roda de jogo, dizendo “biologicamente correto”. São 50 desafios diferentes, 63 cartas ilustradas e para cada desafio, há muitas respostas possíveis. Parte do conteúdo dos desafios é coberto no 4º ano do Ensino Fundamental e parte nos dois anos subsequentes. Nossa experiência maior é com alunos do 4º ano que rapidamente passam a dominar todo o conteúdo do jogo, sem mesmo se darem conta de que aprenderam o que é um polinizador, quais são os animais do Cerrado ou da savana africana. Como muitas dessas crianças jogam muitas vezes ao longo do tempo, é possível observar que o conteúdo é fixado com extrema facilidade. O jogo também suscita grande curiosidade sobre outros conteúdos relacionados com animais e plantas. Um outro jogo, o “Metamorfus”, trabalha os estágios de vida de alguns organismos que fazem metamorfose. As crianças que, por vezes, nem sabem que formigas e besouros fazem metamorfose completa e que libélulas e cigarras fazem uma metamorfose incompleta, dominam esse conteúdo rapidamente no começo do jogo e não esquecem mais. Um outro jogo Direcional Educador, Fevereiro 13 Direcional Educador, Fevereiro 13 Por Nurit Bensusan 19 PÁGINA DO PSICOPEDAGOGO EDUCAÇÃO AMBIENTAL Eu começo, nós recomeçamos: a volta às aulas! Quadro 1: o jogo Bioquê?: exemplos de desafios. 20 ainda, o “Tsunami”, tem como objetivo formar ambientes costeiros, enfrentando ameaças e tendo que sacrificar animais marinhos para combatê-las. É interessante notar, no processo do jogo, que mesmo se tratando de um jogo competitivo, as crianças relutam em se desfazer de suas cartas com criaturas marinhas porque elas são “tão bonitinhas”, ou seja, fica evidente a empatia com essas criaturas. Criar jogos físicos, de papel, de cartas, como o Bioquê?, o Metamorfus e o Tsunami em tempos de computadores, tabletes e outros equipamentos eletrônicos, é um desafio, mas uma roda de jogo ainda exerce sobre as crianças um fascínio, assim como a natureza. Juntar esses dois elementos pode ajudar na preservação do interesse dessas pessoas por temas ambientais no futuro. Além disso, os jogos trazem um outro tipo de aprendizado, ligado à interação social: ajudar as crianças a aprenderem a perder sem se exasperar e a ganhar sem tripudiar. Trata-se de algo fundamental para transformá-las em adultos mais tolerantes e responsáveis. Por fim, vale ressaltar, mais uma vez, que o interesse das crianças pelas questões ambientais é, pelo menos em parte, fruto de suas experiências e os jogos de uma forma alternativa simulam essas experiências. O ciclo do aprendizado, porém, só se completa se o jogo for instigante e acima de tudo divertido. Toda a experiência lúdica fracassa se as crianças não acham o jogo interessante. A expectativa da Biolúdica, com o trabalho que desenvolvemos, é que essa vivência, de conhecimento, mas também de diversão, levada para a idade adulta pode se traduzir numa continuidade da empatia com a natureza verificada na infância e fazer com as “gentes grandes” que essas crianças vão se tornar tenham uma visão mais integrada e menos utilitarista do meio ambiente. Exemplos de cartas ilustradas. Nurit Bensusan é uma ex-humana. Diante dos descalabros constantes de nossa espécie, desistiu de ser Homo sapiens e, no momento, tenta se tornar uma libélula, mas continuar bióloga. Enquanto isso... fez um mestrado em Ecologia e um doutorado em Educação pela Universidade de Brasília. Trabalha com conservação da biodiversidade em áreas protegidas há mais de 20 anos e possui uma longa experiência de reflexão e pesquisa sobre temas relativos às áreas protegidas, à conservação das paisagens, ao acesso aos recursos genéticos e aos conhecimentos tradicionais e à biotecnologia. Além disso, escreve livros de popularização da ciência para adultos e crianças, cria jogos com temas biológicos e fica inventando moda, como o coletivo de ideias Biotrix (www.biotrix.com.br) e a Biolúdica (www.bioludica.com.br). Além disso, mantem um blog, Nosso planeta (http://oglobo.globo.com/blogs/nossoplaneta/), que contribui para conectar biodiversidade, cultura e ciência. Nurit Bensusan é bióloga e engenheira florestal, pós-graduada em História e Filosofia da Ciência pela Universidade Hebraica de Jerusalém, mestre em Ecologia e doutora em Educação pela Universidade de Brasília. Tem diversos livros publicados, entre eles Biodiversidade: é para comer, vestir ou passar no cabelo e Meio Ambiente: e eu com isso? (Editora Peirópolis). retorno às aulas sempre constitui um momento de grande ansiedade para as crianças e não só para aquelas que vão pela primeira vez à escola. Tal sentimento toma de surpresa também a muitos pais, que se vêem entre um turbilhão de sentimentos, já que esse momento reúne fatores que envolvem tanto a separação da criança do núcleo familiar, uma considerável mudança de hábitos do dia a dia, além do assumir de novos compromissos, o que gera compreensível medo do desconhecido. E é claro, atinge os professores que nesse momento devem lidar com as expectativas das famílias, da instituição e suas próprias angústias. O fim das férias, especialmente para as crianças pequenas, que ainda não dominam bem a noção de tempo, parece mais um rompimento brusco de um período de diversão e alegrias, do que o início de uma nova fase onde vão crescer e aprender. È comum reclamarem e pedirem aos pais para não irem à escola, colocando mil e um obstáculos para tal. Como ajudar essas famílias? A primeira providencia é preparar lentamente a criançada para esse momento, introduzindo o assunto no meio à conversa do dia a dia com comentários sobre algum aspecto dessa nova fase. A compra dos uniformes pode ser um bom começo dessa conversa, mostrando o quanto já estão crescidas! E deixar que usem uma ou outra peça em casa, alguns dias antes, seja o tênis, a camiseta, a mochila, para que se familiarizem e ouçam mais comentários (positivos) sobre seu desenvolvimento. Passear e passar na porta da (nova) escola e até arranjar um jeitinho de encontrar a futura professora ou uma outra funcionária que permita que a criança brinque um pouco no parquinho, pode criar uma boa motivação para o primeiro dia de aulas! Fazer uma lista com os lanchinhos preferidos, comprar um pacote de bolachas, balas ou pirulitos (consultar antes a escola!) para distribuir entre os novos coleguinhas, pode render uma popularidade relâmpago, mesmo para os mais tímidos. Crianças um pouco mais velhas já sabem (pois viveram algumas vezes a situação), que as coisas vão mudar e não exatamente no sentido que elas gostariam: acabaram os horários flexíveis, os passeios durante a semana e as conversas sem fim com os amigos. Da mesma forma, os pais devem ir fazendo os horários da rotina voltarem durante a última semana de férias, para evitarem que a primeira semana de aulas se torne um problema para todos: família, criança e escola. Vejo que (infelizmente) algumas famílias esquecem que crianças e principalmente as mais novinhas, do ensino infantil, têm necessidade de horários de alimentação e sono rotineiros, os quais não saem de férias... e há casos que mesmo os bem pequenos, acompanham seus irmãos mais velhos, indo comer e dormir a qualquer hora. Dessa forma, deixam de aproveitar o sol da manhã, o dia fica curto, brincam pouco ao ar livre, com frequência se alimentam de lanches e de tão excitados com o excesso de estímulos, começam a ter dificuldade para dormir bem. Ou seja: a saúde em geral e o crescimento dos pequenos ficam prejudicados sem a menor necessidade! Um outro fator importante, logo no início das aulas, é fazer um lembrete aos pais: problemas de aprendizagem não “desaparecem” sozinhos nas férias e nem na troca de escola ou de professora, simplesmente, como uma mágica. Se a criança tinha alguma dificuldade durante ou no final do último ano letivo, é importante providenciar uma avaliação profissional ou o retorno ao tratamento já iniciado. Todas as crianças têm pavor de serem mal sucedidas perante seus colegas de classe: isso gera baixa autoestima e os desmotiva cada vez mais a quererem ir à escola e se empenhar em aprender. Como tudo que se corrige cedo é mais fácil de encontrar boa solução, é interessante preparar os filhos para o retorno às aulas dando-lhes maiores chances de sucesso nessa parte tão importante de suas vidas: a escola. Maria Irene Maluf é Pedagoga Especialista em Psicopedagogia e Educação Especial, editora da revista Psicopedagogia da ABPp, Coordenadora do Núcleo Sul e Sudeste do Grupo Saber e coordenadora SP do Curso de Especialização em Neuroaprendizagem - Instituto Saber/FACEPD. Site: www.irenemaluf.com.br E-mail: [email protected] Direcional Educador, Fevereiro 13 Direcional Educador, Fevereiro 13 21 EDUCAÇÃO INFANTIL EDUCAÇÃO INFANTIL Uma das primeiras manifestações artísticas da criança a partir dos dois anos é a garatuja ou rabiscos, fase em que o desenho para a criança, nada mais é do que uma ação sobre a superfície e essa ação lhe proporciona prazer. A garatuja é característica do período sensório motor, fase que vai de zero a dois anos de idade e foi estudada por Piaget: Desenho com carvão em caixas. “A criança é um ser de competência, capaz, curiosa e criativa... expressiva, sensível. A infância é a época das descobertas, aventuras e magias”. (Ivete de Lima) Direcional Educador, Fevereiro 13 Introdução Apesar das mudanças ocorridas na Educação Infantil ainda precisamos avançar muito na questão do trabalho com artes. A arte não é mimese da realidade, ela é fruto da experiência estética e humana. 22 1. O desenho: arte de criar e imaginar A Educação infantil há pouco tempo passou a assumir o caráter educativo e com isso as brincadeiras, jogos, danças, contos e o próprio desenhar passaram a assumir novos valores. “A aprendizagem refere-se à aquisição de uma resposta particular, aprendida em função da experiência, obtida ou não. Enquanto que o desenvolvimento seria uma aprendizagem de fato, sendo este o responsável pela formação dos conhecimentos”. É através do faz de conta que a criança (re) inventa o mundo. Transforma “sapo em príncipe”, pensamentos em formas: ao desenhar uma série de formas e riscos desordenados a criança dá nome aos traçados (gato, cachorro, mamãe, papai, etc.). Tanto a criança como o adulto que necessitam deslocarem a ordem pré-estabelecida do mundo transformam uma coisa em outra, ou seja, artistas e crianças percebem o mundo e dão sentido a ele de formas singulares. Como exemplo, podemos citar uma das obras de Picasso, Cabeça de touro (1931). Pablo Picasso reúne um guidão e o selim de uma bicicleta, dando ressignificação de objeto de arte. Os artistas brincam com o cotidiano, com os mitos, histórias e pensamentos. Dão um novo significado a alguma coisa já vista anteriormente e do supostamente sabido. De várias formas os artistas antecipam saberes, através de suas produções. Como por exemplo, a expressão de dores e massacre da humanidade na obra Guernica (1937), de Pablo Picasso, dentre outras. Na Educação Infantil é fundamental que a criança tenha o seu espaço e a oportunidade de fazer arte, criar, explorar materiais, poder se expressar. Que em meio a várias atividades a criança possa fazer suas escolhas sobre o que quer fazer. Cabe à escola organizar estes espaços de forma significativa e próxima às práticas sociais. E para que a criança expresse o seu poder criativo, tanto a escola como o professor não devem bloquear o poder criativo da criança, ou seja, ao programar uma atividade o educador deve fazer propostas de atividades orientadas, porém não deve tirar da criança a oportunidade de deixar a sua marca pessoal. A criança tem a necessidade de se expressar, criar, se manifestar para aprender. Desta forma a criança vai descobrindo esquemas para desenhar, pintar, modelar e conhecer a arte. Direcional Educador, Fevereiro 13 Fotos: Ivete de Lima/CEI Palmira dos Santos Abrantes Pequenos Artistas 23 EDUCAÇÃO INFANTIL Segundo Duarte JR, 1985, p.67 “A arte se constitui num estímulo permanente para que nossa imaginação flutue e crie mundos possíveis, novas possibilidades de ser e sentir-se. Pela arte a imaginação é convidada a atuar, rompendo o estreito espaço que o cotidiano lhe reserva”. 2. A arte e o trabalho do professor na Educação Infantil Direcional Educador, Fevereiro 13 A arte tem a sua essência própria, ela constitui-se como experiência estética e humana. Olhando-a por esta ótica, faz-se necessário que o professor tenha noção da dimensão cultural e estética que tem a arte. É primordial que o professor apresente para os alunos a vida dos artistas, o contexto em que as obras foram criadas, as técnicas utilizadas e os sentimentos expressos nessas obras, que transportam em si a visão de mundo do criador. 24 É de suma importância que o professor visite exposições culturais e artísticas (museus, cinemas, ateliês, teatros, etc.), como área de conhecimento e formação humana. E digo ainda, a criança é um ser curioso e capaz de explorar sempre. O educador precisa aproveitar esta fase da criança, criando situações que estimulem e despertem ainda mais a sua curiosidade. A arte é vista como uma “linguagem” que se manifesta de várias maneiras (pela dança, música, modelagem, escultura, pintura, etc.). da atividade infantil, progressivamente responsável por seus comportamentos afetivos, intelectuais e culturais. Eis aí um começo seguro para a conquista de uma vida adulta (FREINET apud SAMPAIO, 1994, p.30). pione, 1989. DUARTE JR, João Francisco. Por que arte-educação? 2ª ed. Campinas: Papirus, 1985. IAVELBERG, Rosa. Para gostar de aprender arte: sala de aula e formação de professores. Porto Alegre: Artmed, 2003. A ciência não é estática, está sempre em transformação. Nós, como educadores conscientes e mediadores, precisamos rever a nossa prática cotidiana, estarmos prontos a inovações. E isso requer conhecimento, vivência, pesquisa. O educador mediador precisa fazer junto com o educando, para que se chegue a um produto final com êxito, mas para isso faz-se necessário que o educador tenha domínio do tema e uma vivência prática, antes de propor qualquer experiência ao aluno. Referências bibliográficas ALENCAR, Eunice M.L. Soriano de. Como desenvolver o potencial criador: um guia para a libertação da criatividade em sala de aula. Petrópolis: Vozes, 1990. BESSA, Marylda Artes plásticas entre as crianças. 3 ed. Rio de Janeiro José Olimpio,1972. Para Freinet: A livre expressão facilita a criatividade da criança, no desenho, na música, no teatro, extensões naturais volvimento do grafismo infantil. São Paulo: Sci- CASTORINA, J. A. Piaget a Vygotsky novas contribuições para o debate, Ática 2003. DERDYK, E. Formas de pensar o desenho: desen- MOREIRA, A.A. O espaço do desenho: a educação do educador. 12 ed. São Paulo: Loyola. 2008. SAMPAIO, Rosa Maria Whitaker Ferreira. Freinet: Evolução Histórica e Atualidades. 2ª ed. São Paulo: Scipione, 1994. Ivete de Lima é licenciada em Artes Visuais e Pedagogia, Pósgraduada com espec ia lizaç ã o em Psicopedagogia, Educação Infantil, História e estética da arte, Arte e educação e Docência do Ensino Superior. Professora Efetiva de Educação Infantil no CEI Palmira dos Santos Abrantes da Rede Municipal de São Paulo - Prefeitura de São Paulo/SME. E-mail: [email protected] Direcional Educador, Fevereiro 13 Para trabalhar com artes o professor não precisa ser um especialista no assunto, mas ter conhecimento sobre a história da arte e experiência pessoal em arte, como a criança aprende e se desenvolve nas atividades artísticas. 25 CURSO CURSO MÓDULO I INTRODUÇÃO: SOBRE A INFÂNCIA HOJE um dia desses, na internet, olhando pequenos filmes de crianças brincando, deparamo-nos com uma infinidade de possibilidades. Encontramos o menino Maurício, brincando de boneca no quintal. Uma delícia! Fez um buraco no chão, encheu de água e ali, naquele buraco com água lamacenta, ele dava banho na boneca. Colocava-a de ponta cabeça na água, esfregava bem os olhos, lavava os pés... até que achou que havia pouca água e foi buscar mais. Secou a boneca com um pano estranho, mas brincou, brincou de verdade. Em outra situação, vimos uma menina brincando de contar história para sua boneca. Quase dois anos, colocava a boneca numa cadeira de brinquedo e, com dois livrinhos em mãos, arrumava-se toda para contar histórias. Dizia “Era uma vez...” e mostrava algumas páginas do livro para a boneca, mas não contava o que havia no livro. Tivemos oportunidade de conhecer crianças pequenas que colecionam brinquedos. Ganham, as mães guardam, e elas não brincam. Assistem ao filme da galinha, do palhaço, dos bichinhos que brincam no quintal e muitas outras coisas, mas não brincam. Outros vídeos mostram crianças brincando com outras crianças, mesmo que pequenas, dividindo o espaço, jogando, brigando, às vezes, mas juntas. Ficamos admiradas ao ver como, num só país, existem tantas formas diferentes de “ser criança”. E se pegássemos filmes de outros países, de outras realidades, outras culturas? E se fizéssemos uma visita na história da infância no mundo? O que será que iríamos descobrir? [...] estudos e pesquisas têm mostrado, em larga escala, uma nova visão de criança. Essa nova visão nos permite compreender seu desenvolvimento e a forma como ela constrói seu conhecimento, entendendo-a como um sujeito que, desde o nascimento, está inserido num contexto social e dele participa ativamente (SANTOS, 2010, p. 07). Convidamos você a fazer um passeio pela internet, buscando a infância em vários momentos históricos para que complemente e aprofunde o que nós descobrimos: infância é um conceito que não é fixo. Nos diferentes momentos da história da humanidade, existiram distintos conceitos a respeito da infância, distintas formas de delimitar o período da existência e variadas formas de encarar o comportamento daqueles que fazem parte do primeiro período de vida de um ser humano. Em um grupo de pesquisa do qual uma de nós faz parte, está sendo realizado um estudo sobre infância e criança, e descobrimos que infância é uma categoria que permanece ao longo da história, mas que é interpretada de formas diferentes, ou seja, infância é uma permanência feita de mudanças. A criança, ao longo da história e da evolução do homem, nem sempre foi considerada como é hoje. Antigamente, ela era caracterizada como um ser ingênuo, inocente, gracioso ou, ainda, imperfeito ou incompleto. Essas noções constituíram-se em elementos básicos que fundamentaram o conceito de criança, entendido como um ser “sem existência social, miniatura do adulto, 2 abstrata e universal”. Portanto, um conceito que independe da cultura ou classe social. Atualmente, uma nova concepção sobre criança vem tomando espaço no panorama educacional: a criança como ser social (SANTOS, 2010, p. 09). Na época do homem das cavernas, apesar da categoria infância existir, ela não era percebida. Com o decorrer da história, ela foi sendo percebida e colocada em vários lugares: como uma categoria que já nasce em pecado; como anjos intocáveis, assexuados; como mão de obra para auxiliar na renda familiar; como...; como... Descobrimos, então, que não existe a infância, mas as infâncias, cada uma delas influenciada pelo espaço geográfico em que habita, pelo momento histórico em que vive, pelo nível sócio-cultural no qual convive, pela língua que é falada, pela distância das pessoas responsáveis por elas, pela concepção de ser humano, de mundo e de educação que impera onde nasceu, onde se encontra mergulhada. Muitas infâncias... Por isso, é difícil prever o desenvolvimento; é difícil afirmar que uma criança está atrasada ou adiantada. Tudo vai depender de como, naquela sociedade, a categoria infância é compreendida, estimulada; enfim, como é cuidada e educada. Então, se morássemos em tal cidade, poderíamos dizer que todas as crianças daquela comunidade deveriam se comportar de tal maneira e desenvolver-se em tal ritmo? Não, não... Ledo engano. Descobrimos que, além de termos muitas infâncias, nós temos também muitas crianças, e cada uma delas é um mundo de peculiaridades, de modo de ser e de relacionar-se com a vida e com as coisas que fazem parte dela. Para Arroyo (2010), “a escola tem dificuldade em reconhecer a diversidade, pois classifica e hierarquiza as crianças em um padrão único”. Só por curiosidade, entre na internet e busque um site da Folha de São Paulo, chamado O Mapa do Brincar (O MAPA, 2012). Veja a diversidade de possibilidades de infância e de criança que temos em nosso país; veja quantas interpretações diferentes uma mesma brincadeira pode ter. Delicie-se com crianças brincando e aprenda com elas. Pensando nessa diversidade é que acreditamos que a divisão, na escola, de crianças por idade, por exemplo, é pura convenção, pois elas não têm as mesmas experiências anteriores, não têm os mesmos pais, os mesmos avós, as mesmas histórias, as mesmas descendências, a mesma forma de alimentar-se, etc. Alguma coisa relativa ao amadurecimento físico pode aproximálas; porém, dependendo de muitas variáveis intervenientes, elas não respondem da mesma forma, com a mesma prontidão. Por isso, não podemos, como pessoas que educam crianças pequenas, fazer um processo avaliativo que use a comparação entre elas como princípio. Cada criança que faz parte da nossa turma de alunos deve ser percebida e interpretada como um ser único, como alguém que está chegando de um sistema privado de educação (a família) para um sistema público de educação (a escola). Ela vai aprender a conviver nesse sistema público, mas não vai aprender a ser igual. Como perceber a criança como única, com tantos alunos em uma turma? A pergunta é importante, mas a resposta não pode ser a da ação massificada, na qual todo mundo faz a mesma coisa. Usam-se essas ações por quê? Por que facilitam o encaminhamento pedagógico e administrativo da escola? Precisamos buscar respostas para atender o processo educativo, e não para facilitar ao adulto. Se tivermos atividades menos dirigidas, podemos ver as crianças movimentando-se, podemos perceber aquelas que nos chamam atenção num dia, observar outras em outro dia ou outra atividade. É possível solicitar à sua auxiliar que desenvolva uma atividade com as crianças, e você se retirar para observar o grupo e cada um dos seus elementos... Você pode usar qualquer outra estratégia que deseje, menos mecanizar para ser mais fácil para você. SOBRE A EXPERIÊNCIA NA EDUCAÇÃO INFANTIL A criança chega à escola, saindo de um espaço protegido, no qual ela é, muitas vezes, o personagem mais importante, no qual aprende rituais cotidianos. As crianças, ao vivenciarem e participarem dessas formas usuais autênticas de comportamento em sociedade, introjetamnas naturalmente, assimilando sua essência e sua mensagem, captando assim a maneira como seus pais pensam, sentem e relacionam-se com as outras pessoas (OLIVEIRA, 2006, p. 12). Na escola, no entanto... que turbilhão de sensações... que medinho... que vontade de chorar... de morder... de se defender dessas pessoas que não conhece! O trânsito entre esses dois espaços deve ser realizado de forma cuidadosa, compreensiva, sem muitas regras pré-estabelecidas, mas com muita confiança e segurança. A experiência nesse espaço público tem, num determinado momento, o olhar, o fazer, o cuidar maternal, sem ser da mãe, sem substituir a mãe e sem criticar a mãe. Esta é a maior experiência que uma criança da Educação Infantil vai realizar: aprender a conviver num espaço comum a todos, sain- do do canto que é seu e de seus familiares. Algumas delas precisam viver essa experiência muito mais cedo do que outras. [...] aprender a conviver é, talvez, o mais nobre e difícil desafio do homem. A escola pode ser vista como um dos lugares por excelência dessa aprendizagem (OLIVEIRA, 2010, p. 19). A primeira lição, para a criança, é esta: aprender esse novo espaço, aprender a conviver com outras crianças e outros adultos. É preciso que seja permitido a ela viver essa experiência de maneira inteira e intensa; que o adulto leve a sério seus sentimentos, ideias e ações; que ele possa entender o que não é dito a partir do que a criança mostra; que considere que essa é uma situação autêntica de aprendizagem; que perceber a criança em sua unicidade, considerando-a um ser “em situação” seja seu maior trunfo. A experiência, segundo Larrosa (2004), é viver de verdade, deixar-se tocar, deixar passar por dentro, experimentar, saborear, gostar ou não gostar... Chegar à escola é uma experiência fantástica, se ela puder ser experimentada de verdade. [...] a experiência é cada vez mais rara por excesso de trabalho. Esse ponto me parece importante porque às vezes se confunde experiência com trabalho (LARROSA, 2004, p. 158). Muitas vezes, em nome das atividades que estão preparadas para o dia, professores e educadores da infância inibem esta aprendizagem maior, esta que vai lhe proporcionar o crescimento, a mudança de paradigma. Aquela que permite à criança ganhar um novo jeito de olhar o mundo. Lição, segundo Larrosa (2006), vem de lectio, que quer dizer leitura. Uma leitura e, ao mesmo tempo, uma convocação à leitura. Na Educação Infantil, essa leitura é 3 CURSO ARTE Arte na Educação: EXERCÍCIOS: PENSANDO SOBRE O QUE FAÇO À LUZ DOS FUNDAMENTOs Fazer um curso é percorrer um caminho que não deve ser somente teórico. Fazer um curso é percorrer um caminho que permita vislumbrar a relação dos conceitos com a prática; é poder se modificar de verdade, e não apenas acumular certificações que, aparentemente, elevem o status profissional. Fazer um curso é colocar os saberes à prova, questionar-se, fazer relações, criticar o que chega de novo, filtrar e modificar os próprios esquemas, desequilibrar-se, buscar o equilíbrio e aprender. Pensando assim, um curso precisa propiciar provocações para que o desequilíbrio aconteça; e nada melhor do que perguntas para que o leitor, neste caso aluno deste curso, possa aprender de fato. Neste momento, precisamos que você se volte um pouco ao seu fazer e, assim, possa avançar, integrando melhor o discurso e a ação. Para isso, propomos a você uma série de questões: • Que ideia de infância é veiculada pela cultura na qual você trabalha? • Existe uma influência da mídia? Na região em que mora, essa influência é significativa ou não? 4 • No caso de levantar a hipótese de que há influência, pesquise entre seus alunos sobre o tempo que permanecem assistindo TV, por exemplo; sobre que tipo de programas assistem; sobre que ideias de infância são divulgadas por esses programas. • Observe a publicidade existente em sua cidade e veja que ideia de infância está sendo “vendida”. • Na internet, assista a um documentário produzido no Brasil: Criança, a Alma do Negócio (CRIANÇA, 2010). O que você, como educador da infância, pode aprender? Que reflexões você pode fazer? O que faria de forma diferente, a partir de suas reflexões? Que tipo de discussão poderia organizar junto às famílias? • Como é realizada a recepção às crianças que chegam à sua escola pela primeira vez? • Em sua escola, existe uma regra rígida ou a chegada acompanha o ritmo de cada criança? Ou, ainda, ela é realizada de outra forma? • Qual a participação da família no momento em que a criança inicia o trânsito entre o espaço privado e o espaço público? Procure saber como acontece esse momento em diversas escolas. • Como você organiza as atividades para que a criança vá aprendendo a diferença entre esses dois espaços? • E a organização do tempo? É rígida ou flexível? Quais aspectos são privilegiados na organização do tempo? Essa organização inibe a convivência ou permite o desenvolvimento dessa aprendizagem? A trajetória infantil não pode ser pensada pela ótica da razão. Ela passa, necessariamente, pela via do brincar (SANTOS, 2010, p. 07). Concordando com Santos, esperamos você em nosso próximo módulo, no qual exploraremos a brincadeira na infância. uma iniciativa para entender e trabalhar arte 3. Cor, Linha e produção artística de Picasso Por Adalberto Amaral, Elaine Kamke, Iracy Maria de Oliveira Boamorte, Margareth Mariano da Silva e Sandra Regina do Amaral Referências bibliográficas ARROYO, M. Repolitizar os tratos da infância e adolescência populares. Pró-menino. 2009. Disponível em: <http://www.promenino.org.br/Ferramentas/ DireitosdasCriancaseAdolescentes/tabid/77/ ConteudoId/cc1271d8-2fcd-4a74-aaed-671ced8612b5/Default.aspx> Acesso em: 29 set. 2012. CRIANÇA, A ALMA DO NEGÓCIO. Produção: Maria Farinha. Direção: Estela Renner. Disponível em: <http://www.culturainfancia.com.br/portal/index. php?option=com...>. Acesso em: 05 maio 2010. LARROSA, J. Linguagem e educação depois de Babel. Tradução: Cynthia Farina. Belo Horizonte: Autêntica, 2004. LARROSA, J. Pedagogia profana: danças, piruetas e mascaradas. Tradução: Alfredo Veiga. Belo Horizonte: Autêntica, 2006. O MAPA do Brincar. Folha de São Paulo. Disponível em: <www.mapadobrincar.folha.com.br/projeto/>. Acesso em: 01 out. 2012. OLIVEIRA, V. B. de. Rituais e brincadeiras. Petrópolis: Vozes, 2006. OLIVEIRA, V. B. de; SOLÉ, M. B. i; FORTUNA, T. R. Brincar com o outro: caminho de saúde e bemestar. Petrópolis: Vozes, 2010. SANTOS, S. M. P. Brinquedo e infância: um guia para pais e educadores em creche. 10. ed. Petrópolis: Vozes, 2010. forma como vemos a arte na sociedade interfere na forma como a arte é vista dentro da escola. Duarte (1988) lembra que o germe inicial de nossa educação artística é identificado na primeira metade do século XIX. Desse período ele destaca dois conceitos presentes ainda em nossa sociedade: a arte como atividade supérflua e a desvalorização das atividades manuais (exercidas na época pelos escravos). Vale destacar ainda que a desvalorização da arte e de suas manifestações foi reforçada pelo modo de produção capitalista. Para Ostrower (2003), isso ocorre porque é retirado da arte o caráter de trabalho, o que fez com que ela fosse reduzida a algo supérfluo e o ato de criar, fosse compreendido como um relaxamento ou um esvaziamento pessoal, quando na verdade representa a intensificação do viver. A Arte é, portanto, um trabalho criativo, que ajuda o homem a ampliar a consciência de si e do outro. Partindo desse princípio Ostrower (2003, p. 125) defende que “Na obra de arte, qualquer que seja o estilo e a época, transparece uma tomada de consciência ante a realidade vivida, ainda que o indivíduo formule sua experiência em termos subjetivos”. Por isso, pode-se dizer que o trabalho de um artista expressa uma verdade que nasce do real, mas que revela uma ação reflexiva sobre a sua realidade, portanto é resultante de um processo consciente e racional. Nesta perspectiva, a proposta abaixo apresentada irá se apropriar dos elementos cor e linha, mas principalmente da produção artística de Pablo Picasso. Sandra Regina do Amaral é Arte-Educadora. Doutora em Ciências da Educação, Mestre em Ciências da Educação, Especialista em Edu cação Especial Inclusiva e Psicopedagogia. Graduada em Artes Visuais, Artes Plásticas e Pedagogia. Atua como pedagoga na Prefeitura Municipal de Vila Velha (ES), professora de Arte na Prefeitura Municipal de Vitória (ES) e professora e pesquisadora na FDE. É a idealizadora e responsável do projeto de extensão e pesquisa “Arte na educação: uma iniciação para entender e trabalhar arte”. E-mail: [email protected] Conteúdo: Cor e Obra de Pablo Picasso Objetivo: Diferenciar cores quentes de cores frias, através das fases azul e rosa do artista Pablo Picasso Metodologia: - Aula expositiva: apresentar as características das cores primárias, secundárias, quentes, frias e neutras. • Cores primárias: cores puras, obtidas da natureza. Vermelho, Amarelo e Azul. • Cores secundárias: são obtidas na mistura de duas primárias. Laranja, Violeta e Verde. • As cores primárias e secundárias podem ser dividas em quentes e frias. As cores quentes (vermelho, amarelo e laranja) passam a sensação de agitação e calor; as cores frias (azul, verde e violeta) a de tranquilidade e frio. • Misturando branco e preto temos o cinza, e as três são classificadas como cores neutras. (OLIVEIRA e GARCEZ, 2004) Adalberto Amaral, Elaine Kamke, Iracy Maria de Oliveira Boamorte e Margareth Mariano da Silva são alunos de Pedagogia da FDE (Faculdade de Educação – Vitória/ES) e participantes do projeto de extensão e pesquisa “Arte na educação: uma iniciação para entender e trabalhar arte”. Da esquerda para a direita: Margareth Mariano da Silva, Iracy Maria de Oliveira Boamorte, Eliane Kamke e Adalberto Henrique do Amaral Firmiano. Direcional Educador, Fevereiro 13 realizada a partir de uma nova página da vida que é mostrada à criança: a existência de um lugar chamado Escola de Educação Infantil. Quantas coisas ela aprenderá nesta lição, nesta leitura, se nós não nos encarregarmos de artificializar esta aprendizagem, como tem sido comum nas escolas destinadas à infância! Além disso, na Escola de Educação Infantil, faz-se necessário tempo! Tempo para viver, tempo para experimentar, tempo para perceber, comparar, sentir, pensar, buscar palavras, expressar, ouvir e tantas outras coisas necessárias para sua vida. 29 ARTE ARTE talhes) e simplificando (diminuindo os detalhes). Vocês farão com o animal que quiserem: cachorro, pinguim, coelho, cavalo, gato ou qualquer outro (devem estar expostas para o aluno as imagens de alguns animais, para facilitar seu estudo visual e produção). - Será entregue ao aluno uma folha com 8 quadros, para que ele simplifique a imagem utilizando a linha como elemento plástico. Assim como o artista não vamos colorir, mas vamos utilizar a técnica do sfumato (pinta-se utilizando apenas grafite e espalha-se utilizando o dedo ou o algodão). Vale lembrar que colorir pressupõe trabalhar com mais de uma cor, no entanto, é possível pintar sem colorir. Recursos: cópia da obra; figuras de animais; xérox da folha; lápis de escrever; borracha; algodão (duração média: 1 aula). - Orientações ao aluno: Assim como Picasso fez uso da cor para expressar sentimentos e sensações, nós também faremos: decida o que você quer representar (algo que te deixa alegre ou triste?). Escolha sobre o que vai desenhar e faça o desenho com lápis de escrever, depois pinte e contorne de preto. Se for alegre, você irá pintar utilizando apenas as cores quentes e neutras, se for triste, utilizará apenas as cores frias e neutras. Recursos: cópia colorida das obras; lápis de cor; papel A5; giz de cera; canetinha (duração média: 1 aula). Conteúdo: Linha Objetivo: Produzir desenhos com apenas uma linha Metodologia: - Apresentar desenhos de animais feitos com apenas uma linha, para que os alunos conheçam algumas possibilidades. Direcional Educador, Fevereiro 13 30 - Cada aluno receberá uma folha de A4 com 8 quadros. Em cada quadro ele fará o desenho de um animal. Para que ele compreenda o processo de construção do desenho, e perceba com maior facilidade o percurso feito pela linha, além de mostrar o desenho pronto o professor deve desenhar no quadro uns dois desenhos, para que os alunos possam acompanhar o processo de construção e o percurso da linha. Em seguida, sozinho, deve tentar descobrir os outros. Para destacar a linha, ao final do trabalho pode-se contornar com canetinha. Recursos: pranchas com exemplo; xérox da folha; lápis de escrever; borracha; canetinha (duração média: 1 aula). Conteúdo: Linha Objetivo: Demonstrar que uma mesma figura pode ser desenhada de diferentes formas Conteúdo: Formas expressivas de Pablo Picasso Objetivo: Identificar e se apropriar dos elementos que compõem a obra “Mulher da poltrona vermelha”. - Mostrar parte da obra “11 Touros” de Picasso. O artista, assim como em uma fase explorou a cor para expressar-se, em outros momentos apropriou-se da expressividade das linhas. Chamar a atenção para o fato de Picasso iniciar com um desenho que representa o animal o mais figurativo possível, ou seja, rico em detalhes e, aos pouco vai retirando parte das linhas, até que o desenho se torne simplificado, ou seja, com o mínimo de detalhes, mantendo apenas as linhas que considerou necessária. É importante ficar claro para os alunos os dois tipos de desenho: ambos figurativos, um mais naturalista e outro mais simplificado. Vale destacar para o aluno que não existe uma única forma de desenhar, nem uma forma correta e outra errada, são apenas diferentes. Metodologia: - Mostrar partes da obra “Mulher na poltrona vermelha” de Picasso, mostrar que assim como fez estudos com a imagem do Touro, também reconstruiu imagens de mulheres. Ao apresentar as partes do corpo é interessante mostrar uma folha com todas as partes. - Pensando em ampliar a participação dos alunos é interessante utilizar as peças recortadas em tamanho visível para montar no quadro, pedir que identifiquem a cabeça, o pescoço, os seios, a barriga e os braços, montando uma mulher com as suposições. Com outras peças montar outra mulher, colocando as partes em outros lugares, assim será possível estimular a imaginação da criança e ao mesmo tempo, desmistificar o medo de errar. Assim eles poderão, mesmo antes de conhecer a obra do artista, brincar com suas formas. - Afim de exemplificação, pode ser apresentado o trabalho de um outro artista (anônimo), que utilizou a técnica da simplificação para representar uma pessoa. - Depois de montar pelo menos duas mulheres no quadro, apre- sentar a obra “Mulher na poltrona vermelha” (1932), mostrando como Picasso utilizou aquelas formas, identificando com os alunos o que o artista definiu como cabeça, pescoço, seios, barriga e braços. - Assim como estes artistas desenharam de forma simplificada, nós também iremos exercitar essa técnica desenhando a figura de um animal em 8 versões, iniciando de forma naturalista (rica em de- - Explorando o fato de ser uma pintura, mas lembra também uma escultura, propor ao grupo uma releitura da obra utilizando argila. Dividir a turma em grupos de 4 e orientar que um fique responsável em modelar a cabeça, outro os seios, outro o pescoço e a barriga, outro os braços. Quando cada um tiver concluído sua parte, será o momento de juntá-las, formando a mulher. Recursos: um cartaz mostrando as partes do corpo da mulher da obra “Mulher na poltrona vermelha”; 2 obras recortadas para montagem, fita adesiva (colar a montagem no quadro), uma cópia colorida da obra “Mulher na poltrona vermelha”, argila (ou massinha), copos com água, suporte para base do trabalho (papel cartão ou bandejinhas em isopor), palito de picolé (desbastar a argila), jornal para forrar as mesas (duração média: 1 aula). Considerações O interesse, a participação, o envolvimento e a empolgação tornaram essa experiência gratificante. Mas vale destacar que foi fruto de muito preparo, porque foram muitas informações novas, é necessário conhecer as imagens, o artista e seu contexto. Ao contrário do que parecia até então, planejar aulas de arte não é algo simplificado, porque é muito diferente de mandar fazer um desenho simplesmente, ou de desenvolver uma ação espontânea de riscar e pintar. É difícil definir arte, dizer até onde ela pode chegar. As possibilidades são infinitas, porque é uma forma de se expressar. É necessário saber como trabalhar. Referências bibliográficas OSTROWER, Fayga. Criatividade e processos de criação. Petrópolis: Vozes, 2003. OLIVEIRA, Jô. GARCEZ, Lucília. Explicando arte: uma iniciação para entender e apreciar as artes visuais. Rio de Janeiro: Ediouro, 2004. DUARTE Jr, J. F. Fundamentos estéticos da educação. São Paulo: Papirus, 1988. SAKALL, Sérgio Eduardo. Pablo Ruiz y Picasso. http://www.girafamania.com.br/artistas/personalidade_picasso.html. Acesso em: 22/10/2010. Direcional Educador, Fevereiro 13 Metodologia: - Aula expositiva e dialogada: Picasso (1881-1973), pintor e desenhista espanhol, fez Belas-Artes estimulado pelo pai, que era professor de desenho. Sua obra retrata principalmente fatos da vida burguesa e da vida circense. Tem vários estilos: cubista, a obra parece dividida como num espelho quebrado; surrealista, o universo dos sonhos; e, expressionista, destacando a importância das cores para demonstrar os momentos e sentimentos de tristeza e paixão (SAKALL, 2010). 31 EDUCAÇÃO INTEGRAL O Currículo Integrado Direcional Educador, Fevereiro 13 m tema recorrente nas discussões educacionais é a necessidade de repensar o sentido, o alcance, o papel e a contribuição da escola na formação dos sujeitos e na transformação da sociedade – se é que se deseja transformá-la de fato. Paulo Freire desejava e por isso seu trabalho foi tão profícuo. Um dos caminhos para esta retomada é o currículo, que jamais é neutro, está sempre a serviço de uma ou outra concepção e precisamos ter clareza de qual é para assumirmos uma posição a esse respeito. As discussões curriculares, revisões, produções, questionamentos são temas que permanecem na mesa, ora como entrada, ora como prato principal ou até sobremesa. De qualquer forma, há o reconhecimento de que o assunto não é irrelevante e nem pode ser tratado com indiferença. A ideia de um currículo mais rico, diverso e próximo da vida não parece nova. Tolstói1, já em 1859, embora não soubesse o que ou como ensinar, funda em sua própria casa uma escola para os pequenos camponeses, filhos dos servos na Rússia e acreditava na necessidade do desenvolvimento da capacidade criativa das crianças, tão necessária à vida em sociedade. “Em seus diários, ele escreve que a ‘obrigação da escola não é levar o saber, mas levar o gosto e a ideia do saber’. Para ele, ‘a escola não está na escola’, o ensino não deve ser separado da vida, daquilo que é espontâneo ao aluno e que pertence ao seu mundo de curiosidade. Ao invés de ser alvo de imposições cruéis ou de ter sua alma aborrecida por abstrações 32 inúteis, segundo ele, a criança deve ser colocada em contato com a realidade e com a natureza” (RABELLO, 2005, aba interna). A busca por um currículo nacional, mais alinhado e com pontos de partida e chegada comuns, é motivo de críticas de uns e defesa de outros e não resolverá os problemas da relação com o conhecimento, se mantiver, como hoje, cada coisa em seu lugar, em cada gaveta uma etiqueta, um conjunto de informações ou conteúdos, “caixinhas” abertas em momentos específicos, com dias e horas marcados, tempos reduzidos, profissionais com formações aligeiradas e pouca chance para o encontro e planejamento compartilhado. Com isso, a possibilidade de garan- tir motivação para que esses profissionais olhem, para além de suas já complexas molduras, buscando outras cores e formas para compor a sua produção que tenha como foco ajudar meninos e meninas a serem cidadãos do mundo, com atitudes menos nocivas para si, para o outro, para o meio. Quando são definidos conteúdos prioritários e outros – aparentemente menos urgentes - que podem transitar entre as áreas, caso o professor tenha essa percepção e disposição, as separações e hierarquias estão mantidas e a chance da interdisciplinaridade ocorrer é frágil e reduzida. Toda essa introdução pretende chamar atenção para o risco de colocar erroneamente sobre os ombros da educação integral, em alguns casos ainda incipiente, introdutória, limitada à ampliação de jornada diária para realização de atividades complementares - o que já pode ser considerado um avanço - a responsabilidade de responder à demanda do currículo integrado, e nesse contexto, todo o conjunto de sonhos, intenções, planos e necessidades da educação contemporânea. Será preciso mergulhar muito mais fundo. Cabe lembrar que a educação integral em sua concepção e intenções não é nova, menos ainda para a classe dominante que sempre teve essa possibilidade, desde os colégios jesuíticos do período colonial, os colégios e liceus onde estudava a elite imperial, em regime de internato, o mesmo se aplicava aos colégios da República, que eram dirigidos por empresários laicos ou ordens religiosas (GIOLO, 2012, apud MOLL, 2012)2. Para a escola pública, que caminha para a universalização no Ensino Fundamental, a educação integral ou ampliação de jornada – o que não pode ser considerada a mesma coisa - ainda não é uma verdade. No entanto, os municípios, escolas e comunidades que contam com essa possibilidade, têm nas mãos uma importante oportunidade de rever o jeito de ser e fazer educação, contando ainda, em muitos casos, com novos atores, partícipes do processo – quando não são apenas os professores que atuam nessa proposta – recém-chegados no contexto, mas com as malas recheadas de experiências especiais, saberes que precisam ser considerados. Imaginemos uma escola que conte com pessoas que além dos conteúdos ‘propedêuticos’ – importantes, mas que demandam ser revisitados – possam contar também com os saberes dos mestres de capoeira, artistas do grafite, atletas do skate, jogadores de xadrez, que passem a compor o time da escola para discutir trajetórias e destinos, como no conto de José Pacheco3, Três bancos, em que um professor recém-chegado à comunidade portuguesa, nos idos de 1970, pretende aproximar-se dos familiares e entender seu distanciamento da escola e tem essa oportunidade ocasionalmente, partilhando o saboroso vinho verde com um pai. Em um dado momento desta prosa, mais alegre e amiga, amparadas pelo vinho verde, já não eram um pai e um professor que ali estavam, eram dois homens preparando o projeto de vida de um outro, o filho, o aluno. A aproximação escola-comunidade é de longe no tempo, uma necessidade urgente para releituras possíveis da escola. A integração entre escola e comunidade, entre as ações que ocorrem em um período da unidade escolar e as atividades complementares realizadas na ampliação de jornada, ainda não existe em muitos lugares do território nacional, onde a educação integral ganha força e espaço para o debate. Mesmo que não seja um fato, há uma luz acesa, um farol que circula e chama atenção para o que pode e deve ser feito. Nesse fazer, possível, utópico, escola e vida dialogam – aliás, diálogo colocado em destaque desde o início desse texto. Os muros da escola não são impedimentos para que os saberes e potencialidades da comunidade tenham espaço e a devida escuta. Conquistas individuais e coletivas ocorridas dentro da escola precisam ser celebradas principalmente quando refletem soluções testadas na busca por melhores condições de vida, não em um futuro distante, o que para muitos jovens brasileiros nem vai chegar, mas para questões da atualidade, como: lixo, desperdício, arte da rua, gravidez na adolescência, patrimônio material e imaterial anônimos espalhados pela cidade, falta de perspectiva na juventude, temas para projetos que coloquem em jogo saberes e desafios que não faltam em qualquer comunidade e esses temas podem e devem ser maiores do que podem medir os cronômetros escolares. O desafio de construir este currículo integrado não pode prescindir de uma profunda discussão envolvendo muitos atores, em especial: professores, alunos, pais e gestores, sobre o sentido da escola e o que poderá ser feito nela, com ela, por ela e por meio dela nos próximos anos para reduzir o nosso sentimento permanente e indigesto de fracasso. A discussão sobre educação integral e a necessidade de um currículo integrado está na mesa. Podemos nos fartar dessa possibilidade, torná-la um banquete, como na Festa de Babette4, em que todos aqueles que podem provar das delícias da alquimia gastronômica se alegram, intensa e naturalmente como as crianças. Você está convidado para este momento, um banquete que pode servir a muitos! Seja bem vindo! 1. TOLSTÓI, Liev. (1828-1910) Contos da Nova Cartilha: primeiro livro de leitura. Cotia, SP. Ateliê Editorial, 2005. 2. GIOLO, Jaime. Educação de tempo integral: resgatando elementos históricos e conceituais para o debate, in MOLL, Jaqueline. Caminhos da Educação Integral no Brasil – direito a outros tempos e espaços educativos. Porto Alegre: Penso, 2012. P. 94-105. 3. PACHECO, José. Pequeno Dicionário das Utopias da Educação. Rio de Janeiro: Wak Editora, 2009. 4. A FESTA DE BABETTE, filme dinamarquês (1987) que problematiza a possibilidade da felicidade sem pecado e onde a gastronomia é discutida, como um recurso para essa percepção. Maria Helena Negreiros é Mestre em Educação pela Universidade Metodista de São Paulo. Mestranda em Ciências Humanas e Sociais pela UFABC. Possui graduação em Pedagogia, com especialização em Psicopedagogia, Educação Especial e Gestão Pública. Professora nos cursos de graduação e pós-graduação . Autora do livro Leitura e Lazer: uma alquimia possível, foi eleita personalidade do ano 2011, pelo Prêmio João Ferrador, do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC. Tem experiência na área de Educação, com ênfase em Educação Inclusiva, Diversidade e Gestão de Políticas Públicas. E-mail: helena.negreiros@gmail. com Direcional Educador, Fevereiro 13 Desafios e Perspectivas da Educação Integral: EDUCAÇÃO INTEGRAL 33 CHEGA DE HOMENAGENS AO PROFESSOR Direcional Educador, Fevereiro 13 Por Renato Casagrande 34 educação passou a ser o principal fator de desenvolvimento econômico e social a partir do fim do século 20, com a Era do Conhecimento. Nesse contexto, ao abordar a questão educacional no Brasil, sugiro uma pergunta: a escola está cumprindo seu papel? Ao colocar o problema da escola, remeto-me a seu protagonista: o professor. Nunca se falou tanto da importância desse profissional, como ele está inserido no contexto social e o que é possível fazer a favor dele. Instigado por essas questões, levanto o tema principal da “profissão professor”, em que há forte interferência de três aspectos relevantes: o mal-estar com a carreira, a carreira em si e a formação do profissional. O mal-estar instalado entre os professores em relação à carreira é evidente e explícito pela sensação de impotência, frustração e desânimo. Recentemente, a Fundação Victor Civita publicou os resultados de uma pesquisa em que aponta que, no mundo inteiro, o prestígio social do professor está diminuindo. Em pesquisa própria, constatei que entre professores há sentimentos de revolta, indignação e até vergonha da profissão. O professor é valorizado em discursos políticos, mas não encontro isso em boa parte desses profissionais. Uma das razões da sensação de impotência está na complexidade da função docente. Com a revolução tecnológica dos últimos 20 anos, sobretudo da internet, a informação tornou-se acessível a todos, tirando do professor a vantagem que ele tinha sobre o aluno, por ser o detentor de dados e informações. O principal papel do professor deixou de ser o de transmissor de informações para ser o de organizador, analista e facilitador do conhecimento e da aprendizagem. Essa mudança tirou o professor da zona de conforto e contribui para o mal-estar já referido. No Brasil, há razões adicionais para esse mal-estar (também relacionado com os baixos salários e a complexidade da função), entre as quais destaco a carreira e a formação deficitária. Há, por tudo isso, pouca atratividade da carreira, cujo reflexo é a falta de professores. Para uma demanda de 725.991 profissionais, a oferta de professores com habilitação específica é de 354.475, resultando em um déficit superior a 350 mil. Por que os estudantes não buscam a carreira de professor? Pesquisa recente, realizada pela Fundação Victor Civita em conjunto com a Fundação Carlos Chagas, focou jovens concluintes do Ensino Médio, prestes a decidirem que carreira seguir. Os resultados assustam: apenas 2% dos entrevistados admitiram o desejo de ser professor; destes, a taxa cai para perto de zero quando considerados somente os que estudam em escolas particulares. Essa pesquisa apontou ainda que um terço deles até pensou em ser professor, mas desistiu em razão do baixo reconhecimento, dos baixos salários e da rotina desgastante. O terceiro problema diz respeito ao preparo do professor para a docência. As carências nos cursos de formação constituem hoje um dos maiores obstáculos a uma boa educação. Muitos professores exercem a docência sem formação específica ou preparo profissional adequado. Há nos cursos um grande descompasso entre o tempo despendido com questões ideológicas e o tempo dispensado à formação técnica. Assim, muitos chegam à sala de aula inseguros em relação ao quê e como ensinar, sem domínio das técnicas e das ferramentas capazes de contribuir para uma boa aprendizagem. O Brasil ainda figura entre os países com maior percentual de professores que, nos anos inicias de carreira, não passam por programas de introdução e não recebem suporte de orientadores. Segundo a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), no Brasil, a cada 10 professores que ingressam no magistério, oito o fazem sem nenhum tipo de tutoria ou acompanhamento. Na Bélgica, por exemplo, mais de 95% dos professores recebem suporte e acompanhamento inicial nos primeiros anos de sua inserção na carreira docente. Associado ainda a essa falta de acompanhamento, temos outro agravante: muitos dos que ingressam na docência têm dificuldades com o idioma, deficiências em leitura e compreensão de textos, como atesta o baixo desempenho nas avaliações oficiais. O país não avançará em termos de desenvolvimento econômico e social se não investir na qualidade da educação, e isso depende diretamente de investimento para melhorar a formação dos professores. Esta é a hora do professor... O momento de investimento no professor, na sua carreira, na melhoria de sua autoestima profissional. Mais que momento de homenagens, o momento é de ação. Ou se melhora o professor, sua carreira e seus ganhos ou a Educação não conseguirá cumprir seu papel na construção de um Brasil melhor. Renato Casagrande é palestrante, gestor e consultor educacional. Foi diretor de escola pública e pró-reitor de universidades. Hoje é diretor do Alleanza Brasil, instituto que trabalha em prol do desenvolvimento pessoal e profissional. E-mail: [email protected] www.renatocasagrande.com Direcional Educador, Fevereiro 13 FORMAÇÃO DE PROFESSORES FORMAÇÃO DE PROFESSORES 35 GEOGRAFIA GEOGRAFIA EM UM CONTEXTO SÓCIO AMBIENTAL COM PROPOSTA DE INSERÇÃO DO INDIVÍDUO NO ESPAÇO ONDE VIVE Direcional Educador, Fevereiro 13 Por Elisandra Cecília Schwanka 36 uscou-se, através da elaboração deste projeto do ensino de Geografia, uma educação que proporcionasse ao aluno o conhecimento e reconhecimento da paisagem local de forma humanizadora, valorizando os recursos naturais existentes e compreendendo historicamente a maneira como foram apropriados e transformados, e as relações sociais a eles relacionados. Este projeto foi desenvolvido com alunos de 2° ano do ensino de nove anos, com idade de 6 a 7 anos, de uma Escola de Tempo Integral localizada em Curitiba (PR). Resgatou-se o valor do espaço geográfico rico em recursos minerais e abundante em recursos hídricos (como principais fontes econômicas) que favoreceram o progresso e o crescimento da cidade. Desta forma, mostrou-se ao aluno que o espaço se materializa no espaço geográfico e é apreendido pela paisagem, ou seja, a ação do homem sobre o espaço geográfico interfere diretamente na paisagem por meio do trabalho. Esse resgate foi decorrente da preocupação com a realidade dos alunos, pois além da grande diversidade sócio-econômica existente, grande parte é oriunda de classe média baixa, tem pouco acesso a informações de qualidade, baixo índice de capital cultural (o qual não se adquire na escola, mas depende da frequência com que as pessoas entram em contato com fontes culturais como teatros, cinemas, museus, etc.). Os alunos estão em processo de alfabetização, sendo que a maioria não conhecia o espaço em que vivia e não conseguia se localizar no tempo e espaço. Assim, através deste projeto almejou-se ampliar os horizontes dos alunos envolvidos, para que estes busquem o conhecimento, valorizando assim seu próprio espaço. DESENVOLVIMENTO O encaminhamento deste projeto se deu principalmente de forma a aproximá-lo dos fundamentos teóricos recolhidos de leituras dos escritos de especialistas, além das leituras realizadas a partir de Documentos Oficiais da Rede Municipal de Ensino de Curitiba, especificamente aquelas referentes à Geografia e que sejam relevantes e coerentes com o Projeto Político Pedagógico da Unidade Educativa. PIAGET, VYGOTSKY, FREIRE, entre outros pensadores, e também as diversas transformações ocorridas no Brasil e no mundo têm influenciado e contribuído para que o ensino de Geografia seja renovado, com o objetivo de que o aluno, no meio escolar, participe ativamente da construção do espaço. A teoria do pensamento cognitivo de PIAGET busca explicar o desenvolvimento mental do ser humano, no campo do pensamento, da linguagem e da afetividade. Uma grande contribuição de Piaget foi o estudo do desenvolvimento da Linguagem a qual evolui de uma linguagem egocêntrica para uma linguagem socializada, que acompanha o avanço das estruturas mentais. O intelecto da criança se desenvolve por meio de sua interação com as coisas e com as pessoas do seu meio ambiente. Em Geografia, importa tanto a percepção como a cognição, mas pode-se dizer que a cognição fundamenta toda a pesquisa geográfica a partir da percepção que cada um de nós constrói da realidade e a meta que perseguimos ou tentamos atingir. Aceita-se que o verbo de cognição é conhecer. Conhecer consiste em construir ou reconstruir o objeto do conhecimento, de maneira a aprender o mecanismo desta construção. (OLIVEIRA, apud MENDONÇA e KOZEL, 2002, p. 192) Conhecer o entorno onde se está inserido é muito importante, no entanto se deu início a atividade observação de paisagem do entorno da escola com registro de desenho. Iniciou-se com a pesquisa no dicionário da palavra “arredor”, em seguida realizou-se a leitura e discussão do livro didático de Geografia, utilizado pe los alunos em sala de aula, onde se pode analisar uma escola em duas paisagens: rural e urbana. Na sequência os alunos receberam papel, borracha e prancheta para observar e registrar uma paisagem de dentro para fora da escola. A imagem escolhida é de uma rua que dá acesso à escola. A orientação dada aos alunos é de que dividissem a folha e realizassem o registro imaginando como era antes e como está a paisagem agora. Com esta atividade procurou-se trabalhar noções de tamanho (maior/menor), distância (próximo/distante) e localização (direita/esquerda), e uso de legendas, assim como aborda o Caderno Pedagógico de Geografia: Os mapas oferecem uma visão das sínteses das relações espaciais e da distribuição dos diferentes elementos que compõem o espaço. Tal visão está baseada no uso de símbolos. Esses devem se aproximar o máximo possível da imagem real, ser exatos no que diz respeito às convenções, assim como se apresentar uniformes em toda a representação (CURITIBA, SME, 2009, p.18). No registro de observações interessa o que vai acontecendo antes e o que acontece agora na paisagem observada. Nessa atividade a prática possibilita a construção de conceitos geográficos por meio de observação, representação, descrição e análise da paisagem. Paisagem é tudo aquilo que vemos. Ela é formada por elementos naturais e culturais, ou seja, fabricados pela sociedade, o que lhe confere um caráter histórico. DARIN (2005, p.26) relata que: Paisagem é a acumulação desigual de tempos e nada tem de fixo, de imóvel, pois cada vez que a sociedade passa por um processo de mudança (...) a paisagem se transforma para se adaptar às novas necessidades da sociedade. A aula fora da sala foi uma oportunidade ímpar para o desenvolvimento das habilidades como observação sistemática, orientada e explorada pela intervenção do professor, bem como dos elementos que pode ser vista como a capacidade intelectual de selecionar, ordenar e organizar informações. O registro com desenho é por si só o início da linguagem cartográfica, onde por meio dos símbolos compreende-se a realidade. A primeira leitura nesse gênero se dá pelas próprias produções estimuladas e orientadas. Direcional Educador, Fevereiro 13 O RESGATE DE VALORES A cognição humana do espaço segue uma lógica de desenvolvimento sensório espacial sobre os objetos e as ações sobre o espaço. Assim, todos nos inserimos como indivíduos em um meio no qual o homem atua e constrói seus valores, que podem ser compreendidos a partir da expressão oral, corporal, escrita, sonora, artística e outras. 37 GEOGRAFIA Compreender o lugar onde moro foi papel importante para o desenvolvimento da construção permanente do conhecimento, é criar perspectivas para a construção de novos conceitos no aprender Geografia. O conhecimento espacial representa para o indivíduo muito mais do que a simples localização, pois é vital para a realização da existência e dos sonhos, nascendo com o ser humano e se desenvolvendo dentro de sua cultura. Porém, na medida em que se adquire a consciência espacial cria-se a condição necessária para a libertação dos mecanismos de dominação social sobre o indivíduo e abre-se possibilidade do crescimento intelectual, social, cultural e moral. A Alfabetização cartográfica é um recurso fundamental para o ensino de Geografia. Trabalhou-se com uma pluralidade de espaços e lugares com recortes muito variados, alguns mais próximos, outros mais distantes dos alunos, com diferentes enfoques sobre os elementos que identificam e caracterizam esses lugares. Utilizaram-se recursos do IPPUC e da internet para localização dos espaços e recortes de imagens para aplicação desse conteúdo. A contribuição mais importante de VYGOTSKY para a educação é sua proposta de relação entre desenvolvimento e aprendizagem. Para ele o desenvolvimento está atrelado à aprendizagem, que é essencial para promover o desenvolvimento: é como se ela “puxasse” o desenvolvimento para frente. Nisto está referida a importância que VYGOTSKY dá para a cultura, para a experiência de vida do sujeito. A construção de maquete é um modelo em miniatura usado para a representação tridimensional do espaço. Essa técnica leva o aluno a fazer a transposição da realidade vivida para o espaço representado. Como para fazer tal transposição é necessário um cuidadoso exercício de observação, ela prepara o aluno para compreender representações mais elaboradas, como mapas e plantas, que são representações bidimensionais de espaço. Para essa atividade os alunos contaram com a colaboração dos pais e da equipe em sala de aula. Direcional Educador, Fevereiro 13 38 CONCLUSÃO contra as forças que não compreende a não ser que descubra que ele pode. Esta conscientização coloca o primeiro objetivo da educação que é modificá-lo, antes de tudo, provocar uma atitude crítica, de reflexão, que comprometa a ação. A realização de uma pesquisa é indicada quando se deseja ampliar ou aprofundar um tema. É um procedimento que contribui para a autonomia e para a autoconfiança do aluno, à medida que desenvolve habilidades como selecionar informações e utilizar diferentes fontes de consulta. Sendo assim, os alunos realizaram uma visita à cidade mirim no Colégio OPET com o intuito de compreender o funcionamento de uma cidade e seus arredores. O debate sobre informações e opiniões obtidas com base na pesquisa visita, por exemplo, é um procedimento importante para a formação de atitudes relacionadas à construção coletiva de um saber sobre determinado tema. Foi uma técnica que possibilitou regular troca, pois cada um deu sua opinião e escutou a do outro, podendo concordar ou não. Retomou-se a fala do outro a fim de concordar ou não com ela, estruturando as ideias em torno de argumentos resultantes da discussão coletiva. Esses debates foram promovidos em sala constantemente para elucidação dos conteúdos trabalhados. Uma pessoa passa a vida aprendendo coisas, e é este caminho da aprendizagem que vai definir por onde passará o seu desenvolvimento. Isto dá à educação uma perspectiva muito valiosa, que é olhar para frente: uma visão prospectiva e não retrospectiva. Paulo Freire nos ensinou que o ser humano só tem as possibilidades de participar ativamente na história, na sociedade e na transformação da realidade se for auxiliado a tomar consciência da realidade e de sua própria capacidade para transformá-lo. O indivíduo não pode lutar A partir das metas estabelecidas relacionaram-se alguns conceitos essenciais na disciplina de Geografia que direcionou o trabalho em todas as séries dos anos iniciais do Ensino Fundamental de Nove Anos, progredindo gradativamente o nível de complexidade. Consideramos essencial para o ensino de Geografia os seguintes eixos: sociedade, espaço e natureza. Apoiado nestes conceitos fundamentais almejou-se um ensino de Geografia voltado para a interdisciplinaridade, possibilitando a todos os educadores uma nova proposta de trabalho onde a participação foi coletiva, facilitando o diálogo e a troca de experiências, e juntos elaboraram estratégias que fizeram parte das propostas de ensino aprendizagem. Desenvolvendo na criança a capacidade de reflexão sobre o seu tempo e o seu espaço assim como reflexão crítica sobre qualquer tempo e qualquer espaço que ela veio a conhecer. Respeitou-se a especificidade do pensamento infantil, a partir da interação da teoria sócio-histórica com a psicologia do desenvolvimento. Os conteúdos trabalhados foram relacionados com os conteúdos que a criança já possuía, sendo, desta forma, mais bem assimilados por ela. Quanto mais os conteúdos puderem ser efetivamente utilizados pelas crianças, mais interessantes e significativos eles serão. A avaliação não serviu para comparar os alunos uns com os outros, mas para identificar suas necessidades, graus de aprendizagem e suas múltiplas competências. Para isso a avaliação ocorreu ao longo de todo o trabalho e considerou que, mesmo os alunos que avançaram pouco em relação ao restante da turma, obtiveram grande sucesso em relação ao ponto em que se encontravam no início do processo. Procuraram-se indícios que revelaram o tempo e a forma de aprendizagem dos alunos, considerando as diferenças individuais, organizando as intervenções necessárias de acordo com o ritmo da turma. Como a avaliação deve levar em conta as diferenças entre as crianças e contemplar cada uma em particular, os instrumentos avaliativos foram diversificados e utilizados em muitos momentos do trabalho escolar. Além da observação direta do professor foram colhidas pistas sobre a aprendizagem dos alunos e o resultado de seu trabalho por meio dos registros das atividades, exercícios pontuais e trabalhos em grupo. Nos trabalhos em dupla ou equipe os alunos foram convidados a refletir sobre problematizações, a ouvir outras opiniões, checar suas hipóteses. Ao expor os trabalhos para serem analisados pela classe, além de compararem sua produção, voltaram a repensar o mesmo assunto, considerando o ponto de vista do outro. Estes momentos propiciaram a construção de um maior número de relações entre os diferentes significados do assunto investigado, o que torna a própria avaliação um novo momento de aprendizado. Nesse trabalho com a avaliação, assumiram função essencial os registros produzidos pelos alunos durante e após as atividades. Tais registros tiveram a função de auxiliá-los nas organizações de seus conhecimentos, validar o que aprenderam, analisar o que descobriram e especialmente, permitir que, enquanto organizam seus registros após uma atividade, reflitam sobre suas ações, suas conquistas, enfim, sobre sua própria aprendizagem. Ao registrar, por escrito, oral ou pictoricamente, os alunos revelaram o quanto se aproximaram dos objetivos propostos, evidenciando também seus processos de apreensão e construção do conhecimento, suas dificuldades e suas conquistas. O desenho livre e a representação cartográfica foram formas importantes de registro, não apenas porque são alternativos ao texto, especialmente para os alunos em fase de alfabeti- zação, como também por serem motivadores e permitir os primeiros ensaios de uma representação do espaço. Ao desenhar, a criança colocou suas impressões sobre a atividade, representando o que foi significativo para ela e tomou consciência de suas percepções. Referências bibliográficas BEAUCHAMP, J. PAGEL, S.D. NASCIMENTO, A.R. (Orgs.) Ensino Fundamental de Nove Anos: Orientação para a Inclusão da Criança de Seis Anos de Idade. Brasília: MEC/ SEB, 2007. BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais: História e Geografia, 3. Ed. Brasília: MEC/SEF, 2001. CARLOS, Ana Fani Alessandri (org). Novos Caminhos da Geografia. São Paulo: Contexto, 2005. CASTELLAR, Sonia e ZAMBONI, Ernesta. Geografia (Coleção Curumin). São Paulo: Atual, 2004. CRUZ, Márcia e FILIZOLA, Roberto. A Relação da Sociedade com a natureza. 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Elisandra Cecília Schwanka é graduada em Pedagogia Licenciatura Plena pela Universidade Tuiuti do Paraná e em Letras pela Universidade Castelo Branco, pós-graduada em Psicopedagogia pela Universidade Castelo Branco e Gestão Escolar pelo Instituto Brasileiro de Pesquisa e Extensão – IBPEX, Mestranda pela Universidade Nacional Lomas de Zamora em Buenos Aires – Argentina. Pedagoga da Rede Municipal de Ensino de Curitiba, Agente de leitura do Programa Comunidade Escola no Farol do Saber Manuel Bandeira e Professora Corretora de Projetos Pedagógicos pela UNINTER. E-mail: [email protected] [email protected] Direcional Educador, Fevereiro 13 GEOGRAFIA 39 Direcional Educador, Fevereiro 13 Como aproximar, 40 abemos da necessidade de aproximarmos a cultura da escola da cultura juvenil, para que possamos de fato efetivar uma aprendizagem profícua a partir do desenvolvimento do dialogismo, alteridade e interação. O protagonismo juvenil é a condição do jovem ou do adolescente de participar do mundo de maneira construtiva. O termo protagonismo vem do grego Protagonistés que conceitua o principal lutador, porém como vivemos numa sociedade, devemos estabelecer uma linguagem dialógica e interativa para nos relacionarmos com o outro e dessa maneira o termo “protagonismo juvenil” recebe uma ressignição, ou seja, para que o jovem possa trocar aprendizados, construir saberes, democratizar informações deverá estabelecer parcerias, e estas estão justamente presentes num espaço de interação social. A pichação e o grafite são culturas da juventude estampadas nos muros das grandes metrópoles. Há semelhanças entre ambos, visto que utilizam tinta látex ou spray para pintar, e como suporte usam os espaços públicos das cidades como meio para expressarem todo o seu descontentamento social, político e ideológico. O uso dessa linguagem atrelado ao descontentamento social o identifica no seu tempo e espaço. Essas linguagens juvenis, que colorem as cidades, fazem parte das formas de intervenção e de atuação política desses meninos e meninas da virada do milênio: num momento em que os partidos políticos já nao conseguem mais organizar e dar um sentido único a essas disputas, eles expressam sua indignação com a apropriação dos ter- no ensino de Língua Portuguesa, a cultura patrimonial da escola (culturas valorizadas) das culturas da juventude? Por Regilene Paulina da Cunha ritórios e com a constituição de pequenos grupos de afinidades artísticas ou ideológicas (temáticas como a ecologia ou o consumismo que articulam os encontros). No lugar da atuação política convencional e institucionalizada, esses jovens apontam para uma prática política mais pulverizada, atomizada e transitória. A performance, instantaneidade e a efemeridade marcam as ações coletivas e a durabilidade das suas produções culturais; o resultado são painéis de fragmentos que exigem leitura anárquica, rápida e direta, mas recheados de sentido. (OLIVEIRA, 2008: 06) Contudo, na escola contemporânea, o jovem se sente distante e descontente com as práticas vigentes e com o discurso estabelecido. O jovem necessita do diálogo e da aceitação de suas linguagens, que são marcas efetivas de sua identidade para que alcance de fato a autoestima, autonomia e criticidade. Oliveira (2008, p.4) nos explicita a relação estabelecida entre o jovem e a cidade: Ainda hoje, ao redor do fogo, em meio às labaredas e às sombras noturnas, acontecem as conversas noturnas, as trocas afetivas, as afinidades. Com a iluminação pública das cidades, especialmente a elétrica, no século XX, a vida noturna ganha novos ares, marcadamente entre os jovens. Nos seus fluxos noturnos os jovens ganham a cidade deixando suas marcas. (OLIVEIRA, 2008:4). A linguagem é uma atividade essencialmente humana mediada pela interação e pelo dialogismo. Circula nas diferentes esferas e dependem da situação discursiva na qual se estabelece. Esses jovens nos fluxos noturnos estabelecem as suas identidades através da linguagem de indignação transcrita nos muros da cidade. A sua linguagem determina a sua identidade que é marca primordial do ser humano. Segundo Voese (2004): Parece ficar claro, tanto em Heller como em Lukács e Bakhtin, que há uma passagem que o homem precisa cumprir: a superação da esfera imediata abre-lhes as portas do genérico e a possibilidade do vir-a-ser-sujeito, o que significa, em outros termos, que a individualidade toma consciência de que, para compreender a própria vida, é preciso analisá-la na relação com as dos outros. (VOESE, 2004: 86) O sujeito na interação social com o outro compartilha e aprende com esse outro sobre o mundo, organiza suas ideias e reflete sobre o proveito delas, ou seja, aprende-se e apreende-se a partir de uma dada informação ou conhecimento e recria seu próprio conhecimento. Os jovens, à noite, podem na verdade ser o que eles são, podem falar sobre o que pensam sem serem rotulados, é o momento em que têm liberdade, da criação e das suas linguagens (pichação, grafite, street dance, parkour). Vivemos numa sociedade tecnológica, em todas as esferas há a presença da tecnologia, exceto na escola. O jovem domina essa linguagem, por isso muitas vezes o discurso da escola não incita a curiosidade desse jovem. Esse jovem tem na sua essência a velocidade e o efêmero. Talvez, por isso, quando os jovens utilizam “speedy grahito” levam consigo um relógio para cronometrar o tempo de suas ações. Para Moran (1997, p.153), “A profissão fundamental do presente e do futuro é educar para saber compreender, sentir, comunicar-se e agir melhor, integrando a comunicação pessoal, a comunitária e a tecnológica”. O jovem estabelece sua relação com a metrópole, transformando os muros e as paredes em territórios próprios para divulgar e expressar as suas afetividades, relações políticas e sociais. A escola necessita da ferramenta tecnológica para adequar-se à socieda- Direcional Educador, Fevereiro 13 ENSINO FUNDAMENTAL E MÉDIO ENSINO FUNDAMENTAL E MÉDIO 41 ATIVIDADES PRÁTICAS 42 de contemporânea na qual a tecnologia e a rapidez das informações estão presentes em praticamente todas as esferas sociais e comunicativas. Para aproximar a cultura do jovem com a cultura da escola, é necessário que a escola estabeleça uma conduta de alteridade e respeito quanto à linguagem utilizada por esses jovens. Através do grafite a escola tem a oportunidade de ampliar os seus conhecimentos sobre o jovem, suas inquietações e sonhos. Porém há necessidade de mudanças por parte da escola para que se estabeleça esse diálogo, pois ela ainda supervaloriza a variedade padrão: é uma das variedades de uma língua e é associada à escrita e as práticas de linguagem de prestígio social, em detrimento da variedade não padrão, que é aquela falada por pessoas pobres e marginalizadas pela sociedade, e sofrem, consequentemente, o preconceito linguístico daqueles falantes que usam a variedade padrão. Como a escola quer aproximar o jovem se a principal ferramenta, a linguagem, utilizada para essa interação, é vista de maneira preconceituosa? Devese conversar com os jovens sobre a existência das variedades, que podem ser: de gênero, socioeconômicas, etárias, de nível de instrução, urbanas, rurais, etc., e após a reflexão, salientar que os diferentes modos de fala não podem ser conceituados como “certo” ou “errado”, mas com o fato de que as línguas humanas são fenômenos variáveis e essa variação pode ser explicada e descrita. A escola pode se aproximar da cultura dos jovens no ensino de Língua Portuguesa através das suas múltiplas linguagens, por exemplo: pesquisando como o grafite, que era sinônimo de pichação, tornou-se arte, inclusive salientando que alguns grafites fazem parte do acervo de museus e a partir daí programar projetos com grafite para fomentar a apreciação estética, crítica e Referências bibliográficas BRAGA, D; BUZATO, M. Multiletramentos, Linguagens e Mídias. Tecnologias e Práticas Comunicati- MANUAL DE JOGOS, vas. Processos de naturalização das tecnologias: o caso da escrita alfabética e Das paredes das cavernas ao monitor. Campinas, SP: UNICAMP/REDEFOR, 2012. P. Material digital para AVA do curso BRINQUEDOS E BRINCADEIRAS Por Sirlândia Reis de Oliveira Teixeira de especialização em Língua Portuguesa REDEFOR/ UNICAMP. BENTES, A. Linguagem Oral: Gêneros e Variedades. 6 Monte o seu manual de jogos, brinquedos e brincadeiras e saiba como aplicar na prática do cotidiano tornando a aprendizagem significativa. O trabalho com gêneros orais: teoria e prática. O trabalho com gêneros orais formais na escola. dialógica dos jovens no âmbito escolar. Segundo Costa (2011), o protagonismo juvenil desenvolve o senso de participação e responsabilidade social, pois os jovens saem de seus mundos particulares para transitarem num universo com questões de interesse coletivo. O desenvolvimento da cidadania, da solidariedade, contribui para o desenvolvimento e fortalecimento da sociedade, mas não se restringe somente ao âmbito social. O jovem protagonista desenvolve um senso de responsabilidade e resolução prática de problemas, tornando-se um cidadão crítico, autonômo e capaz de exercer a prática da sua cidadania plena. Tornar o aluno um protagonista de seu conhecimento é propiciar a esse cidadão as habilidades para a conquista da plena cidadania, como nos exige a Lei de Diretrizes e Bases 9394/96 e nos orienta os Parâmetros Curriculares Nacionais, e dar condições para que o aluno se aproprie da leitura de mundo, segundo Petit (2008): “... não se trata de modo algum de aprisionar o leitor, mas sim de lhe apresentar pontes ou permitir que ele mesmo construa as suas”. Que essa metáfora utilizada por Michèle Petit se faça presente nas nossas escolas hoje e sempre para que de fato consigamos estabelecer um diálogo com essa cultura jovem, já existente no contexto das grandes metrópoles, mas tão distantes dos muros da escola, e inseri-las no cotidiano escolar. Campinas, SP: UNICAMP/REDEFOR, 2012. P. Material digital para AVA do curso de especialização em “O homem só é inteiro quando brinca; e é somente quando brinca que ele existe na completa acepção da palavra: homem.” Friedrich Schiller Língua Portuguesa REDEFOR/UNICAMP. COSTA, A. Tempo de servir: o protagonismo juvenil passo a passo: um guia para o educador. Belo Horizonte: Universidade, 2001. DOLZ, J; SCHENEUWLY, B. Gêneros orais e escritos na escola. Campinas: Mercado de Letras, 2007. MORAN, J. Como utilizar a internet na educação. Artigo publicado na Revista Ciência da Informação, v. 26, n.2, p.146-153, maio-agosto 1997. BARRA-MANTEIGA Material: um pedaço de giz para riscar o chão. Idade aproximada: a partir de 6 anos Local: pátio ou local amplo Participantes: no mínimo 5 OLIVEIRA, R. Lendo a metrópole comunicacional: culturas juvenis, estéticas e práticas políticas. São Paulo: SENAC, 2008. É uma brincadeira muito legal e podemos brincar no quintal, na garagem, na praça ou no pátio da escola. O espaço precisa ser dividido em três partes conforme o desenho acima. PETIT, M. Os jovens e a leitura. São Paulo: 34,2008. VOESE, I. Análise do discurso e o ensino de Língua Portuguesa. São Paulo: Cortez, 2004. Regilene Paulina da Cunha é formada em Letras, professora titular de Português da rede estadual de Educação de São Paulo e da Prefeitura Municipal de São Paulo. É organizadora do livro EJA: em busca do conhecimento - poesias diversas (Editora Scortecci) e autora na antologia de poesias Nossa História, Nossos Autores, edição comemorativa de aniversário de 30 anos da Scortecci. E-mail: [email protected] Instruções: As crianças devem ser divididas em duas equipes, sendo que uma equipe fica de frente para a outra. Os participantes de cada equipe ficam um ao lado do outro e com a palma de uma das mãos virada para cima. As equipes ficam posicionadas nos campos 1 e 3 e o campo 2 é o espaço para correr. A brincadeira começa quando um participante vai até a equipe adversária e bate com uma mão na mão de um dos participantes da outra equipe. A criança que bateu sai correndo para a sua equipe enquanto é perseguida pelo adversário. Caso o que bateu seja pego passa a jogar na outra equipe. Obs: esta brincadeira geralmente acompanha uma melodia parecida com esta: “Barramanteiga na fuça da (nome da equipe opositora), minha mãe mandou eu escolher esta daqui, mas como eu sou teimosa eu escolho esta daqui, é um, é dois, é três e já.” ( no já bate na mão do escolhido) Vence o time que pegar todos os adversários primeiro. ÁREAS FAVORECIDAS: Cognitiva: compreensão das instruções do jogo, pensamento lógico e sequencial, criatividade para escolher a melhor estratégia para bater na mão do opositor sem ser pego. Social: cooperação e trabalho em equipe, pois não há um vencedor e sim uma equipe vencedora, competição entre as equipes, integração dos participantes. Perceptivo-motora: reflexo rápido e agilidade para correr, noção de velocidade, tempo e espaço. Afetivo-emocional: tensão em esperar a vez de ser escolhido e quando vai escolher alguém, frustração quando a equipe perde e alegria quando ganha. Direcional Educador, Fevereiro 13 Direcional Educador, Fevereiro 13 ENSINO FUNDAMENTAL E MÉDIO 43 ATIVIDADES PRÁTICAS Linguagem: trabalha a rima e o contato com cantigas que fazem parte da tradição oral. Moral: às vezes é difícil para os participantes que foram pegos “vestirem a camisa do grupo opositor”, neste sentido há um senso de moral de pelo menos não atrapalhar a equipe enquanto é “salvo” pelo seu grupo original. Sugestões multidisciplinares Nesta brincadeira os participantes lidam com fortes emoções, desafios e motivação. Os professores podem usar este momento para fazer relações com as diversas disciplinas. Na Matemática, por exemplo, trabalhar a noção espaço e tempo dentro do campo de “batalha”, e soma, divisão, subtração, quando os grupos ganham ou perdem algum componente. Na disciplina de História trabalhar a forma estratégica como cada grupo e individualmente usa para vencer o desafio. Na disciplina de Filosofia refletir sobre a questão de fazer parte de um grupo e depois ter que deixá-los e passar de amigo para “inimigo”. CABO DE GUERRA Direcional Educador, Fevereiro 13 Material: corda e giz para riscar o chão Idade aproximada: a partir de 6 anos Local: pátio ou local amplo Participantes: no mínimo 6 Instruções: Você conhece as expressões “A união faz a força” e “Um por todos e todos por um”? Com esta brincadeira você e seus amigos vão testar quem tem mais força e mais união. Para brincar de cabo-de-guerra vocês precisarão de uma corda. 44 Primeiro, escolham um espaço e tracem uma linha no chão para dividilo ao meio. As crianças devem ser separadas em dois times, sendo que cada time fica com um lado do espaço. Os participantes ficam em fila e todos seguram na corda. Posicionem a corda conforme o desenho ao lado. Alguém de fora dos grupos dá um sinal para começar a partida. Ele será também o juiz que fiscalizará o jogo de forças. Os participantes devem puxar a corda, até que uma das equipes ultrapasse a linha no chão. Serão vencedores aqueles que puxarem toda a equipe adversária para o seu espaço. Áreas Favorecidas: Cognitiva: raciocínio lógico para medir o espaço entre as equipes e o tamanho e a espessura ideal da corda. Social: desenvolve a motivação do trabalho em equipe, a competição entre as equipes e o empenho individual dos participantes. Perceptivo-motora: destreza, força, equilíbrio e agilidade. Afetivo-emocional: a motivação de cada participante para que a sua equipe ganhe. Linguagem: a linguagem verbal (torcida) e a linguagem corporal no envolvimento da brincadeira. Moral: lidar com a frustração, a atitude altruísta para com os seus opositores. Sugestões multidisciplinares O foco desta brincadeira é o trabalho em equipe, habilidade importante em todas as áreas. Os professores podem explorar ao máximo esta ideia através de discussões em equipe e opiniões individuais. Perguntas do tipo: o que fez a diferença para a equipe ganhar? O que faltou para a equipe ganhar? Como individualmente foi possível contribuir para o sucesso da equipe? O que garantiu o sucesso foi a força ou a estratégia? CABRA CEGA Material: uma tira de pano para vendar os olhos Idade aproximada: a partir de 6 anos Local: pátio ou local amplo Participantes: no mínimo 3 Instruções: Esta brincadeira consiste em vendar uma criança que passará a perseguir outros amiguinhos que participam da brincadeira, para colocála em seu lugar. Nesta brincadeira o local deve estar livre de qualquer obstáculo. O jogo se inicia por perguntas e respostas entre uma criança e a cabracega: Cabra-Cega, de onde você veio? Vim lá do moinho. O que você trouxe? Um saco de farinha. Me dá um pouquinho? Não Cabra-cega, não me nega; donde Vem? Do sertão! Trás ouro, prata ou requeijão? Trago ouro. Pois rode como besouro! Gira a criança vendada e solte para ela tentar pegar os amiguinhos. Áreas Favorecidas: Cognitiva: cria estratégias imaginárias, senso de direção espacial, capacidade para perceber os sons e os movimentos dos opositores. Social: interação e confiança no grupo, as crianças aprendem a lidar em quem está em situação desfavorável (cabra-cega). Perceptivo-motora: estimula a discriminação auditiva e sinestésica, o equilíbrio e coordenação espacial e temporal. Afetivo-emocional: medo e tensão por ficar com os olhos vendados. Linguagem: torcida em grupo. Moral: respeito pelo colega que está com os olhos vendados. SUGESTÕES MULTIDISCIPLINARES: Esta brincadeira é interessante do ponto de vista físico e psicológico, o professor de Educação Física tem muito a explorar neste sentido. Os demais professores, além dos aspectos psicofísicos, podem usar o fato dos “olhos vendados” para discutir questões de inclusão e colaboração com os colegas que não podem ver o mundo a sua volta. PASSA, PASSARÁS Material: nenhum Idade aproximada: 7 anos Local: sala de aula Participantes: no mínimo 8 Instruções: Escolher dois participantes para serem “ouro” e “prata”, respectivamente. Nenhum dos outros participantes poderá saber quem é “ouro” ou “prata”. “Ouro” e “prata” ficam diante um do outro, de mãos dadas, formando um arco – a “ponte”. Os outros jogadores marcham, passando sob a “ponte” cantando: “Passarás, não passarás Alguém há de ficar, Se não for o da frente, Será o de trás.” Na palavra “trás”, “ouro e prata” abaixam os braços e aprisionam o último da fila, a quem devem fazer a seguinte pergunta: “Que prefere, ouro ou prata?” Conforme a resposta, o participante se coloca atrás de “ouro” ou de “prata”. A resposta deve ser dada em voz baixa, para que os outros do grupo não percebam quem é “ouro” e quem é “prata”. Novamente a ponte é levantada e o grupo recomeça a cantar, enquanto passa sob o arco. Depois que todos forem aprisionados, formam duas filas, encabeçadas por “ouro e prata”, que ficam de mãos dadas. Os demais jogadores, com os braços em torno da cintura do companheiro da frente, formam duas cadeias, inicia-se então a luta: cada grupo tenta obrigar o outro a transpor uma linha riscada entre “ouro e prata”. O grupo que conseguir é o vencedor. ÁREAS FAVORECIDAS: Cognitiva: pensamento dedutivo e compreensão da brincadeira. Social: cooperação e interação em grupo. Perceptivo-motora: percepção auditiva, força e destreza corporal. Afetivo-emocional: tensão e ansiedade para ficar no mesmo grupo dos amigos preferidos. Linguagem: desenvolve o vocabulário Moral: respeitar as regras da brincadeira SUGESTÕES MULTIDISCIPLINARES: Esta brincadeira é rica em amizade e companheirismo, mas também em buscar estratégia para se autofavorecer. O professor pode sugerir esta brincadeira sempre, mas pode indicar estrategicamente quando houver conflito entre os colegas, pois eles precisam seguir as regras para brincar, e sem poder escolher poderão “cair” no grupo do colega que está em conflito, mas para vencer a brincadeira todos devem se ajudar. Ninguém quer perder então... PASSA ANEL Material: um anel ou um objeto que o substitua Idade aproximada: 4 anos Local: sala de aula ou pátio Participantes: no mínimo 4 Instruções: Sentados numa roda o grupo tira a sorte para ver quem vai passar o anel. Todos devem unir as palmas das mãos e erguê-las na sua frente. Quem ganhou na sorte deve segurar o anel entre as palmas das mãos e passar as suas mãos pelas mãos dos componentes do grupo deixando o anel nas mãos de alguém que ele escolher, mas deve continuar fazendo de conta que continua passando o anel até o último do grupo. Ao final pergunta a um dos participantes onde está o anel? Se este acertar ele será o próximo a passar o anel. Se errar, quem recebeu o anel é que passará, começando novamente a brincadeira. O que errar poderá pagar um “mico”. Obs: a criança que vai passando o anel diz: “guarde meu anel bem guardadinho”, para cada criança inclusive a que for receber o anel. ÁREAS FAVORECIDAS: Cognitiva: criatividade e estratégia de quem passa e de quem fica com o anel. Social: integração das crianças. Perceptivo-motora: destreza para passar o anel, coordenação visomotora. Afetivo-emocional: tensão e controle emocional, medo de errar e ter que pagar o mico. Alegria ao ser escolhido. Linguagem: estimula a linguagem verbal. Moral: desenvolve o senso de justiça para não favorecer o melhor amigo. SUGESTÕES MULTIDISCIPLINARES: A professora pode brincar com as crianças na hora da saída, trabalhar as noções de valores materiais e psicológicos e também a socialização. A socialização, o gosto pela descoberta, desenvolvem características importantes para os papéis sociais, pois enquanto um passa os outros têm que esperar a sua vez. Sirlândia Reis de Oliveira Teixeira é Psicóloga, Psicopedagoga e Mestre em Psicologia da Educação e do Desenvolvimento Humano. Faz parte da presidência da Associação Brasileira de Brinquedotecas (ABBrin) e é membro da International Toy Library Association (ITLA). Atua no grupo de pesquisa Contextos Integrados em Educação Infantil (CIEI) da Faculdade de Educação da USP. Coordena o curso de Pós-Graduação em Psicopedagogia Clínica e Institucional da FIG-Unimesp. Atua também como professora da Graduação e da Pós-Graduação e MBA em Gestão de Pessoas e Competência. E-mail: [email protected] Direcional Educador, Fevereiro 13 ATIVIDADES PRÁTICAS 45 PSICOPEDAGOGIA E agora, Professor? EPSICOPEDAGOGIA agora, Professor? Parte VII De aluno a estudante autônomo Direcional Educador, Fevereiro 13 Por Cassiano Zeferino de Carvalho Neto 46 separação entre o mundo da escola e a escola no mundo atual é gritante. Os estudantes sentem isso de variadas formas, ainda que não consigam explicar o que acontece geralmente por lhes faltar referências e conhecimento teórico profundo acerca da educação. Mesmo sem saber explicar o que sucede, sentem e reagem das mais variadas formas ao que experimentam, frequentemente demonstrando resistência que pode chegar ao nível de hostilidade à escola, de um modo genérico, ou ao professor, numa perspectiva pessoal. Os problemas de “disciplina” gerados em sala de aula todos conhecem e, na atualidade, este cenário vem se agravando, inclusive com registros de violência explícita contra professores, gestores e funcionários da escola, o que é sob qualquer ângulo, inaceitável. No entanto, o que não se costuma ver e compreender são as causas da agressividade demonstrada pelos estudantes e o quanto a mesma tem relação com os modelos de educação e determinadas práticas pedagógicas e seus modos de comunicação. No piso de sala de aula, e todo educador sabe disso, estabelecem-se os cenários para a interação humana. A comunicação, que não significa ser verticalizada e onidirecional no sentido professor-aluno, mas deve ser horizontal e bilateral, tende a se estabelecer ainda que, não raramente, seja truncada e sofra de inúmeras interferências. Foise há muito o tempo em que os alunos ouviam atentos, por minutos sem fim, seus mestres. Atualmente, a possibilidade de se estabelecer uma comunicação eficaz se assemelha aos programas televisivos em que a cada 5, 10 segundos, um novo estímulo é apresentado. Este padrão de comunicação não é, em geral, próprio dos professores e nem mesmo os modelos pedagógicos ainda muito centrados no discurso docente logram sucesso perante os estudantes. A explicação para estes fenômenos não é trivial, conforme mencionado pouco antes há estudos que procuram compreender com mais profundidade o que de fato se apresenta, mas algumas evidências são por demais gritantes. O entorno social à escola, no dia a dia do estudante, que características apresentam quanto aos estilos de comunicação? Por quantas horas os jovens estão imersos na cultura digital (seja via Internet, na TV, no game, no móbile, etc.)? Por quanto tempo conseguem, efetivamente, prestar atenção em um determinado assunto e, mesmo assim, como o fazem? O que importa e interessa ao ‘nativo digital’, ainda que este termo designativo dos jovens que nasceram e cresceram imersos na cultura digital seja controverso? Como ele vê o mundo, o que espera da escola? O que é presencialidade para ele, quando está conectado em uma rede social, ou enviando um SMS (‘torpedo’)? Estas e muitas outras questões são invariável e dramaticamente presentes mesmo que no silêncio que se faz presente quando perguntamos ou tentamos compreender o mundo de um jovem. Mais do que simples questões, elas funcionam como verdadeiros paradigmas dos tempos, isto é, modelam um modo de comportamento social, coletivo, e reservado no âmbito pessoal. Não é viável, pode-se dizer, mesmo que se torna impossível querer que a partir de um confronto de culturas que beira ao antagonismo, nos limites da intolerância, uma delas saia 100% vitoriosa de um embate frontal, até porque os caminhos do confronto que ultrapassam o senso do bem viver com o outro passam a ser violentos e nada construtivos. Na sala de aula, o embate de culturas pode se constituir em um prolongado e desgastante cenário de lutas explícitas ou veladas, que muito pouco contribui para a criação de um bom clima organizacional que favoreça o desenvolvimento de ações construtivas e produtivas para todos. Um caminho para não só se evitar o embate inútil é, em primeiro lugar, se compreender o perfil cultural do jovem estudante. Mesmo com todas as contradições que se possa registrar, o fato dele estar ali de frente com o educador, no recinto da escola, indica que há algo que ele está buscando, ainda que alguém tenha dito ou imposto isso a ele. Aí está o elo potencial, para o início de um diálogo, que pode se prolongar indefinidamente e de forma crescente na precisa proporção que a educação passa a fazer sentido para o estudante. Quando se preconiza que os princípios e recursos da Educação Digital podem contribuir com maior ou menor efetividade para os processos educacionais da atualidade o que se está dizendo é que o educador está na justa interface do processo e dele dependerá, em grande parte, os resultados que se sucederão. Uma vez mais não se trata de voltar a carga ao docente, mas de convidá-lo a refletir a respeito do significado de seu papel na educação, e atualmente, no âmbito da Educação Digital. A capacidade de entendimento do entorno, do perfil dos estudantes e do potencial de contribuição que pode dar estabelecem as vias de possibilidades entre educador-educando, de modo a se poder contar com um eixo consistente através do qual flui a comunicação. Reitera-se que esta comunicação, na ótica do estudante, não é vista como ‘entrega de matéria pelo professor’, mas sim uma comunicação que valorize o potencial de cada estudante naquilo que ele pode vir a realizar e a construir e, nesse processo, aprender e se desenvolver. Mas, para fazer isso bem feito, o educador precisa conhecer e experimentar as efetivas possibilidades que estão ao seu alcance. As tecnologias digitais, neste âmbito, e na perspectiva da Educação Digital podem em muito contribuir para o estabelecimento de um diálogo ativo, mediado por ambas as partes, pois há aspectos que o estudante conhece e o professor não, e vice-versa, de modo que pedagogias colaborativas melhor se coadunam com os perfis culturais dos estudantes, na atualidade. Informalmente os jovens estudantes já praticam educação digital. O acesso à informação disseminada pela Internet, redes sociais e outros nichos digitais representa a matéria prima para o conhecimento. A afirmação (de autor não identificado até o momento) de que a Internet é como um oceano com um dedo de profundidade carece de uma revisão crítica. O contraponto é: depende! Depende de quem e de como cada um está acessando e fazendo uso de informações qualificadas. Não há mais biblioteca física no mundo que, isoladamente, possa fazer frente em volume e abrangência de assuntos à Internet, até porque as obras estão sendo rapidamente digitalizadas e aquelas que representam conhecimento científico são disponibilizadas publicamente, além de milhares de artigos científicos que podem ser encontrados, com facilidade nos repositórios digitais dedicados a esse fim. Portanto, a questão não é mais se ficar discutindo se é ou não adequado fazer uso da Internet na educação, mas sim de como se fazer uso adequado da Internet para a educação. Os estudantes como afirmado anteriormente, já fazem isso e muito bem. Diante destas considerações uma das conclusões aproximativas que se chega é a de que os estudantes gozam hoje de uma autonomia para realizar gestão do conhecimento como em nenhuma outra época da História, ao menos de um modo que tende a cada dia ser mais abrangente. A capacidade de perseguir uma informação é um dos atributos que eles sabem fazer muito bem, mas a escola ainda não se apresentou como efetivamente contributiva para que os saberes culturais, artísticos, científicos e tecnológicos passassem a ser objeto de conhecimento para os estudantes. Este é o pior aspecto, o mais contraditório de todos. O estudante já vivencia sua autonomia, pela via digital. E a escola? Referências bibliográficas CARVALHO NETO, C.Z. Educação Digital. São Paulo: Laborciencia Editora, 2012. ________________. Educação Digital: paradigmas, tecnologias e complexmedia dedicada à gestão do conhecimento. Tese de doutoramento. Florianópolis: PPGEGC/UFSC, 2011. (Disponível em: http://www.carvalhonetocz.com/publica- cao-academica/. Acesso em 02/06/2012). Cassiano Zeferino de Carvalho Neto tem Pós-doutorado no Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA); Doutorado em Engenharia e Gestão do Conhecimento (EGC/UFSC); Mestrado em Educação Científica e Tecnológica (ECT/ UFSC); Especialidade em Qualidade na Educação Básica (INEAM/OEA/ USA) e Licenciatura em Pedagogia, com complementação em Física (PUCSP). Fundador da Laborciencia Editora, do Instituto para a Formação Continuada em Educação (IFCE) e do Instituto Galileo Galilei para a Educação (IGGE). www.carvalhonetocz.com E-mail: [email protected] Direcional Educador, Fevereiro 13 O Ã D Ç IGITAL A C U D E 47 livros Por Luiza Oliva Direcional Educador, Fevereiro 13 LITERATURA FORA DA CAIXA O PNBE NA ESCOLA – DISTRIBUIÇÃO, CIRCULAÇÃO E LEITURA Texto: Aparecida Paiva (org.) 216 páginas R$ 32,00 Editora Unesp www.editoraunesp.com.br As escolas públicas de ensino básico têm acesso a livros de literatura e materiais de pesquisa garantido pelo Programa Nacional de Biblioteca da Escola (PNBE), instituído em 1997. As obras, porém, nem sempre alcançam os estudantes e docentes. O principal motivo, de acordo com a organizadora desta obra, Aparecida Paiva, é a falta de políticas públicas consistentes e continuadas de formação de leitores, acompanhadas de projetos sólidos de mediadores de leitura. Mas, o que seria afinal uma política pública de formação de leitores? Como aferir sua presença ou ausência no sistema educacional? Ou, ainda, sua maior ou menor eficácia? Quem define e determina o que é e o que não é leitura? Para elucidar essas questões, Aparecida – que é professora do Programa de Pós-Graduação em Educação da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais e pesquisadora do Grupo de Pesquisa do Letramento Literário (GPELL/ CEALE/ UFMG) – e as quatro autoras da obra desenvolveram um estudo de campo pioneiro, que investigou todas as 181 escolas de Ensino Fundamental da Rede Municipal de Educação de Belo Horizonte. Além da pesquisa, a obra apresenta um conjunto de sugestões de atividades práticas para auxiliar professores e bibliotecários na tarefa de formar leitores. 48 A MOCINHA DO MERCADO CENTRAL Texto: Stella Maris Rezende Ilustrações: Laurent Cardon 112 Páginas R$ 29,90 Editora Globo Livros www.globolivros.com.br A obra foi a vencedora do primeiro lugar na categoria de Livro Juvenil do Prêmio Jabuti 2012, e também venceu como Livro do Ano de Ficção. A autora já havia sido indicada ao Jabuti três vezes antes de vencer a edição de 2012. Para ela, o reconhecimento por A mocinha do Mercado Central abre espaço para que a literatura juvenil genuinamente brasileira seja mais apreciada pelos leitores e pela mídia. O livro premiado fala da vida em uma fase de transformações, cheia de descobertas e desafios, típica da juventude. Maria Campos, a protagonista, tem origem humilde, assim como seu nome. Decide aventurar-se por diferentes experiências e, a cada uma delas, adota um novo nome cujo significado a ajuda a transpor suas dificuldades. “O mais importante para mim é o trabalho com a palavra, até mais do que a história em si”, afirmou Stella Maris Rezende. Na metáfora criada pela autora, cada nome que a mocinha agrega ao seu representa uma personalidade desenvolvida por Maria Campos para encarar seus desafios, experiências e aprendizados adquiridos ao longo de sua história. O livro fala, em síntese, do desejo de liberdade que só é alcançado com a coragem de se reinventar e tem uma participação especial do ator Selton Mello, que escreveu a apresentação e é citado na história como referência afetiva da personagem principal. OBRIGADO A TODOS! Texto: Isabel Minhós Martins Ilustrações: Bernardo Carvalho 32 páginas R$ 35,00 Editora Peirópolis www.editorapeiropolis.com.br O livro foi publicado originalmente em Portugal e narra a história de um garoto que decide agradecer a todas as pessoas que fazem parte de sua vida, abordando de forma sensível temas como respeito, ética, gratidão e sociabilidade. Com ilustrações divertidas e coloridas, o livro ensina que ninguém está sozinho. Por meio da história repleta de mensagens, a autora demonstra para os pequenos leitores a importância de agradecermos, mesmo que sem palavras, àqueles que nos ensinam algo importante. MEU CORPO DA CABEÇA AOS PÉS Texto: Okido Tradução: Monica Stahel 64 páginas R$ 42,00 Editora WMF Martins Fontes www.wmfmartinsfontes.com.br Como você respira? Por que você faz xixi? O que acontece com o que você come? O que bombeia o sangue pelo seu corpo? Por meio de textos curtos e divertidos, de jogos e brincadeiras individuais ou em grupo, as crianças vão conhecendo o próprio corpo e as funções que ele desempenha. SERRADACAPIVARA.COM – O S INCRÍVEIS DESENHOS DESSES HOMENS MISTERIOSOS Texto: Denise Crispun Ilustrações e fotos: Mariana Massarani 32 páginas R$ 29,90 Editora Global www.globaleditora.com.br A escritora Denise Crispun e a ilustradora Mariana Massarani, em épocas diferentes, estiveram no Parque Nacional da Serra da Capivara, no Piauí, o maior sítio arqueológico brasileiro de pinturas rupestres e de fragmentos dos tempos dos dinossauros. Incentivadas pela agente literária Ana Maria Santeiro, as duas levaram adiante o projeto de livro que traz um enfoque inteligente: o texto é apresentado em primeira pessoa por Maria, uma garota que viaja com a mãe arqueóloga para a Serra e registra suas descobertas por meio das cartas que escreve diariamente para o pai. A obra preenche uma lacuna importante na bibliografia sobre a pré-história brasileira para os jovens. Direcional Educador, Fevereiro 13 Confira nossas boas dicas de livros para alunos e professores. 49 AGENDA EVENTOS IV SEB – SEMINÁRIO DE EDUCAÇÃO BRASILEIRA Local: Centro de Convenções da Unicamp – Campinas - SP Data: 20 a 22 de fevereiro de 2013 Realização: CEDES - Centro de Estudos Educação e Sociedade Informações: (19) 3289-1598 http://www.cedes.unicamp.br E-mail: [email protected] I ENCONTRO PAULISTA SOBRE NEUROEDUCAÇÃO – Neurociências, Aprendizagem e Educação Data: 23 de fevereiro de 2013 Local: UniÍtalo - Av. João Dias, 2046 - Santo Amaro - São Paulo Horário: 8h30 às 17h Realização: Creative Ideias Informações: (21) 2577-8691 – (21) 3246-2904 http://www.creativeideias.com.br E-mail: [email protected] I ENCONTRO NACIONAL DE EDUCAÇÃO ESPECIAL Data: 1 e 2 de março de 2013 Local: Hotel Tannenhof Rua Visconde de Taunay, 340 – Centro - Joinville – SC Realização: Opem Eventos Informações: (41) 3045-3977 http://www.opemeventos.com.br E-mail: [email protected] Direcional Educador, Fevereiro 13 I CONGRESSO NACIONAL DE EDUCAÇÃO INFANTIL Data: 15 e 16 de março de 2013 Local: Hotel Aruan Av Dante Micheline, 1.497 – Praia do Camburi - Vitória - ES Realização: Opem Eventos Informações: (41) 3045-3977 http://www.opemeventos.com.br E-mail: [email protected] 50 I CONGRESSO DE EDUCAÇÃO INFANTIL COM ÊNFASE EM CRECHES I CONGRESSO INTERNACIONAL DE ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO IX CONGRESSO DE EDUCAÇÃO INCLUSIVA III CONGRESSO INTERNACIONAL DE EDUCAÇÃO MATEMÁTICA III FEIRA DE PRODUTOS EDUCACIONAIS Data:15 a 17 de março de 2013 Local:Hotel Majestic - Águas de Lindóia - SP Realização: Didática Consultoria e Eventos Informações: (19) 3704-4291 – (19) 8143-1616 www.adidatica.com.br E-mail: [email protected] III CONGRESSO NACIONAL DE EDUCAÇÃO INFANTIL Data: 22 e 23 de março de 2013 Local: Hotel Renar - Av. Beira Lago, 150 - Centro – Fraiburgo - SC Realização: Opem Eventos Informações: (41) 3045-3977 http://www.opemeventos.com.br E-mail: [email protected] II SIMPÓSIO SOBRE AUTISMO Tema: Práticas educativas na escola e na família Data: 06 de abril de 2013 Local: Colégio Pedro II – Auditório Mário Lago – Rua Campo de São Cristóvão, 177 – São Cristóvão – Rio de Janeiro – RJ (em frente ao Centro de Tradições Nordestinas) Realização: WAK Projetos Culturais Informações: (21) 3208-6113 / 3208-6095 www.wakeditora.com.br E-mail: [email protected] V COLÓQUIO DE REFLEXÃO E FORMAÇÃO DE GESTORES DA EDUCAÇÃO DA INFÂNCIA Data: 22 a 25 de abril de 2013 Para Secretários de Educação, Supervisores de Ensino, Diretores, Coordenadores Pedagógicos, Orientadores Educacionais e Professores da Infância e Séries Iniciais. Local: Hotel Majestic – Águas de Lindoia – SP Realização: Instituto Aprender a Ser Informações: (11) 2503-5892 e (11) 5049-1590 www.aprenderaser.com.br IX SIMPÓSIO DO LABORATÓRIO DE GESTÃO EDUCACIONAL – GOVERNANÇA DEMOCRÁTICA NA EDUCAÇÃO: SISTEMA, REDE E ESCOLA Data: 26 e 27 de abril de 2013 Contato: Faculdade de Educação da Unicamp LAGE – Laboratório de Gestão Educacional Av. Bertrand Russell, 801 - Cidade Universitária Zeferino Vaz - Campinas – SP Tel: (19) 3521-5596 (LAGE) e (19) 3521-5556 (DEPASE) www.fe.unicamp.br/simplage E-mail: [email protected] 20ª EDUCAR / EDUCADOR Tema: Educação 3.0 – A escola do futuro chegou? 20ª EDUCAR – Feira Internacional de Produtos e Serviços para Educação 20º EDUCADOR – Congresso Internacional de Educação 10º AVALIAR - Congresso Internacional de sobre Avaliação na Educação 9º EDUCADOR MANAGEMENT – Seminário Internacional de Gestão em Educação 8º INFÂNCIA & CIA - Congresso Internacional de Educação Infantil e Séries Iniciais 3º EDUCATEC – Fórum Virtual Educa de Tecnologia e Inovação em Educação 2º PROFITEC – Congresso Internacional sobre Educação Profissional e Tecnológica Local: Centro de Exposições Imigrantes - SP Data: 22 a 25 de maio de 2013 Realização: Futuro Eventos Informações: (41) 3033-8100 http://www.futuroeventos.com.br/educar/evento-2013/ E-mail: [email protected] Direcional Educador, Fevereiro 13 COEB 2013 - CONGRESSO DE EDUCAÇÃO BÁSICA Local: Centro de Cultura e Eventos da Universidade Federal de Santa Catarina Data: 6 a 7 de fevereiro de 2013 Realização: Secretaria Municipal de Educação de Florianópolis - SC Informações: (48) 3251-6100 http://portal.pmf.sc.gov.br/sites/coeb/ E-mail: [email protected] 51