associação dos fatores sócio demográficos

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associação dos fatores sócio demográficos
ASSOCIAÇÃO DOS FATORES SÓCIO-DEMOGRÁFICOS, GESTACIONAIS,
OBSTÉTRICOS, E PERINATAIS À OCORRÊNCIA DE EPISIOTOMIA EM
PUÉRPERAS
Larissa Beatriz Ferreira de Paiva1; Luciano Marques dos Santos2; Anayhan Marques do
Nascimento3; Larissa Madalena da Silva Santos4
1. Bolsista PROBIC-UEFS no Núcleo de Estudos Interdisciplinar sobre Desigualdades em Saúde (NUDES), Graduanda do
9º semestre em Enfermagem, Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS), e-mail: [email protected]
2. Orientador, Departamento de Saúde, Mestre em Enfermagem Professor Auxiliar do Curso de Graduação em Enfermagem
da UEFS, Pesquisador do NUDES, Coordenador do Projeto de Pesquisa “Condições Perineais de Mulheres no Pós-parto
Vaginal em uma Instituição Pública no Interior da Bahia”. E-mail: [email protected]
3. Bolsista Fapesb no NUDES. Graduanda em Enfermagem na UEFS. E-mail: [email protected]
4. Voluntária PEVIC-UEFS no NUDES. Graduanda em Enfermagem-UEFS. E-mail: [email protected]
PALAVRAS-CHAVE: Enfermagem Obstétrica. Episiotomia. Saúde da mulher. Períneo .
INTRODUÇÃO
A institucionalização do parto, foi marcada pela sua transferência do espaço domiciliar
para o hospital e a implementação de intervenções obstétricas abusivas e desnecessárias, sem
a avaliação criteriosa de sua utilização. Uma dessas intervenções, utilizada em larga escala, é
a episiotomia, consiste em uma incisão perineal durante o segundo estágio de trabalho de
parto, e é realizado principalmente para facilitar o parto em casos de sofrimento fetal, ou em
casos de parto instrumental ou complicado (com distócia de ombro, apresentação pélvica, feto
macrossômico), períneo inelástico, de acordo com evidências 1.
Apesar de existir poucos estudos relacionados à temática é perceptível que a literatura
brasileira e internacional aponta que este procedimento tem sido adotado principalmente em
mulheres jovens, primigestas e nulíparas, e naquelas cujo partos são de recém-nascidos
macrossômicos. É necessária a realização de novas investigações empíricas que busquem a
relação entre esses fatores e a ocorrência da episiotomia.
Isto posto, questionou-se: fatores sócio-demográficos, gestacionais, obstétricos e
perinatais estão associados à ocorrência de episiotomias?
Assim, este estudo objetivou associar os fatores sócio-demográficos, gestacionais,
obstétricos e perinatais das puérperas com a ocorrência de episiotomias em mulheres de uma
materindade do interior da Bahia no período de maio de 2013 a julho de 2014.
METODOLOGIA
Trata-se de um estudo transversal, realizado na Unidade de Alojamento Conjunto do
Hospital Inácia Pinto dos Santos (HIPS), na cidade de Feira de Santana, Bahia, no período de
maio de 2013 a julho de 2014. A amostra deste estudo foi composta por 768 mulheres
submetidas ao parto vaginal na unidade no período em estudo, que apresentram períneo
íntegro ou episiotomia. Foram inclusas no estudo todas as puérperas de parto vaginal e em
vértice que apresentaram períneo íntegro ou episiotomia; puérpera com condições psíquicas e
psicológicas para responder aos questionamentos dos pesquisadores; puérperas com mais de
seis horas de pós-parto.
Foram excluídas as puérperas que apresentaram episiotomia com laceração e aquelas
com partos com fetos múltiplos ou mortos. Para a coleta de dados foi utilizada a técnica da
entrevista semiestruturada mediada por um formulário contendo dados de identificação,
sóciodemográficos, gestacionais, obstétricos, paridade, informações sobre a atenção
obstétrica, recém-nascidos e condições perineais das mulheres em estudo, preenchido
mediante realização de entrevista e coleta em prontuário das puérperas.
Foi considerada como variável de desfecho a integridade ou não integridade perineal
(períneo íntegro ou com episiotomia) e de exposição: idade, grau de escolaridade, raça/cor,
número de gestações, grau de paridade, tempo de internamento no centro obstétrico, utilização
de ocitocina ,turno em que o parto foi realizado, idade gestacional do recém-nascido e peso do
recém-nascido.
Para análise dos dados utilizada foi a estatística descritiva e inferencial. Os dados
foram tratados e analisados por meio do pacote SPSS versão 15.0 e e OpenEpi, versão 2.3 e
estão apresentados sob a forma de tabelas. A coleta de dados respeitou a resolução 466/12 de
pesquisa com seres humanos, e a participação da mulher só era efetivada após leitura e
assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido. Aprovada pelo Comitê de Ética em
Pesquisa pelo protocolo de nº 69/2012.
ANÁLISE E DISCUSSÃO
Foi encontrada associação estatísticamente significante entre idade (p<0,000), grau de
escolaridade (p<0,000), idade gestacional (p=0,000), grau de paridade (p<0,000), numero de
gestações(p<0,000), tempo de internamento no centro obstétrico (p=0,028), uso de ocitocina
(p=0,000), e peso do RN. Não foram encontradas associações com as variáveis raça/cor e
período do parto.
Tabela 1: Distribuição de puérperas submetidas ao parto vaginal segundo variáveis sócio-demográficas,
gestacionais e obstétricas e a condição perineal em mulheres submetidas ao parto vaginal em uma
maternidade pública do interior da Bahia.Feira de Santana-BA. mai. 2013 - jul. 2014.
Episiotomia Períneo íntegro
Variáveis
N (%)
N (%)
RP
IC (95%)
p-valor
Idade
≤ 20 anos
143 (52,8)
128 (47,2)
2,3
1,701-3,152
<0,000
21 a 30 anos
137 (40,4)
202 (59,6)
1,8
1,295-2,43
0,000
≥ 31 anos
36 (22,8)
122 (77,2)
Grau de escolaridade
Até o ensino fundamental
118 (31,1)
261 (68,9)
0,6
0,512 - 0731
<0,000
Ensino médio/ensino superior
198 (50,9)
191 (49,1)
Raça/cor
Negras
281 (40,4)
415 (59,6)
0,8
0,644-1,071
0,176
Não-negras
35 (48,6)
37 (51,4)
Número de gestações
4,106-8,512
<0,000
Primigesta
224 (64,4)
124 (35,6)
5,9
2,317-5,201
<0,000
3,5
Secundigesta
65 (37,8)
107 (62,2)
3 ou mais gestações
27 (10,9)
221 (89,1)
Grau de paridade
Nulíparas
243 (64,6)
133 (35,4)
9,2
5,602-15,03
<0,000
Primíparas
58 (32,4)
121 (67,3)
4,6
2,703 -7,831
<0,000
2 ou mais partos
15 (7,0)
198 (93,0)
Tempo de internamento no C.O
≤ 5 horas
183 (36,9)
313 (63,1)
0,8
0,607-0,948
0,028
De 6 a 10 horas
79 (49,1)
82 (50,9)
1,0
0,788-1,292
0,956
≥ 11 horas
54 (48,6)
57 (51,4)
Período do parto
Diurno
181 (43,0)
240 (57,0)
1,1
0,931-1,312
0,252
Noturno
135 (38,9)
212 (61,1)
Uso de ocitocina
Sim
200 (47,8)
218 (52,2)
1,4
1,207-1727
0,000
Não
116 (33,1)
234 (66,9)
Idade gestacional
≥37 semanas
296 (44,9)
363 (55,1)
2,4
1,633-3,670
0,000
≤ 36 semanas
20 (18,3)
89 (81,7)
Peso do RN ao nascer
≤ 3500 gramas
241 (39,4)
370 (81,9)
0,8
0,682 – 0,999
0,059
≥ 3501 gramas
75 (47,8)
82 (52,2)
FONTE: Coleta de dados, Feira de Santana/Bahia, mai.2013-jul.2014
Dos 768 partos vaginais que participaram deste estudo, 58,9% (452) mantiveram o
períneo íntegro, 41,1% (316) foram submetidas à episiotomia e destas 96,8% (304) foram do
tipo médio-lateral. A prevalência de realização de episiotomia encontrada na amostra
estudada foi de 41,1%, ainda superior ao limite recomendado pela Organização Mundial da
Saúde (OMS) de 10%.
O tipo de episiotomia, a médio-lateral é a mais realizada no campo obstétrico, pois a
lateral está em desuso, visto que esta está associada a lesões graves da fáscia muscular, já que
o corte lateral afeta o músculo levantador do ânus 2.
Com relação à idade observou-se que 52,8% (143) das mulheres até 20 anos de idade
foram submetidas à episiotomia, com risco de 2,3 vezes mais (IC95% 1,7-3,1) de serem
submetidas a esse procedimento quando comparadas com mulheres mais velhas, e de acordo
com a literatura, adolescentes têm o períneo menos elásticos e mais rígidos que mulheres de
maior idade, dessa forma utiliza a episiotomia para evitar lacerações perineais graves 3.
Mulheres que estudaram até o ensino fundamental (31,1%; 118) apresentaram menor
risco (RP= 0,6 e IC95% 1,7-31) em relação àquelas com maior grau de escolaridade. As que
se autodeclararam negras (40,4%; 281) também apresentaram um menor risco de serem
submetidas à episiotomia do que mulheres autodeclaradas não-negras (RP 0,8 e IC95% 0,651,07). Não há na literatura associação entre o grau de escolaridade e episiotomia, e há poucos
estudos que avaliem a raça/cor, portanto são necessários estudos bem elaborados que incluam
estas variáveis.
As mulheres que eram primigestas (64,4%; 224) apresentaram um risco 5,9 vezes
maior do que mulheres que já haviam engravidado 3 ou mais vezes. E as nulíparas
apresentaram um risco 9,2 vezes (IC95% 5,6-15,03) maior de serem submetidas à
episiotomia. Diminuindo para 4,6 vezes (IC95%2,7-,8) o risco nas mulheres que já tenham
tido pelo menos um parto anterior.
A associação entre episiotomia com o número de gestações e grau de paridade está
bem difundida na literatura 4,5,6,7. Estes estudos apontam que primigestas e nulíparas estão
mais expostas à episiotomia, concordando com os resultados deste estudo.
Mulheres que permaneceram internadas no C.O por um tempo menor ou igual a 5
horas (36,9%; 183) apresentaram menor risco de serem submetidas ao procedimento (RP 0,8
IC95% 0,6-0,9), e aquelas que fizeram uso de ocitocina endovenosa (47,8%; 200)
apresentaram um risco 1,4 vezes maior de serem submetidas ao procedimento do que
mulheres que não usaram (IC95% 1,2-1,7).Quanto ao uso da ocitocina, a literatura aponta que
há associação estatística significante 8.
Em casos de tempo de internamento superior a 6 horas, fase ativa do trabalho de parto,
a episiotomia é utilizada para encurtar o período expulsivo, porém esta afirmação ainda não
está elucidada na literatura 9, necessitando de estudos que analisem o período de internamento
e trabalho de partos fielmente, sem que haja subregistros desses períodos.
De acordo com a Tabela, 43% dos partos realizados no período diurno tiveram
episiotomia. Não se observou associação estatisticamente significante entre o horário de
acontecimento do parto com a realização de episiotomia, (p = 0,252), coincidindo com
resultados da literatura 10.
As gestações com mais de 37 semanas (44,9%; 296) tiveram 2,4 vezes maior risco de
sofrerem episiotomia (IC95% 1,6-3,7). E no parto de recém-nascidos grandes o percentual de
episiotomia foi de 47,8% (75) sendo uma associação estatisticamente significante (RP=0,8;
IC95% 0,682-0,999).
No intuito de evitar o sofrimento fetal, em casos de bebês macrossômicos ou idade
gestacional avançada, a episiotomia é utilizada como forma de evitar lacerações espontâneas
graves 11, e como forma de evitar lacerações perineais graves, de 3º e 4º graus que predispõem
à infecções no sítio de sutura, e estão mais associadas à morbidade, utilizariam a episiotomia.
CONCLUSÃO
Essa pesquisa observou elevada prevalência de episiotomia no hospital em estudo e
encontrou associações estatisticamente significantes com as varáveis idade, grau de
escolaridade, grau de paridade, numero de gestações, tempo de internamento no centro
obstétrico, uso de ocitocina, idade gestacional e peso do recém-nascido, e que
As mulheres que apresentaram risco para a episiotomia foram as de baixa idade,
primigestas, primíparas, que permaneceram internadas por um período superior de até 5
horas, receberam ocitocina intravenosa e que tiveram recém-nascidos com idade gestacional
igual ou superior a 37 semanas e pesando mais do que 3.500 gramas.
Estas características apontam que a episiotomia ocorre de forma rotineira e sem
critérios sustentados por evidências científicas atuais, já que este procedimento obstétrico
parece ser realizado seguindo padrões tradicionais que por décadas justificaram a sua
utilização, como forma de proteção da integridade perineal. Os dados sugerem que os
responsáveis pela utilização da episiotomia a utilizam sem avaliação criteriosa das condições
maternas e neonatais, baseando esta avaliação em critérios culturalmente internalizados nas
unidades obstétricas.
É necessário o investimento da gerência do hospital estudado na educação permanente
dos trabalhadores do centro obstétrico quanto aos critérios mais seguros que possam indicar a
necessidade da episiotomia, bem como a utilização das boas práticas na atenção à parturiente
que possam colaborar com a proteção perineal.
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