1 UNIDADE 2 – ORGANIZAÇÃO DO ESTADO

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1 UNIDADE 2 – ORGANIZAÇÃO DO ESTADO
UNIDADE 2 – ORGANIZAÇÃO DO ESTADO NORTE-AMERICANO II
Sumário: 1. Os limitados e enumerados poderes do Congresso. 2. Análise do caso
Lochner v. New York (1905) como fundante da ideia de liberdade de contrato, impedindo o
Estado de passar regulações nas relações trabalhistas. 3. Análise do caso West Coast
Hotel Co. v. Parrish (1937), que revogou Lochner. 4. Análise do caso United States v.
Lopez (1995), primeiro caso que a Suprema Corte julga um ato do Congresso
inconstitucional desde 1937. 5. Análise do caso National Federation of Independent
Business v. Sebelius (2012) e discussão da controvérsia ao redor da constitucionalidade
do Affordable Care Act (Obama Care). 6. Discussão ao redor da constitucionalidade da
legalização da maconha nos estados do Colorado e Washington.
Objetivos: Entender os poderes do Legislativo Federal como enumerados e limitados;
entender a passagem de Lochner para Parrish como a passagem do Estado Liberal para
o Estado Social; entender como a Suprema Corte se afasta da interferência no Legislativo
em questões sociais e como em Lopez esta reafirma a existência de limites ao poder de
legislar do Congresso; perceber o Affordable Care Act como um novo paradigma do poder
de legislar do Congresso, sem precedentes; entender a relação entre o governo federal e
os governos estaduais a partir dos casos de legalização estadual do consumo da
maconha.
1. Os limitados e enumerados poderes do Congresso
Como analisou-se na Unidade 1 a estrutura de governo prevista na Constituição é
a de um governo federal com poderes limitados e enumerados. A própria dinâmica da
relação entre os Três Poderes colocada em prática pelos Pais Fundadores, fundada no
princípio de checks and balances, refletia o objetivo de constante controle e limitação do
exercício de poder. A ideia é a de que o poder não estivesse concentrado em uma única
pessoa ou órgão, como na monarquia da antiga metrópole britânica.
Por limitados e enumerados entende-se que o Congresso só tem poder de legislar
sobre os temas expressamente previstos na Constituição. No entanto, como veremos
abaixo, em McCulloch v. Maryland (1819) a Suprema Corte entendeu que também faz
parte dos poderes do Congresso aqueles implícitos, que são absolutamente necessários
e próprios (necessary and proper clause prevista no artigo 1, seção 8, cláusula 18, da
Constituição dos Estados Unidos) para a realização das funções estipuladas na
Constituição.
Na seção 8 do artigo 1 da Constituição de 1787 estão enumerados os poderes do
Congresso Federal em 18 cláusulas. Dentre esses poderes estão o de declarar guerra,
regular o comércio internacional e entre os estados, cunhar moedas e regular seu valor,
criar tribunais federais inferiores à Suprema Corte dos Estados Unidos, dentre outros. O
poder de regular o comércio entre os estados (commerce clause prevista na cláusula 3,
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da seção 8, do artigo 1) se mostrou como o principal poder do Congresso, sofrendo
grande transformação de interpretação ao longo dos anos e será o foco principal do nosso
estudo nesta Unidade.
Primeiro analisaremos o caso McCulloch v. Maryland para entendermos como a
dinâmica do governo federal constitucional é muito diferente da forma de organização
anterior das ex-colônias britânicas, o Congresso Continental. Em 1816 o Congresso dos
Estados Unidos passou um ato pelo qual instituiu o 2º Banco dos Estados Unidos, que
operaria nos diversos estados da federação. Logo, muitos estados contraíram dívidas
com o banco e conjecturaram formas de impedir seu funcionamento. O estado de
Maryland passou uma lei que, apesar de seu texto ser geral e teoricamente ser aplicável a
qualquer banco que não fosse do próprio estado, impunha impostos sobre o Banco dos
Estados Unidos com o objetivo de frustrar suas operações. O administrador do Banco se
recusou a pagar o imposto, originando o caso judicial.
Em 1819 a Suprema Corte, ainda sob a presidência do Chief Justice John Marshall,
em decisão unânime, proferiu a seguinte opinião:
Apesar da Constituição não dar especificamente ao Congresso o poder de
estabelecer um banco, ela delega a prerrogativa de taxar e gastar, e um banco é
um instrumento próprio e adequado para auxiliar o governo nas operações de
coleta e distribuição dos recursos. Porque leis federais têm supremacia sobre leis
estaduais, Maryland não tinha o poder de interferir nas operações do banco
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impondo-o impostos .
Essa decisão é fundante da estrutura do governo constitucional que é muito
diferente do Congresso Continental que o precedeu. Este, como visto, regia-se pelos
Artigos da Confederação, que excluía poderes implícitos do Congresso. Também
devemos perceber que a estrutura do governo constitucional simplesmente não
funcionaria se fosse permitido aos estados frustrarem as políticas do governo federal.
Lembremos que já no preâmbulo da Constituição está previsto que o objetivo era de
formar uma forma de união mais perfeita, que assegurasse tranquilidade doméstica.
Além da ideia de poderes implícitos, na decisão está presente a ideia de
supremacia das leis federais sobre as estaduais. Aqui vemos um ponto crucial do
federalismo norte-americano, apesar de não ser ainda o centro da decisão em McCulloch
ela tangencia essa questão. A ideia de supremacia da legislação federal irá definir que
não é permitido aos estados interferirem na aplicação de leis federais que estejam dentro
das competências do Congresso para legislar. Essa supremacia, no entanto, deve ser
compreendida junto com o “anticomandeering principle”, princípio pelo qual o governo
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McCulloch v. Maryland 17 U.S. 316 (1819).
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federal não pode comandar um estado a aprovar determinada legislação.
Essa interação entre o governo federal e os governos estaduais será abordada
mais a frente nesta unidade, mas é interessante desde já perceber que é bem possível
uma legislação federal prever determinada proibição (como o consumo, posse e comércio
de maconha) e uma legislação estadual não prever a mesma proibição, e ambas serem
igualmente válidas e vigentes. O que isso irá implicar é que, no âmbito estadual, nenhuma
pessoa poderá ser presa e processada por autoridades estaduais por descumprir a
legislação federal, mas autoridades federais ainda preservaram sua competência para
prender e julgar aquelas mesmas pessoas por violarem uma lei federal. Ao estado é
proibido interferir com a aplicação de leis federais, mas não aplica-las para o governo
federal.
McCulloch é, portanto, fundante dessa nova estrutura de governo constitucional e
dos poderes do Congresso Federal que não eram como os do Congresso Continental. O
governo federal agora detinha força de impor suas leis aos estados, mesmo que eles
discordassem delas. Aos estados não era mais permitido negar vigência às leis federais e
frustrar sua aplicação. Agora veremos como esse poder legislativo do Congresso evolui
ao longo dos anos, desde a Era Lochner até o recente caso do Obama Care Act.
2. Análise do caso Lochner v. New York (1905) como fundante da ideia de liberdade
de contrato, impedindo o Estado de passar regulações nas relações trabalhistas
Em Lochner pela primeira vez a Suprema Corte reconheceu a existência de direitos
fundamentais (apesar da Corte ainda não usar essa expressão) não expressos na
Constituição, interpretando a cláusula de devido processo legal da 14ª Emenda. Mas
analisaremos aqui o caso sobre outro enfoque, não dos direitos fundamentais, mas sobre
os poderes do Congresso de editar legislações.
Ao fim do século XIX, o estado de New York aprovou uma lei que proibia padarias
contratar padeiros para jornadas de trabalho superiores a 60 horas semanais, ou 10 horas
diárias. Joseph Lochner era proprietário de uma padaria e foi multado por permitir
funcionários a trabalharem fora do padrão estipulado na legislação do estado. Apelou da
decisão até que teve seu caso ouvido pela Suprema Corte em 1905. A decisão do
Tribunal foi no sentido de que a legislação estadual violava o direito de liberdade de
contratar do indivíduo, o qual teria o direito de firmar o contrato que melhor lhe
aprouvesse sem a interferência do estado.
Na opinião majoritária dos juízes, proferida por Justice Peckham, a Corte descartou
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os argumentos do estado de que jornadas de trabalho muito extensas seriam prejudiciais
à saúde pública. A Suprema Corte decidiu que a legislação ia além do poder de polícia do
governo por invadir áreas da liberdade individual. Lochner representou o início de uma era
da Suprema Corte de ativismo judicial que invalidava qualquer lei, estadual ou federal, de
cunho social que intervisse na liberdade de contrato. A interferência da Corte se estendeu
para outros direitos trabalhistas e mesmo para questões como trabalho infantil e de
mulheres. Tudo dentro da doutrina do Estado Liberal.
A ideia central do liberalismo é a de que o Estado deve manter-se distante da vida
privada do indivíduo, como garantia da liberdade individual para conduzir sua própria vida.
Habbermas (2002, p. 118-119) define a liberdade para os liberais como
a liberdade de arbítrio das pessoas jurídicas privadas garantida por via legal (…)
Direitos são liberties, algo como capas protetoras para a autonomia privada. A
preocupação central está voltada a garantir a cada um a mesma liberdade para
levar uma vida autêntica, autodeterminada.
A economia de livre mercado fundamenta-se nessa concepção liberal de liberdade.
Segundo Sandel (2012, p. 99, grifos acrescidos) a ideologia do livre mercado “ao permitir
que as pessoas realizem trocas voluntárias, estamos respeitando sua liberdade; as leis
que interferem no livre mercado violam a liberdade individual”. A ideia de economia
de mercado também se sustentaria a partir de uma justificativa utilitarista, já que quando
duas pessoas livres entram em um acordo voluntário ambas são beneficiadas (Ibidem). A
ideia é que todos os indivíduos são formalmente livres e iguais para firmarem entre si
qualquer forma de acordo e a intervenção estatal somente prejudicaria esses direitos
individuais.
Essa ideologia estava impregnada em todos os casos da Era Lochner, mas ela é
abertamente mostrada nos votos dissidentes. O voto dissidente da maioria dos juízes da
Suprema Corte no caso foi proferido por Justice Oliver Wendell Holmes Jr., um dos mais
proeminentes juiz e jurista. Sua opinião tem apenas três parágrafos, mas vai no centro da
ideologia presente na opinião majoritária. Ele disse:
Este caso é decidido baseado em uma teoria econômica que a maioria da
população do país não concorda. Se isto fosse uma questão se eu concordo com
esta teoria, eu estudaria ela mais detidamente antes de formar minha convicção.
Mas eu não acredito que este seja meu trabalho, porque eu firmemente acredito
que minha concordância ou discordância não tem nada a ver com o direito da
maioria de inserir suas opiniões na lei. (...) Algumas dessas leis englobam
convicções e preconceitos que juízes comumente compartilham. Algumas não.
Mas a constituição não engloba uma teoria econômica particular, seja de
paternalismo e de relação orgânica dos cidadãos do estado ou do laissez faire
2
(livre mercado) .
2
Lochner v. New York 198 U.S. 45 (1905), tradução livre do autor.
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Holmes via na decisão da Corte um ativismo judicial impróprio para o papel de um
Tribunal em um regime democrático. Essa decisão encerra uma ideologia que entendia
um Legislativo fortemente limitado e um papel altamente intervencionista do Judiciário na
garantia desse extremo limite ao Legislativo. Durante as três primeiras décadas do século
XX esse pensamento dominou a jurisprudência da Suprema Corte dos Estados Unidos e
só veio a ser revertida em uma intensa batalha política na década de 1930.
3. Análise do caso West Coast Hotel Co. v. Parrish (1937), que revogou Lochner.
Já durante a década de 1920 o modelo econômico do capitalismo laissez faire
mostrou-se em decadência. Crises severas que levaram ao crack da Bolsa de New York
em 1929 marcaram o período e levaram aos governos abandonarem as políticas liberais
para uma postura social. O Estado Social pregava uma ideia de maior intervenção estatal
com o fim de corrigir as desigualdades entre os indivíduos. Um Estado intervencionista
principalmente em questões econômicas era completamente contrário à ideologia do
Estado Liberal.
A transição para esse novo paradigma nos Estados Unidos iniciou-se com a eleição
de Franklin Delano Roosevelt para a presidência. Roosevelt foi um presidente marcante,
principalmente por ter sido o único presidente a governar por três mandatos consecutivos
– isso, evidentemente, antes da passagem da XXVII Emenda à Constituição – e ter
governado o país durante a Segunda Guerra Mundial. Sua eleição e seu governo
marcaram um novo rumo da história norte-americana, como Lincoln e Washington antes
dele.
Roosevelt e a equipe econômica eleita junto com ele iniciaram programas de
reformas socioeconômicas que não agradavam aqueles que ainda acreditavam na
ideologia liberal. E também não agradou a Suprema Corte que durante grande parte do
seu primeiro mandato julgou vários dos programas da administração de Roosevelt
inconstitucionais, numa postura que reafirmava a doutrina expressa em Lochner. Essa
tensão institucional levou mesmo ao Presidente tentar uma direta interferência na
composição da Corte para atender seus interesses políticos.
Durante a campanha para o seu segundo mandato, o presidente Roosevelt fez um
discurso empolgante no qual disse que a Suprema Corte era a responsável por barrar
suas políticas e que ele não permitiria que isso continuasse impedindo que o país se
recuperasse da crise. Com grande aprovação popular, ganhando em 48 dos 50 estados,
Roosevelt volta à Casa Branca e introduz uma legislação de reforma judicial que lhe
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permitiria apontar um novo juiz para a Suprema Corte, até um máximo de seis, para cada
juiz na Corte com mais de 70 anos e 6 meses. A justificativa do presidente era de que os
juízes mais velhos estavam com mais dificuldades de julgarem os casos e atrasando os
trabalhos do Tribunal. Escondia-se, no entanto, o fato de tentar mudar o precedente da
Suprema Corte quanto aos programas sociais da administração.
A lei não chegou a ser aprovada, mas exerceu grande pressão sobre o Tribunal
que o levou a mudar seu precedente em Lochner de uma forma que a Suprema Corte
nunca havia feito. Em 1937, o Chief Justice Owen J. Roberts muda sua tendência de
votos em relação às políticas sociais no caso West Coast Hotel Co. v. Parrish. A mudança
de Roberts ficou conhecido como o voto que salvou os nove. Com a mudança do
precedente, a lei perdeu apoio político e acabou não sendo aprovada.
O caso originou-se do fato de Elsie Parrish, uma empregada da Companhia de
Hotel West Coast, recebeu menos que os $14,50 de salário mínimo que previa a
legislação do estado de Washington. Ela ingressou no judiciário para receber a diferença
e a corte de instância inferior decidiu a favor do Hotel baseando-se no precedente da
Suprema Corte da Era Lochner. O Tribunal, a partir do voto do Justice Charles Evans
Hughes, entendeu que o estado detinha sim o poder de restringir a liberdade de contratar
dos indivíduos e com isso reverteu o precedente de Lochner v. New York que prevalecia
desde 1905. Em uma votação de 5-4, o holding foi o seguinte: “O devido processo legal
não impede um estado de passar uma lei de salário mínimo para mulheres”.
O voto mais marcante foi, contudo, o de Owen Roberts, que se alinhava com os
juízes mais conservadores e nesse caso resolveu mudar sua posição. Nunca se saberá
se ele o fez por causa da pressão da reforma judiciária iniciada pelo Presidente
Roosevelt. Apesar do juiz Hughes afirmar que sim, Owen Roberts nunca confirmou e ele
não deixou nenhum registro a partir do qual se possa tirar essa conclusão. Roberts
apontou, na sua decisão, que na Constituição não existia a tão falada liberdade de
contrato – apesar de décadas de precedentes da Suprema Corte afirmando exatamente o
contrário – e apontou também que empregador e empregado não eram igualmente livres
na relação econômica, estando o empregado em clara desvantagem. Este caso inaugurou
toda uma nova ideologia econômica e social para os Estados Unidos.
A fala do Chief Justice é impactante e revolucionária para o momento; traduz
claramente os fundamentos da nova ideologia do Estado Social:
O princípio que deve controlar nossa decisão é claro. A previsão constitucional
invocada é a cláusula de devido processo legal da 14ª Emenda, governando os
Estados, como a cláusula de devido processo legal invocada no caso Adkins que
governava o Congresso. Em cada caso, a violação alegada por aqueles atacando
a regulação de salário mínimo para mulheres é a afronta à liberdade de contrato.
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O que é essa liberdade? A Constituição não fala de liberdade de contrato. Ela
fala de liberdade e proíbe a privação da liberdade sem o devido processo legal.
Ao proibir essa privação, a Constituição não reconhece uma liberdade
absoluta e incontrolável. Liberdade em cada uma de suas fases tem sua
história e conotação. Mas a liberdade preservada é a liberdade em uma
organização social que requer a proteção da lei contra os males que
ameaçam a saúde, segurança, moral e riqueza das pessoas. Liberdade de
acordo com a Constituição é, portanto, necessariamente sujeita às restrições
do devido processo legal, e regulação que é razoável para seus fins e é
adotada no interesse da comunidade é legítima.
O caso West Coast Hotel Co. v. Parrish também instaura uma postura da Suprema
Corte menos intervencionista nos atos dos demais poderes. Saindo da dinâmica
controladora das leis emanadas do Legislativo, principalmente em relação a assuntos
econômicos e sociais, o Tribunal passa a permitir uma maior atuação dos órgãos políticos
nessas questões. Roosevelt conseguiu, então, ter aprovado regulações de salários
mínimos, horas semanais de trabalho e principalmente programa de seguridade social
que garantiria aposentadoria.
O Brasil também sofre na década de 1930 uma transição da ideologia liberal,
marcante na nossa Constituição de 1891, para a ideologia do Estado Social durante a Era
Vargas. Contudo, uma característica peculiar apontada por José Murilo de Carvalho na
conquista dos direitos civis, políticos e sociais é que no Brasil houve uma inversão na
ordem com que esses direitos foram conquistados pelos cidadãos. Nos Estados Unidos e
na Europa percebemos primeiramente uma conquista de direitos civis que possibilitaram
aos indivíduos pressionarem e lutarem por um maior reconhecimento de direitos políticos
que, como consequência, permitiram aos cidadãos uma maior participação política e uma
forma de poderem exigir a adoção de políticas sociais que melhor atendessem seus
interesses. Não foi, no entanto, assim que ocorreu a transição das gerações de direitos no
Brasil.
No Brasil os primeiros direitos conquistados foram os direitos políticos, depois os
sociais e só muito recentemente os civis, mas todos dentro de regimes ditatoriais que não
permitiam a verdadeira participação dos cidadãos na sua construção. O exercício dos
direitos políticos sempre estive sujeito a corrupção e ao controle das elites locais. Como
assinala Carvalho3, “A luta política era intensa e violenta. O que estava em jogo não era o
exercício de um direito de cidadão, mas o domínio político local”. O voto era uma moeda
de troca dos cidadãos por dádivas do chefe local – coronel. Aqueles vendiam seus votos
por proteção e por outros tipos de utilidades, como roupas, alimentos e outros. Existia um
3
CARVALHO, José Murilo de. Cidadania no Brasil: o longo caminho. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2013, p.
33.
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comércio e um verdadeiro controle sobre a população.
Sem um verdadeiro exercício de direitos políticos, as conquistas de direitos sociais
seguiram a mesma lógica da venda dos votos. Um Estado paternalista e provedor
garantiu direitos sociais para os cidadãos em troca de um silêncio político em relação aos
governos ditatoriais que se instalaram no Brasil. Getúlio Vargas representou bem essa
figura paternal, “pai dos trabalhadores”, que usou os direitos sociais para evitar
insurreições contra seu governo totalitário. Na doutrina totalitária, trabalhadores e
empregados tinham que conciliar seus interesses para a construção de uma grande
nação – aqui presente o nacionalismo exacerbado dos regimes de exceção – e ao
Estado-pai caberia disciplinar os filhos. Os direitos seriam garantidos apenas através
desse Estado forte, centralizador e interventor.
Por fim, direitos civis nunca foram prioridade para os políticos e nem mesmo para
os cidadãos brasileiros. Os direitos de liberdade e igualdade foram muito importantes para
as democracias europeias e norte-americana, estando na base de sua formação. Pode-se
dizer que a verdadeira Revolução Americana foi anterior à guerra de independência. A
Revolução foi o reconhecimento que os colonos tinham da igualdade entre eles. Um
colono norte-americano de Boston e outro do interior da Virgínia percebiam-se como
iguais. A estrutura social brasileira, presente desde o início da colonização e marcada pela
escravidão, patriarcalismo e estamentos sociais, não permitiu a disseminação dessa ideia
tão fundamental para a formação de uma verdadeira democracia.
Como diz Carvalho4:
O argumento da liberdade individual como direito inalienável era usado com pouca
ênfase, não tinha a força que lhe era característica na tradição anglo-saxônica.
Não o favorecia a interpretação católica da Bíblia, nem a preocupação da elite com
o Estado nacional. Vemos aí a presença de uma tradição cultural distinta, que
poderíamos chamar de ibérica, alheia ao iluminismo libertário, à ênfase nos
direitos naturais, à liberdade individual. Essa tradição insistia nos aspectos
comunitários da vida religiosa e política, insistia na supremacia do todo sobre as
partes, da cooperação sobre a competição e o conflito, da hierarquia sobre a
igualdade.
Essa distinção é importante para percebemos como a conquista de direitos se deu
diferente no Brasil e nos Estados Unidos. Não houve na experiência norte-americana uma
descontinuidade, uma interrupção abrupta do regime democrático, o que permitiu uma
constante, mas jamais linear, evolução das conquistas. No Brasil, o Estado Liberal não foi
realmente implantado, pela dificuldade cultural do reconhecimento da igualdade e
liberdade dos indivíduos, e a transição para o Estado Social se deu por meio de um golpe
4
Ibidem, p. 51.
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e dentro de um regime totalitário. Esses efeitos permanecem até hoje na nossa
sociedade, marcando as críticas políticas até mesmo dentro da nossa mais bem sucedida
experiência democrática.
Para concluir, marcantes são as palavras de Evandro Lins e Silva 5 no prefácio da
sua biografia:
Democracia legítima, a rigor, nunca tivemos neste país, pois jamais aceitamos,
honestamente, o regime da igualdade de todos na fruição das liberdade civis e,
portanto, a negação dos privilégios de raça, sexo, classe, religião, instrução ou
fortuna. Para os nossos falsos liberais, ser democrata consiste apenas em saber
ajustar, destramente, a dominação oligárquica à realização periódica de eleições.
4. Análise do caso United States v. Lopez (1995), primeiro caso que a Suprema
Corte julga um ato do Congresso inconstitucional desde 1937
O que percebemos até aqui nos casos Lochner e em Parrish é o entendimento
dado ao poder que a Constituição garante ao Congresso de regular atividades
econômicas. Através da commerce clause o governo federal pode até mesmo regular
atividades individuais que tenham impacto substancial no comércio entre os estados,
como veremos mais adiante foi com essa argumentação, por exemplo, que a Suprema
Corte começou a mudar os precedentes quanto a segregação racial.
Em Wickard v. Filburn (1942) a Suprema Corte decidiu que a commerce clause
garantia o direito ao Congresso de regular as atividades de um fazendeiro individual,
ainda que de pequeno porte. Filburn era um pequeno fazendeiro em Ohio que recebeu
certa quantidade de terras do governo, o que permitiu que este determinasse a
quantidade de trigo que ele deveria cultivar. Filburn cultivou 12 acres acima da quota,
alegando que era para consumo próprio e não tinha impacto nenhum no comércio entre
os estados. Mesmo assim ele acabou sendo penalizado e acionou o judiciário.
A Suprema Corte entendeu, em uma decisão unânime que se a prática de cultivar
além das quotas estipuladas pelo Departamento de Agricultura poderia sim causar
impacto substancial no comércio entre os estados. O holding da decisão foi:
Quotas sobre produção estabelecidas pelo Agricultural Adjustment Act de 1938
foram constitucionalmente aplicadas para produções agrícolas que foram
consumidas puramente dentro de um estado, porque elas produzem efeitos sobre
o comércio interestadual que estão dentro do poder do Congresso regular de
acordo com a Commerce Clause.
Sob a Commerce Clause o governo federal adquiriu uma grande capacidade de
5
SILVA, Evandro Lins e. O salão dos passos perdidos: depoimento ao CPDOC. Rio de Janeiro: Nova Fronteira: Ed.
FGV, 1997, p. 10.
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regular as atividades individuais dos cidadãos. A Suprema Corte também deixou os
órgãos políticos mais livres para atuarem no interesse dos eleitores que o elegeram.
Levou até 1995 para o Tribunal considerar que uma lei federal violava a Commerce
Clause no caso United States v. Lopez.
Em 1990, o Congresso aprovou uma lei chamada de Gun-Free School Zones
(Zonas Escolares Livres de Armas), certamente tentando impedir a ocorrência de tiroteios
em escolas. De acordo com a lei, ninguém poderia portar armas em áreas que
soubessem ser escolares. Alfonzo Lopez, um estudante do ensino médio de Santo
Antônio, no Texas, levou uma arma escondida para a escola. Ele, primeiramente, foi
acusado de violar a legislação do estado do Texas, mas logo após a acusação foi retirada
devido a agentes federais acusá-lo de violação da legislação federal. Lopez foi condenado
a seis meses de cadeia e dois anos de liberdade condicional. Ele recorreu e o caso
chegou até a Suprema Corte.
A questão apresentada à Corte era se a legislação federal excedia os poderes do
Congresso presentes na Commerce Clause. O Tribunal, por maioria de 5-4 dos seus
juízes, decidiu que sim, a legislação excedia o poder de regular o comércio interestadual
do Congresso Federal. A opinião expressa pela Suprema Corte foi a seguinte:
A Lei excede a autoridade do Congresso presente na Commerce Clause. Primeiro,
apesar desta Corte ter aprovado uma série de leis federais que regulavam
atividades econômicas interestaduais que substancialmente afetavam o comércio
interestadual, a posse de uma arma em uma zona escolar não é em nenhum
sentido uma atividade econômica que pode, apesar de constantes repetições em
outros lugares, não tem nenhum efeito substancial no comércio interestadual. A
seção 922 é uma lei criminal que pelos seus termos não tem nada a ver com
“comércio” ou qualquer outro tipo de atividade econômica, mesmo se os termos
forem abertamente interpretados. Nem mesmo é parte essencial de uma
regulação maior de atividades econômicas (...). Ela não pode, portanto, ser
encaixada nos precedentes desta Corte aprovando regulações de atividades que
podem derivar ou estar conectadas com uma transação comercial, na qual, vista
em conjunto, substancialmente afetam o comércio interestadual. Segundo, § 922
contém nenhum elemento jurisdicional que asseguraria, através de uma sequência
de caso por caso, que a posse de armas de fogo em questão teve alguma relação
com comércio interestadual. O réu era um estudante em uma escola local; não há
nenhuma indicação de que ele recentemente viajou através dos estados, e não há
nenhum indício de que sua posse da arma teve alguma relação concreta com
comércio interestadual. Aprovar essa legislação com o argumento de que a posse
de uma arma de fogo em uma zona escolar realmente substancialmente afeta o
comércio interestadual iria requerer que esta Corte significaria aprovar uma
interferência (nas atividades individuais) que iriam muito além dos poderes da
Commerce Clause.
O caso relembrou que existe um limite ao poder de legislar conferido ao Congresso
pela Commerce Clause. Lembre-se que os Estados Unidos organizam-se em uma
estrutura de Estado com um governo federal de poderes limitados e enumerados. Tanto
quanto o checks and balances atuam como uma forma de controle de um Poder sobre o
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outro, no âmbito do governo federal, também existem limites ao exercício de poder do
governo federal sobre os estados e os indivíduos ali residentes. Aqui já adentramos um
pouco na análise do modelo de federalismo que aprofundaremos mais adiante nesta
Unidade. Mas antes, é interessante ver o poder do governo federal de regular as
atividades dos indivíduos.
Um cidadão norte-americano, como cidadão de um Estado federal, está sujeito a
duas ordens jurídicas distintas e um tanto independentes. Qualquer pessoa que nasça no
território dos Estados Unidos ou venha a ser naturalizada norte-americana, pelo teor do
texto da Seção 1 da 14ª Emenda à Constituição, é tanto cidadão dos Estados Unidos
quanto do estado no qual ela reside. Mas a capacidade de regular as condutas individuais
é muito maior dos estados do que do governo federal. Os estados têm toda a capacidade
legislativa residual, de acordo com a 10ª Emenda, enquanto o governo federal tem
apenas aquela enumerada na Constituição.
Um importante detalhe final é de que a Suprema Corte voltou a limitar o poder
legislativo federal em um caso que envolvia porte de armas. O direito de portar e andar
com armas de fogo, estipulado na 2ª Emenda, é alvo de poucas decisões do Tribunal. No
caso District of Columbia v. Heller (2008) a Corte decidiu que o direito individual de portar
armas de fogo era um direito fundamental incorporado pela cláusula de devido processo
legal da 14ª Emenda. Mas fora isso não houve outra significativa decisão sobre o tema.
No entanto, antes de 2008 o último caso envolvendo a 2ª Emenda tinha sido em
1939, United States v. Miller, e Lopez não chegava a essa questão. De qualquer forma
tangenciava a questão e já apresentava sinais da opinião da Corte quanto ao tema. O
Tribunal estava com uma configuração majoritariamente conservadora, após 12 anos de
governo republicano na Casa Branca. Ronald Reagan, presidente dos Estados Unidos
entre 1981 e 1989, apontou vários juízes para a Suprema Corte com a clara intenção de
reverter os precedentes liberais do Tribunal dos anos 1950 a 1980.
A configuração da Corte influencia significativamente na decisão que ela chega.
Teremos a oportunidade de ver a influência dos órgãos políticos na decisão do Tribunal
claramente no próximo caso a ser analisado que trata do Obama Care, um programa de
reforma do sistema de saúde dos Estados Unidos introduzido pela administração do
Presidente Obama e alvo de intensas críticas. O poder do Presidente de indicar juízes
para a Suprema Corte – e o poder do Senado de ratificar essa escolha – está inserido no
princípio de checks and balances que determina o funcionamento dos Três Poderes. O
presidente pode influenciar na decisão do Tribunal, mas também uma série de
imunizações dos juízes tornam possível que eles tomem decisões contrárias aos
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interesses daqueles que os indicaram.
O sistema de escolha dos juízes dessa forma, que também é o adotado no Brasil
atualmente, não escapa às críticas. No Brasil, recentemente foi aprovada a “lei da
bengala”, uma legislação que permitirá os ministros do STF manterem seus cargos por
mais cinco anos, até a idade de 75 anos. Uma clara tentativa de barrar a possibilidade da
presidente de indicar mais ministros para a Corte. O que se insiste nessas críticas é na
independência de um poder em relação ao outro, mas não se pode conceber que eles
devam, por isso, funcionar isoladamente. A Suprema Corte não existe isolada e as
decisões dela não deviam também ser tomadas isoladamente. Evidentemente juízes, em
uma democracia, têm um papel antimajoritário, de defesa de direitos das minorias, mas
nem por isso deve estar isolada dos demais órgãos do Estado diretamente legitimados
pela maioria democrática. Este é todo o sentido do checks and balances, este constante
controle para que o poder nunca esteja concentrado em uma única pessoa, ou órgão.
Vemos essa dinâmica de interação em toda decisão da Suprema Corte, desde
Marbury até os casos de hoje. No Brasil, só recentemente o Supremo Tribunal Federal
assentou-se como verdadeiro Poder da União, porque até 1988 o órgão era apagado,
com limitada atuação, apenas ratificando constantes arbitrariedades dos demais poderes.
Essa atuação não escapa a críticas, como a constante ideia de que isso significa uma
judicialização da política. Nada mais longe da verdade, já que Direito e Política são
indissociáveis. Um sem o outro são expressões de arbítrio.
Essa dinâmica será levantada no próximo caso e em vários outros daqui em diante.
O caso do Obama Care foi sem precedentes, porque foi a primeira vez que o Congresso
tentou regular indivíduos que não estavam inseridos em atividades econômicas, forçandoos a adquirirem planos de saúde. Tinha todos os sinais de que seria declarada
inconstitucional pela Suprema Corte, mas uma reviravolta, como em Parrish em 1937,
mudou o rumo da decisão.
5. Análise do caso National Federation of Independent Business v. Sebelius (2012) e
discussão da controvérsia ao redor da constitucionalidade do Affordable Care Act
(Obama Care).
A eleição de Barack Obama em 2009 foi movido por um momentum de mudança
no cenário político do país. Uma maior adesão de cidadãos jovens e latinos no processo
eleitoral, junto com insatisfação da administração de Bush levaram à eleição do candidato
democrata com grande suporte popular. Obama foi eleito com 52,9% dos votos populares
12
e levou 365 dos delegados eleitorais, o que representa ganhar em 28 estados e no
Distrito de Columbia.
Dentre as propostas do candidato democrata eleito estavam importantes reformas
socioeconômicas, necessárias para superar a crise econômica e também, muitas vezes,
contrárias às políticas conservadoras da administração Bush. Obama defendeu, durante
sua campanha, a diminuição das intervenções militares em outros países, fechar a prisão
de Guantánamo e, principalmente, uma reforma no sistema de saúde norte-americano.
Para realizar essa última proposta, o Congresso aprovou em 2010 um programa
chamado Affordable Care, que ficou conhecido como Obama Care. Resumidamente, o
programa tentava diminuir o custo dos planos de saúde obrigando todos os cidadãos a
adquirirem um plano, sob pena de sofrerem uma multa. Aumentando a participação dos
indivíduos, incluindo aqueles que não usariam o plano imediatamente, pretendia-se
diminuir os custos para as empresas e permitir que o acesso à saúde fosse, aos poucos,
universalizado. Essa previsão na legislação é conhecida como individual mandate.
Agora, comparando essa legislação com as demais que vimos desde a década
1930 percebemos que é um caso sem precedentes. Diferentemente das outras
legislações, o Congresso não estava regulando atividades econômicas pré-existentes,
mas obrigando o indivíduo a ingressar em uma atividade econômica, sob pena de uma
multa. Em outros termos, o Congresso tentava regular “inatividade” econômica. Uma
grande discussão se instalou quanto à constitucionalidade dessa legislação, se ela
excedia ou não o poder conferido pela commerce clause e invadia áreas de liberdade
individual.
Quanto a esse caso, façamos diferente, façamos a discussão das questões
constitucionais antes de vermos a decisão da Suprema Corte. Façamos isso porque a
decisão foi em um caminho completamente inesperado e exige uma análise por si só.
Anteriormente à decisão da Corte a discussão centrava-se no poder do Congresso de
“mandar” nos indivíduos. Como vimos em grande parte da Unidade 1 e nesta unidade ao
analisar Lochner, os Estados Unidos foram formados dentro de ideal clássico de
liberalismo, na ideia de um governo mínimo, com poderes enumerados e limitados. Essa
estrutura de governo objetivava garantir a liberdade individual, tanto que, como vimos,
alguns dos federalistas consideravam desnecessária a Bill of Rights.
Logo
percebeu-se, no
entanto,
que apenas os poderes expressamente
enumerados na Constituição não garantiria que o governo federal funcionasse como
pretendido pelos Pais Fundadores. Em McCulloch v. Maryland a Suprema Corte definiu os
conceitos de poderes necessários e próprios (necessary and proper clause) que
13
permitiriam ao Congresso exercer suas prerrogativas constitucionais aprovando atos
legislativos que permitissem exercer essas prerrogativas.
Ao longo dos anos a Corte definiu que o juízo de necessidade era reservado ao
legislador, e a Corte não poderia interferir, mas quando ao conceito de próprio o Tribunal
poderia emitir uma opinião. Em United States v. Lopez vemos a Suprema Corte afirmando
(ou reafirmando) que existem limites aos poderes do Congresso, que nem todos os atos
legislativos são próprios para se atingirem as finalidades pretendidas pelo legislador.
O que temos no caso relacionado ao Affordable Care Act é determinar se o
individual mandate é um meio próprio e necessário para o Legislativo atingir seu objetivo
de reforma no sistema de saúde. Seguindo o raciocínio expresso em Lopez muitos
defendiam a posição de que essa previsão excedia os poderes da commerce clause. Não
regulava uma atividade econômica, invadia os princípios básicos da liberdade individual
entendida pela doutrina liberal como liberdade negativa, liberdade de manter o governo
fora das atividades privadas e, além disso, em Lopez percebemos a preocupação da
Corte de que esses tipos de legislações poderiam significar a perda da ideia de poderes
limitados e enumerados do Congresso.
Por outro lado presenciamos aqui o início de um novo paradigma de Estado. Em
1937, no caso Parrish, vimos a transição do Estado Liberal para o Estado Social, em
termos de políticas socioeconômicas do governo federal. O problema é que a ideia de
liberdade negativa ainda prevalecia, o governo federal não tinha grandes poderes para
implementar propriamente seus programas. A interação entre o governo federal e os
estados, como veremos mais detalhadamente no item seguinte, dá-se principalmente pela
adesão voluntária dos estados aos programas federais. Não é permitido ao governo
federal comandar o estado a adotar determinada legislação, mas é permitido que seja
oferecida vantagem aos estados ingressarem nos programas federais (um tipo de
suborno institucionalizado).
Aqui, por outro lado, temos o governo federal comandando os indivíduos
diretamente. Não que ele não possa fazer isso, de fato há diversas legislações que fazem
exatamente isso. A questão é saber se esta legislação se encaixa na commerce clause.
Há quem diga que sim. A maioria destes não fazem uma distinção entre atividade e
“inatividade” econômica, ou não a enxergam da mesma forma dos que acreditam que a
legislação excede os poderes do Congresso. O governo pode multar pessoas que não
compram seguros para veículos, e este era um dos principais argumentos para defender
que a legislação se inseria na commerce clause.
Politicamente essa legislação era crucial para o primeiro mandato de Obama e
14
para garantir um segundo mandato. O caso National Federation of Independent Business
v. Sebelius foi julgado exatamente em ano de eleição para presidência e sob forte pressão
política. A Suprema Corte estava (e ainda está) majoritariamente dominada por juízes
apontados por presidentes republicanos, são quatro juízes apontados por democratas.
Pela
pressão
do
caso
devido
a
grande
insatisfação
e
incerteza
quanto
a
constitucionalidade da lei, bem como devido a configuração da Corte esperava-se que a
lei fosse julgada inconstitucional. O voto surpreendente, assim como em 1937, deveu-se a
um Roberts, dessa vez foi a opinião do Chief Justice John Roberts nomeado por George
W. Bush em 2005.
Era esperado que Roberts, junto com Scalia, Kennedy, Thomas e Alito formassem
a maioria da decisão que julgaria a cláusula de individual mandate inconstitucional. Um
trecho do voto do Chief Justice chegou até mesmo a vazar para a imprensa e ao que tudo
indicava era da opinião de Roberts que a cláusula excedia os poderes da commerce
clause. A decisão acabou, surpreendentemente, indo para a outra direção.
Chief Jusctice Roberts se juntou a Ginsburg, Breyer, Sotomayor e Kagan e
decidiram que a multa da cláusula de individual mandate se encaixava no poder do
Congresso de criar impostos para os cidadãos. O poder de criar impostos do governo
federal é mais amplo do que o da commerce clause e, pelo entendimento da Suprema
Corte, mesmo que o Congresso não tenha usado o termo “imposto” e sim “penalidade”, o
sentido expresso pela lei era de imposto, portanto o Tribunal a considerou constitucional.
É verdade que a maioria dos juízes conservadores considerou que a cláusula
excedia os poderes da commerce clause. A Corte seguiu o argumento de que a cláusula
permitia ao governo regular atividades econômicas e não “inatividades”, ou seja, não
permitia ao governo forçar indivíduos ingressar em atividades econômicas. A opinião de
Roberts, a que vazou para a imprensa, caminhava em todo sentido para considerar a lei
inconstitucional como um todo. No entanto, na página final o Chief Justice emitiu uma
curta opinião de que a cláusula encaixava-se nos poderes de tributar do Congresso e por
isso era constitucional.
Essa decisão foi reformuladora, assim como Parrish foi em 1937. Muda
drasticamente a ideologia presente nos programas governamentais. Uma ideia de um
governo federal ainda mais atuante na promoção de programas de inclusão social, uma
ideia de que todos têm direito a um programa de saúde. A decisão da Suprema Corte foi
também decisiva para a reeleição de Barack Obama e representou a maior vitória da sua
administração no primeiro mandato.
15
6. Discussão ao redor da constitucionalidade da legalização da maconha nos
estados do Colorado e Washington
Em um último tópico desta Unidade e sobre a estrutura do governo dos Estados
Unidos nos voltamos para a questão da interação entre o governo federal e o governo dos
diversos estados. Na Unidade anterior vimos como as ex-colônias britânicas temiam que
um governo central pudesse representar um risco a suas autonomias e, por isso, os
representantes reunidos no congresso constituinte optaram pelo federalismo como forma
de distribuição de poder no território norte-americano.
Federalismo é uma forma de divisão espacial de poder pelo território de uma
nação, na qual se prevê uma certa autonomia nos entes federativos para se autoorganizarem e editarem suas próprias legislações à parte do governo central. Para se
chegar a ideia de autonomia, parte-se do conceito de dualidade jurídica da federação. Em
uma federação o indivíduo está subordinado a duas ordens jurídicas distintas, no mínimo.
O governo federal não está em uma posição hierarquicamente superior aos estados, mas
os dois atuam de forma complementar.
O federalismo norte-americano distingue-se do brasileiro principalmente no tocante
à maior autonomia conferida aos estados lá do que aqui. Dado ao limitado poder
conferido ao governo federal, a maior parte do poder legislativo resta aos estados. Em
questão de organização, a maioria dos estados organizam-se seguindo o modelo federal,
divisão dos três poderes, com um legislativo bicameral, com exceção do estado de
Nebraska que é unicameral. Todos os estados também adotam o sistema do common law,
com exceção da Louisiana, que adota o civil law.
A interação entre o governo federal e os governos dos diversos estados é,
basicamente, regida pelos princípios de sovereignty e anticomandeering. Sovereignty é a
própria ideia de que os estados constituem soberanias independentes e que suas
decisões políticas tomadas dentro do devido exercício de sua soberania estão protegidas
contra mudanças e interferências de outros estados e do governo federal. Em McCulloch
v. Maryland percebemos que não é permitido aos estados prejudicarem a aplicação de
leis federais válidas dentro de seus territórios. O inverso também é, por consequência,
verdadeiro. Os governos federal e estaduais coexistem lado a lado.
Traçando os limites da ideia de sovereignty vemos a atuação da Suprema Corte
um tanto conservadora nessa questão. Em Younger v. Harris (1971), o Tribunal decidiu
que um indivíduo que considerasse que um processo criminal perpetrado contra si por um
estado violava seus direitos constitucionais, por esse motivo simplesmente não lhe dava
16
fundamentos para entrar com um mandado de injunção em uma Corte federal para parar
o processo. Mais tarde, em Seminole Tribe of Florida v. State of Florida (1996), a Corte
afirma que o Congresso não tem o poder, dentro da commerce clause, de passar uma
legislação que submeta um estado à possibilidade de serem processados por cidadãos
em tribunais federais. As proteções dos estados contra interferências do governo federal
ainda traduzem a ideia de federalismo de soberania estatal.
Dentro da ideia de sovereignty o ato estadual está protegido contra alteração e
interferência dos outros entes federativos. Essa doutrina é crucial, já que nos Estados
Unidos cada estado tem grande liberdade legislativa e judicial. Essa organização promove
a possibilidade de experimentar opções políticas diversas, difunde o poder no território,
permite aos estados exercerem influência sobre a política nacional e de outros estados a
partir do exemplo de programas bem sucedidos. Muitos doutrinadores6, no entanto,
consideram a ideia de sovereignty ultrapassada e advogam outras formas de organização
do Estado Federal, mas a Suprema Corte continua defendendo essa organização nas
suas decisões.
Em Printz v. United States (1996) encontramos uma recente definição do princípio
de anticomandeering, importante para a estrutura federal. Anticomandeering traduz a
ideia de que o governo federal não pode comandar os estados a adotarem determinada
legislação ou tomar determinada política. O caso Printz deveu-se a uma legislação
federal, The Brady Handgun Violence Prevention Act, que exigia das autoridades locais
realizarem buscas de antecedentes antes de vender uma arma a alguém. A lei foi
desafiada nos tribunais e em 1996 a Suprema Corte aceitou ouvir uma apelação do Nono
Circuito de Cortes de Apelações Federais para responder a questão de que se exigir das
autoridades locais realizar buscas de antecedentes era própria e necessária para os fins
da legislação.
A Corte, por maioria de 5-4, decidiu pela inconstitucionalidade da legislação,
afirmando que as legislaturas estaduais não estão sujeitas a comandos do governo
federal. A opinião do Tribunal foi emitida por Justice Scalia, juntamente com Rehnquist,
O’Connor, Kennedy e Thomas. O que foi central na opinião de Scalia é que o governo
federal não poderia impor um comando aos estados sem o consentimento destes. A ideia
do princípio anticomandeering é essencialmente a de que os estados devem aderir
voluntariamente aos programas do governo federal. O governo federal pode oferecer
vantagens para estimular a adesão dos estados, como o repasse de verbas, mas, em
6
Veja: GERKEN, Heather. Federalism all the way down. Harvard Law Review, Vol. 124, No. 1, p. 6, 2010.
Disponível em: http://ssrn.com/abstract=1719718. Acessado em: 17/12/2014.
17
última instância, o governo dos estados tem que livremente concordar em se submeter ao
programa e a sua adesão não pode estar vinculada a outros programas.
A questão torna-se complicada quando uma legislação federal entra em conflito
com uma legislação estadual. Em McCulloch v. Maryland estudamos que a legislação
federal tem supremacia sobre a estadual, por causa da supremacy clause prevista na
Constituição (artigo 6, cláusula 2). Mas não é sempre que a legislação federal irá
prevalecer. A Suprema Corte desenvolveu a doutrina de preemption para determinar se
uma legislação federal sobrepõe uma legislação estadual.
Em Arizona v. Inter Tribal Council of Arizona (2012) a Suprema Corte considerou
que a legislação aprovada por iniciativa popular pelos cidadãos do estado do Arizona, que
requeria que eleitores do estado certificassem sua cidadania para poderem exercer seu
direito de voto, inconstitucional. O argumento aceito pela maioria dos juízes da Corte, 7-2,
foi de que a legislação federal, o National Voter Registration Act de 1993, preempt em
relação às legislações estaduais. A opinião da Corte foi a de que permitir que os governos
estaduais criassem seus próprios requisitos para os eleitores, representaria permitir os
estados recusarem eleitores que de outra forma estariam liberados para votar segundo os
critérios federais.
Em outro caso, Arizona v. United States (2012), a Suprema Corte também
reconheceu a inconstitucionalidade de uma lei do estado do Arizona que dava autoridade
a policiais locais para aplicarem a legislação de imigração. A lei estadual levantou grandes
preocupações sobre possíveis violações de direitos civis, com a possibilidade de permitir
atitudes discriminatórias por parte dos policiais. O Tribunal decidiu que a legislação
federal de imigração, assim como a lei eleitoral, preempt sobre a legislação estadual. As
autoridades do estado podem aplicar a legislação federal, mas o estado não pode criar
suas próprias regulações sobre matérias previstas dentro dos poderes enumerados do
Congresso.
Nesses casos percebemos que o governo estadual tentou invadir uma área de
legislação federal. Vamos com eles analisar as recentes – 2012 – legislações aprovadas
pelos estados do Colorado e Washington que legalizaram o consumo, venda e posse da
maconha, condutas proibidas por legislação federal. Os estados em questão ao
aprovarem as legislações não interferiram na aplicação da legislação federal, ela continua
válida e aplicável pelos agentes federais do DEA (Drug Enforcement Administration).
Sobre esse ponto já existe precedente da Suprema Corte. No caso Gonzales v.
Raich (2005) a Corte decidiu que a proibição federal de substâncias entorpecentes
continua válida mesmo se o estado a permitir. Em 1996 o estado da Califórnia legalizou o
18
uso da maconha em procedimentos médicos através de uma iniciativa popular. Em uma
operação, agentes do DEA destruíram várias plantações pessoais de maconha e
prenderam as pessoas que as controlavam. Os presos argumentaram que a legislação
federal excedia os poderes conferidos pela commerce clause ao regular atividades
econômicas internas de cada estado. O Nono Circuito de Cortes de Apelações Federais
aceitou essa argumentação e, valendo-se do precedente Lopez, julgou que a legislação
excedia os poderes do Congresso porque a plantação de maconha para consumo próprio
não afeta o comércio entre os estados.
A Suprema Corte rejeitou essa conclusão do Nono Circuito e decidiu que a
proibição federal de maconha, mesmo que aplicada em casos de uso pessoal e não
tivesse direta ligação com comércio interestadual, não excedia os poderes do Congresso.
A argumentação da maioria dos juízes foi de que a produção de maconha local afeta a
oferta e a demanda no mercado nacional da maconha, constituindo elemento essencial
para a aplicação da legislação federal. E havia precedente da Suprema Corte nesse
sentido, como estudamos acima, no caso Wickard v. Filburn.
A legislação federal de proibição da maconha continua válida, mesmo se uma lei
estadual legalizar o seu consumo. Isso não significa que a legislação federal seja
preempted sobre a legislação estadual. Usar tal raciocínio significaria concluir que ao
passar uma legislação, o governo federal obrigaria os estados a adotarem a mesma
proibição, o que não condiz com o princípio de anticomandeering. A atitude dos estados
de legalizar o consumo, produção e comércio de substâncias proibidas por legislação
federal é idêntica aos estados nunca terem proibido as substâncias em primeiro lugar.
Não obstante esse raciocínio que desenvolvemos, esta é ainda uma questão
aberta, sem precedentes diretos. Porque, apesar de outros estados já terem legalizado o
uso da maconha para tratamentos medicinais, os estados do Colorado e de Washington
foram os primeiros a legalizar a droga para consumo e comércio recreativo. Após a
legalização, os estados de Nebraska e Oklahoma processaram o estado do Colorado
alegando a lei do estado facilitaria a entrada da maconha naqueles estados, onde ainda é
proibida tal substância. Argumentavam que exatamente a legislação federal que proíbe a
droga tem supremacia sobre a lei estadual.
No Brasil a questão da maconha está em um processo de abertura também. Em
janeiro deste ano a ANVISA liberou o uso do canabidiol, uma das substâncias presentes
na maconha, para fins medicinais, permitindo que as empresas farmacêuticas
requeressem que seus medicamentos que usassem a substância fossem autorizados a
serem vendidos e receitados por médicos no Brasil. Em 2013, em um caso de tráfico de
19
drogas, o juiz Frederico Ernesto Cardoso Maciel do Tribunal de Justiça do Distrito Federal
e Territórios decidiu que a portaria 344/1998 do Ministério da Saúde que proíbe o THC,
outro componente da maconha, é inconstitucional e ilegal. Em sua fundamentação o juiz
alega a ausência de fundamentação da portaria para incluir a substância na lista de
proibição e também os exemplos de outros países, como os dos estados do Colorado e
Washington, em legalizar a substância.
O modelo de federalismo brasileiro não permite essa experimentação legislativa
por parte dos estados, dada a grande concentração de poder no ente federativo central. O
ideal de federação surge entre os brasileiros antes mesmo do ideal republicano7. Rui
Barbosa era um dos defensores de uma reforma no regime monárquico para conceder
maior autonomia às províncias, ao invés da adoção de um regime republicano. Contudo, o
regime adotado por força do Decreto nº 1 de 1889 do governo provisório, mais tarde
confirmado pela Constituição de 1891, foi o da República Federativa.
Na prática a forma federativa adotada foi totalmente descaracterizada. Federalismo
é uma forma de repartição de poderes e competência no território de um Estado. A
descentralização administrativa serve à necessidade de dar eficiência à administração do
Estado, que dada à alta complexidade desta ser feita sob a forma de um regime unitário.
Há também inerente ao federalismo uma maneira de trazer as decisões políticas para
perto daqueles que serão diretamente afetados por elas. A centralização do poder afasta
dos cidadãos o controle sobre a tomada de decisão. Mas não foi neste sentido que a
Federação foi adotada como forma de Estado. Foi com o objetivo de fortalecer as
oligarquias locais, as quais fora garantido domínio nas suas regiões de influência e em
troca elas apoiavam o governo federal.8
A visão dominante à época da Proclamação da República, tanto de observadores
nacionais quanto estrangeiros, foi de que o movimento que derrubou o regime
monárquico se deu sem nenhuma ou com pouca presença popular 9. A República, como
7 O ministro Celso de Mello em seu voto na ADI 3.148 chama a atenção para o interesse das províncias por maior
autonomia dentro do regime monárquico por meio da eclosão de diversas revoltas e mesmo em reformas do governo
através do Ato Adicional de 1834.
8 José Murilo de Carvalho trata dessa questão, citando o ex-presidente Campos Sales, mentor da política dos
governadores, como ficou conhecida a política de troca de favores entre o governo estadual e federal: “É de lá [dos
estados] que se governa a República, por cima das multidões que tumultuam, agitadas, nas ruas da capital da
União” (SALES, Campos. Da propaganda à presidência. São Paulo, s. ed., 1908, p. 252 Apud CARVALHO: 1987, p.
33, grifos nossos)
9 José Murilo de Carvalho cita Aristides Lobo de quem é a famosa fala que o povo assistiu bestializado a Proclamação
da República. Outro observador do evento citado por Carvalho é Louis Couty, um intelectual francês residente no país à
época, que concluiu: “O Brasil não tem povo” (COUTY, Louis. L'Esclavage au Brésil. Paris: Librairie de Guillaumin et
Cie. Editeurs, 1881, p. 87 Apud CARVALHO: 1987, p. 9-10). Carvalho irá criticar essa visão de povo apático à
20
coloca a ministra Carmén Lúcia Antunes Rocha10, foi implantada sem questionamento e
reflexão. Foi assim também repetida a cada nova Constituição que a nação brasileira
adotou, sem uma profunda reflexão sobre o que caracterizaria um regime republicano.
Indissociável à República estava a instituição da Federação, podemos, então, ampliar a
visão da douta ministra de que esta foi, também, repetida inquestionavelmente. Mesmo
em constituições de regimes que nada tinham na prática características republicanas e
federativas, como os de 1937 e 1964, lá estava impresso nos seus textos a definição do
Brasil como uma República Federativa. Um conceito que, por sua natureza, deve ser
definido através da discussão política da sociedade, foi positivado e enrijecido como regra
de uma lei.
A Constituição de 1988 traz importantes transformações no pacto federativo.
Destacadamente temos a elevação dos municípios a entes federativos. Por outro lado vêse uma grande centralização administrativa de competências nas mãos da União. O
ministro Celso de Mello, em seu voto na ADI 3.148, cita o ensinamento doutrinário que
explica que, na divisão de competências adotada pelo federalismo brasileiro,
À União cabem apenas os poderes que, explícita ou implicitamente, a Constituição
lhe reservou; aos Estados, tudo o mais. Diga-se melhor. Aos Estados cabem todos
os demais poderes, exceto aqueles que a Constituição federal confere, explícita
ou implicitamente, aos Municípios. Desse modo, a verdadeira significação do
preceito em exame está em afirmar que tudo o que remanesce, extraída a
competência da União e a dos Municípios, é da competência dos Estados. União e
Municípios, portanto, não têm mais do que os poderes que lhes são, explícita ou
implicitamente, atribuídos. Em termos reais, a competência estadual é, em face
da competência da União, como fazem fé os arts. 21 e 22 acima examinados,
das mais reduzidas, seja em extensão, seja em importância. Aparece nisso
um sinal seguro e insofismável da centralização de que sofre o federalismo
11
brasileiro .
situação política usando vários movimentos populares, principalmente na cidade do Rio de Janeiro que é o foco do seu
livro. Merece destaque a afirmação da ministra Cármen Lúcia, “a República pode não ter vindo diretamente do povo no
poder; mas o povo vem diretamente ao poder na República, ou então não se tem República” (1996, p. 54)
10 ROCHA: 1996, p. 45.
11 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Comentários à Constituição brasileira de 1988, vol. 1/204, 1990, Saraiva,
grifos nossos.
21