Uma perspectiva - Pro-Reg
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Uma perspectiva - Pro-Reg
FICHA TÉCNICA Título: A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais – Uma perspectiva internacional Autoria: Rui Cunha Marques Contributos: Pedro Simões, João Simão Pires, João Almeida, Tiago Neves Edição: Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos (ERSAR) Centro de Sistemas Urbanos e Regionais (CESUR) Concepção gráfica: Daniel D. Dias /Praxisd, Lda. Revisão linguística: Tetraepik – Traduções e Serviços, Lda. Composição e paginação: Daniel D. Dias /Praxisd, Lda. Impressão e acabamentos: Europress Tiragem: 1000 exemplares Local e data de edição: Lisboa, Julho de 2011 ISBN: 978-989-8360-07-6 Depósito legal: 330096/11 Agradecimentos: gradece-se a todas as entidades reguladoras e todas as organizações que contribuíram com A informação para o estudo. NOTAS SOBRE O AUTOR E COLABORADORES DO ESTUDO Autor O Dr. Rui Cunha Marques começou a sua carreira académica em 1996. É detentor de formação académica nas áreas de engenharia, direito e economia. A sua tese de Doutoramento incidiu sobre a avaliação do desempenho e regulação de serviços públicos. Actualmente é Professor Associado no Instituto Superior Técnico da Universidade Técnica de Lisboa, tendo sido professor convidado em outras universidades estrangeiras, sobretudo em programas de pós-graduação. Desenvolveu nos últimos 15 anos investigação diversa na área da avaliação de desempenho, regulação e contratação em serviços públicos em Portugal e no estrangeiro. Desempenhou funções de investigador no Centro de Sistemas Urbanos e Regionais (CESUR) da Universidade Técnica de Lisboa até recentemente. Actualmente é investigador do Centro de Estudos de Gestão do IST (CEG-IST) e investigador associado do Public Utilities Research Center (PURC) da Universidade da Flórida. As suas áreas de especialização são a regulação de serviços públicos, avaliação de desempenho e contratação pública, em particular as parcerias público-privadas associadas aos serviços de utilidade pública, transportes e outros sectores públicos. É autor de mais de 250 publicações técnicas e científicas em cerca de 20 países e em diferentes idiomas, incluindo quatro livros, duas teses académicas e mais de 50 artigos em revistas internacionais. Tem desempenhado funções de consultor para diversas entidades, públicas e privadas, em Portugal e no estrangeiro em países como EUA, França, Marrocos, Moçambique, Cabo Verde e Brasil, nas áreas de gestão de projectos, parcerias público-privadas, regulação e avaliação de desempenho em infra-estruturas urbanas. Rui Cunha Marques Centro de Estudos de Gestão do IST (CEG-IST), Instituto Superior Técnico, Universidade Técnica de Lisboa Avenida Rovisco Pais, 1049-001 Lisboa, Portugal Tel: +351-218-417-981 Fax: +351-218-417-979 E-mail: [email protected] A Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos (ERSAR) regula os serviços públicos de abastecimento de água, saneamento de águas residuais e de gestão de resíduos urbanos e é a autoridade competente para qualidade da água para consumo humano em Portugal continental. Através da sua intervenção, a ERSAR tem por objectivo proteger os interesses dos utilizadores destes serviços, tendo em conta a salvaguarda da viabilidade económica dos prestadores dos serviços, através do incentivo à melhoria contínua e eficiência e promovendo a qualidade do serviço e a protecção do ambiente. ERSAR Centro Empresarial Torres de Lisboa Rua Tomás da Fonseca, Torre G 1600-209 Lisboa, Portugal Tel: +351-210-052-200 Fax: +351-210-052-259 E-mail: [email protected] www.ersar.pt Colaboradores no estudo Pedro Tiago Francisco Simões é Mestre em Engenharia Civil pelo Instituto Superior Técnico (IST) da Universidade Técnica de Lisboa. Actualmente é aluno de Doutoramento também na Universidade Técnica de Lisboa e investigador correspondente no Centro de Estudos de Gestão (CEG-IST) do IST. É autor de diversos artigos técnicos nas áreas da regulação e avaliação de desempenho de serviços públicos e transportes. Detém experiência como consultor nas áreas de avaliação do desempenho, gestão de projectos, contratação pública e regulação, bem como na gestão e operação de serviços de infra-estruturas urbanas. João Paulo Simão Pires nasceu em Lisboa em 1969. Completou a Licenciatura em Economia na Universidade Católica Portuguesa em 1992 e um MBA com especialização em Finanças e Estratégia na William E. Simon Graduate School of Business Administration (University of Rochester, EUA) em 1997. Começou a sua carreira como professor na Universidade Católica Portuguesa em 1992 e desempenha funções de Professor Assistente nesta instituição desde 2004, leccionando na Licenciatura em Gestão. A sua carreira profissional iniciou-se em 1992 no Banco de Portugal como colaborador da Unidade de Investigação Económica do Departamento de Estudos Económicos. Desempenhou funções de consultoria na empresa de consultoria estratégica The Monitor Company, em Londres, entre 1993 e 1999, onde colaborou e geriu projectos em países como o Reino Unido, EUA; Alemanha, Espanha e Grécia. Estes projectos foram desenvolvidos em sectores como o das bebidas refrigerantes e cervejas, alumínio, TV por cabo, banca de retalho, vinhos e bebidas alcoólicas, gestão florestal, madeiras e telecomunicações. Desempenhou funções de gestão na empresa de consultoria de gestão Arthur D. Little, principalmente ligadas às áreas dos serviços públicos e telecomunicações. Durante três anos foi Director do Departamento de Controlo e Planeamento Estratégico na Empresa Portuguesa de Águas Livres, S. A. (EPAL). Foi membro do Comité Executivo da Sonae Novobord, a subsidiária sul-africana da Sonae Indústria, baseada em Joanesburgo. Desempenhou funções de partner na empresa Bright Partners – Gestão, Tecnologia e Capital, S.A. Desde Novembro de 2006 até Julho de 2010 foi membro do Conselho Directivo da Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos (ERSAR), que sucedeu ao Instituto Regulador de Águas e Resíduos (IRAR). João Miguel Tiago de Almeida é actualmente Assessor do Conselho de Administração da DHV, S.A. em Portugal, responsável pela Unidade de Estudos, Projectos e Consultoria. Anteriormente havia desempenhado funções como Coordenador do Departamento de Estudos e Projectos do Instituto Regulador de Águas e Resíduos (IRAR), desde Junho de 2006, tendo iniciado as suas funções nesta entidade em Novembro de 2004. De 2002 a 2004 foi assessor do Secretário de Estado do Ambiente, trabalhando em diversas áreas, incluindo a avaliação de impacto ambiental e a gestão de recursos hídricos. Até 2002 trabalhou como consultor na Direcção Regional de Planeamento do Território e Recursos Hídricos dos Açores, participando no planeamento e gestão dos recursos hídricos da região. A sua formação académica foi feita na área da Engenharia Ambiental dispondo também de uma especialização em Gestão de Projectos. As suas principais áreas de interesse são as das tecnologias e políticas ambientais, das tecnologias da informação e da gestão da mudança. Tiago Julião Lourenço Pinto da Cruz Neves nasceu em Lisboa em 1976. É detentor do Master of Science in Environmental Technology do Imperial College (Londres, Reino Unido), de uma pós-graduação em Regulação Pública da Universidade de Coimbra e da Licenciatura em Economia pela Universidade Nova de Lisboa. Durante os seus sete anos de experiência laboral foi economista e gestor de projectos no Instituto Regulador de Águas e Resíduos (IRAR) e, anteriormente, desempenhou funções de consultor na Cap Gemini Ernst & Young. Actualmente é assessor do Ministro da Economia, Inovação e Desenvolvimento e aluno de Doutoramento na London School of Economics and Political Science. AGRADECIMENTOS No período entre 2006 e 2008, duranto o qual decorreu o presente estudo e este livro foi escrito, recebi incentivos e conselhos de muitas pessoas. Contudo, queria deixar um agradecimento especial aos meus colegas no Centro de Sistemas Regionais e Urbanos (CESUR), o centro de investigação ao qual estou afiliado dentro da minha universidade (Instituto Superior Técnico da Universidade Técnica de Lisboa), particularmente a Pedro Simões, Pedro Carvalho, Manuel Carvalho, Nuno Cruz, Tânia Correia, Thelma Ohari, Ana Catana, Rui Oliveira, Antunes Ferreira, João Levy, Valadares Tavares e Patrícia Nunes. Gostaria de agradecer especialmente ao Instituto Regulador de Águas e Resíduos (IRAR), agora renomeado ERSAR, sobretudo ao seu Conselho Directivo, incluindo o seu Presidente Jaime Melo Baptista e os Vogais João Simão Pires e Dulce Álvaro Pássaro, mas também a outros colaboradores da ERSAR como David Alves, Tiago Neves, João Almeida e Edgar Carvalho. A minha gratidão pela confiança que em mim depositaram para levar a cabo este desafio estimulante e pelo seu apoio durante este período. Pedro Simões do IST e João Simão Pires, Tiago Neves e João Almeida da ERSAR merecem um duplo “obrigado” pelos seus valiosos contributos para o livro, revisões e comentários e pela ajuda na definição da sua estrutura. Este estudo não teria sido possível sem a colaboração dos vários reguladores e organizações dos cinco continentes que nele participaram. Estou em dívida para com eles. Da Papua Nova Guiné ao Uruguai, incluindo a Indonésia, Arménia e Gana, mais de 60 entidades de 39 países cooperaram neste estudo. Sem nomear ninguém individualmente de modo a não esquecer nenhum dos participantes, chamo a atenção para a dedicação e interesse de todas estas entidades na regulação dos serviços de águas. Finalmente, gostaria de agradecer a Ângela Marques pela revisão do documento e todo o apoio durante este período. PREFÁCIO DA ERSAR Os serviços de abastecimento público de água aos consumidores domésticos e às actividades económicas, bem como de saneamento de águas residuais urbanas, são ambos estruturais no desenvolvimento das sociedades modernas. Estes serviços partilham algumas características comuns – são essenciais ao bem-estar dos utilizadores, à saúde pública, às actividades económicas e à protecção do meio ambiente. Por esta razão, um conjunto de princípios deve ser aplicado à sua provisão, nomeadamente a universalidade, continuidade e qualidade do serviço, eficiência e equidade de preços. A garantia do cumprimento destes princípios é a principal missão da ERSAR, como entidade reguladora destes serviços. Os mecanismos regulatórios têm por objectivo actuar como substitutos dos típicos incentivos de mercado, reduzindo o poder dos monopólios e protegendo os interesses dos utilizadores dos serviços. Estes objectivos são conseguidos através de procedimentos de supervisão da qualidade de serviço e dos preços cobrados e através de esquemas de benchmarking (“yardstick competition” ou “sunshine regulation”), encorajando deste modo as entidades a melhorarem a sua performance na provisão dos serviços, independentemente de a sua propriedade ser pública ou privada. Na última década, os serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais em Portugal demonstraram uma notável evolução acompanhada por uma permanente busca de um modelo de regulação mais adequado, que assegurasse o cumprimento dos objectivos nacionais para estes serviços. Este sucesso tem sido reconhecido nacionalmente e internacionalmente, tornando-se por isso importante cimentar esta experiência através da identificação de outras boas práticas a nível internacional. Esta publicação tem por objectivo agregar essas experiências dos cinco continentes, que espelham a diversidade existente na provisão dos serviços públicos de águas, e que frequentemente se reflectem nos modelos regulatórios adoptados nos diferentes países. Através da valiosa colaboração das várias entidades, encontra-se agora disponível a todos os intervenientes no sector informação relativamente a cerca de 60 de países, permitindo a comparação e identificação de casos de estudo interessantes e potenciais boas práticas. Este estudo tem a vantagem de agregar, numa única publicação, informação sistemática e comparável sobre o enquadramento legal e institucional de cada país, a estrutura dos mercados, a identificação dos principais actores e números do sector, incluindo as suas estruturas tarifárias, os modelos regulatórios adoptados, e os vários mecanismos usados na avaliação da qualidade do serviço e no cumprimento das obrigações de serviço público. A parceria estabelecida entre a ERSAR e o Instituto Superior Técnico (Universidade Técnica de Lisboa), através do CESUR, uma unidade interdisciplinar dedicada à elaboração de projectos de investigação, foi decisiva na criação deste estudo e na recolha e análise da informação. Em particular, gostaríamos de expressar o nosso apreço em relação à dedicação que o autor, Prof. Rui Cunha Marques, demonstrou na elaboração deste ambicioso estudo. Apesar de as opiniões e conclusões expressas neste trabalho serem da inteira responsabilidade do autor, do nosso ponto de vista será uma contribuição fundamental para uma reflexão futura sobre potenciais melhorias ao modelo regulatório português. Dada a importância e natureza inovadora do estudo, particularmente devido à sua abrangência mundial, foi também recentemente publicada uma versão inglesa desta publicação em colaboração com a IWA – International Water Association – à qual gostaríamos de expressar o nosso agradecimento pelo seu apoio entusiástico e cooperação. É nossa expectativa que esta publicação se torne uma valiosa contribuição para os diversos intervenientes do sector nos diferentes países, no sentido da melhoria da prestação dos serviços de águas para todos. O Conselho Directivo da ERSAR Jaime Melo Baptista (Presidente) Fernanda Maçãs (Vogal) Carlos Lopes Pereira (Vogal) NOTA DO AUTOR A regulação dos serviços públicos, em particular dos serviços de abastecimento de água e saneamento de águas residuais, é um assunto com uma grande importância económica e social, uma vez que são serviços essenciais para o desenvolvimento e coesão da sociedade. De facto, esta é a era da regulação. Por todo o mundo os países têm vindo a criar novas entidades que assegurem a regulação dos serviços públicos de águas. Por conseguinte, este é um tema da maior pertinência hoje em dia. Este livro apresenta um retrato da regulação dos serviços de águas no mundo. Os dados apresentados baseiam-se num questionário distribuído por todo o mundo, englobando mais de 60 reguladores dos serviços de 39 países. É constituído por três partes e três anexos. A primeira parte inclui algumas perspectivas teóricas sobre as questões regulatórias. Este capítulo apresenta seis secções, compreendendo as características dos serviços de águas, a necessidade e objectivos da regulação, os modelos de governança dos serviços de águas, as obrigações de serviço público, a regulação da qualidade de serviço e a regulação económica. A segunda parte apresenta 18 casos de estudos sobre a regulação dos serviços de abastecimento de água e saneamento de águas residuais. Inclui oito países europeus (Bélgica, França, Países Baixos, Itália, Portugal, Reino Unido e Suécia), cinco países do continente americano (Brasil, Chile, Colômbia, Costa Rica e Estados Unidos da América), dois países africanos (Moçambique e Zâmbia), dois países da Ásia (Indonésia e Singapura) e a Austrália. Cada caso de estudo é composto por várias secções que englobam a evolução histórica, onde são apresentados os principais factos e legislação, o quadro jurídico e institucional, incluindo as principais responsabilidades no sector das águas e no enquadramento regulatório, a estrutura de mercado que compreende a propriedade e a gestão dos serviços de água, os intervenientes no sector, a verticalização e a abrangência dos serviços prestados, bem como os principais números do sector. São também descritos para cada caso de estudo as regras do jogo, que abrangem a definição dos preços e tarifas, a qualidade do serviço e as obrigações de serviço público e o desempenho no sector das águas. A terceira parte fornece uma visão geral da regulação da água em todo o mundo. Na primeira secção é apresentado o resumo da pesquisa, analisando os resultados do questionário e da investigação realizada. A secção 2 apresenta os resultados relativos às obrigações de serviço público, enquanto a secção 3 apresenta os aspectos relacionados com regulação da qualidade do serviço. A secção 4 aborda os resultados relativos à regulação económica e a última secção destaca as melhores práticas e aborda as principais recomendações. O livro é complementado por três anexos, onde se encontram os contactos das entidades reguladoras de todo o mundo, juntamente com o questionário enviado às autoridades competentes e os resultados obtidos. O público-alvo do livro é potencialmente bastante amplo, abrangendo todos os países do mundo. Esta publicação poderá ser útil para qualquer entidade interessada nos aspectos da governança e da regulação de serviços de abastecimento de água e saneamento. Pode também ser uma publicação de interesse para os países onde ainda não existem mecanismos formais de regulação, uma vez que apresenta experiências de todo o mundo e as melhores práticas no que respeita aos aspectos mais importantes dos serviços de águas, respectivamente, as tarifas, a qualidade do serviço e as obrigações de serviço público. O livro é também direccionado aos profissionais dos serviços de águas, incluindo economistas, engenheiros, advogados e académicos, de países desenvolvidos ou de países em desenvolvimento. São também potenciais leitores profissionais de outros sectores ou académicos interessados na regulação e governação das indústrias de rede. Todos os países incluídos neste livro tiveram a oportunidade de validar e comentar os dados e observações recolhidos a fim de proporcionar maior precisão aos elementos apresentados. A pesquisa refere-se ao ano de 2008. As conclusões e opiniões expressas neste livro são da inteira responsabilidade do autor, as quais não devem ser atribuídas à ERSAR, à sua universidade ou outras instituições filiadas. Por fim, esperando que o leitor encontre neste livro utilidade para trabalhos, estudos e pesquisas futuras, o autor estará inteiramente receptivo a eventuais comentários e opiniões sobre o texto. Rui Cunha Marques Instituto Superior Técnico Universidade Técnica de Lisboa ÍNDICE LISTA DE ACRÓNIMOS 21 PARTE 1 A REGULAÇÃO DOS SERVIÇOS DE ABASTECIMENTO DE ÁGUA E DE SANEAMENTO DE ÁGUAS RESIDUAIS 27 1.1 CARACTERÍSTICAS DOS SERVIÇOS DE ÁGUA E DE ÁGUAS RESIDUAIS 29 1.2 NECESSIDADE E OBJECTIVOS DA REGULAÇÃO 33 1.3 MODELOS DE ORGANIZAÇÃO NO SECTOR 39 1.4 OBRIGAÇÕES DE SERVIÇO PÚBLICO 43 1.5 REGULAÇÃO DA QUALIDADE DO SERVIÇO 47 1.5.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS 47 1.5.2 ABORDAGENS DE REGULAÇÃO 47 1.5.3 REGULAÇÃO SUNSHINE 48 1.5.4 POTENCIALIDADES DO BENCHMARKING 49 1.6 REGULAÇÃO ECONÓMICA 51 1.6.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS 51 1.6.2 REGULAÇÃO POR TAXA DE REMUNERAÇÃO 51 1.6.3 REGULAÇÃO POR INCENTIVOS DE DESEMPENHO 53 PARTE 2 CASOS DE ESTUDO DE REGULAÇÃO 59 2.1 61 AUSTRÁLIA 2.1.1 ANTECEDENTES HISTÓRICOS 61 2.1.2 ENQUADRAMENTO LEGAL E INSTITUCIONAL 62 2.1.2.1 Responsabilidades 62 2.1.2.2 Regulação 64 2.1.3 ESTRUTURA DO MERCADO 65 2.1.3.1 Propriedade e gestão de serviços 65 2.1.3.2 Players do sector 66 2.1.3.3 Integração do sector e serviços oferecidos 67 2.1.3.4 Números do sector 67 2.1.4 REGRAS DO JOGO 68 2.1.4.1 Estabelecimento de tarifas 68 2.1.4.2 Qualidade do serviço 69 2.1.4.3 Obrigações de serviço público 2.1.5 DESEMPENHO 71 73 2.2 75 BÉLGICA 2.2.1 ANTECEDENTES HISTÓRICOS 75 2.2.2 ENQUADRAMENTO LEGAL E INSTITUCIONAL 76 2.2.2.1 Responsabilidades 76 2.2.2.2 Regulação 79 2.2.3 ESTRUTURA DO MERCADO 2.2.3.1 Propriedade e gestão dos serviços 79 79 2.2.3.2 Players do sector 79 2.2.3.3 Integração do sector e serviços oferecidos 81 2.2.3.4 Números do sector 81 2.2.4 REGRAS DO JOGO 81 2.2.4.1 Estabelecimento de tarifas 81 2.2.4.2 Qualidade do serviço 83 2.2.4.3 Obrigações de serviço público 84 2.2.5 2.3 DESEMPENHO BRASIL 86 89 2.3.1 ANTECEDENTES HISTÓRICOS 89 2.3.2 ENQUADRAMENTO LEGAL E INSTITUCIONAL 91 2.3.2.1 Responsabilidades 91 2.3.2.2 Regulação 92 2.3.3 ESTRUTURA DO MERCADO 95 2.3.3.1 Propriedade e gestão dos serviços 95 2.3.3.2 Players do sector 95 2.3.3.3 Integração do sector e serviços oferecidos 95 2.3.3.4 Números do sector 96 2.3.4 REGRAS DO JOGO 2.3.4.1 Estabelecimento de tarifas 2.3.4.2 Qualidade do serviço 2.3.4.3 Obrigações de serviço público 2.3.5 2.4 DESEMPENHO CHILE 97 97 98 100 100 103 2.4.1 ANTECEDENTES HISTÓRICOS 103 2.4.2 ENQUADRAMENTO LEGAL E INSTITUCIONAL 104 2.4.2.1 Responsabilidades 104 2.4.2.2 Regulação 105 2.4.3 ESTRUTURA DO MERCADO 106 2.4.3.1 Propriedade e gestão dos serviços 106 2.4.3.2 Players do sector 107 2.4.3.3 Integração do sector e serviços oferecidos 108 2.4.3.4 Números do sector 108 2.4.4 REGRAS DO JOGO 110 2.4.4.1 Estabelecimento de tarifas 110 2.4.4.2 Qualidade do serviço 112 2.4.4.3 Obrigações de serviço público 113 2.4.5 2.5 DESEMPENHO COLÔMBIA 115 117 2.5.1 ANTECEDENTES HISTÓRICOS 117 2.5.2 ENQUADRAMENTO LEGAL E INSTITUCIONAL 118 2.5.2.1 Responsabilidades 118 2.5.2.2 Regulação 119 2.5.3 ESTRUTURA DO MERCADO 120 2.5.3.1 Propriedade e gestão dos serviços 120 2.5.3.2 Players do sector 120 2.5.3.3 Integração do sector e serviços oferecidos 122 2.5.3.4 2.5.4 Números do sector REGRAS DO JOGO 122 123 2.5.4.1 Estabelecimento de tarifas 123 2.5.4.2 Qualidade do serviço 125 2.5.4.3 Obrigações de serviço público 126 2.5.5 2.6 DESEMPENHO COSTA RICA 126 127 2.6.1 ANTECEDENTES HISTÓRICOS 127 2.6.2 ENQUADRAMENTO LEGAL E INSTITUCIONAL 128 2.6.2.1 Responsabilidades 128 2.6.2.2 Regulação 129 2.6.3 ESTRUTURA DO MERCADO 130 2.6.3.1 Propriedade e gestão dos serviços 130 2.6.3.2 Players do sector 130 2.6.3.3 Integração do sector e serviços oferecidos 131 2.6.3.4 Números do sector 131 2.6.4 REGRAS DO JOGO 132 2.6.4.1 Estabelecimento de tarifas 132 2.6.4.2 Qualidade do serviço 132 2.6.4.3 Obrigações de serviço público 134 2.6.5 2.7 DESEMPENHO ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA 134 135 2.7.1 ANTECEDENTES HISTÓRICOS 135 2.7.2. ENQUADRAMENTO LEGAL E INSTITUCIONAL 136 2.7.2.1. Responsabilidades 136 2.7.2.2 Regulação 137 2.7.3 ESTRUTURA DO MERCADO 139 2.7.3.1 Propriedade e gestão dos serviços 139 2.7.3.2 Players do sector 140 2.7.3.3 Integração do sector e serviços oferecidos 141 2.7.3.4 Números do sector 141 2.7.4 REGRAS DO JOGO 142 2.7.4.1 Estabelecimento de tarifas 142 2.7.4.2 Qualidade do serviço 144 2.7.4.3 Obrigações de serviço público 144 2.7.5 2.8 DESEMPENHO FRANÇA 145 147 2.8.1 ANTECEDENTES HISTÓRICOS 147 2.8.2 ENQUADRAMENTO LEGAL E INSTITUCIONAL 148 2.8.2.1 Responsabilidades 148 2.8.2.2 Regulação 150 2.8.3 ESTRUTURA DO MERCADO 151 2.8.3.1 Propriedade e gestão dos serviços 151 2.8.3.2 Players do sector 151 2.8.3.3 Integração do sector e serviços oferecidos 153 2.8.3.4 Números do sector 153 2.8.4 REGRAS DO JOGO 154 2.8.4.1 Estabelecimento de tarifas 154 2.8.4.2 Qualidade do serviço 157 2.8.4.3 Obrigações de serviço público 158 2.8.5 2.9 DESEMPENHO PAÍSES BAIXOS 160 161 2.9.1 ANTECEDENTES HISTÓRICOS 161 2.9.2 ENQUADRAMENTO LEGAL E INSTITUCIONAL 163 2.9.2.1 Responsabilidades 163 2.9.2.2 Regulação 165 2.9.3 ESTRUTURA DO MERCADO 165 2.9.3.1 Propriedade e gestão dos serviços 165 2.9.3.2 Players do sector 166 2.9.3.3 Integração do sector e serviços oferecidos 166 2.9.3.4 Números do sector 166 2.9.4 REGRAS DO JOGO 166 2.9.4.1 Estabelecimento de tarifas 166 2.9.4.2 Qualidade do serviço 169 2.9.4.3 Obrigações de serviço público 171 2.9.5 DESEMPENHO 171 2.10 INDONÉSIA 173 2.10.1 ANTECEDENTES HISTÓRICOS 173 2.10.2 ENQUADRAMENTO LEGAL E INSTITUCIONAL 174 2.10.2.1 Responsabilidades 174 2.10.2.2 Regulação 175 2.10.3 ESTRUTURA DO MERCADO 176 2.10.3.1 Propriedade e gestão dos serviços 176 2.10.3.2 Players do sector 177 2.10.3.3 Integração do sector e serviços oferecidos 178 2.10.3.4 Números do sector 178 2.10.4 REGRAS DO JOGO 178 2.10.4.1 Estabelecimento de tarifas 178 2.10.4.2 Qualidade do serviço 180 2.10.4.3 Obrigações de serviço público 181 2.10.5 DESEMPENHO 182 2.11 ITÁLIA 183 2.11.1 ANTECEDENTES HISTÓRICOS 183 2.11.2 ENQUADRAMENTO LEGAL E INSTITUCIONAL 185 2.11.2.1 Responsabilidades 185 2.11.2.2 Regulação 187 2.11.3 ESTRUTURA DO MERCADO 188 2.11.3.1 Propriedade e gestão de serviços 188 2.11.3.2 Players do sector 188 2.11.3.3 Integração do sector e serviços oferecidos 189 2.11.3.4 Números do sector 189 2.11.4 REGRAS DO JOGO 190 2.11.4.1 Estabelecimento de tarifas 190 2.11.4.2 Qualidade do serviço 192 2.11.4.3 Obrigações de serviço público 192 2.11.5 DESEMPENHO 194 2.12 MOÇAMBIQUE 195 2.12.1 ANTECEDENTES HISTÓRICOS 195 2.12.2 ENQUADRAMENTO LEGAL E INSTITUCIONAL 196 2.12.2.1 Responsabilidades 196 2.12.2.2 Regulação 197 2.12.3 ESTRUTURA DO MERCADO 198 2.12.3.1 Propriedade e gestão de serviços 198 2.12.3.2 Players do sector 198 2.12.3.3 Integração do sector e serviços oferecidos 199 2.12.3.4 Números do sector 199 2.12.4 REGRAS DO JOGO 200 2.12.4.1 Estabelecimento de tarifas 200 2.12.4.2 Qualidade do serviço 201 2.12.4.3 Obrigações de serviço público 202 2.12.5 DESEMPENHO 202 2.13 PORTUGAL 203 2.13.1 ANTECEDENTES HISTÓRICOS 203 2.13.2 ENQUADRAMENTO LEGAL E INSTITUCIONAL 204 2.13.2.1 Responsabilidades 204 2.13.2.2 Regulação 206 2.13.3 ESTRUTURA DO MERCADO 207 2.13.3.1 Propriedade e gestão de serviços 207 2.13.3.2 Players do sector 207 2.13.3.3 Integração do sector e serviços oferecidos 210 2.13.3.4 Números do sector 210 2.13.4 REGRAS DO JOGO 211 2.13.4.1 Estabelecimentos de tarifas 211 2.13.4.2 Qualidade do serviço 212 2.13.4.3 Obrigações de serviço público 216 2.13.5 DESEMPENHO 216 2.14 REINO UNIDO 219 2.14.1 ANTECEDENTES HISTÓRICOS 219 2.14.2 ENQUADRAMENTO LEGAL E INSTITUCIONAL 220 2.14.2.1 Responsabilidades 220 2.14.2.2 Regulação 221 2.14.3 ESTRUTURA DO MERCADO 225 2.14.3.1 Propriedade e gestão de serviços 225 2.14.3.2 Players do sector 225 2.14.3.3 Integração do sector e serviços oferecidos 227 2.14.3.4 2.14.4 Números do sector REGRAS DO JOGO 227 228 2.14.4.1 Estabelecimento de tarifas 228 2.14.4.2 Qualidade do serviço 230 2.14.4.3 Obrigações de serviço público 233 2.14.5 DESEMPENHO 235 2.15 ROMÉNIA 237 2.15.1 ANTECEDENTES HISTÓRICOS 237 2.15.2 ENQUADRAMENTO LEGAL E INSTITUCIONAL 238 2.15.2.1 Responsabilidades 238 2.15.2.2 Regulação 239 2.15.3 ESTRUTURA DO MERCADO 240 2.15.3.1 Propriedade e gestão de serviços 240 2.15.3.2 Players do sector 240 2.15.3.3 Integração do sector e serviços oferecidos 240 2.15.3.4 Números do sector 241 2.15.4 REGRAS DO JOGO 241 2.15.4.1 Estabelecimento de tarifas 241 2.15.4.2 Qualidade do serviço 242 2.15.4.3 Obrigações de serviço público 243 2.15.5 DESEMPENHO 243 2.16 SINGAPURA 245 2.16.1 ANTECEDENTES HISTÓRICOS 245 2.16.2 ENQUADRAMENTO LEGAL E INSTITUCIONAL 246 2.16.2.1 Responsabilidades 246 2.16.2.2 Regulação 247 2.16.3 ESTRUTURA DO MERCADO 247 2.16.3.1 Propriedade e gestão dos serviços 247 2.16.3.2 Players do sector 247 2.16.3.3 Integração do sector e serviços oferecidos 247 2.16.3.4 Números do sector 247 2.16.4 REGRAS DO JOGO 248 2.16.4.1 Estabelecimento de tarifas 248 2.16.4.2 Qualidade do serviço 248 2.16.4.3 Obrigações de serviço público 249 2.16.5 DESEMPENHO 250 2.17 SUÉCIA 251 2.17.1 ANTECEDENTES HISTÓRICOS 251 2.17.2 ENQUADRAMENTO LEGAL E INSTITUCIONAL 252 2.17.2.1 Responsabilidades 252 2.17.2.2 Regulação 253 2.17.3 ESTRUTURA DO MERCADO 253 2.17.3.1 Propriedade e gestão dos serviços 253 2.17.3.2 Players do sector 254 2.17.3.3 Integração e âmbito de actuação dos operadores 254 2.17.3.4 Números do sector 255 2.17.4 REGRAS DO JOGO 255 2.17.4.1 Estabelecimento de tarifas 255 2.17.4.2 Qualidade do serviço 256 2.17.4.3 Obrigações de serviço público 256 2.17.5 DESEMPENHO 257 2.18 ZÂMBIA 259 2.18.1 ANTECEDENTES HISTÓRICOS 259 2.18.2 ENQUADRAMENTO LEGAL E INSTITUCIONAL 260 2.18.2.1 Responsabilidades 260 2.18.2.2 Regulação 261 2.18.3 ESTRUTURA DO MERCADO 264 2.18.3.1 Propriedade e gestão dos serviços 264 2.18.3.2 Players do sector 264 2.18.3.3 Integração do sector e serviços oferecidos 266 2.18.3.4 Números do sector 266 2.18.4 REGRAS DO JOGO 266 2.18.4.1 Estabelecimento de tarifas 266 2.18.4.2 Qualidade do serviço 267 2.18.4.3 Obrigações de serviço público 268 2.18.5 DESEMPENHO 268 PARTE 3 PANORAMA MUNDIAL DA REGULAÇÃO 269 3.1 INTRODUÇÃO 271 3.2 OBRIGAÇÕES DE SERVIÇO PÚBLICO 275 3.2.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS 275 3.2.2 UNIVERSALIDADE DOS SERVIÇOS 275 3.2.3 ACESSIBILIDADE E EQUIDADE 278 3.2.4 CONTINUIDADE 278 3.2.5 PROTECÇÃO DOS UTILIZADORES ESPECIAIS 279 3.2.6 DEFESA DOS INTERESSES DOS UTILIZADORES 282 3.2.7 PARTICIPAÇÃO E TRANSPARÊNCIA 283 3.3 REGULAÇÃO DE QUALIDADE DO SERVIÇO 287 3.4 REGULAÇÃO ECONÓMICA 295 3.5 BOAS PRÁTICAS 301 BIBLIOGRAFIA 305 ANEXOS 311 313 ANEXO I – QUESTIONÁRIO SOBRE REGULAÇÃO ANEXO II – RESPOSTAS AO QUESTIONÁRIO SOBRE REGULAÇÃO 327 ANEXO III – CONTACTOS DOS REGULADORES 389 LISTA DE ACRÓNIMOS AAC Custo Médio Anual AATO Autorità di Ambito Territoriale Ottimale ABAR Associação Brasileira de Agências de Regulação ABCON Associação Brasileira das Concessionárias ABES Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental ABRH Associação Brasileira de Recursos Hídricos AC Autoridade da Concorrência ACCC Australian Competition and Consumer Commission ACEA Azienda Governatoriale Elettricità e Acque ACTEW Australian Capital Territory Electricity and Water ADASA Agência Reguladora de Águas e Saneamento do Distrito Federal ADERASA Asociación de Entes Reguladores de Aguas de las Américas AdP ANRSC Autoritatea Nationala de Reglementare pentru Serviciile Publice de Gospodarie Comunala APA Agência Portuguesa do Ambiente APDA Associação Portuguesa de Distribuição e Drenagem de Águas APR Agua Potable Rural APSC Arkansas Public Service Commission AQUABRU Association Bruxelloise de l’Eau AQUAWAL Union professionnelle des Opérateurs publics du cycle de l’eau en Wallonie ARA Administracões Regionais de Águas ARA Asociatia Romana a Apei ARCE Agência Reguladora de Serviços Públicos Delegados do Estado do Ceará ARE Agência de Regulação Económica ARESEP Autoridad Reguladora de ServiciosPúblicos Águas de Portugal ARH Administrações de Região Hidrográfica ADWG Australian Drinking Water Guidelines ARM Autorité de Régulation Multisectorielle AED Administration de l’Equipement et des Déplacements ARPA Agenzia Regionale per la Protezione dell’Ambiente AESBE Associação das Empresas de Saneamento Básico Estaduais ARPB Agência de Regulação do Estado da Paraíba AFNOR Association Française de Normalisation ARPE Agência de Regulação de Pernambuco ARSAE Agência Reguladora dos Serviços de Água e Esgoto de Maná ARSAL Agência Reguladora de Serviços Públicos do Estado de Alagoas ARSAN Agência Reguladora de Serviços de Saneamento Básico do Estado de São Paulo ARSBAN Agência Reguladora de Serviços de Saneamento Básico do Município do Natal ASADAS Asociaciones Administradoras de Acueductos y Alcantarillados Rurales ASEP Autoridad Nacional de los Servicios Públicos ASSEMAE Associação Nacional dos Servidores Municipais de Saneamento ATB Adhya Tirta Batam ATO Ambito Territoriale Ottimale AWA Australian Water Association AWWA American Water Works Association AGENERSA Agência Reguladora de Energia e Saneamento Básico do Estado do Rio de Janeiro AGERSA Agência Municipal de Regulação dos Serviços Públicos Delegados de Cachoeiro de Itapemirim AGL Australian Gas Light Company AGR Agência Goiana de Regulação AMAE Agência Municipal de Água e Esgoto AMINAL Administratie Milieu, Natuurbeheer en Landinrichting AMWA Association of Metropolitan Water Agencies ANA Agência Nacional de Águas ANEA Associazione Nazionale Autorità e Enti di Ambito ANEAS Asociación Nacional de Empresas de Agua y Saneamiento de México ANPA Agenzia Nazionale por la Protezione dell’Ambiente 21 AWWARF American Water Works Association Research Foundation AyA Instituto Costarricense de Acueductos y Alcantarillados BAPPENAS Badan Perencanaan dan Pembangunan Nasional BELGAQUA Fédération Belge du Secteur de l’Eau 22 COREMAS Departamentos Regionais CORFO Corporação de Fomento da Produção COVIRI Comitato di Vigilanza sull’uso delle Risorse Idriche CPP Comitato Provinciale Prezzi CPSSW Code of Practice on Sewerage and Sanitary Works CPSWD Code of Practice on Surface Water Drainage CPUC California Public Utilities Commission CPWS Code of Practice for Water Services CRA Comisión de Regulación de Agua Potable y Saneamiento Básico CRA Conselho de Regulação do Abastecimento de Água CSC Customer Service Code CSS Customer Service Standard CWA Clean Water Act DAPSBA Direcção para o Serviçoo de Água Potável e Saneamento Básico DDAF Direction Départementale de l’Agriculture et de la Forêt DDASS Direction Départementale des Affaires Sanitaires et Sociales DDCCRF Direction Départementale de la Consommation, de la Concurrence et de la Répression des Fraudes BID Banco Inter-Americano de Desenvolvimento BNH Banco Nacional de Habitação BOOT Build-Own-Operate-Transfer BOT Build-Own-Transfer BPD Building Partnerships for Development CA Cooperation Agreement CAAR Comités Administradores de Acueductos Rurales CABEI Central American Bank for Economic Integration CACE Coordination Nationale des Associations de Consommateurs d’Eau CAPEX Despesas de Capital CAPM Capital Asset Pricing Model CAR Corporación Autónoma Regional CAS Communal Social Assistance Committees CC Competition Commission CCDR Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional DDE Direction Départementale de l’Equipement CCE Comité de Contrôle de l’Eau DEA Data Envelopment Analysis CCSPL Commission Consultative des Services Publics Locaux DEFRA Department for Environment, Food and Rural Affairs CCW Consumer Council for Water CEDAE Companhia de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro DEWHA Department of the Environment, Water, Heritage and the Arts DG Director General of Water Services CESB Companhia Estadual de Saneamento Básico DGA Direcção-Geral das Águas CIBE Compagnie Intercommunale Bruxelloise des Eaux DGC Direcção-Geral do Consumidor CIEAU Centre d’Information sur l’Eau DGRNE Direction Général dês Ressources Naturelles et de l’Environnement CILP Custo Incremental de Longo Prazo DHS Department of Human Services CIP Comitato Interministeriale Prezzi DISS Department of Infrastructure and Support Services CLCV Association de la Consommation Éco-citoyenne DNA Direcção Nacional de Águas CMP Costo Medio de Mediano Plazo DNP Departamento Nacional do Planeamento CNP Comissão Nacional de Preços DNS Direcção Nacional de Saúde CoAG Council of Australian Governments DOH Direcção Nacional de Obras Hidráulicas COIL Community Opinion Investigation Committee DRIRE Directions Régionales de l’Industrie, de la Recherche et de l’Environnement CONAMA Comissão Nacional do Meio Ambiente DRIVA Benchmarking System in Sweden FNCCR Fédération Nationale des Collectivités Concédantes et Régies FNDAE Fonds National pour le Developpement des Adductions d’Eau Department of Water Affairs FP2E Fédération Professionnelle des Entreprises de l’Eau DWI Drinking Water Inspectorate FPSC Florida Public Service Commission EA Environment Agency FTC Fair Trading Commission EAAB Empresa de Acueducto y Alcantarillado de Bogotá GWCL Ghana Water Company Ltd ECZ Environment Council of Zâmbia IBAMA Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis EHS Environment and Heritage Service EICE Empresas Industriales y Comerciales del Estado IBDE Intercommunale Bruxelloise de Distribution d’Eau EPA Environment Protection Agency EPA Environment Protection Authority IBGE Institut Bruxellois pour la Gestion de l’Environnement EPAL Empresa Portuguesa das Águas Livres IBrA Intercommunale Bruxelloise pour l’Assainissement EPM Empresas Públicas de Medellín EPS Empresa Prestadora de Servicios de Saneamiento IDAAN Instituto de Acueductos y Alcantarillados Nacionales ERA Economic Regulation Authority IDEA Intercommunale de Développement Economique et d’Aménagement de la Région Mons-Borinage-Centre ERSAPS Ente Regulador de los Servicios de Agua Potable y Saneamiento IFEN Institut Français de l’Environnement ERSAR Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos IGA Instituto de Gestão da Água INAG Instituto da Água ESC Essential Services Commission INASEP Intercommunale Namuroise de Services Publics ESPH Empresa de Servicios Públicos de Heredia ESSBIO Empresa de Servicios Sanitarios del Bio-Bío INHGA Institutul National De Hidrologie Si Gospodarire A Apelor ESVAL Empresa Sanitária de Valparaíso INSFOPAL Instituto de Fomento Municipal ETA Estação de Tratamento de Água IPART Independent Price Authority Regulatory Tribunal ETAR Estação de Tratamento de Águas Residuais IPAs Inspectores de Protecção Ambiental locais EUA Estados Unidos da América IPC Índice de Preços no Consumidor EWI Environment and Water Industry Development Council IPE Ilha do Príncipe Eduardo EWOV Energy and Water Ombudsman IRAC PEI Regulatory and Appeals Commission EWURA Energy and Water Utilities Regulatory Authority IRAR Instituto Regulador de Águas e Resíduos FAE Fundo de Financiamento para Águas e Esgotos IUIDP Programa Integrado de Desenvolvimento de Infra-estruturas IURC Indiana Utility Regulatory Commission IVA Imposto de Valor Acrescentado IWA International Water Association DSE Department of Sustainability and Environment DTe Energiekamer DTF Devolution Trust Fund DTSS Deep Tunnel Sewerage System DWA Federutility Federazione delle Imprese Energetiche e Idriche FGTS Fundo de Garantia por Tempo de Serviço JWSRB Jakarta Water Supply Regulatory Body FINDETER Financiera de Desarrollo Territorial S.A. KPPM Comité da Opinião Pública FIPAG Fundo de Investimento e Património do Abastecimento de Água LCS Local Corporate Sector FKPM Public and Consumer Communication Forum LGWSC Lukanga Water and Sewerage Company LNEC Laboratório Nacional de Engenharia Civil 23 24 OECD Organization for Economic Co-operation and Development OFWAT Water Services Regulation Authority OLS Ordinary Least Squares OMS Organização Mundial de Saúde ONEMA Office National de l’Eau et des Milieux Aquatiques ONG Organização Não Governamental OPA Overall Performance Assessment OPEX Despesas de Operação ORG Office of Regulator General OUR Office of Utilities Regulation PAC Programa de Aceleração de Crescimento PDAM Perusahaan Daerah Air Minum Ministério das Obras Públicas PDO Plan Maestro MOPH Ministério das Obras Públicas e Habitação MPC Ministerio de la Protección Social PEAASAR Plano Estratégico de Abastecimento de Água e Saneamento de Águas Residuais MPSC Montana Public Service Commission PERPAMSI Persatuan Perusahaan Air Minum di Seluruh Indonesia MSP Ministerul Sanatatii Publice PJT Perum Jasa Tirta MWD Metropolitan Water District of Southern California PLANASA Plano Nacional de Saneamento MWSSRO Metropolitan Waterworks and Sewerage System – Regulatory Office PLC Public Limited Company NARUC National Association of Regulatory Utility Commissioners PMSS Programa de Modernização do Sector de Saneamento NAW National Assembly for Wales PNDA Programa Nacional de Desenvolvimento de Águas NAWC National Association of Water Companies PNG Papua Nova Guiné NCC National Competition Council PPP Public-Private Partnership NCCPE National Control Commission for Prices and Energy PrGWS ‘Private’ Group Water Schemes PSC Public Service Commission NEA National Environment Agency PSRC Public Service Regulatory Commission NIAUR Northern Ireland Authority for Utility Regulation PUB Public Utilities Board PUC Public Utility Commission NRA National Rivers Authority PuGWS Public Group Water Schemes NRWA National Rural Water Association PURA Programa de Uso Racional da Água NSW New South Wales / Nova Gales do Sul PURC Public Utilities Regulatory Commission NUT Nomenclatura de Unidades Territoriais para Fins Estatísticos PWS Public Water Supplies QGD Quadro da Gestão Delegada NWASCO National Water Supply and Sanitation Council RCA Restated Cooperation Agreement RIC Regulated Industries Commission NWC National Water Commission NWI Intergovernmental Agreement on a National Water Initiative RIZA Rijksinstituut voor Integraal Zoetwaterbeheer en Afvalwaterbehandeling RPI Retail Price Index NWRB National Water Resources Board RU Reino Unido O/M Operação e Manutenção RV Rateable Value LWSC Lusaka Water and Sewerage Company MAOTDR Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional MAVDT Ministerio de Ambiente, Vivienda y Desarrollo Territorial MEWD Ministry of Energy and Water Development MEWR Ministry of the Environment and Water Resources MINAE Ministerio del Ambiente y Energía MINSA Ministerio de Salud MLGH Ministry of Local Government and Housing MMC Monopolies and Mergers Commission MMGA Ministerul Mediului si Gospodaririi Apelor MoH Ministry of Home Affairs MOP RWA Regional Water Authorities TRA Tennessee Regulatory Authority SABESP Saneamento Básico do Estado de São Paulo TRM Tarifa Real Média SAS Serviço de Abastecimento de Água e de Saneamento de Águas Residuais UE União Europeia SBGE Société Bruxelloise de Gestion de l’Eau UNICEF United Nations Children’s Fund SDWA Safe Drinking Water Act URSEA Unidad Reguladora de Servicios de Energía y Agua SEDAPAL Servicio de Agua Potable y Alcantarillado URSO Regulatory Office for Network Industries SEPA Scottish Environment Protection Agency USL Unitá Sanitaria Locale SFA Stochastic Frontier Analysis V&W Ministerie van Verkeer en Waterstaat SIEG Serviços de Interesse Económico Geral VEWIN Vereniging van waterbedrijven in Nederland SII Servizio idrico intergrato VMM Vlaamse Milieumaatschappij SISS Superintendencia de Servicios Sanitarios SNDE Société Nationale de Distribuition d’Eau VMW Vlaamse Maatschappij voor Watervoorziening SNIS Sistema Nacional de Informação sobre Saneamento VNG Vereniging van Nederlandse Gemeenten SNSA Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental VROM Ministerie van Volkshuisvesting, Ruimtelijke Ordening en Milieubeheer WACC Weighted Average Cost of Capital SOVAK Sdruzeni oboru vodovodu a kanalizaci SPA Programa de Saneamento para Assentamientos Wadata Association de Défense des Droits des Consommateurs SPDE Syndicat Professionnel des Entreprises de Service d’Eau et d’Assainissement WASAZA Water and Sanitation Association of Zambia WaSCs Water-and-Sewerage Companies SPGE Société Publique de Géstion de l’Eau SPS Small Private Supplies WCC Water Supply Customer Advisory Committees SSE Secretaries of State for the Environment of E&W WEF Water Environment Federation SSEFRA Secretary of State for Environment, Food and Rural Affairs WICS The Water Industry Commissioner for Scotland WIRO Water Industry Regulatory Order SSPD Superintendencia de Servicios Públicos Domiciliarios WoCs Water-only Companies WPSC Wisconsin Public Service Commission SUNASS Superintendencia Nacional de Servicios de Saneamiento WSAA Water Services Association of Australia SVW Samenwerking Vlaams Water WSB Water Service Boards SWA Singapore Water Association WSP Water Service Providers SWD Swedish Water Development WVPSC Western Virginia Public Service Commission SWDE Société Wallonne de Distribution d’Eau WWG Water Watch Groups TFP Total Factor Productivity WWRO Water and Waste Regulatory Office 25 PARTE 1 A REGULAÇÃO DOS SERVIÇOS DE ABASTECIMENTO DE ÁGUA E DE SANEAMENTO DE ÁGUAS RESIDUAIS Características dos serviços de águas e de águas residuais 1.1 CARACTERÍSTICAS DOS SERVIÇOS DE ÁGUA E DE ÁGUAS RESIDUAIS O s mercados caracterizados por falhas (market failures) devem, em prol do interesse público, ser sujeitos a uma mão visível externa que permita a sua mitigação. Esta intervenção assume um maior relevo quando estão em causa serviços de infra-estruturas que prestam um serviço colectivo aos cidadãos, de natureza essencial, e que, por possuírem uma estrutura em rede e requererem o uso do direito de propriedade para fins de utilidade pública (public utilities), não podem funcionar em auto-regulação ou sem regulação. Os serviços de abastecimento de água para consumo público e de saneamento de águas residuais urbanas (SAS), por estarem impregnados de falhas de mercado e também devido à sua magnitude e ao interesse geral que os mesmos manifestamente evidenciam, constituem os exemplos clássicos de serviços de interesse geral que requerem regulação pública. Os SAS, quando disponibilizados por uma estrutura de rede fixa aos utilizadores, representam exemplos típicos de indústrias monopolistas. Estes serviços podem mesmo ser considerados monopólios naturais, porquanto os custos de produção são menores no caso de um só produtor para um determinado espectro de procura. Assim, a regulação dos monopólios torna-se necessária para a protecção dos interesses dos utilizadores, principalmente para o controlo dos preços e da qualidade do serviço. Mesmo sem considerar os aspectos de qualidade, na ausência de regulação os utilizadores, perante a circunstância de monopólio natural, ficam duplamente prejudicados ao consumirem menos (ou usufruírem menos do serviço) e pagarem mais. Todavia, refira-se que em países subdesenvolvidos ou em vias de desenvolvimento onde não existem infra-estruturas de abastecimento de água (redes) porta a porta, o regime de funcionamento não é monopolista, podendo mesmo existir grande competitividade entre os fornecedores (water vendors). Estes serviços demonstram ainda economias de escala (rendimentos à escala crescentes), isto é, os custos unitários de produção são decrescentes para quantidades crescentes de procura, ainda que apenas até uma determinada dimensão, a partir da qual existem deseconomias. Com efeito, a entrada de novos players no mercado dos SAS, encontra-se muito condicionada. Na prática, as economias de escala associadas ao monopólio natural conduzem a que cada mercado apenas suporte uma única entidade gestora, reduzindose, desta forma, a possibilidade de competição e, por conseguinte, a ausência de auto-regulação, que caracteriza os mercados concorrenciais. Todavia, é de salientar, que aos SAS em cada país ou região corresponderá uma dimensão óptima que, quando ultrapassada, dá origem a deseconomias de escala (rendimentos à escala decrescentes). Este facto, mais relevante nas redes de distribuição de água e de drenagem de águas residuais (na componente em “baixa”), está associado à crescente complexidade e dificuldade de gestão das infra-estruturas com o aumento da sua dimensão e aos elevados investimentos que requerem as interconexões e a expansão das infra-estruturas nas suas extremidades. Os SAS possuem também economias de gama (scope economies), o que dificulta ainda mais a presença de competição neste mercado. As economias de gama ocorrem quando uma entidade gestora desempenha duas actividades distintas que poderiam ser efectuadas por dois operadores independentes, verificando-se, nesta situação, uma redução de custos da prestação de ambas as actividades. Geralmente, as sinergias manifestadas pela partilha de recursos humanos, equipamento e instalações, conduzem a um custo inferior na presença de um só operador. Por exemplo, um serviço de água revela economias de gama se, para além de fornecer água para consumo público, disponibilizar também água bruta para irrigação ou for, simultaneamente, responsável pelo saneamento de águas residuais. Aliás, esta é a principal razão que justifica que, em muitos países, o serviço de abastecimento de água e o serviço de águas residuais sejam prestados, quase sempre, pela mesma entidade, assim como também serve de argumento à sua verticalização, ou seja, à prestação pelo mesmo operador de todas 29 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional as fases da fileira produtiva, incluindo, designadamente, a “alta” e a “baixa” (por vezes, denominadas economias de verticalização). Também no que respeita às economias de gama existe divergência doutrinária, uma vez que a especialização e, por conseguinte, uma maior eficiência e uma maior transparência podem superar os benefícios da partilha de custos e, portanto, originar deseconomias de gama. No entanto, não é este o entendimento de muitas entidades governamentais que privilegiam o modelo de multi-utility (por ex., a Alemanha). Devido à presença de custos fixos elevados, os SAS evidenciam também economias de densidade crescentes, dignas de registo. O conceito de economias de densidade define-se como o aumento proporcional no custo total resultante de um aumento ainda proporcional dos outputs, permanecendo a estrutura do sistema constante como, por exemplo, a extensão das redes, e está intimamente ligado ao factor de ponta dos sistemas. Os SAS que patenteiam factores de ponta elevados são penalizados quando comparados com os de factor de ponta reduzidos, pois têm de amortizar infra-estruturas com grandes capacidades que apenas correspondem a uma produtividade adequada no período de ponta. Às infra-estruturas dos SAS corresponde um activo muito elevado, de capital intensivo e de longa duração. Estes activos são, ou foram, também muitas vezes subsidiados. Por exemplo, para o serviço de água, o activo compreende as captações, as estações de tratamento de água (ETA), os reservatórios, as estações elevatórias (EE) e as tubagens, quer da adução quer das redes de distribuição de água. Estas instalações e equipamentos têm um horizonte de projecto de várias dezenas de anos. Uma componente substancial dos activos está também enterrada, não sendo acessível a verificação do seu estado e da sua qualidade. Depois de instaladas ou construídas, estas componentes não possuem usos alternativos e não podem ser vendidas nem transferidas para outra localização, sendo, por conseguinte, consideradas irrecuperáveis (sunk costs). A natureza irrecuperável destas infra-estruturas corresponde a um risco acrescido da exploração destes serviços, que tem de ser alocado e acautelado adequadamente, condicionando a presença de novos entrants no mercado dos SAS. Os SAS estão impregnados de problemas de informação, quer de risco moral (moral hazard) quer de selecção adversa (adverse selection). O primeiro refere-se às variáveis endógenas à entidade regulada, às quais os stakeholders não têm acesso, isto é, a informação escondida (hidden information), tais como a distorção dos custos e a respectiva alocação (por ex., a alocação de horas a uma determinada tarefa ou aquisição de mercadorias a custos excessivos). O segundo 30 sucede quando o operador detém mais informação do que o regulador e os restantes stakeholders sobre variáveis exógenas, ou seja, quando conhece melhor o mercado que o regulador. Os agentes exteriores às entidades gestoras possuem restrições de informação sobre a qualidade dos seus serviços e produtos, o seu desempenho e os seus resultados, e, sobretudo, sobre o value for money envolvido. Esta informação, incompleta e imperfeita, pode conduzir a abusos por parte das entidades gestoras monopolistas e à desconfiança dos utilizadores quanto à qualidade dos bens e dos serviços fornecidos. Nos países desenvolvidos, a qualidade da água para consumo público constitui um exemplo de excelência da presença de informação assimétrica, dado que, apesar de a água disponibilizada ser, em geral, de boa qualidade os utilizadores consomem, principalmente, água engarrafada. A informação assimétrica, que afecta todos os stakeholders, também constitui um problema de natureza regulatória. Aos SAS estão também associadas externalidades, negativas ou positivas, com consequências importantes em terceiros. As externalidades negativas podem ter fortes impactos na saúde pública e no ambiente. Um caso exemplar é a poluição, isto é, a falta de tratamento de águas residuais a montante das linhas de água, que, para além das consequências ambientais e de saúde pública, conduz a custos de tratamento de água superiores nas captações a jusante. As externalidades positivas não são menos significativas. Por exemplo, os ganhos sociais para a saúde pública, provenientes da expansão do fornecimento de água ou da rede de águas residuais domésticas, são muito relevantes e devem ser internalizados. A água, que outrora era tida como um bem livre e que é hoje aceite como um bem económico, pode ser considerada como um bem quase-público (vide Marques, 2005 e Moran e Dann, 2008). De facto, o mercado dos SAS é caracterizado por uma não rivalidade (non-rivalry) de consumo ou de usufruto por parte dos utilizadores e por uma quase não exclusão (non-exclusion). Por um lado, o custo da extensão do serviço é insignificante, ou seja, o custo marginal é próximo de zero e, por outro lado, ainda que seja possível o desligamento dos serviços na generalidade dos países, o seu valor social é muito superior ao valor económico e, por conseguinte, a exclusão dos utilizadores dos serviços só deve ser instituída em situações muito particulares. Refira-se que, de facto, o custo de exclusão (por exemplo, em termos de saúde pública, segregação social) torna-se muito superior ao custo da subsidiação dos utilizadores mais carenciados. A presença de condicionalismos exógenos à gestão dos serviços dos SAS conduz a que não existam dois operadores idênticos. Por exemplo, a disponibilidade e qualidade da água na origem Características dos serviços de águas e de águas residuais condiciona largamente o custo do serviço de abastecimento de água. Existem muitos operadores que não têm água na sua área de actuação ou têm-na mas a custos muito elevados (por ex., água dessalinizada). Ocorrem vários outros condicionalismos, tais como as condições topográficas, a geologia dos terrenos, a densidade populacional e respectiva variação, e as características sociais da região servida, os quais enfatizam a especificidade do ambiente operacional de cada operador. A estrutura dos custos dos SAS é fortemente influenciada pelos factores de contextoque caracterizam o ambiente operacional e institucional onde os SAS actuam. Por conseguinte, dada a importância e a especificidade do ambiente operacional de cada operador, torna-se difícil estabelecer critérios técnicos, políticos, sociais e económicos que evitem algum controlo externo (i. e. regulação). O abastecimento de água e o saneamento de águas residuais constituem serviços de interesse geral ou, mais rigorosamente, serviços de interesse económico geral (SIEG). Os serviços de interesse geral são aqueles que satisfazem as necessidades básicas da generalidade dos cidadãos, quer sejam económicas, sociais ou culturais, e cuja existência seja essencial à vida, à saúde ou à participação social dos cidadãos (Gouveia, 2001). Os SIEG constituem, como tal, um subgrupo dos serviços de interesse geral, nomeadamente aqueles que satisfazem necessidades básicas de natureza económica. Embora a classificação dos SAS como SIEG não seja pacífica nalguns países (por ex., no seio da UE), sendo mesmo palco de alguma controvérsia, de facto, os SAS são SIEG, desde que a estes se imponha a condição de auto-sustentabilidade, que ocorre (ou se procura que ocorra) na maioria dos países. Os países em que o mesmo não sucede, pelo menos na Europa, evidenciam situações muito especiais como, por exemplo, o fornecimento próximo do gratuito, em virtude da abundância de água (por ex., na Irlanda e na Áustria), mas mesmo estas situações configuram um desrespeito pela legislação comunitária, designadamente da Directiva-Quadro da água. Os SIEG são fundamentais na promoção da coesão económica e social, quer para o bemestar das populações, quer pelo papel relevante que desempenham em todos os sectores da economia. Por conseguinte, devem obedecer a um conjunto de obrigações de serviço público. Por exemplo, a universalidade, a equidade, a acessibilidade, a continuidade e a adaptabilidade, assim como a adopção de regras de boa conduta, entre as quais sobressaem a transparência da gestão, do sistema tarifário e do financiamento, são requisitos essenciais aos SAS em qualquer sociedade. No entanto, refira-se que, como se verá nos próximos capítulos, e no documento em geral, as obrigações de serviço público são, frequentemente, dissonantes entre si. Existe, assim, a necessidade de uma mão visível que compatibilize os princípios relativos à eficiência económica com os da “eficiência social”. A Figura 1 sistematiza as principais características (falhas de mercado) dos SAS. Figura 1 Principais falhas de mercado dos SAS 31 Necessidade e objectivos da regulação 1.2 NECESSIDADE E OBJECTIVOS DA REGULAÇÃO A s falhas de mercado dos SAS apontadas anteriormente justificam a intervenção do Estado na regulação destes serviços para defesa do interesse público. A mão invisível do mercado nos serviços de rede de infraestruturas não é eficaz e, por conseguinte, o Estado tem de intervir, definindo regras e controlando e supervisionado a sua instituição e funcionamento. Como outras infraestruturas de rede monopolistas, os SAS são susceptíveis à vida calma (quiet life) e à ineficiência e, consequentemente, requerem incentivos para se tornarem mais eficientes e inovadores. Embora a regulação seja instituída pelo interesse público, a mesma não deixa de, inevitavelmente, gerar vencedores e derrotados e, desta forma, poder ser procurada por alguns grupos de interesses, incluído o dos próprios burocratas. Os objectivos da regulação dos SAS variam substancialmente de país para país (ou de região para região) e, por vezes, são traçados em diferentes graus, dependendo, por exemplo, da forma organizatória ou do grau de desenvolvimento existente. Muitos países exigem também obrigações às empresas privadas diferentes daquelas que são impostas às empresas públicas. Por outro lado, a imposição de metas de qualidade de serviço muito ambiciosas não faz muito sentido se a entidade gestora tiver um nível de atendimento de serviço reduzido. Em alguns países, as finalidades da regulação são muito próximas das de outras infra-estruturas de rede, como o gás e a electricidade, em que a criação do mercado e a promoção da concorrência são os objectivos primordiais (por ex., no Reino Unido), embora na grande maioria dos países os direitos exclusivos monopolistas dos SAS, bem ou mal, continuem a ser garantidos e regulamentados. Os principais objectivos da regulação económica prendem-se com o fornecimento de value for money dos SAS e são, sobretudo, os seguintes: • Proteger os interesses dos utilizadores quanto às obrigações de serviço público; • Promover a eficiência e a inovação; • Assegurar a estabilidade, a sustentabilidade e a robustez dos SAS. a) Protecção dos interesses dos utilizadores quanto às obrigações de serviço público Considerando o estatuto de serviços essenciais dos SAS e o respectivo contributo para a coesão socioeconómica das populações, a protecção dos utilizadores, para além de estritamente necessária, envolve diversos requisitos, os quais são vulgarmente denominados obrigações ou princípios gerais de serviço público. De entre estes requisitos, que são frequentes na globalidade dos serviços de infra-estruturas, destacam-se a universalidade, a continuidade, a qualidade do serviço, a equidade, a acessibilidade, a protecção à saúde, a segurança dos bens e serviços, a transparência, a possibilidade de escolha dos fornecedores e dos serviços, a opção de diferentes formas de pagamento, a representatividade e a participação dos utilizadores nas decisões e a existência de mecanismos de conciliação e resolução de conflitos. As obrigações de serviço público serão analisadas em detalhe no capítulo 1.3. A satisfação das mesmas na medida adequada, constitui, por conseguinte, um dos principais objectivos da regulação dos SAS. As obrigações de serviço público, embora não cumpram uma classificação uniforme em termos internacionais para os SAS, apoiam-se numa base comum, variando na intensidade e na forma da respectiva aplicação em cada país. Por exemplo, a obrigação de prestação de um serviço universal nos SAS, implica que todos os potenciais utilizadores tenham acesso ao ser33 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional viço de distribuição de água e de drenagem de águas residuais em condições de preço e qualidade de serviço adequadas, independentemente da sua localização geográfica ou das suas características sociais. A obrigação de serviço universal ou de universalidade envolve a cobertura territorial completa e um cuidado especial com determinados grupos de utilizadores (por ex., pessoas com deficiência e idosos), garantindo as condições de acessibilidade adequadas às suas necessidades particulares. Independentemente dos modelos adoptados para a respectiva implementação, que serão apresentados posteriormente (vide capítulo 1.3) e que variam de país para país ou mesmo de operador para operador, e do objectivo último, que será naturalmente a universalidade dos SAS, os países enquadram legal e institucionalmente este princípio de forma distinta. Assim, existem países onde a obrigação de serviço público referente ao serviço universal está inequivocamente consagrada na legislação principal, noutros na legislação secundária e nos restantes nem sequer consta da lei. Saliente-se que, ao contrário de outros utilities, como a electricidade ou a telefonia fixa, onde o serviço universal está sempre contemplado na lei, pelo menos na Europa, no caso particular dos SAS tal não acontece devido aos impactos significativos do custo desta medida. A regulação tem aqui um papel fundamental, dado que a prossecução das obrigações de serviço público deve ser regulada, tendo em consideração não só a sua garantia mas também a medida em que a mesma é conseguida, designadamente o esforço necessário, com consequências no desempenho económico dos SAS e na sua estabilidade e sustentabilidade. O serviço universal, por si só, é elucidativo, uma vez que, por exemplo, eventuais subsídios ou subsidiações cruzadas se traduzem em mensagens erradas enviadas para o mercado, provocando desperdícios e ineficiências que se pretendem evitar. Por outro lado, os operadores podem não manifestar vontade de servir determinados utilizadores, uma vez que o custo acrescido da disponibilização dos SAS para estes é muito elevado. Está-se claramente perante problemas de natureza regulatória. A qualidade do serviço, sobretudo pela sua natureza multidimensional, configura outro caso interessante. A prestação dos SAS com uma qualidade muito elevada (práticas de gold plate) não defende necessariamente os interesses dos utilizadores, uma vez que estes (ou alguém) terão sempre de pagar o serviço. Por outro lado, os SAS têm, pela sua natureza, de ser prestados com uma qualidade elevada, que se traduza, por exemplo, no serviço de abastecimento de água, pelo menos, em quantidade, qualidade e pressão adequadas. A instituição deste equilíbrio não é fácil e re34 quer a intervenção da regulação. Muitas vezes, os próprios reguladores impõem essa responsabilidade aos utilizadores, que são os principais interessados, perguntando-lhes como pretendem que seja a qualidade dos seus rios ou das suas praias ou, formulando a questão de outra forma, quanto estão dispostos a pagar para terem uma determinada qualidade ambiental ou de serviço. Naturalmente, esta opção só pode vingar quando os utilizadores se encontram muito bem informados sobre os assuntos em discussão, o que não se verifica na maioria das circunstâncias. b) Promoção da eficiência e da inovação A promoção da eficiência e da inovação deve constituir as finalidades primordiais das entidades reguladoras. Só assim os interesses dos utilizadores estarão, de facto, protegidos. Citando o primeiro regulador escocês, “ultimately the best way of promoting customer interests in a public sector model is by improving the economic efficiency of the industry, and thereby the value for money generated” (WICS, 2002). No entanto, é de realçar que os objectivos de maximização da eficiência (económica) podem colidir com algumas das finalidades relativas às obrigações de serviço público, bem como com alguns interesses conexos. De facto, assim é, e não poderia ser de outra forma. Para o regulador, e em prol do interesse público, o mercado deve funcionar e as questões sociais devem ser naturalmente garantidas, mas por quem de direito. Por exemplo, os fornecimentos gratuitos ou as tarifas políticas conduzem a consumos elevados e a desperdícios que serão pagos por todos os utilizadores ou, mais grave ainda, por todos os contribuintes. Sobretudo nos SAS, os princípios de utilizador/ pagador e de poluidor/pagador constituem pilares fundamentais do respectivo funcionamento e desenvolvimento. A eficiência corresponde à comparação entre os valores dos factores de produção e dos resultados observados e os seus valores óptimos. A eficiência pode ser decomposta em eficiência alocativa, que corresponde à circunstância de funcionamento do mercado em concorrência perfeita e, por conseguinte, da tarifação a preços marginais, a qual é descabida para o mercado dos SAS, e eficiência produtiva ou económica, que está associada à produção ao menor custo. A eficiência produtiva pode ainda ser decomposta em eficiência técnica de input ou de output, que mede a intensidade dos desperdícios verificados no processo produtivo nas vertentes referidas, e em eficiência alocativa de preços, que envolve a combinação de inputs (i. e. trabalho e capital) que produz uma determinada quantidade de outputs ao Necessidade e objectivos da regulação mínimo custo. A eficiência técnica pode ainda ser decomposta em várias componentes, sendo a mais relevante a que se refere à eficiência de escala, que mede o impacto da dimensão da entidade gestora no valor da eficiência. É de realçar que o conceito de eficiência tem, essencialmente, uma natureza estática. Embora a doutrina seja divergente em relação a esta questão, há quem inclua na decomposição da eficiência uma parcela, devido à eficiência dinâmica associada à inovação e à mudança da tecnologia (função) de produção, ao longo do tempo. Neste caso, fala-se da produtividade, que tem natureza dinâmica, correspondendo à variação, ao longo do tempo, da eficiência e da inovação, considerando ainda a variação do ambiente operacional e institucional. O objectivo do regulador é incentivar o aumento de produtividade. A Figura 2 sistematiza a decomposição da eficiência. Na promoção da eficiência, é necessário ter qual requer que os preços se aproximem dos custos. Uma outra questão relevante corresponde à dicotomia entre o curto prazo e o longo prazo. c) Assegurar a estabilidade, sustentabilidade e robustez dos SAS A regulação deve promover a estabilidade no sector da água, designadamente das políticas aplicadas, e procurar o seu desenvolvimento de forma gradual e equilibrada, diligenciando para que o mesmo seja, simultaneamente, versátil e robusto na confrontação com as eventuais adversidades. Um dos contributos fundamentais para o preenchimento deste objectivo reside no auto-financiamento dos SAS. Se os princípios do utilizador/pagador e do poluidor/pagador foFigura 2 Decomposição da eficiência em atenção os incentivos fornecidos. De facto, a promoção de um determinado tipo de eficiência pode conduzir à penalização de outro. Estes conflitos entre os diferentes tipos de eficiência estão bem patenteados nos SAS. Neste caso, a maximização da eficiência estática requer a presença de uma única empresa, ao passo que a empresa monopolista adoptará uma política de preços de segunda escolha (e não a de preços marginais), causando ineficiência alocativa. Em oposição, para a maximização da eficiência alocativa, seriam necessárias várias entidades gestoraspara que a competição gerada conduzisse ao estabelecimento de preços marginais (primeira escolha), o que levaria, na realidade, à ineficiência estática (e. g. ineficiência de escala). Numa outra perspectiva, pelo menos a curto prazo, as entidades reguladas necessitam de incentivos para ganhos de produtividade superiores, para se tornarem mais eficientes e inovadoras. Ora, estes estímulos (retenção de maiores lucros) são contrários à eficiência alocativa, a rem instituídos, em que os utilizadores pagam o custo real do serviço (participation constraint), englobando tanto os custos de operação como os custos de capital (incluindo uma remuneração dos capitais próprios investidos), grande parte dos problemas ficará resolvida. Nestas circunstâncias, os operadores possuem estabilidade no respectivo funcionamento, podendo efectuar os investimentos necessários, sobretudo os não urgentes, e desenvolver as políticas de gestão correctas, sem preocupações políticas e de resultados imediatos. Neste âmbito, a regulação é fundamental e constitui um travão para o populismo de curto prazo, relativamente ao não cumprimento dos princípios referidos, e para o adiamento dos investimentos e das decisões justas e tecnicamente adequadas, embora desagrade à população e/ ou os interesses instalados. É de referir que a satisfação das obrigações de serviço público não coíbe estes princípios, permitindo apenas que determinados grupos de utilizadores, mais carenciados, possam ter algum tipo de auxílio 35 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional que não os afaste do usufruto destes serviços essenciais. Para um horizonte temporal, a regulação tem também funções relevantes na garantia da sustentabilidade e de robustez dos SAS. Desta forma, torna-se necessário que os diferentes objectivos relativos à eficiência económica e às obrigações de serviço público, atrás assinalados, sejam perseguidos com uma visão integrada e de longo prazo e não apenas com objectivos de curto prazo. Por vezes, estes objectivos, procurados pela população e oferecidos pelos políticos, inviabilizam e incompatibilizam os objectivos de longo prazo devido à sua popularidade. Como salientado anteriormente, os SAS não devem ser geridos e racionalizados tendo em conta o imediato e o curto prazo, mas sim os ciclos de vida das infra-estruturas que são muito superiores. Antigamente, noutros serviços de infra-estruturas, como a electricidade e as telecomunicações (fixas), a regulação procurava os mesmos objectivos acima referidos para os SAS. Actualmente, por um sem-número de factores, a finalidade primordial da regulação dessas utilities é a criação de mercado e a promoção da concorrência, onde se salientam o desenvolvimento tecnológico e a dimensão e o valor do próprio negócio, acreditando-se que, desta forma, os interesses dos utilizadores fiquem melhor acautelados, se o mercado funcionar. É de salientar que o último objectivo, isto é, a protecção dos utilizadores na prestação de serviços essenciais, continua igual, embora a forma de a garantir seja distinta. Na verdade, mesmo nos SAS, cada vez mais, a função do regulador é também a de se substituir ao mercado, procurando que existam os mesmos incentivos que ocorrem quando existe concorrência para as suas infra-estruturas monopolistas. Por esta razão, recorre-se, cada vez mais, à regulação por comparação (yardstick competition) e às potencialidades do benchmarking, procurando assim substituir a competição no mercado pela competição por comparação. No casos dos SAS, a grande diferença é a suposição de que a competição por comparação será sempre um instrumento mais light e, portanto, menos eficaz na obtenção desses objectivos. Por conseguinte, a regulação é, actualmente, “amiga” do mercado e não hostil ao mercado, ao contrário do que ocorria no passado. Nos serviços de infra-estruturas de energia (gás e electricidade) e telecomunicações, para além de uma maior substituibilidade (i. e., a electricidade pelo gás) e de um maior número de alternativas de concorrência geradas no mercado (i. e., a telefonia móvel), tornou-se 36 possível o acesso às redes por parte de terceiros (third party access). Aliás, no seguimento da legislação comunitária, e apesar dos resultados práticos limitados, aquém do desejado e esperado, mantendo o incumbente com uma posição dominante, esta liberalização dos mercados gerou incentivos concorrenciais muito benéficos, quer em relação aos preços praticados, quer em relação à qualidade do serviço prestada. Nos SAS, essa mesma liberalização encontra-se em curso em alguns países, designadamente no Reino Unido (i. e., common carriage) e em alguns estados australianos e americanos, embora os resultados, ainda que positivos (fundamentalmente para a vertente industrial), fiquem muito longe dos de outras infra-estruturas. Razões sobretudo de natureza técnica, tais como o custo do transporte associado ao peso da água, a elevada fragmentação destes serviços e inexistência de interconexões, os problemas da qualidade da água, quando existem várias origens e a responsabilidade da respectiva supervisão, inviabilizam o sucesso dessa possibilidade. Além disso, o valor do negócio dos SAS é ainda bastante inferior ao de outras utilities e a sua responsabilidade pertence, na maioria dos países, à administração local, o que aumenta a dificuldade de coordenação. A Figura 3 apresenta o esquema hipotético do mercado concorrencial dos SAS. De qualquer forma, todas as grandes reformas efectuadas nas outras infra-estruturas ocorreram também, em certa medida, nos SAS. Por exemplo, se, no caso da energia ou das telecomunicações, existiu uma preocupação de integração dos mercados ao nível de um conjunto de países ou mesmo globalmente, também nos SAS, ainda que a sua prestação seja efectuada muitas vezes pela administração local, cresceu a importância da sua regulação, supervisão e constituição de parcerias, através de associações ou organizações regionais dos países com carácter mais ou menos voluntário (por ex., na UE, com a publicação da Directiva-Quadro da Água ou, de uma forma voluntária, da ADERASA, na América do Sul). Para a Europa, existe mesmo quem defenda a criação de um regulador ou observatório europeu para a UE (Marques e De Witte, 2010). O desmantelamento dos monopólios, que ocorreu nos serviços de energia e de telecomunicações, não se verificou com a mesma intensidade nos SAS. Ainda assim, o seu poder foi, de certa forma, esbatido com a sua empresarialização e mercantilização, no sentido em que existe um limite para os seus lucros e que a gestão tem de ser transparente e sujeita ao juízo público dos utilizadores e de outros stakeholders. Necessidade e objectivos da regulação Nos SAS, a regulação é também crescentemente contratualizada e concertada com os diferentes stakeholders e não é instituída de forma unilateral. Com vista a uma maior responsabilização de todos os intervenientes, a denominada “democracia procedimental” e o combate das assimetrias de informação têm sido diligenciados também nos SAS, no sentido de uma participação efectiva e de concertação de todos os envolvidos na actividade regulatória, designadamente por intermédio de mecanismos de auto-regulação ou da existência de Conselhos Consultivos. Por fim, é de referir o aumento da regulação “social”, transversal a toda a economia e a todos os serviços de infra-estruturas, incluindo os SAS, da qual se destacam os aspectos relativos ao ambiente, à saúde, às condições de trabalho, entre outras, bem como da regulação transversal da concorrência. Figura 3 Modalidades de competição na indústria da água 37 Modelos de organização no sector 1.3 MODELOS DE ORGANIZAÇÃO NO SECTOR O Os modelos de organização dos SAS não são muito diferentes dos modelos de outras infra-estruturas. A diferença principal reside no facto de os mesmos serem conhecidos, não pelo respectivo formato institucional subjacente, mas, pelos países que foram precursores na sua implementação. Segundo Moreira (1997), os serviços públicos de infra-estruturas podem ser prestados através de entidades com propriedade e gestão privada especialmente reguladas, de concessão (ou outra forma de delegação), a entidades privadas sob controlo público e por intermédio de empresas públicas. mundiais está associado à inexistência de uma entidade gestora dedicada para prestação dos SAS. Neste caso, a gestão dos SAS é realizada em conjunto com outras actividades e de forma directa pelas entidades públicas. Devido à ausência de autonomia no respectivo funcionamento e, quase sempre, insustentabilidade económica, não se considera aqui que este “modelo” de prestação dos SAS seja viável e que configure uma opção de futuro. Nos SAS, a primeira configuração institucional é conhecida por modelo inglês, a segunda por modelo francês e a terceira por modelo de entidade gestora pública, que, não sendo propriamente correspondente a um país está, implicitamente associada ao modelo holandês (Marques, 2005). De entre os aspectos mais relevantes a reter, verifica-se que não existem modelos perfeitos e que nos casos apontados, com as suas virtudes e naturalmente alguns problemas, os mesmos funcionam bem e vigoram há, pelo menos, cerca de duas décadas, o que não deixa de ser significativo. A estabilidade destes modelos permitiu atestar com alguma segurança os seus principais méritos e aspectos menos bem sucedidos. É de salientar também que se encontra associado um determinado grau de privatização aos diferentes modelos, partindo do modelo de empresa pública, onde existe apenas a privatização jurídico-formal dos SAS, até ao modelo inglês, que inclui a privatização material (da gestão e jurídico-formal) dos SAS, passando ainda pelo modelo francês, ao qual corresponde a privatização da gestão (jurídico-formal) dos SAS (Marques e Monteiro, 2004). É igualmente de referir que, entre estes modelos existem outros, que compreendem as características de mais do que um modelo ou que apresentam especificidades quase sempre relativas ao grau de integração vertical e horizontal da sua fileira produtiva e âmbito dos serviços prestados. Além disso, o formato institucional predominante em termos O modelo inglês de organização está intrinsecamente ligado à experiência desenvolvida em Inglaterra e no País de Gales, desde 1989, momento em que ocorreu a privatização material dos SAS. Este modelo baseia-se na prestação dos SAS através de operadores privados que, além de terem a responsabilidade de gerir os sistemas, são também proprietários dos activos, incluindo as infra-estruturas fixas. No entanto, as empresas não deixam de ser controladas e supervisionadas pelo Estado, através de uma entidade reguladora independente. Neste modelo existe uma separação inequívoca entre o Estado, o regulador, os operadores e os utilizadores. A escala da gestão dos SAS pressupõe também uma dimensão supra-municipal (regional), de preferência ao nível da bacia hidrográfica, podendo englobar todo o ciclo da água. O sucesso do modelo inglês está bastante associado ao protagonismo e à eficácia da regulação, bem como à capacidade que, de facto, esta tem de se manter independente, quer relativamente ao governo, quer aos operadores e a outros stakeholders. A regulação, tem como missão defender e proteger os utilizadores (qualidade de serviço e tarifas praticadas) e, simultaneamente, garantir a sustentabilidade dos operadores, procurando criar e substituir-se ao mercado, e adoptando mecanismos de yardstick competition (competição por comparação), que são muito importantes para essa finalidade. Para além da Inglaterra e do País de Gales, outros países têm procurado seguir este modelo de orga- a) Modelo inglês 39 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional nização (por ex., o Chile, a Suécia e a República Checa), ainda que sem a mesma notoriedade. A Figura 4 apresenta o modelo inglês de organização dos SAS. e protege de forma apropriada os diferentes intervenientes quanto às eventuais adversidades. É de realçar que aqui a regulação é, sobretudo, contratual, ainda que, cada vez mais, os países b) Modelo francês que seguem este modelo criem entidades reguladoras dedicadas aos SAS para supervisionar a qualidade de serviço e dirimir no caso de conflitos e de circunstâncias não previstas. De facto, é impossível escrever contratos completos que prevejam todos os cenários futuros. Este problema acentua-se com o aumento da duração do contrato. Aqui, as funções dos diversos intervenientes não são tão claras como no modelo inglês, existindo uma fronteira ténue entre o concedente e o concessionário, no que concerne a determinadas obrigações de serviço público e à respectiva responsabilização, penalizando os utilizadores. Os responsáveis governamentais (presidentes das câmaras) assumem, em geral, um protagonismo excessivo e, por vezes, prejudicial neste modelo. No entanto, os problemas relativos ao modelo francês, associados àqueles da contratação pública e, em particular, das parcerias público-privadas (PPP), que, na prática, conduzem a que os contratos não sejam cumpridos e existam reequilíbrios económico-financeiros, não têm impedido a proliferação deste modelo por todo o mundo. A Figura 5 sistematiza o modelo francês. Figura 4 Modelo inglês de organização dos SAS No modelo francês a gestão dos SAS é atribuída a empresas privadas, através de concursos públicos que, mediante um contrato (em geral, de concessão ou de arrendamento), ficam responsáveis por um conjunto de obrigações e detentoras de um conjunto de direitos. A propriedade das infra-estruturas dos SAS mantémse sempre no sector público. A concorrência no acesso ao mercado (competition for the field) e a qualidade da redacção do contrato constituem os elementos chave para o seu sucesso. Este modelo, com origem em França, no século XVIII, rapidamente se expandiu para outros países mediterrânicos (por ex., Espanha e Portugal), constituindo hoje a modalidade mais comum de introdução do sector privado na gestão dos SAS, em particular quando a respectiva responsabilidade pertence aos municípios. Um número elevado de concorrentes permite a eliminação de rendas e lucros excessivos. Um contrato correctamente redigido efectua uma partilha adequada de riscos, permite uma monitorização eficaz Figura 5 Modelo francês de organização dos SAS 40 Modelos de organização no sector c) Modelo de entidade gestora pública No modelo de entidade gestora pública, a titularidade da gestão e da propriedade pertence ao sector público. O Estado, aos seus diferentes níveis (central, regional ou municipal), autoregula-se por intervenção directa no mercado, maximizando, desta forma, o bem-estar social. Note-se que, ao sucesso deste modelo em al- tentação das políticas de curto prazo, tendem a ser regulados por entidades reguladoras independentes (por ex., Escócia e Austrália). No modelo de entidade gestora pública, a gestão dos SAS é, frequentemente, levada a cabo de forma opaca e pouco transparente, procurando evitar a responsabilização da eventual ineficiência e reduzida produtividade existente (Stern e Holder, 1999). De qualquer forma, o modelo de entidade gestora pública é dominante no contexto mundial. A Figura 6 ilustra o modelo de entidade gesFigura 6 Modelo de organização dos SAS baseado na empresa pública guns países não é alheia a privatização jurídicoformal dos SAS, onde existe uma agilização dos procedimentos através de uma clara fuga para o direito privado. Além disso, este sucesso só tem ocorrido quando não existem falhas do próprio Estado (State failures), o que, geralmente, só acontece nos países mais desenvolvidos. Nestes países, a regulação social e transversal a toda a economia fornece contributos muito relevantes tora pública. É de salientar que este modelo não coincide com o modelo de gestão pública, como salientado anteriormente. Assim, os SAS são ainda prestados, com frequência, por entidades sem formato empresarial, designadamente através de régie directa e régie indirecta. No entanto, julga-se que estes últimos formatos tendem a escassear no futuro. O Quadro 1 apresenta os principais formatos organizacionais dos SAS. Quadro 1 Formatos organizacionais dos SAS Régie Directa Régie Indirecta Empresa Pública / Municipal Empresa Privada Personalidade jurídica Não Não Sim Sim Autonomia administrativa e financeira Não Sim Sim Sim Regras do direito Público Público Público/privado Privado Estabelecimento de tarifas Executivo Municipal Executivo Municipal Assembleia-geral / / Estatutos Contrato Supervisão da qualidade de serviço Executivo Municipal Executivo Municipal Assembleia Municipal Contrato / / Regulador para o seu sucesso, tal como se verifica com a auto-regulação levada a cabo pelas associações do sector. Mesmo nestes, reconhece-se a importância da regulação dos serviços de infraestruturas monopolistas, que, mesmo com exclusiva intervenção pública, em virtude dos seus ciclos de vida muito elevados e da grande d) Outros modelos É de referir que, embora a classificação atrás apresentada seja universalmente aceite no sector da água, existem muitas situações intermédias ou variantes, relativas sobretudo ao modelo francês. Neste modelo, a modalidade de contra41 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional Quadro 2 Participação do sector privado na prestação dos SAS tação pública do tipo PPP é privilegiada, podendo corresponder ao caso tradicional de PPP do tipo puramente contratual, isto é, de contratos de concessão ou de arrendamento (affermage), consoante exista ou não investimento por parte do parceiro privado ou do tipo institucional, a qual corresponde a uma joint-venture para a gestão de um determinado SAS (por ex., em Berlim, na Alemanha). O Quadro 2 apresenta as principais possibilidades da participação do sector privado no sector da água. rizontal, servindo apenas algumas centenas de habitantes em termos médios (por ex., Dinamarca), noutros são caracterizados por uma elevada horizontalidade, servindo várias centenas de milhares de habitantes (por ex., Reino Unido), podendo prestar o serviço de água em conjunto com o serviço de águas residuais (por ex., Grécia) ou separadamente (por ex., Bélgica), ou mesmo incluir ainda outras actividades, como o gás, a electricidade ou outras (por ex., Alemanha). Contrato de gestão Arrendamento Concessão Joint-venture Privatização material Titularidade do serviço Pública Pública Pública Partilhada Privada Propriedade dos activos fixos Pública Pública Pública Partilhada Privada Investimento Público Público Privado Partilhada Privado Assumpção dominante do risco Público Público Privado Partilhada Privado Remuneração do serviço Público Público Privado Partilhada Privado Duração da delegação Curta ou média Média Elevada Elevada ou sem duração Sem duração As especificidades dos diferentes modelos nos vários países/regiões estão também frequentemente associadas ao nível de integração vertical ou horizontal dos serviços prestados pelas entidades gestoras dos SAS. Existem países/regiões onde os SAS se encontram verticalmente integrados, isto é, a “alta” (mercado grossista) que corresponde à captação, produção, tratamento e transporte no abastecimento de água e ao transporte e tratamento de águas residuais no saneamento de águas residuais, e a “baixa” (mercado retalhista) que corresponde à distribuição de água no abastecimento de água e à recolha e drenagem de águas residuais no saneamento de águas residuais, são prestadas pela mesma entidade (por ex., Itália e Suécia) e países/regiões onde isso não acontece (por ex., Portugal e Países Baixos). Além disso, enquanto em certos países os SAS possuem um grau reduzido de integração ho- 42 Por último, é de referir que existem algumas situações atípicas, quer de auto-regulação, por exemplo em sistemas comunitários de fornecimento dos SAS em países subdesenvolvidos, quer de desregulação, em que o mercado funciona de forma aberta e sem regras estabelecidas (por ex., water tankers). É de realçar que, no primeiro caso, de auto-regulação, a regulação é desenvolvida pelos próprios regulados através de mecanismos colectivos apropriados, sobretudo, decisões ou acordos estabelecidos por e entre as organizações associativas ou pelos seus representantes. No segundo caso, a desregulação consiste na abolição da principal legislação, estatutos e outras regras que condicionam o comportamento das entidades gestoras, deixando o mercado funcionar de forma autónoma. Todavia, não é crível que estes dois modelos, que em determinadas circunstâncias podem evidenciar grandes vantagens, ganhem, no futuro, expressão significativa nos SAS. Obrigações de serviço público 1.4 OBRIGAÇÕES DE SERVIÇO PÚBLICO P or serem SIEG, os SAS são fundamentais na promoção da coesão económica e social, quer para o bem-estar das populações, quer pelo papel relevante que desempenham em todos os sectores da economia, como, por exemplo, na indústria (vide COM2003/270). Por conseguinte, dado a sua essência, devem satisfazer um conjunto de requisitos que, como referido, se denominam de obrigações de serviço público ou obrigações de serviço de interesse (económico) geral. A universalidade, a equidade, a acessibilidade, a continuidade e a adaptabilidade, assim como a adopção de regras de boa conduta, de entre as quais sobressaem a transparência da gestão, do sistema tarifário e do financiamento, a participação, os mecanismos de resolução de conflitos e o acesso à informação, que constituem as principais obrigações de serviço público. Das mesmas, faz também parte a qualidade do serviço prestado, que será analisada no capítulo próprio para o efeito (vide capítulo 1.5). A defesa dos utilizadores e a garantia das obrigações de serviço público têm como principais objectivos assegurar que o mercado garanta resultados progressivamente melhores e que as insuficiências, susceptíveis de prejudicar os utilizadores, sejam minimizadas, sendo necessário que exista transparência e lealdade das práticas comerciais. É de salientar que, embora as obrigações de serviço público constituam um elemento essencial do modelo de desenvolvimento social (sobretudo, europeu), as forças de mercado não podem, por si só, assegurar as mesmas nos SAS. É por este motivo que os poderes públicos e, em particular, a regulação, estão profundamente implicados a todos os níveis, na prestação, regulamentação, organização ou, em diferentes graus, no financiamento ou no apoio a esses serviços. As obrigações de serviço público que, por vezes, são mesmo dissonantes entre si, têm consequências relevantes na regulação económica e, por conseguinte, não podem também ser dissociadas desta. Seguidamente tecem-se algumas considerações sobre cada obrigação de serviço público que deve ser garantida nos SAS. a) Universalidade Quando os princípios da universalidade ou do serviço universal são satisfeitos, todos os cidadãos têm acesso aos SAS, em condições de igualdade, no que respeita ao preço e à qualidade do serviço, independentemente da respectiva localização geográfica ou características sociais. Desta forma, o serviço universal compreende toda a área de jurisdição do operador e tem uma atenção particular com certos grupos de utilizadores, nomeadamente os mais carenciados que podem incluir pobres, doentes ou outros utilizadores com necessidades especiais. Para que a garantia desta obrigação de serviço público seja possível, os governos ou os operadores (ou utilizadores) de cada país, podem adoptar as políticas que julguem ser mais adequadas, havendo, pelo menos, três procedimentos distintos para a sua obtenção, que vão desde a existência de um fundo de compensação ou de equilíbrio tarifário, segundo o qual os operadores mais ricos financiam os mais pobres, à subsidiação cruzada, onde diferentes bens, serviços e utilizadores financiam os serviços ou os utilizadores menos rentáveis (por ex., a água subsidia o saneamento e os utilizadores industriais, ou os de maior consumo, subsidiam os utilizadores domésticos ou os que pertencem aos menores escalões de consumo) e à atribuição de subsídios directamente à entidade gestora (quer por transferência directa de montantes pecuniários, quer pelo financiamento dos investimentos). É de referir que o objectivo da instituição de um subsídio é o estabelecimento do preço de um bem ou serviço contíguo ao seu custo marginal, gerando excedentes adicionais, justificando-se a sua atribuição quando os ganhos excedentes são superiores às perdas geradas pela transferência dos custos do operador para os utilizadores. O formato do subsídio pode ser diverso, desde o provimento de transferências ou indemnizações compensatórias ou directamente ao utilizador em montante pecuniário ou em espécie (por ex., volume de água gratuito). Em muitos países, o 43 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional princípio de serviço universal está consagrado na lei. O próprio conceito de serviço universal caracteriza-se por ter uma natureza dinâmica, pelo que evolui ao longo do tempo, não só com o desenvolvimento tecnológico, mas também com o crescimento e a mudança das necessidades dos utilizadores de natureza diversa. b) Equidade A equidade constitui um dos requisitos fundamentais na prestação dos SAS. O tratamento dos utilizadores em condições de igualdade afigura-se como um princípio essencial. Todavia, tendo em conta a satisfação do princípio da universalidade, o mesmo pode, por vezes, não ser respeitado. Desta forma, o operador dos SAS deve pautar-se sempre por uma intervenção objectiva, transparente e não discriminatória e respeitar o princípio da proporcionalidade, sobretudo no que se refere às tarifas e à qualidade de serviço. A presença da equidade no processo regulatório tem como principal objectivo garantir a igualdade de tratamento para todos os utilizadores, designadamente no direito de beneficiar dos SAS em condições que não introduzam discriminações entre categorias semelhantes de utilizadores, o que pode condicionar a obtenção do serviço universal atrás referido. Desta forma, o princípio de equidade, procurando dizimar situações de discriminação, intenta também, de um ponto vista económico, mitigar situações de subsidiação cruzada, uma vez que a mais-valia resultante da respectiva disponibilidade é equivalente para todos os que são abrangidos pelo serviço, independentemente do nível de utilização do mesmo. c) Acessibilidade O controlo de acessibilidade de preços e tarifas determina que um SIEG seja oferecido a um preço módico, de modo a ser acessível a todas as pessoas, contribuindo para a coesão socioeconómica. Em alguns casos, a acessibilidade de preços pode implicar a gratuidade do serviço para alguns tipos de utilizadores e noutros a existência de escalões tarifários, de forma a garantir que as populações de baixos rendimentos ou com necessidades sociais especiais não sejam privados do mesmo através de subsidiação cruzada. A promoção da acessibilidade deve, no entanto, promover o uso eficiente da água, evitando a concessão de subsídio de consumos não essenciais. É da obrigação dos governos assegurar a acessibilidade de preços, criando mecanismos de controlo de preços, tais como a regulação de preços máximos e o nivelamento geográfico dos preços 44 e/ou subsidiando os utilizadores com necessidades especiais. A acessibilidade está claramente ligada à universalidade dos serviços, embora seja normalmente contrária à equidade. d) Continuidade A continuidade relaciona-se com o fornecimento permanente dos SAS, admitindo-se a sua interrupção apenas em situações bem definidas ou com justificações atempadas. Para o abastecimento de água público, a continuidade implica o respectivo fornecimento não só em quantidade apropriada, mas também com a qualidade desejada e pressão adequada. Os utilizadores devem ser indemnizados quando as causas da falta de continuidade forem imputáveis aos operadores ou a terceiros, desde que estes últimos sejam identificados e passíveis de serem responsabilizados. Estas medidas dissuasoras conduzem à redução da interrupção dos serviços e ao consequente aumento da fiabilidade e qualidade dos sistemas. Existem determinados utilizadores que podem ter prioridade sobre os restantes, tais como os hospitais, as escolas e outras instalações públicas, devendo as condições do seu fornecimento ser definidas no regulamento de serviço dos SAS. Em determinadas situações, não se torna necessário impor o requisito da continuidade, uma vez que o fornecimento ininterrupto é do interesse comercial. e) Adaptabilidade A adaptabilidade representa um dos muitos atributos que os SAS, como SIEG, devem apresentar. Esta revela-se na capacidade que os operadores dos SAS evidenciam de progredirem em função da evolução económica, tecnológica e mesmo social do contexto em que os mesmos são fornecidos. Os SAS devem também adaptar-se e responder às necessidades individuais e particulares de cada utilizador, evitando a sua exclusão. f) Transparência A actuação do operador dos SAS deve ser pautada pela transparência. Os processos de decisão devem ser públicos e publicitados. A justificação das tarifas e dos preços praticados deve ser clara, compreensível, justificável e de fácil verificação (por uma terceira entidade, se necessário). Os SAS devem divulgar toda a informação de gestão e exploração dos sistemas e, em particular, toda a informação relativa à qualidade da água fornecida e à qualidade ambiental. A qualidade do serviço prestado deve igualmente ser clara e transparente para os diferentes stakeholders. O acesso à informação (livre e pública) é também fundamental neste contexto. Obrigações de serviço público A transparência revela-se um princípio bastante importante de boa governança, sendo amplamente aceite que se deva garantir a máxima clareza e abertura nas operações dos SAS e dos diferentes stakeholders que com estes intervêm (por ex., governo e reguladores). A transparência da regulação é também extremamente relevante em todo o processo regulatório, quanto mais não seja pelo proteccionismo contra os interesses especiais e pela redução do risco de captura, ganhando influência indevida nos mercados. Além disso, a transparência promove maior confiança nos utilizadores, garante a confiança e satisfaz os investidores, mesmo na ausência de um plano de igualdade, responsabilizando toda a indústria pela gestão e evolução dos serviços. Em termos de qualidade dos SAS, o princípio da transparência encontra-se subjacente à necessidade de clarificação, simplicidade e acessibilidade da regulação, tanto quanto possível na sua elaboração, promulgação, codificação e disseminação. g) Participação As decisões dos operadores (e reguladores) devem, na medida do possível, ser participadas pelos diferentes stakeholders e, em particular, pelos utilizadores. Para além de permitir a obtenção de sugestões, críticas e comentários, que podem beneficiar e ajudar na tomada de decisões, contribui para melhor aceitação e redução da contestação das decisões tomadas. Se os utilizadores (e os regulados) puderem participar no processo de definição das tarifas e não as receber como facto consumado, a sua aceitabilidade será distinta. A participação aumenta ainda a responsabilização (accountability) dos vários stakeholders, co-responsabilizando-os pelas decisões tomadas. A participação pode assumir várias formas, desde a mais formal, com prazos definidos, à informal, por iniciativa de ambas as partes. Podem também existir conselhos consultivos (por ex., Portugal), onde todos os stakeholders podem participar e pronunciar-se relativamente ao processo decisório. h) Resolução de conflitos Os utilizadores e os restantes stakeholders devem ter ao seu dispor mecanismos de resolução de conflitos, aos quais possam apelar sempre que considerarem oportuno. Em geral, os litígios possuem pouca expressão económica e não justificam o recurso à via judicial. O utilizador acaba por desistir da reclamação, em prejuízo próprio e da qualidade do serviço global. As possibilidades de resolução de conflitos devem incluir a mediação, a conciliação e a arbitragem voluntária. Estas diligências podem ser promovidas pelos reguladores, pelas associações do sector, por entidades para-judiciais (por ex., julgados de paz) ou por outras entidades, de preferência independentes dos interesses envolvidos. 45 Regulação da qualidade do serviço 1.5 REGULAÇÃO DA QUALIDADE DO SERVIÇO 1.5.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS Conforme referido, muitas das entidades reguladoras dos SAS não têm funções de regulação económica, possuindo apenas funções de supervisão e de controlo da qualidade do serviço. Existem diferentes razões que contribuem para esta circunstância. A primeira está associada ao facto de a atribuição destes SIEG pertencer à administração local. Desta forma, por um lado, o número elevado de operadores inviabiliza a regulação económica no sentido tradicional, visto que não é possível e desejável a instituição de uma entidade reguladora em cada município e, por outro lado, estas entidades locais gozam de uma autonomia própria, protegida normalmente pela lei fundamental de cada país (Constituição), pelo que a administração de natureza supra-municipal (regional, estadual ou federal) não pode aí intervir, pelo menos, com facilidade. Já a defesa e protecção dos utilizadores, onde se inclui a qualidade do serviço prestado é, quase sempre, uma atribuição da administração supra-municipal referida. A segunda razão prende-se com a ocorrência de participação do sector privado, com a existência frequente de uma regulação contratual, onde os princípios da tarifação e do seu estabelecimento estão definidos no contrato e não podem ser alterados. Já a qualidade do serviço, ainda que algumas normas referentes a esta possam estar aí definidas, não está completamente acautelada, nem todos os seus termos foram sujeitos a concurso, pelo que se justifica a existência de um regulador da qualidade do serviço. Por último, uma terceira razão diz respeito à própria natureza e essência dos SAS. A admissão de um regulador económico pode ter dois significados ou consequências distintas, designadamente a preparação do ‘caminho’ para a privatização e o aumento dos preços e tarifas, para garantir a recuperação total dos custos, o que condiciona a sua implementação, sobretudo pelo poder político (i. e. evitar os preços ‘políticos’, fazendo respeitar os princípios do utilizador-pagador e do poluidor-pagador). Muitas vezes, os próprios reguladores da qualidade do serviço são instituídos como um passo intermédio para a criação de um serviço mais exigente e abrangente, com atribuições relativas à regulação económica dos SAS (por ex., alguns estados australianos). 1.5.2 ABORDAGENS DE REGULAÇÃO A regulação da qualidade do serviço nunca deixa de ser um assunto controverso. A multidimensionalidade da qualidade e a impossibilidade dos utilizadores escolherem outros fornecedores agravam o controlo e a regulação da qualidade do serviço e reforçam a sua necessidade. Não existe uma metodologia única, perfeita e consensual, mas sim várias abordagens, cada uma com as suas virtudes e debilidades. Uma das ambições principais dos operadores, sobretudo quando são adoptadas metodologias baseadas em incentivos de desempenho, consiste na redução dos custos no período regulatório, de forma a aumentar os respectivos lucros. Ora, isto só é possível aumentando a produtividade ou reduzindo a qualidade do serviço por eles prestado. Uma vez que não há competição efectiva (actual ou potencial), os utilizadores poderão ser penalizados com a segunda hipótese, se a mesma não estiver contemplada no processo regulatório. Já quando o estabelecimento dos sistemas tarifários é baseado na regulação por taxa de remuneração, a situação é inversa, mas não menos preocupante, dado que os operadores podem pretender disponibilizar um serviço com uma qualidade muito elevada (práticas de gold plate), efectuando investimentos significativos (sobreinvestimento que pode levar ao efeito de A-J, 47 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional fenómeno este explicado no capítulo 1.6), com vista a obterem uma maior remuneração, o que, presumivelmente, é contrário ao interesse dos utilizadores (e do interesse público). Existem, comummente, duas abordagens na consideração da problemática da regulação da qualidade do serviço, uma directa e outra indirecta [vide Rovizzi e Thompson (1995) e Williamson (2001)]. A forma directa, aplicável apenas quando existe, simultaneamente, regulação económica, consiste na admissão de um parâmetro representativo da qualidade do serviço, inserindo-o nas equações das fórmulas de regulação por incentivos de desempenho e da regulação por taxa de remuneração, penalizando (e premiando) as entidades cujo padrão de qualidade se deteriore (melhore) durante o processo regulatório. Nestas circunstâncias, o índice de qualidade definido integra e pondera os vários elementos representativos da qualidade do serviço e é estabelecida uma relação entre este índice e os preços a praticar na respectiva fórmula, acordando-se o processo de monitorização. Esta metodologia apresenta como vantagens o facto de a respectiva aplicação ser automática, com custos reduzidos de transacção, e de facultar liberdade ao operador para a gestão da qualidade, e da sua interacção com o limite de preços definido. A via indirecta penaliza (ou premeia) pontual e periodicamente as entidades que apresentam falhas ou desempenho de excelência (por ex., falta de resposta a reclamações), em função de padrões mínimos de qualidade definidos. Este processo pode compreender a aplicação de sanções globais (que, em caso extremo, podem conduzir ao resgate ou à revogação da licença ou autorização de laboração) e a indemnização individual dos utilizadores lesados. Caso esta última situação ocorra, não obstante a relevância dos custos de transacção (se o sistema não estiver automatizado) e a dificuldade de retratar alguns dos parâmetros da qualidade do serviço (por ex., interferências em contactos telefónicos), tem a vantagem de indicar informações precisas acerca das falhas de qualidade e da respectiva monitorização. Quando as penalidades não são automáticas e não envolvem directamente os utilizadores, a definição dos montantes a estabelecer e a respectiva distribuição torna-se complexa, a não ser de forma arbitrária, envolvendo também custos de transacção significativos e, muitas vezes, perdendo o sentido de oportunidade de aplicação da respectiva sanção (por ex., por interrupções do abastecimento de água). Complementando a via indirecta, a entidade reguladora pode e deve publicar e divulgar a informação sobre a qualidade do serviço manifestada pelos operadores, e esperar que a pressão dos uti48 lizadores, dos media e dos restantes stakeholders constitua uma via coerciva adequada (regulação sunshine). É de referir também que, metodologias do tipo “carrot and stick” (por ex. Inglaterra e País de Gales) são estabelecidas, premiando os operadores que evidenciam desempenhos acima da média e penalizando os que revelam pior desempenho. É de salientar que a meritocracia referida pode ser instituída e reforçada através da permissão da variação positiva ou negativa do sistema tarifário (i. e., factor X na regulação por limite de preços ou do custo de capital na regulação por taxa de remuneração). 1.5.3 REGULAÇÃO SUNSHINE O processo regulatório conhecido como regulação sunshine firma-se na mediatização, comparação e discussão pública dos resultados do desempenho dos operadores dos SAS. A consciencialização da respectiva actuação é obtida pela pressão dos utilizadores, por intermédio dos seus grupos de defesa e de representação, dos media, da classe política (governo e partidos políticos) e das Organizações não governamentais (ONG). Esta estratégia de “name and shaming” faz com que os operadores, que manifestam um desempenho medíocre, fiquem “embaraçados” e, por conseguinte, tenham propensão a corrigir os desvios evidenciados. Este método não fixa tarifas e o seu poder coercivo é, quase sempre, limitado. Todavia, a exposição e a discussão pública do comportamento do regulado desencadeia efeitos bastante positivos, introduzindo competitividade entre os operadores e conduzindo ao aumento progressivo da performance em todo o sector. Esta ferramenta regulatória pode ser implementada isoladamente ou como complemento de outras técnicas de regulação. Se a regulação sunshine for aplicada isoladamente, o seu poder de actuação torna-se menos abrangente do que quando se aplica como complemento do processo regulatório vigente. De qualquer forma, como referido anteriormente, é, frequentemente, o mecanismo mais fácil e mesmo o mais adequado para implementação, sobretudo porque nos SAS as suas vantagens são acrescidas. Para estes, os padrões da qualidade do serviço são de suprema relevância e a regulação explícita tradicional (regulação económica) é, em algumas circunstâncias, mais difícil de implementar (dado a respectiva municipalidade e, por conseguinte, o número significativo de players existente). A regulação sunshine compreende sempre a aplicação de mecanismos de benchmarking, designadamente através de indicadores de de- Regulação da qualidade do serviço sempenho (ou de outros métodos), em maior ou menor grau. Na apresentação de resultados de desempenho económico, o efeito da regulação sunshine não é muito eficaz (uma vez que a sua melhoria implica uma diminuição dos lucros na mesma relação), embora nos aspectos relacionados com a qualidade do serviço, as consequências sejam, quase sempre, muito positivas. Para que a regulação sunshine seja eficaz, é necessário respeitar os seguintes requisitos: a) a publicitação do desempenho deve envolver não apenas o operador em causa mas outros SAS ou players de outras indústrias afins (utilities); b) os resultados de desempenho devem ser disponibilizados em conjunto com os valores óptimos ou de referência, bem como com eventuais factores de contexto que sejam relevantes; c) a publicitação dos resultados deve ser próxima e acessível aos utilizadores; e d) deve ser promovida uma discussão pública sobre os resultados evidenciados com a presença dos diferentes stakeholders. É de realçar também que, se a melhoria da qualidade do serviço for vertida em aumento de preços e tarifas, os efeitos da regulação sunshine serão pouco ou mesmo nada benéficos. Desta forma, se possível, deve garantir-se que a melhoria da qualidade de serviço não seja conseguida à custa dos utilizadores. De referir também que a implementação da regulação sunshine levanta algumas dificuldades e impõe alguns requisitos, tais como a instituição de um organismo a nível nacional que execute este trabalho, de preferência independente do Estado, dado que os operadores fazem parte, muitas vezes, do próprio Estado. A insuficiência do fornecimento de informações por desconhecimento dos operadores, o receio de que o provimento de informação do desempenho possa comprometer e diminuir a sua imagem e a apreensão em relação às consequências que o conhecimento do respectivo desempenho possa ter, ao nível do seu próprio funcionamento, são outras das dificuldades desta modalidade regulatória. 1.5.4 POTENCIALIDADES DO BENCHMARKING A aplicação de benchmarking na regulação reveste-se de enormes potencialidades, sobretudo nos SAS, onde a competição no mercado é mais difícil de implementar, dado que, apesar de existirem, em geral, vários operadores, estes funcionam em regime de monopólios naturais regionais (locais). Entre as principais vantagens do emprego de benchmarking (Marques, 2006a) destacam-se as seguintes: a) fornecimento de fortes incentivos aos operadores para serem eficientes e inovadores, mitigando os seus custos de operação e as despesas de capital; b) colocação de uma pressão contínua nos SAS, para melhorar a qualidade do serviço; c) garantia de uma recuperação mais “justa” dos custos e dos investimentos de capital e d) incremento da partilha e da transparência da informação, minimizando a assimetria de informação existente entre os diferentes intervenientes (em particular, entre o regulador e os operadores). O uso de benchmarking possui várias vertentes, mormente, a utilização na regulação por comparação (vide capítulo 1.6.3), o emprego na regulação sunshine atrás referida e o papel pró-activo na indústria, o qual compete ao regulador promover. Benchmarking resume-se, essencialmente, à aplicação de métodos comparativos e quantitativos de avaliação e medição do desempenho dos operadores ao longo do tempo (benchmarking métrico), os quais permitem ao regulador um comportamento ablativo de resultados que se incluem nas tomadas de decisão do processo regulatório. As vantagens do emprego de benchmarking nos SAS são tão significativas que em determinados países a fusão e aquisição de operadores é vedada (por ex., no Reino Unido pela Autoridade da Concorrência) para a manutenção de um número suficiente de players que permita a realização de exercícios de benchmarking, mesmo que perdendo ganhos de eficiência devido ao incremento das eficiências de escala e de gama. Noutros países, a reestruturação e reforma do sector da água levou à partição de operadores em vários outros para que, ainda que perdendo economias de escala e de gama, levassem a ganhos de eficiência superiores, devido aos incentivos promovidos pelo benchmarking. Esta situação, entre outros exemplos, ocorreu em Melbourne, na Austrália, em Jacarta, na Indonésia, em Manila, nas Filipinas e na Cidade do México, no México. Não obstante os benefícios do uso desta ferramenta, os governos (e reguladores) devem procurar mitigar os seus problemas, designadamente aqueles associados à comparabilidade dos SAS. Para esse efeito, os governos podem dividir as regiões ou os municípios em mais do que uma zona, sendo servida cada uma por um SAS diferente (perda de horizontalidade), sem comprometer, no entanto, as dimensões mínimas razoáveis (que reflictam economias de escala e de gama) e impor a separação de actividades (perda de verticalidade) e de funções nos SAS (unbundling), ainda que permaneçam na posse de um único operador. Além disso, devem definir e implementar sistemas de informação que possibilitem a partilha de elementos entre os diferentes SAS (por ex. Brasil) e associar a comparação do desempenho 49 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional dos SAS a incentivos e a penalizações, como, inter alia, benefícios fiscais, renovação de contratos, prémios e coimas. Os governos devem ainda condicionar a realização de fusões e aquisições entre os diferentes players ao manifesto interesse público (redução significativa dos sistemas tarifários e/ou manutenção de um número suficiente de players). É de referir que, em qualquer processo regulatório, a implementação de esquemas de benchmarking se reveste sempre de vantagens acrescidas. Um dos principais problemas, já mencionado, que ocorre nos processos regulatórios de mercados monopolistas e oligopolistas, prende-se com a assimetria de informação existente entre o regulador e os operadores. A aplicação de benchmarking promove a partilha de informação e a transparência na respectiva transmissão. A utilização de custos padrão ou o cálculo dos custos de capital, através do CAPM, entre diversos exemplos possíveis, constituem também circunstâncias nas quais a execução de estudos de benchmarking aumenta a credibilidade da sua determinação. Por último, são de salientar as vantagens da aplicação de benchmarking na e para a indústria. É 50 do conhecimento geral que existem inúmeras vantagens no emprego de benchmarking pelos operadores, independentemente do tipo (métrico ou processo). Por conseguinte, compete aos governos e aos reguladores estimular e promover iniciativas de benchmarking, tanto métrico como processo, de modo a incrementar a eficiência e a inovação dos operadores. Embora se afirme com frequência que o papel do processo de benchmarking deva ser limitado para o regulador, pois desenvolve-se no seio das empresas e a um nível de detalhe e de informação que não se compadece com as suas funções, este pode manifestar um comportamento pró-activo no sentido do desenvolvimento das melhores práticas (best practices) no sector respectivo. Ademais, o regulador pode sempre participar com neutralidade nesse exercício e contribuir, de forma significativa, por intermédio de mediação, com os reguladores e empresas de outros sectores para a implementação de benchmarking em actividades comuns nas diferentes indústrias. O regulador deve ainda publicar documentos que traduzam os casos de sucesso no sector e que possam mesmo normalizar os procedimentos que se julguem adequados. Regulação económica 1.6 REGULAÇÃO ECONÓMICA 1.6.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS Pelas razões anteriormente apontadas, a regulação económica assume um papel fundamental em todo o funcionamento dos SAS. Se, de facto, não existe ainda regulação económica explícita em muitos dos SAS, esta ausência não pode deixar de ser encarada como uma falha do próprio Estado (State failure) que deverá ser colmatada no futuro. Independentemente da titularidade dos SAS (pública ou privada) e do formato institucional da sua prestação, a existência de regulação económica é necessária e essencial para um desenvolvimento sustentável e equilibrado dos SAS. É de realçar que o termo regulação económica é aqui colocado em sentido lato, não tendo de ser imposta por uma entidade reguladora criada para esse efeito. Pode, por exemplo, ser instituída através de um contrato ou documento normativo. Deste modo, a regulação económica pode ser definida como o estabelecimento e implementação de um conjunto de regras específicas para a instituição de tarifas e preços ou, mais tecnicamente, a regulação económica procura a maximização do bem-estar social, induzindo os operadores a produzirem aquilo que é desejável, de forma a alcançar resultados óptimos no que concerne aos preços praticados, às quantidades produzidas e aos padrões de qualidade oferecidos. Embora os métodos de regulação económica empregues pelo mundo fora sejam diversos, não existe uma classificação pré-estabelecida. No entanto, estes métodos podem ser divididos em dois grandes grupos, consoante o incentivo que proporcionam aos operadores para a redução dos seus custos. A situação de fornecerem um estímulo reduzido para a mitigação dos seus custos corresponde à regulação por taxa de remuneração, enquanto a situação contrá- ria diz respeito à regulação por incentivos de desempenho. Neste último grupo incluem-se vários métodos, designadamente, a regulação por limite de preços (price cap), a regulação por limite de receitas (revenue cap) ou mesmo a regulação por comparação (yardstick competition) em sentido restrito, dado que este último se insere muitas vezes nos dois primeiros. Os dois grandes grupos referidos podem também ser denominados de regulação baseada em custos (price plus), para o primeiro grupo, e regulação baseada em preços (price based) para o segundo. A ideia principal subjacente é que, no primeiro caso, na estrutura de custos apresentada, está garantida uma determinada remuneração pela prestação do serviço em função dos custos evidenciados, enquanto no segundo caso os preços e as tarifas são estabelecidas à cabeça, correndo a exploração do serviço por conta e risco do operador, podendo daí advir prejuízos ou lucros muito elevados. Na realidade, esta separação não é tão evidente em termos práticos, existindo uma aproximação entre os dois métodos, isto não só porque os métodos de regulação por incentivos de desempenho pressupõem o recebimento de uma remuneração justa e adequada (para a sustentabilidade do operador), mas também porque permitem que alguns custos (receitas) sejam passados para os utilizadores. Nos próximos pontos, estes dois grupos serão analisados em maior detalhe. 1.6.2 REGULAÇÃO POR TAXA DE REMUNERAÇÃO A regulação por taxa de remuneração permite o estabelecimento, por parte da entidade gestora, de uma remuneração sobre os investimentos efectuados aprovada pela entidade reguladora. 51 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional O estabelecimento de preços e tarifas é, na maioria das situações, instituído através deste método, mesmo quando não existe regulação económica explícita dos SAS. Este método, por ter sido desenvolvido nos EUA, já no século XIX, é conhecido como método americano, ainda que aqui existam duas formas distintas de o implementar. Na primeira situação existe um período regulatório estabelecido, findo o qual os preços são reapreciados com base em projecções de custos e da procura. Na segunda solução, os preços são revistos apenas quando é desencadeado um processo de revisão (rate case), que pode ocorrer por iniciativa da empresa regulada ou por qualquer outro stakeholder. Nesta vertente, não há nenhum período regulatório definido. Por vezes, na regulação por taxa de remuneração diz-se que esta é pura ou não pura consoante a remuneração seja revista ou não periodicamente, de modo a que o seu valor corresponda, precisamente, ao definido ex ante, existindo, como tal, partilha de lucros ou recuperação dos custos não previstos. A regulação por taxa de remuneração caracteriza-se por períodos curtos de revisão das tarifas (intervalo ou período de regulação, comummente, de 1 ano), pelo facto de os custos do período subsequente se basearem no período anterior, pela fixação, por parte da entidade reguladora, do nível dos preços e da sua estrutura, e por apresentar um risco relativamente baixo para a entidade gestora. O método de regulação por taxa de remuneração inclui os passos que se seguem. Primeiro, os investimentos a efectuar e os activos a remunerar (rate base) são definidos, em seguida, os custos do serviço a regular são aprovados (revistos), estipulando-se uma taxa de remuneração julgada adequada (fair return). Por último, os preços e a respectiva estrutura são determinados, de forma a gerar receitas que cubram os custos e que permitam a remuneração definida. A expressão que traduz este método de regulação corresponde a: As entidades reguladas neste método de regulação não têm incentivos para a redução de custos. A remuneração é, a priori, independente do respectivo desempenho, ainda que no caso de menor (melhor) desempenho possam existir sanções (prémios). A eliminação de desperdícios e os consequentes ganhos de eficiência, bem como a inovação, ficam inibidos. O único incentivo para qualquer mitigação consiste nos ganhos que pudessem ocorrer entre os períodos de revisão das tarifas, nos quais o sistema tarifário está fixado (residual claimant), o que não é relevante, pois os períodos são, geralmente, reduzidos. Para um SAS é indiferente, por exemplo, apresentar 15 ou 50% de perdas de água. A sua remuneração não depende do desempenho. Nesta expressão: Pi corresponde ao preço unitário de venda de um determinado serviço i; qi diz respeito à quantidade prevista de venda das unidades do serviço i; Cj representa a parcela dos custos j a suportar pela empresa; r corresponde à remuneração dos investimentos e/ou dos activos existentes; V evidencia o valor dos investimentos e dos activos. Os momentos chave na regulação por taxa de remuneração constituem a fixação do custo de capital e do montante dos investimentos e dos activos a remunerar. 52 Na regulação por taxa de remuneração, a grande vantagem consiste no estabelecimento, através de uma forma muito simples, de uma relação directa entre os custos, os preços e os lucros subsequentes da entidade regulada, durante o período regulatório. O regulador, de facto, define efectivamente os preços e não uma taxa de remuneração e, deste modo, facilita a definição de sistemas tarifários que jogam com as elasticidades do mercado e que, por isso, possibilitam e incentivam a realização de objectivos não económicos e, em particular, a subsidiação cruzada (cross subsidization) entre os utilizadores ou entre os bens (serviços) fornecidos. Outro problema associado a este método de regulação ocorre quando a taxa de remuneração é superior ao custo de capital, podendo existir sobreinvestimento. Mediante este cenário, a realização dos investimentos com recurso a capital alheio compensa e, por conseguinte, o operador procura aumentar os investimentos obtendo um lucro adicional por cada unidade de capital suplementar despendida. Este fenómeno, denominado de efeito de Averch e Johnson (“efeitos de A-J”), é particularmente sério numa indústria muito próxima da indústria de construção e onde práticas de “gold plate”, dado a sua importância e visibilidade, são bem aceites pelos responsáveis governamentais. Em sentido inverso, se a taxa de remuneração for inferior ao custo de capital, poderá ocorrer subinvestimento. Regulação económica Do mesmo modo, se a entidade regulada efectuar mais do que um serviço, onde nem todos sejam regulados de igual forma, poderá ocorrer imputação de custos (parcela dos custos comuns) do mercado competitivo para o mercado regulado ou o contrário, isto é, as receitas poderão ser desviadas (cost padding). Na regulação por taxa de remuneração e, sobretudo, como resultado da informação assimétrica existente, o regulador requer uma quantidade de informação muito elevada com o intuito de conhecer a repartição integral de custos por actividade (full distributed costs), os activos existentes, os investimentos futuros necessários e uma previsão credível da procura. Esta realidade conduz a um custo elevado de regulação, tanto para o regulador como para o regulado. Relativamente à qualidade do serviço, e embora o método de regulação por taxa de remuneração não esteja associado, à partida, a incentivos de desempenho, as entidades reguladas, tendo em conta o efeito de A-J, têm todo o interesse em efectuar investimentos para a melhoria da qualidade do serviço e da qualidade ambiental. Por conseguinte, deve existir alguma cautela para condicionar a prestação do serviço com uma qualidade desproporcionada. De qualquer forma, se a taxa de remuneração for reduzida ou se a qualidade da gestão do serviço não for a mais adequada, poderá também ocorrer um decréscimo da qualidade do serviço prestado. Por último, é de referir que, em função do valor da taxa de remuneração adoptado e da respectiva relação com o custo de capital, poder-se-ão verificar situações de excesso ou de defeito do indicador de endividamento (de alavancagem) e, portanto, serem salientadas ineficiências do ponto de vista financeiro no que concerne à estrutura do capital da entidade regulada. 1.6.3 REGULAÇÃO POR INCENTIVOS DE DESEMPENHO A regulação por incentivos de desempenho introduz a componente de produtividade associada à redução dos custos como elemento principal do método regulatório. Este modelo regulatório compreende, como sub-processos regulatórios, a regulação por limite de preços, a regulação por limite de receitas e a regulação por comparação. Embora conceptualmente sejam bastante antigas, estas metodologias só começaram a ser aplicadas no mundo empírico nos anos 80 do século passado, designadamente na regulação do sector das telecomunicações (British Telecom), no Reino Unido (Littlechild, 1983). No sector da água, a primeira aplicação remonta ao ano de 1989, também no Reino Unido. Nos modelos de regulação económica podem também ser previstos mecanismos de partilha de lucros (receitas) ou de custos, entre os utilizadores e a entidade regulada, respeitantes a factores exógenos, aproximando-os da regulação por taxa de remuneração. Neste caso serão também denominados de métodos não puros. A regulação por incentivos de desempenho, e em particular a regulação por limite de preços, têm ganho muita popularidade nos últimos anos e têm sido aplicadas nos SAS, numa multiplicidade de países. É de salientar ainda que, inicialmente e sobretudo no Reino Unido, se admitiam períodos regulatórios muito longos de revisão de tarifas, mas os ganhos de produtividade, a imprevisibilidade do funcionamento dos mercados, a ineficácia da liberalização até à data (predomínio do incumbente) e o crescimento do protagonismo da regulação social provaram que tal não seria possível nem desejável a) Regulação por limite de preços A regulação por limite de preços (price cap regulation) consiste no estabelecimento de um tecto máximo médio (cap) para os preços do serviço ou bem fornecido durante o período regulatório. Desta forma, as entidades reguladas retêm os lucros correspondentes à redução de custos que ocorra durante esse período regulatório, para além dos ganhos de produtividade previstos. Deste modo, as entidades reguladas são incentivadas a aumentar a eficiência (estática) e a inovação, com vista à redução de custos e consequente aumento da respectiva remuneração. No final de cada período regulatório, os benefícios da diminuição de custos são transferidos para os utilizadores através da redução dos preços do período seguinte. Este método regulatório é composto por duas parcelas (IPC-X), em que uma corresponde ao Índice de Preços no Consumidor (IPC) e a outra à variação da produtividade esperada, que se prevê que o operador venha a obter no período regulatório (factor X). Este factor, conquanto positivo em geral, pode ser negativo, 53 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional dependendo do nível de investimento futuro requerido. A fórmula de ajustamento dos preços é a seguinte: Nesta equação: Pi,t corresponde ao preço unitário máximo do serviço i no período t; Pi,t-1 representa o preço unitário máximo do serviço i no período t-1; Ii,t,t-1 diz respeito ao Índice de Preços no Consumidor associado ao fornecimento do serviço i, expresso em percentagem, entre o período t e t-1; Xi,t,t-1 representa um factor, em percentagem, dos ganhos de produtividade esperados entre o período t e t-1 na prestação do serviço i. À fórmula anterior pode ser adicionado um coeficiente de ajuste, positivo ou negativo, que permite contemplar situações extraordinárias, A regulação por limite de preços caracterizase por um intervalo longo entre a revisão de tarifas (entre 3 e 10 anos), pela realização de projecções dos custos futuros e dos ganhos de eficiência estimados e por um risco relativamente elevado. Nesta regulação, apesar de os preços máximos estarem definidos à cabeça, o operador tem toda a liberdade para conduzir a respectiva gestão. A oscilação imprevisível das variáveis exógenas que afectam os custos, quando não contemplada na fórmula supracitada, conduz ao aumento dos riscos, agravado pelo aumento do período regulatório. A Figura 7 evidencia o funcionamento deste modelo regulatório para um intervalo regulatório de 4 anos. Em cada período regulatório os lucros do operador crescem de acordo com o avanço no tempo. No final de cada período os lucros são reduzidos a um valor definido, passando os benefícios dos ganhos de produtividade para os utilizadores, mas apenas para o período seguinte. À medida que o operador se for tornando mais eficiente, o valor máximo dos lucros será menor, isto é, os ganhos de eficiência expectáveis serão menores, assim como Figura 7 Incentivos e transferência para os utilizadores na regulação por limite de preços imprevisíveis ou que possam alterar, de forma considerável, o desempenho da entidade regulada como, por exemplo, mudanças na conjuntura macroeconómica, crises energéticas, factores climatéricos insólitos ou, alternativamente, a concretização de objectivos específicos, como a melhoria da qualidade da água ou da fiabilidade do serviço (por ex., como sucede no Reino Unido). 54 as transferências para os utilizadores, uma vez que o operador se aproxima da fronteira eficiente (best practices). A regulação por limite de preços, quando comparada com a regulação por taxa de remuneração, apresenta um risco muito superior, que é suportado pelo operador. Esta situação conduz a alguma instabilidade dos Regulação económica operadores, aumentando o respectivo custo de capital. Uma vez que os custos foram definidos para um intervalo regulatório extenso, os pressupostos assumidos e os eventuais enviesamentos têm consequências mais graves. Para os utilizadores, o cenário é precisamente o oposto, existindo uma maior estabilidade dos preços, pelo menos, durante o período regulatório. Uma das maiores dificuldades e, simultaneamente, uma questão controversa na aplicação deste método regulatório, consiste na definição do factor X, em particular, do seu valor inicial. Teoricamente, o factor X compreende duas parcelas distintas: uma específica para o sector a regular (ganhos de eficiência obtidos por mudanças tecnológicas no sector) e outra relativa à entidade em análise (eficiência estática e alocativa de inputs e outputs, isto é, correcção das ineficiências existentes, aproximando-se das mais eficientes). Por conseguinte, na determinação do factor X recorre-se, cada vez mais, à ferramenta do benchmarking, sobretudo na determinação da parcela de eficiência relativa ao operador regulado individualmente. Para além da dificuldade da estimativa do montante que cada operador ineficiente pode recuperar no período regulatório, as entidades reguladas ineficientes discordam da avaliação efectuada, argumentando com as particularidades do ambiente operacional onde actuam e que não controlam. É de realçar que existem, de facto, factores não controláveis e que devem ser tidos em consideração, começando pela variação da escala (do consumo) das entidades reguladas, que pode conduzir a (des) economias. A definição de um único factor X ou de vários é outra questão pertinente com vantagens e desvantagens. A parcela IPC adoptada pode (e deve) também ser alvo de alguma discussão. A adopção de um índice nacional, que reflicta todos os preços, pode não ser adequado para os SAS, cuja estrutura de custos não coincida com a que está na base do cálculo do IPC. Neste caso particular, existem parcelas cuja variação dos preços tem efeitos relevantes, tais como a variação dos custos dos serviços em “alta” ou da energia. A periodicidade da revisão do processo regulatório constitui outro aspecto a registar. Em geral, o intervalo regulatório é longo, situando-se entre os 3 e os 10 anos, embora não existam impedimentos à respectiva interrupção, podendo esta ocorrer por diversas razões (custos ou lucros imprevistos). Esta possibilidade, que tem como aspecto positivo a redução do risco envolvido, desincentiva o esforço para o aumento da eficiência e da inovação, reduzindo o fosso entre a regulação por limite de preços e a regulação por taxa de remuneração. É de salientar também que o comportamento dos operadores regulados (regulatory gambling) é influenciado pela fase do período regulatório, demonstrando lucros na fase final menores do que os da fase inicial. Esta conduta, associada ao denominado ratchet effect, reflecte que os regulados são influenciados pela expectativa de que os preços do próximo período regulatório se baseiem nos últimos elementos conhecidos e, portanto, possam induzir a existência de menores margens para ganhos de eficiência e de inovação no período futuro. Na realidade, a grande vantagem da regulação por limite de preços consiste no estímulo que fornece aos operadores para a redução dos custos, o que pode ser alcançado através do incremento da produtividade (eficiência estática e de inovação). Porém, neste método os preços podem não estar alinhados com os custos, o que se traduz em ineficiência alocativa. Estas distorções dos preços podem ser penalizantes para algumas actividades e utilizadores. A qualidade do serviço é outra das matérias que merece a maior atenção neste método. Como os preços máximos estão definidos à cabeça, os lucros do operador são tanto maiores quanto maior for a redução de custos. Se os padrões de qualidade do serviço não estiverem bem acautelados, o operador poderá procurar mitigar custos através de uma redução da qualidade do serviço. Como se verificou no último capítulo, existem várias formas de integração desta problemática da qualidade do serviço, ainda que todas elas tenham as suas dificuldades. Na regulação por limite de preços, as obrigações de serviço público devem ficar bem definidas, uma vez que os operadores apenas têm interesse em servir os utilizadores mais rentáveis, podendo pôr em causa a universalidade e a equidade dos SAS ou mesmo subsidiar, através das parcelas mais monopolistas, as actividades mais concorrenciais, através, por exemplo, de subsidiação cruzada (por ex. fenómenos do cream-skimming ou do bypass). Em alguns países, os SAS dos utilizadores industriais têm tarifários mais reduzidos que os utilizadores domésticos. Neste sentido, a definição de preços mínimos (floors), e não apenas de máximos (ceilings), poderá ser uma opção adequada. Nestes cenários, o papel do regulador é decisivo, para controlar situações de abuso. Para a sustentabilidade económica do operador, a regulação por limite de preços deve 55 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional garantir uma remuneração adequada dos capitais investidos. Assim, na definição dos custos para o novo período regulatório, devem ser consideradas todas as despesas, tanto as de operação como as de capital e a respectiva interacção, incluindo de longo prazo, e uma remuneração adequada das entidades gestoras. É conveniente realçar que a regulação por limite de preços apresenta um risco elevado, o que se pode traduzir nalgum afastamento de potenciais investidores. A complexidade e os requisitos de todo o processo regulatório, que garantem a independência e a fiabilidade do acto regulatório, conduzem a custos significativos, quer para o regulador, quer para os operadores que, inevitavelmente, mais tarde ou mais cedo, serão pagos pelos utilizadores. O investimento a efectuar durante o período regulatório é, em geral, insuficiente. O seu nível é definido e proposto pelo operador e aprovado pelo regulador. Ainda que na fase de negociação e de revisão do processo regulatório os regulados possam pretender manifestar e propor níveis de investimento muito elevados, esta intenção não é inteiramente verdadeira e raramente produz efeitos reais. No final, os investimentos a efectuar nos serviços de infra-estruturas são, normalmente, aquém dos necessários. Os investimentos têm de ser pagos e, devido às respectivas características, o risco aumenta, o que pode onerar substancialmente as tarifas. O regulador, por outro lado, é complacente, em consciência, dado que os custos acrescidos, em virtude dos investimentos avultados, seriam suportados pelos utilizadores, o que traria agitação e instabilidade regulatória e adiaria o problema. Esta conjuntura, que se repete de forma sistemática, constitui um dos grandes problemas e desafios da regulação por limite de preços que se faz sentir, sobretudo, a médio e longo prazo. b) Regulação por limite de receitas Na regulação por limite de receitas, os operadores estão limitados a um valor médio máximo para as suas receitas. O tecto das receitas é definido em função de um Índice de Preços no Consumidor (i. e., IPC) e de um factor que traduz a variação de produtividade (X). Assim, em simultâneo com a regulação por limite de preços, o regulado é incentivado a aumentar a sua eficiência e a inovação mais do que o previsto, reduzindo os seus custos, para cumprir os objectivos estabelecidos e aumentar a sua margem de lucro. No final do período 56 regulatório, os ganhos alcançados são transferidos para os utilizadores. A regulação por limite de receitas, apesar de semelhante à regulação por limite de preços no escopo principal relativo ao incentivo à produtividade fornecido, apresenta algumas diferenças. Neste método, a entidade regulada possui, em geral, maior liberdade na definição das novas tarifas, uma vez que não há controlo sobre os preços parcelares, nem sobre a respectiva estrutura, mas, sim, sobre o total das receitas, podendo uns serviços subsidiarem outros (facilitando o cross subsidization). Além disso, como as receitas dependem directamente da procura no mercado, estando sujeitas aos preços dos serviços e às unidades de serviço fornecidas, não estimulam o consumo dos serviços ou bens fornecidos, sendo particularmente vocacionadas para sectores onde as políticas de gestão e racionalização de procura (demand side management) são relevantes, como acontece no sector da água e da energia. Por último, é de referir que a regulação por limite de receitas também é benéfica quando a parcela dos custos fixos é elevada, não estando as suas receitas muito dependentes da flutuação de consumos. c) Regulação por comparação A regulação por comparação baseia-se na avaliação dos resultados do desempenho da entidade regulada em comparação com os de outras entidades do mesmo sector (isto é, a aplicação de benchmarking) e nas respectivas consequências financeiras. O princípio chave deste método de regulação consiste em redireccionar o incentivo da melhoria da eficiência de uma determinada entidade, através da informação extraída junto de outras entidades, constituindo, simultaneamente, uma forma artificial de competição entre as entidades reguladas. Embora a aplicação da regulação por comparação se possa processar de uma forma pura, isto é, a regulação de uma certa tarifa é calculada pela média (ou em função das best practices) de todas as tarifas (custos), por exemplo, é na determinação do factor X da regulação por limite de preços ou de receitas que esta assume uma grande relevância. A regulação por comparação destina-se, sobretudo, a sectores onde os mecanismos concorrenciais estão limitados e a informação assimétrica é preponderante, como a que se refere aos SAS. Este método regulatório tem Regulação económica muitas potencialidades, fornecendo fortes incentivos às entidades gestoras para serem eficientes e inovadoras, e mitigando os respectivos custos de operação e custos de capital. Além disso, melhora a partilha e a transparência da informação, minimizando a assimetria da informação presente entre os diferentes intervenientes. No entanto, este método regulatório não deixa de ser bastante criticado pelas dificuldades inerentes ao cumprimento dos pressupostos da respectiva aplicação e das técnicas adoptadas (por ex., a qualidade e a quantidade de informação, discricionariedade e heterogeneidade), à hipótese de conluio e de manipulação comportamental entre as entidades gestoras, e à capacidade de compromisso que o regulador é capaz de assumir perante aquelas. Para ultrapassar parte da complexidade das diferentes metodologias disponíveis e para fortalecer as tomadas de decisão, os reguladores aplicam, por vezes, mais do que uma técnica de benchmarking para dar robustez aos resultados. A Figura 8 apresenta as principais técnicas de benchmarking aplicadas na como não fronteira ou fronteira, em função de pressuporem, ou não, que as organizações sejam tecnicamente eficientes ou, de outra forma, que os benchmarks assentem nas aproximações médias ou nas melhores práticas (best practices) das amostras. A DEA e as SFA constituem métodos fronteira, enquanto os números índices (à excepção do índice de produtividade de Malmquist) e os modelos de regressão (por ex., OLS) são não fronteira. Mesmo utilizando várias técnicas, as entidades reguladas contestam os resultados e as decisões adoptadas, argumentando que as técnicas disponíveis supracitadas são subjectivas e discricionárias, possibilitando a inconsistência e o oportunismo do regulador, o que enfraquece os incentivos e aumenta o custo de capital (CAPEX), a heterogeneidade (“idiosyncratic shocks”), que é impossível de ser completamente eliminada (seja qual for o modelo adoptado), contribuindo para que o processo regulatório seja discricionário (comparar “apples with oranges”), que nem todos os tipos de custo são conhecidos ou adequadamente contemplados e integrados na análise (por ex., o parâmetro qualidade não é Figura 8 Metodologias de benchmarking regulação económica. Estas são classificadas como paramétricas e não paramétricas, consoante admitam, ou não, uma forma funcional, definida a priori, para a tecnologia de produção, que representa o processo produtivo. As técnicas paramétricas possibilitam a medição do erro, mas introduzem a dificuldade adicional de conhecer a especificação associada ao comportamento admitido. Dos métodos mais aplicados, a data envelopment analysis (DEA) e os números índices são considerados métodos não paramétricos, ao passo que as fronteiras estocásticas (SFA) e os modelos de regressão (por ex., OLS) são paramétricos. Os números índices servem para determinar a produtividade total dos factores (total factor productivity – TFP), que mede a variação da produtividade ao longo do tempo. A TFP é muito relevante na determinação do factor X quando se adoptam métodos de regulação por incentivos de desempenho. Os métodos paramétricos ou não paramétricos podem ainda ser classificados fácil de inserir), que as diferenças entre os custos dos diferentes pares tanto podem ser imputadas à ineficiência como a erros intrínsecos à aplicação das próprias técnicas e que a determinação do parâmetro X, fundada apenas nas diferenças de eficiência verificadas entre as entidades reguladas, pode não ser adequada. d) Outros métodos de regulação A regulação económica apoia-se frequentemente em mais do que um dos métodos atrás referidos. Estes métodos, denominados híbridos, referemse à situação em que o método aplicado apresenta características de vários métodos. Um dos métodos híbridos mais aplicados consiste no de escala deslizante (sliding scale), onde existe um esquema de partilha de lucros (custos), permitindo ao regulado o aumento da taxa de remunera57 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional ção acima do valor pré-estabelecido, no caso de os preços serem simultaneamente reduzidos. Figura 9 Comparação entre a regulação por taxa de remuneração e por limite de preços 58 A Figura 9 apresenta o contexto de aplicação dos métodos de regulação económica. PARTE 2 CASOS DE ESTUDO DE REGULAÇÃO Austrália 2.1 AUSTRÁLIA 2.1.1 ANTECEDENTES HISTÓRICOS A Austrália, oficialmente a Comunidade da Austrália, é uma democracia constitucional fundada na divisão federal dos poderes. A forma governamental que caracteriza o país é uma monarquia constitucional com um sistema parlamentar, cujo monarca se encontra representado, a nível federal, pelo governadorgeral e pelos governadores a nível estadual. O poder legislativo é desempenhado pelo Parlamento da Comunidade, constituído pelo monarca (governador-geral), pelo Senado e pela Câmara dos Representantes. Por sua vez, o poder executivo é exercido pelo Conselho Executivo Federal (o governador-geral aconselhado pelos Conselheiros Executivos que, na prática, são o primeiro-ministro e os ministros). O país, com uma população de cerca de 21 milhões de habitantes dispersos por 7,7 milhões de km2 de área, encontra-se organizado administrativamente em seis estados, dois territórios principais e outros territórios secundários. Dado a sua independência e autonomia, cada estado e território apresenta a sua própria legislação. A Austrália é o continente habitado mais seco do mundo, verificando-se uma grande variação da pluviosidade a nível regional, sendo frequentes os cenários de seca. Com estas pressões no ambiente e, por conseguinte, na economia, em 2004 foi assinado, pelo Governo australiano e por todos os governos estaduais e territoriais, o Acordo Intergovernamental da Iniciativa Nacional da Água (Intergovernmental Agreement on a National Water Initiative - NWI) com o objectivo de gerir melhor os escassos e valiosos recursos hídricos da Austrália. Desde o início dos anos 90, os SAS na Austrália têm sofrido alterações relevantes. A desverticalização (unbundling), a regulação independente, o princípio de recuperação total de custos e o aumento de transparência foram algumas das transformações e dos princípios introduzidos na sua reestruturação. As reformas desenvolvidas têm vindo a mostrar-se grandes impulsionadoras do aumento da eficiência e da eficácia, da qualidade do serviço prestado e do fortalecimento da coesão económica e social. Os passos seguintes visam, sobretudo, uma melhoria da eficiência económica, uma ainda maior sustentabilidade ambiental e a extensão dos princípios aplicados nas áreas metropolitanas e de maior população às zonas rurais. A reforma de 1994, desencadeada pelo Conselho dos Governos Australianos (Council of Australian Governments), estabeleceu uma linha estratégica para o sector da água, na qual os elementos-chave se baseavam na reforma institucional, na gestão dos recursos hídricos ao nível da bacia hidrográfica, na alocação optimizada dos recursos hídricos, na sustentabilidade ecológica dos novos empreendimentos, na protecção dos recursos hídricos subterrâneos e na recuperação integral de custos. Um dos aspectos mais marcantes das reformas ocorridas nos sectores de infra-estruturas na Austrália, que evidenciam características monopolistas e que incluem, naturalmente, os SAS, consistiu na separação do Estado operador do Estado regulador, impondo que todos os estados e territórios fossem dotados de entidades reguladoras independentes, qualquer que fosse a titularidade dos activos e da gestão dos serviços. Apesar da referida autonomia legal por parte dos estados e territórios, na Austrália existe diversa regulamentação federal, como as Normas para a Qualidade da Água para Consumo Humano (Australian Drinking Water Guidelines – ADWG), estabelecidas em 2004 pelo Concelho de Investigação Médica e da Saúde (Health and 61 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional Medical Research Council) em colaboração com o Conselho Ministerial de Gestão dos Recursos Hídricos. As ADWG incorporam os princípios mínimos e recomendados para gestão do serviço de água e promovem junto da comunidade australiana e, em particular dos operadores, a orientação relativa ao que constitui um serviço de água de qualidade elevada. Recentemente, o governo federal aprovou a Lei da Água de 2007 (Water Act 2007), que focaliza a gestão dos recursos hídricos à escala da bacia hidrográfica de Murray-Darling e faz referência a diversas matérias do interesse nacional em relação ao sector da água. Neste âmbito, a lei congrega a criação de um organismo independente para a gestão da bacia hidrográfica de Murray-Darling, com funções e poderes necessários que visam a gestão integrada e sustentada dos recursos hídricos. A Constituição australiana determina que a gestão dos SAS se encontra sob o poder estadual e territorial. Neste âmbito, o sector revela-se consideravelmente complexo, coexistindo muitas leis e agências (aproximadamente 800) com responsabilidades repartidas sobre a gestão da água, desde a escala federal à escala municipal. O panorama de Vitória não é muito distinto do de outros estados e territórios da Austrália, no seguimento das políticas e estratégias definidas pelo governo federal na última década. É de referir, no entanto, que aqui as mudanças foram mais significativas e, de certa forma, pioneiras, mantendo o mesmo ou um maior grau de sucesso de outras regiões australianas. A indústria da água no estado de Vitória encontra-se muito regulamentada, existindo diversos intervenientes com diferentes atribuições. Existe uma entidade reguladora dedicada, embora multissectorial, e vários organismos governamentais que detêm a responsabilidade de seguir políticas e elaborar documentos que impõem obrigações e requisitos aos operadores. Cada organismo desempenha funções importantes, influenciando ou regulando diferentes aspectos do sector da água, de que a entidade reguladora necessita para cimentar a sua atribuição de supervisionar a qualidade do serviço, garantir as obrigações de serviço público e regular economicamente o sector. O mercado da água no estado de Vitória compreende os SAS e encontra-se estruturado em entidades metropolitanas, regionais e rurais. Os seus operadores divergem de forma considerável em termos de tamanho, serviços que prestam e ambiente no qual desenvolvem as suas actividades. Os recursos hídricos são escassos e a origem de água para abastecimento público é maioritariamente superficial. 62 2.1.2 ENQUADRAMENTO LEGAL E INSTITUCIONAL 2.1.2.1 Responsabilidades A responsabilidade sobre o sector da água na Austrália encontra-se associada, para além das várias entidades de âmbito estadual, onde se inserem as entidades reguladoras, a nível federal, ao Departamento Governamental do Ambiente, Água, Património e Artes (Department of the Environment, Water, Heritage and the Arts - DEWHA), ao Conselho Nacional da Concorrência (National Competition Council – NCC), à Comissão do Consumo e da Concorrência Australiana (Australian Competition and Consumer Commission – ACCC), ao Conselho dos Governos Australianos (Council of Australian Governments – CoAG), à Autoridade Independente da Bacia Hidrográfica Murray-Darling (Murray-Darling Basin Authority), à Associação de Serviços de Água da Austrália (Water Services Association of Australia – WSAA), à Associação de Água Australiana (Australian Water Association – AWA) e à Comissão Nacional de Água (National Water Commission – NWC). O papel do DEWHA prende-se, primordialmente, com a protecção do ambiente a nível nacional, onde se insere a gestão adequada e sustentada dos recursos hídricos, aconselhando o Governo australiano neste domínio. O NCC foi estabelecido em 1995, reunindo todos os governos australianos, para desempenhar funções consultivas com o objectivo de supervisionar a implementação da Política Nacional da Concorrência (National Competition Policy). A sua implementação constitui, no entanto, atribuição dos vários governos. Embora este órgão seja financiado pelo governo federal (Commonwealth Government), o mesmo responde perante todos os estados e territórios da Austrália, através do CoAG. Enquanto organismo estatutário, o NCC é independente do poder executivo dos governos. A ACCC, criada em 1995, no formato de entidade reguladora independente, promove a concorrência e a equidade na economia de mercado, de modo a beneficiar os utilizadores, o mercado e a comunidade. A ACCC regula ainda os serviços de infra-estruturas de natureza supra-estadual, cuja responsabilidade primordial é assegurar que os indivíduos e os mercados cumpram as normas e a legislação relativas à concorrência e à defesa dos utilizadores e que não haja discriminação Austrália entre estados e territórios. A ACCC tem também funções relevantes na arbitragem e resolução de conflitos e na educação da sociedade para as temáticas da concorrência e do consumo. O CoAG é um fórum intergovernamental onde se discutem todas as matérias de interesse comum, incluindo as relativas à gestão da água. O CoAG tem como objectivo a salvaguarda da segurança no que concerne aos direitos de acesso, assegurando a melhor utilização da água, através da sua alocação entre estados e o desenvolvimento de mercados de água interestaduais. A Autoridade Independente da Bacia Hidrográfica Murray-Darling possui as funções e os poderes necessários para assegurar a gestão dos recursos hídricos de um modo integrado e sustentável. A WSAA constitui a principal associação dos operadores do sector da água urbana na Austrália. As três dezenas de membros associados representam o fornecimento dos SAS a cerca de 15 milhões de australianos e a um vasto número de indústrias. A WSAA, criada em 1995, tem como objectivo incentivar o desenvolvimento e a cooperação no sector da água, de modo a aumentar o desempenho e a produtividade e as- segurar o enquadramento regulatório adequado aos interesses da comunidade. A AWA, criada em 1961, é uma associação de profissionais do sector da água, independente e sem fins lucrativos. A AWA é, de facto, a maior e mais abrangente associação, representando organizações e indivíduos dispersos por todo o país. A AWA contribui para o progresso do sector, juntando, no mesmo “espaço”, conhecimentos e ideias de pessoas envolvidas na investigação, regulação, consultoria, gestão e operação das infra-estruturas hidráulicas e dos SAS. O papel principal da NWC consiste em ajudar as autoridades governamentais na condução da reforma nacional no sector da água e, também, da NWI no território australiano. A NWC é ainda responsável pelo aconselhamento ao governo federal e aos governos estatais e territoriais em todos os assuntos relativos ao sector da água. Com grande preponderância no sector da água australiano, cada estado e território possui uma entidade reguladora (independente e multissectorial) dedicada, com funções de regulação económica, de qualidade do serviço e de obrigações de serviço público. No Quadro 3 apresenta-se Quadro 3 Operadores e principais organismos com funções regulatórias na Austrália Estado Gestão dos recursos hídricos Serviços de água e águas residuais Regulação ambiental Regulação económica Queensland Departamento de Recursos Naturais e Minas Governo Local Agência de Protecção Ambiental Autoridade da Concorrência de Queensland Departamento do Ambiente e Conservação Tribunal Regulatório Independente de Preços Departamento da Sustentabilidade e Ambiente Comissão dos Serviços Essenciais Nova Gales do Sul Vitória Duas empresas em “alta” Empresa de Água de Sidney Departamento de Planeamento, Infra-estrutura e Recursos Naturais Empresa de Água de Hunter Departamento de Sustentabilidade e Ambiente Empresa de Água de Melbourne Três operadores de retalho Governo Local Operadores Regionais de Água Austrália Meridional Departamento da Conservação da Biodiversidade, Território e Água Empresa de Água da Austrália Meridional Departamento do Ambiente e Património Conselho de Ministros Austrália Ocidental Departamento do Ambiente Empresa de Água e vários pequenos operadores Departamento do Ambiente Autoridade Reguladora Económica Tasmânia Departamento das Indústrias Primárias e da Água Governo Local Departamento do Ambiente, Artes e Turismo Comissão Governamental de Supervisão de Preços Três empresas em “alta” Território da Capital da Austrália ACT Ambiente Empresa de Energia e Água de ACT ACT ambiente Comissão Regulatória e Independente de Preços Território do Norte Departamento dos Recursos Naturais, Ambiente e Artes Empresa de Água e Energia Departamento dos Recursos Naturais, Ambiente e Artes Comissão das Utilities do Território do Norte 63 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional um resumo das principais entidades responsáveis por estado e território da Austrália (Crase et al., 2008). No estado de Vitória, para além da Comissão de Serviços Essenciais (Essential Services Commission – ESC), que constitui o regulador sectorial, existem outras entidades com funções regulatórias relevantes. No que concerne à defesa do utilizador, a Austrália possui provedores em cada estado e território, isto é, entidades credíveis e independentes responsáveis pela investigação e resolução de disputas entre os seus utilizadores e os respectivos operadores dos serviços de água, de gás e de electricidade. No caso do estado de Vitória, esta entidade denominase Energy and Water Ombudsman (EWOV). Na generalidade, os SAS concordaram em aderir ao processo de mediação, conciliação e resolução de conflitos do EWOV. O Ministro da Água de Vitória, através do Departamento de Sustentabilidade e Ambiente (Department of Sustainability and Environment - DSE), é responsável pelo desenvolvimento da política no sector da água. A Autoridade de Protecção Ambiental (Environment Protection Authority - EPA) é um instituto público com autonomia, estabelecido segundo a Lei de Protecção Ambiental (Environment Protection Act), que compreende a responsabilidade de prevenir a poluição e promover a protecção do ambiente no estado de Vitória. Outra entidade com importância na regulação do sector da água no estado de Vitória é o Departamento de Serviços Humanos (Department of Human Services - DHS) que rege, entre outras funções, a segurança e qualidade do fornecimento de água para consumo humano, garantindo o respeito pela legislação vigente, designadamente a Lei da Saúde (Health Act) de 1958, os Regulamentos da Saúde (Health Quality of Drinking Water) de 2002, a Lei da Saúde (Fluoridation) de 1973, a Lei dos Alimentos (Food Act) de 1984 e, mais recentemente, a Lei da Segurança do Abastecimento de Água (Safe Drinking Water Act) de 2003. Em relação a esta última norma, as funções incluem o reforço sobre a monitorização, a divulgação pública do desempenho dos SAS e a promoção da consciencialização para os assuntos relativos à qualidade da água para consumo humano. O DHS tem também funções fundamentais relativamente às descargas de águas residuais e sua reutilização e à garantia do financiamento das famílias mais carenciadas, através da gestão de um fundo próprio constituído para esse efeito. 64 estaduais e territoriais pretendiam desenvolver o sector, modernizando-o e tornando-o mais equilibrado e sustentável, designadamente através da aplicação dos princípios do utilizador e do poluidor pagador, tendo, no entanto, em atenção a sua essencialidade e a sua importância social. Em geral, cada estado e território tem uma entidade reguladora multissectorial, que inclui a regulação dos SAS. A sua área e o seu âmbito de intervenção divergem em função do estado ou do território, podendo abranger só as entidades gestoras metropolitanas ou incluir todas as restantes e a regulação de preços e/ou da qualidade do serviço. Na regulação económica, os diferentes reguladores utilizam métodos similares, embora não uniformes, normalmente baseados na regulação por limite de preços. Por exemplo, o regulador de Nova Gales do Sul, o Tribunal Regulatório Independente de Preços (Independent Price Authority Regulatory Tribunal – IPART), utiliza a fórmula IPC – X, empregando metodologias de benchmarking para estimativa do factor X para o cálculo das tarifas da Sydney Water (e outros operadores). Os mesmos princípios, relativos aos incentivos e ao desempenho, são instituídos noutros estados/territórios, como, por exemplo, na Austrália Ocidental ou no Território do Norte. Em Vitória, a regulação do sector da água era responsabilidade do Office of Regulator General (ORG). Em 2002, o ORG foi substituído pela ESC. A ESC é uma entidade reguladora multissectorial responsável pela regulação de serviços públicos no estado de Vitória: electricidade, gás, portos, transporte ferroviário e rodoviário, seguros, energias renováveis, água e saneamento de águas residuais. Os contornos da regulação são, porém, muito distintos, dependendo do sector regulado. A entidade reguladora foi criada com o propósito primário de proteger os interesses dos utilizadores do estado de Vitória no âmbito dos preços, qualidade e fiabilidade dos serviços públicos. Para alcançar o fim a que se propõe, a entidade reguladora tem de proporcionar um serviço eficiente, viável económico ou financeiramente, competitivo e consistente, promovendo a coesão económica e social no território abrangido. 2.1.2.2 Regulação Até 1 de Janeiro de 2004, a ESC (ORG) incluía nas suas atribuições, em relação ao sector da água, a regulação da qualidade do serviço e a garantia das obrigações do serviço público, mas apenas para as entidades metropolitanas. A actividade desenvolvida durante quase 10 anos assentou na regulação sunshine. A partir dessa data, as suas atribuições foram alargadas à regulação económica e a todas as entidades gestoras do estado de Vitória. Ao longo das últimas duas décadas, o sector da água na Austrália tem sofrido inúmeras transformações. Desde o início dos anos 90, os governos Segundo a regulamentação tarifária (Water Industry Regulatory Order - WIRO), a ESC estabelece os preços de todos serviços, designadamente Austrália da água distribuída, da recolha e drenagem de águas residuais, da água reciclada, do armazenamento, da água bruta, da água bruta reciclada, da drenagem de águas pluviais nos serviços metropolitanos, da água para rega e dos ramais de ligação, entre outros. A WIRO também regulamenta as atribuições que a ESC tem sobre estes serviços, inter alia, a aprovação ou especificação dos preços de cada operador para um período de três anos (início em Julho de 2005), e o estabelecimento de níveis de qualidade do serviço prestado pelas entidades (por ex., contratualização dos níveis de serviço). Além disso, a ESC monitoriza e apresenta publicamente o desempenho dos operadores, examinando a sua conformidade com o esperado e definido, a informação regulada e as obrigações de serviço público. Por último, a ESC possui também a função de arbitragem na resolução de conflitos entre os vários operadores (por ex., operador da “alta” versus os da “baixa”). A ESC é independente no exercício das suas funções, quer em termos funcionais quer orgânicos, sendo também dotada de independência financeira, sendo o seu financiamento determinado em função do seu orçamento previsional e pago pelos operadores regulados proporcionalmente às suas receitas. A ESC é também provida de vastos poderes regulamentares e de aplicação de sanções, estando toda a procedimentalização, incluindo a possibilidade de recurso, prevista no seu estatuto (ESC Act de 2001). Em 2005/2006, a ESC teve um orçamento de aproximadamente 9 milhões de euros, dos quais 1,8 milhões foram alocados à regulação do sector da água, e tinha nos seus quadros 60 funcionários. A ESC desenvolveu, de acordo com as suas obrigações estatutárias, um memorando de entendimento (Memoranda of Understanding) com os diversos stakeholders, incluindo outros reguladores, procurando a concertação dos processos regulatórios e das decisões. Outro aspecto de destaque relaciona-se com a obrigatoriedade da elaboração de uma Carta de Conduta Regulatória e de Consulta Pública (Charter of Consultation and Regulatory Pratice), que é revista de três em três anos, onde são definidos os programas de trabalho para cada indústria regulada e a procedimentalização das notificações, inquéritos, decisões e determinações e da consulta pública. O método de regulação económica adoptado pela ESC para o sector da água foi o da regulação por limite de preços. No processo regulatório de estabelecimento de preços, a definição do plano de desenvolvimento (Water Plan) por parte dos operadores assume uma importância fulcral. A ESC avalia as despesas de ope- ração e de capital necessárias, considerando o histórico, a comparação entre operadores (benchmarking), os consumos previstos, as novas obrigações e legislação a cumprir e os argumentos dos diferentes stakeholders. Existe uma recuperação integral dos custos e uma orientação para a definição das tarifas com base no custo marginal de longo prazo. O valor do factor X para o primeiro período regulatório foi de 1% e equivalente para todos os operadores. Por ser o primeiro período regulatório e pelas mudanças esperadas no sector, o factor X foi estimado com base na variação da produtividade para os sectores menos produtivos da economia, admitindo um cenário pouco agressivo. Ainda que discutidos outros tipos de incentivos, os mesmos ficaram reduzidos aos ganhos de eficiência verificados no período regulatório. A variação da qualidade do serviço não foi considerada no estabelecimento de preços e foi assumido o compromisso de integrar os acontecimentos imprevisíveis, caso ocorressem, no final do período regulatório. Toda a documentação e sua qualidade, incluindo os planos de desenvolvimento (water plans), são auditadas por entidades externas (auditores) credíveis e credenciadas. A ESC desenvolveu um conjunto de linhas orientadoras (Approving, Conducting and Reporting Audits) que pretendem assegurar a independência e o rigor da auditoria, promover incentivos para os operadores reduzirem a informação assimétrica e inexacta e maximizarem a relação entre o custo e eficácia das auditorias. 2.1.3 ESTRUTURA DO MERCADO 2.1.3.1 Propriedade e gestão de serviços Na Austrália, os SAS são maioritariamente promovidos por operadores públicos. A titularidade dos activos é sempre pública, ainda que a mesma possa pertencer aos governos estaduais ou territoriais ou à administração local. Em relação à gestão dos SAS, existem casos pontuais onde é possível observar a presença do sector privado na provisão destes serviços, como sucede, por exemplo, na ACTEW no Território da Capital da Austrália. Até recentemente, na Austrália Meridional, a SA Water (o único operador) tinha um contrato de prestação de serviços (de curta duração) de todas as actividades desenvolvidas com uma entidade privada (United Water). Existem também várias PPP relativas a ETAR e a ETA nos 65 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional diferentes estados e territórios da Austrália. É de referir, aliás, que na Austrália não existem condicionamentos legais à privatização e que o sector privado é, normalmente, muito activo na prestação de serviços (outsourcing). 2.1.3.2 Players do sector As grandes empresas do sector da água australiano têm sempre propriedade pública do governo estatal ou territorial. Já os pequenos operadores são, usualmente, propriedade dos municípios. Em Vitória, em 1994, a Melbourne Water, principal operador deste estado, foi reestruturada, tendo sido dividida em quatro empresas (com propriedade e gestão pública), uma com a responsabilidade do serviço de água em “alta” e das principais ETAR e as restantes três com atribuições do SAS em “baixa”, designadamente, a City West Water, a South East Water e a Yarra Valley Water. Actualmente, a Melbourne Water, para além destas três entidades metropolitanas, abastece em “alta” ainda as entidades gestoras Western Water, Gippsland Water e Southern Rural Water. A Melbourne Water é uma sociedade comercial que opera segundo o Melbourne Water Corporation Act e o Melbourne and Metropolitan Board of Works Act, cabendo, deste modo, ao Ministro do Ambiente e da Água a responsabilidade pelos serviços prestados. As três entidades metropolitanas referidas são propriedade do estado de Vitória, obedecendo ao Corporation Act. As suas atribuições são estabelecidas na Lei da Indústria da Água (Water Industry Act) de 1994. Além dos operadores metropolitanos, existem também operadores com natureza regional e rural. Em relação aos primeiros, registam-se 13 operadores que prestam os SAS no estado de Vitória, englobando cerca de 400 cidades. As suas responsabilidades são atribuídas pela Lei da Água (Water Act) de 1989. Ao contrário do operador metropolitano, que foi sujeito a unblundling, os operadores regionais encontram-se, geralmente, verticalmente integrados. Os operadores regionais operam dentro da sua área de serviço, claramente delineada de acordo com a sua geografia. São caracterizados por uma menor densidade de utilizadores e por alguma heterogeneidade na sua dimensão. Por exemplo, em 2006, a Berwon Water prestava o serviço de água a 125 044 utiliza66 dores, enquanto a Westenport Water fornecia água somente a 13 098 utilizadores. O estado de Vitória é também dividido em regiões que são servidas por cinco entidades gestoras de natureza rural (Goulburn Murray Water, Southern Rural Water, Sunraysia Rural Water Authority, Wimmera Mallee Water e First Mildura Irrigation Trust), operando segundo o estatuto de autoridade através da Lei da Água de 1989. Estes operadores são responsáveis pela gestão e operação dos perímetros de rega, incluindo barragens, albufeiras e canais. Abastecem pontualmente os operadores regionais em “alta” e as propriedades rurais existentes na sua área de actuação. Como operador do sector privado destaca-se a ACT Energy and Water no Território da Capital da Austrália, criada em 1988, pela fusão entre a ACT Electricity Authority com a ACT Water, transformada numa sociedade comercial em 1995. Em 2000, a ActewAGL foi criada como uma joint venture entre a ACTEW e a AGL (Australian Gas Light Company). A ActewAGL é proprietária e opera a ACTEW, os activos de gás e da electricidade da AGL e os activos do abastecimento de água e do saneamento de águas residuais da ACTEW. Em Nova Gales do Sul localiza-se o maior operador australiano, a Sydney Water, que serve mais de quatro milhões de habitantes. Presta os vários SAS e também drena as águas pluviais, abrangendo as áreas de Sidney, Illawarra e as Blue Mountains. A Sydney Water compra água “bruta” à Sydney Catchment Authority. A Hunter Water é outro operador de relevo em Nova Gales do Sul. No Território do Norte, a Power and Water Corporation constitui a empresa mais importante. Este operador (multiutility) promove os serviços de electricidade, água e águas residuais a mais de 100 mil habitantes nas áreas urbanas e rurais. No estado da Austrália Meridional, a SA Water, servindo mais de 1,4 milhões de habitantes, é o principal operador dos SAS. Na Austrália Ocidental existem 37 operadores, quase todos de pequena dimensão. O operador de Perth (Water Corporation) que presta os SAS a 1,4 milhões de habitantes, é o maior operador. Em Queensland, a maioria dos 170 operadores (autoridades locais) integra verticalmente os SAS. Existem dois operadores públicos que fornecem os serviços de água em “alta” à escala supramunicipal. Austrália Por último, na Tasmânia existem três empresas de água em “alta”, que disponibilizam água aos operadores locais, os quais posteriormente a distribuem aos utilizadores. prestam outros serviços, como a energia e o gás. As águas pluviais estão também, quase sempre, junto do abastecimento de água e do saneamento de águas residuais. 2.1.3.3 Integração do sector e serviços oferecidos 2.1.3.4 Números do sector Na Austrália, a integração dos SAS diverge, acentuadamente, entre os estados e territórios. Existem operadores que gerem ambos os serviços verticalmente integrados, desde a captação de água à distribuição e desde a recolha até ao tratamento de águas residuais, mas também há operadores que abastecem exclusivamente outros em “alta” (por ex., a Sydney Catchment Authority, em Na Austrália são produzidos anualmente cerca de 19 mil milhões de m3 de água, sendo a agricultura o maior utilizador, com 65% do total. O uso de água para consumo humano representa, aproximadamente, 11,2% do total produzido. Dentro do consumo total de água, a sua principal fonte é a água superficial com cerca de 79%. Na Figura 10, observa-se o consumo dos diferentes utilizadores de água (NWC, 2005). Figura 10 Uso de água na Austrália Nova Gales do Sul ou a Hobart Water, na Tasmânia) ou que são responsáveis apenas pelo tratamento de águas residuais (por ex., a Melbourne Water no saneamento das águas residuais). Em alguns estados e territórios existe um único operador (Austrália Meridional e Território da Capital da Austrália), enquanto noutros existem vários (por ex., Vitória e Nova Gales do Sul). Por exemplo, em Nova Gales do Sul, para além das empresas metropolitanas (que incluem a Sydney Water e a Hunter Water), existem 107 operadores locais que servem 1,7 milhões de habitantes. De qualquer forma, o nível de integração é elevado, isto é, as 30 maiores empresas servem mais de 70% da população (~15 milhões). Outro traço relevante consiste no facto de existirem várias multiutilities, ou seja, operadores que, para além dos SAS, Na Austrália, as perdas de água dos serviços de água apresentaram, em 2005, um valor aproximado de 12% do valor total produzido. Na Figura 11 representa-se a evolução das perdas de água do sector desde 1997 até 2005. Os operadores australianos vendem anualmente cerca de 2,1 mil milhões de m3 de água. Para a população australiana, em média, o consumo equivale a 104 m3 de água por habitante e por ano, ou seja, 280 litros por habitante e por dia. O nível de atendimento dos SAS (incluindo tratamento) nas zonas urbanas é próximo dos 100%. Contudo, o mesmo não ocorre nas áreas rurais, onde existe uma percentagem de população dispersa muito significativa que recorre a soluções individuais. Em 2005, os SAS na Austrália empregavam directamente cerca de 12 mil funcionários. 67 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional Figura 11 Evolução anual do indicador perdas de água na Austrália Na Austrália, o serviço de água possui cerca de 143 mil km de rede, enquanto o serviço de águas residuais compreende, aproximadamente, 91 mil km de colectores. As redes de drenagem são sempre do tipo separativo. O volume de águas residuais tratado corresponde a 83% do volume de água consumido. Da água consumida na Austrália, cerca de 16% é reutilizada. A maior percentagem de reutilização ocorre no Território da Capital da Austrália, com 28% do volume total. 2.1.4 REGRAS DO JOGO 2.1.4.1 Estabelecimento de tarifas Na Austrália, os preços praticados pelos principais operadores dos SAS são regulados por entidades reguladoras independentes. Contrariamente, em alguns estados (por ex., Nova Gales do Sul) os pequenos operadores estabelecem os seus próprios preços na ausência de regulação. Existem também excepções na Austrália Meridional e em Queensland onde, embora exista regulação tarifária, a mesma é desenvolvida ex-post e não ex-ante. O sistema tarifário usualmente implementado pelos operadores australianos compreende, para os utilizadores domésticos, duas parcelas fixas, uma relativa ao abastecimento de água e outra ao saneamento de águas residuais, e duas parcelas variáveis, uma associada ao consumo de água, dividida em escalões e crescendo com estes, e outra relativa ao tratamento de águas residuais. Ambos os serviços são facturados com 68 base em valores medidos. Para os operadores metropolitanos existe também uma parcela fixa correspondente à drenagem de águas pluviais. No Quadro 4 apresentam-se os sistemas tarifários para os utilizadores domésticos dos cinco maiores operadores no estado de Vitória, bem como a sua factura média. Em relação aos utilizadores não domésticos, não se verificam grandes diferenças nos valores do tarifário e não ocorre subsidiação cruzada entre grupos de utilizadores. Porém, no saneamento de águas residuais há apenas, em geral, um único escalão. No caso do tratamento dos efluentes dos utilizadores industriais, o mesmo é cobrado em função da sua carga orgânica. No sistema tarifário dos utilizadores domésticos e dos não domésticos existe um valor definido para o serviço de incêndio, o qual varia entre um valor fixo cobrado anualmente e um valor dependente do calibre do contador. A ESC estabelece ainda outras parcelas do sistema tarifário, quando aplicável, como, inter alia, a referente à água reciclada, ao armazenamento, à água não tratada, à água tratada em “alta”, à água para rega e à execução dos ramais de ligação. Em média, o preço da água nas cidades australianas é de 0,59 €/m3, representando um valor consideravelmente reduzido face à conjuntura dos países desenvolvidos a nível mundial. De facto, alguns utilizadores domésticos pagam muito menos do que os 0,59 €/m3 referidos, dependendo da área em questão. Em 2005/2006, a factura média dos utilizadores domésticos australianos relativa ao serviço de água foi de 188,5 euros e, combinada com o serviço de águas residuais, perfez um total de 340,9 euros. Austrália Operador Cidade Tarifa de ligação de água (€/ano) City West Melbourne 57,93 South East Yarra Valley Melbourne Melbourne 26,3 34,8 Barwon Geelong 77,2 Coliban Bendigo 66,8 Venda de água (€/m3) (trimestral) Tarifa de ligação de saneamento (€/ano) Tratamento de águas residuais (€/m3) Factura média anual (2004-05) Factura média anual (2005-06) 61,61 0,61 274,20 286,20 88,18 0,57 277,80 288,60 84,98 0,61 310,20 323,40 0,50 96,73 0,6 325,20 348,60 0-50 m3 0,37 168,32 N/A 301,80 314,40 50-100 m3 0,44 >100 m3 0,73 0-40 m3 0,47 40-80 m3 0,55 >80 m3 0,82 0-40 m3 0,47 40-80 m3 0,55 >80 m3 0,86 0-40 m3 0,47 40-80 m3 0,55 >80 m3 0,86 Em 2005, o serviço de água representou um custo de 193,3 euros para os utilizadores domésticos de Sidney e de 203,2 euros para o serviço de águas residuais, totalizando 396,5 euros. O preço médio combinado em Melbourne foi de 314,5 euros, enquanto em Perth o pagamento pelos mesmos serviços foi de 422,9 euros. 2.1.4.2 Qualidade do serviço Na Austrália, como referido, existe uma associação dos operadores (WSAA) que abrange cerca de 75% da população australiana. Dentro das suas atribuições, a implementação do projecto anual de benchmarking, onde se incluem também dois operadores da Nova Zelândia, como forma de promover o desenvolvimento do sector, revela-se uma ferramenta importante. Esta actividade consiste no desenvolvimento de um conjunto de 55 indicadores de desempenho repartidos entre diversos domínios, nomeadamente em recursos hídricos, utilizadores, activos, qualidade do serviço, preços e finanças e saúde. Actualmente, esta associação encontrase a desenvolver um projecto voluntário, o 2008 IWA-WSAA Asset Management Process Benchmarking Project, com o objectivo de melhorar ainda mais a qualidade do serviço. Quadro 4 Sistema tarifário dos utilizadores domésticos de cinco operadores de Vitória Além disso, cada entidade reguladora estatal/territorial, como a ESC ou a Autoridade de Regulação Económica (Economic Regulation Authority – ERA), compara e publicita o desempenho dos operadores (regulação sunshine) e especifica os 69 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional Indicadores de desempenho para os SAS Capacidade financeira Fiabilidade e eficiência da rede Capitação (m por utilizador) Abastecimento de água Factura média por utilizador Interrupções do serviço de água (por 100 km de conduta) Utilizadores domésticos com planos de pagamento (por 100 utilizadores) Frequência média de interrupção do serviço (n.º por utilizador) Utilizadores não domésticos com planos de pagamento (por 100 utilizadores) Frequência de interrupções planeadas em horas de ponta (n.º por utilizador) Cessação do serviço doméstico por não pagamento (por 100 utilizadores) Duração média das interrupções planeadas (minutos) Serviço desligado restaurado dentro de três dias (%, apenas domésticos) Duração média das interrupções não planeadas (minutos) Serviço desligado acima de 14 dias (%, apenas domésticos) Duração média dos utilizadores sem serviço (minutos) Acções legais contra os utilizadores domésticos (por 100 utilizadores) Roturas e fugas (por 100 km de condutas) Acções legais contra os utilizadores não domésticos (por 100 utilizadores) Tempos médios de resposta a roturas e fugas – prioridade um Valor médio de dívida - cessações (€) Tempos médios de resposta a roturas e fugas – prioridade dois Valor médio da dívida - acções legais (€) Tempo médio de rectificação a roturas e fugas – prioridade um (minutos) Valor médio das ajudas às famílias carenciadas (por 100 utilizadores) Tempo médio de rectificação a roturas e fugas – prioridade dois (minutos) 3 Valor médio das ajudas às famílias carenciadas (€) Interrupções planeadas não restauradas dentro de 5 horas (%) Capacidade de resposta Tempo médio de espera pelo operador (segundos) Interrupções não planeadas não restauradas dentro de 5 horas (%) Chamadas telefónicas respondidas dentro de 30 segundos Perdas de água Reclamações recebidas por operador (por 100 utilizadores) Serviço de águas residuais Reclamações recebidas por operador por categoria Obstruções das redes de drenagem (por 100 km de colector) Informação escrita respondida em 5 dias úteis Utilizadores que experimentam uma única obstrução Qualidade da água para consumo humano Descargas oriundas da rede de drenagem doméstica (por 100 km) Qualidade microbiológica da água (%) Resolução das descargas em 5 horas (%) Turvação (%) Descargas por utilizador (por 1.000 utilizadores) Desinfecção por produto Volume de água residual descarregada sem tratamento (%) Reclamações sobre a qualidade da água (por 100 utilizadores) Reclamações sobre a qualidade da água por natureza (por 100 utilizadores) Qualidade da água do sistema em “alta” – Melbourne Water (%) Desempenho ambiental Cumprimento da legislação de tratamento de águas residuais (%) Efluentes reutilizados (%) Biossólidos reutilizados (%) Emissões de gás para o efeito de estufa Quadro 5 Indicadores de desempenho aplicados pela ESC níveis e as condições de desempenho em que o operador presta os serviços. Estes requisitos são incluídos voluntariamente no Water Plan ou estabelecidos como obrigações de serviço público. Para a monitorização e incentivo à qualidade do serviço, conforme demonstrado anteriormente, os utilizadores são compensados pelos operadores na circunstância de uma degradação da 70 qualidade do serviço prestada, sobretudo relativo aos Níveis de Qualidade do Serviço, que se apresentam na subsecção seguinte. Para atingir os objectivos (e resultados) associados à qualidade do serviço, a entidade reguladora recorre ao cálculo de um conjunto de indicadores de desempenho que posteriormente publica e compara num relatório anual de avaliação (regulação sunshine). Austrália No Quadro 5 apresentam-se os indicadores adoptados pela ESC. Na Figura 12 evidenciase o papel positivo da regulação sunshine, apresentando a evolução do indicador interrupção do abastecimento de água ao longo do tempo. Na Figura 13 adoptando ainda o 2.1.4.3 Obrigações de serviço público Com o objectivo de melhor defenderem os interesses dos utilizadores, as entidades reFigura 12 Indicador interrupção do serviço de água para os operadores metropolitanos Figura 13 Indicador interrupção do serviço de água para os operadores regulados em Vitória mesmo indicador, compara-se o desempenho de todos os operadores do estado de Vitória para 2005/2006 (ESC, 2008). É de referir que, mesmo no caso dos operadores dos SAS locais, na situação de não estarem sob a alçada do regulador, os governos estaduais promovem a instituição de benchmarking de forma compulsória, como ocorre em Nova Gales do Sul. Acrescente-se ainda que foi neste estado que, em 1992/1993, foi, pela primeira vez, desenvolvido no sector da água um exercício de benchmarking que constitui a primeira experiência mundial do género no sector. guladoras elaboraram o Código do Utilizador (Customer Service Code - CSC), onde definem os níveis e condições de serviço para os SAS. No Quadro 6, apresenta-se o conjunto de obrigações de serviço público, desenvolvido pela ESC, que cada operador se compromete a respeitar. Uma das principais medidas tomadas pela ESC correspondeu à implementação de um Conselho Consultivo dos Utilizadores (Customer Consultative Committee), que a aconselha sobre os diferentes assuntos e necessidades dos utilizadores. Uma das suas iniciativas foi a instituição de um fórum onde os utiliza71 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional Princípio Conexão e fornecimento Sistema tarifário Reclamações e disputas Obrigação do operador Operador obrigado à sua disponibilização num prazo máximo de 10 dias. Publicitação de tarifas e taxas aprovadas pelo regulador bem como as suas alterações. Aceitar a mediação, arbitragem e conciliação de conflitos. Procedimento definido e aprovado para as reclamações. Facturação Leitura trimestral ou outra, se acordado. A factura tem de conter a totalidade dos serviços cobrados e o respectivo tarifário. Caso a facturação seja efectuada em prejuízo ou benefício do operador, existem condições que têm de ser respeitadas. Em caso de subfacturação, a cobrança tem de ser feita no espaço de 12 meses e na situação de sobrefacturação o operador tem de notificar o utilizador dentro de 10 dias úteis e acordar a forma de ressarcimento. Pagamento Várias formas de pagamento (por ex., agência, correio e débito directo), incluindo planos de pagamento flexíveis, tendo em conta a capacidade financeira do utilizador. Cobrança Acções de não pagamento Qualidade do serviço Fiabilidade dos serviços Reconexão Obrigação de notificar o utilizador em caso de incumprimento com o respectivo pagamento do serviço, pelo menos 7 dias antes de tomar qualquer providência. O operador adoptará as medidas legais quanto à restrição do fornecimento dos seus serviços em caso de não cumprimento do devido pagamento. Existem, no entanto, condicionalismos que não podem deixar de ser respeitados. Adicionalmente à obrigatoriedade de ter de agir de acordo com os requisitos de saúde e ambientais regulamentados, o operador terá de providenciar o serviço em concordância com os padrões de serviço aprovados. Terá de demonstrar periodicamente que cumpre o acordado, compensando o utilizador quando tal não ocorre (níveis de serviço). O operador desenvolverá e implementará planos de gestão dos seus activos, visando a sua fiabilidade. Cabe ao operador elaborar procedimentos que lidem adequadamente com os imprevistos relativos a roturas, descargas ilegais ou obstruções nos seus sistemas, informando os utilizadores em caso de interrupção planeada. O operador tem de reconectar de imediato um ex-utilizador em caso de solicitação. Trabalhos e manutenção Constará nas obrigações do operador um programa que procurará a manutenção do seu sistema de acordo com o padrão de serviço estabelecido. Informação O operador é obrigado a facultar o acesso gratuito à informação, a saber, inter alia, relativa a sobrefacturação, opções de pagamento e ao EWOV. Além disso, o operador é obrigado a informar, em caso de solicitação, os seus utilizadores sobre os actos regulatórios. Tem ainda de permitir o acesso através de um serviço de interpretação para utilizadores com dificuldades orais e/ou auditivas. Carta de direitos do utilizador O operador tem de desenvolver e publicitar através do seu sítio da Web uma carta de direitos do utilizador com o intuito de o informar sobre os serviços executados e respectivos direitos e responsabilidades do operador e dos utilizadores. Quadro 6 Princípios de serviço público e obrigações do operador dores se podem pronunciar. Existem também associações não governamentais de defesa do utilizador, que são, normalmente, ouvidas, como o Consumer Utilities Advocacy Centre. Outro aspecto de relevo da regulação dos serviços públicos essenciais em Vitória é o Utility Relief Grant Scheme, administrado pelo DHS, que providencia assistência financeira aos utilizadores com problemas financeiros tempo- 72 rários. O financiamento incide sobre as facturas de electricidade, gás e água, cobrindo o custo de um período que pode abranger até seis meses consecutivos. Na regulação da água, a ESC aprova também um conjunto de níveis de serviço propostos pelos operadores, os quais se comprometem a respeitá-los durante o período regulatório, e que, no caso de incumprimento, terão de indemnizar os utilizadores (Gua- Austrália ranteed Standard Levels – Níveis de Qualidade do Serviço). Ao contrário da regulação de outros sectores (por ex., electricidade e gás), que inclusive na fórmula de limite de preços possuem um índice integrando a va- ais adversidades. A preocupação da regulação é focalizada nos utilizadores sem descurar a sustentabilidade dos operadores. Os diferentes reguladores têm desenvolvido, com sucesso, a supervisão e o controlo da qualidade do Quadro 7 Níveis de qualidade de serviço para os utilizadores domésticos Montante pago pelo incumprimento* Nível de serviço City West South East Yarra Valley Barwon Central Highlands Interrupções não planeadas e não rectificadas no tempo especificado 15 15 15 - 15 Mais do que cinco interrupções não planeadas em 12 meses 15 15 15 30 15 Falha de notificação de uma interrupção planeada - - 15 - - Interrupção planeada durante as horas de ponta (5h-9h e 17h-23h) - - 15 - - Duração da interrupção maior do que a duração prevista - - 15 - - Interrupção planeada maior que cinco horas - - 15 - - Reparação de fugas das condutas em prazo superior a cinco dias - - - - 15 Mais do que três interrupções em 12 meses 15 15 15 30 15 Interrupções não rectificadas no prazo estabelecido 15 15 15 - 15 Inundações não resolvidas após um período de tempo da notificação 300 300 300 - - Inundações não resolvidas em habitações depois de uma hora 300 300 300 - - Água Águas residuais * (€) e valores aproximados riação da qualidade e dos níveis de serviço, a ESC, pelo menos para o primeiro período regulatório, concedeu alguma liberdade na definição dos Níveis de Qualidade do Serviço, admitindo também que os mesmos seriam impostos apenas para os utilizadores domésticos e para os maiores operadores. O Quadro 7 apresenta os Níveis de Qualidade do Serviço aprovados para o primeiro período regulatório. 2.1.5 DESEMPENHO Os estados e territórios na Austrália apresentam um modelo regulatório bem concebido, moderno e muito robusto, perante as eventu- serviço, como atestam as melhorias verificadas, ano após ano. Os reguladores têm garantido as diferentes obrigações de serviço público, contratualizando-as entre os vários stakeholders, e mantido as remunerações dos operadores através da regulação económica nos limites adequados, isto é, garantindo a viabilidade económica e financeira, sem a realização de lucros acima do razoável. Por último, é de referir que nas vertentes económica, social e ambiental a regulação tem sido desenvolvida numa perspectiva de longo prazo e de sustentabilidade. Em suma, a regulação dos SAS em toda a Austrália e, em particular no estado de Vitória, aqui analisado em maior detalhe, constitui, desta forma, um exemplo a reter. 73 Bélgica 2.2 BÉLGICA 2.2.1 ANTECEDENTES HISTÓRICOS A Bélgica, oficialmente o Reino da Bélgica, é uma monarquia constitucional e uma democracia parlamentar, onde o rei é o representante do Estado e o primeiro-ministro é o chefe de governo, num sistema plural e multipartidário. O poder executivo é desempenhado pelo governo. O poder legislativo federal encontra-se repartido entre o governo e as duas câmaras parlamentares, designadamente, o Senado e a Câmara dos Representantes. O mercado da água na Bélgica é, não obstante o referido, pouco regulamentado. Apesar das mudanças ocorridas nos últimos anos e de existirem regras definidas quanto à gestão de recursos hídricos e à qualidade da água e ao ambiente, em geral, os SAS historicamente têm funcionado de forma desregulada. A inversão desta circunstância é proporcionada muito por pressões oriundas da UE, mas também pelos utilizadores cada vez mais conscienciosos e exigentes. Além disso, a indústria da água pauta-se por uma enorme escassez de sustentabilidade económica e financeira, causada pelo forte financiamento por parte do Estado. A Bélgica, com uma população de cerca de 10,5 milhões de habitantes e uma área aproximada de 30 500 km2, encontra-se subdivida em duas regiões (Flandres e Valónia), cada uma com cinco províncias, e uma terceira região, a região de Bruxelas-Capital, contendo a capital Bruxelas. Além disso, o país encontra-se organizado, a nível local, em 589 municípios, dos quais 308 pertencem à região da Flandres e 262 à região da Valónia. Na região de Bruxelas existem 19 municípios. A tendência de maior interferência dos governos na gestão da água é evidenciada com a criação e entrada em funcionamento do Comité de Controlo da Água (Comité de Contrôle de l’Eau - CCE) na Valónia e com a instituição de uma entidade reguladora na Flandres, ainda que aqui a mesma não tenha iniciado funções até à data (2007). Por exemplo, na Valónia, entre outras medidas que foram tomadas, o CCE pretende conferir uma maior equidade e sustentabilidade aos SAS, através da uniformização dos sistemas tarifários. A Bélgica constitui um dos países europeus com menor disponibilidade de recursos hídricos. Talvez por isso este país tenha desenvolvido, ao longo do tempo, diversas reformas no sector da água. A regionalização, ocorrida em 1980, constituiu um marco muito relevante, alterando bastante a homogeneidade institucional até então existente. Os SAS, cujas atribuições pertenciam ao governo nacional, foram transferidos para os governos regionais. As regiões são caracterizadas por uma grande heterogeneidade a nível estrutural e geográfico, com consequências na gestão do sector da água, como evidencia a própria disponibilidade dos recursos hídricos. Tanto a região da Flandres (25%) como a de Bruxelas-Capital (100%) são dependentes do fornecimento de água para consumo humano a partir da região da Valónia. O serviço de água na Bélgica conheceu a sua primeira etapa de desenvolvimento em meados do século XIX. Neste âmbito, os primeiros investimentos derivaram do sector privado, mas rapidamente os municípios se apoderaram da iniciativa e do monopólio, que caracteriza o sector da água. No entanto, o Estado belga, observando a lenta evolução do sector, procurou incentivar o seu progresso, financiando a construção das infra-estruturas. Por um lado, o Estado reconhecia o direito de os municípios se associarem, desenvolvendo os SAS integrados e subsidiarem os investimentos destes sistemas intermunicipais (intercommunales), segundo a legislação em vigor, Lei de 18 de Agosto de 1907, sobre associação de municípios, posteriormente alterada pela Lei de 1 de Março de 1922. Por outro lado, o Estado criou a Sociedade Nacional de Distri75 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional buição de Água (Société Nationale de Distribuition d’Eau – SNDE) em 1913, com a missão de assegurar a construção e gestão das instalações, onde os municípios não tivessem capacidade para tal. Esta conjuntura manteve-se até 1990, momento em que ocorreu a regionalização do sector da água. numa situação bastante particular, uma vez que abrange praticamente só área urbana, totalmente dependente do abastecimento de água oriundo da Valónia e relativamente dependente do serviço de tratamento de águas residuais da Flandres, dado que os efluentes produzidos em Bruxelas são para aí enviados. Até 1950, as águas residuais eram descarregadas directamente nos rios. Esta prática, associada ao crescimento e desenvolvimento populacional, originou um problema grave de poluição ambiental, que o governo tentou solucionar com a implementação da primeira lei relativa à protecção ambiental, designadamente, a Lei de 11 de Março de 1950. Este documento normativo foi substituído pela Lei de 26 de Março de 1971, a qual incidia mais especificamente sobre a protecção das águas superficiais contra a poluição. Mais tarde, o governo da região de Bruxelas, no sentido de promover uma maior e melhor eficiência e interligação entre as diferentes entidades gestoras e administrações responsáveis pelo ciclo da água, reformulou todo o sector, através da Portaria de 17 de Outubro de 2006. A reforma fundiu as duas administrações que detinham responsabilidades sobre o sector da água, nomeadamente o Instituto Belga para a Gestão Ambiental (Institut Bruxellois pour la Gestion de l’Environnement - IBGE) e a Administração de Equipamento e Descentralização (Administration de l’Equipement et des Déplacements - AED). Além disso, criou uma entidade supramunicipal para a recolha e drenagem de águas residuais, a Sociedade Belga de Gestão de Água (Société Bruxelloise de Gestion de l’Eau – SBGE), em detrimento da intercommunale existente, a IBrA (Intercommunale Bruxelloise pour l’Assainissement), que se revelou ineficaz. A atribuição dos SAS às regiões passou a ser reconhecida em 1980 e em 1988 através das normas relativas à qualidade da água. Desde então, a evolução da gestão do sector da água tem divergido amplamente entre as três regiões. A primeira alteração visível foi a extinção da SNDE, em 1983, e a criação da Vlaamse Maatschappij voor Watervoorziening (VMW) na Flandres e da Société Wallonne de Distribution d’Eau (SWDE) na região da Valónia. A região da Flandres, em particular, enfrentou diversos obstáculos com estas alterações, nomeadamente devido à grande dependência que tinha, em 1982, da Valónia, dado que 60% da sua água tinha origem nesta região. No sentido de contrariar esta situação, o governo da Flandres desenvolveu, em 1984, uma política de maior independência no domínio da provisão de água, designadamente publicando a Lei Regional da Flandres, de 24 de Janeiro de 1984, cujo objecto era a gestão da água subterrânea. Na Valónia, a gestão da água evoluiu de modo bastante diferente. Em 1977, o serviço de tratamento de águas residuais foi colocado sob a responsabilidade dos intercommunales, uma posição confirmada através da Lei Regional da Valónia, de 7 de Outubro de 1985, relativa à protecção das águas superficiais da poluição. A organização do sector foi reformulada em 1999, através da Lei Regional da Valónia, de 15 de Abril de 1999, relativamente à gestão do ciclo da água e que constituiu a Empresa Pública de Gestão de Água (Société Publique de Géstion de l’Eau – SPGE). O governo procurou proteger os recursos hídricos e instaurou, através da Lei Regional da Valónia, de 30 de Março de 1990, uma taxa sobre as descargas de águas residuais domésticas e industriais. A política da água na região de Bruxelas foi desenvolvida mais tarde, tendo como base de comparação as suas congéneres. A região encontra-se 76 Até ao início dos anos 80 do século XX, as normas relativas à qualidade abrangiam um âmbito nacional, que passou a regional com a regionalização. O decreto de 1984 incorpora a Directiva da Água de 1980 sobre o consumo de água para fins públicos. Apenas em 1988, foi desenvolvida legislação específica contemplando os parâmetros mínimos de qualidade de água. Além disso, com as novas imposições da UE, as regiões implementaram uma nova legislação, entre os anos de 2001 e 2002, no âmbito da qualidade da água fornecida aos utilizadores. 2.2.2 ENQUADRAMENTO LEGAL E INSTITUCIONAL 2.2.2.1 Responsabilidades As regiões detêm poderes de decisão relativamente às formas organizacionais dos SAS e à sua eventual privatização, em consonância com o poder dos municípios em decidirem sobre a possibilidade de contratar um operador privado para o seu fornecimento. As regiões asseguram a supervisão do sector, enquanto os operadores monitorizam, eles próprios, as suas actividades através de auto-regulação, nomeadamente no que se refere à qualidade da água fornecida. Bélgica Desde 1980, a gestão da água e as políticas ambientais têm sofrido progressos importantes. Uma das primeiras medidas governamentais envolveu a já referida regionalização do sector da água. A consequência inerente desta política prendeu-se com a grande heterogeneidade com que as regiões têm evoluído, sobretudo, devido à correspondente legislação regional e à desagregação da empresa nacional de água. As três administrações regionais (Flandres, Valónia e Bruxelas) actuam como entidades responsáveis sobre o sector da água, ainda que alguns municípios detenham iguais responsabilidades. Embora a Bélgica possua uma estrutura fragmentada e se caracterize por um desenvolvimento heterogéneo entre as diferentes regiões, nais do sector da água: a AQUABRO (Bruxelas), a AQUAWAL (Valónia) e a SVW (Flandres), totalizando 48 operadores associados. Na região da Flandres, as entidades encontramse associadas a oito organizações do sector, designadamente, Belgaqua, SVW, TNAV, Aquavisie, ISWa, Aqualink, VLW e VIWC/CIW, para além da existência de duas agências governamentais, a Administratie Milieu, Natuurbeheer en Landinrichting (AMINAL), com suaves poderes regulatórios e de supervisão sobre o sector, e a Vlaamse Milieumaatschappij (VMM), uma empresa pública que tem a função de controlar a qualidade da água e a capacidade decisora sobre a localização das ETAR na região. Na Figura 14 apresentam-se os principais actores Figura 14 Enquadramento institucional do sector da água na Flandres é possível identificar a gestão pública como dominante nas três regiões. do sector da água (adaptado de Euromarket, 2004). Pese embora o facto de não existir na Bélgica uma entidade reguladora dedicada para o sector da água, a sua associação profissional, BELGAQUA, desempenha uma função importante na defesa da água como bem comum e do interesse colectivo dos seus membros a nível nacional e supranacional. Para além disso, a associação estimula o desenvolvimento de estudos científicos de natureza técnica e económica, aumentando, deste modo, a informação e as recomendações disponíveis para os operadores e os utilizadores sobre a água de abastecimento e a sua qualidade. Na região de Bruxelas, e antes da sua autonomia do Estado central, o sector da água encontrava-se sob administração de um só organismo, o IBGE. O IBGE possui valências ao nível do licenciamento e monitorização da qualidade da água na região. Com a recente legislação, o IBGE passou também a incluir as atribuições da extinta AED, sobre as águas residuais. A Figura 15 ilustra os protagonistas do sector da água em Bruxelas (adaptado de Euromarket, 2004). A BELGAQUA reúne as três associações regio- Na Valónia, grande parte das competências sobre a água reúne-se num só departamento, a Direcção-Geral de Recursos Naturais e do Ambiente 77 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional Figura 15 Enquadramento institucional do sector da água em Bruxelas (Direction Général dês Ressources Naturelles et de l’Environnement - DGRNE), pertencendo ao Ministério da região da Valónia. O DGRNE detém a função de recolher informação sobre a qualidade da água de origem superficial e subterrânea, licenciar as captações, autorizar a descarga de águas residuais e aumentar as suas taxas e, sobretudo, controlar a qualidade de água distribuída. Desde 1999, a SPGE é uma sociedade anónima de direito público. As suas atribuições prendem-se com o controlo da coordenação e o financiamento do sector da água na região da Valónia. Apesar de ser uma entidade pública, a SPGE recorre bastante ao mercado (privado) para a prestação de serviços. Figura 16 Enquadramento institucional do sector da água na Valónia 78 O CCE possui as funções de estabelecer e assegurar o cumprimento, por parte dos operadores, do ciclo antropocentrista da água, do sistema tarifário, de acordo com o interesse geral, e da política da água na região da Valónia. Além disso, toda a alteração de preços da água tem a obrigatoriedade de ser sujeita à opinião do CCE antes de qualquer formalidade. Deste modo, o Comité teve um papel preponderante na evolução dos sistemas tarifários, aplicados a partir de 1 de Janeiro de 2005, contribuindo para a instalação da política do “Truth-Cost” para o sector da água, harmonizando as tarifas. Na Figura 16 apresentam-se os principais actores do sector da água da região da Valónia (adaptado de Euromarket, 2004). Bélgica 2.2.2.2 Regulação Na Bélgica, embora não exista uma entidade reguladora sectorial para os SAS, existem, em cada região, entidades com importantes funções regulatórias. Na Valónia poder-se-á mesmo dizer que o sector da água é explicitamente regulado, ainda que só recentemente, e através de um organismo integrado na administração pública tradicional, o CCE. Na Flandres está também prevista na lei a instituição de uma entidade reguladora, mas a mesma ainda não entrou em funções (2007). O facto de o poder local prestar, com frequência, os serviços de fornecimento e distribuição de água, revela-se como dissuasor da criação das entidades reguladoras. O CCE, na região da Valónia, detém funções regulatórias importantes, inter alia, o controlo e a supervisão dos sistemas tarifários e a implementação de indicadores de desempenho, que visam o aumento da eficiência e eficácia dos operadores e a observação das missões legais que lhe são conferidas. Além disso, a região da Valónia possui um Provedor (Médiateur de la Région Wallonne), criado em 1994, cuja principal função se prende com a defesa dos interesses dos utilizadores dos serviços públicos, detendo plenos poderes para lidar com as disputas que possam existir entre utilizadores e operadores. Na região da Flandres, o Decreto de 24 Maio de 2002 criou uma entidade reguladora sectorial com o pressuposto de ser instituída até ao final de Julho de 2003. As suas atribuições passavam por listar, aconselhar e relatar todos os assuntos relativos ao sector da água, tendo especificamente como objectivo a transparência, o cumprimento das obrigações de serviço público, a aprovação dos investimentos, o controlo contabilístico e a regulação por comparação. Todavia, até ao fim de 2007, esta entidade ainda não tinha sido estabelecida. Em contraste com o que se passa noutros países, e mesmo na região da Valónia, poucas têm sido as iniciativas desenvolvidas com o objectivo de promover a eficiência e eficácia destes serviços. Apesar de grande parte dos operadores disponibilizarem o acesso aos sistemas tarifários no seu sítio da Web, não se encontra disponível uma visão global sobre os diferentes SAS relativamente à qualidade do serviço e aos sistemas tarifários praticados. Além disso, nenhuma entidade promoveu qualquer estudo sobre a determinação dos factores que contribuem para o custo total de serviço. Em 2002, a associação do sector da água da região da Flandres, a SVW, organizou um estudo de benchmarking entre os operadores, seguindo o exemplo holandês. Cada interveniente no sector recebeu um documento com as suas performances relativas ao grupo de referência (benchmarking). Contudo, estes resultados nunca foram publicitados. Ao contrário da ausência de iniciativas regulatórias formais, os SAS da região da Flandres criaram diversos organismos no sector visando a colaboração em diversos assuntos (por ex., auto-regulação). 2.2.3 ESTRUTURA DO MERCADO 2.2.3.1 Propriedade e gestão dos serviços Globalmente, o sector da água na Bélgica é dominado pelo sector público. As empresas regionais e municipais, bem como as associações intermunicipais (intercommunales), fornecem os serviços relativos à produção e distribuição da água. A prestação dos serviços de águas residuais encontra-se diferentemente organizada dentro da Bélgica, onde há uma empresa regional a fornecer os respectivos serviços (Flandres), empresas intercommunales específicas (Valónia) ou então estão sob o controlo directo dos operadores (Bruxelas). O sector privado tem um papel importante no tratamento de águas residuais através da implementação de PPP. Por exemplo, a ETAR Norte de Bruxelas foi construída optando por esta modalidade de contratação pública, tendo-se constituído a Aquiris, que é dominada pela multinacional Veolia. É de referir que, na década de 90, o sector privado teve uma maior actividade, quer através da Suez, que operava vários sistemas, quer por intermédio da empresa Sever Trent, que possuía 49% da PPP referente à Aquafin. 2.2.3.2 Players do sector Na Flandres, as entidades encontram-se associadas a oito organizações do sector (Belgaqua, SVW, TNAV, Aquavisie, ISWa, Aqualink, VLW, VIWC/CIW). Os operadores de serviço de água nesta região diferem consideravelmente em tamanho e estatutos, pois muitas são as empresas a operar em territórios de reduzidas dimensões. A maior empresa, a VMW, presta o serviço de água a cerca de 40% da população da Flandres, ou seja, 2,4 milhões de habitantes, e os três maiores operadores (AWW, PIDPA e VMW) prestam o serviço a 80% da população, demonstrando que o serviço de água está maioritariamente a cargo destes três operadores. O serviço de águas residuais é fornecido por uma 79 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional única entidade gestora, a Aquafin, uma empresa regional, que outrora era uma PPP, que detém o monopólio do saneamento de águas residuais na região da Flandres, excepto em distritos com menos de 2.000 habitantes. Na Figura 17 evidencia-se a distribuição geográfica dos operadores. Figura 17 Distribuição geográfica dos operadores do serviço de água na Flandres cípios). A ETAR Norte é gerida pela Aquiris, como resultado de uma PPP dominada pela multinacional Veolia. Na região da Valónia, o subsector do abastecimento de água encontra-se fragmentado em 18 entidades gestoras. As quatro maiores empresas Operadores A gestão de uma das duas ETAR existentes (ETAR Sul) é providenciada pela Vivaqua, compreendem mais de 75% do número total de utilizadores na região. A maior empresa da Valónia, a SWDE, fornece o serviço de água a cerca de 70% da população da Valónia, ou seja, 2,3 milhões de habitantes. Além desta empresa regional, o subsector de abastecimento de água engloba 8 sistemas intermunicipais e 2 pequenos operadores municipais, enquanto o subsector do saneamento de águas residuais se restringe a 7 sistemas intermunicipais, dos quais dois também fornecem o serviço de água. A Figura 19 mostra a distribuição geográfica dos operadores. depois de se fundir com a Compagnie Intercommunale Bruxelloise des Eaux (CIBE), uma empresa que fornece todos os serviços do ciclo da água nas três regiões da Bélgica (água e águas residuais por delegação dos muni- A gestão pública directa, através de serviços municipais, encontra-se principalmente integrada na política de gestão de serviço público na região da Valónia. No entanto, a gestão pública delegada, através de departamentos municipais Na região de Bruxelas, o serviço de recolha e de drenagem de águas residuais é fornecido pela SBGE, uma sociedade supramunicipal responsável pelos grandes investimentos (por ex., estações de tratamento e bacias de drenagem), criada pela Portaria de 20 de Outubro de 2006. Tal como no serviço de águas residuais, o serviço de água é apenas fornecido por uma única entidade, ou seja, pela Intercommunale Bruxelloise de Distribution d’Eau (IBDE). Figura 18 Distribuição geográfica dos operadores do serviço de água na Valónia 80 Bélgica independentes, sistemas intermunicipais e empresas regionais, identifica-se como a gestão dominante na Bélgica. Os departamentos municipais independentes ocorrem quer na região da Flandres (12) quer na região da Valónia (2). Por sua vez, os sistemas intermunicipais abrangem grande parte do serviço de água na Bélgica, com 7 sistemas na Flandres, 15 na Valónia (7 sistemas intermunicipais compreendem todo o serviço de águas residuais na Valónia) e 2 em Bruxelas (IBDE e Vivaqua). Por último, existem duas empresas regionais na Flandres (a VWW fornece o serviço de água a 40% da população da Flandres e a Aquafin presta o serviço de águas residuais a 100% da população da Flandres) e uma na Valónia (a SWDE fornece o serviço de água a 70% da população da Valónia). 2.2.3.3 Integração do sector e serviços oferecidos O sector da água na Bélgica caracteriza-se por uma divisão parcial entre os operadores que têm serviços integrados e os que não têm, tanto vertical como horizontalmente. No serviço de água, apesar de alguns operadores na região da Flandres e o único operador na região de Bruxelas dependerem de água oriunda da região da Valónia, existem outros operadores na região da Flandres que integram totalmente o serviço de água. Os serviços de águas residuais pautam-se pela plena desintegração vertical, dado que se verifica, em todo o território belga, a existência de entidades dedicadas exclusivamente ao serviço de recolha e drenagem de águas residuais e outras entidades gestoras especializadas na gestão e exploração das ETAR. Além disso, é usual existirem operadores especializados para os diferentes SAS, observando-se uma desintegração horizontal destes serviços. Todavia, a Vivaqua constitui uma das excepções, uma vez que fornece todos os serviços relativos ao ciclo da água, nomeadamente fornecendo água a algumas intercommunales, gerindo os SAS de outras intercommunales e ainda a ETAR Sul na Região de Bruxelas-Capital. O mesmo sucede com a INASEP (Intercommunale Namuroise de Services Publics) e a IDEA (Intercommunale de Développement Economique et d’Aménagement de la Région Mons-Borinage-Centre), fornecendo, de modo integrado, os SAS na Região da Valónia. 2.2.3.4 Números do sector Na Bélgica são captados cerca de 730 milhões de m3 de água por ano para consumo humano, dos quais 400 milhões são usufruídos pelos utilizadores domésticos. A sua maior fonte é a água subterrânea com cerca de 470 milhões de m3 de água, ou seja, 65% de toda a água captada. Em 2005, os belgas apresentavam uma capitação de água de abastecimento de cerca de 106 litros por habitante e por dia. As perdas de água no sector da água da Bélgica evidenciam um valor próximo de 20% (Belgaqua, 2005). O serviço de água é fornecido a cerca de 99% da população belga, enquanto o serviço de recolha e drenagem de águas residuais apenas é prestado a 81,5%. O nível de atendimento do tratamento de águas residuais é de cerca de 50% (dados de 2004). Os sistemas de águas residuais são ainda predominantemente unitários. Em 2005, os SAS na Bélgica empregavam cerca de 7.200 funcionários. O sector da água na Bélgica compreende cerca de 4 milhões de utilizadores. O património inclui, aproximadamente, 101 mil km de condutas de abastecimento de água (Belgaqua, 2005). 2.2.4 REGRAS DO JOGO 2.2.4.1 Estabelecimento de tarifas Os sistemas tarifários dos SAS variam significativamente de região para região e reflectem opções legítimas dos decisores locais, uma vez que os preços da água constituem uma matéria de competência regional. Para esta situação contribuem diversos factores, nomeadamente o grande número de operadores da região da Flandres, que compram água em “alta” a outros operadores, encarecendo o preço, como consequência dos custos de transporte e também o facto de a captação de água subterrânea conduzir a custos menores de tratamento, apesar da respectiva sujeição a taxas elevadas. Além disso, determinadas questões associadas a cada operador, como o comprimento das redes, o grau de urbanização, o tipo de utilizadores, o número de funcionários, entre outras, conduzem às diferenças verificadas. No entanto, já há alguns anos, existe um intenso debate na sociedade belga sobre a uniformização das tarifas nas várias regiões e, inclusive, no país. Esta dis81 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional cussão, sustentada no argumento dos serviços essenciais e na sua importância para a coesão económica e social da população, já conduziu à definição de uma estrutura única para o sistema tarifário na região da Valónia. O sistema tarifário está uniformizado em toda a região da Valónia. Implementado pelos operadores, desde 1 de Janeiro de 2005 e independentemente da sua natureza (doméstico ou não doméstico), para os utilizadores, compreende uma parcela fixa e uma parcela variável que engloba os SAS. Ambas as parcelas são estabelecidas tendo em conta um factor denominado “truth-cost”, que repercute os verdadeiros custos de operação e manutenção dos diferentes serviços. A parcela fixa é determinada pelo somatório de 20 × CVD com 30 × CVA, em que o CVD corresponde ao “truth-cost” estimado pelo operador para o serviço de distribuição de água (que inclui as taxas de captação e os encargos com a produção e a distribuição), variando entre 0,77 euros e 1,86 euros, e o CVA constitui o “truth-cost” relativo ao tratamento de águas residuais (0,7950 euros em 2007), oscilando de ano para ano. Quadro 8 Sistema tarifário dos utilizadores domésticos da Bélgica A parcela variável, associada ao consumo, foi estabelecida segundo quatro escalões regressivos, que são apresentados no Quadro 8. A Região Parcela fixa Flandres 39 – 57 Bruxelas Valónia 11,9 - 23,80 20CVD + 30CVA Venda de água (€/m³) Conforme salientado, na região da Flandres, os sistemas tarifários existentes diferem consideravelmente de operador para operador. Por lei (Vlaams Decreet betreffende water bestemd voor menselijke aanwending), cada utilizador tem o direito ao fornecimento de 15 m3 de água gratuitos. Caso essa quantidade seja ultrapassada, o operador previa uma parcela variável associada ao consumo, oscilando entre 1,881 €/m³ e 2,931 €/m³, no ano de 2006. O sistema tarifário engloba também uma parcela fixa, que representa uma subscrição fixa, o aluguer do contador ou uma combinação de ambos. Em 2006, esta parcela variava entre 39 e 57 euros, consoante o operador em questão. Apenas em três situações o tarifário é progressivo em função do consumo, sendo, em geral, fixo ou regressivo. O saneamento de águas residuais é ainda muito subsidiado. No entanto, existe uma tarifa para o tratamento de águas residuais para toda a região, de 0,7730 €/m³ (em 2007), imposta pela Aquafin, enquanto para a maioria dos operadores dos serviços de recolha e drenagem de águas residuais já é cobrado um valor pelo serviço prestado, em alguns casos 1,5 vezes o valor referente ao tratamento de águas residuais. Normalmente, a tarifa é independente da natureza do utili- Fundo social (€/m³) 0-15 m3 0 >15 m3 1,881-2,931 0-15m³ 0,80 15-30m³ 1,39 30-60m³ 2,06 >60 m³ 3,06 0-30 m3 0,5CVD 30-5.000 m3 CVD+CVA 5.000-25 000 m3 0,9 CVD+CVA >25 000 m3 0,7CVD+CVA Figura 20 evidencia o sistema tarifário da Valónia (CCE, 2007). Este compreende ainda uma parcela que tem como objectivo a constituição 82 de um fundo social de ajuda do pagamento dos SAS para as famílias mais carenciadas. A contribuição para esse fundo era de 0,0125 €/ m³ no início de 2007. Tarifa de serviço de saneamento (€/m³) 0,01 Aquafin 0,7730 Municípios Variável ‑ IBDE IBDE Regional 0,3275 Municípios 0,43 0,0125 Conjunta com a venda de água zador, existindo alguns operadores que negoceiam bilateralmente com os grandes utilizadores. No abastecimento de água, em muitos Bélgica Figura 20 Metodologia de definição de tarifas na região da Valónia operadores, o sistema tarifário não varia com o utilizador (doméstico ou não doméstico), embora noutros exista um preço inferior para os grandes utilizadores (superior a 1.000 m3 de consumo), chegando mesmo a existir, para os muito grandes, negociação directa para a definição de um preço ainda inferior. A definição de utilizadores não domésticos varia de acordo com o operador. Na região de Bruxelas, o serviço de água é caracterizado por um único sistema tarifário, constituído por duas parcelas principais, as quais se alteram segundo a natureza do utilizador. Para os utilizadores domésticos, o sistema tarifário divide-se em quatro escalões e os encargos crescem com o consumo de água. Para os utilizadores não domésticos e não industriais o tarifário é linear, ao passo que para os industriais existem dois escalões. O tarifário em vigor parece indiciar que não se verifica subsidiação entre os diferentes utilizadores. A parcela fixa para o serviço de água é implementada consoante o operador, oscilando entre os 11,9 euros e os 23,80 euros (ano de 2007). O operador estabeleceu ainda uma tarifa adicional de 0,01 €/m³ sobre a quantidade facturada, com vista à universalização do serviço, através da criação de um fundo que permita a subsidiação às famílias mais carenciadas. Para o serviço de águas residuais subsistem vários tarifários, dependendo das condições locais, se forem relativos aos municípios ou a um único para o sistema regional. Todos eles incluem duas parcelas, sendo uma variável com o consumo, sem escalões, e a outra fixa, mas mutável de acordo com a localização, não existindo diferenças em função da natureza do utilizador. Por último, é de referir também que, para além do IVA (à taxa de 6% para os dois serviços), existe uma taxa que os utilizadores pagam (0,35 €/m³), com vista ao financiamento da construção das infra-estruturas de tratamento das águas residuais. 2.2.4.2 Qualidade do serviço O sector da água na região da Valónia funcionava, até um passado muito recente, em autoregulação. Os preços não eram supervisionados (tal como as obrigações de serviço público) e a qualidade do serviço prestado pelos operadores, não era controlada nem, por vezes, conhecida. No entanto, a associação de operadores da Valónia, AQUAWAL, contribuía para a normalização e divulgação de boas práticas e promovia também a disseminação de alguma informação estatística. No intuito de colmatar os problemas associados à desregulamentação existente, através do CCE, a região da Valónia desenvolveu, para além dos indicadores de controlo das missões legais atrás apresentados, um conjunto de quinze indicadores de desempenho sobre o funcionamento dos operadores. Estas medidas de avaliação, que são calculadas e fornecidas pelos operadores ao CCE, numa folha de cálculo desenvolvida por esta última entidade, foram escalonadas em seis classes, designadamente, na qualidade do serviço, na protecção das captações, na gestão e durabilidade do património, nos preços e gestão, na cobertura e solidariedade e na satisfação dos utilizadores e comunicação. Estes indicadores pretendem estimar e comparar a evolução da qualidade do serviço entre os operadores (regulação sunshine), criando e estimulando a concorrência entre os mesmos (yardstick competition ou competição por comparação). Para além de permitir que as entidades gestoras concretizem uma gestão por objectivos na exploração dos respectivos serviços, as mesmas indicam os valores que consideram adequados para os indicadores, bem como os factores que 83 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional podem influenciar o respectivo desempenho. A folha de cálculo inclui ainda alguns factores de contexto predefinidos. No Quadro 9, apresentam-se os indicadores desenvolvidos pelo CCE, to no que toca a assuntos referentes à qualidade da água, contemplados na lei, e aos aspectos referidos na Charte de Service, apresentada em seguida. Não existem, porém, organismos oficiais responsáveis por essa actividade. Indicadores de Desempenho Qualidade da água Preços e Gestão Conformidade das análises obrigatórias (%) Custo de exploração do serviço de água (€ m-3) Conformidade das análises recomendáveis (%) Custo total por m3 (€ m-3) Número de análises realizadas (%) Factura média (€ util.-1) Protecção das captações Cobertura e solidariedade Volume captado em protecções próprias (%) Prazo médio de recebimentos (dias) Volume captado em protecções próprias licenciadas (%) Crédito de clientes irrecuperáveis (%) Gestão e durabilidade do património Satisfação do cliente e comunicação Volume de água não facturado por extensão de rede (m3dia-1km-1) Número de delegações técnicas (n.º 10-3 util.-1) Volume de água não facturado por contador (m3ano-1cont-1) Rendimento da rede (%) Reabilitação da rede (%) Quadro 9 Indicadores de desempenho adoptados pelo CCE que possibilitam a avaliação da qualidade do serviço. Na Figura 21 é apresentado o esquema de regulação da qualidade do serviço do CCE (CCE, 2006). Na região da Flandres, a qualidade da água para consumo humano encontra-se regulada por legislação da UE, transcrita para a lei belga e para a lei da região da Flandres. Em 2002, esta última publicou um decreto (Betreffende de kwaliteit van het voor menselijke consumptie bestemde water), que estabelece penalidades para os operadores que não cumpram as normas especificadas. A qualidade da água tem vindo a manterse estável ao longo dos anos. Alguns operadores do serviço de água trabalham em conjunto, no sentido de promover projectos específicos relativos à qualidade do serviço. No entanto, não existe informação sobre a qualidade do serviço prestado, nem nenhum procedimento definido para a respectiva supervisão cíclica. Ressalva-se que, até agora, ainda não foi efectuada, pelo menos publicamente, qualquer comparação global sobre a qualidade do serviço, embora a SVW (Associação das Entidades Gestoras) tenha desenvolvido, no passado, um estudo de benchmarking intitulado ‘Samenwerking Vlaams Water’. Aliás, uma das principais razões que fundamentam a decisão política da criação de uma entidade reguladora para o sector é precisamente a necessidade de um organismo que regule a qualidade do serviço dos SAS. Em relação à região de Bruxelas, não existe informação sobre a qualidade do serviço prestado pelo operador, excep- 84 2.2.4.3 Obrigações de serviço público Tendo em conta que na Bélgica não existe qualquer lei federal para as obrigações de serviço público, as três regiões reconhecem a essência dos SAS e definiram um conjunto mínimo de condições de prestação do serviço. Em certas situações, existe regulamentação regional E noutros casos são os próprios operadores que, voluntariamente e de forma individual ou através das respectivas associações, definem esses mesmos requisitos mínimos. Por exemplo, no que concerne à universalidade dos serviços, por um lado, estão estipulados fundos para o efeito (Valónia e Bruxelas) e, por outro lado, prevê-se o fornecimento gratuito de uma determinada quantidade de água (até 15 m3 na Flandres). Na Bélgica, o sector da água é bastante subsidiado através dos respectivos governos, mas não entre utilizadores da mesma natureza ou de natureza distinta, mantendo-se uma equidade elevada entre os mesmos. Na região da Valónia, a maioria das obrigações de serviço público tem sido historicamente implementada nos SAS através de regulamentação. São disso exemplo as obrigações impostas por via da legislação europeia, como a obrigação relativa à protecção das captações ou à qualidade da água, ou pelo próprio parlamento da re- Bélgica Figura 21 Processo regulatório do sector da água na Valónia gião da Valónia, ao estabelecer as condições de abastecimento público no Code de l´Eau ou ao definir o Fundo Social (Decreto de 20 de Fevereiro de 2003). A CCE desenvolveu um conjun- to de indicadores relativos às obrigações legais de cada operador. Os treze indicadores criados, apresentados no Quadro 10, permitem à CCE e aos restantes stakeholders analisar o desem- Missões legais a. Estabelecimento de ligações em conformidade (pressão e débito) - b. Reabilitação das ligações em chumbo - c. Captações que foram sujeitas a autorização (%) d. Captações cujo perímetro de delimitação foi aceite pela entidade competente (%) e. Captações cujo perímetro foi aprovado em Diário da República (%) f. Contadores que não foram lidos nos últimos 5 anos (%) g. Ligações efectuadas em mais de 30 dias de calendário de atraso (%) h. Marcação da realização das ligações em mais de 10 dias de calendário (%) i. Percentagem de contadores com mais de 16 anos (%) j. Percentagem de medidores com mais de 8 anos (%) k. Idade média dos contadores (anos) l. Realização de controlos completos de qualidade da água (%) m. Realização de controlos de rotina da qualidade da água (%) Quadro 10 Indicadores relativos às missões legais na região da Valónia 85 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional penho e o cumprimento relativos a estas missões legais. Na região da Flandres, a maioria dos operadores assume obrigações mínimas perante os utilizadores que se comprometem a respeitar (Níveis de Qualidade de Serviço). Muitos deles incluem indemnizações aos utilizadores quando não disponibilizam os serviços nas condições acordadas. Por exemplo, a VMW definiu um padrão mínimo de serviço a prestar aos utilizadores, obrigando-se a compensá-los em 25 euros, caso o mesmo não seja garantido (Níveis de Qualidade de Serviço). A VMW indemnizará os respectivos utilizadores se, pelo menos, uma das sete circunstâncias seguintes não se verificar: Quadro 11 Compromissos assumidos pelo IBDE Princípio • Se a qualidade da água para abastecimento humano for alterada, providenciará a disponibilização de abastecimentos alternativos de água para consumo humano; • Se a ligação não for restabelecida à rede dentro de três dias; • Se uma nova ligação não for estabelecida dentro de 15 dias; • Se não existir atendimento individual dentro de duas horas, no caso de avaria; • Se todas as reclamações e questões solicitadas não forem tratadas em 10 dias úteis; • Se os funcionários dos operadores não cumprirem os horários e os compromissos assumidos perante os utilizadores; • Se não existir aviso prévio de interrupção planeada de, pelo menos, uma semana. Na região de Bruxelas, o IBDE definiu medidas standard, enunciadas na sua “charte de services”, que têm como objectivo a defesa dos interesses dos utilizadores, embora não esteja prevista nenhuma contrapartida financeira, caso as mesmas não sejam respeitadas. O Quadro 11 apresenta os compromissos assumidos pelo IBDE. 2.2.5 DESEMPENHO O sector da água da Bélgica pauta-se pela complexidade e diversidade entre as três regiões. A informação sobre o sector não é abundante, sobretudo na região da Flandres, Compromisso do operador Acesso à informação Acessibilidade a informação, completa, clara, exacta e actual. Respeito pela vida privada Respeitar a vida privada dos utilizadores. Porte do distintivo obrigatório Cada funcionário apresenta identificação quando em contacto com o público. Respeito pelo compromisso Assistência técnica, quer no domicílio, quer no respectivo edifício central. Tempo de resposta Responder a reclamações/solicitações dentro de 10 dias. Qualidade do serviço/Reclamações Contactar de imediato o reclamante quando o assunto for relativo à qualidade da água. Mostrar os resultados das amostras aos respectivos utilizadores dentro de 7 dias úteis. Facturação Enviar uma factura clara e legível aos respectivos utilizadores. Facilidades de pagamento Propor planos de pagamento em caso de necessidade. Coloca à disposição do Centro Público de Acção Social um fundo social permanente para pessoas com requisitos específicos (por ex., deficientes motores) e com dificuldades financeiras, mediante certas condições. Serviços administrativos não especificados na factura Não cobrar duplicados em caso de solicitação e deslocações dos trabalhadores aquando da leitura do contador. Assinatura Cancelar o contrato se o mesmo for solicitado por carta registada. Realizar uma mudança de utilizador no próprio dia e sem cobrança. Serviço permanente Disponibilizar o serviço de atendimento 24 horas por dia através do piquete. Trabalhar fora das horas normais de serviço, caso seja necessário. Duração de intervenção No caso de condições atmosféricas normais, intervir em menos de duas horas e iniciar a reparação em 48 horas. Em caso de avaria do sistema, e se a interrupção do abastecimento de água englobar, pelo menos, dez utilizadores, providenciar alternativa de emergência. Além disso, o serviço deverá ser restabelecido dentro de 24 horas, em caso de avaria central. Pedidos de ligação Estabelecer uma ligação no espaço de 15 dias, a partir do dia de solicitação. Interrupção do abastecimento de água Não interromper o serviço por mais de 24 horas. Avisar os utilizadores, pelo menos, um dia antes de uma interrupção planeada. Garantia de desligamento Garantir o fecho da ligação através de um funcionário. Erradicação do chumbo Erradicar as ligações de chumbo até 2013. 86 Bélgica onde não existem elementos sobre o desempenho do sector. A forma de delegação das empresas públicas e o respectivo funcionamento também é pouco transparente. A Bélgica carece de recursos hídricos e, embora evidencie uma capitação de água reduzida e uma consciência ambiental elevada, o sistema tarifário não transmite uma mensagem adequada ao mercado, estimulando o consumo e o desperdício. Os SAS não são muito fragmentados, mas evidenciam ganhos potenciais de economias de processo e também de economias de gama. De qualquer forma, o sector apresenta uma relação qualidade/preço interessante e existe uma grande preocupação com os utilizadores e com o respeito pelas obrigações de serviço público. Na região da Valónia, o regulador, se o respectivo papel se tornar efectivo, constituirá uma mais valia, tal como o da Flandres, se entretanto iniciar funções. Por último, é de referir, que o tratamento de águas residuais está ainda muito atrasado, evidenciando actualmente (2007) um nível de atendimento bastante reduzido e ímpar entre os países desenvolvidos. No futuro, o sector privado poderá ter aqui uma palavra a dizer. 87 Brasil 2.3 BRASIL 2.3.1 ANTECEDENTES HISTÓRICOS O Brasil é uma república federativa organizada em cinco regiões geográficas e formada pela união de 26 estados federados, 5.564 municípios e um Distrito Federal (Brasília) que, por sua vez, se dividem em 5.564 municípios. O país possui 8 514 877 km2 de área e tem uma população de cerca de 190 milhões de pessoas. No Brasil, o poder executivo é exercido pelo Presidente, eleito quadrienalmente e que acumula as funções de chefe de Estado e chefe de governo. Concomitantemente às eleições presidenciais, vota-se para o Congresso Nacional, sede do Poder Legislativo, que se divide em duas casas parlamentares: a Câmara dos Deputados, com mandatos de 4 anos, e o Senado Federal, eleito em 1 e 2 terços, alternadamente, a cada 4 anos e cujos membros possuem mandatos de 8 anos. A disponibilidade de recursos hídricos no Brasil varia de região para região, com o máximo de disponibilidade na Região Norte (bioma amazónia) e áreas de relativa escassez como na Região do Semi-Árido do Nordeste (bioma caatinga), exercendo um papel significativo no desenvolvimento económico e social de cada região. O crescimento populacional e económico no século XX, sobretudo a partir do fim da segunda guerra mundial, associado ao investimento estrangeiro, conduziu à exploração desmesurada dos recursos naturais, em geral, e do comprometimento da qualidade dos recursos hídricos, em particular, nas Regiões Sul e Sudeste. Visando esta questão, na década de 80, foram aprovados os primeiros documentos normativos relativos à supervisão ambiental e as indústrias privadas foram pressionadas em relação ao tratamento dos respectivos efluentes. No entanto, o controlo dos efluentes domésticos ainda se mantinha à margem desta política, uma vez que, sendo responsabilidade do sector público, permanecia como uma tarefa de difícil concretização. Os anos 90, por sua vez, foram caracterizados por enormes desafios no sector da água, inter alia, na definição dos aspectos institucionais de gestão dos recursos hídricos, no controlo dos recursos hídricos nas grandes metrópoles brasileiras, na preservação ambiental, no uso e controlo do solo rural e na mitigação do impacto da poluição difusa, adoptando-se uma visão racional de aproveitamento e preservação ambiental. No que concerne à utilização, gestão e regulação dos recursos hídricos e respectivos serviços, o Brasil revela uma legislação adequada e robusta, tendo em conta a conjuntura continental em que se insere. Desde a instituição do Código de Águas, através do Decreto n.º 24.643, de 1934, ainda em vigor, a legislação brasileira sofreu mudanças significativas. Em especial, após a promulgação da Constituição Federal de 1988, com a nova repartição de competências entre os entes federados, ficou estabelecido que compete à União definir as directrizes gerais e os princípios que regem a política de recursos hídricos e normalizar, através da legislação federal, a organização dos sistemas de controlo do uso de recursos hídricos. Por outro lado, compete aos estados a organização do sistema de gestão dos recursos hídricos, que são de domínio dos estados, como os cursos de água que nascem e desaguam no território de um mesmo estado e as águas subterrâneas subjacentes nos respectivos territórios. Em 1993, foi instituído o Sistema Nacional de Gestão de Recursos Hídricos (SNGRH), através da Lei n.º 9.433, que regulamentou o art. 21 da Constituição Federal, o qual determinou que compete à União instituir o sistema nacional de gestão de recursos hídricos e definir critérios de outorga de direitos do respectivo uso. O SNGRH baseia-se nos seguintes fundamentos: a água é um bem de domínio público; a água é um recurso natural limitado, dotado 89 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional de valor económico; em situações de escassez, o uso prioritário dos recursos hídricos é o consumo humano e a pecuária; a gestão dos recursos hídricos deve sempre proporcionar o uso múltiplo das águas; a bacia hidrográfica é a unidade territorial para a implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos e para a actuação do Sistema Nacional de Gestão de Recursos Hídricos; a gestão dos recursos hídricos deve ser descentralizada e contar com a participação do Poder Público, dos utilizadores e das comunidades. A previsão legal para a implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos, define que cabe aos Poderes Executivos Estaduais e ao Distrito Federal, nas suas esferas de competência, outorgar os direitos de uso de recursos hídricos e regulamentar e fiscalizar os respectivos usos; realizar o controlo técnico das obras de oferta hídrica; implantar e gerir o SNGRH, no âmbito estadual e distrital federal; promover a integração da gestão de recursos hídricos com a gestão ambiental. Além disso, na implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos, os Poderes Executivos do Distrito Federal e dos municípios devem promover a integração das políticas locais de saneamento básico, de uso, ocupação e conservação do solo e de meio ambiente com as políticas federal e estaduais de recursos hídricos. No ano de 2000, foi aprovada a Lei n.º 9.984 que definiu as competências do Conselho Nacional de Recursos Hídricos para a articulação dos planeamentos nacional, regional, estadual e dos sectores utilizadores, elaborados pelas entidades que integram o Sistema Nacional de Gestão de Recursos Hídricos e a formulação da Política Nacional de Recursos Hídricos, conforme previsto na Lei n.º 9.433/97. Ao mesmo tempo, foi criada a Agência Nacional de Águas - ANA, que é uma autarquia vinculada ao Ministério do Meio Ambiente, com a finalidade de implementar a Política Nacional de Recursos Hídricos, integrando o Sistema Nacional de Gestão de Recursos Hídricos. Cada um dos estados e o Distrito Federal aprovaram as respectivas legislações relativas aos recursos hídricos ou actualizaram as mesmas após a aprovação da Lei n.º 9433/94. O Código de Águas, como primeiro documento legal vocacionado especificamente para o serviço de água, decretou a utilização gratuita de qualquer corrente ou nascente de água. Consequentemente, não existem águas particulares no país. Mesmo as nascentes que se encontram nos limites de uma propriedade privada, assim como os rios que servem de limite entre duas propriedades privadas, devem ter a respectiva utilização subordinada ao interesse público. Até recentemente, nos sectores de abasteci90 mento de água e de saneamento de águas residuais, a principal medida do governo federal tinha sido o estabelecimento do Plano Nacional de Saneamento (PLANASA), criado em 1978. O PLANASA apoiava-se no Sistema Financeiro de Saneamento gerido pelo Banco Nacional de Habitação (BNH), que era uma entidade administradora dos recursos gerados pelo Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), constituído por recursos recolhidos pelas empresas correspondentes à parcela de 8% dos salários mensais pagos. Relativamente à estrutura operacional, o PLANASA determinava a desvinculação dos SAS da responsabilidade municipal, transferindo a mesma para os respectivos estados. Cada estado da federação deveria criar a sua Companhia Estadual de Saneamento Básico (CESB), necessitando, para tal, de obter a concessão dos municípios do respectivo estado, de forma a funcionar nos mesmos em forma de monopólio. O PLANASA exigia ainda que cada estado criasse, com recursos orçamentais próprios, um Fundo de Financiamento para Águas e Esgotos (FAE) e que investisse, pelo menos, 50% do montante global dos respectivos recursos, sendo que os 50% restantes eram disponibilizados através do BNH e, supletivamente, através de empréstimos externos, principalmente do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e do Banco Mundial, para além de recursos fiscais do governo federal. Os recursos, assim investidos, foram expressivos, perfazendo cerca de 5 mil milhões de euros, entre 1971 e 1991, data em que se esgotou o FAE, permitindo o aumento do nível de atendimento, principalmente nas áreas urbanas, tendo incorporado mais de 66 milhões de habitantes nos serviços de água e 43 milhões nos serviços de águas residuais. Posteriormente foram aplicados vários planos, como o Programa Pró-Saneamento, o Programa Pró-Sanear, o Programa Pró-Comunidade, o Programa FCP/PAN, o Programa Saneamento Rural, o Programa Saneamento é Vida e o Programa Saneamento para Todos. Estes programas, que pretendiam atingir objectivos específicos, eram apoiados tanto pelas entidades governamentais como pelas entidades financiadoras brasileiras e internacionais como, por exemplo, o Banco Mundial. Os resultados foram, na generalidade, positivos, traduzindo-se num aumento significativo do nível de atendimento e de acesso aos serviços por parte dos grupos abrangidos. A proposta de Lei n.º 4.147, de 2001, por exemplo, tinha como objectivo possibilitar um maior acesso do sector privado aos SAS. Este projecto de lei definia os estados como as entidades concedentes nas áreas metropolitanas. Entretanto, a reforma constitucional de 1988 Brasil tinha concedido aos municípios o direito de estabelecer concessões para serviços públicos de interesse local. Devido a esta controvérsia sobre a interpretação da Constituição, essa proposta de lei nunca se transformou em lei, encontrando-se em julgamento no Tribunal Superior a questão da titularidade dos serviços de abastecimento de água e do saneamento de águas residuais. Em 2005, um projecto de lei (n.º 5.296) pretendia estabelecer um novo marco regulatório para o sector da água no Brasil. A Comissão Parlamentar aprovou este projecto em Julho de 2006, após muitas modificações e o mesmo foi transformado na Lei n.º 11.445, em Janeiro de 2007. Este documento normativo estabelece as directrizes nacionais para o saneamento básico, alterando a legislação vigente. Devido à sua brevidade e uma vez que a problemática da titularidade dos serviços ainda não está definida, as implicações decorrentes da Lei n.º 11.445 estão para ser averiguadas no futuro. A Lei n.º 11.445 tem como alvo o aumento de investimentos destinados à melhoria do acesso universal aos SAS e considera as especificidades locais e o uso de tecnologias apropriadas, que se coadunem com a capacidade de pagamento dos utilizadores. A lei ordena o papel dos reguladores e pretende também aumentar a transparência e a responsabilização no sector. Além disso, procura harmonizar as regras de funcionamento e de relação entre os diferentes stakeholders. Todavia, esta lei deixa alguns temas por definir, nomeadamente a responsabilidade pelo fornecimento dos SAS nos grandes centros metropolitanos, onde alguns municípios desafiaram a constitucionalidade da operação dos SAS por parte das empresas estaduais. A Lei n.º 11.079, de 2004, tem um papel relevante na organização actual do sector, instituindo normas gerais para a instituição de PPP, no âmbito da administração pública, o que foi também replicado por leis estaduais, disciplinando a participação da iniciativa privada em projectos de interesse dos serviços públicos. No entanto, é de realçar que esta lei inclui apenas as concessões administrativas a patrocinadas e que as concessões comuns de serviços públicos são abrangidas pela Lei n.º 11.079, de 30 de Dezembro de 2004. Ainda em 2007, o presidente anunciou o novo Programa de Aceleração de Crescimento (PAC), o qual inclui investimentos significativos em estradas, aeroportos, portos, energia, habitação e também nos SAS, beneficiando assim a população mais pobre. O programa estabelece um total de 159 mil milhões de euros destinados a investimentos até 2010, dos quais 139 mil milhões de euros serão fornecidos por companhias estaduais e pelo sector privado, enquanto o remanescente será obtido junto do governo federal. Além destas leis federais instituídas por Brasília, os governos estaduais também podem estabelecer as suas próprias leis em relação à gestão dos recursos hídricos. Actualmente, constata-se que a maioria dos estados tem adoptado a sua própria política para os recursos hídricos. 2.3.2 ENQUADRAMENTO LEGAL E INSTITUCIONAL 2.3.2.1 Responsabilidades No Brasil, embora existam entidades responsáveis por praticamente todas as actividades ligadas à gestão dos recursos hídricos, verificase que a articulação entre os diferentes níveis de governo é ainda frágil e incipiente, produto de factores estruturais e circunstanciais associados, principalmente, à própria organização político-administrativa do país. Às limitações inerentes à gestão de um sector em que convivem três esferas administrativas decisórias (federação, estados e municípios) aliam-se, para explicar a ausência de acções coordenadas de gestão da água, factores, como a ausência histórica de prioridade política dada ao sector da água e a própria fase de alterações institucionais em que o país se encontra. Como referido anteriormente, o sector da água encontra-se, sobretudo, regulamentado pelo Ministério do Meio Ambiente, Ministério de Integração Nacional, Ministério das Cidades e Ministério da Saúde. Na esfera do Ministério das Cidades, é especialmente salientado o papel desempenhado pelo Sistema Nacional de Informação sobre Saneamento (SNIS), englobado no Programa de Modernização do Sector Saneamento (PMSS). Apesar de ter perdido alguma da preponderância que detinha outrora em detrimento das autoridades estaduais, a ANA ainda apresenta valências importantes no seio do sector da água. As associações do sector, como a Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (ABES), a Associação Brasileira de Recursos Hídricos (ABRH), a Associação Brasileira de Empresas Estaduais (AESBE), a Associação Brasileira de Concessionárias (ABCON), a As91 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional sociação Nacional dos Servidores Municipais de Saneamento (ASSEMAE) e a Associação Brasileira de Agências de Regulação (ABAR), encontram-se igualmente dotadas de atribuições relevantes na defesa dos respectivos associados. Por último, mas talvez os organismos mais importantes, tendo em conta a defesa dos diferentes stakeholders, encontramse as entidades reguladoras estaduais dos SAS entre os diferentes níveis de poder, como será explicado no ponto seguinte. A nível nacional, o Ministério das Cidades coordena as políticas sectoriais de saneamento básico que são implementadas por vários Ministérios. Por exemplo, o Ministério da Saúde possui várias atribuições relacionadas com o sector da água, nomeadamente no que concerne à qualidade da água, enquanto o Ministério de Integração Nacional, o Ministério de Agricultura e o Ministério da Reforma Agrária têm atribuições ao nível das áreas rurais. Na esfera federal, a gestão de recursos hídricos é da responsabilidade da ANA, que é tutelada pelo Ministério do Meio Ambiente. A Lei Federal n.º 9.984, de 17 de Julho de 2000, estabelece que é da responsabilidade da ANA estimular e apoiar as iniciativas voltadas para a criação de órgãos gestores de recursos hídricos, ou seja, de Comités de Bacias Hidrográficas e, quando se justificar a sua existência, das Agências de Bacia. A ANA tem procurado, de forma ampla e transparente, cumprir estas responsabilidades. Em suma, a ANA tem como missão regular o uso das águas dos rios e dos lagos de domínio Federal e implementar o Sistema Nacional de Gestão de Recursos Hídricos, garantindo a respectiva utilização de modo sustentável, evitando a poluição e o desperdício e assegurando, para o desenvolvimento do país, água de boa qualidade e em quantidade suficiente, quer para a geração actual, quer para as gerações futuras. O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), subordinado ao Ministério do Meio Ambiente, tem por missão institucional executar as políticas nacionais de meio ambiente. As funções básicas do IBAMA incluem, entre outras, o controlo e a fiscalização do uso dos recursos naturais renováveis, o fomento da implementação de unidades de conservação, a monitorização ambiental e a protecção e preservação de ecossistemas, da flora e da fauna. Fazem parte da estrutura básica desta instituição as Superintendências Estaduais, as quais permitem assegurar a presença do IBAMA em todas as unidades da federação. O SNIS constitui a maior base de dados do sector da água brasileiro. Constituindo uma inicia92 tiva do Ministério das Cidades, no domínio da Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental (SNSA), é administrado no âmbito do PMSS. Por sua vez, o PMSS, o programa que criou e administra o SNIS, desenvolve inúmeras acções no campo da estruturação dos SAS, contribuindo para o desenvolvimento da gestão do sector. 2.3.2.2 Regulação No Brasil, a Lei n.º 11.445 determina que os SAS têm de ser regulados. Embora não especifique o nível de actuação do governo destas entidades e grande parte das entidades reguladoras em funcionamento sejam anteriores à respectiva publicação, de acordo com a lei referida, as entidades reguladoras terão os seguintes objectivos: • Estabelecer padrões e normas para a prestação adequada dos serviços e para a satisfação dos utilizadores; • Garantir o cumprimento das condições e metas estabelecidas; • Prevenir e reprimir o abuso do poder económico, ressalvada a competência dos órgãos integrantes do sistema nacional de defesa da concorrência; • Definir tarifas que assegurem tanto o equilíbrio económico e financeiro dos contratos como a modicidade tarifária, mediante mecanismos que induzam a eficiência e eficácia dos serviços e que permitam a apropriação social dos ganhos de produtividade. A entidade reguladora ficará responsável pela edição de normas relativas às dimensões técnica, económica e social de prestação dos serviços, que abrangerão, pelo menos, os seguintes aspectos: a) padrões e indicadores de qualidade da prestação dos serviços; b) requisitos operacionais e de manutenção dos sistemas; c) metas progressivas de expansão e de qualidade dos serviços e respectivos prazos; d) regime, estrutura e níveis tarifários, bem como procedimentos e prazos para a respectiva fixação, e) reajuste e revisão; f) medição, facturação e cobrança de serviços; g) monitorização dos custos; h) avaliação da eficiência e da eficácia dos serviços prestados; i) plano de contas e mecanismos de informação, auditoria e certificação; j) subsídios tarifários e não tarifários; k) padrões de atendimento ao público e mecanismos de participação e informação; e l) medidas de contingências e emergências, inclusive o racionamento. Brasil Por norma, as entidades reguladoras no Brasil são independentes no exercício das respectivas funções e revestem-se de autonomia administrativa, financeira e orçamental, apesar de possuírem apertados deveres de responsabilização. Devem ser regidas por princípios de transparência, tecnicidade, celeridade e objectividade das decisões. Em 1999, as entidades reguladoras constituíram uma associação civil, a ABAR. Esta entidade possui atribuições diversas e preponderantes (art. n.º 2 do respectivo regulamento), quer ao nível da evolução dos sectores regulados, quer relativamente à defesa dos respectivos associados. No final de 2007, a ABAR contava com 29 agências reguladoras associadas aos vários níveis de governo - nacional, estadual Regulador e municipal - e com atribuições sobre diversos sectores, como energia, gás, transportes, água e águas residuais. O Quadro 12 apresenta as entidades reguladoras do sector da água no Brasil e o respectivo âmbito de actuação, realçando-se que algumas são estaduais e municipais e outras multissectoriais. Considerando o vasto número de operadores dos SAS, apenas um reduzido número de concessionárias é regulado. Esta situação, que tende a ser contrariada, não diminui o papel bastante positivo da maioria das entidades reguladoras no Brasil como, por exemplo, da ARCE e da ARSBAN. Todos os reguladores têm funções relevantes de Estado/Região Quadro 12 Entidades reguladoras do Brasil e respectivo âmbito de actuação Âmbito de actuação ARCE Ceará Electricidade, Gás, Água, Águas Residuais e Transportes ARPE Pernambuco Electricidade, Gás, Água, Águas Residuais, Transportes, Lotaria, ISFL AGR Goiás Electricidade, Água, Águas Residuais, Gás, Transportes e Recursos Hídricos Brasília (Distrito Federal) Água e Águas Residuais Tocantins Electricidade, Água, Águas Residuais e Transportes Natal (Municipal) Água e Águas Residuais Rio de Janeiro Água, Águas Residuais, Electricidade e Gás ARSAM Amazonas Água, Águas Residuais e Transportes AGERSA Cachoeiro de Itapemirim Água e Águas Residuais AGEPAN Mato Grosso do Sul Electricidade, Água, Águas Residuais, Gás e Transportes ARSESP São Paulo Electricidade, Água, Águas Residuais e Gás ARPB Paraíba Electricidade, Água, Águas Residuais e Gás AMAE Joinville (Municipal) Água e Águas Residuais ARSAL Alagoas Electricidade, Água, Águas Residuais, Gás e Transportes AGESC Santa Catarina Electricidade, Água, Águas Residuais, Gás e Transportes AGEAC Acre Electricidade, Água, Águas Residuais e Telecomunicações Mato Grosso Electricidade, Água, Águas Residuais, Gás, Rodovias e Transportes AGERGS Rio Grande do Sul Electricidade, Água, Águas Residuais, Rodovias, Irrigação e Transportes Rodoviários de Passageiros ARSAE Mauá (Municipal) Água e Águas Residuais ADASA ATR ARSBAN AGENERSA AGER 93 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional Quadro 13 Metodologias de regulação económica e de qualidade do serviço usadas no Brasil 94 defesa dos interesses dos utilizadores. Alguns já aplicam esquemas de benchmarking, quer para a regulação da qualidade do serviço, quer para a regulação tarifária. Em conformidade com a Lei n.º 11.445, também já começaram a ser adoptados processos regulamentares de estabelecimento de preços baseados em incentivos de desempenho (por ex., limite de preços). Na regulação da qualidade do serviço, muitos dos reguladores (por ex., ARPE, AGENERSA, ADASA e ARCE) determinam, comparam e publicitam um conjunto de indicadores de desempenho dos operadores. No Quadro 13 é apresentado o âmbito das atribuições dos reguladores e das respectivas metodologias. Várias destas entidades iniciaram funções recentemente, pelo que os processos regulatórios permanecem algo indefinidos. As diferentes associações do sector da água referidas anteriormente e algumas ONG como, por exemplo, a SOS Mata Atlântica e o Instituto Brasileiro de Defesa do Utilizador, possuem igualmente funções regulatórias relevantes, ainda que de auto-regulação e por publicitação, fomentando a disseminação das melhores práticas entre os respectivos associados e discutindo os problemas na sociedade civil. Entidade reguladora Qualidade do serviço Regulação económica ARCE Indicadores de desempenho - ARPE Indicadores de desempenho Taxa de remuneração AGR Indicadores de desempenho Limite de preços ADASA Indicadores de desempenho Limite de remuneração ATR - - ARSBAN - - AGENERSA Indicadores de desempenho Taxa de remuneração ARSAM - - AGERSA Indicadores de desempenho Taxa de remuneração AGEPAN - - ARSESP - - ARPB Indicadores de desempenho - AMAE Indicadores de desempenho Taxa de remuneração ARSAL - - AGESC - - AGEAC - - AGER - - AGERGS Indicadores de desempenho Taxa de remuneração ARSAE - Taxa de remuneração Brasil 2.3.3 ESTRUTURA DO MERCADO 2.3.3.1 Propriedade e gestão dos serviços No Brasil, os SAS são fornecidos maioritariamente pelo sector público. Neste âmbito, o sector privado apenas presta estes serviços a uma parcela reduzida da população brasileira, incidindo sobretudo nas áreas rurais. 25% da população é fornecida por empresas privadas, das quais 5% são possuidoras dos activos das infra-estruturas. A ABCON argumenta que somente através de uma maior participação do sector privado será possível realizar os elevados investimentos requeridos pelos SAS brasileiros. Além da eterna discussão comum a outros países, entre a gestão e a propriedade pública versus privada, o Brasil caracteriza-se por outra grande controvérsia que, neste caso, é a separação de poderes sobre o fornecimento dos SAS entre os municípios e os estados. Neste campo, os diferentes protagonistas tomam posições distintas, tendo em conta os respectivos associados, como a AESBE que, por exemplo, argumenta que os SAS devem ser fornecidos a nível estadual, devido à maior escala de operação, que permite economias de escala, e à possibilidade de subsidiação cruzada entre os municípios de maior e menor porte. Em contraste, a ASSEMAE dá primazia à operação municipal, uma vez que os SAS são essenciais e constituem serviços de proximidade. Existem quase 40 empresas privadas no sector da água no Brasil. As empresas encontram-se espalhadas por todo o país, desde o Norte em Manaus, no Amazonas e Novo Progresso no Pará, ao Sul, no Paraná e em Santa Catarina, passando pelo Centro Oeste, em Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Tocantins e pelo Sudeste nos estados do Rio de Janeiro, de São Paulo, Espírito Santo e Minas Gerais. A participação do sector privado nos SAS prende-se, por um lado, com o fornecimento do serviço de água nas áreas rurais, onde, através de consórcios associados a outras entidades de sectores diferentes, possui a capacidade de “autosustentabilizar” o serviço e, por outro lado, com a resolução de problemas em regiões específicas e estratégicas (por ex., região dos lagos, no Rio de Janeiro). 2.3.3.2 Players do sector No Brasil coexistem dois tipos de autoridades responsáveis pelos SAS, designadamente o município e o Estado. Embora o primeiro predomine em número, constata-se que mais de 80% da população brasileira é servida por operadores públicos estaduais através de concessões. Dado a precariedade da estrutura regulatória, na data em que esses contratos de concessão foram desenvolvidos, os mesmos apresentavam-se consideravelmente incompletos em termos de objectivos, sistema tarifário e transparência ao nível da subsidiação cruzada. No sector da água estima-se que existam cerca de 1.350 operadores de SAS (Oliveira, 2008), concorrendo cinco modalidades diferentes de operadores (formas organizacionais) no Brasil. A primeira modalidade consiste em empresas públicas (25), denominadas CESB, que fornecem os serviços ao nível do Estado e que se regem pelo direito privado. A segunda modalidade contempla empresas do tipo microrregional, sendo algumas delas de direito privado e outras de direito público, congregando vários municípios (associações dos municípios) e cujo número se estima em cerca de duas dezenas. As outras três modalidades de operadores fornecem serviços a nível local (municipal). A primeira modalidade local consiste em empresas que se regem por direito privado (empresas municipais e mistas). A segunda modalidade está associada a operadores locais de direito público (departamentos, secretarias e autarquias) e é a que existe em maior número (cerca de 1.200 operadores). Por último, a terceira modalidade corresponde aos operadores privados que têm, ou não, contratos de concessão com os concedentes (próximo de 40 operadores). Dentro da conjuntura em que se inserem as entidades gestoras brasileiras, a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (SABESP) salienta-se pela sua dimensão, abrangendo cerca de 23 milhões de habitantes. A SABESP é uma empresa de economia mista, de capital aberto, que tem como principal accionista o governo do estado de São Paulo e que actua como concessionária dos SAS municipais. Presentemente, desempenha a respectiva actividade em 367 municípios do estado de São Paulo e congrega, supletivamente, a atribuição do planeamento, a construção e o funcionamento de SAS urbanos e industriais. 2.3.3.3 Integração do sector e serviços oferecidos Normalmente, nos principais centros urbanos, o fornecimento dos SAS é prestado pela mesma entidade, a qual é, regra geral, responsável por toda a fileira produtiva. Nos municípios restantes, o serviço de águas residuais é consideravelmente escasso e, em zonas onde este serviço existe, por norma é fornecido pela mesma entidade que gere o serviço de água. 95 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional Embora seja esta a circunstância mais comum, existem casos pontuais onde os SAS são prestados por entidades distintas (por ex., o operador de Itajai de Santa Catarina) e onde existem empresas de água em “alta” (por ex., a SABESP). 2.3.3.4 Números do sector O Brasil, sendo um dos países mais populosos do mundo, capta anualmente um volume de água na ordem dos 15 400 milhões de m3 para abastecimento público. A origem da água é, predominantemente, subterrânea, com cerca de 68% do valor total. No Brasil, o maior utilizador de água é o sector agrícola com 65%, enquanto o consumo público representa apenas cerca de 16% do consumo total de água. O uso do sector industrial é de, aproximadamente, 14%. O remanescente referese a usos para fins pecuários (5%). Quadro 14 Nível de atendimento dos SAS no Brasil Em 2005, a capitação média no Brasil foi de cerca de 145 litros por habitante e por dia. Em 2006, o nível de atendimento do serviço de água no Brasil era de cerca de 81% da população, enquanto o nível de atendimento do serviço de águas residuais (recolha) representava cerca de 42%. Todavia, o atendimento era significativamente maior nas áreas urbanas, onde se localiza 84% de toda a população brasileira. Neste domínio, o nível de atendimento estava próximo de 93% para o serviço de água e de 48% para o serviço de saneamento de águas residuais. O nível de atendimento em áreas rurais, onde se encontra 16% da população brasileira, era muito inferior, sendo 18% para o abastecimento de água e somente 13% para o saneamento de águas residuais. Geograficamente, o nível de atendimento era mais baixo nas regiões mais pobres do Norte do Brasil e mais elevado no Sul. Os sistemas de águas residuais são tendencialmente separativos, sendo a responsabilidade das águas pluviais dos municípios. No Quadro 14 é possível observar os níveis de atendimento dos SAS para o ano de 2006. Serviços População urbana (84%) População rural (16%) Total Água 93,1 18 81% Águas residuais 48,3 13 42% Os valores das perdas de água são bastante significativos, variando entre os 21% e os 81%, com uma média próxima dos 40%. Espacialmente, os valores também oscilam bastante, sendo que os mais elevados se situam na região norte, com cerca de 58%, e os mínimos na região sul, com cerca de 30%. Figura 22 Comparação entre os custos e as tarifas praticadas pelas CESB 96 No Brasil, em 2005, o sector da água empregava cerca de 200 mil funcionários. Segundo os dados fornecidos pelos operadores ao SNIS, em 2005, os SAS brasileiros receberam dos utilizadores cerca de 1.740 milhões de euros, repartidos igualmente entre os SAS. A Figura 22 compara as receitas e os respectivos custos com os SAS das CESB. Brasil Operador Regional Microrregional Local Total Administração pública directa 0 0 189 189 Município 1 4 310 315 Empresa pública 0 0 10 10 Sociedade comercial mista com administração pública 23 0 11 32 Sociedade comercial mista com administração privada 1 0 0 1 Empresa privada 1 3 39 43 26 7 559 592 Total Conforme referido anteriormente, estima-se que existam cerca de 1.350 operadores. O Quadro 15 apresenta as formas organizacionais dos operadores brasileiros que fazem parte do SNIS e que, embora estejam associados a menos de 50% do total em número, representam mais de 81% da população total (SNIS, 2006). 2.3.4 REGRAS DO JOGO 2.3.4.1 Estabelecimento de tarifas No Brasil os preços variam bastante entre os SAS e as regiões. As CESB, bem como a grande maioria dos restantes operadores, mantêm uma estrutura tarifária homogénea. A fixação das tarifas no Brasil é efectuada pelas CESB e pelas empresas municipais, apesar de seguirem a orientação dos governos estaduais e dos seus accionistas maioritários, quando estes possuem capital privado. No entanto, considerando a necessidade de universalização dos SAS, foi instituído um sistema de subsídios cruzados nas estruturas tarifárias, onde se segue o princípio de que os utilizadores com maior poder de compra subsidiam os de menor, assim como os grandes utilizadores subsidiam os pequenos, sendo adoptados os seguintes critérios para o estabelecimento das tarifas (MPO-SEPURB, 1995): • Determinação de tarifas diferenciadas, segundo as categorias do utilizador (doméstica, comercial, industrial e pública), sendo que a tarifa média do comércio e da indústria deve ser superior à tarifa média da concessionária; • As tarifas da categoria doméstica são diferenciadas para os diversos escalões de consumo, devendo ser progressivas em relação ao volume consumido. Em alguns estados, essa diferenciação também é usada para os sectores comercial e industrial; • Existência de um volume mínimo de consumo doméstico, englobando o consumo de água e a produção de águas residuais, através do valor de 10 m3 mensais. Quadro 15 Formas organizacionais dos operadores no Brasil A Lei n.º 11.445 identifica os princípios a seguir pelo sistema tarifário, onde se insere a respectiva definição com base na sustentabilidade económica e financeira dos operadores, mas tendo em atenção a universalização do serviço. Existe uma grande preocupação com os utilizadores mais carenciados, que se manifesta através da inclusão na lei da possibilidade de subsídios e da subsidiação cruzada entre actividades e utilizadores. O marco normativo referido estabelece também as funções relevantes de fiscalização da regulação neste âmbito e indica claramente que um dos objectivos da regulação económica, considerando a essência do serviço e a respectiva universalização, consiste nos incentivos fornecidos à eficiência económica. Em muitas cidades brasileiras, as tarifas relativas aos SAS são consideravelmente elevadas, tendo em conta o enquadramento dos países da América Latina e o respectivo peso nos encargos do agregado 97 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional familiar. De acordo com o SNIS, a tarifa média relativa aos SAS é de 0,68 €/m3, tal como é possível observar no Quadro 16. Quadro 16 Tarifas médias dos SAS por tipo de operador no Brasil de Uso Racional da Água (PURA) e os organismos de assistência social têm também tarifas diferenciadas. Dimensão Variação da tarifa (€/m3) Regional 0,48 – 1,72 Microrregional 0,26 – 1,39 Local 0,04 – 1,75 A cobrança pelos SAS é efectuada mensalmente. Existe uma penalização aquando do não pagamento da factura após a data de vencimento. Caso esse atraso seja superior a um mês, existe o risco de interrupção da prestação dos SAS por parte do operador. Por exemplo, a SABESP cobra os SAS em conformidade com o Decreto n.º 41.446, de 1996, que estabelece o regulamento tarifário. Este prevê um consumo mínimo padrão de 10 m3 de água, existindo a partir daí, escalões Um estudo desenvolvido em 2005, pela ADERASA, permitiu verificar que a factura referente aos SAS, no Brasil, é cerca de 1,5 vezes superior à média das 21 cidades mais importantes da América Latina. Ademais, a análise dos dados do SNIS, demonstrou que as tarifas sofreram um crescimento substancial no período entre 2002 e 2005, tendo a tarifa média do serviço de água aumentado cerca de 57% e a tarifa relativa ao serviço de águas residuais cerca de 54%. A Figura 23 ilustra a evolução da tarifa média dos SAS, no Brasil (SNIS, 2006) Figura 23 Evolução anual da tarifa média dos SAS no Brasil progressivos de consumo variáveis. Os tarifários, dentro da área de jurisdição da SABESP, variam por sistema. A água consumida é sempre medida, independentemente do tipo de utilizador. As categorias dividem-se em domésticos normal, social e favelas, comercial, industrial e público. Para cada uma, existe uma tabela com os valores estabelecidos para o consumo até 10 m3, de 11 a 20 m3, de 21 a 50 m3 e acima de 50 m3, excepto para as tarifas domésticas social e favelas, que possuem 5 escalões de consumo, isto é, até 10 m3, de 11 a 20 m3, de 21 a 30 m3, 31 a 50 m3 e acima de 50 m3. Um utilizador comum paga mais do dobro de um utilizador social ou residente na favela. A criação do tarifário doméstico social reflectiu uma preocupação da SABESP com este segmento intermédio entre os utilizadores normais e utilizadores residentes nas favelas. Desta forma, desde 1997, a SABESP beneficia mais de 600 mil pessoas carenciadas, com a possibilidade de pagamento, de acordo com os rendimentos, tamanho da moradia e consumo de energia eléctrica. As entidades públicas que aderem ao Programa 98 2.3.4.2 Qualidade do serviço O sector da água no Brasil não apresenta um sistema federal compulsório de avaliação da qualidade do serviço previamente definido a não ser em relação à qualidade da água. O SNIS tem desempenhado funções relevantes neste domínio. A actuação do SNIS é desenvolvida mediante a recolha de informação entre as entidades gestoras de forma voluntária, às quais fornece incentivos para a respectiva adesão. Se os operadores pretenderem ser financiados com capitais públicos, incorrem na obrigatoriedade de fornecer os respectivos dados à SNIS. Segundo os princípios fundamentais de fornecimento de serviço público, a implementação da Lei n.º 11.445 procura a garantia da “transparência das acções, baseada em sistemas de informações e processos decisórios institucionalizados”. Apesar de ser apenas um órgão de recolha de informação sobre o sector da água, o SNIS, desempenha, desta forma, um papel prepon- Brasil derante no respectivo progresso. A elaboração de um relatório anual, que publicita a informação recolhida, enquadra-se nos domínios de uma entidade reguladora. A recolha de informação permite calcular 85 indicadores de desempenho normalizados, repartidos entre os domínios económico, financeiro, administrativo e operacional e que procuram, sobretudo, reflectir a evolução e a qualidade do serviço evidenciadas. Na Figura 24 apresentam-se dois desses indicadores: o volume de água não facturado e o índice de micromedição (SNIS, 2006). grande desafio, que frequentemente requer o uso de métodos não convencionais. Apesar de o país apostar fortemente no uso de tecnologias de baixo custo (por ex., os sistemas individuais de tratamento de águas residuais) e também na participação comunitária nos processos de urbanização, muitos dos mesmos continuam a ser desenvolvidos, de forma informal, com problemas graves ao nível da qualidade da água e da descarga das águas residuais. De qualquer forma, a supervisão da qualidade Figura 24 Indicadores de micromedição e perdas de água das CESB Em relação à qualidade da água, os operadores têm a obrigatoriedade de cumprir os parâmetros impostos pela Portaria n.º 514, de 2004, do Ministério da Saúde, que estabelece normas e padrões de fornecimento de serviço de água. Neste domínio, os estudos desenvolvidos pelo SNIS permitem aferir que nem todos os operadores cumprem os padrões mínimos, o que levanta alguma preocupação entre as entidades responsáveis. O processo de fornecimento dos SAS aos bairros urbanos pobres permanece como um do serviço é uma questão da responsabilidade das entidades reguladoras. A maioria das mesmas encontra-se ainda na fase de implementação dos respectivos sistemas de avaliação de desempenho da qualidade do serviço. A ABAR lançou recentemente uma publicação, que procura uniformizar um conjunto de indicadores de desempenho a calcular pelos reguladores (ABAR, 2006). Alguns dos reguladores já aplicam estas ferramentas. No Quadro 17, é evidenciado o esquema de indicadores de desempenho proposto e aplicado pela ARCE. Indicadores de desempenho Evolução anual das acções de fiscalização Quadro 17 Indicadores de desempenho aplicados pela ARCE Conformidade com o índice de qualidade de turbidez Conformidade com o índice de qualidade do cloro residual Conformidade com o índice de qualidade de coliformes Índice de micromedição Número de contadores instalados Índice de perdas de água Nível de atendimento dos SAS Evolução das solicitações efectuadas à procuradoria da ARCE (reclamações, consultas, etc.) 99 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional A Figura 25 apresenta a evolução dos indicadores reclamações e consultas da ARCE. lei realça ainda que os planos directores sejam compatíveis com os planos da bacia hidrográ- 2.3.4.3 fica em que os titulares dos serviços estiverem inseridos. Figura 25 Indicadores reclamações e consultas da ARCE Obrigações de serviço público No sector da água do Brasil são estabelecidas inequivocamente as obrigações de serviço público. Entre os princípios fundamentais, para a prestação dos SAS públicos, destacam-se a universalidade e a acessibilidade do serviço, “propiciando à população o acesso na conformidade das respectivas necessidades e maximizando a eficácia das acções e resultados”, a segurança, a qualidade e a regularidade no fornecimento dos serviços. Esta lei contempla ainda a integração das infra-estruturas e serviços com a gestão eficiente dos recursos hídricos. Ressalta-se que, conforme o documento normativo, os recursos hídricos não são considerados parte integrante dos SAS. A lei determina que os titulares dos serviços elaborem planos directores dos SAS, que conduzirão a prestação dos serviços públicos e que deverão ser revistos periodicamente (no máximo a cada 4 anos, anteriormente à elaboração do Plano Plurianual). Esses planos deverão abranger, pelo menos, o diagnóstico da situação e dos respectivos impactos nas condições de vida da população (através de um sistema de indicadores), das causas das deficiências detectadas, os objectivos e metas de curto, médio e longo prazo para a universalização dos serviços (sendo admitidas soluções graduais e progressivas), os programas, projectos e acções necessárias à obtenção dos objectivos e metas, identificando possíveis fontes de financiamento, as acções previstas para os casos de emergência e contingência e os mecanismos e procedimentos a serem adoptados na avaliação sistemática da eficácia e eficiência das acções programadas. A 100 O marco regulatório do sector da água parece seguir esta tendência mundial de definição dos mecanismos adequados à necessidade de uma avaliação, cada vez mais efectiva e transparente, da qualidade dos SAS. O próximo passo consiste na instituição, em termos práticos, de um sistema de regulação eficiente e eficaz, que garanta a aplicação adequada dos recursos e a ampliação dos níveis de atendimento e qualidade dos serviços, equilibrando a questão da sustentabilidade dos operadores com a questão da universalização do acesso aos serviços. É de referir que o documento normativo estabelece, de forma clara, os princípios de acesso e livre informação no sector da água. 2.3.5 DESEMPENHO No Brasil, o sector da água enfrenta vários problemas, dos quais alguns são realçados de seguida. Em primeiro lugar, o Brasil confronta-se com a escassez de água em várias regiões e com inundações noutras. Em segundo lugar, o conflito existente entre os diferentes níveis de governo, relativamente à gestão e às atribuições destes serviços, prejudica grandemente a tomada de decisões e, por conseguinte, o sector da água. Em terceiro lugar, as perdas comerciais existentes no sector da água, ao atingirem valores extremamente elevados, condicionam a capacidade de auto-financiamento dos operadores, reflectindo-se nos preços das tarifas cobradas. Em quarto lugar, os níveis de investimento necessários para dotar o sector de infra- Brasil estruturas novas, quer de água, quer de águas residuais, são enormes. São também requeridos investimentos vultuosos para a reabilitação dos sistemas em funcionamento, que se pautam por um mau estado geral, traduzido em valores de perdas de água físicas muito elevados. Inevitavelmente, será necessário recorrer ao sector privado para a realização destes investimentos. Por último, é de referir a reduzida credibilidade que o país possui para a atracção de capital privado para o sector da água. Em relação aos aspectos positivos, sobressai a qualidade da legislação existente, bem como da mão-de-obra qualificada, que caracteriza o sector da água. As entidades reguladoras, cujos frutos se repercutirão no futuro, são também uma mais-valia. 101 Chile 2.4 CHILE 2.4.1 ANTECEDENTES HISTÓRICOS O Chile é uma república democrática, cujo presidente é o chefe do poder executivo. O poder legislativo compreende um parlamento bicamarário, composto pelo Senado e pela Câmara dos Deputados. O país, com cerca de 16,6 milhões de habitantes, dispersos por 756 950 km 2 de área, encontra-se organizado administrativamente em 15 regiões, 51 províncias e 346 municípios. Cada região é dirigida por um superintendente, nomeado pelo presidente, que se divide em províncias, cada uma com um governador apontado também pelo presidente. Por fim, cada província encontra-se dividida em municípios administrados individualmente pelo respectivo presidente de câmara. O sector da água no Chile tem vindo a pautar-se por uma grande evolução, sobretudo nos últimos anos. No início dos anos 90, o Chile apresentava inúmeros problemas (por ex., precários níveis de atendimento dos SAS), e em apenas 10 anos tornou-se um caso de sucesso e um exemplo a reter nesta matéria em toda a América Latina. Várias organizações internacionais e isentas corroboram esta opinião (por ex., Organização Mundial de Saúde - OMS). No final dos anos 80, em resposta às necessidades de investimentos em novas infra-estruturas e de melhoria do funcionamento das existentes (maior continuidade e melhor qualidade do serviço), o Governo chileno desenvolveu nova legislação, através da qual transformou o antigo SAS em várias empresas. O objectivo desta medida legislativa procurava promover o aumento da eficiência da gestão e da equidade dos serviços e demarcar a separação da gestão do serviço das actividades regulatórias do Es- tado. Com esta última finalidade em mente, foi criada uma entidade reguladora dedicada, a Superintendencia de Servicios Sanitarios (SISS). No Chile, o sector da água encontra-se regulado por diversos documentos normativos, entre os quais se destacam o Código da Água, de 1981, onde são definidos os direitos de utilização de água, a Lei Orgânica da SISS (Lei n.º 18.902, de 1990), a Lei de Tarifas (Decreto n.º 70, de 1988, do Ministério das Obras Públicas - MOP) e o respectivo Regulamento (Decreto n.º 453, de 1989, do Ministério da Economia), a Lei Geral dos Serviços Sanitários (Decreto n.º 382, de 1988, do MOP) e o seu Regulamento (Decreto n.º 1.199, de 2004, do MOP), a Lei da Subsidiação dos SAS (Lei n.º 18.778, de 1989) e o respectivo Regulamento (Decreto n.º 195, de 1998). Mediante esta conjuntura, o período entre 1988 e 1990 foi um dos mais reformistas na história do sector da água chileno, tendo sido aprovados vários documentos legais e criadas novas instituições, que vieram a ter uma enorme influência no sector. A Lei das Tarifas estabelece as bases normativas para os procedimentos de fixação de tarifas dos serviços públicos sanitários, compatibilizando os objectivos de eficiência, auto-financiamento e equidade. Além disso, este documento normativo também possibilitou a criação da SISS (Lei n.º 18.902), bem como a instituição do subsídio social (Lei n.º 18.778) direccionado para os utilizadores domésticos mais carenciados. A legislação implementada possibilitou também a criação das empresas de serviço público, pautadas por transparência e autonomia elevadas e concentradas na sustentabilidade e rentabilidade dos seus activos. Em paralelo, a regulação do sector foi estabelecida, separan103 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional do as funções de Estado prestador de serviço das de Estado regulador. Esta conjuntura suscitou progressos significativos na gestão comercial e operacional das empresas públicas, bem como um aumento substancial da qualidade dos SAS. 2.4.2 ENQUADRAMENTO LEGAL E INSTITUCIONAL Em Fevereiro de 1998, o governo, preocupado com a expansão do nível de atendimento dos serviços, a melhoria da qualidade do serviço prestada e maior sustentabilidade, desenvolveu uma nova reforma do sector da água. A modernização do enquadramento regulatório do sector e o maior envolvimento do sector privado, onde se incluía a privatização quase total dos SAS e o estabelecimento de tarifas e de planos de desenvolvimento e de qualidade do serviço, foram os principais aspectos visados por esta reforma. Além disso, esta lei veio alargar os poderes da SISS, passando a possuir valências de supervisão dos operadores (planos de desenvolvimento e níveis de qualidade da água e de serviço), além de implementar directrizes ao nível da qualidade do serviço e de aumentar consideravelmente as sanções e coimas sobre os operadores incumpridores das normas em vigor. 2.4.2.1 Responsabilidades Esta reforma introduziu também melhorias significativas nos processos de definição de tarifas, reduzindo a parcela fixa do sistema tarifário e estabelecendo princípios de salvaguarda para evitar a concentração de propriedade num grupo restrito de operadores e, por fim, determinou também a percentagem de participação do Estado na propriedade que pode ser transferida para o sector privado (máximo de 65%, ou mais, caso o Estado não participe nos aumentos de capital). Entre o período de 1998 e 2001, a participação do sector privado decorreu de dois modos distintos, a saber, através da alienação dos activos das empresas públicas até ao máximo atrás referido (65%) e por intermédio de contratos de concessão. De 2001 em diante, o governo privilegiou o segundo modelo, inibindo a instituição do primeiro. Posteriormente, em meados de 2002, a SISS desenvolveu normas que tinham como principal objectivo promover a transparência nas empresas reguladas. A partir de Março de 2003, os SAS passaram a estar obrigados a disponibilizar informação relativa à sua gestão, aos seus rendimentos e aos custos das diversas actividades, com especificidade, detalhe e uniformidade. Deste modo, a SISS pode caracterizar de forma objectiva e credível a “empresa eficiente”, conceito base para a determinação do sistema tarifário no domínio regulatório chileno. 104 A responsabilidade pelos SAS encontra-se sob o domínio de vários intervenientes na esfera do Governo chileno. Destacam-se o MOP, o Ministério da Saúde, o Ministério da Economia, a SISS, a Direcção-Geral das Águas (DGA), a Direcção Nacional de Obras Hidráulicas (DOH), a Comissão Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) e os seus Departamentos Regionais (COREMAS), as empresas públicas e privadas e, por último, a Corporação de Fomento da Produção (CORFO). A principal atribuição do MOP é prover o país de serviços de infra-estruturas. Nas suas atribuições incluem-se a construção de obras públicas, nas quais se integram as obras associadas aos recursos hídricos e às infra-estruturas hidráulicas. As competências de regulamentação nas zonas urbanas são compartilhadas entre a SISS (na regulação económica) e o Ministério da Saúde (em relação à qualidade da água). Além disso, este ministério, repartindo valências com o Ministério da Economia, compreende as funções de regulação e de supervisão dos operadores das áreas rurais (cooperativas e os comités) que gerem os SAS nestas áreas. O Ministério da Economia tem também a atribuição de aprovar os sistemas tarifários propostos pela SISS. Como referido, a SISS supervisiona e regula os SAS nas áreas urbanas. A fim de lhe ser conferida independência política, a SISS foi criada como instituição descentralizada, dotada de património próprio, autonomia administrativa e financeira. Além das respectivas incumbências de regulação de preços, da qualidade do serviço e das obrigações de serviço público, detém a valência de impor sanções e coimas às empresas quando estas se encontram em situação de infracção das normas em vigor. A SISS possui também atribuições relativas ao tratamento das reclamações dos utilizadores. Apesar de não existir uma autoridade pública, como a SISS para as áreas urbanas, desde 1994 a DOH, tutelada pelo MOP, encontra-se encarregue da execução do Programa Nacional de Água Potável Rural nas áreas rurais, tendo funções regulatórias neste domínio. Chile A DGA, reportando toda a sua actividade ao MOP, é responsável pelo planeamento, desenvolvimento e gestão dos recursos hídricos a nível nacional. A regulação ambiental sobre todos os sectores é efectuada pela Secretaria-Geral da Presidência, através da CONAMA. A CONAMA é uma instituição estatal com a missão de promover a sustentabilidade ambiental das políticas e estratégias definidas pelo governo, que desenvolve as suas atribuições através das COREMAS, cujas atribuições incluem a promoção de consultas e a coordenação dos aspectos ambientais. A CORFO, criada em 1939, é um organismo do Estado chileno incumbido de promover o desenvolvimento produtivo nacional nos diversos sectores, onde se incluem os SAS. Ao contrário do progresso que caracteriza os SAS nas áreas urbanas, nas áreas rurais os mesmos evidenciam ainda muitas debilidades. Neste sentido, existe no Chile uma associação denominada Agua Potable Rural (APR), cujo principal objectivo consiste na assistência técnica, financeira e jurídica aos operadores das áreas rurais, designadamente às cooperativas e aos comités. Na Figura 26 apresentam-se os principais orga- guladora nacional e dedicada foi criada pela Lei n.º 18.902, de 1990, e possui apenas funções relativas às áreas urbanas. A SISS é uma agência governamental autónoma que depende do presidente, através do MOP, a quem reporta toda a sua actividade. A SISS foi instituída como uma parte do processo legal, económico e de transformação institucional dos SAS, que teve início no final de 1980. O cargo principal desempenhado na SISS é o de Superintendente, que é escolhido e destituído mediante as decisões do presidente da República. A SISS é legalmente responsável pelo controlo e pela supervisão do sector da água. A agência tem responsabilidades normativas, onde se inclui o reforço e conformidade com os diplomas relativos ao fornecimento dos SAS, possuindo ainda um papel preponderante na determinação dos sistemas tarifários. Especificamente, a SISS tem os seguintes deveres: i) estudar, propor e reforçar o cumprimento das normas técnicas relativas à concepção, construção e exploração dos SAS; ii) monitorizar e reforçar as normas tarifárias dos serviços fornecidos; iii) aplicar o regime de franchising, incluindo a adjudicação, exploração, transferência e termo do contrato; iv) definir normas e controlar os efluentes industriais; e, por fim, v) aplicar penalidades e outros tipos Figura 26 Enquadramento institucional do sector da água no Chile nismos com responsabilidades no sector da água no Chile (adaptado de ADB, 2001). 2.4.2.2 Regulação De acordo com o modelo regulatório actual, os operadores dos SAS encontram-se sob o controlo da SISS. Conforme referido, a entidade re- de sanções aos incumpridores dos regulamentos em vigor no sector da água. Enquanto entidade reguladora, a SISS emite instruções de natureza obrigatória para todos os operadores dos SAS e assegura o cumprimento das normas legais, regulatórias e técnicas que governam diferentes aspectos dos serviços. As resoluções, levadas a cabo pela SISS, podem 105 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional ser contestadas, não só perante a própria SISS, como também perante os Tribunais de Justiça chilenos. A SISS efectua recomendações ao MOP relativas aos SAS. As PPP compreendem, em geral, o estabelecimento, a construção e a operação dos sistemas de abastecimento de água, desde a produção até à distribuição, e dos sistemas de saneamento de águas residuais, incluindo a recolha, a drenagem, o transporte, o tratamento e a rejeição. Estes direitos podem ser transferidos, ainda que condicionados pela concorrência, e sujeitos à aprovação da SISS. O sistema de regulação económica baseada na empresa “modelo” ou “eficiente” foi adoptado em todos os sectores no Chile que compreendem serviços de utilidade pública. Este enfoque utiliza como padrão de comparação uma empresa virtual eficiente denominada “empresa modelo”, ou seja, uma empresa fictícia e meramente teórica, criada pelo regulador do sector com o objectivo de satisfazer a procura projectada de forma óptima. A SISS, tutelada pelo MOP, possui valências somente sobre os SAS e nas áreas urbanas. No desempenho das suas funções, a entidade reguladora apresentou um valor 7,04 milhões de euros relativo aos custos de funcionamento. No Quadro 18 Maiores operadores dos SAS no Chile final de 2007, empregava directamente 157 funcionários. 2.4.3 ESTRUTURA DO MERCADO 2.4.3.1 Propriedade e gestão dos serviços No Chile, os SAS são prestados quase totalmente pelo sector privado, apesar de o parceiro público (CORFO) estar presente nos principais operadores, como referido anteriormente. De qualquer forma, no Chile subsistem os dois principais modelos de privatização. Até 2001, ocorreu, sobretudo, uma privatização material dos operadores através de alienação de activos. A partir desse ano, o modelo seguido foi o da concessão (privatização da gestão). Embora só se integrem na primeira opção quatros empresas, estas têm grande dimensão, correspondendo a 67% da população urbana (ESVAL, Aguas Andinas, ESSAL e ESSBIO). A participação privada é sempre maioritária. Em relação aos SAS das áreas rurais, a situação é mista, existindo tantos operadores privados quanto públicos. Não estão identificadas as res- Empresa Região Utilizadores (n.º) Municípios (n.º) Aguas Andina Metropolitana 1 428 028 18 ESSBIO Região 6 e 8 610 842 87 ESVAL Região 5 500 841 50 Aguas Nuevo Sur Maule Região 7 195 011 30 SMPA Metropolitana 175 848 3 Aguas Araucanía Região 9 179 836 35 ESSAL Região 10 167 429 33 Aguas del Valle Região 4 165 780 21 Aguas Antofagas Região 2 129 691 6 Aguas del Altiplano Região 10 125 154 9 Aguas Cordillera Metropolitana 113 253 1 Aguas Chañar Região 3 73 517 10 Aguas Magallanes Região 12 44 222 3 Aguas Décima Região 10 36 608 1 Aguas Patagonia Região 14 22 521 8 Servicomunal Metropolitana 17 957 1 Servilampa Metropolitana 4.308 1 Aguas Manquehue Metropolitana 5.487 4 Aguas los Dominicos Metropolitana 3.357 1 Coopagua Região 5 3.273 1 4 002 963 323 TOTAL 106 Chile pectivas proporções, ainda que a hegemonia seja ligeiramente pública. 2.4.3.2 Players do sector Em Dezembro de 2007, os SAS das áreas urbanas eram fornecidos por 53 empresas, as quais se encontram repartidas entre 52 operadores dedicados ao serviço de água e 50 operadores que prestam o serviço de águas residuais. As 20 maiores empresas disponibilizam os SAS a cerca de 13,5 milhões de habitantes (aproximadamente 4 milhões de utilizadores), onde a Aguas Andinas (Santiago) se destaca pela sua dimensão, como se apresenta no Quadro 18. Com o objectivo de prevenir a criação de poder de mercado (e o eventual abuso de posição dominante) a nível nacional, as empresas foram classificadas em três categorias segundo a população total urbana que fornecem. Nenhuma pessoa ou sociedade deve estar na posse de mais de 49% das empresas dentro de uma categoria específica. O Quadro 19 apresenta as diferentes categorias existentes no sector da água. tal Santiago do Chile e cuja maioria de capital (50,1%) pertence à empresa espanhola Aguas de Barcelona (e à francesa Suez), e a Empresa de Servicios Sanitarios del Bio-Bío (ESSBIO), que opera na sexta e oitava região na periferia de Concepção. A maioria do capital deste operador (50,97%) pertence ao fundo argentino Southern Cross. Por último, destaca-se ainda pela sua dimensão a Empresa Sanitária de Valparaíso (ESVAL), que opera na região de Valparaíso e da qual 47,92% da sua estrutura accionista pertence ao Grupo Hurtado Vicuña/ Fernández León. A relevância destas três empresas é de tal ordem que, em conjunto, fornecem o serviço de água a cerca de 63% dos utilizadores chilenos. Como empresas menores destacam-se a Aguas de Antofagasta, a Aguas del Altiplano, a Aguas Cordillera, a Aguas Chañar, a Aguas Magallanes, a Aguas Décima, a Aguas Patagonia de Aysén, a Servicomunal, a Aguas Manquehue, a Servilampa, a Aguas Los Dominicos, a Coopagua e outras 33 empresas mais pequenas. Embora praticamente todas as empresas tenham sido privatizadas entre 1998 e 2004, o Estado chile- Quadro 19 Categorias por dimensão das empresas dos SAS no Chile Categoria Critério Empresas (n.º) População urbana servida Empresas maiores Percentagem de clientes igual ou superior a 15% 2 50,5% Empresas médias Percentagem de clientes igual ou superior a 4% e inferior a 15% 6 34,3% Empresas menores Percentagem de clientes inferior a 4% 45 15,2% Como maiores empresas do sector da água no Chile encontram-se as Aguas Andinas, que possuem 34% do mercado, operando na capi- no mantém uma posição importante do sector da água através da CORFO. O Quadro 20 apresenta os principais players a actuarem como operadores Quadro 20 Principais grupos empresariais intervenientes no sector da água chileno Grupo económico Utilizadores (%) País de origem CORFO 35,7 Chile Aguas de Barcelona 17,0 Espanha Southern Cross Group 10,7 Argentina Grupo Hurtado Vicuña/Fernández León 8,8 Chile Grupo Luksic 5,3 Chile Grupo Solari 5,0 Chile Município de Maipú 2,3 Chile Iberdrola 2,0 Espanha Outros 13,2 107 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional no sector da água em 2006 no Chile e o seu âmbito de actuação (SISS, 2007a). Nas áreas rurais, as cooperativas e os comités rurais de água para consumo humano estão encarregues da operação dos sistemas de abastecimento de água. Em localidades rurais com alguma concentração, com populações entre 150 e 3.000 habitantes e sempre não inferior a 15 habitações por quilómetro de rede, o Programa Nacional de Água Potável Rural tem contribuído para um progresso significativo na prestação do serviço. Todavia, a pequena percentagem de habitações isoladas que ainda existe no Chile carece do serviço de água. Embora um número restrito de localidades tenha encontrado solução no que diz respeito ao sistema de recolha de águas residuais, a maioria destas apresenta bastantes problemas operacionais. Todavia, a titularidade destes pequenos operadores é maioritariamente pública. de operadores para toda a população urbana do Chile. 2.4.3.4 Números do sector Em 2006, a produção de água no Chile (excluindo as áreas rurais) atingiu cerca de 1.451 milhões de m 3, ao passo que o consumo alcançou os 958,3 milhões de m 3, reflectindo um aumento de 2,7% face a 2005. Do valor consumido, 54,7% são fornecidos por grandes empresas, 27,5% por um conjunto de empresas médias e, por último, os restantes 17,8% são fornecidos por empresas menores. Do total da água captada, 51% é de origem superficial e 49% é de origem subterrânea. No Chile, o sector da água apresentou, em 2006, um valor de 37,6% para as perdas de água. Na Figura 27 apresenta-se a Figura 27 Evolução anual do indicador perdas de água no Chile 108 2.4.3. Integração do sector e serviços oferecidos evolução anual das perdas de água entre os operadores regulados no sector da água do Chile (SISS, 2007b). No Chile, os SAS estão, normalmente, fundidos no mesmo operador. Neste âmbito, os serviços encontram-se verticalmente integrados, ou seja, os operadores gerem todas as actividades da fileira produtiva, desde a captação até à distribuição de água. Ao nível do serviço de águas residuais constata-se a mesma situação, designadamente a integração dos serviços, com o fornecimento dos serviços de recolha e de tratamento de águas residuais. O grau de integração horizontal é também elevado, existindo um número reduzido No Chile, a capitação mensal de água sofreu um ligeiro decréscimo entre 2005 e 2006, passando de 20 m3 para 19,9 m3, o que resulta em 196 litros por habitante e por dia. Neste âmbito, a região metropolitana de Santiago continua a apresentar a média mensal mais elevada dos consumos domésticos do país, de 125 m3 no caso da Aguas de Manquehue, 112 m3 no caso da Aguas los Dominicos e de 44 m3 para a Aguas Cordillera. Por sua vez, as empresas médias Aguas Nuevo Sur Maule, Aguas del Valle, Esval, Aguas Araucanía e ES- Chile SAL apresentavam consumos médios mensais de cerca de 15 m3 por habitante. De acordo com a SISS, o nível de atendimento do serviço de água nas áreas urbanas a nível nacional é de cerca de 99,8%, o que implica que 13,5 milhões de habitantes são providos do serviço público de água para consumo humano. No que diz respeito ao serviço de águas residuais, este compreende cerca de 12,9 milhões de habitantes, ou seja, reflecte um nível de atendimento de 95,2%. O Quadro 21 apresenta os níveis de atendimento dos SAS por área urbana e rural. Serviço No Chile, em 2006, o serviço de água apresentou receitas de 441,4 milhões de euros, enquanto o serviço de águas residuais evidenciou uma receita de 315 milhões de euros. Nesse mesmo ano, os SAS caracterizaram-se por um volume de investimento de 339 milhões de euros. Os operadores chilenos investiram cerca de 283 milhões de euros no serviço de tratamento de águas residuais. O consumo de água é quase sempre medido por contadores. Em Dezembro de 2006, 94,4% dos utilizadores das empresas de maior Quadro 21 Nível de atendimento dos SAS em 2006 Atendimento Urbana (87%) Rural (13%) Total Existência de rede 100% 58% 95% Ligação à rede 99% 38% 91% Existência de rede 95% 62% 91% Ligação à rede 89% 5% 78% Água Águas residuais O nível de atendimento do serviço de tratamento de águas residuais tem evoluído de forma notável, apresentando, em Dezembro de 2006, um valor de 81,9%. No final de 2001, evidenciava um valor de 20,9%. Em 2006, o volume de águas residuais recolhidas representou cerca de 522 milhões de m3. Na Figura 28, apresenta-se a evolução anual dos níveis de atendimento dos SAS (SISS, 2007b). dimensão possuíam micromedidores. As empresas médias exibiam um valor de 97,0% e as empresas menores um valor de 98,8%. A média nacional atingia os 96%. No início de 2008, as 20 maiores empresas do sector da água, que abrangem cerca de 13,5 milhões de habitantes, empregavam 9.566 funcionários. Figura 28 Evolução anual do indicador nível de atendimento dos SAS no Chile 109 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional 2.4.4 REGRAS DO JOGO 2.4.4.1 Estabelecimento de tarifas O marco legal, que estabelece a regulação económica, inclui a lei das tarifas e o respectivo regulamento. Este documento normativo tem em consideração os princípios de eficiência económica, eficiência dinâmica, inteligibilidade, equidade e autofinanciamento. Neste âmbito, as tarifas são aprovadas pelo governo, através do Ministério da Economia, segundo os estudos promovidos pela SISS. A determinação do sistema tarifário baseia-se no conceito de empresa modelo (eficiente ou optimizada). Figura 29 Metodologia de definição de tarifas no Chile 110 O modelo de empresa eficiente (art.º n.º 27 e 28 do Regulamento), segundo o qual o tarifário é determinado, envolve a concepção de uma empresa hipotética, mas que funciona de forma eficiente e optimizada, com o objecto de fornecimento dos SAS, considerando a normativa vigente, as restrições geográficas, demográficas e tecnológicas que caracterizam a própria operação do serviço. A Figura 29 apresenta o processo de estabelecimento de tarifas no Chile (Chavez e Quiroga, 2002). A eficiência dinâmica é um princípio que está reflectido no marco legal através do conceito de empresa modelo. Esta ocorre, tal como sucede numa situação de concorrência, quando o preço estabelecido por uma empresa resulta do equilíbrio entre a oferta e a procura, devendo cada empresa ajustar os seus custos aos custos eficientes reflectidos no preço do serviço. O conceito de eficiência dinâmica implica também que em cada oportunidade em que se fixam tarifas se vão incorporando as melhorias da produtividade verificadas. A eficiência económica, e em particular a eficiência alocativa, implica que a definição de Chile preços seja baseada no conceito de custo marginal. Num mercado sem falhas, o preço reflecte o custo de oportunidade de produzir uma unidade adicional de um determinado bem, evidenciando o sacrifício em recursos que a gislação. Os procedimentos específicos a serem aplicados no processo pretendem implementar maior transparência. A Figura 30 apresenta o procedimento regulatório de estabelecimento de tarifas (Chavez e Quiroga, 2002). Figura 30 Processo regulatório de definição de tarifas no Chile produção desta unidade adicional representa para a sociedade. A determinação do sistema tarifário segue um conjunto de etapas que estão definidas na le- No Chile, os principais aspectos envolvidos no processo de estabelecimento de tarifas incluem a previsão da procura, a concepção da empresa modelo, o projecto de expansão, a reabilitação ou manutenção dos activos, a valorização Quadro 22 Sistema tarifário da Aguas Andinas para o ano de 2008 Parcelas variáveis (€/m3) Parcela fixa Água em período normal Água em período de ponta Sobreconsumo de água em período de ponta* (€/mês) Zona A Zona B Zona A Zona B Zona A Zona B Serviço de águas residuais Grupo 1 0,78 0,404 0,400 0,388 0,384 0,893 0,887 0,399 Grupo 2 0,78 0,308 - 0,304 - 0,876 - 0,484 Grupo 3 0,72 0,350 - 0,351 - 0,981 - 0,138 Grupo 4 0,53 0,329 - 0,326 - 0,887 - 0,384 Grupo 6 0,86 - 0,250 - 0,242 - 0,624 0,376 *superior a 40 m3 111 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional Quadro 23 Sistema tarifário da Aguas Cordillera para o ano de 2008 Parcela fixa Grupo 1 e as regras de indexação. No Quadro 22 e no Quadro 23 apresentam-se dois exemplos de sistemas tarifários implementados no Chile. Os Parcelas variáveis (€/m3) (€/mês) Água em período normal Água em período de ponta Sobreconsumo de água em período de ponta* Serviço de águas residuais 1.035 0,475 0,475 0, 771 0,293 *superior a 60 m3 grupos e as zonas têm em consideração as diferentes áreas onde operam, sendo que o Grupo 1 representa a zona de Grande Santiago. O princípio da recuperação dos custos é aplicado, tal como a tarifação assente nos custos marginais. O custo de capital está definido na lei. Adicionalmente, todos os utilizadores chilenos se encontram obrigados a pagar uma taxa relativa ao serviço contra incêndios, representando 4,433 euros por mês. Aos valores cobrados é adicionada a taxa de IVA em vigor, que é de 19%. 2.4.4.2 Qualidade do serviço Um aspecto particular que está associado ao sucesso do modelo regulatório é a atribuição de um subsídio ao consumo (20 m 3) às famílias mais carenciadas, o que permite assegurar um serviço universal num país onde Quadro 24 Indicadores de desempenho aplicados pela SISS A qualidade da água, regularmente controlada pela SISS, caracteriza-se por um nível muito elevado, bem como a qualidade do serviço prestado. A entidade reguladora actua de modo a salvaguardar o cumprimento da norma chilena (NCh 409), que foi posteriormente alterada em Indicadores de desempenho a) Cumprimento com as obras predefinidas b) Atendimento dos SAS e) Qualidade do serviço Qualidade da água para consumo humano Cobertura do serviço de água Continuidade de serviço de água Cobertura do serviço de águas residuais Pressão do serviço de água para consumo humano c) Gestão operacional Continuidade de serviço de águas residuais Fontes de abastecimento Capacidade de cobrar os serviços Produção e perdas de água Tempo de resposta a reclamações Redes de distribuição Indicadores de produtividade d) Gestão financeira e comercial Facturação de água Investimentos Custos de exploração Resultados operacionais Resultados não operacionais Utilidade do exercício Activos Indicadores de rentabilidade 112 os utilizadores domésticos chilenos mais carenciados representam quase 15% da população total. f) Gestão ambiental Evolução do tratamento de águas residuais Desempenho das ETAR Chile 2005 e que inclui os padrões de qualidade de água, pressão de água e continuidade do serviço. Também neste domínio, o Chile prima por uma evolução significativa. No início dos anos 90, o sector da água padecia de problemas com os sistemas de tratamento (por ex., cloragem) de alguns operadores. Por conseguinte, em 1991, 20% das empresas não cumpriam as normas bacteriológicas. Em 2006, esta circunstância apenas correspondia a 1%. Durante o mesmo período, o cumprimento das normas de desinfecção aumentou de 89% para mais de 99%. No sentido de incentivar a qualidade do serviço entre os operadores dos SAS, a SISS determina um conjunto de indicadores de desempenho. Este grupo encontra-se estruturado em diversas categorias de indicadores, nomeadamente em cumprimento com as obras predefinidas, atendimentos dos SAS, gestão operacional, gestão financeira e comercial de água, qualidade do serviço e gestão ambiental. No Quadro 24 apresentam-se os indicadores de desempenho desenvolvidos pela SISS. Esta ferramenta é potencializada pela SISS através da realização de exercícios de benchmarking métrico. Na Figura 31 apresenta-se um exem- 2.4.4.3 Obrigações de serviço público No Chile, o marco legal em vigor define inequivocamente que os sistemas tarifários englobam os princípios de inteligibilidade, equidade, autofinanciamento e acessibilidade como valores prioritários do sector da água. Além disso, a legislação em vigor (Decretos n.º 382 e 1199 e NCh 409) contempla conceitos como a universalidade, continuidade e qualidade do serviço. Além da definição clara ao nível legal, a SISS promove um benchmarking específico sobre estes aspectos com o intuito de incentivar e promover a sua melhoria. Os aspectos considerados incluem indicadores de continuidade para os SAS, de pressão, de capacidade de cobrança e de resposta a reclamações. A Figura 32 ilustra a evolução do indicador continuidade de serviço. Como referido anteriormente, as autoridades governamentais têm uma enorme preocupação com as classes sociais mais desfavorecidas. A sua primeira acção iniciou-se com a implementação de um subsídio, atraFigura 31 Indicador perdas de águas por operador no Chile plo de um exercício de benchmarking desenvolvido pela SISS relativamente às perdas de água. Por último, é de referir que, procurando induzir alguma competição entre os operadores, o regulador elabora um ranking anualmente com base na qualidade do serviço e em outras informações relativas a aspectos financeiros e operacionais das entidades gestoras vés da Lei n.º 18.778, de 1989, posteriormente alterada em 1994, vocacionado para os utilizadores mais carenciados dos SAS. Este subsídio, financiado pelo governo central, é administrado pelos municípios, que também se encontram encarregues do processo de selecção dos utilizadores. O subsídio é directamente deduzido na factura, sendo pago pelo município à empresa em questão. 113 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional Figura 32 Evolução anual do indicador continuidade do serviço de água no Chile O sistema de selecção baseia-se na caracterização socioeconómica dos utilizadores, através da medição indirecta que permite focalizar a acção social do Estado nos sectores mais pobres. Esta aferição é desenvolvida pelas Comissões de Assistência Social Comunitária através da realização de inquéritos. Actualmente, o subsídio aplica-se sobre os encargos fixos e variáveis (somente nos primeiros 20 m3, sendo os restantes facturados normalmente), variando entre 25% e 85% do valor total. A fórmula mais corrente consiste na atribuição de 20 m3 de água gratuitos aos utilizadores carenciados. No Quadro 25 apresentam-se as condições de candidatura e de exclusão do subsídio para utilizadores do- Quadro 25 Condições de candidatura e exclusão do subsídio mésticos com recursos financeiros escassos. Todavia, quando o subsídio é cessado, os utilizadores podem candidatar-se novamente ao benefício. Por último, é de referir que uma outra medida defensora das políticas e estratégias sociais está relacionada com a imposição, através da Lei n.º 19.549, de 1998, das empresas concessionárias dos serviços de água, do dever de prestar assistência técnica e administrativa aos comités e cooperativas de água potável rural nas suas respectivas regiões, assim como desempenhar as actividades necessárias para executar as obras de reabilitação, melhoria e construção de novos serviços rurais. Subsídio de acção social Para ter direito ao subsídio, é necessário: Encontrar-se impossibilitado de pagar o serviço; Ter o pagamento dos serviços em dia; Solicitar ao município, por escrito, este benefício. O acesso ao subsídio cessa: Quando deixam de cumprir alguns dos requisitos que foram aceites; Quando não pagam três vezes consecutivas a parte remanescente da factura; Quando não se proporcionam os antecedentes requeridos pelo município para a revisão das condições socioeconómicas; Quando se cumpre o prazo para o qual existiu a concessão (máximo de 3 anos). 114 Chile 2.4.5 DESEMPENHO O sector da água no Chile representa um caso de sucesso no panorama da América Latina, não só pelos níveis de atendimento de serviço (abastecimento de água e saneamento de águas residuais) e pela qualidade do serviço prestada evidenciada, como também pelo modelo regulatório implementado. A conjuntura legal, social, económica e regulatória estável que caracteriza o país representa uma mais-valia em termos de atractividade do sector privado para os SAS, possibilitando, deste modo, grandes investimentos. Outro factor de grande relevância no sector da água chileno é a assistência financeira a utilizadores domésticos com recursos financeiros escassos, proporcionando uma política de subsidiação razoavelmente sustentada. Todavia, para um maior desenvolvimento, o sector da água do Chile carece do alargamento das competências da SISS a todas as entidades que operam os SAS, ou seja, áreas urbanas e rurais, e de uma maior independência face ao governo. 115 Colômbia 2.5 COLÔMBIA 2.5.1 ANTECEDENTES HISTÓRICOS A Colômbia, com uma população aproximada de 44 milhões de habitantes, dispersa por cerca de 1.142 mil km2, encontra-se organizada administrativamente em 32 departamentos e um distrito capital (Bogotá). Os departamentos, que representam o governo nas diferentes regiões e que são administrados por um governador, subdividem-se em 1.119 municípios, governados pelo presidente da câmara (Alcalde). Na Colômbia, a qualidade dos SAS aumentou significativamente durante a última década. Apesar dos problemas existentes, sobretudo nas áreas rurais, as principais cidades dispõem de serviços com um nível de serviço pouco comum na América Latina. A Colômbia, quando comparada com os países vizinhos (com excepção do Chile), evidencia várias diferenças, como os níveis elevados de investimento, a recuperação substancial dos custos, a existência de empresas públicas relativamente eficientes e, por último, uma estável e saudável participação do sector privado. Nas duas últimas décadas, o sector da água tem sofrido várias reformas. A mais relevante remonta ao ano de 1994, quando se definiu uma nova política sectorial caracterizada por uma estratégia clara e assente no protagonismo crescente dos municípios, na participação do sector privado, na regulação dos SAS, no princípio de recuperação de custos e na subsidiação cruzada. Na primeira metade do século XX, os municípios tinham a responsabilidade de fornecer os SAS na Colômbia. Em 1950, tal como sucedia em muitos outros países, o Governo colombiano adoptou um esquema centralizado e criou o Instituto de Fomento Municipal (Instituto de Fomento Municipal – INSFOPAL) e as Empresas de Água e de Águas Residuais Regionais (Empresas Departamentales de Acueducto y Alcantarillado – ACUAS y EMPOS), representando as entidades responsáveis pelo financiamento, planificação, concepção e administração dos serviços públicos na maioria dos municípios. Ainda assim, alguns municípios mantiveram a responsabilidade pelo fornecimento destes serviços a nível local e outros criaram empresas municipais. O caso mais elucidativo prende-se com a criação, em 1955, da Empresa Pública de Medelin (Empresas Públicas de Medellín – EPM) com responsabilidades multissectoriais. Posteriormente, na década de 80 do século passado, o sector da água enfrentou uma enorme crise. A INSFOPAL entrou em colapso financeiro em 1989, devolvendo, deste modo, a responsabilidade pelo fornecimento dos SAS à alçada dos municípios. Além disso, uma outra alteração institucional no sector da água prendeu-se com a transferência da atribuição tutelar deste sector, passando do Ministério da Saúde para o Ministério do Desenvolvimento Económico, o que representou uma mudança organizacional relevante. A Constituição Nacional, datada de 1991, delega nos municípios a atribuição do fornecimento dos SAS, incluindo a capacidade de decisão sobre a participação do sector privado na sua gestão. A Constituição fornece a estrutura legal e estabelece a plataforma de introdução de mais reformas no sector da água, desagregando claramente os papéis de operador e de decisor político. Na sequência destas reformas, o governo produziu a Lei n.º 142, de 1994 (Ley de Servicios Públicos Domiciliários), que revolucionou o enquadramento legal do sector da água. Esta lei sofreu algumas alterações em 2001, mantendo, no entanto, a sua estrutura principal. A política dos serviços públicos dos governos liberais de César Gaviria (1990-1994) e de Ernesto Samper (1994-1998) foi moldada por uma linha de modernização e abertura empresarial, aumentando 117 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional consideravelmente os investimentos no sector da água por parte dos municípios, melhorando a qualidade e eficiência dos serviços através da participação do sector privado nas áreas mais carenciadas do país (onde as empresas públicas apresentavam maiores défices), estabelecendo uma entidade reguladora sectorial e, por último, fomentando a recuperação dos custos ao mesmo tempo que promovia a política de serviço universal, protegendo os utilizadores dos escalões sociais mais carenciados através de subsidiação cruzada com os utilizadores que a priori apresentavam maior capacidade de pagamento. Com o objectivo de modernizar o sector da água, foi constituída, em 1995, a primeira PPP através da criação de uma empresa de capitais mistos para o fornecimento dos SAS da cidade de Cartagena. No ano seguinte, formou-se a PPP da cidade de Barranquilha à qual sucederam outras PPP. Em 2002, o governo publicou o Programa de Modernização Empresarial visando a introdução e a participação do sector privado no sector da água também em municípios de pequena e média dimensão, o que suscitou progressos significativos ao nível da qualidade e da eficiência do fornecimento dos SAS. A Lei n.º 142 constitui o marco legal que regula os SAS. Esta lei representa a principal ferramenta legal que o governo possui no sector da água, orientando-o inequivocamente para a sua eficiência e para o aumento de concorrência e da promoção da participação do sector privado. Entre os elementos-chave da lei estão o estabelecimento da Superintendência para os Serviços Públicos (Superintendencia de Servicios Públicos Domiciliarios – SSPD) e a definição das funções da Comissão da Regulação de Água Potável e Saneamento Básico (Comisión de Regulación de Agua Potable y Saneamiento Básico – CRA). Além de promover a recuperação de custos através das tarifas, e de ajustar limites da subsidiação cruzada entre os utilizadores, a lei também incentiva a liberalização de todos os operadores de serviço público, incluindo os que tradicionalmente se consideram monopólios naturais. O governo de Alvaro Uribe pretendia elevar o perfil do sector da água na Colômbia para dar um maior impulso no incremento do atendimento do serviço, excedendo os objectivos do Desenvolvimento do Milénio, e melhorando a qualidade do serviço, especialmente nas cidades pequenas e nas zonas rurais que apresentam o maior défice. Para este fim, o Governo colombiano criou, em 2006, o Viceministério da Água e Saneamento, desenvolvendo quatro novos programas: um programa relativo à organização dos SAS (Planes Departamentales de Agua y Saneamiento), um outro para a drenagem 118 de águas residuais (Programa de Saneamento para Assentamientos - SPA), um terceiro para o tratamento de águas residuais (Programa de Saneamento de Vertimientos Municipales) e um último associado à saúde pública (Programa de Lavado de Manos). O programa de Planes Departamentales de Água e Saneamiento destina-se a planificar e a harmonizar os recursos e os esquemas regionais de fornecimento dos serviços ao nível de cada região do país. O programa está a ser primeiramente implementado em quatro regiões, que se encontram em circunstâncias particularmente difíceis, designadamente, Sucre, Cordova, Magdalena e Guajira. Este programa procura também incentivar a automatização do sector nas empresas de menor dimensão para beneficiar das economias da escala. 2.5.2 ENQUADRAMENTO LEGAL E INSTITUCIONAL 2.5.2.1 Responsabilidades As responsabilidades sobre o sector da água encontram-se associadas a diversos organismos, nomeadamente, ao Ministério do Ambiente, da Habitação e do Desenvolvimento Regional (Ministerio de Ambiente, Vivienda y Desarrollo Territorial – MAVDT), ao Ministério da Protecção Social (Ministerio de la Protección Social - MPC), à CRA, à SSPD, às Corporações Autónomas Regionais (Corporación Autónoma Regional – CAR), à Direcção do Orçamento e do Desenvolvimento Territorial (Financiera de Desarrollo Territorial S.A - FINDETER) e aos municípios. Na Colômbia, os municípios têm a atribuição de assegurar que os SAS sejam fornecidos aos seus habitantes de modo eficiente por empresas de serviços públicos (art. n.º 5, da Lei n.º 142). A responsabilidade dos SAS recai então sobre as empresas de serviço público, excepto em alguns casos específicos definidos na lei, em que os municípios podem prestar estes serviços directamente. Em zonas rurais e periurbanas, as associações de municípios fornecem também o serviço de água. É da competência do MAVDT a formulação da política nacional da água. Dentro deste ministério, a Direcção para o Serviço de Água Potável e Saneamento Básico (DAPSBA) supervisiona o sector, estabelece políticas que o regulamentam e institui o seu planeamento e o Departamento Colômbia Nacional do Planeamento (DNP) é o responsável pela concepção e monitorização de políticas, pela realização de planos, programas, estudos e projectos de investimento para os sectores da água e do ambiente. e ambiente, bem como salvaguardar o cumprimento de leis estabelecidas pelo governo ao nível da deposição, administração, gestão e utilização dos recursos hídricos. O MPS possui valências ao nível da supervisão da qualidade da água e da saúde pública. A FINDETER, criada pela Lei n.º 57, de 1989, é uma sociedade comercial, tutelada pelo Ministério da Fazenda e Crédito Público, que tem como atribuição a promoção do desenvolvimento regional e urbano, mediante o financiamento e a assessoria na concepção, execução e administração dos projectos e programas de investimento. A CRA tem funções de regulação económica e da qualidade do serviço, estabelecendo os sistemas tarifários dos operadores através de critérios de eficiência económica e promovendo a competição entre eles. A CRA aprova os planos de investimento e institui e supervisiona a qualidade do serviço e as normas técnicas a serem Os municípios são os responsáveis pela prestação dos SAS, podendo fazê-lo directamente, delegando a empresas municipais ou desenvolvendo PPP do tipo contratual ou institucionalizado. Na Figura 33 apresenta-se o enquadramento institucional dos diferentes intervenientes do sector da água na Colômbia. O Viceministério da Água e do Saneamento é responsável pelo estabelecimento da política sectorial, definindo o marco das políticas nacionais instituídas pelo DNP. Figura 33 Enquadramento institucional do sector da água na Colômbia seguidas pelos operadores dos SAS. Não obstante as várias e importantes funções que detém, a CRA não é responsável pela monitorização de muitas das decisões que toma, estando esta atribuição sob a alçada da SSPD. A SSPD é responsável pela monitorização e supervisão dos serviços públicos (por ex., água, energia, gás e telecomunicações). Neste âmbito, procura que os operadores prestem estes serviços de forma adequada e eficiente, estabelecendo critérios contabilísticos uniformes, supervisionando a administração dos subsídios e monitorizando a sua gestão. As CAR, que asseguram a regulação ambiental, foram criadas pela Lei n.º 99, de 1993. São entidades que dependem do Ministério do Ambiente e têm como atribuições implementar políticas, planos, programas e projectos sobre os recursos naturais renováveis 2.5.2.2 Regulação Na Colômbia existe uma entidade reguladora independente, criada pela já referida Lei n.º 142, de 1994, dedicada às questões de regulação económica, qualidade do serviço e obrigações de serviço público dos SAS. A CRA é um regulador sectorial que tem também funções de regulação dos serviços de resíduos sólidos. A CRA é uma unidade administrativa especial, tutelada pelo Ministério do Ambiente, com independência técnica, administrativa e patrimonial, mas sem personalidade jurídica. A regulação económica desenvolvida pela CRA baseia-se na regulação por comparação (yardstick competition), strictus sensus, isto é, os sistemas tarifários dos operadores são determinados com base no desempenho dos operadores do sector 119 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional que constituem as melhores práticas. O sistema de preços máximos, adoptado para um período regulatório de cinco anos, é constituído por três parcelas: uma parcela relativa aos custos administrativos, uma segunda relativa aos custos de operação e manutenção e uma terceira relativa aos custos de capital, que inclui também as taxas e os impostos ambientais. As duas primeiras parcelas são baseadas nos custos eficientes (melhores práticas), enquanto a terceira assenta na aprovação dos planos de desenvolvimento dos operadores. Este cálculo é efectuado separadamente para o abastecimento de água e para o saneamento de águas residuais. A determinação das melhores práticas apoia-se na técnica fronteira, e não paramétrica, de benchmarking de DEA. Este arrojado modelo tem sido, de facto, muito criticado pelos operadores colombianos (vide Marques e Contreras, 2007). A Portaria n.º 287, de 2004, define os critérios e a metodologia de determinação das tarifas dos SAS, tendo como base diversos princípios, dos quais o mais importante se prende com o incentivo à eficiência económica. De facto, o art. n.º 87 da Lei n.º 142 refere que “o regime tarifário irá ser orientado pelo critério da eficiência económica, neutralidade, solidariedade, redistribuição, autonomia financeira, simplicidade e transparência”. O art. n.º 92 determina que, nas fórmulas tarifárias, a CRA irá assegurar os benefícios através do estabelecimento de um período de tempo para a redução média dos custos dos SAS, ao mesmo tempo que lhe são fornecidos incentivos para se tornarem mais eficientes do que a média e, desta forma, adquirirem vantagens dos benefícios resultantes da maior eficiência. O orçamento de 2006 da CRA foi de, aproximadamente, 2,7 milhões de euros. A CRA é independente financeiramente, pois não necessita de recorrer ao orçamento de Estado. A sua independência financeira é-lhe conferida pela implementação de um tributo aos operadores, denominado “Contribución Especial”, em conformidade com o art. n.º 85 da Lei n.º 142. Neste âmbito, todos os operadores dos serviços regulados encontram-se obrigados a pagar esta taxa, que é calculada com base nos custos administrativos das empresas. Em 2007, o número de funcionários do CRA era de 105. 2.5.3 ESTRUTURA DO MERCADO 2.5.3.1 Propriedade e gestão dos serviços Os SAS têm propriedade pública e caracterizam-se por uma gestão maioritária do sector público. Apesar de, em termos nacionais, o sector priva120 do representar apenas uma pequena percentagem do fornecimento dos SAS, o mesmo foi sempre apanágio de uma grande estabilidade e sustentabilidade, sendo considerado um caso de sucesso no contexto da América Latina. 2.5.3.2 Players do sector Segundo o CRA, existiam, em 2005, 2.886 operadores do serviço de água e 1.071 operadores do serviço de águas residuais. Este diferencial é justificado pela diferença de atendimento entre os dois serviços. Uma das maiores empresas públicas da América Latina é a Empresa Pública de Medelin (EPM), uma empresa municipal que fornece os SAS e os serviços de limpeza e resíduos urbanos, de electricidade e de telecomunicações locais e que evidencia um bom desempenho. As empresas públicas em outras grandes cidades do país, como a Empresa dos SAS de Bogotá (Empresa de Acueducto y Alcantarillado de Bogotá - EAAB), também apresentam bons indicadores de desempenho em comparação com muitas outras empresas públicas dos SAS na América Latina. Ao contrário do que sucedeu em muitos países em vias de desenvolvimento, onde a participação do sector privado no sector da água tem sido muito controversa, resultando frequentemente no termo antecipado dos contratos, na Colômbia a sua presença tem acontecido de forma estável, sendo inclusive considerada, por muitos, um verdadeiro caso de sucesso. Em 2004, a Colômbia contabilizava 125 operadores dos SAS privados e 48 operadores de capitais mistos, onde se incluem grandes, médias e pequenas empresas. Não obstante os bons resultados obtidos (eficácia) pela EAAB, estes devem-se a uma grande “injecção” de capitais públicos oriundos do governo. Neste contexto, a situação tornou-se incomportável, apesar do aumento substancial das tarifas. A solução encontrada, mantendo o estatuto de operador público para a administração da EAAB, passou, em 2003, pelo recurso a três empresas privadas para o estabelecimento de cinco contratos de gestão de várias das fases de cadeia de valor. A EAAB também estabeleceu um contrato BOT de 20 anos, procurando a reabilitação, operação e manutenção de uma das suas ETAR. Este contrato foi estabelecido com a empresa Proactiva, que fornece o serviço de tratamento de águas residuais a cerca de 2,3 milhões de habitantes em Bogotá. Esta empresa, fundada em 1997 com capitais igualmente repartidos entre a FCC (Espanha) e a Veolia (França), gere vários serviços de água, de águas Colômbia Girardot e Riohacha, cujos operadores são, na sua maioria, colombianos e/ou espanhóis. O desempenho geral dos SAS tem melhorado onde o sector privado tem participado, em alguns casos muito acima do expectável, como, por exemplo, em Barranquilla, que alcançou um sucesso impressionante na ampliação do atendimento dos SAS às populações rurais mais pobres. residuais e de resíduos sólidos dispersos por toda América Latina. Na Colômbia, a Proactiva explora também, e aí integralmente, os SAS de cerca de 320 mil habitantes em Monteria (contrato de 20 anos) e em Tunja (contrato de 30 anos), servindo, nesta última, aproximadamente 150 mil habitantes. Observa-se, assim, uma proliferação das empresas espanholas (privadas e públicas) no mercado da água da América Latina. As empresas espanholas estão presentes não só através da já referida FCC, mas também da Agbar, que presta os SAS em Cartagena das Índias, abastecendo cerca de 730 mil habitantes, do Canal de Isabel II e da TECVASA. Em 2006, entre os 365 operadores dos serviços registados na SSPD, que servem mais de 2.500 utilizadores, 318 são empresas de serviço público, 38 são municípios e 9 são de outra natureza. Nos últimos anos, os municípios têm-se retirado tendencialmente da prestação directa destas actividades, criando empresas especializadas para esse efeito (empresas industriales y comerciales del estado – EICE), as quais, pela sua natureza jurídica, têm maior flexibilidade para contratar sob um regime de direito privado, mesmo que sujeitas aos entes administrativos para o seu controlo. Assim, em 2006, a maioria das empresas de serviços públicos era do tipo EICE com 53% da totalidade, mantendo-se os municípios com o esquema de prestação directa em 15% dos casos, as empresas privadas com 12%, as oficiais com 13%, as mistas com 6% e as organizações autorizadas com cerca de 1%. A Empresa de Água colombiana Triple A (AAA) é controlada pelas empresas Canal de Isabel II, uma empresa municipal de água de Madrid, e TECVAS (empresa privada da Comunidade Valenciana). Na Colômbia, a AAA opera em Puerto Colômbia, Soledad, Galapa, Sabanalarga, Sabanagrande, Santa Marta, Santo Tomás, Baranoa e Polonuevo, fornecendo os SAS a cerca de 2 milhões de utilizadores. O Quadro 26 apresenta o número de operadores, pela população servida, no sector da água na Colômbia (Econometria, 2004). Quadro 26 Operadores e população servida no sector da água na Colômbia (2004) Tipo de Operador População Municípios (n.º) Público Comunitário Privado Total operadores: 1.008 > 1 milhão 4 2 0 13 400 000 – 1 milhão 7 2 0 10 100 000 – 400 000 27 9 1 23 40 000 – 100 000 53 38 9 22 < 40 000 1.007 799 32 48 Total 1.098 850 42 116 84,3% 4,2% 11,5% Percentagem A participação da iniciativa privada nos SAS colombianos teve o seu início em Cartagena, em 1995, com o apoio do Banco Mundial. Os exemplos mais importantes são Cartagena, Barranquilla, Santa Marta, Tunja, Montería, Palmira, Em algumas zonas semiurbanas existem exemplos de sucesso na gestão dos SAS por organizações comunitárias, que pautam por grande transparência e responsabilização. Por exemplo, a Junta Administradora del Aqueducto La Sirena 121 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional Quadro 27 Evolução do nível de atendimento dos SAS en el Valle de Cauca, na periferia da cidade de Cali, gere 778 ligações domiciliárias com serviço contínuo a cerca de 4.200 utilizadores, a rede de saneamento e uma estação de tratamento e factura, com base no consumo medido, um preço médio de 2,3 euros por 28 m3 por mês. Não existe estratificação dos consumos, apenas se aplicam tarifas especiais para quem consome mais de 28 m3. A Comunidade tem gerado excedentes que servem para investir na manutenção e mesmo para a construção de infraestruturas novas dos SAS. Outro exemplo de 1990 Grupo águas residuais revelava um nível de atendimento de 74,1%, embora apenas 25% do total de águas residuais recolhidas fosse realmente tratado. Nesse ano, o serviço de água compreendia cerca de 49% de perdas de água. O Quadro 27 apresenta a evolução dos níveis de atendimento dos SAS na Colômbia (SSPD, 2002). A continuidade média do serviço de água no país aumentou de 15.36 horas em 1993 para 19.82 horas em 2003. Em 2007, a continui- 1997 1999 2000 Abast. San. Abast. San. Abast. San. Abast. San. 4 grandes cidades* 94,0 86,9 95,5 89,1 97,2 92,4 98,2 93,4 Cidades > 100 mil hab. 80,0 74,8 94,2 77,7 96,1 84,2 96,4 85,5 Restantes municípios 83,2 51,4 91,0 71,3 90,0 67,9 91,3 71,1 Média zona urbana 86,5 72,1 93,5 80,3 94,6 81,8 95,0 83,5 *Bogotá, Medellín, Barranquilla e Calí. sucesso é o caso da Asociación Acueducto de Río Negro en Popayan, formada há 10 anos, que integra 10 operadores com 7.000 ligações domiciliárias. 2.5.3.3 Integração do sector e serviços oferecidos Normalmente, os SAS são caracterizados pela sua integração vertical e pela sua reduzida integração horizontal, sendo que, de uma forma geral, a mesma entidade presta ambos os serviços. No entanto, alguns operadores públicos contratados externamente, como sucede com a EAAB, são responsáveis por algumas das etapas da fileira produtiva (ciclo da água). Com poucas excepções (por ex., EPM), os SAS na Colômbia não prestam outros serviços. 2.5.3.4 Números do sector Em 2006, o serviço de água na Colômbia caracterizava-se por um nível de atendimento de 88,3%. Nesse mesmo ano, o serviço de 122 dade média do serviço de água representa um valor ligeiramente superior a 20 horas, variando entre o fornecimento de água de 24 horas (nas quatro maiores cidades) e um serviço intermitente nas cidades de menor dimensão. Na Colômbia, o consumo médio de água para consumo humano nas zonas urbanas é de cerca de 59 litros por habitante e por dia. A utilização de água para consumo humano baixou cerca de 25% entre 1996 e 2001, devido, sobretudo, ao aumento substancial das tarifas e à inclusão de utilizadores de baixos rendimentos, como consequência do alargamento do serviço. Segundo a CRA, em 2006, os serviços de água obtiveram uma receita de 367,8 milhões de euros e, tal como sucede na maioria dos países em desenvolvimento, embora o serviço de águas residuais seja, por norma, mais dispendioso, apresenta uma receita consideravelmente menor, neste caso de 246 milhões de euros. Em relação aos investimentos, nos SAS foram investidos, nos últimos três anos, 1,6 mil milhões de euros. Entre 1995 e 2003, foram investidos 2 mil milhões de euros, dos quais 16% foram Colômbia provenientes de capital privado. Na Figura 34 apresenta-se a evolução anual do investimento no sector da água colombiano Para o período entre 2007 e 2017, a SSPD prevê investimentos na ordem dos 1,47 mil 2004), segundo a aplicação de benchmarking (através da técnica de DEA). As tarifas são implementadas mediante a existência de uma parcela fixa e uma parcela variável crescente, em função do consumo de água. Em 2006, a factura média mensal para um utilizador doFigura 34 Evolução anual do investimento no sector da água na Colômbia milhões de euros repartidos entre o abastecimento de água e a drenagem e tratamento de águas residuais. 2.5.4 REGRAS DO JOGO 2.5.4.1 Estabelecimento de tarifas Os princípios segundo os quais se rege a determinação do sistema tarifário na Colômbia são definidos pela Lei n.º 142, independentemente de as empresas serem públicas, mistas ou privadas. O esquema tarifário concebido, que é único na América Latina, alavancou uma série de progressos no sector da água, como um importante aumento nas tarifas da água e na capacidade de autofinanciamento dos SAS, um incremento das transferências do governo central para os municípios destinados ao sector e, por conseguinte, um aumento significativo dos investimentos e do acesso ao serviço e, por último, uma maior protecção aos estratos socioeconómicos mais reduzidos através da diferenciação das tarifas por escalões. A tarifa calcula-se com base nos custos eficientes, de acordo com a metodologia definida a nível nacional pela CRA (Decreto n.º 287, de méstico era de 4,51 euros, para o serviço de água, e de 3,18 euros, para o serviço de águas residuais, totalizando 7,69 euros. Os tarifários são também diferentes consoante a natureza do utilizador, penalizando os comerciais, industriais, oficiais e especiais. Para proteger as pessoas com rendimentos reduzidos contra as tarifas demasiado altas, a entidade reguladora aplica factores que ajustam as tarifas em cada município à capacidade de compra estimada dos utilizadores. Desta forma, a CRA emprega o conceito “estrato socioeconómico”, uma ferramenta utilizada pelo Governo colombiano, para classificar os seus cidadãos mediante os respectivos rendimentos. Deste modo, cada cidade delimitou áreas geográficas correspondentes a cada um dos seis estratos socioeconómicos definidos, desde o estrato 1 (muito reduzido) ao estrato 6 (alto). Os factores afectos às tarifas da água para os utilizadores oscilam entre 0,3 e 1,2, como se pode observar no Quadro 28. A percentagem de população colombiana que pertence aos grupos sociais correspondentes aos estratos 1-3 é muito maior que a restante população, que se insere nos estratos 5 e 6. Por exemplo, em Bogotá 73% da população situa-se nos estratos 1-3, e apenas 10% nos estratos 5 e 6. Com efeito, o sistema tarifário tende a gerar défices permanentes, que requerem subsídios (transferências) oriundos do governo nacional ou 123 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional Quadro 28 Estratos socioeconómicos e factores de ajustamento correspondentes Estrato Factor de ajuste 1 0,30 2 0,60 3 0,85 4 1,00 5 1,20 6 1,20 directamente dos municípios. A Figura 35 ilustra a evolução anual das tarifas dos SAS por escalão de utilizador (SUI, 2008). É de realçar que os escalões na Colômbia correspondem a estratos sociais, para os SAS para o ano de 2007. Os consumos básicos e não básicos incluem as taxas ambientais que assumem valores relevantes. As taxas ambientais pretendem, deste modo, desincentivar o consumo, e não a consumos. O Quadro 29 apresenta os níveis de subsídios alocados, ao longo do tempo, por escalão e relativos à tarifa média dos SAS. O Quadro 30 apresenta o sistema tarifário da EAAB colmatando, de certa forma, o défice ambiental que as captações de água provocam, sendo definidas através da relação entre a regulação ambiental em vigor e as tarifas praticadas pelos SAS. Figura 35 Evolução anual da tarifa média por escalão de utilizador na Colômbia Quadro 29 Níveis de subsídios na tarifa média Estrato 1 2 3 4 5 6 1996 -91% -85% -72% -51% -23% 1% Ano 2000 -82% -68% -48% -22% 13% 42% Ano 2002 -73% -55% -30% -12% 30% 61% Níveis máximos (Lei n.º 812, de 2002) -70% -40% -15% 0% * * 124 Colômbia Abastecimento de água (€/m3) Saneamento de águas residuais (€/m3) Utilizador Parcela fixa (2 meses, €) Consumo básico Consumo não básico Parcela fixa (2 meses, €) Consumo básico Consumo não básico Escalão 1 1,23 0,21 0,70 0,626 0,128 0,426 Escalão 2 2,46 0,42 0,70 1,252 0,256 0,426 Escalão 3 3,77 0,64 0,70 1,920 0,392 0,426 Escalão 4 4,10 0,70 0,70 2,087 0,426 0,426 Escalão 5 9,18 1,04 1,04 5,198 0,639 0,639 Escalão 6 11,22 1,11 1,11 7,222 0,682 0,682 Domésticos Industrial 5,33 0,96 2,734 0,610 Comercial 6,14 1,04 3,131 0,639 Oficial 4,10 0,70 2,087 0,426 Especial 4,10 0,70 2,087 0,426 2.5.4.2 Qualidade do serviço Apesar dos inúmeros avanços que o sector da água tem sofrido ao nível de atendimento dos SAS, ainda subsistem problemas sérios no âmbito da qualidade da água, com enormes défices que se repercutem na elevada taxa de mortalidade, em especial entre as crianças. Embora a qualidade geral do serviço de água na Colômbia tenha melhorado bastante durante os últimos dez anos, o fosso entre as maiores cidades face às cidades pequenas e zonas rurais continua muito elevado. O nível de atendimento dos SAS em áreas rurais é menor do que seria esperado, tendo em conta o nível de desenvolvimento económico do país e, especificamente, os progressos no sector da água. Embora uma das razões para esse atraso seja o conflito político e o conflito armado, existem outras justificações importantes, como, por exemplo, o facto de os municípios usarem as transferências do Sistema Geral de Contribuições (Lei n.º 715, de 2001) para investimentos em áreas urbanas. Além disso, ao contrário de alguns outros países da América Latina, a Colômbia não possui uma instituição ou um programa a nível nacional que ofereça apoio técnico às organizações comunitárias que servem as áreas rurais. A Lei n.º 142 afecta esta tarefa aos departamentos do governo, no entanto, esta atribuição não tem sido desempenhada satisfatoriamente. Quadro 30 Sistema tarifário da EAAB para o ano de 2007 O Inventário do Saneamento Rural (ISR), desenvolvido em 2002, confirmou a situação referida anteriormente, destacando, entre outros aspectos, que apenas 21% das organizações comunitárias rurais estavam habilitadas a desenvolver a manutenção dos SAS e 10% a administrar o serviço. Só 32% emitiam facturas e apenas 10% contabilizavam micromedição. Com o objectivo de aumentar o acesso e melhorar a qualidade dos SAS neste domínio, em 2005 o governo definiu, como atrás referido, as orientações políticas para este serviço nas zonas rurais na Colômbia. De acordo com uma análise do SSPD levada a cabo em 2004, 72% dos utilizadores tiveram acesso a água com qualidade adquada e 28% dos utilizadores receberam um serviço com 125 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional água imprópria para consumo. Em alguns casos, a pressão do serviço de água é inadequada, aumentando consideravelmente os riscos de contaminação. Os serviços de águas residuais não têm a capacidade hidráulica suficiente para as necessidades, especialmente em zonas mais carenciadas, resultando em problemas de transbordos e inundações. Em 2006, cerca de 25% das águas residuais produzidas no país receberam algum tipo de tratamento. As remanescentes 75% continuavam a ser rejeitadas sem nenhum tipo de tratamento, contaminando os recursos de água naturais. Em todo o progresso do sector da água na Colômbia destaca-se o papel da entidade reguladora no cumprimento do seu estatuto, ou seja, na defesa dos interesses dos utilizadores e do interesse público. No entanto, na sua actuação não elabora nenhum relatório onde descrimine o desempenho das entidades gestoras e que, desta forma, incentive o uso de benchmarking. É de salientar, por exemplo, o nível de perdas de água de quase 50%, o qual é inaceitável, ou mesmo a elevada descontinuidade do serviço. Na realidade, o processo regulatório adoptado pela CRA permite incentivar o desempenho e o desenvolvimento da qualidade do serviço, dado que os operadores com resultados negativos neste domínio podem sofrer represálias ao nível da redução de tarifas. Todavia, esta avaliação ainda não foi desenvolvida. 2.5.4.3 Obrigações de serviço público Na Colômbia, como salientado, a regulação dos SAS é determinada pela Lei n.º 142 e por posteriores alterações. Para além dos princípios associados à eficiência económica e à qualidade do serviço que este marco legal regulamenta, contempla também a universalidade dos SAS, procurando que estes serviços sejam fornecidos a todos os utilizadores colombianos. Com o objectivo da universalização dos SAS, e tendo em consideração o reduzido nível de rendimento da maioria dos colombianos, associado a uma grande dispersão dos utilizadores, a política governativa do sector da água promove a subsidiação cruzada entre os estratos socioeconómicos e a natureza do utilizador, e entre as zonas urbanas e rurais, bem como a adopção de tarifas especiais para os utilizadores mais carenciados. No sentido de promover uma melhor interacção com o utilizador, alguns operadores, como a EAAB, desenvolveram uma interface que pre126 tende optimizar as relações entre o operador e os utilizadores, usualmente denominado “Defensor del usuário”. Esta entidade tem como objectivo principal defender os interesses dos utilizadores, devendo dispor de todos os meios possíveis para o desenvolvimento das suas funções, nas quais se destacam o tratamento das reclamações. A Resolución da CRA n.º 287, de 2004, sobre a metodologia tarifária, promove um sistema tarifário sustentado em princípios de eficiência económica, neutralidade, solidariedade, redistribuição, auto-suficiência, simplicidade e transparência. Todas as decisões da CRA, bem como os principais factos relativos ao sector da água, são publicitadas em diversos locais, incluindo o sítio da Web do regulador. 2.5.5 DESEMPENHO A Colômbia tem desenvolvido um enorme esforço para alcançar um padrão de desempenho elevado no sector da água. Em geral, e no que concerne sobretudo ao serviço de água nas zonas urbanas, esse objectivo tem sido conseguido e pode mesmo ser considerado um caso de sucesso, tendo em conta o seu contexto geográfico. Em relação aos SAS nas zonas rurais essa pretensão ainda não foi alcançada. A criação e o funcionamento do modelo regulatório, no qual a CRA assume o seu baricentro têm sido avaliados como muito positivos. A CRA tem adoptado uma metodologia de regulação económica baseada na comparação da eficiência produtiva entre os operadores e no incentivo ao desempenho fornecido aos operadores, mas sem descurar os aspectos relacionados com a regulação social (por ex., serviço universal) e a regulação ambiental (por ex., cobrando taxas para esse efeito). Os procedimentos regulatórios são transparentes e neutrais e evidenciam um knowhow muito elevado. Os principais problemas do sector da água da Colômbia não podem ser dissociados dos problemas do país. Para além dos conflitos políticos, que condicionam a desenvoltura do sector numa parte considerável do seu território, o rendimento reduzido per capita e a baixa densidade populacional condicionam a sua sustentabilidade. A regulação da qualidade do serviço pode e deve ser melhorada, designadamente através da publicação e da comparação de indicadores de desempenho (por ex., benchmarking e regulação sunshine). Até há bem pouco tempo, a CRA tem, e de forma compreensível, focalizado a sua actuação na regulação económica e na regulação social. No domínio da regulação da qualidade do serviço, uma eficaz coordenação entre a CRA e o SSPD assume uma importância fundamental. Costa Rica 2.6 COSTA RICA 2.6.1 ANTECEDENTES HISTÓRICOS A Costa Rica rege-se pela Constituição Política de 1949, que estabelece um sistema presidencialista e um Estado unitário. O país, com cerca de 4 milhões de habitantes distribuídos por 51 100 km2, encontra-se organizado em sete províncias (provincias), cujos governadores são nomeados pelo presidente. Estas províncias dividem-se em 81 cantões (cantones), que, por sua vez, se dividem em 463 distritos (distritos). O presidente da Costa Rica governa o país ao lado de dois vice-presidentes, todos eleitos por voto popular a cada quatro anos. O sector da água na Costa Rica tem evidenciado inúmeros progressos nas últimas décadas, principalmente em relação ao serviço de água e, em particular, relativamente ao seu nível de atendimento. No entanto, este é um sector onde ainda existem enormes desafios, tendo em conta o reduzido número de ligações ao serviço de saneamento de água residuais, a reduzida qualidade do serviço prestado e, por fim, a insuficiente recuperação dos custos de serviço através dos preços cobrados aos utilizadores. Com o intuito de evitar esta realidade, o governo tem promovido várias leis e desenvolvido reformas que têm regulamentado e alterado o sector, procurando uma evolução positiva do sector da água associada a uma preocupação, claramente presente, da defesa da saúde pública dos utilizadores. Historicamente, o sector da água na Costa Rica encontra-se marcado por dois períodos legislativos, referentes a duas Leis de Água, respectivamente a Lei das Águas n.º XI, de 1884 (1884-1942), e a Lei de Águas n.º 276, de 1942. No primeiro período, o sector da água caracterizava-se por uma conjuntura onde a gestão dos serviços de água era repartida entre o sector privado e o sector público, em que o ministério com maiores responsabilidades sobre o sector da água era o Ministério das Obras Públicas. A implementação da Lei da Água n.º 276, que hoje regula todo o sector, foi imposta quando a responsabilidade deste sector se encontrava associada ao Ministério do Ambiente e da Energia. Actualmente, como referido, o sector da água encontra-se primordialmente regulamentado pela Lei da Água de 1942, pela Lei Geral da Água para consumo humano (Lei n.º 1.634, de 1953), que estabelece as responsabilidades dos diferentes órgãos do governo sobre o sector, e também pela Lei Geral de Saúde (Lei n.º 5.395, de 1973). Posteriormente, a legislação que criou a entidade reguladora, a Lei n.º 7.593, de 1996, veio tornar-se num importante documento normativo na promoção da eficiência e da qualidade do serviço neste sector na Costa Rica, designadamente através do estabelecimento de obrigações de serviço público, entre outras medidas. A Lei Geral de Saúde (Ley General de Salud) estabelece, através dos seus artigos n.º 267 e 268, que “Todo sistema de abastecimiento de agua destinada al uso y consumo de la población deberá suministrar agua potable en forma continua, en cantidad suficiente para satisfacer las necesidades de las personas y con la presión necesaria para permitir el correcto funcionamiento de los artefactos sanitarios en uso”. É de salientar que todos os sistemas de abastecimento de água têm de estar sujeitos ao controlo de qualidade por parte do Ministério da Saúde, sendo esta entidade responsável pelo garante do fornecimento de água para consumo humano em condições adequadas. O governo também procurou implementar legislação que impusesse aos operadores mais e melhores condições, mas a conjuntura em que o país se encontra, aliada aos exacerbados custos 127 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional das estações de tratamento, ditaram o fracasso parcial dessa legislação e regulamentação. negligência ao nível de manutenção dos activos do AyA. O sector da água na Costa Rica necessita de consideráveis investimentos para que se consiga desenvolver, sobretudo, na vertente das águas residuais. No passado, mais de 60% dos investimentos no sector provinham de transferências do governo, das quais metade eram provenientes de empréstimos do exterior. No entanto, dado os vultuosos investimentos requeridos pelo sector, o governo não possuía capacidade de manter o elevado financiamento que até então comportava. Consequentemente, o sector voltou-se para um aumento das receitas internamente, através dos sistemas tarifários praticados pelos operadores dos referidos serviços. Por conseguinte, na “ausência” de subsídios do poder central, a maioria do investimento nas áreas rurais é subsidiada através de montantes fornecidos pelo Instituto Costa-riquense de Água e Águas Residuais (Instituto Costarricense de Acueductos y Alcantarillados – AyA), o maior e mais representativo operador dos SAS na Costa Rica, como será amplamente explanado mais adiante. 2.6.2 ENQUADRAMENTO LEGAL E INSTITUCIONAL O AyA tem como objectivo aumentar o nível de atendimento do serviço de água rural para 90%, nos próximos três ou quatro anos, mediante um acordo alcançado entre o Banco Popular e a Central American Bank for Economic Integration (CABEI), assinado em Março de 2007. As finalidades principais do acordo referido relacionamse com a promoção da sustentabilidade das Asociaciones Administradoras de Acueductos y Alcantarillados Rurales (ASADAS) e com a meta para qualquer serviço de água, ou seja, o nível de atendimento de 100%, tal como dotar o país de um sistema de informação automatizado das ASADAS, no sentido de melhorar os registos das operações e do estabelecimento de tarifas. Em 2002, o AyA propôs um programa de modernização do sector (2001-2020), que promoveu o aumento do nível de atendimento do serviço de água em zonas urbanas para 98,5% e com melhor qualidade e a melhoria drástica do nível de atendimento do serviço de águas residuais urbanas para 89% em 2020. Além disso, o programa desafia o sector a aumentar o nível de atendimento do serviço de água em zonas rurais para 90% em 2020. O investimento total requerido para execução deste programa atinge 1,1 mil milhões de euros, correspondendo a, aproximadamente, 55 milhões de euros por ano. Esta situação corresponde a quatro vezes mais do que o investimento anual médio entre 1991 e 1998. Em 2002, o AyA estimou que, tendo em conta o aumento dos rendimentos e da eficiência, somente cerca de 40% do investimento teria de ser financiado pelo governo. Os montantes requeridos reflectem os longos anos de 128 2.6.2.1 Responsabilidades A responsabilidade sobre o sector da água na Costa Rica encontra-se dividida entre o Ministério da Saúde (Ministerio de Salud – MINSA), o Ministério do Ambiente e Energia (Ministerio del Ambiente y Energía – MINAE), a entidade reguladora do sector ARESEP (Autoridad Reguladora de Servicios Públicos), cuja actividade será discutida no ponto seguinte, e a Comissão de Defesa da Concorrência (Comisíon de Defensa de la Competencia), dentro do Ministério da Economia (Ministerio de Economía) e os cantões. De acordo com a Lei da Água de 1953, a administração local, ou seja, os municípios, usualmente denominados cantões, possuem a responsabilidade última do fornecimento dos SAS em condições adequadas de qualidade e fiabilidade. No entanto, a realidade do sector da água na Costa Rica comprova que este serviço é fornecido, maioritariamente, por outras entidades. Além do papel de operador, o AyA (o maior e principal operador dos SAS na Costa Rica) detém importantes responsabilidades no sector da água ao nível do fornecimento de água às comunidades rurais fora da sua área de jurisdição, e também de monitorização do cumprimento das normas técnicas e da garantia de fornecimento de serviço contínuo por todo o país, ao ponto de assumir a gestão de qualquer SAS em áreas cuja exploração do respectivo operador tenha fracassado. O AyA assume-se como um exemplo para os outros operadores e o principal impulsionador de desenvolvimento do sector da água em todo o território costa-riquense. Em particular, o Departamento de Obras Rurais do AyA é responsável pelo planeamento, projecto, financiamento e construção de sistemas de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais. Além disso, este organismo detém também competências na assistência técnica às ASADAS e aos CAAR. De facto, o AyA possui um importante papel político e regulatório, ainda que de forma indirecta, dado que monitoriza o cumprimento das normas técnicas, tem a possibilidade de se apoderar de sistemas em rotura e, por último, Costa Rica compreende a atribuição de servir de conselheiro do ministério no desenvolvimento do sector. Este duplo papel incorre, em muitas situações, num conflito de interesses. O MINSA tem a responsabilidade de supervisionar o sector da água. No entanto, o ministério possui diversas responsabilidades no governo do país, nomeadamente, garantir a protecção e a melhoria do estado de saúde da população, mediante o exercício eficaz da sua magistratura e da liderança institucional, com enfoque na promoção da saúde e na participação social, sob gação e drenagem, abastecimento de água e saneamento de águas residuais, sempre e quando estes não são serviços municipais. Basicamente, a tarefa fundamental desta entidade é recomendar a aprovação ou não das tarifas, de acordo com as regras técnicas e regulamentares vigentes, que incluem, inter alia, os princípios de recuperação de custos, de equilíbrio financeiro, de eficiência económica, das normas da qualidade, da quantidade, da fiabilidade, da oportunidade, da equidade social e da sustentabilidade ambiental. A Figura 36 apresenta o enquadramento institucional do sector da água na Costa Rica Figura 36 Enquadramento institucional do sector da água na Costa Rica os princípios da transparência, equidade, solidariedade e universalidade. Apesar de o MINSA ter bem presente as suas responsabilidades no sector da água, nomeadamente, salvaguardar a qualidade da água no seu país, de facto, o seu desempenho revela-se ineficaz. Embora existam instrumentos para exigir a qualidade de água a todos os operadores, como ordens sanitárias e de encerramento dos sistemas de água, na prática o Ministério da Saúde detém um papel meramente representativo. O MINAE possui competências ao nível da gestão dos recursos hídricos na Costa Rica, de acordo com a Lei Ambiental (Lei n.º 7.554, de 1996), tal como o licenciamento ambiental. Outros ministérios desempenham também funções no sector da água, acabando, por vezes, por existir uma acentuada sobreposição de funções e responsabilidades. A Direcção de Serviços de Águas e Ambiente é o organismo do Ministério do Ambiente encarregue pela realização de estudos necessários à fixação de preços, tarifas e taxas e pelas condições de qualidade e do fornecimento dos serviços públicos associados ao sector da água, a saber, irri- 2.6.2.2 Regulação O sector da água na Costa Rica congratula-se pela existência de uma entidade reguladora dedicada ao sector. A ARESEP, criada em 1996 pela Lei n.º 7593, mas que apenas iniciou a sua actividade em 1999, é uma entidade reguladora independente multissectorial, envolvendo os sectores das telecomunicações, electricidade, água, petróleos, irrigação e transportes (vários modos). Possui a atribuição de regulador económico, onde se inclui a tarefa de estabelecer tarifas aos operadores, monitorizar e controlar a eficiência e a qualidade do serviço, proclamando a defesa do interesse dos utilizadores. No ano de 2006, os custos de funcionamento da ARESEP ascenderam a 3,65 milhões de euros. Este montante, que inclui as despesas com todos os sectores regulados, é integralmente oriundo das tarifas cobradas aos operadores, as quais são implementadas em função do volume de água fornecido, no caso do sector da água. A ARESEP tem 175 funcionários, mas apenas 16 estão afectos ao sector da água. A entidade reguladora não possui a capacidade de estabelecer regulamentos. O presidente (director-geral) e o 129 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional conselho de administração são nomeados pelo parlamento por um período de quatro anos. No entanto, o estatuto de independência do regulador permite-lhe tomar decisões sem necessitar da aprovação do governo e, além disso, tem independência financeira, ou seja, o seu orçamento não depende do governo. tão directa e indirecta dos SAS, dentro e fora da respectiva área de jurisdição. A metodologia tarifária aplicada ao sector da água baseia-se no cálculo dos custos de operação, manutenção e de capital, possibilitando uma remuneração sobre os capitais investidos, ou seja, baseada na regulação por taxa de remuneração. O intervalo regulatório é de um ano. O processo de estabelecimento de tarifas envolve a participação pública, onde os utilizadores podem manifestar a sua opinião sobre a alteração dos preços. 2.6.3.2 Players do sector No âmbito da defesa dos utilizadores, estes podem apresentar a sua reclamação ao regulador, directamente ao governo ou podem ainda recorrer aos serviços da entidade de defesa do utilizador, como a Defensoría de los Habitantes. O regulador procura resolver e mediar os conflitos existentes. Os operadores do SAS repartem-se entre as empresas públicas (AyA e ESPH), os municípios, os Comités Administradores de Abastecimento de Água Rurais (Comités Administradores de Acueductos Rurales – CAAR), as Associações Administradoras dos Serviços de Água e Águas Residuais (Asociaciones Administradoras de Acueductos y Alcantarillados Rurales – ASADAS) e, por último, os operadores privados. O Quadro 31 apresenta o número de cada um destes operadores, bem como a correspondente percentagem de atendimento no país. Observa-se ainda a participação de alguns operadores privados, que efectuam o abastecimento de água a sistemas individuais ou de reduzida dimensão. O sector da água na Costa Rica compreende mais de 1.800 operadores para o serviço de água e somente cinco para o serviço de águas residuais. No entanto, o AyA (em especial) e a ESPH destacam-se pela sua dimensão e cobertura dos SAS no país. O regulador encontra-se obrigado a desenvolver um relatório anual onde conste toda a sua actividade, que é, por sua vez, entregue ao parlamento. 2.6. ESTRUTURA DO MERCADO O AyA é uma instituição pública centralizada que reporta toda a sua actividade ao Ministro da Saúde, cuja gestão é perseguida por critérios políticos e substituída, frequentemente, na base de ciclos políticos. O AyA possui responsabilidades ao nível da exploração dos SAS, englobando cerca de 46% da população da Costa Rica. A maioria destes serviços é desenvolvida nas áreas urbanas, sendo apenas 3% da população rural fornecida pelo AyA. 2.6.3.1 Propriedade e gestão dos serviços Quadro 31 Operadores e respectivo atendimento de serviço de água na Costa Rica O sector da água, como tem sido referido, é governado, principalmente, por entidades gestoras públicas, destacando-se o papel do AyA na ges- A Empresa de Serviços Públicos de Heredia Nível de atendimento de serviço (%) Operador 130 Operadores (n.º) 2002 2007 AyA 1 43,2 46,5 ESPH 1 4,7 4,7 Municípios 30 17,1 17,4 CAAR e ASADAS 1800 24,4 25,5 Privado Indefinido 9 4,0 Costa Rica (ESPH), como o próprio nome indica, é uma empresa pública multissectorial com autonomia e regida de direito privado, fornecendo os SAS e os serviços de electricidade na região de Heredia, no Norte do país, e abrange 5% da população total da Costa Rica. Os CAAR e as ASADAS são pequenos operadores que fornecem os serviços de água nas áreas rurais. A sua actividade é totalmente dependente dos subsídios do AyA. Os operadores privados representam os sistemas isolados que são fornecidos por poços individuais. No Quadro 31 apresentam-se os diferentes players dos SAS na Costa Rica em número e o nível de atendimento correspondente. 2.6.3.3 Integração do sector e serviços oferecidos O sector da água na Costa Rica caracteriza-se por uma integração horizontal e vertical dos respectivos serviços numa só entidade gestora, fornecendo integralmente os serviços referentes a todo o ciclo da água, desde a captação à distribuição de água e da recolha e drenagem ao tratamento de águas residuais. É de salientar, todavia, que o serviço de águas residuais ainda representa uma pequena percentagem de atendimento da população. Como tal, nas áreas onde este serviço é disponibilizado, a entidade gestora que fornece o serviço de água gere simultaneamente o serviço de águas residuais. Normalmente, os operadores do sector da água apenas prestam os SAS, excepto a ESPH que, como mencionado, é uma entidade gestora multissectorial que, além destes serviços, disponibiliza também o serviço de electricidade a cerca de 100 000 habitantes. 2.6.3.4 Números do sector Na Costa Rica, o sector da água distingue-se por uma produção anual de cerca de 350 milhões de m3, dos quais quase 90% são produzidos pelo AyA e somente cerca de 10% pela ESPH (2006). A sua fonte é oriunda, praticamente na totalidade, de água subterrânea, com cerca de 98,2%. Neste âmbito, é possível aferir que os costa-riquenhos têm um consumo médio diário de 210 litros por habitante e por dia (incluindo o volume de água não facturado). Em 2006, o nível de atendimento do serviço de água era de 98%. O valor tão elevado de atendimento de serviço é um mero indicador, dado que apenas cerca de 50% da água fornecida apresenta qualidade adequada, sendo na maioria disponibilizada pelo AyA. Assim, existem quebras de continuidade que comprometem a fiabilidade do serviço. Em 2001, o serviço de águas residuais era fornecido a cerca de 21% da população. No entanto, somente 4,5% era realmente tratado. A maior participação para o valor apresentado corresponde ao atendimento na região de San José (a capital) de 50% e, de seguida, nas regiões de Heredia e Cartago, ambas com cerca de 15%. As outras regiões apresentam níveis de atendimentos do serviço de águas residuais abaixo dos 10%. Em 2006, o AyA produziu cerca de 310 milhões de m3 de água para consumo humano e a ESPH cerca de 30 milhões. A Costa Rica caracterizavase por um volume de água não facturado na ordem dos 50%. Em particular, o AyA não contabilizava cerca de 54% da água produzida e a ESPH cerca de 48%. O nível de micromedição do serviço de água é de 96,4% na Costa Rica. O AyA recolhe e drena cerca de 50 milhões de m3 de águas residuais e trata somente 14 milhões, enquanto a ESPH recolhe e drena 5 milhões de m3 de águas residuais e trata apenas um milhão. Os operadores do serviço de água empregam na Costa Rica cerca de 3.000 funcionários de forma directa. No Quadro 32 é possível observar as receitas obtidas e os investimentos efectuados nos SAS na Costa Rica. AyA Receitas anuais (milhões €) Investimento entre 2004 e 2006 (milhões €) Quadro 32 Receitas e investimentos dos principais operadores do sector da água de Costa Rica ESPH Água Águas residuais Água Águas residuais 56,16 5,79 3,86 0,34 2,14 0,62 31,1 131 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional 2.6.4 REGRAS DO JOGO 2.6.4.1 Estabelecimento de tarifas Quadro 33 Sistema tarifário da AyA para o ano de 2008 O estabelecimento de tarifas para os SAS, como mencionado, carece de aprovação por parte da agência reguladora da Costa Rica, a ARESEP. A conjuntura sociocultural, aliada à instabilidade política, repercute-se na fragilidade financeira A problemática da recuperação de custos é claramente mais grave nas áreas rurais, onde as tarifas não têm qualquer possibilidade de recuperar o custo real dos serviços. Em 2001, as tarifas rurais representavam em média o equivalente a 0,12 €/m3, comparado com os 0,19 €/m3 cobrados pelo AyA. O sistema tarifário, usualmente praticado entre as entidades gestoras, compreende duas parcelas, designadamente, uma parcela fixa, que tem em conta os custos fixos do serviço, e uma parcela variável, em função do volume de água consumido. No Quadro 33 e no Quadro 34 Parcela variável (€/m3) Parcela fixa mensal (€) 0-15 m3 16-40 m3 >40 m3 Doméstica 3,347 0,350 0,367 6,921 Empresarial 13,994 0,904 0,948 38,849 Preferencial 5,286 0,278 0,286 17,805 Governo 8,111 0,427 0,427 52,933 Doméstica 0,801 0,076 0,08 1,565 Empresarial 3,246 0,209 0,209 8,983 Preferencial 1,237 0,071 0,071 4,426 Governo 1,898 0,109 0,109 13,315 Abastecimento de água Tipo de tarifa Saneamento de águas residuais Tipo de tarifa dos operadores, verificando-se um défice elevado entre as receitas obtidas e os custos incorridos na prestação dos SAS neste país. apresentam-se os sistemas tarifários estabelecidos pelos principais operadores dos SAS na Costa Rica, respectivamente, o AyA e a ESPH SA. Tal como referido, os sistemas tarifários não permitem a recuperação total dos custos de serviço. No caso do AyA, verifica-se a subsidiação cruzada da área metropolitana de San José para as outras áreas urbanas e rurais do país. A tarifa é, sobretudo, ajustada com base nas necessidades de fundo de maneio de curto prazo, ao invés de ser implementada com princípios de sustentação económica e financeira. O AyA solicita aumentos do sistema tarifário assentes nas necessidades de curto prazo. A metodologia tarifária aplicada no sector da água baseia-se na regulação por taxa de remuneração para o período regulatório de um ano. Calculam-se os custos de operação, manutenção e administração e o activo líquido, o qual se permite ser remunerado com uma determinada rentabilidade (rédito de desarrollo). Em termos económicos, a metodologia adoptada procura igualar as receitas totais com os custos totais, sendo que nestes últimos se inclui a remuneração do capital investido dado que, segundo a legislação vigente, as tarifas devem permitir uma retribuição competitiva do capital e garantir o desenvolvimento apropriado da actividade. O AyA não tem sido compensado pelo governo por assumir funções sociais muito relevantes de subsidiação para o abastecimento de água no meio rural. Esta circunstância compreende um elevado “fardo” financeiro para o AyA e constitui uma das principais razões para a sua debilidade financeira. Ao abandonar a subsidiação do sector rural, o governo não teve consciência do impacto financeiro desta medida no AyA e, por conseguinte, em todo o sector da água na Costa Rica. 132 2.6.4.2 Qualidade do serviço Desde a sua implementação, a ARESEP tem recolhido informação sobre a actividade das respectivas entidades reguladas. No entanto, até à data, esta informação não tem sido utilizada no Costa Rica Parcela variável (€/m3) Parcela fixa mensal (€) 0-15 m3 >15 m3 Domiciliária 2,000 0,243 4,218 Económica 9,595 0,641 15,535 Institucional 4,278 0,484 7,485 Domiciliária 0,911 0,067 1,790 Económica 1,300 0,095 2,557 Institucional 1,040 0,077 2,046 Abastecimento de água Tipo de tarifa Saneamento de águas residuais Tipo de tarifa processo regulatório. Apesar de a ARESEP possuir nos seus estatutos a atribuição de “evaluar permanentemente la calidad de los servicios públicos regulados”, esta entidade ainda não desenvolve acções específicas no sentido de incentivar a melhoria da qualidade dos SAS. Como referido, a ARESEP não desempenha o papel de promotor do desenvolvimento da melhoria da qualidade do serviço entre os operadores dos SAS. Todavia, a ADERASA (Asociación de Entes Reguladores de Aguas de las Américas) desenvolve um conjunto de dez indicadores de desempenho, que procuram comparar a performance entre os operadores dos SAS dos países da América e, desta forma, por intermédio do benchmarking, estimular a melhoria da qualidade do serviço. O Quadro 35 apresenta o conjunto dos dez indicadores de desempenho desenvolvidos pela ADERASA. tor. Em 2005, apenas cerca de 70% da população era abastecida com água de qualidade adequada. Além disso, 96% de todo o volume de águas residuais recolhido era descarregado no meio receptor sem qualquer tipo de tratamento, gerando um risco de contaminação elevado para a saúde pública e para os recursos hídricos. Na maioria das regiões do país, a capacidade de produção da água está muito perto da procura actual. Desta forma, o risco de enfrentar insuficiência de produção de água num futuro próximo é realmente elevado e, de facto, verifica-se que várias cidades já sofrem deste malefício e incorreram em necessidades de racionalização. Segundo uma notícia de 2007, publicada no Nacion, cerca de 17% dos utilizadores costa- Indicador Quadro 35 Indicadores de desempenho adoptados pela ADERASA Unidade População servida e ligada ao serviço de água % Nível de atendimento do serviço de águas residuais % Atendimento da micromedição % Importância da água subterrânea % m3/ factura/ dia Produção por factura Consumo por habitante l /hab /dia Perdas de água % Roturas nas redes n.º /km Qualidade de água (conformidade geral das análises executadas) De certa forma, o aumento do preço do serviço de água em todo o país tem ocultado a qualidade do serviço medíocre evidenciada pelo sec- Quadro 34 Sistema tarifário da ESPH para o ano de 2008 % riquenhos consomem água que não cumpre os padrões mínimos de qualidade para consumo humano e os programas de melho133 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional ramento estagnaram. No que concerne ao volume de água não facturado, o sector da água na Costa Rica apresenta uma percentagem muito alta face à água produzida, revelando um nível de ineficiência grave, o que compromete largamente a continuidade do serviço e a sua sustentabilidade económica e financeira. 2.6.4.3 Obrigações de serviço público Na Costa Rica, a Lei em vigor (n.º 7.593, de 1996) define com clareza as obrigações de serviço público que os operadores devem respeitar, nomeadamente, a universalidade, a continuidade, a qualidade do serviço e a acessibilidade. Os procedimentos da sua implementação não são, contudo, tão transparentes. Dentro do enquadramento legal não consta qualquer referência sobre o estabelecimento de preços a utilizadores com necessidades especiais, embora alguns dos utilizadores que residem nas áreas mais marginais recebam os serviços de água sem qualquer encargo. É de salientar que 134 uma percentagem elevada de costa-riquenhos vive no limiar da pobreza. 2.6.5 DESEMPENHO Tendo em conta o contexto socioeconómico da Costa Rica, o sector da água apresenta um nível de desempenho razoável. Alguns aspectos do enquadramento institucional, sobretudo o papel do regulador, bem como o elevado nível de atendimento do serviço de água, constituem aspectos positivos a reter. De qualquer forma, o sector requer algumas reformas e grandes investimentos, sobretudo para fazer face ao desafio da drenagem e tratamento das águas residuais. A estrutura do sistema tarifário pode e deve ser melhorada e deve existir uma separação inequívoca entre as funções sociais do Estado e os operadores, em particular do AyA. A universalização do sector não deve ser garantida à custa da sustentabilidade económica e financeira dos operadores. A qualidade do serviço deve também ser objecto de uma maior atenção por parte do regulador. Estados Unidos da América 2.7 ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA 2.7.1 ANTECEDENTES HISTÓRICOS Os Estados Unidos da América (EUA) são uma república federal presidencialista. O poder executivo é exercido ao nível federal pelo presidente (President), de modo independente da legislatura. O poder legislativo é exercido pelo Congresso (Congress) que é, por sua vez, composto pela Câmara dos Representantes (House of Representatives) e pelo Senado (Senate). Os EUA, com uma área de 9,8 milhões de km2 e uma população de cerca de 303 milhões de habitantes, encontram-se divididos em 50 estados (State) e um distrito federal (federal district), o Distrito de Columbia. Cada estado está organizado em condados, com excepção da Louisiana, em que as subdivisões se denominam paróquias (parishes) e do Alasca, onde as subdivisões estaduais são chamadas de distritos (boroughs). Os condados podem ainda ser escalonados em administrações menores, designadas por municípios (municipalities, townships ou towns, dependendo do estado), hamlets e/ou boroughs. Os EUA possuem, actualmente, cerca de 30 mil cidades (cities). Entre muitas particularidades, os SAS nos EUA caracterizam-se por consumos de água muito elevados. Ao longo da história do sector da água, esta conjuntura trouxe, naturalmente, muitos problemas, designadamente ao nível do tratamento e da descarga de águas residuais e, consequentemente, da protecção dos recursos hídricos. Neste sentido, evidenciando uma consciência atenta sobre as questões do ambiente, o governo federal desenvolveu um enquadramento legal robusto que visa não só a problemática dos efluentes, mas também a salvaguarda da qualidade dos recursos hídricos federais. Nos EUA, o sector da água encontra-se, principalmente, regulamentado pela Lei da Água para Consumo Humano de 1974 (Safe Drinking Water Act - SDWA) e pela Lei Federal do Controlo de Poluição da Água de 1972 (Federal Water Pollution Control Act – P.L. 92-500), que, com as posteriores alterações, passou a ser conhecida pela Lei da Água Tratada de 1977 (Clean Water Act - CWA, P.L. 95-217). Destas leis surgiu o enquadramento legal que hoje vigora no país, proporcionando, posteriormente, o desenvolvimento de leis mais restritivas, como a Lei da Qualidade da Água de 1988 (Water Quality Act, P.L. 100-4), que conduziu ao Sistema Nacional de Eliminação e Descarga de Poluentes (National Pollutant Discharge Elimination System), requisitos aplicáveis também às águas pluviais. A CWA, com as alterações subsequentes, constitui a lei federal de base para a prevenção e mitigação da poluição da água dos EUA. Este diploma estabelece os objectivos relativos à qualidade dos recursos hídricos, eliminando a presença de substâncias tóxicas e da poluição adicional da água, assegurando que as águas superficiais se encontrem em qualidade adequada para a prática desportiva e recreação. A SDWA, posteriormente alterada em 1986 e 1996, constitui a lei federal principal que assegura a qualidade da água para consumo humano a todos os americanos, desde as grandes metrópoles ao meio rural. Com esta lei, a Agência de Protecção Ambiental (Environment Protection Agency – EPA) possui capacidade de estabelecer normas relativas à qualidade da água para consumo humano e de supervisionar a sua implementação em todos os estados, localidades e operadores do SAS. A SDWA, como o próprio nome indica, destinase ao abastecimento de água para consumo público nos EUA. Todavia, este documento normativo relega para a EPA o estabelecimento da regulamentação que limita o efeito da poluição e de outros elementos nocivos à saúde pública (National Primary Drinking Water Regulations). Os regulamentos incluem níveis máximos para 135 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional cada elemento (Maximum Contaminant Levels), bem como os respectivos objectivos (Maximum Contaminant Level Goals). Por último, é de referir que cada governo estadual possui a capacidade de estabelecer a sua própria legislação, desde que esteja em conformidade com a lei federal, situação que se verifica na maioria dos estados. 2.7.2. ENQUADRAMENTO LEGAL E INSTITUCIONAL 2.7.2.1. Responsabilidades As responsabilidades sobre o sector da água encontram-se repartidas entre vários intervenientes. Os principais dizem respeito ao Departamento Federal da Agricultura (Department of Agriculture), à EPA, às administrações locais, às entidades reguladoras do sector (Public Utility ou Service Commission – PUC ou PSC) e às diversas associações do sector, inter alia, à Associação Americana dos Assuntos da Água (American Water Works Association – AWWA), à Federação do Ambiente e da Água (Water Environment Federation – WEF), à Associação de Figura 37 Enquadramento institucional do sector da água nos EUA 136 Agências de Água Metropolitana (Association of Metropolitan Water Agencies – AMWA), à Associação Nacional dos Reguladores (National Association of Regulatory Utility Commissioners – NARUC), à Associação Nacional dos Operadores (National Association of Water Companies NAWC), à Associação Nacional de Operadores Rurais de Água (National Rural Water Association – NRWA) e à Fundação de Investigação da Associação Americana dos Assuntos da Água (American Water Works Association Research Foundation – AWWARF). Além destas, existem ainda mais de 100 associações com atribuições a nível estadual. O Departamento Federal da Agricultura desempenha um papel importante no sector da água dos EUA, providenciando subsídios, empréstimos e garantias de empréstimos nas áreas rurais, ou seja, para as pequenas comunidades com populações inferiores a 10 000 habitantes, viabilizando o fornecimento dos SAS que, de outra forma, seriam de difícil sustentabilidade. Este departamento promove também a assistência técnica e a formação no sector da água, sobretudo nas áreas rurais. A EPA, criada em 1970, é uma agência do governo federal dos EUA com responsabilidades sobre a protecção da saúde humana, a salvaguarda da natureza e a sustentabilidade do ambiente. A EPA conduz os principais esforços ao nível da ciência, investigação, educação e avaliação das questões ambientais no país. Neste âmbito, a Estados Unidos da América agência desenvolve e reforça a regulamentação ambiental em vigor, promove assistência financeira a diversas entidades e realiza actividades em consonância com os laboratórios nacionais, com o objectivo de solucionar os problemas do sector ambiental. A EPA promove também várias actividades educacionais, alertando os diversos stakeholders para as problemáticas do ambiente e do sector da água em particular. As administrações locais, nomeadamente os condados, são responsáveis pelo fornecimento dos SAS, com qualidade adequada, em conformidade com as normas estabelecidas a nível federal. As PUC ou PSC possuem valências importantes no sector da água dos EUA, não só pela defesa dos interesses dos utilizadores, mas também pela regulação das tarifas e dos incentivos gerados ao desenvolvimento do sector. Estas responsabilidades, quando os estados não são dotados deste tipo de entidades dedicadas ao sector da água, pertencem aos governos estaduais. No seio das PUC ou PSC, ou mesmo independentemente delas, existem, por vezes, os denominados “defensores públicos” (rate payer advocate), que têm como missão representar e proteger os interesses dos utilizadores, sobretudo na revisão dos tarifários (rate case), surgindo como uma disputa legal (public hearing). Na Figura 37 observa-se simplificadamente a organização do sector da água nos EUA. É de referir que a principal diferença entre as PUC e as PSC consiste na forma como os seus responsáveis são escolhidos. Nas primeiras estes são nomeados, enquanto nas segundas são eleitos por voto democrático. A AWWA é uma organização profissional sem fins lucrativos, de âmbito internacional, dedicada à melhoria do serviço de água e da qualidade da água para consumo humano. Esta associação foi fundada em 1881 e possui, aproximadamente, 60 000 membros dispersos por todo o mundo. Os membros da AWWA evidenciam, em toda a sua plenitude, a comunidade relacionada com o sector da água, compreendendo operadores e gestores de estações de tratamento, cientistas, ambientalistas, fabricantes, académicos, reguladores e outros stakeholders. A AWWA desenvolve a sua missão através de comunicações, conferências, formações e acções locais, publicação de um vasto número de normas, livros, manuais, bases de dados electrónicas e relatórios. A WEF, criada em 1928, é uma associação sem fins lucrativos, com grande representatividade, quer nos EUA quer em termos internacionais. A WEF e os seus membros procuram a preservação dos recursos hídricos a nível mundial. A principal missão da WEF encontra-se associada à preservação e à melhoria da qualidade da água, promovendo encontros informativos e educacionais sobre a qualidade e protecção dos recursos hídricos entre os diversos stakeholders. A AWWARF é uma organização sem fins lucrativos que promove a investigação entre os SAS, agências governamentais e outros profissionais. Esta fundação, criada em 1966, procura o progresso científico nas temáticas ligadas à água. A NARUC, fundada em 1889, é uma organização sem fins lucrativos que compreende entre as suas principais atribuições a representação das PUC/PSC, as quais regulam os operadores que fornecem os serviços públicos, como energia, telecomunicações, água e transportes. A sua principal missão prende-se com a defesa do interesse público e a promoção da qualidade e eficácia da regulação dos diversos sectores. A AMWA é uma associação dos operadores de natureza metropolitana dos EUA, cujos membros fornecem os SAS a mais de 127 milhões de americanos, desde o Alasca a Porto Rico. A AMWA, formada em 1981, possui como principal atribuição a defesa do interesse dos seus membros, trabalhando com o Congresso e as agências federais para acompanhar o desenvolvimento do sector. A NAWC, fundada em 1895, representa os interesses dos operadores privados dos SAS nos EUA. Embora a expressividade do sector privado não seja muito elevada, dado a dimensão do sector, a NAWC constitui uma organização importante no sector da água, compreendendo entre os seus membros todos os formatos organizacionais, desde que tenham natureza privada. A NRWA é outra associação dos operadores que engloba mais de 26 mil membros. A NRWA é uma associação sem fins lucrativos cuja missão consiste na defesa dos interesses dos seus membros em consonância com a disseminação das melhores práticas. 2.7.2.2 Regulação A regulação económica é desencadeada a nível estadual pelas PUC ou pela PCS. As PUC/PCS regulam cerca de 7.000 SAS, dos quais 3.300 são privados, e estão implementadas em 40 estados. As PUC não regulam, por norma, todo o tipo de SAS, regulam com frequência apenas os privados e podem actuar só acima de um patamar mínimo de dimensão. Os EUA, como berço da regulação económica, são caracterizados por um desenho da regulação muito eficiente e eficaz, sobretudo pelas 137 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional suas funções “quase jurisdicionais” e “quase legislativas”, e por toda a procedimentalização do processo regulatório. A tradição regulatória americana desenvolvida durante mais de 100 anos em diversos sectores tem vindo a traduzirse numa homogeneização dos princípios-chave regulatórios. Por isso, também para os SAS, os custos devem ser prudently incurred e os investimentos used and useful. Deve haver a possibilidade de ganhar uma fair rate of return e as tarifas não podem ser unduly discriminatory. Estes, entre outros princípios básicos, contemplados na jurisdição americana, são extrapolados para a regulação dos SAS. Um aspecto menos positivo da regulação dos SAS americanos consiste na quase universalidade da aplicação da regulação por taxa de remuneração, que não incentiva o desempenho dos SAS. De facto, apenas num número limitado de casos (por ex., Iowa) se aplicam outros métodos, como o da regulação por limite de preços. Aliás, esta constatação segue a linha das especificidades dos SAS nos EUA, que não podem, de modo algum, ser considerados benchmarks, pelo menos, quando comparados com alguns operadores europeus. Todavia, o processo regulatório em si funciona bem. Entre as atribuições comuns das entidades reguladoras, que incidem com frequência apenas sobre entidades privadas, estão, inter alia, o estabelecimento de tarifas e de normas de serviço, a definição das áreas de jurisdição, de regras contabilísticas, de aspectos relacionados com a segurança, com a transmissão, compra e junção de activos, e com os procedimentos regulatórios. Os interesses dos utilizadores são representados por uma comissão independente adjacente às PUC/PSC (rate payer advocate). No Quadro 36, evidenciam-se os reguladores do sector da água por cada estado norte-americano. No entanto, uma vez que a maioria dos SAS é disponibilizada pelos operadores municipais, o papel dos reguladores estaduais torna-se de algum modo limitado. Desta forma, é comum existirem comissões municipais ou grupos conselheiros com atribuições de assegurar um preço apropriado para estes serviços essenciais. Mesmo com a presença de uma PUC/PSC, os governos federal e estadual também regulam os domínios do ambiente, da saúde e da qualidade da água. Ainda no domínio regulatório, as associações do sector da água desempenham funções importantes, não só pela forte influência que possuem nos organismos legisladores, mas também pela auto-regulação que impõem aos seus associados, disseminando as melhores práticas e incentivando o seu desenvolvimento. 138 Por exemplo, no estado da Flórida, a entidade reguladora (FPSC), criada em 1887 pelos Estatutos da Flórida (capítulo 350), é uma entidade reguladora independente multissectorial (electricidade, gás, telecomunicações, água e águas residuais) responsável pela regulação económica e pela salvaguarda da qualidade do serviço, nomeadamente pelo estabelecimento das tarifas para os SAS, pela supervisão da concorrência no mercado e pela monitorização da segurança e fiabilidade do serviço. Apesar da independência declarada no seu estatuto, o governo apresenta ainda alguns poderes ao nível da regulação económica no sector, dado que a FPSC apenas regula os operadores de natureza privada. A FPSC não emite legislação, mas pode adoptar regras de modo a implementá-la. É financiada pelos operadores mediante uma taxa de 4,5% sobre a sua facturação (orçamento em 2006 de cerca de 3 milhões de euros). O método de regulação económica utilizado para o estabelecimento de tarifas consiste na regulação por taxa de remuneração. O período regulatório é de 1 ano. A FPSC aplica benchmarking por intermédio de indicadores de desempenho para avaliação da qualidade do serviço. Na Califórnia, a entidade reguladora (CPUC), criada pela Lei dos Serviços Públicos (Public Utilities Act) de 1911, é uma entidade reguladora independente multissectorial responsável pela regulação económica e da qualidade do serviço, designadamente pelo estabelecimento das tarifas para os SAS. A CPUC regula apenas os operadores privados dos serviços de telecomunicações, electricidade, gás natural, água, caminhos-de-ferro e empresas de transporte de passageiros. Tem como principal missão assegurar que os utilizadores possuam um serviço público seguro e de confiança e a preços razoáveis, protegendo-os contra fraudes e promovendo a saúde da economia da Califórnia. A CPUC tem independência orgânica (pessoal seleccionado pelas suas valências técnicas, com longos mandatos e de difícil demissão), está capacitada para a emissão de normas e para a aplicação de sanções e coimas em casos mais graves de fornecimento do serviço, nomeadamente em casos de incumprimentos constantes dos parâmetros de qualidade da água. Intervém por iniciativa própria ou por solicitação de qualquer stakeholder. O regulador presta contas ao parlamento sempre que solicitado e pauta-se pela transparência e participação dos stakeholders nas decisões, pela sua publicitação e pela sua responsabilização financeira. Por último, é de referir que existe a possibilidade de apelo das decisões a outras autoridades. A CPUC é encabeçada por uma Estados Unidos da América Estado Entidade reguladora Estado Entidade reguladora Alabama Alabama PSC Montana Montana PSC Alaska Alaska Regulatory Commission Nebraska - Arizona Arizona Corporation Commission Nevada Nevada PUC Arkansas Arkansas PSC Novo Hampshire New Hampshire PUC Califórnia California PUC Nova Jersey New Jersey Board of Public Utilities Colorado Colorado PUC Novo México - Connecticut Connecticut Department of Public Utility Control Nova Iorque New York State PSC Delaware Delaware PSC Carolina do Norte North Carolina Utilities Commission Flórida Florida PSC Dakota do Norte - Geórgia - Ohio Ohio PUC Hawai Hawaii PUC Oklahoma - Idaho Idaho PUC Oregon Oregon PUC Illinois Illinois Commerce Commission Pennsylvania Pennsylvania PUC Indiana Indiana Utility Regulatory Commission Rhode Island Rhode Island PUC Iowa Iowa Utilities Board Carolina do Sul South Carolina Office of Regulatory Staff Kansas - Dakota do Sul - Kentucky Kentucky PSC Tennessee Tennessee Regulatory Authority Louisiana Louisiana PSC Texas Utah PSC Maine Maine PUC Utah Vermont Public Service Board Maryland Maryland PSC Vermont - Massachusetts Department of Public Utilities Virgínia Virginia State Corporation Commission Michigan - Washington - Minnesota - Virgínia Ocidental West Virginia PSC Mississippi Mississippi PSC Wisconsin Wisconsin PSC Missouri Missouri PSC Wyoming Wyoming PSC pessoa singular e é financiada mediante uma percentagem fixa da tarifa implementada. As decisões, coimas e procedimentos em curso são actividades publicitadas pela agência. O método de regulação económica utilizado para o estabelecimento de tarifas é o da taxa de remuneração com um mecanismo híbrido de limite de receitas. O período regulatório corresponde a 3 anos. Por último, é de referir que, no caso particular da Califórnia, existe ainda a Associação de Água da Califórnia que representa os interesses de cerca de 140 operadores privados e que tem funções relevantes no sector da água. 2.7.3 ESTRUTURA DO MERCADO Quadro 36 Entidades reguladoras do sector da água nos EUA 2.7.3.1 Propriedade e gestão dos serviços Os SAS caracterizam-se por serem maioritariamente fornecidos por operadores públicos, dentro dos diferentes formatos institucionais da sua prestação inseridos na gestão pública. Por 139 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional norma, a participação privada apenas inclui a gestão e não a propriedade. Apesar de a participação do sector privado apresentar mais de um século de história no sector da água americano, os SAS foram sempre vistos como intrínsecos ao sector público, representando um forte constrangimento à sua expansão. Desta forma, apenas uma pequena percentagem da população é fornecida por operadores privados. Não existindo dados fidedignos, estima-se que próximo de 10% dos americanos sejam servidos por cerca de 3.500 operadores privados. Todavia, a maioria é de reduzida dimensão. Alguns dos SAS de maior relevo, privatizados na década de 90, foram recentemente retomados, por distintas razões, pelo sector público (por ex., Atlanta). Entretanto, foram desenvolvidas muitas PPP nos EUA, sobretudo em ETAR e ETA. 2.7.3.2 Players do sector Quadro 37 Características dos serviços de água por dimensão O segmento dos serviços de água nos EUA compreende cerca de 53 000 operadores. Uma pesquisa desenvolvida pela EPA permitiu aferir que existe ainda um grande número de pequenos sistemas, ou seja, de sistemas individuais ou colectivos de reduzida dimensão, perfazendo um total que se projecta em 150 000 operadores dos serviços de água. No Quadro 37 apresentam-se Os SAS são disponibilizados através de sistemas municipais, que são propriedade e operados pelos governos locais, sob diferentes formatos, ou por sistemas privados. Os primeiros compreendem a vasta maioria dos operadores que compõem os SAS dos EUA, contabilizando, aproximadamente, 84% da totalidade dos serviços de água e cerca de 95% do total dos SAS. Em geral, nas áreas urbanas, os sistemas municipais são controlados directamente pelos governos municipais ou das cidades (como sucede na cidade de Nova Iorque) ou indirectamente por empresas dedicadas a esse fim (public utilities), propriedade dos governos municipais ou das cidades. Em alguns casos, as empresas de serviço público referidas abrangem diversas jurisdições (municípios ou cidades). A prestação dos SAS através de cooperativas constitui o formato institucional principal da sua disponibilização nas zonas rurais. No entanto, muitas cidades e aglomerados populacionais seleccionam empresas privadas para operar, gerir e/ou promover investimento nos SAS. Estes contratos, que podem ir desde o simples outsourcing (contadores, facturação, manutenção, etc.) até à concessão e à implementação de BOT/BOOT, representam já uma parcela relevante de operadores. Actualmente, cerca de 11% da população americana, ou seja, 33,5 milhões de habitantes, recebe água fornecida por operadores privados. Por exemplo, na Flórida existem Classe de população Operadores (n.º) População servida (106) Operadores (%) População americana servida por operador (%) 25-500 29 666 4,93 56 2 501-3.300 14 389 20,9 27 7 3.301-10 000 4.748 27,5 9 10 10 001-100 000 3.648 103 7 36 >100 000 386 126 1 45 Total 52 837 282 100 100 os operadores americanos dos serviços de água por população servida (CSS, 2007). O número de serviços de água residuais é menor, estimando-se um valor de 50 000 operadores. A maioria dos serviços é prestada em conjunto com os SAS. Julga-se que existam, aproximadamente, 20 000 operadores de serviços de águas pluviais. 140 197 operadores privados (174 para o serviço de água e 148 para o serviço de águas residuais). Já na Califórnia, operam 138 serviços de água e 12 serviços de águas residuais privados, servindo 15% da população deste estado. O maior operador privado do sector da água nos EUA é a American Water, pertencente à RWE AG (Essen, Alemanha), que fornece os SAS a 16,2 mi- Estados Unidos da América lhões de habitantes em 32 estados, representando cerca de 5% da população americana. A Veolia Water North America é o segundo player privado mais importante nos EUA. Actualmente, a empresa oferece um conjunto diferenciado de serviços de PPP. Esta empresa possui o maior operador do serviço de água privado actual (Indianapolis), o maior contrato BOT (ETA de Tampa Bay) e a maior parceria ao nível do serviço de águas residuais (Milwaukee). Actualmente, a Veolia disponibiliza os SAS a cerca de 14 milhões de habitantes. A United Water/Suez possui também uma importante participação no sector da água dos EUA, fornecendo os SAS a 6,5 milhões de habitantes, onde se incluem PPP nos estados da Califórnia, Texas e Flórida, entre outros. Por último, é de referir que, embora sem grande expressão em termos populacionais, existe um número muito significativo de players privados de natureza local. Nos EUA é ainda possível observar um número, embora reduzido, de operadores do serviço de água em “alta”, sobretudo no Sudoeste árido do país. Um deles, o Metropolitan Water District of Southern California (MWD), vende a água tratada do rio Colorado e da Califórnia do Norte às suas empresas associadas da Califórnia do Sul, através da California Aqueduct. Neste âmbito, 26 operadores que servem 18 milhões de habitantes são membros da MWD. Outro exemplo prende-se com a Central Arizona Water Conservation District que opera o Central Arizona Project Aqueduct e fornece água do rio Colorado a 80 operadores na zona central e sul do Arizona. 2.7.3.3 Integração do sector e serviços oferecidos A integração dos SAS prima pela heterogeneidade ao longo do país. Apesar de se notar uma ligeira superioridade de integração dos SAS face à grande percentagem de operadores locais, é também usual verificar a existência de entidades supramunicipais que asseguram os serviços de forma integral ou que são responsáveis apenas por uma úni- Serviço ca parcela da fileira produtiva, como a produção de água (“alta”). Esta última circunstância ocorre, fundamentalmente, no abastecimento de água. Embora a maioria dos serviços de água seja prestada em conjunto com os serviços de águas residuais, há também a situação inversa, em que existem operadores distintos para ambos os serviços. 2.7.3.4 Números do sector Nos EUA são consumidos cerca de 560 mil milhões de m3 de água por ano, sendo que a energia termoeléctrica consome 48%, a irrigação 34%, o consumo humano representa 11%, o industrial 5% e o remanescente destina-se a outros fins. A principal fonte desta água é a água superficial com 79%, da qual 15% é proveniente de dessalinização. Desta forma, o volume de água para consumo humano corresponde a 61,6 mil milhões de m3. De acordo com um estudo desenvolvido pela AWWA, a água utilizada para o exterior da casa (por ex., jardinagem e piscinas) representa 58% do consumo doméstico. Apesar de não existirem dados rigorosos, estimase que as perdas de água sejam muito elevadas, em virtude do estado de degradação das infraestruturas e do reduzido custo da água. A capitação média dos americanos é de 660 litros de água por habitante e por dia, englobando todas as utilizações. Existem cidades nas quais a capitação atinge os 2.500 litros por habitante e por dia. Estima-se também que o consumo indoor decresce para 260 litros por habitante e por dia. Nos EUA, o serviço de água caracteriza-se pela universalidade, tanto para a população urbana, que representa 80% da população americana, como para os 20% de população rural. O mesmo não sucede para o serviço de águas residuais, devido à reduzida sustentabilidade em determinadas áreas. No Quadro 38 observam-se os níveis de atendimento dos diferentes serviços. Nos EUA, julga-se que o sector da água apresen- Quadro 38 Nível de atendimento dos SAS nos EUA Natureza População urbana (80%) População rural (20%) Total Rede 100% 100% 100% Ligações à rede 100% 100% 100% Rede 100% 100% 100% Água Águas residuais 141 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional te uma receita que varia entre os 65 mil e os 79 mil milhões de euros, representando cerca de 1% do PIB americano. No Quadro 39 apresenta-se a repartição desta receita para uma estimativa de cerca de 66 mil milhões de euros (Grigg, 2007). No mercado da água americano, o sector privado envolve um volume de negócios de, aproximadamente, 1.120 milhões de euros, possuindo contratos com mais de 1.300 governos locais. Quadro 39 Receita dos operadores do sector da água nos EUA O sector da água nos EUA emprega cerca de 1 milhão de funcionários, se bem que ape- os encargos que as famílias têm com os diferentes serviços públicos essenciais. 2.7.4 REGRAS DO JOGO 2.7.4.1 Estabelecimento de tarifas O preço da água nos EUA é um dos mais reduzidos entre os países desenvolvidos. Apesar dos sucessivos aumentos acima da inflação que se têm verificado nos últimos anos, devido a uma Total nacional (106 €) Factura mensal (domésticos) (€) Abastecimento de água 26 346 14,49 Saneamento de águas residuais 26 339 14,49 Águas pluviais 13 171 7,24 65 856 36,22 Serviço Total nas 445 000 estão associados aos operadores dos serviços de água, de águas residuais e de águas pluviais. Na Figura 38, evidenciam-se Figura 38 Encargos das famílias com os serviços públicos essenciais nos EUA 142 maior consciencialização dos stakeholders sobre a problemática do consumo excessivo de água e a necessidade de repercutir a totalidade dos Estados Unidos da América custos sobre os utilizadores, esta situação permanece como uma realidade bastante presente no quotidiano dos americanos. Actualmente, o preço médio da água ronda os 0,33 €/m3. Todavia, as facturas da água, devido a um consumo desmedido, enraizado na cultura norte-americana, apresentam um nível mais ou menos idêntico ao da maioria dos países da OCDE. De acordo com a EPA, uma família americana gasta, em média, cerca de 312 euros por ano com os SAS. A respeito dos sistemas tarifários, os estados apresentam grande variabilidade, não só ao nível do preço médio do serviço, mas também no que respeita às diferentes estruturas tarifárias implementadas pelos operadores. Neste âmbi- sistemas tarifários com base na dimensão da propriedade servida. A ocorrência de tarifários com base sazonal é igualmente comum nos EUA. Por exemplo, na Flórida, a estrutura tarifária tipicamente adoptada para os utilizadores domésticos é constituída por uma parcela fixa, onde se englobam os custos fixos do serviço, e uma parcela variável crescente em função do consumo, com o objectivo de desincentivar o consumo excessivo, apesar dos preços reduzidos. Já na Califórnia, a estrutura tarifária, normalmente implementada ao nível dos utilizadores domésticos, baseia-se numa parcela de preços fixos, definida em função das características dos Época alta Jul -Set Out Quadro 40 Sistema tarifário de Los Angeles para o período entre 2007 e 2008 Época baixa Nov Dez Jan-Mar Época alta Abr Maio Jun 0,537 0,537 0,537 0,539 0,539 0,653 1.º Escalão (€/m3) 0,504 0,499 0,499 0,499 0,526 2.º Escalão (€/m3) 0,649 0,653 0,539 to, segundo um estudo desenvolvido pelo Banco Mundial (2000), aproximadamente um terço dos estados implementa sistemas tarifários para o serviço de água baseados numa parcela fixa, outro terço dos estados institui sistemas tarifários Flórida 0,539 0,535 utilizadores (contador, área, etc.), e numa parcela volumétrica mas ainda fixa. Existem tarifas especiais para os utilizadores mais desfavorecidos. Nos Quadro 40 e Quadro 41 salientam-se exemplos de sistemas tarifários praticados nos estados da Água (€/m3) Águas residuais (€/m3) 0-17,6 m3: 0,108 Palm Beach 0-4 m3: 0,144 17,6-44 m3: 0,231 >4 m3: 0,318 >44 m3: 0,549 0-16,5 m3: 0,072 Miami Dade 0-16,5 m3: 0,267 16,5-33 m3: 0,231 16,5-33 m3: 0,419 33-56 m3: 0,318 >33 m3: 0,520 >56 m3: 0,433 crescentes em função do consumo e, por fim, o terço remanescente implementa tarifas decrescentes em função do consumo. Existem também casos pontuais de operadores que optaram por Califórnia e da Flórida, respectivamente. No Quadro 42 ilustra-se o sistema tarifário da cidade de Nova Iorque. Os valores excluem o IVA, que representa 17,5%. Utilizadores Água Com contador (€/m3) 0,39 Sem contador (€) 54-188 Quadro 41 Sistemas tarifários de Palm Beach e Miami Dade na Flórida (período 2007- 2008) Quadro 42 Sistema tarifário da cidade de Nova Iorque para o período entre 2007 e 2008 Águas residuais 159% da factura da água 143 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional As áreas fornecidas, fora da cidade de Los Angeles, são acrescidas de uma tarifa de 0,136 €/m3. A Los Angeles Department Water and Power promove dois tipos de categorias para os utilizadores domésticos carenciados, designadamente as categorias especial e de baixos recursos. Na primeira incluem-se os utilizadores idosos, com deficiência ou doenças crónicas, sendo subsidiados com cerca de 13 euros a cada dois meses. A categoria de baixos recursos engloba todos os utilizadores domésticos que apresentam reduzidos recursos financeiros, sendo subsidiados com cerca de 6,5 euros a cada dois meses, mais 1,3 euros por cada agregado familiar superior a três membros. Nem todos os utilizadores têm contador e uma parte relevante é medida ao nível do ramal. Por vezes, há também valores mínimos a pagar. É de salientar que, por norma, os tarifários diferem, ainda que ligeiramente, consoante o tipo de utilizador, isto é, os não domésticos pagam mais, existindo quase sempre subsídios (a descontar na factura) ou tarifários especiais para os utilizadores carenciados ou com necessidades especiais (por ex., idosos, doentes e pobres). Além disso, está sempre prevista uma parcela não despiciente para o custo do serviço de incêndio e podem existir tarifários específicos para água destinada a rega, agricultura, indústria e proveniente de reutilização. Com frequência, como referido, o tarifário varia ao longo do ano e a mesma entidade gestora pode diferenciar o sistema tarifário em função da zona servida. 2.7.4.2 Qualidade do serviço O consumo de água nos EUA é um dos mais elevados no mundo e as tarifas da água encontram-se entre as mais baixas praticadas nos países desenvolvidos. Com este binómio, associado ao crescimento da população e à elevada idade das infra-estruturas e ao estado de degradação apresentado pelas mesmas, os SAS requerem vultuosos investimentos. Nos EUA, os SAS caracterizam-se por uma qualidade aceitável, incluindo a continuidade, as boas condições de pressão e a conformidade com as normas do SDWA. No entanto, não existe informação detalhada acerca da qualidade do serviço prestado pelos operadores. Existem, por exemplo, muitas reclamações de facturação sem consequências práticas na prestação de um serviço deficiente. Todos os operadores possuem departamentos de apoio ao cliente e, quando as disputas não são resolvidas entre os utilizadores e os opera144 dores, ambos podem recorrer às PUC/PSC ou às entidades governamentais competentes. Geralmente, não se encontram estabelecidos Níveis de Qualidade do Serviço. Todavia, quando existem diferendos e são efectuadas reclamações para as PUC/PSC, as mesmas podem decidir pelo pagamento de indemnizações aos utilizadores ou a outros stakeholders. Os operadores desenvolvem exercícios de benchmarking, quer por sua iniciativa individual quer por decisão de associações do sector. Em particular, a AWWA e a WEF têm tido um papel de relevo na padronização da linguagem e das definições dos indicadores de desempenho, tanto para os serviços de água como para os serviços de águas residuais. Por exemplo, a AWWA, no âmbito das suas funções de promoção do desenvolvimento do sector da água no país tem realizado anualmente um programa que visa a aplicação de um conjunto de 22 indicadores de desempenho, denominado QualServe. O QualServe é um projecto de avaliação de desempenho voluntário, concebido sob várias vertentes: desenvolvimento organizacional, relações com os utilizadores, aspectos económicos e financeiros, operação dos serviços de água e operação dos serviços de águas residuais. Com a sua participação, o operador possui a capacidade de identificar os seus pontos fracos e fortes e de traçar os objectivos de melhoria e de desenvolvimento do serviço. Os resultados do exercício de benchmarking são identificados e definidos num relatório que, posteriormente, é disponibilizado aos participantes (QualServe Performance Indicators Report). No Quadro 43 apresentam-se os indicadores de desempenho calculados pela AWWA no âmbito do programa QualServe. 2.7.4.3 Obrigações de serviço público Não existe uma lei federal que estipule as obrigações de serviço público no sector da água. No entanto, a nível estadual, com a existência de regulação vertical, com capacidade de emissão de regulamentação, foram estabelecidas obrigações de serviço público prioritárias, tais como universalidade e acessibilidade em muitos estados (por ex., Califórnia e Flórida). Além disso, a elaboração de inúmeros programas específicos para cada distrito e condado são uma das grandes valências das entidades reguladoras, como é exemplo a CPUC, através do operador Califórnia Water e do programa Low-Income Ratepayer Assistance. Estados Unidos da América Indicadores de desempenho Quadro 43 Indicadores de desempenho adoptados pela AWWA Desenvolvimento organizacional Índice organizacional das melhores práticas Taxa de segurança e de saúde no trabalho Horas de formação por funcionário Utilizadores por funcionário, por volume distribuído e por volume de águas residuais tratadas Relação com os utilizadores Reclamações Interrupções do serviço de água Encargos dos utilizadores domésticos com os SAS Custo do serviço de cliente por utilizador Precisão da facturação Aspectos económicos e financeiros Rácio de dívida Rácio de renovação/substituição Remuneração dos activos Operação do serviço de água Qualidade da água Perdas de água nas redes de distribuição Integridade do sistema de distribuição Rácio dos custos de operação e manutenção Rácio da manutenção planeada Operação do serviço de águas residuais Inundações Integridade do sistema de recolha Eficácia do tratamento das águas residuais Rácio do custo de operação e manutenção Rácio da manutenção planeada Na generalidade, o sector da água pauta-se pela manifestação de elevadas preocupações sociais, existindo, quase sempre, tarifários específicos para os utilizadores com necessidades especiais. Os aspectos relativos ao sistema tarifário estão muito procedimentalizados, estando os interesses e a defesa dos utilizadores sempre protegidos através da transparência existente e da participação nos processos decisórios. Os utilizadores são notificados sobre as alterações dos sistemas tarifários e podem sempre apelar para o regulador. 2.7.5 DESEMPENHO Os SAS nos EUA são prestados com qualidade elevada e a um custo muito reduzido. A maioria dos estados é dotada de entidades re145 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional guladoras independentes dedicadas, com vastos poderes e ferramentas de actuação, e que garantem a defesa dos interesses dos vários stakeholders. O seu âmbito de actuação é, no entanto, limitado, incidindo, geralmente, apenas sobre as entidades gestoras de natureza privada. Normalmente, na regulação económica, as PUC/PSC baseiam-se também na metodologia 146 da regulação por taxa de remuneração, não incentivando, desta forma, o desempenho do sector. Os EUA requerem grandes investimentos, dado que globalmente as infra-estruturas apresentam um défice de qualidade acentuado. A grande complexidade relativa à subsidiação e à escassa repercussão dos custos do serviço sobre os utilizadores, associada a enormes consumos per capita, constituem os principais desafios do sector. França 2.8 FRANÇA 2.8.1 ANTECEDENTES HISTÓRICOS A França (République Française) é uma república democrática semipresidencialista, cujo presidente (président de la république) é eleito por sufrágio directo e universal. É o presidente quem nomeia o primeiro-ministro (premier-ministre) e preside ao conselho de ministros. Ao primeiro-ministro cabe a coordenação do governo. O Parlamento francês é bicameral, representado pelo Senado (sénat), eleito indirectamente, e pela Assembleia Nacional (assemblée nationale), eleita por meio do voto popular. Administrativamente, a França encontra-se estruturada em regiões que, por sua vez, se dividem em departamentos (départements), sendo que estes ainda se dividem em distritos (arrondissements). A França, com uma área aproximada de 547 mil km2 e uma população de cerca de 64,4 milhões de habitantes, subdivide-se em 26 regiões, desagregadas em 22 regiões metropolitanas, onde se insere a Córsega, e mais 4 regiões ultramarinas, designadamente, Guadalupe, Martinica, Guiana Francesa e Reunião. Os departamentos dividem-se em 96 metropolitanos e 4 ultramarinos (départements d’outre-mer). Cada departamento constitui tanto uma divisão administrativa como um Estado e uma colectividade territorial (collectivité territoriale). Os distritos (arrondissements) dividem-se em cantões (canton) e estes em municípios (commune). Actualmente, existem 36 782 municípios. Os SAS em França caracterizam-se pela sua universalidade e boa qualidade. A participação do sector privado em larga escala através de concessões e contratos de arrendamento (gestion déléguée) e a existência de agências de bacias (agences de l’eau), que cobram taxas e que visam o financiamento dos investimentos ambien- tais, são alguns factores de relevância face a outros países desenvolvidos. Tal como acontece na maioria dos países da UE, o quadro institucional relativo à gestão dos SAS foi reformulado no início dos anos 90, sendo estabelecido mediante um vasto número de diplomas legais. Os principais documentos normativos dizem respeito às Leis da Água de 1964 e 1992 e a toda a legislação derivada destas. Entre os princípios básicos desta legislação destaca-se o facto de os recursos hídricos não serem sujeitos a qualquer tipo de apropriação, quer pública quer privada. Do ponto de vista legal, os recursos hídricos têm um estatuto res nullius, contudo, o mesmo não acontece com a utilização de água a nível individual, onde cada proprietário pode utilizar os recursos hídricos disponíveis na sua propriedade. A nível administrativo, a Lei da Água de 1964 introduziu o conceito de gestão global do ciclo da água, desenvolvendo a política de controlo da qualidade da água e estabelecendo o enquadramento legal para implementação das seis agências de água, com o objectivo de monitorizar, promover e financiar a gestão da água. No domínio financeiro, a lei definiu regras de natureza financeira aplicáveis a todas as bacias, fundadas, já nessa altura, na implementação dos princípios do utilizador-pagador e do poluidorpagador, instituindo taxas sobre a poluição e sobre o consumo de água. No âmbito político, a lei estabeleceu as seis agências com o objectivo de envolver todos os stakeholders no processo de tomada de decisão, na gestão dos recursos hídricos à escala da bacia hidrográfica. Nesta conjuntura, a Lei da Água de 1992 reforça essa estrutura com a obrigação da realização de planos de gestão de recursos hídricos à escala da bacia hidrográfica (SDAGE) e de âmbito local (SAGE), colocando em vigor alguns princípios essenciais referentes à tarifação da água, à con147 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional cessão de licenças para a utilização da água e à participação pública, entre outras medidas. Além disso, esta lei também reforçou as penalizações perante as infracções ambientais e, por último, mas não menos importante, reconheceu os recursos hídricos como património nacional (“patrimoine commun de la nation”), assumindo explicitamente o valor económico da água. Nos anos 90, diversas leis foram produzidas, tendo como objectivo o aumento do controlo dos operadores dos SAS. A “ Sapin law” de 1993 teve um grande impacto sobre a gestão dos operadores. Embora não se refira directamente ao sector da água, incide sobre a prevenção da corrupção e transparência nas actividades económicas e procedimentos governamentais. Na verdade, define com precisão o enquadramento jurídico aplicável à delegação aos operadores privados que fornecem os serviços públicos locais (água, resíduos, etc.), incluindo regras relativas aos procedimentos concursais. Também a Lei de Barnier de 1995, limitando a duração dos contratos a 20 anos e proibindo um pagamento à cabeça pelo delegatário, veio possibilitar uma maior competitividade e, desta forma, uma consequente redução das tarifas dos SAS, ao mesmo tempo que tornou compulsória a publicação de um relatório anual de actividades com informação sobre a qualidade e os preços dos serviços prestados pelo município, explanando bem a preocupação do governo sobre as questões ambientais e de defesa do utilizador. Finalmente, a Lei de Mazeaud de 1995, relativa à contratação pública e à delegação de serviços públicos, veio impor a publicação pelo concedente, de um relatório anual de contas, que incluísse também os efeitos na qualidade do serviço e a possibilidade de as mesmas serem auditadas por entidade competente e independente. No âmbito da qualidade ambiental, as águas residuais começaram a ser tratadas nos anos 60. Tendo em consideração o crescimento dos problemas ambientais, o governo federal criou o Ministério do Ambiente em 1971, sendo um dos primeiros países a fazê-lo na Europa. Relativamente ao tratamento das águas residuais, assim como à qualidade da água para consumo humano, a regulamentação tem sido bastante influenciada pelas imposições da UE, através da transcrição e adaptação das diferentes directivas europeias. A Lei n.º 1772, de 2006, definiu as orientações para os planos de cinco anos das agências de água (entre 2007 e 2012). Este documen148 to normativo repercute a Directiva-Quadro da Água no território nacional francês, incluindo todas as questões que interferem com a gestão da água à escala da bacia hidrográfica, como o apoio às acções de tratamento de águas residuais, o tratamento e destino das lamas, as descargas industriais, a solidariedade em relação a investimentos em zonas rurais, a protecção das captações de água, o controlo de perdas, a prevenção de inundações, a gestão do ambiente aquático, bem como a cooperação internacional. 2.8.2 ENQUADRAMENTO LEGAL E INSTITUCIONAL 2.8.2.1 Responsabilidades São vários os organismos públicos com responsabilidade no sector da água. Os principais são o Ministério da Saúde, o Ministério das Obras Públicas, o Ministério da Economia, o Ministério do Ambiente e, em particular, as suas Agências de Água, a Agência Nacional da Água e dos Meios Aquáticos (Office National de l’Eau et des Milieux Aquatiques – ONEMA) e o Instituto Francês do Ambiente (Institut Français de l’Environnement - IFEN), os municípios, a Federação Nacional dos Concedentes e das Régies (Fédération Nationale des Collectivités Concédantes et Régies - FNCCR), o Tribunal de Contas (Cour des Comptes), a Associação Francesa de Normalização (Association Française de Normalisation - AFNOR), a Associação dos Operadores (Fédération Professionnelle des Entreprises de l’Eau - FP2E) e as Associações dos Utilizadores (Association de la Consommation éco-citoyenne – CLCV e a Coordination Nationale des Associations de Consommateurs d’Eau - CACE). O Ministério da Saúde, através do seu Departamento dos Assuntos Sociais e Sanitários (Direction Départementale des Affaires Sanitaires et Sociales – DDASS), possui inúmeras valências relativamente ao serviço de água como o licenciamento das captações e a supervisão da qualidade da água. Por sua vez, o Ministério da Agricultura, por intermédio do seu Departamento da Agricultura e das Florestas (Direction Départementale de l’Agriculture et de la Forêt – DDAF), tem competências ao nível do tratamento de águas residuais e controlo da qualidade dos recursos hídricos. O Ministério das Obras Públicas, através do Departamento do Equipamento (Direction Départementale de l’Equipement – DDE), encontra-se responsá- França vel pela assistência aos municípios na gestão dos SAS, na construção de infra-estruturas e na gestão do domínio hídrico público. Por último, o Ministério da Economia, através do Departamento do Consumo, Concorrência e Fraudes (Direction Départementale de la Consommation, de la Concurrence et de la Répression des Fraudes - DDCCRF), tem competências no âmbito da contratação pública e, em particular, na delegação dos serviços aos operadores privados, e das Direcções Regionais (Directions Régionales de l’Industrie, de la Recherche et de l’Environnement – DRIRE) que fiscalizam as contas e actividades das entidades delegadas. Uma das principais responsabilidades do Ministério do Ambiente é o desenvolvimento da regulamentação ambiental. As normas de descargas de águas residuais e relativas à qualidade de água para consumo humano e o enquadramento para a gestão dos recursos hídricos são definidos pela UE através de várias directivas. As seis agências de água do país desempenham um papel importante ao nível da bacia hidrográfica, congregando todos os stakeholders numa espécie de “Parlamento de Água”, com atribuições de natureza essencialmente financeira, quer na obtenção de receitas (por ex., taxas relativas à captação de água e às descargas de águas residuais), quer no seu uso adequado (financiamento de infra-estruturas). São também responsáveis pela elaboração dos planos de desenvolvimento, que visam sobretudo seis áreas prioritárias, nomeadamente, a descontaminação e purificação das comunidades locais, as acções contra a poluição industrial, o controlo da poluição oriunda do sector agrícola, a melhoria da protecção dos recursos hídricos, o rência no conhecimento e na monitorização do estado da água e no funcionamento ecológico de ambientes aquáticos. Nas suas atribuições consta, sobretudo, a disseminação do conhecimento sobre os SAS. Encontra-se envolvida em programas de investigação, na informatização da informação sobre a gestão dos recursos hídricos, abastecendo o Sistema Nacional de Informação da Água (Système d´Information sur l´Eau). Intervém também no controlo das utilizações de água, supervisionando as práticas instaladas. Por último, a ONEMA tem inúmeras atribuições ao nível do terreno propriamente dito, colocando todo o conhecimento e especialização técnica da sua equipa no diagnóstico do estado ambiental e dos recursos hídricos nacionais. O IFEN tem por missão produzir e divulgar informação sobre o ambiente em França. Para tal, este instituto organiza, colecta e processa os dados recolhidos sobre os riscos naturais e tecnológicos, em conexão com a rede dos principais produtores e utilizadores de informações ambientais. Além disso, o instituto desenvolve e harmoniza os métodos relativos ao processamento de informação, constrói estatísticas, promove sinergias entre as estatísticas obtidas e as informações geográficas recolhidas, elabora e produz indicadores ambientais e de desenvolvimento sustentável nas áreas de incumbência do Ministério do Ambiente. Inerente às suas funções está uma colaboração estreita com o Instituto Nacional de Informação Estatística (Conseil National de l´Information Statistique). Em França, os municípios, isoladamente ou através das suas associações (syndicat intercommunal), são responsáveis pelos SAS, com a proporção representada no Quadro 44 (IFEN, 2005). Em particular, o Presidente da Câmara Quadro 44 Etapas da fileira produtiva dos SAS Actividades Municipal (%) Intermunicipal (%) Produção de água 28 72 Distribuição de água 32 68 Recolha de águas residuais 70 30 Tratamento de águas residuais 61 39 abastecimento de água para consumo humano e a conservação dos meios naturais aquáticos. As agências francesas da água consagram, em certa medida, os princípios do modelo de gestão da bacia hidrográfica. (Maire) responde por todos os assuntos relacionados com os SAS. Os municípios podem operar os SAS directamente ou contratar um operador privado para a sua exploração conjunta ou separada. A ONEMA, tutelada pelo Ministério do Ambiente, constitui um corpo técnico de refe- A FNCCR é uma organização colectiva fundada em 1934 e é formada pelos operadores dos ser149 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional viços públicos locais franceses, sejam públicos ou privados, que defende, a nível nacional e Europeu, os interesses dos seus membros. Como representante das colectividades associadas, o poder da FNCCR é muito relevante, em especial, perante os legisladores. Por último, a CLCV, fundada em 1952, e a CACE, criada em 2001, que congrega várias associações de âmbito regional, são das mais importantes associações de utilizadores, que possuem como valências a protecção e a defesa dos seus interesses. A FP2E (anteriormente denominada Syndicat Professionnel des Entreprises de Service d’Eau et d’Assainissement – SPDE) congrega como A Figura 39 apresenta o enquadramento institucional do sector da água em França (Marques, 2005). membros a quase totalidade das empresas privadas que gerem os SAS em França. Os seus membros, dos quais se salientam a Alteau, a Lyonnaise des Eaux, a Saede, a Saur, a Société des Eaux de Fin d’Oise, a Sogedo e a Veolia Water, empregam 32 000 trabalhadores, fornecendo estes serviços a cerca de 46 milhões de habitantes. Nesta conjuntura, a FP2E constitui a “voz” dos operadores privados na defesa dos seus interesses. 2.8.2.2 Regulação Figura 39 Enquadramento institucional do sector da água em França O Tribunal de Contas tem como atribuições o controlo da gestão de todos os organismos públicos ou delegados. O Tribunal, entre muitas das suas actividades, supervisiona a eficiência, eficácia e qualidade das entidades mencionadas. Assume um papel de auditor não só das contas, mas também do desempenho evidenciado e da sua conformidade com os objectivos políticos. Neste contexto, o papel do Tribunal não se cinge à apresentação de críticas, mas denota um trabalho mais exaustivo com a sugestão de recomendações. O Tribunal faz conhecer as suas conclusões, contactando directamente todos os stakeholders, tornando público, posteriormente, todos os seus comentários. No sector da água, a sua actuação tem sido muito relevante. A AFNOR tem diversas atribuições, como a normalização, a edição e difusão de produtos de informação, a formação e a certificação. 150 Em França, em consonância com a conjuntura vivida na maioria dos países da UE, não existe uma entidade reguladora nacional dedicada aos SAS com funções de estabelecimento e aprovação de tarifas e definição de normas e controlo da qualidade do serviço. Neste campo, o número elevado de sistemas e a sua reduzida dimensão tem inviabilizado também a hipótese de implementação de regulação económica ou, pelo menos, de regulação da qualidade do serviço que minimize os efeitos do monopólio natural, das especificidades dos activos que caracterizam os SAS e da existência de contratos forçosamente incompletos entre os municípios e os operadores. Além disso, tem prevalecido o argumento de que, na regulação contratual, os direitos e obrigações estão definidos e a concorrência no acesso ao mercado elimina as falhas existentes no mercado da água. No passado, a tutela do sector estabeleceu a criação de um organismo regulador dedicado (Le Haut Conseil des Services Publics d´Eau et d´Assainissement) que, devido à dificuldade de executar a regulação económica com a actual configuração dos sectores, funcionasse como um observatório (Observatoire de l´Eau) e desenvolvesse a regulação sunshine através da publici- França tação do desempenho dos operadores dos SAS. Este projecto, que foi, e continua a ser, muito controverso em França, tem sido adiado ano após ano. Noutra perspectiva, os utilizadores encontramse relativamente protegidos segundo a legislação e jurisprudência francesa, pela natureza de serviço público dos SAS através da Direction Générale de la Concurrence et de la Répression des Fraudes. Além disso, em França, os Tribunais Administrativos, bem como toda a regulamentação, são eficazes. As Direcções Regionais do Tesouro encontram-se também envolvidas na regulação económica, tendo o direito de auditar os balanços das régies, e mais importante, os operadores delegados. Além disso, estas entidades também desempenham um papel central na clarificação da noção de “renovação” e das provisões que foram alocadas para o efeito na relação de delegação estabelecida. O Tribunal de Contas é outra entidade que regulamenta e supervisiona o sector e que é considerada supragovernamental, o que lhe confere um estatuto de maior obediência. Por último, é de referir que, na ausência de uma entidade reguladora, as associações do sector da água, nomeadamente a FP2E, têm um papel de relevo na sua auto-regulação, promovendo o desenvolvimento do sector. Neste âmbito, em 2005, a FP2E implementou um conjunto de indicadores que abordavam aspectos relativos à qualidade da água. Em 2007, a FP2E alargou o seu conjunto de indicadores, englobando o desempenho do sector da água propriamente dito, revelando-se uma ferramenta de grande utilidade no desenvolvimento da qualidade geral do sector. A França, como país “exportador” de tecnologia e de operadores dos SAS (onde pertencem os maiores grupos privados do mundo), tem uma responsabilidade acrescida na promoção da qualidade do serviço. 2.8.3 ESTRUTURA DO MERCADO 2.8.3.1 Propriedade e gestão dos serviços Em França, a prestação das actividades de abastecimento de água às populações e de recolha, drenagem e tratamento das águas residuais é da competência dos municípios (communes). Caso estes decidam, numa base voluntária, juntar os seus esforços, estas actividades são delegadas a syndicats intercommunaux e realizadas por uma comissão delegada por todos os municípios envolvidos. A maioria da população encontra-se abastecida através de operadores privados, que possuem responsabilidades neste domínio desde o século XVIII. Como referido, os municípios e os sindicatos são livres de escolher, entre várias modalidades, a gestão e exploração dos SAS. As alternativas oscilam entre a gestão directa (régie) e a gestão delegada (gestion déléguée), onde se distinguem os contratos de arrendamento (affermage) e de concessão. As entidades constituídas podem ter capitais mistos (públicos e privados), no entanto, a propriedade é sempre pública. 2.8.3.2 Players do sector Dos 36 569 municípios existentes em França, aproximadamente 60% possuem populações inferiores a 500 habitantes. Dentro deste número, aproximadamente 29 300 encontramse organizados em 2.000 sistemas intermunicipais, que fornecem os SAS a cerca de 66% da população francesa. Os restantes operadores dizem respeito aos municípios, englobando mais de 17 300 operadores. A França compreende cerca de 14 900 operadores do serviço de água e 14 400 relativos ao serviço de águas residuais. Em França, os modelos de gestão dos SAS variam entre a gestão directa, denominada régie, e a gestão delegada sob a forma de concessão. Existe ainda a régie interessada (régie intéressée), em que a entidade delegada, que apenas gere o sistema, recebe um pagamento em função do volume facturado, e a gestão delegada na modalidade de arrendamento, que constitui a forma organizacional mais frequente em França. Neste modelo organizacional, a entidade privada gere e cobra as tarifas aos utilizadores, mas não é responsável pelo investimento, transferindo antes uma renda para os municípios como contrapartida da amortização dos activos. Normalmente, estes contratos têm uma duração entre 10 e 15 anos. Mais de um terço dos operadores optou por delegar os seus serviços, fornecendo os serviços de água a cerca de 71% da população francesa e cerca de 54% no domínio dos serviços de águas residuais. De acordo com o Cour des Comptes (2003), os contratos de arrendamento representam cerca de 85% dos contratos de gestão delegada. A concessão compreende durações mais longas do que o arrendamento. De qualquer forma, em ambos os casos o município ou o sistema intermunicipal estabelece o sistema tarifário sobre os 151 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional Quadro 45 Formas organizacionais dos SAS em França SAS e permanece como proprietário da infraestrutura. No Quadro 45 apresentam-se as formas organizacionais dos SAS franceses. a Suez ou Lyonnaise des Eaux abastece cerca de 22%, aproximadamente 14 milhões de habitantes, e a SAUR, com cerca de 13% da quo- Serviço de água (%) Serviço de águas residuais (%) Operadores públicos 27 45 Empresas mistas 1 <1 Empresas privadas: 62 55 Veolia 39 28 Suez 19 18 SAUR 11 8 Outras delegações 3 <1 Quadro 46 Estatísticas dos três principais operadores do serviço de água em França As maiores empresas francesas a operarem no sector da água são a Ondeo (Lyonnaise des Eaux ou Suez) e a Veolia Water (Compagnie Générale des Eaux ou Vivendi). A Veolia Water fornece os serviços de água a cerca de 39% da população, ou seja, 24,5 milhões de habitantes, enquanto Volume de negócio (milhões de €) Empresa Total Suez Environment (excl. energia) ta de mercado, fornece cerca de 6,4 milhões de habitantes. Os restantes operadores privados representam menos de 3% do serviço de água fornecido à população francesa. No Quadro 46 estão patentes as características dos três principais operadores dos SAS em França (Barraqué e Bris, Utilizadores (milhões) Implantação Funcionários (n.º) 80 de água; 50 de águas residuais 70 países 72 130 14 de água; 9 de águas residuais 2.600 municípios 8.332 108 de água e de águas residuais 57 países (água) 271 153 24,5 de água; 16 de águas residuais 8.000 municípios 28 000 8 países 12 400 6.700 municípios 6.800 Água 11 100 5.900 Lyonnaise des Eaux França 1.700 Veolia Environment (excl. energia) 25 240 Veolia Water França 4.400 SAUR group 1.400 8.800 1.100 SAUR França 152 896 5,5 de água e de água residuais França 2007). No Quadro 47 é representada a evolução do sector privado no fornecimento do serviço de água em França (adaptado de Reynaud, 2007). Ano Quadro 47 Evolução da participação do sector privado em França serviços públicos, como o abastecimento de água, o saneamento de águas residuais, a distribuição e produção de energia, a gestão dos 1938 1964 1975 1979 2001 Público 83% 56% 50% 47% 30% Privado 17% 44% 50% 53% 70% Veolia 42,3% 35,6% 51,1% Suez 26,9% 24,6% 24,3% SAUR 5,8% 10,4% 13,1% Outro 19,2% 16,4% 9,9% SODEBA 5,8% 6,8% - SDEI - 6,5% - Independente - - 1,9% 52 53 60 População servida (milhões) A cidade de Paris revela-se um caso particular, mesmo em termos internacionais, dado que existem dois operadores diferentes dentro da mesma cidade. Uma parte do serviço é delegada ao grupo de Suez (“Paris rive gauche”) e o sistema remanescente encontra-se ao encargo da Veolia (“Paris rive droite”). A circunstância actual que corresponde, desde 1985, a dois contratos de concessão evoluiu de um regime anterior de contrato de arrendamento. 2.8.3.3 Integração do sector e serviços oferecidos Em França, os operadores, sobretudo os públicos, evidenciam uma reduzida integração horizontal e uma elevada integração vertical. Já os principais operadores privados são caracterizados por integrarem de modo vertical e horizontal os SAS, ou seja, em certos municípios estes operadores compreendem todos os serviços relativos ao ciclo da água. Além disso, sendo conglomerados e especializados na provisão de serviços públicos, os mesmos integram sobre si o fornecimento de vários 42 serviços de resíduos sólidos e ainda os transportes públicos. Os serviços de águas residuais são, por vezes, fornecidos pela entidade responsável pelos serviços de água, mas, em alguns casos, são prestados directamente pelo município, mesmo tratando-se de uma empresa intermunicipal de serviço público no âmbito do serviço de água. 2.8.3.4 Números do sector Em 2006, a captação total de água em França totalizou 33,5 mil milhões de m3. Destes, cerca de 6 mil milhões são utilizados para consumo humano. A principal origem de água é a subterrânea, com um valor próximo de 60% (FP2E, 2008). Os serviços de água evidenciam cerca de 26% de perdas de água. Em França, estima-se que o sector da água empregue de forma directa, aproximadamente, 60 000 funcionários (FP2E, 2008). Neste país, quase toda a população se encontra conectada às redes de distribuição 153 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional de água, isto é, mais de 99% dos franceses. Relativamente às águas residuais, e devido à existência de soluções próprias locais, o nível de atendimento do serviço de águas residuais é próximo dos 80%. Em 2004, o preço da água foi, em média, de 3 €/m3 de água consumida em 2004 (IFEN, 2007). Dado que o consumo médio por habitante e por dia é de cerca de 165 litros, resulta numa factura média anual de 177 euros por utilizador. Quadro 48 Encargos em França com os SAS para o ano de 2003 Em 2004, as Agências de Água tiveram um orçamento de 1,4 mil milhões de euros, vocacionados maioritariamente para o financiamento das infra-estruturas dos SAS. O Quadro 48 apre- Em França, os SAS carecem também de investimentos avultados. Os principais activos da maioria dos sistemas são anteriores a 1960. O património dos SAS inclui mais de 850 000 km de condutas de água e aproximadamente 250 000 km de colectores de águas residuais. Enquanto os sistemas de abastecimento de água se encontram avaliados em 130 mil milhões de euros, os sistemas de águas residuais representam aproximadamente 75 mil milhões de euros. Neste sentido, os custos de renovação destes sistemas são estimados em 1,5 mil milhões de euros e cerca de 800 milhões, por ano, respectivamente. Presentemente, a percentagem de renovação da rede oscila entre 0,6% e 1% por ano. Abastecimento de água (106 €) Águas residuais (106 €) Saneamento onsite (106 €) Efluentes industriais (106 €) Operação e manutenção 5.850 5.299 165 1.095 Investimento: 1.611 3.511 670 416 1.200 2.325 - - 411 1.186 - - Encargos Rede Outros activos senta os custos em França com as actividades de abastecimento de água e drenagem e tratamento de águas residuais (CNE, 2006). Na Figura 40, apresenta-se a análise dos fluxos financeiros para o ano de 2006 para o serviço de água em milhões de euros (FP2E, 2007). Segundo a FP2E, o sector privado, que actua nos SAS, facturou em 2004 um volume de negócios de 5,1 mil milhões de euros. Figura 40 Financiamento dos serviços de água em 2006 (106 €) 154 2.8.4 REGRAS DO JOGO 2.8.4.1 Estabelecimento de tarifas Os preços relativos aos SAS variam em função do modo organizacional ou operacional e po- França dem ser explicados principalmente pela complexidade técnica das grandes redes interligadas, que são preferencialmente organizadas a nível intermunicipal e delegadas a um operador. No caso das régies, os preços são aprovados anualmente pelas autoridades administrativas (municípios), enquanto na gestão delegada os preços variam de acordo com fórmulas contratuais de indexação. O Quadro 49 mostra a variação do preço gador (captações) e do poluidor-pagador (descargas), e directamente do Estado (por ex., Ministério da Agricultura). O restante é proveniente dos utilizadores através do sistema tarifário. Este é, em geral, constituído por uma parcela fixa e por uma outra variável que cresce com o consumo. A água para consumo humano é sempre medida. A tarifa é definida por ano pelo município ou Quadro 49 Variação da tarifa de água em função da forma organizacional Organização Função organizacional Municipal (€/m3) Intermunicipal (€/m3) Mista (€/m3) Média (€/m3) Régie 2,19 2,85 2,48 2,54 Delegada 2,93 3,44 3,25 3,28 Mista 2,60 3,04 2,97 2,97 Média 2,59 3,19 2,99 3,01 médio da água em função do modo de operação e da sua organização (Barraqué e Bris, 2007). Parte significativa dos investimentos nos pelos termos acordados em contrato com o operador, mas sempre aprovada pelo município. O Quadro 50 apresenta os en- Quadro 50 Custos dos utilizadores domésticos em quatro cidades francesas (€) Abastecimento de água Saneamento de águas residuais* Outras taxas Parcela fixa Parcela variável* Bordéus 43,75 154,33 195,69 61,56 Lille 23,02 156,07 178,27 85,03 Lyon 45,66 186,56 108,57 60,35 Paris 14,14 146,09 122,30 88,29 SAS, cerca de dois terços, depende dos fundos recolhidos pelas Agências de Água, com base nos princípios do utilizador-pa- cargos anuais dos utilizadores domésticos de quatro cidades francesas para o ano de 2005 (IWA, 2006). * Baseado em 200 m3/ano (€/200 m3) 155 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional Posteriormente, sobre estes custos é ainda aplicado o IVA, que em França é de 5,5%. No Quadro 51 é possível observar o sistema de tarifário dos SAS de cinco cidades francesas (Veolia, 2005). Quadro 51 Sistema tarifário de cinco cidades francesas (€/m3) anual em França é cerca de 175 euros por habitante, repartida entre 85 euros para o serviço de água e 90 euros para o serviço de águas residuais. Parcela fixa Parcela variável* Tratamento de águas residuais Outras taxas IVA e/ou outras taxas Tarifa total Paris 0.08 0.85 0.73 0.55 0.12 2.33 Syndicat d'Ile de France 0.11 1.28 0.98 0.56 0.16 3.09 Bordéus (Syndicat) 0.26 0.91 1.17 0.37 0.15 2.86 Lille (communauté urbaine) 0.14 0.92 1.14 0.54 0.15 2.88 Lyon (communauté urbaine) 0.26 1.19 0.67 0.40 0.14 2.66 * Baseada e dividida por 200 m3/ano Em França, a parcela fixa do sistema tarifário representa cerca de 17% do custo total da factura e a parcela variável em função do consumo corresponde a, aproximadamente, 83% do custo total. Neste âmbito, cerca 90% dos municípios implementam o sistema tarifário bipartido para o serviço de água e cerca de 38% para o serviço de águas residuais. De acordo com o estudo desenvolvido pela consultora NUS (Janeiro de 2008), em 2006, a tarifa média da água e de saneamento em França foi de 2,92 €/m3. Com base no mesmo estudo, foi possível aferir que a mesma tarifa, excluindo o saneamento de águas residuais, representa 1,48 €/m3. Além disso, a factura média da água Quadro 52 Estrutura da factura da água 156 No ano de 2005, os encargos com a factura de água para os utilizadores domésticos repartiam-se em 46% para o abastecimento de água, em 37% para o saneamento de águas residuais e, por último, os restantes 17% eram relativos às taxas e impostos. As taxas referidas têm como destinos as Agências da Água respectivas, o Fonds National pour le Developpement des Adductions d’Eau (FNDAE) e o Estado central no que concerne ao IVA. O FNDAE, criado em 1954 e gerido pelo Ministério da Agricultura, destina-se, especificamente, à construção de infra-estruturas de água e de águas residuais em municípios rurais e de reduzidas dimensões. No Quadro 52 é possível observar a estrutura da factura da água em França para o ano 2000. Parcelas Percentagem (%) Produção e distribuição de água 42 Recolha e tratamento de águas residuais 31 Taxas das agências de água 20 Taxa FNDAE 1 Taxa para a navegabilidade (taxe VNF) 0,5 IVA 5,5 França É de realçar que o custo médio dos SAS quase duplicou entre 1990 e 2004. Este facto tem origem em diversas causas, mas uma das principais relaciona-se com o aumento substancial das taxas e impostos praticados. A Figura 41 ilustra o referido sumo humano apresenta boa qualidade, cumprindo a regulamentação comunitária. Todavia, de acordo com um inquérito desenvolvido pelo Centro de Informação sobre a Água (Centre d’Information sur l’Eau – CIEAU), em 2004, (Barraqué and Bris, 2007). Na Figura 42 observamse os encargos com os vários serviços públicos no orçamento dos utilizadores domésticos franceses. apenas 71% dos inquiridos consideraram a água da torneira como sendo de boa qualidade. Tal como nos outros países da UE, a monitorização da qualidade da água é levada a cabo em dois níveis, primeiro pelo prestador do serviço de forma permanente e, em segundo lugar, pelas autoridades competentes com base em amostragem. 2.8.4.2 Qualidade do serviço Os SAS pautam-se, na generalidade, por uma qualidade do serviço elevada. A água para con- Figura 41 Evolução e decomposição da factura dos SAS em França A qualidade dos serviços públicos essenciais Figura 42 Evolução anual dos encargos dos serviços públicos essenciais em França 157 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional (preço versus qualidade do serviço) é bastante debatida na sociedade francesa. Se, por um lado, as regras existentes asseguram um nível de serviço mínimo, como, por exemplo, o fornecimento contínuo de água e a informação obrigatória sobre a sua qualidade prestada anualmente a todos os utilizadores, por outro lado, não existem regras claras quanto aos direitos básicos dos utilizadores. Tendo em consideração o seu carácter monopolista, em que a competição por comparação assume uma importância de relevo, não existe nenhuma exigência legal quanto à utilização de benchmarking. No entanto, diferentes exercícios voluntários têm sido testados ou encontram-se em desenvolvimento, quer pelos operadores privados e públicos quer pelas diversas associações e entidades governamentais. Os organismos de investigação e/ou universidades têm também tido um papel de relevo neste domínio. Geralmente, os operadores privados utilizam os seus próprios conjuntos de indicadores como uma ferramenta de avaliação interna. Quadro 53 Indicadores de desempenho desenvolvidos pelo FP2E No sentido do desenvolvimento do sector da água e consequente promoção da qualidade do serviço, a FP2E, em consonância com a BIPE (uma consultora) desenvolve um relatório anual relativo a todas as actividades levadas a cabo pelos SAS em França. Além de detalhar todos os parâmetros e elementos que caracterizam o sector da água, a partir de 2008 passou a desenvolver um conjunto de indicadores de desempenho desagregados em água, águas residuais e comuns, como se apresenta, de seguida, no Quadro 53, ainda que os mesmos digam respeito ao sector como um todo e não a cada operador individualmente (FP2E, 2008). Com o objectivo de melhorar a qualidade do serviço e, por conseguinte, prestar um melhor serviço aos utilizadores, é relativamente comum os operadores desenvolverem cartas de compromisso (charte de service), onde se comprometem a respeitar um conjunto de obrigações mínimas. No Quadro 54 apresenta-se a carta de compromisso do operador da cidade de Nantes (Nantes Metrópole). 2.8.4.3 Obrigações de serviço público No âmbito das obrigações de serviço público, todos os resultados monitorizados, relativos à qualidade da água, são publicados na Câmara Municipal e são disponibilizados aos utilizadores por 3 anos. Uma vez por ano, uma síntese dos resultados das análises da água tem de ser enviada para cada utilizador. Este documento explica o significado dos principais parâmetros de qualidade e fornece indicações sobre a qualidade da água fornecida pelo serviço durante os últimos 12 meses. Em caso de emergência, relativa a inconformidades ou a poluição anormal, os utilizadores têm de ser informados, em qualquer altura, e do modo mais eficiente de acordo com as circunstâncias, usando para esse efeito a rádio, o jornal local, os anúncios em ruas ou outros meios considerados adequados. O presidente do município tem a obrigação legal de publicar, todos os anos, um relatório sobre o Indicadores de desempenho Abastecimento de água Interrupções dos serviços não programadas < 3% (93,18% da população servida) Conformidade das análises bacteriológicas 99,69% Conformidade das análises físico-químicas 98,60% Política patrimonial 59,08% Índice de evolução da protecção de recursos hídricos 59,85% Águas residuais Conformidade da descarga das águas residuais 82,31% Índice de conformidade com a lei da descarga de águas residuais 1,35 Grau de tratamento das lamas > 95% Comuns Taxa de reclamações < 1% Cobranças em dívida < 0,7% Existência de Comissão Consultiva dos serviços locais 7 comissões por 10 serviços delegados 158 França preço e a qualidade do serviço (Code Général des Collectivités Territoriales, article L.2224-5). O relatório deve fornecer tanto informação de natureza técnica como de origem financeira, como, por exemplo, inter alia, descrição dos activos, cumprimento das especificações, preços da água e tendências de evolução e empréstimos por liquidar. Todavia, os municípios nem sempre publicam este documento, verificandose que apenas 85% dos municípios cumpriram Não existe uma tarifa social nacional para os serviços de água. Todavia, pode existir apoio social por parte das respectivas autoridades competentes e de alguns municípios, podendo subsidiar uma parte da factura às famílias carenciadas, com o objectivo de evitar desligamentos do serviço. A ajuda social é financiada, em parte, por um imposto retido nas receitas dos operadores, de cerca 0,1% da factura da água, criado pela convenção nacional de soli- Carta de compromisso Controlo permanente da qualidade da água Quadro 54 Carta de compromisso dos SAS de Nantes Metropole Simplificação dos modos de pagamento Atendimento telefónico 24 horas por dia, 7 dias por semana Resposta sistemática ao correio Intervenção domiciliária em 2 horas Tolerância máxima de 2 horas para os encontros agendados Subscrição tratada em 24 horas Ligação ao serviço realizada em 4 semanas Instalação de um contador em 48 horas Aviso prévio de 24 horas em caso de interrupção de serviço Informação facilitada para uma interrupção de água não programada Aviso em caso de consumo anormal (excessivo) com esta obrigação (2000), tal como também, muitos deles, não enviam a informação da qualidade da água, isto é, apenas 62% respeitaram este requisito. Em algumas situações (42% dos casos) também se verificava que os relatórios eram, de facto, preparados pelo operador, ao invés do presidente ou de um membro do conselho municipal. Com o objectivo de melhorar a transparência no sector da água, o Governo francês promoveu o acesso ao contrato de delegação, ainda que sem a sua disponibilização ou publicação, fornecendo, por exemplo, informações sobre preços (cálculo e variação) e as funções do operador. Os municípios com mais de 10 000 habitantes têm a obrigação legal de criar comissões locais para informarem os utilizadores sobre os serviços públicos locais, entre os quais se incluem os SAS. Desde 2002, de acordo com a lei sobre a democracia local, o presidente tem a obrigação de pedir um parecer ao seu Commission Consultative des Services Publics Locaux (CCSPL) antes de tomar qualquer decisão sobre a gestão dos serviços, independentemente de o operador ser público ou privado. A maioria dos membros do CCSPL é representante dos diferentes grupos de interesse. dariedade em assuntos relativos à água (charte nationale “solidarité eau”). A universalidade dos serviços é um princípio que se encontra em fase de estudo, nomeadamente, a nova Lei da Água de 2006 estipula no seu primeiro artigo que todos “têm direito ao acesso a água para consumo humano , a preços que sejam aceitáveis para todos.” Algumas cidades, como Bobigny, no subúrbio parisiense, tomaram medidas, em Março de 2007, para proibir desligamentos dos serviços de água, de águas residuais e de electricidade, argumentando com base numa Carta do Ambiente e no novo direito de habitação. Os operadores que fornecem os SAS fundaram o CIEAU com o intuito de prestar um melhor serviço informativo às dúvidas e perguntas do público. Esta estrutura foi criada como uma organização sem fins lucrativos, governada pela lei de 1901. O CIEAU recolhe informação que, posteriormente, disponibiliza de modo a torná-la acessível a todos os stakeholders. A sua principal função compreende a disseminação da maior informação possível, que é depois publicada, contendo elementos relativos ao estabelecimento de preços dos SAS, qualidade do serviço, regulamentos e normas, tratamento de água para consumo humano e águas residuais e conselhos práticos, entre outras matérias. 159 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional 2.8.5 DESEMPENHO O modelo francês para o sector da água baseia-se na propriedade pública dos SAS e na concorrência no acesso ao mercado e na sua regulação por via contratual. As várias modalidades de gestão, à mercê das administrações locais, competem entre si. Os principais problemas existentes estão sobretudo relacionados com a existência de um oligopólio, condicionando o acesso concorrencial ao mercado, a sua fragmentação, ainda que os grupos privados usufruam de economias de escala significativas e da falta de transparência, apesar dos progressos ocorridos na última década. De qualquer forma, em rela- 160 ção a esta última matéria, embora os princípios das boas práticas constem da lei francesa, os mesmos não são respeitados nem se torna expedita a penalização dos seus infractores. Por último, é de referir que o sector da água em França não é ainda auto-sustentável, sendo financiado por diversas entidades, e o custo com os serviços é significativo. Em contraponto, a qualidade do serviço e ambiental é elevada e a França situa-se na vanguarda dos SAS em termos mundiais, tanto no que concerne aos aspectos e tecnologias ambientais, como nos aspectos operacionais e de gestão. A indústria da água francesa tem uma importância estratégica e histórica para o país, tendo um peso relevante na economia. Países Baixos 2.9 Países Baixos 2.9.1 ANTECEDENTES HISTÓRICOS Os Países Baixos (Nederland), oficialmente Reino dos Países Baixos (Koninkrijk der Nederlanden), é uma monarquia constitucional, cujo parlamento (Staten Gerenaal) é constituído por duas câmaras (Câmara Alta ou Senado e Câmara Baixa). O país, com uma área de 41 526 km2 e uma população a rondar os 16,5 milhões de habitantes, encontra-se organizado em doze províncias (Provincies), cada uma administrada pelo seu governador (Commissaris van de Koningin), as quais, por sua vez, se dividem em 443 municípios (Gemeenten). Os Países Baixos são presentemente descritos como um Estado unitário descentralizado e caracterizado pela grande e afamada participação dos holandeses no processo de tomada de decisões e abordagem consensual, conhecida como “Polder model”. Esta democracia participativa é também evidenciada no sector da água, onde existem os “Conselhos de Água” (waterschappen), que são unidades governamentais eleitas democraticamente e com atribuições na gestão da água. Os Conselhos de Água são muitas vezes descritos como a forma democrática mais antiga de governo nos Países Baixos. Apesar de serem fundados numa tradição de governação local, cooperativa e participativa, são caracterizados por um princípio básico segundo o qual as pessoas com o maior interesse nas funções do Conselho de Água são as que mais o influenciam. Além disso, devido à dimensão do seu território e à sua relação com o mar, os Países Baixos prestaram, desde sempre, a devida atenção aos assuntos relacionados com a água. Ao longo dos anos, os SAS têm enfrentado inúmeros desenvolvimentos, quer a nível legislativo quer a nível organizacional. No entanto, ainda se observam alguns reflexos dos primórdios institucionais do sector, nomeadamente, ao nível do tratamento das águas residuais onde os Conselhos de Água, desde a sua primeira implementação na Idade Média (algures entre os séculos XII e XIV), permanecem como responsáveis pela gestão da água e do serviço de tratamento de águas residuais e coexistem sob a mesma forma administrativa, apesar de mais agrupados e com maiores eficiências de escala do que outrora. Entre a referida evolução organizacional e institucional, salienta-se a extrema preocupação e dedicação do poder central em conferir escala aos respectivos operadores dos SAS. O número significativo de empresas de água (229 em 1938), de municípios e de conselhos de água no início do século XX levou o governo a desenvolver um enquadramento legal específico, nomeadamente, a Lei do Abastecimento de Água de 1957, posteriormente alterada em 1975 e 2000, promovendo a fusão entre os organismos, com o intuito de conceder às respectivas autoridades o poder de induzir mudanças na sua organização e consequentes ganhos de escala. Nos Países Baixos, os serviços de água são prestados sempre por entidades públicas (PLC), ainda que sejam regidas por direito privado e funcionem, de facto, como entidades privadas. Na realidade, as public limited company (PLC) holandesas caracterizam-se por um serviço de qualidade excepcional, correspondendo a uma satisfação elevada dos utilizadores, o que, entre outros factores, tem evitado a participação do sector privado nestes serviços e a sua regulação por entidades reguladoras independentes. Além disso, o país caracteriza-se por um governo central bastante presente e dedicado às questões da água e do ambiente, desenvolvendo uma conjuntura legal consideravelmente robusta, a qual, em muitas situações, serve de modelo para as próprias directivas europeias. A legislação vigente relativa ao sector da água é diversa. Salientam-se, entre outros documentos normativos, a Lei do Abastecimento de Água de 1957 (alterada no ano de 1975 e de 2000), a Lei dos Serviços de Água de 1992 e a Lei da Propriedade dos Serviços de Água de 2004. A estrutura administrativa e financeira dos Conselhos de Água baseia-se na Lei dos Serviços de 161 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional Água (Waterschapswet), que entrou em vigor em 1992, estabelecendo regras gerais para a composição dos seus órgãos directivos. Latifundiários e outros proprietários elegem os representantes directamente, enquanto os representantes da indústria são escolhidos pela Câmara do Comércio. A proporção de lugares disponíveis para cada grupo de interesse é determinada pela respectiva província. A responsabilidade local e regional pertence aos Conselhos de Água, que são posteriormente supervisionados pelas províncias. Os assuntos relativos à gestão da água a nível nacional são governados por um órgão executivo do Ministério dos Transportes, Obras Públicas e Gestão de Recursos Hídricos, a saber, a DirecçãoGeral de Obras Públicas e Gestão dos Recursos Hídricos (Rijkswaterstaat). Em Setembro de 2000, o Ministro do Ambiente neerlandês, Jan Pronk, anunciou a intenção de produzir legislação que impedisse a privatização das PLC na Países Baixos. As PLC manteriam os direitos exclusivos sobre os serviços de produção e distribuição de água para consumo humano nas suas jurisdições, no que concerne aos utilizadores domésticos, e permitiriam a concorrência visando os utilizadores industriais, possivelmente servidos por empresas privadas. Em 2001, estava a ser redigida uma lei nesse sentido, todavia, na sequência da demissão do Governo holandês em 2002, o assunto foi arquivado pelo governo seguinte. Posteriormente, o governo voltou a abordar esta matéria e criou a nova lei da Figura 43 Ciclo da água e protagonistas relevantes 162 água (Waterleidingwet), que acabou por ser aprovada no Parlamento neerlandês, com o apoio dos principais partidos, em Dezembro de 2003, proibindo a participação do sector privado na propriedade, gestão e exploração do sector da água. No âmbito da prevenção e do controlo da poluição dos recursos hídricos, o Governo neerlandês produziu um conjunto de documentos normativos, designadamente, a Lei da Poluição da Água de Superfície em 1969 (Wet Verontreiniging Oppervlaktewateren), que introduziu o princípio do poluidor-pagador (wie het water deert die het water keert). Ao abrigo desta lei, torna-se indispensável o licenciamento dos agentes que produzem poluição equivalente a 100 habitantes. Esta lei conferiu ao governo provincial a responsabilidade de implementação destas políticas, no entanto, na maioria dos casos, esta atribuição foi delegada aos Conselhos de Água que operam nas suas áreas. Como resultado, a gestão da qualidade da água tornou-se a mais importante actividade destes órgãos, ultrapassando a prioridade tradicional referente à gestão da quantidade de água. A Lei das Águas Subterrâneas de 1981 (Grondwaterwet) regulamentou a gestão das águas subterrâneas. Outras leis relacionadas, como a Lei de Protecção dos Solos de 1986 (Wet Bodenbescherming) e a Lei da Gestão da Água de 1989 (Wet op de Waterhuishouding), foram também marcos legislativos importantes. Em 1995, o Go- Países Baixos verno holandês introduziu um imposto sobre a captação de águas subterrâneas, integrando a vos do consumo excessivo. 2.9.2 ENQUADRAMENTO LEGAL E INSTITUCIONAL 2.9.2.1 Responsabilidades Nos Países Baixos, de forma bastante particular entre os países da UE, o sector caracteriza-se pela existência de diversos protagonistas, que devidamente descentralizados são responsáveis pelas diferentes fases do ciclo da água. As PLC são responsáveis pelo serviço de água, nomeadamente, pelas actividades relativas à captação, tratamento e distribuição de água. Os municípios são os principais intervenientes ao nível da gestão dos serviços de recolha e drenagem de águas residuais e, por fim, no culminar do ciclo, os Conselhos de Água detêm valências no âmbito do tratamento das águas residuais. A Figura 43 ilustra a integração destes protagonistas no ciclo da água (Marques, 2005). Como consequência da referida divisão de tarefas dentro do ciclo da água, a coordenação de actividades, no âmbito do sector da água, é essencial para o que é fundamental, a existência de uma forte ligação entre os protagonistas. Neste âmbito, é possível identificar dois grupos distintos que intervêm no sistema de gestão de água nos Países Baixos. O primeiro grupo prende-se com os protagonistas directamente envolvidos na gestão de água, quer ao nível do desenvolvimento político, quer pelo próprio fornecimento do serviço, nomeadamente, o Estado, as províncias, os municípios, as PLC e os Conselhos de Água. O outro grupo inclui os intervenientes remanescentes que, apesar de não possuírem um papel directo no sector, têm uma elevada preponderância em diferentes aspectos da sua regulação, gestão e financiamento: a Associação das Empresas de Água dos Países Baixos (Vereniging van waterbedrijven in Nederland – VEWIN), a Associação dos Conselhos de Água (Unie Van Waterschappen) e os bancos, nomeadamente o Banco dos Conselhos da Água (Nederlandse Waterschapsbank), e o Banco dos Municípios. A Figura 44 apresenta a organização dos principais intervenientes no sector da água dos Países Baixos (adaptado de Figura 44 Principais intervenientes no sector da água dos Países Baixos 163 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional Watertime, 2004). A nível nacional, o Ministério dos Transportes, Obras Públicas e dos Recursos Hídricos (Ministerie van Verkeer en Waterstaat – V&W) e o Ministério da Habitação e Ordenamento do Território e do Ambiente (Ministerie van Volkshuisvesting, Ruimtelijke Ordening en Milieubeheer – VROM) são os dois mais importantes ministérios envolvidos directamente no sector da água. O V&W encontra-se responsável pelos domínios relacionados com os serviços de tratamento de águas residuais e de qualidade das águas superficiais, enquanto o VROM tem a seu cargo o abastecimento de água para consumo humano e a salvaguarda da respectiva qualidade. Os inspectores da VROM fiscalizam a qualidade da água para consumo humano fornecida aos utilizadores. O V&W e o Instituto para a Gestão da Água e para o Tratamento de Águas Residuais (Rijksinstituut voor Integraal Zoetwaterbeheer en Afvalwaterbehandeling RIZA) são os organismos que preparam as novas legislações/regulamentações. O RIZA é um instituto de investigação e de aconselhamento visando as atribuições do Rijkswaterstaat. Este organismo recolhe os dados e conduz a investigação no âmbito da qualidade e quantidade dos recursos hídricos. Na base destes dados, o RIZA desenvolve recomendações no que concerne à gestão dos recursos hídricos. As províncias são, primordialmente, responsáveis pela gestão da água subterrânea e também pela supervisão do desempenho e das actividades e contas dos Conselhos de Água, incluindo o poder de os criar ou suprimir, determinar as suas atribuições de gestão, a área de operação e a respectiva estrutura governativa. Adicionalmente, as províncias também apresentam vários poderes ao abrigo da Lei do Abastecimento de Água, nomeadamente, na promoção da eficiência no sector, onde se inclui a capacidade de incentivar fusões entre as empresas de água. Em suma, as províncias recebem as orientações do governo federal que, posteriormente, transferem para os municípios e para os Conselhos de Água, apesar de se regerem pelas respectivas políticas. Consequentemente, cabe às províncias representarem os municípios e os Conselhos de Água perante o governo nacional. Os municípios são responsáveis pelas redes de drenagem dentro da sua jurisdição, incluindo as águas residuais domésticas e pluviais, mas, como referido, excluindo o tratamento de águas residuais, através dos seus departamentos. Os municípios são representados pela Associação de Municípios dos Países Baixos (Vereniging van Nederlandse Gemeenten – VNG), cuja principal função consiste no aconselhamento dos seus membros nos vários domínios, sempre que so164 licitado. Além disso, os municípios são também accionistas das PLC e exercem um certo controlo neste âmbito. Finalmente, o Banco dos Conselhos da Água (Nederlandse Waterschapsbank) dedica-se ao financiamento do sector da água. A VEWIN foi fundada em 1952 a partir da precedente VWN. A VWN, originalmente formada em 1899, pretendia fomentar a cooperação entre as empresas de água e foi fundada com o principal objectivo de aumentar o conhecimento entre os seus membros. A VEWIN é uma associação representativa das empresas de água, cuja missão principal é a “promoção do desenvolvimento saudável do fornecimento do abastecimento de água nos Países Baixos”. A associação procura promover os interesses das empresas de água, desde que os mesmos não sejam incompatíveis com a sua missão primordial. A VEWIN é responsável por diversas actividades, como a disseminação de boas práticas e a produção de publicações sobre diversos aspectos do sector da água. Por exemplo, a VEWIN elabora planos de desenvolvimento dos serviços de água de médio prazo (dez anos). Supletivamente, a VEWIN é responsável pelo sistema de benchmarking, que contempla quatro aspectos: qualidade da água, qualidade do serviço, qualidade ambiental e desempenho económicofinanceiro. Este sistema de benchmarking, que tem sido exercido de forma voluntária, tornouse obrigatório recentemente. A Associação dos Conselhos de Água protege os interesses dos Conselhos de Água a nível nacional, em particular perante o parlamento. Todos os Conselhos de Água são membros desta associação. Esta associação procura sobretudo, entre os seus membros, encontrar soluções para problemas comuns. O Rijkswaterstaat, criado em 1798 e posteriormente reformado em 1971, é uma organização governamental nacional, tutelada pela V&W, incumbida da supervisão do sector da água e da sua política estratégica. O governo nacional é também responsável pela formulação dos planos de desenvolvimento a longo prazo (trinta anos), que definem a política geral sobre o futuro do sector, bem como as necessidades futuras ao nível das infra-estruturas. Estes documentos complementam os planos de 10 anos, que são produzidos e revistos pela VEWIN a cada cinco anos. A fundação RIONED é um centro de investigação dedicado ao saneamento de águas residuais nos Países Baixos, reunindo municípios, conselhos de água, províncias, ministérios, operadores, consultores e construtores. A RIONED interessa-se por todos os assuntos relacionados com a gestão Países Baixos e exploração das redes de água residuais, contribuindo para a inovação e melhoria da eficiência das diferentes actividades desenvolvidas neste domínio. A informação e o conhecimento resultante encontram-se disponíveis e são partilhados entre os municípios, entidades governamentais e outras que apoiam e constituem a fundação (RIONED, 2006). Note-se também que outra mais-valia, e importante contributo para o desempenho do sector da água neerlandês, reside na comunidade científica aí existente (por ex., universidades) que tem estado, desde sempre, na vanguarda da investigação dos assuntos relacionados com a água. Por último, é de referir um outro organismo que, embora não integrado neste esquema, desempenha um papel importante no sector da água. Trata-se de uma ONG de defesa dos utilizadores (Consumentenbond), que representa 600 000 membros e possui a função de publicitação de informação estatística sobre o sector da água neerlandês. Por exemplo, desde o início da década de 90, publica o rácio preço/ qualidade de todas as empresas holandesas de abastecimento de água. 2.9.2.2 Regulação Embora periodicamente o assunto da privatização e, por conseguinte, da regulação dos SAS seja discutido nos Países Baixos, neste país não existe regulação explícita destes serviços. O Ministro da Economia e dos Assuntos Internos (Ministerie van Economische Zaken) tem promovido este debate e desenvolvido esforços no sentido da instituição de um regulador dedicado, sobretudo motivado pelo papel positivo da entidade reguladora dos serviços energéticos (DTe) na melhoria da eficiência económica deste sector. Com efeito, está previsto, independentemente de a propriedade das PLC continuar pública, a criação de uma entidade reguladora para o sector da água nos Países Baixos, ainda que a mesma tarde a entrar em funções. O adiamento da entrada em vigor desta entidade, que está conjecturada desde 1997, prende-se com o papel muito positivo da VEWIN na auto-regulação do sector. De facto, a VEWIN tem vindo a comportar-se, strictu sensus, como um regulador, incentivando a melhoria do desempenho dos operadores, tanto da qualidade do serviço como dos principais indicadores de cariz económicofinanceiro. A VEWIN, com um papel de relevo e pró-activo, e usando o benchmarking como a sua principal ferramenta, tem adiado não só a regulação económica explícita deste sector, como também a própria privatização, dado que tem conseguido manter as empresas de água no topo da excelência a nível mundial, levando a que os ganhos potenciais de eficiência (com a privatização) sejam limitados. No subsector das águas residuais, os Conselhos de Água, a RIONED e a VNG têm igualmente funções de auto-regulação, incentivando o uso de benchmarking e a melhoria do desempenho nos serviços de águas residuais. Os seus resultados são, no entanto, menos pronunciados. A Associação de Utilizadores (Consumentenbond) tem também funções relevantes de regulação, designadamente de protecção de interesses dos utilizadores, em tudo o que se relaciona com os SAS, mas sobretudo no que respeita à qualidade do serviço. 2.9.3 ESTRUTURA DO MERCADO 2.9.3.1 Propriedade e gestão dos serviços Os SAS caracterizam-se, principalmente, pela forte participação do sector público ao nível da sua propriedade, gestão e exploração, manifestando um dos melhores níveis de desempenho do mundo, nas suas diferentes vertentes. Apesar de, no passado, o sector privado ter sido relevante no sector, sobretudo nos anos 80, a necessidade de fortes investimentos e a pressão de vários grupos de interesse (por ex., organizações ambientais) reduziu a sua importância na década subsequente. A Lei dos Serviços de Água de 2004 viria a proibir a participação do sector privado na prestação dos serviços de água para consumo humano. No entanto, outros usos (por ex., industriais) podem ser fornecidos por entidades privadas. Já relativamente ao tratamento de águas residuais o cenário é distinto. Desde 2002, a Delfland Water Board estabeleceu um contrato de concessão para a construção de uma ETAR em Haia. Esta estação passou a ser uma das maiores da Europa, tratando os efluentes correspondentes a cerca de 1,7 milhões de habitantes. O respectivo concurso público foi ganho por um consórcio, no qual se incluíam a empresa de água de Roterdão e a multinacional Vivendi, actualmente Veolia Water. O contrato da PPP, em regime de BOT, representa cerca de 177 milhões de euros em custos de construção e tem uma duração de 30 anos. 165 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional 2.9.3.2 Players do sector O sector da água, excluindo a reduzida participação do sector privado, compreende, como referido, três tipos de entidades gestoras públicas, em função da respectiva actividade relativa ao ciclo de água. Conforme referido, o serviço de água é efectuado pelas PLC. A configuração e o modo de funcionamento destas entidades constituem algumas das principais razões do sucesso dos serviços de água dos Países Baixos, permitindo, por um lado, a eficiência e a eficácia do sector privado e, por outro lado, a responsabilização, a legitimação e a transparência exigida ao poder público, reforçado periodicamente aquando da realização de eleições. A dimensão das PLC tem crescido de ano para ano. Desde 1970, o governo central tem estimulado a fusão dos serviços de água, de modo a possuírem uma dimensão económica mínima de 100 000 ramais. No final de 2007, existiam apenas 10 operadores: WBGR, Brabant Water, WMD, Vitens, Waternet, WML, DZH, PWN, Evidese e Oasen. No passado, por diversas vezes, procurou-se a criação de multiutilities, designadamente pelas empresas de energia, como a Nuon e a Delta. Algumas destas empresas chegaram a ter participações no sector da água nos Países Baixos e expandiram-se internacionalmente neste mercado. A opção política por vedar este sector à iniciativa privada obrigou à sua retirada, pelo menos por enquanto, do mercado dos Países Baixos, embora mantenham o interesse neste sector no estrangeiro. Os Conselhos de Água, actualmente em número de 25, são os responsáveis pela gestão e operação das ETAR e pela gestão das bacias hidrográficas, além do ordenamento do território relacionado com os recursos hídricos, conservação da natureza e protecção do ambiente. Os Conselhos de Água, cujo número tem vindo a decrescer ao longo do tempo, nomeadamente mediante fusões, são organismos governamentais eleitos. Os seus rendimentos são provenientes de um imposto sobre a poluição e de uma taxa de funcionamento. Os serviços de recolha e drenagem de águas residuais são levados a cabo pelos municípios. Assim, existem, 443 operadores dos serviços de águas residuais nos Países Baixos. 2.9.3.3 Integração do sector e serviços oferecidos Os serviços de água nos Países Baixos são verticalmente integrados. As PLC fornecem todas 166 as etapas da fileira produtiva, desde a captação até à comercialização. As PLC têm, por norma, uma dimensão muito significativa, existindo, como mencionado, 10 operadores para 16,5 milhões de habitantes. De qualquer forma, embora nem sempre tenha sido assim, as PLC prestam unicamente o serviço de água, com excepção da Waternet, que é também responsável pelo serviço de águas residuais e outras actividades relacionadas com os recursos hídricos. Já o saneamento de águas residuais é pautado pela sua desverticalização, estando a “baixa”, relativa à recolha e drenagem de águas residuais, separada da “alta” correspondente ao tratamento de águas residuais. O nível de integração horizontal é também menor, sobretudo no que respeita à recolha e drenagem de águas residuais domésticas. 2.9.3.4 Números do sector Nos Países Baixos, o volume de água produzido em 2006 foi de cerca de 1.300 milhões de m3, dos quais 1.150 diziam respeito ao fornecimento de água para consumo humano. As perdas de água nesse ano representavam próximo de 10% do volume total de água captado. O património dos SAS, em 2006, era constituído por 116 000 km de condutas, que abasteciam de água os neerlandeses, e por 101 000 km de colectores de águas residuais. A principal fonte de captação é a água subterrânea, com cerca de 60% do valor global. Os neerlandeses têm um consumo médio diário per capita de 123,8 litros. O nível de atendimento do serviço de água é de 99% e o valor referente ao serviço de águas residuais é de 98%. Os operadores do serviço de água empregam nos Países Baixos cerca de 4.900 funcionários de forma directa (VEWIN, 2005). No Quadro 55 apresenta-se a decomposição dos custos do serviço de água nos Países Baixos, por entidade gestora, para o ano 2006. 2.9.4 REGRAS DO JOGO 2.9.4.1 Estabelecimento de tarifas Os preços praticados pelos SAS, apontados, normalmente, como elevados, se se considerar o princípio de recuperação de custos e a paridade Países Baixos Operador Custos totais Taxas Custos de capital Amortização Custos operacionais WBGR 1,06 0,18 0,07 0,13 0,68 Brabant water 1,10 0,21 0,21 0,16 0,51 WMD 1,23 0,19 0,21 0,21 0,63 Evides 1,26 0,06 0,50 0,27 0,44 Vitens 1,31 0,22 0,24 0,23 0,62 Waternet 1,48 0,04 0,15 0,34 0,96 WML 1,49 0,17 0,43 0,28 0,61 PWN 1,54 0,03 0,23 0,35 0,93 Oasen 1,68 0,19 0,22 0,46 0,81 DZH 1,72 0,15 0,40 0,40 0,77 Sector* 1,34 0,15 0,28 0,26 0,65 do poder de compra, ou seja, os encargos que estes serviços acarretam para os utilizadores, quando comparado com os de outros países da Europa, evidenciam o cenário oposto. Mesmo em termos reais, os valores médios não são muito significativos quando comparados com outros países europeus. os serviços fornecidos. Este sistema tarifário caracteriza-se pela implementação de uma parcela fixa, denominada “encargos fixos dos Conselhos da Água” e uma variável relativa à poluição produzida. Os valores em défice, pouco comuns, são ressarcidos mediante subsídios oriundos do governo central e local. O sector da água nos Países Baixos congratula-se pela sua própria instituição financeira, o Waterboards Bank (Nederlandse Waterschapsbank), criado em 1954 pelos Conselhos de Água. A instituição bancária, que apresenta uma credibilidade muito elevada (tem tido a classificação de triplo A), financia todo o sector da água, concedendo empréstimos a longo prazo aos Conselhos de Água, aos municípios e a outras instituições públicas, com funções de gestão dos SAS. A instituição financia ainda estas actividades nos mercados internacionais. Dado a estrutura jurídica e a exigência em manter um orçamento equilibrado, os Conselhos de Água têm uma classificação de risco de crédito de 0, que proporciona, igualmente, poupanças para o banco, nomeadamente, dispensando os analistas de crédito ou avaliadores de projectos. Os encargos relativos à poluição baseiam-se numa unidade elementar de poluição (UEP) (vervuilingseenheid), que representa o nível de poluição das águas residuais depositadas. O utilizador doméstico e singular é, normalmente, taxado perante uma UEP e os que envolvam mais do que um indivíduo são cobrados mediante três UEP. Porém, em alguns casos, este imposto é implementado por via dos contadores. Em 2002, o custo médio por UEP foi de 46,24 euros por ano. Uma família que seja proprietária de uma habitação paga, em média, cerca de 240 euros por ano. Como referido, o sector da água nos Países Baixos caracteriza-se por entidades claramente desagregadas e descentralizadas sobre os respectivos serviços. Neste âmbito, é de notar que cada uma das entidades gestoras implementa o respectivo sistema tarifário. Os Conselhos de Água impõem dois tipos de impostos, os quais financiam em mais de 95% Quadro 55 Composição dos custos do serviço de água por operador nos Países Baixos (€/m3) Os Conselhos de Água gastaram cerca de 2,3 mil milhões de euros em 2004, dos quais 27% se referem a investimentos e o restante é relativo a custos operacionais. Da tarifa de 46,24 euros por UEP, cerca de 75% representam os custos de tratamento das águas residuais e o remanescente compreende os custos associados às despesas relativas à gestão das bacias e da qualidade da água. A maioria dos municípios dos Países Baixos, cerca de 90%, cobra uma tarifa para o serviço de águas residuais, de modo a financiar as actividades desenvolvidas neste âmbito. Os valores cobrados repercutem cerca de 85% dos custos reais do serviço. Nos municípios 167 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional remanescentes, este financiamento é conseguido através dos impostos gerais colectados pelos municípios. A Figura 45 mostra a (0,141 €/ m 3 sobre os primeiros 300 m 3 consumidos). Se se considerassem os utilizadores não domésticos, o custo médio por m 3 evolução da recuperação dos custos do serviço de recolha e drenagem de águas residuais ao longo do tempo nos Países Baixos (RIONED, 2006). de água, em 2006, nos Países Baixos diminuía para 1,51 €/ m 3 de água. Note-se que, no seio das PLC, o sistema tarifário varia em função do local servido. No domínio do abastecimento de água, o serviço prestado pelas PLC representava, em 2006, um custo médio de 1,69 euros por m 3 para os utilizadores domésticos, o qual se desagregava em três parcelas. A primeira referia-se aos custos da prestação do serviço pelas PLC (custos de O/M e custos de capital), representando 76,5% do custo total. A segunda estava relacionada com as taxas de captação (subterrânea) que representavam 9,1%. Por último, a terceira dizia respeito aos impostos estatais (14,4% do custo total do serviço), englobando o IVA (6%) e o imposto sobre água da torneira As taxas relativas à captação de água abrangem apenas as origens de água subterrânea. Este tributo começou a ser instituído em 1995, e engloba duas parcelas. A primeira é cobrada pelas províncias, visando a contribuição dos operadores para a investigação no domínio das águas subterrâneas e para o desenvolvimento de planos estratégicos. A segunda parcela é estabelecida pelo Ministério das Finanças e é cobrada sem qualquer propósito específico. Em relação ao imposto sobre a água da torneira, o mesmo foi implementado em 2000, em detrimento de uma subida do IVA, para alavancar as receitas do sector da água. Nos Quadro 56 (VEWIN, 2006) Figura 45 Custos e receitas no serviço de águas residuais Quadro 56 Tarifa média do serviço de água na Países Baixos 168 €/m3 % Pagamento à empresa de água 1,29 76,5 Taxa sobre a captação subterrânea 0,15 9,1 Impostos sobre a água e IVA (6%) 0,24 14,4 TOTAL 1,69 Estrutura tarifária Países Baixos e no Quadro 57 (IWA, 2006) apresenta-se a composição do sistema tarifário para o abastecimento de água, quer em termos médios para os Países Baixos quer para algumas das principais cidades, mostrando-se também, neste caso, os elementos referentes ao saneamento de águas residuais. 2.9.4.2 Qualidade do serviço Desde 1997, a VEWIN iniciou um sistema de benchmarking voluntário para os seus associados (PLC) que engloba praticamente todos os serviços de água. A sua implementação Água (€/200 m3) Quadro 57 Síntese dos preços cobrados ao utilizador doméstico para três cidades Águas residuais (€/200 m3) Cidade Parcela Fixa Parcela variável Recolha Tratamento Amesterdão 31,31 206,13 88,57 140,90 Roterdão 50,63 161,19 105,48 140,90 Eindhoven 31,40 137,69 100,65 108,70 O serviço de água para as indústrias é prestado mediante a realização de contratos individuais. É de notar que, para indústrias, assim como para outros utilizadores não domésticos, os preços são estabelecidos com base na quantidade de água consumida, decrescendo a tarifa com o aumento do consumo e o tipo de água consumida (Swami, 2004). O Quadro 58 compara os encargos que os utilizadores suportam com os vários serviços públicos nos Países Baixos. Serviço pretendia alcançar três objectivos: o aumento de transparência, a prestação de contas e a produção de informação para melhorar o desempenho. Os exercícios de benchmarking comparam o desempenho em quatro áreas já referidas: qualidade da água, qualidade do serviço, qualidade ambiental e, por último, desempenho económico-financeiro. Neste último domínio, o benchmarking é realizado anualmente, enquanto nos remanescentes é desenvolvido de três em três anos. Quadro 58 Comparação entre os encargos com os serviços públicos Ano Doméstico singular Doméstico família Água para consumo humano 2004 108 147a Aquecimento e gás 2004 972b 972b Electricidade 2004 519 711a Resíduos sólidos 2005 202 253 Taxa de poluição 2005 52 156 Encargos com os Conselhos de Água 2005 38 38 Taxa de saneamento 2005 116 125 Taxas municipaisc 2005 669 730 169 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional Estes exercícios de benchmarking têm sido implementados de forma voluntária, tendo já sido anunciada a intenção de os tornar obrigatórios. Este estudo é promovido, através do desenvolvimento de um conjunto de indicadores de desempenho, no âmbito das áreas referidas. Os indicadores são baseados em cerca de 3.300 dados fornecidos pelas empresas. A VEWIN, procurando auditar a informação recebida, inquere os utilizadores directamente com o objectivo de avaliar a expectativa e a satisfação dos utilizadores com as empresas de água (por ex., continuidade do serviço). Por exemplo, a Figura 46 apresenta os re- sidratação. Estes factores são posteriormente utilizados para a determinação de um índice de impacte ambiental. sultados para o indicador relativo às interrupções do serviço de água. rior. O Quadro 59 apresenta uma síntese da evolução de alguns dos indicadores de desempenho calculados pela VEWIN (VEWIN, 2006). A qualidade da água fornecida é obtida através de um índice agregado, designado por índice de qualidade da água, que evidencia o grau de cumprimento da legislação. Um valor de “0” constitui o melhor valor possível, enquanto o valor de “1” diz respeito ao mínimo aceitável. Os operadores de água holandeses apresentam pontuações muito positivas neste domínio, conforme demonstra a figura ante- Figura 46 Indicadores duração das interrupções do serviço de água e qualidade de água Quadro 59 Indicadores de desempenho adoptados pela VEWIN A vertente ambiental é contabilizada e analisada através do consumo de energia, da produção de resíduos e de um índice de de- Indicador O instrumento de benchmarking é também aplicado sobre o serviço de águas residuais, quer 2000 2003 2006 0,06 0,05 0,03 Não cumprimento das normas - 0,11 0,11 Qualidade da água (pelos utilizadores) - 7,7 8,0 7,6 7,6 7,6 Chamadas atendidas dentro de 20 seg (%) - 51 38 Interrupções (min) - - 14 0,47 0,48 0,47 Resíduos reciclados (%) 90 94 94 Custos de serviço (€/m3) 1,28 1,31 1,34 Qualidade de água (WQI médio) Satisfação dos utilizadores Consumo de energia (kWh/m3) 170 Países Baixos na vertente do tratamento das águas residuais, referente aos Conselhos de Água, quer no que concerne à recolha e drenagem de águas residuais prestada pelos municípios. A RIONED, neste âmbito, tem desenvolvido várias iniciativas, tendo o seu primeiro estudo sido realizado em 2004, englobando 39 municípios. Actualmente, a fundação está a desenvolver um estudo similar que conta com a participação de 42 municípios. Os exercícios de benchmarking, levados a cabo pela RIONED, têm incidido não só sobre o tratamento de águas residuais, mas também sobre as actividades de recolha e drenagem de águas residuais domésticas. 2.9.4.3 Obrigações de serviço público De acordo com a Lei do Abastecimento de Água, as empresas de água são obrigadas a informar os seus utilizadores sobre o seu desempenho e qualidade de água fornecida. As empresas de água estão também vinculadas a recolher e tratar a informação solicitada pelos inspectores do VROM, que controlam o serviço fornecido e que o publicitam. As principais obrigações de serviço público como a universalidade e a continuidade estão contempladas na lei. Não estão previstos, no entanto, Níveis de Qualidade do Serviço para os utilizadores. Os municípios, segundo a lei em vigor, a Lei de Gestão Ambiental, são obrigados a desenvolver planos ambientais e de saneamento anuais, cujo draft tem de ser publicamente avaliado e os Conselhos de Água possuem a capacidade de os alterar através de uma petição. Relativamente à qualidade da água, o governo tem desenvolvido normas legais (em muitos casos mais exigentes do que as normas europeias) que pretendem garantir uma qualidade excepcional de fornecimento de água para consumo humano. 2.9.5 DESEMPENHO Em geral, a experiência dos Países Baixos é apontada como um caso de excelência na indústria da água, tornando-se num benchmark para todos os países do mundo. Várias razões concorrem para o sucesso do modelo neerlandês de organização e regulatório dos serviços de água, entre as quais se destacam o modelo de gestão privada efectuada por entes públicos, a representatividade e responsabilização de todos os stakeholders e a auto-regulação das entidades gestoras, desenvolvida pela VEWIN. A prática de benchmarking, instituída por esta entidade, tem vindo a revelar-se muito eficaz, melhorando substancialmente a qualidade do serviço e conduzindo a uma redução de custos. A redução do número de players foi outro aspecto que contribuiu para este cenário de excelência ao permitir realizar economias de escala significativas. Também no que concerne ao serviço de drenagem e tratamento de águas residuais, os Países Baixos evidencia um bom desempenho, ainda que menos notável do que no abastecimento de água. Nos Países Baixos praticamente não existem aspectos menos conseguidos. De qualquer forma, as questões que podem levar a alguma contestação prendem-se com a importância e a eventual captura do sector pela VEWIN, com o facto de o sucesso ser devido à dimensão dos operadores e à sua eficiência de escala, e não ao modelo regulatório vigente, e ainda devido aos serviços de águas residuais, em particular da recolha e da drenagem, poderem estar a funcionar a uma escala não óptima. Além disso, parte das receitas obtidas com os impostos no sector da água, que atingem valores muito elevados, não é reaplicada no sector. 171 Indonésia 2.10 INDONÉSIA 2.10.1 ANTECEDENTES HISTÓRICOS A Indonésia rege-se por um sistema presidencial, em que o presidente, que desempenha simultaneamente as funções de chefe de Estado e de governo, é eleito em conjunto com o seu vice-presidente. O principal corpo legislativo do país é a Assembleia Consultiva Popular (Majelis Permusyawaratan Rakyat), que consiste no Conselho Representativo do Povo (Dewan Perwakilan Rakyat) e no Conselho dos Representantes Regionais (Dewan Perwakilan Daerah). O país, com cerca de 235 milhões de habitantes e uma área aproximada de 1,9 milhões de km2, encontra-se administrativamente organizado em 33 províncias, geridas pelo respectivo governador, das quais três são territórios de regime especial e um é o território da cidade capital de Jacarta. Além disso, o país encontrase subdividido, a nível local, em mais de 450 distritos e municípios, governados pelo regente ou presidente de câmara. A crise que se instalou na Ásia em 1997, com repercussões sobre a Indonésia em 1998, teve sérias consequências, inclusive no seu sector da água, particularmente em Jacarta. Neste sentido, o serviço de água na Indonésia foi sujeito a várias transformações, sobretudo, a partir dos anos 90, com a entrada de operadores privados na gestão dos serviços e das consequentes reformas institucionais que daí advieram. Este cenário, vivido no final dos anos 90, levou à reforma política do sector da água, pautada por uma maior preocupação com o aumento do nível de acesso aos serviços, com a sustentabilidade do serviço fornecido e com a pro- moção de novos investimentos nos sistemas de abastecimento de água. Neste âmbito, em 1999, o governo criou a Lei n.º 22, que ambicionava a Autonomia Regional, transferindo os investimentos para o domínio dos governos locais e das empresas regionais (Perusahaan Daerah Air Minum – PDAM). O objectivo era elevar a sua eficácia. Os SAS encontram-se regulamentados pela Lei n.º 7, de 2004, relativa aos Recursos Hídricos, pela Lei n.º 8, de 1999, sobre a Protecção dos Utilizadores, pela Lei n.º 23, de 1997, sobre a Gestão Ambiental e, por último, pela Lei n.º 23, de 1992, que contempla a Saúde Pública. A Lei n.º 7, de 2004, regulamenta a provisão do serviço de água para consumo humano, impondo a necessidade de supervisão e de controlo da qualidade da água para consumo humano e do seu fornecimento a um preço acessível. Este documento normativo promove o equilíbrio entre os esforços despendidos por utilizadores e operadores e incentiva a melhoria da eficiência e da expansão do serviço de água. Além disso, esta lei estipula os diferentes protagonistas dependentes do Ministério das Obras Públicas, com responsabilidades relacionadas com os recursos hídricos e suas atribuições, possibilitando ainda a participação de empresas privadas e organizações comunitárias, como operadores dos serviços de água no mercado da água indonésio. A Lei n.º 8, de 1999, através do seu art. n.º 3, estabelece o enquadramento legislativo de defesa dos interesses dos utilizadores, tendo como objectivo paralelo o aumento da consciência cívica neste domínio. Ao nível da legislação ambiental, a Lei de Gestão Ambiental n.º 23, de 1997, promove o seu enquadramento legal, nomeadamente através 173 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional da regulamentação da qualidade ambiental, inclusive das normas de descarga das águas residuais. Por último, a qualidade da água encontra-se regulamentada pela Lei da Saúde n.º 23, de 1992, que, entre as demais atribuições, define os requisitos mínimos para o fornecimento de água para consumo humano. Além da conjuntura legal apresentada de âmbito nacional, em Jacarta, com o objectivo de incutir maior desenvolvimento ao sector da água, o governo provincial optou por concessionar os SAS, que até então eram providenciados pela PAM Jaya (antigo operador público provincial), a duas empresas. O primeiro passo tomado nesse sentido partiu do estabelecimento de um Acordo de Cooperação (Cooperation Agreement – CA), em Junho de 1997, que envolveu todas as partes interessadas, designadamente a PAM Jaya e as duas concessionárias. Todavia, devido à referida crise financeira asiática em meados de 1997, afectando os critérios definidos no CA, o contrato revelou-se injusto e relativamente “pesado” para os utilizadores. Tendo em conta as recomendações do Conselho Regional, a renegociação do CA tornou-se incontornável, iniciando-se no ano 2000. Através de um longo processo de negociação, que terminou em Outubro de 2001, foi assinada a alteração do CA (Restated Cooperation Agreement – RCA). Com o intuito principal ao nível da protecção dos interesses dos utilizadores, e também das restantes partes envolvidas no RCA (PAM Jaya e duas concessionárias), foi estabelecida uma agência regulatória, a Entidade Reguladora do Sector da Água de Jacarta (Jakarta Water Supply Regulatory Body – JWSRB). 2.10.2 ENQUADRAMENTO LEGAL E INSTITUCIONAL 2.10.2.1 Responsabilidades Na Indonésia, a responsabilidade sobre os SAS encontra-se repartida em diversos organismos, tanto a nível central como regional, denotando uma grande descentralização do sector. 174 A nível central, as principais entidades dizem respeito ao Ministério da Saúde (Departemen Kesehatan), ao Ministério das Obras Públicas (Departemen Pekerjaan Umum), ao Ministério da Habitação (Departemen Dalam Negeri), ao Ministério do Ambiente (Badan Pengendalian Dampak Lingkungan) e a nível regional, aos governos regionais. A Agência de Desenvolvimento de Planeamento Nacional (Badan Perencanaan dan Pembangunan Nasional - BAPPENAS), a Associação dos Operadores (Persatuan Perusahaan Air Minum di Seluruh Indonesia - PERPAMSI) e o JWSRB são também organismos com importantes atribuições sobre o sector. O Ministério da Saúde (MS) possui a responsabilidade de estabelecer orientações e promover a saúde pública e a monitorização das normas de qualidade da água fornecida para consumo humano. Estabelece directrizes e linhas de orientação para os governos regionais relativas ao desenvolvimento do serviço de águas residuais e para a implementação de programas de consciencialização sanitária e ambiental. O MS detém como alvo principal as áreas rurais. O Ministério das Obras Públicas é responsável por todas as obras de âmbito nacional, de modo a garantir o cumprimento das normas técnicas dos serviços públicos regionais. Este ministério tem a atribuição de prestar a devida assistência ao sector da água. Dentro deste ministério, a Direcção-Geral das Instalações Humanas (Cipta Karya) promove a assistência e orientação técnica adequadas aos governos regionais na concepção e implementação das instalações sanitárias. A Direcção-Geral dos Recursos Hídricos é responsável pela gestão da alocação e protecção dos recursos hídricos superficiais e, tendo em conta que a Indonésia é praticamente abastecida por águas superficiais, desempenha um papel de relevo. Esta agência é também responsável pela implementação de projectos no sector da água, como o Programa Integrado de Desenvolvimento de Infra-estruturas (IUIDP), instituído em 1990. O Ministério da Habitação (MH) supervisiona a descentralização e a monitorização de aspectos não técnicos relativos ao desempenho dos governos regionais, incluindo as PDAM. Este ministério tem incumbências de promoção de directrizes para o estabelecimento de tarifas e para a avaliação e monitorização do desempenho financeiro e operacional das PDAM. O âmbito de actuação do MH incide, sobretudo, sobre as áreas urbanas. Indonésia O Ministério do Ambiente possui como principais atribuições o desenvolvimento legal e regulamentar relativo aos aspectos da protecção ambiental, onde se incluem os recursos hídricos. A BAPPENAS é responsável pelo planeamento e pela coordenação das infra-estruturas urbanas e rurais do processo de reforma nacional. Além disso, a agência desempenha um papel fundamental na formulação de políticas sobre o abastecimento de água, sobre o saneamento de águas residuais, sobre a gestão de resíduos e sobre os transportes. Os governos regionais, sob autonomia regional, encontram-se directamente responsáveis pelos serviços de águas e de águas residuais. Estes governos são ainda proprietários e responsáveis pela regulação dos PDAM, salvaguardando o cumprimento da lei pelos SAS bem como a sua operação e manutenção. A PERPAMSI, fundada em 1972, constitui a associação dos operadores dos SAS na Indonésia. Actualmente, esta associação tem como membros próprios cerca de 300 empresas da água, para além de 60 membros extraordinários, que desempenham funções no sector da água (fornecedores, fabricantes, contratantes, etc.). Neste domínio, esta associação evidencia como principais competências a disseminação das boas práticas nos diferentes campos dos SAS e a formação dos seus funcionários. Por último, apesar do âmbito regulatório reduzido, face à grandeza do país, o JWSRB, estabelecido pelo Decreto Governamental da Província de Jacarta de 2001, desempenha um papel bastante importante no sector da água, comportando-se como um órgão independente, imparcial e profissional. 2.10.2.2 Regulação Como referido anteriormente, a Indonésia compreende um regulador dedicado ao SAS, o JWSRB. No entanto, de modo atípico ao que sucede, comummente, fora das suas fronteiras, esta entidade tem natureza local, detendo apenas atribuições sobre a jurisdição da cidade de Jacarta. Uma das funções do JWSRB consiste em assegurar o equilíbrio de interesses entre os utilizadores e os SAS, concentrando-se na protecção dos direitos dos utilizadores em obter os SAS a um preço razoável e com uma boa qualidade. O JWRSB é também importante para a credibilidade do sector e, desta forma, para a promoção da participação do sector privado nos SAS. Para desempenhar as suas atribuições, foram estabelecidos comités dentro do JWSRB, nomeadamente o Comité da Tarifas, o Comité da Opinião Pública (KPPM) que, entre outras funções, efectua um inquérito à qualidade do serviço, e os Comités de Especialidade. No desenrolar das suas funções de protecção dos interesses dos utilizadores, o JWSRB possui competências de monitorização dos níveis de qualidade do serviço, designadamente do fornecimento de água com quantidade, qualidade, continuidade e pressão adequadas, e com sistemas tarifários comportáveis e ajustados (protecção dos utilizadores contra monopólios), da melhoria da transparência do sector da água e de promoção do estabelecimento das organizações de água comunitárias, quer sejam operadores ou não. Além disso, o JWSRB incentiva e ajuda a formação de associações de utilizadores de água e promove também o estabelecimento de um fórum de água. As organizações de utilizadores de água são entidades que têm como objectivo a defesa dos interesses dos utilizadores. Estas organizações podem ser associações de moradores ou entidades registadas, quer como sociedade quer junto dos governos locais. Em Jacarta, a organização denominada Comité do Utilizador do Serviço de Água (KPAM) destaca-se pela sua relevância na prestação do serviço de água em toda esta província. Os seus membros directivos carecem de aprovação ou nomeação pelo JWSRB. O JWSRB promove o desenvolvimento de um fórum anual entre os diversos stakeholders (operadores, utilizadores, agências governamentais, associações profissionais, universidades, líderes comunitários e ONG). A função principal do fórum prende-se com a discussão de assuntos e de interesses dos utilizadores relativamente aos SAS. O fórum é usualmente denominado FKPM (Public and Consumer Communication Fórum). Em 2006, o JWSRB teve custos de exploração de cerca de 257 mil euros. O seu orçamento é garantido na íntegra pelo pagamento efectuado pelos utilizadores, correspondente a 0,22% da factura de água. Actualmente, a entidade reguladora compreende 30 funcionários, os quais se dividem em 5 membros com funções directivas, 15 relativos ao departamento técnico e 10 ao departamento admi175 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional nistrativo. Na Figura 47 é possível observar a estrutura organizacional da JWRSB. Uma vez mais, é de referir que nas outras províncias não existe entidade reguladora, sendo as funções regulatórias desempenhadas directamente por outras autoridades governativas. com base no Decreto Governamental n.º 2459 de 2004, foi implementado o ajuste de tarifário automático, seguido de um sistema de rebate na tarifa, que tem em consideração o desempenho das concessionárias no estabelecimento da tarifa média. Figura 47 Enquadramento regulatório dos SAS em Jacarta IM – Gestão de Informação; CSS – Pesquisa de Satisfação dos Utilizadores O RCA determina que a concessionária seja remunerada através de uma renda, em função do volume de água vendido em cada semestre e pago pelo concedente, enquanto os utilizadores pagam a tarifa de água, aprovada pelo governador, ao concedente. A renda representa a remuneração das concessionárias pelos seus serviços e investimentos, através do volume de água vendido. É calculada com base em projecções financeiras das concessionárias até uma taxa predefinida de 22% por ano e é indexada em cada semestre ao IPC e aplicada equitativamente a todas as categorias de utilizadores. Desta forma, parte do risco do negócio é tranferida para o concedente. A tarifa da água, que representa o preço pago pelos utilizadores por m3 de água consumida e que varia consoante a sua natureza, é fundada nos princípios associados à capacidade de pagar o serviço e de subsidiação cruzada. Baseado no art. n.º 26 do RCA, a autoridade que estabelece as tarifas encontra-se sob a responsabilidade do governo local e do Conselho Regional da província de Jacarta. Desde o estabelecimento da entidade reguladora, a proposta das tarifas é por esta submetida a aprovação do governador. No âmbito da viabilidade das duas PPP e de modo a proteger o interesse dos utilizadores e 176 Por último, é de referir que a associação do sector, a PERPAMSI, ao nível das suas atribuições, desempenha também um importante papel de auto-regulação do sector da água, especialmente na disseminação de boas práticas entre os seus membros. Além disso, esta associação possui um peso determinante junto dos organismos governamentais, influenciando a tomada de decisões. 2.10.3 ESTRUTURA DO MERCADO 2.10.3.1 Propriedade e gestão dos serviços Os SAS, tal como sucede na grande maioria dos países, encontram-se principalmente providos pelo sector público. As razões culturais e a estrutura institucional vigente na Indonésia convergem nesta situação. Apesar de todos os esforços governamentais em desenvolver a participação do sector priva- Indonésia do nestes serviços, a mesma apenas se começou a fazer sentir ao longo da década de 90, com o intuito de aumentar a disponibilidade de recursos financeiros e de melhorar a eficiência e o desempenho dos SAS, procurando o seu autofinanciamento. Um número significativo de iniciativas de promoção da participação do sector privado tem sido desencadeado mas, em geral, sem sucesso. Como consequência, o sector privado tem demonstrado pouco interesse na operação e manutenção de serviços de água em cidades secundárias, motivado pela falta de um quadro regulamentar adequado e devido à resistência dos operadores existentes, do PDAM e do público em geral. De qualquer forma, a modalidade de privatização adoptada na Indonésia apenas inclui a gestão e exploração dos SAS e nunca a sua propriedade. 2.10.3.2 Players do sector Na Indonésia, o abastecimento de água à maioria da população é efectuado através de empresas regionais de água, usualmente conhecidas como PDAM. Até 1968, apenas algumas cidades tinham sistemas de abastecimento de água públicos (PDAM), que cresceram em consonância com o desenvolvimento do país. Em 1995, o total de PDAM existentes era de 306. No entanto, com a crise geral asiática, observou-se um decréscimo na sua evolução, embora actualmente o seu crescimento tenha sido novamente retomado. Presentemente, o serviço de água é garantido por 319 PDAM em toda a Indonésia. Cerca de 245 PDAM, ou seja, 77% da totalidade dos operadores, prestam o serviço de água a menos de 25 000 utilizadores. Este factor, associado à conjuntura socioeconómica das populações, em geral, indicia uma debilidade clara dos operadores ao nível da auto-sustentabilidade do serviço de água. Actualmente, a presença do sector privado na prestação do serviço de água deve-se, fundamentalmente, à participação das duas concessões na cidade de Jacarta (PAM Lyonnaise Jaya/ Palyja e PAM Jaya/TPJ de Tamisa) e ao operador privado de Batam, a Adhya Tirta Batam (ATB), que abastece cerca de 700 000 utilizadores e a uma empresa mista em Bali. Em 1998, o governo da província de Jacarta convidou duas empresas multinacionais, a Lyonnaise des Eaux (PAM Lyonnaise Jaya/Palyja) e a Thames Water International (PAM Jaya/TPJ de Tamisa), a oferecerem propostas para a gestão dos serviços de água. Estas duas empresas foram convidadas a tornarem-se sócias da PAM Jaya no fornecimento dos SAS em Jacarta, ficando cada uma delas responsável pela gestão do serviço de uma parte da cidade. O objectivo principal deste projecto era a procura do autofinanciamento do SAS através do sistema tarifário, ainda que o seu estabelecimento devesse perseguir princípios sociais. Esta ideia da divisão da cidade deveu-se, sobretudo, a uma tentativa de instituição de competição entre os operadores, permitindo, pelo menos teoricamente, uma melhoria mais acentuada da qualidade do serviço. A Palyja fornece o serviço da água à parte ocidental de Jacarta, servindo cerca de 56% dos 5,5 milhões de habitantes que nessa zona habitam, e a TPJ fornece o serviço à parte leste de Jacarta, abastecendo cerca de 67% dos habitantes aí residentes. As duas áreas da cooperação são delimitadas pelo rio Ciliwung. A PALYJA encontra-se sob o domínio da Suez, que detém 51% da PALYJA, sendo a parte remanescente repartida entre a Astratel e o Citigroup. A TPJ, originalmente propriedade da Thames Water do Reino Unido, é hoje propriedade da Acuatico, uma firma baseada em Singapura, mas de capitais indonésios. Antes da participação do sector privado, o serviço de água em Jacarta era gerido e operado pela PDAM DKI Jaya (PAM Jaya), que pertencia ao governo da província de Jacarta (PEMDA DKI). Como entidade pública, a PAM Jaya tem operado o serviço de água em Jacarta desde 1922. Nas áreas rurais, a maioria das famílias possui captações próprias, normalmente subterrâneas, de reduzida profundidade ou através da retenção de águas pluviais ou de águas de superfície existentes nas proximidades de rios e de nascentes. Os Sistemas Comunitários e/ou Cooperativos disponibilizam água a cerca de 30% da população rural. Por outro lado, o serviço de águas residuais é prestado apenas em dez cidades, através de sete PDAM, uma empresa municipal e dois sistemas geridos directamente pelo governo local (Dinas), sendo o maior operador deste serviço o referente à cidade de Jacarta, através da empresa municipal PD PALJAYA. Os serviços de água residuais servem apenas 3% da população da Indonésia. Para a Indonésia, a ajuda externa no fornecimento do serviço de água, nomeadamente através de instituições financeiras internacionais, como o Banco Mundial e o Banco de Desenvolvimento Asiático, de países com um objectivo bilateral, 177 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional como os Estados Unidos da América, o Canadá, o Japão, a Austrália e a Países Baixos, e, por último, de organismos internacionais, como a UNICEF, revela-se da maior importância. A Indonésia necessita de aumentar os investimentos no sector da água em, pelo menos, 1% do PIB, ou seja, 2,6 mil milhões de euros anuais, para atingir os Objectivos do Milénio. 2.10.3.3 Integração do sector e serviços oferecidos Os SAS são, na sua maioria, promovidos por entidades multissectoriais, que fornecem os serviços de água, de águas residuais e de resíduos urbanos, as já referidas PDAM. Quadro 60 Investimentos e despesas dos diferentes níveis administrativos cerca de 10,5 milhões de m3 de águas residuais. Os serviços de água caracterizam-se por possuírem perdas de água consideravelmente elevadas, variando entre 30% e 50%, mediante a região. O serviço de águas residuais em Jacarta, como referido, é fornecido apenas por uma entidade. O mesmo sucede com a existência de um ope- Em 2005, a Indonésia despendeu cerca de 3,8 mil milhões de euros em infra-estruturas. Estas despesas foram financiadas, principalmente, pelos governos locais (42%) e pelo governo central (42%), seguido do governo provincial, com 16% da despesa total. Neste âmbito, estima-se que a despesa com o serviço de água tenha representado cerca de 10% da despesa total dos governos com infra-estruturas. No Quadro 60 Central Provincial Distrital Total Infra-estruturas (milhões €) 1.600 600 1600 3.800 Total 24 800 2.600 9.800 37 200 % nas infra-estruturas 6,4% 23,7% 16,3% 10,3% rador do serviço em “alta” em Jacarta, o Perum Jasa Tirta II (PJT II), ao qual a PAM Jaya compra a água. Além disso, a PAM Jaya também compra água tratada à Cisadane WTP, propriedade da PDAM Tangerang. De qualquer forma, em geral, os SAS encontram-se verticalmente integrados. 2.10.3.4 Números do sector Na Indonésia são captados anualmente cerca de 83 mil milhões de m3 de água, dos quais apenas 8% se destinam ao consumo humano, sendo a agricultura o maior utilizador com 91% do total. O remanescente 1% destina-se à indústria. Cerca de 90% da população reside na área de jurisdição de uma das 316 PDAM, mas apenas 39% dos residentes urbanos (18% da população da Indonésia) têm acesso ao serviço de água. No serviço de águas residuais, estas debilidades são ainda mais visíveis, onde apenas 3% da população urbana tem acesso ao serviço e desta percentagem somente 2,25% recebe algum tipo de tratamento. Neste âmbito, os operadores do serviço de águas residuais recolhem, anualmente, 178 apresenta-se a distribuição e a representatividade dos custos e investimentos dos diferentes níveis administrativos (Banco Mundial, 2005). 2.10.4 REGRAS DO JOGO 2.10.4.1 Estabelecimento de tarifas Na Indonésia, tal como sucede na maioria dos países em desenvolvimento, apesar dos enormes esforços das autoridades do sector, as tarifas dos serviços de água não cobrem sequer os seus custos de operação e manutenção. Além disso, o país padece de uma percentagem elevada de não pagamento das facturas. O sistema tarifário praticado no sector da água na Indonésia, sobretudo pelos PDAM, segundo a orientação emitida pelo Ministro da Habitação, consiste na aplicação de tarifas volumétricas, com ou sem escalões. Os escalões, quando existem, são normalmente crescentes. A estrutura de tarifa é projectada para permi- Indonésia tir a subsidiação cruzada dos utilizadores com rendimentos mais baixos. O valor das tarifas é estabelecido pelo governo local com a aprovação do Conselho de Cidade (Assembleia Municipal), com base na capacidade que os utilizadores têm de pagar o serviço e na sua situação socioeconómica. Naturalmente, a capacidade de pagar está também associada ao custo de produção da água. Os encargos médios que os utilizadores domésticos têm de suportar oscilam entre 1% e 2% dos rendimentos das famílias, embora em algumas situações o peso seja muito superior para o acesso ao serviço de água. Em Jacarta, em particular, existem dois tipos de tributos: a renda e as tarifas de água. A renda, relativa ao pagamento das concessionárias, é ajustada em cada semestre, usando uma fórmula de indexação, que inclui vários factores prego (Golden Handshake), não se conhecendo, no entanto, o real fim destas verbas. Apesar de não existir diferença no sistema tarifário entre os dois concessionários, as receitas do serviço de água são divergentes. As receitas são obtidas junto dos utilizadores, baseadas num sistema tarifário, que é estruturado em função de uma parcela variável crescente, de acordo com o consumo de água. A tarifa é calculada, revista e proposta pelo regulador ao governador da província de Jacarta, para a homologação por parte do respectivo Conselho Regional. Com o objectivo específico de estabelecer tarifas, foi criado um Comité de Tarifas dentro do regulador. O RCA, definido entre o concedente e os concessionários, estipula que o nível das tarifas terá de ser ajustado à capacidade financeira dos utilizadores da província de Jacarta. No Quadro 61, apresenta-se Categoria I II IIIA Estaleiros navais, serviço de incêndio, instalações de caridade social e orfanatos; Hospitais públicos, alojamentos muito pobres, estações de lavagens, camiões cisterna e apartamentos muito simples; Alojamentos simples e apartamentos simples; Quadro 61 Sistema tarifário dos SAS em Jacarta para o ano de 2005 0-10 m3 11-20 m3 >20 m3 0,039 0,039 0,039 0,039 0,039 0,071 0,174 0,238 0,284 0,248 0,312 0,397 0,362 0,440 0,532 0,692 0,692 0,692 0,816 0,816 0,816 Alojamentos moderados, apartamentos moderados, quiosques, pequenos esta- IIIB belecimentos de reparação, pequenos estabelecimentos comerciais e instituições privadas não comerciais; Alojamentos luxuosos, embaixadas/consulados, escritórios governamentais, edifícios de entidades internacionais, edifícios comerciais, alfaiates, edifícios militares, esta- IVA belecimentos comerciais de média dimensão, lojas, restaurantes, hospitais privados, clínicas de saúde/laboratórios, escritórios de advogados, industriais de pequena dimensão, apartamentos luxuosos e consultórios médicos; Hotéis luxuosos (1-5 estrelas)/motéis, saunas/salões de beleza, night clubs/cafés, IVB bancos, grandes estabelecimentos de reparação, empresas, arranha-céus/condomínios, empresas de refrigeração, indústrias têxteis, armazéns/outras indústrias, barcos e PT Jaya Ancol. V BPP Tanjung Priok (Porto) como os índices cambiais, o IPC, a variação dos custos de trabalho, dos produtos químicos, da electricidade, dos metais e dos preços de água em “alta”. A renda é reformulada a cada 5 anos. Por outro lado, as tarifas de água encontram-se directamente relacionadas com o serviço fornecido pelo operador e pretendem recuperar os custos, não desfazendo os princípios sociais já salientados. Uma parte das receitas do sistema tarifário é ainda retida pelo governo provincial para fins sociais, designadamente de combate ao desem- o sistema tarifário implementado pelas duas concessionárias em Jacarta. Em relação ao serviço de águas residuais, o sistema tarifário em vigor tem, por norma, como referência as características das habitações, mas também existem operadores, como a PDAM Bandung e a PDAM Banjarmasin, que determinam os preços do serviço de águas residuais em função do sistema tarifário do serviço de água. A PALJAYA estabelece o sistema tarifário do serviço de águas residuais segundo uma taxa fixa, em 179 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional função da área do fogo, que para os utilizadores domésticos representa, em média, cerca de 0,60 euros mensais. 2.10.4.2 Qualidade do serviço O sector da água na Indonésia, conforme evidenciado, apresenta diversas debilidades. No entanto, embora em algumas áreas o serviço de água padeça de pouca pressão e seja prestado intermitentemente, na generalidade, o mesmo prima pela sua continuidade. No âmbito da qualidade da água para consumo humano fornecida, cerca de 30% da água distribuída pelas empresas de água encontra-se contaminada. No sentido de monitorizar o desempenho do operador e a satisfação dos utilizadores, o JWSRB desenvolveu um conjunto de indicadores de desempenho, abordando aspectos técnicos, como a quantidade, qualidade, continuidade, pressão, água medida, perdas de água e novas ligações, e aspectos não técnicos, como a facturação, a interrupção do serviço, as reclamações e o sistema tarifário. Os indicadores de desempenho constituem uma ferramenta importante para a avaliação da performance do operador, sendo também utilizados na determinação da Pesquisa da Satisfação dos Utilizadores (CSS). Esta tarefa é desenvol- Quadro 62 Número 180 Descrição vida para determinar o grau de satisfação dos utilizadores relativamente ao serviço de água. A implementação da CSS foi estabelecida em conformidade com a Lei n.º 8, de 1999, relativa à protecção dos utilizadores. A CSS constitui um dos instrumentos de controlo dos serviços de água e é utilizada como base da futura política regulatória tarifária. Especificamente, a CSS é um instrumento que ajuda a culminar os objectivos definidos de curto prazo, como a identificação de áreas que apresentem problemas de desenvolvimento e de expansão, constituindo uma ferramenta de apoio à decisão. No Quadro 62 observam-se os indicadores de desempenho desenvolvidos pelo JWSRB e calculados para a província de Jacarta. Posteriormente, estes indicadores são publicados num relatório desenvolvido anualmente pelo JWSRB e publicitados através dos media (regulação sunshine). Todavia, a imposição deste sistema para o fornecimento de um serviço de água eficiente e eficaz, aliado à forte pressão dos organismos governativos, obriga a um forte investimento no sector, que também incorre em aumentos substanciais na tarifa da água. Este fundamento é sustentado pelo princípio da total recuperação de custos. Dado que o serviço de água para consumo humano é visto também como uma das necessidades humanas básicas, o estabelecimento de tarifas deve, por conseguinte, ter em conta a disponibilidade financeira dos utilizadores fornecidos. Neste aspecto, verifica-se alguma controvérsia no sector da água da Indonésia. Indicadores de desempenho 1 Continuidade Disponibilidade 24 horas por dia Menos de 3 interrupções do serviço por semana 2 Pressão Alcance de segundos andares 3 Quantidade Adaptabilidade às necessidades diárias 4 Qualidade Cumprimento das normas de qualidade e observações físicas (turvação, cor e odor) 5 Leitura do contador Leitura mensal (sempre ao mesmo dia) e precisão da leitura 6 Factura da água Factura mensal 7 Resposta e reclamações Serviço do operador com capacidade para a recepção de reclamações e pedidos 24 horas por dia 8 Reposição e calibração do contador Substituição de contador reposto a cada 4 anos ou, pelo menos, recalibrado 9 Comunicação com o operador O operador tem de disponibilizar serviços de comunicação (pelo menos um número de telefone 24 horas por dia) Indonésia Neste contexto, os três pilares (FKPM, FPAM e a Gestão de Informação) já referidos formam o Sistema de “Voz da Água” (Water Voice System). A “Voz da Água” é uma entidade independente, que não faz parte do operador, e que dá voz aos interesses dos utilizadores, quer em relação ao sistema tarifário quer à qualidade do serviço prestado. uma lei que garanta explicitamente a universalidade do serviço. No entanto, a acessibilidade ao serviço de água, através da recente Lei da Água de 2004, é contemplada, garantindo, simultaneamente, a protecção dos utilizadores. 2.10.4.3 Obrigações de serviço público Os operadores têm, normalmente, call centers e gabinetes de apoio aos utilizadores, designadamente para tratamento das reclamações. Por exemplo, a PAM Jaya agrupa as reclamações em 8 categorias: interrupção do serviço/baixa pressão, roturas, anomalias com o contador, qualidade do serviço precária, obras, facturação imprópria, falta de leitura e outros. Tendo em conta a conjuntura socioeconómica em que se insere a maioria da população, as condições geográficas e a densidade populacional que caracterizam o país, não existe na Indonésia Em Jacarta, no RCA determina-se que as concessionárias atinjam objectivos técnicos e de qualidade mínima, como aqueles sublinhados no Quadro 63. Entre os parâmetros e indicaQuadro 63 Pressão nos utilizadores Manutenção dos níveis de pressão em 7,5 atm Relação com os utilizadores Todas as chamadas devem ser recebidas em 30 segundos Resposta às reclamações relativas à conduta principal em 2 horas Resposta às reclamações relativas à interrupção do serviço em 4 horas Resposta às reclamações relativas à qualidade da água em 6 horas Nova ligação A nova ligação deve ser estabelecida dentro do período de um dia útil, após todos os pagamentos e burocracias necessários Reparação de interrupções no serviço de distribuição A reparação será efectuada de acordo com os seguintes pressupostos: Condutas terciárias até 100 mm sob condições normais em 6 horas, sob condições difíceis em 24 horas Condutas secundárias entre 150 mm e 250 mm sob condições normais em 12 horas, sob condições difíceis em 24 horas Condutas primárias entre 300 mm e 450 mm sob condições normais em 24 horas, sob condições difíceis em 48 horas Condutas primárias acima de 450 mm em 72 horas 181 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional dores estipulados, encontram-se os relativos ao volume da água facturado, o volume de água não facturado, o número de conexões, o nível de atendimento do serviço, a qualidade da água fornecida aos utilizadores, a pressão do serviço, a relação com o cliente, as interrupções de serviço de água e as novas ligações. 2.10.5 DESEMPENHO Actualmente, na Indonésia os SAS caracterizam-se pela existência de diversos problemas. A gestão inadequada, força e vontade política insuficientes, os escassos recursos do governo e a parca regulação são alguns dos factores que carecem de revisão urgente. Os quatro principais domínios de intervenção relacionam-se com a sustentabilidade financeira das infra-estruturas dos serviços, a necessidade de equilibrar os interesses públicos e privados através da alocação de riscos entre os stakeholders, a promoção da competição 182 e da regulação adequada e a necessidade de reestruturação para melhorar e incentivar a transparência do sector. Outras prioridades prendem-se com a autosustentabilidade das PDAM, nomeadamente através dos sistemas tarifários cobrados, permitindo a recuperação dos custos e a gestão do serviço sem interferência política. Em virtude da dimensão reduzida que caracteriza os PDMA, podem ser incentivadas algumas fusões, conferindo-lhes ganhos de escala. Associado a estes factores, o aspecto do não pagamento do serviço de água também se reveste de importância considerável, carecendo de intervenção. No entanto, apesar das dificuldades encontradas, as autoridades têm implementado inúmeras medidas que visam atenuar, ou até mesmo eliminar, algumas destas fragilidades. Neste âmbito, a instituição de uma entidade reguladora em Jacarta, bem como toda a estrutura de defesa dos interesses dos utilizadores associada, constitui um grande passo no sentido do desenvolvimento da qualidade do serviço de água prestado. Itália 2.11 ITÁLIA 2.11.1 ANTECEDENTES HISTÓRICOS A Itália (Italia) é uma república democrática. A Constituição italiana de 1948 estabeleceu um parlamento bicameral, que consiste numa Câmara de Deputados (Camera dei Deputati) e num Senado (Senato della Repubblica), e um sistema executivo composto por um Conselho de Ministros (Consiglio dei ministri), liderado pelo primeiro-ministro (Presidente del consiglio dei ministri). O presidente da República (Presidente della Repubblica) é eleito pelo parlamento para mandatos de sete anos de duração, juntamente com um certo número de delegados regionais. O presidente escolhe o primeiroministro, e este propõe os seus ministros, que são aprovados pelo presidente. Em 2007, o país tinha uma população próxima de 59 milhões de habitantes, distribuída por 301 333 km2. A sua administração processa-se a três níveis organizacionais: 20 regiões (regioni), cerca de 100 províncias (province) e mais de 8.000 municípios (comuni). Todavia, cinco das vinte regiões referidas possuem um estatuto especial (Friuli-Venezia Giulia, Sardenha, Sicília, Trentino-Alto Ádige e Vale de Aosta), que lhes garante maior autonomia para legislar sobre diversas matérias que não sejam de monopólio estatal. Esta especificidade deve-se a razões culturais, linguísticas e geográficas. Historicamente, os municípios, como sucede na maioria dos países europeus, são os principais responsáveis pela prestação dos SAS. No entanto, o Governo italiano, com o intuito de conferir maior auto-sustentabilidade ao sector da água e, por conseguinte, maior robustez, iniciou um processo de reorganização relativo ao nível da responsabilidade local do sector. Esta reforma teve início na publicação da Lei n.º 36, de 1994, usualmente denominada de Lei de Galli (nome do primeiro membro do Parlamento italiano que assinou a proposta de lei), assente nos seguintes pilares: a) a criação dos serviços de água integrados, englobando os serviços de captação, tratamento e distribuição da água para consumo humano e de recolha, drenagem e tratamento de águas residuais, excluindo as redes de águas pluviais; b) a definição das Áreas Territoriais Óptimas (Ambito Territoriale Ottimale - ATO), baseada em critérios hidrográficos e político-administrativos; c) a identificação da forma de cooperação entre as autoridades locais, de modo a formarem o órgão da Autoridade das Áreas Territoriais Óptimas (Autorità di Ambito Territoriale Ottimale - AATO) e da respectiva forma organizacional de gestão; d) o planeamento e controlo da gestão dos serviços de uma forma integrada; e) a introdução de um sistema tarifário que repercutisse sobre os utilizadores a totalidade dos custos de operação e manutenção e de capital e que incentivasse o desempenho, e também, a definição de uma tarifa única para cada ATO e, por último, f) a criação de um órgão governamental que supervisionasse a referida reforma e a sua implementação, o COVIRI (Comitato di vigilanza sull’uso delle risorse idriche), estabelecido dentro do Ministério do Ambiente (Ministero dell’Ambiente e della Tutela del Territorio e del Mare). Todavia, volvidos mais de treze anos desde a publicação da Lei de Galli, a reforma ainda não está concluída, verificando-se que, num número relevante de ATO, os processos de delegação da sua gestão estão por finalizar. Em Itália, a primeira lei desenvolvida no âmbito do sector da água foi proclamada em meados do século XIX, pretendendo ordenar os usos da água (Lei n.º 2248, de 1865). Esta lei definia o processo de autorização dos usos da água, procurando proteger as terras e a população da água, através de obras hidráulicas. Posteriormente, a Lei n.º 129, de 1963 foi considerada a primeira tentativa de regulamentar 183 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional o planeamento dos recursos hídricos em Itália, definindo um plano nacional da água e dividindo o país em diferentes distritos de água, em função dos níveis administrativos e de factores históricos, antecipando-se nessa altura que correspondessem à escala futura dos serviços de água. A segunda tentativa começou com a reforma do Estado e a transferência de funções para as regiões, abrindo o caminho do reforço dos níveis locais e da primeira política de protecção dos recursos hídricos. Os municípios permanecem como os principais responsáveis pela organização do serviço, observando-se, no entanto, uma maior participação das regiões ao nível legislativo nacional e de gestão da água a nível local. Este processo teve início em 1972, mas foi realmente implementado mais tarde, permanecendo em evolução (Lei n.º 112, de 1999). As obras hidráulicas de menor dimensão e a autorização de concessões foram transferidas para as competências das regiões e, em 1977, através da Lei n.º 616, a gestão da água. Esta transferência de competências foi também perceptível na tarifação. O regime de preços em Itália encontrava-se sob o controlo de uma única autoridade, desde 1944, com a criação do Comitato Interministeriale Prezzi (CIP). Em 1974, o papel da CIP foi transferido para o nível provincial para o Comitato Provinciale Prezzi (CPP). Este organismo tinha como objectivo aproximar os preços aos custos reais do serviço associados a cada região. Porém, em 1984, o aumento das tarifas foi limitado como medida de contenção da inflação. Entre 1987 e 1990, a Lei das Finanças autorizou o desrespeito pela regra referida, a fim de recuperar, pelo menos, 60% dos custos com o sistema tarifário. Todavia, os operadores dos SAS não poderiam usufruir de lucros e as regras de tarifação não eram simples nem transparentes. O comité provincial desapareceu em 1994 e a medida transitória tornou-se oficial, antes da implementação da reforma, que teve início nesse ano. No que diz respeito à protecção dos recursos hídricos, o ano de 1976 foi um ano de mudanças relevantes na política da água em Itália. Anteriormente, a água era considerada um bem passível de ser explorado, mas a partir dessa data tornou-se num bem protegido. A Lei de Merli (Lei n.º 319, de 1976) foi a primeira lei importante no âmbito da poluição de água, introduzindo normas para a descarga de águas residuais e um planeamento para o uso e protecção dos recursos hídricos. A lei foi também concebida para introduzir critérios gerais, visando a gestão dos usos da água, por parte dos SAS, e o estabelecimento de indica184 dores relativos à quantidade e qualidade dos recursos hídricos. Nesta conjuntura, as regiões e os municípios são responsáveis pelo controlo, planeamento e organização das actividades relativas ao sector da água a nível local. A Lei n.º 183, de 1989, aprofundou o enquadramento regulatório da água, definindo a bacia hidrográfica como a unidade adequada para a gestão integrada da água, liderada pelas Autoridades da Água, onde Estado e regiões participam, e introduziu o plano de bacia hidrográfica que deverá regulamentar, entre outras actividades, as captações. O território italiano encontra-se dividido em onze bacias hidrográficas nacionais, geridas por seis Autoridades das bacias nacionais, por 18 bacias inter-regionais (envolvendo regiões e a administração estatal) e por diversas bacias regionais, cuja gestão se encontra delegada às regiões. Esta lei introduz o Piano di Bacino, um instrumento legal que define à escala da bacia, orientações de valorização, protecção e gestão equilibrada da água, de âmbito territorial. A Lei n.º 142, de 1990, estabeleceu que os municípios (e províncias) seriam dotados com atribuições relativas à gestão dos serviços públicos locais. Desde 1994, existe uma consequente reorganização dos SAS e um reforço das políticas da água. Em 1994, a reorganização global destes serviços iniciou-se com a referida Lei de Galli. Esta lei introduziu um novo nível de gestão dos SAS, que se designa por perímetro ou área de gestão óptima (ATO). Dentro da ATO, um operador gere simultaneamente os SAS e todas as suas fileiras produtivas (Servizio idrico intergrato – SII). Finalmente, no âmbito da delegação dos SAS, introduzida pela Lei de Galli, o Decreto-Lei n.º 280, de 2001, estabelece as modalidades de gestão possíveis. Em particular, define que o procedimento das AATO na delegação da gestão do operador integrado a uma entidade privada deve ser efectuado por meio de concurso público, cuja adjudicação será efectuada à proposta economicamente mais vantajosa. No entanto, a Lei n.º 448, de 2001, (Legge finanziaria 2002) introduziu a obrigatoriedade de concursos públicos para os serviços públicos locais, mas também definiu o denominado “período de salvaguarda”, onde os mesmos podem não ser efectuados. A Lei n.º 326, de 2003, (Legge Finanziaria 2004) modificou a Lei n.º 448, de 2001, autorizando as seguintes formas organizacionais para a gestão dos SAS: delegação a entidades privadas, delegação a empresas públicas de capitais mistos ou delegação a empresas públicas de capitais dos municípios associados nos ATO Itália (empresa in-house). Nos dois primeiros casos, existirá recurso à contratação pública e no terceiro caso a empresa tem de prestar o serviço em exclusividade, não podendo participar na gestão de outros serviços. É de referir que, no passado, se verificaram algumas adjudicações sem concurso público, o que levou a UE a acusar a Itália de não respeitar as directivas sobre contratação pública. A recente legislação desenvolvida pelo governo, respectivamente, o Decreto Legislativo n.º 152, de 2006, tem como objectivo primordial a promoção do nível de qualidade de vida humana, a ser implementado através da preservação e desenvolvimento das condições e da utilização prudente e racional dos recursos naturais. Para este fim, este decreto reorganiza a coordenação e integração das matérias referidas, de acordo com os critérios e princípios da legislação em vigor, e com o ordenamento comunitário, as atribuições das regiões e das autoridades locais. As normas referidas deste decreto actuam sobre o domínio dos recursos humanos, instrumentais e financeiros previstos na legislação existente e sem alterar ou acrescentar maiores cargas sobre as finanças públicas. Este documento normativo altera formalmente a Lei de Galli e introduz mudanças ao nível das atribuições do COVIRI, alargando-lhe as atribuições aos resíduos sólidos urbanos. No domínio ambiental, produziu-se regulamentação diversa. Um dos documentos normativos mais relevantes, o Decreto-Lei n.º 152, de 1999, integra diferentes políticas de natureza ambiental, da saúde e da economia, visando a protecção dos recursos hídricos. Este documento normativo constitui o quadro legal para a protecção das águas superficiais e subterrâneas, descrevendo os objectivos ambientais gerais para prevenção e redução da poluição e colocando em prática a reorganização dos organismos com funções de controlo da poluição, procurando alcançar a melhoria do estado das águas e adaptar as protecções desses destinos a usos especiais, alcançar o uso sustentável e durável dos recursos de água, com prioridade para o uso de consumo humano, e manter a capacidade natural de limpeza dos organismos de água, a fim de proteger a fauna e a flora. Para cumprir estes objectivos, o decreto declarou que as regiões devem implementar um conjunto de medidas, para ser estabelecido no Piano di Tutela. Além desta legislação do foro federal, cada região também desenvolveu as suas respectivas leis, nos mais variados domínios. Por fim, é de referir que, nas últimas duas décadas, a regulamentação em Itália tem sido, neste domínio, determinada pela legislação comunitária. 2.11.2 ENQUADRAMENTO LEGAL E INSTITUCIONAL 2.11.2.1 Responsabilidades As responsabilidades no sector da água encontram-se repartidas entre o Ministério do Ambiente (Ministero dell’Ambiente e della Tutela del Territorio e del Mare), o Ministério da Saúde (Ministero della Salute), o Ministério das Infraestruturas (Ministero delle Infrastrutture), as regiões, a Associação dos Operadores de Energia e Água (Federazione delle imprese energetiche e idriche – Federutility), a Agência Nacional de Protecção Ambiental (Agenzia Nazionale por la Protezione dell’Ambiente - ANPA), dependente do Ministério do Ambiente, que define, por exemplo, as regras, normas e níveis de serviço para o subsector das águas residuais, a Associação Nacional de ATO (Associazione Nazionale Autorità e Enti di Ambito – ANEA) e o COVIRI, entidade com funções regulatórias relevantes a nível nacional e cujo papel será detalhado no ponto seguinte, entre outros organismos. O Ministério do Ambiente é responsável pelos SAS, fornecendo um enquadramento geral para o nível de serviço (por ex., continuidade) e regras de tarifação (método normalizado de cálculo). O Ministério das Infra-estruturas tem um papel importante na gestão das obras hidráulicas e administra os fundos comunitários que beneficiam o sector. O Ministério da Saúde é responsável pelo controlo da qualidade da água. Desde os anos 70 que as regiões têm uma preponderância política elevada em Itália. Além da intervenção efectuada na implementação da Lei de Galli, ao nível da concepção das ATO (que devem respeitar as fronteiras das bacias hidrográficas ou administrativas) e do modo de cooperação entre os municípios, fornecem e determinam o enquadramento institucional dos contratos entre as AATO e os operadores. As regiões também possuem numerosas competências no sector da água, uma vez que são responsáveis pelas bacias hidrográficas regionais (controlo da qualidade e da quantidade de água disponível) e aprovam e licenciam os respectivos usos de água, recolhendo taxas pela sua captação (por ex., águas subterrâneas). A nível regional, na sequência da criação da ANPA, em 1994, cada região de Itália foi dotada com o seu próprio ramo desta agência (Agenzia Regionale per la Protezione dell’Ambiente – ARPA), substituindo as então unidades sanitárias 185 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional locais (Unità Sanitaria Locale – USL) nos assuntos relativos às questões ambientais. A ARPA acompanha o operador no controlo da poluição pelos vários intervenientes no sector da água, como, por exemplo, as descargas de água das indústrias e de outros impactos ambientais que estas originam. As regiões são responsáveis pela implementação da Lei Galli, concebendo as fronteiras das ATO e o enquadramento para a cooperação intermunicipal, criando a estrutura e a área de jurisdição, cuja operação dos SAS será contratualizada. Na maioria dos casos, as fronteiras das ATO coincidem com as das províncias, passando estas a ser as coordenadoras dos municípios envolvidos. Em alguns casos, apenas foi concebido um ATO dentro da região (por ex., Puglia, Basilicata, Vale de Aosta e Sardegna). As principais formas de cooperação entre as autarquias são o “convenzione”, uma convenção entre os municípios, frequentemente sob coordenação de um grande município ou da província, e o “consorzio”, a criação de uma nova autoridade local dedicada aos SAS. As regiões são responsáveis por elaborar planos regionais (Piani stralcio) para a protecção dos recursos hídricos e, a partir destes, estabelecerem os limites para as descargas de águas residuais. Uma vez concluída esta etapa do enquadramento regional, a reforma pode ser implementada à escala local. A AATO é a autoridade local que organiza os SAS dentro da ATO. A AATO tem de desenvolver um plano técnico, financeiro e económico (“Piano d’Ambito”), onde se inclui uma SAS, ficando responsável pela monitorização e supervisão do operador. A ANEA é a associação nacional das AATO, sem fins lucrativos, cujos objectivos se prendem com o estudo e a discussão dos temas relativos à promoção da uniformidade da regulamentação dos SAS e pela promoção da coordenação das actividades com o Ministério do Ambiente. Os membros desta associação colaboram ao nível da partilha de experiências e debatem os assuntos-chave relacionados com o seu desenvolvimento. O seu protagonismo tem vindo a crescer progressivamente, à medida que aumenta o número de AATO no país e, por conseguinte, os seus membros. Como foi referido, o operador é escolhido pela AATO para a área geográfica de ATO, passando a ser o responsável em exclusivo pelos SAS nessa área (SII). Este operador é uma empresa de direito privado, mas a sua propriedade pode ser privada, pública ou mista. Com a pressão e natureza obrigatória da reforma do sector da água, muitos dos operadores são transformados em empresas de capitais privados. De facto, o capital dessas empresas encontra-se cada vez mais no domínio dos operadores privados. Além disso, a própria lei orçamental para o ano de 2002 estipulava que a forma estrutural eleita para a gestão dos SAS, no futuro, seria constituída pelas ditas empresas de capitais privados e que as restantes seriam a excepção. Na Figura 48 apresenta-se a organização do sector da água em Itália, resultante da implementação da Lei de Galli. Figura 48 análise do estado actual das infra-estruturas e serviços e as exigências futuras, os novos níveis de serviços pretendidos e os correspondentes investimentos para os alcançar, os aumentos mínimos de produtividade, o sistema tarifário e o método de ajuste em relação aos progressos obtidos no serviço. Após o seu desenvolvimento, a AATO pode conceder a gestão e exploração dos 186 As relações entre a AATO e a entidade gestora são reguladas por um contrato administrativo, denominado “Convenzione di affidamento”, cujo enquadramento de cada “Convenzione-tipo” é determinado por cada governo regional. A Federutility é uma associação que congrega os operadores de serviços públicos, incluindo os Itália relativos aos SAS. Concorre para a qualidade do sector, partilhando informação e contribuindo para o seu desenvolvimento. No domínio da defesa dos utilizadores, a Feder Consumatori, tem funções relevantes. Fundada em 1988, é uma organização sem fins lucrativos, cujo objectivo prioritário consiste na protecção dos interesses dos utilizadores. Por último, é de referir a Autoridade da Concorrência (Autorita Garante della Concorrenza e del Mercato), que se tem pronunciado sobre as concentrações no sector e sobre o eventual abuso de posição dominante. Também no que concerne ao respeito pelas regras da contratação pública, em particular na exigência de concurso público na escolha do parceiro privado nas empresas mistas, a Autoridade da Concorrência tem marcado a sua presença. 2.11.2.2 Regulação Em 1994, a Lei de Galli criou um comité de vigilância do sector da água (Comitato per la Vigilanza sull’uso delle Risorse Idriche - COVIRI), um órgão autónomo, mas com superintendência e tutela do Ministério do Ambiente. O papel do em preços máximos. O COVIRI foi reformulado, recentemente pelo Decreto-Lei 152, de 2006, alterando o nome para Autorità per la Vigilanza sulle Risorse Idriche e sui Rifuiti, dado que integrou nas suas atribuições os resíduos sólidos que eram da competência do Observatório dos Resíduos (Osservatorio Nazionalle sui Rifuiti), ainda que o mesmo não tenha entrado em funções efectivas. A preocupação fundamental do COVIRI, em conformidade com o estabelecido na Lei 34, de 1994, relaciona-se com o assegurar da eficiência, da eficácia e da auto-sustentabilidade dos operadores dos SAS. O Comité pode propor acções contra os operadores se for violado algum dos princípios referidos na Lei de Galli, ou mesmo contra os seus administradores na defesa dos direitos e interesses dos utilizadores. Em Itália, o processo regulatório do sector da água compreende diferentes níveis: o Ministério do Ambiente, através das propostas do COVIRI, sobretudo relativo ao sistema tarifário nacional; as regiões, que estabelecem uma minuta de contrato e, finalmente, as AATO ao deterem a competência de garantir, controlar e definir as tarifas dentro da sua jurisdição, bem como de controlar e supervisionar a qualidade do serviço e os compromissos assumidos contratualmente. A Figura 49 apresenta o esquema regulatório Figura 49 Enquadramento regulatório dos SAS em Itália (A) (B) Definição das minutas dos contratos e das regras regulatórias; Monitorização, isto é recolha e análise da informação sobre o desempenho; COVIRI nunca foi claro desde o início e, por isso, esteve sempre envolto em polémica. Além de atribuições relativas à observação dos princípios da lei sobre a reforma do sector da água, o comité deve regular a determinação e a adaptação das tarifas e a protecção dos interesses dos utilizadores. A questão mais problemática tem sido a fórmula de estabelecimento de tarifas baseada (C) (D) (E) Verificação do cumprimento das regras em vigor; Interpretação e aplicação das regras; Julgamento dos recursos contra as decisões tomadas em (D) que é desenvolvido no sector da água em Itália. No âmbito da regulação económica, as valências do comité resumem-se à proposta dos critérios de determinação de tarifas pela utilização do método normalizado de limite de preços e o governo, mais especificamente o Ministério do Ambiente, aprova-o. Os operadores, desde que 187 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional em conformidade com a lei, decidem e aprovam as tarifas nas diferentes áreas do país. A Federutility, como associação do sector, possui também atribuições na actividade regulatória, ainda que de auto-regulação. A disseminação das boas práticas entre os seus associados revela-se como actividade importante na proliferação das preocupações relativas à melhoria da qualidade do serviço e da sustentabilidade económica e ambiental dos operadores dos SAS. A ANEA tem também funções similares. 2.11.3 ESTRUTURA DO MERCADO 2.11.3.1 Propriedade e gestão de serviços Os SAS em Itália eram, no passado, maioritariamente fornecidos por operadores públicos. Com a implementação da Lei de Galli e com a constituição de 91 ATO, ocorreu uma proliferação e uma tendência crescente para a presença do sector privado na prestação destes serviços. Apesar dos contratos estabelecidos com os operadores públicos, as infra-estruturas e instalações permanecem sempre sob propriedade pública. De 57 dos 91 ATO previstos em operacionalização em 2006, 13 são públicos (in house), 11 são privados e 33 eram empresas de capitais mistos, ainda que com capital maioritariamente público. Não se sabe à data, com rigor, a participação do sector privado em Itália, estimando-se que o mesmo directamente envolverá um pouco mais de 10%, mas que indirectamente (através de empresas de capitais mistos) atingirá mais do que 50%. No entanto, o sector privado em Itália compreende a presença das maiores empresas multinacionais, nomeadamente, a Veolia (nas regiões de Sicília, Calábria, Latina, Piemonte, Ligúria e Toscânia), o Grupo Suez (Toscânia), a Aqualia do Grupo FCC (nas regiões de Sicília e Calábria) e a Saur que, entretanto, vendeu a sua posição à ACEA (Sicília e Campânia), bem como as grandes empresas italianas, quer do sector da água (ACEA) quer de outras utilities (IREDO e HERA) ou empresas de outras áreas conexas ou não (por ex., construção). 2.11.3.2 Players do sector O sector da água compreendia, até à implementação das ATO, 3.704 operadores dos serviços de água e 4.278 operadores do serviço de águas 188 residuais, sendo que a maior percentagem destes operadores era prestada por gestão directa do município. É de notar que estes dados não eram estritamente desagregados, uma vez que se constatava a existência de operadores que forneciam ambos os serviços. Todavia, com a reorganização e quando forem realmente concretizadas, as reformas oriundas da Lei n.º 36,de 1994, e da Lei n.º 152, de 2006, os SAS passam a ser geridos por 91 operadores, exactamente o número de ATO que existe no país. A maioria destes operadores tem capitais mistos (com maioria pública), enquanto os operadores totalmente públicos ou totalmente privados existem em número relativamente equilibrado, mas em número muito inferior às empresas de capitais mistos. Por exemplo, em Roma, à ACEA (Suez com 8,6% das acções, 51% na posse do município de Roma e o restante disperso em bolsa) foi adjudicado um contrato de 30 anos. Globalmente, a ACEA fornece os SAS a cerca de 7 milhões de habitantes, ou seja 14% da população italiana, representando o maior operador do sector da água em Itália. As empresas do Grupo operam directa e indirectamente a gestão integrada dos SAS nas regiões de Ligúria, Toscânia e Lázio (Roma e Frosinone). Além da sua presença na estrutura accionista da ACEA, a Suez detém capitais na Acque Spa, na Acque Toscane em Fiesole, na Montecatini Terme e Ponte Buggianese, na Acquedotto del Fiora, na Nuove Acque em Arezzo e, por último, na Publiacqua, todas na região de Toscânia. No total, estas empresas representam o fornecimento dos SAS a cerca de 2,7 milhões de habitantes na região Toscânia, isto é, 75% da população que habita a região. Outras grandes multinacionais, como a Veolia e a Aqualia (FCC), também têm uma presença relevante no sector da água em Itália. A Veolia possui capitais em empresas que se dividem por 38 municípios da ATO Latina, fornecendo os serviços a cerca de 600 mil habitantes, e também em regiões como Ligúria, Vêneto, Piemonte, Emília-Romanha e Sicília, através das empresas Acqualatina, Genova Acque, SIBA e Siciliacque. Só a Siciliacque fornece os SAS a 1,5 milhões de habitantes. A Aqualia, por sua vez, está presente em empresas que operam os serviços na Sicília e na Calábria, como o operador de Caltanisseta, prestando os SAS a 700 mil habitantes. Outro player importante é o Grupo HERA, com actividades nos domínios da energia, da água e dos resíduos sólidos, gerindo os SAS em cerca de 400 municípios na região de Emília-Romanha, através de sete empresas territoriais (Hera Bo- Itália logna, Hera Ferrara, Hera Ravenna, Hera Rimini, Hera Modena, Hera Forlì-Cesena e Hera ImolaFaenza). Neste âmbito, a empresa fornece os SAS a cerca de 1 milhão de habitantes. A operadora multiutility IRIDE, que recentemente adquiriu a empresa AMGA Génova, fornece os SAS a cerca de 915 000 habitantes, através das empresas Acque, AMTER e IDRO-TIGULLIO, ambas na região de Ligúria. Existem outros players do sector da água que têm posições relevantes nos AATO que englobam entidades financeiras e empresas de construção e de outros serviços. 2.11.3.3 Integração do sector e serviços oferecidos Como referido anteriormente, os SAS eram, no passado, maioritariamente promovidos pelo sector público e, em particular, pelos municípios. Com a reestruturação do sector da água, os operadores passam a prestar o serviço de uma forma integrada, quer vertical quer horizontalmente, na área de jurisdição do ATO, na qual existe um único operador compreendendo todo o ciclo da água. Os operadores privados ou públicos presentes no sector da água integram por vezes outros serviços, como o da electricidade ou o do gás. Um caso de particular destaque refere-se ao operador da cidade de Roma, a ACEA, que é responsável pelo abastecimento de água, pelo saneamento de águas residuais, pelo serviço de electricidade, iluminação pública e aquecimento. Outro exemplo diz respeito à AMGA Génova que foi adquirida pelo Grupo IRIDE em 2006, com valências nos sectores da água, da electricidade e do gás. 2.11.3.4 Números do sector Em Itália, o sector da água caracteriza-se por uma captação anual na ordem de 7,6 mil milhões de m3 de água para fins de consumo público. A sua fonte encontra-se igualmente repartida entre a água subterrânea e a água superficial, sendo que nesta última, 35% de água é proveniente de nascentes. O consumo doméstico representa, aproximadamente, 65% de toda a produção de água para consumo público. Estima-se que a capitação de água de abastecimento dos italianos corresponda a um valor de cerca de 230 litros por habitante e por dia. Estima-se que o volume de água não facturado represente cerca de 40% do volume de água produzido. No ano de 2007, o nível de atendimento do serviço de água era cerca de 96%, enquanto para o serviço de águas residuais era de, aproximadamente, 84%. Os sistemas de águas residuais são tendencialmente separativos, existindo ainda uma percentagem relevante de sistemas unitários. Em 2002, estimava-se que os sistemas unitários seriam ainda cerca de 70% do total. No entanto, dentro das águas residuais recolhidas e drenadas, somente 74,8% são tratadas por ETAR. No ano de 2004, os operadores dos SAS obtiveram uma receita total de cerca de 4,2 mil milhões de euros. Referente ao mesmo ano, o sector da água recebeu investimentos de 1,5 mil milhões de euros. Na Figura 50 apresentase a tendência decrescente dos investimentos, ao Figura 50 Investimentos nos SAS em Itália 189 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional longo dos anos, por parte dos governos no sector da água (Danesi et al., 2007). Quadro 64 Sistemas tarifários dos SAS de três cidades em Itália Em 2001, o sector da água em Itália empregava cerca de 64 000 funcionários (Danesi et al., 2007), tendo-se verificado um aumento de 8.000 funcionários nos últimos cinco anos. Um estudo com elementos mais recentes (2005), ainda que baseados numa amostra de 25% da totalidade dos ATO, permite extrapolar uma redução muito significativa do número de funcionários com a reestruturação do sector da água em Itália. Este estudo estimava uma média de 378 funcionários por cada ATO (FraÁgua (€/200 m3) Águas residuais (€/200 m3) Parcela fixa Parcela variável Recolha e drenagem Tratamento Bolonha 6,2 128,3 17,8 50,3 Palermo 25,1 91,5 15,0 41,8 Roma 7,7 49,0 17,8 51,0 quelli, 2005), o que corresponderia a cerca de 35 000 funcionários para todo o sector da água em Itália. 2.11.4 REGRAS DO JOGO 2.11.4.1 Estabelecimento de tarifas O sistema tarifário, usualmente praticado pelos operadores, caracteriza-se pelo sistema bipartido para o serviço de água, baseado numa parcela fixa, em função do calibre do contador ou da propriedade, cobrada a todos os utilizadores e numa parcela variável, em função do consumo Quadro 65 Sistema tarifário da L’Acquedotto Pugliese para o ano de 2008 Serviço Sobre os sistemas tarifários, os utilizadores têm ainda de pagar o IVA que, em Itália, tem um valor de 10%. É de referir que são ainda cobradas outras parcelas por serviços prestados, algumas delas em valores fixos anuais como a manutenção das bocas-de-incêndio. A reutilização de água também é sujeita a uma tarifa especial. Os utilizadores, consoante a sua natureza, são sujeitos a diferentes sistemas tarifários. Nos utilizadores domésticos existe, frequentemente, a separação entre utilizadores domésticos residentes e não residentes. É de referir que, neste âmbito, se observa subsidiação cruzada entre os utilizadores no sector da água em Itália, dado que, quase sempre, são cobradas tarifas consideravelmente superiores aos maiores utilizadores e consoante a sua natureza. O Quadro 65 expõe o sistema tariTarifa (€/m3) Água Parcela fixa (em função do contador) 190 e dividida em escalões. Esta parcela variável é, usualmente, crescente com o consumo. Existem, normalmente, cinco escalões para os utilizadores domésticos, a saber, um reduzido, outro básico e mais três referentes a consumos mais elevados. Por vezes, estes dependem ainda da dimensão do agregado familiar. Em relação ao saneamento de águas residuais, por norma, existe apenas uma parcela variável para a drenagem e outra para o tratamento. Com frequência, o tarifário para este serviço compreende um escalão único. No Quadro 64 evidenciam-se os encargos com os SAS para os utilizadores domésticos para três cidades italianas (ano de 2005). 11,11 – 121,62 (€) Tarifa reduzida (0-73 m3) 0,419 Tarifa base (73 – 101 m3) 0,499 1.º Escalão (101 – 146 m3) 0,873 2.º Escalão (146 – 256 m3) 1,346 3.º Escalão (>256 m3) 1,669 Saneamento de águas residuais 0,091 Tratamento de águas residuais 0,264 Itália fário implementado pela L’Acquedotto Pugliese, empresa que presta serviços à região de Bari. o custo de exploração é limitado a um tecto máximo de 30%, salvo autorização da Média Mínimo Máximo Antes da reforma (2002) 1,01 0,58 1,52 Depois da reforma (2003) 1,23 0,85 1,83 Antes da reforma (2002) 202,59 115,84 304,66 Depois da reforma (2003) 245,51 169,27 365,52 Quadro 66 Tarifas e factura do serviço de água em Itália Tarifa (€/m3) Factura da água (€/ano) Segundo o COVIRI, os SAS representam, em média, um custo de cerca de 250 euros anuais sobre os utilizadores domésticos, correspondendo a uma tarifa média de 1,23 €/m3. No Quadro 66, apresenta-se a variação das tarifas em Itália com a reforma dos SAS (Danesi et al., 2007). O recurso ao sistema tarifário é considerado o principal instrumento para assegurar a viabilidade económica e financeira dos operadores dos SAS, o qual prevê a recuperação integral dos preços, como é sustentado pelo art. n.º 13, da Lei n.º 36, de 1994. Outro objectivo associado à implementação da Lei de Galli, simultaneamente relacionado com a instituição das ATO, consiste na definição dos critérios para o estabelecimento dos sistemas tarifários, segundo regras muito claras, cuja base é o plano de investimentos em cada ATO. Os SAS têm sido, ao longo do tempo, muito subsidiados pelos vários níveis de governo. Até à Lei de Galli, os responsáveis dos municípios propunham as tarifas, que eram aprovadas pelas Comissões de Preços Regionais e, posteriormente, pela Comissão Nacional de Preços (CNP). A preocupação incidia em repor o efeito da inflação e não na recuperação dos custos, os quais se foram tornando cada vez maiores, obrigando a subsídios também mais elevados. Em 1991, a CNP, influenciada pelo processo regulatório da OFWAT, decidiu impor um regime de preços que desse outro tipo de incentivos aos operadores, baseado na regulação por limite de preços. A Lei de Galli permitiu essa reforma ao atribuir ao regulador, por si criado, essa função. Em 1996, a COVIRI estabeleceu (Decreto 1/8) um novo sistema de fixação de tarifas, assente na expressão seguinte, baseada na Tarifa Real Média (TRM) determinada pela regulação por limite de receitas. Nesta, COVIRI, além do valor teórico obtido pela fórmula: Tn = (C + A + R)n-1 × (1 + ∏ + k) onde: T é a tarifa do ano a determinar; C corresponde ao custo de exploração do ano anterior (obtido através de fórmulas de regressão estatística definidas em Decreto); A representa as amortizações; R diz respeito à remuneração do capital investido (valor regulamentado fixo de 7%); ∏ é a taxa de inflação esperada para o ano a regular; K é o limite dos preços. A fórmula de cálculo de todos os parâmetros está normalizada no Decreto. O limite de preço K foi definido como um índice percentual, que as autoridades locais possam utilizar na adaptação dos níveis de tarifa média de ano para ano, em que K não pode exceder determinados valores, dependendo do nível tarifário do ano operacional anterior. Neste método, estabelece-se a TRM, segundo a expressão TRM x VE = T, onde o TRM será o valor da tarifa real média, o VE é o volume de água abastecido e o T corresponde às receitas totais obtidas pela expressão. O sistema tarifário é revisto a cada cinco anos. Em 2002, o COVIRI propôs a revisão deste modelo regulatório ainda mantendo toda a sua estrutura e metodologia processual (fórmula de limite de preços), sustentando alguns problemas detectados com a sua aplicação, como a não inclusão da renda na estrutura de 191 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional custos, a não actualização de alguns valores ao ano corrente, a articulação tarifária e o mecanismo de revisão e controlo (Alpaos e Valbonesi, 2008). 2.11.4.2 Qualidade do serviço No que diz respeito à qualidade da água, a situação vivida no seio do país é variável, mas tem melhorado substancialmente nos últimos anos. Dado a es- inserem-se num único grupo de indicadores do foro económico-financeiro. Outras entidades como a Federutility e as próprias regiões e operadores têm desenvolvido actividades de benchmarking, sobretudo baseadas em indicadores de desempenho e benchmarking métrico. Na Figura 51 ilustra-se o indicador perdas de água por região integrado num exercício de benchmarking desenvolvido pelo operador HERA para o ano de 2004 (HERA, 2005). Figura 51 Indicador perdas de água a nível regional em Itália trutura geográfica do país, há muitas áreas que são mais vulneráveis à poluição (por ex., nutrientes), em particular os grandes lagos e a parte superior do mar Adriático, que abrangem a parte mais industrializada e com mais população do país. No âmbito de uma maior eficácia no cumprimento do seu objectivo principal, a defesa do utilizador, em 2006, o COVIRI propôs ao Ministério do Ambiente o início do desenvolvimento de benchmarking entre os operadores dos SAS. Esta proposta englobava o desenvolvimento de um conjunto de 55 indicadores de desempenho. Estes indicadores do serviço de água encontram-se subdivididos em três grupos, 19 indicadores técnicos, 18 indicadores de gestão e 18 indicadores económico-financeiros. Por sua vez, o grupo dos indicadores técnicos subdivide-se em indicadores relativos à cobertura dos serviços (3), às características dos SAS (1), ao fornecimento de serviços e à sua qualidade (10) e às características das infraestruturas (5). O grupo de indicadores de gestão subdivide-se em indicadores de natureza administrativa (2), relativos à interacção com o utilizador (4), de garantia de serviço (2) e relacionados com o serviço de manutenção (10). Por último, os restantes 18 indicadores 192 Um dos objectivos da reforma do sector da água foi a melhoria da qualidade do serviço. Neste domínio, cada AATO teria de definir uma carta de compromisso onde estabelecia, por um lado, as obrigações de serviço público que serão analisadas de seguida e, por outro lado, um compromisso relativamente aos níveis de serviço a praticar. O próprio plano de investimentos deve considerar os níveis de serviço projectados e pretendidos que devem ser incluídos no estudo económico e financeiro. Esta imposição da Lei de Galli tem vindo a traduzir-se numa melhoria substancial da qualidade do serviço em quase todos os indicadores, com uma maior e melhor responsabilização e maior transparência. O Quadro 67 apresenta a carta de compromisso da empresa de ACEA, operador de Roma. 2.11.4.3 Obrigações de serviço público A legislação em vigor, nomeadamente a Lei 36/1994, institui aos operadores dos SAS a garantia do fornecimento de um serviço adequado às necessidades dos utilizadores (adaptabilidade) e a custos razoáveis (acessibilidade), num contexto de acordo com os Itália Serviço de água Leitura de contadores Pelo menos uma vez por ano Factura Pelo menos duas vezes por ano Piquete 24 horas Recuperação do serviço em caso de manutenção programada Em 24 horas Aviso antecipado da intervenção no caso de manutenção programada Em 24 horas Falha do contador ou outro equipamento à superfície: Tempo da primeira intervenção 72 horas Falha das infra-estruturas enterradas ou equipamento: Tempo da primeira intervenção 72 horas Reposição do serviço: Tempo máximo de recepção da notificação 72 horas Ligação do abastecimento ou mudança de contador onde já existe rede Activação 9 dias Ligação do abastecimento ou mudança de contador onde não existe rede Estimação 30 dias Execução do trabalho 45 dias Autorização ao utilizador 9 dias Verificação do contador 20 dias Reposição do contador irregular 20 dias Verificação do contador em contraditório 30 dias Verificação do nível de pressão 20 dias Término do contrato pelo utilizador 15 dias Situações de atraso de pagamento Restabelecimento após pagamento No dia seguinte Resolução da factura errada 30 dias Tempo de espera Tempo médio 30 minutos Tempo máximo 90 minutos Resposta a reclamações escritas 30 dias Serviço de águas residuais Continuidade e regularidade do serviço 24 horas Falha ou obstrução do colector subterrâneo ou canal - Tempo máximo 72 horas Limpeza e varrimento como resultado de inundações - Tempo máximo 72 horas requisitos de protecção ambiental nacionais e comunitários. Além disso, a regulamentação também intenta introduzir o conceito de serviceability entre os operadores, de modo a incentivar os mesmos à não degradação das suas infra-estruturas e a uma gestão de activos adequada. A regulamentação vigente (D.P.C.M., de 4 de Março de 1996) também define obrigações de serviço público mais específicas, designadamente sobre o nível mínimo de fornecimento do serviço (Livelli Minimi di Servizio). Estas imposições incorrem sobre as capitações e volumes fornecidos, qualidade de água para consu- Quadro 67 Carta de compromissos da empresa ACEA 193 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional mo humano fornecida, controlos de qualidade e qualidade da organização do serviço. Estão também previstas penalidades, quando alguns dos compromissos dos operadores não são respeitados por sua responsabilidade. O sector da água em Itália congratula-se com uma grande preocupação social ao nível do estabelecimento de tarifas, onde para as famílias numerosas, alguns operadores locais modificaram a estrutura tarifária crescente em função do nível de consumo. Este pagamento é exercido com a taxa básica ou reduzida. Outros operadores fixam as percentagens de redução das tarifas aplicadas aos utilizadores mais carenciados. Estas famílias têm de se submeter a uma série de provas para serem elegíveis e beneficiarem destas vantagens. O atraso do não pagamento, assim como o desligamento dos serviços, está regulamentado. Dentro do sistema regulatório, os operadores são obrigados a fornecer regularmente informação à AATO, no âmbito do sistema e processo de compilação de informação de dados relativos ao sector da água. Todos os operadores detêm cartas de serviços, onde são estipuladas as suas obrigações para com os utilizadores [vide, por exemplo, a Acque Toscane, no município de Montecatini Terme (região de Toscânia), ou a Publiacqua, também na região de Toscânia]. 194 2.11.5 DESEMPENHO O modelo de reestruturação do sector da água em Itália, não obstante o atraso ocorrido e toda a polémica gerada, tem produzido bons resultados. Embora sejam muito criticados, principalmente pelos profissionais do sector da água, os resultados, tanto ao nível dos ganhos de escala (passagem de uns milhares de operadores para 91 AATO) como da melhoria da qualidade do serviço, têm provado o seu sucesso. As sustentabilidades económica e financeira, e mesmo ambiental, estão agora mais próximas de alcançar, com uma das melhores relações preço versus qualidade do sector da água da Europa. Como aspectos menos conseguidos, para além da duração da implementação da reforma que ainda não está concluída, apontam-se a escolha de operadores de natureza privada sem concurso público, a falta de sanções para o incumprimento das normas de qualidade do serviço assumidas, a subsidiação cruzada entre serviços e utilizadores nos sistemas tarifários e a falta de independência e de instrumentos de actuação do regulador nacional. A fórmula de regulação por limite de preços não é perfeita, podendo causar algumas injustiças e, por isso, pode ser melhorada, embora constitua, apesar de tudo, um passo importante que deve ser valorizado. Moçambique 2.12 MOÇAMBIQUE 2.12.1 ANTECEDENTES HISTÓRICOS últimos tenham sido recriados em 1986. Neste âmbito, desde 1995, observou-se uma evolução significativa com a criação de novos distritos e municípios, para além da reintrodução dos postos administrativos, extintos em 1975. Moçambique é uma república presidencialista, onde o governo é indicado pelo partido político com maioria parlamentar. Em termos administrativos, Moçambique encontra-se dividido em províncias e estas em distritos que, por sua vez, se decompõem em postos administrativos e estes, por fim, em localidades, o nível mais baixo de representação do Estado central. Numa conjuntura socioeconómica bastante precária, aliada à seca constante com que o país se depara e as acções negativas de forças extrínsecas (por ex., inundações), o Governo moçambicano, desde 1986, tem vindo a empenhar-se num programa de reestruturação do sector da água, com vista ao seu financiamento, particularmente, oriundo do Banco Mundial. Como consequência, o processo de privatização passou a ser um dado adquirido, tendo-se iniciado em 1989. Em 1999, com a entrada da SAUR e da Águas de Portugal (AdP) no mercado de água moçambicano, concretizou-se a opção pela privatização. Moçambique, com uma área aproximada de 801,6 mil km2 e uma população de 21,4 milhões de habitantes, encontra-se dividido em onze províncias, incluindo a cidade de Maputo, que tem estatuto de província e governador provincial. Contudo, é muito frequente, mesmo oficialmente, referir-se que Moçambique tem apenas dez províncias, dado que não é efectuada a separação entre a cidade e a província de Maputo. As províncias são administradas por governadores, nomeados pelo presidente da República. A estas divisões juntaram-se, desde 1998, 33 autarquias locais, denominadas municípios [as 23 cidades mais uma vila em cada província, excepto Maputo (cidade) que apenas tem uma unidade administrativa, o município e a cidade com o mesmo nome]. Além disso, Moçambique encontra-se também escalonado em 128 distritos. Com a independência nacional, a divisão administrativa sofreu algumas alterações, tanto em termos de nomenclatura dos níveis como das unidades administrativas, regressando muitas delas a nomes anteriores com origens locais e tendo sido removidas as conotações coloniais. Houve, porém, uma certa continuidade quanto à divisão territorial propriamente dita, pois os distritos coloniais passaram a designar-se por províncias, os concelhos e circunscrições passaram a denominar-se de distritos e os postos passaram a designar-se por localidades, ainda que estes Neste contexto, o governo, principalmente no final do séc. XX, desenvolveu um conjunto de leis que visam não só a protecção dos recursos hídricos, mas também toda a gestão da água e a sua utilização sustentável. Assim, a Lei da Água n.º 16, de 1991, surge como instrumento fundamental para a satisfação de interesses do povo moçambicano. Esta lei determina que os recursos hídricos pertencem ao domínio público, estabelece os princípios gerais da gestão da água, a necessidade de inventariação de todos os recursos hídricos existentes no país, o regime geral da sua utilização, as respectivas prioridades a ter em conta, os direitos gerais dos utilizadores e as obrigações correspondentes, entre outros. Embora se tenham verificado bastantes progressos no sector da água desde a independência, o nível de serviço e o nível de atendimento permaneciam aquém do desejável, nomeadamente, mediante o estado deplorável das infra-estruturas, que fazia prever o seu fim de vida muito em breve, a percentagem elevada de população que não tinha acesso a um regular serviço de água e a população urbana, com acesso a água ca195 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional nalizada, que dispunha de um serviço irregular e de baixa qualidade. Nas áreas rurais, e nos casos onde se encontravam instaladas bombas manuais, era ainda mais difícil manter a sua operacionalidade. Relativamente ao saneamento de águas residuais, a situação era mesmo mais crítica. Neste sentido, o Governo de Moçambique reformou o sector da água através da Política Nacional de Águas de 1995, focalizada em diferentes condições e áreas de actuação, a saber, o abastecimento urbano, periurbano e rural, a gestão integrada de recursos hídricos e o saneamento de águas residuais, bem como os respectivos objectivos e correspondentes custos. A Política Nacional da Água também estabeleceu orientações para a privatização dos serviços de água urbanos. Dois anos mais tarde, o Governo de Moçambique e o Banco Mundial delinearam, em conjunto, o primeiro Programa Nacional de Desenvolvimento da Água (PNDA I), que incluiu, entre outros projectos, a preparação da participação do sector privado no fornecimento dos SAS. O governo estabeleceu um contrato de exploração por 15 anos para Maputo e um contrato por 5 anos para as cidades da Beira, Quelimane, Nampula e Pemba. Com o desenrolar dos acontecimentos, houve necessidade de implementar um novo plano, o que ocorreu em 1999, o PNDA II, orçado em 79 milhões de euros e vocacionado para a realização de investimentos em infra-estruturas. O PNDA II foi especificamente concebido para implementar a participação do sector privado, através de contratos de concessão, de arrendamento ou de gestão. O Quadro da Gestão Delegada (QGD) foi estabelecido em 1998 através da aprovação do Decreto n.º 72. Este diploma definiu o enquadramento legal para a gestão delegada e criou novas entidades no sector, embora a sua implementação apenas tenha ocorrido, efectivamente, cerca de um ano mais tarde. A institucionalização do QGD teve como objectivos garantir a eficiência da gestão dos SAS e responder às necessidades de planificação e de desenvolvimento do sector, assim como a execução das políticas e a realização dos objectivos e dos parâmetros definidos na Política Nacional da Água. O QGD promove a diferenciação de funções, sendo que certas actividades são realizadas em conformidade com critérios mais economicistas, como são exemplos aquelas desenvolvidas pelo FIPAG, e algumas decisões são mais técnicas, imparciais e normalizadas, como as referentes às atribuições do Conselho de Regulação do Abastecimento de Água (CRA). O QGD considera ainda um envolvimento crescente das autarquias e que as articulações institucionais acomodem esta transição gradual, em particular, na tomada de decisões sobre o desenvolvimento de infra-estruturas e os investimentos públicos. 196 É de salientar que, embora seja uma autoridade independente, o CRA não actua de forma isolada, mas em interacção com as entidades internas e externas que constituem o QGD e que influenciam e determinam o sucesso das respectivas actividades, contribuindo para o resultado final pretendido, isto é, fazer cumprir os objectivos definidos na institucionalização do QGD e da sua integração como um todo. A criação do CRA, pelo Decreto 74, de 23 de Dezembro de 1998, suscitou paralelamente a criação de um regulamento específico para o fornecimento do abastecimento de água, nomeadamente o Regulamento de Qualidade de Água para Consumo Humano em 2004, padronizando os níveis mínimos requeridos de qualidade de água para consumo humano. Por último, o desenvolvimento da Política das Águas de 2007 teve como objectivo a promoção da utilização adequada dos recursos hídricos, garantindo o seu aproveitamento sustentável. Além disso, este marco promove a garantia de uma boa qualidade do meio ambiente, incentivando a prevenção da poluição dos recursos hídricos e a procura de um equilíbrio para o conjunto dos utilizadores, nos casos de usos múltiplos e conflituosos das águas de domínio público. 2.12.2 ENQUADRAMENTO LEGAL E INSTITUCIONAL 2.12.2.1 Responsabilidades As responsabilidades sobre o sector da água encontram-se delegadas em diversos intervenientes, nomeadamente, o Ministério das Obras Públicas e Habitação (MOPH), por intermédio da Direcção Nacional da Água (DNA), o CRA, o Fundo de Investimento e Património do Abastecimento de Água (FIPAG), o Ministério da Saúde, através da Direcção Nacional de Saúde (DNS) e as Administrações Regionais de Águas (ARA). As ARA são instituições públicas com personalidade jurídica, tuteladas pelo MOPH, através da DNA. Neste âmbito, as ARA possuem a responsabilidade da gestão operacional dos recursos hídricos, organizada na base de bacias hidrográficas. A DNA tem atribuições de definir políticas, planificar estrategicamente o sector da água, promover o desenvolvimento geral do abastecimento de água e de saneamento de águas residuais, coordenar os diferentes actores do sector, regular e produzir normas técni- Moçambique cas e, por último, promover a descentralização e a desconcentração. O Ministério da Saúde, segundo a Lei da Água n.º 16, de 1991, possui valências ao nível do estabelecimento de parâmetros, através dos quais se deverá reger o controlo da qualidade da água, para que esta seja considerada água própria para consumo humano. Neste domínio, a DNS, através do Diploma Ministerial n.º 180, de 2004, encontra-se designada por autoridade competente para garantir o controlo de qualidade de água destinada para consumo humano, bem como para supervisionar a aplicação das suas disposições. A inspecção dos sistemas de abastecimento de água ficará a cargo de um Inspector de Águas, nomeado pela DNS, ou do seu representante, possuindo este livre acesso a qualquer ponto do abastecimento de água destinado a consumo humano. O CRA foi criado como uma corporação pública nos termos do Decreto n. º 74, de 1998. Esta instituição é composta por três personalidades públicas propostas e nomeadas pelo MOPH. O CRA tem a responsabilidade de regular o serviço de água e os aspectos relacionados com as instruções relativas ao FIPAG e às Empresas Operadoras Privadas (Águas de Moçambique e Vitens), em particular, no que se refere às tarifas implementadas sobre o utilizador, qualidade do serviço e programas de expansão da rede. As novas tarifas propostas pelo FIPAG apenas são realmente implementadas aquando da aprovação do CRA. Além disso, o CRA também detém competências ao nível da recolha de opiniões e das reclamações dos utilizadores e dos municípios, bem como para arbitragem, conciliação e mediação de conflitos entre o FIPAG e o operador. O organismo governamental que assinou o contrato com o consórcio que ganhou o concurso para a gestão dos serviços de água em Moçambique foi o FIPAG. Esta entidade é composta de dois órgãos: o conselho de administração e a comissão executiva. O conselho é presidido por um representante do MOPH, que age como Presidente do Conselho de Administração, onde se incluem também os outros quatro membros. O Director Executivo inclui um vice-presidente, coadjuvado por um grupo de gestores especializados em empresas de serviço público, programas de investimento ou gestão financeira. A autoridade e as responsabilidades do FIPAG estão relacionadas com os investimentos e a sua gestão orçamental, a maximização da eficiência e da recuperação dos custos, a gestão dos contratos e a monitorização e o reforço das obrigações contratuais do operador privado seleccionado (Banco Mundial, 1999). Em suma, o FIPAG compreende atribuições sobre a implementação de programas de investimento, a sua gestão, a contratação de operadores privados, a delegação a operadores, a gestão do serviço de dívida e, por fim, assegura a sustentabilidade dos serviços em termos de cobertura dos custos de operação e manutenção. As ONG representam também um instrumento importante de apoio aos utilizadores. Na Figura 52 apresentam-se os diferentes intervenientes, com responsabilidades relevantes no sector da água em Moçambique (adaptado de Alvarinho, 2002). 2.12.2.2 Regulação O sector da água em Moçambique congratula-se pela existência de uma entidade reguladora deFigura 52 Enquadramento institucional do sector da água em Moçambique 197 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional dicada. O CRA é “um órgão que, pela independência e competência técnica, garante o equilíbrio dos interesses em presença na prestação do serviço público”. Adicionalmente, o CRA possui atribuições ao nível da defesa dos interesses dos utilizadores, da regulação económica, da conciliação de interesses entre o concedente e o operador, da monitorização e assessoria aos processos de gestão delegada, da identificação das necessidades dos utilizadores actuais e futuros e, por fim, da promoção do funcionamento e melhoria do QGD. Desta forma, o âmbito de actuação do CRA localiza-se entre o governo, a montante, e a autarquia, a jusante, como autoridade local, na defesa do interesse público dos utilizadores. O CRA é uma entidade de direito público, dotada de personalidade jurídica e autonomia administrativa e financeira, que se rege por disposições do seu Estatuto e do seu regulamento interno, por normas próprias dos serviços públicos dotados de personalidade jurídica e autonomia administrativa e financeira e demais legislação aplicável. A entidade reguladora é um órgão colegial composto por três individualidades nomeadas pelo Conselho de Ministros, sob proposta conjunta apresentada pelos MOPH e Ministérios das Finanças e da Administração Estatal. No exercício das suas atribuições, o CRA assume direitos e obrigações atribuídos ao Estado nas disposições relativas à protecção das suas instalações e do seu pessoal. Todavia, as suas actuações carecem de prestação de contas ao Conselho de Ministros. O CRA apenas regula os serviços prestados pelos sistemas delegados, ou seja, 14 sistemas. Para desenvolver a sua actividade, o CRA despendeu, em 2007, cerca de 1,68 milhões de euros, onde se inclui a remuneração dos seus 26 funcionários. Apesar da independência declarada, o CRA ainda depende do orçamento de Estado, dado que as taxas implementadas aos operadores não lhe permitem conferir auto-sustentabilidade. 2.12.3 ESTRUTURA DO MERCADO 2.12.3.1 Propriedade e gestão de serviços 198 nominado “Águas de Moçambique”, em 1999, liderado pela SAUR International. Volvidos dois anos, a SAUR vendeu toda a sua participação no consórcio à Águas de Portugal, a qual prevalece em actividade até à data (início de 2008). 2.12.3.2 Players do sector Em Setembro de 1999, foi assinado em Maputo o primeiro contrato de concessão com um operador privado em Moçambique. Mais tarde, foram assinados contratos com o sector privado em mais quatro cidades. A Águas de Moçambique é a entidade responsável pela exploração do serviço de água na cidade de Maputo, nos municípios de Matola e Boane, e nas cidades da Beira, Quelimane, Nampula e Pemba, abrangendo uma população total de mais de 2 milhões de pessoas. Rigorosamente, a PPP formada não constitui um contrato de concessão, mas sim de arrendamento, dado que o investimento continua a cargo do FIPAG. A duração do contrato de arrendamento em Maputo corresponde a 15 anos. Em relação às restantes cidades, a opção recaiu sobre contratos de gestão, válidos por cinco anos. Sob estes contratos, o operador é responsável apenas pela operação e manutenção das instalações do FIPAG. Os utilizadores estão sujeitos a uma relação comercial com o FIPAG, e não com o operador privado. A FIPAG paga ao operador privado um valor periódico pelo serviço prestado, estando parte ligada ao desempenho do operador privado no que respeita ao cumprimento dos objectivos estabelecidos. Em 2005, um novo operador privado, a empresa holandesa Vitens, entrou no mercado do abastecimento de água em Moçambique. Actualmente, esta empresa opera nas cidades de Inhambane, Maxixe, Xai-Xai e Chókwè e em 11 vilas da periferia, fornecendo o serviço referido a cerca de 550 mil habitantes. No entanto, apenas 30% da população é servida, de facto, pelo abastecimento de água para consumo humano e apenas 2 cidades são fornecidas de forma contínua (24 horas). O sector da água em Moçambique encontra-se maioritariamente dominado pelos operadores privados, através das Águas de Moçambique e da Vitens, fornecendo o serviço de água a 2,5 milhões de habitantes. A população remanescente é abastecida pelo sector público. O subsector do abastecimento de água para consumo humano compreende também sete operadores públicos municipais, onze distritais e cerca de 200 pequenos operadores privados. No domínio do saneamento de águas residuais, somente dois municípios estão providos deste serviço (Maputo e Beira). Existem outros 22 municípios com sistemas de recolha de águas residuais, ainda que precários. No decorrer do programa de privatização das empresas públicas foi formado o primeiro grande consórcio dedicado ao fornecimento de água, de- Em suma, o serviço de água é disponibilizado em 23 cidades e em 68 vilas. Dentro do grupo das cidades, 14 são fornecidas através de Moçambique sistemas de gestão delegada e 5 através de empresas estatais. Os serviços remanescentes correspondem a 70 sistemas de gestão local. A Figura 53 evidencia o quadro institucional passando pelo tratamento e pelo armazenamento de água. Nas cidades moçambicanas onde existem serviços Figura 53 Operadores dos SAS em Moçambique do sector da água em Moçambique em 2007 (adaptado DNA, 2007). de águas residuais (com a excepção de Maputo) estes são geridos pela mesma entidade responsável pelo serviço de água. 2.12.3.3 Integração do sector e serviços oferecidos 2.12.3.4 Números do sector O sector da água, e em particular o serviço de água, encontra-se verticalmente integrado em Moçambique, dado que compete à mesma entidade (por ex., Águas de Moçambique) fornecer toda a fileira produtiva, desde a captação à distribuição de água, A informação existente sobre os volumes de água em Moçambique é muito escassa. No entanto, os sistemas delegados captam anualmente cerca de 85 milhões de m3 de água. Em 2006, o sector da água compreendia um nível de atendimento de serviço de 26% para o abastecimento de água e de 4,6% para o saneamento de águas residuais, como se observa no Quadro 68 Abastecimento de água Ano Rural Quadro 68 Evolução anual do nível de atendimento dos SAS em Moçambique Saneamento de águas residuais Urbana Rural Urbana Variáveis Cobertura (%) Pop. servida (milhões) Cobertura (%) Pop. servida (milhões) Cobertura (%) Pop. servida (milhões) Cobertura (%) Pop. servida (milhões) 2002 35 4,7 33 1,2 27 3,6 42 2,0 2003 36,3 4,9 35 1,4 30 4,0 42 2,1 2004 40 5,5 36 1,5 33 4,5 46 2,9 2005 41,2 6,2 36,5 1,5 35 4,7 52 3,1 199 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional (DNA, 2007). Nos locais onde existem serviços de água o mesmo não é prestado de forma contínua, tendo apresentado um valor médio de 15 horas por dia de disponibilização, em 2006. Em Moçambique, mais de 50% do volume de água captado não é facturado (estima-se em 51% do total). O governo definiu, em 2005, como objectivos a atingir no quinquénio 20052009, aumentar o nível de atendimento do serviço de água para 60% no ano de 2009, servindo cerca de 4 milhões de habitantes, que vivem nas zonas urbanas. Para o alcance das metas dos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio, fixou para 2015 o alvo de 70% para o nível de atendimento do serviço de água. O programa de investimentos em implementação nos cinco sistemas referidos sob gestão delegada envolveu cerca de 57 milhões de euros em 2005, sendo este valor repartido em 17,8 milhões para Maputo/Matola, 11,7 milhões para Beira/Dondo, 15,1 milhões para Quelimane, 5,5 milhões para Nampula e 2,7 milhões para Pemba. Cerca de 23% do valor total investido é destinado a reabilitações e a obras de emergência que, associadas às obras de expansão dos sistemas, estão a contribuir para aumentar a quantidade de água disponível aos utilizadores, tendo já triplicado em Pemba e duplicado em Nampula. Prevê-se também que, relativamente à situação em 2003, o investimento duplique na Beira e em Quelimane, e constitua um adicional de 14% em Maputo. Nas quatro cidades referidas projectou-se a realização de um investimento de cerca de 18,5 milhões de euros nas obras de reabilitação e expansão, e na melhoria da gestão e da capacitação institucional. Em relação à capacidade disponível em 2004, as obras irão triplicar a existente em Maxixe, duplicar em Xai-Xai e aumentar em cerca de uma vez e meia em Chókwè e Inhambane. Em termos de indicadores de atendimento, espera-se que os mesmos evoluam bastante, como é salientado no Quadro 69 (DNA, 2007). Quadro 69 Evolução do nível de atendimento de nove cidades sob gestão delegada 2.12.4 REGRAS DO JOGO 2.12.4.1 Estabelecimento de tarifas A definição e estabelecimento dos sistemas tarifários nos serviços de água integrados no QGD competem ao CRA, ao abrigo da Política Tarifária de Águas, de 1998, e em conformidade com o Decreto n.º 74, de 1998. A Política Tarifária define a água como sendo um bem económico e as tarifas devem reflectir a necessidade de recuperar os custos. Os sistemas tarifários são propostos pelo FIPAG e aprovados pelo CRA. A variação do sistema tarifário nas cidades de Maputo, Matola, Beira, Dondo, Quelimane, Nampula e Pemba comporta-se como factor integrante de uma política que procura a recuperação integral dos custos do serviço, através dos pagamentos aos utilizadores, tendendo para a auto-sustentabilidade desejada entre os sistemas e sempre preservando a sua viabilidade social. Os investimentos provocaram impactos relevantes e visíveis num curto espaço de tempo e, por conseguinte, traduziram-se numa melhoria substancial da conjuntura actual do serviço de água. As tarifas dos SAS das cidades de Xai-Xai, Chókwé, Inhambane e Maxixe integradas recentemente no QGD continuam seguindo um processo de maior ajustamento, dado que se situam em níveis bastante inferiores aos das outras cidades, de forma a permitir que, até 2009, se alcance um nível de preços que lhes confira auto-sustentabilidade. Ao analisar o sistema tarifário entre os serviços de água, constata-se que existe uma política regular neste domínio, ou seja, o CRA coaduna com o objectivo de homogeneizar a metodologia de implementação de preços entre os referidos operadores. Actualmente, os sistemas tarifários em vigor comportam uma parcela fixa, referente ao aluguer e manutenção do contador e uma parcela variável escalonada progressivamente em função do 9 Sistemas sob gestão delegada Ano Maputo % Beira % Quelimane % Nampula % Pemba % Xai-Xai % Chókwè % Inhambane % Maxixe % 2002 38 24 13 19 52 - - - - 2005 43 23 13 24 60 40 55 57 8 2009 200 Espera-se atingir uma cobertura global de pelo menos 60% Moçambique consumo mediante o utilizador final (doméstico ou industrial). O sistema tarifário bipartido implementado, aprovado pelo CRA e proposto pelo FIPAG, apresenta-se no Quadro 70. Neste âmbito, tem a responsabilidade de auditar e acompanhar o cumprimento das normas ao nível da água para consumo humano. Nesse contexto, o contrato pode obrigar à realização de testes regulares para verificar se o operador está a fornecer um serviço com os níveis de qualidade de Tarifa (€/m3) Escalões de consumo Tarifa média 0,432 Fontanários públicos 0,257 Quadro 70 Sistema tarifário em Maputo e Matola para o ano de 2007 Domésticos Consumo mínimo de 10 m3 (mês) 3,429 Consumo entre 10 m3 e 20 m3 0,529 Consumo entre 20 m3 e 30 m3 0,537 Consumos superiores 0,543 Indústria, comércio e consumo público Consumo até 25 m3/mês (comércio e consumo público) 13,214 Consumo até 50 m3/mês (indústria) 26,429 Consumo excedente (€/m3) 0,529 os rendimentos mínimos são garantidos pela existência de um consumo mínimo de 10 m3 mensais e pela parcela fixa, referente ao aluguer do contador. A estes preços é adicionado o IVA (17%) sobre 75% da factura da água referente ao montante total, englobando a parcela fixa e a variável. Parte do preço cobrado ao utilizador serve para pagar uma taxa ao FIPAG e uma outra ao CRA. O sistema tarifário é fixado por cinco anos, sendo ajustado regularmente, de acordo com uma fórmula contratual, isto é, um índice de custos durante o período respectivo. Não existe sistema tarifário para o serviço de águas residuais. 2.12.4.2 Qualidade do serviço O contrato acordado atribui ao operador a responsabilidade de monitorizar continuamente a qualidade da água, de acordo com os requisitos estabelecidos. O concedente água acordados. O controlo da qualidade, de acordo com o contrato, deve ser realizado no ponto de tratamento e em locais estratégicos das redes de distribuição. Um ganho importante a salientar constitui o aumento da fiabilidade do serviço e da qualidade da água fornecida em todos os sistemas, em face dos investimentos em curso. Estes desenvolvimentos estão a permitir expandir o serviço, invertendo a tendência decrescente ou de estagnação, verificada ao longo da década de 90. Mesmo com o progresso referido, o sector da água continua a padecer de auto-sustentabilidade. A conjuntura em que o país se insere, com cerca de 70% da população moçambicana abaixo do limiar da pobreza (Water Aid, 2005), e a necessidade de grandes investimentos face à seca persistente que caracteriza o país, são algumas das características que condicionam uma melhoria mais acentuada da qualidade do serviço prestada. No entanto, são de realçar os esforços que têm sido promovidos pelas entida201 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional des directa e indirectamente responsáveis pela melhoria do fornecimento do SAS. 2.12.4.3 Obrigações de serviço público Quadro 71 Princípios estabelecidos contratualmente entre o operador e utilizador No âmbito do cumprimento de uma das suas principais funções, ou seja, a defesa dos interesses dos utilizadores, o CRA desenvolveu as “Condições Gerais do Contrato do Abastecimento de Água Potável”, onde regulamenta os principais direitos e obrigações dos utilizadores dos serviços de água no QGD. O Quadro 71 apresenta as principais cláusulas contidas nesse documento. Tendo em conta o contexto socioeconómico, como pontos fortes salientam-se estabilidade política e institucional, nomeadamente dos organismos associados ao sector da água, o número relevante de quadros técnicos no país e um sector privado já com alguma experiência (quase 10 anos). Como aspectos negativos realçam-se a fragmentação da gestão da água em muitos sectores e instituições, a dependência da administração centralizada para desenvolver, operar e manter os sistemas de água e de gestão de recursos hídricos, a dificuldade em considerar a água como um bem de valor económico e a falta de ligação da gestão de recursos hídricos com a qualidade Princípios • Abastecimento de água para consumo humano com qualidade de acordo com o Regulamento dos Sistemas Públicos de Distribuição e Drenagem de Águas; • Facturar consumos médios no caso de a ligação não possuir um contador; • Avisar os utilizadores e tomar medidas imediatas para • Manter e reparar as redes de distribuição; remediar situações de interrupção de fornecimento não programadas; • Leituras mensais dos contadores; • Dar informação aos utentes sobre as tarifas praticadas e • Enviar avisos de débitos aos utilizadores antes do prazo de executar a ligação de água; pagamento dos mesmos; • Verificando-se as condições de viabilidade da ligação e • Inspeccionar as instalações dos utilizadores; • Responder a pedidos e reclamações no prazo máximo de quinze (15) dias, com excepção das reclamações sobre o valor da factura, que deverão ser respondidas no prazo de dez (10) dias; efectuado o pagamento da taxa de ligação e demais custos, se a ligação for realizada a uma distância não superior a 25 metros da conduta da rede, a empresa executa a ligação no prazo máximo de vinte (20) dias. 2.12.5 DESEMPENHO O sector da água em Moçambique tem vindo a pautar-se por progressos relevantes nos últimos anos. Ainda que o seu desempenho esteja muito longe do aceitável e, muito menos, do desejável, os problemas conjunturais que o país apresenta, com um nível de pobreza extremo, inviabilizam um maior desenvolvimento do sector da água. 202 da água, saúde, ambiente e desenvolvimento económico. Embora os investimentos tenham aumentado consideravelmente, a contribuição dos utilizadores continua reduzida, os recursos subsidiam ou beneficiam sobretudo a classe média e alta e existem poucos recursos, ou mesmo nenhuns, para o saneamento de águas residuais. Tanto os SAS necessitam de investimentos vultuosos para aumentar o nível de atendimento, como, simultaneamente, têm de ser criadas políticas sociais que permitam a universalização dos serviços. Portugal 2.13 PORTUGAL 2.13.1 ANTECEDENTES HISTÓRICOS Portugal é constitucionalmente um regime semipresidencialista constituído por quatro órgãos de soberania, designadamente o presidente da República, desempenhando o papel de chefe de Estado (poder regulador dos órgãos da democracia), a Assembleia da República (poder legislativo), o governo (poder executivo) e os tribunais (poder judicial). O país, com uma população aproximada de 10,3 milhões de habitantes (Censos 2001), dispersa por cerca de 93,4 km2 de área, encontra-se organizado administrativamente em distritos, em municípios, que constituem a base da estrutura administrativa do país, também denominados concelhos, geridos pelas Câmaras Municipais, e em freguesias, administradas por Juntas de Freguesia. Presentemente, Portugal é composto por 18 distritos, 308 municípios e 4.257 freguesias. Os SAS em Portugal evidenciaram, sobretudo nas últimas duas décadas, grandes desenvolvimentos ao nível do acesso, da qualidade do serviço e da própria estrutura do mercado. A reestruturação do sector da água, iniciada em 1993 com a sua desverticalização, separando a “alta” da “baixa”, com a abertura a capitais privados e, mais tarde, com a instituição de uma entidade reguladora dedicada, marcaram de forma inequívoca o progresso e a qualidade do sector da água em Portugal. Em particular, o sucesso do modelo regulatório tem sido um aspecto amplamente reconhecido, tanto em termos nacionais como internacionais. Em Portugal, os SAS encontram-se regulamentados por vários marcos legislativos, entre os quais sobressaem o quadro legal de delimitação de sectores, estabelecido pela Lei n.º 46/77, posteriormente alterada pelo Decreto-Lei n.º 372/93 e pela Lei n.º 88-A/97, a abertura ao capital privado e a desverticalização do sector, através do Decreto-Lei n.º 379/93 e as bases das concessões, quer multimunicipais, através do Decreto-Lei n.º 319/94 e do Decreto-Lei n.º 162/96 para a água e para as águas residuais, respectivamente, quer municipais, através do Decreto-Lei n.º 147/95, que, por sua vez, também cria o Observatório destes serviços. Outro regime legal, da maior relevância, relacionase com a regulamentação da regulação do sector e do Instituto Regulador de Águas e Resíduos (IRAR), designadamente através do Decreto-Lei n.º 230/97, que o cria, do Decreto-Lei n.º 362/98, que estabelece os seus estatutos, e do DecretoLei n.º 151/2002, que alarga as suas atribuições. Não menos importantes, são de referir a regulamentação do sector empresarial local (SEL) e a implementação das empresas municipais, através da Lei n.º 58/98, posteriormente substituída pela Lei n.º 53-F/2006, e também a legislação referente à defesa dos utilizadores dos serviços públicos essenciais, designadamente a Lei n.º 23/96, recentemente alterada pela Lei n.º 12/2008. Por último, na vertente ambiental, salienta-se a consagração na legislação portuguesa de toda a regulamentação produzida na UE, em particular da DirectivaQuadro da Água, através da Lei n.º 58, de 2005, bem como da titularidade dos recursos hídricos, legislada pela Lei n.º 54/2005. Em Portugal, até meados dos anos 90, os SAS encontravam-se sob responsabilidade exclusiva da administração local. Em 1993, através do Decreto-Lei n.º 372 (revogado pela Lei n.º 88A/97), que alterou o art. n.º 4 do Decreto-Lei n.º 46/77, foi criada a possibilidade de os SAS serem operados por empresas privadas e outras empresas da mesma natureza, através de contrato de concessão. Este diploma legal também procedeu à distinção entre sistemas multimunicipais, que são aqueles que servem em “alta”, pelo menos, dois municípios e que exigem um investimento predominante a efectuar pelo Estado, em função de razões de interesse nacional, e os sistemas municipais, que são todos os restantes, ainda que a sua gestão seja efectuada por associações de municípios. 203 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional Uma vez alterada a lei de delimitação de sectores, permitindo o acesso de capitais privados a algumas actividades do sector da água, o Decreto-Lei n.º 379/93 consagrou o regime legal de exploração e gestão dos sistemas multimunicipais e municipais de captação, tratamento e distribuição de água para consumo público e de recolha, tratamento e rejeição de efluentes. Nos termos do n.º 1 do art. n.º 3 do mesmo diploma legal, a exploração e a gestão dos sistemas multimunicipais é exercida directamente pelo Estado, ou atribuída por este, em regime de concessão, a entidades públicas de natureza empresarial ou à empresa que resulte da associação de entidades públicas, em posição obrigatoriamente maioritária no capital social, com entidades privadas. Este documento normativo sofreu um aditamento pelo Decreto-Lei n.º 103/2003, que clarifica as missões de interesse público dos sistemas multimunicipais. O regime jurídico da construção, exploração e gestão dos sistemas multimunicipais de captação e tratamento de água para consumo público encontra-se regulamentado pelo Decreto-Lei n.º 319/94, alterado pelo Decreto-Lei n.º 222/2003, quando atribuídos por concessão, e aprova as respectivas bases. O regime jurídico da construção, exploração e gestão dos sistemas multimunicipais de recolha, tratamento e rejeição de efluentes, quando atribuídos por concessão, e as respectivas bases, é regulamentado pelo Decreto-Lei n.º 162/96. Por outro lado, o regime jurídico da concessão dos sistemas municipais é conferido pelo Decreto-Lei n.º 147/95, sendo esta mesma norma que cria o Observatório Nacional dos Sistemas Multimunicipais e Municipais. Este diploma viria, todavia, a ser parcialmente revogado pelo Decreto-Lei n.º 362/98, que aprovou o Estatuto do IRAR. Em 1997, a criação do IRAR, pelo art. n.º 21 do Decreto-Lei n.º 230, revelou-se uma importante medida de defesa dos direitos dos utilizadores, bem como de salvaguarda da sustentabilidade económica dos sistemas. O Decreto-Lei n.º 362/98, alterado pelo Decreto-Lei n.º 151/2002, como já referido, aprova o Estatuto do IRAR e extingue o Observatório. A alteração do diploma investiu o IRAR de poderes de autoridade competente, no tocante à fiscalização e ao controlo da qualidade da água para consumo humano. Em 1998, a Lei n.º 58 regulamentou a criação, pelos municípios ou suas associações, das empresas municipais, intermunicipais e regionais, segundo três formatos: empresas públicas (aquelas em que os municípios, associações de municípios ou regiões administrativas detêm a totalidade do capital), empresas de capitais públicos (aquelas em que os municípios, associações de municípios ou regiões administrativas detêm participação de capital em associação com outras entidades públicas) e empresas de capitais maioritariamente públicos (aquelas em que os municípios, asso204 ciações de municípios ou regiões administrativas apresentem a maioria do capital em associação com entidades privadas), constituindo estas últimas PPP. Posteriormente, no ano de 2006, foi publicada a Lei n.º 53-F/2006, que estabelece o novo regime jurídico do sector empresarial local (SEL), revogando a Lei n.º 58/98. Entre as novidades deste documento normativo, destaca-se a matéria contida no art. n.º 11, a qual refere que as entidades do SEL que prossigam actividades no âmbito de sectores regulados ficam sujeitas aos poderes da respectiva entidade reguladora e que a selecção do sócio privado nas PPP exige a instituição de concurso público. No domínio das obrigações de serviço público é de salientar a aprovação recente da Lei n.º 12/2008, alterando a Lei n.º 23/96, que cria no ordenamento jurídico alguns mecanismos destinados a proteger os utentes dos serviços públicos essenciais. Este documento normativo constitui um marco significativo destinado à salvaguarda da protecção dos utilizadores de um conjunto mínimo de serviços, considerados indispensáveis para a qualidade de vida na sociedade actual, onde se incluem os SAS. Por último, é de referir a regulamentação ambiental e da água que é, naturalmente, muito vasta. Sobressai a Lei n.º 58/2005, que aprova a Lei da Água, e procede à transposição para a ordem jurídica nacional da Directiva-Quadro da Água, estabelecendo as bases e o quadro institucional para a gestão sustentável das águas. No que concerne à definição do enquadramento institucional, a Lei da Água procede à sua harmonização com o princípio da região hidrográfica como unidade principal de planeamento e gestão, tal como imposto pela Directiva, criando cinco Administrações de Região Hidrográfica (ARH), cujas sedes coincidem com as das actuais Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR). 2.13.2 ENQUADRAMENTO LEGAL E INSTITUCIONAL 2.13.2.1 Responsabilidades No sector da água coexistem numerosos e diversificados tipos de intervenientes. Ao nível da administração, são de referir os papéis desempenhados pela entidade reguladora (IRAR) e pelos restantes órgãos da Administração Pública, nomeadamente o Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional (MAOTDR), o Instituto da Água (INAG), a Agência Portuguesa do Ambiente (APA), as CCDR, a Direcção-Geral do Consumi- Portugal dor (DGC), a Autoridade da Concorrência (AC), a Associação Portuguesa de Distribuição e Drenagem de Águas (APDA), o Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC) e os municípios. Por fim, não só associado à operação dos SAS, a empresa Águas de Portugal (AdP) possui um papel bastante relevante e estruturante no desenvolvimento do sector. O IRAR é o regulador vertical dos SAS (e também dos resíduos urbanos). No âmbito das suas atribuições, o IRAR supervisiona e regula os SAS concessionados. Entre os seus objectivos consta a salvaguarda da qualidade dos serviços prestados e supervisão e garantia do equilíbrio e da sustentabilidade do sector, nos termos do seu Estatuto e da lei. Tem também funções de autoridade competente, no que concerne à qualidade da água para consumo humano, englobando aqui todos os SAS portugueses. O MAOTDR é o responsável máximo pelas diversas políticas do sector do ambiente, onde se inclui a da água, e que compreende os SAS. A gestão dos recursos hídricos encontra-se sob a responsabilidade do INAG, criado em 1993, dotado de autonomia administrativa e património próprio, e tutelado pelo MAOTDR. O INAG tem por missão propor, acompanhar e assegurar a execução da política nacional no domínio dos recursos hídricos, de forma a salvaguardar a sua gestão sustentável, bem como garantir a efectiva aplicação da Lei da Água. A APA, criada em 2007, através da fusão do Instituto do Ambiente e do Instituto dos Resíduos, visa criar condições de maior eficácia na gestão das políticas do ambiente e do desenvolvimento sustentável. Esta agência tem ainda por missão propor, desenvolver e acompanhar a execução das políticas nas áreas do combate às alterações climáticas e emissão de poluentes atmosféricos, avaliação de impacte ambiental, prevenção de riscos graves, controlo integrado da poluição e educação ambiental, assegurando a participação e a informação do público e das ONG do ambiente. As CCDR são organismos descentralizados da Administração Central (MAOTDR) com competências de regulação ambiental e com funções de coordenação geral, planeamento, licenciamento e fiscalização, designadamente no caso de captações de água e de descarga de águas residuais. As CCDR constituem ainda as auto ridades de gestão dos fundos comunitários dedicados a co-financiamento de investimentos nas redes em “baixa” dos SAS. Todavia, a Lei da Água estabeleceu a criação das ARH, as quais abrangem parte das competências das CCDR. A Lei n.º 58/2005 (Lei da Água) criou as ARH, no sentido de prosseguirem as atribuições de ges- tão da água, incluindo o respectivo planeamento, licenciamento e fiscalização. No continente, foram criadas as ARH do Norte, do Centro, do Tejo, do Alentejo e do Algarve. A DGC é o instituto público destinado a promover a política de salvaguarda dos direitos dos utilizadores, bem como a coordenar e executar as medidas tendentes à sua protecção, informação e educação e de apoio às organizações de utilizadores. Em cooperação com o IRAR, este organismo desempenha um papel significativo na defesa dos utilizadores dos SAS. A AC, criada em 2003, apresenta poderes transversais sobre a economia portuguesa para aplicação das regras de concorrência, em correlação com os órgãos de regulação sectorial. A AC tem por missão assegurar a aplicação das regras de concorrência em Portugal, no respeito pelo princípio da economia de mercado e da livre concorrência, tendo em vista o funcionamento eficiente dos mercados, um elevado nível de progresso técnico e o prosseguimento do maior benefício para os utilizadores. A AC articula-se com o IRAR em tudo o que se relaciona com a concorrência no mercado dos SAS. A APDA, criada em 1986, é uma entidade que representa e defende os interesses dos operadores dos SAS e de todos os demais intervenientes neste domínio. Simultaneamente, esta associação estimula o tratamento, a investigação e o desenvolvimento dos assuntos relacionados com a quantidade e qualidade das águas de abastecimento, drenagem e destino final das águas residuais, constituindo um fórum para profissionais de diversas formações com intervenção no domínio da água. O LNEC constitui um laboratório de investigação de referência, a nível nacional e internacional, no âmbito da engenharia civil, incluindo a área da hidráulica e, em particular, a da engenharia sanitária. Os municípios possuem as atribuições da prestação dos SAS. Neste âmbito, podem concessionar os seus serviços a entidades privadas ou delegálos a terceiros, nomeadamente a freguesias e associações de utilizadores. A AdP, pertencente ao sector empresarial do Estado, constitui o principal grupo empresarial do sector do Ambiente em Portugal, e tem por missão contribuir para a resolução dos problemas nacionais nos domínios de abastecimento de água, de saneamento de águas residuais e de tratamento e valorização de resíduos, num quadro de sustentabilidade económica, financeira, técnica, social e ambiental. Actualmente, esta empresa congrega a sua actividade em mais de 50 empresas, incluindo algumas de âmbito internacional. 205 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional 2.13.2.2 Regulação Em Portugal, existe uma entidade reguladora sectorial, o IRAR, que apresenta, de acordo com o seu Estatuto, funções regulatórias relevantes sobre os sistemas multimunicipais e municipais concessionados dos SAS e dos resíduos urbanos, procurando, sobretudo, a defesa dos direitos dos utilizadores, bem como a salvaguarda da sustentabilidade e viabilidade económica dos sistemas. O IRAR, na qualidade de autoridade competente, possui também a função de fiscalizar e controlar a qualidade da água para consumo humano, compreendendo aqui todos os SAS do país, com excepção da Madeira, que possui uma autoridade competente regional. O IRAR é uma pessoa colectiva de direito público, dotada de personalidade jurídica, com autonomia administrativa e financeira e património próprio, sujeita à superintendência e à tutela do MAOTDR, não tendo, desta forma, independência funcional. O IRAR também não tem independência orgânica, no entanto, possui independência financeira, sendo o seu financiamento assegurado integralmente pelas concessionárias dos sistemas multimunicipais e municipais, através do pagamento de taxas pela sua actividade. Em 2003, iniciou-se um processo de consolidação do modelo regulatório, agora em pleno funcionamento, cuja estratégia se define por dois grandes planos de intervenção: um primeiro ao nível da regulação estrutural do sector da água e um segundo ao nível da regulação dos comportamentos das entidades gestoras. em mais do que uma das etapas sucessivas do processo de produção, necessárias para a prestação do serviço. Complementarmente, a estratégia do IRAR passa também por regular os comportamentos das entidades gestoras, relativamente aos aspectos económicos e de qualidade do serviço. A regulação económica constitui a mais importante forma da regulação dos comportamentos permitidos às entidades gestoras, na medida em que os preços de monopólio tendem a ser mais altos do que os preços resultantes de mercados concorrenciais. A obtenção dos preços mais baixos que permitam, simultaneamente, a viabilidade económica e financeira das entidades gestoras, correspondendo à situação mais justa para os utilizadores, exige uma forte intervenção da entidade reguladora. A regulação económica inclui ainda a avaliação dos investimentos das entidades gestoras. A regulação da qualidade do serviço é uma forma de regulação dos comportamentos indissociável da regulação económica, condicionando os comportamentos permitidos às entidades gestoras, relativamente à qualidade do serviço que pretam aos utilizadores. A competência do IRAR, em matéria da qualidade da água para consumo humano, constitui um caso particular da qualidade do serviço, uma vez que ultrapassa as funções regulatórias tradicionais. Na Figura 54 é apresentado o modelo regulatório do IRAR (IRAR, 2003). De acordo com a nova lei orgânica do MAOTDR (Decreto-Lei n.º 207/2006), o IRAR permane- Figura 54 Modelo regulatório do IRAR A regulação estrutural do sector da água na vertente horizontal procura o nível adequado de desagregação das entidades gestoras por unidades geográficas e por tipos de serviços (mercados), sem prejudicar a desejável e necessária obtenção de economias de escala e de gama, criando melhores condições de competição e permitindo uma regulação mais eficaz. Na sua vertente vertical, procura o nível adequado de agregação das entidades gestoras, quando estas desenvolvem a sua actividade 206 cerá sob a administração indirecta do Estado com o estatuto de Instituto Público, passando a designar-se Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos (ERSAR). Para além das atribuições de regulador das áreas económica e da qualidade dos serviços no sector da água e dos resíduos, a nova lei orgânica prevê também, como atribuições da ERSAR, a manutenção do exercício das funções de autoridade competente relativamente à qualidade da água para consumo humano, compreendendo todos os SAS, Portugal bem como a garantia de uma regulação estrutural do sector e a promoção da comparação e divulgação pública da actividade das entidades gestoras. Como referido, até à data, o modelo regulatório definido para o IRAR é algo limitado no âmbito das suas atribuições, sobretudo da regulação tarifária. No que diz respeito às concessões municipais, o IRAR apenas dá parecer sobre o processo de concurso das concessões dos sistemas municipais e das minutas dos contratos, e não intervém no processo de fixação da tarifa, que constitui um elemento determinante da escolha da concessionária, a não ser na situação de reequilíbrio económico-financeiro. As tarifas ficam reguladas pelo contrato (assim como as suas actualizações). Já no que se refere às concessões dos sistemas multimunicipais, o IRAR pronuncia-se sobre as tarifas que são propostas anualmente ao concedente pela concessionária. No que concerne às modalidades de gestão de sistemas municipais, que não a concessão, para além das questões da qualidade da água, não foi ainda prevista actividade regulatória do IRAR. É de salientar, no entanto, que a reformulação prevista e desejada do Estatuto do IRAR alargará o seu âmbito de actuação às entidades da administração autárquica, nas questões da defesa dos utilizadores. É ainda de referir que a Lei do SEL prevê a intervenção do IRAR na sua regulação, ainda que não estejam clarificados os moldes em que a mesma irá ocorrer. O IRAR adoptou, como principal método regulatório da qualidade do serviço, a regulação sunshine, a qual se baseia na publicitação dos resultados do desempenho das entidades reguladas. Para esse efeito, o IRAR reúne num relatório anual os resultados do desempenho, obtidos a partir de um conjunto de indicadores de desempenho aplicados às entidades gestoras. A elaboração desse documento, baseado em benchmarking, inclui uma avaliação conjunta do desempenho, onde são efectuadas comparações entre as entidades gestoras, e uma avaliação individual do desempenho de cada operador, qualitativa e quantitativamente (Marques, 2006b). Neste âmbito, a consciencialização da actuação das entidades gestoras, pretendida pelo IRAR, é obtida por pressão dos utilizadores e dos cidadãos em geral, através dos seus grupos de defesa, dos media, da classe política (governo/ partidos) e das ONG. O objectivo desta abordagem regulatória consiste em “embaraçar” as entidades gestoras que apresentem um fraco desempenho e que, por conseguinte, terão propensão para corrigir os desvios manifestados (name and shame policy). Embora este método não fixe tarifas e o seu poder coercivo seja limitado, a exposição e a discussão pública do comportamento do regulado desencadeia efeitos bastantes positivos, induzindo a competição entre as entidades reguladas e conduzindo a um aumento progressivo da performance no respectivo mercado (Marques, 2005). O IRAR, no desempenho das suas funções, apresentou, em 2007, um valor aproximado de 5 milhões de euros relativo aos custos de funcionamento, que é autofinanciado através de taxas de regulação e das taxas de qualidade da água. No final de 2007, o IRAR empregava directamente 62 funcionários. 2.13.3 ESTRUTURA DO MERCADO 2.13.3.1 Propriedade e gestão de serviços A propriedade e a gestão dos SAS têm estado associadas maioritariamente ao sector público. Embora, no passado, as maiores empresas em operação fossem privadas (por ex., CAL em Lisboa), os activos pertenciam ainda ao Estado ou aos municípios. De 1974 a 1993 não existiu gestão privada no sector da água em Portugal. A partir de 1993 verificou-se uma proliferação do sector privado, atingindo em 2007 quase 20% do total da população. Além disso, a privatização jurídico-formal (entidade públicas de direito privado) tem ocorrido de forma muito acentuada. 2.13.3.2 Players do sector A atribuição dos SAS pertence aos municípios. Estes podem prestar aquelas actividades de uma forma directa, através de serviços municipais (os que são directamente geridos pelos órgãos municipais, não dispondo de autonomia administrativa ou financeira) ou através de serviços municipalizados, que possuem autonomia administrativa e financeira e são geridos por um Conselho de Administração próprio, embora não tenham personalidade jurídica. Os municípios podem ainda delegar a sua competência às freguesias ou a empresas municipais procurando, neste último caso, uma maior empresarialização e uma fuga clara para o direito privado. A sua delegação pode ser atribuída a entidades privadas, através da figura de concessão. Se se contabilizarem os operadores re207 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional lativos às freguesias, que atingem um número significativo, actualmente, em Portugal, os SAS são fornecidos, respectivamente, por 405 e 315 operadores. Em Portugal, muitos municípios não disponibilizam o fornecimento do serviço de água em “alta”, sendo este prestado pelos sistemas multimunicipais controlados pelo grupo AdP, ainda que participem nas empresas como sócios minoritários. Em 2006, a AdP fornecia os serviços de água em “alta” a 200 municípios, embora apenas parcialmente em muitos destes, através de 14 empresas (incluindo a EPAL), enquanto para os sistemas de águas residuais em “alta”, esse número totaliza os 186 concelhos, cujo serviço era prestado por intermédio de 16 empresas. Existem também duas empresas concessionárias de sistemas municipais (intermunicipais), designadamente a Águas do Vouga e a Tratave, ainda pertencentes à AdP através da participação da Aquapor/Luságua e duas associações de municípios que gerem os sistemas directamente (por ex., AMCAL). Quadro 72 Formas organizacionais dos SAS em “baixa” Em relação à “baixa”, a forma organizacional dominante continua a ser o serviço municipal, ainda que o número de empresas municipais e de empresas concessionárias tenha crescido nos últimos anos e seja expectável que essa tendência se mantenha num futuro próximo. Sem contabilizar os operadores relativos às freguesias, que representam uma população muito diminuta, o Quadro 72 resume as diferentes modali- da Águas de Santo André (Santo André) e do IGA (Porto Santo). A EPAL representa um caso particular, pela sua história, dimensão e importância. A empresa de água, servindo a cidade de Lisboa e os municípios circundantes, é uma sociedade anónima de capitais integralmente públicos, detida a 100% pela AdP. A EPAL serve em “baixa” apenas o município de Lisboa. Esta empresa abastece directamente 564 000 habitantes (Lisboa) e indirectamente 2,6 milhões de habitantes em 26 municípios, que lhe compram água em “alta”. É de salientar também a importância da modalidade de gestão baseada em empresas municipais. No início de 2008, existiam 18 empresas municipais, representando 1,6 milhões de habitantes (15% da população portuguesa). Destas, 3 constituem PPP, dado que envolvem parceiros privados, estando outras 3 em concurso. Como referido, a AdP é o principal player em Portugal. Para além da presença dominante na “alta”, constitui, através da Aquapor e da Luságua, um player relevante dos sistemas em “baixa”, concorrendo com os outros players privados. Os restantes players privados dizem respeito à Compagnie Générale des Eaux (CGE/ Veolia), que é responsável por 4 empresas, servindo cerca de 270 mil habitantes potenciais, à AGS (Grupo Somague/Sacyr) com 8 participações e 670 mil habitantes e à Indaqua (MotaEngil, Soares da Costa e Hidrante) com cinco Água Águas residuais Número* População** Número* População** Serviços municipais 229 4 192 375 (40,6%) 244 5 066 832 (49,1%) Serviços municipalizados 26 2 228 223 (21,4%) 24 2 206 585 (21,4%) Empresas municipais 18 1 567 049 (16,0%) 20 1 650 826 (16,0%) Empresas concessionárias 24 1 737 033 (16,8%) 17 1 393 841 (13,5%) Empresas públicas 3 593 404 (5,7%) - - 300 10 318 084 305 10 318 084 Total * ano de 2008; ** População relativa ao Censos 2001. dades de gestão em “baixa” em operação em Portugal. As empresas públicas apresentadas representam as situações atípicas da EPAL (Lisboa), 208 empresas e 540 mil habitantes. A Aqualia (grupo FCC) possui ainda três sistemas de reduzida dimensão. Em 2008, cerca de 25 sistemas (29 Portugal municípios) privatizaram os SAS, como é possível observar no Quadro 73, correspondendo a cerca de 1,8 milhões de habitantes (17% da população portuguesa). Se se somarem as PPP correspondentes às empresas municipais, a representatividade do sector privado atinge os 19%. Se se contabilizarem os sistemas que estão em concurso, estima-se que Quadro 73 Empresas concessionárias dos SAS em “baixa” Localização Âmbito* População** Empresa Início Duração (anos) Accionistas Mafra A 54 358 CGE de Mafra 1994 25 CGE/Veolia Fafe A 52 757 Indaqua Fafe 1996 25 Indaqua Ourém A 46 216 CGE Ourém 1996 25 CGE/Veolia Setúbal A e AR 113 937 Águas do Sado 1997 25 Aquapor/ Luságua Planalto Beirão A 77 017 Águas do Planalto 1997 15 Aquapor/ Luságua Batalha A 15 002 Águas do Lena 1997 15 Aquapor/ Luságua Trancoso A e AR 10 889 Águas da Teja 1997 25 Aquapor/ Luságua Figueira da Foz A e AR 62 601 Águas da Figueira 1999 25 Aquapor/AGS S. Tirso/Trofa A 109 977 Indaqua S. Tirso/ Trofa 1999 35 Indaqua S. M. da Feira A e AR 135 964 Indaqua Feira 1999 35 Indaqua Valongo A e AR 86 005 Águas de Valongo 2000 30 CGE/Veolia Cascais A e AR 170 683 Águas de Cascais 2000 25 Aquapor/AGS Paredes A e AR 83 377 Águas de Paredes 2001 35 CGE/Veolia Alcanena A 14 600 Luságua Alcanena 2001 15 Aquapor/ Luságua Carrazeda A e AR 7.642 Águas de Carrazeda 2001 30 AGS Gondomar A e AR 164 096 Águas de Gondomar 2001 25 Aquapor/AGS Alenquer A e AR 39 108 Águas de Alenquer 2003 30 Aquapor/AGS P. de Ferreira A e AR 52 985 AGS Paços de Ferreira 2004 35 AGS Barcelos A e AR 122 096 Águas de Barcelos 2004 30 AGS M. Canavezes A e AR 52 419 Águas do Marco 2005 35 AGS Matosinhos A e AR 167 026 Indaqua Matosinhos 2007 25 Indague Vila do Conde A e AR 74 391 Indaqua V. do Conde 2007 40 Indaqua Abrantes AR 42 235 Abrantagua 2007 25 Aqualia/LenaAmbiente Elvas A e AR 15 500 Aqualia 2008 30 Aqualia Campo Maior A e AR 8.387 Aqualia 2008 30 Aqualia *A – água, AR – águas residuais; ** Censos 2001 209 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional a população total servida por entidades privadas ultrapasse os 2,2 milhões de habitantes (21% da população). de 35% para o volume de água não facturado, do qual a grande maioria correspondia a perdas de água. 2.13.3.3 Integração do sector e serviços oferecidos Em Portugal, a capitação média de água sofreu um decréscimo entre 2002 e 2005, passando de 169 litros para 153 litros por habitante e por dia. Na Figura 55 apresenta-se a evolução da capitação média nacional anual (IRAR, 2007). Em Portugal, os SAS encontram-se maioritariamente desverticalizados, isto é, os sistemas em De acordo com o IRAR, o nível de atendimento Figura 55 Evolução anual da capitação média nacional em Portugal “alta” e em “baixa”, quer para o abastecimento de água quer para o saneamento de águas residuais, são prestados por entidades distintas. Em termos horizontais, as entidades gestoras possuem um grau de integração reduzido, existindo (mesmo sem incluir as freguesias) cerca de 300 entidades para quase 11 milhões de habitantes. No que concerne aos serviços disponibilizados, os operadores prestam quase sempre em conjunto os serviços de água e os serviços de águas residuais. Por vezes, incluem também os serviços de resíduos urbanos e, menos frequentemente, os transportes ou outras actividades. Existe apenas um número limitado de operadores a efectuar o abastecimento de água ou o saneamento de águas residuais individualmente. 210 do serviço de água nas áreas urbanas, a nível nacional, é de cerca de 91,1%, o que significa que cerca de 9,4 milhões de habitantes são fornecidos com este serviço. No que diz respeito ao serviço de águas residuais, este carece ainda de maior desenvolvimento, compreendendo cerca de 7,7 milhões de habitantes servidos, o que se reflecte num nível de atendimento de 75,1%. 2.13.3.4 Números do sector Na Figura 56 apresentam-se os níveis de atendimento dos SAS. É de salientar que cerca de 2% da população se encontra isolada e nunca será, à partida, servida por redes públicas (IRAR, 2007). Acrescente-se também que as metas estabelecidas no PEAASAR I (Plano Estratégico de Abastecimento de Água e Saneamento de Águas Residuais) para o ano de 2006 previam níveis de atendimento de 95% para o abastecimento de água e de 90% para o saneamento de águas residuais. Em 2007, a produção de água em Portugal atingiu os 862 milhões de m3. A principal fonte de água constituiu a água superficial (mais de 65%), representando a produção de água para consumo público cerca de 7% do consumo total de água. Nesse ano, em Portugal, os serviços de água apresentavam um valor de cerca O nível de atendimento do serviço de tratamento de águas residuais tem evoluído de forma considerável, apresentando, em Dezembro de 2005, um valor de 66%. No final de 1994, evidenciava um valor de 30,5%. Em 2006, o volume de águas residuais recolhidas representou cerca de 315 milhões de m3. Portugal Em 2006, o serviço de água em Portugal apresentou receitas de 1,2 mil milhões de euros, enquanto o serviço de águas residuais totalizou uma receita de 450 milhões de euros. Os SAS caracterizaram-se nesse ano por um volume de investimento anual de 900 milhões de euros, sendo uma parte substancial deste valor relativo ao tratamento das águas residuais. Em 2006, os SAS empregavam directamente cerca de 17,5 mil funcionários. Os serviços de água compreendem cerca de 75 mil km de condutas de distribuição de água, enquanto o serviço de águas residuais inclui, aproximadamente, 40 mil km de colectores das redes de águas residuais domésticas. 2.13.4 REGRAS DO JOGO 2.13.4.1 Estabelecimentos de tarifas Em Portugal, o estabelecimento de preços e de tarifas depende da modalidade de gestão. No que se refere aos serviços municipais, aos serviços municipalizados e aos diferentes modelos de empresas municipais, o IRAR não tem qualquer tipo de atribuição nesta matéria. Como tal, cabe à própria administração local, neste caso a Assembleia Municipal para os Serviços Municipais e para os Serviços Municipalizados, aprovar os sistemas tarifários sob proposta do Executivo Municipal ou do Conselho de Administração dos Serviços Municipalizados. No caso dos serviços intermunicipais ou intermunicipalizados, a aprovação das tarifas é da responsabilidade da assembleia intermunicipal. No caso das empresas municipais (ou intermunicipais), existem situações distintas, consoante a natu- reza da empresa municipal. Na circunstância de PPP, é a Assembleia-geral que aprova as tarifas sob proposta do Conselho de Administração. No caso das restantes empresas, é o Conselho de Administração que submete à Câmara Municipal para posterior aprovação da Assembleia Municipal. Figura 56 Evolução anual da cobertura dos SAS em Portugal Nos sistemas municipais concessionados as tarifas são, claramente, definidas no contrato de concessão outorgado entre o concedente (Câmara Municipal) e o concessionário. A fixação de tarifas é estabelecida na proposta de concurso, tendo em consideração o art. n.º 5 do Decreto-Lei n.º 147/95. O IRAR não pode interferir directamente na fixação de tarifas, a não ser que o equilíbrio económico-financeiro da concessão seja colocado em causa, por motivos imprevisíveis, aquando da realização do contrato. Nesta circunstância, o IRAR pode ser chamado a pronunciar-se. Nos sistemas multimunicipais, o IRAR tem outro tipo de poderes, sendo solicitado para emitir pareceres sobre os sistemas tarifários propostos, apoiando-se num programa de investimentos previamente definido à data da realização do contrato de concessão e revisto anualmente, a ainda sobre o relatório anual das empresas e o respectivo orçamento. A fórmula de definição do sistema tarifário proposto nos contratos de concessão dos sistemas multimunicipais consiste numa metodologia híbrida, tendo como base o método de regulação por taxa de remuneração estabelecido contratualmente e introduzindo-lhe um mecanismo de repartição de ganhos de produtividade. Embora varie de contrato para contrato, a taxa de remuneração é fixada pelo concedente e consiste numa taxa base (Obrigações de Tesouro ou Euribor) acrescida de um prémio de risco de 3%, que incide sobre o capital social realizado e a reserva legal. A EPAL, como já foi referido, constitui uma situação peculiar em todo o panorama português também no que concerne ao estabelecimento 211 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional de tarifas. O sistema tarifário resulta de uma convenção a efectuar, periodicamente, entre o Estado e a EPAL, sendo o Estado representado pela Direcção-Geral da Empresa. O Decreto-Lei n.º 230/91 estabelece as directivas para a fixação dos preços a praticar pela EPAL. O sistema tarifário consiste no pagamento de uma parte fixa (quota de serviço) e de uma parte variável que depende dos volumes de água abastecidos, bem como dos respectivos princípios de aplicação. Os utilizadores são classificados em domésticos e não domésticos e a EPAL é autorizada a cobrar, como parte do preço, uma parcela adicional, cujo valor será fixado na convenção, por m3 de água facturada a todos os seus utilizadores da cidade de Lisboa, excluindo a Câmara Municipal. Para esta, o montante fica consignado à compensação do valor dos consumos municipais. O documento normativo pressupõe que os preços de venda de água e a remuneração dos serviços prestados assegurem receitas que permitam Quadro 74 Sistema tarifário da EPAL para o ano de 2008 podendo também incluir uma parcela específica para o tratamento de águas residuais. No passado era frequente os encargos com os serviços de águas residuais serem estabelecidos em função das áreas dos fogos. Em geral, os SAS, sobretudo no interior de Portugal, são muito subsidiados pelo orçamento geral do município. O abastecimento de água subsidia, quase sempre, o saneamento de águas residuais e dentro do primeiro os utilizadores industriais e comerciais e os relativos aos maiores consumos subsidiam os restantes utilizadores (domésticos). É ainda de salientar que o serviço de águas pluviais nunca é cobrado e que, com frequência, existem tarifas sociais e sistemas tarifários especiais para famílias numerosas. Nos quadros seguintes (Quadro 74, Quadro 75 e Quadro 76) apresentam-se os sistemas tarifários de diferentes modelos de gestão dos SAS em Portugal, nomeadamente, da EPAL (empresa estatal), dos SMAS de Oeiras e Amadora EPAL Água Parcela fixa (€/mês) Domésticos Não domésticos 3,90 € - 2.129,85 € 9,36 € - 2.854,80 € Parcela variável (€/m3) 0-5 m3 0,1530 5-20 m3 0,5754 >20 m3 1,3460 1,3460/1,0199* * Instituições Privadas de Interesse Público a cobertura dos custos de exploração e que garantam os níveis adequados de autofinanciamento, e de remuneração do capital investido, isto é, a regulação económica da EPAL baseia-se no método da regulação por taxa de remuneração. É de referir que cada SAS tem a sua classificação de utilizadores e os seus próprios escalões, por vezes muito distintos entre si, embora com preços sempre crescentes com o consumo. É de realçar também que existe sempre para o abastecimento de água uma parcela fixa, correspondente ao aluguer do contador e que é crescente com o seu calibre, e uma parcela variável associada a escalões de consumo. A micromedição tem uma penetração de 100% no sector da água em Portugal. Em relação aos serviços de águas residuais, os sistemas tarifários são mais variáveis entre os operadores, mas, normalmente, incluem também uma parcela fixa (de disponibilidade) e uma variável com o consumo de água, 212 (serviços municipalizados), das Águas de Cascais (empresa concessionária), e do Concelho de Porto de Mós (serviço municipal) para os utilizadores domésticos e não domésticos/industriais. Os valores apresentados são ainda acrescidos de IVA de 5%. 2.13.4.2 Qualidade do serviço A qualidade da água, regularmente controlada pelo IRAR, caracteriza-se por um nível muito elevado. A entidade reguladora actua de modo a salvaguardar o cumprimento dos padrões de qualidade de água, de acordo com a legislação portuguesa e da UE. Também neste domínio, Portugal prima por uma evolução significativa nos últimos anos. No sentido de incentivar a qualidade do ser- Portugal viço entre os operadores dos SAS, o IRAR realiza um exercício anual de benchmarking, no qual determina, compara e publicita o desempenho dos operadores regulados (concessionários). Para esse efeito, determina um conjunto de 20 indicadores de desempenho, Quadro 75 Sistema tarifário para os utilizadores domésticos para o ano de 2008 Serviços Municipalizados (Oeiras e Amadora) Empresa privada (Águas de Cascais) Serviço Municipal (Porto de Mós) 2,95 € - 216,11 € 3,42 € - 133,59 € 2,05 € - 8,10 € 0,492 0,400 0,510 1,037 0,729 15-25 m3 1,989 1,211 1,530 >25 m3 2,076 1,951 2,650 - 3,12 1,160 0,268 30% da factura da água Serviços Municipalizados (Oeiras e Amadora) Empresa privada (Águas de Cascais) Serviço Municipal (Porto de Mós) 2,95 € - 216,11 € 4,75 € - 166,09 € 2,05 € - 8,10 € 1,7511 (0-150 m3) 0,400 (0-5 m3) 0,82 (0-50 m3) Água Parcela fixa (€/mês) Parcela variável (€/m3) 0-5 m3 5-10 m3 10-15 m3 0,860 1,020 Águas residuais Parcela fixa (€/mês) Parcela variável (€/m3) 0-5 m3 >5 m3 Serviços 20% da factura da água Abastecimento de água Parcela fixa (€/mês) Parcela variável (€/m3) 1,258 (5-120 m3) 2,3952 (>150 m3) 1,727 (120-400 m3) 1,13 (>50 m3) 2,080 (>400 m3) Saneamento de águas residuais Parcela fixa (€/mês) - 3,12 0,268 30% da factura da água 1,160 Parcela variável (€/m3) 0-5 m3 >5 m3 20% da factura da água Quadro 76 Sistema tarifário para os utilizadores não domésticos para o ano de 2008 213 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional Quadro 77 Indicadores de desempenho adoptados pelo IRAR desagregados, tendo em conta os SAS e a “alta” e a “baixa” destes serviços. Estes grupos encontram-se estruturados em diversas categorias de indicadores, nomeadamente em indicadores de defesa dos interesses do uti- lizador, sustentabilidade da entidade gestora e sustentabilidade ambiental. No Quadro 77 apresentam-se os indicadores de desempenho desenvolvidos pelo IRAR para o abastecimento de água e para o saneamento de águas Indicadores de desempenho Serviço de água Serviço de águas residuais Defesa dos interesses dos utilizadores Defesa dos interesses dos utilizadores Acessibilidade de serviço aos utilizadores Acessibilidade de serviço ao utilizador AA 01 - Cobertura do serviço AR 01 - Cobertura do serviço AA 02 - Preço médio do serviço AR 02 - Preço médio do serviço Qualidade do serviço prestado aos utilizadores Qualidade do serviço prestado aos utilizadores AA 03 - Falhas no abastecimento AR 03 - Ocorrência de inundações AA 04 - Análises de água realizadas AR 04 - Resposta a reclamações escritas AA 05 - Qualidade da água fornecida Sustentabilidade da entidade gestora AA 06 - Resposta a reclamações escritas Sustentabilidade económico-financeira da entidade gestora Sustentabilidade da entidade gestora AR 05 - Rácio de cobertura dos custos operacionais Sustentabilidade económico-financeira da entidade gestora AR 06 - Custos operacionais unitários AA 07 - Rácio de cobertura dos custos operacionais AR 07 - Rácio de solvabilidade AA 08 - Custos operacionais unitários Sustentabilidade infra-estrutural da entidade gestora AA 09 - Rácio de solvabilidade AR 08 - Utilização de estações de tratamento AA 10 - Água não facturada AR 09 - Tratamento de águas residuais recolhidas Sustentabilidade infra-estrutural da entidade gestora AR 10 - Utilização de bombeamento das águas residuais na rede de drenagem AA 11 - Cumprimento do licenciamento das captações de água AR 11 - Reabilitação de colectores AA 12 - Utilização das estações de tratamento AR 12 - Reabilitação de ramais de ligação AA 13 - Capacidade de reserva de água tratada Sustentabilidade operacional da entidade gestora AA 14 - Reabilitação de condutas AR 13 - Obstruções de colectores AA 15 - Reabilitação de ramais AR 14 - Falhas em grupos electrobomba Sustentabilidade operacional da entidade gestora AR 15 - Colapsos estruturais em colectores AA 16 - Avarias em condutas Sustentabilidade em recursos humanos da entidade gestora Sustentabilidade em recursos humanos da entidade gestora AR 16 - Recursos humanos AA 17 - Recursos humanos Sustentabilidade ambiental Sustentabilidade ambiental AR 17 - Análises de águas residuais realizadas AA 18 - Ineficiência da utilização de recursos hídricos AR 18 – Cumprimento dos parâmetros de descarga AA 19 - Eficiência energética de instalações elevatórias AR 19 - Utilização dos recursos energéticos AA 20 - Destino final de lamas do tratamento AR 20 - Destino final de lamas de tratamento 214 Portugal Indicadores de desempenho para os serviços de água em “baixa” 2004 2005 2006 86 86 84 AA 02 - Preço médio do serviço 1,06 1,13 1,24 AA 03 - Falhas no abastecimento 2,24 0,97 0,66 AA 04 - Análises de água realizadas 97,95 99,93 99,46 AA 05 - Qualidade da água fornecida 99,12 99,21 98,95 80 66 73 AA 07 - Rácio de cobertura dos custos operacionais 1,17 1,22 1,24 AA 08 - Custos operacionais unitários 0,88 0,92 0,90 AA 09 - Rácio de solvabilidade 0,28 0,35 0,29 AA 10 - Água não facturada 26,1 25,1 23,6 AA 11 - Cumprimento do licenciamento das captações de água 23 1 3 AA 12 - Utilização das estações de tratamento 69 62 62 AA 13 - Capacidade de reserva de água tratada 1,3 1,4 1,4 AA 14 - Reabilitação de condutas 0,9 1,6 1,3 AA 15 - Reabilitação de ramais 2,2 2,9 2,6 AA 16 - Avarias em condutas 99 81 67 AA 17 - Recursos humanos 3,5 3,4 3,8 AA 18 - Ineficiência da utilização de recursos hídricos 18,6 16,9 15,8 AA 19 - Eficiência energética de instalações elevatórias 0,5 0,5 0,5 AA 01 - Cobertura do serviço AA 06 - Resposta a reclamações escritas AA 20 - Destino final de lamas do tratamento residuais. No Quadro 78 evidenciam-se os resultados médios do país para os primeiros três anos da aplicação do esquema de benchmarking pelo IRAR. Os resultados são, na generalidade, muito positivos, embora existam alguns indica- dores que pioram, mas como resultado de uma alteração na sua definição e de maior rigor na sua aplicação. Na Figura 57 apresenta-se, para o saneamento de águas residuais, a evolução do indicador utilização das ETAR (IRAR, 2007). Quadro 78 Indicadores de desempenho aplicados pelo IRAR ao serviço de água em “baixa” Figura 57 Evolução anual do indicador utilização das ETAR 215 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional O IRAR emite observações relativas aos resultados de cada indicador por operador regulado. Esta avaliação é exercida segundo um sistema de classificação que compara a performance obtida com valores de referência (valores óptimos, ou próximos disso, que o regulador considera como razoáveis de atingir para operadores regulados), tendo em conta os factores de contexto em que cada operador se insere. Neste processo, o IRAR classifica qualitativamente o desempenho de cada operador, considerando a qualidade do serviço prestado, se insatisfatória, mediana ou boa, mediante a discrepância entre o resultado obtido pelo indicador e o intervalo de valores de referência. O IRAR publica os resultados, hierarquizando-os por indicador de desempenho. O IRAR explana, por operador, os resultados obtidos do cálculo dos indicadores de desempenho, quantificando e classificando a qualidade do serviço em insatisfatória, mediana ou boa, atribuindo-lhe uma bola vermelha, laranja ou verde, respectivamente. O processo regulatório anual desempenhado pelo IRAR tem o seu término na publicação de um relatório anual (Relatório Anual do Sector da Águas e Resíduos em Portugal), onde são apresentados os resultados obtidos. Este documento revela-se uma peça crucial no modelo de regulação actualmente em vigor, não só por ser um importante promotor de uma maior eficácia e eficiência das entidades gestoras, mas também por fornecer informação, aos utilizadores e restantes stakeholders, fiável e de fácil interpretação sobre os serviços que lhes são prestados. 2.13.4.3 Obrigações de serviço público Em Portugal, as obrigações de serviço público, visando a defesa dos interesses dos utilizadores, são consideradas, em consonância, na Lei da Água (Lei n.º 58/2005) e na Lei dos Serviços Públicos Essenciais (Lei n.º 23/96, posteriormente alterada Lei n.º 12/2008). Sob este enquadramento legal, a universalidade e a continuidade de serviço são garantidas pelas Lei da Água e pela Lei dos Serviços Públicos Essenciais, respectivamente. A referida Lei dos Serviços Públicos Essenciais contempla diversos domínios que salvaguardam os interesses do utilizador: o direito de participação (as organizações representativas dos utentes têm o direito de ser consultadas quanto aos actos de definição do enquadramento jurídico dos serviços públicos), o dever de informação sobre a suspensão do fornecimento do serviço público (a prestação do serviço não pode ser suspensa sem préaviso adequado, salvo caso fortuito ou de força maior), o direito a quitação parcial (não pode ser 216 recusado o pagamento de um serviço público), os padrões de qualidade (a prestação de qualquer serviço deverá obedecer a elevados padrões de qualidade), os consumos mínimos (são proibidas a imposição e a cobrança de consumos mínimos), a facturação (o utilizador tem direito a uma factura que especifique devidamente os valores que apresenta), a prescrição e caducidade (o direito de exigir o pagamento do preço do serviço prestado prescreve no prazo de seis meses após a sua prestação), o carácter injuntivo dos direitos (é nula qualquer convenção ou disposição que exclua ou limite os direitos atribuídos aos utentes pela presente lei) e o direito ressalvado (ficam ressalvadas todas as disposições legais que, em concreto, se mostrem mais favoráveis ao utente). Como forma de aumentar a acessibilidade económica e a comportabilidade dos SAS para os utilizadores, diversos municípios dispersos por Portugal, com base na proposta da Associação Portuguesa de Famílias Numerosas, têm vindo a implementar a Tarifa Familiar de Água, que tem em conta o número de pessoas do agregado familiar. Esta medida tem sido amplamente adoptada pelos operadores. Muitos outros SAS têm implementado outro tipo de tarifas sociais estabelecidas com critérios relativos à idade, rendimento, doenças ou outros. Procurando aumentar a transparência no sector da água e a consciência dos utilizadores sobre os custos do sector, a Lei das Finanças Locais (Lei n.º 2/2007) veio impor que os sistemas tarifários sejam expostos no sítio da Web do respectivo município, além de conferir a total repercussão dos custos de serviço nos mesmos. Além disso, de modo a conferir maior eficiência ao tratamento das reclamações dos utilizadores, os operadores são obrigados a dispor de livro de reclamações e a enviar para o IRAR, no prazo de dez dias úteis, todas as reclamações recebidas. Por fim, é de referir que a qualidade da água tem melhorado significativamente nos últimos anos, atingindo hoje, na generalidade, níveis de excelência. 2.13.5 DESEMPENHO Em Portugal, os SAS tiveram desenvolvimentos muito relevantes nas últimas duas décadas. Os diversos marcos legais estabelecidos, as alterações organizacionais e, sobretudo, os vultuosos investimentos proporcionaram um aumento significativo de atendimento dos SAS, de tal modo que, na generalidade, os mesmos são, presentemente, disponibilizados com qualidade elevada. A qualidade de água de excelência fornecida aos Portugal utilizadores é outra evidência do sucesso dessa evolução. Além disso, a ampla participação dos stakeholders nas recomendações e a credibilidade técnica e reputação de isenção política do regulador, sobretudo em virtude da sua fragilidade institucional, são também factores que concorrem para o reconhecimento nacional e internacional do grande progresso operacional e regulatório, que tem caracterizado o sector da água em Portugal. É de referir, no entanto, que o país, neste domínio, pauta ainda por desafios importantes, designadamente a necessidade de alargar o modelo regulatório a todas as entidades gestoras dos SAS em Portugal, o facto de, apesar dos esforços significativos, as entidades gestoras não serem, com frequência, auto-sustentáveis, a necessidade dos operadores melhorarem a sua eficiência produtiva, a clarificação do papel do Estado no sector da água e a separação das funções regulatórias das funções de operador e, por último, uma melhoria da legislação existente que, em alguns casos, está ultrapassada e, noutros, é ainda limitada, tendo em conta as novas exigências. 217 Reino Unido 2.14 REINO UNIDO 2.14.1 ANTECEDENTES HISTÓRICOS O Reino Unido é, formalmente, uma monarquia parlamentarista, onde o poder legislativo se encontra associado ao governo e o poder executivo é representado pelo conselho de ministros, que é liderado pelo primeiro-ministro. O Reino Unido revela-se um Estado muito centralizado, com o Parlamento de Westminster composto pela Câmara dos Lordes (House of Lords) e pela Câmara dos Comuns (House of Commons). A tendência para a descentralização iniciou-se em 1999, com a institucionalização do Parlamento da Escócia e da Assembleia Nacional de Gales. A Irlanda do Norte também é dotada de autogoverno, através da Assembleia da Irlanda do Norte. O Reino Unido, com uma população próxima dos 60,5 milhões de habitantes, dispersa por cerca de 245 mil km2 de área, é constituído por quatro “países”: Inglaterra (83% da população), Escócia (9%), País de Gales (5%) e Irlanda do Norte (3%), e é administrado por intermédio de um governo central. Os quatro países encontram-se administrativamente organizados em regiões, condados, distritos e paróquias. No Reino Unido, os SAS primam, na generalidade, pela excelência e sucesso, sendo um benchmark em termos internacionais. A universalidade e a elevada qualidade do serviço, onde se destaca a sua diversidade de interligações institucionais entre as nações que compõem o Reino Unido, são algumas das suas melhores práticas. Além disso, a completa privatização dos SAS em Inglaterra e no País de Gales, a regulação económica (pioneira na Europa) independente e a introdução de competição no sector da água são outros factores conducentes a este êxito. Em Inglaterra e no País de Gales, os SAS são regulamentados por diversos documentos normativos. Apesar de a maior actividade regulamentar ter decorrido entre o final da década de 80 e o início da década de 90, esta teve na sua fase inicial a implementação da legislação de 1973, através da Lei da Água (Water Act), posteriormente alterada em 1983, 1989 e 2003. Também a publicação da Lei da Indústria da Água de 1991 (Water Industry Act 1991), alterada em 1999, instituiu importantes mudanças no sector da água. A Lei da Água de 1973 teve um enorme impacto no sector da água, face à grande revolução organizacional que instituiu nos operadores dos SAS, através da criação de dez operadores regionais, fundindo as competências de milhares de entidades que operavam os referidos serviços até então. Todavia, apenas com a implementação da Lei da Água de 1983, estas autoridades passaram a ter poder efectivo de pôr termo aos acordos que vigoravam no passado. Posteriormente, a implementação da Lei da Água de 1989 teve como principal consequência a privatização do sector da água, tendo sido criadas as Empresas de Água e de Águas Residuais (Water-and-Sewerage Companies – WaSC), de âmbito regional, com licenças de operação de 25 anos, e as Empresas de Água (Water-only Companies – WoC), com atribuições de natureza mais local e de menor dimensão. A entrada em vigor da Lei da Indústria da Água de 1991 consagrou diversas alterações no funcionamento do mercado da água no Reino Unido. Em particular, instituiu as atribuições e o modus operandus do regulador (Director General of Water Services), bem como os direitos e as obrigações dos operadores dos SAS para com o ambiente e os utilizadores do Reino Unido. Em 1999, a lei de 1991 foi alterada, passando a incluir um capítulo relativo aos aspectos sociais, abordando questões como a proibição do desligamento e um outro para a criação da 219 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional entidade reguladora da Escócia (The Water Industry Commissioner for Scotland – WICS). As principais alterações da Lei da Água de 2003 prenderam-se com a introdução de competição para os grandes utilizadores, que até então não existia, com o desenvolvimento de um novo sistema de licenciamento das captações e com a reestruturação da entidade reguladora, substituindo o cargo de director-geral por um Conselho de Administração, alterando inclusive o seu nome de Office of Water Services (OFWAT) para Water Services Regulation Authority (mantendo a sigla OFWAT). Para a Escócia, a Lei da Água de 1980 (Water Law 1980) constituiu um dos marcos normativos mais importantes, o qual, entre as várias determinações, regulamenta a qualidade da água para consumo humano. A já referida Lei da Indústria da Água de 1999 criou o WICS, a entidade reguladora do sector, cujos estatutos foram, posteriormente, alterados pela Lei dos Serviços de Água de 2005 (Water Services Act 2005), passando a denominar-se Comissão da Indústria da Água (Water Industry Commission). Além disso, a Lei da Indústria da Água de 2002 (Water Industry Act 2002) criou a Scottish Water, através da fusão dos três operadores públicos existentes, que prestavam os SAS à população escocesa, e regulamentou o funcionamento do regulador económico (Water Industry Commissioner), dos Comités dos Utilizadores (Customers Panel) e do regulador da qualidade da água (Drinking Water Quality Regulator). 220 2.14.2 ENQUADRAMENTO LEGAL E INSTITUCIONAL 2.14.2.1 Responsabilidades A responsabilidade pelos SAS, tal como sucede com a legislação, apresentam semelhanças entre os diferentes países que constituem o Reino Unido. Em Inglaterra e no País de Gales os principais intervenientes no sector da água são o governo, através do Secretário de Estado do Ambiente, Alimentação e Assuntos Rurais (Secretary of State for Environment, Food and Rural Affairs – SSEFRA), do Departamento do Ambiente, Alimentação e Assuntos Rurais (Department for Environment, Food, and Rural Affairs – DEFRA), da entidade reguladora (Water Services Regulation Authority – OFWAT), da Agência Ambiental (Environment Agency – EA), do Conselho de Utilizadores de Água (Consumer Council for Water - CCW), do Inspector da Água para Consumo Humano (Drinking Water Inspectorate – DWI), da Autoridade da Concorrência (Competition Commission – CC) e, por fim, da Associação dos Operadores (WaterUK). O SSEFRA constitui a instância do governo com maiores responsabilidades no sector da água e no desenvolvimento da política da água. O SSEFRA é entidade de cúpula, neste domínio, desempenhando funções relevantes, como o licenciamento dos SAS e a nomeação dos vários reguladores. Na Irlanda do Norte, um documento normativo de 1999 (Water Order) veio alterar o ordenamento do sector da água existente, em várias vertentes, que, até à data, se baseava na Lei da Água de 1972 (Water Act 1972). Esta lei veio, por exemplo, regulamentar os níveis mínimos de qualidade de água fornecidos para consumo humano, tal como as descargas de efluentes. Mais tarde, em 2003, outra regulamentação ambiental (Water Environment Regulations), implementou a Directiva-Quadro da Água, estabelecendo níveis ainda mais restritos de qualidade. O DEFRA possui a responsabilidade última sobre todos os aspectos ligados à política da água em Inglaterra, onde se inclui o abastecimento de água, a gestão e a qualidade dos recursos hídricos e toda a supervisão dos aspectos ambientais relativos à água e ao seu mercado. Com funções semelhantes ao DEFRA, existe a Assembleia Nacional em Gales (National Assembly for Wales – NAW) no País de Gales, o Departamento do Ambiente na Irlanda do Norte (Department for the Environment in Northern Irland) e o Scottish Executive na Escócia. Compreendendo todo o Reino Unido, a Lei da Concorrência de 1998 (Competition Act 1998) clarifica a regulamentação da concorrência neste país, incluindo a liberalização e a abertura à concorrência do sector da água. A lei identifica e trata as práticas de mercado restritivas e o abuso de posição dominante no mercado. Além destas imposições, a lei introduziu novas sanções para comportamentos anticoncorrenciais. A OFWAT é uma entidade reguladora independente com funções de regulação económica dos SAS em Inglaterra e no País de Gales. Esta entidade foi criada como uma instituição descentralizada, dotada de património próprio, autonomia administrativa e financeira. Aliado às suas incumbências de regulação económica (sistema tarifário), a OFWAT efectua também a regulação da qualidade do serviço e foram-lhe recentemente atribuídas valências sancionatórias no exercício Reino Unido das suas funções. A Comissão da Indústria da Água (Water Industry Commission for Scotland) e a Autoridade de Regulação dos Serviços Públicos (Northern Ireland Authority for Utility Regulation) foram criadas na Escócia e na Irlanda do Norte, respectivamente, mantendo as valências e incumbências regulatórias de modo similar à OFWAT. A EA, criada em 1996, substituindo a antiga Autoridade Nacional dos Rios (National Rivers Authority – NRA), possui valências no domínio da regulação ambiental. A EA tem o dever de conservar, desenvolver, redistribuir e assegurar a correcta utilização e a qualidade dos recursos hídricos em Inglaterra e no País de Gales. Neste âmbito, a agência representa o órgão central com a responsabilidade de planeamento dos recursos de da Água para Consumo Humano (Drinking Water Quality Regulator). A CC foi estabelecida pela Competition Act de 1998, substituindo a Comissão de Monopólios e Fusões (Monopolies and Mergers Commission – MMC), com a função de prover e garantir a concorrência no Reino Unido. Pronuncia-se sobre as operações de concentração, sobre o abuso de posição de mercado e da existência de comportamentos desviantes e sobre os sectores regulados. Em particular, os operadores dos SAS podem apelar para esta entidade das decisões tarifárias da OFWAT, que na circunstância de fusões e aquisições emite também o seu parecer. Na Figura 58 representam-se os principais intervenientes na indústria da água em Figura 58 Enquadramento institucional do sector da água em Inglaterra e no País de Gales hídricos nestes países. A Agência de Protecção Ambiental da Escócia (Scottish Environment Protection Agency – SEPA) e a Environment and Heritage Service (EHS) na Irlanda do Norte têm atribuições semelhantes. O CCW, substituindo o organismo Water Voice que vigorou até 2005, foi criado pela OFWAT, também com independência, com os deveres estatutários de representar os interesses dos utilizadores, onde se incluem as atribuições de investigar e monitorizar as reclamações dos mesmos sobre os SAS. Presentemente, com valências regionais, coexistem seis comités, ao invés dos dez que foram criados com a privatização do sector da água. Na Escócia, existe o Waterwatch Scotland, que substituiu recentemente os cinco comités existentes e que tem funções semelhantes ao CCW. Na Irlanda do Norte, estas funções são desempenhadas pelo Consumer Council for Northerd Ireland. O DWI é um organismo independente, responsável, desde 1990, pela monitorização e verificação da qualidade da água para consumo humano em Inglaterra e no País de Gales, tomando acções coercivas em situações de incumprimento das normas. Na Irlanda do Norte, a entidade com iguais valências apresenta a mesma denominação que em Inglaterra e no País de Gales. Na Escócia, estas funções são assumidas pela Entidade Reguladora da Qualida- Inglaterra e no País de Gales (Marques, 2005). No Quadro 79 sistematizam-se os principais intervenientes e responsabilidades no sector da água no Reino Unido. Por último, a Associação dos Operadores (Water UK) apresenta como objectivo principal a defesa dos interesses dos seus membros, bem como a sua representação a nível nacional e europeu, além da disseminação das melhores práticas entre os membros que a constituem. Supletivamente, a associação desempenha um importante papel de mediador entre operadores, reguladores, governos e sociedade civil. 2.14.2.2 Regulação No Reino Unido, os modelos regulatórios, actualmente em vigor revelam-se bastante eficazes. Baseiam-se na constituição de três reguladores independentes (regulação tricéfala): o regulador económico, o regulador ambiental e o regulador da qualidade da água. Estas três entidades são complementadas pela existência de outras entidades com funções regulatórias importantes, como a DEFRA, a CC e o CCW. Particularmente, em Inglaterra e no País de Gales, a OFWAT, como regulador económico, tem responsabilidades sobre a salvaguarda das actividades adequadas como parte integrante das empresas, a 221 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional Estado Gestão dos recurso hídricos Serviços de água e águas residuais Regulação ambiental Qualidade da água Regulação económica Inglaterra e País de Gales DEFRA 10 WaSC e 12 WoC (e os novos entrants) EA DWI OFWAT Escócia SEPA Scottish Water SEPA DWQ WICS Irlanda do Norte EHS Northern Ireland Water EHS DWI NIAUR Quadro 79 Principais organismos com responsabilidade no sector da água do Reino protecção dos interesses dos utilizadores, a garantia da viabilidade financeira das empresas, a promoção da eficiência económica das empresas e a indução de competição. O EA tem as funções do regulador ambiental, onde se inclui o licenciamento de captações e das descargas e, por último, o DWI tem funções de regulação da qualidade da água. Em Inglaterra e no País de Gales, a privatização do sector da água consistiu na venda dos activos das empresas. Ao mesmo tempo foi criado um regulador económico e dedicado para o sector da água, o Director General of Water Services (DG), responsável pela Office of Water Services (OFWAT), também com funções de controlo da qualidade do serviço e de protecção dos utilizadores. Os activos foram vendidos por cerca de 5% do seu valor estimado (contabilizando o pagamento dos débitos e o fornecimento da green dowry) e foi incentivada a possibilidade de as empresas inglesas privadas, então formadas, se expandirem em termos internacionais, o que veio a concretizar-se. Estava fundado o modelo inglês de organização e de regulação dos SAS, assente na propriedade e na gestão privada, e no controlo centralizado pelo Estado, por intermédio de regulação apertada, cuja função é a de substituição do mercado e, por conseguinte, de protecção dos utilizadores que constituem o epicentro do modelo. Com a privatização, foi atribuída uma licença de operação aos SAS por 25 anos, pelo responsável do governo (Secretary of State for the Environment of England and Wales – SSE), na qual foi estabelecida uma série de princípios a cumprir pelos SAS, sob supervisão da OFWAT. A regulação ambiental ficou a cargo da NRA, a qual foi absorvida, em 1996, pela EA, enquanto a regulação da qualidade da água para consumo humano era, e continua a ser, atribuição da DWI. Estes organismos trabalham na proximidade da OFWAT, so- 222 bretudo na definição dos objectivos de qualidade, com consequências ao nível dos investimentos e, como tal, da regulação económica. Em 1989, o período de revisão do sistema tarifário (intervalo regulamentar) foi estabelecido em 10 anos, pelo Department of Environment, com possibilidade de antecipação para 5 anos e de realização de revisões intermédias pontuais (interim determinations). A partir da determinação inicial ficou atribuída à OFWAT a sua revisão, a qual principiou em 1994, estando agora em análise a sua quarta revisão, relativa ao período 2011-2015. A metodologia de cálculo é baseada na regulação por limite de preços (price cap regulation). A fórmula aplicada consiste no estabelecimento do limite RPI±K, onde o RPI é o retail price index e o K diz respeito à diferença entre Q e X, correspondendo o primeiro ao impacto dos novos investimentos a efectuar e o X a um factor que estima os ganhos de produtividade esperados. O valor do RPI±K constitui o limite superior que os encargos ponderados (weighted average charges increase) com os SAS podem atingir. Na Figura 59 apresenta-se o procedimento regulatório relativo à determinação da variação do limite de preços que garante as receitas acrescidas para financiar o programa de investimentos. As receitas obtidas (tariff basket) são constituídas pela ponderação de vários itens, designadamente, daquelas provenientes do volume de água não medido, do volume de água medido, do volume de águas residuais medido, do volume de águas residuais não medido e do volume de águas residuais recebido, tratado e descarregado. São também incluídas as receitas provenientes do serviço de águas pluviais, que podem estar ou não englobadas nas referentes às águas residuais. A determinação do tecto dos preços de um SAS baseia-se, em grande parte, no desempenho Reino Unido Figura 59 Cálculo dos limites de preços dos outros operadores, pelo que se incorre no modelo de yardstick competition. No primeiro período regulatório, estabelecido pelo governo, o factor X foi determinado com base na produtividade total dos factores, estimada através de números índices. Nesse período, verificou-se que as previsões do governo foram muito benévolas, permitindo lucros excepcionais aos SAS, tendo levado à posterior aplicação de claw-backs. Para o segundo período regulatório, de 1994 a 1999, a OFWAT determinou o factor X com base em estudos de benchmarking mais refinados, assentes em métodos econométricos (regressão estatística) e de programação matemática (DEA), que permitiam determinar a eficiência relativa dos SAS e, deste modo, estimar os ganhos de produtividade esperados no futuro. Estas metodologias, largamente contestadas pelos operadores devido aos seus pontos fracos e ao facto de os modelos de cálculo não serem do seu acesso, apenas se aplicaram ao OPEX. Mesmo assim, no segundo período regulatório registaramse lucros excessivos, o que levou a OFWAT a alterar a fórmula de cálculo. A partir daí (terceiro período regulatório), os SAS começaram a passar todos os lucros acima dos considerados fair and reasonabale de uma só vez para os utilizadores, e não de forma faseada (glide path). Neste período continuaram a usar-se as metodologias de benchmarking referidas, alargando o objecto da sua aplicação também ao CAPEX. Os aspectos capitais no cálculo da revisão de preços eram, no essencial, três. O primeiro dizia respeito à estimativa dos ganhos de eficiência e de produtividade através das técnicas de benchmarking referidas. O Quadro 80 expõe a filosofia adoptada, baseada na construção de matrizes de bandas de eficiência para o ano 2006/2007 (OFWAT, 2007b). O segundo aspecto consistia na realização do plano de investimentos (asset management plan) proposto pelo SAS e aceite pelo regulador. Na sua realização terão de contemplar-se as diferentes parcelas que permitirão a manutenção e a melhoria da “serviceability”, ou seja, o nível do investimento na manutenção de infra-estruturas não pode levar a uma deterioração da qualidade do serviço. A OFWAT supervisiona a qualidade dos activos através da avaliação sistemática de certos indicadores. Por exemplo, para as redes de distribuição de água, esta análise integra os números de roturas, problemas de baixa pressão, interrupções e anomalias de qualidade da água. Por fim, o terceiro aspecto relaciona-se com a remuneração dos SAS, sobretudo com o cálculo dos custos de capital e dos activos a remunerar. Estes últimos consideram o valor do capital regulado (regulated capital value), que resulta da avaliação da OFWAT do activo base regulado dos SAS (regulated asset base). O custo de capital é obtido pelo CAPM. Nos últimos dois períodos de revisão tarifária (price review), de 2000 a 2005 e de 2005 a 2010, mantendo os mesmos princípios, foi adoptada a seguinte formulação para determinação do factor K: K = - Po – X + Q + V + S onde: Po Ajustamento relativamente ao excedente de ganhos verificado no passado; X Ganhos de produtividade futuros; Q Padrão de qualidade desejado; V Melhoria da segurança e fiabilidade do abastecimento; S Melhoria dos níveis de serviço. Desta forma, na determinação do factor K considera-se a reposição de uma remuneração justa 223 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional A Northumbria B Anglian, Bournemouth & West Hampshire C Southern, Thames, Yorkshire, Dee Valley, Portsmouth Severn Trent, Wessex, Sutton & East Surrey North West, Essex & Suffolk South Staffordshire Bristol, Tendring Hundred OPEX Cambridge, North Surrey York D Dwr Cymru, Folkestone & Dover, Mid Kent E South East E D C Three Valleys South West B A CAPEX (só manutenção) Quadro 80 Eficiência relativa dos operadores em Inglaterra e no País de Gales A – Mais eficiente, B – Acima da média, C – Média, D – Abaixo da média, E – Menos eficiente e normal (Po), os ganhos de eficiência e produtividades esperados para o período regulatório seguinte (X), a manutenção da “serviceability” dos operadores (S), a satisfação do equilíbrio entre a procura e a oferta dos recursos hídricos (V) e a melhoria da qualidade da água, ambiental e de serviço (Q). Estes assuntos, bem como os aspectos de natureza financeira, são vertidos num plano de desenvolvimento (master plan), que é analisado, discutido e aprovado pela OFWAT. É também de referir que está instituído um esquema de carrots e sticks na determinação do factor K, que permite às melhores práticas reter parte dos ganhos obtidos, através da redução do termo Po (carrots), e penalizando as piores práticas, não possibilitando essa redução (sticks). É de notar que a OFWAT, e de acordo com as suas atribuições, tem tido um papel muito importante na promoção da competição no sector da água em Inglaterra e no País de Gales. Do leque de opções incentivadas destacam-se os inset appointments, onde para uma dada área geográfica, o operador histórico é substituído por outro na prossecução das actividades de fornecimento de água e de drenagem de águas residuais, o acesso de terceiros à rede (common carriage), a competição na fronteira das áreas abastecidas, a competição pela comercialização e o recurso a sistemas privados e não regulados. Todas estas faculdades têm sido desenvolvidas, de algum modo, nestes países e, embora a sua quota de mercado seja ainda muito reduzida, têm contribuído de forma muito relevante para a dinâmica e competitividade do sector da água, reduzindo substancialmente os preços para os grandes utilizadores. Na Escócia, a regulação económica implementada pela WICS, na prática, revela-se bastante similar à que se observa em Inglaterra e no País 224 de Gales, adoptando também um esquema de preços máximos e a ferramenta de benchmarking como instrumento essencial. O primeiro período regulatório ocorreu entre 2002 e 2006, encontrando-se agora em vigor o segundo período que irá até 2010. Actualmente, a WICS regula um único operador, a Scottish Water. Na Irlanda do Norte, a entidade reguladora multissectorial (Northern Ireland Authority for Utility Regulation – NIAUR) apenas recentemente (em 2007) alargou as suas atribuições aos SAS. Está nesta altura em curso a determinação do sistema tarifário para o primeiro período regulatório (2010-2015), também com base num sistema de preços máximos. Similarmente à Escócia, esta entidade reguladora apenas regula um único operador (Northern Ireland Water). No Quadro 81 apresenta-se o resumo das principais características dos reguladores económicos no Reino Unido. Os conselhos e comités de utilizadores têm funções regulatórias importantes, não só na defesa dos utilizadores quanto à resposta a reclamações e resolução de conflitos, mas também na revisão de preços, participando e pronunciando-se sobre os planos de investimento e sobre as propostas da OFWAT e dos operadores para o estabelecimento de preços. Além da actividade específica das entidades reguladoras, as associações dos operadores (sobretudo a Water UK) desempenham um importante papel de auto-reguladores, em que, além da procura de disciplina entre os operadores, a disseminação das melhores práticas se revela numa actividade preponderante, quando o objectivo constitui o progresso do sector da água e a consequente defesa dos interesses dos utilizadores. Reino Unido OFWAT WICS NIAUR Início de actividade 1989 2005 2007 Domínio regulatório Água e águas residuais Água e águas residuais Electricidade, gás, água e águas residuais 14,5 6,3 1,5 (apenas no sector da água) 98,5% das licenças e 1,5% outros 64% da Scottish Water, 35% da Central Market Agency e 1% outros 100% do operador 190 18 65, mas apenas 12 para o sector da água Despesa total (milhões €) Fonte de rendimento Funcionários (n.º) Regulação por limite de preço (price cap) Regulação económica Período regulatório (anos) Custo capital 5 4 5 CAPM WACC CAPM depois de 2009/10 Também a Autoridade da Concorrência, ao investigar a razoabilidade dos preços praticados, denota uma participação relevante na regulação no sector da água. Apesar do seu vasto domínio multissectorial, esta sustenta-se numa análise que envolve a comparação dos preços dos SAS com o nível de preço médio, pronuncia-se sobre as operações de fusão e aquisição no sector da água e constitui o órgão de recurso quanto às decisões relativas ao estabelecimento de preços pela OFWAT. 2.14.3 ESTRUTURA DO MERCADO 2.14.3.1 Propriedade e gestão de serviços A propriedade dos SAS difere entre os países que compõem o Reino Unido. Em Inglaterra e no País de Gales todos os SAS estão, desde 1989, totalmente sob o domínio do sector privado. De modo contrário, os SAS da Escócia e da Irlanda do Norte são prestados por entidades gestoras públicas, ainda que de direito privado. Nestes países existem também várias PPP para diversas actividades da fileira produtiva dos SAS (p. ex., ETAR). 2.14.3.2 Players do sector A propriedade dos SAS privatizados em Inglaterra e no País de Gales demonstra um modelo misto (privado), que tem sofrido mutações significativas nos últimos 5 anos, com um crescimento considerável no papel de investidores financeiros e de fundos privados. Esta situação tem sido acompanhada por uma diminuição dos fundos próprios e da sua substituição pelos fundos de dívida. Quadro 81 Principais características dos reguladores do Reino Unido Até 1974, em Inglaterra e no País de Gales os SAS eram desenvolvidos por um conjunto significativo de empresas e de serviços locais. Nesse ano, procedeu-se à reorganização do sector, “desmunicipalizando” estas actividades e constituindo as 10 empresas regionais (Regional Water Authorities - RWA), segundo o princípio de gestão por bacia hidrográfica como organização. Em 1989, o governo de Tatcher, enfrentando necessidades de investimento avultadas por parte da indústria da água, e após alguns anos de estudos, decidiu efectuar uma autêntica revolução neste sector através da sua privatização, no sentido mais estrito do termo, isto é, de alienação dos activos. Em 1989, existiam 39 empresas privadas em Inglaterra e no País de Gales, abrangendo mais de 90% da sua população. Destas, 10 empresas, correspondentes às anteriores RWA, eram simultaneamente responsáveis pelos SAS (denominadas WaSC), enquanto as restantes 29 englobavam apenas o serviço de água (WoC). O número das WoC diminuiu nos anos subsequentes à privatização, como resultado de várias fusões e aquisições. No final de 2007 existiam 10 WaSC e 12 WoC (ainda que houvessem mais empresas licenciadas, mas que eram novos entrants). Presentemente, em Inglaterra e no País de Gales existem 12 empresas que fornecem os SAS e 13 empresas que apenas fornecem os serviços de água. Desta forma, foram criadas mais 2 empresas com atribuições de abastecimento de água e saneamento de águas residuais, mas de âmbito 225 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional local, fornecendo os SAS a três aglomerados que não detinham acesso a água. Ainda dentro dos novos entrants, os remanescentes correspondem a uma empresa que abastece um único cliente, outra empresa que fornece os serviços de água numa área referente a cerca de 2.000 habitantes e as restantes 21 são grandes operadores, fornecendo mais de 150 000 utilizadores. Por outro lado, os serviços de águas residuais, excepto as duas empresas referidas que foram criadas em 2007, são operados por grandes empresas, fornecendo mais de um milhão de habitantes. Quadro 82 SAS em Inglaterra e no País de Gales Empresa WaSC WoC Cinco das dez WaSC permanecem ainda cotadas em bolsa. Uma dessas, a Northumbrian, tem 45% das suas acções sob o domínio de três investidores. Uma outra, a South West Water, pertence em 30% ao Grupo Pennon. A Severn Trent Water é dominada pelo Severn Trent Group. A North West Water está sob a alçada do grupo United Utilities. Por último, a Yorkshire está sob a influência do Grupo Kelda. Das restantes 5 WaSC, a Anglian, a Southern e a Thames, são propriedade de grupos privados ou de entidades financeiras. A Wessex é propriedade do grupo multinacional malaio YTL e a quinta WaSC não cotada é uma entidade sem fins lucrativos (Glas Cymru). As 10 WaSC foram protegidas de aquisição por 5 anos pela “golden share” do governo. Como referido, o número de WoC caiu de 29, em 1989, para 12, no início de 2006, principalmente devido às fusões entre WoC e as restantes devido a aquisições por WaSC. As aquisições na década de 90 foram dominadas pelas multinacionais francesas que operam no ramo das utilities (Veolia, Suez e SAUR), bem como por empresas ligadas ao ramo da energia que desejavam expandir-se para o sector da água (p. ex., Enron, Scottish Power e RWE). No entanto, desde 2000 as multinacionais da água e as empresas de energia têm vindo a retirar-se deste mercado, procurando-se em alguns casos novas formas de governo, como a sua mutualização (p. ex., Welsh Water) e o envolvimento dos bancos e de outras entidades financeiras, bem como a sua colocação em bolsa. Das WoC, três encontram-se ainda na posse da Veolia, uma empresa sob a propriedade da Suez/Agbar, uma pertence a um grupo de Hong Kong, uma outra a um grupo britânico (Biwater) e as remanescentes são propriedade de private equity. No Quadro 82 apresenta-se o proprietário dominante das 10 WaSC e das 12 WoC de Inglaterra e País de Gales, o país de origem e a sua natureza. Empresa Proprietário País Natureza Anglian Water Osprey/AWG Reino Unido PE Northumbrian Water - Reino Unido SEC North West Water United Utilities Reino Unido SEC Severn Trent Water Severn Trent Reino Unido SEC Southern Water Royal Bank of Scotland Reino Unido PE South West Water Pennon Group Reino Unido SEC Thames Water Macquarie Austrália PE Welsh Water Glas Cymru Reino Unido NPC Wessex Water YTL Malásia M Yorkshire Water Kelda Reino Unido SEC Bournemouth/West H. Water Biwater Reino Unido P Bristol Water Agbar/Suez Espanha/França M Cambridge Water Cheung Kong Infrastructure Hong Kong M Cholderton Water Cholderton Estate Reino Unido P Dee Valley - Reino Unido SEC Folkestone and Dover Veolia França M Mid Kent Water UTA and HDF Austrália PE Portsmouth Water South Downs Capital Reino Unido PE South East Water UTA and HDF Austrália PE South Staffordshire Water Arcapita Bank Bahrein PE Sutton & East Surrey Water Aqueduct Capital Alemanha PE Tendring Hundred Veolia França M Three Valleys Veolia França M SEC – Stock Exchange Quoted; M – Multinacional; PE – Private Equity; NPC – Not-for-profit company; P – Empresa privada 226 Reino Unido Na Escócia, os SAS são, actualmente, promovidos por uma única entidade, a Scottish Water, uma empresa estatal que fornece toda a população escocesa. Todavia, com o objectivo de dotar o mercado de maior concorrência, o governo liberalizou o sector da água, permitindo o aparecimento de novos entrants, como a Osprey, a Satec e a Aquavitae. Tal como sucede na Escócia, a Northern Ireland Water é uma empresa estatal que opera os SAS em todo o território da Irlanda do Norte. 2.14.3.3 Integração do sector e serviços oferecidos De um modo geral, no Reino Unido, os SAS encontram-se integrados num único operador. Neste âmbito, os serviços encontram-se verticalmente integrados, ou seja, os operadores desempenham todos os serviços relativos à vertente produtiva, desde a captação até à distribuição de água. Ao nível do serviço de águas residuais, constata-se a mesma situação, designadamente a integração dos serviços, quer relativamente à recolha quer ao tratamento de águas residuais. Deste modo, o grau de integração horizontal é igualmente elevado, existindo um número reduzido de operadores para toda a população urbana do Reino Unido. As raras excepções sucedem em Inglaterra e no País de Gales, onde existe cerca de uma dúzia de empresas que apenas prestam os serviços relativos à fileira da produção de água, embora de dimensão elevada. Além disso, há os sistemas individuais, que também abrangem uma população relevante. 2.14.3.4 Números do sector No Reino Unido, mais precisamente em Inglaterra e no País de Gales, são captados por ano cerca de 16 mil milhões de m3 de água, onde se destaca a água superficial (70%) como a principal fonte. Do volume de água produzido, o sector eléctrico assume o lugar de maior consumidor de água, seguido do abastecimento público, cada um com cerca de 42% e 37,5%, respectivamente. Face à não contabilização da água consumida, revela-se mais difícil aferir com exactidão o valor referente às perdas de água, no entanto, estima-se que estas sejam, aproximadamente, de 23,4% no Reino Unido. Apesar de mais de 75% da população não possuir contador na sua propriedade, a OFWAT estima que a capitação de água, em 2006, era cerca de 147 litros por habitante e por dia. No Quadro 83 mostra-se a evolução do referido consumo por tipo de empresa (fonte: OFWAT). No Quadro 84 apresenta-se o número de habitantes que são dotados de 1995-96 1996-97 1997-98 1998-99 19992000 2000-01 WaSC 149 145 147 145 148 149 WoC 171 163 160 159 161 161 Total 154 149 150 148 151 152 Água Águas residuais Abastecimento sem contador Abastecimento com contador Recolha sem contador Recolha com contador WaSC 34 434 000 8 765 000 40 414 000 10 919 000 WoC 7 866 000 1 933 000 - - Total 42 300 000 10 698 000 40 414 000 10 919 000 Quadro 83 Evolução anual da capitação de água em Inglaterra e no País de Gales Quadro 84 População com e sem contador para o serviço de água 227 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional Quadro 85 Principais características das redes de água e de águas residuais quais 3.700 são na Escócia, 1.800 na Irlanda do Norte e os restantes em Inglaterra e no País de Gales. contador por tipo de empresa (fonte: OFWAT). No Quadro 85 destacam-se as principais características das redes de abastecimento de SAS Inglaterra País de Gales Escócia Irlanda do Norte 50,7 3 5 1,7 838 226 47 000 26 500 37 27 Água População fornecida (milhões) Água produzida (milhões de m3) 5.469 Rede de abastecimento de água (km) 310 000 Perdas de água (%) 27 000 22 Águas residuais População fornecida (milhões) Rede de saneamento de águas residuais (km) Percentagem de população ligada à rede 48,7 2,9 5 1,4 285 000 19 000 49 000 14 500 100% 83% 96% água e do saneamento de águas residuais por país do Reino Unido. Tendo em conta as características do sector da água nos diferentes países, de igual modo, são diferentes as necessidades de investimento e as receitas requeridas. No Quadro 86 apresenta-se o resumo dos investimentos e das receitas por serviço e por país. Os SAS do Reino Unido empregam directamente cerca de 35 000 funcionários, dos Quadro 86 Resumo dos investimentos e receitas SAS (milhões de €) 2.14.4 REGRAS DO JOGO 2.14.4.1 Estabelecimento de tarifas A OFWAT constitui uma das mais-valias do modelo inglês. O seu desenho institucional confere independência, atribuições e ferramentas que permitem a sua actuação de forma eficaz e competente. A OFWAT impulsionou a indústria da Inglaterra e País de Gales Escócia Irlanda do Norte Receita total 5.452,6 554,5 188,6 Investimento 7153,8 982,8 321,4 Receita total 5.534,9 676,8 165,8 Investimento 7.648,8 1.072,7 489,0 Água Águas residuais 228 Reino Unido os factores K e são expressas em relação ao IPC de cada ano, que é medido no Reino Unido pelo Retail Price Index (RPI). A fórmula é, assim, conhecida como RPI-K. O processo baseia-se nas previsões de despesas (operação e capital) e na variação da produtividade expectável para o período regulamentar seguinte. No Quadro 88 apresentam-se os limites de preços médios por tipo de empresa estabelecidos em Inglaterra e no País de Gales. água em Inglaterra e no País de Gales, que, em poucos anos, se tornou numa das mais importantes e com melhor desempenho do mundo. Nos últimos 15 anos, em Inglaterra e no País de Gales, os preços não baixaram, pelo menos em valores reais, mas os níveis de investimento na indústria foram altíssimos, traduzindo-se em progressos significativos nos padrões de qualidade ambiental e de qualidade do serviço prestado. Além disso, os ganhos de eficiência e de produtividade têm sido relevantes, fornecendo value for money nestes serviços. O Quadro 87 evidencia esses resultados. Em Inglaterra e no País de Gales, as tarifas implementadas sobre os utilizadores domésticos Preços constantes (€) Variação do desempenho 19901995 19952000 20002005 19902005 Melhoria da qualidade ambiental 58 54 46 158 Melhoria da qualidade de serviço 29 5 2 35 Melhoria da eficiência -8 -29 -96 -133 Balanço total 78 30 -48 61 Limite de preço médio 1990-95 K definido na privatização 1995-2000 Determinação da OFWAT 2000-05 Determinação da OFWAT 2005-10 Determinação da OFWAT WaSC 5.0% 1.4% -1.5% 4,3% WoC 6.1% 0.4% -2.4% 3,1% Total 5.2% 1.3% -1.6% 4,2% Os limites de preços são fixados por um período de 5 anos pela OFWAT, permitindo uma estabilidade de preços para as empresas sem elevar muito o risco. Uma série de fusões e aquisições na década de 90 (frequentemente entre uma WaSC e uma WoC na mesma região) incluíram frequentemente acordos de reduções dos preços como parte das condições da fusão e fora do habitual período de revisão do limite de preços. são fixadas anualmente pelas WaSC com base na variação do RPI e do K, determinado pelo regulador. Embora os limites estejam definidos, os operadores têm alguma liberdade para o estabelecimento do sistema tarifário, designadamente das várias parcelas que o compõem. Todavia, os sistemas tarifários devem evitar a discriminação entre serviços e utilizadores, permitindo recuperar os custos reais associados a cada parcela incluída no tarifário. Conforme referido, a determinação do limite de preços e consequentemente do sistema tarifário baseia-se num processo de análise conhecido como revisão tarifária (price review). A revisão passa por um processo de consulta e de negociação com os operadores. As variações percentuais fixadas são conhecidas como A maioria dos SAS disponibilizados em Inglaterra e no País de Gales continua a estabelecer os preços sem ter em conta o consumo de água. Desta forma, os sistemas tarifários dos utilizadores domésticos são maioritariamente indexados ao valor patrimonial das propriedades (rateable value - RV). Grande parte dos SAS aplica uma Quadro 87 Variação da factura média anual do utilizador em Inglaterra e no País de Gales Quadro 88 Limite de preços (K) estabelecidos em Inglaterra e no País de Gales 229 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional Quadro 89 Facturas médias dos utilizadores domésticos taxa fixa permanente, no entanto, também é usual implementar uma parcela relacionada com a propriedade, o que dilui o impacto do RV (duas empresas cobram os seus serviços baseadas numa parcela fixa). Os SAS são cobrados aos utilizadores mediante a aplicação de uma parcela fixa e de uma parcela variável, independentemente da existência ou não de contador. A única variação prende-se com a parcela variável e que, no caso da contabilização de água, é estabelecida em função do consumo de água, enquanto na outra situação, a mesma é implementada em função das características da propriedade (RV). No Quadro 89 apresentam-se os encargos dos utilizadores domésticos com os SAS (OFWAT, 2007a). O primeiro e segundo escalões divergem entre os SAS, sendo que o consumo até 25 m3 é o limite do primeiro escalão para o serviço de água e de 23,75 m3 para o serviço de águas residuais (95% de afluência à rede). Os segundos escalões referem-se a valores superiores aos referidos consumos, para ambos os serviços, e apresentam tarifários mais reduzidos. Além disso, os utilizadores encontram-se obrigados a pagar uma taxa municipal relativa ao serviço de drenagem, em função do escalão do imposto municipal (Council Tax band). Esta taxa encontra-se desagregada em duas parcelas, uma relativa à propriedade (Property Drainage), com valores entre 33,26 e 99,63 euros, e outra Volumes não medidos Variação dos encargos 1989-2007 (%)* Factura média em 2007 (€) Volumes medidos Variação dos encargos 19892007 (%)* Factura média em 2007 (€) Água 53,7 196,3 Água -8,1 167,5 Águas residuais 44,4 208,8 Águas residuais -3,3 188,8 Combinado 48,8 406,3 Combinado -5,6 356,3 *excluindo o IPC Em Inglaterra e no País de Gales a factura média dos SAS para os utilizadores domésticos foi, em 2007, de 390,3 euros (187,6 euros para o serviço de água e 202,7 euros para o serviço de águas residuais). Estes valores revelam um aumento de 42% face a 1989. Os preços estabelecidos pelas WaSC para o tratamento dos efluentes dos utilizadores não domésticos são efectuados com base na fórmula Mogden, que tem em conta a carga poluente dos efluentes, sobretudo importante para alguns tipos de águas residuais industriais. No Quadro 90 apresentam-se exemplos dos sistemas tarifários em Inglaterra e no País de Gales. Na Escócia e na Irlanda do Norte, os sistemas tarifários pretendem igualmente recuperar a totalidade dos custos, incluindo uma remuneração adequada dos capitais investidos. Tal como em Inglaterra e no País de Gales, existem utilizadores domésticos que não possuem contador, sendo sujeitos a uma única parcela tarifária, que contabiliza todos os custos de serviço. No que concerne aos utilizadores remanescentes, os SAS são cobrados mediante uma parcela fixa, em função do calibre do contador, e uma parcela variável, em função do volume de água consumido. No Quadro 91 e no Quadro 92 representam-se os sistemas tarifários instituídos pela Scottish Water (2008) para os utilizadores com contador e sem contador para o ano de 2008. 230 relativa aos arruamentos (Roads Drainage), com valores de 33,26 a 99,63 euros. Os utilizadores que não possuem acesso ao serviço de águas residuais também não se encontram obrigados a pagar por esse mesmo serviço. No Quadro 93 e no Quadro 94 apresentam-se os sistemas tarifários implementados pela Northern Ireland Water para o ano de 2008. 2.14.4.2 Qualidade do serviço De um modo geral, os SAS do Reino Unido (em todos os países) prestam serviços com uma qualidade elevada. Neste campo, as reformas instituídas no sector da água (privatização em Inglaterra e no País de Gales e as fusões na Escócia e Irlanda do Norte), associada à implementação de entidades reguladoras económicas, de qualidade do serviço e de defesa dos utilizadores, contribuíram de forma acentuada para o progresso do sector da água no Reino Unido. Na regulação da qualidade do serviço, e não desligado da regulação económica anteriormente explanada, o regulador publica também, anualmente, um relatório sobre os níveis de serviço (DG2-DG9) que inclui, designadamente, aspectos relacionados com a pressão inadequada, as interrupções, as restrições de usos, Reino Unido Águas residuais SAS Água Águas residuais e pluviais Águas residuais Anglian Water (WaSC) Volume não medido Parcela fixa (€/ano) 164,13 198,68 156,22 Parcela variável (€/RV) 0,525 0,565 0,565 Parcela fixa (€/ano) 32,47 89,92 47,46 Parcela variável (€/m3) 1,509 1,648 1,648 - - - 1,942 2,980 2,351 211,06 261,02 218,55 - - - Parcela fixa (€/ano) 84,92 147,37 104,91 Parcela variável (€/m3) 0,810 0,797 0,797 Volume medido Consumidores sazonais* Parcela fixa (€/ano) Parcela variável (€/m3) Tarifas sociais Opção I Parcela fixa (€/ano) Parcela variável (€/m3) Opção II Folkestone and Dover Water Services (WoC) Serviço de água Volume medido Parcela fixa (€/ano) 36,56 Parcela variável (€/m ) 1,63 3 Tarifa social** 234,79 Parcela fixa (€/ano) Volume não medido 89,92 Parcela fixa (€/ano) 57,00 Parcela variável (€/RV) 1,25 * Para utilizadores domésticos com consumos anuais de água inferiores a 75 m3; **Caso o consumo seja inferior a 122 m3 as inundações, os contactos sobre facturação, as reclamações escritas, as facturas medidas e a facilidade de contacto telefónico. A publicação e a mediatização destes elementos (regulação sunshine) têm um efeito dissuasor sobre os SAS que evidenciam pior desempenho, e são estimulantes para aqueles que evidenciam as best practices. Com o mesmo fim, ou seja, incrementar a qualidade do serviço, a OFWAT considerou, explicitamente, na revisão de preços, para o período 2000-2005, o desempe- nho dos níveis de serviço, premiando os cinco melhores SAS (+0,5%) e penalizando os cinco piores (-0,5%). Quadro 90 Sistemas tarifários da Anglian Water e da Folk and Dover WS para o ano de 2008 Neste âmbito, o benchmarking desenvolvido pelas entidades reguladoras compreende um papel preponderante no incentivo ao desenvolvimento do sector da água e, deste modo, da qualidade do serviço prestado. No Quadro 95 apresentase a evolução da qualidade do serviço dos SAS de Inglaterra e do País de Gales desde 1990. 231 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional Quadro 91 Sistema tarifário da Scottish Water para os utilizadores com contador Parcelas Água Águas residuais 165,3 – 3.091,2 165,2 – 3.090,6 1.º escalão (€/m3)* 2,59 3,26 2.º escalão (€/m3)* 0,94 1,54 Tarifa unitária (€/m3) 0,94 1,54 Parcela fixa (€/contador.ano) Parcela variável *contadores até 20mm Quadro 92 Sistema tarifário da Scottish Water para os utilizadores sem contador Quadro 93 Sistema tarifário da N. I. Water para os utilizadores com contador A … H Água (€) 141,8 … 425,36 Águas residuais (€) 160,3 … 480,87 Combinado (€) 302,1 … 906,23 Escalão do imposto municipal Parcelas Água Águas residuais 77,99 – 1.980,6 38,99 – 990,3 1,18 0,83 Água Águas residuais Máx. 493,2 Máx. 493,2 Parcela fixa (€/ano) 32,3 35,2 Parcela variável (€/1238 € de NAV) 11,0 11,8 Parcela fixa (€/contador.ano) Parcela variável (€/m3) Quadro 94 Sistema tarifário da N. I Water para os utilizadores sem contador Parcelas Volume não medido A Figura 60 demonstra a avaliação de desempenho global considerando todos os níveis de serviço atrás calculados (overall performance assessment - OPA). Assim, pode obter-se o grau de satisfação global com a qualidade do serviço dos SAS (OFWAT, 2006). Como forma de manter e desenvolver o sector da água no Reino Unido, a OFWAT promove um benchmarking periódico com mais de 40 operadores dos SAS internacionais, que en232 globa países como a Escócia (1), a Irlanda do Norte (1), o Canadá (4), a Escandinávia (10), a Países Baixos (6), a Austrália (6), os Estados Unidos (9) e Portugal (IRAR – 15% da população). Neste projecto são desenvolvidos 23 indicadores de desempenho, onde são avaliadas as áreas da facturação aos utilizadores (2), os níveis de serviço ao utilizador (1), a qualidade da água e o desempenho ambiental (2), a água distribuída, perdas e eficiência (4), os custos unitários e eficiência relativa (3), a ac- Reino Unido 1990-95 (%) 2003-04 (%) 2006-07 (%) DG2 – Propriedades em risco de baixa pressão 1,33 0,04 0,02 DG3 – Propriedades sujeitas a interrupções não planeadas superiores a 12h 0,33 0,14 0,15 14 0 30 DG5 – Propriedades sujeitas a inundações (transbordamento ou outras causas) 0,03 0,01 0,02 DG5 – Propriedades sujeitas a risco de incidentes de inundações (1 em 10 anos) - 0,03 0,02 DG5 – Propriedades sujeitas a risco de incidentes de inundações (2 em 10 anos) 0,08 0,01 0,01 DG6 – Contactos sobre facturação não respondidos (dentro de 5 dias úteis) 21,78 0,47 4,79 DG7 – Reclamações escritas não respondidas (dentro de 10 dias úteis) 21,42 0,14 1,85 DG8 – Facturas não relativas a medições - 0,15 0,86 DG9 – Telefonemas recebidos não respondidos dentro de 30 segundos - 5,85 - – Chamadas não atendidas 2,89 9,76 – Todas as linhas ocupadas 5,44 5,66 Descrição DG4 – População sujeita a fornecimentos fora da rede pública DG9 – Chamadas telefónicas – Satisfação do call handling tividade da rede (2) e, por último, as finanças (10). Além disso, periodicamente, a OFWAT publica relatórios sobre diversos aspectos relacionados com o funcionamento dos SAS, que permite avaliar ao longo do tempo e comparar entre os operadores o desempenho efectuado (p. ex., perdas de água). Na Escócia, o WICS tem como principal função promover a qualidade do serviço dos SAS. Face à restrição de apenas regular um operador, a entidade reguladora adopta como benchmarks os operadores dos SAS em Inglaterra e no País de Gales, além de também possuir como referência os resultados obtidos em anos transactos, designadamente no que se refere aos principais indicadores de desempenho. 4,47 2.14.4.3 Obrigações de serviço público Quadro 95 Evolução dos indicadores de desempenho no sector da água em Inglaterra e no País de Gales No modelo regulatório da Inglaterra e do País de Gales, uma das características essenciais consiste na colocação dos utilizadores no centro da regulação. Neste domínio, a legislação em vigor contempla, de forma clara, as obrigações de serviço público, como a universalidade, a continuidade, a qualidade do serviço e a acessibilidade. De igual modo, a OFWAT, de forma inovadora, consagrou os parâmetros mínimos de qualidade do serviço, a partir dos quais os SAS terão de indemnizar os utilizadores (guaranted standard schemes – Níveis de Qualidade do Serviço). Por exemplo, se uma reclamação não tiver resposta 233 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional Figura 60 Indicador OPA para os serviços de água de Inglaterra e País de Gales num determinado período ou se existir uma interrupção do serviço de água sem aviso prévio e por culpa do operador, os utilizadores receberão um montante pecuniário como contrapartida. Em Abril de 2008, a OFWAT reviu os procedimentos de implementação dos Níveis de Qua- radores definem tarifas especiais a utilizadores com escassos recursos financeiros, como os utentes que sejam providos de subsídios do Estado e tenham três ou mais filhos e também em casos especiais, associados a doenças crónicas. No Quadro 96 apresentam-se alguns exemplos de indicadores de qualidade do serviço desen- Período de privatização 2005-06 Percentagem de reclamações escritas respondidas em 10 dias úteis 81,9% (1992/93) 96,9% Percentagem de contactos sobre facturação respondidos em 5 dias úteis 79,8% (1992/93) 95,6% 11 388 34 040 Serviço ao utilizador Número de pagamentos compensatórios Quadro 96 Exemplos de indicadores de qualidade do serviço lidade do Serviço. Uma das mais importantes alterações prendeu-se com a uniformização dos mesmos nos territórios de Inglaterra e do País de Gales, tal como se verificaram alterações nas garantias relativas ao serviço de águas residuais. É também de salientar que os utilizadores carenciados e com necessidades especiais têm um regime próprio de protecção, estabelecido pelo Water Industry Act 1999, não podendo a sua desconexão ser efectuada com ligeireza. Ainda no respeitante aos utilizadores, é de referir que, em 1989, no desenho institucional da regulação, foi prevista a sua representação e a defesa dos seus interesses, através da instituição dos Comités dos Utilizadores já referidos. Além disso, a existência destas entidades, especialmente vocacionadas para o tratamento de reclamações, revela uma importante orientação relativa aos direitos dos cidadãos. A acrescentar à política de defesa dos interesses dos utilizadores, os ope- 234 volvidos pela OFWAT, de modo a avaliar a qualidade prestada aos utilizadores. No Quadro 97 é possível observar os Níveis de Qualidade do Serviço implementados pela OFWAT em Inglaterra e no País de Gales. Através da Lei da Água de 2003, a OFWAT passou a apresentar novos poderes, nomeadamente, ao nível da capacidade de aplicar sanções às WaSC e WoC até um máximo de 10% do seu volume de negócios, em casos graves de violações das normas de serviço ao utilizador, das obrigações legais ou das condições de licenciamento. Cada operador tem a obrigação legal de desenvolver e manter um sistema económico e eficiente para o abastecimento de água na sua área. Os SAS são responsáveis pelo fornecimento de um serviço de água para consumo humano de qualidade e fiável, desenvolvendo planos de recursos hídricos, submetidos à EA, definindo o seu ponto de vista sobre o modo de gestão Reino Unido Regulação dos Níveis de Qualidade do serviço Pagamento dos níveis de serviço Sanções por atraso de pagamento Consumidores domésticos Consumidores não domésticos Consumidores domésticos Consumidores não domésticos Marcações inadequadas 24,75 € 24,75 € 12,38 € 12,38 € Marcações desmarcadas 24,75 € 24,75 € 12,38 € 12,38 € Incidentes de baixa pressão 30,92 € 30,92 € - - Notícia incorrecta sobre interrupções do serviço 24,75 € 61,85 € 24,75 € 61,85 € Serviço não restabelecido (*) – período inicial 24,75 € 61,85 € 24,75 € 61,85 € Serviço não restabelecido (*) – cada 24 horas acrescidas 12,38 € 30,92 € Questões relacionadas com a facturação ou com o pagamento não atendido a tempo 24,75 € 24,75 € 12,38 € 12,38 € Reclamações escritas não atendidas a tempo 24,75 € 24,75 € 12,38 € 12,38 € Inundações das propriedades com origem interna Pagamento equivalente aos encargos anuais de saneamento (Pagamento mín. 185,5 €; máx. de 1236,5 €) 24,75 € 61,85 € Inundações das propriedades com origem externa Pagamento equivalente a 50% encargos anuais de saneamento (Pagamento mín. 92,75 €; máx. de 618 €) 24,75 € 24,75 € (*) Abastecimento não restabelecido dentro do tempo notificado (trabalho planeado) ou quando o abasteci- mento é interrompido para um período de tempo não planeado/situações de emergência dos recursos hídricos ao longo dos próximos 25 anos. Os SAS têm ainda de elaborar planos de seca, onde definem as respostas aos diferentes tipos de seca e propõem e justificam os investimentos relativos à gestão de recursos hídricos para incorporação nas revisões tarifárias, promover o uso eficiente da água, em nome dos utilizadores e, por fim, manter o sistema de abastecimento de água de forma económica e eficiente. Na Irlanda do Norte e na Escócia, embora de forma não tão saliente como em Inglaterra e no País de Gales, as entidades reguladoras também denotam uma grande dedicação à salvaguarda dos interesses dos utilizadores, garantindo as obrigações de serviço público. Além disso, na Escócia, a Lei da Água de 1980 institui a obrigação por parte das autoridades locais em reportarem toda a informação sobre os SAS ao Conselho de Ministros. Quadro 97 Níveis de Qualidade do Serviço estabelecidos em Inglaterra e no País de Gales 2.14.5 DESEMPENHO O Reino Unido apresenta um modelo regulatório bem concebido, moderno e muito robusto perante as eventuais adversidades. A preocupação da regulação é focalizada nos utilizadores, sem descurar a sustentabilidade dos operadores. Os diferentes reguladores têm desenvolvido, com 235 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional sucesso, a supervisão e o controlo da qualidade do serviço, como atestam as melhorias que se observam no sector. Os reguladores têm garantido as diferentes obrigações de serviço público, através da sua contratualização entre os vários stakeholders, e mantido as remunerações dos operadores através da regulação económica nos limites adequados, isto é, garantindo a viabilidade económica e financeira, sem a conduzir a lu- 236 cros acima do razoável. Por último, é de referir que nas diferentes vertentes, económica, social e ambiental, a regulação tem sido desenvolvida numa perspectiva de longo prazo e de sustentabilidade. Os aspectos menos conseguidos relacionam-se com a ausência da universalização da medição dos caudais consumidos e com o elevado risco regulatório existente, que condiciona a atractividade para o sector privado dos SAS ingleses. Roménia 2.15 ROMÉNIA 2.15.1 ANTECEDENTES HISTÓRICOS A Roménia (România) é uma república democrática em que o poder legislativo é repartido por duas câmaras, o Senado (Senat) e a Câmara dos Deputados (Camera Deputat, ilor). O presidente, chefe do poder executivo, nomeia o primeiroministro, que dirige o governo, cujos membros são, por sua vez, nomeados por ele. O governo é sujeito a um voto parlamentar de aprovação. O país, com 238 391 km2 de área e, aproximadamente, 22 milhões de habitantes, encontra-se organizado em termos administrativos em 4 macro-regiões (NUTS I), oito regiões (NUTS II), 42 condados (judeţe), 319 cidades (oras) e 2.686 freguesias (minicipiu). Cada uma destas últimas estruturas administrativas apresenta o seu próprio conselho local e é governada pelo presidente da câmara (primar). Na Roménia, somente 103 das maiores cidades têm o estatuto de município, que lhes dá maior autonomia e poder administrativo sobre os assuntos locais. No âmbito do enquadramento legislativo da Roménia, o primeiro documento normativo relativo à protecção da água foi publicado em 1891 e era referente à preservação dos recursos hídricos. Posteriormente, em 1927, foi promulgada a Lei do Regime da Água (Legea Apelor). Mais tarde, em 1953, foi produzida legislação sobre o uso racional e protecção da água e, em 1974, foi publicada uma nova lei, visando a protecção do ambiente no domínio da gestão racional da água, protecção e controlo da qualidade da água que viria a ser alterada, em 1989, pela Lei n.º 5. Em 1976, a Lei n.º 1 aprovou um programa nacional procurando o desenvolvimento futuro das bacias hidrográficas na Roménia. O programa foi coordenado pelo Instituto Nacional de Hidrologia e Gestão de Água (Institutul National De Hidrologie Si Gospodarire A Apelor - INHGA), instituição com funções muito relevantes no seio do sector, com mais de cem anos de existência e que, actualmente, se encontra sob coordenação da Administração Nacional de Água (“Apele Romane”). O enquadramento legal vigente do sector da água da Roménia baseia-se fundamentalmente em duas leis, a Lei de Protecção Ambiental de 1995 e a Lei da Água de 1996, a partir das quais as decisões e regulamentação produzidas pelos governos se regem. A Lei da Água ordena o controlo dos recursos hídricos e da actividade desenvolvida no domínio da gestão da água. Esta lei delineia uma abordagem ampla para a governação do sector ao nível das bacias hidrográficas e para a gestão dos recursos hídricos, associando o desenvolvimento social e económico à poluição dos ecossistemas naturais. Além disso, esta lei acrescenta que o uso doméstico é prevalecente sobre os outros usos. A Lei de Protecção Ambiental (n.º 137) de 1995 (Legea Protectiei Mediului), além de promover a conservação e protecção do recurso água, mantendo um equilíbrio ecológico, estabelece a aplicabilidade de factores chave de cariz económico, que visam a gestão e participação de tomada de decisões por todos os stakeholders. Pela primeira vez na Roménia, o sistema legal foi estabelecido com participação pública, revendo e comentando os licenciamentos, as políticas e a legislação. Paralelamente, os ministérios que tutelavam o sector, sobretudo o Ministério do Ambiente, alteraram algumas das normas que estabeleciam parâmetros de qualidade de água, critérios de classificação e regulamentação referente aos usos de água, procurando a consonância com a legislação comunitária. Por decisão governamental, a Apele Romane foi nomeada, em 2002, como autoridade responsável pelo nível da implementação da DirectivaQuadro da Água, integrando na sua organiza237 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional ção o INHGA. Na Roménia foram criados, ao longo de 2001, 11 Comités de Bacias Hidrográficas, organizados de acordo com os organismos desconcentrados da Apele Romane. Os comités juntaram-se aos actores principais da gestão da água e protecção do ambiente na Roménia, mais propriamente, representando o Ministério da Água e da Protecção do Ambiente, o Ministério da Saúde, os Operadores, os presidentes de câmara, a Inspecção da Protecção Ambiental, os utilizadores da água e as ONG. Em 2006, através da Lei n.º 51, foi criada regulamentação para os serviços públicos de interesse geral (Lege servicilor Comunitare de Utilitâti Publice), definindo um conjunto de regras tendo em conta a sua essencialidade. A implementação da Lei n.º 219, de 1998, possibilitou aos municípios a liberdade de concessionarem os seus serviços. 2.15.2 ENQUADRAMENTO LEGAL E INSTITUCIONAL 2.15.2.1 Responsabilidades Várias entidades interferem no governo dos SAS: o Ministério do Ambiente e Gestão das Águas (Ministerul Mediului şi Gospodăririi Apelor – MMGA), o Ministério da Saúde Pública (Ministerul Sănătăţii Publice – MSP), a Apele Romane, os Inspectores de Protecção Ambiental locais (IPA), a administração local, o regulador (Autoritatea Nationala de Reglementare pentru Serviciile Publice de Gospodarie Comunala – ANRSC), a Associação de Água da Roménia (Asociatia Romana a Apei – ARA), a Autoridade da Concorrência (Consiliul Concurenteie) e as ONG. 238 pela qualidade e controlo da qualidade da água fornecida aos utilizadores. Na tutela do MMGA, os IPA são as autoridades com atribuições de inspecção e controlo de implementação das normas legais. Os IPA locais na Roménia são responsáveis pela atribuição de licenças e autorizações e pela inspecção e controlo da qualidade da água e emissões de efluentes entre as entidades do sector da água. Actualmente, existem 42 IPA referentes a cada condado, incluindo a cidade de Bucareste. A Apele Romane, criada em 2002, possui importantes valências ao nível da estratégia nacional de gestão de água. A Apele Romane é uma empresa pública controlada a 100% pelo Estado e tutelada pelo MMGA. A empresa tem diversas competências associadas à gestão de 11 bacias hidrográficas, como, por exemplo, ser responsável pela gestão da captação de água na Roménia. A Apele Romane é uma empresa auto-sustentável, recuperando todos os custos através dos preços cobrados pela água vendida e outros serviços prestados. Entre as demais atribuições, a Apele Romane administra os cursos de água à superfície, como lagos e rios, para além da água subterrânea, zelando pelo seu uso racional. Esta autoridade detém também funções sobre a protecção contra a degradação e poluição da qualidade da água e prevenção e controlo de poluição acidental, bem como ao nível da protecção contra inundações e períodos de seca, coordenando operações associadas às albufeiras e outros reservatórios. Supletivamente, a Apele Romane monitoriza a qualidade e quantidade do ambiente aquático e o uso de água e concebe a gestão orçamental destinada às bacias hidrográficas. Por último, esta entidade é ainda responsável pela instituição das estratégias vocacionadas para o sector da água e para o ambiente e pelas políticas e regulamentos desenvolvidos pelo MMGA. O MMGA desenvolve a estratégia e política nacionais ao nível da gestão e protecção dos recursos hídricos. Neste domínio, esta entidade desempenha diversas funções, inter alia, de planeamento estratégico, incluindo a definição da estratégia da gestão de água a nível nacional e dos programas de desenvolvimento, a preparação da legislação e da política do sector da água, a elaboração do seu orçamento, o estabelecimento de normas e o seu controlo e monitorização, a preparação de processos administrativos que visem a regulação do recurso de água através dos sistemas de licenciamento e, por último, tem ainda atribuições na cooperação internacional sobre esta temática. A Constituição romena define a administração pública local como a principal responsável pela prestação dos SAS. Com efeito, os órgãos locais têm também a capacidade de decidir sobre o modo de gestão destes serviços, mantendo o fornecimento do serviço directamente, delegando-o a uma empresa pública ou concessionando-o a um operador privado. O MSP também possui um papel importante no sector da água, sendo o principal responsável A ARA, associação dos operadores do sector, detém importantes valências no sector, nome- A ANSRC, a entidade reguladora do sector, foi criada recentemente, desempenhando funções relativas ao licenciamento e à monitorização e acompanhamento dos contratos de concessão. Roménia adamente, na defesa dos interesses dos seus associados em relação às políticas adoptadas a nível estatal e na disseminação das melhores práticas, suportando, incentivando e financiando a investigação no sector, com o objectivo de promover a inovação e o desenvolvimento tecnológico. A Autoridade da Concorrência supervisiona os preços/as tarifas de serviços específicos, como a venda da água pela Apele Romane. Esta autoridade, criada em Setembro de 1996, é um organismo estatal especializado no domínio da competição, com prerrogativas na aplicação de políticas e estratégias de promoção da concorrência. As ONG ambientalistas da Roménia encontram-se em pleno processo de evolução, representando uma valiosa fonte de informação ambiental que pode ser tratada, processada e usada para o desenvolvimento do sector. Os mecanismos de recolha de informação utilizados pelas ONG são extremamente eficientes. Pela natureza da sua actividade e pelo número de membros associados e simpatizantes, a sua intervenção possui, com frequência, efeitos relevantes no processo de elaboração de decisões. O papel geral das ONG ambientalistas reside na discussão das actuais práticas e do comportamento das comunidades. A sua actividade encontrase orientada para a consciencialização cívica e educação ecológica e para exercer pressão sobre os decisores, visando a protecção efectiva do ambiente. Na Figura 61 apresenta-se a organização institucional do sector da água da Roménia (Watertime, 2004). 2.15.2.2 Regulação A Roménia possui uma entidade reguladora multissectorial com atribuições no sector da água, a Autoridade Regulatória Nacional dos Serviços Públicos (Autoritatea Nationala de Reglementare pentru Serviciile Publice de Gospodarie Comunala - ANRSC), que é tutelada pelo Ministério da Administração Pública. Este organismo é uma instituição pública de interesse nacional com personalidade jurídica, cujas principais atribuições são a regulação, a monitorização e o controlo, a nível nacional, de actividades no domínio dos serviços públicos de interesse geral. A ANRSC, criada em 2004, é uma entidade reguladora multissectorial, com atribuições sobre os sectores da electricidade, aquecimento, transportes, iluminação pública, água e águas residuais domésticas e pluviais. No exercício das suas funções, a ANRSC é uma entidade reguladora independente, com vastos poderes, incluindo o de emissão de legislação secundária. É financiada directamente pelos operadores e é dotada de um conselho consultivo que se pronuncia previamente à tomada das decisões mais importantes. A ANRSC possui como principais atribuições na regulação dos operadores de serviço público as seguintes: a) elaborar o quadro regulamentar considerando a organização, coordenação e funcionamento dos serviços públicos; b) certificar/autorizar os operadores, independentemente da natureza do capital; c) aprovar os preços e as tarifas para os SAS em função de determinados parâmetros; d) supervisionar os concursos Figura 61 Atribuições dos níveis de administração do sector da água na Roménia 239 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional para delegação dos serviços; e) salvaguardar a elaboração e harmonização dos padrões, normas e prescrições técnicas de acordo com os regulamentos europeus e nacionais vigentes; e f) arbitrar, suspender ou alterar licenças e autorizações. Para o sector da água, a ANRSC tem, até à data, desenvolvido funções ao nível do licenciamento dos operadores de SAS e da aprovação dos preços sugeridos pelos mesmos. A entidade reguladora produziu, entretanto, o quadro regulatório para o sector da água, através da Lei n.º 241 de 2006. Nela são definidos os principais procedimentos relativos à regulação tarifária, dependente do tipo de operador, bem como de supervisão da qualidade do serviço e das principais obrigações de serviço público. A ARA, como associação dos operadores, detém também atribuições na actividade regulatória do sector, ainda que de auto-regulação. A disseminação das boas práticas, entre os seus associados, é uma actividade importante na proliferação das preocupações relativas à melhoria da qualidade do serviço e da sustentabilidade económica, financeira e ambiental dos operadores dos SAS. 2.15.3 ESTRUTURA DO MERCADO 2.15.3.1 Propriedade e gestão de serviços Os operadores dos SAS encontram-se, geralmente, organizados como régies autónomas, dentro da administração local, e em empresas comerciais, através da delegação por parte da administração local. Estas empresas comerciais podem ou não ter capital privado associado. De qualquer forma, e embora o sector privado tenha proliferado, recentemente, abrangendo as maiores cidades, como Bucareste, Ploiesti, Falticeni e Timisoara, em número os operadores dos SAS continuam a ser maioritariamente públicos. Ambos os formatos organizacionais referidos compreendem a gestão e exploração dos serviços, dado que as suas infra-estruturas são sempre propriedade pública. A participação do sector privado é, normalmente, atribuída por um contrato de concessão com uma duração entre 20 e 30 anos, onde as empresas privadas têm de fazer investimentos significativos nas infra-estruturas. 240 2.15.3.2 Players do sector Em 2006, existiam mais de 2.000 operadores dos SAS na Roménia, mas apenas, aproximadamente, 400 operadores tinham autonomia. Apesar de a maioria dos operadores permanecer sob propriedade pública, constata-se um aumento, nos últimos anos, da presença de operadores privados entre os SAS, nomeadamente a Vivendi (Veolia Water) e a Suez-Lyonnaise des Eaux (Ondeu). A Vivendi detém contratos de concessão para operar os SAS em Bucareste, durante um período de 25 anos, possuindo 83% do capital da ApaNova Bucareste, e em Ploiesti, com duração também de 25 anos e possuindo 80% do capital da ApaNova Ploiesti. Ambas fornecem, no total, o serviço de água a 2 milhões de habitantes e o serviço de águas residuais a 1,8 milhões. A Suez-Lyonnaise des Eaux estabeleceu um contrato de concessão de 25 anos em Timisoara em parceria com a empresa de água local, a Aquatim, detendo 51% do seu capital, pertencendo o remanescente ao município, e fornece o serviço de água a 400 000 habitantes. Existem projectos de PPP, em curso, nas cidades de Arad, Craiova, Constanta, Iasi, Brasov e Falticeni, que estão atrair não só as empresas francesas mas também as inglesas, alemãs, italianas, espanholas e israelitas. Na sua grande maioria, os operadores autónomos, mais de 80%, são empresas comerciais, de capitais públicos ou privados, sendo os restantes operadores autónomos, mas sem personalidade jurídica. O número de participações privadas atinge já um valor superior a 30 operadores. A redução do número de players tem sido suave ao longo do tempo, embora existam incentivos para a sua associação e a mesma tenda a ser mais acentuada no futuro. 2.15.3.3 Integração do sector e serviços oferecidos Na Roménia, os SAS encontram-se verticalmente integrados e são também sempre geridos em conjunto, ainda que pontualmente possam prestar outras actividades (p. ex., serviços urbanos). A integração horizontal é reduzida, servindo cada operador uma população média de 55 000 habitantes. Alguns dos operadores (p. ex., ApaNova Bucareste) compram água à empresa Apele Romane, Roménia possuindo, no entanto, as suas próprias infraestruturas de tratamento. 2.15.3.4 Números do sector Na Roménia, o sector da água caracteriza-se por uma captação anual na ordem dos 9 mil milhões de m3 de água (dados de 2006). A sua principal fonte é a água superficial, com cerca de 66% do valor total. O consumo doméstico constitui o segundo maior uso de água com 30% do total, sendo o primeiro o referente ao consumo industrial que representa 50%. Estima-se que a capitação de água de abastecimento dos romenos corresponda a um valor de cerca de 200 litros por habitante e por dia, estando o mesmo em decréscimo desde 1999. Não existem dados rigorosos para o volume de água não facturado na Roménia, calculando-se, contudo, que varie entre os 20% e os 50% do volume de água produzido, resultando numa média de 35%. No ano de 2007, o nível de atendimento do serviço de água era de cerca de 70%, compreendendo 89% nas áreas urbanas e 18% nas áreas rurais. O serviço de águas residuais tinha, nesse ano, valores da ordem dos 50% de população servida. O sector da água na Roménia emprega cerca de 150 000 funcionários e inclui no seu património mais de 42 000 km de condutas de abastecimento de água e cerca de 17 000 km de colectores de águas residuais. Em 2006, os SAS investiram próximo de 600 milhões de euros, estimando que seja necessário investir 18 mil milhões de euros até 2018 para cumprir a legislação comunitária (directivas água, águas residuais e nitratos). 2.15.4 REGRAS DO JOGO 2.15.4.1 Estabelecimento de tarifas Na Roménia, o processo de estabelecimento de tarifas dos SAS é regulado principalmente pela Portaria Governamental n.º 32, de 2002, que foi, posteriormente, alterada em 2003 pela Portaria n.º 35 relativa à organização e funcionamento destes serviços. Os operadores podem optar por um sistema tarifário bipartido, ou seja, composto de uma parcela fixa e de uma parcela variável, em função do consumo de água. No entanto, os SAS, por norma, ainda se caracterizam pela implementação de um sistema tarifário, que apenas tem em consideração a parcela variável, usualmente, em função do consumo e independente do tipo de utilizador. É de notar que, nos últimos 14 anos, o preço da água (2003) aumentou 16 000 vezes. Em 2003, a tarifa média sobre os utilizadores domésticos representa 0,23 €/m3 para o serviço de água e 0,05 €/m3 para o serviço de águas residuais (Speck, 2006). Estes valores, os últimos conhecidos na literatura, pecam necessariamente por defeito. Por exemplo, o sistema tarifário do operador de Bucareste triplicou de 2003 a 2007. A Figura 62 apresenta a evolução dos sistemas tarifários em Bucareste e na Roménia. Figura 62 Evolução da tarifa média dos SAS em Bucareste e na Roménia 241 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional Os sistemas tarifários para os operadores públicos são revistos a cada três meses, se o IPC mudar mais de 3% ou se ocorrer um aumento significativo dos custos de produção. Esta revisão acontece sempre por solicitação do operador, tendo em conta o aumento do custo de serviço, a margem de lucro, o índice de desenvolvimento e a quantidade de água fornecida. (produção de electricidade, distribuição municipal e captação subterrânea para utilizadores industriais). Os municípios pagam pela água captada, sob a jurisdição da Apele Romane, para posterior tratamento e estabelecem os seus próprios preços ainda que sujeitos a aprovação. O custo de água comprada à Apele Romane varia, dependendo da origem e das infra-estruturas utilizadas. Desde o início dos anos 60, a Roménia desenvolveu diversas normas para a gestão da água, em geral, e para a qualidade da água, em particular. As normas mais relevantes são a STAS 1.342, para a qualidade da água para consumo humano, a STAS 1.343, para as necessidades de água, a STAS 1.846, que controla as descargas de águas residuais, a STAS 4.706, relativa às categorias de qualidade e condições da água superficial, e a STAS 9.450, para irrigação de água e água utilizada na agricultura. Não obstante a existência de uma percentagem de perdas de água elevada no serviço e atrasos usuais de pagamento das facturas dos SAS, os preços praticados pelos operadores são reduzidos e insuficientes para garantir a cobertura dos custos de provisão dos serviços e dos vultuosos investimentos requeridos que é necessário efectuar. Conforme referido, os sistemas tarifários são definidos, quase sempre, com base numa parcela variável unitária em função do consumo, ainda que o índice de micromedição não chegue aos 90%. O Quadro 98 apresenta o Quadro 98 Sistemas tarifários praticados pela Vivendi para o ano de 2007 Águas residuais (€/m3) Bucareste 0,62 0,27 Ploiesti 0,53 0,12 A ANRSC também ainda não desenvolveu trabalho neste âmbito. Apesar de ser uma das suas atribuições, a sua jovialidade ainda Água (€/m3) Águas residuais (€/m3) Braila 0,297 0,042 Oradea 0,365 0,204 Sibiu 0,213 0,098 por três operadores públicos escolhidos aleatoriamente. Os preços apresentados não incluem a cobrança do IVA, que é de 19% para ambos os serviços. A Apele Romane implementa taxas sobre a captação de água, que variam com o seu fim 242 Em relação à supervisão da qualidade do serviço, a mesma ainda é efectuada por auto-regulação dos operadores. A ARA tem vindo a preocupar-se com a normalização e com o progresso tecnológico, mas ainda não desenvolveu trabalho específico neste âmbito, por exemplo, através de informação estatística e de cálculo de indicadores de desempenho e aplicação de benchmarking. Água (€/m3) respectivo sistema tarifário para as cidades de Bucareste e Ploiesti. No Quadro 99 é possível observar os sistemas tarifários implementados Quadro 99 Sistemas tarifários de três operadores públicos para o ano de 2005 2.15.4.2 Qualidade do serviço não permitiu o cumprimento desta obrigação estatutária. Desta forma, existe muito pouca informação sobre a qualidade do serviço prestada. Alguns estudos isolados apresentam alguma informação estatística sobre o sector da Roménia água, mas esta é, quase sempre, pouco robusta. A Figura 63 evidencia elementos para dois indicadores (em 2001), um referente às sem de garantir a continuidade do serviço, tanto a nível quantitativo como qualitativo, a adaptabilidade à procura dos utilizadores, o acesso não Figura 63 Indicadores perdas de água e micromedição por região romena perdas de água e outro à micromedição por região romena discricionário e, por último, o cumprimento de normas e regulamentos em vigor. 2.15.4.3 Obrigações de serviço público 2.15.5 DESEMPENHO Actualmente, os serviços públicos de interesse geral são regulados pela ANRSC, incluindo os SAS. Esta entidade tem capacidade de promover regulamentação aos vários níveis, incluindo a imposição de obrigações do serviço público. A Lei n.º 241, de 2006, produzida pela ANRSC e dedicada exclusivamente ao sector da água, impõe um conjunto de obrigações de serviço público: a segurança do serviço, a equidade do sistema tarifário, a transparência e responsabilização, a auto-suficiência, a continuidade, a adaptabilidade, a acessibilidade e o cumprimento da legislação geral. É de referir que, já anteriormente, a Lei n.º 51, de 2006, contemplava fortes imposições relativas à defesa do utilizador, embora esta legislação fosse comum a todos os serviços públicos essenciais. Por exemplo, incluía a obrigação da prestação do serviço universal que não foi contemplado pela Lei n.º 241 dedicada ao sector da água. Ainda mais antiga, a Portaria n.º 35, de 2003, exigia que os operadores dos SAS tives- O sector da água na Roménia tem evidenciado progressos significativos nos últimos anos. Os investimentos elevados efectuados no sector e o aumento dos níveis de atendimento reflectem essa evolução positiva. A criação de uma entidade reguladora dos serviços de interesse geral, nos quais se incluem os referentes aos SAS, é outro aspecto muito positivo e que produzirá efeitos relevantes em breve. Como questões que suscitam alguma preocupação, há que referir, sem dúvida, a reduzida sustentabilidade económica e financeira dos SAS e a estratégia seguida para a participação do sector privado, que tem, sobretudo, incidido sobre as principais zonas urbanas, deixando as zonas rurais de fora e sem solução prevista. Uma maior escala de operação traria também vantagens acrescidas, assim como a disponibilidade de mais e melhor informação sobre o sector da água, que se revela necessária para possibilitar um processo de decisão mais eficaz e sustentado. 243 Singapura 2.16 SINGAPURA 2.16.1 ANTECEDENTES HISTÓRICOS Singapura é uma república parlamentarista, onde o presidente da República representa o papel de chefe de Estado e o primeiro-ministro de chefe de governo, desempenhando, neste domínio, o poder executivo. Por sua vez, o poder legislativo encontra-se repartido entre o governo e o parlamento unicamaral. O país, com cerca de 4,7 milhões de habitantes, dispersos por 704 km2 de área, encontra-se consideravelmente limitado em termos de recursos hídricos. Apesar da grande pluviosidade que caracteriza o país, a capacidade de armazenamento da água pluvial é insuficiente, sendo necessária a importação de água de países vizinhos como a solução mais razoável. Neste âmbito, apercebendo-se das grandes limitações de recursos hídricos que poderiam condicionar o desenvolvimento da ilha, o governo estabeleceu, em 1927, o primeiro acordo de fornecimento de água com Johore (Malásia). Presentemente, o abastecimento de água é garantido por dois acordos estabelecidos em 1961 e 1962 com a Malásia, que cessam em 2011 e 2061, respectivamente. Entre os anos 80 e 90, Singapura desenvolveu enormes esforços no sentido de estabelecer o enquadramento legal e de gestão do domínio ambiental adequados e de primeira linha em termos internacionais, incluindo os serviços de água, o controlo de poluição e a construção de um sistema de saneamento de águas residuais e de condução de águas pluviais de excelência. Com todos estes instrumentos institucionais, Singapura é referenciada como “Cidade Jardim” (Garden City). Desde os anos 90 até à actualidade, o governo tem vindo a focalizar-se em medidas que ga- rantam a sustentabilidade da procura de água. Como forma de colmatar esses défices de recursos naturais e preservar os que existem, a ilha cidade-estado tem disponibilizado muitos recursos financeiros em investigação e tecnologia nos últimos anos e, por conseguinte, tem desenvolvido know-how e capacidade de gestão dos recursos hídricos. Uma vez que os reservatórios disponíveis apenas garantem 50% da procura de água, Singapura optou por desenvolver outras formas de abastecimento, designadamente a opção pela utilização de água reciclada para fins não potáveis (NEWater) e a implementação de sistemas de dessalinização desde Setembro de 2005. Adicionalmente, o governo desenvolveu o “Singapore Green Plan 2012”, que assegura a sustentabilidade do abastecimento de água, como principal foco da política da água em Singapura. Esta política consiste no aumento da robustez e resiliência das fontes de água, desenvolvimento de princípios de gestão de procura, incentivo à participação do sector privado e o estudo e exploração de novas tecnologias. Aliado a esta linha de orientação, o Governo de Singapura, face às debilidades que caracterizam a sustentabilidade da provisão de água para consumo humano, adoptou uma nova estratégia, denominada “Quatro Torneiras” (Four Taps Strategy), cujas quatro fontes de água são os reservatórios de águas pluviais, a água recebida de Johore na Malásia, a água proveniente dos processos de reutilização (NEWater) e a água relativa à dessalinização. Esta estratégia, associada a outros grandes projectos, como o Deep Tunnel Sewerage System (DTSS) e a Marina Barrage, têm tornado o país cada vez mais robusto e independente neste domínio. Actualmente, os SAS encontram-se fundamentalmente regulamentados pela Lei de Saneamento e Drenagem (Sewerage and Drainage Act). Neste âmbito, foram emitidos códigos de conduta, como o Código de Conduta Sanitária e 245 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional de Saneamento (Code of Practice on Sewerage and Sanitary Works - CPSSW), o Código de Conduta de Drenagem de Água Superficial (Code of Practice on Surface Water Drainage - CPSWD) e o Código de Conduta dos Serviços de Água (Code of Practice for Water Services - CPWS). Os códigos de conduta contêm informação relativa às exigências mínimas no projecto, construção e exploração dos trabalhos ao nível dos SAS. O CPSSW estabelece linhas de orientação relativas ao planeamento e projecto adequados ao sistema de saneamento de águas residuais, estipulando, somente, o mínimo e as exigências imperativas do projecto a serem cumpridas. Além dos requisitos mínimos, as boas práticas de engenharia no planeamento, projecto e construção do sistema de saneamento são também prescritas neste código. O CPSWD especifica as exigências mínimas da engenharia para a drenagem da água superficial. Os técnicos e entidades qualificadas devem assegurar que todos os aspectos relativos à drenagem de água superficial sejam efectivamente tomados em consideração no seu planeamento, projecto e implementação das novas propostas de desenvolvimento e de construção de novos empreendimentos. O CPWS define directrizes relativas ao projecto, instalação e reparação das fontes de abastecimento de água a todos os utilizadores domésticos, comerciais e industriais. O código estabelece também os parâmetros mínimos de provisão do serviço de água. Por último, como referido, o governo tem uma enorme preocupação ambiental. Neste sentido, muitas são as normas e outros documentos legais que regulamentam as descargas de águas residuais e poluição inerente, destacando-se a Lei de Controlo de Poluição Ambiental de 2002 que limita a temperatura, o CQO, o CBO, os sólidos em suspensão, os sólidos dissolvidos, o pH e outros 28 parâmetros diferentes dos efluentes. 2.16.2 ENQUADRAMENTO LEGAL E INSTITUCIONAL 2.16.2.1 Responsabilidades Em Singapura, a responsabilidade pelos SAS encontra-se repartida entre várias instâncias do governo, designadamente através do Ministério do Ambiente e dos Recursos Hídricos (Ministry of the Environment and Water Resources – MEWR) e, sob tutela deste, por intermédio da Agência 246 Nacional do Ambiente (National Environment Agency – NEA), o Conselho do Ambiente e Desenvolvimento da Água Industrial (Environment & Water Industry Development Council – EWI) e o Conselho de Serviços Públicos (Public Utilities Board – PUB). A Associação da Água de Singapura (Singapore Water Association – SWA) tem também funções relevantes. O MEWR, que começou como Ministério do Ambiente, em 1972, possui como missão principal promover um ambiente com qualidade de vida e com níveis de saúde pública elevados. A gestão dos serviços de recolha e tratamento de águas residuais inclui-se nas suas atribuições. Em Setembro de 2002, a reforma no sector alterou as suas atribuições, passando o mesmo a gerir estrategicamente os recursos hídricos nacionais e ficando com as incumbências sobre os serviços de águas residuais. Em consonância com os seus dois conselhos estatutários (statutory boards), a NEA e o PUB, o governo procura cumprir as metas a que se predispõe, através de inovação e investigação contínuas. O PUB é a entidade responsável pelo fornecimento do serviço de água com condições adequadas e fiabilidade elevada, mediante princípios económicos de razoabilidade e eficiência, de modo a sustentar o crescimento económico em Singapura. O PUB tem ainda as atribuições relativas aos sistemas de recolha, drenagem e tratamento de águas residuais domésticas e pluviais. A NEA, criada em 2002, tem como principal atribuição a implementação das políticas ambientais estabelecidas pelo MEWR. Na alçada da NEA, as Divisões de Protecção Ambiental e de Saúde Pública Ambiental, e os Serviços Meteorológicos trabalham em consonância para assegurar um ambiente com qualidade e sustentável para os singapurenses de gerações presente e futuras. A SWA aspira desempenhar um papel importante no esforço de perfilar e promover Singapura como ponto de referência para todos os serviços e tecnologias relacionados com a água. Esta associação procura formar sinergias junto das companhias locais para o benefício mútuo de desenvolver uma indústria de água local vibrante e dinâmica. A associação realiza, ciclicamente, um fórum para colaboração e intercâmbio das ideias e conhecimento entre as empresas membro, quer no país quer em termos internacionais. O fórum serve de plataforma para o trabalho em redes entre os membros e disseminação da informação estratégica em oportunidades de negócio emergentes e de novas tecnologias. O EWI, estabelecido em 2006 pelo MEWR, compreende como atribuição o desenvolvimento do mercado ambiental, onde se insere o sector da água. Singapura As funções do EWI são orientadas por uma comissão consultiva e por uma comissão executiva. 2.16.2.2 Regulação Em Singapura, apesar do enorme desenvolvimento que o caracteriza, no sector da água não existe uma entidade reguladora sectorial com funções explícitas de regulação económica, qualidade do serviço e obrigações de serviço público. Todavia, a regulação transversal implementada garante as obrigações de serviço público, ao passo que a auto-regulação contribui para uma qualidade do serviço de excelência. Mesmo em relação à regulação económica, a ausência de regulador não é muito sentida, dado que os serviços são pouco onerosos e são prestados com uma qualidade do serviço muito significativa. Além disso, o enquadramento contextual dos SAS dissuade as possíveis controvérsias com os utilizadores. Desta forma, a regulação dos preços e das tarifas revela-se supérflua e desnecessária. No entanto, no sector da água existe uma associação profissional que, entre as demais atribuições, desempenha funções de auto-regulação e possui a importante valência de disseminar as melhores práticas a serem implementadas no país, nomeadamente através da sua grande interacção com outras experiências e práticas internacionais. 2.16.3 ESTRUTURA DO MERCADO 2.16.3.1 Propriedade e gestão dos serviços Os SAS são maioritariamente fornecidos pela entidade pública que gere todos os serviços. No entanto, recentemente, tem vindo a verificar-se no sector da água a proliferação da actividade privada na gestão dos serviços de água, nomeadamente ao nível do DTSS, da Marina Barrage, da nova instalação da NEWater e da estação de dessalinização. senvolveu uma tecnologia de tratamento que permite recolher toda a água utilizada no país (reutilização de águas residuais) para produzir a NEWater, que é actualmente uma marca popular de água para consumo humano engarrafada. Todavia, este serviço iniciou-se com o objectivo de abastecer utilizadores não domésticos, tais como indústrias e estabelecimentos comerciais, mas ao verificar-se que os resultados obtidos em termos de qualidade da água eram superiores àqueles referentes à água proveniente da Malásia, esta começou a ser usada para utilizações domésticas, ainda que na forma engarrafada. Como referido, o PUB, tendo como um dos principais objectivos o desenvolvimento do sector da água, delegou a gestão da estação de dessalinização à empresa Hyflux, um grupo de Singapura com actividade internacional e multissectorial, em 2005, sob um contrato BOOT de 25 anos. A Hyflux produz ainda água engarrafada, intitulada de Desal H2O, a partir desta estação. A Hyflux ganhou também o concurso para a construção e operação da nova estação da NEWater. 2.16.3.3 Integração do sector e serviços oferecidos Em Singapura, o PUB, como principal operador do sector da água, integra horizontal e verticalmente os SAS. Neste sentido, fornece toda a cadeia de valor do serviço de água, desde a produção até à distribuição de água. O mesmo sucede no subsector das águas residuais, perante o qual é responsável, desde os serviços de recolha e drenagem até ao tratamento de águas residuais, incluindo a sua reutilização. 2.16.3.4 Números do sector Em Singapura, são consumidos anualmente cerca de 500 milhões de m3 de água. Deste valor, o consumo doméstico representa 53% do total, o comércio/indústria pesa 40%, as autoridades governamentais têm 6,7% e o remanescente é relativo ao consumo dos estaleiros de navios. 2.16.3.2 Players do sector Os SAS caracterizam-se, literalmente, pela sua universalidade, dado que toda a população de Singapura tem acesso adequado aos referidos serviços (100% da população). Além disso, como factor importante de caracterização, de desenvolvimento e das especificidades do sector da água em Singapura, as perdas de água representavam apenas 4,5% em 2006. Em Singapura, como mencionado, os SAS são fornecidos por uma entidade pública estatal, designadamente, o PUB. Em 2003, o PUB de- Em Singapura, os principais activos relativos ao sector da água compreendem 14 reservatórios, encontrando-se em construção mais três, uma es- De qualquer forma, o operador de Singapura (PUB) é público e os activos referentes aos SAS são sempre públicos. 247 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional tação de dessalinização e três estações da NEWater. Neste contexto, em 2006, foram disponibilizados 1 230 000 m3 de água para consumo humano por dia, 81 000 m3 da NEWater e 112 000 m3 de água industrial. A capitação de água em Singapura foi, em 2006, de 158 litros por habitante e por dia. Quadro 100 Sistema tarifário dos SAS da PUB para o ano de 2008 A NEWater, e no que concerne aos custos de produção, apresenta valores 50 a 60% mais reduzidos, quando comparados com a água dessalinizada. Em 2005, a NEWater disponibilizava a água a uma tarifa de 0,53 €/m3. Como referido, actualmente, existem três esta- Neste âmbito, face aos diferentes serviços prestados, as tarifas variam tendo em conta os custos e a política que os dois serviços apresentam. A estrutura tarifária do serviço de água para consumo humano é implementada através de uma tarifa escalonada, que aumenta em função do consumo, ao passo que o serviço de água não doméstico é instituído, somente, através de um escalão em função do consumo, como é apresentado no Quadro 100. Este sistema tarifário, em consonância com a implementação de diversas taxas, designadamente a taxa de conservação de água, a taxa Escalão (m3/mês) Tarifa (€/m3) Taxa de conservação de água (% da tarifa) Taxa de saúde pública (€/m3) 1 – 40 0,54 30 0,14 >40 0,65 45 0,14 Não doméstico - 0,54 30 0,28 Estaleiros navais - 0,89 30 - Categoria Taxa de ligação sanitária (€) Doméstico ções da NEWater, que produzem, aproximadamente, 0,9 m3 por segundo. Cerca de 6% deste valor é utilizado, indirectamente, para fins de consumo humano, o que contribui com 1% das exigências da água para consumo humano em Singapura, que são próximas de 13 m3 por segundo. A estação de dessalinização de Singapura configura uma das de maior dimensão do mundo. Em operação desde 2005, produz cerca de 136 000 m3 de água por dia e satisfaz 10% da procura de água de Singapura. 2.16.4 REGRAS DO JOGO 2.16.4.1 Estabelecimento de tarifas Em Singapura, os utilizadores compreendem dois tipos de serviço de água, divergindo pelo tratamento e pelo propósito para o qual a água se destina, a saber, se doméstico ou não doméstico e se potável ou não potável. Assim, e de modo atípico ao que sucede fora das suas fronteiras, os utilizadores de Singapura são fornecidos por um serviço de água potável e, também, por um serviço de água imprópria para consumo humano. 248 1,37 por ligação - de saúde pública e a taxa de ligação sanitária, possui como principal propósito desincentivar o consumo de água. Os preços são ainda sujeitos a uma taxa de IVA de 3%. Como referido anteriormente, o serviço de água não doméstico (água reutilizada não potável) e a NEWater apresentam um custo significativamente inferior ao que foi descrito para o serviço de água para consumo humano. A estrutura tarifária para este serviço compreende uma tarifa unitária em função do consumo, representando cerca de 0,20 €/m3 e 0,53 €/m3, respectivamente. Estes serviços de água apresentam preços mais reduzidos devido à isenção de impostos que os caracteriza, constituindo um incentivo suplementar à sua utilização face aos outros serviços de água disponibilizados. 2.16.4.2 Qualidade do serviço O PUB desenvolve as suas actividades orientadas para o bem-estar dos utilizadores. A empresa instituiu um conjunto de indicadores de desempenho que caracterizam as garantias e os compromissos dados aos utilizadores. Neste contexto, o PUB desenvolve internamente uma série de Singapura indicadores de desempenho que se agrega em três grupos de indicadores: feedback geral, feedback via PUB-One e os indicadores relativos à qualidade do serviço. O Quadro 101 apresenta os indicadores relativos ao feedback geral. com a qualidade do abastecimento de água em “alta” ou a alteração da fonte do abastecimento de água, devido aos requisitos operacionais do PUB. Todavia, estes valores compreendem os recomendados pela OMS. Feedback geral Tempo de resposta Feedback do serviço de cliente 5 dias úteis Linha de apoio à qualidade do serviço Imediata E-mail 3 dias úteis Correio e fax 5 dias úteis O segundo grupo de indicadores, o feedback via PUB-One, está relacionado com os problemas operacionais, englobando aspectos relativos às roturas, pressão inadequada, obstruções nos colectores, danificação dos colectores e inundações. Neste domínio, o PUB compromete-se a dar resposta às solicitações dentro de 2 horas. Por último, o PUB determina um conjunto de indicadores específicos para o incentivo e avaliação da qualidade do serviço. Os indicadores de desempenho considerados pelo PUB apresentam-se no Quadro 102. Além disso, o governo, tendo como pontos de referência as melhores práticas internacionais, estabeleceu valores padrão para a qualidade da água para consumo humano. Estes valores são meramente linhas de orientação e podem variar Quadro 101 Grupo de indicadores relativos ao feedback geral Em Singapura, segundo a OMS, a água fornecida para consumo humano apresenta níveis excepcionais de qualidade. Neste âmbito, o governo, procurando manter estes padrões de qualidade, desenvolveu um sistema de coimas (elevadas) muito dissuasor a aplicar aquando do incumprimento dos regulamentos relativos às descargas de efluentes, precavendo, desta forma, que a qualidade presente não seja alterada no futuro. 2.16.4.3 Obrigações de serviço público Como se observou no ponto anterior, relativo à qualidade do serviço, o operador focaliza-se muito no serviço de cliente. O PUB desenvolveu uma interface utilizador e operador baseada no Indicadores de qualidade do serviço Tempo de resposta Processo de licenciamento das redes interiores para o abastecimento de água 12 dias úteis Duração e execução do ramal de ligação após a recepção e aprovação do pedido 6 dias úteis Duração de ligação do serviço de abastecimento após a execução do ramal 1 dia útil Processamento dos planos de drenagem 12 dias úteis Licenciamento dos planos de drenagem 7 dias úteis Processo de certificação do período de ocupação temporária 7 dias úteis Quadro 102 Indicadores de desempenho relativos à qualidade do serviço prestada 249 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional modelo denominado CARE, mais precisamente CHAMADA, ACÇÃO, RESPOSTA e AVALIAÇÃO (Call-Action-Response-Evaluate). A Figura 64 esquematiza o modelo CARE, demonstrando o fluxo (ciclo) de actividades entre o PUB e os seus utilizadores. tal, procura transmitir essa mesma filosofia aos seus habitantes. A consciência pública sobre os diferentes aspectos do ambiente é desenvolvida através de três medidas principais: campanhas específicas, o sistema educativo e a Semana Verde e Limpa (“Clean and Green Week”), iniciada Quando o operador recebe o feedback do público (CHAMADA), uma acção imediata (ACÇÃO) é executada, gravando toda a informação necessária e/ou destacando a mesma para o departamento adequado para tomar as devidas medidas (RESPOSTA). em 1990. A primeira campanha específica, denominada “Mantém Singapura Limpa” (“Keep Singapure Clean”), incidiu sobre a problemática ambiental e a gestão da água. Figura 64 Modelo CARE implementado pelo PUB O feedback deve ser monitorizado e gravado. Depois das medidas tomadas, e do assunto estar resolvido, o departamento deve avaliar (AVALIAR) as causas e tomar medidas para evitar o seu reaparecimento. Finalmente, o utilizador é informado sobre os resultados da sua chamada. Em Singapura, no âmbito de uma maior protecção dos interesses dos utilizadores domésticos, o operador (PUB) disponibiliza os serviços de telefone, e-mail, fax, SMS, Webchat e VoIP, para facilitar a comunicação do problema dos utilizadores, especialmente, em caso de interrupção do serviço. Como referido, o Governo de Singapura reflecte uma grande consciência ambiental e, como 250 2.16.5 DESEMPENHO O sector da água em Singapura prima pelo grande desenvolvimento, não só pela excelência da qualidade do serviço prestada, onde se evidenciam perdas de água diminutas, mas também pela qualidade de água elevada, independentemente do tipo de tratamento, utilizador e fim a que se destina. Outros factores de destaque prendem-se com a grande preocupação das autoridades governativas em tornar o país auto-suficiente em termos de produção de água, através de alguns processos pioneiros em termos tecnológicos, estimando-se o alcance deste objectivo para 2011, e com a consciência ambiental do governo e dos singapurenses. Suécia 2.17 SUÉCIA 2.17.1 ANTECEDENTES HISTÓRICOS A Suécia (Konungariket Sverige) apresenta-se como um dos países mais ricos do mundo em matéria de disponibilidade de recursos hídricos. O país, com uma área de cerca de 450 000 km2 e, aproximadamente, nove milhões de habitantes, encontra-se estruturado em três regiões (landsdelar), a saber, Götaland (parte sul), Svealand, (parte central) e Norrland (parte norte), 21 condados (län) e 290 municípios (kommuner). Os SAS, por serem considerados monopólios naturais, são sujeitos a uma regulamentação exigente por parte das entidades competentes. Neste domínio, a Suécia é uma referência, controlando o modus operandis e o desempenho dos operadores. Esta postura da administração, mesmo na ausência de uma entidade reguladora dedicada ao sector, representa um excelente exemplo ao nível da defesa do utilizador. Neste âmbito, a Suécia possui uma legislação ao nível ambiental e sobre o sector da água, robusta e abrangente, onde três leis fundamentais estruturam a regulação do sector: a Lei da Águas e das Águas Residuais (Lag – 1970: 244 – om allmänna vatten- och avloppsanläggningar), o Código Ambiental (Miljöbalk, 1998: 808) e a Lei de Segurança Alimentar (Livsmedelslagen, SFS 1971: 511). A Lei da Água e das Águas Residuais revela-se um instrumento jurídico fundamental no âmbito da regulação do sector da água na Suécia, tendo em conta a sua liberalização e modernização. Esta lei, entre outras disposições, atribui aos municípios a responsabilidade de garantir ou de fazer garantir, através de delegação, o fornecimento do SAS em condições de qualidade elevada aos seus utilizadores. No sector da água da Suécia, o operador, público ou privado, com responsa- bilidade directa sobre a operação do serviço é, comummente, denominado como o “Principal” (huvudman). De acordo com este diploma, o Tribunal Nacional da Água e das Águas Residuais (Statens VA – nämnd) tem como atribuição a resolução de conflitos entre os operadores e os respectivos utilizadores a nível nacional. As competências principais relativas à gestão da água encontram-se delegadas às autoridades locais ou regionais. A nível regional, o Conselho de Administração dos Condados (Länstyrelsen) possui as competências de examinar, supervisionar e coordenar o sector da água. A nível local existem 290 municípios responsáveis pelo planeamento, construção e operação das infra-estruturas dos SAS, sendo também os seus proprietários. No intuito de consolidar a legislação que se encontrava dispersa em vários domínios, o governo implementou, em 1999, o Código Ambiental, fundindo, num só documento, 15 leis ambientais, incluindo a Lei da Água (protecção da água nacional), a Lei de Protecção Ambiental (controla e licencia as descargas de águas residuais), a Lei da Protecção da Saúde e a Lei da Higiene Pública. Antes da elaboração deste documento normativo, o domínio da protecção ambiental encontrava-se regulamentado por cerca de 200 normas. Este código passou a regular os padrões ambientais e a estipular as medidas a serem desenvolvidas no sector, de modo a prevenir e minimizar os impactos, no ambiente, causados pelas captações de água e pelas descargas de efluentes. Por último, no sector da água, a implementação da Lei de Segurança Alimentar teve como principal alteração o facto de estabelecer a água para consumo humano como um produto alimentar e, consequentemente, passou a ser tratada com padrões de qualidade equivalentes a qualquer outro produto alimentar, delegando sobre os Ministérios do Ambiente e da Agricultura as responsabilidades legais neste domínio. 251 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional 2.17.2 ENQUADRAMENTO LEGAL E INSTITUCIONAL 2.17.2.1 Responsabilidades Na Suécia, tal como nos seus países vizinhos, a responsabilidade sobre o sector da água, desig- Agricultura (Jordbruksdepartementet), a Agência de Protecção Ambiental (Naturvårdsverket), o Conselho da Administração dos Condados, a Associação do Sector de Água e Águas Residuais Sueca (Svenskt Vatten), a Autoridade da Concorrência (Konkurrensverket) e o Tribunal Nacional da Água e das Águas Residuais (Statens VA – nämnd). Na Figura 65 apresenta-se a organização institucional do sector da água na Suécia, bem como a interligação entre os referidos organismos (adaptado de Euromarket, 2003). Figura 65 Enquadramento institucional do sector da água na Suécia nadamente dos SAS, pertence aos municípios. No entanto, por lei, os municípios podem escolher entre a gestão directa do serviço e a delegação dos serviços referidos a uma entidade gestora privada. Além disso, os municípios possuem igualmente a capacidade de se associarem em federações (sob a lei pública). O Tribunal dos Direitos da Água (Vattenöverdomstolen) é a autoridade responsável pelo licenciamento das captações e os Tribunais Regionais Ambientais (Regionala miljödomstolarna) possuem as valências de autorizar as descargas de águas residuais tratadas pelas grandes ETAR, enquanto o licenciamento ao nível das pequenas ETAR é efectuado pelo Conselho de Administração do Condado (Länstyrelsen). Além das responsabilidades ao nível da provisão dos respectivos serviços, existem outros organismos que possuem papéis importantes no sector, nomeadamente ao nível da supervisão, regulamentação e protecção dos recursos hídricos. Esses organismos são os Comités Municipais de Protecção Ambiental e da Saúde, o Ministério do Ambiente (Miljödepartementet), o Ministério da 252 O Ministério do Ambiente tem a responsabilidade sobre a protecção dos recursos hídricos na Suécia e dos investimentos relativos aos SAS considerados de interesse geral. A supervisão da qualidade dos recursos hídricos é efectuada por diversas entidades mediante o nível em questão, nomeadamente, a Agência de Protecção Ambiental que possui esta competência a nível nacional, o Conselho da Administração dos Condados, controlando o sector a nível regional e, por último, no âmbito local, a supervisão cabe aos Comités Municipais de Protecção Ambiental e da Saúde (Miljö- och hälsoskyddsnämnden). O Ministério da Agricultura detém a responsabilidade global sobre a qualidade da água para consumo humano, visto que esta é considerada um produto alimentar, de acordo com a legislação vigente. A Autoridade da Segurança Alimentar (Livsmedelsverket) constitui a entidade supervisora central da qualidade da água para consumo humano. Esta entidade recebe e revê os relatórios anuais de qualidade de água dos operadores, elaborando programas de melhoria e auditoria várias vezes por ano. Suécia A Agência de Protecção Ambiental constitui a principal entidade com funções de supervisão da protecção da água na Suécia. Esta agência tem a atribuição de promover e coordenar o desenvolvimento ecológico e de actuar como uma fonte pró-activa de alteração de políticas, quer a nível nacional quer internacional. O Conselho de Administração dos Condados tem como principal missão diligenciar no sentido de preservar os recursos ambientais a nível regional, colaborando com todos os municípios na formulação de objectivos e programas de acção sobre as áreas mais carenciadas. Na circunstância de o impacto ambiental ser limitado, esta entidade encontra-se habilitada a efectuar o licenciamento. A Associação do Sector da Água e das Águas Residuais, criada pelos municípios em 1962, compreende como seus membros todos os municípios suecos. Esta associação assiste os SAS tanto a nível técnico como a nível económico e administrativo e possui funções de defesa dos interesses dos municípios em negociações com outras autoridades e organizações, sobretudo ao nível da elaboração da legislação. A Autoridade da Concorrência controla se os acordos não ferem a defesa da concorrência [“eliminate and counteract obstacles to effective competition in the field of production of and trade goods, services and other products” (Swedish Competition Act, 2002)]. Tem também o dever de promover propostas que visem a alteração da legislação e outras medidas vocacionadas para a eliminação de obstáculos a uma competição eficaz, tal como a procura contínua de um aperfeiçoamento do know-how sobre todos os aspectos relativos à competição. A Associação do Sector da Água e das Águas Residuais, a Stockholm Vatten e a Water and Sewage Works em Gotemburgo e Malmoe estabeleceram, em 1996, a Swedish Water Development (SWD) AB com o objectivo de assessorar organizações municipais e públicas internacionais, divulgando e comunicando o conhecimento e a experiência sueca nos domínios da propriedade, operação e gestão dos SAS. O Tribunal Nacional da Água e das Águas Residuais tem como atribuição a resolução de conflitos entre os operadores e os respectivos utilizadores a nível nacional. 2.17.2.2 Regulação Na Suécia não existe nenhuma entidade reguladora sectorial com funções explícitas de regulação económica, da qualidade do serviço e das obrigações de serviço público. No entanto, o sector da água na Suécia caracteriza-se por uma regulação transversal bastante eficaz que garante as obrigações de serviço de público, como a universalidade, e pela auto-regulação praticada, essencialmente por parte da associação do sector, incentivando o desenvolvimento e, por conseguinte, a qualidade do serviço. Neste sentido, o papel desta associação revelase preponderante ao promover um sistema de benchmarking (DRIVA) entre os operadores de água (cerca de 20 municípios), concentrando-se sobretudo na redução de custos e na melhoria da eficiência operacional. Estocolmo, Gotemburgo e Malmoe são ainda membros do projecto 6 cidades PI Grupo que suportam o programa de benchmarking para as maiores cidades dos países nórdicos. A defesa e protecção dos utilizadores, sobretudo os conflitos com os operadores, são tratados pelo Tribunal Nacional da Água e das Águas Residuais, de acordo com o art. n.º 36 da Lei da Água e das Águas Residuais. No caso de os SAS pertencerem ao sector privado, o município pode apontar o denominado “Supervisor” (Tillsynsman) para inspeccionar e supervisionar a provisão e a manutenção dos serviços. Este supervisor, de facto “regulador”, pretende assegurar aos cidadãos um serviço de água de boa qualidade e a custo apropriado, de acordo com a Lei da Água e das Águas Residuais. O Supervisor reporta toda a sua actividade ao município. Até à data existe um único Tillsynsman na Suécia, designadamente, no município de Norrköping. 2.17.3 ESTRUTURA DO MERCADO 2.17.3.1 Propriedade e gestão dos serviços Na Suécia, os SAS são tradicionalmente geridos de forma directa pelos 290 municípios, com a excepção dos maiores núcleos urbanos, como Estocolmo, Gotemburgo e Malmoe, cujos operadores são constituídos por associações regionais. O sector privado também tem participação na gestão destes serviços, aproximadamente, em 10% do total. Em 2002, 243 municípios reportaram que se encontravam organizados como unidades de gestão directa dentro do próprio município, 34 eram empresas municipais, 30 eram sistemas in253 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional termunicipais, 6 operadores possuíam contratos de gestão e 2 municípios eram totalmente privados (Norrköping e Karlskoga). A estrutura do mercado do sector da água na Suécia apresentase no Quadro 103 (Aqualibrium, 2003). A participação de entidades privadas no sector da água da Suécia tem estado sempre associada Quadro 103 Formas organizacionais do sector da água na Suécia No final de 2002, havia 34 empresas municipais. Apesar da sua reduzida representação, é relevante reconhecer a sua importância na Suécia, uma vez que grandes áreas são abastecidas de água por este tipo de organização, nomeadamente, Estocolmo e Gotemburgo e periferia. Na verdade, a Stockholm Vatten fornece o serviço de água a cerca de um milhão de habitantes, 1995 2002 Administração municipal 244 243 Empresa municipal 17 34 Organização order-perform 44 30 Contratos de gestão 7 6 Outra 7 8 Sem resposta 1 - Planos de mudança 20 18 Sem planos de mudança 207 236 Sem resposta 60 35 Número total de municípios 287 289 Forma presente de organização Forma futura de organização a muita controvérsia. O número de contratos de gestão é consideravelmente reduzido e permanece estável desde 1995. Como o sector funciona muito bem e a custos moderados, não existe necessidade de efectuar reformas, que, quando existem, são de cariz ideológico. Em 2002, existiam apenas seis contratos de gestão (p. ex., PPP) com o sector privado e de curta duração (4 a 7 anos). Existe, no entanto, uma presença forte do sector privado na prestação de serviços. 2.17.3.2 Players do sector O número de entidades gestoras municipais é bastante similar ao número de municípios. A SWD contabilizou 294 SAS na Suécia, para os 289 municípios (em 2002). A presença de algumas entidades supramunicipais reduz o número de entidades gestoras, embora parte destas só comercializem água em “alta”. A maioria dessas entidades gestoras, cerca de 243, são municípios que gerem os SAS directamente, inter alia, Gotemburgo, Malmo e Uppsala. 254 correspondendo a 11% da população sueca, prestando também o serviço de águas residuais. Especialmente, na área de Estocolmo existe uma extensa cooperação entre os municípios através de associações formais ou informais. Neste âmbito, o sector da água na Suécia compreende uma clara tendência no sentido da cooperação regional (supramunicipal) e município-município (bilateral). 2.17.3.3 Integração e âmbito de actuação dos operadores Na Suécia, a maior parte das entidades gestoras, principalmente devido à contribuição da gestão directa dos municípios, fornece ao mesmo tempo os SAS. Ao restringir-se a amostra às empresas municipais, é possível observar que apenas um número restrito fornece em simultâneo os serviços referidos, designadamente, a Stockholm Vatten, Solna Vatten AB e Roslagsvatten AB. A integração vertical destes serviços é um aspecto usual entre as entidades gestoras, apesar de Suécia existirem excepções, que tanto promovem o serviço de água em “alta” como o serviço de águas residuais em “alta”. Por exemplo, a Sydvatten fornece água em “alta” a 12 municípios, incluindo Malmoe, e a Syvab presta o serviço de águas residuais a seis municípios na periferia de Estocolmo. Existem, no segmento das empresas municipais, cinco entidades gestoras (multiutilities) que prestam outros serviços de rede, como o de electricidade, para além dos SAS. 2.17.3.4 Números do sector O sector da água na Suécia caracteriza-se sobretudo pela grande abundância de recursos hídricos, nomeadamente, a percentagem de água que é captada para consumo humano é extremamente pequena (inferior a 2%), tendo em conta a conjuntura europeia em que a Suécia se insere. No entanto, esta abundância revela-se também como um factor de desincentivo ao consumo eficiente do recurso, repercutindo-se, sobretudo, ao nível da capitação de 188 litros por habitante e por dia, correspondendo a um dos valores mais elevados da UE. A Suécia produz anualmente cerca de 900 milhões de m3 de água para consumo humano, cuja génese compreende três naturezas distintas: água subterrânea (24%), nascentes (25%) e água superficial (51%). O sector da água na Suécia caracteriza-se por níveis de atendimento na ordem dos 100%, tanto para o serviço de água como para o serviço de águas residuais. Esta realidade sobressai, ainda mais, devido ao facto de apenas uma restrita percentagem dos operadores ter ganhos de escala relevantes, dado que a população é reduzida em número e em grande parte do país encontra-se muito dispersa. O sector pauta-se também por apresentar moderadas perdas de água, nomeadamente, cerca de 22% de perdas em 2004, o que para um país com água em abundância é digno de registo (IWA, 2006). Na Suécia, os SAS englobam cerca de 6.000 trabalhadores (cerca de um terço são administrativos, um terço são operacionais das redes e o outro terço são operacionais das estações de tratamento). Neste domínio, ressalva-se que o número apresentado, representativo de uma elevada produtividade, é resultado de uma redução de 4.000 funcionários nos últimos dez anos. O objectivo, segundo a Associação do Sector, é chegar aos 4.000 funcionários para o sector da água na Suécia, nos próximos anos. 2.17.4 REGRAS DO JOGO 2.17.4.1 Estabelecimento de tarifas Na Suécia não existe um regulamento ou uma estrutura nacional para o estabelecimento de preços e tarifas dos SAS. No entanto, sob a legislação vigente, os municípios devem implementar um sistema tarifário capaz de repercutir sobre os utilizadores todos os custos associados aos serviços, incluindo uma remuneração normal dos capitais próprios mas sem o usufruto de lucros ilegítimos. Os SAS, de acordo com a lei vigente, encontram-se desagregados administrativamente e, apesar das suas valências de monopólio natural, não estão autorizados a retirar dividendos extra dos referidos serviços, além dos custos de provisão do serviço, a fim de poderem subsidiar outros serviços que não sejam auto-sustentáveis (p. ex., resíduos urbanos). Os custos de provisão do serviço englobam todos os custos de operação e manutenção e os custos de capital, que incluem a amortização dos investimentos e a remuneração dos capitais sociais realizados. O grande envolvimento dos municípios nos SAS poderia revelar-se, a priori, um factor preponderante de financiamento dos serviços prestados aos seus utilizadores. Todavia, uma análise realizada em 1998 ao sector ditou que, em média, 99% (em 2001) dos custos operacionais e de capital são cobertos pelas tarifas implementadas pelos operadores e pelas taxas de ligação ao sistema, existindo como tal uma recuperação integral de custos (Watertime, 2004). Na Suécia, o estabelecimento de preços e tarifas do serviço de água é efectuado mediante um sistema de duas parcelas, uma parcela fixa e uma parcela variável, dependente do volume de água consumido ou de outro factor. A parcela fixa cobre, em média, 32% do custo total do serviço de água. Os preços sobre o serviço de águas residuais são desenvolvidos de forma similar, ou seja, são divididos numa parte fixa, que engloba, igualmente, próximo de um terço do custo de serviço, e uma parcela variável. Contudo, existe uma tendência crescente, por parte dos operadores, em aumentar a parcela fixa. Por exemplo, em Estocolmo a parcela variável foi totalmente substituída por uma parcela fixa, que engloba o custo total de serviço de águas residuais. Em 2000, o governo introduziu uma parcela no sistema tarifário, em género de imposto ambiental, pelas descargas de águas pluviais no sistema 255 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional Quadro 104 Sistemas tarifários de três operadores dos SAS na Suécia para o ano de 2005 de saneamento. Esta taxa é cobrada anualmente mediante a área habitacional da propriedade. No entanto, os utilizadores que detenham a capacidade de evitar a sua deposição n a rede pública (p. ex., infiltração nos solos) não são abrangidos por esse imposto. Posteriormente, sobre estes preços ainda é cobrado o IVA, que no país representa 25%. O Quadro 104 apresenta os sistemas çar uma optimização dos resultados, uma vez que nos respectivos países existem poucos operadores com estas dimensões operacionais. Este esquema de benchmarking consiste no desenvolvimento de 28 indicadores de desempenho, que envolvem as áreas económicas, satisfação do utilizador, qualidade do serviço, fiabilidade do serviço, qualidade ambiental e recursos humanos. Águas residuais (€/m3) Água (€/m3) Parcela Fixa Parcela variável Outra parcela* Parcela variável Estocolmo 0,245 0,238 0,483 0,678 Gotemburgo 0,259 0,287 0,550 0,755 Malmo 0,251 0,268 0,519 0,662 *referente às águas pluviais tarifários de três operadores para o ano de 2005 para um consumo de 200 m3 (IWA, 2006). Os utilizadores industriais pagam pelos SAS o custo de produção e possuem condições especiais. Possivelmente, devido à abundância de recursos hídricos, os utilizadores de grande escala usufruem de alguns descontos. A nível agrícola, não existem preços estabelecidos, uma vez que cada proprietário tem o direito aos recursos subterrâneos dentro da sua propriedade, e esta é a origem principal. 2.17.4.2 Qualidade do serviço O sector da água na Suécia evidencia-se, não só pela fiabilidade do serviço, mas também pelo elevado nível de qualidade do serviço fornecido. Para este factor contribui, de certa forma, o papel desempenhado pela associação dos operadores, nomeadamente através da promoção de um sistema de benchmarking (DRIVA) entre os operadores de água (cerca de 20 municípios), concentrando-se sobretudo nos custos e na eficiência operacional dos operadores e que beneficia não só os participantes do projecto directamente como toda a indústria indirectamente. As principais cidades suecas, como Estocolmo, Gotemburgo e Malmoe, são membros voluntários de um benchmarking que envolve as 6 maiores cidades escandinavas, com o objectivo de alcan256 Um número substancial de estudos revela que, apesar da distribuição populacional espacial desfavorável, a Suécia apresenta um serviço muito competitivo em relação a outros países europeus, com melhor desempenho do que muitos países que evidenciam escalas mais favoráveis. 2.17.4.3 Obrigações de serviço público Na Suécia as obrigações de serviço público referentes à universalidade e à equidade estão consagradas na lei. Os cidadãos suecos, através do Princípio de Acesso Público aos Documentos Administrativos (offentlighetsprincipen), têm uma longa e vincada tradição sobre os direitos de acesso a todos documentos relativos ao serviço público e à sua participação na administração, repercutindo-se deste modo sobre os SAS. Em situações de incumprimento dos requisitos de qualidade por parte das instalações dos SAS, o Conselho da Administração do Condado aplica penalidades, impondo medidas cautelares e de correcção, de modo a salvaguardar a saúde dos utilizadores. Sob a lei em vigor, o operador do serviço de águas residuais possui a obrigação de controlar os parâmetros de qualidade dos seus efluentes. Além disso, o operador tem também que apresentar anualmente um relatório ambiental, Suécia contendo essas análises, à autoridade supervisora, normalmente, os Comités Municipais para o Ambiente e Saúde. 2.17.5 DESEMPENHO A Suécia é um dos países mais ricos do mundo em matéria de água. Apresenta um desempenho elevado, com um binómio qualidade do serviço/ preços praticados de excelência. 99% dos custos dos SAS são recuperados através dos valores cobrados aos utilizadores. A Suécia apresenta uma população relativamente reduzida para a sua área, não retirando quaisquer dividendos de ganhos de escala. Por conseguinte, grande parte da população sueca encontra-se dispersa pelo país, servida por diferentes players, conduzindo a maiores custos de prestação do serviço. É também nos municípios mais pequenos que existe alguma concessão de subsídios oriunda do governo sobre as tarifas da água. 257 Zâmbia 2.18 ZÂMBIA 2.18.1 ANTECEDENTES HISTÓRICOS A Zâmbia é uma república democrática. O presidente da Zâmbia reúne os poderes de chefe de Estado e de chefe de governo, num sistema plural e multipartidário. Enquanto cabe ao governo desempenhar o poder executivo, o poder legislativo encontra-se associado não só ao governo, mas também ao parlamento. O país, com uma população aproximada de 11,7 milhões de habitantes dispersos por cerca de 752,6 mil km2, encontra-se dividido em nove províncias, cada uma administrada por um governador nomeado, as quais, por sua vez, se dividem num total de 73 distritos. O sector da água na Zâmbia tem enfrentado vários desafios que têm condicionado o seu desenvolvimento. O problema principal do país não se prende com a disponibilidade, uma vez que a Zâmbia possui recursos hídricos em abundância. Todavia, a sua gestão ao longo do tempo não tem sido a mais adequada, tanto pela falta de recursos financeiros para a construção e manutenção das infra-estruturas como pela insuficiente capacidade de gestão e dos poderes institucionais. A primeira lei produzida relativa ao sector da água foi a Lei da Água de 1948, a qual, com o passar dos anos, se foi revelando ineficaz e insuficiente face aos objectivos assumidos, tornando a sua revisão incontornável. Neste âmbito, o sector da água encontra-se primordialmente regulamentado pela Lei de Governo Local de 1991 (Local Government Act – Lei n.º 22), pela Política Nacional de Água de 1994 e pela Lei da Água e das Águas Residuais de 1997 (Water Supply and Sanitation Act, Lei n.º 28). A Lei n.º 22, entre as demais atribuições, descentraliza o controlo dos SAS para o poder lo- cal, que até então permanecia sobre o poder central. A administração local, para além de funções de operador, foi também dotada de poder normativo. A Política Nacional de Água (National Water Policy) de 1994 criou o enquadramento legal para a implementação da descentralização da responsabilidade dos SAS. Este documento estratégico atribui iguais responsabilidades na prestação destes serviços às áreas urbanas e periurbanas. Estabelece como princípio a universalização do serviço de água, incluindo as populações urbanas e rurais, além de procurar promover o desenvolvimento sustentável dos recursos hídricos, a fim de facilitar o fornecimento equitativo da quantidade e qualidade adequada da água para todos os usos competitivos, a um custo justo e aceitável, e assegurando a sua robustez e fiabilidade. A Política Nacional de Água não lida directamente com as áreas periurbanas ou com os estabelecimentos informais, embora não os ignore. A Lei da Água e das Águas Residuais delega a responsabilidade pelo fornecimento dos SAS nas autoridades locais e incentiva a sua empresarialização através da criação de operadores comerciais. A introdução da participação privada na gestão e exploração destes serviços também foi incluída na opção para a comercialização do sector da água na Zâmbia. Este marco normativo criou ainda o Conselho Nacional de Água e Saneamento (National Water Supply and Sanitation Council - NWASCO), regulador nacional e independente para os SAS urbanos. Em 2004, o governo produziu uma estratégia para os SAS rurais, descentralizando ao nível do distrito e, com base no planeamento local, procurou a agilização e a operacionalização da sua prestação. Em suma, a Política Nacional da Água, em consonância com a Lei do Abastecimento de Água e do Saneamento, incutiram diversas al259 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional terações ao sector, inter alia, a separação da gestão dos recursos hídricos da gestão dos SAS, a separação do Estado regulador do Estado operador aos vários níveis, a atribuição da prestação dos serviços pelas autoridades locais ou empresas privadas, a implementação do princípio da recuperação integral dos custos através dos sistemas tarifários, a profissionalização dos recursos humanos, a utilização de tecnologias apropriadas às condições locais e, por último, a colocação do sector da água no topo das prioridades em termos orçamentais e políticos. 2.18.2 ENQUADRAMENTO LEGAL E INSTITUCIONAL 2.18.2.1 Responsabilidades A responsabilidade sobre o sector da água encontra-se associada a diferentes organismos, nomeadamente, o Ministério da Energia e Desenvolvimento da Água (Ministry of Energy and Water Development - MEWD), o Departamento dos Assuntos da Água (Department of Water Affairs - DWA), o Ministério do Governo Local e Habitação (Ministry of Local Government and Housing - MLGH), o Departamento de Infra-estruturas e Serviços de Suporte (Department of Infrastructure and Support Services - DISS), o NWASCO, a Associação da Água e do Saneamento da Zâmbia (Water and Sanitation Association of Zambia - WASAZA), o Conselho do Ambiente da Zâmbia (Environment Council of Zâmbia - ECZ), os municípios e as ONG. Os SAS compreendem como actor principal o MLGH, tendo em conta o facto de a responsabilidade pelo fornecimento dos SAS se encontrar associada às autoridades locais. No entanto, outros ministérios também possuem importantes funções no desenvolvimento, gestão e monitorização do sector, como os Ministérios das Finanças e Desenvolvimento Nacional, do Ambiente e da Saúde. A desagregação dos recursos hídricos dos SAS atribui ao MEWD a responsabilidade pelo estabelecimento das políticas no domínio dos SAS, delegando este a gestão dos recursos hídricos no Departamento dos Assuntos da Água, o qual tutela. Neste âmbito, foi feita a separação das atribuições de tomada de decisões políticas e do fornecimento do serviço entre o nível central e os níveis provinciais do governo, procurando criar uma regulamentação mais eficaz e mini260 mizar a interferência política, conferindo maior seriedade e independência ao sector. O MLGH, através do DISS, tem responsabilidades ao nível do planeamento e mobilização de recursos para a construção de infra-estruturas. Em 2003, o DISS estabeleceu uma unidade de missão para os SAS rurais (RWSSU) e também, recentemente, uma unidade para os SAS das zonas periurbanas. Em resumo, segundo a legislação em vigor, o DISS é responsável pelo planeamento das infra-estruturas, desenvolvimento e gestão dos SAS. O NWASCO, sendo uma entidade reguladora dedicada ao sector da água, possui a responsabilidade de regular o fornecimento dos SAS no seu país. Além disso, o regulador aconselha o Governo da República da Zâmbia no que concerne ao desenvolvimento de políticas, ao estabelecimento de normas e orientações, ao licenciamento dos operadores dos SAS e, por fim, à monitorização do desempenho dos operadores. Em teoria, a actividade do NWASCO abrange todo o país, mas na prática as entidades reguladas cingem-se somente aos operadores dos SAS de áreas urbanas. A NWASCO tutela ainda o Devolution Trust Fund (DTF), uma unidade de missão que gere os donativos das agências internacionais e os subsídios dos governos. A WASAZA, criada em 1999, inclui nos seus estatutos, como objectivos principais, a realização de um congresso, onde os diferentes stakeholders possam discutir os diversos assuntos que preocupam o sector da água, e a promoção da disseminação das boas práticas entre os stakeholders. A Associação encontra-se aberta a todos os profissionais do sector da água e actividades conexas, como as relativas ao ambiente, à agricultura e à saúde. Os municípios, além da responsabilidade global do fornecimento dos SAS com qualidade adequada nas áreas da sua jurisdição, possuem a capacidade de criar normas adicionais, mas apenas no contexto da regulação previamente estabelecido pelo NWASCO. A criação de empresas comerciais para o fornecimento dos SAS, sobretudo desde 2000, não transfere ou diminui a responsabilidade dos municípios sobre os SAS. O ECZ é um organismo estatutário, criado em 1990, que possui incumbências de proteger o ambiente e controlar a poluição, salvaguardando o bem-estar e a saúde dos concidadãos e o ambiente. As suas funções passam por regular e coordenar a gestão ambiental, promover a consciencialização e assegurar a protecção ambiental. Por último, são de referir as ONG, como a Care International ou o Japanese International Deve- Zâmbia lopment Agency, que têm contribuído de forma significativa para a prestação dos SAS nas zonas periurbanas e rurais. A Figura 66 apresenta o enquadramento institucional do sector da água na Zâmbia. pelo NWASCO, em relação aos operadores, são o licenciamento, a aprovação das tarifas, a supervisão das suas actividades e contas e a instituição de benchmarking entre os operadores regulados. No que concerne aos utilizadores, o Figura 66 Enquadramento institucional do sector da água na Zâmbia 2.18.2.2 Regulação O sector da água na Zâmbia congratula-se pela existência de um regulador específico. O NWASCO, entidade reguladora independente e dedi- cada exclusivamente ao sector da água, foi estabelecido por lei em 1997, mas apenas iniciou as suas funções, efectivamente, em 2000. O seu âmbito regulatório abrange 10 empresas comerciais, que estão espalhadas por todo o país, os operadores puramente privados e as autoridades locais. As ferramentas regulatórias utilizadas NWASCO compreende atribuições de comparar e publicitar a informação oriunda dos operadores (regulação sunshine) e do governo e ainda a resolução de disputas entre os utilizadores e os operadores. O NWASCO reporta anualmente a sua actividade ao MEWD. Na Figura 63 apresenta-se a informação obtida do exercício de bench- marking desenvolvido para os operadores comerciais (adaptado de Kayaga e Franceys, 2008). Figura 63 Folha de benchmarking apresentada no relatório anual do NWASCO Adicionalmente, o NWASCO desenvolve um ranking entre os operadores, tendo em conta a ponderação dos resultados dos indicadores de desempenho obtidos em função da sua importância. 261 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional No Quadro 105 evidenciam-se os indicadores e as ponderações adoptados (NWASCO, 2008). Quadro 105 Indicadores de desempenho aplicados pela NWASCO e respectivas ponderações Indicador vo ao problema das perdas de água (NWASCO, 2008). Peso (pontos) Qualidade da água 20 Eficiência da recolha 20 Percentagem de contadores 15 Horas de abastecimento 15 Cobertura dos custos de operação e manutenção 15 Perdas de água 10 Funcionários por 1.000 utilizadores 10 Percepção dos reguladores 10 Nível de atendimento do serviço de água 5 5 Nível de cobertura do serviço de águas residuais O regulador estabelece também valores-objectivo, considerando a conjuntura e o ambiente operacional em que a entidade gestora se insere. Assim, o Quadro 106 e a Figura 64 ilustram o esquema de benchmarking usado relatiQuadro 106 Valores objectivo para o indicador perdas de água Figura 64 Perdas de água por operador 262 Por último, a entidade reguladora desenvolve recomendações específicas a cada operador comercial, procurando a melhoria de desempenho de cada serviço e, neste sentido, contribuir para o desenvolvimento geral do sector da água. Benchmark para o indicador perdas de águas Bom <20% Aceitável 20-25% Inaceitável >25% Zâmbia 2003/2004 2004/2005 2005/2006 2006/2007 Atendimento do serviço de água (%) 54 58 73 71 Atendimento do serviço de saneamento (%) 32 32 32 34 Utilizadores domésticos (%) - 86 86 92 Produção de água (milhões de m3) - 300,5 303,5 316,3 Perdas de água (%) 50 49 48 47 Contadores (%) 32 32 39 39 Qualidade de água (%) - - 77,9 56,6 Horas de abastecimento* - - 14,3 16,0 Eficiência da recolha (%) 68 74 77 84 - - 9,44 11,54 339,7 420,1 489,5 495,0 Custos de operação - - - - Estrutura de custos - - - - Tarifa média - - - - 65 75 77 102 - - - - Atendimento (%) - 28 24 23 Horas de abastecimento - 7,0 8,7 5,2 Eficiência da recolha (%) - 37 50 33 Atendimento* - - 99,7 99,8 Horas de abastecimento* - - 16,0 17,6 Qualidade de água* - - 84,1** 75,4 Operador comercial Funcionários por 1.000 utilizadores Encargos médios com o pessoal por mês (€) Cobertura dos custos de operação e manutenção (%) Qualificação dos funcionários Autoridades locais Sistemas privados * ponderado pela população servida; ** um operador não respondeu O Quadro 107 apresenta o conjunto de indicadores de desempenho calculados para os últimos 4 anos por operador, ponderado pela população. Os indicadores de desempenho apresentados indiciam diferentes análises, sobretudo para 2005 /2006 e 2006/2007, devido ao início de funções de um outro operador comercial, o Serviço de Águas de Lukanga (LGWSC). Quando o operador apresenta permanentemente resultados com desempenho reduzido, o NWASCO coloca-o sob Supervisão Regulatória Especial (SRE). Durante este período, o operador encontra-se obrigado a apresentar um relatório mensal à NWASCO com os indicadores referidos e as decisões tomadas, as quais, por sua vez, são submetidas a uma vigilância apertada até ao momento em que o regulador esteja convencido dos seus progressos reais. Quadro 107 Resumo dos indicadores aplicados pelo NWASCO nos últimos 4 anos O orçamento que possibilita toda a actividade do NWASCO, incluindo o pagamento dos seus 16 funcionários, é provido maioritariamente pe263 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional las autoridades locais e operadores através de taxas de licenciamento, representando 89% do orçamento total. Do orçamento de Estado provém 7% das suas despesas, 1% de doações e os remanescentes 3% provém de outras origens diversas. Neste âmbito, em 2006, os cus- operadores. A Figura 65 ilustra o procedimento dos WWG no tratamento das reclamações (Lwenje, 2007). tos de funcionamento do NWASCO ascenderam a 577 mil euros. preços, com um período regulatório de três anos, fundado em diversos objectivos como a avaliação do impacto das tarifas da água actuais (p. ex., em 2007 não houve aumento das tarifas para os habitantes carenciados), o conhecimento que os utilizadores têm sobre o custo do fornecimento da água, o incentivo do conhecimento do utilizador sobre a problemática da conservação da água e a verificação da quantidade de água que é consumida pelas diferentes categorias de utilizadores. No âmbito da regulação económica, o NWASCO adopta o método de regulação por limite de Figura 65 Procedimento regulatório do tratamento das reclamações pela WWG No que concerne à sua função primordial, nomeadamente a defesa dos interesses dos utilizadores, o NWASCO criou em 2001 os denominados Water Watch Groups (WWG). Os WWG são grupos de voluntários responsáveis pela salvaguarda dos direitos dos utilizadores no sector da água e pela divulgação da informação disponível relativa ao serviço que lhes é prestado. O NWASCO encarrega e incentiva os WWG a desenvolverem estas funções. As WWG têm sido instituídas em Lusaka, Kitwe, Chingola e Copper Belt, mas a falta de recursos financeiros tem impedido a sua cobertura nacional. Os WWG recebem as reclamações e sugestões dos utilizadores e compilam essa informação para o próprio operador ou para o NWASCO, caso o operador comercial se encontre a violar as suas obrigações. Além disso, também informam os utilizadores sobre a regulação desenvolvida, através da sua publicitação. Os WWG recebem poderes delegados pelo NWASCO ao nível da resolução das reclamações dos utilizadores em primeira instância. Neste sentido, os WWG têm desempenhado um papel muito importante e positivo no desenvolvimento do sector da água na Zâmbia, dado que se observa que os operadores comerciais, onde os WWG já intervieram, se tornam mais focalizados na óptica dos utilizadores prestando um melhor serviço. O NWASCO também integra as suas recomendações na avaliação do desempenho dos 264 2.18.3 ESTRUTURA DO MERCADO 2.18.3.1 Propriedade e gestão dos serviços Os SAS na Zâmbia caracterizam-se por serem fornecidos quase totalmente pelo sector público. Apesar de alguma participação do sector privado na prestação dos serviços de água, esta encontra-se bastante restrita e refere-se apenas a áreas isoladas. 2.18.3.2 Players do sector Na Zâmbia, os SAS abrangem 87 cidades dispersas por todo o país. Os SAS são fornecidos por 10 operadores comerciais, que servem, aproximadamente, 92% da população urbana e 7 operadores privados, que prestam estes serviços a 1% da Zâmbia população urbana. A restante população é fornecida por autoridades locais, nomeadamente, 6 operadores que se encontram licenciados e 16 operadores com licenças provisórias, que fornecem 7% da população urbana. Os utilizadores remanescentes, designadamente os mais desfavorecidos, confiam primeiramente nos poços e nos fontanários, enquanto a maioria dos utilizadores mais ricos tem sistemas privados e individuais. O Governo da República da Zâmbia, especialmente desde 2000, tem incentivado o estabelecimento de operadores comerciais para fornecer os SAS nas áreas urbanas. A instituição destes operadores pretende empresarializar e comercializar a provisão dos SAS. Todas as províncias têm optado pela criação dos operadores comerciais, com excepção da província de Luapula. Os operadores comerciais são estabelecidos pela transferência de sistemas existentes dos SAS para uma empresa registada, propriedade das autoridades locais, não se verificando alteração da sua área de jurisdição. Usualmente, o operador comercial é constituído sem capital adicional, limitando bastante a sua sustentabilidade operacional. Neste contexto, o operador Serviços de Água de Lusaka (LWSC) destaca-se pelo seu domínio operacional, fornecendo o SAS a cerca de 1,6 milhões de habitantes da capital zambiana. Nas áreas onde não se observa a participação de operadores comerciais, a exploração do SAS permanece sob a alçada das autoridades locais. Algumas áreas periurbanas são servidas por redes de água, mas a maioria é servida por fontanários ou em quiosques. Como referido, nas grandes cidades os serviços de água são principalmente fornecidos pelos operadores comerciais que obtiveram uma licença do NWASCO. No entanto, algumas destas áreas são também servidas por Water Trusts, particularmente na cidade de Lusaka, como é descrito de seguida. Na capital, uma grande percentagem da população periurbana é fornecida por associações de moradores que não possuem licença e não se encontram sujeitas a regulação. Na Zâmbia, os Water Trusts são pequenos operadores da rede que foram criados por iniciativa de doadores (p. ex., Chipata ou Kanyama Water Trust), em coordenação com as comunidades locais, nas zonas periurbanas. Actualmente, estas entidades encontram-se a fornecer o serviço de água sob um vazio legal, ainda que colectivamente sirvam quase tantas pessoas quanto os operadores públicos. O serviço de água de Lusaka é disponibilizado para 37% da população através de Water Trusts e para 43% da população por intermédio da LWSC, permanecendo os 20% remanescentes sem abastecimento de água. Um estudo recente sobre regulação social, realizado no âmbito do Building Partnerships for Development (BPD), revelou que os Water Trusts gostariam de ver os seus serviços regulamentados, pois pressupõem que, desta forma, se iria “reforçar a transparência e a confiança das pessoas nos Trusts”. A solução que actualmente está a ser considerada pelo NWASCO consiste na assinatura de protocolos entre os Trusts e o LWSC. A preparação de tais acordos, sob a supervisão da entidade reguladora, é susceptível de reforço da imparcialidade e da protecção de cada uma das partes interessadas. Isto revela-se bastante importante, dado que os Water Trusts fazem questão de manter a sua independência e de não acatarem favoravelmente as propostas para incorporálos como principal fornecedor ou para, de forma simples, se tornarem seu distribuidor. A Figura 66 ilustra o enquadramento organizacional dos Water Figura 66 Enquadramento organizacional do modelo Water Trust 265 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional Quadro 108 Evolução anual do nível de atendimento do serviço de água urbano Trusts (adaptado de Kayaga e Kadimba-Mwanamwambwa, 2006). 2.18.3.4 Números do sector A participação do sector privado no fornecimento dos SAS é consideravelmente limitada. O país tem sete operadores privados, que se encontram concentrados em áreas isoladas, nomeadamente em zonas industriais e outras cooperativas. Como exemplo da participação do sector privado salienta-se o contrato de gestão da SAUR na exploração mineira da cidade de Copper Belt, fornecendo igualmente os SAS aos funcionários da empresa de exploração mineira. Os operadores privados são sistemas desenvolvidos pelas empresas que têm negócios completamente diferentes (p. ex., açúcar e produção de electricidade) e fornecem os SAS aos seus funcionários que vivem nas instalações da empresa, usualmente sem qualquer encargo para o funcionário. Estes sistemas são licenciados pelo NWASCO, segundo a legislação em vigor. Na Zâmbia são produzidos anualmente cerca de 316 milhões de m3 de água para consumo público. Neste âmbito, decorre que a capitação da população com acesso ao serviço de água é de 110 litros por habitante e por dia, incluindo as perdas de água, que na Zâmbia representam 47%. 2005/06 2006/07 População urbana 4 903 529 5 046 420 População urbana servida 3 270 745 3 428 572 67% 68% Nível de atendimento do serviço de água urbano O desenvolvimento do serviço de águas residuais encontra-se muito mais atrasado do que o serviço de água. Apenas uma percentagem reduzida da população tem acesso a este serviço. últimos dois anos do nível de atendimento do serviço de água nas zonas urbanas. 2.18.3.3 Integração do sector e serviços oferecidos O NWASCO e o Instituto de Estatística Zambiano (Central Statistical Office) estimam que 45% da população total viva em áreas urbanas. Da população urbana, 80% (3,9 milhões) vive em áreas low-cost e periurbanas. Estima-se que 80% da população zambiana viva com menos de 0,68 euros por dia. Os SAS são caracterizados, na generalidade, pela sua integração, quer horizontal quer verticalmente. Neste âmbito, o fornecimento dos referidos serviços é, geralmente, prestado pela mesma entidade gestora, tanto na circunstância dos operadores comerciais, como das autoridades locais e mesmo dos operadores privados. O subsector da água na Zâmbia obteve uma receita anual de cerca de 36,7 milhões de euros em 2006. O subsector das águas residuais, embora envolva mais custos, apenas corresponde a uma receita de 20% do serviço de água, ou seja, aproximadamente, 7,5 milhões de euros. Nesse ano apenas foram investidos nos SAS cerca de 552 mil euros. Os operadores comerciais caracterizam-se pela sua dedicação específica a este domínio, não prestando outros serviços. As autoridades locais fornecem directamente os referidos serviços aos utilizadores através do seu departamento de água e de águas residuais. 2.18.4 REGRAS DO JOGO Os operadores privados vêem esta actividade simplesmente como secundária, dado que se cingem apenas ao abastecimento dos seus funcionários e têm como principais mercados outros sectores. 266 Os dados sobre o atendimento dos SAS são muito variados, dependendo da fonte (em especial devido aos critérios adoptados), mas, aproximadamente, 68% (somente 45% de periurbano) da população urbana e 40% dos habitantes rurais têm acesso a água para consumo humano. O nível de atendimento do serviço de águas residuais é de cerca de 34%, sendo que a totalidade de águas residuais recolhidas é tratada. O Quadro 108 apresenta a evolução nos 2.18.4.1 Estabelecimento de tarifas A política governamental fomenta que as tarifas cobradas aos utilizadores devam repercutir a totalidade dos custos. Este objectivo é perseguido Zâmbia pelos operadores comerciais, tendo em conta os seguintes princípios: • Consciência social, ou seja, as tarifas devem ser “razoáveis” para os utilizadores mais carenciados; • Eficiência de utilização, devendo os sistemas tarifários reflectir o consumo, incentivando a medição da água (ainda não generalizada); • Conservação dos recursos onde as tarifas devem ser mais elevadas para níveis de consumo superiores às necessidades normais; • Simplicidade e transparência, isto é, as ta- rifas devem ser estabelecidas através de meios transparentes e participativos. As estruturas tarifárias variam consideravelmente entre os diferentes tipos de gestão e a respectiva região. No entanto, o sistema tarifário mais usual compreende a instituição de uma parcela fixa, referente à reduzida percentagem de habitantes que possuem contador, e uma parcela variável crescente com o consumo ou unitária. Devido ao facto de os contadores ainda representarem uma pequena fracção da população, a maioria dos operadores adopta uma tarifa fixa, particularmente nas áreas periurbanas. No Quadro 109 apresenta-se o sistema tarifário do SAS de Lusaka. Serviço de água facturada apenas pode ser estimada, podendo estar subavaliada. 2.18.4.2 Qualidade do serviço O NWASCO estabelece e contratualiza directa e indirectamente objectivos de desempenho para os operadores públicos, através da indução de competição virtual, mediante o cálculo de indicadores de desempenho e aplicação de benchmarking, conforme, apresentado no Quadro 107 anterior. Incluídos nestes contratos de desempenho estão ainda outros mecanismos de incentivo, procurando promover o desenvolvimento dos serviços. Um deles corresponde ao nível de serviço mínimo necessário onde, associado aos indicadores acima descritos para a cobertura da área servida, todos os operadores são obrigados a submeter ao NWASCO, nos dois meses seguintes após a recepção da licença de funcionamento, uma carta de compromisso assegurando um determinado nível de serviço. O acordo especifica as acções a serem tomadas num certo horizonte temporal (desejavelmente de três anos). Um outro mecanismo está relacionado com o regime de definição de tarifas, que está actual- €/m3 Quadro 109 Sistema tarifário da LWSC para o ano de 2007 Parcela variável 0-6 m3 0,20 6-30 m3 0,22 >30 m3 0,26 O NWASCO implementou recentemente um programa que punia os operadores comerciais pelo desempenho precário. Sob este programa, as tarifas cobradas foram reduzidas pelos operadores comerciais até os mesmos terem uma qualidade de desempenho aceitável. Embora o processo de reforma esteja em curso, procurando a recuperação de custos e a eficiência de serviço, os operadores ainda apresentam grandes ineficiências. Os operadores comerciais, em diversas áreas, revelam rácios de cobertura dos custos operacionais inferiores a um, indicando que as receitas dos SAS continuam inferiores aos custos de operação. Através de melhorias na emissão de facturação e de uma cobrança mais eficiente é esperado que os rácios operacionais melhorem drasticamente. Devido ao baixo nível de medição, a água não mente em revisão. A fixação de tarifas pretende incentivar o desempenho dos operadores, aumentar a eficiência e melhorar a relação entre custos e receitas. Finalmente, um terceiro mecanismo corresponde aos incentivos orientados para o desempenho. Neste domínio, este regime destina-se a aumentar o desempenho operacional (principalmente a gestão e desenvolvimento dos recursos humanos) dos operadores comerciais. Exemplos de alguns indicadores utilizados são a redução dos encargos com o pessoal administrativo, o limite para as despesas com o pessoal que não exceda 25% do volume de facturação e a produtividade do pessoal, medida pela receita por funcionário. Além do referido sistema de indicadores de desempenho, o NWASCO introduziu vários prémios 267 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional visando o reconhecimento dos esforços que se encontram a ser desenvolvidos pelos operadores, recompensando e incentivando a manutenção de um desempenho elevado. No sentido contrário, a legislação em vigor também possibilita o NWASCO de aplicar sanções aos operadores que, por não cumprimento ou negligência, não respeitem os requisitos mínimos. Através das reformas recentes e da supervisão do NWASCO, a prioridade foi atribuída ao alargamento dos serviços de água à população mais deficitária. Neste sentido, o NWASCO estabeleceu o DTF. A missão exclusiva do DTF prendese com o financiamento da expansão do acesso dos serviços de água nas áreas mais carenciadas. Embora o acesso ao serviço de água seja considerado elevado, estima-se que em condições de sustentabilidade e de fiabilidade corresponda a apenas 60% da população. 2.18.4.3 Obrigações de serviço público Na Zâmbia, a constituição de uma entidade reguladora vertical conferiu princípios que não estavam presentes explicitamente no sector da água até à data, nomeadamente a universalidade, a acessibilidade, a qualidade do serviço e a equidade. O quadro legal da Política Nacional de Água, para além destes princípios, também estipula que as áreas periurbanas devem ser tratadas equitativamente com as áreas urbanas, salvaguardando, deste modo, os mais carenciados contra níveis de serviços não equitativos. O Fundo de Devolução, criado pelo NWASCO, é uma instituição financeira independente, responsável pelo financiamento e vocacionada para o abastecimento de água nas áreas periurbanas. Este fundo tem vindo a tornar-se crucial, possibilitando a subsidiação do pagamento dos serviços de água aos utilizadores carenciados que, de outra forma, não teriam possibilidade de o pagar. Os sistemas tarifários também têm em conta os 268 rendimentos dos utilizadores, existindo tarifas reduzidas para os utilizadores mais necessitados. 2.18.5 DESEMPENHO As reformas efectuadas no sector da água da Zâmbia têm melhorado o desempenho dos SAS, em particular das camadas mais pobres. O papel do regulador (NWASCO) tem sido muito importante, constituindo um motor do desenvolvimento do sector da água. Outro aspecto muito positivo é a existência dos WWG que, embora abranjam uma parcela reduzida do sector da água, têm contribuído para a melhoria da qualidade do serviço e do cumprimento das obrigações de serviço público, permitindo a participação e aumentando a responsabilização de todos os intervenientes no sector da água. O método de regulação económica baseado na regulação por limite de preços, com incentivos ao desempenho, constitui outro ponto de relevo. Os SAS enfrentam, contudo, vários desafios. Entre os principais salienta-se a necessidade de melhorar o nível de atendimento do serviço de água e, principalmente, a sua qualidade, permitindo a sua prestação 24 horas por dia com qualidade e pressão adequadas. Para o efeito, são necessários vultuosos investimentos de que o sector não dispõe. Em relação aos serviços de águas residuais, a situação é ainda mais grave. É necessário aumentar e melhorar os sistemas tarifários, tornando-os mais adequados à realidade do país. Uma maior eficiência da cobrança, em simultâneo, com uma redução dos custos de operação e manutenção, através de uma maior eficiência produtiva, trará maiores receitas para o sector. Por exemplo, o volume de água não facturado representa um valor muito elevado na Zâmbia. A introdução gradual e sustentada do sector privado no país poderá também trazer mais recursos para o sector. Uma melhor gestão, quer institucional quer operacional, dos recursos hídricos, sobretudo da água subterrânea, para além da sustentabilidade ambiental, poderá conduzir a poupanças relevantes. PARTE 3 PANORAMA MUNDIAL DA REGULAÇÃO Introdução 3.1 INTRODUÇÃO O presente trabalho de investigação sobre a regulação do sector da água no mundo adoptou a seguinte metodologia. Em primeiro lugar, pesquisou-se, para cada país nos 5 continentes, a existência de reguladores dos SAS, as entidades responsáveis pelas actividades associadas à regulação (preços e tarifas, qualidade do serviço e obrigações de serviço público), os principais intervenientes do sector da água (operadores, associações, etc.), bem como toda a informação relevante sobre estas entidades e sobre os processos regulatórios vigentes. Os contactos de todos os reguladores e das principais entidades com funções de regulação são apresentados no Anexo 3. Em segundo lugar, elaborou-se um inquérito que foi enviado a todos os reguladores e às principais entidades com funções regulatórias dos SAS, para todos os países do mundo. Este inquérito era composto por seis capítulos no corpo principal, designadamente, os aspectos gerais dos SAS, o âmbito da actividade regulatória, os aspectos gerais da entidade reguladora, os aspectos organizacionais da entidade reguladora, a regulação económica e as obrigações de serviço público e de regulação da qualidade do serviço. O inquérito foi ainda complementado com informação de contexto e com a oportunidade de apresentação de comentários finais sobre os pontos fortes e os pontos fracos do sistema regulatório. Cada pergunta, num total de 46, era constituída por múltiplas opções, apresentando quase sempre a possibilidade de resposta aberta. O inquérito foi enviado a 279 entidades, tendo-se obtido resposta apenas de 63 entidades. Um dos problemas que condicionou o número de respostas foi o facto de se ter enviado o inquérito apenas em inglês. Determinados reguladores em África (origem francófona), na Europa (sobretudo do leste europeu e na Europa-Ásia) e na América (origem hispânica) manifestaram essa dificuldade. O prazo de resposta foi também muito mais extenso do que se pensava inicialmente. Os dois meses de prazo, que foram previstos num período inicial, rapidamente se transformaram em quase seis meses. No Anexo 1 apresenta-se o inquérito enviado aos reguladores e diferentes intervenientes nos SAS, em cada país. No Anexo 2 evidenciam-se, em formato de fichas, os resultados e o sumário dos inquéritos. É de realçar ainda que, como se constatou no capítulo anterior, contemplaram-se ainda na análise pormenorizada outras entidades que não responderam ao inquérito, mas que, por constituírem casos de estudo interessantes e por serem representativas de uma região, de tecnologias ou de aspectos particulares, foram integradas, quer nessa análise, quer na análise desenvolvida neste capítulo. Na pesquisa efectuada, referente a Janeiro de 2008, detectaram-se, em todo o mundo, 136 entidades reguladoras. Estas entidades reguladoras estão dispersas por 57 países, dos quais 12 estão localizados em África, 5 na Ásia, 16 na Europa (2 na Europa-Ásia), 2 na Oceânia e 22 na América. Em quatro países da América, a regulação do SAS não abrange todo o território, designadamente no Canadá, nos EUA, no Brasil e na Argentina. Por conseguinte, apenas pouco mais de 22% dos países do mundo têm reguladores dos SAS. Considerando a população abrangida em termos mundiais, a percentagem de população que apresenta os SAS regulados desce para cerca de 20%. De qualquer forma, sem incluir a China e a Índia, a população regulada ascende aos 37% da população mundial. Das 136 entidades reguladoras, 106 são multissectoriais, envolvendo outros SIEG para além do abastecimento de água e do saneamento de águas residuais, e 30 são reguladores sectoriais. No cenário de existência de reguladores multissectoriais, normalmente, estes compreendem também os serviços energéticos (electricidade e gás), embora possam também 271 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional incluir os serviços de transportes, de telecomunicações, postais ou outros. Em relação aos resultados dos inquéritos, que se evidenciarão, com maior detalhe, nos subcapítulos seguintes, existiram, como referido, 63 respostas, correspondentes a 39 países. Das respostas obtidas, 53 diziam respeito a reguladores e compreendiam 33 países distintos. As restantes respostas foram dadas por associações de operadores ou por entidades governamentais, com funções no sector da água. Dos 53 reguladores, 31 eram entidades reguladoras multissectoriais e 22 eram sectoriais. Para além do abastecimento de água e do saneamento de águas residuais, outras actividades estavam incluídas nas atribuições dos reguladores, designadamente, a electricidade, o gás, os resíduos sólidos, as telecomunicações, o aquecimento, a iluminação, os comboios, os portos, os transportes rodoviários, o petróleo, os jogos, entre outros. Dos 53 reguladores, 28 são nacionais/federais, 18 são estatais/regionais e 7 são municipais. Destes 53 reguladores, apenas 8 não são independentes. A direcção das entidades reguladoras é colegial em 39 casos. Nas restantes situações, o comando do regulador é exercido por uma única pessoa. 32% dos reguladores são financiados pelo governo, enquanto os restantes são financiados pelos operadores. Nestes últimos, apenas cerca de 30% estão indexados à tarifa. 44 reguladores têm funções Figura 67 Países com reguladores e respostas obtidas com o inquérito em África 272 de regulação económica, enquanto 9 só intervêm na regulação da qualidade do serviço, ou porque existe regulação contratual (por ex., contratos de concessão), ou porque as funções relativas ao estabelecimento de preços e tarifas pertence ao governo. 79% dos reguladores possuem funções relativas à supervisão da qualidade do serviço e 72% aplicam benchmarking, ou para esta finalidade, ou para o estabelecimento de tarifas e preços. 72% dos reguladores têm funções sancionatórias, embora apenas 40% possam produzir legislação. Em 49% dos casos estudados, existem mecanismos de apelo das decisões dos reguladores. A responsabilização dos reguladores é garantida de diversas formas, sendo a publicitação das decisões, com 66% dos casos de estudo, a mais importante, a transparência e a participação a segunda, com 62%, seguida da obrigatoriedade de presença e de resposta ao Parlamento, com 51%. Das entidades reguladoras com funções de regulação económica, 22 (50%) têm instituídos métodos baseados na regulação por incentivos de desempenho, quase sempre regulação por limite de preços. O período regulatório é, em mais de metade dos casos, equivalente a cinco anos, sendo nas restantes situações sempre inferior. As figuras que se seguem, respectivamente, a Figura 67, a Figura 68, a Figura 69, a Figura 70, a Figura 71 e a Figura 72 apresentam os países com reguladores à esquerda na página e os que responderam ao inquérito à direita na página, sempre por continente. Introdução Figura 68 Países com reguladores e respostas obtidas com o inquérito na América do Norte Figura 69 Países com reguladores e respostas obtidas com o inquérito na América do Sul Figura 70 Países com reguladores e respostas obtidas com o inquérito na Ásia 273 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional Figura 71 Países com reguladores e respostas obtidas com o inquérito na Oceânia Figura 72 Países com reguladores e respostas obtidas com o inquérito na Europa 274 Obrigações de serviço público 3.2 OBRIGAÇÕES DE SERVIÇO PÚBLICO 3.2.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS As obrigações de serviço público constituem a espinha dorsal do funcionamento dos SAS. Só a consagração do serviço universal em muitos países pelo mundo fora permitiria um progresso tão significativo para a sobrevivência e qualidade de vida das populações. A concretização dos Objectivos do Milénio, definidos pela OMS, dificilmente será atingida. Apesar de nos países subdesenvolvidos as populações mais pobres pagarem pela água, muitas vezes, mais do que as populações mais ricas, as mesmas continuam a ser privadas da prestação deste serviço essencial. No saneamento de águas residuais a situação é ainda mais grave. As externalidades negativas, provocadas pela respectiva ausência, são muito relevantes. Desta forma, existe um problema de mau governo do sector da água, sobretudo pela ausência ou deficiência de regulação. Associada às falhas de mercado e características dos SAS, estão também falhas do Estado, que comprometem a respectiva prestação com uma qualidade adequada. Nos casos de estudo apresentados, e em especial na Zâmbia e em Moçambique, verificou-se que, mesmo em países subdesenvolvidos, com inúmeros problemas, tem sido permitido um avanço significativo na qualidade da prestação dos SAS, graças à regulação instituída, suportada pelos respectivos governos. É de referir que nos países mais pobres, é necessário considerar, de forma distinta, as circunstâncias onde não há infra-estruturas (redes) e em que, embora existam, os utilizadores não têm capacidade para pagar o serviço, incluindo, desde logo, o ramal de ligação. Também nos países em vias de desenvolvimento, ou mesmo nos países desenvolvidos, os problemas relativos às obrigações de serviço público são da maior relevância. O fortalecimento da coesão económica e social das populações justifica a definição na lei das obrigações de serviço público e a supervisão da respectiva satisfação por reguladores ou por outras entidades competentes. Nestes países existe também uma franja da população que, apesar de ter infra-estruturas à sua porta, não tem capacidade para pagar o custo dos SAS. Além disso, as populações e os utilizadores exigem outros requisitos, que incluem a ininterruptibilidade da sua prestação, o fornecimento com uma qualidade elevada, a modalidade tarifária e a protecção dos respectivos interesses, mesmo que individuais. Na investigação efectuada, e em particular nos casos de estudo analisados, encontrou-se um conjunto de situações muito díspares, dependendo do grau de desenvolvimento dos países e das respectivas situações particulares. Nos pontos que se seguem apresentam-se algumas das práticas e estratégias seguidas, sobretudo, as de maior destaque em relação às diferentes obrigações de serviço público. Apresentam-se também quadros-resumo, que sistematizam as obrigações de serviço público dos países inquiridos ou adoptados como casos de estudo, neste documento. 3.2.2 UNIVERSALIDADE DOS SERVIÇOS Cada país contempla, de forma distinta, a prestação do serviço universal. Embora quase todos os países, de uma forma ou de outra, abordem este princípio na legislação, o modo como o instituem é muito variado. Vários países na Europa, como a Itália, a França ou a Países Baixos, pressupõem a obrigatoriedade da respectiva prestação a todos os utilizadores e, por conseguinte, não têm este princípio consagrado na lei. Outros, como Portugal e a Grécia, apesar de esta obrigatoriedade estar explicitamente definida na lei, a 275 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional mesma não define o caminho para a respectiva obtenção, tendo as entidades gestoras liberdade para a sua consecução, designadamente através da subsidiação cruzada entre serviços (abastecimento de água e saneamento de águas residuais) e utilizadores, quer relativamente à respectiva natureza (domésticos e não domésticos), quer relativamente ao consumo manifestado (os de maior consumo subsidiam os de menor consumo ou vice-versa). A instituição de tarifas sociais é frequente, isto é, existe um escalão (normalmente o de menor consumo), onde a tarifa correspondente é muito reduzida. No Quadro 110 e no Quadro 111 essa circunstância é apresentada para os SAS de Atenas (EYDAP), na Grécia, Quadro 110 Subsidiação cruzada nos SAS em Atenas (EYDAP) na Grécia e para os SAS do Rio de Janeiro (CEDAE), no Brasil, (ano de 2007). É de salientar que nos países mais pobres, a hipótese de subsidiação cruzada não é suficiente, sendo, mesmo assim, necessária a atribuição de subsídios por parte dos governos ou de doadores, para a concretização do serviço universal. Noutros países ou estados/regiões, existe um fundo de equilíbrio financeiro, para o qual todos os utilizadores contribuem e que serve para financiar os utilizadores ou os operadores mais pobres. Esta prática é adoptada em diversos países, como a Bélgica (em duas das três regiões) para os utilizadores, ou a França, relativamente Água Valor (€/m3) Doméstico 0-5 m3 0,40 5-20 m 0,63 20-27 m3 1,80 27-35 m3 2,52 Superior a 35 m3 3,14 3 Industrial Até 1000 m3 0,81 Superior a 1000 m3 0,96 Saneamento de águas residuais Quadro 111 Subsidiação cruzada nos SAS no Rio de Janeiro (CEDAE) no Brasil 60% da factura da água Água (€/m3) Água e saneamento (€/m3) 0-15 m3 0,62 0,64 16-30 m3 1,36 1,41 31-45 m3 1,85 1,93 3,70 3,86 4,95 5,15 0-20 m3 2,10 2,19 21-30 m3 3,70 3,85 Superior a 30 m3 3,95 4,12 0-20 m3 3,21 3,34 21-30 m3 3,38 3,51 Superior a 30 m3 3,95 4,11 Doméstico 46-60 m3 Superior a 60 m 3 Comercial Industrial 276 Obrigações de serviço público aos operadores. Este fundo, que pode ser gerido centralmente ou pelo próprio operador, permite integrar no sistema os utilizadores mais carenciados ou reduzir o tarifário de certos operadores. O mérito desta opção está muito relacionado com a qualidade do sistema de segurança social ou de controlo, isto é, se, de facto, as pessoas ou os operadores mais necessitados são aqueles que usufruem destas regalias sociais. Na Bélgica, na região de Valónia, por exemplo, a factura da água inclui um valor de 0,0125 €/m3, a fim de constituir um fundo social para a região, denominado “Fonds Social Wallon de l’Eau de la Région Wallonne de Belgique”. O primeiro objectivo do seu estabelecimento consiste na criação de condições de acesso aos SAS pelos utilizadores desfavorecidos, caracterizados pelas dificuldades de pagamento dos encargos com os SAS e pela impossibilidade de assumir o custo, tendencialmente crescente, da água para consumo humano. Esta impossibilidade ou dificuldade de pagamento dos SAS é avaliada pelos assistentes sociais dos municípios (communes). Cerca de 0,5% da população é abonada por este Fundo Social. Em França, a Lei do Financiamento Rectificativo n.º 1485, de 2004, suprimiu a taxa do Fonds National de Développement des Adductions d’Eau (FNDAE), que correspondia ao pagamento de um montante de 21,34 € por cada 1000 m3 de água consumida. As Agências de Água têm, actualmente, a responsabilidade de financiar os investimentos das áreas rurais relativamente ao SAS (que eram anteriormente assegurados pelo Estado, através das receitas obtidas pelo FNDAE). A supressão do FNDAE, em prol do aumento das tarifas, teve como objectivo a transferência das receitas cobradas pelo Estado para as Agências de Água, sem um aumento do custo do serviço para o utilizador. De facto, o impacto do aumento da tarifa, devido às Agências, é compensado pela eliminação da taxa do FNDAE. É de referir ainda que esta parcela desapareceu da factura da água. Existe um limite mínimo a partir do qual as entidades gestoras estão isentas deste pagamento (por ex., nas bacias Rhône-Méditerranée et Corse, o limite era de 30 000 m3 por ano, em 2005). As entidades gestoras são informadas, anualmente, pela Agência da Água, sobre o montante previsto para o imposto do ano seguinte. As áreas rurais (tendo em conta a legislação vigente) que satisfaçam os critérios económicos definidos pela Agência podem beneficiar de ajudas financeiras para investimentos em reabilitação dos SAS. Estas transferências são estabelecidas dentro dos limites estipulados num acordo anual fixado pela Agência, podendo atingir 30% de comparticipação e um máximo de 50%, considerando todas as ajudas. Outra possibilidade para a satisfação do serviço universal, verificada em alguns países, como o Chile, a Zâmbia, a África do Sul e a região de Flandres, na Bélgica, consiste ainda na atribuição de um subsídio em espécie. Veja-se, em detalhe, o caso do Chile. Entre os inúmeros sucessos que caracterizam o sector da água no Chile, a universalidade dos SAS denota especial relevância. Este feito, tendo em consideração a composição geográfica muito específica que caracteriza o país, adquire maior notoriedade face à conjuntura social em que os países vizinhos se inserem (podendo inclusivamente englobar toda a América Latina) (por ex., dotados de rendimentos reduzidos). Entre os demais factores que sustentam a universalidade nos SAS, a subsidiação do sector da água, em especial nas áreas rurais, revela-se um factor preponderante, sendo inclusivamente considerado um benchmark para outros países em condições similares. Este esquema de subsidiação, operacional desde os anos 90 foi concebido para amenizar os impactos sociais adversos do aumento substancial das tarifas (caracterizado pela privatização e pela necessidade de grandes investimentos). O programa de subsidiação é gerido pelo Ministério do Planeamento Social, em conjunto com as administrações locais, o qual determina o montante e o número de subsídios a atribuir por cada região. Posteriormente, o modo de gestão desses subsídios ficará sob a responsabilidade das administrações locais. O esquema de subsídios confere aos utilizadores domésticos o acesso aos SAS a custos reduzidos, dentro de certos limites, definidos legalmente, designadamente entre 20% e 85% da factura. A tutela determina o tecto do consumo que o subsídio irá abranger (actualmente 15 m3 por mês em todas as regiões) e a percentagem de desconto para este primeiro escalão (que varia entre as regiões). O número de subsídios e os montantes correspondentes são determinados anualmente e a despesa associada é incluída no orçamento do Estado. O subsídio é financiado, inteiramente, pelos contribuintes. O SISS (regulador), responsável pelo estabelecimento de tarifas, não tem qualquer responsabilidade nesta matéria. Para ser elegível para este subsídio, o utilizador deverá solicitar o mesmo no seu município. Esta candidatura é apresentada, tendo em conta as necessidades socioeconómicas dos utilizadores, segundo critérios estabelecidos pelo Communal Social Assistance Committees (CAS), denominado pontuação CAS (CAS score). Esta ponderação tem como base a informação obtida numa entrevista realizada na residência dos utilizadores. Esta entrevista consiste em 50 questões, divididas em 9 grupos (informações gerais, condições ambientais, dimensão do agregado familiar, condições de saúde, identificação da constituição familiar, ocupações e rendimentos, subsídios monetários, educação e riqueza). A ponderação resultante prevalece durante dois anos. Assim que o subsídio é atribuído ao utilizador, o operador é notificado e na factura mensal seguinte o utilizador verá descontado o 277 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional subsídio respectivo. Posteriormente, uma vez por mês, o operador cobrará ao município os respectivos subsídios concedidos. Na Zâmbia e na África do Sul, são fornecidos gratuitamente os primeiros 6 m3 de água a todas as famílias. Já na região de Flandres, na Bélgica, o volume correspondente aos primeiros 15 m3 de água é disponibilizado aos utilizadores domésticos sem qualquer custo. Em casos extremos, como na Irlanda, a água é fornecida gratuitamente aos utilizadores domésticos. Os subsídios podem também ser atribuídos directamente aos utilizadores sem ser em espécie como, por exemplo, através de quantias fixas por mês que, indirectamente, lhes permita o cumprimento das suas obrigações com os SAS (por ex., vouchers). Normalmente, esta política não é a mais adequada, porque os utilizadores podem usar os fundos obtidos para outros fins, não usufruindo, assim, deste serviço e das externalidades positivas a que o mesmo conduz. Outras formas de garantir o serviço universal realizam-se através da subsidiação directa dos operadores, permitindo que os mesmos ofereçam um sistema tarifário abaixo do custo. Raramente os custos de capital são recuperados. Aliás, esta é a forma mais comum de subsidiação dos SAS em todo o mundo. Quase todos os países, de uma forma ou de outra, têm os respectivos SAS subsidiados. Nos casos de estudo analisados, apenas a Austrália, o Reino Unido, a Países Baixos e a Suécia não receberam subsídios directamente do Estado. No Quadro 112 sistematiza-se o modo como se procura atingir a universalidade dos SAS nos casos analisados e nos países inquiridos. 3.2.3 ACESSIBILIDADE E EQUIDADE O Quadro 113 apresenta o nível de atendimento dos SAS para os países inquiridos e estudados, para os anos 2005/2007. No saneamento, os valores entre parêntesis dizem respeito ao nível de atendimento do serviço de tratamento de águas residuais. Conforme se constatou no capítulo anterior, existe uma preocupação muito grande, por parte dos diferentes países, em dotar as populações de acesso ao SAS, em condições adequadas. O número de países que adopta políticas de subsidiação cruzada é bastante significativo. Esta realidade, que condiciona a prestação dos SAS com equidade, é, particularmente, evidenciada pelo facto 278 de o consumo referente ao escalão mais baixo ser fornecido sem qualquer encargo ou com uma tarifa muito reduzida quando comparada com as restantes, também denominada tarifa social. De facto, cerca de 60% dos países analisados têm tarifários sociais. Também nos países mais desenvolvidos começa a existir uma preocupação crescente com a equidade, procurando, precisamente, evitar a ocorrência de subsidiação cruzada. Por exemplo, o Quadro 114 evidencia o tarifário de dois operadores australianos para o ano de 2006 (€/m3). Aqui, verifica-se que nem o abastecimento de água subsidia o saneamento de águas residuais nem os utilizadores não domésticos (industriais) financiam os utilizadores domésticos, nem os utilizadores de maior consumo subsidiam os de menor consumo. Pretende-se que este cenário, que ainda é escasso, seja predominante no futuro, sobretudo em países onde o mesmo pode ocorrer com maior facilidade (por ex., Europa e EUA). Caso contrário, continuar-se-á a enviar um sinal errado para o mercado, instigando o consumo e o desperdício. 3.2.4 CONTINUIDADE A continuidade nos SAS constitui outra das obrigações de serviço público fundamentais. Este princípio, que não deixa de estar relacionado com o princípio de serviço universal, deve ser analisado sob duas perspectivas distintas. Por um lado, os SAS devem estar disponíveis durante 24 horas por dia e 365 dias por ano. Esta circunstância, normal nos países desenvolvidos, é ainda uma meta muito ambiciosa para os países subdesenvolvidos ou em vias de desenvolvimento. Dos países inquiridos e analisados, cerca de 50% prestam o serviço de água de forma intermitente, mesmo nas zonas urbanas. O Quadro 115 apresenta o regime de continuidade dos SAS para os casos de estudo e países inquiridos. A intermitência do abastecimento de água, para além dos problemas óbvios que provoca, tem consequências ao nível da saúde pública e torna o sistema ineficiente e ineficaz do ponto de vista hidráulico, gerando muitos desperdícios (por ex., perdas de água). Por outro lado, nos países desenvolvidos o cenário é outro. Aqui, a supervisão desta obrigação de serviço público concentra-se na questão da fiabilidade e no controlo das interrupções pontuais do abastecimento de água devido às roturas nas redes. Em vários países, quando ocorrem interrupções que não são avisadas, existem penalizações que pretendem ressarcir os utilizadores directa ou indirectamente. O Quadro 116 apresenta exemplos desta circunstância em 3 países. Dos 60 países incluídos neste estudo, Obrigações de serviço público País Serviço universal Ásia País Serviço universal Panamá Subsidiação cruzada Arménia Subsidiação cruzada e atribuição directa aos utilizadores Peru Subsidiação cruzada Filipinas Subsidiação cruzada Trindade e Tobago Subsídios aos utilizadores Indonésia Subsidiação cruzada e subsídios aos operadores Ligeira subsidiação cruzada e apenas entre dois escalões Uruguai Subsidiação cruzada Singapura África Europa Bélgica Fundo social e subsídios monetários e em espécie aos utilizadores Cabo Verde Subsidiação cruzada Escócia Descontos para utilizadores especiais Gana Subsidiação cruzada e subsídios aos operadores França Subsidiação cruzada e fundo social Moçambique Subsidiação cruzada Grécia Subsidiação cruzada Níger Subsidiação cruzada Países Baixos Subsidiação cruzada entre utilizadores Quénia Subsidiação cruzada Inglaterra e País de Gales Tanzânia Subsidiação cruzada Irlanda Descontos para utilizadores especiais e famílias numerosas Subsidiação cruzada (ausência de tarifário para os domésticos) Zâmbia Subsidiação cruzada Irlanda do Norte Não existe Itália Subsidiação cruzada América Barbados Subsidiação cruzada e subsídios aos operadores Kosovo Subsídios aos utilizadores Belize Subsídios aos operadores Lituânia Subsídios aos operadores Brasil Maioritariamente subsidiação cruzada Portugal Subsidiação cruzada e subsídios aos operadores Canadá Subsídios aos operadores República Checa Subsidiação cruzada Chile Subsidiação aos utilizadores em espécie República Eslovaca Subsídios aos operadores Colômbia Subsidiação cruzada e subsídios aos operadores Roménia Subsidiação cruzada Costa Rica Subsidiação cruzada Suécia Não existe EUA Subsidiação cruzada Oceânia Honduras Subsidiação cruzada e subsídios aos operadores Austrália Subsidiação entre os utilizadores Jamaica Subsidiação cruzada Papua Nova Guiné Subsidiação cruzada México Subsidiação cruzada apenas esses 3 países compreendem operadores que definem o compromisso de indemnização dos respectivos utilizadores pela interrupção do serviço de abastecimento de água, enquanto 8 referem esse direito mas não especificam o montante ou a forma de o fazer. Alguns países, como o Reino Unido ou a Austrália, têm também esquemas de ininterruptibilidade para utilizadores especiais em que este aspecto assume uma maior importância (por ex., hospitais e escolas). Estas situações podem estar predefinidas ou podem ocorrer por adesão (por ex., as indústrias cujo consumo de água é essencial), implicando ou não um tarifário especial. 3.2.5 PROTECÇÃO DOS UTILIZADORES ESPECIAIS Quadro 112 Serviço universal para os casos de estudo e países inquiridos Para além dos tarifários sociais que incluem, sobretudo, os utilizadores de baixo consumo ou com dificuldades económicas, vários países possuem tarifários especiais para determinados grupos de utilizadores, como as famílias numerosas. Esta circunstância ocorre, por exemplo, no Reino Unido e em Portugal. Outros países possuem 279 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional País Água Saneamento Ásia País Panamá Água Saneamento 86% 51% (39%) 83,8% 76% (28,1%) Arménia 90% 70% (0%) Peru Filipinas 85% 72% (10%) Trindade e Tobago 92% 21% (21%) Indonésia 18% 3% (2,3%) Uruguai 92% 48% (38%) Singapura 100% 100% (100%) Bélgica 99% 82% (50%) África Europa Cabo Verde 85% 16% (15%) Escócia 100% 100% (100%) Gana 57% 7% (0%) França 99% 80% (80%) Moçambique 26% 4,6% (3%) Grécia 99% 96% (85%) Níger 63% 20% (10%) Países Baixos 100% 98% (97%) Quénia 55% 25% (20%) Inglaterra e País de Gales 99% 96% (93%) Tanzânia 60% 3% (3%) 99,9% 93% (92%) Zâmbia 68% 34% (34%) Irlanda do Norte 99% 83% (83%) Itália 96% 84% (75%) América Irlanda Barbados 99% 90% (60%) Kosovo 74% 55% (0%) Belize 90% 40% (40%) Lituânia 66% 60% (58%) Brasil 81% 42% (30%) Portugal 91,1% 76% (67%) Canadá 85% 85% (80%) República Checa 92,4% 80% (75%) Chile 99% 95% (82%) República Eslovaca 86,3% 58% (55%) Colômbia 88% 74% (25%) Roménia 70% 50% (30%) Costa Rica 98% 21% (4,5%) Suécia 99% 99% (95%) EUA 99% 90% (90%) Oceânia Honduras 75% 69% (36%) Austrália 99% 90% (90%) Jamaica 73% 30% (17%) Papua Nova Guiné 30% 22% (22%) México 89% 86% (36%) Quadro 113 Continuidade para os casos de estudo e países inquiridos esquemas sociais de protecção aos utilizadores com necessidades especiais. A Austrália e o Reino Unido constituem exemplos de excelência que serão, de seguida, brevemente expostos. O Estado de Vitória, na Austrália, disponibiliza um esquema de subsidiação, denominado Utility Relief Grant Scheme, que tem como objectivo ajudar os utilizadores mais carenciados. Os utilizadores que possuem o cartão de providência social (current concession card) ou que estejam registados nos operadores como detentores de dificuldades financeiras (utility company’s har- 280 dship program) podem aderir a este programa. Para a respectiva elegibilidade, têm de possuir um rendimento inferior a uma determinada percentagem indexada ao valor da pensão de velhice. Além disso, um aumento significativo do consumo de água, uma redução dos rendimentos do agregado familiar e um aumento inesperado nas despesas essenciais são os critérios para tornar os utilizadores elegíveis para este sistema, desde que tenham sucedido no prazo máximo de 12 meses. Podem também candidatar-se a este esquema de subsidiação os utilizadores que tenham encargos de habitação superiores Obrigações de serviço público Gosford City Council Power and Water Corporation Tarifário Água Águas residuais Água Águas residuais Parcela fixa 46,1 207,7 58,7 183,5 Parcela variável 0,53 - 0,39 - País Continuidade Ásia País Quadro 114 Equidade dos sistemas tarifários na Austrália Quadro 115 Continuidade para os casos de estudo e países inquiridos Continuidade Panamá Maioria da população Não, 8 horas em 2003 Peru Não, 17 horas em áreas urbanas Filipinas Não, 19 horas em Manila Trindade e Tobago Não Indonésia Não (Jacarta está próximo) Uruguai Sim, salvo em zonas rurais Singapura Sim Arménia África Europa Bélgica Sim Cabo Verde Não Escócia Sim Gana Não em 75% de Accra. 30% em 12 horas em 5 dias França Sim Moçambique Não Grécia Sim Níger Não Países Baixos Sim Quénia Variável (por ex. Nyeri é contínuo e Mombaça 19 horas) Inglaterra e País de Gales Sim Tanzânia Não Irlanda Sim Zâmbia 15 horas em média; 11 horas Lusaka Irlanda do Norte Sim Itália Sim América Barbados Não Kosovo Sim Belize Sim Lituânia Sim Brasil Variável Portugal Sim Canadá Sim República Checa Sim Chile Sim República Eslovaca Sim Colômbia Sim, salvo das zonas rurais Roménia Sim Costa Rica Não Suécia Sim EUA Sim Oceânia Honduras Não Austrália Sim Jamaica Não Papua Nova Guiné Não México Não, < 50% da população 281 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional Cidade Operador País Compromisso Indemnização Lincoln Anglian Water Inglaterra Interrupção do serviço sem aviso prévio 24,75 € + 12,38 €/dia Sydney Sydney Water Austrália Serviço não restaurado em 5 horas ou sem aviso prévio 10% de desconto na factura (mínimo 5,7 €) Portugal Intervenção na rede de água no prazo de 2 horas e na rede de águas residuais no prazo de 4 horas 10 000 litros de água Valongo Quadro 116 Compromissos e indemnizações por interrupção do abastecimento de água Veolia a 30% dos seus rendimentos ou cujos encargos dos SAS sejam superiores a 10% dos respectivos rendimentos. Este esquema de subsidiação tem como objectivo o pagamento integral da factura dos SAS durante o período de um ano, desde que estas condições se mantenham, podendo ser renovado. O Departamento de Serviços Humanos (Departament of Human Services - DHS) do Estado de Vitória paga, posteriormente, aos operadores as quantias relativas aos encargos com estes utilizadores. No Reino Unido foi introduzida, em 1999, a Water Industry Act, que é um esquema de protecção dos denominados “vulnerable groups” e que limita a factura dos SAS de um utilizador elegível para a média da factura dos utilizadores dessa região. Para ser beneficiário deste esquema o utilizador tem de pertencer a uma de duas categorias. A primeira diz respeito ao facto de o próprio utilizador ou um membro do respectivo agregado familiar estar a receber uma prestação social, que poderá incluir a isenção de taxas municipais, o crédito à habitação bonificado, o rendimento mínimo, o subsídio de desemprego, o abono de família, pensões ou outra prestação social, estando já habilitado a receber um apoio por ter três ou mais filhos, todos com menos de 19 anos. A segunda é relativa à existência de problemas de saúde, ou seja, na hipótese de terem sido diagnosticados ao próprio utilizador, ou a um membro do seu agregado familiar, problemas graves de saúde, tais como, insuficiência renal, incontinência, etc. Nestas circunstâncias, os operadores são ressarcidos pelo Departamento de Segurança Social (Department for Work and Pensions) dos encargos relativos a estes utilizadores. Todos os utilizadores que evidenciem consumos desnecessários, como piscinas ou sistemas automáticos de rega, não são abrangidos por este sistema. Actualmente, cerca de 0,4% da população do Reino Unido (próximo de 440 000 habitantes) beneficia deste sistema. Além disso, na legislação referida, ficou regulamentada a impossibilidade de desactivação das ligações 282 domésticas para os utilizadores no Reino Unido. Desta forma, caso os utilizadores não paguem os SAS, os operadores terão de recorrer à via judicial para obrigar ao respectivo pagamento ou proceder à respectiva desactivação. 3.2.6 DEFESA DOS INTERESSES DOS UTILIZADORES A defesa dos interesses dos utilizadores é perseguida de forma distinta pelos vários países. Em alguns casos, esta tarefa pertence aos reguladores, podendo estes, ou não, ter funções de regulação económica ou de qualidade do serviço. Outros países possuem a figura de Ombudsman (Provedor), cuja missão principal é a defesa dos utilizadores perante os operadores e outros órgãos da administração pública, como na Austrália e na Suécia. Ainda noutros casos, existem associações de utilizadores com essa função, como no Níger ou na Países Baixos. É de referir também que, no processo regulatório de alguns países, os utilizadores são representados nos Conselhos Consultivos, onde podem expressar a sua opinião sobre os procedimentos regulatórios em curso. Esta situação ocorre, por exemplo, em Portugal. Em determinados países, como na Austrália e na Suécia (pioneiros neste domínio), a defesa dos interesses dos utilizadores é garantida e salvaguardada por uma entidade independente, o Ombudsman. Por exemplo, nos diferentes estados e territórios da Austrália existe, em geral, um Ombudsman específico para os SAS e para os serviços energéticos (electricidade e gás). Os seus préstimos são accionados mediante a reclamação de um cidadão ou utilizador relativamente ao operador dos SAS, sendo que primeiro se deve fazer a reclamação perante este. O Ombudsman irá investigar o fundamento dessa Obrigações de serviço público mesma reclamação e tomar medidas no sentido de resolver o problema. Este serviço é prestado de modo gratuito, sem necessidade de recorrer a intermediários. No sentido lato, o Ombudsman tem, geralmente, a responsabilidade de ajudar no desenvolvimento da prestação e da administração do serviço, nas organizações a quem é endereçada a reclamação, sobretudo quando as mesmas se revelam reincidentes. A maioria das reclamações é solucionada num período de 2 a 4 semanas, embora uma situação mais complexa necessite de mais tempo. A decisão do Ombudsman é vinculativa para o operador, mas não para o reclamante. Em Inglaterra e no País de Gales, existe uma entidade dedicada com funções exclusivas de protecção dos utilizadores dos SAS, designadamente o Consumer Council for Water (CCW). Esta entidade actua de forma independente e descentralizada, possuindo delegações por todas as regiões. A política de proximidade adoptada permite um relacionamento mais efectivo com os utilizadores. O CCW tem como atribuições principais a consciencialização dos utilizadores sobre os seus direitos e a respectiva imposição como organização informada, influente e eficaz na defesa dos utilizadores perante os SAS e as restantes entidades associadas ao sector da água. O CCW, que foi estabelecido em 2005, substituindo o WaterVoice, desenvolve inúmeras actividades no sector da água, dedicadas integralmente à preservação e exacerbação da “voz” colectiva dos utilizadores. A organização de debates nacionais sobre a água, o trabalho de investigação, totalmente publicado, o tratamento das reclamações provenientes dos utilizadores, em caso de resolução falhada com o correspondente operador, e o envolvimento no processo de price review, a preservação do value for money e a promoção de acções de consciencialização dos utilizadores sobre os modos correctos de consumo, com o intuito de assegurar SAS de qualidade e fiáveis a todos os utilizadores, surgem, entre outras, como as atribuições mais importantes do CCW. Especialmente nos países em desenvolvimento, as questões relacionadas com a defesa dos utilizadores tomam outras proporções, face às restantes, tendo em conta a dificuldade de acesso e o custo exorbitante e, por vezes, descabido, frequentemente associado. Por exemplo, no Níger, a Wadata – Association de Défense des Droits des Consommateurs tem um papel muito relevante. Esta associação, com escassos recursos, procura proteger o ambiente e a gestão dos recursos naturais, disponibilizar assistência legal aos utilizadores, desenvolver estudos de impacto em todas as áreas e travar a proliferação de doenças infecto-contagiosas, tais como a SIDA e a malária. No âmbito do sector da água, a Wadata promove diversas investigações ao preço e à qualidade do serviço, bem como ao impacto da respectiva redução. Além disso, desenvolve também análises à qualidade da água e aos recursos hídricos, incidindo em particular sobre a comunidade urbana de Niamey. A Wadata procura ainda salvaguardar e garantir uma gestão adequada dos SAS por parte da Société des Patrimoines des Eaux du Niger (SPEN) e também a promoção de workshops que visem, entre as mais diversas temáticas, o direito dos utilizadores e a qualidade dos serviços prestados. 3.2.7 PARTICIPAÇÃO E TRANSPARÊNCIA A participação nos processos regulatórios e da operação dos SAS assume um relevo fundamental para a respectiva credibilidade e aceitabilidade. A falta de participação desresponsabilizará os utilizadores das decisões tomadas e colocará em risco o desenvolvimento sustentável dos SAS. Pelo menos no estabelecimento dos sistemas tarifários, os utilizadores devem, de alguma forma, poder intervir. As formas de participação dos utilizadores nos processos regulatórios variam de país para país. A participação é ainda fundamental para a transparência dos processos. Toda a actividade dos SAS e dos diferentes stakeholders deve ser clara, pública e facilmente acessível. Embora, em geral, todas as entidades inquiridas tenham afirmado que o sector da água era pautado pela transparência das actividades e pela participação dos diferentes stakeholders, ao ser efectuada uma análise em maior detalhe, verificou-se que, em apenas 45% dos casos analisados, os utilizadores se podem pronunciar sobre o sistema tarifário. Também em 30% das circunstâncias examinadas, os reguladores não tinham sítio na Internet ou não dispunham de muita informação sobre os SAS no respectivo sítio, como a informação respeitante ao sistema tarifário. É de referir mesmo que, sobre a qualidade do serviço prestada, apenas 40% dos reguladores disponibilizavam informação nos seus sítios da Internet. De qualquer forma, existem vários casos de relevo que são apresentados sumariamente de seguida. Os processos regulatórios devem ser totalmente abertos à participação dos cidadãos, uma vez que as tomadas de decisão são determinantes nas suas vidas. Atente-se no caso de Porto Alegre, no Brasil, cujo modelo de administração municipal contempla a participação dos cidadãos nos processos de decisão, compreendendo a denominada “democracia procedimental”, com resultados plenos de sucesso e referenciados na literatura como best practices. Esta forma de actuação, e mesmo de inovação, tem permitido à cidade apresentar níveis de qualidade dos 283 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional SAS muito elevados, com 99,5% de cobertura no abastecimento de água, a um preço relativamente reduzido, e com 84% na recolha de águas residuais, ainda que menos no respectivo tratamento (Viero e Cordeiro, 2003). Este processo, denominado Orçamento Participativo, foi implementado em 1989. Para a respectiva consecução, a cidade foi dividida em 16 regiões, cujos limites foram traçados em função da presença de entidades de moradores e da geografia dos movimentos sociais. Posteriormente, em 1994, como forma de promover a discussão das questões sociais, a prefeitura reformou substancialmente a constituição do Orçamento Participativo, possibilitando, assim, a participação no processo decisivo de sindicalistas, organizações governamentais e não-governamentais, partidos políticos, empresários, estudantes, movimentos culturais e cidadãos, formando, deste modo, as denominadas Sessões Plenárias. A operacionalidade do processo do Orçamento Participativo verifica-se basicamente em três etapas. Em primeiro lugar, inclui o “debate nas reuniões regionais e nas reuniões plenárias temáticas”, realizando-se as primeiras em cada região no mês de Abril e as segundas no mês de Maio. Posteriormente, realiza-se uma nova ronda de reuniões regionais. Em segundo lugar, compreende a “compatibilização do orçamento”, onde é desenvolvida a proposta orçamental, através do conjunto de propostas e prioridades apresentadas pela população, compatibilizadas para formar a minuta da matriz orçamental a ser discutida pelo Conselho do Orçamento Participativo (COP). A proposta final é entregue à Câmara de Vereadores, no mês de Setembro. Por último, inclui a “especificação do orçamento” onde, nos meses finais do ano, são detalhados os diversos investimentos por regiões e os investimentos gerais propostos pelas sessões plenárias temáticas. Nesse processo, depois de alguns anos de experiência, foram definidos critérios de actuação, designadamente os que se referem às necessidades de serviços ou de infra-estruturas urbanas da região, à população em área de carência máxima de serviço ou às infra-estruturas da região, população total e prioridades. A preocupação com a objectividade na distribuição de recursos acarretou a utilização de uma escala de valores, representada por pesos e pontuações, no sentido de garantir uma distribuição justa e criteriosa das verbas disponíveis entre as regiões (Laranjeira, 1996). Assim, a cada critério é atribuída uma classificação de 1 a 4 (por exemplo, se a região tem necessidades relevantes de pavimentação, recebe uma classificação de 4 em necessidade de infra-estruturas). Além disso, é atribuído um peso (de 1 a 3) a cada critério, representando a respectiva importân284 cia relativa, segundo a avaliação do Orçamento Participativo (o critério “necessidade de serviços ou de infra-estruturas urbanas da região” tem recebido peso máximo). No final, agregam-se as classificações e os pesos, que são confrontados com as prioridades de cada região, formando a base de cálculo para a distribuição dos investimentos (Orçamento Participativo de Porto Alegre, 1995). No entanto, qualquer critério pode ser revisto, sempre que se pretender, aquando da constituição de um novo Conselho. Em Jacarta, na Indonésia, a participação dos utilizadores teve como principal motor a instituição do Jakarta Water Supply Regulatory Body (JWSRB), criado em Novembro de 2001. Em Janeiro de 2002, o JWSRB promoveu o primeiro encontro entre os diversos stakeholders do sector da água com o objectivo de criar sinergias, no sentido do aumento da fiabilidade do serviço de água em Jacarta. Este encontro levou, posteriormente, à criação do Consumer and Community Communication Forum (CCCF). Desde então, o CCCF tornou-se uma valiosa plataforma de partilha de knowhow entre os diversos stakeholders, incluindo o JWSRB, os representantes dos utilizadores e da comunidade, ONG, as autoridades governamentais, PAM JAYA (administração local) e o operador do serviço de água. Paralelamente, o JWSRB desenvolveu um sistema interno denominado Community Opinion Investigation Committee (COIC), com a função de salvaguardar o funcionamento do fórum e administrar os níveis de satisfação dos utilizadores. Além disso, em Março de 2003, o JWSRB impulsionou o estabelecimento de Water Supply Customer Advisory Committees (WCC) em cinco municípios da província de Jacarta. Os WCC são organizações do tipo não-governamental dedicadas exclusivamente à defesa dos interesses dos utilizadores. Entre as respectivas responsabilidades, encontram-se a monitorização do nível de serviço, a condução de reclamações relativas à qualidade do serviço, a comunicação entre utilizadores e operadores e a promoção do acesso ao serviço de água dos utilizadores mais desfavorecidos. O JWSRB mantém a responsabilidade de disseminar ambas as informações obtidas dos WCC e do CCCF através dos media. A Figura 73 mostra a organização deste esquema em Jacarta. Em Inglaterra e no País de Gales, o processo regulatório de estabelecimento de tarifas (price review) é pautado pela possibilidade de participação de todos os stakeholders e pela existência de várias hipóteses de contraditório. A Figura 74 apresenta o calendário do processo regulatório adoptado pela OFWAT para a última revisão tarifária. Na Figura 75 é ainda apresentado o processo regulatório da definição de tarifas da Sidney Water, pelo IPART, na Austrália. Obrigações de serviço público Figura 73 Esquema de participação dos utilizadores no serviço da água de Jacarta Figura 74 Revisão tarifária para o período de 2005-2010 em Inglaterra e no País de Gales 285 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional Figura 75 Revisão tarifária da Sidney Water para o período regulatório de 2003-2005 286 Regulação de qualidade do serviço 3.3 REGULAÇÃO DE QUALIDADE DO SERVIÇO A regulação da qualidade do serviço nos SAS assume naturalmente uma importância inquestionável. Embora nem todos os países e/ou reguladores tratem deste assunto conveniente e frequentemente, pelo facto de as prioridades serem outras (acesso aos serviços), todos reconhecem a sua natureza fundamental e asseguram que, no futuro, a mesma irá ser instituída (ou melhorada) sempre que não existir. Dos casos de estudo analisados, 79% controlam e supervisionam a qualidade do serviço. Os objectivos são claramente distintos em função do desenvolvimento do país e dos SAS. De qualquer forma, as metodologias não são muito distintas. Predominantemente são usados indicadores de desempenho, ou seja, em 95% dos casos onde existe regulação da qualidade do serviço. O espírito é, quase sempre, o da regulação sunshine, isto é, comparar, divulgar e discutir publicamente o desempenho dos operadores, para pressionar aqueles que evidenciam um desempenho menos bom e reconhecer o mérito dos melhores. Frequentemente, a comparação efectuada (por ex., o benchmarking) relaciona-se com o desempenho de anos transactos. Em cerca de 57% dos casos, existe uma comparação com outros operadores, em 15% com operadores de outros países e em aproximadamente 20% com benchmarks de referência. Em alguns países (cerca de 25%) são impostas sanções, incluindo consequências no sistema tarifário quando o desempenho ou os níveis de serviço não são os mais adequados. Em alguns casos, existe indemnização directa aos utilizadores, enquanto noutros a mesma reverte para o governo (cerca de 12%). Noutros países são desenvolvidos rankings relativamente ao desempenho dos operadores (8% das situações). No Quadro 117 sistematizam-se os resultados obtidos relativos à regulação da qualidade do serviço para os casos de estudo e países inquiridos. De seguida, é ainda descrita, com maior detalhe, a regulação da qualidade do serviço na Escócia, em Portugal, na Jamaica e no Gana. a) Escócia Na Escócia, a entrada em funcionamento da entidade reguladora dedicada no sector da água (WICS) trouxe inúmeras melhorias, desde a redução dos custos operacionais (cerca de 40%), ao incremento significativo da qualidade do serviço, resultando numa redução, ano após ano, do montante da factura e no aumento geral da satisfação dos utilizadores. A Figura 76 apresenta a evolução da factura média na Escócia, na Inglaterra e no País de Gales. Face à existência de um único operador dos SAS para todo o país, o WICS incorpora como termos de comparação (benchmarking) os operadores dos SAS de Inglaterra e do País de Gales. O WICS adopta um conjunto de indicadores de desempenho que permite avaliar os níveis de serviço prestados. Além disso, o desenvolvimento da qualidade do serviço é avaliado pela WICS através de um indicador de desempenho global (overall performance assessment - OPA). Como referido, os SAS têm sofrido grandes evoluções, sobretudo ao nível da qualidade do serviço, o que se reflecte no aumento do OPA em 40%, apenas entre 2005-2006 e 2006-2007. O OPA é um índice agregado que tem em conta as medidas de desempenho que os utilizadores consideram mais importantes, tais como a rapidez com que o serviço de água é restabelecido, a brevidade com que as reclamações dos utilizadores são tratadas, a qualidade da água fornecida e o desempenho face às normas ambientais. Sempre que possível, o WICS usa as mesmas medidas que são adoptadas pela OFWAT para avaliar o desempenho das empresas em Inglaterra e no País de Gales, de forma a ter benchmarks. Na operacionalidade do OPA é utilizada informação do utilizador sobre o serviço prestado, fornecida trimestralmente. Embora a exactidão e fiabilidade desta informação tenha melhorado substancialmente, existe ainda espaço para 287 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional País Qualidade do Serviço Ásia Arménia Indicadores de desempenho Filipinas Não Indonésia Indicadores de desempenho Singapura - País Qualidade do Serviço Panamá Não Peru Trindade e Tobago Uruguai Indicadores de desempenho Indicadores de desempenho Não Europa África Bélgica Indicadores em Valónia Cabo Verde Não Escócia Várias técnicas Gana Indicadores de desempenho França - Moçambique Indicadores de desempenho Grécia - Níger Indicadores de desempenho - Quénia Indicadores de desempenho Tanzânia Indicadores de desempenho Países Baixos Inglaterra e País de Gales Irlanda Zâmbia Indicadores de desempenho Irlanda do Norte Não Itália Indicadores de desempenho América Várias técnicas - Barbados Não Kosovo Indicadores de desempenho Belize Produtividade total de factores Lituânia Produtividade total de factores Brasil Parcialmente indicadores Portugal Indicadores de desempenho Canadá Não - Chile Indicadores de desempenho Colômbia Várias técnicas República Checa República Eslovaca Roménia Costa Rica Não Suécia - EUA Não Oceânia Honduras Indicadores de desempenho Jamaica Sim México - Quadro 117 Regulação da qualidade do serviço para os casos de estudo e países inquiridos Figura 76 Previsão da evolução das facturas médias na Escócia, na Inglaterra e no País de Gales 288 Austrália Papua Nova Guiné algum progresso neste âmbito. Como forma de aumentar o incentivo à evolução positiva do OPA, o regulador instituiu metas para este indicador, que têm sido excedidas. Na Figura 77 observa-se a evolução (positiva) do OPA, entre 2002-2003 e 2006-2007, e as metas estabelecidas para a Scottish Water. - Indicadores de desempenho Indicadores de desempenho O OPA pode ser desagregado em 4 áreas, designadamente no serviço de água (pressão, interrupções, restrições de uso não doméstico e qualidade da água), no serviço de águas residuais (número de inundações e risco de inundação), nos impactes ambientais (cumprimento das normas de tratamento de águas residuais, perdas Regulação de qualidade do serviço Figura 77 Evolução do indicador OPA e das metas estabelecidas para a Scottish Water de água e poluição) e, por último, no serviço ao consumidor (reclamações, questões sobre facturação e contactos telefónicos). A Figura 78 apresenta a evolução do OPA, entre o período de 2005-2006 a 2006-2007, por medida de desempenho individual. tos importantes no sector da água. Apesar de os SAS evidenciarem inúmeros problemas (por ex., a universalidade), a actuação do Office of Utilities Regulation (OUR) tem sido francamente positiva no que respeita à regulação da qualidade do serviço, não só através da respectiva Figura 78 Desenvolvimento do indicador OPA entre o período de 2005-2006 a 2006-2007 b) Jamaica Na Jamaica, a existência de um regulador dedicado aos SAS tem resultado em desenvolvimen- supervisão, como também do cálculo de alguns indicadores de desempenho (por ex., o volume de água não facturado) e pela instituição de Níveis Mínimos de Qualidade do Serviço (Guaranteed Service Standards). No entanto, os aspectos 289 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional relativos à qualidade da água encontram-se sob responsabilidade do Ministério da Saúde. belecidas para o NWC pela OUR dos indicadores de volume de água não facturado e de micromedição. No sentido de promover a melhoria da qualidade do serviço, o OUR estabelece também metas (targets) Como referido, além do desenvolvimento de indicadores de desempenho, o OUR estabeleceu para o operador estatal (National Water Commission – NWC). Na Figura 79 apresentam-se as metas esta- níveis mínimos de qualidade do serviço no sector da água, como forma de promover a melhoria da Figura 79 Registo e metas para os indicadores de água não facturada e de micromedição Quadro 118 Níveis de qualidade do serviço estabelecidos pelo NWC Descrição Compromisso Acesso Ligação ao serviço Nova ligação em 5 dias úteis Ligação ao serviço simples (contador existente) Ligação em 4 dias úteis Resposta a emergências Resposta a chamadas de emergência em 6 horas Facturação Envio da 1.ª factura em 45 dias úteis após a ligação Reclamações Informação Informação sobre questões escritas em 5 dias úteis Investigação Investigação completa em 30 dias úteis Investigação que envolve terceiros Investigação completa em 60 dias úteis Reconexão Após pagamento da dívida (área urbana) 1 dia Após pagamento da dívida (área rural) 2 dias Substitução do contador 20 dias úteis Compensação (monetária) 45 dias 290 Regulação de qualidade do serviço qualidade do serviço e ressarcir os utilizadores, quando o desempenho não é o mais adequado. No Quadro 118 são apresentados os níveis de qualidade do serviço impostos pelo OUR. O incumprimento de alguns destes compromissos incorre numa compensação de 10 € para o utilizador. c) Gana Também no Gana, um país caracterizado por inúmeros problemas socioeconómicos, o papel da entidade reguladora dedicada aos SAS, a Public Utilities Regulatory Commission (PURC), Descrição lizadores (por ex., o volume de água não facturado). Estes indicadores são posteriormente publicitados num relatório que contempla os últimos 5 anos, salientando assim a respectiva evolução. O Quadro 119 apresenta alguns desses indicadores determinados pela PURC. Alguns dos resultados de maior relevo, obtidos através do trabalho de cooperação com a Ghana Water Company Ltd – GWCL, dizem respeito à redução das perdas de água e à eliminação das ligações ilegais em 10% (hoje quase 40%) e ao aumento de cerca de 20% na capacidade de cobrança das facturas (actualmente em 95%). Na Quadro 119 Variação de alguns indicadores ao longo do tempo, de 1996 a 2003 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 Água produzida* 100,0 97,4 96,1 101,9 96,8 98,6 107,3 107,4 Água cobrada* 100,0 106,1 111,6 107,2 109,7 109,7 103,7 107,5 Água facturada* 100,0 108,9 116,1 105,2 113,3 111,3 96,6 100,0 Receita* 100,0 76,7 130,2 145,5 146,4 193,6 221,6 264,1 Cobrança* 100,0 67,8 100,7 119,6 131,1 155,1 167,4 203,4 Tarifa média* 100,0 72,3 116,6 135,7 133,4 176,4 213,7 245,7 Custos operacionais* 100,0 86,7 88,4 127,9 175,6 188,6 177,4 189,0 Custos operacionais unitários* 100,0 95,8 125,0 148,9 141,4 185,6 177,6 197,3 Custos de energia unitários* 100,0 102,0 154,5 221,7 204,0 259,6 309,1 353,0 Custos operacionais unitários (excluindo a energia)* 100,0 94,1 115,9 126,4 121,9 162,8 137,3 149,3 Custos unitários* 100,0 89,0 92,0 125,5 181,4 191,3 165,3 175,9 Perdas de água 57,1 53,2 50,2 54,8 51,4 52,2 58,5 57,1 Receita real 42,1 40,1 37,8 36,4 42,7 37,5 30,7 32,4 100,0 118,2 133,2 162,6 219,4 249,0 IPC* Inflação* 100,0 59,9 39,1 27,3 47,4 74,9 29,0 21,5 Descrição 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 * Determinado em %, em relação ao ano de 1996 é conotado com uma importância assinalável. Além das valências de regulação económica e de todos os cuidados ao nível dos custos (alvo de grande dedicação), a qualidade do serviço é também um aspecto importante na atenção do regulador. Neste sentido, a PURC aplica um conjunto (restrito, face às limitações) de indicadores de desempenho, onde procura promover o desenvolvimento do serviço prestado aos uti- Figura 80 é apresentada a evolução da produção e perdas de água da GWCL (PURC, 2005). Além do referido, a PURC publicita o respectivo desempenho ao nível das reclamações, desagregando a informação em reclamações colocadas e solucionadas. Também a comparação com os resultados de outros países como o Senegal, o Malawi, o Chile, a Polónia, a França, o Reino Unido e a Alemanha ao nível das perdas de água, 291 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional Figura 80 Evolução da produção e perdas de água da GWCL é uma mais-valia como forma de promover o melhor desempenho da entidade regulada. d) Portugal Em Portugal, a presença de uma entidade reguladora dedicada aos SAS (que inclui também os resíduos sólidos urbanos), o Instituto Regulador de Águas e Resíduos (IRAR), trouxe muitos benefícios para o sector da água. O IRAR tem tido um papel particularmente activo na promoção da qualidade do serviço e na satisfação das obrigações de serviço público. Entre as respectivas valências, nomeadamente, de regulação da qualidade do serviço e da qualidade da água, a regulação sunshine surge como uma das principais ferramentas do IRAR. Desta forma, ao nível da promoção da qualidade do serviço, o IRAR recorre a um conjunto de indicaFigura 81 Ficha de avaliação e benchmarking 292 dores de desempenho que publica no relatório anual. Estes indicadores medem a eficiência e a eficácia dos operadores, relativas a aspectos específicos da actividade desenvolvida ou do comportamento dos SAS. O IRAR implementou um conjunto de 20 indicadores de desempenho, divididos em três grupos e específicos para cada serviço (desagregados em água e em águas residuais e, por sua vez, em “alta” e em “baixa”), designadamente os relativos à defesa dos interesses dos utilizadores, à sustentabilidade da entidade gestora e à sustentabilidade ambiental. Por fim, o IRAR, adicionalmente ao que lhe compete, avalia e emite algumas observações relativas ao resultado de cada indicador por operador, através do respectivo relatório anual. Esta avaliação é exercida segundo um sistema de classificação que compara o valor obtido com o valor de referência Regulação de qualidade do serviço Figura 82 Ficha de avaliação anual da qualidade do serviço correspondente. Estes valores de referência são valores óptimos, ou próximos disso, que o regulador considera “alcançáveis” para os operadores regulados. No entanto, como o próprio nome indica, estes valores de referência não podem ser analisados per si, nem descontextualizados. Por conseguinte, o IRAR classifica qualitativamente o desempenho de cada operador, tendo em conta a qualidade do serviço prestado (insatisfatória, mediana ou boa), mediante a discrepância entre o resultado obtido pelo indicador e o intervalo de valores de referência. O IRAR publica os resultados, hierarquizando-os, por indicador de desempenho. Além disso justifica, por operador, os resultados obtidos a partir do cálculo dos indicadores de desempenho, quantificando e classificando a qualidade do serviço como insatisfatória, mediana ou boa e atribuindo à mesma uma bola vermelha, amarela ou verde, respectivamente. A Figura 81 e a Figura 82 representam exemplos de fichas de avaliação publicadas pelo IRAR: uma ficha de avaliação e benchmarking de um indicador referido e uma ficha de avaliação da qualidade do serviço de uma entidade gestora avaliada (IRAR, 2007), respectivamente. 293 Regulação económica 3.4 REGULAÇÃO ECONÓMICA O s métodos da regulação económica, aplicados nos diferentes casos de estudo e países inquiridos, oscilam entre a regulação por taxa de remuneração e a regulação por limite de preços. Embora a opção pela primeira ainda seja dominante, verifica-se que, nos últimos anos, cada vez mais se preferem os métodos de regulação económica baseados em incentivos de desempenho. Nos casos de estudo analisados e inquiridos, 35 países (58%) tinham, de alguma forma, uma regulação explícita implementada e 60% ainda adoptaram o método de regulação económica assente na regulação por taxa de remuneração. Em relação aos países que adoptam a regulação por incentivos de desempenho, a quase totalidade adopta a regulação por limite de preços, e 41% desses usam metodologias de benchmarking para determinar o factor X, baseando-se, por conseguinte, na regulação por comparação. Dois países adoptam o modelo de empresa eficiente e outros quatro empregam, total ou parcialmente, o método da regulação por limite de receitas. No Quadro 120 são sistematizadas as metodologias de regulação para os casos de estudo e países inquiridos. Em seguida, é também analisada, em pormenor, a metodologia de regulação económica adoptada em quatro dos caso de estudo, designadamente, a Costa Rica, a Austrália (Nova Gales do Sul), o Peru e a Colômbia. No primeiro caso está-se perante a aplicação da regulação por taxa de remuneração e nos restantes perante a regulação por incentivos de desempenho. Nestes incluem-se a regulação por limite de receitas (Austrália) sem uso de benchmarking e a regulação por comparação (modelo de empresa eficiente e regulação por limite de preços, usando metodologias de benchmarking para determinar o factor X). a) Costa Rica Na Costa Rica, a regulação económica dos SAS baseia-se na metodologia de regulação por taxa de remuneração. Esta metodologia determina o sistema tarifário através da seguinte expressão: CSP = CO+CA+D+R onde CSP corresponde ao custo do serviço prestado, CO aos custos de operação e manutenção, CA aos custos administrativos, D às amortizações e R ao montante correspondente à remuneração do operador pela prestação do serviço. O montante acordado para cobrir todas as parcelas referidas diz respeito ao denominado nível tarifário (valor total das receitas que são necessárias para recuperar os custos). Estas receitas são distribuídas sob a forma de tarifas, segundo a estrutura tarifária vigente (que é a atribuição de preços diferentes entre serviços e escalões de consumo, identificados no universo dos utilizadores) e os resultados da análise de mercado (procura). A aplicação desses critérios, em conjunto com o guia de definição das condições e preços para o serviço, intitula-se plegio tarifario. Para determinar as componentes da fórmula, utilizam-se, basicamente, os seguintes elementos (situação actual e prevista pelo menos a 5 anos, porém, normalmente aplicada por dois anos), designadamente, as receitas e os custos, a base tarifária e a origem e aplicação dos fundos tarifários. É de referir também que, mesmo no caso das empresas públicas, se permite a obtenção de um excedente (R), como contrapartida da prestação dos serviços. b) Nova Gales do Sul, na Austrália Na regulação dos SAS metropolitanos em Nova Gales do Sul, na Austrália, onde se inclui a Sidney Water e a Hunter Water, o IPART adopta uma abordagem do tipo building block para determinar o nível de receitas requerido pelos 295 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional Quadro 120 Metodologias de regulação económica para os casos de estudo e países inquiridos Regulação económica País Ásia Regulação económica País Arménia RTR Peru Filipinas RTR Trindade e Tobago Price cap (5 anos) “Empresa Modelo” (5 anos) Revenue cap (5 anos) Indonésia RTR Uruguai RTR Singapura - Panamá África Europa Bélgica RTR (Valónia) Cabo Verde Price cap (5 anos) Escócia Revenue cap (4 anos) Gana RTR/Price cap (4 anos) França - Moçambique RTR Grécia - Níger RTR Países Baixos - Quénia RTR Inglaterra e País de Gales Price cap (5 anos) Tanzânia RTR/Price cap (2 anos) Irlanda - Zâmbia Price cap (3 anos) Irlanda do Norte Price cap (5 anos) Itália Price cap (5 anos) América Barbados RTR Kosovo RTR Belize Lituânia RTR Portugal RTR República Checa - República Eslovaca RTR Colômbia RTR RTR/Price cap/Revenue cap RTR “Empresa Modelo” (5 anos) RTR/Price cap (5 anos) Roménia RTR Costa Rica RTR Suécia - EUA RTR Oceânia Honduras RTR Austrália Revenue cap e Price cap Jamaica Price cap (3 anos) Papua Nova Guiné Price cap (5 anos) México - Brasil Canadá Chile RTR – regulação por taxa de remuneração operadores dos SAS. Este nível de receitas é definido pela seguinte fórmula: Receitas = Custos Operacionais + Depreciação + Remuneração dos Activos A remuneração dos activos é obtida através da expressão seguinte: Remuneração dos Activos = Taxa de Remuneração x Activo a remunerar De modo particular, os custos operacionais são determinados tendo em consideração os custos 296 passados e o respectivo agravamento ao longo dos anos por factores não controláveis e assumindo alguns ganhos de eficiência. De qualquer forma, são usadas metodologias de benchmarking para a determinação desses OPEX (eficientes). A depreciação é calculada tendo em conta o período de vida útil dos activos, o qual, no caso da Austrália para as infra-estruturas de abastecimento de água e de águas residuais, corresponde a 70 anos. A remuneração dos activos é determinada com base no custo médio ponderado do capital (WACC). A partir destes valores obtidos, o regulador (IPART) usa a fórmula do tipo IPC-X para rever as receitas permitidas durante o período regula- Regulação económica tório. O factor X é aqui determinado pelo regulador, tendo em conta as expectativas futuras e os resultados passados, bem como os aspectos sociais e ambientais, sem recurso a nenhuma metodologia especial. Desta forma, durante o período regulatório (três anos), o operador tem incentivos para se tornar mais eficiente, retendo os ganhos alcançados e, por conseguinte, aumentando a respectiva remuneração. c) Peru O processo de regulação económica no Peru, baseado no modelo de empresa eficiente, encontrase estruturado em três fases: Etapa Preparatória, Etapa de Melhoramento e Etapa Definitiva. Na Etapa Preparatória, a ênfase incide sobre o princípio de viabilidade económico-financeira, a fim de garantir que as tarifas cobradas pela Empresa Prestadora de Servicios de Saneamiento (EPS) permitam, pelo menos, cobrir os custos dos serviços. Durante esta fase, o regulador avalia a estrutura tarifária do operador e adopta medidas correctivas. A Etapa de Melhoramento procura melhorar a eficiência económica das EPS, propondo alterações ao nível orgânico e institucional do operador, as quais terão reflexos na fixação de Objectivos de Gestão (Metas de Gestion), de cumprimento obrigatório. Para cada EPS, são definidas fórmulas tarifárias para cinco (5) anos, de modo a que as tarifas anuais permitam a recuperação dos custos médios anuais (CMA). Os CMA englobam os custos relativos à operação e manutenção dos sistemas, os custos de capital, onde se incluem os associados aos capitais próprios da empresa com uma remuneração adequada e aos capitais alheios e os encargos com taxas e impostos no respectivo numerador e o volume total de água facturado num ano no respectivo denominador. O CMA é calculado a partir do Plano Financeiro do EPS, que será estabelecido com base nos Objectivos de Gestão e no respectivo Plano de Desenvolvimento Optimizado (Plan Maestro PDO). O Plano Financeiro terá um horizonte de cinco (5) anos. O PDO deverá conter o cronograma de investimentos na reabilitação, renovação e expansão dos sistemas para um horizonte de médio e longo prazo, bem como um programa de melhoria operacional e institucional dos serviços, onde são definidas metas para os níveis de qualidade e eficiência da prestação dos SAS a médio prazo (empresa eficiente). A fórmula tarifária referida na Etapa de Melhoramento, referente à tarifa média para cada ano, é definida pela seguinte expressão: Tt = Tt-1 (1+kt) (1+Ø) onde Tt corresponde à tarifa média do ano t, Tt-1 diz respeito à tarifa média do ano t-1, kt está associado a um factor de ajuste anual para expressar o aumento real das tarifas e Ø refere-se ao IPC. Na Fase de Melhoramento, pretende-se procurar a redução da subsidiação cruzada, sobretudo entre as diferentes categorias de utilizadores. O processo de ajustamento deverá ser considerado e incluído no Estudio Tarifario correspondente. Na Fase Final cumprir-se-ão os princípios orientadores da regulação tarifária assinalados pela Ley General. Assim, no que respeita ao princípio da eficiência económica, os encargos tarifários, em função do volume consumido, corresponderão ao custo marginal de longo prazo, calculados com base nos pressupostos atrás referidos. O custo marginal de longo prazo médio (Costo Incremental Promedio de Largo Plazo - CIP) será utilizado como uma respectiva aproximação. O CIP é definido pela seguinte expressão: onde It é o investimento no ano t inscrito no PDO, VR corresponde ao valor residual dos investimentos aí definidos para o ano n, Ct equivale aos custos de exploração sem amortizações no ano t, C0 refere-se aos custos de exploração sem depreciação no ano 0, Qt está associado ao consumo do ano t em m3 e o Q0 é igual ao consumo do ano 0 em m3, r é a taxa de actualização (definida pela SUNASS), j é o número de anos do programa de investimento e n é o número de anos do horizonte de planeamento. O CMA é definido pela seguinte fórmula: na qual o CMat corresponde ao custo médio anual do ano t e r é a taxa de actualização. Se os estudos tarifários verificarem que os encargos das tarifas por volume, calculados com base no CIP, são inferiores ao CMA, aplicar-se-ão tarifas fixas para igualar os custos referidos. Assim, a tarifa para cada serviço será constituída por duas parcelas: a) Tarifa volumétrica por m3, igual ao CIP; b) Tarifa fixa por ligação, que permita igualar o CMA. Se os estudos tarifários comprovarem que as tarifas volumétricas, determinadas de acordo com o CIP, são superiores ao CMA, proceder297 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional -se-á à diferenciação por escalões de consumo, de modo a que o valor cobrado para o último escalão corresponda ao CIP e que o valor médio de todos os escalões seja igual ao CMA. O parâmetro Ø será calculado mediante a aplicação de uma fórmula polinomial de reajustamento, cujos parâmetros reflectirão a estrutura de custos de cada serviço, obtida a partir do Estudo Tarifário correspondente. A tarifa será ajustada automaticamente, sempre que o parâmetro Ø varie mais do que 3%. O período regulatório actual (2006-2011) tem uma vigência de cinco (5) anos. Antes do final do período regulatório, o PDO e o Plano Financeiro são actualizados, são realizados novos estudos tarifários e serão determinadas novas estruturas tarifárias para o período seguinte. d) Colômbia O método regulatório da Colômbia baseia-se na abordagem da regulação por incentivos de desempenho, relativamente à regulação por comparação, onde, no sistema de limite de preços adoptado, o factor X é estimado através de técnicas de benchmarking, neste caso particular, da data envelopment analysis (DEA). Os critérios e as metodologias para determinação das tarifas dos SAS foram estabelecidos em 2004, pela Resolution n.º 287 do CRA. O processo regulatório adoptado tem como base um sistema de preços máximos por um período de cinco anos. Os preços máximos são determinados, separadamente, tendo em conta o serviço de água e o serviço de águas residuais e a dimensão da empresa (até 25.000 utilizadores e superior a 25.000 utilizadores). Estes preços são limitados de modo tripartido, tendo em consideração, designadamente, a parte fixa relativa aos custos administrativos e a parte variável que diz respeito aos custos de operação e manutenção (OPEX), aos custos de capital (CAPEX) e aos impostos. e outras contribuições incluídas nos custos administrativos (excluindo impostos ambientais). Por sua vez, o, é constituído pelo CA, que representa os custos administrativos do SAR (sem impostos), que são utilizados na técnica de DEA, e pelo E, que representa a porção de custos administrativos, tendo em consideração o SAR eficiente que é admitido na tarifa. O valor de E é dado por , onde PDEA é a eficiência obtida da DEA. O valor de 0,046 procura englobar os custos e as variáveis explicativas que não são contabilizadas no modelo da DEA. O valor de 1,03 corresponde ao valor máximo adoptado para a comparação de custo eficiente de 100% e o máximo de retorno de 3% sobre as despesas de capital. Neste procedimento são também controlados os outliers, através de uma regra estatística e da existência de preços mínimos. Relativamente à parcela variável dos custos, esta é obtida pelo somatório das três partes referidas anteriormente. Em particular, o OPEX é obtido pela seguinte formulação: onde o OPEXSA corresponde aos custos operacionais do SAR, o OPEXiSA diz respeito aos custos operacionais do SAR específicos a cada empresa, o OPEXeSA é o custo operacional eficiente do SAR, o OPEXSA corresponde aos custos operacionais do SA, o OPEXiSA está associado aos custos operacionais do SA específicos a cada empresa e o OPEXeSA é o custo operacional eficiente do SA. O custo de operação e manutenção do serviço de águas residuais é obtido pela seguinte fórmula (para o serviço de água existe uma fórmula semelhante): Os custos administrativos (CA) para o serviço de água (SA) e para o serviço de águas residuais (SAR) são os seguintes: e onde CAT é o custo administrativo total eficiente dos SAS, NSA diz respeito ao número de utilizadores do serviço de água, NSAR refere-se ao número de utilizadores do serviço de águas e residuais e SSAR é a parcela (%) de CAT relativa à prestação do SAR. e e O CAT será fornecido por CAT , sendo T os custos relativos aos impostos mensais 298 onde o VA é o volume anual de água dentro do sistema, o RA está associado ao volume anual de água facturada, o L corresponde ao valor de 30% relativo ao limite máximo de perdas de água, CE são os custos de energia, CR são os custos de reagentes, T diz respeito aos impostos associados ao OPEX e o ANF é a percentagem de água não facturada. Caso a empresa compre água a terceiros adicionar-se-á outro termo à fórmula. O custo de operação e manutenção, obtido através do benchmarking, é calculado pelas expressões: Regulação económica ciência obtida da DEA. Estão igualmente definidas regras para a identificação dos outliers. O , sendo , onde SDEA é a efi- É de referir que, relativamente à parcela variável, para além do custo de operação e manutenção, esta compreende os custos de investimento, baseados em planos de desenvolvimento aprovados pelo regulador, bem como os encargos e taxas ambientais associados. 299 Boas práticas 3.5 BOAS PRÁTICAS E m jeito de conclusão, são enumeradas algumas recomendações que têm em conta as boas práticas que foram encontradas na realização desta investigação e que os vários países, os reguladores e os SAS devem ter em conta e, se possível, procurar seguir. Os dez princípios e as conclusões apresentadas, embora não deixem de reflectir, naturalmente, a opinião dos autores do estudo, sistematizam os resultados desta investigação. Assim, tecem-se as seguintes observações para o bom governo dos SAS, tendo em consideração as várias vertentes analisadas para cada país, designadamente, a estrutura e a organização do mercado dos SAS e a respectiva regulação, o âmbito e as características da entidade reguladora, os princípios e os procedimentos regulatórios seguidos, as obrigações de serviço público, a regulação da qualidade do serviço e a regulação económica. a) A necessidade de regulação sectorial/multissectorial Por tudo o que foi referido, a instituição de regulação dedicada dos SAS reveste-se de carácter essencial. A regulação permite não só mitigar as falhas de mercado, como também melhorar o governo dos SAS através da procura do seu funcionamento, de uma forma mais técnica, profissional e apolítica. Os benefícios da regulação verificam-se, desde logo, pela informação existente e disponível sobre os SAS. Onde existem reguladores, conhece-se o desempenho e os principais elementos estatísticos e de funcionamento dos SAS. Na situação contrária, como em muitos países na Europa, embora por razões diversas os SAS possam funcionar sem grandes problemas (qualidade da água, qualidade ambiental e tarifas reduzidas), o respectivo desempenho não é transparente, não existe responsabilização, os utilizadores são intervenientes ausentes e ocorrem, com certeza, abusos, muitos desperdícios e ineficiência. A regulação pretende funcionar como substituto do mercado, simulando a concorrência no mercado inexistente através da competência por comparação e incentivando, assim, a melhoria do desempenho e a redução do respectivo poder de monopólio. É de referir que a existência de regulador não tem qualquer relação com a privatização dos SAS. Na Europa, esta asserção é, por vezes, promovida, sobretudo pela indústria que receia a regulação, o que não corresponde à realidade. O exemplo mais elucidativo diz respeito à Austrália, onde os SAS são, por norma, públicos (propriedade e gestão) e, por lei, a implementação da regulação independente é obrigatória. b) O âmbito da regulação deve incluir os aspectos relativos às obrigações de serviço público, à qualidade do serviço e ao estabelecimento de preços e tarifas O regulador sectorial/multissectorial deve ter intervenção nos três vértices do triângulo, que constituem o âmbito e o objecto da regulação e que consistem nas obrigações de serviço público, na qualidade do serviço prestada e nos preços e tarifas praticados, mesmo que possam existir outras entidades com funções nestas matérias. A complementaridade e a inter-relação destas atribuições são evidentes, permitindo ao regulador uma tomada de decisão mais eficaz e, simultaneamente, mais eficiente. A qualidade de serviço prestada é indissociável da regulação económica, assim como a satisfação das obrigações de serviço público tem aí consequências muito relevantes. Com efeito, se forem várias as entidades a ter responsabilidades nestas três vertentes da regulação, para além da dificuldade de analisarem os problemas no seu conjunto e de terem uma visão parcial da regulação (sob a perspectiva da respectiva atribuição), as suas decisões individuais têm consequências que podem comprometer as decisões e o sucesso das restantes. 301 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional c) O regulador deve ser pautado por independência e por instrumentos que lhe permitam cumprir as suas atribuições O regulador deve ser independente de todos os interesses envolvidos, incluindo os dos operadores, governos e utilizadores. Deve, por isso, possuir independência orgânica, funcional e financeira. A independência orgânica é conferida ao regulador pela inamovibilidade dos seus membros, ou seja, por estes serem designados por um período fixo e longo, sendo impossível a sua destituição, excepto nos casos especiais previstos na lei. A independência funcional significa que o regulador está apenas sujeito à lei e ao controlo dos tribunais, não estando submetido a uma tutela de mérito nem à superintendência governamental. Por último, a independência financeira significa que o respectivo orçamento não está dependente do comportamento de alguns dos intervenientes. A independência da regulação tem várias vantagens (Marques, 2005), designadamente a separação da política e da economia e, por conseguinte, a tomada de decisão sem o envolvimento directo do governo, tornando a regulação o mais profissional, imparcial, apolítica e técnica possível; uma maior agilidade, desburocratização e flexibilização dos processos regulatórios, visto que estas entidades não pertencem, por regra, à administração do Estado tradicional; segurança, estabilidade e credibilidade do quadro regulatório; resolução extrajudicial de conflitos entre os vários intervenientes; e uma maior responsabilização no que concerne ao respectivo equilíbrio financeiro. Para que possam cumprir as suas missões, os reguladores devem ter poderes regulamentares (editar documentos normativos), poderes executivos (implementar normas) e poderes fiscalizadores e sancionatórios (fiscalizar e punir as eventuais infracções aos elementos normativos), bem como poderes de resolução de conflitos entre os regulados ou entre os regulados e os utilizadores ou outros stakeholders. A eficácia da regulação é, muitas vezes, comprometida pela falta de algum destes poderes, como a ausência de capacidade de elaboração de normas ou de aplicação de sanções. d) A independência do regulador não significa a sua desresponsabilização, devendo existir sempre mecanismos de apelo Os reguladores, embora independentes, devem prestar contas perante os vários stakeholders. A responsabilização permite a verificação e a 302 contestação dos actos regulatórios considerados injustos ou incompetentes, democratizando, de certa forma, o acto regulatório. Deste modo, o quadro regulatório deve estar dotado de mecanismos que promovam a responsabilização do regulador, nomeadamente, a delimitação clara do âmbito das suas funções, a forma de nomeação do seu corpo directivo e a respectiva possibilidade de destituição, o controlo jurisdicional dos respectivos actos (tribunais) e a submissão destas entidades à lei e ao Estado de Direito, assim como ao controlo financeiro e orçamental do Tribunal de Contas e a outras entidades independentes, com competências específicas no controlo do poder político (por ex., Provedor, acesso a documentos administrativos, protecção de dados pessoais, etc.). Outros instrumentos como a solicitação de pareceres, a análise e acompanhamento da actividade regulatória pelo Parlamento, o contraditório e o recurso, desde que a lei o contemple, a entidades externas, credíveis e de cariz independente para a reanálise das decisões em confronto e a intervenção na actividade regulatória de personalidades reputadas e independentes podem, igualmente, dar credibilidade aos processos regulatórios (por ex., conselhos consultivos). A implementação de procedimentos claros de regulação, nos quais se incluem a mediatização, a informação e a participação dos interessados, além da transparência, fornece legitimação ao processo regulatório. e) Os processos regulatórios devem ser transparentes, participados e compreensíveis A transparência, a participação e a inteligibilidade dos processos regulatórios são da maior importância. Em todos os casos de estudo analisados, existia uma correlação muito forte entre a eficácia, o desenvolvimento e o sucesso apresentados pelos SAS e a existência de processos regulatórios transparentes e participados. Os processos regulatórios devem ser claros, justificáveis e facilmente verificáveis (por um tribunal, se necessário) e públicos. Toda a informação regulatória relevante deve ser divulgada, desde logo, no sítio da Web do regulador (e do operador). A transparência induz à participação e fundamenta a responsabilização e legitimação da regulação. O processo regulatório deve permitir a participação efectiva de todos os stakeholders. A participação permite melhorar o processo regulatório através de críticas, comentários e sugestões recebidas, ajuda e suporta a tomada de decisão, aumenta a transparência e a responsabilização dos intervenientes, contribuindo para a redução da respectiva contestação, e faculta um melhor conhecimento do sector e dos interesses envolvidos. Por último, os processos regulatórios devem ser compreensí- Boas práticas veis e apresentados numa linguagem acessível e conhecida por todos os stakeholders. Embora se admita que os processos regulatórios possam ser complexos e adoptar técnicas sofisticadas, os reguladores devem sempre apresentar resultados e resumos não técnicos que permitam a sua melhor compreensão. f) As obrigações de serviço público e, em particular, o serviço universal, devem ser satisfeitas, enviando a mensagem adequada para o mercado dos SAS As obrigações de serviço público constituem, inequivocamente, um vértice fundamental da regulação. Os SAS não poderão ter um desenvolvimento sustentável se as obrigações de serviço público não forem acauteladas adequadamente. É impensável, sobretudo para o sector privado, que um SAS possa ter futuro, se parte da população não tiver acesso ao serviço ou se a qualidade do serviço prestado pelo mesmo operador for muito diferente em função da área servida ou do utilizador. Casos de insucesso, verificados no passado, comprovam este facto (por ex., Buenos Aires). Desta forma, também aqui a regulação assume um papel fundamental. Por exemplo, na procura da universalidade dos SAS, os esquemas de subsidiação cruzada enviam, muitas vezes, mensagens erradas para o mercado, provocando o desperdício de consumo e a fuga dos principais utilizadores, que procuram novas fontes de água. O subsídio deve ser em espécie, através de tarifas sociais, mas subsidiadas ou por todos os operadores e através da constituição de um fundo para o efeito ou pelo próprio governo. As soluções mais eficazes são prova disso (por ex., Chile). De qualquer forma, há que ter consciência de que os países requerem soluções à sua medida e que, frequentemente, se procuram adaptar soluções muito evoluídas e de grande qualidade em contextos socioeconómicos medíocres, que as inviabilizam e que acabam por se traduzir num desperdício de recursos. As obrigações de serviço público devem estar regulamentadas na lei de cada país, devendo igualmente ser previstas sanções para o seu incumprimento, se for caso disso. que constituem metas a atingir e a ultrapassar, devem estar associadas indemnizações para os utilizadores, sempre que existir incumprimento, ou mesmo outro tipo de sanções. Este tipo de instrumentos, embora possam ser mais usuais em países desenvolvidos, devem ser promovidos também nos países menos ricos, variando, todavia, a respectiva gradação. Os níveis de serviço constituem garantias que os utilizadores devem ter como contrapartida do pagamento dos SAS. Só com SAS fornecidos com qualidade e níveis de serviço elevados é que o value for money estará assegurado e os utilizadores manifestarão disponibilidade para pagar o custo real do serviço. h) O regulador deve usar e promover a utilização da ferramenta de benchmarking O emprego de benchmarking possui várias vantagens que são reforçadas nos SAS pelas suas características particulares. Nos SAS, o uso de benchmarking pelos reguladores não só configura um dos poucos instrumentos à disposição, para criar algum ambiente competitivo neste mercado, como também é potencializado pela existência, normalmente, de um conjunto significativo de players. Esta realidade mitiga um dos principais problemas do benchmarking que é a comparabilidade entre os operadores. De facto, a aplicação de benchmarking cria fortes incentivos para os operadores, para serem eficientes e inovadores, mitigando os seus custos de operação e custos de capital, promove a eficiência no que concerne às despesas de capital, garante a “justa” recuperação dos custos ocorridos e de uma remuneração “justa” dos capitais investidos e o incremento da partilha e da transparência da informação, minimizando a tradicional assimetria de informação presente entre os diferentes intervenientes. Na verdade, quer na supervisão dos níveis e qualidade do serviço, quer no estabelecimento de preços e tarifas (na determinação da eficiência e da produtividade dos operadores), esta ferramenta encerra enormes potencialidades. g) Os i) O fornecimento de incentivos para o desempenho deve constituir um dos principais objectivos da regulação Por via legislativa, ou não, deve ser promovida a realização de cartas de compromisso pelos operadores, identificando os níveis de serviço a alcançar pelos SAS. A estes níveis de serviço, A concorrência existente no mercado dos SAS é muito limitada. Como qualquer entidade monopolista e pertencente ao sector público, os SAS são susceptíveis à quiet life, isto é, à falta de pressão para terem bons resultados e à ineficiência-X (por ex., existência de desperdícios), ou seja, são indiferentes aos custos ocorridos. níveis de serviço devem ser definidos na lei e periodicamente analisados e publicitados 303 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional Os SAS devem, por conseguinte, ser orientados para a gestão por objectivos, tanto em relação à qualidade do serviço, quanto aos custos (eficiência económica) apresentados. j) Os papéis e os objectivos da regulação devem estar perfeitamente delimitados O bom desempenho tem de ser recompensado, assim como o menos bom deve ser repreendido e penalizado. A alocação de objectivos aos diferentes intervenientes e à respectiva meritocracia deve existir sempre, independentemente do estádio de desenvolvimento dos SAS. Desta forma, recomenda-se, sobretudo na regulação económica, a instituição de métodos baseados em incentivos de desempenho. Não deve ser aceitável que a remuneração da entidade gestora seja independente dos resultados obtidos, mesmo que estes, ainda assim, sejam controlados. Esta circunstância é particularmente agravada nos SAS, pelo facto destes exigirem investimentos bastante significativos (indústria de capital intensivo), de funcionarem muito próximo da indústria da construção e, portanto, potencializarem o efeito de A-J. Os papéis e os objectivos da regulação devem ser claros e estar perfeitamente definidos e delimitados. As funções regulatórias devem ainda ser pautadas por uma estabilidade (manutenção das regras do jogo) que forneça alguma previsibilidade à regulação. Sabendo-se que as infra-estruturas dos SAS têm ciclos de vida elevados, as orientações estratégicas (e políticas) de curto prazo devem ser evitáveis. De forma clara, devem estar definidos os papéis que recaem sob os interlocutores políticos e mais circunstanciais e aqueles de natureza mais técnica e apolítica. Frequentemente, verifica-se também alguma indefinição, sobreposição e mesmo incompatibilidade entre as funções dos governos e dos vários reguladores. Estas circunstâncias ocorrem entre o governo (e, eventualmente, a Assembleia da República) e o regulador, sobretudo nas matérias relativas à regulação estrutural, podendo, no entanto, também suceder relativamente a outros assuntos (por ex., a definição de preços e tarifas e a garantia de certas obrigações de serviço público). Quando existe mais do que um regulador com atribuições nos SAS (por ex., autoridade da concorrência e organismo responsável pela defesa do consumidor), podem existir conflitos que reduzam a eficácia dos processos e prejudiquem a imagem dos diferentes intervenientes e, desta forma, da regulação. Também na regulação da qualidade do serviço, a existência de incentivos, designadamente de prémios pela excelência (ou penalizações pelo mau desempenho), através de políticas do tipo carrot and stick, garantem bons resultados. Os incentivos de desempenho constituem os melhores instrumentos que os governos e os reguladores têm para promover a eficiência e a inovação dos SAS e, por conseguinte, o value for money fornecido. 304 Bibliografia BIBLIOGRAFIA ABAR (2006). Regulação – Indicadores para a Prestacão de Serviços de Água e Esgoto (eds Alceu Junior and Alexandre Silva). Associação Brasileira de Agências de Regulação (ABAR), Fortaleza, Brazil. ADB (2001). 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The Electricity Journal, 14(5), 62–70. 309 ANEXOS Anexo I - Questionário sobre regulação ANEXO I QUESTIONÁRIO SOBRE REGULAÇÃO QUESTIONNAIRE “WATER SERVICES REGULATION” Country or Region Profile Notes: • Please fill in the questions below, referring to the guidelines at the end of the questionnaire if applicable; • If your country (state/region) does not have any regulatory agency for the water sector, please ignore sections 3 and 4; • If you have any query please contact Pedro Simões by phone +351 218418316 or e-mail: [email protected]. We are glad to answer any questions or comments you might have regarding the questionnaire; • We intend to use the information you provide within the framework of a survey. Once data are provided we assume that we are allowed to use the data for this specific purpose; • We will be happy to provide you with the results of the survey after completion. Elements of the questionnaire: Reference time for the survey: Latest date for submission of the questionnaire: Estimated time for response: 17 October 2007 16 November 2007 45 minutes The questionnaire was filled in by: Name: Position: Contacts: (Phone) (E-mail) Please send the completed questionnaire by e-mail or by post to: Address: Prof. Rui Cunha Marques Centre for Urban and Regional Systems Instituto Superior Técnico Technical University of Lisbon Av. Rovisco Pais 1049-001 Lisbon Portugal Additional contacts: Phone: +351 218418319 Fax: +351 218409884 Mobile: +351 969076504 Email: [email protected] Thank you very much for your collaboration! 313 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional Country or Region Profile a) Information about the water services industry: Geographical scope of the data provided (name of country or region): Coverage level of drinking water supply service (%): Coverage level of wastewater collection service (%): Coverage level of wastewater treatment service (%): Annual drinking water volume produced (Million m3): Non-revenue water volume (%): Annual collected wastewater volume (Million m3): Annual treated wastewater volume (Million m3): Number of drinking water supply service providers (no.): Number of wastewater service providers (no.): Total revenue from public water supply service (Million US$): Total revenue from wastewater collection and treatment services (Million US$): Investments on the water supply infrastructure/service (Million US$/ last 3 years): Investments on the wastewater collection ant treatment infrastructure/service (Million US$/ last 3 years): b) Information about the regulator: Creation of the regulator (legal document and date of beginning of activity): Scope of the regulation (industries, activities and territory): Total expenditures for the year 2006 (US$): Sources of the regulator revenues (% by source): Staff (no.): 314 Anexo I - Questionário sobre regulação 1. General aspects of the water services A) Who are the responsibles for the provision of water services? Government Local Regional National Other: _____________________________________________________________ Other: ________________________________________________________________ B) What are the roles of the private sector in these industries? Ownership Management (concession, lease or other type of contract) Outsourcing. Please specify the scope of activities: ____________________________ Other: ________________________________________________________________ C) How is the relationship between the water assets owner and the service provider established? Existence of a contract Existence of a license Other: ________________________________________________________________ None. They are the same entity D) What kind of regulatory agency is responsible for quality of service and economic regulation of water services? Independent agency Non-independent agency Transversal agency (e.g. competition authority). Please specify:______________________________________ Self-regulation Other: ________________________________________________________________ None E) Who are the main actors of the water sector? Minister responsible for the water issues Regulator Service provider Service providers association Customers association Competition authority Ombudsman Other: ________________________________________________________________ 315 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional 2. Scope of the regulatory activity A) Who establishes or approves the water services tariffs? Government Regulator Service provider Contract Other: ________________________________________________________________ B) Is there any procedure of appeal against decisions taken regarding the tariff setting? No Yes, to the Government Yes, to the regulator Yes, to the competition authority (or similar agency) Yes, to the Courts Other: ________________________________________________________________ C) How is the quality of service supervised? By the application of sanctions and awards By means of the tariff system By publicizing the best and worst practices By threatening to revoke the license or to cancel the contract Other: There ________________________________________________________________ are no explicit procedures established D) How do customers claim their rights? Directly to the sector regulator Directly to the Government or to a Government agency Directly to the customers association Directly to the ombudsman or similar entity Other: ________________________________________________________________ E) What is the role of benchmarking in the regulatory activity? To compute the tariffs To supervise the quality of service Other: ________________________________________________________________ F) Are there any public service obligations defined in the law? Yes No 316 Anexo I - Questionário sobre regulação 3. General aspects of the regulatory agency A) Are the role, tasks and competences of the regulatory agency clearly defined and published? Yes No B) How is independence from political influence ensured? Decisions Staff Its are taken without being subject to Government assessment is chosen without political criteria, with long mandates and hard to dismiss budget does not depend on the Government C) How does the regulatory agency carry out investigations? Periodically, By imposed by its statutes request of a stakeholder Other: ______________________________________________________________ D) Are the decisions of the regulatory agency legally binding? Yes, immediately Yes, but with suspensory effect if decision is appealed No E) Can the regulatory agency impose fines or other sanctions? Yes No F) Can the regulatory agency enact legislation? Yes No G) How is the regulators’ accountability guaranteed? Answering to Parliament whenever required Transparency Publicizing Possibility Other: and participation in the decisions by the stakeholders the decisions and the regulator financial statements of appeal to other authorities ______________________________________________________________ H) How high is the legal certainty of ex ante decisions taken by the regulatory agency? Legal certainty ensured (ex ante decisions are not revised) Legal certainty not ensured (ex ante decisions are revised) No prior experience of these cases 317 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional 4. Organizational aspects of the regulatory agency A) Does the agency cover various sectors or is it specific to water services? Various sectors Specific to water services Other: ________________________________________________________________ B) How many employees are responsible for the regulation of the water sector in your agency? Number: ________________________________________________________________ C) Who is the head of the regulatory agency? Singular person Collegiate Other: board ________________________________________________________________ D) Are there any scientific / stakeholders’ advisory committees that assist the agency? Yes. Please specify: ____________________________________________________ No E) How is the regulator financed? By the Government By the service provider Depending on the volume Depending on the customers number Fixed Other: percentage of the tariff ____________________________________________________________ Other________________________________________________________________ F) Are the decisions and other important activities of the agency published? No Yes, namely: Decisions Exemptions Powers Fines Ongoing Other procedures administrative matters, for example: ________________________________ G) Are the criteria and methods of the regulation transparent and understandable? Yes. No 318 Please specify: ____________________________________________________ Anexo I - Questionário sobre regulação 5. Economic regulation A) What is the economic regulation method used for tariff setting? Rate-of-return Price regulation (cost-based) cap regulation Revenue Other: cap regulation ________________________________________________________________ B) How long does the regulatory period take? 1 years 2 years 3 years 4 years 5 years Other: _________________________ C) What kind of incentives does the regulatory method have? The service provider retains all the profits Sharing Other: mechanism ________________________________________________________________ None D) How is the quality of service encompassed in the tariff setting procedure? Change in tariffs for up and down Rewards for out-performance Penalties for under-performance None Other: ________________________________________________________________ E) How are the investment plans defined? Presentation of master plans (short, medium and long-term) Based on the network quality of service Based on minimum investment levels Other: ________________________________________________________________ F) Are the investments approved by the regulator? Yes No G) Who determines the cost of capital? The regulator. Please specify the procedure (CAPM, DGM, …): __________________ The country’s central bank The Government The service provider Other: ________________________________________________________________ 319 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional H) How are unpredictable situations included in the regulatory process? By means of extraordinary tariff revisions By means of the contract extension Service providers responsibility Compensation by the Government Other: ________________________________________________________________ I) If benchmarking is applied, which methodologies are adopted? Total factor productivity Non-parametric Stochastic techniques (Data envelopment analysis – DEA) parametric techniques (Stochastic frontier analysis – SFA) Deterministic frontier analysis (Regression, …) Performance indicators Other: ________________________________________________________________ J) How is the quality of information supervised? By auditors By periodical inspections Other: ________________________________________________________________ K) What kind of tariff structure is typically adopted for residential customers? Fixed charge equalised for each customer Fixed charge depending on customer characteristics (meter, area, …) Volumetric charge: Fixed Increasing block charge Decreasing Other: 320 block charge ________________________________________________________________ Anexo I - Questionário sobre regulação 6. Public service obligations and quality of service regulation A) Is the universal service requirement established in the law? Yes No B) How is the universal service intended to be guaranteed? Cross-subsidization Compensation fund Government subsidises service providers Government Other: subsidises some customers directly ________________________________________________________________ C) Do special tariffs exist for special customers? If yes, please tick the correct answer. Numerous families Poor Customers with special needs (disabilities and health problems, elderly, …) Other: ________________________________________________________________ D) What is the procedure adopted for customers debts? Interrupting the service Negotiating, for all customers Negotiating, for special customers Other: ________________________________________________________________ E) Are there information obligations of the service provider defined in the law? Yes. Only Please specify: ____________________________________________________ about water quality data No F) Are there automatic compensations when the supply is interrupted without notice and due to the service provider fault? Yes No G) In which circumstances are there other kind of compensations? Water quality problems Water pressure problems Complaints Other: not answered ________________________________________________________________ 321 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional H) Which levels of service are defined in law? Water pressure Interruptions Restrictions Flooding Billing from sewers contacts Written Ease in water use complaints of telephone contact Other: ________________________________________________________________ I) What are the procedures adopted when there is a poor quality of service? Automatic compensations Compensations Penalties Other: when required by the particular stakeholders in tariff systems ________________________________________________________________ None Final Comment How would you assess the performance of the regulatory model applied to water service provision? Areas for improvement Key strengths 322 •• •• •• •• •• •• •• •• •• •• Anexo I - Questionário sobre regulação Comments on “Water services regulation” Please cross-reference your comments by question number. If you need extra space, please make a copy of this page and number each copy in the space provided. Question number Comment Copy Number 323 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional Comments for answering the questions according to their sections: 1. General aspects of the water service: a) The entity responsible for the provision of water services can be either public or private owned. The public entity may correspond to several kinds of government, such as local, regional, provincial, national or federal, including other bodies (e. g. river basin authorities). Please separate the responsibilities for the water supply and wastewater services if they are not carried out by the same entity. b) Discriminate the type of the management contract. Even if only a particular activity is subject to the intervention of the private sector, please refer it (e. g. BOT of wastewater treatment plant). c) Sometimes it is the same entity, other times there are different entities but no contract established and other times the rights and obligations of the service provider and owner of the assets are established. d) The regulatory functions can belong to a transversal agency, that is, an agency that encompasses several sectors with only a particular responsibility (e. g. customers’ protection or competition rules). In the case of self-regulation, please indicate if it corresponds to the service provider itself or to the association of the sector. e) Please write the names. When more than one entity exists or if they are different for water and wastewater please specify their names. 2. Scope of the regulatory activity a) Specify the government level if applicable. d) The ombudsman or similar entity assumes itself as independent from the Government. e) Please point out on which terms the regulator uses benchmarking to set tariffs and/or to supervise the quality of service. f) Please specify what are the public obligations established in the law, namely if universal service, continuity, quality of service, price affordability, users and customers’ protection are defined in the legislation. 3. General aspects of the regulatory agency a) Refer if the role, tasks and competences do not overlap those of other agencies. b) Please specify how long is the mandate of the board of directors (or director general) and how it is appointed (sector ministry, Cabinet, Parliament…). c) Identify the situations in which investigations can be developed. e) Please refer in which situations the fines or other sanctions can be applied. f) Please specify what kind of legislation (and its subject) the regulator can enact. g) Identify the forms of appeal of the regulated firms if they exist and if there are any kind of advisory board that give advice before the decisions are taken. Explain the participation of stakeholders in the regulatory process. 4. Organizational aspects of the regulatory agency d) Specify under which situations and on what topics the advisory committees can be heard and how binding are their recommendations. g) Point out how transparency is provided. 324 Anexo I - Questionário sobre regulação 5. Economic regulation a) Specify how the rate-of-return is calculated, if it adopts rate-of-return regulation and how factor X in price or revenue formulas is defined. d) Indicate how the quality of service is evaluated, if by performance indicators, satisfaction surveys, or other mechanisms. k) Describe the tariff system features. 6. Public services obligations and quality of service regulation c) Detail the procedure adopted. h) Point out the consequences of infringing the levels of service. 325 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional Glossary • Customers – Clients, end-users; • Responsible body for service provision – Entity with legal obligation to provide the service; • Regulatory agency – Regulatory commission, body, authority; • Service provider – Operator, water/wastewater company; • Water assets owner – Owner of the water services infrastructure; • Water services – Drinking water supply and wastewater collection and treatment services. In case of questions or suggestions please do not hesitate to contact the following CESUR team: Prof. Rui Cunha Marques Project Team Leader Centre for Urban and Regional Systems Technical University of Lisbon Phone: +351 218418319 Fax: +351 218409884 Mobile: +351 969076504 Email: [email protected] Eng. Pedro Simões Assistant Researcher Centre for Urban and Regional Systems Technical University of Lisbon Phone: +351 218418316 Fax: +351 218409884 Mobile: +351 963628321 Email: [email protected] CESUR, DECivil Instituto Superior Técnico Technical University of Lisbon Av. Rovisco Pais 1049-001 Lisbon Portugal We are aware that it is not possible to capture all the specificities and richness of detail through a standardised survey. Therefore prior to data treatment and processing, our team will contact you (phone interview/e-mail) in order to validate our understanding of your answers and add any additional commentary and clarification. Thank you very much for your collaboration! 326 Anexo II - Respostas ao questionário sobre regulação ANEXO II RESPOSTAS AO QUESTIONÁRIO SOBRE REGULAÇÃO 327 Anexo II - Respostas ao questionário sobre regulação ARMÉNIA Modelo de regulação Na Arménia, existe um regulador multissectorial (Public Service Regulatory Commission – PSRC) dedicado às questões de regulação económica, qualidade do serviço e obrigações de serviço público dos SAS, que também tem funções de regulação dos serviços de energia, gás e telecomunicações. A regulação económica desenvolvida pela PSRC baseia-se na regulação por taxa de remuneração para um período regulatório de um ano. A PSRC é uma autoridade independente no exercício das respectivas funções e possui vastos poderes de actuação, como a capacidade de aplicação de sanções e de produção de legislação. O regulador desempenha funções relevantes na supervisão da qualidade do serviço e actua segundo princípios de transparência e de participação dos vários stakeholders nas respectivas decisões. A PSRC utiliza o seu sítio da Web como ferramenta essencial de interacção com os stakeholders. Os principais documentos normativos e de ordenação do sector da água na Arménia são o Código da Água, a Política Nacional da Água e o Programa Nacional da Água. Estrutura do mercado Os SAS são fornecidos fundamentalmente por cinco empresas públicas de direito privado e de âmbito regional. Adicionalmente, existe um conjunto significativo de operadores públicos muito pequenos, de natureza local, e que actuam nas zonas rurais e pouco representativas em termos populacionais. Das cinco empresas, as duas principais, que servem quase 85% da população, têm contratos de gestão com o sector privado, designadamente com a Veolia. Os SAS encontram-se verticalmente integrados num só operador e compreendem apenas actividades relativas ao serviço de água e ao serviço de águas residuais. Estabelecimento de tarifas Qualidade do serviço O sistema tarifário adoptado pelo operador baseia-se numa parcela variável unitária, estabelecida em função do volume consumido estimado. Os valores das tarifas são muito reduzidos e insuficientes. O sistema de cobrança é deficiente e ineficaz. A penetração da micromedição é reduzida. O governo financia os utilizadores carenciados. Os operadores estabelecem tarifas distintas consoante a natureza do utilizador. As infra-estruturas de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais apresentam-se muito deterioradas, com grandes necessidades de investimento. A disponibilização do serviço ocorre num número reduzido de horas diárias e as perdas de água são elevadíssimas. O regulador tem encetado esforços no sentido da melhoria da qualidade através da promoção e da disponibilização de informação de desempenho. O Regulador O Sector Características • Regulador multissectorial • Entidade reguladora independente Diploma legal de criação Decreto do Presidente da República da Arménia de 1997 Número de colaboradores 94 funcionários Orçamento 5,4 milhões de euros (2006) Contactos Public Service Regulatory Comission 22 Saryan St, Yerevan, Armenia 375002 Tel/Fax: +374 1 522 522 / 525 563 http://www.psrc.am Entidades Relevantes Comité Estadual de Sistemas da Água Ministério da Protecção da Natureza • http://www.mnpiac.am Agência de Gestão de Recursos Hídricos • http://www.wrma.am/ Ministério do Ordenamento do Território • http://www.mta.gov.am/ País • Área – 29,8 mil km2 • População – 3,2 milhões de habitantes • Densidade populacional – 101 hab/km2 Atendimento dos serviços • Água – 90% • Drenagem de águas residuais – 70% • Tratamento de águas residuais – 0% Número de operadores • Água – 5 • Águas residuais – 5 Propriedade e gestão dos serviços Água Águas residuais Propriedade Públ. Priv. 100% 0% 100% 0% Gestão Públ. Priv. 15% 85% 15% 85% Volume de actividade • Água captada – 588 milhões m3 • Consumo humano – 88 milhões m3 • Consumo médio – 84 litros por habitante e por dia • Principal origem – 96% subterrânea • Perdas de água – 85% Dados económico-financeiros • Volume de negócios – 16,6 milhões de euros • Preço médio serviço de água – 0,36 €/m3 • Factura média anual por utilizador – • Emprego – 329 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional AUSTRÁLIA (AUSTRÁLIA OCIDENTAL) Modelo de regulação Na Austrália Ocidental, existe uma entidade reguladora multissectorial (Economic Regulation Authority – ERA) que tem funções de regulação dos SAS, da electricidade, do gás e das ferrovias. Em relação à regulação dos SAS, as respectivas atribuições são centradas na regulação da qualidade do serviço e no licenciamento dos operadores. A ERA tem também funções relevantes na defesa dos direitos dos utilizadores, bem como na salvaguarda da sustentabilidade e da viabilidade dos sistemas, elaborando recomendações ao governo. A ERA é independente no exercício da sua actividade. Embora tenha poderes sancionatórios, não tem poderes legislativos. O regulador, sendo um órgão colegial, rege-se por princípios de responsabilização, independência, integridade, profissionalismo, transparência, participação e excelência. A regulação da qualidade do serviço baseia-se, sobretudo, na comparação e publicitação dos resultados do desempenho das entidades reguladas. O estabelecimento de preços e tarifas é proposto pelos operadores em conformidade com a respectiva licença, sendo sempre sujeito à opinião dos utilizadores e de outros stakeholders, bem como à supervisão das entidades governamentais. A principal legislação do sector da água do Estado da Austrália Ocidental está relacionada com a Lei de Licenciamento dos Serviços de Água, de 1995, e com a Lei da Autoridade Reguladora Económica, de 2003. Estrutura do mercado Os SAS na Austrália Ocidental são sempre prestados por operadores públicos. A titularidade dos activos é sempre pública, ainda que a mesma possa pertencer ao governo estadual ou à administração local. Os serviços possuem um nível de integração horizontal elevado e, por norma, incluem todas as actividades do ciclo da água, quer no serviço de água (incluindo o fornecimento de água não potável), quer no serviço de águas residuais, englobando também a drenagem de águas pluviais. O principal operador dos SAS na Austrália diz respeito à Water Corporation, uma empresa pública estadual, que compreende quase 90% da população total. O segundo operador corresponde ao Aqwest, que abrange cerca de 2% da população. As restantes são de dimensão reduzida. Estabelecimento de tarifas Qualidade do serviço Os preços dos SAS são fixados pelo operador, com base na respectiva licença, através do contrato estabelecido. O sistema tarifário adoptado pelos operadores compreende uma parcela fixa, estabelecida em função das características da propriedade. Os valores das tarifas são bastante moderadas, tendo em conta a recuperação dos custos. A subsidiação pelo Estado é consideravelmente reduzida. Os operadores estabelecem tarifas distintas consoante o utilizador (doméstico, indústria, etc.). Os SAS pautam-se por uma qualidade do serviço de excelência. Além do elevado nível de atendimento e da continuidade que caracterizam os SAS, a qualidade de excelência é ainda garantida por cartas de compromissos e níveis de qualidade do serviço, estabelecidos por cada operador e pelo modelo de regulação sunshine estabelecida pela ERA. O Regulador O Sector Características • Regulador multissectorial • Entidade reguladora independente Diploma legal de criação Lei da Autoridade de Regulação Económica de 2003 Número de colaboradores 43 funcionários (4 sector da água) Orçamento 4,5 milhões de euros (2007) Contactos Economic Regulation Authority PO Box 8469, Perth Business Centre 6849 Western Australia, Austrália Tel/Fax: +61 8 9213 1900 / 9213 1999 http://www.era.wa.gov.au Entidades Relevantes Associação dos Consumidores • http://www.consumers.asn.au Ombudsman • http://www.ombudsman.wa.gov.au Departamento da Água • http://www.water.wa.gov.au Comissão Nacional da Água • http://www.nwc.gov.au 330 País • Área – 2.645 mil km2 • População – 2,1 milhões de habitantes • Densidade populacional – 0,83 hab/km2 Atendimento dos serviços • Água – 98% • Drenagem de águas residuais – 94% • Tratamento de águas residuais – 94% Número de operadores • Água – 4 • Águas residuais – 28 • Propriedade e gestão dos serviços Propriedade Gestão Públ. Priv. Públ. Priv. Água 100% 0% 100% 0% Águas residuais 100% 0% 100% 0% Volume de actividade • Água captada – 311 milhões m3 • Consumo humano – 280 milhões m3 • Consumo médio – 373 litros por habitante e por dia • Principal origem – 50% subterrânea • Perdas de água – 10% Dados económico-financeiros • Volume de negócios – 1.680 milhões de euros • Preço médio serviço de água – 1,25 €/m3 • Factura média anual por utilizador – 452 euros • Emprego – 2.406 funcionários (Water Corporation) Anexo II - Respostas ao questionário sobre regulação AUSTRÁLIA (VITÓRIA) Modelo de regulação Em Vitória, existe uma entidade reguladora multissectorial (Essential Services Commission – ESC) com responsabilidades sobre a regulação de serviços públicos no Estado, tais como, a electricidade, gás, portos, transporte ferroviário e rodoviário, seguros, energias renováveis e SAS. Porém, os contornos da regulação são muito distintos e dependem do sector regulado. A entidade reguladora foi criada com o propósito primário de proteger os interesses dos utilizadores do Estado de Vitória, no âmbito dos preços, da qualidade e da fiabilidade dos serviços públicos. Para alcançar este fim, a ESC tem de proporcionar um serviço eficiente, viável (economicamente), competitivo e consistente, promovendo a coesão económica e social no território abrangido. Até 1 de Janeiro de 2004, a ESC tinha nas respectivas atribuições, em relação ao sector da água, a regulação da qualidade do serviço e a garantia das obrigações do serviço público, mas apenas para as entidades metropolitanas. A actividade desenvolvida durante quase 10 anos assentou na regulação sunshine. A partir dessa data, as suas atribuições foram alargadas à regulação económica e a todas as entidades gestoras do Estado de Vitória. Segundo a regulamentação tarifária, a ESC estabelece os preços máximos (price cap regulation), para um período de 5 anos, de todos os serviços dos SAS. A Lei da Comissão de Serviços Essenciais, de 2001, e a Lei da Água, de 1989, constituem os principais documentos normativos. Estrutura do mercado A Melbourne Water, principal operador deste Estado, foi reestruturada em 1994, tendo sido dividida em quatro empresas (com propriedade e gestão públicas), uma com a responsabilidade do serviço de água em “alta” e das principais ETAR e as restantes três com atribuições nos SAS em “baixa”, designadamente a City West Water, a South East Water e a Yarra Valley Water. Actualmente, a Melbourne Water, para além destas três entidades metropolitanas, também fornece água em “alta” às entidades gestoras Western Water, Gippsland Water e Southern Rural Water. Além dos operadores metropolitanos, existem também operadores com natureza regional e rural, totalizando 13 operadores que prestam os SAS no Estado de Vitória e englobando cerca de 400 cidades. Ao contrário do operador metropolitano, que foi sujeito a unblundling, os operadores regionais encontram-se, geralmente, verticalmente integrados. Estabelecimento de tarifas Qualidade do serviço O sistema tarifário adoptado pelos operadores diverge entre uma única parcela fixa, repartida equitativamente pelos utilizadores domésticos, e um sistema fundado numa parcela fixa e numa parcela variável crescente/unitária, estabelecida em função do volume consumido. Os operadores, sobretudo urbanos, estabelecem tarifas distintas consoante o utilizador. Os SAS primam por uma qualidade do serviço de relevo. O elevado nível de atendimento e continuidade revelam a elevada qualidade dos SAS, que caracteriza o Estado. As cartas de compromisso e os níveis de qualidade do serviço, estabelecidos por cada operador e pelo modelo de regulação sunshine da ESC, garantem este serviço de excelência. O Regulador O Sector Características • Regulador multissectorial • Entidade reguladora independente Diploma legal de criação Lei da Comissão de Serviços Essenciais de 2001 Número de colaboradores 65 funcionários (13 sector da água) Orçamento 8,4 milhões de euros (2007) Contactos Essential Services Commission Level 2, 35 Spring Street, Melbourne Victoria 3000, Austrália Tel/Fax: +61 3 9651 0222 / 9651 3688 http://www.esc.vic.gov.au Entidades Relevantes Ombudsman • http://www.ombudsman.vic.gov.au Autoridade de Protecção Ambiental • http://www.epa.vic.gov.au Associação Australiana da Água • http://www.awa.asn.au Comissão Nacional da Água • http://www.nwc.gov.au País • Área – 237 mil km2 • População – 5,2 milhões de habitantes • Densidade populacional – 22,9 hab/km2 Atendimento dos serviços • Água – 94% • Drenagem de águas residuais – 86,7% • Tratamento de águas residuais – 86,7% Número de operadores • Água – 17 • Águas residuais – 17 Propriedade e gestão dos serviços Propriedade Gestão Públ. Priv. Públ. Água 100% 0% 100% Priv. 0% Águas residuais 100% 0% 100% 0% Volume de actividade • Água captada – 671 milhões m3 • Consumo humano – 607 milhões m3 • Consumo médio – 180 litros por habitante e por dia • Principal origem – 94% superficial • Perdas de água – 9,5% Dados económico-financeiros • Volume de negócios – 1.070 milhões de euros • Preço médio serviço de água – 1,24 €/m3 • Factura média anual por utilizador – 444 euros • Emprego – 1.700 funcionários 331 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional BARBADOS Modelo de regulação Nos Barbados, não existe uma entidade reguladora dedicada à regulação económica, à qualidade do serviço e às obrigações de serviço público dos SAS. Com efeito, a Autoridade da Concorrência (Fair Trading Commission – FTC), dependente do orçamento de Estado, denota um papel de muita relevância, possuindo atribuições importantes de regulação transversal do sector. Esta autoridade, intervindo em todos os domínios relacionados com a concorrência no sector da água, desempenha um papel preponderante na sua supervisão, em especial nos aspectos de natureza económica. A FTC define os princípios de estabelecimento de tarifas, onde se incluem os preços máximos a serem aplicados, monitoriza o cumprimento dessas tarifas, promove a eficiência dos operadores regulados, determina os níveis de qualidade do serviço e o respectivo cumprimento e, sobretudo, a protecção do interesse dos utilizadores e a garantia da provisão de um serviço de qualidade com preço “razoável”. No entanto, estas atribuições ainda só são aplicáveis no sector da electricidade e de telefone, encontrando-se em processo de desenvolvimento nos sectores da água e do gás. Até à data, o regulador não controla a qualidade do serviço da empresa estatal dos SAS. O serviço é, fundamentalmente, regulamentado pela Lei que constituiu o Operador, de 1980, e a Lei da FTC, de 2001. Estrutura do mercado A Barbados Water Authority constitui o único operador dos SAS no país. Esta entidade tem natureza pública. Mediante este enquadramento, os serviços são caracterizados pela integração vertical, tanto no serviço de água, como no serviço de águas residuais. Neste âmbito, o operador desempenha todos os serviços relativos ao abastecimento de água, desde a captação até à distribuição de água, e os serviços de recolha e tratamento de águas residuais, ao nível do serviço de águas residuais. Estabelecimento de tarifas Qualidade do serviço O sistema tarifário adoptado pelo operador diverge entre uma parcela variável unitária e uma parcela variável crescente, ambas estabelecidas em função do volume de água consumida. Os utilizadores domésticos que apresentem consumos superiores a 34 m3 são considerados utilizadores comerciais. Os utilizadores mais desfavorecidos são subsidiados pelo Estado. O governo também subsidia o operador. Os SAS pautam-se, na generalidade, por uma qualidade do serviço razoável, salientando-se a universalidade do serviço de água. Todavia, o país apresenta algumas debilidades ao nível da protecção dos recursos hídricos, da fiabilidade do serviço e do volume de água não facturada. O serviço de águas residuais apresenta um nível de qualidade bastante reduzido. O Regulador O Sector Características • Regulador multissectorial • Entidade reguladora independente Diploma legal de criação Lei da FTC de 2001 Número de colaboradores 30 funcionários (1 sector da água) Orçamento 1,4 milhões de euros (2007) Contactos Fair Trading Commission Good Hope, Green Hill, St. Michael, Barbados Tel/Fax: + 246 424 0260 / 424 0300 http://www.ftc.gov.bb Entidades Relevantes Ministério do Comércio e Indústria • http://www.commerce.gov.bb Ministério da Energia e do Serviço Público • http://www.barbados.gov.bb Associação de Água e Águas Residuais do Caribe • http://www.cwwa.net Caribbean Water Management Programme Inc. • http://www.cbwmp.org 332 País • Área – 431 km2 • População – 279 mil habitantes • Densidade populacional – 647 hab/km2 Atendimento dos serviços • Água – 99% • Drenagem de águas residuais – • Tratamento de águas residuais – Número de operadores • Água – 1 • Águas residuais – 1 Propriedade e gestão dos serviços Propriedade Gestão Públ. Priv. Públ. Água 100% 0% 100% Priv. 0% Águas residuais 100% 0% 100% 0% Volume de actividade • Água captada – 42,7 milhões m3 • Consumo humano – 21,4 milhões m3 • Consumo médio – 210 litros por habitante e por dia • Principal origem – 87% subterrânea • Perdas de água – 50% Dados económico-financeiros • Volume de negócios – 46 milhões de euros (projectado) • Preço médio serviço de água – 0,55 €/m3 • Factura média anual por utilizador – • Emprego – Anexo II - Respostas ao questionário sobre regulação BELIZE Modelo de regulação O Belize possui uma entidade reguladora multissectorial (Public Utilities Commission – PUC) com a responsabilidade de regular os SAS, a electricidade e as telecomunicações. O regulador apresenta independência orgânica e funcional. A comissão é responsável por assegurar serviços públicos com qualidade, fiabilidade e a preços razoáveis, aos utilizadores, garantindo, de igual modo, a sustentabilidade dos operadores. O regulador tem, fundamentalmente, o papel de salvaguardar o interesse público, garantindo os modos correctos, viáveis e claros de esclarecimento de dúvidas, reclamações e assistência técnica, em caso de solicitação. O papel multifacetado da PUC cria uma regulação dinâmica, mas bem sustentada. Para esse efeito, a PUC, como principal método regulatório da qualidade do serviço, adoptou um sistema de benchmarking, onde determina a produtividade total dos factores como modo de avaliar e incentivar o desenvolvimento da qualidade do serviço. Ao nível da regulação económica, a PUC adoptou o método de regulação por taxa de remuneração. A Lei da Comissão dos Serviços Públicos, de 2001, revela-se o principal marco regulatório do sector da água no Belize. Estrutura do mercado Após o governo ter privatizado a Water and Sewerage Authority of Belize, em 2000, os SAS são, hoje, maioritariamente geridos pelo sector privado, onde se destaca a Belize Water Services. O sector da água caracteriza-se por uma integração horizontal e vertical dos respectivos serviços numa só entidade gestora, fornecendo integralmente os serviços referentes a todo o ciclo da água, desde a captação à distribuição de água e da recolha e drenagem ao tratamento de águas residuais. Nas áreas onde o serviço de águas residuais é disponibilizado, a entidade gestora gere simultaneamente ambos os serviços. Estabelecimento de tarifas Qualidade do serviço O sistema tarifário adoptado pelo operador baseia-se numa parcela variável crescente, fundada no volume de água consumida. Os valores das tarifas são muito reduzidos e insuficientes. O governo financia os operadores. Existem tarifas especiais para os utilizadores mais desfavorecidos. As tarifas são estabelecidas de modo distinto, em função da área e do tipo de utilizador. Os SAS pautam-se, na generalidade, por uma qualidade do serviço razoável face aos condicionalismos que caracterizam o país. O atendimento do serviço revela-se a característica de maior notoriedade, não esquecendo as grandes necessidades de melhoramento ao nível do serviço de águas residuais. O Regulador O Sector Características • Regulador multissectorial • Entidade reguladora independente Diploma legal de criação Lei da Comissão dos Serviços Públicos de 2001 Número de colaboradores 20 funcionários (7 sector da água) Orçamento Contactos Public Utilities Commission 41 Gabourel Lane, P.O. Box 300, Belize City, Belize Tel/Fax: +501 223 4938 / 223 6818 http://www.puc.bz Entidades Relevantes Ministério do Ambiente e dos Recursos Naturais • http://www.mnrei.gov.bz Ministério das Obras Públicas • http://www.governmentofbelize.gov.bz Ministério dos Serviços Públicos • http://www.governmentofbelize.gov.bz Associação de Água e Águas Residuais do Caribe • http://www.cwwa.net País • Área – 23 mil km2 • População – 314,3 mil habitantes • Densidade populacional – 13 hab/km2 Atendimento dos serviços • Água – 90% • Drenagem de águas residuais – 40% • Tratamento de águas residuais – 40% Número de operadores • Água – 2 • Águas residuais – 1 Propriedade e gestão dos serviços Propriedade Públ. Priv. Gestão Públ. Priv. Água 17,3% 82,7% 0% 100% Águas residuais 17,3% 82,7% 0% 100% Volume de actividade • Água captada – 65 milhões m3 • Consumo humano – 25 milhões m3 • Consumo médio – 240 litros por habitante e por dia • Principal origem – 87% superficial • Perdas de água – 38% Dados económico-financeiros • Volume de negócios – 8,9 milhões de euros (água) • Preço médio serviço de água – 0,15 €/m3 • Factura média anual por utilizador – • Emprego – 550 funcionários 333 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional BRASIL (ALAGOAS) Modelo de regulação No Estado de Alagoas existe uma entidade reguladora (Agência Reguladora dos Serviços Públicos do Estado de Alagoas – ARSAL) que surge como parte do processo de descentralização do governo federal e do processo de modernização do governo estadual. O regulador tem na protecção dos direitos e interesses dos utilizadores a sua principal missão, fiscalizando as concessionárias e garantindo a qualidade dos serviços públicos, nomeadamente os sectores da energia eléctrica, gás natural, transportes intermunicipais e SAS. A ARSAL também tem a tarefa de zelar pelo equilíbrio económico-financeiro das concessionárias, servindo de mediador entre os utilizadores e os operadores de serviços públicos. A ARSAL tem o papel de promover e velar pela eficiência económica e técnica dos serviços públicos e proteger os interesses dos utilizadores contra abusos de poder da concessionária. Actualmente, a entidade reguladora ainda não regula (integralmente) a concessionária dos serviços de água, uma vez que as suas valências não passam por regular a qualidade do serviço. Ao nível da regulação económica, o regulador encontra-se a implementar o método de regulação por taxa de remuneração. Os principais documentos normativos e de ordenação do sector da água são a Lei n.º 11.445, de 2007, e o Programa de Modernização do Sector do Saneamento. Estrutura do mercado Os SAS são maioritariamente geridos por entidades privadas, destacando-se a CASAL como principal operador. A participação de operadores públicos é reduzida, fornecendo os SAS a cerca de 12% da população do Estado. Independentemente da tipologia da gestão dos serviços, os mesmos encontram-se verticalmente integrados, onde é possível observar que os operadores desempenham todos os serviços relativos à vertente produtiva, desde a captação até à distribuição de água. Ao nível do serviço de águas residuais, a situação relativa ao fornecimento dos serviços de recolha e de tratamento de águas residuais é similar. Estabelecimento de tarifas Qualidade do serviço O sistema tarifário habitualmente adoptado pelos operadores baseia-se numa parcela variável crescente, estabelecida em função do consumo de água. O serviço universal é garantido pela subsidiação cruzada. Existem tarifas sociais. As tarifas para os utilizadores domésticos, comerciais, industriais e públicos são estabelecidas de modo distinto. Os serviços de água regulados primam, na generalidade, por uma qualidade do serviço razoável. No entanto, a qualidade do mesmo decresce gradualmente, à medida que nos afastamos dos grandes centros urbanos. Os SAS evidenciam um número acentuado de interrupções do serviço e do volume de água não facturada significativo. Existe uma necessidade avultada de investimento, sobretudo nas águas residuais, para o aumento do nível de atendimento. O Regulador O Sector Características • Regulador multissectorial • Entidade reguladora independente Diploma legal de criação Lei Estadual n.º 6.267 de 2001 Número de colaboradores 112 funcionários (2 sector da água) Orçamento 1,5 milhões de euros (2006) Contactos Agência Reguladora dos Serviços Públicos Rua Cincinato Pinto, 226, 2.º Andar Edf. Ipaseal - Centro Maceió - AL. CEP: 57.020-050, Brasil Tel/Fax: +55 82 3315 2515 / 3315 2501 http://www.arsal.al.gov.br Entidades Relevantes Associação Brasileira de Agências de Regulação • http://www.abar.org.br Ministério do Ambiente • http://www.mma.gov.br Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento • http://www.snis.gov.br Associação Brasileira de Recursos Hídricos • http://www.abrh.org.br 334 País • Área – 27,8 mil km2 • População – 3 milhões de habitantes • Densidade populacional – 101,8 hab/km2 Atendimento dos serviços • Água – 86% (77 dos 102 municípios) • Drenagem de águas residuais – 13% • Tratamento de águas residuais – 0% Número de operadores • Água – 17 • Águas residuais – 17 Propriedade e gestão dos serviços Água Águas residuais Propriedade Públ. Priv. 100% 0% 100% 0% Gestão Públ. Priv. 12% 88% 12% 88% Volume de actividade • Água captada – 107,8 milhões m3 • Consumo humano – 51,7 milhões m3 • Consumo médio – 55 litros por habitante e por dia • Principal origem – • Perdas de água – 52% Dados económico-financeiros • Volume de negócios – 67,5 milhões de euros (2007) • Preço médio serviço de água – 0,73 €/m3 • Factura média anual por utilizador – • Emprego – 2.887 funcionários Anexo II - Respostas ao questionário sobre regulação BRASIL (BRASÍLIA) Modelo de regulação Em Brasília, existe uma entidade reguladora dedicada (Agência Reguladora de Águas e Saneamento do Distrito Federal – ADASA) que tem como finalidades básicas, regular, controlar e fiscalizar a qualidade e quantidade dos recursos hídricos de domínio distrital ou delegados pela União e pelos Estados, bem como os SAS do Distrito Federal. O Distrito Federal tem atribuições de Estado e de Município, e essa característica torna a ADASA, de modo único no Brasil, na entidade reguladora que actua simultaneamente na regulação dos recursos hídricos e dos SAS, acompanhando e regulando o ciclo completo da água, desde a sua captação até à distribuição ao utilizador. A ADASA é uma entidade reguladora dotada de independência orgânica e funcional. Procura garantir o uso sustentável dos recursos hídricos do Distrito Federal e a presença de um SAS de elevada qualidade. Neste âmbito, a ADASA intenta disseminar, por meio de acções efectivas, o conceito de água como um bem económico, sujeito a conflitos entre os seus utilizadores potenciais, considerando o seu relevante papel social, e que necessita de ser protegido e gerido com eficiência e eficácia. Como forma de promover a qualidade do serviço, o regulador desenvolveu um sistema de benchmarking, fundado num conjunto de indicadores de desempenho. Ao nível da regulação económica, a entidade reguladora adoptou o método da regulação por limite de receitas, para um período de 3 anos. Os principais documentos normativos e de ordenação do sector da água são a Lei n.º 11.445, de 2007, e o Programa de Modernização do Sector do Saneamento. Estrutura do mercado No Distrito Federal existe apenas a presença de um operador público, a CAESB. Por conseguinte, os serviços relativos à “baixa” e “alta” dos SAS encontram-se integrados, ou seja, o mesmo operador desempenha todos os serviços, desde a captação até à distribuição de água, ao nível do serviço de água e dos serviços de recolha e de tratamento de águas residuais, no âmbito do serviço de águas residuais. Estabelecimento de tarifas Qualidade do serviço O sistema tarifário adoptado pelo operador compreende uma parcela fixa, em função do calibre do contador, e uma parcela variável crescente, estabelecida em função do volume de água consumida. O serviço universal é garantido pela subsidiação cruzada e pelo estabelecimento de subsídios directos aos utilizadores, oriundos do Estado. O operador estabelece tarifas distintas consoante o utilizador: doméstico, comercial, indústria, público e de rega. Os SAS são caracterizados por uma qualidade do serviço elevada, da qual se salienta o nível do atendimento evidenciado. Todavia, apresenta alguns problemas relativos à continuidade. Para a qualidade do serviço apresentada, ressalva-se o papel importante desempenhado pelo sistema de benchmarking, desenvolvido pelo regulador através da aplicação de um conjunto de indicadores de desempenho. O Regulador O Sector Características • Regulador sectorial • Entidade reguladora independente Diploma legal de criação Lei n.º 3.565 de 2004 Número de colaboradores 70 funcionários Orçamento 2,65 milhões de euros (2006) Contactos Agência Reguladora de Águas e Saneamento SCN 04 Bloco “B” Sala 1302 Ed. Varig Brasília/DF - CEP: 70.710-5000, Brasil Tel/ Fax: + 55 61 3961 4956 / 3961 5050 http://www.adasa.df.gov.br Entidades Relevantes Associação Brasileira de Agências de Regulação • http://www.abar.org.br Ministério do Ambiente • http://www.mma.gov.br Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento • http://www.snis.gov.br Associação Brasileira de Recursos Hídricos • http://www.abrh.org.br País • Área – 5,8 mil km2 • População – 2,4 milhões de habitantes • Densidade populacional – 423,3 hab/km2 Atendimento dos serviços • Água – 98% • Drenagem de águas residuais – 91% • Tratamento de águas residuais – 91% Número de operadores • Água – 1 • Águas residuais – 1 Propriedade e gestão dos serviços Água Águas residuais Propriedade Públ. Priv. 100% 0% 100% 0% Gestão Públ. Priv. 100% 0% 100% 0% Volume de actividade • Água captada – 195 milhões m3 • Consumo humano – 136,5 milhões m3 • Consumo médio – 159 litros por habitante e por dia • Principal origem – Superficial • Perdas de água – 30% Dados económico-financeiros • Volume de negócios – 117 milhões de euros • Preço médio serviço de água – 0,34 €/m2 • Factura média anual por utilizador – • Emprego – 3.550 funcionários 335 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional BRASIL (CACHOEIRO DE ITAPEMIRIM) Modelo de regulação Em Cachoeiro de Itapemirim, existe uma entidade reguladora independente (Agência de Regulação dos Serviços de Saneamento – AGERSA) exclusivamente dedicada aos SAS e que é autónoma na execução das respectivas funções. O objectivo principal do regulador independente é garantir as principais metas da Política Municipal de Saneamento, designadamente a universalidade dos SAS com a fiabilidade adequada, a qualidade do serviço prestada e a razoabilidade de tarifas estabelecidas pelos operadores. Neste domínio, a entidade reguladora compreende os papéis de regulação, fiscalização e controlo da concessionária (único operador dos SAS). Todavia, a AGERSA encontra-se, actualmente, a desenvolver o seu modelo regulatório, onde se inclui um sistema de benchmarking, alusivo à melhoria da qualidade do serviço prestada pela concessionária. Ao nível da regulação económica, encontra-se em fase de implementação pela AGERSA do método de regulação por taxa de remuneração para um ano de período regulatório. Os principais documentos normativos e de ordenação do sector da água são a Lei n.º 11.445, de 2007, e o Programa de Modernização do Sector do Saneamento. Estrutura do mercado Tendo em conta a sua jurisdição, os SAS encontram-se unicamente geridos pelo sector privado, existindo apenas um operador, designadamente a Citágua. Os serviços encontram-se verticalmente integrados, quer na água, quer nas águas residuais, incluindo toda a fileira produtiva desde a captação à distribuição no serviço de água e da recolha ao tratamento de águas residuais, no segmento das águas residuais. Estabelecimento de tarifas Qualidade do serviço O sistema tarifário adoptado pelo operador baseia-se numa parcela variável crescente, estabelecida em função do consumo de água. Os utilizadores com escassos recursos financeiros são fornecidos mediante tarifas sociais. As tarifas para os utilizadores domésticos, comerciais, industriais e públicos apresentam valores distintos. Os SAS pautam-se, na generalidade, por uma qualidade do serviço elevada, em especial pelos níveis de atendimento apresentados. No entanto, evidenciam alguns problemas relativos às interrupções frequentes, no serviço de água, e aos extravasamentos, ao nível do serviço de águas residuais. O Regulador O Sector Características • Regulador sectorial • Entidade reguladora independente Diploma legal de criação Lei n.º 4.789 de 1999 Número de colaboradores 9 funcionários Orçamento 194 mil euros (2006) Contactos Agência de Regulação dos Serviços de Saneamento R. Prof. Quintiliano de Azevedo, 31 - Ed. Guandu Center - 6º andar - Guandu - Cachoeiro de Itapemirim - ES – CEP 29300-803, Brasil Tel/Fax: + 55 28 3511 7077 http://www.agersa.com.br Entidades Relevantes Associação Brasileira de Agências de Regulação • http://www.abar.org.br Ministério do Ambiente • http://www.mma.gov.br Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento • http://www.snis.gov.br Associação Brasileira de Recursos Hídricos • http://www.abrh.org.br 336 País • Área – 877 km2 • População – 195,3 mil habitantes • Densidade populacional – 222,7 hab/km2 Atendimento dos serviços • Água – 99,7% • Drenagem de águas residuais – 96,4% • Tratamento de águas residuais – 85% Número de operadores • Água – 1 • Águas residuais – 1 Propriedade e gestão dos serviços Propriedade Públ. Priv. Gestão Públ. Priv. Água 100% 0% 0% 100% Águas residuais 100% 0% 0% 100% Volume de actividade • Água captada – 14 milhões m3 • Consumo humano – 10,4 milhões m3 • Consumo médio – 142 litros por habitante e por dia • Principal origem – • Perdas de água – 25,5% Dados económico-financeiros • Volume de negócios – 14,43 milhões de euros • Preço médio serviço de água – 0,9 €/m3 • Factura média anual por utilizador – • Emprego – 275 funcionários Anexo II - Respostas ao questionário sobre regulação BRASIL (ESTADO DO CEARÁ) Modelo de regulação No Estado do Ceará, existe uma entidade reguladora multissectorial (Agência Reguladora de Serviços Públicos Delegados – ARCE) dotada de independência orgânica, financeira e funcional, com o principal objectivo de promover e zelar pela eficiência económica e técnica dos serviços públicos, nomeadamente do gás natural, dos transportes intermunicipais rodoviários, da energia eléctrica e dos SAS, propiciando aos seus utilizadores as condições de regularidade, continuidade e universalidade adequadas. A ARCE desempenha as respectivas funções regulando, normalizando e fiscalizando os serviços públicos prestados pela concessionária. A ARCE também actua na mediação dos possíveis conflitos existentes entre o operador dos serviços e os utilizadores, visando o equilíbrio entre as partes. Neste domínio, o regulador tem como missão dotar o sector de princípios como, por exemplo, a transparência, a mediação dos interesses dos utilizadores, do poder concedente e dos operadores de serviços públicos delegados, a fim de garantir a excelência dos serviços. A qualidade do serviço é avaliada através de um sistema de benchmarking, fundado num conjunto de indicadores de desempenho. Ao nível da regulação económica, a ARCE adoptou o método de regulação por taxa de remuneração, para um período de um ano. Os principais documentos normativos e de ordenação do sector da água são a Lei n.º 11.445, de 2007, e o Programa de Modernização do Sector do Saneamento. Estrutura do mercado Os SAS são unicamente geridos pelo sector público, onde se destaca a empresa estatal CAGECE, que presta o serviço de abastecimento de água a cerca de 4,7 milhões de habitantes do Estado. O sector da água caracteriza-se por uma verticalização dos respectivos serviços numa só entidade gestora, fornecendo integralmente os serviços referentes a todo o ciclo da água, desde a captação à distribuição de água e da recolha e drenagem ao tratamento de águas residuais. Apenas uma pequena percentagem da população está ligada ao serviço de águas residuais. Como tal, nas áreas onde este serviço é disponibilizado, a entidade gestora que fornece o serviço de água gere simultaneamente o serviço de águas residuais. Estabelecimento de tarifas Qualidade do serviço O sistema tarifário adoptado pelo operador baseia-se numa parcela variável, estabelecida por escalões (crescentes), em função do volume de água consumida. Existem tarifas especiais para os utilizadores carenciados. Os utilizadores domésticos, comerciais, industriais e públicos são cobrados de modo distinto. Os serviços de água, na sua globalidade, compreendem uma qualidade do serviço aceitável. Todavia, este panorama ocorre fundamentalmente nos grandes centros urbanos. De um modo geral, os SAS apresentam indicadores de desempenho razoáveis (por ex., a continuidade). O Regulador O Sector Características • Regulador multissectorial • Entidade reguladora independente Diploma legal de criação Lei n.º 12.786 de 1997 Número de colaboradores 40 funcionários (8 sector da água) Orçamento 2,6 milhões de euros (2006) Contactos Agência Reguladora de Serviços Públicos Delegados Av. Santos Dumont 1789 14o andar, Cep 60.150.160 Fortaleza-CE Brasil Tel/Fax: + 55 85 3101 1027 / 3101 1000 http://www.arce.ce.gov.br Entidades Relevantes Associação Brasileira de Agências de Regulação • http://www.abar.org.br Ministério do Ambiente • http://www.mma.gov.br Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento • http://www.snis.gov.br Associação Brasileira de Recursos Hídricos • http://www.abrh.org.br País • Área – 148,8 mil km2 • População – 8,2 milhões de habitantes • Densidade populacional – 54 hab/km2 Atendimento dos serviços • Água – 95,7% (149 dos 184 municípios) • Drenagem de águas residuais – 36,5% • Tratamento de águas residuais – 36,5% Número de operadores • Água – 22 • Águas residuais – 22 Propriedade e gestão dos serviços Propriedade Gestão Públ. Priv. Públ. Priv. Água 100% 0% 100% 0% Águas residuais 100% 0% 100% 0% Volume de actividade • Água captada – 370 milhões m3 (regulado) • Consumo humano – 244 milhões m3 • Consumo médio – 85 litros por habitante e por dia • Principal origem – Superficial • Perdas de água – 33,7% Dados económico-financeiros • Volume de negócios – 133,9 milhões de euros • Preço médio serviço de água – 0,50 €/m3 • Factura média anual por utilizador – • Emprego – 6.100 funcionários 337 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional BRASIL (GOIÁS) Modelo de regulação No Estado de Goiás, existe uma entidade reguladora multissectorial (Agência Goiana de Regulação – AGR) que controla e fiscaliza os serviços públicos delegados pelo Estado de Goiás e/ou os objectos de convénios entre a União e os municípios. Entre os objectivos da AGR destacam-se a salvaguarda dos serviços públicos (gás, energia eléctrica, transportes e SAS) adequados às necessidades dos utilizadores, a garantia dos direitos dos utilizadores, a qualidade dos serviços a preços razoáveis, a mediação de conflitos entre os operadores de serviços públicos e os utilizadores, a outorga de concessões, licenciamento e autorizações para execução de serviços públicos, através de autorização do Conselho Estadual de Desestatização e, por fim, o fomento da universalidade e da modernização dos serviços públicos. Além das atribuições citadas, a AGR detém a responsabilidade de conduzir o Fórum de Defesa do Utilizador de Serviços Públicos. Ao nível da regulação económica, a entidade reguladora adoptou o método de regulação por limite de preços para um período de 4 anos. Os principais documentos normativos e de ordenação do sector da água são a Lei n.º 11.445, de 2007, a Lei n.º 14.939, de 2004, e o Programa de Modernização do Sector do Saneamento. Até à data, a entidade reguladora não aplica qualquer metodologia de benchmarking como forma de avaliação da qualidade do serviço. Estrutura do mercado Os SAS são unicamente geridos por operadores públicos, onde se destaca a empresa estadual Saneago, que fornece os serviços de água a cerca de 4,5 milhões de habitantes no Estado. Salvo raras excepções, os SAS encontram-se horizontalmente integrados, isto é, existe uma única entidade gestora, para a mesma área de jurisdição, que fornece ambos os serviços. O mesmo ocorre ao nível da integração vertical dos referidos serviços, onde essa mesma entidade detém as valências de gestão do serviço de água em “alta” e em “baixa” e também no domínio do serviço de águas residuais, onde é a entidade responsável pela recolha e drenagem de águas residuais e, simultaneamente, pelo tratamento das águas residuais. No entanto, em alguns municípios, os SAS fornecem apenas a “baixa”. Estabelecimento de tarifas Qualidade do serviço O sistema tarifário adoptado pelo operador consiste numa parcela variável, implementada por escalões (crescentes), em função do volume de água consumida. O governo subsidia os operadores e directamente os utilizadores carenciados. As tarifas para os utilizadores domésticos, comerciais, industriais e públicos são estabelecidas de modo distinto. Os SAS pautam-se, na generalidade, por uma qualidade do serviço razoável. Contudo, os serviços, em especial relativos às águas residuais, carecem de grandes investimentos. A débil fiabilidade, associada às perdas de água avultadas, representam as principais preocupações no serviço de água. No serviço de águas residuais, a prioridade é o aumento do nível de atendimento. O Regulador Características • Regulador multissectorial • Entidade reguladora independente Diploma legal de criação Lei n.º 13.569 de 1999 Número de colaboradores 500 funcionários (7 sector da água) Orçamento 8,6 milhões de euros (2006) Contactos Agência Goiana de Regulação Av.Goiás n.º 305, Edifício Visconde de Mauá- Centro-CEP: 74005-010- Goiânia -Goiás, Brasil Tel/Fax: +55 62 226 6400 / 226 6523 http://www.agr.go.gov.br Entidades Relevantes Associação Brasileira de Agências de Regulação • http://www.abar.org.br Ministério do Ambiente • http://www.mma.gov.br Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento • http://www.snis.gov.br Associação Brasileira de Recursos Hídricos • http://www.abrh.org.br 338 O Sector País • Área – 340,1 mil km2 • População – 5,6 milhões de habitantes • Densidade populacional – 16,5 hab/km2 Atendimento dos serviços • Água – 80,8% • Drenagem de águas residuais – 33,6% • Tratamento de águas residuais – 27,3% Número de operadores • Água – 10 • Águas residuais – 6 Propriedade e gestão dos serviços Propriedade Gestão Públ. Priv. Públ. Priv. Água 100% 0% 100% 0% Águas residuais 100% 0% 100% 0% Volume de actividade • Água captada – 309,9 milhões m3 • Consumo humano – 189 milhões m3 • Consumo médio – 142 litros por habitante e por dia • Principal origem – Superficial • Perdas de água – 39% Dados económico-financeiros • Volume de negócios – 250 milhões de euros • Preço médio serviço de água – 0,9 €/m3 • Factura média anual por utilizador – • Emprego – 5.900 funcionários Anexo II - Respostas ao questionário sobre regulação BRASIL (JOINVILLE) Modelo de regulação No município de Joinville, existe uma entidade reguladora independente (Agência Reguladora de Joinville – AMAE) que é responsável pela regulação, controlo e fiscalização dos SAS prestados pela concessionária (Companhia Águas) de Joinville. A AMAE desenvolve a respectiva actividade focalizada na defesa do interesse público e na prestação dos SAS, actuando com imparcialidade, autonomia, transparência e independência. Dentro das suas valências, destaca-se a capacidade de criar normas para regulamentação da prestação dos serviços, aprovadas pelo Conselho Municipal dos SAS de Joinville, de fiscalizar a execução dos serviços e de monitorizar a qualidade dos SAS. Além disso, o regulador recebe e apura as reclamações dos utilizadores, julga, em última instância administrativa, os casos de conflitos entre os utilizadores e a concessionária, ouvindo o Conselho, exige a prestação adequada dos serviços, de acordo com as leis, normas e condições estabelecidas, e desenvolve acções de regulação relativas aos SAS, necessárias à defesa do interesse público, com base nos princípios de universalidade, continuidade e qualidade dos serviços. Como forma de incentivar a concessionária a desenvolver a qualidade do serviço, a AMAE estabelece um sistema de benchmarking, baseado num conjunto de indicadores de desempenho. Ao nível da regulação económica, a entidade reguladora adoptou o método da regulação por taxa de remuneração, para um período de 1 ano. Os principais documentos normativos e de ordenação do sector da água são a Lei n.º 11.445, de 2007, e o Programa de Modernização do Sector do Saneamento. Estrutura do mercado Com apenas um operador, os SAS são inteiramente geridos pelo sector privado, nomeadamente pela Companhia de Águas. Os SAS encontram-se verticalizados, isto é, os sistemas em “alta” e em “baixa”, quer para o serviço de água, quer para o serviço de águas residuais, são prestados pela mesma entidade. O operador desempenha os serviços desde a captação até à distribuição de água. Ao nível do serviço de águas residuais, este corresponde ao serviço de recolha e de tratamento de águas residuais. Estabelecimento de tarifas Qualidade do serviço O sistema tarifário adoptado pelo operador baseia-se na aplicação de uma parcela fixa e de uma parcela variável crescente, estabelecidas em função do volume de água consumida. Os utilizadores carenciados são subsidiados directamente pelo governo. As tarifas para os utilizadores domésticos são estabelecidas de modo distinto dos utilizadores comerciais, industriais e públicos. Os serviços de águas residuais carecem de avultados investimentos para aumentar o nível de atendimento, onde sobressai o serviço de águas residuais. O serviço de água apresenta uma qualidade aceitável. Os principais problemas são as interrupções de abastecimento e as perdas de água elevadas. O Regulador O Sector Características • Regulador sectorial • Entidade reguladora não independente Diploma legal de criação Lei n.º 4.341 de 2001 Número de colaboradores 16 funcionários Orçamento 429 mil euros (2006) Contactos Agência Reguladora de Joinville Rua Paraná, 420 Cep: 89202-160 – Joinville – SC, Brasil Tel/Fax: + 55 47 3433 1158 http://www.amae.sc.gov.br Entidades Relevantes Associação Brasileira de Agências de Regulação • http://www.abar.org.br Ministério do Ambiente • http://www.mma.gov.br Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento • http://www.snis.gov.br Associação Brasileira de Recursos Hídricos • http://www.abrh.org.br País • Área – 1,1 mil km2 • População – 487 mil habitantes • Densidade populacional – 430,6 hab/km2 Atendimento dos serviços • Água – 99% • Drenagem de águas residuais – 16% • Tratamento de águas residuais – 16% Número de operadores • Água – 1 • Águas residuais – 1 Propriedade e gestão dos serviços Propriedade Públ. Priv. Gestão Públ. Priv. Água 100% 0% 0% 100% Águas residuais 100% 0% 0% 100% Volume de actividade • Água captada – 57 milhões m3 • Consumo humano – 26 milhões m3 • Consumo médio – 146 litros por habitante e por dia • Principal origem – • Perdas de água – 54% Dados económico-financeiros • Volume de negócios – 35,2 milhões de euros • Preço médio serviço de água – 1,2 €/m3 • Factura média anual por utilizador – • Emprego – 850 funcionários 339 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional BRASIL (MANAUS) Modelo de regulação Em Manaus, existe uma entidade reguladora, a Agência Reguladora de Serviços Públicos Concedidos (ARSAM), que tem como base operacional as políticas e directrizes estabelecidas pelo Estado. Pode actuar também a nível municipal ou federal nos casos em que recebe a delegação, por meio de convénios, para cooperar tecnicamente com entidades ou órgãos que estejam relacionados com os serviços públicos essenciais. Neste âmbito, o regulador tem como objectivo principal garantir a qualidade dos serviços públicos concedidos, através da monitorização e fiscalização dos mesmos, avaliando e fazendo cumprir as metas e os padrões estabelecidos, na legislação e nos contratos celebrados. Como regulador multissectorial, a ARSAM tem responsabilidades, no âmbito das suas competências, nos sectores dos SAS, da energia eléctrica e do transporte rodoviário intermunicipal. A entidade reguladora adoptou o modelo de regulação por limite de preços (price cap), contudo o processo regulatório encontra-se em revisão, designadamente o cálculo do custo de capital. Os principais documentos normativos e de ordenação do sector da água são a Lei n.º 11.445, de 2007, e o Programa de Modernização do Sector do Saneamento. No que concerne à qualidade do serviço, a entidade reguladora, até à data, não aplica qualquer metodologia de benchmarking. Estrutura do mercado Com apenas um operador, os SAS são inteiramente geridos pelo sector privado, nomeadamente pela Águas do Amazonas. Mediante este enquadramento, os serviços são caracterizados pela integração vertical, tanto no serviço de água, como no serviço de águas residuais. Neste âmbito, o operador desempenha todos os serviços relativos à produção de água, desde a captação até à distribuição de água, e os serviços de recolha e tratamento de águas residuais, ao nível do serviço de águas residuais. Estabelecimento de tarifas Qualidade do serviço O sistema tarifário adoptado pelo operador compreende uma parcela variável, que se encontra estruturada em escalões crescentes, em função do consumo de água. Nos SAS não existem tarifas sociais. O serviço é garantido pela subsidiação cruzada. O operador estabelece as tarifas de modo desigual, consoante os utilizadores: domésticos, comerciais, industriais ou públicos. Os SAS são caracterizados por uma qualidade do serviço razoável, de onde sobressai o nível do atendimento no serviço de água. Todavia, os respectivos serviços apresentam alguns problemas, não só pelo número de interrupções no serviço de água, como pelos extravasamentos ao nível do serviço de águas residuais. As perdas de água são ainda muito elevadas. Os serviços de águas residuais requerem investimentos relevantes para aumentarem o nível de atendimento. O Regulador O Sector Características • Regulador multissectorial • Entidade reguladora não independente Diploma legal de criação Lei n.º 2.568 de 1999 Número de colaboradores 69 funcionários (11 sector da água) Orçamento 2 milhões de euros (2006) Contactos Agência Reguladora de Serviços Públicos Concedidos Rua Prof. Ernani Simão, 1314 – Cachoeirinha, CEP: 69020050, Manaus - AM, Brasil Tel/Fax: + 55 92 3234 8787 http://www.arsam.am.gov.br Entidades Relevantes Associação Brasileira de Agências de Regulação • http://www.abar.org.br Ministério do Ambiente • http://www.mma.gov.br Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento • http://www.snis.gov.br Associação Brasileira de Recursos Hídricos • http://www.abrh.org.br 340 País • Área – 11,4 mil km2 • População – 1,6 milhões de habitantes • Densidade populacional – 144 hab/km2 Atendimento dos serviços • Água – 80,2% • Drenagem de águas residuais – 8,4% • Tratamento de águas residuais – 6% Número de operadores • Água – 1 • Águas residuais – 1 Propriedade e gestão dos serviços Propriedade Gestão Públ. Priv. Públ. Priv. Água 100% 0% 0% 100% Águas residuais 100% 0% 0% 100% Volume de actividade • Água captada – 194 milhões m3 • Consumo humano – 66 milhões m3 • Consumo médio – 138 litros por habitante e por dia • Principal origem – 77,4% superficial • Perdas de água – 65,8% Dados económico-financeiros • Volume de negócios – 72,6 milhões de euros (2007) • Preço médio serviço de água – 0,9 €/m3 • Factura média anual por utilizador – • Emprego – 765 funcionários Anexo II - Respostas ao questionário sobre regulação BRASIL (MAUÁ) Modelo de regulação No município de Mauá, existe uma entidade reguladora, a Agência Reguladora dos Serviços de Água e Esgoto (ARSAE), dedicada aos SAS, com funções de entidade técnica e de coordenação do Sistema Municipal de Regulação do Serviço Público de Água (Autarquia SAMA) e Esgotamento Sanitário do Município de Mauá (Concessionária ECOSAMA). O regulador tem como objectivo principal fiscalizar a provisão dos serviços, promover a execução do Plano Director de Gestão do Serviço (PDGS) e dos relatórios anuais a ele vinculado, assegurar a prestação do serviço adequado, assim entendido como aquele que satisfaz as condições de regularidade, equidade, continuidade, eficiência e razoabilidade nas respectivas tarifas. Além disso, o regulador garante a harmonia entre os interesses dos utilizadores e prestadores do serviço público dos SAS do município de Mauá, fiscaliza os SAS, utilizando, inclusive, os poderes previstos em contrato de concessão ou em acordo-programa, zela pelo equilíbrio económico-financeiro do acordo-programa e contrato de concessão dos SAS do município de Mauá, exerce o poder normativo quanto à outorga, prestação de fruição dos SAS e possui a capacidade de aplicar sanções aos operadores, em caso de incumprimento das normas impostas pela regulação do serviço. Ao nível da regulação económica, a entidade reguladora adoptou o método de regulação por taxa de remuneração para um período de 1 ano. Os principais documentos normativos e de ordenação do sector da água são a Lei n.º 11.445, de 2007, e o Programa de Modernização do Sector do Saneamento. Até à data, a entidade reguladora não aplica qualquer metodologia de benchmarking, como forma de avaliação da qualidade do serviço. Estrutura do mercado De modo atípico e tendo em conta a generalidade dos serviços do país, os SAS são fornecidos, de modo desagregado, pelo sector público e pelo sector privado, em função do serviço de água e do serviço de águas residuais, respectivamente. Neste domínio, os serviços encontram-se verticalmente integrados, ou seja, o operador (autarquia local) desempenha todos os serviços relativos à vertente produtiva, desde a captação até à distribuição de água. Ao nível do serviço de águas residuais, constata-se a mesma situação, designadamente a integração dos serviços, no que se refere ao fornecimento dos serviços de recolha e de tratamento de águas residuais, sendo os mesmos fornecidos pela ECOSAMA. Estabelecimento de tarifas Qualidade do serviço O sistema tarifário adoptado pelo operador compreende uma parcela variável crescente, estabelecida em função do volume de água consumida. O governo subsidia directamente os utilizadores mais desfavorecidos. As tarifas são estabelecidas de modo distinto, consoante o utilizador: doméstico, comercial, industrial ou público. O serviço de água pauta-se, na generalidade, por uma qualidade do serviço elevada. Todavia, o serviço de águas residuais, em especial o serviço relativo ao nível do tratamento de águas residuais, carece de grandes investimentos. As perdas de água são ainda um problema que requer atenção. O Regulador O Sector Características • Regulador sectorial • Entidade reguladora independente Diploma legal de criação Lei Municipal n.º 3.263 de 2000 Número de colaboradores 2 sector da água Orçamento Contactos Agência Reguladora dos Serviços de Água e Esgoto Av. Queiroz Pedroso, 235 - Jardim Pedroso - Mauá - SP, Brasil Tel/Fax: +55 11 4513 5972 / 4513 5983 http://www.arsae.maua.sp.gov.br Entidades Relevantes Associação Brasileira de Agências de Regulação • http://www.abar.org.br Ministério do Ambiente • http://www.mma.gov.br Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento • http://www.snis.gov.br Associação Brasileira de Recursos Hídricos • http://www.abrh.org.br País • Área – 62,3 km2 • População – 402,6 mil habitantes • Densidade populacional – 6.463,7 hab/km2 Atendimento dos serviços • Água – 92% • Drenagem de águas residuais – 75% • Tratamento de águas residuais – 2% Número de operadores • Água – 1 • Águas residuais – 1 Propriedade e gestão dos serviços Propriedade Gestão Públ. Priv. Públ. Água 100% 0% 100% Priv. 0% Águas residuais 100% 0% 0% 100% Volume de actividade • Água captada – 32 milhões m3 • Consumo humano – 17 milhões de euros • Consumo médio – 127 litros por habitante e por dia • Principal origem – • Perdas de água – 47% Dados económico-financeiros • Volume de negócios – 20,2 milhões de euros • Preço médio serviço de água – 0,78 €/m3 • Factura média anual por utilizador – • Emprego – 666 funcionários 341 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional BRASIL (NATAL) Modelo de regulação No município de Natal, existe uma entidade reguladora, a Agência Reguladora dos Serviços de Saneamento Básico do Natal (ARSBAN), que tem como objectivo regular a prestação dos SAS. Esta entidade reguladora está vinculada à Secretaria Municipal de Planeamento e Gestão Estratégica e é dotada de independência financeira. A ARSBAN exerce as respectivas atribuições em conformidade com as políticas e as directrizes estabelecidas pelo Conselho Municipal de Saneamento Básico. Nesta vertente, o regulador tem como objectivo principal fiscalizar a provisão dos serviços, assegurar a prestação do serviço adequado, assim entendido como aquele que satisfaz as condições de regularidade, equidade, continuidade, eficiência e razoabilidade nas respectivas tarifas, garantir a harmonia entre os interesses dos utilizadores e prestadores do serviço público dos SAS do município de Natal, fiscalizar os SAS e zelar pelo equilíbrio económico-financeiro da entidade gestora. Ao nível da regulação económica, a entidade reguladora adoptou o método de regulação por taxa de remuneração. Os principais documentos normativos e de ordenação do sector da água são a Lei n.º 11.445, de 2007, e o Programa de Modernização do Sector do Saneamento. A ARSBAN encontra-se a desenvolver um estudo de benchmarking, no qual prevê a utilização de técnicas determinísticas de análise multivariada de dados, associada aos indicadores de desempenho. Estrutura do mercado Com apenas um operador, os SAS são inteiramente geridos pelo sector público, nomeadamente pela empresa estadual CAERN. Os SAS encontram-se verticalizados, isto é, os sistemas em “alta” e em “baixa”, quer para o serviço de água, quer para o serviço de águas residuais, são prestados pela mesma entidade. O operador desempenha os serviços desde a captação até à distribuição de água, no abastecimento de água. Ao nível do serviço de águas residuais, estes dizem respeito aos serviços de recolha e de tratamento de águas residuais. Estabelecimento de tarifas Qualidade do serviço O sistema tarifário adoptado pelo operador compreende uma parcela variável crescente, estabelecida em função do consumo de água. Verifica-se a subsidiação cruzada entre os utilizadores. Existem tarifas sociais para os utilizadores com escassos recursos financeiros. Os consumos domésticos (social, temporário, normal) são tarifados de igual modo, com excepção da tarifa mínima. Além disso, existem tarifas distintas para utilizadores comerciais e utilizadores industriais e públicos. Os serviços de água regulados primam, na generalidade, por uma qualidade do serviço aceitável. No entanto, a qualidade dos mesmos nas áreas rurais decresce abruptamente, quando comparada com os centros urbanos. Os SAS evidenciam um número acentuado de interrupções de serviço e do volume de água não facturada. Existe uma necessidade avultada de investimentos, sobretudo, nas águas residuais. O Regulador O Sector Características • Regulador sectorial • Entidade reguladora independente Diploma legal de criação Lei n.º 5.346 de 2001 Número de colaboradores Orçamento Contactos Agência Reguladora dos Serviços de Água e Esgoto Rua Doutor Poty Nóbrega, n.º 344, Lagoa Nova - CEP 59056180 - Natal/ RN, Brasil Tel/Fax: +55 84 3232 9316 / 3232 9311 http://www.natal.rn.gov.br/arsban Entidades Relevantes Associação Brasileira de Agências de Regulação • http://www.abar.org.br Ministério do Ambiente • http://www.mma.gov.br Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento • http://www.snis.gov.br Associação Brasileira de Recursos Hídricos • http://www.abrh.org.br 342 País • Área – 170,3 km2 • População – 774,2 mil habitantes • Densidade populacional – 4.546,3 hab/km2 Atendimento dos serviços • Água – 99% • Drenagem de águas residuais – 32,8% • Tratamento de águas residuais – 15,6% Número de operadores • Água – 1 • Águas residuais – 1 Propriedade e gestão dos serviços Propriedade Gestão Públ. Priv. Públ. Priv. Água 100% 0% 100% 0% Águas residuais 100% 0% 100% 0% Volume de actividade • Água captada – 81 milhões m3 • Consumo humano – 41,7 milhões m3 • Consumo médio – 147 litros por habitante e por dia • Principal origem – • Perdas de água – 49% Dados económico-financeiros • Volume de negócios – 48,5 milhões de euros • Preço médio serviço de água – 0,50 €/m3 • Factura média anual por utilizador – • Emprego – 974 funcionários Anexo II - Respostas ao questionário sobre regulação BRASIL (PARAÍBA) Modelo de regulação No Estado da Paraíba, existe uma entidade reguladora independente, a Agência de Regulação do Estado da Paraíba (ARPB), que tem por finalidade regular, controlar e fiscalizar os serviços públicos de energia eléctrica, distribuição de gás canalizado, SAS e outros serviços públicos, de competência do Estado da Paraíba, cuja regulação, controlo e fiscalização lhe sejam atribuídos pelo Poder Executivo ou delegados à ARPB. A ARPB tem a responsabilidade de zelar pelo cumprimento da legislação e dos contratos de concessão dos serviços públicos, que lhe cabe fiscalizar. Com esse objectivo, o regulador, ao fiscalizar os serviços, ao dirimir ou prevenir conflitos, ao orientar os concessionários e os utilizadores, encontra-se a desenvolver o seu objectivo primordial, que é a procura do equilíbrio desejável entre o poder concedente, o concessionário e os utilizadores. Fundado num sistema de benchmarking (indicadores de desempenho) que contempla a qualidade do serviço, o regulador tem a capacidade de impor coimas ao operador em virtude dos seus préstimos, com uma qualidade precária constante. Ao nível da regulação económica, o regulador adoptou o método regulação por taxa de remuneração. Os principais documentos normativos e de ordenação do sector da água são a Lei n.º 11.445, de 2007, e o Programa de Modernização do Sector do Saneamento. Estrutura do mercado Os SAS são fornecidos por operadores pertencentes ao sector público, onde se destaca a CAGEPA, que fornece 2,8 milhões de habitantes. Os SAS são caracterizados, na generalidade, pela respectiva integração, quer horizontal, quer vertical. Neste âmbito, o fornecimento dos referidos serviços é, geralmente, prestado pela mesma entidade gestora, tanto na circunstância de empresa estadual, como das autoridades locais. Estabelecimento de tarifas Qualidade do serviço O sistema tarifário adoptado pelos operadores baseia-se numa parcela variável crescente, estabelecida em função do volume de água consumida. O governo subsidia directamente alguns utilizadores. Existem tarifas sociais para utilizadores mais desfavorecidos. A subsidiação cruzada é também uma prática muito corrente. As tarifas, incluindo as tarifas mínimas, são estabelecidas de modo distinto entre os utilizadores domésticos, comerciais, industriais e públicos. Os SAS são caracterizados por uma qualidade do serviço razoável, onde sobressai o nível do atendimento no serviço de água. Todavia, os respectivos serviços apresentam alguns problemas, não só evidenciados pelo elevado número de interrupções do serviço de água, mas também pelos extravasamentos ao nível do serviço de águas residuais. As perdas de água são um problema que carece de maior atenção. O Regulador O Sector Características • Regulador multissectorial • Entidade reguladora independente Diploma legal de criação Lei n.º 7.032 de 2001 Número de colaboradores 41 funcionários (3 sector da água) Orçamento 819 mil euros (2006) Contactos Agência de Regulação do Estado da Paraíba Av. Min. José Américo de Almeida, s/n Ed. DER – 1º andar, Cep: 58040-300 - João Pessoa – PB, Brasil Tel/Fax: + 55 83 3218 6681 / 3218 6644 http://www.arpb.pb.gov.br Entidades Relevantes Associação Brasileira de Agências de Regulação • http://www.abar.org.br Ministério do Ambiente • http://www.mma.gov.br Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento • http://www.snis.gov.br Associação Brasileira de Recursos Hídricos • http://www.abrh.org.br País • Área – 56,4 mil km2 • População – 3,7 milhões de habitantes • Densidade populacional – 63,7 hab/km2 Atendimento dos serviços • Água – 90,9% • Drenagem de águas residuais – 29% • Tratamento de águas residuais – 26% Número de operadores • Água – 6 • Águas residuais – 6 Propriedade e gestão dos serviços Propriedade Públ. Priv. Gestão Públ. Priv. Água 100% 0% 100% 0% Águas residuais 100% 0% 100% 0% Volume de actividade • Água captada – 192 milhões m3 • Consumo humano – 182,4 milhões m3 • Consumo médio – 196 litros por habitante e por dia • Principal origem – Superficial • Perdas de água – 42,6% Dados económico-financeiros • Volume de negócios – 133,1 milhões de euros • Preço médio serviço de água – 0,56 €/m3 • Factura média anual por utilizador – • Emprego – 2.850 funcionários 343 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional BRASIL (PERNAMBUCO) Modelo de regulação No Estado de Pernambuco, existe uma entidade reguladora (Agência de Regulação dos Serviços Públicos Delegados – ARPE) que possui a função de regular todos os serviços públicos delegados pelo Estado de Pernambuco, inter alia, os serviços de gás, de transportes públicos, da energia e dos SAS. A entidade reguladora foi criada com o intuito de estabelecer o equilíbrio nas relações entre utilizadores, governo e concessionárias de serviços públicos. A intervenção regulatória da ARPE, no sector da água, abrange as áreas económico-financeiras, de gestão de reclamações e técnico-operacionais. No que se refere aos aspectos técnico-operacionais, a ARPE actua na fiscalização dos SAS, no controlo da eficiência do tratamento das águas residuais, e ainda na monitorização dos indicadores de micromedição e de perdas de água. Em cada fiscalização, o regulador desenvolve um relatório consubstanciado, que é posteriormente enviado à COMPESA, com o devido questionário, para que as acções correctivas necessárias sejam implementadas. Além da avaliação da qualidade do serviço, através de um sistema de benchmarking baseado em indicadores de desempenho, o regulador tem no controlo da qualidade da água outra importante função. Ao nível da regulação económica, a entidade reguladora adoptou o método de regulação por taxa de remuneração, para um período de 1 ano. Os principais documentos normativos e de ordenação do sector da água são a Lei n.º 11.445, de 2007, e o Programa de Modernização do Sector do Saneamento. Estrutura do mercado Os SAS são, maioritariamente, geridos por operadores privados, nomeadamente pela COMPESA, fornecendo mais de 8 milhões de habitantes, e também por operadores públicos, representando cerca de 5% da população do Estado. Independentemente da tipologia da gestão dos serviços, os mesmos encontram-se verticalmente integrados, onde é possível observar que os operadores desempenham todos os serviços relativos à vertente produtiva, desde a captação até à distribuição de água. Ao nível do serviço de águas residuais, a situação é similar relativamente ao fornecimento dos serviços de recolha e de tratamento de águas residuais. Estabelecimento de tarifas Qualidade do serviço O sistema tarifário habitualmente adoptado pelos operadores, caracteriza-se por uma parcela fixa e uma parcela variável crescente, em função do volume de água consumida. O operador também estabelece tarifas sociais para utilizadores com escassos recursos financeiros. Os utilizadores domésticos, comerciais, industriais e públicos são cobrados mediante tarifas distintas, incluindo as tarifas mínimas. Os serviços de água regulados primam, na generalidade, por uma qualidade do serviço razoável. No entanto, a qualidade dos mesmos decresce gradualmente à medida que nos afastamos dos grandes centros urbanos. Os SAS evidenciam um número acentuado de interrupções de serviço. Existe uma necessidade avultada de investimentos, sobretudo, nos serviços de águas residuais. As perdas de água elevadas contribuem para a ineficiência do serviço de água. O Regulador O Sector Características • Regulador multissectorial • Entidade reguladora independente Diploma legal de criação Lei n.º 11.742 de 2000 Número de colaboradores 87 funcionários (12 sector da água) Orçamento 2,1 milhões de euros (2006) Contactos Agência de Regulação dos Serviços Públicos Delegados do Estado de Pernambuco (ARPE) Av. Conselheiro Rosa e Silva, 975 – Aflitos – CEP 52.050-020 – Recife - PE, Brasil Tel/Fax: +55 81 3382 9700 / 3303 4725 http://www.arpe.pe.gov.br Entidades Relevantes Associação Brasileira de Agências de Regulação • http://www.abar.org.br Ministério do Ambiente • http://www.mma.gov.br Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento • http://www.snis.gov.br Associação Brasileira de Recursos Hídricos • http://www.abrh.org.br 344 País • Área – 98,9 mil km2 • População – 7,9 milhões de habitantes • Densidade populacional – 80,37 hab/km2 Atendimento dos serviços • Água – 94% (173 dos 184 municípios) • Drenagem de águas residuais – 30% • Tratamento de águas residuais – 17% Número de operadores • Água – 1 • Águas residuais – 1 Propriedade e gestão dos serviços Propriedade Gestão Públ. Priv. Públ. Priv. Água 100% 0% 5% 95% Águas residuais 100% 0% 5% 95% Volume de actividade • Água captada – 531,1 milhões m3 • Consumo humano – 212,4 milhões m3 • Consumo médio – 80 litros por habitante e por dia • Principal origem – Superficial • Perdas de água – 60% Dados económico-financeiros • Volume de negócios – 220,3 milhões de euros • Preço médio serviço de água – 0,8 €/m3 • Factura média anual por utilizador – • Emprego – 5.500 funcionários Anexo II - Respostas ao questionário sobre regulação BRASIL (RIO DE JANEIRO) Modelo de regulação No Rio de Janeiro, existe uma entidade reguladora independente (Agência Reguladora de Energia e Saneamento Básico – AGENERSA) que tem a função de monitorizar, controlar e fiscalizar os actuais contratos de concessão dos serviços públicos de gás e de SAS, na Região dos Lagos. Neste domínio, o regulador tem como objectivo estimular o desenvolvimento, a universalização e a modernização dos serviços, fiscalizar o cumprimento das normas, prazos, deveres e direitos estabelecidos nos contratos, zelar pelo equilíbrio económicofinanceiro dos contratos de concessão, corrigir falhas ou problemas na prestação dos serviços, mediar divergências entre utilizadores e concessionárias, defender os direitos dos utilizadores face aos interesses das concessionárias e preservar a razoabilidade das tarifas. Os processos regulatórios são analisados e julgados pelo Conselho Director, em sessões regulatórias públicas, com a presença de representantes do poder concedente, da concessionária, da população e da sociedade civil organizada. O Conselho pode recomendar ou determinar mudanças nos procedimentos, advertir e, até mesmo, autuar as concessionárias. Ao nível da regulação económica, o regulador adoptou o método de regulação por taxa de remuneração. Os principais documentos normativos e de ordenação do sector da água são a Lei n.º 11.445, de 2007, e o Programa de Modernização do Sector do Saneamento. Além das valências referidas, a entidade reguladora aplica um sistema de benchmarking, constituído por um conjunto de indicadores de desempenho, como forma de avaliação da qualidade do serviço. Estrutura do mercado Os SAS são geridos maioritariamente pelo sector público, destacando-se a empresa estadual CEDAE, que fornece os serviços a cerca de 13 milhões de habitantes. A participação do sector privado verifica-se somente em oito municípios, através da Águas de Juturnaíba (1% da população estadual) e Prolagos (2% da população estadual). Os SAS encontram-se integrados. Como tal, o operador desempenha todos os serviços relativos ao ciclo de água, ou seja, desde a captação até à distribuição de água, e os serviços de recolha e de tratamento de águas residuais. Estabelecimento de tarifas Qualidade do serviço O sistema tarifário habitualmente adoptado pelos operadores, compreende uma parcela variável crescente, estabelecida em função do volume de água consumida. Não existem tarifas sociais. A subsidiação cruzada verifica-se entre os utilizadores. As tarifas, incluindo as tarifas mínimas, são estabelecidas de modo distinto entre os utilizadores domésticos, comerciais, industriais e públicos. De um modo geral, os serviços de águas pautam-se por uma qualidade do serviço elevada. A universalidade, a continuidade e o índice moderado de perdas de água representam as principais características que sustentam a qualidade aceitável do serviço prestado aos utilizadores. No entanto, as áreas rurais continuam a necessitar de especial atenção, carenciando de avultados investimentos. O Regulador Características • Regulador multissectorial • Entidade reguladora independente Diploma legal de criação Lei n.º 2.686 de 1997 Número de colaboradores 60 funcionários (4 sector da água) Orçamento 3,9 milhões de euros (2006) Contactos Agência Reguladora de Energia e Saneamento Básico Rua 13 de Maio, 23 - 23º Andar - Centro CEP: 20.031-902 - Rio de Janeiro - RJ, Brasil Tel/Fax: +55 21 2299 4895 / 2299 4899 http://www.agenersa.rj.gov.br Entidades Relevantes Associação Brasileira de Agências de Regulação • http://www.abar.org.br Ministério do Ambiente • http://www.mma.gov.br Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento • http://www.snis.gov.br Associação Brasileira de Recursos Hídricos • http://www.abrh.org.br O Sector País • Área – 43,7 mil km2 • População – 15,4 milhões de habitantes • Densidade populacional – 352,6 hab/km2 Atendimento dos serviços • Água – 85% (8 municípios do estado) • Drenagem de águas residuais – 70% • Tratamento de águas residuais – 70% Número de operadores • Água – 17 • Águas residuais – 17 Propriedade e gestão dos serviços Propriedade Gestão Públ. Priv. Públ. Priv. Água 100% 0% 97% 3% Águas residuais 100% 0% 97% 3% Volume de actividade • Água captada – 48 milhões m3 • Consumo humano – 33,6 milhões m3 • Consumo médio – 216 litros por habitante e por dia • Principal origem – Superficial • Perdas de água – 30% Dados económico-financeiros • Volume de negócios – 36,3 milhões de euros • Preço médio serviço de água – 0,65 €/m3 • Factura média anual por utilizador – • Emprego – 14 260 funcionários 345 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional BRASIL (RIO GRANDE DO SUL) Modelo de regulação No Estado do Rio Grande do Sul, existe uma entidade reguladora (Agência Reguladora de Serviços Públicos Delegados – AGERGS) dotada de independência orgânica e com responsabilidades multissectoriais, incluindo os SAS, o transporte rodoviário e marítimo de passageiros, as rodovias, a irrigação e a energia eléctrica. O objectivo do regulador é garantir a qualidade dos serviços públicos oferecidos aos utilizadores pelos concessionários do sector privado e o equilíbrio económico e financeiro dos contratos entre o poder concedente (governo) e as empresas concessionárias. Detém como missões assegurar a prestação de serviços adequados, designadamente aqueles que satisfazem as condições de regularidade, continuidade, eficiência, segurança, equidade e razoabilidade nas respectivas tarifas, garantir a harmonia entre os interesses dos utilizadores e concessionários de serviços públicos e zelar pelo equilíbrio económico-financeiro dos serviços públicos delegados. Com base na Lei n.º 11.445, de 2007, e na Lei n.º 11.107, de 2005, o regulador encontra-se a estabelecer os acordos (convénios) com os municípios, tendo em vista a regulação do sector da água. Actualmente, o regulador encontra-se a implementar, apesar do restrito número de municípios associados, o processo regulatório do sector da água. Neste âmbito, ao nível da regulação económica, os preços dos SAS são regulados segundo o método de regulação por taxa de remuneração, para um período de um ano. O Programa de Modernização do Sector do Saneamento é também um importante documento normativo do sector da água. A AGERGS desenvolve um sistema de benchmarking, com base na técnica não paramétrica (data envelopment analysis – DEA), com o intuito de incentivar a qualidade do serviço. Estrutura do mercado Os SAS são geridos por entidades públicas, onde se destaca a empresa estadual CORSAN, que serve cerca de 70% da população do Estado. As populações servidas, em geral nas sedes dos municípios, oscilam entre aproximadamente 500 000 habitantes e um pouco mais de 2.500. Os serviços encontram-se verticalmente integrados, quer na água, quer nas águas residuais, incluindo toda a fileira produtiva, desde a captação até à distribuição de água e da recolha ao tratamento de águas residuais. Existem, no entanto, algumas situações particulares em que tal não acontece. Estabelecimento de tarifas Qualidade do serviço O sistema tarifário habitualmente adoptado pelos operadores no Estado do Rio Grande do Sul, baseia-se uma parcela variável crescente, estabelecida em função do volume de água consumido e/ ou das características do imóvel. Existem tarifas sociais para os utilizadores mais desfavorecidos (até um volume de 10 m³ consumidos). A subsidiação cruzada é uma constante entre os utilizadores. Os operadores dos SAS estabelecem as tarifas de modo distinto (incluindo as tarifas mínimas), consoante os utilizadores: domésticos, comerciais, industriais ou públicos. Os serviços de água pautam-se, na generalidade, por uma qualidade do serviço razoável. Todavia, o mesmo não sucede com o serviço de águas residuais, onde são necessários mais investimentos para melhorar o nível de atendimento. Os SAS, sobretudo nas áreas rurais, evidenciam um número acentuado de interrupções de serviço e de água não facturada. A qualidade do serviço é monitorizada por um conjunto de indicadores de desempenho que contempla diversos domínios, tais como a universalidade, a continuidade, a qualidade do serviço e da água, a qualidade comercial, o domínio económico-financeiro e a produtividade. O Regulador Características • Regulador multissectorial • Entidade reguladora independente Diploma legal de criação Lei n.º 10.930 de 1997 Número de colaboradores 85 funcionários Orçamento 2,13 milhões de euros Contactos Agência Estadual de Regulação dos Serviços Públicos Delegados do Rio Grande do Sul Directoria de Qualidade dos Serviços–Gerência de Saneamento Av. Borges de Medeiros, 659 – 13º andar 90020-023 – PORTO ALEGRE – RS – Brasil Tel: +51 3288 8880 – Fax: + 512 3288 8881 Entidades Relevantes Associação Brasileira de Agências de Regulação • http://www.abar.org.br Ministério do Ambiente • http://4ww.mma.gov.br Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento • http://www.snis.gov.br Associação Brasileira de Recursos Hídricos • http://www.abrh.org.br 346 O Sector Estado do Rio Grande do Sul • Área – 281.748 km² • População – 10,6 milhões de habitantes • Densidade populacional – 37,4 hab/km2 Atendimento dos serviços • Água – 78% • Drenagem de águas residuais – 23% • Tratamento de águas residuais – 9,5% Número de operadores • Água – 8 (327 municípios) • Águas residuais – 8 (327 municípios) Propriedade e gestão dos serviços Propriedade Água Águas residuais Gestão Públ. Priv. Públ. Priv. 100% 100% 0% 0% 100% 100% 0% 0% Volume de actividade • Água captada – 811,6 milhões m3 • Consumo humano – 538,3 milhões m3/mes • Consumo médio – 170 litros por habitante e por dia • Principal origem – • Perdas de água – 33,7% Dados económico-financeiros • Volume de negócios – 826,7 milhões de euros • Preço médio serviço de água – 1,18 €/m3 • Factura média anual por utilizador – • Emprego – 10.150 funcionários Anexo II - Respostas ao questionário sobre regulação CABO VERDE Modelo de regulação Em Cabo Verde, existe uma entidade reguladora (Agência de Regulação Económica – ARE) com autonomia administrativa, financeira e patrimonial, e que é dotada de funções regulatórias, onde se incluem as atribuições ao nível de regulamentação, supervisão e sancionamento das infracções. A ARE tem como missão promover a eficiência económica e o equilíbrio financeiro dos sectores regulados (energia, SAS, telecomunicações e transportes), de forma a assegurar a oferta de serviços de interesse público. Além disso, a ARE procura garantir as obrigações de serviço público, proteger os direitos e interesses dos utilizadores, assegurar a objectividade das regras de regulação e a transparência das relações comerciais entre operadores e utilizadores, velar pela aplicação e fiscalização do cumprimento das leis e regulamentos aplicáveis aos sectores regulados, bem como pelo respectivo cumprimento por parte dos operadores. É ainda responsável por coordenar com a entidade competente a aplicação da lei da concorrência nos sectores regulados, contribuir para a progressiva melhoria das condições económicas nos sectores regulados e promover a informação e o esclarecimento dos utilizadores, em coordenação com as entidades competentes. Ao nível da regulação económica, o regulador adoptou o método de regulação por limite de preços, para um período de 5 anos. O Código de Águas e o Decreto-Lei, de 2004, são os principais marcos legais do sector da água. Estrutura do mercado No serviço de água existe uma repartição relativamente equitativa entre a percentagem de participação como player do sector privado e do sector público. Na vertente das águas residuais, e em relação ao tratamento, este serviço é disponibilizado pelo sector privado (ELECTRA), possuindo uma ETAR na Praia, e pelo sector público (directamente pelo município), em Mindelo. De qualquer forma, onde o mesmo existe é verticalmente integrado, incluindo todas as etapas da fileira produtiva, sendo, todavia, horizontalmente separado (várias empresas municipais). A excepção ocorre na cidade da Praia, onde a empresa ELECTRA integra vertical e horizontalmente os SAS, gerindo todos os serviços, quando existem, do ciclo da água, desde a captação e dessalinização ao tratamento de águas residuais. Estabelecimento de tarifas Qualidade do serviço O sistema tarifário adoptado pelo operador corresponde à aplicação de uma parcela variável crescente, em função do consumo de água. Os preços praticados revelam-se elevados para a maioria da população, face ao custo do processo de dessalinização. O governo subsidia as novas ligações. O operador estabelece tarifas aos utilizadores domésticos, industriais e turismo, comerciais, autotanques e de carácter social. A qualidade do serviço prestada em Cabo Verde é globalmente deficiente. Em situações de maior procura, sucedem-se as interrupções. As questões associadas à qualidade do serviço, que é reduzida e pouco supervisionada, são sobretudo de cariz económico e financeiro. A prioridade é o aumento do grau de atendimento e do fornecimento de água em quantidade. O Regulador O Sector Características • Regulador multissectorial • Entidade reguladora independente Diploma legal de criação Decreto-Lei n.º 26 de 2003 Número de colaboradores 19 funcionários (4 sector da água) Orçamento Contactos Agência de Regulação Económica Av. Cidade de Lisboa, n.º 785, Cabo Verde Tel/Fax: +238 260 0430 / 261 1440 http://www.are.cv Entidades Relevantes Instituto Nacional de Gestão dos Recursos Hídricos • http://www.ingrh.cv Ministério do Ambiente e da Agricultura • http://www.maap.cv Ministério da Saúde • http://www.minsaude.gov.cv Banco de Desenvolvimento Africano • http://www.afdb.org País • Área – 4 mil km2 • População – 500 mil de habitantes • Densidade populacional – 118 hab/km2 Atendimento dos serviços • Água – 85% (inclui camiões e chafarizes) • Drenagem de águas residuais – 16% • Tratamento de águas residuais – Número de operadores • Água – 15 • Águas residuais – 3 Propriedade e gestão dos serviços Propriedade Gestão Públ. Priv. Públ. Priv. Água 100% 0% 50% 50% Águas residuais 100% 0% 40% 60% Volume de actividade • Água captada – 6,7 milhões m3 • Consumo humano – 4,6 milhões m3 • Consumo médio – 50 litros por habitante e por dia • Principal origem – 85% superficial • Perdas de água – 31% (ELECTRA) Dados económico-financeiros • Volume de negócios – 8,4 milhões de euros • Preço médio serviço de água – 2,72 €/m3 • Factura média anual por utilizador – 74 euros • Emprego – 679 funcionários (ELECTRA) 347 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional CANADÁ Modelo de regulação No Canadá, o sector da água caracteriza-se geralmente pela auto-regulação. Desta forma, as associações do sector assumem um papel consideravelmente importante, possuindo a capacidade de disseminar as melhores práticas entre os respectivos membros e incentivar, deste modo, o desenvolvimento do sector. Contudo, a qualidade da água fornecida pelos operadores, ou as descargas de efluentes no meio ambiente, bem como o estabelecimento de tarifas, constituem os casos específicos do âmbito de actuação das entidades reguladoras territoriais ou provinciais, nomeadamente multissectoriais (SAS, electricidade, gás, petróleo e transportes). Os critérios e os métodos da regulação adoptados são transparentes e compreensíveis, e, na maior parte das províncias, a regulação adoptada é publicada nos jornais provinciais como uma notícia oficial. O método de regulação económica utilizado no estabelecimento de tarifas entre os operadores baseia-se quase sempre na regulação por taxa de remuneração. Contudo, devido à escassez de entidades reguladoras, as decisões ao nível do estabelecimento de tarifas são exercidas exclusivamente pelos conselhos municipais eleitos. Este método regulatório estende-se para um período de dois anos. A principal regulamentação do sector é constituída pela Lei da Água, de 1970, e pela Lei de Protecção Ambiental, de 1988. Estrutura do mercado Os SAS são fundamentalmente fornecidos por operadores públicos. A presença do sector privado na provisão destes serviços é meramente residual. Mesmo quando se verifica a sua presença, é apenas na gestão e na exploração dos serviços, e nunca na sua propriedade. Os SAS são prestados maioritariamente por entidades multissectoriais (SAS, resíduos urbanos, energia, etc.). Em geral, os serviços encontram-se verticalmente integrados, quer na água, quer nas águas residuais, incluindo toda a fileira produtiva desde a captação, à distribuição no serviço de água e da recolha ao tratamento, no que diz respeito às águas residuais. Existem, no entanto, algumas situações em que tal não acontece (por ex., Vancouver). Estabelecimento de tarifas Qualidade do serviço O Canadá não apresenta uma estrutura tarifária nacional para os SAS. As estruturas tarifárias implementadas entre os operadores dos SAS divergem entre a implementação de um valor fixo, independentemente do consumo, de uma parcela fixa, em função do consumo, de uma parcela variável crescente e decrescente, em função do consumo ou de uma combinação das anteriores. Em geral, os utilizadores apresentam tarifas distintas em função da sua natureza. Os SAS primam pela sua universalidade e qualidade geral elevada. A qualidade do serviço é salvaguardada pela ameaça de revogação da licença ou cancelamento do contrato. No âmbito da supervisão da qualidade do serviço, as entidades competentes desenvolvem estudos de benchmarking, ainda que não de uma forma sistemática. Na generalidade, pautam-se por uma transparência elevada. O Regulador Características Diploma legal de criação Número de colaboradores Orçamento O Sector País • Área – 9.984,7 mil km2 • População – 33,3 milhões de habitantes • Densidade populacional – 3,2 hab/km2 Atendimento dos serviços • Água – 85% • Drenagem de águas residuais – 85% • Tratamento de águas residuais – 80% Número de operadores • Água – 9.000 • Águas residuais – 9.000 Contactos Propriedade e gestão dos serviços Propriedade Entidades Relevantes Associação do Sector • http://www.cwwa.ca Instituto da Água • http://www.nwri.ca Ministério do Ambiente • http://www.ec.gc.ca Ministério da Saúde • http://www.hc-sc.gc.ca 348 Gestão Públ. Priv. Públ. Priv. Água 100% 0% 97% 3% Águas residuais 100% 0% 97% 3% Volume de actividade • Água captada – 5,4 mil milhões m3 • Consumo humano – 4,2 mil milhões m3 • Consumo médio – 343 litros por habitante e por dia • Principal origem – 60% superficial • Perdas de água – 22,5% Dados económico-financeiros • Volume de negócios – 3 mil milhões de euros (distribuição) • Preço médio serviço de água – 0,72 €/m3 • Factura média anual por utilizador – 235 euros • Emprego – 300 000 funcionários Anexo II - Respostas ao questionário sobre regulação CANADÁ (ILHA DO PRÍNCIPE EDUARDO) Modelo de regulação Na província da Ilha do Príncipe Eduardo (IPE), de forma atípica no Canadá, existe uma entidade reguladora multissectorial (PEI Regulatory and Appeals Commission – IRAC), que se comporta como um tribunal independente em matérias relativas às taxas de uso de território, propriedade e de receitas obtidas com os serviços públicos. Ao nível da regulação económica, a comissão, regulando apenas um número restrito de operadores, adoptou o método de regulação por taxa de remuneração, para um período de 1 ano. Até à data, o regulador não possui quaisquer valências relativas ao controlo e promoção da qualidade do serviço. No entanto, a IRAC desenvolve um relatório anual, onde publicita (regulação sunshine) o preço praticado para o respectivo serviço, pelas entidades gestoras dos serviços de água e/ou de águas residuais. Como complemento às atribuições da comissão, o Departamento do Ambiente detém as valências de regulação da qualidade da água que é fornecida aos utilizadores domésticos. Como forma de controlo, a entidade reguladora encontra-se obrigada a reportar toda a sua actividade à Assembleia da IPE, através do Ministério da Educação. A Lei da Água, de 1970, e a Lei da IRAC, de 1991, revelam-se os principais marcos legais que regulamentam os SAS. Estrutura do mercado Os SAS encontram-se organizados de diferentes formas entre as várias áreas, mas sempre sob propriedade e gestão pública. Dentro do âmbito da província, a gestão dos serviços varia entre a integração do ciclo total da água, existindo operadores que prestam os serviços desde a captação de água ao tratamento de águas residuais (por ex., North Rustico), e a provisão específica de um determinado serviço, quer no serviço de água (por ex., Alberton), quer no serviço de águas residuais (por ex., Seawood Water). Em termos horizontais, a provisão dos SAS encontra-se equitativamente repartida entre o número de entidades que integram os SAS e as entidades que prestam exclusivamente um serviço. Estabelecimento de tarifas Qualidade do serviço O sistema tarifário habitualmente praticado pelos operadores baseia-se numa parcela fixa, estabelecida em função das características da propriedade. O governo subsidia os operadores, como forma de promover a universalidade. O tarifário é discriminado em função do utilizador (por ex., um utilizador individual tem uma tarifa diferente de uma família ou dos utilizadores industriais). Apesar da escassa informação, os SAS pautam-se, na generalidade, por uma qualidade do serviço elevada. A ausência de valências da IRAC nesta matéria é compensada pela ameaça de revogação da licença ou cancelamento do contrato. No entanto, o sector prima pela transparência, quer em termos financeiros, quer em termos da qualidade ambiental fornecida. O Regulador O Sector Características • Regulador multissectorial • Entidade reguladora independente Diploma legal de criação Lei da IRAC de 1991 Número de colaboradores 23 funcionários (3 sector da água) Orçamento 1,3 milhões de euros (2007) Contactos PEI Regulatory and Appeals Commission P.O. Box 577, Charlottetown, PE C1A 7L1, Canada Tel/Fax: +902 892 3501 / 566 4076 http://www.irac.pe.ca Entidades Relevantes Associação do Sector • http://www.cwwa.ca Instituto da Água • http://www.nwri.ca Associação dos Recursos Hídricos • http://www.cwra.org Ministério do Ambiente • http://www.gov.pe.ca/enveng País • Área – 5,7 mil km2 • População – 139 mil de habitantes • Densidade populacional – 23,9 hab/km2 Atendimento dos serviços • Água – • Drenagem de águas residuais – • Tratamento de águas residuais – Número de operadores • Água – 14 • Águas residuais – 25 Propriedade e gestão dos serviços Propriedade Públ. Priv. Gestão Públ. Priv. Água 100% 0% 100% 0% Águas residuais 100% 0% 100% 0% Volume de actividade • Água captada – • Consumo humano – • Consumo médio – • Principal origem – • Perdas de água – Dados económico-financeiros • Volume de negócios – 1,7 milhões de euros • Preço médio serviço de água – • Factura média anual por utilizador – 123 euros • Emprego – 349 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional CHILE Modelo de regulação No Chile, os operadores (urbanos) dos SAS encontram-se sob o controlo da SISS (Superintendencia de Servicios Sanitarios), uma agência governamental autónoma, descentralizada, a quem reportam toda a sua actividade. A SISS tem como principais responsabilidades o estudo, o desenvolvimento e a supervisão do cumprimento das normas técnicas para a concepção, construção e operação dos SAS. A SISS possui também valências de garantia do cumprimento do enquadramento legal em vigor e dos sistemas de concessão, regulação dos processos de estabelecimento de tarifas para um período de cinco anos, resolução de quaisquer situações de disputa entre os operadores e os utilizadores, aplicação de coimas e sanções às empresas de acordo com a lei e, por fim, controlo das descargas dos operadores dos SAS e das descargas das águas residuais industriais. O sistema de regulação económica, fundado na empresa “modelo”, foi adoptado em todos os sectores no Chile que compreendem serviços de utilidade pública, para um período de cinco anos, baseado em preços máximos. Este enfoque utiliza como padrão de comparação uma empresa virtual eficiente denominada “empresa modelo”, ou seja, uma empresa fictícia e meramente teórica, criada pelo regulador, como se não existisse a empresa real, com o objectivo de satisfazer a procura projectada em medida óptima. O Código da Água, de 1981, e a Lei Geral dos Serviços Sanitários, de 1988, constituem o principal quadro legal do sector da água. Estrutura do mercado Os SAS são maioritariamente prestados pelo sector privado, apesar da presença do parceiro público (CORFO) nos principais operadores. De qualquer forma, subsistem os dois principais modelos de privatização. Por um lado, até 2001, ocorreu maioritariamente uma privatização material dos operadores através de alienação de activos. A partir desse ano, o modelo seguido foi o da concessão (privatização da gestão). Na primeira opção integram-se as quatro grandes empresas (ESVAL, Aguas Andinas, ESSAL e ESSBIO). A participação privada é sempre maioritária. Em relação aos operadores das áreas rurais a situação é mista, existindo tantos operadores privados quanto públicos. Os SAS estão, normalmente, fundidos no mesmo operador, encontrando-se verticalmente integrados, ou seja, os operadores gerem todas as actividades da fileira produtiva, desde a captação até à distribuição de água, e no saneamento, desde a recolha ao tratamento de águas residuais. O grau de integração horizontal é também elevado. Estabelecimento de tarifas Qualidade do serviço O sistema tarifário habitualmente adoptado pelos operadores baseia-se numa parcela fixa e numa parcela variável crescente, estabelecida em função do volume de água consumida. O governo subsidia directamente os utilizadores carenciados, fornecendo um volume de água gratuito. As tarifas são estabelecidas de modo distinto, isto é, por área e utilizador (doméstico e industrial). Os SAS do Chile representam um dos benchmarks na América Latina, em especial ao nível do atendimento dos serviços. No sentido de incentivar a qualidade do serviço, a SISS estabeleceu um sistema de benchmarking fundado num conjunto de indicadores de desempenho. Em suma, os SAS pautam-se, na generalidade, por uma qualidade do serviço elevada. O Regulador Características • Regulador sectorial • Entidade reguladora não independente Diploma legal de criação Lei n.º 18.902 de 1990 Número de colaboradores 157 funcionários Orçamento 8,5 milhões de euros (2006) Contactos Superintendencia de Servicios Sanitarios Oficina Región Metropolitana, Moneda N°673, piso 1, Santiago, Chile Tel/Fax: +56 2 382 4000 / 382 4003 http://www.siss.cl Entidades Relevantes Comissão Nacional do Meio Ambiente • http://www.conama.cl Ministério da Saúde • http://www.minsal.cl Ministério das Obras Públicas • http://www.mop.cl Direcção Geral das Águas • http://www.dga.cl 350 O Sector País • Área – 757 mil km2 • População – 16,6 milhões de habitantes • Densidade populacional – 21,3 hab/km2 Atendimento dos serviços • Água – 99,8% • Drenagem de águas residuais – 95,2% • Tratamento de águas residuais – 81,9% Número de operadores • Água – 52 • Águas residuais – 50 Propriedade e gestão dos serviços Propriedade Gestão Públ. Priv. Públ. Priv. Água 35% 65% 0% 100% Águas residuais 35% 65% 0% 100% Volume de actividade • Água captada – 1.451 milhões m3 • Consumo humano – 905 milhões m3 • Consumo médio – 150 litros por habitante e por dia • Principal origem – 51% superficial • Perdas de água – 37,6% Dados económico-financeiros • Volume de negócios – 910 milhões de euros • Preço médio serviço de água – 0,59 €/m3 • Factura média anual por utilizador – 225 euros • Emprego – 9.566 funcionários (13,5 milhões hab.) Anexo II - Respostas ao questionário sobre regulação COLÔMBIA Modelo de regulação Na Colômbia, existe uma entidade reguladora independente (Comisión de Regulación de Agua Potable y Saneamiento Básico – CRA) dedicada às questões de regulação económica, qualidade do serviço e obrigações de serviço público dos SAS, que tem também funções de regulação dos serviços de resíduos urbanos. A CRA é uma unidade administrativa especial, tutelada pelo Ministério do Ambiente, com independência técnica, administrativa e patrimonial, mas sem personalidade jurídica. A regulação económica desenvolvida pela CRA baseia-se na regulação por comparação strictus sensus, isto é, os sistemas tarifários dos operadores são determinados com base no desempenho dos operadores do sector que constituem as melhores práticas. O sistema de preços máximos, adoptado para um período regulatório de cinco anos, é constituído por três parcelas: uma relativa aos custos administrativos, outra referente aos custos de operação e manutenção e outra relativa aos custos de capital, que inclui também as taxas e impostos ambientais. As duas primeiras parcelas são baseadas nos custos eficientes (melhores práticas), enquanto a terceira assenta na aprovação dos planos de desenvolvimento dos operadores. Este cálculo é efectuado separadamente para o serviço de água e para o serviço de águas residuais. A determinação das melhores práticas assenta na técnica fronteira e não paramétrica de benchmarking de data envelopment analysis (DEA). A Lei dos Serviços Públicos Domésticos, de 1994, e os Planos Departamentais dos SAS constituem o principal quadro legal do sector da água. Estrutura do mercado Os SAS têm propriedade pública e caracterizam-se por uma gestão maioritária do sector público. Apesar da reduzida representatividade do sector privado no fornecimento dos SAS em termos nacionais, o mesmo foi sempre caracterizado por grande estabilidade e sustentabilidade, sendo considerado, no contexto da América Latina, como um caso de sucesso. Os SAS são, normalmente, caracterizados pela integração vertical e desverticalização horizontal, sendo prestados ambos os serviços pela mesma entidade. No entanto, alguns operadores públicos possuem algumas das etapas da fileira produtiva (ciclo da água) contratadas externamente, como sucede com a EAAB. Com poucas excepções (por ex., EPM), os SAS na Colômbia não prestam outras actividades. Estabelecimento de tarifas Qualidade do serviço O sistema tarifário habitualmente adoptado pelos operadores compreende uma parcela fixa e uma parcela variável crescente, estabelecida em função do volume de água consumida. O governo subsidia os operadores. Existem tarifas sociais para os utilizadores mais desfavorecidos. O operador estabelece as tarifas de modo distinto, consoante o utilizador: doméstico, comercial, industrial ou público. Apesar dos inúmeros avanços que o sector da água tem denotado ao nível do atendimento e da fiabilidade dos serviços, ainda subsistem alguns problemas, sobretudo nas zonas rurais, no âmbito da qualidade da água. O sector carece de um sistema de análise de qualidade do serviço, sobretudo, para as perdas de água. Todavia, tendo em conta a respectiva geografia, o país apresenta uma qualidade do serviço elevada. O Regulador Características • Regulador sectorial • Entidade reguladora independente Diploma legal de criação Lei n.º 142 de 1994 Número de colaboradores 105 funcionários Orçamento 3,1 milhões de euros (2006) Contactos Comisión de Regulación de Agua Potable y Saneamiento Básico Edificio Palma Real Cra.13 No. 28-01 Pisos 5 y 6, Bogotá, Colombia Tel/Fax: +571 327 2800 / 350 9393 http://www.cra.gov.co Entidades Relevantes Autoridade Ambiental • http://www.car.gov.co Direcção de Desenvolvimento • http://www.findeter.gov.co Superintendência para os Serviços Públicos • http://www.superservicios.gov.co Ministério do Ambiente, da Habitação e do Desenvolvimento Regional • http://www.minambiente.gov.co O Sector País • Área – 1.139 mil km2 • População – 44,4 milhões de habitantes • Densidade populacional – 39 hab/km2 Atendimento dos serviços • Água – 88,3% • Drenagem de águas residuais – 74,1% • Tratamento de águas residuais – 25% Número de operadores • Água – 2.886 • Águas residuais – 1.071 Propriedade e gestão dos serviços Propriedade Gestão Públ. Priv. Públ. Priv. Água 100% 0% 88,5% 11,5% Águas residuais 100% 0% 88,5% 11,5% Volume de actividade • Água captada – 2.329 milhões m3 • Consumo humano – 1.188 milhões m3 • Consumo médio – 59 litros por habitante e por dia • Principal origem – Superficial • Perdas de água – 49% Dados económico-financeiros • Volume de negócios – 712,4 milhões de euros • Preço médio serviço de água – 0,36 €/m3 • Factura média anual por utilizador – 92,3 euros • Emprego – 18 633 (50% da população) 351 A regulação dos serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais - Uma perspectiva internacional COSTA RICA Modelo de regulação Na Costa Rica, existe uma entidade reguladora independente multissectorial (Autoridad Reguladora de los Servicios Públicos ARESEP) que envolve os sectores das telecomunicações, electricidade, água, petróleo, irrigação e transportes (vários modos). Possui a atribuição de regulador económico, onde se inclui a tarefa de estabelecimento de tarifas aos operadores, monitorização e controlo da eficiência e da qualidade do serviço, proclamando a defesa do interesse dos utilizadores. A metodologia tarifária aplicada para o sector da água baseia-se na regulação por taxa de remuneração. O intervalo regulatório corresponde a um ano. O processo de estabelecimento de tarifas envolve a participação pública, onde os utilizadores podem manifestar a sua opinião sobre a alteração dos preços. No âmbito da defesa dos utilizadores, estes podem apresentar a sua reclamação ao regulador, directamente ao governo ou podem ainda recorrer aos serviços da entidade de defesa do utilizador, como a Defensoría de los Habitantes. O regulador procura resolver e mediar os conflitos existentes. O sector da água encontra-se, fundamentalmente, regulamentado pela Lei Geral da Água Potável, de 1953, e pela Lei Geral da Saúde, de 1973. Estrutura do mercado O sector da água é gerido, principalmente, por entidades públicas, destacando-se o papel do AyA na gestão directa e indirecta dos SAS, dentro e fora da respectiva área de jurisdição. A participação de alguns operadores privados, que efectuam o serviço de água a sistemas individuais ou de pequena dimensão, é reduzida. O sector da água caracteriza-se por uma integração horizontal e vertical dos respectivos serviços numa só entidade gestora, fornecendo integralmente os serviços referentes a todo o ciclo da água, desde a captação à distribuição de água e da recolha e drenagem ao tratamento de águas residuais. Todavia, é de salientar que o serviço de águas residuais ainda representa uma pequena percentagem de atendimento da população. Como tal, nas áreas onde este serviço é disponibilizado, a entidade gestora que fornece o serviço de água gere simultaneamente o serviço de águas residuais. Estabelecimento de tarifas Qualidade do serviço O sistema tarifário habitualmente adoptado pelos operadores baseia-se numa parcela variável crescente, estabelecida em