Loja Escocesa E Escocesismo - Oficina de Restauração do REAA

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Loja Escocesa E Escocesismo - Oficina de Restauração do REAA
Loja Escocesa E Escocesismo
Escrito por Ailton Branco
Dom, 12 de Junho de 2011 12:56 -
A Loja escocesa ganhou essa denominação informal na França ao ser caracterizada
como Loja maçônica com finalidades políticas reunindo os membros do partido
legitimista inglês e escocês, os jacobitas, refugiados em território francês desde 1688
juntamente com o rei Jaime II da Inglaterra e Irlanda e Jaime VII da Escócia, deposto por
seu genro, Guilherme de Orange, que foi sensível às pressões da oposição whig. O rei
Jaime II convertera-se ao catolicismo em 1671 e sua aproximação com Luiz XIV bem
como os favorecimentos concedidos aos católicos desencadeou forte movimento de
oposição do povo e do Parlamento. A destituição de Jaime II foi deflagrada no ano do
nascimento de seu filho Carlos Eduardo Stuart, porque seus opositores temeram a
implantação de uma dinastia católica. A Inglaterra, desde 1534, adotara o anglicanismo
por ato do rei Henrique VIII, mas o povo continuou por muito tempo cultuando o
catolicismo.
O partido jacobita, depois da deposição de Jaime II, não só sobreviveu nos territórios
antes comandados pela Casa dos Stuart, como criou novas frentes com os exilados que
acompanharam a família real até a França. A reunião maçônica foi o principal meio de
manutenção da coesão política no exterior e onde eram anunciadas as ações de
resistência. Surgiram as Lojas escocesas, organizadas à semelhança das Lojas em
atividade nos palácios e nos castelos da Escócia, mas diferentes no tocante ao
ritualismo; as reuniões jacobitas que ganharam a denominação de Lojas escocesas não
obedeceram inicialmente a ritual. A história revela que, em 1758, na França, apenas 15 %
das Lojas maçônicas obedecia algum ritual. Essas Lojas foram chamadas informalmente
de Lojas francesas, praticando ritual semelhante ao das Lojas filiadas à Grande Loja de
Londres, fundada em 1717. Escreve Paul Naudon, em A Maçonaria (1968): “As Lojas
“escocesas”, que vimos implantar-se entre nós no séquito dos Stuarts, obedeciam aos
antigos usos da confraria, ao contrário das oficinas que dependiam da Grande Loja de
Londres
”.
A maçonaria escocesa foi precursora da maçonaria na Inglaterra. Seus primeiros passos
datam de 1600. O primeiro uso da palavra "Loja" no sentido maçônico e as evidências de
sua existência com regularidade e com indícios de funcionamento e organização em
âmbito nacional, verificou-se na Escócia. Os primeiros catecismos maçônicos expondo
a "Palavra do Maçom" e os segredos de reconhecimento foram também concebidos na
maçonaria escocesa. Os maçons jacobitas levaram o modelo estrutural das Lojas da
Escócia para a França e usaram o segredo elaborado em torno da "Palavra do Maçom"
para desenvolverem planos políticos com segurança e discrição. Em 1708, os Stuart tentaram retomar o trono para Jaime II na Inglaterra e Irlanda. A
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iniciativa fracassou. Em 1719, idêntica investida na Escócia, que também foi mal
sucedida. Fracassadas as duas tentativas as Lojas escocesas jacobitas na França
diminuíram a intensidade dos conteúdos políticos e ampliaram os temas culturais e
esotéricos. O hermetismo Rosa-cruz ganhou simpatizantes que discutiam temas
alquimistas em Lojas secretas, as quais ganharam “status” de graus autônomos. Em
1747, foi fundado na cidade de Arras, França, pelo Príncipe Carlos Eduardo Stuart e seu
primo, o conde de St. Germain, um Capítulo Primordial da Rosa-cruz, formalmente
constituído pela Carta Régia de Arras. Brotava, então, o escocesismo. Foi o primeiro
núcleo completo e organizado com graus acima do de Mestre criado na França por
influência e inspiração Rosa-cruz, com poderes para constituir Capítulos semelhantes
em outras cidades, sob a exigência de ser único em cada cidade.
Em 1780, foi instituído o Capítulo de Arras do Vale de Paris. O Capítulo
Primordial de Arras constituiu-se na primeira Loja Capitular escocesa, onde se originou
o sistema ritualístico escocês, um conjunto de ritos diversificados que reuniram elevado
número de graus superiores aos três iniciais. A Loja Capitular de Arras foi a matriz do
Rito Escocês Primitivo com 4 graus. Esse rito tem sido citado equivocadamente como
Rito Escocês Antigo e Aceito com 4 graus. Os maçons que pesquisam o escocesismo
sabem que o Rito Escocês Antigo e Aceito nunca teve quatro graus apenas.
Ainda, Paul Naudon, em “A Maçonaria”: “O escocesismo é uma das particularidades da
maçonaria francesa. Trata-se, com efeito, de um rito, ou melhor, de uma categoria de
ritos, que nasceu em nosso país. A divergência política independia do ritual. Não
tardariam, porém, as inovações, a principal das quais é o aparecimento dos altos graus,
e o desenvolvimento que se seguiu só se verifica a princípio na França e depois na
Alemanha. As origens e causas da criação desses altos graus permanecem obscuras:
alegaram-se razões de ordem política, que permitiam aos chefes stuartistas dirigir à
distância as Lojas comuns; motivos ligados a interesses pessoais, a colação de títulos
cavaleirescos que lisonjeavam a vaidade dos Irmãos e eram pretexto para a percepção
de foros consideráveis; razões espirituais, que aparecem nítidas no correr do século
XVIII, correspondendo os altos graus a um desabrochar iniciatório do grau de mestre,
em que se integram as diversas formas da tradição. Os escoceses já haviam criado o
grau de mestre, antes dos ingleses. Vários autores (Mirabeau, N. de Bonneville, Mounier,
Ragon, Findel, Rebold) atribuem a criação dos altos graus aos jesuítas que estavam à
testa dos partidários dos Stuarts
”.
Referir altos graus e jesuítas, no entanto, requer algumas palavras de esclarecimento a
respeito da suposta paternidade de Miguel Andrés Ramsay na criação dos altos graus e do
escocesismo. Nascido na Escócia, em 1686, Ramsay refugiou-se na França com os jacobitas
depois da queda dos Stuarts. Conheceu o arcebispo Fenelon, de quem se tornou o discípulo
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mais identificado com suas ideias. Essa influência levou-o a converter-se do anglicanismo ao
catolicismo. Na França, manteve estreito relacionamento com os jesuítas, com os quais
planejou usar a maçonaria para atrair simpatizantes com muito prestígio público para a causa
da religião católica. Os jesuítas queriam devolver o povo britânico à autoridade da Igreja
romana e entenderam que o caminho para alcançar o objetivo era através do Stuart, Carlos
Eduardo, cristão Rosa-cruz que desejava retornar ao trono da Inglaterra e da Escócia. Ramsay
e os jesuítas planejaram realizarem modernas cruzadas com ação e influência das
personalidades da política, 70 % delas filiadas à maçonaria. Os jesuítas tinham como objetivo
final conquistar o Parlamento inglês para oficializar o retorno dos Stuarts ao reino da
Grã-Bretanha e a seguir pressionarem para que a religião católica fosse decretada novamente
a religião oficial.
Ramsay, homem culto e de posses diferenciadas, tomou para si a tarefa de abrir canais na
maçonaria que permitissem o sucesso da idéia; o primeiro passo foi produzir tema jesuítico
novelesco baseado na tradição dos cruzados e, com esse conteúdo, criou, em 1728, graus
sem ritualística, mas com denominações representativas: Escocês, Noviço e Cavaleiro do
Templo. Nesses graus era ensinado aos novos adeptos que a maçonaria constituía-se na
continuação da extinta Ordem dos Templários.
Ramsay foi à Inglaterra propor à Grande Loja de Londres, a substituição dos três graus das
Lojas azuis pelos graus inventados por ele. A Grande Loja, criada há 10 anos tendo como uma
das finalidades enfraquecer as Lojas cristãs, não aceitou e nem reconheceu os novos graus,
além de fazer severa campanha de rejeição aos mesmos.
Ramsay voltou-se então para a França, onde obteve melhor êxito. Na Alemanha, várias Lojas
também adotaram a novidade. O sistema de Ramsay continuou empolgando aos maçons que
adquiriam títulos pomposos e hierárquicos da confraria. Encaminhou a criação, em 1739, da
Ordem da Estricta Observância com o Rito de mesmo nome, que não revelava quem era a
autoridade maior sobre os maçons e as Lojas que o praticavam.
Aos maçons que creditam o início do escocesismo aos três graus templários, em poucas
palavras, embora o tema mereça ampla análise e pesquisa histórica, pode-se dizer que os três
graus criados por Ramsay não constituíram a base do escocesismo. Os graus de Ramsay não
foram lançados com a intenção de ampliar a dimensão dos conhecimentos maçônicos além do
que hoje denominamos simbolismo. Surgiram para substituir os graus de Aprendiz,
Companheiro e Mestre com a finalidade de reavivar a história dos templários e angariar
adeptos para o catolicismo e revitalizar a mística idealista do movimento das cruzadas.
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Ao contrário do que tem sido divulgado por parcela de autores maçônicos, Ramsay não criou
altos graus. Ele foi roteirista de uma história diferente do passado da maçonaria, a qual foi
sintetizada e simbolizada nos três novos graus, criados para substituírem os únicos três graus
adotados pela primeira Grande Loja de Londres. Não obtendo êxito entre os ingleses, Ramsay
levou o material para a França, onde tentou a mesma substituição dos graus azuis pelos seus
graus templários. As Lojas na França que praticavam a ritualística inglesa cristã da Loja de
York e que não aderiram aos rituais com temas hebraicos da Grande Loja de Londres, em
1717, também não aceitaram a troca dos seus graus azuis. Mas algumas foram receptivas à
substituição dos chamados graus irlandeses, quatro acima do Mestre da ritualística cristã
inglesa, pelos novos propostos por Ramsay, ainda, no entanto, sem a sistematização
convencional de um rito constituído de forma permanente. Não existem registros do uso
cerimonial de graus templários antes de 1760. Portanto, não há critério razoável capaz de
confirmar a origem do escocesismo nos graus templários de Ramsay que se constituíram em
rito somente treze anos depois do surgimento da Loja Capitular de Arras com ética e
hermetismo Rosa-cruz.
Quando Ramsay obteve as primeiras adesões na França e na Alemanha e constatando a
receptividade dos novos graus, os maçons Rosa-cruz também lançaram graus isolados,
diferentes dos graus azuis básicos, com finalidade política, mas também com conteúdo voltado
para o ocultismo e para as relações fraternais. Esses graus formaram a base do escocesismo,
a partir de 1747, sistema que viria a ser cultivado até nossos dias em suas diversas
apresentações. Os graus Rosa-cruz estão presentes em todos os ritos do sistema escocês, o
mesmo não acontecendo com os graus templários de Ramsay. O Rito Escocês Antigo e Aceito,
o Rito Escocês mais conhecido no mundo, contribuiu para o embasamento da convicção dos
autores que consideram os graus templários os precursores do escocesismo; os graus
templários foram incluídos na relação dos vinte e cinco do Rito de Heredom, que serviu de
estrutura para os 33 graus do Rito Escocês Antigo e Aceito.
O sistema ritualístico proposto por Ramsay era dirigido por um conselho de jesuítas que, para
não serem identificados, estabeleceram uma liderança secreta para o rito. Fizeram constar até
que havia um Grão-Mestre secreto e que esse poderia ser o pretendente jacobita Carlos
Eduardo Stuart. Carlos Eduardo desmentiu e as lideranças dos graus templários jamais
disseram a verdade. O critério de não revelar a autoridade máxima do rito foi o principal
causador de desconfianças e desistências, fato que levou ao desaparecimento do rito. Em
1782, a célebre Assembleia de Wilhemsbad desautorizou e repeliu totalmente a fábula
templária, vindo com isso a decretar-se a definitiva extinção da célebre Ordem da Estricta
Observância.
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A criação das Lojas e Capítulos com a designação de escoceses, na França, representou
a continuidade de parte da maçonaria da Escócia – a cristã Rosa-cruz de William Schaw
e do alquimista italiano John Damian, diferente do cristianismo católico dos jesuítas e de
William Sinclair. A maçonaria na Escócia estava mais sistematizada na comparação com
a de outras nações no século XVII. Essa particularidade não significa que os vários ritos
escoceses organizados na França, ou a partir de lá, tiveram origem na Escócia.
Em síntese, Loja escocesa na França, antes do surgimento do escocesismo, foi uma
reunião de maçons franceses cristãos Rosa-cruz, políticos jacobitas, inicialmente sem
preocupação ritualística. O elemento mais considerado nas reuniões foi o segredo do
maçom a respeito dos assuntos tratados e dos frequentadores. Escocesismo foi a
perpetuação das idéias políticas e religiosas dos Stuarts através da criação dos altos
graus com o simbolismo dos Rosa-cruz e não dos Templários. O conde de St. Germain
era o chanceler Rosa-cruz do pretendente ao trono britânico, Carlos Eduardo Stuart. Os
graus Rosa-cruz, com seu conteúdo e seus cerimoniais, inclusive nos graus iniciais da
cadeia escocesa, originaram diversos ritos maçônicos, depois que a realidade mostrou a
impossibilidade da linhagem real jacobita voltar ao poder institucional na Grã-Bretanha.
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