Biologia geral dos fungos e micotoxinas
Transcrição
Biologia geral dos fungos e micotoxinas
Biologia geral dos fungos e micotoxinas Prof. Dr. Luiz Roberto Basso Junior Setembro de 2014 Biologia geral dos fungos e micotoxinas Estima-se que o reino Fungi possui cerca de 1,5 milhões de espécies Excelentes decompositores Simbiontes Patógenos e parasitas Biologia geral dos fungos e micotoxinas Somente 150 espécies são capazes de causar doenças em mamíferos; Última década: aumento da frequência de infecções fúngicas (alta morbidade e mortalidade); Infecções disseminadas pelo sangue (>200%); Aumento dos casos de resistência a antifúngicos; Status de grande causa de infecções em humanos (imunocomprometidos); A proximidade evolutiva os torna um desafio terapêutico; Últimos 20 anos: 1 nova droga (ecnocandinas) com novo alvo (parede celular); Necessidade de estudar mecanismos envolvidos na patogênese virulência e resistência a drogas; Biologia geral dos fungos e micotoxinas São organismos eucarióticos, aeróbios (maioria) e heterotróficos que se nutrem por absorção (após hidrólise enzimática), parasitando organismos ou matéria orgânica em decomposição. Apresentam reprodução assexuada e sexuada. Em substratos apropriados os esporos germinam produzindo formas diversas como Bolores (fungos pluricelulares) ou leveduras (fungos unicelulares). Características Nutricionais dos Fungos A maioria dos fungos são aeróbios, fazendo oxidação da glicose (mas também de sacarose, maltose) para a obtenção de energia; Existem várias leveduras fermentadoras anaeróbias facultativas; Necessitam de oligoelementos como fósforo, enxofre, magnésio, sódio, potássio, ferro, cálcio, zinco, manganês, cobre e molibdênio; Fatores de crescimento que não sintetizam (vitaminas) e aminoácidos; Características Metabólicas dos Fungos Algumas espécies são halofílicas (elevada concentração de sal); Temperatura ótima de crescimento entre 20ºC a 35ºC (psicrófilas e termófilas); Crescem bem em pH neutro ou ligeiramente ácido (6,0). Capazes de modificar o pH do meio ambiente; O crescimento vegetativo ocorre principalmente na obscuridade, mas a parte reprodutiva procura a luz para a sua formação (pigmentos carotenóides estimulados com a luz); As radiações ultravioleta da luz solar têm efeito fungistático. Classificação morfológica dos fungos Fungos filamentosos = Bolores Hifa cenocítica Leveduras Hifa septada 37°C 25°C Fungo dimórfico Pseudohifa Identificação de Fungos Fungos filamentosos Leveduras Tempo de crescimento Substratos cromogênicos Morfologia macroscópica Micromorfologia Morfologia microscópica Provas bioquímicas Fungos Filamentosos Morfologia Macroscópica Meio de Sabouraud Fungos Filamentosos Morfologia Microscópica Identificação de leveduras Substratos cromogênicos Micromorfologia Provas bioquímicas Ascomicetos Zigomicetos Basidiomicetos Reprodução Sexuada e Assexuada Taxonomia Deuteromicetos Biologia geral dos fungos e micotoxinas Diferenças entre as células de mamíferos e células fúngicas CÉLULA FÚNGICA Parede Celular de Fungos Espessura entre 80 a 600nm Constituída de material fibrilar composto: - Polissacarídeos (glucanas, mananas e quitina = virulência) - Glicoproteínas (responsáveis pela adesão e antigenicidade) Membrana Celular de Fungos Lipídeos: barreira impermeável ao fluxo de moléculas solúveis em água. Fosfolipídeos, ácidos graxos, glicolipídeos, ergosterol (confere estabilidade para a bicamada e permite a fluidez sem cristalização). Proteínas: transporte específico, enzimas catalizadoras de reações associadas à membrana, ligação estrutural entre citoesqueleto, matriz extracelular e receptores. Ergosterol Cápsula de Fungos Cadeia frouxa fibrilar de polissacarídeos: Glucoronoxylomanana (GXM), Galactoxylomana e manoproteína. Espessura de 1 a 50 m, dependendo dos nutrientes e CO2. Produção de Proteases por Fungos Produção de Proteases por Fungos Produção de Proteases por Fungos Formação de Biofilmes Produção de Melanina Produção de Melanina Bipolaris spicifera Polimorfismo Candida albicans Polimorfismo 25C Paracoccidioides brasiliensis 37C Polimorfismo Polimorfismo Amplificação gênica em Fungos Infecções Fúngicas Fontes de Infecção 1. Saprófitas da natureza (solo, vegetais, madeira) 2. Água 3. Animais domésticos 4. Homem Vias de Transmissão 1. Inalação 2. Traumatismo 3. Contato direto 4. Iatrogênica (sondas, ventiladores, cateter, manipulação) Transmissão digestiva (Toxicoses) e Congênita Infecções Fúngicas Epidemiologia e Ecologia Prevenção e Controle Habitat natural Notificação dos casos Distribuição geográfica Controle ambinetal (geral e hospitalar) Transmissão e porta de entrada Hospedeiro idade, sexo, profissão, fatores de risco Cuidados especiais com o paciente imunodeprimido Evitar exposição à fonte Profilaxia anti-fúngica Vacinas História clínica – Diagnóstico e Contagiosidade Frequência das Infecções Fúngicas O Homem é naturalmente resistente às infecções fúngicas Micoses cutâneas: alta incidência ( 20 a 40% população) Contagiosidade interhumana, animal e ambiental Micoses sitêmicas: áreas endêmicas Pbmicose 20 casos novos/ano (14 H : 1 M) Micoses oportunistas: 4º patógeno em Infecção Hospitalar Candidíase oral = 90% pacientes com AIDS Candidíase vaginal = 75% das mulheres em idade fértil Criptococose = 15-30% pacientes com AIDS Fatores de Virulência dos Fungos Definição: fator que permite o crescimento do fungo sob condições adversas do hospedeiro e que não é necessário para crescimento em cultura. Condições para patogenicidade: • Entrar no hospedeiro (tamanho, adesão). • Multiplicar no tecido do hospedeiro (mudança de forma, composição, metabólica, termotolerância, resistência à drogas). • Resistir ou não estimular os mecanismos de defesa do hospedeiro (cápsula, crescimento intracelular, citocinas, microbiota normal). • Danificar o tecido do hospedeiro (granuloma, fibrose, necrose). Fatores de Virulência dos Fungos Componentes da parede celular Adesão Cápsula Produção de enzimas Variabilidade antigênica, genotípica e morfológica Termotolerância Receptores hormonais Toxinas Resistência a antifúngicos Mecanismos de evasão da defesa do hospedeiro Métodos para diagnótico micológico Métodos diretos 1) Exame direto (KOH a 20%, Coloração, Nankim, Calcofluor) 2) Histopatológico (HE, Giemsa, Prata, Mucicarmim) 3) Isolamento em cultura Meios de cultura (Sabouraud) Identificação Teste de sensibilidadea drogas Tipagem Métodos indiretos 1) Detecção de metabólitos (D-arabinol, manana, -1,3-glucana, enolases, aspartil proteinase) 2) Detecção de DNA ( PCR, Hibridização ‘in situ”) 3) Deteção de antígenos (aglutinação com látex, IMH, IF) 4) Detecção de anticorpos (Elisa e Western-blot) 4) Inoculação animal Diagnóstico, Epidemiologia, Terapia, Controle. Prevenção Drogas antifúngicas - Resistência Natural ou adquirida: C. krusei e C. glabrata (fluconazol) C. albicans (5-fluorocitosina) Múltipla resistência: mesma família ou não relacionadas Resistência à 5-fluorocitosina: genes FCY1 e FCY2 Resistência à Anfotericina B: redução do conteúdo de ergosterol das membranas Resistência aos Azóles = gene ERG11 transportadores de efluxo Principais alvos para drogas antifúngicas Drogas antifúngicas - Resistência 1) Superprodução da enzima alvo 2) Alteração do alvo da droga 3) Bomba de efluxo da droga 4) Barreira de entrada da droga 5) Via alternativa 6) Inibição de enzimas fúngicas que transformam a forma inativa em forma ativa da droga 7) Degradação da droga no meio externo Testes de sensibilidade a antifúngicos 1. Métodos de diluição (determinação da CIM) Meios líquidos macrodiluição microdiluição Meios sólidos 2. Métodos de difusão Discos com concentração fixa (Halo de inibição) Fitas com gradiente de densidade: E-test (CIM) 3. Testes in vivo Patologias causadas por Fungos ALERGIAS: Decorrente da inalação do fungo ou de antígenos destes, em indivíduos atópicos; TOXICOSES: Micetismo (ingestão de fungos venenosos) Micotoxicoses (ingestão de alimentos contaminados com toxina pré-formada); MICOSES: Decorrente da presença e crescimento do fungo no tecido. Toxicoses Micetismo: sintomas resultantes da ingestão de cogumelos venenosos; Calocybe gambosa by Standa Jirásek Agaricus campestris Entoloma sinuatum by Clive Shirley by Laszlo Kaposvari Micotoxicose: ingestão de alimentos contaminados por toxinas de fungos (ou micotoxinas); Micotoxinas são metabólitos secundários (mais de 400 micotoxinas conhecidas). Micotoxinas Substâncias estáveis e resistentes; Geralmente encontradas em produtos agrícolas: Vegetais: Cereais, sementes oleaginosas, frutos, temperos. Produtos de origem animal (leite e derivados, carne, embutidos). Produtos obtidos por fermentação (cerveja, vinho, aditivos alimentares e vitaminas). A contaminação pode ocorrer desde o cultivo até o armazenamento antes do consumo. Presença do fungo não é um indicativo de que existe a toxina: Alta umidade do ar atmosférico (> 85%); Atividade de água inferior a 0,94; Altas temperaturas; Substrato rico em amido (cereais); Integridade dos grãos. Há cepas toxigênicas e não toxigênicas. Prevenção: Armazenamento adequado; Aplicação de antifúngicos; Monitoramento sanitário. Micotoxinas Efeito sinergístico. Efeito dose dependente e freqüência com que são ingeridas. Contaminação aguda: Ataxia, alucinações, hemorragia, necrose e falênci dos órgãos Contaminação crônica: Danos a diversos órgãos (fígado, rins, sistema nervoso e trato gastrointestinal). Alterações do sistema imunológico (aumento da susceptibilidade a infecções). Atividade estrogênica, mutagênica e teratogênica. Micotoxinas Fungos Aspergillus spp Penicillium spp Claviceps spp Fusarium spp Toxinas Aflatoxinas Ocratoxina Alcalóides Ergolínicos Tricotecenos Zearalenona Fumonisina Claviceps by David Moore Aspergillus By Mississippi Genome Exploration Laboratory Fusarium By Don White, University of Illinois Penicilium By Don White, University of Illinois Micotoxinas Aflatoxinas: Produzidas por Aspergillus spp; Econtradas em cereais, nozes, frutas, leite e derivados; Micotoxinas mais importantes: Aflatoxina B1 By Romer labs Frequência, Estabilidade e Toxicidade (B1 > G1 > M1 > B2 > G2); Contaminação aguda: necrose do fígado; Atividade mutagênica, teratogênica e imunosupressora; Orgãos mais atingidos: fígado, rins e o cérebro; Dose letal (DL50) = 0,5 a 10 mg/kg Limite para aflatoxinas totais: 20 g/kg em alimentos e 0,5 g/L/kg em leite e derivados. Ração animal: 50 g/kg Aflatoxina M1 By Romer labs Micotoxinas Aflatoxinas: Fazem ligações covalentes com sítios nucleofílicos do DNA e RNA formando adutos. O O O O O O O2 O P450 O O O OCH3 O OCH3 AFB1 epoxido AFB1 O DNA ou RNA O O HO O N N O O OCH3 AFB1-N7-GUA-DNA N N N + DNA A formação de adutos de guanina é frequentemente observada no gene supressor de tumor p53 em pacientes com câncer de fígado que possuem altos níveis de contaminação de aflatoxinas. Micotoxinas Ocratoxinas: Produzidas por Aspergillus spp e Penicillum spp; Econtradas em cereais, café, frutas secas, vinho e carne; Existem 7 tipos, sendo a ocratoxina A (OTA) a mais tóxica; OTA afeta principalmente os rins e também no fígado; Propriedades carcinogênicas, imunossupressoras e neurotóxicas; Dificulta a coagulação do sangue; Dose letal (DL50) = 3 mg/kg Limite para ocratoxina A: 2-750 g/kg em alimentos e 2 g/L derivados da uva. Ocratoxina By Romer labs Micotoxinas Fusariotoxinas: O gênero Fusarium é o grupo de fungos com maior capacidade genética para produção de micotoxinas em condições adequadas de desenvolvimento. Principais fusariotoxinas: Zearalenona; Fumonisinas; Zearalenona By Romer labs Tricotecenos. Fumonisina B1 By Romer labs Deoxinivalenol By Romer labs Micotoxinas Ergotoxinas ou alcalóides do Ergot: Produzidas por Claviceps spp; Encontradas em cereais e gramíneas. Ergotamina Dois tipos de alcalóides: tipo clavina e derivativos do ácido lisérgico. Ergotismo ou “fogo sagrado”: Gangrena, contrações uterinas, perturbações do sistema nervoso central, náuseas e morte. Primeiras micotoxinas utilizadas na medicina: indução do parto e anti-hemorrágico. Atualmente utilizadas no tratamento de enxaquecas, hemorragias pós-parto, mastopatias e sedação do sistema nervoso central. Efeitos complexos no sistema nervoso central: agonistas ou antagonistas de receptores (adrenérgicos, dopaminérgicos). Micotoxinas Penicilina: Produzida por Penicillium spp; Descoberta em 1928 por Alexander Fleming e utilizada a partir de 1941. Altamente eficiente contra bactérias Gram + Não é tóxica ao homem Cefalosporina: Penicilina By Romer labs Produzida por Cephalosporum acremonium Descoberta em 1946 por Giuseppe Brotzu e utilizada como antibiótico Altamente eficiente contra bactérias Gram + e Gram Não é tóxica ao homem Cefalosporina By Romer labs Referências Bibliográficas MINS, C. et al. Microbiologia médica. 5.ed. Elsevier, Rio de Janeiro, 2014 MURRAY, C. et al. Microbiologia médica. 6.ed. Elsevier, Rio de Janeiro, 2009 TORTORA, G.J. et al. Microbiologia . 10.ed. Artmed, Rio de Janeiro, 2012 VERONESE ,R. ; FOCACCIA, R. Tratado de infectologia . 4.ed. Atheneu, 2010