EFEITOS DO DOSSEL DE SARGASSUM VULGARE
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EFEITOS DO DOSSEL DE SARGASSUM VULGARE
ESCOLA NACIONAL DE BOTÂNICA TROPICAL INSTITUTO DE PESQUISAS JARDIM BOTÂNICO DO RIO DE JANEIRO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM BOTÂNICA DIVERSIDADE VEGETAL: CONHECER PARA CONSERVAR EFEITOS DO DOSSEL DE SARGASSUM VULGARE (OCHROPHYTA - FUCALES) EM DUAS COMUNIDADES NA BAÍA DA ILHA GRANDE, RJ. Raquel de Azeredo Muniz Orientação: Dra. Márcia A. de O. Figueiredo & Dr. Gary Andrew Kendrick ENBT- JBRJ Rio de Janeiro 2008 2 ESCOLA NACIONAL DE BOTÂNICA TROPICAL INSTITUTO DE PESQUISAS JARDIM BOTÂNICO DO RIO DE JANEIRO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM BOTÂNICA DIVERSIDADE VEGETAL: CONHECER PARA CONSERVAR EFEITOS DO DOSSEL DE SARGASSUM VULGARE (OCHROPHYTA - FUCALES) EM DUAS COMUNIDADES NA BAÍA DA ILHA GRANDE, RJ. Raquel de Azeredo Muniz Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Botânica, Diversidade Vegetal Conhecer para Conservar, como requisito necessário para a obtenção do grau de Doutor em Botânica. Orientadores: Dra. Márcia A. de O. Figueiredo & Dr. Gary A. Kendrick Rio de Janeiro 2008 EFEITOS DO DOSSEL DE SARGASSUM VULGARE (OCHROPHYTA FUCALES) EM DUAS COMUNIDADES NA BAÍA DA ILHA GRANDE, RJ. 3 Raquel de Azeredo Muniz Orientadora: Márcia A. de O. Figueiredo Co-orientador: Gary A. Kendrick BANCA EXAMINADORA Dra Marcia Figueiredo Creed (Orientadora) Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro Presidente da Banca Dra Maria Teresa Menezes de Széchy Universidade Federal do Rio de Janeiro Dr Ricardo Coutinho Instituto de Estudos do Mar Almirante Paulo Moreira Dra Renata Perpétuo Reis Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro Dr. Carlos Eduardo L. Ferreira Universidade Federal Fluminense Rio de Janeiro Agosto de 2008 4 M966e Muniz, Raquel de Azeredo. Efeitos do dossel de Sargassum vulgare (Ochrophyta - Fucales) em duas comunidades na Baía da Ilha Grande, RJ / Raquel de Azeredo Muniz. – Rio de Janeiro, 2008. xvii, 158 f. : il. Tese (doutorado) – Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro/Escola Nacional de Botânica Tropical, 2008. Orientadora: Marcia Figueiredo Creed. Bibliografia. 1. Alga. 2. Sargassum vulgare. 3. Herbivoria. 4. Baía da Ilha Grande (RJ). 5. Rio de Janeiro (Estado). I. Título. II. Escola Nacional de Botânica Tropical. CDD 589.3098153 5 RESUMO Algas formadoras de dossel influenciam direta ou indiretamente a estrutura da comunidade de algas do estrato inferior. Em duas comunidades bentônicas, sujeitas à diferentes graus de exposição às ondas, o efeito da remoção do dossel de Sargassum vulgare foi testado no inverno e verão. Indivíduos aleatórios foram removidos ou mantidos intactos como controles (n=8), e a composição e abundância dos grupo morfo-funcionais das algas do estrato inferior foram analisadas mensalmente. O efeito do dossel na comunidade em início de sucessão também foi testado, raspando-se o substrato em áreas com e sem dossel. Em geral, o dossel de S. vulgare influenciou a composição e abundância das algas efêmeras nas comunidades maduras. A remoção do dossel favoreceu a abundância de algas efêmeras no verão, porém, no inverno, o efeito foi mascarado na Ilha Comprida, provavelmente pelo sombreamento da mata no costão rochoso. Na comunidade em início de sucessão, o efeito do dossel não foi detectado, provavelmente pela maior disponibilidade de espaço. As populações de S. vulgare foram ainda estudadas quanto à fenologia e ao recrutamento. A densidade de talos recrutas, juvenis e adultos em quadrados aleatórios (n=10), e o investimento em ramos com estruturas de reprodução e vegetativos (n=30) foram estimados mensalmente por um ano. Placas de epóxi (n= 10) foram colocadas no substrato para contagem mensal e bimestral de recrutas. Fases de vida de Sargassum foram testadas quanto à herbívoria por Lytechinus variegatus e Charibdys hellerii, inclusos em gaiolas (n=4-5), contendo Padina como controle. Talos adultos dominaram com produção constante de ramos reprodutivos em ambas populações, porém o recrutamento nas placas foi baixo e sazonal, sendo maior em intervalos bimestrais. L. variegatus preferiu recrutas e C. hellerii os talos adultos de S. vulgare. Sugere-se que o recrutamento seja limitado nessas populações, a despeito do investimento em estruturas de reprodução devido ao 6 distúrbio de herbivoria e que a coalescência dos talos seja uma estratégia para reduzir potenciais distúrbios. O efeito do dossel também foi avaliado quanto à varredura e diminuição da irradiância, além da associação à herbivoria para talos juvenis de Sargassum e Padina. O sombreamento, ao invés da varredura, limitou a abundância das algas no estrato inferior, principalmente de Padina. Não houve efeito do dossel associado ao aumento da pressão de herbivoria, apesar da alta densidade de invertebrados na meso-fauna sob os dosséis. Palavras-chave: costões rochosos, efeito do dossel, fenologia, herbivoria, recrutamento, Sargassum vulgare, sombreamento, varredura. 7 ABSTRACT Canopy algae influence directly or indirectly the structure of understorey algae communities. In two benthic communities, subject to different degrees of wave exposure, the effect of Sargassum vulgare canopy removal was tested in winter and summer. Random individuals were removed or kept intact as controls (n=8) and the composition and abundance of the functional form groups of understorey algae were analyzed monthly. The canopy effect on early sucessional community was also tested, scrapping the substrata in areas with and without the canopy. In general, the canopy of S. vulgare influenced the composition and abundance of ephemeral algae in mature communities. Removal of canopy algae favored the abundance of ephemeral algae in summer, but, in winter, this effect was masked in Comprida Island, probably by forest shading on the rocky shore. In early sucessional community, the canopy effect was not detected, probably due to more space available. The populations of S. vulgare were also studied regarding phenology and recruitment. The density of recruit, juvenile and adult thalli was accessed in random square areas (n=10) and the investment in branches with reproductive structures or vegetative (n=30) were monthly estimated during one year. Epoxi plates (n= 10) were placed on the substratum at monthly and bimonthly intervals to count recruits. Life phases of Sargassum were exposed to herbivores, Lytechinus variegatus or Charibdys hellerii, included into the cages (n=4-5), containing Padina as control. Adult thallus dominated with constant production of reproductive branches in both populations; however, the recruitment on plates was low and seasonal, being higher in bimonthly intervals. L. variegatus preferred recruits, and C. hellerii the adult thallus of S. vulgare. It is suggested that recruitment is limited in these populations, despite the investiment in reproductive structures due to disturbance by herbivore and 8 that coalescent thallus is one strategy to reduce potential disturbances. The canopy effect was also evaluated in relation to sweeping and irradiance decrease, besides the association with herbivory on juveniles thallus of Sargassum and Padina. Shading, instead of sweeping, limited the abundance of understorey algae, mainly Padina. The canopy effect was not associated with an increase of herbivore pressure, despite the high density of meso-fauna invertebrates under the canopies. Palavras-chave: canopy effect, herbivory, phenology, recruitment, rocky shores, Sargassum vulgare, shading, sweeping. 9 Sumário Folha de aprovação........................................................................................................ Resumo............................................................................................................................ Abstract........................................................................................................................... Dedicatória...................................................................................................................... Agradecimentos.............................................................................................................. Lista de Tabelas............................................................................................................. Lista de Figuras.............................................................................................................. Introdução Geral............................................................................................................ Objetivo geral................................................................................................................. Objetivos específicos...................................................................................................... Capítulo 1 Efeito do dossel de Sargassum vulgare C. Agardh (Ochrophyta – Fucales) em diferentes estádios sucessionais de algas do estrato inferior, em dois costões rochosos do sudeste do Brasil......................................................................................................... Resumo............................................................................................................................ Abstract............................................................................................................................ 1) Introdução................................................................................................................... 2) Materiais e métodos.................................................................................................... 2.1)Área de estudo........................................................................................................... 2.2) Parâmetros abióticos................................................................................................. 2.3) Efeito da remoção do dossel de Sargassum vulgare na comunidade madura.......... 2.4) Efeito da remoção do dossel de Sargassum vulgare no recrutamento em áreas raspadas........................................................................................................................... 2.5) Tratamento estatístico.............................................................................................. 3)Resultados.................................................................................................................... 3.1) Parâmetros abióticos................................................................................................. 3.2) Efeito da remoção do dossel de Sargassum vulgare nas algas da comunidade madura... 3.3) Efeito da remoção do dossel de Sargassum vulgare nas algas em fase de recrutamento Discussão 1- Efeito do dossel de Sargassum vulgare nas algas da comunidade madura... 2- Efeito do dossel de Sargassum vulgare nas algas em fase de recrutamento 5)Referências bibliográficas............................................................................................. Tabelas.............................................................................................................................. Figuras.............................................................................................................................. Capítulo 2 Existe limitação no recrutamento de populações de Sargassum vulgare C. Agardh (Ochrophyta – Fucales) no sudeste do estado do Rio de Janeiro, Brasil?............................... Resumo............................................................................................................................. Abstract............................................................................................................................. 1) Introdução..................................................................................................................... 2)Materiais e Métodos...................................................................................................... 2.1)Área de estudo............................................................................................................ 2.2) Parâmetros abióticos................................................................................................. 3 5 7 12 14 15 16 18 20 20 22 23 25 27 30 30 31 32 33 33 35 35 36 38 40 40 45 48 58 63 73 74 75 76 78 78 80 10 2.3) Fenologia.................................................................................................................. 2.4) Recrutamento em placas de colonização.................................................................. 2.5) Herbivoria nas diferentes fases de S. vulgare............................................................ 2.6) Tratamento estatístico................................................................................................ 3)Resultados...................................................................................................................... 3.1) Parâmetros abióticos.................................................................................................. 3.2) Estudo da fenologia................................................................................................... 3.3) Recrutamento em placas de colonização................................................................... 3.4) Herbivoria................................................................................................................. 4) Discussão ..................................................................................................................... 5)Referências bibliográficas............................................................................................. Tabelas............................................................................................................................. Figuras.............................................................................................................................. Capítulo 3 Efeitos do dossel de Sargassum vulgare C. Agardh (Ochrophyta – Fucales) associados à herbivoria, varredura e sombreamento nas algas do estrato inferior da comunidade bentônica........................................................................................................................... Resumo............................................................................................................................. Abstract............................................................................................................................. 1) Introdução.................................................................................................................... 2) Materiais e métodos..................................................................................................... 2.1)Área de estudo........................................................................................................... 2.2) Pressão de herbivoria nos locais de estudo................................................................ 2.3) Efeito da presença de dossel na herbivoria .............................................................. 2.4)Preferência alimentar pelos herbívoros...................................................................... 2.5)Efeito da irradiância na produtividade....................................................................... 2.6) Efeito da varredura do dossel.................................................................................... 2.7) Tratamento estatístico............................................................................................... 3) Resultados.................................................................................................................... 3.1)Pressão de herbivoria nos locais de estudo................................................................ 3.2)Efeito da presença de dossel na herbivoria .............................................................. 3.3) Preferência alimentar pelos herbívoros..................................................................... 3.4) Efeito da irradiância na produtividade...................................................................... 3.5) Efeito da varredura do dossel................................................................................... 4) Discussão..................................................................................................................... 5) Referências bibliográficas............................................................................................ Tabelas.............................................................................................................................. Figuras.............................................................................................................................. Considerações finais........................................................................................................ Referências bibliográficas................................................................................................ 80 82 82 84 85 85 86 87 88 88 96 105 107 110 111 112 113 116 116 117 118 118 119 120 121 122 122 123 123 124 124 125 132 142 143 147 149 11 Ao meu filho e marido muito amados 12 “Faça como o velho marinheiro Que em dia de nevoeiro leva o barco devagar” Paulinho da Viola 13 “Mas eu não sou relógio nem tão pouco parafuso, meu nome é ventania pra esse mundo revirar.” Nó Cego Agradecimentos À minha orientadora Márcia Figueiredo Creed, e ao meu co-orientador Gary Kendrick, por toda ajuda. Ao professor Joel Creed, pela ajuda e paciência com os sensores de temperatura; 14 Aos amigos queridos do PZCost: Daniel Abrantes, Frederico Tapajós, Alexandre Villas-Boas, Sulamita, Raquel Meihoub, Maria Carolina, Rodrigo Mariath (“Bolinho”), Bianca Marins, Poliana Brasileiro, Rita Manso, Bia, etc; As meninas “super-poderosas” da minha turma de doutorado: Ana Angélica Monteiro Barros, Micheline Leite M. Ferreira, Dulce G. Mantuano, Micheline C. Silva, Inês M. Silva; A todos os meus amigos pela ajuda e paciência de escutar todas as minhas reclamações, principalmente aos meus queridos Luciene e Lars; As estimadas Maria Teresa M. Széchy, Ana Paula Veloso, Gisa Eneida, Cristina Nassar, Mariângela Menezes, Simone Oigman, que muito me ajudaram nesta etapa sofrida. Aos professores: Bernardo Gama; Gilberto Filho, Denise Costa e Renata Reis, Leandro Freitas e Verônica Calado por todos os auxílios e dicas essenciais no meu desenvolvimento como profissional. Aos amigos de Bracuí, fundamentais para a realização deste trabalho, principalmente: João Bosco Ferreira e família e Julio César Martins. A todo pessoal das operadoras de mergulho: Projeto Mergulhar e Frade Diver pelo apoio fundamental. A toda equipe da secretaria da Pós ao longo do tempo: Abílio, Marcia Demby, Catarina, Janúzia, Nilsão, Isabel, Diego, etc, minha gratidão sincera. A DEUS por e dar uma força que eu nem sabia que teria para vencer tantos obstáculos neste momento difícil, e..... Ao MAR! 15 LISTA DE TABELAS Capítulo 1 Tabela 1: Análise de variância trifatorial entre os fatores: local (Ilhas CompridaIC e das Flechas- IF), época do ano (inverno e verão) e dossel (presença ou ausência) de S. vulgare, em relação às diferenças de massa seca de sedimentos. GL= grau de liberdade; MQ= média dos quadrados; F= estatística de teste; P= nível de significância Tabela 2: Análise de variância bifatorial repetitiva no tempo, entre os fatores: locais (Ilhas Comprida- IC e das Flechas- IF) e dossel (presença ou ausência) de S. vulgare, em relação a abundância de algas efêmeras (filamentosas e foliáceas), nas porções centrais (A) e de borda (B), no inverno. GL= grau de liberdade; MQ= média dos quadrados; F= estatística de teste; P= nível de significância................................. Tabela 3: Análise de variância bifatorial repetitiva no tempo, entre os fatores: locais (Ilhas Comprida - IC e das Flechas- IF) e (dossel presença ou ausência) de S. vulgare, em relação a abundância de algas efêmeras (filamentosas e foliáceas), nas porções centrais, no verão. GL= grau de liberdade; MQ= média dos quadrados; F= estatística de teste; P= nível de significância.......................................... Tabela 4: Análise de variância bifatorial repetitiva no tempo, entre os fatores: locais (Ilhas Comprida - IC e das Flechas- IF) e (dossel presença ou ausência) de S. vulgare, em relação a abundância de algas efêmeras (cilíndrico-corticadas), nas porções centrais, no verão. GL= grau de liberdade; MQ= média dos quadrados; F= estatística de teste ; P= nível de significância.... Capítulo 2 Tabela 1: Análise de variância bifatorial entre os fatores: local (Ilhas CompridaIC e das Flechas- IF), e tempo (entre outubro de 2006 e outubro de 2007), em relação a abundância de talos recrutas na população de S. vulgare. GL= grau de liberdade; MQ= média dos quadrados, F= estatística de teste, P= nível de significância............................................................. Tabela 2: Análise de variância trifatorial entre os fatores: local (Ilhas Comprida e das Flechas), tempo (meses entre outubro de 2006 e outubro de 2007), e ramo (ramos com estruturas reprodutivas e ramos vegetativos) de S. vulgare. GL= grau de liberdade; MQ= média dos quadrados, F= estatística de teste , P= nível de significância............................................. Capítulo 3 Tabela 1: Análise de variância bifatorial entre os fatores fixos: local (Ilhas Comprida e das Flechas), e grupo de alga (Padina e Sargassum), em relação à porcentagem de volume consumido. GL= grau de liberdade; MQ= média dos quadrados, F= estatística de teste, P= nível de significância. ............................................... Tabela 2: Análise de variância bifatorial entre os fatores fixos: dossel (presença e ausência), e grupo de alga (Padina e Sargassum), em relação à porcentagem de volume consumido. GL= grau de liberdade; MQ= média dos quadrados, F= estatística de teste, P= nível de significância............................................................................ LISTA DE FIGURAS 58 59-60 61 62 105 106 142 142 16 Capítulo 1 Figura 1: Mapa da área de estudo. Estrelas apontam os locais estudados... Figura 2: Fotos dos locais de estudo, (A) Ilha Comprida e (B) Ilha das Flechas, na superfície; e (C) e (D) na zona infralitoral Figura 3:Esquema mostrando os tratamentos empregados nos experimentos que testam o efeito da presença do dossel em comunidades maduras e comunidade primária, em início de sucessão, nos locais de estudo onde o dossel foi removido ou mantido intacto em dois locais de estudo. IF = Ilha das Flechas e IC= Ilha Comprida... Figura 4: Abundância de sedimentos depositados no substrato, na Ilha das Flechas (IF) e Ilha Comprida (IC), no inverno e verão, nas áreas com e sem dossel de Sargassum vulgare. (*) Dados significativos. Figura 5: Cobertura (%) dos grupos morfo-funcionais de algas e invertebrados sésseis do estrato inferior da comunidade madura (porção central) na presença e ausência do dossel de Sargassum vulgare, nas Ilhas Comprida (A) e das Flechas (B), no inverno, ao longo de dois meses após o início do experimento (T0 - maio, T1- junho, T2- agosto). (Média + Erro padrão, n=8) Figura 6: Cobertura (%) dos grupos morfo-funcionais de algas e invertebrados sésseis do estrato inferior da comunidade madura (porção de borda) na presença e ausência do dossel de Sargassum vulgare, nas Ilhas Comprida (A) das Flechas (B), no inverno, ao longo dois meses após o início do experimento (T0 - maio, T1- junho, T2- agosto). (Média + Erro padrão, n=8). Figura 7: Cobertura (%) dos grupos morfo-funcionais de algas e invertebrados sésseis do estrato inferior da comunidade madura (porção central) na presença e ausência do dossel de Sargassum vulgare, nas Ilhas Comprida (A) das Flechas (B), no verão, um mês após o início do experimento (T0- outubro, T1- novembro). (Média + Erro padrão, n= 8-5) Figura 8: Comprimento e diâmetro do talo de Sargassum vulgare em áreas com o dossel intacto (controle) e com dossel cortado (tratamento), na comunidade madura, nas Ilhas Comprida (A) e das Flechas (B), ao longo de dois meses no inverno (T0- maio, T1- junho, T2- agosto). (Médias ± Desvio padrão, n=8). Figura 9: Comprimento e diâmetro do talo de Sargassum em áreas com o dossel intacto (controle) e com dossel cortado (tratamento), na comunidade madura, nas Ilhas Comprida (A) e das Flechas (B), ao longo de dois meses no verão (T0- outubro, T1novembro). (Médias ± Desvio padrão, n=8-5). (*)Dados ausentes por perda das réplicas. Figura 10: Cobertura (%) dos grupos morfo-funcionais de algas e invertebrados sésseis do estrato inferior da comunidade em início de sucessão (porção central) na presença e ausência do dossel de Sargassum vulgare, na Ilha das Flechas, no inverno (A) e no verão (B), em até três mêses após o início do experimento (T1, T2, T3). (Média + Erro padrão, n= 4). Figura 11: Comprimento e diâmetro do talo de Sargassum vulgare em áreas com o dossel intacto (controles) e com dossel cortado (tratamento), na comunidade em início de sucessão, na Ilha das Flechas, ao longo de três meses no inverno (A) e verão (B). (*) Dados ausentes por perda das réplicas. (Médias ± Desvio padrão, n= 4). 63 64 65 65 66 67 68 69 70 71 72 Capítulo 2 Figura 1: Variação da temperatura da água do mar, nos mêses entre os mêses de outubro de 2006 a outubro de 2007, na Ilha das Flechas (IF) e Ilha Comprida (I C). Média ± desvio.padrão........................................................................................... 107 -2 Figura 2: Variação na densidade (n°. /0,2em ) de recrutas, bases e talos adultos de Sargassum vulgare nas ilhas Comprida (A) e das Flechas (B), entre os meses de outubro 17 2006 a outubro de 2007. Média + erro padrão (n = 10). As letras acima das colunas de ‘a-d’ se referem às diferenças significativas entre médias no teste de Fisher para juvenis; ‘e-n’ se referem às diferenças entre médias de adultos e (?) significa meses com dados ausentes................................................................................................ Figura 3: Investimento percentual (% por 0.25m-2) nos ramos com estruturas reprodutivas dos talos adultos de S. vulgare nas ilhas Comprida (A) e das Flechas (B), nos mêses entre outubro de 2006 a abril de 2007. Média ± desvio padrão, (n = 10). Os dados referentes aos meses de março, maio e agosto não estão presentes....................... Figura 4: Densidade de recrutas de S. vulgare em placas (191cm2) colocadas no sublitoral e retiradas em intervalos de um mês (A) e dois meses na Ilha das Flechas (B). Média + erro padrão (n= 6). Letras distintas acima das colunas indicam médias significativamente diferentes pelo teste de Fisher............................................................ Figura 5: Porcentagem de volume (ml) consumido de talos recrutas, juvenis e adultos de S. vulgare por ouriços (A) e siris (B). Média + erro padrão (n= 5). Foi incluído um herbívoro por gaiola........................ Capítulo 3 Figura 1: Volume consumido (ml) de Padina e S. vulgare, em termos de porcentagem, por herbívoros em geral, na Ilha Comprida (IC) e na Ilha das Flechas (IF). Média +erro padrão.......................................................................... Figura 2: Proporção (%) da densidade de grupos da mesofauna em áreas amostradas de 225 cm2, presentes nas algas do estrato inferior das comunidades nas Ilha Comprida e Ilha das Flechas. Média, +erro.padrão Figura 3: Porcentagem de consumo das algas Padina e Sargassum por herbívoros, em geral, na Ilha das Flechas, em maio de 2007. DH: (presença de dossel e de herbívoros); SDH: (ausência de dossel e presença de herbívoros). Médias + erro padrão)......... 107 108 108 109 143 143 144 Figura 4: Densidade de invertebrados, em geral, da mesofauna nas áreas sob ausência e presença do dossel de S. vulgare. Média + erro padrão. Figura 5: Porcentagem de consumo por herbívoros, em geral, de grupos morfofuncionais de macroalgas: alga filamentosa (Ceramium spp.), alga foliácea (Padina gymnospora) e alga coriácea (talos juvenis de S. vulgare) no campo. As letras acima das colunas denotam diferenças entre médias segundo o teste de Fisher......................... Figura 6: Produção de oxigênio por P. gymnospora em frascos simulando áreas não sombreadas pelo dossel de S. vulgare, com sombreamento pelo dossel e em áreas totalmente no escuro que simulam respiração, durante um período de duas horas de incubação no campo. Média +erro padrão................................................... Figura 7: Porcentagem de cobertura dos grupos de algas, invertebrados e substrato disponível em áreas abaixo do dossel de S. vulgare (A), áreas sem o dossel (B) e áreas abaixo de mímicas plásticas de S. vulgare (C), na Ilha das Flechas. Médias + erro padrão 144 145 145 146 18 INTRODUÇÃO GERAL As macroalgas são componentes importantes nos ambientes marinhos, exibindo variações morfológicas e tipos estruturais que caracterizam estes habitats. Nos substratos consolidados, as macroalgas podem apresentar uma variação de formas de talo, dentre estas: as filamentosas, foliáceas, cilíndrico-corticadas, calcárias articuladas, e coriáceas formadoras de dossel, todas de porte ereto; e as crostosas com talos prostrados aderentes ao substrato. Estas diferentes formas de macroalgas diferem entre si, mediante diferenças nas taxas de crescimento, habilidades competitivas e estratégias contra a herbivoria (Littler & Littler, 1980, 1984; Steneck, 1988; Norton, 1991 e Steneck & Dethier, 1994). Nos ecossistemas marinhos, geralmente, as algas formadoras de dossel são representadas por algas pardas (Ochrophyta, Fucales) que dominam em algumas regiões temperadas e tropicais (Lüning, 1990, Santelices, 2007). Algumas espécies destas algas são consideradas espécies engenheiras (Thibaut et al., 2005), pois modificam o ambiente, permitindo assim a facilitação ou inibição de determinados organismos ocuparem determinado ecossistema (Jones et al., 1994, 1997). Sendo assim, estas macroalgas podem influenciar, positivamente ou negativamente, outros organismos das comunidades bentônicas, mediante fatores diretos ou indiretos, como: a varredura do talo, quando em sinergia com a turbulência das águas, derivada de ondas e correntes (Kennelly, 1989; Kiirikki, 1996; Cheroske et al., 2000; Eckman, 2003); a herbivoria, quando o talo atua como abrigo para espécies de herbívoros (Edgar & Klumpp, 2003; Tanaka & Leite, 2003, Thompsen & McGlathery, 2005) ou repele estes (Edgar, et al., 2003; Gagnon, et al., 2003); o sombreamento do substrato por suas frondes (Figueiredo et al., 1997, 2000; Connell, 2003; Clark et al., 2004; Toohey et al., 19 2007) e aumento da complexidade do habitat, pela adição de componentes estruturais (Beck, 2000). Desse modo, os efeitos do dossel irão influenciar a dinâmica e distribuição não só de outras espécies de macroalgas, mas também da própria espécie de alga formadora do dossel, mediante o efeito da alga adulta sobre seus recrutas (Chapman, 1990; Benedetti-Cecchi & Cinelli, 1992; Toohey & Kendrick, 2007). As algas associadas às formadoras de dossel, geralmente estão presentes como epífitas, ou ocupam o estrato inferior da comunidade, podendo formar dois estratos: ‘tapetes’ quando densamente emaranhadas no substrato (Airoldi & Cinelli, 1995, MacManus & Polsenberg, 2004) ou serem representadas pelo grupo morfo-funcional crostoso (Dethier, 1994). As algas do estrato inferior podem por sua vez suprimir ou facilitar o recrutamento de outras algas, inclusive as formadoras de dossel (Kennely, 1987; Stewart, 1989, Brawley & Johnson, 1991; Britton-Simmons, 2006). Dentre os efeitos do dossel, aqueles associados à herbivoria são de extrema importância para as comunidades bentônicas marinhas, pois, podem influenciar direta ou indiretamente a abundância, composição e distribuição, tanto das algas formadoras de dossel, quanto às do estrato inferior (Worm & Chapman, 1998; Tuya et al., 2005; Steneck et al., 2004). Ao controlar a abundância das macroalgas, os herbivoros podem mediar processos de competição, mitigar efeitos de impactos ambientais e interferir no processo de resiliência das comunidades (Mumby et al., 2006). Outros fatores, que podem ou não estar associados ao efeito do dossel, também influenciam o crescimento e abundância das algas do estrato inferior nas comunidades marinhas de substrato consolidado, como: sedimentação (Kendrick, 1991; Airoldi & Cinelli, 1997; Irving & Connel, 2002; Connel, 2003; Balata et al., 2007), disponibilidade de nutrientes (Cronin & Hay, 1996; Schaffelke, 1999; Pulido & McCook, 2003), irradiância (Algarra & Niell, 20 1991; Falkowski & LaRoche, 1991) e movimentação da água (Hurd, 2000; Lindegarth & Gamfeldt, 2005) ou ainda competição entre espécies (Olson & Lubchenco, 1990). No Brasil, a principal alga formadora de dossel pertence ao gênero Sargassum. Este gênero é considerado o mais importante em termos de abundância em costões rochosos do litoral sudeste (Paula & Eston, 1987; Széchy & Paula, 2000; Amado Filho et al., 2003). Esta alga já foi bastante estudada em termos descritivos quanto a sua participação na estrutura de comunidades no litoral brasileiro (Mansilla & Pereira, 1998; Széchy & Paula, 2000; Muniz et al., 2003; Reis et al., 2003; Figueiredo et al., 2004; Széchy et al, 2000, 2006; Figueiredo, 2006; Figueiredo & Tâmega, 2007). Contudo, o menor investimento em inventários e estudos ecológicos sobre a dinâmica de comunidades de macroalgas bentônicas, especialmente em ambientes de substrato consolidado no infra-litoral (Horta, 2000), torna ainda defasado o conhecimento sobre o seu papel na composição e estrutura das comunidades de costão rochoso. Entretanto, os estudos experimentais, com enfoque nas interações entre espécies são menos comuns, como os realizados por Paula & Eston (1989) e Eston & Bussab (1990). Sendo assim, o objetivo geral deste trabalho foi: Avaliar o efeito do dossel de Sargassum vulgare C. Agardh na comunidade de organismos bentônicos do estrato inferior, principalmente na associação de macroalgas, em duas comunidades de costão rochoso na região sudeste do Rio de Janeiro. E os objetivos específicos foram: • Verificar se existe efeito do dossel de Sargassum vulgare (Ochrophyta Fucales), em escala individual, na composição e dinâmica das comunidades de algas do estrato inferior, em diferentes estádios sucessionais, em dois costões 21 rochosos, depende dos diferentes graus de exposição às ondas, e da época do ano; • Verificar se existe limitação no recrutamento de populações de S. vulgare em comunidades dominadas pelos dosséis de Sargassum adultos, em resposta ao investimento em estruturas de reprodução dos talos, e também em relação à herbivoria, e • Verificar se o efeito do dossel de S. vulgare sobre a composição e abundância das algas do estrato inferior está associado à herbivoria pela agregação de invertebrados herbívoros, maior varredura pelos talos, ou redução da irradiância sobre a comunidade de algas do seu estrato inferior. 22 CAPÍTULO 1 EFEITO DO DOSSEL DE SARGASSUM VULGARE C. AGARDH EM COMUNIDADES COM DIFERENTES ESTÁDIOS SUCESSIONAIS, EM DOIS COSTÕES ROCHOSOS DO SUDESTE DO BRASIL. Muniz, R de A.1*; Kendrick, G. A.3 & Figueiredo, M. A. de O.2 1 - Escola Nacional de Botânica Tropical, [email protected], 2 -Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro, [email protected] 3 - University of Western Australia, [email protected] Artigo a ser submetido ao Journal of Experimental Marine Biology and Ecology 23 Resumo Bancos de macroalgas tropicais geralmente são formados por espécies formadoras de dossel. Estas algas influenciam direta ou indiretamente a estrutura da comunidade de algas do estrato inferior. Abaixo do dossel, as algas calcárias articuladas tendem ser mais abundantes em costões rochosos no sudeste do Brasil. Todavia, as algas efêmeras formadoras de tapete parecem ser mais sensíveis à remoção do dossel. Este estudo testou a significância da presença do dossel, em duas comunidades dominadas por Sargassum vulgare, em duas ilhas com diferentes graus de exposição às ondas. O efeito da remoção do dossel foi medido em cada talo de S. vulgare, em duas comunidades maduras e uma e início de sucessão. Em duas estações (inverno e verão), indivíduos de S. vulgare foram aleatoriamente escolhidos, alguns intactos como controles e outros foram removidos (n=8). A composição e abundância das algas do estrato inferior foram analisadas mensalmente com uma unidade amostral de 962 cm2, com 30 pontos aleatórios, dividida em porção central e de borda. A cobertura das algas foi quantificada para cada grupo morfo-funcional, e as diferenças entre estas foram testadas com uma ANOVA repetitiva. Para testar o efeito do dossel na comunidade em início de sucessão, o substrato foi raspado em áreas com e sem dossel. No inverno, o efeito da remoção do dossel foi significativo somente na Ilha das Flechas, onde algas foliáceas prolifereram sobre as calcárias articuladas. No verão, o efeito do dossel foi significativo em ambas as ilhas, com a dominância de algas foliáceas e cilíndrico corticadas na Ilha das Flechas, e de algas filamentosas na Ilha Comprida. As porções de borda não se alteraram pela remoção do dossel. Sendo assim, existiu efeito do dossel de S. vulgare na estrutura das comunidades maduras, dependendo do local e época do ano. Apesar do grau de exposição às ondas diferir entre os locais de estudo, a remoção do dossel favoreceu à abundância de algas efêmeras no verão, porém, no inverno, foi mascarada 24 na Ilha Comprida, provavelmente pelo sombreamento da floresta que limitou ainda mais a luz no costão rochoso adjacente. Na comunidade em início de sucessão, o efeito do dossel não foi significativo, devido a menor competição por luz e maior disponibilidade de espaço. Palavras chave: Dossel Sargassum vulgare; sucessão; algas efêmeras; costão rochoso, algas do estrato inferior; exposição às ondas. 25 Abstract Tropical macroalgae beds are generally formed by large size canopy-forming species. These algae influence directly or indirectly the community structure of understorey algae. Below the canopy, articulated calcareous algae tend to be more abundant on rocky shores in the southeastern of Brazil. Ephemeral turf algae, however, seems to be more sensible to canopy removal. This study tested the significance of canopy effects on two communities dominated by Sargassum vulgare, in two islands under different exposure wave: The canopy removal effect measured for each thallus of S. vulgare, in two mature communities and one early successional community. In two seasons (winter and summer), S. vulgare individuals were randomly chosen, somewhere intact as controls and others had canopies removed (n=8). The algae composition and abundance of undestorey algae were analysed at the month intervals within a experimental unit of 962 cm2, using 30 random points marked, divided in central and edge portions. The algae cover was quantified for each algae form-functional groups, and the differences between these were tested with repeated mesures ANOVA. In order to test the canopy effect on early successional community, the substratum was scraped in areas with and without canopy. In winter, canopy removal effect was significant only in Flechas Island, where foliose algae prolifered upon articulated calcareous algae. In summer, the canopy effect was significant in both islands, dominating foliose and corticated algae in Flechas island, and filamentous algae in Comprida island. The edge portions not alter by canopy removal. So, S. vulgare canopy influenced algae structure of mature communities, depending of the site and season. Although the degree of exposure to waves differ between the two study sites, canopy removal enhanced ephemeral algae effect this abundance in some way in summer was masked in Comprida Island probably, by forest shade that limit even more the light in winter, on rocky shore 26 beneath. In the early successional stadio community, the canopy effect was not significant, due to less competition for light or more space availability. Key words: Canopy; ephemeral algae; rocky shore; Sargassum vulgare; succession; understorey algae; wave exposure. 27 Introdução No ambiente marinho bentônico, o espaço físico é freqüentemente um recurso limitado (Sebens, 1986). A coexistência das diferentes espécies de algas nas comunidades bentônicas se torna possível através de determinados fatores como: competição, predação e distúrbios ambientais (Airoldi, 2000). O distúrbio ambiental pode ser definido como o processo que remove grande parte da biomassa viva em comunidades (Farrel, 1991). Sendo assim, a coexistência de determinadas espécies, menos competitivas, em habitats onde o espaço é limitado, ocorre como resultado de danos causados pelas espécies competitivamente superiores e dominantes, e pelo aumento da heterogeneidade do habitat (formando um mosaico com diferentes estádios sucessionais), decorrentes de distúrbios físicos ou biológicos (Johnson & Mann, 1993; Keddy, 2005). Os bancos de macroalgas, em diferentes regiões do mundo geralmente, são constituídos por algas dominantes formadoras de dossel, ou seja, formam um estrato superior, que na maioria das vezes são de algas pardas (Ochrophyta). As algas formadoras de dossel são caracterizadas por possuírem comprimento maior que 30cm, o que permite cobrir outras algas no estrato inferior (Goldberg & Kendrick, 2004; Santelices, 2007). Estas algas, ao formarem dosséis, exercem forte influência no restante da comunidade bentônica (Kendrick et al., 1999, 2003; Toohey et al., 2004; Wernberg et al., 2005), suprimindo ou facilitando (Kastendiek, 1982; Irving et al., 2004) determinados táxons associados. Tais macroalgas formadoras de dossel podem ser consideradas espécies “engenheiras”, pois a presença dominante destas algas regula os recursos disponíveis no ecossistema e, consequentemente, altera as condições 28 ambientais, facilitando, ou suprimindo o crescimento e sobrevivência de outras espécies (Jones et al., 1994, 1997). As algas associadas, localizadas no estrato inferior ao dossel podem ser espécies formadoras de tapete (‘turfs’). Espécies que crescem emaranhadas, formando almofadas (MacManus, et al., 2004). Estas associações de algas de diferentes espécies, com talos curtos, eretos e que cobrem substancialmente o substrato são muito comuns em costões rochosos e recifes do mundo todo (Stewart, 1989; Benedetti-Cecchi & Cinelli, 1994; Akioka, 1999). Algas de diferentes grupos morfo-funcionais possuem esta característica de formar tapetes, como por exemplo, algas calcárias articuladas, filamentosas, foliáceas e algumas espécies de cilíndrico corticadas. A principal alga formadora de dossel no Brasil pertence ao gênero Sargassum. Esta alga é considerada a mais importante em termos de abundância em costões rochosos do litoral sudeste (Paula & Eston, 1987; Széchy & Paula, 2000a; Amado Filho et al., 2003). Estudos descritivos sobre estrutura e dinâmica de comunidades bentônicas dominadas por Sargassum são relativamente comuns no litoral brasileiro (Mansilla & Pereira, 1998; Godoy & Coutinho, 2002; Reis et al., 2003; Széchy et al., 2005; Széchy et al, 2006). Alguns destes estudos citam a presença marcante de algas calcárias articuladas associadas aos bancos de Sargassum (Széchy & Paula, 2000a; Széchy & Paula, 2000b; Figueiredo et al., 2004). Contudo, os estudos com enfoque nas interações entre espécies através de experimentos de remoção de Sargassum e sucessão são menos comuns, como os realizados por Paula & Eston (1989) e Eston & Bussab (1990). Tais estudos detectaram a proliferação de algas efêmeras, principalmente foliáceas, após a remoção do dossel. As relações entre algas formadoras de dossel e algas do estrato inferior foram amplamente estudadas em ecossistemas de clima temperado, através de experimentos 29 de remoção de dossel (algas kelps), principalmente em grandes escalas, ou seja, em metros (Kastendiek, 1982; Hawkins & Hartnoll, 1985; Figueiredo et al., 1996, Goldberg & Kendrick, 2004; Irving et al., 2004; Millazo et al., 2004, entre outros). Contudo, as algas formadoras de tapetes, encontradas com frequência abaixo do dossel, podem ter sua composição e abundância influenciadas principalmente por processos que operam em pequena escala espacial (Coleman, 2002). O objetivo deste estudo foi avaliar experimentalmente o efeito do dossel de Sargassum, em escala individual, na estrutura de comunidades maduras e no recrutamento das algas do estrato inferior na fase inicial de sucessão, em dois locais com diferentes graus de exposição às ondas e em duas épocas do ano (inverno e verão). As hipóteses enunciadas abaixo foram testadas considerando como áreas de influência as porção central e borda ao redor dos apressórios de Sargassum e a possibilidade de regeneração do seu dossel ao longo de um curto período (medidas repetitivas de até 3 meses). (1) O dossel de S. vulgare interfere na estrutura da associação de algas do estrato inferior da comunidade madura; (2) A abundância das algas do estrato inferior das comunidades maduras varia entre locais com diferentes graus de exposição às ondas, com maior proliferação na área mais exposta; (3) O efeito do dossel de S. vulgare sobre as algas do estrato inferior das comunidades maduras varia entre os locais de estudo, dependendo da época do ano; (4) O dossel de S. vulgare interfere na abundância das algas do estrato inferior da comunidade em início de sucessão; (5) O efeito do dossel de S. vulgare na deposição de sedimentos no substrato é maior para locais abrigados, dependendo da época do ano; 30 Materiais e métodos Área de estudo Este estudo foi realizado em duas ilhas localizadas na Baía da Ilha Grande, região sudeste do Brasil. A Ilha das Flechas situa-se nas coordenadas 22○ 57` S, 44○ 21` O e a Ilha Comprida em 22○ 57` S, 44○ 22` O (Fig. 1). O primeiro local é exposto à ação de fortes ondulações e correntes, e o substrato compõe-se de um platô de granito extenso (Fig. 2a,c). Este local possui um denso banco de Sargassum vulgare com indivíduos de tamanho médio, aproximadamente 40 cm de altura, ao longo de uma faixa contínua. O segundo local é mais abrigado das ondulações, e o substrato é formado por matacões de granito dispostos irregularmente, cobertos também por S. vulgare, onde os indivíduos de maior porte estão dispostos de modo esparso e, em alguns pontos podem ultrapassar 1 m de comprimento. Neste local, grande parte do costão rochoso é sombreado pela vegetação terrestre da Mata Atlântica, que em alguns pontos encontra-se muito próxima a linha d’água (Fig.2b,d). Em ambas as ilhas, o estudo foi realizado na região infralitoral rasa (2-3 m de profundidade). Nos dois locais, o estrato inferior é dominado por uma densa cobertura de algas calcárias articuladas como: Amphiroa beauvoisii (J.V. Lamouroux) e Jania spp. Estas algas formadoras de tapete geralmente são cobertas por algas filamentosas epífitas na Ilha Comprida, (principalmente Ceramium Roth) e foliáceas na Ilha das Flechas (principalmente Padina Anderson e Dictyota J. V. Lamouroux). Outras algas menos abundantes são as coriáceas (recrutas e talos juvenis de Sargassum), crostas calcárias e algas cilíndrico corticadas, principalmente Laurencia spp. Lamouroux e Asparagopsis taxiformis. (Delile) Trevisan de Saint-Léon e Dichotomaria marginata J. 31 V. Lamouroux. A fauna séssil é composta em grande parte por zoantídeos, anêmonas, poríferos e cirripédios. 1) Parâmetros abióticos Parâmetros abióticos foram medidos, como a temperatura da água do mar, registrada através de sensores (DS1921G Thermochron iButton) colocados a 3m de profundidade em ambas as Ilhas, com medições a cada 1:30h, durante o período de estudo, entre 2005 e 2006. A deposição de sedimentos no substrato foi avaliada em áreas cobertas por dossel e em clareiras naturais (n=10). Seringas plásticas de 20ml foram usadas para aspirar os sedimentos no substrato em amostras de 25 cm2. As amostras foram colocadas em sacos plásticos individuais e posteriormente secas em estufa a 60º C por um período de 24 h e posteriormente pesadas em balança de precisão. A intensidade luminosa (irradiância) foi medida previamente, na Ilha Comprida em cada um dos estratos da comunidade. Um fotômetro acoplado a um sensor submerso e outro terrestre (Licor LI-1000) foi utilizado para estimar a redução da irradiância na coluna d’água. Medidas alternadas entre áreas cobertas ou não pelo dossel de Sargassum (n=10) foram utilizadas para estimar a redução da irradiância pela cobertura do dossel. O grau de exposição às ondas foi calculado seguindo o método de Thomas (1985), aplicando-se uma fórmula que indica o grau de exposição relativo ao arco da exposição, energia do vento e topografia do fundo (EI = Σ log W x [1 + log F/(CS + 0.1 DS)]), onde EI é o índice de exposição, W é a energia do vento [(porcentagem do tempo em que o vento sopra / 100) x (velocidade do vento2)], F é a extensão da pista 32 onde corre o vento em milhas náuticas (máximo de 100 milhas), CS é a distância em milhas náuticas de água com profundidade menor que 6 m próximo à costa, DS é a distância em milhas náuticas de água com profundidade de menor que 6 m dentro da pista, em relação ao continente mais próximo. 2) Efeito do dossel de Sargassum vulgare na comunidade madura O efeito da remoção de dossel de S. vulgare foi testado através de experimentos realizados com exemplares marcados aleatoriamente (n=8), ao longo de um transecto de 50m nos dois locais de estudo. Parte dos exemplares foi mantida intacta, como controle, e a outra foi removida através de corte na base do talo. A porcentagem de cobertura das algas no estrato inferior dos exemplares marcados foi avaliada mensalmente, durante um período mínimo de dois meses após a implantação do experimento, e máximo de quatro, porém, somente períodos de um ou dois meses foram expostos neste trabalho, em função das rápidas respostas da comunidades, em função da remoção do dossel. Em uma unidade amostral circular de 35 cm de diâmetro (962 cm2) de plástico translúcido foram marcados 30 pontos aleatórios na área total (Fig. 3), delimitando-se porção central e periférica. Para cada um dos pontos marcados, a presença dos grupos morfo-funcionais de algas, segundo a classificação de Steneck & Dethier (1994) foi registrada. Uma margem de 20 cm ao redor da área amostrada foi aberta como uma “zona de amortecimento”, para evitar uma possível interferência de outros talos de Sargassum na unidade amostral. O comprimento e o diâmetro dos exemplares foram medidos mensalmente, ao longo do período de cada experimento, para verificar a variação temporal destes parâmetros na população de S. vulgare (controles e talos cortados). A recuperação do 33 tamanho do dossel foi avaliada comparando-se controles aos exemplares cortados. Este experimento foi realizado numa profundidade aproximada de 2 m, em dois períodos: entre maio e início de agosto de 2005 (inverno), e entre outubro e novembro de 2005 (verão). A duração de cada experimento diferiu devido à perda de réplicas marcadas, entre um e dois meses. 3) Efeito do dossel de Sargassum vulgare no recrutamento em áreas raspadas. O efeito de S. vulgare no recrutamento de algas foi avaliado somente na Ilha das Flechas, onde o banco de macroalgas é mais denso. O procedimento foi semelhante ao relatado no experimento anterior, sendo que neste caso, a área amostrada total (aproximadamente 0,25 m2) ao redor das réplicas, teve o substrato raspado por meio de espátula e escova de aço. A porcentagem de cobertura do estrato inferior sob os exemplares marcados também foi avaliada mensalmente com a mesma unidade amostral circular (Fig. 3). Este experimento foi realizado de agosto a novembro de 2005 e de fevereiro a maio de 2006. Os meses do ano foram escolhidos em função da maior freqüência de talos reprodutivos na primavera, em áreas próximas ao local de estudo (Széchy et al., 2006). Estas épocas foram denominadas de inverno e verão. 4) Tratamento estatístico Para a análise da quantidade de sedimentos depositados no substrato, os seguintes fatores fixos foram testados com ANOVA trifatorial (Modelo 1): local (Ilha Comprida e das Flechas), dossel (presença ou ausência) e época do ano (inverno e verão). 34 Para as análises dos experimentos com as comunidades maduras e em início de sucessão, os fatores fixos testados foram: local (Ilha Comprida e das Flechas) e dossel (presença ou ausência). Foram realizados testes de ANOVA repetitiva, pois, as mesmas réplicas foram quantificadas ao longo do tempo de duração de cada experimento (Crowder & Hand, 1990). As épocas do ano não foram consideradas para ANOVA trifatorial porque as medidas repetitivas foram feitas ao longo de 2 meses após a manipulação do dossel no inverno, e somente após um mês no verão, devido a perda de réplicas nas áreas tratadas (corte dos talos). As diferenças das coberturas das algas do estrato inferior, no experimento realizado na comunidade madura, foram analisadas com ANOVA bifatorial (Modelo 1) repetitiva. No experimento realizado com a comunidade em início de sucessão foi utilizada ANOVA unifatorial repetitiva, somente para testar o efeito do dossel, e em ambos os experimentos, as coberturas das algas oportunistas foram analisadas de uma forma geral, ou seja, com o somatório da cobertura de filamentosas e foliáceas, enquanto que a cobertura das algas cilíndrico-corticadas foi analisada separadamente, devido a maior complexidade do talo. Os dados de porcentagem de cobertura foram transformados para arco seno da raiz quadrada da proporção para garantir a homogeneidade das variâncias, que foi testada pelo teste de Cochran utilizado em todas as análises citadas, segundo (Zar, 1984). Os programas estatísticos utilizados foram SPSS e Statística. Para analisar as diferenças entre os comprimentos e diâmetros dos talos de S. vulgare, em ambos os experimentos, foram utilizados testes de ANOVA unifatorial, para os fatores fixos: presença ou ausência de Sargassum, no último tempo de análise, e a homogeneidade foi assumida. E finalmente, para a observação de possíveis relações 35 competitivas entre os grupos morfo-funcionais de algas foram realizados testes de correlação de Pearson. Resultados Os resultados dos experimentos demonstraram que o efeito do dossel de S. vulgare foi significativo, reduzindo a abundância das macroalgas oportunistas nas comunidades maduras, dependendo do local, no inverno. Enquanto que, no verão, o efeito do dossel foi percebido em ambas as ilhas. A abundância de sedimentos depositados no substrato não dependeu da presença do dossel, mas sim do local em função da época do ano. Na comunidade em início de sucessão, o efeito do dossel não foi observado. 1) Parâmetros abióticos A temperatura da água do fundo variou entre 23,0° C (julho) e 28,6º C (março), em ambas as Ilhas, no período de estudo. E a salinidade oscilou entre 34 a 35 entre as duas ilhas. A irradiância variou entre 292 e 413 µmol.m-2 s-1, no períodos de maior insolação, nas áreas abertas, enquanto que, abaixo do dossel registrou-se somente 16 27% da irradiância incidente, isto é, (65,8 a 77,9 µmol.m-2 s-1). A presença do dossel de S. vulgare não interferiu na abundância de sedimentos depositados no substrato em ambas as ilhas, porém a interação entre local e época do ano foi significativa, apontando a abundância de sedimentos significativamente maior na Ilha Comprida, no inverno (Tabela 1; Fig. 4). Na Ilha das Flechas, houve tendência para maior deposição de sedimentos no verão, porém esta não foi significativa. 36 O índice de exposição às ondas verificado foi de 9 e 11, para Ilha Comprida e Ilha das Flechas, respectivamente. É importante ressaltar que este índice apenas leva em consideração a ocorrência de ondas originadas por ventos, ou seja, pode haver falhas neste índice, uma vez que também há incidência de ondas na região que não são originadas por ventos locais (Creed et al., 2007), como por exemplo, àquelas geradas pelo regime de correntes locais. Baseando-se em resultados obtidos por OigmanPszczol (2004), ambos os índices se enquadram num tipo de ambiente com exposição intermediária às ondas. 2) Efeito da remoção do dossel de Sargassum vulgare nas algas da comunidade madura Para a melhor compreensão dos dados, um enfoque principal foi dado às porções centrais das réplicas, menos sucetíveis aos possíveis efeitos de borda. Sendo assim, o efeito da remoção do dossel de S. vulgare nas algas efêmeras, em ambos os locais, foi significativo somente em uma época do ano, pois, no inverno, a abundância de algas efêmeras foi influenciada pelo dossel, dependendo do local (Fig.5a, b; Tabela 2a). Na Ilha Comprida, a cobertura de efêmeras não diferiu entre controles e áreas tratadas, havendo somente uma tendência à proliferação de algas filamentosas (principalmente Ceramium), porém na Ilha das Flechas houve um aumento significativo da cobertura de efêmeras, representadas principalmente por algas foliáceas (principalmente Padina e Dictyota). Na Ilha Comprida, as algas tenderam a restabelecer a fisionomia inicial ao longo do tempo, havendo uma diminuição da abundância das algas filamentosas no estrato inferior. Contudo, na Ilha das Flechas, a fisionomia resultante do distúrbio tendeu a permanecer. Nas porções de borda, o efeito 37 do dossel foi marcante e não houve o restabelecimento da fisionomia inicial, ou este foi tardio, com a permanência da dominância das algas efêmeras (Fig. 6a, b, Tabela 2b). Na outra época do ano, verão, o efeito do dossel foi marcante em ambas as ilhas, com o maior desenvolvimento de algas efêmeras nas áreas onde o dossel foi removido (Fig. 7 a; Tabela 3). As efêmeras influenciadas pelo dossel foram algas filamentosas na Ilha Comprida e algas foliáceas na Ilha das Flechas. As algas cilíndrico-corticadas também proliferaram nesta época, porém a cobertura destas foi significativamente maior nas áreas onde o dossel foi removido, somente na Ilha das Flechas (Fig. 7b, Tabela 4). De um modo geral, nas porções de borda o efeito do dossel não foi significativo para a abundância de nenhuma alga do estrato inferior. Os indivíduos de S. vulgare apresentaram portes distintos nas populações, estudadas, sendo maior na Ilha Comprida do que na Ilha das Flechas. Talos de S. vulgare apresentaram uma diminuição natural em tamanho, em ambas as ilhas, no inverno. Porém, a regeneração do dossel cortado não foi suficiente para se equiparar ao tamanho dos talos controles, na Ilha Comprida (ANOVA, F= 28,6, P<0,001 e ANOVA, F= 22,1, P<0,001, para comprimento e diâmetro respectivamente). Contudo, na Ilha das Flechas, o tamanho dos talos cortados se equiparou ao dos controles dois meses após a implantação do experimento (Fig. 8 a,b), (ANOVA, F= 0,16, P= 0,70 e ANOVA, F= 3,81, P= 0,07, para comprimento e diâmetro respectivamente). No verão, houve crescimento mais acelerado de S. vulgare. Na Ilha Comprida, os exemplares cortados não alcançaram as medidas dos controles (ANOVA, F= 52,1, P<0,001; ANOVA, F= 17,5, P= 0,002, para comprimento e diâmetro respectivamente), enquanto que na Ilha das Flechas, houve uma tendência para que estes recuperaram o tamanho em apenas um mês, porém as diferenças entre talos controles e em regeneração ainda 38 foram significativamente diferentes (ANOVA, F= 7,81, P= 0,02; ANOVA, F=7,77, P= 0,02, para comprimento e diâmetro respectivamente) (Fig. 9 a,b). 2) Efeito da remoção do dossel de Sargassum vulgare nas algas em fase de recrutamento No inverno, as algas calcárias incrustantes e articuladas, dominaram a cobertura do estrato inferior, logo no primeiro mês após a raspagem, tanto em áreas controles como naquelas onde o dossel foi removido,. Posteriormente, houve proliferação de algas foliáceas, também em quantidades semelhantes em ambas às áreas (Fig. 10 a). No verão, observou-se uma proliferação inicial de algas cilíndrico corticadas, principalmente Laurencia spp. e A. taxiformis, em ambas as áreas. No mês seguinte, ocorreu uma tendência ao maior desenvolvimento algas foliáceas e calcárias articuladas, nas áreas sem dossel, porém suas abundâncias não diferiram em relação às áreas controle (Fig. 10 b). De fato, houve uma correlação negativa entre algas cilindrico corticadas e calcárias articuladas (r= -0,68, n=34, p<0,001), e também entre as cilindrico corticadas e foliáceas (r= -0,58, n=34, p<0,001) foram observadas, enquanto que foi observada uma correlação positiva entre algas calcárias articuladas e foliáceas. Os talos de S. vulgare, nas duas épocas do ano mantiveram um tamanho estável ao longo do tempo, porém o diâmetro do dossel, no inverno, teve tendência a ser maior no primeiro mês. Quanto à regeneração dos talos cortados, o tamanho dos indivíduos em regeneração aproximou-se do dos controles no terceiro mês, porém as diferenças ainda foram significativamente diferentes no inverno (ANOVA, F= 4,82, P= 0,06; ANOVA, F= 4,29, P= 0,07, para comprimento e diâmetro respectivamente). No verão o tamanho dos talos cortados também não foi recuperado no período estudado 39 (ANOVA, F= 49,6; P<0,001; ANOVA, F= 21,8, P<0,001, para comprimento e diâmetro respectivamente). (Fig. 10 a,b). 40 Discussão 1) Efeito do dossel de Sargassum vulgare nas algas da comunidade madura As alterações na estrutura da comunidade, quanto à composição e abundância das algas no estrato inferior do dossel de S. vulgare foram verificadas, diferindo conforme o local, época do ano e os estádios sucessionais. Considerando a pequena escala espacial das unidades experimentais, que neste estudo reproduzem a área sob influência de um único indivíduo, foram verificadas respostas, principalmente para algas oportunistas abaixo do dossel. Outros estudos demonstraram o efeito das algas formadoras de dossel em escalas maiores (por exemplo: áreas de 16 m2, em Figueiredo et al., (1996), e 314m2, em Toohey, et al., 2007). Segundo Coleman (2002), as variações na dinâmica da composição, abundância e distribuição de algas formadoras de ‘tapete’ são mais efetivas em pequena escala espacial, do que em escalas maiores. Na comunidade madura, de um modo geral, houve proliferação de algas oportunistas efêmeras, filamentosas e foliáceas, e de algas sazonais cilíndrico corticadas no estrato inferior, onde o dossel foi removido. Efeitos semelhantes, oriundos da remoção de espécies formadoras de dossel, na composição e abundância de algas deste estrato, foram demonstrados em vários estudos realizados, tanto nas algas da comunidade madura quanto em fases iniciais de recrutamento (Hawkins & Harkin, 1985; Kennelly, 1987, 1989; Eston & Bussab, 1990; Benedetti-Cecchi & Cinelli, 1992; Figueiredo et al. 1996, 1997; 2000 Bulleri et al., 2002; Cervin, et al. 2004; Toohey et al., 2004; Patrício et al., 2006; Eriksson et al., 2007; Kraufvelin, 2007; Schiel & Lilley, 2007; Toohey et al., 2007; Wikström & Kautsky, 2007). 41 No inverno, não houve efeito do dossel nas algas do estrato inferior, e a regeneração dos talos cortados de S. vulgare foi lenta, na Ilha Comprida. Neste local, o efeito do dossel provavelmente foi mascarado pelo sombreamento da Mata Atlântica adjacente ao costão rochoso, que diminui consideravelmente a irradiância incidente no substrato. A condição de sombreamento pela mata, é comum nesta região do litoral sudeste do Brasil (Creed et al., 2007; Oliveira et al., 2008), e a irradiância em determinadas faixas do costão rochoso pode ser inferior a 20 µmol.m-2 s-1 (A. E. Oliveira & M.A. O. Figueiredo, dados não publicados). Os talos de grande porte de S. vulgare, nesta ilha, possibilitam a penetração lateral da irradiação solar no estrato inferior, contudo, o menor movimento dos talos limita os níveis de luminosidade, ao menos nas áreas centrais sob o dossel. Na Ilha das Flechas, o efeito da presença do dossel foi marcante nas algas oportunistas, principalmente foliáceas no estrato inferior, apesar da rápida regeneração do tamanho dos talos cortados no inverno. Neste local, o menor porte aproxima os talos de S. vulgare ao substrato, diminuindo os níveis de luz logo abaixo do dossel. Contudo, existe a possibilidade do sombreamento ter sido atenuado pela entrada de pulsos de luz sob o dossel, em função da constante movimentação dos talos em águas com maior turbulência. De fato, a irradiância pode penetrar sob grande parte das algas formadoras de dossel. Tratando-se de algas efêmeras, espera-se que a taxa de crescimento seja prontamente influenciada por pequenos pulsos de luz (Gerard, 1984; Lüning,1992). O efeito da varredura do dossel também é bastante provável em locais expostos ás ondas. A limitação de determinados grupos de algas no substrato, pelo batimento das frondes da alga formadora de dossel, já foi demonstrado em função do grau de exposição às ondas (Kiirikki, 1996). O distúrbio físico decorrente não só da ação de ondas, mas também do intenso fluxo hidrodinâmico, como movimento de marés e correntes, pode 42 determinar a abundância e composição especifica da associação de algas, além de afetar a morfologia e dinâmica populacional das algas formadoras de dossel (Eckman et al., 2003). No verão, a remoção do dossel de S. vulgare promoveu a proliferação de algas oportunistas (foliáceas e filamentosas) nas duas ilhas possivelmente, pelos níveis mais altos de irradiância, e em função do fotoperíodo mais longo. O fotoperíodo é um fator sazonal de suma importância para várias espécies de algas que podem responder fisiologicamente à variações mínimas de irradiância, como constatado por Lüning (1990), que detectou respostas de Scytosiphon lomentaria, com alterações de apenas 15 minutos no regime de irradiância. A proliferação sazonal de outras algas oportunistas de talos mais complexos, como as algas cilíndrico-corticadas (Laurencia e Asparagopsis), foi observada apenas na Ilha das Flechas. O domínio deste grupo morfo-funcional pode estar relacionado não somente a maior disponibilidade de luz, mas também à sua maior resistência ao distúrbio físico (Steneck & Dethier, 1994). O aumento da temperatura da água também é um importante fator, que pode ter favorecido à proliferação destas algas cilíndrico corticadas, na área estudada. Porém, para a confirmação desta possibilidade, a averiguação através de estudos experimentais em laboratório se faz necessária. A exemplo, estudos realizados no campo e no laboratório, por Tsai e colaboradores (2005) corroboram com os resultados do presente estudo, pois confirmaram a proliferação de Laurencia papillosa em função do aumento de temperatura no verão. Padilla-Gamiño & Carpenter (2007) verificaram melhor performance fotossintética de Laurencia pacifica durante o verão (com temperatura média de 21º C), em relação ao inverno (temperatura media de 14º C). 43 Outro fator a ser considerado é a interferência da herbivoria nos resultados observados, principalmente em período de águas mais quentes. Brosnan (1992), sugere que a atividade dos herbívoros pode ser reduzida pela baixa tolerância a decréscimos na temperatura, mesmo em ambientes tropicais. No local de estudo, a redução de 5º C no inverno em relação ao verão, analisada ao longo do período de estudo reforça esta possibilidade. O maior desenvolvimento de algas filamentosas em áreas onde o dossel foi removido deve ser esperado somente na ausência de herbívoros conforme demonstrado por Figueiredo et al., (1996). O consumo por herbívoros pode ainda estar associado ao efeito do dossel nas algas do estrato inferior, devido à agregação destes sob o dossel (Wikström & Kautsky, 2007). Portanto, a menor abundância destes invertebrados em áreas abertas pode favorecer o desenvolvimento de algas oportunistas em áreas sem dossel. Na Ilha das Flechas, foi constatado, de um modo geral, a maior abundância de algas efêmeras e oportunistas em relação à Ilha Comprida. Este resultado pode ser explicado pelo fato das oportunistas, na Ilha das Flechas, serem representadas por algas foliáceas, principalmente Padina, que possui impregnação por carbonato de cálcio, o que dificulta o seu consumo por herbívoros (Duffy & Paul, 1992). O distúrbio resultante da varredura das algas formadoras de dossel é esperado na Ilha das Flechas e pode repelir os herbívoros abaixo do dossel e nas áreas abertas, indiretamente influenciadas pela extensa e contínua cobertura de Sargassum. Tal efeito do dossel em herbívoros foi observado por Gagnon et al., (2003), que constatou a menor densidade de ouriços abaixo do dossel da alga parda Desmarestia viridis, cujo talo varre o substrato repelindo os herbívoros. A diferença entre as espécies de algas oportunistas que dominaram em ambas as ilhas, pode ainda estar relacionada à quantidade relativa de sedimentos depositados. Os 44 resultados relacionados à sedimentação, neste estudo, indicam uma maior deposição de sedimentos na Ilha Comprida, dependendo da época do ano, não dependendo da presença do dossel. Outros estudos sugerem, contudo, uma situação onde há maior deposição de sedimentos em áreas sem dossel (Connell, 2003; Isaeus et al., 2004; Toohey, et al., 2004). As algas filamentosas são resistentes à sedimentação (Como?), e crescem como epífitas das calcárias articuladas, dominantes somente na Ilha Comprida. Estas algas são consideradas as mais adaptadas à deposição de sedimentos (Kendrick, 1991; Stewart, 1989), pois apresentam como característica a retenção de sedimentos, podendo acumular, no espaço entre os talos, uma quantidade dez vezes maior que a própria biomassa (Airoldi et al., 1995). O soterramento e a abrasão que representam uma fonte de estresse e distúrbio para comunidades bentônicas, pode tornar-se um agente seletivo na sobrevivência de determinadas espécies de algas, pela redução de luz e oxigênio (D´Antonio, 1986) e, também pode prejudicar o processo de fixação dos recrutas no substrato (Eriksson & Johansson, 2003). A tendência ao restabelecimento da fisionomia inicial (resiliência) da cobertura de algas do estrato inferior foi verificada, principalmente na Ilha Comprida. Na Ilha das Flechas pôde ser observada a permanência de algas foliáceas, sem uma tendência à recuperação da fisionomia da cobertura após a remoção do dossel de S. vulgare. Eston & Bussab (1990), também observaram que algas foliáceas, principalmente Dictyopteris spp, permanecem dominando o substrato, mesmo com o crescimento da cobertura de Sargassum stenophyllum, após sua remoção no litoral sudeste do Brasil. A persistência de algas foliáceas, abaixo do dossel regenerado também foi observada por Toohey et al. (2007), para Ecklonia radiata na Austrália, podendo ser considerado como um efeito de fotoaclimatação desse grupo de algas no estrato inferior (Toohey et al., 2004). Nas 45 bordas não foi constatado essa resiliência, provavelmente pela recuperação mais lenta do tamanho dos talos de Sargassum. 2) Efeito do dossel de Sargassum vulgare nas algas em fase de recrutamento Na sucessão primária do substrato, as algas que recrutaram de modo semelhante nas áreas manipuladas e controles, portanto, não sofreram influência significativa do dossel. Este resultado foi semelhante ao observado por Goodsell & Connell (2005), na Austrália, onde ocorreu um aumento significativo da riqueza específica do estrato inferior, somente em áreas onde existia o sinergismo do distúrbio de remoção do dossel de Ecklonia radiata com a diminuição da densidade de apressórios desta alga, disponibilizando substrato, ou seja, aumento da disponibilidade de espaço associado à remoção do dossel. O predomínio primário de algas calcárias incrustantes e algas calcárias articuladas no período do inverno pode ser explicado, devido estas algas apresentarem a capacidade de ocupar rapidamente o substrato a partir da base crostosa remanescente, após a raspagem do substrato. As algas calcárias articuladas produzem eixos eretos a partir de uma base crostosa (Konar & Foster, 1992) e esta característica lhes confere uma alta capacidade de competir por espaço (Steneck & Dethier, 1994). A permanência das bases incrustadas nas vilosidades do substrato rochoso permite que estas algas recolonizem rapidamente áreas adjacentes. A rapidez na regeneração das algas nas áreas raspadas também pode estar relacionada à pequena escala espacial, como observado por Dye (1993) que observou a velocidade de regeneração de algas formadoras de tapete entre áreas de diferentes tamanhos. A coexistência das algas calcárias com outras algas que recrutaram, principalmente como epífitas, como no caso das algas foliáceas neste estudo, também foram 46 demonstradas em estudos anteriores, visto que estas algas são capazes de crescer ou até mesmo se reproduzir quando cobertas por outras algas (Figueiredo et al 2000; Airoldi, 2000). De fato, a correlação positiva entre foliáceas e calcárias articuladas observada neste estudo, sugere, portanto, uma interação de facilitação entre estes grupos. Porém, a correlação negativa entre foliáceas e cilíndrico corticadas sugere uma possível interação de competição entre estes grupos de algas, o que pode ter causado o desaparecimento das algas cilíndrico corticadas neste caso. Fatores ambientais, que causam a mortalidade na fase inicial do pós-recrutamento (Vadas et al, 1992), também podem ter influenciado o padrão encontrado. Estas diferenças ocorrem, ainda, devido à reprodução ser freqüentemente sazonal e porque espécies podem sobreviver por um curto período de tempo em épocas específicas (Coleman, 2002). A proliferação de algas foliáceas nas áreas sem o dossel era esperada, assim como observado em outros estudos de sucessão próximos à região de estudo (Eston & Bussab, 1990). De um modo geral, as algas calcárias articuladas foram dominantes no estrato inferior das comunidades estudadas, tanto na sucessão primária quanto na secundária, apesar de sua abundância ter sido mascarada pela cobertura de algas oportunistas, em diferentes épocas. Estas algas, ao formarem ‘tapetes’ com seus ramos calcificados e densamente emaranhados, podem inibir o recrutamento de outras algas epilíticas (Britton-Simmons, 2006), ou ainda permanecer no ambiente numa interação de tolerância com outras espécies, principalmente algas epífitas (Oates, 1989). Sendo assim, a permanência das algas calcárias articuladas ao longo do período de estudo, demonstrou ser este um grupo de algas fundamental na resiliência das comunidades após o distúrbio simulado. A resiliência é a habilidade de um sistema de se regenerar à 47 sua fisionomia original após um distúrbio, ou a velocidade de “recuperação” após uma perturbação temporária (MacManus & Polsenberg, 2004; Creed, 2006). Para concluir, o efeito do dossel de S. vulgare na abundância da comunidade madura variou dependendo do local, e da época do ano, principalmente nas porções mais próximas ao apressório de Sargassum, potencialmente menos afetadas pelos efeitos de borda. Contudo, o dossel de S.vulgare não interferiu no recrutamento das algas no início de sucessão. Isso provavelmente por não haver limitação de espaço. A abundância de sedimentos foi mais abundante na Ilha Comprida, independente do dossel de S. vulgare, e pode estar afetando as algas do estrato inferior nesta comunidade, de um modo geral. A proliferação das algas cilíndrico-corticadas em função da teperatura é um fato marcante, e que pode ser confirmado mediante experimentos futuros, a sere realizados em laboratório de cultivo. Fatores como: o sombreamento do dossel, a varredura dos talos de S. vulgare e o consumo por herbívoros, devem ser avaliados posteriormente com maiores detalhes. Agradecimentos Agradecemos à Coordenação de Aperfeiçoamento Pessoal de Nível Superior (CAPES) pelo apoio financeiro, à Escola Nacional de Botânica Tropical - Instituto de Pesquisas do Jardim Botânico do Rio de Janeiro (ENBT-JBRJ) e à Dra. Verônica Calado da Escola de Química da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) 48 Referências bibliográficas Airoldi, L.; Rind, F. & Cinelli, F., 1995. Structure, seasonal dynamics and reproductive phenology of a filamentous turf assemblage on a sediment influenced, rocky subtidal shore. Botanica Marina 38, 227-237. Airoldi, L., 2000. Responses of algae with different life histories to temporal and spatial variability in disturbance in subtidal reefs. Marine Ecology Progress Series . 195, 81-92. Akioka, H.; Baba, M.; Masaki, T.; Johansen, H. W., 1999. Rocky shore turfs dominated by Corallina (Corallinales, Rhodophyta) in northern Japan. Phycological Research 47, 199-206. Amado-Filho, G. M.; Barreto, M. B. B. 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Prentice-Hall International, London, 718pp. 58 Tabelas Tabela 1: Análise de variância trifatorial entre os fatores: local (Ilhas Comprida- IC e das Flechas- IF), época do ano (inverno e verão) e dossel (presença ou ausência) de S. vulgare, em relação às diferenças de massa seca de sedimentos. GL= grau de liberdade; MQ= média dos quadrados; F= estatística de teste; P= nível de significância. Local Época Dossel Local * Época Local * Dossel Época * Dossel Local * Época * Dossel Erro GL 1 1 1 1 1 1 1 64 MQ 1373653,12 686987,33 382666,68 896237,35 277885,12 214840,15 82756,68 151794,75 F 9,05 4,53 2,52 5,90 1,83 1,41 0,54 P 0,04 0,04 0,12 0,02 0,18 0,24 0,46 59 Tabela 2: Análise de variância bifatorial repetitiva no tempo, entre os fatores: locais (Ilhas Comprida- IC e das Flechas- IF) e dossel (presença ou ausência) de S. vulgare, em relação a abundância de algas efêmeras (filamentosas e foliáceas), nas porções centrais (A) e de borda (B), no inverno. GL= grau de liberdade; MQ= média dos quadrados; F= estatística de teste, P= nível de significância (n= 8). A- Porção central GL MQ F P Local 1 4.82 x 10-17 7.18 0.01 Dossel 1 9.03 x10-17 13.45 0.001 Local * Dossel 1 2.79 x 10-17 4.16 0.05 Erro 28 6.71 x 10-16 Tempo 1 1.5 x 10-18 41.7 <0.001 Tempo * Local 1 1.1 x 10-16 0.30 0.58 Time * Canopy 1 5.4 x 10-17 14.72 0.001 Tempo * Dossel * Local 1 6.9 x 10-16 1.89 0.18 Erro 28 3.7 x 10-16 Entre fatores Dentro dos fatores 60 B- Porção de borda GL QM F P Local 1 6.67 x 10-13 0.001 0.97 Dossel 1 1.01 x 10-18 20.0 <0.001 Local * Dossel 1 3.65 x 10-16 0.721 0.4 Erro 28 5.07 x 10-16 Tempo 1 2.41 x 10-18 45.59 <0.001 Tempo * Local 1 1.63x 10-16 0.31 0.58 Tempo * Dossel 1 4.06 x 10-17 7.67 0.01 Tempo * Dossel * Local 1 5.05 x 10-15 0.09 0.76 Erro 28 5.3 x 10-16 Entre fatores Dentro dos fatores 61 Tabela 3: Análise de variância bifatorial repetitiva no tempo, entre os fatores: locais (Ilhas Comprida - IC e das Flechas- IF) e (dossel presença ou ausência) de S. vulgare, em relação a abundância de algas efêmeras (filamentosas e foliáceas), nas porções centrais, no verão. GL= grau de liberdade; MQ= média dos quadrados; F= estatística de teste; P= nível de significância. GL QM F P Local 1 3.24 x 10-17 5.89 0.02 Dossel 1 3.18 x 10-17 5.78 0.02 Local * Dossel 1 4.28 x 10-16 0.779 0.39 Erro 16 5.50 x 10-16 Tempo 1 5.78 x 10-16 1.29 0.27 Tempo * Local 1 3.04x 10-15 0.06 0.79 Tempo * Dossel 1 3.68 x 10-15 0.08 0.78 Tempo * Dossel * Local 1 1.23 x10-16 0.27 0.61 Erro 16 4.48 x 10-16 Entre fatores Dentro dos fatores 62 Tabela 4: Análise de variância bifatorial repetitiva no tempo, entre os fatores: locais (Ilhas Comprida - IC e das Flechas- IF) e (dossel presença ou ausência) de S. vulgare, em relação a abundância de algas efêmeras (cilíndrico-corticadas), nas porções centrais, no verão. GL= grau de liberdade; QM= média dos quadrados; F= estatística de teste, P= nível de significância. GL QM F P Local 1 4.09 x 10-17 5.69 0.03 Dossel 1 3.49 x 10-17 4.86 0.04 Local * Dossel 1 5.36 x 10-17 7.47 0.01 Erro 16 7.18 x 10-16 Tempo 1 4.54 x 10-16 1.85 0.19 Tempo * Local 1 5.89 x 10-16 2.41 0.14 Tempo * Dossel 1 8.49 x 10-16 3.47 0.08 Tempo * Dossel * Local 1 2.57 x10-16 10.45 0.005 Erro 16 2.45 x10-16 Entre fatores Dentro dos fatores 63 Figuras 44º 22´ 23º 58´ Figura 1: Mapa da área de estudo. Estrelas apontam os locais estudados. 64 A B C D Figura 2: Fotos dos locais de estudo, (A) Ilha Comprida e (B) Ilha das Flechas, na superfície; e (C) e (D) na zona infralitoral. 65 Comunidade madura IF e IC Substrato intocado Substrato raspado Comunidade primária IF Figura 3: Esquema mostrando os tratamentos empregados nos experimentos que testam o efeito da presença do dossel em comunidades maduras e comunidade primária, em início de sucessão, nos locais de estudo onde o dossel foi removido ou mantido intacto em dois locais de estudo. IF = Ilha das Flechas e IC= Ilha Comprida 0,2 Peso seco (g) 0,16 * Com dossel Sem dossel 0,12 0,08 0,04 0 IC IF verão IC IF inverno Figura 4: Abundância de sedimentos depositados no substrato, na Ilha das Flechas (IF) e Ilha Comprida (IC), no inverno e verão, nas áreas com e sem dossel de Sargassum vulgare. (*) Dados significativos. (A) Ilha Comprida – inverno (porção central) filamentosas coriáceas esponjas rocha 100 Cobertura (%) 80 foliaceas articuladas zoantídeos Sargassum pre se nte (maio) corticadas crostas cracas 66 100 Sargassum ause nte 80 60 60 40 40 20 20 0 0 100 (junho) 100 80 80 60 60 40 40 20 20 0 0 100 100 (agosto) 80 80 60 60 40 40 20 20 0 0 (B) Ilha das Flechas Sargassum pre sente (maio) Cobertura (%) Sargassum ausente 100 100 80 80 60 60 40 40 20 20 0 0 100 (junho) 100 80 80 60 60 40 40 20 20 0 0 100 80 100 (agosto) 80 60 60 40 40 20 20 0 0 Figura 5: Cobertura (%) dos grupos morfo-funcionais de algas e invertebrados sésseis do estrato inferior da comunidade madura (porção central) na presença e ausência do dossel de Sargassum vulgare, nas Ilhas Comprida (A) e das Flechas (B), no inverno, ao longo de dois meses após o início do experimento (T0 - maio, T1- junho, T2- agosto). (Média + Erro padrão, n=8) (A) Ilha Comprida – inverno (porção de borda) filamentosas coriáceas esponjas rocha 80 67 corticadas crostas cracas Sargassum presente (maio) 100 Cobertura (%) foliáceas articuladas zoantídeos 80 60 60 40 40 20 20 0 0 (junho) 100 Sargassum ause nte 100 100 80 80 60 60 40 40 20 20 0 0 100 100 (agosto) 80 80 60 60 40 40 20 20 0 0 (B) Ilha das Flechas S argassum presente Cobertura (%) 100 (maio) 100 Sargassum ausente 80 80 60 60 40 40 20 20 0 0 100 (junho) 100 80 80 60 60 40 40 20 20 0 0 100 80 (agosto) 100 80 60 60 40 40 20 20 0 0 Figura 6: Cobertura (%) dos grupos morfo-funcionais de algas e invertebrados sésseis do estrato inferior da comunidade madura (porção de borda) na presença e ausência do dossel de Sargassum vulgare, nas Ilhas Comprida (A) das Flechas (B), no inverno, ao longo dois meses após o início do experimento (T0 - maio, T1- junho, T2- agosto). (Média + Erro padrão, n=8). (A) Ilha Comprida – verão (porção central) filamentosas coriáceas esponjas rocha corticadas crostas cracas Sargassum presente (outubro) 100 Cobertura (%) foliáceas articuladas zoantídeos 68 100 Sargassum ausente 80 80 60 60 40 40 20 20 0 0 (novembro) 100 100 80 80 60 60 40 40 20 20 0 0 (B) Ilha das Flechas Sargassum presente (outubro) Cobertura (%) 100 100 80 80 60 60 40 40 20 20 0 0 100 (novembro) Sargassum ausente 100 80 80 60 60 40 40 20 20 0 0 Figura 7: Cobertura (%) dos grupos morfo-funcionais de algas e invertebrados sésseis do estrato inferior da comunidade madura (porção central) na presença e ausência do dossel de Sargassum vulgare, nas Ilhas Comprida (A) das Flechas (B), no verão, um mês após o início do experimento (T0- outubro, T1- novembro). (Média + Erro padrão, n= 8-5) 69 (A) Ilha Comprida - inverno 100 100 80 80 Sem dossel Diâmetro (cm) Comprimento (cm) Dossel 60 40 60 40 20 20 0 0 T0 T1 T2 T0 T1 T0 T1 T2 (B) Ilha das Flechas 100 Dossel Sem dossel 80 80 Diâmetro (cm) Comprimento (cm) 100 60 40 20 60 40 20 0 0 T0 T1 T2 T2 Figura 8: Comprimento e diâmetro do talo de Sargassum vulgare em áreas com o dossel intacto (controle) e com dossel cortado (tratamento), na comunidade madura, nas Ilhas Comprida (A) e das Flechas (B), ao longo de dois meses no inverno (T0- maio, T1- junho, T2- agosto). (Médias ± Desvio padrão, n=8). 70 (A) Ilha Comprida - verão 100 Sem dossel 80 Diâmetro (cm) 80 Comprimento (cm) 100 Dossel 60 40 60 40 20 20 0 0 T0 T1 T0 T2 T1 T2 (B) Ilha das Flechas 100 Dossel Sem dossel 80 80 Diâmetro(cm) Comprimento (cm) 100 60 40 20 60 40 20 * 0 * 0 T0 T1 T2 T0 T1 T2 Figura 9: Comprimento e diâmetro do talo de Sargassum em áreas com o dossel intacto (controle) e com dossel cortado (tratamento), na comunidade madura, nas Ilhas Comprida (A) e das Flechas (B), ao longo de dois meses no verão (T0- outubro, T1- novembro). (Médias ± Desvio padrão, n=8-5). (*)Dados ausentes por perda das réplicas. (A) Ilha das Flechas - inverno filamentosas coriácea esponjas rocha foliáceas articulada zoantídeos 71 corticated crostas cracas 100 Cobertura (%) 100 80 Sargassum pre sente (se te mbro) 60 20 20 0 0 100 100 (outubro) 80 60 60 40 40 20 20 0 0 100 80 Sargassum ausente 60 40 40 80 80 100 (novembro) 80 60 60 40 40 20 20 0 0 (B) Ilha das Flechas - verão Cobertura (%) 100 Sargassum pre se nte (março) 80 100 Sargassum ause nte 80 60 60 40 40 20 20 0 0 100 80 100 (abril) 80 60 60 40 40 20 20 0 0 100 (maio) 100 80 80 60 60 40 40 20 20 0 0 Figura 10: Cobertura (%) dos grupos morfo-funcionais de algas e invertebrados sésseis do estrato inferior da comunidade em início de sucessão (porção central) na presença e ausência do dossel de Sargassum vulgare, na Ilha das Flechas, no inverno (A) e no verão (B), em até três mêses após o início do experimento (T1, T2, T3). (Média + Erro padrão, n= 4). 72 Dossel 60 50 Sem dossel 50 Diâmetro (cm) 60 40 30 20 10 40 30 20 10 0 0 T0 T1 T2 T0 T1 T2 B 70 Dossel 60 Sem dossel 70 60 Diâmetro (cm) Comprimento (cm) Comprimento (cm) A 50 40 30 20 10 50 40 30 20 10 0 0 T0 T1 T2 T0 T1 T2 Figura 11: Comprimento e diâmetro do talo de Sargassum vulgare em áreas com o dossel intacto (controles) e com dossel cortado (tratamento), na comunidade em início de sucessão, na Ilha das Flechas, ao longo de três meses no inverno (A) e verão (B). (*) Dados ausentes por perda das réplicas. (Médias ± Desvio padrão, n= 4). 73 CAPÍTULO 2 EXISTE LIMITAÇÃO NO RECRUTAMENTO DE POPULAÇÕES DE SARGASSUM VULGARE C. AGARDH (OCRHOPHYTA – FUCALES) NO SUDESTE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, BRASIL? Muniz, R. de A.1; Figueiredo, M. A.de O2 & Kendrick, G. A.3 1 -Escola Nacional de Botânica Tropical, [email protected], 2 -Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro, [email protected] 3 - University of Western Australia, [email protected] Artigo a ser submetido para publicação na Journal of Experimental Marine Biology and Ecology ou Aquatic Botany 74 Resumo Duas populações de Sargassum vulgare foram estudadas durante um ano no sul do Estado do Rio de Janeiro. A densidade de talos recrutas, juvenis e adultos de S. vulgare foi analisada em dez quadrados (0,25m2) aleatórios e o investimento em ramos vegetativos e reprodutivos foi estimado para 30 talos adultos, mensalmente durante um ano. Dez placas de epóxi foram colocadas no substrato e a densidade dos recrutas quantificada em intervalos mensais e bimestrais. A preferência alimentar de recrutas, juvenis e adultos de Sargassum foi testada para dois potenciais consumidores: o ouriçodo-mar Lytechinus variegatus e o siri Charibdys hellerii. Foi incluído um consumidor por gaiola (n= 4-5) contendo uma fase de desenvolvimento de Sargassum junto com Padina (controle). Adultos reprodutivos dominaram na população de S. vulgare. Houve produção constante de ramos reprodutivos, nas duas populações, com produção máxima no inverno (junho), contudo, o recrutamento nas placas foi sazonal em intervalos bimestrais, com as maiores densidades no verão (novembro-dezembro) e inverno (junho). Ouriços preferiram os recrutas e siris consumiram preferencialmente os adultos de S. vulgare. Sugere-se que o recrutamento seja limitado nessas populações, a despeito do investimento na reprodução pelos talos adultos, devido ao possível aumento da competição intra-específica entre recrutas-juvenis e adultos de Sargassum, ou devido ao distúrbio de herbivoria. De alguma forma, a coalescência dos talos aparenta reduzir os impactos do distúrbio. Palavras-chave: Sargassum vulgare, fenologia, herbivoria, coalescência, costões rochosos 75 Abstract Two populations of Sargassum vulgare were studied during one year in southern Rio de Janeiro State. The recruits, juveniles and adult thalli densities were analysed in ten random quadrats (0.25m2) and the investment in vegetative and reproductive branches was estimated from 30 randon adult thallii, monthly, along one year. Ten epoxi plates were fixed on the substrata and recruit densities were quantified monthly and bimonthly. Feeding preference of recruits, juveniles and adult thallii of S. vulgare was tested for two potential consumers: the urchin Lytechinus variegatus and the crab Charibdys hellerii. One consumer was placed into each cage (n= 4-5) with one development phase of Sargassum and Padina (control). Reproductive adults were dominants in the S. vulgare. population structure. There was a constant production of reproductive branches in both populations, with the maximal production in winter (June), however the recruitment showed a seasonal variation and in bimonthly intervals, with maximum in density in summer (November-December) and in winter (June). Sea urchins preferred recruits and crabs consumed mainly adult thallii of S. vulgare. It is suggested that recruitment is limited in these populations, despite of the investment in reproduction by adult thallus, probably due to an increase in intraspecific competition between development phases of Sargassum, or by a limitation in recruitment associated to disturbance from herbivory. Somehow, coalescence seems to reduce the impacts of disturbance. Key words: Sargassum vulgare, phenology, herbivory, coalescence, rocky shores. 76 1- Introdução O gênero Sargassum C. Agardh é freqüentemente encontrado na região infralitoral de regiões temperadas e tropicais do mundo (Lüning, 1990). Este tem grande importância ecológica, por fornecer recursos variados a outros organismos marinhos, como abrigo, substrato e alimento, de forma direta ou indireta (Széchy & Paula, 2000, Muniz et al., 2003, Tanaka & Leite, 2003). Pode inclusive ser caracterizado como uma espécie engenheira, que por definição, é aquela cuja presença dominante regula os recursos disponíveis no ecossistema e, conseqüentemente, altera as condições ambientais, facilitando, ou suprimindo o crescimento e sobrevivência de outras espécies (Jones et al, 1994, 1997). Este gênero tem como característica um ciclo de vida sazonal com fases distintas, a saber: assentamento, crescimento vegetativo, reprodução, senescência e regeneração (Ang Jr., 1985a; Gillespie & Critchley, 1999). Neste ciclo de vida sazonal, os ramos reprodutivos se tornam senescentes, disponibilizando o substrato e amenizando a intensa competição intra-específica de recrutas com adultos (Kendrick, 1994). Na fase de senescência a perda dos ramos pode ser total (Godoy & Coutinho 2002; Muniz et al., 2003), restando apenas os apressórios aderidos ao substrato para posterior regeneração. Contudo, existem populações de Sargassum onde os indivíduos não entram em total senescência, mantendo constante a produção de ramos vegetativos e férteis, ao longo do ano, sendo denominadas perenes (De Wreede, 1976; Széchy et al., 2006). Devido a esta característica de desenvolvimento sazonal de ramos vegetativos e reprodutivos, espera-se que o recrutamento também seja sazonal. Observa-se tal tendência em populações de Sargassum de águas tropicais e temperadas (exemplos em 77 Paula & Eston, 1987; Kendrick & Walker 1994; Hwang et al., 2004; Yoshida et al., 2004). Esta variação sazonal pode ser atribuída a variações na temperatura da água (De Wreed, 1976; Prince & O´Neal, 1979; Aguilar-Rosas & Galindo, 1990; Hwang et al., 2004) e na concentração de nutrientes (Hwang et al., 2004), entre outros fatores. Todavia, a dinâmica populacional não deve ser avaliada somente em estudos realizados com parâmetros relacionados aos talos adultos, pois os processos que envolvem o recrutamento são de suma importância para o entendimento da dinâmica desta população (Chapman, 1990; Brawley & Johnson, 1991). Nesta fase, existe maior vulnerabilidade aos distúrbios como: herbivoria, sombreamento, dessecação, soterramento por sedimentos, varredura por talos formadores de dossel e grande movimentação da água (Vadas et al., 1992). Sargassum é um dos mais importantes gêneros em termos de abundância, dentre as macroalgas da região sublitorânea rasa, no sudeste do Brasil (Paula & Eston, 1987; Paula, 1989; Széchy & Paula, 2000; Amado Filho et al., 2003; Figueiredo et al., 2004; Figueiredo & Tâmega, 2007). Sete espécies deste gênero já foram registradas, para os estados de São Paulo e Rio de Janeiro (Széchy & Cordeiro Marino, 1991), sendo seis somente na Baía da Ilha Grande (Figueiredo & Tâmega, 2007). No entanto, os estudos ora existentes no Brasil sobre fenologia e recrutamento ainda são escassos, tornando o melhor entendimento sobre a dinâmica das populações destes bancos de algas fundamental para futuras medidas de monitoramento e conservação, visto os potenciais impactos antrópicos em algumas regiões, como a Baía da Ilha Grande (Tommasi, 1990; Creed & Oliveira, 2007a). Sendo assim, este estudo teve como objetivo descrever a fenologia de duas populações de S. vulgare C. Agardh, com diferentes fisionomias, em Angra dos Reis, incluindo uma avaliação do investimento potencial na reprodução e recrutamento. As 78 hipóteses testadas foram: (1) Existe dominância da fase adulta em relação às outras fases de desenvolvimento do talo nas duas populações de S. vulgare; (2) O recrutamento nas duas populações de S. vulgare varia em função do tempo apesar do esforço reprodutivo ser constante; (3) Os consumidores apresentam preferência alimentar por determinadas fases de desenvolvimento de S. vulgare. 2- Materiais e métodos 2.1- Área de estudo Este estudo foi realizado em duas ilhas, localizadas na região da Baía da Ilha Grande, no sul do Estado do Rio de Janeiro, região sudeste do Brasil. A Ilha das Flechas situa-se nas coordenadas 22○57’S e 44○21’O e Ilha Comprida em 22○57’S e 44○22’O. Na região, o sublitoral é raso com 3 m de profundidade, na interface do costão rochoso com o fundo arenoso, e a visibilidade varia em torno de 5 m (Creed & Oliveira, 2007b). O sedimento próximo ao substrato consolidado é composto por areia grossa com baixo teor de matéria orgânica e alto teor de carbonato de cálcio (Creed et al., 2007a). Experimentos prévios realizados nos locais de estudo demonstraram que o depósito de sedimentos no substrato foi significativamente maior na Ilha Comprida do que na Ilha das Flechas, somente no inverno, porém a abundância de sedimentos não apresentou relação significativa com a presença do dossel (Capítulo 1). A região da Baía da Ilha Grande apresenta temperatura da água na superfície variando entre 24-28°C no verão e 24-26°C no inverno, enquanto que a temperatura da água na superfície foi em média 2°C mais quentes que as do fundo no verão. A salinidade da água na superfície varia entre 27-37 e entre 32-38 no fundo (Creed et al., 79 2007b). Nesta região, a massa d`água no fundo é caracterizada por baixa temperatura e alta salinidade, conseqüente da entrada da Água Central do Atlântico Sul (ACAS) na baía, no verão (Creed, et al., 2007b). Na Ilha das Flechas, o costão rochoso compõe-se de um platô de granito extenso exposto à ação de fortes ondulações e correntes. Este local possui um denso banco de S. vulgare ao longo de uma faixa contínua, com tamanho médio dos talos adultos variando sazonalmente. Na Ilha Comprida, abrigada das ondulações mais freqüentes, o substrato é formado por matacões de granito dispostos irregularmente. Os talos de S. vulgare têm maior porte e estão dispostos de modo esparso com variação sazonal semelhante à observada na outra ilha (Capítulo 1). Grande parte do costão rochoso na região é sombreado por árvores e arbustos da Mata Atlântica, que em alguns pontos encontra-se muito próxima à linha d’água, havendo depósito de serrapilheira (Creed & Oliveira, 2007b). Talos de S. vulgare se mostraram perenes em ambos os locais, com maior comprimento no outono decaindo no inverno (Capítulo 1). Abaixo do dossel de Sargassum existe uma grande cobertura de algas calcárias articuladas (Figueiredo & Tâmega, 2007), geralmente epifitadas por algas filamentosas e foliáceas. Os ouriços-do-mar Echinometra lucunter (Lamarck, 1816) e Lytechinus variegatus (Lamarck, 1816), e a estrela-do-mar Echinaster brasiliensis Muller & Troschel são freqüentemente encontrados na região. Gastrópodes Bittiolum varium (Pfeiffer, 1840) e siris Cronius ruber (Lamarck, 1818) e Charibdys hellerii (A. MilneEdwards, 1867) também são freqüentes. 80 2.2- Parâmetros abióticos Parâmetros abióticos foram medidos, como a temperatura da água do mar, registrada através de sensores (DS1921G Thermochron iButton) colocados a 3 m de profundidade em ambas as Ilhas, com medições a cada 1 h e 30 min., durante o período de estudo. O grau de exposição às ondas foi calculado seguindo o método de Thomas (1985) com base nos dados meteorológicos locais (www.marinabracuhy.com.br), aplicando uma fórmula que indica o grau de exposição relativo ao arco da exposição, energia do vento e topografia do fundo (EI = Σ log W x [1 + log F/(CS + 0.1 DS)]), onde EI é o índice de exposição, W é a energia do vento [(porcentagem do tempo em que o vento sopra / 100) x (velocidade do vento2)], F é a extensão da pista onde corre o vento em milhas náuticas (máximo de 100 milhas), CS é a distância e milhas náuticas de água com profundidade menor que 6 m próximo à costa, DS é a distância em milhas náuticas de água com profundidade de menor que 6 m dentro da pista, em relação ao continente mais próximo. 2.3- Fenologia O talo de Sargassum consiste em um apressório aderido ao substrato que surge de um eixo isolado (Yoshida, 1983). Este eixo principal se ramifica em vários eixos secundários com múltiplos filóides, aerocistos, além de receptáculos (estruturas reprodutivas), formando uma entidade genética individual. Algumas vezes, porém, talos de Sargassum geneticamente diferentes podem apresentar coalescência pelo apressório, contendo seus próprios sistemas de eixos (Arenas & Fernandez, 2000). 81 Nesse estudo, talo e indivíduo genético foram considerados como uma única entidade para a avaliação da estrutura populacional. Na avaliação do esforço reprodutivo foi realizada a porcentagem de ramos que apresentavam receptáculos, considerados como férteis, em relação aos ramos estéreis. Neste caso, a coalescência de talos foi levada em consideração. Com o propósito de investigar o número de eixos principais coalescentes nos apressórios dos talos adultos, trinta talos de S. vulgare foram coletados, raspando o substrato com uma espátula, em ambas as ilhas em setembro de 2007. A fenologia foi estudada quantificando-se a abundância das diferentes fases de vida nas duas populações de S. vulgare. Quadrados de 0,25 m2 (n=10) foram aleatoriamente distribuídos ao longo de um transecto de 20 m de comprimento, em cada ilha, a uma profundidade aproximada de 2-3 m. Os quadrados foram dispostos mensalmente, entre outubro de 2006 a outubro de 2007, em ambos os locais de estudo, onde o número de talos de S. vulgare foi quantificado para cada fase de vida. A definição das fases seguiu Kendrick & Walker (1994), onde: (1) recrutas são talos com um ou dois filóides; (2) juvenis apresentam talos medindo entre 1 e 10 cm de comprimento, apresentando um apressório bem definido. Neste caso, os recrutas propriamente ditos e ‘recrutas’ derivados de talos em regeneração não foram diferenciados; (3) adultos são talos maiores que 10cm de comprimento, com eixos laterais secundários partindo do(s) eixo(s) primário(s). No acompanhamento do esforço reprodutivo de S. vulgare entre ilhas, o número de ramos vegetativos e ramos com estruturas reprodutivas (receptáculos) de cada talo adulto também foi quantificado em cada um destes quadrados. 82 2.4- Recrutamento em placas de colonização Placas de colonização foram confeccionadas com massa epóxi (Tubolit MEM), na forma circular e com uma área de 191 cm2. As placas foram aderidas ao substrato rochoso mensalmente, sob o dossel de talos adultos de S. vulgare, a uma profundidade aproximada de 3 m. As placas foram coletadas em intervalos de um mês inicialmente em uma metade do ano e em intervalos de dois meses durante o ano completo (n=10), a fim de verificar em qual intervalo de tempo haveria uma otimização no recrutamento. Algumas vezes houve perda de placas, provavelmente pela ação das ondas, que pode removê-las durante o processo de adesão, e o número de réplicas ficou reduzido para cinco ou seis. Os recrutas de S. vulgare foram contados om o auxílio de uma lupa (aumento de 12 x) e o número total registrado por placa. 2.5- Herbivoria nas diferentes fases de S. vulgare Os potenciais consumidores de Sargassum na região da Baía da Ilha Grande são ouriços e siris, observados com numerosos indivíduos nos locais de estudo. O ouriço Lytechinus variegatus (Lamarck, 1816) tem ampla distribuição na costa brasileira (Pereira et al., 2004) e apresenta uma dieta alimentar baseada em gramas marinhas, algas e pequenos crustáceos (Lowe & Lawrence, 1976). O siri Charibdys hellerii (A. Milne-Edwards, 1867) é uma espécie indo-pacífica provavelmente introduzida no Atlântico Oeste (Campos & Turkay, 1989; Gomez, & Martinez-Iglesias, 1990; Lemaitre, 1995; Tavares & Amouroux, 2003), este é um onívora (Cristina Ostrovisc, comunicação pessoal), e foi observado consumindo macroalgas em mergulhos noturnos (Raquel Muniz, observação pessoal). O consumo de talos de Sargassum por estes dois 83 organismos foi previamente observado em mergulhos diurnos e noturnos nas duas ilhas. O desenho experimental para o teste de preferência alimentar, portanto, foi idealizado para incluir prováveis consumidores generalistas, seguindo-se a recomendação de Vadas (1980). O experimento para testar ouriços foi realizado em novembro de 2006 e com siris em dezembro de 2006. No teste de preferência alimentar foram coletados, na Ilha das Flechas, indivíduos de ouriços (8 cm de diâmetro médio) e siris (tamanho médio de 10 cm), estes foram deixados em inanição durante aproximadamente 24 h, antes do início do experimento. Talos de S. vulgare de cada fase de vida (recrutas, juvenis e adultos) foram coletados. No caso dos adultos de S. vulgare, somente a porção apical foi selecionada (cerca de 5 cm de comprimento a partir do ápice do eixo secundário). As porções apicais dos talos adultos estavam disponíveis aos herbívoros, principalmente se tratando dos ouriços, na fase de brotamento a partir do apressório, ou quando muito pesadas, devido a grande quantidade de sedimentos depositada sobre as frondes, principalmente na Ilha Comprida. Talos adultos de Padina gymnospora (Kutz.) Sond. foram coletados para serem oferecidos como opção alimentar (controle). A utilização desta alga como controle foi baseada em experimento prévio, realizado em laboratório, para a observação da preferência alimentar de indivíduos juvenis de L. variegatus, em relação a diferentes grupos morfo-funcionais de algas. Apesar da impregnação por carbonato de cálcio potencialmente dificultar a herbivoria, esta alga foi consumida pelos ouriços, no período do experimento. O consumo de Padina por ouriço também foi observado indiretamente no campo, através da observação de talos comidos (Raquel de A. Muniz, observação pessoal). Todos os talos foram avaliados quanto ao volume inicial, removendo-se previamente os organismos epífitos visíveis. Gaiolas cobertas por tela plástica com 1 84 cm de diâmetro de malha, medindo 40 x 30 x 20 cm, foram usadas para o teste. Em cada gaiola, foram incluídos um exemplar de cada gênero de algas e um consumidor (n= 5). As algas foram amarradas separadamente com arame de aço inoxidável no fundo das gaiolas (n= 4) e fixadas por cabos no substrato. Após um período de 24 h, os consumidores foram liberados e os volumes finais das algas foram medidos. A análise da porcentagem do talo consumido baseou-se na diferença entre volumes final e inicial dos indivíduos de cada grupo de alga. 2.6- Tratamento estatístico Para verificar as diferenças de temperatura da água do mar ao longo do ano, um teste de ANOVA unifatorial foi realizado, tendo como fator fixo o tempo, e níveis os meses do ano entre outubro de 2006 e outubro de 2007. As diferenças entre as fases de vida de S. vulgare foram testadas através de ANOVA bifatorial (modelo 1), para os fatores fixos: local (Ilha Comprida e Ilha das Flechas) e tempo (meses entre outubro de 2006 e outubro de 2007), para cada fase: recrutas, juvenis e adultos. Os dados foram transformados para raiz (x + 0,5) para garantir a homogeneidade e normalidade (Zar, 1984), que foi confirmada com o teste de Cochran, após as análises. Não foi utilizada ANOVA trifatorial neste caso, pois os talos de diferentes fases de vida foram quantificados na mesma unidade amostral (quadrados), portanto, não existia uma independência nos dados. Na avaliação da produção de ramos com estruturas reprodutivas foi utilizada ANOVA trifatorial (modelo 1), para testar a influência do local, tempo e dossel. S. vulgare apresentava ramos férteis e vegetativos no mesmo talo em ambos locais. Neste caso, como a possível coalescência de talos pode ter dificultado distinguir indivíduos, 85 esta análise foi feita separadamente dos ramos vegetativos. As diferenças na abundância dos recrutas de S. vulgare ao longo do tempo foi testada para as placas de recrutamento coletadas em intervalos de um e dois meses, utilizando-se ANOVA unifatorial (modelo 1). As possíveis diferenças de abundância entre os meses de estudo foram detectadas através do teste para comparações múltiplas de médias de Fisher (LSD), e o teste de Cochran foi utilizado para verificar a homogeneidade dos dados. Para testar as diferenças de consumo entre as diferentes fases de Sargassum e Padina por diferentes herbívoros, foram empregadas ANOVA unifatorial para cada experimento, isto é, testando-se ouriços e siris separadamente. Para testar a homogeneidade dos dados, mais uma vez, o teste de Cochran foi empregado. Os programas empregados nas análises foram Exel, SPSS e Statistica. 3- Resultados 3.1- Parâmetros abióticos A temperatura média da água variou de modo semelhante em ambas as ilhas, ao longo do período de estudo. O valor médio máximo foi de 29,2 ºC em fevereiro de 2007, mantendo-se acima de 25ºC no verão, e o valor mínimo foi de 22ºC em agosto, mantendo-se abaixo de 25ºC no inverno, e esses valores foram significativamente diferentes entre os meses do ano (ANOVA, F= 1897,53; P<0,001) (Fig. 1). O índice de exposição às ondas calculado foi de 9 para Ilha Comprida, e 11 para a Ilha das Flechas, que correspondem ao encontrado para ambientes rasos e expostos e considerados adequados para o desenvolvimento de algas, segundo Oigman-Pszczol et al., (2004). Além da ocorrência de ondas originadas por ventos pode haver incidência 86 de ondas na região que não são originadas por ventos locais (Creed et al., 2007). A turbulência das águas também foi observada em relação ao regime de correntes de marés nos locais deste estudo, principalmente na Ilha das Flechas, onde notou-se um freqüente movimento das frondes de Sargassum. 3.2- Estudo da fenologia A estrutura populacional foi distinta entre os dois locais de estudo, porém, a densidade de recrutas foi relativamente baixa em ambas as ilhas, quando comparado com outras fases de vida de S. vulgare. Na Ilha das Flechas, onde a abundância de recrutas foi significativamente maior que na Ilha Comprida, com uma tendência a maior densidade desta fase nos meses de verão, porém esta sazonalidade não foi significativa (Fig. 2a, b; Tabela 1a). Em relação aos talos juvenis, existiu uma interação significativa entre tempo e local (Fig. 2a, b; Tabela 1b), isto é, houve uma variação em termos de abundância, ao longo do tempo na Ilha das Flechas, enquanto que os juvenis sempre foram raros ou ausentes somente na Ilha Comprida. Houve aumento significativo (teste de Fisher) de juvenis no mês de fevereiro, na Ilha das Flechas. Quanto aos talos adultos, de um modo geral foi constatada diferença significativa entre locais, com maior abundância de S. vulgare na Ilha das Flechas. Também houve uma diferença significativa em relação ao tempo (Fig. 2a, b; Tabela 1c). O teste de Fisher mostrou que em ambas as ilhas houve maior abundância de talos adultos em dezembro. O estudo da fenologia de Sargassum vulgare documentou um baixo número de recrutas na população, apesar da continua produção de ramos com estruturas reprodutivas pelos talos adultos na Ilha das Flechas e Ilha Comprida ao longo do ano. Os resultados de ANOVA apresentaram uma interação significativa entre os fatores 87 local, tempo e ramos (Tabela 2). De um modo geral, o percentual de ramos vegetativos foi significativamente maior em todos os meses de estudo, com exceção do mês de junho, quando a porcentagem de ramos férteis foi significativamente maior na Ilha Comprida (Fig. 3a, b; ANOVA, F= 4,64; P= 0,04) e igual aos ramos vegetativos na Ilha das Flechas. O teste de diferença entre médias de Fisher demonstrou que, na Ilha Comprida, houve um aumento na porcentagem de ramos férteis em junho de 2007 e o menor valor foi observado em janeiro. Na Ilha das Flechas, o aumento da produção de ramos férteis foi observado para junho e julho. Não havendo diferenças significativas entre ilhas, e o número máximo de eixos principais por apressório (coalescentes) foram cinco, na Ilha das Flechas e quatro na Ilha Comprida. 3.3- Recrutamento em placas de colonização A taxa de recrutamento foi maior nas placas coletadas em intervalos de dois meses. Nas placas coletadas em intervalos de um mês houve uma variação do recrutamento com o tempo (ANOVA, F= 11,11; P<0,001), havendo maior abundância em novembro (Fig 4 a). Nas placas expostas por dois meses, também houve variação significativa em função do tempo (ANOVA, F= 6,54; P<0,001), sendo os meses de novembro, dezembro de 2006 e junho de 2007 os que apresentaram as médias maiores (Fig. 4 b). 88 3.4- Herbivoria Os experimentos de preferência alimentar por ouriços realizados no campo revelaram a preferência significativa destes pelo consumo de talos recrutas de S. vulgare, em relação às outras fases de vida desta alga (ANOVA, F= 19,24; P< 0,001). Também foi observada a preferência por recrutas de Sargassum em relação à outra alga Padina (ANOVA, F= 7,74; P= 0,03). No experimento realizado com siris, houve consumo preferencial significativo de talos adultos de S. vulgare em relação às suas outras fases (ANOVA, F= 4,13; P< 0,001) e em relação à Padina (ANOVA, F= 54,82; P< 0,001) (Fig. 5). 4- Discussão 1- Fenologia A estrutura populacional de S. vulgare variou entre os locais estudados, e apresentou uma relação clara quanto ao investimento em reprodução, baseado nos dados obtidos sobre a porcentagem de ramos com estruturas reprodutivas e vegetativos em ambas as populações estudadas. Na Ilha Comprida, a diminuta abundância de talos recrutas e juvenis não condiz com o investimento na produção de ramos com estruturas reprodutivas, ao longo do tempo. Esta fisionomia pode estar relacionada a uma alta mortalidade na fase de assentamento, em função do alto grau de sedimentos depositados no substrato neste local, principalmente no inverno (Capítulo 1). Os sedimentos podem afetar negativamente a fixação de recrutas, principalmente na fase de pós-assentamento, quando as algas são mais vulneráveis a este processo (Vadas et 89 al., 1992; Amsler et al, 1992, Schiel et al., 2006). Os efeitos deletérios da sedimentação podem estar relacionados ao soterramento, abrasão e diminuição da irradiância (Vadas et al., 1992; Eriksson & Johansson, 2003). A baixa irradiância também pode explicar a alta mortalidade de recrutas. A alta concentração de sedimentos na Ilha Comprida pode ter gerado uma diminuição da irradiância, como constatado por Schiel et al. (2006), através da correlação positiva entre a abundância de sedimentos depositados no substrato e daqueles em suspensão. Além disso, a baixa irradiância no local também pode ter sido agravada pelo sombreamento da vegetação terrestre próximo a linha d`água, como observado em muitos pontos do costão rochoso na região da Baía da Ilha Grande (Creed et al., 2007c). A alta irradiância, em função da maior distância da vegetação terrestre (aproximadamente 5 metros da linha d`água) e menor abundância de sedimentos depositados no substrato são fatores que podem contribuir como aumento destas fases de vida nesta população. Conseqüentemente, a reduzida densidade de recrutas e juvenis e a menor abundância relativa de talos adultos eram esperadas para a Ilha Comprida. A alta mortalidade de recrutas, por si, é um fato natural, como observado em estudos sobre recrutamento de Sargassum realizados anteriormente em outros locais (De Wreed, 1983; Ang & De Wreed, 1990; Kendrick, 1991a,b; Kendrick & Walker, 1994, Ang, 1985b), assim como para outras Fucales como Fucus (Mc Cook and Chapman, 1992), Ascophyllum (Vadas et al., 1990; Viejo et al., 1999) e Turbinaria (Styger & Payri, 2005). Inclusive no Brasil, em área próxima à região de estudo, Paula & Eston (1987), observaram uma redução drástica na densidade de recrutas de S. stenophyllum Martius. Na Ilha das Flechas, a abundância de recrutas e juvenis foi relativamente maior, mas, ainda assim, foi bastante reduzida se comparada a outros estudos sobre recrutamento de 90 Sargassum, como por exemplo: 102 indivíduos.m-2 no oeste da Austrália (Kendrick & Walker, 1994) e >200 indivíduos.m-2 no sudeste do Brasil (Paula & Eston, 1987). O moderado grau de exposição às ondas e o fluxo de correntes, na Ilha das Flechas, pode ser um fator positivo nesta população de S. vulgare, onde foi observada uma maior densidade nas placas expostas e coletadas em intervalos de dois meses ao invés de um mês. Vadas (1992) comenta a possibilidade dos recrutas serem viáveis por muitos dias após a sua liberação e com isso terem sua dispersão favorecida em águas turbulentas. A movimentação das águas quando moderada pode ser tolerada ou até favorável competitivamente, conforme demonstrado por Norton (1983), que observou uma maior resistência de recrutas de S. muticum ao deslocamento pela movimentação das águas, devido à sua fixação através da liberação de mucilagem que permite uma maior aderência ao substrato. A turbulência também pode diminuir o efeito deletério da deposição de sedimentos (Scheil et al., 2006), que pode causar danos ao recrutamento e ainda levar a um aumento na produtividade pelo aumento na disponibilidade de nutrientes (Hurd, 2000). Contudo, em maiores proporções, o alto grau de turbulência das águas pode levar ao deslocamento até mesmo dos talos maiores pelo aumento proporcional da força de dragagem (Pratt & Johnson, 2002). Estes fatos podem ser vinculados à variação temporal de talos juvenis e adultos, que tendem a apresentar maiores abundâncias nos meses de verão, quando há menor incidência dos ventos fortes do quadrante sul, principalmente na Ilha das Flechas que se encontra mais exposta. A pressão de herbivoria é outro fator que pode ter levado a uma baixa densidade de recrutas, juvenis e adultos. A maior abundância de potenciais herbívoros (ouriços e siris) foi observada na Ilha Comprida a este estudo (Muniz, dados não publicados). Neste caso, a influência dos herbívoros pode ter sido mais marcante no final do verão (março), quando é esperada uma maior atividade, em função da alta temperatura da 91 água do mar. Apesar do consumo por herbívoros a atividade destes pode ser reduzida pela baixa tolerância a decréscimos na temperatura, mesmo em ambientes tropicais (Brosnan, 1992). A herbivoria também pode estar exercendo um forte impacto sobre o recrutamento principalmente pelo ouriço L. variegatus que mostrou preferência alimentar sobre recrutas e talos juvenis do que por talos adultos. Os siris C. hellerii demonstraram preferência por talos adultos, porém estes apresentaram uma variação sazonal discreta. A preferência alimentar dos ouriços sobre S. vulgare foi determinado em estudo preliminar no laboratório e confirmado no campo, logo, acredita-se que o recrutamento pode ter sido baixo pela pressão de herbivoria. Como os ouriços eram indivíduos pequenos e jovens, a quantificação de sua densidade no campo foi imprecisa, devido à dificuldade de serem encontrados em pequenas fendas e entre macroalgas. Na Ilha Comprida, esse fato é agravado pelo maior número de matacões que aumentam a complexidade do habitat. Himmelman et al. (1983), também se surpreenderam com os efeitos causados por pequenos ouriços (< 4mm) de Strongylocentrotus droebachiensis (O.F. Muller, 1776) em seus experimentos de campo, onde só foram eliminados indivíduos a partir de 10mm de diâmetro. De fato, a densidade de ouriços pode ser associada à distribuição e biomassa de macrófitas, como constatado por Palacín et al. (1998) para o ouriço Paracentrotus lividus (Lamarck, 1816). A sazonalidade do recrutamento nas placas foi maior no período de verão (novembro/dezembro) e inverno (junho), contudo somente no segundo período houve maior investimento na produção de ramos reprodutivos. A grande porcentagem de ramos com receptáculo presentes nem sempre representa necessariamente o esforço reprodutivo, pois este pode ser compensado pelo número de receptáculos que cada talo produz (Mathieson & Guo, 1992; Széchy, et al. 2006). A variação sazonal da 92 abundância das fases de desenvolvimento de Sargassum, no entanto, pode ser compensada pela regeneração de talos senescentes, a partir dos apressórios de talos juvenis. Kendrick & Walker (1994), em um banco de Sargassum na Austrália, verificaram que a regeneração deste era resultado não só da entrada de recrutas provenientes de reprodução sexuada, mas também de regeneração de talos antigos a partir de seus apressórios. Por outro lado, a variação sazonal na abundância de talos adultos, em ambas as ilhas pode estar vinculada à alta mortalidade, relacionada à senescência (Gillespie & Critchley, 1999). O acompanhamento do comprimento médio, correlacionado positivamente com a biomassa (r= 0,59, n= 55, p<0,001 ), denota uma queda natural das populações de S. vulgare durante os meses de inverno, logo após o aumento no crescimento vegetativo no outono, e posterior tendência à regeneração no verão. Portanto, a variação sazonal na densidade de talos de diferentes fases de vida e o investimento em reprodução e recrutamento ainda podem estar relacionados à variação na temperatura, como abordado em vários estudos em ambientes tropicais (De Wreed, 1976; Kimura et al., 1987; Glenn, et al., 1990; Martin-Smith, 1993; Vuki, et al., 1994; Hwang, et al., 2004). A fenologia das populações de S. vulgare neste estudo, contrastou com resultados de outros trabalhos realizados no Brasil. Paula & Oliveira Filho (1980) constataram queda na massa seca e no comprimento, no verão e outono, e aumento de ramos reprodutivos no final da primavera, numa população de S. cymosum C. Agardh, no litoral norte do Estado de São Paulo. Em populações de S. furcatum Kützing, no litoral norte do Estado do Rio de Janeiro, houve um aumento vegetativo no verão e perda total das frondes no inverno (Godoy e Coutinho, 2002). Amado-Filho et al. (2003) encontrou diferentes padrões sazonais quanto aos maiores valores de biomassa entre populações de Sargassum spp., dentro de cinco localidades na Baía de Sepetiba. 93 Széchy et al. (2006) encontrou padrões fenológicos semelhantes aos observados neste estudo para outras populações de S. vulgare na Baía da Ilha Grande. Sendo assim, a grande variação de padrões fenológicos, pode não só estar ligada a fatores intrínsecos da população, como também depender de vários fatores ambientais. A coalescência dos apressórios foi aparentemente comum, na área de estudo, sugerindo ser vantajosa esta forma de recrutamento sobre os apressórios. A coalescência pode ocorrer, inclusive, entre indivíduos com diferentes fases de desenvolvimento, com a fixação de esporos em bases adultas, mesmo em condições de sombreamento e varredura proveniente da fronde adulta (Santelices, 2004). Desse modo, a coalescência entre indivíduos pode sim ser um reflexo de uma estratégia adaptativa a distúrbios ambientais freqüentes, como por exemplo, o soterramento e a herbivoria (Maggs & Cheney, 1990; Muñoz & Santelices, 1994, Styger & Payri, 2005). Indivíduos coalescentes podem ainda emitir eixos eretos maiores e mais rapidamente do que os indivíduos não coalescentes. (Santelices, 2004). De fato, a coalescência pode ser um caso comum em Sargassum, visto que, no processo de dispersão os embrioesporos são maiores e mais pesados, afundando rapidamente (Vadas, 1992). Deysher & Norton (1982) observaram que S. muticum, tende a ter uma maior fixação de recrutas próximo à alga parental. O mesmo padrão foi observado por Kendrick & Walker (1991), num estudo sobre dispersão de propágulos de S. spinuligerum, na Austrália. Em Sargassum, a coalescência é comumente observada entre indivíduos por meio dos apressórios (Arenas & Fernandez, 2000). Sendo assim, os estudos fenológicos e principalmente aqueles que enfocam a densidade populacional (auto-desbaste ou ´self-thinning`) de Sargassum, carecem de maior atenção quanto a este aspecto. Portanto, sem um estudo genético detalhado não se pode determinar a taxa de coalescência nem o montante do investimento parental. 94 Para concluir, o grande investimento em ramos vegetativos explica a manutenção da população. Contudo, o investimento nos ramos reprodutivos de S. vulgare, em ambos locais estudados, não refletem o recrutamento na região, que aparentemente é limitado em ambas populações estudadas. Entretanto, a regeneração de talos remanescentes pelos seus apressórios pode ser uma forte estratégia para a manutenção da estrutura populacional nesta região, o que não foi devidamente avaliada neste estudo, pela não discriminação entre talos juvenis propriamente ditos e talos em fase de regeneração. Ainda, a competição entre diferentes fases de vida de Sargassum através da varredura dos talos adultos sobre recrutas e juvenis é outro fator que merece posterior atenção, principalmente na Ilha das Flechas, local cuja movimentação das águas é maior. A coalescência dos talos de Sargassum, por outro lado, deve ser uma forma de estratégia importante na manutenção da estrutura destas populações, entretanto, este fator merece uma avaliação genética. A colonização de S. vulgare no substrato naturalmente coberto por algas formadoras de denso tapete, representadas pelas algas calcárias articuladas, deve ser particularmene observada em trabalhos posteriores. Estas algas com crescimento emaranhado podem favorecer o recrutamento (Benedetti-Cecchi & Cinelli, 1992) ou ao reterem sedimentos, podem inibir o recrutamento de outras algas (Schonbeck & Norton, 1980). O soterramento por sedimentos finos pode interferir no recrutamento na Ilha Comprida, porém a herbivoria é um outro fator que pode estar atuando em ambas as ilhas, como observado neste trabalho, principalmente pelo ouriço L. variegatus. Porém, a pressão de herbivoria é um fator que deve ser observado com mais atenção, devido à presença de herbívoros de menor porte que podem influenciar na estrutura da população. 95 Agradecimentos Agradecemos ao apoio financeiro da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), aos colegas de laboratório, principalmente pela colaboração nos trabalhos de campo. Ao Projeto Mergulhar e à operadora de mergulho Frade Diver. Ao amigo João Bosco Ferreira e sua família, pelo apoio logístico no campo. E à Escola Nacional de Botânica Tropical – Instituto de Pesquisas do Jardim Botânico do Rio de Janeiro. 96 Referências bibliográficas Aguilar-Rosas, R. & Galindo, A.M., 1990. 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GL= grau de liberdade; QM= média dos quadrados, F= valor calculado, P= nível de significância Gl MQ F P Local 1 1,1 x 10-15 0,01 0,92 Ramo 1 9,02 x 10-19 796,3 < 0,001 Tempo 9 4,14 x 10-16 0,36 0,95 Local x Ramo 1 1,36 x 10-16 1,20 0,27 Local x Tempo 9 1,06 x 10-17 0,94 0,49 Ramo x Tempo 9 1,85 x 10-18 16,3 < 0,001 Local x Ramo x Tempo 9 3,98 x 10-17 3,51 < 0,001 1000 1,13 x 10-17 Erro Temperatura (C) 107 32 31 30 29 28 27 26 25 24 23 22 21 20 IC IF O N D J F M A M J J A S O Figura 1: Variação da temperatura da água do mar, entre os meses de outubro de 2006 e outubro de 2007, na Ilha das Flechas (IF) e Ilha Comprida (IC). (Média ± desvio padrão, n= 225). recrutas juvenis adultos A- Ilha Comprida 16 14 12 10 8 6 4 g e f j i k 2 0 ? O N D J F M l ? A M n m n ? J J A S O Densidade (0,25m2) Densidade (0,25m2) 20 18 20 18 16 14 12 10 8 6 4 2 0 B- Ilha das Flechas g h e i e f a a N D e j k b a J d c ? O e F M d ? A M d d ? J J A S O Figura 2: Variação na densidade (n°. /0,25m-2) de recrutas, bases e talos adultos de Sargassum vulgare nas ilhas Comprida (A) e das Flechas (B), entre os meses de outubro 2006 a outubro de 2007. (Média + erro padrão, n = 10). As letras acima das colunas de ‘a-d’ se referem às diferenças significativas entre médias no teste de Fisher para juvenis; ‘e-n’ se referem às diferenças entre médias de adultos e (?) significa meses com dados ausentes. 108 A - Ilha Comprida 100 80 e R a m o s (% ) R a m o s (% ) 80 60 40 B- Ilha das Flechas 100 d a a b e e d e c 20 d 60 e e e b 40 a 20 b b c c D F 0 0 O N D J F A J J O S O N J A J J S O Figure 3: Investimento percentual (% por 0.25m-2) nos ramos com estruturas reprodutivas dos talos adultos de S. vulgare nas ilhas Comprida (A) e das Flechas (B), nos mêses entre outubro de 2006 e abril de 2007. Média ± desvio padrão, (n = 10). Os dados referentes aos meses de março, maio e agosto não estão presentes. B - 2 meses 100 80 60 b 40 20 a a a a D J F 0 O N Densidade de recrutas (191cm) Densidade de recrutas (191 cm) A - 1 mês a 160 140 120 100 a a 80 60 b b J F 40 b 20 0 N D A J A Figura 4: Densidade de recrutas de S. vulgare em placas (191 cm2) colocadas no sublitoral e retiradas em intervalos de um mês (A) e dois meses na Ilha das Flechas (B). Média + erro padrão (n= 6). Letras distintas acima das colunas indicam médias significativamente diferentes pelo teste de Fisher. b b O Sargassum 80 Padina A - ouriço 60 40 20 0 R J A % volume consumido (ml) % volume consumido (ml) 109 80 B - Siri 60 40 20 0 R J A Figura 5: Porcentagem de volume (ml) consumido de talos recrutas, juvenis e adultos de S. vulgare por ouriços (A) e siris (B). (Média + erro padrão, n= 5). Foi incluído um herbívoro por gaiola. 110 CAPÍTULO 3 EFEITOS DO DOSSEL DE SARGASSUM VULGARE C. AGARDH (FUCALES - OCHROPHYTA) ASSOCIADOS À HERBIVORIA, VARREDURA E SOMBREAMENTO NAS ALGAS DO ESTRATO INFERIOR DA COMUNIDADE BENTÔNICA. Muniz, R. de A.1;. Kendrick, G. A.2 & Figueiredo, M. A.de O3 1 - Escola Nacional de Botânica Tropical, [email protected], 2 -Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro, [email protected] 3 - University of Western Australia, [email protected] Artigo a ser submetido ao Journal of Experimental Marine Biology and Ecology 111 Resumo A herbivoria assim como a presença de algas formadoras de dosséis são fatores importantes, que influenciam direta ou indiretamente a estrutura de muitas comunidades marinhas. Sendo assim, o objetivo deste trabalho foi testar o efeito do dossel de Sargassum vulgare em relação à varredura, sombreamento e herbivoria, considerando a densidade da meso-fauna associada e a preferência alimentar. A herbivoria foi testada medindo-se o consumo de talos juvenis de S. vulgare e Padina gymnospora, em áreas com e sem dossel e em dois locais de estudo. O efeito do dossel nestas algas do estrato inferior foi ainda avaliado quanto à varredura e ao sombreamento, usando-se mímicas plásticas e simulando níveis de irradiância. A pressão de herbivoria foi maior na Ilha Comprida, onde o costão rochoso é mais heterogêneo do que na Ilha das Flechas. O grupo morfo-funcional de algas preferencialmente consumido foi o das filamentosas. Apesar da alta densidade de invertebrados na meso-fauna sob os dosséis, não houve relação entre estes e o consumo das algas do estrato inferior. O sombreamento pelo dossel de Sargassum limitou a produtividade e deve ter interferido na abundância relativa das algas do estrato inferior, ao invés da varredura ou da herbivoria associada, principalmente da alga foliácea P. gymnospora. Palavras chaves: Costão rochoso, herbivoria, mesofauna, Sargassum vulgare, sombreamento, varredura. 112 Abstract The herbivory as well as the presence of canopy algae are very important factors influencing directly or indirectly the structure of many marine communities. Therefore, the aim of this study was to test canopy effects of Sargassum vulgare related to sweeping, shading and herbivory, considering associated meso-fauna and feedingpreference. Herbivory was tested measuring consumption of young Sargassum thallus and Padina gymnospora thalli in areas with and without canopy in two studied sites. Canopy effect on these understorey algae was also tested in relation to sweeping and shade, using plastic mimics and simulating irradiance levels. Herbivore pressure was higher in Comprida island, where the rocky shore is more heterogenous than in Flechas island, and filamentous algae were preferencially consumed was the filamentous. Despite of a high density of invertebrates in the meso-fauna under the canopies, there was no relationship between their presence and the consumption of understorey algae. Shading by the Sargassum canopy limited the productivity and might have interfered in the relative abundance of understorey algae, and not sweeping or associated herbivory, mainly of the foliose algae P. gymnospora. Key words: Rocky shores, mesofauna, herbivory, Sargassum vulgare, shading, sweeping, 113 1- Introdução A herbivoria é um importante fator que influencia direta ou indiretamente a abundância e estrutura de muitas comunidades de macroalgas marinhas (Hay, 1986; Hay, 1997; Brawley, 1992; Vadas & Elner, 1992). O efeito da herbivoria na associação de algas depende de muitos fatores, como a natureza e densidade dos herbívoros, a suscetibilidade das algas ao herbívoro e a taxa de crescimento da alga (Brosnan, 1992). A preferência alimentar do herbívoro e as habilidades competitivas dos diferentes grupos de algas da comunidade também são determinantes (Lubchenco, 1978; Shunula & Ndibalema, 1986). Entretanto, a preferência alimentar destes é determinada não somente pelos atributos intrínsecos à planta e pela biologia do herbívoro em si, mas também pelo contexto ambiental (Pérez-Harguindeguy, et al., 2003). A herbivoria pode ainda ser um fator determinante na resistência dos ecossistemas marinhos frente ao crescente impacto global da poluição orgânica, contendo a proliferação excessiva de algas efêmeras, levando à alteração nas fisionomias das respectivas comunidades (Worm & Lotze, 2006). O sombreamento exercido pelos dosséis de algas dominantes nos bancos de macroalgas também pode exercer esta função nos ecossistemas marinhos (Connell, 2003). As frondes destas algas também podem modificar variáveis biológicas pela varredura do substrato (Kennelly, 1989; Kiirikki, 1996). Sendo assim, o dossel destas algas pode influenciar direta ou indiretamente a intensidade de herbivoria nas algas associadas pela atração ou repulsão de herbívoros (Vadas & Elner, 1992; Gagnon, et al., 2003; Taylor & Schiel, 2005). As macroalgas formadoras de dossel podem afetar a mesofauna encontrada nas algas do estrato inferior pela modificação de fatores físicos, 114 tais como: espaço habitado (Jones et al., 1997), quantidade e qualidade de irradiância (Lüning & Dring, 1985; Kennelly, 1989; Clark et al., 2004) e fluxo de água (Duggins et al., 1990). Estes três fatores, portanto, podem atuar em sinergia na estrutura da comunidade de macroalgas associadas (Cervin, et al., 2004; Eriksson, et al., 2007). Em ambientes tropicais peixes e ouriços são os herbívoros dominantes, enquanto que, em ambientes temperados, moluscos e ouriços são os mais representativos (Brosnan, 1992). Os ouriços são particularmente notados por causarem grande influência sobre as populações de algas (Paine & Vadas, 1969; Hughes et al., 1987; Dean et al., 1989; Oliveira, 1991). Os siris também são forrageadores eficientes, causando efeitos em geral nas algas foliáceas (Brosnan, 1992) nos ambientes tropicais. Os mesoherbívoros, definidos como invertebrados maiores que os copépodos e com tamanho máximo de 2,5cm (como por exemplo: pequenos siris, camarões, anfípodas, isópodes, larvas de dípteras, moluscos e poliquetas), quando alcançam densidades muito altas, podem também causar efeitos marcantes na associação de algas (Brawley, 1992). De um modo geral, a alta densidade de herbívoros e o alto consumo das macroalgas pode levar à formação de áreas nuas (Hay, 1981; Hay et al., 1983; Hagen, 1995), onde somente as algas calcárias incrustantes conseguem sobreviver. Enquanto que, a baixa densidade de herbívoros, e conseqüentemente a diminuição ou até ausência de consumo, pode levar à uma proliferação excessiva de algas efêmerase oportunistas, que podem causar efeitos negativos nas comunidades marinhas bentônicas (Eriksson et al., 2007). A preferência alimentar de herbívoros por algas palatáveis e rejeição de algas com defesas químicas, a exemplo de Sargassum, foram relativamente bem explorados (revisão em Fenical, 1992). 115 No Brasil, foram realizados alguns estudos sobre densidade e distribuição da fauna associada às populações de Sargassum (Széchy et al. 2001; Ferreira et al., 2001; Godoy & Coutinho, 2002; Tanaka & Leite, 2003), assim como estudos sobre preferência alimentar (Oliveira, 1991; Ferreira, 1998) e aqueles relacionados às defesas químicas anti-herbivoria (Pereira & Yoneshigue-Valentin, 1999; Pereira, et al., 2000; Pereira et al., 2002; Pereira et al., 2004). Contudo, trabalhos sobre herbivoria associada aos efeitos de varredura ou sombreamento do dossel na estrutura das comunidades bentônicas brasileiras ainda são de suma importância para o melhor entendimento sobre a dinâmica das comunidades bentônicas dominadas por Sargassum. Visto que, este gênero de macroalga é considerado o mais importante em termos de abundância em costões rochosos do litoral sudeste (Paula & Eston, 1987; Széchy & Paula, 2000a; Amado Filho et al., 2003). Neste sentido, os objetivos deste trabalho foram avaliar os efeitos diretos (luz e varredura) ou indiretos do dossel na pressão de herbivoria nas associações de algas em duas comunidades. Para tal, formularam-se hipóteses, baseadas em resultados anteriores (Capítulo 1), a saber: (1) a presença do dossel de Sargassum influencia positivamente no consumo das macroalgas no seu estrato inferior, através da maior concentração da meso-fauna sob este dossel; (2) macroalgas oportunistas do estrato inferior aumentam sua produtividade em função do aumento no nível de irradiância pela remoção do dossel; (3) A varredura das frondes de S. vulgare reduz a abundância das macroalgas oportunistas do estrato inferior. 116 2- Materiais e métodos 2.1- Área de estudo Este estudo foi realizado no sublitoral raso das Ilhas das Flechas (22○ 57` S, 44○ 21` O) e Ilha Comprida (22○ 57` S, 44○ 22` O) na região de Bracuí, localizada na Baía da Ilha Grande, Estado do Rio de Janeiro. O primeiro local é exposto à ação de moderadas ondulações e correntes, o substrato duro compõe-se de granito e se extende até 5m de profundidade. Neste, um denso banco de Sargassum vulgare C. Agardh com talos de tamanho médio, aproximadamente 40cm de comprimento, cobre uma faixa contínua. O segundo local é mais abrigado e apresenta substrato mais heterogêneo, formado por matacões de granito, dispostos irregularmente e cobertos também por S. vulgare, com talos dispostos de modo esparso e, em alguns pontos ultrapassando 1m de comprimento. A temperatura do fundo alcança valores médios máximos nos meses de verão (29ºC em fevereiro de 2007), e mínimos no inverno (22ºC em agosto). O acúmulo de sedimentos finos, depositado no substrato é maior na Ilha Comprida, principalmente no inverno. A salinidade oscila entre 34 a 35, respectivamente nas águas superficiais e de fundo, nas duas ilhas. A irradiância máxima medida na presença e ausência do dossel de S. vulgare, varia respectivamente, entre 292 e 413 µmol.m-2.s-1. Abaixo do dossel apenas de 18 - 23% da irradiância incidente foi medida. No estrato inferior da população de S. vulgare, dominam as algas calcárias articuladas, cobertas geralmente por epífitas filamentosas e foliáceas. Na Ilha Comprida, espécies de Ceramium são os principais componentes dentre as algas filamentosas, e na Ilha das Flechas, Padina e Dictyota, são as principais algas foliáceas. De um modo geral, outras algas são menos abundantes no estrato inferior da 117 comunidade, como as algas coriáceas (Sargassum em fase juvenil), crostas calcárias e as algas cilíndrico corticadas, representadas principalmente pela espécie Asparagopsis taxiformis (Delile) Trevisan de Saint-Léon, Dichotomaria marginata (J.Ellis & Sol.) J.V. Lamour. e Laurencia obtusa (Huds) J.V. Lamour. A fauna séssil incrustante é composta principalmente por zoantídeos, poríferos e cirripédios. A fauna vágil é composta principalmente por gastrópodes, anfípodas e pequenos ouriços (meso-fauna), além do ouriço Lytechinus variegatus (Lamarck, 1816), os siris Charibdys hellerii (A. Milne-Edwards, 1867) e Cronius ruber (Lamarck, 1818). Os seguintes peixes herbívoros foram, particularmente, os mais observados no presente estudo (D. S. Abrantes observação pessoal): Kyphosus sectatrix (Linnaeus, 1758); K. incisor (Curvier, 1831); Stegastes fuscus (Curvier, 1830); Scartella cristata (Linnaeus, 1758) e Mugil curema Valenciennes, 1836. Contudo, estudos sobre a densidade destas populações na região da Baía da Ilha Grande são necessários, para avaliar a pressão de herbivoria, em função do impacto da atividade pesqueira, que é acentuado, como demonstrado em estudo realizado por Creed & Oliveira (2007). 2.2- Pressão de herbivoria nos locais de estudo De modo a selecionar o local para realizar os experimentos, testou-se a pressão de herbivoria em duas ilhas, em experimento implantado em profundidades entre 2 e 3 m, em junho de 2007. Talos juvenis de Padina e Sargassum foram fixos separadamente, às bases dos talos adultos de Sargassum, sob os dosséis, de forma aleatória (n = 6), com seus volumes padronizados previamente em 3ml. Após um período de 24 h, as réplicas foram recolhidas e seus volumes finais foram medidos, para a avaliação do consumo. Uma amostra do substrato (225 cm2) foi retirada do ponto 118 com maior abundância de algas sob o dossel e levada ao laboratório, para quantificação dos invertebrados associados às macroalgas. 2.3- Efeito da presença de dossel de S. vulgare na herbivoria O efeito da presença do dossel de S. vulgare sobre as macroalgas do estrato inferior, foi testado em um experimento com desenho em bloco. Este foi implantado em maio de 2007, na Ilha das Flechas, a uma profundidade entre 2 e 3 m. Talos adultos de S. vulgare permaneceram intocados, como controles, outros talos tiveram seu dossel removido por corte na base (n= 12). Talos juvenis de Padina e Sargassum, com volumes previamente padronizados em 4 ml, foram fixados, aos pares, à base dos talos adultos de S. vulgare. Os exemplares das algas foram fixos e expostos aos herbívoros, e outros foram fixos e envolvidos separadamente por uma malha (tecido Murim), para excluir os potenciais macro e meso herbívoros (n = 12). O experimento permaneceu por um período aproximado de 18 horas, quando o volume final de cada talo foi medido para a verificação do consumo. Amostras de 962 cm2 abaixo do dossel foram raspadas para acontagem do total de invertebrados, de modo a estimar a densidade de invertebrados associados às algas formadoras de tapetes. 2.4- Preferência alimentar pelos herbívoros A preferência alimentar por herbívoros em geral, foi testada em outro experimento implantado no campo, a uma profundidade entre 2 e 3 m, em setembro de 2007, usando três grupos de complexidade de talo diferentes. Talos com volumes previamente padronizados em 2 ml de Padina (alga foliácea), juvenis de S. vulgare 119 (alga coriácea), e Ceramium (alga filamentosa) (n=10) foram amarrados em um cabo de nylon, separadamente e de modo aleatório sob o dossel dos talos adultos de Sargassum, somente na Ilha das Flechas. O experimento foi visitado dois dias depois, para observar o consumo, e 4 dias após a implantação do experimento, este foi removido do campo, pois algumas amostras já haviam sido completamente consumidas, e os volumes finais foram medidos, para avaliar o consumo. 2.5- Efeito da irradiância na produtividade O efeito dos níveis de irradiância e conseqüente produtividade das macroalgas foi testada com a alga foliácea Padina, visto ser a alga efêmera beneficiada pela remoção do dossel (capítulo 1). No campo, um experimento com desenho em bloco, foi realizado em maio de 2007, somente na Ilha das Flechas, no qual cinco cestas plásticas foram fixas com amostras incubadas por duas horas, em uma profundidade aproximada de 3 m. Em cada cesta foram colocadas três garrafas (“DBO”) com 300 ml cada: uma clara (controle), uma envolta em sombrite (com corte de 50% de luz, simulando o dossel de S. vulgare) e uma envolta em papel alumínio (para medir a respiração). O volume de Padina foi padronizado em 4 ml para cada garrafa e a temperatura da água era de 26ºC. A água do mar para incubação das amostras foi previamente filtrada e fervida até o ponto de ebulição, para eliminar eventuais microorganismos que pudessem causar interferência neste experimento. Antes da incubação no campo, foi medida a quantidade de oxigênio dissolvido como referência nas medidas de produtividade, em uma garrafa contendo apenas água do mar. Para a realização das leituras de produção de oxigênio foi utilizado um sensor, com misturador acoplado ao oxímetro (YSI 5000). Após a leitura, as algas foram retiradas das garrafas e secas em 120 estufa (60º C) para estimar a massa, a fim de que a leitura da produção de cada frasco pudesse ser ajustada para cada amostra. No cálculo da fotossíntese e da respiração, foi utilizada a fórmula modificada de Thomas (1998): Respiração = [(garrafa inicial - garrafa escura)]/ tempo de incubação Produtividade = [(garrafa clara - garrafa inicial)]/ tempo de incubação O fator de conversão 0,3 foi utilizado para ajustar as leituras ao volume dos frascos. 2.6- Efeito da varredura do dossel De modo a distinguir entre o efeito da irradiância e da varredura do dossel, um experimento foi implantado na Ilha das Flechas, em setembro de 2007. Os seguintes tratamentos foram usados: mímicas plásticas de S. vulgare (modelo Papiro simples médio, Trema Indústria e Comércio de Equipamentos para Aquário Ltda) aderidas ao substrato com o auxílio de massa epóxi (Tubolit MEM); talos adultos de S. vulgare intocados, como controles, e talos cortados na base para a remoção do dossel (n=10). Os blocos foram colocados aleatoriamente, ao longo de um transecto de 20m, e em uma profundidade aproximada entre 2 e 3 m. A porcentagem de cobertura das algas do estrato inferior de cada tratamento foi avaliada após um mês, através de uma unidade amostral circular de 35cm de diâmetro onde foram marcados 30 pontos aleatórios. 121 2.7- Tratamento estatístico Análise de variância bifatorial (ANOVA, modelo 1) foi utilizada para testar as diferenças no consumo de macroalgas entre os locais de estudo, para os seguintes fatores fixos: locais (Ilha Comprida e Ilha das Flechas) e tipo de alga (Padina e Sargassum). Na análise da diferença no total de invertebrados presentes nas amostras raspadas foi usada ANOVA unifatorial. As diferenças no consumo de macroalgas foram testadas em função do dossel de S. vulgare, através de ANOVA bifatorial, com os fatores fixos: dossel (presença e ausência) e tipo de alga (Padina e Sargassum). ANOVA trifatorial com a adição do fator herbivoria (exclusão de herbívoros e exposição aos herbívoros) não foi utilizada, pois nas amostras cujos herbívoros foram excluídos, o consumo foi nulo. Os valores percentuais dos volumes finais das amostras foram convertidos para arco-seno da raiz quadrada da proporção, com a finalidade de garantir a normalidade e a homogeneidade dos dados (Zar, 1984). As diferenças na quantidade total de invertebrados nas algas do estrato inferior, em áreas dentro e fora do dossel de Sargassum, foi analisada com ANOVA unifatorial. As diferenças gerais no consumo de algas de grupos morfo-funcionais, no experimento de preferência alimentar foram analisadas pelo teste de ANOVA unifatorial, onde os volumes finais dos três grupos de algas foram transformados em (x +1), para garantir a normalidade e homogeneidade dos dados. Em relação ao efeito de sombreamento, os resultados de produtividade em níveis que correspodem à áreas com e sem dossel foram testados através de ANOVA unifatorial (modelo 1), comparando-se frascos claros com os envoltos com tela escura, e entre estes últimos e os de respiração. 122 No experimento de varredura do dossel de S. vulgare, o teste de ANOVA unifatorial repetitiva no tempo foi realizado para o fator dossel (dossel presente, dossel ausente e mímicas) e a variável dependente da porcentagem de cobertura de algas efêmeras (com a soma da cobertura das algas filamentosas, foliáceas e cilíndricocorticadas), considerando o tempo entre a implantação do experimento e um mês após. Os dados foram transformados para arco seno da raiz quadrada da cobertura, para assegurar a normalidade e homogeneidade dos dados para o teste (Zar, 1984). Após as respectivas transformações, o teste de Conchran foi aplicado em todos os resultados, de modo a testar a homogeneidade foi atingida, premissa básica para a realização dos testes. Quando os resultados da ANOVA foram significativos, foi feita a análise da diferença entre mais que duas médias utilizando-se o teste de Fisher. 3- Resultados 3.1- Pressão de herbivoria entre os locais de estudo O resultado do experimento sobre pressão de herbivoria entre ilhas demonstrou que o porcentual do volume de algas consumidas foi significativamente maior na Ilha Comprida do que na Ilha das Flechas, não havendo diferença no consumo entre Padina e Sargassum (Fig. 1, Tabela 1). Apesar disso, a Ilha das Flechas apresentou uma abundância significativamente maior da mesofauna nas algas do estrato inferior em relação à Ilha Comprida (totais de 187 e 85, respectivamente, ANOVA, F = 6,18; P = 0,02). Dentre os invertebrados encontrados, gastrópodes e bivalves foram os mais representativos em ambas as ilhas, sendo que na Ilha Comprida houve uma tendência a maior proporção de gastrópodes em relação ao total de invertebrados encontrados (Fig. 123 2). Em virtude deste resultado preliminar, os demais experimentos deste trabalho foram realizados na Ilha das Flechas, de modo que a alta pressão de herbivoria na Ilha Comprida não pudesse mascarar os resultados obtidos em relação à presença do dossel. 3.2- Efeito da presença de dossel na herbivoria A ANOVA bifatorial não demonstrou interação significativa entre a presença do dossel e o consumo do grupo de macroalga do estrato inferior, nem tampouco para estes fatores isoladamente. Houve uma tendência ao maior consumo de talos juvenis de Sargassum em relação à Padina nas áreas sem o dossel, porém esta diferença não foi significativa (Fig. 3, Tabela 2). A densidade de invertebrados em geral foi significativamente maior abaixo do dossel de S. vulgare (Fig. 4; ANOVA, F = 73,27; P< 0,001) em relação às áreas sem dossel, e representada principalmente pela família Columbellidae, espécie Bittiolum varium (Pfeiffer, 1840). 3.3- Preferência alimentar pelos herbívoros Em relação à preferência alimentar testada no campo, houve uma diferença altamente significativa no consumo de macroalgas em função do grupo morfofuncional, (Fig. 5; ANOVA, F = 16,17; P<0,001). As algas filamentosas (Ceramium spp.) foram as mais rapidamente consumidas. A alga foliácea Padina gymnospora e a alga coriácea S. vulgare foram os grupos relativamente menos consumidos, e de modo semelhante. 124 3.4- Efeito da irradiância na produtividade A macroalga P. gymnospora apresentou valores significativamente maiores de produtividade bruta nos frascos claros, simulando as áreas sem dossel de S. vulgare, em relação aos frascos envoltos com sombrite, simulando as áreas sombreadas pelo dossel (Fig. 6, ANOVA, F= 15, 28; P= 0,004). Os frascos envoltos em sombrite apresentaram uma concentração de oxigênio dissolvido significativamente maior que nos frascos escuros relativos à respiração (ANOVA, F= 10,48; P= 0,01), indicando que apesar do sombreamento a alga não se encontrava em um estresse maior que pudesse interferir nas leituras. 3.5 - Efeito da varredura do dossel O total de algas efêmeras, representadas principalmente pela soma das algas foliáceas e cilíndrico-corticadas, P. gymnospora e A. taxiformis, respectivamente, foram significativamente diferentes entre as áreas testadas (Fig. 7; ANOVA, F= 12,14; P< 0,001), com menor abundância nas áreas onde o dossel não foi removido. As áreas sem dossel e com mímicas não tiveram diferenças significativas em relação à cobertura total de efêmeras, segundo o teste de Fisher. 125 Discussão De um modo geral, a presença do dossel de Sargassum não interagiu no consumo direto das algas por herbívoros no estrato inferior da comunidade. Contudo, a densidade da mesofauna foi significativamente mais alta nas áreas sob os dosséis. Este resultado foi inesperado, pois a maior parte destes invertebrados era representada pelo gastrópodo Bittiolum varium, amplamente distribuído na região da Baía da Ilha Grande (Santos et al., 2007), que é um mesoherbívoro (Cote, et al., 2001) e poderia estar acentuando o efeito do dossel ao consumir as algas abaixo deste. O efeito do dossel de macroalgas foi anteriormente constatado, na composição das algas do estrato inferior, como independente da diversidade de invertebrados vágeis (Schmidt & Scheibling, 2007). O consumo por herbívoros pode também estar associado ao efeito do dossel nas algas do estrato inferior, devido à agregação destes sob o dossel (Wikström & Kautsky, 2007). Em outros casos pode ainda ser mais representativo em áreas livres do dossel, como observado principalmente por ouriços (Edgar et al., 2004; Gagnon et al., 2003). A presença de invertebrados associados a determinadas algas não necessariamente representa atividade de consumo das macroalgas hospedeiras, podendo estar relacionada ao consumo das epífitas que geralmente são mais palatáveis (Hay, 1986). A presença de epífitas influencia diretamente a densidade de espécies associadas às macroalgas (Martin-Smith, 1993; Pavia, et al., 1999), devido ao aumento da complexidade estrutural além da disponibilidade de alimento. Também pode ocorrer maior assentamento de invertebrados resultante da atração de larvas por substâncias liberadas pelos talos das algas hospedeiras (Williams & Seed, 1992). A abundância da fauna sob dossel poderia ainda estar relacionada àquela que procura refúgio contra predadores (Brawley, 1992) ou a algum outro fator ambiental. A exemplo, Széchy, et al. (2001) observaram uma maior abundância de crustáceos na mesofauna (Decapoda – 126 Brachyura) abaixo de Sargassum e a relacionaram ao refúgio quando há exposição direta às ondas. A maior abundância da mesofauna associada às algas do estrato inferior na ilha das Flechas pode estar relacionada às características físicas do local, e não diretamente ao tipo de hospedeiro. De forma semelhante, Schreider et al. (2003), observou uma maior abundância da epifauna relacionada à posição das algas hospedeiras no recife, e não em relação aos hospedeiros especificamente. Apesar da maior abundância de invertebrados ter sido observada na Ilha das Flechas, a proporção do gastrópodo herbívoro B. varium associado à presença do dossel de Sargassum foi maior na Ilha Comprida, onde se deu o maior consumo das algas. Neste local, o maior número de matacões dispostos irregularmente no substrato também propicia um aumento da heterogeneidade. A maior disponibilidade de componentes estruturais do habitat disponibilizaria maior oferta de refúgios para os mesoherbívoros (Brawley, 1992; Beck 2000). A heterogeneidade do habitat é ainda aumentada pelo ´tapete` formado por algas calcárias articuladas que cobrem o substrato de modo denso e espesso, na Ilha Comprida em relação à Ilha das Flechas. A forma emaranhada dos talos destas algas deve contribuir para abrigar uma grande quantidade de invertebrados, como observada por Akikoka et al. (1999). Os efeitos positivos da complexidade do habitat oferecido pelas algas calcárias articuladas se dão, portanto, pela redução do risco de predação, da severidade do habitat e da ação das ondas, e pelo aumento da disponibilidade de recursos como espaço e de alimento (Kelaher, et al. 2001; Kelaher & Castilla, 2005). Estas algas, comumente denominadas como algas formadoras de ´tapetes`, têm uma grande capacidade de reter sedimentos entre seus talos, retendo algumas vezes, uma quantidade até dez vezes maior que a própria biomassa (Airoldi et al., 1995). Esse fato 127 também pode ser positivo para o aumento da riqueza da fauna associada, principalmente, poliquetas, bivalvos e gastrópodos (Kelaher, 2001; Olabarría, et al., 2002; Schmidt & Scheibling, 2007). A heterogeneidade topográfica do habitat também pode favorecer o aumento da pressão de herbivoria por peixes e ouriços (Hay et al., 1983). Como potenciais macroherbívoros, o ouriço Lytechinus variegatus (Echinodermata) (Creed & Oliveira, 2007; Ventura et al., 2007) e peixes herbívoros (Ferreira et al, 2007) são observados na região. L. variegatus potencialmente regula a população de S. vulgare, pelo consumo preferencial dos recrutas desta espécie, nos locais estudados (Capítulo 2). Apesar de ser um animal onívoro, mais de 80% da sua dieta é composta por algas, como observado por Oliveira (1991). A partir de observações do conteúdo estomacal deste ouriço, esta autora ainda observou que 24% destas algas eram do gênero Sargassum. O consumo por peixes também pode interferir na comunidade, pois 10% dos peixes observados na região da Baía da Ilha Grande são herbívoros (Ferreira et al., 2007). De fato, uma maior associação de peixes pode ser esperada na presença de um banco natural de Sargassum como observado por Godoy & Coutinho (2002) ao comparar S. furcatum às suas mímicas. A fauna associada ao habitat formado pelos bancos de Sargassum apresentou uma preferência alimentar nos resultados deste trabalho. Demonstrou-se um consumo preferencial das algas efêmeras, geralmente algas epífitas filamentosas representadas por espécies de Ceramium, quando comparado a algas de talos mais complexos de Padina e Sargassum. Este resultado era o esperado, pois esta alga apresenta talo filamentoso e delicado, mais suscetível ao consumo por herbívoros do que algas foliáceas e coriáceas (Steneck & Dethier, 1994). Esta alga tende a ser mais palatável ao consumo por peixes (Klumpp & Polunin, 1989; Ferreira et al., 1998). De fato, 128 Ceramium só foi observado em maior abundância, na franja do meso-litoral do costão rochoso na Ilha das Flechas, local onde escapa da ação dos herbívoros durante os períodos da baixamar. Metabólitos secundários que podem ser produzidos por Sargassum (Pereira & Yoneshigue-Valentin, 1999) e a calcificação presente na superfície das lâminas de Padina (Schneider & Searles, 1991) podem tornar estas algas menos palatáveis. Mesmo assim, o consumo de Sargassum e Padina, ainda que baixo, foi observado neste trabalho, o que sugere que estas substâncias potencialmente repelentes não inviabilizam totalmente o consumo destas algas por herbívoros. Algumas espécies podem ser suscetíveis aos herbívoros pela baixa produção destes metabólitos secundários, como foi observado por Pereira & YoneshigueValentin (1999), em relação ao consumo de Sargassum furcatum por anfípodas e P. gymnospora e Sargassum filipendula consumidas por peixes e poliquetas (Hay, 1984; Hay, et al., 1988) O carbonato de cálcio pode diminuir a palatabilidade pelo endurecimento do talo e pelo aumento do pH do trato digestivo dos herbívoros, diminuindo o seu desempenho digestivo (Littler & Littler, 1980, Duffy & Paul, 1992; Pennings & Paul, 1992). No entanto, o consumo de algas impregnadas por carbonato de cálcio pode ser priorizado, dependendendo se a relação custo-benefício entre a calcificação e a concentração de matéria orgânica disponível no talo for favorável. Esta relação foi observada por Hay et al., (1994) no consumo pelo ouriço Diadema antillarum. Da mesma forma, Duffy & Hay (1991) observaram que extratos de Dictyota e Sargassum foram preferencialmene consumidos por anfípodas, sendo que a sua sobrevivência explicada pelos valores protéicos encontrados nos extratos das algas. Quanto à varredura do dossel de S. vulgare, esta não influenciou na abundância das algas do estrato inferior, pois não houve diferença significativa na abundância das algas do estrato inferior da comunidade entre áreas sob os talos controles e mímicas de 129 Sargassum na área testada. O efeito relacionado ao distúrbio proveniente da ação das ondas nas frondes nem sempre foi detectado em outros trabalhos. Kraufvelin (2007) observou modificações na estrutura de comunidade de algas de costão rochoso indiferente à varredura, mas associadas à eutroficação do habitat e a herbivoria. Por outro lado, na ausência do efeito da varredura, o efeito do dossel de S. vulgare pode ser atribuído ao sombreamento, que deve limitar a proliferação de algas foliáceas, representadas principalmente por P. gymnospora em áreas sob dossel. De fato, esta alga teve uma redução na produtividade, indicando ser esta a principal razão para a limitação à sobrevivência das algas efêmeras sob o dossel de S. vulgare. No presente estudo, a produtividade maior de P. gymnospora nos frascos simulando o dossel de Sargassum, em relação aos frascos de respiração, sugere que esta alga foliácea tem capacidade de sobreviver, mesmo que em abundância reduzida sob o dossel. O efeito ligado ao sombreamento de alga formadora de dossel foi comprovado experimentalmente por Kennely (1989) que, contudo, não observou efeito de varredura por Ecklonia radiata (C. Agardh) nas algas do estrato inferior. Wernberg et al. (2005) também observaram o efeito exercido pelo sombreamento do dossel de E. radiata, em detrimento do efeito de ondas e deposição de sedimentos, sobre o grupo de algas foliáceas do estrato inferior. No presente estudo, em experimento de maior duração realizado anteriormente, observamos uma proliferação de algas foliáceas nas áreas onde o dossel foi removido e que foi mantida à medida que a cobertura de S. vulgare foi regenerando, sugerindo uma fotoaclimatação (Capítulo 1). Uma provável fotoaclimatação é esperada após a regeneração dos dosséis, como constatado por Toohey et al., (2004) para as algas Pterocladia lucida (R. Brown ex Turner) J. Agardh, Rhodymenia sonderi P.C. Silva e Chauviniella corifolia (Havey) Papenfuss, abaixo do dossel de Ecklonia radiata. 130 O eefeito do dossel de Sargassum vulgare associado ao aumento da pressão de herbivoria não foi detectado nas algas do estrato inferior, apesar do dossel ter a capacidade de agregar invertebrados da mesofauna nas áreas abaixo de suas frondes. Contudo, a diversidade de componentes estruturais do substrato deve ser analisada, mediante medidas mais precisas recomendadas por Beck (2000), para verificar se houve outra influência na complexidade do habitat sobre a oferta de refúgios à mesoafauna. As algas filamentosas foram preferencialmente consumidas em relação à Padina e Sargassum, contudo estas apresentaram seus talos consumidos, respectivamente em 30 a 40%, independente da presença do dossel. Como a abundância destas algas pode estar relacionada à outros fatores ambientais, como a concentração de nutrientes disponíveis na água, estudos posteriores são necessários para explicar a proliferação de algas filamentosas na Ilha Comprida ao invés de foliáceas dominantes na.Ilha das Flechas, apesar do consumo diferenciado. O efeito da varredura do dossel de S. vulgare nas algas do estrato inferior não foi comprovado para a comunidade madura na Ilha das Flechas. Porém, a varredura pode ser mais importante em relação às comunidades em início de sucessão. Por outro lado, o efeito do sombreamento do dossel foi constatado para as algas foliáceas do estrato inferior da comunidade, representadas por P. gymnospora, que como o esperado foi mais produtiva em situação simulada de maior irradiância, o que deve interferir na abundância relativa destas algas a longo prazo. 131 Agradecimentos Agradecemos ao apoio financeiro da Coordenação de aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), aos colegas de laboratório, principalmente pela colaboração nos trabalhos de campo à Gisa Eneida, Rodrigo Mariath e Sulamita O. Barbosa, pelo apoio técnico no campo. Ao Projeto Mergulhar e à operadora de mergulho Frade Diver. 132 Referências bibliográficas Airoldi, L.; Rind, F. & Cinelli, F., 1995. Structure, seasonal dynamics and reproductive phenology of a filamentous turf assemblage on a sediment influenced, rocky subtidal shore. Botânica Marina 38, 227-237. Akioka, H.; Baba, M., Masaki, T. & Johanses, H.W., 1999. 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Gl MQ F P Local 1 0,34 4,31 ≤ 0,05 Grupo de alga 1 0,38 0,48 0,49 Local x Alga 1 0,09 1,19 0,29 Erro 20 0,08 Tabela 2: Análise de variância bifatorial entre os fatores fixos: dossel (presença e ausência), e grupo de alga (Padina e Sargassum), em relação à porcentagem de volume consumido. GL = grau de liberdade; QM = média dos quadrados, F = estatística de teste, P= nível de significância. Gl MQ F P Dossel 1 0,02 0,27 0,61 Grupo de alga 1 0,08 1,29 0,27 Dossel x Alga 1 0,12 1,88 0,18 Erro 20 0,06 143 Figuras Sargassum Padina 60 Consumo (%) 50 40 30 20 10 0 IC IF Figura 1: Volume consumido (ml) de Padina e S. vulgare, em termos de porcentagem, por herbívoros em geral, na Ilha Comprida (IC) e na Ilha das Flechas (IF). (Média +erro padrão, n= 6). gastrópode bivalve anêmona aplisia ouriço poliqueta camarão afípoda ofiuróide siri 100 100 Densidade (225 cm2) Densidade (225cm2) A- Ilha Comprida 80 60 40 20 0 B- Ilha das Flechas 80 60 40 20 0 Figura 2: Proporção (%) da densidade de grupos da mesofauna em áreas amostradas de 225 cm2, presentes nas algas do estrato inferior das comunidades nas Ilha Comprida e Ilha das Flechas. (Média, +erro padrão, n= 6). 144 60 Padina Consumo (%) 50 Sargassum 40 30 20 10 0 DH SDH Figura 3: Porcentagem de consumo das algas Padina e Sargassum por herbívoros, em geral, na Ilha das Flechas, em maio de 2007. DH: (presença de dossel e de herbívoros); SDH: (ausência de dossel e presença de herbívoros). (Médias + erro padrão, n= 12). Densidade (No/962cm2) 400 350 300 250 200 150 100 50 0 Sem dossel Com dossel Figura 4: Densidade de invertebrados, em geral, da mesofauna nas áreas sob ausência e presença do dossel de S. vulgare. (Média + erro padrão, n= 12). 145 100 b Consum o (%) 80 60 40 a a Foliácea Coriácea 20 0 Filamentosa Figura 5: Porcentagem de consumo por herbívoros, em geral, de grupos morfofuncionais de macroalgas: alga filamentosa (Ceramium spp.), alga foliácea (Padina gymnospora) e alga coriácea (talos juvenis de S. vulgare) no campo. As letras acima das colunas denotam diferenças entre médias segundo o teste de Fisher (Média + erro padrão, n= 10). Produtividade (mgO2.ps-1.h-1 (10-2) 3000 Sem sombra Com sombra 2500 Respiração 2000 1500 1000 500 0 Figura 6: Produção de oxigênio por P. gymnospora em frascos simulando áreas não sombreadas pelo dossel de S. vulgare, com sombreamento pelo dossel e em áreas totalmente no escuro que simulam respiração, durante um período de duas horas de incubação no campo. (Média +erro, n= 5). 146 100 Cobertura (%) 80 coriácea corticadas craca articuladas crostas zoantideo filamentosas esponja foliáceas pedra A- Dossel 60 40 20 0 T0 T1 100 Cobertura (%) 80 B- Sem dossel 60 40 20 0 T0 T1 100 Cobertura (%) 80 C- Mímicas 60 40 20 0 T0 T1 Figura 7: Porcentagem de cobertura dos grupos de algas, invertebrados e substrato disponível em áreas abaixo do dossel de S. vulgare (A), áreas sem o dossel (B) e áreas abaixo de mímicas plásticas de S. vulgare (C), na Ilha das Flechas. (Médias + erro padrão, n=10). 147 CONSIDERAÇÕES FINAIS O efeito do dossel de S. vulgare nas algas do estrato inferior da comunidade madura depende da época do ano e local, enquanto que nas comunidades em início de sucessão este efeito não se mostrou significativo. De um modo geral, sugere-se que as interações competitivas entre o dossel de S. vulgare e as algas do estrato inferior foram atenuadas. No caso da comunidade madura, o distúrbio de sombreamento, acentuado pela proximidade da vegetação terrestre adjacente ao costão rochoso da Ilha Comprida, mascarou o efeito do dossel de Sargassum no inverno. Na comunidade em início de sucessão, o distúrbio mecânico por raspagem do substrato aumentou a disponibilidade de espaço, diminuindo assim a competição, o que deve ter contribuído para a não detecção do efeito do dossel. As algas efêmeras do estrato inferior da comunidade são sensíveis à remoção do dossel de Sargassum, em contraste às algas perenes representadas pelo grupo das calcárias articuladas. As populações de S. vulgare são limitadas no recrutamento, apesar do investimento reprodutivo, o que explica a sua baixa cobertura no estrato inferior da comunidade. Esta limitação é dada muito possivelmente pela pressão de herbivoria, exercida principalmente por ouriços nos recrutas e juvenis. Observações feitas no campo sugerem que estas populações são mantidas, provavelmente, pela regeneração e coalescência dos talos nas bases perenes dos talos de S. vulgare. A coalescência é um fenômeno que deve ser estudado posteriormente, pois pode ser uma estratégia de sobrevivência destas populações aos distúrbios ambientais presentes. 148 O efeito do dossel sobre as algas do estrato inferior, representadas principalmente pelas algas foliáceas na Ilha das Flechas, se deve principalmente ao sombreamento e não à varredura ou pressão por herbívoros associados à presença do dossel. As algas filamentosas, apresentam uma proliferação sazonal principalmente na Ilha Comprida e aparentemente não são representativas na Ilha das Flechas, pelo consumo preferencial por herbívoros na região do infralitoral. Distúrbios antrópicos, provenientes principalmente da poluição orgânica em alguns pontos da Baía da Ilha Grande levam ao aumento da turbidez das águas, além do aumento de nutrientes (Creed & Oliveira, 2007), o que pode interferir nas relações competitivas entre os estratos das comunidades. Os distúrbios naturais provenientes de varredura do dossel de S. vulgare em estágios iniciais de sucessão da comunidade, e do aporte de efluentes dos cursos de água que levam ao aumento da sedimentação merecem maiores detalhamentos em estudos posteriores, para o melhor entendimento das comunidades estudadas, e elaboração de modelos ecológicos que possam servir de base para ações de conservação nestas áreas de grande importância ecológica e econômica. 149 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Airoldi, L.; Rind, F. & Cinelli, F. 1995. Structure, seasonal dynamics and reproductive phenology of a filamentous turf assemblage on a sediment influenced, rocky subtidal shore. 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