1 A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA E OS TRATADOS
Transcrição
1 A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA E OS TRATADOS
1 A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA E OS TRATADOS INTERNACIONAIS CONTRA A TORTURA Adriélli Pelizzar Jakuboski1 Izaura José Padilha dos Santos2 Heraldo Felipe de Faria3 RESUMO: A proposta do presente trabalho é expor sobre o crime de tortura acerca da Constituição Federal de 1988, da Lei Federal nº 9.455/97 (Lei de Tortura) e das Convenções e Tratados Internacionais. Em outras palavras, o objetivo é analisar a importância desses dispositivos legais e as medidas utilizadas na luta contra a prática da tortura. Tendo em vista que a tortura viola um dos preceitos fundamentais instituído pela Constituição Federal, qual seja a dignidade da pessoa humana. Diante disso, observa-se a relevância do tema para que essa prática seja reprimida considerando a natureza jurídica dos bens jurídicos tutelados pela legislação supracitada. PALAVRAS-CHAVE: Tortura – Noções Gerais – Tratados Internacionais – Dignidade da Pessoa Humana. ABSTRACT: The purpose of this work is about exposing the crime of torture on the 1988 Federal Constitution, the Federal Law nº 9.455/97 (Law of Torture) and international conventions and treaties. In other words, the goal is to analyze the importance of these legal provisions and the measures used in the fight against torture. Given that torture violates one of the fundamental precepts established by the Federal Constitution, which is the dignity of the human person. Thus, we observe the relevance of the topic to which this practice is repressed considering the legal nature of the legal interests protected by the above legislation. KEYWORDS: Torture - The Basics - International Treaties - Human Dignity. 1- INTRODUÇÃO O presente trabalho tem por escopo apresentar noções gerais sobre o crime de tortura fundamentadas, basicamente, na Constituição Federal de 1988 e na Lei nº 9.455, de 07 de abril de 1997, denominada Lei de Tortura. Ressaltando que os dispositivos contidos no texto constitucional e na legislação federal visam à proteção do direito à vida e à integridade pessoal. No âmbito do Direito Internacional, além da Declaração Universal dos Direitos Humanos, também, serão apresentados outros tratados e convenções, em especial, a Convenção contra a Tortura e outros Tratamentos ou Penas cruéis, Desumanos ou Degradantes, celebrados pela Organização das Nações Unidas – ONU que foram ratificados por diversos países, inclusive pelo Brasil. 1 JAKUBOSKI, Adriélli Pelizzar. Graduando em Direito pela AJES - Faculdade de Ciências Contábeis e de Administração do Vale do Juruena, X Termo. E-mail: [email protected]. 2 SANTOS, Izaura José Padilha dos. Graduando em Direito pela AJES - Faculdade de Ciências Contábeis e de Administração do Vale do Juruena, X Termo. E-mail: [email protected]. 3 FARIA, Heraldo Felipe de. Advogado, Jornalista, Autor de diversos livros; Especialista em Direito Processual Civil pelo CESUSC - Centro de Estudos Superiores de Santa Catarina; Mestre em Direito pela UNIMAR Universidade de Marília - SP. E-mail: [email protected]. 2 Por fim, tratar-se-á das medidas adotadas para reprimir e punir aquele que praticar o crime de tortura, ou seja, aquele que violar tanto as normas brasileiras quanto o disposto nos tratados e convenções internacionais. 2- BREVES CONSIDERAÇÕES ACERCA DO CRIME DE TORTURA O crime de tortura surgiu há muitos anos atrás, tendo em vista que foi um marco para a história brasileira que repercute até os dias atuais no que se refere à dignidade da pessoa humana. Ademais, o crime de tortura é um crime equiparado aos crimes hediondos, ou seja, considerado como delito assemelhado aos crimes hediondos. Nesse diapasão, Cecília Maria Bouças Coimbra afirma que: [...] Somente a última, a de 1988 – já em final do século XX – prevê sua criminalização; entretanto, a tortura encontra-se ali colocada ao lado dos crimes de terrorismo e tráfico de drogas. E somente quase dez anos depois, em 07 de abril de 1997, é que com a Lei 9.455 a prática da tortura foi tipificada em nosso país.4 Antes da Constituição Federal de 1988, nenhuma das Constituições que existiram no Brasil no decorrer da história abordaram o crime de tortura. No entanto, somente com o advento da Carta Magna que o legislador abordou a prática de tortura e no ano de 1997 foi elaborada e promulgada a Lei de Tortura sob o n° 9.455. Segundo Alberto Silva Franco: O Brasil, sem dúvida, um dos últimos países do mundo ocidental a incluir, em sua tipologia oficial, o delito de tortura. É inquestionável que a lei configuradora desse crime poderia ter sido melhor formulada [...], mas será sempre preferível, em matéria de tortura, uma figura típica que possa ser melhorada, do que a carência tipológica. A simples existência do tipo de tortura já constitui, em si mesma, um progresso enorme na área de defesa dos direitos fundamentais da pessoa humana e representa um fator psicológico capaz de reduzir, ou mesmo, de inerciar a atividade delitiva dos torturadores que agiam até bem pouco tempo sob o manto protetor e seguro da impunidade.5 Observa-se que o delito de tortura gerou uma enorme repercussão no Brasil, diante dos tratamentos cruéis, desumanos e degradantes que os torturadores utilizavam. Assim, foi necessário ser regulamentada uma lei para penalizar a pessoa que cometesse este ato, sendo a Lei n° 9.455/97 (Lei de Tortura), tendo como principal objetivo a defesa dos direitos fundamentais da pessoa humana, bem como reduzir esta prática devastadora e cruel existente na humanidade. 4 COIMBRA, Cecília Maria Bouças. Tortura Ontem e Hoje: resgatando uma certa história. Disponível em: ˂http://www.scielo.br/pdf/pe/v6n2/v6n2a03.pdf˃. Acessado em: 06 de set., de 2014. 5 FRANCO, Alberto Silva; LIRA, Rafael; FELIX, Yuri. Crimes Hediondos. 7. ed., atual. e ampl. - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. P. 195. 3 Vale ressaltar que “a tortura era utilizada como um meio de se obter a confissão dos mais variados crimes e em busca de informações que eram relevantes à segurança nacional. As formas de tortura eram as mais cruéis, humilhantes e degradantes”6. Diante disso, torna-se fundamental ser visto neste estudo o que a Lei n° 9.455/97 (Lei de Tortura) versa sobre este ato desumano e degradante, bem como a posição da Constituição Federal brasileira de 1988 para proteger os seres humanos que são vítimas desta prática torturante. O artigo 1°, da Lei n° 9.455/97, dispõe sobre o que constitui o crime de tortura, in verbis: Art. 1º Constitui crime de tortura: I - constranger alguém com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico ou mental: a) com o fim de obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de terceira pessoa; b) para provocar ação ou omissão de natureza criminosa; c) em razão de discriminação racial ou religiosa; II - submeter alguém, sob sua guarda, poder ou autoridade, com emprego de violência ou grave ameaça, a intenso sofrimento físico ou mental, como forma de aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo. Pena - reclusão, de dois a oito anos. §1º Na mesma pena incorre quem submete pessoa presa ou sujeita a medida de segurança a sofrimento físico ou mental, por intermédio da prática de ato não previsto em lei ou não resultante de medida legal. §2º Aquele que se omite em face dessas condutas, quando tinha o dever de evitá-las ou apurá-las, incorre na pena de detenção de um a quatro anos. §3º Se resulta lesão corporal de natureza grave ou gravíssima, a pena é de reclusão de quatro a dez anos; se resulta morte, a reclusão é de oito a dezesseis anos. (...).7 O legislador neste dispositivo legal não definiu o que significa “tortura”, apenas classificou os aspectos em que se constitui o crime de tortura, ou seja, explicou e esclareceu as formas que são consideradas como crime de tortura, com o objetivo de esclarecer as penalidades para quem cometer esta prática degradante. De Plácido e Silva, define tortura como sendo: [...] o sofrimento ou a dor provocada por maus tratos físicos ou morais. É ato desumano que atenta à dignidade humana. É o sofrimento profundo, angústia, dor. Torturar a vítima é produzir-lhe um sofrimento desnecessário. É tornar mais angustiante o sofrimento.8 O crime de tortura refere-se à dor e ao sofrimento provocado por maus tratos, considerada como um ato desumano que viola os preceitos fundamentais que é a dignidade da pessoa humana. 6 SILVA, Magna Meire de Oliveira. Tortura. Conteúdo Jurídico, Brasília-DF. Disponível em: <http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.36374&seo=1>. Acesso em: 02 de set., 2014. 7 Art. 1º da Lei nº 9.455/97. 8 SILVA, De Plácido e. Apud: SILVA, José Geraldo da; BONINI, Paulo Rogério; LAVORENTINI, Wilson. Leis penais especiais anotadas. 12. ed. - São Paulo: Milennium Editora, 2011. P. 509. 4 Outro ponto relevante refere-se à posição constitucional referente ao crime de tortura. Assim, a Constituição Federal de 1988, traz em seu artigo 5º, inciso III, que “ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante”. Observa-se que a Carta Magna resguarda a proteção ao ser humano, pois este não pode ser submetido à tortura e nenhum tratamento desumano ou degradante que viole os preceitos básicos, como a proteção e a segurança. Nesse sentido, Ricardo Freire Vasconcellos aduz que: A Tortura é uma violação de direitos humanos, afeta a integridade física, psicológica e mental por estas razões viola o direito do cidadão de sua integridade, de sua liberdade, de sua convivência social pacifica, e seu direito a vida com dignidade humana.9 O crime de tortura viola vários preceitos que são fundamentais para o ser humano ter uma vida digna sem qualquer tipo de restrições, como: a integridade, a liberdade, a convivência social entre outros. Além disso, para proteger ainda mais as vítimas deste ato, a Constituição Federal de 1988 prevê, também, em seu artigo 5°, inciso XLIII, in verbis: [...] a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem.10 O crime de tortura não é passível de fiança, ou seja, é um crime inafiançável e insuscetível de graça ou de anistia. Nesse contexto, a previsão legal exclui, totalmente, a possibilidade do torturador pagar fiança para não ficar preso, devendo, assim, responder pelos seus atos, que decorrem nas penalidades previstas de acordo com a maneira que se utilizou para praticar a tortura. Portanto, tanto a Lei n° 9.455/97 como a Constituição Federal dispõe sobre o crime de tortura, pois, quem praticar este ato cruel, desumano e degradante deve ser penalizado conforme a legislação sem qualquer tipo de restrição. Ademais, a Lei de Tortura foi elaborada pelo legislador com o objetivo de reduzir a sua prática, bem como proteger todos os cidadãos brasileiros que possuem seus direitos perante a sociedade. 3- A RELEVÂNCIA DOS TRATADOS INTERNACIONAIS NO COMBATE AO CRIME DE TORTURA 9 VASCONCELLOS, Ricardo Freire. Estudo penal - Crime de Tortura - Lei 9.455/97. Disponível em: ˂http://www.portaleducacao.com.br/direito/artigos/44288/estudo-penal-crime-de-tortura-lei-9455-97˃. Acessado em: 06 de set., de 2014. 10 Art. 5º, XLIII, da CF/88. 5 No âmbito do Direito Internacional, a prática da tortura é absolutamente proibida, motivo pelo qual foram instituídos diversos documentos internacionais que condenam a tortura, não podendo ser admitida em qualquer hipótese. Segundo Adalgisa Maria Oliveira Nunes, “no contexto histórico pós Segunda Grande Guerra, a proteção aos direitos e as garantias individuais fizeram parte de uma espécie de carta de propósitos ou de comprometimento com a modernidade”11. Assim sendo, o Direito Internacional visa resguardar, por meio de declarações, pactos, convenções e acordos, o direito à vida, bem como o direito à integridade física de todos os seres humanos, abolindo qualquer tipo de conduta que ofenda, de qualquer forma, tais direitos. A Organização das Nações Unidas – ONU considera o crime de tortura como: Uma negação dos propósitos de sua Carta e como uma violação de Direitos Humanos e das liberdades fundamentais proclamados na Declaração Universal de Direitos Humanos. A proibição da tortura é encontrada em inúmeros tratados internacionais de direitos humanos e tratados humanitários internacionais e também é considerada um princípio geral de Direito Internacional. 12 A Declaração Universal dos Direitos Humanos, assinada em 10 de dezembro de 1948, estabelece em seu artigo 5º que “ninguém será submetido à tortura nem a tratamento ou castigo cruel, desumano ou degradante”. Portanto, o direito expresso no referido artigo, deve ser considerado como um direito fundamental do homem, uma vez que todo ser humano deve ser tratado com dignidade. É oportuno lembrar que as normas contidas na Declaração Universal dos Direitos Humanos não podem ser de maneira alguma derrogadas, em virtude de serem consideradas normas de jus cogens internacional, exceto quando houver a superveniência de norma imperativa de Direito Internacional Geral. Ao tratar do assunto Valerio de Oliveira Mazzuoli afirma que: Foi nesse sentido que o Tribunal Penal Internacional para a ex-Iugoslávia, no acórdão de 10 de dezembro de 1998, considerou ser a proibição da tortura uma regra imperativa de Direito Internacional (jus cogens) e que esses atos de tortura não podem ser amparados por legislações nacionais de anistia.13 11 NUNES, Adalgisa Maria Oliveira. A prática da tortura na legislação brasileira e os direitos humanos. Revista PIBIC, Osasco, v.3, n. 1, p. 23-28, 2006. 12 FOLEY, Conor. Protegendo os brasileiros contra a tortura: Um manual para juízes, promotores, defensores públicos e advogados. 1 ed. Tradução Tatiana Dicenzo; Rita Lamy Freund – Brasília: International Bar Association’s Human Rights Institute (IBAHRI) / Ministério das Relações Exteriores Britânico e Embaixada Britânica no Brasil, 2011. p. 18. 13 MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Curso de direito internacional público. 5. ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. p. 862. 6 Assim sendo, o Direito Internacional Geral vincula todos os Estados, até mesmo aqueles que não tenham ratificado um tratado específico, a respeitar as normas estabelecidas na Declaração Universal dos Direitos Humanos. Nas palavras de Luiz Antonio da Silva Junior, “a Declaração Universal dos Direitos Humanos é, sem dúvida alguma, o texto mais importante da proteção contra a prática da tortura”14. Além de ser considerado um documento de suma importância para o Direito Internacional, é importante lembrar que foi a partir da Declaração Universal dos Direitos Humanos que surgiram outros documentos internacionais cujo teor veda qualquer tipo de tortura contra a pessoa. Luiz Antonio da Silva Junior, também, destaca que: A Declaração Universal dos Direitos Humanos [...] constitui um marco na construção do Direito Internacional dos Direitos Humanos, tem como pilares a dignidade e a igualdade de todos os homens, reconhecendo a condição de pessoa como único requisito para a titularidade de direitos, independendo, desse modo, das condições sociais, culturais e econômicas de determinada sociedade.15 Destarte, é possível afirmar que a Declaração Universal dos Direitos Humanos foi o primeiro documento internacional a vedar a prática da tortura, reconhecendo tal conduta como um delito, obrigando os Estados a reprimi-la e impondo penalidades para aquele que violar seus dispositivos. Citar-se-á, aqui, outros documentos internacionais considerados relevantes na luta contra o crime de tortura, Declaração sobre a Proteção de todas as pessoas contra a Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanas ou Degradantes aprovada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 09 de dezembro de 1975; Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica), a qual foi celebrada em 22/11/1969, sendo ratificada pelo Brasil por meio do Decreto nº 678 de 06 de novembro de 1992; Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura assinada em 09/12/1985 pela Assembleia Geral da Organização dos Estados Americanos e ratificada pelo Brasil por meio do Decreto nº 98.386 de 09 de dezembro de 1989; 14 SILVA JUNIOR, Luiz Antonio da. Universalidade dos Direitos humanos e a tortura. Revista Eletrônica do Ministério Público do Estado de Goiás, n. 1, p. 57-78, out./dez. 2011. Disponível em: <http://www.mp.go.gov.br/revista/pdfs/Universalidade%20dos%20direitos%20humanos%20e%20a%20tortura.p df>. Acessado em: 08 de set. de 2014. 15 SILVA JUNIOR, Luiz Antonio da. Universalidade dos Direitos humanos e a tortura. Revista Eletrônica do Ministério Público do Estado de Goiás, n. 1, p. 57-78, out./dez. 2011. Disponível em: <http://www.mp.go.gov.br/revista/pdfs/Universalidade%20dos%20direitos%20humanos%20e%20a%20tortura.p df>. Acessado em: 08 de set. de 2014. 7 Convenção contra a Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes. Verifica-se que todos esses tratados internacionais fundamentam-se no respeito à dignidade humana e na necessidade de tornar, mais eficaz, a luta contra a tortura no âmbito internacional. Por fim, é importante destacar que a Convenção contra a Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes é considerada uma das principais convenções que visam à proteção dos Direitos Humanos, adotada pela Organização das Nações Unidas em 28 de setembro de 1984 por meio da Resolução nº 39/46 e ratificada pelo Brasil através do Decreto nº 40 de 15/02/1991. Cumpre mencionar que conforme dados disponibilizados pela ONU, até outubro de 2012, 153 dos 193 Estados-membros das Nações Unidas ratificaram ou aderiram à Convenção. De acordo com Flávia Piovesan e Fernando Salla: O elevado número de adesões revela o alcance do consenso internacional sobre o tema, bem como a necessidade de os Estados-membros adotarem medidas capazes de prevenir, punir e erradicar essa prática, que afronta a consciência ética contemporânea.16 A Convenção contra a Tortura e outros Tratamentos ou Penas cruéis, Desumanos ou Degradantes obriga os Estados-membros a tomarem providências efetivas para combater a tortura e, também, cria um Comitê contra a tortura, um organismo formado por dez peritos, conforme dispõe a própria Convenção em seu artigo 17, 1, in verbis: Constituir-se-á um Comitê contra a Tortura (doravante denominado o "Comitê) que desempenhará as funções descritas adiante. O Comitê será composto por dez peritos de elevada reputação moral e reconhecida competência em matéria de direitos humanos, os quais exercerão suas funções a título pessoal. Os peritos serão eleitos pelos Estados Partes, levando em conta uma distribuição geográfica eqüitativa e a utilidade da participação de algumas pessoas com experiência jurídica. Esse Comitê analisa relatórios apresentados pelos Estados-membros em relação à implementação do disposto na Convenção e emite suas conclusões finais, mas se o Comitê concluir pela existência de violação a algum dos direitos consagrados na mencionada Convenção, deverá solicitar ao Estado violador informações a respeito das medidas adotadas para satisfazer o cumprimento das exigências estabelecidas pelo Comitê. 16 PIOVESAN, Flávia; SALLA, Fernando. Tortura no Brasil: pesadelo sem fim? Disponível em: <http://cienciahoje.uol.com.br/revista-ch/revista-ch-2001/176/pdf_aberto>. Acessado em: 08 de set. de 2014. 8 Conforme assevera, Flávia Piovesan, “embora as decisões dos Comitês não sejam legalmente vinculantes e obrigatórias, têm efetivamente auxiliado o exercício dos direitos humanos reconhecidos no plano internacional”17. Assim, pode-se afirmar que o Comitê inibe de certa forma a prática da tortura, uma vez que esse organismo internacional poderá iniciar uma investigação se considerar que existem fortes indícios da prática de tortura em território de algum dos Estados-membros. Diante desse contexto, verifica-se que a tortura não pode ser vista como um crime que atinge as pessoas, de uma maneira individual, porque seus efeitos são devastadores e afetam toda a sociedade. 4- CONSIDERAÇÕES FINAIS Diante do exposto, conclui-se que a gravidade do crime de tortura, vai além da agressão física, pois, também, afeta a integridade psicológica e mental do ser humano refletindo na sua liberdade, bem como no seu convívio social. Verificou-se também que a Declaração Universal dos Direitos Humanos é considerada um dos principais documentos internacionais na repreensão contra o crime de tortura, sendo que a partir desse documento surgiram outros destinados a combater tal prática. Por esses motivos, houve a necessidade da criação de dispositivos legais, tanto nacionais quanto internacionais, para coibir o crime de tortura, visando resguardar os direitos inerentes à pessoa humana. REFERÊNCIAS COIMBRA, Cecília Maria Bouças. Tortura Ontem e Hoje: resgatando uma certa história. Disponível em: ˂http://www.scielo.br/pdf/pe/v6n2/v6n2a03.pdf˃. Acessado em: 06 de set., de 2014. FOLEY, Conor. Protegendo os brasileiros contra a tortura: um manual para juízes, promotores, defensores públicos e advogados. 1 ed. Tradução Tatiana Dicenzo; Rita Lamy Freund – Brasília: International Bar Association’s Human Rights Institute (IBAHRI) / Ministério das Relações Exteriores Britânico e Embaixada Britânica no Brasil, 2011. FRANCO, Alberto Silva; LIRA, Rafael; FELIX, Yuri. Crimes Hediondos. 7. ed., atual. e ampl. - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. 17 PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o Direito Constitucional Internacional. 14. ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2013. p. 286. 9 MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Curso de direito internacional público. 5. ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o Direito Constitucional Internacional. 14. ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2013. PIOVESAN, Flávia; SALLA, Fernando. Tortura no Brasil: pesadelo sem fim? Disponível em: <http://cienciahoje.uol.com.br/revista-ch/revista-ch 2001/176/pdf>. Acessado em: 08 de set. de 2014. NUNES, Adalgisa Maria Oliveira. A prática da tortura na legislação brasileira e os direitos humanos. Revista PIBIC, Osasco, v.3, n. 1, p. 23-28, 2006. SILVA, José Geraldo da; BONINI, Paulo Rogério; LAVORENTINI, Wilson. Leis penais especiais anotadas. 12. ed. - São Paulo: Milennium Editora, 2011. SILVA, Magna Meire de Oliveira. Tortura. Conteúdo Jurídico, Brasília-DF. Disponível em: <http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.36374&seo=1>. Acesso em: 02 de set., 2014. SILVA JUNIOR, Luiz Antonio da. Universalidade dos Direitos humanos e a tortura. Revista Eletrônica do Ministério Público do Estado de Goiás, n. 1, p. 57-78, out./dez. 2011. Disponível em: <http://www.mp.go.gov.br/revista/pdfs/Universalidade%20dos%20direitos%20humanos%20e %20a%20tortura.pdf>. Acessado em: 08 de set. de 2014. VASCONCELLOS, Ricardo Freire. Estudo penal - Crime de Tortura - Lei 9.455/97. Disponível em: ˂http://www.portaleducacao.com.br/direito/artigos/44288/estudo-penalcrime-de-tortura-lei-9455-97˃. Acessado em: 06 de set., de 2014.