Síria: gambito russo coloca “Partido da Guerra” em
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Síria: gambito russo coloca “Partido da Guerra” em
“À guerra, cavaleiros esforçados! Pois os anjos sagrados em socorro estão em terra. À guerra!” (Gil Vicente) 1 a quinzena de setembro de 2013 Vol.XX, nº 7 Síria: gambito russo coloca “Partido da Guerra” em xeque A perspectiva de um ataque militar estadunidense contra a Síria parece estar momentaneamente afastada, enquanto o presidente russo Vladimir Putin, se consolida como o jogador de referência, no explosivo xadrez geopolítico regional. NSA deixa governo brasileiro nu A agressiva espionagem da agência estadunidense exige uma resposta efetiva. PÁG. 8 Jirau paga o preço da sabotagem ambientalistaindigenista A incessante campanha contra a hidrelétrica está cobrando um alto preço e a conta deverá ser paga por todos nós. PÁG. 10 EDITORIAL – PÁGS. 2 E 4 Lorenzo Carrasco denuncia indigenismo na Câmara dos Deputados A despeito das divergências pessoais, os presidentes Barack Obama e Vladimir Putin parecem ter se entendido sobre o conflito sírio, na cúpula do G-20 (foto AP) si_20_07.pmd 1 O presidente do MSIa apresentou seu novo livro sobre o assunto e motivou importantes posicionamentos dos parlamentares. PÁG. 14 17/09/2013, 21:53 2 Solidariedade Ibero-americana EDITORIAL Putin e a negação do “excepcionalismo” Em 11 de setembro, o jornal estadunidense The New York Times publicou um artigo assinado pelo presidente russo Vladimir Putin, instando o governo de Barack Obama a exercer cautela em relação ao conflito interno na Síria. Recebido, previsivelmente, com reações inflamadas, tanto favoráveis como contrárias, a parte mais criticada do texto foi a sua conclusão, que provocou uma verdadeira histeria entre representantes dos setores mais reacionários da sociedade estadunidense, em especial, dos defensores do uso irrestrito da força militar como instrumento de política exterior. O motivo foi a contundente crítica feita por Putin à ideologia do “excepcionalismo” estadunidense, a crença de que os EUA são um país agraciado com a incumbência divina de moldar o mundo à sua imagem de vanguardeiro do processo civilizatório. Disse ele: “É extremamente perigoso incentivar as pessoas a se verem como excepcionais, qualquer que seja a motivação disto. Existem países grandes e pequenos, ricos e pobres, alguns com longas tradições democráticas e outros ainda buscando o seu caminho para a democracia. As suas políticas também diferem entre si. Somos todos diferentes, mas, quando pedimos as bênçãos do Senhor, não devemos esquecer-nos de que Deus nos criou a todos por igual.” A bem da verdade, a crença no “excepcionalismo” não é original dos EUA, sendo uma herança da predestinação calvinista, segundo a qual Deus demonstraria a escolha dos seus “eleitos” pelos sinais visíveis de prosperidade destes, com ênfase nas conquistas materiais. Levado para a América do Norte por importantes grupos dos colo- nizadores pioneiros do subcontinente, o calvinismo encontrou ali um terreno fértil para se metamorfosear em um conjunto de preceitos ideológicos, com ramificações políticas, econômicas e culturais, que tem sido empregado para justificar todas as aventuras expansionistas da oligarquia estadunidense, desde o século XIX, a partir da guerra que roubou ao México quase a metade do seu território. Ao questionar o “excepcionalismo”, Putin também investe – mesmo sem o explicitar – contra o cerne da estrutura de poder hegemônico que o adotou como ideia-força, organizada em torno do domínio das finanças internacionais, a partir da criação do Banco da Inglaterra, no final do século XVII, e cujo ápice atual é o Sistema da Reserva Federal dos EUA, do controle dos fluxos comerciais de alimentos, matériasprimas e recursos energéticos, e do emprego político do vasto “complexo de segurança nacional” estadunidense e seus apêndices da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN). Aparato cujo paroxismo de desmandos e disfuncionalidade mergulhou o mundo na presente crise sistêmica global e cujas tentativas de sobrevivência a todo custo ameaçam provocar um perigoso retrocesso civilizatório. A teimosa crença no “excepcionalismo” é o símbolo da falência desse vasto sistema hegemônico, que, visivelmente, atingiu o limite de suas possibilidades de expansão. E não era sem tempo que fosse denunciado por estadistas do porte de Putin e, à sua maneira, o papa Francisco, que também tem se mostrado incansável na defesa dos princípios superiores da civilização. EDIÇÃO EM PORTUGUÊS Diretora: Silvia Palacios Publicado pelo MSIA – Movimento de Solidariedade Ibero-americana si_20_07.pmd Conselho editorial: Angel Palacios Zea, Geraldo Luís Lino, Lorenzo Carrasco e Marivilia Carrasco Projeto Gráfico: Maurício Santos 2 Rua México, 31 s.202 CEP 20.031-144 Rio de Janeiro-RJ Telefax: + (21) 2532-4086 E-mail: [email protected] Sítio: www.msia.org.br 17/09/2013, 21:53 1 a quinzena de setembro de 2013 3 G-20 pede investimentos de longo prazo em infraestrutura Mario Lettieri e Paolo Raimondi, de Roma Apesar dos ventos de guerra na Síria e suas perigosas consequências geopolíticas e militares, algumas decisões inovadoras e relevantes foram tomadas na cúpula do G-20, em São Petersburgo. De fato, no documento final, pela primeira vez foi colocada a questão do financiamento dos investimentos de longo prazo em infraestrutura e projetos industriais e de pesquisa e desenvolvimento para as pequenas e médias empresas (PMEs). Ademais, destacou-se a necessidade de criação de um clima favorável aos investimentos de longo prazo e, não menos, mobilizar os capitais privados. Para tanto, o comunicado do grupo instou os vários governos a facilitar os investidores institucionais e promover políticas e projetos de investimentos e infraestrutura adequados, consistentes e coerentes. Igualmente, novos instrumentos financeiros nãoespeculativos devem ser identificados para canalizar a poupança privada para os investimentos produtivos e de infraestrutura. Para tal propósito, também se indicam maneiras de criação de parcerias público-privadas (PPPs) e de estabelecimento de fundos de desenvolvimento e investimentos. Aparentemente, há uma determinação para se ir além das habituais boas intenções. De fato, o relançamento dos investimentos de longo prazo se distancia das nefastas políticas financeiras especulativas de curto prazo, que, como se refere o documento, têm “pervertido” os processos econômicos com o seu foco nas finanças convertidas em fim em si próprias e elevadas ao altar do deus dinheiro. Uma novidade significativa foi a referência à necessidade de se reconduzir a poupança e o próprio sistema bancário aos seus papéis indispensáveis de fornecedores de crédito para empresas e investimentos. É preciso destacar a intervenção do grupo BRICS, que colocaram a questão dos empregos e o desemprego dos jovens no centro da declaração final. si_20_07.pmd 3 Em comparação com o passado recente, quando se privilegiavam os parâmetros numéricos do PIB em detrimento dos níveis de emprego, manifesta-se uma inversão de tendência. De resto, seria ilusório pensar numa recuperação econômica com altos níveis de desemprego – visão econômica que remonta ao século XVIII, quando prevalecia a lei da selva, sem qualquer responsabilidade social. Após cinco anos de criação do G-20, os antigos centros de poder econômico e financeiro ocidentais devem tomar nota do crescente papel exercido pelos países do BRICS. Se o mundo inteiro não mergulhou em uma grande depressão econômica, muito disto se deve ao dinamismo e às políticas econômicas dos países emergentes. Da mesma forma, a cúpula teve que reconhecer que a aplicação prolongada de políticas monetárias não convencionais (as injeções de liquidez da Reserva Federal e outros bancos centrais) implica em sérios riscos para o sistema financeiro, devido aos seus efeitos negativos, como a volatilidade dos fluxos de caixa e movimentos perturbadores nas taxas de câmbio, em especial, nas economias emergentes. Em um esforço para reduzir estes riscos, os BRICS criaram um fundo especial de 100 bilhões de dólares para a segurança e proteção de suas moedas e seus mercados. Comparando com as cúpulas anteriores, ficou a impressão de que há uma maior sensibilidade para as questões globais, não apenas as financeiras, mas também as comerciais e os problemas de governança das organizações internacionais, a começar pela distribuição das cotas de controle do Fundo Monetário Internacional (FMI), que deve ser revista no início de 2014. A reorganização do sistema monetário torna-se mais urgente, diante do fato de que mais e mais acordos comerciais entre os países emergentes têm sido fechados em suas moedas nacionais, deixando o dólar de lado. 17/09/2013, 21:53 4 Solidariedade Ibero-americana Síria: gambito russo coloca em xeque agenda do “Partido da Guerra” Lorenzo Carrasco Pelo menos no momento, parece afastada a perspectiva de um ataque militar estadunidense contra a Síria, enquanto, no complexo e explosivo xadrez geopolítico da região, o presidente da Federação Russa, Vladimir Putin, se consolida como o jogador de referência. De fato, diante do jogo pesado dos integrantes do que alguns comentaristas chamam o “Partido da Guerra”, a insidiosa coalizão de interesses que move os governos de Washington e de seus aliados no caminho dos conflitos, Putin usou os seus dotes de enxadrista para neutralizar de imediato uma investida militar que poderia incendiar definitivamente a região e, em um prazo mais longo, promover uma reviravolta estratégica no tabuleiro regional. No horizonte imediato, o líder do Kremlin convenceu o presidente sírio Bashar alAssad a sacrificar um peão importante, colocando o seu arsenal de armas químicas sob supervisão internacional, em troca de ganhos estratégicos maiores, além de assegurar, implicitamente, a responsabilidade pela proteção da Síria contra intervenções militares externas. Ao mesmo tempo, ele deu ao presidente estadunidense Barack Obama um argumento de peso para suspender os planos militares em curso, permitindo-lhe driblar a pressão dos belicistas de plantão em Washington e, não menos, escapar de uma potencialmente desmoralizadora rejeição do seu pedido de autorização para o uso de força militar pelo Congresso, que vinha dando fortes indícios neste sentido. Em um artigo publicado em 11 de setembro, no sítio do jornal The New York si_20_07.pmd 4 Times, Putin advertiu os EUA sobre a limitação das soluções militares, concluindo com um duríssimo ataque à ideologia do “excepcionalismo” estadunidense, que tem sido usado para justificar a crescente militarização da política externa de Washington: “A minha relação de trabalho e pessoal com o presidente Obama é marcada por uma confiança crescente. Eu aprecio isto. Estudei cuidadosamente o seu pronunciamento à nação, na terça-feira. E eu discordaria com uma menção feita por ele sobre o excepcionalismo estadunidense, afirmando que a política dos EUA é “o que torna a América diferente. É o que nos torna excepcionais”. É extremamente perigoso incentivar as pessoas a se verem como excepcionais, qualquer que seja a motivação disto. Existem países grandes e pequenos, ricos e pobres, alguns com longas tradições democráticas e outros ainda buscando o seu caminho para a democracia. As suas políticas também diferem entre si. Somos todos diferentes, mas, quando pedimos as bênçãos do Senhor, não devemos esquecer-nos de que Deus nos criou a todos por igual.” Em particular, ele afirmou que o ataque de 21 de agosto, que motivou o frenesi belicista de Washington, foi uma operação “bandeira falsa” (false flag, no jargão de inteligência) perpetrada pelos rebeldes sírios, para justificar uma intervenção externa. E não menos importante foi o alerta quanto à possibilidade de uma nova operação do gênero, como um eventual ataque químico contra Israel, para sabotar o acordo com o governo sírio. 17/09/2013, 21:53 1 a quinzena de setembro de 2013 Um fator de grande relevância, destacado por várias fontes, é a coordenação entre Putin e o novo governo do Irã, o que coloca este país em uma nova posição no tabuleiro regional e poderá influenciar positivamente o impasse envolvendo as restrições do Ocidente ao programa nuclear iraniano. Segundo o sítio israelense DebkaFile (2/09/2013), considerado um conduto do serviço de inteligência Mossad, a colocação das armas químicas sírias sob supervisão internacional foi discutida entre Putin e o recém-empossado presidente iraniano Hassan Rouhani, como base de uma proposta que seria apresentada a Obama, na cúpula do G-20, em São Petersburgo, como revelou o presidente do Comitê de Relações Exteriores do Parlamento iraniano, deputado Ala-Eddin Borujerdi, em visita a Damasco, no início de setembro. Em seu pronunciamento à nação, na terçafeira 10, o próprio Obama confirmou que o assunto havia sido tratado por ele e Putin, durante a cúpula. E, evidentemente, tais conversas teriam que envolver o próprio Assad. Portanto, a alegada gafe do secretário de Estado John Kerry, apontada como a origem da proposta, pode ter sido uma encenação para facilitar as coisas para o desgastado e pressionado ocupante da Casa Branca. É significativo que Putin e Rouhani tenham se encontrado na cúpula anual da Organização de Xangai para a Cooperação (SCO, em inglês), em Bishkek, Quirguistão, em 13 de setembro, onde também esteve o presidente chinês Xi Jinping. O Irã é membro observador da SCO, mas há indícios de que poderá ser alçado em breve a membro pleno. Até agora, a China vem atuando com um perfil baixo em relação à crise síria, mas a recente decisão de enviar uma flotilha ao Mediterrâneo sugere que Pequim pretende aumentar o peso do apoio político que tem dado à Rússia, nas manobras para bloquear quaisquer decisões do Conselho de Segurança das Nações Unidas para justificar uma intervenção externa contra o regime de Assad. si_20_07.pmd 5 5 Em sua coluna no La Jornada, em 11 de setembro, o bem informado colunista mexicano Alfredo Jalife-Rahme afirmou que a proposta russa teve o decidido apoio do grupo BRICS, em especial da China, e “coloca à mesa do debate integral a desnuclearização de todo o Grande Oriente Médio, sem exceções celestiais, mediante um quid pro quo criativo: destruição, assinatura e ratificação da Convenção de Proibição de Armas Químicas por Bashar [alAssad], que deve ser imitada por Israel, em uníssono com um acordo entre o Irã e o P5+1 [EUA, Rússia, China, França, Reino Unido e Alemanha] sobre o seu contencioso nuclear, que culmine na inspeção e vigilância do reator nuclear de Dimona, concomitante à desnuclearização de Israel. (...)” Jalife pode estar sendo excessivamente otimista em seu cenário, quanto à perspectiva de que Israel aceite abrir mão do seu status de exclusividade nuclear no Oriente Médio, mas, se se configurar o duplo quadro da entrega do arsenal químico de Assad (para o que, certamente, recebeu sólidas garantias de Moscou contra uma eventual repetição do destino de Saddam Hussein e Muamar Kadafi) e de um entendimento sobre o programa nuclear iraniano, Tel Aviv e seus aliados em Washington poderão se ver em uma desconfortável berlinda, que poderá levar Israel, pelo menos, a também ratificar a Convenção de Proibição de Armas Químicas. Por outro lado, ninguém deve iludir-se quanto ao fato de que o “Partido da Guerra” ficará inerte diante de tais desdobramentos. Como observado pelo próprio Putin, ninguém deve se surpreender se alguma operação “bandeira falsa” for desfechada na região, para turvar novamente as águas. Portanto, a partida está longe de um desfecho. Apesar da maestria com que Putin e seus aliados estão jogando, nada impede que, vendo a sua agenda encurralada, os piromaníacos de plantão se disponham não só a virar o tabuleiro, mas também atear-lhe fogo. Por isso, o mundo aguarda em suspenso os próximos lances. 17/09/2013, 21:53 6 Solidariedade Ibero-americana Francisco: “Que acabe o barulho das armas!” Silvia Palacios A frase acima, proferida na homilia da vigília pela paz na Síria, convocada pelo papa Francisco para o sábado 7 de setembro, reflete a intensa atividade diplomática que o Vaticano tem desempenhado para evitar uma intervenção militar na Síria, ameaçada pelo governo de Barack Obama, convertido em preposto dos interesses do poder hegemônico anglo-americano. Na complexidade do cenário internacional, a grei católica e numerosas instituições atenderam à convocação do Pontífice, diante da ameaça de um ataque que poderia colocar o planeta à beira de um conflito de grandes proporções. Na homilia, Francisco uniu as duas necessidades urgentes para a segurança e a paz no mundo: “que acabe o barulho das armas” e a reestruturação do sistema econômico mundial. Na conclusão da jornada, ele aludiu aos fortes interesses políticos que se encontram por trás do que denominou “a devastação da Síria” e de outros conflitos que avassalam o Oriente Médio, além dos meios – com frequência fraudulentos – que os poderes hegemônicos utilizam para justificar a sua belicosidade: Para que serve se fazerem guerras, tantas guerras, se não somos capazes de fazer esta guerra profunda contra o mal? Não serve, não funciona. Isto implica, entre outras coisas, esta guerra contra o mal implica em dizer não ao si_20_07.pmd 6 ódio fratricida e às mentiras das quais ele se serve, à violência em todas as suas formas, dizer não à proliferação das armas e ao seu comércio ilegal. Mas há tantas, mas há tantas... Mas sempre fica a dúvida: esta guerra daqui, dali, há guerras por todos os lados. É realmente uma guerra ou é uma guerra comercial para tomar essas armas do comércio ilegal? Estes são inimigos a serem combatidos, de forma unida e coerente, não seguindo outros interesses que não os da paz e do bem comum. Em paralelo, na carta que enviou ao presidente russo Vladimir Putin, por ocasião da cúpula do G-20 em São Petersburgo, o Pontífice se referiu aos dois temas anteriormente mencionados, complementando: “O contexto atual, altamente interdependente, exige um marco financeiro mundial, com regras próprias, justas e claras, para se chegar a um mundo mais justo, onde se possa Mais de 100 mil pessoas de várias nacionalidades e religiões compareceram à vigília convocada pelo Pontífice, em 7 de setembro (foto AP). 17/09/2013, 21:53 1 a quinzena de setembro de 2013 acabar com a fome e oferecer a todos um trabalho digno, moradia digna e a atenção médica necessária.” O apelo de Francisco para a mobilização antibélica foi secundado não apenas pela hierarquia católica mundial, mas, também, pelos líderes das varias denominações religiosas do Oriente Médio. O patriarca maronita de Beirute, cardeal Bechara Rai, e o patriarca greco-ortodoxo de Antioquia, Youhanna Yazigi, se disseram “profundamente confortados pelo chamado do papa” e confirmaram o compromisso de sensibilizar as suas respectivas comunidades para a oração, pedindo “a todos os países estrangeiros, da região ou mais distantes, lutarem para resolver o conflito por meios políticos, diplomáticos e pacíficos”. O grande mufti da Síria, Ahmad Badreddin Hassou, líder sunita do país, que havia manifestado o desejo de comparecer pessoalmente à vigília, não pode viajar a Roma, mas convocou os muçulmanos sírios, drusos, comunidades tribais e os demais componentes da sociedade síria a se unir à vigília. A unidade de ação produzida pelo clamor do Pontífice deveria servir de lição aos que continuam insistindo em que, para que as iniciativas do papa sejam levadas em conta, é preciso primeiro contabilizar “quantas divisões tem o papa”. Nos momentos de grande tensão mundial e de finais de uma época – como o atual -, as figuras protagonistas da Senhora História são, precisamente, aquelas que têm a estatura moral para interpretar as consciências que clamam por justiça. Na diplomacia do Vaticano, existe uma linha de continuidade frente ao poder do belicismo descontrolado des- si_20_07.pmd 7 7 fechado após a queda do Muro de Berlim, com a Guerra do Golfo de 1991, que até hoje mantém o mundo mergulhado na incerteza e na destruição. Em 1991, o papa João Paulo II qualificou os “ataques cirúrgicos” de George Bush contra a nação iraquiana como “uma grave derrota do direito internacional” e afirmou que a guerra era uma aventura “das quais não há retrocesso”. E antecipou, com presciência: “Tudo se torna mais doloroso pelo fato de que este sombrio panorama, provavelmente, deve estender-se no tempo e no espaço.” Em 2003, João Paulo II voltou a enfrentar um Bush – no caso, o filho –, por conta de uma nova ofensiva contra o Iraque, bradando que “a guerra preventiva é uma guerra de agressão”. Por isso, no mesmo ano, pediu uma nova “ordem ética internacional” e insinuou que a superpotência do momento e seus aliados estavam travando uma guerra pelos recursos naturais do Oriente Médio, pelo que uma nova ordem econômica mundial se fazia urgente: “É impossível ignorar os problemas de caráter econômico. Nesta parte do mundo, existem desigualdades e todos sabemos que, quando a falta de perspectivas para o futuro e a pobreza afetam as pessoas, a paz está em perigo. De fato, a ordem econômica internacional deve tender cada vez mais a compartilhar e a rechaçar o domínio e o desfrute egoísta dos recursos do planeta. Deve-se garantir a remuneração justa das matérias-primas, permitir a todos o acesso aos recursos necessários para viver, garantir o intercâmbio harmonioso das tecnologias e assegurar condições aceitáveis para o pagamento da dívida dos países mais pobres.” Mais atual, impossível. 17/09/2013, 21:53 8 Solidariedade Ibero-americana NSA deixa governo brasileiro nu Geraldo Luís Lino A revelação de que a Agência de Segurança Nacional (NSA) dos EUA estendeu a sua rede de espionagem eletrônica às comunicações da presidente Dilma Rousseff e seus assessores imediatos, apresentada pelo jornalista Glenn Greenwald no Fantástico da Rede Globo de Televisão, em 1º de setembro, provocou uma oportuna indignação. No entanto, se o governo quiser realmente dar uma resposta à altura do desafio da potência hegemônica, será preciso ir além da retórica diplomática e tomar medidas efetivas para impor os interesses nacionais em um cenário global dominado pela agenda geopolítica anglo-americana. Uma opção insuperável para manifestar o descontentamento brasileiro sem uma turbulência maior nas relações com os EUA seria o cancelamento imediato da licitação FX-2 para a compra de caças para a Força Aérea Brasileira (FAB) e, em troca, transferir a encomenda à Federação Russa, que já ofereceu ao Brasil os caças Sukhoi Su-35 com transferência total de tecnologia. Além de serem aeronaves tecnicamente equivalentes aos finalistas da FX-2 – o estadunidense Boeing F/A-18 Hornet, o francês Dassault Rafale e o sueco Saab JAS-39 Gripen – e que poderiam, eventualmente, substituir todos os jatos de combate da FAB (com grandes vantagens logísticas), a opção pelos caças russos elevaria a densidade política da cooperação intra-BRICS a um novo patamar estratégico e, sem dúvida, seria um “recado” inesquecível para Washington. Em particular, o País está pagando o preço de décadas de descaso com as suas Forças Armadas e o sistema de inteligência, em grande medida, por conta de um deslocado sentimento de revanchismo contra o regime militar de 1964-1985, motivado por uma ideologia “antiautoritária” que dificulta si_20_07.pmd 8 a distinção entre uma situação conjuntural e os interesses permanentes de um Estado nacional soberano e suas necessidades de proteção e defesa. Assim, o agressivo desmantelamento do antigo Serviço Nacional de Informações (SNI) por Fernando Collor de Mello e as dificuldades de estruturação da Agência Brasileira de Inteligência (ABIN), ainda não totalmente superadas, deixaram o País quase completamente desprovido de uma capacidade relevante na área e exposto a toda sorte de intromissões externas, além de surpresas desagradáveis nas relações como outros países. A síntese mais sucinta da situação foi feita pelo ex-diplomata Marcos Azambuja, que foi secretário-geral do Itamaraty no governo Collor: “Precisamos ter uma tecnologia de proteção própria. Nossa espionagem é artesanal. Mas, aqui, muita gente associa espionagem à ditadura. Acontece que toda democracia tem que fazer espionagem. Isso não é um atributo do autoritarismo. É algo essencial à defesa (O Globo, 3/09/2013).” No caso de Collor, o ranço antimilitar tinha um caráter mais oportunista do que ideológico, mas este último fator ganhou relevância a partir dos governos de Fernando Henrique Cardoso, exacerbando-se nas presidências petistas, nas quais a presença de um grupo de militantes altamente ideologizados bem situados na estrutura do poder tem assegurado a preservação de certos atavismos, quanto à percepção das necessidades reais da segurança nacional. Entre outros motivos, por conta desta debilidade, potências estrangeiras têm encontrado todas as facilidades para influenciar a formulação de políticas internas, com campanhas disfarçadas de causas bem intencionadas, como a proteção do meio ambiente e da população indígena, com maldis- 17/09/2013, 21:53 1 a quinzena de setembro de 2013 farçados objetivos políticos e econômicos. Por isso, certas ONGs estrangeiras e suas contrapartes “nacionais” têm operado impunemente no País, além de colocar seus representantes na estrutura de governo, influenciando diretamente as políticas de desenvolvimento socioeconômico e fomentando dissensões e conflitos, em um processo que, tecnicamente, pode ser qualificado como uma agenda de guerra irregular (ou “guerra de quarta geração”, como a rotulam alguns estrategistas). Por não dispor de uma maior sofisticação na área, o governo brasileiro se meteu desnecessariamente em imbróglios como a deposição do presidente do Paraguai, Fernando Lugo, enredando-se em situações negativas que poderiam ter sido evitadas por um serviço de inteligência melhor estruturado. Igualmente emblemáticas da ignorância generalizada sobre as atribuições de um serviço de inteligência do Estado são as reações da mídia e de certos setores ideológicos, com frequência beirando a histeria, diante de investigações da ABIN ou de outros órgãos de segurança sobre grupos como o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e outras entidades com uma agenda ideológica e potencial para causar agitações sociais. Uma grande ironia é o fato de que, a despeito da ojeriza desses setores ideológicos pelas atividades de inteligência, uma das entidades que os representam atualmente na estrutura do Estado, a chamada Comissão da Verdade, recebeu documentos oficiais do governo brasileiro da época do regime militar, subtraídos por elementos infiltrados, nas décadas de 1970 e 1980, providos pelo Conselho Mundial de Igrejas (CMI), ONG internacional diretamente vinculada ao aparato de inteligência anglo-americano. Da mesma forma, vale recordar a presteza com que os governos Collor e FHC se empenharam em desmantelar os programas de tecnologia avançada das Forças Armadas, além de enquadrar o País em acordos internacionais de restrição tecnológica, com um entusiasmado apoio da grande imprensa. E não menos emblemático é o fato de que o Ministério da Defesa tem sido sempre um dos primeiros alvos dos recorrentes si_20_07.pmd 9 9 contingenciamentos e cortes orçamentários destinados a assegurar o intocável serviço da dívida pública, que tem sido a prioridade máxima das gestões presidenciais, nas últimas décadas. Outras respostas Prosseguindo no item respostas ao desafio, são bem-vindas as decisões da presidente Dilma Rousseff, de encomendar aos Correios o desenvolvimento de um sistema nacional de e-mail e acelerar o projeto do satélite geoestacionário de comunicações, que estava na gaveta há alguns anos – antes tarde do que nunca. O sistema de e-mail doméstico seria uma alternativa ao Hotmail da Microsoft e ao Gmail da Google, envolvidos no esquema de vigilância da NSA, que tem acordos com as empresas para acessar os seus sistemas. Embora não impossibilite de todo a interceptação das mensagens trocadas pelos usuários, ele dificultaria bastante a bisbilhotice alheia. Outra medida bastante oportuna seria a aceleração da construção da infraestrutura física de comunicações internacionais sob controle nacional, como os cabos submarinos Fortaleza-Caribe-Europa e UruguaiBrasil-África-Europa, a instalação de um Ponto de Troca de Tráfego (PTT) e a integração das redes de fibra ótica sul-americanas. Esta última, já em andamento, necessita de apenas 2 mil quilômetros de linhas adicionais para interconectar as redes já existentes em cada país da região, a um custo da ordem de R$ 100 milhões – absolutamente irrisório diante dos múltiplos benefícios do empreendimento (Resenha Estratégica, 10/07/2013). Igualmente, informou-se que o governo deverá enviar missões à Rússia, China, Alemanha e França, para averiguar como estes países se protegem contra a espionagem eletrônica. Aqui, seria de bom alvitre observar que, nesta área, ninguém compartilha a maioria dos seus segredos e, principalmente, que os serviços de inteligência dos dois últimos países também compartilham informações com a rede anglo-americana de espionagem eletrônica, a despeito dos protestos formais apresentados a Washington, quando tais fatos vieram à tona. 17/09/2013, 21:53 10 Solidariedade Ibero-americana Jirau paga o custo da guerra ambientalista-indigenista Leandro Batista Pereira O consórcio Energia Sustentável do Brasil (ESBR), entidade responsável pela construção e operação da hidrelétrica de Jirau, no rio Madeira (RO), está amargando os enormes prejuízos causados pelo aparato indigenista-ambientalista e por ações de sabotagem contra aquele que é um dos principais projetos de infraestrutura do País. Devido aos atrasos constantes, ocasionados por incêndios criminosos nos canteiros de obras, invasões de indígenas, dentre outras razões, o consórcio está se vendo ameaçado de ter que pagar uma conta extra que pode superar os R$ 400 milhões, por descumprir a entrega do volume de energia prometido a partir deste mês. Na semana passada, a usina recebeu autorização da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) para ligar a sua primeira turbina de 75 megawatts, de um total de 50 unidades geradoras. O problema é que, pelo contrato, a usina deveria estar acionando não apenas uma, mas 16 turbinas este mês, garantindo a oferta de 730 MW médios para setembro. Entretanto, não tendo conseguindo realizar a montagem dos equipamentos como estava previsto, caberá ao consórcio – formado pela francesa GDF Suez (40%), Mitsui (20%), Eletrosul (20%) e Chesf (20%) – comprar a diferença no chamado “mercado livre”, no qual geradoras vendem volumes de energia a preços mais altos do que os do mercado regulado. Segundo o jornal Valor Econômico (9/ 09/2013), somente para cobrir o rombo de geração deste mês, o consórcio teria que desembolsar hoje, com base no preço si_20_07.pmd 10 médio atual no mercado livre, cerca de R$ 130 milhões. Contudo, o problema irá se estender aos meses seguintes, já que o déficit de turbinas geradoras em operação seguirá se traduzindo em uma produção de eletricidade abaixo do estabelecido pelo contrato com o governo federal. De acordo com reportagem, pelo menos até o final do ano, a usina seguirá gerando menos energia que o contratado, com um déficit de 2.774 MW de setembro a dezembro, já descontando a energia que deverá ser produzida pelas dez turbinas que o consórcio pretende acionar ate o final do ano (a previsão original era de 21 unidades). Segundo os valores atuais no mercado livre de energia, este déficit poderá chegar aos R$ 400 milhões acima citados. Um relatório elaborado pelo consórcio ESBR, apresentado à Aneel, ao Ministério de Minas e Energia (MME) e à Empresa de Pesquisa Energética (EPE), tenta convencer o governo de que o déficit não é de sua responsabilidade. No documento, a ESBR alega que tal problema é resultante de uma série de eventos imprevistos, que resultaram no atraso do cronograma. De fato, Jirau é um caso exemplar dos impactos negativos que o aparato indigenista-ambientalista tem causado ao País. Os casos mais graves ocorreram em março de 2011 e em abril de 2012, quando o canteiro de obras da usina foi alvo de dois incêndios criminosos e atos de vandalismo, além de paralisações devido a ações de índios, garimpeiros e ribeirinhos. Visivelmente, trataram-se de ações planejadas e 17/09/2013, 21:53 1 a quinzena de setembro de 2013 executadas em momentos de negociações trabalhistas, por agentes do aparato ambientalista-indigenista, como parte de sua agenda de obstaculização de grandes obras de infraestrutura no País, em especial, na Região Amazônica. Como este Alerta tem reiterado, este aparato é uma peça-chave de uma estratégia de “guerra irregular” contra o desenvolvimento socioeconômico da região, cujo objetivo é consolidá-la como uma autêntica “zona de exclusão ambiental” (Alerta Científico e Ambiental, 24/03/2011 e 31/03/2011). A expectativa do consórcio é que a Aneel perdoe as dívidas resultantes dos atrasos e conceda uma prorrogação de sete meses no cronograma da obra. Segundo os cálculos do consórcio, as greves e os atos de vandalismo ocorridos em 2011 e 2012 resultaram em 25 meses de paralisação total ou parcial das obras da margem direita do empreendimento, além de 18 meses na margem esquerda. O presidente do consórcio ESBR, Victor Paranhos, declarou ao Valor que se Jirau tiver, efetivamente, que comprar 730 MW este mês, sequer encontrará tal volume de energia disponível no mercado, dado o prazo apertado (tal compraria 11 teria de ser efetivada até 7 de outubro). “O paciente está na UTI. Se ninguém fizer nada, ele realmente corre o risco de morrer (...). Quando se leiloou essa usina, ninguém conseguia visualizar o tamanho de seu desafio. Na realidade, o desafio era muito maior do que aquilo que se achava que era”, afirmou. Um fato que beneficia o pleito do consórcio é que o “Linhão do Madeira”, a rede de transmissão que ligará as usinas e Porto Velho a Araraquara (SP), ainda não entrou em operação – a previsão atual e de que isso só ocorra entre o fim de outubro e início de novembro (Alerta Científico e Ambiental, 15/08/2013). “Nós nem teríamos como despachar toda essa energia, por isso, acreditamos numa decisão favorável da Aneel”, esclareceu Paranhos. Quando o “Linhão” estiver operacional, contudo, o problema do déficit de turbinas não estará resolvido, e o consórcio continuará dependendo da decisão final do governo para resolver a questão. “Contamos com o bom senso de todos. A avaliação de responsabilidades é realmente subjetiva, mas não pode ser imputada ao empreendedor uma penalidade que ele não causou”, concluiu o executivo. As depredações dos canteiros de obras de Jirau foram atos deliberados de sabotagem (foto Rondoniagora) si_20_07.pmd 11 17/09/2013, 21:53 12 Solidariedade Ibero-americana Brasil quer construir hidrelétricas com reservatórios nas Guianas A Eletrobrás está estudando a possibilidade de construir usinas hidrelétricas com grandes reservatórios fora do País, como forma de driblar a submissão do governo federal às imposições do aparato ambientalista-indigenista. Segundo uma reportagem do jornal O Globo (7/09/2013), a estatal tem elaborado estudos sobre a construção de três usinas no Suriname e na Guiana, além do estabelecimento de uma linha de transmissão de 1.800 km, interligando os dois países ao sistema elétrico do Amapá e de Roraima e à Guiana Francesa. Batizado como Arco Norte, o projeto conta com o suporte do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e, segundo os primeiros estudos, pode resultar na geração de um total de 5.000 MW – equivalente à potência somada da hidrelétrica de Jirau (RO) e da usina nuclear Angra 2. Outras instituições participantes seriam a estatal francesa EDF, a Agência Francesa de Desenvolvimento (AFD) e outras entidades da Guiana e do Suriname. Ao contrário das hidrelétricas em construção no País, projetadas com reservatórios pequenos e mínima capacidade de armazenamento (chamadas “a fio d’água”), as usinas nos países vizinhos seriam construídas com grandes reservatórios – e este seria a principal razão do interesse da Eletrobrás no projeto. Os seus defensores acreditam que tal iniciativa traria mais segurança para o sistema elétrico brasileiro, ampliando a capacidade de armazenamento para períodos de estiagem, e que o seu sucesso pode ajudar ao retorno da construção de usinas com grandes reservatórios no Brasil. “O Brasil parou de construir usinas com reservatórios, mas elas continuam a serem feitas pelo mundo. As hidrelétricas podem ser importantes para irrigação, controle de enchentes, para transporte, se forem feitas as eclusas. O debate não pode ser apaixonado”, observou Roberto D’Araújo, diretor do Instituto de Desenvolvimento do Setor Energético (Ilumina). si_20_07.pmd 12 O diretor do Comitê Brasileiro de Barragens, Miguel Sória, acrescentou: “Hoje o Brasil depende das usinas termelétricas, que poluem mais, por ter optado pelo fio d’água. O País está desperdiçando potencial.” Segundo a Eletrobrás, ainda não se sabe qual será o teor dos possíveis acordos com os países visados, nem há estimativas dos valores a serem investidos pelo governo brasileiro, mas o projeto só se justifica com o consumo brasileiro de eletricidade: os três países vizinhos, com uma população somada de 1,7 milhões de habitantes, utilizariam apenas um terço da eletricidade gerada pelo Arco Norte. Os maiores ganhos identificados se relacionam à complementaridade dos regimes hidrológicos das Guianas e do Brasil, o que proporcionaria a otimização energética na Amazônia e o aumento da confiabilidade dos sistemas elétricos de todos os países envolvidos. Curiosamente, um inesperado apoio ao projeto veio do coordenador da Estratégia de Infraestrutura da Iniciativa Amazônica do WWF-Brasil, Pedro Bara, apesar de ter feito a ressalva de que as usinas do Suriname e da Guiana não precisariam ter grandes reservatórios para serem interessantes. “Há complementariedade hidrológica ente a Guiana e o Suriname e o Brasil, ou seja, quando é seca em Belo Monte, chove lá. Assim, esse projeto é muito interessante, não apenas pelo seu potencial, mas por serem 5 mil megawatts em plena seca; isso significa desligar termelétricas diretamente.” Bara não explicou como as usinas poderiam gerar os 5 mil megawatts com reservatórios a fio d’água, mas não deixa de ser interessante que até mesmo alguns ambientalistas parecem estar se ressentindo do fato de que as suas campanhas contra as usinas com grandes reservatórios acabaram resultando, ironicamente, no aumento da geração térmica, que provoca impactos ambientais bem maiores. 17/09/2013, 21:53 1 a quinzena de setembro de 2013 13 O esvaziamento tecnológico do Estado brasileiro e suas terríveis consequências Álvaro Rodrigues dos Santos* O longo e radical processo de esvaziamento tecnológico do estado brasileiro vem passando ao largo das atenções da sociedade e, desgraçadamente, de seus representantes nos três grandes poderes da república. Mas, certamente, não suas gravíssimas consequências, ainda que nem sempre percebidas em uma relação direta de causa e efeito. Ao se analisar o processo de esvaziamento tecnológico da administração pública direta e indireta é fundamental considerar o especial e estratégico papel do poder público contratante e fiscalizador, zeloso por princípio da excelência dos resultados esperados de suas contratações, como indutor, por suas exigências, da qualidade das empresas contratadas. Bom lembrar que cabe ao Estado contratante a missão de fixar já nos termos licitatórios as linhas e concepções tecnológicas básicas que mais interessarão ao País no que se refere à qualidade dos objetos contratados, ao aproveitamento máximo de suas vantagens comparativas e de sua estrutura empresarial. Perdese a autonomia dessa decisão quando se perde a competência técnica para defini-la, para bem conduzir a indispensável interlocução tecnológica entre contratante e contratados. Prioridades de investimentos mal definidas, concepções de projeto direcionadas e inadequadas, falhas e acidentes na implantação dos mais variados tipos de empreendimentos, multiplicação exponencial de custos inicialmente estimados, deterioração precoce dos serviços e obras concluídos, sobrecarga nos custos de operação e manutenção, degradação da qualidade dos serviços prestados à sociedade, enorme desperdício de capitais públicos de investimento, abertura de ambiente e amplo espaço propícios à corrupção, são algumas das funestas decorrências da perda de substância tecnológica por parte do estado contratante. Cumpre lembrar que nos órgãos da administração direta o processo de enfraquecimento tecnológico iniciou-se ainda nos anos 50, e de sua decorrência órgãos públicos que no passado constituíram-se em verdadeiras escolas de engenharia hoje não passam de meras * estruturas burocráticas contratantes sem nenhuma consistência técnica ou qualquer vontade estratégica própria. Mais recentemente, agora no âmbito da administração indireta, o processo de privatização de empresas públicas nas áreas de energia, telecomunicações, transportes e infraestrutura em geral implicou na dissolução de equipes técnicas de altíssima capacitação e experiência constituídas ao longo de décadas, assim como em uma temerária fragilização tecnológica de toda uma cadeia empresarial privada mobilizada nas contratações. Essas equipes técnicas, então formadas no âmbito da implantação de empreendimentos da mais alta complexidade tecnológica, e contando com o entusiasmado e estratégico apoio de instituições públicas de pesquisa tecnológica, haviam sido responsáveis pelo desenvolvimento de uma engenharia nacional aplicada às características econômicas, sociais e fisiográficas próprias de nosso país e de suas diferentes regiões, guindando-a, reconhecidamente, ao nível da melhor Engenharia do primeiro mundo. Fato real, os novos e positivos patamares do crescimento nacional encontram hoje o poder público planejador, contratante e fiscalizador totalmente despreparado para o cumprimento desses seus essenciais atributos. Dois outros fatores colaboram ainda para o agravamento desse quadro, o abandono da saudável diretriz que impedia associações de interesse entre a empresa projetista e a empresa executora de um empreendimento licitado e o grande peso com que nossos processos licitatórios continuam a premiar o parâmetro menor preço. Recuperar a substância tecnológica do estado brasileiro não será tarefa fácil ou simples, porém sem sua realização estar-se-á inexoravelmente comprometendo o futuro do país em seu aspecto mais transcendente, a qualidade de vida de sua população. Essa histórica missão será tão menos difícil quanto mais se apóie no que ainda nos resta de reserva tecnológica, as universidades e as instituições públicas de pesquisa. Geólogo, consultor em Geologia de Engenharia e Geotecnia e ex-diretor do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT); [email protected]. si_20_07.pmd 13 17/09/2013, 21:53 14 Solidariedade Ibero-americana Lorenzo Carrasco denuncia aparato indigenista na Câmara dos Deputados O jornalista Lorenzo Carrasco, presidente do Movimento de Solidariedade Ibero-americana (MSIa), participou de uma mesa-redonda na Comissão de Integração Nacional, Desenvolvimento Regional e da Amazônia (CINDRA) da Câmara dos Deputados, em 4 de setembro, na qual sustentou as denúncias sobre a natureza supranacional do aparato indigenista, como apresentado no seu novo livro, Quem manipula os povos indígenas contra o desenvolvimento do Brasil: um olhar nos porões do Conselho Mundial de Igrejas (Capax Dei, 2013). Na oportunidade, Carrasco que semelhante trama tem pelo menos quatro décadas e se baseia em uma rede de inteligência semelhante à revelada pelo ex-analista de inteligência estadunidense Edward Snowden. “Usaram o Conselho Mundial de Igrejas como estrutura de espionagem. Agora que está na moda, o governo brasileiro descobre por acaso que está sendo espionado por agências de inteligência americanas. Quero dizer uma coisa muito simples: o coração do aparato ambiental de Greenpeace, WWF e Instituto Socioambiental são parte de estruturas de inteligências dos governos angloamericanos. E tenho como demonstrar isso, em juízo se necessário”, desafiou. Carrasco disse, ainda, que a infiltração estrangeira busca impedir o desenvolvimento da infraestrutura nacional e encarecer os investimentos, em especial na Região Amazônica, com a criação de “zonas de exclusão econômica” em territórios indígenas. “Isso tudo aparece como uma política progressista, de defender os direitos humanitários de índios, de pobres ou camponeses, mas na verdade esconde interesses de uma estrutura de governo mundial”, alertou. Carrasco argumentou que a estratégia também prevê um trabalho minucioso de manutenção dos povos indígenas num estado de desenvolvimento primitivo: “O homem si_20_07.pmd 14 tem por natureza evoluir, desenvolver. Por que esta questão de manter um povo num estágio neolítico? Isto é desumano, é um crime de lesa-humanidade, manter um ser humano em condições fixas, como se fosse um animal.” Segundo ele, o aparato indigenista-ambientalista está sufocando os produtores brasileiros, em especial as pequenas e médias propriedades. Os maiores beneficiados nesse processo, disse, seriam as grandes corporações do comércio mundial de alimentos: “Estão querendo transformar o Brasil numa grande plantation.” Carrasco esclareceu aos parlamentares que o objetivo do seu livro, escrito em parceria com sua esposa, jornalista Silvia Palacios, não é atacar os povos indígenas, uma vez que eles são vítimas dessa mesma política. A intenção é alertar as autoridades brasileiras para a ameaça da quebra da harmonia racial do país, com a promoção de conflitos étnicos planejados, que oponham índios e não índios. O presidente da CINDRA, deputado Jerônimo Goergen (PP-RS), afirmou que as informações apresentadas por Carrasco precisam chegar aos órgãos nacionais de inteligência. O parlamentar pretende encaminhar um exemplar do livro à CPI da Espionagem, instalada no Senado, na véspera. “O Brasil precisa reagir, sair desse estágio de indiferença com relação aos interesses internacionais. Daqui a pouco perderemos nossa soberania sem ouvir um tiro sequer, por pura ingenuidade das autoridades”, disse ele. A CPI da Espionagem foi criada com base nos documentos vazados pelo ex-agente da NSA, Edward Snowden, que revelam detalhes do monitoramento do governo norte americano sobre o governo e empresas brasileiras. Por sua vez, o deputado Paulo César Quartiero (DEM-RR), recordou a sua luta em Roraima contra o aparato descrito por Carrasco: 17/09/2013, 21:53 1 a quinzena de setembro de 2013 “Gostaria de dizer ao Lorenzo que nós nos conhecemos no começo da década de 1990, em Roraima, e isso que ele está dizendo agora ele já dizia naquela época, e alertava sobre os eventos que iriam se suceder, inspirando a nossa resistência. Nós ficamos desde 1998, em Roraima, resistindo a essa política, até 2009, quando conseguiram implantar a [terra indígena] Raposa Serra do Sol, e retirar os produtores de lá. Foram 11 anos de resistência da população de Roraima contra essa política. Só para relembrar ao nosso presidente [da sessão], a Revolução Farroupilha durou dez anos. E isso foi, nas palavras do próprio ministro Gilberto Carvalho: ‘É claro que foram menos demarcações, porque após a Constituição de 1988 havia muito mais terras para demarcar. Sobrou o mais difícil para nós, como foi a guerra com a Raposa Serra do Sol.’ “Nós demos, em Roraima, uma contribuição para a questão, mostrando a realidade. E lá sim, todo esse aparato esteve presente: a ONU esteve lá, a OEA esteve lá, o CIMI, as ONGs, para pressionar pelas demarcações. O interesse internacional começou a demarcação com a importação do bispo Aldo Mongiano, que promoveu a revolução angolana na África e foi trazido para Roraima para implantar essa política, que começou lá. E nós alertávamos que o destino de Roraima iria nortear o destino do resto do País, e que se nós perdêssemos, como efetivamente aconteceu, o Brasil seria Roraima amanhã.” Principais trechos da exposição de Carrasco “A miscigenação e a integração de povos de diferentes origens, apesar dos problemas sociais, da própria escravidão, etc., torna o país um exemplo para a civilização mundial do que é um modelo de harmonia, de civilização. “Eu me pergunto: como é possível que esse que é um modelo de civilização esteja sendo subvertido? E por quê? E para quê? “Quem são os que estão subvertendo isso, por meio de ONGs, por meio de políticas que vêm sendo implementadas nos úl- si_20_07.pmd 15 15 timos quarenta anos? Tal como mostramos no livro, são os governos da Inglaterra, da Holanda, as casas monárquicas que estão governando a Europa, e estão difundidas por meio de uma série de organizações nãogovernamentais que trazem essa mensagem. “Mas qual é a experiência de civilização que a Inglaterra teve? Qual a experiência de civilização que a Holanda teve? Qual a experiência de colonização que os EUA tiveram? O que fizeram com as populações indígenas? São os mesmos que estão querendo nos dar uma lição, impondo uma política racial absurda ao Brasil. “Nós chegamos a uma organização que foi a origem disso, que se chama Conselho Mundial de Igrejas (CMI). E onde está o CMI? Para se ter uma idéia: apoiou a Comissão Pastoral da Terra, o Movimento dos Atingidos pelas Barragens, apóia todo o movimento criado com o CIMI, que não representa a doutrina e o magistério da Igreja; (...) criaram o Instituto Socioambiental; estiveram por trás do movimento de desarmamento civil. “A origem do Conselho Mundial de Igrejas é o aparato de inteligência angloamericano. O fundador do CMI, que se chamava John Foster Dulles, e que foi o artífice da Guerra Fria, e seu irmão, Allen Dulles, que foi diretor da CIA, usaram a estrutura do Conselho Mundial de Igrejas como estrutura de espionagem. Agora que agora está na moda, o governo brasileiro descobre, por acaso, que está sendo espionado por agências de inteligência americanas. Quero dizer uma coisa muito simples: o coração do aparato ambiental, o Greenpeace, WWF e Instituto Socioambiental, são parte de estruturas de inteligência dos governos anglo-americanos. E tenho como demonstrar isso, em juízo se necessário. “O que está em jogo aqui é que está sendo imposta uma política que aparece como uma política progressista de defender os direitos humanitários de índios, pobres, camponeses sem terras – mas que, em realidade, esconde interesses de uma estrutura de governo mundial. Isso é o que o livro está apresentando.” 17/09/2013, 21:53 16 Solidariedade Ibero-americana CONHEÇA O NOVO LANÇAMENTO DA CAPAX DEI EDITORA Loja virtual: www.capaxdei.com.br | [email protected] F A Ç A O S E U P E D I D O (acrescentar R$ 6,00 para remessa postal) Nome End. Cidade UF Tel.: CEP E-mail exemplar(es) do livro Quem manipula os povos indígenas contra o desenvolvimento do Brasil: um olhar nos porões do Conselho Mundial de Igrejas – R$ 35,00 assinatura anual do jornal Solidariedade Ibero-americana – R$ 135,00 Opção de pagamento: [ ] Cheque nominal à Capax Dei Editora Ltda. no valor de R$ [ ] Depósito bancário no Banco do Brasil, ag. 0392-1, c.c. 20.735-7 em nome da Capax Dei Editora Ltda. no valor de R$ Envie seu pedido e cheque ou comprovante de pagamento à Capax Dei Editora Ltda. R E M E T E N T E | R. México, 31 s. 202 si_20_07.pmd 16 CEP 20031-144 – Rio de Janeiro – RJ telefax +(21) 2510.3656 17/09/2013, 21:53
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