A Responsabilidade do Estado em Decorrência da Morosidade

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A Responsabilidade do Estado em Decorrência da Morosidade
A Responsabilidade do Estado em Decorrência da Morosidade
Judicial e as Possíveis Hipóteses para Solução deste Fato.
A RESPONSABILIDADE DO ESTADO EM DECORRÊNCIA DA
MOROSIDADE JUDICIAL E AS POSSÍVEIS HIPÓTESES PARA
SOLUÇÃO DESTE FATO
Antonio Raimundo Pereira Neto1
Resumo
A lentidão jurisdicional é um fato incorporado à realidade de diversos países da América do Sul, entre
eles o Brasil, mesmo assim o Estado nada faz para combatê-la. Em contraste com esta realidade fática
encontra-se nossa Lex Legum, que enquadra o serviço judiciário na condição de público, afirmando
outrossim que o jurisidicionado possui direito há uma razoável duração do processo judicial. Diante
deste panorâma, a presente pesquisa propõem-se a investigar não só se o Estado deve ser
responsabilizado quando o processo judicial contiver uma morosidade danosa às partes, mas também
em que forma se dará esta responsabilização, caso seja possível, se objetiva ou subjetiva.
Palavras-chave: Responsabilidade objetiva; Estado; Morosidade; Poder Judiciário.
Abstract
The slowness is a jurisdictional fact incorporated into the reality of many South American countries,
including Brazil, yet the state does nothing to combat it. In contrast to this factual reality is our Lex
Legum, which fits the condition of judicial service in public, saying that likewise has jurisidicionado
right there is a reasonable duration of judicial proceedings. Against this backdrop, this research
proposes to investigate not only whether the state should be held accountable when the lawsuit
contains a damaging delays to the parties, but also how to give this responsibility, if possible, whether
objective or subjective
Keywords: Strict liability; State; Delays; Judiciary.
1. Introdução
A atividade ou omissão do Estado, dentro do âmbito contratual ou extracontratual e no
cumprimento de qualquer de suas três funções, seja a executiva, legislativa ou judicial, é
suscetível de causar danos aos particulares que, de acordo com a mais elemental noção de
equidade e justiça, requerem uma reparação pelo seu autor, isto é, pelo Estado.
Esta noção de responsabilização do Estado nos parece uma necessária e inafastável
consequência do Estado de Direito recepcionado pelo clássico modelo de democracia
ocidental. Não podemos deixar de mencionar que o reconhecimento da responsabilidade do
Estado foi produto de uma larga evolução histórica, com marchas e contramarchas, através
1
Professor de Direito do Trabalho e Direito Civil da UNIME, Bahia, Brasil. Pós-graduado em Direito do
Trabalho e Direito Processual do Trabalho. Aluno do curso de Doutorado em Ciências Jurídicas e
Sociais da Universidad del Museo Social Argentino. Membro da Academia de Letras Jurídicas do Sul
da Bahia (ALJUSBA). E-mail: [email protected]
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das quais se foi delineando paulatinamente até adquirir os contornos que hoje a caracterizam.
Isso se deve fundamentalmente ao labor da jurisprudência e dos doutrinadores e,
posteriormente, em alguns casos particulares, ao reconhecimento expresso da legislação2.
Por outro lado, é imprescindível destacar que, em certos âmbitos, esta evolução da
responsabilização do Estado ainda se encontra inacabada, tal como sucede com o
reconhecimento da responsabilidade do Estado em decorrência da Morosidade Judicial, a qual
é uma matéria relativamente nova na sistemática jurídica brasileira.
O surgimento de posicionamentos doutrinários e jurisprudenciais acerca do tema cresceu em
nosso país após a promulgação da Constituição Federal de 1988, que instituiu a
responsabilidade objetiva do Estado nos moldes do seu art. 37, §6°, sendo que após a Emenda
Constitucional nº 45/2004 aumentaram ainda mais as reflexões sobre os limites e
possibilidades de responsabilização do Estado nestes casos.
O direito argentino, por sua vez, no ano de 1984 já chegava ao clímax da onda de
responsabilização objetiva e direta do Estado, sendo que o marco deste posicionamento teve
suporte em um acórdão da Corte Suprema de Justiça da Nação 3 no caso “Vadell Jorge F. vs.
Provincia de Buenos Aires”.4
Calha registrar outrossim que a responsabilidade decorrente da morosidade judicial é
incipiente em nosso ordenamento jurídico, não tendo acompanhado o ritmo de crescimento
das demais modalidades de reparação por ação ou omissão estatal.
Dessa forma, inúmeras ações reparatórias decorrentes da morosidade judicial não têm logrado
êxito, isso por falta de uma cultura jurídica que tenda a responsabilizar o Estado pelo seu mau
funcionamento, funcionamento errado ou ainda pelo não funcionamento a contento da
prestação jurisdicional.
É lamentável que ainda persista em alguns tribunais o entendimento de que o Estado não é
responsável por danos causados a terceiros, quando de uma atividade jurisdicional morosa e
ineficaz.
2
HITTERS, Juan Manuel. Responsabilidad del Estado por error judicial. Buenos Aires: AbeledoPerrot, 1992, t. IV, pp.656.
3
Decisão publicada no seguinte periódico argentino: La Ley, 12-122, com nota do constitucionalista
Spota, Alberto G.
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Nesse diapasão, a motivação da presente pesquisa teve origem na necessidade de trazer à baila
aspectos fundamentais de uma matéria em ascensão no direito brasileiro e no direito
alienígena.
Pretendemos endossar uma contracultulra, aquela que defende que o Estado é responsável
pela prestação jurisdicional praticada a destempo, tendo que ser responsabilizado
objetivamente por ela.
Acreditamos ainda que responsabilizar o Estado pelo funcionamento caótico do Poder
Judiciário contribuirá para que se opere uma reestruturação pessoal e tecnológica do mesmo,
diminuindo consequentemente a morosidade e ineficácia do Poder Judiciário, o que desaguará
numa maior legitimidade das tentativas de justiça, gerando uma maior credibilidade desta
instituição perante a sociedade.
Em remate, buscaremos amparo histórico na presente pesquisa, tendo em vista que
acreditamos ser essencial um estudo do processo de evolução histórica da responsabilidade do
Estado.
2. Evolução teorética sobre a responsabilidade do Estado
Prevaleceu na época dos Estados Absolutos a teoria de que o Estado não tinha qualquer
responsabilidade pelos atos praticados por quaisquer dos seus agentes.
Neste período, primeira metade do século XIX, qualquer responsabilidade atribuída ao Estado
significaria nivelá-lo juntamente com o súdito, ato que significaria desprezo para com a
soberania daquele5.
Esta teorização não vigorou por muito tempo, pois esta noção de que o Estado é um ente
onipotente e inerrante dava ensejo a diversas situações de injustiça pela não responsabilização
por atos de seus agentes. Tem origem nesse período histórico, por exemplo, a máxima de que
o “rei não pode errar”.
Nos dias atuais, o direito positivo das nações civilizadas admite a responsabilidade do Estado
pelos danos que seus agentes causem a terceiros, até porque, sendo o Estado uma pessoa
jurídica é titular de direito e obrigações.6
5
Neste sentido: DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 23ª ed. São Paulo: Atlas,
2010, pp. 644.
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Com a superação da teoria da irresponsabilidade do Estado surgia concomitantemente a
doutrina que apregoava a responsabilidade estatal desde que houvesse ação culposa de seu
agente. Esse pensamento foi rotulado de Teoria Civil da Responsabilidade com Culpa ou da
Responsabilidade Subjetiva.
Essa teoria distinguia, de forma não muito clara, dois tipos de atos estatais: os atos de império
e os atos de gestão. Estes eram praticados pela Administração com a semelhança de atos de
direito privado, em situação de paridade com os particulares. Aqueles (ius imperii)
decorreriam do poder soberano do Estado, pois eram dotados de coercibilidade.
A partir desta distinção passou-se a admitir a responsabilidade do Estado nas hipóteses de
prática de atos de gestão e a excluí-la nas hipóteses de atos de império. O grande problema
desta teoria sempre foi diferenciar na prática o que vem a ser ato de gestão e o que vem ser
ato de império.7
O próximo degrau evolutivo na forma de enquadramento da responsabilidade do Estado
reside na chamada Teoria da Culpa Administrativa ou da Culpa do Serviço.
Para essa vertente não se fazia necessário identificar o agente estatal causador do dano e
muito menos se o ato praticado era de gestão ou de império, visto que cabia à vítima
comprovar apenas que o fato danoso teve origem no mau funcionamento do serviço público e
que, portanto, o Estado teria atuado culposamente.
O próximo passo foi a criação da Teoria do Risco, que dispensa a verificação do fator culpa
em relação ao fato danoso praticado pelo Estado, bastando que a vítima comprove a relação
causal entre o fato e o dano. Tal teoria serviu de fundamento para a responsabilização objetiva
do Estado.
Este novo pensamento leva em consideração que o Estado tem mais poder e prerrogativas do
que o administrado, que é hipossuficiente e encontra-se em posição de subordinação. Por tal
razão, não seria razoável exigir que este, diante de prejuízos originados da conduta estatal,
devesse se empenhar desmedidamente para lograr êxito em uma ação indenizatória.
6
Alguns países como Estados Unidos e Inglaterra deixaram a teoria da irresponsabilidade do Estado,
respectivamente, em 1946 (por meio do Federal Tort Claim) e 1947 (por meio do Crown Proceeding
Act).
7
Com o mesmo pensamento: CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo.
24ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, pp. 503.
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Para Hely Lopes Meireles8, a teoria do risco se subdivide em outras duas, a do risco
administrativo e a do risco integral. Esta inadmite causas excludentes da responsabilidade do
Estado, ao passo que a primeira admite hipóteses excludentes, tais como a de culpa da vítima,
culpa de terceiros ou força maior.
Atualmente, na maioria dos casos, tem predominado a teria do risco administrativo9, mas
existe uma tendência de crescimento da teoria do risco integral10, que possui aplicação, por
exemplo, nos casos de danos ambientais.
3. Responsabilidade decorrente da morosidade na prestação da jurisdição
3.1 A atividade judiciária como serviço público
Nos tempos de antanho, os conflitos entre os homens eram dirimidos por meio da vindita
privada, espécie de autotutela. Posteriormente, os seres humanos cederam uma parcela de sua
liberdade com o fito de originar o Leviatã, ficando a cargo deste prover as necessidades
coletivas da sociedade.
Assim, a tutela jurisdicional passou a fazer parte da seara dos serviços públicos, apresentandose o Estado como titular exclusivo da atividade jurisdicional, em típico monopólio.
Neste ponto, faz-se oportuno relembrarmos o conceito de serviço público, do qual é espécie a
atividade judiciária.
Classicamente, os administrativistas adotam três critérios para definir o conceito de serviço
público, a saber, o critério subjetivo, o objetivo ou material e o formal.
O critério subjetivo ou orgânico leva em consideração o órgão ou entidade provedores da
utilidade, logo serviço público seria aquele prestado por aqueles entes estatais.
O objetivo ou material é o que se baseia no objeto da atividade exercida, constituindo-se
serviço público aquele que atende as necessidades coletivas.
8
MEIRELES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2003, pp.623.
CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 5ª ed. São Paulo: Malheiros, 2004,
pp. 150/152.
10
Neste sentido: MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 17ª ed. São
Paulo: Malheiros, 2008, pp. 982.
9
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O formal, por último, que considera o regime jurídico, ou seja, o serviço público seria aquele
regido pelas normas de direito público.
Com espeque nestas construções teóricas, inúmeras definições foram elaboradas, restando a
nós enumerarmos as principais e mais importantes.
Para o saudoso professor Hely Lopez Meirelles11:
serviço público é toda aquele prestado pela administração ou por seus delegados,
sob normas e controles estatais, para satisfazer necessidades essenciais ou
secundárias da coletividade ou simples conveniências do Estado.
Já no entender do pensador Celso Antônio Bandeira de Mello12:
Serviço público é toda a atividade de oferecimento de utilidade ou comodidade
material destinada à satisfação da coletividade em geral, mas fruível singularmente
pelos administrados, que o Estado assume como pertinente a seus deveres e presta
por si mesmo ou por quem lhe faça as vezes, sob o regime de direito público portanto, consagrador de prerrogativas de supremacia e de restrições especiais -,
instituído em favor dos interesses definidos como públicos no sistema normativo.
Um simples deitar de olhos sobre tais conceitualizações nos basta para deixar evidente que a
acepção de serviço público não se cinge à atividade administrativa do Estado, abrangendo
também o serviço judiciário que, em verdade, é uma espécie do gênero serviço público.
Nesse contexto mostra-se perfeitamente adequado o pensamento de José Cretella Júnior13,
para quem "O serviço público deve funcionar; deve funcionar bem; deve funcionar no
momento exato. Não-funcionamento; mau funcionamento ou funcionamento atrasado podem
ser fatos geradores de dano e, pois, de responsabilidade".
Portanto, o mau funcionamento do serviço judiciário, como serviço público que é, deve
ensejar sempre a responsabilidade do Estado, consoante demonstra a seguinte decisão extraída
do Poder Judiciário Argentino14:
11
MEIRELES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2003, pp.621.
MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 17ª ed. São Paulo: Malheiros,
2008, pp. 99.
13
CRETELLA JÚNIOR, José. O Estado e a obrigação de indenizar. Rio de Janeiro: Forense, 1998,
pp. 195.
14
Decisão disponível em: <http://jurisprudencia.pjn.gov.ar/jurisp/principal.htm>. Acesso em 01 Jul.
2011.
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RESPONSABILIDAD DEL ESTADO. Acto judicial. Acto realizado por
funcionario o agente auxiliar del Poder Judicial. Procedencia. Podrá discutirse en
doctrina -según se adopte un criterio estrictamente orgánico o material - si tales
actos son judiciales o administrativos, mas lo relevante es que los actos del
proceso en que se actúa la función judicial son siempre actos propios del Poder
Judicial, y aún cuando su realización no esté a cargo de magistrados, sino de
funcionarios o agentes auxiliares de la justicia, no existe mérito para que el Estado
deje de responder por los daños que con ellos se cause, ya que no difieren los
principios fundantes de la responsabilidad (ver Reiriz, "Responsabilidad del
Estado", págs. 78 y ss). (Grifo nosso).
3.2 O direito à jurisdição
A jurisdição é um poder-dever do Estado de prestar a tutela jurisdicional a todo aquele que
tenha uma pretensão resistida por outrem, aplicando a regra jurídica à celeuma.
Ao mesmo tempo podemos afirmar que a jurisdição é o direito público e subjetivo,
assegurado ao cidadão, de exigir do Estado a prestação da atividade jurisdicional, conforme
dispõe no art. 5º inciso XXXIV alínea “b” e XXXV da Constituição Federal brasileira.
Segundo Humberto Theodoro Jr.15:
estabeleceu-se a jurisdição, como o poder que toca ao Estado, entre as atividades
soberanas, de formular e fazer atuar praticamente a regra jurídica concreta que, por
força do direito vigente, disciplina determinada situação jurídica.
No entanto, não basta que se assegure o acesso aos órgãos provedores da jurisdição. É
necessário que ela seja prestada, como nos demais serviços públicos, com eficiência e
presteza, tentando atender de forma ágil e eficaz às pretensões dos litigantes.
Por ululante, a prestação jurisdicional não se dá, tão somente, com a prolação da sentença,
mas também, nos provimentos cautelares e antecipatórios denominados de tutelas de urgência
e, principalmente, pela maior participação do magistrado na condução satisfatória do
processo.
Na mesma vereda do nosso pensamento é aquele externado por Carmen Lúcia Antunes
Rocha16:
15
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. 20ª ed. Rio de Janeiro: Forense,
2011, pp.30.
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A liberdade não pode esperar, porque, enquanto a jurisdição não é prestada,
ela pode estar sendo afrontada de maneira irreversível; a vida não pode
esperar, porque a agressão ao direito à vida pode fazê-la perder-se; a igualdade
não pode aguardar, porque a ofensa a este princípio pode garantir a
discriminação e o preconceito; a segurança não espera, pois a tardia garantia
que lhe seja prestada pelo Estado terá concretizado o risco por vezes, com a só
ameaça que torna incertos todos os direitos. (Grifo nosso).
Diante disso, é clara a idéia de que a jurisdição, do mesmo modo que os demais serviços
públicos, constitui um direito básico e subjetivo do cidadão e, como tal, dá ensejo a todas as
conseqüências e responsabilidades do servidor e do Estado.
3.3 Abrindo caminhos entre a doutrina e a jurisprudência relativas ao tema, inclusive
direito comparado
O Judiciário brasileiro vem sofrendo, ao longo dos anos, severas críticas sobre a sua efetiva
operacionalidade, sendo a morosidade o ponto mais combatido e repudiado.
É anseio de toda a sociedade que o Poder Judiciário solucione as lides que lhe são levadas de
maneira ágil, eficaz e segura, sendo passível de críticas e reprovação a demora da efetiva
prestação jurisdicional.
Não há dúvidas de que os juízes e os servidores agem em nome do Poder Judiciário, assim
como é inquestionável que este age em nome do Estado. E nossa Carta Magna, ao tratar da
responsabilidade do Estado, só permite a indagação sobre a relação de causalidade entre o
dano e o serviço público, não criando nenhum tipo de privilégio para levar à impunidade dos
danos causados pelo péssimo funcionamento do Judiciário.
Embora nos pareça claro que o Estado deve responder objetivamente pela morosidade do
Poder Judiciário, por apego à verdade, devemos deixar claro que nosso posicionamento é
minoritário, até porque o próprio Supremo Tribunal Federal17, em acórdãos não unânimes,
tem exigido que o jurisdicionado comprove a culpa da morosidade do processo judicial para
que seja cabível a reparação.
16
Este pensamento foi encontrado na seguinte obra: THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de
direito processual civil. 20ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011, pp.32.
17
DIAS, José Aguiar. Da responsabilidade Civil. 11ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, pp. 863.
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Não nos parece razoável exigir que o jurisdicionado comprove a culpa do Poder Judiciário
pela morosidade do processo judicial, vez que as circunstâncias que corroboram para a
lentidão da ação judicial são estruturais, típica situação interna corporis, o que dificulta sua
comprovação.
Neste passo, deve ser ônus do Estado provar uma das causas excludentes de responsabilidade,
tais como a culpa exclusiva do jurisdicionado, caso fortuito ou força maior, ou a culpa de
terceiro. Não se desincumbindo da prova de uma destas excludentes, impõe-se sua
condenação quando houver excessiva demora no processo judicial.
Ora, como não responder o Estado, por exemplo, no caso daquelas comarcas desprovidas de
juízes ou de serventuários, em face da falta de providências para o preenchimento desta
vagas? Ou então nas freqüentes situações de excesso de trabalho por parte dos Magistrados?
Os fatos deixam aflorar que não é mais possível suportar a lentidão da justiça, que padece por
causa de sua ineficácia estrutural. O Estado deve tomar medidas no afã de por um fim à
negação da justiça pela via do retardamento na entrega da prestação jurisdicional.18
Resta ao jurisdicionado, destarte, o caminho de rebelar-se judicialmente contra o próprio
Estado, que lhe ofereceu justiça a destempo, e exigir-lhe reparação civil pelo dano, ainda que
esta via enfrente o mesmo empecilho. O simples fato de acionar o Estado é por si só uma
maneira legítima de pressionar este, ao mesmo tempo em que se publiciza o inconformismo
com as circunstâncias em que se encontra imersa a justiça.19
Endossamos integralmente a posição do Ex-Ministro do Supremo Tribunal Federal, Aliomar
Balleiro20, o qual no Recurso Extraordinário n° 32.518, datado de 21.01.1966, defendeu, em
posição minoritária, a responsabilidade objetiva do Estado também nas hipóteses de
morosidade do aparelho judicial:
Considero o Judiciário como serviço de vacinação, ou o serviço público de guarda
noturna. O cidadão paga (para) tê-lo. Quem vem à porta do Supremo Tribunal
Federal paga, embora seja um sumaríssimo preparo, que não cobre nem as
despesas com a folha de papel gastas pelo juiz; apesar disso, paga. Está nas
mãos do Estado cobrar mais taxas, mais impostos, porém, faça funcionar a
Justiça. O que não posso admitir é que numa comarca haja situação realmente
18
Com este pensamento: DELGADO, José Augusto. Apud STOCO, Rui. Tratado de
Responsabilidade Civil. 6ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, pp. 1022.
19
Idem. Ibidem. pp.1022.
20
Informação retirada de: DIAS, José Aguiar. Da responsabilidade Civil. 11ª ed. Rio de Janeiro:
Renovar, 2006, pp. 863.
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anárquica, com o juízo acéfalo, sem juiz, e, em outra, o juiz esteja assoberbado,
como trabalho de duas comarcas. (Grifo nosso).
Sobre o tema em estudo, posicionou-se da forma por nós defendida a Desembargadora do
Tribunal Regional Federal da 3ª Região, Marisa Ferreira dos Santos21:
A morosidade da Justiça é a causa maior de seu descrédito pelo jurisdicionado:
causa angústia, insatisfação. O poder Judiciário, constitucionalmente investido
na função da composição de conflitos, ao demorar para dar seu veredicto,
acaba, ele mesmo, por ser causa de mais insatisfação e, conseqüentemente, de
mais conflito. A Constituição Federal de 88 assegura o acesso à Justiça. Ao lado da
garantia constitucional do direito de ação está a triste realidade da tramitação morosa
dos processos, que fulmina os direitos fundamentais do cidadão, acaba com as
esperanças do jurisdicionado e aumenta o descrédito na Justiça. A justiça brasileira
está congestionada. Por quê? Porque lhe falta infra-estrutura mínima para funcionar
e ser eficiente: instalações adequadas, funcionários qualificados, juízes em número
suficiente e leis processuais menos burocráticas. Mas, acima de tudo, é necessário
que o próprio Estado seja o primeiro a cumprir a Lei, e não o maior causador de seu
descumprimento. O jurisdicionado não pode pagar por essa situação lamentável
em que nos encontramos. Cabe à União velar e zelar para que os serviços
públicos, inclusive o serviço judiciário sejam eficientes; cabe a esse ente político
a criação de condições para que esse serviço seja bem prestado. De nada adianta
o trabalho insano de juízes e funcionários se a estrutura em que se assentam não é
adequada ao serviço que devem prestar. Mas, repito, o jurisdicionado não deve
pagar por isso. Continua ele a ter direito à prestação jurisdicional eficaz, ou seja,
apta à solução dos conflitos. Se a União, ente político incumbido da prestação do
serviço, não o põe à disposição do jurisdicionado de modo eficiente, e se dessa
deficiente atuação sobrevém dano, incumbe-lhe indenizar. (Grifo nosso).
Alguns autores parecem confundir a responsabilidade do Estado por erro judiciário, com a sua
responsabilidade pelo defeituoso funcionamento da administração da justiça.
É importante, ainda que perfunctoriamente traçar esta distinção, até porque a maior parte da
doutrina administrativista tem concordado de forma quase uníssona na responsabilização do
Estado em face do erro judiciário, ao passo que tem se verificado justamente o oposto quando
se trata da hipótese de excessiva morosidade do aparato judicial.
A doutrina espanhola, em notável avanço, apregoa a responsabilização do Estado quer nos
casos de erro judicial, quer nas hipóteses de lentidão da prestação jurisdicional, é o que se
infere das palavras de Eduardo Cobreros Mendazona22:
21
Informação disponível em: <http://www.jusnavigandi.com.br>. Acesso em 14 Jun. 2011.
MENDAZONA, Eduardo Cobreros. La responsabilidad del Estado derivada del funcionamiento
anormal de la Administración de Justicia. Madrid: Cuadernos Civitas, 1998, pp. 25.
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[…] nos encontramos en el dominio de la responsabilidad por funcionamiento
anormal de la Administración de Justicia, siempre y cuando la lesión se haya
producido en el ‘giro o tráfico jurisdiccional’, entendido éste como el conjunto de
las actuaciones propias de lo que es la función de juzgar y hacer ejecutar lo juzgado
(excluidas las actuaciones de interpretar y aplicar el Derecho plasmadas en una
resolución judicial que, como se acaba de indicar, caerán en el ámbito del error
judicial); a sensu contrario, no entrarían en este concepto aquéllas actividades que
produjesen un daño -incluso si éste fuese identificado plenamente como achacable a
la actuación de un Juez o Magistrado -si su actuación no se hubiese realizado en el
mencionado ‘giro o tráfico jurisdiccional’, sino en otro tipo de actuaciones distintas.
En definitiva, en el régimen establecido para la responsabilidad por el
funcionamiento anormal de la Administración de Justicia habrán de incluirse las
actuaciones que, no consistiendo en resoluciones judiciales erróneas, se efectúen en
el ámbito propio de la actividad necesaria para juzgar y hacer ejecutar lo juzgado o
para garantizar jurisdiccionalmente algún derecho.
A legislação colombiana, em igual sentido, prevê, desde 1996, que o Estado responderá
perante o jurisdicionado nos casos onde exista um anormal funcionamento do aparelho
judiciário, consoante se depreende da leitura do artigo 69 da Lei nº 279/199623: “quien haya
sufrido un daño antijurídico, a consecuencia de la función jurisdiccional tendrá derecho a
obtener la consiguiente reparación.”
Em coerência com a legislação supra citada, o Tribunal Colombiano de Cundinamarca24, vem
condenado o Estado a indenizar o jurisdicionado quando a falta de celeridade processual torna
este excessivamente moroso, haja vista que em um Estado Social de direito exige-se não só
um simples acesso à justiça, mas principalmente a celeridade nas decisões da mesma. Vale
conferir este julgado:
PROVIDENCIA Nº. 37
DEFECTUOSO FUNCIONAMIENTO DE LA
ADMINISTRACION DE JUSTICIA – Incautación y deterioro de aeronave en
investigación penal – El trámite judicial se adelantó con sujeción a la ley En
materia de defectuoso funcionamiento en la prestación de un servicio, en este caso
de naturaleza administrativa, es importante recordar los siguientes aspectos de orden
general que si bien se refieren a la administración de justicia son de recibo dada la
naturaleza de la falla del servicio que se imputa. Las dilaciones constituyen el
supuesto más extremo de retraso en el funcionamiento de la administración de
justicia; es claro que un Estado social de derecho exige además del acceso a la
administración de justicia, la celeridad en las decisiones de la misma. (Grifo
nosso).
23
Informação disponível em: <http://www.colectivodeabogados.org/Defectuoso-funcionamiento-dela>. Acesso em 18 Jun. 2011.
24
Acórdão disponível em: <http://www.juriversia.com/Colombia>. Acesso em 18 Jun. 2011.
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É certo que se o Estado contraiu a obrigação de prestar o serviço público judiciário, o deve
realizar em condições adequadas para chegar ao fim que foi estabelecido, sendo responsável
pelos prejuízos que causar o seu não cumprimento ou sua irregular execução.
Ante a imperfeição do sistema judicial resultaria antijurídico que a comunidade não fosse
reparada dos danos excessivos, é dizer, aqueles que ultrapassam o limite do razoável ou
tolerável. Cabe à prudente apreciação judicial, analisar caso a caso, onde foram excedidos tais
limites, a fim de que se imponha a responsabilidade estatal para minorar o sacrifício temporal
suportado pelo particular.
O Estado faz-se responsável principal e direto das conseqüências danosas acarretadas pelas
atividades dos seus órgãos ou funcionários, quer judiciais, quer não, vez que o poder público
depende destes para fazer cumprir as finalidades das entidades que criou.
Após a realização de pesquisa no site do Poder Judiciário Argentino, mais especificamente na
Câmara Nacional de Apelações do Contencioso Administrativo Federal, verificamos a
existência de decisões judiciais que responsabilizam o Estado objetivamente pela demora da
tramitação processual, ex vi25:
RESPONSABILIDAD DEL ESTADO. ACTO JUDICIAL. El anormal
funcionamiento de la administración de justicia y los perjuicios producidos por él
pueden resultar consecuencia de numerosas y variadas causas. Una de las más
graves resulta, sin duda, aquélla que reconoce como origen la demora en
la tramitación o resolución de las actuaciones judiciales, así como en la
ejecución de las decisiones de éstas recaídas. Tal responsabilidad resultará,
independiente de la existencia o no de dolo, culpa o negligencia de los
magistrados o funcionarios judiciales responsables de la tramitación. (Grifo
nosso).
De saída, vale deixar claro que não estamos afirmando que todo e qualquer processo judicial
que se arraste por longos anos ensejará a responsabilidade do Estado, até porque podem surgir
circunstâncias que excluam a responsabilidade do mesmo, por exemplo, a queda de um raio
no fórum que leva ao incêndio de diversos processos judiciais, típico caso fortuito, que exclui
a responsabilidade do leviatã.
Repetimos mais uma vez, que, a nosso ver, é ônus do Estado provar uma das causas
excludente de responsabilidade, não se desincumbindo deste ônus, impõem-se sua
responsabilização.
25
Decisão disponível em: <http://jurisprudencia.pjn.gov.ar/jurisp/principal.htm>. Acesso em 01 Jul.
2011.
Antonio Raimundo Pereira Neto – Revista Diálogos Sócio-Jurídicos – Volume 1, 2012.
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Judicial e as Possíveis Hipóteses para Solução deste Fato.
4. Suscitando hipóteses para tentar resolver a demora do processo judicial
Vimos a não mais poder que a morosidade do processo judicial brasileiro é uma realidade,
assim como que o Estado deve responder por este fato. Em continuidade à pesquisa, resta-nos,
neste momento, tentar contribuir de alguma forma para a decapitação deste problema, o que
faremos nas linhas seguintes.
4.1 Incentivos à busca da Justiça Arbitral
A aplicação da Lei de Arbitragem nº 9.307/96 é um instrumento bastante útil na solução de
litígios de bens disponíveis, já que não existe a possibilidade de recursos, sendo a decisão do
árbitro, em regra, irrevogável.
Diversos Estados brasileiros já estão praticando e incentivando a busca da população pela
Justiça Arbitral, isso através das Câmaras de Arbitragem. É o que ocorre, por exemplo, em
Salvador, capital do Estado da Bahia.
Em outubro de 1994 a Associação Comercial da Bahia criou a Câmara de Mediação e
Arbitragem, como ferramenta para a administração e extinção de litígios, buscando
proporcionar às partes caminhos seguros, pela via extrajudicial, oferecendo ainda uma solução
célere, qualificada, eficiente, econômica e confidencial das lides.
Os litigantes, que optam pela arbitragem, escolhem o local e o idioma em que vai ser
processada e quantos árbitros irão atuar, sempre em número ímpar.
O árbitro não precisa ser advogado, nem juiz, mas apenas um profissional especializado na
área do litígio e, por definição legal, conforme artigo 18 da Lei nº 9.307/96, “é juiz de fato e
de direito, e a sentença que proferir não fica sujeita a recurso ou homologação pelo Poder
Judiciário.”
O processo previsto na Lei de Arbitragem brasileira leva, em média, apenas seis meses para
ser concluído, sem falar que as custas do processo arbitral26 são diminutas quando
26
Existem apenas duas custas: a de administração de procedimentos e a de honorários dos árbitros.
Antonio Raimundo Pereira Neto – Revista Diálogos Sócio-Jurídicos – Volume 1, 2012.
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A Responsabilidade do Estado em Decorrência da Morosidade
Judicial e as Possíveis Hipóteses para Solução deste Fato.
comparadas com as custas judiciais, até porque o Poder Judiciário, pela multiplicidade de
recursos que comporta, traz consigo uma considerável onerosidade.
Cabe aos Estados brasileiros promoverem a interiorização e consequente proliferação das
Câmaras Arbitrais, afinal esta solução, quase sempre, aflora somente nas capitais.
O direito comparado latino-americano tem evoluído no mesmo sentido, tanto que a
Venezuela, por meio da Lei de Arbitragem Comercial, em seus artigos 5 e 6, tem buscado
estimular na população venezuelana a cultura de adoção de cláusulas compromissórias em
suas contratações27:
Artículo 5 - El "acuerdo de arbitraje" es el acuerdo por el cual las partes deciden
someter a arbitraje todas o algunas controversias que hayan surgido o puedan surgir
entre ellas respecto de una relación jurídica contractual o no contractual. El acuerdo
de arbitraje puede consistir en una cláusula incluida en un contrato o en un acuerdo
independiente. En virtud del acuerdo de arbitraje las partes se obligan a someter sus
controversias a la decisión de árbitros y renuncian a hacer valer sus pretensiones
ante los jueces. El acuerdo de arbitraje es exclusivo y excluyente de la jurisdicción
ordinaria.
Artículo 6 - El acuerdo de arbitraje deberá constar por escrito en cualquier
documento o conjunto de documentos que dejen constancia de la voluntad de las
partes de someterse a arbitraje. La referencia hecha en un contrato a un documento
que contenga la cláusula arbitral, constituirá un acuerdo de arbitraje siempre que
dicho contrato conste por escrito y la referencia implique que esa cláusula forma
parte del contrato. En los contratos de adhesión y en los contratos normalizados, la
manifestación de voluntad de someter el contrato a arbitraje deberá hacerse en forma
expresa e independiente.
A Câmara Comercial de Caracas, no afã de estimular a utilização desta forma de composição
de conflitos, chegou a disponibilizar uma cláusula modelo a ser inserida nos contratos onde as
partes desejem utilizar a via arbitral, vejamos28:
CLÁUSULA MODELO
El Centro de Arbitraje de la Cámara de Caracas recomienda la siguiente cláusula
arbitral:
Toda controversia o diferencia (susceptible de transacción por las partes, no excluida
por la Ley para ser resuelta mediante arbitraje), que verse sobre la existencia,
extensión, interpretación y cumplimiento de este contrato, será resuelta
definitivamente mediante arbitraje en la Ciudad de Caracas,Venezuela, de acuerdo
con las disposiciones del Reglamento General del Centro de Arbitraje de la Cámara
de Caracas.
27
Informação disponível em: <http://www.arbitrajeccc.org/index.asp?spg_id=22>. Acesso em 20 Jun.
2011.
28
Informação disponível em: <http://www.arbitrajeccc.org/index.asp?spg_id=21>. Acesso em 20 Jun.
2011.
Antonio Raimundo Pereira Neto – Revista Diálogos Sócio-Jurídicos – Volume 1, 2012.
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A Responsabilidade do Estado em Decorrência da Morosidade
Judicial e as Possíveis Hipóteses para Solução deste Fato.
El Tribunal Arbitral estará compuesto por ___ (_) árbitros (siempre debe ser un
número impar) los cuales decidirán conforme a derecho (o equidad).
Toda notificación en virtud de este convenio podrá realizarse a las siguientes
direcciones: ____________________________.
A Câmara de Comercio Argentina está trilhando os mesmos passos, tanto que já está
organizando o “V Congresso Anual de Arbitragem”, que terá lugar nos dias 12 e 13 de
outubro de 2011, na sede da Bolsa de Comércio de Buenos Aires.
Consoante notícia disposta no próprio site29 da Câmara de Comercio Argentina, “los
expositores disertarán sobre los elementos fundamentales del arbitraje y compartirán sus
experiencias prácticas bajo el enfoque ‘El Arbitraje en el Bicentenario, Presente y Futuro.’”
Cabe ao Brasil, por sua vez, criar projetos e programas que incentivem a população a buscar a
via arbitral para solucionar seus litígios, visto que nossos tribunais encontram-se em pleno
colapso.
4.2 Ampliação do número de juízes e servidores cartorários
Esta recomendação é mais do que óbvia e se dirige precipuamente às Varas Cíveis lato sensu
e Criminais das Justiças Estaduais, as quais, muitas vezes funcionam com menos de um juiz.
Isso mesmo, menos de um juiz por Vara Cível ou Criminal.
Esta afirmação causa perplexidade a muitos, mas é o que se costuma verificar nas Justiças
Estaduais, haja vista que muitos magistrados são responsáveis por capitanear mais de uma
Vara, que, por vezes, chegam a estar em comarcas distintas.
Pelo menos dois magistrados para cada Vara Cível e Criminal contribuiriam sobremaneira
para a conclusão eficaz dos conflitos. Podemos citar, como exemplo, a Justiça do Trabalho
que já funciona desse modo.
Esse recrutamento de magistrados deve ser acompanhado da concomitante investidura de
servidores cartorários, os quais deverão praticar todos os atos processuais necessários para o
regular andamento do processo.
29
Informação
disponível
em:
<http://www.cac.com.ar/noticia/LA_CAC_AUSPICIA_EL_V_CONGRESO_ANUAL_DE_ARBITRAJE_
2533>. Acesso em 20 de Jun. 2011.
Antonio Raimundo Pereira Neto – Revista Diálogos Sócio-Jurídicos – Volume 1, 2012.
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A Responsabilidade do Estado em Decorrência da Morosidade
Judicial e as Possíveis Hipóteses para Solução deste Fato.
Com igual pensamento ao que nós estamos propondo, encontramos as palavras claras e diretas
de Andréa Alves de Almeida30:
E a morosidade da atividade jurisdicional decorre da omissão indesculpável de o
Estado não contratar funcionários (juízes, auxiliares do judiciário e defensores
públicos) suficientes para cumprir o seu dever jurisdicional.
Embora nos pareça inquestionável a necessidade de ampliação do quadro pessoal dos
tribunais brasileiros, existem alguns pensadores da área jurídica que combatem ardorosamente
esta hipótese de solução da morosidade judicial, é o que pensa Moniz Aragão31:
Outra solução, igualmente falaciosa a meu ver, mas que tem muitos adeptos entre
políticos e autoridades, inclusive judiciárias, é aumentar sempre mais a quantidade
de juízes e tribunais. [...] Se raciocinarmos com problemas de saúde, quem
defenderia o simples aumento do número de médicos e de leitos em hospitais em vez
de estimular campanhas de vacinação? Ou administrar antitérmicos, em vez de
procurar a causa da febre?
Em muitos países da América do Sul a situação é peculiarmente grave, basta rememorarmos,
que segundo os recentes dados do Conselho Nacional de Justiça32, o Brasil possui uma média
de 08 (oito) juízes para cada grupo de cem mil habitantes.
Peru, Chile, Equador, Bolívia e Venezuela, por seu turno, possuem respectivamente 6,0, 3,2,
6,5, 7,9 e 4,7 juízes para cada grupo de cem mil habitantes33.
Já o Uruguai, em notável avanço, exibe uma média de 15,5 juízes para cada grupo de cem mil
habitantes, situação que o deixa acima dos níveis encontrados em países como os Estados
Unidos, que possui 11,6 juízes por cada grupo de cem mil habitantes.
Insta deixar claro que não estamos defendendo que um aumento na quantidade de juízes seja
de per se a única peça necessária para desafogar o judiciário, mas é indubitável que este é um
30
ALMEIDA, Andréa Alves de. A efetividade, eficiência e eficácia do processo no Estado
Democrático. In: LEAL, Rosemiro Pereira. Estudos continuados de teoria do processo. v. 4. Porto
Alegre: Síntese, 2004, p. 95.
31
ARAGÃO, E. D. Moniz de. Estatística judiciária. Revista de Processo, São Paulo, Ano 28, n. 110,
abr.-jun. 2003, p. 12.
32
Informação disponível em: <http://jusclip.com.br/conjur-brasil-tem-oito-juizes-para-cada-cem-milhabitantes/>. Acesso em 28 Jun 2011.
33
BREÑA, Wilson Hernández. La administración de justicia en datos. Artigo disponível em:
<http://www.justiciaviva.org.pe/informes/153a.pdf>. Acesso em 28 Jun 2011.
Antonio Raimundo Pereira Neto – Revista Diálogos Sócio-Jurídicos – Volume 1, 2012.
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A Responsabilidade do Estado em Decorrência da Morosidade
Judicial e as Possíveis Hipóteses para Solução deste Fato.
dos caminhos a serem trilhados para solução da precária situação atual. Não é por acaso que
Paulo Tamburini, conselheiro do Conselho Nacional de Justiça, acentuou que34:
Precisamos entender que o juiz não é uma peça que trabalha sozinho no processo
judicial, ele tem que ter um conjunto de servidores habilitados, capacitados e ágeis
no andamento processual. Um magistrado precisa ter, também, recursos de ordem
material em seu gabinete, para que consiga fazer um bom gerenciamento do acervo
processual que não para de entrar nos tribunais, além de uma legislação processual
que não permita retardamento no andamento do processo, como a quantidade de
recursos atualmente existente.
4.3 Treinamento e salários dignos aos servidores da justiça
De nada adiantará contratar servidores públicos (magistrados e servidores cartorários), se
estes não receberem o adequado treinamento para o exercício do seu mister, pois, caso isto
não ocorra, poderemos cair em outra hipótese de responsabilização do Estado: por erro
judicial.
O Estado deve canalizar uma maior parcela do erário público para fornecer cursos de
capacitação e atualização para aqueles que integram o serviço judiciário, vez que a ausência
destas medidas tem colaborado para o surgimento de uma classe de servidores cada vez mais
despreparada e desatualizada.
Em remate, afigura-nos eficaz a instituição de abonos de produtividade para aqueles
servidores que ultrapassarem as metas instituídas pelos Tribunais de Justiça a que estejam
vinculados, vez que este plus salarial serviria como um estimulo a mais para que aqueles
impulsionassem a contento os processos judiciais.
4.4 Digitalização do processo judicial.
O processo judicial digital surgiu justamente com o escopo de tutelar os importantes
Princípios da Celeridade e Economia Processual, vez que a adoção do processo virtual, põe
fim, verbi gratia, ao deslocamentos de advogados e partes no trajeto escritório-fórum e
34
Informação disponível em: <http://jusclip.com.br/conjur-brasil-tem-oito-juizes-para-cada-cem-milhabitantes/>. Acesso em 28 Jun 2011.
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A Responsabilidade do Estado em Decorrência da Morosidade
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fórum-escritório, assim como aos atendimentos insatisfatórios geralmente encontrados nos
balcões dos cartórios judiciais.
Com o processo judicial digital consagra-se o Princípio da Publicidade do processo, ao
mesmo tempo em que se elimina um grave inconveniente: o contumaz desaparecimento de
autos físicos e petições.
O Conselho Nacional de Justiça, através do seu Secretário Geral, Sr. Sergio Renato Tejada
Garcia, vem salientando que35:
além de combater a morosidade processual, o processo virtual ainda melhora o
acesso à Justiça e a transparência do Poder Judiciário. Isso porque o processo
eletrônico pode ser manejado em horário integral, isto é, as portas da Justiça estão
sempre abertas para o jurisdicionado. A publicidade é tanta quanto a rede mundial
da Internet permite.
Vê-se, dessarte, que o processo virtual, por ser automatizado, leva a uma movimentação
automática do processo judicial, visto que as citações e intimações passarão em sua maioria a
ser realizadas via internet, sendo que naqueles casos em que a lei processual exige intimação
pessoal, os procuradores serão intimados via e-mail com aviso de recebimento eletrônico.
5. Considerações finais
Como temos apreciado, nos últimos anos há avançado consideravelmente o reconhecimento
da responsabilidade estatal por danos produzidos pela morosidade da função jurisdicional.
Inobstante isso, persistem certos resquícios que colocam este tipo de responsabilidade em um
estágio menos evoluído do que outros tipos, tais como aquela oriunda da atividade
administrativa e legislativa do Estado.
A demora injustificada da prestação jurisdicional deve ser indenizada, uma vez que
considerando a inteligência do art. 37, §6° e da Emenda Constitucional 45/2004, assim como
entendimentos de direito comparado, se a mora provocar danos, o lesado terá legitimidade
para intentar a ação de reparação por danos materiais e morais, ou ainda, Mandado de
Segurança, quando a causa da demora for atribuída a ato de determinado magistrado.
35
Informação disponível em: <http://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=3176>. Acesso em 20
Jun. 2011.
Antonio Raimundo Pereira Neto – Revista Diálogos Sócio-Jurídicos – Volume 1, 2012.
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A Responsabilidade do Estado em Decorrência da Morosidade
Judicial e as Possíveis Hipóteses para Solução deste Fato.
A discussão trazida na presente pesquisa serve de alerta, e se for amplamente difundida,
poderá se tornar um meio de pressionar o Estado a aparelhar o Judiciário, para que este preste
um serviço mais eficiente.
Ademais, o Poder Judiciário não pode ficar aguardando as soluções advindas de outros
poderes. Deve tomar a dianteira da modernização, mudando a mentalidade de seus membros e
auxiliares, simplificando os procedimentos, virtualizando os processos.
Nesse diapasão, é inquestionável a relevância da matéria aqui debatida, haja vista que a
responsabilização objetiva do Estado por atos judiciais minora a hipossuficiência do lesado
quando litiga contra o Estado, fazendo com que a justiça seja efetivada e que o direito atinja
seu maior escopo: a justiça social.
Por fim, empolga-nos o fato de que existe um firme avanço jurisprudencial e doutrinário que
vem apregoando a responsabilidade objetiva do Estado pelo mau funcionamento do Poder
Judiciário, isso não só no direito pátrio, mas também em outros países que tomamos como
parâmetro na presente pesquisa, como é o caso da Espanha e da Colômbia.
6. Referências
Referências Eletrônicas
http://www.arbitrajeccc.org
http://www.cac.com.ar
http://www.colectivodeabogados.org
http//:www.juridicas.unam.mx
http://www.jurisway.org.br
http://www.juriversia.com/Colombia
http://jurisprudencia.pjn.gov.ar/jurisp/principal.htm
Antonio Raimundo Pereira Neto – Revista Diálogos Sócio-Jurídicos – Volume 1, 2012.
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