Uma estratégia anticorrupção para administração da receita

Transcrição

Uma estratégia anticorrupção para administração da receita
Uma estratégia anticorrupção
para administração da receita
Uma análise recente dos empréstimos do Banco para as reformas tributária e aduaneira revela o
potencial desses projetos para as iniciativas de combate à corrupção.
O Banco Mundial define a corrupção como o abuso da administração pública visando ganhos
particulares. As práticas corruptas incluem roubo ou apropriação unilateral dos bens públicos por seu
administrador e as transações entre várias partes, nas quais os beneficiários oferecem propinas a
funcionários graduados. A corrupção pode existir em todos os níveis da administração pública – desde
titulares de altos cargos a funcionários de outros níveis. Uma vez que, as administrações tributárias e
alfandegárias figuram, com freqüência, como as mais corruptas, dentre as agências governamentais, nos
países em desenvolvimento. Os projetos do Banco que reformam essas administrações devem incluir
estratégias anticorrupção.
Qualquer estratégia de combate à corrupção deve limitar os motivos e as oportunidades de práticas
abusivas dos administradores públicos. Isso deve ser feito diretamente contra a corrupção unilateral,
enquanto que a corrupção que envolve várias partes interessadas deve ser combatida indiretamente de
modo a impedir a oferta de propinas. Embora não tenhamos suficiente conhecimento para identificar as
melhores estratégias anticorrupção para diferentes situações nacionais, sabemos que não há uma
estratégia ideal para todos os casos. Vários elementos dentre as possibilidades devem ser integrados em
um pacote coerente. A abordagem do Banco nesta área, descrita abaixo, é compatível com a do Fundo
Monetário Internacional (FMI).
Motivos da corrupção
As reformas potenciais para desencorajar a corrupção entre os administradores de renda estão
discriminadas no Quadro 1, sendo que algumas delas precisam ser aprofundadas. Uma autonomia
organizacional suficiente da administração de renda, combinada ao orçamento vinculado ao
desempenho, é defendida como uma forma de obtenção de eficiência. Base salarial competitiva e
procedimentos de recompensa transparentes e não-arbitrários também são amplamente incentivados.
Porém, não há análises extensas que determinem o tamanho dos aumentos de salário necessários para
reduzir a corrupção. Além disso, esses incrementos podem impor uma carga considerável sobre o
orçamento dos países em desenvolvimento.
Ainda, os incentivos aos funcionários da receita, se não forem verificados, podem levar ao tratamento
importuno dos contribuintes por excesso de zelo, o que é uma forma de corrupção. Por isso e para
penalizar outras práticas corruptas, os estímulos negativos devem complementar os incentivos positivos.
(Contudo, apenas a utilização de estímulos negativos, poderia deter não somente a corrupção mas
também a vontade trabalhar dos administradores de renda.) Finalmente, pesquisas independentes junto
aos contribuintes podem ajudar a identificar os elementos da organização ou até mesmo as repartições
públicas fiscais, onde ocorre grave corrupção.
Oportunidades para corrupção
Uma estratégia anticorrupção deve ir além da abordagem dos incentivos. As oportunidades para a prática
da corrupção também precisam ser freadas (Quadro 2). A simplificação de impostos é talvez o mais
importante método para limitar as oportunidades, podendo também aumentar a eficiência econômica por
outras razões. As reformas tributárias em muitos países e as recomendações do banco e do FMI
geralmente enfocam a diminuição dos impostos, ampliando a base tributária e eliminando as isenções.
Essas reformas tendem a tornar as obrigações tributárias transparentes e a reduzir o custo de observância
dos contribuintes honestos. A tributação presumível das pequenas empresas, que talvez não mantenham
registros e livros-caixa completos, também pode reduzir o poder arbitrário dos inspetores tributários e
tornar mais simples e claros os cálculos de impostos .
As reformas administrativas e organizacionais que fazem parte de uma estratégia anticorrupção incluem
a especificação clara das responsabilidades juntamente com as linhas funcionais, que se baseiam em
procedimentos escritos e transparentes. A implementação efetiva de tais padrões depende do estado de
desenvolvimento da administração tributária e da economia.
Talvez seja mais importante um sistema de verificação interna e externa. As divisões de auditoria interna
e as unidades anticorrupção são os órgãos mais importantes nas administrações de renda. As
salvaguardas institucionais importantes, externas à gestão da receita, incluem: um setor judiciário
independente e eficiente, as análises externas feitas pelas agências governamentais (como as auditorias
externas independentes) e as associações de contribuintes que reforçam a participação dos cidadãos.
Deve ser evitado o estreito contato entre contribuintes e agentes tributários. Os instrumentos importantes
neste sentido incluem os impostos retidos na fonte, o aumento da utilização de dados de terceiros para
análise dos impostos e a privatização de funções selecionadas da administração tributária. A automação
efetiva dos procedimentos também facilita a redução do contato e aumenta a eficiência administrativa.
Incorporação de estratégias aos projetos de reformas
O exame de 43 empréstimos do Banco nos anos 90, com importantes componentes de modernização,
revelou que a maioria dos projetos direcionados explicitamente ao combate à corrupção administrativa
foi realizada depois de 1997. As operações anteriores raramente incorporaram: uma reforma paralela do
judiciário (ausente em 95% dos projetos examinados), determinação e procedimento orçamentários
transparentes (90%), impostos possíveis (88%), auditorias internas e externas (80%) e elementos para
fortalecer a participação do contribuinte ou a introdução de outras instituições externas de controle
(78%). Vários projetos enfocaram principalmente a automação e os computadores, reconhecendo o seu
potencial para facilitar procedimentos independentes padronizados.
Devido à capacidade limitada de absorver as mudanças na maioria dos países em desenvolvimento, as
estratégias de anticorrupção precisam enfocar alguns elementos cruciais originados das características
específicas de cada país. Vários modelos foram sugeridos nos relatórios técnicos e incorporados aos
projetos em andamento.
Abordagens nacionais atuais
Com uma população de 31 milhões de habitantes, a Tanzânia é aproximadamente três vezes maior que a
Guatemala, com PNB per capita de US$210.
A receita tributária, como uma parcela do PNB, é baixa na Guatemala e na Tanzânia. Em 1996, na
Guatemala, diminuiu para 8%, um dos mais baixos níveis no mundo. A receita tributária da Tanzânia foi
bastante baixa para essa região, 12%. Ao contrário, na Letônia, foi de 31% durante o período entre 1995
e 97, estando abaixo dos níveis de gastos. Os três países se beneficiaram de um consenso governamental
e público sobre a necessidade de reformar suas agências tributárias, bem como, da necessidade de
combater a corrupção através de uma ação direta.
A estratégia anticorrupção da Letônia para a administração tributária fez parte de uma estratégia
nacional mais ampla, guiada por uma Unidade de Vigilância. A experiência internacional mostrou que
nas economias em transição a administração tributária é rigorosamente testada para detectar
contribuintes e funcionários públicos corruptos, altos volumes de transações em dinheiro e
extraterritoriais, uma grande evasão de divisas e dívidas não pagas, além do crescimento da economia
informal. A estrutura organizacional do Serviço Estatal da Receita foi aperfeiçoado de modo a integrar
os impostos, a alfândega e o recebimento de seguro social, assim como para criar um alto controle
interno e funções anticorrupção. A Unidade de Vigilância, que opera independentemente da política
financeira, deveria:
• Monitorar e educar as equipes com base no código de ética.
• Investigar os casos de enriquecimento ilícito.
• Conduzir procedimentos disciplinares.
• Desenvolver diretivas para administradores que tratam de corrupção.
• Reformular os procedimentos empresariais para reduzir o arbítrio e, onde este deva ser mantido,
estabelecer sistemas para monitorar sua prática.
• Desenvolver incentivos para promover a integridade e boa conduta.
• Monitorar as declarações de renda e propriedades dos parlamentares, ministros e servidores públicos.
A Guatemala decidiu fundir suas agências de controle tributário e aduaneiro em um órgão autônomo.
Todas as equipes das agências foram substituídas ou seus funcionários precisaram se candidatar
novamente a seus cargos, um processo encomendado a empresas privadas de recrutamento e a uma
universidade local. A transparência e objetividade foram críticas, devido à total desconfiança pública e a
uma percepção da difusão da corrupção nas agências de controle tributário e alfandegárias. Além disso,
um sistema financeiro integrado, administrado pelo Ministério das Finanças, está sendo desenvolvido na
nova agência tributária e os procedimentos foram dinamizados juntamente com a nova implementação
do processo. Finalmente, uma campanha de informação pública está sendo implementada para divulgar
os progressos da agência quanto à melhoria no serviço ao cliente e no atendimento aos objetivos da
receita.
A Tanzânia atuou de forma severa no combate à corrupção através da formação da Administração da
Receita Tributária, em 1996. Desde a sua criação, a administração foi considerada rígida no tratamento
da corrupção. Um relatório nacional sobre corrupção produziu um plano de ação para combater a
corrupção, monitorado pelo conselho administrativo, onde foi criado um Comitê de Fiscalização da
Integridade. Em um esforço paralelo, uma unidade de investigação interna foi estabelecida no
Departamento de Auditoria Interna. Finalmente, foi montada uma campanha de mídia, apoiada por
linhas telefônicas para atendimento 24 horas e recursos para pagamento de informantes de evasão fiscal.
Aprendizado com a experiência
Devido ao maior conhecimento sobre planejamento e à implementação das estratégias de combate à
corrupção, é vital tirar lições de operações, como as descritas acima. Para facilitar essa prática, os
empréstimos para a Letônia, Guatemala e Tanzânia especificaram, cuidadosamente, indicadores de
desempenho para uso nas análises intermediárias e pós-projeto. As lições, com evidências
demonstrativas, incluem a importância do compromisso político dos titulares de altos cargos, o
diagnóstico pré-projeto, o planejamento participativo do projeto e uma grande habilidade no registro de
dados. Há também indícios da eficácia da informatização combinada à reforma organizacional,
administrativa e de pessoal, e da ineficiência da automação sem fortalecimento institucional.
Perguntas importantes geradas pelas operações atuais incluem:
• Qual é a importância da incorporação de programas de combate à corrupção na administração da
receita a programas nacionais mais abrangentes?
• A simplificação e reforma da estrutura tributária produz um efeito mensurável sobre a corrupção?
• Quão eficaz é a participação popular para deter a corrupção na administração da receita?
• Quais medidas para deter a corrupção aumentam a eficiência administrativa e quais a reduzem?
• Uma administração de receita, na qual a corrupção grassa, pode ser profissionalizada sem a
substituição dos funcionários existentes?
• O resultado dos projetos com componentes anticorrupção explícitos é melhor do que aqueles com
enfoque implícito na corrupção - por exemplo, no replanejamento do processo empresarial?
Bibliografia adicional
Barbone, Luca, Luc De Wulf, Arindam Das- Gupta, and Anna Hansson. 1999. “World Bank Projects in
the 1990s with Tax or Customs Administration Reform Com- ponents: A Review.” World Bank, Tax
Pol- icy and Administration Thematic Group, Washington, D.C.
Crotty, John. 1998. “Measures to Address Corruption Problems in Tax and Customs Administrations.”
International Monetary Fund, Fiscal Affairs Depart- ment, Washington, D.C.
Gray, Cheryl W., and Daniel Kaufmann. 1998. “Corruption and Development.”PREMnote 4. World
Bank, Washington, D.C.
Kaufmann, Daniel, Sanjay Pradhan, and Randi Ryterman. 1998. “New Frontiers in Diagnosing and
Combating Corrup- tion.” PREMnote 7. World Bank, Wash- ington, D.C.
Mookherjee, Dilip. 1998. “Incentive Reforms in Developing Country Bureaucracies: Lessons from Tax
Administrations.” In Boris Pleskovic and Joseph E. Stiglitz, eds., Annual World Bank Conference on
Develop- ment Economics 1997. Washington, D.C.: World Bank.
Vito, Tanzi. 1998.”Corruption around the World: Causes, Consequences, Scope and Cures.” IMF
Working Paper 98/63. Inter- national Monetary Fund, Washington, D.C.
World Bank. 1997. “Helping Countries Combat Corruption: The Role of the World Bank.” Poverty
Reduction and Economic Management Network, Wash- ington, D.C.
Esta nota foi escrita por Arindam Das-Gupta (ex-coordenador do Grupo Temático de Administração e
Política Tributária, Rede PREM), Michael Engelschalk (Chefe, Assuntos Fiscais da Unidade de Países
Não-membros, Organização para Desenvolvimento e Cooperação Econômica) e William Mayville
(Consultor, PREM Network).
Se você tiver interesse em artigos semelhantes, considere a possibilidade de participar do Grupo
Temático de Administração e Política Tributária. Entre em contato com Luca Barbone, x32556, ou
Anna Hansson, x38485, ou clique em Thematic Groups, na Rede PREM.
Page 1– Box 1
Quadro 1 Abordagem dos motivos
Motivações básicas
M1 Declaração de propósitos de missão e objetivos
M2 Espírito corporativo e de elite
Incentivos positivos
M3
M4
M5
M6
M7
M8
Autonomia organizacional
Procedimentos orçamentários transparentes e orçamentos vinculados ao desempenho
Compensação vinculada ao desempenho
Competição intra e interagências
Pagamento com base na competitividade
Procedimentos compensatórios transparentes e não-arbitrários
Estímulos negativos
M9 Sanções efetivas à corrupção
M10 Maior participação dos contribuintes através de pesquisas independentes
M11 Análise e controle por parte dos cidadãos
Elementos da oferta
M12 Sanções efetivas aos pagadores de propinas
M13 Instituições independentes para proteger os contribuintes contra perseguição e extorsões
M14 Divulgação das penalidades
Page 1 – Margin text
Qualquer estratégia anticorrupção deve limitar os motivos e as
oportunidades para a prática abusiva dos administradores pública
Page 1
Banco Mundial
PREM
Setor Público
Outubro1999
número 33
Vice-presidência para economia do desenvolvimento e rede de redução da pobreza e gestão econômica
Page 2 – Margin text
As estratégias anticorrupção precisam enfocar alguns elementos
cruciais que se originam nas características específicas de cada país
Page 2 – Box 2
Quadro 2 Abordagem das oportunidades
Reformas da estrutura tributária
O1 Poucas e baixas taxas, e isenções limitadas
O2 Impostos retidos na fonte e presumíveis
O3 Penalidades não-discricionárias
Organização e administração
O4 Organização funcional
O5 Uso crescente de dados de terceiros
O6 Contato limitado entre contribuintes e administradores
O7 Procedimentos comerciais, transparentes, não-discricionários e em condições de igualdade
O8 Recrutamento de recursos humanos e procedimentos orçamentários transparentes
O9 Informatização e automação
O10 Privatização de funções selecionadas
Verificações internas e externas
O11
O12
O13
O14
Auditorias independentes internas e externas
Procedimentos eficientes de supervisão e fiscalização administrativa
Análise e fiscalização dos cidadãos
Unidades anticorrupção internas
Page 3 – Table 1
Tabela 1 Componentes do combate à corrupção das operações do Banco
Projeto de Modernização do Empréstimo para
Projeto de Administração
Serviço da Receita Federal
Assistência Técnica à
Tributária da Tanzânia
Administração Tributária na
da Letônia
Guatemala
Abordagem dos motivos
Motivação básica
Incentivos positivos
Estímulos negativos
Elementos da oferta
Abordagem das
oportunidades
Reformas da estrutura
tributária
Organização e administração
Verificações internas e
externas
M1, M2
M5
M9, M10
M13
M1, M2
M3, M5, M7
M10
O2, O3
O1-O3
O1-O3
O4-O6, O8, O9
O11, O14
O4-O6, O8-O10
O11
O4, O5, O9
O14
M9
M12
Nota:Veja as definições dos códigos da tabela nos Quadros 1 e 2.
Page 3
Outubro 1999
Nota PREM 33
Page 4 – Margin text
Várias lições resultaram de experiências bem-sucedidas, porém é
necessário mais trabalho
Page 4
Esta série de notas destina-se a resumir as recomendações sobre práticas corretas e as principais políticas sobre os
tópicos relacionados à PREM. As Notas PREM são distribuídas para toda a equipe do Banco Mundial e também
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