da ação monitória embasada em cheque prescrito

Transcrição

da ação monitória embasada em cheque prescrito
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
FACULDADE DE DIREITO
EDUARDO CUNHA DA COSTA
DA AÇÃO MONITÓRIA EMBASADA EM CHEQUE PRESCRITO
PORTO ALEGRE
2005
EDUARDO CUNHA DA COSTA
DA AÇÃO MONITÓRIA EMBASADA EM CHEQUE PRESCRITO
Trabalho
apresentado
avaliação
na
Monografia
de
como
disciplina
de
Conclusão
de
Curso, na Faculdade de Direito
da Universidade Federal do Rio
Grande do Sul, orientado pelo
Prof. Norberto da Costa Caruso
Mac-Donald, no ano de 2005.
Porto Alegre, dezembro de 2005.
EDUARDO CUNHA DA COSTA
DA AÇÃO MONITÓRIA EMBASADA EM CHEQUE PRESCRITO
Presidente: Norberto Mac-Donald
Banca: ___________________________
___________________________
Grau atribuído:____Em: _____________
Porto Alegre, dezembro de 2005.
RESUMO
O presente estudo trata da ação monitória embasada em cheque
prescrito. Primeiramente, são analisados, como pressupostos gerais à exposição, os
conceitos de direito subjetivo, de pretensão e de ação material e processual, além
de um breve escorço acerca da evolução da tutela dos direitos subjetivos. Em uma
segunda parte, são abordados os pressupostos específicos ao objeto, sendo então
analisados os conceitos de título de crédito, de prescrição e de ação monitória. Por
fim, é feita a abordagem direta da ação monitória embasada em cheque prescrito,
enfrentado o tema dos limites à sua utilização.
RIASSUNTO
Il presente saggio esamina il procedimento di ingiunzione basato
nell’assegno bancario scaduto. Da prima, vengono analizzati, come presupposizioni
generali alla stesura di questo saggio, i concetti di pretesa e di azione sia materiale
come processuale, nonché un breve scorcio sulla evoluzione della tutela dei diritti
soggettivi. Dopodiché sono esaminati i presuposti specifici all’oggetto, ed altresí i
concetti di titoli di credito, della prescrizione e dell’ingiunzione. Alla fine, si è fatto un
sondaggio diretto nella procedura della ingiunzione fondata in assegno bancario
prescrito e i limiti alla sua utilizzazione.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
06
I – PRESSUPOSTOS GERAIS
08
1 Direito Subjetivo
08
2 Pretensão
15
3 Evolução da tutela dos direitos subjetivos
19
4 Ação de Direito Material e Ação de Direito Processual
25
II – PRESSUPOSTOS ESPECÍFICOS
36
5 Títulos de Crédito
36
5.1 Conceito
36
5.2 Ação Cambiária
39
6 Prescrição
41
6.1 Origem
41
6.2 Conceito
45
6.3 Fundamento jurídico-racional
47
6.4 Efeitos
49
6.5 Títulos de Crédito: a prescrição da ação cambiária
52
7 Ação Monitória
53
III – AÇÃO MONITÓRIA EMBASADA EM CHEQUE PRESCRITO
59
CONCLUSÃO
69
BIBLIOGRAFIA
71
6
INTRODUÇÃO
A jurisprudência dominante nos Tribunais brasileiros vem admitindo
indiscriminadamente a possibilidade do uso da ação monitória embasada em cheque
prescrito, independentemente do negócio causal.
Essa jurisprudência, inclusive já sumulada (enunciado 299 da súmula
do STJ), é a consagração da idéia popular segundo a qual, com a prescrição do
cheque, apenas se perde a ação executiva, restando a ação ordinária de
conhecimento ou a ação monitória para a cobrança.
Esse entendimento, porém, parte de um equívoco nas premissas
básicas dos institutos envolvidos, levando, assim, a uma utilização deturpada da
ação monitória.
No presente trabalho, procuramos identificar essas incorreções,
analisando, primeiramente, o que entendemos ser os pressupostos gerais para
a compreensão do objeto. Nessa primeira parte, então, tratamos do conceito de
direito subjetivo, de pretensão e de ação de direito material. É examinada,
outrossim, a ação de direito processual, após um breve escorço acerca da
evolução da tutela dos direitos subjetivos, que entendemos ser importante para
a compreensão do instituto, em um cotejo desta com a ação material.
7
Na segunda parte, abordamos o que consideramos ser os
pressupostos específicos ao tema. São examinados os conceitos de títulos de
crédito, restringindo-se à sua autonomia e independência frente à relação
fundamental, que deu causa à sua criação ou circulação, e de ação cambiária,
esta delimitada à de cobrança, em uma comparação com a ação causal.
Ainda na segunda parte, fazemos uma exposição acerca do
instituto da prescrição, apresentando a sua origem, conceito, fundamento e
efeitos, além de um tópico específico sobre a prescrição da ação cambiária de
cobrança.
Como
último
item
da
segunda
parte,
analisamos
algumas
características da ação monitória, restringindo a exposição à finalidade do
instituto.
Na última parte do trabalho, abordamos diretamente o tema da
ação monitória embasada em cheque prescrito, procurando expor os equívocos
na sua utilização.
8
I – PRESSUPOSTOS GERAIS
1 Direito Subjetivo
Segundo Michel Villey, o significado do ius dos romanos pouco se
aproxima do conceito de direito subjetivo moderno, pois os jurisconsultos de
Roma encaravam o direito sob um ângulo objetivo, tendo conhecido apenas
instituições jurídicas objetivas (personae, res, actiones)1.
Villey afirma que nenhuma das definições consagradas de ius nas
fontes romanas (de Celso, Ulpiano, Paulo) deixa transparecer que tenha Roma
conhecido uma conceituação de direito subjetivo. Assim, assevera ele que:
Il n’est point de terme romain qui corresponde à droit réel; point de
definition romaine d’un pretendu droit de proprieté. Point de terme qui
signifie vraiment droit de creance.2
Essa afirmação de Villey é rebatida por Giovanni Pugliese, segundo
o qual, embora não tenham os romanos conhecido o conceito de direito
subjetivo, não lhes era desconhecida a sua realidade, como se pode ler no
fragmento de Ulpiano (D. I, 3, 41)3, em que ius é utilizado também em acepção
subjetiva:
Totum autem ius consistit aut in adquirendo aut in conseruando aut in
minuendo: aut enim hoc agitur, quemadmodum quid cuiusque fiat, aut
quemadmodum quis rem uel ius suum conseruet, aut quomodo alienet
aut admittat.4
1
ALVES, José Carlos Moreira. Direito Romano. 13. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002, v. 1, p. 89.
VILLEY, Michel. Leçons d' Histoire de la Philosophie du Droit. Paris: Dalloz, 1962, p. 227.
3
ALVES, op. cit., p. 89.
4
“Todo direito consiste na aquisição, ou na conservação, ou na diminuição, pois ou trata do modo
como algo se torna de alguém, ou como alguém conserva uma coisa ou um direito seus, ou de
como os aliena ou perde” (tradução nossa).
2
9
Quando Ulpiano refere “quemadmodum quis rem uel ius suum
conseruet”, deixa claro ser conhecida do jurisconsulto a acepção subjetiva do
direito (ius suum).
Escrevendo sobre o período antigo, aduz Pugliese 5 que os sujeitos
titulares de situações jurídicas, e, portanto, partes de uma relação jurídica, eram
necessariamente patres familiae, que, a seu turno, apenas as pessoas livres e
pertencentes à “comunità romana”, os cidadãos romanos, poderiam sê-lo (pater
familiae). Dessarte, conclui ele:
Queste condizioni personali, necessarie per la titolarità di situazioni
giuridiche soggettive, costituivano esse estesse uma situazione
soggetive, configurata da norme, precetti, regole.6
Entretanto, o direito subjetivo, como conhecemos hodiernamente,
só começa a ter delineado o seu conceito com os filósofos medievais do período
pós-escolástico, como o inglês Guilherme de Ockham, defensor da idéia de que
o direito deve refletir e regular a liberdade do indivíduo.
Karl Von Savigny inaugura o denominado voluntarismo jurídico, em
que a vontade humana consiste no elemento, pré-jurídico, criador e atuante no
universo social, bem como no plano jurídico. Assim, Savigny parte da premissa
segundo a qual o direito assegura ao indivíduo o exercício de seu livre arbítrio,
culminando no elemento central do direito, a relação jurídica7:
Chaque rapport de droit nous apparait comme une relation de
personne à personne déterminée par une regle de droit, et cette regle
déterminante assigne à chaque individu un domaine ou une volonté
regne independante de tout volonté étrangere.
5
PUGLIESE, Giovanni. Istituzioni di Diritto Romano. 3. ed. Torino: Giappichelli, 1991, p. 44.
Ibidem. p. 44.
7
SAVIGNY, F. C. de. Traité de droit romain. Paris: Firmin Didot Freres, 1856, v. 1, p. 327.
6
10
Segundo Pontes de Miranda, “tanto aqui quanto em todo o direito
(sistema de regras jurídicas), a teoria voluntarista é falsa”. Seguindo, o ilustre
tratadista afirma que a teoria voluntarista “identifica o homem e a vontade; depois,
distingue a pessoa jurídica e a vontade dos órgãos. Ora, os absolutamente
incapazes teriam de ser identificados com a sua vontade, que o direito não
reconhece: nega-a.” 8
Para Pontes, “rigorosamente, a vontade nada tem a ver com as noções
de incidência das regras jurídicas e de seus resultados [...], tanto assim que a
vontade, quando é protegida, só o é porque a incidência a protege e ela se acha do
lado ativo ou passivo da eficácia.” 9
Windscheid,
por
sua
vez,
com
a
concepção
de
vontade
jurisdicizada, isto é, autorizada pelo direito positivo, define direito subjetivo
como “una potestà o signoria della volontà impartita dall’ordine giuridico”10.
O próprio Windscheid, porém, reconhece — com a crítica aviada
por Thon, conforme a qual o elemento volitivo não pode ser essencial para a
existência do direito, como no caso dos loucos, cuja vontade, para o
ordenamento é irrelevante — que a vontade imperante no direito subjetivo é a
do ordenamento, e não a do titular. Em suas palavras:
La base del concetto ora qui sostenuto e presa, como riconosco con
grato animo, dall’ecellente libro di Thon, si deve partire da ciò, che la
8
MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Tratado de Direito Privado. Rio de Janeiro: Borsoi,
1958, Tomo V, § 565.
9
MIRANDA, loc. cit..
10
WINDSCHEID, Bernardo. Diritto delle Pandette. Torino: Unione Tipografico-Editrice Torinese, 1926,
v. 1, p. 170.
11
volontá imperante nel diritto soggetivo è soltanto la volontá
dell’ordinamento giuridico, non la volontá del titolare. Anche quando
l’ordine giuridico desume dalla volontá di una persona il contenuto del
suo precetto, comanda esso solo e non questa persona.11
Conquanto para Rudolf Von Ihering a vontade não seja elemento
estranho ao direito, é o interesse o elemento central do direito subjetivo,
conforme a sua teoria que, por isso mesmo, se chamou teoria do direito
subjetivo como interesse.
Segundo Ihering, a vontade considerada isoladamente é um
elemento vazio e, ao descurar desse dado, os defensores da Willenstheorie (ou
teoria do direito-vontade) desembocaram em um puro formalismo, “en présence
d’une erreur pleine des dangers, même au point de vue de la pratique”12.
Esse autor entende que, ao transferir a noção de direito subjetivo
da vontade para o interesse, está resolvendo a objeção feita por Thon a
Windscheid, quanto aos indivíduos que, por motivos diversos, são destituídos de
vontade, não no sendo, porém, destituídos do direito.
O fenômeno jurídico consistente no sistema de normas que
regulam as relações entre os indivíduos existe para criar e resguardar
determinadas
coisas
consideradas
pelo
momento
histórico
capazes
de
satisfazer às necessidades humanas. Assim, todo direito tem uma utilidade,
enquanto todo bem é útil.
11
WINDSCHEID, Bernardo. Diritto delle Pandette. Torino: Unione Tipografico-Editrice Torinese, 1926,
v. 1, p. 171.
12
JHERING, Rudolph von. L'Esprit du droit romain dans les diverses phases de son développement.
Paris: Marescq Ainé, 1887, p. 325.
12
Ihering acrescenta, ainda, ao conceito de bem a idéia de valor,
como a medida de utilidade do bem, e a de interesse, como medida de valor em
relação a um sujeito13. Para ele, interesse é o sentimento da necessidade de
um bem, sendo o direito um interesse juridicamente protegido.
Pontes de Miranda critica incisivamente essa teoria, sustentando
que “o conceito de um direito que tem em si mesmo o seu valor é negação da
essencialidade do interesse; e interesses, sem conta, continuam sem proteção.” Nas
palavras do jurista alagoano:
A incidência da regra jurídica é que importa; e toda investigação tem de ser
sobre o que fica do lado da eficácia. Ora, a teoria do interesse, sobre ficar
no plano em que se protegeram interesses (plano do mundo político),
portanto antes da incidência, e muito antes da eficácia, não atendeu a que
nem sempre se indaga do interesse concreto quando se apontam direitos.14
Entretanto, doutrinas houve que negaram a existência do direito
subjetivo, qual a de Leon Duguit, que propôs a noção de situação jurídica em
substituição do clássico conceito de direito subjetivo. Para Duguit, os indivíduos
não têm o poder de se impor às outras vontades, mas, sim, cada pessoa se
encontra em uma determinada situação jurídica em virtude das regras jurídicas
existentes15.
Essa teoria, por sua vez, foi fortemente rebatida por François
Gény16, para quem pode surgir um direito subjetivo a partir de uma norma
13
JHERING, Rudolph von. L'Esprit du droit romain dans les diverses phases de son développement.
Paris: Marescq Ainé, 1887, p. 325.
14
MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Tratado de Direito Privado. Rio de Janeiro: Borsoi,
1958, Tomo V, § 565.
15
DABIN, Jean. Le droit subjectif. Paris: Dalloz, 1952, p. 8.
16
GÉNY, François. Méthode d’interprétation et sources en droit positif. 2. ed. Paris: Librairie
générale de droit et de jurisprudence, 1919, p. 19.
13
objetiva, não havendo nenhum obstáculo para que a inobservância de uma
norma possa criar para o sujeito lesado um direito subjetivo.
Para Pontes de Miranda, o direito subjetivo é poder, mas não
qualquer poder. O seu conteúdo é poder, mas não poder da vontade, estando
antes dele interesses cuja proteção consiste no fim do direito subjetivo. Aqui,
Pontes refere que a proteção de interesses é o fim, e não o conteúdo do direito,
como erroneamente sustentou Ihering. Em suas palavras:
O conteúdo do direito subjetivo é, portanto, poder; mas esse poder não há
de ser dito “poder da vontade”. Antes dele, estão interesses; o seu fim é
proteção de interesses (o fim, não o conteúdo; e assim se evita a confusão
em que R. von Jhering incorreu).17
Os diretos subjetivos contêm poder pois pressupõem caber a
alguém um bem da vida, o que consiste em atribuição a alguém de um poder ou
de um complexo de poderes, aos quais também se pode chamar faculdades 18.
Segundo Pontes de Miranda:
Às vezes, basta uma faculdade para fazer um direito subjetivo. Quase
sempre, contém ele muitas faculdades. As faculdades, contidas no
direito, ou são derivadas imediatamente da relação que se juridiciza
com a incidência da regra jurídica (posse, ocupação), ou derivam do
direito, ou servem à consumação dele 19.
É o direito objetivo que, ao regrar a distribuição de bens da vida,
cria poderes ou faculdades que consistem no conteúdo do direito subjetivo. Não
se trata, como refere o conspícuo jurista alagoano, só de poder da vontade, mas
também poder de não querer ou querer o contrário. In verbis:
O direito objetivo, regrando distribuição de bens da vida, cria poderes. Mas
poder, aí, não é mais do que faculdade, que se faz conteúdo do direito
17
MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Tratado de Direito Privado. Rio de Janeiro: Borsoi,
1958, Tomo V, § 565.
18
MIRANDA, loc. cit.
19
MIRANDA, loc. cit.
14
subjetivo. Se restringirmos o sentido ao de faculdade, o conteúdo do direito
subjetivo é poder. Não só poder de vontade; poder, também, de nãoquerer. Uma coisa é poder querer a, ou não querer a, ou querer não-a, e
outra poder querer ou não-querer O titular do ius ne altius toliatur tem
faculdade de querer que não se eleve a construção, e só isso20.
A noção de direito subjetivo é criação moderna, malgrado terem
sempre constituído técnica para a tutela de interesses; com ele, como assevera
Pontes de Miranda, “realiza-se a política de se deixar aos indivíduos o cuidar
dos direitos que têm, dos bens que lhes tocam21.”
Correlato ao direito subjetivo é o dever jurídico, o direito é o plus a
que corresponde o dever, que é o minus 22. Como afirma Pontes:
Há de haver relação jurídica básica, ou relação interna à eficácia
(relação intrajurídica), para que haja direito e, pois, dever. Quem está
no lado ativo da relação jurídica é o sujeito do direito; quem está no
lado passivo é o que deve, o devedor (em sentido amplo). A atividade
(qualidade de ser ativo) de um é o direito; a passividade é o dever. 23
Em síntese, o direito subjetivo é uma abstração a que se chegou
após o exame da eficácia dos fatos jurídicos criadores de direitos. O suporte
fático se torna fato jurídico com a incidência nos fatos da regra jurídica; esta,
por sua vez, é objetiva24. Assim, conclui Pontes de Miranda:
O que, para alguém, determinadamente, dessa ocorrência emana, de
vantajoso, é direito, já aqui subjetivo, porque se observa do lado desse
alguém, que é titular dele 25.
Dessarte, cada posição de titular de vantagem, que, na distribuição
dos bens da vida, é toda feita pelas regras jurídicas, é direito. Continuando o
20
MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Tratado de Direito Privado. Rio de Janeiro: Borsoi,
1958, Tomo V, § 565.
21
MIRANDA, loc. cit.
22
MIRANDA, Tratado das Ações. Campinas: Boockseller, 1998, v. 1., p. 47.
23
MIRANDA, loc. cit.
24
Ibidem, p. 46.
25
MIRANDA, loc. cit.
15
preclaro tratadista afirma que “antes de cada direito, esteve, pois, a ordem
jurídica, a lex, a regra [...].”26
O direito subjetivo é limitação à esfera de atividade de outros
possíveis sujeitos, não se confundindo com a faculdade, a qual ele contém; ele
é o poder jurídico a tê-la. Enquanto a faculdade é fática, meio fático para a
satisfação de interesses humanos, o direito subjetivo é meio jurídico para tal27,
sendo portanto a sua existência dependente da regra jurídica objetiva, do
ordenamento jurídico, enfim.
2 Pretensão
Como obviamente se pode concluir, a existência de um direito
subjetivo, isto é, a atribuição feita pelo ordenamento jurídico, em razão da
incidência dos fatos no suporte fático de uma norma objetiva, a alguém de um
meio jurídico para a satisfação de interesses, não implica, necessariamente, a
idéia de seu exercício.
A partir disso, consoante Ovídio Baptista da Silva, pode-se
distinguir o direito subjetivo da exigibilidade e esta da efetiva exigência exercida
pelo titular do direito para que ele se realize28.
26
MIRANDA, Tratado das Ações. Campinas: Boockseller, 1998, v. 1., p. 46- 7.
Ibidem, p. 55.
28
SILVA, Ovídio Araújo Baptista da. Curso de Processo Civil. 6 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2002, v. 1, p. 78.
27
16
Desse modo, tanto existe a categoria jurídica chamada direito
subjetivo, como existe a pretensão, que consiste na “faculdade de se poder
exigir a satisfação do direito”29. Nas palavras de Ovídio da Silva:
Se sou titular de um crédito ainda não vencido, tenho já direito subjetivo,
estou na posição de credor. Há status que corresponde a tal categoria de
Direito das Obrigações, porém, não disponho ainda da faculdade de exigir
que meu devedor cumpra o dever correlato, satisfazendo a meu direito de
crédito30.
A pretensão surge apenas quando houver a possibilidade jurídica de se
exigir que o titular do dever jurídico cumpra o previsto na norma. Assim, por
exemplo, em uma obrigação a termo, quando este ocorre, nasce a faculdade, de que
passa a dispor o direito subjetivo, de poder exigir que o devedor cumpra a
obrigação. Nesse momento, não surge um novo direito, mas, sim, o mesmo direito
adquire um dinamismo que se chama pretensão. Ovídio da Silva, seguindo na
exposição de seu exemplo, afirma:
No momento em que ocorrer o vencimento, nasce-me uma nova faculdade
de que meu direito subjetivo passa a dispor, qual seja o poder exigir que
meu devedor preste, satisfaça, cumpra a obrigação. Nesse momento, dizse que o direito subjetivo, que se mantinha em estado de latência, adquire
dinamismo, ganhando uma nova potência a que se dá o nome de
pretensão31.
Assim, então, é a partir do momento em que, consoante a norma
jurídica objetiva, se pode exigir a realização do direito subjetivo que nasce a
pretensão.
29
SILVA, Ovídio Araújo Baptista da, Direito subjetivo, pretensão de direito material e ação. In Revista
da Ajuris, Porto Alegre, n. 29, nov/1983, p. 100.
30
Ibidem, p. 100.
31
Ibidem, p. 102.
17
A pretensão, no dizer de Pontes de Miranda, “é a posição subjetiva
de poder exigir de outrem alguma prestação positiva ou negativa”, sendo o seu
“correlato um dever ‘premível’ do destinatário dela, talvez obrigação (no senso
estrito), sempre obrigação (no sentido largo). Ao ‘posso’ do titular da pretensão
corresponde o ‘ser obrigado’ do destinatário.” 32
Seguindo, ele esclarece que o vocábulo obrigação tem dois
sentidos, um, lato, que significa dever (posição subjetiva passiva correlata à de
direito), o outro, que corresponde à posição subjetiva passiva correlata à de
pretensão 33.
Dessarte, pretensão é “o meio para um fim”34, tendo por escopo
uma satisfação a ser realizada pelo destinatário, obrigado em sentido estrito
(correspondente à situação passiva à pretensão). Na pretensão, o direito tende
para diante de si, dirigindo-se para que alguém cumpra o dever jurídico.
No entanto, a pretensão, como exigibilidade que é, depende da
ação ou omissão do devedor 35. Assim, com o exigir, ou seja, com o exercício da
pretensão, há que se esperar a conduta voluntária do obrigado satisfazendo a
obrigação. Nas palavras de Ovídio Baptista da Silva:
A pretensão é meio para fim, mas este fim, na medida em que apenas exijo
o cumprimento do dever jurídico, é obtido mediante conduta voluntária do
obrigado. O exercício da pretensão supõe, então, ação do destinatário do
dever jurídico, prestando, cumprindo, satisfazendo a obrigação. O exigir,
32
MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Tratado de Direito Privado. Rio de Janeiro: Borsoi,
1958, Tomo V, § 615.
33
MIRANDA, loc. cit.
34
MIRANDA, loc. cit.
35
MIRANDA, loc. cit.
18
que é o conteúdo da pretensão, não prescinde do agir voluntário do
obrigado [...]36.
Não há exigibilidade sem pretensão; o direito subjetivo, porém,
pode ser inexigível, diversamente do que consta do texto romano (Digesta, L,
108) em que se lê “Debitor intellegitur is, a quo invito exigi pecunia potest 37”,
pois se deve mesmo quando a dívida não é mais exigível 38 e a realização da
pretensão depende diretamente da vontade do devedor.
Em sendo assim, tem-se que é a ordem jurídica, o direito objetivo
de um estado, que pode outorgar a condição de sujeito de direito a alguém, o
que pode ser feito sem que se lhe reconheça ainda, ou já não mais lhe
reconheça, o poder de exigir a satisfação de tal direito39.
Portanto, com Ovídio da Silva, “pode haver direito subjetivo sem que
haja, ainda, ou não mais exista, a faculdade normal que seu titular deveria ter de
poder exigir a observância e a realização do próprio direito”40.
Como, com o exigir, isto é, com o exercício da pretensão, depende a
realização do direito do agir voluntário do devedor, resta patente que este pode
recusar-se a cumpri-la. Todavia, o Estado não pode aceitar que o ordenamento
36
SILVA, Ovídio Araújo Baptista da, Direito subjetivo, pretensão de direito material e ação. In Revista
da Ajuris, Porto Alegre, n. 29, nov/1983, p. 103.
37
“Devedor entende-se aquele de quem se pode exigir o devido contra a sua vontade (inuito)”.
(tradução nossa)
38
MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Tratado de Direito Privado. Rio de Janeiro: Borsoi,
1958, Tomo V, § 615.
39
SILVA, op. cit., p. 103.
40
SILVA, loc. cit.
19
resulte descumprido sem que de nenhuma forma se possa buscar o cumprimento
forçado da obrigação.
Para esse fim, inicialmente, no campo do direito material, há a ação de
direito material, que surge com a resistência do obrigado. Esta, porém, teve seu
exercício proibido pelo Estado para o particular. Com essa proibição, em
contrapartida, oferece o Estado ao jurisdicionado a ação de direito processual,
voltada contra si (Estado), por meio da qual se buscará o resultado equivalente ao
que teria havido, caso cumprido voluntariamente pelo obrigado.
Para que possamos analisar cada um desses institutos (ação material
e processual), faz-se mister, como um prius lógico, que antes analisemos a evolução
da tutela dos direitos subjetivos, o que passamos a fazer no item seguinte.
3 Evolução da Tutela dos Direitos Subjetivos
Com base em indícios, conjectura-se que a evolução da tutela dos
direitos se tenha dado em quatro etapas, desde uma justiça absolutamente
privada, passando por fases intermediárias, até a uma justiça quase que
totalmente pública 41.
Inicialmente, na que se pode chamar de primeira fase, os conflitos
entre particulares eram resolvidos precipuamente pela força. Nesse período,
41
ALVES, José Carlos Moreira. Direito Romano. 13. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002, v. 1, p.
183.
20
certas regras, estabelecidas gradualmente pelos costumes, distinguem a
autotutela legítima da violência, sendo esta vitanda.
A segunda fase consiste no chamado arbitramento facultativo, em
que o ofendido, em vez de utilizar-se da força para a realização de seu direito,
faz uso, de comum acordo com o ofensor, do julgamento por um terceiro, um
árbitro42.
No entanto, com a necessidade de se dar o arbitramento facultativo
apenas com a anuência do ofensor e como as mais das vezes não havia comum
acordo, o arbitramento passou a ser obrigatório, o Estado passou a obrigar os
litigantes a escolher um árbitro cuja decisão seria assegurada também pela
força estatal43.
A quarta e última fase consiste no afastamento quase que total do
emprego da justiça privada, passando a ser os conflitos resolvidos por
funcionários estatais, não mais havendo um árbitro a ser escolhido pelos
litigantes.
O direito romano conheceu, de certa forma, todas as quatro fases
da evolução da tutela dos direitos. A primeira está representada pela pena de
42
ALVES, José Carlos Moreira. Direito Romano. 13. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002, v. 1, p.
183.
43
ALVES, loc. cit.
21
talião, em que predomina a vingança privada, estabelecida pela lei das XII
tábuas44.
A segunda fase, de certo modo, sempre existiu no direito romano,
pois sempre foi permitida a autocomposição, por meio da escolha, pelos
litigantes, de um árbitro.
Todavia, foi a terceira fase, a do arbitramento obrigatório, a que
melhor caracterizou o direito romano. Vigora nesse período o ordo iudiciorum
priuatorum. Nesse ordo, costumam-se individuar dois grandes sistemas
processuais, o per legis actiones e o per formulas 45.
O processo per legis actiones, o mais antigo, é todo oral e
caracteriza-se pela grande rigidez do formalismo a ser observado pelos
litigantes. Tamanha é tal rigidez que Gaio refere ser possível um litigante perder
a demanda por ter dito uites (videira), e não arbor (árbore), como deveria ter
dito, conforme a lei, ainda que na questão se tratasse de videiras46.
44
Como exemplo, a Tabula VIII estabelece que: “Si membrum rupsit, ni cum eo pacit, talio esto.” Isto
é: Se arrancou o membro de alguém e não faz acordo com ele, que se lhe aplique a pena de talião
(tradução nossa). DOMINGO, Rafael. Textos de Derecho Romano. Navarra: Aranzadi, 2002, p. 29.
45
PUGLIESE, Giovanni. Giudicato Civile (storia). In Enciclopedia del diritto. Varese: A. Giuffre, 1958,
v. 18, p. 727.
46
Institutiones Gai. IV, 11. Actiones, quas in usu ueteres habuerunt, legis actiones appellabantur uel
ideo, quod legibus proditae erant, quippe tunc edicta praetoris, quibus conplures actiones introductae
sunt, nondum in usu habebantur, uel ideo, quia ipsarum legum uerbis accommodatae erant et ideo
immutabiles proinde atque leges obseruabantur. unde eum, qui de uitibus succisis ita egisset, ut in
actione uites nominaret, responsum est rem perdidisse, quia debuisset arbores nominare, eo
quod lex XII tabularum, ex qua de uitibus succisis actio conpeteret, generaliter de arboribus succisis
loqueretur.
22
Esse sistema tornou-se odioso, porém, em razão da sua rigidez
excessiva, como relata Gaio em suas Institutiones:
Mas todas essas ações da lei (legis actiones), paulatinamente, tornaram-se
odiadas. Pois, pelo excessivo formalismo dos antigos que criaram essas
normas, podia perder a demanda quem cometesse o menor erro. Essas
legis actiones, então, foram abolidas pela lei Aebutia e por duas leis Júlias,
passando-se a litigar por fórmulas47 (tradução nossa).
Como se lê na passagem acima transcrita, com a Lex Aebutia, do
século II a.C., aproximadamente, iniciou-se a transição do sistema das legis
actiones para o formulário, ou per formulas 48. Nesse sistema do processo
romano, era criada uma fórmula pelo praetor, conforme a qual o iudex (árbitro)
julgaria a lide. A fórmula torna o processo escrito e menos formalista, não mais
havendo palavras imutáveis ou gestos rituais 49.
Tanto o sistema per legis actiones quanto o per formulas fazem
parte, como predito, do ordo iudiciorum priuatorum, típico exemplo de
arbitramento obrigatório, sendo-lhe característico a divisão da instância em duas
etapas sucessivas. Uma, perante o pretor, chamada in iure (aqui significando
perante o tribunal). Nessa fase, o pretor ouvia as partes e nomeava um cidadão
como árbitro (iudex). Com essa indicação de um árbitro, passava-se à fase
seguinte, a chamada apud iudicem, ou perante o iudex, que agora julgaria a
lide, condenando ou absolvendo o réu.
47
G. IV, 30. Sed istae omnes legis actiones paulatim in odium uenerunt. namque ex nimia subtilitate
ueterum, qui tunc iura condiderunt, eo res perducta est, ut uel qui minimum errasset, litem perderet;
itaque per legem Aebutiam et duas Iulias sublatae sunt istae legis actiones, effectumque est, ut per
concepta uerba, id est per formulas, litigaremus.
48
ALVES, José Carlos Moreira. Direito Romano. 13. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002, v. 1, p.
205-6.
49
Ibidem, p. 206.
23
A quarta e última fase do processo civil romano começou a estender
seu campo de aplicação entre o fim do século II e o início do século III d.C. Seu
início, porém, deu-se no final da idade de augusto (talvez antes, como afirma
Pugliese50), quando era aplicada a casos específicos.
A cognitio extra ordinem, cujo nome se deve justamente por ser
excepcional ao ordo iudiciorum priuatorum vigente à época de seu início, conviveu
por vários séculos com o processo per formulas51.
Na cognitio extraordinária deixa de existir a divisão da instância em
duas fases, passando a administração da justiça a ser totalmente púbica. Deixa,
portanto, de haver a figura do iudex, árbitro privado, em verdade um cidadão
romano. Nas palavras de Danilo Knijnik, na extraordinaria cognitio, o juiz-cidadão é
suplantado pelo juiz-funcionário52.
Nesse
momento
histórico,
delineia-se
o
processo
como
é
hodiernamente conhecido, isto é, um processo em que predomina o caráter público
da administração da justiça e a proibição da autotutela. Daqui, daremos um salto
para o século XIX, visto que não há interesse, para o estudo de nosso objeto, a
análise das vicissitudes vividas pelo processo durante o chamado direito intermédio.
Na segunda metade do século XIX, mais precisamente em 1868,
50
PUGLIESE, Giovanni. Giudicato Civile (storia). In Enciclopedia del diritto. Varese: A. Giuffre, 1958,
v. 18, p. 745.
51
ALVES, José Carlos Moreira. Direito Romano. 13. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002, v. 1, p.
241.
52
KNIJNIK, Danilo. Os standards do convencimento judicial: paradigmas para o seu possível controle.
Revista Forense, Rio de Janeiro (353): 15-51, jan/fev/2001, p. 22.
24
Oskar Von Bülow lança a obra, intitulada teoria das exceções e dos pressupostos
processuais, que forneceu os fundamentos iniciais para a independência dogmática
do processo53.
O elemento que vem a dar ao processo essa autonomia científica é
justamente a idéia de uma relação jurídica processual diversa da relação jurídica
material, que seria o objeto daquela.
Bülow procura demonstrar que o processo é uma relação jurídica
dinâmica, de direito público e que se forma entre o estado e as partes. Conforme
Bülow:
A relação jurídica processual se distingue das demais relações de direito
por outra característica singular, que pode ter contribuído, em grande
parte, ao desconhecimento de sua natureza de relação jurídica contínua. O
processo é uma relação jurídica que avança gradualmente e que se
desenvolve passo a passo54.
No dizer de Ovídio Baptista, Bülow defronta processo como ciência e
procedimento como praxismo anacrônico55. Seguindo, afirma o ilustre processualista
gaúcho que:
O que interessa à nova ciência é o estudo da relação processual,
enquanto tal, através do exame das condições que lhe determinam o
nascimento e das regras sob as quais a relação jurídica de direito público
desenvolve-se, independentemente dos conteúdos concretos e, muito
especialmente,
abstraindo
das
individualidades
procedimentais,
determinadas pelas exigências, porventura impostas pelo direito litigioso56.
Nesse momento surge, então, a construção teórica da ação processual
53
SILVA, Ovídio Baptista da. Jurisdição e Execução na tradição romano-canônica. 2 ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 1997, p. 161.
54
BÜLOW, Oskar von. Teoria das Exceções e dos Pressupostos Processuais. Tradução e notas:
Ricardo Rodrigues Gama. Campinas: LZN, 2003, p. 6.
55
SILVA, op. cit., p. 162.
56
SILVA, loc. cit.
25
como dispositivo indispensável à formação da relação processual, considerada
como uma categoria abstrata, porquanto atribuída indistintamente a todos os
interessados, independentemente de terem o direito alegado no processo57.
Entretanto, para que se possa entender com mais clareza os conceitos
de ação de direito material e de ação de direito processual, abordaremos as duas
juntamente no próximo item.
4 Ação de Direito Material e Ação de Direito Processual
O conceito de ação é sem dúvida um dos mais intrincados da
ciência jurídica, tendo dado ensejo a inúmeras disputas entre aqueles que se
aventuraram a conceituá-la.
Como afirmou Giovanni Pugliese na introdução que fez à tradução
italiana da Polêmica sobre a actio de Windscheid e Muther, antes de
Windscheid a doutrina se dava por satisfeita com a definição de Celso, segundo
a qual nihil aliud est actio quam ius quod sibi debeatur iudicio persequendi. A
possibilidade de uma divergência entre o que os romanos chamavam de actio e
o que os modernos entendem por ação não se delineava, até então, de forma
séria58.
57
SILVA, Ovídio Baptista da. Jurisdição e Execução na tradição romano-canônica. 2 ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 1997, p. 163.
58
WINDSCHEID, Bernhard y MUTHER, Theodor. Polemica sobre la “actio”. Buenos Aires: EJEA,
1974, p. XI.
26
Tampouco, segue Pugliese, havia dúvida quanto ao sujeito passivo
da actio; considerava-se óbvio identificá-lo com o adversário. Quanto à relação
entre o direito subjetivo e a ação, aqui sim, havia divergência entre os que,
como Savigny, consideravam a actio como um novo direito proveniente da lesão
do direito primitivo e aqueles que, como Puchta, consideravam-na como um
anexo do direito subjetivo59.
Windscheid refere que à corrente que considerava a actio como um
anexo do direito se contrapôs a que a considerava como o próprio direito em
atuação ou em ação para fazer-se valer; aquela defendida por Puchta e esta por
Böcking e Kierulff60.
Entretanto, segue o célebre pandectista, essas teorias, embora
eliminando alguns erros de idéias anteriores, não foram satisfatórias no definir a
actio romana. Para Windscheid, “así como la actio no es el derecho a la tutela
de otro derecho, nacido de la lesión de éste, tampoco es la facultad de requerir
tutela para el derecho en caso de lesión”61.
Assim, define ele, por fim, que “la actio es la facultad de imponer la
propia voluntad mediante la persecución judicial” 62, aduzindo, a seguir, que “la
actio está en lugar del derecho; no es una emanación de éste”63.
59
WINDSCHEID, Bernhard y MUTHER, Theodor. Polemica sobre la “actio”. Buenos Aires: EJEA,
1974. p. XII.
60
WINDSCHEID, op. cit., p. 7.
61
WINDSCHEID, loc. cit.
62
WINDSCHEID, loc. cit.
63
WINDSCHEID, op. cit., p. 10.
27
Pugliese, referindo-se a essa definição de Windscheid, afirma que
dela só se pode lamentar por sua indeterminação ou inexata determinação do
objeto da “persecutio” judicial. Em suas palavras:
[...] egli definisce per la prima volta l’actio come ‘la facoltà di far valere
la propria volontà mediante la persecuzione giudiziaria’, defiizione in
cui è solo da lamentare, a nostro parere, l’indeterminatezza o l’inesatta
determinazione dell’oggetto della ‘persecutio’ [...] 64.
A maior contribuição, todavia, da monografia de Windscheid 65 foi a
de demonstrar que o conceito de actio romano era estranho ao direito moderno
e não coincidia, em absoluto, com o conceito de ação (Klagerecht)66. Identificou
ele na actio romana o equivalente ao moderno conceito de pretensão
(Anspruch) e a delineou, pela primeira vez, de forma clara, como distinta da
ação em sentido processual e, por outro lado, como não-identificável com o
direito subjetivo, do qual seria uma emanação67.
Dessarte, como assevera Pugliese:
“[...] no es exagerado decir que la misma figura de la acción abstracta,
dibujada primeramente por Degenkolb y por Plósz y concebida
después de manera diversa por los estudiosos del proceso hasta estos
últimos tiempos, es una consecuencia lógica del planteamiento de
Windscheid.”68
No
entanto,
na
monografia
de
Windscheid,
encontram-se
importantes contradições, sendo a principal delas a de definir a actio ora como
pretensão (Anspruch), ora como o poder de ‘fazer valer’ a pretensão em juízo.
64
PUGLIESE, Giovanni. Actio e Diritto Subiettivo. Milano: Giuffré, 1939, p. 10.
Intitulada Die Actio des Römischen Civilrechts vom Standpunkt des heutigen Rechts e que está
reproduzida na Polemica sobre la “actio”.
66
WINDSCHEID, Bernhard y MUTHER, Theodor. Polemica sobre la “actio”. Buenos Aires: EJEA,
1974, p. XIV.
67
WINDSCHEID, loc. cit.
68
WINDSCHEID, op. cit., p. XV.
65
28
Como afirmou Pugliese:
Il Windscheid ha palesemente davanti a sè due concetti, quello del
potere di agire in giudizio per la esecuzione di um Anspruch e quello
dell’Anspruch, inteso come diritto di pretendere da altri um certo
comportamento.69
Não é possível, no dizer de Pugliese, contemperar essas duas
situações jurídicas, pois pertencem dogmaticamente a campos diversos, sendo
a pretensão voltada para a vontade do sujeito passivo cujo comportamento
constitui seu objeto, enquanto a outra proposição considera a actio como o
poder de operar a tutela jurisdicional, prescindindo da vontade do sujeito
passivo e tendo por fim a atuação de uma determinada sanção. Assim, em suas
palavras:
Ma un simile contemperamento non è concepibile, perchè le due
situazioni giuridiche appartengono dogmaticamente a due campi
diversi: l’uno, l’Anspruch, del cui concetto ora non si discute
l’ammissibilità, si rivolge alla volontà del subietto passivo ed ha per
oggetto un suo contegno, l’altra, il potere di far operare la tutela
giudiziaria, prescinde da quella volontà ed ha per oggetto l’attuazione
di una determinata sanzione.70
A confusão só fez aumentar quando August Thon 71 afirmou que “o
direito subjetivo corresponderia à tutela outorgada a seu titular, como se o
direito fosse a tutela e não a situação existencial que a justifica”72, como
assevera Ovídio Baptista.
69
PUGLIESE. Actio e Diritto Subiettivo. Milano: Giuffré, 1939. p. 11.
Ibidem, p. 11.
71
THON, Augusto. Norma giuridica e diritto soggettivo: indagini di teoria generale del diritto. 2. ed.
Padova: Cedam, 1951, passim.
72
SILVA, Ovídio Araújo Baptista da. Curso de Processo Civil. 6 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2002, v. 1, p. 79.
70
29
Giovanni Pugliese, referindo-se a essa conceituação de direito
subjetivo, afirma que o conceito, segundo o qual o direito seria em substância
um poder reconhecido ao privado para a tutela de um interesse seu, “se accolto,
condurrebbe logicamente a negare la distinzione tra diritto subiettivo e azione e
a vedere assorbito quello in questa”73.
Quando Liebman, ao definir a teoria civilista da ação, afirma que “por
muchos siglos [...], la acción era considerada nada más que um aspecto del mismo
derecho subjetivo privado, que la parte actora afirmaba pertenecerla”74, resulta-nos
clara a confusão criada por diversas doutrinas que tentaram definir o conceito de
ação.
A confusão começa com a chamada teoria civilista da ação, defendida
por grandes juristas do século XVIII e XIX, como Savigny e Pothier, para a qual a
ação não passava de um aspecto do próprio direito subjetivo, um meio técnico para
exercê-lo em juízo. Como assevera Liebman, “[…] no había un concepto propio,
autónomo de la acción. Acción y derecho subjetivo aparecían una sola unidad”75.
Liebman segue e afirma que, para a teoria civilista, a ação parece ser
nada mais que o próprio direito quando entra em guerra a combater por sua própria
existência. Ela não seria nada além do direito subjetivo em um aspecto novo que
toma com a resistência à sua satisfação. Para o processualista italiano:
La acción no parece nada más que el mismo derecho subjetivo que la
73
PUGLIESE. Actio e Diritto Subiettivo. Milano: Giuffré, 1939, p. 8.
LIEBMAN, Enrico tullio. Concepto de la acción civil. Revista de estudios juridicos y sociales,
Montevideo, ano XIII, Tomo XIII, n. 70, 1940, p. 219.
75
Ibidem, p. 220.
74
30
parte afirma pertenecerle, cuando entra en guerra, se pode el casco,
empuña la espada y disciende al terreno a combatir por su propia
existencia. No sería, pues, nada de distinto al derecho subjetivo, sino el
mismo derecho subjetivo en un aspecto nuevo que toma al encontrarse no
satisfecho y al querer obtener satisfacción por medio del proceso76.
Contudo, quando reconhecemos, como com razão afirma Liebman,
“que la jurisdicción es una actividad que persigue un distinto interés del simple
interés de ayudar a las partes, un interés público que tiene el estado de ver
actuando […] el orden jurídico”77, vemos ser insuficiente e confusa essa
conceituação.
Diante disso, outras teorias sobrevieram e contestaram-na, afirmando
a autonomia da ação, ao verificarem que casos ocorriam em que ao final se
constatava não haver direito, mas houvera uma movimentação da máquina estatal,
que se chamava ação. Assim, concluindo que “la acción no puede ser simplemente
el mismo derecho subjetivo en un aspecto especial”78, formularam-se teorias
defendendo a autonomia da ação frente ao direito subjetivo.
Um argumento para essa autonomia, afirma Liebman, é a diferença de
conteúdo do direito subjetivo e da ação. Aquele “tiende a un comportamiento
determinado de otra persona. La acción, en cambio, tiene por fin obtener un
determinado efecto frente a esta misma parte, pero por intermedio de la actividad de
un órgano público”79.
76
LIEBMAN, Enrico tullio. Concepto de la acción civil. Revista de estudios juridicos y sociales,
Montevideo, ano XIII, Tomo XIII, n. 70, 1940, p. 220.
77
Ibidem, p. 221.
78
Ibidem, p. 221.
79
Ibidem, p. 221.
31
Já aqui podemos ver claramente a confusão posta, pois se está a
separar a ação do direito subjetivo, colocando este no campo do direito substancial,
material, e aquela, no campo do direito processual, instrumental, sem, contudo,
desvinculá-la do seu caráter substancial: nisso reside a confusão.
Wach inaugura a doutrina da ação como direito à tutela jurídica. Para
ele, a jurisdição tem o fim de defender os direitos subjetivos por meio da atividade
dos órgãos estatais. À parte que tenha um direito insatisfeito nasceria um novo
direito contra o Estado80 de obter o que lhe seria devido caso o obrigado tivesse
cumprido o seu dever.81
A teoria de Wach é conhecida como concretista, pois, por não se ter
apercebido da dualidade de ações (uma de direito material e outra processual),
equivocadamente sustentou que apenas teria ação a parte que ao final efetivamente
tivesse razão.
O mérito de sua teoria está na distinção entre ação e direito subjetivo,
além de ter posto em evidência o caráter público da ação (que mais tarde
chamaríamos de ação processual), e por conseguinte, do processo. Como comenta
Liebman:
La dirección de la acción, contra el Estado, destaca cabalmente la
distinción, la diferencia, entre el derecho subjetivo y la acción. El derecho
subjetivo particular lo tiene la parte contra el adversario; la acción, según
esta teoría, pertenece a la parte contra el Estado. Desde muchos siglos el
Estado ha prohibido la defensa privada de los derechos, y ofrece, en
80
Segundo Giovanni Pugliese, o primeiro a afirmar ser dirigida contra o estado a ação foi Hasse. Cf.
WINDSCHEID, Bernhard y MUTHER, Theodor. Polemica sobre la “actio”. Buenos Aires: EJEA, 1974,
p. XII.
81
LIEBMAN, Enrico tullio. Concepto de la acción civil. Revista de estudios juridicos y sociales,
Montevideo, ano XIII, Tomo XIII, n. 70, 1940, p. 224.
32
cambio, la actividad de sus órganos para tutelar los derechos de los
ciudadanos.82
A teoria civilista, embora sem distinguir claramente e com alguns
equívocos, oferece, em verdade, um conceito de ação de direito material. Já a
doutrina de Wach oferece os elementos para a formação de um conceito de ação
processual, o que veio a ser aperfeiçoado pela teoria que Degenkolb e outros,
posteriormente, lançam, segundo a qual, a ação é pública e dirigida contra o Estado,
sendo, todavia, abstrata, isto é, independente de ser ou não o autor titular do direito
subjetivo em questão.
Contudo, é a seguinte frase de Pugliese que resume a definição de
ação de direito material, pois nela vemos claramente que, em origem, a ação
era a própria realização da invasão na esfera do devedor, feita pelo credor. Nas
palavras do preclaro romanista:
In origine l’agere era proprio il compimento di quell’atto di aggressione
del debitore, che si doveva poi venire a configurare come sanzione
dell’obbligo di prestare 83.
Como vimos em item anterior, a pretensão é a possibilidade de
exigir que o devedor cumpra a obrigação (lato sensu). Assim, resta evidente que
com o exercício da pretensão, a realização da obrigação, isto é, o seu
cumprimento, depende de um agir voluntário (e não espontâneo, pois se assim
fosse não seria mister o exercício da pretensão, ou seja, do exigir) do devedor.
82
LIEBMAN, Enrico tullio. Concepto de la acción civil. Revista de estudios juridicos y sociales,
Montevideo, ano XIII, Tomo XIII, n. 70, 1940, p. 224.
83
PUGLIESE. Actio e Diritto Subiettivo. Milano: Giuffré, 1939, p. 24.
33
É, porém — nas palavras de Ovídio Baptista da Silva —, quando o
titular da pretensão exige do obrigado a satisfação e tal exigência se torna
infrutífera, por deixar o sujeito passivo de cumprir o dever jurídico, que nasce ao
titular da pretensão a ação de direito material 84. Esta, segue ele, “é o agir – não
mais o simples exigir – por meio do qual o titular do direito realiza-lo-á por seus
próprios meios, ou seja, independentemente da vontade ou de qualquer conduta
positiva ou negativa voluntária do obrigado”85.
No momento em que o obrigado (lato sensu) se recusa a satisfazer
a obrigação (também lato sensu), nasce a ação de direito material, quando
passa o titular do direito subjetivo “a poder agir para a satisfação, sem contar
mais com a ação voluntária do obrigado”. Concluindo, Ovídio Baptista da Silva,
define que “a ação de direito material é, pois, o exercício do próprio direito por
ato de seu titular, independentemente de qualquer atividade voluntária do
obrigado” 86.
Entretanto, como bem diz Luiz Guilherme Marinoni, o exercício da
ação de direito material, que se encontra no campo do direito substancial e não
processual, foi proibido pelo Estado:
Como foi proibida a autotutela, e o Estado tem o dever de conferir ao
cidadão o mesmo resultado que se verificaria caso o agir privado (a
ação de direito material) não estivesse proibido, é adequado e
politicamente generoso o estudo do direito de ação como o direito à
invocação do poder do Estado para que este realize a ação de
direito material que ele mesmo proibiu, utilizando-se dos
84
SILVA, Ovídio Araújo Baptista da. Curso de Processo Civil. 6 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2002, v. 1, p. 80.
85
Ibidem, p. 80.
86
Ibidem, p. 81.
34
instrumentos processuais que devem estar adequadamente
preordenados para atender ao direito material87 (grifo nosso).
Em contrapartida, o Estado tomou a si o exercício e administração
da justiça. Como diz Liebman, “el Estado assume como funcción propia la
jurisdicción”88 e como “no hay jurisdicción sin acción” 89, deve a parte requerer a
atuação estatal para a realização do direito que, não atendido pelo devedor (lato
sensu), está ele proibido de realizar por si mesmo.
O meio que o Estado põe à disposição dos jurisdicionados é a
ação, esta, porém, como o Estado não tem a obrigação de prestar uma
sentença de procedência, como sustenta Liebman90, é abstrata, quer dizer, é
concedida indiferentemente a qualquer jurisdicionado, pois apenas ao final da
prestação jurisdicional, o que se dá com ao exercício da ação processual, é que
se verificará se a parte realmente é titular do direito que alega. Ela é, ademais,
dirigida contra o Estado, e não contra o adversário, evidenciando, assim, o seu
caráter público.
Assim, a ação processual é o motor da jurisdição 91, é por meio dela
que se move a máquina Estatal responsável por buscar a realização, por meio
de provimentos e técnicas próprias, do resultado equivalente ao que teria o
titular do direito violado caso realizado voluntariamente pelo devedor.
87
MARINONI, Luiz Guilherme e ARENHART, Sérgio Cruz. Manual do Processo de Conhecimento. 2.
ed. São Paulo: RT, 2003, p. 67.
88
LIEBMAN, Enrico tullio. Concepto de la acción civil. Revista de estudios juridicos y sociales,
Montevideo, ano XIII, Tomo XIII, n. 70, 1940, p. 225.
89
Ibidem, p. 227.
90
Ibidem, p. 225.
91
Ibidem, p. 225. Esta acción representa lo que hay de vital en el proceso, lo hace posible y
necesario al mismo tiempo.
35
A ação de direito material, por sua vez, é o elemento que dará
suporte ao provimento que busque o resultado equivalente ao cumprimento do
direito. Suporte porque, em verdade, o que o juiz verifica, as mais das vezes, é
se se faz presente a ação de direito material, e não o direito, pois o direito
subjetivo em si pode estar desprovido de pretensão, isto é, não ser ainda ou
não ser mais exigível (pretensão) e, mesmo que exigível seja, se não houve
resistência à pretensão (o que faz nascer a ação de direito material), não fará
jus o jurisdicionado ao provimento equivalente à realização do direito por falta
de interesse (necessidade de recorrer ao Estado, pois o direito, nas palavras de
Pontes de Miranda, com o direito subjetivo realiza-se a política de se deixar aos
indivíduos o cuidar dos direitos que têm, dos bens que lhes tocam92).
Casos há em que o que se verifica para a prestação jurisdicional
não é a presença da ação de direito material, mas, sim, busca-se o exercício da
pretensão em juízo. Assim, apenas excepcionalmente haverá prestação
jurisdicional sem que se verifique a existência da ação de direito material, sendo
esta, portanto, o elemento material que justifica o provimento jurisdicional cujo
resultado seja equivalente à realização, não do direito subjetivo, mas da ação
de direito material.
92
MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Tratado de Direito Privado. Rio de Janeiro: Borsoi,
1958, Tomo V, § 565.
36
II – PRESSUPOSTOS ESPECÍFICOS
5 Títulos de Crédito
5.1 Conceito
Segundo a conceituação de Vivante, o título de crédito é o
documento necessário para o exercício do direito literal e autônomo nele
mencionado93.
Como refere Ascarelli, “é Eineccio que, no século XVIII, estabelece
o princípio da cambial como contrato literal, chegando até a afirmar a abstração
da obrigação cambiária. Surge, assim, o conceito de literalidade da obrigação
cartular”94.
Resta evidente a importância dessa literalidade para a função
prática que os títulos de crédito são chamados a cumprir: a circulação de
direitos 95. Como assevera Ascarelli:
Essa circulação somente é possível quando o direito que lhe é objeto
esteja exatamente delimitado e definido, ou melhor, circunscrito,
relativamente ao conjunto das relações econômicas havidas entre os
seus sujeitos originários.96
Essa delimitação de que fala Ascarelli, por certo, é por meio da
literalidade que se alcança.
93
ASCARELLI, Tullio. Teoria Geral dos Títulos de Crédito. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1969, p. 19.
Ibidem, p. 36.
95
Ibidem, p. 38.
96
Ibidem, p. 39.
94
37
Desse modo, as características dos títulos de crédito são, em
verdade, impostas pelas exigências econômicas da circulação a que eles se
destinam97.
Assim, pois, a literalidade como característico essencial dos títulos
de crédito tem sua explicação na autonomia da declaração nele mencionada, a
qual está submetida exclusivamente à disciplina que decorre das cláusulas do
próprio título98, abstraindo da relação fundamental. Consoante Ascarelli:
[...] os característicos diferenciais dos títulos de crédito estão, de um
lado, na distinção entre direito cartular e relação fundamental e no
caráter constitutivo do título; de outro lado, na autonomia da posição
dos sucessivos titulares do direito99.
Dessarte, o título de crédito é um documento constitutivo, cuja
declaração cartular é distinta da do negócio fundamental 100, sendo aquela
verdadeira fonte de um direito autônomo e distinto do decorrente da relação
fundamental e das demais convenções extracartulares101.
A relação fundamental é o negócio jurídico que justifica a criação
do título (por emissão ou saque) ou a sua circulação. Com a transferência do
título, o que circula é direito cartular, permanecendo o negócio causal de
emissão, por exemplo, entre as partes primeiras. Assim, pode-se afirmar que
97
ASCARELLI, Tullio. Teoria Geral dos Títulos de Crédito. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1969, p. 40.
Ibidem, p. 41.
99
Ibidem, p. 299.
100
MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Tratado de Direito Privado. Rio de Janeiro: Borsoi,
1958, Tomo XXXIV, § 3828, refere que “o negócio jurídico básico não é a única fonte de relações
jurídicas básicas. Em verdade, o título de crédito, abstrato ou não, pode ter como base dívida oriunda
de fato jurídico stricto sensu, ou de ato-fato jurídico, ou de ato jurídico stricto sensu”.
101
ASCARELLI, op. cit., p. 44.
98
38
com a circulação do título há a abstração frente ao negócio que deu causa à sua
criação e também ao que deu causa à sua circulação.
Como assevera Ascarelli, “cada sucessivo titular da cambial goza
quer do crédito cambiário, quer do decorrente da relação fundamental em que
foi parte; este último subsiste, apesar da emissão da cambial [...]”102.
Dessa forma, segue o célebre comercialista italiano, o credor que
perder a ação cambiária poderá recorrer à do negócio fundamental, esta sujeita
aos prazos da prescrição ordinária. Sustenta, arrazoadamente, que “se a
cambial não tiver sido paga, o credor poderá exercitar a ação do negócio
fundamental em vez da cambiária ou cumular ambas”103.
Como se vê, a cártula não é mero documento probatório da relação
causal, pois, se assim fosse, com a perda do direito cambiário, haveria
conjuntamente a perda do direito fundamental.
Como bem afirma Ascarelli, o direito cambiário se distingue do
direito derivado da relação fundamental:
Ao possuidor da cambial cabe quer o direito cambiário, quer o direito
causal da sua relação fundamental com quem lhe transmitiu o título,
mas, enquanto o primeiro se transfere com a circulação cambial, o
segundo, isto é, o da relação fundamental, fica pertencendo ao seu
titular originário.104
102
ASCARELLI, Tullio. Teoria Geral dos Títulos de Crédito. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1969, p. 47.
ASCARELLI, loc. cit.
104
Ibidem, p. 48.
103
39
Conclui-se assim que o direito cambiário é autônomo e distinto do
que decorre da relação fundamental, isto é, trata-se de uma nova, distinta e
autônoma relação jurídica de direito substancial, dando ensejo, portanto, a um
direito subjetivo cartular e a um dever, a ele correlato; ademais, haverá também
uma pretensão cambiária e uma ação de direito material cambiária, sujeita a
prescrição com prazo especial, isto é, diversa da do direito comum. Não fosse
assim, falharia ele à função econômica a que se destina105.
5.2 Ação Cambiária
Como afirma Pontes de Miranda, não é somente a ação de cobrança
que é ação cambiária, mas o são, também, todas as ações que têm fundamento no
direito cambiário106. Diante disso, delimitaremos, desde já, o nosso estudo à ação
cambiária de cobrança por ser esta que interessa como questão prévia ao estudo do
objeto do presente trabalho.
Conforme referimos linhas acima, a relação cartular é abstrata e
autônoma, independente, portanto, da relação jurídica fundamental ou causal (que
deu causa à emissão, saque ou circulação do título de crédito). Assim, cada uma
dessas relações terá vida independente da outra. Cada uma terá um direito subjetivo
com um correlato dever jurídico. Cada um desses direitos subjetivos (o cartular e o
causal) terá uma pretensão distinta; por exemplo, um pode ser dependente da
verificação de uma condição e o outro ser exigível desde a sua constituição. Cada
105
MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Tratado de Direito Privado. Rio de Janeiro: Borsoi,
1958, Tomo XXXIV, § 3.827.
106
MIRANDA, Tratado de Direito Cambiário. Campinas: Boockseller, 2000, Tomo I, p. 566.
40
uma terá, quando resistida a sua pretensão, de forma independente também, uma
ação de direito material.
É a essa ação de direito material, que é o plus que se agrega ao direito
subjetivo cambiário, que se chama ação cambiária; a seu turno, à ação de direito
material oriunda do direito fundamental dá-se o nome de ação causal.
Vale salientar que cada uma dessas ações tem vida autônoma,
podendo uma viver mais do que a outra ou ter limitações ou vantagens que à outra
não se atribuem.
Em sendo elas independentes107, pode ocorrer de uma existir e a outra
não mais. No caso dos títulos dados em pagamento pro soluto, verbi gratia, há a
extinção da relação jurídica causal, de modo que, obviamente, extinguindo o direito
subjetivo, juntamente se eliminam a pretensão e a ação causal (de direito material,
vale lembrar).
Como bem coloca Norberto Mac-Donald, citando Michel Cabrillac:
A autonomia estabelecida entre a relação fundamental e a relação
cambiária e entre as ações que lhes são pertinentes encontra seu
prolongamento natural no terreno processual. Cada ação, repousando
sobre uma causa que lhe é própria, deve corresponder a uma demanda
distinta. Em conseqüência, o credor que, em primeira instância, assentou
sua demanda sobre uma das relações não pode invocar a outra em
apelação; ele introduziria um pedido novo que não poderia ser recebido (La
Lettre de Change dans la Jurisprudence, n° 59, A)108.
107
MAC-DONALD, Norberto da Costa Caruso. Ação Cambiária. In Separata da Revista de Estudos
Jurídicos da UNISINOS, v.6, n.17, 1976, p. 110, citando Giuseppe Gualtieri e Ignacio Winizky, afirma
que essa independência é relativa, pois implica influências recíprocas, sendo que o cumprimento de
qualquer uma extingue a outra e o duplo cumprimento constitui enriquecimento sem causa.
108
MAC-DONALD, op. cit., p. 111.
41
Concluindo, o professor da UFRGS, ao apresentar exemplo em que
uma nota promissória é emitida em razão de um contrato de mútuo, este
devidamente instrumentalizado, inclusive constituindo título executivo, nos termos do
artigo 585, II, do Código de Processo Civil brasileiro, afirma que:
[...] tendo, no exemplo figurado, a nota promissória sido pro solvendo e não
pro soluto, a sua emissão não extingue a ação derivada da relação
fundamental. Dispõe, pois, “B” de duas ações contra “A”: a ação cambial,
baseada na nota promissória, e a ação causal, com fundamento no
contrato; [...]109
Convém salientar que distintas são as ações causal e cambiária
(ambas de direito material) e que nenhuma delas se confunde com a ação de direito
processual. Esta é voltada contra o estado, para que este preste jurisdição e
forneça, ao verdadeiro titular da ação de direito material (o que se verificará após a
cognição ou sobre a qual haja uma presunção de accertamento tornando
desnecessária a cognição), seja ela qual for, o resultado equivalente à realização do
direito subjetivo.
6 Prescrição
6.1 Origem
É nas antigas fórmulas do processo romano que se encontra a
origem da palavra prescrição110. Em Gaio (IV, 132)111, vê-se que o vocábulo
109
MAC-DONALD. Norberto da Costa Caruso. Ação Cambiária. In Separata da Revista de Estudos
Jurídicos da UNISINOS, v.6, n.17, 1976, p. 111.
110
GALDI, Matteo. Della prescrizione: trattato di diritto civile e commerciale. Napoli: Francesco
Giannini, 1905. v. 1, p. 9.
111
Gaio, 4, 132. “Praescriptiones scilicet appellatas esse ab eo, quod ante formulas praescribuntur,
plus quam manifestum est.” As prescrições são assim chamadas, evidentemente, em razão de que
são escritas antes das fórmulas. (tradução nossa)
42
praescriptio se constituiu em razão de ser escrita antes das fórmulas, isto é,
prae (antes) scriptio.
Segundo Giovanni Pugliese 112, praescriptio é uma transliteração do
termo grego paragrafh113, ou paragraphé, feita pelos tradutores dos papiros
gregos para o latim, sendo a paragrafh um meio de defesa — conhecido pelo
direito grego e por ele amplamente regulado — concedido ao possuidor atual.
O processo formulário romano teve início com a instituição do
praetor peregrinus (242 a. C.), momento de passagem para o período préclássico, diante do qual se não podia postular per legis actiones, mas, sim, com
regras correspondentes ao que posteriormente se chamou processo formulário
ou
per
formulas
aut
per
concepta
verba.
Esse
processo
formulário
provavelmente já iniciara algumas décadas antes face ao praetor urbanus.114
Entretanto, não significou a instituição do processo formulário a
derrocada absoluta e total do processo per legis actiones, que, ao invés, teve
um certo abrandamento em sua rigidez, principal crítica a ele feita115.
A possibilidade de se impor um fim à ação pelo decurso do tempo
contradiz o princípio da perpetuidade dos direitos, elemento essencial do direito
quiritário. Assim, as legis actiones são perpétuas, tendo limitação no tempo
112
PUGLIESE, Giovanni. Istituzioni di Diritto Romano. 3. ed. Torino: Giappichelli, 1991, p. 471.
BAILLY, A. Dictionnaire Grec Français. Paris: Hachette, 2000, p. 1459: “Exception,
moyen dilatoire”.
114
PUGLIESE, Giovanni. Istituzioni di Diritto Romano. 3. ed. Torino: Giappichelli, 1991, p. 266-267.
115
Cf. GAIO, IV, 30.
113
43
apenas as ações introduzidas pelo pretor; porém, não são todas nem pelo
mesmo motivo limitadas pelo tempo116.
No processo formulário não havia um sistema que se antepusesse
ao princípio da perpetuidade das ações, sendo esta a regra. As ações
pretorianas, por sua vez, eram freqüentemente limitadas no tempo. Nas fontes,
encontramos a seguinte passagem de Gaio:
110. Quo loco admonendi sumus eas quidem actiones, quae ex lege
senatusue
consultis
proficiscuntur,
perpetuo
solere
praetorem
accommodare, eas uero, quae ex propria ipsius iurisdictione pendent,
plerumque intra annum dare. 111. Aliquando tamen et perpetuo eas dat,
uelut quibus imitatur ius legitimum, quales sunt eae, quas bonorum
possessoribus ceterisque, qui heredis loco sunt, accommodat. furti quoque
manifesti actio, quamuis ex ipsius praetoris iurisdictione proficiscatur,
perpetuo datur; et merito, cum pro capitali poena pecuniaria constituta sit.
117
No entanto, no âmbito da cognitio extraordinem a prescrição
encontrou um terreno mais favorável de desenvolvimento, assumindo o amplo e
atécnico
significado
de
objeção
levantada
pelo
réu
em
sua
defesa,
correspondendo à exceptio formularia118.
As duas expressões serão usadas indiferentemente no direito pósclássico e justineaneu, prevalecendo o emprego do termo praescriptio para a
exceção fundada no tempo119.
116
AMELOTTI, Mario. Prescrizione (dir. Rom.). In Enciclopedia del diritto. Varese: A. Giuffre, 1958, v.
35, p. 36.
117
Gaio, IV, 110-111.
118
AMELOTTI, op. cit, p. 38.
119
AMELOTTI, loc. cit.
44
Foi, contudo, com Teodósio II (408 a 450 d.C.) que surgiu a
submissão de todas as ações à prescrição, à exceção de pouquíssimas120.
Malgrado Teodosio II fosse imperador do Oriente, a prescrição teodosiana se
impôs no Ocidente, por Valentiniano III (424 a 455 d.C.), encontrando
acolhimento nas leis imperiais e no direito vulgar, penetrando inclusive nas
legislações bárbaras e no nascente direito da Igreja. Nas palavras de Mario
Amelotti:
La prescrizione teodosiana s’impone in Occidente, ove trova
accoglienza e conferma nelle leggi imperiali e nel diritto volgare,
penetrando anche nelle legislazioni barbariche e nel nascente diritto
della Chiesa. 121
A prescrição introduzida por Teodósio II limitava a existência da
ação (vivendi ulterius non habeant [actiones] facultatem) em trinta anos (CTh. 4,
14, 1. De actionibus certo tempore finiendis):
Codex Theodosianus, 4, 14, 1, 2. As ações, então, que não foram
movidas antes, pelo silêncio contínuo de trinta anos, desde que se
tenha iniciado o direito de que provêm, não terão a faculdade de viver
além [...]. 122 (tradução nossa)
Posteriormente, no Oriente, a prescrição teodosiana recebe uma
importante inovação feita por Anastásio (C. 7, 39,4)123, Imperador do Oriente de
120
AMELOTTI, Mario. Prescrizione (dir. Rom.). In Enciclopedia del diritto. Varese: A. Giuffre, 1958, v.
35, p. 36.
121
Ibidem, p. 37.
122
CTh. 4, 14, 1. 2. Quae ergo ante non motae sunt actiones, triginta annorum iugi silentio, ex
quo competere iure coeperunt, vivendi ulterius non habeant facultatem. nec sufficiat precibus
oblatis speciale quoddam, licet per annotationem, meruisse responsum vel etiam iudiciis
allegasse, nisi, allegato sacro rescripto aut in iudicio postulatione deposita, fuerit subsecuta
conventio. in eandem rationem illis procul dubio recasuris, quae post litem contestatam, in
iudicium actione deducta habitoque inter partes de negotio principali conflictu, triginta denuo
annorum devoluto curriculo, tradita oblivioni ex diuturno silentio comprobantur.
123
C. 7,39,4,1 (Codex Iustinianus): “Imperator Anastasius. Quidquid autem praeteritarum
praescriptionum vel verbis vel sensibus minus continetur, implentes per hanc in perpetuum valituram
legem sancimus, ut, si quis contractus, si qua actio, quae, cum non esset expressim saepe dictis
temporalibus praescriptionibus concepta, quorundam tamen vel fortuita vel excogitata interpretatione
45
491 a 518 d.C., introduzindo uma prescrição quarentenária a ser aplicada a
todas as ações que ainda restavam perpétuas.
6.2 Conceito
Para o direito romano, a prescrição era uma exceção cujo efeito era
o de infirmar a ação. Consoante Giuseppe Pugliese:
[...] pel diritto romano la prescrizione estintiva fosse un’eccezione, il
cui effetto era quello d’infirmare l’azione, e fosse la prescrizione delle
azione per antonomasia, è opinione predominante fra gli antichi e
moderni interpreti di quel diritto 124.
A prescrição não passava, portanto, de uma exceção, uma defesa
oposta pelo réu à alegação do autor. Consoante Giovanni Pugliese, a
prescrição,
até
o
início
do
período
pós-clássico
ou
justineaneu,
era,
prevalentemente, uma objeção do réu fundada em um diverso sistema de direito
(o do ius honorarium) 125. Segundo Mario Amelotti:
La prescrizione generale delle azioni opera in forma di eccezione
processuale, come risulta senza possibilità di dubbio da tutte le fonti
postclassiche e giutineanee, che parlano indiferentemente di
praescriptio od exceptio oposta non ha più il preciso significato tecnico
che revestiva nel processo formulare, ma rimane come concetto
processuale, ad indicare quelle circostanze che tolgono efficacia
all’azione soltanto se fatte tempestivamente valere dal convenuto. Il
che significa, in riferimento alla prescrizione dell’azione, che essa va
sollevata dal convenuto, ma non può essere rilevata d’ufficio. 126
saepe dictarum exceptionum laqueos evadere posse videatur, huic saluberrimae nostrae sanctioni
succumbat et quadraginta curriculis annorum procul dubio sopiatur, nullumque ius privatum vel
publicum in quacumque causa in quacumque persona, quod praedictorum quadraginta annorum
extinctum est iugi silentio, moveatur.
124
PUGLIESE, Giuseppe. La prescrizione nel diritto civile. 4. ed. Torino: Unione Tipografico-Editrice
Torinese, 1924. v. 2, p. 24-25
125
PUGLIESE, Giovanni. Istituzioni di Diritto Romano. 3. ed. Torino: Giappichelli, 1991, p. 780-1.
126
AMELOTTI, Mario. Prescrizione (dir. Rom.). In Enciclopedia del diritto. Varese: A. Giuffre, 1958, v.
35, p. 45.
46
Como refere Giuseppe Pugliese, os caracteres dessa conceituação
constam da definição de um glosador que assim escreve: “praescriptio est
exceptio ex tempore substantiam capiens quae actioni personali uel in rem
opponitur”127.
“La prescrizione di um’azione è il cessare della sua efficacia per
una troppo lunga trascuranza nell’intentarla”, conforme o ensinamento de
Arndts-Serafini, citado por Giuseppe Pugliese128.
Dessarte, entende-se por prescrição a perda da ação ainda não
exercida em razão do decurso de um determinado período de tempo129.
No dizer de Pontes de Miranda, a prescrição é ato-fato jurídico;
segundo ele, incidindo no suporte fático a regra jurídica sobre prescrição, o fato
jurídico da prescrição se produz, o qual se considera ato-fato jurídico, devido ao ato
humano negativo, talvez involuntário, que é de mister ao suporte fático. Seguindo,
conclui ele que “o ato-fato jurídico da prescrição somente produz, no mundo jurídico,
o efeito de criar o ius exceptionis, isto é, o direito de exceção de prescrição. Direito
que se exerce, ou não”130.
127
PUGLIESE, Giuseppe. La prescrizione nel diritto civile. 4. ed. Torino: Unione Tipografico-Editrice
Torinese, 1924. v. 2, p. 25.
128
Ibidem, p. 25
129
AMELOTTI, Mario. Prescrizione (dir. Rom.). In Enciclopedia del diritto. Varese: A. Giuffre, 1958, v.
35, p. 36.
130
MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Tratado de Direito Privado. Rio de Janeiro: Borsoi,
1958, Tomo VI, § 665, 3.
47
Assim, com Pontes de Miranda, podemos conceituar a prescrição
como sendo “a exceção, que alguém tem, contra o que não exerceu, durante certo
tempo, que alguma regra jurídica fixa, a sua pretensão ou ação”131.
6.3 Fundamento jurídico-racional
Conforme o Direito Romano, a prescrição foi introduzida pelo bem
público, para que a propriedade das coisas e os outros direitos não ficassem
sempre incertos. Para Matteo Galdi:
La prescrizione, dice il diritto romano, è introdotta pel bene pubblico,
affinchè la proprietà delle cose e gli altri diritti non siano sempre incerti:
Bono publico usicapio introducta est, ne scilicet quarandam rerum diu et
fere semprer incerta dominia essent (L. 1, ff. De usurp. et usuc.).132
A prescrição serve à segurança e à paz públicas, sendo o seu
fundamento o de “proteger o que não é devedor e pode não mais ter prova da
inexistência da dívida; e não proteger o que era devedor e confiou na inexistência da
dívida, tal como juridicamente ela aparecia” 133.
O fundamento da prescrição consiste na necessidade de certeza
inerente ao ser humano que se reflete na ciência jurídica e, conseqüentemente,
no direito positivo.
131
MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Tratado de Direito Privado. Rio de Janeiro: Borsoi,
1958, Tomo VI, § 662, 2.
132
GALDI, Matteo. Della prescrizione: trattato di diritto civile e commerciale. Napoli: Francesco
Giannini, 1905. v. 1, p. 10.
133
MIRANDA, op. cit., § 662.
48
Conforme afrma Mario Amelotti, a utilizade da certeza das
relações jurídicas prevalece sobre a sua eferiva correspondência ao direito, ao
justo:
L’utilità che i rapporti giuridici risultino certi prevale sulla loro effettiva
corrispondenza al diritto, l’opportunità che le liti non siano perenemente
sollevate è preferita ad una illimitata ricerca del giusto.134
Como bem afirmou Windscheid, “è il bisogno della certezza ne’
rapporti civili, che, com maggiore o minore energia si è imposto nelle legislazioni
de’ popoli aventi una civiltà relativamente avanzata”. 135
Isso porque, a corroborar o argumento de Pontes de Miranda, a
razão da prescrição está no caráter temporário das relações humanas e na
dificuldade de prová-los, trascorrido longo tempo. Assim sustenta Windscheid:
La ragione intima della prescrizione — secondo scrive il Kohler — è
nel carattere temporaneo de’ rapporti umani e nella necessità che
d’una buona volta si sciolga l’intreccio dei vari diritti: tutto il resto, ma
in ispecie la difficoltà della prova, è conseguenza di questo conceto
fondamentale.136
Por fim, nas palavras de Pontes de Miranda, a prescrição atende à
conveniência de que a exigibilidade ou a acionabilidade não perdurem por longo
tempo:
Os prazos prescricionais servem à paz social e à segurança jurídica. Não
destroem o direito, que é; não cancelam, não apagam as pretensões;
apenas, encobrindo a eficácia da pretensão, atendem à conveniência de
134
AMELOTTI, Mario. Prescrizione (dir. Rom.). In Enciclopedia del diritto. Varese: A. Giuffre, 1958, v.
35, p. 46.
135
WINDSCHEID, Bernardo. Diritto delle Pandette. Torino: Unione Tipografico-Editrice Torinese,
1926, v. 1., p. 1073.
136
WINDSCHEID, loc. cit.
49
que não perdure
acionabilidade.137
por
demasiado
tempo
a
exigibilidade
ou
a
6.4 Efeitos
Quanto aos efeitos da prescrição, desde o direito romano, é este
tema sobremodo controverso, mormente entre os interpretes das fontes
romanas. Dessarte, por um lado se tem a teoria segundo a qual a prescrição
não atinge a substância do direito, mas, apenas, o ius actionis, restando intacto
“o elemento natural da relação jurídica. Conforme Giuseppe Pugliese:
Quale fosse l’efficacia della prescrizione nel diritto romano è vivamente
controverso fra gli interpreti. Una teorica, che vanta strenui
propugnatori, insegna che la prescrizione non tocca la sostanza del
diritto, ma il solo ius actionis, e lascia intatto l’elemento naturale del
rapporto giuridico138.
Seguindo, o conspícuo autor italiano aduz que a essa corrente se
contrapõe a que sustenta perecer toda a relação jurídica, quer em seu elemento
‘civil’ quer em seu elemento natural. Em suas palavras, “a questa si oppone
l’altra teorica, che vuole perisca tutto il rapporto, tanto nel suo elemento civile,
quanto in quello naturale”139.
A extinção da actio por prescrição, ou seja, pela inércia somada ao
decurso do tempo, foi questão posta na célebre controvérsia entre Windscheid e
Muther.
137
MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Tratado de Direito Privado. Rio de Janeiro: Borsoi,
1958, Tomo VI, § 662.
138
PUGLIESE, Giuseppe. La prescrizione nel diritto civile. 4. ed. Torino: Unione Tipografico-Editrice
Torinese, 1924. v. 2, p. 11.
139
PUGLIESE, loc. cit..
50
Para Windscheid, na linguagem moderna, em que se diz que a
actio está sujeita à prescrição e, como a actio também é traduzida por ação,
fala-se em prescrição das ações. Entretanto, essa expressão deve ser evitada,
pois a actio é o termo romano para designar a pretensão jurídica. Assim,
quando os romanos dizem que algo é judicialmente perseguível isso quer dizer
que está juridicamente fundado140.
Desse modo, não se deve relacionar prescrição com ação, mas,
sim, com pretensão141.
Windscheid mesmo afirma que, à sua época, e se pode dizer que
ainda hoje, continua intermitente e sem nenhuma perspectiva de acordo
a
discussão acerca da extinção ou não da obrigação em si por meio da
prescrição. Segundo o célebre pandectista, a prescrição da actio in rem, ou
seja, da pretensão nascida de direito real, não tem o condão de extingui-lo, mas
quanto à prescrição da actio in personam, discute-se se resta extinta a
obrigação junto com a actio ou persiste como obligatio naturalis 142.
No
direito
romano,
as
ações
pretorianas
normalmente
se
extinguiam em um ano, como expusemos em tópico anterior. Explica
Windscheid que, com a prescrição, visto que a actio pretoriana não se fundava
em nenhum ius, evidentemente, nenhum direito poderia subsistir. Com a
evolução do direito romano, as actiones pretorianas passaram a estar
140
WINDSCHEID, Bernhard y MUTHER, Theodor. Polemica sobre la “actio”. Buenos Aires: EJEA,
1974, p. 58.
141
Ibidem, p. 58.
142
Ibidem, p. 59.
51
embasadas em ius (honorarium) tanto quanto as actiones ciuiles (ius ciuile).
Todavia, esse critério não pode ser aplicado para as actiones ciuiles, que,
posteriormente, também se tornaram prescritíveis143.
Windscheid, embora mantendo para a prescrição o caráter de
exceção, põe-lhe como objeto não a ação, mas, sim, a pretensão. Para ele, “la
prescrizione toglie di mezzo la ragione; non che la estingua, la ragione continua
a sussistere, ma la toglie di mezzo col produrre um’eccezione, che la
estingue” 144.
Já Emilio Betti, por sua vez, defende a doutrina segundo a qual a
prescrição não atinge somente a ação, mas além da pretensão, ela extingue o
próprio direito subjetivo. Como ele afirma:
Quanto alla prescrizione estintiva (c. Civ. 2109) dipendente da prolungata
inerzia, essa, invece, non colpisce l’azione ma – dietro la ragione (actio
nel senso romano), che n’è il profilo processuale – colpisce ed
estingue lo stesso diritto sostanziale (Carnelutti), quando, sia diretto a
rimuovere uno stato di fatto contrario a diritto o uno stato di diritto viziato:
stato, cui il privato leso nel proprio interesse, omise di reagire145.
Essa tese foi acolhida pelo direito positivo italiano, pois, como se lê
no artigo 2934 do Código Civil italiano de 1942, “ogni diritto si estingue per
prescrizione, quando il titolare non lo esercita per il tempo determinato dalla legge”.
143
WINDSCHEID, Bernhard y MUTHER, Theodor. Polemica sobre la “actio”. Buenos Aires: EJEA,
1974, p. 61.
144
PUGLIESE, Giuseppe. La prescrizione nel diritto civile. 4. ed. Torino: Unione Tipografico-Editrice
Torinese, 1924. v. 2, p. 25
145
BETTI, Emilio. Diritto Processuale Civile Italiano. 2. ed. Roma: Società editrice del Foro Romano,
1936, p. 166.
52
Para Pontes de Miranda, a prescrição apenas encobre a eficácia da
pretensão; todavia, em sendo a pretensão a exigibilidade do direito, com se viu
em item anterior, não resta ao credor a possibilidade de cobrança direta:
A prescrição não atinge, de regra, somente a ação; atinge a pretensão,
cobrindo a eficácia da pretensão e, pois, do direito, quer quanto à ação,
quer quanto ao exercício do direito mediante cobrança direta (aliter,
alegação de compensação, que depois estudaremos), ou outra
manifestação pretensional.146
No atual direito positivo brasileiro, a prescrição do direito privado
comum está regulada pelos artigos 189 a 206 do Novo Código Civil brasileiro,
que dispõe, em seu artigo 189, de forma imprecisa — confundindo o conceito de
pretensão (utilizado, ali, com o significado de ação de direito material, pois é
esta que nasce com a resistência à pretensão, e não esta com a violação do
direito) —, que a pretensão se extingue com a prescrição.
6.5 Títulos de Crédito: a prescrição da ação cambiária
Inicialmente, da mesma forma como fizemos acima, salientamos que,
no presente trabalho, trataremos apenas da ação cambiária de cobrança e, portanto,
também a ela nos restringiremos ao examinar a sua prescrição.
No direito brasileiro e no direito uniforme, a noção de prescrição
cambiária é a de ineficácia da pretensão e da ação147. Como diz Pontes de Miranda,
“não se dá a destruição do direito cambiário; quanto a este, o que ocorre é que se
146
MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Tratado de Direito Privado. Rio de Janeiro: Borsoi,
1958, Tomo VI, § 662.
147
MIRANDA. Tratado de Direito Cambiário. Tomo I. Campinas: Boockseller, 2000, p. 583.
53
lhe opõe exceção, que lhe encobre a pretensão”148 e, por conseguinte, faz-se
encobrível a acionabilidade.
Como expusemos em item anterior, a relação jurídica cambiária é
autônoma e independente da relação fundamental, cada uma tendo pretensão e
ação próprias.
Dessarte, como obviamente disso se dessume, a prescrição, em sendo
a extinção da pretensão e, conseqüentemente, da ação de direito material, também
será independente para cada uma das pretensões (fundamental e cambiária).
Assim, para o caso do cheque, a prescrição da pretensão e da ação do
portador contra o emitente se dá em seis meses a contar da expiração do prazo de
apresentação149.
7 Ação Monitória
Como pressuposto lógico para o entendimento do procedimento
monitório, faz-se mister entender as razões históricas que levaram à existência
no direito moderno de um processo de execução autônomo.
No direito romano, a razão para que não houvesse uma relação
processual única contendo conhecimento e execução reside no fato de a
jurisdição privada da actio não possuir poderes de imperium. Conforme tratado
148
149
MIRANDA. Tratado de Direito Cambiário. Tomo I. Campinas: Boockseller, 2000, p. 583.
Artigo 59 da Lei 7.357/85.
54
em item anterior, a jurisdição romana do ordo iudiciorum priuatorum consistia no
dito arbitramento compulsório, sendo, portanto, dividida a instância em uma fase
perante o pretor, que detinha o imperium, e outra, perante o iudex, árbitro
privado que tinha apenas iurisdictio, encarregado de dizer o direito, não
podendo impor suas decisões pela força.
O vencedor, no direito romano, necessitava da actio iudicati para
realizar o direito que lhe fora reconhecido pelo iudicatum ou, até à lex Poetelia
Papiria, da manus iniectio 150, pela qual se dava a execução corporal
determinada pela Lex XII Tabularum.
Todavia, nas palavras de Ovídio da Silva, “no direito medieval, de
inspiração germânica, a simultaneidade da cognição e da execução no mesmo
processo passou a ser a regra [...]”151.
Nesse período, por influência do direito tudesco, a presunção,
contrariamente ao que se dá no direito moderno, era de que ninguém se
aventuraria a enfrentar os desgastantes aborrecimentos causados por uma
demanda judicial sem ter um razoável e consistente convencimento152.
Citando Liebman, o preclaro processualista gaúcho segue sua
exposição afirmando que, a partir do direito medieval, passou-se a reconhecer
eficácia executória aos denominados instrumenta guarentigiata, de modo que
150
Tábua III da Lei das XII Tábuas.
SILVA, Ovídio A. Baptista da. Jurisdição e Execução na tradição romano-canônica. 2 ed. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 1997, p. 150.
152
Ibidem, p. 150.
151
55
cabia ao direito processual dar-lhes o processo correspondente, para que essa
eficácia executiva se tornasse efetiva e, ao mesmo tempo, fosse preservada a
natureza abstrata do título, a dispensar a prévia certificação do direito neles
representados153.
Isso porque “o magistrado, fiel executor da lei do Estado, não
poderá autorizar a prática de atos executivos, se o direito do credor ainda não
estiver reconhecido por sentença”. Dessa forma, apenas dispensando a prévia
certificação é que se pode admitir o uso direto de atos materiais para a efetiva
realização do direito.
Como sustenta Ovídio da Silva, “a necessidade de outorgar aos
títulos negociais uma ação de execução sem prévio processo de cognição
exerceu papel decisivo para a autonomia da ação de execução [...]”154.
Para que se possa ter acesso diretamente à execução, faz-se
mister presença de um título (nulla executio sine titulo), pois a prática dos atos
materiais de execução implicam violenta agressão ao patrimônio do devedor.
Esse título é “o ato ou fato jurídico do qual resulta a concreta adequação das
medidas de execução forçada para a atuação da vontade da lei” 155.
Assim, como afirma Cruz e Tucci, enquanto no processo de
conhecimento basta a simples alegação de um direito para invocar-se a tutela
153
SILVA, Ovídio A. Baptista da. Jurisdição e Execução na tradição romano-canônica. 2 ed. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 1997, p. 152.
154
Ibidem, p. 154.
155
DINAMARCO, Cândido Rangel. Execução civil. 4.ed. São Paulo: Malheiros, 1994, p. 260.
56
jurisdicional, o processo de execução apenas se viabiliza àquele que se
apresenta portador de título executivo156.
Consoante Carlos Alberto Alvaro de Oliveira:
O título executivo se apresenta, na realidade, como uma criação dos
juristas do direito intermédio italiano e corresponde a um compromisso
entre as tendências opostas do direito romano e do direito germânico,
aquele exigindo uma escrupulosa verificação prévia do crédito e este
permitindo a satisfação das pretensões sem necessidade da
demonstração prévia de sua procedência 157.
A tutela executiva se oferece a quem está munido de uma
declaração de certeza, enquanto aquele cujo direito ainda não está revestido
dessa certeza deverá primeiramente buscá-la, para só depois ter acesso à
execução.
Nas palavras de Elaine Macedo, “partindo-se da incerteza, chegase ao acertamento do direito aplicado ao caso concreto. Partindo-se da certeza
alcançada, satisfaz-se o direito de crédito com a legítima intervenção no
patrimônio do devedor a partir de atos de constrição judicial [...]”158.
Assim, tem-se que o processo de conhecimento se destina às
relações incertas e duvidosas e o processo de execução compõe as
insatisfações do que já está acertado; existe, porém, uma gama infindável no
156
TUCCI, José Rogério Cruz e. Ação Monitória. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 28.
OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro. Titulo Executivo. In Elementos para uma nova Teoria Geral do
Processo. Porto Alegre: Do Advogado, 1997, p. 352.
158
MACEDO, Elaine Harzheim. Da Ação Monitória. In Inovações do Código de Processo Civil. Porto
Alegre: Do advogado, 1997, p. 229
157
57
mundo das relações negociais de situações jurídicas que não se enquadram
nem em uma, nem em outra previsão159.
Há direitos, porém, que, demonstrados por meio de prova préconstituída, se revestem de verossimilhança. Nas palavras de Elaine Macedo,
“tratá-los através do processo de execução seria efetivamente um excesso.
Viabilizá-los quando não cumpridos espontaneamente, pelo processo de
conhecimento, seria exigir do credor penoso sacrifício”160.
Conforme assevera Cruz e Tucci, o procedimento monitório é uma
técnica de sumarização da cognição destinada justamente para aqueles diretos
que estão entre a certeza e a incerteza, isto é, os dotados de verossimilhança:
[...] ao lado dos títulos executivos extrajudiciais, existem técnicas
especiais de processo de cognição que têm a função de formar o título
executivo de modo mais célere. Entre tais técnicas de sumarização da
cognitio insere-se a do procedimento monitório, no qual o juiz emite
uma ordem liminar, inaudita altera parte, determinando que o devedor
pague certa quantia ou entregue uma coisa ao credor161.
Para Elaine Macedo, o procedimento monitório desenvolveu-se
justamente para dotar o credor de um caminho próprio, quando munido de prova
documental e a convicção de que o devedor não tem séria oposição a elidir a
obrigação assumida 162.
159
MACEDO, Elaine Harzheim. Da Ação Monitória. In Inovações do Código de Processo Civil. Porto
Alegre: Do advogado, 1997, p. 229.
160
Ibidem, p. 230.
161
TUCCI, José Rogério Cruz e. Ação Monitória. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 28.
162
MACEDO, op. cil., p. 230.
58
No direito brasileiro recente, tal expediente foi adotado pela Lei
9.079/95, de clara inspiração na ingiunzione italiana.
Segundo o texto legal, a ação monitória se destina a quem busca
pagamento de soma em dinheiro, entrega de coisa fungível ou de determinado
bem móvel, com base em prova escrita sem eficácia executiva163.
163
Artigo 1.102ª do CPC.
59
III – AÇÃO MONITÓRIA EMBASADA EM CHEQUE PRESCRITO
Como visto em item anterior, a relação jurídica material é distinta da
relação jurídica processual. Com a teoria de Bülow, o processo passa a ser visto
como uma relação jurídica dinâmica, de direito público e que se forma entre o estado
e as partes, independente da relação substancial posta em causa164.
A relação jurídica substancial é entabulada entre os titulares do direito
subjetivo e do seu correlato dever jurídico; o direito é o plus a que corresponde o
dever, que é o minus 165. Como afirma Pontes:
Há de haver relação jurídica básica, ou relação interna à eficácia
(relação intrajurídica), para que haja direito e, pois, dever. Quem está
no lado ativo da relação jurídica é o sujeito do direito; quem está no
lado passivo é o que deve, o devedor (em sentido amplo). A atividade
(qualidade de ser ativo) de um é o direito; a passividade é o dever. 166
O direito subjetivo é uma abstração a que se chegou após o exame
da eficácia dos fatos jurídicos criadores de direitos. Dá-se quando o suporte
fático se torna fato jurídico com a incidência nos fatos da regra jurídica
objetiva167. O direito subjetivo é, portanto, o que dessa ocorrência emana de
vantajoso para alguém168.
Por evidente, a existência de um direito subjetivo, isto é, essa
vantagem que nasce a partir da norma objetiva, não implica, necessariamente, a
idéia de seu exercício.
164
BÜLOW, Oskar von. Teoria das Exceções e dos Pressupostos Processuais. Tradução e notas:
Ricardo Rodrigues Gama. Campinas: LZN, 2003, p. 6.
165
MIRANDA, Tratado das Ações. Campinas: Boockseller, 1998, v. 1., p. 47.
166
Ibidem, p. 47.
167
Ibidem, p. 46.
168
Ibidem, p. 46.
60
Dessarte, pode-se distinguir o direito subjetivo da exigibilidade e
esta da efetiva exigência exercida pelo titular do direito para que ele se
realize169.
A essa exigibilidade dá-se o nome de pretensão, como já visto, e
representa a “faculdade de se poder exigir a satisfação do direito” 170. Essa
faculdade é atribuída pelo ordenamento, sendo que pode existir direito a que
ainda não se atribua, ou não mais se atribua, essa faculdade171.
Quando exercida a pretensão, isto é, a efetiva exigência, não há
ainda ação do titular do direito subjetivo, pois, como afirma Ovídio da Silva,
seguindo Pontes de Miranda, “exigir não é agir; quem exige não age, espera que
outrem aja”172. Nisso resta clara a necessidade, com o exercício da pretensão, do
agir voluntário do devedor (lato sensu) para que se realize o direito.
É, porém, com a resistência a esse exigir do titular do direito, deixando
o sujeito passivo de cumprir o dever jurídico, que nasce para aquele a ação de
direito material173.
Entretanto, o exercício da ação de direito material, que se encontra
no campo do direito substancial e não processual, foi proibido pelo Estado, com
169
SILVA, Ovídio Araújo Baptista da. Curso de Processo Civil. 6 ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2002, v. 1, p. 78.
170
SILVA, Ovídio Araújo Baptista da, Direito subjetivo, pretensão de direito material e ação. In
Revista da Ajuris, Porto Alegre, n. 29, nov/1983, p. 100.
171
SILVA, op. cit., p. 103.
172
SILVA, Ovídio Araújo Baptista da. Curso de Processo Civil. 6 ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2002, v. 1, p. 80.
173
Ibidem, p. 80.
61
a proibição da autotutela, passando a si (Estado) o dever de conferir ao cidadão
o mesmo resultado que se verificaria caso o agir privado (a ação de direito
material) não estivesse proibido174.
Assim, para que o Estado preste a tutela jurisdicional, faz-se mister
que se requeira a atuação estatal. Como diz Liebman, “el Estado asume como
función propia la jurisdicción” 175 e como “no hay jurisdicción sin acción” 176, esse
requerimento de atuação estatal para a realização do direito que não foi
atendido pelo devedor (lato sensu) dá-se por meio de ação. Esta, porém,
diversa e independente da ação de direito material, é voltada contra o Estado.
Não se deve confundir a ação de direito processual, meio pelo qual
se postula a tutela jurisdicional, com a ação de direito material, plus que se
agrega à pretensão, que é a situação existencial que justifica a ação processual.
Contudo, deve-se ressaltar que a verificação da existência e da
titularidade efetiva da ação de direito material só se dá ao final de um processo
de cognição, quando há o accertamento, ou quando há uma declaração de
certeza, de regra encerrada em um título executivo.
174
MARINONI, Luiz Guilherme e ARENHART, Sérgio Cruz. Manual do Processo de Conhecimento. 2.
ed. São Paulo: RT, 2003, p. 67.
175
LIEBMAN, Enrico tullio. Concepto de la acción civil. Revista de estudios juridicos y sociales,
Montevideo, ano XIII, Tomo XIII, n. 70, 1940, p. 225.
176
Ibidem, p. 227.
62
Como visto, outrossim, o título de crédito é um documento
constitutivo, cuja declaração cartular é distinta da do negócio fundamental 177,
sendo aquela uma verdadeira fonte de um direito autônomo e distinto do
decorrente da relação fundamental e das demais convenções extracartulares178.
Dessa forma, o direito cambiário é autônomo e distinto do que
decorre da relação fundamental, constituindo uma nova, distinta e autônoma
relação jurídica de direito substancial, dando ensejo, portanto, a um direito
subjetivo cartular e a um dever, a ele correlato; ademais, haverá também uma
pretensão cambiária e uma ação de direito material cambiária, sempre distinta e
independente da ação causal.
A prescrição, por sua vez, no dizer de Pontes de Miranda, é “a
exceção, que alguém tem, contra o que não exerceu, durante certo tempo, que
alguma regra jurídica fixa, a sua pretensão ou ação”179. Para ele a prescrição não
atinge, de regra, somente a ação, mas encobre também a eficácia da pretensão,
e, portanto, do direito180.
Em sendo a prescrição o encobrimento da eficácia da pretensão e
em sendo o direito subjetivo, a pretensão e a ação material da relação cartular
diversos e autônomos dos da relação que deu causa à criação ou circulação do
177
MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Tratado de Direito Privado. Rio de Janeiro: Borsoi,
1958, Tomo XXXIV, § 3828, refere que “o negócio jurídico básico não é a única fonte de relações
jurídicas básicas. Em verdade, o título de crédito, abstrato ou não, pode ter como base dívida oriunda
de fato jurídico stricto sensu, ou de ato-fato jurídico, ou de ato jurídico stricto sensu”.
178
ASCARELLI, Tullio. Teoria Geral dos Títulos de Crédito. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1969, p. 44.
179
MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Tratado de Direito Privado. Rio de Janeiro: Borsoi,
1958, Tomo VI, § 662, 2.
180
Ibidem, § 662.
63
título de crédito, é conclusão lógica a de que cada pretensão será encoberta
pela sua própria prescrição, ou seja, haverá prescrições distintas para cada uma
das pretensões (causal e cartular).
A prescrição da relação fundamental, quando esta for pertencente
ao direito privado comum (gize-se que a relação causal pode ser regulada pelo
direito cambiário, verbi gratia, um pagamento de uma letra de câmbio por meio
de uma nota promissória), no atual direito positivo brasileiro, será regulada
pelos artigos 189 a 206 do Novo Código Civil brasileiro. Já a prescrição dos
títulos de crédito vem prevista na LUG ou em leis especiais.
O cheque é rigorosamente um título cambiário, nas palavras de
Othon Sidou, e se subordina às regras do direito cambiário quanto à
transmissibilidade e ao seu aspecto autonômico. Segundo Sidou, “por ser título
cambiário, de feição autônoma, o cheque é uma obrigação de causa abstrata,
não se vincula a qualquer obrigação precedente [...]” 181. Por fim, ele conclui que
“é, pois, inútil fazer-se indagação da causa da obrigação” 182.
Não há dúvida quanto ao enquadramento do cheque entre os
títulos de crédito. Dessa forma, consiste ele em uma relação jurídica
independente da que lhe deu causa, tendo, portanto, uma pretensão própria e
uma ação material (cambiária de cobrança) própria. De igual forma se deve
afirmar acerca da prescrição, que vem prevista no artigo 59 da Lei 7357/85,
181
182
SIDOU, J. M. Othon. Do Cheque. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000, p. 5
Ibidem, p. 5.
64
cujo prazo é de seis meses a contar da expiração do prazo para apresentação.
A ação executiva se oferece a quem está munido de uma
declaração de certeza; àquele cuja titularidade do direito ainda não foi
verificada, sendo, portanto, incerta, só lhe resta o uso do processo de
conhecimento, para que se lhe abram as portas da via executiva. No entanto,
há aquele que, sem ter declarada a certeza de seu direito, também não se
encontra no campo da incerteza, estando a meio caminho das duas.
A esse sujeito, cujo direito está dotado de verossimilhança, é
oferecido o procedimento monitório, uma técnica para a obtenção rápida da
certeza necessária para prática dos atos materiais da execução183.
A ação monitória no direito brasileiro se oferece a quem, se
dizendo credor, portador de prova escrita sem eficácia executiva, pretender
pagamento de soma em dinheiro, entrega de coisa fungível ou determinado
bem móvel.
Os tribunais brasileiros vêm firmando o entendimento segundo o
qual o cheque prescrito constitui essa prova escrita necessária para o
procedimento monitório; matéria inclusive já sumulada pelo Superior Tribunal de
Justiça no enunciado 299 184. Tem sido, ademais, admitida indiscriminadamente a
possibilidade do uso da ação monitória embasada em cheque prescrito,
183
184
TUCCI, José Rogério Cruz e. Ação Monitória. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 28.
Enunciado 299 da Súmula do STJ: É admissível a ação monitória fundada em cheque prescrito.
65
independentemente do negócio causal185.
Entretanto, a prescrição não retira simplesmente o acesso direto à
execução, que é garantido ao cheque por força de lei186, mas também encobre a
sua pretensão e ação de direito material.
Assim, o cheque prescrito, embora seja um documento sem eficácia
executiva, não é apenas isso. Ele também não mais possui a pretensão e a ação de
direito material cambiária (abstrata e independente da causal) cujas eficácias foram
encobertas pela prescrição.
Como assevera Pontes de Miranda, “o instituto da prescrição é de
direito positivo”187, de modo que, embora curto o prazo (seis meses) prescritivo do
cheque, é o ordenamento que o prevê, não sendo cabível a utilização de outros
meios para fazer renascer a sua ação.
É a ação de direito material o substrato, a situação existencial que
justifica a tutela jurisdicional. Em não mais existindo ela, não há como se
prestar a tutela jurisdicional, ou seja, a realização dos atos materiais para a
realização do direito, pois oca será a ação processual, visto que não mais há o
185
RESP 575027/RS, Rel. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, QUARTA TURMA, julgado em
19.02.2004, DJ 15.03.2004, p. 282. EMENTA: PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO MONITÓRIA. CHEQUE
PRESCRITO. DOCUMENTO HÁBIL À INSTRUÇÃO DO PEDIDO. IMPUGNAÇÃO. INICIAL.
DESCRIÇÃO DE CAUSA DEBENDI. DESNECESSIDADE. I. A jurisprudência do STJ é assente em
admitir como prova hábil à comprovação do crédito vindicado em ação monitória cheque emitido pelo
réu, cuja prescrição tornou-se impeditiva da sua cobrança pela via executiva. II. Para a propositura de
ações que tais é despicienda a descrição da causa da dívida. III. Recurso especial conhecido e
provido.
186
Artigo 47 da Lei 7.357/85 e artigo 585, I, do CPC.
187
MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Tratado de Direito Privado. Rio de Janeiro: Borsoi,
1958, Tomo VI, § 662, 2.
66
que lhe justifica a existência (o processo é o instrumento para a realização do
direito substancial).
Não há falar-se em mera extinção da via executiva que se dê com a
prescrição do cheque, pois o processo de execução, como remédio processual, nas
palavras de Pontes de Miranda, não prescreve: “quanto à ‘ação’, no sentido de
remédio jurídico, não prescreve, — preclui [...]”188.
A prescrição se opera no campo do direito material, retirando ao direito
a pretensão e a ação material, de modo que, ao final da ação processual (seja qual
for, de conhecimento, executiva, monitória), caso apresentada a exceção de
prescrição, não poderá haver realização de atos equivalentes ao cumprimento do
direito, pois a ele faltam a exigibilidade e a possibilidade de realizá-lo inuito debitore
(ação material).
Pode, porém, restar para o credor do cheque prescrito a ação
proveniente da relação causal, pois a ela se aplicam as regras próprias do direito
objetivo que a regula, podendo ter prazo prescricional maior.
Portanto, conclui-se que, oposta a exceção de prescrição, não é
possível a ação monitória embasada em cheque prescrito fundada somente na ação
cartular, pois esta, elemento que dá substrato à realização, pelo Estado, do
equivalente ao cumprimento do direito, tem a sua eficácia encoberta pela prescrição.
Cabe, porém, ao devedor alegar a prescrição, que deverá ser acolhida pelo juízo,
188
MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Tratado de Direito Privado. Rio de Janeiro: Borsoi,
1958, Tomo VI, § 662, 6.
67
quando verificada a sua efetiva ocorrência.
O que se faz possível é que a ação monitória (mero instrumento para a
realização do direito material) se embase na ação causal (material), se não estiver
prescrita, utilizando-se como início de prova o cheque prescrito (agora mero
documento).
Segundo Ascarelli, a cártula é um documento probatório da relação
fundamental, de modo que poderá embasar a ação monitória para pagamento do
crédito oriundo da relação causal:
O que naturalmente não impede que, além de sua eficácia constitutiva
quanto à declaração cartular, o título de crédito possa ter uma eficácia
probatória quanto à relação fundamental. É o que geralmente se verifica
ao reconhecer na cambial (mesmo cambiariamente inválida), um
documento probatório da relação fundamental, bastante para justificar a
ação causal e, até, para a emanação de uma injunção de pagamento do
crédito derivado da relação fundamental, no processo ‘monitório’ do direito
italiano189.
Concordamos com o mestre italiano, apenas ressalvando que,
segundo Mac-Donald190, citando Gualtieri e Winizky, o título “conserva o seu valor
probatório — embora per se não suficiente — da relação fundamental“.
É de se ressaltar que, em sendo abstrata a relação cartular e, em
razão de sua literalidade, de ordinário não haverá menção à causa no cheque capaz
de constituir algum elemento de prova acerca da relação fundamental. Prova, isso
sim, que houve uma relação cartular, que, porém, não mais possui pretensão e
189
ASCARELLI, Tullio. Teoria Geral dos Títulos de Crédito. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1969, p. 41,
nota 27.
190
MAC-DONALD, Norberto da Costa Caruso. Ação Cambiária. In Separata da Revista de Estudos
Jurídicos da UNISINOS, v.6, n.17, 1976, p. 110
68
ação.
Dessarte, a ação monitória embasada em cheque prescrito não deve
ser de plano rechaçada, pois a prescrição se opera por meio de exceção,
dependendo de oposição do devedor.
Opondo-a, porém, é de ser acolhida, extinguindo-se o procedimento
monitório com julgamento de mérito com base no artigo 269, IV, do CPC, salvo se
estiver fundado na relação causal, para a qual deverá constar prova mais robusta
que a mera apresentação de um título que nada fala acerca do negócio causal.
Caso não possua essa prova escrita da relação subjacente, restará tão-somente a
via do processo de conhecimento para o credor, pois o procedimento monitório
apenas se apresenta cabível para o portador de prova escrita de seu crédito.
69
CONCLUSÃO
Devem-se, primeiramente, distinguir as situações em que a ação
monitória pode estar embasada em cheque prescrito, porquanto poderá estar
calcada na relação cartular, na relação causal ou em ambas.
Por evidente, em qualquer dessas situações o cheque será mera
prova escrita. A questão, porém, reside nas possibilidades de acolhimento e
efetiva realização do crédito em cada uma dessas hipóteses.
A ação monitória, como ação processual, é independente da ação
de direito material, que constitui o elemento existencial que lhe dá substrato.
Assim sendo, quando, por meio da ação monitória com base em cheque
prescrito, o credor objetivar a realização do crédito oriundo da relação cartular,
visto que a ação material cambiária está prescrita, caso o devedor argua a
prescrição, deverá ela ser acolhida e o processo extinto com julgamento de
mérito.
Se, no entanto, o credor buscar a satisfação do crédito proveniente
da relação causal, há que se verificar, primeiramente, se há prova escrita
suficiente para a utilização do procedimento injuncional, não bastando,
normalmente, o cheque, pois nele, de regra, não constam elementos capazes
de provar de plano a existência e a natureza da relação causal. Ultrapassado
70
essa etapa preliminar, caso haja arguição de prescrição da ação causal, deverá
ela ser acolhida, se efetivamente verificada, extinguindo-se o processo da
mesma forma.
Quando fundada nas duas relações jurídicas de direito material, há
que se verificar se a prova escrita é capaz de provar ambas ou qualquer uma
delas e se a que estiver provada não teve a sua ação (cambiária ou causal)
encoberta por alguma causa extintiva. Vale lembrar que a prescrição opera por
meio de exceção, somente sendo acolhida quando alegada e provada pelo
interessado.
Isso se dá porque o que fundamenta a prestação jurisdicional é a
efetiva titularidade da ação material, com base na qual, após o accertamento
(mesmo que sumário), o Estado prestará, por meios coercitivos, o resultado
equivalente ao cumprimento voluntário do devedor.
71
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