Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras

Transcrição

Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Conclusão a 07.11.2008
***
Processo comum colectivo nº 49/00.3JABRG
RELATÓRIO
Acordam os juízes que compõem este tribunal colectivo do 2º Juízo do Tribunal
Judicial da Comarca de Felgueiras:
Em processo comum e perante tribunal colectivo, o MP acusou e a juiz de
instrução criminal pronunciou:
1. MARIA DE FÁTIMA DA CUNHA FELGUEIRAS ALMEIDA
DE SOUSA OLIVEIRA, divorciada, actualmente presidente da Câmara
Municipal de Felgueiras, natural do Rio de Janeiro, Brasil, filha de Bernardino
Alves de Almeida e de Joaquina Alves da Cunha Felgueiras Almeida, nascida no
dia 21.04.1954, residente na Rua Manuel Faria de Sousa, 1º Esq., Margaride,
Felgueiras, titular do B.I. nº 5558059, emitido em 04.04.2000, pelo arquivo de
identificação do Porto;
2. JÚLIO MANUEL CASTRO LOPES FARIA, casado, ex–
presidente da Câmara Municipal de Felgueiras e da Assembleia Municipal de
Felgueiras, actualmente aposentado, natural da freguesia de Margaride, concelho
de Felgueiras, nascido no dia 24.04.1942, filho de Augusto Leite da Costa Faria
e de Maria Helena Saraiva Remísio de Castro Pereira Lopes, residente na Av.
Agostinho Ribeiro, Edifício Europa, Habitação nº 35, Margaride, Felgueiras,
titular do B.I. nº 708772, emitido em 31.03.2004, pelo arquivo de identificação
do Porto;
3. VÍTOR MANUEL DA SILVA BORGES, casado, engenheiro, expresidente do Conselho de Administração da empresa “RESIN – Resíduos
Industriais, S.A.”, actualmente desempregado, natural da freguesia de Paranhos,
concelho do Porto, nascido no dia 19.02.1946, filho de Joaquim Ernesto da Silva
Borges e de Laura Albertina da Silva Borges, residente na Av. da Boavista,
4321, Porto, titular do B.I. nº 1922020, emitido em 11.01.2000, pelo arquivo de
identificação do Porto;
4. CARLOS ANTÓNIO MIRANDA MARINHO, casado, ex-director
financeiro da empresa “RESIN – Resíduos Industriais, S.A.”, actualmente
director financeiro da empresa “Cespa – Portugal, SA”, natural da freguesia de
Várzea da Ovelha e Aliviada, concelho de Marco de Canavezes, nascido no dia
13.06.1965, filho de Bento Marinho Coelho e de Maria Nazaré de Miranda
Monteiro, residente na Rua Eng.º José Torres C. Pacheco, nº 164, Madalena,
Paredes, titular do B.I. nº 6989972, emitido em 27.04.2005, pelo arquivo de
identificação do Porto;
5. JOSÉ ANTÓNIO BARBIERI CARDOSO, casado, engenheiro civil,
director de departamento da Câmara Municipal de Felgueiras, natural da
freguesia do Bonfim, concelho do Porto, nascido no dia 24.07.1954, filho de
António Horácio Cardoso e de Maria Elvira da Costa Barbieri de Figueiredo
Cardoso, residente na Rua de Gondarém, nº 545, 1º, Porto, titular do B.I. nº
2995828, emitido em 08.01.2007, pelo arquivo de identificação do Porto;
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2º Juízo
6. GABRIEL ÂNGELO DOS SANTOS FERREIRA DE ALMEIDA,
divorciado, engenheiro mecânico, professor universitário, ex-quadro superior da
empresa “RESIN – Resíduos Industriais, S.A.”, natural da freguesia de Santo
Ildefonso, concelho do Porto, nascido no dia 28.01.1948, filho de Agostinho
Ferreira de Almeida e de Maria Amélia Amarante dos Santos Ferreira de
Almeida, residente na Travessa Heróis da Pátria, nº 55, 4º-A, Rio Tinto, titular
do B.I. nº 854995, emitido em 28.04.2006, pelo arquivo de identificação do
Porto;
7. ANTÓNIO PEREIRA MESQUITA DE CARVALHO, casado,
professor do ensino básico aposentado, ex-vereador da Câmara Municipal de
Felgueiras, natural da freguesia de Vila Marim, concelho de Mesão Frio, nascido
no dia 15.06.1949, filho de Afonso de Carvalho e de Maria Pereira de Mesquita,
residente no Lugar de Ladário, nº 25, Vila Cova da Lixa, Felgueiras, titular do
B.I. nº 1977728, emitido em 29.11.2002, pelo arquivo de identificação do Porto;
8. ANTÓNIO JOSÉ LEITE BRAGANÇA DA CUNHA, casado,
professor do ensino básico, natural da freguesia de Pombeiro de Ribavizela,
concelho de Felgueiras, nascido no dia 05.08.1959, filho de Afonso da Cunha e
de Maria Aurora da Silva Leite Bragança, residente na Rua D. Maria II, nº 159,
Margaride, Felgueiras, titular do B.I. nº 3862492, emitido em 06.06.2002, pelo
arquivo de identificação do Porto;
9. ANASTÁCIO AUGUSTO PINTO DE MACEDO, casado,
industrial, sócio-gerente da empresa “Macedo & Sousa, Lda.”, natural da
freguesia de Revinhade, concelho de Felgueiras, nascido no dia 24.05.1945,
filho de Armando de Macedo e de Olívia Pinto, residente no Lugar do Carvalhal,
Sousa, Felgueiras, titular do B.I. nº 3344415, emitido em 02.06.19997, pelo
arquivo de identificação do Porto;
10. GUILHERME DA SILVA ALMEIDA, casado, industrial,
administrador da empresa “Ricap – Guilherme da Silva Almeida & Filhos,
S.A.”, natural da freguesia de Penacova, concelho de Felgueiras, nascido no dia
28.09.1956, filho de João de Almeida e de Alzira da Silva, residente no Solar
dos Penedos, Penacova, Felgueiras, titular do B.I. nº 6869560, emitido em
19.04.2001, pelo arquivo de identificação do Porto;
11. JOAQUIM TEIXEIRA PINTO, viúvo, desempregado, exadministrador da empresa “Pinfel Calçados, S.A.”, natural da freguesia de
Lagares, concelho de Felgueiras, nascido no dia 18.01.1948, filho de António
Pinto e de Leonídia Teixeira Pinto, residente no Lugar de Devesinha, Lagares,
Felgueiras, titular do B.I. nº 3407529, emitido em 27.09.2005, pelo arquivo de
identificação de Lisboa;
12. JOSÉ MANUEL PIMENTA DA SILVA, casado, industrial, sóciogerente da empresa “José Manuel Pimenta da Silva & Cª Lda.”, natural da
freguesia de Unhão, concelho de Felgueiras, nascido no dia 01.07.1961, filho de
António Silva e de Maria Amélia Pimenta, residente na Rua João Xavier de
Carvalho, Bloco 7, Oliveira do Castelo, Guimarães, titular do B.I. nº 5831204,
emitido em 22/07/1977;
13. CARLOS SAMPAIO TEIXEIRA, casado, industrial, sócio-gerente
da empresa “Carlos Sampaio Teixeira e Irmão, Ldª” (“Fábrica de Calçado
Jonil”), natural da freguesia de Lagares, concelho de Felgueiras, nascido no dia
16.06.1953, filho de José Teixeira e de Luzia de Sampaio, residente no Lugar da
Cachada, nº 307, Margaride, Felgueiras, titular do B.I. nº 3918141, emitido em
08.03.2004, pelo arquivo de identificação do Porto;
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14. MARIA AUGUSTA FARIA FERREIRA NEVES, casada, docente
universitária, ex-administradora da empresa “Calzeus Calçados, S.A.”, natural
da freguesia de Lagares, concelho de Felgueiras, nascida no dia 25.04.1949,
filha de António Ferreira de Melo e de Maria de Lurdes Faria, residente na Rua
Eça de Queirós, nº 321, 1º esquerdo, Rio Tinto, titular do B.I. nº 1781860,
emitido em 18.02.2005, pelo arquivo de identificação do Porto;
15. HORÁCIO RUI LOURENÇO DA COSTA, casado, gestor de
seguros, natural da freguesia de Margaride (Santa Eulália), concelho de
Felgueiras, nascido no dia 27.07.1964, filho de José Maria Costa e de Beatriz
Cândida Lourenço, residente no lugar da Boavista, nº 816, Silvares, S. Martinho,
4820-703, Fafe, titular do B.I. nº 7005515, emitido em 07.11.2001, pelo arquivo
de identificação de Lisboa; e
16. JOAQUIM MAGALHÃES DE FREITAS, casado, empresário,
natural da freguesia de Torrados, concelho de Felgueiras, nascido no dia
02.11.1955, filho de Joaquim de Freitas e de Maria de Lurdes Alves Magalhães,
residente no Lugar de Bouça, Torrados, Felgueiras, titular do B.I. nº 3327612,
emitido em 25.03.1998, pelo arquivo de identificação do Porto;
Imputando:
à arguida Maria de Fátima da Cunha Felgueiras Almeida de Sousa Oliveira
- com as condutas descritas no capítulo 1º, a prática de 5 (cinco) crimes de
participação económica em negócio, p. e p. pelo art. 23º, nº 1, da Lei n.º 34/87, de
16/07;
- com as condutas descritas no capítulo 2º, a prática de 6 (seis) crimes de
corrupção passiva para acto ilícito, p. e p. pelo art. 16º, nº 1, da Lei nº 34/87, de 16/07;
- com as condutas descritas nos capítulos 5º, 6º e 11º, a prática de 4 (quatro)
crimes de abuso de poderes, p. e p. pelo art. 26º, nºs 1 e 2, da Lei nº 34/87, de 16/07;
- com as condutas descritas nos capítulos 4º e 5º, a prática de 3 (três) crimes de
prevaricação, p. e p. pelo art. 11º, da Lei nº 34/87, de 16/07;
- com as condutas descritas nos capítulos 7º e 8º, a prática de 2 (dois) crimes de
peculato, p. e p. pelo art. 20º, nº 1, da Lei nº 34/87, de 16/07;
- com as condutas descritas no capítulo 9º, a prática de 1 (um) crime de peculato,
sob a forma continuada, p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 30º, nº 2, do
Código Penal e 20º, nº 1, da Lei nº 34/87, de 16/07; e
- com as condutas descritas no capítulo 10º, a prática de 2 (dois) crimes de
peculato de uso, sob a forma continuada, p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts.
30º, nº 2, do Código Penal e. 21º, nºs 1 e 2 da Lei nº 34/87, de 16/07;
ao arguido Júlio Manuel Castro Lopes Faria, com as condutas descritas no
capítulo 1º, a prática de 2 (dois) crimes de participação económica em negócio, p. e p.
pelo art. 23º, nº 1, da Lei nº 34/87, de 16/07 e art. 28º do Código Penal;
ao arguido Vítor Manuel da Silva Borges, com as condutas descritas no
capítulo 1º, a prática de 5 (cinco) crimes de participação económica em negócio, p. e p.
pelo art. 23º, nº 1, da Lei nº 34/87, de 16/07, e art. 28º do Código Penal;
ao arguido Carlos António Miranda Marinho, com as condutas descritas no
capítulo 1º, a prática de 5 (cinco) crimes de participação económica em negócio, p. e p.
pelo art. 23º, nº 1, da Lei nº 34/87, de 16/07, e art. 28º do Código Penal;
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ao arguido José António Barbieri Cardoso, com as condutas descritas no
capítulo 1º, a prática de 3 (três) crimes de participação económica em negócio, sob a
forma de cumplicidade, p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 23º, nº 1, da Lei nº
34/87, de 16/07, e arts. 27º e 28º, ambos do Código Penal;
ao arguido Gabriel Ângelo dos Santos Ferreira de Almeida, com a conduta
descrita no capítulo 1º, a prática de 1 (um) crime de participação económica em
negócio, sob a forma de cumplicidade, p. e p. pelo art. 23º, nº 1, da Lei n.º 34/87, de
16/07, e arts. 27º e 28º do Código Penal;
ao arguido António Pereira Mesquita de Carvalho, com as condutas descritas
no capítulo 6º, a prática de 1 (um) crime de abuso de poderes, p. e p. pelo art. 26º, nºs 1
e 2, da Lei nº 34/87, de 16/07;
ao arguido António José Leite Bragança da Cunha, com a conduta descrita
no capítulo 2º, a prática de 1 (um) crime de corrupção passiva para acto ilícito, p. e p.
pelo art. 16º, nº 1 da Lei nº 34/87, de 16/07 e 28º do Código Penal;
aos arguidos Anastácio Augusto Pinto de Macedo; Guilherme da Silva
Almeida; José Manuel Pimenta da Silva; Joaquim Teixeira Pinto; Carlos Sampaio
Teixeira e Maria Augusta Faria Ferreira Neves, com as condutas descritas no
capítulo 2º, relativamente a cada um deles, a prática de 1 (um) crime de corrupção
activa, p. e p. pelo art. 374º, nº 1 do Código Penal;
ao arguido Horácio Rui Lourenço da Costa, com as condutas descritas nos
capítulos 1º e 2º, sob a forma de cumplicidade:
- a prática de 2 (dois) crimes de participação económica em negócio, sob a
forma de cumplicidade, p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 23º, nº 1, da Lei nº
34/87, de 16/07, e arts. 27º e 28º, ambos do Código Penal; e
- a prática de 2 (dois) crimes de corrupção passiva para acto ilícito, p. e p. pelos
arts. 16º, nº 1 da Lei nº 34/87, de 16/07 e arts. 27º e 28º, ambos do Código Penal.
e ao arguido Joaquim Magalhães de Freitas, com as condutas descritas nos
capítulos 1º e 2º, sob a forma de cumplicidade:
- a prática de 2 (dois) crimes de participação económica em negócio, sob a
forma de cumplicidade, p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 23º, nº 1, da Lei nº
34/87, de 16/07, e arts. 27º e 28º, ambos do Código Penal; e
- a prática de um 1 (um) crime de corrupção passiva para acto ilícito, p. e p. pelo
art. 16º, nº 1 da Lei n.º 34/87, de 16/07 e arts. 28º e 27º do Código Penal.
tudo nos termos dos factos constantes do despacho de pronuncia de fls 10286 e
ss., cujo teor aqui se dá por reproduzido.
O MP, em representação do Mnicípio de Felgueiras, deduziu pedido de
indemnização cível a fls. 6214 e ss., pedindo a condenação:
- dos arguidos Júlio Faria e Fátima Felgueiras a pagar solidariamente a
quantia global de 157.069.761$00 (ou 785.349,50 euros), como reparação pelos
prejuízos sofridos com as condutas descritas nos itens 1º a 7º do PIC em causa,
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acrescida dos juros de mora à taxa legal, contados desde a data de cada um dos
pagamentos em causa, custas e demais despesas legais;
- da arguida Fátima Felgueiras no pagamento à CMF da quantia de 680.380$00
(ou 3.393,72 euros), como reparação pelos prejuízos sofridos com as condutas descritas
nos itens 8º, 9º, 10º e 11º do PIC, acrescida dos juros de mora à taxa legal, contados
desde a data de cada um dos pagamentos em causa, custas e demais despesas legais;
- do arguido Barbieiri Cardoso no pagamento solidário com a arguida Fátima
Felgueiras à CMF da quantia de 118.750$00 (ou 592,32 euros), como reparação pelos
prejuízos sofridos com as condutas descritas nos itens nºs 10 e 15º do PIC, acrescida dos
juros de mora à taxa legal, contados desde a data de cada um dos pagamentos em causa,
custas e demais despesas legais.
A arguida Fátima Felgueiras apresentou contestação escrita, junta a fls 8935 e
ss. (arrolando igualmente testemunhas), reiterada a fls 11081 e ss., onde, em síntese,
nega a prática dos crimes que lhe são imputados.
No que respeita ao PIC deduzido, concluiu que, não tendo praticado qualquer
crime, não se constituiu na obrigação de indemnizar (cfr. a posição expressa no corpo da
primeira contestação apresentada e a posição expressa na contestação autónoma
deduzida relativamente ao PIC, junta a fls 11566).
O arguido Júlio Faria apresentou contestação escrita a fls 8759 e ss.,
reproduzida a fls 10923 e 11294 (arrolando igualmente testemunhas), suscitando a
questão prévia da concretização da acusação no que a si diz respeito; no mais, em
síntese, negou a prática dos crimes que lhe são imputados e invocou factos do seu
percurso de vida pessoal, donde resulta que é pessoa socialmente bem integrada.
No que respeita ao PIC deduzido, o arguido Júlio Faria suscitou a questão do
MP não poder, em representação da CMF, deduzir o PIC em causa, entendendo assim
que o município felgueirense não se acha devidamente representado em juízo; quanto ao
mais, impugna a matéria constante do PIC.
Os arguidos Vítor Borges e Carlos Marinho deduziram contestação escrita a
fls. 9051 e ss., reiterada a fls 10921 (onde também arrolaram testemunhas), chamando
de novo à colacção o facto de não serem titulares de cargos políticos (pelo que não lhes
pode ser feita a imputação dos crimes referidos na pronúncia) e negando em todo o caso
a prática dos crimes que lhes são imputados (impugnando factos e contextualizando de
forma diversa outros). Invocam ainda as respectivas condições sócio-económicas, donde
resulta que são pessoas socialmente bem integradas.
O arguido Barbieri Cardoso, por sua vez, apresentou contestação escrita a fls
8832 e ss., reiterada a fls 11067 e ss. (onde também arrolou testemunhas), tendo negado
a prática dos crimes que lhe são imputados, invocando além do mais desconhecer
qualquer esquema que visasse a obtenção de fundos destinados a financiar as
actividades partidárias do PS local e a custear despesas pessoais de outros arguidos.
Quanto ao PIC contra si deduzido, contestou-o a fls 8830 e ss. (que reiterou a fls
11386), pugnando pela sua absolvição.
Por seu turno, o arguido Gabriel Almeida apresentou também contestação a fls
8908 e ss., reiterada com ligeiras diferenças a fls 11389 e ss., onde arrolou testemunhas
e invocou desde logo a ofensa do caso julgado, pois é-lhe imputada uma conduta na
pronúncia quando da respectiva fundamentação resulta que pelo mesmo seria não
pronunciado; quanto ao mais, negou a prática de qualquer crime, tanto mais que só
entrou ao serviço da “Resin” em 01.09.97, sendo por isso alheio a qualquer plano
criminoso que porventura anteriormente tivesse sido acordado entre outros arguidos e a
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que, em todo o caso, não aderiu. Invoca ainda a sua boa conduta anterior e posterior aos
factos.
O arguido António Pereira Mesquita Carvalho deduziu também contestação
escrita, junta a fls 8918 e ss. e com ligeiras diferenças reiterada a fls 11401 e ss., onde
nega a prática do crime que lhe é imputado e invoca a sua boa conduta anterior e
posterior aos factos.
O arguido António José Leite Bragança da Cunha deduziu contestação
escrita a fls 8881 e ss., onde desde logo invoca a inconstitucionalidade do artº 16º, nº 1,
da Lei nº 34/87, de 17.07, por violação dos princípios da exigibilidade ou necessidade,
da proporcionalidade e da adequação, em face da circunstância de no respectivo tipolegal se cumular a pena de prisão com pena de multa, sendo certo que, sendo tal norma
inconstitucional (não podendo assim ser aplicada pelo Tribunal), não poderá igualmente
ser aplicada a Lei nº 108/2001, que alterou a Lei nº 34/87, sob pena de violação dos
princípios da não rectroactividade e da legalidade. Além disso, não tendo sido titular de
qualquer cargo político, não lhe pode ser imputado o crime referido na pronúncia no que
a si concerne; quanto ao mais, impugna os factos que lhe são imputados e invocou a sua
integridade e honestidade.
O arguido Guilherme da Silva Almeida, por seu turno, apresentou contestação
escrita a fls. 8866 e ss., reiterada a fls 10933 (tendo arrolado testemunhas), onde, em
síntese, nega a prática dos factos que lhe são imputados; mais invoca factos acerca da
sua vida pessoal, donde emerge que é pessoa socialmente integrada.
O arguido Joaquim Teixeira Pinto também apresentou contestação, junta a fls
8980 e ss. (onde arrolou testemunhas), na qual, em síntese, nega a prática do crime que
lhe é imputado na pronúncia.
O arguido José Manuel Pimenta da Silva deduziu contestação escrita e arrolou
testemunhas a fls 8723 e ss., reiterada a fls 11012 e ss., onde, em síntese, nega a prática
do crime que lhe é imputado e alega factos da sua vida pessoal donde emerge que é
pessoa socialmente bem inserida.
O arguido Carlos Sampaio Teixeira apresentou contestação e rol de
testemunhas a fls 8720 e ss., reiterada a fls 11009 e ss., onde , em síntese, nega a prática
do crime que lhe é imputado e alega factos da sua vida pessoal donde emerge que é
pessoa socialmente bem inserida.
A arguida Maria Augusta deduziu contestação escrita e arrolou testemunhas a
fls 8787 e ss., reproduzida a fls 10924 e ss., onde nega a prática do crime que lhe é
imputado, sendo certo que, na sua óptica, a factualidade descrita na pronúncia se
consubstanciaria, quando muito, na prática de um crime de extorsão pelos arguidos
Fátima Felgueiras e António Bragança da Cunha.
O arguido Horácio Costa deduziu também contestação e arrolou testemunhas a
fls 9031 e ss., reiterada a fls 11533 e ss., onde, em síntese, nega a prática dos factos e
dos crimes que lhe são imputados, alegando, além do mais, que sempre actuou de
acordo com as ordens da arguida Fátima Felgueiras (de quem era assessor), sendo certo
que foi na convicção de que nenhuma ilegalidade havia sido praticada que recebeu da
“Resin” os donativos referidos na pronúncia. Referiu ainda que, em caso de
condenação, a pena a impôr-lhe deverá ser especialmente atenuada.
Realizou-se a audiência de julgamento, com a observância dos formalismos
legais, como da respectiva acta consta.
Na audiência de julgamento foi declarada a prescrição do procedimento
criminal movido contra a arguida Fátima Felgueiras no que respeita ao crime de abuso
de poder de que também veio pronunciada, emergende dos factos constantes do
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capítulo 5º da pronúncia (cfr. despacho de fls 13927, proferido na 94ª sessão de
julgamento).
O julgamento prosseguiu porém para apuramento da demais matéria.
*
O arguido Gabriel Almeida, na sua contestação, suscita a questão da ofensa de
caso julgado.
Cumpre apreciar e decidir:
Conforme adverte Lopes do Rego (citado no Cód Proc. Penal Anotado de Simas
Santos e Leal Henriques, 1º vol., pág.375) a eliminação no Cód. Proc. Penal vigente das
matérias sobre caso julgado estabelecidas no C.P.P.1929 pode originar dificuldades e
levar a situações injustas e inconvenientes.
Com efeito, pese embora o caso julgado não deixe de estar previsto em várias
disposições do actual CPP (v.g. artºs 84º, 396º, nº4, 399º, 400º, 411º, 427º e 467º, nº1),
as mesmas são manifestamente insuficientes para abarcar todo o regime deste instituto.
Dessas dificuldades dá-se conta a jurisprudência, designadamente do STJ,
hesitante entre a solução que, no atinente ao caso julgado, preconiza que se deve
recorrer à regulamentação do Cód. Proc. Civil (v.g. acórdão de 05.07.94) e a posição
que entende dever-se considerar ainda em vigor “as disposições regulamentares do
tema que constavam do C.P.P.1929, na medida em que traduzem os princípios gerais
de direito penal vigentes entre nós”, (como se considera no acórdão de 31.10.91, in
BMJ 410º, pág. 437; e ainda na fundamentação do Assento de 27.01.93; DR-I Série A.,
de 10 de Março – hoje acórdão uniformizador de jurisprudência -, e do Assento nº
3/2000, de 15.12.99, in DR-I Série A, de 11.02.2000, págs. 518 e 519).
Ora, seja qual for o caminho a seguir, no caso presente, é manifesto que assiste
razão ao arguido Gabriel Almeida.
De facto, a questão prévia suscitada prende-se com o facto de no despacho de
pronúncia o arguido Gabriel Almeida ter sido despronunciado pela prática de 2 (dois)
crimes de corrupção activa p. e p. pelo art. 374º do C.P. ou pelo art. 18º, nº 1 da Lei nº
34/87, de 16/07, na redacção dada pela Lei nº 108/2001, de 28/11, e de 1 (um) crime de
participação económica em negócio, p. e p. pelo art. 23º, nº 1 do referido diploma, e
ambos na forma de cumplicidade, referentes ao capítulo 1º, na medida em que:
- entre os crimes de corrupção activa e os crimes de participação económica em
negócio apenas existe uma relação de concurso aparente;
- não se recolheram indícios suficientes para que o arguido Gabriel fosse
pronunciado por um dos crimes de participação económica em negócio, sob a forma de
cumplicidade, de que também vinha a acusado, conduta essa reportada a uma suposta
entrega de 20.000 cts em Dezembro de 1998 da “Resin” ao FCF, entrega essa efectivada
– segundo a acusação - através desse arguido, juntamente com o arguido Carlos
Marinho, ao arguido Horácio Costa, o qual encaminhou tal verba para o FCF.
Ora, como é bom de ver, tendo sido despronunciado pela prática daquela
conduta (além do mais por não se terem recolhido indícios suficientes de que ele tenha
acompanhado o arguido Carlos aquando da entrega dessa verba), não pode depois o
despacho de pronúncia voltá-la a incluir no corpo dos factos imputados aos arguidos,
sob pena da decisão ser entre si contraditória, ainda que apenas venha a imputar a
prática do crime em causa ao arguido Carlos Marinho.
Tendo presente o objecto do processo, tal como delimitado pela acusação e
depois comprimido pela pronúncia, é forçoso concluir que, em face da respectiva
fundamentação, a menção da pessoa do arguido Gabriel a fls 10348, correspondente à
página 138 daquele despacho – no segmento “Em 30/12/98, o arguido Horácio Costa
foi então contactado, nas instalações da CMF, pelos arguidos Gabriel Ferreira de
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Almeida e por Carlos Marinho (quadros superiores da “RESIN”)” -, se deveu a mero
lapso ao decalcar-se a segunda da primeira pronúncia proferida nos autos, numa
operação informática de copy e paste.
Consequentemente, na procedência da excepção em causa, dá-se como não
escrita a menção ao arguido Gabriel Almeida no segmento em causa do despacho
da pronúncia, acima transcrito.
*
O arguido Júlio Faria, na sua contestação ao PIC, suscitou a questão da
irregularidade da representação do Município de Felgueiras pelo MP.
Cumpre apreciar e decidir:
O MP deduziu o PIC de fls 6214 e ss., em representação do Município de
Felgueiras, ao abrigo do disposto nos artgs 3º, nº 1, al. a), e 5º, nº 1, al. b), da Lei nº
60/98, de 27.08.
O arguido Júlio Faria entende que o MP apenas tem uma intervenção meramente
acessória na instância cível, tanto mais que a CMF não solicitou que o MP a
representasse para esse efeito.
Sucede que a fls 6052 a CMF, representada pelo seu vice-presidente, manifestou
a intenção de deduzir PIC (caso viessem a ser provados prejuízos), solicitando para o
efeito a intervenção do MP (portanto, em representação do respectivo município).
Cai assim pela base a argumentação que a propósito foi aduzida pelo arguido
Júlio Faria, pelo que se julga improcedente a excepção dilatória em causa.
*
No mais, mantêm-se os pressupostos de validade e de regularidade da instância
verificados no momento da prolação do despacho que designou dia para audiência de
julgamento, inexistindo, por conseguinte, circunstâncias com a virtualidade de obstarem
ao conhecimento do mérito da causa.
***
FUNDAMENTAÇÃO
I – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO 1
a) – FACTOS PROVADOS:
1. Factos provados relacionados com o 1º Capítulo da pronúncia
1.1. A propósito da Introdução.
A “RESIN – Resíduos Industriais, Ldª, com sede em Matosinhos, é uma
sociedade que inicialmente tinha por objecto a recolha, transporte, deposição e
tratamento de todos os tipos de resíduos industriais, bem como a exportação de resíduos
industriais tóxico-perigosos, representação, importação e comercialização de
equipamentos e ainda estudos e projectos técnicos de despoluição, sendo certo que mais
tarde o respectivo objecto social foi alterado/alargado, mantendo-se porém sempre
vocacionada para a área do tratamento dos lixos.
Por escritura realizada em 26.05.92, a “Resin – Resíduos Industriais, Ldª”
procedeu a uma cessão de quotas passando a sociedade “Societé Industielle de
Transports Automobilles – Sita” a ter uma quota equivalente a 14.300.000$00, num
capital global de 52.000.000$00.
1
A propósito da motivação de facto, o Tribunal não tomará posição acerca de comentários, conclusões e
matéria de direito contida na pronúncia, no PIC e nas contestações.
8
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
E em 05.04.94 a “Resin – Resíduos Industriais, Ldª” foi transformada em
sociedade por acções, nominativas e ao portador, passando a ter a designação “Resin Resíduos Industriais, SA”.
Em meados de 1995 a “Empresa de Construções e Obras Públicas Arnaldo de
Oliveira, SA” (“ECOP”) adquiriu 116.108 acções da “Resin - Resíduos Industriais,
SA”, passando assim a ser accionista da mesma.
Essa empresa dedicava-se, desde 1989 e de uma forma inovadora no nosso país,
à resolução dos problemas relacionados com os resíduos em diversas autarquias, sendo
uma das poucas empresas que, à data, em Portugal, tinha capacidade para tratar
convenientemente quer dos resíduos sólidos urbanos quer dos resíduos industriais.
De facto, conforme já referido, a partir de Maio de 1992 a “Societé Industielle
de Transports Automobilles – Sita” passou a ser sócia da “Resin – Resíduos Industriais,
Ldª”, pelo que a partir desse momento esta última começou a apresentar o seu know how
às autarquias portuguesas no que se refere à recolha de resíduos sólidos urbanos, ao
tratamento do lixo e à construção e manutenção de aterros sanitários.
À data, em Portugal, o assunto era ainda pouco explorado e poucas empresas se
dedicavam a tal mercado.
Em 1993, a “Resin”, juntamente com a sua sócia francesa, resolveram levar a
cabo uma campanha de sensibilização junto de autarcas e técnicos para o que já se fazia
neste âmbito na Europa, com vista a definitivamente terminar em Portugal com as
lixeiras a céu aberto e com os perigos para a saúde pública a estas inerentes.
Assim, foi efectuada uma acção comercial pela “Resin” em diversas câmaras
municipais do Vale do Sousa, do Planalto Beirão e do Grande Porto.
Foram estudadas as lixeiras e apresentadas propostas para as transformar, tendo
as diversas autarquias analisado as propostas apresentadas com a garantia do sucesso.
Nessa altura, a situação da lixeira de Sendim caracterizava-se pela deposição
descontrolada dos resíduos e pela sua autocombustão, com a inerente proliferação de
cheiros, fumos e insectos, com riscos ambientais e para a saúde pública.
Ora, a contratação de facto da “Resin” pela CMF para operar na lixeira de
Sendim (primeiro para a reabilitar sumariamente e depois para a explorar), sendo uma
das poucas empresas em Portugal que na altura (em 1993) tinha capacidade para tratar
dos resíduos sólidos urbanos e industriais, deveu-se ao facto da edilidade ter-se visto
confrontada de forma eminente com a circunstância de não ter local onde depositar tais
resíduos, na medida em que o dono do respectivo terreno, a testemunha Menezes Basto,
cessado o respectivo contrato de locação desse imóvel com a CMF, não pretendia
permitir a continuação dessa deposição nos moldes descontrolados que até então se
verificavam, em face, designadamente, dos cheiros e dos fumos provocados pela
combustão dos resíduos no local, com prejuízo para o meio ambiente e para a saúde
pública das populações que então viviam nas imediações dessa lixeira, o que aliás era
alvo de contestação popular.
Foi pois por isso que em Agosto de 1993 o arguido Júlio Faria, então presidente
da CMF (e que havia tomado conhecimento da “Resin” numa das acções de marketing
acima referidas), contactou telefonicamente com urgência o arguido Vítor Borges (que
então gozava férias no Algarve), no sentido deste se deslocar de imediato a Felgueiras –
o que fez - e de apresentar uma solução satisfatória para o tratamento dos resíduos na
lixeira de Sendim, reabilitando-a, de modo a convencer o dono do respectivo terreno a
permitir a continuação da deposição (controlada) dos resíduos sólidos urbanos e
industriais do concelho felgueirense.
9
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Verificava-se aliás, ao tempo, grande oposição da população de Sendim à
continuação da deposição descontrolada dos resíduos naquele local, chegando ao ponto
de ocorrer manifestações, pelas razões já referidas.
A “Resin” apresentou então uma proposta (à CMF e à testemunha Menezes
Basto) de resolução dos problemas que diariamente surgiam na lixeira de Sendim,
convencendo-os dos seus bons serviços nessa área.
Foi na sequência desse contacto e dessa proposta que a “Resin” passou então a
operar na lixeira de Sendim a partir de Dezembro de 1993, primeiro numa missão de
reabilitação sumária, que durou 6 meses, e depois de exploração até ao respectivo
encerramento.
Tendo executado, ainda que recorrendo a outras empresas, os serviços
necessários à reabilitação da lixeira de Sendim e tendo procedido posteriormente à
respectiva exploração, colocou-se desde logo o problema do pagamento desses serviços,
já que inexistia qualquer suporte contratual que o permitisse e a CMF, por razões de
ordem legal e administrativa, à data, não podia contratar directamente com a “Resin”, de
modo que os responsáveis camarários viram-se na necessidade de encontrar expedientes
aparentemente legais que permitissem à edilidade proceder aos respectivos pagamentos.
Assim, para que fosse possível à CMF proceder de facto ao pagamento dos
serviços prestados pela “Resin” na lixeira de Sendim, os arguidos Júlio Faria, Fátima
Felgueiras e Vítor Borges precisavam de superar uma dificuldade adicional que
consistia em a “RESIN” não possuir alvará de construção civil e obras públicas que lhe
permitisse executar empreitadas de tratamento de resíduos sólidos urbanos, bem como o
facto da CMF, até Dezembro de 1994, não ser a proprietária dos terrenos onde se
situava a lixeira de Sendim.
Ora, para ultrapassar essa questão da falta do alvará legalmente exigido e do
facto da edilidade não ser a proprietária do terreno onde os lixos eram depositados, foi
então necessário utilizar suportes formalmente legais que permitissem à CMF justificar
o pagamento de tais empreitadas à “RESIN”, seja aparecendo como oponente aos
concursos públicos consorciada com outras empresas, seja apresentando declaração de
que os trabalhos seriam realizados por uma outra empresa a ela associada, seja
aparecendo uma empresa àquela ligada como oponente (simulada) aos referidos
concursos.
Para esse efeito, o arguido Vítor Borges, da “RESIN”, lançou mão das relações
privilegiadas que tinha com as empresas “Norlabor – Sociedade de Prestação de
Serviços, Lda.”; “Craveira – Sociedade de Construção e Obras Públicas e
Empreendimentos, Lda.”; “Translousada – Soc. de Aluguer de Equipamentos, S. A.” e
“ECOP – Empresa de Construções e Obras Públicas Arnaldo Oliveira, S. A.”,
nomeadamente celebrando com tais empresas contratos de consórcio que lhe permitiram
concorrer aos referidos concursos públicos limitados.
Assim, a empresa “Norlabor – Sociedade de Prestação de Serviços, Lda.”,
a) em Abril de 1995, celebrou, com a “RESIN”, um contrato de
Consórcio tendo como objecto a manutenção e exploração (até ao seu
encerramento definitivo), do Aterro de Sendim – Felgueiras;
b) dois dos seus sócios, José António de Barros de Sousa e Carlos
Ferreira de Sousa, eram, simultaneamente, sócios da empresa
“Craveira – Sociedade de Construções e Obras Públicas e
Empreendimentos, Lda.” e da empresa “TRANSLOUSADA –
Sociedade de Aluguer de Equipamentos, S. A.”;
10
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
c) venceu os concursos (para adjudicação das empreitadas de
construção) de cinco dos nove Ecopontos, promovidos e adjudicados
pela AMVS;
d) prestou serviços para a “RESIN”, em regime de subempreitada, no
encerramento das lixeiras dos municípios integrados na AMVS
(trabalhos inseridos nas empreitadas de construção dos Aterros
Intermunicipais e RIB).
A empresa “Craveira – Sociedade de Construção e Obras Públicas e
Empreendimentos, Lda.”, que tinha sócios comuns à “Norlabor – Soc. de Prestação de
Serviços, Lda.” e à “Translousada – Soc. de Aluguer de Equipamentos, S. A.”, veio a
ser oponente em diversos concursos lançados em execução do plano delineado, para
completar o número mínimo de concorrentes necessário para a validade formal do
concreto procedimento imposto por lei de acordo com o valor da obra, embora nenhuma
empreitada lhe tenha sido adjudicada.
A empresa “Translousada – Soc. de Aluguer de Equipamentos, S. A.”:
a) prestou durante vários anos, serviços para a “RESIN”,
nomeadamente, fornecendo material para esta operar nas
lixeiras/aterros (designadamente, na lixeira de Sendim);
b) prestou vários serviços para a “RESIN”, em regime de
subempreitada, no encerramento das lixeiras dos municípios
integrados na AMVS (trabalhos inseridos nas empreitadas de
construção dos aterros intermunicipais e RIB);
c) prestou serviços, de forma directa, para a CMF, serviços estes
relacionados com a manutenção e reparação de máquinas e viaturas;
d) tinha sócios comuns à “Norlabor” e à “Craveira”.
A empresa “ECOP – Empresa de Construções e Obras Públicas Arnaldo
Oliveira, S. A.”;
a) adquiriu durante o ano de 1995, 20% das acções da sociedade
“RESIN”, situação que se manteve até ao ano de 1999;
b) concorreu e venceu, associada à “RESIN”, os três concursos lançados
pela AMVS para a construção dos Aterros Intermunicipais e
Resíduos Industriais Banais (RIB).
A “Translousada” tinha, de forma directa ou indirecta, interesse em manter um
bom relacionamento com a autarquia de Felgueiras, quer nos pagamentos efectuados
pela CMF à “RESIN”, quer relativamente à movimentação dada a tais quantias, na
medida em que a sua colaboração seria essencial para que também visse os seus
serviços prestados para a “Resin” posteriormente pagos por esta, uma vez que esta
pagaria àquela na medida em que recebesse da CMF, pese embora, não obstante esse
acordo, tenha sucedido ter recebido pagamentos da “Resin” antes desta ter recebido da
CMF.
Ora a arguida Fátima Felgueiras e o arguido Júlio Faria necessitavam de obter
verbas monetárias que lhes permitissem financiar as suas actividades partidárias, com
valor superior ao que poderiam obter pelos usuais métodos de angariação de fundos
para esse objectivo (isto é, recorrendo designadamente ao tecido empresarial
felgueirense no sentido de obter donativos, cada um dos quais não ultrapassando
usualmente as centenas de contos), e ainda custear despesas pessoais, designadamente
da arguida Fátima Felgueiras.
Assim, pelo menos em Abril de 1995, e aproveitando o facto de terem um bom
relacionamento pessoal e de negócios com o arguido Vítor Manuel da Silva Borges,
administrador da empresa “RESIN – Resíduos Industriais, S. A.”, e que vinha prestando
11
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
serviços para a CMF na lixeira de Sendim, Felgueiras, desde Dezembro de 1993 (antes
disso inexistiu qualquer relacionamento entre essa empresa e a CMF), ambos os
arguidos Maria de Fátima Felgueiras e Júlio Faria combinaram e acordaram com aquele
um esquema que lhes permitisse obter as pretendidas verbas para financiamento das
respectivas actividades partidárias, entre as quais a campanha eleitoral referente às
eleições autárquicas de 1997, sob a aparência de resolução da questão do tratamento dos
resíduos sólidos urbanos com que a autarquia se deparava, aproveitando o lançamento
do concurso limitado denominado de “Manutenção do Aterro Sanitário – Execução de
Plataformas”.
Tal esquema consistia assim em, sob impulso ou influência dos arguidos Maria
de Fátima Felgueiras e Júlio Faria na tomada de decisão nos órgãos autárquicos em que
participavam, favorecer a “RESIN” num futuro concurso público de adjudicação de uma
empreitada relacionada com o tratamento e recolha de resíduos sólidos urbanos – pois
era ela quem de facto operava na lixeira de Sendim -, concurso esse a abrir pela Câmara
Municipal de Felgueiras, e ainda celebrando, para o efeito, um contrato simulado com a
empresa “Norlabor” (que seria, como combinado, a vencedora desse concurso limitado,
mas que nada viria a fazer na lixeira, nem tal era suposto), de modo a que os
pagamentos efectuados pela edilidade no âmbito dessa empreitada tivessem como
destinatária final a “Resin”- como forma de pagamento da exploração da lixeira de
Sendim no período imediatamente subsequente ao da reabilitação - e ainda de modo a
que parte desses pagamentos revertessem para os ditos arguidos Fátima Felgueiras e
Júlio Faria, por forma a, desse modo, financiarem as respectivas actividades partidárias,
designadamente a campanha eleitoral referente às eleições autárquicas de 1997 e ainda
para custear, designadamente, algumas despesas de índole pessoal daquela.
Com efeito, os arguidos Maria de Fátima Felgueiras e Júlio Faria, enquanto
presidentes da autarquia felgueirense, influenciavam os órgãos decisórios da Câmara e
da Assembleia Municipal, perspectivando que as respectivas propostas viriam a ser
aprovadas desde que surgissem com a aparência de acto com objecto e forma legal,
assim instrumentalizando os elementos que integravam tais órgãos, levando-os, de boafé, a votar favoravelmente.
É nesse contexto que a arguida Fátima Felgueiras nunca tomou qualquer espécie
de decisão individual em matéria de tratamento dos lixos municipais, quer antes quer
depois de assumir funções como presidente da CMF, estando todo o relacionamento
desenvolvido com o proprietário dos terrenos da lixeira e com a “Resin” coberto por
deliberações colectivas unânimes da CMF (com excepção da deliberação de 05.05.90,
que foi tomada por maioria, com a abstenção da arguida Fátima e de outro vereador),
por contratos (alguns dos quais simulados) celebrados em execução dessas deliberações,
por pareceres técnicos dos serviços técnicos competentes e da assessoria jurídica da
CMF e por vistos do Tribunal de Contas que precederam sempre os pagamentos devidos
por força dos contratos celebrados (alguns dos dos quais simulados).
Por sua vez, o arguido Vítor Borges comprometeu-se a entregar aos arguidos
Maria de Fátima Felgueiras e Júlio Faria, como contrapartida por tal adjudicação e
contrato (que viria a ser celebrado entre a CMF e a “Norlabor”), uma parte das verbas
que fossem pagas de facto à “Resin” pela CMF, através das pessoas que por estes
fossem indicadas, estabelecendo dentro da sua empresa, com a colaboração do arguido
Carlos Marinho, procedimentos contabilísticos que ocultassem essas entregas, com
recurso, se necessário, à obtenção de facturas falsas (designadamente, facturas emitidas
à “Translousada” pela “Resin”, sem que na realidade estivesse subjacente a prestação de
qualquer serviço desta àquela, por forma a que contabilisticamente estivesse justificada
a transferência de verbas entre essas empresas).
12
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Para que este esquema funcionasse com benefício para todos os interessados
seria celebrado, conforme já referido, um contrato simulado com a empresa “Norlabor”,
que formalmente seria a vencedora do concurso limitado mencionado, mas que nada
viria a fazer na lixeira de Sendim, nem era suposto fazer, pois os respectivos trabalhos, à
data da celebração do respectivo contrato de empreitada, já haviam sido concluídos pela
“Resin”.
Neste contexto, já em data indeterminada de meados de 1995, a arguida Maria
de Fátima da Cunha Felgueiras Almeida de Sousa Oliveira, então vereadora na Câmara
Municipal de Felgueiras e braço direito do arguido Júlio Manuel Castro Lopes Faria,
então presidente daquela autarquia, tomou conhecimento que este último tinha a
intenção de se candidatar nas listas do Partido Socialista a um lugar de deputado na
Assembleia da República, nas eleições legislativas de 1995 (antes de meados desse ano
o arguido Júlio Faria não perspectivava sequer ser candidato pelas listas do PS a um
lugar de deputado à Assembleia da República).
Face a tal intenção, e sabendo que poderia ser a sucessora do arguido Júlio Faria
na autarquia de Felgueiras, a arguida Maria de Fátima Felgueiras resolveu começar,
desde logo, a preparar a campanha, que pretendiam grandiosa, para a sua candidatura à
presidência da Câmara Municipal de Felgueiras nas eleições autárquicas que se iriam
realizar no ano de 1997, o que tornou mais premente a necessidade de angariação de
fundos.
Depois da arguida Maria de Fátima Felgueiras ter acordado com os restantes
arguidos todos os pormenores e aspectos referentes ao esquema de movimentação de
verbas que lhe iria permitir obter quantias para financiar a sua campanha eleitoral e
despesas conexas, aquela necessitava de arranjar duas pessoas da sua inteira confiança e
que estivessem disponíveis para abrir uma conta bancária, onde pudesse depositar as
quantias monetárias provenientes da “RESIN”, bem como os vários donativos que
entretanto iria angariar junto dos industriais e munícipes do concelho de Felgueiras.
Assim, e com tal objectivo, em meados do mês de Março de 1997, os arguidos
Júlio Faria e Maria de Fátima Felgueiras deram ordens aos arguidos Horácio Costa (que
na altura exercia de facto o cargo de assessor da presidente da CMF) e Joaquim de
Freitas para que abrissem na agência bancária de Felgueiras do Banco Espírito Santo
uma conta titulada apenas por ambos (Horácio Costa e Joaquim de Freitas), destinada à
movimentação das quantias angariadas e/ou utilizadas para o pagamento de várias
despesas da sua campanha eleitoral, competindo a orientação e direcção efectiva de tal
conta bancária aos arguidos Maria de Fátima Felgueiras e Júlio Faria.
Evitar-se-ia, através de tal esquema, que fosse possível imputar à arguida Maria
de Fátima Felgueiras qualquer ligação oficial com as contas bancárias do Partido
Socialista de Felgueiras, o que lhe permitiria, simultaneamente, não só escapar ao
controle daquele partido sobre tais verbas, mas também efectuar várias despesas, tanto
de cariz pessoal como de cariz promocional da sua campanha eleitoral, sem ter de
prestar quaisquer contas.
O dito arguido Horácio Costa, aliás, havia iniciado as suas funções na CMF
como assessor pessoal da presidente da edilidade a 01.10.96, funções essas que viriam a
cessar a 31.12.98, passando a 01.01.99 a exercer as funções de vereador em regime de
permanência, as quais viriam a terminar a 01.03.2000, por despacho da arguida Fátima
Felgueiras (antes de ingressar na CMF como assessor nunca tinha exercido funções de
índole semelhante, estando mesmo completamente desintegrado da vida política e
autárquica local).
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Esse arguido agiu sempre sob as ordens e instruções da arguida Fátima
Felgueiras e do arguido Júlio Faria, existindo, pelo menos até princípios de 2000, uma
relação de grande confiança entre os arguidos Hoácio Costa, Fátima Felgueiras e Júlio
Faria.
1. 2. - A propósito do contrato de transacção celebrado entre a CMF e o
engenheiro Joaquim Menezes de Basto.
Os arguidos Júlio Faria, Maria de Fátima Felgueiras e Vítor Manuel da Silva
Borges, agindo em conjugação de esforços e de intenções, de modo a resolver o
problema da deposição descontrolada dos resíduos na lixeira de Sendim e de encontrar
um expediente que legalmente permitisse à edilidade pagar a missão de reabilitação
sumária da lixeira, aproveitaram as relações já existentes entre a CMF e o Eng. Joaquim
Menezes Basto, desde meados do ano de 1990, advindas de vários contratos de locação
referentes ao prédio rústico, a este pertencente, denominado “Tapada Grande da
Devesinha”, sito no Lugar de Francoim, Sendim, Felgueiras, com a área aproximada de
3.000 m2, onde eram depositados os resíduos sólidos urbanos do concelho de Felgueiras
e no qual a empresa “RESIN”, designadamente através da “Translousada”, desde
Dezembro de 1993, passou a efectuar trabalhos para a CMF e que se prolongaram até ao
encerramento dessa lixeira.
Estes contratos entre a CMF e o Eng. Joaquim Menezes Basto vigoravam desde
01.6.1986, tendo sido renegociadas novas condições que produziram efeitos nos
períodos compreendidos entre 01.11.1990 e 31.01.1991, 01.02.1992 e 31.07.1992 e
1.02.1993 e 31.08.1993.
As cláusulas contratuais vigentes no ano de 1993, decorrentes das condições
introduzidas desde 1990, estipulavam:
• o pagamento, pela CMF, de uma renda de Esc. 150.000$00/mês;
• a devolução do terreno ao seu proprietário, devidamente limpo e
após cobertura com terra dos resíduos depositados, no final do
período estabelecido, e
• para o caso de incumprimento da anterior, a cláusula penal
compulsória de Esc. 60.000$00 por cada dia de mora na entrega
do imóvel
Pretendendo realizar um contrato de empreitada com a “RESIN” que, como
acima exposto, não possuía o necessário alvará, os ditos arguidos resolveram aproveitar
uma reclamação do Eng. Joaquim Menezes Basto (quanto à forma como os resíduos
continuavam a ser descontroladamente depositados no seu imóvel) para o interpor como
contratante da mesma pelo que, enquanto a CMF negociava a aquisição do terreno em
causa, decidiram propor ao executivo municipal a celebração, com este, de um outro
contrato que lhes permitisse alcançar tal desiderato.
Para o efeito, no dia 01.10.1993, a arguida Maria de Fátima Felgueiras, na
qualidade de vereadora da CMF, apresentou ao executivo camarário (que a aprovou na
sessão realizada em 04.10.1993), uma proposta, elaborada por si ou pelos serviços sob
sua directa orientação, invocando a existência de “... diversos estragos e deteriorações
causados pela deficiente acomodação dos lixos e respectivas infiltrações.”, bem como
o facto de não ter sido possível encontrar outro terreno para aquela finalidade,
pretextando ainda “... evitar o recurso a Juízo a fim de ser determinado o direito de
cada parte e a respectiva indemnização ...” de celebração de um contrato de transacção
com o Eng. Joaquim Menezes Basto, “visando o pagamento de Esc. 32.410.480$00
(trinta e dois milhões, quatrocentos e dez mil e quatrocentos e oitenta escudos) ... a
título de indemnização por todos os danos emergentes dos contratos de locação...”, que
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
englobava uma compensação no montante de Esc. 6.500.000$00, já assumida pela
CMF, e uma indemnização por mora relativa ao último contrato de locação (01.02.1993
e 31.08.1993), no valor de 7.200.000$00. Este valor seria liquidado em sete prestações
mensais – as primeiras seis no montante de Esc. 5.235.080$00 e a última de Esc.
1.000.000$00 -, ficando os pagamentos condicionados à obtenção do visto do Tribunal
de Contas (TC).
Este contrato foi outorgado no dia 25.11.1993, nos exactos termos da proposta
supra referida, nele se estipulando:
• a obrigação, para a CMF, de recuperação, aterro e nivelamento do
terreno objecto do contrato, no prazo de seis meses, por
intermédio de um terceiro escolhido pelos contraentes (CMF e
Joaquim Menezes Basto);
• a obrigação, para o vendedor, de proceder a “...uma missão de
reabilitação sumária e de exploração provisória do aterro, com
execução regular e faseada, nos termos das condições técnicas
constantes de documento anexo”; e
• o direito de a CMF suspender o pagamento das prestações,
relativas à indemnização indicada, caso os trabalhos não
estivessem a ser executados de acordo com as condições técnicas
constantes de um anexo ao contrato.
Na execução do que tinha sido previamente acordado entre os arguidos Maria de
Fátima Felgueiras, Júlio Faria e Vítor Borges, o “terceiro escolhido” para reabilitar e
explorar o aterro foi a “RESIN”.
Uma vez que a reabilitação do terreno constituía obrigação do vendedor,
ultrapassava-se por esta via o impedimento legal da “RESIN” não ser possuidora de
alvará para executar tal empreitada e do terreno à data não pertencer à autarquia, pois
era contratada por um particular – o Eng. Menezes Basto.
Entretanto, a CMF negociara com o Eng. Joaquim Menezes Basto a aquisição do
terreno em causa e, com base em proposta igualmente apresentada pela arguida Maria
de Fátima Felgueiras fundada nos mesmos argumentos que suportaram a proposta de
contrato de transacção, decidiu, na mesma sessão de 04.10.1993, celebrar com aquele
um contrato-promessa de compra e venda tendo por objecto o terreno onde vinham
sendo depositados os lixos recolhidos na área abrangida pelo concelho de Felgueiras.
A outorga deste contrato realizou-se em 22.11.1993 sendo aquele município
representado pelo seu presidente, o arguido Júlio Faria.
O preço acordado foi de Esc. 25.754.820$00 (vinte e cinco milhões, setecentos e
cinquenta e quatro mil e oitocentos e vinte escudos), embora ficando a constar apenas a
quantia de Esc. 24.754.820$00 (vinte e quatro milhões, setecentos e cinquenta e quatro
mil e oitocentos e vinte escudos) que seria paga em diversas prestações mensais - uma
prestação inicial de Esc. 2.750.540$00 e oito prestações sucessivas de Esc.
2.750.535$00, condicionado à obtenção de visto do Tribunal de Contas, mas evitando a
sua apreciação pela Assembleia Municipal.
Nesse contrato estipulava-se que:
• a escritura definitiva seria celebrada na primeira quinzena de
Abril de 1994;
• a transmissão da posse ocorreria por mero efeito do contrato
promessa;
• a CMF obrigava-se a construir um aterro sanitário no final do
período de exploração provisória da lixeira,
15
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
•
podendo adquirir, se necessário, mais terreno ao Eng. Joaquim
Menezes Basto,
• ou este exigir uma indemnização à CMF em caso de
incumprimento da construção e/ou reparação do aterro.
A diferença – Esc. 1.000.000$00 – veio a ser paga por retenção de valores
referentes ao contrato de transacção.
Em 29.03.1994, a CMF procedeu ao pagamento da quantia de Esc.
5.235.080$00 (cinco milhões, duzentos e trinta e cinco mil e oitenta escudos),
correspondente à primeira prestação dos valores referidos no contrato de transacção
celebrado com o Eng. Joaquim Menezes Basto.
Em 07.04.1994, a “RESIN” assumiu as despesas decorrentes da sujeição a visto
do TC do contrato de transacção celebrado entre a CMF e o Eng. Joaquim Menezes
Basto, no valor de Esc. 32.411$00 (trinta e dois mil e quatrocentos e onze escudos).
A escritura definitiva do contrato prometido, isto é, a escritura de compra e
venda do terreno propriedade do Eng. Joaquim Menezes Basto apenas foi celebrada no
dia 27.12.1994, nos exactos termos do referido contrato promessa, tendo a CMF sido
representada pelo Presidente Júlio Faria.
Pela missão de reabilitação da lixeira de Sendim (que durou entre Dezembro de
1993 e Maio de 1994) levada a cabo pela “Resin”, esta viria a facturar e a receber da
testemunha Menezes Basto as quantias referidas infra.
Ora, findo o período de reabilitação sumária da lixeira de Sendim levada a cabo
pela “Resin”, mostrava-se necessário manter a intervenção no local, com vista a impedir
que o depósito diário de lixos voltasse a transformar o terreno já sumariamente
reabilitado numa nova lixeira a céu aberto.
Assim, findo o dito período de reabilitação da lixeira de Sendim, em Maio de
1994, a “Resin” propôs-se a continuar o trabalho mediante o pagamento mensal da
quantia de 2.800.000$00, acrescido de IVA à taxa legal em vigor, o que fez
ininterruptamente até Abril de 1997.
Como, em face do contrato-promessa de compra e venda já referido, se previa
que findo o período da reabilitação da lixeira de Sendim a CMF já tivesse adquirido o
terreno acima identificado, a “Resin” facturou à CMF os serviços prestados na lixeira de
Sendim entre Junho de 1994 e Janeiro de 1995.
Porém, uma vez que a escritura pública de compra e venda de tal terreno não se
realizou na data constante do respectivo contrato-promessa (o que só viria a suceder em
27 de Dezembro de 1994, mas cujos efeitos financeiros só se produziriam em Janeiro de
1995 por força do visto do Tribunal de Contas), a CMF devolveu essas facturas à
“Resin” por falta de suporte legal para o respectivo pagamento, pelo que esta empresa
decidiu facturar esses serviços à testemunha Menezes Basto.
Entretanto, em Junho de 1995, a arguida Maria de Fátima Felgueiras assumiu a
presidência da Câmara Municipal de Felgueiras, em substituição do arguido Júlio Faria,
que entretanto suspendera o seu mandato e posteriormente viria a desempenhar funções
de deputado na Assembleia da República.
Já nessa condição, em 08.02.1996, a arguida Maria de Fátima Felgueiras fez
elaborar e submeteu à aprovação do executivo camarário, uma proposta de aditamento
ao contrato de transacção celebrado com o Eng. Joaquim Menezes Basto, alegando para
o efeito as seguintes razões:
a) a existência de um contrato promessa de compra e venda de uma parcela de
terreno destinado à deposição de lixos, celebrado entre a CMF e o Eng. Joaquim
Menezes Basto, em Novembro de 1993;
16
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
b) o facto de a celebração do contrato definitivo só ter ocorrido em 27.12.1994,
quando deveria ter sido celebrado em Abril de 1994, conforme constava do texto do
contrato;
c) que, até essa data, o proprietário do terreno tinha assegurado a reabilitação
sumária e a exploração provisória do aterro; e
d) que este tinha reclamado, junto da CMF, o pagamento desses serviços, no
montante de Esc. 26.462.000$00 (vinte e seis milhões e quatrocentos e sessenta e dois
mil escudos);
propondo assim aquela arguida à Câmara Municipal de Felgueiras o pagamento
de uma indemnização naquele montante pela continuidade dos trabalhos de reabilitação
e exploração do aterro, a ser processado de forma faseada (sete prestações mensais de
Esc. 3.248.000$00 e uma prestação de Esc. 3.726.000$00), dependente de visto do TC.
Depois de aprovado em reunião do executivo, através da influência exercida pela
arguida Maria de Fátima Felgueiras para o efeito, a CMF e o Eng. Joaquim Menezes
Basto celebraram o referido aditamento ao contrato de transacção, que mais não visou
que o pagamento à “Resin” dos trabalhos por esta levados a cabo na lixeira controlada
de Sendim entre Junho de 1994 e Janeiro de 1995.
Deste modo, e nos termos constantes dos contratos de compra e venda,
transacção e respectivo aditamento, o Eng. Joaquim Menezes Basto teria a receber da
CMF a quantia de Esc. 83.618.300$00 (oitenta e três milhões, seiscentos e dezoito mil e
trezentos escudos).
No entanto, a CMF apenas pagou ao Eng. Joaquim Menezes Basto as seguintes:
a) o valor total do contrato de compra e venda (Esc. 24. 754. 820$00);
b) Esc. 37.645.560$00 (trinta e sete milhões, seiscentos e quarenta e cinco mil e
quinhentos e sessenta escudos) relativo ao contrato de transacção;
No que concerne ao aditamento ao contrato de transacção, a CMF não chegou a
pagar a importância correspondente a tal contrato, tendo-se considerado o seu valor em
dívida, acabando o mesmo por transitar, sucessivamente, de um ano para o outro, nos
orçamentos apresentados pela edilidade (situação que se mantém até hoje).
As verbas recebidas pelo Eng. Joaquim Menezes Basto no âmbito do contrato de
transacção e seu aditamento foram depois transferidas por este para a “RESIN”, de
acordo com o que tinha combinado com os arguidos supra referidos.
Assim, endossou à “RESIN” os seguintes cheques:
- n.º 5207652505, emitido pela CMF no dia 30/03/1994, sacado sobre a conta n.º
00002179630, da Caixa Geral de Depósitos, agência de Felgueiras, no valor de Esc.
5.235.080$00;
- n.º 8284328904, emitido pela CMF no dia 22.06.1995, sacado sobre a conta n.º
00002179630 da Caixa Geral de Depósitos, agência de Felgueiras, no valor de Esc.
17.000.000$00;
- n.º 9811598309, emitido pela CMF no dia 25.06.1995, sacado sobre a conta n.º
00002179630 da Caixa Geral de Depósitos, agência de Felgueiras, no valor de Esc.
6.000.000$00.
O quarto cheque recebido pelo Eng. Joaquim Menezes de Basto da CMF, com o
n.º 8284328997, sacado sobre a conta n.º 00002179630 da Caixa Geral de Depósitos,
agência de Felgueiras, no montante de Esc. 11.000.000$00 (onze milhões de escudos),
17
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
não foi endossado à “RESIN”, devido ao facto de apenas uma parte do seu montante (no
caso Esc. 5.000.000$00), se destinar àquela empresa.
Na verdade, o remanescente de tal cheque, no valor de Esc. 6.000.000$00,
pertencia ao próprio Eng. Joaquim Menezes Basto e dizia respeito ao valor da compra e
venda do terreno, nele se incluindo a diferença de mil contos atrás mencionada. Visando
resolver tal diferença de verbas, o mesmo não endossou o cheque à “RESIN”, tendo
antes emitido um cheque próprio com o n.º 22543202, sacado sobre a conta n.º 211776,
da Caixa de Crédito Agrícola Mútuo, agência de Felgueiras, no valor de Esc.
5.000.000$00, entregando-o de seguida àquela empresa.
Para pagamento dos restantes Esc. 4.410.480$00, a CMF emitiu e entregou ao
Eng. Joaquim Menezes Basto o cheque n.º 2668265232, datado de 25.06.1995, sacado
sobre a conta n.º 00002179630, da Caixa Geral de Depósitos, agência de Felgueiras, que
este depositou na conta n.º 132040013061807, da Caixa de Crédito Agrícola Mútuo,
agência de Felgueiras, no dia 26.06.1998.
Desta quantia entregou Esc. 3.410.480$00 à “RESIN”, em numerário e
faseadamente, obtendo recibo global.
Correspondem, assim, os valores facturados pela “RESIN” ao Eng. Joaquim
Menezes de Basto aos pagamentos efectuados pela CMF a este último, tanto no âmbito
do contrato de transacção, como no âmbito do seu aditamento.
Entretanto, a “RESIN”, como não recebeu do Eng. Joaquim Menezes Basto a
totalidade da quantia referente ao aditamento ao contrato de transacção, porque a
mesma lhe não foi paga pela CMF, em 27 de Novembro de 1998, decidiu constituir uma
provisão para créditos de cobrança duvidosa, no montante de Esc. 24.187.400$00 (vinte
e quatro milhões, cento e oitenta e sete mil e quatrocentos escudos), no pressuposto de
que esse valor, lançado a débito na conta do cliente Joaquim Menezes Basto, seria de
cobrança difícil ou impossível - saldo reportado a 30.06.96 e a 31.08.97.
1. 3. - A propósito do concurso e adjudicação da empreitada de "Manutenção
do Aterro Sanitário - Execução de Plataformas”.
A “Resin”, não obstante por diversas vezes ter comunicado à CMF que poderia
parar o trabalho que desenvolvia na lixeira de Sendim caso não obtivesse o respectivo
pagamento, foi adiando tal tomada de posição, pois sempre acreditou na boa-fé e na
vontade de cumprir dos representantes desta.
Com a celebração do contrato de compra e venda do terreno por parte da CMF à
testemunha Menezes Basto, em 27.12.94, passou então a ser necessária a realização de
concursos (ou a desencadear procedimentos administrativos com vista ao ajuste directo)
para a adjudicação dos trabalhos de empreitada na lixeira, por forma a pagar à “Resin”
os trabalhos que esta levava a cabo no local.
Assim, pelo menos em Abril de 1995, na execução do plano acordado e acima
referenciado, os arguidos Maria de Fátima Felgueiras, Júlio Faria e Vítor Borges
resolveram, em conjugação de esforços e de intenções, simular a realização de um
concurso público que permitisse à Câmara Municipal de Felgueiras pagar a prestação
dos serviços efectuados pela “RESIN” àquela autarquia na lixeira de Sendim entre
Fevereiro de 1995 e Julho do mesmo ano, comprometendo-se, por sua vez, o arguido
Vítor Borges, administrador desta última empresa, com a colaboração do arguido Carlos
Marinho e da então futura colaboração Gabriel Ângelo Santos Ferreira de Almeida (que
só em 01.09.97 foi admitido ao serviço da “Resin”) a devolver à arguida Maria de
Fátima Felgueiras parte das verbas envolvidas na referida adjudicação da dita
empreitada.
18
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Por outro lado, os arguidos Júlio Faria e Maria de Fátima Felgueiras, para
simular o referido concurso, contaram com a colaboração activa e empenhada do
arguido Barbieri Cardoso, nomeadamente quanto à celebração do referido contrato
simulado, colaboração essa que lhes permitiu alcançar os seus objectivos, sendo certo
porém que o arguido Barbieri Cardoso ignorava que, dessa forma, os arguidos Fátima
Felgueiras e Júlio Faria receberiam vantagens patrimoniais.
Assim, e visando definir quais os parâmetros que iriam estar na base da
celebração desse contrato simulado, no dia 11 de Abril de 1995, realizou-se, nas
instalações da autarquia, uma reunião, em que estiveram presentes os arguidos Júlio
Manuel Castro Lopes Faria (presidente da Câmara), Vítor Manuel da Silva Borges
(administrador da “RESIN”), José António Barbieri Cardoso (na época, técnico superior
daquela Câmara Municipal) e a testemunha Terezinha do Nascimento Lopes Domingues
de Carvalho (responsável pela Divisão Financeira da autarquia), sendo certo que no
apontamento efectuado por esta relativamente a essa reunião o arguido Júlio Faria
despachou no sentido de ser dada cópia desse documento ao director do Departamento
Técnico (arguido Barbieri) e ao chefe da Divisão de Apoio Técnico-administrativo
(Engº Ferreira Leite), determinando-lhe que tivesse em conta o que naquela decisão
havia sido decidido.
Nesta reunião foi então decidida a abertura de mais um concurso para
adjudicação de uma Empreitada, designada por "Manutenção do Aterro Sanitário Execução de Plataformas”, a ser executada na área onde funcionava a lixeira municipal,
sita em Sendim - Felgueiras, sob a forma de concurso limitado sem apresentação de
candidaturas.
Para a boa execução do esquema acordado entre todos os referidos arguidos, era
necessário que a “RESIN” se apresentasse como oponente ao referido concurso.
No entanto, como aquela empresa não reunia as condições legais para o fazer
isoladamente, uma vez que não era titular de alvará que lhe permitisse executar obras
públicas, não sendo, de resto, esse o seu objecto social, e visando ultrapassar tal
obstáculo, a “RESIN” celebrou, em 19 de Abril de 1995 (oito dias depois da reunião)
com a “Norlabor – Sociedade de Prestação de Serviços, Lda.” (uma sociedade de obras
públicas), um contrato de consórcio.
Conforme consta do seu texto, este contrato, assinado pelo arguido Vítor Borges
(em representação da “RESIN”) e por José António Barros de Sousa e Carlos Ferreira
de Sousa (sócios da “Norlabor”), tinha por objecto, precisamente, o Aterro de Sendim –
Felgueiras e visava alegadamente a sua manutenção e exploração até ao encerramento
definitivo, sendo estabelecidas as competências e obrigações de cada uma das
outorgantes.
Em 24 de Novembro de 1995, o arguido Vítor Borges (“RESIN”) envia um
telefax à CMF, dirigido ao arguido Barbieri Cardoso, a coberto do qual envia uma
relação das empresas a quem deveria ser endereçado o convite para o concurso de
empreitada de "Manutenção do Aterro Sanitário - Execução de Plataformas".
As empresas indicadas foram, para além da própria “RESIN – Resíduos
Industriais, SA”; a “Norlabor – Sociedade de Prestação de Serviços, Lda.” (“Norlabor”);
a “Craveira – Soc. de Const. e Obras Públicas e Empreendimentos, Lda.”; a
“Translousada – Soc. de Aluguer de Equipamentos, SA” e a “ECOP – Empresa de
Construções e Obras Públicas Arnaldo de Oliveira, SA”.
Três dias depois, em 27 de Novembro de 1995, a presidente da autarquia, Maria
de Fátima Felgueiras (que, entretanto, tinha substituído o arguido Júlio Castro Faria
nessas funções), proferiu despacho através do qual determinou a abertura do referido
concurso.
19
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Esta empreitada (única) consistia, fundamentalmente, na execução de trabalhos
de movimentação de terras para a definição de plataformas, num prazo de trinta dias,
com um preço base de Esc. 17.500.000$00 (dezassete milhões e quinhentos mil
escudos), devendo a apresentação de propostas ser feita até ao dia 18.12.1995.
No seguimento desse despacho, a CMF endereçou às empresas referidas, um
“convite” para apresentação de propostas.
Em resposta ao “convite” da CMF e observando as condições da empreitada, as
sociedades referidas apresentaram as seguintes propostas:
a) a “RESIN” apresentou a sua proposta em 13.12.1995, no valor de Esc.
19.875.100$00 (dezanove milhões, oitocentos e setenta e cinco mil e cem escudos)
acrescido do respectivo IVA, e, uma vez que não era possuidora do alvará necessário
para poder concorrer à referida empreitada, declarou que para execução da empreitada
iria recorrer aos serviços da sociedade “João Tello & C. Lda.”, tendo esta empresa
apresentado declaração nesse sentido;
b) a “Craveira” apresentou a sua proposta, em 15.12.1995, no valor de Esc.
24.861.605$00 (vinte e quatro milhões, oitocentos e sessenta e um mil e seiscentos e
cinco escudos) acrescido do respectivo IVA;
c) a “Norlabor” apresentou a sua proposta, em 15.12.1995, no valor de Esc.
18.619.680$00 (dezoito milhões, seiscentos e dezanove mil e seiscentos e oitenta
escudos) acrescido do respectivo IVA;
d) a “Translousada” apresentou a sua proposta, em 15.12.1995, no valor de Esc.
21.109.400$00 (vinte e um milhões, cento e nove mil e quatrocentos escudos) acrescido
do respectivo IVA, tendo declarado que, para execução da empreitada, iria recorrer aos
serviços da sociedade “Cunha Soares & Filhos, Lda.”, tendo esta empresa apresentado
declaração nesse sentido;
e) a “ECOP” apresentou a sua proposta, em 18.12.1995, no valor de Esc.
22.757.700$00 (vinte e dois milhões, setecentos e cinquenta e sete mil e setecentos
escudos) acrescido do respectivo IVA.
Em 19.12.1995 realizou-se a sessão pública de abertura das propostas
apresentadas para a empreitada de "Manutenção de Aterro Sanitário - Execução de
Plataformas", tendo as mesmas sido apreciadas pela comissão de análise, constituída
pela presidente da autarquia, Maria de Fátima Felgueiras, pelos vereadores José Maria
Guimarães Sampaio e António Pereira Mesquita de Carvalho, estando ainda presentes
Maria Fernanda Dá Mesquita Castro Leal (Directora do Departamento Administrativo)
e o arguido José António Barbieri Cardoso.
No dia seguinte, as propostas foram apreciadas pelo Departamento Técnico
(tendo o arguido Barbieri tido intervenção na respectiva análise enquanto director desse
departamento, tendo assinado o expediente normal por força da delegação de
competências da presidente da edilidade), que se pronunciou favoravelmente pela
proposta apresentada pela “Norlabor”, em virtude de ser a de menor valor.
O contrato de adjudicação da empreitada de “Manutenção do Aterro Sanitário –
Execução de Plataformas” à “Norlabor”, pelo valor da proposta apresentada, foi
outorgado, em 24.01.1996, pela arguida Maria de Fátima Felgueiras (em representação
da CMF) e por Adriano Rafael de Sousa Ferreira e ainda por José António Barros de
Sousa (sócios da Norlabor).
Em 26 de Fevereiro seguinte, a “Norlabor” emite, uma factura (n.º 427), no
valor global contratualizado (Esc. 19.550.664$00 – dezanove milhões, quinhentos e
cinquenta mil e seiscentos e sessenta e quatro escudos).
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Entretanto, pelo facto da CMF não ter procedido ao pagamento da quantia em
dívida, a “Norlabor” insiste (através de um ofício, datado de 08 de Maio), solicitando à
arguida Maria de Fátima Felgueiras a liquidação daquela importância.
Em 13.06.1996, a arguida Maria de Fátima Felgueiras emite um despacho
autorizando o pagamento da quantia de Esc. 5.000.000$00 (cinco milhões de escudos)
relativa a parte do valor da empreitada adjudicada à “Norlabor”, o qual foi processado
em 17.06.1996, emitindo esta recibo em 24.06.1996.
Em 08.05.1998, a arguida Maria de Fátima Felgueiras autoriza o pagamento de
mais Esc. 7.000.000$00 (sete milhões de escudos) relativos à empreitada, tendo os
serviços administrativos emitido a ordem de pagamento e respectivo cheque, no valor
de Esc. 6.633.334$00 (seis milhões, seiscentos e trinta e três mil e trezentos e trinta e
quatro escudos), à ordem da “Norlabor” que emitiu recibo em 13.05.1998 e procedeu ao
depósito em 15.05.1998 no BTA de Paredes.
Finalmente, em 06.10.1998, a arguida Maria de Fátima Felgueiras autoriza o
pagamento dos restantes Esc. 7.550.664$00 (sete milhões, quinhentos e cinquenta mil e
seiscentos e sessenta e quatro escudos), relativos aos trabalhos de execução da
empreitada, tendo os serviços administrativos emitido a ordem de pagamento e
respectivo cheque, no valor de Esc. 7.155.153$00 (sete milhões, cento e cinquenta e
cinco mil e cento e cinquenta e três escudos), à ordem da “Norlabor”, a qual emitiu
recibo em 21.10.1998 e procedeu ao depósito nesse mesmo dia no Banco Português do
Atlântico (BPA) de Penafiel.
Depois de ter recebido aquelas quantias da CMF, no âmbito do referido contrato
de empreitada, a “Norlabor” entregou-as na sua totalidade à “Translousada” que, por
sua vez, as entregou à “RESIN”, através do seguinte esquema de movimentação de
verbas:
a) o primeiro pagamento, no valor de Esc. 4.738.095$00 (quatro milhões,
setecentos e trinta e oito mil e noventa e cinco escudos):
⇒ a “Norlabor” recebeu o cheque em 24 de Junho de 1996, endossou-o à
“Translousada” na mesma data e esta, por sua vez, endossou-o à “RESIN” no dia
seguinte, tendo esta procedido de imediato ao seu depósito bancário;
b) o segundo pagamento, no montante de Esc. 6.633.334$00 (seis milhões,
seiscentos e trinta e três mil e trezentos e trinta e quatro escudos):
⇒ a “Norlabor” recebeu o cheque em 13 de Maio de 1998, depositou-o em
conta bancária em 15 de Maio, tendo sido emitido um cheque, de igual valor, à
“Translousada” (este cheque foi sacado de uma conta particular conjunta dos sócios da
“Norlabor”). A “Translousada” procedeu ao seu endosso à “RESIN” que o depositou no
dia 15 de Maio de 1998;
c) o terceiro pagamento, no valor de Esc. 7.155.153$00 (sete milhões, cento e
cinquenta e cinco mil e cento e cinquenta e três escudos):
⇒ a “Norlabor” recebeu o cheque em 21 de Outubro de 1998 e procedeu ao seu
depósito bancário, tendo, na mesma data, emitido um cheque, de igual valor, à
“Translousada”. Esta procedeu ao seu endosso à “RESIN” que o depositou no dia 22 de
Outubro de 1998.
1. 4. – A propósito do procedimento tendente ao ajuste directo e adjudicação
da empreitada de "Exploração e Manutenção do Aterro de Felgueiras”.
No início de 1996, e em sequência do acordo celebrado entre os arguidos Maria
de Fátima Felgueiras e Vítor Borges, com vista a pagar à “Resin” 12 meses de trabalhos
levados a cabo na lixeira de Sendim por esta empresa, foi decidido entre aqueles
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
arguidos simular um procedimento com vista ao ajuste directo da empreitada de
“Exploração e Manutenção do Aterro de Felgueiras”, a atribuir à dita “RESIN”
(proposta no valor de Esc. 33.600.000$00 - trinta e três milhões e seiscentos mil
escudos, a que correspondia 12 meses de trabalhos a 2.800 cts mensais + IVA), tendo
em conta a análise das propostas efectuada pelo Departamento Técnico.
De facto, desde Junho de 1994 que a “Resin” procedia a trabalhos de
manutenção na lixeira de Sendim, e o procedimento referido foi a forma encontrada
para que a CMF pudesse pagar 12 meses de trabalhos àquela empresa, sendo certo que
em algumas situações ela subcontratou e alugou equipamento às suas consorciadas, com
quem manteve relações comerciais não só na lixeira de Sendim, como na lixeira da
Lustosa, como ainda na lixeira de Penafiel e em outras lixeiras situadas em outras
autarquias para as quais trabalhou.
Assim, o processo de adjudicação, por ajuste directo, da empreitada de
“Exploração e Manutenção do Aterro de Felgueiras”, da responsabilidade da CMF, foi
iniciado em 01 de Abril de 1996, com o envio de “convites” a três sociedades para que
estas apresentassem as suas propostas.
Das condições gerais e especiais, constantes dos convites endereçados, são de
salientar as seguintes:
a) as propostas terem de ser apresentadas até 15 de Abril de 1996;
b) o prazo de execução da obra ser de um ano; e
c) o preço base de Esc. 30.000.000$00 (trinta milhões de escudos).
As sociedades convidadas foram a “RESIN – Resíduos Industriais, SA”; a
“Craveira – Sociedade de Construções e Obras Públicas e Empreendimentos, Lda.” e a
“Translousada – Sociedade de Aluguer de Equipamentos, SA”.
Em resposta ao convite da CMF e observando as condições da empreitada, as
sociedades referidas apresentaram as seguintes propostas:
a) - a “Craveira” apresentou a sua proposta, em 04.04.1996, no valor de Esc.
40.800.000$00 (quarenta milhões e oitocentos mil escudos) acrescido do respectivo
IVA;
b) – a “Translousada” apresentou a sua proposta, em 04.04.1996, no valor de
Esc. 39.600.000$00 (trinta e nove milhões e seiscentos mil escudos) acrescido do
respectivo IVA, tendo declarado que, para execução da empreitada, iria recorrer aos
serviços da sociedade “Cunha Soares & Filhos, Lda.” tendo esta empresa apresentado
declaração nesse sentido;
c) – a “RESIN” apresentou a sua proposta, em 12.04.1996, no valor de Esc.
33.600.000$00 (trinta e três milhões e seiscentos mil escudos) acrescido do respectivo
IVA, tendo declarado que, para execução da empreitada, irá recorrer aos serviços da
sociedade “João Tello & C. Lda.” tendo esta empresa apresentado declaração nesse
sentido.
No dia 12.04.1996, no mesmo dia em que enviou a sua proposta à CMF, a
“RESIN” enviou um fax a Carlos Silva, administrador da “Translousada” (outra das
empresas concorrentes à empreitada), solicitando o fornecimento de um camião e uma
retroescavadora para trabalhos no aterro de Felgueiras, para um período de cinco dias,
com início em 14 de Abril de 1996.
No entanto, conforme se referiu, o prazo concedido pela CMF para as três
sociedades convidadas apresentarem as suas propostas para execução da empreitada de
"Exploração e Manutenção do Aterro de Felgueiras”, só terminava no dia 15 de Abril.
Emitido um parecer favorável pelo Departamento Técnico da autarquia
(subscrito pelo arguido Barbieri Cardoso), a Presidente Maria de Fátima Felgueiras
decidiu adjudicar a empreitada à “RESIN”, em 16 de Abril de 1996, por ter sido esta
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
que apresentou a proposta de menor valor e porque era a que dava maiores garantias de
boa execução e qualidade técnica dos trabalhos (conforme aliás previamente combinado
com o arguido Vítor Borges).
Em 17.04.1996, a arguida Maria de Fátima Felgueiras emitiu um despacho
justificando a decisão de adjudicar “por ajuste directo” as obras de manutenção e
exploração provisória da lixeira de Felgueiras, alegando a sua urgência e interesse
público.
O contrato de adjudicação da empreitada “Exploração e Manutenção do Aterro
de Felgueiras” foi celebrado em 24.04.1996, nos termos da proposta apresentada, tendo
sido assinado pela arguida Maria de Fátima Felgueiras e pelo arguido Vítor Borges,
respectivamente em representação da CMF e da “RESIN”, prevendo o mesmo que as
obras começassem imediatamente a seguir à celebração do contrato e assinatura do auto
de consignação, ficando os pagamentos dependentes do visto do Tribunal de Contas.
A 07.05.96 iniciou-se a deposição dos resíduos sólidos industriais equiparados a
domésticos e em 24 de Junho do mesmo ano a CMF iniciou a cobrança de uma taxa às
indústrias pela deposição dos seus resíduos sólidos na lixeira de Sendim, emitindo para
o efeito a respectiva facturação, o que só se tornou possível na medida em que os
trabalhos referentes à empreitada em causa iam sendo realizados pela “Resin”, ainda
que recorrendo aos serviços de outras empresas, designadamente da “Translousada”.
Sucede porém que o Tribunal de Contas, entretanto, recusou o visto, devido ao
facto da “RESIN” não ter alvará que lhe permitisse executar tal obra, decisão que foi
comunicada à autarquia em 23.08.1996.
Face a tal decisão do Tribunal de Contas, realizou-se uma reunião de
emergência, na CMF, no dia 04.09.1996, na qual participaram apenas representantes da
“RESIN” e da CMF (Vítor Borges, Pedro Ribeiro, Barbieri Cardoso e Fernanda Castro
Leal).
Nessa reunião foram aventadas diversas hipóteses para resolução do problema
suscitado pela recusa de visto do TC e que poderiam passar por:
a) um “contrato de transacção”, para pagamento dos trabalhos efectivamente
levados a cabo pela “Resin” até à comunicação da suspensão dos trabalhos;
b) um “pedido de reapreciação” ao TC; ou
c) um “ajuste directo à “João Tello”, no período compreendido entre a suspensão
dos trabalhos e a decisão de reapreciação.
Tendo sido decidido, no final da mesma, “adjudicar” os trabalhos à “João Tello”
e celebrar um contrato de transacção com a “Resin” de modo a pagar-lhe os trabahos
que entretanto executara ao abrigo do ajuste directo relativo à empreitada em causa.
A primeira hipótese mencionada no documento de fls 255 do apenso 98
(adicional ao contrato de recolha) nada tinha a ver com o ajuste directo em causa mas
com unicamente com outras necessidades que se prendiam com a prestação de serviços
de recolha do lixo e que viriam a ser satisfeitas mediante a celebração, a 29.10.96, de
um aditamento ao contrato de prestação de serviços de recolha de resíduos sólidos
urbanos do concelho de Felgueiras.
Assim, por despacho de 10.09.1996, a Presidente Maria de Fátima Felgueiras
decide adjudicar, por ajuste directo, os restantes trabalhos à “João Tello”, justificando
tal decisão com a análise da proposta (apresentada por aquela sociedade) efectuada pelo
Departamento Técnico.
Por outro lado, visando resolver a questão do pagamento dos trabalhos
efectuados pela “RESIN”, a CMF celebrou com esta empresa, em 20.09.1996, um
contrato de transacção, ficando assim resolvido o problema suscitado com a recusa de
23
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
visto por parte do TC, ressarcindo-se a “RESIN” pelos trabalhos efectuados entre
25.04.96 e 05.09.96.
Tal contrato de transacção foi outorgado pelos arguidos Vítor Borges e Fátima
Felgueiras, sendo ali referido que os trabalhos adjudicados tinham sido iniciados em 25
de Abril e suspensos em 5 de Setembro de 1996, calculando-se o valor dos já realizados
em Esc. 12.133.334$00 (doze milhões, cento e trinta e três mil e trezentos e trinta e
quatro escudos) + IVA.
Esta verba foi facturada pela “RESIN” em 30 de Setembro de 1996 e paga pela
CMF em 16 de Janeiro de 1997.
O contrato de adjudicação da empreitada “Exploração e Manutenção do Aterro
de Felgueiras” foi celebrado entre a CMF e a “João Tello” em 18.10.1996, sendo o
mesmo outorgado por Maria de Fátima Felgueiras (representando a autarquia) e José
Manuel de Pinho Reis de Almeida e José Miguel Santos Vieira Neves (em
representação da “João Tello”).
Em tal contrato é ainda referido que a “João Tello” se obriga a executar a
empreitada pelo valor de Esc. 16.800.000$00 (dezasseis milhões e oitocentos mil
escudos) + IVA, de harmonia com a proposta apresentada e com a análise da mesma
feita pelo Departamento Técnico e que antecederam o despacho de Fátima Felgueiras,
datado de 10 de Setembro, que determinou a adjudicação.
Desde 31 de Dezembro de 1996 e até 03 de Abril de 1997, a “João Tello” emitiu
cinco facturas à CMF, todas relativas à empreitada em questão e no montante global de
Esc.17.640.000$00.
Com data de 11 de Junho de 1997 e na carta da “João Tello” que remete a última
factura (número 49, de 30.04.97), a arguida Maria de Fátima Felgueiras redige um
despacho, dirigido à responsável pela Divisão Financeira (testemunha Terezinha
Carvalho), alertando-a para o terminus do contrato e avisando-a que, a partir daí, devido
à selagem da lixeira de Felgueiras, deveria imputar a facturação ao Aterro da Lustosa.
Em 30 de Junho de 1997, a arguida Maria de Fátima Felgueiras comunica à
AMVS (Associação dos Municípios do Vale do Sousa), que tinham sido dadas
instruções à “RESIN” para que, a partir de Abril de 1997, a facturação relativa à
manutenção da lixeira de Felgueiras passasse a ser apresentada àquela Associação.
Entretanto, a CMF emite para a “João Tello”, em 11 de Dezembro de 1997, uma
ordem de pagamento, no valor de Esc. 9.472.400$00 (nove milhões, quatrocentos e
setenta e dois mil e quatrocentos escudos), tendo aquela emitido o respectivo recibo no
dia seguinte.
A segunda ordem de pagamento da CMF, libertando o restante valor da
empreitada, foi emitida em 6 de Fevereiro de 1998, sendo o correspondente cheque
emitido em 9 do mesmo mês à “João Tello”, no montante de Esc. 7.253.077$00 (sete
milhões, duzentos e cinquenta e três mil e setenta e sete escudos).
Depois de a “João Tello” ter recebido aquelas quantias da CMF, a mesma
entregou-as à “RESIN”, através do seguinte esquema de movimentação de verbas:
a) o primeiro pagamento, no valor de Esc. 9.472.400$00 (nove milhões,
quatrocentos e setenta e dois mil e quatrocentos escudos):
⇒ a “João Tello” recebeu o cheque, em 12 de Dezembro de 1997 e endossou-o à
“RESIN”, no dia 15 de Dezembro de 1997, tendo esta procedido de imediato ao seu
depósito bancário;
b) o segundo pagamento, no montante de Esc. 7.253.077$00 (sete milhões,
duzentos e cinquenta e três mil e setenta e sete escudos):
24
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
⇒ a “João Tello” recebeu o cheque, em 09 de Fevereiro de 1998, tendo este sido
endossado à “RESIN”, que por sua vez o depositou, no dia 12 do mesmo mês na sua
conta bancária.
A “RESIN” recebeu as sobreditas quantias monetárias na medida em que
executou, directamente ou por intermédio de outrem, os trabalhos adjudicados.
1. 5. – A propósito dos alegados proventos e benefícios obtidos da Associação
de Municípios do Vale do Sousa.
Em 31.01.97 o GAT do Vale do Sousa emitiu a proposta para a abertura de um
concurso de “Concepção, Construção e Gestão de um Sistema de Tratamento de
Resíduos Sólidos Industriais e Equiparados a Urbanos no Concelho de Felgueiras”
Em 07.02.1997 o concelho de administração da AMVS reuniu e, quanto ao
ponto dois da ordem de trabalhos (“Resíduos Sólidos Urbanos – Projectos”) deliberou
abrir um concurso público internacional para a adjudicação da empreitada de
“Concepção, Construção e Gestão de um Sistema de Tratamento de Resíduos Solidos
Industriais e Equiparados a Urbanos do Sector do Calçado do Município de Felgueiras”.
Tal decisão da AMVS inseriu-se no âmbito de um programa do Fundo de
Coesão que visava a construção de três aterros sanitários (Aterro Intermunicipal de
Lustosa, Lousada; Aterro Intermunicipal de Canelas – Penafiel e Aterro RIB –
Felgueiras) e de treze Ecocentros (três no Concelho de Felgueiras e dois na área de cada
um dos restantes municípios daquela associação)
Em 08.04.1997 a AMVS publicou o anúncio e respectivo caderno de encargos
do concurso.
Em ordem a concorrer a esse concurso internacional, o consórcio
“Resin”/”Sita”/”Ecop” preparou em conjunto a respectiva proposta a apresentar, o que
implicou a realização de várias reuniões e estudos até à concretização da sobredita
proposta.
Em 14.07.97 foi manuscrito, em papel timbrado da “Ecop”, um apanhado dos
valores a corrigir na proposta em estudo, constando do mesmo que deve “acrescer à
proposta Esc. 140.000.000$00”, distribuído pelos vários itens.
Em 15.07.97 as várias concorrentes, entre as quais o consórcio liderado pela
“Resin”, apresentaram as suas propostas.
Ora, na proposta apresentada pelo consórcio “RESIN”/”SITA”/”ECOP”, em
consonância com o referido manuscrito em papel timbrado da “Ecop”, foi incluído esse
montante de 140.000.000$00, que foi camuflado e distribuído pelos vários itens do
orçamento efectuado, repartindo-se o mesmo pelas diversas rubricas, de acordo com a
margem de manobra que cada uma delas permitia, ressarcindo assim a “RESIN” dos
montantes em dívida pela CMF, conforme o pretendido pelos seus responsáveis, sendo
certo que tal distribuição foi efectuada de forma proporcional, permitindo a inclusão de
outras verbas:
- uma báscula (equipamento que a “Resin” já possuía) o valor total de Esc.
7.800.000$00;
- na instalação de Pré-Tratmento Tipo “Ctipa PT 1500”, a quantia de Esc.
6.000.000$00;
25
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
- na instalação de Pré-tratamento Tipo “Ctipa ATF 1500/S, a quantia de Esc. 6.
000.000$00;
- na citada Báscula a quantia de Esc. 7. 800.000$00;
- no Fornecimento e instalação de um contentor equipado com laboratório de
análises de RIB, a quantia de Esc. 6. 000.000$00;
- no Fornecimento de queimadores atmosféricos individuais tipo “Torchére
900”, a quantia de Esc. 1. 000.000$00;
- na unidade de triagem e prensagem de RIB, incluindo equipamento de
transporte e deposição de fardos, o valor de Esc. 40. 000.000$00;
- na concepção, projecto e estudo de impacte ambiental, o valor de Esc. 15.
080.000$00;
- na montagem, desmontagem e manutenção do estaleiro, o valor de Esc.
12.600.000$00;
- na estrutura metálica aplicada no revestimento lateral de paredes de fachada, o
valor de Esc. 5.520.000$00;
- no restante valor do Capítulo 2, o valor de Esc. 7. 689.917$00; e
- no restante valor do Capítulo 3, o valor de Esc. 32.310.083$00.
À inclusão dessas verbas na proposta apresentada a tal concurso internacional
pelo consórcio liderado pela “Resin” foram completamente alheios os arguidos Fátima
Felgueiras, Júlio Faria e Barbieri Cardoso.
Em 18.07.97 foi realizado o acto público de apresentação das propostas a esse
concurso, tendo sido deliberada a admissão de todas as propostas apresentadas,
dirigindo-as à respectiva comissão de análise.
Após a análise por essa comissão, constituída por Joaquim Moreira (do GAT de
Penafiel, que presidia a essa comissão), pelo arguido José António Barbieri Cardoso (da
CMF) e por Isabel Maria Soares Brandão Vasconcelos (da, então, DRARN), a 24.09.97,
a mesma, no respectivo relatório de análise, propôs que a empreitada deveria ser
adjudicada ao consórcio “Resin”/”Sita”/”Ecop” por apresentar a proposta que dava mais
garantias.
Em 24.10.97 o concelho de administração da AMVS reuniu e deliberou por
unanimidade, ao apreciar o relatório da comissão técnica, adjudicar a empreitada para a
construção e gestão durante 5 anos do aterro RIB de Felgueiras ao consórcio
“Sita”/”Resin”/”Ecop”, pelo preço de 981.467.560$00.
Em 23.01.98 foi outorgado o respectivo contrato de empreitada entre a AMVS e
o consórcio “Resin”/”Sita”/”Ecop”.
Em 08.05.98 foi elaborado pela AMVS, a dona da obra, o auto de consignação
de trabalhos.
Em meados do mês de Dezembro de 2000, por solicitação da arguida Maria de
Fátima Felgueiras e de acordo com os interesses que manifestou, a AMVS (em
14.12.2000), concordou em assinar, com a CMF, um protocolo, nos termos do qual foi
formalizada a transferência de poderes, competências, deveres e obrigações relativas ao
aterro RIB, daquela Associação de Municípios para a autarquia de Felgueiras.
26
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Por sua vez, e quanto os concursos de adjudicação dos ecocentros previstos para
Felgueiras, as propostas apresentadas foram analisadas por uma comissão de avaliação
constituída por Joaquim Moreira (do GAT de Penafiel e que presidia a tal comissão),
pelo arguido José António Barbieri Cardoso e por Fernanda Paula Mariano (estes dois
eram os representantes da CMF na AMVS).
Essa foi a única comissão de avaliação de propostas em que a CMF esteve em
maioria, sendo tal comissão análoga às que foram formadas para idênticos concursos
nos restantes municípios do Vale do Sousa.
Por outro lado, em meados do ano de 1997, a CMF tinha uma dívida para com a
“RESIN” de Esc. 101.214.905$00 (além dos encargos e juros de mora), precisamente na
altura em que foi celebrado o contrato de empreitada relativo ao Aterro RIB de
Felgueiras, relativa a diversos trabalhos, parte deles não documentados e efectuados
sem suporte legal por tal empresa para aquela autarquia.
Com o recebimento do adiantamento referente a tal empreitada, a “Resin” teve
disponibilidade financeira para conceder um donativo de 20.000.000$00 ao Futebol
Clube de Felgueiras, montante que serviu para esse clube liquidasse parte de um débito
que tinha para com a CCAM, mais concretamente parte de uma prestação vencida em
30.09.98, conforme à frente melhor se descreverá.
1.6. - A propósito dos recebimentos.
Durante a execução destes contratos, o arguido Vítor Borges, cumprindo o que
tinha combinado previamente com os arguidos Júlio Faria e Maria de Fátima Felgueiras,
efectuou a estes, por diversas vezes, entregas de dinheiro através dos também arguidos
Horácio Costa e Joaquim de Freitas, dois dos quais provenientes das quantias recebidas
da CMF (no âmbito do simulado contrato celebrado entre a edilidade e a “Norlabor”).
Os pagamentos das quantias supra referidas, por parte do arguido Vítor Borges,
da “RESIN”, à arguida Maria de Fátima Felgueiras e ao arguido Júlio Faria, obedeciam
sempre a um esquema interno instituído naquela empresa por aquele arguido.
Isto é, após serem levantadas, em numerário, as quantias monetárias que iriam
ser entregues à arguida Maria de Fátima Felgueiras, o arguido Vítor Borges entregavaas a esta arguida, ou aos seus representantes, os arguidos Horácio Costa e Joaquim de
Freitas, pessoalmente ou por intermédio dos também arguidos Carlos Marinho e Gabriel
Ângelo.
Assim:
1 - No dia 05.06.1997, o arguido Horácio Costa recebeu, na CMF, um
telefonema do arguido Vítor Borges, administrador da “RESIN” na sequência do qual
elaborou um “relatório de actividade” para a arguida Maria de Fátima Felgueiras - (cfr.
fls. 136 e 199 – 1º Volume dos autos), dando conta do seguinte: “Ex.ma. Sr.ª.
Presidente, Aproveito para informar que recebi agora um telefonema do Sr. Eng.º.
Vítor Borges que na impossibilidade de falar com V. Exª., pede que lhe transmita que
conforme o combinado com a Senhora, os primeiros 5.000 contos estarão disponíveis
no dia 10 de Julho próximo. Mais informo que na sequência das reuniões havidas com
o Sr. Júlio Faria e a Senhora, o Sr. Freitas irá abrir conta no BES, comigo, conforme
as indicações de V. Exª.”.
Face a tal informação, a arguida Maria de Fátima Felgueiras escreveu, na mesma
folha, o seguinte despacho: “TC. Óptimo. 97.06.10”, querendo significar que "Tomou
Conhecimento" da informação.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
No dia 10.07.1997, por ordem expressa da arguida Maria de Fátima Felgueiras,
o arguido Horácio Costa deslocou-se a Matosinhos, aos escritórios da “RESIN”, onde o
arguido Vítor Borges lhe entregou pessoalmente a sobredita quantia de Esc.
5.000.000$00 em notas do Banco de Portugal.
Após ter trazido tal quantia monetária para Felgueiras, o arguido Horácio Costa
contactou a arguida Maria de Fátima Felgueiras, que lhe ordenou que efectuasse, com a
mesma e mais Esc. 1.000.000$00 que uns dias antes lhe tinha entregue em mão, a
abertura de uma conta bancária na agência do Banco Espírito Santo de Felgueiras, aliás,
conforme as ordens expressas que nesse sentido lhe tinha dado em meados do mês de
Março de 1997.
Assim, no dia 11.07.1997, os arguidos Horácio Costa e Joaquim de Freitas
efectuaram a abertura da conta bancária n.º 238/27674/000.9 da agência de Felgueiras
do Banco Espírito Santo e procederam ao depósito da referida quantia de Esc. 6.
000.000$00, em numerário.
2 - No dia 16.06.1998, o arguido Carlos Marinho, director financeiro da
“RESIN”, entregou ao arguido Horácio Costa, no edifício da CMF e na presença do
também arguido Joaquim de Freitas, a quantia de Esc. 5.250.000$00, em numerário,
acondicionada no interior de uma pasta com timbre da “RESIN”.
No interior dessa pasta, e para além da referida quantia em numerário,
encontravam-se igualmente os documentos constantes de fls. 158 a 161 do 1º Volume
dos autos, nomeadamente fotocópias:
•
da Guia de Receita n.º 9016, de 98.05.12 (emitida pela CMF em
nome da firma Norlabor), e de um cheque no valor de Esc.
6.633.334$00, emitido pela CMF à ordem da mesma empresa -;
• de um manuscrito com a alusão ao valor inicial de Esc.
7.000.000$00 e final de Esc. 5.250.000$00, contendo ainda este
documento uma frase manuscrita do seguinte teor: “5.250.000$00
entregue em 16.06.98 ao Sr. Dr. Horácio”, cuja autoria não foi
possível apurar;
• da factura n.º 9701208, datada de 21/11/1997, no valor de Esc.
11.032.770$00, emitida pela “RESIN” à AMVS (Associação de
Municípios do Vale do Sousa), e que respeita a “Trabalhos de
Operação na Lixeira de Felgueiras”;
• da factura n.º 9701207, datada de 21/11/97, no valor de Esc.
2.943.570$00, emitida pela “RESIN” à AMVS, e que igualmente
respeita a “Trabalhos de Operação na Lixeira de Felgueiras”.
A quantia recebida por Horácio Costa das mãos do arguido Carlos Marinho foi
posteriormente utilizada pela arguida Maria de Fátima Felgueiras para o pagamento
parcial à firma “Machado & Costas, S.A.” do preço da viatura de marca “Audi”, modelo
“A4”, matrícula 96-29-LN, como melhor se descreverá mais à frente.
3 - Em dia indeterminado de Outubro ou Novembro de 1998, o arguido Gabriel
Ferreira de Almeida, quadro superior da “RESIN” (o qual foi admitido ao serviço dessa
empresa a 01.09.97 como direcor-geral de exploração, passando a ser o responsável
pelos trabalhos realizados nas lixeiras – nomeadamente nos trabalhos levados a cabo na
lixeira de Sendim - e posteriormente nos aterros, mantendo-se ao serviço dessa empresa
até 2000), sabendo que se tratava de um “retorno” de um dos pagamentos efectuados
pela CMF no âmbito do contrato celebrado entre essa edilidade e a “Norlabor”, segundo
plano engendrado pelos arguidos Vítor Borges, Fátima Felgueiras e Júlio Faria,
28
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
entregou pessoalmente ao arguido Horácio Costa, no gabinete por este utilizado no
edifício da CMF, a quantia de Esc. 5.381.653$00, em numerário, acondicionada no
interior de uma pasta idêntica à utilizada na entrega anterior, mas sem timbre da firma.
Juntamente com a quantia em numerário, foram entregues a Horácio Costa os
seguintes documentos:
•
o cartão comercial constante de fls. 164, do 1º Volume dos autos,
da firma “RESIN” e com o nome de Gabriel Ferreira de Almeida,
com a frase manuscritas pelo mesmo “com os melhores
cumprimentos. Agradecendo desde já o que poder fazer”,
assinando o mesmo com a sua rubrica;
• uma fotocópia da Guia de Receita n.º 17715, de 98.10.07, emitida
pela CMF em nome da firma Norlabor, e de um cheque no valor
de Esc. 7.155.153$00, emitido pela CMF à ordem da mesma
firma;
• um manuscrito com a referência “valor pago” e o valor inicial
“Esc. 7.155.153$00” e valor final “Esc. 5.381.653$00” e a
indicação “retorno”.
Parte desta quantia entregue pela “RESIN” foi posteriormente utilizada, no
seguimento de ordens da arguida Maria de Fátima Felgueiras, na aquisição de 1.550
bilhetes de um sorteio promovido pelo FCF para o Natal de 1998 (no valor total de Esc.
1.550.000$00) e no depósito efectuado, em 23.11.1998, no valor de Esc. 1.850.000$00,
em numerário, na conta bancária do BES, titulada pelo arguido Júlio Manuel Castro
Lopes Faria, sendo o valor restante utilizado no pagamento de múltiplas despesas da
campanha eleitoral da arguida Maria de Fátima Felgueiras, conforme mais
pormenorizadamente se referirá adiante.
De facto, o arguido Júlio Faria tinha sido co-avalista de uma livrança no valor de
cerca de 113.000.000$00, a qual titulava uma dívida do FCF perante a CCAMF.
O valor titulado por essa letra viria a ser pago através de um financiamento
concedido pelo BES ao FCF, garantido também por livrança, de que também o arguido
Júlio Faria deu o respectivo aval.
Como forma de auxiliar a concretização desse pagamento, o FCF decidiu fazer
um sorteio em Dezembro de 1998, tendo sido atribuídos aos vários elementos dos seus
corpos gerentes (entre os aquais o arguido Júlio Faria) cadernetas de bilhetes, que
procurariam vender, mas cujo pagamento desde logo efectuaram ao clube, cabendo-lhes
o respectivo reembolso na medida em que esses bilhetes fossem por si vendidos.
Foi na sequência disso que o arguido Júlio Faria foi reembolsado da quantia de
1.850.000$00 (já que tinha ficado com 1.850 bilhetes, a 1.000$00 cada um).
Para além disso, conforme referido, foram ainda adquiridos 1.550 bilhetes
referentes a esse sorteio, pagos também com os fundos provenientes daquela entrega em
numerário pela “Resin”, segundo instruções recebidas pelos arguidos Horácio e
Joaquim Freitas da arguida Fátima Felgueiras.
4 – No dia 30.12.1998, o arguido Carlos Marinho, entregou ao arguido Horácio
Costa, no edifício da CMF, a quantia de Esc. 20.000.000$00, constituída por um cheque
de Esc. 12.500.000$00, emitido pela “RESIN”, mais Esc. 7.500.000$00, em numerário.
Este montante veio a ser utilizado pelo Futebol Clube de Felgueiras para pagar
uma dívida no mesmo montante à Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Felgueiras,
como melhor à frente se descreve.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Estas quantias perfazem o valor global de Esc. 35.631.653$00 (€ 177.729,94).
Os arguidos Maria de Fátima Felgueiras e Júlio Faria, aceitaram e utilizaram
aquelas quantias monetárias, sendo certo que o fizeram no que concerne às referidas nos
pontos 2 e 3 do ponto 1.6 da pronúncia com intuito de obterem um beneficio
patrimonial que sabiam ser ilegítimo, por constituir indevida contrapartida patrimonial
da prática de actos que violavam os seus deveres como membros de órgão
representativo de autarquia local, no âmbito de um contrato formalmente celebrado
entre a autarquia e a “Norlabor”, acima referenciado, beneficiando assim terceiros.
Por sua vez, o arguido Vítor Borges quis pagar aquelas quantias, sendo as
referidas nos pontos 2 e 3 do ponto 1.6 da pronúncia como contrapartida da indevida,
por violadora das normas legais aplicáveis, adjudicação de empreitadas à empresa que
representava, logrando assim obter os inerentes proventos.
Por outro lado, os arguidos Carlos Marinho, Gabriel Ângelo dos Santos Ferreira
de Almeida, Barbieri Cardoso, Horácio Costa e Joaquim de Freitas, actuaram com o
intuito de ajudar activamente os arguidos Júlio Faria, Maria de Fátima Felgueiras e
Vítor Borges, na execução dos factos supra referidos (isto é, o arguido Barbieri na
colaboração que prestou na simulação de um concurso limitado e na celebração de dois
contratos simulados, um com a “Norlabor” e outro com a “João Tello”, ignorando
contudo que viriam a existir “retornos” de verbas liquidadas pela CMF no âmbito
daquele contrato; o arguido Carlos Marinho na forja do suporte documental e nos
procedimentos contabilísticos destinados a dissimular aquelas entregas em numerário,
tendo procedido a duas dessas entregas, sabendo que pelo menos uma delas constituía
um “retorno” no âmbito do contrato celebrado entre a CMF e a “Norlabor”; o arguido
Gabriel Almeida, já depois das simulações formalmente consumadas, procedeu a uma
entrega em numerário que sabia ser um “retorno” no âmbito do contrato celebrado entre
a CMF e a “Norlabor”; e os arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas colaboraram na
apropriação das verbas em causa através da abertura e movimentação de uma conta
bancária e “caixa” através das quais essas mesmas verbas transitaram para serem
posteriormente utilizadas pelos arguidos Júlio Faria e Fátima Felgueiras), com estes
assim colaborando.
Todos os arguidos agiram de forma livre, voluntária e consciente, sabendo que
as suas condutas eram proibidas e punidas por lei
2. Factos provados relacionados com o 2º capítulo da pronúncia:
2.1. - A propósito de outros donativos que aprovisionaram a conta do BES e a
“conta paralela”.
2.1.1. - A propósito da introdução.
Para além das verbas provenientes da empresa “RESIN”, anteriormente
referidas, a conta bancária do BES e a “caixa paralela”, tendo esta última sido criada
simultaneamente com aquela conta para servir como fundo de maneio para pagamento
de diversas despesas da campanha eleitoral de menor valor, foram providas com vários
donativos entregues pelos industriais e particulares da área do concelho de Felgueiras.
Para o efeito, a arguida Maria de Fátima Felgueiras, no uso dos seus poderes de
direcção sobre a referida conta bancária e “caixa paralela”, entregava ao arguido
Joaquim de Freitas, uma relação (designada habitualmente por “listinhas”), onde
indicava um conjunto de pessoas a contactar (habitualmente empresários da zona de
30
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Felgueiras), bem como indicava, a seguir aos nomes, qual o valor do donativo que devia
ser solicitado.
Esporadicamente, era a própria arguida Maria de Fátima Felgueiras quem
contactava directamente os industriais e comerciantes, solicitando donativos para a sua
campanha eleitoral, sendo a sua posterior recolha habitualmente efectuada pelos
arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas.
Outras vezes, a arguida Maria de Fátima Felgueiras indicava esses nomes
verbalmente, sendo os contactos com as pessoas indicadas efectuados pelos arguidos
Joaquim Freitas e Horácio Costa, que por vezes foram acompanhados por outros
indivíduos.
Noutras situações, os contactados deslocavam-se directamente à CMF, onde
entregavam em mão os donativos, em cheque ou em dinheiro, por vezes ao pessoal
ligado ao Gabinete de Apoio Pessoal à Presidente (GAPP), que os recebiam e faziam
chegar aos arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas.
Alguns dos nomes supra referidos eram assinalados com uma marca,
normalmente uma cruz, por motivo que não se apurou.
A arguida Fátima Felgueiras, no âmbito dos processos de licenciamento,
proferiu os seus despachos com base e de acordo com os pareceres dos serviços
camarários e dos técnicos e assessores competentes, deferindo ou indeferindo de acordo
com tais pareceres.
Assim:
2.1.2. - A propósito dos donativos concedidos pelo arguido Anastácio
Augusto Pinto Macedo
No dia 25.09.1997, o arguido Anastácio Augusto Pinto Macedo entregou aos
arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas o cheque n.º 6256892519, no montante de
Esc. 250.000$00, sacado sobre a conta bancária n.º 0012174005, da agência de
Felgueiras, do Banco Espírito Santo, o qual foi entregue para apoiar financeiramente a
campanha eleitoral do PS referente às eleições autárquicas de 1997.
Uns dias depois de ter obtido a licença de construção no âmbito do processo nº
68/83 (respeitante a um processo de legalização/licenciamento de um pavilhão
industrial), com o mesmo desiderato, o arguido Anastácio Augusto Macedo, no dia
15.10.1997, emitiu o cheque n.º 3856892748, no valor de Esc. 250.000$00, sacado
sobre a conta n.º 00121740005, da agência de Felgueiras, do Banco Espírito Santo,
cheque esse que foi entregue ao arguido Horácio Costa pela arguida Fátima Felgueiras.
2.1.3. - A propósito do donativo concedido pelo arguido Carlos Sampaio
Teixeira
Em 1997, a firma “Carlos Sampaio Teixeira & Irmão, Ldª” (de que o arguido
Carlos Sampaio Teixeira é sócio-gerente) iniciou um processo para a construção de um
novo pavilhão industrial sito em Estrada - Margaride, tendo contratado a firma
“Ambienta” para a elaboração do respectivo projecto, que apresentado para
licenciamento à CMF, em 31.10.1997, foi registado com o n.º 902/97.
Entretanto, o arguido Carlos Sampaio Teixeira foi contactado, por diversas
vezes, pelos arguidos Joaquim de Freitas e Horácio Costa, para que entregasse um
31
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
donativo, o que não sucedeu na medida em que estes nunca o conseguiram contactar
pessoalmente.
Em face disso, os arguidos Joaquim de Freitas e Horácio Costa deram
conhecimento de tal situação à arguida Maria de Fátima Felgueiras, que lhes disse que
iria tratar pessoalmente desse assunto.
Assim, no dia 18 de Novembro de 1997, o arguido Carlos Sampaio Teixeira
entregou a pessoa cuja identidade não foi possível apurar, a título de donativo para a
campanha eleitoral da arguida Maria de Fátima Felgueiras, o cheque n.º 7586645154,
sacado sobre a conta n.º 00195185050, do Banco Comercial Português, agência de
Felgueiras, no valor de Esc. 500.000$00, datado de 18.11.1997, cheque esse que
entretanto chegou à posse da arguida Fátima Felgueiras, a qual por sua vez o entregou
ao arguido Horácio para que procedesse ao respectivo depósito na conta do BES
referida nos autos, o que este fez a 12.12.97.
Já depois de ter efectuado tal entrega, foram emitidos pareceres técnicos
desfavoráveis pelos técnicos responsáveis pelo SNB e pelo PDM local, face ao que, em
08.04.1998, o arguido Carlos S. Teixeira (ou melhor, a firma acima referida) solicitou à
CMF o arquivamento daquele processo de licenciamento (o que foi deferido em
09.04.1998) e, nessa mesma data, apresentou um novo processo para licenciamento de
construção de um pavilhão industrial, sito no mesmo local e freguesia do anterior, ao
qual foi atribuído o n.º 255/98.
Este projecto era acompanhado por fotografias que demonstravam que tal obra
já estava a ser executada (obras de limpeza e de terraplanagem do local).
No entanto, e apesar de resultar de tal processo que a obra estava já a ser
executada, a arguida Maria de Fátima Felgueiras não mandou instaurar o competente
processo de contra-ordenação.
Na sequência deste último projecto, a CMF emitiu no dia 02.08.2000, após
requerimento do interessado nesse sentido e em face de pareceres favoráveis, o alvará
de licença de utilização com o n.º 457/2000, obtendo assim o arguido Carlos Sampaio
Teixeira o licenciamento pretendido.
O arguido Carlos Sampaio Teixeira concedeu o referido donativo nos mesmos
termos em que o fez para apoiar financeiramente a campanha eleitoral de outras forças
políticas às mesmas eleições autárquicas de 1997.
O arguido Carlos Sampaio Teixeira costuma aliás apoiar outras instituições,
culturais, sociais e desportivas quando lhe solicitam esse apoio financeiro, sem que daí
espere retirar quaisquer benefícios ou vantagens.
O donativo referido nos autos não foi concedido com o intuito de obter qualquer
licenciamento ou de evitar qualquer embargo, sendo certo que os serviços de
fiscalização da CMF nunca se dirigiram ao arguido Carlos ou ao local da obra no
sentido de o pressionar no que quer que fosse.
2.1.4. - A propósito dos donativos concedidos pelo arguido Guilherme da
Silva Almeida:
O arguido Guilherme da Silva Almeida, gerente do estabelecimento individual
de responsabilidade limitada denominado “Guilherme da Silva Almeida & Filhos,
EIRL” (hoje S.A.), com instalações no Lugar da Boavista – Penacova – Felgueiras, que
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
haviam sido legalizadas em 1992, por decisão da CMF no processo de obra particular nº
323/83, requereu, em 1993, nova ampliação, deferida genericamente mas sem que fosse
emitido alvará de licença de utilização.
E em 30 de Julho de 1997, requereu o licenciamento da construção de um
edifício industrial no Lugar de Bouça Grande – Penacova – Felgueiras, a que foi
atribuído, na CMF, o n.º 630/97.
No dia 31.07.97, pelas 9h. e 08m., a funcionária do EIRL “Guilherme da Silva
Almeida & Filhos, EIRL”- Sandra Maria Coutinho Pereira – contactou com os serviços
da CMF para marcar uma audiência com a presidente da autarquia, a arguida Fátima
Felgueiras.
Tal chamada foi atendida por uma funcionária da CMF, de nome Rosinda, tendo
sido agendada a audiência com a arguida Fátima Felgueiras para o dia 02.09.97.
Nesta reunião, o arguido Guilherme Almeida, enquanto dono da obra, e a
testemunha Manuel Maria Machado, enquanto autor do projecto e responsável técnico
pela execução da obra, fizeram à arguida Fátima Felgueiras a apresentação do projecto e
da obra que se pretendia realizar e que haviam feito entrar na CMF no dia 30.07.97.
No decurso dessa mesma audiência, após a apresentação do projecto e da obra, o
arguido Guilherme perguntou à arguida Fátima Felgueiras se seria possível iniciar
imediatamente os serviços de terraplanagem e remoção de terras do terreno onde iria ser
construído o edifício, terraplanagens que durariam cerca de 3 a 4 meses, por se tratar de
um terreno rochoso, e que seria também o tempo necessário para a CMF apreciasse e
aprovasse o projecto.
Na sequência desse pedido, pela arguida Fátima Felgueiras foi comunicado ao
arguido que tal só era possível após a aprovação do projecto de arquitectura e com a
obtenção de uma licença para caboucos.
No dia 29.09.97, numa primeira apreciação técnica, o Arquitecto Rui José Silva
Pinto Almeida, técnico da CMF, proferiu o seguinte despacho sobre o pedido de
licenciamento da obra objecto do processo nº 630/97:
“A pretensão deverá ser indeferida tal como é apresentada uma vez que tem
uma área de implantação superior ao imposto pelo regulamento do PDM bem como a
Certidão de Localização aprovada pela CCRN, indeferindo com base nas als. a), b) e d)
do nº 1 do artº 33 do DL. 445/91.”
Este parecer foi notificado ao arguido Guilherme Almeida através do ofício nº
5094, datado de 06.10.97, emanado da CMF, e que ele recebeu a 08.10.97.
Consequentemente, por não respeitar o PDM (que só permitia uma implantação
máxima de 1.000 metros quadrados no tipo de aglomerado em que se inseria) e por estar
em desconformidade com o processo de pedido de emissão de certidão de localização
entregue na CCRN, emitida com base na área de implantação indicada (1.000 m2), o
projecto foi, inicialmente, indeferido.
No dia 07.10.97, o arguido Guilherme da Silva Almeida foi visitado nas suas
instalações fabris pelos arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas, que se intitularam
como pertencendo à comissão de angariação de fundos para a campanha do PS da
concelhia de Felgueiras, os quais ali se deslocaram no sentido de obter daquele um
donativo para ajudar a custear as despesas com a campanha eleitoral do PS para as
eleições autárquicas que viriam a ter lugar a 14.12.97.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Assim, o arguido Guilherme Almeida, na qualidade de titular do EIRL
denominado “Guilherme da Silva Almeida EIRL”, emitiu e entregou aos arguidos
Horácio Costa e Joaquim de Freitas o cheque n.º 3527347293, sacado sobre a conta n.º
0145/08/001464.1, do Banco Pinto & Sotto Maior – BPSM, dependência das Caldas de
Vizela, à ordem do arguido Joaquim de Freitas, datado de 10.10.97 e no montante de
250.000$00.
Entretanto, através de aditamento ao projecto inicial, o arguido Guilherme
requereu então a redução da área de implantação ao limite legal (1.000 m2), dando
assim cumprimento às exigências contidas no PDM, conforme consta do primeiro
despacho de indeferimento.
No dia 14.11.97, depois de satisfeitas as exigências legais (exigências contidas
nos pareceres dos técnicos camarários relativos à aprovação do projecto apresentado
pelo arguido Guilherme), este foi notificado pela CMF de que o projecto havia sido
aprovado.
Nesse mesmo dia (14.11.97), deram entrada na CMF os projectos das
especialidades
Sucede que, em data indeterminada de Novembro de 1997 (mas seguramente
antes do dia 27 desse mês), o arguido Guilherme da Silva Almeida iniciou as
terraplanagens no terreno acima referido.
Mais tarde a obra foi fiscalizada pelos serviços de fiscalização da autarquia que,
face à inexistência de licença de construção, elaboraram o correspondente auto de
notícia, datado de 27.11.1997, o que originou um processo de contra-ordenação, vindo a
obra a ser embargada no dia 09.01.98.
Perante aquele auto de notícia, o arguido Guilherme conctactou a testemunha
Manuel Machado, responsável técnico pela execução da obra, a quem deu
conhecimento desse auto.
No dia 09.01.98, o arguido Guilherme foi então notificado pelos mesmos fiscais
da CMF do embargo total da obra de terraplanagem, tendo-lhe sido comunicado que
deveria parar imediatamente a execução da obra.
Em face disso, o arguido Guilherme ordenou aos operários e demais
responsáveis pela obra de terraplanagem que parassem os trabalhos.
E, a mando do arguido Guilherme Almeida, foram efectuados vários
telefonemas para o gabinete da testemunha Manuel Machado e que se prendiam com a
resolução do problema e com a possibilidade das obras prosseguirem.
Em data indeterminada de meados de Janeiro de 1998, enquanto se encontrava
na “MOCAP” (na “Exponor”), o arguido Guilherme foi contactado pelo seu
funcionário, a testemunha Paulo Martins, o qual lhe comunicou que havia recebido na
empresa um telefonema da CMF vinda do arguido Horácio Costa a pedir para lhe falar.
Como o arguido Guilherme não se encontrava na empresa, o arguido Horácio
Costa solicitou o seu número de telemóvel, o qual lhe foi fornecido, pelo que,
contactando-o de seguida, comunicou-lhe que, segundo indicação por si obtida da
arguida Fátima Felgueiras, o dito Guilherme Almeida poderia continuar com as
terraplanagens.
Em face desta comunicação, o arguido Guilherme Almeida retomou os trabalhos
de terraplanagem.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Todavia, no dia 19.01.1998, os serviços da Câmara Municipal de Felgueiras
elaboram um novo auto de notícia comunicando o não acatamento da ordem de
embargo, auto esse que a arguida Fátima Felgueiras não mandou remeter ao MP para
procedimento criminal pela eventual prática de um crime de desobediência,
diligenciando antes pela obtenção de esclarecimentos junto do Departamento Técnico.
Entretanto, em face dos pareceres favoráveis, a arguida Fátima Felgueiras
deferiu o licenciamento requerido, por despacho proferido em 26.01.1998, em
consequência do que veio a ser emitida a licença de construção nº 101/98.
Em 06.02.1998, o arguido Guilherme da Silva Almeida entregou um segundo
donativo para a campanha eleitoral daquela arguida, no valor de Esc. 150.000$00 (cento
e cinquenta mil escudos), tendo para o efeito emitido o cheque n.º 2283963692, datado
de 06.02.1998, sacado sobre a conta n.º 00000145816, da Caixa de Crédito Agrícola
Mútuo de Felgueiras.
A 14.08.97, o arguido Guilherme Almeida havia dado entrada na CMF de um
projecto de arquitectura relativo à construção de um armazém, ao qual veio a ser
atribuído o nº 662/97.
Em 20.10.97, o arguido Guilherme Almeida recebeu o ofício 5125, datado de
07.10.97, dando conhecimento do parecer técnico dos serviços da CMF, que se
pronunciaram no sentido do seu indeferimento por este, à semelhança do projecto
relactivo ao edifício industrial, prever uma área de implantação superior à permitida
pelo PDM e aprovada pela CCRN.
Como não foi dada qualquer resposta a tal ofício, o arguido Guilherme recebeu a
03.04.98 o ofício nº 1674, datado de 31.03.98, indeferindo o pedido de licenciamento de
construção de tal armazém.
Ora, esse projecto viria a ser reformulado, pelo que, em 19.02.1998, o arguido
Guilherme Silva Almeida apresentou um outro pedido de licenciamento (ao qual foi
atribuído o n.º 116/98) referente à construção de um armazém, contíguo ao edifício
industrial já existente, situado em Bouça Grande – Penacova – Felgueiras (a que
respeita o processo de licenciamento n.º 630/97).
Devido ao facto de tal obra, mais uma vez, ter sido iniciada sem licença, a
mesma foi embargada, após instauração de um processo de contra-ordenação baseado
em auto de notícia datado de 25.05.1998.
Em 17.06.98, o arguido Guilherme recebeu o ofício 3087, datado de 15.06.98,
novamente com um parecer técnico no sentido do seu indeferimento, uma vez que o
deferimento do projecto estava pendente de uma operação de loteamento ou de destaque
da parcela de terreno onde se pretendia efectuar a implantação da obra.
O técnico responsável pelo projecto de arquitectura, contratado pelo arguido
Guilherme, insistiu então na construção do armazém sem qualquer operação de
destaque, tendo sido recebido pelo arguido Guilherme em 26.10.98 o ofício 5592,
datado de 19.10.98, reafirmando a posição da CMF de que o projecto só seria aprovado
após a operação de destaque.
Assim, inicialmente, este pedido de licenciamento foi indeferido, dado que o que
se pretendia era a construção de um armazém na mesma parcela de terreno em que já
existia a fábrica, implicando uma operação prévia de destaque ou de loteamento (o
imóvel foi considerado uma segunda construção).
35
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Em face destes sucessivos despachos, o técnico responsável pelo projecto
contratado pelo arguido Guilherme avançou para a operação de destaque e, em
15.01.99, recebeu o arguido Guilherme o ofício 259, emanado da CMF e datado de
12.01.99, notificando-o da decisão de indeferimento do pedido de destaque tal qual ele
fora apresentado pelo ali requerente.
A operação de destaque viria entretanto a ser aprovada.
Em 11.02.1999, os serviços de fiscalização elaboraram novo auto de notícia,
dando conta do não acatamento da ordem de embargo (de que o arguido Gulherme não
foi notificado).
Em face disso, em 15.02.1999 a arguida Fátima Felgueiras mandou embargar de
novo a obra e, em 17.02.1999, a mesma arguida Maria de Fátima Felgueiras, ordenou a
remessa do auto de notícia ao Ministério Público, para efeitos de procedimento criminal
pela prática do crime de desobediência (facto de que o arguido Guilherme, pelo menos à
data, não teve conhecimento).
No entanto, a 06.04.99, a arguida Maria de Fátima Felgueiras proferiu novo
despacho, em sentido contrário, determinando a suspensão do envio do auto de notícia
ao Ministério Público por 60 dias, com base numa informação do Departamento
Técnico da autarquia datado de 29.03.99 e que consta do processo de licenciamento a fls
133, sendo certo que, em face da aprovação do projecto de arquitectura, esse auto não
viria a ser enviado ao MP.
No dia 05.05.99, o arguido Guilherme recebeu o ofício 2489, notificando-o da
aprovação do projecto de arquitectura, em face de parecer favorável.
No dia 15.07.99, o arguido Guilherme recebeu o ofício 2111, notificando-o para
proceder ao levantamento da licença de construção.
Em 07.10.99 foi emitido o alvará de licença de construção nº 698/99.
Em 16.03.2000 o arguido Guilherme foi notificado do ofício 684, no qual a
CMF informava que não se encontravam aprovadas as obras de infraestruturas.
Em 09.06.2000 foi então emitido o alvará de licença de utilização nº 339A/2000.
2.1.5. - A propósito dos donativos concedidos pelos arguidos Joaquim
Teixeira Pinto e José Manuel Pimenta da Silva
Os arguidos Joaquim Teixeira Pinto e José Pimenta da Silva eram sócios na
empresa do ramo imobiliário denominada “Conterfel”, conjuntamente com o Eng.º.
Manuel Maria Machado, conhecendo-se há vários anos.
Por outro lado, e simultaneamente, o arguido Joaquim Teixeira Pinto era
também administrador da empresa “Pinfel – Indústria de Calçado, SA”, enquanto o
arguido José Manuel Pimenta da Silva era sócio-gerente da empresa denominada
“Solpré – José Manuel Pimenta da Silva & Cª., Lda.”.
Todavia, sucede que ambos os arguidos, necessitavam de construir, para cada
uma daquelas empresas, novas unidades industriais (visto que as anteriores deixaram de
ser suficientes e adequadas à actividade industrial que prosseguiam).
Tendo encontrado um terreno adequado às suas necessidades, situado no lugar
de Cabeça de Porca, Sendim, Felgueiras (situado uma parte, segundo o PDM, em zona
industrial e outra em zona de floresta dominante e área percorrida por incêncios), as
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
duas empresas associaram-se no sentido de o adquirir, perspectivando dividí-lo
posteriormente em duas partes, na qual cada uma das ditas empresas construiria as
respectivas instalações fabris.
Entretanto, entre ambos os mencionados arguidos, foi acordado que seria a firma
“José Manuel Pimenta da Silva & Cª., Lda.” a adquirir o dito terreno, o que se
concretizou por escritura pública realizada ainda no ano de 1997, registando-se assim o
imóvel unicamente em nome da firma “José Manuel Pimenta da Silva e Cª Ldª”, mais
tendo sido acordado que mais tarde a firma “Pinfel – Indústria de Calçado, SA”
adquiriria a parcela onde lhe caberia construir as suas instalações (o que só viria a
suceder após o loteamento do terreno, por escritura publica celebrada em 18.02.2002, no
Cartório Notarial de Fafe).
Contudo, como ao referido terreno correspondia apenas um único artigo
matricial - situação que inviabilizava a construção das duas referidas unidades
industriais -, aqueles arguidos perspectivavam dividí-lo através de uma operação de
destaque de uma parcela, o que porém não viriam a conseguir levar a cabo na medida
em que os serviços competentes da CMF entendiam que a operação em causa apenas
poderia ser concretizada através do loteamento do terreno, o que não agradou nada
àqueles arguidos, visto que se tratava de uma operação mais demorada e mais cara.
A fim de ultrapassar tal problema legal e uma vez que não conseguiam proceder
ao destaque da parcela, os arguidos Joaquim Teixeira Pinto e José Manuel Pimenta da
Silva pediram então uma audiência à arguida Maria de Fátima Felgueiras, em data
indeterminada do ano de 1997, mas situada no primeiro semestre, audiência essa que
lhes foi concedida.
Através de tal contacto pessoal com a Presidente Maria de Fátima Felgueiras,
acompanhada do Arquitecto Rui Almeida e estando ainda na altura presente o
Engenheiro Manuel Maria Machado, que acompanhava os arguidos Joaquim Teixeira
Pinto e José Manuel Pimenta da Silva (por ser o técnico contratado por estes), e depois
dos ditos arguidos terem exposto a situação do referido lote de terreno, bem como as
suas intenções de no mesmo instalarem dois pavilhões industriais, um para cada uma
das suas empresas (“Solpré” e “Pinfel”), àquela arguida foi solicitada a autorização para
o início das obras de terraplanagem, mesmo sem a emissão da respectiva licença de
construção.
Por outro lado, visando resolver o problema da implantação em tal terreno dos
dois citados edifícios industriais, a arguida Maria de Fátima Felgueiras comunicou
àqueles arguidos que a solução seria efectuar-se o loteamento do terreno.
Entretanto, os arguidos Joaquim Teixeira Pinto e José Manuel Pimenta da Silva
iniciaram os trabalhos de terraplanagem, em data não concretamente apurada, mas
situada durante o primeiro semestre do ano de 1997.
No seguimento da referida audiência, em 30.07.1997, a sociedade “José Manuel
Pimenta da Silva & C. Lda.” requereu, à CMF, autorização para proceder à construção
de duas unidades industriais num terreno sito em Cabeça de Porca – Sendim –
Felgueiras, tendo tais pedidos dado origem aos processos de obras particulares com os
n.º 413/99 e 414/99, solicitando, além disso, a constituição de dois lotes independentes,
pedido que deu origem ao processo de loteamento n.º 10/97, o qual viria inicialmente a
ser rejeitado por falta de apresentação de documentos necessários à análise do pedido de
loteamento em causa.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Na altura de qualquer eleição, as comissões de angariação de fundos de qualquer
partido político percorrem a região de Felgueiras em busca de donativos, com particular
insistência junto dos industriais.
Assim, em 29.10.1997, os arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas
deslocaram-se ao gabinete da testemunha Manuel Machado, o qual lhes entregou:
- o cheque n.º 8369035058, no montante de Esc. 500.000$00 (quinhentos mil
escudos), sacado sobre a conta n.º 0003265130, da agência de Felgueiras, da Caixa
Geral de Depósitos, emitido pelo arguido Joaquim Teixeira Pinto (“Pinfel”), a título de
donativo para a campanha eleitoral do PS; e
- o cheque n.º 8350026306, no valor de Esc. 500.000$00 (quinhentos mil
escudos), sacado sobre a conta bancária n.º 0000074888, da agência de Felgueiras, da
Caixa de Crédito Agrícola Mútuo, emitido pelo arguido José Manuel Pimenta da Silva
(da empresa Solpré), também a título de donativo para a campanha eleitoral daquele
partido às eleições autárquicas de Dezembro de 1997.
O arguido Pimenta da Silva efectuou também donativos a outras forças políticas,
concorrentes às eleições autárquicas de 1997.
Já em 12.12.1997, a dita testemunha Manuel Machado entregou aos arguidos
Horácio Costa e Joaquim Freitas o cheque n.º 8417836902, no valor de 670.000$00
(seiscentos e setenta mil escudos), sacado sobre a conta n.º 40012619996, da agência de
Felgueiras, da Caixa de Crédito Agrícola Mútuo, emitido pelo arguido José Manuel
Pimenta da Silva a título de donativo, mas para finalidade que não se apurou.
De permeio, em 26 de Novembro de 1997, a sociedade “José Manuel Pimenta da
Silva & C. Lda.” reformulou o projecto de loteamento.
Tal pretensão veio a ser indeferida, em inícios de 1998, com base em pareceres
técnicos que indicavam que o projecto violava o PDM em vigor, uma vez que a
implantação dos edifícios iria ocupar solo classificado como “floresta dominante”,
sendo uma área habitualmente percorrida por incêndios.
Em 19.02.1998, a arguida Maria de Fátima Felgueiras mandou notificar a
requerente do teor de tal despacho de indeferimento (posterior, portanto, à entrega dos
referidos donativos).
Entretanto, a arguida Maria de Fátima Felgueiras, no dia 06.03.1998, remeteu
novamente o processo ao Director do Projecto do PDM para reapreciação.
Em 03.06.1998, o arguido José Manuel Pimenta da Silva juntou novas plantas,
informando a autarquia de que a estrutura dos edifícios já estava construída e
solicitando ao Gabinete do PDM que lhe indique a forma de ultrapassar a situação.
Depois de ter sido solicitado à Direcção Regional de Agricultura de Entre Douro
e Minho (DRAEDM) que se pronunciasse sobre o processo, esta exigiu um estudo
paisagístico que, uma vez apresentado, foi considerado “globalmente equilibrado”.
Com base neste parecer, os técnicos da autarquia não levantaram qualquer
objecção, motivo pelo qual o projecto de arquitectura referente a tal loteamento acabou
por ser deferido pela arguida Maria de Fátima Felgueiras, em 25.01.1999, vindo a ser
deferida a respectiva licença a 03.01.2000, cujo alvará foi emitido já em 30.11.2001.
No âmbito do processo de obra particular nº 413/99, a Fiscalização elaborou a
27.05.98 uma participação dando conta da construção de dois pavilhões sem a
necessária licença de construção, razão pela qual a obra viria a ser embargada; mas,
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
como foi desrespeitado tal embargo, o arguido Pimenta da Silva foi julgado por crime
de desobediência no âmbito do processo nº 115/2000, do 1º Jz do TJ da Comarca de
Felgueiras.
A par disso, foi levantado um processo de contra-ordenação, tendo a sociedade
“José Manuel Pimenta da Silva & Cª Ldª”, em nome de quem o projecto e o
licenciamento da obra se encontrava, pago a coima que lhe foi aplicada, no montante de
750.000$00, mais custas no montante de 1.795$00, por decisão proferida pela CMF a
17.04.2000.
Pagou também a sociedade em causa, para que o processo fosse legalizado, a
importância de 22.159.150$00, como compensação pela área de terreno (8.475 m2) que
teria de ceder ao domínio público, sendo certo porém que de metade desse valor viria a
ser reembolsada pela sociedade “Pinfel – Indústria de Calçado, SA”.
Foi ainda liquidada a quantia de 4.691.234$00 pela emissão do respectivo alvará
de loteamento.
Com a sua decisão de deferir o referido loteamento, a arguida Maria de Fátima
Felgueiras autorizou a desafectação de um terreno classificado como “floresta
dominante”, requerido pelo arguido José Manuel Pimenta da Silva em representação da
sociedade “José Manuel Pimenta da Silva & Cª Ldª”, que só podia ser legalmente
efectuada por decisão judicial ou através da revisão do PDM, aprovando
consequentemente a legalização das duas supra referidas construções efectuadas pelas
firmas representadas pelos arguidos José Manuel Pimenta e Joaquim Pinto.
Por outro lado, através de tal decisão, os arguidos José Manuel Pimenta da Silva
e Joaquim Teixeira Pinto lograram alcançar os seus objectivos, ou seja, construir no
local referido.
Os arguidos Joaquim Teixeira Pinto e José Manuel Pimenta da Silva agiram de
forma livre, voluntária e consciente querendo através das suas condutas obter o
licenciamento das obras supra referidas, como efectivamente obtiveram.
Por sua vez, a arguida Maria de Fátima Felgueiras, agiu de forma livre,
voluntária e consciente, deferindo o licenciamento do loteamento e das construções
referidas, estribada contudo em pareceres favoráveis.
2.1.6. - A propósito dos donativos concedidos pela arguida Maria Augusta
Faria Ferreira Neves
A arguida Maria Augusta foi militante do Partido Socialista desde 22.07.96 até
15.05.2002, tendo assumido a vice-presidência da Assembleia Municipal de Felgueiras
entre Janeiro de 1998 (na sequência da sua eleição pela lista do PS nas eleições
autárquicas ocorridas em 14.12.97) até meados de 2000, no âmbito da qual foi
convidada várias vezes pela arguida Fátima Felgueiras – em substituição do presidente
da Assembleia Municipal de Felgueiras, o Dr. Barros Moura, que residia e trabalhava
em Lisboa – para estar presente nas mais variadas recepções que a CMF efectuava às
entidades oficiais.
Foi convidada em 1997 para fazer parte da comissão de apoio à candidatura da
arguida Fátima Felgueiras, que era constituída por diversas personalidades locais, tendo
sido a dita Maria Neves incumbida de, pontualmente, organizar actos políticos dirigidos
à área feminina do eleitorado, sendo certo que, nesse âmbito, procedeu à entrega de
39
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
donativos, através da emissão de cheques, uns em nome da “Calzeus” e outro em nome
pessoal.
Consequentemente, era pessoa que mantinha com a arguida Fátima Felgueiras
uma relação de alguma proximidade.
A “Calzeus” é uma sociedade parcialmente pertencente à família da arguida
Maria Augusta Neves, onde trabalhavam quer o marido quer o seu filho, fundada há
mais de 10 anos, tendo grangeado elevado prestígio no mercado de calçado, quer a nível
nacional quer a nível internacional, designadamente através da marca “Swear”.
Nessa empresa a arguida Maria Neves, apesar de ter figurado como
administradora, nunca exerceu funções executivas, nunca tendo assim recebido qualquer
remumeração respeitante ao cargo de administradora, sendo certo que centra a sua
actividade nas funções docência universitária (há mais de 19 anos), na investigação e na
autoria de manuais escolares.
Assim, com o objectivo de apoiar a candidatura da arguida Maria de Fátima
Felgueiras à presidência da CMF, foi entregue por pessoa não concretamente
identificada ao arguido Horácio Costa, em 07.11.1997, um donativo no valor de Esc.
200.000$00 (duzentos mil escudos), através do cheque n.º 6921427631, sacado sobre a
conta bancária n.º 00015300007, da agência do Banco Espírito Santo de Barrosas,
subscrito, na qualidade de administradores da firma “Calzeus”, por José Manuel
Monteiro Neves e José Manuel Ferreira Neves, respectivamente marido e filho da
arguida Maria Augusta.
Cerca de um mês depois, em 12.12.1997, ainda com o mesmo propósito, a
arguida Maria Augusta Ferreira Neves procedeu à entrega de novo donativo, no valor de
Esc. 70.000$00 (setenta mil escudos), através do cheque n.º 0932743089, sacado sobre
a conta n.º 00427209100, da agência Central do Porto da Caixa Geral de Depósitos.
Em 05.01.1998, deu entrada, na CMF, um requerimento, em nome de José
Manuel Monteiro Neves, solicitando licença para proceder à construção de um edifício
destinado a armazém, com uma área de construção de 1.000 m2 (processo de construção
nº 6/98, apreendido nos autos), implantado num terreno com uma área de 11.900 m2
sito em Campos – Lagares – Felgueiras, pertencente à empresa “Calzeus Calçados,
S.A.”, tendo os projectos apresentados à CMF sido elaborados pela firma “Ambienta”.
A 26.02.98 foi aprovado o respectivo projecto de arquitectura, tendo-se
concedido 180 para que o requerente apresentasse os projectos de especialidade, os
quais viriam a ser apresentados a 22.07.98.
Entretanto, no dia 13.05.1998, a arguida Maria Augusta Ferreira Neves entregou
um terceiro donativo, no valor de esc.100.000$00 (cem mil escudos), através do cheque
n.º 9031000271, sacado sobre a conta bancária n.º 36258301001, da empresa “Calzeus
Calçado, Lda.”, da agência de Felgueiras do Banco Totta & Açores, apesar das eleições
terem ocorrido em Dezembro de 1997, donativo esse entregue para ajudar no custeo de
despesas relacionadas com a revista “Rubeas”.
Em 02.09.1998, os funcionários do serviço de fiscalização da CMF verificaram
que a obra já se tinha iniciado sem que tivesse sido emitida a respectiva licença de
construção e que a mesma tinha uma área total de construção bastante superior aquela
que constava do projecto apresentado na CMF.
Dando conta de tal situação, foi elaborado um auto de notícia que veio a dar
origem ao processo de contra-ordenação nº 466/98, aberto no dia seguinte, sendo certo
40
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
que o requerente da licença não se encontrava presente no acto da fiscalização, tendo
sido notificado do processo de contra-ordenação com o respectivo auto de notícia no dia
22.10.98.
Entretanto, no dia 03.09.98 a arguida Maria de Fátima Felgueiras tinha
despachado favoravelmente a emissão da licença de construção nº 660/98, emitida a
09.09.98, estribada em pareceres técnicos favoráveis constantes do processo de
licenciamento referido.
Ainda no âmbito do supra aludido processo de contra-ordenação, o ali arguido
José Manuel Monteiro Neves apresentou a sua defesa em 24.03.99, solicitando o
arquivamento dos autos, tendo aí sido aposta, desde logo, uma nota manuscrita pela
arguida Fátima Felgueiras, dirigida à testemunha Helena Félix, em 25.03.99 e que se
passa a reproduzir: “se, como afirma, o processo estiver legalizado à data da conclusão
do de contra-ordenação, admito que se arquive com admoestação.”
Entretanto, a arguida Maria Augusta Neves, a fim de ajudar a pagar o
remanescente do preço de aquisição da sede local do PS ainda em dívida, entregou ao
arguido António Bragança, em Abril de 1999, o cheque com o n.º 3769765719, no valor
de Esc. 500.000$00 (quinhentos mil escudos), sacado sobre a conta n.º 21656575/001
do BTA, balcão de Felgueiras, titulada por José Manuel Monteiro Neves (mas emitido
por Maria Augusta Ferreira Neves, em 16.04.1999).
Tal cheque foi depois entregue, para posterior depósito bancário, por António
Bragança a José Júlio Silva Pereira, funcionário do GAPP, co-titular com aquele de uma
conta bancária “oficial” do Partido Socialista de Felgueiras com o n.º 309-046952-400
da Caixa Geral de Depósitos de Felgueiras.
O arguido António Bragança exerceu as funções de adjunto do GAPP desde
13.10.99 até 10.02.2000, altura em que foi exonerado.
Em 26.11.99, ainda no âmbito do supra aludido processo de contra-ordenação, o
ali arguido José Manuel Monteiro Neves, instado a tanto pela CMF, veio informar que o
processo de construção estava devidamente legalizado, tendo requerido, uma vez mais,
o arquivamento dos autos.
Tal requerimento foi despachado a 27.11.99 pela arguida Fátima Felgueiras, a
qual, direccionando-o uma vez mais à testemunha Helena Félix, apôs “A confirmar-se,
arquive.”
No seguimento de tal despacho, a testemunha Helena Félix, em nota manuscrita
no próprio requerimento do dito José Neves, solicitou a 02.12.99 informação no sentido
de saber se a construção do pavilhão industrial estava ou não legalizada.
E, no seguimento desse pedido de informação, a 10.12.99, é aposta, igualmente
sobre o referido documento, a informação solicitada, subscrita por um técnico da CMF e
por ele rubricada (a qual é ilegível), na qual refere expressamente que “a obra está
legalizada” .
Em face dessa informação e do despacho da arguida Fátima de 27.11.99, acima
transcrito, o processo foi arquivado, tendo sido o mencionado José Neves notificado
desse arquivamento em 16.12.99.
E em 15.12.99 foi emitido o alvará nº 940/99, licenciando alterações à
construção inicial, alterações estas destinadas a um armazém.
41
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Mais tarde, os serviços da CMF constataram que o edifício não era um armazém
mas uma unidade industrial, motivo pelo qual a arguida Maria de Fátima Felgueiras
proferiu, em 23.11.2000, um despacho concedendo 60 dias para que o proprietário
regularizasse a situação.
No entanto, pelo menos até Janeiro de 2002, tal regularização não tinha sido
requerida, vindo a licença de utilização a ser concedida a 28.02.2002.
A arguida Maria Augusta Ferreira Neves agiu de forma livre, voluntária e
consciente querendo contribuir e entregar os donativos supra referidos à arguida Maria
de Fátima Felgueiras.
A arguida Fátima Felgueiras agiu de forma livre e voluntária, despachando o
sobredito processo de licenciamento e deferindo a emissão das respectivas licenças
estribada, para o efeito, em pareceres técnicos que apontavam nesse sentido.
3. Factos provados relacionados com o 3º capítulo da pronúncia
3.1. – A propósito dos pagamentos de bens e serviços efectuados através da
conta do B.E.S.
A conta bancária n.º 238/27674/000.9, da agência bancária de Felgueiras do
Banco Espírito Santo, entre 11.07.1997 e 07.09.1999, data do seu encerramento, foi
utilizada para depósito de quantias monetárias obtidas pela forma supra descrita e para
realização de inúmeros pagamentos relacionados com os vários serviços e bens
contratados para as acções de campanha eleitoral da arguida Maria de Fátima
Felgueiras, bem como despesas de cariz pessoal da mesma.
De entre os múltiplos pagamentos efectuados através de tal conta bancária,
destacam-se os seguintes:
a) – Acções da campanha eleitoral:
Durante o período em que tal conta esteve activa, através dela foram efectuados
múltiplos pagamentos de custos de campanha eleitoral (designadamente com
espectáculos musicais, bandeiras, cartazes, “pins”, renda da sede, etc.) que atingiram o
valor global de Esc. 52.577.832$00.
b) - Aquisição do Veículo “Audi A4”, de matrícula 96-29-LN, por Fátima
Felgueiras:
Em meados do ano de 1998, a arguida Maria de Fátima Felgueiras manifestou
ao arguido Joaquim de Freitas a intenção de trocar a sua viatura de marca “Citroen”, por
um veículo de marca “Audi A4”, recorrendo para o efeito às sobreditas quantias obtidas
através da “RESIN e depositadas na conta do BES e numa “conta paralela”, de que
aquele e o arguido Horácio Costa eram co-titulares, vindo a utilizar efectivamente parte
da quantia de Esc. 5.250.000$00 entregue em 16.06.1998 pelo arguido Carlos Marinho
em numerário, já em seu poder, proveniente de fundos angariados.
Os arguidos Joaquim de Freitas e Horácio Costa, seguindo instruções da Maria
de Fátima Felgueiras, contactaram a empresa “Machado & Costas, Lda.”, de Guimarães,
e acertaram a compra do referido veículo pelo preço de Esc. 5.700.000$00, a pronto
pagamento.
Posteriormente, e com intuito de impedir, para sua salvaguarda, que fosse
possível associar a compra de tal automóvel à conta existente no BES de Felgueiras,
ainda segundo instruções da arguida Fátima Felgueiras, os arguidos Horácio Costa e
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Joaquim de Freitas decidiram depositar, no dia 28.07.1998, do montante que lhes tinha
sido entregue pelo arguido Carlos Marinho da “RESIN”, a quantia de Esc.
4.700.000$00, em dinheiro, na conta pessoal do primeiro, com o n.º 133180013, do
Banco Melo, agência de Fafe, embora não lograssem completar tal dissimulação.
No dia seguinte, 29.07.1998, os arguidos Horácio Costa, Joaquim de Freitas e
Maria de Fátima Felgueiras, dirigiram-se ao “stand” da empresa “Machado & Costas,
Lda.”, sito em Guimarães onde, após terem tratado de toda a documentação referente à
compra, o primeiro entregou na contabilidade daquela empresa, para pagamento do
automóvel, os seguintes cheques, que tinha previamente emitido:
- o cheque n.º 1659468550, com a data de 29.07.1998, sacado sobre a sua conta
n.º 00133180013, do Banco Melo, agência de Fafe, no valor de 4. 700. 000$00 - (cfr.
fls. 77 do 1º Volume); e
- o cheque n.º 1659468550, com data de 29.07.1998, no valor de Esc.
1.000.000$00, emitido sobre a conta n.º 0027674009 do BES, titulada pelos arguidos
Horácio Costa e Joaquim de Freitas - (cfr. fls. 77 do 1º Volume);
c) – Pagamento de uma dívida do FCF:
No ano de 1998, a “RESIN” recebeu um adiantamento, no valor de Esc.
389.970.768$00, autorizado pela “AMVS”, sobre as verbas provenientes da construção
do aterro RIB de Felgueiras, supra referido.
Após a “RESIN” ter recebido tal adiantamento, uma parte daquele montante foi
utilizado para pagar uma dívida que o FCF tinha para com a Caixa de Crédito Agrícola
Mutuo de Felgueiras (CCAMF), proveniente de um acordo particular assinado entre a
CCAMF e o FCF (acordo de transacção), em 15.09.1998, acordo esse que visou
regularizar as dívidas deste clube para com aquela instituição bancária, relativas a várias
acções comuns e acções executivas em curso, consolidando o crédito da primeira na
quantia global de Esc. 325.000.000$00.
Desse montante, a quantia de Esc. 50.000.000$00 deveria ser paga até ao dia
30.09.1998.
Todavia, sucede que, até essa data o FCF apenas conseguiu pagar Esc.
30.000.000$00, permanecendo em dívida a quantia de Esc. 20.000.000$00.
Porque entretanto a CCAMF estava a exigir o pagamento da quantia ainda em
dívida, o arguido Júlio Faria recorreu à arguida Maria de Fátima Felgueiras, procurando
que esta tentasse encontrar uma solução que permitisse ao FCF pagar à CCAM de
Felgueiras tal montante.
A arguida Maria de Fátima Felgueiras, acedendo a tal pedido, deu instruções ao
arguido Horácio Costa no sentido de acompanhar o arguido Júlio Faria à sede da
“Resin”, em Matosinhos, com o intuito de contactar o arguido Vítor Borges e de lhe
solicitar um donativo de Esc. 20.000.000$00 para o FCF, tendo-se então comprometido
o arguido Vítor Borges a apoiar o clube em face das disponibilidades financeiras da
“Resin” logo que o consórcio “Resin”/”Sita”/”Ecop” recebesse o adiantamento de
verbas da AMVS, no âmbito do contrato de empreitada para a construção do Aterro de
Resíduos Industriais Banais (RIB) de Felgueiras, pois só nessa altura teria
disponibilidade financeira para apoiar aquele clube com um dito donativo.
No seguimento de tal acordo, no dia 27.10.1998, alguém da “Resin” (cuja
identidade não se apurou) contactou, via fax, a Associação de Municípios do Vale do
Sousa (AMVS), solicitando que fosse transcrito para impresso da Associação o texto
enviado em anexo e que autorizava a concessão de um adiantamento sobre o "Contrato
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
de Empreitada de Concepção, Construção e Gestão de um Sistema de Tratamento de
Resíduos Industriais Equiparados a Urbanos do Sector do Calçado no Município de
Felgueiras – RIB de Felgueiras", no montante de Esc. 389.970.768$00 (trezentos e
oitenta e nove milhões, novecentos e setenta mil e setecentos e sessenta e oito escudos)
para que esse montante fosse descontado junto de uma instituição de crédito,
comprometendo-se a AMVS a proceder à sua liquidação.
O Conselho de Administração (CA) da AMVS deliberou favoravelmente a
proposta da “RESIN” autorizando-a a proceder ao desconto de uma factura junto de
uma instituição de crédito, desde que à AMVS não fossem imputados juros de mora
pela sua não liquidação nos prazos previstos, e, em 06.11.1998, comunica tal decisão à
referida empresa.
Após ter tido conhecimento de tal adiantamento à “RESIN”, o arguido Júlio
Faria, visando resolver a dívida do FCF, nesse mesmo dia envia a Horácio Costa um
manuscrito, onde renova o pedido de resolução da situação.
Após o envio de tal missiva e depois do arguido Júlio Faria de ter sido
informado de que poderia comunicar à CCAM de Felgueiras que o problema seria
resolvido a muito breve trecho (pois a “Resin” acedera em entregar o solicitado
donativo de 20.000 cts), no dia 04.12.1998, esse arguido e Álvaro Costa, em
representação do FCF, enviam uma carta à CCAM de Felgueiras referindo que a dívida
de Esc. 20.000.000$00 seria saldada até ao final do ano.
Em 30.12.1998, o arguido Horácio Costa foi então contactado, nas instalações
da CMF, pelo arguido Carlos Marinho (quadro superior da “RESIN”), tendo ele feito
entrega de Esc. 20.000.000$00 (vinte milhões de escudos), sendo Esc. 12.500.000$00
através da emissão do cheque n.º 9112924417, sacado sobre a conta do BPN n.º
122970155, titulada pela “RESIN”, e o restante em numerário.
Como habitualmente, o arguido Horácio Costa comunicou tal recebimento à
arguida Maria de Fátima Felgueiras, que de imediato contactou os responsáveis pelo
FCF.
Decorrido pouco tempo, mas nesse mesmo dia, Horácio Costa foi abordado pelo
Dr. Barata Feio e pelo Sr. Figueiredo, funcionários do FCF, aos quais entregou a supra
referida quantia monetária, na forma em que a recebera da “RESIN” e estes deslocaramse ao Banco Totta & Açores (BTA) agência de Felgueiras onde depositaram aqueles
valores na conta n.º 21287235/001, titulada pelo FCF.
Esta quantia, que permitiu ao FCF solver a totalidade da prestação vencida em
30.09.98, no âmbito do supra descrito acordo de transacção (para garantia do capital em
dívida foram emitidas seis livranças em branco de acordo com a respectiva cláusula 4ª,
tendo os Srs. Álvaro Costa e Fernando Lima prestado o respectivo aval da forma ali
convencionada, sendo certo porém que nenhuma dessas livranças foi avalisada pelo
arguido Júlio Faria, nem era suposto sê-lo em face de tal acordo); tal quantia apenas foi
entregue pela “RESIN” porque tal lhe foi pedido pelo arguido Júlio Faria (com o aval da
arguida Fátima Felgueiras, a qual dera instruções ao arguido Horácio no sentido de
acompanhar à sede da “Resin” o arguido Júlio) e porque tinha obtido (a mais) a quantia
de Esc. 140.000.000$00, dissimulada na proposta que o consórcio liderado pela “Resin”
apresentou ao concurso internacional relativa à concepção/construção/exploração, com
apoios comunitários, do Aterro de Resíduos Industriais Banais (RIB) de Felgueiras.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
A arguida Fátima Felgueiras sempre recebeu com regozijo a colaboração das
mais diversas pessoas e entidades com as associações de natureza desportiva, social,
cultural ou outras existentes no concelho de Felgueiras.
Considerando mesmo vital para a prossecução dos objectivos dessas associações
o mecenato e os contributos, incluindo de natureza financeira, prestados por tais pessoas
e entidades.
O FCF não constituía, neste aspecto, excepção, pelo relevante contributo que
sempre deu ao desenvolvimento do desporto concelhio e ao prestígio do município.
3.2. – A propósito da “conta paralela” ou “caixa paralela”
Para além da referida conta bancária aberta no BES, existiram ainda diversos
donativos e pagamentos efectuados com as quantias recolhidas que não chegaram a ser
depositados ou movimentados em tal conta bancária, acabando os mesmos por
constituir uma espécie de “conta paralela” ou “caixa paralela”.
Estes montantes “guardados em caixa” serviram, entre outras coisas, para pagar
diversos serviços relativos à campanha eleitoral da arguida Maria de Fátima Felgueiras
às eleições autárquicas de 1997, bem como para o pagamento de despesas de cariz
particular de tal arguida, tais como gasolina, despesas com géneros alimentícios, para
pagar 1.550 bilhetes de um sorteio realizado pelo FCF, para depositar Esc.
1.850.000$00 na conta particular do arguido Júlio Faria, etc...
Os depósitos documentados em tal “conta paralela” ascenderam ao valor global
de Esc. 11.131.653$00, enquanto os pagamentos efectuados atingiram o valor global de
Esc. 14.920.998$00, sendo a diferença coberta por transferência da referida conta aberta
no BES.
4. Factos provados relacionados com o 4º capítulo da pronúncia
4.1. - A propósito da introdução
A arguida Maria de Fátima Felgueiras, no exercício das suas funções de
presidente da Câmara Municipal de Felgueiras, analisou e deferiu inúmeros pedidos de
licenciamento de obras particulares e outras, sempre estribada em pareceres técnicos.
Assim:
4. 2. – A propósito do processo de obra particular n.º 130/88, relativo à
construção da unidade industrial da sociedade “Teixeira Pinto & C. Lda.”
(posteriormente, “Pinfel – Indústria de Calçado, SA”)
A sociedade denominada “Teixeira Pinto & C. Lda.” (posteriormente
denominada, “Pinfel – Indústria de Calçado, SA”), no dia 06.04.1988, apresentou, nos
serviços de obras da CMF, um pedido de licenciamento de construção de uma unidade
industrial, sita no Lugar de Pinheiro, Lagares, Felgueiras, o qual foi registado como
processo de obra n.º 130/88, pedido esse que foi deferido, emitindo-se
consequentemente o respectivo alvará de construção.
Todavia, sucede que, no dia 11.06.1997, foi emitido, em tal processo, um
parecer técnico alertando para o facto daquela obra estar a ser ampliada sem o
respectivo licenciamento e em desconformidade com o PDM e RGEU em vigor.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Face a tal denúncia, mas apenas em 27.10.1997, são instaurados dois processos
de contra-ordenação pelas ampliações efectuadas sem licença de construção e pelo facto
do imóvel estar a ser utilizado sem a respectiva licença de utilização (processos de
contra-ordenação nºs 583/97 e 584/97).
Em Novembro de 1997 foi concedido um prazo de 180 dias para que a
requerente regularizasse a situação, o que não foi feito.
Entretanto, os mencionados processos de contra-ordenação foram encerrados,
respectivamente, no dia 25.01.1998 (através de um despacho de arquivamento –
processo nº 583/97) e no 05.11.1999 (através da aplicação de uma coima – processo
584/97).
No dia 16.02.2000 a requerente fez juntar um requerimento no sentido de
legalizar as alterações entretanto introduzidas ao projecto inicial, tendo-lhe sido porém
concedidos 30 dias para instruir o processo com os documentos em falta.
Alguns meses depois, mais precisamente, no dia 06.07.2000, a presidente da
CMF, a arguida Maria de Fátima Felgueiras, sem que tal tivesse sido requerido mas na
sequência de uma audiência concedida à requerente a 05.07.2000, decide solicitar a
reapreciação do referido pedido de licenciamento por parte dos serviços técnicos da
autarquia.
Depois de dois pareceres elaborados por um técnico da CMF (datados de 4 e 19
de Julho de 2000, respectivamente) terem referido, expressamente, que se mantinha a
violação do PDM, a arguida Maria de Fátima Felgueiras decidiu indeferir o
licenciamento/legalização das obras, através de despacho proferido no dia 18.09.2000.
Em 11.12.2000, no mesmo processo de legalização de obra, foram proferidos
novos pareceres técnicos, que mantiveram a indicação de que não estavam a ser
respeitados os afastamentos aos limites da propriedade.
Dada a junção de declaração de não oposição por parte do proprietário do
terreno confinante relativamente ao não respeito da construção pelo afastamento ao
limite da propriedade, por despacho de 21.12.2000, o projecto de arquitectura acabaria
por ser aprovado, ficando o processo a aguardar a apresentação dos projectos de
especialidade.
Entretanto, a 18.01.2001, foi feito um novo requerimento de legalização da obra,
na sequência da qual, a 14.02.2001, foi concedido um prazo de 30 dias para que a
requerente levasse a cabo obras de demolição, sendo concedida licença para o efeito.
Uns dias depois, no dia 21.02.2001, foram liquidadas as respectivas taxas,
embora agravadas (porquanto, pelo menos uma parte das obras decorreu antes do
respectivo licenciamento).
Em 23.02.2001, o processo de obra foi averbado em nome da “Pinfel – Indústria
de Calçado, SA”, tendo o alvará de construção sido emitido em 23.04.2001, com o n.º
304/2001.
Finalmente, depois de a arguida Maria de Fátima Felgueiras ter proferido, em
08.06.2001, um despacho deferindo a licença de utilização, esta veio a ser emitida, no
dia 15 do mesmo mês.
A arguida Maria de Fátima Felgueiras agiu de forma livre, voluntária e
consciente, querendo decidir no sentido da emissão do alvará de construção e da
respectiva licença de utilização da obra supra referida, usando os poderes das funções de
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
autarca que exercia, estribada nos pareceres técnicos proferidos em tal processo de
licenciamento.
4. 3. – A propósito do processo de obra particular n.º 5/I/93 relativo à
construção da unidade industrial da sociedade “Marina Calçados, SA”
O processo de obra particular n.º 5/I/93, relativo à construção da unidade
industrial da sociedade “Marina Calçados, SA”, sita na Quinta da Estrada – Margaride –
Felgueiras, deu entrada na CMF, no dia 15.06.1993, tendo o projecto sido elaborado
pela firma “Ambienta”.
O respectivo projecto de arquitectura foi aprovado por despacho proferido a
02.02.94 pelo arguido Júlio Faria, então presidente da CMF, na sequência de pareceres
técnicos favoráveis, o último dos quais proferido no dia anterior.
Em face disso, não obstante a área de construção requerida ser de 3.996 m2,
violando assim o regulamento do PDM de Felgueiras (que entretanto entrara em vigor a
28.01.94), já que para o local a área máxima de ocupação do solo prevista era de 1.000
m2 (área classificada como sendo de aglomerado de 2º nível), a 19.08.94 a arguida
Fátima Felgueiras despachou favoravelmente o projecto apresentado, sendo emitido o
respectivo alvará de construção, em 07.11.1994, ao qual foi atribuído o n.º 903/94.
No dia 16.10.1997, António Pereira de Castro (irmão e sócio do requerente de
tal projecto - Carlos Pereira de Castro), entregou um donativo para a campanha eleitoral
da arguida Maria de Fátima Felgueiras às eleições autárquicas do mesmo ano, no valor
de Esc. 500.000$00 (quinhentos mil escudos).
Após a entrega de tal donativo, no dia 27.03.1998, foi emitido, pela CMF, o
Alvará de Utilização nº 187 para aquela unidade industrial.
A arguida Maria de Fátima Felgueiras agiu de forma livre, voluntária e
consciente tendo deferido, no pleno exercício das suas funções membro eleito de órgão
autárquico, a emissão do alvará de construção e a respectiva licença de utilização da
obra supra referida, estribada em todo o caso em pareceres técnicos favoráveis.
5. Factos provados relacionados com o 5º capítulo da pronúncia
5.1. - A propósito da introdução
Manuel Renato Guerra Fonseca e Silva (adiante designado apenas por Renato
Guerra - pai) foi sócio-gerente da empresa Proeme – Promoção e Mercados, Ldª, que
tinha por objecto a prestação de serviços na área do estudo de mercados e promoção de
produtos, consultadoria de imagem e publicidade e se encontra actualmente desactivada
e sem qualquer tipo de actividade, detendo o mesmo uma quota de 80% do capital
social, enquanto o seu filho Renato Manuel Ferreira Guerra da Fonseca e Silva (adiante
designado como Renato Guerra - filho) detinha os restantes 20%.
A arguida Maria de Fátima Felgueiras, através da adjudicação e celebração de
um contrato atinente às comemorações dos “20 anos do Poder Local”, pretendia
divulgar o trabalho que tinha desenvolvido na autarquia de Felgueiras, durante os dois
últimos anos do mandato por si exercido, em substituição do arguido Júlio Faria.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
5. 2. - A propósito da adjudicação dos contratos de “prestação de serviços
de assessoria de comunicação e imagem” e de “concepção, produção e
fornecimento de exposição no âmbito das comemorações dos 20 Anos do Poder
Local”, celebrados entre a “Proeme” e a CMF (na parte que ainda interessa)
Na execução do referido projecto estratégico, a arguida Maria de Fátima
Felgueiras, em Fevereiro de 1997, usando para o efeito os poderes que detinha na CMF,
procedeu à abertura de um concurso limitado sem apresentação de candidaturas, que
teve como objecto a prestação de serviços de assessoria de comunicação e imagem
(nomeadamente, assessorar e coordenar as relações públicas da autarquia, conforme o
ponto 5.1 do caderno de encargos) e ainda a concepção, produção e fornecimento de
exposição no âmbito das comemorações dos “20 Anos do Poder Local” (de acordo com
o ponto 5.2 do caderno de encargos).
Para concorreram a tais concursos limitados, a arguida Maria de Fátima
Felgueiras, através da CMF, convidou três empresas para apresentarem propostas.
Todavia, apenas duas das empresas convidadas, as sociedades “Isto É –
Comunicação Visual, Lda.”, com uma proposta global de Esc. 28.269.000$00 (vinte e
oito milhões e duzentos e sessenta e nove mil escudos) e a “Proeme”, com uma proposta
global de Esc. 34.900.000$00 (trinta e quatro milhões e novecentos mil escudos), foram
oponentes ao concurso.
Apreciadas as propostas por uma comissão de análise, esta, no seu relatório
final, considerou-as similares, remetendo a decisão final para a pessoa que detinha a
competência para a adjudicação, ou seja, para a presidente da CMF.
No entanto, no parecer emitido, aquela Comissão alertou para o facto de: “face
ao tipo de concurso aberto – Concurso limitado sem apresentação de candidaturas, o
valor da adjudicação não poderá ultrapassar o limite de 7.500.00$00, pelo que esta se
deve resumir aos serviços prestados no ponto 5.1”, acrescentando ainda que,
relativamente à adjudicação das restantes tarefas englobadas no ponto 5.2., a mesma
deve ser “precedida dos formalismos administrativos adequados a cada uma delas. Isto
não obstará a que o contrato a celebrar para os serviços do ponto 5.1. não possa impor
ao adjudicatário responsabilidades pela exequibilidade, em termos de custos, das
referidas tarefas do ponto 5.2., em conformidade com a respectiva proposta agora
apresentada”.
Apesar de a sociedade “Isto É, Lda.” ter apresentado uma proposta
substancialmente inferior (menos Esc. 6.631.000$00 – seis milhões e seiscentos e trinta
e um mil escudos), a arguida Maria de Fátima Felgueiras decidiu, em 10.03.1997,
adjudicar à “Proeme”, os serviços referidos no ponto 5. 1, alegando para o efeito que era
a: “... firma melhor pontuada, com base na informação técnica”, facto que se colhia do
parecer da comissão de avaliação, com ela celebrando assim a CMF, no dia 01.04.1997,
um “Contrato de Prestação de Serviços de Assessoria de Comunicação e Imagem e
Coordenação das Relações Públicas da CMF”, no valor global de Esc. 7.546.500$00
(sete milhões, quinhentos e quarenta e seis mil e quinhentos escudos), ou seja Esc.
6.450.000$00 + IVA, para vigorar entre o mês de Agosto e o mês de Dezembro de
1997.
Porém, o mesmo acabou por ser suspenso pela autarquia, em Setembro do
mesmo ano, com efeitos a partir de Agosto de 1997, através de um despacho proferido
pela arguida Maria de Fátima Felgueiras, por considerar que a “Proeme” não estava a
executar o contrato conforme o previsto contratualmente.
48
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
A arguida Maria de Fátima Felgueiras agiu de forma livre, voluntária e
consciente, adjudicando o referido contrato de prestação de serviços à “Proeme” na
medida em que a respectiva proposta foi a melhor pontuada pela comissão de análise
constituída para apreciar as propostas apresentadas no âmbito do concurso limitado
acima referido.
6. Factos provados relacionados com o 6º capítulo da pronúncia
6.1. – A propósito da introdução
A “ADEC – Associação para o Desenvolvimento, Educação e Cultura de
Felgueiras”, surgiu, formalmente, no dia 22 de Fevereiro de 1994, por iniciativa de um
conjunto de pessoas, de entre as quais sobressaem José Augusto de Sousa Oliveira,
Horácio António Magalhães Lopes dos Reis, Maria de Fátima Felgueiras, António
Pereira Mesquita de Carvalho, Júlio Faria e Manuel Maria Lopes Machado, tendo a
escritura de constituição da associação sido outorgada pelos dois primeiros.
De acordo com os estatutos aprovados em Assembleia-geral, a “ADEC” visava,
no essencial, prosseguir os seguintes objectivos e interesses:
- promover e desenvolver o ensino, a educação e a formação
profissional, nas suas diversas vertentes, no seio da comunidade;
- promover iniciativas de protecção do ambiente e do património
paisagístico e histórico-cultural da região;
- promover acções de divulgação, informação e defesa dos direitos do
consumidor;
- promover actividades desportivas, recreativas e de lazer e turismo;
bem como
- prestar outros serviços úteis à comunidade.
Na prossecução desses objectivos, a “ADEC” decidiu concretizar dois projectos
- a criação do Jornal “O Sovela” (publicação periódica semanal de âmbito regional) e o
clube de natação “A Foca”, aos quais acabou por cingir a sua actividade.
6. 2. - A propósito do jornal semanário “O Sovela”
No período compreendido entre 16 de Março de 1994 e 6 de Setembro de 1998,
a arguida Maria de Fátima Felgueiras desempenhou as funções de Presidente da
Direcção da “ADEC”, sendo, para além disso, vereadora (até meados de 1995) e
presidente da CMF (a partir dessa altura).
Por sua vez, o arguido António Pereira Mesquita de Carvalho foi secretário da
direcção daquela associação.
Em Setembro de 1998, o arguido António Pereira, foi eleito presidente da
Direcção, em substituição da arguida Maria de Fátima Felgueiras.
Entre 17.04.1997 e 20.05.1998, o arguido António Pereira foi ainda Director do
jornal “O Sovela”, cargo que já antes tinha desempenhado.
Simultaneamente, o arguido António Pereira, desde 05.01.1998, foi vereador da
CMF (com os pelouros da Acção Social, Cultura, Juventude e Desporto), tendo sido
entretanto o seu presidente na sequência da fuga da arguida Fátima do país.
49
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Todas estas pessoas (bem como a quase totalidade dos restantes associados)
estavam intimamente ligadas ao PS de Felgueiras, sendo certo que desde a criação de tal
jornal regional era o arguido António Pereira e a arguida Maria de Fátima Felgueiras
quem decidiam todos os assuntos respeitantes àquele Semanário, inclusive as matérias
jornalísticas que deviam ou não ser publicadas e de que forma.
A arguida Maria de Fátima Felgueiras considerava que o “Semanário de
Felgueiras” estava ligado directamente com a oposição ao seu executivo camarário – no
caso o PSD -, manifestando grande animosidade para com tal periódico, pelo facto de o
mesmo estar relacionado com a publicação de notícias que considerava suas detractoras,
bem como da edilidade que dirigia e ainda pelo facto de o mesmo ser dirigido por um
seu opositor político.
No período compreendido entre meados do ano de 1998 e Fevereiro de 2003, a
CMF contratualizou e pagou a publicidade (incluindo a referente aos eventos,
canalizada pela testemunha António Pimentel) no:
• “Semanário de Felgueiras”, no montante global de € 9.652,32;
• “Jornal da Lixa”, publicidade no valor global de € 8.176,48;
• Jornal “O Sovela” no valor global de € 52.070,53,
No período compreendido entre 15.10.95 e Janeiro de 2002, o arguido António
Carvalho exerceu somente as funções de vereador dos pelouros das áreas de educação,
cultura, desporto, turismo, juventude e acção social.
A partir de Janeiro de 2002 o pelouro do desporto foi entregue ao vereador Vítor
Costa, que também passou a ter a seu cargo os pelouros do trânsito e contra-ordenações,
o qual, a partir de Janeiro de 2003, passou também a ter a seu cargo os pelouros do
turismo e da juventude.
Com a fuga do país da arguida Fátima Felgueiras em Janeiro de 2003, o arguido
António Carvalho, então na qualidade de vice-presidente da CMF, passou a assumir as
funções de presidente da autarquia em exercício.
Em relação às publicações respeitantes a áreas de pelouros que o arguido
António Carvalho não tinha a seu cargo, as ordens eram precedidas frequentemente de
despachos escritos da arguida Fátima Felgueiras.
A arguida Fátima não permitia que qualquer dos vereadores ou funcionários
contrariassem as suas instruções de serviço (escritas ou verbais), bem como os
respectivos despachos (a menos que desse indicações verbais de sentido contrário).
A partir do início do mês de Julho de 2002, o arguido António Carvalho
começou a solicitar por escrito, para despacho do mesmo, a publicação em órgãos de
comunicação social locais de eventos promovidos pelos pelouros de que era
responsável.
No que respeita às publicações sobre os avisos de assuntos do Departamento do
Planeamento da CMF, a publicação foi efectuada no jornal “O Sovela” por exclusão dos
demais jornais locais, sendo certo que o “Semanário de Felgueiras”, nesse caso, para
além de não ter respondido a nenhum dos requisitos exigidos, também não apresentou
proposta de preço para o serviço solicitado.
No que respeita à publicitação da “MOCAP”, a publicidade, segundo despacho
da arguida Fátima, deveria inserir-se em meia página a cores no Jornal “O Sovela”.
Porém, a publicidade em causa foi inserida em mais de meia página, sendo
assim o seu preço inferior ao preço praticado pelo “Semanário de Felgueiras” (e caso a
publicidade fosse efectivada no “Jornal da Lixa” o seu preço seria superior).
Sobre a publicidade a inserir sobre o “Dia Mundial do Consumidor” (em
contracapa), recaiu um despacho da arguida Fátima Felgueiras de 13.03.2002, sendo
50
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
certo que o jornal “O Sovela” foi o único a apresentar uma proposta de preços para
aquele evento (onde o dito evento acabou por ser publicitado).
Quanto à publicação sobre a “Uniformização Documental”, por despacho de
22.03.2002 da arguida Fátima, esta mandou efectuar a respectiva publicitação no
“Sovela” e no “Jornal da Lixa” (nada referindo porém acerca da dimensão e coloração
do anúncio), tendo sido efectuada em contracapa a respectiva publicitação no “Sovela”
e numa página a cores no “Jornal da Lixa”, sendo certo que o preço praticado pelo
“Semanário de Felgueiras” em contracapa era inferior em 99,04 euros relativamente ao
preço praticado pelo “Sovela”.
No que respeita à publicitação dos condicionamentos de trânsito por causa dos
rallies, em 1998, o arguido Bragança da Cunha (então adjunto do GAPP) mencionou
como títulos para a publicitação respectiva os principais jornais locais (“Sovela”,
“Semanário de Felgueiras”, “Jornal da Lixa” e “Notícias de Felgueiras”), sendo certo
que por despacho da arguida Fátima Felgueiras, datado de 11.11.98, esta determinou
que a referida publicidade fosse efectuada apenas nos jornais “O Sovela” e “Jornal da
Lixa” (publicitação efectivada em menos de ¼ de página e em mais de ½ de página, a
preto e branco), sendo certo que no formato em menos de ¼ de página o “Semanário de
Felgueiras” fazia o preço mais elevado e no formato de mais de ½ de página o “Sovela”
praticava o preço mais caro (ambos a preto e branco).
Face a informações escritas proferidas pela testemunha Pimentel, dirigidas ao
arguido António Carvalho, no sentido da publicitação ser efectuada nos principais
órgãos de comunicação social ou em alguns deles, o dito arguido António Carvalho
proferiu despachos autorizadores entre 01 de Julho e 22 de Outubro de 2002, todos eles
relativos à publicitação de eventos a realizar no âmbito do pelouro que tinha a seu
cargo.
Ora, na sequência dessas informações e despachos, respeitantes à publicitação de
eventos realizados no âmbito daqueles que foram promovidos pelo pelouro de que o
dito arguido António tinha a seu cargo, registam-se os seguintes:
- Publicidade acerca do “Encontro de Teatro”, última peça (sobre o qual recaiu
um despacho do arguido António Carvalho, de 01.07.2002 do seguinte teor: “G.
Imprensa: Autorizado, nos moldes das iniciativas anteriores);
- Comemoração da elevação de Felgueiras a cidade (sobre o qual recaiu um
despacho do arguido António Carvalho, de 01.07.2002 do seguinte teor: “G. Imprensa:
Autorizado, nos moldes das iniciaitivas anteriores);
- Festival de Folclore “Cidade de Felgueiras” (sobre o qual recaiu um despacho
do arguido António Carvalho, de 22.07.2002 do seguinte teor: “Autorizado. Proceda-se
como habitualmente, com parcimónia);
- “Feira das Tradições” (sobre o qual recaiu um despacho do arguido António
Carvalho, de 02.09.2002 do seguinte teor: “Autorizado. Proceda-se em conformidade);
- Inscrições Teatro (sobre o qual recaiu um despacho do arguido António
Carvalho, de 017.09.2002 do seguinte teor: “Deve ser feita uma nota p/ os jornais
locais...e utilizar o spot rádio Felgueiras”);
- “Desfolhada Tradicional 2002”;
- “Jornadas Leonardo Coimbra”.
Com a excepção das “Comemorações da elevação de Felgueiras a cidade”, cujo
evento também foi publicitado no “Semanário de Felgueiras”, todos os demais eventos
apenas o foram no jornal “O Sovela”.
A manutenção do jornal “O Sovela” dependia da autonomia financeira do
mesmo.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Caso esse jornal deixasse de ser publicado, a testemunha Pimentel deixaria de
ser o respectivo director, cargo esse de que se orgulhava e que lhe dava alguma
notoriedade na cidade e no concelho de Felgueiras.
7. Factos provados relacionados com o 7º capítulo da pronúncia
No mês de Junho de 1992, a CMF adquiriu à empresa “Auto Sueco”, de Braga,
o veículo de matrícula 58-26-AO, marca “Volvo 460 Turbo”, pelo preço de Esc.
5.507.200$00.
No âmbito de tal contrato, foi ainda instalado, em tal veículo automóvel, um
telefone móvel, com sistema de mãos livres, de marca “AEG”, modelo “Telecar CD
452”, com a referência “AEG AT – 52-SE 53.1795.214.00”, com o n.º 79521412555,
bem como o auscultador de marca/modelo “AEG BHA-A52-2”, com o n.º de série 53.
17.31.040.00 731040, passando tal equipamento a ser propriedade da CMF, uma vez
que foi adquirido com capitais públicos, pelo preço de Esc. 420.000$00.
A instalação daquele telefone, no referido veículo de marca “Volvo”, matrícula
58-26-AO, foi efectuada pela empresa “Sósequeiras – Comércio e Indústria de
Combustíveis e Veículos, Lda.”, com sede na Avenida da Liberdade, em Braga, pelo
preço de Esc. 364. 697$00.
Entretanto, no dia 19.03.1996, o referido veículo de marca “Volvo”, de
matrícula 58-46-AO, teve um acidente em Lisboa, tendo tal viatura ficado em estado
irrecuperável, motivo pelo qual foi abatida ao efectivo da CMF.
Na sequência de tal acidente, em meados do ano de 1996, a arguida Maria de
Fátima Felgueiras ordenou que o referido telefone fosse instalado na sua viatura
particular, de marca “Citroen”, matrícula SE-48-94, o que foi feito na empresa “Electro
- Auto da Gandra”, pelo preço de Esc. 24.541$00, valor debitado à CMF, sendo certo
que na contabilidade da autarquia tal ficou a constar como serviço executado no veículo
da CMF, de marca “Peugeot”, com a matrícula NO-55-23.
A arguida Fátima Felgueiras deu essa ordem na medida em que a CMF, ao
tempo, só dispunha de uma viatura para o serviço da presidência e da vereação e ela
usava a sua viautura pessoal da marca “Citroën”, modelo “BX”, em deslocações ao
serviço da CMF, sendo necessário o uso desse telemóvel para poder desempenhar as
funções de que estava investida.
Entretanto, em meados do ano de 1998, em data não concretamente apurada, a
arguida Maria de Fátima Felgueiras vendeu a sua viatura usada, de marca “Citroen”,
modelo “BX”, de matrícula SE-48-94, a Fernando Pereira Sampaio, pelo preço de Esc.
400.000$00, dele não se retirando (pelo menos) os encaixes referentes ao telemóvel
“AEG” acima referido.
8. Factos provados relacionados com o 8º capítulo da pronúncia
Em Agosto de 1997, a arguida Maria de Fátima Felgueiras teve de se deslocar a
Cabo Verde, para assinar um acordo de geminação entre a cidade de Felgueiras e a
cidade de São Vicente, daquele país, tendo resolvido integrar os seus dois filhos na
respectiva comitiva, que assim se compôs pelas referidas três pessoas.
Para o efeito, reservou na agência de viagens “Navitur”, através dos serviços da
CMF, 3 passagens aéreas para as Ilhas do Sal e S. Vicente, em Cabo Verde, e
alojamento para 3 pessoas naquelas ilhas.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Essa deslocação inseriu-se num conjunto de iniciativas de geminação de cidades
que fazem parte de uma política de seguida pelas autarquias e são consideradas um
factor de importância relevante na valorização dos municípios aderentes.
No caso em apreço, a assinatura do referido protocolo de geminação envolveu,
como normalmente sucede, a deslocação duma representação mais ou menos alargada,
normalmente composta por famílias de acolhimento, grupos culturais e desportivos,
entre outros.
Esse tipo de representação contém sempre uma componente familiar,
considerada essencial pelas entidades envolvidas no processo de geminação, sendo
habitual que os presidentes que participam na representação protocolar se façam
acompanhar dos reespectivos cônjuges e por vezes dos seus filhos.
À data a arguida Fátima vivia separada de facto do seu então marido (de quem
se viria a divorciar), tendo assim resolvido integrar na dita comitiva os seus dois filhos.
Entretanto, viria a ser emitida a factura nº 34960 da “Navitur Turismo”, datada
de 15.10.97, emitida em nome da CMF, no valor total de Esc. 562.303$00 (que
corresponde ao valor de 3 passagens aéreas), e onde é unicamente referido o nome de
“Fátima Felgueiras”, bem como da “passagem aérea Porto/Lisboa/Sal/S.
Vicente/Sal/Lisboa incluindo alojamento em Sal e S. Vicente + transferes”.
Porém, na verdade, a importância debitada naquela factura corresponde às
seguintes despesas:
•
o montante de Esc. 435.603$00 (corresponde ao valor de cada
passagem aérea Porto-Lisboa-Sal-Lisboa-Porto, ou seja,
corresponde a Esc. 145.201$00 x 3 pessoas) ,
• o valor de Esc. 117.300$00 (corresponde ao valor de cada
passagem aérea Sal-S.Vicente-Sal, ou seja, corresponde a Esc.
39.100$00 x 3 pessoas) e
• Esc. 9.400$00 (que corresponde ao valor dos transferes entre as
ilhas do Sal/São Vicente e vice-versa)
Conforme o previsto, Maria de Fátima Felgueiras, Sandra Felgueiras e João
Felgueiras, respectivamente mãe e filhos, efectuaram as ditas viagens a Cabo Verde,
saindo do Porto no dia 10.08.1997 e regressando no dia 18.08.1997.
A arguida e os fillhos permaneceram na cidade de S. Vicente no período
compreendido entre os dias 14 e 17 de Agosto, tendo durante os dias 10 a 14 de Agosto,
permanecido na cidade do Sal.
9. Factos provados relacionados com o 9º capítulo da pronúncia
Durante o período compreendido entre 1997 e 2000, a Câmara Municipal de
Felgueiras pagou várias despesas de viagens aéreas efectuadas pela arguida Maria de
Fátima Felgueiras e suportou ajudas de custo e despesas de alojamento.
Entre as várias viagens, cujos custos foram suportados pela CMF, contam-se as
seguintes:
1. Durante os dias 18 a 22 de Agosto de 1999, a arguida Maria de Fátima
Felgueiras viajou para a Irlanda do Norte, no âmbito de uma visita de estudo realizada
pela “VALSOUSA - Associação de Municípios do Vale do Sousa”, àquele país, sendo
as despesas de alojamento referentes a tal viagem pagas por aquela associação de
municípios.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Porém, e apesar de saber que as despesas de alojamento e ajudas de custo
referentes a tal viagem seriam suportadas por aquela associação de municípios, a
arguida Maria de Fátima Felgueiras havia solicitado e recebido dos serviços da CMF
(assinando a respectiva ordem) o pagamento antecipado de ajudas de custo completas
(incluindo o alojamento), antes portanto da realização dessa viagem, no montante de
Esc. 118.750$00, locupletando-se assim no montante de 35.620$00, correspondente a
cerca de 30% das ajudas de custo adiantadas pela CMF (referentes a alojamento).
Ora, no âmbito de tal viagem à Irlanda do Norte, a “Valsousa-AMVS”, em 29 de
Setembro de 1999, portando depois de realizada a dita viagem, pagou à arguida Maria
de Fátima Felgueiras, na sua qualidade de membro do conselho de administração e
representante da AMVS, ajudas de custo (cerca de 70% do valor das ajudas completas),
no valor de Esc. 83.130$00, deduzidas assim do valor correspondente ao alojamento
(30%).
Ainda em 29 de Setembro de 1999, por sua iniciativa, a arguida Maria de Fátima
Felgueiras devolveu à CMF a quantia que recebera da AMVS nesse mesmo dia, no
montante de Esc. 83.130$00.
Porém, não devolveu à CMF a quantia de 35.620$00, correspondente a cerca de
30% das ajudas de custo que indevidamente lhe tinham sido adiantadas pela CMF,
locupando-se assim nesse montante, no que agiu de forma livre, voluntária e consciente,
com a intenção de fazer sua a sobredita quantia, apesar de bem saber que tal conduta era
proibida e punida por lei.
2. Visando celebrar um protocolo de geminação entre as cidades de Felgueiras e
Pont-Saint-Maxence, em França, a arguida Maria de Fátima Felgueiras, acompanhada
de mais 6 pessoas da CMF, nomeadamente António Carvalho, Anabela Gonçalves,
Silvina Moura, Maria Conceição Rocha, Rogério Azevedo e Agostinho Barbosa,
efectuaram uma viagem Porto/Paris/Porto, com saída no dia 16.05.1997 e regresso em
19.05.1997, viagem essa paga pela CMF.
Para além de tais pessoas, a arguida Maria de Fátima Felgueiras decidiu levar
consigo o seu filho, João Felgueiras, integrado na dita comitiva, tendo as despesas sido
suportadas pela CMF.
Os actos protoculares de geminação de cidades implicam convites para a
integração de familiares dos presidentes de autarquias, sendo pois prática habitual a
inclusão nas comitivas dos filhos dos responsáveis autarquicos.
Foi assim nesse contexto que o filho da arguida Fátima, João Felgueiras, viajou
a França integrado na respectiva comitiva.
As passagens aéreas para tal viagem foram requisitadas pela CMF à Agência de
Viagens “Santa Quitéria”, através da requisição constante de fls. 437 do Apenso 7,
tendo esta agência de viagens, após ter prestado tal serviço, emitido a factura nº 1302,
no valor de Esc. 394.296$00.
Através da ordem de pagamento nº 2288 a CMF efectuou o pagamento dessa e
de várias outras viagens, em 17.07.1997, através de um cheque emitido sobre uma conta
do BTA.
3. No dia 15.09.1997, Sandra Felgueiras, filha da arguida Maria de Fátima
Felgueiras, efectuou uma viagem de avião Porto/Lisboa, tendo para o efeito aquela
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
utilizado o bilhete de avião, com o nº 6852100056107, emitido pela “Portugália
Airlines”, no valor de Esc. 18.791$00.
Por outro lado, na mesma data e no mesmo voo, mas com regresso no mesmo
dia ao Porto, viajou a arguida Maria de Fátima Felgueiras, utilizando o bilhete da
“Portugália” nº 6852100056106, constante por fotocópia a fls. 1651 do 8º volume dos
autos, no valor de Esc. 37.582$00.
Estes dois bilhetes de avião, no valor total de Esc. 56.373$00, foram pagos,
naquela data, pela arguida Maria de Fátima Felgueiras com recurso ao cartão de crédito
com o nº 4940012004694899.
A arguida Maria de Fátima Felgueiras solicitou aos serviços da CMF o
reembolso de toda esta quantia, tendo tal despesa lhe sido efectivamente paga, através
da ordem de pagamento nº 3825, datada de 17.10.1997.
Nos documentos que entregou à CMF para justificar o pagamento daquela
despesa, a arguida Maria de Fátima Felgueiras apenas juntou o bilhete de avião que lhe
dizia directamente respeito, não tendo por lapso entregue qualquer documento
comprovativo da aquisição de uma outra passagem aérea (pelo preço de 18.791$00)
referente a um voo de Lisboa para o Porto, realizado no mesmo dia 15.09.97, numa
outra companhia aérea, voo esse em que de facto viajou, não tendo assim feito uso
integral do bilhete da “Portugália” com o nº 6852100056106 (que só usou para a viagem
Porto/Lisboa).
10. Factos provados relacionados com o 10º capítulo da pronúncia
10.1. - A propósito da Introdução
Enquanto presidente da Câmara Municipal de Felgueiras, a arguida Maria de
Fátima Felgueiras tinha direito à utilização do veículo marca BMW, matrícula 87-74MR, propriedade da CMF.
Tal utilização, nos termos da lei, era restrita a deslocações no exercício das suas
funções oficiais.
No entanto, pelo menos numa situação, que infra se descreverá, a arguida
utilizou essa viatura no interesse particular de terceiros.
Para além da utilização de tal viatura oficial, a arguida Maria de Fátima
Felgueiras também ordenou e permitiu que fossem utilizados os meios existentes no seu
Gabinete de Apoio Pessoal (GAPP), sito nas instalações da CMF, para fins diferentes
daqueles a que estavam adstritos, nomeadamente para executarem ofícios, missivas e
outros documentos para diversos organismos estranhos à autarquia, entre os quais se
contavam o FCF, o Partido Socialista de Felgueiras, a “ADEC”, o Jornal “O Sovela”,
entre outros.
10.2. - A propósito da utilização, por Fátima Felgueiras, para fins
particulares, da viatura adstrita à presidência da CMF
Com a autorização da arguida Maria de Fátima Felgueiras, aproveitando o facto
do motorista da CMF, Manuel Ferreira Pinto, conduzindo a viatura da CMF, de marca
BMW, matrícula 87-74-MR, ter de se deslocar a Lisboa para a trazer de volta no
Domingo seguinte (aonde ela se deslocara no dia 04.05.99 em razões de serviço da
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
CMF, só regressando no Domingo seguinte porquanto iria participar durante esse fimde-semana no Conggresso Nacional do PS), o dito motorista da CMF transportou no
interior da mencionada viatura, no dia 05.02.99, os vereadores Edgar Silva e António
Pereira e a solicitadora Conceição Rocha (militante do PS-Felgueiras), a fim dos
mesmos também participarem no Congresso Nacional do Partido Socialista que
decorreu em Lisboa, nos dias 06 e 07 de Fevereiro de 1999.
Já na cidade de Lisboa, com a conivência e autorização da arguida Fátima, o
mesmo motorista da CMF, naqueles dias 6 e 7 de Fevereiro de 1999, fazendo uso da
dita viatura da marca “BMW”, transportou as referidas pessoas do hotel para o local do
congresso e vice-versa.
O referido motorista, ficou alojado na “Pensão Residencial Avenida Alameda”,
em Lisboa, tendo o mesmo dado entrada, naquela unidade hoteleira, pela 01,00 hora do
dia 06.02.1999, e saído pelas 10,00 horas, do dia 07.02.1999, tendo pago por tal estadia
a quantia de Esc. 13.000$00, que o próprio efectuou em numerário.
As despesas de alojamento, parqueamento, portagens e combustível efectuadas
com tal viagem foram inicialmente pagas pelo motorista Manuel Ferreira Pinto.
Porém, mais tarde, tais despesas relativas ao alojamento e ao parqueamento
daquela viagem, no valor global de Esc. 26.691$00, foram pagas ao referido motorista
por Horácio Costa, através do dinheiro proveniente da “caixa paralela”.
Por outro lado, as despesas de portagens e combustíveis de tal deslocação, foram
pagas pela CMF, mediante a utilização, no primeiro caso da “via verde” e no segundo
caso através de um “fundo permanente” que o motorista Manuel Pinto possuía para o
efeito, sendo o mesmo constituído por uma quantia em numerário disponibilizada
mensalmente pela tesouraria da CMF, por indicação da arguida Maria de Fátima
Felgueiras.
Além disso, e em data que se desconhece, por ordens da arguida Maria de
Fátima Felgueiras enquanto presidente da Autarquia, o motorista da CMF, Manuel
Pinto, transportou, no veículo de marca “BMW”, propriedade da CMF, aquela arguida
da cidade de Felgueiras até à cidade de Lisboa, para participar no casamento de um dos
filhos do Dr. Pais Martins, que se realizou naquela cidade.
Fê-lo na medida em que a arguida Fátima havia recebido o respectivo convite na
qualidade de presidente da CMF, tendo sido nessa qualidade que se deslocou àquele
evento social.
Apesar de bem saber que tal lhe era interdito e que a sua conduta era proibida e
punida pela lei, a arguida Maria de Fátima Felgueiras agiu de forma livre, voluntária e
consciente, querendo utilizar para o uso particular de terceiros, uma das quais estranha a
tal autarquia, na situação acima descrita, o veículo de marca “BMW”, propriedade da
CMF, o qual se destinava prioritariamente ao uso do presidente da câmara para as
funções que lhe estavam adstritas.
10.3. - A propósito da utilização do GAPP (Gabinete de Apoio Pessoal à
Presidente) e respectivos funcionários pela arguida Maria de Fátima Felgueiras, para
fins particulares
Na CMF existia um gabinete denominado ”GAPP” - (Gabinete de Apoio Pessoal
à Presidente) – cuja composição foi definida pela arguida Fátima Felgueiras na
sequência das eleições autárquicas ocorridas em Dezembro de 1997 -, que funcionava
na dependência directa e sob as ordens expressas da arguida Fátima Felgueiras, visando
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
tal gabinete organizar e apoiar as actividades institucionais desenvolvidas pela
presidente da autarquia, no âmbito das funções e competências inerentes a tal cargo.
Todavia, sucede que os funcionários, o material e o equipamento informático
existente em tal gabinete, para além de servirem para o exercício de actividade de apoio
à presidente da Autarquia, também serviram para tratar de inúmeros assuntos de
competência única, directa e exclusiva do Futebol Clube de Felgueiras, do Partido
Socialista de Felgueiras, do Jornal “O Sovela” e ainda da “ADEC” - (Associação para o
Desenvolvimento e Cultura de Felgueiras).
Na verdade, de entre as várias actividades desenvolvidas por tal Gabinete de
Apoio Pessoal à Presidente, este gabinete executou, por ordens expressas da arguida
Maria de Fátima Felgueiras ou com o seu consentimento, durante o ano de 1998, as
seguintes tarefas:
1 - tratou de todos os assuntos administrativos e institucionais do
Partido Socialista de Felgueiras, designadamente a recepção,
tratamento, resposta e envio da mais variada correspondência;
2. – tratou do arquivo das listas de candidatos do Partido Socialista às
Assembleias de Freguesia e Municipal, bem como à Câmara
Municipal;
3. – tratou de manter actualizado o arquivo de relações dos militantes e
candidatos do Partido Socialista de Felgueiras, bem como arquivar os
manifestos eleitorais das listas candidatas pelo PS de Felgueiras; e
4. – tratou da elaboração dos comunicados de carácter político
elaborados pela presidente da CMF, que era à data simultaneamente
presidente da Comissão Política Concelhia do PS - Felgueiras.
Por outro lado, o GAPP também serviu para tratar de diversos assuntos
relacionados com a ADEC (Associação Para o Desenvolvimento e Cultura de
Felgueiras), bem como com o Jornal “O Sovela”, nomeadamente para contactar os
funcionários daquele jornal, que ali se dirigiam para receber os seus salários, para além
de ser o local onde os fornecedores de tal periódico se dirigiam para receber os seus
créditos, que eram pagos pela referida conta do Banco Espírito Santo ou pela “caixa
paralela”.
Para além disso, a arguida Maria de Fátima Felgueiras ordenou, por diversas
vezes, que o GAPP elaborasse e tratasse de vários assuntos relacionados com a gestão
corrente do Futebol Clube de Felgueiras, nomeadamente elaborando mapas relativos à
recolha de fundos, cartas dirigidas a vários industriais do concelho de Felgueiras
solicitando donativos para tal clube, bem como para a convocação de assembleias
gerais.
A arguida Maria de Fátima Felgueiras agiu de forma livre, voluntária e
consciente querendo utilizar de forma continuada e sistemática os serviços dos
funcionários e os bens da autarquia que lhe eram acessíveis em razão das suas funções
de autarca para executar tarefas para terceiros estranhos à autarquia, como
efectivamente utilizou, apesar de bem saber que tal utilização era contrária aos deveres e
obrigações do cargo que exercia.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
11. Factos provados relacionados com o 11º capítulo da pronúncia - o
loteamento do Bustelo
Em 1989, José Augusto Sousa Oliveira, marido da arguida Fátima Felgueiras,
celebrou um contrato-promessa de compra e venda com Armindo Leite da Silva e
esposa relativo à metade indivisa de um terreno situado em Bustelo, Pombeiro,
Felgueiras, sendo certo que a outra metade tinha já sido prometida comprar por
Fortunato Alves de Sousa ao mesmo Armindo Leite da Silva.
No dia 05.06.1990, o dito Fortunato de Sousa requereu à CMF o licenciamento
da operação de loteamento do citado terreno, tendo tal pedido dado origem ao processo
de loteamento n.º 173/90.
Em 07.02.1991, foi celebrada escritura de compra e venda relativa à aquisição
da totalidade de tal terreno, figurando na mesma como único comprador o mencionado
Fortunato Sousa e como vendedores o Armindo Leite da Silva e esposa.
Na mesma altura, o José Augusto Sousa Oliveira celebrou um contrato –
promessa com o Fortunato Alves de Sousa e espsosa, figurando o primeiro como
promitente comprador e os segundos como prometentes vendedores, tendo por objecto a
aquisição de metade do referido terreno, combinando entre si que as despesas já
efectuadas e as a efectuar no futuro, no citado loteamento, seriam divididas na
proporção de 50% para cada um.
As obras de terraplanagem e de infra-estruturas de água e saneamento iniciaramse antes de estar aprovado o referido loteamento, tendo a CMF, em 20.10.1992,
instaurado um processo de contra-ordenação ao Fortunato Alves de Sousa, por falta de
licenciamento de tais obras.
No entanto, e apesar de ter conhecimento de que tinha interesses no referido
terreno (desde pelo menos 1989), a arguida Maria de Fátima Felgueiras, quer como
vereadora substituta do presidente da Câmara de Felgueiras, quer como presidente da
autarquia de Felgueiras, com o intuito de obter vantagem patrimonial com a venda de
lotes e com a construção num deles de uma habitação para nela habitar, participou em
inúmeros actos administrativos relacionados com o referido processo de loteamento nº
173/90, nos quais estava directamente interessada, violando o dever de isenção,
imparcialidade e lealdade, designadamente por omitir a verificação de circunstâncias
impeditivas da sua participação em tais decisões, nomeadamente os seguintes.
Enquanto vereadora, participou;
- na deliberação camarária que aprovou o citado loteamento, realizada no dia
09.08.1991; e
- na deliberação camarária que aprovou o averbamento de tal processo de
loteamento em nome da empresa “F. de Sousa & Filho, Lda.”, realizada no dia
24.06.1993.
E enquanto presidente da Câmara Municipal de Felgueiras (período de
31.10.1995 até ao presente), decidiu:
- em 16.11.1995, ao abrigo da delegação de competências de 16.10.1995, deferir
as obras de urbanização;
- em 05.03.1996, exarou despacho de deferimento no requerimento em que a
empresa “F. de Sousa & Filho, Lda.”, de que o Fortunato de Sousa era sócio, solicita
que, como garantia, sejam aceites lotes de terreno;
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
- em 24.04.1996, emitiu despacho no sentido de o requerente (a empresa “F. de
Sousa & Filho, Lda.”), indicar o número de lotes que ficam a constituir garantias das
obras de urbanização, devendo a área total das mesmas não ultrapassar 12. 400 m2;
- em 17.06.1996, exarou despacho no parecer técnico em como não deverão ser
aceites como garantia de execução das obras de urbanização, os lotes nº 30 e nº 31, nos
quais estava pessoalmente interessada;
- em 15.07.1996, deferiu o pedido de emissão de alvará de loteamento e
respectivas obras de urbanização e mandou proceder à sua emissão;
- em 08.03.1997, despachou no sentido da testemunha Helena Félix verificar se
haveria fundamento para outra solução jurídica que não a imposição de uma coima de
1.000.000$00 (tanto mais que à data o loteamento já estava legalizado), designadamente
a admoestação;
- em 07.05.1997, deferiu a prorrogação de prazo para execução de obras de
urbanização apresentado pelo requerente “F. Sousa & Filho, Lda.”;
- em 17.60.1999, exarou despacho para o Director do Departamento Técnico se
pronunciar sobre o requerimento em que o requerente solicita a recepção provisórias das
obras;
- em 12.11.1999, homologou o auto de recepção provisória de obras de
urbanização.
A arguida Maria de Fátima Felgueiras agiu de forma livre, voluntária e
consciente, violando os deveres que lhe estavam legalmente confiados no exercício do
cargo de vereadora e presidente da Câmara Municipal, nomeadamente os referentes à
garantia de imparcialidade da administração, com o desiderato já referido, sabendo que
tal conduta era proibida e punida por lei.
12. Factos provados relacionados com o percurso de vida dos arguidos, sua
inserção social e antecedentes criminais
Arguida Fátima Felgueiras
A arguida Fátima Felgueiras é a mais velha de duas irmãs, descendente de um
casal de condição sócio-económica e cultural média.
Nasceu no Rio de Janeiro (Brasil), onde o progenitor esteve emigrado. Este
exercia a sua actividade profissional no ramo da restauração e a progenitora era regente
escolar, leccionando no ensino básico.
Com cerca de 4 anos de idade regressa a Portugal com a mãe e a irmã,
permanecendo o pai no Brasil, processando-se a sua socialização num contexto familiar
tradicional e socialmente integrado, marcado pela ausência da figura paterna, o qual só
regressou definitivamente a Portugal quando a arguida tinha 12 anos de idade.
Em Portugal, por força da ausência do progenitor, o agregado familiar
privilegiou o relacionamento com a família alargada do lado materno, dos quais
receberam apoio afectivo e material para suprir as necessidades que pudessem surgir,
evidenciando assinaláveis níveis de solidariedade e coesão intra-familiar.
A arguida viveu parte substancial da sua vida na cidade de Felgueiras, primeiro
integrando o agregado familiar de origem e, posteriormente, com o seu próprio
agregado familiar.
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2º Juízo
O ambiente e a dinâmica familiar no qual a arguida processou o seu
desenvolvimento decorreu num ambiente relacional harmonioso, coeso e solidário, de
acordo com os padrões educativos considerados convencionais.
O seu percurso escolar iniciou-se em Felgueiras, onde concluiu o 9º ano de
escolaridade, tendo feito o 11º ano no Liceu de Guimarães e concluído em Coimbra o
curso de Filologia Germânica em 1977.
Aos 20 anos de idade, ainda antes de concluir a licenciatura, contraíu
matrimónio com a testemunha Sousa Oliveira, resultando desta união o nascimento de
dois filhos (Sandra e João Felgueiras). Este vínculo matrimonial cessou em 1999, após
cerca de 5 anos de separação de facto.
Iniciou a sua actividade profissional como professora, desenvolvendo-a na
cidade de Felgueiras, com excepção do período de um ano, em que realizou estágio
profissional em Coimbra.
Em Felgueiras, fez parte de várias associações culturais, sociais, humanitárias e
religiosas, participando activamente na vida da comunidade.
Em 1979, com 26 anos de idade, foi eleita deputada à Assembleia Municipal de
Felgueiras, onde permaneceu como independente até 1989, ano em que foi eleita
vereadora da CMF, ocupando o pelouro da cultura e acção social.
Em 1995 foi nomeada presidente da CMF, em substituição do então presidente
(arguido Júlio Faria), em virtude deste ter sido eleito deputado à Assembleia da
República. Em 1997 foi eleita presidente da CMF pela primeira vez e reeleita em 2001.
Em 2003, no decurso do presente processo, foge para o Brasil (de modo a evitar ser
presa preventivamente), donde regressou em finais de 2005, candidatando-se de novo à
presidência da CMF, conseguindo ser de novo eleita.
À data dos factos que lhe são imputados na pronúncia, a arguida era vereadora
da CMF e depois a respectiva presidente.
Encontrava-se então separada de facto, habitando na companhia dos filhos num
apartamento com boas condições de habitabilidade, apresentando uma razoável situação
económica. As suas rotinas eram condicionadas pela natureza das funções públicas que
desempenhava.
A arguida está aposentada desde 2004, auferindo uma pensão de reforma no vlor
líquido de cerca de 2.000,00 euros por mês. Desempenha actualmente as funções de
presidente da CMF, auferindo 1/3 do vencimento, isto é, cerca de 1.400,00 euros
mensais.
Em virtude dos dois anos em residiu no Brasil com o filho mais novo, a sua
situação económica agravou-se em virtude das despesas que tem de suportar.
Actualmente partilha com o ex-marido um apartamento deste, a pretexto da
gestão e contenção de despesas, não só as decorrentes da sua vida familiar como
também as decorrentes deste processo.
Dedica quase todo o seu tempo à gestão autárquica e os poucos tempos livres de
que dispõe são dedicados ao convívio com familiares e amigos.
Possui competências cognitivas, interpessoais e sociais que lhe permitem
estabelecer relações de urbanidade e convivialidade, gozando localmente de uma
imagem positiva.
Sente-se injustiçada e revoltada em virtude de ter sido visada no âmbito deste
processo judicial.
A actual situação provoca-lhe um esforço acrescido na gestão da autarquia, dado
que a sua comparência nas sessões de julgamento retiram-lhe disponibilidade para o
exercício das tarefas relacionadas com as suas funções.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
A imagem social da arguida Fátima Felgueiras no meio local não foi afectada
com o presente processo judicial.
O filho mais novo da arguida encontra-se perturbado emocionalmente com toda
esta situação, recusando-se mesmo a voltar a viver em Portugal.
No âmbito do processo comum singular nº 101/02.0TAFAF, do 3º Jz do T.J. da
Comarca de Fafe, por sentença proferida a 22.03.2006, transitada em julgado, foi a
arguida Fátima Felgueiras condenada na pena de 200 dias de multa à taxa diária de
50,00 euros, no montante global de 10.000,00 euros, pela prática de um crime de
difamação perpetrado a 30.09.2001, p. e p. pelos artgs 180, nº 1, 183º, nº 2, e 184º,
todos do CP, com referência ao artº30º, nº 2, da Lei nº 2/99, de 13.01; Tal pena,
entretanto, veio a ser declarada extinta pelo seu pagamento.
Arguido Júlio Faria
O arguido Júlio Faria nasceu em 24.04.42, na freguesia de Margaride –
Felgueiras, é o mais velho de quatro irmãos (dois do sexo masculino e dois do sexo
feminino), descendente de um casal de condição sócio-económica acima da média. O
pai era funcionário judicial, com habilitações académicas universitárias, e a mãe era
doméstica. O seu processo de socialização decorreu num contexto familiar tradicional,
socialmente integrado e sem dificuldades económicas. Viveu parte substancial da sua
vida em Felgueiras, primeiro no agregado familiar de origem e, posteriormente, com o
seu agregado familiar constituído.
O arguido desenvolveu-se em ambiente familiar harmonioso, pautado por
padrões educativos convencionais, veiculando os valores dominantes no seu meio sóciocultural.
O percurso escolar iniciou-se em Felgueiras, onde concluiu o 9º ano de
escolaridade (no Externato Infante D. Henrique). O 10º e o 11º anos foram feitos no
Porto, no colégio João de Deus, evidenciando um trajecto escolar com algum sucesso.
Ingressou entretanto na universidade, no curso de Engenharia Química. Viria contudo a
abandonar este curso devido, por um lado, à morte do progenitor e, por outro lado, ao
facto do curso escolhido não corresponder às suas espectativas, regressando assim para
junto da mãe em Felgueiras.
Abandonados os estudos, permanece durante cerca de um ano em Felgueiras,
antes de ingressar no serviço militar obrigatório, que cumpriu durante 4 anos, dois dos
quais em Moçambique.
Recebeu dois louvores durante o serviço militar (um do comandante do batalhão
em Mueda, em 1968, e outro do comandante militar da região de Porto Amélia, em
1969).
Terminado o serviço militar, começa a sua vida profissional, no Banco de
Portugal, tendo sido colocado em Lisboa, em Agosto de 1970.
Neste ano, contrai matrimónio com a sua esposa, também natural de Felgueiras.
Do casamento nasceram quatro filhos, dois rapazes e duas raparigas, sendo as relações
familiares harmoniosas.
Em 1971 vem trabalhar para a agência do Porto do Banco de Portugal, cidade
onde passa a residir. Em 1978 vem para a agência de Guimarães do mesmo Banco, onde
permaneceu até Março de 1983, fixando definitivamente residência em Felgueiras.
Nesse ano obteve uma promoção por mérito no Banco de Portugal. Este regresso à terra
de origem permitiu-lhe o reforço de redes sociais e, simultaneamente, proporcionou-lhe
as condições necessárias para o início da actividade política local.
Entre 1974 e 1978, desempenhou actividade no Sindicato dos Bancários do
Norte, tendo feito parte da Comissão de Trabalhadores do Banco de Portugal. Após ter
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
fixado definitivamente residência em Felgueiras, foi eleito vereador na CMF em 1983,
ficando com o pelouro da cultura. Em 1985 foi eleito presidente da CMF, cargo que
ocupou até 1995, quando foi eleito deputado à Assembleia da República, onde
permaneceu até ao final da legislatura, em 1999 (tendo sido em 1996 coordenador
adjunto do grupo parlamentar do PS na Assembleia República, da Comissão
Parlamentar de Administração do Território, Poder Local, Equipamento Social e
Ambiente; em 1997 foi membro da Comissão parlamentar de Saúde na Assembleia da
República; em 1995 foi o coordenador regional dos deputados do PS, na Assembleia da
República, pelo círculo do Porto; foi ainda coordenador do grupo parlamentar do PS na
Assembleia da República, da Comissão Eventual de Inquérito Parlamentar às Denúncias
de Corrupção na JAE, em 1998).
Entre 1989 e 1993 foi o presidente da AMVS.
Como militante do PS, liderou desde finais de 1978 até 1993, a Comissão
Política concelhia de Felgueiras daquele partido, sendo certo que ao assumir essa
liderança, na CMF o PS tinha eleito 3 elementos, o PSD 2 elementos e o CDS 3
elementos; nas juntas de freguesia o PS elegeu 15 presidentes, o PSD 11 pressidentes e
um presidente independente; em 1993, na CMF o PS elegeu 4 elementos e 24
presidentes de juntas de freguesia.
Cumpriu 5 mandatos como membro da Comissão Nacional do PS e 3 mandatos
como membro da Comissão Política Nacional do mesmo partido.
Enquanto presidente da edilidade, durante os seus mandatos, foram iniciadas,
concluídas ou executadas, entre outras, as seguintes obras, iniciativas e eventos:
Biblioteca Municipal; Piscina Municipal; Centro Coordenador de Transportes; actual
Estádio Dr. Machado Matos; Escola Preparatória da Lixa; Escola Secundária de
Felgueiras; Escola C+S de Idães; Pavilhão de Idães; Piscina da Lixa; ETAR de
Felgueiras; ETAR da Lixa; largamento da EN 101, entre os Carvalhinhos e Várzea para
duas faixas de rodagem em cada sentido; Praça Vasco da Gama; Rua Manuel Faria e
Sousa; abastecimento de água em Barrosas; Lixeira Municipal Controlada (Sendim);
Instituto Superior de Ciências Educativas; Felmostra – Mostra das Potencialidades do
Concelho de Felgueiras; Valsousa – Associação de Municípios do Vale do Sousa;
recuperação do Cortejo das Flores, integrado nas festas de S. Pedro.
Entre 1996 e 2001 fez parte dos órgãos sociais do FCF. Em 2001 foi eleito
presidente da Assembleia Municipal de Felgueiras, cargo a que renunciou em 2003, na
sequência do presente processo. De 1999 a 2005 foi administrador do Hospital da
Misericórdia de Felgueiras.
Foi ainda membro do Conselho Geral da Associação dos Municípios
Portugueses (tendo obtido dessa associação um voto de apreço e reconhecimento em
1995), do Conselho Geral de Estudos e Formação Autárquica, do Conselho Superior de
Estatística – Norte, audor da Defesa Nacional (em 1989, por designação da CCRN e
Governo Civil, do PSD).
Em 1999 frequentou o Seminário Avançado de Gestão e Investimento em
Serviços de Saúde na Escola Superior de Direcção e Negócios.
À data dos factos que lhe são imputados na pronúncia, o arguido era presidente
da CMF (até 1995) e depois deputado à Assembleia da República, fazendo também
parte dos órgãos sociais do FCF.
Mantinha a residência oficial em Felgueiras, alternando a sua vida entre as idas
ao parlamento, em Lisboa, e a actividade política e outras em Felgueiras. Habitava num
apartamento com boas condições de habitabilidade, na companhia da esposa, dos filhos
e da sua mãe, evidenciando uma situação económica razoável.
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2º Juízo
Desde que deixou o cargo de administrador do Hospital da Misericórdia de
Felgueiras não mais desempenhou qualquer actividade profissional.
Actualmente, continua a residir com a esposa e os dois filhos mais novos, numa
casa com boas condições de habitabilidade. Vive da sua reforma do Banco de Portugal
(1.200,00 euros), que aufere desde 1988, e da de eleito local (2.000,00 euros), que
aufere desde 1999.
Tem uma situação económica algo difícil em virtude de dívidas avultadas que
teve de assumir por ter avalizado operações financeiras realizadas por dirigentes do FCF
e que ainda se encontra a pagar.
Reparte os seus tempos livres no convívio com os familiares, leitura,
aprendizagem de novas tecnologias da informação e actividade física de manutenção.
O impacto da situação jurídico-penal deste processo é marcado por um maior
isolamento social e de uma maior reserva nas relações interpessoais, decorrestes do
desconforto e tensão que este processo provoca.
Do ponto de vista social a sua imagem não foi afectada, pois continua a
beneficiar de uma percepção comunitária bastante favorável.
Economicamente, pelas despesas que acarreta a sua defesa, este processo está a
contribuir para tornar mais delicada a situação económica do arguido.
O arguido Júlio Faria não tem antecedentes criminais.
Arguido Vítor Borges
O arguido Vítor Borges é oriundo de uma estrutura familiar de condição sócioeconómica favorecida. Teve uma infância e adolescência percepcionada pelo mesmo
como gratificantes, ligada ao Instituto Profissional do Terço, uma instituição fundada no
Porto pelos seus familiares maternos, especialmente vocacionada para o apoio/protecção
de menores em risco. Os pais exerciam cargos de direcção, sendo certo que a mãe
também ali leccionava, promovendo o contacto diário dos filhos com os menores
internados, uma vez que frequentaram a escola e viviam na casa da família localizada na
sede da instituição.
O processo de formação escolar caracterizou-se pela adaptação e bom
aproveitamento, ingressando no curso de Engenharia Electrotécnica, no Instituto
Superior de Engenharia do Porto, que frequentou até ao último ano, sem no entanto
concluir a licenciatura, uma vez que interrompeu a vida académica para cumprir o
serviço militar obrigatório, na Guiné, onde permaneceu de 1972 a 1974.
Quando regressou ao Porto, conseguiu colocação profissional como gestor de
produção, responsável pela segurança, controle de qualidade e ambiente na empresa
“Texas Instruments”, uma multinacional americana, onde permaneceu até 1989, ano em
que fundou a “Resin”.
O arguido investiu na expansão desta empresa, pioneira no sector da recolha e
tratamento de resíduos, que acabou por se converter numa sociedade anónima com
implantação a nível nacional. Neste processo relevou características de empreendorismo
e de liderança.
Em 1975 casou com Maria João Borges, nascendo desta união dois filhos,
actualmente com 30 e 27 anos de idade. O casal investiu no processo
educativo/académico dos descendentes (ambos licenciados), procurando satisfazer as
necessidades dos seus elementos e transmitir regras e limites orientadores.
À data dos factos que lhe são imputados na pronúncia, o arguido exercia as
funções de presidente do Conselho de Administração da “Resin”, suspendendo o
mandato quando foi constituído arguido no presente processo judicial. Passou a exercer
funções de administrador até proceder, em Junho de 2006, à venda das acções que
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
detinha na sociedade, pondo fim ao seu vínculo contratual por mútuo acordo.
Actualmente presta apoio e aconselhamento ao seu filho que exerce a actividade na
“Resin”, não apresentando um projecto profissional definido.
A situação patrimonial da família é favorável, contando com participações
activas do arguido, que aufere um subsídio de desemprego, uma renda proveniente de
um espaço comercial e das aplicações financeiras que realizou com a venda das acções e
com o recebimento da indemnização pela caducidade do contrato.
O núcleo familiar é constituído pelo arguido Vítor e pela esposa
(profissionalmente inactiva), os quais privilegiam o contacto com outros elementos da
família alargada no seu quotidiano (filhos, noras, irmãos e pais), a par das relações de
amizade que mantêm, cultivando o convívio social.
Reside em moradia localizada na Avenida da Boavista, nas proximidades do
parque da cidade do Porto, inserida em contexto sócio-residencial conotado com um
padrão sócio-económico elevado, mantendo com a vizinhança relações cordiais.
O arguido vivencia com tranquilidade o desenrolar deste processo, o qual não
interferiu na qualidade das relações familiares e de amizade.
Porém, foi ao nível profissional que este contacto com o sistema penal mais
impacto provocou, pela incompatibilidade que se veio a gerar entre as exigências
inerentes ao exercício das suas funções e a disponibilidade que o presente processo lhe
tem exigido.
O arguido Vítor Borges não tem antecedentes criminais.
Arguido Carlos Marinho
O arguido Carlos Marinho é natural de Marco de Canaveses, sendo o terceiro de
quatro irmãos, por ordem de nascimento, de uma família de modestos recursos
económicos.
A sua família era estruturada do ponto de vista funcional e proporcionou-lhe um
desenvolvimento dentro de padrões normativos. Os pais são por si percepcionados
como elementos de identificação positivos, embora se sinta mais próximo afectivamente
da figura paterna.
Iniciou a escolaridade em idade própria, tendo sido a mesma pautada pelo
sucesso, concluindo a licenciatura em Contabilidade e Administração.
Antes de concluir a licenciatura iniciou-se profissionalmente numa empresa do
ramo automóvel, sendo o responsável pelos serviços administrativos, onde laborou
cerca de 10 meses. A entrada no mercado de trabalho foi precipitada pelo falecimento
do pai, iniciando logo após a conclusão do curso superior a actividade numa empresa
multinacional de auditoria, onde se manteve durante seis anos, saindo em 1993 por ter
encontrado uma alternativa profissional mais rentável e gratificante.
Sequencialmente, ingressa na “Resin” como contabilista, empresa onde ainda se
mantém.
Contraiu matrimónio em 1994, tendo nascido na constância do mesmo um filho
que conta actualmente com 11 anos de idade.
No período a que se reportam os factos de que e pronúnciado o arguido residia
no agregado dos sogros com a cônjuge e descendente, trabalhando na “Resin” como
contabilista primeiro e depois como director financeiro.
No ano de 2000, altura em que o presente processo se tornou do conhecimento
público através dos meios de comunicação social, o arguido, juntamente com o seu
agregado familiar constituído, tinha-se autonomizado em termos habitacionais para casa
própria, cuja hipoteca bancária ainda se mantém. Trata-se de um imóvel tipo moradia,
de rés-do-chão, com boas condições de habitabilidade.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
A mudança para habitação própria surgiu da necessidade de autonomização do
seu agregado, apesar de em termos sócio-familiares não ter surgido qualquer alteração
na medida em que se mantém na mesma cidade onde residem os sogros.
Laboralmente desempenhava as funções de director financeiro da “Resin”,
categoria à qual havia sido promovido, cargo que ainda hoje mantém. Paralelamente
trabalhava na empresa “Contagem, Gabinete de Contabilidade, Ldª”, em Paredes,
actividade que mantém desde 1995, a qual é exercida aos Sábados e esporadicamente
nos períodos nocturnos, como forma de aumentar o pecúlio económico auferido.
Exerce essas funções com elevado grau de responsabilidade.
Ao nível económico o agregado familiar do arguido, os rendimentos auferidos
pelo casal ronda os 6.000,00 euros mensais, pagando uma prestação mensal de 440,00
euros mensais a título de amortização de empréstimo bancário contraído para a
aquisição de habitação própria.
O arguido Carlos Marinho experiencia de forma gratificante a vida familiar,
participando ambos os elementos do casal nas decisões que dizem respeito à vida
comum. Aproveita os tempos livres para o convívio com a família constituída e com a
família de origem, deslocando-se semanalmente a casa da mãe, no Marco de Canaveses,
com o intuito de manter contactos com aquela, irmãos e outros familiares.
Mantém pouco convívio com os vizinhos – pois a maior parte do tempo passa-o
em matosinhos, no seu local de trabalho -, mas as relações que com eles estabeleceu são
cordiais.
É visto no meio como um indivíduo educado, não sendo porém do conhecimento
dos vizinhos o facto dele estar envolvido neste processo, na qualidade de arguido.
Ao nível do impacto deste processo, inicialmente e durante alguns meses –
movido por sentimentos de vergonha -, o arguido isolou-se socialmente, sobretudo
devido à exposição mediática que o mesmo teve e tem tido.
O mesmo sucedeu com a sua esposa, mas com o tempo ambos aprenderam a
minimizar os efeitos deste novo contexto de vida.
Ao nível do cargo e funções laborais exercidas este processo não teve qualquer
implicação. No entanto, no ano de 2004/2005, com a entrada de um novo accionista na
empresa, sentiu um clima de desconfiança relativamente à sua pessoa por haver
conhecimento que ele era um dos arguidos deste processo, situação que lhe provocava
constrangimento. Este clima, porém, foi sendo ultrapassado com o decorrer do tempo,
uma vez que foram reforçadas as funções do cargo que ocupa, as quais se traduzem na
representação da empresa em diversos actos, nomeadamente junto de instituições
bancárias e outras.
A sua entidade laboral deposita nele total confiança, pois são-lhe reconhecidas
boas capacidades profissionais.
O arguido Carlos Marinho não tem antecedentes criminais.
Arguido Barbieri Cardoso
O desenvolvimento psicossocial e afectivo do arguido Barbieri Cardoso
estruturou-se no núcleo familiar constituído pelos pais e por duas irmãs, pautando-se a
dinâmica inter-familiar por elevados níveis de afectividade e coesão, com uma
vinculação extensiva a outras figuras da família alargada, nomeadamente aos avós
maternos.
Beneficiavam de uma situação sócio-económica equilibrada, fruto de uma gestão
criteriosa dos recursos provenientes da actividade profissional do pai nos “TLP”,
cabendo à mãe um papel mais activo no exercício da parentalidade.
65
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
O percurso escolar caracterizou-se pela adaptação e facilidade de apreensão dos
conteúdos lectivos durante a frequência do ensino básico, preparatório e secundário, nos
diversos estabelecimentos de ensino público que frequentou até ingressar na
Universidade do Porto, onde concluiu, em 1977, a licenciatura em Engenharia Civil.
Assim que obteve a licenciatura ingressou no Gabinete de Apoio Técnico na
Câmara Municipal de Peniche, para exercer a actividade de engenheiro, actividade que
suspendeu para cumprimento do serviço militar obrigatório, em Tancos e em Espinho.
Por concurso público, ingressou na CMF como chefe de serviços na carreira
técnica. Ocupou vários lugares de direcção, em regime de comissão de serviço,
efectuando um percurso evolutivo até se posicionar na categoria de assessor principal,
onde ainda se mantém.
Desde 1991 que colabora, em regime de avença, com a “Ader-Sousa”,
desempenhando as funções de coordenador neste projecto que visa o acesso a
programas de desenvolvimento local dos municípios do vale do Sousa.
Contraíu matrimónio em 1981, nascendo desta união duas filhas, actualmente
com 22 e 18 anos de idade. O ambiente familiar é funcional, com um espírito enraizado
de apoio e entreajuda, criando condições para o desenvolvimento integral das filhas,
investindo na sua formação pessoal e escolar.
Os níveis de inserção familiares e profissionais que detinha no período que se
reporta à data dos factos mantêm-se inalterados, na medida em que o arguido Barbieri
mantém-se integrado no núcleo familiar constituído pela mulher (professora do ensino
secundário) e filhas (estudantes, respectivamente, do ensino superior e secundário).
Estabelecendo ligações de proximidade com outros membros da esfera familiar (pais e
irmãs).
Exerce as funções de director de planeamento na CMF, actividade de
compatibiliza com o cargo de coordenador da associação “Ader-Sousa” e com a
participação na sociedade “Ambiédica”, cujo objecto social se encontra ligado ao ramo
imobiliário.
Ao nível das suas características pessoais destaca-se o empreendorismo e
motivação para a participação em actividades promotoras do desenvolvimnto
comunitário, o que lhe permite satisfazer necessidades de reconhecimento sócioprofissional e económico.
A situação financeira do casal é equilibrada, pese embora assistam a uma
diminuição do poder económico em virtude das despesas decorrentes do patrocínio no
âmbito deste processo judicial.
Ao nível dos seus tempos livres, o arguido Barbieri Cardoso disfruta de recursos
de lazer (espaços verdes e passeios à beira-mar) do contexto envolvente à sua habitação,
um apartamento localizado numa das zonas nobres da cidade do Porto (Foz).
Mantém relações cordatas com a vizinhança, procurando porém manter a reserva
da vida privada.
A sua situação jurídico-penal é vivida por si e pelos seus familiares de forma
apreensiva, vivendo com penosidade a sua exposição às instâncias formais de controle e
à consequente censura social.
A complexidade e mediatização deste processo, para além do já referido
acrécimo de despesas, tem tido custos pessoais e familiares, bem como profissionais,
designadamente traduzidos no evitamento de convívio social e na diminuição da sua
responsabilidade para assumir novos compromissos.
O arguido Barbieri Cardoso não tem antecedentes criminais.
Arguido Gabriel Almeida
66
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
O arguido Gabriel é o mais novo de três irmãos, oriundo de uma família estável,
de nível sócio-cultural médio-alto, estabelecida na cidade do Porto, cuja dinâmica é
coesa, pautada por padrões sócio-educativos convencionais e de investimento na
qualificação académico-profissional dos seus membros.
Concluiu aos 23 anos a licenciatura em Engenharia Mecânica na Faculdade de
Engenharia do Porto. No termo do curso realizou um estágio de alguns meses na
Bélgica, após o que ingressou no mercado de trabalho como engenheiro mecânico, na
indústria nacional. Desempenhou a sua actividade profissional em diversas empresas,
numa trajectória de ascensão profissional e de reconhecimento de competência técnica,
que lhe possibilitou aliás cargos de direcção/administração que lhe foram consignados
desde os 31 anos de idade.
Contraíu matrimónio aos 24 anos de idade e construiu com a sua esposa, uma
professora do ensino secundário, um projecto de família que se prolongou por 23 anos e
que se cindiu por divórcio em 1997, no contexto da qual consolidou condições de bemestar e segurança material elevadas. Tem dois filhos, ambos já autonomizados, com
famílias constituídas e descendentes próprios.
Cumulativamente com a carreira no ramo industrial desenvolveu uma actividade
docente, primeiro no ensino secundário e depois, desde 1973, no então Instituto
Industrial do Porto, hoje Instituto Superior de Engenharia do Porto. Leccionou nos
cursos nocturnos, o que lhe proporcionou complementos de rendimento e actualização
mas que lhe condicionou, pelo intenso nível de investimento laboral, a qualidade da
participação na vida em família.
Dotado de uma postura enérgica e pragmática, actuou de forma a corresponder
responsavelmente aos compromissos assumidos nos múltiplos papéis e actividades
desenvolvidas.
No período de 1997 a 2002/2003 cessou, em situação de licença sem
vencimento, as funções docentes, centrando a sua actividade na indústria. Em 1997
efectuou formação técnica e gestão na “Suez-Lyonesse” e, por referenciação de uma
empresa na área do ambiente daquela holding, integrou, em Setembro de 1997, a firma
“Resin”, também daquele ramo, com funções de director-geral, designadamente para as
áreas técnicas e profissionais.
Rescindiu o seu contrato de trabalho que o ligava à “Resin” em Maio de 2000 e
então empenha-se em outros projectos ligados ao ambiente, tendo ainda trabalhado na
sociedade de empreitadas “Adriano”.
Em meados de 2002 retomou a docência, estando desde há 4 anos na situação de
exclusividade no ISEP, integrado no Departamento de Engenharia Mecânica, onde
lecciona as cadeiras de “Órgãos de Mecânica”, “Introdução à Engenharia I”, “Mecânica
dos Materiais” e “Projecto”.
Restringiu a sua actividade profissional ao ensino em razão da sua situação
processual, o que o inibe de aceitar funções com relevância de direcção por as
considerar incompatíveis com os requisitos de credibilidade inerentes ao exercício
daqueles cargos.
Divorciado desde 1997, vive sozinho, em andar próprio, localizado na zona da
periferia urbana da cidade do Porto, não estabelecendo relações de vizinhança para além
das formalmente exigidas.
Mantém um relacionamento próximo frequente com os filhos e respectiva
família constituída e ainda com a ex-mulher. Neste contexto, é preservado o sentido de
unidade familiar, procurando o arguido Gabriel cultivar uma relação de proximidade e
cooperação com os descendentes e, por decorrência, a retribuição afectiva que lhe é
concedida.
67
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Para além destas valências de organização de vida, desenvolve outras
sociabilidades que passam pelo convívio em círculos de amizades e viagens,
caminhadas e dança, as que se configuram comuns e adaptativas para a sua condição.
Vivência com incomodidade o presente processo, nomeadamente ao nível da sua
actividade profissional, tendo porem conseguido mobilizar recursos pessoais e de apoio
da rede de relações familiares e sociais que lhe vêm possibilitando uma adaptação
eficiente a esta nova situação.
O arguido Gabriel Almeida não tem antecedentes criminais.
Arguido António Pereira Mesquita de Carvalho
O arguido António Carvalho é o mais velho de dois irmãos, descendente de um
casal de modesta condição sócio-económica e cultural. O pai era ferroviário, com o 3º
ano de escolaridade, e a mãe era doméstica, sem qualquer instrução académica. O
processo de socialização decorreu inserido num contexto familiar tradicional,
socialmente integrado e com algumas dificuldades económicas, em que apenas uma
gestão muito rigorosa dos rendimentos permitia satisfazer as necessidades básicas
fundamentais.
O âmbiente e a dinâmica familiar no qual se processou a fase inicial do seu
desenvolvimento foi caracterizado por um estilo relacional harmonioso e coeso e por
padrões educativos tradicionais no seu meio cultural, conduzindo, desta forma, a uma
socialização bem sucedida.
O percurso escolar iniciou-se na localidade de naturalidade, onde concluiu o 4º
ano de escolaridade. Aos 12 anos de idade ingressou no seminário de uma congregação
religiosa, onde permaneceu até cerca dos 28 anos de idade. Concluiu o 3º ano de
Teologia e o bacharelato em Filosofia. Enquanto seminarista, leccionou no Seminário
da Régua (1 ano) e Viana do Castelo (1 ano). O seu trajecto escolar evidencia
regularidade e sucesso.
Em 1977, após sair do seminário, contraíu matrimónio com a sua actual esposa,
também professora, tendo fixado definitivamente residência na Lixa (concelho de
Felgueiras). Teve dois filhos fruto desse casamento, um rapaz e uma rapariga,
experenciando um bom ambiente familiar.
Continuou a sua actividade docente em 1996, quase sempre na Lixa, onde foi
presidente do Conselho Directivo da Escola Preparatória, durante 17 anos.
Em 1994 foi convidado para assessor na CMF, tendo sido vereador da cultura de
1995 a 2003. De 2003 a 2005 exerceu o cargo de presidente da CMF, em substituição
da presidente eleita (arguida Fátima Felgueiras), já que esta ausentou-se para o Brasil. A
sua trajectória profissional, quer na escola, quer na actividade camarária, apresenta
hábitos estruturados de trabalho, evidenciando ainda capacidade de realização, tendo
desempenhado cargos directivos de relevo.
Participou na vida associativa da comunidade, tendo feito parte dos órgãos
sociais de várias associações com diferentes fins (B.V. da Lixa, Banda de Música da
Lixa, Misericórdia de Felgueiras e Confraria de Stª Quitéria).
À data dos factos que lhe são imputados, ele era verador da CMF com o pelouro
da cultura. Habitava, e continua a habitar, uma casa, tipo vivenda, adquirida com
recurso a empréstimo bancário há cerca de 16 anos, com boas condições de
habitabilidade, na companhia da esposa, da sogra e dos dois filhos. Apresentava um
estilo de vida pró-social, com participação activa na vida da comunidade, e rotinas
diárias condicionadas pela natureza das actividades que desempenhava, que lhe
absorviam todo o tempo disponível. Revelava, e revela, comportamentos sociais
ajustados e respeitadores dos padrões socialmente dominantes.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
No período posterior aos factos que lhe são atribuídos, substituiu a a presidente
da CMF durante dois anos. Em 2005 aposentou-se, tendo deixado de exercer qualquer
actividade profissional e política.
Actualmente continua a residir na mesma casa, na companhia da esposa,
também reformada, e da sogra (que se encontra acamada).
O agregado tem uma boa situação económica, sendo certo que o arguido e a
esposa recebem, cada um deles, 2.000,00 euros de pensão de reforma por mês.
Ocupa os seus tempos livres no convívio e apoio familiar, bem como na
participação activa nalgumas associações da comunidade.
É pois um indivíduo detentor de competências cognitivas, interpessoais e
sociais, que lhe permitem uma ajustada inserção comunitária.
A sua actual situação jurídico-penal está a causar algum impacto ao nível
pessoal, decorrente do desconforto e tensão que o presente processo lhe acarreta.
Procura manter a família à margem de toda esta envolvência, à custa de uma excessiva
internalização de sentimentos, que estão a reflectir-se nalgumas queixas sintomáticas.
Socialmente a sua imagem não foi afectada, continuando a benificiar de uma
imagem social bastante favorável.
O arguido António Pereira Mesquita de Carvalho não tem antecedentes
criminais.
Arguido António Bragança da Cunha
O arguido Bragança da Cunha teve um processo de desenvolvimento integrado
em grupo familiar residente em Felgueiras, cuja dinâmica e funcionalidade eram
equilibradas.
O percurso escolar do arguido iniciou-se em idade normal e com um
desempenho linerar e adequado, finalizado com o antigo 5º ano do liceu em Felgueiras,
transitando posteriormente para Guimarães, onde concluiu o magistério primário aos 18
anos de idade.
Inicia então a sua trajectória profissional na Biblioteca Municipal de Felgueiras,
tendo ali permanecido durante cerca de dois anos. Seguiu-se uma experiência docente
no ensino primário durante aproximadamente dois anos, interrompida com o exercício
de funções autárquicas na vereação do município de Felgueiras, como responsável pelo
pelouro da cultura e educação no mandato 1983 a 1985.
Paralelamente ao exercício da vereação, o arguido Bragança assume a
coordenação da Direcção de Educação de Adultos de Felgueiras, aproximadamente
entre os anos de 1982 a 1985.
Findo o mandato na vereação, o arguido inicia funções como adjunto do
presidente (cargo mais tarde designado como chefe de gabinete) do município de
Felgueiras, um cargo de nomeação onde se manteve entre os anos de 1986 e 2000, tendo
assim prestado serviço a três presidentes da autarquia (Machado Matos, Júlio Faria e
Fátima Felgueiras).
Enquanto exercia funções na autarquia, em 1997, o arguido concluiu o curso de
estudos superiores especializados em administração escolar no ISCE, instituto superior
sediado em Odivelas, com um pólo em Felgueiras. Fez ainda parte do secretariado da
concelhia do PS, actividade que exerceu em acumulação com as restantes funções,
sensivelmente entre 1980 e 2000.
Casou aos 25 anos de idade, facto que conduziu à autonomização residencial
face ao agregado de origem, mantendo uma relação conjugal estável, tendo tido o casal
uma filha fruto desse casamento.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
A actual situação sócio-familiar não apresenta alterações significativas
relativamente àquela que exstia aquando dos factos sobre os quais está pronunciado,
constituindo o agregado com a cônjuge e uma filha maior, estudante do ensino superior.
Este núcleo familiar reside em habitação própria, tendo uma situação económica
estável.
Com o abandono das funções que exercia na CMF, o que ocorreu após os factos
que originaram os presentes autos, o arguido regressou ao Agrupamento Vertical de
Escolas de Lagares, em Felgueiras, onde desempenhou inicialmente a função de vicepresidente do conselho executivo e actualmente assume a função de presidente para o
mandato 2006/2009. Apesar de manter a filiação partidária, interrompeu as suas funções
no secretariado do PS.
Neste contexto, o quotidiano do arguido está muito centrado nas funções que
desempeha no Agrupamento Vertical de Escolas de Lagares, assim como nas relações
de sociabilidade com familiares e amigos.
É pessoa que tem capacidade de liderança, é detentor de competências pessoais,
sociais e académicas adequadas a um percurso social e profissionalmente activo e
integrador, beneficiando de uma rede social de apoio e integração na comunidade local.
O principal impacto deste processo judicial manifestou-se na interrupção da sua
vida partidária activa, bem como o a transição de uma experiência profissional de
décadas na autarquia para assumir funções na gestão do Agrupamento Vertical de
Escolas de Lagares, actividade que para si é gratificante.
Experienciou também constrangimentos na sua vida profissional, em face deste
processo.
Não tem antecedentes criminais.
Arguido Anastácio Macedo
No âmbito do processo comum singular nº 804/04.2TAFLG, do 1º Jz do T.J. da
Comarca de Felgueiras, por sentença proferida a 16.11.2005, transitada em julgado, foi
o arguido Anastácio Macedo condenado na pena de 130 dias de multa à taxa diária de
5,00 euros, pela prática a 15.06.2004 de um crime de emissão de cheque sem provisão,
p. e p. pelo artº 11º, nº 1, do DL nº 454/91, de 28.12; tal pena, entretanto, viria a ser
declarada extinta pelo seu pagamento.
Arguido Guilherme Almeida
O arguido Guilherme iniciou o processo de socialização em agregado familiar
com um modelo parental ajustado, verificando-se a existência de normas estruturadoras
e controlo parental. Os progenitores proporcionaram aos 11 descendentes uma estrutura
funcional de referência e integração. O arguido, sendo um dos elementos mais novos do
agregado, beneficiou de uma situação económica equilibrada, uma vez que os irmãos
mais velhos cedo começaram a trabalhar e a contribuir para a economia doméstica.
Teve um percurso escolar normal, tendo concluído a escolaridade obrigatória
(equivalente ao actual 1º ciclo do ensino básico). Deixou de estudar porquanto
considerava apelativo o mundo do trabalho, um pouco influenciado pelas experiências
dos irmãos mais velhos.
Iniciou o percurso laboral na área do fabrico de calçado na empresa onde o pai e
os irmãos já trabalhavam. Nos primeiros anos o pai geria o seu vencimento, a partir dos
20 anos de idade passou a comparticipar nas despesas do agregado, gerindo ele o
produto do seu trabalho, sentindo esta mudança como prova da confiança dos pais e
uma maior responsabilização e autonomia face ao agregado.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Aos 20 anos de idade constituiu, juntamente com familiares, uma sociedade
comercial para o fabrico de calçado, cedendo a sua quota 4 anos depois.
Aos 26 anos de idade iniciou a construção de um pavilhão onde veio a instalar a
sua fábrica de calçado. No exercício da actividade empresarial assumiu-se inicialmente
como empresário em nome individual, constituindo posteriormente uma sociedade
unipessoal e em 1997 constituiu uma sociedade anónima.
Casado há 23 anos, tem 4 filhos (com 22, 18, 15 e 13 anos de idade,
respectivamente). A dinâmica familiar deste casal apresentou-se sempre estável, com
um padrão de relacionamento coeso e harmonioso.
À data dos factos que lhe são imputados na pronúncia o arguido residia com a
esposa e os 4 filhos em casa própria, numa pequena freguesia do concelho de
Felgueiras, situação que se mantém no presente. A dinâmica familiar é estruturada e
funcional, com um estilo de comunicação gratificante.
Profissionalmente o arguido Guilherme exerce actividade como administrador
da “Ricap, SA”, uma empresa ligada ao fabrico do calçado. É empresário da indústria
do calçado há mais de 20 anos.
Além da sua actividade profissional, exerce também o cargo de presidente da
Junta de Freguesia de Penacova, tendo sido eleito nas últimas eleições autárquicas.
Encara o exercício autárquico como um dever de cidadania mas também como um
desafio para a sua capacidade de administração.
É um indivíduo que revela sentido de autonomia, realização e motivação para a
prossecução de objectivos definidos e concretos. Tem sentido humanitário e altruísta,
tendo colaborado com várias obras paroquiais e da junta de freguesia, tanto no período
anterior como posterior ao exercício do seu cargo autárquico.
O presente processo judicial está a ser vivido por si com algum desconforto,
encarando-o porém com serenidade.
Até ao momento, pelo menos, em termos sociais, estes processo não tem
afectado a sua imagem, sendo pessoa respeitada e considerada no meio.
Não tem antecedentes criminais.
Arguido Joaquim Teixeira Pinto
O processo de socialização do arguido Joaquim Pinto decorreu em contexto
familiar estável e economicamente equilibrado, sendo satisfatórias as relações intrafamiliares, com uma actuação positiva dos seus progenitores no processo educativo dos
10 descendentes.
O arguido completou o 10º ano de escolaridade, iniciando o seu percurso
profissional com 11 anos de idade numa barbearia até ao 18 anos, idade com que
emigrou para França para evitar o cumprimento do serviço militar obrigatório.
Viveu durante 9 anos naquele país, onde casou aos 24 anos de idade e de cuja
relação nasceram dois filhos, actualmente com 35 e 28 anos de idade, respectivamente.
Durante esse período de tempo desempenhou diferentes actividades profissionais,
sobretudo na área da construção civil e vendas.
Após o 25 de Abril regressou a Portugal, tendo durante um ano exercido a
actividade de agente de calçado.
Em 1976 estabeleceu-se por conta própria no ramo do fabrico do calçado.
Á data dos factos que lhe são imputados, o arguido Pinto integrava o seu
agregado familiar, constituído pela cônjuge e pelos dois filhos do casal. Actualmente,
face ao falecimento da cônjuge e à autonomização dos dois filhos, vive sozinho,
mantendo uma relação de grande proximidade com estes.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
O arguido desenvolveu as funções de administrador da “Pinfel”, sociedade
anónima ligada ao fabrico de calçado. Esta empresa entrou em processo de falência há
cerca de 2 anos.
O arguido pondera agora a possibilidade de investir no mercado africano,
procurando oportunidades de trabalho neste continente.
Apesar de privilegiar o trabalho e a família como as vertentes enformadoras do
seu quotidiano, está também envolvido em actividades pró-sociais, nomeadamente em
iniciativas dos Rotários de Felgueiras.
Aparenta uma consciência crítica e crenças adequadas quanto a comportamentos
normativos, evidenciando competências pessoais e sociais significativas.
O presente processo, apesar de mediatizado, não interferiu com o normal
desenrolar da vida do arguido Pinto, aguardando serenamente o seu desfecho.
Não tem antecedentes criminais.
Arguido José Manuel Pimenta da Silva
O arguido José Silva é oriundo de um agregado familiar numeroso, sendo um
dos sete descendentes de um casal de agricultores de médios recursos. A dinâmica
familiar foi pautada pela funcionalidade, com bons níveis de coesão e solidariedade
entre os seus elementos.
Frequentou o sistema de ensino entre os 6 e os 12 anos de idade, até à conclusão
do 6º ano de escolaridade. Teve um percurso escolar positivo, sem incidentes e com
bom aproveitamento. Contudo, abandonou o percurso escolar, por opção, privilegiando
o exercício da actividade profissional.
Inicia a sua trajectória profissional como empregado de balcão no sector da
restauração, onde esteve até aos 16 anos de idade. Depois de uma curta experiência
como empregado de escritório, ingressou na indústria do calçado como operário. Em
1978 estabeleceu-se por conta própria, criando uma empresa em sociedade com outra
pessoa, que se dedicava ao fabrico de solas. Em 1984malargou a actividade,
constituindo uma outra empresa do mesmo sector.
Em 1986, na sequência da morte súbita da primeira esposa, o arguido vendeu as
empresas e desligou-se de todos os negócios em que estava envolvido, por acusar
problemas depressivos graves.
Um ano depois, porém, retomou a actividade profissional, constituindo a
sociedade “Solpré – José Manuel Pimenta da Silva, Ldª”, empresa que mantém. Alargou
também o seu ramo de investimentos, nomeadamente para o sector imobiliário, sendo
sócio de duas imobiliárias.
Contraíu segundo matrimónio em 1991, nascendo desta relação dois filhos,
actualmente com 12 e 15 anos de idade. A dinâmica familiar é compensadora e
afectivamente equilibrada.
À data dos factos que desencadearam os presentes autos, tal como no presente, o
arguido integrava o agregado constituído pela esposa e pelos dois filhos menores.
Residem em Guimarães numa moradia propriedade de uma das empresas imobiliárias
de que é sócio, dispondo de muito boas condições de habitabilidade e está inserida em
meio urbano.
Profissionalmente exerce as funções de gerente da “Solpré”, com sede em
Cabeça de Porca, Sendim (Felgueiras). Usufrui de uma situação económica estável e
confortável proveniente do rendimento da sua actividade profissional e da esposa.
Em termos de lazer e ocupação de tempos livres, destaca-se a convivência com a
família e amigos.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Tem cuidados específicos com a saúde, uma vez que apresenta alguns problemas
depressivos e perturbações do sono desde jovem, fazendo acompanhamento clínico da
especialidade e tomando medicação para o efeito.
O arguido beneficia de adequada inserção comunitária, especialmente em
Felgueiras, onde passa parte substancial do seu quotidiano. Junto da comunidade onde
cresceu, em Varziela - Felgueiras, detém uma imagem positiva, sendo descrito como
pessoa empreendedora e solidária, participando e contribuindo para instituições
culturais e de solidariedade social, atenta a sua situação sócio-ecnómica confortável. Foi
membro do “Rotary Clube de Felgueiras”.
O presente processo teve um impacto negativo na sua vida, visto que a sua
credibilidade social e empresarial podem sair prejudicadas, sobretudo pelo facto do
processo ser alvo de forte mediatização, além de que, numa fase incial, este contacto
com o sistema judicial acabou por acentuar as suas complicações de saúde, situação
entretanto estabilizada.
Não tem antecedentes criminais.
Arguido Carlos Sampaio Teixeira
O arguido Carlos Sampaio teve um processo de desenvolvimento integrado num
agregado numeroso, ligado a uma actividade empresarial de pequena dimensão no
sector do calçado, actividade na qual se mantêm envolvidos alguns dos irmãos do
arguido.
O percurso escolar inicia-se em idade normal, com abandono aos 13 anos de
idade com a conclusão do 7º ano de escolaridade pelas dificuldades económicas do
agregado e motivação para o desempenho de uma actividade profissional.
Inicia uma trajectória laboral precoce como aprendiz de escriturário, área de
actividade onde se manteve até aproximadamente os 17 anos de idade, momento em que
emigra para França, país onde residia um irmão. Após uma experiência profissional
assalariada numa fábrica de pneus, aos 21 anos de idade regressa a Portugal para o
cumprimento do serviço militar obrigatório.
A trajectória profissional que se seguiu ao regresso a Portugal do arguido
Teixeira manteve-o ligado a uma actividade empresarial estável e continuada fundada
em décadas de laboração no sector do calçado, sector de actividade que assume uma
configuração e transmissão intergeracional na sua família.
Casou aos 26 anos de idade, relação que e estável e donde resultou o nascimento
de dois filhos (um actualmente ainda menor).
No plano cívico e associativo, teve uma curta participação na direcção do FCF,
clube entretanto extinto.
A actual situação sócio-familiar do arguido tendo por referência a data dos
factos que lhe são imputados não apresneta alterações significativas. Vive com a
cônjuge e os dois filhos em moradia própria em Felgueiras. Este agregado tem uma
situação económica estável fundada em décadas de actividade empresarial no sector do
calçado.
O quotidiano do arguido está muito centrado na gestão empresarial da fábrica
“Jonil”, uma organização com aproximadamente 40 trabalhadores e com uma laboração
estável. O arguido trabalha no sector do calçado por conta prórpria há mais de 20 anos,
inicialmente de parceria com um irmão e actualmente em sociedade com o filho mais
velho (de 26 anos de idade) e com a esposa.
Ao longo do seu percurso profissional, o arguido Teixeira não se envolveu na
aquisição de formação certificada na área da gestão, estando a sua competência e
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
sucesso laboral firmados na experiência de vida e no trabalho continuado por conta
própria neste sector, onde sente grande à vontade.
Comunitariamente, o arguido é um indivíduo plenamente integrado na cidade e
no concelho de Felgueiras, cuja imagem social está associada a uma actividade
empresarial estável e socialmente responsável. O seu quotidiano está muito centrado na
vida empresarial e nas relações de sociabilidade com familiares e grupo de pares ligados
à gestão no sector do calçado, factor que impede uma participação mais activa na vida
associativa e cívica do concelho.
Os presentes autos não tiveram qulquer impacto significativo no seu quotidiano.
É pessoa empreendedora, cuja experiência de vida, reforçada pelo carácter
intergeracional de um sector de actividade conhecido do grupo familiar, o dotou de
consolidadas competências sociais e pessoais na área da gestão de empresas no ramo do
calçado.
Não tem antecedentes criminais.
Arguida Maria Augusta
O processo de socialização da arguida Maria Augusta decorreu no seio de um
agregado familiar de bons recursos sócio-económicos, sendo a mais velha de dois
descendentes. A dinâmica familiar foi pautada pela funcionalidade, com bons níveis de
coesão e solidariedade entre os seus elementos.
Frequentou o sistema de ensino de modo continuado até à conclusão em 1973 da
licenciatura em Ciências Matemáticas, pela Universidade do Porto. Paralelamente ao
exercício da actividade profissional como docente do ensino superior, concluiu o
mestrado em 1988 na área da metedologia do ensino da matemática e, em 2000,
concluiu o doutoramento na área didáctica da matemática.
Iniciou a actividade profissional após a conclusão da licenciatura como
professora do ensino secundário, mantendo-se neste ramo de ensino até 1985. Nesta
altura ingressa na docência do ensino superior, tendo passado por vários
estabelecimentos de ensino, nomeadamente pela Universidade do Minho, Universidade
Portucalense e Instituto Superior de Contabilidade e Administração do Porto. Nesta
última instituição desempenhou funções de coordenação e chefia.
Paralelamente à sua actividade docente, a arguida manteve uma colaboração
directa com a “Porto Editora”, exercendo as funções de revisora científica para a área da
matemática.
A arguida iniciou a sua participação política activa durante a década de 90. Em
1997 foi eleita deputada à Assembleia Municipal de Felgueiras, cargo que manteve até
2004.
Contraíu matrimónio com 24 anos de idade, tendo nascido desta relação um
filho, actualmente maior de idade e autónomo. Desde essa altura passou a residir em Rio
Tinto – Gondomar, embora mantivesse residência no seio meio social de origem, em
Lagares – Felgueiras.
Neste plano existe uma dinâmica familiar compensadora sob o ponto de vista
afectivo.
Á data dos factos que desencadearam os presentes autos, a arguida exercia
funções de professora coordenadora do ISCAP. Residia com o marido, em casa própria,
com boas condições de habitabilidade, e evidenciava uma boa situação económica,
situação que ainda se mantém.
Em 2002 foi convidada para presidir ao Conselho Executivo da Escola Superior
de Gestão e Tecnologia de Felgueiras, cargo que manteve até Maio de 2004, altura em
74
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
que apresentou a demissão desse cargo, devido a ter sido constituída arguida no âmbito
dos presentes autos.
É nesta altura que optou por suspender toda a sua actividade académica, por não
se sentir em condições de exercer a actividade laboral enquanto o presente processo não
estiver resolvido. Solicitou licença sem vencimento pelo período de 3 anos, culminando
com o pedido de exoneração dos quadros do ISCAP.
Actualmente, mantém como única ocupação profissional a colaboração com a
“Porto Editora” como revisora científica de manuais escolares de matemática. Reparte o
seu quotidiano entre aquela actividade e a convivência com a família, dispensando
grande parte do seu tempo disponível nos cuidados prestados aos netos menores.
Até Maio de 2004 a arguida Augusta exercia uma actividade política em
Felgueiras, onde possuía residência. Paralelamente detinha outra residência em Rio
Tinto – Gondmar, onde se fixou a título definitivo recentemente.
Tomou conhecimento pela comunicação social de que iria ser constituída
arguida, notícia que foi acolhida por si e pela sua família com surpresa.
O seu envolvimento neste processo causou-lhe sentimentos de vergonha e
constrangimento nas suas relações profissionais e sociais, sobretudo devido à forte
mediatização de que este processo foi alvo.
Desde então sentiu a sua imagem social e profissional descredibilizada, tendo
suspendido os cargos que ocupava quer nos estabelecimentos de ensino superior quer na
assembleia municipal.
Passou a padecer de problemas de saúde, designadamente sintomas depressivos
e descontrolo da tensão arterial, situação que tem vindo a estabilizar-se com a
intervenção clínica. O impacto negativo inicial parece entretanto ter sido ultrapassado,
exprimindo agora a arguida maior tranquilidade e verbalizando o desejo da sua rápida
resolução.
Ela é detentora de uma imagem social conceitualizada, assente numa trajectória
académica e profissional consolidada quer como docente quer como investigadora no
ensino superior.
Não tem antecedentes criminais.
Arguido Horácio Costa
O arguido Horácio Costa é casado, vive com a esposa e dois filhos menores em
casa própria, suportando mensalmente a respectiva prestação em virtude de amortização
de empréstimo bancário que contraiu.
Encontra-se presentemente a montar um escritório que desenvolverá a sua
actividade na área financeira e seguros.
Não tem antecedentes criminais.
Arguido Joaquim Freitas
O arguido Joaquim Freitas é casado e empresário do ramo do calçado.
Não tem antecedentes criminais.
b) – FACTOS NÃO PROVADOS:
Com interesse, não se provou qualquer facto que esteja em contradição com os
que acima se deram como provados nem a demais matéria alegada na pronúncia, no PIC
e nas contestações, designadamente a que infra se referirá.
- A propósito do 1º capítulo da pronúncia
75
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Não se provou que a “Resin”, no âmbito da divulgação da sua actividade junto
das autarquias, tenha levado autarcas a França, em visita a aterros sanitários.
Não se provou que as relações estabelecidas entre a CMF e a “Resin” se tenham
precipitado na sequência de um grave acidente com um camião na lixeira de Sendim,
que se incêndiou por efeito de auto-combustão provocada, e com a tomada de posição
da população da freguesia de Sendim (provou-se porém que essas relações iniciaramse/precipitaram-se na sequência do facto da CMF ter estado na iminência de não ter
local para a deposição dos resíduos, face à relutância da testemunha Menezes Basto em
permitir a continuação da deposição descontrolada desses resíduos no seu terreno).
Não se provou que a população saíu à rua e que impediu a partir desse momento
o depósito de lixo na lixeira (provou-se, em todo o caso, a existência de oposição
popular à deposição descontrolada dos resíduos no local).
Não se provou que a testemunha Menezes Basto tenha exigido qualquer
indemnização à CMF (provou-se, em todo o caso, que reclamou junto da edilidade pelo
facto da deposição dos resíduos ser efectuada de forma descontrolada, ao ponto de
pretender impedir a continuação dessa deposição, pelo menos nesses moldes, tanto mais
que à data já tinha expirado o período de vigência do último contrato de locação
celebrado com a CMF relativamente a esse terreno, o que só não veio a suceder devido
à intervenção da “Resin” no local com a reabilitação sumária da lixeira durante um
período de 6 meses).
Não se provou que a “Resin”, por si ou recorrendo a outras empresas (quer
subcontratando trabalhos quer recorrendo ao aluguer de máquinas com condutor), não
tenha executado os trabalhos que facturou à testemunha Menezes Basto, à CMF e à
AMVS a propósito dos serviços prestados na lixeira de Sendim até ao seu
encerramento.
Não se provou que, no âmbito das empreitadas levadas a cabo para reabilitar e
explorar a lixeira de Sendim, os preços praticados pela “Resin” não fossem ajustados
aos trabalhos que executou no terreno, pelo que, outrossim, não se provou que tenha
existido qualquer sobreavaliação de tais trabalhos ou que tenham sido pagos trabalhos
não executados de modo a permitir “retornos”.
Não se provou que o preço da venda da “Tapada Grande da Devesinha” se tenha
cifrado em 24.754.820$00 (provou-se que o preço se cifrou em 25.754.820$00).
Não se provou que antes de meados de 1995 a arguida Fátima Felgueiras tenha
sabido que o arguido Júlio Faria iria integrar as listas do PS nas eleições legislativas de
1995 em lugar elegível e que, desse modo, antes dessa altura perspectivasse suceder-lhe
à frente dos destinos da CMF e ser candidata pelo PS à presidência da edilidade nas
eleições autárquicas que se viriam a realizar em Dezembro de 1997.
Não se provou que antes de Abril de 1995 os arguidos Júlio Faria, Fátima
Felgueiras e Vítor Borges tenham engendrado um plano que permitisse, por um lado, à
CMF pagar os serviços que de facto a “Resin” prestava na lixeira de Sendim e, por
outro, financiar as actividades do PS local, designadamente a campanha para as eleições
autárquicas que iriam ter lugar em Dezembro de 1997, através de “retornos” de
pagamentos efectuados pela CMF (provou-se que antes dessa altura havia apenas um
“esquema” que consistia no lançar mão de expedientes administrativos que permitissem
à CMF pagar os trabalhos que a “Resin” levava a cabo na lixeira de Sendim e sem que
desse “esquema” estivessem pressupostos “retornos” de verbas; provou-se, em todo o
caso, que em Abril de 1995 foi urdido um plano donde emerge a correlação entre o
expediente administrativo então formalmente adoptado e que permitia à CMF proceder
a pagamentos à “Resin” e os “retornos” que permitiam designadamente financiar as
76
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
actividades do PS de Felgueiras, pese embora só reportado a uma das empreitadas
celebradas a propósito da lixeira de Sendim, formalmente entre a CMF e a “Norlabor”).
Não se provou que o arguido Carlos Marinho tenha sido um dos “cérebros” de
tal plano (provou-se apenas que ele colaborou com os arguidos Vítor Borges, Júlio Faria
e Fátima Felgueiras, na medida em que criou o suporte documental que
contabilisticamente “justificou” as transferências para a sua entidade patronal - a
“Resin” - de todos os pagamentos que a CMF efectuou a propósito dos trabalhos
executados na lixeira de Sendim e que permitiram os “retornos” no âmbito dos
pagamentos efectuados pela CMF no que se refere ao contrato de empreitada referido
no ponto 1.3 da pronúncia, tendo-se aliás provado que procedeu a duas entregas em
numerário, sendo certo que uma delas constituiu um “retorno” e outra traduziu-se num
donativo de 20.000 cts ao FCF, dos quais 7.500 cts foi entregue em numerário e o
restante em cheque).
Não se provou que o arguido Barbieri Cardoso, ao colaborar com os arguidos
Vítor Borges, Júlio Faria e Fátima Felgueiras nas simulações de concurso, ajuste directo
e contratos de empreitada soubesse que daí iriam decorrer “retornos”, designadamente
no que se refere ao concurso limitado e contrato de empreitada mencionados no ponto
1.3 da pronúncia.
Não se provou que o arguido Gabriel, directa ou indirectamente, tenha
colaborado com os arguidos Vítor Borges, Fátima Felgueiras e Júlio Faria antes de
01.09.97, data do seu ingresso ao serviço da “Resin” (sendo certo que a única
colaboração demonstrada se prendeu apenas com a entrega de um dos “retornos”).
Não se provou que os arguidos Júlio Faria e Barbieri Cardoso não tenham estado
presentes na reunião ocorrida na CMF a 04.09.96, mencionada no ponto 1.4 da
pronúncia.
Não se provou que o “adicional ao contrato de recolha” tenha constituído
qualquer hipótese de resolução da situação originada pela recusa do visto pelo TC no
que se refere à adjudicação dos trabalhos pela CMF à “Resin”, referida no ponto 1.4 da
pronúncia.
Não se provou que tenha existido qualquer “retorno” no âmbito dos contratos
referidos nos pontos 1.2. 1.4 e 1.5 da pronúncia (provaram-se apenas dois “retornos” no
âmbito dos pagamentos efectuados pela CMF à “Norlabor”, com referência portanto ao
contrato mencionado no ponto 1.3 da pronúncia).
Consequentemente, não se provou que a primeira entrega de 5.000 cts em
numerário pela “Resin” aos arguidos Júlio Faria e Fátima Felgueiras tenha constituído
um qualquer “retorno” (tratou-se de um donativo mas não se demonstrou que estivesse
relacionado com qualquer “retorno” de verbas pagas pela CMF).
Consequentemente, não se provou ainda que o donativo de 20.000 cts ao FCF
tenha constituído qualquer “retorno” no âmbito de qualquer um dos pagamentos
efectuados ou autorizados pela AMVS (demonstrou-se porém que a “Resin” teve
disponibilidade financeira para apoiar o FCF em virtude de ter recebido um valor
referente ao adiantamento no âmbito da empreitada mencionada no ponto 1.5 da
pronúncia, de que parte reteve para si e não entregou à “Ecop”).
Não se provou que o concurso internacional mencionado no ponto 1.5 da
pronúncia tenha sido lançado no âmbito de qualquer quadro de apoio comunitário
(beneficiou antes de fundos de coesão).
Não se provou que os arguidos Júlio Faria, Fátima Felgueiras e Barbieri Cardoso
tenham exercido qualquer influência junto da AMVS para que o consórcio liderado pela
“Resin” vencesse o concurso internacional mencionado no ponto 1.5 da pronúncia ou
77
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
para que a “Norlabor” vencesse o outro concurso mencionado em tal ponto da mesma
peça processual.
Não se provou que na análise das propostas aos concursos mencionados no
ponto 1.5 da pronúncia (para a construção do aterro RIB de Felgueiras e para a
construção de ecocentros e não ecopontos conforme referido na pronúncia) algum dos
elementos das respectivas comissões de análise tenha favorecido qualquer um dos
concorrentes ou sequer que sobre tais elementos tenham sido exercidas quaisquer
influências nesse sentido.
Não se provou que os arguidos Júlio Faria, Fátima Felgueiras e Barbieri Cardoso
soubessem que a “Resin” inflaccionou em 140.000 cts o valor da proposta apresentada
pelo consórcio “Resin”/”Sita”/”Ecop” (conforme dado como provado), de modo a,
dessa forma, ressarcir-se dos montantes então em dívida pela CMF e que ultrapassavam
os 100.000 cts (mesmo sem considerar os juros de mora e os encargos emergentes dessa
situação de mora por banda da CMF).
Não se provou que esses 140.000 cts, dissimulados na proposta apresentada pelo
consórcio liderado pela “Resin”, digam na realidade respeito à exploração do aterro RIB
de Felgueiras e que tal tenha sido assim dissimulado para beneficiar do cofinanciamento por fundos de coesão comunitários em 85% (fundos esses que não
financiavam a exploração mas apenas a construção do aterro).
Não se provou que a “Resin” nunca tenha entregue qualquer quantia em
numerário (provaram-se quatro entregas em numerário: um donativo que serviu para
abrir a conta do BES, dois “retornos” e parte de um donativo em numerário concedido
ao FCF, conforme acima dado como provado).
Não se provou que as quantias monetárias não tenham sido entregues pelas
pessoas mencionadas na pronúncia, no contexto dado como provado (porém, quanto ao
facto alegado na pronúncia de que o arguido Gabriel Almeida acompanhou o arguido
Carlos Marinho aquando da entrega ao arguido Horácio Costa, na CMF, do donativo de
20.000 cts destinado ao FCF, cfr. o que a propósito acima foi decidido pelo Tribunal a
título de questão prévia).
Não se provou que os arguidos Horácio e Joaquim Freitas não tivessem
consciência que duas das entregas em numerário referidas não se reportassem a
“retornos” de verbas pagas pela CMF no âmbito do contrato de empreitada celebrado
com a “Norlabor” (não se demonstrou pois que, quanto a elas, tivessem partido do
pressuposto de que se trataram de simples donativos).
Não se demonstrou – para além do provado -, quais as funções efectivamente
exercidas pelo arguido Gabriel na “Resin” (designadamente as que alegou nos artgs 20 e
21 da sua contestação).
Não se provou que o arguido Gabriel não tivesse consciência de que a quantia
por si entregue em numerário – proveniente da “Resin” – não constituísse um “retorno”
de um dos pagamentos efectuados pela CMF com referência ao contrato de empreitada
que a edilidade celebrou com a “Norlabor” e mencionado no ponto 1.3 da pronúncia,
não se demonstrando ainda que não tivesse tomado consciência de que o mesmo era
simulado.
Quanto às circunstâncias dessa entrega, não se demonstrou o que a propósito foi
alegado nos artgs 39º a 47º da contestação apresentada pelo dito Garbriel Almeida.
Não se provou que tenha sido o arguido Gabriel a assinar o fax de fls 223 do
apenso 20.
Não se provou que a “Resin” não tenha recebido qualquer verba em numerário
da testemunha Menezes Basto.
78
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Não se provou que os arguidos Júlio Faria e Fátima Felgueiras controlassem
absolutamente os órgãos decisórios da CMF e da Assembleia Municipal de Felgueiras
(pese embora se tenha demonstrado que, naturalmente, exerceriam influência sobre
esses órgãos, em face das relevantes funções autárquicas e partidárias que então
exerciam, tendo o PS a maioria quer no executivo camarário quer na assembleia
municipal).
Não se provou que as empresas “Translousada”, “Craveira”, “Norlabor”, “Ecop”
e “João Tello” tenham acedido em colaborar (aparecendo como oponentes em
concursos ou procedimentos administrativos simulados, com vista à adjudicação de
trabalhos de empreitada referentes à lixeira de Sendim) na perspectiva de serem
beneficiadas ou compensadas em futuras adjudicações de empreitadas que a CMF ou a
AMVS iriam promover (demonstrou-se porém que a “Translousada” tinha interesse em
prestar a sua colaboração no “esquema” montado de modo a que a “Resin” recebesse de
facto as contrapartidas monetárias pelo trabalho que levava a cabo na lixeira de Sendim
na medida em que dessa forma também ela receberia da “Resin” o pagamento pelos
serviços que lhe iam sendo subcontratados, já que existia um acordo entre essas
empresas no sentido de que a “Translousada” receberia o respectivo pagamento na
medida em que a CMF pagasse à “Resin”; em todo o caso, não obstante esse acordo, a
“Resin” chegou a liquidar pagamentos à “Translousada” independentemente de ter
recebido da CMF).
Não se provou que a aposição do despacho “TC. Óptimo. 97.06.10” no
documento de fls 199 e ss. do 1º volume tenha sido aposto pela arguida Fátima
Felgueiras antes da aposição em tal documento pelo arguido Horácio Costa da
informação manuscrita ali constante (consequentemente, não se demonstrou que tal
despacho se refira ao conteúdo do relatório em causa).
Não se demonstrou aliás que qualquer um dos documentos entregues pelo
arguido Horácio Costa tenham sido adulterados (o Tribunal convenceu-se da respectiva
veracidade).
Não se provou que pelas missivas de fls 9145 e 9146 o FCF tenha solicitado
qualquer apoio à “Resin” (tratam-se antes de missivas de agradecimento, sendo certo
que o “apoio” que importa aos autos foi solicitado pessoalmente pelo arguido Júlio
Faria, acompanhado do arguido Horácio Costa, algures em Setembro de 1998; os
agradecimentos a que se reportam as missivas em causa referem-se assim, quando
muito, ao outro contrato de publicidade referido nos autos para a mesma época
desportiva e não àquele cuja cópia consta designadamente de fls 9147).
Com as ressalvas já assinaladas na matéria de facto dada como provada, não se
demonstrou a matéria alegada pela arguida Fátima Felgueiras na sua contestação nos
artgs 1º a 4º, 6º, 8º, 10º, 11º, 12º, 13º, 17º (parte final), 18º, 19º, 20º, 23º, 24º, 26º, 28º,
30º, 31º, 32º, 33º, 34º, 35º e 36º.
Com as ressalvas já assinaladas, não se demonstrou a matéria alegada pelo
arguido Horácio Costa nos artgs 9º, 10º (primeira parte), 11º (primeira parte), 13º, 14º,
15º e 16º da sua contestação.
- A propósito do 2º capítulo da pronúncia
Introdução
Não se provou que a aposição de marcas ou cruzes à frente de nomes constantes
em listas de pessoas a contactar no sentido de lhes solicitar um donativo para a
campanha eleitoral de 1997 correspondia à existência de processos de licenciamento de
construções, pavilhões ou armazéns na CMF, correspondendo ainda tal sinal à
existência de irregularidades e/ou ilegalidades nas obras e construções que os indivíduos
79
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
a contactar tinham em curso ou já concluídas, como forma de os pressionar a contribuir
com o donativo pretendido, não se provando ainda que muitos deles ao darem o seu
contributo para a campanha eleitoral sabiam que evitariam que as suas instalações
fabris, ou obras ilegais, fossem mais tarde fiscalizadas pelos serviços camarários
competentes.
Não se identificou quem do GAPP chegou a recepcionar donativos e a
estabelecer prévios contactos telefónicos com as pessoas a quem lhes eram solicitados
donativos, avisando-as da visita dos arguidos Horácio e Joaquim com essa finalidade.
Não se provou a matéria alegada pela arguida Fátima Felgueiras nos artgs 37º e
38º da sua contestação.
Não se demonstrou que ela nunca tenha agido com a intenção de beneficiar
algum munícipe no âmbito de processos de licenciamento e que sempre agiu convencida
da legalidade e justiça das decisões que nesse âmbito proferiu (pese embora também
não se tenha demonstrado o contrário, isto é, que alguma vez tenha agido com esse
intuito).
Anastácio Augusto Pinto Macedo
Não se provou que, em meados do mês de Agosto de 1997, o arguido Anastácio
Augusto Pinto Macedo foi contactado pelos arguidos Horácio Costa e Joaquim de
Freitas, nas escadas exteriores do edifício da Câmara Municipal de Felgueiras, para que
contribuísse com um donativo de Esc. 1.000.000$00, para a campanha eleitoral da
arguida Maria de Fátima Felgueiras, às eleições autárquicas de Dezembro de 1997, que
se avizinhavam.
Não se provou que, face a tal pedido, o arguido Anastácio Augusto Pinto
Macedo concordou em entregar apenas a quantia de Esc. 500.000$00, em duas tranches,
e desde que os arguidos Horácio Costa e Joaquim de Freitas se comprometessem a
solucionar, junto da arguida Maria de Fátima Felgueiras, um problema relacionado com
a legalização de um pavilhão industrial.
Não se provou que, no mesmo instante, o arguido Horácio Costa disse ao
arguido Anastácio Augusto Pinto Macedo que ia ver o que estava a passar com tal
assunto e que iria procurar “desencravá-lo”, sendo certo que depois lhe diria alguma
coisa.
Não se provou que, entretanto, uns dias depois de ter recebido o primeiro
cheque, e como se tratava de um apoiante da campanha eleitoral de Maria de Fátima
Felgueiras, o arguido Horácio Costa tenha solicitado àquela que defirisse a emissão da
requerida licença de utilização, ao que a mesma acedeu, mas apenas mediante o
compromisso do arguido/requerente, Anastácio Augusto Pinto de Macedo, contribuir
com o segundo donativo, no valor de 250.000$00, para a sua campanha eleitoral,
conforme o combinado.
Não se provou que, após ter efectuado a entrega do primeiro cheque e ainda
antes de efectuar a entrega do segundo, o arguido Horácio Costa tenha entregue ao
arguido Anastácio Macedo, pessoalmente e em mão, a referida licença de utilização,
devidamente emitida pela CMF, que tinha previamente obtido junto de Fátima
Felgueiras, sendo certo que para a sua emissão nunca foi efectuada qualquer vistoria ou
fiscalização pelos serviços competentes da CMF.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Não se provou que o segundo cheque emitido pelo arguido Anastácio tenha sido
entregue à arguida Fátima Felgueiras pelo arguido Joaquim Freitas (mas provou-se que
foi ela quem o entregou ao arguido Horácio).
Não se provou que o arguido Anastácio Augusto Macedo tenha agido de forma
livre, voluntária e consciente querendo entregar várias quantias monetárias à arguida
Maria de Fátima Felgueiras, através de interpostas pessoas da sua confiança, para ajudar
a financiar a campanha eleitoral desta, recebendo em troca da entrega de tais apoios
financeiros a emissão e aprovação da licença de utilização e de ocupação de um
pavilhão industrial de sua propriedade, apesar de o mesmo bem saber que tal conduta
era proibida e punida por lei.
Não se provou ainda que, por sua vez, a arguida Maria de Fátima Felgueiras
agiu de forma livre, voluntária e consciente, aceitando, e utilizando, aquelas quantias
monetárias, com intuito de obter beneficio patrimonial que sabia ser ilegítimo, por
constituir indevida contrapartida da prática de actos administrativos que violavam as
normas legais aplicáveis e os seus deveres como membro de órgão representativo de
autarquia local, sabendo igualmente que a sua conduta era proibida e punida por lei.
Por outro lado, não se demonstrou também que o arguido Horácio Costa tenha
agido de forma livre, voluntária e consciente querendo participar e colaborar na prática
de tal crime, nomeadamente colaborando na angariação de fundos monetários para a
campanha eleitoral da arguida Fátima Felgueiras, e nesse âmbito solicitando-lhe que
emitisse a aludida licença de utilização recebendo em troca um donativo monetário por
parte do beneficiado, o que conseguiu e obteve, sendo certo que o mesmo bem sabia que
tal conduta era proibida e punida por lei.
Carlos Sampaio Teixeira
Não se provou que o arguido Carlos Sampaio Teixeira tenha iniciado os
trabalhos de movimentação de terras antes de Dezembro de 1997.
Não se provou que o arguido Carlos se tenha recusado perante os arguidos
Horácio e Joaquim a conceder qualquer donativo para a campanha eleitoral do PS
relativo às eleições autárquicas ocorridas em Dezembro de 1997 (provou-se antes que o
dito Carlos nunca recebeu os arguidos Horácio e Joaquim, apesar destes várias vezes
terem procurado contactá-lo).
Não se provou que tenha sido a arguida Fátima a dar instruções aos funcionários
dos serviços de fiscalização da CMF no sentido de se deslocarem ao local, de modo a
pressionar o arguido Carlos Sampaio Teixeira a contribuir com um donativo.
Não se provou que o arguido Carlos tenha concedido o donativo referido nos
autos em face de tal visita da Fiscalização e em ordem a evitar o embargo da obra.
Não se provou que a arguida não tenha mandado instaurar um processo de
contra-ordenação contra o arguido Carlos Sampaio Teixeira com o intuito de o
beneficiar.
Não se provou que a licença de construção nº 457/2000, de 02.08.2000 tenha
sido concedida como contrapartida do donativo que o arguido Carlos Sampaio Teixeira
concedera em Novembro de 1997.
Não se provou pois que a arguida Maria de Fátima Felgueiras agiu de forma
livre, voluntária e consciente, aceitando, e utilizando, aquelas quantias monetárias, com
intuito de obter beneficio patrimonial que sabia ser ilegítimo, por constituir indevida
contrapartida da prática de actos administrativos que violavam as normas legais
aplicáveis e os seus deveres como membro de órgão representativo de autarquia local e
81
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
da omissão de instauração de procedimento contra-ordenacional, sabendo igualmente
que a sua conduta era proibida e punida por lei.
Por sua vez, também não se provou que o arguido Carlos Sampaio Teixeira agiu
de forma livre, voluntária e consciente querendo entregar uma quantia monetária à
arguida Maria de Fátima Felgueiras, através de interpostas pessoas da sua confiança,
para ajudar a financiar a campanha eleitoral desta, recebendo em troca da entrega de tal
quantia monetária a emissão e aprovação da licença de utilização de um pavilhão
industrial de sua propriedade, apesar de o mesmo bem saber que tal conduta era
proibida e punida por lei.
Não se provou também a matéria alegada nos artgs 31º, 32º e 33º da contestação
apresentada pelo arguido Carlos Sampaio Teixeira.
Guilherme da Silva Almeida
Não se provou que, após ter sido notificado da decisão de indeferimento no
âmbito do processo de licenciamento nº 630/97, o arguido Guilherme da Silva Almeida,
acompanhado do engenheiro Manuel Maria Machado (responsável pelo projecto), se
tenha deslocado à CMF, tendo contactado com a Presidente Maria de Fátima Felgueiras
(provou-se que essa audiência teve lugar antes de qualquer parecer ou decisão no
âmbito de tal processo de licenciamento).
Não se provou que no decurso de tal reunião, realizada em Setembro de 1997, o
arguido Guilherme da Silva Almeida tenha obtido da arguida Maria de Fátima
Felgueiras, verbalmente, autorização para começar as obras, ainda que sem o despacho
favorável e consequente emissão e levantamento da licença de construção, mediante o
compromisso de entregar um donativo para a campanha eleitoral daquela arguida.
Não se provou que, na sequência do embargo das obras de terraplanagem, o
arguido Guilherme Almeida se tenha deslocado à CMF e, na impossibilidade de falar
com Fátima Felgueiras, tenha colocado o problema a Horácio Costa, pedindo-lhe que
intercedesse junto daquela arguida no sentido de resolver o referido embargo.
Não se provou que no dia 16.01.98, o arguido Horácio Costa tenha informado
verbalmente o arguido Guilherme de Almeida que a arguida Maria de Fátima Felgueiras
tinha dado autorização verbal para o recomeço das obras e que iria resolver o problema
do embargo e do licenciamento da referida obra, desde que o mesmo entregasse mais
um donativo para a sua campanha eleitoral, o que aquele arguido aceitou fazer logo que
tivesse a licença na sua posse e o embargo resolvido (provou-se que foi o arguido
Horácio quem transmitiu via telefone a dita autorização, mas não se provou que a
mesma estivesse dependente de qualquer donativo).
Não se provou que, na sequência do alegado desrespeito do embargo da obra de
terraplanagem a arguida Maria de Fátima Felgueiras, num primeiro momento, tenha
decidido mandar comunicar esse facto ao Ministério Público mas que posteriormente,
devido ao acordo celebrado com o arguido Guilherme de Almeida, tenha revogado tal
decisão (demonstrou-se que a arguida Fátima nunca ordenou a remessa do auto ao MP,
pois o que existe no processo de licenciamento é uma simples “choca” nesse sentido,
sem que a arguida Fátima a tenha assinado, tendo antes manuscrito um despacho no
sentido de obter esclarecimentos).
Não se provou que do processo de licenciamento nº 116/98 não conste a
informação do Departamento Técnico de 29.03.99 (provou-se que consta de fls 133 de
tal processo).
82
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Não se provou que o arguido Guilherme da Silva Almeida tenha entregue os
quantitativos monetários referidos nos autos à arguida Maria de Fátima Felgueiras,
através dos arguidos Horácio Costa e Joaquim de Freitas, com intuito de obter em troca
decisão favorável sobre licenças de construção e de utilização das obras em que era
interessado.
Não se demonstrou que, por sua vez, os arguidos Maria de Fátima Felgueiras,
Horácio Costa e Joaquim de Freitas agiram em conjugação de esforços e de intenções,
visando através das suas condutas obterem (do modo descrito na pronúncia)
quantitativos monetários para a campanha eleitoral daquela arguida, sendo certo que
aquela para alcançar tal objectivo usou para o efeito os poderes de natureza pública do
cargo que exercia, apesar de bem saber que não podia receber qualquer gratificação ou
quantia monetária pelo exercício de tais funções ou por causa delas.
Não se demonstrou que todos estes arguidos bem sabiam que as suas condutas
eram proibidas e punidas por lei.
Com as ressalvas acima referidas (a propósito da factualidade provada), não se
demonstrou, designadamente, a matéria constante dos artgs 7º (pois provou-se que a
arguida Fátima impôs duas condições para que os trabalhos de terraplanagem pudessem
arrancar); 15º (pois não se demonstrou que só a 14.11.97 é que esses trabalhos se
iniciaram); 19º (provou-se que as obras arrancaram em data indeterminada de
Novembro de 1997); 22º; 25º, 2ª parte (pois demonstrou-se que essa visita apenas foi
efectuada pelos arguidos Horácio e Joaquim); 26º, 2ª parte; 27º (no sentido de que não
se sabe se o pedido foi então ali efectuado pelos visitantes ou se esse pedido já
anteriormente havia sido feito, designadamente pela arguida Fátima); 28º, 2ª parte; 30º;
31º, 1ª parte; 36º, 41º (não se apurou, em concreto, qual o teor das comunicações
estabelecidas entre o arguido Guilherme e o gabinete “M2”, embora se tivesse
demonstrado que se prendiam com a resolução do problema lavantado pelo auto de
notícia); 46º; 47º (ignora-se qual foi em concreto o teor das comunicações estabelecidas
entre o arguido Guilherme e o gabinete “M2”, embora se tivesse demonstrado que se
prendiam com a resolução do problema lavantado pelo embargo da obra); 50º, parte
final (não se demonstrou que as obras só tivessem sido retomadas a 19.09.98); e 56º, 2ª
parte, todos da contestação apresentada pelo arguido Guilherme da Silva Almeida.
Joaquim Teixeira Pinto e José Manuel Pimenta da Silva
Não se provou que o terreno referido nos autos tenha estado registado em nome
do arguido José Pimenta da Silva (provou-se que esse terreno esteve registado em nome
da firma “José Manuel Pimenta da Silva & Cª Ldª”).
Não se provou a existência de qualquer correlação entre a entrega dos donativos
por banda destes arguidos e o andamento e deferimento das suas pretensões no âmbito
dos processos de licenciamento referidos nos autos (assim como não se demonstrou o
inverso).
Não se demonstrou em que data do primeiro semestre de 1997 teve lugar a
reunião entre os arguidos Fátima, Pinto e Silva.
Não se provou que nessa reunião a arguida tenha dado autorização verbal para
que as obras de terraplanagem se inciassem.
Não se provou que na mesma reunião a arguida Fátima tivesse transmitido aos
arguidos Pinto e Silva que a divisão do terreno em duas parcelas poderia ser feita
através de um destaque.
Não se provou que os arguidos Pimenta da Silva e Teixeira Pinto tenham
entregue directamente os respectivos donativos aos arguidos Horácio e Joaquim e que o
83
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
fizeram em datas distintas (provou-se que os primeiros dois donativos foram entregues
na mesma ocasião através da testemunha Manuel Machado e que todos os donativos
foram entregues através desta mesma testemunha).
Não se provou qual a finalidade da concessão do donativo de 670 cts e que este
tenha sido entregue directamente pelo arguido Silva os arguidos Horácio e Freitas.
Não se demonstrou que os arguidos Fátima, Silva e Pinto tivessem consciência
de que a aprovação da operação de loteamento fosse um acto administrativo ilegal.
Não se demonstrou a matéria alegada pelo arguido Pimenta da Silva nos artgs 7º
a 13º e 25º a 29º na sua contestação escrita.
Não se demonstrou a matéria constante dos artgs 2º a 5º, 7º a 16º, 19º, 28º, 29º,
35º, 36º, 37º, 46º, 47º, 56º, 63º 64º, 65º, 68º, 69º, 70º, 74º, 77º e 89º da contestação
apresentada pelo arguido Joaquim Teixeira Pinto.
Maria Augusta Faria Ferreira Neves
Não se provou que antes de iniciar a construção do edifício industrial, a arguida
Maria Augusta Neves tenha colhido previamente junto dos serviços técnicos da CMF, e
pessoalmente junto da arguida Maria de Fátima Felgueiras, a informação que tal
construção era possível e legal.
Não se provou que se tenham deslocado ao local da obra vários Técnicos da
Autarquia e a própria arguida Maria de Fátima Felgueiras, a fim de se inteirar sobre a
mesma.
Não se identificou que entregou ao arguido Horácio o cheque de fls 519.
Não se demonstrou que o cheque de fls 541 tenha sido entregue para apoiar a
candidatura da arguida Fátima à presidência da CMF (provou-se que foi entregue para
apoiar o projecto relativo à revista “Rubeas”).
Não se provou que, face da instauração do processo de contra-ordenação nº
466/98, a arguida Maria Augusta Faria Ferreira Neves tenha tentado, de imediato, falar
com a arguida Maria de Fátima Felgueiras, não o tendo conseguido.
Não se demonstrou que, devido à dificuldade em conseguir falar com a
Presidente da CMF, a arguida Maria Augusta Faria Ferreira Neves tenha resolvido
abordar informalmente o arguido António Bragança da Cunha, pedindo-lhe que
comunicasse à arguida Maria de Fátima Felgueiras a instauração do referido processo e
se podia fazer alguma coisa para o resolver.
Não se apurou que, depois de o arguido António Bragança da Cunha ter
comunicado aquele pedido à arguida Maria de Fátima Felgueiras, esta lhe tenha dado
instruções no sentido de deixar o referido processo de contra-ordenação no seu gabinete
e de informar a arguida Maria Augusta que o problema seria resolvido e que entregasse
a quantia de Esc. 500.000$00 ao partido, instruções que aquele cumpriu.
Não se provou que no dia 0909.1998 a arguida Maria de Fátima Felgueiras tenha
despachado favoravelmente a emissão da licença de construção nº 660/98 (provou-se
que esse despacho foi proferido a 03.09.98).
Não se provou que, como o processo de contra-ordenação não tinha sido, de
imediato, arquivado, a arguida Maria Augusta Neves tenha questionado, novamente, o
arguido António Bragança sobre tal situação, ou seja, sobre o facto de o processo de
contra-ordenação não ter sido arquivado, bem como sobre o facto de estar a ser exigido
pela CMF o pagamento da respectiva coima.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Não se demonstrou que, mais uma vez, este facto tenha sido comunicado pelo
arguido António Bragança à arguida Maria de Fátima Felgueiras, e que esta, para
arquivar o processo, tenha exigido que a arguida Maria Augusta Neves pagasse a
quantia combinada, ou seja, a quantia de Esc. 500.000$00 (quinhentos mil escudos).
Não se provou que tenha sido no seguimento daquela exigência que a arguida
Maria Augusta Neves tenha entregue ao arguido António Bragança, em Abril de 1999, o
cheque com o n.º 3769765719, no valor de Esc. 500.000$00 (quinhentos mil escudos),
sacado sobre a conta n.º 21656575/001 do BTA, balcão de Felgueiras, titulada por José
Manuel Monteiro Neves (mas emitido por Maria Augusta Ferreira Neves, em
16/04/1999).
Não se provou que, posteriormente, emergente de uma qualquer combinação
entre ambas arguidas, tenha sido arquivado o processo de contra-ordenação referido e
que tenha sido emitido o alvará nº 940/99, licenciando alterações à construção inicial,
alterações estas destinadas a um armazém.
Não se provou que a arguida Maria Augusta Ferreira Neves agindo de forma
livre, voluntária e consciente tenha querido contribuir e entregar os donativos supra
referidos à arguida Maria de Fátima Felgueiras a fim de obter em troca o respectivo
licenciamento da obra supra referida, assim como não se demonstrou que ela tenha
visado com tais condutas evitar que lhe fosse aplicada uma coima de valor elevado
pelos serviços camarários, sendo certo que a mesma bem sabia que tal conduta era
proibida e punida por lei.
Não se provou também que os arguidos Maria de Fátima Felgueiras e António
Bragança da Cunha agiram de forma livre, voluntária e consciente, em conjugação de
esforços e de intenções, querendo receber as quantias supra aludidaspara licenciarem
contra as normas legais vigentes as obras requeridas pela arguida Maria Augusta junto
da CMF, bem como para evitarem que a mesma pagasse uma elevada quantia monetária
àquela autarquia, a título de coima, usando para o efeito os poderes legais dos cargos de
autarcas que desempenhavam, apesar de bem saberem que ao fazê-lo violavam os
deveres a que estavam a obrigados por força de tais cargos e que as suas condutas eram
proibidas e punidas por lei.
Não se demonstrou ainda qualquer outro facto alegado nas contestações, em
contradição ou para além dos que acima se deram como provados, designadamente:
- A matéria constante dos artgs 12º, 14º, 24º, 50º e 60º (2ª parte) da contestação
apresentada pela arguida Maria Augusta Neves;
- A matéria constante dos artgs 64º, 67º e 70º da contestação apresentada pelo
arguido Bragança.
- A propósito do 3º capítulo da pronúncia
Não se provou a matéria que a propósito foi alegada pela arguida Fátima
Felgueiras nos artgs 48º a 53º, 55º e 57º da sua contestação.
Não se provou a versão dos factos apresentada na contestação dos arguidos Júlio
Faria (artº 62º), Vítor Borges e Carlos Marinho (artgs 107º a 109º e 111º), no que
respeita à concessão pela “Resin” do donativo de 20.000 cts, na parte em que entra em
contradição com a matéria que acima se deu como provada.
Não se demonstrou que tenha sido a arguida Fátima a contactar directamente
com a “Resin” no sentido desta empresa apoiar financeiramente o FCF, designadamente
com recurso às verbas que aquela empresa iria receber da AMVS.
Não se provou que a “Resin” desde logo se tenha comprometido a contribuir
com 20.000 cts para o FCF (provou-se que foi esse o donativo solicitado e que a
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
“Resin” se comprometeu a contribuir de acordo com as suas disponibilidades
financeiras e em face de verbas que teria a receber da AMVS).
Não se provou que tenha sido o arguido Gabriel Almeida a assinar e a enviar
para a AMVS, no dia 27.10.98, o fax referido na pronúncia e constante de fls 223 do
apenso 20 (ignora o Tribunal quem o fez).
Não se demonstrou quem informou o arguido Júlio Faria de que poderia remeter
uma missiva à CCAM, referindo que a dívida de 20.000 cts seria saldada até ao final do
ano de 1998.
Não se provou que o arguido Gabriel Almeida tenha acompanhado o arguido
Carlos Marinho aquando da entrega dos 20.000 cts.
Não se provou que a entrega dessa quantia permitiu saldar uma dívida avalisada
pelo arguido Júlio Faria (provou-se aliás que o arguido Júlio não tinha prestado
qualquer aval no âmbito do acordo de transacção que o FCF celebrou com a CCAM).
A propósito da aquisição dos bilhetes referentes ao sorteio promovido pelo FCF,
não se provou a versão dos factos alegados pelo arguido Júlio Faria na medida em que
esteja em contradição com a matéria de facto que a esse propósito se deu como provada
(a versão desses factos que deu na audiência de julgamento não foi aliás coincidente
com a posição expressa no artº 61º da sua contestação escrita).
- A propósito do 4º capítulo da pronúncia
Introdução
Não se demonstrou que a arguida Fátima Felgueiras, ao proferir os seus
despachos nos processos de licenciamento, tenha deferido as pretensões formuladas
pelos requerentes em tais processos com a consciência de que ao fazê-lo estaria a violar
qualquer norma legal, designadamente o RGEU e o PDM.
Não se demonstrou ainda que tenha decidido em sentido contrário aos pareceres
proferidos pelos técnicos em tais processos de licenciamento.
Processo de obra particular nº 130/88
Não se provou que a arguida Fátima Felgueiras tenha proferido qualquer
despacho contra qualquer parecer proferido no âmbito do processo em causa.
Não se provou que a arguida Fátima Felgueiras tenha agido com a consciência
de que, ao deferir o licenciamento da obra em causa bem como ao deferir a respectiva
licença de utilização, estivesse a violar qualquer norma legal, designadamente do RGEU
e do PDM.
Não se demonstrou ainda que tivesse agido com a intenção de ilicitamente
beneficiar a requerente nas decisões que tomou naquele processo de licenciamento.
Processo de obra particular nº 5/I/93
Não se provou que, no momento da aprovação do projecto de arquitectura,
tivesse existido a consciência por parte do presidente da edilidade de que o projecto
violava o PDM.
Não se provou que a arguida Fátima, em face dos despachos que proferiu,
tivesse tido a consiência de ter cometido alguma ilegalidade (designadamente por
violação do PDM).
Não se demonstrou que a arguida Fátima Felgueiras tivesse querido beneficiar a
requerente do processo de licenciamento em causa.
Não se provou a existência de alguma relação entre o donativo concedido e o
deferimento da licença de utilização.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
- A propósito do 5º capítulo da pronúncia
Não se provou que a “Proeme”, antes da abertura do concurso limitado referido
nos autos, tenha fornecido bens e serviços à CMF, mantendo assim com esta um
relacionamento priviligiado.
Não se demonstrou que a arguida Fátima Felgueiras, aproveitando esse
relacionamento, em finais do ano de 1996, tenha tido qualquer reunião com a
testemunha Renato Guerra, onde ficou acordada a elaboração de “um projecto global”,
nos moldes indicados na pronúncia.
Não se demonstrou que da informação técnica proferida pela comissão de
análise das propostas apresentadas pelas firmas “Proeme” e “Isto É” não resulte que a
proposta apresentada por aquela não seja a melhor pontuada.
Não se provou que a arguida Fátima Felgueira tenha agido com a intenção de
beneficiar a firma “Proeme” quando determinou a adjudicação à firma melhor pontuada.
- A propósito do 6º capítulo da pronúncia
Não se provou que tenha sido a testemunha Pimentel a tratar de toda a
publicidade mandada publicar pela CMF (demonstrou-se que ele, enquanto membro do
Gabinete de Imprensa da CMF, só tratava da publicidade dos eventos e não da
publicidade institucional).
Não se dmeonstrou que, em meados do ano de 1997, os arguidos Maria de
Fátima Felgueiras e António Pereira, resolveram beneficiar o Jornal “O Sovela”,
encaminhando para tal semanário a maioria das verbas que a CMF gastava em
publicidade, em detrimento e prejuízo dos restantes periódicos do concelho de
Felgueiras, no caso “O Semanário de Felgueiras” e o “Jornal da Lixa” (porém, também
não se demonstrou o contrário).
Não se demonstrou, consequentemente, que tal decisão tinha ainda como
objectivo o financiamento indirecto do jornal “O Sovela”, no sentido de o viabilizar,
atentas as dificuldades financeiras com que se debatia tal órgão de imprensa regional,
bem como o de fazer frente ao “Semanário de Felgueiras”.
Não se demonstrou que, devido às posições políticas assumidas no referido
“Semanário de Felgueiras”, a arguida Maria de Fátima Felgueiras entendia que aquele
periódico não devia, nem podia, beneficiar das verbas que a CMF gastava
periodicamente em publicidade nos jornais existentes no concelho de Felgueiras, pelo
que, e no seguimento de tal entendimento, ordenou verbalmente ao arguido António
Pereira que encaminhasse a grande maioria da publicidade da Câmara para o jornal “O
Sovela” e que tal publicidade fosse contratada com o “Semanário de Felgueiras” apenas
em casos muito excepcionais (em todo o caso, também não se demonstrou o contrário).
Não se provou que, por sua vez, o arguido António Pereira, depois de ter
recebido tal ordem e de ter concordado com ela, pô-la em execução, instruindo em
conformidade o Gabinete de Imprensa da autarquia, dirigido por António Pimentel (em
todo o caso, também não se demonstrou o inverso).
Não se provou que, em face da desporporção de verbas pagas aos vários jornais
locais por causa da publicação de publicidade da CMF, desproporção essa favorável ao
“Sovela”, os arguidos Maria de Fátima Felgueiras e António Pereira, através das
condutas descritas, tenham conseguido canalizar a maioria dos montantes que a
autarquia que dirigiam gastava em publicidade para o semanário “O Sovela”,
beneficiando assim este periódico em detrimento dos outros dois existentes naquele
concelho.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Não de demonstrou que os arguidos Maria de Fátima Felgueiras e António
Pereira agiram de forma livre, voluntária e consciente querendo canalizar a maioria dos
montantes que a autarquia que dirigiam gastava em publicidade para o semanário “O
Sovela”, com o intuito de beneficiar este periódico em detrimento dos demais existentes
naquele concelho, usando e abusando para efeito dos poderes que como autarcas
detinham e exerciam, apesar de bem saberem que estavam a violar o princípio da
imparcialidade e isenção a que se encontravam obrigados legalmente, para além de
saberem que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei.
Não se demonstrou, em todo o caso, a matéria de facto alegada pelo arguido
António Pereira Mesquita de Carvalho na sua contestação nos artigos 10º, 11º (parte
final), 15º, 19º, 46º, 47º (na parte em que se refere que a testemunha Pimentel
desobedeceu a instruções), 48º, 49º (no sentido de que a desconformidade entre as
instruções escritas e a publicação dos eventos em causa pela testemunha Pimentel se
tenha devido à razão alegada), 53º, 54º e 55º.
Não se provou ainda a matéria alegada pela arguida Fátima Felgueiras na sua
contestação nos artgs 72º e 73º.
- A propósito do 7º capítulo da pronúncia
Não se provou que, aquando da venda da viatura “Citroën BX” referida nos
autos e da respectiva entrega à testemunha Fernando Sampaio, não se tenha retirado o
corpo do telemóvel “AEG” referenciado nos autos (em todo o caso, também não se
demonstrou o contrário).
Não se demonstrou que a arguida Fátima Felgueiras tenha agido com qualquer
intenção apropriativa relativamente a tal equipamento.
- A propósito do 8º capítulo da pronúncia
Não se provou que a arguida Fátima Felgueiras tenha resolvido aproveitar a
deslocação em causa para gozar umas férias com os seus dois filhos, a expensas do
erário público, no caso da CMF.
Não se provou que, para conseguir que os serviços da autarquia de Felgueiras
pagassem as referidas passagens aéreas e despesas correlacionadas, não só a si, mas
também aos seus filhos, a arguida Maria de Fátima Felgueiras necessitasse que na
factura emitida ficasse apenas a constar a emissão de uma única passagem aérea, em seu
nome.
Não se demonstrou que, para tanto, a arguida Fátima tenha solicitado à
“Navitur” que na factura a emitir apenas fosse referida uma passagem aérea e não três.
Não se demonstrou que estivesse previsto, no programa inicial, que a arguida
Maria de Fátima Felgueiras iria permanecer na cidade de São Vicente durante os dias 10
a 18 de Agosto de 1997.
Não se provou que a arguida Maria de Fátima Felgueiras se tenha locupletado à
custa do erário público da quantia de Esc. 374.802$00 (Esc. 290.402$00 + Esc.
78.200$00 de passagens aéreas + Esc. 6.200$00 de transferes), referente às passagens
aéreas e transferes pagas pela CMF, para que os seus filhos a acompanhassem até Cabo
Verde.
Não se demonstrou ainda que a arguida Maria de Fátima Felgueiras agiu de
forma livre, voluntária e consciente querendo apropriar-se para si e em benefício de
terceiros de dinheiro pertencente ao erário público, no caso à CMF, como efectivamente
se apropriou, usando e abusando para o efeito os poderes e as facilidades que o cargo
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
político que exercia lhe atribuíam, apesar de bem saber que tal conduta era proibida e
punida por lei.
Não se demonstrou por fim a matéria constante dos artgs 86º e 87º da
contestação apresentada pela arguida Fátima Felgueiras.
- A propósito do 9º capítulo da pronúncia
No que respeita à parte introdutória
Não se demonstrou que, para além e sem prejuízo da factualidade dada como
provada a propósito dos pontos 1 a 3 deste capítulo, a CMF, durante o período
compreendido entre os anos de 1997 e 2000, tenha suportado o pagamento de várias
despesas de viagens aéreas de familiares da arguida Fátima Felgueiras.
Não se demonstrou, para além e sem prejuízo da factualidade dada como
provada a propósito dos pontos 1 a 3 deste capítulo, que, sempre que algum dos filhos
da arguida Fátima necessitasse de viajar de avião, ela adquiria os respectivos bilhetes,
em seu nome, cedendo-os de seguida àqueles, apresentando posteriormente nos serviços
da autarquia o respectivo comprovativo, como se tais viagens tivessem sido efectuadas
por ela própria em serviço da autarquia, visando assim a mesma, através de tal esquema,
ser reembolsada do preço desembolsado com tais viagens de avião.
No que respeita ao ponto 1.
Não se provou que o pagamento efectuado pela AMVS à arguida Fátima, a título
de ajudas de custo, tenha sido anterior ao pagamento antecipado dessas mesmas ajudas
de custo por banda da CMF.
Não se provou que a arguida Fátima tenha sido alertada pelos serviços da CMF
para o facto de ter recebido ajudas de custo em duplicado.
Não se demonstrou que ela se tenha locuptado indevidamente de quantia
superior a 35.620$00, cerca de 30% do valor que antecipadamente recebera da CMF a
título de ajudas de custo.
No que respeita ao ponto 2.
Não se provou que, face à matéria de facto que a propósito se deu como
provada, a arguida Maria de Fátima Felgueiras se tenha locupletado à custa do erário
público do preço referente à viagem efectuada pelo seu filho João Felgueiras a França,
apesar de bem saber que tal conduta era proibida e punida por lei.
No que respeita ao ponto 3.
Não se provou que, tendo em conta que a arguida Fátima Felgueiras apenas
apresentou o bilhete de avião que lhe dizia respeito, tenha a nesma recebido
indevidamente o valor de Esc. 18.791$00, assim se locupletando nesse montante,
correspondente à viagem de avião utilizada pela sua filha, Sandra Felgueiras.
Não se provou ainda que a arguida Maria de Fátima Felgueiras agiu de forma
livre, voluntária e consciente querendo-se locupletar à custa do erário público, de forma
sistemática e continuada, de várias quantias a título de viagens de avião efectuadas pelos
seus filhos, como efectivamente se locupletou, tendo para o efeito a mesma apresentado
nos serviços da CMF os respectivos comprovativos como se tivesse sido a própria a
efectuar tais viagens, quando bem sabia que os mesmos não correspondiam à verdade e
que por tal motivo não tinha direito a receber os montantes gastos com tais viagens,
uma vez que as mesmas não foram prestadas no âmbito do serviço público, para além de
mais saber que tais condutas eram punidas e proibidas por lei.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Não se provou ainda a matéria alegada pela arguida Fátima no artº 95º da sua
contestação 2 .
- A propósito do 10º capítulo da pronúncia
No que respeita à introdução
Não se demonstrou que, para além da matéria dada como provada a propósito da
deslocação a Lisboa ao Congresso Nacional do PS, por diversas vezes, a arguida Maria
de Fátima Felgueiras tenha utilizado a viatura “BMW” referida nos autos, conduzida
pelo seu motorista, em deslocações que nada tinham a ver com o serviço do município,
nomeadamente de e para reuniões em Lisboa do Secretariado Nacional, da Comissão
Política e da Comissão Permanente do Partido Socialista.
Para além da matéria dada como provada a propósito da deslocação a Lisboa ao
Congresso Nacional do PS, não se demonstrou que tenha ocorrido qualquer outra
situação de uso da mencionada viatura para fins particulares da arguida Fátima ou de
terceiros.
No que respeita ao uso da viatura “BMW” referida nos autos
Não se provou que a viatura em causa fosse usada exclusivamente pela arguida
Fátima Felgueiras em deslocações de serviço.
Não se provou que a arguida tenha viajado nessa viatura para Lisboa, a fim de
participar no Congresso Nacional do PS.
Não se provou que o convite para o casamento de um dos filhos do Dr. Pais
Martins tivesse sido endereçado à arguida Fátima a título particular e que, assim, a
respectiva deslocação a esse evento social tivesse sido efectuada por ela a título
particular.
Não se demonstrou que ela tenha usado a viatura em causa para fins particulares
em qualquer outra situação (não se demonstrou pois, para além da situação referida, a
matéria genérica constante do intróito com que a pronúncia abre o seu ponto 10.1).
Em todo o caso, também não se provou a matéria alegada nos artgs 97º e 99º
(segunda parte) da contestação apresentada pela arguida Fátima Felgueiras.
No que respeita à utilização do GAPP
Não se provou que tenha sido a arguida Fátima a criar o GAPP.
Não se apurou, em concreto, qual o valor do papel e dos meios informáticos
utilizados nas tarefas referenciadas na matéria de facto dada como provada.
Não se provou a matéria alegada pela arguida Fátima Felgueiras no artº 100º da
sua contestação.
- A propósito do 11º capítulo da pronúncia
Não se provou que em que altura de 1989 a arguida Fátima teve conhecimento
do negócio celebrado entre as testemunhas Sousa Oliveira e Fortunato Sousa (provouse, em todo o caso, que ela teve esse conhecimento em 1989).
Não se provou que em 23.02.1997, a arguida Fátima tenha fixado a coima de
Esc. 1.000.000$00, a Fortunato Alves de Sousa, como representante legal da empresa
2
Note-se que o Tribunal se convenceu que à arguida Fátima lhe foram pagas as passagens aéreas que
adquiriu (referente a três viagens, uma Porto/Lisboa e duas Lisboa/Porto), sendo certo que apenas não foi
entregue na CMF, certamente por lapso, o comprovativo da aquisição da segunda passagem aérea
Lisboa/Porto. Em face deste nosso convencimento, naturalmente que não se demonstrou que a CMF, com
ou sem lapso, tenha liquidado a passagem aéra referente à viagem Porto/Lisboa de Sandra Felgueiras mas
antes a segunda viagem Lisboa/Porto adquirida pela arguida Fátima.
90
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
“F. Sousa & Filho, Lda.”, na sequência da instauração do Processo de Contraordenação, por terem sido executadas obras do loteamento e de urbanização sem o
correspondente alvará de licenciamento;
Não se provou que em 08.03.1997 ela despachou no sentido de ser alterada
aquela coima, no valor de Esc. 1.000.000$00, para admoestação, sem que existisse
qualquer justificação para o efeito;
- A propósito do PIC deduzido
Não se provou qualquer outro facto para além dos que se deram como provados
a propósito da matéria constante da pronúncia, designadamente, que o município de
Felgueiras tenha ficado lesado nas quantias referidas nos artgs 3º, 4º, 5º, 6º, 7º, 8º, 9º
(provou-se que a arguida Fátima locuptou-se indevidamente na quantia de 35.625$00),
11º, 13º e 14º, do PIC deduzido 3 .
- A popósito das condições sócio-económicas dos arguidos e respectivos
percursos de vida
Não se demonstrou qualquer outra matéria para além da que se deu como
provada (a qual aliás, na essência, traduz, ainda que por outras palavras, a quase
totalidade do que a propósito foi alegado por alguns arguidos nas respectivas
contestações).
c) - A CONVICÇÃO DO TRIBUNAL:
O tribunal alcançou a sua convição ponderando de forma conjugada os
depoimentos dos arguidos que quiseram depôr, os testemunhos produzidos e os
documentos analizados na audiência de julgamento da forma que a seguir se explicitará.
Por outro lado, dado o elevado número de intervenientes (acidentais e não
acidentais) que prestaram declarações e a evidente complexidade dos autos, optou-se
por reproduzir por súmula 4 as respectivas declarações (possibilitando assim que melhor
se possa escrutinar a forma como o Tribunal as filtrou) e, quando se justifique, procurarse-á relacionar os respectivos depoimentos com os documentos pertinentes constantes
dos autos.
Assim:
- A convicção do Tribunal a propósito do 1º capítulo da pronúncia
Introdução
Reprodução por súmula dos depoimentos prestados a esse propósito
- Arguida Fátima Felgueiras
Referiu ter sido eleita pelo PS nas eleições locais de Dezembro de 1989, numa
altura em que não era militante do partido, assumindo a função de vereadora na CMF
entre Janeiro de 1990 e Outubro de 1995, com o pelouro da educação, cultura, acção
3
A factualidade alegada nos args 10º e 15º do PIC não foi objecto de apreciação na medida em que o
arguido Barbieri não foi pronúnciado pela prática do alegado crime de peculato que lhe está na base
(emerge aliás dos autos que ele devolveu a totalidade da quantia que recebera da CMF a título de
antecipação de ajudas de custo, no montante de 118.750$00).
4
Tratando-se de uma reprodução por súmula, não se trata, como é bom de ver, de uma reprodução ipsis
verbis de tudo quanto foi dito, pelo que o resumo dos depoimentos prestados pressupôs por parte do
Tribunal uma actividade interpretativa de todas as declarações prestadas.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
social, desporto e habitação. Nessa altura era presidente da autarquia o arguido Júlio
Faria, até ter sido eleito deputado na Assembleia da República nas eleições legislativas
ocorridas em 1995.
Salientou que apenas em Julho de 1995 teve conhecimento de que o arguido
Júlio Faria tinha a intenção de se candidatar a um lugar de deputado na Assembleia da
República, integrando a lista do PS, sendo certo que as listas dos candidatos não são
divulgadas antecipadamente e, devido a movimentações internas no partido, são
formuladas e reformuladas até à última hora antes de serem apresentadas, de sorte que
ignorava se ele iria ocupar na lista um lugar elegível. Em todo o caso, não era
expectável que Felgueiras tivesse um candidato elegível nas listas do PS, elaboradas
pela Federação Distrital do Porto do partido
Nega que perspectivasse suceder ao arguido Júlio Faria à frente dos destinos da
CMF (não obstante na altura ser vice-presidente da CMF), dando conta da grande
oposição interna a esse facto, no seio do PS de Felgueiras, oposição essa que se
verificou quer quando integrou as listas do PS de Felgueiras em lugar elegível nas
eleições autárquicas de Dezembro de 1989, quer quando assumiu o comando dos
destinos da autarquia a partir de Outubro de 1995 (parece que terá sido apartir de
Agosto de 1995, visto que o arguido Júlio Faria suspendeu o seu mandato nessa altura)
e ainda quando se apresentou como canditada a presidente da CMF nas listas do PS nas
eleições autárquicas de 14 de Dezembro de 1997.
Nega terminantemente ter engendrado qualquer esquema de angariação de
fundos com vista às eleições autárquicas de 1997, descrevendo a forma como são
organizadas as campanhas eleitorais, com a nomeação de comissões encarregues de
levar a cabo as diferentes actividades necessárias ao decurso da campanha eleitoral,
entre as quais a recolha de fundos, dando conta que, como cabeça de lista do PS local,
apenas lhe cabia dirigir a campanha eleitoral em termos de orientação política,
alheando-se de todo em todo da recolha de fundos, que cabia aos arguidos Horácio
Costa e Joaquim Freitas, razão aliás pela qual foi aberta em nome deles a conta do BES
referida nos autos e sobre a qual não tinha qualquer poder de disposição, ignorando de
todo em todo os respectivos movimentos, bem como quem oferecia os donativos e em
que montante.
De resto, salientou ser normal em todas as eleições locais e em todos os partidos
a abertura de uma conta paralela, isto é, uma conta “não oficial” do partido (ignorando
em todo o caso se tal foi feito nas eleições autáquicas de 1993).
Nega terminantemente alguma vez ter reúnido com os arguidos Júlio Faria,
Vítor Borges e Carlos Marinho, estes na altura pertencentes aos quadros da “Resin”,
com os objectivos descritos na pronuncia e que alguma vez os valores das empreitadas
adjudicadas tenham sido sobreavaliados com o desiderato ali referido.
De resto, referiu ter conhecido o arguido Vítor Borges em Outubro de 1995 e o
arguido Carlos Marinho apenas no ano passado no T.J. de Guimarães, aquando da
realização do debate instrutório a que se reportam estes autos.
Nega terminantemente alguma vez ter controlado ou instrumentalizado os
órgãos decisórios da CMF (aliás compostos também por elementos da oposição,
designadamente no executivo, onde três veradores foram eleitos por listas de outros
partidos que não do PS) ou a AMVS.
Referiu que a “Resin”, à data, era das únicas empresas a operar em Portugal que
tinha os conhecimentos necessários para o tratamento dos lixos domésticos e industriais,
sendo certo que essa empresa – conforme é aliás habitual – se consorciou com outras
empresas a fim de concorrer aos concursos abertos e relativos à construção de aterros e
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
tratamento dos lixos, assim ultrapassando o facto de não ter alvará de construção civil e
obras públicas.
Revelou desconhecer os fluxos financeiros existentes entre as empresas ali
referidas, admitindo como verídica essa matéria, justificando a transferência de verbas
para a “Resin” pelo facto de sempre ter sido ela quem tratou os lixos no concelho, na
lixeira de Sendim, ainda que sem qualquer contratualização em alguns períodos, e das
relações de consórcio estabelecidas entre umas e outras.
Nega a existência de concursos simulados (mas não deu uma explicação
satisfatória para o facto da “Resin” ter enviado uma lista das empresas a contactar a fim
de serem oponentes, conforme referido na pronúncia).
- Arguido Júlio Faria
Referiu que suspendeu o seu mandato como presidente da autarquia
Felgueirense a 03.08.95, data que coincidiu com a última reunião camarária a que
presidiu.
Na sequência da sua eleição como deputado na Assembleia da República, nas
eleições legislativas ocorridas em Outubro de 1995, renunciou ao mandato de presidente
da CMF.
Esclarece que em finais de Junho ou princípios de Julho de 1995 a Federação
Distrital do PS havia elaborado a lista de candidatos e o depoente foi colocado em 14º
lugar dessa lista, portanto em lugar elegível.
Acrescentou que foi contactado nessa altura para integrar a dita lista,
manifestando disponibilidade para tal pelo facto de já ser presidente da CMF há cerca
de 10 anos (foi presidente da CMF entre 1986 e 1995; antes disso foi vereador).
Foi só nessa altura que comunicou esse facto à arguida Fátima Felgueiras, sendo
certo que entendia que ela tinha condições para se candidatar à presidência da CMF nas
eleições de Dezembro de 1997.
A propósito da campanha eleitoral para as eleições autárquicas de 14.12.97,
referiu que a Comissão Política do PS de Felgueiras convocou os militantes e
simpatizantes para se organizar a respectiva campanha, com a organização dos
diferentes “pelouros”, entre os quais o das finanças, responsável pela recolha de fundos
(a primeira reunião ocorreu a 09.07.97, conforme “acta” junta aos autos no decurso da
audiência de julgamento).
Esse “pelouro das finanças” foi integrado pelos arguidos Horácio Costa e
Joaquim Freitas, bem como pelo Sr. Dinis. Mais tarde outras pessoas diligenciaram
também pela recolha de fundos para a campanha eleitoral.
A angariação de fundos decorreu conforme era habitual, isto é:
- Procedia-se à obtenção de fundos junto das pessoas que pudessem apoiar
financeiramente a campanha eleitoral do PS;
- Procedeu-se à abertura de uma conta bancária com vista ao depósito dos
donativos recolhidos (normalmente titulada por elementos do “pelouro das finanças”),
sendo certo que na conta oficial do partido praticamente apenas se depositavam as
quotas dos militantes e as verbas destinadas à gestão corrente do PS. Justificou assim a
não utilização dessa conta oficial do partido para o depósito dos donativos para a
campanha eleitoral, até porque nesta participavam elementos que não eram militantes do
PS.
Referiu que não lhe foi dado conhecimento da abertura da conta do BES, titulada
pelos arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas, sendo certo que nunca teve
conhecimento das respectivas movimentações nem poder de facto para dispor do
dinheiro depositado em tal conta, tanto mais que em 1997 estava já afastado da
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2º Juízo
intervenção política em Felgueiras (não obstante, era membro da Comissão Política do
PS de Felgueiras desde 1978).
Aliás, referiu que, enquanto candidato à presidência da CMF em anteriores
eleições, nunca se ocupou da angariação de fundos, sendo certo que acerca disso
nenhuma informação era prestada à direcção de campanha, mais ocupada em iniciativas
de cariz político.
Na campanha de 1993 referiu que o Dr. Sousa Oliveira (ex-marido da arguida
Fátima Felgueiras) era candidato à Assembleia Municipal, não se recordando se
integrou ou não o “pelouro das finanças”.
Na campanha eleitoral de 1997 também a questão da angariação de fundos não
foi abordada ao nível da direcção de campanha, sendo certo que só viu o Horácio Costa
na 1ª reunião da Comissão Política (antes já o conhecia, por ser assessor da CMF – com
funções que em concreto desconhece –, mas não tinha com ele grande relacionamento).
De resto, o depoente integrava a “comissão coordenadora”, que se ocupava
apenas da coordenação das acções de campanha (e onde se abordava a estratégia a
seguir), e fê-lo dada a sua experiência eleitoral e porque era membro da Comissão
Política do PS de Felgueiras desde 1978.
Referiu não se recordar porque razão foram escolhidos os arguidos Horácio
Costa e Joaquim Freitas para integrar o “pelouro das Finanças” (embora parta do
pressuposto de que não mereciam quaisquer reservas da presidente da Comissão Política
do PS de Felgueiras, a arguida Fátima Felgueiras), não confirmando que alguma vez os
mesmos se tivessem reunido em sua casa para debaterem a composição desse pelouro (o
Joaquim Freitas, em todo o caso, esteve várias vezes em sua casa e o Horácio Costa –
que se lembre - esteve uma vez em sua casa, acompanhado do arguido Bragança, por
motivo de assuntos particulares e que nada tiveram a ver com a campanha eleitoral).
Seja como for, reconheceu que o manuscrito de fls 156 do 1º volume é da sua
lavra (alusivo ao “pelouro das finanças”), expressando não se recordar onde o elaborou
nem onde o entregou aos arguidos Joaquim Freitas e Horácio Costa, sendo certo que tal
documento terá sido elaborado aquando das primeiras reuniões da Comissão Política.
Salientou o facto de suspeitar que tal documento não está completo, sendo certo
que é uma mera súmula de uma das reuniões quanto às necessidades a que o dito
“pelouro das finanças” deveria dar resposta.
A expressão “se assim for entendido dar conhecimento à candidata” mais não
significa do que, se assim for entendido, deveria dar-se conhecimento à arguida Fátima
Felgueiras das contribuições mais significativas.
Salientou nunca ter dado ordens aos arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas
para o pagamento de algumas contas, já que não eram seus subordinados, pois quando
muito chamava a atenção para o seu pagamento, de que o manuscrito de fls 171, do 1º
volume, é, na sua óptica, exemplo (não se recorda a quem deixou esse “post-it”, mas
terá sido a um dos elementos do “pelouro das finanças”).
Expressou desconhecer as relações estabelecidas entre a “Resin” e outras
empresas, designadamente as referidas na pronúncia.
Na altura da campanha eleitoral referida já conhecia o arguido Vítor Borges
(mas não conhecia o arguido Carlos Marinho), pois conheceu-o no 1º semestre de 1993
aquando de uma apresentação efectuada pela “Resin” enquanto empresa especializada
no tratamento do lixo, num encontro com autarcas da AMVS num hotel em Lousada.
A “Resin” era então a única empresa com conhecimento e capacidade para tratar
do lixo.
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2º Juízo
Explicou que na altura a recolha do lixo era um problema grave em Felgueiras,
sem qualquer tratamento, visto que era depositado sem mais na lixeira de Sendim, onde
ocorriam frequentes incêncios por força da combustão desses lixos assim depositados.
Recorda-se que em 1982 – era o depoente vereador – os lixos eram depositados
em Pombeiro, o que motivou fortes protestos da população, razão pela qual os lixos
passaram a ser depositados por favor em Sendim, entre 1982 e 1986, em terrenos
pertencentes ao Eng. Menezes Basto.
Salientou que em virtude da forte pressão do dono do terreno onde estava
implantada a lixeira no sentido da CMF pôr termo à deposição do lixo naquele local
(ameaçando mesmo impedir a deposição do lixo naquele local) e dado o facto de
inexistir local alternativo (em 1992 havia-se vedado e efectuado algumas obras num
terreno em Barrosas, mas a deposição do lixo nesse local não foi avante em face dos
protestos populares), em finais de Agosto de 1993 contactou a “Resin”, na pessoa do
arguido Vítor Borges, tendo então decorrido conversações entre este, o depoente e o
Eng. Menezes Basto, de que resultou a concessão por este de uma moratória na
deposição do lixo no seu terreno em Sendim.
- Arguido Vítor Borges
Esclareceu que a “Resin” constituiu-se em Fevereiro de 1989, tendo obtido um
acordo com uma empresa francesa com “know how” na área da recolha, transporte e
tratamento do lixo, pagando-lhe por isso uma verba.
Tal empresa (France Déchets) acabou por deter 45% do capital social da
“Resin”, na altura uma sociedade por quotas.
Referiu que o primeiro contacto que a “Resin” teve com o Vale do Sousa
ocorreu em inícios de 1993 numa reunião com a AMVS destinada a apresentar aquela
empresa, na altura pioneira na prestação de serviços na recolha, transporte e tratamento
de lixos.
Os presentes ficaram agradados com tal apresentação, tendo sido nessa mesma
reunião que conheceu o arguido Júlio Faria (só em 1995 viria a conhecer a arguida
Fátima Felgueiras).
Nessa reunião deu conta aos autarcas da possibilidade de candidatura a fundos
comunitários para financiar projectos na sua área de intervenção, tendo então ficado a
aguardar contactos.
Sucede que em Julho ou Agosto de 1993, estando o arguido de férias no Algarve
(acha que é mais provável ter sido em Agosto pois é nesse mês que normalmente passa
férias), recebeu um telefonema de Felgueiras, tendo-lhe sido dado conta que o
presidente da autarquia tinha urgência em falar consigo.
A situação assumia foros de urgência, pois o arguido Júlio Faria encontrava-se
em pânico ante a eminência do fecho da lixeira de Sendim e a falta de alternativas para
a deposição dos lixos (segundo lhe transmitiu, o proprietário do terreno – a testemunha
Menezes Basto – iria impedir a deposição do lixo no seu terreno em Sendim a partir da
Segunda-feira próxima).
Acedeu então em deslocar-se do Algarve a Felgueiras para falar com a
testemunha Menezes Basto.
Explicou que na altura a “Resin” tinha necessidade de construir em Portugal,
ainda que a custos de produção, um protótipo do tipo de obra que poderia realizar de
modo a poder mostrar o trabalho desenvolvido a potenciais clientes.
Uma vez chegado a Felgueiras, reuniu-se de imediato com o arguido Júlio Faria,
o qual o colocou em pormenor a par da situação (basicamente nos termos descritos por
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2º Juízo
este arguido), informando-o que a testemunha Menezes Basto não queria receber sequer
o dito Júlio Faria.
Foi então a Sendim falar com o dito Eng. Menezes Basto e apresentou-se,
dizendo-lhe que vinha da parte do arguido Júlio Faria. Em face dessa apresentação foi
muito mal recebido, mas conseguiu encetar com ele uma conversa que durou cerca de 2
horas e garantiu-lhe que resolvia o problema da lixeira de Sendim do seguinte modo:
- Em 6 meses faria uma reabilitação visual do local, por forma a fazer cessar os
cheiros e insectos no local provocados pela lixeira;
- Taparia os lixos depositados (de modo a evitar a respectiva combustão).
Por imposição da testemunha Menezes Basto teve de convencer também a
respectiva esposa, o que aliás conseguiu.
Ficou então acordado que a “Resin” poderia avançar com a reabilitação do local.
Teve então com o Eng. Menezes Basto várias outras reuniões, sendo certo que
ele só aceitava o depoente como interlocutor.
Avisou porém o depoente que nada lhe iria pagar pois entendia que era a CMF
que deveria pagar a reabilitação.
Numa reunião em que estiveram presentes o depoente, o arguido Júlio Faria e a
testemunha Menezes Basto, foi apresentado o estudo da reabilitação da lixeira de
Sendim e o respectivo custo (cerca 34.0000 cts.), segundo orçamento fornecido pela
“France Déchets” em Setembro de 1993.
Sucede que devido ao facto de não ser da propriedade da CMF o terreno onde tal
lixeira estava implantada existiam constrangimentos administrativos que impediam a
edilidade de directamente pagar à “Resin” os serviços a prestar.
Uma das hipóteses colocadas seria o pagamento de uma renda superior pela
CMF ao Eng. Menezes Basto, parte da qual reverteria para a “Resin”.
Porém, convenceu a testemunha Menezes Basto a vender o terreno à CMF pois
alertou-o de que, por força de legislação comunitária que iria ser aprovada, os
proprietários dos terrenos onde estivessem implantadas lixeiras iriam ser
responsabilizados pela alteração da qualidade ambiental, o que certamente lhe traria
custos avultados.
Por essa razão ele desistiu de renegociar os termos do contrato de arrendamento
com a CMF e decidiu-se a vender o terreno referido.
Antes da decisão de avançar com os trabalhos quis mostrar ao Eng. Menezes
Basto um aterro sanitário em França, aproveitando o facto dele ir de férias com a família
para França. Consequentemente, tal aterro sanitário foi-lhe mostrado por um
responsável da “France Déchets” e ele ficou fascinado com o que viu.
Entretanto, a recuperação interna da lixeira ficaria a aguardar a concessão de
fundos comunitários, sendo certo que se passaram meses em negociações entre o Eng.
Menezes e a CMF.
Entre fins de 1993 e princípios de 1994 (algures entre Novembro de 1993 e
Janeiro de 1994) iniciaram-se os trabalhos na lixeira de Sendim (vindo de França uma
máquina de compactação a 10.12.93 – que no mercado custava cerca de 35.000 cts -,
com os respectivos técnicos - cfr. documento junto na audiência de julgamento).
Confrontado com o documento em causa, adiantou que os trabalhos nunca se iniciariam
antes da data da vinda da referida máquina de compactação de França para Portugal
(razão pela qual os trabalhos ter-se-iam iniciado em Dezembro de 1993 e durante um
período de 6 meses, isto é, até Maio de 1994).
Assegurou que a “Resin” não retirou qualquer lucro da operação de reabilitação
em causa, visto que pagou 24.500 cts aos franceses e colocou no local dois seguranças,
um porteiro e um encarregado, além de que teve de pagar o transporte de terra.
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2º Juízo
O depoente assegurou não ter tido qualquer participação na realização do
contrato de transacção e respectivo aditamento.
O Eng. Menezes Basto apenas lhe disse que o pagamento dos 34.000 cts estaria
assegurado e que, na sequência da conversa que teve com ele, iria vender o terreno à
CMF “por vinte e tal mil contos”.
Os pagamentos efectuados pelo Eng. Menezes de Basto foram efectuados em
prestações (não pôs em causa que os pagamentos tenham sido efectuados conforme
descrito na pronúncia), negando terminantemente a existência de qualquer retorno ou
sequer qualquer pagamento da “Resin” em numerário nos termos descritos no
mencionado despacho.
Admite que possa ter pressionado a CMF a pagar ao dito Eng. Menezes Basto
para assim obter também o respectivo pagamento, mas assegurou não se recordar desse
facto.
Tem a ideia de que os pagamentos só aconteceram depois de terminada a
reabilitação visual da lixeira.
O arguido Carlos Marinho, por seu turno, segundo se lembra, foi contratado para
trabalhar na “Resin” em 1990 ou 1991 (cfr. em todo o caso o respectivo contrato de
trabalho, junto com a sua contestação). Posteriormente o arguido Vítor Borges corrigiu
as suas declarações, afirmando então que o arguido Carlos Marinho foi admitido ao
serviço da “Resin” apenas em 1993, com responsabilidade na área da contabilidade da
empresa e passando a ser o respectivo director financeiro quando a “ECOP” vendeu as
suas acções da “Resin” (onde chegou a deter 20% do capital).
A propósito da “Translousada” e da “Norlabor” (que têm sócios comuns) referiu
que a “Resin” procurou empresas locais para lhe prestarem serviços de subempreitada
nos aterros pois os custos seriam menores. A “Resin” não procedia a trabalhos de
empreitada (limitava-se praticamente a empregar o seu “know how” e a dirigir os
trabalhos), subempreitando a empresas locais a execução das empreitadas, por
representar menores custos, e não por não dispor de alvará para o efeito (pois poderia
usar o alvará da sua accionista).
Confirmou a celebração do contrato de consórcio com a “Translousada” (cfr.
doc. de fls 145 do apenso 97) pelas seguintes razões:
1ª - Havia a necessidade de ter um consorciado com alvará (não faria sentido
utilizar o alvará da sua accionista “Sita” dada a dimensão pouco relevante da obra para
esta empresa; se usasse esse alvará teria desnecessariamente custos acrescidos pois teria
de lhes pagar);
2ª - Era um “cartão de visita” para a “Translousada” (com reflexos favoráveis
para a imagem desta empresa junto de potenciais clientes).
Por outro lado, a única irregularidade que se verificou nos trabalhos executados
para a AMVS foi o facto de inexistir base administrativa legal para que a autarquia
pudesse pagar à “Resin”.
De facto, quando a “Resin” terminou o trabalho de reabilitação da lixeira de
Sendim, andaram um a dois anos sem que fosse concretizado o pagamento da
exploração dessa lixeira por não haver suporte legal.
Recorda-se de ter pressionado a CMF a pagar os trabalhos referentes à
exploração do aterro e de facturar directamente à CMF. Porém, no final do ano, foi
chamado à CMF e explicaram-lhe que rejeitavam essas facturas pois não havia base
legal para as pagar. Foi por isso que fizeram o concurso a que se reporta o ponto 1.3. da
pronúncia.
Fez-se pois o concurso referido no ponto 1.3. da pronúncia, sendo certo que o
arguido Barbieri remeteu-lhe um fax a pedir que informasse de empresas que poderiam
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
ser convidadas a apresentar propostas por estarem habilitadas a executar os trabalhos
pretendidos, o que fez (o original de tal documento de resto encontra-se no dossier
respeitante ao processo administrativo desse concurso limitado, conforme se verificou
na audiência de julgamento).
Ora, o legal representante da “Translousada” disse-lhe para indicar as firmas
“Craveira” e “João Tello”, o que fez no referido fax.
De resto, com o arguido Barbieri Cardoso apenas teve contactos de índole
técnica e que se prendiam com o andamento dos trabalhos.
Explicou ainda que pelo facto da “Translousada” e da “Norlabor” ter sócios
comuns, confunde as duas firmas, sendo certo que esta última quase sempre trabalhou
na realbilitação da lixeira e trabalhou sempre na respectiva exploração. Recebeu aliás
dela reclamações pelos atrasos no pagamento dos serviços que prestou para a “Resin”,
atrasos esses que chegaram ao montante de 30.000 cts, o que tinha grande relevância
para ela dada a sua pequena dimensão.
- Arguido Carlos Marinho
Salientou que só começou a trabalhar na “Resin” a 15.09.93, data em que
assinou o respectivo contrato de trabalho (conforme documento constante de fls 7031
do volume 27-A). Ocupou-se então da área contabilistica e fiscal da empresa. A parte
financeira da empresa era então assumida pelo Sr. Florentino Borges, entretanto
falecido.
Cabia-lhe assim tratar contabilisticamente os documentos (como por ex.
facturas, recibos, notas de débito, notas de crédito), elaborar balancetes mensais, fazer
análises à rentabilidade da empresa, processar os salários (tarefa que mais tarde foi
atribuída a uma pessoa contratada para o efeito).
Salientou que não participava em actos de gestão da empresa.
Apenas tomou conhecimento da existência das empresas “ECOP” e “SITA”
porquanto entraram para o capital social da “Resin”, altura em que a “Resin” passou a
ter um novo director financeiro (Luciano Barreira, provindo dos quadros da “ECOP”).
Travou conhecimento com as empresas “Translousada” e “Norlabor” devido às
relações comerciais que estabeleceram com a “Resin”.
De facto, a “Translousada”, que fazia terraplanagens, trabalhou para a “Resin”
na lixeira de Sendim desde o início dos trabalhos de reabilitação (Dezembro de 1993)
até pelo menos ao início da exploração do aterro. Tal empresa também alugou
equipamento à “Resin”, equipamento esse que operava em Sendim.
A “Norlabor” encetou relações comerciais com a “Resin” depois de 1993, visto
que efectuou serviço idêntico na lixeira da Lustosa, tendo igualmente alugado
equipamento à “Resin” nos trabalhos executados na Lustosa.
A “Craveira” nada lhe diz.
Da “Translousada” conhecia o Sr. Carlos Silva e o Dr. Carlos Sousa.
Na altura não lhe foi dado a conhecer a celebração do contrato de consórcio
entre a “Resin” e a “Norlabor” referido nos autos, desconhecendo igualmente em que
circunstâncias foi celebrado tal contrato. Aliás, só dele teve conhecimento já no decurso
do presente processo.
À epoca não sabia que o Dr. Carlos Sousa era sócio comum da “Translousada” e
da “Norlabor”.
Nega a existência do esquema referido na pronúncia no que a si concerne.
- Arguido Barbieri Cardoso
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2º Juízo
Começou por referir que foi admitido ao serviço da CMF em Setembro de 1980
como chefe dos Serviços Técnicos de Obras.
Em 22.05.85 foi nomeado director do Departamento Técnico.
Como director do Departamento Técnico cabia-lhe dirigir a actividade do
respectivo departamento, respondendo directamente perante o executivo municipal.
Explicou que os chefes de divisão têm uma função mais operativa e que respondem
perante o respectivo chefe de departamento.
Participa em reuniões de coordenação (onde participa a presidente da edilidade,
os vereadores, os directores de departamento e eventualmente os chefes de divisão). Por
norma as decisões de lançamento dos concursos de obras são tomadas nas reuniões de
coordenação.
Salientou os deveres de lealdade, sigilo e obediência a que está sugeito enquanto
funcionário camarário perante o respectivo executivo.
Em traços gerais, explicou a estrutura organizativa da CMF (cfr. a fls 28 a 37 do
apenso 137 a estrutura organizativa da CMF).
Em 19.05.2000 foi nomeado director do Departamento de Planeamento (cfr. fls
67 e ss. do apenso 137).
Além disso era coordenador técnico da ADERSOUSA, daí ter travado
conhecimento com os presidentes de câmara do Vale do Sousa (aliás, antes de tomar
certas decisões a AMVS ouvia-o).
Para além dessas funções, é sócio da “Ambiedica, Ldª” (uma empresa que
desenvolve a sua actividade na área imobiliária) e “Ambienta, Ldª” (sociedade que
elabora projectos de construção civil), assegurando que nunca teve funções executivas
nesta última, sendo certo que há já cerca de 3 anos que nela não exerce qualquer função,
tendo inclusive decidido deixá-la, o que ainda não se concretizou.
Explicou que o Eng. Adelino Leite era o responsável pela área de infraestruturas de ambiente (águas, saneamento e recolha de resíduos), sendo certo que como
era engenheiro electrotécnico e de máquinas não tinha qualificação técnica para apreciar
as propostas apresentadas em concursos de obras de construção civil.
Em face das funções que exercia era ele quem sempre teve mais intervenção nas
relações com a “Resin” e que justificou a emissão das respectivas facturas.
Quanto à problemática da recolha dos resíduos sólidos urbanos no concelho
felgueirense, descreveu a lixeira de Sendim como um “inferno”, em que os resíduos
entravam em auto-combustão e exalavam um cheiro nauseabundo, tendo-se chegado a
esse ponto dado o contínuo e crescente aumento da recolha de resíduos, em face do
crescimento enconómico e da alteração dos hábitos de consumo, que determinou aliás
também a alteração da natureza dos lixos produzidos (em 1981 recolhiam-se
semanalmente 27 toneladas; em 1985 65,5 toneladas semanais; em 1989 105 toneladas
por semana; em 1991 150 toneladas semanais; e em 1992 43,5 toneladas por dia, dos
quais 54% eram resíduos sólidos urbanos e 46% resíduos industriais banais – tratam-se
de valores estatísticos em função de amostragens efectuadas, visto que não havia na
altura báscula para pesar os camiões. Só a partir de Abril de 1996 é que esse
equipamento se encontrava a operar na lixeira).
Explicou que integrou a Comissão de Análise quer no que se refere ao concurso
a que se reporta o ponto 1.3 da pronúncia quer no ajuste directo a que se reporta o ponto
1.4 da mesma peça processual em face das funções que exercia na CMF, sendo certo
que a análise das propostas foi relativamente simples e teve a ver essencialmente com os
preços apresentados.
Por outro lado, nos concursos da AMVS era hábito nomear-se para a Comissão
de Análise um técnico do município onde a obra iria ser implantada, já que a dita
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2º Juízo
associação não dispunha de técnicos próprios para o efeito. Foi pois nesse contexto que
também integrou a Comissão de Análise nos concursos a que se reporta o ponto 1.5,
sendo certo que o depoente era já um elemento conhecido devido às funções que
também desempenhava na ADERSOUSA.
Nega terminantemente que alguma vez tenha sido influenciado directa ou
indirectamente nas apreciações que fez das diversas propostas apresentadas.
A propósito do tratamento dos resíduos (produção do lixo – recolha –
eliminação/reciclagem), referiu que teve várias reuniões com a Direcção Regional e
com o Ministério do Ambiente desde 1995.
Nas lixeiras o tratamento dos resíduos reconduz-se ao fim ao cabo à
compactagem do lixo e à sua movimentação de modo a criar plataformas, bem como à
cobertura com terra por forma a melhor permitir a decomposição dos resíduos
orgânicos.
Tratam-se pois de vasadouros controlados.
É este tipo de trabalhos que estavam em causa no concurso a que se reporta o
ponto 1.3 da pronúncia e no ajuste directo a que se alude no ponto 1.4 da mesma peça
processual.
Havia a expectativa de prolongar o tempo de vida útil da lixeira e obviar ao
perigo de desmonoramento com a criação de plataformas, sendo certo que 1 tonelada de
lixo representa 2 m3 de lixo doméstico e 3 m3 de resíduos industriais banais.
Em 02.07.99 na lixeira de Sendim deixou de haver depósito de lixo doméstico e
só em meados de 2001 é que também se deixou de depositar os resíduos industriais
banais, altura em que começaram a ser depositados no aterro RIB quando este ficou
totalmente concluído.
Explicou que a propósito da concepção/construção (selagem da lixeira e
construção do aterro)/exploração a “Resin” apresentou a melhor solução técnica, pois
previa o enfardamento dos resíduos e assim uma melhor compactagem, além de uma
mesa de triagem dos resíduos, assim dininuindo o espaço utilizado e,
consequentemente, prolongando o tempo de vida útil do aterro.
Assim, no concurso internacional a que se faz alusão no ponto 1.5, confirmou
que abertura de propostas teve lugar a 18.07.97, a 28.11.97 efectuou-se a adjudicação, a
23.01.98 celebrou-se o contrato de empreitada e a 08.05.98 efectuou-se a consignação,
tendo sido concluída a obra em Dezembro de 2000 e iniciada a sua utilização em Julho
de 2001 (a deposição dos resíduos industriais banais na lixeira fazia também parte do
concurso enquanto ela não fosse selada).
A escolha da localização do aterro prendeu-se com questões técnicas, pois era
adequado do ponto de vista geotécnico, além de que no local já existia a lixeira de
Sendim e que era necessário selar, possibilitando o respectivo controle da qualidade
ambiental com menores custos.
Recorda-se que a escolha daquela localização para o aterro provocou protestos
(segundo a arguida Fátima Felgueiras não era expectável que essa localização criasse
resistência pois já ali existia a lixeira; porém, esses protestos ocorreram e foram
fomentados pela oposição ao executivo camarário, tendo sido criada uma associação
que intrepôs 3 providências cautelares para impedir a construção do aterro naquele
local).
- Arguido Horácio Costa
Segundo referiu, iniciou funções na CMF em Outubro de 1996.
Explicou que tinha sido aluno da arguida Fátima Felgueiras quando esta
leccionava na Escola Secundária de Felgueiras.
100
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Chegou a ganhar um prémio por ser o melhor aluno, que recebeu na CMF, sendo
certo que a arguida Fátima Felgueiras estava presente.
Foi também aluno do ex-marido da arguida Fátima Felgueiras.
Certo dia deslocou-se à CMF a propósito de um investimento de uma empresa
do seu sogro no concelho (na altura o depoente dava aulas e trabalhava a tempo parcial
para o sogro) e por acaso encontrou-se com a arguida Fátima Felgueiras, a qual, tendo-o
reconhecido, entabularam conversa, na sequência da qual ela perguntou-lhe se não
queria exercer funções na CMF.
Ela queixava-se que estava sozinha (dos 3 vereadores do PS só um exercia
funções efectivas) e que “precisava de sangue novo”.
Propôs-lhe então a celebração de um contrato de prestação de serviços,
exercendo assim funções de assessor.
O seu cunhado Bragança da Cunha (também arguido neste julgamento) fez a
ponte entre os dois. Salientou porém que não foi por intermédio dele que ingressou na
CMF, tanto mais que a arguida Fátima Felgueiras não nutria apreço pelo seu cunhado,
razão pela qual não lhe iria fazer favores.
Assim, a 01.10.96 iniciou funções como assessor da Presidente da CMF (até
Dezembro de 1998), por 290 cts mensais, tendo como tarefa tratar dos assuntos
relacionados com o Centro Coordenador de Transportes (mais tarde redenominado de
Centro de Camionagem) e tinha de estar disponível para o que fosse necessário para
auxiliar a arguida Fátima Felgueiras, sendo certo que só dela recebia ordens, razão pela
qual aliás ela lhe delegou competências.
Tinha a obrigação de apresentar um relatório mensal da execução das tarefas de
que era incumbido.
Consequentemente, na prática, exercia funções mais vastas que aquelas que
constavam do objecto do contrato que celebrou com a CMF.
Assim, para além do Centro Coordenador de Transportes, teve intervenção no
conjunto habitacional da Longra (no arrendamento de apartamentos e na venda de lojas
e garagens); na venda de lotes de um terreno na Lixa para construção em altura (onde se
procedeu à limpeza do espaço e à formalização do loteamento); à venda de lotes
camarários dispersos por todo o concelho; teve intervenção na reabilitação do
Cineteatro Fonseca Moreira e da “Casa do Curral” (edifício adquirido pela CMP após
muitas negociações com o respectivo proprietário e onde viria a ser instalado um pólo
do Instituto Superior Politécnico do Porto); na zona das “Portas da Cidade” encetou
diligências junto dos proprietários de terrenos nessa zona com vista à respectiva
aquisição por banda da CMF; teve intervenção nas negociações que conduziram à
demolição de um edifício numa das entradas da cidade de Felgueiras e, de uma forma
geral, teve intervenção ao nível do património imobiliário da CMF, o que o obrigava a
ter um contacto estreito com os serviços camarários, pois era necessária a execução de
obras de vária ordem nesses espaços e antes de mais tinha necessidade de identificar os
espaços junto dos serviços camarários e saber o que neles era possível construir (assim
se inteirando do património imobiliário do Município Felgueirense e do seu respectivo
valor patrimonial).
Ainda título de exemplo da estreita colaboração que mantinha com os serviços
camarários, referiu que na preparação do orçamento camarário para 1997 a testemunha
Terezinha pôs-lhe num dos gabinetes uma série de documentos de modo a que o
depoente colocasse as questões que entendesse acerca dos custos e dos investimentos na
área do património imobiliário da CMF, entre os quais o Centro Coordenador de
Transportes.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
No início exerceu as suas funções num gabinete minúsculo situado no edifício
da CMF, que partilhava com mais pessoas, como por exemplo o presidente da
Assembleia Municipal de Felgueiras (que na altura era o ex-marido da arguida Fátima
Felgueiras) e, durante algum tempo, com a D. Cândida (funcionária camarária), numa
altura em que a testemunha Leonor era recepcionista da parte política da CMF.
Era também um gabinete de apoio à presidente da edilidade, razão pela qual
chegou a ausentar-se do local para que ela pudesse efectuar telefonemas.
Era suposto ter ocupado um gabinete no Centro Coordenador de Transportes, na
altura ainda em construção (durante cerca de 1 ano). Acabou por nunca ocupar esse
gabinete, tanto mais que os acessos e arranjos exteriores ainda não estavam concluídos
(devido ao ano chuvoso em 1997 registaram-se atrasos na conclusão dessas obras), o
que o impedia aliás de levar lá potenciais interessados na aquisição das lojas do Centro
de Camionagem e de cuja venda o depoente estava incumbido. As obras aliás só se
concluíram já em 1998, quando era suposto estarem concluídas em 1997. Nunca chegou
a realizar-se uma cerimónia de inauguração desse edifício, mas existiu um auto de
recepção da obra. De resto, os elementos da fiscalização camarária, quando visitavam o
edifício, devido ao estado dos acessos, chamavam o encarregado da obra e eram
transportados na pá de um empilhador até ao interior do edifício (até finais de 1997).
Inexistia ainda água e luz até finais de 1997 (e até inícios desse ano inexistia mesmo a
caixilharia das portas e janelas).
Era pois no dito gabinete, situado no edifício da CMF, que desde finais de 1996
recebia os munícipes em audiência (por ex. os interessados na aquisição das ditas lojas,
munícipes com queixas dos vizinhos, pedidos de emprego, assuntos relacionados com o
PS, assuntos relacionados com a campanha eleitoral, assuntos relacionados com obras
particulares, assuntos relacionados com publicidade na via pública, entre outros), em
representação da arguida Fátima Felgueiras quando ela estava ausente, em face da
delegação de competências no depoente, transmitindo-lhe depois os assuntos em causa.
Foi de resto a arguida Fátima quem ordenou ao arguido Bragança que
providenciasse pela instalação do depoente nesse gabinete, tendo-lhe arranjado
provisoriamente uma secretária de recurso até que fosse adquirida uma outra e uma
cadeira para aquele espaço e dado instruções à empregada de limpeza (D. Adelaide)
para limpar o local. O GAPP forneceu-lhe então algum material de escritório e com a
autorização da testemunha Fernanda Leal, no Departamento Administrativo, fez
dossiers e foram-lhe fornecidos lápis, borrachas e papel.
Era frequente deslocar-se ao gabinete da arguida Fátima Felgueiras para tratar
dos mais variados assuntos. Esta aliás não confiava em mais alguém para fazer
audiências na sua ausência e deu-lhe carta branca no exercício das suas funções,
permitindo que o depoente se socorresse do auxílio dos serviços camarários.
A testemunha David Mota apenas foi admitido na CMF em meados de 1998
para exercer funções na Central de Camionagem, numa altura em que o depoente ainda
partilhava o gabinete com o Vereador Lickfold.
Sinal de que o seu local de trabalho se situava na CMF – onde cumpria um
horário, sem prejuízo do exercício das suas funções o obrigar a deslocações frequentes –
é o facto de almoçar muitas vezes do bar situado no edifício da CMF.
Exerceu pois funções como assessor da presidente da autarquia até Dezembro de
1998, tendo passado a exercer as funções de vereador - em face da renúncia do
Vereador Lickfold - desde 01.01.99 até Fevereiro de 2000 (o depoente integrou a lista
do PS, em 5º lugar, nas eleições autárquicas de Dezembro de 1997, razão pela qual
substituiu o dito vereador – cfr. documento de fls 5802 dos autos). Nessa altura passou a
exercer as funções de vereador em regime de permanência, sem qualquer pelouro,
102
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
exercendo ainda as mesmas funções que antes. Em Março de 2000 a arguida Fátima
Felgueiras retirou-lhe o estatuto de verador em regime de permanência, tendo sido nessa
qualidade que foi vereador até ao final de 2001.
Para ilustrar o grau de confiança que a arguida Fátima Felgueiras depositou em
si, juntou aos autos um cartão manuscrito por ela quando o convidou para integrar a
lista do PS nas eleições autárquicas (e cuja lista foi apresentada a 17.12.97). Uma vez
que integrou o 5º lugar dessa lista não tinha qualquer expectativa em ser eleito, a fazer
fé nas sondagens efectuadas.
Quando iniciou funções na CMF não era filiado em partido algum e não tinha
qualquer experiência política, estando completamento alheado do ambiente político no
concelho de Felgueiras, tanto mais que residia em Fafe.
Porém, já conhecia a D. Cândida e o arguido Júlio Faria dos seus tempos de
escola, além de ser cunhado do arguido Bragança.
Quanto ao seu papel nas eleições autárquicas de 1997, referiu o seguinte:
O desempenho das suas funções agradou à arguida Fátima Felgueiras, nunca
tendo recebido qualquer reparo a esse propósito.
Tomou contacto com os elementos do PS local quando exercia funções na CMF,
ou porque iam solicitar alguma coisa à arguida Fátima Felgueiras ou porque ali se
dirigiam para pagar as suas quotas.
O PS era composto por elementos com muito pouco espírito crítico e que
gravitavam à volta do poder.
O secretário-coordenador do PS local (o arguido Bragança, seu cunhado), na
prática, nada fazia.
O arguido Joaquim Freitas fazia parte da Comissão Política do PS local e era
amigo da arguida Fátima Felgueiras.
A arguida Fátima Felgueiras era assim a única com capacidade para se
candidatar à presidência da câmara nas eleições autáquicas de Dezembro de 1997.
Assim, ela auto-propôs a sua candidatura e escolheu as pessoas que iriam
trabalhar consigo.
O depoente só soube que ia integrar a lista do PS em 5º lugar, como
independente, minutos antes da mesma ser apresentada no T.J. da Comarca de
Felgueiras, o que aliás motivou desagrado entre alguns elementos do partido.
Como não foi eleito continuou como assessor na CMF.
O seu contrato foi então alterado e passou a auferir uma remuneração
equivalente à de vereador, por proposta da arguida Fátima Felgueiras, já que ela
considerava-o o 5º vereador, apesar de não ter sido eleito (cfr. contrato de prestação de
serviços de fls 5797 do 23º volume).
Para além de aumentada a sua remuneração (para 580 cts mensais) alargaram-se
o âmbito das suas funções.
Tinha de cumprir um horário (das 9.30 horas às 20 horas) e recebia instruções da
Presidente Fátima Felgueiras, encontrando-se sempre ao seu dispôr. Aliás, não se
ausentava do edifício da CMF sem a autorização dela.
De resto, a arguida Fátima Felgueiras sempre reconheceu publicamente ao
depoente as suas funções como assessor dela, dando como exemplo a entrevista que ela
deu ao “Comércio do Porto”, publicada na edição de 23.06.2000 (cfr. documento de fls
5796 do 23º volume).
Na campanha eleitoral a sua participação foi sempre efectuada a mando da
arguida Fátima Felgueiras.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Ela era uma pessoa muito ocupada, pois para além de presidente da CMF, era
presidente da Comissão Política do PS local, dirigente nacional do PS, dirigente do
FCF, exercia funções na “Cercifel” e na “Cruz Vermelha”, entre outras funções.
Apercebeu-se que a arguida Fátima Felgueiras não nutria grande apreço pelo
secretário-coordenador do PS local, o arguido Bragança da Cunha, não obstante este ser
“um pau mandado” dela e uma “extensão” do arguido Júlio Faria na CMF.
Assim, foi o depoente quem a representou em várias reuniões do partido, onde
transmitia aposição dela, reportando-lhe mais tarde o que se passara.
Muitas vezes deixou o seu trabalho para dar execução a ordens proferidas pela
arguida Fátima Felgueiras em tarefas ligadas à campanha eleitoral.
Nesse contexto, por exemplo, diligenciou pela instalação da sede de campanha
numa loja fechada e arrendada ao “Minipreço” e cujo proprietário era o Sr. Lickefold,
tendo sido através dele que encetou contactos com um elemento do “Minipreço” em
ordem a alcançar aquele desiderato.
Teve um papel preponderante na organização de iniciativas de campanha.
Esteve também no “Pelouro das Finanças” da campanha eleitoral.
O arguido Joaquim Freitas foi-lhe apresentado pela arguida Fátima Felgueiras
quando foi trabalhar para a CMF.
Em Março de 1997 a arguida Fátima Felgueiras mandou-o ir a casa do arguido
Júlio Faria (que conhecia de vista e que representava uma espécie de “pai político” do
PS local, pois foi presidente da CMF, era deputado e oriundo de uma família
conceituada em Felgueiras) e encontrou o arguido Joaquim Freitas à porta do edifício.
Entraram os dois no apartamento do arguido Júlio Faria, o qual lhes revelou os
motivos da reunião. Disse ao depoente que devia fidelidade à arguida Fátima Felgueiras
e ao Joaquim Freitas referiu o facto dele fazer parte da Comissão Política do PS local e
de ser amigo pessoal da arguida Fátima Felgueiras.
Transmitiu-lhes que era necessário criar um “Pelouro das Finanças” para a
campanha eleitoral que se avizinhava e que a arguida Fátima Felgueiras pretendia que
eles integrassem esse pelouro.
Deu-lhes então conta de que era necessário abrir uma conta bancária e entregoulhes um manuscrito (que não adulterou), documento esse que fez juntar aos autos.
Aceitou a tarefa de que foi incumbido e o arguido Júlio Faria transmitiu-lhes que
a direcção de campanha iria instruí-los acerca da forma como a dita conta iria ser gerida
e que a Fátima Felgueiras iria falar com eles a esse propósito.
Sabe agora que a conta do BES foi aberta por força de uma desavença entre o
então marido da arguida Fátima Felgueiras e o arguido Júlio Faria (caso não tivesse
existido essa zanga, tal como em 1993, seria o Dr. Sousa Oliveira com o arguido
Joaquim Freitas quem seriam os titulares da conta respectiva).
Na primeira oportunidade transmitiu à arguida Fátima Felgueiras o que se tinha
passado na reunião em causa.
Cerca de uma semana depois ela chamou-o ao seu gabinete (estava presente o
arguido Joaquim Freitas) e deu-lhes instruções para abrir uma conta bancária, pois era
necessário dar cumprimento a várias situações urgentes em termos financeiros.
Uma dessas situações prendia-se com o Jornal “O Sovela”, que praticamente
estava falido, jornal esse que era um veículo para fazer passar a mensagem política da
arguida Fátima Felgueiras.
O director desse jornal era o Sr. Barros (de quem a arguida Fátima não gostava).
O depoente constatou a realidade do jornal, designadamente a falta generalizada
de pagamento aos credores e o contabilista desesperava pois não lhe era entregue a
documentação necessária para fazer a contabilidade.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
O depoente fez um levantamento dos credores e das dívidas existentes e agiu no
sentido de reabilitar o jornal, sempre sob as ordens da arguida Fátima Felgueiras.
Antes de abrir a conta no BES procurou informar-se da razão de ser da abertura
dessa conta.
Recorda-se que quando foi trabalhar para a CMF foi ao escritório do ex-marido
da arguida Fátima Felgueiras (Dr. Sousa Oliveira), o que fez aliás várias vezes a mando
deste e com autorização da arguida Fátima Felgueiras, sendo certo que existia alguma
incompatibilidade entre ele e o arguido Júlio Faria. O ex-marido da arguida Fátima quis
fazer de si “um pombo correio”.
Numa dessas ocasiões fez-lhe o ponto da situação da pré-campanha e deu-lhe
conta que tinha instruções para abrir uma conta com o arguido Joaquim Freitas. Ele
comentou então que sempre assim foi (em 1993 já tinha sido aberta uma conta para o
mesmo fim, titulada pelo próprio e pelo arguido Joaquim Freitas, sendo certo que já em
1989 tinha também sido aberta uma conta titulada por outras duas pessoas).
Perguntou-lhe então se o PS não tinha uma conta oficial, ao que lhe respondeu
que não porquanto se o dinheiro caísse no partido “ninguém pagava a ninguém, pois
toda a gente rouba”.
Ficou pois com a convicção de que a abertura da conta era uma prática normal e
para obviar a problemas no seio do partido, tendo-lhe garantido o Dr. Sousa Oliveira a
legalidade de tal procedimento, o que deixou tranquilo o depoente.
De resto, o Dr. Sousa Oliveira procurou sempre manter-se informado acerca da
gestão financeira de tal conta.
O “Pelouro das Finanças” tinha também uma vertente de dinheiro em caixa,
além da conta.
Inicialmente ficou estabelecido que a conta do BES apenas se destinaria a
financiar as acções de campanha, mas com o decorrer do tempo apercebeu-se que
gradualmente tal conta foi estando ao serviço de outras coisas (como por ex. para o
pagamento des despesas do PS local, pagamento de despesas relacionadas com a
campanha referente à regionalização, para a campanha das legislativas e para o
Parlamento Europeu, além de algumas situações ligadas ao FCF).
Se desse facto tivesse antecipado conhecimento teria pedido a demissão.
Nessa altura existia uma relação de recíproca confiança entre o depoente e a
arguida Fátima Felgueiras. Esta referiu-lhe que existiam outras contas como aquela e
que os respectivos titulares nunca a questionaram acerca dos propósitos da sua abertura.
O depoente e o arguido Joaquim Freitas limitavam-se a recolher dinheiro e a
depositá-lo na dita conta, tudo segundo orientações que lhes eram dadas quer pelo Dr.
Sousa Oliveira quer pela arguida Fátima Felgueiras (aliás, aquele chegou a indicar-lhe
os montantes que certas pessoas deveriam dar e a arguida Fátima Felgueiras chegou a
entregar-lhes dinheiro e cheques de donativos, como por ex. de um empresário têxtil
chamado Dinis, da esposa de um empresário de terraplanagens e do dono da empresa
“Jonil”. Vários elementos da CMF fizeram o mesmo como por ex. o seu cunhado
Bragança, o Sr. Júlio Pereira, a D. Leonor, além do Dr. António Pereira – que instalou
salamandras nas escolas primárias do concelho - e do Sr. David, lider da Juventude
Socialista do PS local).
Quanto às listas de pessoas a contactar em ordem a recolherem donativos, nunca
as mesmas lhe foram entregues, sendo certo porém que as viu nas mãos do arguido
Joaquim Freitas.
Era este aliás quem estabelecia o percurso a fazer de acordo com as instruções
da arguida Fátima Felgueiras.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Por outro lado, algumas outras pessoas também participavam na recolha de
fundos, como por exemplo o Sr. Fernando Pereira Sampaio (que os acompanhou em
algumas deslocações a clientes e amigos dele).
A contabilidade dos donativos era feita no GAPP, designadamente pelo arguido
Bragança da Cunha.
O Sr. Júlio Pereira juntava vários cheques e procedia ao seu depósito (não sabe
em que conta).
Haviam vários peditórios para os mais variados fins.
Assim, em 1997, a própria arguida Fátima Felgueiras várias vezes acompanhou
o Sr. Fernando Lima (então presidente do FCF) na recolha de donativos, ao que pensa,
para o FCF.
Quanto aos movimentos na conta do BES explicou que recebia os respectivos
extractos e apunha-lhes anotações.
Os arguidos Fátima Felgueiras, Júlio Faria e Bragança da Cunha e o Sr. Júlio
Pereira tinham conhecimento dos ditos movimentos (o Sr. Júlio Pereira e os arguidos
Júlio Faria e Bragança da Cunha eram os titulares da conta oficial do PS de Felgueiras).
Aliás, extraía fotocopias dos extractos bancários da mencionada conta do BES e
fornecia-as aos arguidos Fatima Felgueiras e Júlio Faria.
Alguns dos cheques emitidos dessa conta destinaram-se a pagar despesas do PS
local.
A arguida Fátima Felgueiras tinha perfeito conhecimento dos depósitos
efectuados e das facturas a que era necessário dar pagamento.
Esta aliás metia o “nariz em tudo”, tendo o depoente junto quatro documentos
para ilustrar esta afirmação (documentos que se reportam a mensagens políticas e a
actividades de campanha, em que ela deu directrizes para as acções de campanha).
Ninguém questionava as suas directrizes e o mesmo se passou no que respeita ao
“Pelouro das Finanças”.
Quanto à forma como se processava a troca de correspondência entre o arguido
Júlio Faria e a CMF, na altura em que aquele era deputado na Assembleia da República,
explicou que o arguido Bragança da Cunha organizava uma pasta com documentos
destinados ao arguido Júlio Faria (como por ex.fotocópias do extracto da conta do BES
e recortes de jornal) e que era entregue pelo motorista da CMF (Sr. Pinto) em casa dele.
Na volta o dito motorista trazia documentos destinados a elementos que prestavam o seu
serviço na CMF, entre os quais o depoente, pois foi assim que recebeu do arguido Júlio
Faria o manuscrito a que já se fez alusão (constante de fls 156 e 157 do 1º volume).
No que respeita ao clube de natação “Foca” o depoente não teve qualquer
intervenção pois esse assunto estava entregue a outro assessor.
A arguida Fátima Felgueiras pretendia uma campanha eleitoral que ofuscasse a
Federação Distrital do Porto do PS, de quem aliás recusou contributos, e centrada na sua
pessoa (para ilustrar esta facto exibiu uma medalha que era oferecida).
Constava-se na CMF que o arguido Júlio Faria tinha preparado a sua
substituição com antecedência, sendo certo que ele nunca se desligou dos assuntos
camarários mesmo depois de ter sido eleito deputado.
Aliás, os elementos do Gabinete de Apoio tinham sido escolhidos pelo arguido
Júlio Faria e a arguida Fátima Felgueiras manteve a sua composição por imposição dele.
De resto, a D. Cândida foi substituída pela arguida Fátima Felgueiras e assistiu a
alguns telefonemas que esta fez ao arguido Júlio Faria a dar-lhe conta da sua mágoa por
esse facto.
Quanto substituiu na vereação o Sr. Lickefold, deu conta à arguida Fátima
Felgueiras de que pretendia deixar de tratar de determinados assuntos como por
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
exemplo efectuar os pagamentos através da conta do BES e de manter esta conta aberta,
posição que a desagradou Quis-lhe então entregar os dossiers relacionados com o
“Pelouro das Finanças” mas ela retorquiu-lhe “que estavam muito bem” com o
depoente.
Instruiu-o no sentido de levar consigo e analisar o dossier do Dr. Sousa Oliveira.
Acerca disso falou com o Joaquim Freitas, o qual se demarcou do assunto, tendo então o
depoente não acatado aquela instrução.
Divergiu com a arguida Fátima Felgueiras no que respeita à compra do estádio
Dr. Machado Matos e faltou à reunião onde tal assunto foi discutido (em meados de
1999).
A partir de então o seu relacionamento com ela nunca mais foi o mesmo, pois
ela não admitia ser contrariada.
No final de 1999 tomou conhecimento da denúncia anónima que originou estes
autos, denúncia essa que causou um “turbilhão” na CMF, sendo certo que a arguida
Fátima Felgueiras queria saber quem tinham sido os seus autores.
Tendo ela tomado conhecimento que algumas pessoas de Felgueiras se reuniram
com o Narciso Miranda a propósito dos acontecimentos que vieram a público e
desagradada com tal facto, acusou o arguido Bragança da Cunha de ter sido o autor da
denúncia anónima e correu-o da CMF, retirando-lhe o computador.
Desde então a arguida Fátima Felgueiras entendeu que o depoente não tinha
condições para continuar a exercer as funções de verador em regime de permanência,
tendo passado a exercer as funções de vereador sem esse regime até Dezembro de 2001
(cfr. o despacho datado de 01.03.2000, proferido pela arguida Fátima Felgueiras,
constante de fls 5807 do 23º volume).
Esclareceu, quanto aos pagamentos efectuados, que na CMF tirava fotocópias
dos cheques que ia emitindo com o arguido Joaquim Freitas e apunha notas e
informações quando inexistiam documentos de suporte, por forma a assim prestar
contas.
Confrontado com o documento de fls 120 do apenso 1, referiu tratar-se de um
cheque no valor de 600.000$00, datado de 02.12.97, emitido a favor do arguido Júlio
Faria e sacado sobre a sobredita conta do BES, sendo certo que o cheque em causa foi
assinado pelo depoente e pelo arguido Joaquim Freitas (era necessária a assinatura dos
dois). Tal cheque foi emitido por ordem da arguida Fátima Felgueiras e sem lhes dar a
indicação do fim a que se destinava.
Tal cheque foi de facto entregue ao arguido Júlio Faria (não se recorda de que
forma), que o endossou ao filho (António Pedro Lopes Faria), razão pela qual não
chegou a ser depositado na conta pessoal daquele.
Confrontado com o documento de fls 165 do 1º volume (igual ao documento de
fls 197 do apenso 1) referiu tratar-se de mais um cheque sacado sobre a conta do BES a
favor do arguido Júlio Faria, no montante de 170.000$00 e datado de 28.01.99, como
sempre assinado pelo depoente e pelo arguido Joaquim Freitas. Pese embora não se
recorde porque motivo tal cheque foi emitido, acha pouco provável que se tenha
destinado a reembolsar o arguido Júlio Faria de despesas que ele suportou a propósito
da campanha eleitoral das eleições autárquicas de Dezembro de 1997, em face da data
do cheque (é certo que após as eleições foram pagas despesas relacionadas com a
campanha, mas depreende-se do depoimento em causa que tal não terá sido o caso dada
a distância temporal entre a emissão desse cheque e a data das eleições referidas).
Salientou que, pese embora nem todos os cheques tenham sido mandados emitir pela
arguida Fátima Felgueiras, foi ela quem ordenou a respectiva emissão relativamente a
todos os cheques destinados ao arguido Júlio Faria.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Confrontado com outro documento de fls 165, do 1º volume (depósito do cheque
referido), referiu não conhecer a letra, razão pela qual ignora quem procedeu ao
respectivo depósito. Não reconhece inclusive a rúbrica que consta do canto inferior
esquerdo.
Confrontado com o documento de fls 199 do apenso 1 referiu tratar-se de um
cheque sacado sobre a conta do BES, assinado pelo depoente e pelo arguido Joaquim
Freitas, a favor do arguido Júlio Faria, datado de 15.02.99, titulando a quantia de
57.090$00. Explicou que tal cheque foi emitido para reembolsar o arguido Júlio Faria
do facto de ter pago o almoço dos elementos de Felgueiras que se deslocaram ao
Congresso Nacional do PS, realizado em Lisboa (o depoente esteve presente a convite
da arguida Fátima Felgueiras).
Confrontado com o respectivo talão de depósito (cfr. fls 166 do 1º volume),
referiu que esse depósito foi efectuado pelo Sr. David Mota Queirós, pessoa que chegou
a trabalhar na dependência do depoente e chegou a ser líder da Juventude Socialista do
PS de Flegueiras.
Confrontado com o talão de depósito de fls 195 do apenso 1 na conta do BES,
no montante de 250.000$00 e datado de 23.12.98, depósito esse efectuado pelo dito
David Queirós, referiu tratar-se de um donativo, ao que pensa.
Confrontado com o talão de depósito de fls 200 do apenso 1 na conta do BES,
no montante de 250.000$00, datado de 24.02.99, referiu ter sido efectuado tal depósito
pelo Sr. Armindo Álvaro Pimenta Brochado (também ele fazia depósitos na conta do
BES), o qual pertencia também à Juventude Socialista do PS local.
O Vereador António Pereira procurou-o e entregou-lhe um cheque do Eng.
Agostinho Correia Lemos dizendo-lhe que se tratava de um donativo concedido pela
empresa “Mecanor”. Recebeu o cheque e depositou-o na conta do BES (cfr. doc. de fls
509 do 4º volume). Mais tarde veio a saber que a “Mecanor” montava o aquecimento
nas escolas primárias do concelho.
O Eng. Macedo procurou-o e disse-lhe que trazia um donativo (referiu-lhe que
tinha procurado entregar à própria arguida Fátima o dito cheque mas ela mandou-o ir ter
com o depoente). O dito engenheiro pediu-lhe para não apresentar a pagamento esse
cheque durante uns dias pois a conta ainda não estava aprovisionada para o efeito (cfr.
documento de fls 496, do 1º volume). Mais tarde veio a saber que o dito senhor era
sócio de uma empresa que estava a construir para a CMF escolas pré-primárias.
O Sr. Meireles procurou-o e disse-lhe que queria fazer um donativo, tendo-lhe
entregue um cheque de 50.000$00 (cfr. fls 492 do 4º volume). Mais tarde veio a saber
que ele fazia biscates de construção civil para a CMF.
A propósito dos documentos de fls 182 e 186 do 1º volume, referiu que alguém
encomendou a realização de propaganda eleitoral pelo telefone, a qual foi efectuada.
Foi-lhe então dirigida pelo Dr. Manuel Seabra (na altura a exercer funções na
CM de Matosinhos) uma factura no montante de 256.345$40. Como não estava por
dentro da situação aguardou por instruções. Após insistência pelo respectivo pagamento
pelo dito Manuel Seabra, a arguida Fátima Felgueiras a 01.04.98 despachou no sentido
de ser paga tal factura. Emitiu então a 09.04.98 um cheque ao portador (traçado), no
montante de 256.345$00 (constante de fls 186 do 1º volume).
Confrontado com cartão de fls 2183, referiu reportar-se a uma firma cujo
respectivo sócio-gerente é o Sr. Jorge Fonseca, cartão esse que veio acompanhado de
um donativo de 500.000$00. Foi a arguida Fátima Felgueiras quem lhe entregou tal
quantitativo em numerário com o cartão dentro de um envelope, transmitindo-lhe que se
tratava de um donativo para a campanha eleitoral.
108
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Confrontado com o documento de fls 7087 do volume 27-A (cheque de
1.500.000$00, datado de 20.10.97) referiu pertencer ao Sr. Joaquim Ribeiro, empresário
muito conhecido em Felgueiras e morador em Caldas de Vizela, entretanto falecido,
cheque esse que lhe foi entregue pelo arguido Bragaça da Cunha para o depositar na
conta do BES, o que fez.
Confrontado com o cheque de fls 7085, no montante de 200.000$00 e datado de
12.12.97, referiu que lhe foi entregue pela arguida Fátima Felgueiras e que o mesmo se
reporta a um donativo, sendo certo que tal cheque foi sacado sobre uma conta conjunta
do Sr. José Andrade David Pereira (dono de máquinas de terraplanagem) e de Deolinda
Lima (que pensa ser a esposa).
Confrontado com o cheque de fls 7098 do volume 27-A (emitido por Manuel
Joaquim Oliveira Magalhães), no montante de 100.000$00, esclarece que foi o Sr.
Fernando Pereira Sampaio quem o depositou (acompanhava-o quando isso sucedeu).
Confrontado com o “post-it” de fls 171 do 1º volume, referiu ser da autoria do
arguido Júlio Faria, reportando-se a uma ordem que deu ao “Pelouro das Finanças”. O
“David” ali mencionado não é senão o Sr. David Mota Queirós, líder da Juventude
Socialista local. O “Nequinhas”, por seu turno, é um senhor já reformado e pai do Sr.
Júlio Pereira. O Dr. Orlando Sousa à data era membro da assembleia municipal e
militante do PS e actualmente é presidente da Assembleia Municipal de Felgueiras.
Confrontado com o teor do cheque de fls 172 do 1º volume, referiu tratar-se de
um cheque de 800.000$00 que se destinou a pagar bandeiras e pendões.
Aliás, recorda-se que o Sr. Sousa Oliveira o chamou ao seu escritório para lhe
dar orientações e disse-lhe que o Dr. Orlando Sousa era um indivíduo a “temer” porque
nas eleições de 1993 foi necessário proceder ao pagamento de despesas de campanha a
uma empresa de Braga com quem ele tinha relações e ele tinha por hábito inflaccionar o
valor das facturas a pagar.
Por via da dita empresa de Braga, foi o Dr. Orlando Sousa quem forneceu as
bandeiras e os pendões referidos, sendo certo que está convencido que não foi a arguida
Fátima Felgueiras quem encomendou esses artefactos pois nunca antes lho tinha
referido. O arguido Joaquim Freitas disse-lhe também que de nada sabia acerca dessa
encomenda.
Ora, o Dr. Orlando Sousa exigiu ao depoente o pagamento dos ditos 800.000$00
pela encomenda dessas bandeiras e pendões, por contacto telefónico que efectuou para a
CMF.
A demora no pagamento foi tanta que o arguido Júlio Faria lhe entregou o “postit” de fls 171 do 1º volume, na sequência da qual emitiu o cheque de fls 172 do 1º
volume.
Confrontado com o cheque de fls 213 do apenso 4, datado de 30.11.98 e no
montante de 35.000$00, referiu ter-se tratado do pagamento de um serviço prestado pelo
Sr. Carlos Ribeiro (publicidade numa carrinha na campanha do referendo pela
regionalização).
Ainda do mesmo apenso 4, os documentos de fls 212 (cheque datado de
23.11.98), 205 (cheque de 200 cts, datado de 08.09.98 e emitido a favor de Renato
Guerra) e 206 (comprovativo da remessa do meio de pagamento pelo correio) dizem
respeito a um pagamento efectuado à “Proeme” a propósito da campanha referente ao
referendo para a regionalização (fornecimento de placares). Chamou à colacção o
documento de fls 208 do mesmo apenso 4 para demonstrar que os funcionários da CMF,
em horário de expediente, tratavam de assuntos relacionados apenas com o PS.
O documento de fls 224-A do apenso 4 reporta-se a um recibo da “Portugal
Telecom” dirigida ao arguido Bragança da Cunha e respeitante ao uso do telefone
109
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
instalado na sede de campanha durante o mês de Janeiro de 1998. Não obstante, o
respectivo recibo foi dirigido à CMF e foi mesmo despachado pela arguida Fátima
Felgueiras, que a 28.02.98 nele apôs uma rúbrica. Foi o arguido Bragança da Cunha
quem lhe entregou esse documento.
O documento de fls 224-B do apenso 4 reporta-se a uma despesa com um
almoço com o Eng. António Guterres que ocorreu no Porto ainda a propósito da
campanha relativa ao referendo para a regionalização.
Confrontado com o cheque de fls 224 do apenso 4, no valor de 280.000$00,
referiu que foi emitido e entregue ao Sr. David a propósito de uma iniciativa levada a
cabo pela Juventude Socialista do PS local no Parque de Campismo em Vila Fria e
destinado a pagar ao “Quinteto Zézé Fernandes”.
Confrontado com o cheque de fls 218 do apenso 4 esclareceu que se tratou de
um pagamento ao Sr. Querós, pois foi ele quem efectuou a sonorização da carrinha que
fez a publicidade relativa à campanha para as eleições europeias de 1999.
Esses pagamentos eram quase sempre efectuados nas instalações da CMF, pois
era ali que as pessoas iam ter consigo. Chegou a colocar o problema à arguida Fátima
Felgueiras, mas ela ordenava o respectivo pagamento a si ou ao secretário-coordenador
do PS (o arguido Bragança da Cunha).
Os documentos normalmente eram rubricados pelo depoente e pelo arguido
Joaquim Freitas.
Chegaram a gratificar (com fundos da conta do BES) pessoas que com o seu
trabalho participaram na campanha eleitoral, como por exemplo 100.000$00 ao Sr.
David Mota (cfr. cheque de fls 178 do apenso 1, emitido a 14.05.98, e cheque de fls 161
do apenso 1, no montante de 50.000$00).
Explicou que a sede de campanha ainda se manteve durante algum tempo após
as eleições e foi o dito David quem teve um papel importante no seu desmantelamento,
daí as gratificações a que aludiu. Aliás, foi o depoente quem sugeriu a gratificação
referida, mas a decisão final coube à arguida Fátima Felgueiras.
Porém, o cheque de fls 184 do apenso 1, no valor de 200.000$00, datado de
02.09.98, emitido a favor do Sr. David Mota, não constituiu uma gratificação.
A propósito do documento de fls 127 do apenso 4º referiu que o mesmo reportase ao pagamento da quantia de 57.740$00 referente ao custo das bebidas consumidas no
“Ciclos Bar”, as quais foram oferecidas aos jovens presentes, depois de com eles a
arguida Fátima Felgueiras se ter reunido na sede de campanha para lhes dar a conhecer
os seus projectos para o concelho (encontro que ocorreu a 04.12.97). O documento em
causa não é mais que um cartão do bar com o consumo efectuado. Em tal documento
não foi aposta a rúbrica do depoente nem do arguido Joaquim Freitas.
A propósito dos documentos de fls 179 e 180 do apenso 4º referiu que anotou
que se tratava do pagamento de lanternas emprestadas pelos Bombeiros Voluntários e
que foram furtadas durante o concerto dos “Santos & Pecadores” no Mercado
Municipal, pelo que tiveram de as substituir, o que importou a quantia de 102.389$00.
Os Bombeiros pagaram o remanescente da factura, pois aproveitaram para também
fazer uma encomenda.
A propósito do documento de fls 2895 e ss. (ou 4511 e ss.), explicou que se trata
da contestação apresentada na acção de prestação de contas movida contra si e contra o
arguido Joaquim Freitas pelo PS a 28.10.2001, segundo lhe disseram por influência da
arguida Fátima Felgueiras.
O documento de fls 187 do apenso 4º reporta-se ao pagamento da quantia de
6.700$00 referente a um ramo de flores entregue à arguida Fátima Felgueiras.
110
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
O documento de fls 173 do 1º volume refere-se a um orçamento de instalação do
ar condicionado do espaço que servia de sede do PS (apesar de formalmente não
pertencer ao partido), dirigido ao arguido Bragança da Cunha, sendo certo que após a
sua instalação foi ele quem lhe entregou a factura, tendo conseguido então um desconto
de 3%, daí que só tenha pago a quantia de 776.0000$00, conforme anotação efectuada
vermelho no documento referido. Esclareceu que foi decidido pela arguida Fátima
Felgueiras instalar o ar condicionado naquele espaço na medida em que ela queixava-se
do execessivo calor existente no local aquando de uma reunião que ali teve lugar em
Julho ou Agosto de 1997. A ordem de aquisição foi transmitida por ela ao arguido
Bragança da Cunha.
O documento de fls 174 do 1º volume, datado de 16.10.97, reporta-se à
reparação de um painel colocado no edifício que funcionava como sede do PS, tendo
sido paga a quantia de 331.500$00 (cfr. cheque de fls 175, datado de 16.10.97) por essa
reparação e o montante de 50.000$00 pelo respectivo transporte (cfr. documento de fls
176 do 1º volume).
Quanto aos documentos de fls 196 e 197 do 1º volume explicou-os da seguinte
forma:
No âmbito de uma viagem a Lisboa pela arguida Fátima Felgueiras, a qual ali se
deslocou na viatura da CMF, conduzida pelo respectivo motorista (Sr. Pinto), de modo a
participar no Congresso Nacional do PS, foram efectuadas despesas com a dormida do
motorista, combustíveis e estacionamentos. Tais documentos foram-lhe entregues pelo
Sr. Pinto por ordem da arguida Fátima Felgueiras por forma a que o depoente pagasse
tais despesas com os fundos recolhidos na conta do BES, o que fez.
Quanto ao cheque de fls 187 do volume 1º, datado de 23.11.98, no montante de
150.000$00, emitido ao portador, referiu que o mesmo foi depositado na conta oficial
do partido para fazer face às dificuldades de pagamento das contas de água e luz
consumidos no espaço que funcionava como sede do partido.
O documento de fls 28 do apenso 4º diz respeito ao contrato subscrito pelo
arguido Bragança da Cunha para a actuação do Armando Gama e da Valentina Torres,
que o depoente se limitou a pagar.
O documento de fls 93 do mesmo apenso 4º, reporta-se a uma factura datada de
14.11.97 emitida pelo “Supermercado S. Jorge” (pertencente ao Sr. Inácio Ferreira
Faria, presidente da junta de freguesia da Várzea), relativo ao fornecimento de carne,
alho e sal, produtos esses pagos pelo depoente com fundos da conta do BES.
O cheque de fls 96 do apenso 94 (no montante de 90.000$00) reporta-se ao
pagamento do aluguer de mesas usadas num evento de campanha organizado pelo Sr.
Carlos Severino, presidente da junta de freguesia de Lagares, evento esse que teve lugar
em Santa Luzia.
O documento de fls 102 a 104 do apenso 4º reporta-se ao contrato subscrito para
a actuação do grupo “Santos & Pecadores”, tendo emitido os respectivos cheques de
pagamento a 07.11.97 e a 11.12.97 (cfr. fls 103 e 104 do mesmo apenso).
Os documentos de fls 117 a 125 do mesmo apenso reportam-se a almoços e
jantares no “Lucybar” de funcionários camarários pagos com fundos da conta do BES.
Os documentos de fls 139 a 150 do apenso 4º reportam-se a facturas de refeições
consumidas no “Café Snack-bar Bem-Estar” por funcionários camarários que, após o
expediente, iam fazer serviços para a campanha eleitoral do PS (eram-lhes pagas as
refeições e gratificações). Tais depesas foram pagas com fundos da conta do BES.
No que se refere ao documento de fls 195 do 1º volume explicou que a arguida
Fátima Felgueiras encomendou um fogo de artifício para fechar a sua campanha
eleitoral, tendo sido paga a quantia de 850.000$00.
111
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
O documento de fls 190 do 1º volume reporta-se a um serviço de transporte de
elementos do PS ao Porto, a fim de participarem num almoço com o Eng. António
Guterres que teve lugar a 06.11.98, numa acção que se inseria na campanha do
referendo da regionalização. Tal serviço foi efectuado pela “Auto-Viação de Landim” e,
não obstante ter sido encomendado pela Federação Distrital do Porto do PS acabou por
ser pago com fundos da referida conta do BES.
O documento de fls 188 reporta-se a um aviso/recibo de seguro no montante de
14.890$00, seguro esse que foi efectuado para acautelar qualquer ocorrência na
utilização pelo PS do espaço do Cineteatro Fonseca Moreira em 06.11.98 e 07.11.98,
ainda a propósito de um evento que se inseria na campanha do referendo pela
regionalização. A ordem para efectuar o seguro chegou-lhe através do Gabinete de
Apoio à Presidente.
Deu conta dos rumores que referiam a hipótese da arguida Fátima Felgueiras
poder vir a ocupar um cargo ministerial e que o arguido Júlio Faria não tinha assegurada
a sua continuidade como deputado na Assembleia da República.
Referiu que a arguida Fátima Felgueiras preocupava-se com o futuro político
dele, tendo existido rumures de que ele poderia vir a ser nomeado Governador Civil do
Porto, de vir ocupar um cargo importante a nível regional caso a regionalização
avançasse, de ser nomeado para a Comissão de Coordenação da Região Norte ou de ser
nomeado para um cargo de relevo na AMVS, hipóteses que não se concretizaram. Ele
acabou então por ocupar o cargo de gestor do Hospital Agostinho Ribeiro.
Em meados de 1999 a arguida Fátima Felgueiras, na qualidade de presidente da
Comissão Política do PS de Felgueiras, propôs-se apresentar na Federação Distrital do
Porto do PS novos elementos a fim de se tornarem filiados no partido, entre os quais o
depoente. Recorda-se que assinou a proposta mas nunca chegou a receber o cartão de
militante, razão pela qual não se considera militante do PS.
Ainda a propósito da campanha eleitoral das autárquicas de 1997, debruçando-se
sobre as actas datadas de 09.06.97 entregues na audiência de julgamento pelo arguido
Júlio Faria e constantes de fls 12211 a 12215, referiu que nunca teve conhecimento da
existência de actas, pese embora seja referido a fls 1212 que o depoente iria assegurar a
feitura da acta e assinalar as presenças.
Explicou que nesse período existiam muitas reuniões da chamada “task force”,
constituído pelo núcleo duro. Não reconhece assim naqueles documentos o espelho da
realidade.
De resto, o Sr. Dinis nunca fez parte do “Pelouro das Finanças” ao contrário do
que consta em tal documento (aliás, com ele só falou uma única vez).
A propósito de um documento junto na 29º sessão de julgamento, referiu tratarse de um rascunho de uma reunião da autoria do arguido Bragança da Cunha e na alusão
à “contabilidade” aparece alusão à arguida Fátima Felgueiras com as iniciais “FF”. As
inicias “AJB” significam António José Bragança (secretário-coordenador), as iniciais
“HC” reportam-se à pessoa do depoente (assessor da presidente da CMF) e as iniciais
“JJP” reportam-se a José Júlio Pereira (membro da Comissão Política e do Secretariado
do PS local).
Assegurou nunca ter tido qualquer responsabilidade na contabilidade do PS
local, sendo certo que o seu nome é ali referido por ser co-titular da conta do BES, a
qual se tornou na conta não oficial do partido.
Teve participação nessa reunião porque a arguida Fátima Felgueiras solicitou a
sua comparência.
112
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Explicou que o Sr. Júlio Pereira, Secretário da arguida Fátima Felgueiras, em
horário de expediente tratava de assuntos relacionados com o PS, dando como exemplo
os documentos de fls 10 a 17 do apenso 4º.
- Arguido Joaquim Freitas
Foi militante do PS desde 1993 até à altura em que o Eng. António Guterres foi
o Secretário-geral do partido.
Foi membro da Comissão Política do PS de Felgueiras no tempo em que a
arguida Fátima Felgueiras foi presidente da CMF (antes do presente mandato). Foi ela
quem o convidou em 1996 para fazer parte de tal Comissão. Pensa que ali permaneceu
até 1999.
Conheceu a arguida Fátima Felgueiras em 1992 ou 1993 por intermédio do Dr.
Sousa Oliveira. Eram amigos de família, pois as respectivas famílias conviviam com
regularidade em casa uma da outra, relacionamento esse que se manteve até ao ano
2000 (até à altura da denúncia anónima que deu origem a estes autos).
A arguida Fátima Felgueiras assumiu o segundo lugar das listas do PS já antes
de 1993 quando o nº 2 até então, o Professor Campos, foi “corrido” e foi para o PSD,
sendo certo que já então qualquer elemento crítico era corrido. Corrigiu depois o seu
depoimento, precisando que o Prof. Campos foi eleito vereador da CMF cumprindo
mandato entre 1993 e 1997, tendo sido corrido quase no final desse mandato, não
aparecendo nas listas de 1997, razão pela qual não foi reeleito.
Em 1993 fez parte com o Dr. Sousa Oliveira de uma comissão angariadora de
fundos para a campanha eleitoral das eleições autárquicas ocorridas nesse ano, sendo o
arguido Júlio Faria o cabeça de lista pelo PS. Foi convidado pelo arguido Júlio e pelo
Dr. Sousa Oliveira para assumir essas funções. Recorda-se que nessa altura lhe diziam
que a arguia Fátima Felgueiras, dentro de 2 ou 3 anos, viria a ser presidente da
edilidade, o que pressupunha que o arguido Júlio Faria fosse eleito deputado na
Assembleia da República, o que se veio a concretizar de facto em 1995 visto que ela
era a Vice-presidente da autarquia. Tal informação foi-lhe dada pela própria arguida
Fátima Felgueiras e mais tarde ouviu também tal comentário da boca do Dr. Sousa
Oliveira quando se dirigiu ao Sr. José Anselmo Peixoto Pereira no sentido de obter um
donativo (o depoente estava presente).
Na política prepara-se o caminho com tempo.
Assim, em 1995 era já previsível que o arguido Júlio Faria ocupasse um lugar
elegível para a Assembleia da República nas listas do PS.
Recorda-se aliás que já em 1994 houve um jantar na sua casa do Mindelo onde
se discutiu a sua sucessão e onde a mesma foi “cozinhada”.
De resto, o pré-lançamento da arguida Fátima como sucessora do arguido Júlio
Faria ocorreu num churrasco que teve lugar na quinta do pai do depoente. Nessa altura
recorda-se que o arguido Júlio Faria estava doente, tendo sido substituído pela arguida
Fátima à frente dos destinos da CMF, enquanto vice-presidente da edilidade (facto que
só ocorreu uma vez). Tal churrasco ocorreu por alturas do Verão, não sabendo precisar
nem o mês nem o ano (em todo o caso teve lugar em data posterior a 1994).
Quanto à angariação de fundos para a campanha eleitoral referiu o seguinte:
O presidente da CMF era sempre o presidente da comissão política do PS local e
era ele quem designava as pessoas da sua confiança para fazerem parte das diferentes
comissões, designadamente a de angariação de fundos para a campanha eleitoral.
A existência de contas paralelas vinham já pelo menos desde as eleições
autárquicas de 1993 (nesse ano o depoente integrou com o Dr. Sousa Oliveira a
comissão de angariação de fundos) onde era suposto proceder-se ao depósito dos
113
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
donativos. Estranhou por isso que donativos tivessem sido depositados na conta pessoal
do Dr. Sousa Oliveira.
Em 1997, data que não consegue recordar mas antes da pré-campanha (que se
iniciou em Abril/Maio desse ano), a arguida Fátima Felgueiras pediu-lhe para ir a casa
do arguido Júlio Faria, o que fez (já ali se tinha deslocado várias vezes). Uma vez ali
chegado, ao que pensa, encontrou o arguido Horácio Costa à entrada do prédio onde se
situa o apartamento do arguido Júlio Faria. Subiram então juntos ao dito apartamento,
onde foram recebidos pelo arguido Júlio Faria, o qual sabia ao que iam – pois foi logo
direito ao assunto que ali os levou - e, no decurso da reunião, escreveu o manuscrito que
consta de fls 156 e 157 dos autos. Explicou-lhes que já tinha falado com a arguida
Fátima acerca desse assunto e que o depoente e o arguido Horácio haviam sido
escolhidos para integrar o “Pelouro das Finanças”. Foi o arguido Horácio Costa quem
guardou o manuscrito referido na CMF, sendo certo que tratava de matéria sigilosa.
A arguida Fátima levou esse assunto à Comissão Política onde foram aditados
mais nomes a fim de integrar o “Pelouro das Finanças”, como por exemplo o Sr.
Sampaio da Lixa e o Sr. Dinis (chefe das Finanças de Felgueiras, o qual porém nunca os
acompanhou na angariação de donativos nem nunca entregou donativos).
Sendo matéria sigilosa, que em princípio não deveria extravasar o conhecimento
dos quatro (depoente, Horácio Costa, Júlio Faria e Fátima Felgueiras), estranhou que a
arguida Fátima tivesse levado esse assunto à Comissão Política.
Assim, os donativos institucionais ficariam a cargo dos arguidos Fátima
Felgueiras e Júlio Faria, ao passo que o depoente e o arguido Horácio tratariam de
recolher donativos no meio empresarial.
Abriram então a conta no BES com 5.000.000$00 entregues pela “Resin”
(segundo lhe disse o arguido Horácio Costa tratou-se de um donativo) e 1.000.000$00
entregues pela arguida Fátima ao arguido Horácio Costa. O arguido Horácio transmitialhe os donativos que recebia e vice-versa, não pondo em causa a veracidade do que ele
lhe transmitia a esse propósito.
A razão de ser da abertura dessa conta era a de fugir ao controle do PS. De resto,
as contas da campanha de 1997 nunca foram prestadas à Comissão Política, como já
assim tinha sucedido em 1993 (o Dr. Sousa Oliveira referiu-lhe que era necessário
prestar contas aos arguidos Júlio Faria e Fátima Felgueiras e, segundo ele, tê-las-á
entretanto prestado num dia em que o depoente não se encontrava presente. Seja como
for, essas contas não foram prestadas ao partido).
Como sempre havia grande desconfiança sobre aqueles que angariavam fundos,
o depoente e o arguido Horácio decidiram anotar tudo (o arguido Horácio Costa anotava
tudo e dava conhecimento ao depoente), até por exemplo da compra de selos (cfr.
manuscrito de fls 226 do apenso 4).
A primeira vez que se falou na abertura da mencionada conta foi em casa do
arguido Júlio Faria, na reunião a que já se referiu. Deu conhecimento à arguida Fátima
do que ali se passou, no gabinete desta na CMF, tendo-lhe ela então dado instruções
para abrir a dita conta. Entre a data daquela reunião e a data da abertura da conta
decorreu algum tempo na medida em que não existia dinheiro para proceder à sua
abertura.
Recorda-se que as eleições desse ano foram preparadas com muita antecedência
na medida em que era a primeira vez que a arguida Fátima concorria como cabeça de
lista do PS à CMF.
Nessa altura não tinha grande confiança com o arguido Horácio, o qual lhe foi
apresentado pela arguida Fátima Felgueiras no gabinete desta. Ele era visto como braço
direito dela e da sua confiança. Sinal disso é o facto dela o ter apresentado, pois não era
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
habitual ela fazê-lo relativamente aos funcionários camarários. De resto, quer o
depoente quer o arguido Horácio Costa foram escolhidos para o “Pelouro das Finanças”
por serem pessoas de confiança e por não questionarem. A arguida Fátima apresentou-o
como colaborador e só à testemunha Leonor é que ouviu tratar o arguido Horácio como
assessor.
A recolha dos fundos que foram depositados na conta referida destinou-se não
só à dita campanha eleitoral como também a outras campanhas e causas (como por
exemplo o “Sovela”).
Como a comissão política não tinha “massa crítica” – era composta sobretudo
por presidentes de juntas de freguesia, designados por “Yes men” - a arguida Fátima
tudo decidia. De resto, as decisões normalmente já estavam tomadas (no GAPP entre os
arguidos Fátima e Bragança e ainda o Sr. José Júlio Pereira) quando expostas na
comissão política.
Já o Secretariado (composto sobretudo por funcionários camarários, como por
ex. o arguido Bragança, o Sr. José Júlio Pereira e o Sr. Silva) tinha alguma massa
crítica.
Fora das reuniões as pessoas criticavam a arguida Fátima, mas nas reuniões nada
diziam.
Deu como exemplo o facto de ter votado desfavoravelmente a gestão por parte
da CMF de um pavilhão gimnodesportivo, tendo sido por isso um pouco afastado.
Na sequência do Dr. Sousa Oliveira ter votado negativamente a concessão de um
apoio na ordem dos 300.000 cts ao FCF pela CMF a arguida Fátima incumbiu o
depoente de propor um voto de desconfiança na Comissão Política, o que fez, tendo
sido tal voto aprovado por unanimidade (depois do Sr. Silva ter votado contra e de ter
declarado que se “enganara”, alterando o seu sentido de voto).
Confrontado com o documento de fls 199 do 1º volume, reconheceu nele, na
parte manuscrita, a letra do arguido Horácio Costa. Referiu que não conhecia o arguido
Vítor Borges.
Sempre apenas recebeu ordens da arguida Fátima Felgueiras no que à campanha
eleitoral de 1997 diz respeito, sendo certo que a recolha de fundos correu à margem do
partido.
O arguido Bragança, por seu turno, estava marginalizado nas actividades de
campanha e procedia tarde e a más horas aos contactos de que era incumbido fazer.
Segundo lhe foi confidenciado por ele as relações entre ambos não eram boas porque ele
aspirava a ser vereador (o que nunca conseguiu).
Quando o arguido Horácio Costa entrou para a CMF o fosso entre os arguidos
Fátima e Bragança aumentou porque aquele “fez-lhe sombra” (o arguido Horácio por
vezes queixava-se à arguida Fátima do cunhado). De resto, o relacionamento entre o
arguido Horácio Costa e o arguido Bragança não era bom, apesar de serem cunhados
(daí que não seja verosímil que o arguido Horácio tenha entrado para a CMF por cunha
do arguido Bragança).
Todos os dias o depoente passava pela CMF para falar com o arguido Horácio a
fim de tratarem de assuntos relacionados com a angariação de fundos para a campanha
eleitoral.
O Horácio Costa tinha ali um gabinete, o qual era o seu local de trabalho.
O depoente e o arguido Horácio não movimentavam a conta a seu bel-prazer.
Era arguida Fátima quem dava as ordens para se proceder aos pagamentos, sendo certo
que lhe era dado conhecimento dos contributos (quem e com quanto contribuíam).
Iam bater à porta de empresários que constavam de uma lista que lhes era
fornecida (não se recorda se essa lista lhes era fornecida pela arguida Fátima ou pelo
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
GAPP, designadamente pelo arguido Bragança) e essas pessoas eram avisadas pelo
GAPP da visita do depoente e do arguido Horácio.
Depreende agora que quer a arguida Fátima quer o arguido Júlio não quiseram
ser titulares da dita conta para evitar qualquer responsabilidade criminal que pudesse ter
lugar.
Telefonou para a PJ quando suspeitou de que poderia haver um “saco azul”, o
que sucedeu quando teve um almoço de trabalho com a testemunha Manuel Faria (com
quem tem relações comerciais) e este lhe fez alusão a esse “saco” quer para a campanha
eleitoral quer para o futebol. Falou acerca desse assunto com o arguido Horácio e
decidiram verificar da veracidade dessa suspeita.
O depoente nunca tomou qualquer iniciativa de fazer pagamentos. Houveram
aliás pagamentos com os quais não concordou.
A gestão da conta do BES era feita pela arguida Fátima Felgueiras e o arguido
Júlio por vezes solicitava a realização de alguns pagamentos (cfr. por ex. doc. de fls 171
do 1º volume).
A arguida Fátima chegou-lhe a entregar vários donativos que angariou (exemplo
disso foi um cheque emitido a seu favor e que estava acondicionado num envelope
endereçado “à atenção da Srª presidente”).
Não tem porém a certeza se os contactos pessoais que ela fez se reportavam à
obtenção de donativos para a camanha ou à obtenção de donativos para o FCF ou
mesmo para o jornal “O Sovela” (acompanhada pelo Sr. Fernando Lima).
Recorda-se que a arguida Fátima disse-lhe que o Eng. Manuel Maria Machado
(que é o técnico que apresenta mais projectos na CMF) tinha a obrigação de entregar um
donativo de três ou quatro mil contos (em 1997 ele entregou dois cheques de donativos
do Sr. Pimenta da “Solpré” e do Sr. Pinto da “Pinfel” – cfr. ponto 2.4. da pronúncia).
Fez a recolha de donativos não só com o arguido Horácio mas também com o
arguido Bragança e o Sr. Sampaio da Lixa. Foi também uma vez com a arguida Maria
Augusta a Lagares tentar obter um donativo do Sr. Júlio Teixeira, conhecido dela.
Foi-lhes entretanto movida uma acção judicial de prestação de contas pelo PS,
sendo certo que, em todo caso, antes disso, quiseram prestá-las à arguida Fátima, a qual
lhes disse para o fazerem ao Dr. Sousa Oliveira, o que não fizeram (tal passou-se antes
do arguido Horácio ser vereador).
Confrontado com a acta da Comissão Política a propósito da organização da
campanha eleitoral de 1997 (junta no decurso da audiência de julgamento e datada de
09.06.97) e onde consta que fazia parte da Direcção de Campanha, referiu que na
prática nada se passava conforme ali estava estabelecido pois era a arguida Fátima quem
mandava de facto e se reunia apenas com 3 ou 4 pessoas (a “task force”: Professor
Edgar, o arguido Horácio Costa, o depoente, o arguido Bragança e o arguido Júlio
Faria), inexistindo qualquer acta.
Era o “núcleo duro” que executava ou mandava executar o que a arguida Fátima
determinava. A arguida Fátima era minuciosa ao ponto de por exemplo determinar a que
hora deveriam os carros com propaganda sonora circular nas ruas.
- Testemunha Maria Fernanda Dá Mesquita Castro Leal
É funcionária da CMF desde 1989, tendo chefiado o Departamento
Administrativo desde 1991, passando a directora do Departamento de Administração
Geral desde 2000 (redenominação do Departamento Administrativo).
Recorda-se que no Verão de 1995 o presidente da autarquia – o arguido Júlio
Faria - interrompeu o seu mandato para ir para a Assembleia da República como
deputado.
116
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Depois disso ele deslocou-se uma vez ou outra durante algum tempo para
assegurar a transição dos processos para a arguida Fátima Felgueiras, a qual lhe sucedeu
na presidência da CMF.
Às reuniões de câmara o arguido Júlio Faria deixou de ir desde que tomou posse
como deputado na Assembleia da República.
A depoente nunca participou ou assistiu a qualquer sessão da Assembleia
Municipal.
Ignora qual a influência política que o arguido Júlio Faria poderia eventualmente
exercer no seio do PS local depois de ter deixado a presidência da CMF.
Sobre os funcionários camarários deixou de exercer qualquer influência.
Acerca do arguido Horácio Costa referiu ter a ideia de que ele dispunha de um
gabinete no edifício da CMF desde que foi admitido como assessor.
Confirma os contactos que ele teve com o Departamento Administrativo no que
tange ao património imobiliário da CMF, não só com a depoente – designadamente
porque desempenha além do mais as funções de notária privativa da CMF - como
também com a funcionária Fernanda Sousa.
Era habitual o Departamento Administrativo fornecer o papel e outro material de
escritório.
Manifestou a ideia de que o arguido Horácio ia à CMF todos os dias.
Não tem ideia da testemunha Cândida ter ocupado o gabinete a que se referiu o
arguido Horácio, mas não pôs em causa a veracidade desse facto.
Recorda-se de ver o arguido Horácio no bar da CMF mas não se recorda se o via
lá todos os dias.
- Testemunha Cândida da Ascenção Ribeiro da Costa
É funcionária da CMF há cerca de 19 anos. Quando foi admitida foi exercer
funções no Gabinete de Imprensa e depois foi para o Gabinete de Apoio ao Presidente
(na altura o arguido Júlio Faria, durante dois mandatos), onde dava apoio
administrativo.
Em 1996/97 foi transferida para a Secção de Expediente Geral (Departamento
Técnico) e em 2001 foi para o Gabinete de Atendimento (altura em que esse gabinete
abriu).
Conheceu o arguido Horácio Costa nos tempos de escola.
Ele prestava funções de gestor do Centro Coordenador de Transportes, ao que
pensa em 1996, como avençado. Nessa altura a depoente estava no GAPP e passou para
a recepção.
O arguido Horácio Costa tinha um gabinete no edifício do Centro Coordenador
de Transportes, onde também trabalhava a testemunha David Mota Queirós.
Por vezes, como vagou um gabinete usado pelo Vereador José da Silva Campos,
o arguido Horácio usava-o para fazer alguns atendimentos e para ultimar assuntos
relacionados com a venda das lojas do Centro Coordenador dos Transportes.
Em meados de um ano que não pode precisar (talvez 1997), no Verão (já era
presidente da CMF a arguida Fátima Felgueiras), a depoente foi de férias e quando
regressou ocupou esse gabinete no edifício da CMF durante cerca de dois meses, antes
de ser transferida para a Secção de Expediente Geral – Obras Particulares (transferência
que lhe foi comunicada pelo arguido Barbieri Cardoso).
Enquanto a depoente ali esteve (entre Setembro e Outubro de 1997) o Dr. Sousa
Oliveira não usou o dito gabinete.
Ao contrário do que referiu o arguido Horácio Costa não ficou desagradada com
essa transferência e não contactou o arguido Júlio Faria para se lamentar desse facto.
117
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Não pôs em causa o carácter diversificado das funções do arguido Horácio e
referiu não saber se a testemunha David Mota Queirós partilhava com ele um gabinete
no Centro Coordenador de Transportes.
*
Foi efectuada uma acareação entre o arguido Horácio Costa e a testemunha
Cândida de Ascenção Ribeiro da Costa, da qual resultou que cada um manteve a
respectiva versão dos factos, designadamente no que respeita ao facto do arguido
Horácio ter ocupado ou não um gabinete no edifício da CMF (o arguido Horácio
chamou à atenção para o facto de que o edifício do Centro Coordenador de Transportes
à data estava em acabamentos pelo que não poderia ocupar qualquer gabinete nesse
edifício, como emerge dos relatórios mensais que na altura remetia à arguida Fátima
Felgueiras, designadamente o que diz respeito a Janeiro de 1997. Já a testemunha David
Queirós, segundo o arguido Horácio, entrou para a CMF em finais de 1998).
A testemunha Cândida, apesar de manter o seu depoimento, admitiu que o
arguido Horácio Costa pudesse ir todos os dias ao dito gabinete na CMF mas não estava
lá todo o dia. Depois de 1997 admitiu não saber se ele ocupou ou não esse gabinete pois
saíu de lá.
O arguido Horácio Costa acrescentou ainda que a testemunha em causa ficou
aborrecida com a transferência e que isso sucedeu porque ela era próxima do vereador
José Campos, eleito pelo PSD. Foi por isso que o arguido Bragança diligenciou pela
substituição dela pela testemunha Leonor Couto. Reafirmou que assistiu a telefonemas
dela para o arguido Júlio Faria , onde se lamentava desse facto.
O Dr. Sousa Oliveira, segundo a testemunha Cândida, ocupou um gabinete ao
lado do Departamento Administrativo e não o gabinete em causa, quando foi presidente
da Assembleia Municipal de Felgueiras.
Acrescentou que depois das eleições de 1997 o arguido Horácio Costa exercia
funções por ali mas não sabe que gabinete ocupava, sabendo que o ocupou enquanto
vereador a tempo inteiro.
O arguido Horácio Costa retorquiu que o Dr. Sousa Oliveira de facto ocupou um
gabinete ao lado do Departamento Administrativo para impedir que fosse ocupado por
vereadores eleitos pelo PSD, altura em que o gabinete em causa lhe foi definitivamente
atribuído.
*
- Testemunha Edgar Pinto da Silva
Referiu ser militante do PS desde 1996. Foi vereador na CMF de 1997 a 2001
(na sequência das eleições autárquicas de Dezembro de 1997), onde tinha o pelouro da
educação, do ambiente (não se recorda em que altura do seu mandato), dos cemitérios,
das contra-ordenações (mais tarde) e da “Casa do Risco”.
A propósito da campanha eleitoral referente às eleições autárquicas de 1997
referiu que participou em reuniões preparatórias para que as várias equipas fossem no
dia seguinte às juntas de freguesia realizar acções de campanha.
Nessas reuniões participavam, designadamente, os candidatos à vereação e à
Assembleia Municipal e a arguida Fátima Felgueiras, além de outros militantes e
simpatizantes do PS.
Assim, participou em reuniões onde estiveram presentes, designadamente, os
arguidos Fátima Felgueiras, Júlio Faria, Horácio Costa, Joaquim Freitas, António
Pereira, António Bragança da Cunha e Maria Augusta Neves, além das testemunhas
Júlio Pereira e Orlando Sousa, entre outros militantes e simpatizantes.
Tais reuniões não eram restritas.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
No final de cada dia realizava-se um encontro na sede de campanha a fim de se
fazer um balanço das acções levadas a cabo nesse dia.
Na altura o depoente era inexperiente nas questões políticas.
Não tem a certeza se fazia parte ou não da direcção de campanha
Pese embora nas reuniões se falasse da compra do material necessário para a
campanha não se debatiam questões de ordem financeira, pelo menos que se lembre.
Nunca assistiu a qualquer reunião onde o pelouro das finanças estivesse em
discussão. Nessa altura, aliás, não sabia quem integrava esse pelouro, o que só veio a
saber depois da toda a celeuma que deu origem a estes autos.
Ignora pois de que forma as despesas de campanha eram pagas bem como a
quem eram entregues os documentos para o pagamento dessas despesas.
Nunca viu qualquer manuscrito alusivo ao pelouro das finanças.
Para além dessas reuniões mais alargadas existiam reuniões mais restritas do
“núcleo duro”, não se recordando se nelas participava ou não.
Conhece o arguido Horácio Costa desde a altura da campanha eleitoral referida.
Ele participou nela desde Maio/Junho de 1997, participando inclusive nas reuniões
referidas. Nelas não se recorda de alguma vez ter sido levantada alguma questão
relacionada com o pagamento de despesas de campanha.
Ele, de resto, organizava as pessoas para irem às juntas de freguesia em acções
de campanha e era o responsável pelos carros de som. Era enfim o responsável pela
organização da campanha.
Sabe que ele antes de ser vereador foi assessor da arguida Fátima Felgueiras
(ignora desde quando, mas talvez desde 1996), ou pelo menos assim sempre foi
considerado.
No âmbito das suas funções, o arguido Horácio Costa atendia munícipes na falta
da arguida Fátima Felgueiras e tinha a seu cargo o Centro Coordenador de Transportes.
Tem a ideia de que ele era também assessor político da arguida Fátima Felgueiras.
Salientou porém o depoente que ia só de vez em quando à CMF.
Ainda a propósito da campanha eleitoral referiu que as pessoas eram
distribuídas por várias tarefas. Lembra-se por exemplo de ter substituído o arguido
Horácio Costa em certa ocasião no que se refere ao percurso efectuado por um carro
equipado com aparelho de som e que divulgava propaganda política. O depoente, de
resto, para além de organizar os percursos dessas viaturas, ia às juntas de freguesia e
organizava sessões de esclarecimento.
Foi confrontado então com as declarações que prestou perante a JIC a fls 7772,
último parágrafo e primeiras duas linhas de fls 7773 e linhas 15 a 27 de fls 644.
Em face desse confronto admitiu que foi na fase final da campanha eleitoral que
soube quem eram os responsáveis pelo pelouro das finanças (não obstante, perante a JIC
havia afirmado que só tinha tomado conhecimento desse facto já no decurso deste
processo). Não soube porém explicar a sua razão de ciência.
A propósito da forma como as pessoas eram escolhidas para integrar os
diferentes pelouros referiu que a escolha era decidida em conjunto, mas que a arguida
Fátima Felgueiras tinha sempre a última palavra. Foi pois a arguida Fátima quem em
última análise escolheu os membros da comissão de campanha.
Tem a ideia de que a campanha eleitoral terá custado cerca de
50/60.000.000$00.
Todos dependiam do que a arguida Fátima Felgueiras decidia e o arguido
Horácio não seria excepção.
Ela tem uma personalidade forte e tudo o que ordenasse tinha de ser feito. Julga
por isso que o arguido Horácio Costa não tinha autonomia.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Na altura não chegou a saber da existência da conta do BES referida nos autos.
Soube dela mais tarde numa reunião de câmara quando o Vereador Manuel Faria lhe
perguntou se conhecia a dita conta e lhe respondeu negativamente.
Pensa que a arguida Fátima Felgueiras teria de ter conhecimento da mesma pois
era ela quem mandava e, conhecendo-a como conhece, o arguido Horácio Costa não a
iria abrir sem prévio conhecimento dela.
O arguido Horácio Costa era pessoa organizada e fiel à arguida Fátima.
Quando o depoente assumiu as funções de vereador, em Janeiro ou Fevereiro de
1998, o arguido Horácio Costa ocupava um gabinete na CMF. Tem a certeza desse facto
enquanto foi Vereador da CMF.
Antes disso tem a ideia que ele partilharia esse gabinete com o Vereador
Lickfold, mas não tem a certeza desse facto, pois só esporadicamente ia à CMF (tem a
ideia de ter falado com a arguida Fátima no GAPP quando foi convidado para integrar a
lista do PS às eleições autárquicas de 1997 e o arguido Horácio encontrava-se ali).
Nunca presenciou qualquer conversa entre os arguidos Fátima e Horácio a
propósito das contas da campanha.
Porém, recorda-se de certa vez, no final de uma reunião no gabinete da arguida
Fátima, do arguido Horácio lhe ter querido mostrar as contas (que interpretou ser da
campanha eleitoral), ao que ela lhe respondeu que as contas estavam bem entregues a
ele (foi na altura em que o arguido Horácio passou de assessor a vereador). O arguido
António Pereira Mesquita de Carvalho estava também presente.
As relações entre os arguidos Horácio Costa e Fátima Felgueiras começaram a
detriorar-se quando o arguido Horácio se manifestou contra a proposta da arguida
Fátima no sentido de que a CMF adquirisse o Estádio Dr. Machado Matos. A esse
propósito ocorreu um jantar na “Pensão Albano” com todos os vereadores (incluindo da
oposição) e a presidente da edilidade, sendo certo que no trajecto para aquele
estabelecimento a arguida Fátima, junto ao edifício da CGD, estando presentes o
depoente e os arguidos Horácio e António Pereira, reagiu mal ao facto de todos
manifestarem oposição a essa proposta, dizendo que quem decidia era ela, avisando os
eventuais dissidentes de que lhes retiraria os pelouros caso fossem vereadores.
Naturalmente que essa advertência foi tida como uma ameaça. Ora só o arguido Horácio
Costa, no dito jantar, abertamente contrariou a posição da arguida Fátima Felgueiras,
justificando essa oposição com o facto de estar “cansado” de receber dinheiro no seu
gabinete para liquidar dívidas do FCF e do arguido Júlio Faria.
No âmbito das suas funções de vereador não tinha autonomia, pois nada se fazia
na CMF sem a autorização e o conhecimento da arguida Fátima Felgueiras.
Normalmente as decisões eram tomadas em reuniões de vereação, mas a última
palavra cabia sempre à arguida Fátima Felgueiras.
Não se recorda de ter desabafado com o arguido Horácio Costa de que “nem
sequer podia pregar um prego numa escola” (apesar de ter o pelouro da educação), mas
admite que possa ter efectuado com ele esse desabafo.
Quanto à autonomia dos demais vereadores julga que ela era partilhada com a
arguida Fátima Felgueiras. Ela tinha sempre a última palavra e intrometia-se no trabalho
dos vereadores. Revelava-se pouco flexível e impunha a sua vontade.
De resto, ela sabe impor-se e as pessoas iam um pouco a “reboque” das ideias
dela. Ela manifestava conhecimento em todas as áreas e enquanto presidente da CMF
tinha de se ingerir nos assuntos dos vereadores. Avocava a si as competências dos
vereadores, de modo que era ela quem praticamente tudo fazia, às vezes sem o
conhecimento do vereador responsável pelo pelouro ao abrigo do qual certa acção era
desenvolvida.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Ainda quanto ao modo de agir da arguida Fátima Felgueiras confirmou as
declarações que prestou a fls 7776, 1º e 2º parágrafo.
Não obstante ter tido o pelouro do ambiente quase nenhuma acção desenvolveu
nessa área.
Admite que o problema dos lixos tivessem a ver com o pelouro do ambiente e
que na altura era, ao que pensa, a “Resin” que recolhia e tratava o lixo, operando no
aterro de Sendim.
À pergunta efectuada no sentido de saber se o depoente participou em alguma
reunião entre a CMF e responsáveis da “Resin” respondeu ter participado numa reunião
na lixeira por causa dos lixiviados. Tem a ideia de que os elementos da “Resin” se
deslocavam à CMF para solicitar a efectivação dos pagamentos de facturas apresentadas
por prestadores de serviços nesse domínio.
Era a arguida Fátima Felgueiras quem tratava directamente com a “Resin”, à sua
revelia (não obstante ter o pelouro do ambiente). Ela achava que o depoente não tinha
capacidade para estar com esse pelouro, ignorando, em face disso, por que motivo lho
terá sido atribuído.
Aliás, incomodava-o o facto de por vezes saber que ela estava reunida na CMF
com empresas ligadas ao ambiente sem que ao depoente fosse dado conhecimento
sequer.
- Testemunha Maria Leonor Alves da Costa
Entrou em 1985 para a CMF como auxiliar de serviços gerais.
Em 1997 (ao que pensa), foi substituir a testemunha Cândida no GAPP no
respectivo período de férias (pensa que na 2ª quinzena de Agosto), o que normalmente
também sucedia quando ela faltava muito esporadicamente (era o arguido Bragança
quem a chamava para a substituir). Hoje exerce funções no GAPP.
Referiu que o arguido Horácio Costa não ocupava qualquer gabinete na área
política do edifício da CMF. Tal só veio a suceder quando o Vereador Lickfold
renunciou ao cargo e o arguido Horácio passou a exercer a função de vereador (em todo
o caso, o arguido Horácio, quando se deslocava à CMF, chegou também a utilizar esse
espaço quando o Vereador Lickfold ainda não tinha renunciado e não se encontrava na
CMF, já que este apenas ali se deslocava ou de manhã ou de tarde, ocupando o arguido
Horácio a secretária mais pequena).
Quando a testemunha Cândida regressou de férias no Verão de 1997 ocupou um
gabinete na área política do edifício da CMF.
O arguido Horácio Costa era o responsável pelo Centro Coordenador de
Transportes, sendo certo que sabe que ele dispunha de um gabinete nesse edifício
(nunca o viu porém a ocupá-lo). A sua razão de ciência deve-se ao facto de ter atendido
na CMF potenciais interessados na aquisição de lojas do Centro Coordenador de
Transportes e remetia-os para o arguido Horácio Costa naquele centro.
Além disso, quando o arguido Horácio ia à CMF pedia à Cândida para utilizar o
gabinete que estava atribuído a esta, pois entendia que tinha mais dignidade que o
gabinete de que dispunha no Centro Coordenador de Transportes para receber os
potenciais interessados na aquisição das lojas daquele centro (situação que se verificou
no período compreendido entre o momento em que a Cândida regressou de férias e o
momento em que foi transferida para o Departamento Técnico). Recorda-se aliás que o
arguido Horácio Costa certa vez lhe disse que o seu gabinete no Centro Coordenador de
Transportes era impessoal.
A testemunha David Mota, ao que presume, chegou a partilhar com o arguido
Horácio um gabinete no Centro Coordenador de Transportes. A sua razão de ciência
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
deve-se ao facto de os ver regressar (presumivelmente) daquele centro. Em todo o caso,
à pergunta feita no sentido de se saber se o dito gabinete no Centro Coordenador de
Transportes era ocupado pelo arguido Horácio Costa ou pela testemunha David Mota,
respondeu apenas não saber quem o ocupou em primeiro lugar.
Não conhecia ao arguido Horácio qualquer outra função, sendo certo que nunca
ouviu dizer que ele fosse assessor da arguida Fátima Felgueiras.
A esse propósito foi confrontada com as declarações prestadas perante a JIC a
fls 7812, linhas 14ª a 20ª, tendo referido a esse propósito que só por lapso proferiu tais
declarações, pois estava nervosa e com muita pressão (a posição agora assumida pela
testemunha e a explicação que deu para a discrepância assinalada pareceu-nos
manifestamente inverosímil).
Por outro lado, a propósito das audiências concedidas pela arguida Fátima
Felgueiras, a testemunha Cândida ia buscar os processos de licenciamento e elaborava
uma ficha com as questões que os munícipes iriam colocar nas audiências com a
presidente. Tal sucedeu até à transferência da Cândida para o Departamento Técnico,
por alturas do Natal de 1997.
Esclareceu que o arguido Horácio Costa recebia munícipes uma vez ou outra
quando a arguida Fátima Felgueiras estava ausente. Presume que o fazia por indicação
da arguida Fátima. Ignora quais os assuntos tratados em tais audiências.
Nessas ocasiões o arguido Horácio recebia os munícipes no gabinete que
ocupava na ausência do Vereador Lickefold.
Não sabe precisar se tal já sucedia antes de 1998 (acabou por referir que antes
das eleições autárquicas de 1997 isso não sucedia).
Admite que para se ser assessor da presidente teria de existir confiança política.
Ignora porém de que forma o arguido Horácio Costa foi recrutado.
Ignora qual era o horário de trabalho desse arguido e não se recorda se ele ia à
CMF todos os dias. Porém, se ele se deslocasse todos os dias à CMF naturalmente
cruzar-se-ia consigo todos os dias, o que não sucedia.
Confrontadas com as declarações prestadas perante a JIC a fls 7813, linhas 17ª a
22ª, confirmou-as.
Precisou, a propósito, que o gabinete referido não era do arguido Horácio (tal
afirmação não se coaduna com a afirmação contrária feita perante a JIC) e que já não se
recorda se ele o partilhava com o Verador Lickefold ou com a testemunha Cândida. Isto
é, quando ele tinha necessidade de ali receber munícipes, ele pedia autorização ou ao
Verador Lickefold ou à testemunha Cândida para usar tal espaço (tal depende do
momento temporal em que tal sucedeu).
Ignora se o arguido Horácio guardava o seu arquivo pessoal nesse gabinete.
*
Efectuada uma acareação entre o arguido Horácio Costa e as testemunhas
Fernanda Leal, Terezinha do Nascimento e Cândida Costa, no essencial
reafirmaram a posição já antes expressa acerca do facto do arguido Horácio Costa
ocupar ou não um gabinete no edifício da CMF (como sintoma ao fim ao cabo da
relação de confiança mútua então vivida entre ele e a arguida Fátima).
A esse propósito, com relevo, a testemunha Terezinha do Nascimento
acrescentou que era muitas vezes confrontada com orçamentos de obras apresentados
pelo arguido Horácio Costa (relacionados com património imobiliário da CMF) e por
vezes contactava-o telefonicamente numa extensão interna do edifício onde está
instalada a CMF.
O arguido Horácio Costa referiu que o vereador Lickefold tinha outros interesses
para além da CMF (era por ex. comandante dos Bombeiros Voluntários de Felgueiras),
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
daí que só exercesse funções a meio tempo, sendo certo que ainda assim procurava
empurrar para o depoente os assuntos que a ele competiam porque não estrava disposto
a receber ordens da arguida Fátima Felgueiras.
Tanto quanto lhe permite a memória, ele não terá exercido efectivas funções de
vereador mais do que 6 meses, após o que passava pela CMF sem qualquer assiduídade,
acabando por renunciar ao cargo de vereador ao fim de cerca de 1 ano após ter tomado
posse.
Quando isso sucedeu foi incumbido de tarefas que anteriormente estavam sob a
responsabilidade do Sr. Lickefold.
Esclareceu que quando ocupou esse gabinete o mesmo tinha 1 mesa redonda, 2
sofás, 2 armários, 1 mesa de telefone, sendo certo que o arguido Bragança e a
testemunha Júlio Pereira confidenciaram-lhe que a outra mesa que ali existia tinha ido
para casa da arguida Fátima para ela nela despachar os processos, tendo o GAPP ali
colocado uma mesa nova e 2 cadeiras. A testemunha Cândida, segundo o arguido
Horácio, ocupou a mesa que já lá existia durante o tempo em que ambos ocuparam esse
espaço (a testemunha Cândida referiu que nesse gabinete nunca existiram armários em
madeira enquanto o ocupou e que quando o arguido Horácio lhe pedia para usar esse
espaço usava a secretária mais pequena, sinal de que o gabinete fora-lhe atribuído e que
ele só o usava porque o permitia, posição que o arguido Horácio rejeitou).
Segundo o arguido Horácio, quando a testemunha Cândida de lá saiu, salvo erro,
o arguido Bragança mandou adquirir dois armários e duas cadeiras a condizer com o
mobiliário que tinha ali instalado quando depoente foi ocupar esse espaço por indicação
da arguida Fátima Felgueiras. O depoente procurava acondicionar os seus dossiers o
melhor que pôde nos armários antes existentes e que já estavam atolhados, sendo certo
que entretanto acomodou devidamente os seus dossiers nos novos armários (os quais
dispunham de chave).
A testemunha Cândida entretanto reconheceu que partiu do pressuposto que o
arguido Horácio tinha um gabinete no Centro Coordenador de Transportes (sem
verdadeira razão de ciência, porque nunca o viu a ocupar esse gabinete) e explica o
facto dele por vezes usar o gabinete na CMF referido porque, segundo o que agora
ouviu a esse arguido, o Centro Coordenador de Transportes não estaria concluído.
*
- Testemunha Joaquim José Teixeira Ribeiro
Disse ser presidente da junta de freguesia de Refontoura desde 14.12.97 até ao
presente (eleito pelo PSD) e, como tal, deputado na Assembleia Municipal de
Felgueiras.
De 24.04.99 até Fevereiro de 2001 foi o presidente da Comissão Política do PSD
local. Integrou a Comissão Política do PSD local de Março de 1996 até há cerca de 3-4
meses, considerando a data da tomada do seu testemunho.
Segundo conversas que ouviu (não soube precisar de quem as ouviu), o arguido
Horácio Costa era assessor da presidente da edilidade. Tal facto aliás era do domínio
público.
Uma das suas funções (do arguido Horácio) era a de receber presidentes de junta
(algumas vezes recebeu o depoente) e transmitia depois à arguida Fátima as
preocupações que nessas reuniões lhe eram transmitidas. Tratavam-se de assuntos de
resolução simples e notou que ele tinha autonomia para os receber. Tem aliás a ideia
que ele o fazia na qualidade de assessor da arguida Fátima Felgueiras.
Assim, por exemplo, uma das situações que tratou com ele numa dessas reuniões
prendia-se com o reforço das comparticipações da CMF às juntas de freguesia.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
O arguido Horácio Costa estava de resto numa situação de algum privilégio em
relação a qualquer outro funcionário da CMF.
Porém, a partir de meados de 1999 deixou de poder reunir-se com o arguido
Horácio Costa.
Hoje aliás é a própria Fátima Felgueiras quem recebe os presidentes de junta.
- Testemunha José Orlando Dias da Rocha e Sousa
Foi candidato à Assembleia Municipal de Felgueias nas eleições autárquicas de
1993, 1997, 2001 e 2005 (hoje é o presidente da Assembleia Municipal de Felgueiras).
Nas eleições de 1997 integrou como independente as listas do PS e fez parte da
Direcção de Campanha do PS (de que também fazia parte o arguido Júlio Faria, os
candidatos à Assembleia Municipal e à CMF e os candidados a presidentes de junta).
Alguns membros tinham tarefas especificas, como por exemplo o arguido Júlio
Faria (coordenação), a arguida Fátima Felgueiras (estratégia política) e os arguidos
Horácio Costa e Joaquim Freitas (aspecto financeiro da campanha).
Foram os responsáveis máximos do ponto de vista político quem escolheram as
pessoas, designadamente a arguida Fátima Felgueiras, o Sr. Lickfold, o Prof. Edgar, o
Sr. Álvaro Costa, os arguidos Horácio Costa e António Pereira e o Dr. Barros Moura
(este último candidato à Presidência da Assembleia Municipal de Felgueiras). O
depoente, por sua vez, não fazia parte desse grupo.
Os arguidos Horácio Costa e Joquim Freitas eram os responsáveis pela
angariação de fundos para a campanha e pelo pagamento das inerentes despesas.
Como não estava bem por dentro desses assuntos (tanto mais que era
independente) ignora se o aspecto financeiro da campanha eleitoral era processado de
forma independente em relação ao PS.
Em todo o caso, deduz que se movimentaram consideráveis somas de dinheiro
em face da logística financeira existente.
As pessoas davam as suas contribuições em dinheiro ou em cheque e os arguidos
Horácio Costa e Joaquim Freitas usavam esse dinheiro para pagar as despesas de
campanha.
Pensa que eles abriram inclusive uma conta bancária, tendo essa ideia na medida
em que a certa altura foi-lhe solicitado que arranjasse rapidamente uns pendões e
bandeiras porque tinha contactos em empresas de publicidade e que poderiam fornecer
esse tipo de material. Ora, o depoente adiantou a quantia necessária para a aquisição
desse material (pois as empresas exigem o pagamento no acto do levantamento do
material em tempo de campanha eleitoral), da qual foi reembolsado através de um
cheque endossado pelo arguido Júlio Faria (que lhe havia prometido o reembolso),
cheque esse que foi entregue pelo arguido Horácio Costa. Não se recorda quem lhe fez a
solicitação, mas lembra-se que lhe foi feita numa reunião da Direcção de Campanha,
quando esta já estava na recta final.
Confrontado com o “post it” de fls 171 (manuscrito pelo arguido Júlio Faria) e
com cópia do cheque de fls 172, no valor de 800 cts e datado de 09.12.97, sacado sobre
a conta do BES titulada pelos arguidos Horácio e Joaquim Freitas, confirmou que o
cheque em causa foi aquele que lhe foi entregue pelo arguido Horácio Costa de modo a
reembolsá-lo da quantia que desembolsara com a aquisição das bandeiras e dos
pendões. Quanto ao “post it” não reconhece a respectiva letra, ignorando quem seja o
“Nequinhas”, sendo certo que a alusão a um tal de “David” se pode reportar a um dos
candidatos à Assembleia Municipal.
Em face do recebimento desse cheque, sacado sobre aquela conta do BES, deduz
que a mesma se reportasse à campanha eleitoral, sendo certo que ouviu dizer que outros
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
pagamentos foram efectuados através de tal conta, deduzindo ainda que tal facto era do
conhecimento de outras pessoas ligadas ao PS.
Referiu que é normal que numa campanha surjam necessidades de última hora,
as quais são sentidas em função das ideias que se vão concretizando, incumbindo-se
dessa tarefa normalmente a pessoa que esteja em melhores condições de fazer as
encomendas de material que se revelem necessárias, cabendo depois aos arguidos
Horácio Costa e Joaquim Freitas proceder ao respectivo pagamento.
Todos os que estavam presentes nessas reuniões sabiam que era assim. Em todo
o caso, os elementos do “núcleo duro” eram mais assíduos (candidatos à CMF, os
primeiros 10 da lista de candidatos à Assembleia Municipal e cinco ou seis candidatos a
presidente das juntas de freguesia mais importantes).
Por que a estrutura montada era composta de voluntários, era normal que se
registassem ausências às reuniões.
Deduz que a arguida Fátima soubesse que os arguidos Horácio e Joaquim Freitas
estavam encarregues de proceder aos pagamentos na medida em que ela era a figura
máxima.
Fez a distinção entre a Direcção de Campanha (que era um grupo mais restrito) e
a Comissão de Apoio à candidatura da arguida Fátima Felgueiras (que era um grupo
bem mais alargado e composto por pessoas da sociedade civil que apoiavam a
candidatura da arguida Fátima e cuja identificação era normalmente divulgada em papel
de formato A4).
O “núcleo duro” é que determinava quais as acções de campanha que deveriam
ser levadas a cabo, bem como a aquisição dos produtos a fim de serem usados em tais
acções.
Os arguidos Horácio e Joaquim Freitas tinham autonomia para angariar fundos,
presumindo que tivessem tal autonomia no que se refere aos pagamentos, tanto mais
que faziam parte do “núcleo duro”.
Ignora se mais alguém angariou fundos para além dos arguidos Horácio Costa e
Joaquim Freitas.
Nas reuniões em que esteve presente não se recorda de alguma vez se ter
debativo questões que se prendessem com o aspecto financeiro da campanha.
À pergunta efectuada no sentido de se saber se as acções de campanha eram
decididas em função das disponibilidades financeiras referiu que as campanhas
normalmente são geridas de forma irracional, daí os déficites.
Não se recorda de alguma vez os arguidos Horácio Costa e Joquim Freitas terem
alertado para a existência de dificuldades financeiras em face da disponiblidade
necessária para custear certas acções de campanha. Aliás, tais questões eram
secundarizadas. A preocupação centrava-se mais na estratégia política e nas acções de
campanha a levar a cabo.
*
A propósito das declarações prestadas pela testemunha José Orlando Dias da
Rocha e Sousa, o arguido Horácio Costa começou por salientar que desde a abertura do
inquérito que deram origem a estes autos a estratégia da arguida Fátima Felgueiras e das
pessoas que a rodeiam orientou-se no sentido de imputar apenas ao depoente e ao
arguido Joaquim Freitas a responsabilidade pela abertura da conta do BES e pela
angariação de fundos.
Acrescentou que a testemunha Orlando Sousa só foi para o PS depois de corrido
do PSD, segundo ouviu dizer, por se ter aproveitado economicamente nesse partido.
No PS ele não teve qualquer papel de destaque e teve pouco poder de
intervenção.
125
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Movimentou-se nos meandros do FCF.
Fez fornecimentos para a campanha eleitoral respeitante às eleições autárquicas
de 1993.
Chegou a jurar vingança ao depoente.
Todas as manhãs de Domingo, na “Rádio Felgueiras”, ele tinha intervenções que
demonstravam grande animosidade para com a pessoa do depoente.
Não o considera por isso uma testemunha fiável.
Além disso, mantém com a arguida Fátima Felgueiras uma relação de grande
amizade.
Ademais, partir do momento em que tomou posições consentâneas com a
posição da arguida Fátima e de ataque ao depoente conseguiu ascender à presidência da
Assembleia Municipal de Felgueiras.
A propósito da encomenda dos pendões e das bandeiras, assegurou não ter
presenciado a solicitação nesse sentido à testemunha referida, sendo certo que ele
solicitou-lhes (ao depoente e ao arguido Joaquim Freitas) o pagamento da quantia
referente ao preço dos mesmos, pedido a que só acederam quando receberam o “post-it”
de fls 171.
O cheque foi entregue ao “Nequinhas”, que por sua vez o terá entregue à
testemunha Orlando Sousa.
*
- Testemunha Horácio António Magalhães Lopes dos Reis
É vereador da CMF, tendo sido já membro da Assembleia Municiapal, eleito
pela lista do PS nas eleições autárquicas de 1993. Para além disso é administrador de
várias empresas, entre as quais a “Marfel”.
Referiu que fez parte do conselho editorial da revista “Rubias” e que não fez
parte da direcção de campanha nas eleições autárquicas de 1997 (pelo PS).
Nas reuniões não era assíduo.
*
A propósito destas declarações, referiu o arguido Júlio Faria que a testemunha
em causa, conforme resulta dos documentos que entregou no decurso da audiência de
julgamento alusivas às actas das reuniões onde se definiram os pelouros, fez parte da
direcção de campanha, da comissão coordenadora e do pelouro da comunicação (que
tinha a seu cargo a revista “Rubias”).
Acrescentou que normalmente nas actas constava a indicação das pessoas
presentes nas reuniões, admitindo que a testemunha Horácio Reis não fosse assíduo.
*
A testemunha Horácio Reis reiterou que não fazia parte da direcção de
campanha, sendo certo que o lugar que ocupava na lista do PS para a Assembleia
Municipal não era determinante (ocupava um lugar abaixo do 10º).
O depoente não tratou do que quer que seja que não fosse da revista “Rubias” e
da comunicação social no período de campanha eleitoral.
Por norma, a direcção dos partidos têm regras estatutárias acerca da escolha dos
candidatos.
Confrontado com as actas de fls 12206 e ss., onde o seu nome é referido como
fazendo parte da direcção de campanha, referiu ter sido a primeira vez que viu esse
documento, admitindo apenas que quem elaborou esse documento estivesse a contar
consigo para a direcção de campanha, da qual efectivamente nunca fez parte.
Seja como for, não assinou qualquer um desses documentos nem teve qualquer
intervenção na respectiva elaboração.
De resto, não fazia parte sequer do chamado “núcleo duro”.
126
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Nas eleições de 1993 e 1997 não era obrigatória a elaboração de actas das
reuniões.
Nas eleições de 2005 a elaboração dessas actas já era obrigatória (nestas eleições
já fez parte da direcção de campanha).
*
A propósito destas declarações a arguida Fátima Felgueiras referiu que a
testemunha Horácio Reis não fez parte da direcção financeira da campanha nas eleições
de 1997, sendo certo que participou no grupo de trabalho da comunicação social (que
tinha a seu cargo a revista “Rubeas”).
A testemunha em causa, para além disso, fez parte da direcção de campanha e
esteve presente em reuniões onde se definiu a orientação política a seguir nas sessões de
esclarecimento.
Era o secretário-coordenador quem tinha de organizar esses eventos, entendendo
que a divergência de depoimentos é mais de natureza semântica no que diz respeito ao
facto da testemunha em causa ter ou não integrado a direcção de campanha.
Ademais, todas as pessoas que integravam a lista do PS faziam parte da direcção
de campanha (facto que, em todo o caso, não coincide com o teor das actas juntas pelo
arguido Júlio Faria).
Como a depoente raramente ia às reuniões do “núcleo duro” (só ia às reuniões
em que estava em causa a orientação política), não pode precisar se ele fazia ou não
parte desse núcleo.
A testemunha esteve também presente em reuniões de plenário e de orientação
política.
*
Ainda a propósito desta temática, o arguido Horácio Costa salientou que não
reconhece nos documentos de fls 12206 e ss. a natureza de actas das reuniões. Foi o
arguido Bragança quem entregou esses documentos ao arguido Júlio Faria, sendo certo
que o depoente nunca fez quaisquer actas (segundo esses documentos caberia ao
depoente redigí-las, o que nunca sucedeu).
Na ocasião em que estas questões vieram a público o arguido Bragança
organizou uma reunião em sua casa com a testemunha Júlio Pereira, onde fizeram a
composição de documentos e actas (os documentos que foram juntos pelo arguido Júlio
Faria), pelo que não lhes atribui qualquer credibilidade.
Refutou as declarações acima exaradas e pertencentes à arguida Fátima, pois a
direcção de campanha não tinha a abrangência que ela pretendeu transmitir.
Ela era a presidente da Comissão Política do PS local e não existiam quaisquer
actas das reuniões desse órgão.
Nas reuniões eram feitas listas de presenças mas não actas.
Os nomes colocados nos documentos juntos pelo arguido Júlio Faria foram ali
colocados sem o conhecimento dos próprios.
A testemunha Horácio Reis não fez parte da direcção de campanha, sendo certo
que ele não aparecia às reuniões, pois tinha pouca disponibilidade, mesmo para
colaborar com a revista “Rubeas”.
O Jornalista João Ivo era pago pelo grupo que organizava a revista e não através
da conta do BES.
*
- Testemunha Gonçalo Alberto Alves da Costa Magalhães
Referiu ser assistente administrativo especialista na CMF, ao serviço da qual foi
admitido há 21 anos. Além disso, entre 92/93 e 2000/2001, prestou apoio à Comissão
Especializada de Fogos Florestais, a qual era presidida pelo presidente da CMF, e
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
integrava-na um elemento da GNR, elementos das duas coorporações de bombeiros do
concelho (BV de Felgueiras e BV da Lixa), por elementos da “Associação Florestal do
Vale do Sousa” e por um representante da zona agrícola do Vale do Sousa.
Tal comissão tinha uma conta bancária e era o presidente da CMF ou os dois
comandantes de cada uma das coorporações de bombeiros, na ausência daquele, que a
poderiam movimentar (testemunha Luís Queirós, enquanto comandante dos BV da
Lixa, e o Sr. Lickfold, enquanto comandante dos B.V. de Felgueiras).
Os assuntos eram discutidos e decididos nas reuniões dessa comissão.
Era a presidente da edilidade quem geria o dia-a-dia da comissão, mas as
decisões mais importantes eram tomadas nas reuniões, na qual todos os elementos
poderiam participar.
Do depoimento desta testemunha não resultou que a arguida Fátima impusesse a
sua vontade nas decisões tomadas no seio da comissão.
- Testemunha Luís Magalhães Pinto de Queirós
Referiu que é professor aposentado, tendo sido comandante dos B.V. da Lixa
durante 34 anos (até 2001).
Enquanto comandante dos BV da Lixa integrou a “Comissão Especial de Fogos
Florestais” desde a sua criação até 2001.
Integravam essa comissão, para além da presidente da CMF, os dois
comandantes dos B.V. do concelho e um representante dos Serviços Florestais.
Reuniam muitas vezes, sobretudo antes da época dos fogos florestais.
Tal comissão tinha uma conta bancária e o depoente tinha poderes para a
movimentar. Admite que a possa ter movimentado, mas não se recorda se de facto tal
sucedeu.
As decisões eram discutidas e deliberadas em conjunto, sendo certo que
ninguém impunha o que quer que seja.
- Testemunha David Mota Antunes Queirós
Referiu ser funcionário da CMF desde Março/Abril de 1998, exercendo
actualmente as funções de técnico informático.
Esclareceu que trabalhou no Centro de Camionagem entre 1998 e 2001/2002.
Foi militante do PS desde 1994 até 2004 ou 2005.
Foi líder da Juventude Socialista de Felgueiras entre 1998 e 2004. Por inerência,
nesse período foi membro da Comissão Política do PS local.
Na Central de Camionagem coordenava os serviços e organizava o serviço de
condomínio e os transportes que ali operavam.
O seu chefe directo era o arguido Horácio Costa.
Normalmente, quase todos os dias, falava com ele, tanto na CMF como no
Centro de Camionagem.
Segundo presume, o local de trabalho do arguido Horácio Costa era na CMF,
pois dirigia-se lá para falar com ele, sendo certo que ele ocupava um gabinete que era
do Vereador José Carlos Lickfold. Normalmente informava a D. Leonor, a qual estava à
entrada, e que, por sua vez, comunicava ao arguido Horácio Costa a sua presença, tanto
telefonicamente como batendo à porta daquele gabinete. Se ele estava ocupado
esperava, mas normalmente entrava logo. Foi sempre nesse espaço que se encontrava
com ele quando ali se dirigia para lhe falar.
O arguido Horácio Costa dizia-lhe que era assessor da CMF e encarregue do
edifício do Centro de Camionagem. À partida ele era assessor da arguida Fátima
Felgueiras.
128
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Apercebeu-se que ele negociava algum do património imobiliário da CMF,
incluindo as lojas da Central de Camionagem (o depoente dava-lhe apoio
administrativo, daí que tenha conhecimento desse facto).
Ignora se tinha outras funções.
À pergunta efectuada no sentido de se saber se ele recebia pessoas, referiu que
por vezes ligava para a CMF para saber se este ali se encontrava e ele informava-o para
não aparecer a determinada hora pois estaria ocupado a receber pessoas.
Essas audiências deveriam ser determinadas pela arguida Fátima mas não tem
conhecimento directo desse facto.
Pensa que o arguido Horácio tanto recebia pessoas quando ela estava presente
como quando não se encontrava presente, mas não tem certeza desse facto na medida
em que habitualmente o depoente encontrava-se no Centro de Camionagem.
Presume, em todo o caso, que ele fazia audiências em substituição da arguida
Fátima Felgueiras.
Pelo que o arguido Horácio lhe dizia, ele também recebia presidentes de junta.
À partida o arguido Hrácio teria de merecer alguma confiança por parte da
arguida Fátima, tanto mais que ele fez parte das listas do PS nas eleições autárquicas de
1997, tendo inclusive chegado a desempenhar funções de vereação. Porém, qual o grau
de confiança existente não o pode referir por ignorar.
Quanto à participação do depoente na campanha eleitoral das eleições
autárquicas de 1997, referiu que, enquanto membro da Juventude Socialista, participou
em acções de campanha.
Como tinha à data algum tempo disponível, estava pela sede com colegas da
Juventude Socialista.
Integrou uma comissão que se ocupava da logística e organização da campanha
eleitoral.
A Comissão Política do PS local era presidida pela arguida Fátima.
Havia uma direcção de campanha, composta por exemplo por elementos da
Comissão Política com disponibilidade (por ex., o líder de então da Juventude
Socialista, António Faria; os arguidos Bragança, Joaquim Freitas, Fátima Felgueiras,
Júlio Faria e Horácio Costa e as testemunhas Edgar Silva e Júlio Pereira).
No âmbito da direcção de campanha organizaram-se grupos de trabalho (ex.,
constituíram-se as comissões de estratégia política (composto pelos arguidos Fátima
Felgueiras e Júlio Faria e o falecido Barros Moura), de logística (composto pelo arguido
Horácio Costa, pela testemunha Edgar Silva e por membros da Juventude Socialista,
entre os quais o depoente) e de angariação de fundos (composto pelos arguidos Horácio
e Joaquim Freitas, e ainda por alguns industriais que não conhecia).
Esclareceu que não fazia parte da direcção de campanha mas chegou a participar
em algumas das suas reuniões.
Tem a ideia de ter estado presente na reunião onde se constituíram os grupos de
trabalho que referiu, reunião essa que foi uma espécie de plenário (reunião mais
alargada, até para ver da disponibilidade de cada um).
Nos plenários a arguida Fátima normalmente estava presente, pelo que é
provável que ela estivesse presente na reunião referida.
A comissão de angariação de fundos é sempre importante, pois da sua acção
vem a possibilidade de financiar uma campanha eleitoral.
O depoente nunca angariou fundos, mas estes eram recolhidos junto de
militantes, simpatizantes do PS e empresários com disponibilidade financeira para o
efeito.
129
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Não sabe de que forma essas contribuições eram dadas, mas presume que os
doadores fossem contactados pela comissão de angariação de fundos.
Na comissão de logística, quando se propunha alguma iniciativa havia a
preocupação de perguntar ao arguido Horácio Costa ou ao arguido Joaquim Freitas se
existiam ou não fundos para o efeito.
Essas iniciativas eram propostas em reuniões da direcção de campanha ou
apenas no seio da comissão de logística, a qual gozava de alguma liberdade de acção.
As despesas reportavam-se normalmente a comícios, contratação de artistas e
material de campanha.
Dependendo da iniciativa que se pretendesse levar a cabo, a questão da sua
realização poderia ser discutida no seio da direcção de campanha (normalmente no que
se refere às iniciativas como maior impacto), questionando-se então na reunião se
existia ou não fundos para as realizar.
Os comícios são as iniciativas mais importantes numa campanha. O candidato à
presidência da Câmara Municipal era o principal orador, pelo que sabia o que se iria
passar nesse evento e teria de dar o seu acordo à forma como ele se iria desenrolar.
Se a arguida Fátima concordasse com a estratégia delineada, seguia-se esse
caminho, se não concordasse ela daria a sua opinião e procurava-se chegar a acordo
com a decisão da direcção de campanha.
Existiam pessoas que estavam em desacordo com a posição da arguida Fátima
Felgueiras e expressavam esse desacordo. Várias vezes o depoente manifestou a sua
discordância com ela nas reuniões da comissão política.
A arguida Fátima por norma revelava muito conhecimento acerca de todos os
assuntos e era por isso que por vezes as pessoas não se sentiam à-vontade para dar a sua
opinião, pois receavam não ter um conhecimento tão aprofundado do assunto em causa.
A este propósito a testemunha foi confrontada com as declarações que prestou
perante o JIC a fls 7839, linhas 7 a 13, do 29º volume.
Referiu então que é possível que algumas pessoas, nas costas da arguida Fátima,
criticassem as suas posições e o não fizessem na sua presença. Tal comportamento é
normal, talvez porque essas pessoas estariam mais à-vontade para o fazer perante duas
ou três pessoas e não numa reunião.
Quando perante a JIC referiu que as pessoas tinham receio de a contrariar quis
na verdade dizer que tinham esse receio porque não dispunham da mesma informação
que ela para argumentar de igual modo com a mesma.
Ignora se a comissão de angariação de fundos dispunha ou não de alguma conta
bancária.
Explicou que várias vezes o arguido Horácio lhe pediu para efectuar depósitos
numa conta bancária do BES, não lhe dando qualquer justificação para o efeito.
Foi confrontado com o talão de depósito de fls 7101 do 27º volume, no valor de
250.000$00 (depósito de um cheque do BPA), a 23.12.98, confirmando que a assinatura
constante do talão é sua, assegurando que não lhe foi dada qualquer explicação para
esse depósito.
Foi confrontado com o talão de depósito de fls 7102, do 27º volume, de um
cheque do BPA no valor de 250.000$00, depósito esse efectuado a 24.02.99, referindo
que esse depósito foi efectuado pelo Armindo Brochado (funcionário da CMF – auxiliar
administrativo que prestava apoio ao GAPP).
Foi confrontado ainda com o talão de depósito de fls 7103, fo 27º volume, sem
qualquer assinatura, ignorando que procedeu a esse depósito de 2.000.000$00 em
numerário no dia 15.12.97.
Esclareceu que não relacionou a conta do BES com actividades partidárias.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Só se recorda de efectuar depósitos nessa conta após as eleições de 1997.
A sede do PS passou a dispor de um computador em 2000 ou 2001. Antes disso
o depoente usava o seu computador pessoal de casa para elaborar documentos para o
PS, quanto aos outros elementos, não sabe onde compunham os textos usados pelo
partido.
Esclareceu que entretanto pediu a demissão da Juventude Socialista e que foi
expulso do partido na sequência de um procedimento disciplinar.
Não tem a certeza se o arguido Horácio fazia parte da Comissão Política do PS
local (se não fosse militante não poderia fazer parte dessa comissão), mas tem a certeza
que fazia parte da direcção de campanha nas eleições autárquicas de 1997.
Não se recorda se devido a assuntos relacionados com essa campanha eleitoral
se dirigiu ao GAPP na CMF, sendo certo que não tinha confiança com as pessoas que
trabalhavam nesse gabinete de apoio.
O arguido Horácio Costa pediu-lhe para pagar a renda da sede do PS em Paredes
(na altura da campanha eleitoral de 1997), o que fez através de um cheque que se
encontrava num envelope. Não reparou na importância.
Sabia que a responsabilidade pelas despesas de campanha era dos arguidos
Horácio e Joaquim Freitas. Não sabe de que forma essas despesas eram pagas.
Julga que eles tinham autonomia para efectuar os pagamentos, pois tinham a
responsabilidade pela parte financeira da campanha.
Recorda-se, por exemplo, que a Juventude Socialista organizou um
acampamento nacional em Felgueiras (em 1998 ou 1999) e o PS pagou a despesa
inerente (pagamento a um grupo musical que fez a animação do evento) através de um
cheque que lhe foi entregue pelo arguido Horácio Costa. Explicou que como a
Juventude Socialista não tinha autonomia financeira, tiveram de pedir o dinheiro aos
elementos do PS. No caso em apreço, solicitou ao arguido Horácio o apoio financeiro
necessário. Reparou que o cheque que ele entregou reportava-se a uma conta titulada
por ele, não sabendo se se tratou ou não de um contributo pessoal da sua parte, sendo
certo que na altura ignorava que ele era titular de uma conta que servia para pagar
despesas referentes a iniciativas do PS, facto que só mais tarde veio a saber através dos
jornais.
À data os responsáveis financeiros do PS local eram o arguido Bragança e a
testemunha Júlio Pereira (eles eram titulares da conta oficial do PS). Não recorreu a eles
porque se sentia mais à-vontade com o arguido Horácio (acabou por referir não se
recordar se na altura rcorreu também aos ditos Bragança e Pereira).
Não se recorda de ter feito o pagamento de pequenas despesas de campanha,
como por exemplo despesas de correio, mas admite que tal facto corresponda à verdade.
Admite que o arguido Bragança e a testemunha Júlio Pereira lhe possam ter
pedido para levar cartas ao correio e que pagou os respectivos selos e outras pequenas
despesas do PS, sendo certo que tais despesas eram normalmente pagas em numerário.
Admite que possa ter recebido dinheiro em numerário do arguido Horácio para
esse fim.
Não se recorda de ter entregue à testemunha Orlando Sousa um cheque de
800.000$00, mas pensa que não.
Para além dos elementos que compunham a comissão de angariação de fundos
esporadicamente alguns industriais auxiliaram os arguidos Horácio e Joaquim Freitas na
recolha de fundos.
Nunca se apercebeu de terem sido entregues donativos no GAPP.
Em finais de 1998 ou já em 1999 foi com o arguido Horácio Costa a algumas
fábricas recolher donativos para financiar actividades do PS.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Após o período eleitoral o arguido Horácio Costa colaborou com o arguido
Bragança e com a testemunha Júlio Pereira na contabilidade do PS.
Relativamente à campanha eleitoral de 1997 fez algumas tarefas por
incumbência do arguido Horácio, o qual lhe deu uma gratificação em numerário.
A única vez que recebeu um cheque da conta do BES foi para pagar a animação
musical no acampamento organizado pela JS, conforme já referiu.
Confrontado com o cheque de fls 178 do apenso 1 (ou fls 382 do 1º volume,
com uma anotação do arguido Horácio), no valor de 100.000$00 e datado de 14.05.98,
sacado sobre a dita conta do BES, reconheceu tê-lo levantado. A esse propósito, admitiu
que tenha auxiliado nalguma tarefa para o “Sovela”, mas não se recorda em concreto
por que motivo tal cheque foi por si levantado.
Confrontado com o cheque de fls 184 do apenso 1, no valor de 200.000$00, de
02.09.98, sacado sobre a conta do BES, emitido à sua ordem, reconheceu também ter
levantado a quantia monetária respectiva, referiu não se recordar a que propósito é que o
fez.
Confrontado com o cheque de fls 161 do apenso 1, no valor de 50.000$00, de
22.01.98, sacado sobre a conta do BES, reconheceu que a respectiva quantia foi por si
levantada. Também no que a este cheque se refere, assegurou não se recordar por que
motivo o levantou.
Em todo o caso, referiu que o arguido Horácio Costa chegou-lhe a emitir
cheques de modo a levantar a respectiva quantia, que depois lhe entregava em mão.
Afirmou então que os cheques em causa não se reportaram a qualquer
pagamento à sua pessoa.
Confrontado com o talão de depósito de fls 73, do 1º volume (depósito de
170.000$00 a favor do arguido Júlio Faria, a 28.01.99), referiu não reconhecer a
assinatura de quem fez o depósito.
Confrontado com o talão de depósito de fls 74, do 1º volume, datado de
15.02.99, no valor de 57.090$00, reconheceu que apôs a sua rúbrica nesse documento,
mas não se recorda por que motivo efectuou esse depósito.
Esclareceu que sabia que a conta do BES era titulada pelo arguido Horácio, mas
não sabia para o que servia.
Não se recorda se recebeu do arguido Horácio algum dinheiro para pagar as
despesas do “ralypaper” (iniciativa da campanha eleitoral de 1997, onde foram
distribuídos troféus, artefactos que terão sido encomendados e pagos por alguém, que
neste momento não sabe precisar).
*
Em face das declarações da testemunha David Queirós o arguido Horácio Costa
assegurou que aquele tomou conhecimento da conta do BES porque foi portador de
dezenas de cheques para pagamento a credores no âmbito da campanha eleitoral e de
despesas do “Sovela” e do PS.
Ele aliás chegou a deslocar-se à fábrica do arguido Joaquim Freitas com cheques
da conta do BES para colher deste a respectiva assinatura.
Nunca a testemunha David lhe entregou um tostão sequer dos cheques que
levantou dessa conta.
No que se refere ao cheque de fls 178 do apenso 1, assegurou que serviu para
pagar a embalagem e a ensacagem do “Sovela”, conforme anotação que apôs na
fotocópia desse cheque, conforme documento de fls 382 do 1º volume.
Acrescentou a esse propósito que a testemunha em causa arranjou elementos da
Juventude Socialista para fazerem esse serviço, tendo-lhes pago as horas de trabalho
despendidas através da entrega desse cheque ao David Mota.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
A referida testemunha sabia que o depoente não era militante do PS e que era
convidado por elementos do PS local nas iniciativas partidárias.
Quando conheceu a referida testemunha ele era colaborador de António Faria, à
data líder da JS, e como este não tinha grande disponibidade, era substituído pelo David
nas reuniões da Comissão Política do PS local.
Mais tarde ele assumiu a liderança da JS.
Foi ele quem organizou o “ralypaper” e comprou os troféus, ao que pensa, em
Barrosas.
Ele também organizou em Stª Quitéria jogos de “paintball” com elementos da
JS.
Sob as ordens do arguido Júlio Faria ele organizou na Escola Preparatória
Manuel Faria e Sousa um evento com jovens (jantar cozinhado nesse estabelecimento
de ensino, com animação), sendo certo que se tratava de um evento da JS.
Ele efectuou vários pagamentos em cheques e em numerário, como por
exemplo:
- Numa loja dos 300, adquiriu baldes do lixo, esfregonas, produtos de limpeza e
cestos para colocar guarda-chuvas;
- Pagou a grupos folclóricos;
Ele abria e fechava a sede de campanha da arguida Fátima Felgueiras;
Era ele quem conferia a entrega dos brindes e conferia com o depoente e o
arguido Joaquim Freitas o respectivo pagamento.
Era a testemunha em causa quem comprava os jornais diários e os colocava na
sede de campanha e para fazer face a essa despesa o depoente retirava o dinheiro (em
numerário) da gaveta no seu gabinete, conforme aliás a testemunha David várias vezes
observou.
Sempre soube que o depoente obedecia a ordens.
Solicitou-lhe o pagamento de eventos organizados por ele, como foi o caso do
acampamento referido, sendo certo que ele foi ter com o depoente porquanto, segundo
lhe disse, tinha instruções da Comissão Política para que esse pagamento fosse
efectuado.
Ele chegou a esperar várias vezes que o depoente tirasse fotocópias dos cheques
que ia emitindo, antes de lhos entregar para efectivar o depósito.
É falso que vários empresários – com a excepção das pessoas que referiu –
tenham auxiliado o depoente na recolha de fundos.
Na Comissão Política do PS discutiu-se a colocação de uma aparelhagem de
som num carro de modo a fazer propaganda política no âmbito da campanha de 1997,
sendo certo que foi a testemunha David quem tratou do assunto, falando com o Sr.
Queirós, tendo posteriormente entregue ao depoente o documento respectivo, com base
no qual foi efectivado o pagamento dessa despesa.
A arguida Fátima queria que mais carros do género circulassem, pelo que alguns
empresários disponibilizaram viaturas das suas empresas para esse efeito, sendo certo
que o David chegou a conduzir várias dessas viaturas, tendo sido advertido pelo
depoente e pelo Joaquim Freitas que o combustível deveria ser pago com dinheiro da
gaveta ou então, se adiantasse o dinheiro, seria posteriormente reembolsado, sendo-lhe
vedado pagar o combustível solicitando recibos em nome das firmas que
disponibilizaram as viaturas.
Nesse período ele chegou a distribuir o “Sovela” numa carrinha do arguido
Joaquim Freitas.
133
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
A testemunha David participava nas reuniões, mas não participou nas reuniões
mais importantes, onde era definida a estratégia e onde eram tomadas as decisões mais
importantes.
Ele aliás muitas vezes teve de esperar pelo fim dessas reuniões do “núcleo duro”
para poder fechar a sede de campanha.
Confirmou que o encarregou de pagar uma renda da sede de campanha em
Paredes no “Minipreço” (senhoria daquele espaço).
Conforme já referiu antes, ele foi compensado monetariamente pelo auxílio que
prestou.
Em 1997 a testemunha David não tinha qualquer relacionamento com o arguido
Bragança e não era este quem lhe dava instruções para ir ter com o depoente a fim de
serem efectivados os pagamentos dos eventos organizados pela JS.
Na Comissão Política mandava a arguida Fátima Felgueiras, pelo que quando a
testemunha lhe solicitava algum pagamento o depoente só o poderia fazer com
autorização daquela.
*
Em face destas declarações do arguido Horácio Costa, a testemunha David
Queirós referiu que os jornais eram recebidos na sede de campanha e o depoente ou os
jovens faziam a respectiva distribuição nos pontos de interesse.
Poucas vezes conduziu carrinhas com equipamento de som próprio para a
divulgação pelas ruas da propaganda política (conduziu uma “Renault Express” da
firma do arguido Joaquim Freitas e uma carrinha “Toyota” de outra empresa). Admitiu
que o pagamento do combustível era feito conforme referido pelo arguido Horácio.
É verdade que chegou a esperar que o arguido Horácio tirasse fotocópias dos
cheques emitidos, antes de lhe serem entregues.
Manteve contudo que chegou a levantar quantias da conta do BES as quais
posteriormente entregou ao arguido Horácio.
A iniciativa levada a cabo numa escola preparatória (evento referido pelo
arguido Horácio) partiu de uma proposta da JS e poderá ter sido sugerida pelo arguido
Júlio Faria. Essa proposta foi apresentada à direcção de campanha, onde foi aprovada tal
iniciativa. Negou, em todo o caso, que o arguido Júlio Faria tivesse encaminhado o
depoente ao arguido Horácio Costa de modo a que a despesa fosse paga.
Foi o arguido Horácio quem lhe deu o dinheiro (em numerário) para que o
depoente pudesse ir à dita loja dos 300 adquirir os produtos referidos por aquele
arguido.
Não se recorda de alguma vez ter pago qualquer quantia a ranchos folclóricos.
Os brindes que entravam na sede de campanha eram de facto conferidos por si e
distribuía-os conforme instruções que recebia do arguido Horácio Costa, não passando
pelo depoente o pagamento desses brindes.
Quanto ao “rallypaper”, tratou-se de uma iniciativa aprovada pela direcção de
campanha sob proposta da JS, sendo certo que se recorda agora que os troféus foram
adquiridos pelo líder do núcleo de Barrosas da JS.
Acrescentou que o PS dispunha de uma aparalhagem de som que estava
avariada. Após a campanha eleitoral decidiu-se mandar repará-la, pelo que, segundo
instruções ou do Júlio Pereira ou do arguido Bragança, foi pedido um orçamento.
Entretanto deram-lhe a indicação para adquirir uma aparelhagem nova e que
fosse ter com o arguido Horácio para que a mesma fosse paga.
Em 1998 assumiu a liderança da JS. Antes disso era o braço direito do líder da
JS, contactando por isso com o arguido Bragança.
134
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Sabia que o arguido Joaquim Freitas tinha uma fábrica em Torrados, tendo-se
deslocado algumas vezes à mesma para ir buscar a carrinha “Renault Express” a fim de
ser usada a propósito de várias campanhas eleitorais, não se recordando de ali se ter
deslocado por qualquer outro motivo.
Não se recorda de ter ido à empresa do arguido Joaquim Freitas para colher a
sua assinatura, mas admitiu que tal possa ter sucedido. Seja como for, se tal sucedeu, os
cheques iam acondicionados num envelope, o qual deveria entregar ao dito Joaquim
Freitas, envelope esse que umas vezes ele devolvia e outras vezes não. Tem pois a ideia
de ter levado envelopes à fábrica do arguido Joaquim Freitas (mas acabou por referir
que o memso não lhe era devolvido). Não se recorda que tipo de envelopes eram esses,
que por vezes levou à fábrica do arguido Joaquim Freitas. Situa esse faco por alturas da
campanha eleitoral de 1997 ou em momento posterior.
Sabe que os cheques da conta do BES eram assinados por duas pessoas, mas à
data não reparou nesse facto quando lhe foram entregues cheques dessa conta pelo
arguido Horácio.
O arguido Horácio Costa solicitou-lhe várias vezes que procedesse ao
levantamento de cheques de outras pessoas, presumindo que se tratavam de donativos,
tendo-lhe posteriormente entregue a correspondente quantia monetária.
É possível que tivesse auxiliado na ensacagem e embalagem do “Sovela”, mas
por esse trabalho nenhuma compensação monetária recebeu.
Porém, conforme se pode verificar a fls 357, consta um pagamento de
100.000$00 com a indicação de que foi efectuado ao depoente.
Assegurou porém que tal facto não corresponde à verdade.
Admite contudo que os jovens (entre dois a quatro) que auxiliaram nessa
operação de ensacagem e embalagem de duas ou três edições do “Sovela” tenham sido
gratificados e que eventualmente tivesse recebido esse dinheiro para lhes dar. A
testemunha porém acabou por afastar esta hipótese (que aliás foi por ele levantada).
Confrontado com o documento de fls 383, dirigido ao arguido Horácio e
respeitante ao preço da ensacagem (orçamento) por semana (7.000$00 por semana, num
total de 14.000$00 por duas semanas), com a anotação (aposta pelo arguido Horácio) de
pagamento e com a indicação do respectivo cheque, com o qual foi também confrontado
(cuja cópia consta de fls 382, no valor de 100 cts e onde consta uma anotação de que foi
para pagar duas semanas de ensacagem do “Sovela” e para pagar contas residuais da
campanha), confirmou ter sido por si levantado (tal cheque não é traçado, pelo que pode
ser levantado).
Confrontado com o cheque de fls 384, constatou-se que se trata de um cheque
traçado, no valor de 103.683$00, de 04.05.98 (dstinado ao pagamento de uma empresa
de embalagens).
Confrontado com o cheque de fls 385 a 387 constatou-se que se tratam
igualmente de cheques traçados e, como tal, foram depositados.
Perguntado acerca de um tal João Ivo, referiu tratar-se de um colaborador do
“Sovela”, não sabendo de que forma era pago.
*
Em face destas declarações, o arguido Horácio Costa esclareceu que, ainda a
propósito do cheque de fls 382, no valor de 100 cts e datado de 14.05.98, o mesmo foi
emitido a favor da testemunha David de modo a que ele levantasse o dinheiro e
procedesse ao pagamento aos jovens que o auxiliaram a ensacar e embalar o “Sovela”, o
que saiu mais barato para o dito jornal. Crê que ele também ficou com algum desse
dinheiro.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Anotou também na cópia desse cheque que o mesmo também se destinou a
pagar algumas contas residuais. Tal cheque não foi traçado para que o David pudesse
levantar a respectiva quantia e assim pudesse proceder aos pagamentos.
Por vezes os credores pediam para que os cheques não fossem traçados na
medida em que, necessitando do dinheiro, não os queriam depositar.
O documento de fls 383 (de 29.05.98) reporta-se a um orçamento de uma
empresa e prendia-se com o facto de se ter optado por enviar o jornal para ensacar numa
empresa durante duas semanas, pelo preço de 14 cts, já que a experiência com os jovens
correu mal.
O cheque de fls 384 (traçado, datado de 04.06.98, no valor de 103.683$00) foi
emitido para pagar a outra empresa pela embalagem do “Sovela”, já que a outra
empresa tinha falido entretanto.
O João Ivo era funcionário do “Sovela” e recebia um salário, o qual era pago
através da conta do BES, segundo instruções que recebeu, daí que a esse propósito
tenha emitido cheques traçados.
Confrontado com o teor do cheque de fls 161 do apenso 1, no valor de
50.000$00 e datado de 22.01.98, o qual não se mostra traçado, explicou que o emitiu a
favor do David para o remunerar na medida em que ele ficou durante algum tempo com
a responsabilidade de desmantelar a sede de campanha.
Já no documento de fls 258 do apenso 4 consta o nome de vários jovens que
deram o seu contributo para a campanha eleitoral e que por isso receberam uma
gratificação, entre os quais a testemunha David Queirós. À frente de cada um dos nomes
consta a gratificação concedida (o David recebeu 100 cts).
Já o cheque de fls 184 do apenso 1, datado de 02.09.98 e no valor de
200.000$00, foi entregue à testemunha David a fim de o entregar ao Dr. Sousa Oliveira
e correspondia a 50% do valor do preço de venda da viatura “Citroën BX” referida nos
autos, cheque esse que foi emitido em face das ordens recebidas da arguida Fátima
Felgueiras.
À pergunta efectuada no sentido de se saber se acondicionava os cheques num
envelope que entregava à testemunha a fim de os ir levar ao arguido Joaquim Freitas
esclareceu que no seu gabinete, na presença da testemunha David, tirava o livro de
cheques da gaveta e colocava-o num envelope, pedindo então para ele os levar ao
arguido Joaquim Freitas a fim de os assinar. Informava-o de quantos cheques levava e
que eram para o arguido Joaquim Freitas os assinar. Depois de assinados por este, a
testemunha David devolvia-os ao depoente. Consequentemente, o David bem sabia que
levava aqueles cheques a fim de serem assinados pelo arguido Joaquim Freitas, sendo
certo que o depoente nada tinha a esconder da dita testemunha, segundo assegurou.
No que se refere à aquisição da aparelhagem ao Sr. Queirós, referida pela
testemunha David, chamou à colação o documento de fls 217 e 218 do apenso 4, o qual
se trata da factura respectiva.
Ainda sobre o acampamento organizado pela JS no Parque de Campismo de
Vila Fria, esclareceu que se tratava de um parque camarário e que estava sob a alçada
do arguido António Pereira Mesquita de Carvalho. Recorda-se que certa ocasião a
arguida Fátima deu instruções ao arguido António Pereira para “pôr aquilo em
funcionamento” de modo a que o espaço fosse rentabilizado e foi então que ele sugeriu
que a JS poderia promover ali alguma iniciativa, a qual viria a ter lugar conforme já
referido, tendo sido o depoente quem liquidou os custos.
Ainda a propósito das carrinhas usadas na campanha e disponibilizadas por
empresários felguerenses, referiu que o Sr. Pinto (empresário que tem a sua empresa
sediada em Revinhade) foi um dos empresários que disponiblizou uma carrinha (a
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
testemunha David apenas confirmou ter-se deslocado a uma empresa em Revinhade
para ir buscar uma carrinha, mas não se lembra do nome do respectivo empresário).
Ainda a propósito da compra dos troféus para o “rallypaper”, acrescentou que
foi a testemunha David Queirós quem lhe entregou o documento de fls 598 do3º volume
(daí que, ao que se depreende, tenha presumido que tenha sido ele), precisando agora
que ignora quem adquiriu esses troféus.
A testemunha David fez muitos depósitos na conta do BES (por ex., um depósito
de 250 cts, conforme documento de fls 195 do apenso 1, a seu mando, não se
recordando por que motivo esse depósito foi efectuado, mas deveria respeitar a um
donativo).
O depoente instruia a testemunha em causa para depositar os cheques na “conta
da campanha”, pois era sempre assim que se referia a essa conta.
Recorda-se que a certa altura o arguido Bragança chamou à CMF uma senhora
que fornecia e instalava cortinados, tendo-a levado à sede de campanha e combinado
com ela os cortinados e os varões a colocar nesse espaço, os quais foram efectivamente
colocados.
Chegado o momento de proceder ao pagamento, ela foi informada de que era da
conta da campanha que obteria o pagamento e que se deveria dirigir ao depoente no
sentido de obter o respectivo pagamento pois era o responsável por essa conta.
Era assim com todos os credores, razão pela qual era procurado por eles no
sentido de lhes pagar.
*
A testemunha David Queirós, por turno, ainda a propósito do documento de fls
184 do apenso 1, reafirmou não se recordar porque razão procedeu ao levantamento
desse cheque.
Acrescentou, em todo o caso, que “usaram da sua inocência” para ir levantar
dinheiro.
Nunca entregou qualquer quantia ao Dr. Sousa Oliveira.
Não sabe se os jovens que ensacaram o “Sovela” foram ou não remunerados
(pensa em todo o caso que não).
Foi-lhe dito que o “Sovela” estava com dificuldades financeiras, daí que o
auxílio prestado fosse gratuito.
Mantém que nunca teve conhecimento que a conta do BES era a conta da
campanha das eleições ocorridas em 1997. Sabia que o arguido Horácio era titular dessa
conta, sendo certo que ele não se referia a ela como sendo a conta da campanha.
Não se recorda do arguido Horácio lhe ter dito para levar cheques ao arguido
Joaquim Freitas a fim deste os assinar.
Não se recorda se levava e trazia de volta alguns dos documentos que
transportava acondicionados em envelope (antes havia referido que só os levava e que
não os trazia de volta, possibilidade que agora admite).
Explicou que se tratava de assuntos a que não deu importância, pelo que não os
memorizou.
Acrescentou que quando o arguido Joaquim Freitas não se encontrava na sua
empresa, deixava o envelope com alguém da recepção da fábrica. O arguido Horácio
queria porém que o depoente os entregasse pessoalmente ao arguido Joaquim Freitas.
À pergunta efectuada no sentido de saber se o depoente aguardava que o arguido
Joaquim Freitas lhe devolvesse o envelope, referiu que podia ficar um pouco à conversa
com ele, mas não se recorda de ter aguardado que ele lhe devolvesse algo, hipótese que
porém agora não descarta.
137
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Reconheceu que fez vários depósitos na conta do BES conforme já referido e, se
bem se recorda, efectuou também um depósito na conta pessoal do arguido Júlio Faria.
No que respeita à quantia de 50 cts que o arguido Horácio referiu terem sido
recebidos pelo depoente (cfr. documento de fls 161 do apenso 1 – cheque de 50 cts,
datado de 22.01.98), explicou que a quantia monetária em causa não era para si, porque
só recebeu uma gratificação de 100 cts do arguido Horácio no final da campanha
eleitoral, quantia que presume ter sido proveniente dos donativos efectuados para a
campanha. Ignora quem tomou a decisão de o gratificar. O arguido Horácio referiu-lhe
que ia ou que já tinha gratificado outras pessoas.
É possível que quando fez depósitos na conta do BES soubesse que se tratavam
de donativos, pois sabia que o arguido Horácio era responsável pela angariação de
fundos, mas a conta do BES poderia ser uma conta pessoal dele que fosse usada para
aquele fim (tinha a noção que ela era usada para o depósito de donativos e para o
pagamento de despesas de campanha).
No que se refere ao talão de depósito de fls 141 do apenso 1 (no valor de 2.000
cts, efectivado a 15.12.97) referiu não reconhecer a letra.
Os responsáveis pela parte financeira da campanha eram os arguidos Horácio e
Joaquim Freitas e, que saiba, eles não prestavam contas a quem quer que seja, mas se as
prestassem não tinha de ter conhecimento desse facto.
Noutras campanhas (que não a de 1997) levantou cheques de donativos e
entregou a respectiva quantia ao arguido Horácio, conforme instruções que recebia dele.
*
O arguido Horácio Costa chamou então à colação o teor do documento de fls
357 (relação dos pagamentos de despesas do “Sovela”, a qual foi feita ao longo do
tempo, à medida em que os pagamentos eram processados), na qual foram incluídos os
100 cts entregues ao David para pagar a ensacagem do jornal.
Quanto o depoente se demitiu da ADEC entregou cópia da relação dos
pagamentos com os respectivos comprovativos ao arguido António Pereira Mesquita
Carvalho, o qual, por sua vez, a entregou à testemunha Horácio Reis numa reunião da
ADEC ocorrida em Setembro ou Outubro de 1999.
A dita cópia foi enviada com a missiva cuja cópia se acha a fls 422, dirigida ao
arguido António Pereira Mesquita Carvalho.
*
- Testemunha Adelino José Magalhães Leite
Referiu ser funcionário da CMF desde 1991, sendo desde 2002 (mais ou menos)
o chefe da Divisão de Apoio Operativo (com responsabilidades pelas viaturas da CMF).
Explicou que desde 1991 até cerca de 2002 foi o chefe da Divisão dos Serviços
Urbanos (incluía o serviço de recolha do lixo e o seu vasadouro).
Tem formação em engenharia electrotécnica.
A Divisão dos Serviços Urbanos estava integrada no Departamento Técnico, o
qual na altura era chefiado pelo arguido Barbieri Cardoso.
Quando iniciou funções na CMF a recolha do lixo era feita por viaturas da
autarquia adaptadas para o efeito, lixo esse que era vasado directamente na lixeira
municipal (em Sendim).
Sempre conheceu o terreno onde estava implantada a lixeira como a lixeira
municipal.
Tratava-se de um foco de poluição, sendo certo que quando se procedia à
queima dos resíduos na estrada nacional apenas se circulava com os faróis acesos.
Recebia muitas queixas da população em face dessa circunstância.
138
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Em 1993 ou 1994 foi-lhe comunicado que tal lixeira iria ser controlada (foi ou o
arguido Barbieri ou o arguido Júlio Faria que lho terão comunicado).
A recolha do lixo iria ser feita pela “Resin”, com viaturas novas para esse fim,
com um aumento significativo dos contentores e dos circuitos de recolha (que se
alargou praticamente a todo o concelho).
Essa recolha do lixo pela “Resin” começou em 1994 ou 1995.
Aquando da definição dos circuitos de recolha e frequência de recolha travou
conhecimento com o arguido Vítor Borges e com a Engª Claudia Ribeiro (em reuniões
que tiveram lugar nos Serviços Operativos).
O depoente não teve qualquer intervenção nos concursos efectuados nem
controlou a execução das obras na lixeira.
De facto, sobre essa matéria nada sabe, nem tinha de saber, na medida em que o
lançamento dos concursos e os projectos de obras não faziam parte das suas atribuições,
já que eram matéria do planeamento, assunto directamente tratado pelo director do
Departamento Técnico (o arguido Barbieri Cardoso).
Era porém a sua Divisão que controlava a recolha do lixo pela “Resin” (quando
deixou ela própria de proceder a essa recolha).
Nessa medida, passava regularmente pelos locais de recolha do lixo e verificava
se havia sido recolhido ou não. Passou também o depoente a controlar a qualidade da
recolha do lixo.
Quanto ao seu vasamento, uma ou duas vezes por mês dirigia-se à lixeira para
verificar se existiam condições para a deposição do lixo.
Presenciou várias máquinas a trabalhar no local, não se preocupando em saber
quem em concreto operava no local, não se recordando de ver nessas máquinas qualquer
alusão à firma a que pertenciam.
Ao fim de algum tempo de intervenção (que não precisou) foi colocado um
controle de entrada, facto de que se recorda porquanto teve de se identificar para entrar
na lixeira, sendo certo que o funcionário que ali estava disse-lhe que trabalhava para a
“Resin”.
Constatou a execução de plataformas e a deposição do lixo na mesma, sendo
certo que era o Departamento Técnico da CMF que controlava a boa execução dos
trabalhos (designadamente o Eng. José António Ferreira e o Eng. Almeida, não sabendo
se a Engª Neri exerceu também fiscalização dessa obra).
Desconhece se algumas reuniões tiveram lugar na CMF com elementos da
“Resin” (salvo naquelas em que participou a propósito da frequência e da definição dos
circuitos de recolha do lixo).
Diariamente contactava com um encarregado da “Resin” (como por ex. o Sr.
Cunha, encarregado da “Resin” no que se refere à recolha do lixo, o qual prestava o seu
serviço nos Serviços Operativos da CMF, onde o depoente também prestava o seu
serviço, sendo certo que os encarregados não eram sempre os mesmos; recorda-se ainda
do Sr. Faria, outro dos encarregados da “Resin” que por ali passaram).
Não tem memória de na lixeira ter visto qualquer logotipo alusivo à “Resin”.
Assegurou que a sua Divisão não executou qualquer obra na lixeira.
Segundo foi informado, quem executava as obras nesse local era a “Resin”.
Não lhe competia visar as facturas referentes aos trabalhos ali efectuados, tanto
mais que nem sequer sabia quais eram os valores da adjudicação.
Na lixeira o depoente nunca levantou qualquer objecção quanto à qualidade dos
serviços ali prestados (controlava apenas a deposição do lixo, nada sabendo acerca da
execução dos demais trabalhos na lixeira, até porque desconhecia o respectivo projecto).
Com a intervenção da “Resin” o lixo deixou de ser queimado.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Nunca ouviu falar das firmas “Norlabor” e “João Tello”, sendo certo que sabe
que a “Translousada” repara equipamento pesado, pois executou já serviços para a CMF
nessa área (ao que pensa, em 1998 ou 1999 reparou uma máquina retroescavadora e
uma máquina autoniveladora da CMF). Ignora se essa empresa aluga esse tipo de
equipamentos.
Nunca ouviu qualquer menção que relacionasse essas empresas com a lixeira de
Sendim.
Na lixeira, para além do porteiro, não se recorda de ali ver alguém a trabalhar
que fosse funcionário da “Resin”.
Na portaria existia uma balança ligada a um computador para pesar o lixo que
era admitido. Ignora se essa informação era comunicada à CMF a fim de que fosse
cobrada uma taxa a quem ali recorria para depositar resíduos.
*
Referiu o arguido Barbieri Cardoso que a testemunha Adelino Leite nunca
abriu qualquer concurso, mesmo em obras que diziam respeito a áreas da sua
responsabilidade (como por exemplo o saneamento).
A testemunha em causa não visou as facturas da “Resin” respeitantes aos
trabalhos na lixeira, pois apenas competia-lhe visar as facturas apresentadas pela
“Resin” no que se refere à recolha do lixo.
Crê que os carros de recolha do lixo tinham o logotipo da “Resin”, assim como
os contentores de recolha. Na lixeira existia também o logotipo da “Resin” conforme
aliás ilustrado em fotografias juntas aos autos.
*
A testemunha Adelino Leite confirmou que apenas visava as facturas referentes
à recolha do lixo e que o logotipo da “Resin” encontrava-se nos carros de recolha do
lixo e em quase todos os contentores.
Explicou que também fazia projectos para clientes, pois foi sócio de duas
empresas que se dedicavam ao ramo imobiliário e a projectos de electricidade e
telefones (firmas “Imoreactiva” e “Reactiva”).
- Testemunha Cláudio Pedro Ribeiro Barreto Marques
Explicou que era o sócio-gerente da firma Barreto Marques, Unipessoal, Ldª”, a
qual tinha como objecto o marketing e a comunicação, dedicando-se à elaboração de
trabalhos de design gráfico (designadamente no âmbito de campanhas políticas).
Fizeram trabalhos e forneceram material para a campanha política do PS de
Felgueiras nas eleições autárquicas de 2001 (conceberam logotipos, outdoors e cartazes
e forneceram material de campanha).
Para o efeito contactaram a arguida Fátima Felgueiras na CMF (o depoente e o
seu pai), oferecendo os seus préstimos, tendo-lhe exibido um portfólio demonstrativo do
seu trabalho executado noutras campanhas eleitorais. Recorda-se que foram recebidos
num gabinete no 1º piso, mas que não era o gabinete da presidente. Estava presente o
Sr. Júlio e talvez o Dr. Victor. Ficaram de desenvolver uma linha gráfica e se a mesma
agradasse seriam contratados, o que veio a suceder.
O progenitor do depoente era o elemento que tinha know how na área das artes
gráficas, sendo ele quem ia às reuniões.
Nesse âmbito, recorda-se dos Srs. Júlio e Victor e da arguida Fátima Felgueiras.
Inicialmente desenvolveram uma linha gráfica e posteriormente foram
fornecendo material, como por ex. pins, bonés t-shirts e canetas, o que ascendeu a cerca
de 5.200.000$00.
A encomenda foi feita pelos referidos Fátima Felgueiras, Sr. Júlio e Dr. Victor.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
O depoente participou em reuniões onde se tomaram decisões acerca do logotipo
da campanha, designadamente no que respeita à sua côr.
Falou com a arguida Fátima (certa ocasião em que a encontrou) para lhe pedir a
opinião acerca da imagem que da sua pessoa deveria ser colocada por ex. em t-shirts.
Não foi convocada qualquer reunião para esse efeito, apenas a encontrou por acaso e
aproveitou a oportunidade para a abordar acerca do assunto referido. Aliás, o depoente
não foi convocado para qualquer reunião com a arguida Fátima.
Por vezes as decisões eram tomadas na sede do PS local, em reuniões onde
estava muita gente (não sabe os respectivos nomes).
O pagamento dos seus serviços e do material fornecido foi efectuado através de
duas letras aceites pelo Sr. Sidónio Ribeiro, entretanto reformadas, pelo que tiveram
dificuldade em receber o pagamento respectivo. Antes disso perguntaram a elementos
da campanha de que forma iriam receber, tendo sido remetidos para aquele Sr. Sidónio,
o qual foi entretanto contactado, não sem antes terem pedido o dinheiro ao Sr. Júlio.
Seja como for, não solicitou o pagamento à arguida Fátima (não sabe se o seu
pai o fez), nem com ela teve qualquer encontro a esse propósito.
Em todo o caso, o seu pai disse-lhe que falou com ela a respeito da reforma das
letras e que ela o tranquilizou dizendo que esse assunto já estaria resolvido.
É normal os candidatos não se envolverem nas questões financeiras da
campanha eleitoral, em face da experiência profissional que tem. Acreditou por isso que
ela partisse do pressuposto de que esse assunto já estivesse resolvido.
- Armindo Álvaro Pimenta Brochado
É funcionário camarário desde Maio de 1998, exercendo funções no GAPP
desde Agosto desse ano até às últimas eleições (em 2005).
O depoente era militante do PS, pertencendo à data à Juventude Socialista e,
como tal, participou na campanha eleitoral referente às eleições autárquicas ocorridas
em 1997.
Foi candidato à Assembleia de Freguesia da freguesia onde vivia.
Ignora se depois de terminada a campanha eleitoral foram efectuados
pagamentos referentes a despesas relacionadas com ela.
Nunca foi da sua responsabilidade o pagamento de despesas de campanha, nem
sabia sequer quem tratava desses assuntos.
Não se recorda de ter levantado ou depositado cheques relacionados com essa
matéria.
Não se recorda de ir aos CTT enviar correspondência relacionada com acções de
campanha.
Confrontado com o documento de fls 200, do apenso 1 (igual ao documento de
fls 7101), respeitante a uma cópia de um talão de depósito na conta do BES de 250 cts,
a 24.02.99 pelas 10h56m, confirmou ter sido esse talão preenchido pelo depoente.
Porém, afirmou não saber que conta é aquela a que diz respeito o depósito, presumindo
que se trata de uma conta pessoal do arguido Horácio Costa. Deve tê-lo feito a pedido
desse arguido.
Era normal à data (em 1999) o depoente ir à rua fazer todo o tipo de serviços
relacionados com o GAPP.
Em todo o caso, o arguido Horácio nada tinha a ver com o GAPP.
Porém, não lhe ia negar a realização desse pedido de depósito.
Os credores dirigiam-se às pessoas que faziam parte do “grupo financeiro” a
propósito de despesas de campanha (de 1997), mas à data não sabia quem o compunha
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
(só mais tarde é que ficou a saber que os arguidos Horácio e Joaquim Freitas faziam
parte desse grupo, quando toda esta questão veio a público).
Confrontado com o talão de depósito na conta do BES, no valor de 250 cts,
constante de fls 7102 e 7103, reconheceu ter preenchido esse talão (igual ao de fls 200
do apenso 1), referiu que era o arguido Horácio quem lhe dava os elementos para
proceder ao respectivo preenchimento. Por vezes o talão de depósito já estava
preenchido. Reafirmou que presumia que essa conta era uma conta pessoal do arguido
Horácio Costa, pelo que partia do pressuposto que lhe fazia um favor, sendo certo que
entendia que na CMF ele era seu superior por à data partilhar um gabinete com um
vereador (Lickefold).
É certo que nenhum verador da CMF lhe pediu para efectuar depósitos, mas têlos-ia efectuado se lho pedissem.
Confrontado com o documento de fls 208 do apenso 4 (talão dos CTT
respeitante ao envio de correspondência a 28.10.98, no montante de 92.650$00, em que
o PS é a entidade devedora), referiu que presume tratar-se de despesas de envio de
correspondência. Nessa cópia existe um manuscrito a vermelho com os dizeres “Pago.
Regiões”. Assegurou não conhecer a letra (que é do arguido Horácio, segundo o
próprio).
Houve de facto uma campanha que se prendeu com o referendo da
regionalização, mas já não se recorda em que ano.
O depoente tinha assento na Comissão Política do PS local enquanto membro da
JS.
Conhece a testemunha David Queirós, o qual era líder da JS.
Explicou que quando depôs motraram-lhe documentos alusivos a depósitos na
conta do BES e nas conversas que teve então com a dita testemunha não os
relacionaram com depósitos referentes a actividades partidárias, nem tinham de os
relacionar.
O arguido Horácio entitulava-se assessor da presidente da autarquia e
frequentava com regularidade as instalações da CMF.
Ele exercia funções no Centro de Camionagem.
Tem a ideia que quando o arguido Horácio foi para a CMF partilhou o gabinete
com o Vereador Lickefold, ficando com ele quando este deixou de desempenhar essas
funções (este, até renunciar, exercia funções a meio tempo, mas via-o pela CMF com
regularidade).
*
Em face destas declarações o arguido Horácio Costa referiu que conheceu a
testemunha Armindo Brochado durante a campanha eleitoral de 1997, o qual era uma
“extensão” da testemunha David Mota, da JS.
Quando foi necessário obter o apoio da JS, foi a testemunha David Mota quem
trouxe os elementos.
A testemunha Armindo teve grande conhecimento acerca da logística e acerca
das acções de campanha.
Na verdade, ele organizou reuniões, foi muitas vezes à CMF e ao gabinete do
depoente a esse propósito, conduziu viaturas e fez parte de um staff que organizou
concertos, entre outras actividades em que participou nessa campanha.
Ele esteve presente em todas as acções organizadas pela JS, designadamente no
acampamento em Vila Fria.
Ele teve assim conhecimento de situações relacionadas com o financiamento da
campanha.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Devido à sua acção na campanha foi um dos elementos agraciado com uma
compensação monetária (em Dezembro de 1997 pagou-lhe uma quantia em dinheiro –
cujo montante não se recorda -, ao que julga na CMF).
Não compreende como pode ter referido ao tribunal entender que o depoente era
o seu superior hierárquico, já que a testemunha Júlio Pereira e o arguido Bragança é que
eram os seus superiores hierárquicos desde a altura em que ele integrou o GAPP.
Sabe assim que o depoente não tinha autoridade para lhe dar qualquer ordem.
A testemunha Davi Mota é que colaborava com o depoente na CMF.
Nunca o depoente mandou à testemunha Armindo efectuar qualquer depósito na
conta do BES.
Ele aliás tirava cópia dos cheques no GAPP e transportava-os por ordem dos
seus superiores e nunca por ordem do depoente.
Foi devido à sua acção na campanha de 1997 que ele foi para o GAPP por
merecer a respectiva confiança política.
Sobre o Centro de Camionagem a testemunha em causa nada sabe.
Foi a testemunha Armindo quem o auxiliou a levar as caixas com as suas coisas
para a sua viatura (por indicação da testemunha Júlio Pereira), quando ali se deslocou
para as recolher, conforme episódio que já relatou.
*.
Em face destas declarações a testemunha Armindo Brochado referiu que tirava
cópia dos cheques que depositava e entregava ao arguido Horácio essas mesmas cópias.
É verdade que foi gratificado pela sua acção na campanha eleitoral de 1997,
tendo sido a testemunha David Queirós quem lhe entregou o dinheiro num envelope
fechado, na sede de campanha. Segundo presume, esse dinheiro proveio do arguido
Horácio (talvez o David lho tenha dito, mas não se recorda). À data não sabia que ele
era o responsável pelos pagamentos, sendo certo que só mais tarde veio a saber que era
ele e o arguido Joaquim os responsáveis pelos pagamentos.
Confirmou que transportou os caixotes para o carro do arguido Horácio, tendoos recolhido no salão nobre da CMF. O arguido Horácio escolheu o que quis levar e o
depoente auxiliou-o (não se recorda quantos caixotes transportou).
- Testemunha Vítor Manuel Fernandes Oliveira de Sousa
É jornalista de profissão, tendo colaborado a tempo inteiro para o “Público” de
Novembro de 1992 até Março de 1997. Por convite telefónico da arguida Fátima
Felgueiras, ingressou no Gabinete de Imprensa da CMF a 01.04.97, onde permaneceu
até ao final de 2005.
Quando iniciou funções na CMF conheceu o arguido Horácio Costa, o qual já
era assessor da arguida Fátima Felgueiras. Ele foi-lhe apresentado nessa qualidade ou
pela própria arguida Fátima ou por algum elemento do GAPP. Não sabe em concreto
quais eram as suas funções na CMF.
Como tinha de ir muitas vezes à zona da presidência da CMF, cruzava-se muitas
vezes com o arguido Horácio Costa, o qual dispunha nessa zona de um gabinete (à
direita). Sempre o viu na zona do GAPP a prestar as suas funções.
O depoente fez parte da direcção de campanha nas eleições autárquicas de 1997,
tendo integrado o pelouro da comunicação.
O arguido Horácio, por seu turno, estava na área financeira da campanha.
Foi nesse período que mais de perto conviveu com ele, pois ambos faziam parte
da direcção de campanha.
143
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Recorda-se que nas primeiras reuniões ficaram definidos os pelouros. Aliás, a
respectiva composição foi publicada na comunicação social, tendo como fonte a
direcção de campanha.
A composição dos pelouros foi feita em função da disponibilidade das pessoas e
das áreas a que estavam ligadas, sendo certo que alguns lugares já vinham definidos.
O arguido Joaquim Freitas fazia também parte do pelouro das finanças.
Não se recorda como é que esse pelouro foi constituído, mas o certo é que o
depoente, os arguidos Fátima Felgueiras, Júlio Faria, António Pereira, Horácio Costa e
Joaquim Freitas e ainda outros elementos estavam presentes na reunião onde tal ficou
definido.
A arguida Fátima Felgueiras acompanhava de perto a actividade do pelouro da
comunicação, presumindo que assim fosse em relação aos demais pelouros.
Aliás, estava-lhe no ADN controlar tudo de perto.
Desconhece porém se ela interferia nas questões financeiras da campanha.
Recorda-se que nas reuniões as coisas já vinham definidas e eram postas à
consideração.
As reuniões depois passaram a ser sectoriais, isto é, cada pelouro reunia os seus
elementos.
No caso do depoente, articulava-se com a arguida Fátima Felgueiras (havia
outros elementos no pelouro da comunicação mas que eram meramente decorativos).
Fazia-o no seu local de trabalho.
Quanto ao modo como decorriam as outras reuniões sectoriais nada sabe.
O depoente não se preocupava com os custos das publicações de campanha pois
tal constituia preocupação do pelouro das finanças.
O depoente limitava-se a concluir o seu trabalho e a entregá-lo na reunião,
perdendo-lhe depois o rasto. Constatava depois o produto final, uma vez publicado.
Todos sabiam quem compunha o pelouro das finanças, segundo presume.
Ignora se esse pelouro pagou despesas depois de finda essa campanha.
Não sabe igualmente se foram pagas por esse pelouro despesas que nada tinham
a ver com a campanha (desiganadamente despesas do “Sovela”).
Depois das eleições o arguido Horácio Costa chegou a ser vereador (ele era o 5º
da lista e foi substituir o vereador Lickefold, o qual se demitiu dessa função).
- Testemunha José Júlio da Silva Pereira
É funcionário administrativo da CMF há 25 anos, tendo exercido funções no
GAPP durante 22 ou 23 anos, até 2005.
É militante do PS há 10/15 anos.
Fez parte de várias comissões políticas do PS local, tendo colaborado nas várias
campanhas eleitorais desde há cerca de 15 anos (designadamente na preparação de
eventos, como comícios).
A primeira campanha eleitoral autárquica em que colaborou remonta à segunda
metade da década de oitenta.
As despesas partidárias disparavam aquando das eleições.
O PS tinha uma conta própria e na altura da campanha eleitoral havia um grupo
que tratava das contas da campanha, contas essas que nada tinham a ver com a conta
oficial do partido. Julga que esse grupo abria uma conta bancária, mas não tem a certeza
desse facto.
No tempo em que o arguido Júlio Faria se candidatou à CMF criava-se uma
direcção de campanha composta por membros da comissão política e algumas pessoas
convidadas para o efeito.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Criavam-se então os vários grupos para o desempenho de tarefas variadas, entre
as quais o grupo das finanças da campanha.
Não se recorda quem nessa altura compunha o grupo das finanças,
designadamente nas eleições de 1993.
À pergunta efectuada no sentido de saber se a testemunha Sousa Oliveira (exmarido da arguida Fátima Felgueiras) fez parte do grupo das finanças na campanha
eleitoral referente às eleições de 1993, referiu não se recordar, acrescentando que ele foi
candidato à Assembleia Municipal de Felgueiras nessas eleições.
O tipo de procedimento que referiu quanto à organização da campanha sempre
se manteve assim.
Não sabe em concreto quais os valores despendidos nas campanhas, mas tudo
indica que eram despendidas verbas significativas nas acções de campanha que eram
desenvolvidas.
Os fundos provinham de donativos de pessoas amigas do PS, designadamente
industriais, comerciantes e cidadãos comuns.
Não sabe de que forma esses donativos eram concedidos, isto é, se em
numerário se através de cheque. Admite que os donativos fossem concedidos de ambas
as formas, mas salientou que nunca fez parte do pelouro das finanças.
À pergunta efectuada no sentido de se saber por que razão tais fundos não
entravam na conta oficial do partido, referiu que sempre foi assim, sendo certo que a
conta oficial do PS destinava-se a penas a pagar as despesas correntes do partido (os
titulares dessa conta eram os arguidos Júlio Faria e Bragança e o depoente). Não deu
qualquer explicação para esse facto, limitando-se a referir ignorar a razão subjacente a
tal realidade.
A campanha era sempre gerida à parte em termos financeiros.
Foi então a testemunha confrontada com as declarações que prestou perante o
JIC, exaradas a fls 3276, linhas 33 a 36 (14º volume), referindo então que presumia ser
conforme então declarou.
Explicou que nas campanhas em que o arguido Júlio Faria foi o cabeça de lista
ignora se era aberta alguma conta bancária.
Relativamente às campanhas em que foi cabeça de lista a arguida Fátima
Felgueiras, soube posteriormente da abertura de uma conta. Concretamente, no que se
refere às eleições de 1997, soube posteriormente (em 1999 ou 2000) da abertura da
conta do BES. À data ignorava se tinha ou não sido aberta alguma conta, mas presumia
que sim em face dos montantes movimentados serem avultados. Todos aliás presumiam
que tinha sido aberta uma conta.
Nessa campanha eleitoral o grupo das finanças era composto pelos arguidos
Horácio Costa e Joaquim Freitas e, ao que julga, pela testemunha Dinis. Foi numa
reunião da direcção de campanha (formada por 20 a 30 elementos, como por exemplo
os arguidos Júlio Faria, Fátima Felgueiras e Maria Augusta, o depoente, a testemunha
Horácio Reis e Fernando Martins Coelho) que essas pessoas foram indicadas para esse
grupo.
Porém, a propósito do seu nome não constar como pertencendo à direcção de
campanha nos documentos juntos pelo arguido Faria na audiência de julgamento (cfr.
fls 12211), explicou que a direcção de campanha é diferente da comissão coordenadora,
da qual não fazia parte. Os elementos da comissão coordenadora faziam parte da
direcção de campanha, mas era um grupo mais restrito.
Era sobretudo a comissão de eventos que dependia mais da angariação de
fundos, visto que sem dinheiro nada se fazia (daí a importância da comissão de gestão
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
financeira da campanha). Era o grupo financeiro que procedia ao pagamento das
despesas.
A opinião da arguida Fátima era sempre uma referência.
Ignora se antes das reuniões as decisões já vinham “cozinhadas”.
Na direcção de campanha não se abordavam questões relacionadas com
pagamentos.
Na campanha eleitoral de 1997 o depoente fazia parte da comissão de eventos.
Estava por isso mais afecto à logística da campanha. Não fazia encomendas.
Nas eleições autárquicas de 2005 o candidato à CMF e um outro candidato
(ambos do PS) é que abriram uma conta para as despesas de campanha (ao que parece é
agora obrigatório por lei), sendo certo que o depoente fez parte da direcção de
campanha.
Acha que os candidatos por norma não se sentem confortáveis com a questão da
recolha de fundos para que de alguma forma não se sintam reféns.
Antes dos elementos do pelouro das finanças irem recolher os fundos sucedia
que elementos da direcção de campanha poderiam contactar potenciais doadores.
Não se recorda porém de terem telefonado do GAPP para potenciais doadores
para a campanha, designadamente industriais.
Ao depoente não foram entregues donativos, nem os donativos foram entregues
no GAPP, que tenha conhecimento.
Cofrontado com cópia do cheque de fls 501 do 3º volume (o segundo), no valor
de 250.000$00 e datado de 10.10.97), emitido a favor do arguido Joaquim Freitas,
referiu ignorar por que motivo se acha emitido a favor deste arguido.
Foi confrontado com o cheque de fls 526, do 3º volume (cópia de cheque
emitido por Albino Moreira Fernandes, no valor de 300.000$00), emitido a favor do
arguido Horácio Costa. Assegurou não conhecer o dito Albino, conhecendo antes a
firma “Machado Fernandes e Nogueiras, Ldª”, por ter construído uns prédios em frente
à Biblioteca Municipal. Essa empresa tem um funcionário que foi seu colega de escola
(Júlio). Ignora onde é a sede dessa empresa, mas deduz que seja em Fafe em face do
teor do cheque em causa. Não se recorda de ter falado com o Júlio no sentido de
sensibilizar a respectiva entidade patronal a conceder um donativo, sendo certo que ao
depoente ninguém entregou na CMF qualquer donativo.
Confrontado com o cheque de fls 7089, datado de 04.11.97 e no valor de
500.000$00, sacada sobre uma conta titulada por Paula Maria Leite Melo, mas assinado
por Rolando Melo (ex-vereador da CMF e dono da empresa de calçado “RCM” e que
tem uma filha de nome Paula), assegurou ignorar de que forma esse cheque foi parar ao
pelouro das finanças.
Constatou-se que o único cheque emitido a favor do PS (referente a donativo)
consta de fls 518 do 3º volume (cheque de Eugénio Faria Leite, no valor de 500.000$00
e datado de 09.12.97). Assegurou não se recordar desse cheque, sendo certo que a
maioria dos donativos concedidos ao PS não eram daquela monta e surgiram
fundamentalmente por alturas da aquisição da sede do PS local, em 1994 ou 1995.
Nas eleições legislativas, eram as estruturas distritais do partido que escolhiam
os candidatos à Assembleia da República. No caso, seria a Distrital do Porto do PS
quem escolhia os candidatos à Assembleia da República e os indicava à estrutura
nacional do partido, que, depois de tomar a decisão quanto à composição das listas,
incluía os candidatos indicados nas listas.
A campanha para as eleições autárquicas é mais personalizada, havendo um
confronto mais directo entre os candidatos.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Quando o arguido Horácio Costa ingressou como assessor na CMF o depoente
já exercia funções no GAPP. Ele era assessor da presidente da autarquia e administrava
o Centro Coordenador de Transportes e o património municipal.
Ele partilhava o primeiro gabinete à direita, ao lado do GAPP. Partilhou esse
gabinete com o verador Lickefold e chegou a partilhá-lo com a testemunha Cândida
num curto período de tempo, ao que pensa antes das eleições de 1997. Ele ia quase
diariamente a esse gabinete. Entretanto passou a exercer as funções de vereador.
Não tem conhecimento que ele tenha feito audiências a presidentes de junta, pois
o depoente só marcava audiências dos presidentes de junta com a arguida Fátima
Felgueiras.
Seja como for ele atendia pessoas no seu gabinete, mas o depoente não fazia a
marcação de audiências com os munícipes. Assim, não sabe se ele chegou ou não a
atender presidentes de junta.
Pensa que o arguido Horácio não teria autonomia na sua acção, já que deveria
estudar os assuntos que lhe competia acompanhar para depois os submeter à apreciação
da arguida Fátima Felgueiras. Ele cumpria as ordens dela.
Quando o arguido Horácio Costa deixou de se vereador permanente o mobiliário
do seu gabinete foi removido para o salão nobre da CMF, visto que a zona dos gabinetes
entrou em obras.
Esse mobiliário permaneceu no salão nobre até ao momento em que ele ali se
deslocou para recolher os seus pertences, na sequência do facto de ter sido convocado
para o efeito por meio de ofício e de ter acertado telefonicamente com ele o dia e a hora
em que isso sucederia.
Foram então ambos ao salão nobre e foi ele quem abriu o armário (já que era ele
quem tinha a respectiva chave). Ele retirou então os objectos do armário e o depoente,
juntamente com a testemunha Armindo Brochado, auxiliaram-no a transportar tais
objectos para a sua viatura.
Em sede de reinquirição referiu que em 1997 pertencia à comissão política do
PS local e era secretário da arguida Fátima (prestava serviço no GAPP). Nessa altura o
arguido Júlio Faria não pertencia à dita comissão política. Faziam parte desse órgão a
arguida Fátima Felgueiras, a testemunha Sousa Oliveira, a testemunha Fernando Pereira
Sampaio, o arguido Bragança, Augusto Faria, Conceição Rocha, António Faria, o
depoente, etc.
A comissão política reunia de três em três meses, sendo certo que em alturas de
campanha eleitoral é a direcção de campanha que assume a liderança da campanha.
Na comissão política e na direcção de campanha, que tenha conhecimento, o
arguido Júlio Faria não tinha qualquer poder de facto ou de direito.
A direcção de campanha não escolhia candidatos. Era a comissão política que
escolhia o candidato à presidência da CMF e à presidência da Assembleia Municipal de
Felgueiras. Os presidentes de junta normalmente eram recandidatados.
A comissão coordenadora era composta por um grupo de pessoas mais restrito.
Eram constituídos pelouros (finanças, logística, eventos, produção de textos ou
notícias).
Reafirmou que só soube da conta do BES após as eleições de 1997 (não se
recorda de quem ouviu essa informação), sendo certo que o PS tinha uma conta que
servia para pagar as despesas correntes e não as despesas de campanha.
Na altura da campanha eleitoral sabia que alguém geria financeiramente a
campanha, mas não sabia quem.
Ainda em sede de reinquirição afirmou que das reuniões da direcção de
campanha eram feitas actas pelo arguido Bragança, as quais eram distribuídas na
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
reunião seguinte. Não sabe porém se eram feitas actas de todas as reuniões. Tais
documentos não estão na posse do PS.
Em sede de reinquirição referiu que o processo de escolha dos candidatos a
deputado na Assembleia da República passa pela Federação Distrital do PS (cujo líder
era a testemunha Narciso Miranda), e concerteza que se começou a falar da
possibilidade do arguido Júlio Faria integrar a lista do PS à Assembleia da República
uns meses antes das eleições legislativas (essas eleições ocorreram em Outubro e a
escolha dos candidatos ter-se-á processado antes do Verão).
Em todo o caso, salientou que ignora os pormenores da escolha do arguido Júlio
Faria.
Em Felgueiras ele foi o primeiro ex-presidente de Câmara a ir para a Assembleia
da República.
Não sabe se o arguido Júlio Faria suportou despesas do PS.
O arguido Júlio Faria, quando era deputado, usava um gabinete para
atendimento na Biblioteca Municipal (à Segunda-feira, dia em que se encontrava em
Felgueiras).
O Sr. Pinto levava ao arguido Júlio Faria recortes de jornais e alguma
correspondência dirigida a ele (que retirava de uma prateleira que se encontrava em
cima de uma mesa no GAPP e destinada à colocação de documentos destinados ao
arguido Júlio Faria. Ignora se o arguido Horácio alguma vez ali colocou algo destinado
ao arguido Júlio). Não sabe se o Sr. Pinto levava esses documentos a casa dele ou ao
gabinete que ocupava para atendimento. Ignora ainda se o Sr. Pinto levava-lhe esses
documentos semanalmente ou de quinze em quinze dias.
*
A propósito das declarações da testemunha José Júlio, referiu o arguido Horácio
Costa que a constituição do grupo das finanças ocorreu antes de constituída a direcção
de campanha, pelo que não foi no âmbito da mesma que tal pelouro foi criado.
De facto, a pré-campanha começou em Maio/Junho de 1997 e na altura não
havia sido ainda constituída a direcção de campanha.
Nessa altura a arguida Fátima Felgueiras deu instruções rigorosas acerca do
lançamento da sua candidatura.
O primeiro evento sucedeu em Julho de 1997 (refeição no Mercado Municipal),
tendo sido realizadas despesas, designadamente de correio (respeitante aos convites) no
montante de 114.289$00 (cfr. extrato da conta do BES, designadamente fls 10 do
apenso 1).
Essas despesas chegaram às mãos da testemunha José Júlio, o qual se dirigiu ao
depoente para as pagar, o que foi feito.
Nessa altura o pelouro das finanças já estava constituído conforme já relatou,
logo, esse pelouro não foi criado no âmbito da direcção de campanha.
De resto, a conta do BES foi aberta em Julho de 1997 e os primeiros donativos
foram doados em Julho desse ano.
Quando muito a direcção de campanha, depois de constituída, ratificou a
composição do pelouro das finanças tal como havia sido criado.
Os fornecedores da campanha iam ter consigo ou com o arguido Joaquim Freitas
porque alguém os remetia nesse sentido. Alguns desses credores já tinham prestado os
seus serviços ao PS no âmbito de outras campanhas (como por exemplo a “Tipografia
de Guimarães”; “Xavier Calçada”; José Carlos Ribeiro, que prestou um serviço de
propaganda numa viatura por 1.500 cts para a campanha de 1997; “Foto Macedo”, o que
importou numa despesa de mais de 1.000 cts no âmbito da campanha de 1997).
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2º Juízo
Existiram também contas do PS que lhe chegaram via arguido Bragança, como
era o caso dos artistas contratados (como por exemplo a Cândida Branca Flôr e os
“Excesso”).
Alguns presidentes de junta também fizeram fornecimentos para a campanha.
A testemunha Júlio Pereira ia ter consigo com carácter regular e permanente a
propósito de débitos do PS porque tinha instruções nesse sentido.
Foi ele aliás quem lhe apresentou o Sr. Germano, da “Tipografia de Guimarães”,
na CMF, porque existia um débito que era necessário liquidar.
De facto, com carácter regular pagou débitos do PS, de que são exemplos os
documentos de fls 174, 176, 177, 182 e 186.
Apesar da testemunha José Júlio ter referido que não era hábito prestar-se contas
ao partido a propósito da campanha, o certo é que foi movida ao depoente e ao arguido
Joaquim Freitas uma acção de prestação de contas.
Em Fevereiro de 2000 foi a um plenário de militantes do PS na sede local do PS
e foi confrontado com perguntas sobre as contas da campanha. Respondeu durante 3
minutos mas teve de sair porque foi vaiado.
Já depois do depoente ter saído da CMF, a testemunha Júlio Pereira e o arguido
António, segundo lhe disse o arguido Joaquim Freitas, foram à empresa de calçado
“Combate”, situada em Torrados, pertença do pai do arguido Joaquim Freitas e dos
filhos, e assediaram o arguido Joaquim Freitas no sentido convencer o depoente a
fornecer-lhe elementos documentais relativos ao PS, prometendo que nada lhe
aconteceria, que a testemunha Sousa Oliveira (ex-marido da arguida Fátima) trataria de
tudo e que todos os problemas recairiam sobre a pessoa do depoente. Este discurso
partiu mais do arguido António Pereira Mesquita de Carvalho, segundo lhe foi referido
pelo arguido Joaquim Freitas.
No que respeita ao cheque de fls 526 do 3º volume, emitido pelo Sr. Albino,
referiu que este senhor residia no centro da cidade de Felgueiras e a testemunha José
Júlio disse ao depoente para ir ao escritório de uma firma em Fafe para levantar um
donativo junto de um Sr. Júlio, o que fez, tendo-lhe sido entregue um envelope dirigido
à testemunha José Júlio, a quem o entregou. Mais tarde a testemunha José Júlio
devolveu-lhe um cheque passado em seu nome para o depositar (cuja cópia consta de fls
526 do 3º volume), já que se tratava de um donativo para a campanha.
No que respeita ao cheque cuja cópia se acha a fls 518 do 3º volume, emitido
pelo Sr. Eugénio a favor do PS, assegurou que o mesmo foi entregue no GAPP e que foi
a testemunha José Júlio que o deu ao depoente já endossado, tendo-o então depositado
na conta do BES.
No que se refere ao cheque do Sr. Rolando (constante de fls 7089), assegurou
que quem lho entregou foi o arguido Bragança, o qual mantinha com ele um bom
relacionamento. O Sr. Rolando Melo tinha sido vereador, não o conhecendo
pessoalmente.
O Sr. Agostinho Costa dirigia-se ao GAPP para tratar de assuntos do FCF e a
certa altura o arguido Joaquim Freitas encontrou-o lá e solicitou-lhe um donativo para a
campanha, sendo certo que a testemunha José Júlio estava presente.
A testemunha bem sabe que a arguida Fátima se deslocava com o Sr. “Lima da
Jóia” (Fernando Lima) a empresas no sentido de solicitar donativos e a respectiva
contabilidade era feita no GAPP pela testemunha José Júlio.
Além disso, quem levava os credores ao seu gabinete na CMF para serem
atendidos pelo depoente era a testemunha José Júlio da Silva Pereira (foi o caso da
pessoa que se deslocou à CMF para receber o crédito emergente da prestação dos
“Bombos de Airães”).
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2º Juízo
*
Em face das declarações proferidas pelo arguido Horácio Costa, a testemunha
José Júlio da Silva Pereira referiu que não sabe quando teve lugar a reunião da
direcção de campanha onde ficaram definidos os vários pelouros, entre os quais o
pelouro das finanças.
Referiu porém não se recordar da pessoa que nessa reunião transmitiu a
composição dos vários pelouros.
Foi confrontado com o manuscrito de fls 156 (da autoria do arguido Júlio Faria),
tendo-lhe reconhecido a letra. O arguido Júlio Faria fazia parte da direcção de campanha
e está em crer que ele esteve presente nas reuniões da direcção de campanha.
Se esse documento tivesse sido escrito após a reunião da direcção de campanha
que definiu a composição dos pelouros deveria constar o nome da testemunha Dinis
(chefe da Repartição de Finanças da Lixa, à data, tendo vindo mais tarde para a
Repartição de Finanças de Felgueiras, pessoa que não era assídua nas reuniões) como
fazendo parte do pelouro das finanças, o que não sucede (o que inculca a ideia que esse
documento terá sido redigido antes, além de que o texto está dirigido para o futuro).
Além disso, esse documento trata de matéria reservada e as reuniões da direcção de
campanha eram mais alargadas. Ignora porém se esse documento está ou não completo.
Da análise do documento parece resultar que já existiria a comissão coordenadora,
composta por um grupo de pessoas mais restrito.
No que se reporta à refeição no Mercado Municipal, recorda-se apenas de uma
em que participou o António Guterres. Não se lembra de qualquer refeição nesse local
na campanha de 1997.
Admite que tenha solicitado ao arguido Horácio a liquidação das despesas de
correio, no valor de 114.287$00, por ele referidas (a 31.07.97 – cfr. fls 10, do apenso 1
e relação de cheques de fls 53 do apenso 1). Deve tê-lo feito porque alguém lhe deve ter
dado essa indicação, talvez o arguido Bragança, que era o secretário coordenador do PS
local (não obstante à ainda não estar constituído o pelouro das finanças?).
Ainda a propósito de despesas do PS pagas pelo arguido Horácio, foi
confrontado com os documentos de fls 2 a 8 do apenso 4.
Não se recorda se recebia a verba necessária em cheque ou em numerário para
pagar essas despesas.
Não se recorda em que data ocorreu a conferência de imprensa de lançamento da
candidatura da arguida Fátima Felgueiras às eleições de 1997 (cfr. fls 14 do apenso 4,
cópia de recibo dos CTT, onde tem manuscrita uma anotação alusiva a conferência de
imprensa realizada a 30.06.97).
Conhece o Sr. Germano da “Tipografia de Guimarães” por ser fornecedor da
CMF. Não se recorda de o ter apresentado ao arguido Horácio Costa mas admite essa
possibilidade a propósito de um crédito que essa tipografia detinha por força de
trabalhos efectuados para a campanha eleitoral de 1997.
Confirmou que foi a comissão de finanças que pagou a sessão fotográfica aos
candidados do PS às eleições autárquicas de 1997, trabalho executado pela “Foto
Macedo”.
Pensa que de facto quer os “Excesso” quer a Cândida Branca Flôr actuaram em
eventos da campanha de 1997. Era a comissão coordenadora quem tratava da
contratação e de fazer as encomendas para a campanha.
Esteve presente na reunião na sede do PS ocorrida em Fevereiro de 2000, a que
o arguido Horácio fez alusão. Recorda-se dele ter falado alguns minutos e de ter saído
na sequência de algumas movimentações de desagrado (ele não teve condições para
150
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
poder continuar a falar). Não se recorda qual o assunto acerca do qual ele estava a falar
quando saíu.
O depoente fazia parte do secretariado do PS de Felgueiras, pelo que sabe que a
acção de prestação de contas foi proposta contra os arguidos Horácio e Joaquim Freitas.
Pese embora não consiga situar no tempo, confirma que se deslocou à firma
“Combate”. Fez um telefonema ao arguido Joaquim Freitas a pedido da arguida Fátima
Felgueiras e ele disse-lhe que só falava com o depoente e com o arguido António
Pereira. Dirigiram-se então à dita firma e ele mostrou-lhes uma convocatória da PJ,
mostrando-se muito preocupado. Não sabe o que é que a arguida Fátima queria dele,
mas ele não queria falar com ela. Quando se encontraram com ele não receberam
indicações da arguida Fátima acerca do assunto que deveriam tratar, mas foi ela quem
lhes disse para irem ter com ele (?!). Não presenciou qualquer aliciamento.
Ainda no que respeita ao cheque de fls 526, do 3º volume, emitido pelo Sr.
Albino, referiu não se recordar de ter solicitado ao Júlio que intercedesse no sentido da
sua entidade patronal conceder um donativo, sendo certo que não mandou o arguido
Horácio a Fafe para o receber, negando ter-lhe entregue o cheque em causa.
Quanto ao episódio relatado pelo arguido Horácio a propósito do Sr. Agostinho
Costa, referiu que ele de vez em quando ia ao GAPP, levando no início de cada ano
calendários para colocar nas secretárias. Ele era um negociante de peles, fez parte da
direcção do FCF e de uma comissão organizadora de uma tourada destinada a recolher
fundos para o FCF (o depoente fez também parte dessa comissão).
Não se recorda porém de ter ouvido o arguido Joaquim Freitas solicitar-lhe
qualquer donativo no GAPP.
Não sabe se a arguida Fátima recolheu fundos com o Sr. Fernando Lima. Só
sabe que ela participou em dois jantares de angariação de fundos para o FCF e numa
campanha de angariação de fundos para esse clube.
A este propósito, em sede de reinquirição, referiu que era prática habitual o FCF
organizar sorteios, sendo certo que os membros da respectiva direcção é que se
encarregavam de distribuir os bilhetes, podendo nessa conformidade recorrer aos
presidentes de junta e aos industriais.
*
O arguido Horácio Costa esclareceu então que a refeição no Mercado
Municipal se tratou de um almoço e o conjunto dos recibos dos CTT que totalizam
114.289$00 corresponde à divulgação desse evento.
As conferências de imprensa visavam tornar grande um evento que serviria de
apresentação de uma candidatura. A conta bancária do BES tinha sido aberta
recentemente e ainda não dispunham de cheques, daí que só mais tarde essas despesas
tenham sido pagas.
O documento de fls 602 reporta-se a uma despesa paga ao restaurante “Brasão”,
estabelecimento que prestou o serviço no almoço no Mercado Municipal (despesa que
foi paga em numerário na medida em que ainda não dispunham de cheques).
*
O arguido Júlio Faria, por seu turno, referiu que foi por alturas de Maio de
1997 que a comissão política do PS de Felgueiras iniciou o processo das eleições de
1997. Como o depoente à data não fazia parte desse órgão, não sabe exactamente o que
foi entendido fazer a esse propósito.
No início de Junho criou-se a direcção de campanha e a comissão coordenadora
(quanto à composição da direcção de campanha remeteu para os documentos por si
juntos a fls 12206 a 12208; quanto à composição da comissão coordenadora remeteu
para os documentos por si juntos a fls 12209 a 12221).
151
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Mais tarde quer a direcção de campanha quer a coordenadora incluíram outros
elementos que inicialmente delas não faziam parte.
A 09.06.97 ocorreu a primeira reunião da direcção de campanha, sendo certo
que deve ter sido a comissão coordenadora que reflectiu acerca do início da campanha,
pois, segundo assegurou, existia lista de presenças.
Explicou que a comissão coordenadora era o órgão executivo da direcção de
campanha.
O período de campanha eleitoral é de 10 dias, conforme legalmente
estabelecido.
Ainda a propósito do seu manuscrito de fls 156, interroga-se se esse documento
está completo na medida em que não contém a sua rúbrica e a data. Tem para si que
esse documento deverá ter sido elaborado após a primeira ou as primeiras reuniões da
direcção de campanha.
Juntou entretanto aos autos um documento alusivo a uma reunião da comissão
coordenadora a 20.06.97. Segundo o depoente, o facto de nesse documento se fazer
referência à firma “Xavier Calçada” demonstra que o seu manuscrito é posterior a
20.06.97. De facto, o depoente não conhecia essa firma, daí que a referência à mesma
no seu manuscrito só pode significar que esse documento foi por si elaborado depois
dessa reunião ocorrida a 20.06.97.
*
O arguido Horácio Costa, entretanto, reafirmou o que já havia dito quanto às
audiências que fazia, isto é, que fazia audiências a presidentes de junta, que inicialmente
eram dirigidas à arguida Fátima Felgueiras. Essas audências eram marcadas no GAPP
para que a arguida Fátima as fizesse, mas ela mandava o depoente fazê-las (deu três
exemplos a esse propósito). Aliás, a arguida Fátima Felgueiras instruiu o GAPP para
direccionar para o depoente essas audiências, quando não tinha disponibilidade.
Posteriormente o depoente informava-a por escrito do conteúdo da audiência e ela
proferia o inerente despacho, que muitas vezes era dirigido ao GAPP.
Fez também muitas audiências a munícipes.
Havia uma funcionária no hall de entrada da zona política da CMF (onde se
encontravam os gabinetes da presidente e da vereação) – a testemunha Leonor – e se se
tratasse de assuntos do PS ela encaminhava as pessoas para o GAPP, o qual depois
encaminhava para o depoente se se tratasse por exemplo de algum credor do PS, sendo
certo que nunca lhe foi pedido para ir para a sede do PS tratar dos pagamentos. Esses
pagamentos eram feitos pelo depoente na CMF.
Segundo notícia do “Sovela” (edição de 24.10.97, uma sexta-feira), foi na
segunda-feira, dia 20.10.97(último dia para apresentar no tribunal as listas), que foram
divulgadas as listas na sede do PS local. Foi esse o acto público de apresentação das
candidaturas às eleições.
Quanto à firma “Xavier Calçada”, tratou-se de uma empresa que prestou os seus
serviços ao PS a propósito de propaganda móvel (o Sr. Xavier Calçada foi-lhe
apresentado pelo arguido Bragança e era um prestador de serviços habitual do PS),
tendo ocorrido o primeiro pagamento (de 750.000$00) no dia 13.10.97 (cfr. documento
de fls 65 do apenso 4), o segundo pagamento (de 750.000$00) no dia 10.11.97 (cfr.
documento de fls 66 do apenso 4) e o terceiro pagamento (de 1.500.000$00) a 11.12.97
(cfr. documento de fls 67 do apenso 4).
*
- Testemunha Fernando Pereira Sampaio
Foi militante do PS de 1992 até por alturas de 2000.
152
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Fazia parte do movimento que preconizava a elevação da Lixa a concelho por
alturas de 1999. Antes dessa data não era conotado como sendo apoiante dessa causa.
No que toca à campanha eleitoral de 1997 não se recorda se pertencia à direcção
de campanha, mas tem a ideia que sim, até porque montou na Lixa uma sede de
campanha (chegou a pertencer à comissão política num determinado período e ao
secretariado noutro, não concretizando porém entre que datas pertenceu a esses órgãos
do PS de Felgueiras).
A sua acção nessa campanha centrou-se sobretudo à zona da Lixa.
A sede da campanha do PS na Lixa foi montada num espaço pertencente a um
familiar do arguido António Pereira e funcionou durante três semanas.
Fez parte do grupo de recolha de fundos com os arguidos Horácio Costa e
Joaquim Freitas e com a testemunha Dinis (não se lembra se nessa altura já tinha sido
ou não montada a sede na Lixa, sendo certo que quando contactou com o arguido
Horácio alguns empresários antes das eleições essa sede na Lixa ainda não havia sido
montada, o que só viria a suceder, talvez, um mês e meio depois).
Recolheu fundos com os ditos arguidos.
Tem a ideia que esse grupo foi constituído na reunião onde foi constituída a
direcção de campanha, facto do qual não tem a certeza. Seja como for, foram nomeados
numa reunião ocorrida na sede do PS local, ao que pensa depois das férias, sendo certo
que a arguida Fátima Felgueiras estava presente, tendo sido ela quem indicou os nomes
para a composição desse grupo (normalmente era ela quem indicava os nomes). Teve a
percepção de que o arguido Horácio Costa estava mais ligado à arguida Fátima
Felgueiras.
Não teve então a percepção de que os arguidos Horácio e Joaquim já estivessem
intrusados, sendo certo que iriam ocorrer mais reuniões para se definir os termos da
recolha de fundos, às quais o depoente não compareceu, tendo achado estranho não ter
sido convocado.
Depois de ter sido nomeado para a comissão de angariação de fundos chegou a
dizer à testemunha Dinis que só foram nomeados “para fazer monte”, visto que não
eram convidados para nada. As funções do pelouro das finanças centravam-se nos
arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas.
Não se recorda em que data ocorreu essa primeira reunião em que esteve
presente (onde nem sequer se determinou a abertura de uma conta bancária para a
gestão dos fundos da campanha, da qual só veio a ter conhecimento quando veio a
público o presente caso).
A propósito do destino das verbas recolhidas foi confrontado com as declarações
prestadas perante o JIC e constantes de fls 7672, 2º parágrafo, tendo esclarecido que na
altura presumia que os donativos seriam depositados na conta do PS na medida em que
era o partido que geria esses fundos. À data desconhecia a existência da conta do BES.
Pensava aliás que a conta oficial do PS era a conta da campanha.
Os pagamentos eram feitos pelo arguido Horácio Costa, sendo certo que ignora
quem assinava os cheques dessa conta, pois não viu nenhum.
Quase sempre se fazia aquilo que a arguida Fátima determinava. Aliás, durante o
tempo em que participou na campanha não tem conhecimento de se ter feito algo
contrariando o que ela determinava. “Era ela quem dava as ordens e ponto final”. Quase
ninguém se atrevia a alterar aquilo que ela determinava.
Nessa altura o relacionamento que mantinha com a arguida Fátima era normal na
medida em que ainda não pertencia ao movimento que preconizava a elevação da Lixa a
concelho, movimento que ela não gostava.
153
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Porém, confrontado com as suas declarações de fls 7671, linhas 7 a 9, prestadas
perante o JIC (donde emerge que nessa altura já pertencia a esse movimento e que a
arguida Fátima indicou o seu nome para o grupo de angariação de fundos na medida em
que conhecia muitos empresários) admitiu estar equivocado quando à data em que
ingressou nesse movimento de elevação a concelho da Lixa, sendo certo que em 2004
(quando prestou declarações perante o JIC) recordava-se melhor dos factos.
Tem aliás uma cópia da escritura de constituição desse movimento, pelo que na
altura deve ter consultado esse documento para prestar a informação relativa à data em
que ingressou em tal movimento.
São pois mais fidedignas as ditas declarações prestadas perante o JIC.
Dadas as relações de animosidade existentes entre si e a arguida Fátima (pelo
motivo apontado), deduz que foi nomeado para o grupo de angariação de fundos na
medida em que tinha três ou quatro amigos que poderiam dar contribuições monetárias
para a campanha.
Ignora se algum dos elementos da comissão de angariação de fundos fez parte de
idêntica comissão em campanhas anteriores.
Em 1993 o depoente foi candidato à junta de freguesia de Vila Cova, ignorando
quem ficou encarregue de angariar fundos.
Confrontado com manuscrito de fls 156 (da autoria do arguido Júlio Faria),
assegurou nunca o ter visto.
Não sabe qual era o papel do arguido Júlio Faria nessa campanha eleitoral, mas
pensa que ele era pessoa influente no concelho.
Recorda-se que com o arguido Horácio foi a três ou quatro sítios no sentido de
obter donativos para a campanha (ao que pensa antes das eleições, pese embora os
donativos possam ter sido concedidos depois, sendo o depoente quem normalmente
comunicava o motivo da visita):
- Ao Sr. Manuel Benjamim Fernandes Rodrigues (tem a ideia que o arguido
Joaquim Freitas também os acompanhou, mas não tem a certeza se ele entrou nas
instalações fabris), em Revinhade, ao que pensa já depois das eleições. O dito
Benjamim era cliente do depoente (o depoente faz projectos de obras – firma “Projecto
Lixa”) e foram lá por o conhecer. O depoente e o arguido Horácio falaram com ele e
solicitaram-lhe então um donativo e tem a ideia que ele ficou de entregar mais tarde um
cheque através de um seu empregado na CMF, não sabe a quem. Ele referiu que poderia
contribuir com 500.000$00 (cfr. o cheque de fls 535, no montante de 1.000.000$00 e
datado de 26.02.98);
- Ao Sr. Armando Jorge de Almeida Moreira, que conhecia por ser seu cliente.
Ele só conheceu o arguido Horácio nesse encontro. Não se recorda qual o montante que
ele deu (cfr. o cheque de fls 7096, de 200 cts e datado de 23.09.97, igual ao documento
de fls 493), sendo certo que ele ficou de mandar entregar mais tarde o donativo. Por
norma, nessas circunstâncias, os donativos eram entregues na CMF ao arguido Horácio
Costa no seu gabinete (gabinete esse no qual já tinha entrado várias vezes, quer antes
quer depois das eleições. Nessa zona do 1º andar do edifício da CMF existia uma
funcionária na recepção – a testemunha Leonor –, a quem perguntava se o arguido
Horácio estava, sendo certo que pelo menos numa das vezes ele não se encontrava
presente. Sempre conheceu aquele local como sendo o gabinete do arguido Horácio,
sendo certo que nunca lhe transmitiram que ele teria um gabinete noutro lado). Admite
que quando o arguido Horácio não se encontrava na CMF os cheques poderiam ser
entregues no GAPP, mas não tem conhecimento concreto desse facto. O depoente até
poderia entregar os seus donativos aos arguidos Bragança, Júlio Faria e Fátima
Felgueiras e não necessariamente ao arguido Horácio Costa. Seja como for, quando
154
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
visitavam os empresários não ficava definido a quem o cheque do donativo respectivo
deveria ser entregue, apenas que seria entregue na CMF se o donativo não fosse logo
concedido aquando da visita;
- Ao Sr. José Luís Alves Magalhães da Cunha, de Lagares, aonde se deslocou
com o arguido Horácio Costa antes das eleições. Esse senhor também era seu cliente,
sendo certo que ele transmitiu-lhes que mandaria entregar o donativo respectivo na
CMF. Ignora qual o montante que ele concedeu (cfr. o cheque de fls 530, no montante
de 500.000$00 e datado de 28.01.98);
- Ao Sr. Manuel Joaquim Oliveira Magalhães (que vende na Lixa materiais de
construção), o qual é também seu cliente. Também ele assentiu em dar um donativo que
posteriormente entregaria na CMF (cfr. o cheque de fls 7098, de 100.000$00 e datado
de 08.10.97, igual ao documento de fls 498).
Não fez mais contactos no sentido de angariar donativos para a campanha
eleitoral de 1997.
Depois das eleições, numa das suas idas à CMF, o arguido Horácio Costa pediulhe para dar uma ajuda no sentido de contribuir para a liquidação das dívidas da
campanha (estava presente o arguido Joaquim Freitas), tendo-lhe dito na altura o
arguido Horácio que a arguida Fátima tinha fornecido uma lista relativa a pessoas que
teriam de contribuir, sendo uma delas o depoente, o qual bem podia dar um contributo.
O depoente mostrou-se então renitente em dar uma contribuição na medida em
que tinha custeado as despesas relativas à montagem da sede de campanha na Lixa
(tendo desembolsado mais de 1.000.000$00) e o PS ainda não o tinha reembolsado.
Apesar disso, acedeu em contribuir com 500.000$00 (não se recorda se deu essa quantia
nessa data ou posteriormente – cfr. o cheque de fls 531, nesse valor e datado de
06.02.98, cheque que confirmou ter sido por si emitido – mas não foi o depoente quem
lhe colocou o montante -, tendo-o entregue ao arguido Horácio no seu gabinete na
CMF).
Confrontado com o documento de fls 310 do apenso 4, alusivas às despesas de
montagem da sede da Lixa, num total de 549.000$00 (segundo anotação do arguido
Horácio Costa, datada de 15.12.97, foi oferta da testemunha Fernando Pereira Sampaio),
esclareceu a testemunha que foi o depoente quem entregou esse documento ao arguido
Horácio Costa ainda antes das eleições (esse documento foi por si elaborado e
assinado), sendo certo que essas despesas foram consideradas por si como sendo uma
oferta.
Esclareceu ainda que foi induzido em erro pelo facto das despesas com a
montagem da sede e do donativo que entregou ter ultrapassado a quania de
1.000.000$00.
Corrigiu pois as suas declarações no sentido de que o custo da montagem da
sede na Lixa foi de 549 cts.
*
Em face destas declarações o arguido Horácio Costa referiu que a testemunha
nunca esteve em nunhuma reunião do PS, da comissão política do PS ou do
secretariado.
Ele de facto acompanhou o depoente na visita aos empresários acima referidos,
mas não o fez por convite do depoente, já que apenas seguia as instruções da arguida
Fátima Felgueiras.
Deslocaram-se nessas visitas usando a viatura da testemunha.
Muitos dos cheques referentes a donativos só chegaram depois das eleições. Se o
PS não tivesse ganho as eleições está convencido que muitas pessoas que prometeram
donativos os não iriam conceder.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Era o arguido Joaquim Freitas quem tinha as “listinhas” e disse à testemunha
Sampaio que teria de dar 1.000 cts por indicação da arguida Fátima Felgueiras (segundo
lhe transmitiu o Joaquim Freitas). Assim, ele teria de complementar o que já tinha
contribuído com mais cerca de 500 cts (despesas da sde na Lixa no valor de 549 cts +
500 cts).
Quanto à data da inauguração da sede de campanha na cidade da Lixa, segundo
noticiado no jornal “Sovela” de 31.10.97, terá ocorrido a um Domingo, dia 26.10.97.
A testemunha Dinis nunca lhe entregou qualquer donativo.
*
A testemunha Fernando Pereira Sampaio, por sua vez, acrescentou que ia
frequentemente à CMF (até porque fazia projectos de obras que apresentava na CMF) e
foi nessas ocasiões que combinou com o arguido Horácio as deslocações àqueles
empresários.
O Horácio Costa dizia-lhe que tinha recebido instruções da arguida Fátima no
sentido de visitar com o depoente esses empresários, razão pela qual combinaram a
deslocação em causa.
Na reunião em que foi indicado para fazer parte da comissão da angariação de
fundos tem a ideia que o arguido Horácio não estava presente, pois era uma reunião do
partido e o arguido Horácio não era militante. Quer a testemunha Dinis quer o arguido
Joaquim estavam presentes pois ambos faziam parte da comissão política.
Porém, confrontado com as suas declarações prestadas a fls 7670, penúltimo
parágrafo, e 7673, 1º a 3º parágrafo, prestados perante o JIC, referiu agora ter quase a
certeza que o arguido Horácio esteve afinal presente na reunião dado assunto em causa
reportar-se à campanha, nomeadamente à recolha de fundos.
Os elementos que integraram essa comissão de angariação de fundos aceitaram
de imediato e verbalmente a incumbência.
Desconhece a existência de um secretariado da direcção de campanha.
Existia o secretariado local do PS, que era o órgão que determinava as iniciativas
a tomar fora do âmbito das eleições, órgão esse composto por 10 elementos, um dos
quais da JS.
A comissão política do PS local, por seu turno, era composta por vinte e tal
elementos.
Nessa altura fazia parte quer da comissão política quer do secretariado.
Confrontado com os documentos juntos pelo arguido Júlio Faria a fls 12206 a
1208, referiu que a alusão a secretariado deve referir-se ao secretariado do PS, sendo
certo que as pessoas que constam dessa lista são as mesmas que faziam parte do
secretariado do PS (mas no documento refere-se ao secretariado da direcção de
campanha).
Referiu ter a ideia que existiu uma reunião do secretariado do PS e logo a seguir
uma outra para nomear os elementos da comissão de angariação de fundos, não sabendo
se o arguido Horácio estava presente desde o início ou se só foi admitido quando se
tratou do problema da recolha de fundos. Sabe que entre a primeira e a segunda reunião
saíram pessoas, que já não estavam assim presentes na segunda reunião (ocorrida de
imediato no mesmo local), tendo ficado apenas 4 ou 5 pessoas (o depoente, o Joaquim
Freitas, a testemunha Dinis; não tem a certeza se o arguidos Horácio Costa e a arguida
Fátima estariam presentes). Porém, a testemunha nas declarações prestadas perante o
JIC, a fls 7670, penúltimo parágrafo, referiu que tinha sido a arguida Fátima quem fez a
respectiva nomeação, como aliás o referiu antes na audiência de julgamento. Manifesta
agora dúvidas quanto a esse facto.
Nunca assinou qualquer lista de presenças nas reuniões do secretariado.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Quanto à inauguração da sede de campanha na Lixa, admite que a notícia do
“Sovela” seja verídica quanto à data, já que esse jornal fez a cobertura do
acontecimento.
Assim, corrige as suas declarações pois, em face desse dado de que já não se
recordava, conclui que a preparação da instalação da sede na Lixa ocorreu em
Setembro/Outubro de 1997.
*
A arguida Fátima Felgueiras, por seu turno, referiu que a Comissão Política era
um órgão de reflexão política do PS e o Secretariado do PS o órgão executivo do
partido, cujo responsável era o secretário-coordenador (arguido Bragança).
Foi na comissão política que se decidiu acerca da composição da direcção de
campanha e admite que possam ter sido recebidas sugestões do secretariado.
Nunca foi a qualquer reunião do secretariado do PS local.
Como a depoente fazia parte da Comissão Política Nacional do PS e do
Secretariado Nacional do mesmo partido, tinha conhecimentos em termos de análise
política que os outros elementos das estruturas locais do partido não tinham.
Por via de regra não existia um secretariado da direcção de campanha, tarefa que
normalmente era assumida pelo secretariado do PS local como órgão executivo da
estrutura local do partido.
Reafirmou que só cuidava da estratégia política a seguir na campanha eleitoral.
Nunca soube quem eram os clientes da testemunha Sampaio, daí que não
entenda como poderia ter indicado ao arguido Horácio que deveria visitá-los com a
testemunha em causa.
Nunca teve qualquer relação de animosidade com a dita testemunha, pese
embora não tivesse com ele qualquer relação de amizade.
Nunca achou “graça” existir uma sede de campanha na Lixa, mas foi a
testemunha Sampaio quem fez questão disso, à semalhança do que sucedia com outros
partidos.
*
O arguido Horácio Costa referiu ainda que esteve presente em muitas reuniões
do PS a mando da Fátima Felgueiras e que era por esse motivo que ninguém
questionava a sua presença, apesar de não ser militante do PS.
Esteve em reuniões da direcção de campanha e da comissão coordenadora.
Não tem dúvidas porém em que nunca esteve em qualquer reunião em que fosse
equacionada a sua participação no pelouro das finanças (ver, em todo o caso, o auto de
exame de dois discos rígidos do computador usado pelo arguido Bragança, constante de
fls 1108 e a perícia que entretanto foi determinada pelo tribunal já no decurso da
audiência de julgamento).
*
- Testemunha Herique Manuel da Silva Correia
Referiu ser inspector-chefe da PJ (tendo coordenado a investigação nos
presentes autos).
Tomou conhecimento do caso dos autos através da denúncia anónima constante
de fls 2 a 12 do 1º volume, tendo entretanto surgido outras denúncias anónimas que
foram juntas aos autos.
Mais tarde, pelos jornais, tomou conhecimento que o arguido Horácio Costa
tinha sido afastado da CMF, bem como o arguido Bragança e que havia um litígio
crescente entre os arguidos Horácio Costa, Joaquim Freitas e Bragança relativamente à
arguida Fátima Felgueiras.
Assim, em 2000, deslocaram-se a Felgueiras para tentar obter informações.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
À data o arguido Horácio Costa era vereador e o arguido Bragança era chefe do
GAPP e o secretário-coordenador do PS de Felgueiras.
A cota de fls 28 a 30 reporta-se a informações que recolheram no terreno.
Foram entretanto contactados pelos ditos Horácio Costa e Joaquim Freitas, os
quais quiseram denunciar certos factos, já numa fase posterior ao primeiro contacto com
a PJ (cfr. fls 62 dos autos – informação de serviço acerca da entrega de documentos
pelos ditos arguidos, juntos a fls 87 e 88, os quais dizem respeito a dois manuscritos.
O requerimento de fls 63, de 28.03.2000, desses arguidos, foi acompanhado dos
documentos juntos a fls 64 a 84.
O documento de fls 64 versa sobre a criação do pelouro das finanças no âmbito
da campanha eleitoral de 1997; o documento de fls 66 reporta-se a uma guia de
pagamento da CMF e cópia de um cheque da CMF emitido a favor da “Norlabor”; o
documento de fls 67 trata-se de um manuscrito com contas; os documentos de fls 68 e
69 reportam-se a duas cópias de facturas emitidas pela “Resin” à “AMVS”; o
documento de fls 70 diz respeito a uma guia de pagamento da CMF relativamente à
“Norlabor”, com cópia de um cheque emitido pela CMF a favor dessa firma; o
documento de fls 71 é mais um manuscrito com contas; o documento de fls 72 trata-se
de uma fotocópia de um cheque da conta do BES emitido a favor do arguido Júlio Faria;
os documentos de fls 73 e 74 reportam-se a talões de depósito a favor do arguido Júlio
Faria; o documento de fls 75 é uma cópia de um cheque emitido a favor do arguido
Júlio Faria; o documento de fls 76 reporta-se a um talão de depósito em numerário de
1.850 cts na conta do arguido Júlio Faria; os documentos de fls 77 reportam-se a cópias
de dois cheques da conta do BES; o documento de fls 78 reporta-se a um extrato de
conta; o documento de fls 79 reporta-se a um talão de depósito de 4.750 cts na conta do
arguido Horácio no “Banco Mello”; o documento de fls 81 a 83 reporta-se a cópia de
documentos alusivos ao seguro do “Audi A4” referido nos autos, na companhia de
seguros “AXA”; e o documento de fls 84 é um bilhete de um sorteio promovido pelo
FCF.
Pediram informações bancárias alusivas à conta do BES (cfr. ofício de fls 71),
tendo obtido dos respectivos titulares a respectiva declaração de autorização (cfr. fls 39
e 48).
Criaram então o apenso nº 1 (cfr. cota de fls 89) com os documentos entregues
pelo BES.
- Testemunha Carlos Manuel Ferreira Alves
É inspector da PJ, tendo auxiliado a testemunha Henrique Correia nas
investigações.
A PJ tomou conhecimento incial de alguns factos denunciados através da
denúncia anónima constante de fls 3 a 12, remetida para a Procuradoria Geral da
República.
Contactaram inicialmente os arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas (não se
recorda se por iniciativa deles ou da PJ), tendo tomado conhecimento da existência
desses indivíduos através da comunicação social.
À pergunta efectuada no sentido de se saber se os arguidos Horácio Costa e
Joaquim Freitas contactaram as estruturas nacionais do PS por causa de alguns dos
factos em causa nos autos, referiu não saber se os documentos (faxes) constam dos
autos (cfr. fls 1184 e 1185 – missivas remetidas a José Sócartes e a Jorge Coelho; cfr.
ainda os talões de correio de fls 1186 e 1187).
Ao longo da investigação foram surgindo outras denúncias anónimas.
158
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Foi sobretudo o arguido Horácio quem entregou documentos à PJ (cfr. por ex. o
requerimento de fls 63 de junção de documentos dos arguidos Horácio e Joaquim
Freitas.
Esses arguidos eram os titulares da conta do BES, os quais autorizaram o
levantamento do sigilo bancário respectivo (cfr. fls 39 e 48).
- Testemunha Sandra Cláudia de Jesus Ribeiro
É engenheira civil e trabalhou para a “Resin” entre 1995 e 2007. Inicialmente
era engenheira civil no Departamento de Estudos e Projectos (fazia a preparação das
propostas a apresentar nos concursos públicos ou a clientes particulares. Em ordem a tal
fazia o levantamento do terreno e fazia estudos económicos) e mais tarde, entre 1995 e
2001, tornou-se responsável pelas explorações (recolha do lixo, aterros e selagem de
lixeiras), no âmbito do qual fazia a gestão do equipamento e do pessoal e fazia estudos
económicos.
Em Felgueiras acompanhou a exploração da lixeira de Sendim entre o final de
1996 e o princípio de 1997 (durante cerca de um ano deslocava-se ao local uma ou duas
vezes por semana). Ia ao local ver o desenvolvimento dos trabalhos ou a reuniões na
CMF com o arguido Barbieri Cardoso para dar nota dos trabalhos executados. Nessa
altura acompanhou também a recolha de resíduos urbanos em Felgueiras.
Depois da selagem da lixeira de Sendim, a partir de Maio de 1997 deixou de a
acompanhar (passou a ser acompanhada pelo engenheiro Barriga e depois pelo
engenheiro Faria).
Quando iniciou o acompanhamento dessa lixeira ela já era controlada e já tinha
sido efectuada a primeira reabilitação (reabilitação que continuou enquento lá esteve).
A recepção dos resíduos era controlada (os resíduos eram pesados com recurso a
uma báscula) e a lixeira era vigiada 24 horas por dia.
As máquinas faziam a movimentação e a compactação do lixo, o qual era
depositado em alvéolos.
Por norma as lixeiras são exploradas por fases. Define-se um alvéolo que vai ser
coberto com resíduos. Torna-se necessária a construção de plataformas para dar
estabilidade à lixeira e plataformas de acesso para descarga dos resíduos pelos camiões.
As plataformas vão mudando de local e crescendo à medida que a lixeira vai
sendo explorada e à medida que vão sendo depositados os lixos.
A lixeira de Sendim tinha declives mais acentuados do que a lixeira de Lustosa
e, por isso, era mais difícil de explorar.
Em Felgueiras sempre foram recebidos muitos resíduos provenientes da
indústria do calçado, resíduos que são volumosos, difíceis de compactar e mais
inflamáveis, aumentando assim o risco de incêncio.
Tinha assim de haver uma inspecção visual quando esses resíduos eram
depositados e a cobertura tinha de ser feita de imediato para minimizar o risco de
combustão.
À entrada da lixeira havia uma recepção instalada num contentor pré-fabricado,
uma báscula e um guarda.
Quando chegava um camião com resíduos fazia-se a respectiva pesagem
(controlava-se assim o tipo de resíduos e a sua quantidade), após o que a viatura era
encaminhada para a zona de descarga, onde nela existia sempre uma máquina com o
respectivo operador, o qual procedia à aludida inspecção visual, à compactação dos
resíduos e à sua cobertura com materiais inertes.
Os vigilantes eram funcionários da “Resin”.
159
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Os operadores de máquinas eram funcionários da empresa à qual a “Resin”
procedia ao respectivo aluguer.
As máquinas usadas na lixeira consistiam numa pá carregadora, num
compactador e às vezes uma máquina com pás giratórias.
A “Resin” coordenava os trabalhos levados a cabo pelos operadores de
máquinas, existindo um encarregado, funcionário da “Resin”, que coordenava os
trabalhos.
A “Resin” fazia ainda a planificação da exploração.
Era ela que tinha o “know how” necessário para a execução desses trabalhos,
sendo certo que a CMF acompanhava a exploração.
O talão da báscula tinha três vias: uma delas era entregue a quem procedia ao
depósito, outra era entregue mensalmente à CMF e outra ficava para a “Resin”.
Crê que a CMF cobrava uma taxa aos industriais pela deposição do lixo.
A “Resin” tinha um contrato com um valor fixo mensal pela exploração da
lixeira, independentemente da quantidade de lixo depositado. Não sabe qual o
respectivo preço (acha possível que seja de 2.800 cts por mês, quando confrontada com
esse valor).
Nunca teve acesso a qualquer contrato celebrado entre a CMF e outra entidade
que tivesse por objecto a dita lixeira.
O nome Menezes Basto não lhe é estranho e relaciona-o com o proprietário dos
terrenos onde foi instalada a lixeira de Sendim. Nunca viu qualquer contrato celebrado
entre ele e a CMF.
A “Norlabor” era uma empresa que fazia terraplanagens e movimentações de
terras, procedendo também ao aluguer de equipamento. Nunca teve qualquer
conhecimento de algum contrato celebrado entre esta empresa e a CMF.
A “João Tello” era uma empresa do mesmo género e, ao que pensa, também
alugava equipamento. Nunca viu qualquer contrato celebrado entre esta empresa e a
CMF.
A depoente não tinha acesso ao que se pagava ou deixava de pagar a propósito
das obras em que a “Resin” estava envolvida.
Na lixeira sabia o que devia ser facturado (as facturas não lhe passavam pelas
mãos mas dava indicações à contabilidade acerca do que deveria ser facturado).
Em face disso, não sabia o que de facto era pago, ignorando se a CMF devia
dinheiro à “Resin”.
Durante o tempo em que a depoente acompanhou a exploração da lixeira de
Sendim a “Resin” sempre se manteve no local a trabalhar e depois disso continuou a
operar nessa lixeira.
A depoente reportava ao director geral da “Resin” (ao arguido Gabriel Almeida).
Tem a ideia que ele terá sido contratado pela “Resin” em 1996/97 para exercer essas
funções (acompanhava a gestão da empresa ao nível operacional, acompanhava os
contratos que a empresa tinha celebrado tanto a nível da gestão diária –
equipamentos/pessoal – como ao nível da gestão económica dos projectos. Não crê que
ordenasse pagamentos).
Normalmente ele econtrava-se na sede da “Resin”, mas fazia frequentes
deslocações às obras.
Crê que ele tinha poder para fechar negócios.
A decisão de concorrer a algum concurso era conjunta, entre os arguidos Vítor
Borges e Gabriel Almeida.
160
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Não sabe se ele procedia à cobrança de créditos, mas crê que ele diligenciava
junto das entidades devedoras pela obtenção dos pagamentos a que a “Resin” tinha
direito.
O arguido Carlos Marinho era o responsável pela gestão financeira da empresa.
Em 1997 ele era apenas o responsável pela contabilidade (o director financeiro era a
testemunha Luciano Barreira). Não crê que tivesse autonomia para decidir fazer
pagamentos.
O arguido Vítor Borges, por seu turno, era o administrador da “Resin”
(presidente do conselho de administração).
Quando a depoente foi admitida ao serviço da “Resin” era o arguido Vítor
Borges quem era o responsável pelos negócios da empresa em Felgueiras, mas quando
foi admitido o arguido Gabriel Almeida houve uma transferência de responsabilidade
daquele para este no que concerne ao acompanhamento dos negócios em Felgueiras.
Os trabalhos que foram pagos à “Resin” foram efectivamente realizados, pelo
menos no tempo em que acompanhou a exploração da lixeira de Sendim.
Em face do tipo de trabalho em causa (contínuo) é normal que o auto de
recepção da obra fosse assinado sem a ida ao local. Tratava-se de um trabalho que
nunca estava concluído enquanto existisse deposição de lixo na lixeira. Só quando se dá
a selagem da lixeira é que a obra está concluída, o que só ocorreu em 1998, ao que crê.
Nessa altura já estava afastada do acompanhamento dessa lixeira.
Os concursos públicos tinham um caderno de encargos onde se definia o que se
pretendia e às vezes a forma de execução.
Quando se trata da execução de uma obra não há qualquer obstáculo a que se
façam autos de medição e de recepção.
A selagem consiste na modelação para dar estabilidade à massa de resíduos. É
assim criada uma rede de drenagem de lixiviados e do gás, procede-se à
impermeabilização com tela e procede-se à cobertura com terras para que possa ser
vegetalizada. Não acompanhou esse processo em Felgueiras mas crê que procedeu-se
desse modo na selagem da lixeira de Sendim.
Durante o tempo em que acompanhou a exploração da lixeira de Sendim
contactou várias vezes com o arguido Barbieri Cardoso. Era com ele que reunia para lhe
dar conta da evolução dos trabalhos. Era a ele que entregava os talões da báscula.
Sempre o viu como uma pessoa bastante profissional e rigorosa na defesa dos interesses
da CMF.
A esse propósito não teve contacto com mais algum técnico da CMF, sendo
certo que contactou com o engenheiro Leite (funcionário camarário) a propósito da
recolha de resíduos em Felgueiras.
A “Resin” não necessitava necessariamente de alvará, tudo dependia da
intervenção que tivesse nas obras. No caso da lixeira de Sendim a “Resin” prestava os
serviços já referidos, mas subempreitava o serviço de movimentação de terras a
empresas que dispunham do necessário alvará.
O último concurso na zona do Vale do Sousa em que a “Resin” participou terá
sido em 1998 (parece que foi em Outubro de 1997, cujo dono da obra era a AMVS) e
não tem a certeza se o arguido Gabriel participou na negociação respectiva.
- Testemunha Carlos Miguel da Venda de Paços Faria
É engenheiro do ambiente, foi funcionário da “Resin” desde Julho de 1998 até à
fusão daquela com outra empresa, em 2006. Antes de ter sido admitido ao serviço da
“Resin” não a conhecia.
161
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Explicou que foi contratado para acompanhar o encerramento das lixeiras do
Vale do Sousa e o arranque da construção dos aterros de Lousada, Penafiel e Felgueiras.
Numa primeira fase acompanhou a construção dos aterros e o encerramento das
lixeiras que tinham atingido o volume disponível para a deposição de resíduos.
A lixeira de Sendim era para ser encerrada em 1998, mas como se registou um
atraso na construção do aterro da Lustosa (Lousada), manteve-se a exploração dessa
lixeira por mais tempo que o previsto.
De facto, com a construção do aterro da Lustosa estava prevista a deposição dos
resíduos domésticos no mesmo provenientes do concelho de Felgueiras. Como a
construção desse aterro se atrasou, continuou-se a proceder à deposição desse tipo de
resíduos na lixeira de Sendim. Para Felgueiras estava apenas prevista a deposição dos
resíduos do calçado.
Porém, só em Julho de 1999 é que os resíduos sólidos urbanos de Felgueiras
começaram a ser depositados no aterro da Lustosa e até lá continuaram a ser
depositados na lixeira de Sendim.
E só em Julho de 2001 é que se iniciou a exploração do aterro RIB de Felgueiras
e até lá os resíduos eram depositados na lixeira de Sendim.
Consequentemente, a exploração da lixeira prolongou-se por cerca de mais dois
anos.
Recorda-se que pelo menos duas ou três vezes alguém que não concordava com
a localização da lixeira naquele sítio ateou fogo aos resíduos.
Era necesário construir caminhos de acesso e plataformas para que os camiões
que carregavam os resíduos conseguissem chegar ao local de deposição.
À medida que a deposição de resíduos ia ocorrendo criavam-se taludes.
Sob a última camada de resíduos depositados era colocada cerca de meio metro
de terra, após o que se colocava uma tela de impermeabilização com mais meio metro
de terra e criava-se uma rede de drenagem de águas.
Em termos técnicos o depoente era o responsável, mas reportava à testemunha
Pinto Barriga e mais tarde a outra pessoa (Octávio Englekn) – responsáveis pelo
departamento técnico da “Resin” para o Vale do Sousa -, a quem enviava a lista do que
era depositado na lixeira. Mandava também para a CMF uma outra via desse documento
para que ela pudesse cobrar uma taxa pela deposição do lixo.
Explicou que a “Resin” tinha quatro funcionários na lixeira, onde se fazia o
registo do que era depositado através de uma báscula, sendo emitidos três talões (um era
entregue a quem depositava o lixo, outro era entregue à CMF e outro ficava para a
“Resin”).
Havia uma lista de empresas proibidas de depositar os resíduos na lixeira
porquanto não pagavam essa deposição, pelo que deduzia que a CMF facturava a
deposição do lixo.
O director geral da “Resin” era o arguido Gabriel Almeida e só mais tarde é que
contactou com esse arguido quando ele visitava as obras na zona do Vale do Sousa, o
que nem sequer sucedia uma vez por semana.
Só na fase final da exploração da lixeira é que a “Resin” ali colocou um
encarregado. Antes disso existia também um encarregado, funcionário da “Resin”, mas
estava mais afecto à recolha de resíduos sólidos urbanos em Felgueiras.
Quer a “Translousada” quer a “Ecorumo” eram empresas subcontratadas pela
“Resin”.
Por vezes a “Resin” alugava (com manobrador/condutor) máquinas (por vezes
uma máquina com pás giratórias para escavar terra e a tempo inteiro encontrava-se no
local uma máquina com pá de rastos) e camiões.
162
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
O depoente não tinha grande conhecimento da parte financeira da “Resin”. O
arguido Carlos Marinho era o responsável da “Resin” pela parte financeira da empresa.
Sabe que havia um valor fixo mensal que era cobrado pela “Resin” pela
exploração da lixeira, sendo certo que com o aterro passou a ser cobrado um valor por
tonelada.
A certa açtura passou a haver indeferenciação na facuração, que era emitida ou à
AMVS ou à CMF, o que aliás motivou a devolução de facturas.
Por um lado, a “Resin” tinha um contrato com a AMVS para encerrar a lixeira e
explorar o aterro, mas por outro, era a CMF que depositava os resíduos na lixeira.
No que se refere ao aterro, para além do tipo de resíduos, haviam várias
especificidades que atrasaram a sua construção.
Numa primeira fase estava prevista a construção do aterro encostado à zona da
lixeira, mas por questões de estabilidade partiu-se para outra solução (construiu-se um
caminho de permeio).
Com a construção verificaram a existência de nascentes de água, alterações nas
características dos taludes e indiferenciação no tratamento dos lixiviados (aliás, lançouse um concurso para redimensionar o tratamento dos lixiviados, visto que o que estava
projectado revelou-se insuficiente).
Tudo isso atrasou a conclusão da construção do aterro.
As reuniões havidas por causa do aterro eram feitas com a AMVS e nelas
participavam elementos da CMF, como o arguido Barbieiri, a engenheira Neri e outro.
Aliás, o depoente contactava mais com o arguido Barbieiri Cardoso.
- Testemunha José Henrique Machado Pinto Barriga
Trabalhou para a “Resin” desde Outubro de 1997 até à sua fusão com outra
empresa em 2005 ou 2006. Era engenheiro do ambiente para a área do Vale do Sousa.
Foi admitido pelo arguido Gabriel Almeida.
No Vale do Sousa iriam iniciar-se um conjunto de obras com alguma
complexidade quer ao nível da selagem de lixeiras quer ao nível da construção de
aterros.
Em 1997 a lixeira de Sendim já estava controlada, não sendo já uma lixeira
“selvagem”.
Tinha equipas nas várias lixeiras (do Vale do Sousa) para proceder à
compactação e cobertura dos resíduos (lixeiras de Sendim, Seroa e Lustosa).
O depoente, por seu turno, dava o respectivo acompanhamento técnico.
Em todas essas lixeiras existiam máquinas para fazer a compactagem e a
cobertura dos resíduos.
Construíam-se com inertes plataformas para acesso dos camiões para descarga.
Em Felgueiras a lixeira era vigiada 24 horas por dia por três funcionários.
Faziam-se levantamentos topográficos para verificar a capacidade de
compactação dos resíduos. Quanto mais compactados menor quantidade de lixiviados
existiriam e maior capacidade teria a lixeira de receber resíduos.
Acompanhou a fase de exploração da lixeira de Sendim até final de 1999, sendo
certo que depois dessa data quem passou a estar à frente do controle dessa lixeira era a
testemunha Carlos Miguel da Venda de Paços Faria.
Explicou que a quantidade de resíduos depositados, o tipo de resíduos em causa
e a maior ou menor pluviosidade registada pode condicionar a rapidez e a necessidade
de construção de plataformas.
A “Resin” não interrompeu a exploração da lixeira, pois se isso sucedesse
perder-se-iam anos de trabalho com a deposição “selvagem” dos lixos.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Na lixeira de Sendim, quando necessário, um encarragado da recolha de
resíduos, dava o seu apoio.
Existia a operar uma máquina para a compactagem dos resíduos e a “Resin”
alugava camiões para o transporte da terra com que os resíduos eram cobertos (o
aluguer era feito à “Translousada” e mais tarde à “Ecorumo”. O seu intorlocutor era a
testemunha Carlos Silva, tanto no que se referia a uma como a outra empresa).
Não conhece nem a “Norlabor” nem a “João Tello”.
Haviam reuniões técnicas na CMF, sendo sobretudo o arguido Barbieri o seu
intorlocutor.
Havia uma fiscalização periódica pela autoridade que tutelava e quem respondia
pelo que se passava na lixeira era a “Resin”.
A “Translousada” limitava-se a cumprir as directivas que lhe eram dadas pela
“Resin”.
Só desde o momento em que cessasse a deposição do lixo na lixeira é que seria
lógica a existência de um auto de recepção.
A exploração pressupõe o controle e a queima do bio-gás.
Construíram assim um sistema de captação de lixiviados que foi complexo.
A máquina que procedia à cobertura dos resíduos custava 8/9 cts à hora.
A “Resin” debitava por mês 2.800 cts.
Ouviu dizer que tinha dificuldade em receber os pagamentos, mas não se tratava
de uma questão sobre a qual se debruçasse. Tem a ideia de que terminou um contrato e
que não havia outro contrato (no âmbito do qual pudessem ser feitos os pagamentos
devidos).
A construção do aterro de Felgueiras atrasou-se muito.
A exploração de um aterro impõe um leque grande de trabalhos preparatórios
complexos (é mais fácil construir uma casa).
O resíduo industrial do calçado ocupa muito espaço e pesa pouco, tornando-o
difícil de compactar. Como também eram depositados no local os resíduos sólidos
urbanos, os resultados da compactagem eram mais difíceis.
O aterro de Felgueiras foi construído pelo consórcio “Resin”/”Sita”/”Ecop”.
Havia a dificuldade de compactagem dos resíduos industriais do calçado, com
metais pesados cujos tratamentos físico-químicos eram mais exigentes.
A construção ficou a cargo da “Ecop”, o projecto sobretudo a cargo da “Sita” e a
exploração pela “Resin”.
O início da exploração do aterro de Felgueiras deu-se em finais de 2000.
O depoente só acompanhou algumas reuniões preparatórias com a ETEC
(empresa contratada pela AMVS para fiscalizar a obra) para a construção do aterro.
Com efeito, o depoente acompanhou mais a construção dos aterros de Lustosa e
de Penafiel, de sorte que, no que ao aterro de Felgueiras concerne, só conhece o
projecto, não tendo acompanhado a sua construção.
Foi substituído pelo engenheiro Octávio Engelkn.
Em todo o caso, o projecto previa a construção de uma rede de drenagem
friática, o alisamento do terreno, a deposição de uma camada de um metro de argila, a
colocação de uma tela e de uma camada de impermeabilização, uma rede de drenagem
do aterro e uma rede de drenagem dos lixiviados.
Havia uma reunião mensal e reuniões secundárias de fiscalização pela ETEC.
Inicialmente o depoente reportava ao engenheiro Paulo Ribeiro.
O arguido Vítor Borges era o presidente do conselho de administração da
“Resin”. Vinha raramente ao terreno, normalmente em ocasiões solenes.
O arguido Carlos Marinho era o contabilista da empresa.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
A testemunha Luciano Barreira era o director financeiro (o qual esteve pouco
tempo no exercício dessas funções). Depois, para essas funções (provindo da “Ecop”),
veio o Dr. António Massa, o qual esteve no exercício dessas funções durante cerca de
um ano, até ao momento em que a “Ecop” deixou de participar no capital social da
“Resin”.
Pensa que o contrato de manutenção da lixeira de Sendim foi celebrado com a
CMF e que a facturação era-lhe emitida; porém, não tem a certeza desse facto (acabou
por referir não saber a quem a “Resin” facturava).
- Testemunha António Fernando da Silva Ramos
É encarregado de resíduos sólidos urbanos. Trabalhou para a “Resin” entre
Novembro de 1993 até à data em que se fundiu com outra empresa, dando origem à
“Cespa Portugal”, ao serviço da qual actualmente a testemunha trabalha.
Quando iniciou funções na “Resin”, durante dois ou três meses, foi motorista,
passando depois a encarregado na lixeira de Felgueiras (desde Janeiro de 1994 até à
construção do aterro RIB de Felgueiras).
Quando começou a trabalhar na lixeira de Sendim o lixo ardia muito e havia lixo
por todo o lado.
Trabalhou com dois funcionários (o Sr. Pereira e o Sr. Sousa), sendo certo que
na altura estava a operar na lixeira um “buldozer” de uma empresa francesa com o
objectivo de limpar o local (que operou nessa lixeira durante 6 meses).
O depoente conduzia uma máquina com uma pá de rastos, que entretanto
desmontou, e para o local foi trabalhar uma outra máquina com pá de rastos da marca
“Catterpilar”.
Foi o Sr. Oliveira Pereira (de nacionalidade portuguesa mas há muitos anos a
trabalhar em França) quem lhe deu formação para operar com a dita máquina.
Foi ele quem lhe deu formação na limpeza dos alvéolos, deposição do lixo e sua
cobertura.
Recorreu várias vezes aos Bombeiros de Felgueiras no sentido de lhe fornecer
água para os radiadores das máquinas.
Os primeiros engenheiros a dar-lhe indicações foram as testemunhas Pinto
Barriga, Claudia Ribeiro e Miguel Faria.
O depoente também trabalhou em Lousada e em Penafiel.
De facto, ainda em 1994 foi fazer o mesmo tipo de trabalho na lixeira da
Lustosa, dividindo-se então entre esta e a lixeira de Sendim.
Na lixeira de Sendim existia um contentor à entrada, onde guardava algumas
peças e combustível.
Em frente a esse contentor construiu logo no início um pequeno jardim e com
brita fez no chão o logotipo da “Resin”.
Entretanto, cerca de um ano depois de ter ido trabalhar para essa lixeira, foi
colocada uma báscula para pesar o lixo.
Construíam plataformas nos locais de descarga, em zonas criadas para o efeito.
Essas plataformas eram construídas quando se mudava de local de descarga.
Até ao encerramento da lixeira a “Resin” sempre ali se manteve a operar e a
construir plataformas.
A “Translousada”, a “Ecorumo” e a “Norlabor” alugavam máquinas com
manobrador à “Resin”. Era a testemunha Carlos Silva quem contactava consigo.
Quando havia problemas com a máquina (manobrada pela testemunha Mário
Barbosa) contactava a “Translousada” no sentido de se diligenciar pela respectiva
165
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
reparação. A testemunha Mário Barbosa dizia-lhe que a “Translousada”, a “Ecorumo” e
a “Norlabor” pertenciam ao mesmo grupo.
Acabou por dizer não saber se a “Norlabor” alguma vez operou no local.
Afirmou que no local, na lixeira, só existiu uma báscula.
- Testemunha Albino Fonseca Loureiro
Referiu ter sido membro da Assembleia da Freguesia de Sendim, secretário da
junta de frequesia de Sendim até 1993 e presidente dessa junta de freguesia desde 1993
até 2005, tendo integrado ainda a Assembleia Municipal de Felgueiras.
Há cerca de 20 anos que desempenha cargos autárquicos.
Até Janeiro de 1994 ao lixo depositado na lixeira de Sendim era ateado fogo
diariamente e durante a noite o fumo corria pelo vale até ao centro da freguesia. Em dias
mais quentes não se podia dormir com a janela aberta ou deixar roupa a secar no
exterior. Em dias de nevoeiro, com o fumo à mistura, não se via nada. Havia
proliferação de insectos na zona e as águas foram contaminadas a médio/longo prazo.
Uma das condições que colocou para ser candidato à presidência da junta de
freguesia de Sendim (em 1993) era a de que a situação da lixeira mudasse, o que lhe foi
garantido numa sessão pública se o PS vencesse as eleições autárquicas (tratou-se de
uma sessão ocorrida na sede de Felgueiras do PS. O arguido Júlio Faria por norma
estava presente nessas sessões, mas na sessão em causa não se recorda se ele esteve
presente ou não).
De facto, a população estava contra a existência da lixeira naquelas condições.
Recorda-se que, ainda era secretário da junta de freguesia de Sendim, a lixeira
esteve para sair daquele local para ser instalada noutro sítio (da mesma freguesia), o que
originou protestos. O presidente da CMF iria então a uma sessão da Assembleia de
Freguesia de Sendim, convocada extraordinariamente por causa desse assunto, onde iria
dar explicações. Porém, como na noite anterior registaram-se distúrbios na zona onde
iria ser implantada a nova lixeira, o presidente da edilidade transmitiu que apenas iria a
essa sessão extraordinária da assembleia de freguesia se lhe fossem garantidas as
condições de segurança necessárias. Como essas condições de segurança não lhe foram
garantidas ele não compareceu, sendo certo que nessa assembleia existiu forte oposição
à mudança da lixeira para outro local da freguesia de Sendim.
Desde Janeiro de 1994 o lixo passou a ser diariamente aterrado normalmente.
Faziam-se sucalcos, o espaço da lixeira foi vedado e vigiado.
Passou a ser uma lixeira controlada, sendo evidente a alteração da situação.
Até à abertura do aterro a lixeira incendiou-se três vezes. O pó proveniente da
lixa das máquinas de cardar calçado é altamente inflamável.
Recorda-se que na lixeira chegou a falar algumas vezes com a testemunha
António Fernando da Silva Ramos (funcionário da “Resin”). Foi aliás muitas vezes ver
os trabalhos na lixeira, tirando inclusive fotografias para demonstrar que a situação na
lixeira estava melhor. O mau cheiro no local não desapareceu totalmente, mas na
povoação esse cheiro deixou de se fazer sentir, assim como os fumos.
Até ao encerramento da lixeira ela esteve sempre controlada, pois sempre ali
trabalhavam pessoas nos mesmos moldes.
- Testemunha Américo da Silva Teixeira
Foi tesoureiro da junta de de freguesia de Sendim entre 1986 e 1989 e presidente
dessa junta entre 1990 e 1993, eleito pelas listas do CDS.
Enquanto era presidente dessa junta de freguesia a lixeira referida nos autos era
um problema porque ardia e cheirava mal. Quando entrava em combustão ninguém
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
podia parar no local. O depoente aliás, nessas ocasiões, tinha de fechar as janelas de sua
casa. A população estava farta dessa situação e incomodava-o por esse facto.
A testemunha Menezes Basto era o proprietário do terreno onde estava
implantada essa lixeira. Havia um contrato que terminou e, segundo ouviu dizer, a
lixeira era para ser instalada em Barrosas. Porém, dado que a população de Barrosas
opôs-se a isso, surgiram rumores de que afinal a lixeira iria mudar-se para outro local de
Sendim (lugar de Casal).
Entretanto, conseguiu-se que a testemunha Menezes Basto prorrogasse por mais
6 meses a deposição do lixo no mesmo local. Foi o depoente quem fez esse pedido à
testemunha Menezes Basto e à esposa deste, tendo acedido, sendo certo que a CMF
comprometeu-se a retirar dali a lixeira findo esse período.
Entretanto, terminou o mandato do depoente.
Constatou que posteriormente a situação da lixeira melhorou. Referiu que é
proprietário de uns terrenos a cerca de 1.000 mts mais abaixo e as águas das minas eram
coloridas por força da poluição, águas essas que entretanto melhoraram muito.
Tendo desaparecido os cheiros e os fumos a população de Sendim acomodou-se
à existência da lixeira, reclamando apenas mais obras para a freguesia como
compensação pela existência dessa lixeira.
*
A propósito da possibilidade da lixeira de Sendim se deslocar para Barrosas,
referiu o arguido Júlio Faria que nessa freguesia do concelho de Felgueiras nunca
existiu lixeira, pese embora estivesse tudo preparado para ali instalar uma lixeira, o que
não sucedeu devido à forte oposição da população, que impediu a concretização desse
projecto.
*
- Testemunha António José Ferreira Pereira
Foi funcionário da “Resin” entre 08.01.94 até 30.06.2006, tendo trabalhado na
portaria da lixeira de Sendim.
Quando iniciou funções na “Resin” foi logo trabalhar para a dita lixeira.
No Início apontava os carros que entravam com o lixo (matrícula e o nome da
firma).
Quando ali foi instalada uma báscula procedia-se à respectiva pesagem e
anotava-se também as viaturas. Nessa altura foram trabalhar para a lixeira mais pessoas.
À data o seu chefe era a testemunha Fernando Ramos (encarregado).
O depoente esteve sempre no mesmo lugar.
Existia uma máquina que aterrava o lixo que era descarregado num local
próprio.
Andava lá o Sr. Pereira, que veio de França.
De vez em quando iam ao local engenheiros da “Resin”. O responsável era o
engenheiro Miguel Faria quando começou a funcionar o aterro. No tempo da lixeira a
engenheira Cláudia também ia ao local.
Não sabe ao certo em que data a lixeira foi selada. Nessa altura foi trabalhar para
a portaria do aterro RIB de Felgueiras, que tem a mesma localização que a lixeira e cuja
portaria é comum.
Em todo o tempo que ali prestou serviço a “Resin” sempre se manteve a operar
no local.
- Testemunha José de Sousa
Foi admitido ao serviço da “Resin” a 08.01.94, tendo trabalhado para essa
empresa até há cerca de 5 anos atrás (saiu a 13.03).
167
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Foi trabalhar para a lixeira de Sendim como cantoneiro. Cerca de 1 ano e meio
depois foi trabalhar para a Lustosa, onde permaneceu durante dois ou três anos. Nessa
altura exerceu funções para “Translousada” e para a “Norlabor”, mas era ainda
funcionário da “Resin”. Fazia também a vigilância nocturna na lixeira de Sendim.
Recorda-se de ver na lixeira de Sendim carrocarias de viaturas incendiadas.
O Sr. Pereira começou a trabalhar na lixeira de Sendim com o depoente. Logo
depois veio o Sr. Fernando Ramos e depois o Sr. Pereira (que veio de França), o qual
lhes deu formação para trabalhar com as máquinas.
Na lixeira chegou a trabalhar um manobrador de máquinas, pensa que da
“Norlabor” (chamava-se Mário).
A “Norlabor” e a “Translousada” tinham sócios comuns.
- Testemunha Joaquim Fernando Moreira
É engenheiro civil, encontrando-se reformado da função pública.
Explicou que foi director do GAP do Vale do Sousa desde 1986 até há cerca de
um ano. Antes disso, desde 1976, foi ali funcionário.
O Vale do Sousa tinha um conjunto de lixeiras onde os lixos eram depositados
de forma descontrolada.
Os autarcas de então perceberam que a lixeira de Sendim, como estava, não
podia continuar devido aos incêndios e outros problemas que causavam ao nível
ambiental. Os resíduos industriais do calçado eram ali depositados.
Antes da AMVS decidir lançar os concursos referidos no ponto 1.5 da
pronúncia, segundo a ideia que tem por volta de 1993/94, a lixeira de Felgueiras
começou a ser controlada.
Quando se pensou na construção de um aterro em Felgueiras visitou a dita
lixeira (já depois de 1994). Nessa altura no local já se encontrava uma empresa a fazer a
manutenção da lixeira. Era a “Resin” que se encontrava no local (viu lá um técnico e um
funcionário da “Resin”. As máquinas que viu a trabalhar não pertenciam de certeza à
“Resin” porque ela não possuía esse tipo de equipamento. Não sabe a quem pertenciam
essas máquinas). Já conhecia a “Resin” porque assistiu à sua apresentação numa reunião
com os autarcas do Vale do Sousa, ocorrida em Lousada (esteve presente como
convidado).
Os fumos deixaram de existir à medida em que os incêndios iam diminuindo.
Diminuiu também o mau cheiro.
Na altura o Vale do Sousa produzia cerca de 200 toneladas de lixo por ano e a
AMVS começou por pensar em construir um aterro para servir os seus seis concelhos
(Penafiel, Lousada, Felgueiras, Paredes, Paços de Ferreira e Castelo de Paiva).
Decidiu-se porém proceder à construção dos aterros de Lustosa (Lousada) e
Penafiel, segundo estudos de localização que então foram efectuados e que apontaram
para a Lustosa, no que se refere a Lousada, sendo certo que a localização do aterro de
Penafiel era pacífica.
Assim, em 1994 foi lançado o concurso para a construção do aterro da Lustosa.
A seguir lançou-se o concurso para a construção do aterro de Penafiel e por último o
concurso para a construção do aterro de Felgueiras, o qual essencialmente se destinaria
a receber os resíduos provenientes da industria do calçado.
Os resíduos sólidos urbanos do concelho de Felgueiras, por sua vez, passariam a
ser depositados no aterro da Lustosa logo que estivesse construído (o qual receberia
também os resíduos sólidos urbanos dos concelhos de Paços de Ferreira e de Lousada).
168
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Enquanto não era concluída a construção do aterro da Lustosa, os resíduos
sólidos urbanos provenientes do concelho de Felgueiras continuariam a ser depositados
na lixeira de Sendim.
Sucede que, para além do período previsto no concurso, a lixeira de Sendim
continuou a receber os lixos urbanos.
A C.M. de Lousada pretendia que os concelhos de Paços de Ferreira e Felgueiras
pagassem uma verba mensal à junta de freguesia da Lustosa para que os resíduos
sólidos urbanos pudessem ser depositados no aterro da Lustosa. Houveram divergências
acerca deste ponto, de modo que o presidente da C.M. de Lousada não permitiu que na
Lustosa fossem recebidos aquele tipo de resíduos provenientes de Felgueiras, impasse
que durou cerca de 8 ou 9 meses, período de tempo em que os resíduos sólidos urbanos
continuaram a ser depositados na lixeira de Sendim.
Chegou-se entretanto à conclusão que a verba prevista para a selagem da lixeira
de Sendim seria muito superior porque o volume de lixo ali depositado foi muito
superior ao previsto no contrato, pelo que se teve de ajustar o preço.
- Testemunha José da Silva Campos
Foi vereador a tempo não permanente na CMF entre 1983 e 1985 e a tempo
permanente entre 1986 e 25.10.93, voltando a ser verador a tempo não permanente entre
1994 e 1997. Só em Junho de 1996 voltou a execer a as funções de vereador a tempo
não permanente.
Nos primeiros 11 anos concorreu integrado nas listas do PS como independente.
Nos quatro anos seguintes concorreu integrado nas listas do PSD como independente e
no último mandato voltou a concorrer integrado nas listas do PS como independente.
Nunca tendo sido filiado, no âmbito das campanhas apenas tinha intervenção
política, desconhecendo como era organizada.
Sabia que existiam donativos e que muitos felgueirenses apoiavam todos os
partidos com donativos, tanto quanto ouviu dizer.
Ignora a quem o dinheiro era entregue, mas certamente que seria entregue a uma
equipa encarregue de recolher o dinheiro.
- Testemunha António Ribeiro Dinis
É militante do PS desde Março de 1995.
Integrou a comissão política concelhia do PS de Felgueiras em 1996/97. À data
a presidente da comissão política era a arguida Fátima Felgueiras (não sabe desde
quando).
Em finais de Maio ou princípios de Junho de 1997 a comissão política deliberou
por unanimidade apoiar a candidatura da arguida Fátima Felgueiras à presidência da
CMF. Ela era a candidata natural para esse cargo.
Mandataram então o secretariado para eleger a direcção de campanha e para
dinamizar o grupo de apoio.
O arguido Bragança era o responsável pelo secretariado.
Haviam reuniões do secretariado, mas o depoente não participava nelas.
Esteve presente numa reunião onde foi constituída a direcção de campanha e
criados os pelouros. Estavam presentes muitas pessoas, inclusive os arguidos Horácio
Costa, Joaquim Freitas, Júlio Faria e Fátima Felgueiras (a qual chegou mais tarde).
Essa reunião terá-se-á realizado talvez em Junho de 1997, logo a seguir à
deliberação da comissão política a que já fez referência, pois entretanto vinha o período
das férias.
169
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Tem a ideia que a testemunha Fernando Sampaio também estava presente nessa
reunião.
O depoente integrou de forma voluntária o pelouro das finanças, tendo-se
mesmo oferecido para integrar esse pelouro, de que também faziam parte os arguidos
Horácio Costa e Joaquim Freitas.
À pergunta efectuada no sentido de se saber porque razão o arguido Horácio
Costa, não sendo militante do PS, integrou esse pelouro, respondeu que ele é familiar do
arguido Bragança (cunhado) e cabia ao secretário-coordenador desenvolver a
composição dos pelouros, pelo que, segundo presume, terá sido essa a razão pela qual
ele integrou o pelouro das finanças, além de que ele também exercia funções na CMF
(acha que ele era assessor da arguida Fátima, mas não tem a certeza. Expressou a
certeza de que ele era assessor – conforme era do domínio público -, mas em rigor não
sabe se o era da arguida Fátima). Esse facto pode também ter contribuído para que ele
integrasse esse pelouro.
Mais tarde surgiram outras pessoas a colaborar com o pelouro das finanças, mas
quando esse pelouro foi constituído só tinha três elementos (os arguidos Horácio Costa
e Joaquim Freitas e o depoente).
De resto, a testemunha Fernando Sampaio chegou a colaborar com os arguidos
Horácio e Joaquim Freitas na angariação de donativos, sem que no entanto fizesse parte
do pelouro das finanças.
Tem a ideia que o arguido Joaquim Freitas, por seu turno, tinha já experiência na
recolha de fundos em campanhas anteriores.
Os três reuniram-se e elaboraram uma lista de pessoas e empresas a contactar no
sentido de obter donativos (o critério de constituição dessa lista tinha a ver com a
disponibilidade financeira das pessoas a contactar, normalmente elementos pertencentes
ao tecido empresarial). Seguramente que deu sugestões de nomes.
Entretanto, não sabe porque razão o deixaram à margem do processo de recolha
de fundos, não tendo assim efectuado qualquer contacto no sentido de recolher fundos
para a campanha.
Não questionou os arguidos Horácio e Joaquim Freitas acerca das razões pelas
quais foi posto de lado, mas tem a ideia que comentou esse facto com a testemunha
Fernando Sampaio.
Ouviu dizer que o arguido Horácio fazia os contactos telefónicos.
Nessa altura o depoente trabalhava na repartição de finanças de Lousada (tendo
depois ido para a repartição de finanças de Baião e, em Setembro de 1997, para a
repartição de finanças de São João da Madeira). Assim, só à sexta-feira é que o
depoente poderia ir às reuniões, ainda que chegasse atrasado.
Por conseguinte, não obstante as suas limitações de tempo por força da sua
actividade profissional, participava nas reuniões da direcção de campanha e estava
presente em acções de campanha.
Nas reuniões da direcção de campanha eles apresentavam com satisfação o
resultado da sua acção em termos genéricos (tinham uma ideia de quanto seria
necessário para custear a campanha e eles apenas iam revelando em termos globais
como ia decorrendo a angariação de fundos. Diziam que esta estava a correr bem, mas
não davam pormenores).
Seja como for, o depoente não sabia nem lhe era transmitido qual o nível de
realização da angariação de fundos.
Estavam mais preocupados com as acções de campanha e não tanto com a parte
financeira.
170
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
A arguida Fátima Felgueiras nunca se preocupava muito com as questões
financeiras, preocupando-se mais com a estratégia política.
Em 2001 o depoente também participou na campanha para as eleições
autárquicas e a postura era a mesma.
Referiu porém não saber se fora do âmbito das reuniões da direcção de
campanha o arguido Horácio Costa informava a arguida Fátima Felgueiras dos assuntos
relacionados com o pelouro das finanças.
O arguido Júlio Faria integrava a comissão coordenadora da direcção de
campanha. Esse grupo centralizava as questões em termos de estratégia política.
Faziam-se actas das reuniões, sendo certo porém que nunca as viu, tendo a ideia
de que haveria alguém mandatado para as fazer.
À época as pessoas mais importantes do PS de Felgueiras eram os arguidos Júlio
Faria e Fátima Felgueiras.
Nessas eleições o número dois da lista foi o Sr. José Carlos Lickefold e o
número três a testemunha Edgar Pinto da Silva.
Confrontado com o manuscrito de fls 156, reconheceu a letra do arguido Júlio
Faria, acrescentando porém que desconhece o documento em causa.
*
Em face do depoimento da testemunha António Ribeiro Dinis, o arguido
Horácio Costa referiu que não conhecia a dita testemunha, só a tendo visto na
apresentação da candidatura da esposa dele na Lixa, a qual encabeçava a lista de
candidatos a uma das juntas de freguesia dessa zona, sendo certo que só falou com ele
na inauguração da sede de campanha na Lixa. Até esse dia não o conhecia.
Só ouvia falar dele de vez em quando, sendo certo que nunca esteve com ele em
qualquer reunião seja de que ambito for.
Nas reuniões ele não tinha participação. Ele trabalhava na repartição de finanças
e não se lembra dele ter estado presente em qualquer reunião.
Ele participou na elaboração da candidatura da esposa, segundo teve
conhecimento por terceiros.
Não sabe se ele participava nas reuniões da comissão política, reuniões onde o
depoente não participava.
Se ele tivesse de facto feito parte do pelouro das finanças tê-lo-ia referido ao
tribunal.
Assegurou que ele não fez parte desse pelouro.
O depoente não tinha poder para incluir ou excluir (marginalizar) quer quer que
seja.
Não compreende que, se ele tivesse feito parte desse pelouro e tivesse sido
marginalizado, não tenha colocado o problema, quando é certo que a testemunha em
causa foi um dos mandatários que em nome do PS local lhe instauraram a acção de
prestação de contas já referida.
*
A testemunha Dinis, por seu turno, reafirmou o que disse, acrescentando que o
José Manuel Pinto Ribeiro (um industrial da Lixa) lhe disse que o arguido Horácio
Costa lhe havia telefonado por causa de um donativo.
Não se recorda de mais alguém lhe ter dito que o arguido Horácio fez um
contacto telefónico nesse sentido.
- Testemunha Augusto Coelho de Faria
Desde 1978 que é o presidente da junta de freguesia de Idães e até às últimas
eleições autárquicas fez parte da comissão política do PS local. Foi sempre eleito
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
integrado nas listas do PS, com excepção das últimas eleições autárquicas, uma vez que
foi eleito integrado nas listas do PSD. Foi militante do PS desde 1989 até 2005.
Fez parte do secretariado e da comissão eleitoral na campanha eleitoral referente
às eleições autárquicas que tiveram lugar em 1997.
Aliás, sempre fez parte das comissões eleitorais.
Uma vez que fazia parte do secretariado integrou a direcção de campanha.
Em 1997 a comissão política do PS foi eleita em Janeiro, tendo reunido em
princípio de Junho desse ano, onde foi mandatado o secretário-coordenador (o arguido
Bragança) para criar a direcção de campanha.
Foi assim o secretariado e alguns elementos da comissão política (por ex. o
depoente) quem fizeram os convites às pessoas para integrar a direcção de campanha.
Pensa que os respectivos elementos não foram escolhidos pela arguida Fátima
Felgueiras, visto que as pessoas convidadas foram à primeira reunião da direcção de
campanha acompanhadas das pessoas que as convidaram, sendo certo que a arguida
Fátima não esteve presente nessa primeira reunião.
A direcção de campanha foi assim composta por elementos do secretariado, por
alguns membros da comissão política e outras pessoas amigas do PS mas não militantes.
O arguido Júlio Faria fazia também parte dessa direcção de campanha (mas a arguida
Fátima Felgueiras não fazia parte da mesma. Em todas as campanhas eleitorais
autárquicas em que participou o candidato à presidência da CMF nunca fez parte da
direcção de campanha).
A direcção de campanha reuniu pela primeira vez a 09.06.97, data que
confirmou com documentos que possui e que verificou quando soube que iria depor
neste julgamento como testemunha.
Os jornais locais reportaram-se à criação e composição da direcção de
campanha, designadamente o jornal “O Sovela”, edição de 12.09.97, o qual cobriu uma
conferência de imprensa onde foi apresentada a direcção de campanha, tendo sido
publicado nesse jornal os nomes de quem integrava essa estrutura da campanha
eleitoral.
A arguida Fátima era à data a presidente da comissão política.
Foi então confrontado com os documentos de fls 12206 e ss., juntas pelo arguido
Júlio Faria, referindo que também tem cópia desses documentos, tratando-se de actas
que eram feitas em cada uma das reuniões que tinham lugar.
Era o arguido Bragança quem fazia as actas das reuniões, as quais não eram
assinadas. Na reunião seguinte eram distribuídas cópias da acta referente à reunião
anterior. Foi assim nessa altura que entrou na posse dos documentos que já referiu.
Assim, no documento de fls 12211 (igual ao documento a que acima fez
referência a propósito da data da primeira reunião da direcção de campanha) consta que
a primeira reunião ocorreu a 09.06.97, conforme tinha afirmado.
Chamou à atenção para o facto de que nas actas não constam o nome de todos os
elementos que integravam a direcção de campanha, já que existiam elementos que por
inerência faziam parte dela, além de que o rol das pessoas que dela faziam parte ia-se
alargando até ao dia das eleições.
Assim, é natural que o “Sovela” apenas tenha divulgado os nomes das primeiras
pessoas que fizeram parte da direcção de campanha, na sua edição de 12.09.97.
Já a reunião ocorrida no Centro Tecnológico do Calçado a 16.06.97 serviu para
traçar com a direcção de campanha a organização da campanha eleitoral, tendo sido
decidido fazer um apelo público à arguida Fátima Felgueiras para se candidatar, apelo
esse que teve lugar a 05.07.97 num almoço no Mercado Municipal (cfr. a edição do
“Sovela” de 11.07.97, onde noticia esse evento, ocorrido no dia 05.07.97. A fls 3 desse
172
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
jornal aparece uma fotografia da mesa, onde está a D. Glória Freitas, militante do CDS).
A organização desse evento e realização desse apelo público era uma forma de
mobilizar as pessoas em torno da campanha pois já se sabia que a arguida Fátima seria a
candidata do PS.
Como a arguida Fátima Felgueiras “estava no coração das pessoas”, foi muito
fácil a mobilização das pessoas para a campanha.
O convite endereçado à arguida Fátima para se candidatar era lógico, em face da
obra que ela levou a cabo no concelho nos dois anos anteriores. Assim, pelo menos em
Margaride, já se sabia que ela seria candidata antes de se fazer o apelo à sua
candidatura.
No mínimo ela teria já essa expectativa, mas só aquando da primeira reunião a
que aludiu é que essa expectativa se concretizou.
Em Setembro desse ano ocorreu a apresentação da candidatura dela, conforme
noticiado pelo jornal “O Sovela”.
Na primeira reunião da direcção de campanha (a 09.06.97) criaram-se os
pelouros (dos eventos, da comunicação, das finanças, da estratégia política, entre
outros).
Os arguidos Júlio Faria e António Pereira integraram o pelouro da estratégia
política.
O depoente, nessa reunião, estava ao lado da testemunha António Dinis, o qual
se ofereceu logo para integrar o pelouro das finanças, tendo integrado ainda esse
pelouro os arguidos Joaquim Freitas e Horácio Costa.
Nessa primeira reunião é possível que tenham estado presentes as testemunhas
Edgar Pinto da Silva e Orlando Sousa.
Admite também que as testemunhas Vítor Sousa (que fez parte do pelouro da
comunicação) e Fernando Sampaio (que participou em muitas reuniões) tenham estado
presentes na dita reunião onde se criaram os pelouros, mas não se recorda.
A arguida Fátima Felgueiras nada teve a ver com o pelouro das finanças, até
porque ela não esteve presente nessa reunião.
A imagem do presidente da câmara era para ser resguardada, daí que não
acredite que ela tenha tido qualquer intervenção nesse domínio.
A propósito da realização de eventos mais caros, questionavam os elementos do
pelouro das finanças no sentido de saber se existiam os fundos ncessários. Sucedeu
assim por exemplo a propósito da actuação dos “Santos & Pecadores”.
Recorda-se de ter questionado os elementos do pelouro das finanças acerca
desse assunto, sendo certo que a arguida Fátima Felgueiras não estava presente. Não era
aliás a arguida Fátima quem programava os eventos mas a direcção de campanha.
Nunca a viu a pedir donativos para a campanha.
Explicou que é muito amigo dela e se isso sucedesse saberia.
Aos arguidos Joaquim Freitas e Horácio Costa nunca os viu tristes e
preocupados. Diziam que toda a gente dava dinheiro porque “adoravam a Fatinha”.
As contas da campanha eleitoral sempre foram separadas das contas do PS. A
conta oficial do partido era apenas usada para o pagamento das despesas correntes do
PS.
As contas da campanha eram separadas (como sucedia com todos os partidos) na
medida em que nela participavam pessoas que não eram militantes.
Assim, as finanças da campanha nada tinham a ver com as finanças do PS, pois
as campanhas tratam-se de eventos supra partidários.
O arguido Joaquim Freitas era um elemento da comissão política do PS.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
O arguido Horácio Costa trabalhava na CMF (não sabe o que fazia mas
trabalhava no andar de cima do edifício da CMF, perto do GAPP) e era cunhado do
arguido Bragança (secretário-coordenador).
O arguido Horácio Costa dizia que era assessor da arguida Fátima Felgueiras,
mas nunca foi recebido por ele, apesar de quase todos os dias ir à CMF.
O arguido Joaquim Freitas já tinha feito parte do pelouro das finanças em
anteriores campanhas eleitorais referentes a eleições autárquicas.
O pelouro das finanças é tão importante como os outros.
Para si a escolha dos candidatos era mais importante.
O arguido Horácio Costa integrou o pelouro das finanças se calhar por ser
cunhado do secretário-coordenador do PS.
No âmbito das reuniões em que a arguida Fátima esteve presente (ela esteve
presente em muitas) ela dava sugestões como qualquer outra pessoa.
Nunca viu ordens escritas da arguida Fátima dirigidas aos pelouros.
O número dois da lista do PS a essas eleições era o Sr. Lickefold e quando ele
saíu da vereação foi o arguido António Pereira que passou a ocupar a vice-presidência
da CMF, ao que presume (na medida em que ele era o braço direito da arguida Fátima).
A testemunha Edgar Pinto da Silva, por seu turno, passou a número três (a testemunha
referiu que não tem a certeza deste facto).
A testemunha Edgar Pinto da Silva não fazia parte do secretariado, pelo que
acha estranho que ele tivesse afirmado que foi a arguida Fátima Felgueiras quem
escolheu os elementos da direcção de campanha.
Havia um grupo de pessoas de que fazia parte o arguido António Pereira e meia
dúzia de presidentes de junta, incluíndo o depoente, que “davam o litro” pela
candidatura da arguida Fátima Felgueiras.
Nunca ouviu a expressão “task force” ou “núcleo duro” como reportado a esse
grupo de pessoas ou a outro.
A testemunha Orlando Sousa foi candidato à Assembleia Municipal de
Felgueiras.
Não sabe se ele fez parte da Direcção de Campanha, mas é natural que
entretanto viesse a fazer parte dela (essa testemunha referiu a existência de um “núcleo
duro”, facto que a testemunha Augusto Faria referiu desconhecer).
A testemunha Vítor Sousa é jornalista e integrava o pelouro da comunicação.
Pensa que ele era militante do PS. Admite que ele possa ter estado na primeira reunião
da direcção de campanha. Confrontado com o facto dessa testemunha ter referido que a
arguida Fátima esteve nessa reunião, respondeu que ele se deve ter equivocado.
Confrontado com o facto da testemunha Fernando Sampaio também ter dito que
a arguida Fátima esteve presente nessa reunião, na sede do PS, respondeu que ele se
deve ter equivocado.
Tal testemunha referiu ainda que a arguida Fátima indicou nomes para a
direcção de campanha, facto que a testemunha Augusto Faria refutou, assegurando que
as pessoas ofereciam-se para integrar os diferentes pelouros em face das suas aptidões.
O depoente nunca ouviu dizer que essa testemunha tenha feito parte do pelouro
das finanças, admitindo porém que possa ter colaborado com esse pelouro.
O depoente teve mais contacto com o arguido Horácio Costa quando ele foi
vereador (pensa que a partir de Janeiro de 1999), pese embora cerca de 99% das vezes
que ia à CMF, enquanto presidente de junta, falava com a arguida Fátima Felgueiras.
Não sabe qual era o relaciomento existente entre os arguidos Fátima Felgueiras e
Horácio Costa.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
O arguido Joaquim Freitas era empresário e dava-se bem com o arguido
Horácio.
A testemunha Dinis, apesar de fazer parte do pelouro das finanças, pouca ou
nenhuma actividade desenvolveu nesse âmbito, ignorando porque motivo tal sucedeu.
Ele referiu-lhe que apenas o chamaram uma vez no âmbito desse pelouro, ignorando em
que altura isso terá sucedido.
Não sabe se os arguidos Horácio e Joaquim Freitas conversavam com a arguida
Fátima acerca desse pelouro, mas pensa que não.
O arguido Júlio Faria coordenava as reuniões da direcção de campanha.
Foi então a testemunha confrontada com o manuscrito de fls 156, tendo referido
não reconhecer a letra.
Apenas admite que esse documento tenha sido elaborado após a primeira
reunião da direcção de campanha, onde se criaram os pelouros.
Não sabe se antes das reuniões ocorreram contactos pessoais entre os arguidos
Júlio Faria, Horácio Costa e Joaquim Freitas a propósito do pelouro das finanças.
Não sabe como é que esse pelouro movimentava a conta aberta, mas
normalmente eram os responsáveis desse pelouro quem recebiam os donativos e
pagavam as despesas.
Não faz ideia quanto é que se gastou na campanha, mas terá sido “muito
dinheiro”.
Não sabe quanto é que as pessoas em concreto contribuíram, mas tal assunto era
tratado nas reuniões.
Sempre soube que iria ser aberta uma conta para a campanha eleitoral, pois o
arguido Joaquim Freitas transmitiu-lhe que iriam abrir uma conta para proceder ao
depósito dos donativos e para proceder aos pagamentos. Soube depois pela
comunicação social que foram os dois a abrir essa conta. Aquando dessa conversa não
se recorda quem estaria presente, admitindo até que pudesse estar apenas com o arguido
Joaquim Freitas.
Ignora se os outros elementos da direcção de campanha sabiam ou não da
existência dessa conta à data.
Não sabe se a arguida Fátima se preocupava ou não com a situação financeira do
“Sovela”.
Ao que pensa, qualquer compra tinha de passar pelo secretário-coordenador.
*
Em face destas declarações, o arguido Horácio Costa referiu que nunca esteve
em qualquer reunião em que tenha sido constituído o pelouro das finanças.
Se o PS entendia que pelo facto da sua candidata, estando envolvida nas
questões financeiras da campanha, ficaria com a sua imagem delapidada, o depoente
não sentiu a sua imagem delapidada pelo facto de pertencer ao pelouro das finanças.
O depoente, em muitas ocasiões, ia às reuniões em representação da arguida
Fátima Felgueiras, levando as suas instruções, daí que de facto ela muitas vezes não
tenha estado presente.
Ia a essas reuniões em representação dela porque ela assim lho ordenava.
A testemunha Augusto Faria deu indicações relativamente a pessoas que
poderiam contribuir para a campanha e sempre com referência à arguida Fátima na
medida em que ela gozava de grande popularidade.
Os valores recebidos eram comunicados aos arguidos Fátima Felgueiras e Júlio
Faria. Entregava-lhes cópias dos extractos bancários. Tratava-se de assunto que não era
divulgado.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Os presidentes de junta eram uma espécie de parentes pobres e iam à CMF
mendigar junto da arguida Fátima Felgueiras as suas reivindicações.
As reuniões da “task force” eram constituídas por pessoas muito ligadas à
arguida Fátima Felgueiras (pelo depoente, Joaquim Freitas, Bragança, Júlio Faria, Maria
Augusta, Edgar Pinto da Silva, Júlio Pereira e Francisco Almeida).
Os presidentes de junta tinham também que tratar das respectivas candidaturas.
O depoente chegou a receber a testemunha Augusto Faria (ele enquanto
presidente de junta) a propósito de um diferendo que ele teve em 1998 com
determinadas pessoas do lugar do Tarrio. Antes tinha recebido a pessoa que encabeçava
esse movimento e mais tarde a testemunha para explicar a sua posição.
Recebeu-o no seu gabinete na CMF a propósito de eventos realizados em Idães,
como por exemplo em Julho de 1997.
Em boa verdade não era o secretariado que organizava as coisas, pese embora
colhesse os louros em relação ao que era feito.
As listas foram feitas pouco antes de terem sido apresentadas no tribunal.
O símbolo da campanha foi escolhido pela arguida Fátima, bem como o slogan.
A escolha da sede de campanha foi escolhida pela arguida Fátima e não pelo
secretariado.
A escolha de alguns fornecedores não foi feita pelo secretariado nem pelo PS.
A propósito de uma entrevista concedida pela testemunha Manuel Faria (líder da
oposição) à RTP a arguida Fátima reuniu a “task force” para rebater em termos políticos
o que nessa entrevista foi dito. A testemunha Augusto Faria não fazia parte da “task
force”. Sabe porém que ele era muito ouvido pela arguida Fátima a propósito de
assuntos relacionados com as juntas de freguesia, pois ele tinha um certo peso político.
Muitas vezes, depois das reuniões ocorridas na sede de campanha, ficavam os
elementos da “task force” e tratavam de assuntos que não tinham sido tratados nas
reuniões mais alargadas.
*
A testemunha Augusto Faria referiu, por seu turno, que pensa não ter tido
qualquer reunião com o arguido Horácio a propósito de um problema de águas em
Tarrio (não se tratava de um problema relacionado com um caminho).
Reafirmou que o secretário-coordenador teve um papel fundamental na
coordenação da campanha eleitoral. Ele era o braço direito do arguido Júlio Faria na
comissão coordenadora.
O depoente esteve presente na reunião em que o arguido Horácio Costa – que
também estava presente – foi indicado para 5º lugar da lista do PS. O depoente colocou
reticências à inclusão do nome do arguido Horácio Costa naquela posição da lista por
ser novo. Não sabe quem o indicou, pois ele já constava do documento que circulava
entre os presentes. Disseram-lhe que era uma lista para ganhar e acatou-a.
O depoente como membro do Secretariado e da Comissão Política não se podia
fazer substituir, pelo que não faz sentido que a arguida Fátima se fizesse representar
pelo arguido Horácio nas reuniões.
*
Em face destas declarações o arguido Horácio Costa referiu que não incluiu o
arguido António Pereira Mesquita de Carvalho como fazendo parte da “task force” na
medida em que ele nunca ficava nas reuniões da noite por razões pessoais.
Em todo o caso, ele era uma pessoa da confiança da arguida Fátima Felgueiras.
Já tinha referido que a inclusão do nome do depoente no 5º lugar da lista não foi
bem acatado.
176
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
As folhas de presença nas reuniões do secretariado e da comissão política eram
apenas assinadas por quem estava presente. O seu nome aparecia depois de uma linha
divisória, que o separa dos demais.
Reafirmou que participou nessas reuniões da comissão política em representação
da arguida Fátima Felgueiras, sendo certo que, não sendo militante nem eleito para esse
órgão, não era suposto nelas tomar parte.
*
A testemunha Augusto Faria, por seu turno, referiu não se recordar de ver o
arguido Horácio em alguma reunião da comissão política.
Admitiu porém que ele possa ter estado presente em alguma reunião da
comissão política, mas não tinha o direito de voto.
Muitas vezes o arguido António Pereira esteve consigo à noite depois das
reuniões da comissão política.
*
A arguida Fátima Felgueiras referiu, por seu turno, que na reunião em que
foram aprovadas as listas foi a depoente que fez as listas para a CMF.
Foi o falecido Barros Moura quem fez as listas para a Assembleia Municipal.
Eram os cabeças-de-lista quem propunham as listas.
Foi a depoente quem indicou para 5º lugar o nome do arguido Horácio Costa
pelos motivos que já teve oportunidade de explicar (apenas para acalmar o arguido
Bragança, ainda com a promessa de mantê-lo no GAPP, já que tinha negado integrá-lo
sequer na lista, quando ele queria ser o número dois), sendo certo que o 5º da lista nunca
era eleito (desde 1989 que integrava as listas do PS e o 5º elemento nunca tinha sido
eleito). Nas eleições de 1997, porém, estiveram perto de eleger o 5º elemento da lista,
sendo certo que foi considerado que nessas eleições o PS obteve a maior vitória no
concelho (e a segunda maior vitória no destrito do Porto nessas mesmas eleições).
A propósito do cartão de fls 12644 (cartão de agradecimento junto pelo arguido
Horácio Costa na 28ª sessão) referiu que fez questão de manuscrever os cartões de
agradecimento dirigidos a várias pessoas pelo contributo que deram para a campanha
(trabalhando na mesma).
Tal nada teve a ver com o agradecimento a algum elemento da sua lista.
Aliás, o cartão de fls 12644 foi “roubado” por alguém, sendo certo que esse
documento não foi dirigido ao arguido Horácio Costa. Escreveu cartões iguais depois
das eleições. A referência nesse cartão ao dia 17 às 21.30 horas deverá reportar-se à
comemoração da vitória, mas não tem a certeza (as eleições ocorreram a 14.12.97).
Eram sobretudo a figuras de instituições de Felgueiras e que estiveram com a
sua candidatura (pensa que não eram sequer militantes do PS) que dirigiu tais cartões.
Uma das pessoas a quem deu um dos cartões de agradecimento foi ao Sr.
Clemente Freitas (pai do arguido Joaquim Freitas) e pode ter sido por via dele que o
cartão de fls 12644 chegou às mãos do arguido Horácio Costa.
O secretariado é um órgão executivo.
A comissão política é um órgão colegial de reflexão política.
Nas reuniões da comissão política podem estar como convidados eleitos pelo PS
não militantes, sem direito a voto ou de intervenção.
O arguido Horácio assistiu a uma ou duas reuniões da comissão política como
convidado, quando já era vereador. Ele queria intervir mas não podia fazê-lo. Enquanto
ele não foi vereador ele nunca foi a qualquer reunião da comissão política, ainda que
como convidado, pois não o poderia lá estar.
177
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Na comissão política não há representações em caso de ausência, pelo que nunca
se poderia fazer representar por alguém nas suas ausências. É pois falso o que a
propósito referiu o arguido Horácio.
*
O arguido Horácio Costa, por sua vez, ainda em relação ao cartão de fls 12644,
assegurou que o mesmo lhe foi dirigido e recebeu-o no dia em que a lista iria dar
entrada no tribunal.
É pois falsa a versão apresentada pela arguida Fátima Felgueiras a esse
propósito.
- Testemunha Maria da Glória Pinto Leite Freitas
Foi deputada na Assembleia Municipal de Felgueiras (eleita como independente
na lista do PSD) durante um mandato, antes da arguida Fátima Felgueiras ter sido eleita
presidente da CMF (terá sido pois eleita nas eleições de 1993).
Fez igualmente parte da direcção da “Cercifel”.
Participou na campanha eleitoral da arguida Fátima Felgueiras referente às
autárquicas de 1997, a qual já conhecia por motivos profissionais, tendo estabelecido
com ela uma relação de amizade. Considerava-a a melhor candidata à presidência da
CMF.
A depoente fez parte do grupo de eventos (foi a D. Madalena quem a convidou).
Integrou esse grupo depois de estar formado, sendo certo que se tratava de um grupo
que se ia alargando.
A arguida Maria Augusta também fazia parte desse grupo.
Participou em muitas reuniões, quer relativas apenas ao grupo de que fazia parte
quer em reuniões mais alargadas à noite.
Sempre que o grupo dos eventos queria realizar alguma iniciativa contactava o
grupo de angariação de fundos na pessoa dos arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas
(o arguido Horácio era o “homem da nota”).
Deu como exemplo o facto de terem recebido cinco deputadas europeias, tendo
organizado um lanche num hotel e oferecido um ramo de flores a cada uma. Foi o
arguido Horácio Costa quem pagou a despesa e recorda-se que ele achou caro.
Às vezes a arguida Fátima, nas reuniões mais alargadas, dirigia-se ao arguido
Hoarácio e perguntava-lhe se havia dinheiro (“Ó Horácio, há dinheiro? Pode ser?”).
Nunca notou que os arguidos Fátima Felgueiras e Horácio Costa andassem
aborrecidos.
Acerca dos eventos conversavam com a arguida Fátima, mas ela não “metia o
bedelho” nesses assuntos.
Os arguidos Horácio e Joaquim Freitas angariavam fundos, tendo o marido da
depoente (comerciante de peles) comentado consigo que os viu em fábricas, presumindo
que a pedir donativos.
Sabe que o arguido Horácio Costa trabalhava na CMF, mas não sabe que
funções exercia.
O arguido Joaquim Freitas, por seu turno, era empresário (trabalhava na fábrica
do pai).
*
O arguido Horácio Costa referiu que na campanha de 1997 houveram um
conjunto de pessoas que por indicação da arguida Fátima Felgueiras foram convidadas
para aderirem à causa da sua candidatura. Ela deu-lhe uma lista de nomes de “notáveis”,
segundo a expressão dela, com bom nome na terra e normalmente desprendidas do PS.
178
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Precisou que a arguida Fátima fornecia os nomes ao arguido Bragança, os quais,
no seu computador, os incluía na lista de pessoas que integravam a comissão de apoio.
Entretanto as listas foram organizadas em face da actividade das pessoas a
convidar. Entre elas estava a testemunha Maria da Glória Freitas.
Essas pessoas iam sendo chamadas quando haviam eventos.
Confirma que a testemunha Maria da Glória participou no pelouro dos eventos.
Porém, quem normalmente executava as tarefas eram as pessoas ligadas ao PS e
que trabalhavam na CMF.
A testemunha Maria da Glória não foi designada na reunião onde se
constituíram os pelouros.
No que se refere ao lanche ocorrido num hotel (“organização de mulheres para
mulheres”), foi dos poucos homens que esteve presente.
Conforme disse a testemunha Maria da Glória, o depoente era conhecido como o
“homem da nota”.
A factura das flores chegou-lhe às mãos, através da testemunha Júlio Pereira.
Não sabia de onde vinha essa factura.
Acerca da constituição do pelouro das finanças e da abertura da conta do BES a
testemunha Maria da Glória nada sabe na medida em que era matéria reservada.
Naturalmente que a arguida Fátima lhe perguntava se havia dinheiro à frente de
outras pessoas, informando-a. À frente de outras pessoas ela não lhe iria perguntar de
forma pormenorizada acerca das verbas existentes, pois era assunto tratado em privado,
dado ser matéria reservada.
Na altura havia o nervosismo inerente ao facto da eleição não ser certa, daí que a
contenção na informação era importante, de modo a não passar para a oposição.
A arguida Fátima, aliás, não queria que as contas da campanha passassem por
certos elementos do PS e não queria prestar contas à estrutura distrital do PS.
As coisas eram organizadas antes de serem discutidas nas reuniões, pois se a
organização das coisas se fizesse nas reuniões nada se organizaria. Era o “staff” da
arguida Fátima quem de facto organizava os eventos.
*
- Testemunha Carlos Zeferino Ribeiro da Costa
É presidente da junta de freguesia de Lagares desde 1976, tendo sempre
concorrido às eleições autárquicas integrado nas listas do PS.
Desde 1992 que é militante do PS.
Foi membro da comissão política de 1997 até 2005.
Em 1997 a arguida Fátima Felgueiras era a presidente da comissão política do
PS de Felgueiras.
Em termos políticos era ela quem mandava. Em termos de execução era o
secretariado que executava as determinações políticas. O secretário-coordenador era o
arguido Bragança, cunhado do arguido Horácio Costa.
Nos princípios de Junho de 1997 a comissão política do PS reuniu (a arguida
Fátima estava presente) e mandatou o secretariado para constituir uma direcção de
campanha, contactando assim as pessoas para o efeito.
Nos finais de Junho desse ano, no Centro Tecnológico do Calçado, fez-se uma
reunião mais alargada e decidiu-se que nos princípios de Julho de 1997 iria realizar-se
um almoço-convívio para apelar à arguida Fátima Felgueiras que se candidatasse à
presidência da CMF, o que sucedeu no primeiro Sábado de Julho no Mercado
Municipal.
Ela era a candidata natural do PS.
179
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Os pelouros apenas foram criados numa reunião ocorrida depois das férias na
sede do PS, reunião essa na qual não esteve presente. Soube disso por ouvir dizer a
alguns dos seus colegas.
O depoente não fez parte da direcção da campanha, mas assistiu a algumas
reuniões. Nas reuniões a que assistiu a arguida Fátima Felgueiras era presença habitual.
Ela era a principal interessada que a campanha corresse bem.
Toda a gente sabia que a angariação de fundos ficou a cargo dos arguidos
Horácio Costa e Joaquim Freitas. Eles pediram a colaboração a alguns presidentes de
junta no sentido de lhes indicar pessoas a contactar a fim de lhes solicitar um donativo.
Não acompanhou os arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas à fábrica da
testemunha Júlio Sampaio Teixeira (fábrica “Lagarto”), em Lagares, no sentido de
recolher um donativo.
Eles vangloriavam-se que angariavam muito dinheiro. Não lhe parece que eles
andassem a cumprir ordens de quem quer que seja.
Nunca viu qualquer escrito, designadamente do arguido Júlio Faria, relativo ao
pelouro das finanças.
Se não houvesse dinheiro pouco se poderia fazer.
Cada um oferecia-se para os pelouros para os quais tinham mais vocação.
Era o arguido Júlio Faria – enquanto coordenador da campanha – que
perguntava às pessoas acerca do pelouro que estariam dispostas a integrar, segundo lhe
disseram, e então as pessoas ofereciam-se para integrar os pelouros de acordo com a
respectiva vocação.
Segundo lhe disseram, a testemunha Dinis foi o terceiro a oferecer-se para
integrar o pelouro das finanças.
Não sabe se a arguida Fátima estava presente nessa reunião.
Essa reunião era importante na medida em que se escolhessem as pessoas
erradas para os diferentes pelouros podia-se deitar tudo a perder, pelo que considera
natural que a arguida Fátima estivesse presente nessa reunião.
Antes dessa campanha não estava “muito metido” no PS, pelo que não sabe de
que modo eram organizadas as campanhas anteriores.
As contas da campanha eram separadas das contas do partido até porque nas
campanhas eleitorais autárquicas intervinham pessoas que não eram militantes do PS.
Tal era assim um procedimento habitual.
O depoente era fornecedor de peixe e fornecia as sardinhas para os eventos.
Num dos eventos quis oferecer as sardinhas mas o arguido Horácio Costa fazia
questão de as pagar, dizendo-lhe que não havia a necessidade de as oferecer na medida
em que havia muito dinheiro (tratava-se de um valor a rondar os 50.000$00); o depoente
porém não aceitou o pagamento.
A Comissão de Eventos era constituída pelo Jacinto Ferreira, pela arguida Maria
Augusta e pelo António Faria. Nenhum dos seus elementos trabalhava na CMF. Nunca
lhe constou que a testemunha Maria da Glória fizesse parte dessa comissão, mas via-a
por lá. Acabou por referir que ela foi convidada para integrar essa comissão por ser
dinâmica. Constava-se que ela era simpatizante de um partido de direita (acha que do
CDS).
O depoente quis fazer um evento de apresentação dos candidatos em Lagares e
falou acerca disso com a Comissão de Eventos e com o arguido Horácio no sentido de
saber se havia dinheiro para custear as despesas.
O depoente apresentou queixa-crime contra o arguido Horácio Costa na medida
em que ele, na Assembleia Municipal de Felgueiras, disse que os presidentes de junta
beneficiaram de dinheiro do “saco azul”.
180
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Quando o depoente tinha assuntos relacionados com a freguesia de Lagares,
tratava-os com a arguida Fátima no gabinete desta.
Recorda-se que certa altura apareceu na CMF o arguido Horácio Costa e nessa
altura não sabia quem ele era. Encontrava-o de vez em quando nos corredores da CMF,
na zona política. Diziam que ele se gabava de ser assessor, segundo lhe disseram alguns
dos seus colegas presidentes de junta de freguesia. Não perguntou à arguida Fátima
quem era ele.
- Testemunha Artur Manuel da Silva Carvalho Borges
É militante do PS. Foi presidente da Câmara Municipal de Baião entre 1983 até
1993. Por ser presidente da CMB, foi presidente da comissão política do PS de Baião.
Em finais de 1995 era o Vice-governador Civil do Porto (o Dr. Joaquim Couto
era o Governador Civil do Porto).
Presidiu à comissão de fogos florestais do Governo Civil.
Em 2002/2003 foi chefe de gabinete da arguida Fátima Felgueiras (GAPP).
Em 1997, por norma, os candidatos à presidência das câmaras municipais não
integravam a respectiva direcção de campanha, a qual era integrada por pessoas que se
disponibilizavam para acompanhar determinada candidatura.
Era comum, segundo a experiência que tem, que os cidadãos se organizassem
em torno de determinada personalidade, que encabeçava o projecto.
À época as direcções de campanha dirigiam o convite à candidata de forma mais
reservada, cujo anúncio era depois tornado público.
O candidato não se metia na organização dos pelouros, só se ocupando da parte
política e da estratégia política. Não lhe causa assim estranheza que a cabeça de lista
não esteja presente na reunião onde se organizaram os pelouros.
Não é usual em qualquer partido que o candidato se envolva na parte financeira
da campanha. Esse distanciamento, porém, não vai ao ponto de se desinteressar de saber
se há ou não dinheiro para custear as despesas de campanha.
O candidato tem uma intervenção muito centrada nos comícios e ao nível da
transmissão do projecto político. Essa é a prioridade da sua intervenção.
É preocupação da direcção de campanha organizar-se de modo a reunir os
fundos necessários para custear as despesas.
Não concorda com a ideia de que as pessoas que angariam fundos para a
campanha tenham de ser de grande confiança do candidato.
Ao tempo, as contas da campanha não entravam nas contas dos partidos porque
as pessoas que faziam parte da máquina da campanha não eram todas militantes.
As eleições autárquicas são muito personalizadas, independentemente dos
partidos.
A comissão política é normalmente um órgão deliberativo e o secretariado um
órgão executivo.
- Testemunha Francisco Soares Mesquita Machado
É presidente da Câmara Municipal de Braga desde as primeiras eleições
autárquicas. É militante do PS.
Antes da nova legislação, o PS tinha uma comissão política (que designa os
candidatos, os quais são ratificados pela comissão política nacional do PS) e um
secretariado (órgão executivo).
O secretariado organiza a campanha (normalmente é o secretário-coordenador
que assume papel de relevo na coordenação do secretariado, o qual pode agregar outros
181
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
elementos que possam auxiliar nas tarefas da campanha eleitoral, ainda que não sejam
militantes).
As tarefas são assim distribuídas, sendo certo que é habitual a existência de um
grupo ou de uma só pessoa encarregue da angariação de fundos.
Normalmente tenta-se resguardar o cabeça de lista da angariação de fundos na
medida em que ele é o responsável pela estratégia política, tarefa que por si só já é
pesada.
Convém que a angariação de fundos seja feita com alguma independência.
Não conhece caso algum (que pode existir) em que o cabeça de lista se envolva
na angariação de fundos.
Os angariadores de fundos têm em primeiro lugar que ser pessoas de confiança
do secretário-coordenador.
Acha pouco provável que tenham de ser pessoas de confiança da candidata, a
qual é só a responsável número um pela coordenação política da campanha e não da
logística. Em todo o caso tem de haver confiança mútua.
Se no final não existisse dinheiro suficiente para pagar todas as despesas de
campanha a responsabilidade pelo respectivo pagamento seria do partido a nível local e,
em última análise, a responsabilidade pelo pagamento seria do PS nacional.
Era habitual a abertura de uma conta para a campanha.
Em Braga, no final, reuniam-se e se houvesse um saldo positivo, a verba
respectiva convertia-se em receita do PS.
As contas da campanha tinham autonomia em relação às contas do partido, até
porque na campanha referente às eleições autárquicas intervinham pessoas que não
eram militantes e as contribuições até eram concedidas por pessoas que não se
identificavam sequer com o partido.
Normalmente as pessoas que davam donativos não queriam que o respectivo
nome fosse revelado. Com a nova lei de financiamento dos partidos é obrigatória a
identificação das pessoas que contribuem para as campanhas, situação que cria
dificuldades na angariação de fundos.
Não tem conhecimento que em Felgueiras as coisas se passassem de modo
diferente em relação a Braga.
Conhece a arguida Fátima Felgueiras há muitos anos (desde o tempo em que ela
era veradora na CMF) e já pertenceram ambos ao Secretáriado Nacional no PS.
Das diversas conversas que manteve com ela nunca notou nada que o levasse a
pensar o contrário (em todo o caso as conversas que tinham não versavam sobre esse
tema).
A arguida Fátima é pessoa afável, dinâmica e corajosa para enfrentar a situação
de que está a ser alvo.
Nunca notou nela um acto menos sério.
Ela faz as coisas com convicção e tem uma postura que caracteriza pelo “antes
quebrar que torcer”.
Ela foi considerada uma autarca modelo.
O presidente da comissão política faz apenas a orientação política do PS a nível
local. O secretariado é que tem o poder executivo.
A angariação de fundos numa campanha visa assegurar o pagamento das
despesas de pré-camapanha e da campanha propriamente dita. Na altura da précampanha já está formada a comissão eleitoral.
Os valores envolvidos numa campanha dependem da câmara em concreto e do
valor da oposição. O esforço financeiro não é igual em todo o país.
182
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
À pergunta efectuda no sentido de saber se em Felgueiras é razoável um gasto na
ordem dos 50.000 cts, limitou-se a responder que sempre se despendem quantias
avultadas.
É evidente que o secretário-coordenador tem de ter confiança nas pessoas que
escolheu para angariar os fundos, as quais têm de ser sérias.
A conta bancária do PS não se pode misturar com a conta bancária da campanha,
desconhecendo qualquer situação em que isso não seja assim.
É normal existir dinheiro em caixa para pagar pequenas despesas.
A conta bancária da campanha por vezes não está em nome do partido mas das
pessoas responsáveis pela angariação de fundos.
Reconheceu que, em concreto, não sabe o que se passou em Felgueiras.
Normalmente as contas bancárias abertas para a campanha não deverão ser
usadas para outros fins (devem ser apenas usadas para financiar a campanha).
Ao depoente, em Braga, nunca lhe foram prestadas contas acerca da campanha
eleitoral, pois não se envolvia nesses assuntos nem queria saber quem tinha concedido
os donativos.
- Testemunha Raúl Fernando Sousela da Costa Brito
É militante do PS desde 1975, tendo sido dirigente distrital e nacional desse
partido (pertenceu ao secretariado nacional da comissão política nacional do PS). Foi
deputado na Assembleia da República durante 13 anos, até 1995, dando apoio à região
do Vale do Sousa. Foi igualmente deputado no Conselho da Europa e vice-governador
civil do Porto. Foi ainda vereador na CMF.
Teve intervenção na campanha eleitoral de 1997 em Felgueiras.
A nível local existia um Secretariado da Comissão Política do PS de Felgueiras
que via quais eram os nomes para determinada candidatura e que cerca de oito a seis
meses antes das eleições apresentava a sua proposta à comissão política.
É o Secretariado que detém o poder executivo no partido.
O secretário-coordenador é o principal decisor na estrutura local do PS, pois
preside a um órgão executivo do partido.
As grandes deliberações são tomadas na comissão política, normalmente sob
proposta do secretariado.
Naturalmente que o candidato pode fazer as suas exigências e colocar as suas
condições, designadamente no que respeita à composição das listas.
No que a este aspecto concerne, não sabe se a Comissão Política do PS de
Felgueiras deu ou não à arguida Fátima carta branca para constituir a respectiva lista,
circunstância que não descarta e que admite ser uma possibilidade.
Todos tentam angariar o maior número de apoiantes, assim alargando a base de
apoio.
Em 2001 o depoente foi candidato (derrotado) à presidência da Câmara
Municipal de Paços de Ferreira e foi o secretariado do PS local que lhe apresentou os
nomes das pessoas que integrariam os diversos grupos. O candidato também pode
sugerir nomes. Parte-se do pressuposto que as pessoas escolhidas são sérias.
Os candidatos não se envolvem na recolha de fundos de modo a que não se
sintam depois condicionados no caso de serem eleitos.
A regra é assim a distanciação entre a questão dos fundos para a campanha e o
candidato. Este, em todo o caso, pode participar em almoços de angariação de fundos.
O candidato tem assim uma intervenção mais política e normalmente não tem
um conhecimento profundo da situação financeira da campanha.
183
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Naturalmente que quando o candidato deseja fazer um comicio tem de saber se
existem os fundos necessários, sendo então informado pela estrutura.
Convém que um dos elementos do grupo de angariação de fundos faça parte da
comissão política local do PS.
Sucede frequentemente que os fundos existentes sejam insuficientes para custear
a campanha e o partido não se responsabiliza pelo pagamento das dívidas, razão pela
qual muitas vezes os credores dirigiam-se aos candidatos no sentido de lhes pagar os
respectivos créditos, chegando eles então a pagar do seu bolso algumas despesas de
campanha.
Até por esse motivo as contas da campanha são autónomas em relação às contas
do partido, sendo certo que desconhece qualquer situação em que assim não fosse, numa
altura em que não havia financiamento público dos partidos políticos.
Por outro lado, essa autonomia deve-se ainda ao facto da campanha para as
eleições autárquicas envolver pessoas que não são militantes.
Assim, ninguém prestava contas ao partido no que respeita às contas da
campanha (enquanto dirigente da Federação Distrital do PS nunca verificou que alguém
tenha prestado contas das campanhas eleitorais autárquicas).
Os assessores normalmente estão numa situação de fragilidade e procuram
agradar na medida em que o respectivo lugar pode estar em causa.
Se estivesse no lugar do arguido Horácio Costa teria recusado angariar fundos.
Trata-se de uma situação que lhe parece anómala na medida em que pode levar a que
alguns doadores possam ter expectativas de alguma contrapartida, pois há o risco de se
associar o assessor ao candidato no que se refere à angariação de fundos.
À data a arguida Fátima Felgueiras era a presidente da comissão política local do
PS.
Normalmente as campanhas movimentam verbas consideráveis.
Na campanha de 2001 para a campanha eleitoral relativa às eleições autárquicas
para a Câmara Municipal de Paços de Ferreira, foram despendidos cerca de
8.000.000$00.
Em Felgueiras não sabe que verba foi despendida, pois tal depende das
iniciativas que aqui foram tomadas.
Existem pessoas que dão dinheiro para a campanha e não querem que se saiba,
sendo certo que as contribuições tanto podem ser dadas em numerário como através de
cheque.
Normalmente a comissão de candidatura abre uma conta bancária.
No seu caso (campanha eleitoral de 2001 relativa à C.M. de Paços de Ferreira)
isso sucedeu e se não havia dinheiro para determinada iniciativa o depoente decidia se
pagava ou não o que faltava do seu bolso em ordem a que essa iniciativa se realizasse
(ou não).
No seu caso, os titulares da conta respectiva pertenciam ao grupo de angariação
de fundos, facto que o depoente sabia. Seja como for, o depoente não participou na
recolha de fundos. Não obstante, admitiu ter recebido dois donativos de dois amigos.
Acabou por referir que, no que toca aos outros concelhos, não sabe como é que
essa questão foi organizada.
Assim, não obstante os princípios que proclamou professar, considerou um
donativo de 500 cts normal e que os aceitaria se lhos fossem oferecidos pessoalmente,
concluindo que não é fácil conciliar o princípio da necessidade (que o obrigaria a aceitar
pessoalmente donativos) com o princípio da independência em relação à questão dos
fundos.
184
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
- Testemunha Armando António Martins Vara
Em 1997 fazia parte do secretariado nacional do PS.
Foi coordenador do PS no que se refere às eleições autárquicas de 2001.
O PS caracteriza-se por ser uma “organização desorganizada”.
Havia grande autonomia das suas estruturas locais.
Era a comissão política concelhia que ratificava a lista dos candidatos e tomava
as decisões. O secretariado é que organizava o processo eleitoral do partido.
O depoente conhece melhor a realidade de Bragança.
As tarefas eram distribuídas pelas pessoas, incluindo a angariação de meios
financeiros para a campanha.
Por norma os cabeças de lista não se ocupavam da angariação de fundos, no
sentido de resguardar o candidato de um hipotético conflito de interesses uma vez eleito.
Se o depoente fosse candidato procuraria que alguém muito perto de si não
estivesse envolvido no grupo responsável pela recolha de fundos para a campanha
eleitoral.
Por via de regra era o secretariado que designava as pessoas.
As contas da campanha não se confundiam com as contas do partido a nível
local.
Os estatutos do PS regulam as substituições, não achando por isso possível que o
presidente da comissão política concelhia possa ser substituído na sua ausência por um
representante que tenha enviado para o efeito. Quem o deveria substituir seria o
primeiro suplente.
Segundo tem ideia, não recebeu dos arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas
qualquer carta, mas admite que possa estar equivocado visto que recebia muitas
missivas.
A questão de se saber se o PS apoiaria ou não a recandidatura da arguida Fátima
Felgueiras em 2001 foi discutida na comissão de coordenação do PS para as eleições
autárquicas de 2001. O PS manteve o apoio à arguida Fátima, não obstante as notícias
que vinham a público, já que a forma como ela vinha exercendo o cargo de presidente
da CMF mereceu-lhe mais confiança do que as acusações que vinham a público e que
considerava serem fruto de uma disputa do poder a nível local.
Se tivesse tido qualquer dúvida acerca da honestidade dela e do seu carácter não
a teria apoiado no sentido de que fosse a candidata do PS à CMF nas eleições
autárquicas de 2001.
Ela sempre foi uma excelente presidente de câmara.
Quem é militante de uma causa não anda por interesse pessoal. A arguida
Fátima Felgueiras é militante nas causas que defende.
- Testemunha Mário Hermenegildo Moreira de Almeida
É presidente da Câmara Municipal de Vila do Conde desde 1981, tendo sido
presidente da Associação Nacional de Municípios durante 11 anos.
Há muitos anos que é o presidente da comissão política do PS de Vila do Conde.
Quem efectivamente conduz os destinos do PS a nível local é secretariado. O
depoente, quando se quer inteirar dos pormenores de algum assunto relacionado com o
partido consulta, por exemplo, o secretário-coordenador.
No dia-a-dia o depoente não manda no PS de Vila do Conde, pese embora seja a
figura máxima do partido em Vila do Conde. Confia nas pessoas que fazem parte do
secretariado local.
Em 1997, em Vila do Conde, no que se refere à campanha eleitoral, referiu o
seguinte:
185
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Normalmente há recandidaturas. Recolhe-se os nomes que irão integrar a lista e
é aí que o candidato tem a intervenção principal.
O depoente nunca se ocupa dos aspectos organizativos da campanha, conforme
aliás é a norma.
No período de campanha eleitoral o candidato tem um trabalho enorme e tem de
se concentrar nas questões políticas.
O secretariado é que organizava a campanha, podendo criar grupos, onde se
inclui a angariação de fundos (que organiza, por ex., jantares de angariação de fundos,
recolhe donativos e organiza leilões de obras de arte).
Em Vila do Conde as receitas angariadas para a campanha entravam na conta
oficial do PS local.
O depoente nunca se envolveu na recolha de fundos e se alguém lhe oferecesse
algum donativo remetia a pessoa para os responsáveis pela angariação de fundos,
recusando-se a receber esse donativo.
Não sabe como é que as coisas se passaram em Felgueiras.
- Testemunha José Narciso de Rodrigues de Miranda
Foi presidente da Câmara Municipal de Matosinhos durante 26 anos, funções
que interrompeu por pouco tempo quando integrou o Governo.
Integrou todos os órgãos do PS, quer a nível local, regional e nacional, excepto o
de secretário-geral.
Em 1997 era o presidente da Federação Distrital do Porto do PS e membro de
órgãos nacionais do mesmo partido.
No exercício das suas funções no PS acompanhou as eleições autárquicas nesse
ano.
Existia uma orientação verbal segundo a qual os candidatos não deveriam
participar na recolha de fundos.
Aliás, o depoente, em todas as vezes que concorreu à presidência da C.M. de
Matosinhos, nunca recebeu pessoalmente qualquer donativo e se lho quisessem oferecer
pessoalmente diria que não tratava desse assunto.
Quanto à composição das listas, dava-se grande autonomia às estruturas
concelhias do partido, listas essas que normalmente eram aprovadas pelo PS.
Nas concelhias onde apenas existe uma secção as questões operacionais são
tratadas pelo secretariado.
Havia a orientação de se organizar grupos de trabalho nas campanhas. Havia
também o grupo de recolha de fundos, cujos membros eram os responsáveis pela
recolha dos fundos.
O depoente nunca conheceu nem se preocupou em conhecer os mecanismos de
recolha de fundos. Durante a campanha a pressão é maior e o candidato não tem sequer
tempo para se ocupar dessas questões.
Esteve em Felgueiras a propósito da campanha eleitoral relativa às eleições
autárquicas de 1997.
À data o secretário-coordenador era o arguido Bragança.
Recorda-se que em 1997 o processo eleitoral no interior do partido foi pacífico.
Na disputa interna no seio da Federação Distrital do Porto do PS a arguida
Fátima apoiou sempre um candidato diferente do depoente, com excepção da última
candidatura do depoente (em que ela o apoiou).
Ela integrou a estrutura nacional do PS, mas tal não sucedeu por sugestão do
depoente.
186
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
A primeira vez que sentiu que qualquer coisa de anormal se passava em
Felgueiras foi quando certa ocasião uma das suas secretárias o chamou à atenção para o
facto de ter recebido cartas anónimas relacionadas com Felgueiras, mas o depoente não
lhes deu importância (nem sequer as viu) e mandou avisar a arguida Fátima Felgueiras.
Em Outubro/Novembro de 1999 o depoente foi para o Governo e no seu
ministério comentou-se que tinham recebido cartas anónimas (o Jorge Coelho era o
ministro).
Numa viagem de avião em que também viajava a arguida Fátima, abordou-a
acerca desse assunto e disse-lhe para ver o que se passava.
Foi-lhe pedida insistentemente a realização de uma reunião com pessoas do PS
de Felgueiras, entre as quais o arguido Bragança, mas recusou várias vezes. Entretanto,
acabou por aceder tomar um café com ele, mas como se atrasou combinaram jantar em
Matosinhos. Nessa reunião conheceu os irmãos Costa (o arguido Horácio Costa e o
irmão), estando ainda presentes os arguidos Joaquim Freitas e Bragança.
Eles pediram-lhe a sua ajuda para resolver o problema de Felgueiras, uma vez
que eles tinham um projecto de poder, projecto esse encabeçado pelo arguido Horácio
Costa.
Porém, tal projecto era absurdo, razão pela qual nunca poderia dar o seu aval a
essas intenções.
Esse projecto consistia em afastar a arguida Fátima da presidência da CMF.
Acusavam-na de autoritarismo.
Disse-lhes que se a arguida Fátima saísse da presidência da CMF teria de ser o
número dois a assumir a presidência. Consequentemente, o projecto deles era inviável.
Abordaram o assunto das cartas anónimas, mas recusou-se a falar com eles
acerca do respectivo conteúdo.
Nessa reunião falou sobretudo com o arguido Bragança.
Entretanto, em Setembro de 2000, o depoente saíu do Governo e alguns meses
depois teve lugar uma reunião na sede distrital do PS com elementos do PS de
Felgueiras (consegue apenas identificar o arguido Horácio, não se recordando quem
eram os demais elementos) na qual lhe quiseram entregar um dossier acerca das contas
do PS de Felgueiras, as quais apresentavam saldo (era o arguido Horácio quem tinha na
sua posse esse dossier, o qual se mostrava cansado e abatido).
Pediu para que lhe explicassem quem é que em Felgueiras lhe deu credenciais
para ter uma conta bancária do PS. Disseram-lhe então que a conta estava em nome dos
arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas, recusando-se por isso a receber o dito
dossier (por não se tratar de uma conta do PS).
Sugeriu que apresentassem esse dossier ao responsável do PS pelas contas
nacionais do partido.
Lidou com a arguida Fátima Felgueiras sobretudo nos congressos do PS e nas
estruturas nacionais do partido.
Recorda-se que perante um conflito institucional que se prendia com a instalação
de um instituto politécnico pelo Governo na região do Vale do Sousa (tem a ideia que
ponderava-se a sua instalação ou em Felgueiras ou em Lousada ou em Felgueiras ou em
Paços de Ferreira, já não se recorda bem), tendo-se marcado uma reunião entre a
Secretaria de Estado do Ensino Superior e os dois presidentes de câmara onde esse
instituto se poderia vir a instalar (ambos eleitos pelas listas do PS) e, em face do que a
arguida Fátima expôs de forma agerrida, aquele instituto viria a ser instalado em
Felgueiras.
Em 2001 o depoente chegou a ser o responsável do PS, durante 5 meses, pela
coordenação das autárquicas (sucedeu-lhe a testemunha Armando Vara) e questionava-
187
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
se se o PS deveria ou não apoiar a recandidatura da arguida Fátima. Todos consideraram
que ela se deveria recandidatar numa reunião ocorrida numa altura em que já era a
testemunha Armando Vara o responsável do PS pela coordenação da campanha eleitoral
referente às eleições autárquicas de 2001.
*
Em face do depoimento da testemunha Narciso Miranda o arguido Horácio
Costa negou terminantemente que existisse alguma tentativa de “assassinato político”
da arguida Fátima Felgueiras.
Na sequência da denúncia anónima houve uma reunião em casa da arguida
Fátima Felgueiras.
O Dr. Barros Moura conversava muito com o arguido Bragança, inclusive acerca
da denúncia anónima, e a arguida Fátima “andava de cabeça perdida”.
Ele (Barros Moura) sugeriu ao arguido Bragança a marcação de uma reunião
com a testemunha Narciso Miranda, o que foi feito para o dia 05.02.2000 (inicialmente
havia referido 05.02.2001, dizendo ter-se tratado de lapso).
Essa reunião tinha como objectivo expôr a situação política que se vivia em
Felgueiras para que a testemunha Narciso Miranda chamasse a “capítulo” a arguida
Fátima (em face da reacção dela na sequência de denúncia anónima).
Foi estabelecido que a essa reunião iria o Dr. Barros Moura, os arguidos
Bragança e Joaquim Freitas, o depoente, a testemunha Edgar Costa (o qual se recusou a
ir).
Porém, à última hora o Dr. Barros Moura informou que não poderia ir a essa
reunião e, em sua representação, foi o irmão do depoente (Orlando Costa), o qual era
membro da Assembleia Municipal de Felgueiras.
Na dita reunião a testemunha Narciso Miranda lançou o repto de um projecto de
poder a encabeçar pelo arguido Bragança, tendo comparado a arguida Fátima a um
eucalipto que em volta tudo seca. Mais disse ao arguido Bragança que ele teria de tomar
conta do partido em Felgueiras e que teria de “mobilizar as suas tropas” caso tivesse
fundamento a denúncia anónima e que o partido teria de prosseguir ainda que com um
“cadáver político”.
Foi por isso que o arguido Bragança fez os seus contactos nos dois dias
seguintes, findos os quais foi corrido da CMF.
Na dita reunião a testemunha Narciso Miranda contou que também tinha sido
alvo de uma denúncia anónima e geriu a questão sem dar nas vistas, isto é, sem fazer
“ondas” na comunicação social.
Ele viu a documentação que levavam.
A testemunha Narciso encarregou então a testemunha Guilherme Pinto de se
econtrar com o depoente para melhor esclarecer a situação, razão pela qual entretanto se
encontraram na Foz (o depoente, o arguido Joaquim Freitas e a testemunha Guilherme
Pinto).
Entretanto, a propósito de documentos que entretanto fez juntar ao processo a fls
14718 e ss., o arguido Horácio Costa chamou à colacção vários artigos de jornal que
considerou relevantes (e demonstradores do apoio que a testemunha Narciso Miranda
prestou à arguida Fátima Felgueiras), designadamente as cópias desses artigos
constantes de fls 14719 a 14724, 14726 a 14729, 14732 a 14737.
*
Dada a contradição existente entre os depoimentos do arguido Horácio Costa e
Narciso Miranda, procedeu-se à respectiva acareação, onde ambos mantiveram
posição anteriormente assumida quanto ao propósito do encontro que tiveram.
188
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Assim, o arguido Horácio Costa disse que a reunião com a testemunha Narciso
Miranda ocorreu em 05.02.2000 (e não 2001 conforme por lapso havia referido).
A testemunha Narciso Miranda apoiou as quatro pessoas que com ele se
reuniram na Federação Distrital do Porto.
Não foi o depoente quem a marcou com a testemunha Narciso. O depoente foi
convidado pelo arguido Bragança para ir com eles, sendo certo que ele iria transmitir à
testemunha Narciso quais eram as necessidades do partido em face da gestão autárquica
que então se vivia e do que era imputado à arguida Fátima Felgueiras.
O Dr. Barros Moura, enquanto presidente do órgão fiscalizador da acção da
CMF (era presidente da assembleia municipal), sentiu a necessidade da realização da
aludida reunião com a testemunha Narciso Miranda.
O Dr. Barros Moura, aliás, estava também a ser alvo de ataques, pois a jornalista
Inês Serra Lopes, do “Independente”, remeteu ao arguido Barbieri um documento
alusivo à gestão dos dinheiros públicos pela Associação Industrial de Felgueiras (criada
pelo Dr. Barros Moura e outras pessoas), a fim de dele obter um comentário
(28.01.2000) – cfr. e-mail de fls 14718.
Haviam pois razões partidárias e pessoais do Dr. Barros Moura para que ele
quisesse a realização da reunião com a testemunha Narciso Miranda.
A 14.02.2000 o PSD de Felgueiras promoveu uma conferência de imprensa onde
tornou pública a denúncia anónima e acrescentou uma série de assuntos em relação a
essa denúncia.
O ambiente era tenso e de preocupação para quem estava ligado ao PS de
Felgueiras, daí a necessidade da reunião com a testemunha Narciso Miranda.
O depoente foi incluído nesse grupo de pessoas, mas nunca foi incluído em
qualquer projecto de poder. O depoente foi convidado para ir à dita reunião para dar
conta do que se passou com a conta do BES.
Refuta pois a ideia da existência de um projecto de poder que visasse o derrube
da arguida Fátima Felgueiras nos moldes em que a testemunha Narciso Miranda o
apresentou ao Tribunal.
As expressões “assassinato político” e “assalto de poder” foram usadas pela
arguida Fátima Felgueiras para desvalorizar a investigação e as declarações do
depoente. Quando ela foi constituída arguida ela passou a dizer que as pessoas eram
ressabiadas políticos e que as oposições se aproveitavam disso na tentativa de a
destituir.
A testemunha Narciso prometeu-lhes que iria tomar decisões e resolver o
problema, mas apercebeu-se que ele acabava por actuar de forma diferente. Ele acedia
com quem falava, isto é, se falasse com a arguida Fátima solidarizava-se com ela e ao
mesmo tempo manifestava apoiar o grupo que o visitou .
No “Sovela” aliás vem publicada uma notícia que dá conta que a testemunha
Narciso Miranda se solidarizou com a arguida Fáima Felgueiras (notícia publicada na
edição de Abril de 2000).
O depoente considerou tal facto uma traição, nomeadamente em face do que a
testemunha Narciso se comprometeu perante o grupo com quem reuniu e mesmo para
com o PS de Felgueiras.
Ele apelava para a unidade do partido e para a vitória das próximas eleições
autárquicas, que viriam a ocorrer em 2001.
Salientou que nas declarações que o depoente fez à comunicação social manteve
sempre a versão dos factos quer no que toca à reunião com a testemunha Narciso
Miranda quer quanto ao encontro à beira-mar com a testemunha Guilherme Pinto.
189
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
A testemunha Narciso Miranda chegou a fazer alguns telefonemas ao depoente
dizendo-lhe para não falar à comunicação social e assegurava-lhe que tudo se iria
resolver.
O depoente deixou-se “enrolar” por ele até certa altura porque era “caloiro” na
política. Apercebeu-se que ele jogava com um “pau de dois bicos”.
Numa entrevista que a testemunha Narciso Miranda deu a 13.01.2003 negou ter
conhecimento do “saco azul” quando é certo que a reunião já referida ocorreu em
05.02.2000 (cfr. documento de fls 14737).
Na edição do “Público” de 10.10.2001 vem noticiado que a testemunha Narciso
Miranda apoiava a recandidatura da arguida Fátima Felgueiras à CMF (cfr. documento
de fls 14729).
Reafirmou que foi a testemunha Narciso quem, na dita reunião ocorrida a
05.02.2000, lançou ao arguido Bragança o repto para um projecto de poder, para ele
reunir as suas tropas, que a arguida Fátima era um “eucalipto que secava tudo em volta”
e que se houver um “cadáver politico” a arguida Fátima seria esse cadáver.
Por seu turno, a testemunha Narciso Miranda assegurou que só acedeu reunir
após muitas insistências, pois entendia serem irrelavantes as reuniões solicitadas.
A sua então secretária foi permanentemente contactada para que o depoente
acedesse em reunir com eles (ela trabalhou consigo até Outubro de 1999, tendo então
ido para a Assembleia da República exercer as funções de deputada e o depoente
ingressou no Governo).
Só depois do caso vir a público e porque tinha mais tempo é que acedeu
encontrar-se com eles, encontro que não ocorreu à hora marcada pois o depoente
atrasou-se.
Explicou que o jantar aconteceu acidentalmente, pois a reunião era para se
realizar na mesa de um café às 18 horas, mas por deferência para quem tinha esperado
por si muito tempo, acabou por reunir com eles ao jantar.
Não perguntou a quem quer que seja se tinham comprado um triciclo e não se
lembra de ter apelidado a arguida Fátima de “eucalipto”, mas trata-se de uma expressão
usada com frequência na política e aplicada a pessoas firmes e que são lideres (secando
tudo à volta), pelo que entende ser um elogio.
À data não conhecia a arguida Fátima Felgueiras suficientemente bem para usar
aquela expressão relativamente à pessoa dela.
Em todo o caso, admite que possa ter usado essa expressão na dita reunião.
Nega porém que tenha dito que o poder poderia “cair na rua”.
O jantar foi muito cordial, sendo certo que só conhecia os arguidos Bragança e
Joaquim Freitas.
Reafirma que ainda hoje não conhece a conta do “saco azul” e não seria na dita
reunião que iria tomar conhecimento dessa conta. De facto, nessa reunião não lhe foram
apresentados papéis.
Mais tarde houve uma reunião na sede do PS Porto e quiseram-lhe entregar
documentos relativos ao “saco azul”, mas recusou recebê-los, tendo sugerido que os
mesmos fossem entregues ao presidente da Comissão de Jurisdição (testemunha
Guilherme Pinto), visto que é essa comissão que aplica sanções aos militantes.
O PS tem regras e é a Comissão de Jurisdição que constitui uma espécie de
tribunal do partido. Essa comissão só se pronuncia se houver uma queixa. O normal
seria que se os estatutos tivessem sido violados que se tivesse apresentado uma queixa.
Não sabia que o dito jantar se realizou por iniciativa do Dr. Barros Moura, o
qual era seu amigo e com quem teve várias conversas informais. Ele tinha sido deputado
190
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
e era eurodeputado. Era pessoa muito respeitada. Se soubesse que ele iria à reunião teria
mais cuidado na sua marcação.
Quanto às considerações feitas pelos jornalistas não as comenta, designadamente
que apoiou a arguida Fátima Felgueiras.
Salientou que a arguida Fátima Felgueiras apoiou o Francisco Assis contra a sua
recandidatura à Federação Distrital do Porto do PS, logo não tinha razões para a apoiar.
Que se lembre, nunca falou com o Dr. Sousa Oliveira.
Não tem a certeza em que data ocorreu o dito jantar, mas tem quase a certeza
que teve lugar ainda em 1999 (nessa altura o problema ainda não era público, pois se
fosse já público não acederia em reunir com eles, segundo disse em contradição com o
facto de ter declarado anteriormente que acedeu em reunir após o “problema” se tornar
público e por ter mais tempo disponível).
Tem a certeza que esse jantar ocorreu depois da reunião na sede do Porto do PS
(antes a testemunha tinha transmitido a ideia de uma sequência inversa das reuniões).
Esta reunião na sede do partido no Porto teve lugar pouco depois de ter tomado
posse como Secretário de Estado (Outubro de 1999), talvez 15 ou 30 dias depois.Tem
quase a certeza que foi ainda em 1999.
Ao contrário do que disse o arguido Horácio Costa o dinheiro do “saco azul”
não financiou a Federação Distrital do Porto do PS.
Na altura não existiam regras quanto ao financiamento dos partidos.
Na altura o depoente não tinha razões para se opor à recandidatura da arguida
Fátima Felgueiras.
Não é de estranhar que se prepare as eleições autárquicas com 15 meses de
antecedência. Neste momento já se preparam as próximas eleições autárquicas.
As estruturas dos partidos é que fazem movimentações em reuniões para
preparar estratégias para as candidaturas às eleições autárquicas. É ainda muito cedo
para definir as listas, sendo assuntos que são muito tratados nos corredores.
Deve-se delinear a estratégia e só depois é que deve-se colocar a questão dos
nomes. Reconheceu em todo o caso que na prática não é bem assim.
Não sabe quem é que insistentemente solicitava as reuniões com o depoente, só
a sua ex-secretária é que poderá esclarecer esse facto. Sabe apenas que eram opositores
internos à arguida Fátima Felgueiras.
Explicou que quando há um conflito entre dois militantes do PS não é o líder
distrital que o pode derimir, mas a Comissão de Jurisdição.
Recorda-se que no dito jantar ligou para a sua então secretária (chamava-se
Paula Cristina Guimarães Duarte e não Ana Paula, conforme referiu o arguido Horácio
Costa, sendo certo que nunca teve qualquer secretária ou assessora com o nome “Ana”).
Não tem ideia nenhuma de lhe ter telefonado por causa de algum assunto tratado
nessa reunião.
Na reunião ocorrida na sede do Porto do PS o conflito era já público (o que mais
uma vez revela contradição no depoimento da testemunha quanto à sequência das
reuniões: primeiro referiu que ocorreu o jantar e depois a reunião na sede distrital do
PS; depois afirmou o contrário e agora reafirma a primeira versão). Estavam presentes o
Guilherme Pinto e o Renato Sampaio.
Da dita reunião deduziu que houve uma tentativa de tomada de poder em
Felgueiras.
O arguido Horácio Costa, por sua vez, replicou, reiterando que o jantar ocorreu
a 05.02.2000. Foi aliás o arguido Joaquim Freitas quem pagou o dito jantar com o seu
cartão de crédito.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
O Dr. Barros Moura responsabilizou a testemunha Narciso Miranda pela má
gestão da “questão de Felgueiras”.
Na reunião ocorrida na sede distrital do Porto do PS (ocorrida a 19.02.2000) o
depoente foi convocado, mas ausentou-se porque recebeu chamadas anónimas,
ameaçando de morte os seus filhos. A testemunha Narciso Miranda disse-lhe que isso
não se fazia e que era muito feio. Não assistiu por isso a essa reunião.
O depoente e o arguido Joaquim Freitas foram alvo de um inquérito disciplinar
pela Federação Distrital do PS e foram ambos suspensos por 60 dias em face das
denuncias difamantes que fizeram em relação à arguida Fátima Felgueiras.
Em 09.02.2000 ocorreu uma reunião em Lisboa em que participaram o Dr.
Barros Moura, a arguida Fátima e a testemunha Narciso Miranda.
No dia 10.02.2000 o arguido Bragança foi posto fora da CMF.
O depoente explicou que tinha a ideia que a secretária da testemunha Narciso se
chamava Ana Paula, mas admite que se possa ter equivocado. Ele ligou-lhe para pedir
que o “material” de Felgueiras fosse colocado na sua secretária na Segunda-feira
seguinte.
É evidente que nesse jantar ele não tomou conhecimento do extracto da conta,
mas tomou conhecimento da situação, como por exemplo a compra do “Audi A4”
referido nos autos.
A testemunha Narciso Miranda referiu então que não foi a Federação Distrital
que aplicou qualquer sanção, mas a Comissão de Jurisdição.
Quem escolhe os candidatos são as comissões políticas concelhias, mas podem
ser avocadas as candidaturas (é necessário para o efeito uma maioria de 2/3). O líder do
partido, com a sua autoridade, pode propor a avocação ao abrigo dos estatutos e quando
ele faz essa proposta é porque já sabe que detém a maioria de 2/3 necessária à respectiva
aprovação.
Em média fazem-se três a quatro avocações por ano no seu partido a nível
nacional.
A reunião na Federação Distrital correu muito bem. Quando deu a palavra para
que o assunto fosse exposto é que lhe quiseram entregar as contas, mas não as aceitou.
No final o arguido Horácio Costa disse que estava a ser ameaçado e disse-lhe que não
era ali que poderia resolver esse assunto.
Acrescentou que no jantar já referido, quando lhe foi apresentado um projecto
alternativo de poder para Felgueiras, perguntou quem era o número dois. Como o
número dois não se encontrava entre o grupo, não seria apossível essa pretensão, pois
em caso de impedimento do presidente da autarquia ele é substituído pelo número dois
(vice-presidente).
O depoente pertencia à Comissão Permanente do PS, na altura presidida pelo
Jorge Coelho, a qual se reunia semanalmente.
Assegurou que em Lisboa não teve qualquer reunião com o Dr. Barros Moura,
pois não tratava desses assuntos.
Em face destas declarações o arguido Horácio Costa explicitou que se
encontrou na Mealhada com o Dr. Barros Moura no dia 07.02.2000 e deu-lhe conta do
que se passou na reunião (jantar) ocorrida no dia 05.02.2000.
Na reunião de 19.02.2000 (na Federação Distrital do Porto) saíu no início da
mesma, conforme já explicou.
No dia 12.10.2001 o “Comércio do Porto” publicou um artigo de opinião da
testemunha Pedro Baptista, onde defendia que o PS não deveria apoiar a recandidatura
da arguida Fátima Felgueiras (cfr. documento de fls 14730 e 14731).
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
A testemunha Raúl Brito, por seu turno, numa notícia de jornal, queixou-se da
falta de apoio da Federação Distrital do Porto do PS na sua candidatura à Câmara
Municipal de Paços de Ferreira (cfr. documento de fls 14725).
*
A propósito do e-mail de fls 14718, referido pelo arguido Horácio Costa (e por
ele junto aos autos para demonstrar que o Dr. Barros Moura também tinha interesse na
reunião que teve lugar com a testemunha Narciso Miranda), explicou o arguido
Barbieri Cardoso que, à data, a CMF apenas tinha três endereços electrónicos, um dos
quais caía no computador do depoente, outro no computador da Informática (de que era
responsável) e outro no computador da arguida Fátima (mas que esta não usava).
Ficaram espantados como é que o “Independente” tinha tido acesso ao endereço
electrónico em causa, pois era utilizado como um endereço quase privado.
Estranharam que esse e-mail tenha sido enviado a uma Sexta-feira (dia de folga
desse jornal, que na altura saía precisamente à Sexta-feira) e às 23.18 horas.
Em face disso, ficaram na dúvida se esse e-mail tinha sido ou não enviado pelo
“Independente”, já que poderia ter sido remetido por qualquer um.
Consequentemente, procuraram saber se o “Independente” tinha na verdade
enviado esse correio electrónico (não se recorda se falou com a Inês Serra Lopes ou
com a sua secretária), tendo-lhe sido dito de forma inequívoca que não tinha sido esse
jornal a remeter esse e-mail.
Procuraram então saber a origem do mesmo junto da “AEIOU”, a qual alegou
sigilo para negar prestar essa informação e que só a prestariam em sede de investigação
(criminal).
Não tem qualquer ideia de ter fornecido uma cópia desse documento ao arguido
Horácio Costa.
Apesar de não negar esse facto, acha-o estranho, pois o arguido Horácio não
tinha nada a ver com o assunto nem dele nada percebia.
Certo é que a resposta dada (de cariz técnico) não foi posta à consideração dele
(remeteu-a para o “Independente”).
Tem a ideia que a arguida Fátima não queria que se desse qualquer resposta.
*
Ainda a propósito desse assunto, a arguida Fátima Felgueiras referiu que a
estratégia de se remeter e-mails do género foi um método usado para provocar
incidentes, de modo a que a comunicação social fizesse um julgamento em praça
pública.
Antes desse e-mail (de 28.01.2000) a depoente já tinha recebido várias cartas
anónimas.
A primeira carta anónima que recebeu prendia-se com a aquisição do Estádio
Dr. Machado Matos pela CMF, cuja decisão já tinha sido tomada pela CMF mas que
faltava a ratificação pela assembleia municipal, pelo que deve ter recebido essa carta
anónima por alturas de Junho/Julho de 1999.
O Dr. Barros Moura recebeu carta anónima de idêntico teor, pelo que telefonou
logo à depoente a contar-lhe o sucedido.
Procurou-se saber junto dos CTT quem e donde essas cartas tinham sido
enviadas e apuraram apenas que foram remetidas através dos CTT de Vizela.
Ainda acerca do mesmo assunto recebeu uma segunda carta anónima (seguida
de uma carta acerca do mesmo assunto remetida a todos os presidentes de junta de
freguesia, exortando-os a votar contra a aprovação da aquisição do estádio, método que
muito os indignou), onde se fazia menção de que não tinha dado a devida atenção à
primeira carta e que o escândalo iria rebentar.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
O Dr. Barros Moura só conversava consigo acerca destes assuntos e com o
arguido Júlio Faria (foi a depoente quem o convidou para se candidatar à presidência da
Assembleia Municipal de Felgueiras, o que ele aceitou na medida em que eram
conhecidos de longa data, visto que a depoente andou no externato propriedade da mãe
dele e o irmão dele – Pedro – foi seu professor de matemática).
Os três interrogaram-se acerca da identidade dos autores dessas cartas e
naturalmente que apontaram suspeitos em função dos interesses em jogo. Identificaram
essas pessoas e os jornalistas de que eles se serviam.
Entenderam porém que nada haveria a fazer que não fosse esperar.
Acha estranho que o e-mail de fls 14718 esteja nas mãos do arguido Horácio
Costa, pois não havia razão alguma para que o arguido Barbieri lhe tivesse entregue
uma cópia desse documento. Este aliás enviou uma cópia desse documento para o Dr.
Barros Moura (na Assembleia da República).
A depoente, aludindo indirectamente ao arguido Horácio Costa e a propósito dos
artigos de jornal que fez juntar aos autos, referiu que não andava a colecionar artigos de
jornal.
*
O arguido Horácio Costa, em face destas declarações da arguida Fátima
Felgueiras, reafirmou tudo o que disse no que respeita ao e-mail em causa,
designadamente a forma como lhe veio parar às mãos (tem aliás na sua posse a
respectiva resposta, que se recusou a assinar na medida em que o assunto não lhe dizia
respeito).
Em Julho de 1999 o “Independente” já havia publicado um artigo alusivo aos
negócios existentes entre a CMF e o FCF.
O negócio do estádio foi feito muito antes de Julho de 1999, sendo certo que
nessa altura já a Assembleia Municipal de Felgueiras tinha aprovado o negócio, daí que
não faça sentido que a arguida Fátima tenha recebido cartas anónimas com o teor que
ela referiu após essa aprovação.
Por outro lado, a respeito do facto da arguida Fátima ter referido que não
coleccionava artigos de jornal, salientou que ela juntou dezenas de artigos de jornal no
Tribunal Administrativo (acção de perda de mandato).
Ademais, na primeira entrevista que ela deu aos jornais, não fez referência a
qualquer maquinação para dar uma certa aparência aos factos, descartando antes
qualquer responsabilidade em alguma irregularidade ou ilegalidade cometida, sacudindo
essa responsabilidade para os técnicos da CMF.
Não compreende porque motivo o arguido Júlio Faria haveria de ser consultado
a propósito das aludidas cartas anónimas na medida em que o nome dele só veio à baila
na primeira denúncia anónima.
De resto, à data, o depoente não tinha acesso sequer (e assim conhecimento) a
toda a matéria que consta nessa denúncia.
Por fim, referiu que o Dr. Barros Moura veio do PCP, onde é costume respeitarse a máquina partidária.
Ele, respeitando a máquina partidária, tinha longas conversas ao telefone com o
arguido Bragança acerca de assuntos relacionados com a CMF e a assembleia
municipal.
É portanto falso que sobre as questões referidas pela arguida Fátima ele apenas
falasse com ela e com o arguido Júlio Faria.
*
- Testemunha Paulo Ramalheira Teixeira
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
É presidente da Câmara Municipal de Castelo de Paiva desde 07.01.98 (eleito
pelas listas do PSD).
Referiu que se candidatou à presidência da C.M. de Castelo de Paiva em 1993 e
que perdeu essas eleições, tendo porém vencido as eleições em 1997, sendo reeleito em
2001 e 2005.
Os partidos apresentam os candidatos às Câmaras mas não os apoiam, tendo por
isso de existir uma estrutura autónoma de apoio.
Há assim uma equipa que trabalha todo o processo eleitoral.
Antes de 2001 não existia qualquer regulamentação legal quanto ao
financiamento. Havia sempre um grupo de pessoas credíveis (socialmente credíveis e
sem problemas financeiros) que angariavam fundos para a campanha.
O depoente não se envolvia na questão da angariação de fundos, daí que não
saiba como é que essa comissão procedia.
O candidato tem muitas tarefas, o que não lhe permite disponibilizar tempo para
assuntos como a questão do financiamento.
Além disso, se o candidato se envolvesse nessa questão ficaria comprometido
para com os doadores.
Referiu o depoente que foi condenado em 1996 no pagamento de uma multa de
mil e tal contos e que recusou os apoios financeiros que então lhe foram oferecidos para
liquidar tal multa, justamente para não se comprometer.
Pensa que todos os candidatos se procuram colocar de fora da angariação de
fundos. Essa será a regra, pese embora admita que possam haver excepções.
O depoente trabalhou num grande grupo económico que costumava dar
donativos para vários partidos.
O PSD só lhe ofereceu a foto e mais nada. A partir do momento do anúncio da
candidatura as contas de campanha não entram nas contas do partido. Tal era a regra no
PSD.
Ao que lhe disse o candidato pelas listas do PS à C.M. de Castelo de Paiva,
também era assim no PS, mas não sabe em que moldes.
Acabou por referir que não sabia ao pormenor quem fazia os fornecimentos e
quem os ia pagar no âmbito da campanha eleitoral. Só no final da campanha é que se
fazia um balanço e chegou a ter de passar um cheque pessoal para cobrir o passivo
(pagou 2/3 do custo da campanha).
Referiu ainda que foram encarregadas duas ou três pessoas que garantiram ao
mandatário da sua candidatura que iriam fazer os possíveis para angariarem fundos,
sendo certo que o depoente apenas conhecia a pessoa que ia liderar essa angariação de
fundos por fazer parte da estrutura da sua candidatura, sendo certo que esteve presente
na reunião onde se criou a estrutura de campanha.
Em rigor não sabe se os outros candidatos sabem ou não quem é o responsável
pela angariação de fundos.
O candidato à Câmara é o líder em termos de imagem.
Não se recorda de alguém alguma vez lhe ter oferecido um donativo para a
campanha. Se tal sucedesse remeteria a pessoa para o responsável pela angariação de
fundos.
Revelou que na campanha eleitoral de 1993 foram despendidos 550.000$00, na
campanha eleitoral de 1997 foram despendidos 3.000.000$00 e na campanha de 2001
foram despendidos 10.000.000$00.
Quando um candidato já é presidente de Câmara, quando se recandidata
normalmente é o último a ser apresentado porque se parte do pressuposto de que se vai
recandidatar (uma vez que a estrutura já está montada).
195
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
É normal que quem se candidata pela primeira vez tenha de se apresentar mais
cedo.
O depoente já foi convidado pelo presidente do PSD para se recandidatar em
2009 às eleições autárquicas.
Os presidentes do PS e do PSD já anunciaram publicamente que estavam
disponíveis para apoiar a recandidatura de presidentes de Câmara.
Referiu, por fim, no que concerne aterros, que a ministra do ambiente de então,
Elisa Ferreira, na inauguração do Aterro de Rio Mau, elogiou a AMVS pelo facto de
não ter existido derrapagens em relação ao orçamentado.
- Testemunha José Alves de Sousa Oliveira
É advogado de profissão e foi casado com a arguida Fátima Felgueiras até
meados de 1999, tendo a respectiva acção de divórcio por mútuo consentimento sido
proposta em meados de 1998 (a separação de facto deu-se porém em meados de 1997,
quando o depoente saiu da casa-de-morada de família).
Nas eleições de 1993 o depoente foi candidato à presidência da Assembleia
Municipal de Felgueiras, tendo sido o depoente quem fez a respectiva lista (pelo PS)
para esse órgão, tendo incluído nela o arguido Joaquim Freitas.
Quem tinha a responsabilidade pela composição da lista para a CMF era o
candidato à presidência.
Em 1995 a IGAT fez uma inspecção ao município felgueirense e nessa altura o
depoente era o presidente da assembleia municipal.
Até 1995 o arguido Joaquim Freitas andava muito consigo e era visita de sua
casa. Ele era capaz de “rastejar” para agradar.
Na segunda parte do seu mandato como presidente da Assembleia Municipal de
Felgueiras o depoente despachava o respectivo expediente no seu gabinete porquanto o
gabinete da CMF que usava para esse efeito foi necessário para nele instalar um serviço
camarário (pensa que foi para instalar o serviço que tratava das contra-ordenações).
A testemunha Sousa Oliveira fez questão de ser ouvido à matéria relativa ao
funcionamento das campanhas eleitorais (apesar de inicialmente nenhuma questão lhe
ter sido colocada acerca desse assunto), o que se concretizou aquando da sua
reinquirição.
Referiu então que desde 1979 que tem conhecimento da dinâmica das
campanhas eleitorais.
O Dr. Machado Matos era advogado e o depoente trabalhou no escritório dele.
Até 1993 nunca foi candidato, mas apoiava sempre as campanhas do PS.
Em 1993 o depoente foi efeito presidente da Assembleia Municipal de
Felgueiras.
Na campanha eleitoral desse ano o depoente ficou encarregue da angariação de
fundos.
Em 1993 existiam um grupo de pessoas donde emergiram os vários grupos.
Foi assim constituído por exemplo um grupo de reflexão.
Os vários grupos tinham autonomia entre si.
Para evitar que as pessoas soubesse da matéria relativa aos dinheiros e porque o
Sr. Silvério (que fazia parte do grupo que recolhia os fundos) era pessoa muito ocupada,
os donativos foram depositados nas contas pessoais do depoente, na CGD, no BES e na
CCAM.
O depoente não abriu assim nenhuma conta para esse efeito.
Não informou o arguido Júlio Faria (candidato nessas eleições à presidência da
CMF) das contribuições que eram dadas para a campanha.
196
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
A si nunca lhe pediram para fazer algum favor como contrapartida em relação a
algum donativo que era concedido, pois todos sabiam que não valeria a pena fazer esse
pedido ao depoente.
Nesse aspecto a arguida Fátima Felgueiras era igual ao depoente, isto é, não era
permeável a pedidos.
Por via de regra o candidato à presidência da CMF não era informado das
contribuições que eram feitas.
As contas da campanha, por seu turno, nada tinham a ver com as contas do
partido.
Em 1997 o arguido Horácio Costa procurou-o uma vez no seu escritório e pediulhe para ver se lhe arranjava uma lista das pessoas que na campanha anterior
concederam donativos e para o informar dos montantes com que contribuíram, pedido
que recusou na medida em que se tratava de matéria reservada.
Lateralmente, referiu que vive na mesma casa que a sua ex-mulher, mas
salientou que fazem vidas completamente separadas (essa alusão foi feita a despropósito
e relaciona-se com o facto do arguido Horácio ter referenciado o facto da testemunha
em causa viver com a arguida Fátima, numa anterior sessão de julgamento em que a
testemunha Oliveira já não estava presente, apesar deste ter assegurado – sem qualquer
credibilidade - não saber o que se passava na sala de audiências).
*
Em face do depoimento da testemunha Sousa Oliveira o arguido Joaquim
Freitas referiu que em 1993 foi o depoente que andou a pedir donativos com essa
testemunha, só não o tendo acompanhado nas visitas a empresas que prestavam serviços
para a CMF.
*
- Testemunha Mário Eurico Pontes Martins
Referiu ser técnico oficial de contas e compadre da arguida Fátima Felgueiras
desde 1992 (ela é madrinha de baptismo do seu filho).
Filiou-se no PS em Fevereiro de 1975. Deixou de ser filiado nesse partido em
2007.
Em 1983 radicou-se em Felgueiras.
Fez parte das comissões políticas e do secetariado.
Desde 1992 até ao presente que é membro da Assembleia Municipal de
Felgueiras.
Em 1997, a nível local, o Secretariado é que detinha o poder executivo e quem
estava à frente dessa estrutura local do PS era o secretário-coordenador. Era ele quem
dirigia a parte executiva do poder no seio do partido a nível local, assegurando tudo
quanto dizia respeito à vida quotidiana do PS em Felgueiras.
A Comissão Política, por seu turno, era o órgão do partido que a nível local
traçava as orientações gerais, reunindo de vez em quando.
Em 1997 a Comissão Política reuniu-se em Junho.
Não fez parte da Direcção de Campanha em 1997, mas era o animador do
partido.
Não havia evento algum que não fosse apresentado por si (“esteve em todas”). O
depoente considera-se um homem da comunicação social, tendo um programa na rádio
local há mais de 20 anos.
Para ilustrar a sua dedicação referiu ter subido aos postes para colocar cartazes.
Nessas eleições o depoente concorreu em número quatro da lista do PS à junta
de freguesia de Margaride.
197
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Não existe a tradição da candidata à presidência da CMF fazer parte da direcção
de campanha.
O principal responsável (como coordenador) da direcção de campanha em 1997
foi o arguido Júlio Faria.
Os pelouros foram criados da forma habitual (criaram-se os pelouros dos
eventos, das finanças e da logística).
As pessoas ofereciam-se para integrar os diferentes pelouros, sendo certo que o
depoente ofereceu-se para integrar o pelouro dos eventos (liderado pela arguida Maria
Augusta).
A testemunha Vítor Sousa pertencia à direcção de campanha e parece que estava
ligado a actividades jornalísticas. Ele era avençado na CMF e integrava ali o Gabinete
da Comunicação.
O pelouro das finanças, por seu turno, foi integrado pelos arguidos Horácio
Costa e Joaquim Freitas e pela testemunha Dinis.
O arguido Horácio Costa não era filiado no partido, tendo na altura perguntado
quem ele era, pois não o conhecia. Veio então a saber que ele era cunhado do arguido
Bragança e irmão de Orlando Costa, o qual, à data, era membro da Assembleia
Municipal de Felgueiras (e irmão de uma funcionária da CMF). Disseram-lhe que o
arguido Horácio Costa trabalhava para os lados do Centro Coordenador de Transportes.
O depoente vai poucas vezes à CMF, sendo certo que nunca viu o arguido
Horácio na área política, nem sequer quando ele foi vereador, pois eram as secretárias
que o atendiam (nunca o viu no GAPP). Nunca o depoente conheceu os gabinetes dos
assessores e dos vereadores da CMF.
Ignora quem o convidou para trabalhar na CMF, nem sabe quais as funções que
ele ali exercia.
Mesmo antes de entrar na política a arguida Fátima Felgueiras era a grande
referência cultural do concelho.
Só a ouvia tratar por “tu” o arguido Pereira (nunca a ouviu tratar por “tu” o
arguido Horácio Costa. Segundo imagina, pois nunca a viu dirigir-se a ele, deveria tratálo normalmente, isto é, por “você”).
Nunca a viu envolvida na angariação de fundos. Os candidatos não têm
interferência seja em que pelouro for. A candidata tem de se preocupar com a
mensagem política e de contactar com as pessoas.
Quem reunia com os pelouros era a direcção de campanha. A arguida Fátima
estava presente nas reuniões gerais (com todos os pelouros), não tendo conhecimento
dela se reunir com este ou aquele pelouro.
Existia também um pelouro da comunicação, mas era o secretariado que tratava
dessa área.
Nunca viu os arguidos Horácio e Joaquim Freitas prestarem contas à arguida
Fátima Felgueiras.
Era a candidata à presidência da CMF quem escolhia a sua equipa, assim como
competia ao candidato à presidência da assembleia municipal escolher os elementos
para a respectiva lista, pois a comissão política dava liberdade para tal, pese embora
tivesse de ratificar as listas.
As relações entre os arguidos Bragança e Fátima Felgueiras nunca foram boas.
Foi o depoente quem sugeriu à arguida Fátima que deveria candidatar-se à CMF.
Em 1997 aliás o PSD andava atrás dela para ser a sua candidata.
O arguido Horácio Costa apareceu em quinto lugar da lista para a CMF e não
percebeu esse facto. Interpelaram a arguida Fátima acerca desse assunto e ela disse-lhe
que tinham existido pressões nesse sentido por parte do arguido Bragança, o qual queria
198
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
ser o número dois da lista (cfr. o depoimento da testemunha Augusto Coelho Faria,
presidente da junta de freguesia de Idães). Em 1989 ele tinha sido candidato a
presidente da junta de freguesia de Margaride e havia perdido. Foi ele quem angariou
muitos militantes para o PS.
Havia a tradição do PS eleger quatro elementos (pelo que o quinto elemento em
princípio não seria eleito).
O depoente não esteve presente na reunião onde foram apresentadas as listas de
candidatos.
Os arguidos Horácio e Joaquim Freitas não andavam contrariados na recolha de
fundos. As pessoas contrariadas no PS afastavam-se. Ninguém no PS anda às ordens na
medida em que só existem voluntários.
A arguida Fátima, por seu turno, nunca se deixava mandar por quem quer que
seja e nunca dizia “nim”.
Normalmente é o presidente da comissão política que é o candidato à
presidência da CMF, mas nem sempre foi assim (o Dr. Machado Matos era
independente e o arguido Júlio Faria também no primeiro mandato).
*
Em face destas declarações o arguido Horácio Costa referiu que a testemunha
Mário Martins nunca esteve presente em qualquer reunião em que o depoente esteve
presente.
Constava-se que ele era funcionário de uma empresa de uma cunhada que “dava
rédea curta” aos funcionários e era por isso que ele tinha pouca disponibilidade.
Numa primeira fase era o arguido António Pereira quem animava os eventos e
só mais tarde é que a testemunha Mário Martins passou a animar os eventos.
Ele tinha tão pouca disponibilidade que mesmo nos eventos ele chegava em
cima da hora (a ponto de se colocar o problema de não saberem se ele iria aparecer ou
não), sendo certo que o arguido Bragança entregava-lhe então o guião uns minutos antes
de se iniciar o evento (guião esse que estava na posse do arguido Bragança na CMF).
Aliás, só porque a testemunha em causa não tinha disponibilidade é que foi outra
pessoa quem fez a gravação de uma mensagem da arguida Fátima para ser divulgada
nos carros de som.
Em 1997 ele nunca colocou qualquer panfleto e cartazes, ao contrário do que
disse. O depoente pagou 1.000 cts pela realização desse serviço.
Não compreende como é que a arguida iria ceder a pressões do arguido
Bragança. Ironizou que ele tinha tanto poder no PS local que nem sequer conseguiu
fazer-se incluir na lista para a CMF.
O depoente andava bem disposto porque à data não tinha motivos para pensar
que iria ter problemas.
Pelo menos uma vez a testemunha em causa foi ao seu gabinete na CMF
acompanhado do arguido Joaquim Freitas. Este disse-lhe que ele vinha da parte da
arguida Fátima Felgueiras e explicou-lhe que estava em causa o pagamento das horas
que ele perdia pela animação que fazia, sendo certo que ele tinha tomado conhecimento
de que se tinha gratificado outros colaboradores (pelo que também queria uma
gratificação). Colocou o problema à arguida Fátima, mas a pretensão dele não foi
satisfeita, pois ela disse que as pessoas deveriam andar no PS sem qualquer interesse, o
que deixou muito agastada a testemunha Martins.
Há figuras que só se acercaram da arguida Fátima quando se sabia que ela seria
a vencedora, entre os quais a testemunha em causa.
*
199
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
A testemunha Mário Eurico Pontes Martins mostrou-se então estarrecido com
as declarações proferidas pelo arguido Horácio Costa, negando que alguma vez tenha
estado com o arguido Joaquim Freitas na CMF.
Apodou de atroz mentira o facto do arguido Horácio ter referido ao tribunal que
o depoente pretendia ser gratificado pela sua acção desenvolvida na campanha eleitoral
de 1997, tendo salientado o seu espírito altruísta, pois nunca levou dinheiro a ninguém,
sempre tendo feito tudo de borla.
Em 1997 de facto “não trepou aos postes” para colocar cartazes, mas fê-lo em
campanhas anteriores.
É falso que o arguido Bragança lhe tenha entregue qualquer guião referente a
qualquer evento que tenha apresentado.
Reafirmou que esteve “em todas”. Fez por exemplo a apresentação da
candidatura da arguida Fátima e era a sua voz que se ouvia difundida pelos carros de
som.
- Testemunha Manuel Tomás Cortez Rdrigues Queiró
Foi secretário-geral do CDS.
Referiu que o arguido Júlio Faria é casado com uma prima da progenitora do
depoente.
O arguido Júlio Faria exerceu as funções de presidente da CMF, presidente da
Assembleia Municipal de Felgueiras e deputado na Assembleia da República (eleito
pelo círculo eleitoral do Porto).
As associações municipais têm muito pouco poder e a fiscalização que exercem
é necessariamente política, já que a Câmara é que detém o real poder.
A associação de municípios normalmente tem poderes delegados dos municípios
associados e as decisões que toma não podem ultrapassar os municípios.
O depoente já fez a constituição da lista de candidatos para a Assembleia da
República com o Professor Freitas do Amaral (na altura presidente do CDS).
Há lugares elegíveis e outros que apenas são incluídos para fazer número. A
disputa dos lugares elegíveis é muito grande e só as cúpulas partidárias é que decidem.
Isto é, ninguém, de per si, decide ser candidato numa posição da lista elegível, pois tal
depende de decisão das direcções nacionais dos partidos.
A composição das listas depende da negociação entre as direcções distritais e a
direcção nacional dos partidos. Há mais abertura nos partidos maiores.
A palavra final é assim sempre do órgão nacional, em particular do líder do
partido.
A esse nível as concelhias não têm qualquer poder.
Em face do que já referiu no que se refere à composição das listas, entende que
em 1993 seria difícil (senão impossível) que o arguido Júlio Faria já perspectivasse a
sua inclusão nas listas do PS para a Assembleia da República, na sequência das eleições
legislativas ocorridas em 1995, e muito menos que perspectivasse a sua inclusão nessa
lista num lugar elegível.
Só no último momento é que se decide a composição das listas.
As eleições locais, por seu turno, são descentralizadas e muito personalizadas
nos candidatos e, assim, muito dependentes da lógica local, factores que se reflectem no
respectivo financiamento.
Há uma contabilidade nacional do partido, o qual fornece material de apoio a
nível nacional, mas também há material específico de cada concelho.
A contabilidade local tem mais relevância nas eleições autárquicas (facto que é
mais evidente nos pequenos partidos).
200
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
O depoente já foi o candidato do CDS à CMF em 2001 (numa altura em que o
arguido Júlio concorreu à presidência da Assembleia Municipal de Felgueiras) e 90% do
financiamento da campanha eleitoral reportou-se a financiamento local (na sua
campanha foram despendidos mais de 10.000 cts, tendo prestado contas ao CDS).
Isto também é válido no que se refere aos outros partidos.
Grande parte do seu tempo foi despendido na angariação de fundos para a
campanha eleitoral, tendo visitado para o efeito as indústrias locais, visitando as pessoas
do costume e outras pessoas que lhe foram indicadas, tendo para o efeito elaborado uma
lista alagrada. Se o depoente não se deslocasse pessoalmente no sentido de pedir
donativos seria difícil obtê-los. Às vezes referiam-lhe que já tinham concedido
donativos a outros partidos (PSD e PS).
Revelou que programou despesas sem ter as receitas asseguradas, tendo assim
ficado com um déficit.
Explicou que quem parte à conquista de uma posição perdida não pode prometer
nada.
Ignora como é que se procede no PS e no PSD, mas segundo lhe parecia os
efeitos práticos eram os mesmos.
Nas eleições autárquicas existem 308 lógicas diferentes, tantas quantos os
municípios existentes no nosso país.
A angariação de fundos pelo depoente não era propriamente um acto de
campanha. Se fosse eleito presidente da autarquia e se recandidatasse não consegue
especular se o seu procedimento seria o mesmo quando ao método de angariação de
fundos.
O arguido Júlio Faria foi presidente da autarquia felgueirense numa altura de
grande explosão urbanística no concelho, pelo que ele ficou ligado a muitas obras.
O depoente foi campeão nacional de natação. Recorda-se assim da construção da
Piscina Municipal de Felgueiras.
Foi porta-voz do CDS na Assembleia da República para a área do ambiente e
não lhe passou despercebida a construção das ETAR em Felgueiras.
- Testemunha Pedro Luís da Rocha Baptista
É membro da concelhia política do PS do Porto.
Entre 1993 e 1997 foi deputado municipal na Assembleia Municipal do Porto.
Foi deputado do PS na Assembleia da República entre 1995 e 1999. Foi adjunto
da direcção parlamentar entre 1999 e 2001.
Uma Câmara é basicamente um órgão executivo.
A assembleia municipal tem um papel essencialmente fiscalizador.
As associações de municípios, por seu turno, existem para defender interesses
supra-municipais, dada a falta de regiões administrativas.
Nunca há uma grande antecedência no que respeita às decisões relativas à
composição das listas de candidatos. A tendência é para deixar para a última hora a
tomada das decisões dolorosas, ao ponto de muitas vezes tais decisões serem tomadas
no último dia disponível para a apresentação das listas.
As pessoas podem fazer os seus cálculos na sua intimidade para alcançar
determinados objectivos, mas a política é muito volúvel.
A decisão pertence à comissão política distrital e ao secretário-geral do PS (o
qual tem direito a indicar 30% da lista).
Não sabe quando é que o arguido Júlio Faria foi convidado para integrar a lista
dos candidatos do PS à Assembleia da República no que se refere às eleições
legislativas de 1995.
201
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
O depoente foi convidado duas ou três semanas antes da respectiva apresentação
para integrar essa lista (tendo ficado posicionado num lugar entre o 20º e o 30º dessa
lista, sendo certo que o arguido Júlio Faria ocupava um lugar um pouco melhor
posicionado em relação ao lugar ocupado pelo depoente).
Tem a certeza que com mês e meio/dois meses antes da respectiva apresentação
ninguém esboçou a composição dessa lista
É costume a eleição de um deputado pelo Vale do Tâmega.
Não sabe se alguma vez havia sido eleito um deputado de Felgueiras.
O presidente da Federação Distrital faz um esboço da lista e faz contactos tendo
em conta o critério de qualidade dos candidatos e a representatividade, na medida em
que há a tradição de sub-regiões terem deputados eleitos.
Nas eleições legislativas tudo se passa ao mais elevado nível do partido.
É fornecido o material de campanha e é o partido (quer a estrutura nacional quer
a estrutura distrital) que assume a responsabilidade pelo pagamento das despesas de
campanha.
O candidato é quase anónimo.
Nas eleições autárquicas tudo se passa de modo diferente.
Nas eleições de 1997 o depoente foi o candidato do PS à Câmara Municipal de
Gondomar, tendo apenas sido eleito vereador.
Assim, em Gondomar, nessa altura, foi criada uma comissão de fundos, tendo
afastado a pessoa que nas anteriores eleições havia angariado os fundos para a
campanha eleitoral, o qual, por esse facto, apelidou de Nazi o depoente. Afastou-o
mesmo antes de existir uma direcção de campanha e fê-lo porque queria que fosse um
grupo a angariar os fundos e porque o indivíduo em causa não lhe merecia confiança no
que respeita à sua seriedade em face das informações que dele obteve.
O depoente nunca mexeu num tostão. Certa vez alguém lhe disse que queria
contribuir e remeteu-o para o grupo que recolhia os fundos, de modo a que mais tarde
não se sentisse condicionado se fosse eleito.
Essa comissão de recolhe de fundos era autónoma em relação ao PS.
Não sabe se essa comissão abriu alguma conta bancária, mas presume que sim
na medida em que receberam donativos em cheque e passaram recibo.
Recolhia-se fundos a nível local.
Existiam verbas a nível nacional para auxiliar o esforço das campanhas a nível
local.
Uma das condições que colocou para ser candidato à presidência da CMG foi a
de lhe terem garantido na Federação Distrital do PS que havia dinheiro para o apoiar.
Tem porém a certeza que a comissão de angariação de fundos não angariou o
montante necessário para fazer face às despesas de campanha (as quais rondaram os
10.000 cts, facto que só soube à posteriori e de modo vago; houveram porém despesas
que a Federação Distrital do PS pagou directamente a empresas de publicidade e cujo
montante desconhece).
Esse grupo de angariação de fundos prestou contas ao seu número dois, o qual
por sua vez prestou contas à Federação Distrital do PS.
Por via de regra a contabilidade da campanha autárquica é autónoma da
contabilidade do partido.
Quanto mais distante do dinheiro melhor para o candidato pela razão que
apontou.
Não conhece qualquer sede concelhia que esteja registada em nome do PS
nacional (a sede do Porto do PS está em nome do partido). Referiu não saber por que
razão isso sucede.
202
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
O depoente ainda era deputado quando foi convidado pela arguida Fátima
Felgueiras no âmbito de questões que se prendiam com a natação, pois ela tinha um
projecto de criação em Felgueiras de um pólo de natação (o que implicava a construção
de uma piscina olímpica) e o depoente disponibilizou-se para tentar sensibilizar o
Governo de então para apoiar esse projecto.
Veio várias vezes a Felgueiras assistir a simpósios e nessas alturas encontrava-se
com ela.
A nível partidário nunca teve com ela qualquer relação.
Quem manda nos partidos a nível concelhio é a Comissão Política respectiva e o
presidente dessa comissão é pessoa influente.
Existe também um secretariado da comissão política.
O exercício do poder a nível local depende muito das personalidades que
compõem os órgãos locais do PS.
As comissões políticas é que criam as comissões de campanha.
As decisões mais importantes têm de passar pela comissão política local.
O Secretariado, por seu turno, é o órgão executor.
*
A arguida Fátima Felgueiras, em face destas declarações, referiu que
Felgueiras tem uma única secção do PS, tem um secretariado e uma comissão política.
A Comissão Política é o órgão superior em termos de estratégia política, mas
quem manda é o secretário-coordenador e não o presidente da comissão política local,
no que se refere ao dia-a-dia do partido. É ele quem faz a filiação dos miliantes por
exemplo, sendo certo que a comissão política reúne poucas vezes.
*
A testemunha Pedro Luís da Rocha Baptista referiu então que o poder
executivo é do secretariado.
A Comissão Política é o órgão deliberativo e reúne no mínimo de três em três
meses. É fundamentalmente um órgão de debate político.
O Secretariado é que decide as questões do dia-a-dia do partido e reúne todas as
semanas.
O secretário-coordenador tem um papel preponderante do ponto de vista
executivo.
*
O arguido Horácio Costa, por seu turno, a propósito do financiamento do
partido, chamou à colação o artigo de opinião da testemunha Pedro Baptista, publicado
na edição de 12.10.2001 do “Comércio do Porto” (cfr. documento de fls 14730 e
14731), onde então expressava uma opinião diversa da que transmitiu ao Tribunal.
*
- Testemunha Luís da Costa Lima
Sempre residiu em Felgueiras e exerceu alguns cargos políticos.
Foi membro da Assembleia Municipal de Felgueiras de 1996 até 2005.
É vereador da CMF (eleito nas listas do PSD) desde 2005.
Foi vogal do Conselho Fiscal da CCAM entre 1998 e 2000 (ao que pensa).
Foi presidente do Conselho Fiscal do FCF durante duas épocas desportivas (tem
a ideia que por volta dos anos 2000 e 2001).
Referiu que a oposição estaria atenta a eventuais ilegalidades cometidas pelo
Executivo camarário e não se recorda de nada desse género que envolva a lixeira de
Sendim.
Não tem a certeza se a questão da lixeira foi ou não discutida na Assembleia
Municipal de Felgueiras.
203
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Quando a lixeira era um problema era natural que a oposição chamasse esse
assunto à colacção, mas não se recorda desse problema ter sido abordado por causa de
eventuais ilegalidades.
As populações da freguesia de Sendim reclamaram por causa da existência da
lixeira e dos problemas que causava, sendo certo que a respectiva junta de freguesia tem
recebido compensações por ter a lixeira instalada naquele local (tem uma bonificação).
A oposição (PSD, CDS e CDU) censurava a CMF por não tomar medidas no
que se refere aos problemas criados pela lixeira, na altura em que se tratava de uma
lixeira a céu aberto, onde eram indiscriminadamente depositados os resíduos urbanos e
industriais (sobretudo provenientes da indústria do calçado), resíduos esses que
frequentemente entravam em combustão, provocando fumos espessos e cheiros, o que
era prejudicial para a saúde, sobretudo para quem estava mais próximo desse local.
À pergunta efectuada no sentido de se saber se em 1996, quando a testemunha
entrou para a Assembleia Municipal de Felgueiras, esse assunto ainda era discutido, e se
nessa altura a lixeira já estava controlada, apenas respondeu que tal era provável,
acabando por referir não se recordar em que época os problemas relacionados com esse
assunto foram levantados na assembleia municipal, admitindo que essas questões
tivessem sido levantadas antes de nela ingressar.
*
Em face destas declarações, o arguido Júlio Faria referiu que a testemunha Luís
Lima foi de facto membro da Assembleia Municipal de Felgueiras e que a questão da
lixeira foi anterior ao ingresso da testemunha em causa nesse órgão autárquico, pois
remonta a 1993.
Especulou que a testemunha tenha conhecimento dessa questão enquanto
dirigente político do PSD local.
*
A testemunha Luís Lima, por seu turno, referiu que foi presidente da concelhia
local do PSD em 2000, sendo certo que antes de 2000 não exercia qualquer cargo no
PSD local. Porém, era militante desse partido.
Assim, admite que tenha ouvido as discussões em torno da lixeira na Assembleia
Municipal de Felgueiras antes de nela ter ingressado, já que as sessões são públicas e o
depoente assistiu a algumas sessões, além de que essas questões eram dicutidas em
reuniões do seu partido (existiam reuniões mais restritas e outras mais alargadas).
- Testemunha José Joaquim Almeida Lopes
Referiu ser juiz conselheiro (do STA) jubilado e parente em 6º grau da arguida
Fátima Felgueiras (o pai dela era primo da sua mãe).
A arguida Fátima nasceu no Brasil e veio viver para Portugal aos 4 anos de
idade.
Assim, desde criança que convive com ela, sendo muito amigos.
Conheceu a testemunha Sousa Oliveira em Coimbra, na faculdade. Foi a arguida
Fátima quem o apresentou (na altura namoravam). Desde então sempre foram muito
amigos.
Ambos depositavam em si muita confiança.
A sua prima Fátima disse-lhe que desconfiava que tinha sido o arguido Horácio
Costa quem tinha enviado a carta anónima que despoletou este processo (ele tinha sido
assessor dela e depois verador na CMF).
A arguida Fátima Felgueiras viu-se aflita com o que dela se dizia na
comunicação social.
204
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Telefonou assim muitas vezes ao depoente para lhe pedir esclarecimentos acerca
de dúvidas que ela lhe expressava. Nessa altura foi uma espécie de conselheiro jurídico
dela.
Aconselhou-a a não falar com a comunicação social (“cala, reza e sofre”), mas
ela não conseguia manter-se calada e procurava defender-se.
Em Agosto de 2000, no Mindelo, cerca das 22 horas, foi ter à casa de férias do
arguido Joaquim Freitas para lhe falar acerca desse assunto.
Deu um passeio com ele e conversaram durante cerca de uma hora/hora e meia
(entre as 22 e as 23/23.30horas).
O depoente, quando leu a primeira carta anónima, desconfiou logo que por
detrás de tudo isto estivessem razões do foro sentimental.
Assim, perguntou ao arguido Joaquim Freitas a razão de tudo isto, porque é que
era amigo da arguida Fátima e porque motivo agora se voltava contra ela e ele abriu-se
todo com o depoente, tendo-lhe contado tudo.
Disse-lhe que estava profundamente apaixonado pela arguida Fátima Felgueiras
há já muito tempo e que tentou ter com ela um relacionamento amoroso, que ela sempre
recusou.
Sintomático disso foram os episódios que ele lhe contou:
- Certo dia, ele procurou a arguida Fátima em casa desta, às 3 horas da manhã,
num fim-de-semana, numa altura em que ela estava sozinha (nessa altura já a
testemunha Sousa Oliveira tinha saído de casa e a arguida Fátima andava com o filho
João para todo o lado, com excepção do fim-de-semana, que o João passava com o pai).
A arguida Fátima atendeu-o e ele perguntou-lhe se ela estava sozinha ao que ela,
mentindo-lhe, disse que estava com o João, tendo-se então ido embora o arguido
Joaquim.
- Certo dia os autarcas foram para o Algarve e hospedaram-se no mesmo hotel.
O arguido Joaquim Freitas estava presente e a arguida Fátima fazia-se acompanhar pelo
João.
O arguido Joaquim pensava que o João estava alojado noutro quarto (porém
estava alojado no mesmo quarto que a mãe), pelo que ele bateu-lhe à porta, mas como
ela estava com o filho ele desistiu dos seus intentos naquele dia.
- Certo dia, encontrando-se a sua prima Fátima em Lisboa, o arguido Joaquim
Freitas deslocou-se à capital e andou atrás dela por todo o lado. Ela regressou com o
arguido Júlio Faria na viatura deste e na A1 o arguido Joaquim, ao volante da sua
viatura, pôs-se ao lado da viatura em que eles seguiam durante alguns quilómetros.
- Certo dia, em Lisboa, estavam os arguidos Joaquim Freitas, Júlio Faria, Fátima
Felgueiras e os seus dois filhos (e ainda outras pessoas) num estabelecimento de
restauração quando os ditos Júlio Faria e Fátima Felgueiras ausentaram-se, o que o
deixou furioso com os ciúmes.
- Certo dia o arguido Joaquim Freitas combinou jantar com a arguida Fátima no
“Hipanema Park Hotel”, no Porto. A ideia dele era “dormir” com ela no Hotel depois do
jantar. Porém, ela não compareceu. Passado uma hora ele telefonou-lhe e ela disse-lhe
ele “andava muito enganado”.
Na conversa que teve com o arguido Joaquim Freitas o depoente notou-lhe os
ciúmes doentios e ele julgava que por ser filho de um rico industrial de Felgueiras tinha
direito a ter a primeira dama.
Ele revelou-lhe que não tinha contado a verdade à PJ acerca do “saco azul”.
Disse-lhe que a arguida Fátima apenas sabia que eram eles (Joaquim e Horácio)
quem angariavam os fundos para a campanha eleitoral e que os depositavam, mas que
não sabia quanto tinham, sendo certo que ela não se interessava por dinheiro.
205
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Disse-lhe que queriam tirá-la da presidência da CMF.
Disse então ao arguido Joaquim Freitas que os factos de que a arguida Fátima
era acusada constituíam crime e que podiam dar cadeia por muitos anos e que dessa
forma eles também se incriminavam.
Desafiou-o então a colocar por escrito o que lhe dissera, a fim de ser revelado à
comunicação social, o que ele assentiu mas apenas na presença da arguida Fátima
Felgueiras.
Sugeriu então um encontro entre ambos.
Sugeriu-lhe igualmente que ele se fizesse acompanhar de um advogado, ao que
ele lhe retorquiu dizendo que confiava no depoente e na arguida Fátima.
Ele aliás referiu-lhe que havia consultado o Dr. Proença de Carvalho e que tinha
gasto muito dinheiro.
O depoente na altura não tinha telemóvel (só em 2000 é que adquiriu um) e por
esse motivo pediu para usar o telemóvel do arguido Joaquim a fim de telefonar à
arguida Fátima de modo a combinarem o encontro, o que ele acedeu.
Ele sugeriu um jantar com os três no “Hipanema Park Hotel”, no Porto, e que
pagava a despesa.
O depoente falou então com a “Fatinha”, tendo-lhe contado o sucedido e
sugeriu-lhe que combinassem então um jantar. Ela respondeu-lhe que “não queria nada
com ele”. O depoente, porém, aconselhou-a a ceder, ao que ela lhe respondeu que iria
pensar no assunto. Disse-lhe então que o arguido Joaquim lhe iria telefonar no dia
seguinte, altura em ela lhe daria a sua resposta.
Combinou com o arguido Joaquim Freitas que este passaria por sua casa, indo
assim juntos ao dito jantar (pelas 20 horas), sendo certo que a arguida Fátima iria
directamente para o hotel.
Porém, no dia seguinte, o depoente aguardou em vão em sua casa que o arguido
Joaquim Freitas comparecesse, o que não sucedeu. Jantou por isso em casa. Cerca das
22 horas o depoente passou por casa do arguido Joaquim Freitas e questionou-o por que
motivo não tinha aparecido, ao que ele lhe respondeu que a arguida Fátima lhe havia
dito para assumir as suas responsabilidades e que ela assumiria as suas, não querendo
nada consigo, tendo-lhe desligado o telefone, o que deixou triste o dito Joaquim Freitas.
Disse ao Joaquim Freitas que se calhar ela tinha feito bem em recusar o convite,
pois colocou a hipótese do arguido Joaquim Freitas levar consigo elementos da PJ para
os apanhar. Ele disse-lhe que se davam bem (ele e o arguido Horácio) com os
inspectores da PJ e que até já tinham almoçado e jantado com eles. Referiu-lhe ainda
que tinham o “estatuto de arrependidos”, ao que o depoente o avisou para não estarem
seguros de que não iriam ser responsabilizados criminalmente.
Ele disse-lhe ainda que a PJ andava “a reboque” do arguido Horácio Costa.
O arguido Joaquim pediu-lhe ainda para telefonar à arguida Fátima no sentido
de a convencer a encontrar-se com ele, mas como ela nunca quis nada com ele tudo
ficou sem efeito.
Mais tarde o arguido Joaquim contou à PJ a conversa que tiveram e eles
distorceram tudo. Desde então o depoente foi também visado no inquérito.
Na sequência do facto do Dr. Artur Marques, em entrevista ao “24 Horas”, em
2004, ter dito que o depoente seria testemunha, foi profundamente incomodado, tendo
então sido transcritas escutas telefónicas que lhe fizeram em 2000/2001 e cuja
destruição havia sido determinada pelo JIC, falsificando autos de transcrição (ao que
presume foram arrancadas folhas validadas pelo JIC e colocaram no seu lugar outras
folhas), o que aliás é demonstrado pela qualidade com que o depoente é identificado
nesses autos de transcrição (o depoente à data não tinha essa qualidade).
206
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Foi remetida uma certidão pelo MP à Procuradoria-geral da República para
procedimento criminal contra o depoente, mas que foi arquivado liminarmente por não
haver qualquer matéria que justificasse a abertura de um inquérito.
As ditas escutas foram divulgadas nos jornais, o que lhe acarretou sérios
problemas.
Já na instrução a JIC mandou extrair certidão dessas escutas a fim de serem
remetidas ao CSM para eventual procedimento disciplinar, o qual acabou por ser
arquivado na medida em que é claramente inconstitucional a utilização de escutas
telefónicas em sede de procedimentos disciplinares.
O seu sistema nervoso “rebentou” e a sua carreira terminou, razão pela qual se
jubilou.
Os elementos que recolheu a propósito deste processo foram recolhidos quer no
processo crime de que foi alvo quer no procedimento disciplinar referido.
O depoente prestou depoimento na acção de perda de mandato instaurado contra
a arguida Fátima Felgueiras.
O arguido Joaquim Freitas andava por todo o lado, na sua viatura, com a arguida
Fátima na campanha eleitoral de 1997 e à data eles eram muito amigos.
De uma paixão que ele sentia por ela passou a nutrir-lhe ódio.
Em relação ao arguido Horácio Costa sempre desconfiou que também poderiam
estar na base da respectiva actuação razões de ordem sentimental, mas o arguido
Joaquim Freitas contou-lhe que ele se desentendeu com a arguida Fátima num
restaurante a propósito de uma deliberação da CMF que iria ser tomada no sentido de
apoiar o FCF com um subsídio, o que ele discordava; como ele disse que iria votar
contra ela dirigiu-lhe palavras desagradáveis, pelo que ele se terá sentido humilhado,
passando a detestá-la.
Notava-se que o arguido Joaquim tinha medo do arguido Horácio.
Recorda-se do arguido Joaquim lhe ter mostrado uma tablete de calmantes que
trazia no bolso, dizendo que os andava a tomar.
A arguida Fátima contou-lhe que tinha sido professora de Inglês do arguido
Horácio Costa e que o tinha trazido para assessor dela na CMF e que ele nutria uma
paixão por ela.
Disseram-lhe aliás que o arguido Horácio Costa se tinha gabado de ter ido para a
cama com a arguida Fátima Felgueiras, facto que lhe pareceu descredível.
A sua prima disse-lhe que ele era um assesssor dedicado e que mais tarde ele
assumiu a função de vereador.
*
Em face destas declarações, o arguido Horácio Costa referiu que não foi o
depoente quem elaborou a carta anónima referida.
Nos seus depoimentos à PJ nunca mentiu, nem nunca sentiu motivos de
arrependimento.
Sempre teve muito respeito pela arguida Fátima Felgueiras enquanto mulher,
desde a altura em que de facto foi aluno dela.
Nutriu por ela simpatia, negando terminantemente ter alguma vez sentido
qualquer espécie de paixão por ela.
Já na sessão de julgamento em que viria a ser inquirida a testemunha Guilherme
Pinto, relembrou ainda o arguido Horácio Costa que a testemunha Almeida Costa
declarou ao tribunal que o depoente teria agido por vingança.
A esse propósito, esclareceu que moveu um processo-crime contra a arguida
Fátima por difamação, sendo certo que numa carta enviada a António Pereira – chefe de
finanças de Amarante, transcreveu as declarações prestadas pelo dito juiz conselheiro
207
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
nesse processo-crime, em que referia que esse senhor lhe tinha contado que ouvira o
depoente a gabar-se de ter ido para a cama com a arguida Fátima Felgueiras. Remeteulhe assim a dita carta para que o dito António Pereira se explicasse, isto é, se confirmava
ou não ter relatado algum episódio do género ao dito Almeida Lopes (cfr. documento de
fls 14740 e o respectivo aviso de recepção, constante de fls 14741).
Porém, não recebeu qualquer resposta, nem por ele foi recebido na Repartição de
Finanças de Amarante, apesar de ali se ter deslocado com o intuito de dele obter
esclarecimentos.
Para ilustrar o facto de nunca ter agido movido por sentimentos de vingança,
referiu que no Verão de 2005 foi contactado pelo arguido Jaoquim Freitas, o qual lhe
pediu para falar com uma pessoa muito próxima da arguida Fátima, a sua filha Sandra
Felgueiras. O depoente acedeu, tendo-se encontrado com ela num hotel em Guimarães.
Ela explicou-lhe então que a sua mãe queria regressar a Portugal do Brasil e
candidatar-se à presidência da CMF e que ela tinha garantias de que poderia regressar
para responder neste processo e que, nesse contexto, era importante que o depoente se
mantivesse em silêncio, de modo a não prejudicar a candidatura dela.
Transmitiu então à Sandra Felgueiras que nada de pessoal lhe movia contra a
arguida Fátima Felgueiras, que não frequentava Felgueiras e que não tinha qualquer
ambição política, pelo que seria na Justiça que o problema se resolveria, razão pela qual
não manteria com a arguida Fátima qualquer conflito nesse período de tempo, desde que
não fosse provocado.
Esta postura do depoente levou a que outras pessoas procurassem confrontar-se
com o depoente e com o arguido Joaquim Freitas, pois não queriam que a arguida
Fátima ganhasse as eleições autárquicas de 2005.
Foram assim atacados de todos os lados, acusando-os de irem mentir à Justiça e
de ascender com a arguida Fátima ao poder.
O facto de ter prometido à Sandra Felgueiras que se manteria em silêncio no
período eleitoral demonstra que não agiu com qualquer intuito vingativo.
A Sandra Felgueiras confidenciou-lhe que uma jornalista e namorada do José
Sócrates e que este já tinham diligenciado para que não houvesse qualquer problema
com o regresso da arguida Fátima Felgueiras.
*
O arguido Joaquim Freitas, por seu turno, reafirmou o teor da conversa que
teve com a testemunha Almeida Lopes conforme já tinha relatado ao tribunal.
Assegurou que nunca esteve apaixonado pela arguida Fátima Felgueiras e que
“tem vergonha de ser português” em face do que ouviu da boca da testemunha em
causa.
*
Já a arguida Fátima Felgueiras referiu ter ouvido pela primeira vez da
testemunha Almeida Lopes que o arguido Joaquim Freitas nutria por si uma paixão, mas
não duvida que ele lhe tenha contado falsamente esse facto.
Acrescentou que pouco tempo depois de ter visto os arguidos Horácio e Joaquim
na televisão numa entrevista que concederam, o Sr. Clemente Freitas (pai do arguido
Joaquim), que sempre havia apoiado a depoente, pediu-lhe uma entrevista na CMF,
tendo acedido, apesar de ter hesitado em concedê-la. Recebeu-o e ele cambaleava e
chorava, pedindo-lhe desculpa pelo comportamento do filho, mas que eram uma chatice
as questões de amor. Foi a primeira vez que lhe passou pela cabeça que o arguido
Joaquim Freitas, com a sua disponibilidade e simpatias, pudesse nutrir por si uma
paixão, o que a deixou perplexa. Ele tinha aliás reacções infantis (ele era “uma criança
num corpo de homem”).
208
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
O arguido António Pereira contou-lhe que o arguido Joaquim Freitas lhe
confidenciara que se tinha metido com um familiar e não tem dúvidas que é mentira o
que contara àquele arguido.
- Testemunha Guilherme Manuel Lopes Pinto
Referiu que se recorda de ter estado com o arguido Horácio Costa em duas
ocasiões, uma delas a pedido da testemunha Narciso Miranda, à data presidente da
Federação Distrital do Porto do PS.
A primeira vez que se encontrou com ele foi numa reunião que teve lugar entre a
dita testemunha Narciso Miranda e o arguido Horácio Costa (que se fazia acompanhar
de duas ou três pessoas, cuja identidade já não se recorda, mas pensa que um deles era
membro da comissão política de Felgueiras do PS). Encontrava-se ainda presente, para
além do depoente, um outro elemento da Federação Distrital do Porto do PS. Essa
reunião teve lugar no último trimestre de 1999.
Nessa primeira reunião pretendia-se discutir a situação política criada em
Felgueiras. A ideia era afastar a arguida Fátima Felgueiras da presidência da CMF. A
testemunha Narciso Miranda opunha-se a essa hipótese por entender que não existiam
razões políticas que o justificassem. Mais no final da reunião os elementos de
Felgueiras tentaram entregar à testemunha Narciso um dossier mas este recusou-se a
recebê-lo na medida em que a Federação Distrital não era um órgão jurisdicional e a
reunião em causa era apenas de cariz político.
Explicou que não havia qualquer forma legal do PS afastar a arguida Fátima da
presidência da CMF e foi isso mesmo que tentaram explicar aos elementos de
Felgueiras presentes nessa primeira reunião. Havia também o problema de se saber
como é que a CMF iria ser governada se a arguida Fátima Felgueiras fosse afastada,
pois nesse caso gerar-se-ia grande instabilidade política, sendo certo que nenhum dos
elementos de Felgueiras presentes poderia ascender à presidência da CMF.
Na segunda reunião o depoente reuniu-se com os arguidos Horácio e Joaquim
Freitas, num Sábado, em 2000, no Porto, na Foz (essa reunião antecedeu a cimeira da
presidência portuguesa da União Europeia, cimeira essa que teve lugar em Aveiro em
Janeiro de 2001). Acedeu em reunir com eles na medida em que ameaçavam perturbar
as cerimónias relativas à dita cimeira com uma manifestação.
O depoente reuniu com eles na qualidade de presidente da Comissão de
Jurisdição para analisar os aspectos jurídicos relacionados com um processo disciplinar
que eles queriam que fosse instaurado contra a arguida Fátima Felgueiras (queriam a
sua expulsão do partido).
Explicou que essa reunião teve lugar na Foz na medida em que era um lugar
facilmente identificado por todos.
Viu os documentos que eles traziam, mas não viu grande coisa.
Ficou revoltado quando leu duas notícias de jornal em que se dizia que a reunião
teve lugar junto ao mar para que os documentos a ele fossem lançados pelo depoente (os
arguidos Horácio e Joaquim Freitas manifestaram esse receio ao jornal).
Eles não quiseram deixar-lhe ficar cópia dos documentos que traziam (apenas os
exibiram). Disseram-lhe que esses documentos já tinham sido entregues à PJ. Assim,
por falta de provas, o procedimento disciplinar contra a arguida Fátima não prosseguiu.
Foi entretanto movido um procedimento disciplinar contra os arguidos Horácio e
Joaquim Freitas por difamação da arguida Fátima.
Eles, de facto, recorreram a um órgão jurisdicional do partido e depois não
colaboraram, daí que se partisse do pressuposto de que se tratava de uma difamação.
209
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
O depoente ficou convencido que se tratava de uma tentativa de assalto ao
poder.
Tem a ideia que a medida disciplinar aplicada foi uma repreensão.
Só em data posterior à aplicação dessa sanção é que tomaram conhecimento que
a PJ estava a investigar os factos em causa.
Explicou que nessas duas reuniões os arguidos Horácio e Joaquim Freitas
tiveram uma presença importante, sendo certo que as pressões provinham sobretudo do
arguido Horácio Costa, o qual aliás se mostrava determinado.
Admite que possa ter reunido com eles uma terceira vez, mas não se recorda
desse facto.
*
Em face destas declarações o arguido Horácio Costa referiu que a testemunha
Guilherme Pinto nunca esteve consigo em qualquer reunião e muito menos em 1999.
Só esteve consigo na Foz, à beira-mar, em Junho de 2000. Ele tinha acabado de
chegar do estrangeiro, onde foi assistir a uma partida de futebol, ou da seleccção ou do
F.C. do Porto.
Recorda-se aliás que o foram levar a casa, para os lados do Hospital Pedro
Hispano.
Na altura ele disse-lhe que a arguida Fátima se tinha portado mal porquanto não
compareceu na reunião com o Narciso Miranda e que ela era autoritária.
Reafirmou que em 05.02.2000 teve lugar o jantar nos “Lusíadas”, em
Matosinhos, tendo sido essa a primeira vez que o depoente esteve com a testemunha
Narciso Miranda.
Se tivesse estado com ele em data anterior, as cartas que remeteu ao PS tê-loiam referido (cfr. ponto 4 de fls 5821 – carta de 18.09.2000).
No fax remetido a Jorge Coelho em Maio de 2000 refere-se o mesmo assunto.
Chamou ainda à colação o artigo publicado na “Visão” de 18.10.2001 (cfr.
documento de fls 14732), onde se faz alusão precisamente a essa reunião do dia
05.02.2000 (já na altura a posição do depoente era sempre a mesma).
A cimeira referida pela testemunha Guilherme Pinto ocorreu em Santa Maria da
Feira e não em Aveiro, a qual teve lugar em Junho ou princípios de Julho de 2000, o
que preocupou a testemunha Narciso Miranda porquanto o depoente disse à
comunicação social que iria entregar (na dita cimeira) ao Primeiro Ministro de então
(António Guterres) um dossier sobre esse assunto.
Foi por isso que a testemunha Narciso mandou a testemunha Guilherme
encontrar-se com o depoente e o arguido Joaquim Freitas.
De facto, o depoente tinha um dossier para entregar ao António Guterres na
cimeira referida.
No “Público” de 30.06.2000 noticia-se esse episódio e o encontro com o
depoente em Junho de 2000.
A testemunha Guilherme Pinto, sobre esse assunto, prestou declarações ao
“Comércio do Porto”, edição de 09.10.2001.
Antes desse encontro na Foz o depoente tinha estado reunido com o Renato
Sampaio, onde lhe foi oferecido “tudo e mais alguma coisa” para se calar.
Nega que quisesse “assaltar” o poder, até porque era apenas um vereador há
cerca de 1 ano e era o quinto da lista. Aliás, com que apoios políticos é que poderia
“tomar o poder”?
O depoente prestou declarações no processo disciplinar de que foi alvo, mas não
violou o segredo de justiça em relação ao que tinha contado à PJ e aos documentos que
lhe tinha entregue.
210
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Nunca falou em afastar a arguida Fátima. Ela estava legitimada para estar na
presidência da CMF.
Questiona por que motivo o PS lhe moveu um processo disciplinar por
difamação da arguida Fátima quando esta não fez qualquer queixa-crime contra o
depoente por esse motivo.
Na sequência desse processo disciplinar o depoente foi suspenso por 60 dias
(apesar de não ser militante do PS).
Explicou que desconfiava da testemunha Guilherme Pinto como desconfiava de
toda a gente.
*
A testemunha Guilherme Pinto, por seu turno, reafirmou o que disse.
Admite que um colega seu da comissão de jurisdição inquiriu o arguido Horácio
Costa no âmbito do processo disciplinar que lhe foi movido.
Tem a certeza que uma das reuniões referidas ocorreu antes da cimeira, que
admite ter-se realizado em Stª Maria da Feira, e que a segunda reunião teve lugar já
depois da presidência portuguesa.
Pretendia-se evitar que esta situação prejudicasse a presidência portuguesa da
União Europeia.
- Testemunha Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho
Esta testemunha prestou declarações por escrito, visto ser membro do Conselho
de Estado, as quais se encontram juntas aos autos a fls 13600 a 13602 (cfr. as questões
que lhe foram efectuadas por escrito e constantes de fls 13065 a 13067).
Referiu que em 16.05.2000 e 19.09.2000 era membro do Secretariado Nacional
do PS.
Nessas datas a arguida Fátima Felgueiras era também membro desse órgão
nacional do PS.
O depoente foi o coordenador político das eleições para as autarquias locais nas
eleições de 2005.
Na medida em que nunca esteve ligado à área financeira do PS referiu ignorar de
que modo se processava nas concelhias o financiamento das campanhas eleitorais para
as eleições autárquicas de 1997, sendo certo que na altura era Ministro da
Administração Interna e não tinha qualquer função executiva no seio do partido.
Assegurou nunca ter recebido o fax de 16.05.2000, constante de fls 1186 e 5819.
Da mesma forma, assegurou não ter recebido a carta cuja cópia se acha junta a
fls 1189 dos autos (de 19.09.2000).
Além disso, não teve sequer conhecimento do teor dessas missivas.
Não tomou igualmente conhecimento do teor das missivas de fls 5821 e 5827,
pois as mesmas nunca lhe foram apresentadas.
Presume que tomou conhecimento da investigação a que respeita estes autos
pela comunicação social, em data que não pode precisar, limitando-se a aguardar a
conclusão das investigações em curso.
Esteve presente na cerimónia de recandidatura da arguida Fátima Felgueiras às
eleições autárquicas de 2001, em nome do Secretariado Nacional do PS, sendo certo que
à data inexistia contra ela qualquer acusação proferida pelo MP (ainda decorria a
investigação).
- Testemunha Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
211
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Esta testemunha depôs por escrito, visto ser deputada na Assembleia da
República (cfr. as questões que lhe foram colocadas por escrito a fls 12944 a 12947 e as
respectivas respostas a fls 13627 a 13631).
Referiu que em Abril de 2000 fazia parte do Secretariado da Federação Distrital
do PS do Porto.
À data a testemunha Narciso Miranda era o presidente da Federação Distrital do
PS do Porto e o falecido Dr. Barros Moura o presidente da Assembleia Municipal de
Felgueiras.
Por sua vez, a arguida Fátima Felgueiras, segundo se recorda, era membro da
Direcção Nacional do PS.
A responsabilidade financeira das concelhias do PS cabia normalmente ao
respectivo presidente e ao secretariado, sendo certo no entanto que cada concelhia
decidia sobre a respectiva estrutura.
O financiamento das concelhias do PS deveria processar-se com o apoios da
Direcção Nacional do partido e de donativos.
Confirma que esteve presente na reunião/almoço no restaurante “Scala” (referida
na questão nº 6), na praça Velásquez, no Porto, acompanhado do Dr. Barros Moura e
cujo objectivo era o de falar acerca das divergências no seio do PS de Felgueiras.
Foi o Dr. Barros Moura quem solicitou e agendou essa reunião, sendo certo que
o depoente esteve presente sem que para o efeito tivesse sido mandatado por quem quer
que seja ou em representação de quem quer que seja.
Nessa reunião estiveram ainda presentes os arguidos Horácio Costa (à data
vereador na CMF) e Joaquim Freitas (à data membro da Assembleia Municipal de
Felgueiras).
Nessa reunião foi abordado o tema da investigação então em curso na PJ sobre
um alegado “saco azul” na CMF (irregularidades no financiamento do PS de Felgueiras
e irregularidades na gestão levada a cabo pela arguida Fátima Felgueiras na autarquia),
sendo certo que não se recorda de ter sido referenciado o nome de qualquer empresa,
designadamente a “Resin”.
Segundo os arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas as denúncias poderiam
beliscar o PS, sendo certo que nunca se pediu silêncio a qualquer um dos presentes, mas
apenas ponderação nas afirmações de prova.
Na opinião dos presentes essas denúncias apenas prejudicavam a arguida Fátima
Felgueiras (afirmação que parece ser contraditória com facto de ter referido que,
segundo os arguidos Horácio e Joaquim, o PS poderia sair beliscado com o caso).
Não confirmou que se tenha feito algum comentário acerca da testemunha Sousa
Oliveira.
A presença do arguido Horácio serviu, conforme se apercebeu, para que ele
relatasse as irregularidades existentes na CMF.
Não confirmou que este arguido apenas tenha comparecido no final da reunião.
Nessa reunião não foi apresentada qualquer proposta ao arguido Horácio Costa,
tanto mais que o depoente não estava mandatado por quem quer que seja para que a
pudesse apresentar..
Admite que possa ter transmitido o resultado dessa reunião/almoço à testemunha
Narciso Miranda, mas não “tem bem presente” esse facto.
À data ignora se a testemunha Narciso Miranda demonstrou solidariedade para
com a arguida Fátima Felgueiras, facto que sucedeu mais tarde na convicção de que não
existiam graves irregularidades.
Ignora se contra os arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas foi instaurado
algum procedimento disciplinar por parte da Federação Distrital do PS do Porto.
212
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Colocada a questão de se saber se não deveria ter sido instaurado um
procedimento disciplinar pelo PS à arguida Fátima, expressou apenas a opinião de que
ninguém deveria ser condenado sem culpa provada.
- Testemunha Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Esta testemunha prestou declarações por escrito, visto ser deputada na
Assembleia da República, as quais se encontram juntas aos autos a fls 14780 e 14781
(cfr. ainda as perguntas que lhe foram efectuadas por escrito a fls 14754 e 14755).
Confirmou que, entre 1989 e 1995, exerceu as funções de secretária e/ou
assessora da testemunha Narciso Miranda, então presidente da C.M. de Matosinhos.
Em 1995 foi eleita deputada à Assembleia da República, mas continou a
colaborar graciosamente com a C.M. de Matosinhos até 1999 como assessora do
presidente da edilidade.
Referiu que, no exercício dessas funções, desde o início do Verão de 1999 foi
contactada telefonicamente e de forma insistente por elementos que diziam ser do PS de
Felgueiras no sentido de ser agendado um encontro com a testemunha Narciso Miranda,
então presidente da C.M. de Matosinhos e da Federação Distrital do Porto do PS. O
objectivo desse encontro, segundo lhe disseram esses elementos, prender-se-ia com o
PS de Felgueiras e com a autarquia liderada pela arguida Fátima Felgueiras.
Não se recorda da identidade desses elementos que a contactaram
telefonicamente.
No seguimento dessa solicitação foi entretanto agendada uma reunião com a
testemunha Narciso Miranda, a qual ocorreu talvez em Novembro ou Dezembro de
1999.
Situou os factos no tempo com recurso ao facto da testemunha Narciso Miranda
ter sido nomeado Secretário de Estado em Outubro de 1999, sendo certo que a dita
reunião foi agendada posteriormente a pedido do mesmo (nessa reunião a testemunha
Narciso Miranda esteve presente, não sabendo dizer se ele esteve em outras reuniões
com os ditos elementos de Felgueiras).
Análise crítica
Antes de mais, à guisa de introdução, é de salientar que, a propósito das várias
matérias, a credibilidade e verosimelhança dos factos não se mede pela soma aritmética
dos depoimentos num ou noutro sentido, sendo certo que notamos por parte de alguns
uma tentativa de “branqueamento” de determinadas realidades (o sacudir sistemático de
“água do capote”, a tese da cabala – de assassinato político e da forja de documentos -,
o depoimento esguio particularmente politizado, afirmações de fé sem real sustentação,
sofreguidão na defesa das posições mais convenientes a alguns arguidos por manifesta
inexistência de distânciamento emocional e depoimentos de descredibilidade
confrangedora emergentes do facto dos depoentes respectivos ainda serem funcionários
da CMF) e noutros afirmações que se fundam em documentos e razão de ciência que
dão consistência às suas afirmações e ainda em relatos repletos de pormenores que, no
contexto em que se inseriram, conferiram as mais das vezes credibilidade ao respectivo
depoimento.
Esta tendência de comportamento impressionou o Tribunal, criando-lhe uma
certa predisposição na análise da credibilidade dos váriados depoimentos.
Porém, tal não significa necessariamente que uns depuseram sempre com
respeito pela verdade dos factos e que os outros o não fizeram de todo em todo, pois
essa posição maniqueísta, especialmente em relação a acontecimentos complexos,
costuma não corresponder à realidade das coisas e da vida.
213
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Acerca da possibilidade do Tribunal poder e dever valorar as declarações
prestadas pelo arguido Horácio Costa, tendo presente o seu comportamento processual
na audiência de julgamento e o disposto na actual versão do artº 345º, nº 4, do CPP (que
dá expresso acolhimento a alguma jurisprudência e a alguma doutrina proferida já no
âmbito da anterior versão do CPP, pelo que, nessa medida, não é dispiciendo
considerar-se tal norma interpretativa), já tivemos a oportunidade de tomar posição
acerca dessa matéria em despacho proferido na 75ª sessão da audiência de julgamento
(fls 13609 dos autos principais), do qual aliás foi interposto recurso.
Inversamente, pelas razões então expressas, não se poderá valorar o depoimento
do arguido Joaquim Freitas na parte em que prejudica a posição dos demais arguidos.
Isto posto:
Quanto ao objecto social da “Resin” e à sua transformação de sociedade por
quotas em sociedade anónima e respectivas participações sociais, teve-se em
consideração a certidão comercial junta a fls 9093 e ss. e a cópia certificada de fls 9125
a 9142 dos autos.
O arguido Vítor Borges, por seu turno, teve a oportunidade de se referir ao
desenvolvimento da actividade de tal empresa em Portugal, de forma que aliás nos
mereceu credibilidade.
No despacho de pronúncia não se determina com exactidão a data em que a
arguida Fátima Felgueiras teve conhecimento da intenção do arguido Júlio Faria em se
candidatar nas listas do PS a um lugar de deputado na Assembleia da República, a
propósito das eleições legislativas que teriam lugar em Outubro de 1995 (depreende-se
contudo que, segundo a pronúncia, esse conhecimento terá tido lugar em 1993, facto
que de todo não se demonstrou).
Foi, no entanto, possível apurar que esse conhecimento teve lugar pelo menos
em meados do ano de 1995.
De facto, a arguida Fátima Felgueiras assegurou que só em Julho de 1995 teve
conhecimento dessa intenção do arguido Júlio Faria.
Essa versão dos factos coaduna-se com a posição que a propósito foi assumida
pelo arguido Júlio Faria, pois referiu que foi convidado para o efeito na altura em que as
respectivas listas foram elaboradas pela Federação Distrital do Porto do PS, algures em
finais de Junho ou princípios de Julho de 1995, tendo sido pois nessa altura que deu
conta desse facto à arguida Fátima Felgueiras, na altura vereadora e vice-presidente da
CMF.
Com verdadeiro conhecimento de causa acerca desse facto ninguém mais foi
ouvido.
Em todo o caso, várias testemunhas, conhecedoras das actividades partidárias,
por desempenharem ou terem desempenhado cargos políticos e funções partidárias,
deram conta que a composição das listas não é feita com muita antecedência e está
sujeita a alterações, às vezes de última hora, em face das variadas movimentações
internas no seio dos partidos (diriamos que quase como “sete cães a um osso”).
Tais depoimentos dão verosimelhança à posição expressa a esse propósito pelos
arguidos Júlio Faria e Fátima Felgueiras (cfr. ainda, em especial, os depoimentos das
testemunhas Manuel Tomás Cortez Rodrigues Queiró, Narciso Miranda e Pedro Luís da
Rocha Baptista).
É de salientar que, a este propósito, não pode ser valorado o depoimento do
arguido Joaquim Freitas, pois de alguma forma prejudica a posição assumida pelos
arguidos Júlio Faria e Fátima Felgueiras e em face do facto de se ter recusado a
responder a quaisquer perguntas que os mandatários dos assistentes ou os defensores
dos demais arguidos lhe quisessem porventura colocar (cfr. artº 345º, nº 4, do CPP, na
214
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
sua actual versão, emergente da Lei nº 48/2007, de 29.08, a qual deu expresso
acolhimento a idêntica posição assumida por alguma doutrina e por alguma
jurisprudência, designadamente do Tribunal Constitucional, acerca dessa matéria à luz
da anterior versão do CPP).
Sem qualquer credibilidade, porém, foi a posição expressa pela arguida Fátima
Felgueiras de que não perspectivava suceder ao arguido Júlio Faria à frente dos destinos
da CMF (em face da oposição interna que se registava no seio do PS local), já que ela
era a “candidata natural”, segundo aliás referido por algumas testemunhas e pelo
arguido Horácio Costa, em face do facto de ter assumido a presidência da CMF em
1995 após a ida do arguido Júlio Faria para a Assembleia da República e do trabalho
desenvolvido por ela nos dois anos seguintes, sendo certo que, como nos pareceu
provado à saciedade, o PS de Felgueiras era constituído por elementos desprovidos de
“massa crítica” (e que gravitavam em torno dela), conforme referiu o arguido Horácio
Costa a dada altura, além de que a arguida Fátima Felgueiras era pessoa centralizadora e
de personalidade forte – “o tal eucalipto que tudo seca em volta”, na expressão da
testemunha Narciso Miranda -, facto que foi assim demonstrado apesar de algumas
testemunhas procurarem “virar o bico ao prego” face a anteriores declarações prestadas
perante a JIC, com as quais foram aliás confrontadas, daí que possam ser valoradas.
De resto, sinal de que ela procurou logo em abrir caminho à sua candidatura foi
o facto se ter preocupado com a “imagem” da CMF (ou antes, com a sua própria
imagem), contratanto os serviços de uma empresa para o efeito (a “Proeme”). A
divulgação das actividades camarárias misturou-se assim com a propaganda política (de
que o “Sovela” dava eco, conforme é perceptível pela sua leitura).
Não é pois por acaso que foi grangeando grande apoio popular, de sorte que não
se vislumbra no panorama local qualquer outra pessoa que, à data, se perfilasse como “o
candidato natural” pelo PS às eleições autárquicas de 1997.
Os “apelos” à sua candidatura, já em meados de 1997, mais não são do que
meras encenações políticas, pois à data já se sabia há muito que ela se iria candidatar
pelo PS à presidência da CMF nas eleições autárquicas que haveriam de ter lugar em
Dezembro desse ano. De facto, “ela era a noiva que antes de o ser já sabia que iria sêlo”.
Por outro lado, ficou demonstrado que a “Resin” iniciou os trabalhos na lixeira
de Sendim em Dezembro de 1993, no circunstancialismo relatado pelos arguidos Júlio
Faria e Vítor Borges (cfr. também o depoimento da testemunha Menezes Basto). Esse
facto é mais ou menos corroborado pelos vários ex-funcionários dessa empresa que
foram ouvidos, alguns dos quais iniciaram funções em Janeiro de 1994 (cfr. em
particular os depoimentos das testemunhas António Fernando da Silva Ramos, António
José Ferreira Pereira e José de Sousa; cfr. também o depoimento de alguns elementos
que pertenceram à junta de Freguesia de Sendim e ainda o documento junto já no
decurso do julgamento e alusivo à máquina de compactação que foi operar para o local
e que proveio de França em Dezembro de 1993 com o respectivo manobrador, o qual
terá dado formação técnica aos funcionários da “Resin” que ali prestavam serviço no
sentido de poderem manobrar aquele tipo de maquinaria).
Nesse sentido apontam também as facturas emitidas pela “Resin” à testemunha
Menezes Basto e à CMF até Janeiro de 1995 (as quais viriam a ser devolvidas pela
CMF por falta de suporte legal que permitisse o respectivo pagamento), bem como as
facturas emitidas pela “France Dechets” à “Resin” – cfr. as facturas juntas aos autos a
fls 52 e ss. do apenso 98, bem como as facturas juntas aos autos pelo arguido Vítor
Borges a fls 12663 e ss. e as que o arguido Carlos Marinho juntou a fls 12320 e ss.
215
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Assim, as relações entre a CMF e a “Resin” iniciaram-se de facto nessa altura
(apesar de formalmente continuarem a ser inexistentes).
Note-se que ninguém nos relatou o episódio do incêndio do camião do lixo,
descrito na contestação dos arguidos Vítor Borges e Carlos Marinho, mas ficou patente
da prova produzida – já referida – que à data (1993) existia grande descontentamento
popular pela forma como eram descontroladamente depositados os resíduos na lixeira
de Sendim, situação que mudou com a intervenção no local por banda da “Resin”, a
qual se havia dado a conhecer aos autarcas do Vale do Sousa nesse ano de 1993, razão
pela qual o arguido Júlio Faria contactou telefonicamente o arguido Vítor Borges no
Verão desse ano, no circunstancialismo que então ambos descreveram assertivamente
ao Tribunal (porquanto não emergiu das declarações prestadas pelos arguidos nem pela
prova testemunhal produzida, não se provou que a “Resin” tenha levado autarcas a
França em visita a aterros sanitários; fê-lo, em todo o caso, pelo menos em relação à
testemunha Menezes Basto, aproveitando o facto dele ter ido a esse país passar férias, o
que foi decisivo para o convencer de que a lixeira de Sendim poderia ser reabilitada
com sucesso, o que de facto veio a suceder).
Poder-se-ia pensar que, em face do facto do Tribunal se ter convencido que só
em meados de 1995 é que a arguida Fátima perspectivou a sua possível candidatura à
presidência da CMF nas eleições de 1997, que só então o esquema relatado na
pronúncia foi engendrado (destinado a financiar as actividades partidárias do PS local),
realidade a que oportunamente iremos retornar no sentido de explicitar de que forma o
Tribunal se convenceu desse facto.
Note-se, porém, que o esquema engendrado para que, de facto, a “Resin”
recebesse da CMF os pagamentos como contraprestação do trabalho de reabilitação e
exploração que levava a cabo, já vinha desde finais de 1993, daí a celebração do
contrato de transacção com a testemunha Menezes e respectivo aditamento.
Note-se ainda que a reunião onde ficou decidida a realização do concurso
limitado simulado mencionado no ponto 1.3 da pronúncia ocorreu em Abril de 1995,
pelo que, conforme melhor se explicitará, tendo-se convencido o Tribunal da existência
de dois “retornos” no âmbito desse contrato, naturalmente que o esquema engendrado e
que, aproveitando-se do lançamento desse concurso, visou a obtenção pelos arguidos
Fátima e Júlio de verbas destinadas a financiar as respectivas actividades partidárias e,
como se verá, custear despesas pessoais desta última, terá sido urdido nessa altura pelos
arguidos Júlio, Fátima e Vítor.
Assim, naturalmente que estarão excluídas do mesmo as situações anteriores
(portanto, pelo menos, o contrato de transacção celebrado com o Eng. Meneses Basto e
respectivo aditamento), sendo certo que os “recebimentos” ou “retornos” só tiveram
lugar a partir de 1997 e, ainda assim, reportados apenas ao contrato celebrado entre a
CMF e a “Norlabor”, conforme à frente melhor se verá.
Além disso, não se convenceu o Tribunal de que o contrato de transacção tenha
sido sobreavaliado (de modo a permitir “retornos”) pois, com assertividade, foi referido
pelo arguido Vítor Borges que o preço praticado fundou-se num orçamento apresentado
pela “France Dechéts”, a qual recebeu cerca 24.000 cts pela operação de reabilitação da
lixeira – cfr. documentos de fls 12263 e ss. -, não tendo pois a “Resin” retirado qualquer
lucro, em face dos demais custos que teve que suportar, designadamente com pessoal,
sendo certo que esta estava interessada em mostrar obra feita – ainda que a custo de
produção - para angariar potenciais clientes.
Após a missão de reabilitação referida a “Resin” porpôs-se a continuar a operar
no local mediante o pagamento mensal de 2.800 cts + IVA (cfr. ainda os depoimentos
216
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
dos arguidos Carlos Marinho e Barbieri Cardoso, bem como o depoimento de algumas
testemunhas, entre as quais Pinto Barriga).
A simulação (relativa, por interposta pessoa – cfr. artº 241º, nº 1, do Código
Civil) 5 do contrato de transacção celebrado entre a CMF e o Eng. Meneses visou antes
permitir que a “Resin” recebesse o que tinha direito pelo facto de ter ido operar na
lixeira de Sendim, ante a eminência da referida testemunha Menezes Basto impedir a
continuação da deposição dos lixos no local e do facto dessa deposição ser efectuada de
forma descontrolada, com prejuízo para as populações e para o meio ambiente,
conforme resultou do depoimento dos arguidos Fátima Felgueiras, Júlio Faria, Vítor
Borges e Barbieri Cardoso, e ainda do depoimento de muitas testemunhas que relataram
o estado da lixeira antes e depois da reabilitação levada a cabo pela “Resin”.
Note-se aliás que essa matéria não foi levada à apreciação da Assembleia
Municipal de Felgueiras, apesar da sua relevância, porque não era conveniente,
conforme referiu aliás o arguido Júlio Faria, dando a explicação de que tal não se
compadecia com a necessidade de uma resolução rápida do problema (para além disso,
à data vivia-se já em clima de campanha eleitoral – referente às eleições autárquicas de
1993 – e a questão dos resíduos era arma de arremesso político por parte da oposição;
refira-se porém que a questão da celeridade na resolução do problema não seria posta
em causa pela apreciação dessa questão por parte da Assembleia Municipal de
Felgueiras, segundo nos convencemos, pois poderia ser convocada uma sessão
extraordinária desse órgão autárquico e, segundo foi dito, num mês teria já deliberado; o
combate político terá sido assim a verdadeira razão subjacente ao facto de se não
pretender submeter aquela matéria à apreciação da Assembleia Municipal de
Flegueiras).
Ora, o facto do arguido Júlio Faria se ter preocupado em afastar esse assunto da
apreciação da Assembleia Municipal de Felgueiras não significa necessariamente que
ele não “controlava” esse órgão autárquico. Naturalmente que teria um peso decisivo na
maioria que sustentava o executivo liderado por si, controlo esse que seria menor se
fosse necessária uma maioria qualificada. A verdadeira razão que esteve na base da
decisão de simular o preço da compra e venda do terreno onde se situava a lixeira de
Sendim e de assim evitar a apreciação da questão em causa pela Assembleia Municipal
de Felgueiras foi assim a de evitar que a oposição explorasse politicamente esse tema.
Adiantamos já que, não obstante o arguido Júlio Faria estar afastado dos
destinos da CMF desde Agosto de 1995 (altura em que suspendeu o seu mandato,
renunciando ao cargo já em Outubro de 1995, na sequência das eleições legislativas
realizadas nesse mês, em face das quais conseguiu ser eleito deputado à Assembleia da
República), mantinha contudo uma actividade partidária local (a testemunha Manuel
Ferreira Pinto levava-lhe documentos – cfr. as declarações do arguido Horácio Costa, do
5
A CMF queria verdadeiramente contratar com a “Resin” e não com a testemunha Menezes Basto,
conforme ficou demonstrado à saciedade (cfr. por exemplo os depoimentos dos arguidos Júlio Faria e
Vitor Borges e ainda das testemunhas Menezes Basto e Fernanda Leal), só não o tendo feito em face de
constrangimentos administrativos que a impediam de celebrar com essa empresa qualquer contrato,
designadamente o facto de não ser a proprietária do terreno onde os lixos eram depositados. O Eng.
Menezes Basto é, assim, na verdade, um “testa de ferro” nesse negócio, transmitindo para a “Resin” os
respectivos efeitos económicos (os pagamentos tinham como destinatário final a “Resin”, conforme aliás
não foi posto em causa – cfr., designadamnente, o relatório que seguiu o rasto do dinheiro, o depoimento
de quem o elaborou e os documentos pertinentes referenciados aquando da reprodução por súmula dos
depoimentos das testemunhas que a propósito deposeram). A simulação existe porquanto todos os
intervenientes agiram conluiados, as declarações negociais divergem da real vontade das partes e elas
agiram naturalmente com intenção de enganar terceiros (desde logo o Tribunal de Contas), sendo certo
que, como é sabido, não é requisito da simulação o propósito de prejudicar terceiros.
217
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
próprio arguido Júlio Faria e das testemunhas Ferreira Pinto, que a propósito procurou
“tapar o sol com a peneira”, e José Júlio da Silva Pereira, donde resulta que a
testemunha Pinto recolhia no GAPP, em local especialmente destinado para o efeito, a
documentação que era preparada para o arguido Júlio Faria), além de que desempenhou
um papel relevante na preparação e na campanha eleitoral de 1997, tendo aliás sido
beneficiado com pagamentos provenientes da conta do BES, designadamente a título do
reembolso de despesas que efectuou a propósito de actividades partidárias que por si
foram custeadas, com o pagamento de bilhetes que lhe haviam sido atribuídos e
referentes a um sorteio promovido pelo FCF e de um donativo de 20.000 cts concedido
pela “Resin” a esse clube por intermédio desse arguido – matérias a que oportunamente
iremos dar particular atenção -, tudo conforme referiu o arguido Horácio Costa
sustentado por documentos juntos aos autos (de que o manuscrito de fls 156 é um
exemplo), o que inculca a ideia de que também participou nesse “esquema” destinado a
angariar fundos que doutra forma não teriam conseguido os arguidos Fátima e Júlio –
note-se que esse esquema foi engendrado numa altura em que ele ainda era presidente
da CMF -, tanto mais que, a avaliar pelos gastos efectuados na campanha eleitoral de
1997 (cerca de 50.000 cts), esta campanha foi de facto “grandiosa” (note-se que o valor
em causa é extremanente avultado em relação ao que foi expresso por várias
testemunhas que também se candidataram a eleições autárquicas e que revelaram qual o
valor que foi despendido nas respectivas campanhas), além de que aquele donativo da
“Resin” e outras contribuições por ela efectuadas (designadamente os “retornos”)
concerteza não seriam concedidas se ela não tivesse sido beneficiada nas adjudicações
que de facto lhe foram efectuadas pela CMF, camuflada pela interposição de “testas de
ferro” nos negócios em causa (o benefício traduziu-se designadamente na adjudicação
de facto de trabalhos sem qualquer procedimento administrativo legalmente conduzido
de forma a que esses trabalhos lhe pudessem ser real e legalmente adjudicados. Não se
põe em causa contudo que os trabalhos tenham sido de facto realizados, os quais aliás
constatámos no local – cfr. o auto de inspecção ao local, ilustrado de resto com
fotografias).
Resta saber se esse benefício da “Resin” terá alguma relevância penal,
indemonstrada que está a ocorrência de qualquer prejuízo patrimonial para a CMF,
matéria de direito que a seu tempo iremos dar atenção.
Ademais, não terá sido por acaso que o vereador que tinha o pelouro do
ambiente fosse posto sistematicamente de lado nos assuntos que se prendiam com a
“Resin” e a lixeira, já no mandato emergente das eleições de 1997, a ponto de se sentir
incomodado com esse facto (cfr., a propósito, o depoimento da testemunha Edgar Pinto
da Silva).
Ainda segundo essa testemunha, a arguida Fátima intrometia-se nos assuntos
que deveriam ser tratados pelos vereadores, ultrapassando-os, chegando ao ponto de
tratar pessoalmente de tudo, sinal claro de que de facto é pessoa centralizadora. Se
assim é na sua acção à frente dos destinos da CMF assim seria também ao nível da
acção partidária (a menos que tenha dupla personalidade, o que por certo não sucede),
pelo que nos pareceu manifestamente abusiva a pretensão de que se procurar transferir
para o secretário-coordenador a responsabilidade pela tomada de algumas decisões.
“Estava-lhe no ADN” (da arguida Fátima) controlar tudo de perto, segundo a
testemunha Vítor Sousa.
Por outro lado, em face da prova produzida, é bem evidente que o arguido
Horácio Costa era de facto assessor da arguida Fátima Felgueiras (independentemente
dos termos do contrato de assessoria e respectivo aditamento – cfr. documentos de fls
5797 a 5801), tanto mais que era nessa qualidade que se apresentava e era conhecido
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
pela generalidade das pessoas (conforme referido por várias testemunhas), sendo pois
uma pessoa da sua inteira confiança. Assim se explica que ele tenha sido “pau para toda
a colher”, quer no que respeita a assuntos de índole partidária (não obstante ser um
recém chegado às lides do PS de Felgueiras e de não ser militante desse partido) quer no
que respeita a assuntos de natureza pessoal, como foi por exemplo o episódio da
aquisição do “Audi A4” e da venda do “BX” referido nos autos.
Esse arguido, entretanto, a 01.01.99, viria a assumir o cargo de vereador em
regime de permanência, na sequência da renúncia ao mandato pelo Verador Lickfold,
mantendo-se nessa condição até Março de 2000 (cfr. documentos de fls 5804 e ss. do
23º volume dos autos).
Pareceu ao Tribunal que as testemunhas que procuraram contrariar a ideia de
que o arguido Horácio Costa era pessoa então muito próxima da arguida Fátima
procuraram deliberadamente ocultar a verdade dos factos (designadamente, em face da
evidência do arguido Horácio Costa surgir ligado aos mais variados assuntos, alguns
deles sensíveis, tendo sido aliás pela mão dela que ele ingressou na CMF como
assessor).
Sinal disso foi a circunstância de se ter procurado contrariar o facto do arguido
Horácio ter ocupado um gabinete na CMF enquanto assessor (facto afirmado a pés
juntos por ele e, com credibilidade, confirmado designadamente pelas testemunhas
Fernanda Leal e Terezinha do Nascimento, ambas funcionárias da CMF, facto esse
corroborado pela circunstância do Centro Coordenador de Transportes não estar
concluído de forma a que ele pudesse ocupar nas suas instalações um gabinete – cfr. os
relatórios mensais juntos pelo arguido Horácio Costa já no decurso do julgamento, os
quais se reportavam, designadamente, ao estado das obras naquele edifício, constantes
de fls 12669 a 12697; cfr. ainda o documento remetido pela CMF de fls 13446 a
13449).
Note-se que o Tribunal convenceu-se que o arguido Horácio Costa recebia
presidentes de junta na ausência ou nos impedimentos da arguida Fátima Felgueiras,
conforme referiram aquele arguido e, por exemplo, a testemunha Joaquim José Teixeira
Ribeiro (presidente da junta de freguesia da Refontoura); ao invés, pareceu-nos que as
testemunhas que faziam as marcações das audiências não depuseram de forma
totalmente isenta acerca dessa matéria, talvez devido ao constrangimento de serem
funcionários camarários e de não se sentirem à vontade para pôr em causa quem de
momento comanda os destinos da autarquia, segundo aquela que foi a percepção do
Tribunal.
Não foi pois por acaso que o arguido Horácio Costa foi escolhido pelos arguidos
Fátima Felgueiras e Júlio Faria para integrar o “pelouro das finanças”, sendo assim um
dos con-titulares da conta do BES referida nos autos (aberta em 11.07.97 – cfr.
informação de fls 13923, a ficha de assinaturas de fls 13924 e o extracto bancário
constante do apenso 1), juntamente com o arguido Joaquim Freitas (este amigo pessoal
da arguida Fátima, membro da comissão política do PS local, conhecedor do meio
empresarial e já com experiência na recolha de fundos, pois fez parte do “pelouro das
finanças”, juntamente com a testemunha Sousa Oliveira, na campanha eleitoral referente
às eleições autárquicas de 1993).
Em todo o caso, porquanto só a ela se referiu o arguido Horácio Costa, não se
demonstrou a matéria alegada por ele no artº 15º, primeira parte e parte final, da sua
contestação.
Procurou-se ainda fazer passar a ideia de que era perfeitamente natural a
existência de uma conta autónoma para a campanha eleitoral, dado que as campanhas
219
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
para as eleições autárquicas envolvem pessoas que não são militantes e a conta oficial
do partido destinar-se-ia apenas a fazer face às despesas correntes.
O argumento parece-nos pobre, além de que, pelo menos em Vila do Conde,
inexistia qualquer conta autónoma para esse efeito (cfr. o depoimento da testemunha
Mário Hermenegildo Moreira de Almeida).
O certo é que os candidatos a eleições autárquicas ouvidos (vencedores ou
vencidos) apenas relataram a sua experiência pessoal relativamente a outros concelhos,
revelando assim de facto nada saberem em relação a Felgueiras, sendo certo que as
concelhias do PS gozavam de grande liberdade na forma como se organizavam para a
campanha eleitoral.
Seja como for, ficou demonstrado que era constume a existência de uma conta
autónoma, pelo menos desde as eleições autárquicas de 1989, mas no caso em apreço
essa mesma conta não se destinou apenas a financiar a campanha eleitoral, como
também outras causas do PS local, entre as quais o “Sovela”, bem como a aquisição da
viatura “Audi A4” referida nos autos. Ultrapassou pois em muito o âmbito do
financiamento das mencionadas eleições autárquicas.
Em face disso, sendo a arguida Fátima pessoa centralizadora, merece mais
crédito o depoimento do arguido Horácio Costa quando referiu que quem de facto
controlava a conta do BES era ela e o arguido Júlio, pois ia-lhes dando conta do que
recebiam e pelo menos alguns pagamentos só foram efectuados com o aval dela ou por
indicação do arguido Júlio Faria (cfr. o “post-it” já referenciado).
De resto, dando crédito ao depoimento do arguido Horácio, convencemo-nos
que ele actuou sempre sob as ordens e orientações, sobretudo, da arguida Fátima
Felgueiras (essa sustentação é verosímel em face da personalidade centralizadora da
arguida Fátima, que nada deixava ao acaso; o arguido Horácio recebia também
instruções do arguido Júlio, daí o teor de alguns manuscritos por ele redigidos e
destinados ao dito Horácio Costa).
Tal não significa necessariamente que a arguida Fátima tivesse conhecimento
pormenorizado, digamos em tempo real, de todos os movimentos da conta do BES (daí
que, nesse contexto, não seja estranho que a dado passo ela se tenha disponibilizado
para pagar uma despesa de campanha caso não existissem fundos na conta do BES,
conforme nota escrita dirigida ao arguido Horácio no documento de fls 185 do 1º
volume, quando na verdade à data esses fundos existiam em face do que se vislumbra
do respectivo extracto bancário constante do apenso 1).
Reafirma-se que a conta do BES não foi só a conta da campanha eleitoral de
1997, pois destinou-se a outros fins, desde o pagamento das mais variadas despesas e
actividades do PS, até ao pagamento de despesas da ADEC (“Sovela”) e mesmo de
despesas pessoais da arguida Fátima (como por exemplo a aquisição do “Audi A4”), daí
que não pareça verosímel que (em particular) a arguida Fátima se tenha desligado da
gestão dessa conta, tal era a sua importância.
Ademais, mesmo do manuscrito de fls 156 (da autoria do arguido Júlio Faria) se
extrai que essa posição de absoluta independência do candidado em relação ao aspecto
financeiro da campanha poderia não corresponder à realidade, pois ali se admite que se
poderia dar conhecimento à candidata (se assim fosse entendido) da questão da
angariação de fundos (distanciamento esse que de facto inexistiu pelas razões já por nós
mencionadas sinteticamente).
Não era pois muito relevante o distanciamento da arguida Fátima em relação à
questão da angariação de fundos, posição de princípio adiantada por várias testemunhas
(pese embora o “princípio da necessidade”, segundo a testemunha Raúl Brito, o pudesse
levar a fazer concessões em prejuízo do “princípio da independência” do candidato em
220
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
relação a essas matérias), mas sem real conhecimento de causa em relação ao que de
facto se passou em Felgueiras.
Note-se aliás que em Felgueiras existiam peditórios a “torto e a direito” e a
arguida Fátima tomou parte activa em alguns desses peditórios, como por exemplo para
financiar o FCF e a ADEC, conforme emerge de alguns documentos acima
referenciados aquando da reprodução por súmula das declarações prestadas por alguns
arguidos e testemunhas.
É de salientar que da versão dos factos plasmada na contestação à acção de
prestação de contas quanto às incidências da abertura da conta do BES resulta que os
arguidos Horácio e Joaquim Freitas sabiam desde a primeira hora que essa conta
bancária não se destinaria apenas ao depósito dos fundos necessários para a campanha
eleitoral de 1997, mas também para outras causas do PS, pelo que nessa parte as
afirmações efectuadas, designadamente pelo arguido Horácio Costa (de que estava
convencido que essa conta serviria apenas para proceder ao depósito dos donativos para
essa campanha eleitoral), não nos mereceram credibilidade.
Não obstante o arguido Horácio agir sob as ordens da arguida Fátima, o certo é
que, designadamente em função do grau de confiança mútuo patenteado, não podia
deixar de saber que algumas das entregas em numerário por banda da “Resin”
constituíam “retornos”, matéria a que mais à frente iremos dar atenção mais detalhada.
Tivemos ainda um relato por parte da testemunha Jorge Fernando Moreira da
Fonseca (“Anglomex”), o qual referiu que entregou o respectivo donativo para a
campanha eleitoral de 1997 à arguida Fátima Felgueiras, juntamente com o cartão de fls
2183 (o próprio arguido Horácio referiu ter recebido alguns cheques por intermédio da
arguida Fátima).
Ademais, por alturas da recepção do cheque de fls 499 do 3º volume, a arguida
Fátima estava presente, segundo a testemunha Joaquim Fernando Melo (que já não se
recorda se ela chegou a assistir à entrega do dito cheque ao arguido Joaquim Freitas ou
se surgiu no local 2 ou 3 minutos depois, o que em todo o caso não parece ter sido
coincidência, segundo deduzimos).
Não era pois pessoa muito preocupada em manter as devidas distâncias em
relação à angariação de fundos (naturalmente que os incautos cidadãos, quando
confrontados com pedidos de donativos por parte da “Srª Presidente” da autarquia, não
fariam grande distinção se se tratavam de donativos para uma campanha eleitoral, se
para o FCF ou se para a “ADEC” ou ainda para outro fim, conforme aliás parece
resultar do depoimento de algumas testemunhas que concederam donativos mas que não
sabem já exactamente para que finalidade; houve até uma testemunha que afirmou ter
concedido um donativo que tinha dois destinos: parte para a campanha eleitoral e parte
para o FCF, tal era a confusão).
Tudo isso torna verosímel a posição expressa pelo arguido Horácio Costa a
propósito do facto de ter referido que dava conhecimento das movimentações da conta
do BES aos arguidos Fátima e Júlio Faria e que, assim, eles não se mantinham distantes
no que se refere aos donativos que iam sendo concedidos.
Não é de estranhar que a generalidade das testemunhas ouvidas e que estiveram
envolvidas na campanha eleitoral referente às eleições autárquicas de 1997
desconhecessem na verdade se o arguido Horácio reportava ou não à arguida Fátima,
pois era matéria sensível e reservada (cfr. o manuscrito do arguido Júlio Faria de fls
156).
Não têm pois verdadeiro conhecimento de causa acerca dessa matéria,
limitando-se a expressar opiniões e convicções alicerçadas em pobres ou inexistentes
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
fundações. Algumas dessas profissões de fé, aliás, mais não representaram que
comoventes manifestações de apreço pela figura da “Srª Presidente”.
De resto, ficamos com a ideia que tudo era na verdade decidido por meia dúzia
de elementos (o “núcleo duro” ou “task forçe”, de que os arguidos Horácio e Joaquim
Freitas faziam parte, o que atesta bem o grau de confiança que neles era depositado) e
que nas reuniões mais alargadas alguns aspectos seriam apenas “apurados”. É aliás
sabido que em reuniões alargadas nada de concreto se tende a decidir se os assuntos a
tratar não vierem já alinhavados.
O arguido Horácio explicou em que circunstâncias foi convidado para integrar o
pelouro das finanças e quais as circunstâncias que rodearam a abertura da conta do BES.
Fê-lo relatando o encontro que ocorreu em casa do arguido Júlio Faria em Março
de 1997, com abundância de pormenores, o que tornou tal depoimento credível, tanto
mais que foi assertivo.
Foi nesse encontro, ocorrido em Março de 1997, que o arguido Júlio Faria
entregou aos arguidos Horácio e Joaquim Freitas o manuscrito de fls 156, facto por este
negado.
Aliás, o arguido Júlio Faria, apesar de reconhecer a autoria de tal documento,
suspeita (especula) que o mesmo não estará completo, dando a ideia de que esse
documento foi assim adulterado. Fê-lo porém sem qualquer assertividade.
Da análise desse documento retira-se, designadamente, que se reporta ao futuro
(o que inculca a ideia de que se trata de um documento anterior a qualquer reunião
realizada no seio do PS com vista à organização dos diferentes pelouros, tanto mais que
nesse documento não é referenciado que a testemunha Dinis faça parte do pelouro das
finanças, como de facto fez, pois ofereceu-se para isso numa reunião ocorrida em
meados de 1997, sendo certo que nesse pelouro, não obstante, não teve qualquer acção cfr. o depoimento da testemunha António Ribeiro Dinis). Além disso, convém não
esquecer que, segundo foi afirmado, alguns lugares já estavam preenchidos antes da
reunião onde se definiram os vários pelouros (cfr. por exemplo o depoimento da
testemunha Vítor Manuel Fernandes Oliveira de Sousa), em que os participantes se
ofereceram para os diversos grupos, pese embora a última palavra cabesse sempre à
arguida Fátima Felgueiras, conforme nos pareceu mais credível em face da
personalidade centralizadora dela, que nada quis deixar ao acaso (cfr., designadamente,
o depoimento testemunha Edgar Pinto da Silva; a arguida Fátima apenas reconheceu ter
composto a lista concorrente à CMF pelo PS nessas eleições).
A alusão à firma “Xavier Calçada” no documento de fls 156 prova, segundo o
arguido Júlio, que esse documento é posterior a uma reunião onde se abordou a
contratação dessa empresa, a qual até então desconhecia. Consequentemente, conclui
que esse manuscrito só foi elaborado por si após essa reunião. Questiona-se porém a
necessidade da simples existência desse manuscrito, o qual inculca fortemente a ideia de
que nem tudo era tratado nas reuniões, designadamente as matérias sensíveis.
Seja como for, o Tribunal convenceu-se da versão que a propósito foi
apresentada pelo arguido Horácio Costa pelos motivos sinteticamente referenciados
(chama-se aqui à colacção, além do mais, a diferença de postura corporal aquando da
tomada de declarações – o arguido Horácio olhava-nos directamente, o arguido Júlio
baixava os olhos; o arguido Horácio mostrou-se quase sempre muito assertivo naquilo
que dizia e o arguido Júlio utilizava frequentemente a expressão “estou em crer”).
Ademais, não vemos discrepâncias relevantes entre o que foi afirmado pelo
arguido Horácio Costa a propósito da abertura da conta do BES – com a ressalva de que
não nos mereceu credibilidade a sua afirmação de que pensava que essa conta apenas se
destinaria ao depósito dos donativos necessários para o financiamento da campanha
222
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
eleitoral de 1997 - e o que havia sustentado a esse propósito na acção ordinária nº
705/2001 do 1º Jz deste Tribunal (cfr. certidão de fls 13944 e ss., em particular os artgs
65º e ss. da contestação apresentada nessa acção de prestação de contas).
Foi ainda referido pelo arguido Júlio Faria (e por algumas testemunhas, como
por exemplo Augusto Coelho de Faria) a existência de umas “actas” referentes às
reuniões onde se tratou da organização da campanha, quer no que respeita aos vários
pelouros quer no que respeita às acções de campanha propriamente ditas (não referem
esses documentos quem os elaborou nem estão assinados, sendo certo que o arguido
Horácio Costa referiu que esses documentos foram compostos pelo arguido Bragança e
pela testemunha José Júlio da Silva Pereira já depois deste caso vir a público) – cfr. os
documentos de fls 12206 e ss., 14311 e ss., 14445 e ss. e o exame aos discos rígidos de
fls 14327 e ss.
Em face desse exame parece não existir dúvidas de que foi o arguido Bragança
quem os elaborou (não se sabe porém em que momento, parecendo-nos estranho que
essas “actas” não estejam assinadas; ignoramos assim se são documentos fidedignos ou
não).
Seja como for, a simples existência de um manuscrito do arguido Júlio Faria
alusivo ao “pelouro das finanças”, entregue numa reunião ocorrida em Março de 1997
em sua casa pela calada da noite, inculca a ideia de que de facto tudo era decidido por
meia dúzia de pessoas e que muitos dos que deram o seu contributo para a campanha
eleitoral com o seu esforço e empenho mais não foram do que marionetas manipuladas
pelas mãos hábeis que seguravam nos cordelinhos.
Além disso, pareceu-nos caricato o facto de algumas testemunhas terem referido
desconhecer que o arguido Horácio fazia parte do “pelouro das finanças”, quando outras
houve, com menores ou nenhumas responsabilidades nas lides partidárias, que
declararam saber que aquele arguido era o “homem da nota”; não obstante,
curiosamente, era sempre a ele que recorriam quando se tratava do financiamento de
alguma actividade do PS ou da JS, integrada ou não no âmbito da dita campanha
eleitoral, sinal inequívoco de que, pelo menos depois das eleições de 1997, bem sabiam
que o arguido Horácio era um dos titulares de uma conta que se destinava a financiar as
actividades do PS de Felgueiras.
A matéria em causa parece que “queimou” quem acerca dela foi questionado,
alegando desconhecimentos inversosímeis acerca de realidades de que não poderiam
deixar de conhecer (com maior ou menor pormenor). Esta postura, encardida em
determinadas testemunhas, tornou-as as mais das vezes descredíveis.
No que se refere às relações estabelecidas entre a “Resin” e as empresas
“Norlabor”, “Craveira” e “Translousada”, teve-se em conta o depoimento do arguido
Vítor Borges, o qual explicou que procurava manter relações comerciais com as
empresas locais, designadamente porque isso permitia reduzir os custos, que seriam
maiores se contratasse empresas não locais a fim de executarem os trabalhos em regime
de subempreitada.
Tal arguido explicou a razão por que foi celebrado o contrato de consórcio a que
se reporta o documento de fls 145 do apenso 97. A explicação dada não nos merece
qualquer reserva.
Emerge do depoimento desse arguido e do arguido Carlos Marinho que as
relações estabeleceram-se primordialmente com a “Translousada” e com a “Norlabor”
(aquela operou na lixeira de Sendim e esta na Lustosa, alugando equipamento com
condutor) e que foi através destas empresas que a “Resin” tomou conhecimento da
“Craveira” (com sócios comuns às já referidas empresas) e “João Tello” (que na
realidade nada fezeram na lixeira de Sendim).
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Por outro lado, a “ECOP” chegou a entrar no capital social da “Resin”, tendo
aliás estabelecido relações de consórcio com esta, factos que não foram postos em
causa.
A este propósito foi igualmente relevante o depoimento das testemunhas que
tinham responsabilidades nas empresas referidas.
Acresce, por fim, que não se demonstrou que a arguida Fátima e o arguido Júlio
tenham exercido qualquer influência junto da AMVS para que o consórcio liderado pela
“Resin” tenha vencido o concurso a que se reporta o ponto 1.5 da pronúncia.
Acerca destas matérias mais à frente delas trataremos com mais pormenor.
O contrato de transacção celebrado entre a CMF e o Eng. Joaquim Menezes
de Basto
Reprodução por súmula das declarações prestadas a esse propósito
- Arguida Fátima Felgueiras
Deu conta do problema premente que era a recolha do lixo no concelho, visto
que era depositado na lixeira de Sendim sem qualquer tratamento, com os inerentes
problemas para a saúde pública e para o ambiente, designadamente, em face da
combustão dos lixos e fumos por ele originados, da contaminação dos lençóis friáticos e
da propagação de insectos e outros animais, bem como o cheiro nauseabundo que se
sentia no local.
Os terrenos onde eram depositados os lixos pertenciam a particulares
(designadamente ao Eng. Menezes Basto), tendo sido então celebrada entre a CMF e o
proprietário um contrato de arrendamento abarcando uma área de cerca de 3.000 m2.
Antes disso já os lixos ali eram depositados, ignorando que tipo de acordo vigorava
entre a CMF e o respectivo proprietário.
Em todo o caso, não pôs em causa o teor da pronúncia no que se refere aos
sucessivos contratos de arrendamento ali descritos.
Referiu que em 05.11.90 participou numa reunião do executivo (então na
qualidade de veradora) onde o verador que tinha o pelouro do ambiente (verador
Campos) informou que o Eng. Menezes Basto – que à data recebia 25.000$00 de renda
por mês – queria por termo à deposição de lixo no seu terreno, permitindo porém a
deposição por mais um ano, impondo a vedação do terreno e o pagamento de uma renda
mensal de 200.000$00. Nessa reunião, com a abstenção da depoente, foi aprovada uma
contraproposta que consistia no pagamento de 60.000$00 mensais de renda e a
deposição de lixo por mais 14 meses, sendo certo que por cada dia de atraso na
devolução de tal terreno a CMF pagaria 30.000$00 a título de cláusula penal,
contraproposta essa que terá sido aceite pelo Eng. Menezes Basto (cfr. os contratos de
arrendamento juntos a fls 7, 11 e 12 do apenso 98).
Ora, o contrato de arrendamento celebrado nas condições descritas terminou em
Janeiro de 1992 sem que a CMF tivesse uma alternativa quanto ao local de deposição do
lixo, sendo certo que diariamente eram recolhidas cerca de 60 toneladas por dia, dos
quais cerca de metade eram lixos domésticos e outra metade residos industriais, em
especial provenientes da indústria do calçado.
Simultaneamente, o Eng. Menezes Basto exigia a devolução do terreno e o
pagamento da indemnização fixada a título de clausula penal por cada dia de atraso.
É nesse contexto que o presidente da elididade de então (o arguido Júlio Faria), a
04.02.92, informa os serviços desse facto, tendo entretanto convencido o respectivo
proprietário a prorrogar o contrato de arrendamento por mais 6 meses e que terminaria
em Julho de 1992, tendo porém o Eng. Menezes Basto exigido uma renda mensal de
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
150.000$00 e uma cláusula penal de 60.000$00 por cada dia de atraso na devolução do
terreno, o que foi aceite pelo executivo camarário na medida em que não existia uma
solução alternativa.
Sucede porém que, no final de Julho de 1992, a CMF não tinha ainda soluções
alternativas, visto que outras localizações para a deposição dos lixos eram alvo de
contestação popular.
Em face dessa realidade, a CMF convenceu o Eng. Menezes Basto a prorrogar
por mais 7 meses e pela última vez o contrato de arrendamento (até Agosto de 1993),
numa altura em que ali eram depositadas cerca de 70 toneladas de lixo por dia.
Ora, no final de Agosto de 1993, o Eng. Menezes Basto mostrava-se irredutível
em negar a continuação da deposição do lixo no seu terreno (dado o problema de saúde
pública e de degradação ambiental gerada pela deposição do lixo a céu aberto sem
qualquer tratamento, além de que ele vivia nas imediações da lixeira), sendo certo que a
deposição dos lixos tinha já ultrapassado a área que tinha sido arrendada à CMF.
Foi assim nesse contexto que o arguido Júlio Faria contactou com o arguido
Vítor Borges, enquanto presidente do Conselho de Administração da “Resin” – uma das
poucas empresas na altura com “know how” para tratar os lixos e que a depoente
conheceu através do presidente da AMVS -, no sentido de convencer o Eng. Menezes
Basto a permitir a continuação da deposição dos lixos (mas em moldes
substancialmente diferentes quanto à forma de deposição, de modo a eliminar os riscos
para a saúde pública e para o ambiente).
Foi pois o arguido Vítor Borges quem convenceu o Eng. Menezes Basto de que
era possível tratar os lixos, tendo este inclusive visitado em França, por ocasião das suas
férias, um aterro sanitário.
Entretanto, uma vez que o arguido Júlio Faria esteve doente durante cerca de 2
meses, a depoente substituiu-o nesse período de tempo à frente dos destinos da
edilidade, tendo sido por isso ela a apresentar ao executivo camarário a proposta de
celebração do contrato de transacção com o Eng. Menezes Basto, nos modes constantes
da pronúncia, em Outubro de 1993, e pelas razões explicitadas em tal proposta, que
reafirmou.
Confirmou assim os termos do contrato de transacção celebrado com o Eng.
Menezes Basto nos moldes constantes nos autos.
Justificou o facto de caber ao Eng. Menezes Basto a obrigação de reabilitação da
lixeira (não obstante ter sido a CMF, com a deposição dos lixos, quem degradou o
terreno) pelo facto de ser o titular do respectivo direito de propriedade (justificação que
não colhe inteiramente em face das declarações prestadas pelos arguidos Júlio Faria e
Vítor Borges).
Justificou a escolha da “Resin” para a reabilitação da lixeira de Sendim pelo
facto de ser das poucas empresas em Portugal com “Know how” para o efeito e dos
preços praticados serem mais baixos, sendo certo que a “Resin” dispunha do alvará de
empresas com quem se consorciava para realizar as obras necessárias para o efeito.
Referiu que o custo da reabilitação foi 32.410.480$00, precisamente o montante
constante do contrato de transacção, pelo que tal verba terá sido utilizada pelo Eng.
Menezes Basto para pagar os trabalhos de reabilitação da lixeira levados a cabo pela
“Resin”, o que desmente os termos constantes de tal contrato quanto à finalidade de tal
verba, tratando-se a celebração de tal contrato um estratagema que visava afinal permitir
o pagamento de tais trabalhos levados a cabo pela “Resin” (cfr. as declarações dos
arguidos Júlio Faria e Vítor Borges). Isto é, ao contrário do que expressamente
reconheceu e do que consta do documento respectivo, a celebração do contrato de
transacção visava o pagamento dos trabalhos de reabilitação da lixeira de Sendim
225
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
levados a cabo pela “Resin” (o que aliás se depreende também das suas declarações
acerca da real razão para a celebração do aditamento a tal contrato).
Referiu ignorar quem pagou as despesas relativas ao visto do TC, mas admitiu
que a “Resin” pagou algumas despesas (cfr. fls 226 do ap. 97 e 53 L do ap. 98).
Confirmou os termos do contrato-promessa de compra e venda do terreno onde
eram depositados os lixos, bem como os termos da escritura pública de compra e venda,
nos termos constantes da pronúncia.
Salientou a urgência na aquisição de tal terreno, já que os lixos continuavam a
ser depositados diariamente (mesmo para além do período do contrato de
arrendamento), razão pela qual era inconveniente submeter tal assunto à Assembleia
Municipal de Felgueiras (que normalmente reunia cinco vezes por ano, sem prejuízo da
realização de assembleias extraordinárias), o que em todo o caso seria necessário caso o
preço de aquisição ultrapassasse os 25.000 cts. Daí que, segundo se depreende do seu
depoimento, o preço se tenha cifrado em 24.754.820$00 (existe porém um diferencial
de 1.000.000$00, também recebidos pelo Eng. Menezes Basto, o que indicia que o
preço realmente acordado foi afinal de 25.754.820$00).
Ora, segundo referiu, o prazo de 6 meses previsto no contrato de transacção
terminou por alturas de Abril de 1994, altura em que a CMF deveria celebrar com o
Eng. Menezes Basto a escritura de compra e venda de tal terreno (cfr. os termos do
contrato-promessa), o que não foi possível pois este não tinha registado em seu nome o
direito de propriedade respectivo, além de que nessa altura a CMF não dispunha de
dinheiro para o pagamento do respectivo preço.
Consequentemente, só em Dezembro de 1994 se realizou a dita escritura de
compra e venda.
Não obstante, a “Resin” não deixou de trabalhar na lixeira entre Abril de 1994 e
Dezembro do mesmo ano, razão pela qual teriam de ser pagos os serviços prestados, não
obstante inexistir qualquer contratualização, dada a premencia do problema da recolha e
tratamento dos lixos e inexistência de outras alternativas.
A “Resin”, por seu turno, tinha interesse em manter-se no local já que pretendia
conquistar mercado no norte do país, sendo certo que operava também em Paços de
Ferreira e em Lousada sem qualquer contratualização. Porém, ameaçava demandar a
CMF e proceder à interrupção dos trabalhos de manutenção da lixeira caso não fosse
pago o valor correspondente a esses trabalhos (mais adiante, porém, referiu que a
“Resin” exigia o pagamento desses serviços ao Eng. Menezes Basto, razão pela qual
este fazia chegar à “Resin” o dinheiro que recebia da CMF e que não respeitavam à
aquisição do terreno, depreendendo-se do seu depoimento que a “Resin” recebia o
dinheiro do Eng. Menezes Basto na medida em que este recebesse da CMF o respectivo
pagamento).
Foi nesse contexto, em Fevereiro de 1996, já depois de ter assumido a
presidência da CMF (já que o arguido Júlio Faria foi eleito deputado na Assembleia da
República em Outubro de 1995), que submeteu à aprovação do executivo uma proposta
de aditamento ao contrato de transacção referido pelas razões mencionadas na mesma.
Ora, nesses termos veio a ser celebrado com o Eng. Menezes Basto o aditamento
referido ao contrato de transacção, que realmente mais não visava que o pagamento à
“Resin” dos trabalhos de manutenção da lixeira que entretanto vinha fazendo, segundo
se depreende do depoimento da arguida Fátima Felgueiras, e cujo pagamento não estaria
coberto pelo contrato de transacção inicialmente celebrado.
Confirmou os pagamentos efectuados no âmbito do contrato de transacção e
respectivo aditamento, nos moldes constantes da pronúncia (cfr. os documentos a
propósito mencionados na pronúncia, quer do processo principal quer do ap. 98).
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
- Arguido Júlio Faria
Referiu que em Agosto de 1993 o Eng. Menezes Basto queria por fim à
deposição do lixo no seu terreno em Sendim, o que já ocorria desde 1982, sendo certo
que em 1986 fizeram um acordo sucessivamente renovado em condições mais gravosas
para a CMF. De resto, já em 1992 havia sido, sem sucesso, tentada a transferência da
deposição do lixo para Barrosas.
Confirmou os termos do acordo celebrado entre a CMF e o Eng. Menezes Basto
conforme consta da pronúncia.
Já na altura as Câmaras Municipais de Felgueiras, Paços de Ferreira e Lousada
buscavam uma solução intermunicipal para o problema da recolha e tratamento do lixo,
perspectivando-se a construção de um aterro sanitário intermunicipal e com recurso a
fundos comunitários.
Sucede que, inexistindo na altura qualquer solução intermunicipal para o
problema da recolha e tratamento do lixo, findo o período de vigência do contrato
celebrado com o Eng. Menezes Basto, uma vez que inexistia terreno alternativo para a
deposição do lixo do concelho, a CMF não entregou o imóvel conforme estipulado
(sendo certo que já na altura, com a deposição do lixo, se ocupava terreno não incluído
no contrato de arrendamento celebrado com o Eng. Menezes Basto, visto que a área de
deposição do lixo era já de cerca de 3.000 m2).
Por força desse facto houve uma reunião entre o arguido Vítor Borges (que o
depoente havia contactado) e o Eng. Menezes Basto, onde se procurou sossegar as
preocupações deste relativamente à forma como no futuro ali se iria continuar a
proceder ao deposito dos lixos (foi pois necessário convencê-lo de que a deposição dos
lixos no local iria processar-se em moldes radicalmente diferentes, de modo a evitar a
combustão, os fumos e os maus cheiros, tendo inclusivamente o Eng. Menezes Basto
visitado em França um aterro sanitário a convite do arguido Vítor Borges).
Criaram-se assim condições para a celebração do contrato de transacção referido
nos autos (cfr. fls 52 do apenso 98), cuja proposta foi preparada pelos Serviços
Administrativos e Jurídicos da CMF.
Mais referiu que foi o depoente quem escolheu a “Resin” para operar no local
(pois era a única, segundo sabia, que tinha o “know how” necessário), o que foi
aprovado pelo executivo camarário com a concordância do Eng. Menezes Basto.
A respectiva proposta foi assim apresentada pela arguida Fátima Felgueiras ao
executivo camarário (não o foi pelo depoente, enquanto Presidente da edilidade, na
medida em que entre Setembro e Novembro de 1993 foi substituído por ela por motivo
de doença – cfr. fls 63 do apenso 98).
O valor encontrado teve por base o preço praticado pela “Resin” relativamente
aos serviços que se propunha fazer no local (depósito dos lixos de forma ordenada e
controlada, cobertura com terra vegetal de modo a evitar a combustão, vedação do
terreno, colocação de um vigilante e utilização da maquinaria necessária à execução dos
trabalhos).
Na mesma altura propôs-se também a aquisição do terreno referido.
Os 32.410.480$00 referidos no contrato de transacção destinavam-se na verdade
a pagar os serviços a prestar pela “Resin” e não, no todo ou em parte, ao pagamento
duma indemnização pelos prejuízos sofridos pelo Eng. Menezes Basto pelo
incumprimento por banda da CMF dos acordos anteriormente celebrados.
Aliás, não tem qualquer recordação de alguma vez o Eng. Menezes Basto ter
exigido à CMF qualquer indemnização (antes da intervenção da “Resin” o dito Eng.
propunha-se apenas impedir a CMF de continuar a depositar os lixos naquele local).
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Referiu que coube ao Eng. Menezes Basto a reabilitação do terreno pelas razões
já expandidas pela arguida Fátima Felgueiras.
A liquidação dos montantes ao Eng. Menezes Basto foi feita em prestações,
sendo certo que ele fazia chegar o dinheiro à “Resin”, de modo que esta pudesse
continuar com os trabalhos.
Aliás, ao que pensa, a “Resin” começou no local os trabalhos em Dezembro de
1993, tendo realizado os serviços constantes do contrato de transacção.
Mais referiu que se o contrato-promessa de compra e venda do dito terreno
ultrapassasse os 25.000 contos teria a sua aquisição de ser submetida à aprovação da
Assembleia Municipal (cfr. o respectivo contrato-promessa de compra e venda,
constante de fls 80 do apenso 98).
Aliás, não era conveniente submeter tal questão à Assembleia Municipal na
medida em que o problema dos lixos era premente (pelas razões já referidas, isto é, em
suma, pela falta de local alternativo e pelo problema ambiental e de saúde pública que
eram gerados pela forma como eram depositados os lixos na lixeira de Sendim) e dado
que já se vivia em clima pré eleitoral relativamente às eleições autárquicas de 1993 (e
essa questão poderia-se tornar numa arma de arremesso político por parte da oposição).
Afirmou que o preço de aquisição desse terreno é o que consta do contratopromessa e respectiva escritura pública de compra e venda, isto é, 24.754.820$00 (e não
25.754.820$00). Recorda-se porém que, de facto, a proposta incial do Engenheiro
Menezes Basto ultrapassava os 25.000 contos, de modo que o conseguiu convencer a
baixar o preço por forma a que o assunto não tivesse de ser submetido à aprovação da
Assembleia Municipal, pelas razões já referidas.
Referiu ignorar quem assumiu o pagamento das despesas com o visto do
Tribunal de Contas no que concerne ao contrato de transacção referido.
Por fim, visto que na altura já não exercia qualquer cargo autárquico, salientou
ser alheio ao aditamento ao dito contrato de transacção.
- Arguido Vítor Borges
Reafirmou o que a propósito já referiu, designadamente que o contrato de
transacção em apreço (cfr. doc. de fls 52 e ss. do apenso 98) servia para que a CMF
pagasse ao Eng. Menezes Basto a reabilitação da lixeira de Sendim e de modo a que
este pagasse à “Resin” os trabalhos que ali levava a cabo.
Confirmou que a “Resin” suportou o custo com o visto do Tribunal de Contas
(cfr. fls 226 do apenso 97 e 531 do apenso 98).
Quanto à venda do terreno pelo Eng. Menezes Basto à CMF (cfr. o respectivo
contrato-promessa de compra e venda a fls 80 e ss. do apenso 98 e o contrato definitivo
constante de fls 83 e ss. do mesmo apenso 98) reafirmou o que já havia dito, ignorando
ao certo qual foi o preço estabelecido entre as partes (na ordem dos “vinte e tal contos”,
segundo lhe disse a dita testemunha Menezes Basto).
Ainda a propósito do contrato-promessa de compra e venda do terreno onde
estava implantada a lixeira de Sendim e do respectivo contrato definitivo, recorda-se do
Eng. Menezes Basto lhe ter referido ter celebrado o mencionado contrato-promessa e
que não havia ainda sido celebrada a escritura por problemas existentes com o terreno
(que o arguido não soube explicar quais. A razão adiantada por outros arguidos foi a de
que o registo não estaria actualizado, de modo que houve a necessidade de que o Eng.
Menezes Basto o registasse primeiro em seu nome, o que terá motivado o atraso na
celebração da escritura de compra e venda do imóvel, que apenas teve lugar a 27.12.94
– cfr., em todo o caso, a respectiva certidão da Conservatória do Registo Predial
competente).
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Quanto ao aditamento ao dito contrato de transacção explicou a necessidade da
sua celebração na medida em que o primeiro contrato apenas cobria a reabilitação da
lixeira durante 6 meses (até Maio de 1994) ao preço de 2.800.000$00 mensais (já não se
recorda se com IVA incluído ou não; parece em todo o caso que a tal montante deveria
acrescer o IVA a 5% em face das facturas juntas aos autos). Consequentemente, haveria
que pagar o trabalho de exploração dessa lixeira pela “Resin” no período compreendido
entre Junho e Dezembro de 1994 (inicialmente havia referido entre Junho e novembro
de 1994, corrigindo depois as suas declarações do modo referido), sendo certo que
inicialmente a “Resin” havia directamente emitido as facturas respectivas à CMF (por a
considerar a responsável pela deposição do lixo no local), as quais foram recusadas por
falta de suporte administrativo para as pagar pelas razões já referidas, segundo lhe
explicou a testemunha Teresinha (ou seja, enquanto o terreno não fosse adquirido pela
CMF não era possível efectuar um ajuste directo à “Resin” desses trabalhos).
Em face de tal devolução, mantiveram as facturas em causa mas retiraram o
nome da CMF e colocou-se o nome do Eng. Menezes Basto (cfr. a propósito as
declarações prestadas pelo arguido Carlos Marinho e as facturas em causa juntas na
audiência de julgamento tal como originalmente haviam sido emitidas), tendo-lhe sido
enviadas, o que lhes permitiria ao menos recuperar o IVA pago ao Estado (chegou a
explicar ao Eng. Menezes Basto a razão de tal procedimento, sendo certo que já sabia
que ele as não iria liquidar, conforme aliás lho referiu).
A forma de se ultrapassar a situação (de modo a permitir que a testemunha
Menezes Basto liquidasse tais facturas) foi assim a celebração do dito aditamento ao
contrato de transacção (cfr. a proposta apresentada a 08.02.96 pela arguida Fátima
Felgueiras, constante de fls 55 e ss. do apenso 98).
Sucede que esse aditamento apenas cobria 7 meses de trabalhos (entre Junho e
Dezembro de 1994), faltando ainda liquidar trabalhos executados ao longo de mais 11
meses no local (daí a abertura do concurso a que se reporta o ponto 1.3. da pronúncia).
Questionado acerca do facto do aditamento ao contrato de transacção apenas
cobrir o pagamento de 7 meses de trabalhos respondeu que tal se terá devido ao facto de
se prever a aquisição do terreno pela CMF findo esse período (cfr. o respectivo
contrato-promessa de compra e venda, onde se estipulava que a escritura seria celebrada
na primeira quinzena de Abril de 1994; porém, esse contrato só viria a ser celebrado a
27.12.94, conforme emerge do respectivo documento constante de fls 83 e ss. do apenso
98).
Confrontado com vários documentos do apenso 97, entre os quais os de fls 213,
345 e 347 referiu que nunca viu os cheques referidos na pronúncia (pois não tratava dos
assuntos da contabilidade), ignorando mesmo quanto foi recebido pela “Resin” a
propósito do aditamento ao contrato de transacção já referido, tendo porém a ideia que
parte do crédito (contabilisticamente detido sobre o Eng. Menezes Basto em face da
alteração das facturas quanto ao seu destinatário) foi colocado numa conta de créditos
de cobrança duvidosa, remetendo para o arguido Carlos Marinho as respectivas
explicações em face das funções que este exerceu na “Resin” (a ideia foi, em todo o
caso, obter uma vantagem fiscal).
Sem ter a certeza, tem a ideia de se ter enviado muitos faxes à CMF a solicitar o
pagamento e ponderou suspender os trabalhos por falta de pagamento.
Em todo o caso, assegurou que o Eng. Menezes Basto nada pagou em numerário
à “Resin”.
- Arguido Carlos Marinho
229
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Referiu que não teve qualquer intervenção na celebração do contrato de
transacção em apreço, celebrado entre a CMF e o eng. Menezes Basto, apenas dele
tomando conhecimento já no decurso deste processo.
De resto, não participou em qualquer reunião onde esse tema fosse abordado,
tendo apenas alertado o arguido Vítor Borges da falta de rentabilidade do preço
praticado para a reabilitação da lixeira de Sendim (2.800.000$00 + IVA por mês), pois
pagavam mensalmente à “Translousada” 1.600.000$00 + IVA, colocaram no terreno
três homens e o custo da estrutura montada rondava os 8 a 10%.
Confirmou que foi a “Resin” quem suportou o pagamento do visto do TC,
conforme confirmou nos documentos contabilísticos a que teve acesso, ignorando
porque motivo foi a “Resin” a suportar esse custo, quando tal despesa caberia ao dono
da obra.
No que concerne ao aditamento ao contrato de transacção esclareceu que após a
conclusão dos trabalhos de reabilitação da lixeira de Sendim, em Maio de 1994, a
“Resin” manteve-se a operar no local (exploração da lixeira), passando a CMF a ser
responsável pelo pagamento das respectivas facturas.
Assim, desde Junho de 1994 a Outubro de 1995 a “Resin” fez a exploração
dessa lixeira, facturando mensalmente à CMF 2.800.000$00 + IVA.
No final de 1995 o arguido Vítor Borges teve uma reunião na CMF e nessa
altura devolveram-lhe as 17 facturas em causa visto que por razões administrativas a
CMF as não podia liquidar, sendo certo que parte delas iriam ser debitadas ao Eng.
Menezes Basto.
Por esse motivo, tais facturas foram anuladas, tendo aconselhado o arguido Vítor
Borges a que se procedesse à substituição nas facturas originais da identidade do sujeito
passivo (que passou a ser o Eng. Menezes Basto até Janeiro de 1995 – altura em que
deixou de ser proprietário do terreno onde estava implantada a lixeira - e a
“Translousada” a partir de então), dessa forma se evitando uma fiscalização das
Finanças que por certo quereria averiguar a razão de tal procedimento. Para provar o
que afirmou exibiu e juntou aos autos as ditas 17 facturas emitidas à CMF e referentes
àquele período de tempo.
Assegurou que nas facturas compreendidas entre Junho de 1994 e Janeiro de
1995 foi substituída a CMF pelo Eng. Menezes Basto como sendo a entidade a quem
foram emitidas porquanto em Janeiro de 1995 o dito Eng. Manezes Basto deixou de ser
o proprietário do terreno onde se situava a lixeira, pelo que formalmente deixava de ser
responsável por qualquer pagamento (está documentado nos autos que o contrato de
compra e venda ocorreu em Dezembro de 1994).
Nas facturas compreendidas entre Fevereiro de 1995 e Outubro do mesmo ano
substituíram a CMF como sujeito passivo pela “Translousada”. A testemunha não deu
uma explicação para tal.
Referiu que a reabilitação da lixeira foi integralmente paga, tendo explicado os
documentos constantes dos autos e que documentam esses pagamentos (indicados na
pronúncia), em que essencialmente o Eng. Menezes Basto recebia da CMF e fazia
chegar esse dinheiro à “Resin”, chegando porém a emitir um cheque pessoal.
Assim, o cheque da CMF nº 5207652505, datado de 30.03.94 (constante de fls
347 do apenso 97), foi endossado pelo Eng. Menezes Basto e destinou-se ao pagamento
da factura nº 663, de Dezembro de 1993, constante de fls 218 do apenso 97 (cfr. o
depósito constante de fls 227 e o respectivo recibo de fls 225, todos do mesmo apenso
97).
Já o cheque nº 8284328904, emitido pela CMF a 22.06.95 (constante de fls 345
do apenso 97), foi também endossado à “Resin” pelo Eng. Menezes Basto e destinou-se
230
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
ao pagamento das facturas nºs 940056, de Janeiro de 1994 (constante de fls 220 do
apenso 97), 9402116, de Fevereiro de 1994 (constante de fls 221 do apenso 97), factura
nº 9400177, de Março de 1994 (constante de fls 222 do apenso 97) e parte da factura nº
9400251, de Abril de 1994 (constante de fs 223 do apenso 97). Cfr. ainda o depósito de
fls 231 (a 23.06.95) e o recibo de fls 230, de 03.06.95, todos do mesmo apenso 97.
Já o cheque pessoal do Eng. Menezes Basto nº 22543202, no montante de
5.000.000$00, destinou-se ao pagamento do remanescente (3.940.320$00) da factura nº
9400251, de Abril de 1994 (constante de fls 223 do apenso 97) e parte da factura nº
9400319, constante de fls 228 do apenso 97 (1.059.680$00). Cfr. ainda o recibo de fls
232, datado de 06.07.95 e o talão de depósito de fls 234, todos do apenso 97.
Quanto a este cheque de 5.000.000$00 emitido pelo Eng. Menezes Basto a favor
da “Resin”, constante de fls 338 do apenso 98 (o depósito consta de fls 234 do mesmo
apenso), não sabe porque razão foi emitido um cheque pessoal daquele.
Por fim, em Julho de 1996 o Eng. Menezes Basto pagou o remanescente da
factura nº 9400319 e parte da factura nº 9400480, constante de fls 203 do apenso 97,
datada de 29.07.94, através do endosso do cheque nº 9811598309, datado de 25.06.95 e
emitido a seu favor pela CMF, tendo sido emitido o correspondente recibo constante de
fls 213 do apenso 97 e datado de 26.06.96.
Tal testemunha assegurou que a “Resin” não recebeu do Eng. Menezes Basto
qualquer quantia em numerário, sendo certo que o recibo de fls 213 do apenso 97
reporta-se ao pagamento das facturas por si já indicadas, efectuado através do endosso
do cheque nº 98115983309, emitido pela CMF a 25.06.95.
Aliás, afirmou que o dito eng. nenhum outro pagamento efectuou.
A dívida (respeitante também à exploração da lixeira) transitou de ano para ano
desde 1994 na contabilidade da “Resin”, pelo que em Outubro/Novembro de 1998 foi
constituída uma provisão para clientes de cobrança duvidosa por forma a eliminar tal
dívida da contabilidade, desistindo pois a “Resin” de cobrar uma quantia que rondava os
24.000.000$00. Tal procedimento foi adoptado sem que lhe dessem qualquer explicação
por parte da administração, tendo-lhe transmitido porém que havia a expectativa de
receber esse dinheiro. Ignora se a “Resin” chegou a adoptar algum procedimento para a
receber, sendo certo que, se formalmente era o Eng. Menezes Basto o devedor, o certo é
que o real devedor era a CMF.
Só o fizeram em 1998 porque só nesse ano é que a “Resin” teve condições para
considerar essa dívida como custo.
Referiu ainda que não se recorda com que base fez a facturação da reabilitação
da lixeira, adiantando porém que o deverá ter feito segundo notas escritas do arguido
Vítor Borges.
Confirmou que veio de França uma máquina necessária para se dar início aos
trabalhos de rabilitação (cfr. doc. junto na audiência de julgamento), tendo visitado a
lixeira uma única vez (o mesmo sucedendo ao aterro).
A exploração da lixeira já foi efectuada com o recurso aos serviços da
“Translousada”, segundo as facturas por ela apresentadas.
A reabilitação importou em cerca de 31.000.000$00 (IVA incluído) e a
exploração em cerca de 26.000.000$00. Tais trabalhos foram facturados ao Eng.
Menezes Basto, tendo ficado em dívida cerca de 24.000.000$00, sendo certo que era a
CMF a real devedora. Expressou a propósito a ideia de que ficaram por pagar parte dos
trabalhos de exploração reportados a um tempo em que era a CMF a cliente de facto
mas não a proprietária do terreno onde se situava a lixeira, o que a impedia de
formalmente assumir o pagamento desses serviços prestados pela “Resin”.
Assegurou que a “Norlabor” não trabalhou na lixeira de Sendim.
231
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Nega ter alguma vez tido qualquer contacto com o arguido Barbieri Cardoso,
sendo certo que não conhecia pessoalmente quer a arguida Fátima Felgueiras quer o
arguido Júlio Faria.
- Arguido Barbieri Cardoso
Referiu não ter estado na reunião em Lousada onde a “Resin” se apresentou aos
autarcas, conforme referido pelo arguido Vítor Borges.
Contudo, esteve presente numa reunião que se realizou em Paços de Ferreira a
13.05.93, presidida pelo Eng. António Taveira, então Secretário de Estado dos Recursos
Naturais, onde se discutiu a problemática da recolha e tratamento do lixo e da
dificuldade da resolução desse problema a nível meramente municipal, concluindo-se
pela necessidade de uma solução conjunta intermunicipal entre os municípios do Vale
do Sousa.
Nessa reunião participou o arguido Vítor Borges (em representação da “Resin”)
e o Sr. Xavier Bonelle (em representação da “Déchets”).
O dito Secretário de Estado admitiu então a construção de dois alvéolos na
lixeira da Lustosa (Penafiel) e o encerramento das lixeiras, entre as quais a de Sendim.
Entretanto, foi remetido um ofício do Ministério da Administração Interna ao
CEFF (o qual porém apenas deu entrada na CMF a 11.08.93), que na altura era
presidido pelo Prof. Campos, o qual despachou no sentido de lhe ser remetido tal
expediente uma vez que era também o vereador responsável pela área do ambiente.
Em face desse expediente recebido do Ministéro da Administração Interna, o
depoente deslocou-se duas vezes, no final de Agosto de 1993, à lixeira de Sendim, onde
encontraram o Eng. Menezes Basto acompanhado de um técnico da “Portucel” (empresa
que explorava a floresta no local) e que ameaçava rescindir o contrato que tinha com o
dito eng. se o problema da lixeira não se resolvesse devido aos incêndios.
Recorda-se que numa das deslocações ele estava também acompanhado do
arguido Vítor Borges.
Foi nessas circunstâncias que travou conhecimento com o Eng. Menezes Basto
(antes disso, nas reuniões de câmara, ouvia apenas falar dele e dos contratos de
arrendamento que tinha celebrado com a CMF, sendo certo que, em todo o caso, era o
Sr. José da Silva Magalhães – encarregado-geral da CMF – quem o contactava
pessoalmente).
Recorda-se que nessa altura o arguido Júlio Faria – então presidente da edilidade
- informou-o que a “Resin” havia sido contactada para apresentar uma solução para a
lixeira de Sendim. O depoente foi acompanhando a evolução da situação nas reuniões
de coordenação na CMF, pois o arguido Júlio Faria solicitava consultas ao
Departamento Técnico acerca de aspectos técnicos.
Foi consultado antes de ter sido celebrado o contrato de transacção com o Eng.
Menezes Basto, tendo sido encetadas negociações com este e com o Sr. Moura Borges
(proprietário dos terrenos vizinhos e que também haveriam de ser adquiridos pela CMF
para o mesmo fim) para adequarem os respectivos terrenos à deposição dos lixos.
A exploração provisória da lixeira de Sendim foi sendo feita a par da sua
reabilitação desde Dezembro de 1993 (antes disso não tem conhecimento nem notícia da
“Resin” operar no local).
Explicou que a CMF não celebrou na altura qualquer contrato com a “Resin”,
apesar de ser esta quem operava na lixeira de Sendim, na medida em que não era a
proprietária do terreno onde tal lixeira estava implantada e o Eng. Menezes Basto não
queria transmitir a propriedade do imóvel até se assegurar de que a realibilitação da
lixeira era concretizada, além que de que a “Resin” não possuía o alvará necessário para
232
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
levar a cabo as obras no local e por isso tal empresa apenas poderia ser considerada uma
prestadora de serviços (esclareceu que à data da sua inquirição na fase de inquérito
desde processo a única ideia que tinha para a não contratualização com a “Resin” era a
falta de alvará desta última).
O arguido Júlio Faria decidiu então celebrar o contrato de transacção com o Eng.
Menezes Basto como forma de se ultrapassar a questão, naturalmente depois de
consultar a assessoria jurídica.
Pronunciou-se o depoente acerca do documento de fls 98 e ss. do apenso 98, no
que aos aspectos técnicos concerne.
Assegurou que a missão de reabilitação foi executada no local conforme fotos
juntas aos autos a fls 11736 e ss. do 45º volume e de acordo com o que estava previsto.
Foi ao local de vez em quando acompanhar a execução dos trabalhos, razão pela
qual se lembra de ver ali uma máquina francesa e de outra maquinaria, não se
recordando se as mesmas estavam ou não identificadas com o logotipo ou outro sinal
identificativo de alguma empresa, sendo certo que nunca se interessou em saber a quem
pertenciam. Chegou a falar algumas vezes com o encarregado da “Resin” e com a Engª
Claudia Reibeiro.
Crê que lhe transmitiram que a “Translousada” também trabalhava no local.
O chefe da Divisão dos Serviços Urbanos (Eng. Adelino Leite) dava-lhe conta
também de que não tinha problemas com a deposição do lixo em face das obras que iam
sendo executadas no local.
Assegurou que era a “Resin” e a “France Déchets” quem executavam os
trabalhos referidos.
Recorda-se do arguido Júlio Faria ter estado doente e de ter sido substituído pela
vice-presidente da autarquia, a arguida Fátima Felgueiras.
Recorda-se ainda de terem sido adquiridos três terrenos contíguos, um
pertencente ao Eng. Menezes Basto, com a área de 22.160 m2 (onde ocorria a deposição
dos lixos), e dois ao Sr. Moura Borges (com as áreas de 3.135 m2 e 6.980 m2).
A proposta inicial efectuada pelo Eng. Menezes Basto quanto ao preço de venda
ultrapassava os 30.000.000$00, o que lhe pareceu excessivo, sendo certo que foi
chamado a pronunciar-se acerca do valor dos terrenos em causa.
Deu conta que ignora se o preço acordado entre as partes é ou não coincidente
com o que consta do contrato-promessa e da escritura pública de compra e venda.
Tem ideia que houve atraso na celebração desta última porquanto o Eng.
Menezes Basto “não tinha em ordem os documentos” necessários à concretização do
negócio (cfr. a este propósito a respectiva escritura, designadamente fls 84 verso do
apenso 98, donde emerge que o Eng. Menezes Basto só logrou proceder ao registo do
imóvel em seu nome no dia 11.04.94, o que terá justificado o dito atraso).
Quanto ao aditamento ao contrato de transacção celebrado com o Eng. Menezes
Basto, salientou que os trabalhos foram prosseguindo sem qualquer contratualização
formal com a “Resin”, havendo pois que encontrar soluções que não passassem pela
celebração de contratos de transacção no futuro.
Sabia que existiam facturas emitidas pela “Resin” à CMF sem suporte
administrativo que permitisse o pagamento por parte desta última.
A arguida Fátima Felgueiras foi pois confrontada com essa situação desde Junho
de 1994, isto é, existência de facturas para as quais inexistia suporte administrativo que
permitissem o respectivo pagamento.
Equacionaram-se pois quais as soluções necessárias para resolver esse problema,
que se arrastava desde Junho de 1994 e quais as soluções a adoptar para as situações
futuras.
233
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Ora, em Setembro/Outubro faz-se o planeamento do orçamento camarário e até
Janeiro de 1995 a solução não passava pela abertura de um concurso limitado (visto que
o contrato de compra e venda do terreno só produziu todos os seus efeitos após o visto
do TC em 16.01.95). Assim, a solução adoptada foi a do aditamento ao contrato de
transação para o pagamento dos trabalhos até Dezembro de 1994.
Ora, quer a decisão de se proceder ao aditamento ao contrato de transacção
celebrado com Eng. Menezes Basto, quer a decisão de se proceder à abertura do
concurso a que se reporta o ponto 1.3 da pronúncia, quer a decisão de se proceder ao
ajuste directo à “Resin” (ponto 1.4 da pronúncia) foram tomadas na mesma reunião de
coordenação, de modo a solucionar o problema do pagamento dos trabalhos efectuados
até então e de modo a solucionar o problema do pagamento dos trabalhos a executar no
futuro na lixeira de Sendim.
Tais soluções foram já equacionadas na preparação do orçamento camarário para
1996 (em reuniões mais alargadas) sendo certo que, como referiu, o planeamento
orçamental para o ano seguinte efectua-se por norma em Setembro/Outubro de cada
ano.
O contrato de transacção serviu assim para pagar a missão de reabilitação da
lixeira de Sendim, a exploração provisória e o projecto respectivo, de forma assim
indemnizar o Eng. Menezes Basto em ordem à reabilitação do seu terreno e o
aditamento ao contrato de transacção destinou-se ao pagamento dos trabalhos
efectuados na lixeira de Sendim entre Junho de 1996 a Janeiro de 1995, à razão de
2.800.000$00 + IVA (em Janeiro de 1995 o IVA passou de 16 para 17%).
A cláusula inserta no contrato-promessa de compra e venda referido nos autos de
entrega do terreno prometido vender visava salvaguardar a continuidade de deposição
de lixos no local.
A propósito do manuscrito de fls 2275, do 10º volume, efectuado pela
testemunha Teresinha, esclareceu não ter estado na reunião a que ali se faz alusão e,
segundo depreende desse documento, também o arguido Júlio Faraia não terá estado
presente (caso contrário não haveria necessidade de elaborar o documento em causa).
Explicou que os concursos passavam pela Divisão de Apoio Técnico e
Administrativo (cujo chefe era o Eng. José Ferreira), daí o teor do despacho do arguido
Júlio Faria inserto no dito documento de fls 2275.
A propósito do fax de fls 2273 do 10º volume explicou que o GAT (Gabinete de
Apoio Técnico) de Penafiel orientava a pesquisa de terrenos alternativos para neles se
construir aterros sanitários.
Na audiência foi junto um documento respeitante a um fax remetido pela
“Resin” a dar conta do preço praticado para a continuação dos trabalhos (2.800.000$00
+ IVA), documento esse despachado pela arguida Fátima Felgueiras na medida em que
o arguido Júlio Faria se encontrava de férias.
- Testemunha José Joaquim Mesquita Teixeira de Oliveira
Tendo sido inspector da Inspecção Geral de Finanças elaborou vários relatórios
que se encontram juntos aos autos (cfr. fls 2285 e ss., 4140 e ss., 4677 e ss. e 5964 e
ss.).
Confrontado com os documentos de fls 341 e 342 do apenso 97 (missivas
remetida pela “Resin” ao Eng. Menezes Basto no sentido dele confirmar o débito em
causa), presume que esses documentos não chegaram a ser enviados ao destinatário uma
vez que este os não preencheu na parte destinada a tal. Explicou que se tratam de
documentos elaborados pelos Revisores Oficiais de Contas para confirmação de saldos.
234
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Não se tratam de documentos de cobrança de dívidas. Pede-se ao destinatário (devedor)
que confirme o crédito.
Já os documentos de fls 344 e 345 do apenso 97, de igual natureza, terão sido
preenchidos pelo destinatário.
- Testemunha Joaquim de Jesus Osório de Menezes Basto
Referiu que tinha um terreno que começou a ser usado para o depósito do lixo
do concelho de Felgueiras, talvez há mais de 20 anos (o Dr. José Maria Machado Matos
ainda era o presidente da CMF, pelo que tal terá ocorrido nos anos 80).
A primeira abordagem feita ao depoente no sentido de consentir na deposição do
lixo naquele local foi feita pelo Sr. Silva, um funcionário da CMF.
Nessa altura o depoente, como contrapartida, apenas pediu à CMF que
pavimentasse o caminho de acesso à sua residência, o que foi feito. Inexistiu nessa
altura qualquer outra contrapartida.
Asseguraram-lhe que a deposição do lixo no seu terreno seria temporária.
Porém, a deposição do lixo naquele local arrastou-se no tempo, sendo certo que toda a
gente ali depositava lixo, tendo-se mesmo ultrapassado a área inicialmente acordada.
Consequentemente, a lixeira tornou-se um local insuportável, com o lixo amontoado por
todo o lado e de forma desordenada, entrando de vez em quando em combustão.
Falou então com o arguido Júlio Faria, à data presidente da CMF, no sentido
dele encontrar uma solução alternativa, o qual então lhe manifestou a dificuldade em
encontrar outra alternativa.
Durante anos pressionou-o a parar com a deposição dos lixos na sua
propriedade, tendo-se dirigido muitas vezes a CMF com esse desiderato. Não se recorda
de ter ameaçado chamar a GNR e vedar o terreno para parar com a deposição do lixo
nesse local.
Celebrou entretanto com a CMF um contrato de locação (não se recorda de todo
do ano em que tal contrato foi celebrado), enquanto a CMF procurava encontrar um
local alternativo para a deposição do lixo.
Esse contrato veio posteriormente a ser alterado.
É possível que os sucessivos contratos de locação se tenham arrastado de 1986
até 1993.
Não se recorda do montante da última renda paga pela CMF (os montantes eram
discutidos com o arguido Júlio Faria).
Acerca das cláusulas dos diferentes contratos de locação revelou a testemunha
grandes lacunas de memória, tendo sido então confrontado com a cópia dos contratos de
locação referidos, designadamente com os constantes de fls 7, 11 e 12 do apenso 98. A
propósito deste último referiu não ter ideia de ter recebido qualquer indemnização da
CMF pelo atraso na devolução do terreno locado. Confrontado com a cláusula 7ª do
último contrato de locação celebrado (que previa uma indemnização a título de cláusula
penal em caso de mora na entrega do imóvel) confirmou o pagamento de 6.500.000$00.
A CMF entretanto pretendeu adquirir o terreno e o depoente decidiu vendê-lo,
opção mais consentânea com os seus interesses dado o ponto de degradação a que
chegou o dito terreno. Não se recorda quem da CMF lhe propôs o negócio, não se
recordando ainda se nessa altura já conhecia o arguido Vítor Borges (acabou por referir
que foi este arguido quem o aconselhou a vender o terreno, visto que iria sair legislação
comunitária que o responsabilizaria pela reabilitação ambiental do terreno). Assegurou
que a sua esposa não se metia nesses assuntos (assim desmentindo a versão contada
pelo arguido Vítor Borges, o qual referiu que teve de convencer a esposa da testemunha
para que pudesse avançar com a reabilitação da lixeira).
235
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Tem a ideia que os preços foram discutidos com o arguido Barbieri Cardoso,
sendo certo que o vereador José Campos estava presente.
Não se recorda de quanto era o valor da proposta inicial que apresentou à CMF.
Não tem ainda presente por quanto vendeu o terreno; seja como for, o respectivo
preço consta da escritura de compra e venda celebrada. Não tem porém a certeza se o
preço declarado na escritura de compra e venda coincide com o preço realmente
acordado entre as partes.
Admite que a venda ter-se-á concretizado em 1993 ou 1994 (cfr. o documento de
fls 83 do apenso 98, datado de 27.12.94).
A testemunha em causa foi então confrontada com as declarações que prestou
perante a PJ a fls 2062 quanto ao preço de venda e razões da divergência entre o preço
realmente acordado e o que ficou expresso na escritura.
Confirmou então o que a esse propósito declarou à PJ. Recorda-se que foi por
uma questão de ordem técnica que ficou a constar um preço inferior a 25.000.000$00,
caso contrário seria necessária a realização de um concurso público (pensa que terá sido
essa a explicação que lhe foi transmitida pelo arguido Júlio Faria).
Por outro lado, por questões de ordem política, a questão tinha de se resolver
rapidamente (aproximavam-se eleições autárquicas).
Esclareceu que tinha herdado o terreno em causa e que não o tinha registado em
seu nome, tendo apenas diligenciado nesse sentido quando decidiu vender o imóvel à
CMF.
Antes de se ter concretizado a venda tornava-se necessário reabilitar o terreno,
sendo certo que se encontrava depositado lixo por todo o lado, mesmo fora dos limites
da lixeira, quer numa área de cerca de 10.000 m2 ainda pertencente ao depoente quer
ainda numa área de terreno pertencente a um vizinho.
Sugeriu então à CMF que fosse a “Resin” a proceder à reabilitação do terreno
porque entendeu que era a empresa adequada a tal. Porém, não celebrou com ela
qualquer acordo escrito. Como a responsabilidade pelos estragos provocados era da
CMF esta pagaria a reabilitação ao depoente, o qual por sua vez pagaria à “Resin”, daí a
celebração do contrato de transacção com a CMF.
Tomou conhecimento da “Resin” por andar pela lixeira, designadamente o
arguido Vítor Borges (aliás, ninguém o apresentou, tendo travado conhecimento com
ele porque o encontrou na lixeira).
Confirmou que inicialmente se mostrou renitente na capacidade da “Resin”
reabilitar o local, mas entretanto aproveitou o facto de ter ido de férias a França para
visitar um aterro sanitário (da “France Dechéts”), por intermédio do arguido Vítor
Borges, o qual queria convencê-lo de que faria uma reabilitação profissional da lixeira.
Ficou agradado com que viu em França e então acreditou que a “Resin” poderia
reabilitar adequadamente a lixeira, criando uma infra-estrutura semelhante à que vira.
Assim, desde o Verão de 1993 que o lixo passou a ser tratado na lixeira,
compactado e acondicionado, sendo certo que o lixo era depositado diariamente. Pese
embora não se encontrasse diariamente no local, das vezes que ali se deslocou passou a
ver a deposição do lixo efectuada nos moldes referidos.
O valor do contrato de transacção celebrado com a CMF foi de 32.410.480$00,
equivalente ao valor que acordou com a “Resin” (confirmou os termos do contrato de
transacção em causa, cuja cópia se acha a fls 76 e 77 do apenso 98).
Referiu que não foi a CMF a contratar directamente a “Resin” porque tal
obrigaria a um concurso e dada a proximidade das eleições autárquicas, segundo lhe
disse o arguido Júlio Faria.
236
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Tem a ideia que a quantia acordada para a transacção foi paga na totalidade em
prestações. Perguntava na contabilidade da CMF (à testemunha Terezinha do
Nascimento Lopes Domingues Carvalho) quando é que as prestações iriam ser pagas.
Como se deslocava à CMF muitas vezes (à contabilidade para saber dos pagamentos, já
que se registava grande atraso na liquidação do acordado) não era necessário ser avisado
por terceiros (designadamente pela “Resin”) da ocorrência desses pagamentos. Seja
como for, referiu que por vezes o arguido Vítor Borges contactava-o a dar-lhe conta de
que a CMF iria proceder a um pagamento parcial.
Entende que era natural que a “Resin” procurasse junto da CMF saber quando é
que ela iria efectuar ao depoente os pagamentos pois deles dependia os pagamentos
efectuados pelo depoente àquela empresa.
Sobre o assunto dos pagamentos não se recorda de ter tido qualquer conversa
com a arguida Fátima Felgueiras.
Por outro lado, não conhece o arguido Carlos Marinho.
Como referiu, recebia o dinheiro da CMF e pagava à “Resin”, por vezes
endossando à mesma o cheque que recebera da CMF.
Chegou também a depositar o dinheiro na sua conta e a emitir a favor da “Resin”
um cheque sacado sobre a sua conta pessoal.
Não se recorda se chegou a proceder algum pagamento em numerário à “Resin”
(tem a ideia que sim, mas não tem a certeza; mais à frente acabaria por referir não ter
ideia de ter feito qualquer pagamento em numerário, posição que manteve mesmo
depois de confrontado com as declarações que prestou a fls 2803 perante a PJ na fase de
inquérito).
Normalmente aparecia alguém da “Resin” para receber o pagamento sem
necessidade de prévio contacto da sua parte (o que pressupunha que já sabiam do
pagamento efectuado pela CMF, tanto mais que apareciam logo a seguir ao
recebimento).
Não tem ideia de ter feito qualquer pagamento directamente ao arguido Vítor
Borges.
Assim, os 32.410.480$00 destinaram-se à “Resin”.
À testemunha foi perguntado se tinha retirado dos pagamentos recebidos da
CMF a quantia de 1.000.000$00 referente à diferença entre o preço real e o preço
declarado na escritura de compra e venda celebrada com a CMF (e também no contratopromessa de compra e venda celebrado anteriormente), ao que respondeu “que é capaz”
de ter ficado com 1.000.000$00 por esse motivo.
Confirmou ainda os termos do aditamento ao contrato de transacção, celebrado a
28.02.96, conforme documento que consta a fls 57 e 57 verso do apenso 98, no
montante de 26.462.000$00.
Explicou que a sua razão de ser se deveu ao facto dos trabalhos se terem
prolongado por muito tempo e o dinheiro não chegar para pagar esses trabalhos, sendo
certo que “do seu bolso” nada pagou à “Resin” (só lhe pagava o que recebia da CMF).
De resto, até Dezembro de 1994 o terreno ainda era seu, de modo que era suposto que o
dinheiro que deveria receber da CMF se destinasse ao pagamento da reablitação da
lixeira e num seu terreno confinante com ela, onde também abusivamente se havia
depositado lixo.
A questão preocupava-o na medida em que tinha um terreno que confinava com
a área da lixeira e onde também se depositaram lixos, daí que também tivesse tal área de
ser reabilitada.
Nunca pediu à CMF qualquer indemnização, só pedindo à arguida Fátima
Felgueiras (à data presidente da edilidade) a conclusão da reabilitação do terreno. O
237
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
dinheiro que recebesse a propósito do aditamento era para pagar a quem o depoente
entregasse a conclusão dos trabalhos de reabilitação.
Referiu que contratou homens para limpar o seu terreno adjacente à área da
lixeira.
Na área da lixeira propriamente dita só a “Resin” ali trabalhou, segundo se
apercebeu, tendo-se procedido inclusivamente à vedação da área ocupada pela lixeira.
Em todo o caso o depoente reside em Guimarães e a casa da quinta dista cerca de
1.500/2.000 metros de distância relativamente à área da lixeira, sendo certo que não
tomava normalmente o caminho que dava acesso à dita lixeira. Viu lá máquinas – entre
as quais um caterpilar amarelo a fazer trabalhos de terraplanagem - e camiões a
trabalhar (não sabe a quem pertenciam pois não tinham qualquer sinal identificativo).
Quanto à “Translousada” referiu não ter qualquer ideia de que alguma vez
alguém lhe ter dito que operou na lixeira.
À pergunta feita no sentido de se saber se o dinheiro que lhe caberia receber por
força do contrato de transacção se destinaria apenas a reabilitar a lixeira ou também o
seu terreno confinante com aquela, respondeu não saber na medida em que a lixeira na
altura não estava vedada e na sua zona de confinância os terrenos confundiam-se.
Além disso, existem pagamentos feitos ao depoente que não se destinaram à
“Resin”, relativos a trabalhos não executados por esta empresa.
Quanto aos recebimentos confirmou o que a propósito consta dos seguintes
documentos:
- Cópia do cheque de fls 347, do apenso 97, emitido pela CMF a 30.03.94, no
montante de 5.235.080$00, a favor do depoente;
- Cópia do cheque de fls 345 do apenso 97, emitido pela CMF a 22.06.95, no
montante de 17.000.000$00, a favor do depoente (cfr. ainda o recibo de fls 339 do
apenso 97, de 23.06.95, o qual se reporta a 3 facturas e parte de outra; bem como o
recibo emitido pela “Resin” a 26.06.95 a favor do depoente, no montante de
6.000.000$00, constante de fls 231 do apenso 97);
- Cópia de talão de depósito na conta do depoente, no montante de
11.000.000$00, efectivado a 30.06.95, dos quais 6.000.000$00 destinaram-se ao
depoente (ainda referente ao preço da aquisição do terreno pela CMF) e 5.000.000$00 à
“Resin” pela reabilitação da lixeira (cfr. documentos de fls 338 e 353 do apenso 97);
- Cópia do cheque de fls 349 do apenso 97, emitido pela CMF a 25.06.98, no
valor de 4.410.480$00, a favor do depoente (cfr. o depósito respectivo referenciado no
extracto da conta do depoente, conforme documento de fls 389 do apenso 97); referiu a
testemunha não se recordar qual o destino que deu a esse dinheiro, o qual se tratou do
último pagamento efectuado pela CMF. Porém, essa quantia não vem referênciada no
que manuscreveu no documento de fls 334 do apenso 97 (onde estão indicados todos os
pagamentos efectuados), sendo certo que foi depositada na conta pessoal do depoente
(cfr. o extracto da sua conta a fls 389 do apenso 97).
Em face do que manuscreveu no documento de fls 335 do apenso 97 mostrou-se
baralhado quanto ao facto de em 1998 ter pago ou não à “Resin” a quantia de
3.410.480$00, retendo 1.000.000$00 para si. Porém, os seus apontamentos poderão não
ser contemporâneos a esse pagamento. Seja como for, entende que os seus manuscritos
são mais fidedignos (de fls 334 e 335 do apenso 97).
Consequentemente, a CMF pagou-lhe o total de 37.645.560$00, dos quais
apenas 6.000.000$00 se destinaram ao depoente.
Acha que mais nada recebeu da CMF, pelo que não foi paga a totalidade da
quantia referente ao aditamento ao contrato de transacção.
238
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
A “Resin” emitia ao depoente as respectivas facturas, sendo certo que ignora se
todas elas foram pagas. Em todo o caso a “Resin” não lhe reclamou pela falta de
qualquer pagamento nem o demandou judicialmente por esse facto.
Ignora ainda se as facturas que lhe foram exibidas e que constam do apenso 97
são aquelas que a “Resin” na altura emitiu, não se lembrando mesmo se as recebeu,
assim como os respectivos recibos após os pagamentos efectuados (foi confrontado com
a factura de fls 203 do apenso 97, com os recibos de fls 336 e 337 do apenso 97; neste
último documento reconheceu a sua assinatura, reconhecendo assim ter sido recebido
por si. Seja como for, quer este documento quer o de fls 336 do apenso 97 foram por si
entregues à PJ, já que o depoente entregou os documentos de fls 333 e ss do apenso 97,
pelo que deve tê-los recebido).
Ignora também se a “Resin” considerou o depoente como um cliente de
cobrança duvidosa (cfr. doc. de fls 199 do apenso 97).
Confrontado com o documento de fls 334 do apenso 97, datado de 29.09.94
(documento contabilístico da “Resin” dirigido ao depoente no sentido de confirmar o
saldo de 26.175.400$00 a favor daquela empresa com referência a 30.06.94, devendo
devolver o duplicado respectivo devidamente assinado), confirmou que recebeu tal
documento e que manuscreveu nele uma contabilidade (tratam-se dos valores recebidos
a propósito do contrato de transacção celebrado a 25.11.93 e pagamentos efectuados à
“Resin”, onde faz a indicação das facturas emitidas pela “Resin” e dos recibos por ela
emitidos, o que pressupõe o pagamento, sendo certo que dali resulta que, a propósito do
aditamento celebrado a 28.02.96, só foi paga, em 26.06.96, a quantia de 1.824.600$00).
Não pode garantir que tenha remetido à “Resin” o duplicado (que aliás foi por si
assinado), mas acha que o deve ter feito. Por outro lado, uma vez que nesse documento
fez referência a factura e a recibos, conclui que os deve ter recebido da “Resin”.
O documento de fls 343 do apenso 97 tem a mesma natureza, está datado de
30.06.95, sendo certo que o saldo indicado nesse documento é de 9.175.400$00.
Não garante que tenha assinado e devolvido o respectivo duplicado.
O documento de fls 342 do apenso 97 tem a mesma natureza, está datado de
30.06.96 e o saldo indicado é de 24.187.400$00. Tal documento não está assinado por si
(em todo o caso foi o depoente quem o entregou à PJ).
De modo idêntico o documento de fls 341 do apenso 97 não está assinado por si
(mas foi entregue à PJ pelo depoente pelo que o deve ter recebido da “Resin”). Tal
documento, de idêntica natureza aos já referidos (documento remetido para conferência
de saldo), data de 31.08.97 e refere ainda o saldo de 24.187.400$00 (montante em
dívida relativo ao aditamento ao contrato de transacção).
Se recebeu os documentos de fls 342 e 341 do apenso 97 não lhes ligou
importância (deve tê-los recebido pois entregou-os à PJ), pois na altura os pagamentos
estavam suspensos pela CMF. Não viu nesse facto qualquer motivo de preocupação
uma vez que só estava obrigado a pagar à “Resin” na medida em que recebesse da
CMF.
Confrontado com o documento de fls 199, do apenso 97 (extracto de conta da
“Resin” relativamente ao depoente, apresentando um saldo a favor daquela no montante
de 24.187.400$00 a 27.11.98 e com um manuscrito que refere “clientes de cobrança
duvidosa”), referiu não saber a que se refere.
*
O arguido Júlio Faria referiu nesta altura que o início da deposição do lixo no
terreno da testemunha Menezes Basto ocorreu numa altura em que era presidente da
CMF o Dr. Machado Matos, em 1982, sendo certo que em 1986 (tinha o depoente
acabado de assumir a presidência da CMF) celebrou-se o primeiro contrato de locação
239
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
referido nos autos, confirmando que a única contrapartida então oferecida pela CMF foi
a pavimentação do acesso à casa da referida testemunha.
Foi no Verão de 1993 que se iniciou colaboração da “Resin”, numa altura em
que a testemunha Menezes Basto pressionava no sentido de cessar a deposição do lixo
no seu terreno.
Esclareceu que o Vereador José Campos detinha o pelouro da higiene e limpeza
(daí que não seja de estranhar que estivesse presente aquando da negociação do preço de
aquisição do terreno à testemunha Menezes Basto).
Procurou-se evitar que tal aquisição fosse sujeita à aprovação da Assembleia
Municipal pois estava-se às portas das eleições autárquicas, daí que o valor da aquisição
não pudesse exceder os 25.000.000$00, sendo certo que a operação teve de ter
igualmente o visto do Tribunal de Contas.
Quanto ao facto da testemunha referida se ter dirigido várias vezes à CMF para
saber da efectivação dos pagamentos referiu que era frequente os credores da CMF
dirigirem-se às suas instalações com o propósito de saberem quando os seus créditos
iriam ser liquidados.
*
- Testemunha José António de Sousa Ferreira
É funcionário da CMF desde 1983/1984 e há cerca de uma década que é chefe
da Divisão da DATA, respondendo directamente perante o arguido Barberi Cardoso.
Referiu que a “Resin” começou a fazer o tratamento da lixeira de Sendim, sendo
certo que quem pagava os serviços por ela prestados era o proprietário do terreno onde
estava implantada a referida lixeira (a testemunha Menezes Basto). Na altura discutia-se
se a CMF poderia ou não assumir o pagamento dos serviços prestados pela “Resin” em
terrenos que não eram seus, segundo se apercebeu em conversas informais que teve no
seio da CMF.
Segundo ouviu dizer a CMF fez um protocolo com o Eng. Menezes Basto em
que durante certo período de tempo pagou o tratamento do lixo a esta testemunha, para
que esta depois pagasse à “Resin”. Precisou que presume que era à “Resin” que o Eng.
Menezes Basto pagava na medida em que era quem no local prestava os serviços de
tratamento do lixo desde 1993, ano em que a CMF deixou de ter intervenção directa na
lixeira de Sendim.
- Testemunha Manuel Ferreira de Faria
Foi vereador durante vários mandatos, eleito pelas listas do PS e PSD nos anos
80 e 90, tendo igualmente sido deputado na Assembleia Municipal de Felgueiras nos
anos 80. Fez parte de uma comissão administrativa do FCF, ao que pensa em 1994. É
membro da direcção da CCAM desde 1999. É sócio da testemunha Menezes Basto na
firma “Cifal” desde 1987 (o arguido Júlio Faria precisou que a testemunha em causa foi
eleita como idependente pelas listas do PS no mandato de 1986/89; foi vereador eleito
pelas listas do PSD nos mandatos de 1994/97 e 1998/2001. A testemunha em causa
confirmou esta precisão).
A testemunha Menezes Basto era proprietária de uns terrenos onde se fazia o
depósito dos resíduos, já no tempo em que era presidente da autarquia o Dr. Machado
Matos. Entre a CMF e a dita testemunha existia um contrato de arrendamento desses
terrenos, os quais se iam renovando, segundo lhe disse essa testemunha, a qual só
conheceu em 1987. Quando entrou para a CMF (nos anos 80) esses contratos já
existiam. Desconhece em concreto os seus termos.
Os assuntos relacionados com a deposição dos resíduos eram discutidas quer no
executivo quer na assembleia municipal.
240
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Ignora se a testemunha Menezes Basto vendeu à CMF o terreno onde se
depositava o lixo.
Ele queixava-se muito do atraso no pagamento das rendas por parte da CMF.
A “Resin” recolhia e tratava os lixos no concelho de Felgueiras, quer quando
apenas existia a lixeira quer posteriormente após a construção do aterro.
Deduz que seria a CMF a pagar-lhe esses serviços, sendo certo que era cobrada
uma taxa aos munícipes (durante muitos anos não foi cobrada qualquer taxa. Cfr. a
deliberação que aprovou a cobrança dessa taxa, constante do apenso 137, a fls 55 e ss.,
datada de 08.01.96 para entrar em vigor a 01.03.96 – o depoente confirmou ter assinado
o documento em causa).
Tem a ideia da existência de facturação à CMF. Ignora se a “Resin” emitiu
facturas à testemunha Menezes Basto.
Tem a ideia de que nas contas de gerência da CMF constava um débito de cerca
de 17.000.000$00 à testemunha Menezes Basto e que era alvo de críticas por parte da
oposição.
Confrontado com o orçamento camarário de 2001, constante de fls 66 ss. do
apenso 98, referiu tratar-se do documento que referira, onde se verifica que o aludido
débito para com a testemunha Menezes Basto rondava os 26.000.000$00. Uma vez que
essa rúbrica apareceu em mais do que um orçamento camarário, foram pedidos
esclarecimentos pela oposição. Não se recorda da testemunha Terezinha (do
Departamento de Gestão Financeira da CMF) ter sido ouvida sobre esse assunto mas
admite que o possa ter sido.
Ignora se esse montante foi entretanto pago.
- Testemunha Maria Fernanda Dá Mesquita Castro Leal
É funcionária da CMF desde 1989. Entrou como jurista, chefiou o Departamento
Administrativo de 1991 até à sua reestruturação em 2000, altura em que passou a
assumir o cargo de Directora do Departamento de Administração Geral (redenominação
do Departamento Administrativo).
Na reestruturação do ano transato a área financeira da CMF saíu da alçada do
Departamento de Administração Geral. Certo é que a Divisão Administrativa e
Financeira da CMF estava integrada no Departamento Administrativo e o respectivo
quadro não estava preenchido nessa altura (cfr. a fls 28 e ss. do apenso 137 cópia do
diploma que respeita à organização dos serviços camarários e que data de 1992 e a fls
67 e ss. do mesmo apenso consta o diploma respeitante à estrutura da CMF na
reestruturação de 2000).
A depoente exercia também as funções de notária privativa da CMF.
Cabia-lhe assim elaborar os diferentes contratos e as escrituras, além de
superintender os serviços de que era responsável. Também instruia e acompanhava os
processos de contra-ordenação instaurados pela CMF.
Em 1995 foi admitida outra jurista na CMF (Drª Helena Felix), a qual passou a
ocupar-se da área das contra-ordenações, sendo certo que neste momento ela é a chefe
da área de contencioso da CMF.
Em 1989 já existia o Departamento Administrativo e o Departamento Técnico.
Era o Departamento Técnico que preparava os projectos de obras, o caderno de
encargos e o programa dos concursos abertos pela CMF com vista à execução das obras
que o executivo camarário decidia levar a cabo.
Porém, por vezes esse serviço era encomendado a terceiros estranhos à CMF.
O Engº Ferreira era o responsável pela área dos concursos (DATA).
241
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
A depoente estava presente nas sessões públicas de abertura das propostas
apresentadas nos concursos, bem como ou o director do Departamento Técnico (arguido
Barbieri Cardoso) ou o chefe de Divisão (Engº Ferreira, chefe da DATA), os quais
prestavam auxílio à Comissão de Análise.
Era a CMF que deliberava a composição quer da Comissão de Abertura quer a
da Comissão de Análise.
Esclareceu que pouco tempo depois de ser admitida na CMF o presidente de
então (o arguido Júlio Faria) pediu-lhe para minutar um contrato de locação de um
terreno situado em Sendim para o depósito do lixo, terreno esse pertencente à
testemunha Menezes Basto. Foi nessa altura a primeira vez que ouviu falar dele.
Recorda-se de ter feito a minuta de outros contratos de locação com o mesmo
objecto, pois tinham um prazo de vigência e renegociava-se a respectiva renda mensal
(cfr. a fls 3, 4, 11 e 12 os contratos de locação respectivos, celebrados em 1986, 1990,
1992 e 1993, respectivamente).
Tem a ideia de ter sido em 1993 que o arguido Júlio Faria determinou à
assessoria jurídica que elaborasse um contrato de transacção entre a CMF e a dita
testemunha Menezes Basto decorrente de prejuízos sofridos por este com a deposição
do lixo no seu terreno, já referido. O contrato foi preparado quer pela depoente quer
pelo Dr. José de Barros (ilustre mandatário do arguido Barbieri Cardoso nestes autos),
pois ambos constituiam a assessoria jurídica da CMF. Tal contrato mereceu o visto por
parte do TC (o qual aliás pediu o envio dos contratos de locação e a informação dos
pagamentos efectuados pela CMF).
Ignora se a testemunha Menezes Basto reclamou ou não da CMF alguma
indemnização, pois não tinha com ele um nível de contacto que lhe permitisse sabê-lo.
Em todo o caso, quando o arguido Júlio Faria determinou à depoente que minutasse o
contrato de transacção, referiu-lhe que a testemunha Menezes Basto reclamava da CMF
o pagamento de indemnizações pelo uso do seu terreno como lixeira.
Mais foi determinado na mesma altura pelo arguido Júlio Faria que se
preparasse a celebração de um contrato-promessa de compra e venda do aludido terreno
(com uma área superior à que constava do contrato de locação), em que a CMF figurava
como promitente compradora. A CMF pretendia continuar a depositar naquele local o
lixo.
Foi pois sob a orientação do arguido Júlio Faria que se elaboraram esses
contratos (a cópia da respectiva proposta de aquisição do terreno consta de fls 78 do
apenso 98 e é datada de 01.10.93, tendo sido aprovada por deliberação de 04.10.93,
onde refere que o preço da aquisição seria de 24.754.820$00).
Não obstante no contrato-promessa referido se contemplar uma clausula que
permitia intervenções no terreno pela CMF a assessoria jurídica da edilidade considerou
que a edilidade não tinha tomado posse do imóvel, pois existia um regime específico
para estas situações, conforme aliás foi explicado ao TC, daí que a CMF, de per si, não
pudesse intervir no terreno até ao momento da sua aquisição.
Tem a ideia de que o preço da compra e venda roudou 24.000 e tal contos.
Recorda-se que inicialmente o preço da compra e venda era superior em 1.000
cts, preço esse que chegou a constar na minuta inicial do contrato-promessa. Esse valor
inicial havia sido indicado pelo arguido Júlio Faria, porém a assessoria jurídica
informou-o das consequências caso o preço ultrapassasse os 25.000 cts (a celebração do
contrato teria de se sujeitar à aprovação da Assembleia Municipal). Em face dessa
informação o arguido Júlio Faria deu nota de que tinha de renegociar o preço com a
testemunha Menezes Basto, o qual teria de baixar o preço em 1.000 cts, aumentando-se
simultaneamente em 1.000 cts o valor do contrato de transacção.
242
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
O contrato de compra e venda do terreno da testemunha Menezes Basto deveria
ter sido celebrado em Abril mas porque a dita testemunha não o tinha registado em seu
nome só mais tarde (em Dezembro de 1994) é que se logrou concretizar a celebração da
respectiva escritura.
Só após o visto por parte do TC (em Janeiro de 1995) é que o contrato de
compra e venda em causa pôde produzir os seus efeitos financeiros (portanto desde
Janeiro de 1995), pelo que só desde então é que a CMF poderia proceder ao pagamento
do preço e intervir no terreno enquanto proprietária.
De resto, a CMF, como o mesmo fim, adquiriu à família Moura Borges um
terreno confinante (cfr. a fls 161 e ss. do apenso 98 o contrato de transacção celebrado a
esse respeito).
Ao que pensa em 1996, foi efectuado um aditamento ao dito contrato de
transacção, tendo sido a arguida Fátima Felgueiras (já então na qualidade de presidente
da CMF) quem lhe determinou a preparação do respectivo contrato.
Ouviu dizer que tal aditamento foi celebrado após insistência da testemunha
Menezes Basto (não conseguiu porém revelar qual identidade da pessoa que lho terá
dito).
Por força do contrato de transacção a testemunha Menezes Basto obrigou-se a
contratar uma terceira entidade para reabilitar o terreno em causa.
Como os trabalhos prolongaram-se para além de Abril (altura prevista
inicialmente para a celebração da escritura pública de compra e venda do terreno) e
tinham de ser pagos celebrou-se o já referido aditamento ao contrato de transacção.
Hoje ouve dizer que era a “Resin” que no local se encarregou da sua
reabilitação, mas na altura tal não lhe foi dado a conhecer tal facto.
Em 2005 a testemunha Menezes Basto remeteu uma carta à CMF a exigir o
pagamento da verba ainda em dívida (referente ao aditamento) sob pela de recorrer aos
tribunais.
Nas reuniões de preparação do planeamento do orçamento camarário verificava
que essa dívida aparecia sucessivamente como passivo (os contratos têm de ter um
cabimento orçamental. A verba respectiva ficava cativa enquanto não fosse pago o
débito em causa. Assim, transitou de exercício para exercício como passivo).
Ignora qual o destino final do dinheiro pago à testemunha Menezes Basto. Ele
aliás contactava mais com a testemunha Terezinha.
Foi então confrontada com a informação constante de fls 7 do apenso 98,
informação esta prestada pelo Vereador José Campos a propósito da cláusula penal e
dos contratos de arrendamento celebrados com a testemunha Menezes Basto. A esse
propósito referiu ter a ideia de que foi na sequência dessa informação que viriam a
celebrar o contrato de locação (antes tinham a designação de arrendamento).
Reafirmou que foi a depoente e o Dr. José de Barros quem preparou a proposta
de fls 78 do apenso 98, a qual foi apresentada para aprovação ao Executivo a 04.10.93.
Admite que possa ter estado na reunião onde a proposta viria a ser aprovada.
Não se recorda de em alguma reunião a que tenha assistido se discutir a questão
das indemnizações a pagar à testemunha Menezes Basto.
*
A arguida Fátima Felgueiras, a propósito da testemunha Fernanda Leal, referiu
que ela foi a primeira jurista a ser admitida na CMF e que desde a sua admissão assistia
às reuniões de Câmara, isto é, sempre teve assento no local onde o Executivo abordava
todas as questões.
243
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
A questão da deposição do lixo no terreno da testemunha Menezes Basto e as
exigências deste, conforme já referido, não era menor e era também debatida em
reuniões de coordenação dos serviços.
*
- Testemunha Terezinha do Nascimento Lopes Domingues Carvalho
Em Outubro de 1990 foi admitida na CMF, onde passou a trabalhar na área da
contabilidade e na dependência directa do presidente da CMF. Cabia-lhe preparar o
orçamento, prestar contas, proceder aos pagamentos, analisar as propostas de crédito e
demais funções na área da contabilidade.
A 13.04.2000 foi nomeada chefe da Divisão Financeira, passando a testemunha
Fernanda Leal a ser a sua superiora hierárquica.
O Eng. Menezes Basto falou consigo várias vezes no âmbito dos contratos de
arrendamento/locação celebrados entre a CMF e essa testemunha a propósito dos
pagamentos.
Teve acesso ao conteúdo desses contratos na medida em que era remetida uma
cópia dos mesmos para a contabilidade a fim de que pudesse tomar conhecimento dos
pagamentos que eram devidos pela autarquia.
Não se recorda porém das datas em que tais contratos foram celebrados (talvez
1990/93).
Pelo mesmo motivo teve conhecimento da celebração entre a CMF e o Eng.
Menezes Basto de um contrato de transacção (rondava os 33.000 cts) e de um contrato
de compra e venda de um terreno da sua propriedade (que rondava os vinte e quatro mil
e tal contos, não se recordando se o preço expresso no contrato era o preço realmente
acordado entre as partes).
Uma vez que os pagamentos eram efectuados com atrasos, o Eng. Menezes
Basto dirigia-se à depoente para saber dos pagamentos no que se refere a tais contratos
(não se recorda porém se ele lhe especificava a que contratos se referia).
Do que viu no contrato de transacção referido tem a ideia de que a testemunha
Menezes Basto obrigou-se a recorrer a um terceiro para proceder à reabilitação do
terreno (uma vez que o mesmo não era à data da propriedade da CMF).
No âmbito das conversas que teve com essa testemunha por causa dos
pagamentos ele referiu-lhe que a “Resin” o pressionava no sentido do pagamento. Não
se recorda dele lhe ter referido que a CMF lhe devia o pagamento de indemnizações.
De resto, também o arguido Vítor Borges a questionava acerca dos pagamentos.
Posteriormente foi celebrado entre a CMF e o Eng. Menezes Basto um
aditamento ao contrato de transacção (no montante de vinte mil e tal contos; cfr.
documento de fls 57 do apenso 98, onde se constata que o valor foi de 26.462.000$00).
Ignora se a verba prevista para o contrato de transacção se destinava ou não à
“Resin” na medida em que sobre essa matéria não conversou com a testemunha
Menezes Basto (cfr., sobre este contrato, a informação redigida pela depoente e
constante de fls 2275 e as declarações infra exaradas acerca desde documento por banda
desta testemunha).
Assegurou que em 1998 foram pagos 21.000 cts no âmbito desse contrato de
transacção.
Em 2005 a testemunha Menezes Basto reclamou o pagamento do remanescente
(através de uma missiva dirigida à CMF pelo seu advogado), o que mereceu uma
deliberação no sentido de que esse crédito ainda não poderia ser pago porque estava a
ser objecto de análise nestes autos. Consequentemente, o remanescente da quantia em
causa ainda não foi paga.
Esse passivo transitou sucessivamente de ano para ano no orçamento camarário.
244
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Por vezes era questionada acerca dessa inscrição no orçamento camarário pela
arguida Fátima Felgueiras e explicava-lhe que se tratava de um débito no âmbito do
aditamento ao contrato de transacção.
Confrontada com o orçamento camarário de 2001, cuja cópia se acha a fls 66 e
67 do apenso 98, constatou que o montante em dívida cifrava-se em 26.462.000$00,
montante que se reporta ao aditamento ao contrato de transacção já referido, admitindo
porém que não se possa reportar apenas a esse aditamento visto que no que se refere ele
tem a ideia de que a dívida rondava os 21.000.000$00 (porém esse montante coincide
com a verba constante no aditamento ao contrato de transacção).
Explicou que não tinha instruções para anular a inscrição daquela verba no
passivo, daí que tenha transitado sucessivamente de exercício para exercício.
Não tem memória de alguma situação similar em termos de atraso no pagamento
pela CMF. Não põe porém de parte essa possibilidade relativamente a outros débitos
visto que a CMF procede aos pagamentos com atraso em face das dificuldades
financeiras de que padece.
Explicou ainda que não era a depoente quem determinava a afectação das
verbas disponíveis aos pagamentos devidos pela CMF. Era a presidente da edilidade
quem assinava as ordens de pagamentos, sendo certo que a depoente informava-a das
disponibilidades de tesouraria.
Quanto à reabilitação da lixeira nada sabe, apenas se tendo deslocado a esse
local uma única vez há cerca de 2 anos.
- Testemunha Luís Vieira Lemolino Velosa
Referiu ter sido o revisor oficial de contas da “Resin” durante 3 ou 4 anos, desde
a altura em que ela se transformou em sociedade anónima (pensa que desde 1996 até
1999).
Confrontado com o documento de fls 199 do apenso 97 (extracto de conta da
“Resin” para com a testemunha Menezes Basto) e com o facto de ter sido constituída
uma provisão por se ter considerado a dívida de 24.187.400$00 de cobrança duvidosa
em finais de 1998 referiu que concerteza a administração da “Resin” teve dúvidas
quanto à cobrança desse montante. Normalmente, antes disso, o devedor é interpelado
para pagar o débito, pelo que presume que a testemunha Menezes Basto tenha sido
interpelado nesse sentido, mas não o pode afirmar pois trata-se de uma decisão da
administração.
O depoente referiu que concerteza à data quis-se inteirar da razão do reforço da
provisão em causa, sendo certo porém que não contacta os clientes. Vê antes a listagem
dos clientes e vê o saldo que existe antes do final do período e faz um pedido por escrito
ao cliente para confirmar o saldo inscrito nas contas que são apresentadas pela empresa
em relação a ele. Com isso pretende tão só verificar se o saldo apresentado pela empresa
está correcto ou não independentemente de ser de cobrança duvidosa ou não.
É a administração da empresa que toma a iniciativa de colocar certos créditos
como sendo de cobrança duvidosa, sendo certo que tal não era sequer feito por sugestão
do depoente.
Contraditoriamente, porém, referiu que dava sugestões acerca da constituição de
provisões que entendia deverem ser constituídas e a administração aceitava ou não essas
sugestões. Além disso, quando lhe pediam uma opinião dava-a. Porém, a sua
preocupação era a de rever as contas de modo a verificar se elas estavam ou não bem
feitas. O revisor oficial de contas certifica perante terceiros que as contas apresentadas
têm fiabilidade. Trata-se pois de uma função fiscalizadora. Assim, se se tivesse
apercebido que as contas porventura tinham sido forjadas não as teria aceite e nessa
245
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
hipótese das duas uma: ou eram corrigidas ou o depoente emitia reservas às contas
apresentadas.
No exercício de 1998 entendeu que a “Resin” deveria ter feito provisões
superiores (que quanto maiores menores serão os resultados do exercício).
Recorda-se aliás que por esse motivo chegou a colocar reservas às contas
apresentadas pela “Resin”, como sucedeu relativamente às contas referentes ao
exercício de 1997, sugerindo o aumento da provisão constituída para créditos de
cobrança duvidosa.
Relativamente à provisão a que se reporta o documento de fls 199 do apenso 97,
referiu que foi constituída em 1998, o que significa que no ano seguinte a “Resin”
acatou a sugestão efectuada pelo depoente (situação que aliás era normal).
A provisão para cobrança duvidosa deve ser constituída obedecendo a vários
critérios, desde logo critérios económicos que resultam de uma análise da situação do
cliente, mas no caso dos autos o Código do IRC impunha limitações à consideração
desse tipo de critérios (para efeitos fiscais). Foi pois um critério de natureza fiscal que o
motivou a levantar reservas (em função da idade dos saldos, quanto mais antigos maior
a percentagem da provisão a constituir, nos termos do artº 35º do CIRC: em créditos
com mais de 24 meses deve ser constituída uma provisão de 100%; há mais de 18
meses, 75%; há mais de 12 meses, 50%; há mais de 6 meses, 25%).
Confrontado com os documentos de fls 343 (de 04.09.95, onde se refere um
saldo de 9.175.400$00) e 344 do apenso 97 (de 14.10., apresentando um saldo de
26.175.400$00) referiu tratar-se dos mencionados pedidos de confirmação de saldo,
neste caso à testemunha Menezes Basto. Foi por iniciativa do depoente que essas
missivas foram-lhe enviadas, as quais aliás mereceram resposta dessa testemunha
(nesses documentos ele apôs a sua assinatura e apôs o que bem entendeu).
Esse tipo de documentos (que não são interpelações para pagar) são também
remetidas a fornecedores, a bancos e de um modo geral a todos os terceiros que mantém
com a empresa relações comerciais e que o revisor oficial de contas selecciona.
Recorda-se aliás que chegou a remeter documentos de idêntica natureza a um escritório
de advogados de modo a confirmar o saldo e para saber dos processos pendentes.
Confrontado com os documentos de fls 341 (de 6.11.97, apresentando um saldo
de 24.187.400$00, que coincide com a verba colocada como sendo de cobrança
duvidosa) e 342 do apenso 97 (datada de 26.08.96, onde o saldo apresentado é
exactamente o mesmo: 24.187.400$00) referiu tratar-se de documentos semelhantes,
mas a testemunha Menezes Basto não confirmou o saldo em causa na medida em que
não respondeu.
Explicou que certos clientes não dão qualquer resposta a esse tipo de missivas,
os quais aliás muitas vezes nem sabem para que servem, devolvendo-as sem confirmar
ou não o saldo apresentado. Não parece ser esse o caso dos autos na medida em que o
cliente em causa respondeu às missivas de fls 343 e 344 do apenso 97, tendo colocado
anotações nesses documentos. Não sabe porém por que motivo as missivas de fls 341 e
342 do apenso 97 não contêm qualquer resposta por parte da testemunha Menezes de
Basto.
- Testemunha Paulo José Bento Ribeiro
Referiu ter sido Director Técnico da “Resin” desde Janeiro de 1995 até Março
de 1999.
Explicou que trabalhava numa empresa francesa que pertencia ao grupo
“Lyonesse”, principal accionista da “Resin”, quando foi convidado para trabalhar nesta
pelo arguido Vítor Borges.
246
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
A actividade da “Resin” consistia na recolha e limpeza urbana de resíduos.
Foi admitido ao serviço da “Resin” para desenvolver estudos e projectos de
irradicação de lixeiras e construção de aterros sanitários. Dava apoio técnico nas obras
em curso e fazia os orçamentos com que a “Resin” se apresentava aos concursos
públicos.
À data em que entrou para a “Resin” a gestão financeira desta era efectuada por
um francês, proveniente da “Sita”.
A “Resin”, no desenvolvimento da sua actividade, estabeleceu consórcios com a
“Hidroprojectos”, com a “Aciconstrói” para a zona a Sul de Leiria e com a “ECOP” –
quando esta entrou no capital social da “Resin” – para a zona a Norte de Leiria.
A “ECOP” entrou no capital social da “Resin” quando o depoente já ali
trabalhava, tendo sido nessa altura nomeado um director financeiro para a “Resin”
proveniente da “Ecop”.
Tal facto não constituiu uma surpresa para si na medida em que o arguido Vítor
Borges discutiu esse assunto consigo, tendo verificado que a maioria das empresas do
mesmo ramo de actividade associavam-se a empresas de construção civil e obras
públicas. Assim, de modo a expandir os seus negócios, teria a “Resin” que associar-se a
uma empresa de construção civil com alguma dimensão, tendo assim procurado
empresas que estivessem interessadas.
Entretanto o arguido Vítor Borges transmitiu-lhe que a “Ecop” se mostrava
interessada, adquirindo, salvo erro, 25 ou 30% do capital social da “Resin” (que era a
participação que o accionista francês estava disposto a alienar).
Explicou que antes da construção do aterro RIB de Felgueiras e mesmo antes de
ser admitido na “Resin” esta já recolhia o lixo e fazia a manutenão das lixeiras do Vale
do Sousa (Sendim, Lustosa e Paços de Ferreira).
Em 1995 a Secretaria de Estado do Ambiente lançou os projectos de irradicação
das lixeiras e construção de aterros sanitários (encerraram-se nos anos seguintes mais de
300 lixeiras e construíram-se mais de 20 aterros).
A “Resin” propôs-se a encerrar lixeiras e a construir aterros sanitários (um dos
seus accionistas – a “France Dechéts” – construía aterros e a “Sita” recolhia resíduos
urbanos). Em face disso o depoente fez um estágio em França.
O depoente participou na construção de 60 aterros, quer como funcionário da
“Resin” quer como consultor de outras empresas.
À data haviam outras empresas com “know how” na área, mas estava-se nos
primórdios do encerramento das lixeiras e na construção de aterros sanitários. Até
1994/1995 a principal área de negócio do tipo de empresas como a “Resin” reportava-se
à recolha e transporte de resíduos.
Em Felgueiras a lixeira de Sendim era uma lixeira com controle e com uma
actividade de manutenção (rudimentarmente eram acamados os lixos e tapados com
terra).
Inicialmente tal lixeira recebia todo o tipo de resíduos urbanos e da indústria do
calçado, sendo certo que o depoente deslocava-se ao local quase diariamente.
Com a construção do Aterro da Lustosa (o primeiro do país) encerraram-se as
lixeiras e a lixeira de Sendim apenas passou a receber os resíduos industriais banais.
Posteriormente foi construído o aterro RIB de Felgueiras, o primeiro do país
com as características necessárias para receber esse tipo de resíduos.
Só ouviu falar da testemunha Menezes Basto numa altura em que se procurava
escolher um local para a construção do aterro RIB.
Ele tinha um terreno que confrontava com a lixeira de Sendim e que seria um
dos locais possíveis para a construção do dito aterro. Uma parte desse terreno (a
247
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
montante) poderá ter sido escolhido para a construção do aterro (juntamente com o
terreno de outro proprietário), terrenos esses que teriam de ser adquiridos pela CMF.
Ignora a quem pertencia o terreno onde se situava a lixeira de Sendim, admitindo
que seria da CMF na medida em que ali eram depositados os lixos do concelho.
Ignora se existia alguma conta-corrente entre a “Resin” e a testemunha Menezes
Basto.
Confrontado com os quadros de fls 22 e 23 do apenso 12, referiu não os
conhecer.
No que toca à dívida da CMF para com a “Resin”, sabe que chegou à centena de
milhar de contos.
O arguido Vítor Borges referiu-lhe a certa altura que os accionistas da “Resin”
também fizeram sentir a necessidade da “Resin” receber os valores em atraso da CMF,
pois a manutenção dessa situação traduziam-se em resultados negativos, existindo um
entendimento entre a administração e os accionistas de que parar os trabalhos não seria
sensato em termos comerciais pois os valores em causa não eram significativos e viam o
trabalho desenvolvido em Felgueiras como um investimento que poderia potenciar a
expansão dos negócios com os fundos comunitários que tinham sido aprovados. Não
seria pois sensato cortar relações com potenciais clientes.
Consequentemente, não se equacionava a paragem dos trabalhos e procuravamse encontrar soluções com a CMF e mais tarde com a AMVS no sentido de se obter o
pagamento do montante em dívida.
O arguido Vítor Borges transmitia-lhe que iria encontrar a solução junto da
CMF quanto à questão dos pagamentos, sendo certo que assistiu a uma reunião na CMF
entre os arguidos Vítor Borges e Fátima Felgueiras em que foi manifestada a
preocupação pela falta de pagamento, tendo aliás o depoente dito à arguida Fátima que
era seu entendimento que a “Resin” deveria parar os trabalhos em face da falta de
pagamento dos trabalhos efectuados, tendo então o arguido Vítor Borges assentido em
aguardar durante mais algum tempo para que entretanto se encontrassem as soluções
necessárias para que a situação fosse desbloqueada.
Transmitiu também essa preocupação ao arguido Barbieri Cardoso.
Com a admissão do arguido Gabriel Almeida na “Resin” (para exercer as
funções de Director Geral) este passou a conduzir as negociações, juntamente com o
arguido Vítor Borges, afastando-se o depoente desse assunto, daí que não tenha grande
conhecimento das soluções que entretanto foram adoptadas no sentido de ultrapassar os
constrangimentos de natureza legal que impediam a CMF de proceder ao pagamento da
quantia em dívida para com a “Resin”.
Quando o depoente saiu da “Resin” era o arguido Carlos Marinho quem assumia
as funções de contabilista da empresa e, como tal, estando dependente hierarquicamente
do Director Financeiro, não tinha poderes de direcção.
- Testemunha Henrique Manuel da Silva Correia
Referiu que entre si e a testemunha Carlos Alves (inspector da PJ) foi dividida a
investigação, sendo certo que a investigação de tudo o que se relacionava com os lixos
ficou a cargo deste.
O terreno onde estava implantada a lixeira de Sendim pertencia à testemunha
Menezes Basto.
Não se recorda quando é que a CMF ali começou a depositar o lixo.
Foi então confrontado com o documento de fls 3 do apenso 98 (contrato de
arrendamento celebrado a 01.07.85 entre a CMF e a testemunha Menezes Basto, para se
iniciar a 01.03.86).
248
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Foi ainda confrontado com os contratos de locação celebrados entre as mesmas
partes, cujas cópias constam de fls 4, 11 e 12 do apenso 98.
No que se refere ao documento de fls 63 do apenso 98, referiu tratar-se da
proposta subscrita pela arguida Fátima Felgueiras, datada de 01.10.93, no sentido de se
pagar à testemunha Menezes Basto uma indemnização por força de incumprimento dos
contratos de locação por banda da CMF, na sequência da qual foi celebrado o contrato
de transacção cuja cópia consta de fls 76 e 77 do apenso 98 (a 25.11.93), encontrando-se
cópia das respectivas ordens de pagamento a fls 22, 26, 33, 40, 45 e 50 do apenso 98.
Também a arguida Fátima Felgueiras propôs a aquisição do terreno onde estava
implantada a lixeira, conforme documento de fls 78 e 79 do apenso 98 (proposta
apresentada a 01.10.93), na sequência da qual foi celebrado entre a testemunha Menezes
Basto e a CMF o contrato-promessa cuja cópia consta de fls 80 a 82 do apenso 98,
celebrado a 22.11.93.
Esclareceu que estes documentos foram recolhidos na CMF.
Não encontraram na CMF qualquer documento alusivo à negociação de tais
contratos, designadamente correspondência com a testemunha Menezes Basto (quer no
que se refere ao contrato de transacção quer no que se refere ao contrato-promessa de
compra e venda, designadamente no que respeita ao montante da indemnização e no que
respeita ao preço da compra do terreno). A esse propósito, para além dos aludidos
contratos, na CMF a PJ apenas encontrou as propostas subscritas pela arguida Fátima
Felgueiras.
A diferença do preço declarado na escritura de compra e venda (escritura
celebrada a 27.12.94, conforme documento de fls 83 a 85 do apenso 98) e o preço
realmente acordado entre as partes para a aquisição do terreno (de 1.000.000$00) vem
mencionada no documento de fls 142 do apenso 97, apreendido na “Resin” (alusivo ao
historial do aterro de Felgueiras).
Procurou-se não ultrapassar os 25.000 cts, caso contrário seriam necessários
outros procedimentos de índole administrativa para que o contrato de compra e venda
pudesse ser celebrado.
Ainda a propósito do contrato de transacção sabe que o terceiro escolhido para
proceder à reabilitação do terreno foi a “Resin”, o que se deduz em face do facto dos
pagamentos efectuados pela CMF à testemunha Menezes irem parar à “Resin” (com
excepção do montante relativo ao pagamento do preço da venda do terreno à CMF),
além de que foi a “Resin” quem pagou o custo do visto do Tribunal de Contas,
conforme emerge do documento de fls 226 do apenso 97, no valor de 32.401$00
(documento de caixa da “Resin”), sendo certo que quem deveria ter procedido ao
pagamento seria ou a CMF ou a testemunha Menezes Basto.
A “Resin” não dispunha de alvará para levar a cabo certo tipo de obras. Uma das
formas encontradas para contornar esse problema era o de responsabilizar a testemunha
Menezes Basto pela reabilitação do terreno, conforme emerge do contrato de transacção
aludido (dessa forma seria ele e não a CMF a contratar os serviços do terceiro escolhido
para proceder à respectiva reabilitação, caso contrário o dito contrato por certo não
mereceria o visto do TC, conforme sucedeu numa outra situação aludida na pronúncia).
Nas buscas efectuadas pela PJ não encontraram qualquer escrito entre a
testemunha Menezes Basto e a “Resin”.
Ignora se o terreno em causa não estava registado em nome da testemunha
Menezes Basto e se foi por esse facto que a celebração da escritura se atrasou face ao
que estava estabelecido no respectivo contrato-promessa de compra e venda.
A arguida Fátima subscreveu ainda uma proposta de aditamento ao contrato de
transacção, conforme emerge do documento de fls 55 e 56 do apenso 98, no valor de
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
26.462.000$00, o qual efectivamente veio a ser celebrado entre a CMF e a dita
testemunha, conforme documento de fls 57 do apenso 98, a 28.02.96.
No orçamento da CMF para 2001 (cfr. documento de fls 66 e 67 do apenso 98)
aparece uma rubrica que refere renda de terrenos, no montante de 26.462 cts, verba
coincidente com o valor do aditamento ao contrato de transacção (o que significa que
pelo menos até 2001 esse montante não havia sido pago pela CMF).
A PJ só foi à lixeira para ver aonde ficava e não se recorda quem lá operava.
Foi a testemunha confrontada com o documento de fls 344 do apenso 97
(conferência de saldos da “Resin” para com a testemunha Menezes Basto, reportada a
30.06.94, apresentando um saldo de 26.195.400$00, documento enviado pelo ROC da
“Resin”, a testemunha Velosa). O saldo respectivo foi confirmado pela testemunha
Menezes Basto.
Referiu que esse documento é uma fotocópia, ignorando onde se encontra o
original (deverá estar na posse da testemunha Menezes Basto), sendo certo que só lhe
foi entregue uma cópia pelo ROC da “Resin” aquando da sua inquirição na fase de
inquérito destes autos.
Foi ainda confrontado com os documentos da mesma natureza (que são
originais), constante de fls 341 e 342 do apenso 97 (onde aparece em ambos o mesmo
saldo de 24.187.400$00, ainda em dívida, o que coincide com o documento de fls 199
do apenso 97), onde não consta qualquer confirmação do respectivo saldo pela
testemunha Menezes Basto, ao contrário do que havia feito no que se refere ao
documento de fls 344 do apenso 97, que também lhe foi remetido pelo ROC. Desses
documentos não emerge que tenham sido enviados à testemunha Menezes (porém, em
face do teor da cota de fls 2089 e do apenso 97, que foi aberto com os documentos
apreendidos à “Translousada” - cfr. auto de apreensão de fls 2009 e cota de abertura do
apenso 97, constante de fls 2010 -, terá sido a testemunha Menezes quem forneceu esses
documentos, pelo que os deverá ter recebido, mas aos quais não deu qualquer resposta
ao ROC da “Resin”. Referiu porém a testemunha Henrique Correia que esses
documentos foram recolhidos na “Resin”, declaração que mais tarde corrigiu).
O documento de fls 342 do apenso 97 tem uma anotação manuscrita (“RES
96/21/54) que não sabe se se trata de um registo de correio.
Referiu a testemunha que não esteve presente na busca efectuada à “Resin”.
Foi confrontado com as facturas emitidas pela “Resin” à testemunha Menezes
Basto, alusivas a trabalhos de exploração no aterro de Felgueiras, constantes de fls 203 a
209, 211 e 220 a 223, do apenso 97, facturas essas emitidas até 31.01.95 e que prefazem
o valor global de 57.422.480$00.
A factura de fls 218 do apenso 97 (de 31.12.93) é referenciada no documento de
fls 334 do mesmo apenso.
Nesse documento também é referenciada, além do mais, a factura de fls 220 do
apenso 97.
Segundo anotação aposta pela testemunha Menezes existia um saldo de
24.187.400$00.
A fls 347 do apenso 97 consta uma cópia de um cheque da CMF emitido a favor
da testemunha Menezes Basto, no valor de 5.235.080$00 e datado de 30.03.94, sendo
certo que esse cheque foi endossado à “Resin”, a qual por sua vez emitiu ao dito
Menezes Basto um recibo no mesmo valor a 30.03.94 (nas observações constantes desse
recibo faz-se alusão ao dito endosso) – cfr. fls 225 do apenso 97.
A fls 345 do apenso 97 consta cópia de um cheque de 17.000 cts emitido pela
CMF à testemunha Menezes Basto, o qual foi por este endossado à “Resin”, a qual por
sua vez emitiu àquele o respectivo recibo, no mesmo valor (cfr. documento de fls 230,
250
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
do apenso 97, onde se alude ao cheque que serviu de meio de pagamento, que é o
mesmo que foi emitido pela CMF).
A fls 213 do apenso 97 consta uma cópia de um recibo emitido pela “Resin” a
favor da testemunha Menezes Basto, no valor de 6.000 cts.
A fls 232 do apenso 97 consta uma cópia de um recibo emitido pela “Resin” a
favor da testemunha Menezes Basto, no valor de 5.000 cts.
A fls 349 do apenso 97 consta uma cópia de um recibo emitido pela “Resin” a
favor da testemunha Menezes Basto, no valor de 4.410.480$00.
A fls 388 e 399 do apenso 97 consta um extracto de conta da “Resin” para com a
testemunha Menezes Basto (apreendido na “Resin”).
Em face desse extracto, houve um montante por liquidar à testemunha Menezes
Basto pela “Resin”.(24.187.400$00 – cfr. ainda o documento de fls 199 do apenso 97 e
334 do mesmo apenso).
Em face disso, contabilisticamente a “Resin”fez um reforço da conta de clientes
de cobrança duvidosa no montante de 24.187.400$00, conforme está manuscrito nesse
extracto de conta.
A PJ não encontrou qualquer elemento que lhe permitisse concluir que houve
uma tentativa de cobrança coerciva desse montante.
Sem essa tentativa não compreende por que motivo foi aquele crédito
considerado de cobrança duvidosa.
Confrontado com as facturas juntas na audiência de julgamento pelo arguido
Carlos Marinho, constantes de fls 12.322 e ss. dos autos, emitidas pela “Resin” à CMF,
verificou-se que são iguais às que foram emitidas à testemunha Menezes Basto.
A fls 132 do apenso 97 consta um fax de 03.06.96 enviado pela “Resin” à
“Translousada” (ao cuidado da testemunha Carlos Sousa), onde se dá conta que quanto
aos valores em dívida referente aos anos de 1995 e 1996 inexiste suporte legal para que
a CMF pudesse pagar as verbas em causa, tendo solicitado a respectiva resolução à
CMF.
Admite que nessa altura as empresas não tinham muito “know how” na área de
actividade da “Resin”.
- Testemunha Carlos Manuel Ferreira Alves
Recolheram na CMF documentos relativos à lixeira de Sendim.
O proprietário dos terrenos era a testemunha Menezes Basto.
Ao que pensa, desde 1986 existiu um contrato de arrendamento e depois de
locação, o qual se foi renovando até cerca de 1993.
Nesse período de tempo existiu um período em que inexistia qualquer contrato
que permitisse à CMF utilizar tal terreno para a deposição do lixo, o que deu origem ao
pagamento de uma indemnização de 6.500 cts à dita testemunha pela CMF.
Foi então confrontado com o contrato de arrendamento, cuja cópia consta de fls
3 do apenso 98, e com os contratos de locação cujas cópias constam de fls 4 (datado de
20.11.90), 11 (que vigorou de 01.02.92 até 31.07.92) e 12 (que vigorou de Fevereiro de
93 até Agosto do mesmo ano), todos do apenso 98.
Assim, entre Agosto de 1992 e Janeiro de 1993 inexistiu qualquer contrato.
Segundo a justificação apresentada, foi por esse motivo que foi paga à testemunha
Menezes Basto a dita indemnização de 6.500.000$00 (cfr. a proposta de celebração do
contrato de transacção, apresentada pela arguida Fátima Felgueiras a 01.10.93,
conforme documento de fls 63 do apenso 98).
251
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Não recolheram na CMF qualquer documento que demonstrasse que a
testemunha Menezes Basto exigisse o pagamento de qualquer indemnização, nem
recolheram qualquer documento alusivo a eventuais prejuízos por ele sofridos.
A CMF decidiu ainda comprar o terreno onde estava instalada a lixeira (mais do
que os 3.000 m2 iniciais), tendo sido a respectiva proposta apresentada pela arguida
Fátima Felgueiras a 01.10.93 (cfr. documento de fls 78 e 79 do apenso 98).
À data a arguida Fátima era vereadora e tinha alguns pelouros, entre os quais os
pelouros do desporto e cultura, não tendo a certeza se ela tinha o pelouro do ambiente (o
arguido Júlio Faria era então o presidente da autarquia).
O contrato-promessa de compra e venda do aludido terreno foi celebrado a
22.11.93, onde se refere um preço de 24.754.820$00 (cfr. documento de fls 80 a 82 do
apenso 98). Se o preço ultrapassasse os 25.000.000$00, a aquisição teria de ser
aprovada pela Assembleia Municipal.
Do documento de fls 142 do apenso 97 (historial do aterro de Felgueiras),
apreendido na “Resin”, mais concretamente do documento nº 1, alusivo ao contrato de
compra e venda do terreno, emerge que o preço acordado foi de 25.754.820$00, sendo
certo que do documento nº 2 ali aludido refere-se uma parcela de 1.000 cts pertença da
testemunha Menezes Basto (cfr. ainda o documento de fls 344 do apenso 344, referente
a conferência de saldos, designadamente as contas efectuadas nesse documento pela
testemunha Menezes Basto)
O contrato de transacção referido foi celebrado a 25.11.93, no montante global
de 32.410.480$00.
Parece-lhe estranho que tenha sido a testemunha Menezes Basto quem, por força
do dito contrato de transacção, se tenha obrigado a reabilitar o terreno, quando é certo
que três dias antes tinha celebrado um contrato-promessa de compra e venda do terreno
em que, conforme emerge dos seus termos, transmitiu para a CMF a respectiva posse
por mero efeito desse contrato.
As prestações devidas por força destes contratos foram pagos à testemunha
Menezes Basto.
Alguns dos cheques emitidos pela CMF à dita testemunha foram por este
endossados à “Resin”, a qual lhe emitia facturas em valores idênticos.
A “Resin” tinha uma conta-corrente com a testemunha Menezes Basto, mas não
existia qualquer contrato escrito entre eles, o que não lhe parece normal.
Para além disso, a “Resin” não tinha qualquer contrato com a CMF que tivesse
qualquer relação com a lixeira.
A “Resin” não dispunha de alvará para executar as obras de reabilitação da
lixeira.
A CMF, por sua vez, não poderia contratar com uma empresa que não
dispusesse do alvará necessário para proceder à execução das obras de reabilitação
necessárias na lixeira de Sendim, até porque dessa forma não lograria obter o necessário
visto do Tribunal de Contas.
Naturalmente que o problema estaria ultrapassado se fosse a testemunha
Menezes Basto a contratar os serviços da “Resin”.
A fls 347 do apenso 97 consta uma cópia de um cheque emitido pela CMF a
favor da testemunha Menezes Basto, no valor de 5.235.080$00, datado de 30.03.94.
A fls 225 do apenso 97 consta um recibo da “Resin” para a testemunha Menezes
Basto, datado de 30.03.94, no mesmo valor de 5.235.080$00 (nesse documento, nas
observações, refere o número do cheque que serviu de meio de pagamento e que
coincide com o número do cheque de fls 347 do apenso 97, emitido pela CMF).
252
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
A fls 213 do apenso 97 consta um recibo emitido pela “Resin” à testemunha
Menezes Basto no valor de 6.000.000$00, datado de 26.06.96.
Do documento de fls 353 do apenso 97, penúltima linha, extrai-se que na conta
dessa testemunha foi efectuado um depósito de 11.000.000$00 (cfr. ainda o respectivo
talão de depósito nesse montante, tendo-se tratado do depósito de um cheque, sendo
certo que nesse documento tem manuscrito os dizeres “5.000 cts - Resin”; 6.000 cts –
mim”).
A fls 232 do apenso 97 consta um recibo da “Resin”, emitido a favor da
testemunha Menezes Basto, no valor de 5.000 cts.
A fls 349 do apenso 97 consta um cheque da CMF para a testemunha Menezes
Basto, no valor de 4.410.480$00, o qual foi depositado na conta dessa testemunha (cfr.
documento de fls 389 do apenso 97, 2ª parcela).
Entretanto a arguida Fátima Felgueiras, a 08.02.96, apresentou uma proposta de
aditamento ao contrato de transacção referido, no montante de 26.462.000$00 (cfr.
documento de fls 55 do apenso 98), tendo esse aditamento sido celebrado a 28.02.96.
Nessa altura a arguida Fátima era já presidente da CMF (o arguido Júlio já tinha
ido para a Assembleia da República exercer as funções de deputado).
Nunca encontraram na CMF qualquer documento da testemunha Menezes Basto
reclamando qualquer indemnização.
Também não encontraram na CMF qualquer documento alusivo à negociação
entre esta e a referida testemunha no que se refere ao pagamento de uma indemnização.
A celebração da escritura do contrato de compra e venda estava prevista para
Abril, segundo o contrato-promessa mas só se realizou a 27.12.97.
Ignora se a totalidade do terreno estaria em nome do vendedor.
Porém, se o atraso na celebração da escritura fosse imputável ao promitente
vendedor, naturalmente que inexistiria qualquer justificação para que a CMF lhe tivesse
de pagar qualquer indemnização por esse atraso (um dos motivos apresentados para a
celebração do aditamento ao contrato de transacção foi precisamente o atraso na
celebração da escritura pública de compra e venda desse imóvel e o custo dos trabalhos
que a testemunha Menezes alegadamente suportou nesse período de tempo – cfr. doc. de
fls 55 do apenso 98).
Só durante o inquérito é que a CMF contabilizou um pagamento, segundo se
apurou numa perícia.
Pensa que se tratou de uma duplicação de um pagamento no âmbito do contrato
de transacção, não contabilizado, no montante de cinco mil e tal contos (não se
reportava pois ao aditamento).
O orçamento da CMF reflectia um valor em dívida correspondente ao valor do
aditamento (cfr. por ex. o orçamento da CMF para 2001 – fls 66 e 67 do apenso 98).
Não encontraram na CMF qualquer documento donde se extraia que a
testemunha Menezes Basto tenha reclamado esse valor, o que não é normal.
Porém, tal compreende-se na medida em que o dinheiro não lhe era destinado,
mas à “Resin”, pois ele já tinha recebido tudo a que teria direito.
A “Resin” não recebeu qualquer verba da CMF referente ao aditamento.
Os documentos apreendidos a esse propósito na CMF referem que esse montante
era devido pela testemunha Menezes Basto.
Recorda-se que o ROC da “Resin” (testemunha Velosa) remeteu à testemunha
Menezes Basto um ou dois ofícios para confirmação de saldos.
Assim, por exemplo, consta de fls 344 do apenso 97 um desses documentos,
datado de 29.09.94, reportado a um saldo em 30.06.94, que a testemunha Menezes
confirmou (no qual estão indicados os pagamentos efectuados pela CMF)
253
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
O valor da transacção foi de 32.410.480$00, dos quais 1.000.000$00 diziam
respeito a parte do preço do contrato de compra e venda do terreno.
Os documentos de fls 341 (é o original e data de 26.08.96) e 342 do apenso 97 (
de 06.11.97) são de idêntica natureza e não terão sido devolvidos pela testemunha
Menezes Basto ao ROC.
Não se recorda se esses documentos foram entregues pela testemunha referida
(recorda-se que ele entregou documentos) ou se foram apreendidos na “Resin” (cfr. cota
de fls 2010, referente à abertura do apenso 97 com os documentos apreendidos à
“Translousada”, documentos esses referenciados no auto de apreensão de fls 2009,
tendo sido entretanto juntos a esse apenso outros documentos, como por exemplo os que
foram apreendidos à “Resin” e estão referenciados no auto de apreensão de fls 2017 a
2019 e cota de fls 2020; os documentos apreendidos à “Norlabor” e referidos no auto de
apreensão de fls 2024 e na cota de fls 2025; outros documentos apreendidos à
“Translousada”, conforme auto de apreensão de fls 2027 e cota de fls 2028; outros
documentos apreendidos à “Norlabor”, referenciados no auto de apreensão de fls 2038 e
na cota de fls 2039; outros documentos apreendidos à “Resin” e identificados no auto de
apreensão de fls 2079 e 2080 e referenciados na cota de fls 2081. Por outro lado, do
auto de inquirição de fls 2086 e da cota de fls 2089 resulta que os documentos em causa
– de confirmação de saldos - terão sido entregues pela testemunha Menezes Basto,
tendo sido juntos ao apenso 97 pela testemunha Carlos Alves – conforme acabou por
confirmar quando confrontado com esses elementos -, após o separador com o nome da
dita testemunha Menezes Basto).
Não encontraram qualquer documento da “Resin” donde resulte que tenha
reclamado junto da testemunha Menezes Basto o pagamento da quantia em dívida.
No que se refere à CMF não se recorda, sendo certo que a “Resin” a não
demandou.
Era frequente o pagamento com atrasos consideráveis pelas autarquias e as
empresas têm relutância em demandá-las por temerem que não lhes sejam adjudicadas
mais obras.
A quantia em dívida foi considerada de cobrança duvidosa pela “Resin”,
conforme emerge do extracto de conta-corrente com a testemunha Menezes Basto,
constante de fls 199 do apenso 97 (onde se indica que foi constituída uma provisão na
conta de clientes de cobrança duvidosa)
O devedor de facto da “Resin” era a CMF, mas não tinha qualquer suporte legal
para lhe exigir o respectivo pagamento.
Por sua vez, a testemunha Menezes Basto não tinha qualquer interesse em exigir
o pagamento da quantia em falta na medida em que não lhe era destinada e o terreno já
não era dele.
A “Resin” emtiu facturas e recibos de verbas que recebeu da testemunha
Menezes. Emitiu também facturas a essa testemunha e que não obteram pagamento.
A fls 335 do apenso 97 consta um documento com mais contas elaboradas pela
testemunha Menezes Basto.
Ele tinha mais terrenos nas imediações da lixeira de Sendim e que estariam
desvalorizados em face da existência da mencionada lixeira.
Em face das facturas e recibos emitidos pela “Resin” deduz que ela tenha
prestado serviços na lixeira, mas não pode afirmar quais e quando.
Acha difícil que a CMF tivesse meios para tratar do lixo (para o recolher e
depositar sim, mas para o tratar não).
254
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Recorda-se de ler notícias em jornais dando conta de que populares reclamavam
da existência da lixeira naquele local por força de incêndios e escorrimentos de líquidos,
mas não sabe a que tempo se reportam esses protestos.
Numa primeira busca levada a cabo às instalações da “Resin” viu um mapa que
espelhava a área de intervenção dessa empresa.
À data a “Resin” centrava a sua actividade numa área do país e existia outra
empresa que prestava serviços idênticos mas que centrava a sua acção noutra área do
país.
O arguido Barbieri facultou fotografias que retratavam a situação da lixeira antes
de intervencionada.
O aditamento ao contrato de transacção não foi pago, não tendo a “Resin”
demandado quem quer que seja por esse facto.
- Testemunha António Fernando da Silva Ramos
A testemunha Menezes Basto, a certa altura, apresentou-se ao depoente (quando
trabalhava na lixeira de Sendim ao serviço da “Resin”) e andou com ele no sentido dele
lhe indicar a localização de uma mina de água.
Tem a ideia que ele era o proprietário do terreno onde estava implantada a
lixeira, segundo deduz.
Ele não lhe demonstrou qualquer animosidade. Aliás, ele disse-lhe que ainda
bem que tinham ido para ali resolver o problema da lixeira, referindo-lhe inclusive que
em meio ano até os eucaliptos que por ali existiam ficaram mais bonitos.
- Testemunha José da Silva Campos
Foi vereador a tempo não permanente na CMF entre 1983 e 1985 e a tempo
permanente entre 1986 e 25.10.93, voltando a ser verador a tempo não permanente entre
1994 e 1997. Só em Junho de 1996 voltou a execer as funções de vereador a tempo não
permanente.
Nos primeiros 11 anos concorreu integrado nas listas do PS como independente.
Nos quatro anos seguintes concorreu integrado nas listas do PSD como independente e
no último mandato voltou a concorrer integrado nas listas do PS como independente.
O depoente teve a seu cargo muitos pelouros (higiene e limpeza, cemitérios,
mercados e feiras, etc).
Foi o vereador que foi confrontado com mais situações relacionadas com a
lixeira de Sendim.
O vereador Mendes Ribeiro, já falecido e eleito pelas listas do PSD, partilhou
consigo esse dossier.
O depoente exerceu funções nessa área, enquanto vereador, de 1986 até 1993.
A arguida Fátima Felgueiras só tinha intervenção nessa área em substituição do
arguido Júlio Faria, nas suas faltas e impedimentos, no tempo em que ela era vereadora
e este o presidente da autarquia. Nessa altura ela era a vice-presidente da autarquia.
Já no tempo em que era presidente da autarquia o Dr. Machado Matos (em 1983
era o presidente da CMF) existiu uma revolta popular em Pombeiro devido à “Lixeira
do Sapato”.
Uma das cláusulas penais insertas num contrato de locação celebrado com o
dono do terreno foi o depoente quem fez questão de a incluir (depois de ter conversado
com o dono do terreno e com o seu advogado, Dr. Paiva Martins).
Nessa altura viviam um problema muito premente com lixeiras clandestinas
dispersas pelo concelho em face do “boom” da indústria do calçado (deu como exemplo
a existência de uma lixeira em Revinhade).
255
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Procuraram vários locais para a instalação da lixeira (em Barrosas, na zona da
Lixa – em Seixedo - e por trás do monte de Stª Quitéria).
Chegou a ser ameaçado de pistola por um proprietário onde se perspectivava a
instalação da lixeira.
Em Barrosas chegaram a vedar o terreno e a drenar as águas, mas devido à
contestação popular tal projecto não foi avante.
Continuou-se assim a depositar o lixo em Sendim.
Essa lixeira não era clandestina.
Ultrapassou-se a área inicialmente acordada por via de contrato com o dono do
terreno.
O contrato inicial tinha sido celebrado no mandato anterior.
Não é verdade que o dono do terreno (testemunha Menezes Basto) nunca tenha
reclamado, pois muitas vezes foi o seu intorlocultor no que a essas reclamações
concerne e que se prendiam com a situação da lixeira (por ex., a autocombustão dos
resíduos, o que provocava incêndios, e o facto de se ter ultrapassado a área inicialmente
acordada).
Ele disse-lhe várias vezes que não queria uma lixeira nos seus terrenos e
pressionou-o nesse sentido.
Referiu-lhe ainda que pretendia ser ressarcido pelos prejuízos decorrentes das
más condições de funcionamento da lixeira e pela excessiva utilização do seu terreno
para esse fim (transmitiu-lhe essa pretensão na altura em que os contratos de locação
foram celebrados).
Numa zona próxima à lixeira (Francoim) existia uma zona industrial, em parte
instalada em terrenos que foram da testemunha Menezes Basto, o que provocava
desagrado aos industriais em face do funcionamento da lixeira naquelas condições.
O presidente da junta de freguesia de Sendim, por seu turno, dava conta do
sentimento de revolta popular.
Foi confrontado com o documento de fls 7 (de 01.10.90) e 10 (de 10.09.90), os
quais se reportam a informações suas a propósito da lixeira, enquanto vereador, tendo
relatado conversas com a testemunha Menezes Basto, onde lhe dava conta que ele não
queria a continuação da deposição do lixo no seu terreno naqueles moldes, tendo
imposto condições para a continuidade da deposição dos resíduos naquele local,
impondo designadamente uma renda superior, de 25 para 200 cts, o que era uma forma
de obrigar a CMF a sair dali.
Como não foi possível instalar em Barrosas a lixeira, negociou-se com a
testemunha Menezes Basto a prorrogação do contrato, onde figurou então da dita
cláusula penal.
A testemunha Menezes Basto mostrou-se receptiva aos apelos da CMF pois
sabia que o problema era premente, daí que, não obstante não desejar a lixeira nos seus
terrenos, continuasse a permitir a deposição do lixo nesse local, ainda que a cláusula
penal referida não tivesse sido cumprida.
De 1990 a 1993 as relações existentes entre a CMF e a testemunha Menezes
Basto degradaram-se bastante por causa da lixeira. Ele aliás queria falar pouco com o
arguido Júlio Faria, a ponto de não querer ser recebido por ele.
Em 25.10.93 o depoente entregou os pelouros, tendo-se então desligado das
negociações.
Não acompanhou assim de perto os trabalhos que entretanto foram
desenvolvidos na lixeira, não podendo precisar em concreto quem andava no terreno.
Os problemas relacionados com a lixeira prendiam-se com os incêndios, os
fumos e os cheiros.
256
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Para pelo menos controlar o início dos incêndios, foi ali colocado um
encarregado, de modo a que os resíduos depositados fossem cobertos.
A “Resin” surge como sendo uma empresa com “know how” nessa área, a qual
se apresentou em Lousada (ao que pensa num restaurante) à AMVS e em Felgueiras (na
CMF), onde deu a conhecer as suas capacidades e possíveis soluções.
Crê que foi a partir de finais de 1994 que a “Resin” teve intervenção na lixeira
de Sendim.
Tomaram-se medidas para não poluir as águas da zona da lixeira.
A “Resin”, nos primeiros tempos, teve de tratar dos lixiviados da lixeira.
Considera que o trabalho desenvolvido pela “Resin” merece ser relevado na
medida em que resolveu um problema grave no concelho de Felgueiras.
Acabaram-se entretanto as queixas relacionadas com o funcionamento da lixeira
de Sendim.
O único interesse da CMF era o de resolver o problema. Não tem a percepção de
que a “Resin” tivesse sido beneficiada.
Tem a ideia que os contratos celebrados com a “Resin” foram aprovados na
CMF e que são legais (haviam pareceres jurídicos). Acabou por referir não ter
conhecimento concreto de algum contrato celebrado entre ambas.
O interesse inerente à sua celebração não era de índole pessoal, mas apenas de
resolução do problema dos lixos.
Não conhece a “Norlabor” e que a CMF tenha celebrado com essa empresa
algum contrato por causa da lixeira.
Nunca tinha ouvido falar da “João Tello”. Não sabe se foi celebrado algum
contrato entre a CMF e essa empresa a propósito da lixeira.
Não sabe se, para além dos contratos de locação, a CMF celebrou com a
testemunha Menezes Basto algum outro contrato.
- Testemunha Fernando Valdemar Rodrigues Lima
É empresário. Foi vereador na CMF entre 1990 e 1993 (pelo PSD).
Esteve ligado ao FCF de 1994 a 1997, tendo feito parte da direcção do clube em
1996 e 1997.
Os contratos celebrados a propósito da lixeira eram discutidos em reunião de
Câmara, mas não se recorda bem. Tem a ideia de nessas reuniões se falar da “Resin”.
Foi a “Resin” que tomou conta da lixeira.
Os documentos da CMF foram submetidos à apreciação do Tribunal de Contas e
não houve problemas (por exemplo, o protocolo celebrado entre a CMF e o FCF). Não
se tratavam de contratos celebrados com a “Resin”.
Não conhece a testemunha Menezes Basto, mas esse nome não lhe é estranho.
Tem uma vaga ideia de terem existido problemas com uns arrendamentos
relacionados com a lixeira.
Não tem a certeza se a “Resin” trabalhou na lixeira no tempo em que era
vereador, mas tem a ideia que sim.
Não conhece ninguém dessa empresa.
*
A propósito destas declarações o arguido Júlio Faria referiu que o primeiro
contrato celebrado entre a CMF e a “Resin”, ou melhor, entre a CMF e a testemunha
Menezes Basto, é de Novembro de 1993, numa altura em que a testemunha Fernando
Lima ainda era vereador. Foi a propósito desse contrato que a entidade terceira
escolhida para reabilitar o terreno foi a “Resin”, facto que foi objecto de discussão na
CMF.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Nos finais do ano de 1993 existiram conversações com o arguido Vítor Borges
e que permitiram a celebração da transacção com a testemunha Menezes Basto.
Em todo o caso, durante o tempo em que a testemunha Fernando Lima foi
vereador, a “Resin” não teve qualquer intervenção na lixeira.
Os problemas relacionados com a lixeira eram discutidos em reuniões de
Câmara e com os autarcas, devido aos problemas provocados pelo descontrolo da
lixeira.
Análise crítica
Os contratos de arrendamento/locação celebrados com a testemunha Menezes
Basto constam dos autos e foram já acima referenciados (cfr. os documentos de fls 3, 4,
11 e 12 do apenso 98).
Acerca da inexistência de local alternativo para a deposição dos resíduos e das
circunstâncias em que a “Resin” foi operar na lixeira de Sendim (subcontratando
designadamente os serviços da “Translousada”) já o tribunal teve oportunidade de
expressar a sua convicção, fundada nos depoimentos, em particular, dos arguidos Júlio
Faria e Vítor Borges e ainda no depoimento da testemunha Menezes Basto. Em relação
a essa matéria foram também relevantes os depoimentos dos arguidos Fátima Felgueiras
e Barbieri Cardoso.
Para além disso, muitas testemunhas relataram o estado da lixeira antes e depois
da reabilitação levada a cabo pela “Resin”.
A proposta para a celebração do contrato de transacção foi apresentada ao
executivo camarário pela arguida Fátima Felgueiras (cfr. fls 63 do apenso 98) na medida
em que, à data, o arguido Júlio Faria se encontrava doente (segundo o próprio, entre
Setembro e Novembro de 1993), sendo por isso substituído por ela (a qual, recorde-se, à
data, era a vice-presidente da autarquia) – cfr. as declarações dos arguidos Júlio e
Fátima Felgueiras.
Os termos dessa proposta não correspondiam porém à realidade dos factos, pois
o propósito da celebração do contrato de transacção foi na verdade outro, conforme já
tivemos oportunidade de explicitar.
Seja como for, estava subjacente uma situação que urgia resolver, de modo a
pôr cobro ao problema de saúde pública e ambiental que então se vivia em face da
forma como os resíduos eram depositados na lixeira de Sendim e ante a eminência da
CMF não ter à disposição local alternativo para os depositar.
Em todo o caso, a testemunha Menezes Basto não exigia na verdade o
pagamento de qualquer indemnização (conforme aliás referiu), apenas não estando
disposto a permitir a continuação da deposição dos resíduos, pelo menos nos mesmos
moldes (isto é, de forma descontrolada – cfr. por exemplo as informações de 01.10.90 e
de 10.09.90, constantes de fls 7 e 10 do apenso 98, proferidas pelo então Verador José
da Silva Campos, o qual entretanto se desligou desse assunto quando cessou o seu
mandato).
Já os termos do contrato de transacção, celebrado a 25.11.93, são os que
constam do respectivo documento (cfr. fls 76 e 77. do apenso 98), sendo certo que,
segundo a testemunha Maria Fernanda Castro Leal, foi ela quem redigiu esse contrato (e
o contrato-promessa de compra e venda) sob a supervisão do arguido Júlio Faria.
Por outro lado, o facto de ter sido a “Resin” a pagar o visto do Tribunal de
Contas (cfr. fls 226 do apenso 97 e 53L do apenso 98) é indício que corrobora a ideia de
que o contrato de transacção em causa é simulado (simulação relativa, nos moldes já
acima explicitados), além de que essa empresa foi a destinatária final dos pagamentos,
razão pela qual exercia pressões sobre a CMF em ordem à obtenção do pagamento
258
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
(sabendo aliás da respectiva ocorrência sem necessidade de ser informada desse facto
pela testemunha Menezes, sinal de que existia um canal de comunicação directo entre a
CMF e a “Resin” – cfr. a propósito, por exemplo, as declarações prestadas pelas
testemunhas Menezes Basto e Terezinha Carvalho).
Acerca da necessidade da dita simulação já tivemos a oportunidade de explicitar
a sua razão de ser – a CMF não podia celebrar o contrato dissimulado com a “Resin”
(em especial, segundo explicou a testemunha Fernanda Leal, porquanto não era dona do
terreno onde estava implantada a lixeira, não obstante, nos termos do contrato-promessa
de compra e venda desse terreno constar que a respectiva posse se havia transmitido
para a CMF por mero efeito desse contrato; por outro lado, a “Resin” não dispunha de
alvará que, de per si, lhe permitisse executar os trabalhos, dificuldade que poderia ser
ultrapassada usando o alvará de outra empresa; para o arguido Barbieri esta segunda
razão era a única de que tinha conhecimento e que impedia a CMF de proceder a um
ajuste directo desses trabalhos à “Resin”. Note-se aliás que a missão de reabilitação da
lixeira, levada a cabo pela “Resin”, pressupôs, como não podia deixar de ser,
movimentações de terras, daí que os trabalhos só pudessem ser legalmente levados a
cabo por quem dispusesse de alvará para o efeito).
De resto, reafirma-se, do depoimento daqueles arguidos e daquela testemunha
resulta que de facto tal contrato visou apenas permitir que a CMF pagasse à “Resin” os
serviços que ela viria a prestar na lixeira de Sendim (entre Dezembro de 1993 e Maio de
1994, segundo o arguido Vítor Borges), sendo certo que o valor desse contrato cobria o
preço da reabilitação da lixeira de Sendim, existindo um diferencial de 1.000.000$00
que diziam ainda respeito ao preço de aquisição desse terreno pela CMF, conforme mais
à frente iremos melhor explicitar (cfr. documentos de fls 142 e ss. – “Aterro de
Felgueiras – Hitorial” 6 - e 344, ambos do apenso 97).
Na verdade, a testemunha Menezes Basto pagava à “Resin” na medida em que
recebesse da CMF (conforme o demonstram os documentos respectivos – cfr. por
exemplo, a este propósito, as declarações do arguido Carlos Marinho e os documentos
mencionados na pronúncia).
De modo a evitar os constrangimentos que não permitiam à CMF legalmente
pagar à “Resin” a reabilitação da lixeira, era imperioso que aquela adquirisse o
respectivo terreno (terá sido o arguido Vítor Borges quem terá convencido a testemunha
Menezes Basto a vender esse terreno à CMF, conforme emergiu dos respectivos
depoimentos).
Para o efeito, foi celebrado entre as partes um contrato-promessa de compra e
venda (cfr. fls 80 e ss. do apenso 98), na sequência de proposta apresentada nesse
sentido pela arguida Fátima Felgueiras a 01.10.93 e aprovada pelo executivo camarário.
Verifica-se que o preço é na verdade simulado, pois, conforme aliás emerge das
declarações do arguido Júlio Faria, era importante que o mesmo não ultrapassasse os
25.000 cts, caso contrário tal contrato teria de ser submetido à apreciação da Assembleia
Municipal de Felgueiras, o que de todo era inconveniente (pelos motivos já referidos).
Ora, o tribunal convenceu-se que, na realidade, o preço acordado foi de
25.754.820$00, conforme a custo admitiu a testemunha Menezes Basto (facto negado
sem qualquer credibilidade pelo arguido Júlio Faria, o qual apenas admitiu que a
proposta inicial da testemunha Menezes relativamente ao preço – e pelos vistos final –
ultrapassava os 25.000 cts; cfr. ainda as declarações do arguido Barbieri Cardoso a este
propósito).
6
Documento apreendido na “Resin”.
259
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
A testemunha Fernanda Castro Leal referiu aliás que o preço de 25.754.820$00
chegou a constar da minuta inicial do contrato, tendo sido entretanto alterado quando a
assessoria jurídica informou o arguido Júlio Faria de que um valor superior a 25.000 cts
obrigaria à aprovação desse contrato pela Assembleia Municipal de Felgueiras, facto
que aponta no sentido de que o preço foi de facto simulado em ordem a evitar a
intervenção deste órgão autárquico.
Na verdade, do dinheiro recebido da CMF, a testemunha Menezes Basto ficou
com essa quantia, tendo feito chegar o remanescente à “Resin”, conforme consta da
pronúncia.
Tendo a testemunha Menezes recebido da CMF um pagamento parcial de
11.000 cts – cfr. o talão de depósito de fls 338 do apenso 97 7 -, desse montante apenas
pagou à “Resin” 5.000 cts, conforme explicitado na pronúncia – cfr. fls 234 e 338 do
apenso 97 -, retendo pois para si a quantia de 6.000 cts, razão pela qual não terá
endossado esse cheque de 11.000 cts emitido pela CMF (cfr. ainda a anotação da
testemunha Menezes no doc. de fls 334 do apenso 97, donde emerge que desse
montante pago pela CMF apenas 5.000 cts se destinaram à “Resin”).
O diferencial de 1.000 cts (reportados ainda ao preço da compra e venda e
retidos pela testemunha Menezes) emerge ainda do documento de fls 142 do apenso 97
(historial do aterro de Felgueiras), apreendido na “Resin”.
Negaram os arguidos Vítor Borges e Carlos Marinho o recebimento de qualquer
quantia em numerário por parte da testemunha Menezes.
Porém, esta testemunha começou por admitir ter procedido a um pagamento em
numerário à “Resin”, mas sem ter a certeza desse facto, hipótese que depois afastou,
mesmo depois de confrontado com as suas declarações de fls 2803 dos autos (as
declarações então prestadas perante a PJ – com as quais foi confrontado, por ter sido
autorizado por todos os intervenientes processuais - merecem-nos maior credibilidade
pelo que a seguir se explicita).
Ora, o último pagamento que recebeu da CMF (de 4.410.480$00 – cfr. o cheque
de fls 349 do apenso 97 e talão de depósito na conta da testemunha Menezes de fls 389
do mesmo apenso) não vem referenciado no documento de fls 344 do apenso 97, tendo
essa testemunha referido ao Tribunal ignorar qual o destino que deu a esse dinheiro.
Certo é que a “Resin” emitiu um recibo de 6.000 cts a 26.06.96 (cfr. fls 213 do
apenso 97), pelo que, não tendo recebido o remanescente (3.410.480$00) por nenhuma
das vias já referidas (endosso de cheques emitidos pela CMF ou cheque pessoal da
testemunha Menezes), conclui-se que terá recebido essa verba em numerário, o que
confere credibilidade às declarações prestadas a esse propósito pela testemunha
Menezes ao JIC.
A escritura de compra e venda apenas foi celebrada a 27.12.94 (cfr. fls 83 e ss.
do apenso 98), quando, nos termos previstos pelo contrato-promessa de compra e venda,
deveria ter sido celebrada na primeira quinzena de Abril de 1994.
A razão de ser desse atraso prendeu-se com o facto do promitente-vendedor não
ter registado em seu nome esse terreno. Trata-se assim de facto imputável à testemunha
Menezes Basto e não à CMF (cfr. fls 84 verso do apenso 98), de sorte que essa
circunstância nunca poderia servir para justificar a celebração de qualquer aditamento
ao contrato de transacção.
Certo é que esse atraso na celebração do contrato definitivo terá “obrigado” à
celebração do aditamento ao contrato de transacção a 28.02.96 (cfr. fls 57 do apenso 98)
– na medida em que enquanto a CMF não fosse a proprietária do terreno mantinham-se
7
Onde a testemunha Menezes Basto manuscreveu “5.000.000$00 Resin” / “ 6.000.000$00 mim”.
260
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
as dificuldades de ordem administrativa que não lhe permitiam contratar directamente
com a “Resin” -, possibilitando assim à CMF o pagamento dos serviços prestados pela
“Resin” entre Junho e Janeiro de 1995 (cfr., designadamente, as declarações dos
arguidos Vítor Borges e Barbieri Cardoso), cuja proposta foi também apresentada pela
arguida Fátima, então já na qualidade de presidente da edilidade (cfr. fls 55 e 56 do
apenso 98).
Ademais, emerge do documento de fls 142 e ss. do apenso 97 que esse
aditamento foi a forma legalmente encontrada para que a “Resin” pudesse receber o
pagamento dos trabalhos executados na lixeira de Sendim entre Junho de 1994 e Janeiro
de 1995 (altura em que o contrato de compra e venda do terreno produziu os seus efeitos
financeiros por força do visto do TC, conforme referiu a testemunha Fernanda Castro
Leal).
Segundo a testemunha Fernanda Leal, foi a arguida Fátima Felgueiras quem lhe
determinou a preparação desse contrato.
Nas facturas emitidas pela “Resin” à CMF (as quais foram devolvidas – cfr. fls
12320 e ss.), foi alterada a identidade do destinatário nas facturas emitidas até Janeiro
de 1995 (recorde-se que só a partir desta data é que se produziram os efeitos financeiros
do contrato de compra e venda do terreno por força do respectivo visto por banda do
Tribunal de Contas a 16.01.95 - cfr. as declarações do arguido Carlos Marinho, as quais,
nessa parte, nos pareceram credíveis, tanto mais que as mesmas se fundam nos
documentos juntos já no decurso da audiência de julgamento por parte desse arguido,
documentos esses que se reportam às facturas em causa e às missivas que enviaram tais
documentos à CMF).
Por outro lado, os documentos enviados pelo ROC da “Resin” (testemunha
Velosa) à testemunha Menezes Basto terão sido de facto por ele recepcionados,
inclusive os de fls 341 e 342 do apenso 97, pois foram fornecidos por esta testemunha à
PJ (sinal de que os terá de facto recebido), conforme acabou por emergir dos
depoimentos dos agentes da PJ que conduziram a investigação.
No que toca ao aditamento nada foi pago à testemunha Menezes Basto (ou
melhor, à “Resin”), tanto mais que nos sucessivos orçamentos camarários a respectiva
verba (26.462.000$00) aparece sempre como passivo (cfr., designadamente, o
orçamento camarário de 2001, constante de fls 66 e 67 do apenso 98; cfr. ainda as
declarações prestadas a esse propósito pela testemunha Terezinha).
A propósito dos pagamentos por parte da CMF, referiu ainda a testemunha
Terezinha que eles eram determinados pela presidente da CMF (pois assinava as
respectivas ordens de pagamento), limitando-se a testemunha a informá-la das
disponibilidades de tesouraria.
De resto, conforme consta da pronúncia (e confirmado designadamente pelo
arguido Carlos Marinho), a “Resin”, a 27.11.98, decidiu constituir uma provisão para
clientes de cobrança duvidosa, no montante em dívida de 24.187.400$00 (cfr.
documentos de fls 199, 341 e 342, todos do apenso 97).
A testemunha Velosa, então ROC da “Resin”, explicou em que condições se
deve constituir uma provisão dessa natureza (outras testemunhas referiram-se também a
esse facto, designadamente por terem conhecimentos técnicos na área da contabilidade).
Esse procedimento não causa particular estranheza pelo facto do devedor de
facto ser a CMF.
Na verdade, formalmente era a testemunha Menezes o devedor, mas a real
devedora – ainda que sem qualquer contrato formalmente firmado - era a CMF, daí
talvez a incerteza na cobrança do crédito (a CMF sempre poderia ser demandada, pois
entre a CMF e a “Resin” estabeleceram-se relações comerciais de que resultou para
261
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
aquela a obrigação de pagar o preço acordado para a prestação dos serviços desta na
lixeira de Sendim, além de que, ainda que assim não fosse entendido, sobejaria sempre
o recurso ao instituto do enriquecimento sem causa).
Salientamos, em todo o caso, o facto de não se ter produzido qualquer prova de
que a “Resin” não tenha efectuado os trabalhos em causa ou que o respectivo valor
tenha sido empolado, mesmo em relação aos contratos mencionados nos pontos 1.3 e
1.4. da pronúncia; aliás, provou-se justamente o contrário (cfr. as declarações prestadas
pelos arguidos Fátima Felgueiras, Júlio Faria, Vítor Borges, Carlos Marinho e Barbieri
Cardoso e o depoimento das testemunhas que relataram o estado da lixeira antes e
depois da intervenção da “Resin”, com relevo para o depoimento da testemunha
Menezes Basto, o depoimento dos ex.funcionários da “Resin”, o auto de inspecção ao
local, as fotos tiradas aquando da inspecção, as fotos tiradas no momento em que a
“Resin” operava no local e os documentos de fls 12391 a 12396, 12426 a 12510, 12511
e 12512, 12513 a 12523, 12524 a 12565, 12576 a 12579, 12580 a 12584, 12585 a
12590, 12599 12613, bem como os documentos juntos no apenso 141, conjugados com
as explicações dadas pelo arguido Barbieri Cardoso, que aliás nos mereceram todo o
crédito pela forma escorreita com que depôs acerca dessa matéria).
O preço de 2.800 cts mensais + IVA mostrou-se pois ajustado em função dos
trabalhos levados a cabo e do crescente volume de deposição de resíduos registado na
lixeira de Sendim ao longo do tempo, cujo tempo de vida aliás se prolongou para além
do esperado.
O Concurso e Adjudicação da Empreitada de “Manutenção do Aterro
Sanitário – Execução de Plataformas”
Reprodução por súmula dos depoimentos prestados a esse propósito
- Arguida Fátima Felgueiras
Esclareceu que quando assumiu a presidência da CMF assumiu igualmente o
pelouro do ambiente, sendo certo que a partir de Dezembro de 1995 deixou de haver
qualquer contratualização relativamente à recolha e tratamento do lixo, além de que o
espaço utilizado para a deposição do lixo revelava-se já insuficiente.
Antes disso, por proposta dos serviços, entendeu a CMF abrir um concurso para
a manutenção do aterro e execução das plataformas, sendo certo que não esteve presente
na reunião de 11.04.95, mencionada no documento de fls 2275, do 10º volume.
Confirmou ter proferido o despacho de abertura do concurso a 27.11.95
(portanto já depois de ter assumido a presidência da CMF), conforme doc. de fls 69 do
apenso 95-A e doc. de fls 897. Esclareceu em todo o caso que a informação em causa
terá sido redigida pela Drª Terezinha e que o arguido Barbieri Cardoso era ao tempo o
responsável pelo Departamento Técnico da CMF.
Seja como for, a propósito do doc. de fls 70, referiu que o manuscrito ali inserto
foi escrito depois de ter proferido o respectivo despacho, sendo certo que alguém do
Departamento Técnico (de que o arguido Barbieri Cardoso era o responsável) colocou o
nome das empresas a convidar para o concurso.
Confirmou o objecto da empreitada a realizar, segundo o caderno de encargos
elaborado pelos técnicos, conforme consta da pronúncia, bem como o respectivo valor.
Pese embora tenha referido entender ser normal o convite a algumas empresas
em ordem a apresentarem as respectivas propostas, não deu qualquer explicação
plausível para o teor do fax de fls 301 do apenso 21, que alegou desconhecer.
Quando confrontada com o documento de fls 145, do apenso 97, não lhe causou
estranheza que a “Resin” se consorciasse com outras empresas, designadamente com a
262
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
“Norlabor” (consórcio esse que tinha como objecto precisamente a exploração e a
manutenção do aterro de Felgueiras), já que tal tipo de acordos são frequentes nas
relações comerciais existentes entre as empresas de construção civil e obras públicas.
Não pôs em causa o teor das propostas apresentadas, conforme consta da
pronúncia (cfr. docs de fls 118 e ss. do apenso 98) e que a sessão pública de abertura
dessas propostas ocorreu nos moldes também ali descritos (cfr. doc. de fls 89 e ss. do
apenso 98), sendo certo que foi escolhida a proposta apresentada pela “Norlabor” em
face do parecer técnico elaborado pelo Departamento Técnico (cfr. docs de fls 94 e ss.
do apenso 95-A), a qual aliás era a de menor valor.
Referiu ter sido uma surpresa não ter ganho a “Resin”, pois era quem no terreno
vinha executando os serviços de recolha e tratamento do lixo.
Salientou que todos os seus despachos foram proferidos com base nas
informações dos serviços camarários.
Confirmou que o contrato foi outorgado a 24.01.96, nos moldes descritos na
pronúncia.
Não obstante, era a “Resin” quem vinha procedendo aos trabalhos em causa,
pelo que se a “Norlabor” ou qualquer outra empresa efectivamente tiveram intervenção
neste domínio fizeram-no a título de subempreitada.
Admitiu assim que pelo menos parte dos trabalhos tinham sido já iniciados antes
da adjudicação à “Norlabor”, ignorando quanto tempo demorou a execução dos
trabalhos adjudicados (mas que seguramente ultrapassou 1 mês).
Confirmou o não pagamento da primeira factura emitida pela “Norlabor” e que
esta reclamou várias vezes o respectivo pagamento.
Confirmou que era à “Norlabor” que a CMF pagava os trabalhos executados
pela “Resin”, pelo que, pese embora desconheça qual o trajecto que teve o dinheiro
recebido pela “Norlabor”, não estranhou o facto do mesmo chegar à “Resin”, já que era
quem efectivamente executava a obra.
Referiu aliás não saber se a “Norlabor” prestou algum serviço na lixeira de
Sendim, mas se o fez fê-lo por subempreitada, conforme já referido.
Esclareceu aliás que a “Resin” exigia também o pagamento dos seus serviços e
insistia com a CMF para que ultrapassasse os embaraços administrativos que impedia
tal pagamento e para decidir se queria contratualizar com ela ou não quanto ao
tratamento dos lixos, visto que desde Janeiro de 1995 trabalhava na lixeira sem qualquer
contratualização formal.
Mais esclareceu que era a Drª Teresinha quem recebia da “Resin” os insistentes
pedidos de pagamento.
Salientou que os pagamentos efectuados à “Norlabor” corresponderam aos
serviços efectivamente executados no terreno (pela “Resin”).
Não deu qualquer explicação para o facto da “Norlabor” considerar de cobrança
duvidosa o alegado crédito que formalmente detinha sobre a CMF (cfr. doc. de fls
1906), não tendo conhecimento de que essa empresa alguma vez tenha demandado a
CMF, sendo certo que, em todo o caso, não teria interesse em o fazer pois foi oponente
em vários concursos abertos nos municípios do Vale do Sousa.
- Arguido Júlio Faria
Explicou que, a propósito da prossecução e realização dos trabalhos que a
“Resin” vinha executando na Lixeira de Sendim, existia alguma indefenição quanto ao
modo como se deveria avançar, num quadro de dificuldade em escolher e libertar o
terreno necessário à construção de um aterro que servisse os concelhos de Felgueiras, de
263
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Paços de Ferreira e de Lousada, sendo certo que em 1994 já se desenhava um novo
quadro de apoio comunitário.
Devido a contestação popular não foi possível construir esse aterro
intermunicipal em Lustosa (Lousada). Consequentemente, os três concelhos teriam de
indicar terrenos alternativos para serem avaliados, o que demorou o seu tempo.
Nesse meio tempo a “Resin” continuava a prestar os seus serviços na Lixeira de
Sendim.
Ora, a “Resin” remeteu-lhe um fax em 1994 mostrando-se disponível para
proceder à análise das alternativas de localização do futuro aterro no concelho de
Felgueiras.
Criaram-se pois assim condições para o lançamento do concurso referido nos
autos.
A propósito da reunião mencionada na pronúncia como tendo ocorrido a
11.04.95, referida no manuscrito de fls 2275 do 10º volume (da autoria da Drª
Teresinha), referiu não ter estado presente, sendo certo que a informação de fls 2275 lhe
é dirigida, o que seria desnecessário se de facto tivesse participado na dita reunião.
De resto, em face do conteúdo de tal documento – mormente na parte em que o
depoente determina que se dê cópia desse documento ao arguido Barbieri – se vê que
também este provavelmente não esteve presente (caso contrário não seria necessário
entregar-lhe cópia da informação prestada pela Drª Teresinha).
Referiu ignorar se a “Resin” já tinha executado parte dos trabalhos previstos no
caderno de encargos do concurso aquando da respectiva abertura, sendo certo porém
que ela sempre se manteve a operar em Sendim, executando trabalhos que deveriam ser
pagos pela CMF e que não estavam a coberto do contrato de transacção acima referido.
Consequentemente, a abertura do concurso em apreço foi a forma encontrada
para permitir o pagamento dos trabalhos que a “Resin” vinha executando em Sendim e
de modo a concluí-los de acordo com o respectivo caderno de encargos.
Existia por outro lado a preocupação de candidatar o projecto a fundos
comunitários, de modo a afectar o mínimo possível o orçamento camarário.
Referiu desconhecer a “Norlabor”.
Depois de ter sido eleito deputado desligou-se do andamento dos assuntos
camarários, até para não ser mal interpretada a sua actuação e ser vista como uma
ingerência incómoda em assuntos que já não lhe diziam respeito. Procurava assim dar
espaço aos novos dirigentes camarários.
Quanto ao facto de ter sido a “Resin” a indicar a lista das empresas a convidar
para o concurso, referiu ser normal a remessa de uma lista de empresas a convidar,
sendo certo que à data não teve qualquer reunião com a Tutela onde lhe indicassem
nomes de empresas com capacidade para executar os trabalhos. Terá sido por isso que
se recorreu à única empresa que se sabia ter essa capacidade, no sentido dela própria
indicar outras empresas que pudessem concorrer ao dito concurso.
Referiu ainda que só manteve com o arguido Barbieri Cardoso uma relação
profissional, sendo certo que ele não era filiado no PS nem nunca o viu em qualquer
iniciativa promovida por este partido.
- Arguido Vítor Borges
Reafirmou o que já havia referido quanto à necessidade da celebração do
concurso em causa.
Recorda-se de ter tido uma reunião na CMF onde esse problema foi abordado
(cfr. doc. de fls 2275 do 10º volume – manuscrito da Drª Teresinha alusivo à dita
reunião) e onde se adiantaram várias hipóteses de resolução do problema do pagamento
264
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
dos trabalhos efectuados pela “Resin” (invocação de natureza urgente e razões de saúde
pública ou abertura de um concurso limitado para trabalhos já excutados pela “Resin”
através de subempreitada à “Translousada” e à “Norlabor”).
Não se recorda de quem esteve presente (tem ideia de terem estado presente as
testemunhas Teresinha e Fernanda Castro Leal. Não tem ideia alguma do arguido
Barbieri Cardoso ter estado presente, tanto mais que ali não se discutiram questões de
natureza técnica).
Não se recorda se a esse propósito teve ou não mais reuniões, mas admite como
provável que sim.
Confirmou a celebração do contrato de consórcio de fls fls 145 do apenso 97 e
reafirmou as razões da respectiva celebração, acrescentando ainda que a “Norlabor”
receava ficar arredada das empreitadas quando a “ECOP” entrou no capital social da
“Resin”, sendo certo que a área do ambiente era potencialmente atraente, além de que
queria fixar uma listagem de preços de aluguer dos equipamentos (o que aliás foi feito
com a “Translousada”).
O concurso em apreço precipitou a celebração desse contrato de consórcio.
Pese embora não tenha já a certeza, tem a ideia de que foi o arguido Barbieri
Cardoso quem lhe telefonou (presume esse facto por lhe ter dirigido o fax de fls 301 do
apenso 21) solicitando-lhe que indicasse as empresas que deveriam ser convidadas (as
quais deveriam ter no seu objecto social a celebração de empreitadas de obras públicas e
que tivessem capacidade para as executar), daí a remessa do fax de fls 301 do apenso 21
a 24.11.95.
Como os trabalhos já estavam feitos (incluindo a execução das plataformas,
triagem do lixo, deposição do mesmo com compactagem e deposição de terra), o
concurso apenas visou o pagamento dos mesmos à “Resin” (a data muito próxima entre
a adjudicação e a conclusão dos trabalhos indicia que eles já estariam realizados, já que
não seria possível executá-los naquele pequeno período de tempo se nada estivesse feito
à data da adjudicação).
Nessa medida, já se sabia à partida que a “Norlabor” iria ganhar o concurso (e
que a “Resin” seria o destinatário final dos pagamentos a efectuar pela CMF). Houve
assim uma consertação entre os concorrentes nas propostas apresentadas de modo a que
a “Norlabor” apresentasse a melhor proposta. Nesse sentido, aliás, deu instruções aos
técnicos da “Resin” para conversarem com as outras empresas concorrentes.
Na altura haviam débitos da “Resin” à “Norlabor”. Porém, quem de facto
trabalhou na lixeira foi a “Translousada”, conforme verificou nos documentos depois da
sessão de julgamento do dia anterior.
Reafirmou que para si a “Norlabor” e a “Translousada” eram a mesma coisa,
pois tinham sócios comuns.
Explicou o percurso sinuoso que os meios de pagamento tiveram até chegar à
“Resin” (via “Norlabor” e desta para a “Translousada” até por fim chegar à “Resin”)
pelo facto da “Norlabor” ter ganho o concurso por ter alvará para o efeito, havendo que
fazer intervir a “Translousada” no circuito do pagamento porque quem de facto
executou trabalhos na lixeira foi esta empresa (subcontratada pela “Resin”), a qual já
tinha recebido parte dos pagamentos por banda da “Resin” (a “Resin” elaborou o
projecto, supervisionou a sua execução, mantendo no terreno um engenheiro, dois
seguranças e um encarregado).
Acrescentou que as relações comerciais que a “Resin” mantinha com a
“Translousada” a propósito do trabalho por esta desenvoilvido na lixeira de Sendim não
foi formalizado por escrito.
265
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
- Arguido Carlos Marinho
Explicou que em finais de 1995, aquando da devolução das 17 facturas pela
CMF, foi-lhe dito pela administração da “Resin” que parte delas teriam de ser anuladas
e emitidas ao Eng. Menezes Basto e outra parte à “Translousada”, tendo-se procedido
do modo já acima referido.
Posteriormente soube pelo arguido Vítor Borges que foi a “Norlabor” que
ganhou o concurso em causa relativo à manutenção da lixeira.
Nessa altura ignorava a celebração do contrato de consórcio com a “Norlabor”,
acerca do qual aliás nunca foi ouvido, tendo-lhe sido dito posteriormente que a
celebração de tal contrato visava garantir no futuro o relacionamento comercial
existente com a “Norlabor” em face do facto da “ECOP” ter entrado no capital social da
“Resin”.
Na altura da realização do concurso em causa ignorava que tinha sido solicitada
à “Resin” a indicação de empresas que a ele pudessem concorrer.
Confirmou que a CMF pagou à “Norlabor”, esta pagou à “Translousada”, a qual
por sua vez pagou à “Resin”, a qual era a destinatária final dos pagamentos efectuados
pela CMF, sendo certo que a “Norlabor” nunca operou na lixeira de Sendim (apenas
operou na lixeira da Lustosa). De facto, apenas a “Translousada” operou na lixeira de
Sendim subcontratada pela “Resin”.
Os pagamentos ocorreram em 1996 e 1998.
A propósito do documento de fls 127 do apenso 97 (missiva da “Translousada” à
“Resin”, ao cuidado do arguido Vítor Borges, em Julho de 1996, a remeter cópia do
contrato de empreitada celebrado entre a CMF e a “Norlabor”), com o qual foi
confrontado, referiu ignorar, visto que os documentos pertinentes já haviam sido
tratados contabilisticamente pelo depoente em finais de 1995 com a emissão das
facturas à “Translousada” (o depoente tratava das facturas e contabilizava os
recebimentos recebidos pela tesouraria).
Confrontado com o teor da factura de fls 122 do apenso 95-A (factura emitida
pela “Norlabor” à CMF, a 26.02.96, no valor de 19.550.664$00) referiu que o montante
respectivo corresponde à totalidade do valor da empreitada em causa. A única
explicação que encontra para o facto de ter sido apresentada uma única factura com o
valor global da empreitada é a de que a mesma se destinava ao pagamento de trabalhos
já efectuados.
Confrontado com o teor do documento de fls 123 do apenso 95-A (recibo da
“Norlabor” à CMF, no montante de 5.000.000$00), explicou que até 1998 não chegou à
“Resin” qualquer outra quantia monetária por conta do pagamento dos serviços que
prestou na lixeira de Sendim, no que diz respeito à sua manutenção/execução de
plataformas (o primeiro pagamento parcial da CMF cifrou-se na quantia líquida de
4.738.095$00, após as legais retenções).
Ignora se a “Norlabor” pressionou a CMF a efectivar os pagamentos em falta ou
se a “Resin” exerceu também pressão junto da edilidade nesse sentido, mas admite que
tal possa ter ocorrido visto ser a destinatária final desses pagamentos (cfr. a propósito o
documento de fls 293 do apenso 97).
Explicou que o documento de fls 1906 constitui um extracto de conta-corrente
existente entre a “Norlabor” e a CMF.
Em finais de 1997 o crédito em causa (cerca de 14.000.000$00) foi considerado
de cobrança duvidosa, o que de certa forma considerou estranho em face da natureza da
entidade devedora, remetendo para os responsáveis da “Norlabor” a explicação de tal
procedimento. Não deu qualquer explicação para o facto de tal procedimento ter sido
adoptado sem dar conhecimento à “Resin” já que esta era a destinatária final dos
266
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
pagamentos efectuados pela CMF, remetendo mais uma vez a explicação para os
responsáveis da “Norlabor”.
Foi então confrontado com os seguintes documentos, que não pôs em causa:
- fls 131 do apenso 95-A (ordem de pagamento da CMF no montante de
7.000.000$00, com o valor líquido – após as legais deduções – de 6.633.334$00);
- fls 133 do apenso 95-A (recibo nº 649, no montante de 7.000.000$00, emitido
pela “Norlabor” à CMF, datado de 13.05.98, reportado ao segundo pagamento parcial
da já referida factura cuja cópia se acha a fls 122 do apenso 95-A);
- fls 136 do apenso 95-A (ordem de pagamento da CMF à “Norlabor” do
montante de 7.550.664$00, o que perfaz o valor líquido de 7.155.153$00, após as legais
retenções);
- fls 138 do apenso 95-A (recibo da “Norlabor” à CMF no montante de
7.550.664$00, datado de 21.10.98, reportado ao terceiro e último pagamento parcial da
factura de fls 122 do apenso 95-A).
Por outro lado, confirmou que a “Resin” recebeu as quantias em causa do
seguinte modo:
- 4.738.095$00 a 25.06.96, através do cheque nº 1159765 da CGD, constante de
fls 1903 dos autos, para liquidação da factura nº 9500182, de 27.02.95 (cfr. fls 161 do
apenso 97) e parte da factura nº 9500280, de 31.03.95 - 1.462.095$00 (cfr. fls 162 do
apenso 97) -, tendo emitido o respectivo recibo à “Translousada” a 25.06.95 (cfr.
documento de fls 191 do apenso 97); cfr. ainda o talão de depósito na conta da “Resin”
a 25.06.96, constante de fls 192 do apenso 97;
- 6.633.334$00, através do cheque nº 40878643, de uma conta particular de
sócios da “Norlabor”, constante de fls 1910 dos autos (cfr. ainda o documento de fls 158
do apenso 95-A e o talão de depósito na conta da “Norlabor” constante de fls 1912 dos
autos), para pagamento do remanescente da factura nº 9500280, de 31.03.95, constante
de fls 162 do apenso 97 (1.813.905$00), da totalidade da factura nº 9500369, datada de
18.04.95, no montante de 3.276.000$00 (cfr. documento de fls 163 do apenso 97) e
parte da factura nº 9500451, de 31.05.95, constante de fls 164 do apenso 97
(1.543.429$00); cfr. ainda o documento comprovativo do depósito na conta da “Resin”
a fls 196 do apenso 97 e o recibo respectivo a fls 195 do apenso 97, datado de 14.05.98;
- 7.155.153$00, através de cheque endossado pela “Translousada” e emitido pela
“Norlabor”, correspondente à liquidação do remanescente da factura nº 9500451, de
31.05.95 (cfr. fls 164 do apenso 97 – 1.732.571$00), à totalidade da factura nº 9500571,
de 30.06.95, no montante de 3.276.000$00 (constante de fls 165 do apenso 97) e parte
da factura nº 9500665, de 31.07.95 (constante de fls 166 do apenso 97 - 2.146.582$00);
cfr. o recibo de fls 198 do apenso 97, datado de 22.10.98 e o documento e fls 151 do
apenso 95-A.
Quanto ao manuscrito a lápis no verso do recibo de fls 195 do apenso 97
(respeitante ao segundo recebimento), afirmou não ser da sua autoria, ignorando a que
se refere (cfr. fls 4629 dos autos).
Explicou, em todo o caso, que o IVA entre empresas era de 17% na altura e que
no que respeita a uma entidade pública era na altura de 5%. Consequentemente, as
facturas emitidas pela “Resin” à “Translousada” incluiam IVA a 17%, ao passo que a
factura emitida pela “Norlabor” à CMF incluíu IVA a 5%.
Assim, o valor do crédito da “Resin” é superior ao valor da factura emitida pela
“Norlabor” à CMF.
Tal facto explica porque razão a última factura emitida pela “Resin” à
“Translousada” (cfr. fls 166 do apenso 97) não foi integralmente paga.
267
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
A esse propósito esclareceu que abordou o Sr. Carlos Silva da “Translousada”
no sentido de ser paga a diferença, mas tal situação foi-se protelando no tempo até que o
valor em dívida foi “anulado” (considerando o crédito de cobrança duvidosa,
constituindo-se por isso a provisão respectiva) como compensação pelo facto da
“Resin” não pagar atempadamente os serviços prestados pela “Translousada” na lixeira
de Sendim, sendo certo que esta empresa nunca debitou juros de mora.
Questionado da razão pela qual nas 17 facturas originalmente remetidas à CMF
para pagamento (e por esta recusadas conforme já acima referido) colocou o IVA a
17%, não obstante a CMF ser uma entidade pública, respondeu que decidiu fazer desse
modo porquanto inexistia qualquer contratualização entre essa edilidade e a “Resin”
(explicação que não se percebe, pois se não havia contratualização desde logo essas
facturas não deveriam ter sido emitidas e apresentadas a pagamento à CMF).
Nega que os valores dos trabalhos tenham sido sobrevalorizados e que alguma
quantia recebida pela “Resin” tenha sido entregue à arguida Fátima Felgueiras,
conforme consta da pronúncia.
Explicou ainda que a “Translousada” tinha de intervir no processo de forma a
que contabilisticamente os pagamentos à “Resin” estivessem justificados na medida em
que aquando da devolução das referidas 17 facturas pela CMF (em Dezembro de 1995)
parte delas foram reemitidas e enviadas à “Translousada”, sendo certo que quem acabou
por ganhar o concurso foi a “Norlabor” (porém, tendo sido devolvidas as facturas em
causa no final de 1995, numa altura em que já se sabia que a “Norlabor” já tinha ganho
ou ganharia o concurso - realizado em Dezembro de 1995 -, não se percebe, à luz
daquela explicação, porque razão as facturas reemitidas o não foram à “Norlabor” no
período compreendido entre Fevereiro de 1995 e Outubro de 1995, sendo certo aliás que
parece ter havido concertação na apresentação das propostas dos diferentes concorrentes
ao concurso em causa de modo a que ganhasse a proposta apresentada pela “Norlabor”,
concorrentes esses indicados aliás pela “Resin”, daí que seja pouco plausível que tenha
constituído uma surpresa para a “Resin” que a “Norlabor” tenha ganho o concurso,
empresa com a qual aliás tinha celebrado a 19.04.95 um contrato de consórcio tendo por
objecto precisamente a manutenção da lixeira de Sendim, dai que faça todo o sentido
que esta última tenha apresentado a proposta que viria a ser vencedora por ser pelo
menos a de menor custo para a edilidade).
Confrontado com o documento de fls 127 do apenso 97 (é a “Translousada” que
remete à “Resin” cópia do contrato de empreitada celebrado a 24.01.96 entre a CMF e a
“Norlabor”), referiu que a “Translousada” e a “Norlabor” tinham sócios comuns, daí
que não estranhe esse facto.
- Arguido Barbieri Cardoso
Em 1995 o então Secretário de Estado do Ambiente (Poças Martins)
impulsionou o desenvolvimento da resolução o problema dos resíduos no Vale do
Sousa, tendo sido celebrado a 28.09.95 um protocolo entre o Ministério do Ambiente e
os municípios do Vale do Sousa (documento junto na audiência de julgamento) com
vista à candidatura aos fundos comunitários.
Havia pois a expectativa que os custos com a recolha e tratamento dos resíduos
viessem a ser em parte suportados pelos fundos comunitários (os fundos estruturais
comparticipavam em 50%, ao passo que os fundos de coesão comparticipavam em
85%).
Ora, a partir de Maio de 1994 inexistia qualquer contratualização formal que
permitisse à “Resin” continuar a trabalhar na lixeira de Sendim, quer porque a CMF
ainda não havia adquirido o terreno onde estava implantada a lixeira (a escritura
268
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
realizou-se a 27.12.94) quer porque a “Resin” não dispunha de alvará que lhe permitisse
executar obras de empreitada. A este propósito recorda-se que o TC rejeitou um
contrato de fornecimento de semáforos por entender que se tratava de um contrato de
empreitada e o mesmo por certo entenderia quanto à actividade desenvolvida pela
“Resin” na lixeira de Sendim. Havia pois dúvidas acerca da qualificação jurídica dessa
actividade (mera prestação de serviços ou empreitada?), sendo certo que a qualificação
como empreitada permitia à CMF pagar um IVA de apenas 5%, ao passo que se se
tratasse de um fornecimento ou de uma mera prestação de serviços teria de pagar o IVA
a 17%.
O arguido Júlio Faria, não obstante (dada a falta de alternativas), concordou em
que a “Resin” continuasse a operar no local (cfr. fax de fls 2773).
A “Resin”, a propósito, remeteu o respectivo orçamento (2.800 cts /mês + IVA),
conforme documento junto na audiência de julgamento.
A Drª Terezinha prestou informação escrita ao arguido Júlio Faria do que se
passou na reunião de 11.04.95, conforme documento de fls 2275, do 10º volume.
Em meados de 1995 o problema arrastava-se e só se procurou uma solução
quando a arguida Fátima Felgueiras tomou conta desse dossier em Setembro/Outubro de
1995.
Em 17.07.95 foram abertas as propostas para o concurso de construção do aterro
da Lustosa (Penafiel), criando a expectativa de uma resolução rápida do problema da
recolha e tratamento dos resíduos.
Como a arguida Fátima Felgueiras queria “colocar a casa em ordem” decidiu-se
que o serviço de recolha de resíduos deveria gerar receitas para se financiar, com a
criação de uma taxa em inícios de 1996 para os resíduos industriais (princípio
poluidor/pagador).
Além disso, em ordem a resolver questões passadas (pagamento dos trabalhos já
executados) ela mandou abrir um concurso ao Departamento Técnico, sendo certo que é
a assessoria jurídica quem prepara e elabora os contratos, dando seguimento ao que já
havia sido anteriormente decidido pelo arguido Júlio Faria (cfr. documento de fls 2275
do 10º volume).
Explicou que a lixeira de Sendim situava-se em terrenos que segundo o PDM
faziam parte da Reserva Ecológica, como acontecia com todos os terrenos com uma
inclinação superior a 30%. No caso o terreno tinha essa inclinação devido à deposição
do lixo, pelo que não fazia sentido integrar aquela área na “Reserva Ecológica”.
Ora, os trabalhos efectuados pela “Resin” entre Junho de 1994 até Abril de 1996
foram pagos com recurso ao expediente do concurso (precisou mais tarde que esse
expediente serviu para pagar os trabalhos efectuados entre Fevereiro de 1995 até Abril
de 1996; já antes desse perído de tempo a CMF teria lançado mão do contrato de
transacção e seu aditamento, referidos no ponto 1.2 da pronuncia, para pagar trabalhos
efectuados anteriormente).
Nega qualquer sobreavaliação pois foi paga a quantia de 977$00 por tonelada de
lixo, o que é um preço muito bom.
Esclareceu que o concurso em causa reportava-se formalmente a trabalhos a
executar num período de 30 dias na medida em que grande parte desses trabalhos já
haviam sido executados quanto à movimentação de terras. Para consolidar essa
movimentação de terras bastariam 30 dias. A ideia era a de abarcar todo o trabalho de
movimentação de terras e consolidação das plataformas até ao ajuste directo referido no
ponto 1.4.
O ajuste directo a que se reporta o ponto 1.4 da pronúncia serviu para pagar os
serviços que iriam ser prestados pela “Resin” sendo certo que o concurso a que se
269
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
reporta o ponto em causa serviu para pagar os trabalhos efectuados desde o final do
período coberto pelo aditamento ao contrato de transacção celebrado com o Eng.
Menezes Basto até à concretização do ajuste directo (entre Janeiro/Fevereiro de 1995
até Abril de 1996).
Havia a expectativa de que os encargos entretanto transitassem para a AMVS.
Recorda-se que na fase de indefinição da resolução da questão dos pagamentos à
“Resin” por banda da CMF, o arguido Vitor Borges ameaçou abandonar os trabalhos
pois “tinha de dar satisfações aos franceses”.
Foi-lhe então comunicado a abertura do concurso a que se reporta este ponto da
pronúncia em ordem a resolver o problema dos pagamentos e o arguido Vítor Borges
recomendou cuidado acerca das empresas a convidar para apresentar as respectivas
propostas visto que quem ganhasse teria de falar com a “Resin” dado ser ela quem de
facto operava no terreno. Dessa forma acalmou-se o arguido Vítor Borges. Admite o
depoente que possa ter sido quem lhe comunicou a decisão de realização desse
concurso, salientando em todo o caso que agiu sempre com base em instruções
superiores, relembrando que responde directamente perante a presidente da CMF.
Partiu assim do pressuposto, na altura, que a “Resin” não iria concorrer, até
porque não dispunha de alvará, daí que tenha apenas constatado que ela concorreu
aquando da abertura das propostas.
Nesse contexto, não achou estranho que a “Resin” tivesse indicado as empresas
a convidar.
Não se recorda de ter recebido ordens para contactar a “Resin” em ordem a
indicar as empresas a convidar. A esse propósito, foi confrontado com as declarações
prestadas perante o JIC, constantes do 2º parágrafo de fls 2267 e do 2º parágrafo de fls
3918, esclarecendo que as declarações que ali constam correspondem a respostas
parcelares. Reconheceu que na altura lhe foi presente o fax já referido e que lhe era
endereçado, mantendo a posição já adoptada perante o JIC. Em todo o caso, não põem
de parte que possa ter recebido instruções da arguida Fátima Felgueiras no sentido de
contactar a “Resin” com aquele desiderato. Adiantou que tal possa ter sido
eventualmente feito pelo Eng. Ferreira (responsável pela área dos concursos) ou pela
funcionária Conceição Ferreira, a qual dava apoio à área dos concursos.
Como achou na altura que a “Resin” não iria concorrer não entendeu então
imprudente solicitar-lhe a indicação de empresas a convidar para o concurso. Seja como
for, reafirmou não se lembrar se ter contactado a “Resin” para esse fim, reafirmando
ainda que esse contacto também poderia ter sido feito pelo Eng. Ferreira Leite
(responsável pelos concursos) ou pela funcionária Conceição. Admite em todo o caso
que possa ter conversado com o Eng. Ferreira acerca desse assunto. Seja como for,
nunca teve a percepção do cometimento de alguma ilegalidade, pois caso contrário o fax
de fls 301 do apenso 21 não constaria, como consta, do processo respeitante ao
concurso em causa.
Referiu então que o fax de fls 301 do apenso 21 (indicação das empresas pela
“Resin”) não lhe chegou às mãos, pois nesse caso teria despachado no mesmo, o que
não se verifica, sendo certo que os serviços administrativos já sabiam que se aguardava
essa indicação. Só mais tarde viu esse fax quando a Drª Maria Natal, a propósito de um
inquérito à CMF pela IGAT, o abordou acerca desse assunto. Sobre este ponto não foi
muito assertivo, admitindo que eventualmente já tivesse visto tal documento, embora
não se recorde de tal facto.
Confrontado com o convite dirigido à “Resin” (cfr. fls 70 o apenso 95-A),
salientou que esse convite foi feito sem o seu conhecimento, sendo certo que a letra
desse documento é de uma funcionária camarária (Conceção Ferreira, chefe de secção).
270
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Reconheceu que ela deverá ter redigido e dirigido os convites conforme a
indicação dada pela “Resin” no documento de fls 301 do apenso 21.
Esclareceu que todos os veradores sabiam do objectivo do concurso.
Ignora se a apresentação das propostas pelas diferentes empresas foi feita de
forma concertada por forma a que uma delas ganhasse o concurso, sendo certo, em todo
o caso, que os concorrentes teriam de garantir a continuação dos trabalhos até ao ajuste
directo à “Resin”.
Não havia a possibilidade da CMF ter de pagar duas vezes os trabalhos em causa
(à “Resin” e à empresa que ganhasse o concurso) na medida em que só pagaria à
empresa que ganhou o concurso os trabalhos que ela própria eventualmente executasse
(porém, estes trabalhos que formalmente constavam do caderno de encargos estariam já
praticamente concluídos aquando do concurso e seguramente concluídos aquando da
celebração do contrato de empreitada respectivo. Em todo o caso, segundo o depoente,
este concurso serviu para efectuar o pagamento de trabalhos que se estenderam até Abril
de 1996). A CMF controlava os trabalhos efectuados porquanto eram medidos os
trabalhos de escavação e aterro, ao qual se pagava o preço unitário previsto na proposta
que ganhou o concurso. Nessa medida, a CMF acabou por pagar uma quantia inferior a
2.800 cts + IVA por mês.
De resto, se a empresa ganhadora do concurso não estivesse concertada com a
“Resin”, teria de cumprir o volume de movimentação de terras previsto no concurso.
De facto, quando preparou o concurso, previu 6 meses de escavação e aterro, na
ordem de 20.000 m3 de movimentação de terras, à razão de 3.350 m3 por mês (cfr. os
convites endereçados às empresas convidadas).
A apreciação das propostas incidiu basicamente na verificação e comparação dos
preços apresentados, tendo ganho a proposta mais económica (da “Norlabor”).
A formalização do contrato de empreitada respectivo só ocorreu a 24.01.96 (cfr.
documento de fls 128 do apenso 97) na medida em que só então o cabimento
orçamental da CMF o permitiu.
Só existiu um auto de medição efectuado pelo Eng. Ferreira Leite a 23.02.96,
aprovado pela arguida Fátima Felgueiras a 06.05.96.
Referiu que hoje sabe que a “Norlabor” directamente não executou qualquer
trabalho pois subempreitou-os à “Translousada” sem o comunicar à CMF.
Confrontado com as declarações de fls 2268, 2º parágrafo, por remissão das
declarações prestadas a fls 3918, 2º parágrafo, entende inexistir qualquer contradição
com o que referiu, salientando a veracidade do que agora referiu e do que a propósito
declarou na fase de inquérito. Em todo o caso, nessa altura ignorava que a
“Translousada” tinha executado trabalhos (forneceram camiões e máquinas; ignora se
sem ou com condutor, sendo em todo o caso normal que esse fornecimento incluísse o
manobrador), sendo do seu conhecimento que a “Resin” operava no local com pessoal e
com o seu “know how” (sucede que a “Resin” pagou à “Translousada” os trabalhos por
esta efectuados, pelo que conclui que terá sido de facto subempreitada pela “Resin” e
não pela “Norlabor”).
Não teve conhecimento que a “Norlabor” considerou de cobrança duvidosa o
crédito que formalmente detinha sobre a CMF. Adiantou em todo o caso que a CMF
pagava sempre com grande atraso. Ignora também se algum outro credor teve o mesmo
procedimento.
Chamou por fim à colação uma notícia do Jornal de Notícias de 23.01.96 acerca
da lixeira de Sendim e um estudo elaborado pela “Quercus” para o Ministério do
Ambiente (e remetido por este à CMF), datado de 17.05.96, acerca da produção e
encaminhamento dos resíduos sólidos industriais do sector do calçado na região Norte
271
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
- Testemunha José Joaquim Mesquita Teixeira de Oliveira
Enquanto inspector da IGAT fez uma análise da relação de entregas em
numerário da “Resin” a alguém relacionado com a CMF e pagamentos efectuados à
“Norlabor”.
Para o efeito efectuou uma auditoria contabilística e financeira aos documentos
de suporte.
Como apareceram elementos documentais ligados à “Translousada” e à “Resin”
resolveu alargar o âmbito da sua análise.
Apurou então, em face da análise efectuada, que os pagamentos efectuados pela
CMF à “Norlabor” (a qual emitiu a factura nº 427, cuja cópia consta de fls 1899) foram
transferidos para a “Translousada” e desta para a “Resin” nos moldes descritos na
pronúncia, confirmando assim o teor do seu relatório de fls 2285 e ss, do 10º volume.
Assim, o primeiro pagamento efectuado pela CMF à “Norlabor”, no valor de
4.738.095$00, foi efectivado através do cheque cuja cópia se acha a fls 1903 do 8º
volume; tal cheque foi endossado pela “Norlabor” à “Translousada”, a qual por sua vez
o endossou à “Resin”.
O segundo pagamento efectuado pela CMF à “Norlabor” cifrou-se em
6.633.334$00 (o valor ilíquido era de 7.000.000$00, tendo sido efectuadas as
respectivas deduções relativas a caução e para a Caixa Geral de Aposentações – cfr.
doc. de fls 158 do 1º volume) e foi efectivado através do cheque cuja cópia se acha a fls
1910 do 8º volume (ou fls 158 do apenso 95-A), o qual foi depositado por esta empresa
na sua conta. Entretanto a 14.05.98 a “Norlabor” emitiu um cheque de igual valor à
“Translousada”, sacado de uma conta particular conjunta dos respectivos sócios, a qual
por sua vez o endossou à “Resin”, empresa que por sua vez o depositou a 15.05.98.
O terceiro pagamento efectuado pela CMF à “Norlabor”, no montante de
7.155.153$00, foi efectivado através do cheque cuja cópia se acha a fls 151 do apenso
95-A (ou fls 1915 do 8º volume), a qual procedeu ao seu depósito bancário (cfr. fls
1917), tendo na mesma data emitido um cheque de igual valor a favor da
“Translousada”, a qual por sua vez o endossou à “Resin”, empresa que efectuou o
respectivo depósito a 21.10.98.
Para justificar a transferência dos pagamentos efectuados para a “Translousada”
esta emitia notas de débito à “Norlabor”.
Por outro lado, as perdas que foram contabilizadas na conta de provisões de
exercício da “Resin”, que no total ascendem a 28.231.803$00 (2.894.985$00 +
24.187.400$00 + 1.129.418$00), não aparecem no relatório de contas nem nas
declarações fiscais. Em conversa informal com o revisor oficial de contas da “Resin”,
pelo mesmo foi-lhe dito não se recordar da explicação para tal facto, o que ao depoente
não parece normal.
Essas situações de perda decorreram do facto da CMF não ter efectuado o
pagamento respectivo.
Confrontado com os manuscritos de fls 159 e 163 do 1º volume, referiu que do
ponto de vista contabilístico não pode retirar qualquer ilacção que lhe permita concluir
que foram feitas entregas de dinheiro pela “Resin” para o chamado “saco azul” (cfr. o
relatório de fls 1893 do 8º volume).
Por outro lado, não encontrou na “Resin” qualquer documento de suporte
relativa às supostas entregas de dinheiro, designadamente as saídas de caixa. Em todo o
caso, em face da sua experiência profissional, referiu que este tipo de operações não
passam pela contabilidade.
272
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Seja como for, existe proximidade temporal entre as datas de pagamento pela
CMF (cfr. os cheques acima referidos) e as datas de “retorno”, segundo o que consta
dos documentos de fls 159 e 163, do 1º volume. Existem também algumas
coincidências ao nível dos montantes.
Confrontado com o documento de fls 22 do apeso 12 (mapa apreendido num
computador da “Resin” – cfr. fls 7 do relatório referido, correspondente a fls 2291 dos
autos), o qual no seu verso tem aposta uma frase manuscrita (“recebemos e devolvemos
os valores de Norlabor e João Tello quase na integra”, referiu não ter assistido à
apreensão, tendo no entanto instruído os inspectores da PJ acerca dos documentos
contabilísticos que deveriam ser apreendidos.
- Testemunha Amadeu Fernando Costa Monteiro de Magalhães
Enquanto especialista superior da PJ efectuou o relatório de fls 1893 e ss.
Analisou a factura nº 427 (constante de fls 1899), no valor de 19.550.664$00,
emitida a 26.02.96 pela “Norlabor” à CMF e relativa à “Manutençao do Aterro Sanitário
– Execução de Plataformas” (inclui IVA a 5%).
A 24.06.96 foi emitido um recibo no montante de 5.000.000$00, correspondente
a liquidação parcial de tal factura (cfr. doc. de fls 1901), feita pela CMF através do
cheque cuja cópia se acha a fls 1903 (cfr. ordem de pagamento de fls 1902, com as
retenções descritas a fls 1904; cfr. ainda extrato de conta-corrente de fls 1900 a 1903).
Ficou assim em dívida a quantia de 14.550.664$00 após esse pagamento parcial.
No final de 1997 na conta 2110444 a CMF apresentava um saldo devedor nesse
montante que a “Norlabor” saldou através da transferência para uma conta de clientes
de cobrança duvidosa (cfr. fls 1906), criando a respectiva provisão, o que não faz
sentido pois os créditos em causa não são incobráveis e como tal aliás não são
considerados pelo fisco (as autarquias podem demorar a pagar mas pagam), pelo que
nenhuma vantagem fiscal obteria com essa operação.
Como o cheque emitido pela CMF a favor da “Norlabor” foi por esta endossado
a favor da “Translousada” esta última emitiu o respectivo recibo a favor daquela (cfr.
documento de fls 1905).
A fls 1909 consta cópia da ordem de pagamento da quantia de 7.000.000$00,
com a dedução legal de 366.66600, conforme descrito no documento de fls 1911.
Consequentemente, a 12.05.98, foi emitido um cheque de 6.633.334$00 pela
CMF a favor da “Norlabor” (cfr. documento de fls 1910), a qual por sua vez emitiu o
recibo nº 649, de 15.05.98, no valor de 7.000.000$00 (cfr. documento de fls 1907, o
qual foi apreendido nas instalações da “Norlabor”). Apesar do recibo em causa,
constante de fls 1907, apresentar um traço de anulação, o certo é que foi contabilizado o
pagamento parcial respectivo e, como tal, registado na conta-corrente da “Norlabor”
(cfr. fls 1908). De resto, na CMF encontrava-se uma cópia desse recibo sem esse traço
de anulação.
Tal montante foi depositado pela “Norlabor” na sua conta (cfr. documento de fls
1912).
Em face deste pagamento a provisão que tinha sido criada no final de 1997 pela
“Norlabor” foi anulada (cfr. fls 1908).
A fls 1914 encontra-se a ordem de pagamento relativo ao último pagamento, no
montante de 7.550.644$00, o qual, após as legais deduções, prefez o montante de
7.155.153$00 (cfr. documento de fls 1916), na sequência do qual foi emitido o
correspondente cheque pela CMF a 08.10.98 (cfr. documento de fls 1915), o qual por
sua vez foi depositado na conta da “Norlabor” a 21.10.98 (cfr. fls 1917) e registado tal
pagamento na conta-corrente existente entre as duas entidades (cfr. fls 1908).
273
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Quanto aos supostos “retornos” para o chamado “saco azul”, partiu das
informações fornecidas pela investigação quanto às entregas em numerário pela “Resin”
(conforme consta do seu relatório).
Porém, não detectou nas contas e na caixa da “Norlabor” a saída de montantes
semelhantes ou iguais, pelo que não lhe foi possível fazer a ligação entre os pagamentos
efectuados pela CMF à “Norlabor” e as entregas para o “saco azul”.
Aquando da elaboração do seu relatório analisou o documento de fls 159 e estará
relacionada com a segunda entrega a 16.06.98, segundo depreende (o valor inicial
considerado – 7.000 cts – corresponde ao recibo do 2º pagamento pela CMF à
“Norlabor”, sendo certo que o montante líquido corresponde ao que de facto foi pago
pela mesma entidade, isto é, 6.633.334$00, depois de feitas as legais deduções –
33.343$00 + 333.333$00).
A referência nesse manuscrito a 800.000$00 (que não conseguiu explicar no
relatório) prender-se-á, ao que depreende, com o reembolso da diferença da taxa de IVA
(nas relações com a CMF foi de 5% por se tratar de uma empreitada, ao passo que entre
as empresas era de 17%, o que dá uma diferença de 12%).
Não consegue explicar as demais indicações contidas no manuscrito de fls 159.
Constatou-se que no manuscrito está aposta uma data de pagamento de cerca de
1 ano depois do 2º pagamento efectuado pela CMF à “Norlabor”.
Segundo o documento a entrega ao arguido Horácio ocorreu no dia 16.06.98,
sendo certo que o cheque emitido pela CMF a favor da “Norlabor data de 12.05.98 e o
depósito foi efectivado a 15.05.98.
Já o manuscrito de fls 163 estará relacionado com o 3º pagamento efectuado
pela CMF à “Norlabor”, efectuado a 21.10.98 (cfr. fls 162), segundo deduz (cfr. com
relevâcia o quadro de fls 22 e 22 verso do apenso 12). Constatou-se que 798.000$00
corresponde a 12% do valor da prestação em causa (7.000 cts) deduzida de 5% .
Nas contas que fazem os manuscritos referidos percorrem caminhos diferentes.
- Testemunha José António de Sousa Ferreira
Segundo ouviu dizer (não se recorda se numa reunião de vereação ou da boca do
arguido Barbieri Cardoso, na altura seu superior hierárquico) que o acordo com a
testemunha Menezes Basto terminava em determinada data (que não soube precisar),
mas o tratamento do lixo tinha de continuar, daí que a solução encontrada tenha sido a
da realização de um concurso limitado de modo a permitir a continuação dos trabalhos
na lixeira de Sendim (o lixo era despejado na lixeira, onde era compactado e
acondicionado, sendo então coberto por terra).
Tal concurso terá ocorrido em 1995 ou 1996.
Segundo se recorda as empresas convidadas a apresentar as respectivas
propostas foram a “Resin”, “Norlabor” e a “Craveira”, além de outras duas de que não
se recorda (não tem a certeza se eram a “ECOP” e a “Translousada”).
Segundo se lembra, o depoente elaborou os convites que foram endereçados às
empresas referidas a 30.11.95 (segundo lista que lhe foi fornecida pelo arguido Barbieri
Cardoso, a qual lhe havia sido remetida pela “Resin” por fax – cfr. fls 301 do apenso 21,
datado de 24.11.95), os quais, ao que pensa, foram assinados pelo director de
Departamento (o dito arguido Barbieri Cardoso).
Posteriormente a testemunha em causa admitiu que o documento de fls 301 do
apenso 21 talvez não tivesse passado pelas mãos do arguido Barbieri Cardoso na
medida em que ele normalmente despacha e assina no próprio documento,
designadamente se o quisesse remeter ao depoente, o que no caso em apreço não
sucede.
274
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Foi então confrontado com o documento de fls 70 e 71, do apenso 95-A, datado
de 30.11.95, e nele reconheceu a assinatura da arguida Fátima Felgueiras (trata-se do
convite dirigido à “Resin”).
Não é normal que uma das empresas a convidar para o concurso indique outras
empresas concorrentes, mas sucede por vezes perguntarem a empreiteiros a indicação de
outras empresas com capacidade para executarem os trabalhos que estiverem em causa,
sobretudo se se tratarem de trabalhos muito específicos.
As propostas deveriam ser apresentadas até 18.12.95, conforme consta dos
convites, e o prazo de execução da obra era de 30 dias.
À pergunta efectuada no sentido de se saber se quando o concurso foi aberto se
destinava ao pagamento de trabalhos já efectuados ou por fazer respondeu que não
controlava no terreno os trabalhos que iam sendo executados; em todo o caso, tem a
ideia de que alguns trabalhos já haviam sido realizados, pelo que pelo menos parte dos
trabalhos a que se reporta o concurso já estariam realizados (outros trabalhos porém
ainda não estariam realizados).
Confrontado com o manuscrito de fls 2275, do 10º volume, datado de 11.04.95,
nele reconheceu a letra da testemunha Terezinha, sendo certo que referiu não conhecer o
documento em causa. Em todo o caso, depois de o ter lido referiu que lhe parece não ter
qualquer relação com o concurso em causa. Referiu porém ignorar se a proposta nele
inserta de realização de um concurso se reporta ao concurso da “execução de
plataformas” (sendo certo que não tem conhecimento de outro concurso com essa
finalidade).
O depoente não fez a apreciação das propostas apresentadas, tendo a “Norlabor”
ganho o concurso, o que lhe causou estranheza dado o facto de ser a “Resin” quem
operava na lixeira (daí que pensou que esta iria vencer o concurso). Não sabe se falou
com alguém acerca desse assunto, designadamente com o arguido Barbieri Cardoso.
Ignora também se a “Norlabor” se associou ou não à “Resin” (na altura ignorava
que a “Resin” não dispunha de alvará que lhe permitisse sozinha realizar as obras
necessárias).
Fez o auto de medição de fls 119 do apenso 95-A (o auto de consignação consta
de fls 118 do apenso 95-A), não obstante não ser o depoente quem fazia a gestão dos
trabalhos que iam sendo executados no terreno. Aliás, não foi sequer à lixeira quando
fez o auto de medição (explicou que nem sempre vai ao local fazer os autos de
medição). Recorda-se que por curiosidade passou por lá três ou quatro vezes e constatou
que os trabalhos iam sendo executados.
Era o Eng. Leite quem fazia a gestão do lixo e deve ter sido ele quem reportou
ao arguido Barbieri que os trabalhos haviam sido executados.
Não foi elaborado o auto de recepção definitiva da obra porque não houve
iniciativa nesse sentido nem da dona da obra (CMF) nem do empreiteiro.
Porém, confrontado com o documento de fls 125 do apenso 95-A (trata-se de
uma informação feita pelo depoente e dá conta de um pedido de recepção definitiva da
obra pela “Norlabor” para permitir a libertação da caução prestada), esclareceu que a
“Norlabor” apenas pediu a libertação da garantia, tendo acrescentado na informação o
pedido de recepção definitiva da obra na medida em que se trata de um pressuposto
necessário à libertação da caução.
Nessa informação referiu que a execução da obra se prolongou para além dos 30
dias previstos (indicou o dia 06.05.96 como a data da conclusão da obra), o que não se
compagina com a data do auto de medição constante de fls 119 do apenso 95-A.
*
275
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
O arguido Barbieri Cardoso salientou que nunca foi chefe da testemunha José
António de Sousa Ferreira, chefiando antes um Departamento Técnico, do qual fazia
parte uma Divisão chefiada pela referida testemunha. Não obstante, não existia
propriamente com ele uma relação de subordinação.
Tem com ele uma relação de amizade pois trabalham juntos na CMF há mais de
20 anos.
A Divisão dessa testemunha era a responsável pelos concursos e pelo
acompanhamento das obras.
No concurso em causa neste ponto da pronúncia desde Abril que a testemunha
referida tinha conhecimento da sua realização, visto que o despacho do arguido Júlio
Faria a abrir o concurso é-lhe dirigido.
Ademais, a cabimentação orçamental tem de ir à Assembleia Municipal e pode
demorar meses a ser aprovada.
O Eng. José Ferreira tinha dificuldade em saber que firmas convidar, daí o fax
remetido pela “Resin” indicando as empresas a convidar (cfr. fls 301 do apenso 21).
O depoente tinha a ideia que a “Resin” não iria concorrer na medida em que não
dispunha de alvará (porém, na lista fornecida por ela, vem a mesma referida como
empresa a convidar).
De resto, não obstante lhe ter sido dirigido, o fax em causa pode nem sequer ter
chegado às mãos do depoente, pois não era responsável pelos concursos.
Seja como for, colaborou com a testemunha José Ferreira na elaboração do
concurso em causa.
Tal concurso serviu para regularizar o pagamento de obras já executadas.
Quanto ao auto de medição (cfr. documento de fls 119 do apenso 95-A), referiu
que foi elaborado na sequência de conversa com o depoente. Aliás, já explicou de que
forma se chegou à quantidade m3 ali referidos.
Ademais, o facto de não se ter ido ao local aquando da elaboração do auto de
medição prendeu-se em grande medida com o facto dos trabalhos à data já terem sido
executados.
*
- Testemunha Célia da Conceição Pacheco Lopes Martins
Referiu ter sido técnica de contas da “Norlabor” desde meados dos anos 90 até
2002.
Enquanto tal classificava e arquivava os documentos que lhe eram apresentados
e que se relacionavam com a contabilidade dessa empresa.
A PJ visitou duas vezes as instalações da “Norlabor” e pretendiam apreender
documentos relacionados com as relações estabelecidas entre essa empresa e a CMF.
Em face dos elementos de contabilidade que processou (facturas e recibos) acha
que a “Norlabor” prestou serviços para a CMF, mas não tem conhecimento pessoal
desse facto.
Como não se tratava da sua área de actividade, ignora se havia ou não na
“Norlabor” algum processo de obra relativa à lixeira de Sendim (não se recordando
mesmo se foi questionada acerca dele pela PJ aquando de uma das visitas às instalações
da “Norlabor”).
Falou com o Dr. Carlos Sousa (responsável da “Norlabor” e também sóciogerente da “Translousada”) acerca desse assunto.
Por norma deveria haver um processo de obra, o qual deveria estar na posse do
Eng. Barros (engenheiro responsável pela obra) ou no Departamento de Engenharia da
“Norlabor”.
276
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Acerca disso foi confrontada com as declarações prestadas perante a PJ a fls
1831, as quais confirmou, reafirmando que não acompanhou os agentes da PJ ao
arquivo da empresa para procurar o processo de obra, sendo certo que o arquivo da
contabilidade é distinto.
A esse propósito referiu que foi a Susana Maria Marques Alves quem ficou de
falar à gerência da empresa por causa do processo de obra.
A “Norlabor” colocou o crédito que tinha junto da CMF como sendo de
cobrança duvidosa, assumindo ter sido a depoente a cometer esse erro contabilístico (era
o 1º ou o 2º ano que fazia contabilidade), erro esse corrigido no ano seguinte, depois de
ter falado acerca desse assunto com o revisor oficial de contas (foi aliás ele quem a
alertou para aquele erro).
Tratou-se de um erro na medida em que a nível contabilístico não é permitido
colocar entidades do Estado como “clientes de cobrança duvidosa”.
Nega que a rectificação da situação se tivesse prendido com algum pagamento
efectuado pela CMF (conforme emerge de fls 1910 ocorreu um pagamento em 12.05.98
e a anulação da provisão teve lugar a 31.05.98, conforme mais adiante reconheceu a
testemunha).
A esse propósito foi confrontada com o extracto de conta da “Norlabor” no que
respeita às suas relações com a CMF, designadamente com fls 1906 do 8º volume (onde
consta a indicação da colocação da CMF como cliente de cobrança duvidosa no final de
1997, numa altura em que – segundo a testemunha – estaria há cerca de 1 ano na
“Norlabor”), referindo então que o documento em causa foi feito em Março de 1998,
constando que a dívida ascendia a 14.550.664$00.
Foi ainda confrontada com fls 1908 do 8º volume (onde consta a indicação do
recebimento da CMF e a anulação da provisão), tendo esclarecido que tal terá sido
afinal efectuado em 31 de Maio de 1998 porque foi nessa altura que teve a reunião com
o revisor oficial de contas.
No recibo de 7.000.000$00 emitido pela “Norlabor” com data de 13.07.98 a
favor da CMF (mas contabilizado a 31.05.98), em face do facto de inicialmente ter sido
dada como anulada, escreveu que o dito recibo é válido, ignorando se o original do
recibo (entregue na CMF) tem a mesma anotação.
Não faz ideia do valor da empreitada e do recibo global.
O recibo referido de 7.000.000$00 diz respeito à factura nº 427, constante de fls
199 do apenso 11 (18.619.680$00 + IVA).
Trata-se de um valor que considera normal para o volume de negócios da
empresa.
Confrontada com cópia do cheque emitido pela CMF, no valor de 4.738.095$00,
de 17.06.96 (constante de fls 1903), disse que, ao que pensa, reporta-se a um pagamento
parcial da factura nº 427 (de fls 199 do apenso 11), conforme se vislumbra no extracto
de fls 1908, sendo certo que a fls 1901 consta o respectivo recibo de 5.000.000$00 (cfr.
ainda a respectiva ordem de pagamento da CMF no valor líquido de 4.738.095$00 e a
nota de fls 1904 referente à retenção).
A propósito do recibo de 5.000.000$00, de 24.06.96, da “Translousada” à
“Norlabor” (cfr. fls 1905) referiu que se tratou da regularização de duas notas de débito.
A “Norlabor” comprava e tomava de aluguer máquinas à “Translousada” e é
natural que existissem notas de débito que tenham sido liquidadas conforme recibo de
fls 1905.
Ignora se o cheque cuja cópia se acha a fls 1903 foi ou não endossado à
“Translousada”.
277
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Confrontada com cópia do cheque de fls 1910, da CMF para a “Norlabor”, no
valor de 6.633.334$00, datado de 12.05.98 (e que motivou o já referido recibo de 7.000
cts, de 13.07.98), referiu ignorar se o respectivo valor, directa ou indirectamente, foi
entregue à “Translousada” (cfr. fls 1912 – depósito desse montante na conta da
“Norlabor” a 15.05.98).
Confrontada com o documento de fls fls 38 do apenso 97 (onde consta um
recibo da “Translousada” a favor da “Norlabor” nesse valor de 6.6.33.334$00, datado de
21.10.98), referiu que nada mais sabe para além do que resulta dos documentos.
Confrontada com o cheque de fls 1915, no valor de 7.155.153$00, datado de
08.11.98, emitido pela CMF a favor da “Norlabor” e do recibo de fls 41, do apenso 97,
no mesmo valor, emitido a 22.10.98 pela “Translousada” a favor da “Norlabor”,
manteve a mesma posição (cfr. o depósito a 21.10.98 na conta da “Norlabor”, conforme
documento de fls 1917).
Referiu que a “Craveira” também teve relações comerciais com a “Norlabor”.
Ao invés, desconhece a firma “João Tello”.
Quanto ao teor das suas declarações de fls 2036, com as quais foi confrontada,
referiu não estar já recordada, pugnando no entanto pela veracidade do que então
declarou.
Referiu que deve ter perguntado à Susana como é que deveria fazer a operação
de saída de caixa.
Confirmou ainda as suas declarações de fls 2037, salientando que não tem
conhecimento de outra situação igual, a qual não é usual, mas é possível que tenha já
existido.
- Testemunha Carlos Soares da Silva
Referiu ter sido o técnico oficial de contas da “Translousada” entre 1986 até
1992, após o que foi administrador da mesma firma até 1998 (responsável pela área
comercial).
A “Translousada” estabeleceu relações comerciais com a “Resin” quando esta
iniciou o tratamento do lixo, alugando-lhe máquinas para obras, sendo certo que numa
primeira fase foram contactados pelo arguido Vítor Borges e posteriormente por
técnicos dessa empresa.
Assim, durante meses, ao que pensa em 1994 ou 1995, a “Translousada” alugou
máquinas (com o respectivo manobrador) à “Resin”, as quais operaram na lixeira de
Sendim (tais como retroescavadoras, camiões e máquinas escavadoras rotativas).
Tal maquinaria não exibia qualquer identificação da “Translousada”, sendo certo
que por vezes socorriam-se de máquinas de outras empresas.
Recorda-se que a “Resin” pagava à “Translousada” quando obtivesse o
correspondente pagamento da CMF.
Foram confrontados com o problema da “Resin” não poder obter da CMF os
pagamentos a que tinha direito por questões de ordem legal.
A “Resin” não tinha alvará e por esse motivo não podia concorrer aos concursos.
O concurso em causa neste ponto destinava-se a que a CMF pudesse pagar à
“Resin” 6 meses de trabalhos na lixeira de Sendim.
Normalmente o depoente contactava com o arguido Carlos Marinho
(responsável pela área financeira da “Resin”) ou com a Engª Cláudia. O Engº Paulo
Ribeiro (também funcionário da “Resin”) estava também a par da situação.
Uma vez que a “Translousada” não recebia da “Resin” os pagamentos a que
tinha direito (na medida em que esta não recebia o pagamento da CMF), foram
contactados por alguém da “Resin” (ao que pensa o arguido Vítor Borges, pois falava
278
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
sempre com ele a respeito deste assunto) no sentido de prestarem o respectivo auxílio
em ordem a que fossem ultrapassados os constrangimentos legais que impediam a CMF
de proceder aos pagamentos.
Para o efeito, foi-lhe dito que era necessário o lançamento de um concurso e que
para isso seria necessária a indicação de quatro ou cinco empresas a quem se iriam
endereçar convites (tratava-se de um concurso limitado).
Salientou que a “Translousada” tinha todo o interesse em manter com a “Resin”
as relações comerciais estabelecidas já que esta operava numa área de negócio que na
altura era nova (área do tratamento dos lixos).
Assim, o depoente contactou com a “Norlabor” (que tinha um sócio comum à
“Transloudada” – a testemunha Carlos Sousa), a qual aceitou ser incluída na lista de
empresas a enviar à CMF pela “Resin”, para que esta entretando remetesse depois os
respectivos convites.
Pese embora já não se recorde admite ser possível que tenha indicado outra
empresa para além da “Norlabor”.
Admitiu ainda conhecer a “Craveira” e manifestou então ter a ideia de que
contactou alguém da administração dessa empresa, já que sabia que ela tinha o alvará
necessário para que se pudesse apresentar a concurso em caso de convite.
A empresa ganhadora do concurso deveria fazer parte da lista a remeter à CMF
para que estivesse assegurado o encaminhamento para a “Resin” dos pagamentos que
iriam ser efectuados pela CMF. Tinham assim de ser convidadas empresas da confiança
da “Translousada” (a “Norlabor” era uma empresa de confiança porque tinha um sóciogerente comum, a testemunha Carlos Sousa).
Revelou que quando se indicaram as empresas a convidar ficou combinado que
seria a “Norlabor” a vencer, apresentando para o efeito o melhor preço (escudando-se
no facto de não ter acompanhado os pormenores desse acordo, referiu ignorar em
concreto que pessoas firmaram esse acordo).
Foi a “Resin” quem indicou os preços de cada uma das propostas apresentadas
(tem a ideia que foi a Engª Cláudia que os indicou ao depoente no que concerne às
propostas a apresentar pela “Translousada” e pela Norlabor”; pese embora sem tanta
assertividade, admite que também possa ter recebido a indicação do preço a apresentar
pela “Craveira”).
Foi o depoente quem posteriormente transmitiu essas indicações às empresas
referidas.
Por indicação da testemunha Carlos Sousa contactava o Engº Barros Sousa da
“Norlabor”.
No que concerne aos aspectos técnicos das propostas, cada empresa apresentou a
respectiva proposta conforme estava habituada a fazer.
Referiu porém que os técnicos da “Resin” deram orientações quanto a aspectos
técnicos específicos (seja como for, no anúncio do concurso constam os items a que
teriam de dar resposta).
Sabia assim de antemão que a “Norlabor” iria vencer o concurso.
Segundo lhe foi transmitido, a “Resin” não venceria o concurso porque não tinha
alvará (e nessa medida não iria concorrer).
Referiu que a “Translousada” concorreu consorciada com outra empresa (acha
que é possível que o tenha feito consorciada com a firma “Cunha Soares e Filhos, Ldª –
de que é o actual director comercial – por ter o alvará necessário. Tal empresa estava
porém mais vocacionada para a instalação de cabos de alta tenção ao passo que a
“Norlabor” estaria mais vocacionada para a área em questão, além de que a testemunha
279
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Carlos Sousa era sócio gerente dessa empresa e da “Translousada, daí que fosse uma
empresa de confiança).
Tem a ideia que a CMF convidou assim a “Translousada”, a “Norlabor” e a
“Craveira” (cfr. os convites, constantes de fls 70 e 71 do apenso 95-A).
Salientou porém que, não obstante, os trabalhos já estavam executados e
reportavam-se a trabalhos levados a cabo pela “Resin” durante 6 meses na lixeira de
Sendim.
Referiu não se recordar do preço apresentado pela “Norlabor”, mas andaria na
casa dos 17 ou 18.000 cts (admite ser possível que rondasse os 19.000.000$00).
A “Norlabor” facturava os serviços prestados na lixeira à CMF (como se tivesse
executado a obra), a “Translousada” facturava os mesmos serviços à “Norlabor” (depois
de ver os documentos de fls 63 a 67 e 70 do apenso 97 corrigiu o seu depoimento e
reconheceu que a “Translousada” facturava à “Norlabor” o aluguer de máquinas, mas
exactamente no mesmo valor do débito da CMF, sendo certo que nenhuma máquina foi
alugada à “Norlabor” no âmbito daquela obra pois não foi executada por esta mas pela
“Resin”) e a “Resin” facturava à “Translousada” os serviços levados a cabo na lixeira de
Sendim (nas facturas respectivas, constantes de fls 161 a 167 do apenso 97 consta a
cedência de know how técnico; a testemunha confirmou serem as facturas em causa as
que foram emitidas pela “Resin”). Consequentemente, a CMF pagava esses serviços à
“Norlabor”, a qual por sua vez fazia chegar à “Translousada” esses pagamentos, os
quais por sua vez tinham como destino final a “Resin”.
Para o efeito, os cheques da CMF eram endossados à “Resin” ou as quantias por
eles tituladas eram depositadas e depois emitidos cheques da “Translousada”.
Se não lhe falha a memória, expressou a convicção de que os serviços foram
pagos em 3 ou 4 vezes.
No que respeita ao primeiro pagamento da “Norlabor” à “Translousada” referiu
que esta última depositou o cheque que recebera da CMF e um dos sócios (Eng. Barros
Sousa) emitiu um cheque pessoal à “Translousada” do valor correspondente (especulou
que tal se deveu ao facto da “Norlabor” ter sido pressionada a transferir de imediato o
pagamento que recebera da CMF, pelo que um dos seus sócios adiantou o dinheiro,
numa altura em que o pagamento pela CMF ainda não estaria disponibilizado).
Expressou ter a ideia de ter sido a “Norlabor” a levantar na CMF os pagamentos
respectivos, mas acerca desse facto não se mostrou muito assertivo.
Referiu que não foi exigida qualquer caução pelo dono da obra (CMF) pois já
estava executada.
O camião mencionado, segundo expressou sem grande assertividade, reporta-se
a outra obra e destinou-se ao transporte de resíduos.
Uma vez que a CMF atrasou-se nos pagamentos (segundo invocava por
dificuldades de ordem financeira) tentou-se diligenciar no sentido desses pagamentos
serem efectuados, razão pela qual o Dr. Carlos Sousa chegou a ter uma reunião na CMF,
ao qual o depoente não esteve presente. Ignora se nessa reunião participou alguém da
“Resin” ou da “Ecop”, embora admita tal possibilidade.
Não tem presente se nessa reunião se acordou numa caladarização dos
pagamentos, mas tem a ideia de que a CMF se comprometeu a ser mais célere nos
pagamentos.
Tem a ideia de uma dilação de cerca de 2 anos entre o primeiro e o último
pagamento, num total de três.
Uma vez que o dinheiro não pertencia à “Norlabor” esta empresa não
diligenciou pela obtenção do pagamento por parte da CMF.
280
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Ignora se a “Norlabor” colocou a CMF como “cliente de cobrança duvidosa”.
Tal não seria uma situação normal uma vez que se tratava de uma câmara municipal,
ignorando se alguma situação idêntica alguma vez teve lugar.
Referiu porém que é frequente as câmaras municipais atrasarem-se nos
pagamentos, o que poderá motivar a instauração de acções judiciais para cobrança
desses créditos. Nesse contexto, o crédito deve ser considerado de cobrança duvidosa
(ou quando o credor tem essa percepção).
Foi então confrontado com cópia dos cheques emitidos pela CMF (a fls 1903,
datado de 17.06.96; 1910, datado de 12.05.98; e 1915, datado de Outubro de 1998).
Constata-se que o valor líquido pago pela CMF (deduzidas das legais retenções
e com uma taxa de IVA a 12%) coincide com o valor da empreitada.
Referiu ignorar de que forma as empresas tratavam da diferença de valores, mas
o normal seria que as verbas em causa, respeitantes à diferença, ficassem em contacorrente até se encontrar forma de regularizar essa diferença de valores.
Ignora se essa diferença de valores foi considerada pela “Resin” como perda de
exercício no que se refere à “Translousada”.
- Testemunha Susana Maria Marques Alves
Referiu ser escriturária na “Norlabor” desde 1992, ocupando-se da área
financeira da empresa, no âmbito da qual processa os salários dos trabalhadores, emite
facturas e recibos. Já esteve também nos recursos humanos dessa empresa.
Em 1995/96 fazia um pouco de tudo nas suas funções de escriturária.
Admitiu ter sido a depoente quem elaborou a factura de fls 1899 referente à obra
em causa (factura nº 427), uma vez que tinha a função de elaborar as facturas.
Uma vez que elaborou a mencionada factura parte do pressuposto que a
“Norlabor” executou os trabalhos nela mencionados. Tem a ideia aliás da “Norlabor” ter
tido uma empreitada cujo dono da obra era a CMF, pelo que essa factura deverá referirse a essa empreitada de que tem memória.
Ignora se a factura nº 427 se reporta ao valor global da obra em causa.
Confirmou que a PJ visitou as instalações da “Norlabor” mas não se recorda
muito bem desse episódio.
Recorda-se de ter andado com colegas (pensa que com a testemunha Célia
Martins) à procura do processo referente à obra em causa no arquivo da empresa mas
não o encontrou. Não pode assegurar se mais tarde tentaram ou não localizá-lo.
Esclareceu que normalmente o processo de referente a determinada obra
encontra-se com o engenheiro responsável, o que não sucedeu neste caso, situação que
não é normal.
Não se recorda de ter falado acerca desse assunto com algum responsável da
empresa.
Confrontada com o documento de fls 1901 do 8º volume referiu ter sido
elaborado pela depoente, explicando que se tratou de um recibo referente a um
pagamento parcial efectuado pela CMF (5.000.000$00).
Idêntica posição assumiu relativamente ao documento de fls 1907 do 8º volume
(7.000.000$00). Relativamente a este documento esclareceu que apôs quer a expressão
“anulado” quer a expressão “não está anulado”, sendo certo que pela letra parece-lhe
que terá sido a testemunha Célia Martins quem apôs a expressão “este recibo é válido”.
Referiu não se recordar da razão de ser da aposição daquelas menções.
Também no que respeita ao recibo de fls 1913 do 8º volume, no valor de
7.550.664$00, referiu tê-lo elaborado (tanto mais que tem a sua rubrica).
Os valor dos 3 recibos prefaz o valor da factura nº 427.
281
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Confrontada com os documentos de fls 1903 do 8º volume (cópia de um cheque
emitido pela CMF, no montante de 4.738.095$00, a que corresponde o recibo de fls
1901, de 5.000.000$00; cfr. ainda a ordem de pagamento de fls 1902), 1910 do 8º
volume (cópia de um cheque emitido pela CMF, no montante de 6.633.334$00, a que
corresponde o recibo de fls 1907, de 7.000.000$00; cfr. ainda a ordem de pagamento de
fls 1909) e de fls 1915 do 8º volume (cópia de um cheque emitido pela CMF, no valor
de 7.155.153, a que corresponde o recibo de fls 1913, de 7.550.664$00; cfr. ainda a
ordem de pagamento de fls 1914), referiu não ter memória deles, embora os deva ter
visto.
Os cheques normalmente eram depositados pela empresa.
Foi então confrontada com os talões de depósito na conta da “Norlabor” dos
cheques de fls 1910 e 1915, respectivamente a fls 1912 e 1917.
Assegurou não saber se a “Norlabor” fez pagamentos de igual montante à
“Translousada”.
Em todo o caso, existiam relações comerciais entre as duas empresas (a
“Norlabor” comprou máquinas à “Translousada”), as quais aliás tinham um sócio
comum (ao que pensa o Dr. Carlos Sousa).
- Testemunha Maria de Salomé Ferraz da Silva Vale
Referiu ter trabalhado para a “Norlabor” há cerca de 12-14 anos durante cerca de
1 ano e meio (terá sido em 1995/96, mas não tem a certeza).
Competia-lhe ir ao correio, proceder ao pagamento dos salários dos
funcionários, entregar propostas, fiscalizar se os funcioinários estavam a trabalhar nas
obras para controlar as faltas.
Recorda-se de ter ouvido falar na “Translousada”, mas não tem conhecimento de
relações comerciais entre essa empresa e a sua então entidade patronal.
A “Norlabor” desenvolvia a sua actividade na área da construção civil e fazia
também empreitadas para a “Portugal Telecom”.
Não conhece a “Craveira”.
O Dr. Carlos Sousa era o gerente da “Norlabor”. Não sabe se era sócio de outras
empresas.
- Testemunha José António Brandão Barros Sousa
Referiu que é accionista da “Norlabor” desde que se transformou em sociedade
anónima (em 1994), tendo sido o respectivo gerente entre 1994 até por volta do ano
2003 (antes disso, desde 1989/90 que tinha uma quota nessa firma, então sociedade por
quotas).
Referiu ter sido formalmente sócio da “Translousada” em 1996/97. Só o foi
“formalmente” na medida em que a respectiva quota pertencia de facto a um seu sócio
na “Norlabor” (a testemunha Carlos Pereira de Sousa), o qual lha transmitiu
ficticiamente porquanto estava em ruptura conjugal, correndo já o respectivo processo
de divórcio.
Teve também uma quota na “Craveira”, talvez em 1994/95. A testemunha
Carlos Sousa tinha também uma quota nessa empresa.
A “Norlabor” só ganhou um concurso limitado aberto pela CMF a pedido da
“Translousada” (haveria de mais tarde construir o ecocento em Felgueiras para a
AMVS). De facto, o Sr. Carlos Silva (da “Translousada”) disse-lhe que necessitava de
rectificar uma situação para poder receber o pagamento dos trabalhos que efectuava no
aterro de Felgueiras e que para o efeito seria necessária a participação da “Norlabor”
num concurso limitado referente precisamente a trabalhos já efectuados no dito aterro
282
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
pela “Translousada”. Tal testemunha transmitiu-lhe assim que necessitava de um grupo
de empresas para concorrerem ao dito concurso limitado, uma das quais a “Norlabor”.
Ele explicou-lhe aliás que a CMF pagaria os trabalhos realizados através desse concurso
e deu a entender que seria a “Norlabor” a ganhá-lo. Deduz que não seria a
“Translousada” a vencer esse concurso por não ter alvará.
Deduz que idêntico pedido tenha sido feito aos outros concorrentes, mas a como
a “Norlabor” estava mais próxima da “Translousada” pelo facto de ter um sócio comum
e de serem empresas pequenas terá sido essa a razão pela qual se dicidiu que seria
aquela a vencer o concurso.
Em face do pedido que lhe foi feito falou com os outros sócios da “Norlabor” (as
testemunhas Carlos Sousa e Adriano Rafael de Sousa Ferreira) e acederam então em
fazer esse favor à “Translousada” (até porque a testemunha Carlos Sousa era também
sócio dessa empresa).
Aguardaram então o convite da CMF como lhe havia sido dito pela testemunha
Carlos Silva, o que de facto se veio a verificar.
A proposta de candidatura foi então elaborada na “Norlabor” mas de acordo com
as indicações fornecidas pela testemunha Carlos Silva.
Confrontado com as diferentes propostas apresentadas (cfr. fls 118 e ss. do
apenso 98) constatou-se que todas, com excepção da proposta apresentada pela
“ECOP”, têm a mesma estrutura, só divergindo nos preços.
Ficou combinado com a “Translousada” que a “Norlabor” só lhe pagaria na
medida em que recebesse da CMF.
Confrontado com o documento de fls 129 do apenso 97 (contrato de adjudicação
da empreitada à “Norlabor”) nele reconheceu a sua assinatura e a assinatura de Adriano
Rafael de Sousa Ferreira em representação da “Norlabor” e a assinatura da arguida
Fátima Felgueiras em representação do Município de Felgueiras.
Esclareceu que esse contrato foi assinado na CMF e que a arguida Fátima estava
presente. Todas as assinaturas foram apostas de resto naquele acto (facto negado pela
arguida Fátima Felgueiras, a qual assegurou que não esteve presente e que apôs a sua
assinatura no contrato em momento diferente. De resto, segundo referiu, só
esporadicamente e por deferencia é que está presente no momento da assinatura de
contratos de empreitada pelos legais representantes das firmas empreiteiras. Não foi este
o caso segundo assegurou).
Assegurou que a “Norlabor” nada fez no âmbito dessa empreitada.
Ficou convencido que a CMF sabia que a realização do concurso limitado em
causa mais não era do que um meio de regularizar os pagamentos a quem executou os
trabalhos.
Confirmou que assinou o auto de consignação da obra, datado de 29.01.96 (cfr.
documento de fls 118 do apenso 95-A). Explicou que não esteve presente nesse acto e
que foi a testemunha Carlos Silva quem lhe trouxe tal documento para assinar (o auto de
medição consta de fls 119 do apenso 95-A).
A “Norlabor” emitiu apenas uma factura (cfr. fls 122, do apenso 95-A ou fls
1809 dos autos), no valor de 18.619.680$00 + IVA (19.550.664$00).
Tal factura foi paga pela CMF em dois ou três cheques. Recorda-se que os
pagamentos demoraram muito a serem efectuados e que o Sr. Carlos Silva pedia à
“Norlabor” que pressionasse a CMF no sentido de concretizar os pagamentos. Foi nesse
sentido que se remeteu a missiva de fls 293 do apenso 97 à CMF a solicitar uma reunião
por causa do atraso nos pagamentos (tal missiva foi assinada por uma funcionária
administrativa da “Norlabor”).
283
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Recorda-se aliás que certa vez o Sr. Carlos Silva compareceu na “Norlabor” e
trazia um cheque da CMF referente a um dos pagamentos em causa, que o depoente, em
representação da “Norlabor”, endossou à “Translousada” (cfr. cheque de fls 1903 do 8º
volume, de 17.06.96.
De resto, era o Sr. Carlos Silva que entregava os recibos da “Norlabor” à CMF
contra o recebimento dos cheques desta.
Outro dos pagamentos efectuados pela CMF foi concretizado através do cheque
cuja cópia se acha a fls 1910 do 8º volume (ou fls 158 do apenso 95-A), de 12.05.98.
Não endossou esse cheque à “Translousada” na medida em que só ficaria
disponivel cerca de 5 dias depois, daí que tenha emitido um cheque pessoal naquele
valor, concordando assim em antecipar o pagamento à “Translousada” (cfr. o respectivo
depósito a fls 1912 dos autos), pois estavam “aflitos” para receber.
Por fim, o cheque de fls 1915 do 8º volume, datado de 08.10.98, no montante de
7.155.153$00, diz respeito ao terceiro e último pagamento efectuado pela CMF (cfr. o
depósito a fls 1917 dos autos).
Confrontado com o documento de fls 1906 do 8º volume (extracto de conta da
“Norlabor” relativo à CMF), referiu não saber explicar porque motivo o crédito que
detinham sobre a CMF foi considerado de cobrança duvidosa, deduzindo que se tratou
de algum arranjo contabilístico. Certo é que nada percebe de contabilidade e não deu
qualquer instrução para que se procedesse daquele modo.
Os documentos contabilísticos que justificaram os pagamentos da “Norlabor” à
“Translousada” são as facturas de fls 63 a 67 do apenso 97 emitidas por esta àquela
(reportam-se a aluguer de equipamento), sendo certo que, no que toca à obra em causa,
a “Translousada” não alugou qualquer equipamento à “Norlabor”. Tal pretexto foi a
justificação encontrada para os referidos pagamentos da “Norlabor” à “Translousada”.
No que toca a outras obras a “Translousada” chegou a alugar equipamento à
“Norlabor”, mas não na obra em causa (até porque a “Norlabor” nada executou na
mesma).
A propósito da “cedência” de alvarás de empresas que depois nada farão na obra
referiu que tal é prática corrente para que as empresas possam cumprir todas as
exigências dos concursos aos quais concorrem.
Não sabe que trabalhos foram executados no local pela “Translousada” mas
disseram-lhe que se tratou de movimentação de terras.
Quando passou pelo local viu uma placa que dizia “Resin”(empresa que aliás só
conhecia de nome) e viu equipamento sem identificação da empresa proprietária mas
que o Sr. Carlos Silva dizia ser da “Translousada”.
- Testemunha Adriano Rafael de Sousa Ferreira
Referiu ter sido gerente da “Norlabor” desde 1995 até 2003. Foi também
accionista dessa empresa. A testemunha Carlos Sousa é seu irmão e foi também
accionista dessa empresa.
A “Norlabor” concorreu a uma obra ligada ao aterro de Felgueiras. Tratou-se de
um favor que fizeram à “Translousada”.
O Sr. Carlos Silva (da “Translousada”) falou com a testemunha José António
Brandão Barros Sousa no sentido da “Norlabor” concorrer ficiticiamente a um concurso
para execução de uma empreitada na lixeira de Felgueiras e que iria ser aberto de modo
a poderem receber os respectivos pagamentos pelos trabalhos já ali executados, segundo
lhe foi dito.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Como o depoente estava mais ligado à área de produção da “Norlabor”
desconhece todos os pormenores, tanto mais que tudo foi tratado com a testemunha José
António Brandão Barros Sousa.
Acederam ao pedido do Sr. Carlos Silva na medida em que ele era sócio com o
seu irmão Carlos Sousa numa empresa (acha que precisamente na “Translousada”).
A proposta apresentada pela “Norlabor” foi “trabalhada” pelo Sr. Carlos Silva.
Confrontado aliás com as propostas apresentadas pela “Norlabor”,
“Translousada” e “Craveira” constatou que eram exactamente iguais, divergindo apenas
nos preços.
Ganharam o concurso mas nada executaram na obra em causa.
Assinou o respectivo contrato (cfr. doc. de fls 129 e 130 do apenso 97) com a
testemunha José António Brandão Barros Sousa em representação da “Norlabor” e a
arguida Fátima Felgueiras em representação do Município de Felgueiras. Ela aliás
esteve presente e as assinaturas foram apostas no mesma altura (só estavam 4 pessoas na
sala). Essa foi a única vez que se deslocou à CMF (a arguida Fátima Felgueiras negou
que tivesse estado presente no momento em que esta testemunha e a testemunha Barros
Sousa assinaram o contrato em representação da “Norlabor”, sustentando que as
testemunhas em causa se equivocaram).
O depoente limitou-se a assinar o respectivo contrato sendo certo que tudo o
resto foi tratado entre a “Translousada” e a testemunha José António Brandão Barros
Sousa.
Não se recorda de ter visto algum cheque da CMF, mas sabe que o pagamento
foi efectuado em várias prestações. Não sabe de que modo esses pagamentos se
processaram e de que forma chegaram à “Translousada”.
Não sabe se a CMF foi colocada como cliente de cobrança duvidosa.
O que consta do contrato corresponde aos trabalhos que haviam sido já
executados pela “Translousada”.
Esclareceu que a “Translousada” tinha relações comerciais com a “Norlabor”
pois esta última comprou-lhe e recebeu de aluguer equipamento.
Era habitual (hoje não é tão frequente) o “empréstimo” de alvarás entre
empresas a fim de serem usados nos concursos a que concorriam.
- Testemunha Carlos Ferreira de Sousa
Foi sócio da “Translousada” desde a sua fundação (em 1986) até 2001 ou 2002,
mas com períodos de interregno.
É accionista da “Norlabor”, tendo deixado de ser administrador dessa empresa
em 2002 ou 2003.
Não tem qualquer ligação com a firma “Craveira”.
Existiam relações comerciais entre a “Translousada” e a “Norlabor” na medida
em que aquela vendia e alugava equipamentos para a área do ambiente.
A “Translousada” tinha de resto um parque de máquinas que vendia ou alugava.
Uma vez que não estava ligado à área dos concursos não tem conhecimento
directo dos factos em causa, sendo certo que era o Sr. Carlos Silva quem tratava desses
assuntos.
De resto, só aquando da busca pela PJ à “Norlabor” é que se apercebeu que essa
empresa havia feito um favor à “Translousada” num concurso aberto pela CMF. De
facto, a “Norlabor” dispôs-se a concorrer ao concurso em causa porque tinha o alvará
necessário e a “Translousada” não, de modo a que o dinheiro referente ao pagamento
dos trabalhos (que já tinham sido executados) chegasse à “Translousada”, pois tinha
sido ela quem os tinha executado.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Foi a testemunha Carlos Silva quem contactou a testemunha Barros Sousa no
sentido da “Norlabor” concorrer a esse concurso. Nessa altura os sócios da “Norlabor”
eram, para além do depoente e do dito Barros Sousa, o seu irmão Adriano Rafael de
Sousa Ferreira.
Só o depoente tinha uma ligação à “Translousada” (era sócio).
Salientou que o favor efectuado pela “Norlabor” à “Translousada” o foi à sua
revelia e numa altura em que por razões de ordem familiar tinha cedido
temporariamente a sua quota à testemunha Barros Sousa.
Não se recorda de lhe ter sido transmitido o pedido efectuado pela
“Translousada”. Em todo o caso, se o tivessem consultado daria o seu assentimento,
pois era sócio da “Translousada”.
Posteriormente foi-lhe dito que a “Translousada” necessitava desse favor para
cativar um seu cliente (a “Resin”). De facto, a “Translousada” pretendia receber da
“Resin” os pagamentos a que tinha direito por força dos trabalhos que levou a cabo na
lixeira de Felgueiras a título de subempreitada e tal seria mais fácil se por sua vez a
“Resin” (o empreiteiro) recebesse o pagamento da CMF referente aos trabalhos levados
a cabo na dita lixeira de Felgueiras.
Ignora que trabalhos ali foram desenvolvidos.
Desconhece a identidade dos outros concorrentes ao dito concurso promovido
pela CMF.
Não sabe mesmo se a “Translousada” concorreu, sendo certo porém que não
tinha o alvará necessário para o efeito, a menos que concorresse associada a uma
empresa que dispunha do necessário alvará.
Ignora ainda qual o tipo de concurso promovido pela CMF.
Segundo lhe disseram mais tarde foi a “Norlabor” quem venceu o concurso.
Disseram-lhe ainda que foi o Sr. Carlos Silva quem orientou a apresentação da
proposta da “Norlabor” e da “Craveira” (das demais concorrentes não sabe).
A “Norlabor” estava vocacionada para obras em telecomunicações mas queria
diversificar os seus negócios para empreitadas de obras públicas, daí o seu interesse na
“Craveira”.
Como quando se pede um favor se contactem as pessoas conhecidas, deduz que
foi por essa razão que o Sr. Carlos Silva terá contactado a “Norlabor”, empresa que
conhecia. Em todo o caso, seria a CMF quem teria de endereçar os convites respectivos.
Ignora se a testemunha Carlos Silva recebeu por sua vez orientações da “Resin”,
designadamente do arguido Vítor Borges.
Tem a ideia de que a PJ não encontrou o processo de obra referente ao concurso
em causa e que lhes foi dito que provavelmente estaria nas antigas instalações da
empresa, tendo sido sugerida a requisição de uma 2ª via à CMF.
Teve então a oportunidade de se inteirar da situação e de ver a factura emitida
pela “Norlabor” (factura nº 427, constante de fls 1899, datada de 26.02.96) e de conferir
os pagamentos efectuados pela CMF.
Segundo lhe foi dito, não obstante a celebração do contrato a que se reporta fls
129 e 130 do apenso 97 com a CMF, a “Norlabor” nada fez na lixeira de Felgueiras,
pois as obras teriam sido executadas pela “Translousada”.
Foram as testemunhas Carlos Silva e Barros Sousa quem lhe disseram que os
trabalhos já haviam sido executados e que o concurso mais não serviu do que para
permitir a realização dos pagamentos pela CMF.
Não se recorda de ter tido qualquer conversa com a testemunha Carlos Silva em
que ele tenha mencionado que as máquinas que operavam na lixeira de Felgueiras
pertencessem à “Translousada”.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Foi-lhe ainda dito que a CMF emitiu 3 ou 4 cheques e que a “Norlabor” tinha de
entregar as quantias recebidas à “Translousada”.
Não sabe se a testemunha Carlos Silva pediu à “Nrlabor” para insistir junto da
CMF pelos pagamentos.
A testemunha em causa foi então confrontada com os cheques emitidos pela
CMF à “Norlabor” e constantes de fls 1903 (datado de 17.06.96, no valor de
4.738.095$00), 1910 (datado de 12.05.98, no valor de 6.633.334$00) e 1915 (datado de
08.10.98, no valor de 7.155.153$00).
Em face da demora nos pagamentos ignora que atitude tomou a “Norlabor”,
designadamente a transferência do crédito em causa para a conta de clientes de cobrança
duvidosa, como resulta do documento de fls 1906 dos autos.
Em todo o caso referiu que sendo a CMF a devedora o crédito em princípio não
seria de cobrança duvidosa, sucedendo porém normalmente atrasos no seu cumprimeito.
Deduz que terá sido um arranjo contabilístico para efeitos fiscais.
Por outro lado, confrontado com a missiva de fls 293 do apenso 97, referiu que
deveria ter sido a “Translousada” que estaria por detrás da remessa dessa missiva da
“Norlabor” à CMF por causa do atraso nos pagamentos pois era ela quem estava
interessada no recebimento.
Normalmente a “Norlabor” depositava os cheques da CMF e emitiria cheques
seus à “Translousada”. Se chegou a endossar cheques da CMF fugiu à prática habitual
na empresa.
Não tem conhecimento de outras obras em Felgueiras da responsabilidade da
“Norlabor”, ainda que para a AMVS, conforme é referido no ponto 1.5.
Nunca existiu a percepção dos responsávies da “Norlabor” de que se estava a
cometer qualquer ilícito criminal.
- Testemunha Manuel Ferreira de Faria
Tem a ideia da “Norlabor” ter vencido um concurso promovido pela CMF, mas
em concreto ignora qual o objecto do concurso .
Nunca foi à lixeira de Sendim.
Não sabe quem são as empresas “Translousada” e “João Tello”.
- Testemunha Maria Fernanda Dá Mesquita Castro Leal
Foi o departamento do Engº Ferreira Leite (Chefe da DATA até 2000 – Divisão
de Apoio Técnico e Administrativo, integrado no Departamento Técnico) que elaborou
o programa de concurso e o caderno de encargos respectivo. A DATA tinha a seu cargo
os concursos até 2000 e a partir de então tal competência passou para o Departamento
de Obras.
Como o concurso em causa era limitado, pelo Departamento Técnico foram
feitos e remetidos os convites (ao que pensa o número mínimo de convites era de 5 –
cfr. o fax de fls 301 do apenso 21, datado de 24.11.95, dirigido à CMF, à atenção do
Director do Departamento Técnico – o arguido Barbieri Cardoso - e que se reporta à
lista das empresas a convidar segundo indicação da “Resin” à CMF; cfr. ainda um dos
convites a fls 70 do apenso 95-A, datado de 30.11.95, assinado pela arguida Fátima
Felgueiras na qualidade de presidente da autarquia).
A depoente esteve presente no acto público de abertura das propostas e preparou
o contrato que viria a ser celebrado com a “Norlabor”.
Não sabe o que esteve na origem da decisão de abertura deste concurso.
Confrontada com o documento de fls 2275 do 10º volume, datado de 11.04.95,
referiu tratar-se de um manuscrito da testemunha Terezinha dirigido ao então presidente
287
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
da CMF (o arguido Júlio Faria). Referiu desconhecer a existência de tal documento, só
dele tendo ouvido falar recentemente pela testemunha Terezinha, a qual inclusive lhe
referiu que foi questionada acerca dele pela PJ e que não se recordava com nitidez do
teor da informação em causa. Em todo o caso, aquando da preparação do concurso não
se recorda de lhe ter sido comunicado o teor da informação em causa.
A depoente confirmou a identidade das concorrentes conforme descrito na
pronúncia e referiu não encontrar qualquer explicação para que uma das concorrentes (a
“Resin”) tenha indicado as outras empresas a convidar, não tendo mesmo ideia de
semelhante coisa ter ocorrido noutro concurso limitado.
Em todo o caso, o Engº Ferreira Leite perguntava pela indicação de empresas
que operavam na área em causa nos concursos se as não conhecia para que se pudessem
endereçar os convites respectivos.
Os contratos normalmente são assinados no seu gabinete pelos empreiteiros, mas
não se recorda se o contrato de fls 129 e 130 do apenso 97 foi assinado no seu gabinete
ou no gabinete da arguida Fátima Felgueiras.
Tratam-se de contratos dos quais já existem minutas e muitas vezes a arguida
Fátima assinava normalmente ao fim do dia, em momento diferente do momento da
assinatura pelos empreiteiros. No caso em apreço não se lembra se todos assinaram na
mesma altura.
- Testemunha Terezinha do Nascimento Lopes Domingues Carvalho
Salientou que apenas tem conhecimento dos contratos para os cabimentar e
depois proceder aos pagamentos. Antes disso deles não tem conhecimento.
Consequentemente, a situação em causa neste ponto não foi excepção, pois não se
recorda de ter tido qualquer intervenção anterior no que respeita à celebração do
contrato em causa com a “Norlabor”.
Porém, confrontada com o documento de fls 2275, reconheceu tratar-se de um
documento manuscrito e assinado por si (trata-se de uma informação dirigida ao
presidente da autarquia, à data o arguido Júlio Faria). Explicou que se trata de um
resumo de uma reunião ocorrida na CMF (no gabinete da presidência) a 11.04.95 e em
que esteve presente (não se recorda a que horas ocorreu tal reunião). Além da depoente
estiveram presentes os arguidos Júlio Faria, Vítor Borges e Barbieiri Cardoso. Nesse
documento fez um apanhado da situação relativamente ao contrato de transacção (à data
tinha sido paga apenas uma prestação), ali se referindo que esse dinheiro se destinava à
“Resin”. Não obstante formalmente esse contrato ter sido celebrado com a testemunha
Menezes Basto o certo é que ele não esteve presente nessa reunião.
Faz-se ainda nesse documento alusão ao valor que faltava liquidar relativamente
ao contrato de compra e venda do terreno onde se situava a lixeira e à facturação da
“Resin” e que estava pendente na contabilidade por inexistir suporte legal para a pagar
(inexistência de qualquer contrato).
Para ultrapassar a situação foi decidido abrir um concurso limitado nessa
reunião, segundo o que se observa na aludida informação. Explicou que teria de
verificar se no orçamento camarário existia ou não verba disponível que permitisse a
concretização desse concurso e a celebração do subsequente contrato de empreitada
com a firma vencedora. É por isso que nessa informação dá conta da necessidade de
reforçar a rúbrica respectiva em 60.000 cts, de modo a poder-se resolver o pagamento
das facturas pendentes e das facturas futuras. Para o efeito era necessário ir buscar esses
60.000 cts a outras rúbricas do orçamento, o que implicou o cancelamento de outros
investimentos por parte da CMF.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
A “Resin”, por sua vez, prontificou-se a anular as facturas já emitidas (o
contrato deveria preceder a emissão das facturas, o que não sucedia neste caso, razão
pela qual não poderiam ser pagas). Não sabe se as facturas em causa são aquelas que
foram juntas pelo arguido Carlos Marinho já no decurso da audiência de julgamento
(cfr. fls 12320 e ss.), mas admite essa possibilidade.
A solução encontrada teria contudo de ser aprovada em reunião de Câmara.
Explicou a expressão contida na informação “outra justificação que não o
tratamento do lixo” com o facto de se tratar apenas de uma prestação de serviços que
não tinha cabimento na rúbrica referida, daí a necessidade de se dar “outra justificação”.
De facto, se as facturas em causa referissem o tratamento do lixo a rúbrica deveria ser
outra.
Explicou ainda que existe sempre a possibilidade de se fazer alterações
orçamentais de modo a reforçar uma rúbrica à custa de outras. Como a solução
encontrada foi a abertura de um concurso de empreitada a rúbrica teria de ser aquela que
naquele documento é referida.
Constata-se que nessa informação, no canto superior direito, o arguido Júlio
Faria apôs um despacho no sentido de que tomou conhecimento e de concordância com
o respectivo teor, mais determinando a extracção de cópia da informação para si, para o
Chefe da Divisão de Saneamento Básico (Eng. Ferreira Leite) e para o Director do
Departamento Técnico (o arguido Barbieri). Salientou que a remessa de cópia para cada
um deles nada tem a ver com o facto de terem estado ou não presentes em tal reunião,
pois quer o arguido Barbieri quer o arguido Júlio Faria estiveram presentes em tal
reunião.
Depois disso nunca mais esteve ligada a esse assunto.
Ignora se o contrato entretanto celebrado com a “Norlabor” se prendia ou não
com a execução de plataformas. Salvo erro tratava-se de uma empreitada a ser
executada na lixeira de Sendim.
Tal contrato entretanto chegou à contabilidade e os procedimentos
desencadeados seriam então os normais em idênticas situações: eram-lhe dirigidas as
facturas emitidas pelo empreiteiro para proceder ao respectivo pagamento e os
respectivos autos de medição, se os houver, devendo o responsável pela fiscalização da
execução da obra confirmar a respectiva execução com a colocação de um visto nas
facturas. Havendo verba disponível as facturas seriam pagas por orientação superior
através da respectiva ordem de pagamento.
No caso em apreço não se recorda quem visou as facturas.
Não se recorda igualmente do valor do contrato.
Os cheques de pagamento eram remetidos pelo correio ou eram entregues
pessoalmente (hipótese menos frequente). Por via de regra eram entregues contra a
entrega do respectivo recibo, mas como os cheques nunca eram emitidos ao portador
existia prova bastante do pagamento ter sido efectuado.
Quando os cheques eram entregues pessoalmente a identificação da pessoa a
quem eram entregues era feita apenas verbalmente, daí que pudesse suceder a entrega
indevida de cheques a certa pessoa que se fazia passar por outra.
Não se recorda se o pagamento à “Norlabor” foi pago numa ou em várias
prestações (cfr. as respectivas ordens de pagamento, os três cheques emitidos pela CMF
e respectivos recibos a fls 1902 e ss. dos autos).
Tem a ideia de que a CMF apenas celebrou com essa empresa um único contrato
(em causa no ponto em questão).
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Foi então confrontada com a cópia da única factura emitida pela “Norlabor” no
âmbito do contrato referido, cuja cópia se acha por exemplo a fls 1891 do 8º volume (no
valor de 19.550.664$00, datada de 26.02.96 e reportada à execução de plataformas).
Referiu que essa factura lhe deve ter passado pelas mãos mas não se recorda
dela. Constata que tal factura não está visada (o documento em causa foi apreendido na
“Norlabor”). Também no respectivo original (constante de fls 199 do apenso 11) não
consta qualquer visto.
No que respeita ao primeiro pagamento a ordem de pagamento respectiva consta
de fls 1902, no valor de 4.738.095$00 (valor líquido depois de efectuadas as legais
retenções; o valor ilíquido é de 5.000 cts) e o cheque emitido pela CMF nesse valor
líquido, datado de 17.06.97 consta de fls 1903.
No que respeita ao segundo pagamento a ordem de pagamento consta de fls
1909 (no valor líquido 6.633.334$00) e o cheque emitido pela CMF nesse valor a
12.05.98 consta de fls 1910. O recibo de fls 1907 (igual ao que consta de fls 188 do
apenso 11, o qual só apresenta uma via), tem a indicação de anulado e depois a
indicação de que é válido, o que significa que terá sido entregue na CMF (no
documento de fls 200 do apenso 11 existem já 3 vias desse recibo).
No que concerne ao terceiro pagamento a respectiva ordem consta de fls 1914
(no valor líquido de 7.155.153$00, a que corresponde o valor ilíquido de 7.550.664$00)
e o cheque, datado de 08.10.98, consta de fls 1915, no valor de 7.155.153$00.
Os valores ilíquidos correspondem ao valor da factura apresentada pela
“Norlabor”.
Não se recorda se em face no atraso nos pagamentos a “Norlabor” tomou
alguma iniciativa em ordem a obter mais prontamente os pagamentos. Admite que possa
ter reclamado junto de si o respectivo pagamento.
Ignora se algum credor da CMF a colocou como cliente de cobrança duvidosa,
nunca tendo ouvido de quem quer que seja tal menção.
Confrontada com o documento de fls 1906 (extrato da conta-corrente entre a
“Norlabor” e a CMF, documento apreendido naquela e onde tal menção é feita), referiu
nunca o ter visto.
*
A propósito das declarações prestadas até ao momento pela testemunha
Terezinha o arguido Barbieri Cardoso refutou que tivesse estado presente na reunião
de 11.04.95, acima referida, pois tem a firme convicção de nela não ter participado.
Foi aliás o depoente quem entregou à PJ o manuscrito de fls 2275 e dele falou à
mesma entidade, sendo certo que nessa altura deu nota desse facto à testemunha
Terezinha, a qual lhe disse então não se recordar de nada. Entregou-lhe então cópia
desse documento.
Quanto ao seu conteúdo explicou que é difícil alterar o orçamento no que
concerne às despesas correntes, sendo mais fácil proceder alterações nas verbas adstritas
aos investimentos de capital, como por exemplo as empreitadas.
Além disso, se se considerasse a obra em causa como uma empreitada (e não
como uma mera prestação de serviços ou fornecimento) o IVA a liquidar seria menor.
Por outro lado, no orçamento, em face do equilíbrio orçamental que se exige, a
despesa não pode ser superior à receita.
*
A propósito das declarações acabadas de referir a testemunha Terezinha referiu
não se recordar do arguido Barbieri Cardoso lhe lhe ter fornecido uma cópia do
documento de fls 2275, pois só tem memória de o ter visto quando foi inquirida pela PJ.
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Reafirma que o manuscrito traduz um resumo dos assuntos abordados na reunião
ocorrida a 11.04.95.
Não se recorda da identidade do participante nessa reunião que sugeriu a
realização do concurso limitado, sendo certo que não foi a depoente, até porque não
dispunha dos conhecimentos jurídicos necessários para o efeito. Admite que tenha sido
a assessoria jurídica a sugerí-lo, mas não assistiu a esse facto.
O arguido Vítor Borges chegou a telefonar-lhe para saber dos pagamentos, o
mesmo tendo sucedido com o arguido Carlos Marinho, contabilista da “Resin”.
A CMF paga aos seus credores com atraso, sendo certo que no último orçamento
o passivo ronda os 16.000.000,00 euros.
*
Nesta altura a arguida Fátima Felgueiras referiu que tem a convicção de que a
testemunha Terezinha não dependia do Presidente Júlio Faria. Seja como for, quando a
depoente assumiu a presidência ela não dependia de si, pois era funcionária da CMF.
Quanto aos pagamentos era ela quem dava a informação com a proposta dos
pagamentos a efectivar. Como a verba do passivo é verba que não se pode usar e porque
as despesas não podem ultrapassar o valor do passivo, as várias rúbricas do passivo
eram explicadas.
Quanto ao problema das facturas emitidas pela “Resin” e que não poderiam ser
pagas por falta de contratualização assegurou que andaram meses sem encontrar a
solução adequada. Não cabia à parte política encontrar a dita solução jurídica e
financeira, sendo certo que o Departamento de Administração Geral não havia
conseguido encontrar a solução para sair do impasse.
*
- Testemunha Mário Barbosa Silva
É encarregado de construção civil, tendo trabalhado durente cerca de 4 ou 5 anos
(entre 1994 até 1997 ou 1998) na firma “Ecorumo”, a qual pertence ao mesmo grupo da
“Translousada”. Assegurou que nessa altura trabalhou no aterro de Felgueiras com
máquinas (pás carregadoras de arrasto e giratória), na compactagem do lixo, desde
Dezembro de 1994 até cerca de 4 ou 5 anos depois.
De vez em quando, segundo assegurou, iam para esse local máquinas e camiões
alugados pela “Resin”, sendo certo que era esta última que explorava o aterro referido.
No local existia um escritório com um funcionário da “Resin” (o Sr. Pereira).
Havia também um encarregado no aterro (o Sr. Fernando Ramos).
A certa altura os funcionários da “Resin” passaram a trabalhar no local por
turnos, inclusive à noite quando passou a haver vigilância (o que sucedeu pouco tempo
depois do depoente ter ido para lá trabalhar com máquinas).
As máquinas com que o depoente trabalhava não apresentavam qualquer sinal
alusivo à “Translousada”. Existiam porém máquinas a operar no local que ostentavam a
identificação da firma “JCL”.
O nome da firma “João Tello” nada lhe diz. No tempo em que trabalhou naquele
local nenhuma máquina dessa firma operou ali.
Conhece a firma “Norlabor” (hoje trabalha nesta empresa como encarregado de
obras) mas também esta empresa não operou no local, pelo menos no tempo em que o
depoente ali trabalhou.
Assegurou que os trabalhos nunca chegaram a ser suspensos.
As máquinas usadas no local pelo depoente eram da “Translousada” (fazia
movimentação de resíduos, escavações e tapagem de resíduos). Não obstante, era
funcionário da “Ecorumo”, uma empresa do mesmo grupo da “Translousada”.
291
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Tais trabalhos eram efectuados por força de subempreitada da “Resin” à
“Translousada”.
Recorda-se que quando foi trabalhar para essa lixeira já lá operavam duas
máquinas que não eram da “Translousada” e muitos trabalhos já haviam sido
executados.
Era o Sr. Fernando quem lhe dizia o modo como os trabalhos deveriam ser
executados. Por vezes iam ao local engenheiros da “Resin”.
O Sr. Carlos Silva (sócio-gerente da “Ecorumo”) deslocava-se à obra duas ou
três vezes por semana.
- Testemunha Joaquim José Teixeira Ribeiro
Enquanto Presidente da Comissão Política do PSD local tinha responsabilidades
acrescidas na Assembleia Municipal.
Referiu que a 28.07.2000 realizou-se uma Assembleia Municipal Extraordinária
(depois de ter sido inviabilizada uma primeira assembleia convocada com o mesmo fim
por falta de quorum) onde apresentou vários documentos que lhe chegaram às mãos
(não se recorda quem lhos entregou, não confirmando que tenha sido o Sr. Vítor
Vasconcelos, então Vice-presidente da Comissão Política do PSD local), de modo a
obter, sobretudo da arguida Fátima Felgueiras, esclarecimentos.
Tais documentos foram objecto de análise no seio do seu partido e analizaramnos de modo a separar as questões do foro criminal das questões do foro politico.
A 30.11.2000 entregou à PJ cópia desses documentos, tendo acrescentado mais
dois documentos que não tinham sido entregues na Assembleia Municipal (cfr. docs de
fls 457 até 466; a fls 268 e ss. constam dos autos os documentos entregues pelo Dr.
Barros Moura, ao tempo presidente da Assembleia Municipal de Felgueiras).
Ignora quem manuscreveu o documento de fls 269, tendo-lhe suscitado dúvidas
a expressão “reembolsos” e “entregar”. Em regimes de empreitada o IVA a pagar pela
CMF era de 5%, daí que tais expressões se refiram à diferença do IVA entre 17% e 5%.
Tal documento de fls 269 relaciona-se com a guia de receita de fls 268, pois o valor é
coincidente.
O valor final é igual ao do valor do cheque emitido pela CMF à “Norlabor”.
Já tinha ouvido falar dessa empresa, pois ouvia dizer que prestava serviços à
CMF.
Falava-se que esse pagamento relacionava-se com a lixeira.
Recorda-se que na altura não lhe foram dadas quaisquer explicações para esse
pagamento, remetendo-a para a “Justiça”, alegando que era a entidade competente para
proceder à investigação.
Colocava-se a questão de se saber a que título é que um fornecedor da CMF é
pago por um serviço que prestou e depois tem de entregar certa quantia ao arguido
Horácio Costa, o que na sua óptica indicia um uso indevido de dinheiros públicos.
Quanto aos documentos de fls 270 e 271 constatou tratar-se de documentos
semelhantes aos já referidos, ignorando quem é o seu autor.
Pediu também esclarecimentos em relação a eles (designadamente se estavam ou
não a ser usados indevidamente dinheiros públicos) não tendo obtido da arguida Fátima
qualquer explicação. Esse alegado uso indevido de dinheiros públicos foi aliás a razão
de ser da convocação da dita Assembleia Extraordinária.
A fls 457 e ss. consta uma cópia da exposição que fez nessa assembleia. Tratouse de um guia da sua intervenção nessa assembleia.
Tomou conhecimento da conta do BES por força das declarações públicas dos
arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas.
292
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Não sabe se a “Norlabor” prestou ou não efectivos serviços à CMF. Não sabe
qual foi o destino final dos pagamentos efectuados a essa empresa.
Seja como for, a “Resin” procedia à recolha do lixo em Felgueiras e operava na
lixeira, não compreendendo por isso a que título a CMF procedeu a pagamentos à
“Norlabor”.
- Testemunha Luís Vieira Lemolino Velosa
Confrontado com o documento de fls 199 do apenso 97, referiu não saber a
quem diz respeito a conta nº 211043 (com um saldo de 1.129.418$00). Porém, em face
do teor do documento de fls 200 do apenso 97, verifica que o extracto dessa conta diz
respeito à “Translousada”.
À pergunta efectuada no sentido de saber se o montante ali referido também foi
considerado de cobrança duvidosa, tendo sido efectuada a respectiva provisão referiu
que não na medida em que não foi considerado no cálculo da provisão visto que o valor
desta é de 24.000.000$00.
Não obstante tal resposta, confrontado com o quadro em baixo, o qual apresenta
um valor de 28.211.803$00, admitiu tratar-se afinal do montante da provisão, pelo que,
em face disso, corrigiu o respectivo depoimento, admitindo assim que de facto o
montante de 1.129.418$00 foi considerado de cobrança duvidosa.
- Testemunha Paulo José Bento Ribeiro
Antes da construção do aterro RIB de Felgueiras a “Resin” fazia a manutenção
da lixeira de Sendim (a “Resin” recolhia e depositava naquele local os lixos) e para o
efeito celebrava acordos com a “Translousada” para alugar equipamento
(retroescavadoras), apresentando as facturas à CMF. A “Translousada” tinha alvará que
lhe permitia movimentar terras e fazer terraplanagens.
Chegaram também a socorrer-se de outras empresas conhecidas da
“Translousada”, sendo certo que era sempre a testemunha Carlos Silva o seu
intorlocutor.
Por razões de ordem administrativa as facturas foram-se acumulando sem
qualquer pagamento, o que levou a que se procurasse encontrar uma forma
administrativamente viável para que a CMF as pagasse.
Recorda-se de ter insistido com a administração da “Resin” dando conta de que
desse modo seria difícil continuar. Foi-lhe então transmitida a ideia de que se tratava de
um investimento para apresentação de trabalhos junto de outros potenciais clientes por
forma a expandirem a sua actividade. O depoente, porém, insistia que era necessário
obter o pagamento dos trabalhos efectuados na lixeira.
Esclareceu que era o depoente quem fazia as facturas.
Não se recorda do montante em dívida, mas ultrapassou a centena de milhar de
contos.
Relativamente aos expedientes legais engendrados para que a situação do
pagamento fosse desbloqueada referiu que não participou nas reuniões pelo que não tem
acerca deles grande conhecimento de causa.
A recolha do lixo era diária e não podia parar, razão pela qual as soluções
encontradas eram tardias e concretizadas à posteriori.
A testemunha Carlos Silva, para além de ser o seu intorlocutor no que diz
respeito à “João Tello”, estava também ligada à “Norlabor” (não sabe de que forma),
empresa da região que se propunha fazer trabalhos de subempreitada para a “Resin” na
lixeira e que tinha alvarás de maior dimensão para o efeito.
293
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Sabe que essa empresa operou nas lixeiras de Lustosa e Penafiel. Não se recorda
porém se ela desenvolveu ou não alguma actividade na lixeira de Felgueiras, sendo
certo que se ela ali operou deverão existir facturas emitidas por essa empresa à
“Resin”.
A “Norlabor” fazia parte de um grupo de empresas de que a “Resin” se socorria
para a manutenção e encerramento de lixeiras, uma vez que não dispunha de alvará que
lhe permitisse executar essas obras.
Não tem qualquer ideia da “Norlabor” ter vencido qualquer concurso promovido
pela CMF relativamente à lixeira de Sendim.
De resto, a partir de Julho de 1997 Felgueiras passou-lhe ao lado, pois a partir
dessa altura foi o arguido Gabriel quem assumiu as funções de Director Geral da
“Resin” e tomou a seu cargo a responsabilidade pelo acompanhamento das obras que
iam sendo executadas em Felgueiras.
Referiu não ter conhecimento de alguma situação em que uma câmara municipal
tenha solicitado a um potencial concorrente para lhe indicar outros possíveis
concorrentes a um concurso limitado. Em todo o caso, tal é possível se se tratar de um
concurso promovido para regularizar situações passadas, circunstância em que terá de
existir um acordo entre todos.
Confrontado a propósito com o documento de fls 301 do apenso 21 (listagem de
empresas enviadas por fax pela “Resin” à CMF, à atenção do Director do Departamento
Técnico – o arguido Barbieri Cardoso -, fax esse assinado pelo arguido Vítor Borges,
indicando as seguintes empresas: “Resin”, “Translousada”, “Norlabor”, “Craveira” e
“Ecop”), referiu não se recordar desse documento; em todo o caso, disse ser provável
que na altura tinha tido conhecimento dele, visto ser na altura o responsável pelo
Departamento Técnico da “Resin”.
Tal documento relaciona-se com um concurso limitado promovido pela CMF,
em que são convidadas cinco empresas a apresentar as respectivas propostas (o número
legalmente estabelecido de empresas a convidar nesse tipo de concursos).
Terá pois havido concerteza um acordo entre a “Resin” e essas empresas,
tratando-se de um caso claro de uma tentativa de se encontrar uma forma de se justificar
pagamentos através do lançamento de um concurso limitado. Se esse concurso fosse
vencido por exemplo pela “Resin” estavam legalmente justificados os pagamentos
relativamente a trabalhos efectuados na lixeira.
Tal situação era aliás comum em todo o país (de modo a proceder-se ao
pagamento de trabalhos já efectuados).
Não tem conhecimento que o concurso em causa tenha sido vencido pela
“Norlabor”. Se tal aconteceu, tal situação poderá prender-se com o facto dessa empresa
dispor do alvará necessário (e a “Resin” não) para levar a cabo as obras necessárias na
lixeira de Sendim, de sorte que a “Resin” poderia, nessa hipótese, ter feito um acordo
com ela no sentido de que, vencendo essa empresa o dito concurso, faria chegar os
pagamentos à “Resin”, tratando-se assim a “Norlabor” de uma mera intermediária no
que toca ao recebimento dos pagamentos. Nesta hipótese, o concurso em causa poderia
destinar-se a dar cobertura legal a pagamentos necessários para que os trabalhos
prosseguissem.
Ainda a propósito do fax de fls 301 do apenso 12 referiu que era o arguido
Barbieri o elo de ligação da CMF com a “Resin”, daí que o fax seja dirigido ao Director
do Departamento Técnico da CMF.
Conheceu vagamente o Engº Ferreira da CMF, pois ele não era o intorlocutor da
“Resin” junto da CMF.
294
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Não está a ver a arguida Fátima Felgueiras a assinar de cruz qualquer despacho
sem que previamente se informasse. Porém, no que diz respeito aos contratos celebrados
pela CMF, são os assessores jurídicos quem detêm o conhecimento dos respectivos
aspectos jurídicos.
Ignora se a arguida Fátima tomou ou não conhecimento do fax de fls 301 do
apenso 12.
- Testemunha Henrique Manuel da Silva Correia
A CMF, salvo erro com vista a ajuste directo (tratou-se porém de um concurso
limitado), endereçou cinco convites a outras tantas empresas (“Ecop”, “Resin”,
“Norlabor”, “Translousada” e “Craveira”) – cfr. documento de fls 70 do apenso 95-A.
A PJ encontrou um documento alusivo a uma reunião prévia (cfr. informação
efectuada pela testemunha Terezinha, constante de fls 2275, datada de 11.04.95, onde
foi aposto um despacho pelo arguido Júlio Faria no canto superior direito, datado de
19.04.95. Nessa informação alude-se a uma reunião ocorrida na CMF com o arguido
Vítor Borges.
O prazo de execução da obra era de 30 dias, conforme consta dos convites.
Todas as firmas convidadas apresentaram as suas propostas, tendo vencido a
“Norlabor”, a qual apresentou a proposta com o preço mais baixo (18.619.680$00 +
IVA – cfr. documento de fls 81 do apenso 95-A).
A PJ apreendeu um documento na “Resin” onde se indicavam as empresas a
convidar pela CMF (trata-se de um fax dirigido ao director do Departamento Técnico da
CMF – o arguido Barbieri), constante de fls 301 do apenso 21 e datado de 24.11.95.
Pensa tratar-se de uma situação anómala o facto de um dos oponentes ao
concurso indicar outros concorrentes a quem endereçar os convites.
A “Translousada”, a “Craveira” e a “Norlabor” tinham sócios comuns.
Existia por outro lado um consórcio entre a “Resin” e a “Norlabor” (cfr. fls 145
do apenso 97), o qual se reportava à manutenção e exploração do aterro de Sendim.
A “Resin”, por sua vez, tinha um contrato de consórcio com a “Ecop”.
A fls 69 do apenso 95-A consta cópia do despacho da arguida Fátima Felgueiras,
datado de 27.11.95, a determinar a abertura do concurso em causa.
A fls 129 do apenso 97 consta o contrato celebrado entre a CMF e a “Norlabor”
(datado de 24.01.96) na sequência do facto de lhe ter sido adjudicada a obra pelo valor
de 18.619.680$00.
A fls 141 do apenso 97 consta um fax remetido pela testemunha Carlos Silva
(sócio-gerente da “Translousada”) para o arguido Vítor Borges, remetendo um
documento da CMF, assinado pelo arguido Barbieri, dirigido à “Norlabor”,
comunicando-lhe que lhe foi adjudicada a obra. Este documento diz respeito à CMF e à
“Norlabor”, pelo que não é normal que tenha sido remetido ao arguido Vítor Borges por
um sócio-gerente da “Translousada”.
Entretanto a “Norlabor” emitiu à CMF a factura nº 427, datada de 26.02.96,
constante designadamente de fls 1899.
O auto de medição da obra foi feito pela testemunha Ferreira Leite (engenheiro
que é funcionário da CMF), conforme documento de fls 119 do apenso 195-A.
A CMF, por sua vez, procedeu ao respectivo pagamento em três prestações.
No que se refere ao primeiro pagamento, a respectiva ordem consta de fls 1902
(4.738.095$00, montante já deduzido das legais retenções).
A fls 1903 consta uma cópia do cheque emitido pela CMF a favor da “Norlabor”
(datado de 17.06.96), no aludido montante de 4.738.095$00.
295
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
A “Norlabor”, em face do recebimento daquele pagamento, emitiu um recibo a
24.06.96 no valor de 5.000 cts (cfr. documento de fls 1900).
A fls 1906 consta um extracto da conta-corrente existente entre a “Norlabor” e a
CMF, reportada a 1997, apresentando um saldo a favor daquela no montante de
14.550.664$00 (valor deduzido já do montante entretanto pago pela CMF).
Nesse extracto faz-se a referência a uma transferência do valor desse crédito
para a conta de clientes de cobrança duvidosa.
Da sua experiência profissional nunca constatou que um débito de uma câmara
municipal fosse considerado como sendo de cobrança duvidosa, sendo certo que a PJ
não detectou qualquer indício de que se tenha tentado cobrar coercivamente tal crédito.
Em todo o caso, consta de fls 243 do apenso 97 uma carta da “Norlabor” para a
CMF a solicitar uma reunião pelo não pagamento da quantia em dívida, carta essa que
data de 08.05.96, portanto anterior ao primeiro pagamento.
No que se refere ao segundo pagamento, foi emitida pela CMF a respectiva
ordem de pagamento no valor líquido de 6.633.334$00, na sequência da qual foi
emitido o cheque cuja cópia se acha junta a fls 1910, datado de 12.05.98.
A “Norlabor”, em face desse recebimento, emitiu um recibo reportado ao
montante de 7.000 cts, constante de fls 1907 (esse recibo tem a indicação de anulado e
depois uma anotação de que é válido, sendo certo que no duplicado constante da CMF
essas anotações não existem).
No que se refere ao terceiro pagamento, a CMF emitiu a respectiva ordem de
pagamento, no valor líquido de 7.155.153$00 (valor ilíquido de 7.550.664$00), na
sequência da qual emitiu o cheque cuja cópia consta de fls 1915 (datado de 08.10.98 e
naquele montante líquido), em face do qual a “Norlabor” emitiu um recibo no valor de
7.550.664$00 a 02.10.98 (cfr. documento de fls 1913).
Estes pagamentos à “Norlabor” acabaram por ir parar à “Resin”, passando pela
“Translousada”, tendo a PJ feito a análise às contas bancárias no sentido de seguir o
rasto dos cheques emitidos pela CMF.
Assim, o cheque de fls 1903 foi endossado pela “Norlabor” à “Translousada” e
desta para a “Resin”, a qual procedeu ao respectivo depósito na sua conta bancária.
A fls 1905 consta um documento da “Translousada” para a “Norlabor”, datado
de 24.06.96, onde são referidas duas notas de débito de 30.12.95 e referentes a uma
regularização de 5.000 cts.
O recibo emitido pela “Translousada” à “Norlabor” tem o montante de
4.738.095$00 (valor coincidente com o primeiro pagamento efectuado pela CMF) – cfr.
documento de fls 191 do apenso 97, datado de 25.06.96 (onde aliás é referenciado o
número do cheque que serviu de meio de pagamento, bem como a respectiva entidade
bancária sobre a qual foi sacado, elementos identificadores coincidentes com o primeiro
cheque emitido pela CMF à “Norlabor”).
Já o cheque de fls 1910 emitido pela CMF à “Norlabor” (correspondente ao
segundo pagamento) foi depositado na conta da “Norlabor”, tendo sido entretanto
emitido um cheque de uma conta particular (do Banco “Totta & Açores”) dos seus dois
sócios para a “Translousada” no mesmo montante (cfr. documento de fls 4097, de
15.05.98).
A “Translousada” emitiu à “Norlabor” o respectivo recibo, no valor de
6.633.334$00 a 21.10.98.
Esse cheque de fls 4097 foi endossado à “Resin”, que o depositou, tendo emitido
o respectivo recibo a 14.05.98 à “Translousada”, no valor de 6.633.334$00, conforme
documento de fls 195 do apenso 97. Tal documento tinha no verso manuscrito uns
dizeres a lápis e que foi possível recuperar pelo Laboratório de Polícia Científica, apesar
296
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
de terem sido apagados (“acerto de contas. Diferença de IVA. Resin factura à
Translousada 17%. Translousada para a Norlabor 17%. Norlabor – CMF 5%).
O depósito desse valor na conta da “Resin” ocorreu a 15.05.98 (cfr. documento
de fls 196 do apenso 97).
O cheque de fls 1915 emitido pela CMF à “Norlabor” (correspondente ao
terceiro e último pagamento) foi depositado na conta da “Norlabor”.
Desse montante a “Translousada” passou um recibo à “Norlabor” a 22.10.98
(cfr. documento de fls 41 do apenso 97) e a “Resin” emitiu um recibo à “Translousada”,
no mesmo valor, também a 22.10.98 (cfr. documento de fls 198 do apenso 197).
Para justificar estes movimentos da “Norlabor” para a “Translousada” foram
emitidos os documentos de fls 61, 62, 68, 69 e 71 a 74 do apenso 97.
No extracto de conta-corrente da “Translousada” para com a “Norlabor” são
referidas notas de débito (cfr. fls 61 e 62 do apenso 97), encontrando-se os originais
dessas notas de débito a fls 68, 69 e 71 a 74.
Por sua vez, para justificar os movimentos de verbas da “Translousada” para a
“Resin”, esta emitiu àquelas as facturas de fls 161 a 166 do apenso 97, tendo ainda
emitido três recibos à “Translousada”, conforme documentos de fls 191 (4.738.095$00),
195 (6.633.334$00) e 198 (4.738.095$00), todos do apenso 97.
Tem a ideia que o consórcio existente entre a “Resin” e a “Norlabor” dizia
respeito à obra mencionada no ponto 1.3., mas que nunca chegou a ser accionado
(porquê a interferência da “Translousada” se existia esse contrato de consórcio?).
- Testemunha Carlos Manuel Ferreira Alves
A autarquia felgueirense convidou cinco empresas (“Norlabor”, “Translousada”,
“Ecop”, “Craveira” e “Resin”) para apresentar as respectivas propostas e a empreitada
em causa foi adjudicada à “Norlabor”, a qual apresentou a proposta com o preço mais
baixo.
A “Norlabor”, a “Translousada” e a “Craveira” tinham sócios comuns e a
“Ecop” tinha um participação no capital social da “Resin”.
Pela PJ foi apreendido na CMF o manuscrito de fls 2275, do 10º volume, onde
se faz alusão a uma reunião que teve lugar na CMF no dia 11.04.95 com o arguido Vítor
Borges, documento esse da autoria de uma funcionária da autarquia.
Nesse documento foi aposto um despacho pela arguida Fátima Felgueiras,
declarando que tomou conhecimento e de acordo ao que era proposto.
Foi na sequência dessa reunião que foram convidadas as cinco empresas
referidas para apresentarem as respectivas propostas.
Foi aliás apreendido um fax remetido pela “Resin” à CMF a 24.11.95 (do
arguido Vítor Borges para o director do Departamento Técnico, na circunstância o
arguido Barbieri), onde se indicava a esta quais as empresas que deveria convidar (as já
referidas) – cfr. documento de fls 301, do apenso 21.
A “Resin” não dispunha de alvará de construção civil mas tinha celebrado com a
“Norlabor” um contrato de consórcio e que tinha por objecto a realização de trabalhos
na lixeira de Sendim (cfr. documento de fls 145, do apenso 97, datado de 19.04.95), o
qual nunca foi utilizado (não sabe porque razão).
A fls 129 do apenso 97 consta cópia do contrato de adjudicação da obra em
causa à “Norlabor” pelo prazo de 30 dias, contrato esse celebrado a 24.01.96.
A PJ foi várias vezes à “Norlabor”, tendo efectuado uma busca com o objectivo
de se apreender documentos respeitantes a esta empreitada, mas nada foi encontrado
nessa empresa que dissesse respeito à dita obra.
297
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
A “Norlabor” apresentou uma factura (nº 427) à CMF, datada de 26.02.96, no
valor de 19.550.664$00 (cfr. documento de fls 1899, do 8º volume).
A quantia em causa foi paga em três tranches e teve como destinatária final a
“Resin”, mas antes disso a “Norlabor” remeteu à CMF uma missiva solicitando o
pagamento da factura nº 427 (cfr. documento de fls 293 do apenso 97, datado de
08.05.96). Para além desse documento não se recorda de qualquer outra interpelação
escrita por banda da “Norlabor” para que a CMF pagasse o montante em dívida.
Assim, no que respeita ao primeiro pagamento, a fls 1902 dos autos encontra-se
cópia de uma ordem de pagamento emitida pela CMF a 13.06.96, no montante ilíquido
de 5.000 cts, o que, após as legais retenções, prefez o montante líquido de
4.738.095$00.
A fls 1903 dos autos encontra-se cópia do cheque emitido pela CMF a 17.06.96
a favor da “Norlabor”, no montante de 4.738.095$00, cheque esse que foi endossado à
“Translousada”, a qual, por sua vez, o endossou à “Resin”, tendo esta emitido a favor
daquela o respectivo recibo, a 25.06.96, naquele valor de 4.738.095$00 (nesse recibo
faz-se referência ao número do cheque que serviu de meio de pagamento, coincidente
com o número do cheque emitido pela CMF).
No extracto de conta-corrente entre a “Norlabor” e a CMF, faz-se referência a
um valor em dívida deduzido do primeiro pagamento (14.550.64$00), reportado a
22.02.2001, sendo certo que no descritivo refere-se uma transferência para a conta de
clientes duvidosos.
No que se refere ao segundo pagamento, consta de fls 1909 a respectiva ordem
de pagamento por banda da CMF, no montante de 7.000 cts (valor ilíquido), o que
perfez o montante líquido, após as legais retenções, de 6.633.334$00.
A fls 1910 consta uma cópia do cheque emitido pela CMF a favor da
“Norlabor”, no montante de 6.633.334$00.
Esse montante foi depositado pela “Norlabor”, a qual depois emitiu um cheque
no mesmo valor a favor da “Translousada”, cheque esse sacado de uma conta titulada
pelos respectivos sócios daquela empresa (cfr. o cheque de fls 4097, de 15.05.98), tendo
a “Translousada” emitido o respectivo recibo a favor da “Norlabor”, constante de fls 38
do apenso 97, datado de 21.10.98. Esse cheque foi entretanto endossado pela
“Translousada” à “Resin”.
No que se refere ao terceiro e último pagamento, a CMF emitiu o respecivo
cheque a favor da “Norlabor”, datado de 08.10.98, no montante de 7.155.153$00 (cfr.
documento de fls 1915; a fls 1916 consta a guia de receita alusiva às deduções).
Esse valor foi depositado pela “Norlabor” (cfr. documento de fls 1917), a qual
por sua vez emitiu um cheque de igual valor a favor da “Translousada”, tendo esta
emitido o respectivo recibo (cfr. docuumento de fls 41 do apenso 97).
Entretanto a “Resin” emitiu o respectivo recibo nesse valor à “Translousada”,
conforme documento de fls 198 do apenso 97.
Não percebe porque razão a “Translousada” interveio no circuito dos
pagamentos, sendo certo que tal facto dificultou a investigação.
- Testemunha Rui Manuel Correia de Pinho
É revisor oficial de contas.
Deve-se considerar um cliente como sendo de cobrança duvidosa quando há
atrasos no recebimento do crédito e existem dúvidas acerca do respectivo recebimento
(a incerteza do recebimento pode advir do atraso ou do conhecimento de algum facto
que leva a essa dúvida). A provisão deve assim ser constituída quando há mora e há
dúvida quanto à cobrança.
298
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
A provisão em causa prende-se com a prudência na gestão da empresa.
Do ponto de vista fiscal existem regras acerca da percentagem da provisão e que
tem a ver com a idade do crédito.
Uma dívida com mais de dois anos, por prudência, deve ser provisionada, a não
ser que existam garantias sólidas de pagamento.
Os ROC pedem a confirmação de saldos a terceiros, segundo selecção que
efectua, normalmente os que têm mais movimento com a empresa cujas contas petende
certificar.
Se entendesse que deveria ser feita determinada provisão faria à empresa a
respectiva sugestão, a qual, se não fosse acatada, poderia levar a que o depoente
colocasse reservas às contas apresentadas.
Existe uma cultura em Portugal de que as dívidas das autarquias e do Estado não
devem ser provisionadas como cliente de cobrança duvidosa, mas como ROC entende
que sim nas circunstâncias que já descreveu.
Foi então confrontado com o documento de fls 1906 do 8º volume (contacorrente da “Norlabor” com a CMF, donde consta que procederam a uma transferência a
31.12.97 para provisionar a conta de clientes de cobrança duvidosa). Explicou que o
“software” inclui o mês 13º e 14º, sendo certo que alguns incluem um 15º mês.
Os seviços efectuados devem ser facturados independentemente de serem pagos
ou não ou da factura respectiva ser devolvida ou não.
A fls 1908 do mesmo documento consta um recebimento em Maio e outro em
Outubro. A provisão referida foi invertida (isto é, anulada), o que se traduziu num
procedimento correcto e perfeitamente comum.
Explicou que existem situações em que só pelo atraso no pagamento é legítimo
fazer-se a provisão na conta de clientes de cobrança duvidosa, não acreditando que antes
a empresa não diligencie pelo respectivo pagamento.
Conhece outras situações em que idênticas provisões foram feitas relativamente
a débitos de câmaras municipais.
À pergunta efectuada no sentido de saber se é razoável que uma empresa facture
a uma câmara municipal quando cerca de um ano antes lhe foi comunicado que seria
outra entidade a pagar, referiu não poder responder em abstracto, tudo dependendo de
quem encomendou de facto o serviço prestado. Se o serviço foi prestado à câmara
municipal é a ela que a factura deve ser emitida ainda que diga que é outra entidade a
pagar.
O responsável pela preparação das contas é o órgão de gestão da empresa, contas
essas que são elaboradas pelo contabilista porque tem preparação técnica para as fazer.
- Testemunha Luís Manuel Moura Esteves
É revisor oficial de contas e amigo do arguido Carlos Marinho, que conhece há
cerca de 20 anos (foram colegas na faculdade).
A propósito de se saber quando é que se deve constituir uma provisão na conta
de clientes de cobrança duvidosa, referiu que tal deve ser feito quando há incerteza
quanto à sua cobravilidade. Uma dívida pode ser de cobrança duvidosa passados dois ou
três dias, como pode ter 4 ou 5 anos e não ser de cobrança duvidosa.
Salientou que o critério fiscal é diferente do critério económico. De facto, se é o
Estado o devedor e há incerteza quando à boa cobrança desse crédito, as leis fiscais
impedem que essa dívida seja fiscalmente considerada como um custo, mas isso não
quer dizer que não possa ou não deva ser criada a respectiva provisão por questões de
gestão, daí a questão dos impostos deferidos para reflectir essa diferença.
299
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Deu como exemplo os credores da Câmara Municipal de Lisboa. Aconselhavaos a fazer a respectiva provisão.
Se o ROC remete missivas a um cliente particular para conferência de saldos e
se ele ao longo dos anos confirma os respectivos saldos e depois deixa de responder há
que ver se a dívida se tornou incerta. Em caso afirmativo deve ser constituída a
provisão.
A facturação dos serviços prestados, por outro lado, é uma obrigação legal.
Foi confrontado então com a situação dos autos, em que existe uma dívida da
CMF perante uma entidade particular vencida em Março de 1996. Houve uma
insistência pelo respectivo pagamento em Maio de 1996. A 25.06.96 há um primeiro
pagamento parcial de 5.000 cts. Em face disso pergunta-se: a colocação da CMF, no dia
31.12.97, como cliente de cobrança duvidosa (pela “Norlabor”) é uma medida acertada?
A testemunha respondeu que se a provisão foi constituída em Dezembro de 1997 não
lhe parece descabido. O tempo é apenas um dos indicadores.
- Testemunha José Vitorino da Cunha Loureiro
Referiu que foi admitido ao serviço na “Resin” em Janeiro de 1993 como
funcionário administrativo (expediente geral). A pouco e pouco foi tomando também
conta da caixa da empresa, passando a ser o tesoureiro cerca de 2 ou 3 anos depois.
No início o Sr. Florentino Borges dava-lhe apoio e mais tarde ficou apenas
ligado à Direcção Financeira da “Resin”.
Quando não tinha estafeta era o depoente quem procedia aos depósitos. Também
fazia levantamentos para suprimentos de caixa. Os depósitos e levantamentos que
efectuava diziam apenas respeito à conta da empresa, negando que tivesse procedido a
levantamentos de contas pessoais dos respectivos sócios ou funcionários.
Explicou que a testemunha Luciano Barreira foi o seu superior hierárquico, pois
foi Director Financeiro da “Resin”. Tal testemunha ingressou na “Resin” enviada pela
“ECOP”, ao que pensa, em 1994 (tendo permanecido ao serviço da “Resin” até 1998,
salvo erro). Aquando da reinquirição a testemunha expressou então que tem a ideia que
ele terá entado para a “Resin” quando a “Ecop” entrou para o capital social da “Resin”,
ao que pensa em 1995. Nega que alguma vez lhe tenha entregue qualquer quantia em
numerário.
Na altura o arguido Vítor Borges era o único a obrigar a empresa.
Até Setembro de 1993 o depoente preparava os documentos para a
contabilidade, altura em que foi admitido um contabilista (o arguido Carlos Marinho).
Em finais de 1999 o arguido Carlos Marinho deixou de ser contabilista da
“Resin” por ter tido um desentendimento com o director geral de então, passando a ser o
respectivo director financeiro a partir de 2000.
Confrontado com as facturas juntas pelo arguido Carlos Marinho a fls 12320 e
ss., referiu que se reportam à segunda fase (as primeiras facturas haviam sido emitidas à
testemunha Menezes Basto). Como essas facturas foram todas devolvidas de uma só vez
pela CMF, foram emitidas outras de uma só vez.
Não sabe como é que o valor de 2.800 cts + IVA era apurado.
A “Resin” começou a trabalhar em Felgueiras em finais de 1993, sendo certo
que nessa altura chegou uma máquina provinda de França para trabalhar na lixeira de
Sendim (veio com um funcionário chamado Pereira, tendo operado na lixeira 6 ou 7
meses). Recorda-se que nessa altura o arguido Vítor Borges estava em França e
telefonou para ele saber o que fazer à máquina referida.
Entretanto contratou-se a “Translousada” como subempreiteira, facto de que tem
conhecimento na medida em que em recepcionaram facturas dessa empresa respeitante
300
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
a esses serviços. O depoente contactava o Dr. Carlos Silva da “Translousada”. Os
assuntos relacionados com a “Norlabor”, “João Tello” e “Ecorumo” eram também
tratados com essa testemunha.
Na lixeira a “Resin” manteve-se a operar com funcionários até ao seu
encerramento (não se recorda em que data). Sabe disso por causa das facturas que eram
emitidas à CMF (o depoente falava sempre com a testemunha Terezinha).
Só em 1997 é que o depoente deixou de fazer facturação e de contactar com
clientes para pagar.
Entretanto, mais tarde, ficou incumbido da cobrança a clientes.
Precisou que com a testemunha Terezinha só contactava por telefone, sendo
certo que ela nunca lhe transmitiu que inexistia suporte legal para que as facturas
fossem pagas. Dizia-lhe apenas que a CMF não tinha disponibilidade de tesouraria para
proceder ao pagamento.
Nesse período a “Resin” continuava a operar na lixeira de Sendim e pagava ao
subempreiteiro (“Translousada”) apesar de não ter recebido da CMF.
Só quando o Dr. Carlos Silva, em face das dificuldades de tesouraria da “Resin”,
propunha o pagamento com letras é que mandaram falar com o director financeiro.
Análise crítica
Conforme emerge do documento de fls 142 e ss. do apenso 97 (documento
apreendido na “Resin”) a abertura do “concurso limitado” em causa foi igualmente
simulado (nos termos já referidos), pois na verdade tratou-se do estratagema encontrado
para pagar à “Resin” os trabalhos que esta realizou na lixeira de Sendim entre Fevereiro
de 1995 e Julho do mesmo ano (“3ª fase”), sendo certo que a forma encontrada para que
a “Resin” obtivesse o pagamento dos trabalhos realizados até Dezembro desse ano (“4ª
fase”) seria através do expediente mencionado a fls 144 do apenso 97, portanto, ainda
com recurso ao contrato de adjudicação em causa celebrado com a “Norlabor”,
designadamente pela existência de “trabalhos a mais”.
Isso mesmo aliás emerge de forma mais ou menos pacífica dos depoimentos
prestados (não totalmente coincidentes porém quanto ao período de trabalhos que foram
pagos através desse expediente), em especial dos arguidos envolvidos e dos
representantes da “Norlabor” e da “Translousada” (cfr. os depoimentos das testemunhas
Carlos Soares Silva, José António Brandão Barros Sousa, Adriano Ferreira e Carlos
Sousa).
Sinal dessa simulação (relativa) é ainda o facto de ter sido a “Resin” quem
remeteu à CMF a relação das empresas a convidar e de ter sido ela a destinatária final
dos três pagamentos efectuados pela autarquia felgueirense.
Consequentemente, os convites endereçados, as propostas apresentadas, a
respectiva abertura e análise tratou-se de um encadeado de actos combinados e
conformados numa espécie de concurso limitado em ordem ao desfecho que se viu,
culminando numa adjudicação de trabalhos que já se haviam realizado à data e no
almejado pagamento dos mesmos à “Resin”.
De facto, a “Norlabor”, por seu turno, nada fez na lixeira de Sendim (foi a
“Translousada” quem no terreno forneceu maquinaria com condutor - cfr com relevo o
depoimento da testemunha Mário Silva), como admitiram os seus então responsáveis
(de resto, o contrato foi assinado a 24.01.96 e a 26.02.96 foi emitida a respectiva factura
nº 427, elaborada pela testemunha Susana Alves, sinal evidente de que os trabalhos já
estariam realizados, visto que nesse curto período de tempo não seria possível executar
os trabalhos previstos no caderno de encargos).
301
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
De resto, curiosa foi a forma como foi assinado o auto de consignação da obra
(cfr. documento de fls 118 do apenso 95-A e o depoimento da testemunha José António
Brandão Barros Sousa).
O surgimento das empresas concorrentes (para além da “Resin”) tratou-se pois
de um mero favor, dadas as relações existentes entre umas e outras (referida na parte
introdutória da pronúncia) – cfr. os depoimentos prestados a esse propósito,
designadamente pelos responsáveis de algumas dessas empresas.
Note-se que essa solução terá sido engendrada na reunião ocorrida na CMF a
11.04.95 e a que o documento de fls 2275 do 10º volume faz alusão (trata-se de uma
informação elaborada pela testemunha Terezinha).
O documento em causa foi explicado de forma convicente pela testemunha
Terezinha, a qual foi muito assertiva na afirmação de que estiveram presentes na aludida
reunião as pessoas mencionadas na pronúncia.
Os arguidos Júlio e Barbieri Cardoso negaram porém terem estado presentes,
mas fizeram-no de forma pouco assertiva e estribados, “grosso modo”, no facto daquele
apontamento escrito da testemunha Terezinha ter sido dirigido ao presidente da
autarquia - o arguido Júlio Faria - e deste ter aposto um despacho de concordância,
mandando remeter cópia, designadamente, ao arguido Barbieri, o que na sua óptica não
faria sentido se eles tivessem estado presentes na dita reunião; a este argumento ripostou
porém a testemunha Terezinha, afirmando que tal não é necessariamente assim, pois
limitou-se a colocar por escrito o resumo do que nela foi discutido, sendo certo que essa
reunião ocorreu no gabinete da presidência, o que naturalmente pressupôs a presença do
presidente da edilidade, além de que a remessa de uma cópia dessa informação a cada
uma das pessoas mencionadas no despacho aposto pelo arguido Júlio Faria nada tem a
ver com o facto de terem estado presentes ou não nessa reunião; o arguido Vítor Borges
referiu, por seu turno, não se recordar quem esteve presente nessa reunião, não tendo
porém a ideia de ter estado nela com o arguido Barbieri pois não se discutiram ali
questões de ordem técnica. Ora, tratando-se de um assunto de suma importância, tendo
aliás chegado a “Resin” a ameaçar não continuar com o tratamento do lixo por falta de
pagamento, mal se compreenderia que o presidente da edilidade não estivesse presente
nessa reunião. Deu pois o Tribunal crédito ao depoimento da testemunha Terezinha,
sendo certo que não se vê por parte desta testemunha qualquer interesse em sustentar
uma posição que prejudica as posições assumidas pelos arguidos Júlio e Barbieri, tanto
mais que manifestou claro desconforto pelo facto de depôr como testemunha neste
julgamento, dada a circunstância de ser funcionária camarária e de algumas das suas
afirmações poderem prejudicar, designadamente, as posições de um ex-presidente da
CMF, da actual presidente da edilidade e de um colega de trabalho. Além disso, a
suposta ausência do arguido Barbieri coaduna-se mal com o facto de ter sido a ele quem
foi dirigida a relação das empresas a convidar para o dito concurso, conforme fax de fls
301 do apenso 21, sinal de que estava por dentro da maquinação em causa.
É certo que o arguido Barbieri referiu que não deve ter recebido o documento de
fls 301 do apenso 21 (pois não o despachou, além de que os serviços já estavam a contar
com a dita lista de empresas a convidar). Fê-lo porém sem assertividade e estribado
apenas no facto de não ter aposto qualquer despacho nesse documento.
Ora, o certo é que a testemunha José Ferreira referiu inicialmente que foi o
arguido Barbieri quem lhe forneceu essa lista para que o depoente elaborasse os
respectivos convites, acabando mais tarde por manifestar dúvidas acerca do facto desse
arguido ter recebido o fax de fls 301 do apenso 21 na medida em que mereceria por
parte dele um despacho.
302
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Porém, por um lado, a inexistência de um despacho nesse documento por banda
do arguido Barbieri é uma premissa pobre em ordem a dar-se como demonstrada a
versão desse arguido e, por outro lado, a verdade é que o dito fax foi-lhe dirigido (e não
a quem tinha a responsabilidade pelos concursos nessa área – a testemunha Ferreira
Leite), o que certamente não sucedeu por acaso conforme apontam as regras da
experiência comum (alguém acredita que esse documento iria ser remetido a quem não
estivesse por dentro do esquema? 8 ).
De resto, convencemo-nos que o arguido Barbieri colaborou no favorecimento à
“Resin” quando o interesse desta coincidiu com o interesse da CMF (quando isso não
sucedeu este arguido adoptou posições que contrariaram as pretensões daquela empresa,
conforme o mesmo salientou ao explicar alguns dos documentos que fez juntar com o
recurso das medidas de coacção que lhe foram impostas – cfr. apenso 137).
Tal não significa, porém, que o Tribunal se tenha convencido que o arguido
Barbieri soubesse que dessa forma a “Resin” procederia a “retornos” de verbas, com as
quais o PS de Felgueiras e a arguida Fátima se financiaram.
Convencemo-nos porém que ele bem sabia e participou no encadeado de actos
que visavam pagar os trabalhos efectuados ou a efectuar pela “Resin” na lixeira de
Sendim, já que isso coincidia com o interesse da autarquia.
A sua actuação, acima descrita, demonstra isso mesmo.
Não podia contudo ignorar que dessa forma a “Resin” – através do expedidente
da simulação do concurso e da adjudicação dos trabalhos à “Norlabor” – viria a auferir
das inerentes vantagens económicas através dos pagamentos que de facto lhe foram
efectuados pela CMF através de interposta empresa (a “Norlabor”), passando ainda pela
“Translousada”.
Isto é, os trabalhos foram de facto adjudicados à “Resin” – a qual daí retirou as
inerentes vantagens económicas – sem que fosse adoptado o legal procedimento
administrativo que pudesse conduzir a essa adjudicação de facto dos trabalhos
realizados na lixeira de Sendim. O procedimento adoptado não pode assim deixar de
representar um desvio aos deveres inerentes a quem, na CMF, desempenhava as funções
próprias dos cargos para os aquais foram eleitos (arguidos Júlio Faria e Fátima
Felgueiras, com a conivência do arguido Barbieri).
Resta saber se esse facto, neste caso, tem relevância penal, conforme iremos
analisar a propósito da fundamentação de direito.
Seja como for, note-se que o arguido Barbieri não é político, não se encontra
filiado no PS e é um simples funcionário camarário, sendo certo que nenhum meio de
prova produzido aponta no sentido inequívoco de que ele sabia que o PS de Felgueiras e
a arguida Fátima se financiaram daquela forma.
Além disso, ele explicou que o Eng. Ferreira Leite não integrou as comissões de
análise na medida em que não tem formação académica que lhe permitisse analisar as
propostas (é licenciado em engenharia electrotécnica), explicação que parece ter lógica
e, nessa medida, é credível (cfr. ainda o quadro de pessoal alusivo às competências dos
funcionários camarários, juntos no apenso 137 pelo arguido Barbieri Cardoso).
Quanto ao despacho que determinou a abertura do concurso, quanto aos convites
endereçados às empresas indicadas pela “Resin” (e a esta), quanto às propostas
apresentadas, quanto à respectiva abertura a 19.12.95, quanto ao respectivo relatório de
análise pelo Departamento Técnico da CMF (chefiado pelo arguido Barbieri), quanto ao
contrato de adjudicação dos trabalhos à “Norlabor”, quanto à emissão da factura nº 427,
quanto à interpelação de pagamento de fls 293 do apenso 97, quanto às autorizações de
8
A expressão “esquema”, neste contexto, reporta-se apenas à simulação do concurso limitado, com vista
à efectivação dos pagamentos da CMF à “Resin”.
303
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
pagamento, quanto aos três pagamentos efectuados pela CMF, quanto aos recibos
emitidos pela “Norlabor” e quanto ao circuíto do dinheiro até chegar à “Resin”,
passando pela “Translousada”, remete-se para os documentos mencionados na
pronúncia, para os depoimentos acima transcritos por súmula, em especial dos arguidos
Fátima Felgueiras, Vítor Borges, Barbieri Cardoso e Carlos Marinho, e das testemunhas
José Joaquim Mesquita Teixeira de Oliveira (em conjugação com os relatórios de fls
2285 e ss. e 4140 e ss.), Amadeu Fernando Costa Monteiro de Magalhães (que fez a
análise da factura nº 427 no relatório de fls 1893 e ss.), Carlos Soares Silva, Susana
Alves, José António Brandão Barros Sousa, Adriano Ferreira e Carlos Sousa.
Terá sido por alturas da reunião referida (em Abril de 1995) que os arguidos
Júlio Faria e Fátima Felgueiras, conluiados com o arguido Vítor Sousa, terão concebido
o plano que lhes permitiu obter o financiamento, designadamente das suas actividades
partidárias, aproveitando o lançamento do referido concurso limitado.
Esse facto decorre da circunstância da reunião onde foi decidida a abertura desse
concurso ter ocorrido em 11.04.95, de no âmbito do contrato celebrado entre a CMF e a
“Norlabor” terem existido dois “retornos” e de terem sido os ditos arguidos Júlio e
Fátima os beneficiários últimos de tal arrecadação de verbas.
Cerca de dois meses depois o arguido Júlio é convidado para integrar as listas do
PS às eleições legislativas e é pelo menos nessa altura que a arguida Fátima vê mais
próxima a expectativa de comandar os destinos da CMF e de naturalmente vir a
encabeçar a lista do PS à CMF nas eleições autárquicas que iriam ocorrer em Outubro
de 1997, factos que, com toda a naturalidade, se vieram a concretizar.
Acerca da suposta sobrevalorização dos trabalhos em ordem a permitir os
“retornos” e os recebimentos, mais à frente melhor explicitaremos a razão de ser da
convicção do Tribunal (sendo certo que, adiantámos já, da simples análise dos fluxos
financeiros não é possível tirar qualquer ilacção a esse propósito – cfr. os relatórios de
fls 1893 e ss., 2285 e ss. e 4140 e ss. -, de modo que então veremos se foram produzidos
outros meios de prova atendíveis que corroborem ou não a versão dos factos sustentada
na pronúncia, designadamente o mapa de fls 22 do apenso 12 e os documentos de fls
159 e 163 dos autos principais, em conjugação com as declarações prestadas a propósito
pelo arguido Horácio Costa, as quais, na óptica do Tribunal, podem e devem ser
valoradas – cfr. a este propósito a posição expressa pelo Tribunal na 75ª sessão da
audiência de julgamento, fls 13609 dos autos principais).
O crédito formalmente detido pela “Norlabor” sobre a CMF, antes da sua
liquidação total, foi considerado entretanto de cobrança duvidosa (cfr. a respectiva
conta-corrente e as declarações da testemunha Célia Martins).
A explicação dada pela testemunha Célia Martins não foi inteiramente
convincente, sendo certo que, tratando-se de facto de um crédito que a “Resin” detinha
sobre a CMF, percebe-se que nenhuma acção judicial tenha sido intentada de modo a
que coercivamente viesse a obter o respectivo pagamento, tanto mais que a “Resin”
viria a compensar-se através da empolação de valores no âmbito do concurso
internacional referido no ponto 1.5., conforme mais à frente iremos ver.
Concluiu em todo o caso o Tribunal que do ponto de vista contabilístico nenhum
óbice existe a que uma empresa que detenha um crédito sobre uma autarquia efectue a
provisão respectiva caso, por qualquer motivo atendível, venha a considerar de cobrança
duvidosa tal crédito; simplesmente, de tal operação não resultará qualquer benefício em
termos fiscais (cfr. o depoimento das testemunhas Lemolino Velosa, Rui Manuel
Correira de Pinho e Luís Esteves).
Por fim, tendo-se consorciado a “Resin” com a “Norlabor” (cfr., designadamente
o depoimento do arguido Vítor Borges e o respectivo contrato), ultrapassando-se dessa
304
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
forma a dificuldade daquela não dispôr de alvará, percebe-se que o facto dela não ter
afinal vencido o “concurso limitado” (chamemos-lhe assim) e de no circuito do dinheiro
se ter interposto a “Translousada”, só pode significar que se procurou deliberadamente
ocultar o “esquema” montado, sinal de que os seus mentores estavam perfeitamente
cientes da ilegalidade do procedimento adoptado.
Isto é, o facto do concurso limitado em causa ter sido vencido a “Norlabor” e de
no circuito do dinheiro se ter interposto a “Translousada”, inculca a ideia de que, de
facto, o esquema engendrado pelos arguidos Fátima Felgueiras, Júlio Faria e Vítor
Borges foi delineado de modo a esconder os “retornos”. Se assim não fosse, que
necessidade haveria de fazer vencer o dito concurso limitado pela “Norlabor” (a “Resin”
poderia perfeitamente ter vencido esse concurso, associada a uma empresa com o
necessário alvará, já que o objectivo primordial era o do pagamento dos serviços que
prestara na lixeira entre Fevereiro e Julho de 1995)? E que necessidade haveria de fazer
interpor a “Translousada” no circuito dos pagamentos efectuados pela CMF? Aliás, nos
procedimentos referidos nos autos, esse esquema de movimentação de verbas é mais
complexo nesta situação, o que por certo não terá sido por acaso (o próprio arguido
Barbieri mostrou-se surpreendido pelo facto da “Resin” não ter apresentado a proposta
com o preço mais baixo e assim não ter vencido o “concurso”, pois era ela quem
operava na lixeira de Sendim e o procedimento em causa destinava-se a pagar-lhe esses
trabalhos).
O ajuste directo referente à adjudicação da empreitada de “Exploração e
Manutenção do Aterro de Felgueiras”
Reprodução por súmula dos depoimentos prestados a esse propósito
- Arguida Fátima Felgueiras
Referiu que os serviços camarários propuseram a realização de um concurso
público limitado para a adjudicação da empreitada de “Exploração e Manutenção do
Aterro de Felgueiras”, no valor de 33.600.000$00, pelo prazo de 1 ano, tendo sido
enviados os respectivos convites às empresas mencionadas no despacho de pronúncia e
nas condições também ali mencionadas (cfr. fls 196 e ss. do apenso 98).
Reconheceu ainda os termos da pronúncia quanto às propostas apresentadas
pelas firmas convidadas (cfr. fls 210 e ss. 223 e ss., e 235 e ss. do apenso 98).
Em face do parecer técnico emitido pelo Departamento Técnico da CMF (ao
tempo chefiado pelo arguido Barbieri Cardoso), referiu ter proferido o respectivo
despacho decidindo a adjudicação dos trabalhos em causa à “Resin”, datado de 17.04.96
(cfr. fls 241 do apenso 98 – despacho de 16.04.96 a determinar o ajuste directo à firma
ordenada em 1º lugar -; e fls 242 e 243 do mesmo apenso 98 – despacho datado de
17.04.96 a adjudicar os trabalhos à “Resin”).
O contrato respectivo veio a ser outorgado a 24.04.96, conforme descrito na
pronúncia, sendo certo que os pagamentos ficariam dependentes do visto do TC (cfr. fls
317 e ss. do apenso 98).
Sucede porém que, segundo referiu, o TC não emitiu o respectivo visto, tendo
perguntado à CMF pelo necessário alvará da empresa que iria executar as obras em
causa (cfr., em todo o caso, o teor do documento de fls 316 do apenso 98 e os
documentos de fls 219 a 222 do mesmo apenso, alusivos ao alvará da “João Tello”).
Na sequência disso, referiu que, por lapso dos serviços, não terá sido enviado ao
Tribunal de Contas o alvará da firma que, nos termos da proposta apresentada pela
“Resin”, por subempreitada, iria executar esses trabalhos (a firma “João Tello”).
305
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
Ora, como não era opção a paragem dos trabalhos (já que a recolha e tratamento
do lixo era uma necessidade diária e inexistiam alternativas) e porque era premente a
resolução do problema (o que não se compadecia com o tempo necessário para
responder e pela concessão do visto, isto é, segundo calcula, cerca de 30 dias), optou-se
por não responder ao TC e pelo ajuste directo à “João Tello” de tais trabalhos
(formalizado a 10.09.96; cfr. fls 325 do apenso 98), não se recordando já das demais
opções que se chegaram a equacionar na altura, sendo certo que a “Resin” trabalhou no
local até à recusa do visto pelo TC, sem qualquer contratualização entre Janeiro e Abril
de 1996, serviços esses que teriam de ser pagos, daí a celebração com esta empresa do
contrato de transacção referido nos autos, a 20.09.96 (cfr. fls 314 do apenso 98).
Quanto ao documento de fls 255 do apenso 98, onde é feita a referência à
reunião de 04.09.96, pelas 17.30 horas, referiu ter sido a primeira vez que o viu,
parecendo-lhe no entanto que a letra é da Drª Fernanda Castro Leal e que no verso
reconhece a letra do arguido Barbieri Cardoso.
Em todo o caso, assegurou ignorar se naquela data as pessoas mencionadas na
pronúnica se reuniram ou não.
Quanto aos pagamentos efectuados à “Resin” no âmbito desse contrato de
transacção, referiu que as respectivas facturas não lhe chegavam às mãos, sendo os
serviços que controlavam o que devia ser pago, pelo que a depoente apenas se limitava a
assinar as respectivas ordens de pagamento.
Do mesmo modo se processavam os pagamentos à “João Tello”, admitindo que
os pagamentos sofreram atrasos, em face das disponibilidades financeiras da CMF.
Confirmou o teor do documento de fls 343 do apenso 98 (cfr. a missiva da “João
Tello” com a qual remete a factura nº 49, onde a arguida Fátima apôs um despacho
datado de 11.06.97, onde chamava a atenção para o términus do contrato e que a partir
daí seria de imputar ao aterro da Lustosa – selagem da lixeira de Sendim) e o teor da
comunicação à AMVS constante de fls 168 do apenso 21, de sorte que a facturação dos
serviços de selagem da lixeira de Sendim foram remetidas à AMVS (o que só ocorreu
com a construção do aterro de RIB do calçado).
Mais referiu ignorar se de facto a “João Tello” trabalhou ou não na lixeira de
Sendim, sendo certo que para a depoente só a “Resin” trabalhou no local.
- Arguido Vítor Borges
Explicou que na continuidade dos trabalhos que iam sendo executados na lixeira
controlada de Sendim houve a necessidade de pagar à “Resin” os serviços em causa.
Sem grande assertividade, referiu que o concurso em causa reportava-se
essencialmente à execução de trabalhos ainda não prestados e, talvez, também ao
pagamento dos trabalhos efectuados entre Janeiro e Abril de 1996 pela “Resin” (entre a
data da adjudicação dos trabalhos à “Norlabor”, conforme referido no ponto 1.3., e o
ajuste directo a que se reporta este capítulo).
Não se recorda de qualquer reunião onde se tenha abordado este assunto, pese
embora admita que a mesma possa ter acontecido.
De resto, o depoente não foi consultado acerca das empresas que deveriam ser
convidadas a apresentar as respectivas propostas (naturalmente que a CMF aproveitou a
indicação anterior referida a propósito da matéria vertida no ponto 1.3 da pronúncia).
Ainda sem grande assertividade, referiu que pensa não ter existido consertação
entre as diferentes empresas no sentido da “Resin” apresentar a melhor proposta (não
descarta porém essa hipótese).
Confirmou o teor do documento constante de fls 83 do apenso 98 (sinal de que a
“Resin” continuava a prestar os seus serviços no terreno). A esse propósito referiu que
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
não foi o depoente quem enviou o fax em causa – como aliás se depreende do seu teor -,
sendo certo que a “Resin” alugava camiões para transporte de terra e gravilha,
necessária para a execução dos trabalhos (mormente para a cobertura do lixo), daí a
solicitação que efectuou à “Translousada” não obstante ela operar no terreno.
Confirmou a celebração a 24.04.96 do contrato com a CMF por ajuste directo,
nos termos descritos na pronúncia, e que o Tribunal de Contas recusou o visto, ao que
parece, pelo facto de não ter sido apresentado o alvará da “João Tello” (com quem
formalmente concorreu associada, pese embora esta empresa apenas tenha
“emprestado” o seu alvará) – cfr., em todo o caso, o teor dos documentos de fls 317 e
ss. do apenso 98 (contrato de adjudicação à “Resin”) e o teor de fls 219 a 222 do mesmo
apenso (apresentação do alvará da “João Tello” com a proposta).
Foi então chamado à CMF a fim de se resolver o problema, na medida em que,
em face da recusa do visto pelo T.C. as obras teriam de parar, o que na realidade nunca
chegou a suceder (visto que os lixos eram depositados diariamente), pelo que mais uma
vez foram prestados serviços pela “Resin” sem qualquer contratualização formal (cfr. o
documento de fls 255 do apenso 98, alusivo a essa reunião ocorrida a 04.09.96).
Para solucionar o impasse equacionaram-se várias hipóteses, tendo-se optado
pelo ajuste directo à “João Tello” dos trabalhos mencionados na proposta apresentada
formalmente por ela e pela “Resin” (afastou-se a possibilidade de se adjudicar os
trabalhos ao segundo classificado por ter uma proposta mais onerosa para a CMF).
Seja como for, não obstante, a “João Tello” nada fez no terreno, pois, como
disse, essa empresa apenas “emprestou” o seu alvará (tal empresa tinha sido aliás
indicada pela “Translousada”. Do mesmo modo, a “Craveira” foi também indicada por
aquela).
Subsistia porém o problema do pagamento dos trabalhos efectuados pela
“Resin” entre Janeiro e Agosto de 1996, isto é, entre a data da celebração do contrato
referido no ponto 1.3. entre a CMF e a “Norlabor” (a 24.01.96) e a recusa do visto pelo
TC (comunicada à autarquia no dia 23.08.96).
Consequentemente, foi celebrado o contrato de transacção cuja cópia se acha a
fls 314 e ss. do apenso 98, onde se constata que o valor ali encontrado corresponde ao
preço praticado pela “Resin” referente a 4 meses e 10 dias (a 2.800.000$00 por mês +
IVA).
Pese embora formalmente tivesse sido expresso nesse documento que se
destinavam a pagar os trabalhos efectuados entre 25.04.96 (dia seguinte ao da
adjudicação) e a data cessação dos trabalhos na sequência da recusa do visto pelo TC,
certo é que tal paragem nunca ocorreu.
O montante ali em causa terá sido pago (tem quase a certeza desse facto,
segundo expressou – cfr. a factura de fls 320 do apenso 98, datada de 30.09.96, e o
recibo de fls 321 do mesmo apenso, datado de 16.01.97).
Confirmou a celebração do contrato a que se reporta o documento de fls 325 e
326. do apenso 98 entre a CMF e a “João Tello” (o valor de 16.800.000$00 + IVA
corresponde a 6 meses de trabalho a 2.800.000$00 + IVA).
Confirmou que a “João Tello” recebeu os valores acordados e fê-los chegar à
“Resin”.
Explicou ainda que a selagem da lixeira de Sendim estava incluída no concurso
a fundos comunitários para a construção do aterro de Felgueiras, pelo que a partir do
momento em que no âmbito do concurso internacional lançado para o efeito ganhou a
proposta apresentada pela “Resin/Sita/ECOP” a arguida Fátima Felgueiras deu
instruções para que a facturação fosse emitida em nome da AMVS (cfr. documento de
fls 168 do apenso 21).
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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo
A propósito do documento de fls 286 do apenso 98 (comunicação da
“Translousada” para a CMF) explicou que nunca falou com alguém da “João Tello”,
pois foi a “Translousada” ou a “Norlabor” – na pessoa do Sr. Carlos Silva, sócio de
ambas as empresas - que indicou essa empresa e diligênciou pelo “empréstimo” do
alvará.
A propósito dos cheques de fls 2450 e 2451 e do respectivo endosso pela “João
Tello” não sabe quem apôs o respectivo carimbo e quem assinou o respectivo endosso,
tanto mais que na altura não sabia sequer a identidade dos sócios dessa empresa.
Ignora de quem é a assinatura que subscreveu (em representação da “João
Tello”) a declaração de recebimento na ordem de pagamento da CMF constante de fls
336 do apenso 98.
No auto de recepção definitivo da obra, datado de 19.02.98 (cfr. fls 311 do
apenso 98) constatou-se que não existe a assinatura do legal representante da “João
Tello”, o que terá motivado o envio pela CMF, na pessoa do arguido Barbieri Cardoso,
da missiva de fls 310, datada de 24.03.98, o que terá pressuposto a dificuldade da CMF
em contactar a “João Tello”.
Entretanto, a fls 307 do apenso 98 consta uma comunicação da “João Tello” à
CMF solicitando o levantamento da caução prestada (por retenção de 5% do valor da
empreitada), datada de 11.02.98 (onde se verifica que o carimbo aposto e supostamente
da “João Tello” é diferente do carimbo dessa firma que consta do verso dos cheques de
fls 2450 e 2451 referente ao endosso e das facturas por si emitidas à CMF (cfr. fls 307;
os carimbos apostos a fls 330 e 331 não são da gerência).
Concluiu ter a ideia de que a “João Tello” entretanto foi declarada falida em data
muito posterior a esses factos.
- Arguido Carlos Marinho
Foi-lhe dito pelo arguido Vítor Borges que o Tribunal de Contas chumbou o
visto, pelo que deixou de ser possível o ajuste directo da obra de “exploração e
manutenção do aterro de Felgueiras”.
Foi então emitida uma factura à CMF no valor de 12.133.334$00, constante de
fls 320 do apenso 98, reportada aos trabalhos efectuados entre 24.04.96 (data da
celebração do contrato de empreitada com a CMF) e 20.09.96 (cfr. ainda o respectivo
recibo de fls 321 do apenso 98, datado de 16.01.97; cfr. ainda o contrato de transacção
celebrado entre a CMF e a “Resin” a 20.09.96, constante de fls 314 do apenso 98).
A partir desta última data passaram a facturar à “João Tello” pela mesma razão
que antes haviam facturado à “Translousada”, isto é, tal facturação reportava-se a
trabalhos já realizados pela “Resin”, sendo pois esta a destinatária final dos pagamentos
efectuados pela CMF à “João Tello”, a qual apareceu neste circuito pela mão do Sr.
Carlos Silva da “Translousada”.
Foi confrontado então com o teor do documento de fls 242 do apenso 98
(despacho que decidiu adjudicar a empreitada à “Resin”), com o teor do contrato cuja
cópia se acha junta a fls 317 do apenso 98 (contrato de empreitada celebrado entre a
CMF e a “Resin” a 24.04.96) e o contrato de empreitada celebrado entre a CMF e a
“João Tello” (constante de fls 325 do apenso 98), celebrado na sequência da recusa do
visto pelo Tribunal de Contas relativamente ao primeiro dos contratos de empreitada
referidos, documentos esses que não pôs em causa.
Esclareceu que a administração da “Resin” lhe deu instruções para facturar à
“João Tello” a partir de 20.04.96 (não se recorda da explicação que então lhe foi dada,
mas que se intui do teor das suas declarações e do facto de formalmente o contrato de
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